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ANGOLA: 45 ANOS DE AFIRMAÇÃO

CULTURAL

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 LUANDASegunda, 09 De Novembro De 2020    20h20

  Cultura

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Luanda – Quando se fala em balanço dos 45 anos da
independência nacional, a primeira sensação é revisitar
o que marcou o país em termos políticos, económicos e
sociais, mas há um sector fulcral que jamais deverá ser
dissociado desta análise global: a Cultura.
(Por Venceslau Mateus, editor da Angop)

A cultura angolana, que se tornou numa importante bandeira do país além-


fronteiras, após a conquista da independência nacional, no dia 11 de Novembro
de 1975, nem sempre "mereceu" o seu verdadeiro valor, fundamentalmente da
parte do regime colonial.

É sabido que Angola, detentora de uma vasta diversidade de povos, línguas e


tradições, registou, contra a vontade dos povos autóctones, um forte processo de
negação às suas origens. 

Face a esta realidade imposta pelas autoridades portuguesas, que "infringiram"


uma ríspida política de oposição aos hábitos e costumes do povo, o país viveu
dividido (em termos de extratificação social) por largas décadas, essencialmente
com dois grupos distintos: os assimilados e os gentios.
Foi com esta estratégia que o regime português procurou dominar as várias
comunidades angolanas, por via da imposição da cultura da negação entre filhos
da mesma Pátria, pondo assimilados (da zona urbana) e gentios (do musseque)
em extremos diametralmente opostos.

Foram, verdadeiramente, anos de luta e determinação para os angolanos


conseguirem impor as suas matrizes étnicas e culturais, diante de um regime
colonial que banalizou, fundamentalmente, a questão da promoção das línguas
nacionais, levando o povo a complexos e estereótipos da sua própria cultura.   

Entretanto, também foi pela mesma cultura que muitos dos melhores filhos da
Pátria (conhecidos e anónimos), tais como religiosos e políticos, criaram, de
forma clandestina, verdadeiras "armas de arremesso" contra os propósitos das
autoridades portuguesas.

Através da música, da poesia e do cinema, bem como de actividades religiosas


clandestinas de movimentos messiânicos, que lutaram com hinos de forte
intervenção patriótica (entoados em línguas nacionais), lançou-se um amplo
movimento de contestação.

Quem não se lembra, a esse respeito, dos históricos escritos do "poeta maior",
António Agostinho Neto, das canções de exaltação dos Ngola Ritmos e do Grupo
Nzaji, da tenacidade de Kimpa Vita, Simão Toco, Gaspar de Almeida e Jesse
Chiula Chipenda (só para citar alguns), que recorreram à cultura, às tradições e à
espiritualidade para combater o regime português, ante um cenário de privações
e cadeias?

De facto, a cultura angolana jogou papel preponderante no alcance e na


materialização do sonho da liberdade e da promoção de Angola no Mundo,
depois do 11 de Novembro, através do canto, da literatura, do cinema, da dança,
das artes plásticas e outras manifestações artísticas.  

É inquestionável que a cultura tenha contribuído, decisivamente, não só para a


conquista da independência, mas também para o reconhecimento internacional
da Nação.
Na essência, Angola é um estado multi e transcultural, que abriga, desde a época
colonial, diversas culturas, várias línguas, costumes e origens diferentes.

Uma das maiores matrizes do país é a sua diversidade linguística, sendo que
estudiosos apontam para a existência de 42 idiomas regionais, além da língua
oficial (português) sendo, neste particular, considerado uma excepção dentro do
continente africano.

Embora as línguas nacionais sejam as línguas maternas da maioria da


população, a Língua Portuguesa é o primeiro idioma de 30 por cento da
população angolana, estimada em mais de 30 milhões. 

Foi neste particular da afirmação das línguas nativas que Angola sentiu os
maiores obstáculos na época colonial, com resquícios que se arrastaram desde
os primeiros anos de liberdade até aos dias actuais, exigindo, do Governo, a
adopção de políticas mais eficazes de promoção dos idiomas locais.

Apesar das barreiras que ainda persistem na promoção da cultura, deve-se


reconhecer que, em pouco menos de meio século de soberania, o país viu subir a
sua cotação na arena internacional, e assiste, desde a década de 1970, a um
amplo movimento cultural, nas mais diferentes modalidades artísticas.

Um dos grandes marcos da história do movimento cultural da então República


Popular de Angola (actual República de Angola) foi, sem dúvidas, o 1º Festival
Nacional de Cultura (FENACULT 89),   que reuniu dezenas de artistas e
espectadores, em pleno período de intenso conflito armado.

Realizado no Estádio Nacional da Cidadela, na província de Luanda, o evento


teve grande dimensão internacional, particularmente pela presença, pela primeira
vez, após o exílio forçado na Europa, do músico Alberto Teta Lando, um dos mais
aguardados do festival.

Outro ponto marcante ao longo dos últimos 45 anos foi a primeira manifestação
popular ao ar livre, organizada por angolanos, em Março de 1978, ou seja, o
chamado "Carnaval da Vitória".
A iniciativa surgiu de um veemente apelo lançado pelo primeiro Presidente da
República, António Agostinho Neto, aquando da proclamação da independência
nacional, a 11 de Novembro de 1975, no sentido do retorno imediato às
verdadeiras tradições e raízes do povo angolano.

Era um momento marcante de rompimento total com uma cultura imposta pelos
colonizadores portugueses, numa festa popular que levou às ruas milhares de
angolanos, eufóricos por expressar a sua própria forma de ser, de vestir, de
cantar e de tocar, através da dança e do canto.  

Tratou-se de uma manifestação cultural inédita, que, entre outros propósitos,


visava comemorar a expulsão de mercenários sul-africanos que invadiam Angola.
Vem daí o termo Carnaval da Vitória.

Com esta mega e espontânea festa do povo, os grupos evocavam, através de


canções, alegorias, bandeiras, danças e teatralização, essencialmente, o cenário
de uma batalha vencida, lembrando a sua arte, os vários conflitos armados, os
hábitos e costumes, a política, o luto e as suas cantigas.

Além destes dois eventos, outros acontecimentos importantes marcaram a


história cultural do país ao longo dos seus 45 anos de liberdade, que serão
assinalados a 11 de Novembro.

Instrumento de afirmação no período colonial e factor de união, a cultura


angolana ganhou mais projecção internacional a partir dos anos 70, com o
surgimento de nomes que se tornaram incontornáveis em África e noutros cantos
do Mundo.

Inspirados pelos ganhos da liberdade, figuras ligadas às letras, artes plásticas e


à música transformaram o imaginário numa luta pela afirmação dos angolanos,
tornando o produto nacional apetecível.

Considerados "combatentes da linha da frente" na estratégia de promoção de


Angola, figuras como Agostinho Neto, António Jacinto, José Luandino Vieira,
Pepetela, Manuel Rui Monteiro, Vitex, Liceu Vieira Dias, Elias Dyakimuezu,
Bonga, Alberto Teta Lando, entre outras, elevam, desde os primórdios da
independência, a bandeira nacional a patamares internacionais.
Muitas destas referências motivaram a criação de cátedras em universidades
europeias de renome.

Literatura   

No domínio da literatura, o nome de Agostinho Neto é tradicionalmente citado


como a principal referência, embora Angola tenha produzido outros importantes
escritores, que também se bateram pela liberdade e mostraram a Angola
independente com escritos de elevada qualidade.  

Um dos mais notáveis marcos deste domínio foi a criação da União dos
Escritores Angolanos, na senda de um importante movimento de artistas, entre
os anos 70 e 80, embora a literatura de Angola tenha começado a afirmar-se
ainda antes da independência nacional.

Música 

Usada durante a luta contra o colonialismo português, como meio de transmissão


de mensagens, a música angolana continua a ser das principais referências
culturais do país, fruto da projecção alcançada pelos seus executores ao longo
dos 45 anos de independência.

Com vários nomes que marcaram as diversas décadas e gerações do cancioneiro


nacional, o país teve em agrupamentos como os Ngola Ritmos (liderado por Liceu
Vieira Dias), Duo Outro Negro, Kissanguela, Jovens do Prenda, Kiezos e África
Ritmo, bem como os artistas individuais Bonga, Teta Lando e Waldemar Bastos,
alguns dos pilares para mostrar a sua cultura no Mundo.

Numa miscelânea entre a nova e antiga geração, a música angolana é


actualmente o porta-estandarte da imagem do país, suplantando em alguns
aspectos o vector político, fruto da forte aposta dos seus agentes na
internacionalização do produto musical.

Com Bonga como uma das principais figuras, a música angolana ganhou espaço
no Mundo, nas últimas três décadas, mercê do talento de vários artistas da velha
e nova geração, entre os quais Paulo Flores, Eduardo Paim, Yuri da Cunha,
Anselmo Ralph e Matias Damásio e outras referências.
Fruto do trabalho destes e de outros artistas, a kizomba, semba e o kuduro, por
exemplo, ultrapassaram barreiras e deixaram, hoje, de ser somente de consumo
interno.

Noutra direcção, Angola tem vindo a conquistar prémios e a entrar para a lista do
património mundial, como se deu com a recente inscrição do Centro Histórico de
Mbanza Kongo na lista da UNESCO.     

Bienal de Veneza marca artes plásticas

No domínio das artes plásticas, que tem em “Vitex” uma das suas principais
figuras, Angola espantou o mundo com a conquista do Leão de Ouro na Bienal de
Veneza, em 2013.

Presente no evento, pela primeira vez, o país espantou o mundo com um projecto
"Luanda, Cidade Enciclopédica", tendo como foco, para além de obras de pintura,
um conjunto de quadros fotográficos.

Isso obrigou a uma correria do público ao pavilhão angolano para ver de perto as
bases que levaram a organização a atribuir o mais elevado de apetecível prémio.

Mbanza Kongo: o orgulho nacional

Joía da coroa cultural do país, a secular cidade de Mbanza Kongo, antiga capital
do Reino do Kongo, tornou-se, em 2017, no orgulho de angolanos e da RD
Congo, Congo Brazzaville e Gabão, com a sua inscrição na lista do património
mundial da UNESCO.

Localizada no norte, o centro histórico de Mbanza Kongo tem uma área


classificada que envolve um conjunto cujos limites abrangem uma colina a 570
metros de altitude e se estende por seis corredores.  

Inclui ruínas e espaços, entretanto alvo de escavações e estudos arqueológicos,


que envolveram especialistas nacionais e estrangeiros.
Dividido em seis províncias que ocupavam parte das actuais República
Democrática do Congo, República do Congo, Angola e Gabão, o Reino do Congo
dispunha de 12 igrejas, conventos, escolas, palácios e residências.

Leila Lopes: a beleza angolana no mundo

Se, no domínio das artes, diversos são os nomes que deram e dão o melhor de si
em prol da afirmação de Angola, no mundo da moda o país deu o ar da sua graça
com a eleição da jovem Leila Lopes como Miss Universo, em 2011, num dos mais
expressivos ganhos dos últimos 20 anos.

Num concurso dominado maioritariamente por concorrentes dos países sul-


americanos e da América do Norte, a angolana espalhou beleza, simpatia e
inteligência, conquistando um grupo de jurado “rígido” em termos de critérios d
classificação.

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