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LÍNGUAS
Àrea Disciplinar de Português
11º ano
Grupo I
Grupo II
Creio que o dia mais importante da minha vida foi um sábado de maio de 1977
1 em que entrei para os escuteiros. Eu tinha oito anos. Essa decisão iria
desencadear a sede dos espaços abertos, que por sua vez iria provocar a
curiosidade de ver o que estava do lado de lá desses espaços abertos que é a
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razão de cada viagem. Mas não descobri logo nesse sábado que adorava viajar.
Foi alguns fins de semana depois, quando se marcou um acampamento para a
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nossa faixa etária, os lobitos. O destino era Cantanhede, a cerca de trinta
quilómetros da Figueira da Foz.
Hoje, com as autoestradas e os automóveis, ir a Cantanhede desde a Figueira
da Foz é mais rápido que atravessar o centro de Lisboa. Na altura, precisámos de
várias horas num comboio que parava em todas as estações e apeadeiros do
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ramal da Pampilhosa. Nunca tinha andado de comboio, nunca tinha posto uma
mochila às costas e nunca havia estado mais longe de casa por conta própria do
que nas manhãs da escola primária. Nesse dia cheguei pela primeira vez ao fim
do mundo.
Mas o melhor, o encontro mais importante da minha vida, ainda estava para
acontecer.
15 Acampámos no adro de uma capela no tecido urbano. Nessa noite, cantámos
e representámos histórias escutistas à volta da fogueira. Tínhamos todos entre
oito e onze anos, exceto os dois chefes que nos acompanhavam e que deviam ter
à volta de dezoito. Era a noite mais intensa da minha vida.
Mas o melhor, o encontro mais importante da minha vida, ainda estava para
acontecer.
20 Todas as cidadezinhas portuguesas têm o seu maluquinho de estimação, e
Cantanhede não era exceção. O Joaquim chegou por volta das vinte e duas,
empunhando uma faca de barrar manteiga e gritando desvairado “Seus drogados,
o mundo vai acabar por vossa culpa, eu mato-vos a todos.” Eu fugi para cima da
árvore com mais dois companheiros, outros correram para trás do contentor,
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outros ainda para lá do muro e para trás dos carros. Ríamos e gritávamos,
divertidos e assustados. […]
Gonçalo Cadilhe, “Geografia das Amizades”, in Visão (secção “Viagens”), edição online, 2 de dezembro
de 2011 (consultado em abril de 2015).
1. Para responder a cada um dos itens de 1.1. a 1.7., selecione a opção correta.
1.1. Aquele sábado ficou marcado como o dia mais importante da vida do
enunciador porque
(A) descobriu que o medo iria fazer parte da sua vida.
(B) percebeu a importância dos espaços abertos.
(C) passou por uma aventura inesquecível.
(D) compreendeu que iria ser sempre escuteiro.
1.2. O autor-narrador avalia aquela saída como se tivesse chegado “pela primeira
vez ao fim do mundo” (l. 13),
(A) devido ao percurso longo e fastidioso que fez.
(B) pois Cantanhede ficava muito longe de Lisboa.
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(D) por ter vivido uma experiência aterrorizadora.
1.3. O primeiro período do texto apresenta uma frase complexa, que integra
(A) três orações: duas subordinadas adverbiais e uma subordinada
substantiva.
(B) duas orações: uma subordinante e uma subordinada adverbial temporal.
(C) duas orações: uma subordinante e uma subordinada substantiva
completiva.
(D) três orações: uma subordinante e duas subordinadas (substantiva e
adverbial).
1.6. O elemento sublinhado em “Tínhamos todos entre oito e onze anos” (ll. 16-
17) corresponde ao
(A) sujeito.
(B) complemento direto.
(C) complemento indireto.
(D) vocativo.
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GRUPO III
Como se envelhece rápido, como a sabedoria nada tem a ver com a idade:
não nos tornamos sábios, apenas conscientes de que os riscos são inerentes a
qualquer ação. (…) Mas eu sei que os jovens, no profundo de suas almas, […]
pressentem que respeitar os velhos e achá-los plenos de sabedoria é uma das
armas para enfrentar no futuro a flacidez de seus próprios músculos, a errática
forma da memória, os frios súbitos em pleno verão.
Murilo Carvalho. O Rastro do Jaguar. 2009. Leya.