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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC - SP

ARLINDO MANUEL ESTEVES RODRIGUES

ECOSSOCIALISMO: UMA UTOPIA CONCRETA


ESTUDO DAS CORRENTES ECOSSOCIALISTAS NA FRANÇA E NO
BRASIL

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

São Paulo – 2015


ARLINDO MANUEL ESTEVES RODRIGUES

ECOSSOCIALISMO: UMA UTOPIA CONCRETA


ESTUDO DAS CORRENTES ECOSSOCIALISTAS NA FRANÇA E NO
BRASIL

DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS

Tese apresentada à Banca Examinadora


da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, como exigência parcial para
obtenção do título de Doutor em Ciências
Sociais na área de Sociologia sob a
orientação do Prof. Dr. Luiz Eduardo
Waldemarin Wanderley.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO


São Paulo - 2015
Banca Examinadora

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____________________________________

____________________________________
AGRADECIMENTOS

Ao orientador Prof. Dr. Luiz Eduardo Wanderley pela atenção e sábias e oportunas
orientações, bem como incentivo permanente.

Ao co-orientador não somente no período de estágio doutoral junto a École des Hautes
Études en Sciences Sociales, em Paris / França, professor Dr. Michael Löwy por sua
acolhida e seus ensinamentos.

Aos professores Dr. Ladislau Dowbor e Dr. José Corrêa Leite pelas valiosas contribuições
no Exame de Qualificação.

Aos professores da PUC, em especial a Dra. Maura Pardini Véras, pela dedicação e
competência no diálogo na construção do conhecimento.

Aos colegas do programa de pós em Ciências Sociais, principalmente os amigos e parceiros


de luta socioambiental, Lauro Prado e Adolfo Deny.

Aos funcionários da PUC / SP, que sempre me atenderam com eficiência e dedicação.

Aos ecossocialistas presentes em diversas organizações no planeta que compartilham a


utopia de construção de uma sociedade justa, ecológica e solidária.

Aos meus pais pela dedicação, pelos ensinamentos éticos e inspiração.

Aos meus filhos, pela compreensão da minha ausência e apoio carinhoso.

Por fim, revelo toda minha gratidão a Sandra de Barros, cuja presença em minha vida
encerra toda a poesia presente na palavra companheira.
ECOSSOCIALISMO: UMA UTOPIA CONCRETA
ESTUDO DAS CORRENTES ECOSSOCIALISTAS NA FRANÇA E NO BRASIL
ARLINDO MANUEL ESTEVES RODRIGUES

RESUMO

A tese desenvolve um estudo sobre Ecossocialismo, uma corrente de pensamento e


ação socioambiental, e tem como objetivo central analisar os avanços e os desafios
do ecossocialismo internacional, com mais profundidade nos partidos políticos da
França e do Brasil. Para tanto, a tese apresenta, de início, as motivações para as
ações concretas do ecossocialismo. Discute-se como está se desenvolvendo a crise
socioambiental e os seus riscos para a humanidade. Em seguida, expõe as diversas
formas de propostas socioambientais para enfrentar a crise, suas divergências e
convergências. Posteriormente, apresenta mais detalhadamente a forma de
pensamento e ação da corrente ecossocialista e como ela está presente na política
partidária francesa. O ecossocialismo na política partidária brasileira é analisado sob
os aspectos de sua história e perspectivas. Os resultados da pesquisa demonstram
que, apesar de apresentar limitações, quais sejam as resistências da esquerda
tradicional e o baixo desempenho eleitoral, as correntes ecossocialistas na política
partidária francesa e brasileira têm crescido nos debates internos e podem evoluir ao
aumentar sua interação com os movimentos sociais, principalmente despertando
neles a consciência dos aspectos ecológicos, muitas vezes, já presentes nas suas
pautas.

PALAVRAS-CHAVES: Ecossocialismo, Ecologia, Sociologia, Ecologia Política,


Cidadania Ecológica.
ECOSSOCIALISMO: UMA UTOPIA CONCRETA
ESTUDO DAS CORRENTES ECOSSOCIALISTAS NA FRANÇA E NO BRASIL
ARLINDO MANUEL ESTEVES RODRIGUES

ABSTRACT

The thesis develops a study on Ecosocialism, a current of thought and socio-


environmental action, and is mainly aimed to analyze the progress and challenges of
international ecosocialism, deeper political parties of France and Brazil. Therefore,
the thesis presents at first, the motivations for the concrete actions of eco-socialism.
It discusses how is developing the socio-environmental crisis and risks for humanity.
It then sets the various forms of social and environmental proposals to address the
crisis, their differences and similarities. Then, it presents in more detail the form of
thought and action of ecosocialist current and how it is present in the French party
politics. Ecosocialism in Brazilian party politics is analyzed from the aspects of its
history and perspectives. The survey results show that, despite its limitations, namely
the resistance of the traditional left and the low electoral performance, current
ecosocialists in French and Brazilian party politics have grown in internal debates
and may progress to increase their interaction with social movements mainly
awakening in them the awareness of ecological aspects often already present in its
patterns.

KEYWORDS: Ecosocialism, Ecology, Sociology, Political Ecology, Ecological


Citizenship.
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 – Crise Socioambiental: Riscos Assumidos ................................... 9


1.1 Caminhos da Nova Barbárie .............................................................................. 9
1.2 Trem sem freio: Capitalismo como devorador .................................................. 19
1.3 Soluções da Desgovernança global .................................................................. 25

CAPÍTULO 2 – Correntes Ecológicas ..................................................................... 31


2.1 Correntes Ecológicas: Propostas e Divergências ............................................. 31
2.2 Proposta de Alier ............................................................................................... 41
2.3 Decrescimento ................................................................................................... 47
2.4 Buen Vivir .......................................................................................................... 53
2.5 Política partidária ecológica na França ............................................................. 58
2.6 Política partidária ecológica no Brasil ................................................................ 59

CAPÍTULO 3 – Ecossocialismo ................................................................................ 71


3.1 Corrente Ecossocialista: Pensamentos e Propostas ........................................ 71
3.2 Ética Ecossocialista ........................................................................................... 81
3.3 Planejamento e Estratégia na construção do Ecossocialismo ......................... 88
3.4 Ecossocialismo e o Altermundismo ................................................................... 91
3.5 Ecossocialismo na política partidária francesa ................................................. 96
NPA Nouveau Parti Anticapitaliste ..................................................................... 100
Parti de Gauche ................................................................................................. 103
Ensemble Mouvement pour une alternative de Gauche, Ecologiste et Solidaire 104
CAPÍTULO 4 – Ecossocialismo Brasileiro ............................................................ 108
4.1 Ecossocialismo de Chico Mendes ................................................................... 108
4.2 Ecossocialismo na política partidária brasileira .............................................. 122
PT Partido dos Trabalhadores ......................................................................... 122
PSOL Partido Socialismo e Liberdade ............................................................ 137
Rede Sustentabilidade .................................................................................... 143
4.3 Rede Brasil de Ecossocialistas ....................................................................... 151

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 156

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ............................................................................ 162


ENTREVISTAS ........................................................................................................ 183
SÍTIOS ...................................................................................................................... 185

ANEXOS .................................................................................................................. 188


1 Primeiro Manifesto Ecossocialista brasileiro (1991) ............................................ 188
2 Manifesto Ecossocialista Internacional (2001) .................................................... 199
3 Declaração Ecossocialista de Belém (2003) ....................................................... 203
4 Declaração de Princípios e objetivos da Rede Brasil de Ecossocialistas ........... 210
Lista de gráficos

Gráfico 1 – Macrotendências – de 1750 até atualidade ............................................ 10


Gráfico 2 – Distribuição de renda................................................................................ 16
Lista de Tabelas

Tabela 1 – Limites Planetários .................................................................................... 14


Tabela 2 – Comparação de Consumo por pessoas Canadá x EUA x Índia e Mundo. 20
Tabela 3 – Evolução da participação no Fórum Social Mundial nos primeiros anos.... 92
Tabela 4 – Dívidas assumidas pelo seringueiro para iniciar sua jornada ................... 109
Tabela 5 – Distribuição das áreas de alerta em 2012 ................................................. 119
Lista de Figuras

Figura 1 – Crescente consumo humano...................................................................... 11


Figura 2 – Impacto no meio ambiente do crescimento do consumo humano ........... 12
Figura 3 – Limites Planetários..................................................................................... 15
Figura 4 – Curvas Ambientais de Kuznets ................................................................. 43
INTRODUÇÃO

As crises sociais e ambientais geradas pelo atual modo hegemônico de produção na


Terra têm desafiado a sociedade e motivado importantes debates nas últimas décadas.
Apesar dos esforços dos governos, empresas e sociedade civil, principalmente após a
publicação do Relatório Brundtland, Nosso Futuro Comum, em 1987, em projetos para
tornar o atual modelo socioeconômico sustentável, a crise socioambiental persiste e tem se
agravado.

A falta de condições de obter o consenso entre os países ricos e os demais países


ocorre desde a primeira Conferência das Nações Unidas para debater os problemas
ambientais, a Conferência do Meio Ambiente Humano em Estocolmo, em 1972. A grande
barreira à ação conjunta dos países para chegar às soluções socioambientais unificadas
era, e tem persistido, equalizar o conflito entre a busca do bem comum mundial e os
interesses internos específicos de cada país. Em nome da soberania nacional, os países
impõem suas condições particulares nas negociações, o que leva a poucos resultados.

As demais conferências, RIO 92, Johannesburgo – 2002 e Rio+20 mantiveram os


conflitos de interesses e poucas soluções práticas. Porém, os debates envolvendo
desenvolvimento sustentável e possíveis soluções provocaram maior conscientização da
sociedade sobre a importância da governança ambiental global e local, isto é, aumento da
percepção que os problemas globais impactam e são impactados pelas questões locais.
Assim, tem origem a estratégia: pensar globalmente e agir localmente.

A resposta dos órgãos oficiais (ONU, PNUMA) e de alguns representantes dos


governos e do setor empresarial para a crise ambiental é, hoje, a adoção da Economia
Verde como caminho para o Desenvolvimento Sustentável. Mesmo com a inovação da
definição oficial da ONU para Economia Verde, no documento preparatório da Conferência
Rio+20, que vincula combate à miséria e responsabilidade ambiental, as soluções não
cumprem o prometido.

A resolução da crise socioambiental requer a superação do poder do capital. O capital


impõe sua lógica com forte investimento em propaganda e marketing: em torno de US$ 1
trilhão por ano em publicidade junto aos meios de comunicação (Dowbor, 2013a, p. 66).
Esse volume monetário garante a cumplicidade dos meios de comunicação e a ilusão de
que a felicidade está na compra da nova versão do produto, mas como o consumo não se
traduz em felicidade, a eterna frustração aprisiona a sociedade no ciclo consumo-frustação-
mais consumo e, consequentemente, aumenta a concentração de riqueza e mantém o
poder financeiro e político da classe detentora do capital.

O consumismo descontrolado, gerado nesse ciclo, esgotou a capacidade de o planeta


repor reservas naturais, e o fluxo infinito de consumo não respeita a finitude do planeta.
Segundo o relatório Planeta Vivo de 2012, publicado pelo World Wide Fund for Nature
(WWF), a Natureza consegue repor apenas 50% do impacto ambiental do consumo humano
(WWF, 2012a, p. 14).

O relatório do WWF demostra que as tentativas hegemônicas de ajuste do atual modo


de produção e consumo não estão gerando o resultado prometido. A reversão da atual crise
socioambiental exige da humanidade a capacidade de sonhar e ter esperança e construir
um mundo novo, isto é, a capacidade de produzir e gerar utopia.

Essa utopia, para iniciar uma transformação mais profunda, deve ser realista, isto é,
deve unir uma análise radical da realidade e o anúncio de uma outra lógica de civilização. A
visão utópica é realista quando está consciente das contradições, conflitos e da grande
desigualdade da atual sociedade mundial (Wanderley, 2013, p. 121); ao mesmo tempo em
que, sem abandonar a preocupação realista com a estratégia transformadora, permite os
devaneios, a esperança ativa e o “espírito visionário vermelho” (LÖWY, 2000a, p. 127).

A utopia tem na indignação sua energia mobilizadora, pois a consciência da realidade


indesejada e da esperança da construção do futuro sonhado foram, ao longo da história, as
condições necessárias para as transformações. A indignação gerada pela consciência da
realidade – pobreza absoluta, fome e morte recorrente, frutos da globalização hegemônica –
caminha na companhia da utopia, compondo os “sonhos de asas e raízes” (Wanderley,
2013, p. 121). Bensaïd (2008, p. 97) define a indignação como “um começo. Uma maneira
de se levantar e de entrar em ação. É preciso indignar-se, insurgir-se só depois ver no que
dá. É preciso indignar-se apaixonadamente, antes mesmo de descobrir as razões dessa
paixão”. Por isso é muito interessante a recomendação de Hessel (2011, p. 5) de que cada
indivíduo deve encontrar seu motivo de indignação, pois esse sentimento nos transforma em
militantes, fortes e engajados na busca da justiça e liberdade.

A dinâmica “denúncia e anúncio” envolve o “anúncio de um futuro a ser criado,


construído, político, estética e eticamente, por nós, mulheres e homens.” (Freire, 1992, p.
91). A utopia é fundamental para a criação da nova sociedade, pois sua imaginação
antecipa a sociedade desejada: verdadeiramente democrática, com a convivência
harmônica entre a humanidade e a natureza. Afinal, como afirmou Löwy (2000a, p. 129),
parafraseando Lenin: “sem utopia revolucionária não haverá prática revolucionária”.

2
No processo de acumulação de capital à custa do esgotamento dos trabalhadores e
depredação ambiental, o ecossocialismo surge como alternativa utópica, e, também, como
contribuição epistemológica, quando assume que o debate ambiental atualiza a teoria
marxista; e o marxismo é fundamental para o movimento ambientalista não optar por
soluções reformistas.

O caminho indicado pelo ecossocialismo para superar a crise socioambiental é a


ruptura da lógica produtivista do capitalismo e do socialismo “real”, através do resgate da
proposta marxiana do “Reino da Liberdade”, na qual o produtivismo que desgasta o
trabalhador e o meio ambiente é substituído pela redução da jornada de trabalho, o que
propiciará o tempo livre necessário para estudo, atividade cidadã, lazer, namoro, enfim,
ações de satisfação pessoal geradas pela qualidade na integração social; ações que na
maioria das vezes não envolvem relação comercial. E o prazer deixará de ser mercadoria
remunerável ao capital e ganhará a função social da autorrealização (LÖWY, 2005a, p. 71).

No desenvolvimento de uma outra civilização, socialmente e ambientalmente justa, o


ecossocialismo se apresenta como a utopia concreta que transforma a esperança de uma
vida feliz em construção desta vida. O pensamento utópico ecossocialista é a antecipação
dessa outra civilização, sob a perspectiva da busca do inédito viável de Paulo Freire,
“inédito, porque ainda não aconteceu; viável, porque pode acontecer e já está presente na
realidade concreta” (WANDERLEY, 2009c, p. 119).

O ecossocialismo é uma proposta de pensamento que está em construção nos últimos


trinta anos, graças ao diálogo e obras de pensadores como Manuel Sacristan, Raymond
Williams, Rudolf Bahro e André Gorz, James O’Connor, Barry Commoner, John Bellamy
Foster, Joel Koveluan Martínez Alier, Francisco Fernandez Buey, Jorge Riechman, Jean-
Paul Déléage, Jean-Marie Harribey, Elmas Altvater, Frieder Otto Wolf entre outros. Revistas
como Capitalism, Nature and Socialism, Écologie politique são espaços utilizados pelos
autores para apresentarem suas concepções. (LÖWY, 2000b, p. 234; LÖWY, 2005a, p. 48;
LÖWY, 2011, p. 13).

Esses autores não mantém homogeneidade política, mas apresentam como eixo
comum a busca da construção de um outro paradigma civilizatório, rompendo com a
ideologia produtivista do capitalismo e do socialismo burocrático (LÖWY, 2005a, p. 40).

3
Há alguns pontos que unem todas as correntes de pensamento ecossocialistas:
 As crises ecológicas e o colapso social são consequências do processo capitalista,
com superação da capacidade de resiliência do planeta pelo produtivismo industrial e
consumismo massivo, ou seja, pela superexploração dos recursos naturais pelo capital;
 O sistema capitalista não tem capacidade de gerenciar ou superar a crise engendrada,
pois sua lógica produtiva está alicerçada na regra “cresça ou morra!”;
 O Ecossocialismo é, obrigatoriamente, internacional.

A proposta do ecossocialismo é fundada numa aposta já presente nas obras de Marx:


“predominância, numa sociedade sem classes, do “ser” sobre o “ter”, isto é, da realização
pessoal, pelas atividades culturais, lúdicas, eróticas, esportivas, artísticas, políticas, em vez
do desejo de acumulação ao infinito de bens e produtos. Esse desejo é induzido pela
ideologia burguesa e sua publicidade, e nada indica que é uma “natureza humana eterna””
(LÖWY, 2005a, p. 58).

O ecossocialismo é a proposta utópica de mudança socioambiental fundada na


associação das lutas ambientalistas com os demais movimentos representativos da classe
social oprimida. A associação entre os movimentos assume a visão de que a atual crise
ecológica tem a mesma origem que as demais crises sociais: a máquina mortífera da busca
ao retorno rápido do capital. Perante esse desafio da superação da crise socioambiental, a
libertação da tirania do capital depende da integração dos movimentos contra-hegemônicos:

Esse projeto não pode renunciar a nenhuma das cores do arco-íris:


nem ao vermelho do movimento operário anticapitalista e igualitário,
nem ao violeta das lutas para a libertação da mulher, nem ao branco
dos movimentos não-violentos para a paz, nem ao anti-autoritarismo
negro dos libertadores e anarquistas, e ainda menos ao verde da luta
por uma humanidade justa e livre num planeta habitável (LÖWY,
2005a, p. 62).

4
PROBLEMA DE PESQUISA

A escolha do Ecossocialismo como tema se deve à necessidade de analisar a corrente


ecossocialista como resposta à crise socioambiental. Essa crise envolve mudanças
climáticas, perda da biodiversidade e aumento da desertificação dos solos e mares, fatores
de risco para as condições de vida humana no planeta. A atual resposta das lideranças
governamentais e empresariais para a crise, o Desenvolvimento Sustentável, se mostra
ineficiente e contraditório.

A sociedade civil e as lideranças dos movimentos contra-hegemônicos estão


buscando alternativas aos atuais modelos de desenvolvimento. O lema dessa busca,
batizado pelas lideranças no Fórum Social Mundial, é que “um outro mundo é possível”. Em
entrevista, Joel Kovel (D’Almeida, 2011) afirmou que “logicamente, deveríamos poder dizer
que este “outro mundo” é o do Ecossocialismo”.

Considerando essa provocação de Kovel, a tese busca responder às seguintes


questões: O Ecossocialismo é opção utópica na construção de uma outra sociedade? Quais
são os desafios e oportunidades da politica partidária na construção da Sociedade
Ecossocialista?

OBJETIVOS

Esta pesquisa tem como objetivo central analisar os avanços e dificuldades do


Ecossocialismo como proposta utópica na construção de uma outra civilização. A
construção dessa nova Sociedade envolve grande transformação do atual modelo de
civilização produtivista e consumista para um novo paradigma de civilização, responsável
social e ambientalmente, principalmente sem opressor e oprimido.

Os objetivos específicos são:

a) Analisar os avanços e os desafios da corrente ecossocialista internacional;


b) Analisar as correntes ecossocialistas nos partidos políticos brasileiros, os avanços e
os desafios enfrentados.

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METODOLOGIA

A metodologia desta tese baseou-se nas seguintes etapas:

a) Pesquisar a bibliografia com o intuito de apurar um arcabouço teórico sobre a crise


ambiental e propostas utópicas de sua superação;

b) Pesquisar a bibliografia sobre a proposta ecossocialista, principalmente as


contribuições de Michael Löwy, John Bellamy Foster e Joel Kovel;

c) Levantamento das experiências do movimento ecossocialista na política partidária da


França, debate ecossocialista entre NPA – Noveau Parti Anti Anticapitaliste, Parti de
Gauche e Ensemble Mouvement pour une alternative de Gauche, Ecologiste et Solidaire; e
no Brasil, Partido dos Trabalhadores, Partido Socialismo e Liberdade e Rede
Sustentabilidade;

d) Levantamento da experiência Rede Brasil de Ecossocialistas;

e) Levantamento de documentos elaborados pelos próprios partidos na sua fundação e


encontros relevantes para suas correntes ecossocialistas;

f) Entrevistas com militantes dos partidos políticos para apurar as dificuldades,


oportunidades e propostas de ações futuras do movimento ecossocialista no mundo e no
Brasil.

A pesquisa enfocou a política partidária, pois é o setor da sociedade que tem debatido
o ecossocialismo há mais tempo e com mais vigor, principalmente depois do anúncio da IV
Internacional ter aderido ao ecossocialismo. Em 2003, a IV Internacional adotou em seu
congresso o documento “Ecologia e Revoluções Sociais” de inspiração ecossocialista
(LÖWY, 2011, p. 14).

As entrevistas focaram nos envolvidos na construção do ecossocialismo nos partidos


brasileiros e os assinantes brasileiros do Manifesto Ecossocialista Internacional de setembro
de 2001 (Isabel Loureiro e Marcos Barbosa de Oliveira). Buscou-se entrevistar
representantes ecossocialistas por partido, assim, no PT foram Gilney Viana e Mauricio
Laxe, no PSOL foram João Alfredo Telles Melo e Roberto Bannwart e na Rede
Sustentabilidade foi Samuel Maia. Os entrevistados foram escolhidos por representarem a
história e o pensamento ecossocialista no Brasil e por serem atuantes no atual debate

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interno em seus partidos. Foi também entrevistado Michael Löwy por sua vivência na política
partidária e, principalmente, pela influência que sua obra exerce sobre as correntes
ecossocialistas nos partidos políticos brasileiros.

A tese está dividida em quatro capítulos e considerações finais, além da referência


bibliográfica e os anexos.

O primeiro capitulo apresenta a crise socioambiental, sua dimensão e perspectivas. A


pesquisa aponta que a barbárie socioambiental é uma das duas bifurcações possíveis para
a sociedade. Incialmente a nova barbárie apresentada nesse capítulo está relacionada aos
riscos assumidos pelas decisões dos donos do Capital e suas ações institucionais
multilaterais que apontam soluções de ajustes que não tem desviado a civilização da
situação de risco de condições da manutenção da vida humana no planeta.

No segundo capítulo, procura-se retratar as diferentes propostas socioambientais,


suas evoluções, conflitos e contradições. A opção foi utilizar a classificação dos segmentos
políticos ecológicos do professor Eduardo J. Viola para ajudar a entender as relações
desses segmentos, seus conflitos e convergências. Porém, como essa classificação não
esgota a riqueza da política ecológica, assim foi necessário incorporar os conceitos dos
movimentos Ecologismo dos Pobres de Alier, Decrescimento e Buen Vivir. Além dos
conceitos das posições políticas ecológicas, há também nesse capítulo a apresentação das
ações dessas posições na política na França e no Brasil.

O terceiro capítulo debate a proposta para a outra bifurcação possível: o


ecossocialismo, seus principais pensadores, como está presente mundialmente na vida
política partidária mundial, com realce na França. A opção pela vida política francesa foi
devido a sua importância dentro da corrente ecossocialista mundial, inclusive com a
presença de três partidos políticos ecossocialistas, NPA, Parti de Gauche e Ensemble. As
fontes principais das informações sobre os partidos foram os documentos elaborados pelos
mesmos, além de obras e blogs de seus militantes. O acesso a essas informações foi
possível através de estágio sanduíche em Paris, sob orientação de Michel Löwy, no
segundo semestre de 2013.

O quarto capítulo relata como a corrente ecossocialista está presente na política


partidária brasileira. Chico Mendes foi o primeiro tema do capítulo por sua importância na
história política ecológica e sua contribuição socioambiental na formação do PT, além de ele
ser uma das principais referências do pensamento ecossocialista brasileiro. O
ecossocialismo está presente na política partidária brasileira, inicialmente na formação do
PT-Partido dos Trabalhadores e posteriormente no PSOL- Partido Socialismo e Liberdade e

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na Rede Sustentabilidade, assim, as histórias das correntes ecossocialistas nesses partidos
estão retratadas nesse capítulo. O Estudo sobre a Rede Brasil de Ecossocialistas, sua
história e retomada, encerra esse capítulo.

Por fim, nas considerações finais, são retomadas as questões relevantes no conjunto
do trabalho, bem como a análise dos desafios e oportunidades do Ecossocialismo,
principalmente na política partidária brasileira.

Além da Referência Bibliográfica, há a relação das entrevistas e sítios visitados


importantes para o tema, inclusive os blogs de militantes partidários. Esse conjunto de
fontes foi importante para o embasamento teórico da pesquisa.

Os principais documentos ecossocialistas estão disponíveis no item Anexos: Primeiro


Manifesto Ecossocialista Brasileiro (1991); Manifesto Ecossocialista Internacional (2001);
Declaração Ecossocialista de Belém (2003) e a Declaração de Princípios e Objetivos da
Rede Brasil de Ecossocialistas.

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CAPÍTULO 1 – Crise Socioambiental: Riscos assumidos

1.1 Caminhos da Nova Barbárie

A vida no planeta está estruturada em um sistema complexo e delicado. Espécies


estão inseridas em diferentes nichos complementares e em constantes ajustes
(homeostase). A complementaridade entre os nichos elimina a geração de sobra, “lixo”, pois
os resíduos de um nicho de espécies oferecem recursos vitais para outro nicho:
Toda essa complementaridade entre as espécies só é possível devido
à diversidade que elas apresentam, fazendo com que se
complementem, evitando a competição e possibilitando a
cooperação. Ela é tão requintada que faz com que na natureza não
exista a noção de “lixo”, porque os resíduos de uma determinada
espécie são suporte para a existência de outra (MILANEZ, 2003, p.
79).

Vencida a capacidade de adaptação às novas condições ambientais pelas espécies,


sua extinção é a consequência mais provável; como a biodiversidade garante a
complementaridade entre os nichos, a extinção de uma espécie desarmoniza o sistema
causando reação em cadeia, impactando a sobrevivência das outras espécies dependentes.

O modelo produtivista e consumista da sociedade pós-revolução industrial exerce uma


pressão sobre os recursos naturais de uma forma cada vez mais agressiva. As
consequências da alteração do fluxo das mudanças estruturais do planeta e a resposta do
planeta para estas interferências desafiam toda sociedade a repensar o modelo produtivo. O
Special report: How our economy is killing the Earth publicado pela revista New Scientist
ilustra a crescente pressão das atividades humanas em diversos níveis, as quais
pressionam o esgotamento da adaptação da natureza. O Gráfico 1 apresenta a
convergência de ritmo dos diversos vetores das atividades humanas e o aumento de
degradação ambiental.

As curvas dos índices, que inicialmente não refletem uma relação direta entre eles (a
temperatura no hemisfério Norte, população mundial, Concentração de CO2, PIB, perda de
florestas tropicais, extinção das espécies, automóveis, uso da água, consumo de papel,
exploração da pesca, perda da camada de Ozônio e investimento estrangeiro), passaram a
apresentar um paralelismo de suas curvas a partir de 1950.

9
Gráfico 1 – Macrotendências – de 1750 até atualidade

Fonte: New Scientist, outubro de 2008, apud Lopes, 2010, p. 13.

As figuras 1 e 2 são os quadros de apoio do relatório How our economy is killing the
Earth da New Scientist, elas confirmam a relação das atividades humanas com sua pressão
do consumo (Fígula 1) e o esgotamento da Natureza (Figura 2).

O fato que desperta atenção nos gráficos contidos nas figuras é o ponto de grande
crescimento de todos os índices a partir de 1950, período pós II Grande Guerra. Por um
lado, houve o início de grande incremento da população, PIB, investimentos, consumo de
água, papel, fertilizantes e urbanização (Figura 1); por outro lado, as curvas dos gráficos da
Figura 2 mostram que, principalmente após 1950, as alterações na biosfera de diferentes
ecossistemas acompanharam as curvas da Figura 1.

10
Figura 1 – Crescente consumo humano

Fonte: New Scientist, outubro de 2008, apud Cortez, 2012.

11
Figura 2 – Impacto no meio ambiente do crescimento do consumo humano

Fonte: New Scientist, outubro de 2008, apud Cortez, 2012.

Para Cortez (2012): “este modelo não vai funcionar por muito tempo, na exata medida
em que os recursos naturais se esgotam e que as mudanças climáticas podem colocar a
economia e a sociedade diante de uma catástrofe planetária”.

O planeta, após eras de instabilidades climáticas, entrou na Era do Holoceno. Essa


era, iniciada há 10 mil anos, foi marcada por uma fase de estabilidade climática, que
forneceu as condições naturais favoráveis ao ser humano, principalmente disponibilidade de
solos férteis, alimentação de origem marinha rica em proteínas e as geleiras, que funcionam
como gigantescos reservatórios de água (Folke, 2013, p. 21). Essa estabilidade planetária

12
permitiu que a humanidade iniciasse a agricultura, entre outras atividades necessárias ao
seu desenvolvimento. Antes dessa estabilidade, a humanidade vivia em pequenos grupos
como caçadores-coletores (STEFFEN, 2007, p. 614).

As alterações nas condições do planeta, provocadas pela produção capitalista pós II


Grande Guerra, foram expressivas na dinâmica do planeta e causaram a mudança da era
planetária, o Antropoceno. Junto com a nova era, vieram os riscos de colapso da civilização.

Considerando os severos riscos envolvidos na Era Antropoceno, alguns cientistas


elaboraram a métrica Limites do Planeta. O objetivo da proposta é responder: Quais são as
pré-condições planetárias não negociáveis que a humanidade precisa respeitar, a fim de
evitar o risco de mudanças ambientais prejudiciais ou mesmo catastróficas para
humanidade? (Rockström, 2009). Para responder essa questão, foi elaborado um modelo de
métricas para identificar os limites perigosos cuja ultrapassagem pode eliminar as condições
do planeta de suprir a civilização (Tabela 1).

A civilização, em 2009, já tinha ultrapassado três limites:


 Mudanças Climáticas: a proposta é ter 350 ppm (partes de CO2 por milhão), mas em
2009, o planeta já apresentava 387 ppm, e em maio de 2012, esse índice chegou a 400
ppm. Nesse item há também a retenção da radiação solar, isto é, a diferença da radiação
recebida do Sol pelo planeta e aquela irradiada de volta ao espaço, o proposto é 1 e a
situação em 2009 era 1,5.
 Perda de biodiversidade: a proposta é 10 espécies extintas por milhão de espécies por
ano, em 2009 o planeta apresentava um número superior a 100;
 Ciclo do nitrogênio: a quantidade de N2 removida da atmosfera pela humanidade
deveria ser de 35 milhões de toneladas por ano, em 2009, já havia a perda de 121 milhões.

13
Tabela 1 – Limites Planetários
Processo Planetário Variável Métrica
Proposta
Mudanças Climáticas (i) Concentração de dióxido de carbono 350
atmosférico (ppm)
(ii) Mudanças na retenção de radiação solar 1
(watts por m2)
Taxa de perda da taxa de extinção (número de espécies extintas 10
biodiversidade por milhão de espécies por ano)
Ciclo do nitrogênio Quantidade de N2 removido da atmosfera para 35
(parte de um limite uso humano (milhões de toneladas por ano)
com o ciclo do
fósforo)
Ciclo do Fósforo Quantidade de P fuindo para os oceanos 11
(parte (milhões de toneladas por ano)
de um limite com o
ciclo do nitrogênio)
Esgotamento do Concentração de ozônio (unidade Dobson) 276
ozônio estratosférico
Acidicação dos Saturação média global de aragonita em águas 2,75
oceanos Superciais
Uso global da Consumo de água doce por seres humanos 4.000
Água doce (km3 por ano)
Mudanças no uso Percentagem do território global convertido em 15
do solo terras agrícolas
Carga atmosférica de Concentração total de material particulado na A definir
aerossóis atmosfera, em bases regionais
Poluição química Por exemplo, a quantidade emitida ou a A definir
concentração, no ambiente global, de poluentes
orgânicos persistentes, plásticos, disruptores
endócrinos, metais pesados e lixo nuclear – ou
seus efeitos no funcionamento dos
ecossistemas
e do Sistema terra
Fonte: ROCKSTRÖM, 2009

14
As demais fronteiras estavam dentro do limite proposto. A figura 3 ilustra a tabela, a
sinalização vermelha e amarela no indicadores auxiliam a analisar a situação e riscos dos
índices. As fronteiras marcadas em vermelho indicam que os limites foram ultrapassados e
as em amarelo indicam perigosa aproximação do limite.

Figura 3 – Limites Planetários

ROCKSTRÖM, 2009

A perda da diversidade é relevante, pois ela compromete a capacidade biótica de


sustentar seu funcionamento sob novas condições ambientais (FOLKE, 2013, p. 24).

A complexidade das fronteiras está na interpendência entre elas. A ultrapassagem de


um limite altera as condições e limites das outras fronteiras, e esta dinâmica obriga novos
cálculos sobre os limites das fronteiras (Folke, 2013, p. 26). Mas essa complexidade deve
ser aprofundada, não somente nos cálculos das fronteiras planetárias, mas também nas
análises de impacto socioambiental.

A fronteira que desperta grande preocupação é a das Mudanças Climáticas. O ciclo de


mudanças climáticas descontroladas (runaway climate change) é uma das ameaças mais
inquietante (Löwy, 2009a, p. 7). Em sua obra Seis Graus, Lynas apresenta as
consequências socioambientais do crescimento da temperatura, grau a grau, na média atual
no clima mundial. Mesmo o incremento de apenas um grau, gera alterações radicais nas
condições socioambientais do planeta, por exemplo um terço do planeta estará desprovido

15
por completo de água doce, assim, não será mais habitável por seres humanos, além de
deixar os furacões mais ferozes (LYNAS, 2008, p. 37).

O risco envolvido nas mudanças climáticas é a perda da estabilidade vigente no


Holoceno, que é vital para a nossa agricultura, isto é, nossa capacidade de alimentar bilhões
de pessoas. As transformações socioambientais pelo incremento descontrolado das
mudanças climáticas podem levar à barbárie, temida por setores do movimento
socioambiental, pois as disputas por nascente de rios e terras férteis levarão a conflitos e
guerras.

Mas a crise socioambiental não está restrita ao esgotamento dos recursos naturais, a
civilização também tem sérios problemas, principalmente na divisão justa da riqueza
produzida. O Gráfico 2 indica que os 20% mais ricos se apropriam de 82,7% da riqueza
produzida por todos, em contrapartida dois terços da população mais pobre são obrigados a
se contentar com 20% da produção.

Gráfico 2 – Distribuição de renda

Fonte: Relatório de Desenvolvimento Humano (1992, p. 35 e 2005, p. 37), apud Lopes


(2010, p. 14).

A base desse gráfico é formada por 2,3 bilhões de pessoas, cuja renda é de até U$ 2
por dia, e destes, 1,3 bilhões sobrevivem com menos de 1,25 por dia. O que leva a
sociedade a ter 800 milhões de analfabetos e 850 milhões de famintos, e destes 180
milhões são crianças. O número de óbito infantil por fragilização do organismo é expressivo,
são de 10 a 11 milhões de crianças anualmente (DOWBOR, 2014, p. 85).

16
Em contrapartida, se o total da riqueza produzida no mundo está em torno de U$ 70
trilhões em 2014, e considerando que a população mundial está em torno de 7 bilhões de
pessoas, pode-se considerar que há volume de riqueza o suficiente para proporcionar a
renda mensal de U$ 3 mil por família de 4 pessoas (Dowbor, 2014, p. 85). Mas a lógica do
capitalismo é concentradora de riqueza, não apresenta a abertura de negociação dessa
divisão igualitária e justa.

Além da divisão da riqueza, o uso dos recursos no consumo expõe sérios problemas
na alocação dessa riqueza. O estudo considerando indicadores de várias instituições
multilaterais (ONU, 1997; UNDP / UNFPA e UNICEF, 1994, Relatório Direitos Humanos
1998) indicaram que são necessários investir 6 bilhões e 12 bilhões, respectivamente, para
proporcionar educação básica para todos no planeta e oferecer saúde reprodutiva a todas
as mulheres no mundo, mas esses recursos não são apurados para esse fim. Por outro
lado, valores bem mais expressivos são “alocados” para fins, no mínimo questionáveis,
como por exemplo: cosméticos nos EUA (U$ 8 bilhões); perfumes na Europa e nos EUA;
sorvetes na Europa (U$ 11 bilhões); entretenimento corporativo no Japão (U$ 35 bilhões);
cigarros na Europa (U$ 50 bilhões); bebidas alcoólicas na Europa (U$ 105 bilhões); drogas
no mundo (U$ 400 bilhões) e gastos militares no mundo (U$ 670 bilhões) (LOPES, 2010, p.
17).

A conclusão possível na análise sobre o impacto das atividades humanas sobre a


Natureza, retratado no relatório divulgado pela New Scientist (Gráfico 1), e a concentração
de renda, ilustrada pelo Gráfico 2, é que “estamos destruindo o planeta, para o proveito de
um terço da população mundial” (LOPES, 2010, p. 15).

O último relatório da OXFAM confirma o parecer de Lopes e Dowbor. OXFAM, a partir


de dados da Credit Suisse, indica que 1% da população mais rica detém 48% de toda a
riqueza produzida, enquanto os demais 52% da riqueza estão dispersos nos demais 99% da
população, e 85 bilionários têm a mesma riqueza que a metade inferior da população do
mundo (OXFAM, 2015). A perspectiva é de agravamento da diferença, pois a curva de
acumulação projeta que em 2016, 1% da população terá a mesma quantidade dos demais
99% (50% para cada) e a partir deste momento, a parcela mais rica acumulará cada vez
mais riqueza acumulada (OXFAM, 2015).

17
A concentração de riqueza apontada pelos estudos da OXFAM confirma os resultados
estatísticos da ETH (Instituto Federal Suíço de Pesquisa Tecnologica). ETH partiu de uma
amostra de 43.060 corporações contida no banco de dados Orbis 2007, com 30 milhões de
empresas. A pesquisa estudou como está estruturada a relação entre as empresas: o peso
econômico de cada entidade, a sua rede de conexões, os fluxos financeiros, e em que
empresas têm participações que permitem controle indireto (Dowbor, 2012a). O objetivo foi
analisar o inter-relacionamento de controle mútuo das empresas, isto é, uma empresa pode
ser controladora e controlada por outra, ou por uma rede de outras, e esse controle é
estruturado por mutua participação de ações, mutual cross-shareholdings. O resultado é que
o poder está altamente concentrado, pois apenas 737 das principais empresas (top-holders)
detêm 80% do controle de todas as empresas transnacionais (ETN) e destes, 147
transnacionais formam o núcleo de poder da rede, isto é, controlam a si mesmas e destes
75% são intermediários financeiros (Vitali, 2001). Para Dowbor (2012a), “O estudo do ETH
abriu uma janela importante para a abordagem científica do poder global das corporações,
com implicações óbvias para as ciências econômicas, políticas, sociais, de relações
internacionais e outras”.

O controle desse sistema impessoal e concentrador de riqueza tem sua força vital no
produtivismo e consumismo.

18
1.2 Trem sem freio: Capitalismo como devorador

A percepção que o consumo é o causador do esgotamento dos recursos naturais não


está correta. Alguns setores ambientalistas apontam que a atual crise ambiental é gerada
pelo consumo excessivo da população, porém essa percepção deve ser questionada pois o
tipo de consumo da atual civilização capitalista, com sua ostentação, desperdício e
obsessão acumuladora é a verdadeira fonte da crise ambiental (Löwy, 2005a, p.52; Löwy,
2011, p. 38-37). Além disso, a desigualdade social deve ser considerada no debate sobre o
esgotamento da natureza, pois o consumo nos países avançados é, além de muito maior,
ostentatório. Assim, não é adequado dar o mesmo tratamento à população que consome
feijão e milho, em algumas vezes de forma insuficiente, e àqueles que acumulam iates
(LÖWY, 2012a, p.13).

O consumismo descontrolado gerado nesse ciclo supera a capacidade de o planeta


repor reservas naturais, o fluxo infinito de consumismo capitalista não respeita a finitude do
planeta. O esgotamento do planeta em manter o atual padrão de consumo pode ser
demonstrado no relatório Pegada Ecológica da WWF (2012b), que indica a superação de
50% da capacidade de reposição do planeta.

O método pegada ecológica ou ecological footprint method foi desenvolvido por


Wackernagel e Reed (1996). Os autores apontavam sérios problemas estruturais no modelo
de sociedade e seu consumo, para eles se toda civilização consumisse no mesmo padrão
norte-americano, seria necessário mais dois planetas (Wackernagel, 1996, p. 15). A Tabela
2 - Comparação de consumo por pessoa Canadá x EUA x Índia e Mundo apresenta
números da desigualdade no uso dos recursos naturais, o que permite deduzir que o baixa
consumo dos países não ricos compensam o superconsumo dos países ricos. A tabela
demonstra que o padrão de consumo dos países desenvolvidos, representado pelo Canadá
e do EUA, está sustentado pela carência de consumo dos países pobres ou em
desenvolvimento. Essa lógica deve ser transformada, afinal vale o questionamento: por que
razão não teriam todos os chineses e todos os indianos direito a uma vida confortável?
(DOWBOR, 2008, p.13).

19
Tabela 2 – Comparação de consumo por pessoa Canadá x EUA x Índia e Mundo
Consumo por pessoa (1991) Canada USA Índia Mundo
Emissão de CO2 (toneladas/ano) 15.2 19.5 0.81 4.2
Renda (US$) 19,320 22,130 1,150 3,800
Veículos (por 100 pessoas) 46 57 0.2 10
Consumo de Papel (kg/ano) 247 317 2 44
Consumo Energia Fóssil (Gigajoules/ano) 250 (234) 287 5 56
Consumo Água (m3 / ano) 1,688 1,868 612 644
Pegada Ecológica (ha. M3/ano) 4.3 5.1 0.4 1.8
Fonte: Wackernagel, 1996, p. 85

O capitalismo tem duas armas para manter o consumismo sempre muito ativo:
propaganda e a obsolescência programada.

A obsolescência programada ou planejada foi incorporada pela indústria como forma


de vender mais pelo incremento de consumo por substituição do bem já possuído por outro
mais moderno ou em melhores condições. O planejamento da produção prevê um prazo de
vida útil do bem que antecipa sua obsolescência. A redução da durabilidade do produto é
“parte produtivista e consumista, e também precisa ser modificado” (Löwy, 2012a, p. 13). O
termo obsolescência planejada foi atribuído ao desenhista industrial, Brooks Stevens, com
sua definição: “instigar no comprador o desejo de possuir algo um pouco mais novo, um
pouco melhor e um pouco mais rápido que o necessário” (LEONARD, 2011, p. 174).

Löwy (2012a, p. 13) exemplifica a obsolescência planejada com a geladeira que há


quarenta anos durava quarenta anos, mas atualmente tem sua durabilidade reduzida para
três anos para aumentar artificialmente a necessidade de comprar outro produto para
substituí-lo. A obsolescência não tem outro objetivo senão gerar mais lucro para as grandes
empresas com o consumismo criado artificialmente (LÖWY, 2011, p. 69).

Oliveira (2013) apresentou a lâmpada como exemplo dessa prática produtiva: “Nos
anos 1920, uma simples lâmpada durava mais de 2500 horas. Percebendo, nesse caso, que
as vendas seriam bem menores dada a elevada durabilidade do produto, os fabricantes
rapidamente trataram de dar uma vida útil bem baixa a esse produto” e assim, reduziu sua
vida útil para menos de 1.000 horas.

20
A obsolescência é uma estratégia mundial, esse modelo de planejamento de processo
produtivo está presente em todos os países. O documentário Comprar, tirar, comprar
apresenta experiências e reflexões na Espanha, França, Alemanha, Estados Unidos e Gana
com esse tema. Para Oliveira (2013), “a prática da obsolescência programada (proposital
curta vida útil) se configura numa maquiavélica estratégia de mercado” cujo objetivo único é
forçar que o consumidor não tenha alternativa diferente de efetuar nova compra.

Essa estratégia foi incorporada de forma mais intensa com a crise de 1929. Já em
1928, o lema do capitalismo era “Aquilo que não se desgasta não é bom para os negócios” e
em 1932, o corretor de imóveis, Bernard London propôs que a obsolescência planejada
fosse obrigatória, no seu panfleto Acabando com a Depressão através da obsolescência
planejada (Leonard, 2011, p. 175), isto é, os produtos deveriam ter uma data de expiração,
pois assim, as fabricas manteriam o nível de produção com o consumo contínuo do mercado
e, por consequência, o trabalhador manteria o nível de emprego, e o capital teria seu ciclo
de lucro garantido (Padilha, 2013). A obsolescência planejada avançou com a substituição
da ideia cultural do suficiente pela abundância contida no american way of life (Padilha,
2013).

Há produtos com a obsolescência planejada com ciclo único de consumo, conhecido


como bens descartáveis ou produtos de obsolescência instantânea. As fraudas e os
absorventes higiênicos foram os primeiros, mas posteriormente surgiram outros produtos
como lâminas de barbear, pratos e talheres, câmaras, esfregões, entre diversos produtos
produzidos para serem utilizados apenas uma vez (Leonard, 2011, p. 175).

A geladeira e a lâmpada não são os únicos produtos que sofrem a obsolescência


programada, a pesquisa desenvolvida pelo IDEC e Market Analysis demonstra que esse
universo é bem maior. A pesquisa ocorreu com consumidores de nove capitais brasileiras
(São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Brasília
e Goiânia) envolvendo 806 casos. Os produtos foram agrupados em quatro grupos: digitais
(computador, notebook, laptop ou tablete, câmera fotográfica e impressora);
eletroeletrônicos (TV e DVD); Eletrodomésticos (geladeira, micro-ondas, lavadora de roupas
e fogão) e celular ou smartphone (IDEC, 2013, p. 64).

21
Os produtos pesquisados e o tempo de uso da última unidade descartada (em anos)
foram (IDEC, 2013, p. 29):
 Celular ou Smartphone 3,0
 Câmara fotográfica: 3,8
 Impressora: 4,0
 Computador: 4,0
 DVD ou Blue Ray: 4,1
 Televisão: 7,6
 Micro-ondas: 5,2
 Lavador de roupas: 7,4
 Fogão: 8,3
 Geladeira ou freezer: 9,5

Apesar da vida útil reduzida do bem, o consumidor tem uma percepção positiva da
durabilidade de seus bens. A pergunta sobre satisfação da durabilidade para
eletrodoméstico apontou 62% como totalmente satisfeito, 28% como parcialmente satisfeito
e 3% como totalmente insatisfeito; os eletroeletrônicos e digitais apresentaram índices
semelhantes, apenas o celular apresenta números de satisfação menores: 56% como
totalmente satisfeito e 34% como parcialmente satisfeito e menos de 4% como totalmente
insatisfeito (IDEC, 2013, p. 13). A conclusão apontada na pesquisa é que o “consumidor
brasileiro está muito satisfeito com o desempenho e a durabilidade dos equipamentos que
possui” (IDEC, 2013, p. 59) ao mesmo tempo, considera a durabilidade uma característica
importante do bem (IDEC, 2013, p. 59).

A pesquisa também apontou que, quando o bem apresenta defeito que impede ou
atrapalha, o consumidor compra outro e não o conserta. O mapa dos motivos da opção de
nova compra em relação ao conserto é muito interessante, pois revela que os produtos
foram produzidos para não serem consertados e sim descartados após o prazo definido. Os
principais motivos para que o consumidor não fizesse o conserto do bem após a avaliação
da assistência técnica foram (IDEC, 2013, p. 39): conserto muito caro, demora do conserto,
falta de peça e o resultado não era garantido.

A perda da funcionalidade, ou obsolescência funcional, não é a única motivação da


compra de outra unidade do bem, a outra motivação está relacionada ao emocional e não
ao funcional, isto é, “a obsolescência psicológica, percebida ou simbólica, a qual é
caracterizada pelo desejo de se ter um equipamento mais atual, independentemente de já
possuir um equipamento com a mesma função” (IDEC, 2013, p. 60). Nesse caso, o gosto e

22
a moda assumem o controle. A cor e o cumprimento da roupa, a largura da gravata, nova
versão do celular, o armário de cozinha da época formam a obsolescência percebida em
ação (LEONARD, 2011, p.176).

A interpretação de Echegaray, diretor geral da Market Analysis (2014) para as


informações da pesquisa é que “existe uma assimilação conformada do consumidor frente
às estratégias da indústria e da propaganda, já que ele percebe “em abstrato” que os
aparelhos deveriam durar mais, mas está satisfeito com a durabilidade e desempenho de
seu aparelho”.

É possível outra forma de produzir, a perenidade do bem e sua utilidade podem e


devem ser priorizados, para reduzir o impacto do descarte de grande quantidade de resíduo
e eliminação da ilusão da felicidade pelo consumo da nova versão do mesmo produto que já
atende as reais necessidades. A lâmpada, um dos símbolos da obsolescência planejada,
pode também ser o símbolo da resistência: foi criada, pelo engenheiro espanhol Benito
Mouro, uma lâmpada que tem a capacidade de ficar ligada de forma ininterrupta pelo preço
de 37 euros. Para seu desenvolvimento, Muros visitou o parque de bombeiros de Livermore
na Califórnia para conhecer a lâmpada que permanece acessa há mais de 111 anos, o
conhecimento sobre essa lâmpada só ocorre com entrevista aos descendentes dos
criadores, pois não há documentação de seu projeto (Castellano, 2012). Certamente não
será a popularização da lâmpada de Mouro que vencerá o consumismo, mas sua lâmpada
demonstra que a produção pode gerar bens perenes.

Os gráficos das figuras 1 e 2 apresentados no item “Caminhos da Nova Barbárie”


ilustra algumas consequências da política de consumo impostas pela obsolescência
planejada ao volume de consumo e sua pressão no meio ambiente.

A obsolescência planejada tem uma relação vital com a propaganda, pois a primeira
depende da ilusão de felicidade propagada pela segunda, e esta precisa da carência
artificial produzida pela primeira como fator de oportunidade de novas vendas.

A ruptura da crise socioambiental requer a superação da tirania do capital. O capital


impõe sua lógica com forte investimento em propaganda e marketing: em torno de US$ 1
trilhão por ano em publicidade junto aos meios de comunicação (Dowbor, 2013b, p. 66).
Esse volume financeiro garante a cumplicidade dos meios de comunicação e a ilusão que a
felicidade está na compra da nova versão do produto, como o consumo não traduz em
felicidade, a eterna frustração tranca a sociedade na prisão do ciclo consumo-frustação-mais
consumo e, consequentemente, a manutenção do poder financeiro e político da classe
detentora do capital.

23
A publicidade tem exercido o poder de influência sobre as necessidades através da
manipulação mental. O modelo de sociedade imposto pela publicidade invadiu grande parte
do cotidiano da sociedade como alimento, roupas, cultura, politica, religião (Löwy, 2009b, p.
46-47). A publicidade impõe sua vontade com a apropriação das ruas, jornais, mídias e da
atenção da sociedade. Para Löwy (2012b, p. 151), “se trata de criar um novo modo de
consumo e um novo modo de vida, baseado na satisfação das verdadeiras falsas
necessidades produzidas artificialmente pela publicidade capitalista”.

Certamente, a sociedade deve puxar o freio desse trem, que avança velozmente e
exige fontes ilimitadas, porém inserido em um planeta finito. O final desta estrada é o
abismo, resta aos passageiros a responsabilidade de pará-lo antes do colapso.

24
1.3 Soluções da Desgovernança global

Os representantes governamentais passaram a se reunir periodicamente, buscando


responder a crescente pressão dos movimentos sociais e ambientais sobre os riscos
relacionados ao desequilíbrio ecológico causado pelas alterações das condições do planeta
pelas atividades humanas.

O primeiro passo encontrado foi definir a sociedade ideal, cujo desenvolvimento seja
sustentável, e os mecanismos para alcançá-la. Lester Brow definiu essa expressão no inicio
dos anos 80 como “sociedade que é capaz de satisfazer suas necessidades sem
comprometer as chances da sobrevivência das gerações futuras” (Milanez, 2003, p. 77).
Posteriormente a CMMAD (Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da
ONU) definiu desenvolvimento sustentável (DS) como sendo “aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras
atenderem a suas próprias necessidades” (CMMAD, 1988, p. 46).

A definição da CMMAD não é unânime e nem é a última definição aplicada. Para Sachs,
o desenvolvimento sustentável deve obedecer ao duplo imperativo ético da solidariedade:
com as gerações presentes e futuras, e com a explicitação de critérios de sustentabilidade
social e ambiental e de viabilidade econômica. Assim, o desenvolvimento para ser
sustentável deve considerar os três elementos, isto é, promover o crescimento econômico
com impactos positivos em termos sociais e ambientais (SACHS, 2004, p. 36).

Mas, o próprio Sachs (2004, p. 15-16) ampliou a definição de desenvolvimento


sustentável ao considerar a estrutura de cinco pilares sustentável:
 Social: “fundamental por motivos tanto intrínsecos, quanto instrumentais, por causa da
perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muitos lugares
problemáticos do nosso planeta”;
 Ambiental: “com as suas duas dimensões (os sistemas de sustentação da vida como
provedores de recursos e como “recipientes” para a disposição de resíduos)”;
 Territorial: “relacionado à distribuição espacial dos recursos, das populações e das
atividades”;
 Econômico: “sendo a viabilidade econômica a conditio sine qua non para que as coisas
aconteçam”;
 Político: “a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário
para fazer as coisas acontecerem; a liberdade faz toda a diferença”.

25
O debate mundial pela tomada de consciência sobre a necessidade de alcançar uma
solução global para a crise ambiental do planeta intensificou-se no final do século XX. No
entanto, alguns debates sobre questões ambientais aconteceram em encontros
governamentais desde século XIX, mas esses encontros debateram apenas temas
específicos. Os primeiros encontros ocorreram em Paris, em 1883, para debater sobre a
proteção das focas do mar de Bering e em 1895, sobre a proteção dos pássaros úteis à
agricultura. Em 1949, houve a Conferência da ONU sobre a Conservação e Utilização de
Recursos (UNSCCUR) na cidade de Nova Iorque, Estados Unidos (BENINCÁ, 2010, p.
101).

A Conferência Intergovernamental de Especialistas sobre as Bases Científicas para


Uso e Conservação Racionais dos Recursos da Biosfera, “Conferência da Biosfera”, ocorreu
na cidade de Paris em 1968. A poluição da água e do ar, responsáveis pela chuva ácida
foram os temas debatidos nessa conferência (Benincá, 2010, p. 103). Esse encontro foi
importante por seu caráter científico e por ter proporcionado um dos primeiros diagnóstico e
prognóstico pessimistas para o planeta Terra (DUARTE, 2003, p. 13).

A primeira conferência organizada pela ONU foi a Conferência Mundial do Meio


Ambiente Humano em Estocolmo em 1972, que teve como objetivo tratar os seguintes
temas: poluição atmosférica, da água e do solo provocadas pela crescente industrialização
dos “países até então fora do circuito de economia internacional” (RIBEIRO, 2010, p. 74).

O Encontro foi marcado por conflito entre os países ricos e os países não
desenvolvidos. O conflito de posicionamento entre as nações pode ser assim resumido: os
países em desenvolvimento defenderam o direito do uso de suas riquezas naturais no seu
processo de crescimento e, por outro lado, os países ricos expressaram a preocupação com
o esgotamento de recursos estratégicos e poluição.

A postura brasileira foi bastante agressiva no sentido de encarar as propostas


ambientais conservadoras dos países desenvolvidos como políticas econômicas com
propósito de criar barreiras à industrialização dos países em desenvolvimento. O debate foi
tão radical que um diplomata brasileiro chegou a convidar “que todas as indústrias poluentes
vão para o Brasil, temos espaço suficiente para isso, e no dia em que formos tão ricos como
o Japão, nos preocuparemos com o meio ambiente” (SACHS, 2009b, p. 231).

26
Essa posição radical repercutiu entre os países em desenvolvimento, principalmente a
Índia e a China, que já apresentavam alto índice de crescimento econômico. Nesse sentido
o discurso da primeira ministra indiana Indira Gandhi ficou marcado por denunciar a pior das
poluições: a pobreza. O mantra “poluição da pobreza” foi repetido diversas vezes nos
debates do encontro.

Apesar das diferenças entre as nações, o encontro conseguiu concluir o documento


Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, composto de 26 princípios. Mas não
conseguiu eliminar a preocupação dúbia em relação ao planejamento ambiental: deve ter o
foco no crescimento atual e futuro dos países em desenvolvimento (Princípio 11); mas ao
mesmo tempo os recursos devem ser destinados para a preservação e melhoramento do
meio ambiente (Princípio 12) (UNEP, 1972).

A forma da organização do Encontro de Estocolmo foi inovadora. Havia a assembleia


dos representantes dos Estados no parlamento sueco, conferências públicas com
convidados do secretariado coordenadas por Maurice Strong e reuniões off Broadway
organizadas pela sociedade civil. A cidade Estocolmo se transformou em um grande palco
de debates e reflexões (Sachs, 2009b, p. 232). A principal resolução da Conferência foi a
criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) com sede em
Nairóbi, capital do Quênia, com o objetivo de centralizar as ações da ONU em relação às
questões ambientais.

Outra herança foi a apresentação da proposta ecodesenvolvimento por Strong no


encontro. A virtude simbólica desse conceito estava na associação indissolúvel do
desenvolvimento e o meio ambiente. Posteriormente a palavra ecodesenvolvimento foi
substituída por desenvolvimento sustentável (Sachs, 2009b, p. 232).

Apesar da falta de harmonia entre os países sobre o papel do Estado no controle da


poluição, a Conferência Estocolmo 1972 foi positiva por despertar nas nações e empresas a
consciência da necessidade de gestão ambiental em todos os níveis. Os governos iniciaram
uma nova etapa na política ambiental com a estruturação de ministérios, órgãos federais,
leis e normas para controle e ambientais. Em paralelo, as empresas começaram a avaliar
que o investimento em soluções ambientalmente responsáveis poderia ser fonte de lucros e
não somente custo adicional. Nessas condições a Conferência Rio 1992 encontrou situação
mais fértil para debater soluções sustentáveis mundiais (SACHS, 2009b, p.253).

27
A Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento
(CNUMAD), Cúpula da Terra, ocorreu em junho de 1992 na cidade do Rio de Janeiro, com o
objetivo de estabelecer acordos internacionais “que mediassem as ações antrópicas no
ambiente” (RIBEIRO, 2010, p. 108).

Houve um amplo leque de temas debatidos nessa Conferência: proteção do solo, por
meio do combate ao desmatamento, desertificação e seca; proteção da atmosfera por meio
do combate às mudanças climáticas, ao rompimento da camada de ozônio e a poluição
transfronteiriça; proteção das áreas oceânicas e marítimas; conservação da diversidade
biológica; controle da biotecnologia; controle de dejetos químicos e tóxicos; erradicação de
agentes patogênicos e proteção das condições de saúde (DUARTE, 2003, p. 40).

A Cúpula da Terra foi um marco positivo, pois foram pactuados diversos


compromissos visando uma sociedade mais sustentável. O documento mais importante
firmado no encontro foi a Agenda 21, um extenso programa de ação com 40 capítulos que
consolida e estrutura as resoluções da Conferência, com o objetivo de facilitar sua
implementação nos diversos níveis. As diversas recomendações nela contidas devem ser
ainda subsídios para o seu detalhamento por Agendas 21 locais. Além da Agenda 21, foram
aprovados os documentos Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e o
Desenvolvimento e Convenção sobre Mudanças Climáticas, a Convenção da
Biodiversidade.

O otimismo deixado pela Cúpula Rio 92 foi aos poucos eliminado pela hegemonia das
políticas neoliberais do Consenso de Washington, que buscam o lucro a qualquer custo.
Esse momento histórico proporcionou o frustrante encontro de Johannesburgo em 2002.

A Cúpula Mundial do Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio +10, foi


realizada em Johannesburgo, África do Sul em 2002, para avaliar os progressos alcançados
pelos compromissos pactuados na Cúpula da Terra 1992. O tema da Cúpula 2002 foi
desenvolvimento sustentável e os principais objetivos foram a erradicação da pobreza, a
mudança nos padrões insustentáveis de produção e consumo e proteção dos recursos
naturais. Os documentos Declaração Política e Plano de Implementação foram produzidos
nessa Cúpula. Apesar dos significativos avanços da ciência no conhecimento sobre o
funcionamento dos ecossistemas e do planeta como um todo, a influência do momento
histórico crítico com grande avanço das políticas neoliberais, as nações não avançaram nos
compromissos pactuados na Cúpula da Terra. A frustração foi tão grande que o encontro
ficou marcado como uma “Rio – 10” (SACHS, 2009b, p. 254).

28
A conferência mais recente foi a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável-2012, Rio+20, que ocorreu na cidade do Rio de Janeiro em
junho de 2012, com o tema: “uma economia verde no contexto do desenvolvimento
sustentável e a erradicação da pobreza” e “o quadro institucional para o desenvolvimento
sustentável” (PNUMA, 2011).

O debate do tema economia verde e a erradicação da pobreza foi antecipado pelo


relatório "Rumo a uma economia verde: caminhos para o desenvolvimento sustentável e a
erradicação da pobreza", divulgado em fevereiro de 2011 pelo Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambiente (PNUMA, 2011) em Nairóbi, no Quênia, durante o Fórum Global de
Ministros do Meio Ambiente. A conclusão do relatório é que seria necessário o investimento
de apenas 2% do PIB mundial, em torno de cerca de US$ 1,3 trilhões, para mundialização
da economia verde. Esse recurso seria aplicado na melhoria do bem-estar das populações,
diminuição das desigualdades sociais e redução dos riscos de um colapso ambiental. Para
alcançar esse objetivo, o investimento focará na transformação para economia verde de dez
setores-chaves: agricultura, edificações, energia, pesca, silvicultura, indústria, turismo,
transporte, água e gestão de resíduos. O montante previsto no relatório seria investido entre
os anos 2011 e 2050 (PNUMA, 2011).

Além dos Congressos, o outro formato de reuniões mundiais das nações encontrado
pelas Nações Unidas são as Conferências das Partes (COP). A COP de maior impacto foi a
COP3 realizada em Quioto em 1997, pois nesse encontro as nações aprovaram o Protocolo
de Quioto. Segundo esse compromisso, os países contidos no Anexo 1 da Convenção sobre
Mudança do Clima devem reduzir as emissões antrópicas de gases de efeito estufa em pelo
menos 5% abaixo de dos níveis de 1990 no período entre 2008 e 2012. Essa redução
poderia ser individual ou em conjunto (Barbieri, 2011, p. 36). A grande contribuição para a
Gestão Ambiental Global do Tratado de Quito é a criação dos três mecanismos previstos no
método do Tratado: Implementação Conjunta, Comércio de Emissões e Mecanismos de
Desenvolvimento Limpo. Sua implantação foi prejudicada pela falta de assinatura dos
representantes dos principais países poluidores, entre eles os Estados Unidos. A reação da
sociedade americana, influenciada pelo uso dos meios de comunicação pelas indústrias, foi
negativa pelo temor de que haveria desemprego generalizado. Assim, o congresso
estadunidense rejeitou a assinatura do Tratado (DUARTE, 2003, p. 49).

Mas pouco se avançou nesses encontros, os principais países continuam com o


discurso que a solução deve ser iniciada pelos outros. Por exemplo: a Conferência de
Copenhague em 2009 apresentou o impasse entre Estados Unidos e China, pois os EUA
assumiu que é um dos maiores responsáveis pelas emissões de gases poluentes, mas

29
afirmou que a China tem o mesmo volume de poluição e “se esse país não fizer nada, não
serão eles que tomarão a iniciativa” e em contrapartida, a China respondeu que os Estados
Unidos estão emitindo gases há mais tempo e têm a responsabilidade histórica de investir
na redução de suas emissões e, por isso, somente após essa ação, a China poderá discutir
o assunto. Mais uma vez, cada país empurrou para o outro a responsabilidade das
mudanças (LÖWY, 2012a, p.10).

A sequência de debates e encontros mundiais para buscar caminhos e soluções para


a crise ambiental não apresentaram soluções consistentes para a crise socioambiental. Mas,
mesmo sem melhorias nas condições de vida, os governos e empresários insistem no atual
modelo. A proposta da economia verde como ponto para chegar ao desenvolvimento
sustentável é a aposta do inicio do século XXI da classe dominante para melhorar o atual
modo de produção sem alterar suas condições essenciais.

O impasse pode ser resumido pelo conflito de dois interesses: o primeiro grupo
formado pelos países desenvolvidos que procuram chutar a escada na qual construíram seu
crescimento econômico; e o segundo, formado pelos demais países que buscam seu
desenvolvimento. Mas essa é uma interpretação, há outras conforme a estrutura teórica e
ideológica que as fundamentam.

Há também diversas formas de entendimento e intervenção ambiental nesse debate.


No próximo capítulo, serão apresentados algumas das principais correntes de pensamento
ecológico, como se aproximam e como se antagonizam.

30
CAPÍTULO 2 – Correntes Ecológicas

2.1 Correntes Ecológicas: Propostas e Divergências

A concepção utópica dos movimentos ambientalistas não é unanimidade,


principalmente na área de ecologia política. Há diversas formas de conceituar os
movimentos ecológicos e diversos critérios para classificá-los, e, mesmo dentro da mesma
classificação, há diferentes correntes de pensamento. A presente pesquisa adota a
classificação proposta pelo professor Viola (1987b, p. 45): “sintetizando as correntes
existentes no movimento ecológico e na teoria política ecologista, podemos diferenciar
quatro posições: ecologistas fundamentalistas, ecologistas realistas, ecossocialistas e
ecocapitalistas”. Mas há a necessidade de completar esse modelo de classificação de Viola
com a contribuição de Jean Martínez Alier, o movimento Decrescimento e a corrente Buen
Vivir.

Os ecologistas fundamentalistas, ou deep ecology, expressam sua herança anarquista


através de uma projeção histórica pessimista: “futuro é inviável (não há Terra nem Paraíso),
resta apenas esperar o fim vivendo de modo coerente com os princípios” (Viola, 1987b, p.
45). A proposta da ecologia fundamentalista é a construção de uma sociedade ecológica
alternativa na margem da sociedade materialista, reforçada pela crença que não há
possibilidade de transformação social, pois a lógica predatória da civilização contemporânea
é irreversível (VIOLA, 1987a; VIOLA, 1987b, p. 45).

As bases conceituais dos ecologistas fundamentalistas são constituídas por duas


fontes: a primeira, baseada nas ideias de norueguês Arne Naess com sua ecologia profunda
de perfil anti-humanista e pan-naturalista, que propõe um retorno romântico à natureza, à
igualdade quase total com os animais e plantas. A segunda fonte é o anarquismo libertário
de estadunidense Murray Bookchin com a proposta de uma ecologia social, baseada no
municipalismo ecológico-libertário (MÜNSTER, 2013, p. 140).

Os fundamentalistas se destacam no movimento ecológico pela preocupação com a


pureza do movimento, com a criação de uma economia alternativa periférica e são
fortemente relutantes a qualquer aproximação com outras forças sócio-políticas. Essa
resistência cerceia o diálogo com os demais setores da sociedade; esse comportamento
tende a provocar uma imagem de potencial messiânico-autoritário (VIOLA, 1987a).

31
Em contrapartida, os ecologistas realistas apresentam críticas semelhantes ao modelo
insustentável de civilização, porém acreditam na possibilidade de transformação social com
a organização de um movimento ecologista rígido nos princípios e flexível na interação com
a sociedade. Os realistas não buscam alteração do modo de produção, a proposta é
ecologizar progressivamente o capitalismo e o socialismo. A opção transformadora dos
realistas é pela longa transição da atual civilização a partir da atual estrutura. (VIOLA,
1987a; VIOLA, 1987b, p. 46).

Os realistas debatem a plataforma ecológica, mas com distância do embate esquerda


x direita. Seu enfoque é formular um programa econômico de transição viável capaz de
ecologizar paulatinamente a sociedade desenvolvimentista com aproximação de setores
sensíveis a projetos verdes dos partidos socialdemocratas, socialistas e liberais (Viola,
1987a). A postura política dos realistas, presente nos partidos verdes, se destaca por se
considerar acima da direita e da esquerda, essa postura é confirmada pela afirmação de
Rabóczkay (2004, p. 14): “o Partido Verde não é nem da esquerda, nem da direita – é pra
frente”.

Os ecologistas realistas têm participação ativa na politica partidária. Essa corrente


está presente na direção dos Partidos Verdes (Viola, 1987b, p. 46). As primeiras
experiências partidárias ecológicas mundiais ocorreram na Tasmânia (Austrália) e Nova
Zelândia. A experiência da Tasmânia foi a United Tasmania Group, UTG, fundada em 23 de
março de 1972. Sua importância histórica é ter sido o primeiro partido político com
plataforma ambientalista a disputar uma eleição; sua criação foi o caminho encontrado pelo
movimento ambiental tasmaniano para confrontar os projetos hidroelétricos no lago Pedder,
que desapareceria com a implementação desses projetos. A principal força antagônica ao
UTG foi a aliança dos grandes partidos no Lake Pedder Action Committee, LPAC, que
defendiam uma nova política hidroelétrica (RABÓCZKAY, 2004, p. 18).

O partido UTG lançou doze candidatos na sua primeira eleição e obteve um índice
positivo, 7%, mas não conseguiu eleger representantes. Posteriormente, UTG conseguiu
disputar mais duas eleições, mas em 1977 foi dissolvido sem eleger nenhum representante.
Mesmo assim, deixou heranças positivas, como a apresentação de diversas propostas
políticas ecológicas e o despertar de novos cidadãos para a atuação na política partidária
em defesa de propostas ambientais (Rabóczkay, 2004, p. 18). As novas lideranças
formadas pela UTG, após sua dissolução, foram para outros partidos, principalmente o
Green Independent, criado em 1980 (RABÓCZKAY, 2004, p. 19).

32
A segunda experiência partidária de plataforma ambiental foi o The Values Party,
Partido dos Valores, da Nova Zelândia. Esse partido foi fundado em 30 de maio de 1972
com propostas de crescimento econômico e demográfico zero para conter a poluição e a
pressão sobre os recursos naturais (Rabóczkay, 2004, p. 19). O formato inicial de atuação
política foi somente no nível comunitário, para fugir de estrutura convencional de partido,
mas essa estratégia quase levou o partido à extinção. Em 1975, o The Values Party alterou
a estrutura organizacional e sua proposta política foi ampliada para atender as demandas de
um projeto de política econômica consistente (Rabóczkay, 2004, p. 19-20). Porém, essa
ampliação acirrou o embate entre posições antagônicas na condução do partido: a primeira
posição defendia que o partido deveria se comportar como um movimento visando apenas a
promoção de um novo estilo de vida alternativo; a segunda, composta por políticos mais
experientes, acreditava que seria possível provocar mudanças através de ações políticas
convencionais e com a busca do poder (Rabóczkay, 2004, p. 20). A crise aumentou na
campanha das eleições de 1978, pois as principais propostas do partido foram a
nacionalização das terras e a obrigatoriedade de cooperativismo das empresas privadas.
Isso acarretou reação do setor interno que defendia que o partido deveria ser apenas um
movimento, além disso, esse setor acusou estar ocorrendo a tomada marxista do partido.
Com a baixa votação eleitoral, o partido alcançou apenas 2,8%, a crise se agravou, e a
consequência foi a dissolução do partido e migração de seus ativistas para o novo partido,
Green Party (RABÓCZKAY, 2004, p. 21).

A primeira experiência partidária ecológica europeia foi o People no Reino Unido. O


partido foi fundado em fevereiro de 1973, em uma reunião com a presença de
aproximadamente cinquenta pessoas. Em 1975, People mudou o nome para Ecology Party,
EP, mas o nome escolhido foi considerado estéril, porque a palavra ecologia tem conceito
demasiadamente científico e “não transmitia compaixão, esperança”, espelhando o
ambientalismo emocional dos verdes britânicos. Assim, em 1985, o partido definiu o nome
Green Party para representar o perfil de sua militância (Rabóczkay, 2004, p. 22). O processo
de criação foi delineando a presença de duas visões de partido: a primeira defendia que a
estrutura organizacional deveria ser descentralizada, com democracia de bases e liderança
coletiva; e, para a segunda, o partido deveria ter uma estrutura centralizada, com liderança
mais efetiva para poder enfrentar disputas eleitorais mais eficazmente (RABÓCZKAY, 2004,
p. 22).

O Partido Verde alemão (Dia Grünnen) é o partido com plataforma ecológica mais
importante no cenário político mundial. Foi fundando em janeiro de 1980 no congresso de
formação, com a presença de 1.004 delegados, na cidade de Karlsruhe. A participação de

33
militantes foi expressiva, principalmente se considerar que cada um representava mais dez
membros do seu lugar de origem (Rabóczkay, 2004, p. 27). Em outubro de 1980, o partido
participou da sua primeira eleição, obtendo apenas 1,5% dos votos, mas mesmo com esse
baixo índice elegeu representantes em diversas cidades (Rabóczkay, 2004, p. 28). Sua
história, com seus conflitos internos, avanços e crises, levou o Partido Verde alemão a se
tornar a terceira força política alemã e a ser convidado a participar do governo Social
Democrata (RABÓCZKAY, 2004, p. 45).

Há também a posição ecocapitalista, a qual assume que o mercado tem a função de


alocar os recursos, porém com a presença do Estado como “guardião ecológico da
sociedade, sendo compatível com o predomínio da grande propriedade oligopólica” (Viola,
1987a; Viola, 1987b, p. 46). Nessa ótica, o “Estado de Bem-Estar Social deverá se
transformar no Estado de Bem-Estar Sócio-Ecológico” (Viola, 1987a; Viola, 1987b, p. 46).
Outra característica desse modelo é o otimismo em relação ao futuro e a crença nas
instituições internacionais de proteção ambiental como o PNUMA, ONU e na
“tecnoburocracia estatal” (Viola, 1987b, p. 46 - 48). Os pensamentos predominantes dessa
corrente são o liberalismo e a socialdemocracia (VIOLA, 1987b, p. 47).

Os ecocapitalistas repousam no Desenvolvimento Sustentável (debatido no item 1.3–


Soluções da Desgovernança global do capítulo 1–Crise Socioambiental: Riscos Assumidos)
e na tecnologia os ajustes necessários para acertar as arestas ambientais e, ao mesmo
tempo, melhorar a rentabilidade das empresas. A preocupação ecocapitalista está inserida
na dinâmica do processo produtivo, pois ele gera dois resultados, o produto desejado e o
resíduo, material para descarte e esse material é a poluição. Para minimizar essa poluição,
os ecocapitalistas apostam na associação de tecnologias, Produção Mais Limpa (P+L), 4Rs
e a Ecoeficiência.

A Produção Mais Limpa foi desenvolvida pelo PNUMA e pela Organização das Nações
Unidas para o Desenvolvimento Industrial. A proposta da P+L é produzir com menos
poluição ao meio ambiente, menos resíduos e menos recursos naturais (Barbieri, 2011, p.
124); sua base é gerir produtos e processos de acordo com a seguinte sequência:
“prevenção, redução, reuso e reciclagem, tratamento com recuperação de materiais e
energia, tratamento e disposição final” (BARBIERI, 2011, p. 126).

Umas das principais ferramentas do Desenvolvimento Sustentável é 4Rs, cuja


finalidade é prevenir a poluição e reduzir a pressão sobre os recursos. O foco dessa
ferramenta, coerente com todo pensamento ecocapitalista, é reduzir a poluição com o
aumento da rentabilidade do Capital e a produtividade da organização: “a prevenção da

34
poluição aumenta a produtividade da empresa, pois a redução de poluentes na fonte
significa recursos poupados, o que permite produzir mais bens e serviços com menos
insumos” (Barbieri, 2011, p. 110). A motivação ecocapitalista para adotar os Rs é a redução
dos custos, melhoria da produtividade e, consequentemente, aumento dos lucros (Barbieri,
2011, p. 110). Os 4Rs são: reduzir, reusar, reciclar e recuperar energia.

Reduzir é a opção prioritária, tem duas frentes: reduzir o consumo de insumos e o


resíduo gerado no fim da produção. Para implementar essa opção, o processo produtivo
deve ser continuamente estruturado para produzir o máximo com o mínimo de matéria prima
(Barbieri, 2011, p. 110). Reusar é, entre outras ações, reaproveitar o resíduo como matéria
prima da produção com reaproveitamento do resíduo de matéria prima, energia pelo calor
dissipado e aumentar a vida útil de embalagens (Barbieri, 2011, p. 111). A Reciclagem é a
utilização dos resíduos de um ciclo produtivo por outro, esse processo envolve nova
transformação do resíduo (Barbieri, 2011, p. 110). Por último, Recuperar energia é utilizar o
material sem possibilidade de reaproveitamento como fonte energética (Barbieri, 2011, p.
1121). Os inevitáveis resíduos da produção são captados, tratados e dispostos com o uso
de técnicas de controle end-of-pipe, para reduzir o impacto da poluição no meio ambiente
(BARBIERI, 2011, p. 110).

A outra tecnologia é a Ecoeficiência, modelo promovido pela OCDE e Business


Council for Sustainable Development, WBCSD. Sua proposta é produzir com preços
competitivos e reduzir progressivamente o impacto ecológico, respeitando a capacidade do
planeta. Nesse caso, a produção deve minimizar a intensidade de energia, dispersão de
material tóxico e, ao mesmo tempo. aumentar o uso sustentável dos recursos renováveis e a
intensidade dos serviços nos seus produtos (Barbieri, 2011, p. 129). A ecoeficiência está
baseada na proposta de que “a redução de materiais e energia por unidade de produto ou
serviço aumenta a competitividade da empresa, ao mesmo tempo em que reduz as
pressões sobre o meio ambiente” (BARBIERI, 2011, P. 129).

Delfim Netto, em entrevista a Ricardo Arnt sobre sustentabilidade, ilustra o


pensamento ecocapitalista. Para esse economista, o capitalismo é uma evolução, fruto de
um processo de seleção biológica (Delfim Netto, 2010, p. 15). Ele tem no mercado o seu
instrumento de alocação de recursos, assim, o Estado não pode assumir a função
produtora, deve sim, dar suporte jurídico para o seu bom funcionamento (DELFIM NETTO,
2010, p. 15).

35
Para Delfim Netto, o capitalismo tem imperfeições, mas é a melhor opção. Esse modo
de produção apresenta como produto muita desigualdade, pois não há como compatibilizar
liberdade, igualdade e eficácia; esses fatores são contraditórios porque a “eficácia exige
alguma hierarquia” (Delfim Netto, 2010, p. 13). Nessa lógica de produção, a sociedade “não
pode escolher simultaneamente o máximo de crescimento e o máximo de distribuição. Há
uma contradição nisso” (DELFIM NETTO, 2010, p. 31).

Outra restrição do capitalismo está relacionada às externalidades dos custos. Delfim


Netto (2010, p. 20) alerta que o mercado tem dificuldade para lidar com as externalidades e
com os bens comuns (recursos que não podem ser apropriados privadamente, mas seu uso
pode ser privatizado), a solução indicada pelo economista é a presença de um Estado forte,
para, via agências adequadas, efetuar o controle. Delfim Netto indica que, em alguns casos,
o teorema de Coase, do economista Ronald Coase, pode ajudar a resolver esse problema;
essa teoria propõe que os envolvidos com externalidades podem negociar “a partir de direito
de propriedade definidos pelo Estado e de incentivos corretos, chegando a acordos em que
os custos das externalidades sejam internalizados nos preços dos bens e serviços” (Delfim
Netto, 2010, p. 20). As consequências socioambientais da externalidade foram debatidas no
Capítulo 1: Crise Socioambiental: Riscos Assumidos.

A poluição está na pauta de debate e reflexão dos ecocapitalistas. Para Delfim Netto,
a poluição é um grande problema, pois além de interferir na temperatura do planeta, encurta
a expectativa de vida da população. Com essa realidade, todos os setores estão cuidando
da poluição, por exemplo: “já não produz aço com a poluição gerada antes. Praticamente
em todos os setores há filtros e tecnologias novas” (Delfim Netto, 2010, p. 12). O novo
desafio é minimizar a emissão de CO2 por unidade de PIB, assim, o modelo matemático do
desenvolvimento econômico, que já previa a maximização do crescimento, melhora da
distribuição de renda, manutenção da liberdade dos agentes e diminuição das
desigualdades regionais, tem o incremento da minimização da relação de CO2 por unidade
de PIB (DELFIM NETTO, 2010, p. 13).

O desequilíbrio entre os recursos naturais limitados e o crescimento contínuo do


produtivismo capitalista também estão na pauta do ecocapitalismo. A solução para o
crescimento infinito não está no controle do mercado e sim, no controle demográfico, para
Delfim Netto, “Não vai ter crescimento infinito. Tudo está ligado à população. Aí voltamos
para o velho Malthus” (DELFIM NETTO, 2010, p. 23).

36
A última corrente ecológica, para Viola, é a opção ecossocialista que propõe uma
ruptura com a sociedade capitalista e a socialista “real”. Para Viola (1987b, p. 46), o
ecossocialismo é herdeiro do “socialismo revolucionário-democrático” de Marx, Rosa
Luxemburgo e Leford-Castoriadis da fase “Socialismo ou Barbárie”. O diferencial político dos
ecossocialistas está na proposta de transformação, com o desenvolvimento da consciência
socialista e ecológica da “classe operária” (Viola, 1987a; Viola, 1987b, p. 47). A corrente
ecossocialista será apresentada no capítulo 3–Ecossocialismo.

A batalha das ideias entre as posições ecológicas envolve pontos de convergências e


antagonismos. Os ecologistas realistas se propõem a desempenhar papel de mediadores e
reguladores de conflitos entre os outros três setores – fundamentalistas, ecocapitalistas e
ecossocialistas – porém as divergências e desconfianças mútuas cerceiam o diálogo entre
as propostas verdes (VIOLA, 1987b, p. 47 - 48).

Os fundamentalistas tendem a condenar os ecossocialistas e ecocapitalistas como


“deturpadores da pureza do movimento”; em contra partida, essas correntes acreditam que
os fundamentalistas são românticos e politicamente ingênuos (Viola, 1987b, p. 47). Ao
mesmo tempo, a crítica severa ao capitalismo aproxima fundamentalistas e ecossocialistas,
mas a grande divergência entre essas correntes está centrada no combate ao
antropocentrismo: enquanto os primeiros recusam o humanismo, a corrente ecossocialista
não aceita as “posições relativistas que põem todas as espécies vivas no mesmo nível. É
realmente necessário considerar que o bacilo de Koch ou o mosquito anófeles têm o mesmo
direito à vida que uma criança tuberculosa ou com malária?” (LÖWY, 2005a, p. 47).

A radicalidade nas propostas de transformação socioambiental é a grande diferença


entre os ecossocialistas e os ecocapitalistas, nesse sentido, os ecossocialistas e
ecocapitalistas travam o embate ambiental na mesma radicalidade das lutas históricas nas
políticas sociais. Os ecossocialistas acusam o ecocapitalismo de ser uma manobra da
classe dominante para manter a atual estrutura desigual e elaboram críticas às agências
estatais do meio ambiente pelo seu isolamento em relação aos demais setores da
tecnoburocracia oficial (VIOLA, 1987b, p. 48).

Para os ecossocialistas, as reformas parciais no capitalismo são insuficientes, sua


proposta é substituir a microracionalidade do lucro por uma racionalidade macrossocial
ecológica, uma verdadeira mudança de civilização. Para construir essa sociedade, a
corrente ecossocialista propõe uma profunda mudança tecnológica que substitua as fontes
de energias atuais por outras, não poluentes e renováveis, como a eólica e a solar. Nesse

37
ponto, essa corrente se diferencia dos realistas e ecocapitalistas, pois acredita que a
tecnologia contribui na transformação socioambiental somente quando está sob o controle
do interesse público, da sociedade e não sob a tirania dos bancos e empresas capitalistas
(LÖWY, 2011, p. 35-36).

Por outro lado, os ecocapitalistas acusam os ecossocialistas de pretenderem


transformar o movimento ecológico em apêndice dos partidos de esquerda (VIOLA, 1987b,
p. 48). As ações políticas ecossocialistas de bloquear ou retardar os projetos necessários ao
crescimento econômico capitalista, motivadas por impacto ambiental, compõem um dos
grandes pontos de conflito entre ecocapitalistas e ecossocialistas:

O socialismo verde é pior que o socialismo vermelho. As contradições


são do mesmo tipo. Mas a virulência dos ataques, contra
hidrelétricas, por exemplo, produz tanta bobagem que o mercado
acaba produzindo energia com petróleo, com gás ou atômica, que
são menos limpas e mais poluidoras. As extravagâncias de alguns
movimentos ambientalistas produzem caricaturas (DELFIM NETTO,
2010, p. 18).

Essa divergência é confirmada pela proposta ecossocialista de se opor radicalmente


aos grandes projetos, sob sua ótica, inúteis, pois envolvem degradação ao meio ambiente,
agravamento da desigualdade social e não melhoram as condições de vida da população
(MÜNSTER, 2013, p. 156-157).

Outra frente de debate ecológico é o embate entre ecossocialistas e realistas. Para os


primeiros, as críticas dos ecologistas políticos verdes ao produtivismo são relevantes, mas
os realistas não questionam a economia de mercado (Löwy, 2011, p. 52). Além disso, o
pensamento ecossocialista considera inviável uma ecologização progressiva do capitalismo
e do socialismo “real”, pois essa corrente não acredita que seja possível eliminar o
produtivismo da lógica capitalista, nem retirar a concorrência feroz e a expansão de
mercado da dinâmica vital do capitalismo. No ponto de vista ecossocialista, é impossível e
inimaginável haver um modelo alternativo de desenvolvimento no modelo capitalista de
produção que seja ambientalmente responsável e socialmente justo (Löwy, 2012a, p.12),
pois a essência do capitalismo é o produtivismo e expansão ilimitada, e esses processos
são os fatos geradores do esgotamento da Natureza e, ao mesmo tempo, da própria
humanidade. Nessa dinâmica, os realistas ficam restritos a soluções para ajustar excessos
do capitalismo, limitando a propostas de reforma ecológicas na economia de mercado, sem
agir na raiz da crise socioambiental (LÖWY, 2009b, p. 36).

38
Para a corrente ecossocialista, a questão não é optar entre capitalistas maus ecocidas
ou bons capitalistas verdes, em ambos os casos, são condutores de um sistema destrutivo.
A energia vital do capitalismo é proporcionada pela competição agressiva, a busca de lucros
rápidos e aumento contínuo de rentabilidade, essa dinâmica destrói o equilíbrio natural. A
crítica de Löwy (2011, p. 35) é que capitalismo verde é uma manobra publicitária, uma
etiqueta que visa vender a mercadoria, ou, no melhor dos casos, uma iniciativa local
equivalente a uma gota de água sob o sol árido do deserto capitalista:

Il ne s’agit pas d’opposer les « mauvais » capitalistes écocides aux «


bons » capitalistes verts : c’est système lui-même, fondé sur
l’impitoyable compétition, les exigences de rentabilité, la course au
profit rapide, qui est destructeur des équilibres naturels. Le prétendu
capitalisme vert n’est qu’une manouvre publicitaire, une étiquette
visant à vendre une marchandise, ou, dans le meilleur des cas, une
initiative locale équivalant à une goutte d’eau sur le sol aride du désert
capitaliste (LÖWY, 2011, p. 35).

Para os ecossocialistas, os partidos verdes europeus – francês, alemão, italiano e


belga – representam a política ecológica reformista, cuja ausência de uma postura
anticapitalista coerente levou cada um deles “a tornar-se simples parceiro “ecorreformista”
da gestão social-liberal do capitalismo pelos governos de centro-esquerda” (LÖWY, 2010, p.
36). Para os ecossocialistas, a crise socioambiental será superada com transformações
sociais radicais, pois a raiz da crise socioambiental é a acumulação continua e ilimitada do
capital, como já dito na tese (capítulo 1–Crise Socioambiental: Riscos Assumidos): o planeta
está sendo dilapidado em benefício de poucos (LOPES, 2010, p. 15).

Em contrapartida, as críticas dos ecologistas realistas em relação aos ecossocialistas


também são severas. Para os realistas, o método de interpretação e ação ecossocialista é
ao mesmo tempo ineficiente e ultrapassado. Tibor Rabóczkay, do Partido Verde brasileiro,
apresenta diversas passagens do livro Repensando o Partido Verde Brasileiro (2004), que
ilustram as diferentes formas de fazer politica socioecológica entre os ecologistas realistas e
os ecossocialistas. Uma divergência é a forma de envolver os trabalhadores na política
ecológica: para Rabóczkay, a classe trabalhadora deve despertar-se para a realidade que
os verdes são seus aliados, pois sua proposta envolve qualidade de vida, além do bem estar
e segurança material; proposição melhor que a dos socialistas, já que esses proporcionaram
melhoria de vida apenas aos países muito atrasados com grandes prejuízos ambientais
(Rabóczkay, 2004, p. 63), principalmente porque o marxismo não consegue explicar porque
a poluição tende a ser mais grave nos países socialistas (RABÓCZKAY, 2004, p. 64).

39
Por outro lado, Rabóczkay defende que o Partido Verde, por seu caráter democrático,
deve “acomodar os ecossocialistas, ao lado dos ecocapitalistas”, pois o debate na
diversidade é a fonte da riqueza ideológica verde. Porém seu posicionamento não é tão
democrático como afirma, pois para ele “a ideologia ecologista é que deve ser a referência
para o socialismo e não o socialismo para o pensamento verde”, o argumento do autor para
essa afirmação é que “assim como não há o porquê recorrer à teoria de Ptolomeu para
entender o sistema solar, pode-se esquecer Marx com tranquilidade” (Rabóczkay, 2004, p.
105). Assim, para o autor, o marxismo não tem contribuição no debate ecológico, e sim,
busca a ecologia para sobreviver:

há conflito entre as diversas opções verdes, sobretudo o esforço dos


marxistas em se apoderarem do movimento ambientalista. Embora
eles argumentem que marxismo contribua para o embasamento da
ideologia do ambientalismo, a mim parece o oposto, a adesão dos
marxistas reflete a ânsia de dar uma sobrevida a essa ideologia do
século XIX – não sei, porém, se o fazem conscientemente ou se
enganam a si mesmos (RABÓCZKAY, 2004, p. 49).

Rabóczkay defende que o “o marxismo é pré-darwiniano assim, não trabalha com as


ideias evolucionárias” (Rabóczkay, 2004, p. 70) e, “consequentemente, ineficiente para
interpretar os fenômenos humanos” (Rabóczkay, 2004, p. 134). Nesse contexto, o autor
defende que o desapontamento dos ambientalistas do PT confirma a inviabilidade do
ecossocialismo ou ecomarxismo, mas sem surpresa porque “marxismo parte de premissas
outras, em direção a objetivos outros que os dos ecologistas. Tentar atribuir a Marx e Engels
preocupações ecológicas, como nós a entendemos hoje, é um exercício tão fútil”
(RABÓCZKAY, 2004, p. 127).

Mas as críticas dos realistas, representados por Rabóczkay, ao ecomarxismo não se


sustentam. As obras dos ecomarxistas Michael Löwy e John Bellamy Foster apresentam
contribuições importantes para melhor compreender as dimensões e limitações ecológicas
na produção marxiana e consequentemente, discernir os erros teóricos nas críticas de
Rabóczkay.

O enquadramento do movimento verde em quatro posições ajuda a compreender o


debate socioambiental, mas tem limites e não consegue esgotar todas as correntes e
pensamentos ecológicos. Há outras interpretações e propostas que complementam e são
complementadas pelo enquadramento de Viola. Entre as propostas, o Ecologismo dos
Pobres de Alier, Decrescimento e Buen Vivir têm contribuições relevantes.

40
2.2 Proposta de Alier

Alier apresenta outra proposta de enquadramento do movimento ecológico. Para ele, a


ecologia política tem três correntes principais: “Culto à vida silvestre”; o “Evangelho da
ecoeficiência” e a “Justiça Ambiental” ou “Ecologismo dos Pobres” (ALIER, 2009, p. 21).

A primeira corrente, Culto à vida silvestre, é semelhante a posição ecologia profunda


ou ecologistas fundamentalistas apresentada por Viola. Essa corrente não combate o
crescimento econômico, pois assume que não é possível reverter esse processo
hegemônico, sua proposta é resgatar o encantamento da humanidade pela Natureza, isto é,
“o culto pelo silvestre”, que surge do “amor às belas paisagens e de valores profundos,
jamais para os interesses materiais” (Alier, 2009, p. 22). Sua base teórica é a biologia da
conservação, e o índice estudado para avaliar o impacto da ação humana no meio ambiente
é o AHPPL, Apropriação Humana da Produção Primária Líquida da biomassa, e seus
resultados apontam que “uma proporção cada vez menor de biomassa está disponível para
espécies que não sejam a humana ou associadas aos humanos” (ALIER, 2009, p. 23).

Além da biologia da conservação, a corrente Culto à vida Silvestre propaga o instinto


“biofilia” humana, isto é, o amor à natureza, esse sentimento leva a humanidade a assumir
que a natureza deve ser preservada e a reconhecer que as demais espécies possuem o
direito à vida, assim, a humanidade não tem o direito de eliminá-las (Alier, 2009, p. 23). O
resgate do sagrado provoca a associação teórica e prática com a espiritualidade de seus
ativistas. Nesse caso, a corrente incorpora o panteísmo e as religiões orientais, por serem
menos antropocêntricas que as religiões ocidentais, a exceção é São Francisco de Assis,
pois ele tinha preocupação com os pobres e animais (Alier, 2009, p. 23). Mas a principal
proposta política é a mudança cultural da sociedade ao assumir a ética do maior apreço pela
Natureza (ALIER, 2009, p. 25).

A proposta política priorizada pela corrente Culto à vida Silvestre é a manutenção das
reservas naturais, parques nacionais ou naturais, livres da ação degradadora da
humanidade, elas poderiam ser visitadas pela população, mas nunca seriam habitadas por
humanos (Alier, 2009, 24). A preservação da vida silvestre envolve a manutenção da
biodiversidade e a proposta dessa corrente para analisar e propor mudanças para a perda
da biodiversidade é a AHPPL. Esse índice seria usado como base de metas nos níveis
mundiais e nacionais para redução da apropriação humana das reservas naturais atuais, na
mesma relevância dos atuais índices de cotas para emissões de clorofluorcarbono, dióxido
de enxofre ou limite de pesca de algumas espécies (Alier, 2009, p. 24). Nesse sentido,

41
houve a contribuição da ONG Amigos da Terra da Holanda sobre a utilização dos recursos
ambientais da Holanda nos início da década de 1990 (ALIER, 2009, p. 26).

Suas propostas são apoiadas por algumas organizações importantes do movimento


ambientalista mundial como WWF – Worldwide Fundo of Nature, IUCN – International Union
for the Conservation of Nature e Nature Conservancy (Alier, 2009, p. 24) e estão ativas nas
campanhas de preservação no hemisfério norte, África e América Latina. Entre algumas
vitórias dessas propostas estão a reintrodução dos lobos no Parque de Yellowstone e a
recuperação dos pântanos de Everglades (ALIER, 2009, p. 24).

A segunda corrente, “Evangelho da ecoeficiência”, é semelhante a posição


ecocapitalista exposta por Viola. Essa corrente defende o crescimento econômico, mas
limitado a “boa utilização” dos recursos e às condições previstas pelo Desenvolvimento
Sustentável (Alier, 2009, p. 26). Outro ponto que difere das demais correntes é que
considera a Natureza como “recursos naturais”, “capital natural” ou “serviços ambientais”.
Há total perda do sentido do sagrado, assim, para os adeptos do Evangelho da
ecoeficiência, os animais “não possuem direito indiscutível à vida” (ALIER, 2009, p. 27).

Alier “batizou” essa corrente em “homenagem” à descrição de Samuel Hays sobre


“Movimento Progressista pela Conservação” que atuou nos Estados Unidos entre os anos
1890 e 1920: “enquanto um “evangelho da eficiência””. Essa corrente cresceu e hoje é
hegemônica nos debates socioambientais nos Estados Unidos (Alier, 2009, p. 27) com apoio
da fundamentação científica da economia ambiental, através da busca do preço correto pela
“internalização das externalidades” e da ecologia industrial que investiga o impacto
ecológico do “metabolismo industrial” (ALIER, 2009, p. 28).

As teorias que sustentam essa corrente são: pensamento das “Curvas Ambientais de
Kuznets”, Figura 4, cuja proposta é que os investimentos e a tecnologia produzem, no
primeiro momento, aumento do impacto ambiental, mas após atingir o ápice de impacto,
essa tendência se torna cada vez mais decrescente (Alier, 2009, p. 27), sendo que a curva
de impacto tem o formato de “U” invertido, conforme figura abaixo; “desenvolvimento
sustentável” que defende o crescimento econômico “win-win”, isto é, crescer com soluções
de ganhos econômicos e ganhos ecológicos; por último, a “modernização ecológica” que
envolve dois vetores: o econômico baseado nos ecoimpostos e mercados de licenças de
emissões, e o segundo, tecnológico, cuja base é o investimento em soluções técnicas para
a redução de uso de energia e matéria-prima nos processos produtivos e pelas famílias
(ALIER, 2009, p. 28).

42
Figura 4 – Curvas Ambientais de Kuznets

Fonte: Alves, 2014.

A contribuição da Ecoeficiência repousa nas melhorias do “vínculo empresarial com o


desenvolvimento sustentável”. Além da “limpeza verde”, a “ecoeficiência” colabora com a
melhor compreensão sobre o consumo de matéria-prima e energia na economia e as
possibilidades de desvincular o crescimento econômico de sua base material (Alier, 2009, p.
28), o que envolve o debate sobre a desmaterialização da economia e seu reflexo no cálculo
do PIB (ALIER, 2009, p. 28).

As duas correntes, “Culto ao silvestre” e “Ecoeficientes”, apesar de suas diferenças,


estão unidas na crença de que as inovações tecnológicas produzem a desmaterialização da
economia (pela virtualização, por exemplo), essas, aliadas à produção ecoeficiente,
reduzem a necessidade de expansão da exploração dos recursos naturais, permitindo
assim, preservar a Natureza que ainda está fora do ciclo econômico (Alier, 2009, p.33).
Porém há uma armadilha nessa crença, pois há projetos envolvendo essas correntes com
impactos socioambiental questionáveis, como por exemplo: o projeto de plantio de eucalipto
em várias regiões do mundo, com a associação entre a Shell e a WWF, nesse caso, o
argumento é “isso diminuirá a pressão sobre os bosques naturais e, presumivelmente,
promoverá também o aumento da absorção do carbono” (Alier, 2009, p. 33); e outro
exemplo, a defesa “pró-nuclear”, de algumas instituições ambientais, para solução
energética.

A corrente Ecologismo dos Pobres ou Justiça Ambiental é a corrente ecológica mais


radical nas suas análises e ações socioambientais. O Ecologismo dos Pobres é também
chamado de Ecologismo popular, Ecologismo da livelihood (do sustento, da sobrevivência
humana) e ecologia da libertação (Alier, 2009, p. 33). Nos Estados Unidos, a corrente justiça
ambiental está associada ao movimento social contra o racismo ambiental e tem forte

43
vínculo com a militância dos direitos civis de Martin Luther King da década de 1960 (Alier,
2009, p. 35). A denominação Ecologismo dos pobres está associada aos movimentos do
Terceiro Mundo que buscam reduzir e reverter os impactos socioambientais que ameaçam
as condições de sobrevivência dos pobres. O Ecologismo dos pobres pode ser
exemplificado pelos “movimentos de base camponesa cujos campos ou terras voltadas para
pastos têm sido destruídos pela mineração ou por pedreiras; movimentos de pescadores
artesanais contra os barcos de alta tecnologia ou outras formas de pesca industrial” (ALIER,
2009, p. 35).

Ecologismo dos Pobres foi identificado a partir de 1985, inicialmente como “agrarismo
ecologista” que era a resistência dos movimentos camponeses associada a crítica ecológica
no enfretamento à modernização agrícola (Alier, 2009, p. 37). A dificuldade de identificar
essa corrente como socioambiental é que em muitos casos, seus envolvidos não utilizam
um discurso explicitamente ambientalista (ALIER, 2009, p. 39).

Uma divergência dessa corrente com os Ecoeficientes é a defesa que o crescimento


sempre implica no aumento do impacto ambiental, principalmente pelo descarte de resíduos
e pelo deslocamento geográfico dos recursos entre os países, que ocorrem envolvendo,
principalmente, petróleo, gás, alumínio, cobre, eucalipto, etc. (ALIER, 2009, p. 34).

Outra divergência é a crença na tecnologia como solução da crise socioambiental, pois


para a Ecologia dos Pobres, as inovações tecnológicas não garantem a solução dos
conflitos de justiça ambiental. Sementes transgênicas e energia nuclear com seus resíduos
radioativos são exemplos de tecnologias indesejadas pela Ecologia dos Pobres. A
tecnologia defendida por essa corrente deve ser transformadora e deve ser criada pela
ciência participativa ou pela “epidemiologia popular”, isto é, combinação entre a ciência
formal e a informação. No Brasil, essa associação fundamenta a agroecologia tradicional de
grupos camponeses e indígenas como fruto do diálogo dos saberes (ALIER, 2009, p. 36).

O risco do “efeito Jevons” também é apontado pelo Ecologismo dos Pobres como
consequência na aposta da tecnologia como solução de todos os problemas. Stanley
Jevons no seu livro The Coal Question (1865) mostrou que a crescente eficiência na
produção de energia reduzia a demanda por carvão na unidade produzida, porém o
paradoxo era que essa economia por unidade provocava aumento na demanda de energia,
aumentando a pressão por mais carvão, assim, esse paradoxo é conhecido por efeito
Jevons (Cechin, 2012). Aplicando esse conceito, a corrente Ecologismo dos Pobres alerta
que as novas tecnologias não são necessariamente uma solução para a divergência entre a
economia e o meio ambiente, mas sim riscos (ALIER, 2009, p. 36).

44
Ecologismo dos Pobres se distingue do “Culto ao silvestre” por não reverenciar a
natureza como sagrado e sim, como agente de sobrevivência e subsistência humana. A
ética do Ecologismo dos Pobres se distingue dos fundamentos do Culto ao Silvestre ao
assumir a orientação ética da justiça social entre os humanos; para Alier (2009, 34): “tanto
como um fator positivo quanto uma debilidade”. O relato de José Augusto Pádua do diálogo
com um amigo, militante do IBASE, ilustra a tensão e confluência entre essas correntes:
Eu dizia para ele que “não preciso de justificativa para defender as
baleias. Não acho que seja necessário ter uma justificativa utilitária
para defender as baleias. Não é porque o óleo vai servir para alguma
coisa no futuro – mas porque a baleia é uma maravilha da Terra, é
uma maravilha da vida. Não existe argumento utilitário maior do que
este”. Esse meu amigo “ambientalista do desenvolvimento social”,
disse: “Para mim, não. Não tenho nenhum compromisso especial com
a defesa das baleias. Se as baleias desaparecessem, isto para mim
não traria grandes problemas de consciência. A minha preocupação é
com os pescadores, sua vulnerabilidade a essas práticas predatórias,
o recurso pesqueiro; como ficará a situação dos pescadores se esse
recurso acabar”. Depois ele diz: “no entanto, somos aliados na
maioria das lutas concretas” (PÁDUA, 1995, p. 19 – 20).

Importante ressaltar que a finalidade do Ecologismo dos Pobres está na qualidade de


vida socioambiental dos estratos oprimidos. Para Alier, o Ecologismo dos Pobres luta contra
as ameaças socioambientais aos pobres (Alier, 2009, p. 35). Essa luta é constituída por
várias frentes como, por exemplo: movimentos camponeses que enfrentam os campos e
pastagens destruídos pela mineração; pescadores artesanais contra os barcos de alta
tecnologia ou outras formas de pesca industrial que esgotam o pescado; comunidades
afetadas pela contaminação do ar pelas minas e fábricas (Alier, 2009, p. 35).

Ecologismo dos Pobres envolve diversas frentes teóricas e políticas. Sua proximidade
com a relação da questão agrária e a pobreza atraiu militantes da agroecologia, da
etnoecologia e da ecologia política (Alier, 2009, p. 35-36). Essa corrente cresce na medida
em que aumentam os conflitos socioambientais no planeta, devido ao aumento da
deterioração das condições de sobrevivência dos setores mais humildes por causa da
degradação ambiental (ALIER, 2009, p. 36).

Alier (2009, p. 39) alerta que “uma mesma organização pode pertencer a mais de um
destes tipos”. Greenpeace é um dos exemplos de instituição que flui entre as três correntes
quando: atua ativamente na Convenção de Basileia, que proíbe a exportação de resíduos
tóxicos para África e outros países; trabalha junto a moradores urbanos pobres contra os

45
riscos tóxicos dos incineradores; apoia as comunidades dos mangues; promove a
ecoeficiência de refrigerador alemão por não usar CFC e ter maior eficiência no uso de
energia (ALIER, 2009, p. 39).

Além dessas interpretações, há também o movimento Decrescimento que dialoga com


diversos segmentos ecológicos.

46
2.3 Decrescimento

O “Decrescimento” é um movimento socioambiental que dialoga com diversas fontes


de pensamento, sua radicalidade nas críticas e nas propostas o aproxima dos
ecossocialistas. Para Latouche (2009, p. 131), o “decrescimento pode ser considerado um
“ecossocialismo”, sobretudo se por socialismo se entender, com Gorz”: uma proposta
concreta para enfrentar a desintegração das relações sociais, provocada pelas relações
mercantis e pela concorrência, ambas inerentes ao capitalismo. A proposta do
Decrescimento é construir a nova sociedade gradativamente, conforme o espírito capitalista
da sociedade dominada pelo dinheiro for eliminado. Essa transformação prevê etapas de
transição entre sociedades, com apoio dos partidários do decrescimento aos
altermundialista e a economia solidária. Nessa transição, o Decrescimento está em sintonia
com diversos referenciais como a ecologia social de Murray Bookchin, a ecologia profunda
de Arne Naess, a hipótese de Gaia de James Lovelock, o powerdown de Richard Heinerg, o
downshifting estadunidense, transition towns de Rop Hopkins, as zonas autônomas dos
Chiapas, as experiências dos indígenas (LATOUCHE, 2012, P. 53).

A corrente do decrescimento tem participação ativa na política francesa. Ela é


inspirada nas críticas sobre a sociedade de consumo (dos autores Henri Lefebvre, Guy
Debord e Jean Baudrillard) e da supervalorização da tecnologia (de Jacques Ellul). Mas
Decrescimento não é uma corrente homogênea, há duas formas de pensamento que se
destacam nessa corrente: o antiocidentalíssimo de Sérgio Latouche e a ecologia republicana
de Vicent Cheynet e Paul Ariès (LÖWY, 2011, p. 15).

A corrente do Decrescimento representada por Cheynet e Ariès, apesar de algumas


controvérsias, se aproxima do pensamento ecossocialista dos partidos franceses Parti de
Gauche e Nouveau Parti Anticapitaliste, e da antiglobalização do Attac. Essa aproximação
se deve, principalmente, pelas críticas dessa corrente ao predomínio do valor de troca sobre
o valor de uso e pelas propostas de redução do tempo de trabalho e desigualdade social e
aumento de atividades não comerciais, orientadas pelas necessidades sociais e proteção
ambiental (LÖWY, 2011, p. 16).

O representante mais controverso do Decrescimento é Serge Latouche. Por um lado,


sua crítica à religião do crescimento e progresso e ao desenvolvimento sustentável é
interessante. Por outro lado, sua restrição à cultura ocidental e à democracia representativa
e a falta de uma análise mais profunda sobre o capitalismo, ao ficar restrito às críticas ao

47
capitalismo de Marx e capitalismo destruidor do meio ambiente de Gorz, o afasta do
pensamento ecossocialista (LÖWY, 2011, p. 15-16).

Para Latouche, a palavra decrescimento “é um slogan político com implicações


teóricas, uma “palavra-obus” como diz Paul Ariès, que visa acabar com o jargão
politicamente correto dos drogados do produtivismo” (Latouche, 2009, p. 4). A proposta do
Decrescimento não é o crescimento negativo, e sim, refutar o crescimento ilimitado com o
objetivo de atender a necessidade ilimitada de lucro do Capital, com consequências
nefastas para a Natureza e, consequentemente, para a humanidade (Latouche, 2009, p. 4).
Latouche cita o alerta do ativista e economista Kenneth Boulding: “quem acredita que um
crescimento infinito é possível em um mundo finito, ou é louco ou é economista” (Latouche,
2009, p. 16). O risco apontado por essa corrente é que a Natureza não consegue
transformar os resíduos em novos recursos na mesma velocidade da produção humana de
resíduos, essa dinâmica pode ser traduzida nos números da nossa pegada ecológica, pois
temos apenas um planeta com espaço finito e capacidade finita de absorver as nossas
consequências indesejadas da produção (LATOUCHE, 2009, p. 27).

Rosa Luxemburgo é lembrada também pelos defensores do Decrescimento:


“decrescimento ou barbárie!” (Latouche, 2009, p. 5), pois para eles, o vício de crescimento
econômico da sociedade atual está causando distorções socioambientais. Como por
exemplo, a queda do crescimento projetado pelo Capital gera perda da qualidade de vida da
população, com o aumento de taxas de desemprego, abandono de programas sociais,
sanitários, educacionais e ambientais. Assim, a proposta é construir outra lógica de
sociedade, uma sociedade com a cultura do “a-crescimento”, isto é, a troca da crença do
progresso e culto ao crescimento pelo crescimento pela meta de uma vida melhor, com a
população trabalhando menos e consumindo menos, resgatando a proposta de André Gorz
da “racionalização ecológica”, contida na sua obra Capitalisme, socialisme, écologie, que a
“modernização ecológica exige que o investimento deixe de estar a serviço do crescimento e
passe a servir ao decrescimento da economia”, no sentido de ruptura do modelo de
acumulação do capital e redução do consumo com autolimitação (LATOUCHE, 2009, p. 5-
6).

48
O Decrescimento debate a equação de Ehrlich, I=PAT, onde: I é o impacto ambiental;
P é o tamanho da população; A representa o consumo ou afluência; e T, a tecnologia. Mas o
foco de sua crítica está na variável A, consumo. Os decrescentistas não negam a
importância da variável Tecnologia, sua estratégia de reciclagem e ecoeficiência, mas não
creditam à melhoria dessa variável a salvação para o impacto do crescimento ilimitado,
assim, a tecnologia deve estar associada à libertação da “gaiola do consumismo” para ter
eficácia (BOCCATO-FRANCO, 2013).

Para o pensamento do Decrescimento, reduzir o impacto da variável população é uma


falsa solução. Latouche aponta o uso político do debate do controle populacional, pois a
redução quantitativa da população dos países pobres permite o melhor controle dos EUA ao
acesso à suas riquezas naturais. O memorando Incidência do crescimento da população
mundial sobre a segurança dos Estados Unidos e sobre seus interesses ultramarinos de 10
de dezembro de 1974 escrito por Henry Kissinger ilustra essa “preocupação” com a pressão
populacional:

Para perpetuar a hegemonia americana no mundo e garantir aos


americanos um livre acesso aos minerais estratégicos de todo o
planeta, é necessário conter ou até reduzir a população dos treze
países do Terceiro mundo ... cujo peso demográfico por si só já os
condena, por assim dizer, a desempenhar um papel de primeiro plano
em política internacional (LATOUCHE, 2009, p. 31)

O debate sobre o controle populacional pode ter propostas bem mais radicais, como a
de William Vogt que, nos anos 1950, defendia uma redução drástica da população com uma
“guerra bacteriológica de grandes proporções”, energicamente conduzida para devolver à
terra suas florestas e suas pastagens (Latouche, 2009, p. 31-32). A redução demográfica,
nesse debate, fica restrita aos países pobres do Sul. Mas para o Decrescimento, a questão
não está na quantidade de pessoas no planeta, mas na capacidade de dividir os recursos
com honestidade e equidade (LATOUCHE, 2009, p. 35).

Para o Decrescimento, o eixo central para a saída da crise socioambiental é a variável


A, expressada pelo consumismo. Para Latouche (2009, p. 17), a sociedade do consumo
depende de três ingredientes para a sua “ronda diabólica”: publicidade, crédito e a
obsolescência acelerada ou programada. Os ingredientes publicidade e obsolescência estão
debatidos no capítulo 1–Crise Socioambiental: Riscos Assumidos. O ingrediente “crédito”
está inserido na forma do uso do dinheiro e sua disponibilidade para a população que,

49
inicialmente, não o teria para consumir. O problema socioambiental é a falta de
responsabilidade, pelos agentes de crédito, das consequências sociais do endividamento.
(LATOUCHE, 2009, p. 20).

Para o Decrescimento, a sociedade almejada deve ser, ao mesmo tempo, equitativa e


equilibrada ambientalmente. Para atingir essa sociedade é necessário articular oito
mudanças interdependentes que se reforçam mutuamente. Podemos sintetizar o conjunto
delas num “círculo virtuoso” de oito “erres”: reavaliar, reconceituar, reestruturar, redistribuir,
relocalizar, reduzir, reutilizar, reciclar (Latouche, 2009, p. 42), enfim, “substituir a atitude do
predador pelo do jardineiro” (Latouche, 2009, p. 45). Esses oito Rs são igualmente
relevantes, mas há três estratégicos: reavaliação, redução e relocalizar. Os “Rs” do
Decrescimento são:

 Reavaliar: é romper com os “velhos valores “burgueses”” que orientam uma sociedade
baseada na busca de riqueza monetária e o individualismo (Latouche, 2009, p. 43) e
construir a troca de valores, enfim, substituir o dinheiro como fim e do individualismo como
forma de vida pela cooperação, solidariedade, o prazer do lazer, senso de justiça,
democracia (Latouche, 2009, p. 44). Sua relevância estratégica é que a reavaliação “preside
a toda mudança” (Latouche, 2009, p. 58), afinal a sociedade deve assumir valores como
altruísmo, convivialidade, respeito a natureza entre outros para possibilitar o diálogo entre as
diversas culturas (LATOUCHE, 2009, p. 147);

 Reduzir: é minimizar o impacto da produção e consumo na biosfera. A nova


racionalidade deve eliminar qualquer forma de desperdício de recursos, seja provocado pela
obsolescência programada, consumismo ostentatório ou qualquer outro desperdício de
recursos naturais (Latouche, 2009, p. 49). Outra redução defendida é o tempo de trabalho,
inclusive como forma de combate ao desemprego. Além do desemprego, a redução envolve
também o novo uso do tempo profissional para enfrentar crises de setores econômicos e
desenvolvimento de novas aptidões, esse novo tempo deve prever o deslocamento do
trabalhador de uma função para outra; o exemplo de Latouche (2009, p. 53) para essa
dinâmica foi a possibilidade de uma pessoa que trabalha com montagem industrial de
aparelhos de televisão poder se dedicar à outra atividade, motivada por crise do setor ou
desenvolvimento de outras aptidões (agrícola, jardim comercial ou cuidado de saúde, prática
de esporte para crianças ...). O desafio para construção desse novo “tempo” é desintoxicar o
vício do trabalho, do produtivismo e resgatar o prazo do uso do tempo para a satisfação
pessoal: “o prazer de cumprir seu dever de cidadão, o prazer das atividades de fabricação
livre, artísticas ou artesanal, a sensação do tempo recuperado para a brincadeira, a
contemplação, a meditação, a conversação, ou até, simplesmente, para a alegria de estar

50
vivo” (Latouche, 2009, p. 54). Reduzir tem papel estratégico porque “condensa todos os
imperativos práticos do Decrescimento” (LATOUCHE, 2009, p. 58);

 Relocalizar: é priorizar a produção local, principalmente os produtos de necessidade


da população, fornecida por empresas locais e financiada pela poupança acumulada
localmente. Há o empoderamento local das decisões econômicas, políticas e culturais. O
fluxo comercial externo deve ficar restrito apenas ao indispensável (Latouche, 2009, p. 49).
Pelo fato de impactar diretamente a vida e emprego de milhões de pessoas, essa mudança
é também estratégica para o Decrescimento (LATOUCHE, 2009, p. 58);

 Reconceituar: a partir da troca de valores, a humanidade pode assumir outra forma de


enxergar o mundo, “de apreender a realidade”. Os conceitos “riqueza x pobreza”, “escassez
x abundância”, alicerces da atual economia, devem ser questionados e reconceituados, para
a sociedade romper com a transformação da abundância da Natureza em escassez pelos
donos do capital pela apropriação de bens comuns com imposição de suas etiquetas,
marcas e valor de pedágio para posterior mercantilização. A escassez alarmada pelos
agentes econômicos torna-se uma profecia autorealizada, construída artificialmente pelo
controle dos recursos pelo Capital (LATOUCHE, 2009, p. 46);

 Reestruturar: é adaptar o aparelho produtivo às novas necessidades provocadas pela


mudança de valores, engendrados pelo primeiro R, Reavaliar. A nova estrutura produtiva
deve assumir a orientação do Decrescimento, e essa troca de paradigma é incompatível
com o atual modo produtivo hegemônico, assim, a saída do capitalismo se impõe como
orientação da construção de outro modo de produção e novos aparelhos produtivos
(LATOUCHE, 2009, p. 46).

 Redistribuir: é reestruturar as relações sociais existentes com a distribuição da riqueza


e democracia ao acesso ao patrimônio natural, seja entre países Norte e Sul ou entre
indivíduos dentro de cada sociedade. A redução do consumo projetado pela redistribuição
será provocada pela queda do poder dos “grandes predadores” das grandes oligarquias
mundiais e pela eliminação da promoção do consumismo (Latouche, 2009, p. 47). A
redistribuição envolve a democratização do acesso dos recursos naturais entre os países do
Sul e Norte. A redução da pegada ecológica dos países do Norte permite o aumento da
pegada ecológica do Sul, isto é, mais acesso ao consumo e ao conforto (LATOUCHE, 2012,
p. 50).

 Reutilizar / reciclar: Essas mudanças, também relacionadas como uma das


tecnologias de gestão relacionada pelo ecocapitalismo, são os Rs da Sustentabilidade. O

51
exemplo de Latouche foi a experiência do programa da Xerox para receber as máquinas
sem uso e devolvidas e reutilizar as peças na fabricação de novas máquinas (LATOUCHE,
2009, p. 55).

As transformações socioecológicas propostas pelo Decrescimento tem nas mudanças


locais seu projeto político, por isso a mudança da Relocalizar tem papel central na utopia
concreta e “se expressa imediatamente em programa político” (Latouche, 2009, p. 58). O
ecomunicipalismo de Murray Bookchin é uma das fontes teóricas da mudança Relocalização
com a construção de uma sociedade ecológica constituída por “pequenas municipalidades”,
estruturadas em pequenas comunas, em harmonia com seu ecossistema (Latouche, 2009,
p. 59). Aplicando o ecomunicipalismo nos grandes centros, os bairros ganham importância
como comunas justapostas (Latouche, 2009, p. 61). Uma ação concreta proposta pelo
Decrescimento é impor às cantinas e restaurantes públicos que utilizem apenas produção
dos pequenos produtores da agricultura orgânica (Latouche, 2009, p. 69). Esta e outras
propostas estão inseridas na proposta “substituir a OMC pela OML (Organização Mundial
pela Localização), tendo por slogan “Proteger o local globalmente”” (Latouche, 2009, p. 71).

A proposta do Decrescimento é uma proposta anticapitalista. Para Latouche (2009, p.


127), o capitalismo e o socialismo produtivista são duas variações do mesmo projeto de
sociedade do crescimento. O crescimento indefinido é o motor essencial do capitalismo,
essa expansão ilimitada “não pode não destruir o planeta, assim como destrói a sociedade e
tudo que for coletivo” (Latouche, 2009, p. 130). Nessa perspectiva, o Decrescimento e o
ecossocialismo se aproximam.

A importância do Decrescimento para o debate socioambiental foi ressaltada por


Stéphane Lavignette no seu livro La décroissance est-ele souhaitable?, pois para o autor a
combinação politica das correntes, com suas inevitáveis divergências, que buscam uma
mudança cultural radical para romper com o capitalismo e o produtivismo é necessária para
sair do atual sistema desumano (LÖWY, 2011, p. 17).

O Decrescimento no Brasil ainda está na fase inicial. No país, apenas um livro


específico sobre o pensamento Decrescimento foi publicado: Pequeno Tratado do
Decrescimento Sereno de Serge Latouche (Boccato-Franco, 2012, p. 276), mas há alguns
trabalhos acadêmicos de mestrado e doutorado sobre o tema, além de reportagens e blogs.
O espaço de debate sobre Decrescimento mais participativo no Brasil é o grupo virtual
(Yahoo Grupos) que contava com 106 associados em 2011 (Boccato-Franco, 2012, p. 280).
Para Boccato-Franco (2012, p. 283), o debate sobre Decrescimento no Brasil ainda é
“incipiente e pontual”.

52
2.4 Buen Vivir

Buen Vivir é uma proposta latina americana à crise socioambiental. As suas


motivações são: crítica ao desenvolvimento desigual entre os países (Norte x Sul) e
construção de uma nova forma de desenvolvimento humano, socialmente justo e em
harmonia com a Natureza. Essa é uma alternativa à política dos países desenvolvidos que
exploram o povo e a natureza dos países não desenvolvidos, seu fundamento resgata
tradições indígenas, assumindo que a verdadeira fonte de qualidade de vida está na
integração social em comunidade. Nesse caso, a comunidade é entendida em um sentido
mais amplo, pois inclui a Natureza (GUDYNAS, 2011b, p. 236; GUDYNAS, 2011c).

Buen Vivir propõe uma desconstrução da proposta hegemônica de desenvolvimento.


O modelo de desenvolvimento impõe aos países não desenvolvidos o papel de provedor
mundial de alimentos, com uso intensivo de agrotóxicos, uso de grandes extensões de terra
e volume de água, expulsão dos povos indígenas, construções de grandes hidrelétricas, é
destrutivo ambientalmente e socialmente nos países não desenvolvidos. Assim, Buen Vivir
se apresenta como alternativa ao desenvolvimento dentro de um cenário pluricultural
(GUDYNAS, 2011c).

Para Buen Vivir, o desenvolvimento e o crescimento econômico não podem ser o


objetivo da sociedade. Para Buen Vivir, a validade da ideia crescimento é questionável,
assim, como o progresso, porque o desejável é a melhoria social proposta pela cosmovisão
indígena (Gudynas, 2011a, p. 104). Nesses aspectos, há a uma aproximação com as
propostas da corrente Decrescimento, porém as posições espirituais e comportamento
intercultural do Buen Vivir, o distância do Decrescimento (GUDYNAS, 2011c).

Buen Vivir tem diversas raízes, as mais divulgadas são a equatoriana e a boliviana. No
Equador, surge a partir de sumak kawsay, na língua kichwa, que significa uma vida plena
em comunidade, isto é, em harmonia com as demais pessoas e a Natureza; na Bolívia, a
denominação é Vivir Buen ou vida buena, tem sua origem no conceito suma qamaña do
povo aymara (Gudynas, 2011a, p. 103; Gudynas, 2011c). Além dessas, que são as
principais referências, há também Waras (vida boa do Shuar no Equador) e Kume mongen
(dos mapuches do Chile) (Gudynas, 2011c). Para Gudynas (2011c), Buen Vivir é melhor
definido como um guarda-chuva de diferentes posições, onde as visões críticas ao
desenvolvimento e as práxis transformadoras são compartilhadas.

53
Suma qamaña (Bolívia) está ligada ao conceito andino ayllu, que define o bem estar
como não só humano, mas também, em relação à cultura e a Natureza, assim, rompe com a
dualidade homem-Natureza, em ayllu, não há como separar o homem e a Natureza
(GUDYNAS, 2011c).

A rejeição ao antropocentrismo do Buen Vivir o aproxima das propostas de Naess,


pois ambos repudiam essa visão e buscam construir uma relação diferente entre a
humanidade e a Natureza, assumindo valores intrínsecos ao ambiente. Nesse sentido, há o
reconhecimento dos direitos da Natureza, ao assumir a posição indígena de que a vontade e
sentimentos não são restritos à humanidade, mas também são direitos dos animais, plantas,
ecossistemas e espíritos (GUDYNAS, 2011c).

A proposta desse pensamento é o pós-capitalismo, como também pós-socialismo. O


socialismo sumak kawsay proposto por René Ramirez (secretário de Planejamento do
Equador) é definido como biossocial, republicano e igualitário, e rompe com as tradições
capitalistas e socialistas com o componente “bio” na questão social, isto é, incorpora os
direitos da Natureza (Gudynas, 2011c). Nesse aspecto, abre-se diálogo com a corrente
ecossocialista.

Buen Vivir ganhou maior visibilidade no debate socioambiental ao estar presente nas
constituições da Bolívia e Equador, mas sua relevância e dimensão estão particularizadas
em cada constituição. Enquanto a constituição da Bolívia, aprovada em 2009, apresenta o
conceito como Vivir Buen e suas referências são: suma qamaña (do povo aymara);
ñandereko (vida harmoniosa dos guaranis); teko kavi (boa vida); ivi maraei (terra sem males)
e o qhpaj Ñan (caminho para a vida nobre). Essa união de referências provoca o
comportamento multicultural do modelo boliviano do Buen Vivir (Gudynas, 2011a, p. 106;
Gudynas, 2011c). Buen Vivir está previsto no Artigo 8 da constituição como um dos
princípios éticos e morais de uma sociedade plural, o artigo prevê a suma gamaña, Vivir
Bien, assim como suwa (são sejas mentiroso e nem ladrão); ñandereko (vida harmoniosa),
teko kavi (vida buena), ivi maraei (terra sem mal) e qhapaj ñan (camino da vida nobre). Esse
artigo postula o Buen Vivir em seus diversos conceitos culturais (Gudynas, 2011a, p. 107;
Gudynas, 2011b, p. 233) e na mesma hierarquia dos demais princípios éticos como
igualdade, inclusão, dignidade, solidariedade, respeito, justiça social (GUDYNAS, 2011b, p.
234).

A presença do Buen Vivir na constituição do Equador, aprovada em 2008, é mais


ampla. No Equador, o conceito Buen Vivir, suma qamaña, é o conjunto complexo de direitos,
que incluem direito a saúde, educação, moradia, alimentação, meio ambiente, liberdade,

54
participação, comunidades, proteção e Natureza (uma inovação importante na constituição).
Sendo que não há hierarquia entre os direitos, isto é, todos têm a mesma importância
(Gudynas, 2011a, p. 106; Gudynas, 2011b, p. 234; Gudynas, 2011c). O artigo 11 da
Constituição aponta que os direitos de Buen Vivir estão no mesmo nível hierárquico que os
demais direitos (Gudynas, 2011a, p. 106), essa quebra de hierarquia vincula todos os
direitos, isto é, não há exercício pleno de um direito sem que todos os direitos estejam
respeitados, assim, a conquista do Buen Vivir está diretamente vinculada ao conjunto de
direitos, que será somente alcançada com transformações nas estratégias de
desenvolvimento (Gudynas, 2011a, p. 107). Esse vínculo de direitos, sociedade e Natureza,
é reforçado na constituição pelo artigo 14, que reconhece o direito de todos viverem em um
ambiente saudável e ecologicamente equilibrado como premissa para alcançar o sumak
kawsay, Buen Vivier (GUDYNAS, 2011b, p. 234).

As diferenças entre as abordagens Buen Vivir e Vivir Buen, isto é, entre a visão
equatoriana e boliviana, podem ser resumidas como: a primeira trata o conceito de uma
forma mais incisiva, como um conjunto de direitos e, inovando com regularização do direito
da Natureza, Mãe Terra ou Pachamama (Gudynas, 2011c), no seu artigo 72, a constituição
equatoriana estabelece os direitos da preservação e recuperação da Natureza, o que
fortalece sua dimensão ecológica (GUDYNAS, 2011a, p. 108; GUDYNAS, 2011a, p. 235).

A segunda trata o conceito como um princípio ético, incorporando o direito das


manifestações multiculturais. A Natureza está restrita como orientação ética dos direitos
humanos, como a qualidade de vida e proteção do meio ambiente (Gudynas, 2011c). A
constituição assegura os direitos econômicos, sociais e culturais, mas a Natureza não tem
seus direitos assegurados, outra brecha é o papel do Estado como provedor de
industrialização dos recursos naturais (artigo 355) (GUDYNAS, 2011b, p. 236).

Buen Vivir não é um conceito fechado e muito menos, uma proposta à volta ao
passado. Esse movimento expressa um processo que está em construção, sempre
buscando propor resposta, ferramentas e métricas, a partir da identidade multicultural, para
superação da atual crise socioambiental (GUDYNAS, 2011a, p. 109; GUDYNAS, 2011c).

A insatisfação com os manejos da Natureza foram uma das motivações do Buen Vivir
e, ao mesmo tempo, é um dos seus dos principais desafios. O neo-extrativismo, que
persiste no atual modelo baseada na visão utilitarista da Natureza, mantém os países do Sul
reféns da dependência da exploração mineral, petrolífera e gasífera e monoculturas dos
agronegócios de exportação (Gudynas, 2011b, p. 237). Esse modelo está presente em
todos os países da América do Sul, seja pelas exportações de minérios e soja da Argentina

55
e Brasil, ferro pelo Uruguai ou hidrocarbonos pela Bolívia, Equador e Venezuela
(GUDYNAS, 2011b, p. 237).

A armadilha do neo-extrativismo é o argumento dos governos que essa opção gera


renda convertida no desenvolvimento social da população. Para Gudynas (2011b, p. 238),
essa prática gera uma relação causalidade e dependência entre o extrativismo e as medidas
governamentais de assistência e desenvolvimento social. O desafio está em alertar as
consequências ambientais dessas atividades e que essa política é insuficiente para um
Buen Vivir pleno. Gudynas identifica na administração de Evo Morales um espaço
interessante para reflexão, pois nos debates internacionais sobre mudanças climáticas, o
seu discurso é questionador e radical, porém no nível local, há flexibilização de normas
ambientais, isto é, há um sério risco de defender os direitos da Natureza no nível mundial e
não aplicá-los no nível local (GUDYNAS, 2011b, p. 240).

Para assegurar um processo de transformação fiel à proposta Buen Vivir, deve-se


romper com a dualidade sociedade-Natureza, resgatando as circunstâncias ecológicas da
racionalidade entre as pessoas e o resgate dos valores próprios da Natureza, presentes em
várias culturas tradicionais, principalmente dos povos indígenas, seja pela sua integração,
seja pela sua atenção à figura da Pachamama, que proporciona uma relação harmoniosa
com a Natureza. Esse resgate é a base para a busca da qualidade de vida das pessoas.
(Gudynas, 2011b, p. 242).

Em junho de 2013, na cidade de Quito, houve um passo na história do Buen Vivir, o


“Encontro Internacional sobre Crisis Civilizatoria: Ecossocialismo y Buen Vivir”. Esse foi um
momento de diálogos sobre as pautas políticas do ecossocialismo e Buen Vivir com o
objetivo de buscar alternativas ao poder hegemônico das oligarquias capitalistas e
apresentar propostas e esperanças de uma outra sociedade.
O documento elaborado pelo Encontro apresenta pontos concretos para política
socioambiental. Para romper com o neodesenvolvimento extrativista, o poder público e a
sociedade devem (Declaración de Quito):
 Construir uma relação respeitosa com as lutas populares e movimentos sociais que
defendem os bens comuns, sobrevivência e emancipação;
 Incentivar iniciativas comuns e comunitárias nos níveis local, regional e nacional;
 Aceitar os limites biofísicos e ecossistêmicos;
 Lutar contra a mercantilização da natureza, dos ecossistemas e dos bens comuns;
 Proteger a biodiversidade e enfrentar diretamente os mecanismos corporativos
destinados a apropriar-se dela através de manipulação genética, as patentes e outras
formas de privatização do conhecimento;

56
 Desenvolver a estratégia para superar o extrativismo predatório, com planos concretos
para mudar a matriz energética baseada em hidrocarbonetos fósseis e reduzir o desperdício
de recursos;
 Alcançar a integração regional da América Latina (com iniciativas como CELAC,
UNASUL, o Banco del Sur, ALBA-TSP, Petrocaribe, etc.) para a inserção comum na
economia mundial dentro de um internacionalismo ecossocialista que promova a
cooperação Sul-Sul e ajude a alterar a desigualdade das relações Norte-Sul;
 Reconhecer e reforçar o papel dos saberes tradicionais; e
 Lutar contra modelos consumistas, tendo como guia a concretização de Buen Vivir nas
práticas.

Houve a participação de diversos pesquisadores e militantes sociais e de diversos


países. Entre os presentes estavam os brasileiros João Alfredo Telles Melo do PSOL e
Francisco Caporal, Universidade Federal Rural de Pernambuco; o argentino Guido
Galafassi, (Universidad de Quilmes); o cubano Fabio Grobart (Universidad la Habana); os
equatorianos Carlos Prieto (IAEN); Matthieu Le Quang (IAEN), Miguel Ruiz (IAEN) e Tamia
Vercoutère (projeto Yachay); o mexicano Gian Carlo Delgado (UNAM); os venezuelanos
Miguel Angel Núñez (Instituto Universitario Latinoamericano de Agroecologia ”Paulo Freire”)
e Ximena Gonzáles Broquen (Instituto Venezolano de Investigaciones Científicas); os
europeus Daniel Tanuro, (Clima y Justicia Socia da Bélgica); Jorge Riechmann (Universidad
Autónoma de Madrid da Espanha); Michael Löwy (Centro Nacional de la Investigación
Científica da França); os estadunidenses Joel Kovel (Red Ecosocialista Internacional) e
John Fagan (Earth Open Source); e o canadense Terisa Turner (Universidad de Gelph)
(Declaración de Quito).

. A proposta que uniu esses diversos nomes e origens foi o compromisso de todos nos
esforços para construir os princípios do Buen Vivir, o ecossocialismo, ecofeminismo, a
ecologia política radical, justiça ambiental, entre outras propostas emancipatórias
(Declaración de Quito). A virtude do encontro foi permitir o contato da militância do Bien Vivir
com diversas propostas de transformação social, principalmente a ecossocialista.

57
2.5 Política partidária ecológica na França

A França tem uma longa história de política ecológica. O primeiro candidato de


plataforma ambiental francês foi René Dumont, em campanha presidencial em 1974
(CHESNAIS, 2012, p. 157).

Mesmo com o aumento da preocupação ecológica no país, há pouco espaço para uma
transformação ecossocial no Partido Socialista, o principal partido de esquerda francês. A
visão ecológica nos partidos socialdemocratas e socialista permanece minoritária, por
exemplo, a corrente altermundialista e ecológica alcançou apenas 2% no Congresso do
Partido Socialista francês em 2008 (Münster, 2013, p. 120). Os atuais partidos socialistas e
marxistas ortodoxos não conseguem revisar sua posição produtivista e foco no crescimento,
ao mesmo tempo em que os partidos Verdes não rompem com a economia de mercado
capitalista, adotando o ecocapitalismo liberal, propondo algumas reformas ecológicas, mas
sem alteração da forma de produção capitalista (MÜNSTER, 2013, p. 120).

A coligação entre o Partido Socialista e o EELV (Europe Ecologie Les Verts) na


eleição de 2012 na França ilustra como as propostas ambientais dos verdes franceses, além
de não questionarem o modo de produção capitalista, não apresentam propostas de
transformações profundas na sociedade (Münster, 2013, p. 121). Para Münster, a
associação da EELV na campanha do primeiro ministro Jean-Marc Ayrault, do PS, de 2012
é marcada pela postura de obediência e de simples auxílio em troca de participação do
governo e algumas concessões ecológicas, como redução e fechamento de usinas
nucleares. Essa associação também contribuiu para desencorajar sua militância verde para
uma postura transformadora, ecológica radical, fazendo-a manter uma posição a favor do
capitalismo e sua lógica produtivista (MÜNSTER, 2013, p. 122).

Outro exemplo da falta de uma proposta transformadora das coligações verdes-


socialistas europeias é o modelo adotado na Alemanha na gestão do chanceler Gerhard
Schröder com a participação de Daniel Cohn-Bendit. A adoção de um projeto político
ambiental reformista radical da EELV na coligação do governo alemão a distanciou de uma
proposta mais radical, ecossocialista (MÜNSTER, 2013, p. 121-122).

58
2.6 Política partidária ecológica no Brasil

Para Viola, a política ambiental brasileira pode ser dividida em duas fases: a primeira,
que inicia em torno de 1971 e vai até 1986, associada à educação ambiental, representa um
esforço para difundir uma consciência ecológica, com a finalidade de impedir a deterioração
do meio ambiente. A segunda fase, a partir de 1987, incorpora a gradual institucionalização
do movimento e o debate sobre o modelo de desenvolvimento do país e sua relação com os
desequilíbrios ambientais (VIOLA, 1992, p. 89).

Antes da década de 1970, houve diversas vozes brasileiras que denunciaram


situações de riscos e desequilíbrios ambientais específicos. Os alertas de José Bonifácio,
Euclides da Cunha e Alberto Torres sobre as consequências predatórias da monocultura
dos ciclos de cana-de-açúcar e café, que favoreciam apenas aos interesses europeus, são
exemplos dessas vozes isoladas (Viola, 1992, p. 92). Esses autores identificaram e
registraram a preocupação com o processo de degradação ambiental, já iniciada com a
monocultura da colonização portuguesa no Brasil. Essa monocultura foi instalada no país
associada a baixa produtividade econômica, técnicas nada inovadoras de preparo do solo e
de cultivo, além de ser consumidora insaciável de terra, matérias-primas e trabalho. Além da
atuação agrícola gananciosa, faltaram processos de recuperação e adubação, até mesmo
por “estrume animal, pois a pecuária esteve dissociada dessa agricultura essencialmente
comercial” (Martinez, 2006, p. 77). A Mata Atlântica foi a principal área impactada por esse
processo, pois, excetuando a Bahia e Pernambuco, onde a fertilidade natural do solo foi
mais duradoura, rapidamente os solos foram exauridos (MARTINEZ, 2006, p. 77).

O alerta de José Bonifácio de 1823 contra o modelo plantation adotado no Brasil,


altamente nocivo ao meio ambiente, está presente na Obra política de José Bonifácio de
Octaviano Nogueira citado por Alier (2009, p. 30-31):

A Natureza fez tudo a nosso favor, nós, porém, pouco ou nada temos
feito a favor da Natureza. Nossas terras estão ermas, as poucas que
temos rotado são mal cultivadas, porque o são por braços indolentes
e forçados. Nossas numerosas minas, por falta de trabalhadores
ativos e instruídos, estão desconhecidas ou mal aproveitadas. Nossas
preciosas matas vão desaparecendo, vítimas do fogo e do machado
destruidor da ignorância e do egoísmo. Nossos montes e encostas
vão-se escalvando diariamente, e, com o andar do tempo, faltarão as
chuvas fecundantes que favoreçam a vegetação e alimentem nossas
fontes e rios, sem o que o nosso belo Brasil, em menos de dois

59
séculos, ficará reduzido aos páramos de desertos áridos da Líbia.
Virá então este dia (dia terrível e fatal), em que a ultrajada natureza
se ache vingada de tantos erros e crimes cometidos.

Infelizmente os alertas de José Bonifácio serviram apenas para o autor ser


considerado por muitos ambientalistas brasileiros como o “Patriarca do Reflorestamento”
(ALIER, 2009, p. 30).

Em 1942, o padre jesuíta Balduíno Rambo publicou o livro Fisionomia do Rio Grande
do Sul, descrevendo a Geografia e história natural do Rio de Grande do Sul. Na sua obra,
encontra-se o capítulo A Proteção à Natureza que alerta sobre os sinais de agressão
humana e a necessidade de uma consciência preservacionista em defesa da Natureza e
criação de parques nacionais. A importância histórica dessa obra foi o despertar ecológico
de Lutzenberger ao lê-lo na sua infância (CARNEIRO, 1995, p. 9).

Outra voz verde brasileira importante anterior a 1970 foi Roessler. Luiz Henrique
Roessler foi um dos pioneiros da consciência ecológica no Brasil. Funcionário da Delegacia
Estadual dos Portos, aproveitava suas viagens de ofício para deixar cartazes nos postes
com mensagens de defesa do meio ambiente e, após o expediente, fazia, inicialmente de
forma voluntária e posteriormente credenciado pelo Ministério da Agricultura, fiscalização de
caça e pesca no Rio Grande do Sul. Sua credencial foi cassada após denunciar a poluição
do rio Sinos pela indústria dos curtumes. Sua reação à cassação foi a criação da primeira
entidade ecológica, União Protetora da Natureza - UPN, em 1955. (Carneiro, 1995, p. 8). O
papel educativo das ações da UPN, com mensagens endereçadas aos pais para aplicar
seus ensinamentos na educação dos filhos, utilizou panfletos contendo desenho do próprio
Roessler e mensagens fortes e diretas (Pereira, 2008). Roessler publicou suas propostas e
reflexões no O Correio do Povo de 1957 até o dia 8 de novembro de 1963, dia de seu
falecimento; suas ideias apresentadas no jornal influenciaram as gerações seguintes de
ecologistas gaúchos (CARNEIRO, 1995, p. 9).

O Brasil teve três fatores que impactaram a politica ecológica na década de 1970: o
Estado brasileiro teve que adotar medidas preservacionistas para ter acesso aos
investimentos e empréstimos junto às agências internacionais, pois a questão ambiental
entra na pauta das exigências pelo impacto da Conferência de Estocolmo 1972; movimentos
ambientais brasileiros, principalmente no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul; e o retorno
dos exilados políticos com experiência do debate ecológico (Gonçalves, 2013, p. 16). Além
desses, houve fatores internos como devastação ambiental gerada pelo “milagre brasileiro”,
despertar da luta pela qualidade de vida pelo estrato médio da população brasileira,

60
liberação política iniciada em 1974 e a derrota da luta revolucionária da esquerda brasileira
(VIOLA, 1992, p. 90).

O movimento ecológico no Brasil foi enriquecido nas décadas 1970 e 1980 pelo
debate e ações políticas apontados acima, mas também, por produção teórica. No plano
reflexivo, houve algumas publicações que contribuíram com o debate ecológico, com
destaque dos livros Poluição: A morte dos nossos rios de 1972 de Samuel Murgel Branco; O
Fim do Futuro de José Lutzenberger de 1975 e Catecismo da Ecologia de Vasconcelos
Sobrinho (CARNEIRO, 1995, p. 10).

Na década de 1980, houve grande aumento de grupos ambientalistas, principalmente


nas regiões Sul e Sudeste. Em 1980, eram 40 grupos, cinco anos depois, a quantidade
girava em torno de 400 (Viola, 1992, p. 93) e, em 1989, 700 (Viola, 1992, p. 96). Os
primeiros focos de ações desses grupos foram: alertas contra as fábricas e usinas
poluidoras, riscos a áreas verdes protegidas, degradação de reservas ecológicas e as
ameaças de áreas urbanas de valor histórico pelo setor imobiliário (Viola, 1992, p. 93- 94).
Um ponto de inflexão desses movimentos foi a profissionalização de algumas associações,
pois houve a incorporação da sistematização de ações para a preservação e restauração do
ambiente degradado (VIOLA, 1992, p. 97).

Lutzenberger foi um personagem importante na história ambiental brasileira. Esse


ambientalista era engenheiro agrônomo, que abandonou o emprego em uma multinacional
do agrotóxico. Foi o autor da primeira publicação brasileira de cunho ecológico: Fim do
Futuro? Manifesto Ecológico Brasileiro (Viola, 1987a). Mas sua atuação não ficou restrita
apenas ao plano teórico, em junho de 1971, liderou um grupo de combativos ambientalistas
para fundação da AGAPAN, Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (VIOLA,
1987a).

AGAPAN foi a primeira associação ecologista a surgir no Brasil e na América Latina


(Viola, 1987a). Seu programa de fundação tinha os seguintes pontos de ação:

“defesa da fauna e da vegetação; combate a uso exagerado dos


meios mecânicos contra o solo e à poluição causada pelas indústrias
e veículos; combate ao uso indiscriminado de inseticidas não-
tratados; combate às destruições desnecessárias de belezas
paisagísticas; luta pela salvação da humanidade da destruição,
promovendo a ecologia como ciência da sobrevivência e difundindo
uma nova moral ecológica” (VIOLA, 1987a).

61
A primeira grande vitória da AGAPAN foi a inclusão da proibição de construção de
usinas nucleares na Constituição do Estado do Rio Grande do Sul (VIOLA, 1987a).

Para Viola, a AGAPAN “teve sucesso na articulação de um programa estratégico que


incluiu não apenas medidas de preservação, mas também tendências conservacionistas e
sensibilidade para a visão da ecologia como uma ciência para a sobrevivência e a
formulação de estilos alternativos de vida” (Viola, 1992, p. 90). A AGAPAN continua muito
atuante, os temas de ação previstos na AGAPAN estão disponíveis no sitio da instituição e
são: agrotóxicos, aquecimento global, mobilidade urbana, código florestal, leis ambientais
ameaçadas no Rio Grande do Sul, planejamento urbanístico do Guaíba, transgênicos, túneis
verdes, entre outros.

A participação do movimento ecológico na fundação do Partido dos Trabalhadores


envolveu um amplo debate no fim da década de 1970 e inicio dos anos 1980. O setor
ecossocialista participou mais intensamente que os realistas desse momento, pois
apostaram na transformação social, com participação principalmente de uma classe operária
de consciência socialista e ecológica (Viola, 1987b, p. 47). O grande obstáculo dessa aposta
era a limitada receptividade do movimento operário ao ecossocialismo, pois a “mentalidade
média do operariado brasileiro é favorável a altas taxas de crescimento econômico (sem
importar seu caráter degradador do meio ambiente) e redistribuição de renda” (Viola, 1987b,
p. 47). As exceções dessa forma de pensamento, eram os movimentos dos trabalhadores
de área industriais como Cubatão, Criciúma e Gravatal. Mesmo com as dificuldades, a
corrente ecossocialista apostou na transformação do PT em um partido ecossocialista,
apostando na possível sensibilidade ecológica fertilizada por sua opção socialista
democrática (VIOLA, 1987b, p. 47).

Após os primeiros meses do governo presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva, os


ecossocialistas do Partido dos Trabalhadores entraram em crise. Grande parte dos
ecossocialistas saiu para participar da fundação do PSOL, Partido Socialista e Liberdade, e
posteriormente, o grupo liderado por Marina Silva saiu, no primeiro momento para a
candidatura da Marina à presidência pelo Partido Verde e posteriormente, com o
rompimento com o Partido Verde, a fundação da Rede Sustentabilidade. Esse processo
será debatido no capítulo 4 – Ecossocialismo Brasileiro.

62
. Na década de 1980, começaram os primeiros resultados eleitorais das candidaturas
verdes. Em 1986, foi eleito o primeiro deputado federal com plataforma ecológica: Fábio
Feldman pelo PMDB (Viola, 1992, p. 94). Mesmo sendo o único deputado verde eleito na
Assembleia Constituinte, ele conseguiu sensibilizar, com ajuda do lobby ambientalista,
outros parlamentares para a criação da Frente Parlamentar Verde, com 15% do congresso
(Viola, 1992, p. 97-98). Esse pequeno grupo conseguiu assegurar em constituição o direito
do brasileiro em ter condições socioambientais dignas. Para isso, está determinado no
Capítulo IV Meio Ambiente, Art. 225, que “Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para
as presentes e futuras gerações”. Para assegurar esse direito da população no Brasil, o
Capítulo IV prevê obrigações do Estado para promover educação ambiental, proteção de
biomas e fauna e flora em risco de extinção. Além do Capítulo IV, há também o Artigo 23 do
Título III, Da Organização do Estado, da Constituição que define a competência comum do
Estado (nos três níveis) de zelar e proteger o meio ambiente e combater a poluição (VI),
preservar as florestas, a fauna e a flora (VII), fomentar a produção agropecuária e organizar
o abastecimento alimentar (VIII), promover programas de construção de moradias e a
melhorias das condições habitacionais e de saneamento básico (IX), combater as causas da
pobreza e os fatores de marginalização (X) (BRASIL, 1988).

A fundação do Partido Verde, PV, foi outra consequência do aumento do


envolvimento dos movimentos ambientalistas com a política partidária. Coerentemente com
o momento histórico de relações de conflito no movimento ambiental, a fundação do PV
brasileiro envolveu o debate entre quatro posições.

A primeira posição defendia que o Partido Verde era desejável e viável em curto
prazo. A principal corrente dessa opção era o “Coletivo Verde” do Rio de Janeiro com o
argumento que a “participação na arena parlamentar é fundamental para a luta ecologista,
como vem demonstrando a experiência europeia” (VIOLA, 1987b, p. 48). Para Sirkis (1987,
p. 62), a ação política deveria ser inserida em uma perspectiva de luta pelo poder e “os
verdes devem se preparar para exercê-lo dentro de padrões éticos diferentes dos da política
tradicional brasileira”.

63
A segunda posição defendia que o Partido Verde era desejável, porém não era viável
em curto prazo. A corrente majoritária dessa posição era o “Movimento Ecológico Livre” de
Florianópolis que alegava que o “movimento ecológico brasileiro é ainda insuficientemente
consistente na sua base para lançar à dificílima tarefa de construção de um partido”, o temor
dessa corrente era o risco do Partido Verde cometer os mesmos erros dos partidos já
existentes, como personalismo, oportunismo, clientelismo e sectarismo (VIOLA, 1987b, p.
48).

A terceira posição achava que o Partido Verde não era desejável. A alegação dessa
postura, fundamentalista, era baseada na ideia de que a “arena parlamentar é negativa para
o movimento ecológico, já que o leva inexoravelmente à realização de compromissos com
as formas tradicionais de fazer política” (VIOLA, 1987b, p. 48-49).

A última posição confiava que o Partido dos Trabalhadores poderia se transformar em


um Partido Verde. Esse posicionamento foi sustentado principalmente pelos ecologistas
petistas gaúchos que acreditavam ser possível transformar o PT com valores ecológicos e
com a vantagem petista de ter uma base popular (VIOLA, 1987b, p. 48-49).

Em 1986, foi fundado o Partido Verde brasileiro com a vitória da primeira posição do
debate sobre a criação do PV, principalmente nos estados Rio de Janeiro, São Paulo, Santa
Catarina e Minas Gerais. Devido a alguns problemas enfrentados pelo partido, seu registro
definitivo foi obtido somente em 30 de setembro de 1993 (Rabóczkay, 2004, p. 57). O
Manifesto do Partido Verde afirmava ser este um partido de mudanças, de movimento de
cidadãos e não de políticos profissionais, com o objetivo de “transformar a vida das pessoas
fazendo-a mais livre e digna” (PV, 1987, 65-66). Mas, sem um modelo pré-definido, para
Sirkis (1987, p. 61), o partido surgiu sem “grandes gênios do pensamento, como Marx e
Engels, capazes de criar um edifício teórico completo como o Capital”.

Mesmo após a fundação do Partido Verde, o debate interno entre as correntes


continuou, mas o foco se transferiu para a política de alianças. O debate sobre coligações
do PV envolve até hoje, duas posições: a primeira é contra coligações, pois acredita não ser
desejável a negociação com políticos comprometidos com interesses de “grupelhos, famílias
ou pessoas” e defendem rigidez no relacionamento com demais partidos, pois “nem o
autoritarismo da esquerda é mais palatável do que o da direita” (Rabóczkay, 2004, p. 130); e
outra, mais pragmática, que defende as coligações “com qualquer um”, sem abandonar os
princípios do partido (Rabóczkay, 2004, p. 130), um de seus argumentos é que as
organizações sem grandes recursos financeiros não conseguem muito espaço para sua

64
visibilidade junto à sociedade (Rabóczkay, 2004, p. 128). A atual política do partido “não
admite normalmente, uma coligação com outra agremiação se esta for tachada de direitista”
(Rabóczkay, 2004, p. 128). Uma liderança que defende a primeira posição é Tibor
Rabóczkay, para esse militante do PV de São Paulo, o Partido Verde deve ser independente
não só dos demais partidos brasileiros, até mesmo dos demais Partidos Verdes dos outros
países, nesse caso, ele argumenta que os problemas locais demandam estratégicas
específicas (Rabóczkay, 2004, p. 16). Mas a história do partido tem mostrado que a
segunda posição, mais pragmática, tem prevalecido.

Nesse aspecto, o PV é fiel à crença dos realistas que é possível “esverdear” a


sociedade sem entrar em conflito com a política, seja de esquerda ou de direita. Para Sirkis
(2011, p. 45), a proposta não é ““eliminar”, de algum modo, a direita, mas de superá-la
culturalmente, como recentemente nos EUA, com o fenômeno Obama”, Sirkis “reconheceu”
que a superação do exemplo – Obama – foi momentânea e efêmera (Sirkis, 2011, p. 45).
Nesse sentido, a presença de Eduardo Jorge e Alfredo Sirkis nas secretarias de meio
ambiente das prefeituras de Kassab (São Paulo) e César Maia (Rio de Janeiro) foi avaliada
como positiva, pois para Sirkis (2011, p. 51) a presença verde nessas prefeituras “resultou
em notórias realizações ambientais e urbanísticas”.

A experiência eleitoral da campanha de Gabeira já tinha sido animadora para o Partido


Verde, um marco histórico foi a união dos realistas e ecossocialistas em uma mesma
campanha eleitoral. Mesmo antes da criação formal do Partido, os verdes lançaram o
jornalista Fernando Gabeira ao governo do Estado do Rio de Janeiro, em 1986, através de
uma coligação informal entre o Partido Verde e o Partido dos Trabalhadores, associado às
candidaturas verdes de Liszt Vieira para deputado federal constituinte e Carlos Minc e
Herbert Daniel para a câmara estadual (Rabóczkay, 2004, p. 54). O resultado foi positivo,
Gabeira alcançou 9%, sendo 11% na região metropolitana e 20% em algumas pequenas
cidades do interior, como Volta Redonda e Petrópolis. Outro ponto vitorioso foi a eleição de
Minc como primeiro deputado estadual fluminense verde (RABÓCZKAY, 2004, p. 54).

Uma grande inovação da campanha foi provocar a participação da população nas


transformações. Com o criativo slogan É só querer, a campanha buscava provocar no eleitor
a sensação de que as mudanças dependiam dele, assim “o que estava em jogo não era só
a competência de seu candidato, mas sua vontade mesma de transformar” (GABEIRA,
1987, p. 103).

65
O ponto alto da campanha foi o Abraço à Lagoa. A manifestação do Abraço
denunciava a ausência de uma demarcação clara das margens e o despejo de esgotos em
suas águas, comum aos demais espaços hídricos da cidade, Baía de Guanabara, Rio
Paraíba (Gabeira, 1987, p. 169). A manifestação superou os oito mil participantes
necessários para seu sucesso (Gabeira, 1987, p. 166). Para Gabeira, o “Abraço à Lagoa
provou que é possível caminhar por novas trilhas e que o Brasil resiste, através de milhares
de pessoas, e o único problema é encontrar os momentos e as chances para que elas
possam se manifestar” (GABEIRA, 1987, p. 174).

A apresentação de uma política ecológica foi um marco da campanha de 1986. Além


do resultado quantitativo, a grande vitória foi a oportunidade de apresentar propostas e
polêmicas verdes de uma forma ampla (Sirkis, 1987, p. 62). Uma contribuição da campanha
foi o debate e divulgação dos riscos da presença das usinas nucleares, (Gabeira, 1987, p.
64) com a novidade do envolvimento do sindicato dos ferroviários na solução de uma
possível fuga rápida no caso de acidente nuclear por um ramal ferroviário desativado
(Gabeira, 1987, p. 162). A originalidade da campanha foi combinar a plataforma ambiental
com questões sociais como “libertação das mulheres, discriminação racial e direito das
minorias” (GABEIRA, 1987, p. 105).

Em 1989, o Partido Verde indicou Fernando Gabeira para vice de Luís Inácio Lula da
Silva do PT para a presidência, mas após pressão de alguns setores dos demais partidos da
candidatura, o nome verde foi retirado e o Partido Verde, inicialmente, optou pelo
lançamento de Herbert Daniel, que associava o ativismo verde e homossexual (Rabóczkay,
2004, p. 55). Mas o candidato oficial do Partido foi Fernando Gabeira (TSE).

Gabeira, pelo Partido Verde, participou de mais duas campanhas eleitorais


expressivas: em 2008 para a prefeitura do Rio de Janeiro, aliado ao PSDB e PPS, indo para
o segundo turno com votação de 25,61%, perdeu no segundo turno para Eduardo Paes por
apenas 1,66%; em 2010, com a coligação DEM, PSDB e PPS, ficou em segundo lugar com
20,68% dos votos à governador do Estado do Rio de Janeiro (índices apurados no sitio
TSE).

Para a presidência da República, o Partido Verde alcançou os seguintes índices:


0,18% com Gabeira em 1989 e 0,31% com Alfredo Sirkis em 1998 (índices apurados no sitio
TSE). Em 1994, o PV apoiou o candidato Lula, porém nas eleições presidenciais de 2002 e
2006, o PV não apresentou candidato e nem apoiou um, “abriu o voto” (Sirkis, 2011, p. 28).

66
Em 2009, o Partido Verde optou por uma candidatura própria para eleições de 2010 e
em julho de 2009, iniciou as negociações com Marina Silva para sua candidatura à
presidência como uma resposta à avalição que o governo “fracassou na criação de um novo
marco institucional e ético, um novo modelo para a nação” e não “soube enfrentar a questão
do desenvolvimento sustentável nem o desafio socioambiental” (Sirkis, 2011, p. 33). A
avalição do PV foi que a Marina seria uma alternativa competitiva aos candidatos
conhecidos e superaria o voto ideológico ou de protesto como foi Heloísa Helena. A
proposta da campanha era “Não é Lula nem anti-Lula, mas pós-Lula” (Sirkis, 2011, p. 35).
Nessa campanha, o PV com Marina Silva alcançou 19,33% dos votos (sitio de TSE).

Confirmando a crença da relativização ideológica e sua “vocação” para intermediar do


pensamento realista, o PV acreditava que a vitória da Marina Silva conseguiria unir o Partido
dos Trabalhadores (PT) e o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB). Para Sirkis
(2011, p. 135), esses partidos “social-democratas, cada um à sua maneira, não se juntariam
em um governo comandado por um ou outro, mas Marina poderia promover esse
“realinhamento histórico” com sua mediação”, o que permitiria uma gestão mais
programática sem precisar se render às negociações com o PMDB ou DEM. Sirkis
acreditava que a associação desses partidos no governo de Marina Silva seria positivo para
todos, “lhes faria um imenso bem, permitindo em ambos os partidos, a emergência daquilo
que têm de melhor” (Sirkis, 2011, p. 171). Além do PSDB e PT, a proposta era envolver “as
pessoas do bem” dos demais partidos, PMDB, DEM entre outros, na participação da
governabilidade (SIRKIS, 2011, p. 171). Essa proposta foi retomada na campanha de
Marina Silva à presidência, pelo PSB, em 2014 pela proposta de governar com os melhores
do país (SILVA, 2014).

O candidato verde na eleição presidencial de 2014 foi Eduardo Jorge com slogan
“Viver bem. Viver Verde”. Seu documento de campanha, Diretriz, apresentou suas propostas
inovadoras e avançadas, como a remuneração dos parlamentares, descriminalização do
aborto.

Estão apresentados abaixo alguns pontos do documento:


 Desenvolvimento Sustentável: O conceito de Desenvolvimento Sustentável defendido
pelo documento é que as ações individuais e coletivas sejam orientadas pelo equilíbrio entre
os fatores ecológicos, sociais e econômicos (PV, 2014, p. 4). Para alcançar essa harmonia
entre os fatores, as diferenças dos padrões de vida devem ser enfrentadas, inclusive com
crescimento zero ou redução de consumo para as regiões e setores privilegiados, inclusive

67
no Brasil, para setores pobres poderem melhorar a qualidade de vida (PV, 2014, p. 5). Para
o PV (2014, p. 5) é possível “um projeto para o Brasil que combine desenvolvimento
sustentável, justiça social, cultura de paz com radicalização da democracia”;
 Reforma Política: Esse item apresenta a percepção de democracia para o Partido
Verde, que defende a democracia participativa e direta. O primeiro ponto debatido foi o
papel e condições dos parlamentares: a proposta envolve, além da eliminação de verbas de
gabinete, a redução de gasto do legislativo com redução de parlamentares e teto máximo de
20 salários mínimos para os parlamentares federais e estaduais e o fim do salário dos
vereadores, o argumento para eliminar o salário do vereador foi que “é função de relevância
pública” e “ser vereador é uma honra para o cidadão eleito” (PV, 2014, p. 7). No nível
municipal, as alterações buscam “a fusão da democracia representativa e participativa” com
a eleição direta dos conselhos de cidadãos com funções integradas e complementares às
Câmaras Municipais, inclusive na elaboração de projetos e orçamentos (PV, 2014, p. 7).
Além da alteração das condições dos parlamentares, o PV retoma dois debates: voto
distrital misto e facultativo (para aproximar o cidadão e o parlamento com redução de custo
de campanha, com o fim da obrigatoriedade do voto) e o plebiscito sobre parlamentarismo,
pois para o PV, o atual modelo é “presidencialista imperial e centralizador” e estimula o
“messianismo despolitizador e regressivo” (PV, 2014, p. 8);
 Mais Brasil, menos Brasília: A proposta é transferir gestão de recursos e obrigações
para o nível municipal, pois a “proximidade com os cidadãos abre oportunidade maior à
participação e democracia direta” (PV, 2014, p. 10). O governo federal terá apenas a função
de coordenação e o governo estadual será o responsável de agrupar os municípios em
regiões e consórcios para melhor eficiência das políticas públicas (PV, 2014, p. 10-11);
 Economia Verde: A condução da economia do país será orientada pela associação da
economia de baixo carbono, democracia, respeito à diversidade e igualdade com a
substituição do parâmetro de crescimento do PIB pelo IDH da ONU, pois incrementa
indicadores de educação e saúde a evolução do PIB per capita (PV, 2014, p. 12);
 Energia: Esse item está baseado nos textos do professor José Goldemberg (PV, 2014,
p. 21). A proposta é gerar aumento de oferta de energia com eficiência sem comprometer os
recursos naturais e ampliar a emissão de gases de efeito estufa. Entre as propostas está o
investimento em tecnologia para aumentar a eficiência dos motores utilizados na indústria
automobilística e investimento em Gás de xisto por seu baixo custo mesmo com alto preço
ambiental (PV, 2014, p. 21). A posição do Partido Verde em relação à energia nuclear é ser
contrária, inclusive com a desativação das usinas existentes em Angra (PV, 2014, p. 21);
 Previdência Segura: A solução, inclusive para o desequilíbrio das contas da
Previdência, é unificar o regime para todos os brasileiros, inclusive deputado, camponês,
empresário ou alto burocrata. O atual regime do INSS será o ponto de partida, mantendo os

68
tipos atuais: por contribuição, idade, invalidez, casos de profissões insalubres e perigosas,
porém com teto máximo de 10 salários mínimos (PV, 2014, p. 22);
 Saúde e Educação: O aumento do investimento nas áreas de saúde e educação está
associado a implantação do tributo único federal. Esse tributo financiará, além da saúde e
educação, a política de estímulo ao baixo carbono e o combate ao aquecimento global com
investimentos na agricultura mais limpa, combate ao desmatamento, energias renováveis e
transporte público (PV, 2014, p. 23). A educação terá a revisão de conteúdo para agregar a
disseminação de valores como o valor do trabalho, da solidariedade, respeito à diversidade
e observação da natureza e música. Além dessas mudanças, a saúde terá ênfase na
educação para prevenção na saúde (PV, 2014, p. 24). O capítulo da saúde prevê dois
pontos envolvendo o planejamento familiar e a gravidez indesejada: a opção da esterilização
voluntária e a legalização do procedimento de interrupção da gravidez sem a
obrigatoriedade de todos os profissionais de saúde, possibilitando a recusa por motivos
filosóficos ou religiosos (PV, 2014, p. 24);
 Cultura da paz: Os preceitos da Carta da Terra são aplicados e refletidos, inclusive
como material básico nas escolas, com uma política de apoio as diversidades e revisão da
política de segurança pública (PV, 2014, p. 26-27). Um ponto inovador ecológico da cultura
da paz dessa diretriz é a política de Bem Estar Animal com o fim da escravidão animal,
inclusive com preocupação do bem estar dos animais de estimação e política de estimulo à
alimentação vegetariana (PV, 2014, p. 28);
 Desigualdade e Miséria: as inspirações da política ao combate à desigualdade e
miséria são a Economia solidária defendida por Paul Singer e a política de inclusão de
Muhammad Yunus. Além da manutenção do programa Bolsa Família e as melhorias da
qualidade de vida apontadas nos itens anteriores da Diretriz, o PV propõe, como política de
acesso ao emprego, a redução imediata da jornada de trabalho para 40 horas semanais
com reduções graduais até atingir 30 horas semanais (PV, 2014, p. 30);
 Internacionalismo: A globalização deve ser transformada para ser benéfica a todo o
planeta, para isso, a insustentável desigualdade entre os países deve ser superada. O PV
apoia a ONU como gestor mundial pela paz e solução de conflitos, mas assume que o Brasil
deve liderar a construção de uma governança mundial orientada pela cultura da paz e
desenvolvimento sustentável (PV, 2014, p. 31).

O documento Diretriz expressa conceitos realistas como Desenvolvimento Sustentável


e Economia Verde, além de proposta dos direitos dos animais sem avançar em questões de
transformações mais profundas no modo de produção e domínio do capital sobre o trabalho
e Natureza.

69
Apesar de ter uma presença positiva nos debates, Eduardo Jorge alcançou em torno
de 630 mil votos, ficando com 0,61% dos votos (TSE).

70
CAPÍTULO 3 – Ecossocialismo

3.1 Corrente Ecossocialista: Pensamentos e Propostas

O ecossocialismo é a proposta utópica concreta de mudança socioambiental que


associa as lutas ambientalistas aos demais movimentos representativos da classe social
oprimida. O ecossocialismo une as práxis ecológica e socialista, pois considera que o
socialismo sem a visão ecológica não consegue ser alternativa aos desafios
socioambientais do século XXI; e a ecologia que não seja socialista não tem a radicalidade
necessária para enfrentar esses desafios. A definição presente na obra de Löwy (2005a, p.
47; 2009a, p. 7; 2010, p. 37; 2011, p. 31-32) para o ecossocialismo é: uma corrente de
pensamento e ação ecológica que incorpora fundamentos do pensamento marxista, ao
mesmo tempo em que o liberta das escórias produtivistas. Para o ecossocialismo, a lógica
da dominação do mercado e a sua busca de lucro como fim em si mesmo, inerente ao
capitalismo e ao autoritarismo burocrático do finado socialismo “real”, são incompatíveis com
a necessidade de preservação da capacidade do meio ambiente em suprir a vida, inclusive
a da humanidade.

O ecossocialismo inclui, dentro da superação do capitalismo ecológico, projeto


reformista-revolucionário de um planejamento ambiental democrático, como resultado de
uma síntese dialética das teses do movimento ambientalista radical com a crítica marxista
sobre a economia política. E esta síntese dialética é ao mesmo tempo uma crítica à ecologia
de mercado e ao socialismo produtivista, que continuam a ser indiferentes aos limites da
Natureza (MÜNSTER, 2013, p. 128).

A práxis ecossocialista está em construção e tem diversos “operários”. Para Münster


(2013, p. 139), o ecossocialismo surgiu nos anos 70 com a interseção da ecologia política
nas correntes socialistas, associando uma postura ecológica radical à proposta de um
socialismo autogestor; e, também, com uma corrente marxista internacional comprometida
em, além de eliminar a visão produtivista nas suas propostas, assumir valores da ecologia
política. Essa corrente tem os seguintes representantes mais significativos: René Dumont e
André Gorz (França), David Pepper (Inglaterra), Joel Kovel (Estados Unidos) e Michael
Löwy (França e Brasil).

71
Löwy amplia a quantidade de “operários ecossocialistas”. Para ele, o ecossocialismo
teve as primeiras contribuições através do socialismo ecológico de alguns pioneiros russos,
ainda no período entre o final do século XIX e início do século XX, entre esses pensadores
estão Sérgio Podolinsky e Vladimir Vernadsky (Löwy, 2000b, p. 234). As contribuições de
elaborações teóricas e práticas ao ecossocialismo têm evoluído a partir da década de 1970
com colaborações surgidas em diversos países: Elmas Altvater e Frieder Otto Wolf
(Alemanha); Barry Commoner, James O’Connor, Joel Kovel e John Bellamy Foster (EUA);
Francisco Fernandez Buey, Jorge Riechman, Juan Martínez Alier e Manuel Sacristán
(Espanha); André Gorz, Jean-Marie Harribey e Jean-Paul Déléage (França); Raymond
Williams (Reino Unido) (LÖWY, 2000b, p. 234; LÖWY, 2005a, p. 48; LÖWY, 2011, p. 13).

A construção da práxis ecossocialista tem diversos colaboradores em diversos


espaços políticos e acadêmicos. O Ecossocialismo também tem espaço nos debates em
diversas revistas: Capitalism, Nature and Socialism (fundado por James O’Connor); Climate
and Capitalism (editado por Ian Angus); Ecologia Política; Ecología Politique; Ecologie &
Politique (fundada por Jean-Paul Deléage); Ecover: Revue Critique d’écologie politique;
Mientras Tanto (fundada por Giulia Adinolfi e Manuel Sacristá) e Monthly Review (John B.
Foster é seu editor). Além desses espaços, alguns pensadores mantêm seus blogs para
apresentação de suas ideias e debates, como por exemplo: Corinne M. Darleux, Daniel
Tanuro e Michael Löwy. Os endereços eletrônicos das revistas e dos blogs estão
relacionados no item “Sítios” do capítulo Referência Bibliográficos.

A associação dos aspectos sociais e ecológicos fundamenta o raciocínio


ecossocialista. O ecossocialismo está fundado na constatação que a condição ecológica do
planeta, que proporciona condições de vida, inclusive humana, é incompatível com a lógica
expansiva e destrutiva do capitalismo (Löwy, 2011, p. 7); ao mesmo tempo critica o
socialismo não ecológico, pois a experiência soviética não apresentou alternativa ambiental
em relação à prática ecológica dos países capitalistas, e sim, reproduziu o mesmo
produtivismo (LÖWY, 2012a, p. 12).

Para Löwy, o pensamento ecossocialista está alicerçado em dois argumentos: o


primeiro é que o capitalismo é sustentado pela manutenção, e até mesmo, o agravamento
da desigualdade entre os países do Norte e Sul, pois a planeta entraria em colapso se a
acumulação ilimitada, o desperdício de recursos, o consumo ostensivo e a destruição do
meio ambiente atual dos países desenvolvidos fossem estendidos aos demais países. Um
exemplo que ilustra essa desigualdade entre as nações e a gravidade socioambiental é que

72
“se fosse generalizado ao conjunto da população mundial o consumo médio de energia dos
EUA, as reservas conhecidas de petróleo ficariam esgotadas em dezenove dias” (Löwy,
2000b, p. 235-236; Löwy, 2005a, p.49-50; Löwy, 2010, p. 37; Löwy, 2011, p. 34). O segundo
argumento é, mesmo mantendo a desigualdade entre Nações apontada no primeiro
argumento, as condições do planeta de suprir a vida humana na terra estão seriamente
ameaçadas pela dinâmica do capitalismo, e nessa ameaça é imperativo humano preservar o
meio ambiente para possibilitar a continuidade das condições naturais à vida humana na
Terra (LÖWY, 2000b, p. 235-236; LÖWY, 2005a, p.49-50; LÖWY, 2010, p. 37; LÖWY, 2011,
p. 34).

O despertar das lideranças sindicais sobre a urgência ecológica é um dos desafios


ecossocialistas, pois a participação do movimento dos trabalhadores é fundamental na
construção de uma sociedade justa, ecológica e solidária, mas ainda falta sensibilizar a
maioria das lideranças dos trabalhadores sobre a relevância da pauta ecológica. Os
ecossocialistas, apesar de suas críticas às lideranças sindicais, acreditam que a justiça
social e a perenidade ambiental têm, nos trabalhadores e nas suas organizações, forças
transformadoras na construção da sociedade socialista e ecológica, ecossocialista (Löwy,
2005a, p.47; Löwy, 2009a, p.7; Löwy, 2010, p.37; Löwy, 2011, p.31-32). A crítica
ecossocialista sobre a maioria das lideranças sindicais é que essa liderança não associa as
reinvindicações sobre qualidade de condições da vida e segurança no trabalho à uma pauta
ecológica anticapitalista; os sindicalistas ficam estacionados nas negociações sobre salários
e empregos (Chesnais, 2012, p. 157). Um passo ecossocialista importante para os
sindicatos é considerar as condições do meio ambiente na sua pauta política, com a
superação do foco restrito apenas nas reivindicações monetárias, como manutenção de
emprego e vantagens no cotidiano nas empresas; eles devem ponderar que, além da vida
profissional direta, as condições de moradia em regiões poluídas e outros problemas
ambientais podem afetar a saúde do próprio trabalhador e da família, dilapidando as
conquistas monetárias (BERNARDO, 1995, p. 13).

As ações dos ecossocialistas junto ao movimento sindical estão gerando avanços


positivos, mas há muito por percorrer nessa tarefa. Há correntes sindicais abertas às
propostas ecológicas nos sindicados. O exemplo francês dessa abertura é o SUD –
Solidaires Unitaires Démocratiques, outro exemplo é a divulgação da proposta “Um milhão
de empregos verdes” por alguns sindicatos ingleses. No setor de energia ou do petróleo,
alguns militantes sindicais começam a despertar para a reflexão de busca das alternativas
energéticas, mas o movimento dos mineiros de carvão é mais resistente ao debate sobre
novas formas de energia, assim como o poderoso sindicato CGT – Confédération Générale

73
du Travail, do setor de energia, defende as centrais nucleares e uso do petróleo. Nesse
aspecto, os militantes dos partidos ecossocialistas (NPA, PG, Ensemble entre outros) têm
levado o debate socioambiental para o interior das lutas sindicais, cientes de que é uma luta
de longo prazo, mas animados com alguns sinais positivos (LÖWY, 2014a).

O movimento ecossocialista é diversificado, há várias formas de ação, porém a aliança


entre os verdes e os vermelhos, com o diálogo dos verdes libertos da ilusão do
ecorreformismo e os vermelhos sem seu delírio produtivista, é o ponto de convergência
entre as correntes ecossocialistas. A base ecossocialista é a união das visões das correntes
socialistas e ecológicas com o questionamento à autonomização da economia, ao domínio
dos valores quantitativos, à produção como objetivo em si mesma e à tirania do capital. Para
superar essa hegemonia do capital, as propostas vermelhas e verdes devem estar unidas: o
resgate dos valores qualitativos e do valor de uso para a construção de uma igualdade
social e a satisfação das necessidades de todos, para os vermelhos; e a preservação da
Natureza e equilíbrio ecológico para os verdes (LÖWY, 2005a, p. 42; LÖWY, 2011, p. 26).

Nesse caso, não há divergência de objetivos entre vermelhos e verdes, mas


complementariedade, o que se enriquece com a participação das demais “cores” libertárias
do arco-íris ecossocialista. Löwy (2000b, p. 238; 2005a, p. 62; 2011, p. 45) concorda com
Riechmann na afirmação que o combate por uma nova civilização, mais humana e
ecológica, deve unir o conjunto dos movimentos sociais emancipadores, associando
vermelho do movimento operário anticapitalista, a violeta das lutas da libertação da mulher,
o branco dos movimentos pela paz, o negro dos libertários e anarquistas e o verde da luta
por um planeta habitável:

no puede renunciar a ninguno de los colores del arcoiris: ni al rojo del


movimiento obrero anticapitalista e igualitario, ni al violeta de las
luchas por la libertación de la mujer, ni al blanco de los movimientos
noviolentos por la paz, ni al antiautoritario negro de libertarios y
anarquistas, ni mucho menos al verde de la lucha por una
humanidade justa y libre sobre um planeta habitable (RIECHMANN,
2012, p. 39).

Essa associação entre segmentos dos movimentos está presente nos documentos dos
partidos ecossocialistas. Os documentos de programas e debates dos partidos franceses
NPA - Nouveau Parti Anticapitaliste, Parti de Gauche e Ensemble e do brasileiro PSOL
apresentam propostas envolvendo o arco-íris ecossocialista, principalmente, a questão da
libertação da mulher e o fim das discriminações raciais e orientações sexuais, assim

74
confirmam a relevância da articulação do arco-íris ecossocialista para a construção de outra
lógica de civilização.

O ecossocialismo é também chamado de ecomarxismo, porque a presença do


pensamento marxista na forma do ecossocialismo propor as transformações para uma outra
sociedade é essencial e polêmica. A relação do pensamento marxista com o debate
ecológico é controversa, pois há passagens da produção marxiana em que ocorre forte
presença de questões ecológicas e em outras, o tema é ignorado. Para Löwy (2005a, p. 19;
Löwy, 2011, p. 79), os temas ecológicos não estão no lugar central nas obras marxianas,
mas há referências do poder destrutivo do produtivismo capitalista e a necessidade de outra
forma de relação entre a Natureza e o homem. A não centralidade do debate ecológico na
produção marxiana possibilitou questionamentos sobre o produtivismo e posição
“prometeico” na sua obra.

Alguns setores do movimento ecológico acusam o pensamento marxista de ser


produtivista. Por um lado, essa acusação é pertinente, pois a questão do progresso da
sociedade foi associada ao evolucionismo, e há falta de uma crítica mais radical à civilização
industrial, essa interpretação da contribuição da evolução humana do capitalismo pode ser
encontrada no prefácio da Contribuição à crítica da economia política de 1859 (Löwy, 2000b,
p. 229; Löwy, 2005a, p. 24; Löwy, 2011, p. 85-86). Por outro lado, a acusação é injusta, pois
apesar da questão ambiental não ser o tema central de sua obra, Marx denunciou o
produtivismo da acumulação capitalista como objetivo por si mesmo como fonte de
deterioração da saúde do trabalhador e da destruição da Natureza (LÖWY, 2000b, p. 229;
LÖWY, 2005, p. 23-24; LÖWY, 2011, p. 84).

No relacionamento inseparável humanidade e Natureza, as consequências nefastas


do capital afetam aos dois. As contradições do “progresso” sob as forças produtivas estão
descritas no Capital, na passagem sobre a agricultura capitalista, na qual os autores
afirmam que essa destrói a saúde física e a vida espiritual do trabalhador, destruindo
também a fertilidade do solo, através de colheitas cada vez mais antecipadas. Para os
autores: “a produção capitalista só desenvolve a técnica e a combinação do processo de
produção social ao mesmo tempo em que esgota as duas fontes de onde brota toda a
riqueza: a terra e o trabalhador” (LÖWY, 2000b, p. 230).

O Reino da Liberdade é a alternativa marxiana à fúria destrutiva do produtivismo.


Nessa proposta utópica, Marx aponta para uma nova forma de relacionamento da
humanidade com a felicidade, que valoriza a relação entre os seres humanos com os
demais seres e entre si, indica a ruptura com a lógica produtivista do capitalismo e

75
socialismo “real” e resgata a valorização do ser humano com sua plena realização de suas
potencialidades. Para Marx, o socialismo resgata a produção de valores de uso: consumo e
produção não devem ser guiados pelo crescimento infinito de posse de bens (“o ter”), mas o
aumento da disponibilidade de tempo para o ser humano buscar e viver suas
potencialidades (“o ser”). Esse tempo será possível com a redução da jornada de trabalho
(Löwy, 2000b, p. 229; Löwy, 2005a, p. 23-24; Löwy, 2005a, p. 58; Löwy, 2005a, p. 71; Löwy,
2011, p. 84; Löwy, 2011, p. 120-121; Löwy, 2012b, p. 149). O tempo é redefinido no Reino
da Liberdade, ele não está mais submetido à lógica da acumulação de infinitas de bens,
induzida pela ideologia burguesa e sua publicidade, mas sim, no envolvimento de atividades
que proporcionam realização pessoal como: culturais, lúdicas, eróticas, esportivas, artísticas
e políticas (LÖWY, 2005a, p. 58; LÖWY, 2005a, p. 71; LÖWY, 2011, p. 120-121).

O tempo social é proporcionado pela libertação da “obrigatoriedade” das pessoas


acumularem bens, e essa liberdade gera condições delas se realizarem através do convívio
cidadão e lúdico, essencial para uma sociedade ecossocialista:

o ecossocialismo é fundado numa aposta, que já era a de Marx:


predominância, numa sociedade sem classes, do “ser” sobre o “ter”,
isto é, da realização pessoal, pelas atividades culturais, lúdicas,
eróticas, esportivas, artísticas, políticas, em vez do desejo de
acumulação ao infinito de bens e produtos. Esse desejo é induzido
pela ideologia burguesa e pela publicidade, e nada indica que é uma
“natureza humana eterna” (LÖWY, 2005a, p. 58).

Associada a crítica de produtivismo, há também, a acusação de que Marx e Engels


defendiam a posição humana como o conquistador “Prometeu”. Essa posição opõe a
humanidade à Natureza, dando ao homem o poder de mestre e dono do mundo natural,
assim, submetendo-a ao domínio tirânico do mesmo, mas essa percepção é contraditória
com a definição de domínio presente nos escritos de Marx e Engels, quando eles definem
que no socialismo os seres humanos terão consciência da Natureza pelo domínio do
conhecimento das suas leis (LÖWY, 2005a, p. 20; LÖWY, 2011, p. 80).

Para Engels, o domínio da Natureza pelo homem não pode ter a mesma lógica de
uma invasão de um povo em terras estrangeiras, esse domínio tem outro conceito: é uma
relação de pertencimento, de conhecimento de suas leis e sabedoria na aplicação da ação
sobre a Natureza (Engels, 2000, p. 223-224). Essa sabedoria é possibilitada pelas ciências
naturais e suas descobertas sobre as consequências das ações humanas sobre a Natureza
de uma forma mais consistente, compreendendo além dos efeitos imediatos. Esse crescente
conhecimento tem consequências positivas para relação entre ambos.

76
tanto mais os homens se sentirão unificados com a Natureza e tanto
mais terão a consciência disso, tornando-se cada vez mais impossível
sustentar essa noção absurda e antinatural que estabelece a
oposição entre espírito e matéria, entre o homem e a Natureza, entre
alma e corpo (ENGELS, 2000, p. 224).

Para esses autores não há como separar a humanidade da Natureza. A Natureza é


descrita nos Manuscritos de 1844 como corpo “inorgânico” do homem, isto é, sua
sobrevivência depende de sua interação contínua. Marx (2010, p. 84) afirma que “a vida
psíquica e mental do homem está interconectada com a natureza não tem outro sentido
senão que a natureza está interconectada consigo mesma, pois o homem é uma parte da
natureza”. Mas, para a superação do antagonismo entre homem e Natureza, deve ocorrer a
eliminação da propriedade privada (LÖWY, 2005a, p. 20-21; LÖWY, 2011, p. 80-81).

A relação entre humanidade e Natureza também afeta a percepção de produção de


riqueza, assim, o conceito de geração de riqueza ganhou nova definição pelos autores do
Capital. A riqueza, para Marx, não é produzida somente pelo trabalho, a Natureza é a fonte
dos valores de uso, da riqueza real, manifestada pelo trabalho humano, forma natural
(LÖWY, 2005a, p. 23).

A integração entre a Natureza e a humanidade não é estática, há mudanças mútuas e


“é na medida em que o homem aprendeu a transformar a Natureza que a sua inteligência foi
crescendo” (Engels, 2000, p. 139). Porém, quando o domínio humano transgride os limites
de adaptação da Natureza, sua reação retorna contra o próprio homem; Engels (2000, p.
223-224) alertou que não “nos regozijemos demasiadamente em face dessas vitórias
humanas sobre a Natureza. A cada uma dessas vitórias, ela exerce a sua vingança. Cada
uma delas, na verdade, produz, em primeiro lugar, certas consequências com que podemos
contar; mas, em segundo e terceiro lugares, produz outras muito diferentes, não previstas,
que quase sempre anulam essas primeiras consequências”. Esse alerta está fundamentado
na obra de Engels nos exemplos de experiências em diversas passagens da história, em
que a humanidade desmatou para plantar ou para criar gado e, com esse desmatamento,
provocou enchentes, secas, desertificação e proliferação de doenças (ENGELS, 2000, p.
223-224).

Outra contribuição marxiana para o debate socioecológico é o principio da


responsabilidade presente no Livro III do Capital através da afirmação ética que a
humanidade não é proprietária da terra, são sim, ocupantes com direito de usufruir e com a
missão de cuidar e deixá-la em melhores condições para as futuras gerações (LÖWY,
2005a, p. 35; LÖWY, 2011, p. 96).

77
O envolvimento de Marx no debate ambiental foi orientado pelas preocupações
ecológicas de seu tempo. Foster (2012, p. 88) alerta que a crítica ecológica de Marx está
limitada pelo período em que foi escrita. As grandes preocupações da sociedade europeia
do século XIX eram: “o esgotamento da fertilidade do solo, só comparável às preocupações
com a crescente poluição das cidades, o desflorestamento de continentes inteiros e os
temores malthusianos de superpopulação” (FOSTER, 2005a, p. 211).

Dessas preocupações, um dos principais pontos ecológicos nas obras de Marx é sua
reflexão sobre o desgaste do solo e seu impacto social. Marx, apoiado pelas pesquisas do
agrônomo químico Justus von Liebig, desenvolveu a problematização e crítica radical dos
desastres socioecológicos resultantes do produtivismo capitalista, assim, avançou a
teorização do metabolismo da ruptura entre a humanidade e a Natureza gerada por este
produtivismo (Löwy, 2005a, p. 27; Löwy, 2011, p. 87). No livro I do Capital, a conclusão
alerta que o produtivismo capitalista não só desgasta a saúde física e espiritual do
trabalhador, mas também, deteriora a relação entre a humanidade e a terra, afetando a
perenidade da fertilidade do solo, tornando cada vez mais difícil a sua contribuição com o
bem viver (LÖWY, 2011, p. 89).

A análise metabólica foi desenvolvida inicialmente pela química e biologia no inicio do


século XIX para auxiliar os estudos sobre os processos químicos dos organismos, suas
operações e interações com o meio ambiente, esse processo é dinâmico e a interação é
mútua, isto é, o organismo extrai matérias e energia do seu meio ambiente e a transforma
por troca metabólica (Foster, 2010, p. 22). Marx incorporou esse conceito, porém ampliando
o seu contexto e o aplicou em sua produção, principalmente após 1950. Em Marx, a troca
metabólica ganhou um “significado ecológico específico e um significado social mais amplo”,
dando-lhe um sentido socioambiental (FOSTER, 2010, p. 22).

Ao ser aplicada na lógica capitalista, a troca metabólica foi interrompida pela excessiva
urbanização e a migração maciça da população para os grandes centros, assim, os
nutrientes essenciais a reposição do solo, produzidos pelo ser humano, eram despejados
nos rios, poluindo-os, ao invés de retornar para o solo (Foster, 2010, p. 24). Esse processo
de absorção de pessoas pelos grandes centros e o empobrecimento químico do solo foi
denominado Raubbau por Justus von Liebig. Para Marx, Raubbau, roubo, tomou a forma de
“uma fenda irreparável” no interior da sociedade ao romper o metabolismo entre a
humanidade e a terra, um metabolismo “prescrito pelas próprias leis naturais”, o que exige
sua restauração sistemática enquanto “lei regulativa da produção social” (FOSTER, 2012, p.
91).

78
A fenda metabólica na relação humanidade e Natureza descrita por Marx no século
XIX evoluiu em múltiplas fendas metabólicas e ecológicas, transgredindo as fronteiras entre
a sociedade e a Natureza e colocando em risco as condições de sobrevivência da
humanidade (FOSTER, 2012, p. 101).

Para Löwy, é impossível ter uma análise ecológica sem considerar a crítica marxista
da acumulação destrutiva do capital, sem essa gama de conceito, o parecer ecológico não
consegue superar a limitação de propor ajustes dos excessos do capitalismo produtivista e
perde a capacidade de apresentar soluções consistentes para a crise socioambiental
(LÖWY, 2005a, p. 37 LÖWY, 2011, p. 98).

Para compreender esta realidade, suas contradições e as


possibilidades de sua transformação radical, a obra de Marx
permanece um ponto de partida indispensável, uma ferramenta
insubstituível, uma bússola sem a qual temos boas chances de perder
o caminho (LÖWY, 2000c, p. 61).

Em contra partida, o debate ambiental é uma oportunidade de enriquecimento do


pensamento marxista. Os temas ecológicos que estão presentes nos itens indicados por
Löwy devem ser aprofundados no pensamento marxista (LÖWY, 2000a, p. 128):
1. Novo sistema produtivo e tecnológico que não agridam o meio ambiente e usem fontes
renováveis de energia;
2. Radical emancipação do trabalho incluindo o fim da divisão sexual do trabalho e
separação e hierarquização da produção manual e intelectual;
3. Crescente distribuição de bens e serviços para atender as necessidades materiais e
culturais da sociedade, substituindo a lógica do mercado e do dinheiro;
4. As relações entre gêneros e raças sejam verdadeiramente “igualitárias, não
hierárquicas e não opressivas”;
5. Substituição do Estado por um modelo de governança socioambiental democrático, e
a universalização para o conjunto da humanidade de valores até então restritos (e impostos)
às mulheres: a serenidade, o cuidado com o outro, o altruísmo etc.

O movimento ecológico, além dos demais movimentos sociais (pacifismo, feminista,


diversidade sexual, etc.) contribui com a renovação necessária do pensamento marxista,
dando-lhe um caráter universal de busca da eliminação de todas as formas de opressão
(Löwy, 2000a, p. 126). Para Löwy (2000b, p. 231; 2005a, p. 38; 2011, p. 26-27), a questão
ecológica é “o grande desafio para uma renovação do pensamento marxista no início do
século XXI”, pois ela provoca uma revisão profunda da concepção das forças produtivas no
pensamento marxista atual, assim como rompimento com os atuais paradigmas do

79
progresso e tecnologia da civilização industrial moderna. O marxismo precisa radicalizar sua
crítica da modernidade e da civilização industrial burguesa para oferecer propostas
concretas aos desafios atuais (LÖWY, 2000d, p. 242).

Ao mesmo tempo, o ecossocialismo procura apresentar alternativa à esquerda


tradicional, cujo projeto político mantém o modelo de produção existente, deixando
investimentos ambientais negligenciados ou marginalizados (Löwy, 2009b, p. 36). A
esquerda tradicional busca a substituição da propriedade privada pela a propriedade coletiva
dos meios de produção, mas os ecossocialistas acreditam que esse encaminhamento é
bom, mas não é o suficiente, pois não é possível o desenvolvimento ilimitado das forças
produtivas, deve-se questionar sobre a manutenção do próprio aparelho produtivo (Löwy,
2012a, p.13). Nesse aspecto o diálogo dos setores partidários ecossocialistas com os
demais setores da esquerda é fundamental para renovar seu pensamento e propostas.

80
3.2 Ética Ecossocialista

A ética ecossocialista orienta a nova forma de propor e construir uma outra civilização
com valores sociais e ecológicos qualitativos e irredutíveis aos valores do capital. Para isso,
une valores fraternidade, igualdade e justiça social do socialismo e valores ecológicos como
proteção ambiental, proibição do desperdício de energia, respeito pela Natureza e pela vida
em todas as suas formas, proteção da biosfera, movimento cooperativo e uma
transformação radical da relação entre humanidade e Natureza (MÜNSTER, 2013, p. 123).

Há, na ética ecossocialista, a consciência de que apenas o desenvolvimento de uma


nova racionalidade econômica ecológica, substituindo a lógica capitalista e produtivista,
pode prevenir novas catástrofes ambientais e proteger a humanidade (MÜNSTER, 2013, p.
126).

Para Münster (2013, p. 123-124), a ética ecossocialista está baseada na consciência


utópica da necessidade de transformação radical das nossas relações com a Natureza e do
modo de vida atual e assume que a sobrevivência da humanidade está ameaçada pela atual
forma de civilização com a poluição das nossas cidades, destruição progressiva dos
ecossistemas e biosfera. A consciência utópica crítica provoca o enfrentamento ao poder
das forças capitalistas poluidoras e o sentimento de solidariedade a todas as vítimas do
capitalismo anti-ambiental das corporações em todo planeta, principalmente na África, Ásia
e América Latina.

Para Löwy, a ética ecossocialista pode ser assumida como a união de cinco éticas:

1. Social: a construção de uma nova sociedade é uma responsabilidade coletiva. Assim,


as ações individuais como respeito ao meio ambiental, autolimitação ou recusa aos
desperdícios são importantes, mas, insuficientes. As transformações ocorrem com a
participação coletiva organizada, isto é, a sociedade organizada nos movimentos ambientais
e sociais, partidos políticos, etc. (LÖWY, 2005a, p. 72-73; LÖWY, 2011, p. 122).
2. Igualitária: a produção e consumo dos países desenvolvidos são perdulários,
ostentatórios e ambientalmente destrutivos e, se for democratizado, isto é, acessível a todos
no planeta, mantendo esse modelo de consumo, provocará colapso planetário,
inviabilizando a presença humana. A ética igualitária ecossocialista propõe a redistribuição
planetária da riqueza de forma igualitária com responsabilidade ambiental, “graças a um
novo paradigma produtivo” (LÖWY, 2005a, p. 74; LÖWY, 2011, p. 123).
3. Solidária: a solidariedade ecossocialista implica em assumir que a satisfação das
necessidades sociais deve ser regida pela apropriação coletiva dos meios de produção e a

81
distribuição de seus produtos deve seguir o critério da equidade, isto é, a partilha será “a
cada qual segundo as suas necessidades”, assim, não há homogeneização e nem a
equidade liberal (LÖWY, 2005a, p. 74-75; LÖWY, 2011, p. 123-124);
4. Democrática: a democracia ecossocialista assume que as decisões econômicas e as
escolhas produtivas devem ser tomadas pela sociedade, tirando esse poder dos banqueiros
e tecnocratas, donos do poder capitalista e do Politburo do socialismo “real”. Assim, as
definições sobre a produção e distribuição serão frutos de debate democrático e plural, mas
sempre orientados por outra forma de responsabilidade: não exploração dos trabalhadores e
preservação do meio ambiente (LÖWY, 2005a, p. 75; LÖWY, 2011, p. 124);
5. Radical: o ecossocialismo busca a raiz da crise socioambiental e alerta que as
propostas de reformas e mercados de direito de poluir são incapazes de oferecer uma
solução concreta. A ética ecossocialista indica que é “necessária uma mudança radical de
paradigma, um novo modelo de civilização, em resumo, uma transformação revolucionária”
(LÖWY, 2005a, p. 76; LÖWY, 2011a, p. 124).

A ética ecossocialista assume a ética da responsabilidade e do cuidar em uma outra


lógica de civilização. O princípio da responsabilidade assumido é a reflexão de Hans Jonas
na sua obra O Princípio da Responsabilidade, sua contribuição foi apresentar as ameaças
de destruição ambiental pela tecnologia moderna às futuras gerações (Löwy, 2011, p. 125).
Porém o alerta de Hans Jonas dos riscos projetados para as futuras gerações deve ser
revisto porque foi antecipado pelas mudanças climáticas; as consequências e riscos da crise
ambiental já se iniciaram no inicio do século XXI (Löwy, 2005a, p. 73-74; Löwy, 2011, p.
125). Outro ponto é que a ética ecossocialista difere do principio da responsabilidade, por
não ser fruto do medo, mas sim, de uma consciência lúcida e crítica que se une ao
“otimismo militante” de Ernst Bloch e a esperança messiânica para a construção da utopia
de uma nova sociedade (MÜNSTER, 2013, p. 127).

Na percepção da ética ecossocialista, não há contradição entre o princípio da


responsabilidade de Hans Jonas e o princípio da esperança de Bloch, e sim, uma
complementariedade, pois sem o princípio da responsabilidade, a utopia é apenas
destrutiva, e sem o principio da esperança, a responsabilidade é somente uma ilusão
conformista (LÖWY, 2011, p. 127).

A base transformadora de uma sociedade orientada pela ética ecossocialista é a


autoemancipação. A autoemancipação da classe oprimida é o empoderamento, não só dos
meios de produção como também das decisões democráticas sobre fatores de qualidade de
vida, como produtos que devem ser subvencionados, fontes de energias, sistema de
mobilidade e ações reparadoras de degradação ambiental. Estas decisões e

82
encaminhamentos não devem ser monopolizados por leis de mercado ou por oligarquias,
seja capitalista ou socialista (LÖWY, 2005a, p. 52; LÖWY, 2009, p. 7).

A autoemancipação do oprimido é a premissa para uma transformação socioambiental


libertadora. Como escreveu Marx na fundação da Primeira Internacional: “a emancipação do
proletariado é tarefa do próprio proletariado” (Löwy, 2000a, p. 125), essa autolibertação é a
tomada da consciência do oprimido sobre sua condição alienada, seus reais interesses,
aspirações e valores (Löwy, 2000a, p. 125). Para Singer (1998, p. 131), o despertar para a
desalienação inicia-se pela a conscientização de que a sociedade está alienada da maioria
das decisões que afetam sua vida, para isso é necessária uma participação ativa em
cooperativas, sindicatos, centros estudantis e partidos políticos. Essa libertação envolve
internalizar a democracia em todos os níveis da relação humana:
O socialismo não existe na realidade atual; precisa ser reinventado
como o resultado final da luta pelo futuro. Isso significa encorajar uma
discussão de longo alcance, sem limites ou tabus sobre as
possibilidades de um socialismo democrático baseado na autogestão,
com planejamento verdadeiramente democrático (onde os valores de
uso predominem novamente sobre os valores de troca), relações não
alienadas entre os sexos, o restabelecimento da harmonia entre a
humanidade e a natureza e o equilíbrio ecológico do planeta (LÖWY,
2000a, p. 127).

Este empoderamento envolve mudança de paradigma na forma de organização


socioeconômica, e consequentemente alteração da atual forma de organização
concentradora de riqueza e poder, gerador de desigualdade das condições sociais. A nova
organização além de eliminar a estrutura de classes, altera a forma de decisões sobre
fatores de impacto nas rotinas da população, como transporte, fontes de energia e
distribuição da produção. As decisões passam a ser fruto de “debate democrático e
contraditório entre diferentes propostas” (LÖWY, 2009b, p. 7).

A ruptura conduzida pela autoemancipação ocorre pela libertação da alienação


exterior e dos grilhões internos. Esse despertar ocorre na própria práxis transformadora, que
“os explorados e os oprimidos podem quebrar ao mesmo tempo as “circunstâncias”
exteriores que os aprisionam – o Capital, o Estado – e sua consciência mistifica anterior”
(LÖWY, 2000c, p. 59).

Umas das principais armas da política de domínio hegemônico é a aderência da


sociedade, principalmente o estrato mais humilde, aos valores do opressor. A dominação
pelos valores hegemônicos ocorre com ampla divulgação de mitos de “bom aculturamento”

83
e despreparo das forças populares e desqualificação da cultura popular; esse processo é
uma fraude ideológica que busca escravizar a sociedade aos interesses de uma minoria.

Paulo Freire apresenta a relação de valores impostos pelos opressores à toda


sociedade, que formam a base ideológica da manutenção de poder, apesar de extenso, a
leitura ajuda a entender a dinâmica dos mitos transmitidos pelo opressor para a manutenção
da opressão:
O mito, por exemplo, de que a ordem opressora é uma ordem de
liberdade. De que todos são livres para trabalhar onde queiram. Se
não lhes agradar o patrão, podem então deixá-lo e procurar outro
emprego. O mito de que esta “ordem” respeita o direito da pessoa
humana e que, portanto, é digna de todo apreço. O mito de que
todos, bastando não ser preguiçosos, podem chegar a ser
empresários – mais ainda, o mito de que o homem que vende, pelas
ruas, gritando: “doce de banana e goiaba” é um empresário tal qual o
dono de uma grande fábrica. O mito do direito de todos à educação,
quando o número de brasileiros que chegam às escolas primárias do
país e dos que nelas conseguem permanecer é chocantemente
irrisório. O mito da igualdade de classe quando o “sabe com quem
está falando?” é ainda uma pergunta dos nossos dias. O mito do
heroísmo das classes opressoras, como mantenedoras da ordem que
encarna a “civilização ocidental cristã”, que elas defendem da
“barbárie materialista”. O mito de sua caridade, de sua generosidade,
quando o que fazem, enquanto classe, é assistencialismo, que se
desdobra no mito da falsa ajuda que, no plano das nações, mereceu
segura advertência de João XXIII. O mito de que as elites
dominadoras, “no reconhecimento de seus deveres”, são as
promotoras do povo, devendo este, num gesto de gratidão, aceitar a
sua palavra e conformar-se com ela. O mito de que a rebelião do
povo é um pecado contra Deus. O mito da propriedade privada, como
fundamento do desenvolvimento da pessoa humana, desde, porém,
que pessoas humanas sejam apenas os opressores. O mito da
operosidade dos opressores e o da preguiça e desonestidade dos
oprimidos. O mito da inferioridade “ontológica” destes e o da
superioridade daqueles (FREIRE, 2011, p. 188 – 189).

A adesão desses valores está presente no preconceito do oprimido pelos opressores e


no comportamento opressor dos capatazes em relação aos antigos companheiros. Nesse
caso, o capataz se posta mais duro que os próprios opressores por medo da liberdade e a
adesão dos mitos (FREIRE, 1992, p.106; FREIRE, 2011, p. 45-46).

84
A denúncia é o primeiro passo para construção de outra sociedade. A consciência que
a sociedade é malvada, desigual e desumanizadora somente ocorre com o exercício critico
da leitura e da releitura do mundo (Freire, 1992). A denúncia busca desconstruir a política
deliberada pelos dominantes em convencer os dominados que são seres incultos e
incapazes, um adestramento que transforma os homens em “coisas”.

A ruptura dessa situação de opressão, a práxis utópica, está relacionada com a


clareza política do enfrentamento da realidade concreta. Para Paulo Freire (2011, p. 125 -
127), as “situações-limites”, isto é “dimensões concretas e históricas de uma dada realidade”
não podem ser encaradas como intransponíveis e ao invés da busca da adaptação, a
resposta deve ser respostas transformadoras.

Além da conscientização da realidade concreta, a classe oprimida deve indignar-se. É


fundamental para a construção da proposta utópica que haja a discordância da situação
perversa da realidade, haja indignação. Para Hessel (2011), a razão para ser resistência foi
a indignação e é preciso que todos tenham indignação para as mudanças ocorreram.

O processo de conhecimento e indignação requer a reapropriação do tempo pela


sociedade. A liberdade para a cidadania é um dos pontos debatidos pela ética
ecossocialista, pois não é possível informar-se, debater ideias e propostas, atuar
politicamente sem ter o tempo disponível. A apropriação deste pelo capital é uma barreira à
autoemancipação.

Seja no controle do tempo dedicado ao trabalho ou apropriando o tempo “livre” do


trabalhador, o capital incorpora o tempo da sociedade à seu favor, afinal “tempo é dinheiro”.
O controle rígido do ritmo do trabalho pode ser ilustrado na produtividade exigida aos
profissionais de telemarketing, há desconto nos rendimentos quando o intervalo entre duas
chamadas for superior a dois segundos, e o controle, em centésimos de segundos, das
costureiras de algumas grandes marcas (DOWBOR, 2013a, p. 143).

Além do controle do fluxo do trabalho, há também a apropriação do tempo livre. Para


Dowbor (2013a, p. 143), o “desperdício do nosso tempo constitui provavelmente uma das
externalidades mais poderosa do capitalismo”. O setor bancário é exemplar nesse aspecto:
está protegido pela pilhagem coletiva do tempo dos clientes, pois “basta assegurar que os
outros bancos se comportam de maneira semelhante, para não criar má fama” (Dowbor,
2013a, p. 143). Além do período de permanência nas filas dos caixas para compensar a
redução do número de atendentes, os bancos terceirizaram os clientes na sua linha de
produção, com a vantagem de não precisar remunerá-los, o acesso remoto ou em ATM
transferem para o cliente as tarefas então executadas pelo bancário. A revista The

85
Economist, na página 16 da edição de 18 de setembro de 2004, apresenta um comentário
que ilustra essa apropriação do tempo:

Muitas pessoas se queixam de empresas que terceirizam o trabalho


para países de baixos salários: mas quantos notam que as empresas
estão crescentemente terceirizando o trabalho para os seus próprios
consumidores?...Quem já não se viu pego em séries intermináveis de
menus numéricos? – isto pode deixar clientes furiosos e aliená-los.
No seu desejo de cortar custos, muitas empresas dificultam
deliberadamente o acesso a um operador humano (DOWBOR,
2013a, p. 83).

Na mesma edição, The Economist apresenta os números do valor do tempo


apropriado do cliente ao fazê-lo trabalhar para si: “o auto-serviço online pode reduzir o custo
de uma transação até um mínimo $0,10, comparando com $7,00, para fazer a mesma
transação num call center” (DOWBOR, 2013a, p. 84).

É insuficiente apontar apenas para o setor bancário como apropriador de tempo social,
há mais setores como transporte público, companhia telefônica entre outros. A escravatura
fóssil também danifica o tempo da sociedade, o paulistano gasta em média duas horas e
quarente e três minutos no trânsito com uma média de 14 km/hora (Dowbor, 2013a, p. 146-
147). O empoderamento do tempo pela sociedade deve, além da redução da jornada de
trabalho, assumir politicamente o domínio de seu tempo livre.

Mas estes objetivos passam por um valor essencial que precisa ser
resgatado: o da solidariedade humana. Primeiro, porque é triste ver
estes pobres seres humanos, que passam numa breve viagem pela
vida, gastar o seu pouco tempo arreganhando os dentes uns para os
outros, como que impotentes frente às suas raízes animais – homo
homini lupus – incapazes de ver, ou de ter o tempo para ver a beleza
do rio que passa, o esplendor do pôr do sol, a genialidade de um
poema, o gosto de um trabalho bem feito, a magia de uma criança
que descobre uma coisa nova, cada vez mais motivados
negativamente pela insegurança generalizada, numa eterna fuga para
a frente, correndo como loucos atrás do sucesso, ainda que sabendo
perfeitamente onde termina a corrida. A solidariedade é uma questão
de elementar senso das realidades (DOWBOR, 1998, p. 9).

Além de libertar-indignar, a ética ecossocialista induz a aliança entre a reflexão e a


ação para construir outra lógica de civilização. O tempo livre associado, além do lazer, é

86
fundamental para a participação da sociedade no debate democrático. Para Löwy (2011, p.
57), o planejamento democrático é o exercício da liberdade da decisão que se faz em
conjunto na sociedade. Esse exercício é necessário para libertar das leis econômicas e das
gaiolas de ferro alienantes que estruturam a sociedade capitalista e burocrática. A
planificação democrática associada à redução de tempo de trabalho seria um progresso
para chegar ao “Reino da Liberdade” anunciado por Marx, o argumento do tempo livre é
condição para a participação dos trabalhadores na discursão democrática e gestão
econômica e social. Para Marx (1988e, p. 255), a “redução da jornada de trabalho é a
condição fundamental” para o verdadeiro reino da liberdade.

Loin d’être « despotique » en soi, la planification démocratique est


l’exercice de la liberté de décision que se donne l’ensemble de la
société. Un exercice nécessaire pour se libérer des « lois
économiques » et des « cages de fer » aliénantes que sont les
structures capitalistes et bureaucratiques. La planification
démocratique associée à la réduction du temps de travail serait un
progrès considérable de l’humanité vers ce que Marx appelait « le
royaume de la liberté » : l’argumentation du temps libre est en fait un
condition de la participation des travailleurs à la discussion
démocratique et à la gestion de l’économie comme de la société
(LÖWY, 2011, p. 57).

A retomada cidadã do tempo pelo trabalhador é uma grande ameaça ao domínio do


capital, pois a disponibilidade para o convívio social, criando e fortalecendo vínculos
comunitários, a cooperação entre as pessoas e com a natureza é destruidor da lógica do
individualismo egoísta que sustenta o capitalismo (LÖWY, 2000d, p. 244).

87
3.3 Planejamento e Estratégia na construção do Ecossocialismo

A corrente ecossocialista, como utopia concreta, não fica restrita apenas a debates de
projetos futuros e planos de governos, seu planejamento e estratégia envolvem ações
imediatas identificadas como emergências para a justiça socioambiental, seja propondo
soluções para problemas concretos, seja refutando falsas soluções. Nesse sentido, uma das
ações ecossocialista é se opor radicalmente a grandes projetos inúteis e ao desmatamento
florestal (MÜNSTER, 2013, p. 156-157).

A sociedade ecossocialista não ocorrerá naturalmente, deverá ser construída. A


proposta de Münster de ações emergenciais para essa construção foi influenciada pela
perspectiva do pensamento de Gorz (assim como já tinha sido definido por Renê Dumont),
as ações propostas unem as visões ambientalista e socialista de autogestão (Münster, 2013,
p. 130 - 131). As ações propostas são (MÜNSTER, 2013, p. 130 - 131):
 Substituição da racionalidade econômica dominante por uma racionalidade econômica
e social, em ruptura da lógica capitalista produtivista, de exploração ilimitada dos recursos
naturais, destruidora dos ecossistemas e de maximização do lucro;
 Decrescimento da produção, graças à autolimitação das necessidades de consumo,
assumindo que a sociedade pode produzir melhor com menos. Uma declaração de guerra
ao capitalismo e seu produtivismo;
 Instauração de linhas de produção comunitária de autogestão dos trabalhadores
associados;
 Direito a um rendimento, dissociado do trabalho, ou seja, uma renda de subsistência,
independentemente de inclusão em estruturas de trabalho organizado.

Para que ocorra o debate democrático na forma de produção, distribuição e consumo,


o aparelho produtivo deve ser orientado pelo empoderamento da sociedade. A
transformação socioambiental ecossocialista é radical, sua conquista do Estado e dos
aparelhos produtivos não tem a missão de assumir a gestão, mas sim, de criar outras
estruturas adequadas às necessidades da humanidade. A inspiração dessa ação é o alerta
de Marx – numa carta a Kugelmann debatendo a Comuna de Paris – sobre o aparelho do
Estado, na qual afirma que os trabalhadores não devem apropriar-se do aparelho do Estado
burguês e usá-lo a seu serviço, devem sim, destruí-lo e criar outro tipo de poder, pois o
Estado nunca estará a serviço dos trabalhadores. Esse mesmo conceito deve ser usado na
conquista do aparelho produtivo, pois ele tem a lógica do lucro, da acumulação competitiva.
Nesse desafio, os trabalhadores devem transformar estruturalmente a forma de produzir
(LÖWY, 2005a, p. 40; LÖWY, 2009b, p. 38; LÖWY, 2012b, p. 150; LÖWY, 2011, p. 39-40).

88
A proposta para o Estado é que seja substituído por sistema de governança
democrático com planejamento participativo:
Mesmo o Estado proletário, revolucionário deveria acabar por
“definhar” (Engels), suas funções indispensáveis sendo
progressivamente absorvidas pela sociedade civil. O planejamento
numa escala mundial, baseado em unidades regionais e locais,
substituiria o sistema atual de nações-Estado rivais com suas
fronteiras, exércitos, alfândegas etc (LÖWY, 2000a, p. 128)

O novo aparelho produtivo, assim como o novo Estado, deve ser construído por outra
racionalidade envolvendo planejamento democrático, participativo e ecológico, assim um
dos desafios da tomada ecossocialista do meio de produção é a definição da forma de
posse e exercício do controle da produção. O poder de decisão sobre investimento e
tecnologia sai do capital financeiro e das empresas privadas e será assumido pela classe
oprimida e estará à serviço de todos. A tecnologia deve estar à serviço da classe
trabalhadora que, assim, assume o seu controle, pois seu papel é fundamental para criar
novas condições da construção de uma outra forma de produzir e conviver. A contribuição
das novas tecnologias para despoluir ricos e solos, expandir o uso de energia solar e eólica,
além de desenvolver outras formas de energia renováveis e não poluentes entre diversas
oportunidades que a tecnologia proporciona se for apropriada de forma social (Löwy, 2011,
p. 35-36).
Essas são as bases para a construção de uma sociedade ecossocialista, que terá um
processo longo, e as necessidades de mudanças são urgentes. Nesse processo, há ações
de transição. Para Löwy (2009b, p. 36), para construir uma sociedade ecossocialista, é
necessário superar três condições para efetivar as transformações socioambientais:
1) “propriedade coletiva dos meios de produção”, o termo “coletivo” é definido como
propriedade pública, comunitária ou cooperativa;
2) “planejamento democrático que possa permitir à sociedade a possibilidade de definir
seus objetivos no que concerne ao investimento e à produção” e
3) “nova estrutura tecnológica das forças produtivas”.

O planejamento ecossocialista envolve transformação crítica do conjunto de avanços


capitalistas produzido pela ciência e tecnologia. As inovações que envolvem produtivismo,
riscos à Natureza e à humanidade devem ser descontinuadas, por exemplo, a geração de
energia nuclear, técnicas de pesca intensiva, produção com desmatamento de florestas
entre outros, assim como, deve haver investimento nas inovações que melhoram as
condições de produção humana com baixo impacto ambiental. A geração de energia é um
desafio crítico, pois as soluções hegemônicas, fósseis, impactam nas mudanças climáticas,

89
além de envenenar solo e rios e lençóis freáticos, nesse caso, as soluções energéticas que
devem ser geradas por fontes renováveis: Sol, ar e água (Löwy, 2009b, p. 38). A solução
energética nuclear não é indicada pela severidade dos riscos envolvidos e a falta de solução
consistente para seus resíduos tóxicos (Löwy, 2009b, p. 38).

Outro critério do planejamento ecossocialista é o pleno emprego equitativo (plein-


emploi équitable) (Löwy, 2009b, p. 38). Por ter forte relacionamento com o modelo
capitalista de divisão de tarefas, a palavra emprego pode ser substituída por participação
socioambiental, ficando o termo como “plena participação socioambiental equitativa”, esse
item, aproxima a perspectiva ecossocialista com as expectativas das organizações da
classe trabalhadora, mas em uma nova estrutura socioambiental, pois associa o controle
público dos meios de produção e um planejamento democrático (Löwy, 2009b, p. 38). A
proposta da apropriação dos meios de produção, não somente retira o poder de decisão da
classe dominante financeira e industrial, mas altera a lógica organizacional, pois envolve a
associação dos trabalhadores organizados com os demais setores da sociedade, sejam
seus consumidores ou vizinhos. Assim, haverá uma profunda transformação na decisão
produtiva, pois os “critérios sociais, políticos e ecológicos” substituirão a “lei da oferta e da
procura” (Löwy, 2009b, p. 39).

O planejamento democrático ecossocialista está associado ao tempo disponível da


população. Como defendido por Marx, o Reino da Liberdade prevê tempo social livre para a
população estar disponível para a cidadania, isto é, debates democráticos e gestão
socioecoambiental da sociedade e das organizações (Löwy, 2009b, p. 39).

90
3.4 Ecossocialismo e o Altermundismo

A ética radical aproxima os ideais ecossocialista e altermundistas. Desde os protestos


dos indignados com a inércia dos representantes oficiais da COP de Copenhague em 2009,
quando ocorreu a manifestação com mais de 100 mil pessoas em protestos nas ruas, com a
palavra de ordem “change the system, not the climate”, ou seja, “mudemos o sistema, não o
clima”, associando as mudanças climáticas ao modo capitalista de produção, a reivindicação
era o fim do capitalismo como forma de superação da crise ambiental climática (LÖWY,
2012a, p.12).

O sentimento dos movimentos ecológicos é que a transformação somente ocorrerá


com a sociedade organizada e consciente da imposição de uma mudança de civilização.
Além disso, os grandes embates da crise socioecológica são planetários. O movimento
altermundialista é “o mais importante fenômeno de resistência antissistêmica do início do
século XXI”, e os ecossocialistas se envolveram com o movimento altermundialista desde o
início (LÖWY, 2010, p. 39).

O movimento altermundialista tem como característica ser uma ampla rede


decentralizada, nessa rede estão sindicatos, movimentos camponeses, organizações
indígenas, ONGs, movimentos de mulheres e associações ecológicas. O marco de seu
nascimento foi a grande manifestação popular que provocou o fracasso da reunião da OMC
em Seattle em 1999. A partir dessa manifestação, os altermundialistas se encontram nas
grandes manifestações e no Fórum Social Mundial (LÖWY, 2010, P. 39).

O Fórum Social Mundial, FSM, é muito importante na relação entre o ecossocialismo e


o altermundismo por ser espaço de troca de experiências e reflexões, utilizado pelos
ecossocialistas para apresentar, debater e enriquecer suas propostas. FSM foi uma
proposta utópica pensada por Oded Grajew, Chico Whitaker e Bernard Cassen em fevereiro
de 2000 (Whitaker, 2005, p. 177) para oferecer espaço, que permitisse encontros de
dimensão mundial e a participação de todas as organizações comprometidas com a busca
utópica de uma outra sociedade. Para Boaventura de Sousa Santos (2005, p. 16), a
“dimensão utópica do FSM consiste em afirmar a possibilidade de uma globalização contra-
hegemônica. Por outras palavras, a utopia do FSM afirma-se mais como negatividade (a
definição daquilo que critica) do que como positividade (a definição daquilo a que aspira)”.

91
O Fórum Social Mundial foi planejado para ocorrer no mesmo período do Fórum
Econômico Mundial, que ocorre anualmente em Davos, pequena e luxuosa estação de esqui
na Suíça, com o objetivo de reunir lideranças e intelectuais para debater a evolução do atual
sistema capitalista. A força simbólica do paralelismo temporal entre o Fórum Social Mundial
e o Fórum Econômico Mundial é destacar o antagonismo dos “dois projetos de civilização e
duas realidades sociais opostas, antagônicas, irreconciliáveis” (LEITE, 2003, p. 70).

O projeto utópico do Fórum tornou-se realidade em janeiro de 2001 com o


engajamento organizacional das entidades ABONG – Associação Brasileira de
Organizações Não-Governamentais; ATTAC – Ação pela Tributação das Transações
Financeiras em Apoio aos Cidadãos; CBJP – Comissão Brasileira de Justiça e Paz da
CNBB; CIVES – Associação Brasileira de Empresários pela Cidadania; CUT – Central Única
dos Trabalhadores; CJG – Centro de Justiça Global; MST – Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra e apoio da prefeitura de Porto Alegre e do Estado do Rio Grande do Sul
(WHITAKER, 2005, p. 178).

O Primeiro Fórum Social Mundial ocorreu entre os dias 25 e 30 de janeiro de 2001 sob
o lema utópico “Um outro mundo é possível” com 4 mil delegados e 16 mil participantes
credenciados de 117 países (Leite, 2003, p. 66). O Encontro foi subsidiado por quatro eixos
para reflexão propositiva: a produção de riquezas e a reprodução social; acesso às riquezas
e a sustentabilidade; afirmação da sociedade civil e dos espaços públicos e poder político; e
a ética na nova sociedade (WHITAKER, 2005, p. 178).

Esse encontro foi um sucesso surpreendente, “até aos seus próprios organizadores” e
contrariou as previsões da mídia dominante que tiveram que mudar a redação da notícia
previamente escrita com o fracasso do encontro (Whitaker, 2005, p. 33). O sucesso não
ficou no primeiro encontro, a participação nos demais Fóruns somente aumentou. Os
números apresentados na tabela abaixo ilustram o sucesso dos encontros FSM:

Tabela 3 – Evolução da participação no Fórum Social Mundial nos primeiros anos

Edição Participação Número de Número de Número de


FSM Total Delegados Workshops Países
Representados
2001 20.000 4.700 420 117

2002 60.000 12.274 622 123

2003 100.000 20.763 1.286 156

2004 135.000 74.126 1.200 117

92
Fonte: Sousa Santos, 2005, p. 39

O FSM é um espaço de debates e movimento de ideias, e não uma organização, por


isso não tem caráter deliberativo. Está apoiado na organização formal do Comitê
Organizador (CO) e Conselho Internacional (CI). Os CO e CI foram estabelecidos por
cooperação e sua legitimidade está fundada no sucesso da organização dos encontros do
Fórum.

O CO foi formado pelas instituições que organizaram o Primeiro FSM e manteve a sua
formação. Seu papel é organizar o FSM no Brasil e atuar como Secretaria Internacional
(Sousa Santos, 2005, p. 45). O objetivo do CI é consolidar o processo permanente de
mundialização do FSM (Leite, 2003, p. 79). As organizações que compõem o Conselho
Internacional estão disponíveis no site http://www.forumsocialmundial.org.br/index.php.

A evolução do FSM aponta para aumentos de fóruns locais articulados por ele,
proporcionando uma capilaridade global dos debates e aumentando a aderência dos
diálogos sobre as questões locais e globais.

O compromisso do FSM com o meio ambiente se inicia na própria prática da


organização:

lixo zero, não-poluição de qualquer tipo, bicicletário para a


locomoção dos participantes dentro do espaço físico do Fórum,
participação de fornecedores de alimentação e serviços integrados
aos movimentos de economia solidária e produção agrícola biológica,
construções que respeitem as exigências ecológicas quanto aos
materiais utilizados (WHITAKER, 2005, p. 57)

Formalmente o espaço dedicado à questão ecológica foi o Eixo I – Desenvolvimento


democrático e Sustentável (Sousa Santos, 2005, p. 187), além da pequena presença
transversal nos demais Eixos. Mas a participação do Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem Terra (MST) foi um exemplo de participação integrada das questões ecológicas e
sociais no FSM. Suas ações/reflexões sempre foram pautadas na igualdade entre os seres
humanos e nos princípios ecológicos. (LÖWY, 2010, p. 41)

Além de participar nas atividades, os ecossocialistas ocuparam os espaços de debate


para apresentar suas propostas e projetos. A Rede Brasil de Ecossocialistas foi lançada no
dia 27 de janeiro de 2003 no Fórum Social Mundial em Porto Alegre na oficina “A
Sustentabilidade pelo Ecossocialismo”, promovida pelo Centro de Estudos Ambientais, CEA
de Pelotas (RS) e o Instituto Terra Azul de Fortaleza (CE) com a participação de mais de

93
250 pessoas, representando 16 estados brasileiros (Löwy, 2005a, p. 91). O documento de
lançamento foi a Declaração de Princípios e Objetivos da Rede Brasil de Ecossocialistas
(Anexo 4).

Outro marco foi o lançamento do 2º Manifesto Ecossocialista, a Declaração


Ecossocialista de Belém (Anexo 3) no encontro FSM de 2009 em Belém. O tema principal
do documento era o Aquecimento Global. O alerta foi que, se o capitalismo for mantido
como a ordem social dominante, “o melhor que podemos esperar são condições climáticas
insuportáveis, a intensificação das crises e a propagação das formas mais bárbaras de
poder ... para controlar os cada vez mais escassos recursos naturais no mundo” (Löwy,
2009c). O Ecossocialismo foi indicado como o caminho utópico concreto para sua
superação através da apresentação de propostas de ações e intervenções de melhorias
socioecológicas, mas com a transformação sendo guiada pela união das categorias
oprimidas (Löwy, 2009c). A insurgência altermundista da Declaração de Belém ilustra o
casamento das pautas sociais e ambientais:

A devastação ecológica não será paralisada nas salas de


conferências ou nas negociações de tratados: somente a ação de
massa pode fazer a diferença. Os trabalhadores urbanos e rurais, os
povos do Sul global e os povos indígenas de todo o mundo estão na
vanguarda desta luta contra injustiça social e ambiental, combatendo
as multinacionais exploradoras e poluidoras, o agronegócio químico
venenoso e desregulado, as invasivas sementes geneticamente
modificadas, e os biocombustíveis que agravam a crise alimentar.
Nós devemos intensificar estes movimentos socio-ambientais e
construir a solidariedade entre as mobilizações ecológicas anti-
capitalistas no Norte e no Sul (LÖWY, 2009c).

O grande desafio ambiental é a inserção dos movimentos ambientais de forma mais


ativa no debate sobre a nova sociedade. O movimento ecológico deve assumir que partilha
com os demais movimentos sociais o mesmo desejo de mudança da lógica produtivista do
mercado e a revolta contra “autonomização reificada da economia em relação às
sociedades, e um desejo de “reinserir” a economia num meio ambiente social e natural”.
(Löwy, 2005a, p. 71). Esse debate sobre a nova sociedade aproxima o ecossocialismo do
movimento altermundialista desde a palavra de ordem “o mundo não é uma mercadoria”,
pois, para ambos os movimentos, esse mundo também inclui a Natureza, principalmente
pelas pautas de ação sobre OGMs (Organismos Geneticamente Modificados), transporte
público gratuito, entre outras (LÖWY, 2010, p. 40).

94
O Fórum Social Mundial de 2009 foi muito relevante pela interação entre os
ecossocialistas e os indígenas e populações tradicionais, que contribuíram apresentando
seu diagnóstico sobre a crise da civilização capitalista ocidental, além do alerta sobre a
destruição acelerada da floresta amazônica pela exportação de madeiras, produção de soja
e pelas grandes propriedades de pecuária; a proposta política resultado dessa análise foi
“Desmatamento Zero, Agora!” (LÖWY, 2013a, p. 59).

O Fórum Social Mundial de 2005 foi, também, o espaço de fundação do Movimento


Passe Livre, MPL, esse movimento tem uma pauta importante para o ecossocialismo, o
transporte público gratuito (Löwy, 2013b). Em sua carta de princípios, o MPL defende a
ruptura do transporte dominado pela lógica do capital, porém ainda não tem em sua reflexão
a dimensão socioambiental da mobilidade urbana, assim como outros movimentos e
militâncias anticapitalistas.

Considerando que o carro individual é, além de nocivo à saúde dos habitantes das
grandes cidades, um dos principais emissores de gás de efeito estufa, a gratuidade do
transporte público está inserida na transformação socioambiental que leva a um outro modo
de vida, um passo importante para a libertação da sociedade da indústria fóssil. Para Löwy
(2014c), “a luta pelo transporte público gratuito é ao mesmo tempo uma luta pela justiça
social, pelo interesse material dos jovens e dos trabalhadores, pelo princípio da gratuidade,
pela saúde pública, pela defesa dos equilíbrios ecológicos”.

Os ecossocialistas devem investir no diálogo com os movimentos anticapitalistas e


altermundistas, levando-lhes sua radicalidade e o despertar dos aspectos ecológicos nas
atuais pautas. A esse processo deve estar associada a reflexão dos próprios ecossocialistas
sobre as ações concretas desses movimentos.

95
3.5 Ecossocialismo na política partidária francesa

Apesar da rica contribuição da corrente ecossocialista para a transformação social, até


o século XX, os partidos socialistas foram indiferentes ao debate ecológico. Mas essa
situação começou a mudar com a crescente preocupação ambiental nos programas dos
partidos socialistas alemão, francês e escandinavo, muito evidenciada na proposta de
Oskar Lafontaine e Peter Glotz no programa do Partido Socialdemocrata Alemão (SPD) de
1989. Houve também a abertura ao debate ambiental por lideranças socialistas francesas,
Ségolène Royal entre outros (MÜNSTER, 2013, p. 119-120).

A baixa votação dos socialistas e sociais-democratas no período de 1990 a 2010


proporcionou condições para o desenvolvimento eleitoral das correntes ecologistas e
ecossocialistas, como David Pepper na Inglaterra, Bookchin nos Estados Unidos. Rodolf
Bahro e Joël Kovel já tinham iniciado a jornada eleitoral ecossocialista na Alemanha e
Estados Unidos respectivamente (MÜNSTER, 2013, p. 110), além de Ralph Nader,
candidato diversas vezes à presidência dos Estados Unidos pelo Green Party.

Nos anos 80, surgiu uma corrente ecossocialista marxista na Alemanha, cujo
representante principal é Rudolf Bahro, dissidente do partido Die Grünen. Sua saída do
partido se deveu a divergência e recusa de aderir às ideias e propostas do Partido
(MÜNSTER, 2013, p. 139).

David Pepper, um dos fundadores do ecossocialismo inglês, no seu livro Ecosocialism


from deep ecology to social justice, publicado em 1993, provocou os ecocentristas afirmando
que o marxismo pode contribuir muito mais para a ecologia que o movimento verde está
disposto a absorver porque o marxismo rompe o pensamento tradicional com uma leitura
materialista histórica sobre a relação natureza-sociedade, muito diferente da abordagem
proposta do ecocentrismo dos fundamentalistas ecológicos (MÜNSTER, 2013, p. 114).

Após Maio de 68 e a guerra do Vietnam, sugiram duas correntes ecossocialistas na


esquerda do movimento ecológico, dentro do marxismo radical: a primeira é uma corrente
ecossocialista marxista internacional que se apoia teoricamente nos escritos de Marx e nas
passagens dos livros Manuscritos de 1844 e do Capital denunciando o potencial destruidor
da Natureza e meio ambiente do capitalismo “desenfreado”, ávido pela exploração dos
recursos naturais e sua produção infinita, essa corrente é representada principalmente pelos
teóricos Joel Kovel e Michael Löwy. A outra corrente é socialista, ecológica, autogestionária
e articulada com movimentos de protestos contra Centrais nucleares na França; com a
reivindicação de decrescimento e com terceiro-mundismo anticolonialista ecológico

96
resultado de combate à destruição sistemática do ecossistema e agricultura dos países
africanos pelas multinacionais, conforme René Dumont e André Gorz (Münster, 2013, p.
148-149). As duas correntes apresentam orientações anticapitalista, sendo que a primeira
corrente avançou na organização da Rede Ecossocialista Internacional, composta
essencialmente por intelectuais da esquerda radical norte-americana, canadense, europeia
e brasileira, que produziram o Manifesto Ecossocialista de 2001. A segunda corrente,
ecossocialista autogestionária, foi incorporada na Europa, nos anos 80 e 90, por movimento
ecológico majoritariamente de orientação reformista (Verdes, Europe Ecologie/Les Verts), ao
mesmo tempo, foi reforçada, nos plano das ideias, com as publicações de André Gorz
(MÜNSTER, 2013, p. 149).

O Manifesto Ecossocialista de 2001 foi o primeiro e importante passo para unificar


todas as forças ecologistas e ecossocialistas em uma plataforma comum. “Passo que se
torna mais importante ainda com a urgência ecológica, pois apresenta o ecossocialista como
movimento político capaz de intervir cada vez mais eficazmente na politica nacional e
internacional” (MÜNSTER, 2013, p. 122).

Em dezembro de 2013, com a participação do Parti de Gauche francês, houve o


congresso dos partidos de esquerda europeus em Madri, o PGE, Congrès du Parti de la
Gauche Européenne, onde estavam presentes os partidos Avec Syriza (da Grécia), Die
Linke (Alemanha), Bloco de Esquerda (Portugal) e Alliance Rouge et Verte (Dinamarca). No
documento regido em conjunto, os partidos afirmam que o ecossocialismo é a resposta
racional ao duplo impasse entre o capitalismo e a socialdemocracia (DARLEUX, 2013):

la gauche européenne sait que l'émancipation humaine ne peut être


atteinte par le biais d’une croissance économique sans fin. Le PIB est
loin d'être un indicateur de bien-être (…) L'écosocialisme n'est pas
une utopie à laquelle la réalité doit se conformer, mais une réponse
humaine rationnelle à la double impasse du social-libéralisme et du
capitalisme

Na França, a corrente ecossocialista foi favorecida pelas mobilizações contra as


centrais nucleares e todas as propostas de energia nuclear na economia energética
francesa, como a campanha contra a central de Fessenheim. Mas também houve a
contribuição das ideias de dois grandes intelectuais do movimento socialista autogestionário
engajados na causa ecológica: René Dumont e André Gorz (MÜNSTER, 2013, p. 140).

97
Gorz foi uns dos primeiros ecossocialistas franceses do século XIX, sua proposta é a
troca da lógica do capitalismo por outra, anti-produtivista, anti-crescimento e autogestionária.
O ecossocialismo, para Gorz, está estruturado em novas tecnologias e oficinas comunais
cooperativas, "ateliers communaux coopératifs", interligadas entre si, para troca de
experiências, ideias e invenções (Münster, 2013, p. 11-12; Münster, 2013, p. 144 - 145). A
essência da proposta de Gorz é produzir menos e melhor, para isso, a estrutura de
autogestão envolve a autonomia dos trabalhadores associados sobre a quantidade e a
qualidade da aplicação do trabalho (Münster, 2013, p. 12-13). A inovação radical dessa
proposta era sua projeção que as oficinas comunais substituíssem os grandes complexos
industriais (MÜNSTER, 2013, p. 13).

A formação do Front de Gauche teve um impacto relevante na vida política francesa.


Front de Gauche é um movimento político partidário muito importante para a corrente
ecossocialista francesa, pois conseguiu unificar algumas de suas principais forças em torno
de um projeto de governo comprometido na construção de uma sociedade ecossocialista.
Para Jean-Luc Mélenchon, em entrevista ao jornal Libération, na véspera do 1º Assis pour
L’ecosocialisme, que ocorreu no dia 01 de dezembro de 2012, o ecossocialismo é a
emancipação do socialismo, uma atuação na categoria do imperativo ecológico, envolvendo
a cidadania na planificação ecológica e regras verdes como orientadores das decisões, para
sair do capitalismo e construir em conjunto, uma sociedade do “bem viver” (do Paul Ariès e
Jacques Testard), da Justiça social, da fraternidade e do bom convívio (de Illich e Gorz) e do
respeito aos bens comuns mundiais (Münster, 2013, p. 152 – 153). Com essas premissas
ecossocialistas, Front de Gauche proporciona uma opção para os dissidentes
ecossocialistas do EELV, Parti Socialiste e NPA (MÜNSTER, 2013, p. 152 – 153).

Para Münster (2013, p. 156), com a chegada ao poder, o governo ecossocialista do


Front de Gauche será capaz de impor uma agenda de ações contrárias às exigências dos
representantes do capital, entre elas, a incorporação da saída da solução nuclear e incentivo
necessário para o desenvolvimento da agricultura ecológica.

A inovação social do programa do Front de Gauche foi a proposta do Fonds européen


de développement social, écologique et solidaire com o objetivo de possibilitar a criação de
novos poderes para os funcionários e incentivar o surgimento de cooperativas,
democraticamente autogeridas. Essa proposta é importante para enfrentar a crise e dá um
passo na ecologização da economia, ou seja, a transformação em uma economia ecológica

98
e social, acompanhada de medidas concretas para a abolição da precariedade e da pobreza
e a criação de uma verdadeira proteção social para todos (MÜNSTER, 2013, p. 136-137).

No mesmo plano, o projeto de planejamento ambiental presente na campanha de


2012 do Front de Gauche (2012) é fundamental, pois viabiliza projetos para sair da energia
nuclear e combustíveis fósseis, substituindo-as pelas energias não fósseis renováveis,
prioritariamente por energia geotérmica, energia solar e energia eólica, já que atualmente o
número de parques eólicos da França é muito menor que da Alemanha e dos países
nórdicos. Para viabilizar esses projetos, que inclusive estavam presentes na campanha de
Jean-Luc Mélenchon através da proposta de criação do Pôle Financier Public, é necessário
o financiamento público, que, além de financiar projetos na área de energia, deve também
financiar projetos para a agricultura sem OGM. Mas o importante é que todas essas novas
opções de energia estejam sob o controle do cidadão (MÜNSTER, 2013, p. 136-137;
MÜNSTER, 2013, p. 151).

Os partidos ecossocialistas franceses são recentes. Os Partidos NPA e Parti de


Gauche foram fundados em 2009, e o Ensemble, em 2013, mas a maioria de sua militância
estava presente no LCR, Ligue Communiste Révolutionnarie, partido filiado à IV
Internacional, que em 2009 foi dissolvido tendo a maioria de seus militantes optado pela
formação do NPA. A história da política partidária ecossocialista francesa tem muitas
contribuições a todos no mundo, pelos seus debates, acertos, erros, vitórias e derrotas.

99
NPA Nouveau Parti Anticapitaliste

O NPA, Nouveau Parti Anticapitaliste, foi fundado em fevereiro de 2009 com o objetivo
de reunir todos os movimentos e cidadãos que desejassem romper com o capitalismo e
construir uma sociedade inédita, democrática, igualitária, feminista e ecológica (NPA,
2009a).

O documento Princípios Fundadores do Partido destaca que todas as formas de


discriminação, ecológica, raça, orientação sexual são o coração do projeto. A eliminação da
divisão sexual do trabalho está destacada no documento. Para o NPA, a opressão das
mulheres está presente nos outros tipos de dominação e esferas da sociedade, na dupla
jornada de trabalho da família patriarcal (NPA, 2009b).

O NPA foi fundado com o objetivo de superação da crise socioambiental. Para ele, o
capitalismo é o fato gerador da crise socioambiental que une as crises de alimentos,
ecológica, energética, financeira, saúde e as tensões entre países e guerras. Em nome do
lucro, a produção é organizada para o excesso de produção e consumo de bens
desnecessários para poucos, enquanto quase a metade da humanidade sobrevive com
menos de um dólar por dia (NPA, 2009b). Esse produtivismo capitalista produz, além da
poluição do ar, água e comida, aquecimento global pela concentração dos gases de efeito
estufa e degradação da saúde da população, e essas consequências levam sérios riscos de
sobrevivência da população, principalmente dos estratos mais pobres e, em muitas vezes,
causando grandes migrações (NPA, 2009b). As políticas públicas francesas atuais não
estão contribuindo para superar as crises, ao contrário, a busca do lucro continua sendo a
prioridade, inclusive das ações “retificadoras” com a deterioração das condições de trabalho
e a flexibilização na contratação e desmanche dos serviços públicos. O resultado dessa
política pode ser ilustrado pela participação dos dividendos aos acionistas em relação à
folha de pagamento na França, enquanto em 1982 era 4,4%, subiu para 12,4% em 2009.
(NPA, 2009b).

A proposta do NPA para superação dessa crise é a mobilização ecossocialista. No


documento do NPA, o ecossocialismo está associado ao empoderamento da sociedade nas
decisões da produção e a uma forte redução do tempo no trabalho, para distribuir entre
todas as pessoas o tempo disponível nas organizações, após a produtividade proporcionada
pelo progresso tecnológico. Mas também deve-se promover boas condições de trabalho e
criticar a cultura, a arte e a mídia que propagam a ideologia da classe dominante, assim,
deve haver uma reapropriação democrática desses elementos (NPA, 2009b).

100
A proposta do NPA não tem um modelo pré-existente. Ao mesmo tempo, o NPA
nasceu repudiando, além do capitalismo verde e a proposta socialdemocrata presentes na
França, as ditaduras burocráticas soviéticas e chinesas (NPA, 2009b). A nova lógica deve
ter como orientado a utilidade social ao invés do lucro e, principalmente, uma sociedade
liberta da ditadura do capital, pois somente assim, haverá reconciliação entre o homem e a
Natureza (NPA, 2009b).

Para o NPA (2009b), o ecossocialismo é necessariamente internacionalista. A


libertação da opressão não deve ficar restrita às relações entre os cidadãos, mas também,
entre os países, isto é, cada país deve ser livre para construir soberania alimentar, ter
acesso à água, permitir a autoemancipação de seu povo e possibilitar a construção de seu
futuro.

O ecossocialismo proposto pelo NPA envolve o controle social de áreas consideradas


como bens públicos comuns, como saúde, educação, água, energia, transportes,
telecomunicações, serviços postais, bem estar da infância e velhice. Esse controle envolve a
gestão pública e participação social para garantir a equidade no acesso a esses bens (NPA,
2009b).

Nas frentes já apresentadas, além do pilar social, a ecologia é central na orientação do


NPA. A concepção ecológica do partido incorpora conceitos relevantes como solidariedade
entre as gerações, rejeição da crença na expansão ilimitada da produção, domínio da
Natureza pela humanidade e qualquer forma de produtivismo. O partido aponta que a atual
política socioambiental hegemônica é regida por uma lógica de destruição do planeta e
propõe a redistribuição de renda, diminuição do consumo de recursos não renováveis,
deslocalização da economia e substituição na forma de produção de indústrias
consumidoras intensivas de energias, inúteis, produtoras de poluentes perigosos e usuárias
de energia nuclear (NPA, 2009b).

A produção de alimentos também está presente nos princípios fundadores. As zonas


rurais devem ter seu tecido social protegido para manter o camponês em sua terra e
possibilitar sua contribuição à soberania alimentar de seu país. A qualidade e segurança da
alimentação deve ser o objetivo, inclusive com a eliminação de produção de OGM (NPA,
2009b).

Para debater seus temas específicos e desenvolver uma cultura no partido de


respeito e não opressão a qualquer segmento social, a liberdade do uso de espaços
específicos de reflexão e ação está prevista nos princípios fundadores. Assim, as mulheres,
LGBTI, jovens e imigrantes têm a opção de realizar reuniões específicas para cada um

101
desses segmentos. Para o NPA, essa liberdade é importante para construir uma proposta
de uma sociedade livre de discriminação em que todos tenham acesso ao trabalho, escola,
formação, habitação, transporte público, saúde e cultura (NPA, 2009b).

A democracia interna no NPA é radical. Ela prevê que cada pessoa com sua
especificidade, inclusive de nível de compromisso, deve ter o seu espaço no partido, a
pluralidade de opinião e ponto de vista está garantida (NPA, 2009b).

O NPA se apresenta como alternativa à esquerda institucional (Partido Socialista e o


Partido Comunista) e seus aliados verdes. Para o NPA, os partidos de esquerda
abandonaram os compromissos com as aspirações das pessoas e os verdes venderam
suas ambições ambientais. O NPA definiu duas tarefas prioritárias: desenvolvimento de
lutas sociais de um novo sindicalismo; e construir um partido político com um programa
abrangente de emancipação (NPA, 2009b). A construção do partido envolve a participação
nas eleições para defender suas propostas e reunião da população em torno do programa,
propor e apoiar medidas que melhorem a vida dos trabalhadores, direitos democráticos e
respeito ao meio ambiente. A radicalidade dessas posições impede a participação de
qualquer coligação contraditória com o compromisso de transformação (NPA, 2009b).

O poder, para o NPA, não é o fim em si mesmo. O verdadeiro poder é germinado pela
auto-organização da sociedade no rompimento do capitalismo e apropriação da autogestão
da população (NPA, 2009b).

102
Parti de Gauche

O Parti de Gauche se apresentou rapidamente como a opção ecossocialista viável em


relação à proposta ecocapitalista promovida pelos socialistas reformadores com apoio da
Europe Ecologie (Münster, 2013, p. 122-123). O Parti de Gauche, liderança do Front de
Gauche, assumiu a bandeira ecossocialista, apresentando propostas e associando as
reivindicações socialistas com o paradigma ecológico. A boa repercussão da campanha de
Jean-Luc Mélenchon divulgou a proposta ecossocialista e a apresentou como caminho
viável de governo (Münster, 2013, p. 108-109). Münster destaca o encontro Les Assis de
l’écosocialisme organizado pelo Parti de Gauche em 1º de dezembro de 2012, em Paris
como marco da campanha partidária ecossocialista, apresentando alternativa à
socialdemocracia (MÜNSTER, 2013, p. 109).

A consciência dos efeitos de mais e mais catástrofes do aquecimento global, da


destruição progressiva da ecosfera que atingem a humanidade e da responsabilidade do
capitalismo por essas catástrofes provocou a necessidade de ascensão politica e
organizacional do movimento ecossocialista. O encontro Les Assises de l’écosocialisme em
Paris no dia 1º de dezembro de 2012 e inscrição oficial do ecossocialismo no programa
político do Parti de Gauche transformou o ecossocialismo na França em um grande
movimento e corrente política, inicialmente com a presença dos militantes do Front de
Gauche que recebeu a adição de outros de militantes ecológicos da d’Europe Ecologie/Les
Verts, de militantes dissidentes do NPA e também de certo número de militantes alternativos
(MÜNSTER, 2013, p. 152-153).

Em fevereiro de 2013, o partido lançou seu manifesto com 18 teses para o


ecossocialismo. O manifesto foi uma obra coletiva com a participação de nomes importantes
do movimento ecossocialista: Anita Rozenholc; Arno Münster; Corinne Morel Darleux;
Damien Joliton; Danièle Obono; Guillaume Étievant; Jacques Lerichomme; Janette Habel;
Laurent Garrouste; Laurent Maffeïs; Mathieu Agostini; Matthieu le Quang; Michael Löwy;
Paul Ariès e Susan George (Darleux, 2013a, p. 6). A proposta do manifesto é ser uma base
de debate sobre os caminhos necessários para construir a sociedade ecossocialista. Para
Darleux (2013a, p. 7), a construção da bifurcação social e ecológica é orientada pelo projeto
ecossocialista, com planificação ecológica e uma estratégia revolucionária cidadã, isto é, a
apropriação politica por todos.

103
Ensemble Mouvement pour une alternative de Gauche, Ecologiste et Solidaire

O partido Ensemble, Mouvement pour une alternative de gauche, écologiste et


solidaire foi criado em conferência, realizada nos dias 23 e 24 de novembro de 2013, com
220 delegados, pela união de diferentes instituições politicas partidárias participantes do
Front de Gauche. Esses partidos foram: Alternatifs; C&A-Convergences&Alternativa; ACU-
Communistes Unitaires; FASE-La Fédération pour une alternative sociale et écologique; GA
– La Gauche Anticapitaliste e Gauche Vraiment Unitaire (Beltar, 2013). O Ensemble nasceu
como um partido ecossocialista que busca a transformação social, incorporando a pauta
anticapitalista, ecológica, feminista, internacionalista (Ensemble, 2013a). O método principal,
adotado pelo partido na fundação para tomada de decisão e definição de rumos, foi o
consenso com uma estrutura organizacional mais horizontal e menos vertical (BELTAR,
2013).

A importância da criação do Ensemble para Myriam Martin, uma liderança do partido


GA – Gauche Anticapitaliste, foi a criação da terceira força do Front de Gauche, que se
juntará aos dois grandes partidos do Front de Gauche, PCF e PG. Para ela, essa força
unificada elimina o excesso de oferta e unifica as vozes e, assim, facilita o acesso ao
eleitorado (ALEMAGNA, 2013).

As principais orientações e estratégias de ação de curto e médio prazo do Ensemble


estão registradas no documento apresentado na Conferência Nacional, Textes de
Références du Mouvement. Nesses textos, o Ensemble se define como um partido
ecossocialista, que integra as dimensões social, ecológica e democrática na atuação política
da emancipação da classe oprimida; um projeto político emancipatório de sociedade que
incorpora o melhor das utopias socialistas e ecologistas para construir uma sociedade com
base de valores democráticos, igualitários, feministas e autogestionárias (Ensemble, 2013b,
p. 9). Esse projeto, além de se apresentar como alternativa ao liberalismo, estalinismo e
socialdemocracia e seus malefícios (Ensemble, 2013b, p. 9), busca sensibilizar o movimento
sindical para a pauta ambiental, e o movimento ecológico para as propostas anticapitalistas,
com a mensagem de que o produtivismo capitalista, ampliado pela ciência e tecnologia, tem
gerado males ambientais, degradando a relação da humanidade com a Natureza
(Ensemble, 2013b, p. 11). Para o partido, no atual modelo produtivo, a classe dominante
não tem a capacidade de tomar as decisões necessárias para superar a atual crise
socioambiental (ENSEMBLE, 2013b, p. 3).

104
O Ensemble tem suas propostas de utopia ecossocialistas com caminhos e projetos
de médio e curto prazo para contribuir não só no Front de Gauche, como também no amplo
debate ecossocialista. Para o Ensemble, o ser humano e a natureza são inseparáveis, e o
ecossistema compatível com a vida humana deve estar no centro do projeto de
transformação da sociedade (Ensemble, 2013b, p. 11). Esse projeto deve anunciar uma
nova forma de relacionamento sociedade e Natureza, superando as contradições das
dimensões ecológica e socialista. A busca do Ensemble é uma ecologia da justiça social
(ENSEMBLE, 2013b, p. 12).

O documento do Ensemble destaca também a armadilha da revolução verde,


alertando sobre a compra de terras produtivas e florestas nos países do Sul por
multinacionais, para especulação com a produção agrícola e biocombustível, em detrimento
do acesso à alimentação pela população mundial e da preservação das florestas
(ENSEMBLE, 2013b, p. 13).

A aposta do Ensemble para a produção de alimentos é a agroecologia. O partido tem


consciência que essa opção requer profundas transformações na política agrícola francesa,
europeia e mundial, pois contraria os interesses dos setores de agronegócios e
especuladores de commodities, mas tais transformações são fundamentais para construir
outra forma de relacionamento de produção e consumo dos produtos agrícolas, com o uso
racional do solo, do trabalho e acesso aos alimentos (ENSEMBLE, 2013b, p. 13).

Para a produção de energia, o partido defende que a sociedade deve superar o


domínio fóssil. Para o Ensemble, a adoção da energia nuclear não é a solução desejável,
pois os riscos envolvidos nessa opção devem ser evitados. A proposta do partido para essa
área é o investimento na combinação de várias fontes de energia renováveis, gerenciada de
forma descentralizada, respeitando as necessidades específicas locais, sem desperdício de
recursos. As fontes priorizadas são a eólica, solar e as relacionadas com a ciência da terra
(geotérmica, marés, microalgas, biomassa entre outras) (ENSEMBLE, 2013b, p. 13-14).

O PIB tem um espaço importante na proposta do Ensemble. Nesse ponto, o partido


promove o encontro com o pensamento Decrescimento (Ensemble, 2013b p. 12) com o
pensar marxiano do conflito entre o valor de uso e o valor de troca, denunciando o fetiche do
crescimento promovido pela publicidade e acelerado pela obsolescência programada
(ENSEMBLE, 2013b, p 12).

105
A questão ecológica não monopoliza o documento, o combate a todas as opressões
norteia o projeto do Ensemble, assim, há propostas para as questões femininas, racismo,
xenofobia e orientações sexuais. A proposição é combater todas as discriminações
socioeconômicas e construir uma sociedade democrática. A democracia defendida pelo
partido combina a libertação social e respeito ecológico, fruto da ação dos movimentos
sociais (ENSEMBLE, 2013b, p. 17).

A atual prioridade política do Ensemble é construir o Front de Gauche. Sua proposta é


que o Front de Gauche francês construa uma alternativa no campo da esquerda francesa
para gerar condições para liderar as transformações necessárias, com novas conquistas
coletivas e romper com a atual estrutural social liberal (Ensemble, 2013b p. 6). Para
Ensemble, Front de Gauche deve estar aberto a todas as forças de esquerda, inclusive
setores de EELV e PS, associações, sindicatos e todos os demais movimentos que buscam
transformações socioambientais (Ensemble, 2013b p. 8). Assim, o projeto ecológico e social
ecossocialista deve articular os movimentos sindical, ecológico e a esquerda não
produtivista (Ensemble, 2013b p. 12), pois integra diversas pautas socioecológicas como a
defesa de melhores condições de trabalho, intervenção ativa do trabalhador na produção,
redução do tempo de trabalho, luta contra o consumismo, fim do fetiche do crescimento do
PIB, educação para ecologia e respeito ao bem comum, uso de energia renováveis
(ENSEMBLE, 2013b, p. 12).

O Front de Gauche tem dois grandes obstáculos para vencer. O primeiro é o modelo
de governo conservador adotado pela coligação Partido Socialista e Partido Verde (EELV),
seu perfil desqualifica a esquerda francesa perante a percepção popular, construída com o
investimento da mídia, que veicula que não há alternativa e que a esquerda não consegue
propor mudanças ao modelo atual de governo. A outra crise é interna, foi gerada pela
coligação do Partido Comunista Francês (PCF) com o Partido Socialista na candidatura ao
governo municipal de Paris, de 2013, ao romper com a Frente (Hendrik, 2013). Para superar
essa crise, o Ensemble optou em buscar ser liderança no aumento do diálogo e projetos,
não só internamente no Front de Gauche como também incorporar outras forças de
esquerda, como NPA, sindicatos, associações (como ATTAC, Fundação Copernic,
movimentos ambientalistas). Além da interação junto aos setores de esquerda, Ensemble
decidiu organizar frentes temáticas e mobilizar cidadãos para participar de reuniões
ordinárias e abertas (HENDRIK, 2013).

106
A democracia, principalmente interna, é um dos principais valores do Ensemble para
irradiar mudanças. As decisões não são tomadas por estrutura burocráticas, e sim por
amplo debate interno, com total liberdade de expressão de opinião de todas as correntes,
seja nos Congressos internos, seja externamente. Mas o desafio dessa democracia é estar
em sintonia com a eficiência, afinal todo movimento político deve ser eficaz, isto é, atingir
objetivos, mas no caso do Ensemble, a meta é construir a conexão entre o partido e o
ativismo social e recriar uma ligação de aspirações (HENDRIK, 2013).

O avanço da direita nas eleições municipais de 2013 e na eleição Europeia de 2014


agravou a crise dos partidos de esquerda na França. A comissão ecológica do Ensemble
publicou um texto apresentando propostas para avançar as bases das alianças dos partidos
e movimentos de esquerda francesa. O documento aponta que há duas tarefas urgentes:
reconstruir um projeto de emancipação socioecológica e apresentar uma nova força política,
que seja alternativa ao atual modelo de governo. Esse desafio deve ser respondido pela
união das esquerdas e deve ter como motor, as propostas ecológicas, anticapitalistas e anti-
produtivistas (ENSEMBLE, 2014).

107
CAPÍTULO 4 – Ecossocialismo Brasileiro

4.1 Ecossocialismo de Chico Mendes

Chico Mendes construiu uma história que é referência para a proposta ecossocialista.
Foi um dos primeiros brasileiros a associar luta social com responsabilidade ambiental. Ele
tinha a convicção que era necessário preservar a Amazônia para todos os povos e que a
autoemancipação dos seringueiros deveria ser construída a partir da sua integração aos
demais povos da floresta e à própria floresta. Sua história pode ser estudada com ajuda de
suas entrevistas documentadas por Edilson Martins (1998) e Cândido Grzybowski (1991),
documentários e textos de diversos autores que trabalharam com Chico.

Chico Mendes era de uma família de seringueiros, sua trajetória foi marcada pela
herança das condições opressoras impostas pelos fazendeiros. Os seringueiros foram
inseridos na floresta amazônica com a ilusão de vida melhor que a sofrida rotina do sertão
cearense, porém a realidade encontrada foi outra. As trabalhadoras e trabalhadores
buscaram os seringais da Amazônia na segunda metade do século XIX para fugir das
longas estiagens e da gripe de 1877, causadora de mais de cem mil mortes (Martins, 1998,
p. 13). A situação de opressão, com características de escravidão, foi detalhada por
Euclides da Cunha (2006) no início do século XX.

Euclides da Cunha, em seu À Margem da História de 1908, já apresenta números


que comprovam a gravidade da situação do trabalhador migrante nos seringais na
Amazônia: a contabilidade das dívidas iniciais, tabela 4, apresenta uma dívida inicial de
2.090$000. Em uma projeção muito otimista, considerada impossível pelo autor: “a) que seja
solteiro; b) que chegue à barraca em maio, quando começa o corte; c) que não adoeça e
seja conduzido ao barracão, subordinado a uma despesa de 10$000 diários; d) que nada
compre além daqueles víveres“, o seringueiro continuaria endividado e inserido em um ciclo
de produção e endividamento eterno no final do primeiro ano de trabalho (CUNHA, 2006, p.
29).

Além das dívidas compulsórias, havia o risco de multa de 100$000 no caso de


“infrações” na execução do trabalho, tais como: “a)fazer na árvore um corte inferior ao gume
do machado; b)levantar o tampo da madeira na ocasião de ser cortada; c)sangrar com
machacinhas de cabo maior de quatro palmos” (CUNHA, 2006, p.30).

108
Os utensílios invariáveis presentes na tabela 4 proporcionavam as condições mínimas
de sobrevivência na selva: um boião de furo, uma bacia, mil tigelinhas, uma machadinha de
ferro, um machado, um terçado, um rifle (carabina Winchester) e duzentas balas, dois
pratos, duas colheres, duas xícaras, duas panelas, uma cafeteira, dois carretéis de linha e
um agulheiro. Os mantimentos entregues na chegada do trabalhador antes do envio a sua
estadia final eram: 3 paneiros de farinha de água, 1 saco de feijão, outro, pequeno, de sal,
20 quilos de arroz, 30 de xarque, 21 de café, 30 de açúcar, 6 latas de banha, 8 libras de
fumo e 20 gramas de quinino (CUNHA, 2006, p.29).

Tabela 4 – Dívidas assumidas pelo seringueiro para iniciar sua jornada


Histórico Dívidas

(Em mil réis)

Dinheiro recebido para preparar-se 150$000

Passagem de proa até o Pará 35$000

Passagem do Pará até barracão 150$000

Utensílios invariáveis 800$000

Dívida inicial 1.135$000

Mantimentos para 3 meses 750$000

Despesas diárias para manutenção


barracão 10$000

Fonte: Cunha, 2006, p.29

Outro fator relevante é que o trabalhador só podia comprar no armazém do barracão,


"não podendo comprar a qualquer outro, sob pena de passar pela multa de 50% sobre a
importância comprada"” (Cunha, 2006, p.30). A dívida gerada pela compra de produtos
fundamentais para sobrevivência com preços definidos pelos mesmos que remuneravam o
fruto da extração das seringueiras está na lógica de preços exorbitantes pela mercadoria
comprada e baixas remunerações do fruto do trabalho, além de “erros” nas contas (Cunha,
2006, p.30). Para a manutenção do ciclo das “contas” que garantiam a opressão, os filhos
dos seringueiros eram proibidos de estudar para não descobrirem os “erros” na
contabilidade da dívida da sua família. A proibição foi flexibilizada apenas a partir de 1970
(GRZYBOWSKI, 1991, p. 60).

109
A conclusão de Euclides da Cunha (2006, p. 30-31) não dá margem de dúvida da
perversidade das condições do trabalhador: é “natural que ao fim de alguns anos o freguês
esteja irremediavelmente perdido. A sua dívida avulta ameaçadoramente: três, quatro, cinco,
dez contos, às vezes, que não pagará nunca. Queda, então, na mórbida impassibilidade de
um felá desprotegido dobrando toda a cerviz à servidão completa. O regulamento é
impiedoso: "Qualquer freguês ou aviado não poderá retirar-se sem que liquide todas as suas
transações comerciais..." Fugir?” A fuga era inviável pelas condições da região, distância
entre os barracões e a cumplicidade entre os senhores dos seringais, aliado a pesadas
multas aos fazendeiros que não cumpriam o “acordo”. (CUNHA, 2006, p. 31).

Euclides da Cunha já em 1908 escrevia que era necessário intervir politicamente para
mudar as condições dos trabalhadores dos seringais:

urgência de medidas que salvem a sociedade obscura e abandonada:


uma lei do trabalho que nobilite o esforço do homem; uma justiça
austera que lhe cerceie os desmandos; e sem forma qualquer do
homestead que consorcie definitivamente à terra (CUNHA, 2006,
p.31).

A quantidade de escravos nordestinos nos seringais da Amazônia somente iniciou sua


redução a partir de 1955, com a migração de parte desses para trabalhar como boias-frias
nas fazendas de empresas agropecuárias em troca, em grande parte, de comida e pinga
(MARTINS, 1998, p. 86).

Chico Mendes nasceu em 15 de dezembro de 1944, em Xapuri no Acre. Filho de


Francisco Alves Mendes e de Maria Rita Mendes, Chico iniciou seu trabalho como
seringueiro aos nove anos e foi alfabetizado aos 20 anos (GRZYBOWSKI, 1991, p. 10). Ele
soube apreender lições fundamentais para a sua trajetória, seja pela transmissão de
conhecimento do seu professor Távola, seja pela sua vivência dos sucessos e fracassos nos
movimentos sociais.

Uma lição fundamental para a trajetória de Chico foi aprender a ler e ouvir notícias
com o auxílio de um exilado político, Euclides Fernando Távola. Euclides era oficial do
exército quando participou da Coluna Prestes, por essa militância, foi preso e enviado para o
presídio da ilha de Fernando de Noronha. Foi solto por influência do seu tio Juarez Távola, e
seguiu para a Bolívia onde se engajou no Partido Comunista Boliviano, trabalhando com o
movimento operário. Porém foi perseguido e obrigado a voltar à clandestinidade. Acabou se
refugiando na selva perto da fronteira entre Brasil (Acre) e Bolívia e para sobreviver,
aprendeu a fazer a borracha com os seringueiros (MARTINS, 1998, p. 87-88).

110
Em 1962, Euclides Távola passou ao acaso na casa da família Mendes e o pai de
Chico gostou do diálogo e das ideias do visitante. Com a permissão do pai, Chico Mendes
iniciou a alfabetização com seu mestre marxista. Inicialmente, as aulas eram aos sábados e
domingos na casa de Euclides, para chegar às aulas, Chico Mendes andava três horas. O
método usado pelo professor era a leitura crítica de jornais, Euclides conseguia edições
atrasadas de jornais e noticiários de rádio. Chico criou o hábito de ouvir o noticiário das 18
horas das estações Central de Moscou, BBC de Londres e Voz da América no rádio à
bateria cedido por Euclides. O contato com as notícias permitiu que Chico Mendes
observasse a diferença de enfoque na forma do noticiário sobre o golpe de 1964, pois para
a Voz da América, a democracia seria a vitoriosa em evitar que os comunistas acabassem
com o país, em contra partida a Central de Moscou alertava sobre as prisões das lideranças
sindicais e das torturas aos presos da repressão (GRZYBOWSKI, 1991, p.63).

Não há muitas informações sobre Euclides Távola, pois ele queimava tudo que
anotava e em julho de 1965 foi à cidade para checar se seu emagrecimento era um
processo de úlcera e nunca mais voltou (MARTINS, 1998, p. 88).

A lição do professor Távola muito valorizada por Chico Mendes era a relevância na
militância sindical e a possibilidade da futura restruturação dos sindicatos no Brasil, pois
“apesar de derrotados, humilhados, massacrados, as raízes nunca se acabaram, elas
sempre germinam; por mais atacadas que sejam, elas germinarão mais tarde” (Grzybowski,
1991, p.64). Para Távola, a militância no movimento sindical era fundamental, mesmo no
caso de sindicatos chamados pelegos, porque o ingresso de militantes combativos
estabelece as bases para espalhar as “sementes da liberdade” (GRZYBOWSKI, 1991, p.64).

Em entrevista à CUT no 3ª Congresso em 1988, Chico lembrou de alguns


ensinamentos de Euclides: “hoje os trabalhadores estão sendo rechaçados, mas por maior
que seja o massacre sempre existirá uma semente que renascerá e aí você terá que entrar,
mesmo que seja daqui a oito, dez anos” (MARTINS, 1998, p. 88).

Com o conhecimento adquirido nas suas aulas, Chico descobriu que sua família e os
demais seringueiros eram manipulados pelos comerciantes da fazenda: o valor da metade
da produção de um ano de borracha pagava a conta na venda do seringalista e o lucro
gerado seria a outra metade, porém, nas contas do seringalista, o seringueiro estava
sempre devendo (Martins, 1998, P. 89). A lição foi que a eterna dívida do mercado do patrão
era ferramenta de opressão, a liberdade deveria ser construída com a ruptura do monopólio
da venda aos seringalistas. A opção inicial foi o comércio com os marreteiros, pequenos
comerciantes, para comprar mais barato pagando com borrachas (MARTINS, 1998, p. 89).

111
O segundo marco na formação de Chico Mendes foi o convívio com o sindicalista
Wilson Pinheiro, a avalição dos sucessos e a desmobilização do sindicado após a morte do
Wilson esteve presente nas ações posteriores de Chico. Wilson Pinheiro foi a primeira
liderança na direção do sindicado de Brasiléia, Acre, em 1978 e 1979. Foi na sua
coordenação que os empates foram generalizados por toda a região (GRZYBOWSKI, 1991,
p.18-21).

O empate é uma forma de manifestação ao mesmo tempo pacífica e de forte impacto.


Sua ação é liderada pela direção do sindicado e composta por centenas de seringueiros
com suas mulheres, crianças e velhos. Os empates são mobilizados a partir da denúncia de
desmatamento, o primeiro passo é a reunião das comunidades, principalmente as afetadas,
em assembleia na mata para definir a liderança e o grupo que ficará na frente das foices e
motosserras. As mulheres e crianças costumam sair na linha de frente com bandeira para
evitar a recepção do grupo à tiros pelos “seguranças” e policiais a serviço dos fazendeiros.
As armas dos empates são os discursos educativos alertando da importância da
manutenção da floresta e as consequências de seu desmatamento para todos aos peões
responsáveis pelo cumprimento de ordens. A proposta do método é sensibilizar o peão,
responsável pela ação do desmatamento, pois apesar de ser o representante da ação
opressora, o peão é um ser humano “simples, indefeso e inconsciente” (Martins, 1998, p.
26). O convencimento dos peões muitas vezes provocou adesão dos próprios peões nos
empates. (GRZYBOWSKI, 1991, p. 38).

A fama e notoriedade de Wilson Pinheiro foram construídas com a mobilização e


liderança de 300 seringueiros que, com apenas facões e enxadas, expulsaram de
pistoleiros, armados com rifles, que estavam ameaçados os posseiros na Boca do Acre.
Essa vitória gerou também, seu julgamento e condenação à morte pela “corte” dos
fazendeiros. No dia 21 de julho de 1980, Wilson Pinheiro foi morto por dois pistoleiros na
sede do sindicato de Brasiléia. Sua morte aumentou a situação de conflito na região:
inconformados com a percepção da falta de ação da Justiça, os seringueiros fuzilaram um
dos fazendeiros acusados de envolvimento na morte de Wilson, Nilo Sérgio. Entretanto a
ação da “Justiça”, para a reação dos seringueiros, foi ágil: prendeu e torturou centenas de
seringueiros. Com a morte de Wilson Pinheiro e repressão do Estado, o movimento dos
seringueiros na Brasiléia perdeu força (GRZYBOWSKI, 1991, p.19-20; GRZYBOWSKI,
1991, p. 42).

112
A avaliação e aprendizado de Chico Mendes com o crescimento e retração da
experiência desse sindicato foram que:
O movimento deveria passar por uma discussão muito maior e uma
preparação muito maior para não se repetir o que aconteceu em
Brasiléia. Quando mataram Wilson, como ele centralizava todo o
poder, toda a resistência em suas mãos, houve uma recuada. Aqui,
em Xapuri a gente se propõe a fortalecer mais as bases, para que o
movimento tivesse uma sustentação maior (GRZYBOWSKI, 1991,
p.21).

Xapuri assumiu a liderança dos movimentos dos seringueiros com a coordenação de


Chico Mendes. O sindicato foi fundado em 1977 com aprendizado da experiência de
Brasiléia. A organização de Xapuri buscou ampliar a participação dos trabalhadores. O
modelo de diálogo do sindicado aplicava o aprendizado de Chico Mendes junto às
comunidades de base, iniciado em 1973 (GRZYBOWSKI, 1991, p. 20-21).

Chico Mendes entrou em contato com as propostas dos padres progressistas,


aderindo às Comunidades Eclesiais de Base, em uma época que a igreja era o um espaço
de diálogo social. Essa relação permitiu que o Sindicato pudesse funcionar no terreno da
Igreja (GRZYBOWSKI, 1991, p. 20-21).

Para aumentar e melhorar a participação de todos nos diálogos e decisões, houve


investimento na educação da população trabalhadora. A formação e estruturação de
condições para geração de novas lideranças e uma ampla participação de todos foram
preocupações importantes nas práxis de Chico Mendes. A educação foi uma ação para
despertar a conscientização da população oprimida. Inicialmente foi criada a cartilha
Poronga com apoio CEDI - Centro Ecumênico de Documentação e Informação e diversos
grupos de universitários. A cartilha foi aplicada nos cursos, que eram ministrados por
professores eleitos pela comunidade. Para Chico: “Poronga é a luz que o seringueiro usa e
coloca na cabeça para caminhar na selva” (MARTINS, 1998, p. 85).

Outro apoio importante na organização das primeiras escolas foi a OXFAM. Esse
apoio foi motivo de denúncia por parte dos fazendeiros aos órgãos de repressão sob a
acusação de recebimento de recursos dos comunistas de Moscou. Os seringueiros não se
intimidaram e conseguiram, em 1983, comprovar que a fonte das divisas eram de uma
entidade não governamental inglesa de apoio a projetos sociais no terceiro mundo
(GRZYBOWSKI, 1991, p. 46).

113
Além do apoio das ONGs e do Ministério da Educação, o diferencial do projeto da
construção das escolas foi a mobilização da população, os agentes do Ministério ficaram
estarrecidos com o resultado obtido com reduzidos recursos, em relação ao alto montante
de recursos enviado às prefeituras do Acre: as prefeituras entregaram menos que um terço
do total de escolas (GRZYBOWSKI, 1991, p. 47).

Para Chico Mendes, a educação era fundamental para a práxis transformadora, esse
sentimento pode ser exemplificado pelo último conselho que Chico Mendes deu a sua filha
Elenira, que quando ele morresse, ela não deveria chorar na sua morte e sim estudar para
continuar a sua luta: “Se seu pai morrer, você tem que ser forte, tem que estudar para
continuar a luta dele” (VENTURA, 2003, p. 19).

Chico Mendes entendia que para avançar com as conquistas, o movimento deveria se
estruturar em sindicatos e se inserir na política partidária. Em 1977, Chico participou
ativamente na fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri e se elegeu
vereador pelo partido de oposição à ditadura militar, MDB (Martins, 1998, p.15).
Posteriormente ele soube dialogar com as diversas siglas (PT, PCB, PC do B, PV, PDT e
PSB). Sem perder o espaço de diálogo com os demais partidos, ele se filiou ao PT, pois
para ele era o “único partido, com todos os seus problemas, que tem dado maior cobertura,
maior apoio à luta dos seringueiros” (GRZYBOWSKI, 1991, p. 49-50).

Para ampliar o diálogo e deixá-lo mais visível na sociedade brasileira, o sindicado de


Xapuri sob a liderança de Chico Mendes construiu o Conselho Nacional dos Seringueiros. O
Conselho foi criado com a missão de buscar alternativas para a floresta amazônica e
enfrentar o desmatamento (Martins, 1998, p 17) e principalmente, buscar o reconhecimento
dos seringueiros como classe (GRZYBOWSKI, 1991, p. 26).

O primeiro passo concreto para a criação do Conselho foi o Primeiro Encontro


Nacional de Seringueiros em 1985 em Brasília. A capital brasileira foi escolhida por ser
considerada na avaliação das lideranças do Encontro como o centro das decisões da nação
e seria importante mostrar para as autoridades e demais setores da sociedade brasileira que
a Amazônia não era uma floresta vazia, havia trabalhadores vivendo nela e dela
(GRZYBOWSKI, 1991, p. 22).

O primeiro encontro foi fundamental na história do movimento dos povos da floresta. A


adesão foi expressiva, pois além das lideranças de Xapuri, trabalhadores de Brasiléia,
representantes de quase todos os municípios do Acre, dos estados da Amazônia, Amapá e
Pará estavam presentes (Grzybowski, 1991, p. 27). Os principais resultados foram: a criação
da diretoria provisória do Conselho Nacional dos Seringueiros e a proposta da criação da

114
reserva extrativista da Amazônia. O objetivo da proposta da reserva extrativista era
demonstrar que há alternativa sustentável para a Amazônia em relação à proposta de
desenvolvimento de crescimento econômico à custa da devastação da floresta
(GRZYBOWSKI, 1991, p. 23).

O método principal no desenvolvimento do Conselho foi a dinâmica de discussão dos


seringueiros estruturada em bases organizadas, essa era a força para enfrentar desafios
que se apresentavam para o movimento como a distância e a dificuldade de locomoção na
região, dificuldades das pessoas em se envolver em mais de um movimento e a dificuldade
de comunicação entre os seringueiros (GRZYBOWSKI, 1991, p. 38).

Outro ponto valorizado na autoemancipação do seringueiro era a construção de


cooperativas para libertar os trabalhadores das condições impostas ao comércio dominado
pelos fazendeiros. Chico acreditava que a “cooperativa é uma forma nossa de lutar pela
liberdade. Isso foi conseguido com cinco anos de articulação, pois houve cooperativas
anteriores controladas pelo governo e que não vingaram, pois se tornaram mais um patrão
do seringueiro. Para nós, a cooperativa deveria ser um instrumento do próprio seringueiro,
uma conquista dele” (Martins, 1998, p. 85). A construção das cooperativas de produção e
consumo foi desenvolvida na pauta econômica do Conselho.

A cooperativa de Agroextrativista envolve, além dos seringueiros, que organizavam e


coordenavam a cooperativa, os pequenos agricultores com atuação inicialmente no Acre,
porém a proposta era integrar toda Amazônia brasileira (Grzybowski, 1991, p. 41). A
percepção de Chico Mendes sobre a experiência da cooperativa era que ela resolve o
“problema econômico dos seringueiros, que ao longo dos anos ninguém resolveu”
(GRZYBOWSKI, 1991, p. 55).

O Conselho Nacional dos Seringueiros foi o espaço fundamental para o diálogo entre
os seringueiros e indígenas e para a criação da União dos Povos da Floresta. A conclusão
dos seringueiros e indígenas era que nenhum dos dois era o responsável pelo conflito entre
eles, os verdadeiros geradores eram o seringalistas e os demais exploradores das riquezas
amazônicas (GRZYBOWSKI, 1991, p. 26).

O método dividir para dominar foi amplamente usado pela classe dominante para
manter os povos da floresta isolados e enfraquecidos. Em entrevista, Chico Mendes afirmou
que a crença das diferenças entre seringueiros e índios esteve presente na sua formação:
“estão vivos na minha memória o preconceito e a hostilidade alimentados em relação aos
índios da Amazônia: traiçoeiros, primitivos e preguiçosos” (MARTINS, 1998, p. 14).

115
Um depoimento muito interessante sobre a aliança nos Povos da Floresta pode ser
expresso pelo depoimento de Osmarino Amâncio no Encontro Rio 92:
"No começo", afirmou ele, “instigados pelos poderosos,
acreditávamos que os índios eram nossos inimigos. Por sua vez, os
índios, manipulados pelos mesmos poderosos, acreditavam que
éramos seus inimigos. Com o tempo, fomos descobrindo que as
nossas diferenças não deveriam ser jamais razão para que nos
matássemos entre nós em favor dos interesses dos poderosos.
Descobrimos que éramos todos 'Povos da Floresta' e que queríamos
e queremos uma coisa só em torno da qual nos devemos unir; a
floresta. Hoje”, concluiu, “somos uma unidade nas nossas diferenças”.
(FREIRE, 1992, p. 155 – 156).

A integração dos indígenas com os seringueiros chegou no nível da presença indígena


nos encontros municipais dos seringueiros, nas comissões de organização do Conselho
Nacional dos Seringueiros e nos empates (GRZYBOWSKI, 1991, p. 28).

A proposta extrativista liderada por Chico Mendes associa a justiça social com respeito
à cultura local e responsabilidade ambiental, pontos ecossocialistas para a construção de
uma sociedade sustentável. Para Chico Mendes, “a Amazônia não pode se transformar num
santuário intocável. Por outro lado, entendemos, também, que há uma necessidade muito
urgente de se evitar o desmatamento que está ameaçando a Amazônia e com isto está
ameaçando até a vida de todos os povos do planeta” (GRZYBOWSKI, 1991, p. 24).

A resposta das lideranças do Conselho Nacional dos Seringueiros para esse paradoxo
é a reserva extrativista, isto é, as terras devem ser da União para usufruto dos povos da
floresta, trabalhadores extrativistas e índios. A renda deve ser gerada pela extração dos
frutos da floresta, sejam já conhecidos e industrializados como borracha da seringueira,
castanhas, babaçu, açaí ou a explorar novos produtos como tucumã e papauá (ricos em
óleo), capaíba, bacaba, babaçu e pupunha, assim como o mel das abelhas, pescado e
plantas medicinais, mas sempre respeitado o limite de exploração (Grzybowski, 1991, p. 24).
Além da produção industrial dos produtos da floresta, Chico alertava que a Amazônia será
uma região muito rica quando as faculdades investirem em pesquisa de novos
medicamentos na região (GRZYBOWSKI, 1991, p.25).

Os usineiros, interessados no aumento da produção da borracha e no lucro com


comércio com as cooperativas, aliaram-se às campanhas políticas dos seringueiros. A
politica de articulação e união para construção de um mundo melhor não rejeitou o apoio
dos usineiros, porém de uma forma atenta e crítica. Os seringueiros estavam conscientes

116
que o interesse dos usineiros não estava nas melhores condições do trabalhador e sim no
lucro proporcionado pela compra de mercadorias mais baratas (Martins, 1998, p. 84). Além
do objetivo do lucro, os seringueiros sabiam que os usineiros também eram madeireiros,
mas a associação era tática e restrita a melhorias de condições de venda da borracha e com
o objetivo imediato de evitar o fechamento da Superintendência do Desenvolvimento da
Borracha, SUDHEVEA, órgão federal de apoio à produção brasileira de borracha
(GRZYBOWSKI, 1991, p.30).

Chico Mendes tinha muito claro que a armadilha do desenvolvimento gera riqueza
apenas a uma pequena oligarquia, seja no campo ou nos grandes centros. Para Chico
Mendes “queremos que a Amazônia seja preservada, mas também queremos que seja
economicamente viável” (Martins, 1998, p. 92). Além disso, Chico alertava que o modelo das
queimadas é insustentável: “O solo fica improdutivo. Por exemplo, em uma passagem onde
eles desmatam 2 ou 3 mil ha, essa terra não tem potência para resistir, e em dois anos a
terra seca ..” (MARTINS, 1998, p. 94).

A denúncia de Chico do desmatamento crescente da floresta para o governo do


Estado demonstrava que a economia ambiental integrada era mais lucrativa que a economia
de exploração insustentável:
Naquela área desmatada, na safra passada, os seringueiros
colheram 1.400 latas de castanha, uma grande produção.
Desafiamos o fazendeiro daquela área e o próprio governador a
computar a renda anual de 1ha de área transformada em pasto com a
renda de 1ha da mesma área virgem. E eles não quiserem aceitar
esse desafio porque nós iríamos provar que o lucro de 1ha de floresta
daria 20 vezes mais valor anual do que os bois ali dentro
(GRZYBOWSKI, 1991, p.25).

A preocupação da classe opressora, dona do capital, é a busca do lucro sem a


preocupação das consequências do desmatamento, desertificação ou impacto social das
decisões dos investimentos, nesse sentido o conceito de diferença espacial de Bauman
(1999, p. 16) ilustra muito bem: “quem for livre para fugir da localidade é livre para escapar
das consequências. Esses são os espólios mais importantes da vitoriosa guerra espacial”.
Exemplo da lógica insustentável do lucro imediato foi a invasão dos fazendeiros do sul na
Amazônia no inicio da década de 70 com apoio fiscal da Sudam: as primeiras ações foram
espalhar centenas de jagunços e expulsar os posseiros e índios queimando suas terras, a
resistência de alguns posseiros custou óbitos de animais e pessoas (Martins, 1998, p.78).
As 10 mil famílias expulsas do campo foram formar os cinturões de misérias nas cidades
(Martins, 1998, p. 94). O processo de desmatamento provocado pelos donos do capital,

117
como pela pecuária da década de 70, não considera o impacto social, não cumpre a
promessa de retorno social do rendimento econômico e nem mantém a perenidade
produtiva da floresta. Os números apresentados por Chico Mendes ilustram a percepção e
necessidade de enfrentar o descompromisso socioambiental dos fazendeiros: “a borracha,
com todo o desgaste que tem sofrido, ainda foi responsável por 45% da arrecadação do
ICM, enquanto a pecuária chegou somente a 5%” (MARTINS, 1998, p. 94).

Chico alertava que o discurso ecológico do governo não era comprometimento com
propostas sustentáveis e sim, era argumento para viabilizar financiamento de bancos
internacionais e órgãos multinacionais. O passo seguinte foi alertar aos responsáveis da
aprovação de crédito a contradição entre o discurso e a prática dos tomadores de
empréstimos da Amazônia, pois o argumento de integração era na verdade transformada
em desmatamento e degradação social. Chico Mendes conseguiu reverter o financiamento
dos órgãos multilaterais à obra da BR-364 (Transamazônica) com a sua participação na
reunião do BID em Miami em março de 1987. Em consequência da denúncia de Chico
Mendes e pressão das organizações ambientais, o BID suspendeu os recursos destinados
ao asfaltamento da estrada em abril de 1987 (MARTINS, 1998, p. 81).

A construção da sociedade sonhada por Chico Mendes tinha alguns adversários com
poder: os seringalistas, madeireiros e agropecuaristas. O crescimento do movimento da
classe trabalhadora no Acre provocou reação dos opressores, principalmente com o
ingresso da União Democrática Ruralista, UDR, no Acre. A UDR tinha como prioridade
combater a organização dos seringueiros em Xapuri, pois consideravam que o sindicato de
Xapuri era o principal obstáculo no seu domínio da região do Acre (GRZYBOWSKI, 1991, p.
30).

Em 22 de dezembro de 1988, Chico Mendes foi assassinado em sua casa deixando


uma viúva e dois órfãos, Helenira, 4 anos e Sandino, 2 anos (Grzybowski, 1991, p.7). O
conflito agrário gerou e continua gerando mortes de lideranças rurais, Chico Mendes foi o
octogésimo quarto trabalhador assassinado em 1988, nesse ano, o total foi noventa e seis.
No período de 1964 à 1985, foram 1.300 mortes de representantes dos oprimidos na área
rural (Martins, 1998, p. 43). As mortes nos campos por conflito de terra e água continuam
em um ritmo bárbaro: 136 mortes entre 2007 e 2011 (CPT, 2012, p. 15).

A morte de Chico Mendes não foi em vão. Em visita ao Acre quinze anos após a morte
de Chico Mendes, Zuenir Ventura (2003) encontrou as cidades de Rio Branco e Xapuri mais
urbanizadas e a sociedade mais integrada socialmente. Algumas lideranças que
trabalharam com Chico ocupavam posições de destaque na politica socioambiental, eram o

118
prefeito de Xapuri (Júlio Barbosa), o governador do Estado do Acre (Jorge Viana) e a
ministra do Meio Ambiente (Marina Silva). Acima de tudo, os índices da participação do Acre
no desmatamento da Amazônia foram reduzidos. Os indicadores de participação dos nove
estados da Amazônia brasileira na pesquisa sobre desmatamento, no período de 1988 a
2002, apontava que o Acre, com 2,7%, perdia apenas para Roraima (1,1%) e Amapá
(0,3%). O pódio de desmatamento era o Pará com 33,9% (VENTURA, 2003, p. 190). O
relatório divulgado pelo INPE (2013) sobre desmatamento de 2012, tabela 5, aponta que os
indicadores não se alteraram muito, Pará e Mato Grosso continuam liderando o
desmatamento da Amazônia brasileira e o Acre apresenta baixa participação (INPE, 2013).

Tabela 5 – Distribuição das áreas de alerta em 2012


Distribuição dos 2446.72 km2 de alertas de desmatamento no período

AC (7.13)

AM (166.07)

AP (0.31)

MA (57.42)
U
MT (1155.65)
F
PA (632.25)

RO (357.09)

RR (55.39)

TO (15.41)

Fonte: INPE, 2013

Chico Mendes deixou o aprendizado da importância da articulação de diversas


instituições e forças políticas na construção da autoemancipação da classe trabalhadora. O
primeiro Encontro Nacional dos Seringueiros, marco na história dos povos da Amazônia,
teve o apoio de diversos agentes como, por exemplo: Universidade Federal de Brasília,
Comunidades Eclesiais de Base, INESC, OXFAM, CONTAG, Centro de Defesa dos Direitos
Humanos e a assessoria da antropóloga Mary Allegretti, que foi importante na organização
da ida de Chico Mendes aos Estados Unidos para denunciar que a obra financiada pelos
organismos multilaterais agravava o desmatamento da Amazônia.

119
A utopia ecossocialista sonhada por Chico Mendes deve servir de inspiração a todos
que buscam a construção de uma outra sociedade (Mendes, 2012):

Atenção jovem do futuro,

6 de setembro do ano de 2120, aniversário do primeiro centenário da


revolução socialista mundial, que unificou todos os povos do planeta,
num só ideal e num só pensamento de unidade socialista, e que pôs
fim à todos os inimigos da nova sociedade.

Aqui ficam somente a lembrança de um triste passado de dor,


sofrimento e morte.

Desculpem. Eu estava sonhando quando escrevi estes


acontecimentos que eu mesmo não verei. Mas tenho o prazer de ter
sonhado

Mas essa utopia ainda é apenas uma indicação de chegada, pois a situação rural é
muito crítica. O poder do setor rural assumiu a pauta partidária e consegue exercer grande
influência política no país e consequentemente, manter ou até mesmo aumentar seu poder
na área rural, fechado o ciclo. Um exemplo dessa força política está na formação da
Comissão de Agricultura da Câmara federal, composta por 40 parlamentares que
acumulavam um patrimônio de R$ 51 milhões em propriedades rurais (Castilho, 2012, p.
121).

Além de eleição pessoal nas prefeituras, governos estaduais e parlamento nos três
níveis, há também, o ingresso na política partidária com financiamento de campanha. Um
dos exemplos, presentes na obra de Castilho, foi a Friboi que investiu R$ 10 milhões nas
candidaturas a governos de estado, conseguindo eleger Marconi Pirillo em Goiás e Siqueira
Campos em Tocantins, mas sua força está no parlamento federal, pois dos 63 candidatos
financiados, conseguiu eleger 41 deputados federais e 7 senadores (Castilho, 2012, p. 150 –
151), poucos partidos políticos tem uma bancada tão numerosa. Essa questão esteve
presente no debate sobre alteração do Código Florestal, pois a maioria da bancada Friboi foi
fiel ao seu financiador, com exceção apenas de três parlamentares, além do relator, Paulo
Piau, ter sua campanha financiada pelo agronegócio (Castilho, 2012, p. 153).

120
Infelizmente a escravidão, os assassinatos e a grilagem ainda são companhias dos
povos da floresta, companheiros de Chico Mendes. Além do conflito desigual pelas terras,
há ainda a prática de escravidão em nossa área rural. Castilho, com apoio da ONG Repórter
Brasil, uma referência em pesquisa sobre escravidão, apontou em seu livro diversos
exemplos de trabalhadores em situação análoga a escravos em diversos estados brasileiros
(Castilho, 2012, p. 184 – 204). Interessante observar que há casos em que o político tem
domicílio eleitoral nos estados do sul e sudeste, mas suas propriedades rurais estão no
norte e nordeste, como o caso de um deputado federal radialista de Santos de cujas terras
em Bonópolis (Goiás) foram libertados 46 trabalhadores, sendo 7 menores (CASTILHO,
2012, p. 201).

A morte também é presença constante entre os povos da floresta. A violência não é só


praticada pela “mão armada do latifúndio” (Castilho, 2012, p. 207), mas também pelo poder
público a serviço dos fazendeiros, como os massacres de Corumbiara em 1995 e Eldorado
do Carajás em 1995 (CASTILHO, 2012, p. 207 – 210).

O assassinato da missionária Dorothy Stang em 2005 teve grande repercussão


internacional. Ela foi “marcada para morrer” por denunciar a violência contra os
trabalhadores, grilagem e desmatamento praticados pelos fazendeiros da região de Anapu,
no sul do Pará, nesse caso, os culpados foram julgados e condenados (CASTILHO, 2012, p.
211 – 213).

A violência do campo atinge também às comunidades indígenas, acirrada pela falta de


demarcação de suas terras e invasões, pois apenas 38% das terras indígenas estão
regularizadas, o que gera a possibilidade de invasão ou grilagem por parte dos “ruralistas”
(Buzatto, 2014, p. 12). Os quais aproveitaram a inércia do governo federal para propor a
Emenda à Constituição (PEC) 215/2000 que prevê a transferência da responsabilidade pela
demarcação das terras indígenas ao poder Legislativo. Felizmente a proposta foi derrotada
pela mobilização da sociedade, mas essa vitória não garante a paz para os povos indígenas
(Rangel, 2014, p. 16) que somente poderá ocorrer com a demarcação de suas terras,
enquanto isso, o conflito persiste e as mortes também.

A questão da terra é um dos grandes problemas socioambientais brasileiros, pois é um


processo histórico e mantido por forças políticas que atuam nos três poderes e nos três
níveis, municipal, estadual e federal, com a cumplicidade da mídia.

121
4.2 Ecossocialismo na política partidária brasileira

PT Partido dos Trabalhadores

O Partido dos Trabalhadores, PT, foi o primeiro partido político brasileiro que abarcou
diversos segmentos ambientais. No Brasil, a proposta política de integração das lutas
sociais e ambientais motivou os ecossocialistas a ingressarem no Partido dos Trabalhadores
(PT) na década de oitenta do século XX. O movimento apostava na transformação do PT
em um partido ecossocialista, sob o argumento que “todo componente inovador de sua
corrente socialista democrática deverá reconhecer em médio prazo o caráter crucial dos
problemas ecológicos no mundo contemporâneo” (VIOLA, 1987a, p. 47).

As primeiras reuniões de militantes ecológicos no PT ocorreram nos intervalos dos


cursos de formação do partido que foram ministrados na cidade de Cajamar (SP) em 1990
(Laxe, 2013a; 2014c). A motivação das reflexões era a necessidade de unir a ecologia e o
socialismo e propor alternativa ao capitalismo, dessas reflexões, surgiu o nome
ecossocialismo, que foi adotado a partir de então (LAXE, 2014c).

Os representantes das correntes socioambientais no PT estavam organizados em


núcleos de ecologistas do PT e na Subsecretaria Nacional dos Ecologistas do Partido dos
Trabalhadores. Os núcleos mais atuantes estavam situados nas cidades de Brasília, Porto
Alegre, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. O período de 1989 a 1991 foi produtivo para os
ecossocialistas, pois ocorreram várias reuniões, reflexões e foram produzidos vários
documentos sobre o ecossocialismo (LAXE, 2013a).

Um marco para o ecossocialismo brasileiro foi o Encontro em Angra dos Reis em


1991. O Encontro Nacional dos Ecologistas do partido de Angra dos Reis foi organizado
pela, então, Subsecretaria Nacional dos Ecologistas do Partido dos Trabalhadores (Laxe,
2013a). O resultado do encontro foi positivo, pois foi houve a formalização do setorial
ecossocialista do partido (Laxe, 2014c), a eleição dos coordenadores, geral (Augusto de
Franco) e executivo (Mauricio Laxe) (Laxe, 2014c) e o lançamento da primeira versão do
Manifesto Ecossocialista (Laxe, 2013a; Laxe, 2014c). O Manifesto foi redigido com apoio de
muitos documentos escritos por diversos autores no processo preparatório do encontro
(LAXE, 2014c).

122
O primeiro manifesto ecossocialista (Anexo 1) é amplo com 41 pontos programáticos.
Esse manifesto denuncia a degradação socioambiental gerada pelo antropocentrismo, mas
alerta que não é a presença humana que esgota a capacidade de resiliência do planeta,
mas sim, a atual “sociedade fundada no lucro e na propriedade privada”, isto é, o modo de
produção hegemônico, seja sua versão capitalista ou socialista “real”, que “gera riqueza
(questionável) para poucos, miséria para muitos e degradação ambiental para todos” e
assim, assume o risco de esgotar a capacidade do planeta fornecer condições de
sobrevivência humana (PT, 2001, p. 352). Outro aspecto relevante é o resgate do conceito
marxista que o homem “é parte da natureza, aquela que, inclusive, desenvolveu a
consciência” (PT, 2001, p. 352), assim, a relação homem e Natureza deve superar a atual
forma de dominação antropocêntrica capitalista; segundo o primeiro manifesto, o meio
ambiente saudável é incompatível com o capitalismo, seja na sua versão liberal ou
socialdemocrata (PT, 2001, p. 352). O manifesto ecossocialista afirma que a proposta não é
“pintar de verde a fachada do prédio do capitalismo” (PT, 2001, p. 358) e sim, substituir a
propriedade privada por gestão coletiva democrática, em sintonia com a Natureza e solidária
com as futuras gerações (PT, 2001, p. 352).

O primeiro item do manifesto expressa a sua conexão com o arco-íris ecossocialista e


a necessidade de uma nova forma de relacionamento entre a humanidade e a Natureza:
Os ecossocialistas procuram resgatar a herança histórica de luta da
humanidade pela justiça social, pela democracia como valor essencial
e pelo direito à diferença (de gênero - Homem-Mulher -, da
diversidade cultural dos povos e de opções sexuais, religiosas).
Afirmam que, como parte dos movimentos que entram em luta por
novas formas de relações sociais (socialistas), entram em luta
também por novas formas de relação do ser humano com a natureza.
Nesse sentido, não somos nem socialistas no sentido estrito, nem
ecologistas em sentido estrito: somos ecossocialistas (PT, 2001, 351).

O primeiro manifesto apresenta temas relevantes para o inicio do século XXI como a
participação das lideranças sindicais e o papel da ciência e tecnologia na construção de
uma sociedade ecossocialista. A reflexão sobre o papel das lideranças sindicais no
manifesto é bem atual, pois questiona o “corporativismo” em diversos pontos do manifesto; o
enfoque desse questionamento é que o movimento sindical deve superar o estágio de se
limitar à pauta de melhoria salarial e participação de lucros, assim, os proletariados fabris e
rurais devem, em parceria com os movimentos sociais, assumir as transformações
socioambientais (PT, 2001, p. 356). O exemplo dado pelo manifesto para pensar além do
corporativismo é a reflexão sobre a falta de acesso a automóveis por todos trabalhadores: a

123
proposta não é priorizar a posse de automóveis, e sim estruturas eficientes de transporte
público, pois o objetivo não deve ser a socialização do congestionamento. A proposta
contida no Manifesto de 1991 é que a análise critica do movimento sindical sobre produção
deve incorporar “para o que se produz” ao questionamento “como se produz” (PT, 2001, p.
355), isto é, além das condições físicas e monetárias dos trabalhadores, a utilidade e o
impacto socioambiental dos bens e serviços produzidos é também presença importante na
pauta política sindical. A orientação contida do Manifesto é que o desejável deve ser o bem
viver, e não somente o conforto material (PT, 2001, p. 355).

O papel socioambiental da ciência e tecnologia também tem um espaço importante no


manifesto de 1991. O ponto de encontro entre a ciência e tecnologia com o movimento
sindical está na busca de condições de trabalho saudáveis, com a substituição e exclusão
de materiais tóxicos (como benzeno, mercúrio, agrotóxicos e jateamento de área) na
produção. A orientação do documento é que o movimento sindical deve incorporar a busca
de um ambiente despoluído, seja na jornada de trabalho, seja na vida pessoal nos seus
objetivos (PT, 2001, p. 358). Para alcançar esse objetivo, o manifesto indica que o papel da
ciência e tecnologia é importante para a superação do desperdício, da devastação e a
diminuição da jornada de trabalho (PT, 2001, p. 357).

A divulgação do Manifesto Ecossocialista foi uma das atividades do partido na


Conferência Eco-92, mas ocorreram outras participações sociais do partido nessa
conferência. O PT, a ONG pernambucana Aspan e o núcleo do meio ambiente da CUT com
o apoio da FAMERJ – Federação das Associações de Moradores do Rio de Janeiro, do
Fórum de Organizações Ambientalistas da América Latina e organizações ambientalistas
presentes no Fórum Global Paralelo, que ocorreu concomitante à Conferência Eco-92,
fizeram uma expressiva manifestação contra a lógica de consumo, de exploração
econômica e de degradação ambiental e social, inerentes a globalização e ao sistema
capitalista, que gerou a passeata “Eco dos Oprimidos” com a participação de mais de 40 mil
pessoas (Laxe, 2013a). O termo “ecossocialista ou barbárie” que tem orientado as reflexões
ecossocialistas atuais já estava presente nessa passeata em um cartaz na frente do carro
de som (LAXE, 2014c).

Após a experiência da Conferência Rio-92, o PT alterou a área ambiental na estrutura


organizacional do partido, dando-lhe maior relevância. A Subsecretaria Nacional dos
Ecologistas foi alterada para Secretaria Nacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento,
SMAD/PT, em 1993, com o objetivo de promover avanços na consciência e organização da
cidadania socioambiental no PT em todas as suas instâncias (LAXE, 2013a).

124
Além da militância partidária, os ecossocialistas petistas também se envolveram na
militância de ONGs ambientalistas e nos debates dos Fóruns Sociais Mundiais. Para Laxe
(2013a), a participação dos ecossocialistas do partido nos Fóruns Sociais Mundiais e os
debates do pensamento ecossocialista com diversos segmentos políticos no Brasil e demais
países do continente americano e europeu aumentou a visibilidade do ecossocialismo e
melhorou a consistência das propostas da corrente ecossocialista (LAXE, 2013a).

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência da republica em 2002 e a


consequente posse de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente em 2003 mudaram o
rumo da corrente ecossocialista no Partido. A posse de Marina Silva desarticulou o
movimento em diversos estados, pois os responsáveis da construção da Rede
Ecossocialista nesses estados se transferiram para Brasília para assumir cargos no
ministério, esvaziando os trabalhos de articulação nos seus locais de militância (LAXE,
2014c).

Outro impacto da vitória de 2002 foi alteração pragmática da candidatura, pois para se
viabilizar eleitoralmente, o partido amenizou sua radicalidade socioambiental. Após uma
sequência de derrotas para candidaturas neoliberais (1988 para Fernando C. de Mello e
1994 e 1998 para Fernando H. Cardoso), o PT alterou a estratégia eleitoral se aproximando
de setores mais conservadores. Entre as ações, a candidatura da vice-presidência foi
assumida pelo industrial José de Alencar e houve também o fortalecimento interno de
setores da socialdemocracia (Löwy, 2012d). Uma ação formal de campanha, para “acalmar”
o mercado e reduzir a resistência à candidatura Lula, foi a redação e divulgação do
documento Carta ao Povo Brasileiro. A estratégia foi vitoriosa, pois venceu as eleições de
2002 no segundo turno com 61% dos votos contra o candidato José Serra do PSDB (TSE).

A Carta ao Povo Brasileiro apresentou, em termos gerais, como seria o governo do


PT e aliados. A promessa contida no documento era que o mandato de Lula seria uma
gestão de coalizão (Lula da Silva, 2002, p. 2) com compromissos de resultados: reforma
tributária associada à desoneração a produção; reforma agrária com a segurança de paz no
campo; redução das carências energéticas e déficit habitacional e o compromisso de honra
os contratos vigentes (Lula da Silva, 2002, p. 3 e 4). A proposta contida na Carta buscava
resgatar a confiança do setor financeiro e do “mercado” na economia do país (Lula da Silva,
2002, p. 3) com o compromisso de “crescimento econômico com estabilidade e
responsabilidade social” (Lula da Silva, 2002, p. 5) e a garantia que haveria o cumprimento
dos contratos vigentes (LULA DA SILVA, 2002, p. 3; LULA DA SILVA, 2002, p. 4).

125
A preocupação na proposta do PT era resgatar a confiança do mercado para obter os
investimentos necessários ao crescimento econômico, e assim, gerar empregabilidade e
renda para os trabalhadores. Desta forma, o governo buscou deliberar orientado que: suas
decisões influenciam como tendências de longo prazo; os choques de curto prazo têm
impacto nas rotinas das empresas e das pessoas (Barbosa, 2013, p. 69), assim como, a
“política econômica também pode criar tendências de longo prazo e alterar o curso de
desenvolvimento de uma economia promovendo avanços mais rápidos a favor de alguns
setores ou grupos sociais” (BARBOSA, 2013, p. 70).

Sicsú (2013, p. 83) justifica essa proposta argumentando que o investimento é


fundamental, pois qualifica o crescimento econômico porque facilita a trajetória que
possibilita a continuidade do próprio crescimento da economia. Isto é, “o investimento numa
hidroelétrica possibilitará a geração de mais energia que por sua vez, possibilitará a
instalação de novas fábricas consumidoras de energia”. Assim, o investimento não somente
incrementa o crescimento imediato, mas também, potencializa crescimentos futuros, o PIB
potencial (Sicsú, 2013, p. 83). Para Sicsú, o investimento público estimula o investimento
privado, pois reduz os custos empresariais e incertezas de demanda futura (SICSÚ, 2013,
p.85).

Nesse aspecto, o governo trabalhou para construir cenários positivos para estimular os
investimentos privados, pois esse investimento depende da expectativa e segurança. Em
2012, houve uma redução de investimento privado pela contaminação da crise europeia.
Essa retração levou o governo a reduzir as tarifas de energia elétrica, reduzir as taxas de
juros pela ação dos bancos públicos e efetuar as desonerações (SICSÚ, 2013, p. 77).

Além da apreensão sobre investimento para o crescimento econômico, havia


também a preocupação com a governabilidade. Para o PT, a governabilidade, nesse
momento, exigia compor com as forças políticas conservadoras. O paradoxo, apontado por
Sicsú (2013, p. 86), é como compor com a elite brasileira, mesmo acreditando que ela “não
pensa no país, incluindo aí o personagem central: o povo. A elite brasileira é conservadora e
somente têm interesses econômicos que visam à formação de patrimônio”. Sicsú
complementa o conceito sobre a elite brasileira: preocupa-se apenas com seus
apartamentos e outras propriedades que possuem no exterior, principalmente nos Estados
Unidos e na França e considera o Brasil apenas um quintal onde ganham muito dinheiro”
(SICSÚ, 2013, p. 86).

126
Para as lideranças do PT, os partidos de esquerda precisam de aliados para governar,
para ter a maioria no Congresso. Para Sicsú (2013, p. 91), o desafio é administrar as
coligações políticas, pois há aliados com interesses particulares e conveniência eleitoral e
“governar com esses partidos é uma tarefa difícil, governar sem eles é uma tarefa
impossível ... o Brasil avançaria mais rápido se pudesse contar com uma base aliada de
partidos e parlamentares progressistas e de esquerda, mas esta possibilidade não existe”. O
Congresso Nacional é um espelho da sociedade, são representantes da cultura e
pensamento da sociedade, que em grande parte são conservadores e de direita (Sicsú,
2013, 91). A situação é agravada pela atuação da mídia ao propagar o repúdio à classe
política e assim, alimentar a hegemonia conservadora no congresso pelo voto
descompromissado ou indiferente do eleitor, reflexo da crença deste que “todos são iguais”
(SICSÚ, 2013, p. 92).

A formação da estrutura de gestão e governabilidade dos mandatos presidenciais do


Partido dos Trabalhadores e seus aliados expressam os conflitos de interesses de vários
setores sociais, com diversos representantes de posições ideológicas muitas vezes
antagônicas. A grande questão é que esse modelo de governabilidade afasta o Partido dos
Trabalhadores da utopia anticapitalista e socialista presente em seu documento do
Congresso do Partido de 1990 (LÖWY, 2012d).

A concessão ideológica do governo do presidente Lula foi superior às expectativas de


alguns setores, e essa quebra provocou mudanças na sua militância. Em 2003, houve a
primeira perda na corrente ecossocialista no PT, quando três deputados (João “Babá”
Batista Araújo, João Fontes e Luciana Genro) e a senadora Heloísa Helena foram expulsos
do partido por divergências em relação as orientações e ações do PT e do governo Lula, e
cujo ponto mais crítico foi a votação contra à reforma da previdência. O grupo iniciou a
fundação do novo partido PSOL, Partido Socialismo e Liberdade, com apoio de outras
dissidências petistas, principalmente de trotskistas, socialistas cristãos, sindicalistas, e
intelectuais marxistas como Carlos Nelson Coutinho, Chico de Oliveira, Leandro Konder e
Ricardo Antunes (Löwy, 2012d). Posteriormente, após a derrota de Plínio de Arruda
Sampaio nas eleições internas do partido em 2005, houve outra migração de militantes para
o PSOL, com o ingresso de, além do próprio Plínio de Arruda Sampaio, diversos filiados do
PT, inclusive os deputados Chico Alencar do Rio de Janeiro e Ivan Valente de São Paulo.

A gestão de Marina Silva foi, para a corrente ecossocialista do partido, outro obstáculo
para o ecossocialismo no PT. Para Laxe (2014c), a primeira crise ocorreu em 2003, com a
proibição de reunião do coletivo ecossocialista no interior do ministério, o que levou o grupo
ecossocialista a realizar suas reuniões em espaço público na região do ministério. Essa

127
proibição criou desconfiança dos ecomarxistas históricos do PT em relação à Marina Silva e
essa crise teve o seu ápice na reforma no Ministério do Meio Ambiente em 2007. Nessa
reforma, houve uma forte alteração no perfil ideológico no ministério, sendo que o espaço do
ecossocialismo foi totalmente eliminado com o desligamento de alguns ecomarxistas
petistas e o rebaixamento de cargo para os demais. O setor político fortalecido na reforma
ficou conhecido como “grupo marinista”, que posteriormente a acompanhou na saída do PT
e seu ingresso no PV (LAXE, 2014c).

O afastamento de setores ecológicos históricos do PT do Ministério de Meio Ambiente


trouxe um duplo prejuízo, primeiramente enfraqueceu Marina Silva perante as lideranças do
Partido dos Trabalhadores (Laxe, 2014c), e sua saída do partido prejudicou ainda mais a
corrente ecossocialista, pois os ecologistas ficaram estigmatizados e sofreram rejeição por
parte de algumas lideranças do partido (LAXE, 2014c; LAXE, 2014d).

Em 2008, Marina Silva saiu do PT após atritos e disputas internas. Uma crise séria
entre a então ministra e demais setores do governo federal foi o embate sobre a MP
458/2008, que tratava a questão fundiária na Amazônia, esse projeto foi enviado pelo
governo e aprovado pelo Congresso. Para Marina Silva (2010, p. 84), essa Medida
Provisória foi “a pior coisa já feita para Amazônia desde a ditadura militar”, pois, em sua
percepção, o projeto desconsiderou dois elementos fundamentais: o relacionamento das
terras ao ordenamento territorial, zoneamento ecológico, e o combate à grilagem e, assim,
privatizou 67 milhões de hectares de terras públicas na Amazônia (Silva, 2010, p. 85).

Os doze primeiros anos dos governos do PT e aliados foram marcados por problemas
na área ambiental, mas também houve avanços na área social e desafios na área produtiva,
em todos os casos sem ruptura com o modelo produtivo hegemônico. O objetivo central dos
mandatos foi incentivar a produção para aumentar a riqueza, mas proporcionando
distribuição mais justa. Para incentivar a produção, o governo reduziu a taxa de juros para
capital de giro de 42,3% em 2002 para 18% em 2012 (SICSÚ, 2013, p. 31). Outro desafio
para gerar riqueza enfrentado pelo governo foi estimular a competitividade das empresas
brasileiras para poder disputar com a importação de produtos industrializados. O volume de
importação cresceu de US$ 40,4 bilhões em 2002 para US$ 193,9 bilhões em 2012, esses
números indicam transferência de empregabilidade, sendo que a proposta para o aumento
da competitividade no Brasil era aumentar a empregabilidade do brasileiro e interromper a
exportação de “postos de trabalho” (SICSÚ, 2013, 45).

128
As políticas na área social apresentaram alguns indicadores de avanços, como a
redução da desigualdade territorial com o crescimento das regiões Norte e Nordeste, 5,6% e
5% respectivamente no período de 2003 a 2013. No mesmo período o Sudeste cresceu
4,5% ao ano, sendo que os estados de Rondônia, Acre e Tocantins cresceram em torno de
7% ao ano (SICSÚ, 2013, p.32).

A política de desenvolvimento com redução da desigualdade gerou resultados


positivos. O índice Gini indica que a distribuição da renda do Brasil melhorou no período dos
governos do PT e aliados. Esse índice mede a distribuição de renda, sendo o mais próximo
de 1 indica maior desigualdade, enquanto mais próximo de 0, maior igualdade; por exemplo,
o índice da França é 0,308 e da Suécia é 0,244. No Brasil, o índice saiu de 0,585 em 1995
para 0,563 em 2002 e para 0,501 em 2011 (Sicsú, 2013, p. 61). Outro indicador positivo foi a
participação do salário no PIB, pois evoluiu de 49,16% em 1995, chegando a 46,26% em
2003 e alcançou 51,40% em 2009 (SICSÚ, 2013, p. 62).

A democracia de oportunidade cidadã pelo consumo apresentou números expressivos


nos doze primeiros anos do governo do PT e aliados. Para Sicsú (2013, p. 35), o governo de
Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu reverter a herança assumida em 2003, onde a
“autoestima do povo era baixa, o desemprego era elevado e o crédito e o consumo eram
inacessíveis para dezenas de milhões de brasileiros”. Em 2003, o mercado consumidor era
sustentado por apenas 45,2% da população, restrita aos estratos A, B e C, e nesse período
houve o ingresso dos estratos D e E, aumentando para 63,7% da população, o que em
valores absolutos chegam a 122 milhões de brasileiros (Sicsú, 2013, p. 71). A melhoria
social desse período também pode ser ilustrada pela esperança de vida do brasileiro, que
era de 64,7 anos em 1991, índice que saltou para 73,9 anos em 2010 e, 74,5 anos em 2012,
isto é, houve um aumento de quase dez anos na expectativa de vida do brasileiro
(DOWBOR, 2014d).

O questionamento ecológico sobre essa evolução está no seu formato socioambiental,


pois democratizar o consumo é muito bom, porém, o governo não enfrentou o paradoxo
ambiental da harmonia entre o consumo e a pressão ambiental que ele gera. Esse conflito
pode ser ilustrado com a política de estímulo à produção de automotores fósseis. Em 2003,
foram produzidos 1,7 milhão de automóveis, ônibus, veículos leves e caminhões, mas esse
número elevou-se para 3,4 milhões em 2011. Por um lado, seu mérito foi a criação de
milhares de empregos, mas em contra partida contribuiu para a transformação das grandes
cidades em espaços caóticos. A crítica é que o “emprego de milhares de trabalhadores
depende da geração de engarrafamentos e de mais poluição do ar e sonora” (SICSÚ, 2013,
p. 31), essa avaliação confirma o alerta presente no Manifesto Ecossocialista de 1991 sobre

129
os riscos da “socialização do congestionamento” da sociedade do automóvel (PT, 2001, p.
355 - 356). A alternativa de estimular a economia por intermédio da produção e venda de
automóveis seduziu o governo, porém “consolidamos um modelo de cidades para os carros,
que é insustentável. O modelo atual deve ser substituído pelo modelo de cidade para os
cidadãos” (SICSÚ, 2013, p. 32).

Dentro de uma ótica produtivista, houve melhoras, mas há muito investimento


socioambiental para construir. Para Sicsú (2013, p. 33), o desafio para os próximos dez
anos é sociabilizar o bem-estar, o bem viver, pela melhoria e universalização da saúde
pública, educação formal, qualidade do transporte público, iluminação nas ruas, coleta de
lixo, saneamento, segurança pública, acesso à água potável etc. Ladislau amplia as
“tarefas” necessárias para construir uma sociedade mais justa socialmente:
Mas, para os que apoiam os avanços do país, é também bastante
complicado. Não dá para negar os imensos avanços, mas não dá
para negar a imensa paralisia política que gera a tal da
governabilidade, o travamento da reforma agrária, os imensos atrasos
do saneamento, a continuidade do financiamento dos grandes grupos
de comunicação pela publicidade oficial, o escandaloso nível dos
juros dos bancos comerciais, a fortuna transferida anualmente para
os bancos pela taxa Selic, a imensa injustiça do sistema tributário, e
assim por diante. Muitos simplesmente baixam os braços e se tornam
espectadores, quando não se juntam a alguma alternativa que
esperam ser mais promissora (DOWBOR, 2014d).

A campanha pela reeleição de 2014 foi acirrada, mas a presidenta Dilma se reelegeu,
com discurso de ampliação dos projetos sociais e melhoria da economia através do
aumento da produção. Os documentos de campanha, Diretrizes e Programa de Governo:
Mais Mudanças, Mais Futuro, sinalizam que a opção produtivista para geração de riqueza
com distribuição de renda será mantida no segundo mandato de Dilma Rousseff. O
documento Diretrizes aponta que para continuar com as mudanças iniciadas em 2003,
primeiro governo Lula, é necessário gerar um crescimento mais acelerado da economia
brasileira, movida, entre outros fatores, pelo aumento da produtividade (PT, 2014a, p. 12). O
governo pretende associar o crescimento à erradicação da pobreza, preservação do meio
ambiente e a ampliação da democracia (PT, 2014a, p. 14), pois para a candidatura de Dilma
“não precisa existir contradição entre crescer, incluir, proteger e conservar” (PT, 2014a, p.
14).

130
O programa de governo apresentava algumas preocupações ambientais. A
“profissão de fé do PT” registrada no programa de governo para o segundo mandato de
Dilma Rousseff é o modelo de desenvolvimento economicamente viável, socialmente
justo e ambientalmente sustentável (PT, 2014b, p. 8), esse desenvolvimento foi
associado pelo documento ao aumento de investimento na economia; inflação baixa;
radical redução da pobreza e redistribuição de renda; e fortalecimento do consumo de
massa (PT, 2014b, p. 8).

O Programa de governo da então candidata ao segundo mandato apresenta


“diversas conquistas” na área social, econômica e ambiental dos primeiros mandatos do
PT e aliados. Das conquistas enaltecidas no Programa de Governo, há a adoção de
“políticas consistentes e continuadas de apoio ao agronegócio e à agricultura familiar”
que proporcionou o salto de 96 milhões de toneladas em 40 milhões de hectares na
safra 2001/2002 para 191 milhões de toneladas em 56 milhões de hectares na safra
2013/2014 (PT, 2014b, p. 10) e o País ter assumido o papel de maior redutor de
emissões de gases de efeito estufa (PT, 2014b, p. 11).

Para o segundo mandato, a proposta apresentada no Programa é o “fortalecimento


de uma política macroeconômica sólida, intransigente no combate à inflação e que
proporcione um crescimento econômico e social robusto e sustentável” associado ao
“compromisso com o Brasil Produtivo”, isto é, aplicar as politicas industrial, científica,
tecnológica e agrícola para reduzir os custos na produção (PT, 2014b, p. 26).

A política ambiental, presente no Programa, tem os seguintes pontos de


preocupação: agilização nos licenciamentos ambientais, modernização do licenciamento
ambiental, segurança hídrica e redução de emissões (PT, 2014b, p. 28). As ações para
a redução de emissões previstas no Programa 2014 foram: combate ao desmatamento,
principalmente da floresta Amazônia, engajamento do governo nas negociações
climáticas internacionais e aceleramento do Cadastro Ambiental Rural, além do apoio a
restruturação produtiva para economia de baixo carbono (PT, 2014b, p. 28).

Mas a dualidade e as concessões dos governos do PT e seus aliados tem na área


rural ou “disputa do solo rural” um exemplo significativo. Por um lado, foram implementados
projetos importantes para a Amazônia como o Plano de Ação para Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia Legal, envolvendo diversos ministérios, e o PAS Plano
Amazônia Sustentável, que para Minc (2010, p. 104), “trabalham sob uma lógica excelente”,
além do Projeto de Desenvolvimento Ambiental (PDS); Plano de Desenvolvimento Florestal

131
(PDF); e Plano de Desenvolvimento de Assentamento Sustentável (PDA) (Minc, 2010, p.
105). Por outro lado, aliada ao produtivismo do PAC, a política da reforma agrária é
insuficiente e há uma forte influência do setor de agronegócio no governo federal (MINC,
2010, p. 114).

O produtivismo e seus interesses de curto prazo “contribuem para que as políticas


ambientais sejam contextualizadas sem o nível de conhecimento técnico e científico
satisfatório”, e esse processo é agravado pela baixa capacidade institucional existente nos
órgãos ambientais no Brasil, pois, para Vieira (2013, p. 238), há falta quantitativa de
profissionais, materiais, recursos financeiros, tecnológicos, organizacionais, gerenciais e
informação.

Essa dualidade de forças, muitas vezes antagônicas, está representada na


composição dos ministérios. Os conflitos e incoerências no interior do governo podem ser
exemplificados, entre outras ações, pelo embate sobre a proibição do amianto e sua
substituição. Houve forte reação no estado de Goiás, inclusive do sindicato dos
trabalhadores da produção de amianto, na defesa da manutenção da mina de amianto
Minaçu, utilizando o argumento o “nosso amianto é diferente do outro, o nosso não polui
tanto” (Minc, 2010, p. 98). Esse embate também foi travado no governo federal, pois o
governo brasileiro necessitou definir uma posição sobre o amianto para a convenção sobre
produtos perigosos em 2009. Os ministérios do Meio Ambiente, do Trabalho e Emprego e da
Saúde foram favoráveis a inclusão do amianto na relação dos produtos perigosos, e os
ministérios de Minas e Energia e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior se
posicionaram contra. O impasse não foi sanado, assim, o Ministério de Relações Exterior
ficou impossibilitado de levar uma posição brasileira para esse tema (MINC, 2010, p. 99).

A militância ecológica interna no PT é um grande desafio, pois o partido não superou a


cultura corporativista, alertada no Manifesto de 1991, e mantém a perspectiva de melhoria
das condições de vida da classe trabalhadora somente com o crescimento econômico. Para
Minc (2010, p. 114), o “DNA do PT é produtivista”, assim, “o DNA do nosso governo é
produtivista”. Para reverter essa cultura partidária, a militância ecológica deve se articular e
crescer sua representatividade interna, pois, conforme o depoimento de Minc (2010, p. 114),
“nós, os chamados ecossocialistas, ecolibertários ou ecorrevolucionários ou
ecoqualquercoisa, formamos uma composição de menos de 10% do PT”.

132
O processo de formação do Coletivo Ecossocialista do PT tem grandes desafios na
sua construção. Para Viana (2014), não existe uma corrente ecossocialista organizada no
PT, apenas um grupo de socioambientalistas em torno do Setorial de Meio Ambiente e
Desenvolvimento, que é reconhecida como uma secretaria nacional e dentre esses, há
diversos ecossocialistas.

Por um lado, a corrente de pensamento ecossocialista é totalmente livre dentro do PT,


porém, ainda há dificuldade de influenciar nas decisões e rumos do partido. Para Viana
(2014), os grandes desafios da corrente ecossocialista no PT são:
a) Insuficiência teórica: atinge a toda corrente ecossocialista e não apenas aos do PT;
b) Dificuldade de apresentar propostas políticas: a capacidade de influenciar as decisões
e as intervenções do PT, seja no papel de governo, seja na intervenção na sociedade civil
(sindicatos, Ongs, movimentos sociais, etc.);
c) O ecossocialismo é uma proposta anti-hegemônica, assim, falta a corrente
ecossocialista do PT apresentar posições anti-capitalistas nos debates dentro do próprio
partido, no movimento popular e até mesmo, no Governo. Esse debate é débil.

As razões, apontadas por Viana (2014), para o fraco desempenho do ecossocialismo


no PT são:
1) contradição de ser partido e ser governo, ou simplesmente estar no governo;
2) perda de vários colaboradores que saíram do partido:
3) burocratização do partido;
4) ida para instâncias governamentais dos militantes ecossocialistas e
5) dificuldades operacionais da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento, SMAD
que, tradicionalmente, fazia o debate dentro do PT.

Nesse quadro adverso, o grupo ecossocialista no partido ficou desarticulado, com


ações individuais, até a Conferência Rio+20. Houve uma nova reunião de ecossocialistas
provocada pela atividade “O Ecossocialismo e a Sustentabilidade - Paradigmas
Ecopolíticos” promovida pela ONG ECOS BRASIL - Assoc. Ecológica de Cooperação Social
com participantes do PT, PSOL e PSTU. Após essa atividade, os militantes do PT fizeram
outra reunião para resgatar a corrente ecossocialista no partido (LAXE, 2014d).

O processo de reconstrução do ecossocialismo influenciou na área de meio ambiente


do partido. Para Laxe (2014d), a última eleição para a Secretaria do Meio Ambiente e
Desenvolvimento do Partido dos Trabalhadores foi um momento histórico marcante, pois as
três candidaturas apresentaram o ecossocialismo nas suas propostas de gestão.

133
A retomada do ecossocialismo no PT foi animada pelo Encontro de 2013. Em 17 de
dezembro de 2013, ocorreu a Plenária “o PT e o Ecossocialismo” na sede nacional do
Partido dos Trabalhadores em Brasília, que retomou o tema ecossocialismo no partido e
criou o Coletivo Ecossocialista do PT (LAXE, 2013c). A proposta inicial do encontro foi
comemorar os 22 anos do Manifesto Ecossocialista de 1991 e retomar a construção do
coletivo ecossocialista no partido (LAXE, 2013b).

O encontro foi uma iniciativa de retomada do pensamento ecossocialista no PT. O


interesse foi expressivo, pois havia 21 presentes no encontro e outros 43 manifestaram o
desejo de estar presente, mas justificaram a ausência pela distância ou problema de agenda
(Laxe, 2013c). O encontro iniciou com palestras envolvendo a relação de temas
socioambientais como as questões: sindical (Chico Floresta), ambiental (Gilney Viana) e
agrária (Ney Zavaski) e suas relações políticas com a ecologia e o socialismo (Laxe, 2013c).
Além das palestras, houve a apresentação do histórico da corrente ecossocialista no Brasil e
os cenários previstos para 2014, houve também o debate sobre as mobilizações de junho de
2013, seu impacto sobre a mobilidade e reforma urbana, além do debate sobre o retrocesso
na legislação ambiental (LAXE, 2013c).

A proposta para o movimento ecossocialista no PT é atuar nos embates da medida


provisória do Governo para a Reforma Agrária; revisão do Código de Mineração (que
permite mineração em UCs); a PL 215 (que reduz os direitos indígenas); as propostas que
“afrouxam” a legislação sobre agrotóxicos; novo Código Florestal; e a Política Nacional de
Meio Ambiente, pois foi implementada há 32 anos e grande parte de seus instrumentos não
foram implementados até hoje, 2014 (LAXE, 2013c).

A proposta do Encontro foi fundar o coletivo ecossocialista no PT com o objetivo de


promover o debate político ecossocialista no partido. O objetivo do coletivo ecossocialista
petista é organizar uma instância política capaz de influenciar e ser canal de interlocução
ecossocialista junto a formulação de políticas socioambientais nos diversos níveis
governamentais. Para Laxe (2013c), é necessário enfrentar os grandes “gargalos e
problemas socioambientais” presentes no Brasil e ainda não atacado pelos governos
petistas.

Outro ponto relevante desse Encontro foi a exposição da necessidade da articulação


das agendas dos ecossocialistas do PT com partidos e movimentos populares
comprometidos com os setores agrários, urbanos, de cultura, de juventude, etc., e ainda
com os movimentos sociais afins para construir uma sociedade ecossocialista (LAXE,
2013c).

134
O encontro decidiu construir os seguintes pontos (LAXE, 2013c):
 A organização de uma Agenda de discussões ideológicas, para prover uma releitura
ideológica dos principais documentos ecossocialistas, inclusive com uma avaliação e
possível atualização do I Manifesto Ecossocialista do PT (1991).
 A organização de uma Agenda de Debates temáticos e programáticos socioambientais
e a formação de um grupo interativo pela internet dos ecossocialistas do PT.
 A imediata constituição de um Coletivo Ecossocialista do PT, buscando promover uma
integração permanente entre os militantes.
 A organização de um Calendário de Atividades específicas de rearticulação dos
ecologistas socialistas do Partido, inclusive nos Estados.
 Formação de um Grupo de Trabalho de caráter preliminar, para colaborar na
organização destas Agendas, tanto político-partidária, como técnico-temática.
 A realização de uma nova reunião dos ecossocialistas do PT, com o indicativo de ser
organizada entre fevereiro a março de 2014.

Foi definido também, o grupo de trabalho para acompanhamento da construção do


Coletivo Ecossocialista do PT com os seguintes colaboradores: Alberto Jorge, Geraldo
Abreu, Mauricio Laxe, Moises Savian e Sergio Bueno. Para dar continuidade ao debate e
acompanhamento da construção do coletivo, foi criado um canal eletrônico não somente
para o Coletivo Ecossocialista, mas aberto aos demais militantes ecologistas do PT (LAXE,
2013c).

Após a sua retomada, o setorial já atuou no sentido de entender e intervir na campanha


eleitoral de 2014. O coletivo ecossocialista avançou e está ativo. No ano de 2014,
coordenou três atividades (LAXE, 2014d):
 Debate “O Ecossocialismo e as Eleições 2014”;
 Elaboração do documento Balanço e Perspectivas do Ecossocialismo;
 Elaboração do documento A Ecologia, o Ecossocialismo e as Eleições 2014 de
orientação teórica e apoio a Dilma.

Mas o quadro interno do partido voltou a ficar desfavorável aos ecossocialistas


petistas. Na última eleição para a Secretaria do Meio Ambiente, houve um acordo entre os
candidatos que o mandato seria dividido em tempos iguais por dois gestores, o primeiro
período seria de Júlio Barbosa e, após um e meio de mandato, assumiria Geraldo Abreu,
por mais um ano e meio. Porém, quando findou o primeiro período, Geraldo Abreu não pode
assumir a secretaria porque a Direção Nacional não aceitou o acordo e destituiu o
secretário, mesmo com a aprovação da proposta em plenária. Rui Falcão, presidente do
partido, agendou para o dia 14 de janeiro de 2015, a plenária para eleger o próximo

135
secretário, assim, até essa data, a Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento estará
desativada (Laxe, 2014d). A última atividade da secretaria foi o debate “O Ecossocialismo e
as Eleições 2014” que ocorreu no dia 8 de abril de 2014 (LAXE, 2014b).

O coletivo ecossocialista traz esperança do resgate do PT ao sentimento de sua


origem, mas com maturidade de sua vivência. Porém a história tem apresentado vários
avanços e retrocessos, desmontes e retomadas, a esperança utópica persistente ainda na
crença que o partido resgate sua diretriz básica definida no III Congresso de 2007: “O
socialismo petista ou será radicalmente democrático e sustentável, ou não será socialista”
(PT, 2007, p. 17), pois “Não há socialismo sem a defesa de um desenvolvimento
sustentável” (PT, 2007, p. 23).

Os mandatos presidenciais do PT e aliados com sua dualidade e uma política


produtivista com grande custo ambiental impõem barreiras de grandes dificuldades à
formação e consolidação da corrente ecossocialista no PT, principalmente porque há a
“contradição de ser partido e ser governo, ou simplesmente estar no governo” (Viana, 2014).

O desafio de criar o setorial ecossocialista no PT será uma tarefa árdua,


principalmente enquanto o PT for o principal partido de um governo produtivista e
desenvolvimentista, processos que justificam os projetos do PAC – Programa de Aceleração
do Crescimento, porém o distancia de uma proposta ecossocialista.

136
PSOL Partido Socialismo e Liberdade

O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) foi fundado, principalmente, pela dissidência


do Partido dos Trabalhadores, inclusive parte dos ecossocialistas. A fundação do Partido
Socialismo e Liberdade teve sua origem nas divergências entre diversos grupos políticos,
militantes socialistas e intelectuais de esquerda, logo após a posse de Luís Inácio Lula da
Silva à presidência, as expectativas de transformações sociais mais radicais foram
frustradas e o PT passou a viver um período de muitas tensões internas.

A página História do sitio do PSOL aponta que o PSOL surgiu como resposta de
militantes que “estavam descontentes com os rumos do governo, pois sinalizava, a cada dia,
o abandono do socialismo como horizonte estratégico e a defesa de projetos prejudiciais ao
povo brasileiro”; a proposta foi a fundação de um partido de orientação socialista e
democrática. O PSOL foi regularizado junto ao TSE em setembro de 2005 (TSE).

Em 2005, o PSOL foi enriquecido por mais uma migração de descontentes do PT,
entre eles, os deputados federais Ivan Valente, Chico Alencar, João Alfredo Telles Melo, os
deputados estaduais Afrânio Boppré, Randolfe Rodrigues, Carlos Gianazzi e Brice Bragato,
além de personalidades, militantes e intelectuais como Plínio de Arruda Sampaio, Marcelo
Freixo, entre outros.

O PSOL é único partido brasileiro que tem a corrente ecossocialista organizada em um


setorial, o Setorial Ecossocialista Paulo Piramba. O nome do setorial é homenagem ao
ecossocialista Paulo Piramba que foi muito atuante na construção do setorial até seu
falecimento em 2011 (BANNWART, 2013).

O ecossocialismo encontrou no PSOL o espaço para se desenvolver, pois seus


militantes tinham um conhecimento e vivência de debates acumulados no PT, e liberdade de
organização no novo partido, pois a direção nacional do PT não permitiu que o setorial que
debatia as questões ambientais fosse nomeado como ecossocialistas, ficando assim, como
setorial do Meio Ambiente e Desenvolvimento (Bannwart, 2014). Essa restrição não existe
no PSOL.

O processo de criação do espaço organizado da corrente ecossocialista no PSOL não


foi simples, pois os ecossocialistas estavam dispersos pelo Brasil e focados na construção
do partido. A construção do coletivo ecossocialista foi um processo de muito trabalho
(BANNWART, 2014).

137
Para Bannwart (2013; 2014), houve dois grandes marcos para a corrente
ecossocialista no partido: o 1º Congresso do PSOL e o 1º Encontro Ecossocialista do PSOL.
O 1º Congresso do PSOL ocorreu na Universidade Federal do Rio de Janeiro, na praia
Vermelha em 2007. No intervalo desse encontro, houve o primeiro encontro presencial entre
os ecossocialistas do PSOL, que até então, se comunicavam por troca de e-mail. Essa
reunião foi resultado de investimento de vários ecossocialistas e conseguiu unir várias
pessoas que, além do PT, tinham migrado de outros partidos (Bannwart, 2014). Nesse
encontro foi estruturada a lista nacional de correspondência eletrônica, e-mails, entre os
militantes ecossocialistas de todos os estados contando inicialmente com em torno de 40
militantes cadastrados (Bannwart, 2013).

Em 2011, houve o 1º Encontro Ecossocialista do PSOL em Curitiba, esse encontro foi


o momento fundacional do Ecossocialismo do PSOL. A primeira coordenação nacional foi
eleita nesse encontro e formada com um representante de cada estado presente, Bahia,
Ceará, Espírito Santo, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São
Paulo (BANNWART, 2014).

O encontro gerou a Carta de Curitiba: Fundação do Setorial Ecossocialismo no PSOL,


o documento apresenta os principais pontos debatidos no encontro. Esse documento aponta
que a crise ou “policrise” é “social, ambiental e civilizacional” e acirra a disputa ideológica
sobre o entendimento de suas causas e métodos de enfrentamento entre as correntes de
pensamento socioambiental ecocapitalistas e ecossocialistas, ou seja, uma “disputa entre
projetos de sociedade e, portanto, de civilização” (PSOL Setorial Ecossocialista, 2011). Ao
mesmo tempo, o documento assume que o Ecossocialismo ainda é uma promessa, uma
aposta necessária para garantir a sobrevivência da humanidade enquanto espécie frente à
barbárie provocada pela “policrise”, assim, o ecossocialismo é a proposta para a construção
de uma nova sociedade, que possa vir a ser, “a um só tempo, politicamente democrática,
socialmente justa e igualitária, cultural e etnicamente diversa e ambientalmente sustentável”
(PSOL Setorial Ecossocialista, 2011).

Esse Encontro definiu a pauta política com cinco pontos (BANNWART, 2013):
 Código Florestal;
 Usina Belo Monte;
 Angra 3 (Projeto Nuclear);
 Transposição do São Francisco;
 Agrotóxico.

138
Além da definição da coordenação nacional do setorial, o encontro decidiu que
ocorrerá um encontro nacional dos ecossocialistas do PSOL a cada dois anos, assim, o
segundo encontro ocorreu em 2013 no Rio de Janeiro e o terceiro será em 2015 no Ceará
(Bannwart, 2014). Todos os encontros geraram documentos de reflexão e indicações de
prioridades nas pautas políticas do setorial e estão disponíveis no sítio do setorial.

O segundo encontro ocorreu no Rio de Janeiro em maio de 2013. Foi estruturado com
apresentações de conceitos como Crise Socioambiental por João Alfredo T. Melo,
Aquecimento Global por Alexandre A. Costa, Belo Monte por Mauricio Matos e mesas de
debates sobre atuação do setorial frente aos desafios atuais. As apresentações estão
disponíveis no blog do setorial ecossocialista do PSOL.

Carta do Rio foi o documento gerado pelo encontro. Esse documento retoma as
críticas ao capitalismo como concentrador de riqueza e devorador da Natureza e
humanidade e indica os seguintes eixos prioritários para a atuação ecossocialista do
coletivo:

 Enfrentamento da Questão climática e combate ao aquecimento global com defesa do fim


dos combustíveis fósseis, da matriz nuclear e defesa das energias limpas e renováveis
libertas da lógica do lucro e dos interesses do capital
 Crítica aos agrotóxicos, aos transgênicos e defesa das sementes como bem comum e da
agroecologia (Reforma Agrária Agroecológica)
 Crítica à mercantilização da vida e do consumismo (propaganda)
 Defesa da Água como bem comum – proteção e combate à sua mercantilização
 Defesa dos biomas (pela aprovação da PEC da Caatinga/Cerrado, defesa da Mata
Atlântica, do Pantanal, do Pampa Gaúcho, dos recursos hídricos e Oceanos)
 Defesa das Florestas (Apoio ao Projeto de iniciativa popular pelo Desmatamento
Zero, mobilizado pelo Greenpeace)
 Combate ao Racismo e à Injustiça Ambiental
 Combate ao Envenenamento e poluição do sistema global
 Defesa do Direito à Cidade – defesa das unidades de conservação e áreas verdes e
combate à especulação imobiliária; do direito à moradia adequada, do acesso à água, à
energia e ao saneamento básico e combate às remoções causadas pelos grandes eventos;
do direito à mobilidade humana, do transporte público e não motorizado e crítica à
sociedade do automóvel; da coleta seletiva dos resíduos sólidos, com o protagonismo das
associações e cooperativas de catadores.
 Demarcação de todas as terras indígenas e quilombolas

139
 Combate aos megaempreendimentos (grandes barragens e obras para os
megaeventos), suspensão de Belo Monte
 Suspensão imediata dos leilões de petróleo e gás.

O setorial ecossocialista proporcionou uma grande contribuição ao debate


socioambiental ao publicar a Revista Ecossocialista em junho de 2012 como Edição
Especial. A publicação apresentou vários textos mesclando documentos elaborados pelo
encontro de Curitiba (Fundação do Setorial Ecossocialista), reflexões teóricas e debates
sobre ações concretas. As reflexões teóricas tiveram a colaboração de Michael Löwy (Rio +
20 e a propaganda verde), Bannwart e Mocelin (Brasil 2012: diagnóstico de injustiça
socioambiental e perspectiva de luta ecossocialistas), Alexandre Costa (Mudanças
Climáticas e as Cidades) entre outros.

Importante destacar, nessa revista, o texto sobre a construção de um mandato


municipal ecossocialista do parlamentar João Alfredo, pois ilustra como o pensamento
ecossocialista foi, e está sendo, aplicado de uma forma concreta em propostas e ações
parlamentares.

um mandato parlamentar é um instrumento de uma luta bem maior,


pela realização de uma nova sociabilidade, que possa vir, a um só
tempo, ecologicamente sustentável; socialmente justa e igualitária;
cultura, de orientação sexual e etnicamente diversa: política e
radicalmente democrática: a sociedade ecossocialista (MELO, 2012,
p. 35).

O depoimento presente nesse texto aponta que uma frente do mandato é o combate
ao capital imobiliário. A ação concreta foi a conquista da preservação de quinze hectares
das milenares dunas às margens do Rio Cocó pela aprovação do Projeto Lei da Área de
Relevante Interesse Ecológico das Dunas de Cocó. Essa vitória foi construída pela
mobilização envolvendo intelectuais, pesquisadores, jovens, moradores de bairro e
movimentos sociais e ecológicos cuja pressão unida com a atuação do mandato fez crescer
a resistência ao lobby de especulação imobiliária, tanto no legislativo quanto no judiciário
(Melo, 2012, p. 35). Essa vitória animou que esses setores mantivessem a articulação com o
mandato em outras propostas, como a conservação da “matinha do Pici”, que está
localizada em torno do Açude Santo Anastácio proposto por professores universitários e o
projeto de lei que declara os botos-cinza como patrimônio natural de Fortaleza desenvolvido
em parceria com movimentos sociais e ONGs (Melo, 2012, p. 35).

140
O diferencial do mandato é o seu envolvimento com a mesma intensidade tanto nos
temas ambientais quanto aos temas sociais, assumindo que a proposta é construir um
mandato socioambiental. Mas o perfil de diálogo com a sociedade e utilizar o mandato como
ferramenta de desenvolvimento da autoemancipação da sociedade é o ponto ecossocialista
fundamental.

Essas ações são coerentes com a visão de João Alfredo (Melo, 2010, p. 235) sobre
politizar a ecologia:

Construir uma nova utopia, onde socialismo significa não só a


superação das desigualdades sociais e econômicas, mas sobretudo a
construção de uma sociedade radicalmente democrática,
ecologicamente equilibrada e politicamente autogerida (MELO, 2010,
p. 235)

A coerência do mandato com o pensamento ecossocialista está expressa na recusa


de fazer carreata, na defesa de pautas de mobilidade, na defesa dos direitos humanos e no
apoio a todas as mobilizações e greves dos trabalhadores (Melo, 2010, p. 292 – 295).

O programa de campanha de 2014 a presidência da república da candidata Luciana


Genro revelou um grande avanço na incorporação da proposta ecossocialista no partido.
Com o slogan “O Povo Acordou por mais direitos”, a candidatura apresentou diversas
propostas de transformação socioambiental como criar o Ministério da Ecologia e da Justiça
Socioambiental (PSOL, 2014, p. 34), priorizar a política pública para reforma agrária e
agricultura familiar (PSOL, 2014, p. 41), além de definir como prioridades o combate ao
desmatamento, eliminação do uso de agrotóxicos e transgênicos, defender a gestão pública
da água como bem essencial à vida, não podendo ser tratada como mercadoria e estimular
políticas para os Grandes Biomas (Amazônia, Mata Atlântica, Caatinga, Cerrado, Pantanal,
Pampa e Zona Costeira), respeitando suas especificidades (PSOL, 2014, p. 34).

Mas a grande novidade ecossocialista foi a afirmativa que o PSOL promoveria as


mudanças estruturais no país sob a ótica ecossocialista:

Nossa proposta é ecossocialista, pois não pode haver uma defesa


consequente do meio ambiente sem que se aponte para a superação
das leis do capital, que necessita sugar os recursos naturais e
explorar o ser humano para garantir a acumulação em benefício de
1% da população, enquanto 99% sofrem as consequências nefastas
deste modelo econômico (PSOL, 2014, p. 10).

141
O setorial ecossocialista elaborou o documento Contribuição do Setorial Ecossocialista
“Paulo Piramba” para os programas de governo do PSOL nas eleições de 2014 para
subsidiar a elaboração de programas de governos, nos três níveis e candidaturas ao
legislativo. O documento apresenta análise crítica aos governos federais do PT e aliados,
seu perfil produtivista e desenvolvimentista presente no PAC, Programa de Aceleração do
Crescimento; questionamento sobre as Conferências do Clima; reflexão sobre causas e
impactos socioambientais das mudanças climáticas e propostas ecossocialistas da
agroecologia, gestão hídrica, democratização da ciência, a questão indígena, e alterações
no modelo de geração e gestão da energia (PSOL - Setorial Ecossocialista, 2014). Esse
documento é uma ferramenta de apoio importante para candidato, ou mesmo parlamentar
ou executivo eleito, elaborar projetos.

O PSOL, em sua grande maioria, é sensível à questão ambiental, publicamente, todos


se assumem como preocupados com a questão ambiental, um exemplo foi a mobilização da
grande maioria do partido contra a reforma do código florestal. Mas ainda falta internalizar
as pautas socioambientais no socialismo do partido pela maioria. A avaliação do Bannwart
(2014) é que o “motivo da dificuldade de assumir o ecossocialismo como estratégia de
organização é porque, historicamente, a esquerda revolucionária tinha uma forte influência
do pensamento produtivista ou desenvolvimentista”. João Alfredo (Melo, 2015) concorda
com Bannwart nessa análise: a esquerda “está presa a um determinado paradigma de
socialismo desenvolvimentista”, ela é muito produtivista.

Um grande desafio dos ecossocialistas é o combate à cultura fóssil. Para os


ecossocialistas do PSOL, a sociedade deve investir em energias de baixo impacto
socioambiental, como eólica, solar, marémotriz e abandonar mais rapidamente possível de
soluções fósseis, nucleares e das grandes hidrelétricas. Nesse sentido, Bannwart (2014)
defende o abandono imediato do pré-sal, mas consciente que há uma grande resistência
social dessa proposta, mas ainda falta uma ação mais incisiva dos parlamentares do PSOL
para criticar a utilização da matriz energética fóssil e aumentar o investimento em energias
renováveis (Melo, 2015).

O PSOL é o partido que tem a corrente de pensamento ecossocialista mais


organizada, unida na construção e desenvolvimento do setorial ecossocialista. Seu setorial é
formado por militantes experientes, muitos participaram dos debates nas décadas 1990 e
2000 no PT, mas, há também uma renovação com o ingresso de jovens ecossocialistas. A
tarefa de tornar o PSOL um partido ecossocialista é complexa e requer um grande período
de debates e “batalha das ideias”, mas o importante é que esse processo já iniciou.

142
Rede Sustentabilidade

O partido Rede Sustentabilidade nasceu com o discurso de renovação política e com


um ampla rede de pensamentos políticos. O partido foi lançado no encontro do dia 16 de
fevereiro de 2013 em Brasília com 1,5 mil presentes (CASTILHO, 2013).

A fundação da Rede Sustentabilidade inclui a promessa de construção de uma nova


forma de fazer política. Para isso, o documento Diretrizes Programáticas da Rede
Sustentabilidade apresenta duas bandeiras: um modelo econômico para o desenvolvimento
socialmente includente e ambientalmente sustentável; e um outro modelo de
governabilidade, que seja uma alternativa à forma de governo baseada em trocas
fisiológicas e manutenção de feudos de poder (Rede Sustentabilidade, 2013a). Nessa última
bandeira, há uma proposta de reforma política que inclui: a possibilidade de candidaturas
independentes, isto é, sem a exigência de filiação partidária, quebrando assim o monopólio
dos partidos sobre os cargos de representação; fim da possibilidade de reeleição; redução
da desigualdade e erradicação da pobreza através da garantia de acesso a oportunidades
aos indivíduos para “sua inclusão na sociedade” (REDE SUSTENTABILIDADE, 2013a).

As premissas presentes no documento Diretrizes foram detalhadas no Estatuto da


Rede Sustentabilidade, confirmando o compromisso do partido com o “desenvolvimento
justo e sustentável da Nação, em todas as dimensões”. Um ponto importante para reflexão é
a questão de financiamento de campanha, pois o partido prevê (Título V, Capítulo I do
Estatuto) que além de contribuições de pessoas físicas e fundo Partidário, só poderão ser
aceitos recursos financeiros que não sejam oriundos dos setores de bebida alcoólica,
cigarro, arma e agrotóxicos (Rede Sustentabilidade, 2013b). Para Marco A. Teixeira, a Rede
acerta quando apresenta uma proposta concreta para restringir o financiamento de
campanha, mas “erra na definição de exclusões na sua política de doações corporativas,
principalmente ao deixar de fora as construtoras, responsáveis pelos maiores escândalos de
corrupção do Brasil” (CASTILHO, 2013).

A restrição de financiamento de campanha definida pelo partido é positiva, porém


pouco radical, pois o financiamento de campanha por empresas vincula o mandato do
parlamentar e do executivo eleitos aos interesses da empresa financiadora e não do eleitor,
afinal uma empresa que financia um candidato tem interesses e estes “se manifestam do
lado das políticas que serão aprovadas” (Dowbor, 2013b, p. 21). Para uma visão radical, a
proposta deveria eliminar os financiamentos de campanha de pessoas jurídicas e limitar o
valor das contribuições das pessoas físicas.

143
Outro ponto polêmico na proposta da Rede é a possibilidade de candidatura
independente ou “autoral”. O Título IV, Capítulo I do Estatuto prevê que o partido oferecerá
30% das vagas às eleições proporcionais para os candidatos “cívica independentes”, isto é,
pessoas que desejam atuar politicamente no legislativo, porém não desejam se filiar a
nenhum partido político, inclusive a própria Rede, bastam apresentarem documentos que
comprovem ficha limpa, seus históricos de atuação em causas em sintonia com as
orientações da Rede, manifesto público com os compromissos e a relação de apoiadores da
candidatura (com nome e número do título de eleitor) (Rede Sustentabilidade, 2013b). Para
Samuel Santos, essa proposta é positiva, pois visa um eleitorado que acredita no candidato
avulso. Como não há como ser candidato sem partido pela legislação brasileira, essa opção
é um mecanismo para atrair possíveis candidatos que não gostariam de estar filiados em
partido a entrarem na Rede nessa perspectiva (SANTOS, 2014).

O segundo grupo de ecossocialistas dissidentes do PT esteve presente na campanha


da Marina Silva em 2010 e na fundação do partido Rede Sustentabilidade, liderado pela
própria Marina Silva e Heloísa Helena (PSOL). Mas essa corrente ecossocialista não tem
espaço de formação de corrente ou tendência na Rede Sustentabilidade, assim como
qualquer outra linha de pensamento, porque a diretriz definida pelo partido é que não há
possibilidade de associação formal de grupos ideológicos em seu interior, as pessoas
podem apenas atuar de forma autoral ou coletiva para formular propostas. Esse critério foi
adotado porque as lideranças do partido não querem repetir as experiências do PT e do
PSOL que estão divididos em diversas correntes, cada qual defendendo suas teses
(SANTOS, 2014).

Há uma resistência dos ecossocialistas históricos da Rede em se posicionar enquanto


militantes no partido. Um exemplo dessa resistência foi a consulta aos participantes da
direção nacional, Elo Nacional, para uma publicação do próprio partido na cidade de Duque
de Caxias sobre ecossocialismo. Samuel Maia, responsável por essa publicação, enviou
algumas perguntas sobre o tema ao grupo virtual da direção nacional, composto por 102
pessoas, para obter informações sobre como o tema está presente no partido, mas as duas
únicas respostas não foram de ecossocialistas: Pedro Piccolo Contesini ratificou a posição
de que a Rede não tem tendências, assim, o pensamento ecossocialista não está
estruturado nela, mas os ecossocialistas históricos do partido poderiam responder; e o
segundo retorno, de Bazileu Margarido, foi que ele não tinha o conhecimento necessário
para responder, mas haveria outros membros que poderiam ajudar (SANTOS, 2014).

144
Em ambas as respostas, os formuladores ecossocialistas do partido, Júlio Rocha,
Pedro Ivo de Souza Batista e Gabriela Barbosa Batista foram indicados para ajudar na
publicação, mas não houve o retorno deles. Esses três membros são reconhecidos
internamente como elaboradores ecossocialistas, principalmente pela publicação do livro A
Crise Ambiental Planetária e o Ecossocialismo pela Associação Alternativa Terrazul, da qual
eles são também colaboradores. Com o incentivo das duas respostas, Samuel enviou
mensagem diretamente aos três ecossocialistas com a pergunta “Quais são as contribuições
que podemos dar para o debate sobre ecossocialismo?”, o silêncio continuou e a edição do
jornal da Rede na Baixada teve que assumir outro tema (SANTOS, 2014).

Para Samuel (Santos, 2014), há pessoas que defendem o ecossocialismo na Rede


Sustentabilidade, como o próprio Samuel Maia, Márcio Sales Saraiva entre outros, mas
também, há um recuo de alguns ecossocialistas por temerem prejudicar a construção do
partido, pois nele há diversas correntes de pensamento, algumas antagônicas entre si, e o
posicionamento explícito para o ecossocialismo de alguns pode gerar conflitos entre seus
membros e a perda de militantes. Essa situação foi acentuada com a eleição de algumas
lideranças ecossocialistas para algumas coordenações: Gabriela Batista (Geral), Júlio
Rocha (Formação Política) e Pedro Ivo (Organização) no encontro do Elo Nacional de
dezembro de 2014 (REDE SUSTENTABILIDADE, 2014b).

Nesse cenário, parece ser difícil defender as propostas ecossocialistas contidas na


publicação A Crise Ambiental Planetária e o Ecossocialismo, pois certamente a direita do
partido teria muita dificuldade em aceitá-las. Principalmente por sua concepção
anticapitalista, pois defende que o conceito ““desenvolvimento sustentável”, como uma
adaptação administrativa do sistema a parâmetros “aceitáveis” de exploração, se verifique
na prática insuficiente para evitar a catástrofe prevista pela forma predatória como estão
sendo esgotados os recursos naturais” (Barbosa, 2008, p. 2), já que a crise é decorrente do
“modelo capitalista de produção e consumo” (Barbosa, 2008, p. 4), assim como o
aquecimento global é o “resultado da ação de classes sociais que se apropriam da natureza
e do trabalho humano e submetem o planeta a lógica do lucro e da mercantilização”
(Barbosa, 2008, p. 7), e a proposta da ONG para superar essa crise mundial é o
ecossocialismo (BARBOSA, 2008, p.12).

Para Samuel, diferentemente do que ocorreu no PT e no PSOL, a Rede


Sustentabilidade recuou seu discurso de transformação mais radical, como reação às
manifestações mais extremadas à direita. Após o processo eleitoral de 2014, “há um ataque
frontal a tudo o que vislumbre uma proposta socialista, pois há um discurso claramente

145
conservador reacionário de caça a quem defende o socialismo ou qualquer outra proposta
de rompimento com atual modelo de produção capitalista” (SANTOS, 2014).

Outro motivo para o recuo de um discurso mais radical é a necessidade de aglutinar


adesões à formação do partido. Assim, a aliança de diversos setores da sociedade tem sido
o caminho do partido para sua construção conseguir as 100 mil assinaturas necessárias
para efetivar o registro do partido até fevereiro de 2015 (SANTOS, 2014).

Mesmo com essa preocupação, há uma movimentação de setores à esquerda da


Rede Sustentabilidade, a dúvida é qual será o poder de influência desse grupo nas decisões
do partido. O ingresso formal de Heloisa Helena na direção nacional e na executiva nacional
animou a parcela mais a esquerda do partido, pois passa a ter uma referência nacional, a
expectativa desses segmentos é que a Heloísa Helena seja o contraponto aos setores mais
conservadores do Partido, pois há uma relação de sintonia entre Marina Silva e Heloísa
Helena, mas há também, divergências e debates (SANTOS, 2014).

A Rede Sustentabilidade efetuou uma coligação informal com o PSB para a campanha
presidencial de 2014. Por não estar formalizada junto ao TSE, seus militantes se filiaram ao
PSB. Inicialmente, Marina Silva assumiu a candidatura à vice-presidência na chapa
presidencial do governador Eduardo Campos, porém, com o óbito do candidato em um
acidente em agosto de 2014, Marina Silva assumiu a candidatura à presidenta com Beto
Albuquerque como vice (Rede Sustentabilidade, 2014a, p. 3). O programa da candidatura
apresentava o slogan Plano de Ação para Mudar o Brasil e detalhava os principais pontos
dos documentos de fundação da Rede Sustentabilidade (Diretrizes Programáticas e o
Estatuto). Esse documento anunciava diversas mudanças na gestão federal, cuja meta era
“atingir um desenvolvimento sustentável, porta de acesso a condições civilizatórias básicas”
(Rede Sustentabilidade, 2014a, p. 14). O documento apresenta diversos pontos com
críticas, critérios e algumas metas em seu texto, por exemplo: a unificação do calendário
geral das eleições, o fim da possibilidade de reeleição e a mudança do mandato para cinco
anos; novos critérios para definição dos eleitos para os cargos proporcionais; a possibilidade
de inscrição de candidaturas avulsas; redefinição do tempo de propaganda; criação de
mecanismos de transparência nas doações de campanhas; melhorar a representatividade
da sociedade brasileira nos parlamentos (REDE SUSTENTABILIDADE, 2014a, p. 15).

Na área econômica, o documento defendia o retorno do tripé econômico para


combater a inflação. O tripé seria aplicar metas de inflação “críveis e respeitadas”; construir
“superávit fiscal necessário para assegurar o controle da inflação” e retirar qualquer

146
intervenção do Banco Central na taxa de câmbio, deixando-a flutuar livremente, além da
imediata independência do Banco Central (REDE SUSTENTABILIDADE, 2014a, p. 46).

A meta audaciosa contida no programa é atingir a liderança da economia global


florestal, zerando a perda da cobertura florestal brasileira, ampliando para 5% a participação
brasileira no comércio mundial de produtos florestais, aumentando em 40% a área de
florestas plantadas, dobrando a área de florestas públicas destinadas ao uso sustentável e
implementando o programa de tecnologia de refinamento de biomassa florestal para
“produção de combustíveis, polímeros, fertilizantes, fámacos, essências e outros produtos”
(REDE SUSTENTABILIDADE, 2014a, p. 89).

Na geração de energia, há propostas muito interessantes como a construção de um


milhão de casas autossuficientes em energia a partir de painéis solares fotovoltaicos e três
milhões de casas com aquecimento solar de água até 2018, além de aumentar a
participação de energias renováveis na matriz energética brasileira e reduzir o consumo
absoluto de combustíveis fósseis (Rede Sustentabilidade, 2014a, p. 67), mas não há o
compromisso com a eliminação da fonte fóssil.

O projeto apresenta algumas propostas interessantes de melhorias no atual modelo de


produção e distribuição de riqueza, mas não há uma proposta indicativa de ruptura. O
documento é coerente com a flexibilidade de Marina Silva em relação aos temas políticos,
pois seu posicionamento em relação aos pontos polémicos, como construção das grandes
hidrelétricas e transgênicos, é submetido aos “senões”, isto é, podem ser desenvolvidos
“desde que...” (Silva, 2010, p. 78). Essa flexibilidade permite à Rede Sustentabilidade, a
esperança de diálogo com setores de esquerda e direita.

A definição de desenvolvimento sustentável de Marina Silva propõe redução da


desigualdade, porém, sem transformações nas relações de poder. Sua proposta para o
desenvolvimento sustentável é que os países ricos devem estabilizar suas economias para
garantir o atendimento das necessidades básicas da população e em contra partida, a África
e a América Latina deve continuar seu crescimento, mas sempre com “equidade e
distribuição de renda” (SILVA, 2010, p. 78).

A candidatura da Marina Silva para a presidência teve destaque na mídia e na


militância. O resultado da candidatura foi positivo, pois Marina Silva obteve em torno de 19%
em 2010 pelo PV e avançou para 21% em 2014 (TSE), houve um avanço, mas insuficiente
para levá-la ao segundo turno.

147
O posicionamento da Rede Sustentabilidade no segundo turno da eleição presidencial
de 2014 causou forte tensão no partido. Além do apoio formal ao candidato Aécio Neves do
PSDB, o processo da decisão também criou instabilidade interna, pois apesar de haver uma
reunião prevista no Elo Nacional para definir se o partido iria optar pelo voto nulo ou apoio
sem formalização ao candidato Aécio Neves, o grupo mais próximo da Marina Silva
declarou, pelo porta voz Walter Feldman, apoio ao candidato tucano. Essa antecipação criou
uma séria tensão na direção do partido e a reação foi a redação de um documento, Nota
Paralela, redigido por setores mais a esquerda, defendendo o voto nulo (Santos, 2014).
Nesse caso, o posicionamento da Heloísa Helena foi para o voto nulo, o que reforça a
expectativa de que haverá a política do “pêndulo” e, consequentemente, mais espaço para o
pensamento ecossocialista no partido (SANTOS, 2014).

Para Samuel Santos (2014), a afirmação do partido que não é direita e nem esquerda
não é sustentável, “quando se posiciona que não é A e nem B, mas afinal, o que é o C?”.
Certamente, o partido não concorda com a direita extremada que pede o impeachment da
Dilma e o retorno da ditadura, ao mesmo tempo em que está distante da “esquerda que se
comporta como autista, que afirma que nada aconteceu e que essas acusações estão
inseridas em um grande golpe da direita” (Santos, 2014). Mas deve definir qual é a proposta
de modelo de sociedade que quer defender (SANTOS, 2014).

A necessidade de definição de posicionamento do partido também foi apontada pela


socióloga e uma das fundadoras do partido, Maristela Bernardo: “Temos que pensar outro
sistema produtivo, uma mudança do motor essencial das sociedades, que é o excesso de
consumo e a decorrente naturalização das injustiças” (CASTILHO, 2013).

A propaganda política da Rede Sustentabilidade se apresenta como uma nova forma


de fazer política, mas não há como romper com cultura de seus participantes como o Barão
de Münchhausen se libertou do pantanal. (Löwy, 2009c). A façanha do Barão de
Münchhausen foi ter escapado do pântano, quando ele e seu cavalo estavam sendo
tragados, ao se puxar pelos cabelos (Löwy, 2009c, p. 37), a imagem do feito do Barão ilustra
a visão positivista da ilusão de que a “boa vontade” de seres é capaz de isolar o ser humano
de seu pântano, isto é, sua cultura e saberes profundamente enraizados, e construir
“verdades evidentes, incontestáveis, indiscutíveis” (Löwy, 2009c, p. 37).

148
No caso, da experiência da Rede Sustentabilidade, a sua cultura e saberes enraizados
são proporcionados pelos seus aliados políticos, financiadores de campanha e militância.
Para Samuel Santos (2014), construir uma nova política na Rede Sustentabilidade é um
grande desafio, pois

ela é feita pelos velhos políticos isto é, militantes que vieram da velha
tradição, PT, PSTU, PSOL, PSDB e que trazem para as relações
internas a escola que tiveram, então é muito difícil driblar essas
culturas, principalmente porque essas se mantêm nas estruturas que
já tinham antes, mas agora organizados dentro da Rede (SANTOS,
2014).

Os documentos da Rede Sustentabilidade defendem a sustentabilidade econômica,


mas precisa definir qual é a base teórica que orientará sua proposta. Há três matrizes de
pensamento no partido: pensamento liberal, defendida por Eduardo Giannetti; visão de
Bazileu de centro que procura harmonizar justiça socioambiental e a liberdade do mercado;
e a concepção marxista de Martiniano Cavalcante, que defende o socialismo (Santos, 2014).
O resultado do debate dessas propostas é que gerará que modelo de sociedade, produção
e relação Natureza e economia que será defendida pelo partido.

O encontro do Elo Nacional de 13 e 14 de dezembro de 2014 foi um passo na direção


de reestruturação do partido. A pauta do encontro foi o calendário político de 2015, a
estratégia para conseguir o registro da Rede junto ao TSE, a avaliação da conjuntura
política, a análise do processo eleitoral e a recomposição da Executiva Nacional (Rede
Sustentabilidade, 2014b). Em relação à formalização do partido, a meta é efetuar o registro
formal em fevereiro de 2015 e, para cumprir essa meta, falta completar a quantidade de
assinaturas necessária. Para José Gustavo, um dos novos coordenadores de Comunicação,
“calculamos a necessidade de mais 32 mil assinaturas para o registro da Rede. Nosso
objetivo é atingir o montante até o mês de janeiro a partir da mobilização de todos os
membros do partido” (REDE SUSTENTABILIDADE, 2014b).

Para Carlos Henrique Painel, coordenador executivo, o encontro foi muito positivo,
pois definiu a forma de atuação para as eleições municipais de 2016: “A Rede vai mostrar a
importância da sustentabilidade na política. O evento também valeu a pena porque permitiu
formar a projeção para o futuro da legenda e para definir o cenário político nas próximas
eleições” (REDE SUSTENTABILIDADE, 2014b).

149
Em relação ao calendário político para 2015, o encontro definiu que haverá as
convenções estaduais em maio e junho e o Congresso Nacional até setembro, quando
haverá a eleição do novo Elo Nacional e a revisão programática e estatutária (Rede
Sustentabilidade, 2014b). Para Samuel Santos (2014), há uma grande expectativa na
Conferência Nacional da Rede em 2015, pois será definido o “momento chave” para o rumo
do partido, isto é, qual será o projeto que será “defendido pelo partido, mas há um sério
risco de que o setor derrotado não deseje continuar, pois para criar o partido, houve um
leque muito amplo de associados e com grande diversidade ideológica”.

A crise interna do partido Rede Sustentabilidade teve em janeiro de 2015 mais um


desdobramento, o inicio do processo de fundação de um novo partido por segmentos
descontentes da Rede Sustentabilidade. O nome provisório é Avante, mas o título do
encontro para debater a estrutura do partido, ocorrido em 16 e 17 de janeiro, foi Queremos,
uma inspiração do partido espanhol Podemos, o que deixa o nome do futuro partido a
definir. Célio Turino explicou que provisoriamente “nos identificamos com Avante e nosso
manifesto está na fase de redação final, temos um processo de horizontalidade e o texto
tem sido discutido a muitas mãos” (Faria, 2015). A definição dos pilares de construção do
partido é inovador: o bem comum, o bem viver, o ecossocialismo e o cidadanismo, para
Turino o “ecossocialismo é um dos pilares que mais avançamos na discussão e o
cidadanismo é reflexo do direito de participação, algo muito evidente nas Jornadas de junho
de 2013” (Faria, 2015).

O novo partido tem inspiração nos partidos Podemos (espanhol), Syrisa (grego) e o
MAS – Movimiento al Socialismo (boliviano), além de experiências partido-movimento. Há
expectativa de ingresso de não só descontentes com a Rede Sustentabilidade, mas também
do PT, PSOL, PSB e PCdoB (Faria, 2015).

O desdobramento da crise da Rede Sustentabilidade terá, no Congresso Nacional de


2015, um momento de definição, mas o pensamento ecossocialista está muito enfraquecido
e piorou com a saída de ecossocialistas para a fundação do Avante. Esse sim é uma
promessa de inovação partidária ao unir o ecossocialismo com o Buen Vivir e Cidadanismo,
mas sua relevância na política partidária no Brasil dependerá do seu desenvolvimento
histórico e como será travado o debate interno e externo.

150
4.3 Rede Brasil de Ecossocialistas

A Rede Brasil de Ecossocialistas foi uma proposta de articular os ecossocialistas de


diferentes frentes de atuação. Foi lançada no dia 27 de janeiro de 2003 na oficina “A
Sustentabilidade pelo Ecossocialismo” promovida pelas ONGs CEA - Centro de Estudos
Ambientais (Pelotas – RS) e Instituto Terrazul (Fortaleza – CE) no Fórum Social Mundial,
com participação de mais de 250 pessoas (LÖWY, 2005a, p. 91).

Essa organização deveria ser constituída “por uma articulação de militantes


ecossocialistas, que nas diferentes esferas de ação política atuarão de acordo com os
princípios e a reflexão teórica e programática construída pelo referencial do ecossocialismo”
(Löwy, 2005a, p. 91). Assim, a Rede Brasil de Ecossocialistas seria um fórum de troca de
experiências, reflexão e debates que enriqueceria a atuação política de seus membros em
suas organizações.

A Declaração de princípios e objetivos da Rede Brasil de Ecossocialistas , Anexo 4,


afirma que não há futuro para qualquer pensamento político que não seja ecológico, e a
crise é um fenômeno global, mas que deve ser enfrentada não só global, mas também
localmente com a mesma intensidade (Rede Brasil de Ecossocialistas, 2005, p. 91). Sendo
a crise provocada pela fúria capitalista em privatizar, controlar, patentear e tornar tudo em
mercadoria, inclusive a biodiversidade, reservas florestais, a água e a vida (Rede Brasil de
Ecossocialistas, 2005, p. 91), nessa lógica, a vida não é o objetivo da sociedade, e sim o
lucro de seus dominantes.

A orientação contida nessa Declaração é que a militância ecossocialista, organizada


na Rede, deve buscar garantir que cada um dos seres humanos tenha o mesmo direito ao
acesso à Natureza, respeitando os limites do planeta, para que sejamos uma civilização
sem resíduos, isto é, nossa produção consiga reaproveitar totalmente os materiais utilizados
e que ao mesmo tempo, tenhamos como o objetivo proporcionar situação digna a todos no
planeta (REDE BRASIL DE ECOSSOCIALISTAS, 2005, p. 92).

Além disso, o alerta presente na Declaração da Rede está relacionado com inovação e
tecnologia. Nesse caso, o critério deve ser o da precaução, isto é, a sociedade não deve
assumir riscos socioambientais, assim, há uma troca de lógica social, pois o fato de não
haver provas que uma tecnologia é perigosa não é critério para adotá-la, seus responsáveis
devem provar que ela é segura e que representa um fator de melhoria socioambiental em

151
relação à situação vigente no planeta (REDE BRASIL DE ECOSSOCIALISTAS, 2005, p.
92).

As bases éticas do arco-íris ecossocialista estão presentes na Declaração da Rede.


Pois a sociedade desejada convive com a diversidade de pessoas e povos cuja “diferenças
culturais, étnicas, de raça, de gênero e de opção sexual não podem jamais ser instrumentos
de negação de igualdade de direitos sociais” (REDE BRASIL DE ECOSSOCIALISTAS,
2005, p. 93).

A Declaração da Rede encerra seu texto com uma definição sobre o que é ser um
ecossocialista: “a rede de ecossocialistas é formada por pessoas que dedicam suas vidas
para defender a vida, contra a barbárie e pela paz no planeta” (Rede Brasil de
Ecossocialistas, 2005, p. 93). Nesse caso, a barbárie socioambiental alertada pelo
ecossocialismo envolve o colapso das condições do planeta em manter a vida em sua
superfície, inclusive a humana.

Uma motivação para a militância na Rede Brasil Ecossocialista era melhorar a


capacidade de intervenção política. Setores acreditavam que seria um caminho para “tentar
minimizar os impactos socioambientais do primeiro governo Lula, pois havia um sentimento
que esse governo teria um viés produtivista e desenvolvimentista, mesmo com a Marina
Silva convidada para ser ministra do Meio Ambiente” (BANNWART, 2014).

Houve o II Encontro da Rede Brasil de Ecossocialistas no dia 18 de novembro de


2006, na sede do Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro com a presença de 51
participantes. Nesse encontro houve dois momentos, o primeiro de reflexão e análise de
conjuntura e o segundo sobre a organização e futuro da Rede Brasil de Ecossocialistas. No
primeiro momento, ocorreram duas mesas com palestras e debatas com Michael Löwy
(“Ecologia e socialismo" e “Planejamento, Estado e Ecossocialismo”), após as mesas,
ocorreu a análise de conjuntura “Desafios e perspectivas da Rede Brasil de
Ecossocialismo”. O segundo momento teve como resultado as seguintes orientações e
encaminhamentos de ações (Rede Brasil de Ecossocialistas, 2006):
 A Rede é uma organização formada por militantes que aderem ao Manifesto
Ecossocialista Internacional e à Carta de Princípios de Fundação, além de ser uma
organização independente do Estado e dos partidos;
 Eleição de uma nova Coordenação, que deverá apresentar um plano de trabalho e
funcionamento, de uma secretaria executiva da coordenação e formação de grupos de
trabalhos temáticos;

152
 Constituir um Grupo de Colaboradores da Coordenação para ajudar na elaboração
teórica da Rede;
 Construir uma página da Rede Brasil na internet;
 Efetuar recadastramento dos membros da Rede;
 Realizar encontros e fóruns nos Estados, tendo o Fórum Social Mundial como espaço
privilegiado de atividades.

Porém as ações concretizadas foram as eleições que ocorrem no próprio encontro,


sendo a coordenação formada por Adilson Vieira; Carlos Carvalho; Gabriela Rocha; João
Alfredo; Michael Löwy; Pedro Ivo Batista; Rafael Tomyama; Temístocles Marcelos e Vânia
Caus (Rede Brasil de Ecossocialistas, 2006) e a Secretaria Executiva formada por Pedro Ivo
Batista e Temístocles Marcelos (Rede Brasil de Ecossocialistas, 2007).

Em 13 de março de 2007, houve a reunião de coordenação para avaliação do II


Encontro da Rede com a presença dos coordenadores Carlos Carvalho (RJ), Gabriela
Batista (CE), Pedro Ivo (DF), Rafael Tomyama (CE), Temistocles Marcelos (MG) e Vania
Caus (ES) e os convidados Esther Neuhaus (DF) e Edinaldo Severiano (CE) (Rede Brasil de
Ecossocialistas, 2007). Essa reunião avaliou o segundo encontro e fechou algumas metas
para a evolução da Rede.

A avaliação da coordenação da Rede para o II Encontro foi positiva, como também foi
considerada positiva a oficina da Rede Brasil de Ecossocialistas no Fórum Social Mundial
em Nairóbi, com a participação de 100 ativistas, que se mostraram “dispostos a contribuírem
com a discussão política do ecossocialismo” (REDE BRASIL DE ECOSSOCIALISTAS,
2007).

Foi definido que 2007 seria o ano de fortalecimento e consolidação da Rede Brasil de
Ecossocialistas e para cumprir essa meta, foram definidas as seguintes ações:
recadastramento dos integrantes da Rede; proposta de formação de “quadros”, elaboração
de um projeto para trabalho junto a juventude, desenvolver a edição de Boletins e Revista
Teórica, organizar a moderação da lista de discussão na internet e realizar os encontros
estaduais (REDE BRASIL DE ECOSSOCIALISTAS, 2007).

Mas a história da construção da Rede Brasil de Ecossocialistas não evoluiu como o


esperado. A vitória de Luiz Inácio Lula e a posse de Marina Silva para o Ministério do Meio
Ambiente gerou uma expectativa positiva para os ecossocialistas, em particular, os
envolvidos na construção da Rede Brasil de Ecossocialistas. Os primeiros passos foram
dados, Marina Silva era a catalizadora do processo, mesmo com suas contradições. A Rede

153
foi impactada pelos processos de rupturas internas do PT, geradas por discordâncias com o
governo Lula, os quais esvaziaram a organização da Rede até o seu completo fim de
funcionamento (Melo, 2015). O depoimento de Laxe (2014d) ilustra o processo: “A Rede
Ecossocialista Brasileira teve um início promissor, com representantes em São Paulo,
Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Sul, mas não evoluiu, não houve reuniões presenciais
e nem virtuais após 2007, a Rede morreu “por inanição””.

Existiam tensões sobre a relação que algumas lideranças da Rede Brasil


Ecossocialista tinham com o Ministério do Meio Ambiente, pois havia uma percepção das
demais lideranças que ocorria o uso político da Rede Brasil de Ecossocialistas
(BANNWART, 2014; LAXE, 2014d).

A Rede Brasil de Ecossocialistas conseguiu, mesmo com suas tensões internas,


evoluir e desenvolver enquanto seus participantes estavam no mesmo partido, PT, e havia
apoio do Ministério do Meio Ambiente. Porém as cisões que ocorreram no partido
provocaram a total inoperância da Rede Brasil de Ecossocialistas e saída da Marina Silva do
Ministério e do PT foi o marco do encerramento desta Rede.

Em 2014, iniciou-se um debate sobre a retomada da Rede Brasil de Ecossocialistas,


porém seu processo não será simples, mas é possível e importante. Para Laxe, do PT, a
proposta sobre a Rede Ecossocialista é muito interessante, o “novo modelo deve ser mais
aberto de estrutura partidária, deve agregar todos os sonhadores da construir a sociedade
ecossocialistas” (Laxe, 2014d). Mas sugeriu que o nome fosse mudado para Fórum, para
não utilizar a palavra Rede, pois teme causar falsa associação com o partido Rede
Sustentabilidade (LAXE, 2014d).

Samuel Santos, da Rede Sustentabilidade, ressaltou o papel de revisão teórica dos


debates na Rede Brasil de Ecossocialistas. Para ele, a Rede terá muito a contribuir como
revisão do pensamento marxista clássico “buscando desenvolver uma nova leitura e ampliar
esse leque”, e esse processo não pode estar restrito a um só partido ou organização
(SANTOS, 2014).

Já João Alfredo, do PSOL, propôs que haja uma pessoa dedicada a essa construção,
uma pessoa com história e conhecimento reconhecido que consiga reconstruir as “pontes
destruídas” pela história das principais lideranças dispersas nos diferentes partidos,
Bannwart, José Correa e João Alfredo, entre outros ecossocialistas, estão no PSOL, Pedro
Ivo na Rede e o Laxe e Gilney no PT (Melo,2015). Para João Alfredo Melo (2015), “o desafio
é como “juntar esses cacos”, acredito ser difícil, pois exigiria um grau de esforço de unidade
imenso em função do tamanho de divergências”. A grande dificuldade de diálogo entre as

154
lideranças das correntes ecossocialistas está nas divergências históricas, embates e
diferenças ideológicas entre os partidos.

Para João Alfredo (Melo, 2015), o melhor nome para essa tarefa é o Michel Löwy, pela
sua história e respeito que todos têm por ele. João Alfredo acredita ainda que as
dificuldades de retomar a Rede Brasil de Ecossocialistas são “imensas” e a figura de
“alguém profissionalizado” para o papel de articulador das diferentes posições é
fundamental, essa articulação “é uma tarefa de Sísifo” (Melo, 2015). Segundo ele, a
proposta de haver um responsável pode ser substituída por um comitê de refundação, mas
certamente é fundamental organizar um primeiro encontro de ecossocialistas para iniciar o
processo. Nesse sentido, Löwy (2014b) acredita que os ecossocialistas do PSOL, por ter a
corrente ecossocialista mais organizada, devem buscar o diálogo com Pedro Ivo, por ser o
último coordenador, e em conjunto convocar uma reunião de refundação da Rede Brasil de
Ecossocialistas.

Uma mudança relevante na proposta de retomada da Rede Brasil Ecossocialista é o


ingresso de representantes dos movimentos populares e ONGs que apresentem pautas
ecossocialistas. A proposta de Michael Löwy (2014b) é envolver representantes do MST, do
Movimento Passe Livre, alguns intelectuais, por exemplo, Isabel Loureiro, e Fundação Rosa
de Luxemburgo, que inclusive pode ser o espaço físico da reunião. Para Bannwart (2014),
do PSOL, o envolvimento de ONGs, além de partidos, será importante no processo de
construção da Rede Brasil de Ecossocialistas:
Um novo caminho é envolver ONGs e movimentos sociais. MAB,
MTST, MST, Sindicato da Sabesp, Sindicado dos Químicos de
Campinas, pessoas avulsas, intelectuais, para gerar um diálogo. A
proposta é a transversalidade, isto é, a utopia perseguida é que todas
as correntes do PSOL, tendências dos partidos e enfim toda a
sociedade assuma o programa ecossocialista; é convencer todos os
outros coletivos e grupos para incorporarem o ecossocialismo, afinal
o ecossocialismo não tem dono é como o socialismo, não há
monopólio de um grupo.

Mauricio Laxe (2014d) também acredita que a “retomada da Rede Ecossocialista


Brasileira deve superar o desgaste do anterior, deve ser um Fórum ou uma Frente e,
necessariamente deve ir além dos partidos políticos. Nesse caso é fundamental o ingresso
de ONGs e Movimentos Sociais na organização”.

Para João Alfredo, nesse caso, a Rede Brasil Ecossocialista estaria alterando o seu
perfil para agregar o movimento social, “essa alteração deve ficar claro, pois há uma troca

155
de situação, pois o ecossocialismo está muito ligado à visão política, que se organiza dentro
dos partidos e suas correntes” (Melo, 2015). João Alfredo (Melo, 2015) acredita ser possível
integrar com uma série de movimentos sociais e com outras redes. Sua sugestão foi
incorporar a Rede Brasil de Justiça Ambiental, por ter ações importantes de integração com
muitos movimentos no Brasil, como anti-nuclear, mineração, agroecologia, etc. Mas, para a
retomada avançar, deve haver uma proposta detalhada sobre o formato de atuação (Melo,
2015).

A retomada da Rede é importante como forma de agregar ideias e pessoas para


debater e irradiar propostas e ideais ecossocialistas. Pois a sociedade ecossocialista não
pode ser construída em um contexto limitado a um só partido político (Münster, 2013, p.
157-158), mas sim pela “mobilização de toda oposição ao capitalismo, à oligarquia
financeira e ecocídio na união das forças do polo ecológico com o polo socialista e da
grande massa desorganizada vítima da crise e da política austeridade” (Münster, 2013, p.
157 – 158).

Há uma relação de mútua construção entre a Rede Brasil de Ecossocialistas e os


partidos e movimentos sociais, pois, por um lado, as instituições associadas devem construir
e alimentar a Rede de temas e práticas, mas, ao mesmo tempo, receber da Rede
consistência teórica e provocações. Por outro lado, a Rede depende do fortalecimento da
cultura ecossocialista das organizações que a formam. Para Bannwart, “a base para isso é
fortalecer o setorial ecossocialista do PSOL e transformar o PSOL em um partido
ecossocialista para gerar a semente da nova Rede Ecossocialista; esse é um projeto em
aberto”.

A retomada da Rede Brasil de Ecossocialistas é importante para dialogar e difundir as


propostas ecossocialistas, e o ingresso dos movimentos populares e ONGs, além de
acadêmicos e representantes de diversos partidos políticos, dará à Rede o caráter plural,
fator desejado por todos os seus idealizadores.

156
CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tese buscou responder se o Ecossocialismo é opção utópica na construção de uma


sociedade e quais são os desafios e oportunidades da política partidária na construção da
Sociedade Ecossocialista.

O primeiro passo foi entender o porquê essas perguntas são tão importantes. E a
resposta encontrada foi que a sociedade vive hoje uma crise socioambiental de grandes
proporções, que coloca em risco as condições do planeta suportar vida na atual proporção,
pois sua capacidade de recomposição, resiliência, está sendo superada em uma velocidade
crescente. Essa realidade pode ser mensurada pela pegada ecológica, criada por
Wackernagel e Reed e amplamente divulgada pela WWF, são números cada vez mais
preocupantes, que revelam que a capacidade do planeta a cada ano está sendo esgotada
cada vez mais cedo: ao final de 2014, eram necessários dois planetas para suprir o atual
nível de consumo. Além do esgotamento, há também o processo de mudanças climáticas,
que afetam a capacidade do planeta fornecer solo fértil e água, essenciais para a
sobrevivência da humanidade. Diante de perguntas tão relevantes, a sociedade deveria
buscar respostas o mais breve possível, antes de atingir o ponto “sem volta”, onde poucos
ou ninguém conseguirá se adequar à nova realidade climática.

Como o problema é planetário, os países passaram a se reunir, quase anualmente, a


fim de achar uma solução unificada para as mudanças climáticas. Mas, como era esperado
pelos ecossocialistas, essas reuniões geram vários documentos e nenhuma solução.
Enquanto que o discurso de que a crise não é séria e que as soluções técnicas serão
encontradas no momento adequado é utilizado pelo poder hegemônico.

Nesse debate, pode-se observar as diferenças ideológicas entre as correntes. Por um


lado, os ecocapitalistas e os realistas acreditam que essa solução técnica está em
construção, há como “esverdear” o capitalismo e são otimistas em relação as instituições
multilaterais. Por outro lado, os ecossocialistas, os “decrescistas”, os ecologistas dos
pobres, o movimento buen vivir e alguns setores dos ecologistas fundamentalistas afirmam
que é impossível haver capitalismo verde e são céticos em relação a resultados concretos
dessas reuniões.

157
A análise socioambiental sobre inovação e tecnologia também ilustra essa
divergência: para os ecocapitalistas, qualquer tecnologia é válida – transgênicos e energia
nuclear, por exemplo – “desde que” seu impacto socioambiental seja compensado por
ecotaxas e seus riscos mitigados. Para eles, essa remuneração deve ser paga por parcela
de rendimentos adicionais proporcionados pela tecnologia em questão, resumindo-se,
qualquer tecnologia é válida “desde que” incremente o lucro.

O enfoque ecossocialista é restritivo. Para essa corrente, qualquer inovação e


tecnologia que produzem degradação socioambiental devem ser suprimidas. Mesmo as
inovações consideradas “sustentáveis”, somente serão apoiadas “desde que” não causem
impacto socioambiental negativo, por exemplo, não são aceitos parques eólicos que
impactem em degradação ambiental e expulsem ou reduzam as condições de sobrevivência
da população local.

Essa postura dos ecossocialistas em relação às questões e soluções geradas pela


sociedade é motivada por sua radicalidade, pois seu compromisso ético é buscar a raiz da
crise socioambiental e alertar sobre ineficiência de reformas, como as que possibilitam aos
mercados o direito de poluir pagando ecotaxas, por serem incapazes de encontrar uma
solução concreta. Para os ecossocialistas, a origem e base da crise socioambiental é o
próprio modelo produtivista e consumista do capitalismo, que tem em sua essência vital a
necessidade de crescimento contínuo à custa do esgotamento do trabalho e da Natureza.

Para Löwy (2011, p. 35-36), as reformas parciais são totalmente insuficientes: a


construção de uma outra sociedade é construída pela substituição da micro-racionalidade do
lucro pela macro-racionalidade social e ecológica. Assim, para ocorrer essa transformação
socioambiental é necessária uma profunda mudança tecnológica, para substituir as atuais
fontes de energia fóssil por fontes renováveis e não poluentes, como a eólica e solar.

O ponto que diferencia os ecossocialistas em relação ao socialismo “real” é a questão


da união das práxis ecológica e socialista. Pois essa corrente considera que o socialismo
sem a visão ecológica não consegue ser alternativa aos desafios socioambientais do século
XXI; e a ecologia que não seja socialista não tem a radicalidade necessária para enfrentar
esses desafios.

Uma oportunidade de melhoria na formação dos ecossocialistas nos partidos é


construir e incrementar conhecimento nas ciências da Natureza. Esse ponto já estava na
obra de Engels e Marx: o domínio da Natureza pelo homem é o domínio do conhecimento
para poder manter o metabolismo entre a humanidade e Natureza perene, não só para a
atual geração, mas também para as futuras. Nas entrevistas realizadas junto às lideranças

158
ecossocialistas dos partidos brasileiros, dois militantes experientes apontaram que falta, nos
partidos brasileiros, quadros com conhecimento da ciência da Natureza para subsidiar o
entendimento sobre os impactos socioambientais das ações humanas e os limites que a
sociedade deve respeitar para ter perenidade de condições de vida saudável. Nesse
sentido, o cientista do clima, Alexandre Costa, tem uma atuação muito importante, com suas
informações e alertas sobre as mudanças climáticas e políticas hídricas. Mas, infelizmente,
são muitos poucos ecossocialistas com esse conhecimento técnico da natureza.

Outra dificuldade é a resistência da sociedade em debater a questão ambiental, pois a


ilusão da empregabilidade e ganhos monetários do incremento dos PIBs entorpece a
sociedade, enquanto o discurso ecossocialista, contestando a fantasia hegemônica, cria
resistências, inclusive na esquerda tradicional.

No Brasil, há a oportunidade de debate provocada pela crise hídrica, principalmente na


região sudeste, que é acompanhada pelas crises do abastecimento e de energia. O desafio
para os ecossocialistas é saber comunicar a gravidade da crise como esta e suas conexões
com desmatamento das matas próximas aos grandes centros e das florestas situadas no
norte do país. No caso, as soluções dos governos federal e estadual devem ser
questionadas e rompidas para quebrar o processo de desertificação do sudeste brasileiro. A
crise deve ser usada como fator concreto das críticas e proposições ecossocialistas.

Para os ecossocialistas, essa interação com a sociedade é um dos pontos vitais para
sua consolidação, pois busca trabalhar com todas as formas de construir mudanças em
conjunto, isto é, gerar um empoderamento social dos mecanismos políticos, fundamental
para construir uma sociedade sem a hegemonia do capital ou de um “grupo centralizador de
decisões”. O empoderamento pela autoemancipação deve ser construído pelo diálogo entre
os ecossocialistas e a sociedade.

Essa autoemancipação somente pode ser construída através do empoderamento do


tempo, pela redução da jornada de trabalho e libertação de outras formas de apropriação
das horas do trabalhador pelo capital. Esse tempo deve ser socialmente útil, isto é, para
permitir que a sociedade consiga explorar suas potencialidades, seja artística, seja na
integração com demais indivíduos e com a Natureza. Sem esquecer também a necessidade
do tempo cidadão, em que ocorre a contribuição do trabalhador nas decisões, sem “delegar”
para terceiros seu direito de decidir sobre sua vida e seu cotidiano. Essa dinâmica é
fundamental para construir estruturas que substituirão o Estado e os aparelhos produtivos
por instâncias de decisões que efetivamente estejam a serviços do bem viver de todos. Essa
é a utopia da sociedade ecossocialista.

159
Mas para a construção da sociedade ecossocialista será necessário uma práxis radical
dos ecossocialistas junto aos demais setores anti-hegemônicos e altermundistas, isto é, o
vermelho do movimento operário, a violeta da libertação das mulheres e do respeito a todas
as orientações sexuais, o negro dos anarquistas e igualdade racial, o branco da mobilização
pela paz, o verde pela defesa de uma integração humana responsável com a Natureza,
assim construindo o arco-íris ecossocialista, principalmente porque a política ambiental é
necessariamente transversal, há conexão com todos os setores. O grande desafio nessa
construção é despertar nesses setores a relevância socioambiental de seus movimentos e
que é fundamental a integração de todos.

Nesse aspecto, os partidos franceses estão com essa práxis mais avançada, há
interação entre os partidos e movimentos sociais, seja através da luta pela eliminação da
solução de energia nuclear na França ou pela proteção ao imigrante. Mas há a dificuldade
em tornar propostas e ações em votos e participação no congresso, a votação dos partidos
ainda não permite o sonho de domínio da pauta na política francesa.

A política brasileira apresenta maiores dificuldades aos ecossocialistas. Inicialmente


dentro dos próprios partidos, pois não há, ainda, um partido ecossocialista brasileiro. O
único, até dezembro de 2014, que tem um espaço organizado por essa corrente de
pensamento é o PSOL, que tem o Setorial Ecossocialista Paulo Piramba, organizado
nacionalmente. Os setores ecossocialistas dos demais partidos, PT e Rede
Sustentabilidade, não conseguiram se estruturar, pois enfrentam grande dificuldade nas
estruturas internas de seus partidos.

Inicialmente a grande maioria dos ecossocialistas participou da fundação do PT e lá


ficaram até os anos 2000. O problema é que, principalmente após sérias divergências, parte
dos militantes saiu e criou o PSOL e a Rede Sustentabilidade resultando em uma situação
de desgaste que cerceia o diálogo, mas não impede.

Mas um ponto de grande resistência interna é a esquerda tradicional nos partidos, que
mantém a cultura produtivista e desenvolvimentista, adoradora do crescimento ilimitado do
PIB, pois ainda tem a ilusão que a empregabilidade e a geração da renda são
proporcionadas por crescimento desse índice e que isso é bom para a sociedade.

160
As dificuldades externas são provocadas também pela cultura desenvolvimentista da
esquerda e pela falta de conhecimento da população sobre a severidade dos riscos e a
complexidade da situação. Esses fatores são reforçados pela associação da mídia com os
demais donos de capital que filtram as informações sobre todos os assuntos, inclusive sobre
temas socioambientais que possam por em cheque o conforto do capital. Mas há uma
expectativa que essa “segurança” seja fragilizada pelo agravamento da crise ambiental,
principalmente a hídrica, pelo alto grau de impacto na rotina da população.

No Brasil, há ONGs e movimentos sociais que apresentam propostas socioambientais


próximas à pauta ecossocialista, que podem e devem compor o arco-íris ecossocialista,
como a Rede Brasil de Justiça Ambiental, Alternativa Terrazul, ECOS Brasil, ISA – Instituto
Socioambiental, MAB-Movimento dos Atingidos por Barragens, MST – Movimentos dos
Trabalhadores Sem Terra, MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, entre outros. A
corrente ecossocialista deve se aproximar dessas instituições, além das organizações
sindicais, para apresentar a pauta ecossocialista e receber o enriquecimento dessa pauta
pelos diálogos e vivências com essas instituições.

O espaço para esse encontro interessante é a retomada da Rede Brasil de


Ecossocialistas, pois a esse grupo poderiam se incorporar pesquisadores, intelectuais e
centros de debates como a Fundação Rosa de Luxemburgo. Esse espaço seria uma
semente de diálogo e troca de experiências para enriquecer a militância ecossocialista
internamente nas suas organizações e no exterior com a intervenção dessas instituições na
sociedade, transformando-a cada vez mais justa, ecológica e solidária.

A pesquisa concorda com a afirmação de Kovel: “O outro mundo possível chama-se


Ecossocialismo”.

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de 2013.

182
ENTREVISTAS

BANNWART, Roberto.
Militante histórico, membro do setorial nacional ecossocialista do PSOL e coordenador do
núcleo paulista ecossocialista do PSOL.
Entrevistas nos dias:
25 de fevereiro de 2013;
03 de dezembro de 2014.

LAXE, Mauricio Cortines


Advogado e Ecólogo, militante ecossocialista histórico no Partido dos Trabalhadores.
Coordenador do Programa de Revitalização da Bacia do São Francisco, do Ministério do
Meio Ambiente.
Entrevistas nos dias:
09 de janeiro de 2014b;
09 de abril de 2014c; e
16 de dezembro de 2014d.

LOUREIRO, Isabel e OLIVEIRA, Marcos Barbosa de.


Assinantes do Manifesto Ecossocialista Internacional de 2001.
Entrevista no dia 11 de dezembro de 2014.

LÖWY, Michael
Pensador e militante ecomarxista brasileiro radicado na França, diretor de pesquisas do
Centre National de la Recherche Scientifique. Redigiu o Manifesto Ecossocialista
Internacional com Kovel e participou com comitê de Redação da Declaração Ecossocialista
de Belém.
Entrevistas nos dias:
9 de fevereiro de 2014a;
27 de outubro de 2014b.

MELO, João Alfredo Telles


Advogado e Ecólogo, militante ecossocialista histórico no Partido Socialismo e Liberdade,
parlamentar ecossocialista, foi deputado federal e estadual pelo Ceará, atualmente exerce o
mandato de vereador pela cidade de Fortaleza.
Entrevista no dia 08 de janeiro de 2015.

183
SANTOS, Samuel Maia dos.
Militante ecossocialista da Rede Sustentabilidade, membro do Elo Nacional da Rede.
Entrevista no dia 09 de dezembro de 2014

VIANA, Gilney Amorim.


Militante ecossocialista histórico no Partido dos Trabalhadores, ex-secretário de
Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente.
Entrevista no dia 05 de novembro de 2014.

184
SÍTIOS:

AGAPAN (http://agapan.blogspot.com.br/): AGAPAN (Associação Gaúcha de Proteção ao


Ambiente Natural) é a primeira associação ecologista do Brasil e da América Latina.

Associação Alternativa Terrazul (http://www.alternativaterrazul.org.br/): ONG ecossocialista


de Pernambuco.

Buen Vivir (http://www.buenvivir.gob.ec/inicio): sítio do Plano Nacional Buen Vivir do


Equador.

Capitalism, Nature and Socialism (http://www.cnsjournal.org/): revista de ecologia política


fundada James O’Connor.

Casseurs de pub (http://www.casseursdepub.org/): Associação e revista que associa a


criação artística e critica à sociedade de consumo.

Climate and Capitalism (http://climateandcapitalism.com/): revista ecologia política, de


inspiração ecossocialista, editada por Ian Angus.

Daniel Tanuro (http://www.lcr-lagauche.org/category/nos-blogs/blog-daniel-tanuro/): blog do


engenheiro agrônomo e ecossocialista Daniel Tanuro.

Ecologia Política (http://www.ecologiapolitica.iepe.org/): revista de ecologia política com


base no Chile que tem como objetivo debater políticas ecológicas na América Latina.

Ecología Polítique (http://ecologiapolitica.info/wordpress/): revista eletrônica de ecologia


política, fundada em 1991 por Joan Martínez Alier.

Ecologie & Politique (http://www.ecologie-et-politique.info/): revista de ecologia política


fundada em 1992 por Jean-Paul Deléage).

Ecorev (http://ecorev.org/): Sitio da revista de ecologia política Ecover: Revue critique


d’écologie politique.

185
Eco Brasil (http://ecosbrasilong.blogspot.com.br/): ONG ecossocialista. ONG fundada em
1997 com o objetivo de defesa do meio ambiente e dos direitos humanos e sociais e,
promoção do Ecossocialismo e da Ecopolítica.

Ecossocialismo ou Bárbarie (https://ecossocialismooubarbarie.wordpress.com/): blog do


setorial ecossocialista do PSOL.

Ecosocialist International Network: http://ecosocialistnetwork.org/?page_id=10: sitio oficial


da Rede Internacional Ecossocialista.

Ecosocialists Unite (http://www.ecosocialistsunite.com/): Blog do ESU- Ecosocialists Unite.


Sitio fundado em novembro de 2010.

Ensemble (www.ensemble-fdg.org): Sitio do partido ecossocialista francês Ensemble;

Gauche Anticapitaliste (http://www.gauche-anticapitaliste.org/en-region): Sitio do partido


ecossocialista francês Gauche Anticapitaliste presente no Front de Gauche e participante na
formação do partido Ensemble.

Green from Below (http://greenfrombelow.wordpress.com/): sitio do movimento


ecossocialista inglês Green from Below.

INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (http://www.inpe.br/.): Tem como missão


“produzir ciência e tecnologia nas áreas espacial e do ambiente terrestre e oferecer produtos
e serviços singulares em benefício do Brasil”; efetuou estudos sobre panoramas futuros de
clima no Brasil baseados nos cenários do IPCC.

Jean-Luc Melenchon (http://www.jean-luc-melenchon.fr/2014/12/29/enfin-la-chaine-va-


craquer/#comments) – Liderança Ecossocialista francês do Front de Gauche.

La Lucha Indígena (http://www.luchaindigena.com/): revista eletrônica cujo diretor é o Hugo


Blanco Galdós e situado em Lima (Peru).

Ladislau Dowbor (http://dowbor.org/): blog do professor e pesquisador Ladislau Dowbor,


suas linhas de pesquisas: “Desenvolvimento Local” e “Articulação de mecanismos de
regulação nas economias modernas”. Tem contribuído nos debates sobre economia
ambiental.

Les Petits pois sont rouges (http://www.lespetitspoissontrouges.org): blog da Corinne Morel


Darleux, militante ecossocialista do Party de Gauche.

186
Michael Löwy (http://blogs.mediapart.fr/blog/michael-lowy): blog do Michael Löwy.

Mientras Tanto (http://www.mientrastanto.org/): revista fundada em 1979 por Giulia Adinolfi e


Manuel Sacristá.

Monthly Review (http://monthlyreview.org/): revista de ecologia política cujo editor é John


Bellamy Foster.

Objecteurs de croissance (http://www.objecteursdecroissance.fr/): sitio sobre Decrescimento


administrado por Cheynet Vincent e Leray Florence;

O que você faria se soubesse o que eu sei


(http://oquevocefariasesoubesse.blogspot.com.br/): blog do militante ecossocialista do
PSOL, Alexandre Costa. Atuante no debate climático e a crise da água. Ele é Ph.D. em
Ciências Atmosféricas.

PT. Secretaria - Meio Ambiente e Desenvolvimento – SMAD


(http://www.pt.org.br/secretaria/meio-ambiente-e-desenvolvimento/): Secretaria do Meio
Ambiente e Desenvolvimento do Partido dos Trabalhadores.

PSOL - Setorial Ecossocialista Paulo Piramba


(https://ecossocialismooubarbarie.wordpress.com/): Espaço virtual de comunicação oficial do
Setorial Nacional Ecossocialista Paulo Piramba do PSOL. O objetivo do sitio é “divulgar as
decisões levadas a cabo pelo setorial, textos, informativos, artigos informativos, artigos,
informações e divulgação de eventos de formação sobre ecossocialismo”.

RAP (http://antipub.org/): RAP (Association Résistance à l’agression publicitaire) é uma


associação, sediada em Paris, com o objetivo de combater os efeitos negativos das
propagandas sobre os cidadãos e a Natureza.

Rede Sustentabilidade (http://redesustentabilidade.org.br/): Sítio oficial do Partido Rede


Sustentabilidade.

Reporterre (http://www.reporterre.net/): revista eletrônica francesa de ecologia política.

187
ANEXOS

Anexo 1: Primeiro Manifesto Ecossocialista brasileiro (1991)

MANIFESTO ECOSSOCIALISTA

Primeiro Manifesto Ecossocialista brasileiro

1) Os ecossocialistas procuram resgatar a herança histórica de luta da humanidade pela


justiça social, pela democracia como valor essencial e pelo direito à diferença (de gênero -
Homem-Mulher -, da diversidade cultural dos povos e de opções sexuais, religiosas).
Afirmam que, como parte dos movimentos que entram em luta por novas formas de relações
sociais (socialistas), entram em luta também por novas formas de relação do ser humano
com a natureza. Nesse sentido, não somos nem socialistas no sentido estrito, nem
ecologistas em sentido estrito: somos ecossocialistas.

2) O "socialismo realmente existente", ao propor a primazia do desenvolvimento das forças


produtivas em detrimento de novas relações sociais que permitissem o livre
desenvolvimento do ser humano e a proteção do meio ambiente, reproduziu na prática
características da sociedade capitalista que pretendia superar.

3) A crise na qual está imersa a humanidade não se restringe ao campo do econômico, mas
abrange todo um processo civilizatório com suas crenças e seus valores, inclusive a crença
de que a economia é a base da felicidade humana. Daí a necessidade de se repensar os
fundamentos filosóficos para a construção de uma nova utopia. Entre esses valores que
precisam ser repensados e que fazem parte, inclusive, da herança filosófica de grande parte
da esquerda está o antropocentrismo.

4) Para os ecossocialistas, as especificidades do homem como espécie biológica que, por


exemplo, tem a propriedade de criar cultura e história não são suficientes para autorizar a
visão da natureza como objeto a ser submetido. Para os ecossocialistas, o Homem é parte
da natureza, aquela que, inclusive, desenvolveu a consciência. Se vivemos numa sociedade
em que a espécie humana perdeu essa consciência da sua naturalidade, esta é mais uma
dimensão do processo de alienação a que se chegou.

5) Para os ecossocialistas, a defesa da vida não se restringe à defesa da vida humana, mas
se estende a todas as formas de vida.

6) O chamado "socialismo científico", construído a partir das visões científicas do século


passado (positivismo, evolucionismo, determinismo), da lógica cartesiana e da física

188
newtoniana (mecânica), deve ser dialeticamente superado. Uma nova visão de mundo,
holística, não-compartimentalizada, que reconheça que aquilo que a ciência convencional
chama de "LEI" e "ORDEM" é apenas uma parte da realidade, da qual o ACASO também
faz parte, constitui-se em novo paradigma sobre o qual poderíamos reformular nossa utopia.

7) Os ecossocialistas recusam a tese de que o homem está destruindo a natureza. Essa


tese, ao tratar da questão genericamente, dilui as responsabilidades pela atual devastação
do planeta. Numa sociedade fundada no lucro e na propriedade privada, a natureza não
está igualmente à disposição do ser humano. A propriedade privada da natureza tira, por
exemplo, de grande parte da humanidade o direito de decidir o que dela vai ser feito. Assim,
vivemos numa sociedade que gera riqueza (questionável) para poucos, miséria para muitos
e degradação ambiental para todos, pondo em risco, inclusive, a própria sobrevivência do
planeta.

8) Desse modo, os recursos naturais do planeta não podem ser apropriados sob o regime
da propriedade privada com poderes absolutistas do proprietário, mas sim de forma coletiva,
democrática, em sintonia com o meio ambiente, e solidária com as gerações futuras.

9) Nesse sentido, é necessário mudar a relação ser humano-natureza, buscando uma


relação harmoniosa preocupada com o futuro do planeta. Os interesses dos segmentos,
grupos classes, povos e nações têm que ser compatibilizados com o meio ambiente. Para
os ecossocialistas, os interesses dos explorados e oprimidos devem ser pensados para
além do corporativismo, e para isso é preciso que incorporemos um projeto que seja do
interesse de toda a humanidade e de defesa da(s) vida(s) e do planeta. A visão holística
inerente aos ecossocialistas é fundamental na superação efetiva do corporativismo, pois
implica reconhecer o outro como outro na sua diferença.

10) Para os ecossocialistas, um meio ambiente saudável é incompatível com o capitalismo


nas suas duas vertentes, a neoliberal e a social-democrata. A preocupação com o
enriquecimento imediato, inerente à lógica do MERCADO e do LUCRO, deve deixar de
constituir a base dos valores da humanidade. A separação do homem da terra está na
origem e no cerne da sociedade capitalista. Só assim foi possível a mercantilização
generalizada dos homens (proletarização) e da natureza. A lógica do mercado, que
pressupõe a divisão do trabalho, levou a uma extrema especialização tanto produtiva como
do conhecimento. A lógica da concorrência impôs ritmos intensos ao processo de produção,
incompatíveis com os fluxos de matéria e energia de cada ecossistema (que ficaram
dependentes de insumos energéticos externos), com o equilíbrio psicoafetivo do trabalhador

189
(vide Chaplin em Tempos Modernos) e com os ritmos próprios à vida de cada povo e
cultura. Nesse sentido, capitalismo e desenvolvimento auto-sustentável são incompatíveis.

11) A queda do Muro de Berlim e da burocracia com suas políticas secretas sepultou o
modo coletivista do Estado autoritário e centralizado, mas não os princípios e os
fundamentos de um igualitarismo socialista democrático.

12) No entanto, para a opinião pública mundial ficaram abalados os princípios da


supremacia do coletivo sobre o individual e do plano sobre o mercado. Impõe-se a
necessidade de repensarmos a relação entre o individual e o social, entre o público e o
privado. A luta contra a desigualdade, por exemplo, não é uma luta pela igualdade no
sentido estritamente econômico-social. É uma luta para que todos tenham condições iguais
para afirmar suas diferenças. Os ecossocialistas recusam uma visão do social que anule o
indivíduo. Queremos um social que incorpore a visão de que cada indivíduo é singular, tem
a sua originalidade. Queremos um social que permita o desabrochar da criatividade que
existe em cada ser humano. Queremos um socialismo (e não um social-ismo) que seja
assinado na primeira pessoa, em que cada um se sinta estimulado e responsável
individualmente pela sua construção. Não confundimos afirmação da individualidade com
individualismo, como, de certa forma, a esquerda até hoje veio fazendo. Como a questão do
indivíduo era confundida com o individualismo burguês, ela foi negligenciada e recalcada.
No entanto, como ela é parte constitutiva do homem moderno e não era explicitada no seio
da esquerda, a questão do indivíduo veio se manifestando de uma maneira perversa por
meio dos diversos cultos à personalidade. Aquilo que era negado à maioria sob o pretexto
de que se constituía num princípio burguês passou a ser privilégio de alguns poucos (quase
sempre do secretário-geral).

13) No entanto, os ecossocialistas propugnam por ampliar radicalmente os espaços das


liberdades coletivas e individuais, não restringindo as especificidades do desenvolvimento
afetivo, psicológico e cultural.

14) Em uma sociedade em que o poder e a economia estão extremamente centralizados,


monopolizados - como a que vivemos, tanto em nível nacional como internacional -, não é
possível deixar exclusivamente às forças do mercado a formação dos valores, dos gostos e
dos preços. O mercado não gosta dos miseráveis e a justiça social não é mercadoria que dê
lucros imediatos. Não queremos trocar o ESTADO TOTAL pelo MERCADO TOTAL. É
preciso mesmo indagar-se se existe mercado numa economia oligopolizada.

15) Afirmamos que os princípios da autogestão, da autonomia, da solidariedade (inclusive


com as gerações futuras), da defesa da(s) vida(s) e das liberdades, do desenvolvimento

190
espiritual e cultural dos indivíduos e dos povos e das tecnologias alternativas, libertos das
amarras do produtivismo e do Estado autoritário, ajudarão a semear e robustecer a utopia
transformadora ecossocialista e libertária.

16) Uma das decorrências do antropocentrismo (na verdade, do homem europeu, logo do
eurocentrismo) foi (e é) o produtivismo. A crença num homem TODO-PODEROSO que tudo
pode submeter está na base da idéia de progresso do mundo moderno. O PROGRESSO
entendido como aumento da riqueza material, medido por meio do PIB, impregnou as
consciências, inclusive a de muitos que se pensam críticos da sociedade dominante. Para
os ecossocialistas, o capitalismo não é somente um modo de produção. É também um modo
de vida, um determinado projeto civilizatório, um modo de ser para o ser humano. Não cabe
simplesmente questionar o modo de produção-distribuição do capitalismo. Se o capitalismo
não permite que todos tenham automóveis, nós, os ecossocialistas, não lutamos para que
todos tenham um, pois isso só socializaria o congestionamento. Assim, não questionamos
somente o modo como se produz e para quem. Incorporamos à nossa crítica também o
BEM-ESTAR. Queremos um BEM-VIVER, que vai além do conforto material. SEM MEDO
DE SER FELIZ.

17) Assim, os ecossocialistas questionam os padrões culturais de consumo que são


condicionados pelo modo de produção. Diferenciamo-nos dos demais ecologistas, pois não
ficamos na crítica ao consumismo, uma vez que esta é a face aparente de uma sociedade
que, no fundo, é produtivista. O produtivismo-consumismo é, por sua vez, filho direto dos
valores antropocêntricos que a sociedade capitalista leva ao paroxismo com sua visão da
riqueza imediata, do lucro e da extrema fragmentação/especialização da produção, inclusive
da produção do conhecimento.

18) A crítica ecossocialista da matriz produtivista-consumista dos atuais modelos de


desenvolvimento predatórios, embotantes e desumanos se dirige também à proposta de
"crescimento zero" ou do anticonsumismo monástico para o Terceiro Mundo. Propomos,
sim, um redirecionamento da produção-consumo que vise prioritariamente a superação da
miséria, tanto material como espiritual, e uma gestão democrática dos recursos. Para os
ecossocialistas, a produção não é um fim em si mesma, mas um meio para a efetivação de
uma sociedade igualitária baseada na radicalização democrática (que combina democracia
direta e representativa).

19) A tese do "crescimento zero" demonstrou toda a sua fragilidade sobretudo na última
década de recessão e desemprego, com queda do PIB. Mesmo nesse contexto, a
degradação ambiental só fez progredir. Nada temos contra o crescimento se ele for baseado

191
na proteção da natureza e na gestão democrática dos recursos. O crescimento do ser
humano não pode ser reduzido ao consumo de bens materiais. Não queremos substituir o
SER pelo TER. Essa é a utopia capitalista.

20) Para os ecossocialistas, o trabalhador não se define como "mão-de-obra" ou "força-de-


trabalho", mas como um ser humano pleno e complexo, com direitos integrais de cidadania.
Não reduzimos o ser humano ao mundo da produção, nem tampouco à sua dimensão
econômica. A economia é apenas um instrumento a serviço da sociedade, e não o contrário,
como acontece no capitalismo, e, portanto, deve estar subordinada democraticamente aos
cidadãos.

21) Os ecossocialistas não entendem que os proletários fabris e rurais sejam os únicos
agentes da transformação social. Há um movimento real, constituído por diferentes
movimentos sociais, que procura suprimir o estado de coisas existentes. São pessoas que
pelas mais diferentes razões rompem a sua inércia e vêm para o espaço público construir
novos direitos.

22) Os ecossocialistas propõem novos critérios para a elaboração da contabilidade nacional,


em que sejam computados os custos da degradação do meio ambiente, como, por exemplo,
a perda da biodiversidade, do fundo de fertilidade da terra (e da água), dos mananciais. A
poluição é um claro exemplo de socialização dos prejuízos e da privatização dos benefícios.
Para nós são indicadores do desenvolvimento o tempo livre e o avanço cultural do povo e,
para isso, é fundamental retomar a luta pela diminuição da jornada de trabalho. Não existe
nenhum limite natural para a jornada de trabalho. Ele é claramente político e é o resultado
das lutas de classes. Entendemos que o trabalho é uma necessidade e, como tal, deve ser
democraticamente gerenciado e reduzido para que o homem possa ser livre.

23) A sociedade americana, paradigma de desenvolvimento na ótica dominante, no seu afã


produtivista-consumista, chegou à insana condição de, com apenas 6% da população
mundial, consumir 25% da produção mundial do petróleo. Desse modo, se 24% da
população mundial tivesse o padrão cultural da sociedade norte-americana, consumiria
100% do petróleo mundial. Esse modelo se mostra, assim, definitivamente, não só
devastador-poluidor como também excludente socialmente. Se na utopia capitalista a
felicidade deve ser alcançada por meio do consumo de bens materiais com todas as
conseqüências já apuradas, nós, ecossocialistas, propugnamos a luta por um
redirecionamento do que seja riqueza que incorpore, inclusive, a dimensão ética, pois deve
ser estendida a todos os seres humanos e se pautar no direito à vida de todos os seres

192
vivos. A sociedade moderna surgiu apoiada numa ética do trabalho, que, no entanto, vem
sendo substituída pela ética do consumo. É preciso superarmos, dialeticamente, a ambas.

24) a ciência e a tecnologia são indispensáveis para a construção da sociedade


ecossocialista, em que haja a superação do desperdício e da devastação e a diminuição da
jornada de trabalho (o tempo livre). Todavia não podemos cair no mito nacionalista de que a
ciência e a tecnologia são os únicos motores para se alcançar tal fim. É a própria noção de
riqueza e trabalho que precisa ser reelaborada. Outras sociedades, menos complexas
tecnologicamente do que a nossa, foram capazes de subordinar o trabalho e não se
escravizar a ele.

25) A luta pela construção do ecossocialismo passa, necessariamente, pela invenção de


novas tecnologias e por uma apropriação crítica do complexo tecnológico hoje à disposição
da humanidade. Nesse sentido, devemos estar atentos e abertos a todo o complexo
científico-tecnológico que o conhecimento humano produziu e, sobretudo, saber adequá-lo
às particularidades socioculturais de nosso povo, tanto para recusá-lo como para dele nos
apropriar.

26) Até agora o movimento popular e sindical tem se preocupado com a questão tecnológica
basicamente por seu impacto no (des)emprego, com ênfase nas conseqüências da robótica
e da informática. Esse é um aspecto importante e por intermédio dele é possível perceber
com clareza que a redução da jornada de trabalho se constitui numa bandeira
extremamente moderna e atual. No entanto, há um outro lado da questão que precisa ser
aprofundado: em muitos casos o trabalhador tem vendido a sua saúde (insalubridade como
adicional no salário) em vez de lutar pela despoluição das fábricas e dos processos de
produção, deixando intacta a matriz tecnológica do capital. Os ecologistas lançam junto aos
sindicatos e à classe trabalhadora a luta política pelas tecnologias limpas e um ambiente de
trabalho saudável, tanto no aspecto bio-físico-químico como no psicossocial. Devemos, pois,
assumir a luta por tecnologias que minimizem o impacto agressivo sobre a saúde e a vida
de quem produz e o meio ambiente, patrimônio da população e base de sua qualidade de
vida. A luta pela substituição das tecnologias sujas que usam o benzeno, o mercúrio, o
ascarel, o asbesto, os agrotóxicos e o jateamento de areia (nos estaleiros, por exemplo),
entre outros, supõe o aumento da consciência de classe e, por incorporar a dimensão
ecológica, torna-se uma questão de interesse de toda a humanidade, contribuindo para
superar o corporativismo. Ambientes de produção ecologicamente seguros são condição
preliminar para que todo o ambiente seja despoluído. O segredo comercial, normalmente
invocado pelo capital para não revelar a composição química de seus produtos, não pode
estar acima da vida.

193
27) As chamadas tecnologias limpas não se resumem ao tratamento da saúde, dos
efluentes e dos despejos, mas implicam a despoluição de todo o processo de produção em
todas as suas fases. O ecossocialismo não quer limpar a atual organização do processo
produtivo sem alterar seus princípios e sua lógica de funcionamento. Não queremos pintar
de verde a fachada do prédio do capitalismo predatório, mantendo inalterada sua lógica de
exploração, exclusão e desigualdades. Assim, a bandeira das tecnologias limpas deve se
associar às transformações na estrutura da propriedade, de distribuição e da natureza do
consumo final.

28) Para efetivar esta bandeira torna-se fundamental uma articulação entre a comunidade
científica, o movimento ambientalista e o movimento popular e sindical. Isolados estes, as
teses ficam nas gavetas e a chantagem patronal joga trabalhadores e ecologistas uns contra
os outros. São os trabalhadores que vivem cotidianamente submetidos às piores condições
ambientais, tanto no seu local de trabalho como em sua moradia. É preciso, no entanto,
romper com o corporativismo que opõe trabalhadores de um lado e ambientalistas e
cientistas de outro. Se os trabalhadores, por exemplo, não têm onde morar e, constrangidos,
invadem áreas de interesse público, como mananciais, é preciso afirmar que nesse caso a
questão habitacional torna-se de interesse público e haveremos de buscar alternativas para
que os trabalhadores tenham um teto e o manancial seja preservado. Assim, é preciso
reverter o corporativismo e a alienação a ele vinculada, aprofundando a luta política,
cimentando a concepção de uma nova sociedade fundada em um outro tipo de
desenvolvimento tecnológico.

29) Os ecossocialistas propugnam pela reciclagem dos resíduos e materiais, pela


descentralização geográfica da economia e da política, pelo combate ao desperdício e à
obsolescência precoce planejada do produto. A durabilidade deve se constituir num critério
de qualidade do produto. Estas são bandeiras que devem estar associadas à luta contra a
pobreza (material e simbólica), contra a concentração de terra e renda e contra a
dependência externa.

30) A conversão gradual do complexo militar e industrial para uma economia voltada para
um desenvolvimento autogerido, democrático e sustentável deve ser acompanhada pela
transformação radical dos critérios de investigação de ecotécnicas, tecnologias
economicamente eficientes, poupadoras de energia, descentralizáveis (tanto no plano
técnico como no político), ecologicamente seguras e capazes de serem apropriadas e
geridas pelo trabalho coletivo.

194
31) A tendência atual do capitalismo de diminuir cada vez mais o número de trabalhadores
do processo de produção material, aumentando enormemente a capacidade de produção,
tem como um dos sustentáculos a manipulação do desejo, a fabricação capitalista da
subjetividade por meio da mídia, sobretudo da televisão. Este tem sido um poderoso
instrumento político dos grandes monopólios. A democratização dos meios de comunicação
torna-se essencial. Pela "Reforma Agrária do AR".

32) A defesa do ensino público, gratuito e de qualidade em todos os níveis é fundamental


para que criemos um complexo científico-tecnológico que contribua para um
desenvolvimento ecologicamente seguro, voltado para o interesse comum e a soberania dos
povos. Só com um estreitamento profundo da universidade com os interesses da grande
maioria do povo será possível quebrar o mito da neutralidade das forças produtivas. A busca
de um paradigma filosófico e científico não-reducionista é parte da luta por uma
universidade de qualidade e voltada para o interesse comum.

33) Um projeto ecossocialista pressupõe as reformas agrária e urbana, que devem ser
pensadas na sua articulação com a matriz energética. O incentivo às formas de geração de
energia descentralizadas como miniusinas, biodigestores, eólica (vento) e solar é importante
no sentido de democratizar o acesso à energia sem aumentar a pressão sobre a atual matriz
energética, esta sim excludente, com vistas a possibilitar o desenvolvimento de pequenas e
médias cidades. Essa preocupação não deve nos omitir das responsabilidades referentes
aos problemas das grandes cidades, exigindo a proteção das encostas, dos mananciais e
fundos de vales, a primazia do transporte coletivo sobre o individual, o uso do gás como
combustível, as ciclovias, a reciclagem do lixo urbano e outras propostas.

34) Na sociedade atual há um verdadeiro culto à centralização, à concentração e ao que é


grande (ao maior) sob o pretexto de que seriam mais eficientes. Combatemos radicalmente
esse princípio, não por um culto ingênuo ao pequeno, ao menor, mas sim pela
hierarquização e centralização do poder que os MEGAPROJETOS comportam. O limite de
tamanho é desigual para as diferentes atividades e sociedades e não é uma questão de
ordem exclusivamente técnica, embora comporte, como tudo, um lado técnico do fazer.
Como tal, o limite do tamanho é sobretudo do campo político e, assim, deve ser
estabelecido a partir de uma base democrática e autogestionária. Não é difícil perceber a
íntima relação entre os MEGAPROJETOS no Brasil (Tucuruí, Jari, Carajás, Angra I e II,
Itaipu...) e o suporte autoritário que os criou. E aqui não devemos confundir o autoritarismo
com sua fachada aparente que foi a ditadura militar, mas, sobretudo, ver os vínculos
profundos que mantém com o capital monopolista.

195
35) Os ecossocialistas lutam pelo desenvolvimento de formas democráticas e participativas
de gestão em todos os níveis, desde o local de trabalho até o Parlamento, por meio da
combinação da democracia direta e da representativa. Acreditamos ser esta uma forma
evoluída de gestão política e administrativa. Os cidadãos trabalhadores devem ter uma
noção geral dos problemas e participar criativamente das soluções, substituindo a visão
fragmentária por uma visão holística (que se preocupa com a relação das partes entre si,
das partes com o todo e com a relação do TODO retroagindo sobre as partes). Para isso
são necessários tanto um processo educacional que, ao mesmo tempo que estimule o
senso crítico e a criatividade, vise o interesse público como uma radical democratização dos
meios de comunicação. Sem essas condições as mudanças no regime de propriedade e nas
formas de gestão, que estão associadas, ficam comprometidas.

36) Para os ecossocialistas uma nova ética revolucionária é precondição de uma nova
política: os FINS não justificam os MEIOS. As práticas autoritárias, machistas, elitistas,
militarizadas e predatórias só fundamental uma falsa transformação, sem a afirmação de
novos valores para uma nova sociedade.

37) Essa nova ética ecológica planetária é incompatível com a exportação de lixo químico
dos países ricos para os países periféricos e inconciliável com os testes nucleares que
transformam o planeta em laboratório e a população em cobaia. Sobretudo agora, quando
caiu o Muro e com ele toda a lógica da Guerra Fria e sua corrida armamentista, torna-se
necessária a desnuclearização do mundo para que a política não fique submetida àqueles
que têm o poder de definir a morte. A queda da burocracia no Leste Europeu, saudada por
todos os verdadeiros socialistas, deixou, por outro lado, o imperialismo de mãos livres para
apertar o botão.

38) Defendemos uma nova divisão internacional do trabalho radicalmente diferente da atual,
em que os países ricos se reservam as tecnologias de ponta, como a robótica, a
biotecnologia, a química fina e o laser, e relocalizam no Terceiro Mundo as indústrias sujas,
altamente degradadoras do meio ambiente e consumidoras de energia, inclusive do próprio
homem. Uma nova ética ecológica planetária supõe intercâmbio, cooperação, paz,
solidariedade e liberdade no lugar da hipocrisia do nacionalismo chauvinista que justifica as
próprias agressões praticadas por cada governo e empresas contra suas próprias
populações e seu meio ambiente. O direito à autodeterminação dos povos não pode ser

196
invocado para destruí-los, assim como suas fontes naturais de vida. Um novo conceito de
soberania é necessário, incorporando uma ética ecológica.

39) O ecossocialismo não se constrói num só país nem numa só direção. A solidariedade
entre todos aqueles que são negados em sua humanidade, por serem explorados e
oprimidos, se faz pelo reconhecimento de que formamos uma mesma espécie, cujo maior
patrimônio é nossa diferença cultural. Uma posição verdadeiramente revolucionária,
ecossocialista, reconhece que habitamos uma mesma casa, o planeta Terra, que, por sua
vez, vem sendo ameaçado por um internacionalismo fundado no dinheiro e no lucro e por
um poder altamente concentrado: o IMPERIALISMO.

40) Os ecossocialistas entendem que é necessário romper com a idéia restrita de revolução,
originária da mitológica tomada de assalto do poder, militarizada e, por sua vez, derivada de
uma restrita visão do Estado. Afirmamos que inexiste o tal corte absoluto mistificado na
história, uma vez que o processo de transformação social é composto não por uma, mas por
várias rupturas, descontinuidades, desníveis e disfunções. No entanto, numa sociedade em
que o poder está hierarquizado, do cotidiano familiar ao aparelho de Estado, passando pelos
locais de trabalho, as diversas rupturas nos diversos níveis têm contribuições diferenciadas,
embora todas essenciais num verdadeiro processo de transformação, aliás em curso. Aqui
se faz necessária, mais uma vez, uma visão que dialetize a relação entre as partes e o todo.
Os debates acerca dessa questão vêm ganhando maior profundidade no seio da esquerda.
Mesmo aqueles que procuram afirmar a idéia de uma ruptura têm apontado que ela implica
o estabelecimento de novas relações entre o Estado e a sociedade civil, entre partidos e
sindicatos e demais movimentos populares. Apontam que o socialismo se torna uma
necessidade reconhecida pela população quando no processo de luta evidenciamos os
limites de desenvolvimento capitalista. Esses limites são evidenciados, por sua vez, quando
a burguesia rejeita propostas humanização em geral, em particular no tocante à socialização
da propriedade. Desse modo, a ruptura deve ser entendida como o resultado prático e
teórico da dialética reformas / revolução. Nesta dialética é fundamental, portanto, entender
que a teoria e a prática para uma sociedade socialista devem existir já a partir do
capitalismo, embora condicionada pelos limites e barreiras dessa sociedade. Aí são
fundamentais, por exemplo, os Conselhos Populares. Estes devem ser organizações da
sociedade civil autônomas em relação ao Estado e aos partidos, atuando como verdadeiros
laboratórios de construção de hegemonias. Assim, a democracia socialista não é

197
simplesmente a negação da democracia capitalista, mas sim a sua superação. Se a
democracia é um valor estratégico, como acreditamos, e não tático, e o poder não se
localiza em um lugar restrito, como no aparelho de Estado, por exemplo, devemos instituir
práticas democráticas em todos os lugares de interesse público, inclusive nas unidades de
produção (empresas / locais de trabalho), o que implica repensar o regime de propriedade.
Afinal, assim como os fluxos de matéria e energia dos ecossistemas e mesmo da sociedade
transcendem as fronteiras nacionais, o mesmo ocorre com as cercas e fronteiras da
propriedade privada.

41) Por fim, a atual crise que afeta a humanidade expressa na descrença com relação ao
futuro, no hipocondrismo, no alcoolismo, na violência cotidiana, no estresse, na apatia e no
consumo indiscriminado de drogas em geral mostra a decadência do atual modelo de
desenvolvimento. Repudiamos a militarização do combate às drogas que vem substituindo a
antiga caça aos comunistas. A militarização no combate às drogas acaba por escamotear a
verdadeira questão: o esvaziamento do sentido da vida, a instrumentalização mercantilizada
do desejo, a vida sem direito a fantasias típicas da sociedade que transformou a liberdade
"numa calça velha, azul e desbotada", conforme um anúncio publicitário. Nós,
ecossocialistas, reconhecemos que, se é, num certo sentido, verdadeiro que ninguém vive
de fantasia, também é verdadeiro que a dimensão da fantasia é inerente à vida. Assim,
repudiamos a sociedade que reduz a fantasia à sua por intermédio da droga.

Sem medo de ser feliz!

Secretaria Nacional de Movimentos Populares


Subsecretaria Nacional dos Ecologistas do PT

198
Anexo 2: Manifesto Ecossocialista Internacional (2001)

MANIFESTO ECOSSOCIALISTA INTERNACIONAL

O século XXI se inicia com uma nota catastrófica, com um grau sem precedentes de
desastres ecológicos e uma ordem mundial caótica, cercada por terror e focos de guerras
localizadas e desintegradoras, que se espalham como uma gangrena pelos grandes troncos
do planeta África Central, Oriente Médio, América do Sul e do Norte, ecoando por todas as
nações.

Na nossa visão, as crises ecológicas e o colapso social estão profundamente relacionados e


deveriam ser vistos como manifestações diferentes das mesmas forças estruturais. As
primeiras derivam, de uma maneira geral, da industrialização massiva, que ultrapassou a
capacidade da Terra absorver e conter a instabilidade ecológica. O segundo deriva da forma
de imperialismo conhecida como globalização, com seus efeitos desintegradores sobre as
sociedades que se colocam em seu caminho. Ainda, essas forças subjacentes são
essencialmente diferentes aspectos do mesmo movimento, devendo ser identificadas como
a dinâmica central que move o todo: a expansão do sistema capitalista mundial.

Rejeitamos todo tipo de eufemismos ou propaganda que suavizem a brutalidade do sistema:


todo mascaramento de seus custos ecológicos, toda mistificação dos custos humanos sob
os nomes de democracia e direitos humanos. Ao contrário, insistimos em
enxergar o capital a partir daquilo que ele realmente fez.

Agindo sobre a natureza e seu equilíbrio ecológico, o sistema, com seu imperativo de
expansão constante da lucratividade, expõe ecossistemas a poluentes desestabilizadores,
fragmenta habitats que evoluíram milhões de anos de modo a permitir o surgimento de
organismos, dilapida recursos, e reduz a vitalidade sensual da natureza às frias trocas
necessárias à acumulação de capital.

Do lado da humanidade, com suas exigências de autodeterminação, comunidade e


existência plena de sentido, o capital reduz a maioria das pessoas do mundo a
mero reservatório de mão-de-obra, ao mesmo tempo em que descarta os considerados
inúteis. O capital invadiu e minou a integridade das comunidades por meio de uma cultura
de massas global de consumismo e despolitização. Ele expandiu as disparidades de riqueza
e de poder em níveis sem precedentes na história. Trabalhou lado a lado com uma rede de
Estados corruptos e subservientes, cujas elites locais, poupando o centro, executam o

199
trabalho de repressão. O capital também colocou em funcionamento, sob a supervisão das
potências ocidentais e da superpotência norte-americana, uma rede de organizações trans-
estatais destinada a minar a autonomia da periferia, atando-a às suas dívidas enquanto
mantém um enorme aparato militar que força a obediência ao centro capitalista.

Nós entendemos que o atual sistema capitalista não pode regular, muito menos superar, as
crises que deflagrou. Ele não pode resolver a crise ecológica porque fazê-lo implica em
colocar limites ao processo de acumulação uma opção inaceitável para um sistema baseado
na regra “cresça ou morra!”. Tampouco ele pode resolver a crise posta pelo terror ou outras
formas de rebelião violenta, porque fazê-lo significaria abandonar a lógica do império,
impondo limites inaceitáveis ao crescimento e ao “estilo de vida” sustentado pelo império.
Sua única opção é recorrer à força bruta, incrementando a alienação e semeando mais
terrorismo e contra-terrorismo, gerando assim uma nova variante de fascismo.

Em suma, o sistema capitalista mundial está historicamente falido. Tornou-se um império


incapaz de se adaptar, cujo gigantismo expõe sua fraqueza subjacente. O sistema
capitalista mundial é, na linguagem da ecologia, profundamente insustentável e, para que
haja futuro, deve ser fundamentalmente transformado ou substituído.

É dessa forma que retornamos à dura escolha apresentada por Rosa Luxemburgo:
“Socialismo ou Barbárie!”, em que a face da última está impressa neste século que se inicia
na forma de eco-catástrofe, terror e contra-terror e sua degeneração fascista.

Mas por que socialismo, por que reviver esta palavra aparentemente consignada ao lixo da
história pelos equívocos de suas interpretações no século XX? Por uma única razão:
embora castigada e não realizada, a noção de socialismo ainda permanece atual para a
superação do capital. Se o capital deve ser superado, uma tarefa dada como urgente
considerando a própria sobrevivência da civilização, o resultado será necessariamente
“socialista”, pois esse é o termo que designa a passagem a uma sociedade pós-capitalista.

Se dizemos que o capital é radicalmente insustentável e se degenera em barbárie,


delineada acima, então estamos também dizendo que precisamos construir um “socialismo”
capaz de superar as crises que o capital iniciou. E se os “socialismos” do passado falharam
nisso, é nosso dever, se escolhemos um fim outro que não a barbárie, lutar por um
socialismo que triunfe. Da mesma forma que a barbárie mudou desde os tempos em que
Rosa Luxemburgo enunciou sua profética alternativa, também o nome e a realidade do
“socialismo” devem ser adequados aos tempos atuais.

200
É por essas razões que escolhemos nomear nossa interpretação de “socialismo” como um
ecossocialismo, e nos dedicar à sua realização.

Por que Ecossocialismo?

Entendemos o ecossocialismo não como negação, mas como realização dos socialismos da
“primeira época” do século vinte, no contexto
da crise ecológica. Como seus antecessores, o ecossocialismo se baseia na visão de que
capital é trabalho passado reificado, e se fortalece a partir do livre desenvolvimento de todos
os produtores, ou em outras palavras, a partir da não separação entre produtores e meios
de produção. Entendemos que essa meta não teve sua implementação possível
no socialismo da “primeira época”. As razões dessa impossibilidade são demasiadamente
complexas para serem aqui rapidamente abordadas, cabendo, entretanto, mencionar os
diversos efeitos do subdesenvolvimento no contexto de hostilidade por parte das
potências capitalistas. Essa conjuntura teve efeitos nefastos sobre os
socialismos existentes, principalmente no que ser refere à negação da democracia interna
associada à apologia do produtivismo capitalista, o que conduziu ao colapso dessas
sociedades e à ruína de seus ambientes naturais.

O ecossocialismo retém os objetivos emancipatórios do socialismo da “primeira época”, ao


mesmo tempo em que rejeita tanto os objetivos reformistas da social-democracia quanto às
estruturas produtivistas das variações burocráticas do socialismo. O ecossocialismo insiste
em redefinir a trajetória e objetivo da produção socialista em um contexto ecológico. Ele o
faz especificamente em relação aos “limites ao crescimento”, essencial para a
sustentabilidade da sociedade. Isso sem, no entanto, impor escassez, sofrimento ou
repressão à sociedade. O objetivo é a transformação das necessidades, uma profunda
mudança de dimensão qualitativa, não quantitativa. Do ponto de vista da produção de
mercadorias, isso se traduz em uma valorização dos valores de uso em detrimento
dos valores de troca um projeto de relevância de longo prazo baseado na atividade
econômica imediata.

A generalização da produção ecológica sob condições socialistas pode fornecer a base para
superação das crises atuais. Uma sociedade de produtores livremente associados não
cessa sua própria democratização.

Ela deve insistir em libertar todos os seres humanos como seu objetivo e fundamento. Ela
supera assim o impulso imperialista subjetiva e objetivamente. Ao realizar tal objetivo, essa
sociedade luta para superar todas as formas de dominação, incluindo, especialmente,
aquelas de gênero e raça. Ela supera as condições que conduzem a

201
distorções fundamentalistas e suas manifestações terroristas. Em síntese, essa
sociedade se coloca em harmonia ecológica com a natureza em um grau impensável sob as
condições atuais. Um resultado prático dessas tendências poderia se expressar, por
exemplo, no desaparecimento da dependência de combustíveis fósseis característica do
capitalismo industrial , que, por sua vez, poderia fornecer a base material para o resgate das
terras subjugadas pelo imperialismo do petróleo, ao mesmo tempo em que possibilitaria a
contenção do aquecimento global e de outras aflições da crise ecológica.

Ninguém pode ler estas recomendações sem pensar primeiro em quantas questões práticas
e teóricas elas suscitam e, segundo e mais desesperançosamente, em quão remotas elas
são em relação à atual configuração do mundo, tanto no que se refere ao que está baseado
nas instituições quanto no que está registrado nas consciências. Não precisamos elaborar
estes pontos, os quais deveriam ser instantaneamente reconhecidos por todos.
Mas insistimos que eles devem ser tomados na perspectiva adequada. Nosso projeto não é
nem detalhar cada passo deste caminho nem se render ao adversário devido à
preponderância do poder que ostenta. Nosso projeto consiste em desenvolver a lógica de
uma suficiente e necessária transformação da atual ordem e começar a dar os passos
intermediários em direção a esse objetivo. O fazemos para pensar mais profundamente
nessas possibilidades e, ao mesmo tempo, iniciar o trabalho de reunir aqueles de idéias
semelhantes. Se existe algum mérito nesses argumentos, então ele precisa servir para que
práticas e visões semelhantes germinem de maneira coordenada em diversos pontos do
globo. O ecossocialismo será universal e internacional, ou não será. As crises de nosso
tempo podem e devem ser vistas como oportunidades revolucionárias, e como tal temos o
dever de afirmá-las e concretizá-las.

Disponível em: http://pdf.ecodebate.com.br/ecossocialismo.pdf

A versão original está disponível em: http://www.europe-solidaire.org/spip.php?article2278

202
Anexo 3: Declaração de Belém (2013)

Declaração Ecossocialista de Belém (2º Manifesto Ecossocialista). Comitê de Redação:


Michael Lowy e Joel Kovel e Ian Angus (janeiro 2009).

"El mundo tiene fiebre por el cambio climático y la enfermedad se llama modelo de
desarrollo capitalista"
Evo Morales, presidente da Bolívia, Setembro 2007

A Escolha da Humanidade

A humanidade enfrenta hoje uma escolha extrema: ecossocialismo ou barbárie.

Não precisamos de mais provas da natureza bárbara do capital, este sistema parasita que
explora a humanidade e a natureza. Seu único motor é o imperativo rumo ao lucro e logo a
necessidade de crescimento constante. Ele cria produtos desnecessários de maneira
dispendiosa, drenando os limitados recursos naturais e dando em retorno toxinas e poluição.
Sob o capitalismo, a única medida de crescimento é quanto é vendido cada dia, cada
semana, cada ano – incluindo vastas quantidades de produtos que são diretamente
prejudiciais aos seres humanos e à natureza, produtos que não podem ser produzidos sem
espalhar doenças, destruir as florestas que produzem o oxigênio que nós respiramos,
devastar ecossistemas, e tratar nossa água e ar como se fossem esgotos do lixo industrial.

A ânsia do capitalismo pelo crescimento existe em todos os níveis, desde a empresa


individual até o sistema como um todo. A fome insaciável das corporações é facilitada pela
expansão imperialista na busca para ter cada vez mais acessos aos recursos naturais, mão-
de-obra barata e novos mercados. O capitalismo sempre foi ecologicamente destrutivo, mas
em nossa atual existência estas agressões à foram se acelerando. Uma mudança
quantitativa está dando lugar à transformação qualitativa, levando o mundo a um ponto
limite, à beira do desastre. Um time crescente de pesquisadores científicos tem identificado
muitas maneiras nas quais pequenos aumentos na temperatura poderiam desencadear
efeitos incontroláveis – tais como o derretimento rápido da camada de gelo da Groelândia
ou a liberação do gás metano enterrada no gelo e no fundo do oceano – que tornaria
inevitável uma catastrófica mudança do clima.

Sem controle, o aquecimento global terá impactos catastróficos nas vidas humana, animal e
vegetal. A produção das colheitas se reduzirão drasticamente, gerando fome em larga

203
escala. Centenas de milhões de pessoas serão deslocadas por secas em algumas áreas e
por níveis elevados das marés em outras. Um clima caótico e imprevisível será a regra.
Epidemias de malária, de cólera e mesmo de doenças mais mortais aniquilarão os mais
pobres e os mais vulneráveis de cada sociedade.

O impacto da crise ecológica é mais devastador naqueles cujas vidas já foram ou vêm
sendo destruídas pelo imperialismo inúmeras vezes na Ásia, África e América Latina, e os
povos indígenas de todas as partes são especialmente vulneráveis. A destruição ambiental
e as mudanças do clima constituem um ato de agressão dos ricos sobre os pobres.

A destruição ecológica, resultante da ânsia insaciável pelo lucro, não é uma característica
acidental do capitalismo: está no DNA do sistema e não pode ser reprogramada. A produção
orientada ao lucro considera somente um horizonte a curto prazo em suas decisões de
investimento, e não consegue levar em consideração a saúde e a estabilidade a longo prazo
do meio ambiente. A expansão econômica infinita é incompatível com ecossistemas finitos e
frágeis, mas o sistema econômico capitalista não pode tolerar limites ao crescimento; sua
necessidade constante de expansão subverte todos os limites que possam se impor em
nome do "desenvolvimento sustentável." Assim o sistema capitalista inerentemente instável
não pode regular sua própria atividade, muito menos superar as crises causadas por seu
crescimento caótico e parasítico, porque fazê-lo exigiria colocar limites em sua acumulação
– uma opção inaceitável para um sistema predicado na regra: Crescer ou Morrer.

Se o capitalismo continuar a ser a ordem social dominante, o melhor que podemos esperar
são condições climáticas insuportáveis, a intensificação das crises sociais e a propagação
das formas mais bárbaras de poder, como a luta dos poderes imperialistas entre si e com o
Sul global para controlarem os cada vez mais escassos recursos naturais no mundo.

No pior dos casos, a vida humana pode não sobreviver.

Estratégias Capitalistas para Mudança

204
Não faltam estratégias para lidar com a ruína ecológica, incluindo a crise do aquecimento
global em conseqüência do aumento imprudente do dióxido de carbono atmosférico. A
grande maioria destas estratégias compartilha uma característica comum: são planejados
por e agem em nome do sistema global dominante, o capitalismo.

Não é surpreendente que o sistema global dominante que é responsável pela crise
ecológica também estabelece os termos do debate sobre esta crise, uma vez que o capital
comanda os meios de produção do conhecimento, tanto quanto aquele do dióxido de
carbono atmosférico. Conformemente, seus políticos, burocratas, economistas e professores
proferem uma gama infinita das propostas, todas variações do tema que o dano ecológico
do mundo pode ser reparado sem o desbaratamento dos mecanismos do mercado e do
sistema de acumulação que comanda a economia mundial.

Mas uma pessoa não pode servir a dois mestres, ou seja, neste caso, a integridade da terra
e a rentabilidade do capitalismo. Um deve ser descartado, e a história deixa poucas dúvidas
sobre as alianças da vasta maioria dos atores políticos. Temos toda a razão, portanto, de
duvidar radicalmente das ações estabelecidas para medir a escalada da catástrofe
ecológica.

E certamente, além de um verniz cosmético, as reformas dos últimos 35 anos foram uma
falha monstruosa. Melhorias individuais acontecem naturalmente, contudo elas são
inevitavelmente oprimidas e varridas pela expansão impiedosa do sistema e da natureza
caótica de sua produção.

Um exemplo demonstra este fracasso: nos primeiros quatro anos do século XXI, as
emissões globais anuais de carbono eram quase três vezes maiores daquelas da década
dos 1990s, apesar do surgimento do Protocolo de Kyoto em 1997.

Kyoto emprega dois mecanismos: o do Sistema "Cap and Trade" , que fixa um limite máximo
de emissões e cria um mercado de livre troca de títulos de direito de emissão de carbono, e
projetos no Sul global — os chamados "Mecanismos de Desenvolvimento Limpo" (MDLs) —
para compensar as emissões das nações industriais. Todos estes instrumentos dependem
dos mecanismos de mercado, o que significa, primeiramente, que o carbono atmosférico se
transforma diretamente em uma commodity, logo sob o controle dos mesmos interesses das
classes que criaram o aquecimento global em primeiro lugar. Os poluidores não são
compelidos a reduzir suas emissões do carbono mas na verdade têm carta branca para usar
seu poder monetário para controlar o mercado de carbono para seus próprios fins, o que
inclui a exploração devastadora para mais carbono. Tampouco há um limite à quantidade de
créditos da emissão, que podem ser emitidos por governos coniventes.

205
Dado que a verificação e a avaliação dos resultados é quase impossível, o regime de Kyoto
não só é incapaz incapaz de um controle das emissões, mas dá margem também a amplas
oportunidades de evasão e fraudes de todos os tipos. Como o jornal Wall Street Journal
escreveu em março de 2007, o comércio de emissões "daria lucro para algumas grandes
corporações, mas não acredite por um minuto sequer que esta trapaça fará muito pelo
aquecimento global."

As reuniões de Bali em 2007 abriram precedentes para futuros abusos ainda maiores. Bali
evitou a menção explícita dos objetivos drásticos para a redução do carbono elaborada
pelos melhores cientistas dos clima (90% até 2050); abandonou os povos do Sul global à
mercê do capital, ao dar a jurisdição do processo ao Banco Mundial; e deixou ainda mais
fácil a compensação da poluição do carbono.

Para afirmar e garantir o futuro da humanidade, uma transformação revolucionária é


necessária, na qual todos os esforços particulares devem ser vistos na luz de uma luta
maior contra o próprio capital. Esta luta maior não pode ser meramente negativa e anti-
capitalista. Ela deve anunciar um tipo diferente de sociedade, e isto é ecossocialismo.

A Alternativa Ecossocialista

O movimento ecossocialista visa parar e inverter o processo desastroso de aquecimento


global em particular e do ecocídio capitalista em geral, e construir uma alternativa prática e
radical ao sistema capitalista. O Ecossocialismo situa-se em uma economia transformada
fundada nos valores não-monetários de justiça social e de equilíbrio ecológico. Ele critica
tanto a "ecologia capitalista mercado" e o socialismo produtivista, que ignoraram o equilíbrio
e limites da terra. Ele redefine o trajeto e o objetivo do socialismo dentro de uma estrutura
ecológica e democrática.

O Ecossocialismo envolve uma transformação social revolucionária, que implique a limitação


do crescimento e a transformação das necessidades por uma mudança profunda dos
critérios econômicos quantitativos para os qualitativos, com ênfase no valor de uso em vez
do valor de troca.

Estes objetivos exigem a tomada de decisão democrática na esfera econômica, permitindo a


sociedade de definir coletivamente seus objetivos do investimento e da produção, e a
coletivização dos meios de produção. Somente a tomada de decisão e a posse coletiva da
produção podem oferecer a perspectiva a longo prazo que é necessária para o equilíbrio e a
sustentabilidade de nossos sistemas sociais e naturais.

206
Além da grande escala de intervenções valiosas propostas pelo "movimento dos
movimentos," uma perspectiva singular e central está começando a ser discutida: que, para
afirmar e sustentar nosso futuro da humanidade,

As tentativas capitalistas de resolver a crise ecológica falharam: somente uma mudança


profunda na própria natureza da civilização pode salvar a humanidade das conseqüências
catastróficas da mudança do clima.

A rejeição do produtivismo e a mudança dos critérios econômicos quantitativos para os


qualitativos envolve um repensar da natureza e dos objetivos da produção e da atividade
econômica em geral. As atividades humanas criativas, não-produtivas e reprodutivas
essenciais, tais como tomar conta da casa, cuidado e educação das crianças e adultos, as
artes, todos serão valores chaves em uma economia ecossocialista.

O ar puro e a água e o solo fértil, assim como o acesso universal a alimentos sem
agrotóxicos e às fontes de energia renováveis, não-poluidoras, são direitos naturais e
básicos do ser humano básico defendidos pelo ecossocialismo. Longe de ser "despótico," a
tomada de decisões coletiva nos níveis locais, regionais, nacionais e internacionais ocasiona
o exercício da sociedade de liberdade e responsabilidade comuns. Esta liberdade de
decisão constitui uma libertação das "leis" econômicas alienantes do sistema capitalista
orientadas ao crescimento.

Para evitar o aquecimento global e outros perigos que ameaçam a sobrevivência humana e
ecológica, setores inteiros da indústria e a agricultura devem ser suprimidos, reduzidos ou
reestruturados e outros devem ser desenvolvidos, fornecendo emprego para todos. Uma
transformação tão radical é impossível sem o controle coletivo dos meios de produção e o
planejamento democrático da produção e da troca. As decisões democráticas sobre o
investimento e o desenvolvimento tecnológico devem substituir o controle das empresas
capitalistas, acionistas e bancos, a fim de proporcionar um horizonte a longo prazo dos bens
comuns da sociedade e da natureza.

Os elementos mais oprimidos da sociedade humana, os povos pobres e os indígenas,


devem ter um papel central na revolução ecossocialista, a fim de revitalizar as tradições
ecológicas sustentáveis e dar voz àqueles que o sistema capitalista não pode ouvir. Dado
que os povos do sul global e os pobres são geralmente as primeiras vítimas da destruição
capitalista, suas lutas e demandas ajudarão a definir os contornos da sociedade ecológica e
sustentável economicamente a ser criada. Similarmente, a igualdade de gênero é integral ao
ecossocialismo, e os movimentos de mulheres têm estado entre os grupos oponentes mais

207
ativos da opressão capitalista. Outros agentes potenciais da mudança revolucionária do
ecossocialismo existem em todas as sociedades.

Tal processo não pode começar sem uma transformação revolucionária das estruturas
sociais e políticas baseadas no apoio ativo, pela maioria da população, de um programa do
ecossocialista. A luta do trabalho – trabalhadores, fazendeiros, os sem-terra e
desempregados – pela justiça social é inseparável da luta pela justiça ambiental. O
capitalismo, explorador social e ecológico e poluidor, é o inimigo da natureza e do trabalho
em igual medida.

O Ecossocialismo propõe transformações radicais:

1. no sistema energético, substituindo os combustíveis fósseis e biocombustíveis por fontes


limpas energéticas com controle social: eólica, geotérmica, marítima, e, principalmente,
solar; 2. no sistema de transporte, reduzindo drasticamente o uso de caminhões e de carros
particulares, substituindo-os por transporte público grátis e eficiente; 3. nos padrões atuais
de produção, consumo e construção, que são baseados no lixo, na obsolescência inata, na
competição e poluição, e produzir no lugar bens sustentáveis e recicláveis, e adotar a
arquitetura verde sustentável; 4. na produção e distribuição de alimentos, ao defender a
soberania alimentar local o máximo possível, eliminando o agronegócio industrial poluidor,
criando agro-ecossistemas sustentáveis e trabalhando ativamente para renovar a fertilidade
do solo.

Para teorizar e trabalhar para concretizar o objetivo de um socialismo verde não significa
que não devemos lutar por reformas concretas e urgentes agora. Sem nenhuma ilusão
acerca de um "capitalismo limpo," devemos tentar ganhar tempo e impor nos poderes – quer
sejam governos, corporações, instituições internacionais – algumas mudanças elementares
mas essenciais:

208
* redução drástica e obrigatória da emissão de gases estufa; * desenvolvimento de fontes
limpas de energia; * provisão de um sistema extenso de transporte público grátis; *
substituição progressiva de caminhões por trens; * criação de programas de despoluição; *
eliminação da energia nuclear e do orçamento bélico.

Estas, além de demandas similares, estão no coração da agenda do movimento pela Justiça
Global e dos Fóruns Sociais Mundiais, que tem promovido, desde Seattle em 1999, a
convergência de movimentos sociais e ambientais numa luta comum contra o sistema
capitalista.

A devastação ecológica não será paralisada nas salas de conferências ou nas negociações
de tratados: somente a ação de massa pode fazer a diferença. Os trabalhadores urbanos e
rurais, os povos do Sul global e os povos indígenas de todo o mundo estão na vanguarda
desta luta contra injustiça social e ambiental, combatendo as multinacionais exploradoras e
poluidoras, o agronegócio químico venenoso e desregulado, as invasivas sementes
geneticamente modificadas, e os biocombustíveis que agravam a crise alimentar. Nós
devemos intensificar estes movimentos socio-ambientais e construir a solidariedade entre as
mobilizações ecológicas anti-capitalistas no Norte e no Sul.

Esta Declaração Ecossocialista é uma chamada à ação. As elites governantes encasteladas


são poderosas, mas o sistema capitalista se revela diariamente cada vez mais falido
financeira e ideologicamente, incapaz de superar as crises econômicas, ecológicas, sociais,
alimentares e as outras crises que ele gera. E as forças da oposição radical estão vivas e
são vitais. Em todos os níveis, local, regional e internacional, nós estamos lutando para criar
um sistema alternativo baseado na justiça social e ecológica.

Nós abaixo assinados, endossamos a análise e as perspectivas políticas esboçadas na


Declaração Ecossocialista de Belém, e apoiamos o estabelecimento e a construção de uma
Rede Ecossocialista Internacional.

Tradução: Beatriz Leandro

Fonte http://ecosocialistnetwork.org/Wordpress/wp-content/uploads/2012/03/Declaration-
Belem-pt.pdf/

209
Anexo 4: Declaração de Princípios e objetivos da Rede Brasil de Ecossocialistas

Não existe futuro para qualquer pensamento político que não seja ecologicamente
sustentável. A crise ecológica é um fenômeno Global, que deve ser tratado local e
mundialmente com a mesma intensidade. Em sua ofensiva, para transformar tudo em
propriedade e mercadoria, o capital patenteia a vida, apropria-se da biodiversidade, quer
impor os produtos transgênicos, privatizar, mercantilizar e controlar as reservas florestais e a
água. Entender que a lógica da produção e consumo capitalistas funciona como se ela
mesma fosse o seu próprio objetivo não basta, temos que transpor a barreira do
entendimento ortodoxo, objetivado puramente nos termos das antigas vitórias da classe
operária e seu partido, e reconhecer que a pauta ecológica impõe uma nova identificação de
atores da cena social e na composição do bloco de forças em torno da aliança operário-
camponesa.

A rede de ecossocialistas é formada por mulheres e homens que acreditam que o ambiente
não pertence a indivíduos, grupos ou empresas, nem mesmo a uma só espécie.

Que lutam para que cada ser humano existente no planeta tenha os mesmos direitos a
dispor dos elementos ambientais e sociais que necessita e que, quando estes forem
limitados, ou mesmo insuficientes, a divisão deve ser justa e planejada. Nunca definida por
guerras, competição ou outras formas de disputa.

Que compreendem que a humanidade deve limitar e adequar as suas atividades produtivas,
respeitando os outros seres e processos de manutenção da vida no Planeta.

Homens e mulheres que acreditam que o ecossocialismo é a realização do socialismo, livre


dos equívocos burocratizantes e centralizadores do chamado socialismo real, e atualizado
ao contexto da crise ecológica.

Lutamos por uma sociedade sem a exploração de pessoas sobre pessoas, onde o trabalho
vise a libertação e não alienação humana. Uma sociedade movida por energia de fontes
renováveis, onde a produção reaproveite totalmente os materiais utilizados, sem gerar
resíduos.

Lutamos por um Planeta onde o eterno ciclo natural de extinção e renovação de espécies,
mantenha-se determinado por ritmos naturais e não mais dentro do ritmo avassalador dos
dias de hoje, em que muitas espécies sucumbem com enorme rapidez, por causa das ações
da humanidade, que fica cada vez mais sozinha na superfície da terra. Um planeta habitado

210
por espécies originadas nos processos naturais de criação e mutação naturais, onde se
insere a humanidade;

Uma sociedade onde todos tem direito básico ao seu território, a um espaço para viver as
superfície da terra e o espaço ambiental não é objeto de especulação imobiliária ou
instrumento de Dominação e exclusão. Onde a terra fica para quem nela trabalha e vive, no
campo e na cidade. E falamos de cidades sustentáveis.

Onde as pessoas tem consciência de que toda a produção utiliza elementos ambientais,
conhecimentos e estruturas sociais. E que, portanto, parte de produção é de propriedade
social e toda pessoa tem direito de acesso aos resultados da produção social, que lhe
permita viver em condições dignas.

Uma sociedade que não aceite riscos sócio-ambientais. Que entenda que a inexistência de
provas para demonstrar que uma tecnologia é perigosa não basta para a sua aceitação, pois
quando surge uma inovação, normalmente ainda não se tem conhecimento dos riscos. Ao
contrário, é preciso que a tecnologia prove ser segura e constituir-se em instrumento de
melhoria sócio-ambiental da sociedade, em relação ao existente.

Lutamos por um tempo onde a diversidade social é fruto da livre determinação de pessoas e
povos. As diferenças culturais, étnicas, de raça, de gênero e de opção sexual não podem
jamais ser instrumento de negação de igualdade de direitos sociais.

Enfim, a rede de ecossocialistas é formada por pessoas que dedicam suas vidas para
defender a vida, contra a barbárie e pela paz no planeta.

Porto Alegre, III Fórum Social Mundial, 27 de janeiro de 2003.

Cimara Machado
Centro de estudos Ambientais
Contatos:
ceaong@uol.com.br
tel: 53 9112 7807

Disponível em:

http://www.forumsocialmundial.org.br/dinamic.php?pagina=oficina_ecosocialist

211
Entrevistado: Roberto Bannwart
Militante histórico, membro do setorial nacional ecossocialista do PSOL e coordenador
do núcleo paulista ecossocialista do PSOL.

Data: 25 de fevereiro de 2013.

Diálogo:
O PSOL foi fundado em sua grande maioria por militantes do PT insatisfeitos com a
política do PT. O movimento ecossocialista estava presente no setorial de Meio
Ambiente do PT com a participação de várias correntes, inclusive o grupo da então
ministra Marina Silva.

No PSOL, houve dois grandes marcos para o movimento ecossocialista:


 Em 2007: 1º Congresso do PSOL na cidade do Rio de Janeiro. Nesse encontro, foi
estruturada a lista de correspondência eletrônica entre os militantes ecossocialistas de
todos os estados. No encontro foram cadastrados em torno de 40 militantes na lista e
hoje há em torno de 240 militantes.
 Em 2011: 1º Encontro Nacional Ecossocialista do PSOL em Curitiba. O encontro foi
o momento fundacional do Ecossocalismo do PSOL. Foi definida a coordenação
nacional com um representante de cada estado presente (Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia e Ceará).
Foi definido que a organização estadual será estruturada de forma soberana por cada
estado. Por exemplo: São Paulo optou por ter o núcleo ecossocialista, por considerar
que esse modelo assim, deixaria a organização mais ágil e o Ceará definiu pela
estrutura de setorial estadual. A proposta fundamental é regionalizar o debate e as
propostas ecossocialistas.
O Encontro definiu os cinco pontos de pauta:
 Código Florestal;
 Usina Belo Monte;
 Angra 3 (Projeto Nuclear);
 Transposição do São Francisco;
 Agrotóxico.
O PSOL de São Paulo tem trabalhado com a proposta de integrar os principais
movimentos, porém com a preocupação de respeitar a total autonomia dos
movimentos, por exemplo, a luta do MST contra agrotóxicos. Umas das criticas do
PSOL em relação ao PT está na relação do mandato do PT de cooptação das
lideranças, essa lógica enfraquece os movimentos.

Há uma séria preocupação no PSOL na união da luta política com o embasamento


técnico. O conhecimento técnico é fundamental para alimentar constantemente com
embasamento teórico os militantes políticos.

Todas as tendências apresentam alguma sensibilidade ambiental, principalmente


porque é um dos pontos de críticas ao mandato da presidenta Dilma e dos governos
estaduais. Porém, há apenas uma tendência com programa com foco estratégico na
proposta ecossocialista: Enlace (com militantes oriundos da DS, quarta internacional).

O site oficial do setorial ecossocialista do PSOL tem o nome Ecossocialismo ou


Barbárie. Esse site era o blog do militante histórico Paulo Piramba,
https://ecossocialismooubarbarie.wordpress.com. Ele faleceu em 2011 e sua viúva e o
setorial decidiram manter o blog como site de divulgação do ecossocialismo do PSOL.

A Rede Brasil de Ecossocialistas está desarticulada porque a direção estava


centralizada na pessoa do Pedro Ivo e o mesmo, estava envolvido na fundação do
partido Rede Sustentável.

O próximo Encontro Nacional do Setorial Ecossocialista do PSOL ocorrerá no Rio de


Janeiro nos dias 17, 18 e 19 de maio de 2013.
Entrevistado: Mauricio Cortines Laxe
Advogado e Ecólogo, militante ecossocialista histórico no Partido dos Trabalhadores.
Coordenador do Programa de Revitalização da Bacia do São Francisco, do Ministério
do Meio Ambiente.

Data: 9 de janeiro de 2014.

Diálogo: Primeiras contribuições ecológicas brasileiras.

O nome do Professor que eu lhe disse é "Vasconcelos Sobrinho", como sendo um dos
primeiros na avaliação da relação da questão ecológica com a questão social, não
necessariamente com o caráter de precursor do ecossocialismo. Ele tratou dos
desafios das questões ecológicas e sociais no semiárido, da vida do nordestino
interagindo com as questões do uso e domínio da terra, da força do capital no
agravamento da degradação da caatinga, na exploração do capital sobre o homem
sertanejo, ressaltando a necessidade de difusão das praticas de convivência com o
semiárido e a seca. Ele foi sim, o precursor da tese da desertificação (acelerado pela
influencia antrópica). Foi o primeiro a tratar academicamente a matéria ecologia e
conservacionismo, entre outras ações..

Nesse sentido exemplificamos; para popularizar alguns de seus pensamentos,


escreveu nos anos 70, o conhecido "10 Mandamentos Ecológicos", depois fez uma
adaptação a este texto, voltando-o especificamente para o sertão, o qual preferiu
denominar de "10 Mandamentos de Padre Cicero". Erroneamente muitos ainda
consideram este ultimo texto como uma obra de Padre Cicero. Por incrível que pareça,
era isso mesmo que ele queria. Chegava a dizer: "Se eu, Vasconcelos, for dar
conselhos ecológicos de repercussão social ao sertanejo, ele nem me dará atenção,
mas se vier de Padre Cicero, as possibilidades de ele gravar serão bem maiores e
tanto quanto será a influencia deste, na pratica diária do sertanejo com a natureza".

Propôs e promoveu inclusive, diversas articulações junto a Igreja Católica, (com ajuda
de Dom Helder Câmara), para que fosse estabelecido "São Francisco de Assis" como
patrono da Ecologia, (sua proposta obteve êxito ao final), numa estratégia na mesma
lógica anterior, para facilitar a ampliação da consciência social para com os problemas
ecológicos e suas relações com os problemas sociais. Visava que, a partir da
inspiração e significado da própria biografia de São Francisco e a influencia de seus
pensamentos junto aos pobres e a natureza, aumentar a sensibilização da sociedade
para a questão ecológica. Precursor na luta e militância ecológica no Brasil foi um
dos responsáveis pela instalação da primeira CPI sobre um problema ecológico com
repercussão social no Brasil, que foi a CPI do Engenho Uchoa, ocorrido na
Assembleia Legislativa de Pernambuco, ao final dos anos 70. Foi um dos fundadores
da ASPAN, segunda Ong ecológica do Brasil e a primeira do NE. Foi contemporâneo
de outros influentes pernambucanos como Paulo Freire, Josué de Castro, Mário
Schenberg e inclusive seu vizinho e amigo, Gilberto Freire. Como professor da UFPE
e UFRPE, exerceu importante influencia politica junto à retomada do movimento
estudantil em Pernambuco.

Mas acho que não seria adequado rotulá-lo como "o precursor do ecossocialismo",
mas sim um dos que ajudariam a influenciar o surgimento e elaboração desta corrente
de pensamento ideológico, como parte de um processo de evolução politica. As
avaliações da conjuntura politica diante dos desafios para uma transição ao
socialismo, não eram objeto direto de seus trabalhos. A questão ecológica associada a
uma visão holística, dialética e social, assim como a busca de processos
sustentáveis, fazia sim parte da matriz de suas avaliações. Destaca-se que as
reflexões sobre a relação da ecologia e o socialismo vêm sendo historicamente
aprimorada no decorrer de analises e debates políticos, que foram intensificados
principalmente a partir da queda do muro de Berlim. Lhe manderei um texto a respeito.

Entrevistado: Michael Löwy


Ecomarxista brasileiro radicado na França, diretor pesquisas emérito no Centre
National de la Recherche Scientifique. Redigiu o Manifesto Ecossocialista
Internacional com Kovel e participou com comitê de Redação da Declaração
Ecossocialista de Belém.

Data: 9 de fevereiro de 2014.

Diálogo:
1. A Rede Ecossocialista Internacional é um grande marco importante para a
construção de uma civilização ecossocialista. Qual é a situação hoje e quais são as
perspectivas?
A Rede conseguiu ter uma intervenção importante no Fórum Social Mundial de
Belém do Pará (2009), quando seu Manifesto, acerca da mudança climática, foi
distribuído em duas línguas. Nesta ocasião houve também uma conferência
ecossocialista internacional. Depois desta data houve também uma intervenção
interessante na Manifestação de protesto nas ruas de Copenhagen em 2009, quando
distribuímos, em nome da Rede, um panfleto em forma de historia em quadrinhos.
Mas desde então têm sido raras as intervenções da Rede, que provavelmente
necessita de uma reorganização.

2. Considerando que a participação dos representantes dos partidos políticos é


importante na construção da Rede Ecossocialista Internacional. Quais são os
principais desafios no diálogo entre os diversos representantes da militância partidária,
com suas diferentes concepções de lutas e a práxis da Rede Ecossocialista
Internacional?
A Rede busca ter um caráter pluralista, na base de um acordo com o Manifesto
Ecossocialista Internacional de 2001 e o Manifesto de Belém de 2009. O principal
desafio é conseguir assegurar um funcionamento regular da Rede, o que desde 2009
não tem sido o caso.

3. Há algum movimento para criar uma Rede Ecossocialista Francesa?


Houve algumas tentativas, mas não vingaram. Agora se criou uma situação nova,
com a adesão do Parti de Gauche (PG), da revista Ecoreve, do coletivo Ensemble
(membro também do Front de Gauche) ao ecossocialismo. Possivelmente surgira
algo da convergência destes partidos e coletivos.

4. O congresso com participação dos partidos Parti de Gauche (Fr), Alliance Rouge-
Verte (Dk), Syriza (Gr), Bloco (Port), Die Linke (All) aprovou a proposta
ecossocialista com 48% de votos a favor e 43% contra em dezembro de 2013.
Qual é o impacto dessa aprovação no debate entre os ecossocialistas? E, nas
correntes de esquerda que ainda não incorporaram as lutas ambientais à luta
social?
Obviamente é um passo importante, que amplia consideravelmente o
espectro das forças interessadas pelo ecossocialismo. Isto não quer dizer que
não haja desacordos entre estas forças, assim como com outras correntes que
já ha algum tempo se reclamam do ecossocialismo (como o NPA francês). Mas
sem duvidas o ecossocialismo esta na ordem do dia da esquerda radical
europeia. As principais resistências vêm dos Partidos Comunistas tradicionais,
mas mesmo em seu seio já se começa à discutir do ecossocialismo.
E importante, diante desta ampliação, de manter uma atitude vigilante,
insistindo no caráter anticapitalista do ecossocialismo, e evitando que se
transforme numa formula vazia, tipo “economia verde” ou “desenvolvimento
sustentável”.

5. A participação do consumidor como agente ativo na decisão sobre o que produzir


e como produzir é a grande ruptura na gestão dos aparelhos produtivos na democracia
ecossocialista. Para haver consumidor cidadão será necessária uma grande ruptura
no papel passivo do consumidor, que influenciado pela publicidade compra o que não
precisa sem questiona as consequências socioambientais do seu consumo. Como a
corrente ecossocialista deve dialogar com os consumidores na construção da
sociedade ecossocialista?
E importante este diálogo com os consumidores e com as associações de
consumidores. Muitos se dão conta de que o capitalismo envenena os alimentos e a
agua e procuram reagir. O que buscamos é unir produtores, consumidores, jovens,
mulheres, enfim, os 99%, num combate ao ecocídio capitalista. Não acreditamos na
“culpabilização” dos consumidores, e tampouco achamos que a mudança de
comportamento individual dos consumidores vai resolver o problema da crise
ecológica. O desafio é organizar um movimento de conjunto para impor mudanças
estruturais radicais.
6. Retornando á Rede Ecossocialista Internacional, como a Rede pode participar do
processo transformador do consumidor e produtor? Qual são as ações que poderiam
ser provocadas pela Rede no debate do novo consumidor?
A Rede é uma iniciativa modesta, sua contribuição é sobretudo publicar alguns
documentos e estabelecer laços entre ecossocialistas de vários países.

7. A outra ponta do aparelho produtivo é o produtor. Na proposta ecossocialista, as


organizações serão administradas pelos próprios trabalhadores, que deverão dialogar
com o consumidor, inclusive prestando contas do impacto ambiental de sua produção
e descarte. Como a corrente ecossocialista participa do debate de autogestão e as
mudanças necessárias nos projetos de autogestão para uma sociedade
ecossocialista?
Como procurei explicar em meu ensaio “Ecossocialismo e planificação
democrática” a transição ao ecossocialismo não resulta de diálogos entre produtores e
consumidores, mas da decisão democrática do conjunto da população, em todos os
níveis (local, nacional, continental) sobre as prioridades da produção e do consumo.
Trata-se de uma autogestão global, ao nível da fabrica, da escola, do hospital, da
cidade, da região, do país, etc., partido do principio de subsidiariedade.

8. Há algum diálogo entre Comércio Justo e a corrente ecossocialista?


Até agora não. O comércio justo é uma tentativa simpática mas limitada de corrigir
alguns dos excessos do sistema. O ecossocialismo busca suprimir o capitalismo.

9. Um dos grandes desafios para a práxis ecossocialista é o diálogo com os


trabalhadores, e seus sindicatos, das áreas de alto carbono, por exemplo: mineiros de
carvão, petroleiros. A oportunidade seria a contribuição desses trabalhadores na
construção de uma civilização livre da economia do carbono. Há experiências desse
debate na França? Há algum setor ecossocialista envolvido nesse diálogo?
Existem correntes abertas às propostas ecológicas nos sindicatos, na França, por
exemplo no sindicato SUD, e mais ainda na Inglaterra. Neste ultimo pais, uma rede
sindical de esquerda publicou um documento propondo “Um milhão de empregos
verdes”. Existem no setor da energia nuclear ou do petróleo militantes sindicais que
começam a colocar perspectivas alternativas; entre os mineiros do carvão tem sido
mais difícil. Os militantes de partidos da esquerda radical de tendência ecossocialista
- NPA, PG, Ensemble, etc. - tentam levar este debate para dentro dos sindicatos, mas
ha bastante resistência da burocracia sindical. Por exemplo, o poderoso sindicato
CGT da Energia defende as centrais nucleares, o petróleo, etc., sem muita tolerância
para opiniões dissidentes...E uma luta de longo prazo, mas já existem alguns sinais
positivos.
Entrevistado: Mauricio Cortines Laxe
Advogado e Ecólogo, militante ecossocialista histórico no Partido dos Trabalhadores.
Coordenador do Programa de Revitalização da Bacia do São Francisco, do Ministério
do Meio Ambiente.

Data: 9 de abril de 2014.

Diálogo: Qual é a história da corrente ecossocialista no PT?

Em 1990, houve dois tipos de cursos em Cajamar: um de formação política e outro,


comunicação e rádio comunitária (não me lembro bem). Os cursos ocorreram no
mesmo período, um conjunto de pessoas passaram em curso por quase um mês com
excelentes palestrantes como Marilena Chauí, Walter Pomar entre outros. No período
da tarde, havia conversas informais sobre a questão ambiental, e nessas conversas,
surgiu a visão de associar a ecologia com o socialismo. Assim, surgiu o
ecossocialismo em resposta às provocações de “ecochatos”, aproveitando o debate
(ecologia + socialismo) x capitalismo. Um dos pontos debatidos era a reforma agrária,
como fazê-la sob a ótica ecossocialista, houve um grande embate, Gilney anos mais
tarde questionou a forma de operar as ocupações de área de assentamento sem
preocupação ambiental, tipo de ocupação que não preserva o meio ambiente, o que
acabou criando um conflito com o MST.

Em 1990, houve a preocupação de organizar o núcleo ecossocialista e provocar


discussão nacional no partido porque havia apenas a Secretaria dos Movimentos
Populares e não tinha ainda setoriais, havia apenas a proposta de criá-las.
Posteriormente, o debate evoluiu para criar o núcleo nacional dos ecologistas do PT
com nove integrantes. O tema principal das reuniões era (ecologia + socialismo) x
capitalismo, a proposta era trabalhar o conceito que reforça a opção socialista, mas
tivesse a ecologia como marco, o nome ecossocialismo tem esse conceito:
ecossocialismo seria a construção do ecológico e fecharia com o socialismo, que
deixaria a última parte mais marcante. Essa semântica defendia o grupo da alcunha de
“ecochatos”, pois esse grupo era marcado como os loucos da história.

No inicio de 1991, o núcleo evoluiu para setorial condição ambiental do trabalho, do


mundo e dos sistemas (capitalistas e comunistas) eram os pontos da crise
socioambiental que guiavam as discussões para elaborar propostas para a crise. A
morte de Chico Mendes provocou a união do grupo de ecologistas no PT, além desse
ponto, sua importância simbólica contribuiu para o grupo ecossocialistas criar
identidade. Nesse sentido, havia um Chico Mendes Vive nas primeiras reuniões dos
ecossocialistas no PT.

Os temas debatidos como questões programáticas eram: o trabalho; as condições do


trabalho; as condições da classe trabalhadora; questão urbana das favelas e energia
(principalmente após o acidente de Chernobyl). Os temas da realidade nacional eram:
questionar as alterações na política nacional do ambiente, a falta de uma política de
recursos hídricos; enfim era necessário construir toda uma estrutura de gestão
ambiental. O núcleo utilizou o artigo 225 da Constituição, a primeira base normativa,
como base para requalificar a, então, gestão ambiental.

O setorial ecossocialista foi formalizado em 1991 no Encontro em Angra dos Reis


guiado pelas pautas trabalhador e relações internacionais. No processo preparatório,
foram redigidos diversos documentos por diversos autores, e essas diversas
contribuições desembocaram no primeiro Manifesto que foi extenso porque a redação
final do texto agregou essas diversas contribuições. Em 1991, foram eleitos o Augusto
de Franco como coordenador geral do setorial e Mauricio Laxe como coordenador
executivo.

As reuniões que estavam ocorrendo para a Conferência Eco-92 contribuíram muito na


formação do coletivo ecossocialista no PT. Nessas atividades, havia a contribuições
das ONGs, principalmente o Fórum Brasileiro de ONGs, além das atividades
acadêmicas, em destaque o Encontro do Ensino de Ecologia em Recife com
ambientalistas históricos do nordeste. Esse encontro foi a primeira grande atividade
pós-Angra, nesse encontro foi definido que havia a necessidade dos petistas se
preparar para Eco-92.

Com o apoio da Nacional com Sônia Hypólito (secretária nacional do PT: movimentos
populares) e Augusto de Franco, o setorial conseguiu que todas as atividades da
sociedade civil e do governo preparatórias para a Rio-92 tivesse reuniões de petistas
durante ou no final. Nessa participação, o setorial já se apresentava como
ecossocialistas e utilizava o Manifesto Ecossocialista como elemento agregador e o
termo ecossocialismo como reflexo simbólico da filosofia.

Na Eco-92, ocorreu a primeira visibilidade da sociedade para a militância


ecossocialista do PT, principalmente com a participação no Fórum Global no
Flamengo, fórum paralelo. Houve dois enfrentamento grandes na Rio-92: dificuldade
no Fórum das ONGs com uma postura acomodada da coordenação Latino Americano,
mesmo assim, saíram duas propostas de atividade de mais enfrentamento do que era
debatido no encontro. A proposta foi organizar um movimento de massa no último dia
e com ajuda da área ambiental da CUT, foi lançada a proposta da passeata “Eco dos
Oprimidos”, apesar da resistência do Fórum da ONGs, mas foi com ajuda da
intervenção do padre Henry a favor do “Eco dos Oprimidos” para enfrentar o
ecocapitalismo representado pela Conferência oficial. A história está contada no Jornal
do Brasil, com fotos. Um ponto interessante foi a participação espontânea dos
cadeirantes, que se dispuseram em ir à frente para minimizar atrito com a tropa de
choque. A organização da passeata que iniciaria no Flamengo e iria até o Rio Centro
foi articulado com FAMERJ e CUT e tiveram 60 mil pessoas na rua; foi a maior
passeada após “64”, Lula esteve na passeata e chegou a fazer discurso. Nessa
passeata, o termo “ecossocialista ou barbárie” apareceu em um cartaz na frente do
carro de som.

Após a Rio-92, as atividades reduziram até 1994 quando aumentaram as atividades na


elaboração de propostas para elaboração da proposta da candidatura presidencial de
1994.

Em 1994, o Setorial do Meio Ambiente se transformou em Secretaria Nacional Meio


Ambiente. Os ecossocialista se uniram para redigir o documento “Programa com base
Ecológica” com um capítulo para o programa de governo. Após 1994, houve um
aumento de participação ecológica no partido, chegou a quatorze estados com o
setorial organizado.

Os ecossocialistas do PT sempre trabalharam com duas expectativas: o


ecossocialismo é uma filosofia “para além” do partido e a ecologia tem os ferramentais
teóricos para demonstrar as contradições do capitalismo.

A secretaria do meio ambiente se fortaleceu, tendo estrutura organizada em 14 ou 15


estados, oito coletivos ecossocialistas em Brasília, Minas Gerais, Mato Grosso,
Paraíba Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo. Porém, após a derrota
na eleição de 1998, o setorial ecossocialista se desarticulou, ficando apenas algumas
ações individuais e candidaturas como as de Gilney Viana, João Bosco, Chico Floresta
e Fernando Ferro que incluíram o termo ecossocialista em suas teses de campanha.

A retomada da militância do ecossocialismo ocorreu no I Fórum Social Mundial em


2001 na cidade de Porto Alegre. Na primeira edição, as reuniões entre os
ecossocialistas ficaram restrito apenas entre os militantes do Partido dos
Trabalhadores com o tema “O PT e o ecossocialismo”, essas reuniões não tinha uma
organização formal; eram agendadas e coordenadas de forma espontâneas e com
convites de forma oral.

No FSM do ano seguinte, as ONGs Ecos Brasil e a Terra Azul (duas entidades, que na
época, eram coordenadas por petistas) assumiram a agenda e organização das
reuniões, sendo que a Terra Azul assumiu a gestão formal das reuniões. Nessas
reuniões, foi escrito o segundo Manifesto Ecossocialista. Além do manifesto, ficou
decidido que seria estruturado um Fórum ecossocialista do Brasil, trabalhando com a
perspectiva de ser um movimento, a ideia do fórum seria o PT teria o seu setorial
ecossocialista e nos fóruns trabalharia com outros partidos de esquerda como o PC do
B, PCO, PTSU, que ainda quando seus militantes estavam no PT participaram no
inicio dos debates sobre ecossocialista. Após o Fórum Social Mundial, houve uma
tentativa de reunião em São Paulo mas sem sucesso. A estrutura da Rede era “meio
anárquica”, não havia um comando, a ausência de um comando ou ponto focal, para
tentar a evitar a personalização, por impacto com as críticas geradas pela queda do
Muro de Berlim.

Em 2003, houve a Mesa da retomada do Fórum Ecossocialismo do Brasil, essa


reunião definiu a retomada do Fórum como um movimento ecossocialismo e haveria
reuniões periódicas. Houve uma atividade com Terra Azul, com Marina e Löwy na
mesa que estabeleceu outra reunião para definir a coordenação e o manifesto de
Belém. A proposta também previa uma plenária para além do partido agregando as
ONGs ecossocialistas, atualização do manifesto. Porém, os encontros nunca
aconteceram. A posse da Marina Silva no primeiro mandato de Luiz Lula da Silva
impactou fortemente no processo da Rede, pois a militância foi alocada na máquina
federal do Ministério Meio Ambiente e outros ministérios como Pesca, assim, as
reuniões da Rede Ecossocialista passou a ser virtual com debates temáticos. Outra
iniciativa da Rede Ecossocialista que fracassou foi a aproximação com a IV
Internacional.

Eco Brasil assumiu o ecossocialismo e a Terra Azul o diluiu no seu operacional.

Com a vitória de Lula em 2002 e posse da Marina Silva no Ministério do Meio


Ambiente em 2003, desarticulou o movimento, pois os responsáveis da construção da
Rede Ecossocialista nos diversos estados, se transferiram para Brasília para assumir
cargos no ministério
A corrente ecossocialista do PT teve uma séria derrota na reestrutura no Ministério do
Meio Ambiente em 2007. Houve uma forte alteração no perfil ideológico no ministério,
sendo que o espaço do ecossocialismo foi totalmente eliminado no ministério. Em
2003, já havia indicativo dessa eliminação com a proibição de reunião do coletivo
ecossocialista no interior do ministério, o que levou o grupo ecossocialista realizar as
suas reuniões no bar na região do ministério. Essa proibição criou desconfiança dos
ecomarxistas históricos do PT em relação à Marina Silva e essa crise teve o seu ápice
na reforma ministerial de 2007. Nessa reforma, houve o desligamento de alguns
ecomarxistas petistas e o rebaixamento de cargo para demais. O setor político
fortalecido na reforma formou o grupo marinista, que posteriormente a acompanhou na
saída do PT e seu ingresso no PV.

O afastamento de setores ecológicos históricos do PT do Ministério de Meio Ambiente


trouxe um duplo prejuízo, primeiramente enfraqueceu a Marina Silva perante as
lideranças do Partido dos Trabalhadores e depois criou um clima de desconfiança para
os ecologistas no interior do partido após a saída da Marina do Partido.

Após essa crise, o ecossocialismo sumiu no interior do PT. Esse processo foi
agravado com o enfraquecimento do socialismo no partido, o dialogo interno era
agravado porque o grupo estava propondo ir para além do socialismo, isto é, o
ecossocialismo, enquanto o partido não chegava nem no socialismo. A máquina do
governo engoliu o sonho socialista e ecológico.

Foi elaborado um pequeno documento, a Carta (ou Mensagem) do Rio, para a


Conferência Rio+20, Carta do Rio que apontava para a necessidade do
amadurecimento e detalhamento do relacionamento da filosofia do ecossocialismo
com as políticas públicas e propostas para a transição do Sistema. Os pontos tratados
pelo documento foram: consolidação das elaborações políticas e filosóficas sobre
preceito do ecossocialismo; necessidade de ampliar a articulação e implementar todas
as instâncias pensadas para avançarmos na formulação dos princípios
ecossocialistas, necessidade de construir um agenda, fórum para avançarmos no
sentido de derrotar o capitalismo e aperfeiçoar o socialismo etc. Uma carta de
chamamento de oxigenação do pensamento ecossocialismo.

A esperança ecossocialista está nos movimentos sociais. Movimento Sem Terra não
se assume como ecossocialismo, mas há lideranças ecossocialistas, como por
exemplo, o coordenador do MST de Brasília, Alexandre Conceição, que é
ecossocialista e um dos fundadores da Ong Ecos Brasil. Há questões agrícolas com
viés ambiental que o MST participa ativamente como o combate ao transgênico e ao
agrotóxico.

A ecologia associada ao socialismo é, no século XXI, a maior força para se tornar a


fagulha revolucionária para provocar movimento de massa latente, pois a associação
ao socialismo dá à ecologia a força ideológica de alterar o status quo do modelo
hegemônico. Essa visão utópica é que alimenta e anima os militantes ecossocialista a
enfrentar a dificuldades e buscar construir outra sociedade.

O ecossocialismo deve evoluir, avançar no sentido teórico. É necessário ir para outra


etapa, superando a fase de definição filosófica e teorização para uma programatização
do ecossocialismo, isto é, apontar para outras políticas públicas, respondendo como é
a reforma agrária ecossocialista? como é a agricultura ecossocialista? como é a
economia ecossocialista? há algumas pistas, dadas não só pelo ideal intelectual, mas
também por condicionantes da própria da natureza: capacidade de carga do planeta.
O que dá não dá mais para continuar com uma crise que só beneficia 10% da
população em detrimento dos outros 90. A perspectiva das contradições ecológicas
levará a construção de um modelo de base ecológica e socialista, para isso é
necessário construir uma agenda programática

O problema é agenda programática o maior receio é a processo eleitoral da disputa,


essa preocupação é fundada historicamente pela chegada do PT ao governo e no
mesmo processo esquecer o socialismo.

Um ponto importante para o pensamento ecossocialismo é resgatar a filosofia de


revolução permanente de Trotsky.

.
Entrevistado: Roberto Bannwart
Militante histórico, membro do setorial nacional ecossocialista do PSOL e coordenador
do núcleo paulista ecossocialista do PSOL.

Data: 03 de dezembro de 2014

Diálogo:
Primeiramente, gostaria de alertar que falarei sobre o que eu conheço e
vivenciei, podem haver algumas informações que podem fugir, o meu conhecimento
que é mais concentrado no eixo Rio de Janeiro e São Paulo, pois morei e militei
politicamente nesses dois estados. Além do Rio de Janeiro e São Paulo, há outros
estados com bom histórico de militância na política ambiental.
O PT tinha um amplo debate ambiental, mas não explicitamente ecossocialista,
inclusive a direção nacional do PT, na época, não permitiu que nos denominássemos
de ecossocialista o setorial que existia para debater as questões ambientais. Havia
militantes que defendiam o nome Ecossocialismo, mas, o nome permaneceu como
setorial do Meio Ambiente e Desenvolvimento.
Assim, já havia a vontade de conceber o setorial ecossocialista nas décadas
1990 e 2000 no PT. Posteriormente, ocorreu a ruptura, fomos expulsos do PT no inicio
dos anos 2000 porque divergíamos publicamente da formação do primeiro governo
Lula, esse embate ocorreu no interior do partido durante um ano até ocorrer a
expulsão.
Houve duas grandes migrações de militantes do PT para o PSOL, a primeira
ocorreu já nos ano de fundação, 2004 e 2005, e a segunda no processo do mensalão
em 2006 e 2007. O PSOL foi criado no inicio dos anos 2000 herdando a cultura do
debate ambiental pela presença de ex-militantes do PT que tinham histórico do debate
ecossocialista travado no PT nas décadas anteriores, inclusive com militância no
setorial do meio ambiente e desenvolvimento no PT, que é o meu caso, assim havia
um acúmulo de conhecimento e cultura sobre militância ambiental na formação do
PSOL.
Havia uma elaboração teórica e militante interessante na área ambiental que era
travada pelas correntes internas do PT, DS (Democracia Socialista) e FS (Força
Socialista) e também pelo grupo de Marina Silva entre outros.
Muitos desses militantes, com conhecimento acumulado, vieram para o PSOL,
mas o inicio do partido não foi fácil, pois havia uma urgente necessidade de reunir e se
organizar para finalmente conseguir construir o setorial ecossocialista.
Como o PSOL é uma crítica à esquerda da política produtivista e
desenvolvimentista do PT e havia um acúmulo mais radical de conhecimento adquirido
nos debates sobre temas socioambientais dos grupos que estavam fundando o PSOL,
os ecossocialistas oriundos do PT, acreditavam que era possível construir o setorial
ecossocialista no PSOL. Mas, o processo não foi tão simples como o projetado porque
as pessoas estavam dispersas, assim havia inicialmente a necessidade de reorganizar
esse grupo e reaglutinar essas pessoas. Em resumo, o registro do PSOL no TSE foi
em setembro de 2005 e somente em abril de 2011 foi fundado o setorial nacional
ecossocialista no PSOL no primeiro Encontro em Curitiba. Nesse encontro foi definida
a primeira coordenação nacional.
A primeira reunião dos ecossocialistas do PSOL ocorreu durante I Congresso
Nacional do PSOL em 2007 no Rio de Janeiro (UFRJ na praia Vermelha), nesse
encontro, houve um espaço de debate entre os ecossocialistas para construir uma
organização mínima, havia em torno de 30 a 40 pessoas identificadas com a proposta
ecossocialista. Esse foi o primeiro encontro presencial entre os ecossocialistas, até
então, havia diálogo apenas por troca de e-mail, mas a importante herança dessa
reunião foi a definição sobre a fundação do setorial ecossocialista.
A reunião ecossocialista de 2007 foi articulada pelo Paulo Piramba, João
Alfredo, Roberto Bannwart entre outros. Um resultado imediato dessa reunião foi a
criação da Lista Nacional de E-mails dos Ecossocialistas do PSOL. Com a facilidade
de comunicação nacional proporcionada pela Lista, o grupo começou a articular a
criação formal do setorial ecossocialista junto ao Partido.
E, posteriormente o grupo organizou o primeiro Encontro Nacional Ecossocialista
do PSOL em Curitiba em abril de 2011. Nesse encontro, foi definida a primeira
coordenação nacional do setorial, estavam presentes representantes de oito estados e
cada estado definiu seu coordenador para facilitar o diálogo. Os estados presentes na
primeira coordenação nacional do setorial eram: Bahia, Ceará, Espirito Santos,
Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo. Outra
decisão importante foi que ocorreria um encontro nacional dos ecossocialistas do
PSOL a cada dois anos, o segundo encontro foi em maio de 2013 no Rio de Janeiro e
o próximo será em 2015 no Ceará. A atual coordenação foi escolhida no segundo
encontro. A cada encontro, as coordenações são atualizadas e um documento ou
carta é redigido. Esses documentos estão disponíveis no sitio e no blog do setorial
(https://ecossocialismooubarbarie.wordpress.com/).
Em geral, a maioria no PSOL tem sensibilidade ambiental, nenhuma corrente do
PSOL se assume publicamente como produtivista ou desenvolvimentista, mas há
correntes que se empenham mais na construção do programa ecossocialista do
PSOL. O motivo da dificuldade de assumir o ecossocialismo como estratégia de
organização é porque, historicamente, a esquerda revolucionária tinha uma forte
influência do pensamento produtivista ou desenvolvimentista, apesar de diversos
estudiosos, entre eles o Michael Löwy, buscarem nas fontes de Marx e Engels e
conseguirem resgatar várias preocupações ecológicas desses autores.
Enquanto alguns setores do PSOL assumem o ecossocialismo como uma
construção estratégica, há outros que o encaram como uma questão tática porque o
tema está em voga e é uma forma de enfrentamento aos governos e à direita
tradicional, a questão ambiental é um gancho importante na critica radical à situação
atual, porque há um desprezo no tratamento ao tema ambiental tanto pela direita
tradicional quanto pelo governo do PT, haja vista a politica do atual governo federal
para a questão do Belo Monte, Angra III, ampliação da energia nuclear, produção de
energia por hidroelétrica, super exploração dos combustíveis fósseis, crise hídrica, a
falta de investimento nas energias menos poluidoras como eólica, solar, marémotriz,
etc. Nesse quadro, há a oportunidade de fazer uma séria critica aos governos no
campo ambiental.
Importante é que, dentro do PSOL, há um quase consenso de que a questão
ambiental é importante por diferentes motivos, já descritos na entrevista, e há
correntes mais engajadas e outras menos, mas publicamente todos se assumem com
preocupação ambiental. Por exemplo: no debate da reforma do código florestal,
praticamente todos do PSOL, parlamentares, correntes, e militantes entraram em
bloco na luta contra a reforma, mas assumir as pautas ecossocialistas em questões
específicas não garante que todos assumam o programa ecossocialismo na sua
plenitude.
Nesse sentido, o setorial elaborou um amplo programa de governo para
contribuir com as diversas candidaturas do PSOL no país. Uma das questões que
defendemos é o abandono do projeto pré-sal, isto é, a proposta é não haver
investimento na extração do petróleo pré-sal porque defendemos sair da matriz
energética atual e para isso, não só deve-se desmontar as atuais usinas nucleares
como interromper a construção de novas, além de interromper o investimento nos
projetos de grandes hidrelétricas, o investimento deve ser focado nas energias
alternativas.
Mas assumir um programa nesse perfil, como a cultura fóssil está enraizada no
senso comum, é muito difícil. A proposta de chegar na rua e defender que o petróleo
deve fica lá sendo ela uma riqueza e que pode ser usada para investir em eólica, solar
e em marémotriz é uma missão complicada de cumprir, mas devemos fazê-la. Por
isso, há uma necessidade de uma transição de um modelo de desenvolvimento
produtivista para um modelo ecossocialista, sabemos que isso não é feito de um dia
para a noite, nem alguns anos ou até em algumas décadas, é um processo longo e
complexo.
Podemos citar alguns países que esse debate está mais avançado, como por
exemplo, Alemanha, Suíça, Itália etc., onde se tem uma consciência ecológica maior e
um acúmulo mais avançado.
Não é difícil defender o ecossocialismo no PSOL, exemplo foi o ato da Luciana
Genro no dia 01 de dezembro em São Paulo, onde eu fui convidado para falar em
nome do setorial ecossocialismo. O partido já se sensibilizou para a importância do
debate ambiental e da mobilização das forças e parlamentares a favor do meio
ambiente e contra o produtivismo e desenvolvimentismo exacerbado, o próximo passo
será adotar o ecossocialismo como um programa, não só para ganhar eleições, mas
para governar também.
Eu estava na reunião que fundou a Rede Brasil de Ecossocialistas no Fórum
Social Mundial, em janeiro de 2003 em Porto Alegre. A base teórica para essa reunião
foi Manifesto Ecossocialista Internacional. Uma das preocupações era tentar minimizar
os impactos socioambientais do primeiro governo Lula, pois havia um sentimento que
esse governo teria um viés produtivista e desenvolvimentista, mesmo com a Marina
Silva convidada para ser ministra do Meio Ambiente. O único encaminhamento
concreto da reunião de fundação foi a criação de uma Lista de e-mails.
Para nós, ala mais radical, Marina seria como uma “cerejinha no bolo”, pois os
ministérios chave estavam nas mãos de Henrique Meireles no Banco Central, Furlan
no Ministério Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Rodrigues na
Agricultura, e esses nomes indicavam a tendência produtivista do governo Lula e o
papel da Marina era ser um consolo para os ambientalistas.
Mas, desde seu nascimento, a Rede Brasil de Ecossocialistas tinha sérios
problemas, pois nós percebemos que as lideranças estavam usando esse espaço para
fazer propaganda para o governo Lula, a Lista era controlada por Pedro Ivo, que
estava no Ministério do Meio Ambiente, até o momento que ocorre o rompimento da
Marina Silva com o governo e seu grupo saí do PT. Após esse rompimento, Rede
Brasil de Ecossocialistas teve descontinuidade, mas, antes já havia uma crise: com o
passar do tempo, a Rede Brasil de Ecossocialistas foi instrumentalizada para fazer
política interna na disputa de espaço dentro do governo. A situação da Rede
Ecossocialista piorou com a política produtivista do governo Lula, chegando a
ressuscitar projetos do governo militar, que na época não tiveram coragem de
desenvolvê-los, que é caso do Belo Monte e nuclear. Tudo isso fez falir o projeto da
Rede Brasil de Ecossocialistas.
Acreditamos que o projeto Rede Ecossocialista Brasil deve ser resgatado, porém
em outras bases, pois não há como mais resgatar algo que foi feito no período anterior
a experiência do governo do PT, a passagem da Marina no Ministério e as rupturas do
PT, para a construção do PSOL e Rede Sustentabilidade. O momento histórico é
outro, completamente diferente.
Mas a proposta ainda é válida, vide o crescimento do pensamento
ecossocialista, não só por evolução teórica, mas, principalmente porque a atualidade
tem levado as pessoas a terem novas preocupações ambientais, por exemplo, a crise
hídrica em São Paulo, desmatamento acelerado da Amazônia, aquecimento global,
queima dos combustíveis fósseis, expansão do projeto de construção de usinas
nucleares, assim, essa realidade objetiva impõe as pessoas uma preocupação maior
com a questão ambiental, e como há também a preocupação social, fica fácil fazer o
link, pois as minhas preocupações me levam a ser um ecologista e um socialista ao
mesmo tempo, e aí então a palavra e o programa ecossocialista vem como proposta.
A realidade mudou, há alguns anos os ecossocialistas eram como o “patinho
feio”, pois quando se apresentavam como ecologistas no ambiente socialista
revolucionário, o retorno, em geral, era que a ecologia era assunto para o pequeno
burguês urbano de bairros nobres e universitários, não podiam ser socialistas e em
contra partida, quando falava de socialismo para os ecologistas, era encarados como
defensores do socialismo real, modelo soviético.
Mas, essa crise não define que a Rede Brasil de Ecossocialistas não deve ser
retomada, mas, o problema é definir sobre que base será feito?, com quem? Em
minha opinião, a base para isso é fortalecer o setorial ecossocialista do PSOL e
transformar o PSOL em um partido ecossocialista para gerar esta semente. Esse é um
projeto em aberto.
Um novo caminho é envolver ONGs e movimentos sociais. MAB, MTST, MST,
Sindicato da Sabesp, Sindicado dos Químicos de Campinas, pessoas avulsas,
intelectuais etc., para gerar um diálogo. A proposta é a transversalidade, isto é, a
utopia perseguida é que maioria a sociedade encampe esse projeto, ou seja assuma o
programa ecossocialista.
Entrevistado: Gilney Amorin Viana

Militante ecossocialista histórico no Partido dos Trabalhadores, ex-secretário de


Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente.

Data: 05 de dezembro de 2014..

Diálogo:

A pauta proposta para a entrevista foi:

1. Como a corrente ecossocialista está organizada na Organização?


Não existe no PT uma corrente ecossocialista organizada. Existe um grupo bem amplo
de socio-ambientalistas e dentre estes muitos são ecossocialistas. No PT existe o
direito de tendência e se poderia registrar uma corrente interna com esta definição,
mas não existe, formalmente. Contudo, informalmente, existe.
Os ecossocialistas do PT se organizam em torno do Setorial de Meio Ambiente e
Desenvolvimento, que tem status de Secretaria nacional de Meio Ambiente e
Desenvolvimento - SMAD.

2. Qual á oportunidade de desenvolvimento do pensamento ecossocialista na


Organização?
O desenvolvimento do pensamento ecossocialista é totalmente livre dentro do PT.
Este não é o problema, o problema é a potência que os ecossocialistas adquiriram ou
não para influenciar os rumos do PT.

3. Quais são os desafios enfrentados pela corrente ecossocialista na Organização?


Os maiores desafios, penso eu, são:
a) Insuficiência teórica (que atinge não apenas os ecossocialistas do PT, mas a todos
os ecossocialistas);
b) Dificuldade de apresentar propostas políticas para a intervenção do PT, seja a nível
governamental, seja no nível da sua intervenção na sociedade (sindicatos, ongs,
movimentos sociais, etc.); propostas que sejam assumidas pelo PT, pela militância, e
possam influenciar as políticas públicas e a atuação dos movimentos da sociedade
civil;
c) Tratando-se de um pensamento anti-hegemônio (mais que não hegemônico) penso
ser fundamental o debate aberto com o pensamento hegemônico. E isto nós,
ecossocialistas do PT, estamos travando de uma forma débil este debate dentro do
PT, do movimento popular e do Governo.
As razões deste fraco desempenho nosso tem muito a ver com:
1) a contradição de ser partido e ser governo (ou simplesmente estar no governo);
2)a perda de vários quadros que saíram do PT:
3) a burocratização do partido;
4) a ida para instâncias governamentais de muitos militantes; e
5) as dificuldades operacionais da SMAD que, tradicionalmente, fazia o debate dentro
do PT.

4. Qual é a sua avaliação sobre a retomada da Rede Ecossocialista Brasileira?


Acho difícil a retomada da Rede Ecossocialista Brasileira, neste momento. Um passo
precedente e importante seria dado se reorganizássemos a corrente ecossocialista do
PT. É o que estamos tentando, no momento.
Entrevistado: Samuel Maia dos Santos
Militante ecossocialista da Rede Sustentabilidade, membro do Elo Nacional da Rede.

Data: 9 de dezembro de 2014.

Diálogo:
Previamente foi enviada a proposta de pauta para o Samuel Maia para orientar o
diálogo. A pauta enviada foi:
5. Como a corrente ecossocialista está organizada na Organização?
6. Qual á oportunidade de desenvolvimento do pensamento ecossocialista na
Organização?
7. Quais são os desafios enfrentados pela corrente ecossocialista na Organização?
8. Qual é a sua avaliação sobre a retomada da Rede Ecossocialista Brasileira?

O entrevistado enviou as perguntas da pauta da entrevista para o grupo da


direção nacional, em torno de 102 pessoas, para obter contribuições sobre o
pensamento ecossocialista dentro da Rede Sustentabilidade. Para não criar
constrangimento e motivar as respostas espontâneas, foi informado que as respostas
serão base para a próxima do jornal da Rede Sustentabilidade da baixada fluminense
que está prevendo debater o ecossocialismo em seu próximo número, o respaldo para
a seriedade da proposta é que a mensagem foi enviada por um membro do Elo
Estadual e Elo Nacional, o próprio Samuel. Além do e-mail para o grupo do Elo
Nacional, foi também enviada a mensagem com as perguntas para os e-mails
pessoais de algumas lideranças: Bazileu Margarido, Pedro Ivo de Souza Batista,
Gabriela Barbosa Batista, Haldor Omar e Pedro Piccolo Contesini.
O interessante é que as duas únicas respostas não foram de ecossocialistas,
apontaram de uma forma ética seu desconhecimento sobre o tema. O primeiro retorno
foi de Pedro Piccolo, a resposta foi que “como a Rede Sustentabilidade nacional não
terá organização de tendências ou correntes, as pessoas até podem atuar de forma
autoral ou coletiva se agrupar e formular propostas, mas a Rede não quer vivência
essa experiência como PSOL e PT, que tem diversas correntes defendendo suas
teses, mas seria interessante você perguntar ao Júlio Rocha, Pedro Ivo e a Gabriela o
que eles pensam sobre esse tema”, esses três são identificados dentro do partido
como ecossocialistas, principalmente após a publicação do livro Crise Ambiental e o
Ecossocialismo. A resposta de Bazileu foi que “não tinha base teórica para responder
as questões e não conhecia nada sobre o tema, mas há outros companheiros que
podem conversar sobre isso”. Interessante é que as pessoas que se autoproclamam
ecossocialistas e já fizeram o trabalho teórico sobre isso ficaram em silêncio total.
Como o Pedro Piccolo repetiu a resposta no e-mail do grupo nacional, o Samuel
provocou os três através do grupo nacional, Gabriela Batista, Júlio Rocha e Pedro Ivo,
com a pergunta “Quais são as contribuições que podemos dar para o debate sobre
ecossocialismo?” e nunca houve resposta para essa provocação. Assim, o jornal da
Rede na Baixada terá outro tema em seu próximo número.
A situação atual é que a Rede Sustentabilidade tem pessoas que defendem o
ecossocialismo como eu (Samuel Maia), Márcio Sales Saraiva entre outros, mas o
momento político e o processo eleitoral e pós-eleitoral, os atuais confrontos na arena
política com tentativas de desestabilizar o governo do PT por setores mais extremados
à direita, que estão defendendo o Impeachment do governo eleito e até mesmo a volta
da ditadura, provoca nesses setores, que formulam propostas ecossocialistas, um
recuo por temer que uma postura mais radical, ao defender esse tipo de tese, possa
levar ao isolamento, porque há um ataque frontal a tudo o que vislumbre uma proposta
socialista, pois há um discurso claramente conservador reacionário de caça a quem
defende o socialismo ou qualquer outra proposta de rompimento com atual modelo de
produção capitalista.
Percebi que há um recuo na defesa de uma força mais enfática a tese
ecossocialista, isso não acontece no PT e no PSOL e nem comigo, jamais deixarei de
falar que o ecossocialismo é a oportunidade de uma revisão do marxismo e da velha
esquerda, outros atores da Rede estão recuados diante desse embate que continuou
pós-eleição, outro motivo do recuo é a necessidade de facilitar o diálogo e alianças
com diversos setores da sociedade para a Rede conseguir as 100 mil assinaturas em
janeiro, e assim poder em fevereiro de 2015 efetuar seu registro.
O ingresso da Heloisa Helena na direção nacional e na executiva nacional e a
saída do Sirkis do projeto Rede, ele deve continuar no PSB, sinaliza que a Rede
poderá ter um posicionamento mais à esquerda, pois a figura pública após a Marina
tende a ser a própria Heloisa, por sua história e envergadura. Esse momento histórico
sinaliza também que o posicionamento da Marina de apoiar o Aécio será
contrabalanceado pela entrada da Heloísa na Executiva Nacional da Rede
Sustentabilidade. O embate tende ser facilitada porque elas são amigas, dialogam
bem, mas com posições diferentes, por exemplo, na Executiva Nacional, a Heloísa
defendeu o “voto nulo” no segundo turno de 2014. Nesse sentido, acredito que
ocorrerá a política do “pêndulo” para aos poucos definir que socialismo é desejável
pelo partido, se é o ecossocialismo ou outro caminho mais histórico trotskista
(influência de Heloísa Helena, que tem sua origem na DS). Se a opção da Heloísa for
retomar sua origem trotskista, esse movimento facilitará seu diálogo com
ecossocialistas do partido e setores que tentaram levar para campanha da Marina
mais para esquerda, pois a campanha teve um comportamento de centro-direita.
Quando alguns setores afirmam que não são nem de direita nem de esquerda,
por um lado exige que essa corrente se posicione qual a linha e perspectiva história
assumida por estes. Mas por outro, há também uma coerência, pois tenta se distanciar
da atual direita extremada que pede o retorno da ditadura militar e impeachment da
Dilma e ao mesmo tempo se mantém distante da esquerda que se comporta como
autista, que afirma que nada aconteceu e que essas acusações estão inseridas em um
grande golpe da direita. Mesmo assim, esse grupo tem que definir a tese que defende,
pois ao lançar uma proposta econômica está também defendendo um modelo de
sociedade, como será instituída a renda e a oportunidade. Afinal quando se posiciona
quem não é A e nem B, mas afinal, o que é o C; e a falta de dessa definição é a
grande crise que esse setor vive, pois eles querem ser o novo, mas defendendo o
quê?
Acredito que posso falar por ser uma pessoa que participo de movimento social,
e de debates sobre o que achamos sobre a radicalização da democracia, então, por
exemplo: fui eleito delegado nacional Controle e Transparência Social nos espaços
públicos na conferência organizada pela CGU e também, houve várias teses
aprovadas na Conferência Nacional de Transparência e Controle Social apontam para
uma nova política, por exemplo: as decisões do dia a dia, mais importante na vida das
pessoas, sejam utilizadas ferramentas tecnológicas para que as pessoas possam
avaliar como será afetada a vida das pessoas na cidade, o que vai afetar e como, as
ferramentas serão importantes como ferramenta de decisão da população sobre o que
será feito e impactado na vida. Hoje há ferramenta tecnóloga que permite isso.
Assim, entendo que essa participação popular deve ser radicalizada, porque o
atual modelo de representação de eleger os vereadores em uma cidade e depois
esses mesmos vereadores assumem todo o processo legislativo e fiscalização sem
nenhum diálogo com a sociedade. Esse modelo distanciou o parlamento da
sociedade, o que leva a sua perda de representação deste em relação à sociedade.
Baseado nessa análise, foi proposta a mudança dessa representação na Conferência,
a representação da sociedade deverá ter outros canais, representação real da
sociedade, como conselhos ou movimentos, em suma, canais que aproximem as
pessoas dos processos decisórios da sua vida. Assim também nas outras esferas, isso
aponta para uma nova política de representação, que supera o modelo atual.
O modelo econômico defendido pela Rede é a sustentabilidade econômica,
sustentabilidade nas áreas da questão cultural, na questão social, produtiva, esse é o
discurso, mas qual é a base teórica que será utilizada? O atual modelo liberal? Ou é
um novo modelo econômico? Onde a relação de produção é solidária e a gestão de
recursos naturais limitados seja incorporada nessa produção? Eduardo Giannetti que
faz esse debate no interior da Rede e é identificado em uma linha liberal e outros
como Bazileu, que faz esse mesmo debate sob ótica macroeconômica em uma linha
mais ao centro ao tentar mediar o mercado e justiça social e por outro lado, o
Martiniano Cavalcante que vem de uma escola trotskista e faz essa discussão mais
focada da questão do socialismo, assim, não há hoje uma teoria econômica que a
Rede defenda com clareza de como se dará a nova relação de produção econômica
sustentável nessa sociedade que vivemos hoje, na verdade nesse momento, ainda se
busca, dentro da Rede, construir um consenso qual é o modelo que o partido irá
defender. Se for analisar o programa de governo da Marina Silva defendia, não era o
modelo que era debatido nos fóruns da Rede, gerando até momentos de crise interna
na Rede, onde várias pessoas saíram da Direção Nacional da Rede porque não ficou
claro que rumo está sendo traçado pelo programa. O principal ponto questionado foi
que as decisões sejam horizontais, e na campanha algumas decisões foram fechadas
pelo grupo que cercavam a Marina sem consulta aos demais do grupo Elo Nacional,
isso criou uma crise tremenda que tem reflexo até hoje com desligamento de algumas
lideranças, de representação do movimento social, da Rede Sustentabilidade.
Hoje, não há clareza qual é o modelo econômico e como se dará o alicerce
desse modelo econômico que a Rede defende, há teses gerais, isto é, queremos uma
sociedade sustentável, mas qual é o modelo? Uma sociedade de baixo carbono, mas
qual é a troca do modelo de produção do atual para o modelo de baixo carbono? Para
isso é necessário injetar recursos para a indústria e para o setor de serviços para que
eles possam se adequar a economia de baixo carbono, mas esses recursos virão de
onde? Serão feitos de que maneira? Há várias questões que estão em aberto e aí
nesse sentido há setores mais progressistas, ligados ao movimento social, que vem
fazendo esse debate no seio desse movimento social porque esse debate de uma
nova política não é só da Rede, ele vem de outros setores que surgem em 2011 no
Movimento Nova Política que tem vários setores, que não eram só pessoas da Rede
Sustentabilidade, nesse grupo estavam Cristovam Buarque, Eduardo Suplicy,
Alessandro Molon, isto é, vários setores discutindo o que seria uma nova política para
o Brasil, a Rede acabou canalizando vários pensadores desse movimento, porém não
é o único.
O embate será mais forte na direção nacional da Rede e a ida da Heloísa para a
direção nacional deixará claro quais serão as propostas, a direção nacional afirma que
não haverá nem correntes ou tendências, mas se observar a composição pode-se
identificar grupos mais organizados que se formam na direção, eu sou um dos poucos
que foi para o Elo Nacional sem acordo de corrente, mas pelo trabalho de construção
da Rede e por posicionamento diferenciado no Rio de Janeiro por estar localizado fora
da capital do estado, e também ser o único do Elo Estadual que não está na capital.
O projeto Rede Sustentabilidade ficará mais claro a partir da reunião do final de
semana de 13 / 14 de dezembro de 2014, quando haverá a oficialização do ingresso
da Heloísa Helena e organização do Primeiro Congresso do Partido, mas
teoricamente, será amplamente debatido no próximo ano, quando o partido for
legalizado e começar ter os debates. Um momento chave para o partido será a
Conferência Nacional da Rede que ocorrerá junho de 2015, quando será apontado o
caminho das teses para fechar a formulação teórica do partido. Certamente que esse
debate terá pessoas independentes defendendo o socialismo dentro de uma
expectativa ambiental, mas há dúvida se haverá capacidade de formular uma tese
comum? e qual é o modelo de sociedade ecossocialista que queremos? Essas
questões serão debatidas em um processo de disputa interno que nos levar a uma
definição até o ano que vem.
Os documentos de fundação do partido, Manifesto e Estatuto, deixam
possibilidades de voo solo, isso criar oportunidade das pessoas fazerem militância
autoral, inclusive prevê que 30% das candidaturas sejam de pessoas que não militam
na Rede, para isso, basta assinar um documento se comprometendo que caso sejam
eleitos defenderem as teses que a Rede defende. Essa proposta visa um eleitorado
que acredita no candidato avulso. Como não há como ser candidato sem partido, essa
opção é um mecanismo para atrair possíveis candidatos que não gostariam de estar
filiados em partido a entrarem na Rede nessa perspectiva. Assim, a Rede
Sustentabilidade defende as candidaturas avulsas na reforma política.
O Ecossocialismo na Rede Sustentabilidade tem na indefinição de projeto para o
partido um espaço de disputa política. Considerando que o apoio da Marina ao Aécio
provocou uma nota de consenso pelo Elo Nacional, que debateu a possibilidade de
voto em nulo ou em Aécio sem declarar, porém, o grupo mais próximo da Marina com
o Walter Feldman como porta voz, antecipou e declarou apoio ao Aécio. Mas, essa
antecipação de definição sem fechamento de acordo provocou um e setor mais a
esquerda do Elo fizeram um documento, Nota Paralela, chamando para o voto nulo
acirrando o conflito entre as lideranças da nacional.
Esse conflito prosseguirá até a Conferência Nacional da Rede em junho de 2015,
quando será definido o rumo do partido, isto é, qual será o projeto que defendido pelo
partido, mas há um sério risco de que o setor derrotado não deseje continuar no
partido, pois para criar o partido, houve um leque muito amplo de associados e com
grande diversidade ideológica.
Em relação à Rede Ecossocialistas Brasil há o debate do combate ao monopólio
teórico e prático do ecossocialismo. A questão de determinados partidos ou
segmentos monopolizarem o pensamento de um segmento sempre levou essa linha
de pensamento para isolamento. Então quando se pensa na questão do
ecossocialismo, surge uma revisão do pensamento marxista clássico, na verdade
buscando desenvolver uma nova leitura e ampliar esse leque e esse movimento não
se pode reduzir a determinados partidos ou numa federação e confederação, que
restringirá o reconhecido a um determinado núcleo dirigente. Esse modelo mostrou
que não avança, então a partir do momento que abre para a possibilidade de todos
aqueles que se identificam com as teses do ecossocialismo terem um espaço de
debate, essa rede ficará mais ampla. Concordo com esse encaminhamento porque é
uma resposta às ideias da direita, que também tem os mecanismos de formulação e
teorização espalhados, não há uma centralidade, os formuladores da política
conservadora estão organizados em vários segmentos e, inclusive, com fracionamento
entre eles, para fazer o contraponto em relação ao pensamento conservador, a
esquerda não pode ter uma centralidade maior, deve respeitar as culturas
diferenciadas.
A participação da Rede Sustentabilidade na formulação da Rede Ecossocialismo
dependerá da proposta hegemônica no Congresso de julho. Mas como será o primeiro
congresso, apesar dos possíveis tensionamentos, terão muitas definições e
concessões e nesse debate, haverá duas figuras marcantes, que serão a Marina Silva
e a Heloísa Helena, elas dialogam bem, mas terão momento de tensionamento. Após
o congresso é será possível identificar o caminho da Rede Sustentabilidade, a atual
situação do partido está mais favorável ao campo da Heloísa pelo desgaste que a
Marina teve com o seu apoio ao Aécio e a insatisfação que esse posicionamento
gerou na Rede, esse quadro favorece ao movimento de contraponto representado pela
Heloísa, que tenderá a levar a Rede para mais a esquerda.
A Rede Sustentabilidade busca construir uma nova política, mas o desafio de
construir essa nova política é que ela é feita pelos velhos políticos isto é, militantes
que vieram da velha tradição, PT, PSTU, PSOL, PSDB e que trazem para as relações
internas a escola que tiveram, então é muito difícil driblar essas culturas,
principalmente porque essas se mantêm nas estruturas que já tinham antes, mas
agora organizados dentro da Rede.
Entrevistado: Mauricio Cortines Laxe
Advogado e Ecólogo, militante ecossocialista histórico no Partido dos Trabalhadores.
Coordenador do Programa de Revitalização da Bacia do São Francisco, do Ministério
do Meio Ambiente.

Data: 16 de dezembro de 2014.

Diálogo:
A pauta enviada foi:
9. Como a corrente ecossocialista está organizada na Organização?
10. Qual á oportunidade de desenvolvimento do pensamento ecossocialista na
Organização?
11. Quais são os desafios enfrentados pela corrente ecossocialista na Organização?
12. Qual é a sua avaliação sobre a retomada da Rede Ecossocialista Brasileira?

O diálogo:

O setor ecossocialista do PT conseguia influenciar nas ações do Ministério do Meio


Ambiente no inicio do mandato da Marina Silva, no período de 2003 a 2006, quando
houve uma aposta no modelo de gestão coletiva. Porém, após esse período, houve
um refluxo dessa realidade quando ocorreu uma cisão no Ministério entre o grupo da
Marina e os ecologistas históricos do PT. O “marinismo” surgiu nesse processo para
diferencia dos demais ecologistas no partido, muitos ecomarxistas. Nessa cisão, a
maioria dos ecologistas históricos do PT deixou o ministério ou assumiram funções
secundárias no Ministério. Esse conflito já tinha sido previsto nos primeiros debates
entre os ambientalistas no PT e na elaboração do manifesto em 1991: o embate entre
os ecossocialistas e os ecocapitalistas, nesse sentido, o ingresso dos marinistas no
PSB e o apoio desse grupo ao Aécio Neves no segundo turno da eleição de 2014,
coloca o grupo marinista no campo ecocapitalista.

A herança deixada pelos marinistas no PT prejudicou os ecossocialistas no partido


porque os ecologistas ficaram estigmatizados e criou rejeição de algumas lideranças
em relação aos ecologistas. Apagando algumas vitórias ecossocialista no partido,
como a inclusão da palavra Sustentabilidade nas diretrizes básicas do partido, ficou
“Socialismo, Democracia e Sustentabilidade”, conquista pela intervenção de Gilney
Viana.
Esse processo causou mais perdas ao ecossocialismo, pois algumas lideranças
optaram por “carreira solo”.

O grupo ecossocialistas do PT ficou desarticulado até a Rio+20. Houve a atividade


“Ecossocialismo e a Sustentabilidade Paradigmas ecopoliticos” Balanço e Perspectiva
do Ecossocialismo promovido pela ONG Ecos Brasil com a participação de
representantes do PT, PSOL e PSTU. Após a plenária, os militantes do PT fizeram
outra reunião com o objetivo de organizar o resgate do ecossocialismo no PT.

Na última eleição para a direção da Secretaria do Meio Ambiente, havia três


candidatos e de uma forma inédita, os três com propostas ecossocialistas. Mas, houve
um problema no processo da última eleição para a Secretaria do Meio Ambiente e
Desenvolvimento porque houve um acordo entre as chapas para dividir o mandato
entre dois gestores, o primeiro foi o Júlio Barbosa que cumpriu o mandato de um ano e
meio, porém, quando o segundo gestor, Geraldo Abreu de Minas Gerais, não pode
assumir a secretaria porque a Direção Nacional não aceitou o acordo e destituiu o
secretário, mesmo com a aprovação da proposta em plenária. Rui Falcão, presidente
do partido, agendou para o dia 14 de janeiro de 2015, a plenária para eleger o próximo
secretário, assim, até essa data, a Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento
estará desativada, a sua última atividade foi o debate “O Ecossocialismo e as Eleições
2014” que ocorreu no dia 8 de abril de 2014.

Não houve apenas retrocesso na área ambiental no partido, a área social também
sofreu retração com o enfraquecimento da práxis socialistas do partido e a pouca
atenção aos movimentos sociais e participação social. A visão desenvolvimentista do
governo federal explica o desmonte ecológico no partido e crises socioambientais e
retrocessos como nos casos da PL 215, Código Florestal, Mineração, poucos
resultados na politica Climática, falta de investimento em energia alternativas (falta
marco regulatório). Assim, o Partido perdeu a capacidade de se apresentar como
diferencial para a sociedade. Perante essa fúria produtivista, a capacidade de
intervenção dos ecologistas no partido e no governo fica muito limitada.

Atualmente, os ecossocialistas estão isolados, principalmente com a perda do


mandato do ecossocialista Fernando Ferro.

Mesmo com essa realidade adversa, o coletivo ecossocialista avançou e tem se


mantido ativo. O coletivo ecossocialista já desenvolveu três atividades:
 Debate “O Ecossocialismo e as Eleições 2014”
 Elaboração do documento Balanço e Perspectivas do Ecossocialismo
 Elaboração do documento A Ecologia, o Ecossocialismo e as Eleições 2014 de
apoio a Dilma.

A retomada da Rede Ecossocialista Brasileira deve superar o desgaste do anterior,


deve ser um Fórum ou uma Frente e, necessariamente deve ir além dos partidos
políticos. Nesse caso é fundamental o ingresso de ONGs e Movimentos Sociais na
organização. A Rede Ecossocialista Brasileira teve um inicio promissor, com
representantes em São Paulo, Pernambuco, Ceará e Rio Grande do Sul, mas não
evoluiu, não houve reuniões presenciais e nem virtuais após 2007, a Rede morreu “por
inanição”. O título Rede é perigoso por confundir com a Rede Sustentabilidade, por
isso, a proposta de ser um Fórum. O novo modelo deve ser mais aberto de estrutura
partidária, deve agregar todos os sonhadores da construir a sociedade ecossocialistas.

O ecossocialismo deve construir propostas pragmáticas, respostas, na perspectiva


ecossocialista, para a vida real: economia, reforma agrária, agricultura, energia, saúde.
O pensamento e a ideologia ecossocialista têm muito a se construir. Há também a
necessidade de rever o próprio socialismo com novas interpretações e aplicações das
obras de Marx, Trotsky, Gramsci para fortalecer o pensamento ecossocialista do
século XXI.

A transição e construção da sociedade ecossocialista é um tema necessário, afinal a


corrente ecossocialista deve ter a resposta para “Cheguei no poder e agora?”. A
questão é como transformar o ecossocialismo em um processo revolucionário de base
social?

Outro desafio é a educação e a cultura, para formar uma humanidade ecossocialista.


Um ponto é a inclusão do olhar dos vencidos e das responsabilidades do cuidado
socioambiental a partir da educação básica.

A democracia que se busca é a plena, isto é, a democracia participativa associada à


representativa deve ser. Outro ponto é romper com o poder caótico da superestrutura
com seus paraísos fiscais, bancos etc.

Uma proposta ecossocialista da ONG Ecos Brasil, que será apresentada no próximo
ano, é a limitação para, no máximo, de três mandatos.
Entrevistado: João Alfredo Telles Melo
Advogado e Ecólogo, militante ecossocialista histórico no Partido Socialismo e
Liberdade, parlamentar ecossocialista, foi deputado federal e estadual pelo Ceará,
atualmente exerce o mandato de vereador pela cidade de Fortaleza.

Data: 8 de janeiro de 2015. .

Diálogo:

Arlindo: Como para você o ecossocialismo está organizado no seu partido, o que o
partido facilita nesse debate, o que o partido cerceia e por último, qual é a sua
avaliação sobre a Rede Brasil de Ecossocialistas?

João Alfredo:

Acho que o PSOL tem algumas vantagens em relação à questão de abordar o


tema ecossocialista, primeiro porque uma das principais, senão a principal, referência
internacional, que é o caso do Löwy, embora não seja filiado formalmente, ele já se
declarou ser PSOL, ele é uma referência muito forte dentro e fora do PSOL por seus
livros, seus artigos, seus textos, suas palestras, suas frequentes vindas ao Brasil.
Suas reflexões animam muito o debate interno da questão do ecossocialismo. Eu
colocaria o Löwy com esse patamar de importância, por ser a referência teórica,
âncora do pensamento, da reflexão ecossocialista no mundo e com impacto
evidentemente no Brasil.

O segundo aspecto, que é importante ressaltar, antes de entrar na parte mais


organizativa, é o fato de que, mesmo com limitações, a Luciana Genro assumiu o
programa Ecossocialista na campanha. Nós, inclusive, fizemos uma agenda
importante para ela aqui, no Ceará, que é onde foram lançadas as bases para o
programa. Nós estivemos numa área muito impactada que é a área do Complexo
Industrial e Portuário do Pecém, onde tem uma série de atividades extremamente
poluidoras, ligadas a utilização de carvão mineral, portanto com alto grau de emissão
de CO2, que são as termoelétricas, uma siderúrgica construída e uma refinaria que
ainda está como projeto, e que tem removido uma população importante, isto é, tem
deslocado uma população indígena daquela região, que são os Aracê, importante
ressaltar que nós estivemos nessas áreas com a candidata. Eu acho que isso de
alguma forma norteou um pouco o debate e as posições dela, embora ela não tenha
histórico de participação e debate nesta questão. Ela teve muita abertura para o
pensamento ecossocialista e praticamente delegou ao setorial a elaboração dessa
parte do programa e também, vale destacar o fato de que ela esteve reunida com o
Greenpeace e assumiu também algumas bandeiras importantes levantadas pelo
Greenpeace. Acho que esse é o segundo aspecto importante.

O setorial perdeu, há mais de dois anos, um de seus principais animadores, o


Paulo Piramba, que inclusive o setorial ecossocialista do partido o homenageia com o
seu nome. Mas outras pessoas assumiram e aí, é importante destacar de uma forma
muita especial, o camarada Alexandre Araújo Costa do Ceará, ele é um físico com
doutorado na ciência climática, Ciência do Clima; inclusive, ele faz parte também do
painel de mudanças climáticas. Ele tem um blog "o que você faria se você soubesse o
que eu sei", que tem animado muito esse debate, suas reflexões são voltadas para a
questão climática e, agora também, para o debate sobre os recursos hídricos.

Eu acho que pontes importantes com muitos movimentos foram estabelecidas na


campanha presidencial de 2014, entre essas pontes estão a Rede Brasileira de Justiça
Ambiental e a Articulação Antinuclear Brasileira. Aqui no Ceará, nós temos o caso da
segunda usina de urânio no Brasil, a primeira é a de Caetité na Bahia, a segunda é a
Tataia no município de Santa Quitéria. Há um movimento forte contra essa construção
e nós temos uma forte presença nesse debate.

Temos também envolvimento na luta contra os agrotóxicos. Além dessas frentes,


no norte do país, os ecossocialistas estão envolvidos nas lutas contra as grandes
barragens, na defesa dos povos indígenas, por isso acredito que temos uma boa
presença nas lutas socioambientais. Inclusive aqui, no caso específico do Ceará, a
campanha do Ailton, que foi candidato a governador, assumiu como um eixo de sua
campanha o ecossocialismo, até porque essa questão está relacionada à crítica ao
modelo de desenvolvimento do grande capital que está voltado a essas indústrias
intensivas de consumo de água, de carvão e de alta emissão de CO2, isso com
impactos sociais e ambientais, justiça ambiental.

Nós temos um setorial ecossocialista e acredito que ter o setorial é positivo e


negativo no seguinte aspecto, temos uma dificuldade organizativa, isso é um fato, mas
não sei se o motivo é o tamanho do Brasil, não sei se é pela nossa própria fragilidade
enquanto partido, pela nossa quantidade de militantes, mas creio que carece de uma
melhor organização.

Mas temos feito bons encontros. Os encontros têm apresentado bons debates,
resoluções importantes para o interior do partido. Acho que o setorial é um setorial
vivo, com todas as dificuldades que todos os setoriais têm, mas eu acho que ele é
importante. O setorial ecossocialista no Ceará, de certo ponto de vista, é um dos mais
vibrantes, um dos mais atuantes.

Quais seriam as dificuldades que eu encontraria mais no partido. Eu acho que


tem uma dificuldade, que não é do PSOL só, que é da esquerda de um modo geral:
ela está presa a um determinado paradigma de socialismo desenvolvimentista, isso aí
é fato. Acho que nem todos no partido conseguiram incorporar visão ecossocialista,
isso fica muito claro no debate sobre o pré-sal, há uma dificuldade muito grande dos
parlamentares e dos nossos dirigentes serem mais incisivos com a crítica da utilização
da matriz de energia da matriz fóssil. É muito claro que é difícil travar o debate acerca
dessa política compensatória, por exemplo, a utilização dos recursos do pré-sal para a
saúde e para a educação e, principalmente em estados que são extratores de
petróleo. Pode-se observar, por exemplo, os nossos parlamentares do Rio que tem
tido, muitas vezes, boas reflexões, projetos e pronunciamentos importantes na área do
ecossocialismo, vamos dizer assim, mas apresenta dificuldade no enfrentamento da
questão do petróleo. A esquerda, ela é, de um modo geral, muito produtivista, isso é
fato. Claro que isso vai também se encontrar dentro do partido. Talvez a nossa
corrente, a Insurgência, seja a que tem mais participação, mais reflexão, mais ação
nessa área e, portanto, mais crítica com relação a esses rumos no próprio partido.

Arlindo: Um ponto muito debatido é a formulação teórica, você trouxe a presença


sempre constante do Michel Löwy, mas há outros autores, como o Bellamy Foster, por
exemplo.

João Alfredo:

Sim, além do Bellamy Foster, temos o Kovel, outros autores latino americanos,
como <<Não consegui entender o nome>>, que tem um livro importante sobre o tema,
há também Jorge Riechmann na Espanha. O Foster tem seu livro A Ecologia de Marx,
que é um clássico, além de boas reflexões, artigos mais conjunturais que permitem
uma intervenção mais no dia-a-dia, mais conjuntural do que propriamente somente a
reflexão teórica. No Brasil, José Correa Leite também tem escrito sobre isso, na área
de mineração, o Carlos Bittencourt no Rio tem trabalhado também nessa perspectiva,
e o Beto Bannwart tem atuado mais na área anti-nuclear.

Eu acho que a nossa revista foi um produto muito rico, porque ela traz o debate
ecossocialista de uma forma bem ampla, pegando a questão urbana, a questão
nuclear, agrotóxicos, justiça ambiental, populações tradicionais, a contribuição de
Braguinha, que trabalha com a questão das populações tradicionais na Bahia, assim,
eu acho então, que temos uma boa reflexão.

O que eu sinto falta é uma ação mais organizada, isto é, o conjunto do partido,
sua direção, seus parlamentares para tornar o partido ecossocialista, pois não somos
um partido ecossocialista, nós temos um setorial ecossocialista, mas nós não somos
um partido ecossocialista. Isso aí ainda é uma lacuna, uma falha muito grande na
nossa base teórica e, consequentemente, na nossa ação política. Existe uma abertura,
mas falta incorporar a cultura ecossocialista, tanto é que quando se ler qualquer
documento que sai no início do ano ou no final do ano do diretório, pode-se observar
que o tema mudanças climáticas não está presente nos documentos. O que acontece,
por exemplo, na questão da água, há uma crítica que deve ser feita evidentemente
sobre a irresponsabilidade dos governos tucanos, do Alckmin, principalmente, mas
uma abordagem sistêmica que possa ver desde problema do desmatamento da
Amazônia, que causa um impacto muito grande na diminuição de chuvas em todo
continente sul-americano, à destruição das margens dos rios e das nascentes não são
abordados de uma forma sistêmica.

Acredito que falta uma formação em ecologia, porque um sujeito para ser
ecossocialista, precisa ser verde e vermelho, precisa ser verde no sentido de que ele
tenha incorporado em sua reflexão e na sua ação, a questão ecológica, a
compreensão das dinâmicas ambientais, o ciclo de vida do carbono, da água, etc.,
portanto, é preciso compreender a relação da sociedade humana com seu entorno da
natureza, para que essa perspectiva tenha corte de classe, um corte socialista, assim
para que tenha uma visão humanista radical no sentido de que possa buscar a
superação desse problema, procurando conciliar a igualdade social, com a
sustentabilidade. Assim, se afastando do capitalismo verde, ou até mesmo um certo
fascismo verde que existe, anti-humanista, mas tem que ter a reflexão ecológica. Falta
isso, a esquerda faz belas análises da questão estrutural da sociedade, do ponto de
vista da economia, do ponto de vista da dívida pública, do ponto de vista das relações,
da questão do desemprego, etc., mas falta a base da economia que é a ecologia, que
não entra nesse debate.

Há uma preocupação justa, correta e adequada, do ponto de vista da questão do


desemprego pela crise da indústria automobilística, mas essa indústria é altamente
insustentável em todos os aspectos. A visão do automóvel individual, tanto com
relação ao problema do consumo de combustíveis fósseis, mas também da
inviabilização do direito da mobilidade nas grandes cidades, isso precisa ser levado
em conta. Nós não podemos achar, unicamente, que temos que defender sempre
essa política de redução de impostos pra garantir os empregos, pois há também altos
lucros e remessa desses lucros para as matrizes da indústria automobilística. Eu acho
que falta uma formação nessa área, nós somos bons economistas na esquerda, temos
uma boa formação dos nossos dirigentes e parlamentares na economia política, mas
falta a ecologia política, é isso que eu sinto, é disso que eu me ressinto.

Arlindo: Quais são os grandes desafios na área urbana hoje?

João:

Olhando aqui em Fortaleza, que já está entre a quarta e a quinta cidade do país,
do ponto de vista da visão ecossocialista, há problemas imensos, são tão grandes
quanto essas cidades estão. O problema de abastecimento de água, São Paulo já
sinalizou isso de uma forma muito forte, nós aqui no Ceará temos um problema grave,
porque as três grandes indústrias sedentas de água que estão no polo industrial do
Pecém, a termoelétrica que funciona, a siderúrgica que está em construção e a
refinaria que está em projeto, elas três juntas irão consumir 95% do que consome a
população da cidade de Fortaleza, sendo que a fonte dessa água, que é o açude
Castanhão, construído sobre o leito do rio Jaguaribe, vem do mesmo canto. Então
esse conflito da água, que São Paulo trouxe de forma bastante aguda, eu acho que é
um problema grave. O problema do lixo, dos resíduos sólidos, você tem aí essa
pressão dos municípios para que as medidas no plano da Lei do Plano Nacional de
resíduos sólidos não viessem a ser adotadas, poucas cidades têm uma política de
separação e de reciclagem, reuso, reutilização, redução do seu lixo, dos seus resíduos
sólidos, esse é um problema grave.

O problema da moradia, que acaba se juntando com o problema das nossas


áreas protegidas, das nossas áreas verdes, unidades de conservação, praças,
parques e jardins. É um problema grave na medida em que não há uma boa política
de moradia ou há atendimento sem nenhum critério socioambiental. Quando você tem,
por um lado, a apropriação da paisagem urbana, as melhores áreas próximas às áreas
verdes, pelo capital imobiliário e, por outro lado, a população mais pobre vivendo em
áreas de risco, nesse quadro uma política habitacional tem que levar em conta isso.

Há também um problema grave que é a mobilidade, que está tendo uma


resposta interessante hoje em São Paulo e também aqui em Fortaleza, com toda
crítica que eu tenho a essa gestão, que é uma gestão ecocida e historicida – também
e aí tem o aspecto do nosso patrimônio histórico tão pouco protegido –, tem ampliado
muito aqui as áreas para o tráfego de bicicleta também através da construção de
muitas ciclofaixas e também de corredores exclusivos para os ônibus. Então, eu acho
que nesse aspecto, a mobilidade, pela situação de quase estrangulamento que
chegou, passou a ter uma atenção importante dos governos nos últimos tempos.

Agora, evidentemente, como política urbana, se ela não tiver articulada no global
com a política rural, o problema da migração vai continuar. O tema da reforma agrária
é um tema para o campo, mas também para a cidade, e uma reforma agrária que seja
popular como o MST fala, mas também que seja uma reforma agrária ecológica, uma
reforma agrária que possa trabalhar numa perspectiva de sustentabilidade,
perspectiva de respeito à biodiversidade, ligada à questão da agroecologia, da
questão do combate aos agrotóxicos.

Finalmente, tem, talvez a mais importante, a questão das energias. O que


deveria ser uma revolução energética esbarra evidentemente nos interesses do
grande capital, seja porque há um investimento pesado nas térmicas, nas hidrelétricas
que impactam as populações indígenas, florestas, populações tradicionais, seja
porque se está ainda investindo num país como nosso em energia nuclear. Nesse
sentido, a “bola da vez” aqui, como já disse, está na mina de Tataia.

Até o caso das chamadas energias renováveis, que poderia ser algo positivo,
mas como está submetido aos interesses do capital, acaba causando impactos sociais
muito fortes. No nordeste no Ceará, há especificamente o problema das eólicas, como
elas estão ligadas a grandes multinacionais, construtoras ou geradoras de energia,
seus parques eólicos estão sendo construídos sobre dunas, sobre comunidades de
pescadores e índios do nosso litoral, provocando privatização as praias e dunas. Essa
privatização dos recursos naturais provoca uma natural resistência dessas
comunidades às energias eólicas. A política energética deveria ser descentralizada,
onde, nas casas nas comunidades, nas repartições públicas, nas universidades, nas
empresas, tivesse em cima de cada uma delas uma placa solar e um “cata-vento”
eólico desses, mas o que há, são os grandes parques eólicos. A mesma lógica serve
para as hidrelétricas, pois, ao invés de estar estruturada por pequenas barragens – a
ideia de pequenas barragens é mais sustentável –, a lógica atual é a construção de
grandes barragens.

Ao invés da descentralização dos cata-ventos, das torres eólicas para atender a


população no local de moradia e trabalho, há grandes usinas eólicas vinculadas ao
sistema de transmissão e que, portanto, acaba entrando na mesma lógica do capital. É
um problema grave porque, se por um lado diminui a emissão de CO2, por outro lado
acaba trazendo outros impactos sociais e ambientais.

Deveria ter um processo em grande escala de barateamento coordenado por


uma estatal de energias renováveis no Brasil, que ela pudesse, por exemplo, trabalhar
articulado com o programa “minha casa minha vida” e implantar uma placa solar
nessas casas junto com o cata-vento e deixar de depender de uma rede central,
libertando esses setores das multinacionais que dominam hoje a distribuição de
energia no Brasil, essa proposta exemplifica o porquê não é possível desvincular a
questão ecológica da questão social.

Por um lado, o socialismo produtivista perde a perspectiva ecológica, por outro


lado, alguns ecologistas, que não tem essa compreensão, essa abordagem socialista,
acabam sendo ingênuos, nesse sentido, essa reflexão não considera os capitalistas
verdes, pois esses têm visão política para isso, defendem a lógica do capital
conscientemente, estou falando de uma parte do movimento que acaba sendo ingênuo
por não perceber que até mesmo na questão ecológica tem uma disputa de classes
entre os ecocapitalistas e os ecossocialistas.

Faltou falar de algum ponto?

Arlindo: Faltou falar sobre a Rede Brasil de Ecossocialistas

João Alfredo:

Essa está precisando existir, a figura do Pedro Ivo e a quem ele está ligado
talvez seja a chave para compreender o que ocorreu com a Rede Brasil de
Ecossocialistas, durante um momento nos anos de 2003 a 2006.
Quando estávamos todos no PT, a figura da Marina Silva era a catalizadora
desse processo, mesmo com suas contradições, ela fazia que, mesmo tendo algumas
divergências, houvesse a tentativa de construção de algo mais amplo.

A grande dificuldade da Rede Brasil de Ecossocialistas foi o “Big Bang” que foi o
governo Lula: nós estamos no PSOL, Pedro Ivo, na Rede ou PSB e o Laxe e Gilney,
no PT. O desafio é como “juntar esses cacos”, acredito ser difícil, pois exigiria um grau
de esforço de unidade imenso em função do tamanho de divergências.

Um exemplo é a Marina, que é uma pessoa que tenho uma relação de respeito
muito grande, mas nos últimos anos, ela caminhou para direita de uma forma
impressionante. Nesse caso, a minha hipótese é que somente o ressentimento com o
PT pode explicar o fato da adesão dela ao PSB e ao Eduardo Campos, considerando
o que representou o governador Eduardo Campos em Pernambuco do ponto de vista
socioambiental, e, depois, inclusive apoiar o Aécio no segundo turno. Assim, Marina
rompeu e queimou todas as pontes com setores médios que ainda acreditavam nela
como referência ecológica, mesmo considerando que ela nunca foi ecossocialista.
Usando o conceito de Ecologismo dos Pobres ela migrou da justiça ambiental para o
capitalismo verde, o que o Alier chama do evangelho ao credo da ecoeficiência.

No PT, gosto do Gilney e do Laxe, mas a gestão ambiental do PT é um desastre,


a gestão da Izabella Teixeira é um desastre. Para ilustrar, houve recentemente a
declaração de Kátia Abreu que nos últimos dias havia pessoas dizendo que ela se dá
mal com a ministra Izabella, e essas pessoas estão erradas. Para Kátia Abreu,
Izabella é o céu, pois ela recua tudo para atender ao agronegócio e à indústria, isto em
um governo que coloca a Kátia Abreu dona de “títulos”, como a miss desmatamento, a
motosserra de ouro, inimiga dos índios e a parlamentar que foi uma das principais
articuladoras para acabar com o código florestal. Na atual realidade do governo do PT,
fica difícil entender como essas pessoas, Laxe e Gilney, possam fazer processos de
resistência. As concessões que elas abrem são muito grandes.

Hoje, a grande dificuldade é envolver uma pessoa que possa assumir o papel de
ser um ponto de unidade, um catalisador desses elementos tão diferentes e articulador
de um programa em comum, que junte, esses grupos. Essa é, em minha opinião, a
grande dificuldade.

Nós já temos dificuldades em nossos partidos, sendo que as que as dificuldades


dos petistas, considerando que Laxe e Gilney continuam sendo ecossocialistas, são
muito maiores que as nossas, que estamos no PSOL. Outra dificuldade é que eu não
sei como o Pedro Ivo – que é uma pessoa que quero muito bem, foi padrinho de um
dos meus casamentos, um amigo de mais de trinta anos – consegue conciliar a visão
ecossocialista dele com as posturas da Marina.

Acredito que uma pessoa que pode assumir esse papel de articulador seja o
próprio Löwy, por ser uma pessoa que mora fora, pela história dele e pelo respeito que
todo mundo tem dele, ele teria seria o mais indicado para fazer essa “congregação”.

Essas dificuldades são imensas para essa Rede, mas para ser retomada,
alguém tem que “colocar a mão na massa”. Infelizmente, no meu caso, tenho muita
dificuldade para assumir essa função, pelo fato de ter um mandato municipal, que me
exige muito, e do próprio setorial, além das atividades acadêmicas. O difícil, mas
necessário, é ter alguém profissionalizado que possa fazer esse papel de articular
essas diferentes posições. Não acho que seria de todo ruim, acho difícil, muito difícil, é
uma tarefa de Sísifo.

Arlindo: Qual é a sua opinião sobre a Rede Brasil de Ecossocialistas trabalhar com os
movimentos sociais, MTST, MST, MAB, Rede Brasil de Justiça Ambiental, nesse caso,
o Laxe poderia participar como representante da ONG ECOS Brasil, assim, como
Pedro Ivo e a Gabriela como representante da Alternativa Terrazul, mas eles não
podem participar em nome dos partidos PT e Rede respectivamente, pois seus
partidos não tem um setorial ecossocialista organizado. Mas, a essência da proposta é
amplia, a Rede para além dos partidos.

João Alfredo:

Nesse caso, a Rede Brasil de Ecossocialistas estaria assumindo o movimento


social, essa alteração deve ficar clara, pois há uma troca de situação, pois o
ecossocialismo está muito ligado à visão política, que se organiza dentro dos partidos
e suas correntes. É possível integrar com uma série de movimentos sociais, e
integração com outras redes, como a Rede Brasil de Justiça Ambiental. Essa Rede é
importantíssima, pois une muitos movimentos no Brasil, como anti-nuclear, mineração,
agroecologia, etc.. Nessa proposta, seria um outro formato, pessoalmente tenho
dúvida porque como ela vai atuar, no nosso caso vamos atuar dentro do nosso partido,
mas ela vai ser um movimento social ou será misto? Essa questão precisa ficar mais
clara, para podermos entender como funcionaria. Não tenho clareza, nenhuma.

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