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Sónia Maria Lameirão Gomes

PERFIL COGNITIVO DE CRIANÇAS COM DIFICULDADES

DE APRENDIZAGEM

UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO


VILA REAL, 2010

1
Dissertação de Mestrado para obtenção do

grau de Mestre em Psicologia Clínica, na

Universidade de Trás-os-Montes e Alto

Douro, sob orientação da Professora Doutora

Eduarda Coelho.

2
AGRADECIMENTOS

Na elaboração e conclusão deste projecto de investigação várias


pessoas tiveram uma importância crucial e permitiram que as dificuldades com
que me deparei ao longo do percurso fossem ultrapassadas.

Deste modo, queria dedicar um agradecimento especial à Professora


Doutora Eduarda Coelho, que me orientou na realização da presente tese e
que sempre se mostrou disponível para me ajudar, ensinar e atender às
minhas dúvidas, inseguranças e frustrações.

Ao João, pelo amor, carinho, apoio e compreensão, facilitando a minha


disponibilidade emocional para a elaboração deste trabalho.

Aos meus pais e à minha irmã que directa ou indirectamente contribuem


para que todos os meus projectos sejam possíveis.

À Belmifer pela ajuda, cooperação e empenho.

Aos agrupamentos escolares da cidade de Vila Real, que autorizaram a


recolha de informação nas escolas, e aos docentes que acarinharam a minha
presença e sempre se disponibilizaram para me ajudar.

A todos, o meu muito obrigada!

I
RESUMO

O actual estudo teve como principal objectivo caracterizar o perfil


cognitivo das crianças com dificuldades de aprendizagem e compará-lo em
função do tipo de dificuldade de aprendizagem e do nível socioeconómico.

A nossa amostra é constituída por 69 crianças com dificuldades de


aprendizagem, 25 do género feminino e 44 do género masculino, com idades
compreendidas entre os 6 e os 14 anos (8,78±1,86), que frequentam o 1º e 2º
ciclo. De acordo com o tipo de dificuldade de aprendizagem foram divididas em
cinco grupos: Dislexia (n=22), Disortografia (n=24); Discalculia (n=5), Disgrafia
(n=3) e Dificuldade de Aprendizagem Geral (n=15). Para avaliar o perfil
cognitivo foi aplicada a Escala de Inteligência para Crianças – 3ª edição (Wisc-
III). Na comparação de grupos foi utilizado o qui-quadrado para variáveis
nominais e a anova com teste post-hoc de Scheffe para variáveis contínuas.

Os resultados deste estudo demonstram que para a amostra total


verifica-se um Q.I. total de 87,36 e um Q.I. verbal maior que o Q.I. de
realização (93,03 vs. 86,86). Relativamente aos índices factoriais, o índice de
compreensão verbal é o mais elevado e o de velocidade de processamento o
que possui um pior resultado. Apenas 10 crianças (14,5%) podem ser incluídas
no perfil desenvolvido por Bannatyne.

Não se verificam diferenças significativas no tipo de dificuldade de


aprendizagem em função do género (p=0,106) e do nível socioeconómico
(p=0,375). No que diz respeito ao perfil da Wisc-III, as crianças com
Dificuldades de Aprendizagem Geral apresentam valores inferiores
comparativamente às com Dislexia e Disortografia em todas as variáveis, não
sendo esta diferença significativa para o subteste de memória de dígitos
(p=0,053). O estatuto socioeconómico não diferencia o perfil da Wisc-III.

Este estudo permitiu conhecer melhor a problemática das dificuldades


de aprendizagem e as limitações cognitivas que lhe estão associadas.

II
ABSTRACT

The current study`s main objective was to characterize the cognitive


profile of children with learning disabilities and compare it to the type of learning
disability and socio-economic level.

Our sample comprised 69 children with learning disabilities, 25 females


and 44 males, aged 6 to 14 years (8,78±1,86), attending the 1 st and 2nd cycles.
According to the type of learning disability were divided into five groups:
Dyslexia (n = 22); Dysorthography (n = 24); Dyscalculia (n = 5); Dysgraphia (n =
3) and General Learning Disability (n = 15). To assess the cognitive profile was
applied to Intelligence Scare for children – 3rd edition (WISC-III). In the
comparison group, by Chi-Square Test for nominal variables and ANOVA with
post-hoc Scheffe for continuous variables.

The results of this study demonstrate that for the total sample there is a
total of IQ of 87,36 and with a verbal IQ greater than accomplishment IQ (93,03
vs 86,86). For index factor, the verbal comprehension index is the highest and
processing speed which has a worse outcome. Only 10 children (14.5%) may
be included in the profile developed by Bannatyne.

There were no significant differences in the type of learning disability by


gender (p=0,106) and socio-economic level (p=0,375). Regarding the profile of
the Wisc-III, children with General Learning Disabilities are lower compared to
those with Dyslexia and Dysorthography in all variables, these differences were
not significant for the digit memory test (p = 0.053). The socio-economic status
does not differentiate the profile of the Wisc-III.

This study provided the problematic of learning disabilities and cognitive


limitations that are associated.

III
ÍNDICE GERAL

AGRADECIMENTOS ............................................................................................. I
RESUMO ............................................................................................................ II
ABSTRACT ......................................................................................................... III
ÍNDICE GERAL .................................................................................................... IV
ÍNDICE DE QUADROS ........................................................................................... V
ÍNDICE DE ABREVIATURAS ................................................................................... VI
1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO PROBLEMA ................................................... 2
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ................................................................................ 6
2.1 - APRENDIZAGEM E COGNIÇÃO ............................................................................6
2.2 - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ....................................................................8
2.3 - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICA ..................................................10
2.3.1 - DISLEXIA................................................................................................................... 11
2.3.2 - DISORTOGRAFIA........................................................................................................ 13
2.3.3 - DISGRAFIA ................................................................................................................ 14
2.3.4 - DISCALCULIA............................................................................................................. 14
2.4 - ETIOLOGIAS DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICAS ......................15
2.5 - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM GERAL .........................................................17
2.6 - FUNCIONAMENTO COGNITIVO DAS CRIANÇAS COM DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM
...............................................................................................................................18
2.6.1 - CATEGORIAS DE BANNATYNE NAS CRIANÇAS COM DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM .. 23
2.7 - O GÉNERO E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ...........................................24
2.8 - ÁREAS DE ACTIVAÇÃO CEREBRAL NAS CRIANÇAS COM DIFICULDADES DE
APRENDIZAGEM........................................................................................................25
3. METODOLOGIA ............................................................................................... 29
3.1 - AMOSTRA .........................................................................................................29
3.2 - VARIÁVEIS ........................................................................................................31
3.3 - INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO .........................................................................31
3.3.1 - ESCALA DE INTELIGÊNCIA DE W ECHLER PARA CRIANÇAS - 3ª EDIÇÃO .......................... 31
3.3.2 - QUESTIONÁRIO BIOGRÁFICO ...................................................................................... 33
3.4 - PROCEDIMENTOS ..............................................................................................33
3.5 - LIMITAÇÕES......................................................................................................34
3.6 - ANÁLISE ESTATÍSTICA.......................................................................................35
4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS ................................................................. 37
4.1 - ANÁLISE DESCRITIVA ........................................................................................37
4.1.1 - DESCRIÇÃO TOTAL DA AMOSTRA ............................................................................... 37
4.1.2 - DICOTOMIA Q.I VERBAL/Q.I DE REALIZAÇÃO .............................................................. 39
4.1.3 - DESCRIÇÃO DO PERFIL DAS CATEGORIAS DE BANNATYNE ........................................... 39
4.2 - ANÁLISE COMPARATIVA ....................................................................................40
4.2.1 - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM EM FUNÇÃO DO GÉNERO ......................................... 40
4.2.2 - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM EM FUNÇÃO DO NÍVEL SOCIOECONÓMICO................. 41
4.2.3 - PERFIL DA W ISC-III SEGUNDO O TIPO DE DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM .................. 41
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ........................................................................ 46
5.1 - AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O GÉNERO ...........................................46
5.2 - AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O NÍVEL SOCIOECONÓMICO ...................49
5.3 - AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O PERFIL COGNITIVO ............................51
6. CONCLUSÃO ................................................................................................... 57
7. PROPOSTAS FUTURAS DE INVESTIGAÇÃO ......................................................... 60
8. BIBLIOGRAFIA ................................................................................................ 62
9. ANEXOS ......................................................................................................... 75

IV
ÍNDICE DE QUADROS

QUADRO 1 - Caracterização Geral da Amostra ................................................. 30

QUADRO 2 - Perfil Wisc-III para a amostra total ................................................ 38

QUADRO 3 - Dicotomia entre o Q.I verbal e o Q.I realização ............................ 39

QUADRO 4 - Perfil das Categorias de Bannatyne nas crianças com dificuldades


de Aprendizagem ............................................................................................ 40

QUADRO 5 - Comparação do tipo de dificuldade de aprendizagem em função do


género ............................................................................................................. 40

QUADRO 6 - Comparação do tipo de dificuldade de aprendizagem em função do


nível socioeconómico ...................................................................................... 41

QUADRO 7 - Comparação do Perfil da Wisc-III em função do tipo de Dificuldade


de Aprendizagem ............................................................................................ 42

QUADRO 8 - Comparação do Perfil da Wisc-III em função do nível


socioeconómico ............................................................................................... 43

V
ÍNDICE DE ABREVIATURAS

DA - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM

DAE - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICA

DAGERAL - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM GERAL

ICV - ÍNDICE DE COMPREENSÃO VERBAL

IOP - ÍNDICE DE ORGANIZAÇÃO PERCEPTIVA

IVP - ÍNDICE DE VELOCIDADE DE PROCESSAMENTO

NSE - NÍVEL SÓCIOECONÓMICO

PHDA - PERTURBAÇÃO DA HIPERACTIVIDADE COM DÉFICE DE ATENÇÃO

VI
1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO PROBLEMA

1
1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICAÇÃO DO PROBLEMA

A investigação das dificuldades de aprendizagem (DA) tem sido


controversa e fundamentalmente pouco produtiva no que respeita a um melhor
controlo e a uma maior compreensão das suas causas e consequências
(Fonseca, 2008).

O aumento da escolaridade obrigatória conduziu a um crescente número


de crianças inadaptadas. Assim, quando os métodos que eram eficazes para a
maioria não serviam, rapidamente se criavam processos de selecção e de
segregação para outras crianças (Fonseca, 2008).

Porém, quando a educação passou a ser um dos principais objectivos


das sociedades, pensou-se que os alunos com características diferentes
deviam ser ensinados “com métodos especiais e em escolas especiais” (Serra,
2008). Contudo, surge o movimento de inclusão, que afirma que, todos os
alunos, sem excepções, devem ser escolarizados em aulas regulares e receber
nelas uma educação eficaz. Surgindo, desta forma, a “educação inclusiva” que
respeita todo o sistema de ensino, baseando-se na diferenciação curricular e
num currículo em construção (Serra, 2008). Deste modo, as crianças que não
conseguiam acompanhar os currículos convencionais foram incluídas na escola
ao abrigo da “educação especial”.

As crianças com DA que careciam de ter atenções especiais e, por


vezes, a necessidade de alterar ou adequar os métodos de ensino
convencionais passaram a estar mais protegidas, evitando-se o fracasso e o
abandono escolar precoce.

Apesar do termo DA estar amplamente difundido é, muitas vezes,


inadequadamente utilizado, verificando-se também a utilização de diferentes
terminologias para denominar o mesmo grupo de pessoas. Para além disso, o
conceito subjacente ao termo DA não é entendido de modo igual por todos os
que o utilizam (Martins, 2006). Neste sentido, um dos principais factores que

2
tem dificultado o avanço da investigação na área das DA é a falta de acordo
entre os peritos no que diz respeito às características diferenciais e definição
das crianças com DA, sendo também, deste modo, um entrave à construção de
modelos de avaliação-prescrição-intervenção adequados a esta população
(Lopes, 2000).

Portanto, e não querendo nós também provocar algum tipo de confusão


com a nomenclatura que iremos utilizar para diferenciar as crianças,
subdividimos o grupo de crianças com DA em dois grupos: Dificuldades de
Aprendizagem Geral (DAGeral), que apresentam um Q.I<80, e Dificuldades de
Aprendizagem Específica (DAE), com um Q.I>80. Este último grupo inclui
crianças com Dislexia, Disortografia, Discalculia e Disgrafia.

As DA costumam manifestar-se numa área específica, ou em várias,


seja na leitura, na escrita ou na matemática (Sánchez, 2004). Assim a
dificuldade é específica (DAE) se a criança demonstrar dificuldades numa área
ou geral (DAGeral) se tiver uma aprendizagem mais lenta do que o normal, em
várias actividades académicas (Dockrell & Mcshane, 2000).

Para compreendermos as DA temos de saber porque é que as crianças


que apresentam estas dificuldades não conseguem executar as tarefas e
actividades como as outras crianças e, para esse fim, temos de entender o seu
funcionamento cognitivo.

O que nos propomos com este trabalho de investigação é caracterizar o


perfil cognitivo das crianças com DA e compará-lo em função do tipo de
dificuldade de aprendizagem e do nível socioeconómico (NSE). Pretendemos
ainda, comparar o tipo de dificuldade de aprendizagem em função do género e
do NSE.

Para tornar exequíveis os objectivos propostos e avaliarmos as


capacidades cognitivas das crianças com DA, iremos utilizar a Escala de
Inteligência para Crianças – 3ª Edição (Wisc-III) que foi desenvolvida por David
Wechsler e cuja adaptação e aferição portuguesa é o resultado do trabalho da
equipa de Investigação e Publicações Psicológicas (CEGOC-TEA) com a

3
colaboração do professor Mário Simões. De modo a recolher os dados
biográficos das crianças, elaboramos um questionário para ser respondido
pelos professores em colaboração com os pais.

O trabalho que apresentamos está organizado em diferentes capítulos.


No primeiro capítulo está a introdução ao trabalho, onde fazemos um
enquadramento no âmbito do estudo e referimos os objectivos. No capítulo 2,
apresentamos a revisão da literatura, onde abordamos alguns conceitos
fulcrais: aprendizagem, cognição e DA, assim como a caracterização do
funcionamento cognitivo das crianças com DA, segundo vários autores. O
capítulo 3 é dedicado à metodologia utilizada, que engloba a amostra, as
variáveis, os instrumentos, os procedimentos para a recolha dos dados e a
análise estatística. No capítulo 4, realizamos a apresentação dos resultados, no
capítulo 5, efectuamos a discussão desses resultados e nos capítulos 6 e 7,
apresentamos as conclusões finais e sugerimos futuras propostas de
investigação, respectivamente. No oitavo e último capítulo, fazemos referência
à bibliografia utilizada.

4
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

5
2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.1 - APRENDIZAGEM E COGNIÇÃO

A aprendizagem, como condição humana, constitui uma mudança do


comportamento resultante da experiência, é pois uma resposta modificada,
estável e durável, interiorizada e consolidada, no próprio cérebro do indivíduo
(Fonseca, 2008). A aprendizagem envolve uma integridade neurobiológica e
um contexto sócio-cultural facilitador, ou seja, um processo equilibrado e
mutuamente influenciado entre a hereditariedade e o meio ou entre o
organismo e o seu envolvimento (Das, 1998).

O cérebro é o orgão da aprendizagem que transforma precocemente a


acção em pensamento, e, posteriormente, o pensamento em acção. Assim, a
“acção faz a cognição e a cognição faz a acção”, que surge primeiramente de
sistemas não simbólicos e depois de sistemas simbólicos de representação
(Fonseca, 2001).

O que ocorre no cérebro em termos de aprendizagem, apesar de ainda


não ser possível de o determinar exactamente, nem de o observar
simplesmente, constitui um processo cognitivo total que lhe dá suporte
(Fonseca, 2001). Como não é possível invadir o cérebro, só observando o que
ele capta, extrai, integra, armazena, combina, elabora, planifica e comunica a
informação se pode antever se a aprendizagem ocorreu ou não (Fonseca,
2001).

A cognição pode ser definida como “acto ou processo de conhecimento”,


ou algo que é conhecido através dele (Flavell, Miller & Hiller, 1993). Em termos
multicomponenciais, a cognição envolve a “contribuição e a coesão-coibição de
vários subcomponentes, nomeadamente da atenção, da percepção, da
emoção, da memória, da motivação, da integração e da monitorização central,

6
do processamento sequencial e simultâneo, da planificação, da resolução de
problemas e da expressão e comunicação da informação” (Fonseca, 2001).

A cognição diz respeito aos processos pelos quais um indivíduo percebe


(input), elabora e comunica (output) informação para se adaptar. Tais
processos, verdadeiros pré-requisitos básicos da inteligência, constituem as
componentes do acto mental, envolvendo funções cognitivas que
compreendem sistemas funcionais cerebrais que explicam, em parte, a
capacidade do indivíduo para usar a experiência anterior na adaptação a
situações novas e complexas (Fonseca, 2007).

O desenvolvimento cognitivo decorre não só de sistemas pré-


estruturados que se auto-organizam e edificam no indivíduo pela interacção
com o ambiente (Piaget, 1965), mas também por sistemas de mediação
interindividual que se co-constroem num contexto sociocultural (Vygotsky,
1962).

O processamento da informação no cérebro depende do seu conteúdo


verbal ou não verbal, simbólico ou não simbólico, falamos assim da
especialização hemisférica. Assim, os conteúdos não verbais são
primariamente processados pelo hemisfério direito, que lida com a integração
motora e postural, bem como as discriminações perceptivas, imagens, figuras,
acontecimentos sonoros, orientação espacial, gestos, actividades interpessoais
sociais, entre outras. Os conteúdos verbais são preferencialmente processados
pelo hemisfério esquerdo, baseando-se na linguagem e noutros componentes
linguísticos, sobre os quais a comunicação e os pensamentos são levados a
cabo, onde acontecem as representações internas das experiências, bem
como a sua conceptualização (Fonseca, 2007).

No entanto, no cérebro, independentemente desta especialização


hemisférica, verifica-se uma interacção intra-hemisférica, mediada pelo corpo
caloso. Assim, os dois hemisférios actuam em perfeita harmonia funcional,
havendo competências linguísticas que são mediadas pelo hemisfério direito,
como o reconhecimento de palavras longas e complexas e como na percepção
e retenção de sons consonânticos, ao mesmo tempo que o hemisfério

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esquerdo também se encontra envolvido em processos de análise espacial,
nomeadamente no reconhecimento de figuras familiares (Fonseca, 2001).

Segundo o pensamento luriano, cada área do cérebro pode operar


unicamente em conjugação com outras áreas, de modo a produzir
comportamentos. Nenhuma área do cérebro se pode assumir como única e
responsável por qualquer comportamento ou aprendizagem, de igual modo,
nem todas as áreas se consideram igualmente contribuidoras para todos os
comportamentos e condutas (Fonseca, 2001). Assim, o comportamento resulta
do funcionamento de sistemas que integram várias áreas do cérebro, mais do
que o resultado de áreas específicas bem determinadas.

Deste modo, quando um sistema funcional está disfuncional ou


desagregado em termos sistémicos, o comportamento, representado pela
cadeia funcional, pode ficar obviamente afectado. No entanto, existem sistemas
funcionais alternativos, assim um dado comportamento ou processo de
aprendizagem, pode ser produzido por mais de um sistema funcional,
evocando a plasticidade do cérebro (Fonseca, 2001).

Luria divide o cérebro em três unidades básicas: 1ª unidade - alerta e


atenção; 2ª unidade - recepção, integração, codificação e processamento
sensorial e 3ª unidade - execução motora, planificação e avaliação.

Cada uma destas unidades está envolvida em todos os tipos de


comportamento e aprendizagem, sem excepção, porém, a contribuição de cada
uma delas varia conforme o comportamento considerado, isto é, verbal ou não
verbal, simbólico ou não simbólico, linguístico ou práxico (Fonseca, 2001).

2.2 - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Segundo García (1995), a fundação oficial do campo do estudo das DA


ocorreu quando Samuel Kirk popularizou o termo Dificuldades de

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Aprendizagem (learning disabilities) numa comunicação apresentada na
“Conference on Exploration into Problems of the Perceptually Handicapped
Child” nos Estados Unidos. Este mesmo autor definiu as DA como “um atraso,
uma desordem ou uma imaturidade no desenvolvimento de um ou mais
processos da fala, da linguagem, da leitura, do soletrar, da escrita ou da
aritmética, resultantes de uma possível disfunção cerebral e/ou distúrbio
emocional ou comportamental, e não resultantes de deficiência mental, de
privação sensorial, ou de factores culturais ou pedagógicos” (Kirk, 1962, cit. por
Correia, 1991).

Kirk voltou a usar o termo DA, numa conferência em 1963, para


descrever um grupo de crianças que têm desordens no desenvolvimento da
linguagem, da fala, da leitura, e das habilidades associadas à comunicação
necessárias para a interacção social (Garcia, 1995).

Ao longo dos anos foram elaboradas várias definições das DA, no


entanto, aquela que apresenta maior consenso entre os profissionais e
aceitação internacional é a definição do NJCLD, que afirma que “dificuldades
de aprendizagem é o termo genérico que diz respeito a um grupo heterogéneo
de desordens, manifestadas por dificuldades significativas na aquisição e no
uso das capacidades de escuta, de fala, de leitura, de escrita, de raciocínio ou
de capacidades matemáticas. Estas desordens são intrínsecas ao indivíduo,
são presumivelmente devidas a uma disfunção do sistema nervoso central e
podem ocorrer ao longo da vida”. Problemas nos comportamentos auto-
regulados, na percepção social e nas interacções sociais podem coexistir com
as dificuldades de aprendizagem, mas não constituem, por si só, uma
dificuldade de aprendizagem. Embora as dificuldades de aprendizagem
possam ocorrer concomitantemente com outras condições de incapacidade
(por ex.: deficiência sensorial, deficiência mental, distúrbio emocional grave) ou
influências extrínsecas (como: diferenças culturais, ensino insuficiente ou
inadequado), elas não são devidas a tais condições ou influências (NJCLD,
1994).

9
2.3 - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICA

A definição portuguesa de DAE foi elaborada por Miranda Correia


(2005), no seu relatório ao Secretário de Estado da Educação, onde afirma que
“as dificuldades de aprendizagem específica dizem respeito à forma como o
indivíduo processa a informação – a recebe, a integra, a retém e a exprime –
tendo em conta as suas capacidades e o conjunto das suas realizações. As
dificuldades de aprendizagem específica podem, assim, manifestar-se nas
áreas da fala, da leitura, da escrita, da matemática e/ou da resolução de
problemas, envolvendo défices que implicam problemas de memória,
perceptivos, motores, de linguagem, de pensamento e/ou metacognitivos”.
Estas dificuldades, que não resultam de privações sensoriais, deficiência
mental, problemas motores, défice de atenção, perturbações emocionais ou
sociais, embora estes possam ocorrer em concomitância com elas, podem,
ainda, alterar o modo como o indivíduo interage com o meio envolvente.

Segundo Fonseca (1999) e Citoler (1996), de todas as definições das


DAE existem três critérios que aparecem mais frequentemente e encontram um
grande consenso na sua utilização: especificidade ou inclusão, a exclusão e a
discrepância. O primeiro critério refere-se ao facto das DAE se manifestarem
em matérias muito concretas, o que leva a atribuir-lhe uma definição específica
em função do problema – dislexia, disortografia, disgrafia e discalculia (Citoler,
1996). O segundo refere que se deve excluir uma série de problemas, tais
como os causadores de deficiências sensoriais, deficiência mental, distúrbio
emocional severo, privação sociocultural, absentismo escolar, inadequação dos
métodos educativos e privação envolvimental e cultural (Fonseca, 2008; Citoler
1996). Por último, o critério da discrepância entre o potencial de aprendizagem
(consensualmente definido por um QI ≥ 80) e o aproveitamento escolar abaixo
das expectativas (Fonseca, 2008).

Segundo o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações


Mentais - DSM-IV-TR (2002), as dificuldades de aprendizagem são
diagnosticadas quando o rendimento do indivíduo nas provas de leitura,

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aritmética e escrita é substancialmente inferior ao que era esperado para a sua
idade, nível de escolaridade ou para o seu nível intelectual. Estes problemas de
aprendizagem interferem significativamente com o rendimento escolar ou com
as actividades da vida diária que exigem aptidões de leitura, aritmética e
escrita.

Para se proceder ao despiste das DAE temos que verificar se existe


algum défice sensorial e, se existir, as alterações ao nível da leitura, escrita e
cálculo devem exceder as que normalmente estão associados a esse défice
(DSM-IV-TR, 2002).

Nas crianças com DAE podem estar subjacentes anomalias no


processamento cognitivo (por ex.: na percepção visual, processos linguísticos,
atenção ou memória ou combinação destes) (DSM-IV-TR, 2002).

2.3.1 - DISLEXIA

Citoler (1996) sugere que o termo dislexia evolutiva ou de


desenvolvimento se refere àqueles indivíduos que, na inexistência de uma
lesão cerebral (pelo menos conhecida), na presença de uma inteligência
normal (ausência de um défice intelectual) e excluindo outros problemas (como
alterações emocionais severas, um contexto sociocultural desfavorecido, a
carência de oportunidades educativas adequadas ou um desenvolvimento
insuficiente da linguagem oral) têm dificuldades nos mecanismos específicos
de leitura.

A World Health Organization (2004) define a dislexia como uma


desordem que se manifesta pela dificuldade em aprender a ler, apesar de a
instrução ser a convencional, da inteligência ser adequada e das oportunidades
socioculturais, sendo, deste modo, resultado de discapacidades cognitivas,
frequentemente, de origem estrutural (neurológica).

Existem duas formas de classificar a dislexia, com base no momento em


que surgem ou na sua etiologia.

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As dislexias classificadas de acordo com o momento em que surgiram,
podem ser: dislexias adquiridas e dislexias evolutivas ou de desenvolvimento
(Citoler, 1996).

As dislexias adquiridas ocorrem nas pessoas que, tendo previamente


sido leitoras competentes, perdem essa habilidade como consequência de uma
lesão cerebral, as dislexias evolutivas englobam os indivíduos que
experimentam dificuldades na aquisição inicial da leitura (Cruz, 2007; Citoler,
1996).

A investigação neuropsicológica tem realçado diversas formas de


dislexia adquirida, que têm como característica comum o facto de em todas
elas se encontrarem lesões no hemisfério cerebral dominante (Cruz, 2007;
Citoler, 1996).

É ainda de referir que, a dislexia adquirida e a dislexia evolutiva se


podem subdividir de acordo com o tipo de limitação na leitura: fonológica (os
indivíduos lêem através da via léxica ou directa, já que a fonológica - subléxica
ou indirecta – está alterada). Assim, são capazes de ler as palavras regulares e
irregulares, desde que sejam familiares, sendo, no entanto, incapazes de ler
palavras desconhecidas (não familiares) ou pseudopalavras, visto que não
usam o mecanismo de conversão de grafema em fonema. Superficial (os
indivíduos podem ler através de procedimentos fonológicos, mas não o
conseguem fazer por intermédio da via léxica). Não conseguem reconhecer a
palavra como um todo e, consequentemente, têm graves dificuldades com as
palavras irregulares e excepcionais, lendo melhor as palavras regulares,
familiares ou não. Profunda (ambos os procedimentos de leitura estão
alterados e esta é caracterizada, principalmente, por uma leitura mediada pelo
significado, com grande presença de erros semânticos) (Cruz, 2009).

Na classificação segundo a etiologia, a dislexia pode ainda ser


subdividida em dislexia visual, dislexia auditiva e dislexia mista, de acordo com
o facto de terem, respectivamente, o processamento visual, o auditivo ou
ambos afectados (Citoler, 1996).

12
Fonseca (2008) caracteriza as características comportamentais dos
indivíduos com dislexia auditiva do seguinte modo: problemas na captação e na
integração de sons; não associação de símbolos gráficos com as suas
componentes auditivas; não relacionar os fonemas com os monemas (partes e
todo da palavra); confusão de sílabas iniciais, intermédias ou finais; problemas
de percepção, de articulação, de memorização auditiva, de atenção e
dificuldades de comunicação verbal. A nível da dislexia visual demonstram
dificuldades na interpretação e na diferenciação de palavras; memorização de
palavras; confusão na configuração de palavras; frequentes inversões,
omissões e substituições, problemas de comunicação na grafomotricidade e na
visuomotricidade; na percepção social e em relacionar a linguagem falada com
a linguagem escrita.

2.3.2 - DISORTOGRAFIA

Fonseca (1999) sugere que a disortografia ocorre quando o indivíduo


apresenta uma perturbação nas operações cognitivas de formulação e sintaxe,
não conseguindo organizar nem expressar os seus pensamentos segundo
regras gramaticais.

Assim, a disortografia coloca um problema na expressão escrita, pois


afecta a ideação, a formulação, a produção e os níveis de abstracção (Cruz,
2009).

Citoler (1996) apresenta os seguintes factores como potenciais


justificadores das dificuldades disortográficas: problemas na produção do texto
por falta de automatização dos procedimentos da escrita de palavras, os quais
podem interferir com a geração de frases e ideias; as estratégias utilizadas, no
que se refere aos diferentes processos (de composição e escrita) são imaturos
ou ineficazes; falta de conhecimento sobre os processos e subprocessos
implicados na escrita ou dificuldade em aceder a eles, o que implica uma
carência nas capacidades metacognitivas de regulação e controlo da
actividade.

13
2.3.3 - DISGRAFIA

Segundo Assunção e Coelho (2003), a disgrafia é a dificuldade de


passar para a escrita o estímulo visual da palavra impressa, caracterizando-se
pelo lento traçado das letras, que em geral, são ilegíveis. Os indivíduos não
conseguem idealizar no plano motor o que captou no plano visual.

Os principais erros das crianças disgráficas são os seguintes:


apresentação desordenada do texto; margens malfeitas ou inexistentes;
espaço irregular entre palavras, linhas e entrelinhas; traçado de má qualidade
(tamanho pequeno ou grande, pressão leve ou forte, letras irregulares e
retocadas); distorção da forma das letras; substituição de curvas por ângulos;
movimentos contrários ao da escrita convencional; separações inadequadas
das letras; ligações defeituosas de letras na palavra; irregularidades no
espaçamento das letras na palavra e dificuldades ao nível da direcção da
escrita (Assunção & Coelho, 2003).

Fonseca (2008) diz que a disgrafia é uma forma específica de dispraxia


e caracteriza-se pela dificuldade na cópia de desenhos geométricos simples ou
compostos, nos grafismos rítmicos, na coordenação oculomotora, na figura-
fundo, na constância da forma, no transporte de posições e relações
visuoespaciais, na organização de pontos de referência, que se manifestam ao
nível da escrita por dificuldades em produzir traços, formas, tamanhos, ligações
entre letras, uso da pressão tónica adequada, melodia cinestésica grafomotora,
etc.

2.3.4 - DISCALCULIA

Casas (1988) diz que a discalculia pode ser definida como um transtorno
parcial da capacidade de manipular símbolos aritméticos e de fazer cálculos
matemáticos.

A discalculia é um transtorno estrutural (ou seja, disfunção neurológica)


de maturação das habilidades matemáticas, que está presente, sobretudo, nas

14
crianças e que se manifesta por dificuldades na realização do processamento
dos números, no cálculo aritmético e na resolução de problemas (Cruz, 2009).

Casas (1988) sugere que as crianças com discalculia podem apresentar:


dificuldades na identificação dos números, incapacidade para estabelecer uma
correspondência recíproca, escassa habilidade para contar de modo
compreensivo, dificuldade na compreensão de conjunto, na conservação, nos
cálculos, na compreensão do conceito de medida, em aprender a dizer a hora,
na compreensão do valor das moedas, na compreensão da linguagem
matemática e dos símbolos e em resolver problemas orais.

Miller e Mercer (1997) afirmam que as crianças com discalculia


apresentam dificuldades ao nível do processamento da informação,
demonstrando alterações nas seguintes áreas: défices de atenção, défices
visuo-espaciais, dificuldades de processamento auditivo, problemas de
memória e dificuldades motoras.

2.4 - ETIOLOGIAS DAS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM ESPECÍFICAS

Existem várias teorias que explicam a génese das DAE, assim, de


acordo com Martín (1994), os três tipos de teorias mais explicativos e mais
universalmente aceites são os seguintes: teorias baseadas no neurobiológico e
neurofisiológico, teorias perceptivo-motoras e teorias psicolinguísticas e
cognitivas.

As teorias neurobiológicas e neurofisiológicas tentam explicar o


comportamento humano em função do funcionamento neurológico e cerebral
do indivíduo, tendo como referência os trabalhos pioneiros desenvolvidos por
Orton.

Citoler (1996) sugere que ao nível da teoria neurobiológica as duas


áreas de maior interesse são os estudos genéticos e neuro-anatómicos. Vários

15
estudos genéticos, particularmente ao nível do estudo da dislexia, verificaram
que existe uma componente hereditária. Shaywitz (2003) sugere que 23% a
65% das crianças que têm pais com dislexia, 40% dos irmãos de disléxicos e
27% a 49% dos parentes dos disléxicos, podem ter esta mesma desordem.
Existem também estudos genéticos que localizam a dislexia no cromossoma 6
e 15, e mais recentemente, no cromossoma 2 (Cruz, 2009).

Actualmente, o uso das novas tecnologias, nomeadamente, PET


(positron emission tomography), fMRI (functional magnetic resonance imaging)
e SPECT (single photon emission computed tomography), permitiu estudos
promissores na área das DAE, apesar de ainda haver um longo caminho a
percorrer (Kaufman & Kaufman, 2001).

Ao nível da dislexia vários estudos estabeleceram uma relação entre os


transtornos na leitura e lesões na porção esquerda da circunvolução angular
(Síndrome de Gerstman), assimetrias entre os hemisférios cerebrais,
anomalias da arquitectura celular da área de Wernicke e défices no
funcionamento do cerebelo (Cruz, 2009).

Com base nas teorias perceptivo-motoras, as crianças com DAE


apresentam dificuldades na percepção visual (relações espaciais, posição no
espaço, constância da forma, figura-fundo e coordenação visuomotora). A nível
auditivo podem apresentar dificuldades na discriminação auditiva, identificação
fonética, síntese auditiva, associação auditiva, etc (Fonseca, 2008).

Segundo o mesmo autor, estas crianças apresentam problemas


psicomotores, nomeadamente dificuldades de controlo tónico, equilíbrio,
noções do corpo, estruturação espaciotemporal e coordenação de movimentos.

De acordo com as teorias psicolinguísticas, as DAE resultam de


desordens que ocorrem nos indivíduos e lhes dificultam a recepção, integração
e expressão de conteúdos escolares (Shaywitz, 2003; Fonseca, 1999). Assim,
estes indivíduos podem apresentar dificuldades ao nível da fonologia,
morfologia, sintaxe, semântica e pragmática, demonstrando alterações na
linguagem receptiva, integrativa, expressiva ou na combinação das três.

16
Relativamente aos aspectos cognitivos, Fonseca (1999) refere que as
aprendizagens simbólicas como a leitura, a escrita e o cálculo, envolvem
processos cognitivos complexos.

O mesmo autor refere que os processos cognitivos abrangem os


processos de conteúdo, os sensoriais e os de hierarquização da aprendizagem.
Assim, os primeiros referem-se a conteúdos verbais e não verbais, referindo
que os indivíduos com DAE manifestam mais dificuldades nos conteúdos
verbais, apesar de terem surgido estudos que referem que as DAE apresentam
dificuldades tanto ao nível verbal como não verbal (Rourke & Conway, 1997).

Ao nível dos processos sensoriais ocorrem alterações nas modalidades


intrassensorial e intersensorial. Na hierarquização da aprendizagem podem
ocorrer alterações nos diferentes níveis hierárquicos: percepção, imagem,
simbolização e conceptualização. Assim qualquer alteração, disfunção ou
dificuldade num dos níveis pode afectar todo o encadeamento sistemático dos
restantes níveis (Fonseca, 1999).

2.5 - DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM GERAL

No nosso trabalho tivemos a necessidade de elaborar este capítulo de


forma a definir as crianças que demonstravam dificuldades de aprendizagem
dos conteúdos académicos, mas não se enquadravam nos parâmetros das
crianças com DAE nem no convencionalmente estabelecido para as crianças
com deficiência mental.

Estas crianças apresentavam dificuldades na realização académica,


tinham um Q.I<80 e não demonstravam dificuldades ao nível do
comportamento adaptativo.

Segundo Dockrell e Mcshane (2000) as dificuldades de aprendizagem


gerais são concebidas tendo como base os processos cognitivos específicos e

17
as suas estruturas que, quando ausentes ou ineficientes, levam a um
desempenho inadequado em várias tarefas cognitivas.

Estas crianças mostram uma velocidade de aprendizagem mais lenta e


chegam a um patamar de aprendizagem mais baixo, ou seja, há limites na
extensão do desenvolvimento cognitivo, havendo também limites superiores de
desempenho (Dockrell e Mcshane, 2000). No entanto, esta opinião é discutível
e depende muito do sistema de ensino e da forma como são estimulados
cognitivamente.

2.6 - FUNCIONAMENTO COGNITIVO DAS CRIANÇAS COM DIFICULDADE DE


APRENDIZAGEM

Foram realizados muitos estudos nos anos 70 e 80 sobre das DA,


muitos deles recorrendo ao uso da Escala de Inteligência para Crianças (Wisc),
de modo a encontrar determinadas características nestas crianças que as
pudessem diferenciar da restante população escolar. Anderson, Kaufman e
Kaufman (1976) num estudo usando a Wisc-R compararam 41 crianças com o
diagnóstico de dificuldades de aprendizagem e a amostra estandardizada
(reportada por Kaufman em 1976, na normal estandardização da amostra para
a Wisc-R) e verificaram que não existiam diferenças significativas entre os
resultados da escala verbal, de realização e escala completa. Contrariamente,
Tabachnick (1979), usando o mesmo instrumento, verificou que existiam
diferenças significativas ao nível da escala de realização e completa, entre a
sua amostra (105 crianças com dificuldades de aprendizagem) e a amostra
estandardizada, no entanto, não se apuraram diferenças ao nível dos subtestes
verbais. Ryckman (1981), num estudo similar aos precedentes, usando uma
amostra de 100 crianças com dificuldades de aprendizagem (25 raparigas e 75
rapazes) e comparando com a amostra estandardizada, obteve uma
substancial sobreposição na distribuição entre as crianças com dificuldades de
aprendizagem e o grupo de controlo.

18
Ryckman (1981) afirma que para se continuarem as pesquisas tem que
se fazer alterações na população com dificuldades de aprendizagem, pois
estas apresentam-se muito heterogenias. Assim será necessário caracterizar
sub-grupos homogéneos, pois, de outro modo, torna-se improvável encontrar
um perfil único, com características comuns.

Vários estudos foram desenvolvidos na tentativa de diferenciar as


crianças com dificuldades de aprendizagem das crianças com distúrbios
emocionais e comportamentais (usando a Wisc-R), apresentando-se, os
resultados, inconclusivos em parte devido a heterogeneidade dos grupos
(Hamm & Evan, 1978; Dean, 1978; Fuller & Goth, 1981; Vance, Fuller & Ellis,
1983).

Com recurso à Wisc-R outros estudos foram realizados incidindo


primordialmente ao nível das diferenças entre o Q.I verbal e o Q.I de
realização, perfil ACID (aritmética, código, informação e memória de dígitos) e
SCAD (pesquisa de símbolos, código, aritmética e memória de dígitos). Cunha
(2000) refere que a discrepância entre os QIs permite descrever a organização
dos processos psicológicos do sujeito. Kaufman (1994) sugere que a diferença
entre o Q.I verbal e o Q.I de realização pode ser indicativa de discrepâncias na
habilidade fluida e cristalizada, e não no pensamento verbal e não verbal.

Para Simões (2002) diferenças importantes entre o Q.I verbal e o Q.I de


realização na Wisc-III, podem ser considerados marcadores de uma
especialização hemisférica ou indicar défices de processamento, disfunção
cerebral lateralizada e dificuldades de aprendizagem. Assim, a discrepância
entre o Q.I verbal e o Q.I de realização, com um resultado melhor neste último,
pode significar um quadro de dificuldades de aprendizagem e/ou a presença de
um défice de linguagem (Kamphaus,1993; Lucca, Mancine & Veiga, 2008).

Alguns estudos verificaram que as crianças com dificuldades de


aprendizagem apresentam um Q.I verbal mais baixo do que o Q.I de
realização. Segundo Bannatyne (1978) cerca de 60% a 80% das crianças com
dificuldades de aprendizagem avaliadas têm défices nas áreas verbais.

19
Slate (1995) num estudo com três grupos de crianças, entre as quais
crianças com dificuldades de aprendizagem e deficiência mental verificou que
todos os grupos apresentavam um Q.I de realização superior ao Q.I verbal.

Um estudo grego com uma amostra de 180 crianças diagnosticadas com


dificuldades de aprendizagem (136 rapazes e 44 raparigas), com idades
compreendidas entre os 6.11 e os 14.4 anos, apresenta uma média do Q.I da
escala completa de 96.08, um Q.I da escala verbal de 96.38 e um Q.I de
realização de 96.61. Quando se verifica a direcção das diferenças, podemos
notar que 48,9% da amostra tem um Q.I verbal maior e 46,7% tem um Q.I de
realização mais elevado (Rotsika et al., 2009).

O estudo de Figueiredo, Quevedo, Gomes e Pappen (2007) cujo


objectivo era estudar as habilidades cognitivas de crianças e adolescentes com
dificuldades de aprendizagem, e cuja amostra englobava 263 crianças de
escolas públicas, com idades compreendidas entre os 6 e os 16 anos, que
apresentavam problemas de leitura e défices de atenção, verificou que a
discrepância, apesar de não significativa, se deu a favor do Q.I verbal em
detrimento do Q.I de realização.

Vários estudos investigaram a validade e o valor preditivo do perfil ACID,


e concluíram que este perfil não era eficiente para discriminar crianças com DA
(Figueiredo, Quevedo, Gomes & Pappen, 2007; Filippatou e Livaniou, 2005;
Rotsika et al., 2009; Ward, Ward, Hatt, Young & Mollner,1995; Watkins, Kush &
Glutting, 1997)

Mayes, Calhoun e Crowell (1998) realizaram um estudo que envolveu


uma amostra de 51 crianças sem DA e 66 crianças com DA, sendo as crianças
com DA subdivididas em dois subgrupos: um com Perturbação de
Hiperactividade com Défice de Atenção (PHDA) associada e outro sem
comorbilidade associada. Os resultados demonstraram que as crianças sem
comorbilidade associada é mais provável terem o perfil ACID, no entanto, o
perfil SCAD é mais evidente em crianças com PHDA associada à DA.

20
Após o recurso à dicotomia verbal-realização e aos perfis ACID e SCAD,
os estudos, envolvendo a compreensão das crianças com DA usando a Wisc,
começaram a dar mais ênfase à análise compreensiva dos subtestes e aos
índices factoriais: ICV (índice de compreensão verbal), IOP (índice de
organização perceptiva) e IVP (índice de velocidade de processamento).

Num estudo com crianças Mexicanas a viver nos EUA, que eram
bilingues e apresentavam diagnóstico de DA, foi-lhes aplicada a Wisc-R e
verificou-se que estas crianças apresentavam médias mais baixas ao nível dos
subtestes de memória de dígitos e informação e valores médios mais elevados
em complemento de gravuras (Mishra, 1984)

Waldron e Saphire (1990) num estudo envolvendo uma amostra de 24


crianças dotadas, cujo grupo experimental (crianças com DA) apresenta um Q.I
total médio de 132 e o grupo de controlo (crianças sem DA) um Q.I total médio
de 133, verificaram que no grupo de crianças com DA os subtestes de
semelhanças e aritmética eram significativamente mais elevados que o da
memória de dígitos, enquanto que no grupo de controlo, o subteste de
semelhanças foi significativamente mais elevado do que o da memória de
dígitos. Neste estudo, os autores avaliaram 14 factores e foi possível verificar
que as crianças dotadas com DA apresentam como pontos fortes a
conceptualização verbal (semelhanças, vocabulário e compreensão) e
raciocínio (semelhanças, aritmética e compreensão) e fracos ao nível
recordação da informação verbal (informação, vocabulário e memória de
dígitos).

Mayes, Calhoun e Crowell (1998) verificaram que as crianças com DA


apresentavam resultados mais baixos nos subtestes de aritmética, memória de
dígitos e informação. No entanto, a única diferença significativa entre as
crianças com DA e as crianças sem DA ocorreu no subteste memória de
dígitos. Os subtestes que apresentaram pontuações mais elevadas nas
crianças com DA foram o complemento de gravuras, compreensão e
semelhanças. Resultados similares foram verificados por Rotsika et al. (2009),
cujos subtestes com pontuações mais baixas eram a memória de dígitos e
aritmética e mais elevadas no complemento de gravuras e semelhanças.

21
Filippatou e Livaniou (2005) verificaram que as crianças com PHDA, o
subteste com o resultado mais baixo na Wisc-III, era o de código e as crianças
com dificuldades de aprendizagem apresentavam um resultado mais baixo no
subteste de informação.

Figueiredo, Quevedo, Gomes e Pappen (2007) identificaram, nas


crianças com DA, resultados baixos nos subtestes de aritmética, código,
informação, memória de dígitos, disposição de gravuras e semelhanças,
demonstrando, segundo os autores, fraquezas relacionadas com a atenção e
concentração, conhecimento académico, organização visual e pensamento
abstracto. Sendo que os resultados mais baixos foram verificados nos
subtestes de aritmética e disposição de gravuras.

Nyden, Billsteds, Hjelmquist e Gillberg (2001) num estudo, envolvendo


rapazes com Aspeger (n = 20), PHDA (n = 20) e dificuldades de leitura e escrita
(n = 20), verificaram que as crianças com Aspeger apresentavam valores mais
baixos nos testes de pesquisa de símbolos e memória de dígitos e as crianças
com PHDA e dificuldades de leitura e escrita tiveram pontuações mais baixas
em memória de dígitos e código e os três grupos apresentavam um valor mais
elevado no subteste de vocabulário.

Segundo Rotsika et al. (2009), a maioria dos estudos concordam com o


item mais difícil para as crianças com DA, no entanto, não concordam com o
item mais fácil. Sendo que a maioria dos estudos verificam que os itens mais
difíceis são aritmética e memória de dígitos, outros referem que o subteste com
pontuação padronizada mais baixa é vocabulário ou mesmo informação e
disposição de gravuras.

As pesquisas ao longo dos anos vão associando as DA a dificuldades ao


nível da memória de trabalho (Alloway & Gathercole, 2006; Pickering 2006). Foi
considerada uma evidência que as crianças com dificuldades ao nível da leitura
apresentam défices ao nível do processamento fonológico e armazenamento
(Velluttino, Fletcher, Snowling & Scanlon, 2004; Pickering 2006; Swanson,
2006). É ainda de referir que apesar das poucas referências bibliográficas as
crianças com dificuldades ao nível da escrita apresentam dificuldades ao nível

22
da memória de trabalho visuo-espacial (Kibby, Marks, Morgan & Long, 2004;
Pickering, 2006)

Maehler e Schuchardt (2009), num estudo envolvendo um grupo de


controlo, de 27 crianças sem dificuldades ao nível da aprendizagem, e um
grupo experimental subdividido em: 27 crianças com DA e um Q.I dentro dos
parâmetros normais e outro grupo de 27 crianças com DA e um Q.I baixo. Os
resultados demonstram existir uma deficiência global ao nível da memória de
trabalho nas crianças com DA comparando com o grupo de controlo, no
entanto, inexplicavelmente, não existem diferenças entre os dois grupos de
crianças com DA. Chegaram à conclusão que a memória de trabalho está
associada às DA independentemente do nível de inteligência da criança.

Relativamente aos índices factoriais, alguns estudos verificaram que


crianças com DA apresentavam um valor mais baixo ao nível do índice de
velocidade de processamento (IVP) (Mayes et al., 1998; Nyden, Billstedt,
Hjelmquist & Gillberg, 2001; Calhoun & Mayes, 2005) e mais elevado o índice
de compreensão verbal (ICV) (Mayes et al., 1998; Calhoun & Mayes, 2005).
Nas crianças com deficiência mental foram encontrados resultados similares
(Calhoun & Mayes, 2005).

2.6.1 - CATEGORIAS DE BANNATYNE NAS CRIANÇAS COM DIFICULDADES DE


APRENDIZAGEM

Bannatyne (1968, 1974) apercebeu-se que a divisão da Wisc em escala


verbal e de realização não era útil, nem ajudava a caracterizar as crianças com
DA, propondo, deste modo, uma taxonomia alternativa. Sugeriu quatro
categorias de classificação dos subtestes: Espacial (complemento de gravuras,
cubos, composição de objectos), Conceitual (compreensão, semelhanças,
vocabulário), Sequencial (memória de dígitos, aritmética e código) e
Conhecimento Adquirido (informação, aritmética, vocabulário). No entanto,
Rugel (1974) examinou uma série de estudos que utilizavam a Wisc em

23
crianças com dificuldades de leitura e verificou um défice na categoria
Sequencial e pontuações mais elevadas na categorial Espacial.

Assim, foi criado um perfil das categorias de Bannatyne, verificando-se


que Espacial > Conceitual > Sequencial na maioria das crianças com DA e
dificuldade de leitura. As crianças com DA apresentam uma boa capacidade
espacial, adequadas capacidades verbais-conceituais e fraca capacidade
sequencial, assim como deficientes habilidades que envolvam atenção e
concentração (Vance & Singer, 1979).

Todavia, vários estudos posteriores apresentam resultados pouco


conclusivos, pondo em causa a utilidade do perfil das categorias de Bannatyne
como forma de discriminar crianças com DA.

Mishra (1984) analisou a ocorrência do perfil das categorias de


Bannatyne em crianças de origem Mexicana a viver nos EUA, podendo-se
verificar que estas apresentaram um melhor desempenho médio a nível
Espacial e as categorias Sequencial e Conceitual apresentaram valores
semelhantes.

Smith e Watking (2004), num estudo comparando 1302 crianças com DA


e 2158 crianças da amostra normativa da Wisc-III, verificaram que as
categorias de Bannatyne ocorriam em 22% a 24% das crianças com DA e em
14% das crianças do grupo de controlo. Assim, puderam concluir o perfil das
categorias de Bannatyne não eram aconselháveis para predizer se as crianças
tinham ou não dificuldades de aprendizagem (Berk, 1983; Smith & Watking,
2004).

2.7 - O GÉNERO E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Na maioria dos estudos, nomeadamente os supracitados, a maior


percentagem de crianças com DA são do sexo masculino.

24
Segundo Fonseca (1984) existem diversas explicações para o
predomínio das DAE no sexo masculino: Anatómica – proposta por Galaburda,
na década de 1960, que sugeriu a existência de menos microgiros no cérebro
de homens do que de mulheres observados em estudos post-mortem;
Genética – que defende a participação de determinados genes em distúrbios
específicos de aprendizagem; Especialização Hemisférica – em virtude de
uma maior habilidade demonstrada pelas meninas em provas
neuropsicológicas relacionadas com a coordenação motora fina e também em
provas de ordem verbal e características de aquisição da linguagem.

Karande, Sawant, Kulkarni, Galvankar & Sholapurwala (2005) afirmam


que a maior predominância das DA no sexo masculino se deve ao facto de
haver mais meninos encaminhados pela equipa docente para avaliação.

2.8 - ÁREAS DE ACTIVAÇÃO CEREBRAL NAS CRIANÇAS COM DIFICULDADES DE


APRENDIZAGEM

Nos últimos anos vários estudos genéticos foram desenvolvidos na área


das DA e identificados os possíveis genes que estão na sua origem,
nomeadamente da Dislexia. No entanto, actualmente sabe-se que um simples
gene não é responsável por todas as alterações que desencadeiam o
desenvolvimento da Dislexia, mas um conjunto heterogéneo de factores que
afectam o seu desenvolvimento e levam a um diagnóstico comum de DA
(Gilger & Kaplan, 2001).

Sabemos também que diferentes ambientes experienciais e as próprias


contingências desenvolvimentais conduzem a que um simples gene ou factor
ambiental se manifeste de forma diferente a nível da estrutura e funcionamento
cerebral (Gilger & Kaplan, 2001).

Inicialmente acreditava-se que alterações na linguagem estavam


relacionadas com determinadas áreas no cérebro. Vários estudos,

25
inconsistentemente, mostravam que crianças com alterações ao nível da
leitura, escrita e linguagem, apresentavam alterações nas áreas temporais
esquerdas. No entanto, foi possível verificar que o cérebro de pessoas com DA
apresenta, muitas vezes, uma evidente disfunção multifocal, englobando uma
variedade de áreas, nomeadamente, o hipocampo, a área occipital, temporal, o
frontal, o cerebelo e corpo caloso (Chase, Rosen & Sherman, 1996; Bigler,
Lajiness-O`Neill & Howes, 1998; Gilger & Kaplan, 2001; Pope & Whiteley,
2003).

Estudos de imagens do cérebro identificararam uma rede de regiões


cerebrais em ambos os hemisférios que estão envolvidas na habilidade da
leitura (Price, Gorno-Tempiri, Graham, Biggio, Mechelli, Patterson, Noppeney,
2003).

Shaywitz e Shaywitz (2005), usando os recentes avanços da tecnologia,


nomeadamente a ressonância magnética funcional, verificaram que existia uma
base neurológica para a Dislexia, especialmente uma interrupção de dois
sistemas do hemisfério esquerdo do cérebro posterior, um parieto-temporal e
outro occipital-temporal, com mecanismos compensatórios do sistema anterior
à volta do giro frontal inferior e o sistema posterior (occipital-temporal direito).

Odegard, Ring, Smith, Biggan e Black (2008) afirmam que antes do


tratamento, os indivíduos com dificuldades ao nível da leitura exibem um
padrão anormal de activação espaço-temporal que inclui a activação occipital-
temporal bilateral, assim como frontal inferior, giro angular e temporal superior
que pode ser ou bilateral ou lateral direito.

Relativamente ao nosso instrumento de trabalho, a Wisc-III foi


construída como um instrumento de avaliação da inteligência e não como uma
medida de funcionamento neurológico. No entanto, e apesar de não ser
propriamente uma prova neuropsicológica, é amplamente utilizada em
neuropsicologia e encontra-se mesmo entre os instrumentos mais
frequentemente usados (Horowitz, Schatz & Chute, 1997).

26
Alguma evidência de natureza correlacional, não conclusiva, oferece
suporte para o Q.I verbal reflectir o funcionamento do hemisfério esquerdo e o
Q.I de realização traduzir a actividade do hemisfério direito, baseando-se na
hipótese da distinção entre as competências verbais e não-verbais (Simões,
2002).

A lesão sofrida por um adulto no hemisfério esquerdo pode afectar mais


o Q.I verbal do que o Q.I de realização, sendo opostos os resultados para a
lesão no hemisfério direito (Simões, 2002). Mas segundo Manga e Fournier
(1997), o desenvolvimento e plasticidade cerebrais não permitem que se
observem nas crianças relações semelhantes às encontradas nos adultos.

Com frequência, a dicotomia Q.I verbal - Q.I de realização parece


revelar-se útil para saber se a criança apresenta um défice que afecta as
capacidades linguísticas (Q.I. verbal) ou as capacidades perceptivo-espaciais
(Q.I. de realização) (Simões, 2002). No entanto, apesar de ser possível o
levantamento de hipóteses explicativas do funcionamento cerebral, é
necessária precaução nas interpretações, e estas devem-se basear num
conjunto de dados recolhidos e não somente nos resultados inconclusivos de
um teste.

27
3. METODOLOGIA

28
3. METODOLOGIA

O paradigma que serviu de base à elaboração deste estudo foi o quasi-


experimental, mais especificamente a investigação descritiva e inferencial. Esta
investigação foi realizada fora do contexto laboratorial, não possuindo o
controlo e rigor do método experimental, razão pela qual, se designa de quasi-
experimental.

3.1 - AMOSTRA

A amostra foi constituída por 69 crianças com DA, com idades


compreendidas entre os 6 e os 14 anos (8,78±1,86), sendo 25 do sexo
feminino (36,2%) e 44 do masculino (63,8%). Foram incluídas na amostra as
crianças que frequentavam o 1º e 2º Ciclos dos Agrupamentos de Escolas
Monsenhor Jerónimo do Amaral e Diogo Cão, estando sinalizadas pelo
respectivo agrupamento como apresentando DA.

As crianças com DA não apresentam outra patologia associada, não


havendo interferências de comorbilidades, nomeadamente Perturbação de
Hiperactividade com Défice de Atenção (PHDA), que está muitas vezes
associada às DA.

No Quadro 1 apresentamos as características gerais da amostra.

29
QUADRO 1 - Caracterização Geral da Amostra

Frequência (n=69) Percentagem (%)


Feminino 25 36,2
Género
Masculino 44 63,8
1º Ano 6 8,7
2º Ano 18 26,1
Ano de 3º Ano 26 37,7
Escolaridade 4º Ano 5 7,2
5º Ano 6 8,7
6º Ano 8 11,6
Nenhuma 41 59,4
Uma 22 31,9
Nº de Retenções
Duas 2 2,9
Sem informação 4 5,8
Nenhuma 6 8,7
Um 38 55,1
Nº de Irmãos Dois 19 27,5
Três 1 1,4
Sem informação 5 7,2
Baixo 27 39,1
Nível Médio 31 44,9
Socioeconómico Alto 6 8,7
Sem informação 5 7,2
Dislexia 22 31,9
Disortografia 24 34,8
DA da Criança Discalculia 5 7,2
Disgrafia 3 4,3
Dificuldade de
15 21,7
aprendizagem geral

Da análise do quadro 1, podemos referir que a maior parte das crianças


frequentam o 2º e 3º ano (26,1% e 37,7%) e não apresentam retenções
(59,4%).

Relativamente à família, a maioria tem apenas um irmão (55,1%) e uma


percentagem elevada pertence ao nível socioeconómico médio e baixo (44,9%
e 39,1%).

30
3.2 - VARIÁVEIS

Neste estudo usamos como variáveis dependentes os resultados obtidos


na Wisc-III, nomeadamente o Q.I total, Q.I verbal e Q.I de realização. Assim
como, os subtestes da escala verbal (vocabulário, semelhanças, compreensão,
aritmética, memória de dígitos e informação), os subtestes da escala de
realização (complemento de gravuras, pesquisa de símbolos, labirintos, código,
cubos, disposição de gravuras e composição de objectos) e os índices
factoriais: índice de compreensão verbal (ICV), índice de organização
perceptiva (IOP) e índice de velocidade de processamento (IVP).

As variáveis independentes são as dificuldades de aprendizagem


(Dislexia, Disortografia e DAGeral), o nível socioeconómico e o género.

No entanto, ao analisarmos as dificuldades de aprendizagem em função


do género e do nível socioeconómico, a Dislexia, Disortografia e DAGeral,
passaram a funcionar como as variáveis dependentes.

3.3 - INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO

Para criarmos um perfil cognitivo das crianças com DA, utilizamos a


Wisc-III e um questionário biográfico.

3.3.1 - ESCALA DE INTELIGÊNCIA DE W ECHLER PARA CRIANÇAS - 3ª EDIÇÃO

Para este estudo foi usado uma Escala de Inteligência de Whechsler


para Crianças, sendo a primeira versão elaborada em 1945 por David
Wechsler. A versão usada no nosso trabalho (Wisc-III) foi realizada em 1991
por uma equipa coordenada pelo Dr. Aurélio Prifitera. A adaptação e aferição

31
portuguesa da Wisc-III é resultado do trabalho da equipa de Investigação e
Publicações Psicológicas (CEGOC-TEA) com a colaboração do professor
Mário Simões, cujos trabalhos foram iniciados em 1999 e envolveram uma
amostra estratificada de 1354 sujeitos com idades compreendidas entre os 6 e
os 16 anos, representativa da população portuguesa nas variáveis: idade, sexo,
nível de escolaridade, meio de residência e localização geográfica.

Este teste apesar de ter sido criado com intuito de avaliar a inteligência,
tem uma aplicação mais vasta, sendo usado com frequência na psicologia
clínica e neuropsicologia como instrumento de avaliação neuropsicológica. Esta
escala permite-nos, assim, não só uma avaliação quantitativa das capacidades
dos indivíduos, mas também uma avaliação qualitativa do funcionamento
cognitivo.

A Wisc-III é composta por uma componente verbal, da qual fazem parte


6 subtestes (informação, semelhanças, aritmética, vocabulário, compreensão e
memória de dígitos) e uma componente não verbal constituída por 7 subtestes
(complemento de gravuras, código, disposição de gravuras, cubos, composição
de objectos, pesquisa de símbolos e labirintos). Com as provas verbais
podemos chegar ao valor do Q.I. verbal e as provas de realização (não verbais)
contribuem para a obtenção de um Q.I. de realização. O Q.I. Total é obtido pela
soma dos resultados padronizados de 10 subtestes.

São ainda calculados três Índices Factoriais: Índice de Compreensão


Verbal, Índice de Organização Perceptiva e Índice de Velocidade de
Processamento. O ICV é obtido pela soma dos resultados padronizados dos
subtestes de informação, semelhanças, vocabulário e compreensão. Para a
obtenção do IOP, usamos os seguintes subtestes: complemento de gravuras,
disposição de gravuras, cubos e composição de objectos. Para calcular o IVP
são usados os subtestes de código e pesquisa de símbolos.

Determinados autores sugerem que uma diferença que de 10 a 15


pontos entre o Q.I verbal e o Q.I de realização, pode-nos dar directrizes
importantes sobre o funcionamento cognitivo das crianças (Kaufman &

32
Reynolds, 1983; Koppitz, 1976, Groth-Marnat, 1999, Wechsler, 2003). Assim,
no nosso estudo, utilizaremos uma diferença de 15 pontos entre os Q.Is.

Bannatyne sugeriu a divisão dos subtestes da Wisc por categorias que


tinham como objectivo reconhecer um perfil das crianças com dificuldades de
aprendizagem. O autor, David Wechsler, não introduz essa classificação como
uma das valências avaliativas do teste.

3.3.2 - QUESTIONÁRIO BIOGRÁFICO

Foi elaborado um questionário para recolha de dados biográficos sobre a


criança e a família. Neste questionário foi possível recolher informação relativa
à idade e género da criança, ano de escolaridade, número de retenções, nível
socioeconómico (NSE) e constituição do agregado familiar.

O NSE é definido como um grupo de pessoas com uma ocupação,


escolaridade e características económicas semelhante (Santrock, 2004).
Assim, definimos o NSE com base na ocupação/emprego, escolaridade das
figuras parentais e tamanho do agregado familiar. Para procedermos a esta
delimitação apoiamo-nos nas tabelas do NSE de Hollingshead e nas classes
sociais delimitadas pela marktest.

3.4 - PROCEDIMENTOS

Para procedermos à recolha dos dados e após o consentimento dos


Agrupamentos Escolares, deslocamo-nos aos respectivos professores do 1º
ciclo e directores de turma dos alunos do 2º ciclo que funcionaram como
intermediários entre nós e a família.

Em seguida, foi enviado por escrito um pedido de autorização aos


encarregados de educação das crianças seleccionadas de modo a podermos

33
aplicar o teste. Após consentimento informado e assinada a autorização por
parte do encarregado de educação, foi aplicada individualmente a Wisc-III na
escola das crianças. Esta aplicação foi feita em salas de apoio facultadas pela
escola, onde apenas se encontrava a criança e a examinadora.

Posteriormente, foi preenchido um questionário pelo professor, referente


a dados biográficos da criança, recorrendo aos pais para obter uma informação
mais fidedigna e às fichas de inscrição dos respectivos alunos.

A examinadora falava sempre com os professores sobre as dificuldades


que as crianças apresentavam no contexto escolar, estratégias utilizadas na
sala de aula, envolvimento parental e dinâmica relacional com a escola, entre
outros assuntos que se mostravam de relevante interesse para ambas as
partes e permitiam a compreensão do problema.

No final, e cumprindo o acordo feito entre a escola, pais, professores e


examinadores, foram facultados os resultados ao agrupamento e equipa
docente, tendo sempre como objectivo a partilha de conhecimento e entre-
ajuda.

3.5 - LIMITAÇÕES

Em relação às limitações do nosso estudo, podemos referir o tempo de


aplicação da Escala (90 minutos) e a demora nos processos burocráticas dos
pedidos de autorização aos agrupamentos de escolas, professores e
encarregados de educação, o que limitou o tamanho da nossa amostra.

34
3.6 - ANÁLISE ESTATÍSTICA

Para o tratamento estatístico dos dados foi utilizado o programa


Statistical Package for Social Science – SPSS 17.0. Iniciámos pela análise
exploratória dos dados (cálculo da média, mediana, desvio padrão, valor
máximo e mínimo) e verificação da normalidade das distribuições através do
cálculo da assimetria e achatamento, apresentando a maioria valores
compreendidos entre -1 e 1. Para a classificação, segundo o perfil das
categorias de Bannatyne, usou-se a frequência e a percentagem.

Relativamente aos testes comparativos, utilizou-se o Qui-quadrado para


variáveis nominais e a Anova com teste post-hoc de Scheffe para variáveis
contínuas (perfil da Wisc-III). Em todos os testes o nível de significância foi de
5%.

35
4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

36
4. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Neste capítulo serão apresentados os resultados obtidos do tratamento


estatístico efectuado, tendo sido utilizados dois tipos de análise: a descritiva e a
comparativa.

4.1 - ANÁLISE DESCRITIVA

4.1.1 - DESCRIÇÃO TOTAL DA AMOSTRA

No quadro seguinte apresentamos os valores obtidos através da


estatística descritiva (valor mínimo, valor máximo, média e desvio padrão) para
a amostra total, relativa às variáveis dependentes envolvidas neste trabalho.

37
QUADRO 2 - Perfil Wisc-III para a amostra total

Desvio
Perfil Wisc-III N Média Mínimo Máximo Simetria Achatamento
Padrão
Q.I. Verbal 69 93,03 15,78 57,00 139,00 0,122 0,551
Q.I. de Realização 69 86,86 14,80 57,00 132,00 0,326 0,476
Q.I. Total 69 87,36 14,88 56,00 122,00 0,110 -0,266
Complemento de
69 8,06 3,10 1,00 15,00 -0,162 -0,429
Gravuras
Informação 69 8,00 2,86 1,00 16,00 -0,004 0,297
Código 69 8,77 2,90 2,00 19,00 0,156 1,576
Semelhanças 69 9,30 2,93 2,00 17,00 0,419 0,434
Disposição de
69 8,36 3,12 2,00 19,00 0,418 1,193
Gravuras
Aritmética 69 9,04 2,68 3,00 17,00 0,329 0,698
Cubos 69 8,07 2,63 2,00 14,00 -0,051 -0,210
Vocabulário 69 9,41 3,21 1,00 19,00 0,104 0,765
Composição de
69 8,04 2,86 2,00 14,00 -0,169 -0,304
Objectos
Compreensão 69 9,57 3,25 2,00 19,00 0,525 0,932
Pesquisa de
69 8,19 2,83 2,00 17,00 0,300 0,709
Símbolos
Memória de Dígitos 69 7,77 2,38 1,00 14,00 0,055 0,100
Labirintos 69 8,84 2,82 4,00 17,00 0,306 -0,022
Índice de
Compreensão 69 93,58 15,93 53,00 142,00 -0,005 0,987
Verbal
Índice de
Organização 69 87,39 15,32 60,00 136,00 0,349 0,667
Perceptiva
Índice de
Velocidade de 69 90,99 13,31 54,00 119,00 -0,437 0,030
Processamento

Da análise do quadro 2, podemos verificar que as crianças avaliadas


apresentam um valor médio do Q.I. total de 87,36(±14,88), um Q.I. de
realização de 86,86(±14,80) e um Q.I verbal de 93,03(±15,78). Deste modo é
possível verificar que, na nossa amostra, o Q.I Verbal é superior ao Q.I
Realização.

No que concerne aos subtestes foi visível uma melhor performance


média no subteste de compreensão (9,57±3,25), seguido do vocabulário
(9,41±3,21) e semelhanças (9,30±2,93). O subteste com um valor médio mais

38
baixo foi a memória de dígitos (7,77±2,38), seguido pela informação
(8,00±2,86) e composição de objectos (8,04±2,86).

Relativamente aos índices factoriais, o índice de compreensão verbal é o


que apresenta um valor mais elevado (93,58±15,93), seguido do índice de
organização perceptiva (87,39±15,32) e o de velocidade de processamento
(90,99±13,31).

4.1.2 - DICOTOMIA Q.I VERBAL/Q.I DE REALIZAÇÃO

No quadro seguinte é apresentada a frequência e a percentagem das


crianças que apresentam um Q.I verbal maior do que o Q.I de realização ou um
Q.I de realização maior do que o Q.I verbal, e quando esta diferença é superior
a 15 pontos.

QUADRO 3 - Dicotomia entre o Q.I verbal e o Q.I realização

Frequência Percentagem (%)


Q.I.de realização > Q.I. verbal 24 34,8
Q.I. verbal > Q.I. de realização 45 65,2
Q.I. de realização > 15pts Q.I. verbal 7 10,1
Q.I. verbal > 15 pts Q.I. de realização 20 29,0
pts - pontos

Relativamente à dicotomia Q.I verbal / Q.I de realização, verificámos que


existem 24 crianças (34,8%) com um Q.I de realização superior e 45 crianças
(65,2%) com um Q.I verbal mais elevado. As diferenças são superiores a 15
pontos em 7 crianças (Q.Ir>Q.Iv) e em 20 crianças (Q.Iv>Q.I r).

4.1.3 - DESCRIÇÃO DO PERFIL DAS CATEGORIAS DE BANNATYNE

No quadro seguinte é apresentada a frequência e a percentagem de


indivíduos que se encontram abrangidos pelo perfil das categorias de
Bannatyne (Espacial>Conceitual>Sequencial).

39
QUADRO 4 - PERFIL DAS Categorias de Bannatyne nas crianças com Dificuldades de
Aprendizagem

Categorias Bannatyne
Frequência Percentagem (%)
(E > C > S)
Presença 10 14,5
Ausência 59 85,5

No que concerne ao perfil das categorias de Bannatyne podemos


averiguar que somente 10 crianças (14,5%) podem ser incluídas e em 59
crianças (85,5%) não se verifica.

4.2 - ANÁLISE COMPARATIVA

Para procedermos à análise comparativa utilizamos somente três grupos


de crianças da amostra total: Dislexia (n=22), Disortografia (n=24) e DAGeral
(n=15). As crianças que apresentavam Discalculia e Disgrafia foram retiradas
desta análise estatística pois apresentavam-se em número muito reduzido.

4.2.1 - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM EM FUNÇÃO DO GÉNERO

No quadro seguinte são comparadas as dificuldades de aprendizagem


em função do género.

QUADRO 5 - Comparação do tipo de dificuldade de aprendizagem em função do género.

Feminino (n=19) Masculino (n=42)


Frequência Percentagem (%) Frequência Percentagem
(%)
Dislexia 10 52,6 12 28,6
Disortografia 4 21,1 20 47,6
DAGeral 5 26,3 10 23,8
2
X = 4,480
p = 0,106

40
Pela análise do quadro anterior, verifica-se que não existem diferenças
significativas no tipo de dificuldade de aprendizagem em função do género
(X2=4,480; p=0,106). No entanto, notámos que a DA mais predominante nas
raparigas é a Dislexia (52,6%), e nos rapazes é a Disortografia (47,6%).

4.2.2 - DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM EM FUNÇÃO DO NÍVEL


SOCIOECONÓMICO

No quadro 6 são apresentadas as dificuldades de aprendizagem das


crianças em função do nível socioeconómico do agregado familiar.

QUADRO 6 - Comparação do tipo de dificuldade de aprendizagem em função do nível


socioeconómico

Nível Socioeconómico
Baixo (n=23) Médio (n=28) Alto (n=6)
F P (%) F P (%) F P (%)
Dislexia 11 47,8 7 25,0 3 50,0
Disortografia 8 34,8 13 46,4 1 16,7
DAGeral 4 17,4 8 28,6 2 33,3
2
X = 4,233 F - Frequência; P - Percentagem
p = 0,375

Pela análise deste quadro, podemos verificar que não existem


diferenças no tipo de dificuldade de aprendizagem em função do nível
socioeconómico (X2=4,233; p=0,375). No entanto, verificámos que a DA
predominante nas crianças de um nível socioeconómico baixo e alto é a
Dislexia, enquanto no nível socioeconómico médio é a Disortografia.

4.2.3 - PERFIL DA WISC-III SEGUNDO O TIPO DE DIFICULDADE DE

APRENDIZAGEM

No quadro 7 apresentamos os resultados da comparação do perfil da


Wisc-III em função do tipo de dificuldades de aprendizagem.

41
QUADRO 7 - Comparação do Perfil da Wisc-III em função do tipo de Dificuldade de
Aprendizagem.

Disortografia DA Geral Diferenças


Dislexia (DL) P
WISC-III (D0) (DAG) F entre
(n=22) (sig)
(n=24) (n=15) Grupos
DL>DAG;
Q.I. Verbal 98,55 ± 10,58 96,50 ± 11,29 74,07 ± 10,56 26,47 0,000*
DO >DAG
DL>DAG;
Q.I. Realização 92,55 ± 9,41 94,13 ± 13,81 69,54 ± 8,65 25,65 0,000*
DO >DAG
DL>DAG;
Q.I. Total 93,68 ± 9,05 93,46 ± 11,73 66,87 ± 5,58 43,99 0,000*
DO >DAG
Complemento de DL>DAG;
9,14 ± 2,64 9,38 ± 2,41 5,33 ± 2,97 12,59 0,000*
Gravuras DO >DAG
DL>DAG;
Informação 8,86 ± 2,12 8,58 ± 2,90 5,33 ± 2,55 9,96 0,000*
DO >DAG
DL>DAG;
Código 9,95 ± 3,37 9,38 ± 1,84 5,93 ± 2,34 11,81 0,000*
DO >DAG
DL>DAG;
Semelhanças 9,91 ± 2,86 9,79 ± 2,32 6,67 ± 2,19 9,16 0,000*
DO >DAG
Disposição de DL>DAG;
9,55 ± 2,13 9,67 ± 3,14 4,67 ± 1,80 21,78 0,000*
Gravuras DO >DAG
DL>DAG;
Aritmética 9,60 ± 2,09 10,08 ± 2,72 6,60 ± 2,10 10,97 0,000*
DO >DAG
DL>DAG;
Cubos 8,73 ± 2,03 9,21 ± 2,38 5,80 ± 2,24 11,83 0,000*
DO >DAG
DL>DAG;
Vocabulário 10,09 ± 2,43 9,75 ± 2,75 6,47 ± 2,53 10,14 0,000*
DO >DAG
Complemento de DL>DAG;
8,36 ± 2,57 9,13 ± 2,61 6,13 ± 2,77 6,09 0,004*
Objectos DO >DAG
DL>DAG;
Compreensão 10,86 ± 2,78 9,67 ± 2,26 6,33 ± 2,29 15,52 0,000*
DO >DAG
Pesquisa de DL>DAG;
8,45 ± 2,76 9,21 ± 2,86 6,20 ± 1,97 6,19 0,004*
Símbolos DO >DAG
Memória de
8,41 ± 2,09 7,71 ± 2,24 6,5 ± 2,50 3,10 0,053
Dígitos
Labirintos 9,14 ± 2,32 9,50 ± 3,16 7,27 ± 2,69 3,24 0,047*
Índice de DL>DAG;
Compreensão 99,14 ± 10,94 96,08 ± 10,64 75,20 ± 12,88 22,42 0,000* DO >DAG
Verbal
Índice de DL>DAG;
Organização 92,50 ± 9,79 94,92 ± 14,66 71,00 ± 10,88 19,96 0,000* DO >DAG
Perceptiva
Índice de DL>DAG;
Velocidade de 94,32 ± 13,26 96,25 ± 9,94 77,13 ± 11,44 14,08 0,000* DO >DAG
Processamento
*P ≤ 0,05

42
Da análise do quadro anterior, podemos referir que existem diferenças
significativas entre todas as variáveis que compõem o perfil da Wisc-III,
excepto na memória de dígitos (p=0,053). Verifica-se que as crianças com
DAGeral apresentam valores inferiores em todas as variáveis
comparativamente às crianças com Dislexia e Disortografia.

4.2.4 - PERFIL DA W ISC-III SEGUNDO O ESTATUTO SOCIOECONÓMICO

No quadro seguinte apresenta-se o Perfil da Wisc-III em função do


estatuto socioeconómico das famílias onde as crianças se encontram inseridas.

QUADRO 8 - Comparação do Perfil da Wisc-III em função do nível socioeconómico

ESTATUTO SÓCIO-ECONÓMICO
P
WISC-III Baixo Médio Alto F
(sig.)
(n=23) (n=28) (n=6)
Q.I. Verbal 88,04 ± 14,17 95,07 ± 16,42 89,00 ± 9,63 1,485 0,236
Q.I. de Realização 87,87 ± 12,41 87,75 ± 17,36 87,67 ± 16,79 0,001 0,999
Q.I. Total 85,30 ± 12,25 89,14 ± 17,77 85,00 ± 13,02 0,463 0,632
Complemento de
8,48 ± 2,94 8,57 ± 3,26 8,00 ± 2,37 0,086 0,917
Gravuras
Informação 7,39 ± 2,86 8,39 ± 3,22 8,00 ± 1,26 0,732 0,486
Código 9,26 ± 3,85 8,54 ± 2,28 7,83 ± 2,79 0,658 0,522
Semelhanças 8,52 ± 3,01 9,68 ± 2,87 8,00 ± 1,41 1,506 0,231
Disposição de
8,17 ± 2,85 8,14 ± 3,74 10,00 ± 3,41 0,802 0,454
Gravuras
Aritmética 8,57 ± 2,37 9,50 ± 3,21 8,67 ± 2,25 0,754 0,476
Cubos 8,39 ± 2,41 8,11 ± 2,97 8,50 ± 2,26 0,096 0,908
Vocabulário 8,09 ± 2,94 9,82 ± 3,10 8,50 ± 1,76 2,294 0,111
Complemento de
8,26 ± 2,36 8,11 ± 3,01 7,67 ± 3,93 0,103 0,902
Objectos
Compreensão 8,91 ± 3,22 9,54 ± 3,05 9,33 ± 3,33 0,249 0,780
Pesquisa de
7,35 ± 2,60 8,61 ± 3,10 9,00 ± 3,16 1,473 0,238
Símbolos
Memória de Dígitos 7,09 ± 2,19 8,04 ± 2,60 7,67 ± 1,86 1,004 0,373
Labirintos 8,48 ± 2,54 9,25 ± 3,24 9,00 ± 1,55 0,468 0,629
Índice de
88,17 ± 14,69 95,43 ± 16,21 90,00 ± 8,81 1,523 0,227
Compreensão Verbal
Índice de
Organização 88,70 ± 12,41 88,25 ± 18,07 89,17 ± 16,70 0,010 0,990
Perceptiva
Índice de Velocidade
89,04 ± 14,84 91,93 ± 13,65 91,33 ± 15,34 0,263 0,770
de Processamento
*P ≤ 0,05

43
Da análise do quadro anterior, verificámos que não existem diferenças

significativas no perfil da Wisc-III em função do nível socioeconómico das

crianças.

44
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

45
5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

5.1 - AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O GÉNERO

Na pesquisa bibliográfica efectuada acerca das dificuldades de


aprendizagem foi possível verificar que em grande parte dos estudos, o número
de crianças do sexo masculino era superior ao número de crianças do sexo
feminino. No nosso estudo, esta tendência também se verificou, sendo que na
nossa amostra, 25 crianças eram do sexo feminino (36,2%) e 44 eram do sexo
masculino (63,8%). Relativamente à predominância da dificuldade específica
apresentada, no sexo feminino existem mais crianças com Dislexia (52,6%) e
no sexo masculino com Disortografia (47,6%). No entanto, na Dislexia, o
número de crianças do género masculino (12) e feminino (10) é muito similar,
indo de encontro a Antunes (2009), que afirma que é das poucas dificuldades
do desenvolvimento em que o número de meninos é semelhante ao número de
meninas.

Coutinho e Oswald (2005) afirmam que, na educação especial, a


desproporcionalidade entre o género masculino e feminino já se verifica há
vários anos, sendo que essa diferença varia entre 1,5:1 e 3,5:1.

No nosso estudo, a diferença entre géneros é visível numa


proporcionalidade 1,8:1 entre o género masculino e o feminino,
respectivamente, indo de encontro ao supracitado.

Uma proporcionalidade semelhante é visível no estudo de Coutinho e


Oswald (2005) em que a percentagem de crianças do sexo masculino com
dificuldades de aprendizagem é o dobro da verificada nas crianças do sexo
feminino. Resultados similares foram verificados num estudo envolvendo
crianças com Dislexia de Hong Kong, em que a proporcionalidade era de 1,6:1
(Chan, Ho, Tsang, Lee & Chung, 2007).

46
Outros estudos realizados aludem a proporcionalidades superiores. Os
estudos de Ryckman (1981) e Rotsika et al. (2009) com 3:1, e o de Figueiredo
et al. (2007) com 2,2:1.

Estas diferenças ao nível do género, com um maior número de rapazes


a serem diagnosticados com dificuldades de aprendizagem, podem dever-se a
uma maior sinalização por parte dos professores das crianças do género
masculino. Evidências sugerem que as raparigas são pouco referidas para a
educação especial e os rapazes são excessivamente referenciados
(Liederman, Kantrowitz & Flannery, 2005). Em média, as raparigas quando são
sinalizadas tendem a ser mais velhas e a ter mais dificuldades do que os seus
pares masculinos (Volgel, 1990).

Algumas pesquisas colocaram em hipótese que a maior sinalização dos


rapazes por parte dos professores se deve às diferenças comportamentais
entre rapazes e raparigas (Shaywitz & Shaywitz, 1990), pois estes tendem a
apresentar um comportamento mais disruptivo e incomodativo da dinâmica da
sala de aula, o que induz a uma maior preocupação do docente e, deste modo,
à sua sinalização. Existe uma tendência de negligenciar as dificuldades das
raparigas, visto que as suas manifestações comportamentais são mais subtis e
não incomodam na sala de aula (Oswald, Best, Coutinho & Nagle, 2003)

No entanto, Flannery, Liederman, Daly e Schulty (2000) num estudo com


uma grande amostra (n=32.223), verificaram que a diferença de
proporcionalidade nas dificuldades de aprendizagem entre o género masculino
e feminino não é um simples artefacto metodológico, podendo-se falar de uma
maior vulnerabilidade do sexo masculino.

No nosso estudo, devido à estreita ligação estabelecida com a equipa


docente foi-nos possível perceber que a sinalização e a preocupação dos
professores relativamente a estas crianças, não se devia ao seu
comportamento, mas sim às dificuldades académicas que se manifestavam nas
diferentes áreas leccionadas. Assim, não poderemos falar de uma maior
sinalização dos professores devido a problemas comportamentais, mas sim, a
uma possível vulnerabilidade desenvolvimental relacionada com o género.

47
Uma conclusão congruente com a nossa, verificou-se no estudo de
Liederman et al. (2005), em que após serem eliminados os artefactos externos
que conduziam a uma maior preponderância de rapazes com dificuldades de
leitura, estes continuavam a ser em maior número, concluindo-se, deste modo,
que o maior predomínio do género masculino nas dificuldades de leitura não
era um mito, mas um fenómeno real.

Rutter et al. (2004), concordando com os autores supracitados, falam de


um maior risco do sexo masculino em desenvolver problemas ao nível da
leitura.

Esta maior vulnerabilidade do sexo masculino para o surgimento de


determinadas alterações funcionais, cognitivas e mesmo psiquiátricas, neste
caso particular, as dificuldades de aprendizagem, deve-se ao facto dos
indivíduos do sexo masculino terem uma maturação mais lenta do que os
indivíduos do sexo feminino (Halpern, 2000; Morgan, 1979; Nass, 1993).

Rosen, Mesples, Hendriks e Galaburda (2006) afirmam que as crianças


do sexo masculino que nascem prematuras, ou com baixo peso à nascença,
parecem ser mais vulneráveis a alterações na substância branca, hemorragias
intraventriculares e prejuízos cognitivos do que as crianças do sexo feminino.
Partindo do pressuposto de que o cérebro masculino responde pior a uma
lesão mais precoce do o feminino, pode estar mais predisposto, no futuro, a
manifestar numa dificuldade de aprendizagem.

No nosso estudo verificámos que as crianças com dificuldades de


aprendizagem apresentavam alterações ao nível da memória. Tentando
relacionar os resultados da nossa observação com o género, podemos verificar
que outros estudos concluíram existir um aumento da susceptibilidade de ratos
do género masculino na rapidez de processamento da memória auditiva
induzida por alterações neonatais, enquanto que fêmeas adultas com uma
idêntica malformação não apresentavam esta dificuldade (Tallal & Piercy,1974;
Herman, Galaburda, Fitch, Carter & Rosen, 1997). Um papel importante parece
desempenhar também as hormonas femininas, como o estrogénio, na melhoria
da memória imediata e memória social (Rial, Xikota, Miozzo, Cruz, Prediger &

48
Walz, 2009). Assim, o estrogénio melhora, quer a capacidade de
aprendizagem, quer a memória (MacLennan et al., 2006).

Apesar de ser complicado fazer inferências, pois muitos destes estudos


envolvem a manipulação de animais e pessoas adultas, há a possibilidade de
questões desenvolvimentais, hormonais, morfológicas e funcionais ligadas ao
género estarem relacionadas com a génese e desenvolvimento das
dificuldades de aprendizagem.

5.2 – AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O NÍVEL SOCIOECONÓMICO

No nosso estudo, a classe económica mais representada pelas crianças


avaliadas com dificuldades de aprendizagem (Dislexia, Disortografia e
DAGeral) foi a classe de NSE médio (28 crianças), seguida da classe de NSE
baixo (23 crianças) e, por fim, a classe de NSE alto (6 crianças).

O ambiente desempenha um importante papel no desenvolvimento das


capacidades cognitivas das crianças. As actividades em casa, as
características do lar e as práticas parentais contribuem para o
desenvolvimento das habilidades cognitivas, nomeadamente a capacidade de
leitura (Molfese, Modglin & Molfese, 2003).

Morrison e Hinshaw (1988) afirmam que, em vários estudos, o NSE foi


relacionado com numerosas habilidades cognitivas, sendo encontrada uma
forte relação entre o NSE baixo e uma maior vulnerabilidade a estes
problemas. Uma opinião similar tem Coutinho, Oswald e Best (2005), afirmando
que a pobreza está associada a um aumento das dificuldades de
aprendizagem.

No entanto, no nosso estudo, apesar de um grande número de crianças


pertencer à classe média e baixa e existir um número muito limitado de
indivíduos da classe alta, pode dever-se ao facto de recolhermos a informação

49
em escolas públicas da cidade e não estarem representadas na amostra os
colégios privados, que são em, grande parte, frequentados por indivíduos das
classes de NSE superior. Para além disso, os nossos dados não corroboram a
relação estabelecida entre o NSE e as habilidades/capacidades cognitivas
avaliadas pela Wisc-III, não sendo encontrada nenhuma diferença significativa
quando comparado com os subtestes, o Q.I verbal, o Q.I de realização e o Q.I
total.

O estudo Morrison e Hinshaw (1988) confirma o resultado da nossa


pesquisa ao afirmar que não existem diferenças significativas entre o NSE e as
capacidades neuropsicológicas e perceptuais das crianças com dificuldades de
aprendizagem. Estes autores verificaram uma correlação significativa entre as
capacidades neuropsicológicas/perceptuais e os testes de conhecimento
académico e inteligência, o que fornece um maior suporte à nossa conclusão,
aludindo não se poder estabelecer uma relação entre o NSE e as dificuldades
de aprendizagem.

Contudo, alguns estudos referem que a má nutrição, falta de


estimulação precoce, carências afectivas, prematuridade, baixo peso à
nascença, complicações e infecções durante gravidez e no pós-parto podem
afectar o desenvolvimento do sistema nervoso central e funcionarem como um
factor de risco para as dificuldades de aprendizagem (Cravioto, Birch & Gaona,
1967;Hallahan & Cruickshank, 1973; Klein, Forbs & Nader, 1975). Tendo em
conta que este tipo de problemática ocorre com mais frequência nos meios
desfavorecidos, as crianças de classes sociais baixas apresentam mais atrasos
de maturação neurobiológica (Fonseca, 2008) e, consequentemente, maior
predisposição para o desenvolvimento de dificuldades de aprendizagem.

Apesar de não podermos referir que o NSE diferencie o tipo de


dificuldade de aprendizagem, não menosprezamos a importância que o
ambiente tem no desenvolvimento das crianças.

50
5.3 – AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E O PERFIL COGNITIVO

Ao longo dos anos, vários estudos abordaram a dicotomia existente


entre o Q.I verbal e o Q.I de realização, chegando à conclusão da existência de
um Q.I de realização superior ao Q.I verbal nas crianças com dificuldades de
aprendizagem (Bannatyne, 1978; Kamphaus, 1993 & Slate, 1995).

No nosso estudo, o resultado desta dicotomia ocorreu num sentido


inverso, verificando-se uma maior percentagem de crianças com um melhor
desempenho no Q.I verbal em detrimento do Q.I de realização. Assim,
apuramos que 65,2% das crianças demonstravam um Q.I verbal maior que o
Q.I de realização e 34,8% tinham um Q.I de realização superior ao Q.I verbal.

Os estudos de Figueiredo et al. (2007) e Rotsika et al., (2009)


apresentam um resultado congruente com o nosso, visto que um maior número
de crianças com dificuldades de aprendizagem apresenta um Q.I verbal
superior ao Q.I de realização.

A escala verbal avalia a capacidade de lidar com símbolos abstractos,


compreensão, memória e fluência verbal, estando muitos dos subtestes
dependentes da educação formal e estimulação do ambiente (Cunha, 2000). A
escala de realização envolve a capacidade de integrar estímulos perceptuais,
respostas motoras pertinentes, trabalhar rapidamente e avaliar as informações
visuo-espaciais (Groth-Marnat, 1999).

Segundo Nielsen, Hynd & Hiemenz (1998) a discrepância Q.I de


realização maior do que o Q.I verbal, pode estar positivamente correlacionada
com um melhor desempenho em testes de integração visuo-espacial do que
em testes de linguagem. O padrão Q.I verbal maior do que o Q.I de realização
não está associado, de modo consistente, a um melhor desempenho em testes
de linguagem comparativamente à realização em testes de integração visuo-
motoras.

51
Assim, com as devidas precauções, podemos colocar a hipótese que as
crianças com dificuldades de aprendizagem podem apresentar algumas
limitações ao nível das capacidades visuo-espaciais e visuo-perceptivas, indo
de encontro ao que afirma Fonseca (2008) sobre as limitações ao nível da
figura-fundo, completamento visual, constância da forma, posição no espaço,
relações no espaço e coordenação óculo-manual.

Ao nível dos índices factoriais, foi o de organização perceptiva (IOP) que


obteve um pior resultado nos três grupos, comprovando um pior desempenho
nos subtestes que envolvem capacidades perceptivas. Estas crianças podem
apresentar um disfunção perceptiva, demonstrando “dificuldade em formar uma
percepção tão refinadas e organizadas como as que são necessárias para
aprender” (Fonseca, 2008).

Em termos médios, verificamos que o IOP apresenta o resultado mais


baixo (87,39) e o ICV o mais elevado (93,58). Os estudos de Mayes et al.
(1998) e Calhoun e Mayes (2005), vão de encontro aos nossos resultados ao
verificarem um valor mais elevado no ICV, assim como o estudo de Waldron e
Saphine (1990) ao afirmarem que um dos pontos fortes das crianças com DA é
a conceptualização verbal (semelhanças, vocabulário e compreensão),
comprovando um melhor desempenho em provas de cariz verbal.

Ao comparar as dificuldades de aprendizagem (Dislexia, Disortografia e


DAGeral) com o perfil da Wisc-III, verificámos que os três grupos apresentavam
um resultado baixo ao nível do subteste memória de dígitos, mas o mais
relevante é ser o único teste onde não existem diferenças significativas entre
os três grupos. Tendo em conta que um dos critérios de inclusão das crianças
no grupo das DAGeral era a existência de um Q.I<80, pressupõe-se um pior
desempenho em todos os subtestes da escala, que posteriormente são
utilizados para a obtenção de um Q.I total, no entanto, ao nível do subteste
memória de dígitos esta diferença não é observada.

Maehler e Shuchardt (2009) chegaram a um resultado semelhante ao


nosso, ao concluírem que o subteste de memória de dígitos apresentava um
resultado baixo e que não existiam diferenças significativas entre os dois

52
grupos de crianças com dificuldades de aprendizagem (um grupo com um Q.I
normal e outro com Q.I baixo).

A memória de dígitos avalia a memória auditiva imediata (dígitos na


ordem directa) e a memória de trabalho (dígitos na ordem inversa) (Jurema,
2000; Rotsika et al., 2009), assim, ao verificarmos que na Dislexia e
Disortografia um dos piores resultados é verificado no teste memória de dígitos,
podemos concluir que estas crianças apresentam défices ao nível da memória
auditiva imediata e memória de trabalho.

As crianças com dificuldades de aprendizagem mostram limitações ao


nível da memória de trabalho e memória auditiva imediata (Richie & Aten,
1976; Rotsika et al., 2009; Swanson & Jerman, 2007), demonstrando também
limitações ao nível da memória de trabalho visuo-espacial (Kibby, Marks,
Morgan & Long, 2004; Pickering, 2006).

Johansson (2006) afirma que a memória de trabalho tem um papel


importante para a aquisição de elevada proficiência na leitura de língua
materna. Assim uma limitação na memória de trabalho vai constituir um factor
limitativo na competência de leitura e nas restantes aprendizagens
académicas.

Segundo Nicolson e Fawcett (1994), as dificuldades no subteste de


memória de dígitos seriam decorrentes de um distúrbio fonológico, assim, e
tendo em conta que existe uma componente fonológica ligada à memória do
trabalho (Baddeley, 2003; Baddeley, Gathercole & Papagno, 1998), as crianças
com dificuldades de aprendizagem podem ter alterações fonológicas.

Estas conclusões são fundamentadas por autores que evidenciam que


as crianças disléxicas demonstram dificuldades na consciência fonológica,
memória de trabalho fonológica e discriminação de fonemas (Capaviolla,
Capaviolla & Silveira, 2000; Fawcett & Nicolson, 1995; Olson, 1992).

Confirmando os nossos resultados, Dock e Mcshane (2000) afirmam que


as crianças com DAGeral tem um desempenho insuficiente na memória.

53
Torgesen, Kistner e Morgan (1987) depois de reverem estudos sobre a
memória activa concluíram que as crianças com DAGeral exploram a
informação presente nesta memória mais lentamente do que as outras
crianças.

No que concerne ao processamento da informação no cérebro, depende


do seu conteúdo verbal ou não verbal, os conteúdos não verbais são
processados primordialmente no hemisfério direito e os conteúdos verbais no
hemisfério esquerdo. Fazendo a alusão à Wisc-III, podemos relacionar o
funcionamento do hemisfério esquerdo com o Q.I verbal e o funcionamento do
hemisfério direito com o Q.I de realização (Simões, 2002).

No nosso estudo foi possível averiguar que 65,2% das crianças


apresentavam um Q.I verbal superior ao Q.I de realização e somente em
34,8% a superioridade ocorreu no sentido inverso. Esta diferença foi superior a
15 pontos em 20 crianças (Q.Iv > Q.Ir) e em 7 crianças (Q.Ir>Q.Iv).

Com base no supracitado, as nossas conclusões não confirmam as


conclusões de Bannatyne (1979) quando declara que grande parte das
crianças com dificuldades de aprendizagem apresenta uma dominância do
hemisfério direito.

Deste modo, somente podemos dizer que as crianças com dificuldades


de aprendizagem apresentam limitações em algumas capacidades
primordialmente processadas no hemisfério direito (percepção visual,
capacidades visuo-espaciais e memória auditiva não verbal) ou no hemisfério
esquerdo (memória auditiva verbal), sem nos esquecer que os dois hemisférios
não trabalham separadamente, mas em interligação.

Assim, apesar de existir a primazia de um dos hemisférios para


determinadas actividades cognitivas, as funções de transdução e conversão
ocorrem devido ao diálogo e co-função de ambos os hemisférios – funções
inter-hemisféricas (Fonseca, 2008).

Sabemos, por exemplo, que as alterações na linguagem são mais


frequentes após lesão no hemisfério esquerdo, mas, por vezes, também

54
ocorrem depois de lesões no hemisfério direito, pois a compreensão de
histórias e confabulação são tarefas cognitivas complexas dependentes do
hemisfério direito (Johansson, 2006).

Quando um sistema funcional está disfuncional ou desagregado em


termos sistémicos, o comportamento, representado pela cadeia funcional, pode
ficar obviamente afectado. No entanto, existem sistemas funcionais
alternativos, sugerindo que um dado comportamento ou processo de
aprendizagem, pode ser produzido por mais de um sistema funcional,
evocando a plasticidade do cérebro (Fonseca, 2001).

Cohen et al. (2004) afirmam que nas crianças com lesões cerebrais
precoces, o hemisfério intacto pode assumir as funções que normalmente são
desempenhadas pelo hemisfério lesionado. Assim, parece ser complicado falar
em funcionamento hemisférico, sendo mais prudente aludir a funções
cognitivas que se encontram em défice e que interferem na capacidade destas
crianças aprenderem a ler, escrever e calcular.

Relativamente ao perfil desenvolvido por Bannatyne, ao agrupar os


subtestes das Wisc em categorias, este não se mostra eficaz para classificar e
compreender o funcionamento cognitivo das crianças com DA, pois somente se
verifica em 14,5% da nossa amostra, corroborando com as conclusões de
alguns estudos (Berk, 1983; Smith & Watking, 2004).

55
6. CONCLUSÃO

56
6. CONCLUSÃO

A elaboração deste estudo permitiu-nos tirar algumas conclusões que


possibilitam conhecer melhor a problemática das dificuldades de aprendizagem
e as limitações cognitivas que estas crianças apresentam, que se reflectem no
seu desempenho escolar.

Deste modo, podemos verificar que as DA ocorrem com mais frequência


no género masculino, no entanto, o número de crianças com Dislexia é similar
entre os géneros.

Relativamente ao perfil cognitivo destas crianças, apurámos que se


verificam diferenças significativas entre as DAE (Dislexia e Disortografia) e a
DAGeral, em todas as variáveis da Wisc-III, excepto no subteste memória de
dígitos. Deste modo, concluímos que as crianças com DA apresentam
limitações ao nível da memória auditiva imediata e memória de trabalho,
independentemente, do tipo de dificuldade de aprendizagem.

No que concerne ao NSE, constatamos que não existem diferenças


significativas quando comparado com os diferentes tipos de dificuldades de
aprendizagem, nem com os resultados obtidos da Wisc-III. Assim, apesar da
maioria das crianças da nossa amostra pertencerem à classe média e baixa, e
somente uma percentagem muito reduzida ser da classe alta, o NSE não
diferencia o tipo de dificuldade de aprendizagem e o seu funcionamento
cognitivo.

Quanto ao perfil de Bannatyne (E>C>S) somente se verificou em 14,5%


das crianças com DA, logo não se apresenta como bom classificador do
funcionamento cognitivo destas crianças.

Apesar das conclusões obtidas neste trabalho contribuírem para uma


melhor compreensão das dificuldades de aprendizagem, este continua a ser
um assunto, que apesar de bastante debatido e pesquisado nos últimos anos,
ainda não é plenamente compreendido, e as crianças nas nossas escolas

57
continuam a não ter planos educativos e adaptações curriculares adequadas às
suas capacidades e limitações.

Pensamos que, por parte da equipa docente, a terminologia “dificuldades


de aprendizagem” é conhecida, no entanto, os défices cognitivos que estão
subjacentes ainda continuam a ser ignorados.

Assim, é necessário apostar numa adequada formação dos professores,


particularmente, ao nível desta problemática, visto não existirem crianças com
DA que não consigam aprender, o importante é compreender as suas
limitações e adequar os métodos de ensino, recorrendo às suas capacidades.

58
7. PROPOSTAS FUTURAS DE INVESTIGAÇÃO

59
7. PROPOSTAS FUTURAS DE INVESTIGAÇÃO

Para futuras investigações, podemos sugerir estudos, no seguimento do


que efectuamos.

- Caracterização do perfil cognitivo das crianças com DA, englobando as


escolas privadas do concelho de Vila Real.

- Realizar um estudo longitudinal sobre a influência da estimulação da


memória de trabalho e memória imediata no desempenho escolar destas
crianças.

- Realização de um estudo longitudinal sobre a influência de estratégias


educacionais, adaptadas às dificuldades destas crianças, no seu rendimento
académico.

60
8. BIBLIOGRAFIA

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9. ANEXOS

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