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1
Índice
Objetivos .................................................................................................................... 3
Definição de Dislexia ................................................................................................. 4
Etiologia e componentes da Dislexia ....................................................................... 6
Origem da Dislexia ................................................................................................. 6
Componente genética ............................................................................................7
Componente neurológica ......................................................................................7
Critérios de diagnóstico da Dislexia......................................................................... 14
Sinais de alerta e principais comportamentos escolares associados .................... 15
Na primeira infância.............................................................................................. 18
Em idade pré-escolar ............................................................................................ 19
No 1º ano de escolaridade .................................................................................... 19
A partir do 2º ano de escolaridade ...................................................................... 20
Em jovens e adultos .............................................................................................. 22
Consequências emocionais e comportamentais ............................................... 24
Links para aprofundar conhecimentos ................................................................... 26
Referências bibliográficas ........................................................................................ 27
2
Objetivos
3
Definição de Dislexia
DIS – desvio, dificuldade
LEXIA - (do latim) leitura; (do grego) linguagem
4
não sendo ideal para definição clara da problemática, nem permitindo compreender
os défices reais ao nível da leitura e escrita (Fonseca, 2014).
Assim, no final da década de 60, a Federação Mundial de Neurologia utilizou
pela primeira vez o termo “Dislexia do Desenvolvimento”, definindo-a como “um
transtorno que se manifesta por dificuldades na aprendizagem da leitura, apesar das
crianças serem ensinadas com métodos de ensino convencionais, terem inteligência
normal e oportunidades socioculturais adequadas.”
Em 1994, O Manual de Diagnóstico e Estatística de Doenças Mentais, DSM IV,
inclui a dislexia nas perturbações de aprendizagem, sob a designação de
“Perturbação da Leitura e da Escrita” e, em 2003, a Associação Internacional de
Dislexia adotou a seguinte definição:
“Dislexia
é uma incapacidade específica de aprendizagem, de origem neurobiológica.
É caracterizada por dificuldades na correção e/ou fluência na leitura de palavras e
por baixa competência leitora e ortográfica.
Estas dificuldades resultam de um Défice Fonológico, inesperado, em relação às
outras capacidades cognitivas e às condições educativas.
Secundariamente podem surgir dificuldades de compreensão leitora, experiência
de leitura reduzida que pode impedir o desenvolvimento do vocabulário e dos
conhecimentos gerais”.
5
como eram classificados no DSM-IV (2000), com a justificativa de que os indivíduos
que apresentam essas dificuldades podem ter défices em mais do que uma área de
aprendizagem (Franceschini, Aniceto, Oliveira, & Orlando, 2015).
Considerando que estas áreas de aprendizagem são mais utilizadas,
desenvolvidas e exigidas às crianças entre os 6 e os 10 anos de idade, é nesta etapa
que é possível identificar as perturbações de aprendizagem, como a dislexia, uma vez
que alterações no processo de ensino-aprendizagem se tornam mais evidentes, tanto
para os professores quanto para a família e até mesmo para a criança (Schirmer;
Fontoura; Nunes, 2004, citados por Franceschini, Aniceto, Oliveira, & Orlando, 2015).
Todavia, é também comum ouvir comentários de familiares de crianças com
dislexia dizerem “Sai a mim, eu também sou disléxico” ou “Ele é preguiçoso, porque
quando se interessa presta atenção”, e o fator hereditariedade, aliado ao senso
comum, legitimam o diagnóstico de dislexia, tornando-a numa herança natural (Massi
& Santana, 2011). Isto pode constituir uma generalização perigosa, uma vez
que uma coisa é a criança que não quer aprender a ler, outra é a criança que não pode
aprender a ler com os métodos pedagógicos tradicionais. Não podemos assumir
atitudes reducionistas que afirmam que a dislexia não existe, pois ela existe e é
extremamente complexa (Fonseca, 2014).
6
Atualmente atribui-se à dislexia uma base neurológica, com origem genética
e hereditária, constando por isso na história familiar, com maior incidência no sexo
masculino (Ianhez & Nico, 2002, citados por Cabussú, 2009).
Componente genética
Fisher e DeFries (2002) comprovam a base genética da dislexia, ao registar
incidência de dislexia entre gémeos monozigóticos (idênticos) de 68% e dizigóticos
(fraternos) cerca de 8% (Carvalhais & Silva, 2007)1.
Relativamente aos genes implicados na dislexia, assinalam-se os
cromossomas 2p, 3p-q, 6p, 15q e 18p (Teles, 2004; Marques, 2014, citado por Melo, et
al., s.d.).
Componente neurológica
Vários estudos têm também demonstrado a influência de fatores
neurológicos, e apesar de não se poder afirmar que estes causam diretamente
dislexia, é possível relacionar os padrões de alteração cerebral com os padrões
cognitivos e comportamentais observados na dislexia (Capovilla & Capovilla, s.d.).
Nesse sentidos, nos últimos anos, estudos realizados por neurocientistas, com
recurso à Ressonância Magnética Funcional, fMRI, permitiram registar o
funcionamento do cérebro durante tarefas de leitura e escrita e extrair conclusões
sobre as bases da dislexia e, consequentemente, dos métodos educativos mais
promissores.
Com efeito, a neuroimagem “contribui não somente para um diagnóstico
específico quanto aos domínios afetados, como também para uma estratégia
específica, uma vez que cerca de um quinto dos indivíduos com dislexia consegue
7
compensar suas dificuldades de aprendizagem subjacentes e desenvolver
habilidades de leitura adequadas no momento em que atingem a idade adulta, sendo
que os mecanismos pelos quais essa compensação ocorre permanecem, em grande
parte, desconhecidos” (Ciasca, 2000, citado por Melo, et al., s.d.).
A nível cerebral, o plano temporal é uma zona localizada no lobo temporal de
ambos os hemisférios cerebrais, esquerdo e direito. No hemisfério esquerdo situa-se
a área de Wernicke, relacionada com o processamento fonológico e a compreensão
da fala e escrita. Na maioria das pessoas regista-se assimetria dos planos temporais,
sendo maior o do hemisfério dominante para a linguagem (regra geral, o do
hemisfério esquerdo, HE). Este facto ocorre para 70% de indivíduos não disléxicos,
enquanto apenas 30% de pessoas com dislexia apresentam a mesma assimetria. Os
restantes apresentam simetria entre os planos temporais ou assimetria reversa
(maior do lado direito).
Considerando que a definição do tamanho dos planos temporais ocorre entre
o 5º e o 7º mês de gestação, a alteração é congénita. Apesar de não constituir um
fator de diagnóstico, é um fator de risco, especialmente quando ocorre em
simultâneo com outras alterações de foro genético ou neurológico (Capovilla &
Capovilla, s.d.; Bakker, 2002; Pinheiro, 2002).
8
Apesar de não existir um “centro cerebral de leitura”, destacam-se três áreas
no hemisfério esquerdo, que desempenham funções-chave durante esta tarefa:
Girus inferior frontal
o Responsável pela linguagem oral, onde se processa a vocalização e
articulação das palavras, e inicia a análise dos fonemas.
Zona particularmente ativa nos leitores iniciantes e disléxicos,
uma vez que a subvocalização ajuda a leitura por fornecer um
modelo oral das palavras.
Área parietal-temporal
o Responsável pela análise das palavras, através do processamento
visual da forma das letras, da correspondência grafofonémica,
segmentação e reconstrução silábica e fonémica.
Esta leitura analítica processa-se lentamente, sendo a via
utilizada pelos leitores iniciantes e disléxicos.
Área occipital-temporal
o Responsável pelo reconhecimento visual das palavras, pelo que
quanto mais automaticamente for feita a ativação desta área, mais
eficiente é o leitor.
o Zona para onde convergem todas as informações dos diferentes
sistemas sensoriais e onde se situa o “modelo neurológico da palavra”,
que contém informação relevante sobre cada palavra, no que diz
respeito à ortografia (“como parece”), a articulação (“como se diz”) e
o significado (“o que quer dizer”).
9
Verifica-se então que leitores eficientes ativam redes neurológicas das regiões
parietal-temporal e occipital-temporal, ativando percursos de análise rápidos,
conseguindo ler as palavras instantaneamente – em menos de 150 milésimos de
segundo. Em contrapartida, leitores disléxicos recorrem a um percurso lento e
analítico para realizar descodificação das palavras, ativando redes do girus inferior
frontal, vocalizando as palavras, e da zona parietal-temporal, segmentando as
palavras em sílabas e estas em fonemas, para procederem à conversão
grafofonémica e aceder ao seu significado (Teles, 2004).
Efetivamente, as crianças com dislexia apresentam uma alteração no sistema
neurológico que dificulta o processamento fonológico e consequente acesso ao
sistema de análise das palavras e de leitura automática. Em compensação à
dificuldade, recorrem à área de linguagem oral, e a áreas do hemisfério direito (HD),
responsáveis por pistas de suporte à informação escrita (Teles, 2004; Bakker, 2002;
Pinheiro, 2002).
Perante diferentes tarefas de memória visual e memória verbal, observou-se
ativação cerebral similar entre disléxicos e não disléxicos para tarefas de cariz visual,
mas ativação de áreas distintas entre os grupos nas de cariz verbal. Nestas, os
indivíduos não disléxicos ativaram as áreas de Wernicke (responsável pela
compreensão da fala), Broca (produção da fala), ínsula (repetição da fala) e lobo
parietal inferior (evocação de sequências fonológicas), enquanto que indivíduos
disléxicos mostraram um padrão bastante diferente, com menor ativação de todas
estas áreas, e nenhuma ativação da ínsula. Isto sugere que os disléxicos apresentam
severa dificuldade em evocar sons de fala internamente, bem como em conseguir
analisá-los e compará-los (Capovilla & Capovilla, s.d.).
10
Esta hipótese ilustra a Teoria aceite pela grande maioria dos investigadores,
que diz respeito ao Défice Fonológico, e segundo a qual a dislexia resulta de um
défice no sistema de processamento fonológico, a nível neurológico cerebral.
Défice Fonológico
Este Défice Fonológico dificulta a discriminação e processamento de sons, o
desenvolvimento da consciência fonológica (CF)2 e do princípio alfabético3. O que
significa, em última instância, uma dificuldade para descodificar informação escrita.
Assim, apesar da integridade das competências cognitivas superiores,
necessárias à compreensão dessa informação, tais como a inteligência geral,
vocabulário, competências linguísticas como semântica e sintaxe, o raciocínio e
formação de conceitos, a capacidade para realizar a correspondência grafofonémica,
necessária para o processo de descodificação, encontra-se alterada (Teles, 2004).
Esta Teoria é corroborada pelas evidências de que os disléxicos apresentam
menor velocidade e precisão de nomeação que os normoléxicos, têm dificuldades
em tarefas de memória verbal, de repetição de pseudopalavras e de consciência
fonológica, particularmente ao nível do fonema (consciência fonémica) (Capovilla &
Capovilla, s.d.).
Uma outra hipótese diz respeito à Teoria do Défice de Automatização,
segundo o qual a dislexia se caracteriza por uma dificuldade na capacidade de
automatizar a descodificação das palavras, com impacto negativo na realização de
uma leitura fluente, correta e compreensiva (Teles, 2004).
Já a Teoria Magnocelular, apesar de não excluir a Teoria do Défice Fonológico,
atribui à dislexia um défice específico na transferência de informações sensoriais
visuais para as áreas primárias do córtex, enfatizando a sensibilidade a estímulos de
acordo com o contraste que apresentam (Teles, 2004; Carvalhais & Silva, 2007).
2
Entendida como a consciência de que o continuum de fala é formado por palavras, estas por
sílabas e estas por fonemas, e que com estes diferentes elementos se podem realizar operações como
identificação, segmentação, síntese, adição, omissão ou substituição, por exemplo.
3
Conhecimento de que os caracteres do alfabeto são representações gráficas dos sons, e qual a
sua correspondência (correspondência grafofonémica).
11
Baseia-se num dos principais sistemas envolvidos na perceção visual, relacionados
com o movimento, importante no processamento da mudança rápida de imagens
característica do processo de leitura. Esta teoria não identifica nem referencia défices
de convergência binocular e refere que o processo de descodificação pode ser
facilitado através da diminuição do contraste folha-letras, utilizando uma
transparência azul ou cinzenta sob a página. Tem sofrido bastantes críticas, já que os
resultados não são reproduzíveis (Teles, 2004).
12
modo a construir uma representação coerente do sentido do texto (Borella & de
Ribaupierre, 2014). Também a inibição de respostas (incluída nas funções executivas)
está envolvida na compreensão, já que contribui para a seleção de informação
relevante para a construção do sentido do texto (Borella & de Ribaupierre, 2014).
Atualmente, os défices no processamento neurolinguístico são percebidos
como o principal preditor e a variável comum mais importante nas Dificuldades de
Aprendizagem Específica (Moura, 2014).
Vários estudos experimentais têm vindo a demonstrar a inexistência de
alterações significativas no processamento visual quando controlada a influência da
componente verbal da linguagem.
Nestes estudos experimentais, Vellutino (citado por Moura, 2014) observou
que as crianças com dislexia apresentavam um desempenho semelhante às crianças
normoléxicas em medidas de memória de letras e palavras visualmente similares (por
exemplo: ‘b’ e ‘d’, ‘was’ e ‘saw’) quando a tarefa exigia uma resposta escrita, bem
como em medidas de reconhecimento visual e de recordação visual de letras e
palavras de um sistema alfabético não familiar para ambos os grupos. Estes
resultados permitiram assumir que a Dislexia é mais um sintoma de disfunção durante
o armazenamento e recuperação da informação linguística do que consequência de
uma deficiência no sistema visual.
13
Critérios de diagnóstico da Dislexia
Para a Perturbação de Aprendizagem Específica, o DSM-V (APA, 2014)
apresenta os seguintes critérios:
Leitura de palavras de forma imprecisa ou lenta e com esforço (p. ex., lê
palavras isoladas em voz alta, de forma incorreta ou lenta e hesitante,
frequentemente adivinha palavras, tem dificuldade de soletrá-las).
Dificuldade para compreender o que é lido (p. ex., pode ler o texto com
precisão, mas não compreende a sequência, as relações, as inferências).
Dificuldades em escrever segundo regras ortográficas (p. ex., pode
adicionar, omitir ou substituir vogais e consoantes).
Dificuldades com a expressão escrita (p. ex., comete múltiplos erros de
gramática ou pontuação nas frases; emprega organização inadequada de
parágrafos; expressão escrita das ideias sem clareza).
Dificuldades para dominar o sentido numérico e cálculo (p. ex., entende
números, sua dimensão e relações de forma insatisfatória; conta com os
dedos para adicionar números de um dígito em vez de lembrar o fato
aritmético, como fazem os colegas; perde-se no meio de cálculos
aritméticos e pode trocar as operações).
Dificuldades no raciocínio (p. ex., tem grave dificuldade em aplicar
conceitos, fatos ou operações matemáticas para solucionar problemas
quantitativos).
Com prejuízo na leitura:
o Precisão na leitura de palavras
o Velocidade ou fluência da leitura
o Compreensão da leitura
14
preciso ou fluente de palavras, problemas de decodificação e dificuldades de
ortografia. Se o termo dislexia for usado para especificar esse padrão particular.
15
futuras, comprometedoras do sucesso escolar e do desenvolvimento académico,
pessoal e social.
É importante que pais, professores e educadores estejam atentos a
indicadores de diagnóstico precoce da dislexia, tais como a história pessoal do aluno
e as suas manifestações linguísticas em contexto escolar. Os dados históricos de
dificuldades na família, por exemplo, podem ser de grande utilidade para os
profissionais que atuam no processo de reeducação linguística das crianças disléxicas
(Ribeiro & Baptista, 2006).
Tratando-se de uma perturbação da linguagem, com origem nas dificuldades
de processamento fonológico, a linguagem e competências leitoras emergentes são
bons preditores da aprendizagem futura de leitura, não sendo as competências
percetivas e motoras preditores significativos (Teles, 2004).
Um estudo interessante registou que aos 3 meses de idade a criança começa
a desenvolver determinadas aptidões que serão responsáveis da sua dislexia. Por
esta altura, o bebé começa a reconhecer apenas os traços da face humana, em
particular a da mãe. Embora comece a ver, ainda não domina os músculos do pescoço
para poder voltar a cabeça e seguir com o olhar, por isso foca-se no que encontra no
seu campo de visão. Uma criança potencialmente disléxica, aos 3 meses, desorienta
as suas perceções: se vir o cotovelo da mãe cria de imediato uma imagem mental dela
no seu todo. Ou seja, ativa áreas cerebrais responsáveis pela perceção que fazem
com que a criança não veja o que está no seu campo de visão – o cotovelo -, mas sim
outra coisa – o rosto da mãe -, acrescentando informação ao que os olhos vêem4.
Ronald R. David, fundador da Reading Reserch Council e diretor do Dyslexia
Correction Center, na Califórnia, fez esta descoberta, atribuindo responsabilidade ao
pensamento intuitivo, ainda que sem conseguir precisar bem o tipo de operação que
é realizada pelo bebé. O bebé apresenta, por um isso, um talento particular para
identificar pessoas ou objetos sem cometer erros, o que é de admirar. Ao longo do
desenvolvimento, esta perceção demasiado rápida assume um lado positivo e um
4
Sabemos que existem processos de observação e eliminação para reconhecimento da mãe,
nomeadamente através do cheiro, raciocínio analítico e lógico, mas um bebé de 3 meses ainda não
apresenta estes processos, limita-se a utilizar diretamente a desorientação (Ribeiro & Baptista, 2006).
16
lado negativo: por um lado, constitui uma vantagem, pois permite completar
perceções fragmentadas e, por isso, apresentar uma intuição particularmente
desenvolvida e um pensamento mais vivo que o da média das pessoas,
nomeadamente no que diz respeito a objetos 3D (Davis, 2004, citado por Ribeiro &
Baptista, 2006); por outro, um handicap, pois as capacidades de raciocínio e de lógica
analítica aparecerão mais tardiamente no desenvolvimento, apresentando
dificuldade no reconhecimento rápido de elementos 2D, como a palavra escrita
(Ribeiro & Baptista, 2006).
No período pré-escolar registam-se dificuldades de expressão linguística,
marcadas pela lentificação na nomeação rápida de objetos e imagens e por um
discurso significativamente infantilizado, dificuldades psicomotoras (postura,
lateralidade, estruturação, organização do espaço, ritmo, por exemplo) e de
memória (memorizar e repetir números, sílabas, palavras, pequenas histórias,
lengalengas, por exemplo), bem como confusão com os pares de palavras que soam
de forma semelhante (nó/só, tua/lua, vaca/faca, por exemplo), e significativa
dificuldade ou desinteresse em participar em jogos de sons (segmentar palavras em
sílabas, contar sílabas, jogos de rimas, identificação de sons iniciais das palavras ou
dos nomes, etc), que ilustram as dificuldades no domínio de consciência fonológica
(Abreu, 2012).
Em idade escolar (6-8 anos) deparamo-nos com uma série de sinais clínicos
reveladores, como erros típicos de inversão de letras, cópias com erros ortográficos,
nomeadamente com omissão de letras ou palavras. Regista-se confusão de letras
com semelhança morfológica e fonética, como a/o manuscritas, ou o/u nas impressas,
de letras cuja forma é idêntica mas que se distinguem na sua posição relativa, como
b/d, p/q, u/n, d/p, d/q, por exemplo, e de palavras com inversões e omissões, como
cubido/bicudo, dral/ladra, borboleta/bolota, por exemplo. A reprodução de símbolos
ou letras ocorre com alterações como inversões em espelho, confusão de letras
semelhantes na sua forma gráfica ou som, e dificuldade em processar os
limtes/fronteiras, produzindo aglutinações (união de elementos: demanhã, edepois,
porisso) ou separações (em tão, sabo nete, de pois).
17
Tais alterações ilustram uma escrita confusa e com ideias mal estruturadas,
enquanto que a leitura é geralmente hesitante, silabada e mecânica. Coexistem, regra
geral, dificuldades na linguagem oral, com presença de vocabulário pobre, e de
memória, com dificuldade em tarefas de repetição de sequências, por exemplo.
Em contrapartida, uma criança disléxica desta idade desenvolveu já uma
grande capacidade imaginativa, de resolução de problemas e, frequentemente, uma
aptidão para trabalhos manuais (Ribeiro & Baptista, 2006).
A partir dos 9 anos de idade, a criança apresenta clara consciência das suas
dificuldades, até porque há maior contacto com a leitura e escrita nos seus contextos,
logo um maior confronto com as suas competências, o que se pode traduzir num
significativo grau de frustração. As manifestações mais frequentes a partir deste
período são a dificuldade na estruturação de frases, adequação e emprego dos
tempos verbais, ausência de concordância, caligrafia irregular com incorreções
ortográficas, semânticas e sintáticas. Verifica-se, também, dificuldade de
compreensão leitora, fluência leitora alterada, arritmada, o que, em suma, dificulta o
acesso às várias aprendizagens escolares (Ribeiro & Baptista, 2006).
18
do adulto, como omissão e inversão de sons nas palavras
produzidas oralmente: fósforos/fosfos,
pipocas/popicas, por exemplo;
Em idade pré-escolar:
o Manutenção de um padrão imaturo de fala, frequentemente
descrito como “linguagem/fala de bebé”;
o Dificuldade em aprender coisas novas, como nomes de cores
(verde/vermelho), pessoas, objetos, lugares, etc;
o Dificuldade em memorizar canções e lengalengas;
o Dificuldade na aquisição de conceitos de tempo e espaço
básicos: ontem/amanhã; direita/esquerda; depois/antes;
o Dificuldade em compreender que as frases são formadas por
elementos menores (palavras) e que estas se podem
segmentar em unidades mais pequenas (sílabas);
o Dificuldade em conhecer as letras do seu nome próprio;
o Dificuldade em aprender e recordar os nomes e sons das letras.
No 1º ano de escolaridade:
o Dificuldade em compreender que as palavras são constituídas
por sílabas e sons/fonemas;
o Dificuldade em associar as letras aos sons (correspondência
grafofonémica);
o Erro de leitura por desconhecimento dessa correspondência:
vaca/faca, janela/chanela, calo/galo, por exemplo;
o Dificuldade em ler monossílabos e palavras simples: ao, os, pai,
bola, rato;
o Dificuldade na leitura de palavras isoladas e pseudopalavras;
o Comportamentos de recusa/adiamento de tarefas de leitura e
escrita, manifestando relutância e lentidão na sua realização;
19
o Necessidade de acompanhamento individual do professor/pais
para continuar/terminar as tarefas e trabalhos;
o Queixas de pais e professores em relação às dificuldades de
leitura e escrita;
20
contextuais (sentido da frase), em alternativa à
descodificação;
Dificuldade em ler pequenas palavras funcionais «aí, ia,
ao, ou, em de...»;
Dificuldade na leitura e interpretação de problemas
matemáticos;
Desagrado e tensão em tarefa de leitura em voz alta;
Leitura sincopada, trabalhosa, pouco fluente;
Dificuldade em terminar os testes no tempo previsto;
Caligrafia alterada e presença frequente de erros
ortográficos:
Particularmente nas palavras com
correspondências grafofonémicas irregulares.
o Dificuldades de linguagem:
Discurso pouco fluente, com presença de pausas e
hesitações;
Produção incorreta de palavras multissilábicas, não
familiares ou pouco frequentes:
Omissão, adição e substituição de fonemas e
sílabas nas produções orais;
Alterações na sequência fonémica e silábica;
Dificuldade em encontrar a palavra exata:
Uso de palavras imprecisas em substituição do
nome exato: a coisa, aquilo, aquela cena...;
Substituição por outras, semelhantes
foneticamente: humidade/humanidade...
Dificuldade em recordar informações verbais,
problemas de memória a curto termo: datas, nomes,
números de telefone, sequências temporais, algoritmos
da multiplicação, por exemplo:
21
Dificuldades de discriminação e segmentação silábica e
fonémica;
Necessidade de tempo extra, dificuldade em dar
respostas orais rápidas.
Em jovens e adultos:
Dificuldades de leitura persistentes, com alteração de
fluência (leitura lenta, esforçada e cansativa);
Dificuldades em ler e pronunciar palavras pouco
comuns, estranhas, ou únicas, como nomes de pessoas,
de ruas, de lugares, dos pratos, na lista do restaurante...;
Dificuldade em reconhecer palavras que leu ou ouviu
quando as lê ou ouve no dia seguinte;
22
Baixo interesse na leitura ou preferência por livros com
poucas palavras por página e com muitos espaços em
branco;
Longas horas na realização dos trabalhos escolares;
Alterações de ortografia, adotando comportamentos
compensatórios, como recurso a palavras menos
complexas, mais fáceis de escrever;
Evitamento de situações de leitura em voz alta, com
impacto nas situações sociais.
Persistência das dificuldades de linguagem oral, com
alteração da produção correta das palavras;
Vocabulário expressivo inferior ao vocabulário
compreensivo;
23
Consequências emocionais e comportamentais
Humphrey e Mullins (2002, citados por Carvalhais & Silva, 2007) referem que
as crianças estabelecem uma associação entre o seu desempenho na leitura e
inteligência. Neste seguimento, as crianças com dislexia acreditam que quando se é
um bom leitor, poderá ser-se considerado inteligente e vice-versa.
A dislexia pode influenciar o autoconceito, nomeadamente o autoconceito
académico (Carvalhais & Silva, 2007). Poderá existir, por isso, uma relação entre a
dislexia, um baixo autoconceito e as dificuldades emocionais e comportamentais
(Carvalhais & Silva, 2007). Moura (2018) refere que as dificuldades emocionais e
comportamentais poderão passar por sintomatologia ansiosa perante situações de
avaliação ou atividades que envolvam leitura e escrita ou sintomatologia depressiva
decorrente das dificuldades sentidas.
Nos estudos enumerados por Carvalhais e Silva (2007) estabeleceu-se uma
correlação significativa entre o impacto das dificuldades específicas de aprendizagem
na autoestima e a confiança no futuro. Isto é, quanto maior for o impacto na
autoestima, menos otimista é a visão que as crianças têm do seu futuro. Esta redução
da autoestima poderá ser decorrente de sentimentos de insegurança e vergonha
como resultado do fracasso sucessivo nas tarefas (Moura, 2018).
Tem havido evidências de redução do empenho e motivação para as tarefas
que envolvem leitura e escrita, o que, consequentemente, aumenta as dificuldades
na aprendizagem (Moura, 2018).
Nos alunos com dislexia tende a haver um maior abandono da escola antes do
fim do ensino obrigatório, reprovações sucessivas que dão lugar a grandes
diferenças entre a idade cronológica do aluno e o nível escolar. Os alunos com dislexia
tendem também em ingressar em tipos de ensino menos exigentes, que conduzem a
aprendizagens profissionais imediatas, mas que os afasta do ingresso no ensino
superior (Carvalhais & Silva, 2007).
24
Como consequências comportamentais são enumerados os problemas
comportamentais e desafio de autoridade (pais, professores, etc.), agitação motora
e défice de atenção (Moura, 2018).
Compreender a problemática emocional associada à dislexia é fundamental a
qualquer educador e professor, uma vez que, se as questões emocionais não forem
devidamente geridas, o insucesso pode resultar numa rejeição total de todas as
atividades de âmbito escolar. Por esta razão, tanto pais como professores deverão
valorizar todos os progressos obtidos pelas crianças, centrando-se mais nas
pequenas conquistas do que nas falhas (Carvalhais & Silva, 2007).
25
Links para aprofundar conhecimentos
Utilize os links abaixo para aprofundar conhecimentos relativos ao tema
abordados no módulo. As notícias e vídeos disponibilizados, complementam de uma
forma prática os tópicos trabalhados neste manual.
Sites a visitar
http://uptokids.pt/educacao/sobre-a-dislexia/
http://www.sabado.pt/ciencia---saude/detalhe/cientistas-podem-ter-
descoberto-a-cura-para-a-dislexia
https://www.dn.pt/sociedade/interior/como-e-ler-com-dislexia-
experimente-e-perceba-melhor-5065585.html
https://lifestyle.sapo.pt/familia/pais-e-filhos/artigos/um-dia-na-vida-de-um-
aluno-com-dislexia
http://expresso.sapo.pt/sociedade/2017-10-10-Aprender-as-si-la-bas-e-a-
deixar-de-tior-icar-os-pes-pelos-tes.-Ou-como-ultrapassar-a-dislexia-
1#gs.OQ83pzc
https://lifestyle.sapo.pt/familia/crianca/artigos/o-lado-emocional-da-
dislexia
Sugestões de vídeos
https://www.youtube.com/watch?v=S4KrqCOgiBA
https://www.youtube.com/watch?v=roTYfQ4pCJc
https://www.youtube.com/watch?v=SmySLdD9Tl8
26
Referências bibliográficas
Abreu, S. I. (2012). Dislexia - Aprender a Aprender. Escola Superior de
Educação Almeida Garrett.
American Psychiatric Association (2014). DSM-5. Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais. (5ª Edição). São Paulo. Brasil. Artmed
Editora Ltda.
Bakker, D. (2002). O Cérebro e a Dislexia. In Dyslexia International - Tools and
Technologies. O Choque Linguístico – A Dislexia nas várias Culturas. Pp. 14-21.
Barbosa, C. F. (2014). Dislexia: Dificuldades de aprendizagem na Escola.
Universidade Tecnológica Federal do Paraná.
Baron, I. S. (2004). Neuropsychological evaluation of the child. New York:
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Borella, E., & de Ribaupierre, A. (2014). The role of working memory, inhibition,
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Cabussú, M. A. (2009). Dislexia e estresse: implicações neuropsicológicas e
psicopedagógicas. Revista Psicopedagogia.
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