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INTRODUÇÃO
O Dicionário Brasileiro de Fraseologia é simplesmente um repositó-
rio dos diversos tipos de “discurso repetido” em língua portuguesa, entre os
quais está o provérbio, uma das mais importantes expressões da literatura
oral de todos os tempos e de todas as civilizações.
Patrich Dahlet, apresentando o livro de Regina Rocha, lembra que o
provérbio só pode ser bem compreendido em bloco, visto que a soma de
seus elementos constituintes é insuficiente para estabelecer o seu sentido e
que é um discurso pronto e acabado, que obriga o seu usuário a não alterá-lo
(DAHLET, 1995, p. 8).
Portanto, como forma fixa, pode ser organizado como um vocabulá-
rio porque, apesar da quase impossibilidade de encontrar palavra ou expres-
são com sentido equivalente, tem o seu significado próprio que não se con-
funde com o de qualquer outro no léxico da língua: um elemento lingüísti-
co-literário que pode ser reconhecido por suas características formais e se-
mânticas.
Formalmente, o provérbio “é um verso ou quase verso, apresentando
muitas vezes rima, assonância, metáforas, estrutura geralmente bimembre,
elipse etc.” Semanticamente, “deve encerrar uma mensagem admoestadora
ou conselho” (Cf. ROCHA, 1995, p. 11).
Apresentaremos alguns exemplos extraídos do Dicionário Brasileiro
de Fraseologia para exemplificar as descrições em português da enunciação
dos provérbios sem marcas pessoais, exemplificada por Regina Rocha em
seu livro Enunciação dos Provérbios, p. 73-76.
A enunciação será tratada, aqui segundo os termos definidos por
Benveniste, como a “conversão individual da língua em discurso” (Cf. RO-
CHA, p. 25), de modo que uma frase vaga e generalizada tenha uma aplica-
ção prática e direcionada no discurso.
A língua, na enunciação, é empregada num contexto de relação com
o mundo em que vivemos:
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Portanto, para não se cansar tanto, trago-lhes uma relação dos quatro
tipos marcados por substantivos:
a) substantivos genéricos para pessoas;
b) nomes de animais;
c) nomes de coisas como substitutos de pessoas ou de pronomes pes-
soais;
d) termos abstratos.
Cão que ladra não morde. Lá se foi o melhor boi do meu arado.
Carrapato quer ter tosse. Lagartixa sabe em que pau bate a cabeça.
Cavalo comedor, cabresto curto. Macaco velho não mete a mão em cumbuca.
Cobra que não anda não engole sapo. Mais vale tito-tico no prato que jacu no mato.
Coelho duma cama só morre depressa. Mais vale um burro vivo que um doutor mor-
to.
Coruja não acha os filhos feios.
Mais vale um passarinho na mão que dois vo-
Cutia ficou sem rabo de tanto fazer favor. ando.
De grão em grão a galinha enche o papo. Marimbondo pequenino já mostra que tem
De noite, todos os gatos são pardos. ferrão.
Formiga corta longe de casa. Marrada de vaca velha não derruba marruá.
Formiga sabe a folha que rói. Mata-se a cobra, mas não o veneno.
Formiga, quando quer se perder, cria asas. Muriçoca em beira de água é maruim.
Franga que canta, quer galo. Mutuca é que tira boi do mato.
Galinha ciscadeira acha cobra. Não se pescam trutas a bragas enxutas.
Galinha de olho torto procura o poleiro certo. O carneiro, quando “fasta”, a marrada inda
é maior.
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O pinto já sai do ovo com a pinta que o galo Raposa de luvas não chega às uvas.
tem. Raposa que dorme não apanha galinha.
Onde não há cachorro, galinha carrega osso.
Raposa, cai o cabelo, mas não deixa de comer
Onde nasce a lagarta, aí se farta. galinha.
Onde tem onça, macuco não pia. Sapo de fora não chia.
Ovelha que berra, bocado que perde. Tatu na toca é rei.
Ovelha que é do lobo, Santo Antônio não Tatu velho não se esquece do buraco.
guarda. Traíra, quando não tem o que comer, come os
Papagaio come milho, periquito leva a fama. parentes.
Papagaio só larga do pé, estando seguro pelo Uma andorinha só não faz verão.
bico. Urubu pelado não voa em bando.
Para burro velho, capim novo. Urubu, quando ainda caipora, atola até no
Para cavalo novo, cavaleiro velho. lajedo.
Para gato velho, camondongo. Urubu, quando anda caipora, o de baixo caga
Passarinho sem alpiste não canta. no de cima.
Vaca parida não come longe.
Peixe grande come peixe pequeno.
Vaca velha parece que nunca foi bezerra.
Pinto pelado, urubu camarada.
Veado baleado todo ele é grande e gordo.
Porco velho não se coça em pé de espinho.
Primos e pombos é que sujam a casa.
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Moça com velho casada como velha se trata. Mulher e pote se encontra aos “lote”.
Moça que casa com bacharel não tem quar- Mulher e potro, feito por outro.
tel. Mulher e relógio não se empresta a ninguém.
Moça, chita e fita, não há feia nem bonita. Mulher e vidro sempre estão em perigo.
Moça, só nbão namora com carrapato, por Mulher formosa, doida ou presunçosa.
não saber qual é o macho. Mulher honesta, ter o que fazer é a sua festa.
Mulher andeja fala de todos, e todos dela.
Mulher pariu, quer galinha.
Mulher barbuda, Deus nos acuda!
Mulher que assobia e galinha que canta, fa-
Mulher bem casada não tem sogra, nem cu- ca na garganta.
nhada. Mulher que em jura de homem se fia chora
Mulher boa é prata que soa. de noite e de dia.
Mulher bonita e homem valentão têm muita Mulher ri quando pode, e chora quando
extração. quer.
Mulher calada é pior que boi sonso. Mulher rixenta, nem o diabo agüenta.
Mulher chorosa, mulher fogosa. Mulher sardenta e cavalo passarinheiro,
Mulher de bigode não é pagode. alerta, companheiro!
Mulher se queixa, mulher se dó, mulher en-
Mulher de bigode nem o diabo pode.
ferma quando ela quer.
Mulher de boa vida não tem medo de homem
Mulher só chora, quando se casa, porque is-
de má língua.
so não foi há mais tempo.
Mulher de cabelo na venta, nem o diabo
Mulher tagarela fala de todos, todos falam
agüenta.
dela.
Mulher de cego, se é direita, não se enfeita.
Mulher, arma e cavalo de andar, nada de
Mulher de igreja, Deus nos proteja! emprestar.
Mulher de janela fala de todos, e todos dela. Mulher, cachaça e bolacha, em toda parte se
Mulher de janela, nem costura nem panela. acha.
Mulher doente, mulher pra sempre. Mulher, cavalo e cachorro de caça, se esco-
lhe pela raça.
Mulher e beiju de massa em toda parte se
encontra. Mulher, quanto mais fala, mais mente; quan-
to mais mente, mais jura.
Mulher e chita, cada um acha a sua bonita.
O homem e fogo e a mulher estopa: – vem o
Mulher é como espelho: – pra se sujar basta diabo e sopra.
o bafo.
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O homem fala, a mulher escuta: – vem o di- Um homem prevenido vale por dois.
abo e executa. Velho apaixonado, com pouco está casado.
O homem faz e Deus desfaz.
Velho com amor, inverno em flor.
O homem na praça, e a mulher em casa.
Velho com amor, morte em redor.
O homem põe e Deus dispõe.
Velho é bananeira que já deu cacho.
O homem que junta dinheiro não tem fé em
Velho é jerimum de ponta de rama.
Deus.
Velho gaiteiro, velho menino.
O homem se faz por si.
Velho não se senta sem “Ui!”, nem se levan-
Rapaz é negro de padre.
ta sem “Ai!”.
Rei morto, rei posto.
Viúva é sobejo de defunto.
Se o velho pudesse e o moço soubesse, não
havia nada que não se fizesse.
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Os pés irão onde quiser o coração. Por fora muita farofa, por dentro molambo
Ovo gabado, ovo gorado. só.
Porta aberta, o justo peca.
Palavra dada, vida empenhada.
Porta da rua, serventia da casa.
Palavra de rei não volta atrás.
Pote velho é que dá boa água.
Palavra não é bem de raiz.
Pouco fel faz azedo muito mel.
Palavra não é prego.
Prego batido, ponta virada.
Palavra puxa palavra.
Primeiro o bucho, depois o luxo.
Palavras ditas, pancadas dadas.
Primeiro os dentes, depois os parentes.
Palha não apaga fogo.
Quando a barriga está cheia, toda goiaba
Palmatória quebra dedo, mas não quebra
tem bicho.
opinião.
Quando o mar briga com a praia, quem apa-
Panela no fogo é sinal de barriga vazia.
nha é o caranguejo.
Panela que muito ferve, o sabor perde.
Quando o mar briga com o rochedo, quem
Panela que muitos mexem, ou sai insossa ou sofre é o marisco.
salgada.
Quanto maior é a nau, tanto maior a tormen-
Pão comido, pão esquecido. ta.
Pão grande não acha freguês. Quanto mais alto é o pau, mais bonita é a
Pão, pão; queijo, queijo. queda.
Papel agüenta tudo. Remédio de doido é doido e meio.
Para quem ama, catinga de bode é cheiro. Remendo novo não pega em pano velho.
Pau que nasce torto, tarde ou nunca se endi- Rio se faz é com riacho.
reita. Roma não se fez num dia.
Pau seco não dá embira. Roupa suja se lava em casa.
Pau seco não mata cobra. Saco vazio não pára em pé.
Pé de galinha não mata pinto. Saco vazio não se põe em pé.
Pedra que rola não cria limo. Santo de casa não faz milagre.
Pela boca se aquenta o forno. Se as armas falam, as leis calam.
Pela fumaça se conhece o pau do tição. Tamanco faz zoada, mas não fala.
Pela palha se conhece a espiga. Tantas cabeças, tantas opiniões.
Pelo dedo se conhece o gigante. Tanto vai o pote à bica que, um dia, lá fica.
Pelos santos, adoram-se as pedras. Tanto vale a tampa quanto o balaio.
Penico de barro não dá ferrugem. Terra e cal escondem muito mal.
Pilão seco não dá paçoca. Um grão não enche um celeiro, mas ajuda o
Pimenta-do-reino é preta, mas faz de-comer companheiro.
gostoso. Uma mão lava a outra e ambas lavam o ros-
Pipoca não quer ser feia. to.
Por fora bela viola, por dentro pão boloren- Vão-se os anéis, fiquem os dedos.
to. Vaso ruim não se quebra.
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Por causa de uma esporada, perde-se uma Seguro morreu de velho e Dona Prudência
vaquejada. foi ao seu enterro.
Praga de urubu não mata égua. Seguro morreu de velho, desconfiado ainda
Presunção e água benta, cada um toma o vive.
que quer. Sempre o medo nasceu da culpa.
Primeiro a obrigação, depois a devoção. Silêncio também é resposta.
Princípio de angu é mingau. Sombra de pau não mata cobra.
Princípios ruins, desgraçados fins. Sossego de homem é mulher feia e cavalo
Proibição faz tentação. capado.
Quando a desgraça vem, não olha a quem. Tempo bom é o que já passou.
ENFIM...
Há provérbios com marcas pessoais de primeira (Farinha pouca,
meu pirão primeiro; Todos nós somos filhos de Deus); e de segunda pessoa
(Justiça do Ceará te persiga!), mas a maioria esmagadora é constituída de
construções sem marcas pessoais.
BIBLIOGRAFIA
ROCHA, Regina. A enunciação dos provérbios: descrições em francês e
português. São Paulo: ANNABLUME, 1995, 184 p.
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