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2 — Ficha de avaliação
GRUPO I
Apresente as suas respostas de forma bem estruturada.
A
Leia com atenção o seguinte fragmento do Livro do desassossego, de Bernardo Soares.
mostra. Sob as máscaras que as más ideias usam, de boas ou indiferentes, mesmo
dentro de nós eu pelos gestos as conheço por quem são. Sei o que em nós se esforça
40por nos iludir. E assim à maioria das pessoas que vejo conheço melhor do que eles a si
próprios. Aplico-me muitas vezes a sondá-los, porque assim os torno meus. Conquisto
o psiquismo que explico, porque para mim sonhar é possuir. E assim se vê como é
natural que eu, sonhador que sou, seja o analítico que me reconheço.
[…]
45 As coisas são a matéria para os meus sonhos; por isso aplico uma atenção
distraidamente sobreatenta a certos detalhes do Exterior.
Para dar relevo aos meus sonhos preciso conhecer como é que as paisagens reais
e as personagens da vida nos aparecem relevadas. Porque a visão do sonhador não é
como a visão do que vê as coisas. No sonho, não há o assentar da vista sobre o
50importante e o inimportante de um objeto que há na realidade. Só o importante é que
o sonhador vê. A realidade verdadeira dum objeto é apenas parte dele; o resto é o
pesado tributo que ele paga à matéria em troca de existir no espaço.
Semelhantemente, não há no espaço realidade para certos fenómenos que no sonho
são palpavelmente reais. Um poente real é imponderável e transitório. Um poente de
55sonho é fixo e eterno. Quem sabe escrever é o que sabe ver os seus sonhos
nitidamente (e é assim) ou ver em sonho a vida, ver a vida imaterialmente, tirando-lhe
fotografias com a máquina do devaneio, sobre a qual os raios do pesado, do útil e do
circunscrito não têm ação, dando negro na chapa espiritual.
651. Indique as razões que, segundo Bernardo Soares, justificam a inaptidão para a ação
que caracteriza o sonhador.
2. Explicite o modo como os sonhadores adquirem um conhecimento profundo da
Humanidade.
3. Clarifique a relação entre a «máquina do devaneio» (l. 53) e a ideia de «[saber]
70 escrever» (l. 51).
B
Leia o poema «Manhãs brumosas», de Cesário Verde.
Aquela, cujo amor me causa alguma pena,
Põe o chapéu ao lado, abre o cabelo à banda,
E com a forte voz cantada com que ordena,
Lembra-me, de manhã, quando nas praias anda,
5 Por entre o campo e o mar, bucólica, morena,
Uma pastora audaz da religiosa Irlanda.
ENTRE NÓS E AS PALAVRAS • Português • 12.o ano • Material fotocopiável • © Santillana 2
Que línguas fala? A ouvir-lhe as inflexões inglesas,
— Na névoa, a caça, as pescas, os rebanhos!—
Sigo-lhe os altos pés por estas asperezas;
1 O meu desejo nada em época e banhos,
0 E, ave de arribação, ele enche de surpresas
Seus olhos de perdiz, redondos e castanhos.
3
0
GRUPO II
Nas respostas aos itens de escolha múltipla, selecione a opção correta.
Escreva, na folha de respostas, o número do item e a letra que identifica a opção
escolhida.
90Leia com atenção a apreciação crítica do documentário A toca do lobo, realizado por
Catarina Mourão.
Portugal não lida bem com a sua memória. Não é de hoje, é mesmo de sempre, e
é disso que fala o magnífico filme de Catarina Mourão — que já desesperávamos de
95ver chegar ao grande público, depois de ter feito o circuito de festivais ao longo dos
últimos dezoito meses. É do Portugal dos anos de Salazar, e da sua sociedade
atrofiada, que A toca do lobo fala, mas também dos segredos, das mentiras, dos
silêncios e das omissões que continuamos a cumprir quase religiosamente, mesmo
hoje, quarenta anos depois do 25 de Abril.
100 Partindo de uma construção de documentário de fatura tradicional —
depoimentos contemporâneos, imagens de arquivo, pesquisa de matéria —, Catarina
Mourão revela lentamente a verdade do filme como uma paciente investigação
detetivesca, contada na primeira pessoa pela realizadora, com a ajuda preciosa da mãe
que vai preenchendo de memória o que não está nos arquivos e nos registos. Nesse
105processo de avanços e recuos, A toca do lobo desenrola-se como um quebra-cabeças
que nos envolve aos poucos, começando como uma simples curiosidade pessoal para
terminar numa verdadeira reconstrução da história familiar, à volta não de uma
presença mas de uma ausência: Tomaz de Figueiredo (1902-1970), o avô materno que
Catarina Mourão nunca conheceu, escritor que chegou a ser publicado mas cuja
110memória se foi perdendo com o tempo, dentro e fora da família.
A tentativa de devolver espessura a essa memória — convocada pelo acaso de
imagens de arquivo de um programa televisivo onde o escritor se dirige a uma neta
que se poderia vir a chamar Catarina, anos antes de ela ter sequer sido concebida —
transforma-se então numa tentativa de resolver um mistério espicaçado pelas
115inconsistências e pelos silêncios, pelas questões que vieram inclusive separar a família.
E, nessa teimosa insistência em deixar as coisas a remoer, por dizer, por resolver, num
lume brando entre o doloroso e o ressabiado, A toca do lobo amplifica de modo quase
comovente essa dificuldade tão portuguesa de assumir e aceitar a nossa história tal
como é, sem a minimizar nem a empolar; de sabermos olhar para ela como parte de
120um contínuo temporal.
É verdade que a história pode ser escrita pelos vencedores, mas isso não torna os
perdedores menos dignos de nela serem lembrados, e por vezes é nos recantos mais
ENTRE NÓS E AS PALAVRAS • Português • 12.o ano • Material fotocopiável • © Santillana 4
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poeirentos que encontramos a chave que nos permite compreender o que se passou.
A toca do lobo recorda-no-lo, com um pudor extraordinário e uma inteligência
125delicada, e com a capacidade de transformar a história esquecida de uma família na
história de toda uma sociedade ao longo de todo um período, e de explicar quanto de
nós ali está. Ainda bem que este belíssimo filme não fica restrito ao circuito de festivais
— mesmo que as voragens do «mercado» quase o condenem a uma estreia frágil,
A toca do lobo merece que se corra a vê-lo, apenas porque é um dos grandes filmes do
130ano.
Jorge Mourinha, https://www.publico.pt/2016/11/02/culturaipsilon/noticia/contra-o-
esquecimento-1749659, publicado em 2 de novembro de 2016;
consultado em 28 de novembro de 2016 (com adaptações).
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(A) adverbial temporal.
(B) substantiva completiva.
(C) adjetiva relativa explicativa.
(D) adjetiva relativa restritiva.
1656. Na passagem «A toca do lobo recorda-no-lo, com um pudor extraordinário e uma
inteligência delicada» (ll. 32-33), o recurso ao pronome pessoal constitui
(A) uma anáfora.
(B) uma substituição por sinonímia.
(C) uma substituição por hiponímia.
170 (D) uma substituição por meronímia.
7. Na expressão «sem a minimizar nem a empolar» (ll. 27-28), o antecedente dos
pronomes é
(A) «dificuldade».
(B) «a nossa história».
175 (C) «insistência».
(D) «ela».
8. Indique o tipo de coesão assegurado pela palavra «disso» (l. 2).
9. Identifique a função sintática da oração subordinada presente em «É verdade que a
história pode ser escrita pelos vencedores» (l. 29).
18010. Classifique a oração «mesmo que as voragens do "mercado" quase o condenem a
uma estreia frágil» (l. 36).
GRUPO III
Devaneio
185 1. Quimera, fantasia.
2. Ideia de quem devaneia.
3. Delírio, desvario.
Observações:
1951. Para efeitos de contagem, considera-se uma palavra qualquer sequência delimitada por espaços em
branco, mesmo quando esta integre elementos ligados por hífen (ex.: /opôs-se-lhe/). Qualquer número
conta como uma única palavra, independentemente dos algarismos que o constituam (ex.: /2016/).
2. Relativamente ao desvio dos limites de extensão indicados — entre duzentas e trezentas palavras —
há que atender ao seguinte:
200— um desvio dos limites de extensão indicados implica uma desvalorização parcial (até 5 pontos) do
texto produzido;
— um texto com extensão inferior a oitenta palavras é classificado com zero pontos.