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TESTES DE VIDA

Estudos em 1 João
LIÇÃO 14 – FILHOS DO DIABO E FILHOS DE DEUS
1 JOÃO 3.7-10

Este estudo continua o tema do anterior, que é o teste moral, desta feita focalizando
no contraste que João faz entre os filhos de Deus e os filhos do diabo. Pela primeira vez na
carta o apóstolo apresenta o conceito de que os praticantes do pecado são descendentes
espirituais do Maligno.

INTRODUÇÃO
João vinha apontando aos seus leitores algumas das características dos filhos de Deus
como um teste, para que eles pudessem desmascarar os falsos mestres, os quais se
apresentavam como cristãos mas, ao mesmo tempo, introduziam doutrinas errôneas e
ameaçavam a pureza doutrinária da Igreja. O que é nascido de Deus pratica a justiça,
ensina o apóstolo. Ele se purifica moralmente, na expectativa de encontrar-se com o
Senhor Jesus, na sua vinda. Ele não pratica o pecado, pois o Senhor manifestou-se para
tirar os pecados. É desta maneira que se pode reconhecer o verdadeiro cristão. De
alguma forma, os mestres que estavam perturbando as igrejas da Ásia não passariam no
teste moral proposto por João.

FIRMEZA CONTRA O ERRO


João continua o teste moral com uma advertência: Filhinhos, não vos deixeis enganar
por ninguém (3.7). Que os falsos mestres parassem de tentar enganá-los dizendo que a
salvação era mediante um conhecimento (gnose) secreto, e que a conduta moral e
prática das pessoas não fazia a menor diferença para Deus! Este ensinamento era
obviamente falso: aquele que pratica a justiça é justo, assim como ele é justo (3.7b).
Deus é justo (1.9; 2.9) e Jesus Cristo é justo (2.1). Quem é nascido de Deus é tornado
justo mediante a obra substitutiva de Cristo e a imputação de sua justiça.
Conseqüentemente, vive na prática da justiça. Esta é a verdade, e não o ensinamento dos
gnósticos. “Provavelmente diriam que a justiça de Deus estava profundamente arraigada
no profundo de seus corações, mas a iniqüidade de seus atos estava claramente evidente
em seus olhos, pés, mãos e língua” (Calvino).

Aqui o apóstolo está exigindo uma atitude mais firme da parte das igrejas para com
aqueles pregadores, do que simplesmente não lhes dar ouvidos. Os cristãos deviam
quebrar de uma vez por todas o fascínio que aqueles encantadores porventura
estivessem exercendo sobre eles. Em outra carta, o apóstolo determinou à igreja: “se
alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis
as boas-vindas” (2Jo 10). É isto que os crentes da Ásia deveriam fazer.

DESCENDENTES ESPIRITUAIS DO DIABO


Se quem pratica a justiça é justo e nascido de Deus, segue-se que aquele que pratica o
pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o princípio (3.8a). A
doutrina dos pregadores gnósticos, por fazer uma dicotomia profunda entre o espírito e a
matéria, acabava produzindo indiferença para com o pecado, e mesmo negação dele.
João já havia alertado a Igreja contra esta mentira (1.8 e 10). O pecado é uma realidade
e se constitui na violação da lei de Deus (3.4); e da mesma forma que a prática da
justiça identifica os que procedem de Deus (3.7), a prática do pecado identifica os que
procedem do diabo. O termo predileto de João para Satanás é o maligno, que ocorre
cinco vezes nesta carta, enfatizando seu caráter maldoso, maléfico, mau e perverso.
Aqui e no verso seguinte, o apóstolo se refere a ele como diabo, que literalmente
significa caluniador, cuja característica própria é pecar. É isto que este anjo decaído
vem fazendo, até hoje, desde que começou sua carreira como diabo, ao ensoberbecer-se
e desejar ser como Deus (ver 1Tm 3.16 e comparar com Is 14.12-15; Ez 28.2,5,13-17).
É isto que ele fez no princípio da história humana, quando pecou no Jardim, levando à
morte o primeiro casal (Gn 3.1-3; cf. Ap 12.9).

O conceito de que os praticantes do pecado procedem do diabo tem origem no ensino do


próprio Jesus: “Vós sois do diabo, que é vosso pai”, disse Jesus aos fariseus (Jo 8.44).
Jesus declara nesta passagem que desde a criação do mundo o diabo foi assassino (ele
foi o responsável primeiro pela “morte” de Adão e Eva, e de toda a raça humana). Logo,
todos aqueles que têm desejos assassinos – como os fariseus tinham contra Jesus – eram
propriamente descendentes espirituais do diabo (Mt 13.38; Ef 2.2). Quando o diabo
peca, está apenas fazendo o que é o seu costume. E as pessoas que estão acostumadas a
pecar como se fosse natural, são como o diabo, e, portanto, seus descendentes ou filhos.
É neste sentido que o senhor Jesus se referiu a Judas como sendo do diabo (Jo 6.70) e
João a Caim, da mesma forma (1Jo 3.12). É quase certo que João se refere aqui em 3.8
aos falsos mestres, a quem também ele chama de “anticristos”, veja 1 João 2.18-19 e 22
e o estudo sobre esta passagem. Eles são filhos do diabo porque falam a mentira, e o
diabo é o pai da mentira, João 8.44.

Aqui, em 1 João 3.8, o apóstolo claramente divide a humanidade em dois grupos


apenas, aqueles que são filhos de Deus e os que são filhos do diabo. Com isto ele quer
dizer que os filhos de Deus são guiados e governados pelo Espírito de Deus, enquanto
que os outros são iludidos por Satanás e vivem debaixo do seu governo (1Jo 5.19). Cada
um destes grupos se dá a conhecer por suas obras, os de Deus pela prática da justiça e os
do diabo pela prática do pecado. Não existe terreno neutro aqui, ou somos de Deus ou
do diabo. Entretanto, é preciso esclarecer que João não está dizendo que o diabo é igual
a Deus, de tal forma que possa contender com o Todo-Poderoso com a mesma
autoridade e poder. Esta é uma heresia antiga, chamada de maniqueísmo, e corretamente
rejeitada pela Igreja. O diabo é uma criatura, um anjo decaído, sujeito à autoridade e ao
governo de Deus, que o restringe de tal forma, que ele só pode fazer alguma coisa sob
permissão divina.

ESPERANÇA PARA OS CATIVOS DO DIABO


Quem continua pecando pertence ao diabo, denuncia o apóstolo João. Entretanto, há
esperança para os cativos de Satanás: Para isto se manifestou o Filho de Deus: para
destruir as obras do diabo (3.8b). O que o diabo tem feito é espalhar o pecado e a
morte entre a humanidade. Estas são as suas obras. Jesus Cristo, o Filho de Deus,
manifestou-se ao mundo com o específico propósito de destruir (no original, desfazer)
estas obras, ou seja, soltar as amarras do pecado, dissolver seu poder e influência na
vida dos pecadores (cf. 3.5).

OS FILHOS DE DEUS
Aqueles que são alcançados por Cristo e por sua obra de destruição do pecado, se
tornam filhos de Deus, e como resultado, não vivem mais pecando, como antes: Todo
aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado (3.9a). O texto grego diz
literalmente “não comete pecado”. Por este motivo e por outros, vários grupos
defenderam através da história da Igreja que o apóstolo João está ensinando nesta
passagem que a obra de Cristo é tão completa aqui neste mundo que os nascidos de
Deus não pecam mais. Na antiguidade houve os pelagianos e alguns grupos anabatistas
ensinando a impecabilidade dos nascidos de Deus. Após a Reforma, veio João Wesley e
as denominações que seguiram seu ensino, como por exemplo a Igreja do Nazareno e
muitos ramos pentecostais. Entretanto, a doutrina da perfeição cristã aqui neste mundo
não tem base nos ensinos de João e nem na Bíblia: (1) Se João está ensinando que os
regenerados não pecam mais, está entrando em contradição com o que havia dito antes,
cf, 1.8,10 e 2.1. (2) O verbo grego na frase “não comete pecado” pode ser corretamente
traduzido no sentido linear, de uma ação contínua, “não vive cometendo pecado”. Este é
o sentido que se harmoniza com o ensinamento de João na carta e no restante das
Escrituras. A obra de Cristo nos nascidos de Deus só será completa na glorificação.
Permanecem ainda nos regenerados, nos nascidos de Deus, resíduos da velha natureza
pecaminosa, de forma que não estão ainda inteiramente livres do pecado. Por outro lado,
o nascido de Deus não tem como hábito pecar, pois o que permanece nele é a divina
semente (3.9b). “Divina semente” tem sido entendido por alguns como uma referência
de João ao Espírito Santo, que é dado aos nascidos de Deus, neles permanece, e controla
suas paixões, mortifica o pecado e os habilita a viver uma vida santa (1Jo 3.24; 4.13). O
mais provável, porém, é que João se refira ao princípio da vida divina que foi
implantada nos nascidos de Deus por ocasião da regeneração (cf 1Pe 1.23; 2Pe 1.4).
João usa aqui o quadro da reprodução humana. O sêmen carrega a vida e transfere as
características paternas. Portanto, os que são filhos de Deus herdam a natureza divina (2
Pedro 1:4), e como decorrência, o nascido de Deus não pode viver pecando, porque é
nascido de Deus (3.9b). Muito embora permaneçam nele restos da natureza
pecaminosa, prevalece a nova natureza, a vida divina, a semente de Deus, que não
permite que o nascido de Deus continue pecando, e que o impulsiona diariamente a
buscar a Deus e a fazer o que agrada ao Pai.

É aqui que reside o tremendo teste ao qual João submete seus leitores e os mestres
gnósticos: Nisto são manifestos os filhos de Deus e os filhos do diabo: todo aquele
que não pratica justiça não procede de Deus, nem aquele que não ama a seu irmão
(3.10). Os verdadeiros cristãos são reconhecidos pelo fato de que não vivem pecando,
enquanto que os falsos crentes e falsos mestres, que João chama de filhos do diabo,
estes não praticam a justiça (isto é, vivem habitualmente no pecado) e não amam seu
irmão. Estes não procedem de Deus, mas do diabo.

João termina o teste moral mencionando o amor aos irmãos. Sem dúvida, o amor é o
resumo dos mandamentos (veja Rm 13.9); e logo em seguida, João apresenta, mais uma
vez o teste do amor, que é o tema da próxima lição.

CONCLUSÃO
1. Os cristãos devem estar alerta contra a possibilidade do erro religioso em si
próprios e nos outros. Afinal, a heresia é obra da natureza pecaminosa (cf.
feitiçaria e idolatria em Gl 5. 19-20). Para evitar serem enganados, devem ser
cautelosos quanto ao que ouvem. Eles são como ovelhas “no meio de lobos” (Mt
10.16).
2. Durante os cultos em uma igreja local, todos parecem ser cristãos, assentados,
ouvindo a Palavra, cantando e participando do culto. É pela conduta após o culto
que se revela quais os verdadeiros cristãos.
3. Infelizmente muitos crentes interpretam erradamente o mandamento “não
julgueis” como sendo uma proibição absoluta de fazermos uma avaliação acerca
das outras pessoas. O ensino bíblico, porém, é que não devemos julgar os outros
com severidade ou hipocritamente – não é proibido examinarmos todas as coisas
para retermos o que é bom.

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