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Curso de Capacitação e Aperfeiçoamento

em Psicologia da Saúde e Hospitalar

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Sumário
1.0 BREVE HISTÓRICO SOBRE A PSICOLOGIA HOSPITALAR E PSICOLOGIA
DA SAÚDE .................................................................................................................................. 5
1.1 Alguns fatos marcantes para o crescimento da área ........................................... 8
1.2 A evolução do trabalho ............................................................................................ 10
1.3 Breve histórico da Psicologia no contexto hospitalar ......................................... 11
1.3.1 Estados Unidos da América.................................................................................. 11
1.3.2 Brasil ......................................................................................................................... 15
1.4 Psicologia no hospital geral: aspectos conceituais e práticos ................................ 26
2.0 QUANDO SURGIRAM OS HOSPITAIS?....................................................................... 32
3.0 A PSICOLOGIA HOSPITALAR ....................................................................................... 36
3.1 Histórico da Psicologia Hospitalar ............................................................................... 36
3.2 A História da SBPH ....................................................................................................... 39
3.2.1 Fundação ................................................................................................................. 39
3.2.2 Congresso da SBPH .............................................................................................. 40
3.2.3 Título de especialista ............................................................................................. 41
3.2.4 Produção científica ................................................................................................. 41
3.2.5 Funções do psicólogo hospitalar conforme definição do CFP e SBPH ......... 43
3.2.6 Lista de presidentes da SBPH.............................................................................. 43
3.2.6 Gestão 2015-2017 ............................................................................................ 44
3.3 Um pouco da história da psicologia hospitalar no Brasil .................................... 45
3.4 Primeiros passos para sistematização de um serviço de Psicologia Hospitalar
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4.0 O PSICÓLOGO HOSPITALAR........................................................................................ 49
4.0.1 Atuação da Psicologia nos hospitais ....................................................................... 50
4.1 Tarefas básicas da Psicologia Hospitalar (Rodriguez-Marín, 2003): .................... 56
4.2 Em quais locais o psicólogo hospitalar atua? ........................................................... 57
4.3 Atividades do Psicólogo Hospitalar:............................................................................ 58
4.4 Oferece e desenvolve: .................................................................................................. 58
4.5 Promove: ......................................................................................................................... 58
4.6 Modalidades de intervenção no hospital: ............................................................. 59
4.7 Trabalho em Equipe no Hospital ................................................................................. 59
4.8 Ética e Trabalho Em Equipe ........................................................................................ 60
4.9 Relatório Multiprofissional ............................................................................................ 61
4.10 Como se tornar um psicólogo hospitalar? ............................................................... 61
5.0 SETTING TERAPEUTICO ............................................................................................... 63

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5.1 A construção do setting terapêutico............................................................................ 64
5.2 Benefícios do setting terapêutico ................................................................................ 65
5.2.1 Colaboração entre profissional e paciente ......................................................... 65
5.2.2 Disciplina de tempo ................................................................................................ 65
5.2.3 Crescimento e amadurecimento pessoal ........................................................... 65
5.2.4 Olhar para si mesmo .............................................................................................. 66
6.0 O PAPEL DO PSICÓLOGO HOSPITALAR NA ATUALIDADE .................................. 66
6.1 A psicologia e sua construção como ciência ............................................................. 68
6.2 A política de humanização hospitalar e os papéis dos profissionais de saúde ... 71
6.3 Pacientes em crise e o papel da psicologia hospitalar ............................................ 73
6.4 Adoecimento, hospital e crise ...................................................................................... 77
6.5 Medicina e Psicologia ................................................................................................... 82
7.0 AS REAÇÕES PSICOLÓGICAS À DOENÇA E AO ADOECER................................ 85
7.1 A regressão..................................................................................................................... 87
7.2 A depressão.................................................................................................................... 89
7.3 Doenças agudas ............................................................................................................ 90
7.4 Doenças crônicas .......................................................................................................... 91
7.5 Benefícios primários e secundários da doença ........................................................ 97
7.6 A adaptação.................................................................................................................... 97
7.7 A negação ....................................................................................................................... 98
8.0 AVALIAÇÃO PSICOLOGICA DO PACIENTE HOSPITALIZADO ............................ 100
8.1 A Entrevista Psicológica Hospitalar e seu Campo de Intervenção ...................... 108
8.2 Parecer de saúde mental............................................................................................ 115
8.2.1 Atitude frente ao examinador.............................................................................. 116
8.2.3 Comunicação com examinador e sentimentos despertados ......................... 117
9.0 ATENDIMENTO PSICOLÓGICO DENTRO DO HOSPITAL .................................... 118
9.1 O Psicólogo Hospitalar e a Família do Paciente..................................................... 121
9.2 O Psicólogo Hospitalar e a Equipe Multidisciplinar ................................................ 122
9.3 A Atuação do Psicólogo no Hospital Geral .............................................................. 123
9.4 Primeiros passos no atendimento psicológico dentro do hospital ....................... 125
9.5 A prática do psicólogo hospitalar em equipe multidisciplinar ............................... 128
9.6 Interconsulta psicológica: demanda e assistência em hospital geral .................. 131
10.0 O PSICÓLOGO NA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA ..................................... 136
10.1 Atuação do psicólogo junto à criança..................................................................... 140
10.2 Atuação do psicólogo junto ao idoso ...................................................................... 141
10.3 Atuação do psicólogo junto à família ...................................................................... 142

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10.4 Atuação do psicólogo junto à equipe de saúde .................................................... 143
11.0 O PSICÓLOGO HOSPITALAR E A ONCOLOGIA – PSICO-ONCOLOGIA ........ 143
12.0 O PSICOLOGO HOSPITALAR JUNTO A UNIADADE DE QUEIMADOS ........... 148
12.1 A importância do psicólogo ...................................................................................... 151
12.2 As dores e comorbidades......................................................................................... 152
13.0 O PSICÓLOGO E OS CUIDADOS PALEATIVOS ................................................... 156
13.1 O paciente terminal ................................................................................................... 157
13.2 Cuidados paliativos ................................................................................................... 159
13.3 A atuação do psicólogo em cuidados paliativos ................................................... 160
14.0 ÉTICA NO CONTEXTO HOSPITALAR ..................................................................... 163
14.1 A Política Nacional de Humanização (PNH) / HumanizaSUS ............................ 166
14.2 Atenção Hospitalar ou Terciária .............................................................................. 170

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Curso de Aperfeiçoamento em
Psicologia da Saúde e Hospitalar

1.0 BREVE HISTÓRICO SOBRE A PSICOLOGIA HOSPITALAR E


PSICOLOGIA DA SAÚDE

Foi no Hospital McLean, em Massachussets, no ano de 1818 que formou-se


a primeira equipe multiprofissional incluindo um psicólogo. Em 1904 foi fundado
um Laboratório de Psicologia nesse mesmo hospital, onde foram desenvolvidas
várias pesquisas pioneiras relacionadas à Psicologia Hospitalar.

Já no Brasil, os primeiros serviços ligados à área da saúde mental


aconteceram na década de 30 e sempre estiveram junto aos hospitais
psiquiátricos, se apresentando como propostas alternativas à internação
psiquiátrica, e o psicólogo junto à Psiquiatria inaugura seus trabalhos
profissionais na instituição de saúde com enfoque clínico.

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A inserção do psicólogo em hospitais gerais começa pouco mais tarde, na
década de 50, Matilde Neder é a pioneira instalando um Serviço de Psicologia
Hospitalar no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, o que ela
fez foi uma adaptação técnica de seu instrumental clínico teórico junto à
realidade institucional.

Foi a partir da década de 80 que a área da saúde passou a constituir-se em


mais uma possibilidade de absorção profissional e sabemos que nesse espaço,
o psicólogo ainda ocupava um papel secundário. No mesmo período a saúde
pública brasileira foi questionada pela reforma sanitária, observou-se, então, que
a abertura de novos espaços e práticas profissionais se fazia necessária, uma
vez que os hospitais gerais pouco absorviam esse profissional.

É possível perceber que inúmeras dificuldades foram encontradas para que


o objetivo de tratar e prevenir doenças e tratar o doente fosse prática básica no
hospital, que estava habituado, até então, a simplesmente acolher os pobres
doentes, até que morressem. A Medicina foi gradativamente ocupando o seu
espaço e fazendo da instituição seu lugar de praxe.

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Naturalmente, que a Psicologia também enfrentaria inúmeras dificuldades
para inserir-se no ambiente hospitalar. Tais dificuldades giravam em torno da
resistência da população em aceitar um profissional de saúde mental, prestando
assistência a uma pessoa com enfermidades físicas. Cabe ressaltar que essa
resistência não se deu somente por parte da população leiga, mas também das
equipes médicas. São poucos os registros da atuação de psicólogos em
instituições de saúde no Brasil, porém, pode-se perceber que na década de 50
havia atividades do psicólogo em hospitais no Rio de Janeiro, São Paulo e Porto
Alegre.

Segundo Sebastiani (2000), observa-se que na mesma época em que


ocorreram os primeiros movimentos mais consistentes a fim de oficializar a
Psicologia como profissão no Brasil, instalaram-se no país os primeiros serviços
estruturados e oficializados de Psicologia Hospitalar. Esses serviços foram
implantados de 1952 a 1954 na Ortopedia e em 1957 na Unidade de
Reabilitação, ambas no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo. No início da década de 60, a Psicologia foi
oficialmente reconhecida como profissão no Brasil.

Nesse período, observa-se também a expansão de iniciativas de vários


psicólogos para desenvolver seus trabalhos em hospitais gerais. Além disso, é
fundada em Cuba a primeira sociedade de Psicologia da Saúde no mundo.
Percebe-se também que, tanto no Brasil como em outros países da América
Latina, as atividades voltadas para a atenção à saúde da população com a
participação de psicólogos são desenvolvidas, se expandido o campo de
atuação para além das delimitações do modelo clínico.

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A Psicologia Hospitalar foi crescendo na medida em que se enfatiza o caráter
preventivo, considerando não só os aspectos físicos, mas também os
emocionais da doença. O ser humano deve ser considerado em sua globalidade
e o profissional deve, portanto, desenvolver uma filosofia humanista no
tratamento com os pacientes. Em 1984, Cerqueira apontou a necessidade da
participação de profissionais de diversas áreas na promoção da saúde.

Seu objetivo primeiro era formar equipes com profissionais comprometidos


com as novas tarefas do modelo assistencial, enfatizando a necessidade de que
outros profissionais fizessem parte da equipe, até então formada quase
exclusivamente por médicos. Em decorrência disso, a construção de um
conhecimento sobre a intervenção da Psicologia no ambiente da saúde torna-se
pré-requisito para a real expansão dos serviços psicológicos dentro da equipe
de atenção à saúde.

1.1 Alguns fatos marcantes para o crescimento da área

 1976 – Primeiro curso de Psicologia Hospitalar do Brasil, coordenado por


Bellkiss Wilma Romano no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da USP.

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 1979 – Trabalho junto a pacientes terminais, criado por Regina D’Aquino,
em Brasília, tornando-se um dos grandes marcos da atuação frente à
morte e suas implicações.

 1981 – Primeiro curso de Especialização em Psicologia Hospitalar no


Instituto Sedes Sapientiae de São Paulo, sob a responsabilidade de
Valdemar Augusto Angerami-Camon.

 1983 – Um fato também importante na história dessa nova área foi a


realização do I Encontro Nacional de Psicólogos da Área Hospitalar sob
responsabilidade geral de Bellkiss Lamosa, esse foi promovido pelo
Serviço de Psicologia do Hospital das Clínicas e do Instituto do Coração
da USP.

 A partir da mobilização política nacional e dessas Conferências, um


conjunto de ações específicas foi implementado pelo governo brasileiro
desde a década de 70. Uma dessas ações foi a criação da rede de
assistência interligada, composta por unidades básicas de saúde,
ambulatórios e hospitais gerais e especializados, mais tarde tivemos
também a criação e implantação de um novo modelo de atenção à saúde
denominado de Sistema Único de Saúde (SUS).

 Essas mudanças no cenário da saúde pública brasileira culminaram com


a ampliação da inserção do psicólogo junto à rede de assistência básica
à saúde e o fortalecimento do trabalho do psicólogo na área da saúde
mental. Entre os anos de 1976 a 1984 tivemos um crescimento de
empregos de 21,47% em Psicologia na área da saúde, revelam Carvalho
& Yamamoto (1999).

 1997 – tivemos a fundação da Sociedade Brasileira de Psicologia


Hospitalar (SBPH), que vem fortalecendo a área no cenário brasileiro,
tendo por objetivo ampliar o campo de conhecimento científico e promover
cada vez mais o profissional que se dedica a este campo, através de

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realização de congressos, incentivo à pesquisas, para possibilitar a
circulação do poder e dos saberes entre os profissionais.

 O CFP reconheceu a Psicologia Hospitalar como uma especialidade


apenas no ano de 2000 quando se criou normas para a regulamentação
dos programas de Residência em Psicologia no país (Resolução CFP Nº
015/2007).

1.2 A evolução do trabalho

Nota-se hoje que e os programas oficiais de saúde como as Ações


Integradas de Saúde (AIS) representam uma evolução do psicólogo neste
campo, uma vez que possibilitam a atuação autônoma nas equipes de saúde,
fato que tem se mostrado diferente em muitos outros países latino-americanos
cujas legislações e/ou políticas de saúde ainda subordinam a atuação do
psicólogo ao médico.

Através desta pesquisa constatou-se que a Psicologia Hospitalar e da


Saúde, apesar firmarem-se como uma especialidade, ainda mantém um viés do
modelo clínico tradicional, podemos confirmar essa informação ao observar que
a maioria dos Psicólogos atuantes na área de Saúde-Hospitalar possuem a área
Clínica como outra especialidade em sua profissão.

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O certo é que a produção brasileira na área de Psicologia da Saúde tem
crescido muito nos últimos anos, porem Psicologia da Saúde não é a Psicologia
Clínica aplicada ao ambiente da saúde. Os indivíduos atendidos em Psicologia
da Saúde não precisam obrigatoriamente ter um distúrbio psicológico. O que
distingue o campo da Psicologia da Saúde de outros campos da Psicologia é o
fato que os indivíduos aqui atendidos têm, em geral, um problema ligado à sua
saúde física, de diversas gravidades.

Dada sua relevância, deve-se destacar a importância da Promoção de


Saúde, que não se faz só em hospitais ou ambulatórios, mas que pode ser feita
em qualquer contexto, tais como locais de trabalho, lares, escolas, Núcleos de
Saúde da Família. São ações que um psicólogo da saúde executa para melhorar
a qualidade de vida de uma parcela da população. (Gorayeb, Netto & Bugliani,
2003; Murta & cols., 2010).

1.3 Breve histórico da Psicologia no contexto hospitalar

1.3.1 Estados Unidos da América

Nos Estados Unidos da América (EUA), a atuação do psicólogo no


hospital geral ocorreu após o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945),
quando foi identificada a necessidade da assistência psicológica para os
11
militares, que apresentavam uma série de reações psíquicas no período de
hospitalização, como distúrbios da sensopercepção, alterações no humor e
agitação psicomotora (Pate & Kohut, 2003). As atividades da Psicologia nos ambientes
de saúde iniciaram-se com o propósito de identificar as repercussões
psicológicas decorrentes do processo de adoecimento e consequente
hospitalização, buscando estratégias para minimizar as alterações psíquicas e
compreender a experiência da pessoa doente.

Os procedimentos invasivos relacionados aos exames periódicos e às


cirurgias, bem como os efeitos das medicações ocasionavam o surgimento de
episódios depressivos nos pacientes hospitalizados. Dessa maneira, esse
período foi muito importante para o acompanhamento psicológico hospitalar
(Nogueira-Martins & Frenk, 1980). Verificou-se que a situação de adoecimento e
hospitalização representava um fenômeno complexo, o qual necessitava do
entendimento de vários profissionais. Isso possibilitou a integração do psicólogo
nas equipes multiprofissionais de saúde. Em 1970, o programa federal dos EUA
- The Civilian Health and Medical Program of the Uniformed Services -,
reconheceu as atividades desse profissional na área da saúde, mas somente em
1977 a aprovação da ata oficializou as práticas para todo o país (Dorken, 1993; Enright,
Resnick, DeLeon, Sciara, & Tanney, 1990).

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Na década de 1970, ocorreu, nos EUA, uma série de questionamentos
relacionados à atuação do psicólogo nos projetos que incluíam promoção da
saúde, prevenção e tratamento de doenças. Em 1973, iniciaram-se as
investigações para analisar as atribuições desse profissional no contexto da
saúde e os dados destacaram sua importância, mas foi somente em 1978 que
a American Psychological Association oficializou a Divisão 38. Esse fato marcou
o surgimento da área denominada de Psicologia da Saúde (Straub, 2008).

O primeiro presidente da American Psychological Association, Joseph


Matarazzo, destacou que a Psicologia da Saúde tem o objetivo de estudar a
etiologia das doenças orgânicas, desenvolver intervenções direcionadas para a
promoção da saúde, prevenção e tratamento de doenças, buscando o diálogo
com os representantes governamentais para aprimorar as políticas públicas
(Matarazzo, 1980). De acordo com Belar (1997), os Psicólogos da Saúde investigam
as manifestações físicas e psicológicas vivenciadas pelos indivíduos em uma
situação de doença. Esse profissional também atua na prevenção de doenças e
manutenção das condições saudáveis por meio de intervenções educativas.

Nos EUA, a atuação do psicólogo nos diversos contextos (postos de


saúde, hospitais e comunidades), com o foco no processo saúde e doença, foi
reconhecida internacionalmente por Psicologia da Saúde. Em 1978, a Califórnia
foi o primeiro estado a inserir psicólogos nas equipes de saúde, o que possibilitou

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o crescimento significativo da profissão nas instituições hospitalares (Dorken, 1993).
Na década de 1980, a American Psychological Association regulamentou as
práticas dos Psicólogos da Saúde por meio de documentos que tinham o objetivo
de apresentar as principais diretrizes para a atuação da categoria (Enright, Resnick,
Ludwigsen, & DeLeon, 1993).

A American Psychological Association publicou, em 1985, um documento


intitulado "A Hospital Practice Primer for Psychologists", que apresentava
informações sobre a estrutura dinâmica das instituições hospitalares,
destacando as habilidades necessárias dos profissionais de saúde com o
propósito de facilitar a inserção do psicólogo no contexto hospitalar. Destaca-se
que, em 1991, outro documento foi publicado pela mesma associação, o
"Guidelines on Hospital Privileges: Credentialing and Bylaws", o qual
apresentava as orientações para o treinamento de psicólogos para a atuação
nos hospitais com ênfase na delimitação das atividades relacionadas à avaliação
e à intervenção psicológica (Enright et al., 1993). Foram discutidas as propostas para
a implantação dos serviços de Psicologia nos hospitais gerais com o objetivo de
promover a integração entre teoria, prática e pesquisa para avaliar os modelos
de atuação em Psicologia da Saúde. Enright et al. (1993) destacam que os
documentos da American Psychological Association contribuíram para a
legitimação das práticas psicológicas no ambiente hospitalar, assim como para
a publicação de pesquisas, com o surgimento do periódico Journal Health
Psychology, em 1982, que, com reconhecimento internacional, publica
pesquisas até os dias de hoje.

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1.3.2 Brasil

No Brasil, a Psicologia da Saúde está fundamentada no princípio da


integralidade, uma concepção dinâmica que enfatiza a inter-relação de aspectos
envolvidos no processo saúde e doença (Mattos, 2003) e na interdisciplinaridade.
Esses aspectos estabelecem diálogo e fundamentam estratégias alternativas
nas práticas de atenção à saúde (Bonaldi, Gomes, Louzada, & Pinheiro, 2007). A atuação do
psicólogo no hospital geral, que representa uma especificidade da Psicologia da
Saúde no setor terciário, iniciou-se na década de 1950 com poucos profissionais
psicólogos. Havia, no país, profissionais com formação nas áreas das Ciências
Humanas os quais eram responsáveis pela assistência psicológica aos
pacientes hospitalizados. Entretanto, verificou-se a necessidade do surgimento
dos cursos de graduação em Psicologia para delimitar a atuação do psicólogo
nas instituições de saúde (Angerami-Camon, 2002).

As primeiras atividades foram realizadas por Matilde Néder em 1954 na


clínica ortopédica e traumatológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal de São Paulo (HC-FMUSP), considerada a
pioneira na área (Angerami-Camon, 2002). O acompanhamento psicológico para as

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crianças, realizado por essa psicóloga pioneira, ocorria durante o período pré e
pós-operatório de cirurgias na região cervical.

A partir de 1956, na unidade pediátrica do HC-FMUSP, Aydil Pérez-


Ramos foi a psicóloga responsável pela assistência às crianças hospitalizadas,
que apresentavam diferentes patologias, e aos seus familiares, os quais
permaneciam na condição de acompanhantes (Angerami-Camon, 2002). Pérez-Ramos,
vinculada à equipe multiprofissional, desenvolvia atividades de psicodiagnóstico
e intervenção psicológica hospitalar, procedimentos que estavam sendo
utilizados em uma fase inicial e foram aprimorados a partir de sua experiência
prática, considerando a necessidade de elaboração dos princípios técnicos. Na
literatura consultada, foi possível identificar os estudos da autora acerca da
criança hospitalizada (Queiroz, 1958, 1961).

Na década de 1950 verificou-se que a hospitalização infantil representou


uma temática relevante para os psicólogos em hospitais e, desse modo, a
atuação profissional contribuiu para o desenvolvimento de estudos científicos.
Em 1974, o HC-FMUSP possibilitou a inserção da Psicologia no hospital geral
nos Institutos de Ortopedia, Psiquiatria, Neurologia e da Criança. Além disso,
impulsionou os serviços da Psicologia nos hospitais de especialidades (Instituto
do Coração, Instituto Central, Instituto de Reabilitação), autorizou a contratação
de profissionais psicólogos sob a direção de psicólogos, gerou manuais de
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trabalho, promoveu a participação de psicólogos nas equipes multiprofissionais
por meio de tarefas delimitadas e compartilhadas e descreveu o perfil profissional
para atuação na área. Um ponto a ser considerado foi a atuação de psicólogos
nesses serviços nos hospitais, o que antes era restrito aos profissionais médicos
do Hospital das Clínicas (HC).

Na década de 1970, a atuação do psicólogo no hospital geral representou


uma temática de estudo na universidade. A Profa. Dra. Thereza Pontual de
Lemos Mettel, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de
São Paulo (FMRP-USP), investiu na organização de uma equipe para a
realização do trabalho clínico junto às crianças, o qual se consolidou e resultou
em grande sucesso em tratamentos médicos de diversas especialidades.
Depois, como professora da Universidade de Brasília, teve um papel importante
na introdução de uma política de atenção hospitalar destinada à criança, que
incluía os familiares acompanhantes e a participação ativa das mães no cuidado
à saúde do filho. Realizou uma pesquisa no Hospital de Base do Distrito Federal,
que mostrou melhora nas condições de saúde das crianças e redução do tempo
de internação quando as mães permaneciam no local. Esses resultados
culminaram na adoção de políticas de humanização em hospitais da rede pública
de saúde (Mettel, 2007).

O trabalho da referida professora em Ribeirão Preto deu origem a um


programa pioneiro destinado ao treinamento de psicólogos no hospital geral,
considerado referência em Psicologia da Saúde no Brasil. Recebeu a
denominação de Programa de Aprimoramento, apresentando a estrutura de um
curso de residência, no qual o recém-formado desenvolvia atividades em tempo
integral. Os psicólogos e professores Edna Maria Marturano e Ricardo Gorayeb
foram responsáveis pela direção desse serviço, que incluía atividades de ensino,
prática e pesquisa na área da Psicologia Clínica e Hospitalar no Hospital das
Clínicas da FMRP-USP (Gorayeb, 2010). A partir de então, foram criados, no
país, outros Programas de Aprimoramento Profissional e, em 1976, o Ministério
da Saúde iniciou a elaboração de Programas de Residência para Áreas da
Saúde, nos quais constava a Psicologia. Entretanto, a proposta não apresentou
avanços e foi arquivada. Posteriormente, ocorreu o surgimento das Residências

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Multiprofissionais e em Área Profissional da Saúde, por meio da Lei nº 11.129
de 2005, na qual foi incluída a Psicologia pelo fato de ser considerada profissão
da área da saúde (Brasil, 2005). Em 2007, foi publicada a Portaria Interministerial
nº 45 referente a essas residências e, em seguida, foi institucionalizada uma
Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde - Portaria
Interministerial nº 698, de 19 de julho de 2007 (Brasil, 2007). A partir disso, o
Conselho Federal de Psicologia (2007) apresentou as normas para o
credenciamento de Programas de Residência em Psicologia na área da saúde
(Resolução Conselho Federal de Psicologia nº 15/2007).

É preciso considerar, ainda, o trabalho de Célia Zannon, que iniciou sua


trajetória como psicóloga no Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São
Paulo (HC-SP) e elaborou uma tese de doutorado pioneira na área de Psicologia
hospitalar: "O comportamento de crianças hospitalizadas e a rotina hospitalar:
subsídios para atuação do psicólogo junto à equipe de pediatria" (Zannon, 1981),
sob a orientação da Profa. Dra. Thereza Mettel. Essa tese marcou o advento da
pesquisa empírica em Psicologia em hospital geral.

Avanços significativos marcaram o crescimento da Psicologia no hospital


geral devido à iniciativa de profissionais da área, os quais buscaram delimitar as
práticas psicológicas. Na tentativa de facilitar a formação profissional, surge, em
1977, o primeiro curso de Psicologia Hospitalar realizado no país, na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, produzido e ministrado por Bellkiss
Romano. A partir da década de 1980, destacam-se nessa trajetória o "I e o II
Encontros Nacionais de Psicólogos da Área Hospitalar", eventos científicos que
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contribuíram para o aprimoramento profissional (Romano, 1999). A possibilidade
de atuação do psicólogo nos ambientes de saúde representou, então, um
período marcado por inúmeros questionamentos acerca das tarefas desse
profissional, as quais precisavam ser definidas com clareza para orientar as
práticas. De acordo com Santos e Jacó-Vilela (2009), os psicólogos estavam diante de
teorias e técnicas das abordagens psicológicas, mas na tentativa de responder
com urgência às demandas da instituição de saúde apresentavam dificuldades
em estabelecer parâmetros para a atuação qualificada. Nas primeiras atividades
da Psicologia implementadas em hospital geral, predominava uma perspectiva
prática da Psicologia clínica tradicional. Diante das características da instituição
hospitalar, a simples transposição do modelo mostrava-se insuficiente para
atender uma demanda tão complexa. Assim, foi necessário promover uma
reflexão crítica acerca das atribuições profissionais do psicólogo que atua em
hospitais, principalmente no que se refere à sua inserção nas equipes de saúde,
o que ocorreu de forma gradativa a partir do enfrentamento das dificuldades de
sua inserção em um campo exclusivo das ciências biomédicas.

Após um período de enfrentamento desses desafios, nas décadas de


1970, 1980 e 1990, foram implantados os Serviços de Psicologia Hospitalar, que
se tornaram referência no Brasil. Em 1974, o Serviço de Psicologia do HC-
FMRP-USP já estava consolidado (Gorayeb, 2010), quando, no mesmo ano, foi
implantado o Serviço de Psicologia do Instituto do Coração do HC-FMUSP
(Romano, 1999). Em 1981, foi implantado o Serviço de Psicologia na Unidade de
Pediatria do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina

19
(Crepaldi, Gonçalves, & Moré, 2011). No mesmo ano, o Serviço de Psicologia do Hospital
de Base de São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, foi implantado
também por meio da iniciativa de psicólogos da Unidade de Pediatria (Miyazaki,
Domingos, & Valério, 2006). Em 1982, o Serviço de Psicologia do Hospital
Brigadeiro, São Paulo, foi implantado por Heloísa Chiattone, priorizando o
atendimento psicológico às crianças hospitalizadas e aos acompanhantes ( Dias,
M. N. Baptista, & Baptista, 2003). Em 1986, foi institucionalizado o Serviço de Psicologia do
Hospital de Clínicas de Porto Alegre, reconhecendo o trabalho das psicólogas
que lá atuavam desde a década de 1970 (Silva, 2006). Já a Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo implantou o Serviço de Psicologia em 1992 (Bruscato,
2004).

O surgimento desses Serviços atendeu às demandas de crianças e


adolescentes e contribuiu para legitimar as práticas psicológicas no território
brasileiro. Outros tantos serviços foram implementados pelo país atendendo às
necessidades de saúde de usuários nos diferentes momentos do ciclo de vida.
Diante do crescimento dessa área, tornou-se necessário estabelecer diretrizes
para a atuação profissional, considerando que os psicólogos precisavam
compartilhar experiências e apresentar resultados de pesquisas.

20
No que se refere à produção da literatura especializada na área da
Psicologia Hospitalar, Angerami-Camon (1984, 2002) iniciou a publicação de livros com
o propósito de apresentar as possibilidades de atuação. Ocorreu o surgimento
gradual dos cursos de especialização e a inserção da disciplina de Psicologia
Hospitalar nos cursos de graduação (Sebastiani, 2006), iniciativas que foram
relevantes para a formação profissional. Os psicólogos interessados na área da
saúde procuravam aprimorar habilidades nesses cursos e nos Programas de
Aprimoramento.

Em 1987, uma pesquisa sobre a atuação do psicólogo no hospital geral


apontou que a Psicologia Hospitalar estava em uma fase de desenvolvimento
inicial e os psicólogos precisavam estruturar o modelo de intervenção e as
habilidades de ensino e pesquisa (Romano, 1999). Em síntese, no final da década de
1980, as estratégias de atuação ainda necessitavam de esclarecimentos acerca
dos procedimentos técnicos, principalmente diante das diversas abordagens
teóricas utilizadas pelos psicólogos nos hospitais. Romano (1990) organizou
uma coletânea de textos sobre a prática da Psicologia nessas instituições,
tratando de temáticas como: a importância do psicólogo identificar as
repercussões psíquicas do paciente submetido à cirurgia coronariana;
considerações acerca da atuação desse profissional nos centros de terapia

21
intensiva; a intervenção psicológica com os pacientes fora de possibilidades
terapêuticas (em processo terminal); e especificidades de pacientes com lesão
medular, fissura de lábio e hipertensão arterial. Os textos apresentavam
indicações para a atuação do psicólogo hospitalar e a produção bibliográfica
repercutiu diretamente no surgimento de subáreas. Desse modo, as práticas
psicológicas relacionadas à cardiologia e psico-oncologia se destacaram devido
à inserção crescente de psicólogos nessas equipes de saúde.

Alguns acontecimentos históricos contribuíram para o desenvolvimento da


Psicologia Hospitalar. Em 1994, a Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia foi
inaugurada para discutir as diretrizes teóricas da especialidade (Gimenes, Magui, &
Carvalho, 2006), pois representava uma área de interesse para os psicólogos que
atuavam nos hospitais gerais. Em 1997, foi estabelecida a Sociedade Brasileira
de Psicologia Hospitalar, a qual iniciou a publicação de um periódico em 2004,
promovendo a integração de psicólogos nas reuniões científicas (Romano, 1999).

As atividades desses profissionais nos hospitais foram reconhecidas pelo


Ministério da Saúde por meio de documentos que regulamentam o atendimento
em Psicologia nos procedimentos de média e alta complexidade. Alguns
exemplos são a obrigatoriedade dos serviços de Psicologia nas Unidades de
Terapia Intensiva, na assistência à gestante de alto risco, nos centros de
atendimento em oncologia, nas unidades de internação em hospital geriátrico,
atendimento hospitalar de pacientes crônicos, pacientes em tratamento da

22
obesidade e nas unidades de assistência em alta complexidade cardiovascular
(Conselho Regional de Psicologia, 2007). Verificou-se o comprometimento das
políticas públicas de saúde e os psicólogos demonstraram que ações efetivas
são desenvolvidas nas instituições hospitalares. Destaca-se que o psicólogo
hospitalar continuou buscando ampliar o campo de atuação. Um aspecto central
se refere à prática profissional, a qual passou por um processo de
aprimoramento e, embora muitas portarias apontem para a necessidade dos
serviços de Psicologia em hospitais, muito ainda está por ser feito.

O atendimento psicológico hospitalar focaliza as repercussões psíquicas


do indivíduo referentes à situação de doença e hospitalização. Busca-se
investigar a capacidade de adaptação do paciente, os problemas vivenciados
nesse ambiente, o nível de adesão ao tratamento e o relacionamento
estabelecido entre paciente, acompanhante e equipe de saúde ( Romano, 1999). A
adaptação está ligada a uma concepção evolucionista do ser humano, ou seja,
refere-se à capacidade do indivíduo de construir estratégias para o
enfrentamento das situações que, a curto ou longo prazo, possibilitem um
funcionamento produtivo, permitindo desenvolver recursos úteis para o seu
crescimento pessoal (Leahy, Tirch, & Napolitano, 2013). Inicia-se problematizando a
situação para que as reflexões possam facilitar o surgimento de ideias as quais

23
o auxiliem a enfrentar os acontecimentos, o que representa um aspecto
importante para o indivíduo hospitalizado.

Essas colocações sobre a realidade hospitalar contribuíram para a


delimitação das atividades profissionais e possibilitaram o surgimento dos
grupos de estudo com o objetivo de aprimorar conhecimentos para auxiliar a
prática do psicólogo hospitalar. No início do ano 2000, um grupo de psicólogos,
sob a coordenação de Célia Zanonn, institucionalizou o Grupo de Trabalho em
Psicologia Pediátrica da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em
Psicologia (ANPEPP), promovendo a realização de pesquisas referentes à
temática (Crepaldi, Rabuske, & Gabarra, 2006).

Destaca-se que desde a década de 1950 os estudos sobre a criança


hospitalizada despertavam interesse nos psicólogos que estavam iniciando as
atividades nos hospitais. Esse grupo é responsável pela maioria dos trabalhos
científicos publicados na área de Psicologia Pediátrica. A ANPEPP agregou
outros grupos, como o Grupo de Trabalho em Psicologia da Saúde, coordenado
pela professora Raquel Kerbauy (Universidade de São Paulo), contribuindo para
a formação de psicólogos para a pesquisa na área da saúde, principalmente com
a divulgação de estudos realizados no Laboratório de Saúde e Comportamento
do Departamento de Psicologia Experimental da USP (Kerbauy, 1999).
Atualmente, esse grupo recebe o nome de Grupo de Psicologia da Saúde em

24
Instituições e na Comunidade e é coordenado pelos professores Ricardo
Gorayeb (USP-Ribeirão Preto), Eliane Fleury Seidl (Universidade de Brasília) e
Maria Cristina Miyazaki (Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto -
FAMERP). A professora Vera Lúcia Raposo do Amaral, da Pontifícia
Universidade Católica de Campinas, contribuiu para o desenvolvimento de
intervenções na área da saúde baseadas em evidências por meio das atividades
de ensino e pesquisa, as quais promoveram avanços na maneira de sistematizar
as práticas.

Os estudos teóricos e relatos de pesquisas empíricas com temáticas da


Psicologia Hospitalar representaram um avanço importante para a divulgação do
conhecimento científico, o qual tem sido considerado referência na área.
Diversos estudos publicados por volta da década de 2000 contribuíram para o
desenvolvimento de intervenções psicológicas relacionadas à pediatria ( Crepaldi,
1999a,1999b; Dias et al., 2003; Crepaldi et al., 2006), cardiologia (Romano, 2001), câncer
infantil (Valle, 2001) e obstetrícia (Bortoletti et al., 2007). Verificou-se a publicação de um
livro sobre temas de ensino e pesquisa com a apresentação de exemplos de
intervenções (Ismael, 2005); o manual de Psicologia Hospitalar com uma abordagem
psicanalítica (Simonetti, 2004); e o manual de Psicologia Clínica para hospitais
(Romano, 2008). Estes últimos discutem as principais tarefas do psicólogo em
hospitais.

25
Além disso, Miyazaki et al. (2006) organizaram a publicação de pesquisas
que auxiliaram a atuação profissional nos seguintes pontos: avaliação
psicológica, preparação de crianças para cirurgias, identificação de estresse e
estratégias de enfrentamento em pacientes submetidos a transplantes e
hospitalizados por doenças crônicas e outras temáticas relevantes. Os estudos
científicos contribuíram para o crescimento da área e reconhecimento das
atividades profissionais do psicólogo no hospital geral. Isso possibilitou o
desenvolvimento de Programas de Pós-Graduação stricto sensu (mestrado e
doutorado); o Programa de Psicologia e Saúde da FAMERP; e o Programa
Psicologia da Saúde da Universidade Estadual da Paraíba e da Universidade
Metodista de São Paulo. Esses programas cumprem o objetivo de formar
pesquisadores e docentes na área.

1.4 Psicologia no hospital geral: aspectos conceituais e práticos

Na produção científica verificou-se que a definição da Psicologia no


hospital geral é apresentada nos manuais específicos de autores brasileiros
(Angerami-Camon, 2010; Chiattone, 2006; Romano, 1990, 1999) e a literatura internacional
destaca as atividades práticas relacionadas à Psicologia da Saúde ( Belar, 2000). A
terminologia Psicologia Hospitalar, utilizada apenas no Brasil, destaca a atuação
do psicólogo no hospital geral, embora represente um termo inadequado para se
referir ao local de práticas de uma área profissional. Psicologia da Saúde é o
termo correto para destacar as atividades desenvolvidas pelo psicólogo nos

26
diversos contextos da área, neste caso, a atuação da Psicologia no hospital
representa uma subespecialidade da Psicologia da Saúde.

A especialidade Psicologia Hospitalar foi reconhecida pelo Conselho


Federal de Psicologia (2000), por meio da Resolução nº 014/2000, na qual
apresenta instruções para o psicólogo obter o registro. Os profissionais que
atuavam nessa área solicitavam o registro de especialista após a conclusão dos
cursos de especialização credenciados pelo Conselho Federal de Psicologia ou
diante da comprovação de experiência prática de dois anos e aprovação nas
provas teóricas. O Conselho Federal de Psicologia (2001), por meio da
Resolução nº 02/2001, definiu os parâmetros para a atuação na área,
considerando relevante a avaliação e o acompanhamento psicológico aos
pacientes hospitalizados e seus familiares com a utilização das teorias e técnicas
adequadas. A resolução destaca que o psicólogo hospitalar desenvolve
diferentes tipos de intervenção, atende pacientes que se encontram em
ambientes distintos (como a unidade de terapia intensiva, enfermarias,
ambulatórios etc.) e aponta que os procedimentos utilizados precisam priorizar
a relação paciente, família e equipe de saúde por meio do contato interdisciplinar
com os profissionais para compartilhar informações úteis para o direcionamento
de estratégias.

A perspectiva interdisciplinar por meio do diálogo constante entre a equipe


de saúde representa uma estratégia efetiva para facilitar a comunicação,
conforme foi destacado por Chiattone (2006) e Almeida (2000). Isso possibilita discutir

27
características de um caso clínico com os profissionais, definir procedimentos de
intervenção e acompanhar os resultados avaliando seus efeitos.

Simonetti (2004) destaca, em uma perspectiva psicanalítica, que a Psicologia


hospitalar focaliza, em um primeiro nível, a identificação dos pensamentos e
sentimentos do indivíduo hospitalizado para, em seguida, iniciar o tratamento por
meio de técnicas psicológicas. Segundo o autor, é preciso compreender as
alterações emocionais vivenciadas pelos pacientes hospitalizados diante de uma
situação de luto proveniente do surgimento da doença, assim será possível
acompanhar o indivíduo no processo de elaboração dessa experiência por meio
da exploração das verbalizações de maneira que o manejo da resistência e da
transferência sejam fundamentais. Angerami-Camon (2010), a partir de uma
fundamentação fenomenológica existencial, enfatiza que se trata de uma área a
qual visa minimizar, no paciente, o sofrimento gerado pelo processo de
hospitalização, por meio da escuta e da empatia para iniciar a ressignificação ou
atribuição de novos significados às suas vivências.

É importante ressaltar que outras perspectivas teóricas contextualizaram


a sua capacidade de produzir conhecimentos no contexto hospitalar. Nesse
sentido, podem ser citados autores da teoria sistêmica, os quais reconhecem a
possibilidade do desenvolvimento de intervenções psicológicas pelo fato de
considerarem o hospital um sistema aberto e dinâmico, repleto de significados
nas relações que são estabelecidas entre paciente, família e equipe de saúde.
Essa visão multidimensional, focalizada na comunicação, na complexidade do
contexto hospitalar e na intersubjetividade, representa o elemento central para
reflexões críticas (Moré, Crepaldi, Gonçalves, & Menezes, 2009). Psicólogos da teoria cognitivo

28
comportamental, no acompanhamento hospitalar de pacientes e familiares,
buscam reestruturar cognições, minimizar estresse com técnicas de relaxamento
e fortalecer estratégias de enfrentamento; também estão envolvidos na
sistematização de diretrizes que orientam a atuação profissional por meio da
construção de protocolos, da delimitação de instrumentos, procedimentos e de
estratégias baseadas em evidências, buscando a inter-relação da prática e da
pesquisa (Azevêdo, 2010; Azevêdo & Santos, 2011; Gorayeb & Guerrelhas, 2003; Miyasaki

et al., 2006). É possível verificar que os autores definem formas de atuação


congruentes com o modelo teórico utilizado, o que permite compreender que as
especificidades caracterizam determinada prática ou uma maneira peculiar de
contextualizar e definir intervenções psicológicas a serem utilizadas na situação
de doença e hospitalização.

Seja qual for a abordagem teórica em Psicologia, existem pontos centrais


na atuação do psicólogo no hospital geral. Campos (1995), por exemplo, destaca a
necessidade de focalizar a tríade paciente, acompanhante, equipe de saúde. No
contato com o paciente, o psicólogo constrói o vínculo terapêutico, mostra-se
disponível para a escuta das queixas e demandas, identificando, de forma
colaborativa, as situações que provocam sofrimento, visando reorganizar a
tensão emocional. Busca-se promover conversações para os acompanhantes,
demais familiares e equipe de saúde com o objetivo de mediar o relacionamento

29
e a comunicação destes com o paciente e, por outro lado, atender às demandas
emocionais da família.

O atendimento psicológico hospitalar é realizado em locais distintos, como


as unidades de internação e ambulatórios. Por causa disso, é preciso considerar
as características de cada local, verificando o contexto apropriado para o
atendimento, o número de sessões, os horários e o período destinado ao
acompanhamento (Azevêdo & Santos, 2011). O paciente hospitalizado
apresenta problemas que são vivenciados em uma situação real de doença e
demais agravos da saúde que necessitam de hospitalização, o que exige do
psicólogo habilidades para estabelecer vínculo e manter o foco nas demandas
centrais, por isso a importância da avaliação e intervenção psicológica.

No processo de avaliação, considera-se relevante o diálogo entre o


psicólogo, o paciente, o acompanhante e a equipe de saúde para compartilhar
informações. No contexto da Psicologia Pediátrica, por exemplo, a avaliação
psicológica engloba diversos fatores, como a avaliação de aspectos psicológicos
decorrentes da situação de doença e hospitalização, avaliação de estresse e
enfrentamento e da dinâmica familiar estabelecida entre criança e
acompanhante (Crepaldi et al., 2006). De acordo com as autoras, quando isso ocorre
de maneira dinâmica, permite selecionar os instrumentos adequados a serem
utilizados no processo de avaliação, assim, escalas psicométricas, entrevistas e
a observação representam recursos relevantes. Segundo Pedromônico (2006), a

30
avaliação psicológica hospitalar por meio de protocolo representa um guia que
orienta as etapas, auxilia em uma tarefa fundamentada no método científico e
possibilita que a equipe de saúde compreenda as atividades desenvolvidas pelo
psicólogo.

Os dados obtidos na avaliação servem para descrever informações no


prontuário hospitalar e delimitar estratégias de intervenção. Segundo Dias et al.

(2003), o planejamento da avaliação e a intervenção efetiva da Psicologia


diminuem o tempo de hospitalização do paciente, por considerar que a
identificação de distúrbios psicológicos na fase inicial facilita direcionar condutas
evitando a evolução dos sintomas. A avaliação psicológica hospitalar tem sido
utilizada em pesquisas e é possível verificar, na produção científica, estudos
sobre avaliação de estratégias de enfrentamento de crianças com câncer ( Moraes
& Enumo, 2008), avaliação da dor em neonatos e crianças (Linhares & Doca, 2010) e
avaliação de estresse em crianças submetidas a cirurgias eletivas após terem
participado de um programa de preparação psicológica (Broering & Crepaldi, 2011).

Esses estudos são importantes para o desenvolvimento de novas possibilidades


de atuação do psicólogo no hospital geral, por considerar que a avaliação de
variáveis específicas permite estruturar as intervenções que serão realizadas,
nesse caso, o conjunto de técnicas psicológicas.

A multiplicidade de práticas oriundas das diferentes teorias psicológicas


possibilitou estabelecer modelos diferenciados de atuação profissional. É

31
possível destacar os relatos de casos clínicos referentes à intervenção com
crianças cardiopatas (Santos & Guidugli, 2013), ao paciente renal crônico e
cardiopata (Almeida, 2013), à gestante à espera de um bebê cardiopata (Guidugli,
2013) e a um grupo de pacientes tabagistas (Bueno & Ismael, 2013). Nessas situações,
o psicólogo hospitalar busca investigar a demanda por meio do acolhimento e,
ao priorizar a escuta, permite que o paciente verifique as possibilidades de
enfrentamento das situações.

De forma específica, a intervenção segue algumas diretrizes dependendo


da teoria utilizada. Ao utilizar a abordagem cognitivo comportamental, por
exemplo, o psicólogo hospitalar tem o objetivo de auxiliar os pacientes na
identificação das situações, dos pensamentos, sentimentos e comportamentos.
Busca-se promover, no paciente, a capacidade de reestruturação cognitiva de
pensamentos sobre a situação de doença com o propósito de atribuir novos
significados e desenvolver a adaptação. Se o paciente relata que não acredita
em perspectivas de recuperação, provavelmente surgirão sentimentos de
tristeza e comportamentos os quais dificultam sua inserção nos procedimentos
do setor, mas se, por outro lado, o psicólogo começa a explorar esse ponto,
existe a possibilidade do paciente buscar informações sobre a evolução clínica,
manter contato com os profissionais de saúde e verificar que o processo de
recuperação implica necessariamente a participação coletiva. As mudanças na
maneira de interpretar os eventos possibilitam desenvolver flexibilidade diante
das situações vivenciadas.

2.0 QUANDO SURGIRAM OS HOSPITAIS?

32
Nos tempos antigos não é comum a presença de um recanto próprio para
pessoas enfermas, no qual elas fossem retidas e submetidas a terapêuticas
específicas por profissionais da saúde; geralmente os doentes eram agrupados
junto com os miseráveis, órfãos e viajantes, no que concernia à carência de
desvelo.

A expressão hospital procedia do latim ‘hospitalis’, que tem o sentido de


‘ser hospitaleiro’, qualidade que provém de ‘hospes’, que tem a conotação de
‘hóspede, estrangeiro’, e também de ‘aquele que hospeda’. Atualmente este
termo é similar ao vocábulo ‘nosocomium’, o qual significa ‘local dos enfermos,
asilo dos doentes’.

Documentos que remontam a 3000 anos a.C. comprovam o exercício da


medicina entre os assírio-babilônicos. Esta profissão era regulamentada
pelo Código de Hamurabi, que data de 2.250 anos a.C. Mas não há
comprovação alguma que indique onde essa prática era concretizada e como
era realizado o atendimento, apesar do historiador Heródoto comentar, em sua
obra, sobre a existência de um suposto mercado, ao qual os enfermos eram
transportados para terem suas dores diagnosticadas.

A vinda do Cristianismo instaura um ponto de vista mais humano,


modificando assim a estrutura social e imbuindo o ser humano de novas
obrigações; evolui então velozmente a ideia de ajuda aos necessitados e aos
doentes, bem como aos que se encontram em trânsito. Eles são socorridos com
a ajuda financeira provida pelos cristãos. O decreto de Milão, de 313 d.C.,

33
instituído pelo imperador Constantino, dotando o Cristianismo da liberdade de
ação, e o Concílio de Nicéia, de 325 d.C., o qual estabelecia o atendimento
compulsório aos carentes e enfermos, constituíram a motivação final para o
desenvolvimento dos hospitais.

As diaconias, nesta época, propiciavam os cuidados necessários aos que


precisavam de socorro. Na cidade de Roma os acomodamentos eram mais
vastos e bem estruturados; alguns estudiosos, por esta razão, avaliaram estes
recantos somente como locais de ajuda aos enfermos; mas não se pode
esquecer que os miseráveis e os estrangeiros também eram recepcionados
nestes espaços. Muitas ordens religiosas, durante o período medieval, também
se dedicaram a este trabalho.

A criação dos hospitais foi estimulada principalmente pelo aprimoramento


do aprendizado da Medicina e pela evolução das obras sanitárias. Um exemplar
dos hospitais construídos em terras islâmicas, durante a Idade Média, é o do
Cairo, edificado em 1283. Nele havia enfermarias distintas para pacientes com
lesões, os que já estavam em recuperação, as mulheres, os doentes da visão, e
assim por diante. Um médico administrava o complexo, com a ajuda de outros
profissionais; homens e mulheres, na tarefa da enfermagem, assessoravam o
atendimento.

34
No continente europeu, em fins do século XVIII e princípio do XIX, como
consequência da Revolução Industrial inglesa, impulsionada a partir de 1750,
crescia uma nova e poderosa classe social, a burguesia, imbuída de novas
aspirações nas esferas socioeconômica e moral. Foram implementadas, então,
providências mais eficazes no campo da higiene e da saúde pública.

Neste contexto surgiram os hospitais modernos, estruturados com novas


técnicas, aperfeiçoadas através de longos estudos e inquirições na área da
Medicina. A partir deste momento os doentes são distanciados de seus familiares
e da sociedade e asilados nestes edifícios. Hoje, algumas organizações não-
governamentais, como os Doutores da Alegria e outras, procuram amenizar o
problema causado por essa distância, através de atividades lúdicas e
engraçadas.

As origens do hospital contemporâneo estão ligadas às instituições


religiosas de atenção social da Antiguidade. Os templos e outros
estabelecimentos eram as instituições de cuidado que recebiam os enfermos e
providenciavam atenções especiais.

Viajantes e vítimas de outros infortúnios eram também assistidas por


estas instituições que proviam cuidados médicos gerais e de assistência social.
A função desses hospitais era muito ampla e sua clientela englobava os doentes
e também os sadios.

Com o crescimento das cidades e fortalecimento da burguesia, algumas


mudanças ocorreram em tais instituições. O hospital passa a ser dirigido pela
administração pública, o que contribuiu para a diminuição da responsabilidade
do pessoal religioso, mas não a extinguiu por completo.

Os médicos passaram a ser admitidos com frequência e de acordo com


Foucault (1986), a Idade Média marca a associação entre medicina e hospital.
Durante a Idade Moderna os hospitais mantiveram suas iniciais funções, porém
a eles, foi acrescido mais uma tarefa: segregar contingentes populacionais, ou
seja, abrigar pessoas que representavam perigo ao convívio em comunidade:
mendigos, loucos, prostitutas, portadores de moléstias transmissíveis, etc.

35
Realizava-se a exclusão e o isolamento com o objetivo de promover
controle e disciplina da vida urbana. Funcionavam basicamente como os
estabelecimentos penais daquele período.

Com o passar do tempo, percebeu-se que as instituições hospitalares


haviam se convertido em fonte de desordem, acarretando consequências
desagradáveis para a vida urbana, como contágios, por exemplo.

Foucault (1986) diz que o surgimento do hospital como instrumento terapêutico


é uma invenção relativamente nova, datada do final do século XVIII. Foi
necessária a realização de sucessivas reformas nos hospitais, para erradicar a
insalubridade e adquirir definitivamente seu caráter terapêutico.

O hospital contemporâneo tem como objetivo a recuperação da saúde e


o acolhimento no momento da morte, quando não é possível curar a doença. A
estrutura e organização do hospital são baseadas em tecnologia e os pacientes
são portadores de diversas doenças, físicas e mentais.

Nesse momento, o conhecimento médico vê a necessidade de controlar


de forma rígida tudo aquilo que envolve o enfermo: qualidade do ambiente, dieta
alimentar, temperatura e, claramente, o espaço de internação. Assim, a figura do
médico é alçada à posição de maior destaque, tanto técnico quanto
administrativo dentro da instituição hospitalar.

3.0 A PSICOLOGIA HOSPITALAR

3.1 Histórico da Psicologia Hospitalar

36
A história da Psicologia Hospitalar remonta a 1818, quando, no Hospital
McLean, em Massachussets, formou-se a primeira equipe multiprofissional que
incluía o psicólogo. Nesse mesmo hospital foi fundado, em 1904, um laboratório
de psicologia onde foram desenvolvidas pesquisas pioneiras sobre a Psicologia
Hospitalar. (Ismael, 2005; Bruscato, Benedetti & Lopes, 2004).

No Brasil, os primeiros serviços de Higiene Mental foram fundados na


década de 30, como propostas alternativas à internação psiquiátrica, e o
psicólogo inaugura, junto à Psiquiatria, seu exercício profissional na instituição
de saúde. Os relatos de inserção do psicólogo em hospitais começam na década
de 50, com Matilde Neder instalando um Serviço de Psicologia Hospitalar no
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
(op cit.).

Matilde Neder, ao ser convidada para o trabalho, procurou fazer uma


adaptação técnica de seu instrumental teórico, acoplando-o à realidade
institucional. Houve então a criação de modelos teóricos de atendimentos que
visavam agilizar esses atendimentos afim de torná-los adequados à realidade
hospitalar. (Angerami-Camon, Chiattone & Nicoletti, 2004).

Na década de 70, Bellkiss Wilma Romano Lamosa é convidada para


implantação do Serviço de Psicologia do Instituto do Coração do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Na ocasião,
Bellkiss já havia atuado em diversas unidades do Hospital das Clínicas da USP,

37
mas ao assumir esta responsabilidade, estava sedimentando a atividade e
cravando seu nome no percurso e história da mesma. (op cit.).

O primeiro curso de Psicologia Hospitalar do país foi oferecido pela


Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em 1976, sob responsabilidade
de Bellkiss W.R.Lamosa. (op cit.).

Em 1979, Regina D’Aquino cria, em Brasília, um trabalho junto a pacientes


terminais, tornando-se um dos grandes marcos da atuação frente à morte e suas
implicações. No mesmo ano, Wilma C. Torres inicia, como coordenadora, o
Programa de Estudos e Pesquisas em Tanatologia da Fundação Getúlio Vargas
no Rio de Janeiro. (op cit.).

Em 1981 o Instituto Sedes Sapientiae de São Paulo oferece o primeiro


curso de Especialização em Psicologia Hospitalar, sob a responsabilidade de
Valdemar Augusto Angerami-Camon. Marli Rosani Meleti normatiza, em 1982,
após anos de atividades, o Setor de Psicologia do Serviço de Oncologia
Ginecológica da Real e Benemérita Sociedade Portuguesa de Beneficência. No
mesmo ano, Heloisa Benevides Carvalho Chiattone implanta o Setor de
Psicologia do Serviço de Pediatria do Hospital Brigadeiro em São Paulo. (op cit.).

O I Encontro Nacional de Psicólogos da Área Hospitalar foi promovido


pelo Serviço de Psicologia do Hospital das Clínicas da USP em 1983, sob
responsabilidade geral de Bellkiss W.R. Lamosa. Este foi o primeiro evento de

38
âmbito nacional a reunir os diversos psicólogos que atuavam de maneira
dispersa pelos mais diferentes pontos do país. (op cit.).

Durante muito tempo, a psicologia hospitalar utilizou-se de recursos


técnicos e metodológicos de outras áreas do saber psicológico, que nem sempre
se mostraram adequados ao contexto hospitalar. A inexistência de um
paradigma claro que pudesse definir estratégias dificultou a oportunidade de
legitimação do espaço psicológico nas instituições de saúde. A partir da
pluralidade evidenciada no exercício da psicologia no contexto hospitalar,
iniciou-se um direcionamento de pesquisas e publicações a respeito dessas
práticas a fim de se fortalecer a identidade do profissional dessa área.
(Angerami-Camon, 2002).

Desde o ano 2000, a Psicologia Hospitalar foi reconhecida como uma


especialidade pelo Conselho Federal de Psicologia. Além disso, a fundação da
Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar (SBPH), em 1997, vem
fortalecendo a área no cenário brasileiro. A sociedade tem por objetivo ampliar
o campo de conhecimento científico e promover cada vez mais o profissional que
se dedica a este campo. (Ismael, 2005).

3.2 A História da SBPH

3.2.1 Fundação

39
A Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar foi fundada em 1997, mas
sua história começou muito antes disto. Na década de 1980 começaram uma
serie de congressos e encontros particulares com uma rica programação
científica, que geravam debates e reflexões sobre a profissão.

Dessa forma, na medida em que a práxis do psicólogo hospitalar passa a


ser discutida, surge a necessidade da criação de um órgão que cuidasse dos
interesses e avanços científicos da classe. Em 4 de junho de 1997 as psicólogas
Bellkiss Wilma Romano (SP) e Marisa Decat de Moura (MG) reuniram no Centro
de Estudos do Hospital Mater Dei, quarenta e cinco profissionais que
atuavam em hospitais de todo país para uma assembléia , a partir da qual
fundaram a SBPH em Minas Gerais, com sede em Belo Horizonte. A sociedade
foi legilitamada através de um estatuto, o qual foi aprovado pelos presentes, com
o objetivo de organizar e promover direitos e deveres entre os profissionais.

3.2.2 Congresso da SBPH

No ano seguinte a sua fundação foi realizado o I Congresso da Sociedade,


em Guarujá, São Paulo, nos dias 27, 28 e 29 de agosto de 1998. O II congresso
foi realizado em Belo Horizonte nos dias 19, 20 e 21 de agosto 1999. O III
congresso foi realizado em Salvador, no período de 18 a 21 de outubro de 2001.
O IV congresso em Porto Alegre, no período de 17 a 20 de setembro de 2003. O
V congresso em São Paulo, no período de 07 a 10 de setembro de 2005. O VI
Congresso em Natal, no período de 12 a 15 de setembro de 2007, com o tema:
“10 anos da SBPH: ampliando horizontes na construção de saberes”. O VII
Congresso da SBPH foi realizado em setembro de 2009 no Rio de Janeiro.
Durante esse congresso, foi realizado pela primeira vez em parceria com o
Conselho Federal de Psicologia, a prova para o Concurso de Título de
Especialista em Psicologia Hospitalar. O VIII Congresso da SBPH aconteceu em
Curitiba no ano de 2011. Em agosto de 2013 foi realizado em Belo Horizonte, o
IX Congresso, com o tema “Desafios Contemporâneos da Psicologia Hospitalar:
Teoria e Clínica, pela primeira vez com um Fórum Internacional Psicologia e
Hospital”. Em continuidade à parceria firmada com o Conselho Federal de
Psicologia a SBPH realizou pela terceira vez a prova para o Concurso de Título
de Especialista em Psicologia Hospitalar. O X Congresso da SBPH aconteceu

40
em São Paulo, no mês de setembro de 2015 e teve como tema “O tempo da vida
e a vida do nosso tempo- Repercussões na Psicologia Hospitalar”.

Para 2017 já está ocorrendo uma intensa organização para a realizar o XI


Congresso da SBPH com o tema “Psicologia na Saúde: Novas Demandas,
Novos Caminhos, que acontecerá na cidade de Gramado/RS, entre os dias 30
de agosto a 02 setembro.

3.2.3 Título de especialista

Nesse percurso foi fundamental e decisiva a participação da SBPH junto


ao Conselho Federal de Psicologia - CFP, para conquista do título de
especialista em psicologia hospitalar, regulamentada pela resolução 014/2000
do CFP. Com o título, a psicologia hospitalar deixa de ser uma prática oficiosa
para ser uma especialidade reconhecida. Junto com a especialidade clínica
congrega um número significativo de especialistas registrados.

Em 2009 foi realizada a primeira Prova de especialista em Psicologia


Hospitalar pelo Conselho Federal de Psicologia no VII Congresso Brasileiro da
SBPH no Rio de Janeiro - 04 a 07/09/09.

3.2.4 Produção científica

41
Na ocasião dos Congressos ocorre o Prêmio da SBPH, o qual visa
incentivar e reconhecer a contribuição de trabalhos científicos para o
desenvolvimento e a ampliação do campo da psicologia da saúde e hospitalar.
É um concurso destinado aos melhores trabalhos apresentados sobre
assistência, ensino e pesquisa de psicologia nos diversos contextos da
psicologia da saúde e hospitalar destinado aos autores de trabalhos que se
inscreverem no Congresso.

Outra importante forma de incentivo e divulgação à produção científica dá-


se através da Revista da SBPH. Os periódicos hoje em formato digital que pode
ser acessada através do site da BVsPsi. Esse portal dá maior visibilidade e
possibilita o intercâmbio entre pesquisadores, professores e profissionais da
Psicologia e áreas afins no Brasil e exterior: http://www.sbph.org.br/revista.asp
FÓRUM DE ENTIDADES NACIONAIS DE PSICOLOGIA BRASILEIRIA
(FENPB) E UNIÃO LATINO AMERICANA DAS ENTIDADES DE PSICOLOGIA
(ULAPSI)

A SPBH está inserida no Fórum de Entidades Nacionais de Psicologia


Brasileira – FENPB, desde 2002. Nesta organização, a SBPH emitiu parecer
favorável ao Projeto de Lei que determina a contratação de pelo menos dois
psicólogos a cada duzentos leitos de hospital, emitiu parecer favorável ao
aumento de remuneração do psicólogo que trabalha no SUS, participou
ativamente junto ao FENPB da discussão do ato médico, fez parte da
organização do III Congresso Brasileiro de Psicologia (CBP) com o tema
“Ciência e Profissão”, realizado em 2010 e do plano estratégico da BVSPsi.
Participou junto ao FENPB das sugestões relativas às Diretrizes curriculares
em PSICOLOGIA.

42
A SBPH ainda é membro da União Latino Americana das Entidades de
Psicologia (Ulapsi), chegando a ser eleita, em 2012, como uma das
representantes das entidades das brasileiras na suplência do conselho
executivo. A ULAPSI reúne várias entidades de Psicologia da América Latina e
proporciona uma articulação científica, profissional e acadêmica, sem fins
lucrativos e com o compromisso de incentivar intercâmbios entre as entidades
filiadas, que possam servir como instrumento de transformação e melhorias das
sociedades latino americanas. Como conselheira titular o Brasil conta com a
representação da Psicóloga Adriana Eiko do CFP e conselheira suplente a
Psicóloga Juliana dos Santos Batista da diretoria da SBPH.

3.2.5 Funções do psicólogo hospitalar conforme definição do CFP e SBPH

- Atua em instituições de saúde nos níveis secundário e terciário;

- Atua em instituições de ensino superior e/ou centros de estudo e pesquisa


visando aperfeiçoamento ou especialização dos profissionais;

- Atende a pacientes e familiares, membros de equipe multidisciplinar, alunos e


pesquisadores quando estes estão em pesquisa de campo;

- Avalia e acompanha intercorrências psíquicas quando o paciente está em


tratamento;

- Favorece a promoção e recuperação da saúde física e mental, promove


intervenção para melhorar a relação médico/paciente/família;

- Atende pacientes clínicos/cirúrgicos em diferentes especialidades;

- Realiza atendimento psicoterapêutico, grupos, psicoprofilaxia, avaliação


diagnóstica, interconsultas;

- Trabalha em ambulatório, enfermarias, PS, UTI, UCO e atua de forma


interdisciplinar.

3.2.6 Lista de presidentes da SBPH

 Bellkiss Wilma Romano (SP) 1997 - 1999

43
 Marisa Decat de Moura (MG) 1999 - 2001

 Patrícia Pereira Ruschel (RS) 2001 - 2003

 Silvia Maria Cury Ismael (SP) 2003 - 2005

 Tânia Runicki (RS) 2005 - 2007

 Monica Giacomini (SP) 2007 - 2009

 Claire Terezinha Lazzareti (PR) 2009 - 2011

 Elaine M C Zanolla Dias (MG) 2011 - 2013

 Valeria de Araújo Elias (PR) 2013 - 2015

 Paula Costa Mosca Macedo (SP) 2015 – 2017

3.2.6 Gestão 2015-2017

Atualmente a SBPH é presidida pela psicóloga Paula Costa Mosca


Macedo (SP), juntamente com um grupo de diretores bastante atuantes na área
de psicologia hospitalar e da saúde, que ficarão na gestão entre 2015 e 2017.

A diretoria acredita que uma sociedade é constituída essencialmente por


seus membros. Considera que ser sócio implica em uma participação ativa na
construção do desenvolvimento, conhecimento, formação e atuação da
Psicologia Hospitalar no Brasil. Ser associado da SBPH deve significar contribuir
para o fortalecimento e a promoção da especialidade, ampliando
seu reconhecimento e valorização.

Desde sua criação, a Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar tem


apostado na construção e no avanço dessa práxis, buscando investir na
educação continuada a fim de contribuir para a formação dos profissionais da
área.

Para exercer o trabalho nesse contexto tão peculiar, é fundamental a


formação do psicólogo. Para isso procurou-se ampliar o campo teórico, revisar
conceitos e avançar na clínica que vem sendo formalizada a partir dos impasses.

44
Através dessa história testemunhamos os avanços e desafios da
Psicologia Hospitalar. Portanto, a SBPH reitera o comprometimento dos
psicólogos que trabalham nesta área, de construir e consolidar os pressupostos
teóricos de sua prática, e reconhece a importância da psicologia hospitalar no
cenário brasileiro.

3.3 Um pouco da história da psicologia hospitalar no Brasil

Começamos a ter escritos no Brasil sobre psicologia hospitalar a partir de


1980, pensando sempre no bem estar dos pacientes sejam elas crianças,
adolescentes, adultos ou idosos. Simonetti (2004, p. 29) tem como definição que:
“a psicologia hospitalar é o campo de entendimento e tratamento dos aspectos
psicológicos em torno do adoecimento” e escreve que “o objetivo da psicologia
hospitalar é a subjetividade, é ajudar o paciente a fazer a travessia da
experiência do adoecimento”.
Um exemplo simples mais de grande valia para o entendimento e direcionamento
do assunto é o que salienta o escritor, quando colabora dizendo que:

“em medicina, diagnóstico é o conhecimento da doença por meio de seus


sintomas, enquanto na psicologia hospitalar o diagnóstico é o conhecimento da
situação existencial e subjetiva da pessoa adoentada em sua relação com a
doença.” (SIMONETTE, 2004, p. 33).

45
A psicologia hospitalar surge não para curar a doença da pessoa
hospitalizada, pois disso já cuida e, muito bem o faz a medicina, mas escutar a
pessoa que está inserida no meio dessa doença, escutar a sua subjetividade
porque no fim das contas a cura em si não elimina a subjetividade do sujeito, ou
melhor, a subjetividade não tem cura como diz Simonette (2004).

Nesse cenário existe a necessidade biológica e a necessidade


psicológica, nesse caso o médico trabalha com coisas a fazer e o psicólogo
trabalha com coisas a dizer (SIMONETTI, 2004). Ele também acrescenta que:

“cena hospitalar é rica em conflitos e o psicólogo hospitalar cada vez mais


tem sido chamado a prestar seus serviços não ao paciente, mas aos
médicos, enfermeiras, equipe administrativa e familiares por meio de
programas de controle de estresse, cursos de relações humanas, etc.”
(SIMONETTE, 2004, p. 101).

Por esses e outros motivos, mais tarde por volta de 1997 acontecia a
fundação da Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar (SBPH) que vinha
fomentar e oportunizar discussões através de eventos, congressos e seminários,
fóruns e pesquisa para essa área.
Logo começaram a ser publicados na literatura acadêmica e em sites
como o Scielo Brasil, o Portal de Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePSIC),

46
Biblioteca Virtual em Saúde – Psicologia da União Latino Americana de
Entidades de Psicologia (BVS-PSI ULAPSI), também nos congressos da
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP),
na Associação de Brasileira de Editores Científicos de Psicologia (ABECIP),
Biblioteca Nacional de publicações de livros do MEC, documentos,
recomendações, artigos, entrevistas, textos sobre a psicologia hospitalar e a
humanização do atendimento hospitalar, sobre:

“tratar a pessoa, e não a doença foi um dos objetivos mais valiosos em psicologia
hospitalar, e tal só se possível quando se conhece minimamente a vida da
pessoa seus interesses, seus assuntos favoritos, seu trabalho, sua condição de
vida, etc. e uma ótima maneira de se alcançar esse conhecimento é conversando
de maneira descompromissada com o paciente.” (SIMONETTI, 2004, p. 125).

Tão logo começaram a surgir publicação fomentando esses objetivos


inclusive artigos com vertentes que vão desde atenção especialmente voltada a
esse público revelando ações e práticas que vão do atendimento mais
humanizado até a recreação hospitalar para crianças que estão inseridas nesse
universo.

3.4 Primeiros passos para sistematização de um serviço de Psicologia


Hospitalar

A atuação da(o) Psicóloga(o) Hospitalar abrange o âmbito assistencial, a


pesquisa, o ensino e a gestão dos serviços de Psicologia. Os hospitais possuem
características específicas que demandam da(o) profissional o pensar e o fazer
da Psicologia a partir dessas especificidades.

Sendo assim, um dos primeiros passos para a estruturação e organização


do serviço de Psicologia engloba a necessidade de um diagnóstico institucional.
Esse diagnóstico envolve responder algumas questões que podem nortear as
possibilidades de atuação.

47
Que hospital é este? Qual é esta instituição? Quantos leitos? Quais são as
demandas institucionais? Como funciona esta instituição? Como atender às
demandas da instituição em nível de gestão e da clientela? Qual a clientela
atendida? Como articular o mundo acadêmico com a realidade do hospital? O
que a Psicologia pode oferecer ao hospital de acordo com a realidade da
instituição?

Esse diagnóstico proporciona um mapeamento da instituição e, com isso,


a(o) profissional poderá estruturar o seu trabalho, sistematizando o serviço de
Psicologia. A partir da percepção da instituição, é possível pensar quais serão
as prioridades para atuação, onde o profissional vai intervir e o que precisará
para intervir. Esse panorama possibilitará embasamento para discutir com os
gestores quais as possibilidades de ação, inserção da Psicologia no hospital.

A partir disso, cabe um olhar criterioso para a clientela dessa instituição,


visto que nem todos os indivíduos hospitalizados necessitarão de atendimento
psicológico. Para isso, a(o) profissional poderá se utilizar de entrevistas de
triagem que, segundo Tavares (2000, p. 50), “tem por objetivo avaliar a demanda
do sujeito e fazer um encaminhamento”. Tavares (2000) afirma, ainda, que as

48
entrevistas de triagem são recursos bastante utilizados em serviços de saúde,
onde as demandas são frequentes e diversas, sendo necessário avaliar a
adequação das mesmas frente ao encaminhamento pretendido. Desse modo,
a(o) profissional tem a possibilidade de triar os clientes para definir à quem cabe
a proposta do serviço oferecido e poderão ser atendidos pela Psicologia.

No hospital, a triagem será iniciada por meio da análise do prontuário do


cliente, da comunicação com a equipe de saúde, da qual pode emergir uma
solicitação de atendimento, bem como das observações e entrevistas com o
cliente e/ou acompanhante.

Para Queiroz et al. (2007), o ato de observar é um dos meios mais


frequentemente utilizados pelo ser humano para conhecer e compreender as
pessoas, as coisas, os acontecimentos e as situações. Todavia, a observação
se torna uma técnica científica a partir do momento em que passa por
sistematização, planejamento e controle da objetividade. Em relação ao conceito
de entrevista, Bleger (2007) a descreve como um instrumento fundamental do
método clínico, uma técnica de investigação científica em Psicologia. Em
complemento, Dallagnol et al. (2010) apontam que essa técnica recebe novas
configurações e adaptações considerando as contingências do ambiente
institucional em que a mesma seja utilizada e as particularidades da população
beneficiada.

Após a triagem, nos casos em que existe a demanda de atendimento,


caberá à(o) profissional, realizar uma avaliação mais detalhada.

4.0 O PSICÓLOGO HOSPITALAR

49
“Psicologia Hospitalar é o campo de entendimento e tratamento dos
aspectos psicológicos em torno do adoecimento (…) não trata apenas das
doenças com causas psíquicas, classicamente denominadas”
psicossomáticas”, mas sim dos aspectos psicológicos de toda e qualquer
doença.” (Simonetti, 2004, p.15).

O Conselho Federal de Psicologia reconhece a Psicologia Hospitalar


como área de atuação do psicólogo brasileiro e a inclui nas especialidades
descritas na Resolução CFP nº 013/2007.

4.0.1 Atuação da Psicologia nos hospitais

A presença da(o) psicóloga(o) na área da saúde vem crescendo


gradativamente ao longo dos anos, sendo que, atualmente passam a ser pré-
requisito da maioria das instituições hospitalares que este profissional tenha uma
titulação de especialista. Apesar de haver uma abertura nas instituições de
saúde para a inclusão da(o) psicóloga(o) nas equipes médicas, conforme pontua
Giannotti (1995), estas muitas vezes não sabem o que exigir da(o) psicóloga(o),
na medida em que não têm objetivos claros e definidos ao atendimento voltado
à saúde mental.

50
Rodríguez-Marín (2003) afirma que a Psicologia Hospitalar é a
intersecção de contribuições educativas, científicas e de atuação profissional
que as diversas disciplinas psicológicas fornecem para possibilitar uma melhor
assistência aos pacientes no contexto hospitalar. Para alcançar este objetivo,
precisa estudar não só a doença em si, mas a força e a capacidade de
crescimento pessoal. Para tal, é preciso se apropriar das concepções da doença
orgânica (RUDNICKI, 2007). Desse modo, a justificativa da inserção da
Psicologia no ambiente hospitalar advém de um sofrimento psíquico, em
decorrência de uma vivência de adoecimento ou trauma físico.

O setting terapêutico criado pela(o) psicóloga(o) na atenção à pacientes


hospitalizados e/ou seus familiares tem por princípio garantir um espaço para a
escuta do sofrimento psíquico sem desconsiderar as interfaces com os
processos biológicos e socioculturais que se apresentam naquele momento. O
setting terapêutico não é definido como na atuação clínica convencional, visto
que ampliam- -se o saber/fazer psicológico, fugindo-se dos enquadramentos da
psicoterapia convencional e aproximando-se da atenção psicológica integrada
ao demais fazeres e aos procedimentos que as equipes de saúde prestam aos
pacientes no hospital.

51
Esta escuta clínica da(o) psicóloga(o) hospitalar é ampliada a três
diferentes grupos de atenção: pessoa assistida, família e instituição. Esta tríade
configura um diferencial importante do trabalho da Psicologia dentro das
instituições de saúde, em contraponto com a atuação na clínica, pois o foco
central no sujeito adoecido ou em sofrimento preconiza um olhar ampliado à
família do paciente como extensão dessa dor emocional e uma necessidade de
interação efetiva com a equipe de saúde que acompanha o caso.

Na instituição de saúde a demanda de atendimento psicológico é


“inversa”. Na grande maioria dos casos são os agentes de saúde (médicos,
enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas, dentre outros) que solicitam
avaliação e acompanhamento psicológico, muitas vezes sem antes comunicar
ao próprio paciente. Deste modo, a(o) psicóloga(o) precisa inicialmente
evidenciar essa demanda com ele, a fim de poder desenvolver um vínculo
terapêutico que auxilie nas investigações dos sintomas emocionais que podem
interferir na sua evolução clínica.

A(O) psicóloga(o) hospitalar deve reunir esses conhecimentos e essas


técnicas para aplicá-las visando à melhoria da assistência integral ao paciente
hospitalizado, sem precisar se limitar exclusivamente ao tempo específico da

52
internação. Entretanto, necessita de técnicas diagnósticas e psicoterápicas
breves, que sejam decisivas, sem perder sua eficiência e que conduzam a uma
psicoterapia mais à longo prazo, caso seja necessário.

Atuando no hospital, a(o) psicóloga(o) entra em contato com as diferentes


patologias, com a prática da medicina e dos outros profissionais de saúde com
suas tarefas curativas, seguindo protocolos de tratamentos com seus
desdobramentos, conforme as exigências do Ministério da Saúde e em busca
constante pela qualidade do atendimento. No entanto, hoje, a equipe de saúde,
já compreendendo as demandas biopsicossociais e espirituais, procura cumprir
seus protocolos, sem deixar de lado o aspecto humanizado e de acolhimento do
paciente e da sua família.

A busca pela excelência no atendimento, faz lembrar Ismael (2013, p. 3),


apud. Weber (2009), quando afirma que há:

[…] dois conceitos complementares, importantes no cuidado, que


é “atender” que significa cumprir os protocolos de atendimento,
normas operacionais e cada qual na equipe deve fazer a sua parte
da melhor forma possível; e o “assistir” que significa estar
exatamente ao lado do paciente compreendendo e acolhendo
todas as necessidades, sejam emocionais ou espirituais.

53
As patologias são muito específicas, apresentam sintomas e
desdobramentos tão próprios, que a Psicologia não precisa dar conta, visto que
nossa competência e nosso olhar estarão voltados para a escuta do sofrimento
e o fortalecimento das defesas psíquicas necessárias ao enfrentamento de
situações difíceis como o adoecimento e suas consequências psicossociais,
compreendendo que, neste contexto, muitos se desestabilizam emocionalmente.

Amaral et al., (2012, p. 136) ratifica este pensamento dizendo:

Muitos vivenciam esse processo de forma desadaptativa, e é nesse


contexto que atua a(o) psicóloga(o) hospitalar, trabalhando no
intuito de propiciar um olhar diferenciado ao doente, buscando
melhora da doença a partir do reconhecimento do doente como ser
biopsicossocial.

À(Ao) psicóloga(o), portanto, interessa como a pessoa assistida/


familiares se encontram neste momento, como foi afetada pela situação e quais
os recursos psíquicos presentes para que eles possam atravessar o tratamento
e como poderemos ajudá-los como participante da equipe de cuidadores. E
ainda, não negligenciar a ética da tarefa de ser psicóloga(o): ações situadas e
contextualizadas nos diferentes momentos da doença; preparo científico/técnico,
disponibilidade, resolutividade e interesse genuíno pela pessoa adoecida e
vulnerável.

Enfatiza-se neste ponto que no processo de hospitalização, pelas rupturas


sofridas, requer uma adaptação ao ambiente das enfermarias, na maioria das
vezes, percebido como ameaçador. É necessário um trabalho de reorganização
da rotina e, muitas vezes, dos projetos de vida, visto que nem sempre há uma
recuperação da saúde da pessoa.

A(O) psicóloga(o) chega ao hospital e já encontra uma rotina instalada.


Procedimentos médicos, de enfermagem, curativos, fisioterapia, horários de
alimentação, uma dinâmica própria daquele contexto. É necessário, que eles
saibam qual é o nosso fazer. Para que isto aconteça, precisamos manter o nosso
domínio técnico-teórico e a identidade profissional. Podemos sair dos modelos
tradicionais de psicoterapia para Atenção Psicológica contextualizada neste
espaço multi e interdisciplinar, sem se perder da ética da tarefa de ser

54
psicóloga(o) que está na coerência entre a metodologia e os objetivos
terapêuticos, entre o fazer e as necessidades do paciente e entre o que acontece
nos atendimentos, em cada encontro terapêutico.

Então, pode-se perguntar: Quais as especificidades dos atendimentos


psicológicos nas enfermarias e nos diferentes espaços do hospital? Como atuar
clinicamente neste espaço tão compartilhado com outros saberes?

Devemos, inicialmente, avaliar a condição emocional do paciente e sua


condição orgânica do momento, estabelecendo modalidades de intervenção
para cada pessoa assistida/família, em-situação e considerar:

• A disponibilidade da pessoa assistida para os atendimentos. Considerar


que ele não foi ali procurar a(o) psicóloga(o) e sim cuidados médicos e por isso
não compreenda a disponibilidade da(o) psicóloga(o) para uma atenção
psicológica, apresentando indisposição e preconceitos. Deve-se, pois,
considerar, sobretudo, a capacidade do paciente para a elaboração de
conteúdos psíquicos.

• O setting terapêutico, na maioria das vezes, acontece na “beira do leito”,


precisando ser adaptado a certas interferências como TV ligada ou pessoas
circulando, por exemplo.

• A dinâmica do contexto hospitalar pede nossa flexibilidade metodológica


— não há horário definido, nem dias marcados, tudo depende da necessidade

55
emocional da pessoa assistida e das rotinas do tratamento como curativos,
exames, gravidade da patologia, entre outros. Os atendimentos devem ter
começo, meio e fechamentos, focados e diretivos, com duração média de trinta
a quarenta minutos. Lembramos que neste espaço não se realiza a psicoterapia
nos moldes tradicionais e que poderão ser acertados encaminhamentos, por
ocasião da alta hospitalar ou se por acaso o paciente for transferido para outro
espaço ou clínica, como uma UTI, por exemplo. Ali estará outro colega que
prestará a assistência necessária.

• A presença dos familiares, que também podem estar recebendo atenção


psicológica. Nesse sentido, é imprescindível cuidar do sigilo nesses casos.

• Ações terapêuticas adequadas e diversas, conforme as necessidades


da pessoa assistida/família, como atendimentos individuais, em grupo,
psicoeducação, diálogo franco, manejo ambiental, entre outros (BRUSCATO et
al., 2012; SOUZA, 2013; SAFRA, 2003; BORGES, 2009; BATISTA E DIAS,
2003; ROMANO, 1999; ANGERAMI-CAMON, 1996).

4.1 Tarefas básicas da Psicologia Hospitalar (Rodriguez-Marín, 2003):

1) função de coordenação: relativa às atividades com os funcionários do


hospital;

56
2) função de ajuda à adaptação: em que o psicólogo intervém na qualidade do
processo de adaptação e recuperação do paciente internado;

3) função de interconsulta: atua como consultor, ajudando outros profissionais a


lidarem com o paciente;

4) função de enlace: intervenção, através do delineamento e execução de


programas junto com outros profissionais, para modificar ou instalar
comportamentos adequados dos pacientes;

5) função assistencial direta: atua diretamente com o paciente;

6) função de gestão de recursos humanos: para aprimorar os serviços dos


profissionais da organização.

4.2 Em quais locais o psicólogo hospitalar atua?

Onde atua?

Instituições de saúde.

O que faz nesse local?

Participa da prestação de serviços de nível secundário ou terciário da atenção à


saúde.

Onde atua?

Instituições de ensino superior e/ou centros de estudo e de pesquisa.

O que faz nesse local?

Visa o aperfeiçoamento ou a especialização de profissionais em sua área de


competência, ou a complementação da formação de outros profissionais de
saúde de nível médio ou superior, incluindo pós graduação lato e stricto sensu.

57
4.3 Atividades do Psicólogo Hospitalar:

Atende a:
 Pacientes;
 Familiares e/ou responsáveis pelo paciente;
 Membros da comunidade dentro de sua área de atuação
 Membros da equipe multiprofissional e eventualmente administrativa,
visando o bem-estar físico e emocional do paciente;
 Alunos e pesquisadores, quando estes estejam atuando em pesquisa e
assistência.

4.4 Oferece e desenvolve:

Atividades em diferentes níveis de tratamento, tendo como sua principal


tarefa a avaliação e acompanhamento de intercorrências psíquicas dos
pacientes que estão ou serão submetidos a procedimentos médicos, visando
basicamente a promoção e/ou a recuperação da saúde física e mental.

4.5 Promove:

Intervenções direcionadas à relação médico/paciente, paciente/família, e


paciente/paciente e do paciente em relação ao processo do adoecer,

58
hospitalização e repercussões emocionais que emergem neste processo.

4.6 Modalidades de intervenção no hospital:

As modalidades de intervenção dependerão da demanda e da área específica


de atuação. São elas:

 Atendimento psicoterapêutico;

 Grupos psicoterapêuticos;
 Grupos de psicoprofilaxia;
 Atendimentos em ambulatório e Unidade de Terapia Intensiva;
 Pronto atendimento;
 Enfermarias em geral;
 Psicomotricidade no contexto hospitalar;
 Avaliação diagnóstica;
 Psicodiagnóstico;
 Consultoria e interconsultoria.

4.7 Trabalho em Equipe no Hospital

“A integração da equipe de saúde é imprescindível para que o


atendimento e o cuidado alcancem a amplitude do ser humano,
considerando as diversas necessidades do paciente e assim,

59
transcendendo a noção de conceito de saúde, de que a ausência de
enfermidade significa ser saudável”. (Fossi & Guareschi 2004, p. 31).

O profissional de psicologia participa de decisões em relação à conduta a


ser adotada pela equipe, objetivando promover apoio e segurança ao paciente e
família, aportando informações pertinentes à sua área de atuação, bem como na
forma de grupo de reflexão, no qual o suporte e manejo estão voltados para
possíveis dificuldades operacionais e/ou subjetivas dos membros da equipe.

I MPORTANTE! A equipe multidisciplinar é formada a partir das


necessidades do paciente, portanto, não é pré-definida. Com a demanda, os
profissionais da saúde se integram, visando a satisfação das necessidades da
pessoa, proporcionando seu bem-estar global.

4.8 Ética e Trabalho Em Equipe

Consta no Art. 12 do Código de Ética Profissional do Psicólogo que “nos


documentos que embasam as atividades em equipe multiprofissional, o
psicólogo registrará apenas as informações necessárias para o
cumprimento dos objetivos do trabalho.

60
4.9 Relatório Multiprofissional

A resolução CFP nº 06/2019, traz uma nova modalidade de relatório: o


multiprofissional.

O Relatório Multiprofissional é resultante da atuação da(o) psicóloga(o)


em contexto multiprofissional, podendo ser produzido em conjunto com
profissionais de outras áreas, preservando-se a autonomia e a ética profissional
dos envolvidos.

A descrição da demanda constitui requisito indispensável e deverá


apresentar o raciocínio técnico-científico que justificará procedimentos utilizados
pela(o) psicóloga(o) e/ou pela equipe multiprofissional.

A conclusão do relatório multiprofissional pode ser realizada em


conjunto, principalmente nos casos em que se trate de um processo de trabalho
interdisciplinar.

4.10 Como se tornar um psicólogo hospitalar?

Naturalmente, a primeira atitude a tomar é investir em uma graduação em


Psicologia. Isso vai exigir pelo menos quatro anos de estudos.

61
Aqui vale um esclarecimento: a maioria dos cursos de Psicologia é do tipo
bacharelado, mas também existem as licenciaturas. Se você pretende se tornar um
psicólogo hospitalar, o mais indicado é fazer o bacharelado, já que a licenciatura é
focada em preparar o profissional para o âmbito escolar (orientador educacional ou
formação de professores, no caso da Psicologia).

Existem centenas de cursos de bacharelado em Psicologia espalhados pelo


país. É importante fazer pelo menos uma sondagem básica sobre cada faculdade,
para verificar a sua reputação no meio acadêmico e no mercado profissional. E,
claro, não deixe passar o mais importante: o curso e a instituição devem ter o aval
do Ministério da Educação (MEC) para que o diploma seja válido em todo o território
nacional. Vá atrás dessa informação antes de qualquer outra.

A graduação é puxada, repleta de leituras e trabalhos, mas extremamente


interessante. Você vai encontrar inúmeras disciplinas fundamentais para o exercício
da profissão de psicólogo hospitalar, como por exemplo: Teoria Psicoterápica,
Neuropsicologia, Psicologia de Atenção à Saúde e Psicologia Comportamental, só
para citar algumas.

E nem tudo é teoria. Na parte final do curso, você terá contato com a prática
da profissão, fazendo os estágios supervisionados obrigatórios.

Passada a faculdade, é necessário obter o registro no Conselho Regional de


Psicologia (CRP) de sua região, quesito obrigatório para exercer a profissão de
psicólogo. A inscrição no CRP não é feita por meio de nenhuma prova ou exame.
Basta apresentar o seu diploma e outros documentos pessoais.

Mas os estudos não param por aí. Para ser um psicólogo hospitalar, você
precisa se especializar. Não que isso seja condição imprescindível para começar a
trabalhar, mas hoje em dia uma especialização é a única maneira de conseguir
destaque em meio a tantos graduados saindo das faculdades anualmente. O Brasil
oferece um bom leque de opções de especializações nas diferentes áreas da
Psicologia Hospitalar, em cursos presenciais e a distância. A duração em geral é de
dois anos.

62
Há ainda outra possibilidade de especialização: obter o Título de Profissional
Especialista em Psicologia do Conselho Federal de Psicologia (CFP). O detalhe aqui
é que, para se candidatar a esse título, é preciso ter pelo menos dois anos de
experiência comprovada na profissão. Além disso, é necessário realizar provas
práticas e teóricas.

5.0 SETTING TERAPEUTICO

Setting terapêutico dentro da Psicologia se refere ao espaço na qual a


relação entre paciente e terapeuta acontece. A proposta é que o terapeuta utilize
uma escuta diferenciada para os pacientes encontrarem novos meios de lidar
com os problemas. Contudo, ainda é comum que a consulta com o profissional
seja feita apenas em último caso.

A ideia de setting terapêutico ou setting analítico possui várias


perspectivas, dependendo do autor em questão. Para alguns, se mostra
direcionado ao ambiente físico e os laços de cooperação dentro do tempo e
espaço. Por outro lado, alguns afirmam seu caráter estrutural e dinâmico no
interior de uma sessão e que contribui ao tratamento dela.

Olhando por essa última ótica, o trabalho feito com o setting constitui-se
de maneira relacional. Ele acaba por influenciar a conduta técnica e ética na
relação que ultrapassa o ambiente físico da terapia. Não apenas isso, mas

63
também dos princípios colocados em contrato que conduzem o encontro do
terapeuta com paciente.

5.1 A construção do setting terapêutico

O trabalho com o setting terapêutico é construído de forma sequenciada,


alinhando adequadamente os elementos envolvidos. Aqui se estabelecem
regras específicas, de maneira a solidificar os pilares para cada trabalho. Não
apenas isso, mas também a combinação adequada e individualizada entre o
terapeuta e paciente.

A combinação se trata de preparar o ambiente de trabalho de acordo com


a demanda específica do visitante. Os papéis de cada um ficam devidamente
especificados e entendidos para a iniciação do projeto. Com isso, acaba se
estabelecendo uma assimetria necessária que dá identidade ao encontro.

Cabe ao terapeuta encontrar a linha de equilíbrio perfeita ao seu enquadre


dentro da terapia. Desse modo, precisa ser firme ao mesmo tempo e que
também é flexível para controlar o fluxo de interação. Graças a isso que a
transferência e a contratransferência são bem direcionadas quando surgirem ao
longo do trabalho.

64
5.2 Benefícios do setting terapêutico

Dentre as diversas mudanças alcançadas com o setting terapêutico,


citamos:

5.2.1 Colaboração entre profissional e paciente

O trabalho somente fica possível quando o psicoterapeuta e paciente


atuam juntos na avaliação mental. Seus resultados aparecem de maneira
gradual, sendo visto também na facilidade de comunicação entre as partes.

5.2.2 Disciplina de tempo

Como dito linhas acima, o processo de setting em consultório envolve uma


preparação rigorosa para atender melhor cada paciente. Nisso, o tempo antes,
durante e depois é adequadamente trabalhado, gerando uma disciplina de tempo
sadia ao paciente. Acontece que isso acaba sendo levado à vida, tornando a
pessoa mais responsável com suas tarefas.

5.2.3 Crescimento e amadurecimento pessoal

Em um ambiente propício a isso, seu desenvolvimento encontra mais


espaço para que possa florescer. Além de lidar com suas questões pessoais, a
pessoa em questão pode rever conceitos e ideias limitantes. Nisso, amadurece

65
sua postura e se mostra alguém mais sadio intelectualmente e socialmente,
compreendendo mais facilmente os outros.

5.2.4 Olhar para si mesmo

É cabível deixar claro que que o ambiente do setting analítico ajuda a


desenvolver a capacidade de auto-observação. Aqui se instala o momento
necessário para que o visitante possa refletir sobre si e entender o que impede
ele. Nesse caminho, fica viável encontrar novas abordagens que te permitam
conduzir e compreender mais sua vida.

O trabalho psicoterapêutico ajudará na lapidação de suas capacidades


interpessoais. Nisso, a empatia, resolução de conflitos, comunicação e o
fortalecimento de sua estrutura mental. Assim, ficará mais fácil tolerar diferenças
e crescer ao lidar com os obstáculos que encontrará em seu caminho.

6.0 O PAPEL DO PSICÓLOGO HOSPITALAR NA ATUALIDADE

O adoecimento traz em si uma desorganização da vida do paciente,


provocando várias transformações em sua subjetividade (CHIATTONE, 2011).
Essa desorganização pode envolver mudanças de hábitos, de identidade
(despersonalização) e muitas vezes o paciente pode acabar se tornando apenas
mais um número de CID e de leito (ESTIVALET, 2000). Sendo assim, junto com
66
a equipe multidisciplinar surge a figura do psicólogo com o intuito de escutar e
acolher o sofrimento do indivíduo frente as suas principais dificuldades no que
tange essa fase. O objetivo do psicólogo hospitalar é auxiliar o paciente em seu
processo de adoecimento, visando à minimização do sofrimento provocado pela
hospitalização, devendo prestar assistência ao paciente, seus familiares e a toda
equipe de serviço, levando em conta um amplo leque de atuação e a pluralidade
das demandas (CHIATTONE, 2011). A atuação do profissional da psicologia no
contexto hospitalar não se refere apenas à atenção direta ao paciente, refere-se
também a atenção à família e a equipe de saúde, com o objetivo de promover
mudanças, atividades curativas e de prevenção, além de possibilitar a
diminuição do sofrimento que a hospitalização e a doença causam no sujeito.

Santos; Jacó-Vilela, (2009) apud Gioia-Martins; Rocha Júnior (2001)


acreditam que o profissional da psicologia inserido no contexto hospitalar não
tem consciência de que sejam suas tarefas e seu papel dentro das instituições,
ao mesmo tempo em que o hospital também tem dúvidas quanto ao que esperar
desse profissional, desse modo o distanciamento da realidade institucional e a
inadequação da assistência mascarada por um falso saber pode gerar
experiências mal sucedidas. A psicologia hospitalar por ser uma área que lida
diretamente com a subjetividade e sofrimento do outro exige que o psicólogo
entenda os limites de sua atuação para não se tornar um dos elementos invasivos
provenientes da hospitalização, bem como promover a humanização e a
transformação social no ambiente hospitalar, sem ficar preso nas teorizações
que isolam conflitos mais amplos (ESTIVALET, 2000). Conjuntamente com o
enfoque da humanização e do atendimento em saúde, a interdisciplinaridade é
uma das bases da tarefa do psicólogo que adentra no hospital, pois partindo
67
desse pressuposto o sujeito doente deve ser considerado biopsicossocial
(TAVARES et al., 2012).

Contudo, é um desafio para o profissional da psicologia adentrar em um


contexto onde se predomina o olhar biomédico, onde há limites institucionais
regidos por regras, condutas e normas, além disso, o trabalho do psicólogo é
muitas vezes deficiente no contexto hospitalar, pois a ausência de estrutura física
impossibilita o espaço de cuidado do psicólogo (CHIATTONE, 2011). Ainda é
muito presente o modelo tradicional de atuação do mesmo nesse contexto,
porém, na verdade, mesmo que se busquem novas formas de cuidados
psicológicos, nos deparamos com situações onde o profissional obriga-se a
exercer seu trabalho nos corredores e entre macas (SEBASTIANI, 2011).

O estado precário da saúde da população brasileira é um entrave dentro


do saber psico, pois exige do profissional uma revisão de seus valores pessoais,
acadêmicos e emocionais. Assim, nessa perspectiva, o contexto hospitalar
difere-se do contexto de aprendizagem e orientação acadêmica, já que se
percebe uma realidade precária nas condições de saúde da população que é
alvo constante das injustiças sociais e aspira por um tratamento hospitalar digno
(SALMAN; PAULASKAS, 2013). Diante dessa concepção e das dúvidas que
abarcam a psicologia e o papel do psicólogo hospitalar, a pesquisa realizada
teve como objetivo entender a construção do papel do psicólogo hospitalar na
atualidade, verificando a construção histórica do perfil desse profissional na
realidade brasileira e seus possíveis desdobramentos, levando em consideração
sua atuação na dimensão assistencial e na saúde pública atualmente.

6.1 A psicologia e sua construção como ciência

68
Segundo Soares (2010), por volta do século XIX, historiadores da
medicina deram uma grande importância e vasta contribuição para o estudo da
Psicologia no Brasil, onde através de seus doutoramentos, assim chamado os
trabalhos de conclusão do curso de medicina, foi possível trazer para o homem
de cultura grandes conclusões interessantes e que contribuíram para esse
processo. Com tendência a Neuropsiquiatria, a Psicofisiologia e Neurologia, as
faculdades de medicina, não excluíam a Psicologia de seus estudos, pois havia
muita relação da mesma com os campos de estudos e suas pesquisas.

Em meados do século XX, Ivan Petrovitch Pavlov inicia seus estudos


pautados nos reflexos condicionados, tendo influência muito grande para a
psicologia, denominando então sua teoria de Psicologia Experimental, onde no
Brasil Henrique Roxo foi o primeiro autor a orientar estudos relacionados ao tema
e com bases no estudo de Binet-Simon associou a Psicologia Experimental à
Psiquiatria e à Neurologia (SOARES, 2010).

Ainda para Soares (2010), com a grande influência benéfica de correntes


doutrinárias que as faculdades de Medicina da Bahia e do Rio de Janeiro
recebiam no período, com teses, atividades e ensaios médicos averiguou-se que
estes então traziam um caráter científico, preciso e rico no interesse psicológico,
por estarem voltados aos métodos e técnicas da psicologia de maior objetividade
e confiabilidade, onde diante deste movimento começaram a surgir nos hospitais
e clínicas psiquiátricas os laboratórios de Psicologia.

69
A atuação do psicólogo brasileiro se consolidou primeiramente no âmbito
privado com o objetivo da prática psicoterápica clínica, assim para Marcon, Luna
e Lisboa (2002) após a década de 60, a área da saúde pública abriu o espaço
para a absorção dos profissionais em diversos segmentos, fazendo com que sua
atuação nos hospitais se tornasse então uma nova área de atuação. Todavia,
sabe-se que somente em 1962 a profissão de psicólogo foi regulamentada no
Brasil e o primeiro curso de Psicologia foi implantado na universidade de São
Paulo, quando logo mais tarde em 1987 a 1ª Conferência de Saúde Mental
aprovou a redução progressiva de leitos em hospitais psiquiátricos e sua
substituição por serviços alternativos à internação psiquiátrica, em seguida no
ano de 1992 a 2ª Conferência de Saúde Mental aprovou a rede de atenção
integral à saúde mental, com o objetivo de substituir os hospitais psiquiátricos.
No âmbito de sua atuação, embora já se visualizasse a passagem para um
modelo de atenção integral, o psicólogo era visto ainda exercendo seu trabalho
clínico e não um trabalho ligado à saúde ou ao biopsicossocial e que em relação
a sua formação os psicólogos não a tiveram pautados na área da saúde
(MARCON; LUNA; LISBOA, 2002).

70
6.2 A política de humanização hospitalar e os papéis dos profissionais de
saúde

Segundo Mota; Martins e Véras (2006) no âmbito hospitalar o movimento


de humanização é voltado para um processo de educação e treinamento dos
profissionais da saúde para tornar a experiência da hospitalização algo mais
confortável para o usuário, desmistificando toda aquela dor que a internação traz
a ele, visa melhorar o atendimento ao usuário e as condições do ambiente de
trabalho para os profissionais da saúde. Partindo desse pressuposto, podemos
falar da ética, que é quando alguém se preocupa com a consequência de sua
conduta sobre o outro, mas para que haja ética é preciso mudar o olhar sobre o
outro, mudança essa que culmine no respeito a ele como ser humano (MOTA;
MARTINS; VÉRAS; 2006).

Facilmente se presume que o psicólogo passou a ser bem visto no


contexto hospitalar, nas enfermarias e nos ambulatórios quando sua atenção se
voltou para a humanização, fazendo compreender a relação dos profissionais da
saúde com o paciente e com os familiares. Estudos apontam que buscar
informações sobre a história do paciente é algo indispensável em sua atuação,
pois é o psicólogo quem pode oferecer uma escuta, uma ajuda psicológica e
oferecer a oportunidade de confronto do paciente com sua angústia e sofrimento

71
na fase da hospitalização, fase esta que gera muitas crises (MOTA, MARTINS e
VÉRAS, 2006).

Para Salman; Paulaskas (2013), a humanização tem como aspecto


fundamental a valorização do indivíduo como um todo, fazendo com que o
psicólogo tenha como papel a valorização do ser doente do que a patologia do
mesmo, aprendendo também a ouvir seus familiares em um local próprio e
adequado, nos deixando claro que para a prática da humanização dar certo é
necessário realizar uma execução reflexiva acerca dos valores e princípios que
norteiam a prática profissional, culminando num tratamento digno, solidário e
acolhedor por parte dos profissionais da saúde ao doente, garantindo que a
humanização busque sempre manter ou melhorar a qualidade da comunicação,
consequentemente a possibilidade de relacionamentos mais saudáveis e
próximos.

Um aspecto importante em relação ao papel dos profissionais da


psicologia no hospital é que este profissional deve estar pautado nos aspectos
do adoecer, das crenças e das fragilidades dos pacientes e de seus familiares,
assim para os autores o psicólogo deve promover a diminuição da angústia e da
tensão para então mudar a impressão que as pessoas têm sobre o hospital, em
contrapartida fazendo os usuários perceberem o hospital como um lugar que
tenta oferecer condições para uma manutenção ou recuperação da saúde,
ficando claro que a atuação do psicólogo hospitalar consiste de uma rápida
capacidade de ação emergencial e para a construção de uma política qualificada
em relação à saúde a humanização deve ser vista como uma das dimensões
indispensáveis nesse processo, onde tenha função de mostrar que além de um
programa, sua aplicação tem objetivo de torna-se uma política que opere em
toda rede dos hospitais brasileiros (MOTA, MARTINS e VÉRAS, 2006).

72
6.3 Pacientes em crise e o papel da psicologia hospitalar

Ao trabalhar com o paciente enfermo, o psicólogo lida com o sofrimento


físico e psíquico, tendo que compreender o sujeito em sua integralidade,
entendendo e considerando o conflito determinado pela situação da doença e da
hospitalização, o sofrimento físico, a dor e o mal-estar, destacando que a
necessidade do atendimento psicológico muitas vezes não é percebida pelo
paciente, pois diante da situação em si, todas as preocupações estão voltadas
para o corpo doente, fazendo necessário então que a atuação preventiva no
contexto hospitalar se torne real, com o objetivo de oferecer ajuda para que os
pacientes possam alcançar o reconhecimento das motivações que estão
subjacentes a seus problemas, dedicando-se precocemente ao diagnóstico de
transtornos psicológicos do paciente e seus familiares, em trabalho diário com o
objetivo de decodificar suas dificuldades. Com um perfil mais emergencial e
focal, a intervenção pode ser feita pela psicoterapia breve ou pela psicoterapia
de emergência, dando total apoio e suporte ao paciente, considerando o
momento de crise vivenciado pelo mesmo na situação especial e crítica da
doença e sua hospitalização, sendo assim, tanto a psicoterapia de emergência
como a intervenção em crise são caracterizadas como técnicas breves advindas
da psicanálise com especificas adaptações no nível estratégico para situações
de emergência ou crise (CHIATTONE, 2011).

73
Chiattone (2011) ressalta ainda a importância do olhar do psicólogo em
relação aos pacientes hospitalizados, devendo levar em consideração alguns
aspectos importantes nos processos de resolução da crise, sendo eles: os traços
de personalidade dos pacientes, suas atitudes frente a vida, a maturidade interna
e o grau de integração psíquica, as crenças que o mesmo possui sobre sua
doença, suas reações a crises passadas e suas perdas significativas, os sinais
psicológicos ou físicos de depressão, a presença de reações ou sinais
paranoides e por fim a doença instalada, onde a psicoterapia emergencial surge
como um apoio caracterizando-se de um processo de superação dos problemas
ligados a situações de natureza traumática, onde dependendo do olhar que a
pessoa tem sobre a situação permite que a mesma possa expressar livremente
seus sentimentos em relação ao seu estado, sendo indicada a pacientes que
passam por sobrecarga emocional muito grande, auxilia o paciente a atravessar
o período crítico em que se encontra, determinado pelo processo da doença e
hospitalização, permitindo-lhe buscar a elaboração e integração subjetiva dos
acontecimentos.

Considerando que o hospital é uma instituição marcada pela luta


constante entre a vida e a morte. Um dos princípios significativos da psicologia
no contexto hospitalar é a atuação conjunta do psicólogo e as equipes de
saúdes, onde o objetivo é maximizar nos pacientes a esperança de melhora,
cura e minimização ou suspensão do sofrimento em si, já que a maioria das
pessoas tem uma imagem negativa relacionada ao ambiente hospitalar,
marcada por mortes e sofrimentos, sendo um local onde excita uma batalha
constante diante das condutas terapêuticas. Portanto, a atuação do psicólogo
requer uma maturidade que passa pelo exame detalhado de sua posição diante
da morte e do morrer, sendo de suma importância o profissional elaborar o medo
e a negação em relação a essa problemática, diagnosticar em si as dificuldades
de enfrentamento e elaboração da própria negação da morte para então
entender a negação da própria instituição, do paciente e dos familiares, sendo
que muitas vezes trabalhar com o sofrimento ou perda de significado da
existência pelo paciente pode despertar nos profissionais as mesmas vivências
(CHIATTONE, 2011).

74
Sendo assim, para Chiattone (2011), a tarefa do psicólogo se define pela
capacidade de apoio, compreensão e direcionamento humanizado das
diferentes situações pelas quais passam esses pacientes e seus familiares, e
culminar para que todo programa terapêutico eficaz e humano deva incluir apoio
psicológico para o enfrentamento de todo o processo de doença e possibilidade
de morte, pois o manejo de pacientes hospitalizados inclui a adaptação
fisiológica e medica e a adaptação psicológica e existencial frente a situação
traumática em si. Em relação aos pacientes e seus familiares, o psicólogo deve
estruturar um trabalho de psicoterapia pautado num modelo comunicativo,
reforçando o trabalho estrutural e de adaptação dos pacientes e seus familiares
no enfrentamento da problemática vivenciada por ambos, direcionado, então, em
um nível de apoio, atenção, compreensão, suporte ao tratamento, clarificação
dos sentimentos, esclarecimentos sobre a doença e o fortalecimento dos
vínculos pessoais e familiares.

Em segundo plano, o psicólogo hospitalar pode ainda realizar a formação


de grupos com o objetivo de informar, culminando num espaço de reflexão e
expressão dos sentimentos, minimizando o impacto emocional e estresse
vivenciados pelos mesmos. Em relação às equipes de saúde, o psicólogo
hospitalar pode sistematizar a realização de grupos operativos, realizando um
treinamento e clarificando o papel de cada profissional, além de estimular a

75
realização de atividades para a diminuição do estresse visto que em profissionais
da área da saúde o nível de estresse é elevado (CHIATTONE, 2011).

Para Salman e Paulauskas (2013) apud Cordioli (1998), um dos principais


desafios da psicologia tem sido fundamentar e desenvolver técnicas de
intervenção psicológica quem atendam às demandas específicas de pacientes
em ambientes hospitalares, tendo como objetivo possuir intervenções que levem
aos pacientes uma melhor aceitação de sua doença bem como o tratamento,
onde as intervenções com os pacientes em crise constituam na utilização de
técnicas para diminuir a ansiedade, favorecendo o desenvolvimento de um
estado emocional mais tolerável e capaz de restaurar a estabilidade afetiva e
suas relações com o ambiente.

O uso do manejo assistencial centrado na equipe, um diagnóstico


diferencial, um atendimento psicológico de apoio, um manejo ambulatorial,
técnicas complementares e intervenção familiar são fortemente recomendadas,
onde a flexibilidade e a criatividade são condições fundamentais para a
percepção das necessidades que cada paciente apresenta, com isso a
construção de um ambiente terapêutico apropriado e a centralização do trabalho
com o paciente em crise gera o melhor manejo das relações humanas no
ambiente hospitalar, o que não é tarefa somente do psicólogo, mas também dos
outros profissionais da área da saúde inseridos nesse contexto, já que os
mesmos possuem um contato mais próximo e contínuos com esses pacientes,

76
no caso das enfermeiras, fisioterapeutas, nutricionistas e médicos intensivistas.
(SALMAN; PAULAUSKAS, 2013).

Desse modo, para Salman e Paulauskas (2013), o atendimento


psicológico ao paciente pode ser caracterizado por intervenção focal pautado na
psicoterapia breve de apoio, consistindo em avaliar sua situação, analisar a
maneira de enfrentamento e a manifestação do paciente no momento presente,
bem como construir opções de pensamento e, consequentemente, o
comportamento. O que é levado em conta e o que se espera do terapeuta é que
o mesmo possua uma postura ativa no manejo da assistência, com o intuito de
permitir continência das manifestações, expressando concordância com ideias e
atitudes do paciente, assim também reforçar as funções adaptativas do ego,
reassegurando a boa percepção da realidade, além disso, o psicólogo tem como
papel favorecer a percepção de novas formas de enfrentamento da situação,
promovendo o devido suporte para o momento de instabilidade emocional,
favorecendo o vínculo de confiança com a equipe multiprofissional.

6.4 Adoecimento, hospital e crise

A experiência de adoecimento e hospitalização representam para a


maioria das pessoas enfermas um momento muito difícil pelas ameaças de
perdas, como da autonomia, cujos desejos são delegados a outros ou

77
substituídos por procedimentos médicos necessários à sobrevivência, à
possibilidade de morte, entre tantos outros fatores. É neste cenário hospitalar
que muitas vezes o paciente encontra-se em situação de crise. Para Simon,
(1989, p. 60) a crise acontece quando “há um aumento ou redução significativa
do espaço no universo pessoal” entendendo-se “universo pessoal” o “ser em sua
unidade”, cujo significado emocional que ele dá ao fato experienciado é
individual, intransferível e original.

Seguindo este pensamento, o paciente em crise, “ser em sua unidade”,


sente-se, muitas vezes, incapaz de reagir, pois encontra-se vulnerável. Sartre
fala do ser-em-situação (VERGEZ; HUISMAN) em que apenas cada um pode
atribuir seu próprio sentido ao momento vivido. São momentos de rupturas, em
que o paciente desestabiliza-se, a família desestabiliza-se e tudo isso provoca,
na equipe de saúde, afetações importantes na subjetividade de cada membro
cuidador, mobilizando, também, sentimentos ambivalentes e conflituosos.

Neste sentido, não se pode isolar a doença do ser que adoece, do


sentimento de estar-enfermo, que coloca o sujeito numa experiência de mal-
estar, sendo o adoecimento considerado uma situação-problema vivida pelo ser-
doente-em-situação. Tal experiência decorrente do adoecimento envolve
sensações e sentimentos diversos, dependendo das percepções de quem está
vivenciando este momento ímpar. E sendo assim, pensando-se na
hospitalização e nos momentos de dor e de sofrimento, pode-se compreender
os movimentos particulares, os mecanismos de enfrentamento de cada um dos
envolvidos e reflexões sobre como atravessar as dificuldades da situação.

78
O adoecimento, então, é compreendido como um momento de crise dada
as possíveis rupturas significativas, mobilizações do ponto de vista emocional,
as implicações e desdobramentos na existência da pessoa. Uma experiência de
mal-estar que tem um poder desestabilizador e que pede cuidados.

Safra (2003) afirma que nas situações de crise, o sujeito pode estar
paralisado pelo problema, perdendo momentaneamente a capacidade de
encontrar soluções. A crise paralisa, cuja inércia não permite que ele consiga
falar sobre o problema e colocar sua questão em movimento, podendo encontrar
meios de melhor se relacionar com ela e aceitar suas dificuldades.

No mesmo sentido, Rolnik (1994, p. 3) aponta que:

[…] crises, “são quebras, rupturas, demolições que se dão em


níveis e graus de intensidade variáveis, com diferentes ritmos –
mais bruscos ou mais lentos, mais fortes ou mais fracos, abalando
pedacinhos de nossos territórios ou o nosso território quase por
inteiro, camadas mais superficiais ou mais profundas — seja de
que ordem forem tais quebras, elas acontecem necessariamente e
ao longo de nossa existência.

Por esta compreensão, crises acontecerão ao longo da existência, mas


como enfrentá-la? O que pode ser feito pelas(os) psicólogas(os) para favorecer
o processo de enfrentamento e superação?

Durante a crise a pessoa perde momentaneamente sua capacidade de


equilíbrio, desestabiliza-se, há uma redução da capacidade de se encontrar
soluções imediatas para o problema que interfere na capacidade adaptativa da
pessoa. Há um aumento do nível de tensão. Reações de ajustamentos são
necessárias. No entanto, sentimentos, percepções distorcidas da realidade ou
mesmo reais e insuportáveis, fantasias destrutivas, exames e procedimentos
médicos, prognóstico, põe em dúvida o grau de suportabilidade dos pacientes e
seus familiares. Muitas vezes, eles pedem para morrer. Eles podem chegar a um
limiar de afetação que os impedirá de lançar mão de mecanismos adaptativos
adequados e a Atenção Psicológica poderá favorecer este processo (ROMANO,
2008; BRUSCATO, 2012; SIMON, 1989; SAFRA, 2003).

79
É nesta perspectiva que Simonetti (2004, p. 15) afirma: “toda doença
apresenta aspectos psicológicos, toda doença encontra-se repleta de
subjetividade, e por isso pode se beneficiar do trabalho da(o) psicóloga(o)
hospitalar”. O autor acrescenta ainda

o adoecimento se dá quando o sujeito humano, carregado de


subjetividade, esbarra em um “real”, de natureza patológica,
denominado “doença”, presente em seu próprio corpo, produzindo
uma infinidade de aspectos psicológicos que podem se evidenciar
no paciente, na família ou na equipe de profissionais (SIMONETTI,
2004, p. 15).

Tais constatações levam ao sentido do saber/fazer da(o) psicóloga(o) no


hospital: a demanda de sofrimento e a subjetividade do paciente e seus
familiares também aflitos, visto que toda doença está impregnada de
subjetividade, afeta a dimensão psicológica por estar acompanhada de
significados subjetivos.

Assim, aqueles que não conseguem estratégias de enfrentamento


construtivas, mas reagem de modo mal adaptativo e destrutivo, deverão receber
atendimento específico ofertado pela ação da(o) psicóloga(o) com as
intervenções em crise que é um manejo breve e adequado às situações como
as hospitalizações. Considera a situação-problema, ou seja, a crise instalada
que precisa ser suportada, atravessada, enfrentada da melhor maneira que for
possível para a pessoa. Envolvendo-se e comprometendo-se com seu
tratamento, o paciente poderá aceitar as restrições que a patologia impõe e,
assim, certamente poderá desenvolver posturas mais ativas e de sobrevivência.

80
Por esta compreensão, cabe ao profissional de saúde, sobretudo à(ao)
psicóloga(o) inserido no contexto hospitalar, uma atenção ao que está
acontecendo com o paciente e seus familiares na situação de perda da saúde,
identificando reações emocionais próprias do adoecimento, como
inconformismo, negação, passividade ou regressão, por exemplo.

Assim, se desenvolve um trabalho de atenção à dor da perda da saúde,


da condição de sadio e as reações (des)adaptativas que interferem na adesão
ao tratamento e na elaboração do luto. A(O) psicóloga(o) busca, então, medidas
terapêuticas baseadas no suporte emocional, apoio psicológico, intervenções
clínicas breves e focais que favoreçam reflexões que possibilitem novos padrões
adaptativos com ênfase nas dificuldades do momento (BORGES, 2009; SIMON,
1989; SAFRA, 2003).

A Psicologia no hospital objetiva dar voz à subjetividade, aproxima-se do


paciente em sofrimento, favorecendo a elaboração simbólica do adoecimento, a
travessia do tratamento necessário e trabalhando no sentido de validar
sentimentos presentes entrando em contato com as dificuldades do momento
que pode parecer insuportável e infinito. Deste modo, a prática clínica psicológica
em um contexto como o hospital acontece dirigida ao ser que adoece frente as
diversas patologias e os diferentes espaços de atendimento. Onde houver
sofrimento e desadaptações, o trabalho da(o) psicóloga(o) incide nos aspectos
subjetivos e emocionais do adoecimento, assim como nos possíveis

81
desdobramentos relacionados ao tratamento, recuperação, sequelas, cuidados
paliativos e óbito.

É importante ressaltar que o processo de saúde-doença é um desafio


quando se pensa as ações em saúde para além das necessidades individuais,
considerando também as necessidades de ordem sociais e coletivas. O espaço
público pede novas práticas de atenção e cuidado. E por isso a importância de
se ultrapassar os paradigmas tradicionais de atenção em saúde, implicando e
ampliando para uma atenção ao sujeito em sua totalidade, buscando a
participação de outros profissionais de saúde compondo a equipe multidisciplinar
e interdisciplinar.

6.5 Medicina e Psicologia

Enfatiza-se que no hospital a demanda costuma ser médica, na lógica da


atenção biomédica, mesmo que se considere a atual política de atenção
hospitalar citada no Eixo 1, que preconiza assistência integral aos usuários, o
que pressupõe a importância da ação de outros saberes. O mundo do
conhecimento biomédico e das patologias têm diversas especialidades e ainda
muitas particularidades, como protocolos, tipos de tratamento, medicações
específicas, procedimentos, intervenções e prognósticos, que vão dos mais
simples àqueles reservados. Existem várias possibilidades e classificações,
diagnósticas e prognósticos: doenças agudas, doenças crônicas, doenças
crônico degenerativas, doenças infecto-contagiosas e cuidados paliativos que,
muitas vezes, evoluem por muitos anos, até a fase final da doença e posterior

82
morte da pessoa doente. As seguintes definições são aspectos importantes
nessa lógica biomédica:

Diagnóstico – processo de identificar e determinar a natureza de uma


doença ou distúrbio, por seus sinais ou sintomas, mediante o uso de técnicas de
avaliação.

Doença - processo patológico definido com origens orgânicas, marcado


por um conjunto característico de sintomas que pode afetar todo o corpo ou uma
parte dele e que enfraquece o funcionamento (VANDENBOS, 2010).

Os diagnósticos ainda organizam processos essenciais para os sujeitos


na área de saúde. Eles são a base para algumas teorias clínicas em psicologia
e pode definir o acesso a políticas públicas, como a previdenciária, por exemplo.
Para a(o) psicóloga(o), a questão mais importante sobre adoecimento e
hospitalização é saber em que circunstâncias este fato aconteceu, quem é o
paciente e como ele se percebe em tal situação. A capacidade de enfrentar e o
grau de suportabilidade da dor e do sofrimento é muito singular e não há medida
para ser dimensionada. Patologia e diagnóstico é circunstancial e multifatorial. É
necessário, portanto, contextualizar e atentar para aquela pessoa única, com sua
história, valores e dificuldades.

83
Neste aspecto, a subjetividade aparece como fator mais relevante e aí
está a diferença de objetivos da Medicina, dos demais profissionais da equipe e
da Psicologia. A Medicina busca a resolução e a objetividade das ações,
colocando o centro das atenções na doença e no tratamento da patologia com
todos os recursos técnico/científicos, com uma ética voltada para valores sociais,
cura e respeito à vida. A Psicologia, por sua vez, enfatiza a ética do respeito à
singularidade e, utilizando o conhecimento técnico/científico, busca trabalhar o
luto e as demandas de sofrimento, com atenção as desadaptações e sintomas,
pela natureza da situação. É necessário dar voz ao paciente, as suas verdades,
as questões confusas, distorcidas e embaralhadas. Busca a compreensão da
condição trágica da existência, tendo que suportar o desamparo e a solidão. E
no hospital, o que é familiar, se desfaz!

O adoecimento revela o homem desabrigado, vulnerável diante da sua


própria situação, centrado no desconforto e no mal-estar, preocupado com o
futuro que desestabiliza-se. Ele precisa se reconhecer em-situação, confrontar-
se com sua realidade, com as necessidades do momento. O impacto emocional
e a repercussão nas pessoas envolvidas nesta situação também vai depender
de quem é o paciente e de como se instalou seu problema de saúde. O ser-em-
situação desabrigado deixa emergir sua singularidade e contradições: angústia,
incertezas, medos difusos, confiança, esperança, fé. É necessário dar voz a
experiência humana de sofrimento, buscando reflexões e elaborações dos
conteúdos psíquicos presentes (SOUZA, 2003, 2005, 2013).

84
A(O) psicóloga(o) como participante de uma equipe de saúde pode
contribuir na compreensão das possíveis repercussões emocionais que a
doença pode ocasionar em determinado paciente/famíliar e atuar junto a esta
equipe de saúde favorecendo novas compreensões sobre a subjetividade do ser
que adoece. Nesse sentido, o mundo da subjetividade é infinito e, assim, teremos
muito trabalho neste contexto de dor e sofrimento. É importante ainda
acrescentar que, para as(os) psicólogas(os), outros detalhes são de extrema
relevância para se compreender e intervir adequadamente no momento vivido
pelos pacientes. Destaca-se, por exemplo, a fase do desenvolvimento que a
mesma se encontra, sua idade, o seu lugar na família e a qualidade das relações
familiares entre outros.

7.0 AS REAÇÕES PSICOLÓGICAS À DOENÇA E AO ADOECER

"É do conhecimento de todos, e eu o aceito como coisa natural, que uma


pessoa atormentada por dor e mal-estar orgânico deixa de se interessar pelas
coisas do mundo externo, na medida em que não dizem respeito a seu
sofrimento. Uma observação mais detida nos ensina que ela também retira o
interesse libidinal de seus objetos amorosos: enquanto sofre, deixa de amar. (...)
Devemos então dizer: o homem enfermo retira suas catexias _ libidinais de volta
para seu próprio ego, e as põe para fora novamente quando se recupera" (Freud,
1914, "Sobre o narcisismo: Uma introdução", vol. XIV, pg. 98).

A passagem do homem da situação de sadio para a de doente, seja de


forma abrupta ou insidiosa, modifica a sua relação com o mundo e consigo

85
mesmo e implica sempre em repercussões psicológicas, tanto nele quanto no
seu círculo familiar e social.

A maneira como um indivíduo reage à eclosão e à instalação de uma


doença -geralmente vivenciada como uma "ameaça do destino" - é função de
uma série de fatores, tais como o seu caráter breve ou duradouro, as implicações
quanto ao seu prognóstico, as limitações físicas acarretadas, o valor simbólico
das funções corporais ou dos órgãos atingidos, etc. As fantasias do paciente a
respeito da sua doença, a maneira como ele constrói um sentido próprio para
ela, assim como o peso dos significados implícitos de certas doenças como o
câncer e a AIDS, são da maior relevância na determinação do modo com que o
indivíduo vai se relacionar com a sua doença (Shavelzon e cols., 1978; Sontag,
1984).

Podemos afirmar que qualquer que seja a natureza de uma doença, ela
sempre representa uma avaria ao nosso narcisismo, uma ferida no sentimento
de onipotência e imoralidade e uma vivência de agilidade e dependência em
relação aos outros. Além da injúria narcísica, a doença envolve também
sofrimento, frustrações e, dependendo da sua gravidade, limitações dos nossos
projetos de vida. A doença nos torna conscientes de nossa fragilidade e nos
surpreende com o sentimento ameaçador, raramente presente no nosso
cotidiano, de que somos mortais e que devemos morrer um dia.

A maneira como a enfermidade é vivenciada é sempre um acontecimento


singular, uma experiência pessoal, resultante da história de cada um, de seu
modo de ser, de viver, de se relacionar. É o indivíduo que dará à doença e às

86
vicissitudes desta um sentido particular, que só pode ser compreendido dentro
do conjunto de sua história (Eksterman,1994).

Há aqueles que frente a uma enfermidade entregam-se a ela, ficando


dominados pela dor e desespero, paralisados na sua capacidade de luta,
enquanto outros conseguem fazer da doença uma possibilidade de repensar a
própria existência, de empreender mudanças - ainda em tempo! - enfim, de
colocar a vida em questão. E ainda há aqueles que frente à doença, sintomas ou
sinais, tendem a atuar sempre como se sua afecção fosse banal, mesmo quando
ela é grave.

Vale lembrar que às vezes é a própria doença que pode ser compreendida
como uma resposta do organismo a uma situação vivida como traumática. Na
impossibilidade de encontrar uma outra saída para situações conflitivas
inconscientes, que não a via somática, o indivíduo adoece. Mas não é nossa
pretensão discutir aqui os possíveis mecanismos envolvidos na gênese do
fenômeno do adoecer, muito embora saibamos o quanto está sempre presente
na cabeça da pessoa que adoece, a pergunta: "Por que isto aconteceu? Por que
isto me aconteceu? Por que isto me aconteceu agora?" (Chiozza, 1986).

Segundo Balint (1975), com o começo da doença põe-se em movimento


uma série de processos secundários à enfermidade, criando uma "situação vital",
à qual o paciente deverá se adaptar. A doença põe em jogo não só mecanismos
fisiológicos que tendem a restabelecer a homeostase, como do ponto de vista
psíquico, mobiliza defesas psicológicas no intuito de enfrentar a ruptura do
equilíbrio que é acarretada pela eclosão da doença.

A primeira e mais constante das consequências psíquicas para o doente


é a regressão. Trata-se de um mecanismo praticamente universal, que se
caracteriza pelo aparecimento de um comportamento infantil, de marcada
dependência e egocentrismo. Geralmente a regressão não só é necessária,
como útil, na medida em que o paciente se deixa ajudar e apoiar pelo grupo
social que o rodeia.

7.1 A regressão

87
Toda relação de um paciente com o médico implica, em alguma fase da
evolução da doença, um certo grau de afrouxamento de suas funções e atitudes
adultas, deixando aflorar seus aspectos mais infantis, necessitados ou
dependentes (Tizón, 1988). A regressão constitui um mecanismo de adaptação
à doença na medida em que permite ao paciente deixar-se cuidar pela equipe
médica, renunciar temporariamente às suas atividades habituais e aceitar a
necessidade de uma hospitalização. A impossibilidade de regredir pode deixar o
doente com uma exigência psíquica de "super adaptação" à doença, que a médio
e longo prazo pode trazer-lhe bastante prejuízo (Jeammet, Reynaud e Consoli,
1982). Ou, então, o paciente julga não estar doente e recusa-se a ser tratado ou
abandona o hospital.

Por outro lado, há situações em que a regressão - em etapas evolutivas


da doença em que esta já não se faz mais necessária - é bastante prejudicial,
não permitindo ao paciente mobilizar forças essenciais no sentido da
recuperação. Cabe lembrar também que às vezes é a equipe de saúde (ou a
família) que, de maneira consciente ou inconsciente, favorece a regressão,
colocando o doente na posição do "bonzinho", que se deixa manipular
docilmente, que não reclama e não reivindica.

88
O médico tem um papel muito importante, na medida em que, com sua
atitude, possibilita que aspectos mais sãos do paciente, aqueles com mais
capacidade de autonomia, recuperem a iniciativa diminuída pela enfermidade,
ao invés de cronificar-se em um comportamento regressivo.

7.2 A depressão

A depressão constitui uma consequência psíquica praticamente inevitável


do adoecer e uma das causas mais frequentes de solicitação de pedido de
parecer à Psicologia Médica em um hospital geral.

Sob o termo "Depressão" encontram-se os mais variados estados


mentais, sendo importante não confundir sentimento de tristeza, desesperança
e preocupação - ligados à experiência do adoecimento e da internação - com
quadros depressivos de maior intensidade. Estes não podem prescindir de uma
investigação minuciosa dos possíveis fatores envolvidos no seu aparecimento
ou agravamento (p. ex.: certos medicamentos, doenças endócrinas, tumores,
doenças neurológicas, doenças infecciosas, deficiências de vitaminas, distúrbios
eletrolíticos, etc.) e, eventualmente, do uso de medicação específica (Hyman &
Tesar, 1994).

Uma doença somática, pelo que representa de ataque à imagem corporal,


à autoestima e ao sentimento de identidade, é sempre potencialmente capaz de
suscitar afetos depressivos e há uma relação inegável entre a severidade da

89
enfermidade e a frequência de depressão (sejam sintomas ou síndromes). Em
contrapartida, o psiquiatra não deve permitir que uma depressão seja rotulada a
priori como "apropriada", deixando de tratá-la como merece e, com isso, não
aliviando o paciente (Furlanetto, 1995; Cassem, 1995).

Por outro lado, sintomas de depressão tais como fadiga, apatia, anorexia,
perda de peso e insônia, podem ser confundidos com sintomas resultantes da
própria doença física, e é importante que se tenha outros elementos para se
firmar um diagnóstico de síndrome depressiva moderada ou grave, de modo que
não se prive o paciente do - benefício de uma intervenção adequada (Rodin e
Vohart, l 36).

Uma ocorrência comum é o fato do choro de um paciente em uma


enfermaria ser capaz de rapidamente mobilizar o médico a enviar um parecer
com uma solicitação implícita de prescrição de antidepressivo, enquanto passa
desapercebida uma depressão profunda de outro paciente, pelo simples fato de
ser "quietinho", "não dar trabalho", "não questionar"...

Manifestações como a recusa em tomar a medicação, de colaborar nos


exames ou pedidos de alta "à revelia" (que podem estar ligados a quadros
depressivos), também costumam atrair a atenção da equipe médica e com isto
permitir a intervenção da Psicologia Médica junto a estes pacientes.

7.3 Doenças agudas

90
Aquelas de instalação brusca e inesperada que ocupam os espaços nas
emergências dos hospitais. Implicam ameaças e risco iminente de vida e pede
tratamento e ações médicas imediatas. Apresentam o elemento surpresa com
rupturas importantes para o sujeito biopsicossocial. Emerge o trágico da
condição humana como visto nos acidentes, desastres, catástrofes, violências,
com um destaque especial para as tentativas de suicídios. Geram intenso
sofrimento pelo desamparo e mobiliza em demasia a família, também perplexa
pelo acontecimento inesperado. Neste espaço, as(os) psicólogas(os) trabalham
com diferentes respostas emocionais entre elas o Transtorno de Estresse Pós-
traumático (TEPT) e os Transtornos de Estresse Agudo (TEA) com suas
sintomatologias próprias (BORGES, 2009).

Outras características: doenças agudas podem levar a óbito ou à


recuperação total. Podem se tornar crônicas, deixar sequelas momentâneas ou
definitivas e reais, como também, e não menos importantes, as sequelas
significativas como cronicidade emocional com os ganhos secundários da
doença.

Para as(os) profissionais de saúde mental, compreende-se que o Trauma


Agudo leva ao paciente e familiar à respostas compensatórias e defensivas pela
incerteza da situação, apresentando um novo estado emocional, menos
equilibrado e em permanente alerta.

7.4 Doenças crônicas

91
A doença crônica, especialmente a de maior gravidade, constitui uma
condição difícil e dolorosa, tanto para o paciente como para o médico.

A maneira como cada indivíduo vivência a sua doença crônica é


absolutamente pessoal e função de sua personalidade, de sua tolerância às
frustrações, das vantagens e desvantagens da condição de doente assim como
de sua relação com o médico e com a equipe de saúde. Há aqueles que apesar
de acometidos por uma ou várias doenças crônicas, conseguem readaptar-se
(fora das eventuais fases de agravamento) a uma vida quase normal, a despeito
de limitações ou cuidados impostos pela doença. Já outros indivíduos se sentem
tão profundamente atingidos, que nunca mais conseguem levar uma existência
normal, ou pelo menos, tão normal quanto as restrições somáticas ou psíquicas
o permitirem.

Aquelas de instalação brusca ou lenta que permanecem por tempo


indeterminado e evoluem até a morte. Exige tratamento interdisciplinar
prolongado, limitações e muitas vezes levam ao esgotamento tanto do paciente
quanto dos familiares.

Santos e Sebastiani (1996, p. 160) assim definem a doença crônica:

O diagnóstico de uma doença crônica faz emergir a questão da


morte, não só dos pacientes, mas dos próprios profissionais de
saúde, devido ao fato de saberem estar lutando contra uma doença
que dificilmente terá como fim a cura.

McDaniel, Hepworth e Doherty (1994, p. 179) também afirmam que:

O paciente e a família geralmente não estão preparados para as


mudanças físicas, períodos alternados de estabilidade e crise e incertezas
do funcionamento futuro. A doença crônica exige novos modos de
enfrentamento, mudanças nas autodefinições do paciente e da família e
períodos extensos de adaptação. O paciente com a doença percebe
múltiplas perdas, incluindo a saúde física e o funcionamento, perda dos
papéis ou responsabilidades, perda dos sonhos e possibilidade de menos
tempo de vida.

92
Complementam estes autores que as características das diversas
doenças crônicas específicas possuem extensa bibliografia, no entanto, o que
querem ressaltar é que as doenças não tem as mesmas repercussões sobre as
famílias e sobre a pessoa assistida e precisam ser tratadas como únicas.

Não se pretende aqui aprofundar as particularidades de todas as doenças


crônicas. O objetivo é apontar como a doença crônica se prolonga e que o centro
das atenções, tanto para o paciente como para a família, torna-se o tratamento,
a evolução do quadro e as fases do seu desenvolvimento.

Sabe-se bem que, atualmente, a doença crônica já pede cuidados


paliativos desde o diagnóstico, durante a evolução do tratamento que pode levar
anos, até o momento final com o óbito.

Faremos uma abordagem geral às contribuições teóricas e estratégias


clínicas que a(o) psicóloga(o) poderá lançar mão para muitas doenças crônicas.
Citaremos, como exemplo, as Cardiopatias, Diabetes, Epilepsias, o Acidente
Vascular cerebral (AVC), Esclerose Múltipla e tantas outras doenças
neurológicas como Alzheimer, Parkinson por exemplo, a Oncologia e suas
características especiais, a insuficiência Renal Crônica, as Infecções
Sexualmente Transmissíveis (IST)/HIV/ aids entre tantas outras progressivas,
fatais ou incapacitantes.

Cabe ressaltar que as fases do desenvolvimento são comuns a todas elas


e que os desafios nas fases aguda, crônica e terminal vão depender dos padrões
adaptativos da pessoa assistida e dos familiares. Porém, de uma fase para

93
outras, aquelas estratégias adaptativas podem não ser mais a mesma. Sabe-se
que mesmo sendo patologias tão diferentes, os efeitos psicossociais poderão ser
semelhantes em alguns pacientes e familiares.

Tendo o diagnóstico já fechado, pacientes e familiares apresentam suas


particularidades e podem surgir mecanismos defensivos, como aponta Kubler-
Ross (1969), sendo a negação um deles e o primeiro a se revelar. Segue com
momentos de raiva, barganha, depressão e aceitação quando possível.

Para McDaniel, Hepworth e Doherty (1994) a fase de Crise inicia de modo


agudo ou gradual, antes mesmo do diagnóstico, ao aparecimento de alguns
sintomas e a sensação de alguma coisa está acontencendo. A definição do
diagnóstico é um período de grande estresse e turbulência emocional pelas
dúvidas e desconfiança do pior.

Complementa Coelho (2001, p. 82) que com o diagnóstico definido pelo


médico, inicia-se os elucidamentos sobre o tratamento e as intervenções
necessárias. Segundo Carter e Mac Goltrych (1995), o curso da doença é
marcado por três formas gerais:

• Progressiva - apesar do tratamento, sempre sintomática, vai progredindo


em severidade.

• Constante – após instalada, se mantém estabilizada como nas


amputações por traumas, ou AVC, por exemplo que deixam um déficit óbvio e
irreversível, com limitação residual funcional permanente.

• Reincidente ou episódico – com períodos alternados de exarcebação


dos sintomas, até com hospitalizações recorrentes e períodos mais estáveis o
que gera muita incerteza e aflição entre todos os envolvidos no tratamento.
Nestas fases, todos da família, em geral, se unem e participam muito do
tratamento do enfermo que pode ser prolongado e com estas alternâncias de
crises, hospitalizações e recaídas. São momentos permeados também de
esperança que apareça um novo medicamento ou um médico mais atualizado.

Coelho (2001) ainda aponta que são necessários ajustamentos


específicos a cada fase do curso da doença. Diz:

94
Em síntese, podemos dizer que a enfermidade física crônica
apresenta implicações diferentes em cada fase do
desenvolvimento e encerra com potencial de prevenir ou aumentar
suas consequências, dependendo da sua forma de emergir, bem
como está sendo administrada pelo indivíduo e seus familiares. A
doença crônica ou aguda torna-se mais suave quando é vista como
uma condição de “estar doente”, diferente da posição de “ser
doente”, que leva à dependência, incapacitação, regressão e
derrota emocional (COELHO, 2001, p. 83).

Ainda para a autora citada (2001, p. 69) atentar para a repercussão


emocional relativa a doença crônica muito ajudará a equipe a compreender
aquele paciente e familiar. Segundo ela:

Este paciente convive por muito tempo com a condição de doença


e na qual a perda da saúde produz uma repercussão emocional
que provoca cuidados prolongados por parte da equipe.
Compreender por que algumas pessoas superam a cronicidade e
outras com o mesmo quadro clínico tornam-se dependentes e em
processo de deterioração global, sem dúvida, favorece também a
adoção de estratégias preventivas mais adequadas às
necessidades de nossos pacientes desde as fases iniciais da
conduta terapêutica.

Como bem se vê, a atuação da(o) psicóloga(o) no âmbito hospitalar, e


sobretudo com doenças crônicas e fazendo parte da equipe que cuida, será de
grande valia, visto que, todos poderão compreender a singularidade e os modos
de enfrentamento particular de cada paciente/família, sem propor a eles
condutas heróicas diante da situação por eles experienciada. A(O) psicóloga(o),
então, desenvolverá seu trabalho de acompanhamento psicológico prolongado
individual e também familiar, seguindo o curso natural da doença e as
possibilidades de cada ser-em-situação/paciente/sofrente.

A título de ilustração construimos um fluxograma apontando como as


doenças se instalam, os possíveis desdobramentos e evolução do quadro
clínico.

95
Assim, a(o) psicóloga(o) no âmbito hospitalar estará implicado não só com
o sofrimento, mas com a evolução do quadro clínico até a fase final, com o luto
e o óbito. Deste modo, é importante saber: quem é a pessoa assistida? Qual a
patologia? Aguda ou crônica? Com sequelas provisórias ou definitivas? Está
devidamente informado sobre seu tratamento? E a família? Participativa?
Fragilizada? Quais as repercussões psicossociais na vida da pessoa assistida e
da sua família? A doença já evoluiu para a fase terminal? Pode-se fazer
paliação?

Se a doença evolui progredindo para a fase terminal, começam os sinais


de cansaço e o fim da esperança. O paciente pode estar debilitado e sem forças
para reagir. A(O) psicólogas(o) pode trabalhar o luto acompanhada(o) por uma
equipe bem preparada em cuidados paliativos em busca de uma morte digna, o
que será discutido mais adiante.

96
7.5 Benefícios primários e secundários da doença

Benefícios secundários são aqueles que resultam das consequências da


doença, podendo favorecer a acomodação na enfermidade e a sua cronificação.
Nunca é demais lembrar que os benefícios secundários são sempre parciais,
uma vez que a doença também é fonte de sofrimento e limitações.

Os benefícios conscientes são aqueles ligados à compensação social da


doença. As oportunidades que a doença oferece para que o indivíduo escape de
determinadas situações conflitivas e penosas são geralmente inconscientes.
Aqui também incluímos os desejos regressivos de dependência e passividade,
realizando-se na medida em que a pessoa se torna alvo de cuidados especiais.
Os benefícios primários das enfermidades - às vezes impossíveis de serem
separados dos ganhos secundários - são aqueles que desempenham um papel
significativo no desencadeamento da doença ou na sua própria estruturação.

7.6 A adaptação

A adaptação não significa uma aceitação passiva nem uma submissão à


doença, mas um processo dinâmico, permanente, de tentar buscar uma
"convivência razoável" com a doença, através de um trabalho emocional
complexo e doloroso de elaboração da profunda ferida narcísica representada
pela enfermidade.

No processo de elaboração do luto desencadeado pelas perdas sofridas


(da autonomia, da saúde, das capacidades do organismo), podemos observar

97
alternância e mistura de sentimento de tristeza, depressão, ódio e revolta, até
que de alguma maneira todo este trabalho mental progressivamente torne
possível (pelo menos na maior parte do tempo) a superação ou elaboração do
luto pelo que se era no passado e que foi .remediavelmente perdido.

A adaptação, portanto, subentende que a reação depressiva provocada


pela doença pode ser elaborada e controlada pelo paciente e que ele aceitou
receber ajuda dos que o rodeiam sem, porém, abrir mão da autonomia
compatível com a sua condição. Também implica ser capaz de fazer uma
avaliação mais realista de sua doença e das perspectivas para o futuro.

Nunca é excessivo lembrar que o médico é essencial neste processo de


adaptação (Lipowski, 1983).

A adaptação de um doente à sua doença só pode ser avaliada em função da sua


personalidade anterior e do seu modo habitual de reagir e lidar com situações
difíceis, e não em função de parâmetros predeterminados. Assim sendo, tanto
um paciente "criador de caso" e "queixoso" pode estar bem adaptado à doença,
quanto um paciente dócil demais e cumpridor de todas as recomendações
médicas pode estar mal adaptado.

7.7 A negação

98
Traía-se de uma defesa contra a tomada de consciência da enfermidade,
que consiste na recusa parcial ou total da percepção do fato de se estar doente.
Essa negação da realidade - tanto do diagnóstico, quanto de suas implicações -
é um mecanismo de urgência contra a angústia, sendo frequentemente
encontrada nas fases iniciais das doenças agudas (p. ex.: infarto do miocárdio)
ou de prognóstico grave (p. ex.: câncer). Com o passar do tempo, a negação
costuma ir diminuindo e o paciente deprime-se (House, Mayou e Mallison, 1995).

A negação pode ocorrer em relação à natureza, gravidade ou efeitos da


doença e pode se tornar prejudicial quando impede que o paciente busque um
diagnóstico ou aceite um tratamento médico.

Como exemplo de uma situação em que a negação nas fases iniciais de


um diagnóstico é bastante comum, há o caso de pacientes que sofrem acidentes
e ficam irreversivelmente paraplégicos. É como se fosse necessário um tempo
maior para a aceitação desta terrível verdade, sob o risco de uma
desestruturação grave. Já presenciamos situações dramáticas em que, quanto
mais o médico insistia em mostrar ao paciente (quase que num confronto...) que
as chances de nunca mais voltar a andar eram de 100%, mais o paciente se
refugiava numa posição de dizer que "tinha fé em Deus, que com sua força de
vontade ia certamente voltar a andar um dia". Ainda que seja função do médico
ir mostrando ao paciente as perspectivas reais que existem quanto à sua
recuperação, é preciso, simultaneamente, respeitar este "tempo interno" do
paciente e não o forçar a aceitar toda a verdade de uma vez.

Muito frequentemente os pacientes com câncer ou outras doenças de


prognóstico sombrio recorrem à negação como uma forma de lidar com a
doença. E como se lançassem mão de mecanismos de proteção para escutarem
somente aquilo que estão em condições de assimilar, mesmo quando a verdade
lhes é comunicada diretamente. Há também casos em que, pelo contrário, os
pacientes sabem que sua doença é grave e, no entanto, o médico ou a própria
família tenta manter um clima de falsa esperança e negação que contradiz a
percepção do paciente, aumentando o seu sentimento. de solidão e isolamento
(Shavelzon & cols, 1978).

99
A reação persecutória, que geralmente é uma consequência da negação.
Numa tentativa de evitar a depressão ou angústia excessiva, o doente atribui ao
exterior a causa dos seus sofrimentos. Sente-se mal tratado e mal cuidado,
entrando eventualmente em litígio com o médico ou a equipe de saúde
(Jeammet, Reynaud e Consoli, 1982).

8.0 AVALIAÇÃO PSICOLOGICA DO PACIENTE HOSPITALIZADO

No campo da Psicologia Hospitalar, a avaliação será focada nas questões


que permeiam a doença e a hospitalização, buscando ampliar o olhar frente
àquele sujeito, possibilitando compreender quem é ele e como vem encarando
todo esse processo, quais são suas perspectivas, mecanismos de defesa, se
pode ou não contar com rede de apoio. Faz-se importante responder algumas
questões norteadoras como: O que? Como? Com quem? Quando? Para quem?

A busca pelas respostas das questões apontadas acima possibilita a


ampliação da percepção da demanda de trabalho por parte do cliente. Além
disso, a junção desses dados com referencial teórico proporcionará a definição
das possibilidades de intervenção e/ou encaminhamento.

100
Se o profissional tem esse aporte de avaliação bem sedimentado em sua
prática, certamente as possibilidades de intervenção ficarão mais claras. A partir
disso, é possível criar protocolos de triagem, avaliação e intervenção. Com essa
sistematização do serviço pautado em métodos e técnicas psicológicas,
acredita-se que o serviço de Psicologia encontrará respaldo para sua atuação
em bases científicas, o que acarretará em credibilidade e longevidade ao
mesmo.

A avaliação psicológica é uma área aplicada da psicologia que permite a


operacionalização das teorias psicológicas de forma sistemática, ao integrar
teoria e prática (Primi, 2003). É definida pelo Conselho Federal de Psicologia -
CFP como um processo técnico e científico realizado com pessoas ou grupos,
conforme área de conhecimento e suas metodologias específicas, e ainda de
forma dinâmica, ao constituir-se como fonte de informações de caráter
explicativo sobre os fenômenos psicológicos, cuja finalidade é subsidiar os
trabalhos nos diferentes campos de atuação do psicólogo, como nas áreas da
saúde, educação, trabalho e em outras em que ela se fizer necessária (CFP,
2003; CFP, 2013).

A avaliação psicológica requer cuidado e planejamento de acordo com a


finalidade a que se destina. Trata-se de um processo amplo e complexo, em que
devem ser considerados os determinantes históricos e sociais (CFP, 2003).

101
Vale ressaltar a diferença entre testagem psicológica e avaliação
psicológica, pois a testagem se resume a uma das etapas da avaliação
psicológica, com a utilização de testes psicológicos para tomada de decisões
acerca de uma pessoa, grupo ou programa. Ocorre dentro de um contexto de
avaliação que objetiva encontrar respostas sobre questões psicológicas, por
meio de um processo que contempla coleta de dados, avaliação e análises que
respondam a questões propostas, visando à solução de problemas (Cunha,
2000; Urbina, 2007).

As autoras ainda apontam a avaliação enquanto processo flexível, não


padronizado, complexo, que engloba aspectos estruturados e não estruturados,
exigindo qualificação profissional, ao passo que pode envolver a utilização de
vários procedimentos (entrevistas, observações, testagens) e fontes colaterais
além do examinando (parentes, professores).

Dentre as técnicas que podem ser utilizadas em avaliação psicológica,


tarefa privativa do psicólogo, a testagem psicológica se configura pelo uso de
testes psicológicos, instrumentos de mensuração de características
psicológicas, construídos conforme princípios reconhecidos cientificamente e
com regulamentações desde sua elaboração, uso e comercialização (CFP,
2001). Para serem utilizados, alguns requisitos mínimos são avaliados através

102
do Sistema de Avaliação dos Testes Psicológicos - SATEPSI do Conselho
Federal de Psicologia quanto sua fundamentação teórica, precisão, validade e
normatização, sendo qualificados enquanto instrumentos aptos ou inaptos para
uso enquanto categoria de testes psicológicos, domínio exclusivo de psicólogos
(Primi & Nunes, 2010).

A terminologia teste tem sua origem no latim, significando testemunha, e


do inglês test, ou seja, prova ou exame. Desse modo, realizar um teste é
apontado como a realização de uma prova, de dar o testemunho sobre algo. Os
testes psicológicos configuram um procedimento sistemático de se obter
amostras de comportamentos padronizadas (Ambiel & Pacanaro, 2011; Urbina,
2007).

Outra ferramenta bastante utilizada em avaliação psicológica que vale


destacar é a entrevista, assinalada por Santos (2014) como a técnica mais
utilizada para obtenção de informações acerca de uma pessoa, sendo
empregada pelo psicólogo como procedimento para diferentes finalidades,
desde diagnóstico, encaminhamentos e até mesmo pesquisas. Destaca-se por
seu caráter flexível e adaptável, soberana na busca de esclarecimentos.

Tavares (2000) afirma que a entrevista é o instrumento mais poderoso do


psicólogo, pois é adaptável a diferentes públicos, contextos e forma de
estruturação. No trabalho com crianças, Werlang (2000) descreve a importância
das entrevistas para compreensão de processos psicológicos, salientando o
caráter diagnóstico da entrevista lúdica, enquanto técnica rica para conhecer o
pensamento infantil.

Dentre os vários contextos onde se utiliza instrumentos para a avaliação


psicológica estão os serviços de saúde (Urbina, 2007). O trabalho do psicólogo
em instituições de saúde volta-se para seis tarefas básicas: 1) função de
coordenação, 2) função de ajuda à adaptação, 3) função de interconsulta, 4)
função de enlace, 5) função assistencial direta, e 6) função de gestão de recursos
humanos. Portanto, seu trabalho abarca desde intervenções junto ao paciente e
família, como também buscando alcançar as relações com a equipe e
profissionais da instituição (Rodriguez-Marín, 2003).

103
Assim, a essência do trabalho do psicólogo numa unidade prestadora de
serviços de saúde volta-se para uma assistência que pretende aliviar aspectos
físicos e emocionais do paciente e de sua família, inserindo-se como colaborador
da comunicação e da expressão humana por meio da linguagem. O psicólogo
encara a prática profissional no contexto hospitalar atuando na qualidade de
facilitador do processo de elaboração das vivências dos pacientes, fornecendo
suporte psicológico de forma humanizada, com ações pautadas no uso de
técnicas e procedimentos sustentados por construtos e metodologias da área da
psicologia (Lazzaretti et al., 2007; Mosimann & Lustosa, 2011; Santos &
Sebastiani, 2013; Pinto, 2004).

O propósito da psicologia hospitalar é o acolhimento aos pacientes de


todas as faixas etárias, bem como seus familiares, em sofrimento psíquico
resultante de patologias, internações e tratamentos, contemplando ações de
assistência, ensino e pesquisa. Configurando-se como mais um espaço no qual
a psicologia pode oferecer escuta e compreensão, precisamente nesse
momento em que valores são revistos e há todo um imaginário envolvendo o
adoecer (Angerami-Camon, 2013; Lazzaretti et al. 2007).

O diagnóstico de uma doença e seus possíveis tratamentos pode trazer


como consequência tanto problemas práticos e materiais (trabalho e questões
financeiras), como emocionais e não materiais (medo, insegurança e problemas
interpessoais). Liberato e Macieira (2008) apontam que o modo como cada
pessoa enfrenta as circunstâncias advindas neste processo depende de

104
características individuais e da significação do adoecer, relacionado ao momento
da vida em que a pessoa se encontra.

Com o desenvolvimento e avanços no campo das ciências da saúde nos


últimos anos, o hospital passou a considerar dentre as diversas especialidades,
a psicologia hospitalar. Desse modo, a inserção do psicólogo no hospital deuse
na busca de superar a relação dicotômica mente-organismo (Lazzaretti et al.,
2007).

Tonetto e Gomes (2007) advertem para a necessidade de ampliação da


prática psicológica em hospitais, com destaque ao trabalho em equipe, que se
apresenta como área promissora de atendimento no campo da saúde. Relatam
ainda que a psicologia tem muito a contribuir neste cenário, haja vista interesse
pelo trabalho do psicólogo. No entanto a atuação no hospital precisa ser
ampliada e consolidada.

Dentre os desafios de atuar junto a equipes está articular a questão da


saúde enquanto conceito complexo que perpassa por questões históricas,
políticas e sociais, de modo que contemple a concepção de sujeito e de
sociedade (Fossi & Guareschi, 2004).

O Conselho Federal de Psicologia – CFP (2007) reitera que o


acompanhamento psicológico pode ser dirigido nas diferentes especialidades
médicas e em diferentes modalidades, dentre elas: atendimentos
psicoterapêuticos em enfermarias, ambulatórios e unidades de atendimento,
tanto em nível individual, quanto grupal. Vale ressaltar ainda atendimentos em

105
Unidade de Terapia Intensiva e pronto atendimento, consultoria e
interconsultoria, avaliação diagnóstica e psicodiagnóstico.

Um estudo de caracterização dos psicólogos que trabalham em


instituições hospitalares de Curitiba revelou que apenas 8% destes atuam em
hospitais psiquiátricos, o restante, 92%, subdividiram-se em menores nichos,
destacando o trabalho em ambulatórios (12%) nas seguintes especialidades
citadas: bebê de risco, fibrose cística, adolescência, crianças e adolescentes
vitimizados, epilepsia e dor crônica, além do ambulatório de saúde mental.
Quanto às especialidades em que está sendo desenvolvido o trabalho em
psicologia, foi mencionada a atuação na clínica médica, geral e cirúrgica, nas
UTIs neonatal e adultos, além da cardiologia (Lazzaretti et al., 2007).

Em relação aos instrumentos que viabilizam a atuação do psicólogo


destaca-se a proposta de Fongaro e Sebastiani (2013) para profissionais da
psicologia que atuam em hospital geral adequado ao contexto hospitalar e a
dinâmica de atendimentos em enfermarias. O roteiro de exame e avaliação
psicológica do paciente internado propõe as seguintes funções: diagnóstico,
orientação de foco, fornecimento de dados sobre a estrutura psicodinâmica da
personalidade da pessoa, avaliação continuada do processo evolutivo da relação
do paciente com sua doença e tratamento, conhecimento da história da pessoa,
diagnóstico diferencial e estabelecimento das condições de relação da pessoa
com seu prognóstico.

Os autores chamam a atenção para a especificidade da avaliação


psicológica no hospital geral, que difere do que é desenvolvido em outras
ocasiões, apontando para o aspecto temporal desse processo, no qual se avalia
um momento específico da vida do sujeito frente ao adoecer, tratamento e
internação hospitalar.

Com vistas à necessidade de procedimentos de atendimento psicológico


padronizados, Dias e Radomile (2006) desenvolveram um projeto de
implantação do serviço de psicologia no hospital geral. A proposta se estrutura
em três etapas: triagem psicológica hospitalar, avaliação psicológica hospitalar
e acompanhamento psicológico hospitalar, disponibilizando quatro protocolos

106
destinados tanto à avaliação, quanto a padronização dos registros de
atendimento, além de uma versão resumida de um roteiro.

Com intuito de avaliar e elaborar uma proposta de avaliação acerca das


estratégias que a criança utiliza para enfrentar o processo de hospitalização,
Motta e Enumo (2002) analisaram a importância do brincar no hospital, com base
nos relatos de 28 crianças, de ambos os sexos, inscritas no Serviço de Oncologia
de um hospital público de Vitória, ES, Brasil. Para tanto, foi proposto um
instrumento de avaliação do enfrentamento da hospitalização, denominado AEH
(Avaliação das Estratégias de Enfrentamento da Hospitalização), com pranchas
ilustradas. A pesquisa revelou que o brincar correspondeu a 78,6% das
respostas relativas ao que a criança hospitalizada gostaria de fazer.

Apesar da importância de se estruturar novos protocolos para atuação,


alguns estudos tem demonstrado a utilização de instrumentos já padronizados
no âmbito hospitalar. Peres e Santos (2006) avaliaram a personalidade de
pacientes com indicação de transplante de medula óssea (TMO) por meio do
Inventário Fatorial de Personalidade (IFP), que forneceu subsídios relevantes
para o direcionamento desses pacientes e indicou que o IFP foi de grande
utilidade para o delineamento das características de personalidade dos
examinados.

Mesmo com o crescimento da psicologia hospitalar nos últimos anos e


aumento do número de estudos faz-se necessário ainda fortalecer uma
identidade à área. Nesse sentido, o presente estudo justifica-se pelo nosso
107
interesse em compreender o que tem sido produzido no cenário brasileiro
referente à avaliação psicológica no hospital e compartilhar a importância de o
psicólogo hospitalar utilizar procedimentos padronizados na orientação de sua
práxis.

8.1 A Entrevista Psicológica Hospitalar e seu Campo de Intervenção

A prática e a intervenção da psicologia hospitalar são amplas. No


atendimento ao paciente o psicólogo necessita primeiramente intervir
desenvolvendo uma aliança de confiança (MacKinnon; Michels & Buckley, 2008),
prestando assistência ao acamado junto ao leito e aos seus familiares,
esclarecendo dúvidas e amenizando angústias.

Também, é seu papel auxiliar na recuperação e adaptação do doente às


novas condições de vida mediante a enfermidade, avaliar o seu estado
emocional, garantindo aderência ao tratamento e auxiliar os familiares no
enfrentamento de situações de morte e luto. Este trabalho requer flexibilidade e
dedicação, bem como, recursos que auxiliem na obtenção de resultados
benéficos em curto período de tempo (Tonetto & Gomes, 2007b).

Nesta perspectiva, para desempenhar sua função, o psicólogo necessita


utilizar alicerces teóricos, assim como, técnicas específicas de sua prática, ou
mesmo, adaptá-las ao contexto em questão. Um dos principais instrumentos

108
empregados, o qual muitas vezes se limita a ser a única ferramenta utilizada em
intervenções, é a entrevista psicológica (Seger, 2006).

Conforme descreve Tavares (2000), a entrevista psicológica se refere a


um conjunto de técnicas investigativas, limitada no tempo e conduzida por um
profissional treinado que se utiliza de conhecimentos advindos da psicologia por
meio de uma relação estritamente profissional. Através desta técnica tem-se o
objetivo de descrever e avaliar aspectos pessoais com o intuito de realizar
intervenções que tragam benefícios aos entrevistados.

Embora a literatura estruture passos para a condução de uma entrevista


psicológica, o espaço hospitalar demanda do psicólogo a adaptação deste
manejo para um contexto permeado por imprevistos e principalmente pela
insuficiência de tempo. Com isso, a essência da entrevista permanece, porém é
necessário que o profissional possua determinados domínios, recursos e
habilidades específicas que o possibilitem o desenvolvimento e a execução de
um trabalho de qualidade em um momento permeado pelo sofrimento.

Neste contexto, a entrevista psicológica tem um foco nos sintomas do


sujeito e nos fatos mais significativos de sua vida que possam estar relacionados
ao seu estado de saúde, procurando sempre basear-se na história de vida em
geral, na história clínica e na doença atual. Não possui um tempo determinado,
podendo ser administrada em mais de uma sessão. Porém, com seu término,

109
espera-se que o profissional psicólogo possa compreender dinamicamente este
sujeito (MacKinnon, et al., 2008).

Autores como Seger (2006), referem que compete ao psicólogo, quando


solicitado pela equipe, fazer uma entrevista esclarecendo o motivo explícito da
mesma. Em alguns casos, o motivo está refletido na equipe pouco preparada ou
com dificuldades no atendimento de demandas específicas que surgem no
ambiente hospitalar, cabendo ao psicólogo agir no intuito de atenuar, compensar
e eliminar estas implicações. Este aspecto ressalta a extensão da intervenção
do psicólogo hospitalar, ao passo que abrange toda a equipe de profissionais da
saúde.

Conforme a autora supracitada, o desenvolvimento de uma entrevista


hospitalar é muitas vezes um trabalho árduo que exige adaptações. Está
permeado por inúmeros fatores, como o tempo que pode ser de apenas uma
sessão e a falta de setting nos moldes tradicionais, ou seja, um espaço
reservado, sigiloso, e sem interferências. Estes aspectos são ocasionalmente
prejudicados em função da movimentação e rotatividade do ambiente.

Com a ausência do setting terapêutico “ideal”, as entrevistas são


realizadas normalmente junto ao leito, onde, em muitas ocasiões, há presença
de outros pacientes que dividem o mesmo espaço, o que implica na privacidade
do paciente. Desta forma, o setting necessita ser constituído ou reestruturado,
quando possível, considerando-se as condições presentes e a criatividade do
psicólogo, como aponta Seger (2006).

Tonetto e Gomes (2005) corroboram com esta perspectiva, destacando a


necessidade de que ocorram adaptações dos recursos e espaços disponíveis no
âmbito hospitalar para a prática da psicologia, de modo que o setting, na maioria
das vezes, se torna um dos mais prejudicados. Estas peculiaridades que
envolvem a adequação e a flexibilidade teórico metodológica do psicólogo
hospitalar ao espaço de trabalho que dispõe, o diferenciam do contexto clínico
tradicional.

Outro estudo realizado por Garcia, Souza & Holanda (2005) que vai ao
encontro dos achados anteriores, revela que as intervenções do psicólogo clínico
são insuficientes para o contexto hospitalar, pois se necessita de adaptações.

110
Segundo esses autores, é necessário também conhecer a dinâmica da
instituição, pois é esta que define, por meio de suas normas, os settings
terapêuticos em que ocorrem as atuações psicológicas, enfatizando assim a
flexibilidade deste profissional.

Do mesmo modo, estando preparado para o encontro com o paciente, o


psicólogo deve estar consciente da possibilidade de que no quarto se encontrem
mais pessoas internadas, não sendo possível muitas vezes a manutenção de um
local reservado. Em consequência disto, ao iniciar a entrevista propriamente dita,
o profissional deve se apresentar ao paciente, aproximar-se ou sentar perto a
ele estando numa direção ao nível dos olhos. Além disso, convém falar
“delicadamente” na tentativa de criar um ambiente propício ao bom andamento
da entrevista (MacKinnon et al., 2008).

Da mesma forma, o psicólogo também necessita dispor de destreza e


competência para desenvolver, num curto período de tempo ou em uma única
sessão, uma entrevista que envolva avaliação, diagnóstico da situação,
esclarecimentos, intervenções e/ou encaminhamentos. Além disso, as
entrevistas podem incluir a presença de familiares ou acompanhantes, ou até
mesmo, serem realizadas exclusivamente por estes, principalmente quando as
pessoas próximas ao doente estão muito fragilizadas e interferem no bom
atendimento ao paciente (Seger, 2006).

111
Muitas vezes uma única entrevista psicológica tem fins terapêuticos,
fundamentalmente quando se refere à área hospitalar. Fazendo esta referência,
Seger (2006) assinala que isto ocorre em função do pequeno período de tempo
que o psicólogo disponibiliza para intervir com o paciente, necessitando realizar
um trabalho relativamente curto e utilizando de técnicas direcionadas como a
psicoterapia breve focal e intervenções de apoio.

Em decorrência destas condições em que, inúmeras vezes, o psicólogo


hospitalar realiza seu trabalho, é esperado que este tenha certas habilidades
para desempenhá-lo da melhor forma com o intuito de alcançar bons resultados.
Alguns teóricos como Dalgalarrondo (2008), MacKinnon et al. (2008), Seger
(2006) e Tonetto e Gomes (2007a) citam a agilidade, a paciência, a boa
comunicação e a capacidade empática como características essenciais a este
profissional.

Outro aspecto relevante desta prática está na sensibilidade do profissional


perceber os momentos em que o paciente precisa chorar e revelar seus
sentimentos da forma mais autêntica, uma necessidade que muitas vezes é
encoberta por atitudes dos familiares, ou mesmo da equipe (Seger, 2006).

MacKinnon et al. (2008) consideram que muitos aspectos neste contexto


de trabalho podem variar não se tendo como controlar, sendo que dentre estes
se encontra a entrevista psicológica. Neste sentido, a capacidade de adaptação
se torna um elemento básico e necessário, assim como a preparação do
entrevistador com conhecimentos e informações previamente coletados. Nesta
perspectiva, destaca-se de acordo com estes autores que anteriormente a
entrevista com o paciente é conveniente ao psicólogo se apropriar de
informações advindas do prontuário. Após obter esses subsídios também é
viável conversar com membros da equipe para conhecer melhor o caso. Quanto
mais dados acerca do paciente, melhores e mais eficazes são as probabilidades
de acerto nas intervenções.

Ainda, no que se refere a fase de adaptação, o paciente pode vivenciar


sentimentos ambivalentes que inúmeras vezes repercutem na família e nas
pessoas mais próximas. Dessa forma, o suporte psicológico se torna
indispensável, pois auxilia na elaboração de novas realidades (Yamada &

112
Bevilacqua, 2005). Ao mesmo tempo, a assistência à família traz benefícios à
medida que facilita a manutenção e o assentimento do tratamento, bem como,
colabora com as rotinas da enfermaria (Klein & Guedes, 2006).

Segundo os autores supracitados, frequentemente a raiva e o sarcasmo


são dois tipos de resistências presentes em pacientes hospitalizados,
apresentando também baixa motivação. Nesta perspectiva, interpretações
psicodinâmicas raramente são feitas aos pacientes, visto que pouco são úteis ao
processo terapêutico devido a diminuída capacidade e disponibilidade
momentânea do paciente em extrair benefício destas intervenções.

Ainda, para MacKinnon et al. (2008), é essencial, num primeiro momento,


a estruturação de uma aliança entre terapeuta e paciente. Com o andamento da
entrevista, o entrevistador precisa estar apto para ser ativo e esclarecedor na
tentativa de melhorar a autoestima do paciente, buscando o máximo de
informações possíveis.

Considerando a desenvoltura necessária ao psicólogo na condução da


entrevista, pode-se destacar que em função do momento de vida que se
apresenta o paciente cabe ao entrevistador estabelecer uma postura coerente
com a situação. Com esta perspectiva colabora Dalgalarrondo (2008) ao referir
que a habilidade do entrevistador se demonstra pelas perguntas que formula no
decorrer da entrevista. Também para este autor, é fundamental que se
estabeleça uma relação empática e produtiva ao mesmo tempo durante a
entrevista.

Ainda com relação a este tema, este mesmo autor refere que para que
ocorra um bom trabalho cabe ao psicólogo respeitar o paciente não o invadindo
de modo agressivo por meio da entrevista, mas sim utilizando respeito, limites e
paciência, sendo está última considerada como fundamental em contexto de
saúde.

Com o término da entrevista, compete ao psicólogo comunicar ao


paciente os resultados obtidos com o trabalho. Indicações terapêuticas e
acompanhamento ambulatorial podem ser recomendados, caso necessário.
Ainda, é importante que anotações não detalhadas referentes à entrevista sejam
disponíveis aos membros da equipe, de modo a primar sempre pelo sigilo dos

113
dados mais relevantes. Este aspecto é importante na medida em que
instrumentaliza os demais membros da equipe quanto ao estado do paciente. A
conclusão do processo se dá no momento em que os dados obtidos sejam
repassados ao médico responsável que solicitou a intervenção psicológica
(MacKinnon et al., 2008).

Pesquisas recentes têm revelado que os resultados das intervenções


psicológicas em hospitais se mostram positivas e necessárias. Isso se evidencia
através de autores como Juan (2005) que corroboram com essa premissa, pois
segundo ele pacientes que receberam atendimento psicológico pré-cirúrgico
demonstraram maior estabilidade emocional, melhor recuperação e menor
propensão a sintomas dolorosos.

Da mesma forma, na tentativa de investigar os efeitos provocados pelas


intervenções psicológicas em crianças pré cirúrgicas, Broering (2008)
desenvolveu uma pesquisa que continha, dentre as demais ações, a técnica de
entrevista. Através deste trabalho, a pesquisadora identificou como resultados
uma significativa redução dos níveis de estresses e comportamentos negativos
e inadequados das crianças que receberam intervenções psicológicas
previamente ao ato cirúrgico.

Ainda, um estudo realizado por Palmeira, Peralva e Batista (2007) com


objetivo de avaliar a importância da oferta de apoio psicológico para familiares
de pacientes submetidos à cirurgia cardíaca, revelou que a atuação do psicólogo

114
auxilia significativamente na diminuição das angústias dos familiares a partir da
possibilidade de expressão dos sentimentos e fantasias em relação a cirurgia.

8.2 Parecer de saúde mental

Inicia-se com uma descrição sumária sobre o local onde se realiza a


entrevista (hospital, posto de saúde, consultório particular). Em seguida,
descreve-se o motivo pelo qual está sendo realizada (avaliação para internação
hospitalar ou tratamento ambulatorial, diagnóstico, consultoria), seguindo-se de
impressões sobre o paciente registradas pelo entrevistador:

Deve-se observar o modo do paciente de andar, sua postura, roupas,


adornos e maquiagem utilizados, sua higiene pessoal, cabelos alinhados ou em
desalinho, atitude (amigável ou hostil), humor ou afeto predominante, modulação
afetiva, sinais ou deformidades físicas importantes, idade aparente, as
expressões faciais e o contato visual. O ideal é que seja feita uma descrição
precisa, de maneira que o leitor possa visualizar a aparência física do paciente
no momento do exame. Uma postura encurvada pode sugerir afeto triste, assim
como desleixo no modo de vestir-se. Já o uso de roupas estravagantes e o
excesso de adornos fazem pensar em mania ou características histéricas de
personalidade. Uma pessoa com uma doença crônica ou com um grande
sofrimento (por exemplo: depressão) pode aparentar uma idade maior do que a
real, enquanto que pacientes hipomaníacos, histriônicos ou hebefrênicos podem
parecer mais jovens. Pouco contato de olhar pode indicar vergonha, ansiedade
ou dificuldade de relacionamento. É útil a comparação das características de
aparência do paciente com os indivíduos de mesma idade, profissão e condição
socioeconômico, assim como a obtenção de informações com familiares a
respeito de mudanças em relação a aparência anterior da pessoa.

A atividade psicomotora refere-se a maneira como a atividade física se


relaciona com o funcionamento psicológico, considerando os aspectos
quantitativos e qualitativos do comportamento motor do paciente. Um paciente
em agitação psicomotora caminha constantemente, não consegue ficar quieto e
frequentemente apresenta pressão para falar e ansiedade. Outros sintomas
comuns são rabiscar, balançar pés ou pernas, cruzar e descruzar
frequentemente as pernas, roer unhas, ficar enrolando o cabelo, etc., em padrão

115
acelerado. O retardo psicomotor é caracterizado por uma lentificação geral dos
movimentos, da fala e do curso do pensamento, usualmente acompanhado de
humor deprimido. Também ocorrem: respostas monossilábicas, aumento na
latência das respostas, manutenção da mesma posição por longo tempo, pouca
gesticulação, expressão facial triste ou inexpressiva. A atividade psicomotora
pode ser normal, retardada ou acelerada, assim como podem ocorrer sintomas
catatônicos ou de agitação. Consideram-se, ainda, outras formas de distúrbios
específicos (que ocorrem em estados psicóticos), como movimentos
estereotipados, maneirismos, negativismo (fazer o oposto do que está sendo
requisitado), ecopraxia (imitar os movimentos de outra pessoa) e flexibilidade
cérea (manter certa posição desagradável por horas apesar do aparente
desconforto).É interessante que se descreva o tipo de atividade que o paciente
apresentou durante a entrevista ao invés de apenas classificá-lo, por exemplo,
"o paciente permaneceu imóvel durante toda a sessão" informa melhor do que
apenas "o paciente apresenta grave retardo psicomotor".

8.2.1 Atitude frente ao examinador

Frequentemente os pacientes são inicialmente reservados, limitando-se a


responder as perguntas do examinador. Alguns são mais abertos, fornecendo
mais dados e informações ricas a partir de menos perguntas. Outros são

116
reticentes, fechados e até desconfiados, por vergonha, falta de vontade ou medo
de contar suas experiências pessoais. Também podem ser hostis, numa
tentativa de envergonhar ou humilhar o examinador; bajuladores, para agradar
o entrevistador; ou sedutores. Ainda, podem ser ambivalentes, ou seja,
apresentarem simultaneamente emoções aparentemente incompatíveis,
positivas e negativas, em relação ao médico. Assim, a atitude frente ao
examinador pode ser amigável, cooperativa, irônica, hostil, defensiva, sedutora
ou ambivalente. Aqui também é interessante que, além de classificar a atitude
do paciente frente ao examinador, se realize uma descrição sumária da parte do
relato do paciente que fez o médico pensar em tal atitude (dar um exemplo).

8.2.3 Comunicação com examinador e sentimentos despertados

Devem ser descritas as características da fala do paciente, em termos de


quantidade, velocidade e qualidade de produção. Dessa forma, o tipo de
comunicação pode ser descrito como normalmente responsivo, loquaz, taciturno,
prolixo, volúvel, não espontâneo. A verbalização pode ser rápida, lenta, tensa,
hesitante, emotiva, monótona, forte, sussurrada, indistinta. Também podem ser
incluídos aqui defeitos da fala, como gagueira e tiques vocais, como ecolalia.

O entrevistador deve relatar a impressão emocional geral transmitida pelo


paciente, ou seja, os sentimentos despertados em sua pessoa pelo paciente.
Geralmente são sentimento de tristeza, pena, irritação, desejo de ajudar. Tais

117
dados podem ser um importante pista para a psicopatologia subjacente.
Destaca-se, ainda, que este item é intimamente relacionado com a aparência do
paciente.

9.0 ATENDIMENTO PSICOLÓGICO DENTRO DO HOSPITAL

A atuação do psicólogo no contexto hospitalar não se refere apenas à


atenção direta ao paciente, refere-se também atenção que é dispensada à
família e a equipe de saúde, dentro de sua atuação profissional. A atuação do
psicólogo hospitalar promove mudanças, atividades curativas e de prevenção,
diminui o sofrimento que a hospitalização e a doença causam ao sujeito.

Os diagnósticos de cada caso são feitos a partir da representação que


o paciente tem da doença e em particular da sua doença, e que envolve os
aspectos de sua formação cultural, social e individual. O psicólogo hospitalar,
deve-se estar alerta, principalmente, para a maneira como o paciente reage
frente ao diagnóstico de sua doença, como a sua vida psíquica e sua vida social
interfere na dinâmica subjetiva, e também como se estabelecem as relações
psicológicas entre o paciente, a família e a equipe de saúde.

De acordo com Cabral citando Rodríguez e Marín (2003) a Psicologia


Hospitalar é um conjunto de contribuições científicas, educativas e profissionais

118
que as várias correntes da psicologia oferecem para prestar uma assistência de
maior qualidade aos pacientes hospitalizados. O psicólogo hospitalar é o
profissional que detém esses saberes e técnicas para aplicá-los de forma
sistemática e coordenada, sempre com o intuito de melhorar a assistência
integral do sujeito hospitalizado. O trabalho do psicólogo hospitalar é
especificamente direcionado ao restabelecimento do estado de saúde do doente
ou, ao controle dos sintomas que comprometem bem-estar do paciente. Ainda
segundo esse mesmo autor existem seis tarefas básicas do psicólogo hospitalar:

 A função de coordenação, relacionadas às atividades com os funcionários da


instituição.
 A função de auxílio à adaptação, intervindo na qualidade do processo de
adaptação e recuperação do paciente internado.
 A função de interconsulta: auxiliando outros profissionais a lidarem com o
paciente.
 A função de enlace, de intervenção, por meio de delineamento e execução
de programas com os demais profissionais, para modificar ou instalar
comportamentos adequados dos pacientes.
 Assistência direta: atua diretamente com o paciente.
 A função de gestão de recursos humanos: aprimora os serviços dos
profissionais da instituição, o que contribui de forma significativa para a
promoção de saúde.
No contexto hospitalar, o psicólogo deve buscar estabelecer um contato
mais próximo com outras profissões. A saúde não é de competência de um único
profissional, ela é uma prática interdisciplinar e os profissionais das muitas e
diferentes áreas de atuação, devem agregar-se em equipes de saúde. De acordo
com Chiattone (2003) tendo como objetivos comuns estudar as interações
somatopsicossociais e encontrar métodos adequados que propiciem uma prática
integradora, tendo como enfoque a totalidade dos aspectos inter-relacionados à
saúde e à doença.

Conjuntamente com o enfoque da humanização do atendimento em


saúde, a interdisciplinaridade é uma das bases da tarefa do psicólogo que
adentra ao hospital, pois partindo do pressuposto de que o ser doente deve ser

119
considerado biopsicossocial. “Essas três esferas interdependem e inter-
relacionam-se à outra, mantendo o ser doente, intercâmbios contínuos com o
meio em que vive, num constante esforço de adaptação à sua nova condição de
doente […]." (CHIATTONE, 2003, p. 32).

Está abrangência multidisciplinar e estratégica da atuação do psicólogo


hospitalar, pelo reconhecimento do campo de saúde como uma realidade
complexa, e que necessita de conhecimentos distintos integrados é que define
a necessidade de intervenção de forma imediata. Portanto, estas ações
deveriam envolver profissionais de diferentes áreas em uma rede de
complementaridade onde são mantidas as exigências organizacionais unitárias.

Os psicólogos hospitalares atuam como intérpretes das demandas do


paciente, da família e da equipe profissional. Ele atua como facilitador do diálogo
entre essa tríade, e dispensa apoio psicológico a família, assim como
esclarecimento de suas dúvidas. A inserção do psicólogo no hospital gera
qualidade, e amplia a promoção da saúde e a melhor qualidade nos
atendimentos hospitalares

120
A psicologia no contexto hospitalar atua para a melhor integração, e
compreensão das diferentes práticas teóricas, minimiza os espaços entre as
diversidades dos saberes, e lapida o cuidado à saúde e a prevenção de doenças.
Assim é possível estabelecer as condições adequadas de atendimento aos
pacientes, familiares e melhor desempenho das equipes de saúde no hospital.

9.1 O Psicólogo Hospitalar e a Família do Paciente

O acompanhamento psicológico junto à família do paciente é muito


importante pois, o familiar vivencia um momento de crise acometido pelo
sentimento de impotência frente a moléstia de seu ente querido, e também seu
temor pelo falecimento; pela dificuldade em compreender o que se passa com o
paciente; pela distância imposto pelo ambiente hospitalar ( o que impossibilita o
familiar de cuidar, ele mesmo do paciente); a dor da impotência diante o
sofrimento do outro.

Em relação a importância de se prestar uma assistência psicológica a


família do doente, Chiattone ressalta o seguinte:

No hospital, o psicólogo hospitalar também estará realizando avaliação e


atendimento psicológico aos familiares, apoiando-os e orientando-os em suas
dúvidas, angústias, fantasias e temores. Junto à família, o psicólogo deverá atuar
apoiando e orientando, possibilitando que se reorganize de forma a poder ajudar

121
o paciente em seu processo de doença e hospitalização. Não se pode perder de
vista a importância da força afetiva da família. Ela representa os vínculos que o
paciente mantém com a vida e, é, quase sempre, um importante força de
motivação para o paciente na situação de crise. (CHIATTONE, 2006, p. 32)

Nesse sentido, pode-se acrescentar que o psicólogo avalia o estado


emocional do paciente e da família e o impacto do adoecimento e da internação
para ambos. Avalia também as possíveis crenças ou ideias distorcidas que os
familiares têm em relação ao quadro clinico do paciente, e a relação do paciente
e da família com a equipe profissional, uma vez que todos esses fatores podem
influenciar no tratamento. A partir destas considerações o profissional da
psicologia fará suas intervenções.

9.2 O Psicólogo Hospitalar e a Equipe Multidisciplinar

Nas instituições de saúde são indispensáveis que os papéis, e as tarefas


profissionais de cada membro da equipe sejam claramente delimitados.
Principalmente porque a indefinição ou a ambiguidade relativa ao papel
profissional podem gerar conflitos na equipe, ao se acumularem expectativas
inadequadas ou mal delimitadas entre seus membros. A respeito disso Chiattone
ressalta:

122
[…] a delimitação do papel profissional acompanha as expectativas dos outros
membros da equipe quanto ao papel que o profissional em questão deve exercer,
acrescidas das próprias expectativas do profissional sobre sua capacidade de
realização e de interpretação das expectativas dos outros. Em geral, no hospital
geral, é muito comum ocorrerem conflitos em equipes compostas por
profissionais com distintos graus de instrução e conhecimentos sobre as outras
especialidades, sendo que o potencial conflitivo torna-se aumentado se não
houver compreensão das capacidades dos membros, se o profissional visualizar
a tarefa como invasão de terreno dos outros profissionais, se assumir um
comportamento defensivo em prol das prerrogativas profissionais e se acreditar
na falha de utilização plena das qualificações dos outros membros.
(CHIATTONE, 2006, p. 33)
A postura diante ao trabalho, devem ser delineadas pela disposição de
compartilhar os diversos saberes, ter flexibilidade, vontade de aprender e
disposição decisões conjuntas. O respeito e a confiança também são essenciais,
assim como os atributos pessoais de cada membro da equipe (autoconfiança,
boa capacidade de comunicação, e profissionalismo).

O trabalho em equipe deve ser compreendido pela maneira como a


equipe exerce suas tarefas, acrescentado da análise de cada funções, regras e
valores, aspectos que dizem respeito à liderança e decisões, definição de
objetivos, interação e exercício de poder.

9.3 A Atuação do Psicólogo no Hospital Geral

123
O hospital desde sua criação foi considerado o símbolo máximo de
atendimento em saúde, ideia que, de certa forma, ainda persiste. Muito
provavelmente, esse é o motivo pelo qual, no Brasil, o trabalho da Psicologia no
campo da saúde é chamado Psicologia Hospitalar, e, não, Psicologia da Saúde,
o que enfatizaria mais a promoção de saúde.

No Brasil, os primeiros psicólogos começaram a atuar em hospitais,


por volta de1960, quando ainda não existia um determinado padrão a ser
seguido. Estes profissionais passaram, então, a realizar nos hospitais as
mesmas práticas que realizadas em seus consultórios. Também atuavam como
assessores dos Psiquiatras, ou como psicometristas; sem participar do
atendimento direto ao paciente. "A reprodução das práticas de consultório, […],
não floresceu e não poderia mesmo florescer, por não trazer respostas às
necessidades do paciente e da própria equipe." (GORAYDE, 2001, p. 263). É
necessário quando se trabalha com Psicologia dentro do hospital compreender
que é preciso se fazer não apenas Psicologia, mas uma Psicologia Médica.:

[…] por psicologia médica se entende o estudo das situações psicológicas


envolvidas na questão mais ampla de saúde do paciente, com destaque para o
aspecto da saúde orgânica. Os aspectos psicológicos são vistos e tratados como
associados à questão de saúde física, não devendo de esta ser dissociados. Não
se trata de diminuir a importância da psicologia, mas sim de adequá-la, para uma
maior eficiência. (GORAYDE, 2001, p. 263).

É importante enfatizar que o indivíduo hospitalizado é diferente daquele


que procura o consultório, pois este traz uma demanda espontânea. Ele não
possui quadros clássicos de psicopatologia, doença de ordem orgânica,
agravada ou modera, ele traz uma demanda psicológica específica. "Necessita
comunicar-se bem com seu médico, ou colocado de uma forma correra,
necessita que seu médico se comunique adequadamente consigo, necessita
informações e apoio." (GORAYDE, 2001, p. 264).

Se devido às características psicológicas anteriores ou um quadro de


stress causado pela internação pela internação, o paciente passar a apresentar

124
algum distúrbio psicológico transitório é extremamente importante que os
membros da equipe de atendimento do hospital compreendam que este distúrbio
é temporário, específico, e provavelmente está relacionado com a hospitalização
do sujeito. Em decorrência de uma situação semelhante a essa, "[…] o papel do
psicólogo hospitalar é essencial para apoiá-lo, esclarecê-lo, informá-lo, levar a
equipe a se relacionar efetivamente com ele, dar-lhe todas as informações de
aspectos específicos de sua patologia e do prognóstico." (GORAYDE, 2001, p.
264). Com isso, o profissional da psicologia ganha um papel de destaque para
consolidar a harmonia da equipe e auxiliar no restabelecimento da saúde do
paciente.

9.4 Primeiros passos no atendimento psicológico dentro do hospital

Ao chegar ao hospital pela primeira vez o estagiário ou psicólogo não sabe


por onde começar. Sente-se perdido, não compreende a terminologia técnica do
vocabulário utilizado. Os pacientes são muito diferentes daqueles vistos em
psicologia clínica e são em número muito maior, reunidos em um mesmo espaço
físico. A supervisão é uma demanda urgente, bem como conhecimentos
técnicos-científicos.

A experiência em lidar com estagiários mostra que o primeiro contato em


psicologia hospitalar deve ser feito com livros e cursos. Já dentro do hospital, o
estagiário ou profissional deve ser apresentado aos funcionários e médicos, aos
locais físicos em que irá trabalhar. Deve nos primeiros dias observar os doentes,

125
seus familiares e a atuação das pessoas, familiarizando-se com o ambiente de
trabalho.

É recomendado que se faça um anteprojeto de trabalho, com a proposta


inicial da sua atuação, com levantamento de bibliografia e especificação do tipo
de doença do paciente a ser atendido.

Uma visão global dos pressupostos da psicologia hospitalar ajuda o


estagiário/profissional a se posicionar. Ele deve ser paciente em suas
observações, tornando mais criterioso o seu modo de seleção dos atendimentos.

Deve informar-se, de modo geral, sobre:

 Diagnóstico
 Prognóstico
 Propedêutica
 Grau de risco de vida
 Tempo de internação (até o momento do início do atendimento e a
previsão do tempo total)
 Cuidados especiais com determinado doente
 Por exemplo: Um paciente renal crônico em hemodiálise apresentará
características muito distintas de um paciente neurológico.
 Traçar as primeiras impressões do paciente visitado e da área de
atendimento, poderá ajudá-lo a fazer um diagnóstico situacional e a partir
de então dar-lhe a ideia das primeiras ferramentas de trabalho a serem
utilizadas.

Estabelecimento da forma de atendimento:

 O doente deverá ser encaminhado pelo médico?


 Pela enfermagem?
 Deverá o psicólogo abordar aquele que ele julgar necessitado de
acompanhamento psicológico?
 Deverá atender a todos ou só aos encaminhados?

2. Estabelecimento do tempo de duração do processo terapêutico:

126
 Do início do atendimento até a alta hospitalar e/ou alta da
psicologia?
 Determinado número de sessões para trabalhar os sintomas-foco?

3. Critério de atendimento - técnica a ser utilizada:

 Terapia individual?
 Terapia em grupo?
 Terapia família?

O hábito de fazer relatório dos seus atendimentos é muito útil. Através


destes se tem feedback dos atendimentos, além de possibilitar estudos
estatísticos futuros. Os relatórios nos possibilitam reestudar um caso e observar
as falhas e os sucessos do atendimento. Devem ser feitos do modo mais
completo possível, porém sem serem prolixos e floreados de inutilidade. Devem
ser técnicos, com vocabulário próprio, sem coloquialismos.

O estudo teórico sempre acompanha os atendimentos e os relatórios.


Sem teoria o atendimento ao doente poderia ser realizado por qualquer pessoa

127
disposta a ajudar. A diferença se faz em conhecimentos, responsabilidade nas
intervenções e na resolução dos conflitos inconscientes.

9.5 A prática do psicólogo hospitalar em equipe multidisciplinar

O trabalho em equipe é hoje uma prática crescente no atendimento à


saúde (Bucher, 2003; Maclean, Plotnikoff & Moyer, 2000; Moré, Crepaldi,
Queiroz, Wendt & Cardoso, 2004; Remor, 1999; Seidl & Costa, 1999; Wild,
Bowden & Bell, 2003). As equipes se caracterizam pelo modo de interação
presente na relação entre profissionais (Chiattone, 2000; Maclean et al., 2000),
que pode ser interdisciplinar, multidisciplinar e transdisciplinar.

A interação é interdisciplinar quando alguns especialistas discutem entre


si a situação de um paciente sobre aspectos comuns a mais de uma
especialidade. É multidisciplinar quando existem vários profissionais atendendo
o mesmo paciente de maneira independente. É transdisciplinar quando as ações
são definidas e planejadas em conjunto. Na prática, poucos são os trabalhos que
contemplam essa diferenciação. Independente do termo empregado, há
expectativas de que profissionais da saúde sejam capazes de ultrapassar o
desempenho técnico baseado em uma única arte ou especialização (Bucher,
2003; LoBianco, Bastos, Nunes & Silva, 1994).

128
Reconheça-se, contudo, que o interesse pelo trabalho em equipe
multidisciplinar vem se fortalecendo, tendo como base a crescente aceitação do
modelo biopsicossocial de saúde. Nesse modelo, saúde é definida como o bem-
estar físico, mental e social, em contraste com o modelo biomédico tradicional
para o qual saúde é a ausência de doença (Organização Panamericana da
Saúde, 1996).

A organização ou mobilização de equipes está associada à complexidade


da demanda (Crepaldi, 1999). Nessas situações, os profissionais se deparam
com seus próprios limites e encontram nos colegas de outras formações
subsídios para a compreensão e atendimento do caso em questão. No entanto,
tal atitude não é uma conduta padrão, podendo variar conforme a tradição
profissional, a característica do grupo de trabalho e o tipo de intervenção
(Chiattone, 2000). Na verdade, o trabalho em equipe traz novos desafios,
exigindo competências e habilidades para o trabalho em grupo e para a
justificação clara e objetiva de procedimentos técnicos pertencentes à dada
especialidade

No âmbito hospitalar, a falta de clareza quanto às atribuições dos


diferentes profissionais, principalmente em profissões emergentes, é um dos
fatores que dificulta o trabalho em equipe. O hospital é uma instituição complexa,
que envolve um grande número de especialidades. Esses profissionais são
preparados para tomar decisões importantes em curto espaço de tempo.
Tradicionalmente, tais decisões competem aos médicos. No entanto, com o

129
aparecimento de novas especialidades, os médicos contam hoje com o auxílio
de diversos profissionais de campos emergentes. Um desses campos é a
Psicologia.

A crescente inserção da Psicologia em equipes de saúde é hoje um fato


reconhecido (LoBianco et al., 1994). No âmbito hospitalar, sabe-se que a
Psicologia vem participando mais ativamente na definição de condutas e
tratamentos (Romano, 1999). Contudo, há queixas entre psicólogos de que
muitas das suas observações clínicas não são prontamente aceitas pelas
equipes. Tais dificuldades têm gerado discussões sobre qual o modo mais
apropriado da Psicologia se inserir nas equipes multidisciplinares.

Uma primeira condição para o trabalho multidisciplinar efetivo do


psicólogo é a clareza de suas atribuições e das expectativas concernentes a sua
especificidade (Romano, 1999). No caso de estarem esclarecidas as atribuições
do psicólogo, espera-se que ele seja capaz de se mostrar competente o
suficiente para que sua prática seja vista como necessária (Chiattone, 2000;
Moré et al., 2004).

Uma das dificuldades apontadas na relação do psicólogo com a equipe é


a ausência de linguagem clara e objetiva. Em contraste, Seidl e Costa (1999)
informaram que tais dificuldades diminuem quando o psicólogo é pós-graduado,
desenvolve atividades de pesquisa e participa de eventos científicos.

Em estudo realizado na Escócia, Wild et al. (2003) verificaram que o baixo


índice de encaminhamento para tratamento psicológico estava mais relacionado
à falta de compreensão da prática do que à desconfiança dos métodos. A partir
desses resultados, os autores concluíram que há necessidade de os psicólogos
hospitalares investirem em canais de comunicação que permitam divulgar e
esclarecer o trabalho que realizam ou podem realizar em hospitais.

Apesar dos avanços obtidos, o trabalho em equipe ainda constitui um


importante desafio para o desenvolvimento da Psicologia Hospitalar (Seidl &
Costa, 1999; Yamamoto & Cunha, 1998). Gavião e Pinto (2000) ouviram 80
psicólogos que trabalhavam em hospital e concluíram que o compromisso
interprofissional é ainda muito idealizado. Com efeito, a intervenção
multidisciplinar não ocorre de modo frequente e sistemático (Bucher, 2003;

130
Crepaldi, 1999), podendo ser prejudicada por uma rígida discriminação
hierárquica (Romano, 1999). A discriminação hierárquica ocorre quando não se
diferencia status de função, substituindo-se as especificidades de cada membro
da equipe pelas relações de poder. A dinâmica de trabalho em equipe,
fundamentada na diferença de cada especialista, depende da autonomia e do
compartilhamento de responsabilidades. Em uma equipe bem-sucedida, o
diálogo é aberto e cooperativo, favorecendo o rodízio natural de lideranças
situacionais (Romano, 1999).

9.6 Interconsulta psicológica: demanda e assistência em hospital geral

A interconsulta em psicologia, tal como desenvolvida no hospital alvo do


presente estudo, inspira-se no modelo da interconsulta psiquiátrica preconizado
por Botega (2006), definido como um instrumento metodológico utilizado pelo
profissional da saúde mental para compreender e aprimorar a assistência ao
paciente no hospital geral, por meio do diagnóstico e tratamento de problemas

131
psicológicos, dificuldades interpessoais e dilemas institucionais envolvendo o
paciente, a família e a equipe de saúde.

A interconsulta psiquiátrica, na concepção de Schmitt e Gomes (2005),


teria por funções prover assistência específica a pacientes acometidos por
transtornos mentais, priorizar uma forma de trabalho centrada no paciente e não
na doença, colaborar na abordagem psicossocial do paciente, auxiliar na tarefa
de ensino e pesquisa e aproximar os profissionais de saúde mental de outras
especialidades da área da saúde. De acordo com os autores, a interconsulta
compreende uma atividade interprofissional e interdisciplinar. Por sua vez,
Guerreiro et al. (2009) descrevem a interconsulta em saúde mental como uma
tentativa de integração das dimensões biológica, psicológica e social,
possibilitando uma intervenção diferenciada e estruturada na avaliação,
diagnóstico e tratamento dos aspectos psicológicos que interferem na
experiência do adoecimento.

Em relação aos objetivos mencionados anteriormente, a interconsulta


psicológica se assemelha àquela desenvolvida pelos psiquiatras, com exceção
da realização de exame físico, prescrição de medicação e indicação de exames
ou procedimentos médicos. É possível identificar pontos de afinidade
metodológica entre o modelo de assistência adotado na interconsulta
psiquiátrica e aquele desenvolvido pelo psicólogo. Na perspectiva de Botega
(2006), a atuação do profissional interconsultor em saúde mental no hospital
geral deve-se pautar pela presteza e sistematização de ações. A boa qualidade
da intervenção dependerá, entre outros fatores, do estabelecimento de um
contato inicial satisfatório entre o profissional solicitante e o interconsultor, com
vista a esclarecer a razão do pedido e compreender a história clínica e pessoal
do paciente, o que permitirá o planejamento de estratégias mais apropriadas ao
caso em questão. Devem-se observar as motivações, o grau de proximidade
afetiva, as preocupações, os sentimentos e as reações dos profissionais
atuantes no cuidado ao paciente.

A habilidade do interconsultor em promover uma entrevista ampliada, não


apenas com o profissional solicitante, mas também com outros membros da
equipe assistencial e com familiares do paciente, enriquecerá um processo de
comunicação e diagnóstico que, em essência, depende da articulação favorável
132
das relações interpessoais. A modalidade de entrevista possui, então,
características especiais, relacionadas à situação de crise vivenciada pelo
paciente, visto que a hospitalização representa um desafio à capacidade
adaptativa do indivíduo, provocando alterações no autoconceito, em seu estilo
de vida e na dinâmica dos relacionamentos familiar e social (Sherer, Z. A.P. ,
Sherer & Labate, 2002).

Além disso, Botega (2006) salienta a importância da leitura atenta do


prontuário para coleta de informações essenciais sobre a história do
adoecimento, o comportamento e o estado de ânimo do paciente durante a
hospitalização, estabelecendo-se, assim, vínculos e responsabilidades entre os
envolvidos no processo; após análise do pedido solicitado, o interconsultor
segue para avaliação do paciente. A avaliação psicológica de um paciente
internado em hospital geral está invariavelmente condicionada por
particularidades do ambiente hospitalar e do momento da história de vida da
pessoa.

Nesse cenário, a comunicação é sempre considerada um dos aspectos


cruciais do sucesso ou fracasso da interconsulta. Após a devida avaliação do
paciente, é recomendável informar pessoalmente o profissional solicitante e
outros membros da equipe sobre a impressão diagnóstica e o plano terapêutico
estabelecido. Essa atitude demonstra interesse e preocupação do interconsultor
pela situação do paciente e reforça a confiança e a necessidade de trabalho
conjunto entre profissionais da saúde. Soma-se a isso o fato de que uma
133
adequada e eficiente ação do psicólogo como interconsultor só tende a ampliar
a valorização deste profissional perante seus pares (Marinho & Caballo, 2001).

Traçada a estratégia adotada no atendimento em interconsulta


psiquiátrica e psicológica, torna-se fundamental descrever a importância desse
modelo de atuação. Como ressaltado anteriormente, a internação em um
hospital geral acarreta a necessidade de o indivíduo ajustar-se ao ambiente, pois
ele pode desenvolver diversas reações, tanto positivas (de enfrentamento)
quanto negativas, o que interfere na recuperação. Dessa forma, é compreensível
que o adoecer e o consequente envolvimento de cuidados com a saúde se
tornem fatores potenciais de estresse. Os interconsultores em saúde mental têm
a responsabilidade de identificar e manejar as dificuldades adaptativas deste
período, atuando para a recuperação do paciente, o bem-estar da família e um
trabalho mais saudável da equipe hospitalar (Zavaschi, Lima & Paula, 2000).

A permanência prolongada do paciente no hospital pode ser tanto uma


consequência direta de sua patologia quanto produto da severidade de relações
patológicas estabelecidas no contexto hospitalar, as quais tornam o tratamento
mais difícil. Em relação aos custos e à utilização dos serviços médicos, Carvalho
e Lustosa (2008) certificam que a negligência no manejo dos transtornos mentais
e das queixas psicossociais acarreta o prolongamento do tratamento médico,
além de repetidas e desnecessárias reinternações hospitalares; já no tocante ao
bem-estar do enfermo, a falha em identificar e tratar adequadamente queixas
psiquiátricas ou psicológicas leva a uma assistência deficiente e a sofrimentos
desnecessários.

Como argumento para que patologias psiquiátricas e psicológicas


recebam a atenção necessária no período de internação hospitalar, salientam-
se a incidência e a severidade de transtornos que envolvem a interface do
somático e psíquico, considerando-se não apenas os transtornos psiquiátricos,
mas também as somatizações e comorbidades físicas e psiquiátricas (Carvalho
& Lustosa, 2008).

Andreoli e Mari (2002) propõem um modelo de interconsulta que leva em


consideração um conjunto de fatores que envolvem o binômio doença/cura e a
relação médico-paciente e exercem influência sobre as internações hospitalares.

134
A ausência de assistência psiquiátrica e psicológica pode prolongar o
tratamento, ou mesmo dificultar as ações da equipe no atendimento ao caso
clínico em questão, principalmente devido à repercussão negativa da patologia
sobre a vida do paciente e seus familiares e às limitações em desvendar a
complexa associação estabelecida entre distúrbios psicológicos e doenças
físicas.

Diferentes motivos podem ser determinantes da solicitação de uma


interconsulta psiquiátrica por médicos e outros membros da equipe. Smaira,
KerrCorrêa e Contel (2003) evidenciam alguns desses fatores motivacionais,
quais sejam: colaboração para o diagnóstico diferencial de patologias orgânicas
e psicológicas, persistência de comportamento queixoso do paciente,
comportamento de paciente que altera o funcionamento da enfermaria,
sensibilização da equipe pelas atitudes do paciente, dificuldade da equipe em
lidar com sentimentos e reações decorrentes do adoecer, risco e/ou tentativa de
suicídio, transtornos psiquiátricos de pacientes e desajustes na relação médico-
paciente.

Geralmente, os pedidos de interconsulta tornam evidentes situações de


conflitos não suficientemente explicitadas, envolvendo o paciente, o médico, os
membros da equipe de saúde e a instituição. O processo se desenrola em um
ambiente marcado pelo sofrimento e pela esperança, o qual é preenchido por
relações interpessoais e de entrecruzamento institucional e condicionado pela
particularidade de cada situação clínica e pela participação de cada pessoa nela
envolvida, em interação consigo mesma e com os demais (Botega, 2006).

A partir das considerações mencionadas acima, a interconsulta


psicológica deve ser operada por um profissional que seja devidamente
habilitado e adote, para pensar e agir, o referencial teórico predominante. A
finalidade do psicólogo em sua faceta como interconsultor é a de contribuir para
compreensão e ampliação da tarefa assistencial, atuando ainda como facilitador
da comunicação entre o profissional de saúde, o paciente e o familiar. Nessa
empreitada, busca-se compreender a dinâmica interpessoal dos
relacionamentos efetivados e realizar um diagnóstico situacional, integrando
ópticas parciais a fim de alcançar um nível de entendimento e de assistência
integrado, em vez de dissociado e fragmentado (Maldonado & Canella, 2003).
135
Observa-se, destarte, que o trabalho de interconsulta supõe uma
aprendizagem recíproca, em que os profissionais envolvidos aprendem a olhar
para determinada situação a partir de novos ângulos e podem organizar
estratégias mais eficientes de atuação. Com as falhas assistenciais de um caso,
outras possibilidades de manejo podem surgir e ser aplicadas no futuro.

10.0 O PSICÓLOGO NA UNIDADE DE TERAPIA INTENSIVA

Os primeiros relatos históricos que abordam a criação da UTI surgiram


com a enfermeira Florence Nightingale ao descrever as vantagens da criação de
uma área separada do hospital para pacientes em recuperação de cirurgia
durante a guerra da Criméia (SIMMONS, NIGHTINGALE, 2004. apud
FONSECA, FONSECA, 2010). Foi assim que nasceu a ideia de classificar os
doentes de acordo com o grau de dependência, dispondo-os nas enfermarias,
de tal maneira que os mais graves ficassem próximos à área de trabalho das
enfermeiras, para maior vigilância e melhor atendimento.

No Brasil, as UTI’s surgiram na década de 70 do século XX, encontrando


campo fértil no país no auge do milagre econômico que, no contexto, privilegiava
um modelo econômico concentrador de renda e uma política voltada à
modernização e ao desenvolvimento, o que repercutiu no setor da saúde em que
a expansão se deu às custas da ação do Estado (GERMANO, 1983. apud
TRANQUITELLI, CIAMPONE, 2004).

136
De acordo com o Conselho Regional de Medicina do Estado de São
Paulo, em sua resolução nº 71, de 08 de novembro de 1995, a unidade de terapia
intensiva caracteriza-se como o local dentro do hospital destinado ao
atendimento em sistema de vigilância contínua a pacientes graves ou de risco,
potencialmente recuperáveis.

A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é a área do hospital que se diferencia de


outras unidades de um hospital geral, pois oferece tratamento específico e
intensivo para o paciente em estado crítico. (SOUZA, POSSARI e MUGAIAR,
1985, apud PREGNOLATTO, AGOSTINHO, p.139, 2010).

A UTI é caracterizada como um fruto extraordinário do avanço que as


ciências médicas e sua tecnologia atingiram no século XX. (SEBASTIANI, 2010).
O conceito de UTI surge quando se concluiu que era mais seguro isolar
pacientes em estado grave numa sala especial, visando a manutenção da saúde
do sujeito por equipe especializada e dotada de equipamentos específicos,
recursos materiais e tecnológicos.

A UTI é um setor do hospital destinado a receber pacientes clínicos, pós-


cirúrgicos, terminais e em estado grave com possibilidade de recuperação. É um
local que abrange diagnósticos de diversas especialidades, como: politraumas,
traumatismos cranianos de níveis leves, moderado e grave; insuficiência

137
respiratória aguda; infarto agudo do miocárdio; angina instável; insuficiência
renal aguda; aneurisma cerebral; recuperação pós- -cirúrgica; infecção
localizada (chamada sepse); leucemia, parada cardiorrespiratória, entre outros.
Conclui-se que os pacientes internados em uma UTI podem apresentar
diferentes diagnósticos, mas todos necessitam de cuidados especiais
(PREGNOLATTO E AGOSTINHO, 2010).

O ambiente da UTI é considerado um local “frio” e “hostil” em que causa


insegurança tanto para o paciente quanto para a família. Segundo Moura (1996)
apud Oliveira (2002), considerando-se as práticas intensivistas na UTI, onde
todo atendimento é sempre norteado pelo imediato, ao se tratar da singularidade
nesse espaço da urgência o sujeito é lançado no estado inicial de desamparo,
um estado que pode se repetir em qualquer momento da vida, revelando a
precariedade e fragilidade do ser humano.

Nesse sentido, a UTI torna-se um lugar imbuído por crenças que vão de
encontro ao seu objetivo que é o de prolongar a vida do paciente através dos
recursos tecnológicos e cuidados especializados.

Com o crescimento do trabalho em equipe multidisciplinar e fortalecimento


do modelo holístico ao qual vê o sujeito como sendo um ser
biopsisocioespiritoambiental, o psicólogo vem adquirindo espaço importante
nessa equipe de saúde, sendo ele responsável pela cura e ou manutenção da
mente do paciente interno em hospitais.

O profissional de psicologia, por fazer parte da equipe de saúde que atua


em diversos setores de um hospital, tem como uma de suas funções a atuação
na UTI que dar-se em uma tríade constituída de: paciente, sua família e a própria
equipe de saúde, todos envolvidos na mesma luta, mas cada um compondo um
dos ângulos desse processo. (SEBASTIANI, 2010).

De acordo com Sebastianini, 2010, o sofrimento físico e emocional do


paciente é uma situação em que a dor aumenta a tensão e o medo que, por sua
vez, exacerbam a atenção do paciente à própria dor que, aumentada, gera mais
tensão e medo. Além disso, há a angústia e o sofrimento da família que se sente
impotente para ajudar seu familiar e que também se assusta com o espectro da
morte que muitas vezes ronda seus pensamentos. O profissional de saúde

138
também é afetado por sentimentos ambivalentes de onipotência e impotência,
onde a própria finitude que é denunciada a cada momento faz o mesmo se
refugiar em suas defesas. Tudo isso compõe o foco da atuação do psicólogo na
UTI, local onde merece atenção e respeito, pois é ao mesmo tempo agente e
paciente de tudo que se mencionou anteriormente.

Ainda segundo Sebastiani, fatores que mobilizam sentimentos e


sensações perturbadoras são permanentemente presentes em uma UTI,
contudo podem ser compreendidos e neutralizados pela pronta intervenção. É o
local onde a atuação do psicólogo pode ser de pronta intervenção, pela sua
presença constante e sua formação voltada para a investigação e análise de
quadros comportamentais e situações de risco.

Assim, o psicólogo deve atuar junto aos agentes envolvidos no processo


de hospitalização na UTI com o seguinte foco:

• Orientar e informar rotinas da UTI, horário de visita;

• Informar ao paciente acerca dos acontecimentos que ocorrem fora da


UTI, mesmo o paciente estando em coma (inconsciente);

• Estimular o contato do paciente com a família e equipe, visando a


facilitação da comunicação;

• Avaliar a adequada compreensão do quadro clínico e prognóstico por


familiares e paciente;

• Verificar qual membro da família tem mais condições emocionais e


intelectuais para o contato com a equipe;

• Disponibilizar horários e intervir para atendimentos individuais aos


familiares, quando necessário ou solicitado pelo familiar.

Sabemos que o atendimento do psicólogo sempre se estende do paciente


à família, no qual o profissional envolverá ambos, que precisam ser ouvidos,
necessitam de resposta. Isso acontece pelo fato de estarem ambos com medo,
inseguros e em meio à crise emocional gerada pelo processo de adoecimento.

139
10.1 Atuação do psicólogo junto à criança

A estadia de crianças em UTI pediátrica é um evento traumático, para os


pacientes, pais e/ou cuidadores assim como para a equipe de saúde, devido ao
alto risco de morte que essas crianças se encontram ao serem submetidas a
UTI. A prematuridade, síndrome de aspiração de mecônio, hidrocefalia, icterícia
fisiológica e doença hemolítica do RN são os diagnósticos clínicos mais
frequentemente observados (Baptista, Agostinho, Baptista, Dias, 2010). Neste
sentido, diversos profissionais compõem a UTI–Pediátrica ou UTI–NEO, como
médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, assistentes
sociais, fonoaudiólogos, psicólogos, entre outros.

O psicólogo tem a tarefa de avaliar aspectos ligados ao peso e idade


gestacional com o objetivo de prever futuras morbidades em nível de
desenvolvimento (BAPTISTA, AGOSTINHO, BAPTISTA, DIAS, 2010).

De acordo com Baptista, Agostinho, Baptista, Dias, (2010), compete ainda


ao psicólogo avaliar também questões psicológicas e sociais dos familiares,

140
objetivando assim um trabalho de equipe interdisciplinar que envolve a avaliação
de todos os aspectos que podem estar envolvidos no nascimento e
hospitalização de um bebê com algum comprometimento.

Ainda segundo os autores supracitados, uma importante atribuição do


psicólogo em UTI-NEO dá-se no acompanhamento de mães que tenham seus
filhos internos, pois o psicólogo vai orientar as mães sobre o contato com os
bebês, que será estabelecido por meio do olhar, do toque e da fala; como
também informações sobre a rotina da UTI-NEO, tendo em vista que não se trata
de uma realidade do cotidiano dessas mães.

10.2 Atuação do psicólogo junto ao idoso

É um grande desafio entender e compreender a complexidade do idoso,


já que entre suas doenças crônicas está o fator desencadeador da
descompensação clínica e o papel que a UTI pode desempenhar nesses casos.
O idoso já é muito frágil por natureza e uma intercorrência na UTI só tem a
contribuir para a deterioração do seu estado geral, pois normalmente esse idoso
não apresenta condições psicológicas nem reservas fisiológicas sufi ciente para
enfrentar o novo acontecimento. Isso leva ao paciente idoso e toda família uma
atitude desesperadora no sentido de encontrar soluções para melhorar seu
estado.

141
O psicólogo, muitas vezes pelo seu próprio estado, tem uma dificuldade
até para chegar nesse paciente que, por muitas vezes, pela sua própria idade,
tem dificuldade até de audição e cognição, o que complica a atuação do
profissional de saúde.

10.3 Atuação do psicólogo junto à família

Quando se presta atendimento a um paciente que está hospitalizado em


estado grave, esse paciente vem sempre acompanhado em seu pensamento de
questões relacionadas à doença e sua morte. Nesse momento, a família é o
vínculo mais próximo e mais propício de criar estratégias no sentido de melhorar
e enfrentar tanto o sofrimento do paciente como o da própria família.

A família experimenta diferentes estágios de adaptação à realidade do


paciente em estado grave, semelhantes aos estágios enfrentados por ele nesse
processo de aceitação e superação.

Segundo Kübler-ross (1985) apud Pereira (2004), existem fases pelas


quais esses pacientes podem passar durante o processo de morte: negação,
raiva, barganha, depressão e aceitação. São estágios dinâmicos que acontece
tanto com paciente como com a família por períodos variados de acordo com

142
cada um. A negação aparece como um mecanismo de defesa, para proteger o
ego do indivíduo. Quando esse paciente não consegue manter- -se apenas
negando sua realidade, surgem os sentimentos de raiva, ressentimento, revolta
e inveja que podem caracterizar um segundo estágio de enfrentamento .

10.4 Atuação do psicólogo junto à equipe de saúde

A realidade vivenciada pela equipe multiprofissional que atua em


unidades de terapia intensiva é permeada por variados sentimentos e emoções,
onde aspectos ligados à finitude e às expectativas impostas por familiares,
paciente e colegas no cotidiano de trabalho, a escassez de recursos materiais
(leitos e equipamentos) e de recursos humanos e a tomada de decisões
conflitantes relacionadas com a seleção dos pacientes que serão atendidos são
fatores importante para tais profissionais serem acompanhados por psicólogos
em suas rotinas diárias.

As ações da equipe devem favorecer a geração de condições para


que o cuidado possa produzir crescimento e transformação, a
despeito das circunstâncias, pois a finalidade do cuidado é ajudar
o indivíduo a crescer, seja para viver ou para morrer (LEITE, VILA
2005).

Tais aspectos são evidências claras de que o profissional de saúde que


atua na UTI é alvo da atuação do psicólogo, pois os mesmos necessitam de
auxílio para lidar com esses estressores, que muitas vezes os levam a se refugiar
em suas defesas, onde o racionalismo, o não envolvimento, a própria onipotência
estão presentes no dia-a-dia do mesmo (SEBASTIANINI, 2010).

Assim, Sebastianini (2010) define que a atuação do psicólogo junto aos


profissionais dá-se como facilitador do fluxo dessas emoções e reflexões,
auxiliando a detectar os focos de “estresse” e a sinalizar quando suas defesas
se encontram acentuadas.

11.0 O PSICÓLOGO HOSPITALAR E A ONCOLOGIA – PSICO-ONCOLOGIA

143
Considerando-se a definição da área de psicologia da saúde proposta
pela American Psychological Association (APA), como um campo de
contribuição científica e profissional, específica da psicologia enquanto
disciplina, que visa a promoção e a manutenção da saúde, a prevenção e o
tratamento de doenças (Matarazzo, 1980), podemos demarcar um campo de
interface entre a oncologia (área da Medicina que estuda o câncer) e a
psicologia, denominada psico-oncologia, como um dos elementos integrantes da
área da psicologia da saúde.

Sendo assim, é possível descrever a psico-oncologia como um campo


interdisciplinar da saúde que estuda a influência de fatores psicológicos sobre o
desenvolvimento, o tratamento e a reabilitação de pacientes com câncer. Entre
os principais objetivos da psico-oncologia está a identificação de variáveis
psicossociais e contextos ambientais em que a intervenção psicológica possa
auxiliar o processo de enfrentamento da doença, incluindo quaisquer situações
potencialmente estressantes a que pacientes e familiares são submetidos.

Fatores psicológicos intervenientes sobre processos de desenvolvimento


de doenças em seres humanos já foram referidos desde épocas milenares da
medicina chinesa, embora estudos sistemáticos que investigassem a relação
entre variáveis de natureza psicológica e o desenvolvimento de câncer somente
tenham sido delineados a partir de meados da década de 40 (Holland, 1991).

144
Estudos mais recentes apontam evidências de que a resposta psicológica do
paciente ao câncer constitui variável interveniente significativa sobre os
resultados do tratamento, podendo, inclusive, afetar a duração de sua
sobrevivência (Carey & Burish, 1988; Scott, 1994; Simonton, Matthews-
Simonton & Creighton, 1987).

Conforme descrito em Della Porta (1983; citado em Miyazaki & Amaral,


1995), em termos de fatores de risco, reconhece-se que mais de 80% dos casos
de câncer “estão associados a fatores ambientais, incluindo o meio em geral,
ambiente ocupacional, ambiente de consumo e ambiente cultural” (p. 241). Sob
tais perspectivas, a contribuição potencial da psico-oncologia para o
entendimento da influência de variáveis psicossociais sobre processos de
geração de neoplasias e para o desenvolvimento de estratégias que auxiliem o
indivíduo doente a enfrentar o processo de tratamento são inegáveis.

Observa-se que a psico-oncologia vem se constituindo, nos últimos anos,


em ferramenta indispensável para promover as condições de qualidade de vida
do paciente com câncer, facilitando o processo de enfrentamento de eventos
estressantes, se não aversivos, relacionados ao processo de tratamento da
doença, entre os quais estão os períodos prolongados de tratamento, a
terapêutica farmacológica agressiva e seus efeitos colaterais, a submissão a
procedimentos médicos invasivos e potencialmente dolorosos, as alterações de
comportamento do paciente (incluindo desmotivação e depressão) e os riscos
de recidiva.

145
Atualmente, podemos afirmar que acompanhamento psicológico do
paciente e de seus familiares, em todas as etapas do tratamento, constitui
elemento indispensável da assistência prestada (Bearison & Mulhern, 1994;
Carvalho, 1994; Dahlquist, Czyzewski & Jones, 1996; Gimenes, 1996). Deve-se
observar, entretanto, que por se tratar de uma área relativamente recente são
muitos os fatores psicossociais vinculados a um episódio de câncer ainda não
suficientemente compreendidos por pesquisadores e profissionais da área.
Temas relacionados à adaptação comportamental e ajuste emocional do
paciente ao tratamento, estratégias de enfrentamento em contextos
estressantes, indicadores de qualidade de vida, efeitos psicossociais do
tratamento do câncer a longo prazo e modalidades de intervenção psicológica
junto ao paciente e familiares ainda serão, por exemplo, alvo de estudos
científicos e assunto de discussão pelos próximos anos.

Embora ainda permeado por um caráter catastrófico, o diagnóstico de


câncer e seu consequente tratamento vêm obtendo resultados cada vez
favoráveis. Avanços farmacológicos têm permitido a geração de agentes
quimioterápicos cada vez mais eficientes e com maior controle de efeitos
colaterais desconfortáveis; ao mesmo tempo, descobertas genéticas e
imunológicas, bem como novas técnicas de diagnóstico, têm permitido a
identificação precoce de formações neoplásicas (Cassileth & Chapman, 1996;
Farah, 1997). Em consequência, taxas demonstrativas de sobrevida vêm
apresentando índices percentuais ascendentes engrossando a proporção de ex
pacientes de câncer (Greaves, 1998).

146
Os índices de sobrevida são ainda mais significativos quando considerado
o câncer infantil. A incidência média de cura de leucemia linfóide aguda, principal
modalidade de câncer em crianças, passou de 30%, na década de 60, para mais
de 70% na década de 90. Segundo Wood e Bunn (1996), a taxa de remissão
completa de leucemia linfóide aguda tem sido geralmente superior a 90% e a
taxa de cura em cinco anos tem sido no mínimo de 50%; considerando os
pacientes que completam entre dois e meio e três anos de terapia de
manutenção sem recidiva, a chance de cura é superior a 80%.

É necessário ressaltar, ainda, que embora a evolução tecnológica no


campo da medicina venha produzindo resultados altamente significativos,
campanhas de esclarecimento público e de estímulo ao desenvolvimento de
comportamentos de prevenção também são responsáveis, parcialmente, por
estatísticas encorajadoras de sucesso de tratamento. O compromisso social da
psicologia (e de outras ciências da saúde) inclui a formação de profissionais
capacitados para identificar perfis de personalidade e repertórios de
comportamento de risco, intervindo no sentido de que o indivíduo atendido possa
ter a oportunidade de adquirir e manter comportamentos de saúde, tais como a
evitação de situações de vulnerabilidade, a prática de exames periódicos e o
desenvolvimento de ambientes favoráveis ao convívio pessoal, familiar, social e
profissional.

147
No caso da psico-oncologia, o atendimento profissional, independente da
abordagem teórico-filosófica do psicólogo, deve ultrapassar os limites do
consultório e da prática psicoterápica, inadequada e insuficiente para o
cumprimento dos objetivos da psico-oncologia, indo buscar e trabalhar com o
paciente onde quer que ele se encontre (na sala de espera do hospital, na
enfermaria, na sala de procedimentos invasivos, em casa, ou em qualquer outro
local) e incluindo a participação ativa de diferentes profissionais. A psico-
oncologia deve ser entendida como um instrumento que viabiliza atividades
interdisciplinares no campo da saúde, desde a pesquisa científica básica até os
programas de intervenção clínica.

A intervenção em psico-oncologia é baseada em modelos educacionais e


não em modelos médicos ou clínicos que enfatizam estruturas patológicas e
atendimentos terapêuticos individuais. O profissional, no contexto da psico-
oncologia, deve priorizar a promoção de mudanças de comportamento
relacionadas à saúde do indivíduo. A experiência de tratamento deve se
constituir em uma condição de aprendizagem sociocomportamental e cognitiva
para o paciente; cabe ao psicólogo demonstrar que os repertórios de
comportamentos adquiridos no contexto do tratamento podem ser úteis em
diversas situações de risco, mesmo aquelas distantes do contexto de doenças e
tratamentos médicos, a que o indivíduo for submetido.

12.0 O PSICOLOGO HOSPITALAR JUNTO A UNIADADE DE QUEIMADOS

148
A atuação do psicólogo dentro do ambiente hospitalar tem crescido
bastante em relação às décadas passadas, em função do avanço da Psicologia
Hospitalar em oferecer apoio sistemático, acompanhamento psicológico e
manejo humanizado nos hospitais. Tal profissional favorece, dentre outros
benefícios, a continuidade da adesão do paciente aos tratamentos e às
intervenções médicas, tendo resultado direto na qualidade e no avanço da
recuperação dos pacientes tratados nas diversas especialidades médicas, como
em uma unidade de queimados.

Embora o número de profissionais psicólogos seja insuficiente para a


realidade demandada nos hospitais brasileiros, esse profissional desde seu
início histórico, no Brasil, sempre esteve ligado aos hospitais. No entanto, nas
primeiras unidades especializadas no tratamento de queimados, a figura do
psicólogo era inexistente, apesar da alta complexidade desse paciente, dos
sofrimentos causados pelas queimaduras, comorbidades, internações
prolongadas e a convivência com sequelas dilacerantes que danificam a estima
e abalam o referencial corpóreo.

O paciente queimado deve ser tratado em uma unidade especializada de


queimados por uma equipe multidisciplinar, profissionais treinados para
interação interdisciplinar no tratamento dessas lesões e suas diversas
consequências (médicos especializados, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos,
fisioterapeutas, fonoaudiólogos, etc.).

149
No Brasil, as pesquisas sobre queimaduras não estão unificadas a ponto
de oferecer a real estatística desses acidentes com lesões na pele provocadas
pelo calor intenso entre outros. No entanto, o poder público tem, gradativamente,
movidos e, conjuntamente com a sociedade civil, no sentido de melhorar a
assistência aos pacientes vítimas de queimaduras. Segundo o Relatório da
Reunião sobre Políticas Públicas para Prevenção a Queimaduras e para
Reabilitação de Queimados do Senado Federal, estima-se que, no Brasil, cerca
de 1 milhão de pessoas se acidentam, tornando-se vítimas de queimaduras, e
que, no âmbito do SUS, a atenção prestada é insuficiente em número e em
qualidade.

Relatou-se, também, que nem todos os estados brasileiros possuem


serviço especializado ao atendimento de pacientes queimados, assim como o
número de profissionais especializados na rede pública para esse tipo de
atendimento é pequeno, sobretudo quanto à assistência especializada do
psicólogo. É importante lembrar que, segundo Anzieu, "existe no paciente com
trauma térmico, uma dor psíquica, mental, devido à abertura repentina, violenta
nos limites da pele".

Toda doença, independentemente da sua cronicidade, abarca, ao mesmo


tempo, elementos orgânicos e psicológicos, encontra-se repleta de subjetividade
e, por isso, os indivíduos doentes, adultos, crianças e idosos queimados devem
se beneficiar do trabalho da Psicologia Hospitalar. O psicólogo se torna essencial
para apoiar, esclarecer, informar e acompanhar a evolução do paciente e dos
familiares em seus aspectos clínicos e emocionais atrelados ao adoecimento4,
sendo fundamental para a equipe interdisciplinar, especialmente em uma
unidade de queimados.

Existe um contingente reduzido de profissionais psicólogos atuando na


área da saúde hospitalar, não é raro constatar que há hospitais sem psicólogos,
tampouco exclusivos para essa unidade. Há, também, número reduzido de
artigos sobre a atuação dos psicólogos nas unidades de queimados,
consequência dessa inserção lenta da Psicologia nas unidades especializadas,
conjuntamente com uma cultura hospitalar conservadora, na qual a presença do
psicólogo nem sempre é devidamente exigida em equipes de tratamento
intensivo adulto.
150
12.1 A importância do psicólogo

O apoio essencial do psicólogo hospitalar ao paciente queimado no


enfretamento à dor física e existencial, ao luto e às perdas vivenciadas se dá de
forma mais assertiva pelo trabalho acolhedor, cuidadoso e sistemático do
especialista em psicologia hospitalar, o qual fortalece o paciente no
reconhecimento de si mesmo, da realidade e em sua reorganização interna e
cognitiva, nessa descida profunda em busca do que restou de si e de seu corpo
após o acidente da queimadura.

O número crescente de acidentes faz com que o aprimoramento do


conhecimento das alterações psicológicas seja cada vez mais utilizado no
tratamento do paciente queimado. Apesar de muitos pacientes recuperarem-se
dos efeitos agudos do trauma, da ansiedade e da depressão após a alta
hospitalar, uma proporção significativa desenvolve tardiamente sintomas de
estresse e depressão pós-traumáticos.

A intervenção psicológica na Unidade de Tratamento de Queimados


(UTQ) fornece novas técnicas de manejo da dor, favorece a adesão do paciente
ao tratamento, propicia a troca interdisciplinar, pois ajuda a manejar de forma
mais harmoniosa e humanizada as demandas das relações interprofissionais em
ambiente hospitalar. Sabemos que, com a presença do psicólogo hospitalar no

151
acompanhamento aos pacientes, o custo da hospitalização diminui, o número de
dias internados se reduz, a adesão ao tratamento e a aceitação a medicação são
melhores, assim também como o enfrentamento à dor.

As relações humanas dentro do ambiente hospitalar estão em


transformação; a Psicologia tem construído e demonstrado novas habilidades e
oferecido novos espaços para pacientes, familiares, médicos e para toda a
equipe de saúde se aprimorarem em prol da excelência no atendimento, por
meio de relações de respeito e orientadas ao trabalho Inter e multidisciplinar,
levando em consideração a realização de técnicas e protocolos de prevenção
psíquica e emocional para o hospital como um todo e para a particularidade de
cada setor.

12.2 As dores e comorbidades

Embora o processo de hospitalização e de restauração da saúde sejam


integrados, envolvendo várias áreas e diferentes profissionais em vários níveis,
as demandas mais específicas da UTQ em relação ao comportamento e estado
psicológico e mental do paciente referem-se à dor com características
psicossomáticas de difícil manejo apenas com sedação ou analgesia. Necessita-
se, também, para diminuição e alívio do sofrimento, a compreensão, a escuta e
a busca do significado dessa dor na vida do paciente.
Sabe-se que o tipo de lesão e queimadura, dependendo da região e do
percentual atingido, leva a dores em altos graus, podendo chegar, inclusive, à
perda de consciência13. Geralmente, a dor do paciente queimado está
relacionada às atividades rotineiras e específicas do tratamento, tais como
processo de limpeza da ferida, desbridamentos, enxertos, troca de curativos e
fisioterapia.
A dor pode ainda modificar comportamentos, humores e até traços de
personalidade, gerando agressividade, depressão, apatias, desejo de morte,
podendo, ainda, ocasionar doenças psicopatológicas. Outra demanda se refere
à dor existencial vivenciada pelo paciente, que necessitará de ajuda na
elaboração do que aconteceu no acidente, de forma gradativa de acordo com a
152
idade e contexto, à medida que o paciente permite reconhecer os fatos que o
levaram àquele estado de saúde, evitando, assim, de forma
psicoterapeuticamente acompanhada, possíveis complicações, transtornos e
distúrbios mentais e emocionais.
Defendemos que o psicólogo muito pode ajudar, acompanhar, apoiar o
paciente em sua hospitalização, em momentos e processos difíceis, como o
reconhecimento de uma disfunção, sequela ou perda. Tais fatos trazem ao
paciente queimado grande dificuldade de aceitação e elaboração da
autoimagem agora danificada, seja por seu aspecto estético dilacerante e
definitivo ou por sequelas e preconceitos sociais vivenciados e gerados pelo
próprio paciente, muitas vezes.
A hospitalização e o processo de reestruturação da imagem corporal
(corpo queimado com perda ou não de membro ou função) provocam, muitas
vezes, sentimento de inadequação no paciente, rejeição familiar ou conjugal
implícita num processo de marginalização social (perda de emprego, rejeição na
escola em criança sequelada, etc.)
Toda a equipe de saúde especializada deverá colaborar de forma
uníssona no sentido de traçar um manejo e estratégia individualizada,
humanizada e assertiva para o paciente e sua família, facilitando a adesão e o
envolvimento da pessoa em sua própria recuperação e bem-estar,
especialmente em internação na UTQ. Uma vez que a sobrevivência do paciente
queimado tenha sido assegurada, as funções físico-funcionais, estéticas e
emocionais se convertem nos maiores fatores para a subsequente qualidade de
vida.
Diferentemente de uma unidade de terapia intensiva, onde muitos
pacientes recebem potentes sedativos que os mantêm em algum grau de coma,
na UTQ, o acompanhamento psicológico deve ser mais intenso e diário, pois os
pacientes estão em estado grave, mas, em geral, conscientes2,10.
A psicóloga e discente Radomile apresenta um procedimento geral em
três níveis: 1) Triagem ou visita psicológica, a qual se caracteriza pela visita a
todos os leitos, etapa na qual se realiza uma breve avaliação de triagem; 2)
Avaliação psicológica, caracterizada por uma ampliação da visita psicológica, na
qual serão avaliados mais pormenorizadamente os pacientes que apresentaram
tal necessidade na etapa de triagem; 3) Atenção psicológica focal, ou seja, após

153
avaliação e sendo identificada a necessidade de acompanhamento/
atendimento, o paciente recebe atenção sistemática com visitas regulares. De
acordo com o resultado e percepção da triagem, cada paciente deverá receber
a atenção psicológica necessária à continuidade do tratamento, de seu bem-
estar físico e existencial.

A rotina do psicólogo hospitalar na UTQ segue um protocolo de triagem e


troca de informações de casos clínicos por meio de reuniões com a equipe
multiprofissional e, nos pacientes agudos, existe a necessidade mais frequente
e diária de acompanhamento psicológico e intervenções, realização de
psicodiagnóstico em resposta a pedidos da equipe, incluindo os
psicodiagnósticos de crianças com queixas de distúrbios emocionais e
dificuldades intelectuais anteriores, além de orientação a familiares e utilização
de técnicas de ludo terapia em atividades socio recreativas de crianças. O
suporte familiar colherá dados importantes sobre o acidente e sobre o paciente,
e ainda ajudará emocionalmente ao acompanhante, que conjuntamente com a
equipe também cuidará do paciente, e, mais tarde, favorecerá a adequada
continuidade do tratamento e das recomendações médicas em âmbito domiciliar.
É costumeiro constatar o entrelaçamento e o aumento de comorbidades
na unidade de queimados, sendo agravadas ou evitadas pelo estado de ânimo
e saúde mental do paciente que, por sua vez, são influenciados pelas
comorbidades; no entanto, muitas psicopatologias são desencadeadas pela
própria internação, pois cada paciente reage de uma maneira à queimadura e às
subsequentes e novas condições do tratamento.
Dentre comorbidades que podem surgir no paciente adulto e idoso
queimado destacam-se:

154
 Síndrome da internação - também chamada de hospital ismo; são apatias
geralmente observadas em crianças e idosos sem suporte emocional.
Apresentando sentimento de abandono e desinteresse pela
sobrevivência;
 Estados depressivos - humor rebaixado com dificuldades em lidar com a
dor/sofrimento e desejo de morte para evitá-los;
 Crises histéricas - desencadeadas pela dor e caracterizadas por seguidos
processos de descontrole emocional, crise de choro e inconformismo.
Também entendido como dificuldade em aceitar o acidente;
 Estados de Euforia - de confirmação da dor, tendência a alegria,
eloquência e ousadia, aumento da energia e aceleração da
psicomotricidade. Verbalização de progressos inexistentes em termos de
tratamento;
 Corpo Fantasmático - imagem corporal destruída, fragilidade e
vulnerabilidade na imagem corporal (identidade), podendo provocar medo
da morte e, principalmente, dificultando o reconhecimento progressivo de
melhoras clínicas;
 Comportamentos agressivos - reações infantis, fixação em fases da
evolução emocional que foram mal resolvidas, provocando
comportamentos passivos, de solicitações frequentes, ou seja, retorno ao
útero e desejo de proteção;
 Negação do acidente - formação reativa provocando dificuldade de
aceitar as consequências do acidente e o eventual tratamento de saúde,
ainda se expressa como um desejo de morte como "saída" para a dor e
ainda como resignação por meio de sentimentos que desencadeiam
fanatismo religioso como recurso para elaboração do acidente.
 Agressividade/Revolta - direcionados para a equipe de saúde,
familiares, sendo uma projeção de sentimentos mórbidos e de
culpabilização do outro pela "dor que sinto".

155
Em todos os distúrbios descritos, o acompanhamento psicológico é
fundamental como forma de diminuir o sofrimento e garantir a continuidade da
adesão ao tratamento.

Acreditamos que o psicólogo tenha as ferramentas e treino mais


adequados, além da psicoterapêutica para abrir espaço para subjetividade da
pessoa adoentada e de seus familiares. Nenhum outro profissional da área da
saúde foi terapêutica e sistematicamente treinado para isso, pois Medicina e
Psicologia Hospitalar têm filosofias distintas: a primeira tem como objetivo curar
doenças e salvar vidas, já a segunda tem como principal objetivo situar e ajudar
o sujeito em relação ao adoecimento e ao enfrentamento dos processos
psicoemocionais da hospitalização.

Sendo assim, o profissional da Psicologia Hospitalar é o responsável por


fazer a avaliação psicológica, diagnosticando tais reações ao adoecimento, já
que é ele quem obtém os instrumentos para fazer o psicodiagnóstico, por meio
de psicoavaliação, ajudando, dessa forma, paciente, família e equipe no
entendimento e no enfrentamento do processo de adoecimento e tratamento,
com o uso das técnicas próprias da Psicologia para correta intervenção,
acionando o melhor processo de elaboração simbólica do adoecimento para
cada paciente.

13.0 O PSICÓLOGO E OS CUIDADOS PALEATIVOS

156
Os avanços científicos nas últimas décadas foram significativos,
principalmente na área da saúde, caso em que o conhecimento é ampliado com
intuito de aumentar a expectativa e a qualidade de vida. Assim, os profissionais
da área da saúde se questionam sobre o que fazer com relação a pacientes fora
de terapêutica curativa, já que, por meio das medidas estabelecidas para salvar
vidas a todo custo, os procedimentos médicos muitas vezes deixam de lado as
práticas humanistas, as quais possibilitam suporte e maior assistência ao
indivíduo acometido pela doença e para sua família.

Entretanto, é de suma importância dar as devidas condições de dignidade


aos pacientes em procedimento de morte irrevogável a fim de encorajá-los a
enfrentar de forma realista os limites da existência humana. Nessa perspectiva,
surgem os cuidados paliativos (CP), denominação utilizada para conceituar um
processo no qual uma equipe multiprofissional atua prestando assistência
integral com pacientes que apresentam patologias fora de possibilidade de cura.
Tratase de uma prática que consiste em cuidar do ser doente nas esferas física,
psíquica, social e espiritual, não apenas de sua doença.

A permissão para a morte de forma humanizada, sem recorrer a


processos desnecessários de prolongamento da vida, traz de volta a dignidade
do ser humano em seu momento epílogo, dandolhe auxílio no enfrentamento da
morte. Embora, a princípio, a abordagem dos cuidados paliativos tenha sido
pouco difundida, atualmente nota-se que a ambiência hospitalar ressalva a sua
relevância, uma vez que os estudos indicam que fatores emocionais são gatilhos
no agravamento dos quadros clínicos. Toda a equipe de saúde desempenha um
papel importante para que se alcancem bons resultados, inclusive o psicólogo.
Diante dos esforços para a manutenção da vida, ainda que uma sobrevida, do
indivíduo adoecido com a morte anunciada e o sofrimento que invade a família,
surge a problemática de qual seria o lugar do profissional psicólogo encarregado
de resgatar a subjetividade de paciente e familiares. Destarte, é possível erigir
as questões da presente pesquisa: No que a psicologia pode contribuir para a
prática de cuidados paliativos? Quais ações o psicólogo pode exercer na
abordagem dos cuidados paliativos?

13.1 O paciente terminal

157
O perfil do paciente terminal pode ser considerado como aquele que
devido seu estado de saúde já tão debilitado, não se pode mais realizar nenhum
tipo de tratamento curativo. A finitude aparenta ser a linha central de sentido
nesse quadro. Esgotam-se as possíveis formas de resgatar as condições de
saúde do indivíduo e a probabilidade da morte breve parece irrevogável e
aguardada. O paciente torna-se “irremediável” e vai ao encontro da morte, sem
que seja possível reverter esta realidade (Gutierrez, 2001).

De acordo com Mendes, Lustosa e Andrade (2009, p. 154), “A


identificação do paciente terminal na prática, considerado sem esperança de
cura terapêutica, ou com morte inevitável, é complexa e não envolve unicamente
um raciocínio lógico”. Isso porque, ainda de acordo com as autoras, por mais
que se tente chegar a um diagnóstico específico por meio de padrões
investigativos, a falta de critérios definitivos sobre essa problemática faz com que
a equipe se sinta muitas vezes insegura ao diagnosticar alguém como paciente
terminal. “Um paciente é terminal em um contexto particular de possibilidades
reais e de posições pessoais, sejam de seu médico, sua família e próprias.”
(Gutierrez, 2001, p. 92).

158
Concebe-se, assim, que o paciente em estágio terminal indica o registro
da perda do poder absoluto da equipe médica em efetivar a cura, uma vez que
os anseios advindos frente a seu papel e à morte estão intimamente ligados a
“exibição” de um trauma narcísico no autoritarismo médico (Batista & Schramm,
2004). Destaca-se também que o paciente fora de possibilidade terapêutica de
cura da sua condição patológica passa por um movimento de finitude chamado
“processo de morte e morrer”, o qual foi descrito por Kübler-Ross (1996) em
cinco estágios: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Tais estágios
não seguem ordem definida, podem se misturar ou serem concomitantes e o
sentimento de esperança perpassa todos eles.

13.2 Cuidados paliativos

A palavra “paliativo” deriva do latim pallium e significa manto. Destina-se


para o intuito dos cuidados paliativos: amenizar os sintomas, a dor e o sofrimento
em indivíduos com doenças crônico-degenerativas ou em estágio terminal,
enfocando o paciente em sua totalidade de ser e melhorar sua qualidade de vida
(Pessini & Bertachini, 2005). Para o paciente que enfrenta uma doença ativa,

159
progressiva e que ameaça a continuidade da vida, compete empregar os
cuidados paliativos para propiciar ao indivíduo o máximo de conforto possível e
dignidade até o momento de sua morte, abrangendo o ser em aspectos
biopsicossociais (Burlá & Py, 2014).

Os cuidados paliativos foram definidos pela OMS em 1990 e redefinidos


em 2002 como uma terapêutica que promove qualidade de vida ao paciente e
sua família por prevenir e aliviar o sofrimento, além de contemplar identificação
precoce, avaliação e tratamento da dor e de outras questões de caráter físico,
psicossocial e espiritual (OMS, 2002; Terra, 2013). No Brasil, os CP tiveram seu
início em 1980, tornaram-se emergentes no final da década de 1990 e assistiram
crescimento ainda mais significativo a partir do ano 2000 (Carvalho & Parsons,
2012; Gomes & Othero, 2016).

Reconhecer que não há mais os recursos para a cura e que o indivíduo


se encaminha para a finitude, não significa dizer que não há mais nada a fazer.
Pelo contrário, origina-se aí um leque de possibilidades de condutas que podem
ser ofertadas ao paciente e sua família (Gutierrez, 2001). Para Arantes (2016, p.
44), “diante de uma doença grave e incurável, as pessoas entram em sofrimento
desde o diagnóstico.”. Os cuidados paliativos ofertam, não somente a retirada
de tratamentos inúteis, mas também uma realidade mais ampla e assistencial
por uma equipe multidisciplinar que cuidará além dos sintomas físicos, os
emocionais (Arantes, 2016). Elucida-se que os CP devem “proporcionar não
apenas o alívio, mas a prevenção de um sintoma ou situação de crise” (Conselho
Regional de Medicina do Estado de São Paulo [CREMESP], 2008, p. 17).

13.3 A atuação do psicólogo em cuidados paliativos

A equipe multidisciplinar – composta por médicos, enfermeiros,


psicólogos, dentre outros profissionais da área de saúde – fica responsável por
efetivar a proposta dos cuidados paliativos que expressa o ato de cuidar do
paciente em sua totalidade, abrangendo aspectos físico, mental, espiritual e
social (Hermes & Lamarca, 2013). Esses profissionais qualificados para lidar
com os medos, as angústias e os sofrimentos trazidos pelo paciente e pela

160
família trabalham com respeito diante da realidade da finitude da vida e às
necessidades do doente (Machado, Pessini & Hossne, 2007).

Integrando a equipe na atuação da área de CP, está a contribuição do


psicólogo que se define no que concerne ao adoecimento como pertencente ao
campo mental e das experiências e expressões da mesma, por meio do corpo.
O psicólogo como membro de uma equipe que divide funções deve trabalhar
para manter o equilíbrio nas relações com os outros profissionais e encontrar
meios para uma comunicação clarificada que permita a troca e o conhecimento,
a partir de diferentes saberes (CREMESP, 2008).

A presença do psicólogo na terapêutica de estado terminal possibilitará


que o profissional execute ações de “apoio, atenção, compreensão, suporte ao
tratamento, clarificação dos sentimentos, esclarecimento sobre a doença e
fortalecimento dos vínculos familiares” (Cantarelli, 2009, p. 139). Além disso, o
significado atribuído ao sofrimento pode ser alcançado por meio da palavra, da
linguagem, caso em que o psicólogo configura-se como ouvinte indispensável
(Cantarelli, 2009).

No campo da Psicologia, cuidados paliativos são uma variante na qual o


psicólogo realiza um trabalho para facilitar o entendimento do paciente sobre o
seu diagnóstico e perspectiva de vida, buscando confortar suas angústias e

161
atenuar as dores emocionais, considerando seu tempo frente à anuência da
terminalidade de sua vida (Rezende, Gomes & Machado, 2014).

Por outro lado, a família é um ponto importante, e a assistência do


psicólogo deve ser estendida aos familiares tendo em vista que estes também
estão presentes no decurso do adoecimento e são determinantes na aceitação
e enfrentamento do quadro de terminalidade. A atenção da equipe de saúde
direcionada para atenuar o sofrimento do paciente de forma humanizada dentro
da prática dos cuidados paliativos, que engloba a tarefa do psicólogo, deve
oferecer atendimento ao indivíduo com precaução dinâmica e global efetuada
com o intuito de obter uma melhor qualidade de vida para o paciente e sua
família. Além de que, muitas vezes, a família sente medo frente ao
desconhecido, culpa pela condição do doente e por estar num lugar de
impotência técnica para auxiliá-lo (Rezende et al., 2014).

A Psicologia naturalmente busca desenvolver uma visão holística do


indivíduo e seu modo de existir, o que explica sua contribuição para a área da
saúde, especialmente para os CP (Porto & Lustosa, 2010). No processo de morte
e morrer, o psicólogo é crucial para realizar essa compreensão global
supracitada, manter a autonomia do paciente e integrar os aspectos clínico,
psicológico, familiar, social e espiritual (Ferreira, Lopes & Melo, 2011; Domingues
et al., 2013).

162
14.0 ÉTICA NO CONTEXTO HOSPITALAR

O Código de Ética do Psicólogo, em seus princípios fundamentais,


estabelece que a(o) psicóloga(o) “trabalhará visando promover a saúde e a
qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a
eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão” (CFP, 2005). E, ainda, que atuará com
responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política,
econômica, social e cultural e baseará o seu trabalho no respeito e na promoção
da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano,
apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos
Humanos (CFP, 2005).

Portanto, para o cumprimento de tais princípios, é imprescindível que


as(os) psicólogas(os) que trabalham em hospitais conheçam, além do Código de
Ética, também as resoluções do CFP pertinentes à sua atuação e as políticas
públicas de saúde, tais como o SUS, sua história, diretrizes, princípios e a forma
como a rede de assistência à saúde (RAS/SUS) encontra-se organizada para
prestar assistência aos cidadãos brasileiros.

163
O psicólogo, particularmente aquele que está inserido na instituição
hospitalar, defronta-se constantemente com problemas que envolvem, solicitam
e exigem posicionamentos éticos, seja no trato com seus pacientes, em alguns
casos vivendo no limite suportável de sofrimento, seja com seus colegas e outros
profissionais com os quais divide, com maior ou menos poder e importância
social, o espaço hospitalar. (OLIVEIRA, 1995)

Embora existam relatos da presença de psicólogos no contexto hospitalar


mesmo antes da regulamentação profissional, segundo Campos (1988), parece
razoável, a partir dos inúmeros estudos acerca da realidade da profissão no
Brasil, a suposição de que somente nos últimos anos, com a mudança mais
ampla da configuração do campo profissional do psicólogo, este logrou inserir-
se de forma estável e significativa no ambiente hospitalar.

Na tentativa de dimensionar o campo de atuação, Campos (1988) afirma


que, enquanto profissional de saúde, o psicólogo teria “papel clínico, social,
organizacional e educacional”, na forma de assistência psicológica que incluiria,
enquanto clientela, além do paciente e seus familiares, a equipe multiprofissional
e demais funcionários do hospital; e enquanto atividades, assessorias,
consultorias e interconsultas psicológicas. Lamosa (1987) vai além, sugerindo
que o psicólogo que trabalha em hospitais necessitaria “desenvolver uma
imagem mais ampla como profissional de saúde, assumindo seu potencial de

164
avaliação e manejo de problemas de saúde, além daqueles usualmente tidos
como da alçada do psicólogo, ou seja, o emocional e o psicopatológico”. Se
suposta a irreversibilidade de sua inserção no contexto hospitalar, admite a
autora que os referenciais (teóricos, acadêmicos, práticos e éticos) da Psicologia
necessitam ser revistos.

O atraso da psicologia em ocupar deu espaço, talvez tenha sido o maior


responsável pela banalização do nosso campo de trabalho. Segundo Oliveira
(1995), todos os outros profissionais parecem entender de psicologia e arriscam-
se a fazer diagnósticos psicológicos, sejam eles médicos, enfermeiros, padres,
etc. Na verdade, o que se apresenta como básico e urgente é que o psicólogo
consiga afirmar o seu papel profissional, definindo suas atribuições e delimitando
a ocupação do seu espaço nas instituições hospitalares. Uma vez que, de acordo
com o mesmo autor, muitas vezes este profissional é colocado frente a situações
em que esquece o seu papel e acaba exercendo funções que não são as suas,
muitas vezes movido por motivos de pura solidariedade humana.

Atitudes como essas podem causar grandes danos à imagem da


profissão. Pois pode acabar invadindo o campo de atuação de outros
profissionais. “O psicólogo não é médico, não é enfermeiro, nem é assistente
social. Tais profissionais não são psicólogos e estarão cometendo imprudência
ética ou fazendo exercício ilegal da profissão e, portanto violando a lei, quando
assim procedem”. Faz-se necessário respeitar os limites éticos da atuação
profissional.

É possível interpretar as exigências postas para o profissional inserido no


contexto hospitalar, na literatura referida, como sendo constituída por dois níveis.
Num primeiro, situar-se-ia o exercício das atividades “usualmente tidos como da
alçada do psicólogo” (Lamosa, 1987), traduzidas por Campos (1988) como os
papéis “clínico, social, organizacional e educacional”. Num segundo nível,
ultrapassando os papéis convencionais, o desenvolvimento de “uma imagem
mais ampla como profissional de saúde, assumindo seu potencial de avaliação
e manejo de problemas de saúde”. Essas exigências pressuporiam,
adicionalmente, uma revisão dos referenciais da Psicologia, a formação
acadêmica aí incluída.

165
As atividades desenvolvidas pelos profissionais são, no essencial, de
natureza clínica: psicoterapia breve com pacientes, trabalhos de suporte com
familiares. Mas, ambas conteriam uma dimensão educacional. A isso, pode-se
agregar uma marca da atuação do psicólogo nos hospitais: “a busca (ainda) pela
definição do seu espaço e atividades no interior da instituição hospitalar parece
ser uma constante. De uma certa forma, as descrições sobre as ações do
psicólogo no âmbito hospitalar lembram aquelas iniciais sobre o psicólogo na
escola (malgrado o fato de que esta realidade ainda persista em muitos locais):
uma espécie de profissional polivalente, de prontidão para atuar quando e onde
se fizer necessário”. (Witter et al., 1992).

Existe ainda a necessidade de uma melhor instrumentalização técnica,


fundamentada em desenvolvimentos teóricos mais consistentes, para subsidiar
as ações que ampliam os limites tradicionais, utilizando, não raro, recursos que
não se coadunam com as novas exigências desse alargamento de fronteiras
profissionais dos psicólogos.

Para a própria preservação do espaço destinado à psicologia na


instituição hospitalar, cabe ao psicólogo demarcar com a clareza da sua prática,
com os recursos de sua técnica e com as suas formulações o campo pelo qual
é responsável, para ir construindo e fazendo sua história.

14.1 A Política Nacional de Humanização (PNH) / HumanizaSUS

166
A Política Nacional de Humanização (PNH) é uma política transversal ao
SUS. É o reflexo de uma luta por um SUS mais humano, construído com a
participação de todos os cidadãos e que assegure serviços de qualidade para
promover a saúde integral. A PNH tem por princípios:

A valorização da dimensão subjetiva e coletiva em todas as práticas de


atenção e gestão do SUS fortalecendo o direito à cidadania; Fortalecimento do
trabalho multiprofissional, inspirado na transversalidade e grupalidade;
Construção da autonomia e do protagonismo dos sujeitos e dos coletivos
implicados no SUS; Co-responsabilidade dos sujeitos nos processos de
atenção e de gestão; Estabelecimento de vínculos solidários e de participação
coletiva no processo de gestão; Mapeamento e interação com as demandas
sociais, coletivas e subjetivas de saúde; Defesa de um SUS que reconhece a
diversidade do povo brasileiro e a todos oferece a mesma atenção à saúde,
sem distinção de idade, etnia, origem, gênero e orientação sexual; Mudança
nos modelos de atenção e gestão em sua indissociabilidade, tendo como foco
as necessidades dos cidadãos, a produção de saúde e o próprio processo de
trabalho em saúde, valorizando os trabalhadores e as relações sociais no
trabalho; Proposta de um trabalho coletivo, para que o SUS seja mais
acolhedor, mais ágil e mais resolutivo; Compromisso com a qualificação da
ambiência, melhorando as condições de trabalho e de atendimento;
Compromisso com a articulação dos processos de formação, com os serviços e
práticas de saúde (BRASIL, 2008, p. 18).

Além das orientações acima apresentadas, a PNH pressupõe orientações


para cada tipo de atenção da RAS. No caso da atenção hospitalar, o PNH
recomenda as seguintes ações: Implantação de Grupos de Trabalho de
Humanização (GTH); garantia de visita aberta, da presença do acompanhante e

167
de sua rede social significativa; implantação do acolhimento aos usuários como
mecanismo de recepção; fomentar a escuta diferenciada e qualificada aos
usuários; estabelecimento de equipe multiprofissional de referência para
pacientes internados; implantação de Conselho de Gestão Participativa;
existência de mecanismos de desospitalização, visando alternativas às práticas
hospitalares como as de cuidados domiciliares; garantia de continuidade de
assistência, com ativação de redes de cuidados para viabilizar a atenção integral;
Ouvidoria funcionando; dentre outras orientações (BRASIL, 2008).

Ademais, são ações fundamentais recomendadas pelo PNH (BRASIL,


2008): o acolhimento, a atenção à alteridade e à ambiência.

O acolhimento é um dispositivo destinado à escuta dos usuários em todas


as suas dimensões e destina-se à construção de vínculos desses sujeitos com
as(os) profissionais que compõem as equipes de saúde, para garantir o acesso
aos serviços. Trata-se de uma “tecnologia do encontro”, que pressupõe a
construção de redes de conversações afirmadoras de relações importantes nos
processos de produção de saúde. Acolher é uma postura ética, que envolve
resolutividade e responsabilidade. Cabe às(aos) profissionais ouvir o usuário,
atendendo aos seus pedidos e assumindo no serviço uma postura capaz de dar

168
respostas mais adequadas, ainda que esta seja o encaminhamento para outros
pontos de atenção da rede. Uma postura acolhedora implica estar atento e
aberto às diversidades cultural, racial e étnica. Implica na construção de práticas
que denotam a responsabilização da equipe de trabalho pelo usuário, desde a
sua chegada até a sua saída. No processo de acolher, a(o) profissional ouve
suas queixas através da escuta qualificada, analisando a demanda e garantindo-
lhe uma atenção integral e resolutiva (BRASIL, 2006).

A alteridade refere-se à experiência das relações intersubjetivas, que


pressupõem a internalização da existência do outro. Trata- -se de colocar-se no
lugar do usuário para comunicar-se com este com fluidez, ética e
responsabilidade e compreender suas representações, necessidades e
demandas de saúde.

A ambiência trata do cuidado aos componentes estéticos que podem


melhorar a condição de saúde da população, à exemplo, o cuidado com o espaço
geográfico e afetivo, tal como a luminosidade, presença de ruídos, temperatura,
além de características sócio- -culturais, locais e regionais. Inclui a recepção dos
usuários e sua relação com profissionais e gestores da forma mais ética,
humana, respeitosa e inclusiva.

Assim, a(o) profissional atenta(o) a essas ações fundamentais, pode


agora construir um plano de atenção singular ao usuário, fomentando o vínculo
e o acompanhamento terapêutico longitudinal. É nessa perspectiva que se
incorpora o conceito de Clínica Ampliada que surge em contraposição à ideia da
clínica tradicional, cuja atenção é instituída pelo saber biomédico (CUNHA,
2009). A Clínica Ampliada preconiza que a atenção deve incluir uma visão
complexa do sujeito e de sua demanda, que escapa às racionalidades da
biomedicina. É um dispositivo que pressupõe, segundo Cunha (2005), que
as(os) profissionais conheçam e deem atenção ao mecanismo de transferência
e ressonâncias nas relações com os usuários, produtos dos sentimentos
depositados nas(os) profissionais por ocasião da interação. Deve-se levar em
conta, ainda, os sentimentos contratransferenciais que, muitas vezes, opõem-se
entre profissional e usuários e que interferem na atenção a ser dispensada.

169
O relatório da pesquisa do CREPOP4 mostrou que as(os) psicólogas(os)
brasileiras(os), ao trabalharem com o tema da Humanização, buscam
referências nas diretrizes das políticas oficiais, porém, em sua maioria, não
incorporaram de forma apropriada a Política Nacional de Humanização, tal como
é descrita pelo Ministério da Saúde. Em seus relatos, não se constata mudanças
nas concepções de cuidado, nem tampouco nos processos de trabalho como um
todo. Referem algumas atividades preconizadas pelo PNH, mas esta política não
aparece de forma transversal no trabalho desenvolvidonos setores em que
atuam. Desenvolvem ações pontuais que sinalizam uma preocupação com o
tema, mas ainda sem maior base ou consistência. Ocorreram relatos da
participação de psicólogas(os) em comissões de gestão do PNH e menções aos
Programas oficiais como o Humaniza SUS, e o Programa do Parto Humanizado,
do Ministério da Saúde, respectivamente (CFP, 2012). Corrobora estes
resultados uma revisão bibliográfica recente (CID et al., 2019), que analisou 27
artigos sobre o tema e concluiu que, embora muitas sejam as iniciativas de
práticas profissionais das(os) psicólogas(os) que levem em conta a PNH,
observou-se uma necessidade de implantar processos formativos inovadores
que habilitem as(os) profissionais envolvidas(os) nas práticas de saúde para
humanização, incluindo as diretrizes da PNH para a gestão dos processos de
trabalho.

A(O) psicóloga(o) tem um papel fundamental na construção e


implementação da PNH, pois todos os seus princípios estão também na base do
seu trabalho cotidiano. A(O) psicóloga(o) deve ser referência e estar
preparada(o) para compreender o sujeito em seus diferentes estados
emocionais e formas de interação social. Assim, deve atentar para os processos
de humanização em pauta, nos diferentes serviços em que atua, pois sua
inserção no hospital, originalmente, se deu exatamente para integrar as equipes
de saúde hospitalares, também com o objetivo de humanizar os processos de
trabalho e de assistência..

14.2 Atenção Hospitalar ou Terciária

O trabalho da(o) psicóloga(o) em hospitais do SUS se insere na chamada


Atenção Terciária ou Atenção de Alta Complexidade ou alta densidade

170
tecnológica. Inclui ações que requerem tecnologias mais duras, como a que é
necessária para a realização de transplantes, por exemplo. Frequentemente a
Psicologia Hospitalar se aplica também a serviços de atenção secundária, de
média densidade tecnológica, como os ambulatórios de acompanhamento
longitudinal, que atendem, por exemplo, gestantes de alto risco, follow-up5 de
bebês prematuros ou que estiveram em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)
neonatal, centros de atenção especializados a renais crônicos, portadores do
HIV, oncologia, ambulatórios hospitalares destinados a atender aos usuários no
processo de reabilitação pós-hospitalização, como nos casos de amputações e
demais cirurgias complexas, dentre outros.

É importante destacar que historicamente no Brasil o cuidado hospitalar


seguiu o modelo biomédico-hegemônico, como foi visto na introdução, centrado
em procedimentos tecnológicos que produziam uma atenção fragmentada e
desarticulada e que se organizava em função da demanda espontânea. Tal
modelo provocou, ao longo de décadas, o empobrecimento da dimensão
cuidadora, gerando insatisfação dos usuários, ineficiência e ineficácia dos
serviços e baixo impacto na assistência (BRASIL, 2013).

Em contraposição a este modelo, a Política Nacional de Atenção


Hospitalar se propõe a rever este modelo biomédico-centrado, trazendo para a
centralidade da atuação a preocupação com a humanização, com a atenção
qualificada e eficiente e enfatizando que a Atenção Hospitalar deve se organizar
de forma regionalizada, articulada e integrada com a RAS. A atenção deve ser
feita por equipe multiprofissional e o hospital deve concentrar sua assistência
nas atividades altamente especializadas, buscando o processo de
desospitalização e a formação de redes e associações de cuidados, garantindo
a continuidade destes em outros pontos de atenção das RAS. A Atenção
Hospitalar deverá ser baseada nos pressupostos da clínica ampliada e na gestão
da clínica (BRASIL, 2009).

Como definido anteriormente, a Clínica Ampliada é um modelo de atenção


à saúde que tem ganhado cada vez mais espaço nas instituições públicas e
privadas. Ela é baseada no conceito de saúde integral, que vê a qualidade de
vida como o resultado de fatores biopsicossociais. Outro pilar do modelo é
integrar a equipe de profissionais de diferentes áreas na busca de um cuidado e
171
tratamento de acordo com cada caso, criando, assim, vínculo e diálogo com os
usuários. Segundo Padilha et al. (2018), a gestão da clínica ampliada põe ênfase
nos sujeitos envolvidos, nas relações estabelecidas, no cuidado integral à saúde
e nos consequentes processos de aprendizagem, concebidos no trinômio
atenção à saúde-gestão-educação. Nesse sentido, gestores e profissionais de
saúde devem construir objetivos comuns, para os quais compartilham
conhecimento e esforço profissional e se implicam igualmente. Nesse contexto,
a criticidade e o comprometimento são vetores na construção de um ponto de
vista.

Ao final deste primeiro eixo, que compõe as normas técnicas da psicologia


hospitalar, é importante lembrar que há portarias do Ministério da Saúde que
incluem, obrigatoriamente, a(o) psicóloga(o) na equipe mínima, tais como a
Portaria n.º 628 de 26/04/01, que trata de serviços destinados à realização da
Cirurgia Bariátrica. A Portaria n.º 400 de 16/11/2009, que prevê a presença de
uma(um) psicóloga(o) na equipe de saúde para Atenção aos Ostomizados. A
Portaria n.º 930 de 10/05/12, que recomenda que a equipe de saúde inclua
uma(um) psicóloga(o) na organização da atenção integral e humanizada ao
recém-nascido grave ou potencialmente grave. Outras, ainda, recomendam
assistência psicológica nos serviços de média e alta complexidade, o que inclui
ambulatórios e hospitais e podem ser encontrados no sítio virtual do Ministério
da Saúde.6 Assim, é necessário que a(o) psicóloga(o) conheça a legislação
referente à área em que irá atuar, para garantir uma participação baseada nos
princípios legais, éticos e políticos de sua profissão.

Pensar na promoção e recuperação da saúde da no âmbito do SUS requer


da(o) psicóloga(o), além de competência técnica, um compromisso ético e
participação cidadã, com atenção especial às lutas pela mudança das condições
sociais da população brasileira, através de participação política, para a garantia
dos direitos da população, tendo como horizonte da atuação a defesa do SUS.

172
173
REFERENCIA:

- https://blogdapsicologia.com.br/unimar/2017/05/breve-historico-sobre-a-psicologia-
hospitalar-e-psicologia-da-saude/
- https://siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/psicologia/historico-da-
psicologia-hospitalar/15287
- https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-166X2016000400573
- https://www.infoescola.com/medicina/a-criacao-dos-hospitais/
- https://psicoterapiaepsicologia.webnode.com.br/products/historico-da-psicologia-
hospitalar/
-
http://www.sbph.org.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=157&Itemi
d=740
- Conselho Federal de Psicologia (2005). Código de Ética Profissional dos Psicólogos.
Brasília, 2005.
- Conselho Federal de Psicologia (2007). Resolução CFP N.º 013/2007 -Consolidação
das resoluções relativas ao título profissional de especialista em psicologia. Brasília:
CFP.
- Conselho Federal de Psicologia (2019). Resolução CFP Nº 06/2019 - Institui regras
para a elaboração de documentos escritos produzidos pela(o) psicóloga(o) no
exercício profissional e revoga a Resolução CFP nº 15/1996, a Resolução CFP nº
07/2003 e a Resolução CFP nº 04/2019. Brasília: CFP
- https://www.sanarsaude.com/blog/guia-psicologia-hospitalar-o-que-
faz?gclid=CjwKCAjwr7X4BRA4EiwAUXjbt0kDmHDfXf3-
ZFH6y17vhqbXAj8bhf_s5tUOov0F2gCzOLI-jttEwhoCVOkQAvD_BwE
- https://www.guiadacarreira.com.br/carreira/psicologia-
hospitalar/#:~:text=Se%20voc%C3%AA%20pretende%20se%20tornar,%2C%20no%2
0caso%20da%20Psicologia).
- http://www.fundacaojau.edu.br/revista11/artigos/7.pdf
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_As_Reacoes_Psicologicas_a_doenca_e_ao_adoecer.pdf
- http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-
08582017000200005#:~:text=O%20roteiro%20de%20exame%20e,doen%C3%A7a%2
0e%20tratamento%2C%20conhecimento%20da
- https://www.redepsi.com.br/2011/11/10/a-atua-o-do-psic-logo-no-contexto-hospitalar/
- https://www.scielo.br/pdf/estpsi/v24n1/v24n1a10.pdf
- https://www.scielo.br/pdf/pe/v16n2/a16v16n2.pdf
- https://periodicos.set.edu.br/index.php/fitsbiosaude/article/viewFile/461/195
- file:///C:/Users/ClienteRT/Downloads/Dialnet-EntrevistaPsicologica-5155016.pdf

174
- http://rbqueimaduras.org.br/details/118/pt-BR/a-atuacao-do-psicologo-junto-a-
pacientes-na-unidade-de-tratamento-de-queimados
- https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A1323.pdf
- https://ethienny.wordpress.com/resenhas/etica-no-contexto-hospitalar/
- https://crppr.org.br/wp-
content/uploads/2019/05/AF_CRP_Caderno_Hospitalar_pdf.pdf
- https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/2019/11/ServHosp_web1.pdf

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