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Órgãos sociais e vinculação das sociedades comerciais  A)Quanto ao número de titulares: falamos de órgãos singulares

- Quando vimos os tipos de sociedades, especialmente as sociedades ou órgãos plurais ou coletivos. Os singulares são compostos por
por quotas e a sociedade anónima, falamos um pouco sobre os órgãos apenas um indivíduo, enquanto que os plurais, obviamente,
sociais, especialmente para explicar sobre a distribuição de terão a composição de mais sujeitos (é o caso das assembleias,
competências societárias; - Agora cumpre aprofundar um pouco nesse conselhos, comissões, etc.);
domínio, oferecendo uma perspectiva mais alargada de cada órgão e  B)Quanto às funções (uma classificação mais didática, pois
das suas competências específicas, assim como de como interagem permite compreender melhor a estutrura interna):
entre si; - Esse estudo é fundamental para compreendermos as deliberativos, de administração, representativos e de
relações internas da sociedade e a distribuição de competências que fiscalização ou de controle.
irão fundamentar a vinculação da sociedade nos atos externos.  1.Deliberativos: são órgãos que formam a vontade da
1.Noção de órgãos sociais – sociedade, aprovando diretrizes fundamentais que deverão ser
A ideia de órgãos sociais está diretamente ligada à ideia de acatadas pelos outros órgãos;
personalidade coletiva; - Como é obvio, as pessoas coletivas não têm  2.De administração (também chamados executivos ou
vontade própria, quando muito, pode-se falar num interesse coletivo diretivos): são os que praticam os atos materiais ou jurídicos de
que as orienta e que não é o interesse individual de um dos seus execução da vontade da sociedade, ocupando-se ainda da
membros, mas objetivamente, um interesse comum de todos; - Mas gestão;
como definir esses interesses e com expressar concretamente a  3.Representativos: manifestam a vontade da sociedade perante
vontade? - Os órgãos sociais existem para suprir essa necessidade: eles terceiros, ou seja, externamente, normalmente através da
irão formar, manifestar e executar a decisão empresarial nos seus constituição, modificação ou extinção de relações jurídicas que
diferentes quadrantes - de forma estrutural e na forma de gestão. tenham a sociedade como sujeito;
Podemos defini-los como as entidades, ou núcleos de atribuição de  4.De fiscalização ou de controle: são os que verificam a
poderes que integram a organização interna da sociedade, através dos conformidade da atividade dos outros órgáos com a lei e os
quais ela forma, manifesta e exerce a sua vontade de pessoa jurídica; - estatutos, denunciando as irregularidades que descubram.
Se recordarmos o que vimos quando estudamos os tipos de Vejam que as funções de administração e representação são muitas
sociedades, resulta evidente que nas sociedades de pessoas os órgãos vezes combinadas, sendo algo artificioso tentar separá-las. Vejam o
sociais estarão estruturados de forma mais simples, enquanto nas art. 192.º , n.º 1, quanto à competência dos gerentes, e o art. 405.º ,
sociedades de capitais (sobretudo por conta da tutela do crédito e dos n.º 1 e 2, ambos do CSC. - Portanto, o que proponho é uma
sócios minoritários, e mesmo do interesse público relativamente às classificação mais simples, reduzida a três tipos de órgãos que tem em
sociedades cotadas) resulturá uma estrutura mais complexa; - A conta atribuições intrínsecas (não excluem outras funções em
estrutura, a competência e o funcionamento dos órgãos sociais irão sobreposição, a variar conforme o tipo de sociedade):
depender fundamentalmente dos comandos legais, assim como do  1 Legislativo ou deliberativo (aprovação de contas de exercício
que determina o estatuto social quanto ao que se aproximam ou se e alterações ao contrato);
afastam dos das normas dispositivas.  2. Executivo (que congrega administração e representação);
2. Classificação dos órgãos sociais  3. Sindical (que deve auditar as contas da sociedade e negócios
Entre vários critérios possíveis para estudarmos os órgãos sociais, jurídicos assinalados pela lei, como é o caso das fusões, cisões
iremos propor essencialmente dois: ou incorporações).
sociedades em nome coletivo. Vejam o art. 214.º , assim como as
3. Órgãos dos vários tipos de sociedades ressalvas do art. 215.º.
– As estruturas dos órgãos sociais irão variar enormemente de acordo - A primeira coisa que salta aos olhos quanto a estrutura de órgãos
com o tipo de sociedade; sociais das sociedades anónimas é que a lei procurou dar às SA, do
- Vejam, por exemplo, os órgão sociais das sociedades em nome ponto de vista da organização interna, uma pluralidade de órgãos
coletivo, que possuem apenas assembleia geral (arts. 189.º e 190.º) e sociais com esferas de competências delimitadas de modo muito mais
gerência (art. 191.º e ss.); rigoroso do que nos outros tipos de sociedades.
- Essas sociedades não tem órgão de fiscalização. - Embora a assembleia geral, onde se encontram os sócios, os
- Aos sócios da sociedade em nome coletivo já é garantido um amplo “proprietários” da sociedade, continue a ser visto como o órgão
acesso à informação, conforme o art. 181.º do CSC, portanto, são eles supremo da corporação, não lhe cabe gerir ou representar: está aqui
a exercer as funções de sindicância das contas; coroado o primado da separação entre propriedade e controlo;
- Além disso, a responsabilização subsidiária em relação à sociedade e - Um dos traços de continuidade que a reforma societária de 2006
solidária entre eles faz com que tenham os incentivos corretos para o preserava em relação à versão originária do CSC prende-se com a
desenvolvimento dessas tarefas; existência de modelos de governo, designados, na terminologia do art.
- As sociedades em comandita tem gerência (art. 470.º) e assembleia 278.º como modalidades de estruturação da fiscalização e
geral, (art. 471.º), sendo que os sócios comanditados (de administração
responsabilidade ilimitada) não podem ter menos de metade dos - A referida pormenorizada estruturação dos órgãos de administração
votos; e fiscalização foi acolhida nos termos do art. 278.º , a que se deve
- Quanto à fiscalização destas sociedades, aplicam-se as normas que somar a assembleia geral;
regem as sociedades anónimas (ou seja, obrigatoriamente terão de ter - Em qualquer desses modelos haverá sempre assembleia geral
um órgão de fiscalização), conforme o art. 478.º. Entretanto, aos (embora no modelo germánico as suas competências sejam
sócios comanditados é garantido um amplo direito à informação (art. reduzidas):
480.º), da mesma forma que é garantido aos sócios das sociedades em A) Modelo clássico - assembleia geral, conselho de administração e
nome colectivo conselho fiscal;
- Já nas sociedades por quotas há um movimento no sentido em se B) Modelo anglo-saxónico - assembleia geral e conselho de
privilegiar mais a fiscalização externa das contas, evidenciando o seu administração (que compreende uma comissão de auditoria, art.
caráter híbrido entre sociedade de pessoas e sociedade de capital; 423.º-B, n.º 1);
- A sociedade por quotas tem portanto assembleia geral (art. 248.º e C) Modelo germânico - assembleia geral com funções reduzidas ou
ss.) e gerência (art. 252.º e ss.), mas a lei faculta-lhes, através de redimensionadas, conselho geral e de supervisão (que fiscaliza o
previsão no contrato social, a existência de um conselho fiscal, como conselho de administração e nomeia os seus membros) e conselho de
órgão fiscalizador, nos termos do art. 262.º , n.º 1; administração.. Artigo 278.º - Estrutura da administração e da
- Mas, caso se verifiquem as circunstâncias do n.º 2, será obrigada a ter fiscalização
um Revisor Oficial de Contas; 1 - A administração e a fiscalização da sociedade podem ser
- Obviamente que se não houver um órgão de fiscalização, a função estruturadas segundo uma de três modalidades:
será exercida pelos sócios, que também têm amplo acesso às a) Conselho de administração e conselho fiscal;
informações da sociedade da mesma forma como acontece nas
b) Conselho de administração, compreendendo uma comissão de excluído que os sócios deliberem sobre matéria de gestão, embora
auditoria, e revisor oficial de contas; c) Conselho de administração essa seja uma competência da gerência;
executivo, conselho geral e de supervisão e revisor oficial de contas. - No entanto, diz o art. 373.º n.º 3 que sobre matérias de gestão da
sociedade anónima, os accionistas só podem deliberar a pedido do
órgão de administração. Essa indicação automaticamente aponta a
competência dos administradores.
Os modelos actualmente previstos podem ser assim caracterizados: - Como se escolhe então o melhor modelo para os órgãos sociais de
- Modelo tradicional, também chamado clássico (ou latino), administração e fiscalização?
compreendendo conselho de administração (ou administrador único) e - Há que ter em conta a profundidade de avaliação do desempenho
conselho fiscal (ou fiscal único); societário (sobretudo, quanto ao processo de preparação e de
- Modelo anglo-saxónico, também chamado monista, que inclui aprovação dos documentos de prestação de contas) e o escrutínio
conselho de administração, comissão de auditoria e revisor oficial de sobre actos de potencial conflito de interesses (ou seja, transacções
contas; entre partes relacionadas fora das condições de mercado ou outros
- Modelo germânico, também chamado dualista, postulando a aproveitamentos privados de benefícios do poder societário);
existència de conselho de administração executivo, conselho geral e de - Desde essas funções, os modelos de governação previnem, em grau
supervisão e revisor oficial de contas. Em sociedades de grande variável, os desvios em relação aos interesses típicos dos accionistas,
dimensão e em sociedades emitentes de valores mobiliários admitidos os comportamentos oportunistas e as simples ineficiências de
à negociação em mercados regulamentados, o conselho geral e de funcionamento.
supervisão deve incluir uma comissão para as matérias financeiras. - Na mesma medida, irão servir também à gestão societária, tendo em
- Daqui vemos claramente o seguinte: conta a complexidade crescente da actividade financeira das
as sociedades anónimas devem ter sempre órgão(s) de fiscalização, sociedades; Vamos ver cada um desses modelos com alguma atenção:
mas com modelos bastante diferentes; - Primeiro, temos que destacar que as sociedades anónimas irão ter
- São as variações nas estrutura de fiscalização, e numa medida menor, sempre um órgão de fiscalização;
uma variação na influência da assembleia geral (relativamente ao - Enquanto nas sociedades por quotas o conselho de fiscalização é
modelo dualista), que irão pautar os diferentes modelos; facultativo, podendo a sua função ser desempenhada pelos próprios
- Trata-se de uma forma que tem implicações decisivas na distribuição sócios (até porque tem muito mais direitos de informação e podem
dos poderes dentro da sociedade. deliberar sobre matérias de gestão), na sociedade anónima a função
Isso porque irá interferir directamente no processo decisório, ou no de fiscalização será sempre realizada por um órgão autónomo
que eu gosto de chamar: a formação da decisão empresarial. relativamente ao órgão de administração, embora tenha roupagens
- Como isso ocorre? diferentes conforme cada um dos três modelos
Ora, o modelo de governo afeta o processo decisório da sociedade, - No modelo tradicional, também chamado clássico, porque até o CSC,
condicionando a medida de influência dos administradores executivos, em 1986, foi a única estrutura organizatória disponível em Portugal,
dos accionistas (dominantes, qualificados ou minoritários) e dos temos o conselho de administração e o conselho fiscal;
membros de órgãos de fiscalização; - Note-se que esse modelo é muito popular por conta da possibilidade
- Vejam que o art. 259.º , referente à sociedade por quotas, diz que os de ter administrador único e fiscal único no caso de sociedades com
gerentes devem respeitar as deliberações dos sócios, ou seja, não está capital social até 200 mil euros, cf. art. 278.º , 1, a), 2, 413.º , 1, a), 4,
414.º , 1, 2;
- Se tiver fiscal único, este deve ser um ROC, no caso do conselho - Os órgãos são compostos por pessoas, que atuam como seus
fiscal, deve constar um ROC não sócio, ou se optar-se pela variante titulares, nos termos dos artigos 162.º e 164.º do CCiv;
qualificada do modelo tradicional, poderá haver um ROC externo a - Nada impede que uma pessoa coletiva seja sócia de uma sociedade,
este conselho, e aí o conselho fiscal não precisa de ser composto por podendo ser titular de um órgão da mesma;
um; - A titularidade materializa-se através da designação de um titular de
- Ou seja, na variante do modelo tradicional qualificado, temos dois um órgão de representação ou de um mandatário da sócia pessoa
órgãos de fiscalização: o conselho fiscal e o ROC, sendo a variação coletiva titular de um órgão;
obrigatória em alguns tipos de sociedades: arts. 278.º , 3, 413.º , 2, a)). - Mas esta regra, embora válida para a Assembleia Geral, não irá valer
- O modelo anglo-saxónico, também chamado monístico, assim para o Conselho de Administração: os administradores devem ser
chamado pelo seu predonímio nos Estados Unidos, foi introduzido com pessoas físicas:
a reforma do CSC de 2006; - Vejam quanto aos gerentes em nome coletivo, art. 191.º , n.º 3, os
- O monismo seria uma referência à comissão de auditoria estar das sociedades por quotas, art. 251.º , n.º 1, e também com o cargo de
integrada no conselho de administração e composta por pelo menos administrador, art. 309.º , n.º 3, e 425.º n.º 6, al. D) e membro do
três administradores e ROC - arts. 278.º , 1, b), 423.º-B, 446.º; conselho geral e de supervisão (art. 434.º , n.º 3).
- Ou seja, os membros da comissão de auditoria tem necessariamente - A única exceção é quanto ao conselho fiscal das sociedades anónimas
de ser membros do conselho de administração; ou por quotas, em que se admite que a titularidade seja de uma
- A comissão, no entanto, guarda autonomia relativamente ao sociedade de advogados ou de revisores oficiais de contas (arts. 414.º
conselho, e a estes administradores é vedado o exercício de funções e 262.º do CSC);
executivas na sociedade, art. 423.º-B, 3. - Por que acham que é assim?
Além disso, há um outro órgáo de fiscalização, que é o ROC. - Vejam que o propósito da lei foi o de prestigiar a responsabilidade
- Por fim, o modelo germânico, também referido por dualista, deve ter, individual, inclusive porque os administradores estão sujeitos à
a par do conselho de administração executivo (ou do administrador responsabilidade penal (art. 509.º);
único), conselho geral e de supervisão (composto por pessoas - Além disso, é uma forma de privilegiar a formação e o talento
singulares com capacidade jurídica plena, sócios e/ou não sócios) e individual para o desempenho das funções;
ROC (não sócio) - arts. 278.º , 1, c), 434.º , 446.º; - Alienar o direito à designação dos admitradores para uma outra
- É o modelo que até recentemente era o único disponível na sociedade (pois este seria o efeito prático) constituiria também uma
Alemanha, embora lá o conselho geral e de supervisão também tenha indício de ilicitude, pois o interesse social estaria exposto, além de uma
elementos eleitos pelos trabalhadores; clara usupação de poderes aos acionistas.
- Apenas para dimensionarmos a importância do Conselho Geral e de - A lei não proibe que seja eleita uma pessoa coletiva para um cargo de
Supervisão nas sociedades em que o adotam, vejam o art. 441.º do administração nas sociedades anónimas, mas obriga que quando assim
CSC, e 442.º , .º 1; for, a pessoa coletiva eleita designe uma pessoa singular para exercer
- São designados pelo contrato, ou pela assembleia geral, conforme o as funções, e este sujeito é que incorpora todas as responsabilidades e
art. 435.º , n.º 1. poderes pessoalmente.
O mesmo se passa relativamente aos administradores do conselho de Ou seja, não é mero representante daquela, embora a pessoa coletiva
administração, art. 391.º. torne-se solidariamente responsável com o designado;
4. Titulares dos órgãos
- Vejam que as funções de administração e representação não estão - Portanto, podemos dizer que a relação entre a sociedade e cada um
reservadas aos sócios, podendo haver pessoas estanhas à sociedade a dos titulars dos seus órgãos tem natureza contratual:
ser designadas para as mesmas. é um contrato inominado e atípico, que se rege pelas regras do
A exceção é a sociedade em comandita, em que a administração é mandato, e que é formado, por parte da sociedade através da
reservada aos sócios comanditados; - Mesmo a sociedade em nome manifestação da vontade aquando da eleição, e por parte do
coletivo admite que os gerentes não sejam sócios (art. 191.º , n.º 2), administrador ao aceitar a designação, de forma expressa ou tácita;
sociedade por quotas, art. 252.º , n.º 1; - A livre destituição é importante para que a dinâmica empresarial não
Mas nas sociedades anónimas, a função de membro do conselho geral seja prejudicada, no entanto, a lei protege os administradores quando
e e supervisão é reservada aos sócios, sem dúvida porque o órgão a mesma seja feita sem justa causa.
substitui a assembleia geral em muitas das suas funções de - Já vimos a questão da destituição dos gerentes ou administradores.
deliberação. Para os gerentes, aplica-se o art. 257.º , n.º 7, e para os
administradores, o art. 403.º , n.º 3.
5. Vínculo dos administradores
- Muito se discute sobre o vínculo dos administradores com a 6. Designação
sociedade; - A forma de designação irá variar conforme o tipo de sociedade;
- Em verdade, não existe uma relação de trabalho: - Nas sociedades em nome coletivo, em princípio os sócios são todos
não há dever de subordinação, nem devem cumprir com ordens, nem gerentes, conforme o art. 191, n.º 1 e 2, a não ser que haja convenção
estão estipuladas (ao menos não é habitual) o cumprimento de um em contrário no contrato social. Vejam que podem ser gerentes,
certo número de horas de trabalho por semana; apenas alguns deles, ou um deles;
- Se não são trabalhadores, então como poderiam ser qualificados? - Também é possível designar gerente um não sócio, mas para tanto,
- O entendimento dominante na doutrina e na jurisprudência, com será preciso deliberação unânime dos sócios; - Nas sociedades por
apoio na nossa lei, é que a relação jurídica entre o administrador e a quotas, segundo o art. 262.º , n.º 1, os gerentes são designados no
sociedade, embora não se baseie rigorosamente num contrato de contrato de sociedade ou posterirmente eleitos pelos sócios
mandato, está todavia sujeita às regras deste contrato. - Já nas sociedades anónimas, como vimos, os administradores e
- É o que sugere o n.º 1 do art. 987.º do CCiv., norma do regime geral membros do conselho geral e de supervisão, quando houver modelo
do contrato de sociedade, e que portanto, aplica-se tanto às germánico, podem ser designados no contrato social ou eleitos pela
sociedades civis como às sociedades comerciais: “Aos direitos e assembleia geral (art. 391.º , n.º 1, e 435.º , n.º 1);
obrigações dos administradores são aplicáveis as normas do - Os membros do conselho de administração executivo (exclusivo do
mandato”; modelo germánico), são designados pelo conselho geral e de
- E o mesmo resulta do art. 1156.º , do CCiv.: “as disposições sobre o supervisão ou designados pelo contrato (art. 425.º).
mandato são extensivas, com as necessárias adaptações, às - Lembram-se do que dissemos sobre o conselho geral e de
modalidades do contrato de prestação de serviços que a lei não regule supervisão? Ele é designado no contrato ou eleito pela assembleia
especificamente.” geral, mas depois acumula muitos poderes de deliberação que seriam
- Efetivamente, a relação entre o administrador e a sociedade tem sem da assembleia geral, como o de designar e demitir os administradores
dúvida analogia com o contrato de prestação de serviços, já que nela executivos.
não existe a subordinação jurídica que caracteriza o contrato de Portanto, o legislador viu a necessidade de introduzir um parâmetro de
trabalho e visa a prestação à sociedade de uma actividade de gestão. equilíbrio para proteção dos sócios minoritários.
E foi o que fez através do art. 392.º e 435.º , n.º 3); 8. Natureza jurídica e responsabilidade dos órgãos da sociedade
- É uma manifestação do chamado princípio da proteção das minorias. - Vamos falar agora um pouco sobre a questão de como são vistos
juridicamente os órgãos sociais e como são responsabilizados;
7. Regime de incompatibilidades dos administradores - A questão é importante porque a sociedade é uma pessoa coletiva, e
– Há um regime que impõe restrições aos administradores de modo a temos de perceber quem será responsabilizado no caso de haver
evitar conflitos de interesses e resguardar a sua independência; ilicitudes:
- Já falamos brevemente disso, vamos ver agora os dispositivos que a sociedade ou as pessoas que agiram por ela?
disciplinam as incompatibilidades; O que vocês acham?
- Primeiramente, quanto à função de membro do conselho fiscal, ou de - Nós temos duas teorias.
fiscal único das sociedades anónimas (arts. 414.º-A e 446.º , n.º 3, a) A teoria da representação diz-nos que os órgãos da pessoa coletiva
aplicáveis às sociedades por quotas, mercê do art. 262.º , n.º 5). são apenas representantes desta e, como tais, conservam uma
Quem pode ler o art. 414.º-A? individualidade jurídida distinta da pessoa jurídica.
- Vejam que quem fiscaliza a sociedade obviamente não a pode - Por aqui, a vontade e os atos do representante seriam expressão da
administrar porque teria uma tendência natural em justificar as suas sua própira identidade e apenas os seus efeitos, mercê de uma relação
decisões de modo passional; de mandato, se projetariam na esfera jurídica da pessoa coletiva
- E mesmo no modelo anglo-saxónico que tem um conselho de representada: separação entre o ato jurídico e seus efeitos.
admininstração composto por auditores, estes estão proibidos de Natureza jurídica e responsabilidade dos órgãos da sociedade
exercer funções executivas. b) Teoria organicista: para fazer frente à teoria da representação,
- De forma assemelhada, os administradores propriamente ditos temos a chamada teoria orgânica ou organicista;
também estão sujeitos a diversas limitações. Vejamos os arts. 397.º , - Aqui, os órgãos da pessoa coletiva identificam-se com ela, fazem
428.º , 445.º , n.º 1); parte integrante da sua estrutura constitutiva e, por consequência, a
- Além de não poderem obviamente exercer atividade concorrente vontade que exprimem e os seus actos são diretamente imputados à
com a da sociedade (arts. 254.º , e 398.º), proibição válida para pessoa jurídica.
gerentes e administradores, os administradores de sociedades Os atos e os efeitos jurídicos são da sociedade.
anónimas ainda estão proibilidos de exercer funções emergentes de - As diferenças entre as teorias estão ligadas ao que distingue o
contrato de trabalho, durante o período para o qual foram designados, mandato da representação:
art. 398.º , 1; vejam que o mandante, que outorga o mandato, pode sempre
- Vejam que não pode exercer função emergente de contrato de substituir-se ao mandatário Se o mandatário não executar o ato, o
trabalho, mas pode obviamente ser administrador de outras mandante pode chegar-se a frente e fazê-lo, o que na representação
sociedades. não pode ocorrer.
Por que então a limitação quanto ao contrato de trabalho? - O mandato nasce de um ato unilateral do mandante, vontade
- Por fim, os membros do conselho geral e de supervisão, um bocado individual, enquanto que a representação surge da vontade social, ou
na mesma linha de incompatibilidades impostas aos membros do seja, dos sócios que compõem a sociedade.
conselho fiscal, não podem ser membros do conselho de - Depois, quanto à origem, o mandato não exige aceitação, equanto
administração executivo, art. 437.º , n.º 1. que a representação ou designação do membro do órgão de
administração contribui com o seu próprio voto para se constituir
nessa titularidade.
- O mandato está pensado para conferir poderes para a prática pelo - O problema nunca esteve nos atos lícitos, mas sempre nos atos
mandatário de atos jurídicos (art. 1157.º do CCiv.), mas os titulares dos ilícitos praticados pelos representantes;
órgãos de representação da sociedade não se limitam a apenas - E entre os ilícitos, ainda se discutia entre os de incumprimento
praticar atos jurídicos, mas necessariamente desempenham atos de obrigacional (claramente a recair sobre a sociedade), e os de ilícito
gestão técnica, económica e financeira. extracontratual ou delitual propriamente ditos, porque discutia-se se a
- Depois, no mandato o mandante está subordinado às instruções do pessoa coletiva poderia existir para a prática de atos ilícitos, que não
mandatário, enquanto que na representação não existe essa poderiam ser compreendidos como dentro do seu objeto, e portanto,
subordinação; fora da sua capacidade de gozo. - O raciocínio era o seguinte: como a
- Por isso, com base nesta teoria organicista, não podemos dizer que prática de atos ilícitos não poderia ser incluída atribuições dos
os gerentes ou administradores sejam mandatários dos sócios - não administradores, a sociedade não poderia ser responsabilizada.
são; - O que fez mudar esse raciocínio foram outros dois princípios
- O comerciante em nome individual pode ter um mandatário, jurídicos: o primeiro é o de que ao poder acompanha a
conforme prevê o código comercial; responsabilidade, traduzido em latim ubi commoda ibi incommoda;
- Mas nas sociedades comerciais não se fala em mandato, mas em - O segundo é o da segurança no comércio jurídico: se não se
representação através da titularidade dos órgãos sociais. responsabilizasse a sociedade, gravíssimas consequências quanto à
E não é representação dos sócios... é da sociedade. Lembrem- se, a segurança das transações seriam colocadas em causa; - Como isso foi
sociedade é que é uma pessoa coletiva. resolvido no regime legal?
- Agora, vocês podem pensar, “está muito bem essa questão - Primeiro, o art. 165.º traz a regra da responsabilidade das pessoas
doutrinária, mas qual a relevância prática?” coletivas pelos atos e omissões dos seus representantes, fazendo uma
- Para responder a essa questão, peço que vocês imaginem quem deve equiparação com o regime das comissões:
ser responsabilizado, por exemplo, uma uma decisão empresarial que os comitentes respondem pelos atos dos comissários (cfr. Os arts.
resulta num sério dano ambiental: 500.º - no que toca à responsabilidade por factos ilícitos - e 800.º - a
o administrador ou administradores que tomaram a decisão, ou a respeito da responsabilidade atos lícitos, ambos do CCiv.).
sociedade comercial? No direito das sociedades a mesma regra é a que já vimos, ou seja, a
- Pelo mandato, não poderíamos responsabilizar o mandante. Mas do art. 6.º , n.º 5.
pela representação, podemos responsabilizar a sociedade.
- Vejam o que diz o art. 6.º , n.º 5, 10. Orgão de administração e representação
- Depois da sociedade arcar com a responsabilidade, pode haver uma - Vamos falar sobre a gerência ou administração das sociedades:
ação social para apurar se o administrador actuou de acordo com os perceber melhor as suas funções, poderes, quem pode ser titular
seus deveres legais; desses órgãos, também ver se a sociedade pode ter administradores e
- No entanto, externamente, a sociedade deve arcar com as mandatários em simultâneo, além de compreender os deveres dos
consequências vindas das decisões dos seus órgãos. titulares.
10.1 Funções
9. Responsabilidade da sociedade por atos dos seus órgãos - Já vimos que a relação do administrador com a sociedade é de
- Já vimos que n.º 5 do art. 6.º coloca a responsabilidade da sociedade conteúdo contratual, sendo equiparada a uma prestação de serviços.
pelos atos dos seus órgãos, mas essa é uma solução recente. A sociedade atua através dos seus órgãos, e são estes órgãos que a
A questão só foi pacificada com o código civil de 1967. representam verdadeiramente, agindo através dos seus titulares;
- Vejam que não é só uma questão de terminologia, temos de ter - Vejam que estes poderes são os anunciados pelo art. 259.º do CSC
cuidado com os títulos jurídicos que damos aos sujeitos pois cada um para as sociedades por quotas, e artigos 405.º e 406.º para as
acarreta um regime diferente; sociedades anónimas.
- Lembram-se do que dissemos sobre o mandato, por exemplo? - Visto isso, os poderes que constam desse art. 406.º são um rol
Não podemos considerar o administrador como um mandatário exaustivo, ou são só exemplos dos poderes dos administradores, o que
porque daí não poderíamos responsabilizar a sociedade por atos deste. acham?
- Mas nas funções de gerir e representar não pode haver uma - Podem surgir situações que não estão aqui, mas em que eles terão
vinculação absoluta da sociedade: tendo em conta os números 1 e 3 de agir para manter a sua prestação de gerir e representar.
do art. 6.º do CSC, os atos sociais que se revelem contrários ao fim Aliás, a representação é uma função exclusiva dos administradores,
lucrativo, salvo previsão legal, estão sujeitos à nulidade; como diz os arts. 405.º , n.º 2 e 408.º.
- Quais seriam então precisamente os limites das funções dos - Duas observações antes de avançarmos para ver quem pode ser
administradores? titular de um órgão de administração:
- Quanto ao objeto social, o n.º 4 do art. 6.º não restringe a 1ª: numa estrutura anglo-saxónica (art. 278.º , n.º 1, al. B) as funções
capacidade da sociedade comercial, embora crie para os órgãos sociais de administração competem ao conselho de administração que é
a obrigação de não os praticar, ou seja, não podem praticar atos fora composto por administradores executivos e não-executivos.
da capacidade, mas se os praticarem, serão válidos e eficazes como Os não executivos são os que compõe a comissão de auditoria, e a eles
forma de proteger os terceiros de boa fé; é que cabe a função de fiscalizar a sociedade, cabendo, no entanto, e
- Portanto, as funções de gestão e representação estão vinculadas à isso é muito importante, a função de exame das contas da sociedade a
capacidade da sociedade (atos que não contrariem o fim lucrativo), um ROC, conforme o art. 446.º
sendo que são válidos e eficazes os que contrariem o objeto social, 2.ª Nas sociedades anónimas de estrutura germánica (art. 278.º , n.º
mas os administradores poderão ser responsabilizados no caso de 1, al. C) opera-se uma redistribuição de poderes, lembram-se?
haver ilicitude. - A assembleia geral ainda existe, mas perde algumas atribuições para
10.2 Poderes o Conselho Geral e de Supervisão, que também assume as funções de
- As competências dos administradores não são apenas as de fiscalização;
administrar, ou administrar e representar apenas. - Trata-se de um órgão verdadeiramente híbrido: fundamentalmente
Cercear as suas liberdades seria o mesmo que limitar o alcance do será um órgão de deliberação (art. 441.º , als. A e b) e de fiscalização
potencial de exploração da empresa; (arts. 432.º e 441.º , als. D) e ss.), mas também terá alguns poderes de
- Por isso, tendo em conta a capacidade da sociedade e o objeto controlo da gestão (que seriam da assembleia geral), representação
social, os administradores devem poder realizar todas as operações interna da sociedade (art. 441.º , als. c) e q), e 443.º), mas sem poderes
sociais ligadas ao exercício da empresa; de gestão e representação externas (art. 442.º , n.º 1) - afinal, alguma
- Se formos considerar que o contrato de sociedade tem dois fins coisa tinha que restar ao Conselho de Administração executivo
segmentados: exploração da empresa (fim imediato) para produção e 10.3 Titulares dos órgãos de administração
distribuição de lucros (fim teleológico ou mediato), a prestação dos - Quanto aos titulares dos órgãos, a primeira coisa que devemos reter
administradores está na primeira finalidade, sendo, no entanto é que podemos falar de órgãos singulares ou órgãos plurais;
circunscrita pela primeira; - Se for um só administrador, temos um órgão singular, se forem dois
ou mais, instala-se a pluralidade.
- Com a pluralidade, surge outra questão, que é se teremos sistema de - Mas nas sociedades anónimas, há sempre um órgão de fiscalização,
decisão disjuntivo ou colegial; que será o conselho fiscal, comissão de auditoria ou conselho geral e
- O disjuntivo caracteriza-se por facultar funções específicas a alguns de supervisão, dependendo da estrutura adotada;
administradores, ou retirar poderes a outros: - Como já vimos as estruturas dos órgãos de administração e
pode haver administradores sem funções de representação, por fiscalização das sociedades anónimas, vamos apenas sumarizar
exemplo (para proteger os terceiros de boa-fé que contratam com a rapidamente os modelos de órgãos de fiscalização:
sociedade, a disjunção tem de ser conhecida, pois de outro modo a) Modelo tradicional português: Conselho de administração e
valerá a regra legal quanto à maioria para vinculação da sociedade); conselho fiscal;
- Vejam o que diz o art. 192.º , n.º 1 quanto às sociedades por quotas e - Numa versão básica, art. 278.º , al. A), o modelo tradicional pode ter
arts. 407.º , 408.º , 431.º , n.º 3, 443.º e 444.º conselho fiscal ou fiscal único, e neste caso, terá de ser um ROC ou
10.4 Mandatários - Vimos que o regime do mandato não vigora para uma sociedade de ROCs. O modelo reforçado, art. 413.º , n.º 2, tem
os administradores, embora as normas do mandato possam ser Conselho Fiscal e ROC ou sociedade de ROCs;
aplicadas em analogia; - O modelo reforçado é obrigatório se a sociedade anónima for
- Isso quer dizer que a sociedade não pode ter procuradores? O que emitente de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado
acham? - Evidentemente, são coisas diferentes... a sociedade pode regulamentado; e as sociedades que, não sendo dominadas por uma
constituir procuradores para agir em seu nome, mas o regime é sociedade que adote este modelo, ultrapassem, durante dois anos
diferente daquele dos titulares dos órgãos sociais; consecutivos, dois dos limites quantitativos constantes da al. A) do n.º
- O procurador tem uma relação de subordinação aos administradores 2 do art. 413.º;
e age especificamente para cumprir os termos do mandato; - Nos outros casos, o modelo reforçado é facultativo, sendo possível a
- Não pode haver delegação de poderes (transmissão dos poderes para nomeação judicial nos casos previstos nos artigos 417.º e 418.º
terceiro): no mandato, os administradores não perdem as suas b) Nas sociedades com o modelo anglo-saxónico, além do conselho de
competências e podem mesmo substituir-se aos procuradores, já na administração que irá abrigar uma comissão de auditoria com
delegação de poderes há uma transferência das funções. membros independentes e qualificados, haverá ainda um ROC como
A delegação está proibida para as sociedades por quotas (art. 252.º , órgão de fiscalização complementar;
n.º 5), e sociedades anónimas (391.º , n.º 6). - A qualificação e a independência dos membros da comissão de
- Já o mandato está expressamente permitido, vejam os artigos 252.º , auditoria são exigidos pelos artigos 423.º-B, n.º 4 e 5, e com significado
n.º 6, e 391.º , n.º 7. definido no art. 414.º , n.º 5. c)
Nas sociedades de modelo germánico, para além do conselho geral e
11. Órgão de fiscalização de supervisão, as funções de fiscalização também são exercidas por
- Por conta das sociedades envolverem interesses de diversos sujeitos: um ROC (arts. 278.º , al. C), e 446.º).
sócios, credores, trabalhadores, e mesmo da comunidade, é - As suas funções irão variar consoante o tipo de sociedade; -
importante resguardar a correção das suas contas e de algumas Fundamentalmente, o conselho fiscal ou fiscal único tem as
transações mais importantes; competências previstas no art. 420.º , n.º 1, compreendendo
- Este papel é desempenhado pelo órgão de fiscalização; basicamente a fiscalização da administração da sociedade, a vigilância
- Como já vimos, o conselho de fiscalização é facultativo nas quanto ao cumprimento da lei e dos estatutos, a supervisão da gestão
sociedades por quotas, art. 262.º , n.º 1, tendo de ter, no entanto, um financeira e contabilística, bem como a emissão de relatório anual
ROC no caso das condições do n.º 2;
sobre a sua atuação e sobre o relatório, contas e propostas - Vejam o art. 246.º , aplicável às sociedades por quotas e que definie
apresentadas pelo conselho de administração; as competências da assembleia geral, sendo aplicável às sociedades
- Deve ainda suprir a omissão do presidente da mesa da assembleia em nome coletivo (art. 189.º) e às sociedades em comandita simples
geral de convocar esta e cumprir as demais atribuições legais ou (art. 474.º).
estatutárias; porém, no chamado modelo reforçado, cabem-lhe ainda Quem pode ler o art. 246.º?
as competências previstas no n.º 2 do art. 420.º; - Vamos notar uma diferença se formos confrontar essa competência
- Já o ROC membro do conselho fiscal tem os deveres especiais com aquela que é prevista para as sociedades anónimas, também
referidos nos n.º 3 e 4 deste artigo. aplicáveis às sociedades em comandita por ações através da remissão
do art. 478.º; - Além da competência específica da assembleia geral
12. Assembleia geral anual (art. 376.º), cabem ao órgão as matérias que se são
- A assembleia geral é o órgão supremo da sociedade, mas as suas “especificamente atribuídas pela lei ou pelo contrato” e “as que não
atribuições são bem específicas; estejam compreendidas nas atribuições de outros órgãos da
- Fundamentalmente, e em que pese a tendência doutrinária para sociedade” , sendo ainda de notar que “sobre matérias de gestão da
apontar a sua competência como residual relativamente às do órgão sociedade, os accionistas só podem deliberar a pedido do órgão de
de administração e órgão de fiscalização, a assembleia geral é o órgão administração”.
deliberativo quanto às questões estruturais da sociedade e para a - Bem, claro está que há uma grande contenção na atribuição de
aprovação das contas de exercício e distribuição de dividendos; competências da assembleia geral nas sociedades puramente de
- Tendo o cuidado de direcionar a administração para cumprir com a capitais;
causa do contrato de sociedade, ou seja, deve-se guiar pelo interesse - Enquanto que nas sociedades de pessoas e na sociedade por quotas
social objetivo, a assembleia geral perdeu muito da sua supremacia (híbrida como de pessoas e de capital) existe uma margem muito
original. Mas isso não quer dizer que perdeu-a de todo; maior para as deliberações, o mesmo não se passa nas sociedades
- Vejam que as limitações impostas não podem cruzar uma linha: são puramente de capitaisJ;
os sócios os donos da sociedade. Foram eles que arriscaram o seu - Isso também vai de encontro ao que dissemos quanto ao
capital para constitui-la. descolamento entre propriedade e controlo da empresa: nas
O fracasso da sociedade, é o fracasso dos seus sócios. Desvalorizar em sociedades de capital essa dissociação será muito mais intensa,
absoluto a assembleia geral iria provocar um efeito danoso essencial: o chegando ao cúmulo no modelo germánico, em que nem mesmo os
desinteresse pelo investimento na empresa. administradores executivos são designados pela assembleia geral, que
- Doutrinariamente, a questão é posta da seguinte forma: a assembleia perde outras competências de deliberação para aquele órgão.
geral é o órgão de poder fundador da sociedade, e por isso nela - As assembleias gerais devem ser regularmente convocadas;
manifesta-se originalmente a vontade social, dela emanando a - A regra para as sociedades por quotas está no art. 248.º , n.º 3:
legitidade que por sua vez forma os poderes dos outros órgãos; qualquer dos gerentes pode convocá-la através de carta registada com
- Os limites dessa supremacia moderna são so poderes dos outros um prazo mínimo de 15 dias, caso outro prazo não tenha sido previsto
órgãos. Por isso, essencialmente, não é função da assembleia geral pela lei ou pelo estatuto social. Conta-se desde a data da expedição da
gerir ou fiscalizar a sociedade. carta;
- No entanto, temos de atender às diferenças nas suas atribuições de - Já nas sociedades anónimas, teremos de observar os termos do art.
acordo com o tipo de sociedade que estamos a lidar. 377.º: aqui a convocação caberá ao presidente da mesa da assembleia
geral, mas quando a lei preveja, poderá ser convocada pelo conselho
fiscal, pela comissão de auditoria ou pelo conselho geral e de - O primeiro suplente é o presidente do órgão de fiscalização ou,
supervisão, ou mesmo por ordem judicial, arts. 375.º , n.º 6, e 377.º , quando este não estiver presente, aí sim teremos a regra do acionista
n.º 1). com o maior número de ações, e em caso de haver dois com o mesmo
- Vejam que conforme o art. 54.º é possível convocar assembleias número (pouco provável nas sociedades anónimas), o mais velho.
gerais de forma regular, na forma de assembleias universais, ou seja, - Na ausência do secretário, servirá de secretário um acionista
quando se congreguem todos os sócios e todos manifestem a vontade escolhido pelo presidente em exercício (art. 374.º , n.ºs 3 e 4);
de que a assembleia se constitua e delibere sobre determinado - Outra disposição importante quanto aos membros da mesa é que, no
assunto caso das sociedades cotadas, estão sujeitos aos mesmos requisitos de
- Um aspecto importante das assembleias gerais é o direito de independência exigidos aos membros do órgão de fiscalização (art.
participação; - Vejam que pelo art. 21.º , n.º 1, al. B) do CSC é direito 374.º-A).
geral dos sócios tomar parte nas assembleias, e mais: só os sócios é . Assembleia geral Local e instalação das reuniões
que podem participar; - Em princípio, os trabalhos da assembleia geral devem decorrer na
- Quando há os congressos de outras entidades ocorre algo parecido: sede social, mas podem decorrer em outro local da mesma comarca se
só os membros que têm direito de voto podem estar na sala das as condições não forem adequadas;
convenções onde são feitos os discursos. Isso por conta de se - Outra exceção quanto ao lugar é a de que a convocação tenha sido
preservar aquele ambiente e as deliberações ali tomadas; feita pelo órgão de fiscalização e as circunstâncias o justifiquem (art.
- Mas os sócios podem se fazer representar por terceiros. Vejam 377.º , n.º 6, al. A), e 7).
quanto à sociedade por quotas, a regra do art. 249.º , n.º 4 e 5; - Hoje também existe a possibilidade de se realizar a assembleia geral
- Há ainda a regra de proibição de representação por escrito (n.º 1), e por meios telemáticos, foi uma inovação introduzida em 2006; - Os
no caso de assembleia universal, deve ter poderes específicos para arts. 382.º e 383.º tratam dos procedimentos, sendo interessante
votar em assembleia que não havia sido regularmente convocada. notar que, salvo no caso de exigência legal ou do estatuto social, não
- Já nas sociedades anónimas há mais flexibilidade: pelo art. 380.º , o existe quorum mínimo para a assembleia poder funcionar:
acionista pode se fazer representar por qualquer pessoa, não podendo ou seja, não é exigido nem um número mínimo de sócios, nem de
o contrato de sociedade proibir ou limitar a faculdade de o fazer, fração do capital social.
embora o art. 381.º traga certas limitações quanto aos pedidos de Mas atenção que nas sociedades anónimas, quanto a alteração do
representação de acionistas. Mesa da assembleia contrato social, transformação, fusão, cisão ou dissolução da
- A direção dos trabalhos caberá à mesa da assembleia, que é o seu sociedade é exigido um quórum de 1/3 do capital social para que a
conselho diretor. assembleia seja instalada.
Nas sociedades por quotas, o seu presidente é o sócio com maior Assembleia geral Ata
participação no capital social, e caso haja igualdade nas quotas, o mais - A prova da existência, conteúdo e resultado das deliberações dos
velho entre eles, art. 248.º , n.º 4. sócios na assembleia geral fica registada numa ata;
- Nas sociedades anónimas, a mesa é composta por um presidente e - A ata, portanto, é um documento escrito em que devem constar
um secretário, podendo ter outros componentes. todos os elementos exigidos no art. 63.º , n.º 2, bem como os demais
A mesa é eleita pela assembleia e tem um mandato de até quatro necessários para refletir, de forma sintética, claro, mas ainda assim
anos (art. 374.º). fiel, tudo quanto de relevante tiver ocorrido na reunião da assembleia.
- Há regras sobre a composição no caso de ausência do presidente, por - Quem deve assinar as atas?
exemplo.
- Nas sociedades em nome coletivo e por quotas, todos os sócios e
seus representantes presentes devem assiná-la (arts. 189.º , n.º 5, e
248.º , n.º 6). Se faltar alguma assinatura, a ata fica sem força
probatória até que o sócio omisso tenha assinado, ou seja notificado
judicialmente para fazê-lo no prazo de oito dias.
Se não o fizer?
A ata ganha força probatória na mesma desde que esteja assinada
pela maioria dos sócios presentes na assembleia (art. 63.º , n.º 3).
- Nas sociedades anónimas, basta a assinatura do presidente e do
secretário da mesa, sem necessidade de aprovação prévia pela
assembleia, a não ser que esta delibere fazê-lo (art. 388.º).
- As atas são lavradas no respectivo livro, que é um dos livros de
escrituração comercial de que falamos logo no início do curso.
Também é possível que sejam lavradas por escritura pública,
instrumento notarial fora de notas ou documento particular avulso,
art. 63.º , n.º 4.
- Vejam que a ata constituirá, mesmo que feita sem observância das
formas, um princípio de prova do que tenha ocorrido na reunião (art.
63.º , n.º 7), sendo admitidos outros meios de prova (gravações em
vídeo e testemunhos).

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