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História da música popular angolana

na universidade
A investigação no domínio dos Estudos Culturais Universitários está em
condições de incluir no seu conteúdo a história sistematizada e
rigorosamente datada de todo o processo de evolução da história da
Música Popular Angolana, primórdios da sua formação, desenvolvimento,
consolidação da discografia e respectiva periodização.

18/11/2019  ÚLTIMA ATUALIZAÇÃO 10H14

 
 

João Gomes | Edições Novembro © Fotografia por: Elias dya Kimuezo, um dos maiores intérpretes
angolanos em língua nacional kimbundu
Sabe-se que a afluência dos cantores, compositores e instrumentistas às
zonas urbanas e a absorção da tecnologia musical ocidental, influenciaram
a sonoridade e estrutura da Música Popular Angolana. Formações musicais
que no início da sua formação usavam a viola acústica, dikanza (reco-reco),
caixa (percussão) e o chocalho começaram a introduzir, paulatinamente,
instrumentos eléctricos ou electrificados.
Os estudos sobre a história da Música Popular Angola, que inclui análises
comparativas entre a tradição e modernidade, passam pelo registo dos
primeiros agrupamentos musicais, ou seja, a passagem da fase acústica à
electrificação, processo que poderá contribuir para o surgimento de várias
propostas de periodização da Música Popular Angolana, evidenciando a
música dos anos quarenta, com o Ngola Ritmos, processo de consolidação
do semba, com os Kiezos, até à eclosão da nova geração.
Neste processo, a compilação de documentos dispersos para orientação
epistemológica da geração mais jovem de estudiosos, pode incluir a
biografia dos cantores e compositores, as suas aprendizagens e influências
adquiridas. A intenção é estruturar conhecimentos para melhorar a
qualidade do ensino da Música Popular Angolana, de nível médio e
superior, e motivar o surgimento de teses de pós-graduação, facto que
poderá estimular as instituições universitárias a multiplicar e fazer circular
diferentes publicações sobre o tema, em todas as bibliotecas do País.

Encontro

O debate e análise do estado actual da Música Popular Angolana,deve


identificar, através da realização de um encontro alargado, os factores que
inibem o seu desenvolvimento no domínio da criação, investigação,
produção, edição, distribuição fonográfica, internacionalização, realização
de concertos e festivais, com o objectivo de reforçar o intercâmbio cultural
e comercial entre editores, produtores e distribuidores da discografia
nacional e conhecer o estado da divulgação da Música Popular Angolanana
comunicação social e no mundo.

Tradição

Há um segmento musical configurado no espaço rural, que designamos,


Música Tradicional, ritualizado por diversas práticas e costumes, que se
dimensiona num quadro cultural e antropológico, específico. A música no
campo possui, normalmente, uma função social. Parafraseando, Adriano
Duarte Rodrigues, “Pelo facto de a modernidade se definircomo ruptura, a
tradição representa a únicafonte possível de sentido”.

Línguas

Pela sua dimensão identitária, o Estado deve estimular o uso das línguas
nacionais nas composições da Música Popular Angolana, a reutilização da
poesia angolana nos textos musicais e valorizar os grupos tradicionais,
muitos deles em plena função nas cidades. Torna-se imperioso estimular os
meios académicos a encararem de frente o importante desafio de
aperfeiçoar a expressão oral e escrita em línguas nacionais, o estudo da
cultura e costumes das comunidades, e sua expressividade na Música
Popular Angolana.

Musseques
Com a expansão da colonização portuguesa, Portugal começou a estender
a sua presença do litoral em direcção ao Sul no Século XVII, as cidades
foram crescendo e surgiram, na periferia, grandes aglomerados
populacionais, pré-urbanos, designados musseques. O musseque, do
kimbundo, mu (onde) +seque (areia), traduzindo, onde há areia, por
oposição à zona asfaltada, era considerado o espaço de transição entre o
universo rural e a cidade, que se transformou no principal laboratório
textual das canções, absorvidas pelas expectativas do ambiente cultural
urbano.

Modernidade

Fenómeno interessante ocorreu com o surgimento do conjunto, África


Show, a primeira formação musical angolana que introduziu, com sucesso,
o órgão, traduzindo uma postura estética distintiva e mais enquadrada às
exigências de um público heterogéneo que seguia, em Angola, os grandes
sucessos musicais do Brasil, Europa e Estados Unidos da América.Antes do
África Show, os chamados "Conjuntos de Música Moderna" já tinham
ultrapassado a era acústica. Grupos como os “Indómitos”, “The Five Kings” e
“Os Jovens” do Mário Rui Silva embora fizessem algumas incursões na
música angolana tinham o rock, como género preferencial.

Temas

Os temas das canções do corpus mais representativo da Música Popular


Angolana que vem resistindo ao tempo, evocam situações cuja génese
textual e formato espacial se projectam, maioritariamente, nos musseques,
o filho desaparecido no mar, a garota de mini-saia, o assédio sexual entre o
patrão e a empregada doméstica ( é clássico o verso da canção
“MadyaKandimba”, “sinholauakuatapichitola”, a senhora pegou na pistola,
os conflitos conjugais, a infidelidade amorosa, a condição da lavadeira, o
feitiço e o enfeitiçado, o lamento do amigo ou parente próximo
desaparecido, a exemplo da canção “Lamento do Visconde”, do cantor e
compositor, Óscar Neves, o carnaval, a nostalgia da infância
(consubstanciada na frustração do compositor não ter ido à escola) e a
concretização da praga anunciada , são alguns dos temas mais recorrentes,
registados nos textos das canções da Música Popular Angolana.

Fontes

Para além das personalidades vivas que estiveram expostas à ocorrência


dos fenómenos da história e participaram nos principais momentos de
desenvolvimento da Música Popular Angolana, os arquivos nacionais e
estrangeiros, publicações da época com destaque para jornais e revistas,
“Notícia” e “Noite e dia”, e a documentação de conferências e encontros,
poderão constituir fontes poderosas para reconstituição histórica da
Música Popular Angolana. Ainda sobre as fontes, destacamos os estudos do
jornalista Sebastião Coelho, pioneiro da historiografia da Música Popular
Angolana e figura emblemática da difusão radiofónica e damoderna
produção discográfica angolana, que deixou estudos sobre política, línguas
nacionais, imprensa, artes plásticas e história da Música Popular Angolana,
tendo sido um dos fundadores da Companhia de Discos de Angola (CDA).

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