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de guerra das doutrinas societárias, ao se debaterem COLEÇÃO

por atos fundados na moral, ética, razão, virtude, “HISTÓRIA, PENSAMENTO E EDUCAÇÃO”
justiça, e, sobretudo, ao reivindicarem para si a
Compartindo do investimento de formar súditos da monarquia ou cidadãos
A instrução pública nas vozes

Carlos Monarcha
autoconsciência do tempo vivido, precipitam-se nas
cenas como portadores de futuros possíveis. da República, irrequietos e desacomodados, ora em chave realista ora fanta- Direção de
siosa, publicistas provindos de horizontes diversos, guardadas as ipseidades, dos portadores de futuros DÉCIO GATTI JÚNIOR
Nas vozes encartadas e nas atitudes de sujeitos encar- GERALDO INÁCIO FILHO
nados como porta-vozes dos interesses gerais,
convergem na urgência de uma instrução primária de Estado, gratuita e
obrigatória (e no evoluir do tempo, laica), como marco da estratégia geral de
(Brasil – séculos XIX e XX)
escritores, políticos, jornalistas, professores, bacharéis,
funcionários, médicos, militares, politécnicos, juristas, governo pacificado e liberação de forças produtivas. Desnecessário dizer que SÉRIE
administradores, em suma, frações da inteligência nesses sobrevoos de imaginação a instrução popular aparece como prope- “NOVAS INVESTIGAÇÕES”
brasileira, irmanam-se numa comunidade de propó-
dêutica ao homem social pela efetividade da cultura. No aglomerado de Carlos Monarcha
sitos: instruir a massa bruta de analfabetos, cuja
linguagem, dizia-se, recordava à infância das primei- vozes, paz pública, razão de Estado e economia política se entrecruzam. Direção

A instrução pública nas vozes dos portadores de futuros


ras sociedades e costumes de uma humanidade Endosso prático e anteparo firme viriam da instrução organizada como ARMINDO QUILLICI NETO
vivente no subsolo da história. instituição nacional, valioso tonificante, poderoso moto-contínuo, adorável DÉCIO GATTI JÚNIOR

anjo da paz. Eis, leitor, o todo e o porquê de A instrução pública nas vozes dos
Nas visões desdobradas, a luz geral a ser propagada
pelo mestre de escola do Império e pelo professor portadores de futuros (Brasil – séculos XIX e XX). VOLUME 8
primário da República eliminaria a parte malsã dos A instrução pública nas vozes
regimes constitucionais e representativos consubs- Carlos Monarcha dos portadores de futuros

(Brasil – séculos XIX e XX)


tanciados em pacto de união e/ou corpo político (Brasil – séculos XIX e XX)
estável. Entrementes, malformada e exígua, a instru-
ção pública é a metonímia de um país perplexo de si, AUTOR
o analfabetismo nacional, o torniquete. CARLOS MONARCHA

Certamente, provém do século XIX brasileiro –


Carlos Monarcha é doutor em Educação: História e momento em que se consuma a doutrina liberal como
Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade fundamento jurídico-político do regime dinástico,
Católica de São Paulo. Professor titular no Departa- constitucional e representativo – a determinação mais
mento de Ciências da Educação da Faculdade de clara de engendrar coletividades harmoniosas pela via
Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista, da instrução pública.
campus de Araraquara. Autor, entre outros, de A
reinvenção da cidade e da multidão - dimensões da Assemelhada a uma estrutura profunda, melhor,
modernidade brasileira: a Escola Nova (Cortez/ marco de esperança cravado em presentes passados,
Autores Associados, 1990), Escola Normal da Praça: o incólume, a confiança no halo da instrução, antiga
lado noturno das luzes (Editora da Unicamp, 1999), figura fractal, atravessará in extenso as temporalidades
Lourenço Filho e a organização da psicologia aplicada à do Império e da República. Formulo então uma
educação. São Paulo 1921-1934 (Inep, 2001) – obra questão que leve para além da percepção do nível
premiada pela Academia Brasileira de Educação, e manifesto da realidade e fragilidade das aparências.
Brasil arcaico, Escola Nova: ciência, técnica e utopia nos
anos 1920-1930 (Editora Unesp, 2009) – prêmio Coleção Série Na tempestividade das épocas, comungantes, em
Jabuti 2010. História, Pensamento Novas Investigações coextensão especulativa - homens públicos da monar-
e Educação Volume 8 quia e da república, conquanto discordantes na praça
A instrução pública nas vozes
dos portadores de futuros
(Brasil – séculos XIX e XX)
Universidade
Federal de
NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISAS
Uberlândia EM HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA
DA EDUCAÇÃO
REITOR
Elmiro Santos Resende COLEÇÃO
“História, Pensamento e Educação”
VICE-REITOR
DIREÇÃO
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Décio Gatti Júnior e Geraldo Inácio Filho

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CONSELHO EDITORIAL Antón Costa Rico – Univ. Santiago de Compostela
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Paolo Bianchini – Università degli Studi di Torino
EDITORAÇÃO E CAPA
Eduardo Warpechowski
SÉRIE
REVISÃO DAS REFERÊNCIAS “Novas Investigações”
BIBLIOGRÁFICAS
Maira Nani França DIREÇÃO
Armindo Quillici Neto e Décio Gatti Júnior

VOLUME 8
A instrução pública nas vozes dos portadores de
futuros (Brasil – séculos XIX e XX)

Editora da Universidade Federal de Uberlândia AUTOR


Carlos Monarcha
Av. João Naves de Ávila, 2121
Campus Santa Mônica IMAGEM CAPA
Bloco 1S – Térreo Escola-Modelo Masculina anexa à Escola Normal
Cep 38400-902 da Praça (Arquivo Público do Estado de São Paulo)
Uberlândia – Minas Gerais – Brasil
Tel: (34) 3239-4293 IMPRESSÃO E ACABAMENTO
www.edufu.ufu.br DIGRA – Divisão Gráfica da UFU
Carlos Monarcha

A instrução pública nas vozes


dos portadores de futuros
(Brasil – séculos XIX e XX)

Coleção Série
História, Pensamento Novas Investigações
e Educação Volume 8
Editora da Universidade Federal de Uberlândia

Copyright 2016 © Edufu – Editora da Universidade Federal de Uberlândia/MG


Todos os direitos reservados.
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

M734i Monarcha, Carlos, 1949-


A instrução pública nas vozes dos portadores de futuros (Brasil -
séculos XIX e XX) [recurso eletrônico] / Carlos Monarcha. - Uberlândia :
EDUFU, 2019.
424 p. : il. - (Coleção História, Pensamento, Educação. Série Novas
Investigações, v. 8).

ISBN: 978-85-7078-500-8 (e-book)


Inclui bibliografia.
Modo de acesso: Internet.
Disponível em: http://www.edufu.ufu.br/
Publicado no formato impresso em 2016.

1. Educação - História - Brasil. 2. Intelectuais. 3. Discursos,


alocuções, etc. I. Núcleo de Estudos e Pesquisas em História e
Historiografia da Educação (NEPHE). II. Título.

CDU: 37(81)
Sumário

Introdução......................................................................................................9

Parte I
Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império

A instrução pública às vésperas de si...................................................19


A estabilidade institucional.................................................................33
Dos modos de instruir........................................................................45

Parte II
Do apogeu ao fim do Segundo Reinado

No “plano inclinado” da monarquia....................................................61


Duas figuras de reformadores.............................................................73
Ao sol da ciência.................................................................................83
De mestre-escola a professor primário................................................99
Da química moral.............................................................................109
Vozes testamentárias.........................................................................123

Parte III
Do Governo Provisório republicano à virada do século

Sob a bandeira fraternal....................................................................129


Republicanismo educativo................................................................141
Regeneração didática........................................................................149

Parte IV
Da política dos governadores à década dos centenários

Sobre a natureza do bom e do mau governo.....................................169


Os números revelados.......................................................................181
E continuam a revelar.......................................................................191
Verbo social, pátria viva....................................................................211
Hermeneutas da República iletrada..................................................227
Parte V
Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo

Sentido do Brasil, república agrícola.................................................245


Da escola de instrução primária e seu magistério.............................263
Marcha territorial.............................................................................279

Fontes e bibliografia...................................................................................299

Instituições consultadas..............................................................................331

Apêndice A – Outras tabelas......................................................................333

Apêndice B – Imagens antigas, quase esquecidas.......................................349

Crédito das imagens...................................................................................413

Índice onomástico......................................................................................415
O Brasil é um presente do século XVI,
oferecido ao futuro pelo acaso.

(Santa’Anna Nery, Le pays des Amazones:


l’El-Dorado, les terres à caoutchouc, 1899)
9

Introdução

Questão

Certamente, provém do século XIX brasileiro – momento


em que se consuma a doutrina liberal como fundamento jurídico-
político do regime dinástico, constitucional e representativo – a
determinação mais clara de engendrar coletividades harmoniosas
pela via da instrução pública. Assemelhada a uma estrutura profunda,
melhor, marco de esperança cravado em presentes passados, incólume,
a confiança no halo da instrução, antiga figura fractal, atravessará in
extenso as temporalidades do Império e da República.
Na tempestividade das épocas, comungantes, e em coextensão
especulativa, homens públicos da monarquia e da república, conquanto
discordantes na praça de guerra das doutrinas societárias, ao se
debaterem por atos fundados na moral, ética, razão, virtude, justiça, e,
sobretudo, ao reivindicarem para si a autoconsciência do tempo vivido,
precipitam-se nas cenas como portadores de futuros possíveis.
Nas vozes e nas atitudes de sujeitos encarnados porta-vozes dos
interesses gerais, escritores, políticos, jornalistas, professores, bacharéis,
funcionários, médicos, militares, politécnicos, juristas, administradores,
em suma frações da inteligência brasileira, irmanam-se numa
comunidade de propósitos: instruir a massa bruta de analfabetos, cuja
linguagem, dizia-se, recordava à infância das primeiras sociedades e os
costumes de uma humanidade vivente no subsolo da história.
10 • Carlos Monarcha

Nas visões desdobradas, a luz geral a ser propagada pelo


mestre de escola do Império e pelo professor primário da República
eliminaria a parte malsã dos regimes constitucionais e representativos
consubstanciados em pacto de união e/ou corpo político estável.
Entrementes, malformada e exígua, a instrução pública é a metonímia
de um país perplexo de si, o analfabetismo nacional, o torniquete.
Compartindo o investimento de formar súditos da monarquia
ou cidadãos da república, irrequietos e desacomodados, ora em
chave realista ora fantasiosa, publicistas provindos de horizontes
diversos, guardadas as ipseidades, convergem na urgência de uma
instrução primária de Estado, gratuita e obrigatória (e no evoluir do
tempo, laica), como marco da estratégia geral de governo pacificado
e de liberação de forças produtivas. Desnecessário afirmar que
nesses voos a instrução popular aparece como propedêutica ao
homem social pela efetividade da cultura. No aglomerado de vozes,
paz pública, razão de Estado e economia política se entrecruzam.
Endosso prático e anteparo firme viriam da mediação da instrução
organizada como instituição nacional, valioso tonificante, poderoso
moto-contínuo, adorável anjo da paz. Eis, leitor, o todo e o porquê
de A instrução pública nas vozes dos portadores de futuros (Brasil –
séculos XIX e XX).

Procedimentos

Para Veyne (1971), a história pode ser narrada por uma pluralidade
de enredos, o que por certo não significa afirmar que a sua escrita não
aspire à veracidade e à objetividade. Considerando a efetividade dessa
formulação, a história da instrução pública no Brasil, nos séculos XIX
e XX, pode ser igualmente narrada de diversos modos e maneiras, de
sorte que o enredo por mim definido implica a abordagem de um dos
temas centrais da cultura política, a saber, a variação das formas e fins
públicos da instrução popular nas vozes de sujeitos que tomaram para
si o partido da instrução primária de Estado.
Introdução • 11

Abordagem abarcante, sem abdicar das minúcias e pormenores


vivos, extensamente documentado e perspectivado sob a ótica
da história social das ideias (e práxis nelas nucleadas), o livro ora
apresentado ao leitor preocupa-se em compreender e explicar os modos
pelos quais diferentes sujeitos (e suas ideias-força), em diferentes
tempos e em diferentes lugares, agiram e reagiram às circunstâncias,
visando transformar um mundo percebido como paradoxal e
contraditório1. Donde meu empenho em apreender, nas dimensões
diacrônica e sincrônica, as fluentes pressões políticas, sociais, culturais,
econômicas e demográficas nos domínios da instrução pública; para
tanto, periodizei as épocas situadas entre a ordenação jurídico-política
do Brasil como Estado-nação, o pós-independência e o ápice da Era
Getuliana, o Estado Novo.

A periodização identifica continuidades e rupturas; abre caminho


para a interpretação. Ela torna a história não propriamente inteligível,
mas, pelo menos suscetível de ser pensada. [...] Na construção da
história, vê-se a importância decisiva do trabalho sobre o tempo. Além
de uma colocação em ordem, de uma classificação cronológica e de uma
estrutura em períodos, trata-se de uma hierarquização dos fenômenos
em função do rito da mudança de cada um por uma sucessão de períodos,
nem mesmo um plano: as linhas entrecruzadas por ele compõem um
relevo. Ele tem espessura e profundidade (Prost, 2008, p.108-114).

Na busca do essencial dedutível, movimento-me do mais


amplo e mais geral para o mais particular e mais específico. O curso
das investigações, de uma parte, volta-se para o como e o porquê

1
Por conseguinte, não se trata aqui de traçar uma historiografia das ideias nos
moldes dos estudos das ideologias e/ou difusão de ideias, ou a relação imaginária
dos indivíduos com as condições reais de existência. Na ampla literatura
acadêmica respeitante, as controvérsias sobre o estatuto historiográfico dos
modelos e métodos concernente à história das ideias, história intelectual,
história das mentalidades, ver Duby (1976), Falcon (1997) e Vovelle (1991).
Sobre a renovação e revalorização da história política, ver Rémond (2003).
12 • Carlos Monarcha

das continuidades e descontinuidades nas formas e fins públicos


da instrução popular; de outra, os procedimentos heurísticos
remetem à formulação ativa de temas contíguos e conexos entre si,
articuladamente a efeitos de sentido. Ademais, insertas no corpo dos
quadros narrativos, o recurso às citações de sujeitos de época não
visa à produção de efeitos de realidade ou certificação de argumentos
teóricos, ao contrário, são evocações de experiências vividas num
mundo transitório e instável.

Plano do livro

O livro progride com recurso a quadros narrativos perspectivados,


podendo ser lidos autonomamente. Na primeira parte, “Da Assembleia
Nacional Constituinte à consolidação do Império”, abordo a ordenação
jurídico-política da nação, e nela a organização da instrução pública;
passo seguinte, detenho-me na compreensão da “onda liberal” e
do regresso conservador com seu inequívoco apelo à centralização
político-administrativa. No emaranhado de acontecimentos, procuro
determinar o lugar da instrução pública e as práticas correlacionadas.
Nesse recorrido, noto que o fôlego especulativo estima a vida unitária
pelo ângulo da luz geral propagada pela instrução, alados, os voos de
imaginação são altos e irretorquíveis.
Na segunda parte, “Do apogeu do Segundo Reinado à queda da
monarquia”, detenho-me no “plano inclinado” do Império, as décadas
de 1870 e 1880, nelas se avolumam planos de reforma da vida nacional
e muito especialmente da instrução e métodos de processuação do
ensino herdados da tradição. Nesse Segundo Reinado, em que insertas
na grande política encontram-se as preocupações com os modos de
instruir razão e volição do povo pé-descalço, com efeito, essa parece ser
a nova tábua da lei. Paralelamente, o vozerio republicano, ao respaldar
novas teorias societárias, avoluma o tom, adquire corpo e força. No
quadro conflituoso entre liberdade e autoridade, a República aparece
como bela totalidade; no mais, a construção nacional pela via de
Introdução • 13

uma primeira instrução de Estado, cujo efeito de atração redobrara,


manifesta-se severo corretivo da malformação do país e suas gentes.
Na terceira parte, “Do Governo Provisório republicano à virada
do século”, reporto-me ao advento da República; como modo de ser, o
novo regime aparece como objetivação da razão na história, irrupção
angelical, sobremodo imanência da moral virtuosa. Nesse governo dos
homens pelos homens, cujos fundamentos são tidos como racionais
porquanto não sobrenaturais, sobreleva-se a integração na bela
totalidade ética. Regime de governo baseado na representação popular,
a República é figurada como objetivação do gênio da Liberdade, em
tese, consumava a vontade geral constituída de sujeitos portadores de
direitos sociais e políticos. No preâmbulo heroico do novo regime,
em uníssono, ouvem-se os apelos das esperanças da razão, o elogio do
Estado de direito e do federalismo estadualista. Assiste-se à explosão
do partido da liberdade, igualdade civil, fraternidade, felicidade, no
léxico acalorado por uma espécie de fé secular, pátria, povo e instrução
são os temas bem-queridos. Nessa nova idade da história nacional,
prossegue a regeneração didática, deflagrada nas décadas precedentes
e, por ser promessa de venturoso porvir, cultua-se a infância, donde os
investimentos de energia a fim de desbarbarizar o banco escolar.
Em “Da política dos governadores à fenomenologia das festas
centenárias”, quarta parte, refiro-me ao acumulado de indagações a frio
dos erros e regressões da República e seus governantes. Chegara o tempo
de irreversível desconfiança. Sem meias-tintas, no espelho das reflexões,
é a vez e a hora de a vaga ensaística colocar em exame o desgoverno dos
governantes, a bulimia da República e a inexistência de povo político.
Na tela expectante animada por infindáveis coros de vozes
acusadores das disfunções, os irredutíveis publicistas fazem das praças
públicas tribunas, obstinados confrontam quer um passado de males
quer um presente de incoerências os quais parecem não diferir entre
si. De par, o verbo fácil de certos cruzados da instrução popular agita
realidades supraindividuais, com efeito, exubera-se a boa natureza, a
proficuidade do território, o espírito do povo, o afeto entre irmãos,
14 • Carlos Monarcha

mais do que antes, e isso é indubitável – sobredita-se a pedagogia do


cidadão e da cidadania. Chamejantes, as visões substancialistas de
pátria e povo são perfilhadas. Instruir a prole da nação, estender a ação
social da escola faz por vibrar as cordas ideológicas. Novamente é o
momento da fuga para o futuro do presente. Passo seguinte, detenho-
me na aclimatação da ciência estatística. Algo é indiscutível, parece-
me, ao circunstanciar a descrição da população, economia e cultura: a
sede de números engendra fartas visões do Brasil e dos brasileiros.
No clima de opiniões, indormida desde o Império e primórdios
da República, retorna a questão excruciante da obrigatoriedade escolar
e, como outrora, a ela, se atribui o a cristalização da escola societária.
Cumulativamente, ocorrem as celebrações dos fatos e feitos referidos
à formação da nacionalidade. À primeira vista, na década de 1920,
parece haver um excesso de lugares de memória; com efeito, é a década
das celebrações dos centenários, dentre muitos, da Independência e da
lei de criação das escolas de primeiras letras.
Vem em seguida, a quinta parte, “Do imediato pós-30 à mitologia
do Estado Novo”. Passo por passo, objetivando consorciar homem
e terra, pertinazes, os portadores de futuros possíveis reclamam a
proteção de Ceres, deusa da colheita e da abundância, na praça pública
das doutrinas societárias, aos borbotões, os sujeitos e suas vozes dão
livre curso às volições pessoais. E sempre em pé-de-guerra, convictos,
testemunham a favor do agrocentrismo – sentido e substância do país,
sob a premência de estancar a depopulação em áreas rurais, efloresce
com simplificação a teoria fisiocrata e sua economia política. De sorte
que as consignas oitocentistas de Felix Méline – “retour à la terre” e “salut
par la terre” – ao agitarem mentes e corações fixam o destino do país
como república agrícola, condizer a escola com os ambientes naturais e
neles fixar professorado e alunado são as divisas benquistas, assim parece.
Fixo o término da narrativa com a análise da empresa de ocupação
do Brasil distante de si. No escuro meio-dia da Era Getuliana, o
Estado Novo, redobra a determinação de colonizar as funduras
baldias da territorialidade interior. Para legitimar a marcha territorial
Introdução • 15

do poder de Estado, a “marcha para o azul”, evoca-se a audácia das


bandeiras e bandeirantismo coloniais – o intento, trazer as regiões
ignotas e imóveis para a racionalidade da civilização do valor de troca.
De súbito, e isso é certeza, o recitativo das origens míticas e porvires
futurosos resplandecem; o sertão remoto, bruto, enfurnado, um Brasil
proscrito, distante de si, é ressituado como anteparo firme da nação e
da nacionalidade em vias de fusão. Pensadores nacionais, tratadistas,
literatos, autoridades públicas – em suma, a inteligência brasileira
na sua diversidade – patenteiam mesmíssimas certezas: superar o
ermamento das populações inconscientes de si e dos outros, expandir
as fronteiras agrícolas, dilatar fronteiras políticas e culturais. Diga-se,
assim, que o “batismo cultural” de Goiânia, Cidade radiosa, formaliza
o portal de redescoberta e reconquista do assoalho nu – o interior, o
campo, o sertão. Escolarizar os vazios é um dos anseios gerais, talvez o
mais esperançoso, talvez o mais congraçador.

***

No desenrolar da pátria monárquica e da pátria republicana,


entre paixões desconcertantes, litígios de interesses, intrigas capciosas,
devoções ardentes, projeções utópicas, incessantemente a cultura
política das épocas ritualizará na ordem das certezas, a instrução
como sumo civilizatório, valor comunitário, fonte de melhoramento
material, fator de concórdia. E não obstante empenhado em pensar
e conhecer as continuidades e descontinuidades das formas e fins
públicos da instrução, não há nas páginas a seguir o propósito de
oferecer panoramas históricos completos – atitude que, por certo,
implica escolhas (e escolhas são sempre discutíveis) –, ademais, na sua
pluralidade, os quadros narrativos não conduzem a sínteses gerais –
o que não pretendo. Incontestavelmente, leitor, a última palavra está
longe de ser ditada. Por último, diga-se tão só que a roda deste livro
expressa o desejo de recordar os impasses e as contradições, insolúveis
em aparência, concernentes a uma herança inalienável e universalmente
reconhecida, à educação popular.
Parte I

Da Assembleia Nacional Constituinte à


consolidação do Império
19

A instrução pública às vésperas de si

Da herança colonial

No conhecidíssimo artigo “A instrução pública nos tempos


coloniais”, Manuel Duarte Moreira de Azevedo, ao sopesar o descaso
da metrópole portuguesa quanto à “vida espiritual” da colônia, julgava
o estado de coisas concernente à instrução.

Se com a vinda do rei para o Brasil criaram-se algumas escolas


em uma ou outra cidade ou vila das mais importantes da colônia, não
se tratou de regularizar o ensino, da boa escolha dos professores e de
quem lhes fiscalizasse o procedimento. Ensinava cada um do modo
que lhe parecia mais cômodo. E não havia método nem sistema, ou
plano, organizado pelo Governo.
Os mestres eram nomeados sem concurso, e sem que fosse avaliada
a moralidade de suas ideias e costumes. Raros eram os livros que
circulavam, e não havia o menor gosto pela leitura. As escolas eram
muito poucas e mal dirigidas, havia diminuta frequência de alunos e
geralmente as mulheres não aprendiam a ler (Moreira de Azevedo,
1892, p.20).

Do Brasil-Reino de D. João VI, a ex-colônia herdara poucas


aulas primárias de iniciativa eclesiástica e alguns seminários
episcopais, mais as escolas menores e aulas régias dos tempos do
20 • Carlos Monarcha

marquês de Pombal e sob o comando dos “mestres-régios, “useiros


e vezeiros na férula e na chibata, discricionariamente empregadas
consoante o bom ou mau humor do momento”, como outrora
depôs Nestor Lima (1927, p.27). Seja qual for a versão dos fatos,
algo é indiscutível, por rotina, ao deter-se quase exclusivamente no
conhecimento da Doutrina cristã, o exame dos candidatos às cadeiras
de primeiras letras estava aquém das expectativas.
Naquele Brasil inicial, a territorialidade é heteróclita e provisória.
Com efeito, acompanhemos vivíssimos números: a população geral
beirava a 3.167.900 habitantes, dos quais 843 mil brancos, 426 mil
mestiços libertos, 202 mil mestiços escravos, 159.500 pretos forros,
1.727.080 pretos cativos e 254.400 índios aldeados. Tão só nas capitais
do Pará, Maranhão, Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais,
Mato Grosso, havia “professores de primeiras letras e, quando muito,
de latim, retórica, filosofia, acrescendo as de grego, comércio, desenho,
línguas vivas no Rio de Janeiro, bem como as de matemáticas e grego
na Bahia”, avaliaria Carlos Leôncio de Carvalho, por volta de 1884.

Da ordem jurídica

Na abertura da Assembleia Nacional Constituinte e Legislativa,


D. Pedro I, na Fala do Trono, semeava apreensão. “Espero que a
Constituição, que façais mereça a minha imperial aceitação, seja
tão sábia e tão justa quanto apropriada à localidade e civilização do
povo brasileiro.” Cerca de 10 províncias fiéis à independência enviam
deputações à assembleia sediada no Rio de Janeiro. Pará e Maranhão,
províncias próximas a Portugal, Piauí e Cisplatina mantêm-se fiéis à
metrópole; verdade seja dita, pela primeira vez reuniam-se homens
eleitos nas mais distantes regiões do país.2

2
Ao todo estavam reunidos 90 constituintes eleitos por catorze províncias, entre
eles, 23 bacharéis em direito, sete doutores em direito canônico, três médicos,
dezenove padres, entre os quais um bispo, três marechais de campo e dois
brigadeiros, além de proprietários rurais e funcionários públicos. “Eleitos de
forma indireta e através do voto censitário, não representavam certamente a massa
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 21

O início do Brasil como país independente presencia discussões


meritórias a respeito da “promoção da educação física, moral e
intelectual da mocidade brasileira”, a ponto de o padre Belchior
Pinheiro de Oliveira, deputado por Minas Gerais, propor o título de
Benemérito da Pátria e condecorar com a Ordem do Cruzeiro do Sul
a quem apresentasse, até o final de 1823, o “melhor trabalho sobre a
educação da mocidade”.
A expensas do Governo Imperial, a Comissão de Instrução
Pública decide editar Necessidade de uma instrução geral e mais conforme
com os deveres do homem na sociedade, insuficiência da atual sobre a reforma
dos estudos menores da capitânia de São Paulo, memória elaborada à
época do Brasil-Reino, pelo agora deputado e membro da Comissão de
Instrução, Martim Francisco Ribeiro de Andrada Machado. Calçado
num ponto de vista político-contratual de teor liberal-iluminista, no
manuscrito, o paulista disserta acerca dos primeiros graus da instrução
comum, métodos pedagógicos, compêndios e mestres. Na abertura do
documento, solene declaratória.

§1 – A instrução pública é um dever do soberano para com os


seus vassalos, é uma obrigação contraída no nascimento das sociedades
políticas, entre o governante, e os governados, e que manifestamente
redunda em proveito de ambos: a instrução pública, igual, e geralmente
espalhada por todos os membros de qualquer Estado, nivela pouco
mais ou menos suas faculdades intelectuais; aumenta sem prejuízo a
superioridade daqueles, que a natureza dotou de uma organização mais
feliz; aniquila esta dependência real, triste monopólio, que as luzes de
uma classe exercitarão sobre a cega ignorância da totalidade; destrói a
desigualdade que nasce da diferença de sentimentos morais; facilita a
cada um o gozo dos bens, que a sociedade confere; corta pela raiz os

de excluídos por aquele sistema. Representavam, na verdade, em grande parte, os


interesses da aristocracia rural. Em um país cuja unidade territorial ainda seria
objeto de disputa por muitos anos, contudo representavam suas diversas partes
pela primeira vez reunidas” (Lustosa, 2006, p.160).
22 • Carlos Monarcha

males e brandões da discórdia, com que a ignorância em diferentes


épocas tem abusado o mundo, e dos quais estão cheios de páginas da
história; e finalmente, conspira a promover a prosperidade dos Estados
e a torná-los firmes, e estáveis pela reunião das forças morais com as
físicas (Memória..., 1945 [1816], p.466).3

Os constituintes encaminham as propostas da Comissão de


Instrução. “Artigo 250 – Haverá no Império escolas primárias em
cada termo, ginásios em cada comarca e universidades nos mais
apropriados locais. Artigo 251 – Leis e regulamentos marcarão o
número e a constituição desses úteis estabelecimentos. Art. 252 –
É livre a cada cidadão abrir aulas para o ensino público, contando
que responda pelos abusos.” Essas disposições atestam a doutrinação
de Antonio Carlos, José Bonifácio, Januário Pereira da Cunha,
Bittencourt Sá, Araújo Lima, Aguiar de Andrade, e Muniz Tavares,
notórios membros da comissão.
Na retórica incitante envolvida na consolidação jurídico-política
e territorial do recém-surgido Estado-Nação, imperativo virtuoso, as
luzes do entendimento assegurariam a moralidade pública, igualdade
civil, prosperidade da nação. Em suma, o esclarecimento propiciaria
o partejamento da consciência de alteridade. Demais um truísmo de
ontem e sempre, o advento de sociedades políticas fundadas no sufrágio
e representação popular requer uma primeira instrução comum
distribuída pelo Estado, e assim requeriam os letrados gravemente,
seriamente dispostos a efetivarem a fórmula monárquica dinástica,
constitucional e representativa.
Conhecido como “projeto Antonio Carlos” em alusão
aos irmãos Andrada – Antonio Carlos, Martim Francisco, José
Bonifácio, homens públicos amadurecidos na cultura da Ilustração

3
Como se sabe, o texto manuscrito é decalcado de Cinco memórias sobre a instrução
pública, de Condorcet. Lourenço Filho (1944, p.11) avaliava diferentemente. “As
ideias de educação, que expõe, Martim Francisco as bebeu nos ‘filantropistas’
para os quais o fim principal da educação era o ‘de fazer do homem o instrumento
de sua própria felicidade’”. Obviamente um engano.
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 23

portuguesa, porquanto afeitos às ciências naturais e às “letras


jurídicas”, o anteprojeto da Constituição expressa os interesses dos
deputados liberais moderados. Dentre outros, postulavam sistema
eleitoral censitário e indireto, limitação dos direitos dos portugueses
residentes no país e aquilo que será o pomo da discórdia, limitação
do poder do imperador.4 Nas narrativas dos intérpretes do passado,
as sessões da Assembleia Constituinte testemunharam refregas entre
o “partido Português” favorável à união do Brasil com Portugal e o
“partido Brasileiro” adepto da monarquia constitucional. Querelava-
se, a supremacia seria do Legislativo ou do Executivo? Quem de fato
iria gerir a máquina estatal?
Um ato ominoso, um feito iliberal. Retornando ao absolutismo, D.
Pedro I dissolve a Assembleia Nacional e Geral. Nesse passo, os Andrada
fundam O Tamoio, jornal de oposição ao imperador e ao “partido
Português”, com outros deputados, os dissidentes são deportados. Das
versões. Em A Revolução de 7 de abril de 1831 e Evaristo Ferreira da Veiga,
livro-crônica assinado “por um fluminense amante da Constituição”, o
autor prefere o anonimato, assim autentica o acontecimento.

D. Pedro veio então à testa de um corpo de cavalaria, e, fazendo o


general Moraes cercar a Câmara, com peças de artilharia, ordenou que
a Assembleia se dissolvesse imediatamente. Ante o direito da força
curvou-se a força do direito, e Antonio Carlos, Martim Francisco,
Rocha, Montezuma e o padre Belchior Pinheiro são presos ao saírem
da Câmara, assim como José Bonifácio, que o tinha sido em sua casa, e
transportados todos para a França, D. Pedro, no decreto de dissolução,
tratou de justificar a sua prepotência e assegurou que submeteria à
Assembleia que ia ser convocada, um projeto de Constituição duas
vezes mais liberal do que a projetada pela Assembleia Constituinte (A
Revolução..., 1862, p.15).5

4
Cf. Basile (2000) e Mota (1999).
5
Comenta Rodrigues (1974, p.22): “A inspiração de uma Assembleia Constituinte
vinha da França Revolucionária e nunca foi bem aceita pelos conservadores”.
24 • Carlos Monarcha

Como ratifica a tradição historiadora, o imperador arroga


para si o direito de convocar a Assembleia Nacional Constituinte
e Legislativa com o suposto de repropor o código jurídico-político.
Surge o “Projeto de Constituição para o Império do Brasil, organizado
no Conselho de Estado sob as bases apresentadas por sua Majestade
Imperial o senhor D. Pedro I, Imperador Constitucional e Defensor
Perpétuo do Brasil”. No adentrar do século XX, John Armitage (1914,
p.331) escreveria: “A admissão do título ‘Defensor Perpétuo do Brasil’
aplicado ao Imperador na constituição, também parece algum tanto
incompatível com as instituições de um povo livre, que deve ser
defensor de si mesmo”.
25 de março de 1824: outorgava-se a Constituição Política do
Império do Brasil, na rotação do tempo, os dispositivos centralizadores
serão objeto de contestações. De imediato, o ato de inconformismo
parte do norte do país, a Confederação do Equador, ato contínuo,
reconvertem-se as capitanias reais em províncias, 18 no conjunto:
Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso,
Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Norte, São Pedro do Rio Grande do Sul, Santa Catarina,
São Paulo, Sergipe. Nesse Brasil por fazer-se, as fronteiras internas são
mal delimitadas.6 No mais se queria solidarizar homens e mulheres
que a Independência tão só aglomerara. E, embora muitos dissessem
que os homens nasciam livres e iguais, à exceção de Representação à
Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil sobre a
escravatura e Apontamentos para a civilização dos índios bravos do Império
do Brasil, ambos da lavra de José Bonifácio, pouco se disse e pouco se
fez a respeito de escravos e índios.
Do código outorgado, sobrevém a definição do Império como
associação política de todos os brasileiros, a legitimação jurídica do
governo monárquico, dinástico, constitucional, e representativo, a divisão
do poder em três instâncias: Executivo, Legislativo (Senado e Câmara),
Judiciário, conjugadamente se instituía uma instância protoabsolutista,

6
Cf. Escobar (1995 [1940]).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 25

o Poder Moderador, a Coroa, ou seja, D. Pedro I nomearia, sem


aprovação do Legislativo, ministros de Estado, presidentes de províncias,
magistrados, e escolheria os senadores eleitos em listas tríplices.
As instâncias político-administrativas são estruturadas em
três níveis: municípios, províncias e governo central. E será na fé,
no sobrenatural que a razão de Estado procura respaldar a sua
superioridade moral, assim oficializa-se o catolicismo apostólico
romano como religião de Estado, permitindo-se o culto particular de
outras confissões religiosas, “sem forma alguma exterior de templo”.
Da Carta Política, sobrevém a representação da unidade entre Estado-
Nação-Coroa-Igreja.
Aos homens maiores de 25 de anos, mesmo se analfabetos,
reserva-se o direito de votar; o voto é censitário e em “dois graus”,
no plano local, vota-se para os Conselhos-Gerais Provinciais, as
Câmaras Municipais, e Juízes de Paz. No plano maior, vota-se para a
Assembleia Geral, deputados e senadores, o mandato dos primeiros é
temporário, dos últimos, vitalício. Para os cargos locais, as eleições são
diretas; para os gerais, indiretas. Os votantes elegem eleitores que por
sua vez elegem deputados e senadores. Votantes e eleitores declaram
renda anual de 100 e 200 mil réis, libertos votam apenas nas eleições
de primeiro grau.7 Alijados da massa de cidadãos ativos, aqueles com
renda anual inferior a 100 mil réis, menores de 25 anos, mas é possível
votar aos 21 se casado ou oficial militar. Para clérigos e bacharéis, não
há limite de idades; sem direito ao alistamento eleitoral, criados de
servir, filhos-família moradores com os pais, religiosos em regime
claustral, mulheres. Décadas adiante, ao exigir a assinatura na ata
eleitoral e elevar o censo pecuniário para 200 e 400 mil réis, a Lei de
19 de agosto de 1846 inicia a lenta exclusão dos analfabetos. Se há um
ideário liberal, esse é mais doutrina da ordem e menos da liberdade, ou
melhor, de ordem estamental.
No código de estruturação jurídico-política do Estado nacional,
as preocupações com o ensino clausulavam o “direito do cidadão à

7
Cf. Carvalho (2012) e Nicolau (2012).
26 • Carlos Monarcha

gratuidade da instrução primária”, ousadia para a época. De fato,


o artigo 179 estipula a inviolabilidade dos direitos civis e políticos
dos cidadãos brasileiros – a liberdade, a segurança individual e a
propriedade, além de garantir instrução primária gratuita a todos,
ademais previa-se a instalação de colégios e universidades para o
ensino de “elementos das ciências, belas-letras e artes”. A bem de ver,
a Constituição configura uma esfera pública em moldes da doutrina
liberal, a grande lei velaria pelas liberdades pessoais, religiosas,
trabalho, imprensa, igualdade perante a lei e inviolabilidade da
propriedade.8 Agora otimista, Manuel Duarte Moreira de Azevedo
(1892, p.158) assim comentava: “O desenvolvimento da vida cívica
fez alargar a esfera do ensino; tratou-se de educar os homens para se
tornarem livres.” Num país de povoamento escasso, com populações
esquecidas em territórios desmesurados, dissociados entre si, cuja
economia se sustentava no latifúndio e na escravaria, a instrução
primária, poderoso agente civilizatório, no tempo representaria um
marco fatigante a ser materializado.

O utilitarismo de Americus

Dentre as intenções de dar forma aos “estudos menores” segundo


os preceitos da civilização do momento, cabe citar o Projeto sobre o
estabelecimento e organização da instrução pública no Brasil, do tenente-
general Francisco de Borja Garção Stockler, 1808, avançar um pouco
mais com Necessidade de uma instrução geral e mais conforme com os deveres
do homem na sociedade, insuficiência da atual sobre a reforma dos estudos
menores da capitânia de São Paulo, a sempre relembrada “Memória”, de
Martim Francisco Ribeiro de Andrada Machado, 1816, prosseguir
com “Ideias elementares sobre um sistema de educação nacional”, de

8
Casalecchi (1987, p.247): “A partir da independência, o ideário liberal se impõe
como referência necessária à constituição do Estado Nacional. A partir daí, e pelo
menos até o final da Primeira República, ele contribuiu para as mudanças, desde
que não se enquadrassem no rol das transformações mais ousadas”.
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 27

Americus, e culminar com o projeto da Comissão de Instrução Pública


presidida por Januário da Cunha Barbosa, 1826.
Por agora, convém citar o deslembrado “Ideias elementares
sobre um sistema de educação nacional”, de Americus, pseudônimo,
constante em Cartas políticas (1825, 2 t. in-8°). Os tomos reúnem as
cartas do autor publicadas em Padre Amaro, ou sovela política, periódico
“dedicado a todos os portugueses de todos os mundos”, editado em
Londres por Joaquim Ferreira de Freitas. O plano consta na carta 12,
tomo 1, e indicia a mentalidade utilitarista dos homens do Reino; de
saída, Americus declara sua verdade, por sinal merecedora de atenção,
pois quer responder a dilemas postos pela época: Qual o alcance do
esclarecimento? Teria o esclarecimento limite ou nenhum limite? A
quem o esclarecimento tornaria virtuoso e civil?

Todavia ainda hoje há quem afirme que a inteligência, e as luzes


são qualidades, que não é muito para desejar sejam possuídas pela
grande massa do povo! Não sei como há quem tenha tanto medo
às luzes; só se isso vem de que, sendo certo que o saber é poder [...]
há muitos que temem este poder, porque pode dar ao mecanismo
político da associação uma nova forma, que transforme uma certa
ordem de interesses. Por certo que em a massa geral de uma sociedade
sendo ilustrada, deixará de se dividir (como até aqui) em duas classes
somente, uma das quais oprima, e a outra sofra. Este foi o estado do
Brasil até um certo período; mas (Deus graças) novus rerum nascitur
ordo ... (Americus, 1825, t.1, p.5, grifo do autor).

Utilitarista, não por acaso Americus recorre à deontologia de


Jeremy Bentham e Stuart Mill, ao justificar o ensino aplicado aos
“usos da vida”, teoricista, retoma Hartly e Condillac, a associação
de ideias fundamenta a educação moral e intelectual, ilustrado, cita
Helvécio, qualquer indivíduo saudável de regular perfeição orgânica
alcança maior ou menor perfectibilidade moral e mental, convicto,
corrobora Hobbes, Locke, Hume, diz, filosofar acerca do espírito
28 • Carlos Monarcha

humano é descrever a ordem e sucessão das sensações. Cauteloso,


admite as descobertas fisiológicas de Darwin e Cabanis, as quais,
nalguma medida, elucidavam o homem físico e moral. E ao cabo da
exposição, o cânon virtuoso, a educação é o instrumento da felicidade
individual e de todos os viventes em comunhão civil. “O grande
embaraço, porém sobre esta matéria consiste em que, não havendo
ideias exatas sobre qual seja verdadeiramente a felicidade temporal
do homem, é forçoso que se empreguem diversos meios para obter
um fim, que não é para todos uniforme”.
O “plano de ensino público e nacional” ou “plano de educação
intelectual elementar” de Americus envolve o cultivo físico, moral
e intelectual e, ao diferenciar os níveis de instrução conforme a
destinação profissional e a utilidade social das pessoas, ele revalida
argumentos utilitaristas ao mesmo tempo revive aspectos inerentes às
sociedades de ordens.
A “primeira escola” se destinaria a “rapazes de seis anos até
os nove” para além do ler, escrever, contar, acrescentar-se-ia um
catecismo religioso e uma “cartilha universal”, contendo “útil
coleção de verdades populares” relativamente à história natural,
química, botânica e fenômenos naturais. Critérios de idade e grau
de proficiência ordenariam o agrupamento de meninos em classes
regidas pelo modo de Lancaster – “que essencialmente não é outra
coisa mais do que o método dos decuriões das escolas jesuíticas mais
aperfeiçoado” (p.221 – grifo do autor). Endereçada aos rapazes de
9 a 11 anos, filhos da “classe média da sociedade”, comerciantes,
lavradores, fabricantes, artistas, a “segunda escola ou escola média”
ensinaria a língua materna, o francês e as ciências pelo “sistema das
tábuas crestomáticas de Mr. Bentham”, isto é, catecismos curtos com
máximas sobre o sistema solar, geografia, cronologia histórica, ética,
moralidade, mineralogia, botânica, química e mecânica. Por último,
recomendava um catecismo político explicativo da Constituição e
dos direitos afiançados e obrigações dos cidadãos, e outro de história
contendo fatos desde a “criação do mundo até agora”.
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 29

A variedade das matérias assustará tão somente a quem não refletir,


que cada um desses quadros deve ser muito resumido, e que podendo
ser ensinados pelo método de Lancaster podem ser aprendidos com a
maior facilidade; o caso todo é que cada um destes catecismos seja um
composto onde entre na mesma proporção doutrina suficiente, concisão
e clareza” (Americus, 1825, p.229-230, grifo do autor).

Na cimeira do plano, a “terceira escola” ou “escola superior” para


rapazes de 11 a 14 anos, destinados às profissões científicas, a saber,
teologia, jurisprudência, arte militar, política, medicina e filosofia
natural; com a intercessão de compêndios “mais extensos”, seria cometido
o estudo da língua materna, francês, inglês, grego, latim, geometria,
álgebra, história, geografia, mitologia, cronologia geral e portuguesa.
Nas tantas idealidades utilitaristas de Americus, a instrução popular,
ao dar a conhecer o mundo e a vida, aparece como atividade prática,
daí a necessidade de criar as primeiras escolas em freguesias, e segundas
e terceiras escolas em cidades e vilas notáveis. Quem é Americus? Para
Sacramento Blake, tratava-se de Miguel Calmon du Pin e Almeida, então
vivente na Suíça, o futuro marquês de Abrantes, político-chave nos jogos
conservadores da monarquia; para Lourenço Filho (1944), era Martim
Francisco Ribeiro de Andrada, outro engano.

Plano geral de instrução pública

Reaberto o parlamento, reunida a magistratura, em 1826, retornam


os assuntos da instrução, Antonio Ferreira França, cônegos Januário da
Cunha Barbosa, José Cardoso Pereira Mello, membros da Comissão da
Instrução Pública, encaminham projeto de lei dispondo o ensino em
quatro graus: Pedagogias, ensino elementar hierarquizado em três classes,
prevendo-se escolas para habilitação de alunos-mestres, Liceus com
três anos de curso e programa científico – Pedagogias e Liceus seriam
gratuitos –, Ginásios, curso de humanidades regido por 12 mestres para
as cadeiras a serem criadas de Filosofia especulativa, Geografia e História
30 • Carlos Monarcha

civil, Línguas latina e francesa, e num futuro próximo, Hermenêutica


e numismática, Italiano, Grego, Alemão e Inglês. No cume, Academias
abrangendo as escolas superiores existentes e aquela a ser instalada –
a escola superior de ciências sociais e jurídicas. “Seria também criado
o Instituto Imperial do Brasil, organismo semelhante ao Institut de
França” (Rodrigues, 1938, p.256). Esse “plano nacional de educação” não
prospera, jazendo nas “catacumbas parlamentares” conforme sentença
condenatória de Primitivo Moacyr (1936, 1938).9
É de supor que o projeto retomasse os acumulados constantes
nas memórias da instrução de Garção Stockler e Martim Afonso, o
plano de educação nacional de Americus, assim como as propostas da
Comissão de Instrução capitaneada pelos Andrada. Projeto mais modesto
será encaminhado à Câmara dos Deputados, versando tão só a criação
de escolas de primeiras letras. Referendada pelo ministro do Império,
visconde de São Leopoldo, e pelo imperador, promulgava-se a lei geral de
15 de outubro de 1827, 17 artigos enxutos em cujo caput se enunciava.
“D. Pedro I, por graça de Deus e unânime aclamação dos povos,
Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil: Fazemos saber
a todos os nossos súditos que a Assembleia Geral decretou e nós queremos
a Lei seguinte”.
Os termos do decreto-legislativo denotam a força agregadora
imputada à instrução elementar pela relevância histórica, por si só é um
marco legal memorioso, revisitado e recomentado pelos intérpretes do
passado, convêm citar as disposições, pois, de certo modo, inaugurava-se
o intento de ofertar um plano geral de instrução elementar para todo o
Império. Dentre outros, o decreto-legislativo estipulava a criação de escolas
de primeiras letras nas “cidades, vilas e lugares populosos”, “proporcionado
à compreensão dos meninos”, o ensino pelo método mútuo, ou seja, as
operações de aritmética, noções de geometria prática, gramática da língua
nacional, princípios de moral cristã, doutrina da religião católica, leitura
da Constituição do Império. Outras disposições ousadas: instrução para
meninas, vitaliciedade do magistério, gratificação anual não excedente

9
Cf. também Moraes Filho (1959).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 31

à “terça parte do ordenado”, aos professores distinguidos por mais de


12 anos, “por prudência, desvelo, grande número e aproveitamento dos
discípulos”, iguais vencimentos e gratificações para mestras e mestres.
Como explica a tradição historiadora, durante um século ou mais,
a lei imperial de 15 de outubro de 1827 será o único dispositivo geral e de
conjunto sobre a instrução elementar; outras leis orgânicas apareceriam
no século XX, quer em decretos do Executivo quer em decretos-leis
expedidos em governos discricionários. Nas muitas avaliações, a lei
de 1827 aspirara a verdades prematuras, de qualquer modo, e isso é
louvável, esse código primordial expressa o intento de ofertar ensino a
todos. E, naquele mesmo ano de 1827, para formar quadros capazes de
administrar e zelar pela ordem jurídica e, sobretudo, mover a máquina do
Estado Nacional, instalavam-se os cursos de Ciências Jurídicas e Sociais
em São Paulo e Olinda.
Na cultura política dos estadistas, a instrução pública ao separar
o homem do estado de natureza, aparece como via de entendimento
das instituições sociais e da formação da nacionalidade, mormente,
modo de regular as novas gerações por intermédio de uma instrução
elementar de Estado.10 Numa palavra, desde a Constituinte, alardeava-
se a existência de um povo inferior a ser educado para o usufruto
das conquistas do liberalismo político e dos costumes da civilização
moderna.11 Mas acautele-se a palavra, uma vez que é necessário
distinguir a lei e a sua aplicação, valer dizer, entre o aparecer e o ser. Após
dez anos de independência, a estatística oficial registrava a existência de
162 escolas para meninos e 18 para meninas. Dessas escolas, comentava
José Ricardo Pires de Almeida (1989 [1889]), 40 careciam de mestres,
dentre as dificuldades, a inexistência de pessoas habilitadas a processuar
o modo lancasteriano de ensino. “Foi preciso improvisar professores e
atraí-los pelo vulto das vantagens e promessas de recompensas para eles

10
“Menos de vinte anos depois da outorga da lei básica do Império, já se alastrava
tão bem a opinião típica do século de que o progresso no saber era a fonte
milagrosa de todas as virtudes cívicas e privadas, que não se julgava sequer lícito
pôr em discussão essa crença” (Buarque de Holanda, 1960, p.184).
11
Cf. Rodrigues (1974).
32 • Carlos Monarcha

se aventurassem à nova profissão legalmente disciplinada” (Lima, 1927,


p.45). Nessa formação econômico-social, 90% da população habitam
as zonas rurais, boa parte em regime de servidão, as populações de livres
e escravos, a “plebe rural”, para recordar a formulação cara a Oliveira
Vianna, distribuíam-se diversamente.12

Tabela 1 – População do Brasil em 1819


Regiões Livres Escravos Total
Norte 104.211 39.040 143.251
Nordeste 716.468 393.735 1.110.203
Leste 1.299.287 508.351 1.807.638
Sul 309.193 125.283 434.476
Centro-oeste 59.584 40.980 100.564
Total 2.488.743 1.107.389 3.596.132
Fonte: Silva J.N.S. Investigações sobre os recenseamentos da população geral do Império
e de cada Província de per si. Relatório do Ministério dos Negócios do Império (1870). Rio
de Janeiro: Tipografia Nacional (1870) e Velloso (1866) apud Marcílio (1986).

12
“Entre escravos e senhores, existia uma população legalmente livre, mas a que
faltava quase todas as condições para o exercício dos direitos civis, sobretudo a
educação” (Carvalho, 2001, p.21).
33

A estabilidade institucional

A “onda liberal”, a descentralização

Em abril de 1831, o imperador abdicava, entre a abdicação e o


coroamento de Pedro de Alcântara, regentes governam o país. Desde
a Independência, falava-se em federalismo, óbvia reação aos excessos
do poder central.13 No teatro da política imperial, predominam as
discussões acerca da descentralização do poder, bem como o grau de
autonomia a ser concedido às províncias.
A Lei nº 16 de 12 de agosto de 1834 adita “alterações e adições”
à Constituição Política do Império, a Câmara dos Deputados extingue
o Conselho de Estado, introduz a regência una eletiva e temporária,
renovável a cada quadriênio, enquanto perdurar a menoridade de
Pedro de Alcântara. Ademais se concedia autonomia às províncias
ao transformar os Conselhos-Gerais em Assembleias Legislativas,
além de alterar a divisão de rendas entre governo central, províncias e
municípios. De teor monárquico e federativo, e conduzido por liberais
moderados, Diogo Antonio Feijó, Bernardo Pereira de Vasconcelos,
Evaristo da Veiga, o Ato Adicional, ao conjugar interesses opostos,
apazigua as demandas das classes senhoriais: poderes Executivo
e Legislativo, fortes no âmbito do poder central, e as demandas
descentralizadoras das províncias.

13
Cf. Iglésias (1993).
34 • Carlos Monarcha

As adições na Carta Política modificam as competências


relativas aos serviços de instrução, o governo central administraria
e manteria o ensino primário e secundário na Corte, além do ensino
superior existente país afora; aos governos provinciais, competiria a
instrução pública, não compreendendo as faculdades de Medicina, e
cursos Jurídicos, e quaisquer outros estabelecimentos criados por lei
geral. Embora a hermenêutica jurídica no futuro viesse a concluir pela
competência concorrente entre poder central e os poderes provinciais, tal
interpretação não prevalece, de sorte que a querela atravessa o Império
e a República. Nas contendas jurídico-políticas, a presença da União
no sustento e extensão da instrução popular será insuficiente quer pela
centralização fiscal quer pela insuficiência de recursos. Contrafeito, na
Fala do Trono de 1834, Diogo Antonio Feijó vergastava.

Os brasileiros têm necessidade de uma educação nacional: sem


está nunca teremos acordo nos pontos mais vitais da sociedade. E se
no sistema representativo só as maiorias decidem dos negócios mais
importantes, quanto não é necessário generalizar certas máximas, para
que elas possam predominar em maior número.
Senhores, sem educação e sem moral, não é possível haver uma
verdadeira civilização (Falas..., 1977 [1889], p.110).

Nos lotes de dias e anos que hão de vir, a descentralização


das competências soará como ato de abandono do poder central
na franquia de uma cultura inicial e uniforme destinada a formar o
homem brasileiro, ação considerada prioritária num país recém-liberto
do jugo colonial. Irremovível divisor de águas, pois tema controverso
nos anais historiográficos, o Ato Adicional, sem dúvida, determinaria
os caminhos ulteriores: em vez de um sistema geral, como previsto na
lei de 15 de outubro, haveria “aparelhos didáticos” paralelos, o central e
os provinciais/estaduais.14

14
Ver a respeito as cronologias de Bittencourt (1946, 1953), Mello (1996) e
Venancio Filho (1945). A diversidade de legislações provinciais consta em Bello
(1978), Bittencourt (1981), Leite (1970), Marcílio (1963) e Olympio (1922).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 35

Do regresso conservador

“Mas... aí veio a lei de 12 de maio de 1840, amputou-se o Ato


Adicional” (Tavares Bastos, 1937 [1870], p.148). Os estremecimentos
separatistas ameaçam a integridade política e territorialidade do Império,
com isso desperta o “desejo de ordem nacional”. Às vésperas da declaração
da maioridade de Pedro de Alcântara, por iniciativa do regente Pedro
de Araújo Lima, futuro marquês de Olinda, a “Lei de interpretação”
do Ato Adicional dará lugar ao “regresso conservador”. Com efeito, ao
recentralizar o aparato administrativo e judiciário, a tenaz denominada
“Lei de Interpretação”, revisão das competências dos governos provinciais,
restaura o Conselho de Estado e altera o Código de Processo Criminal.15
Em “Esquisse de l’histoire du Brésil”, José Maria da Silva Paranhos, o barão
de Rio Branco, revê os fatos. “Um projeto de lei interpretativa do Ato
Adicional, tendo por objetivo fixar mais precisamente as atribuições das
legislaturas provinciais, para por fim as usurpações do poder central, ou da
autonomia comunal, por essas assembleias, foi debatido no parlamento
de 1828 a 1840, e adotado somente neste último ano – a Lei de 12 de
maio de 1840” (Paranhos, 1889, p.70). Mas, antes disso, no sistema
intelectual, ecoavam as palavras de Gonçalves Dias, futuro conselheiro
do Império. “A legislação provincial, relativa à instrução, aos seus efeitos
até hoje, à previsão do que será no futuro pelo que tem sido no passado,
dezessete anos enfim de experiências baldas bastam, segundo penso, para
nos convencerem de que em matérias de instrução – nada absolutamente
nada se pode esperar das Assembleias Provinciais” (Gonçalves Dias,
1957 [1852], p.340).
E, ao mesmo tempo em que se presenciava o advento das
formas políticas contemporâneas, a saber, constitucionalismo,

15
Cf. Dolhnikoff (2005). Para Alonso (2002, p.52): “O status quo imperial
esteve mais representado em modos de pensar e agir do que em doutrinas
explicitamente formuladas. O Império não contou com um texto de fundação.
Seus princípios básicos estão na Lei de Interpretação do Ato Adicional de 1841
(sic), que não toma mais que duas páginas. Os valores estavam encarnados nas
próprias práticas políticas.”
36 • Carlos Monarcha

representação popular, divisão dos poderes, liberalismo (conservador)


e “parlamentarismo”, no chão histórico remanesciam as estruturas
coloniais, a monocultura, o latifúndio, o escravismo, o tráfico negreiro,
numa palavra, o colonialismo sobrevivia no Império.16 Viventes
nesse chão movediço, homens públicos, homens do Império, liberais
e conservadores batem-se pelo partido da instrução, figurando-a
santelmo das públicas liberdades e coroamento da obra civilizadora do
Império. E, ao apelarem para a instrução como via “da União Cristã
e da Sociedade Civil”, idealizam o povo como “razão nacional que
governa”. Na cultura política reforçava-se a confiança no halo de uma
primeira instrução distribuída pelo Estado. Quaisquer que sejam os
teores dos embates, quaisquer que sejam as concretizações, cravava-se
no tempo severo princípio na cultura política – a instrução popular,
a instrução do povo branco, do povo mestiço, do povo pé-descalço,
do povo votante, ao propiciar inesgotável fonte de benefícios sociais
e melhoramentos materiais, garantiriam a estabilidade social e a
perpetuação das instituições liberais.

Um decreto de longa duração

Cartório do Brasil, na Corte, autenticam-se e consorciam-se as


utopias políticas em benefício da realidade, dos jogos de força saltam
planos do ser e dever ser das finalidades públicas da instrução. É lícito supor
que a irradiação das disposições reformadoras pelos quadrantes do país em
vias de formação deve-se à ronda incessante dos presidentes de províncias,
delegados do Imperador, que, ao tomarem para si os atos legais codificados
na Corte, atuassem na consolidação dos poderes locais. Referidas à capital
do Império, as iniciativas de reforma social e cultural remontam ao
“Ministério da conciliação” presidido pelo marquês do Paraná, Honório
Hermeto Carneiro Leão, prosseguindo em 1854, ano de inauguração dos
telégrafos e iluminação a gás, no Rio de Janeiro, com Luiz Pedreira do
Couto Ferraz, ministro de Estado dos Negócios do Império.

16
Cf. Prado Júnior (2011).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 37

Couto Ferraz, “gentil-homem da imperial câmara” e dos


“primeiros beneméritos da pátria”, no dizer afortunado de Sacramento
Blake, diplomara-se em Direito na academia de São Paulo. Nela viria
a ser catedrático, e no tempo ocuparia postos de mando e prestígio –
deputado e senador pelo Rio de Janeiro, presidente da província do
Espírito Santo, conselheiro de Estado, presidente do Instituto Histórico
e Geográfico Brasileiro e Instituto Fluminense de Agricultura, vice-
presidente da Associação Protetora da Infância Desvalida.
O Decreto nº 1.331-A, de 17 de fevereiro de 1854, baixado por
iniciativa de Couto Ferraz, regulamenta a reforma do ensino primário e
secundário da Corte; minucioso e centralizador, o dispositivo comporta
135 artigos. E a um tempo normatiza a inspeção dos estabelecimentos
públicos e particulares, nomeação e demissão de professores, sanções
disciplinares, programas e métodos de ensino. No mais, incorpora
disposições da reforma Guizot, 1833, ou seja, a criação de um sistema
escolar de Estado, do projeto Carnot, 1848, ou seja, a lealdade ao
ensino gratuito e obrigatório, da lei Falloux, 1850, o desprezo pelas
escolas normais e reforço do serviço de inspeção.17
Robustecido, o corpo de inspeção seria integrado pelo ministro
e o secretário de Estado dos Negócios do Império, ambos secundados
pelo inspetor-geral, conselho diretor e inspetores distritais. Operador-
chave, ao inspetor-geral delegavam-se muitíssimas obrigações:
examinar candidatos ao magistério, aplicar penas disciplinares,
autorizar abertura de escolas, elaborar mapas estatísticos e orçamentos
anuais, expedir diretivas para inspetores e professores, propor
sistemas práticos de ensino, por fim, revisar compêndios escolares.18
Inovava-se. Ensino primário obrigatório, sanções para pais, tutores

17
Ecos da legislação decretada por Guizot e Falloux, nos planos de reforma, são
constatados por Chizzotti (1975) e Moreira (1955). Quanto ao cenário francês,
ver Gontard (1981).
18
“Pode-se dizer que o também Decreto-Lei Couto Ferraz, de 1854, é um ponto
de inflexão nas políticas públicas de educação ao longo do Império. Foi ele quem
estabeleceu pela primeira vez uma estruturação funcional da educação, que vinha
sendo requisitada desde a primeira lei de educação, de 1827” (Rocha, 2010, p.126).
38 • Carlos Monarcha

e curadores recalcitrantes no tocante à matrícula e à frequência


dos filhos e pupilos, doação de material e vestuário para crianças
pobres, criação de asilos-escola para menores abandonados. Para o
exercício do magistério, o candidato deveria comprovar idoneidade
moral e capacidade profissional, em contraparte instituía o direito à
aposentadoria aos 25 anos de docência. Relativamente à pedagogia
escolar, sancionava o método simultâneo e, além de encaminhar a
criação de “escolas de 1º e 2º grau”, introduzia a figura do professor-
adjunto a ser recrutado entre filhos de professores e/ou alunos pobres
maiores de 12 anos.
O Regulamento do Ensino Primário e Secundário da Corte
de 1854, a sua vez, estipulava o ensino de instrução moral e religiosa,
leitura e escrita, noções de gramática, princípios de aritmética, sistema
de pesos e medidas. A esses conteúdos acrescentava-se a leitura dos
Evangelhos, notícias de História Sagrada, elementos de história
e geografia do Brasil, noções de ciências físicas e história natural
“aplicáveis aos usos da vida”, geometria, agrimensura, desenho linear,
noções de música, exercícios de canto e ginástica; por fim, introduzia o
ensino da metrologia francesa. No futuro, ao balancear positivamente
as realizações do Segundo Reinado, Franklin Menezes Dória, o
pertinaz barão de Loreto, louvaria a reforma capitaneada por Couto
Ferraz. “Breve, o ministro do Império Luiz Pedreira do Couto Ferraz,
visconde de Bom Retiro, organiza a instrução primária e, com o
Decreto de 17 de fevereiro de 1854, conquista para si verdadeira glória,
comparável a que de Guizot, em França, a sua lei de 28 de junho de
1833” (Dória, 1899, p.15).
E por ventura não será despropositado, se agora acrescentássemos
os dizeres contrastantes (e otimistas) de José Manoel Garcia, autor de
proficiente parecer sobre a questão “Das escolas primárias, disciplinas
que devem ser ensinadas, material escolar” encaminhado ao Primeiro
Congresso da Instrução Pública do Rio de Janeiro, anunciado para 1884,
mas não realizado. Ao avaliar os desdobramentos do Ato Adicional,
José Manoel Garcia, assim, argumentava, conquanto o artigo 10, §
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 39

2º do ato aditivo houvesse quebrado a unidade da educação nacional,


não prejudicara “o acréscimo das escolas primárias, ao contrário, não
obstante os movimentos revolucionários de diversas províncias ao
norte e ao sul do Império, as guerras com as repúblicas vizinhas, as
secas e as epidemias que têm exaurido os cofres gerais e provinciais,
elevaram-se cada vez mais” (Garcia, 1884a, p.2-3). Otimista declinava
números positivos, ainda que insuficientes, na medida em que indiciam
escolarização mínima das populações infantis.

Tabela 2 – Evolução do número de escolas públicas e matrícula geral


– 1838-1873

Escolas públicas Alunos


1838 607 11.445
1845 835 26.584
1852 1.246 43.829
1864 2.038 83.884
1873 3.875* 154.351**
*Diurnas – 3.792 **Diurno – 154.351
*Noturnas – 83 **Noturno – 21.113
Fonte: GARCIA, José Manoel. 5ª questão: das escolas primárias, disciplinas que
devem ser ensinadas, material escolar. Parecer do Dr. José Manoel Garcia. In: ATAS
e pareceres do Congresso de Instrução Pública do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro:
Tipografia Nacional, 1884.

Cultura da razão e da vontade

Ao notificar um plano de matérias para as escolas do Império,


a lei de 1827 oficializava o “sistema de Lancastre” ou de “Lencastre”
ou “lancastrino”, o qual, note-se, inovava ao ensinar a ler e a escrever
simultaneamente. No Brasil, um dos começos da aclimatação do
“método mutualista” remete ao Decreto de 1º março de 1823,
promulgado por D. Pedro – “Hei por bem mandar criar nesta Corte
uma escola de primeiras letras, na qual se ensinará pelo método
do ensino mútuo, sendo em benefício, não somente dos militares
40 • Carlos Monarcha

do Exército, mas de todas as classes dos meus súditos que queiram


aproveitar-se de tão vantajoso estabelecimento.”
Outras iniciativas episódicas remontam a José Paulino Soares de
Souza, visconde de Uruguai, por sua diligência, instalava-se em 1835, a
Escola Normal de Niterói para habilitar mestres conforme o método.19
Iniciativa relevante, desde a expulsão dos jesuítas no século XVIII pelo
ministério pombalino, improvisavam-se mestres de escola, qualquer pessoa
poderia abrir escolas ou nelas ensinar. Demais iniciativas concernem à Lei
nº 76 de 24 de julho de 1838, promulgada por Vicente Tomás Pires de
Figueiredo Camargo, presidente da província do Maranhão, autorizando
mandar à França “um sujeito de reconhecida e indisputável habilidade a
fim de aprender praticamente o ensino pelo método Lencastrino, o qual
assim instruído venha reger uma Escola Normal na capital da Província.”
A escolha recai na pessoa de Felipe Benício de Oliveira Conduru. “Tal
Escola constituía uma novidade no ensino público do país. Precedíamos,
no assunto, à província de S. Paulo, que só teve uma escola deste gênero,
em 1846, quando já fracassava entre nós o novo método. Anexa ao Liceu,
orientada pelo diretor deste estabelecimento, a Escola teve os seus dias de
prosperidade, e tanto que, por diversas vezes, se pensou em separar os dois
institutos” (Viveiros, 1952, p.80).
Explica-se diversamente a origem desse método, em que o mestre
atua como espectador e inspetor, contudo um dado é certo, embora de
olhar filantropicamente esclarecido e cristão, a escola lancasteriana insere-
se na órbita da neutralidade religiosa. Como narram os intérpretes do
passado, o “método”, “sistema” ou “modo” estabelecera-se na Inglaterra
após relato de Andrew Bell a respeito da aplicação exitosa em Madras,
Índia, e propagara-se graças a Joseph Lancaster. Tratados como Exposição
do novo método de ensino mútuo seguido nas escolas militares de primeiras letras
em Portugal, de João Crisóstomo do Couto Melo, e L’enseignement mutuel
“ou histoire de l’introduction et de la propagation de cette méthode par les soins
du docteur Bell, de J. Lancaster et d’aufres”, de Joseph Hamel, no qual há
singular esboço histórico do método, concorreram na popularização da
lógica de aplicação e rendimento do método.

19
Cf. Lacerda (1938) e Villela (1990).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 41

O novo método de ensino é conhecido por diversos nomes. Nós


o chamamos de método de Bell ou de Madras porque o doutor Bell
o concebe primeiramente em Madras (na costa de Coromandel), e
método de Lancaster, pois M. Lancaster foi o primeiro que de fato o
aplicou e que teve sucesso, de forma zelosa e ativa, em fazer com que
fosse adotado por toda a Inglaterra.
Na França, o designamos por seu próprio objeto, e o nome do
método de ensino mútuo é sem dúvida o mais convencional, uma
vez que caracteriza o modo de educação, sem admitir uma alusão
ao menos incerta, seja a um inventor do processo, seja aos lugares
onde tenha surgido. Desse modo, encontra-se, na verdade, resolvida
a questão da economia do ensino elementar, uma vez que é suficiente
um único professor para dirigir a educação de um grande número
de crianças: chega-se mais rápido ao objetivo e sua instituição exige
menos despesas (Hamel, 1818, p.3-4, grifo do autor).

Ao esmiuçar a prática do ensino mútuo, algo complexo, o autor


acentuava argumentos simpáticos ao “método de Bell ou de Madras”
e/ou “método de Lancaster”.

Os antigos métodos resultam na perda de um tempo precioso.


Com eles, passa-se às vezes três ou quatro meses antes que as crianças
conheçam seu alfabeto, e alguns anos antes que elas saibam ler
fluentemente e escrever de forma legível.
Se há cinquenta alunos em uma escola onde toma-se três horas
pela manhã e duas horas durante a tarde, admitindo-se que não se
perde sequer um segundo (e essa suposição é extrema), o professor não
poderá jamais dedicar mais que seis minutos a cada uma das crianças,
e o restante do tempo será quase que perdido por elas. Mesmo que
em um ano haja trezentos dias de aula, cada criança terá apenas trinta
horas de ensino (Hamel, 1818, p.3-4).

De uma parte, a recepção do método deve-se à tomada de


consciência do valor econômico da instrução e da escassez de
professores; para uns, a instrução salvaguardaria a civilização, ordem
42 • Carlos Monarcha

pública e bons costumes; para outros, incrementaria a produtividade


manufatureira e agrícola; no mais, a recepção auspiciosa devia-se à
propalada economia de recursos, um mestre, num local avantajado
secundado por alunos-monitores, ensinaria centenas de crianças.
Grosso modo, o princípio metodológico baseia-se na reciprocidade
do ensino, os mais aptos servem de mestres aos menos aptos, assim
todos avançariam gradualmente.20 Diretividade de comandos, divisão
de responsabilidades, exercícios maquinais, processos mnemônicos e o
mais assemelham os procedimentos às normas das casernas e fábricas.
De resto, as expectativas convergem para o ato de suprir a baixos custos
a falta de mestres, muito embora a necessidade de espaços amplos e a
panóplia de utensílios didáticos implicassem gastos.
Vice-reitor da Universidade de Paris, membro da Academia
Francesa, Octave Gréard em Éducation et instruction, no findar o século
XIX, descrevia o essencial da cena lancasteriana, para ele relíquia
de um passado em desuso. Acompanhemos a descrição. Em toda a
extensão, no meio da sala, filas de bancos de 15 a 20 lugares, à direita
o púlpito do monitor, a série de modelos para escrita; “uma espécie de
telégrafo” emissor de comandos une a sequência de fileiras. Junto às
paredes laterais, semicírculos para agrupamentos de alunos, “à meia
altura e ao alcance da mão”, quadros-negros para exercícios de cálculo
e quadros murais para leitura e gramática.

Lá do fundo do salão, sobre um vasto e elevado estrado, com vários


degraus e rodeado de balaustres, a cadeira do professor, que a seu
turno, valendo-se da voz, do bastão ou do apito, fiscaliza os quadros
e os grupos distribuindo os incitamentos e as reprimendas e, em uma
palavra, regulando, como o capitão de navio na ponte de comando,
toda a manobra do ensino (Gréard, 1889, p.26-27).

20
Cf. Dussel e Caruso (1999) e Lesage (1981). Sobre a adoção e usos do método
monitorial/mútuo nas províncias do Império, ver Bastos e Faria Filho (1999).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 43

Médico e cronista dos fatos educacionais no Império, José


Ricardo Pires de Almeida, ao circunstanciar o uso do método em solo
nacional, certamente ajuda a matizar um tanto mais a análise.

Apesar do eclipse da grande voga do ensino mútuo na Inglaterra,


os liberais brasileiros, propugnadores do método, pensaram então
que a liberdade de abrir de abrir escolas, sem exames prévios e
sem autorização, unida a um novo sistema de instrução, difundiria
rapidamente, até aos mais distantes pontos do Império, a necessária
instrução primária às massas (Pires de Almeida, 1989 [1889], p.57).

Desde meados de 1830, deplorava-se a condição das escolas


lancasterianas, por regra refugiadas em locais impróprios, desprovidas
de mestres aptos na técnica e utensílios, compêndios. “Em seus
relatórios, os ministros de então, Campos Vergueiro, Chichorro da
Gama, Inácio Borges e Bernardo de Vasconcellos, fulminavam o
sistema lancasteriano, em voga para as nossas escolas de primeiras letras”
(Fleiuss, 1922, p.1.999). Estabelecimentos de instrução idealizados
para meios urbanos, neles há populações relativamente adensadas, as
escolas lancasterianas guardariam vigência até o segundo quartel do
século XIX. Na província de São Paulo, o método deixa de vigorar
em 1846; já no Espírito Santo, o Regulamento Geral da Instrução
Pública assim estatuía. “Artigo 25 – Não é permitido o sistema de
ensino por decuriões ou monitores, e o professor é obrigado a lecionar
pessoalmente todos os seus alunos.” Em plena República, disposição
análoga consta no Regulamento da Instrução Pública do Estado
de Mato Grosso de 1910. “Art. 22 – Não é permitido o sistema de
ensino por decuriões ou monitores, pelo que o professor que não tenha
adjunto é obrigado a lecionar pessoalmente todos os seus alunos”.
45

Dos modos de instruir

Desmobiliadas, improvisavam-se as “casas públicas de instrução


e educação” em saletas na casa do mestre, onde, por vezes, funcionava
uma venda ou em cantos de cadeias e igrejas. Médico e pastor da colônia
inglesa na Corte, Robert Walsh, em Notícias do Brasil, narra cena em
nada lisonjeira. “A venda era mantida por um homem instruído, que
também mantinha uma escola.”

Quando entramos, fomos saudados pelo animado murmúrio de


crianças, que recitavam em coro a lição num cômodo contíguo. Fomos
até lá e deparamos com dez ou doze meninos sentados em bancos
decentemente trajados, todos lendo junto em voz alta. Seus livros não
passavam de cartas comerciais recebidas pelo seu mestre e tratando de
vários assuntos relativos aos seus negócios, sendo cada folha protegida
de maneira que manuscritos tão preciosos não sofressem com o
manuseio dos meninos.
O professor via-se forçado a se valer desse recurso porque não dispunha
de livros, e dessa forma seus alunos aprendem a ler textos manuscritos
antes dos impressos. Algumas cartas eram quase incompreensíveis e muito
mal escritas, e em minha opinião teriam confundido qualquer escrivão do
Registro Público (Walsh, 1985 [1830], p.54).

No geral, os mestres de escolas manejam a relação mestre-aluno


ou mestre-classe pelo método individual ou simultâneo, por regra
as aulas ocorrem em duas jornadas diárias uma pela manhã, outra à
46 • Carlos Monarcha

tarde.21 Exemplo ideal-típico de emprego de tempo e distribuição


de lições consta no relatório manuscrito de 15 de julho de 1868 de
Bernardino de Carvalho, professor na província de São Paulo.

Período da manhã
Todos os dias
– caligrafia: das 8 às 8 ¾
– aritmética prática: das 8 ¾ às 9 ½
– leitura de impressos
– lições de doutrina de gramática inclusive o tempo da tomada
das lições das 9 ½ às 10 ½
Escola da tarde
Todos os dias
– caligrafia: das 2 às 2¾
– aritmética prática: das 2 ¾ às 3 ½
– leitura dos manuscritos e lições de tabuadas (cada aluno em
particular)
– teoria da aritmética e sistema métrico (inclusive o tempo
das tomadas de lição) das 3½ as 4 ½ (Carvalho apud Neves,
2003).22

O senso prático, assim, recomendava: apenas se começa a


escrever quando o aprendiz souber soletrar e ler e a fazer contas.
Não há aulas aos domingos e dias santificados ou de grande gala,
igualmente nos dias de Entrudo, Quarta-feira de Cinzas ou entre
Domingo de Ramos e Páscoa, o mesmo para Finados. As férias
abarcavam da primeira semana de dezembro à primeira de janeiro;
salvo nalgumas escolas agrupadas na Corte, as aulas públicas são as
mais simples, uma classe, um mestre. Não se admitiam menores de
cinco anos, meninas em escolas de meninos e vice-versa, crianças
com moléstias contagiosas anteriormente expulsas por incorrigíveis.

21
Cf. Kubo (1986) e Vechia (2004).
22
Para apreciação das formas escolares no período, ver Marcílio (2005).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 47

Quanto aos escravos, a postura das autoridades é idêntica à


declinada em Documentos com que ilustríssimo e excelentíssimo senhor
Dr. José Antonio Saraiva, Presidente da Província de S. Paulo, instruiu
o relatório da abertura da Assembleia Legislativa Provincial no dia 15
de fevereiro de 1855.

Suscitou-me dúvida se eram admitidos à matrícula os escravos,


ou indivíduos, sobre cuja liberdade não havia certeza. Visto que
as famílias repugnam mandar as escolas públicas seus filhos se essa
qualidade de alunos fosse aceita, e atendendo aos perigos de derramar
a instrução pela classe escrava, ordenei que não fossem recebidos
nos estabelecimentos de instrução pública senão os meninos, que
os Professores reconhecessem como livres, ou que provassem essa
qualidade (Documentos..., 1855, p.48).

Desnecessário redizer que a instrução elementar, assim se crê,


constitui propedêutica à cultura em sentido antropológico, ou seja,
conjunto de ideias, signos, modos de comportamento, comunicação e
sobremodo propedêutica ao homem social pela efetividade da cultura,
donde o anelo de transcender o círculo restrito do ler-escrever-contar
pelo ensino de noções literárias e científicas, acrescidos de edificantes
valores morais, sãs virtudes da fé e modos civis.

Conhecimentos epitomizados

Numa época demarcada por fenômeno relativamente inédito,


qual seja, as relações entre ensinante e aprendizes, mediatizadas
tanto pela palavra do mestre, execução de cópias, ditados, cálculos
numéricos quanto pela leitura de manuscritos e impressos, cresce
a procura de compêndios. Índice fortuito consta na “memória” do
coronel e bacharel em Filosofia e Matemáticas, Martim Francisco
Ribeiro d’Andrada.
48 • Carlos Monarcha

Os compêndios destinados para o primeiro grau de instrução,


encerrando em si elementos mais simples, e princípios de verdade
geralmente reconhecida, que nunca experimentam a influência
das novas descobertas, devem ser compostos debaixo da vigilância,
e inspeção do Estado, porque desta forma sua doutrina nunca será
desnaturalizada, pela superstição ou negligência, e por isso hão de ser
de necessidade melhores (Memória..., 1945 [1816], p.470).

Outro ângulo, outra voz. Nos meados do século XIX, o


governo imperial encarrega Antonio Gonçalves Dias de inspecionar
estabelecimentos de instrução das províncias do norte. Do périplo
ajustado, vinha à tona Instrução pública nas províncias do Pará, Maranhão,
Ceará, Rio Grande, Paraíba, Pernambuco e Bahia, documentário ímpar a
desdizer as aparências pelas realidades. Estupefato, o poeta maranhense
cujo romantismo-indianismo desde cedo à meninice aprendera a
admirar, deplorava. “Um dos defeitos é a falta de Compêndios no
interior porque os não há, nas Capitais, porque não há escolha, ou
foi mal feita; porque a escola não é suprida, e os pais relutam em
dar os livros exigidos, ou repugnam aos mestres os admitidos pelas
autoridades” (Gonçalves Dias, 1957 [1852], p.362).

Quais compêndios? Quais autores? Quais lugares?

Terra-a-terra, os passos de vida escolar no Primeiro Reinado,


Regências e início do Segundo Reinado, de algum modo, faziam-se
acompanhar dum sortimento de obras didáticas, hoje quase esquecidas,
conquanto saudadas como expressivas de técnicas intelectuais do
entendimento da ordem natural das coisas e dos homens.23 Lento
e lento assistia-se à integração da escola de instrução primária em

23
Quanto à escolarização dos saberes com vista a propiciar “aprendizagens
elementares” e a “trilogia ler-escrever-contar”, escreve Hébrard (1999, p.66): “Em
suma, trata-se de ver como essa trilogia, a nossos olhos tão natural, é produzida
na e pela escolarização”.
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 49

paisagens sociais diversas, além de certa familiarização do ensino letrado


com recurso a impressos revestidos de ditaticidade. É de supor que,
porventura, nos lugares nos quais se vivenciava a experiência escolar,
que a combinatória ensino/texto/imagem se viabiliza consoante edições
esporádicas ou repisadas de compêndios impressos em tipografias locais
ou em editoras a caminho do prestígio comercial. Se tal combinatória
é circunstanciada por imperativos técnicos e potenciais de consumo,
sem dúvida, o é também pela renúncia ao recurso único da memória,
faculdade superior, mas susceptível de elisões.

Como os trabalhadores do mundo físico, os do mundo moral,


para não perderem suas forças em vão, precisavam de um depósito
que recolhesse e guardasse os seus produtos. O depósito que para se
inventou foi o livro. O livro, portanto, está para o mundo moral na
mesma razão que o celeiro está para o mundo físico. Como o celeiro
guarda o alimento do corpo, o livro guarda o alimento do espírito, ou
é o depositório das ciências, das leis, da memória, dos acontecimentos,
dos usos, dos hábitos e dos costumes (Oliveira, 1874, p.361).

Sem pretender estabelecer copioso censo editorial ou declarar


título a título, autor a autor ou ainda contabilizar produção, uso e
recepção, convém nomear alguns títulos e autores, assim o rol indexado
a seguir é tão só primeira escavação em solo rico em despojos.
Nos cantos e recantos do Império, para ensinar a ler, recorre-se
às “cartas de ABC”, cartões com as letras do alfabeto, leitura e cópia
de manuscritos, cartilhas quando houver. Para “ler correntemente”,
convém relembrar: Primeira coleção de cartas para os meninos e meninas
aprenderem a ler, de Alexandre Balmat (Rio de Janeiro, 1840); Arte de
ler e de escrever em pouco tempo, ou razão filosófica da verdadeira ortografia,
desinfetada dos prejuízos da ortografia barbaresca, de Marcelino Pinto
Ribeiro Duarte (Niterói, 1842); Novas cartas para aprender a ler,
nas quais se mostra que não é necessário estudar as sílabas isoladas dos
nomes, como se ensina pelas antigas cartas, de Salvador Henrique de
50 • Carlos Monarcha

Albuquerque (Pernambuco, 1842); Plano para o ensino das primeiras


letras, aproveitando os três métodos: mútuo, individual e simultâneo, de
Antonio Gentil Ibirapitanga (Bahia, 1846); Cartilha do povo, de José
Inácio de Abreu e Lima (Pernambuco, 1849), Traslados caligráficos, de
Cirilo Delermando (Rio de Janeiro, 1854). E a muito bem divulgada
cartilha portuguesa, Método Castilho para o ensino rápido e aprazível do
ler impresso, manuscrito, e numeração e do escrever, de António Feliciano
de Castilho (Lisboa, 2ed., 1853), propagandeada no Brasil pelo autor
sob incentivo de Pedro II, com o intuito de recomendá-lo como
“método nacional de alfabetização.”

Diremos de passagem que este era o método ideado por Antonio


Feliciano de Castilho, para ensinar a leitura: “ele punha de parte
inteiramente, a relação entre o nome e o valor das letras, para dar,
como deu a cada uma, o nome de uma pessoa ou de um objeto, com os
quais organizava um “conto”, em que a graça era um meio de “fixar” e a
analogia um meio de “derivar”. A era um mandrião; B – boi, C- cortesão”
(Lições de pedagogia, do autor, 1919) (Lima, 1927, p.153, grifo do autor).

Ainda nesse gênero: Silabário brasileiro para aprender facilmente


a ler, “confeccionado por” Francisco de Paula Soares e Carlos Koeffer
(Porto Alegre, 1858), Manual explicativo do método de leitura denominado
Escola Brasileira, oferecido à classe de Professores de Primeiras Letras, de
Francisco Alves da Silva Castilho (Rio de Janeiro, 1859); Compêndio
de gramática portuguesa, por Policarpio José Dias da Cruz, “corrigido e
emendado de acordo com os Srs. professores públicos da Corte” (Rio
de Janeiro, 1860), Iris clássico, do citado Antonio Feliciano de Castilho,
dedicado “A Sua Majestade o Senhor D. Pedro Segundo, Imperador
do Brasil” e “ordenado e oferecido aos mestres e aos alunos das escolas
brasileiras”; Método facílimo para aprender a ler e escrever no mais curto
espaço de tempo possível tanto a letra redonda quanto a letra manuscrita,
de Emilio Achilles Monteverde (Lisboa, 1865); Gramática da infância
dedicada aos srs. Professores de instrução primária (Rio de Janeiro, 1864).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 51

Na modalidade “crestomatia”, ou seja, “estudo das coisas úteis”


e “recolha de excertos de autores”: Crestomatia brasileira, “adotada
pelo Conselho de Instrução Pública da Província, para uso das classes
de leitura e análise”, por Francisco de Paula Soares e Carlos Koeffer
(Porto Alegre, 1859); O livro dos meninos. Curso elementar de instrução
primária, de António Rego (Maranhão, 1864), e o singularíssimo
Livro do povo, de Antonio Marques Rodrigues, inspetor da Instrução
Pública, “conselheiro do professorado; animando a uns, admoestando
a outros, fiscalizando a todos” (Maranhão, 1861).

O Livro do povo – volume de perto de 300 páginas em tipo


compacto e intercalado de muitas gravuras – vendia-se por 400 réis e
continha os seguintes capítulos: Vida de Cristo, O vigário, Descrição
de alguns mamíferos, O bom homem Ricardo, Descrição de algumas
aves e répteis, O professor primário, Moral prática, Evangelho de
lavradores, Máximas e sentenças, Regras de higiene, Os astros, Extrato
de Simão de Nantua, Corografia do Brasil.
Não satisfeito com o preço insignificante de 400 réis, que mal dava
para cobrir as despesas da impressão, tirava Marques Rodrigues edições
especiais desse livrinho para distribuição gratuita. E assim o Livro do
povo foi o livro de leitura da infância maranhense do segundo reinado,
que quase toda ela aprendeu a ler as lições ditadas pelo espírito bom e
generoso de Antônio Marques Rodrigues (Viveiros, 1952, p.80).

Quanto à “matéria escrever correntemente”, lembrando que se


aprendia a escrever copiando e desenhando letras, recorrendo-se a
exercícios caligráficos como: bastardo, bastardinho e cursivo, ortografia,
cópia, ditado e, quando possível, à composição de períodos.
Para “contar e calcular”: Lições de aritmética, por “Um brasileiro”
(Rio de Janeiro, 1825), Compêndio aritmético ou Tabuada curiosa para
os meninos, onde se explica em diálogo os principais fundamentos da
aritmética, e outras coisas curiosas, e necessárias, de P. Plancher-Seignot
(Rio de Janeiro, 1827); Compêndio de aritmética, por Candido Batista
52 • Carlos Monarcha

de Oliveira, “para uso das nossas Escolas de instrução primária,


especialmente de ensino mútuo” (Rio de Janeiro, 1832); Compêndio de
matemáticas elementares, por Henrique Luiz de Niemeyer Bellegarde
(Rio de Janeiro, 1831); Compêndio científico para a mocidade
brasileira, “Destinado ao uso das escolas dos dois sexos, ornado de
nove estampas acomodadas as artes, e ciências de que nele se trata,
tiradas por litografia”, “por um cidadão agradecido” [pseudônimo de
José Paulo de Figueroa Nabuco de Araújo] (Rio de Janeiro, 1838);
Aritmética para meninos, contendo unicamente o que é indispensável e se
pode ensinar nas primeiras letras, de Antonio Álvares Pereira Coruja
(Rio de Janeiro, 1850).
Quanto à fruição da consciência histórico-geográfica: Resumo
da história do Brasil até 1818, “traduzido de M. Denis, corrigido e
aumentado”, por Henrique Luiz de Niemeyer Bellegarde, “adaptado
pelo governo para uso das escolas” (Rio de Janeiro, 1831), Compêndio
de geografia universal, contendo a descrição particular de todas as regiões
do mundo conhecido e com especialidade do Império do Brasil, “composto
e dedicado à mocidade brasileira, por um oficial General do Exército”,
de Jacques Antonio Marcos de Beaurepaire (Rio de Janeiro, 1835);
Compêndio de geografia elementar, de José Saturnino da Costa Pereira
(Rio de Janeiro, 1836); Compêndio das eras da província do Pará, de
Antonio Ladislau Monteiro Baena (Pará, 1838); Historia universal
resumida para uso das escolas, de Parley (pseudônimo de Daniel
Hawthorne), tradução do desembargador Lourenço José Ribeiro
(Rio de Janeiro, 1838); Introdução coreográfica à história do Brasil, por
Pedro D’Alcântara Bellegarde (Rio de Janeiro, 1840); Compêndio de
geografia, de Tomás Pompeu de Souza Brasil (Ceará, 1856); Compêndio
de geografia da Província do Rio Grande do Sul, de Eudoro Brasileiro
Berlinck (Porto Alegre, 1863).
Para conter a frouxidão da índole das gerações nascentes, formar
seres virtuosos mediante controle das pulsões e comportamentos
hostis (afinal, toda educação tem seu preço), recomenda-se a leitura
e a cópia de civilidades, a memorização de conselhos e a vivência de
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 53

máximas morais. Dentre os códigos de decoro, fenômeno expressivo


de uma ortopedia moral nascente, o bem-fadado A ciência do bom
homem Ricardo ou meios de fazer fortuna, de Benjamin Franklin (Rio de
Janeiro, 1835), sisudo repositório de conselhos contrários à vadiação. É
do autor o conhecidíssimo adágio burguês – “tempo é dinheiro”.

Mas se amais a vida, diz outra vez o bom homem Ricardo, não
desperdiceis o tempo, porque ele é o estofo da vida. Quanto tempo
não damos ao sono além do necessário? Não nos esqueçamos de
que a raposa que dorme não apanha galinhas. Se o tempo é o mais
precioso dos bens, desperdiçá-lo é o maior das loucuras, diz o bom
homem Ricardo, pois diz ele em outro lugar: o tempo perdido
não recupera, e o que nós dizemos tempo bastante sempre é pouco
(Franklin, 1825, p.4, grifo do autor).

No solo reescavado, mais ao fundo, o Fabulista da mocidade ou


fábulas seletas de Esopo, de La Fontaine, tradução de Tristão da Cunha
Portugal (Lisboa, 1837), Coleção de Fábulas (imitadas de Esopo e de La
Fontaine: dedicadas a S. M. o Imperador D. Pedro II), de Justiniano José de
Souza (Rio de Janeiro, 1852); Tesouro de meninos: obra clássica dividida
em três partes: moral, virtude, civilidade, de Pedro Blanchard, “vertida
em português e oferecida à mocidade estudiosa” por Mateus José da
Rocha (Lisboa, 16. ed. 1861); Educador da mocidade, de Alexandre J.
Melo Morais (Bahia, 1852); Guia de leitura e máximas gerais de conduta,
por Antonio Alves Branco Moniz Barreto (Rio de Janeiro, 1854).
No engrossado das civilidades: Cartas de uma americana sobre a
educação de meninas, tradução de João Cândido de Deus e Silva (Rio
de Janeiro, 1838); Noções gerais acerca da educação da mocidade brasileira,
de João Henrique Freeze (Rio de Janeiro, 1850); Tesouro de meninas ou
Diálogos entre uma sábia aia e suas discípulas, de Jeanne Marie Leprince
de Beaumont, tradução de Joaquim Inácio de Frias, do original
Magasin des enfants ou dialogues entre une sage gouvernante et plusieurs
de ses élèves de grande distinction (Lisboa, 1846, 2v.).
54 • Carlos Monarcha

Nos quais refletem e falam as meninas, segundo o gênio,


temperamento, e inclinações de cada uma; e representando-se os
defeitos da sua idade, se mostra de que modo se podem emendar.
Compreende também esta obra um compêndio da História Sagrada, da
Fábula, e da Geografia, e alguns contos morais, para entreter as meninas
agradavelmente, sendo tudo escrito em estilo simples, e proporcionado
aos seus tenros anos (Leprince de Beaumont, 1846, p.26).

Nas páginas instrutivas, outro conselho de Leprince de


Beaumont. “Primeiramente deveis pedir a Deus todas as manhãs,
e noites nas vossas orações graças para vós emendares, porque
nós não podemos nada sem o seu socorro; mas é preciso pedir-
lhe esta graça com eficácia, é como vós pedis a vossa mãe o que
mais desejais” (Leprince de Beaumont, 1846, p.46). Para propiciar
experiência cristã de vida e, claro, exaltar a aliança entre Trono
e Altar, coexistem o empenho de escolarizar as verdades do
cristianismo, cujo propósito reside na anunciação de prêmios e
castigos da vida sobrenatural: Escola brasileira, ou instrução útil a
todas as classes, extraída da Sagrada Escritura para uso da mocidade,
por José da Silva Lisboa, visconde de Cairu, “membro da Sociedade
Filosófica de Filadélfia” (Rio de Janeiro, 1827), dedicado “Ao mui
alto e poderoso senhor d. Pedro I – Imperador constitucional e
Defensor Perpétuo do Brasil”.

Sendo constante em um e outro hemisfério a porfia dos infiéis


em subverterem o Altar e o Trono, pela introdução de maus livros,
em que se desluz a Sagrada Escritura parece conveniente à firmeza
e estabilidade do Edifício Político, de que Vossa Majestade foi o
glorioso Fundador na Terra de Santa Cruz, que, para se exterminar
dela o contágio do século, se instrua e fortifique o espírito dos
meninos no Ensino de Primeiras Letras com a lição de originais
ditames dos Livros, que dão a evidência da Divina Revelação
(Lisboa, 1827, p.10).
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 55

Partilhando do princípio que assevera a religião como salvaguarda


da moralidade dos povos, vem a público Cartilha da escola brasileira
para instrução elementar na religião do Brasil, de José da Silva Lisboa,
visconde de Cairu (Rio de Janeiro, 1831).

P. Meninos, que Religião professas?


R. A Religião do Estado.
P. Que ensina esta Religião?
R. A Lei de Deus, conforme a Doutrina Evangélica e Tradição
Apostólica, interpretada e certificada pela Igreja de Roma.
P. Sois cristãos?
R. Sim, e católico pela Graça.
P. Quem é Deus?
R. É um Espírito Eterno, Poder invisível, Imenso, Criador,
Conservador, e Regedor do Universo, infinitamente Sábio e Perfeito,
Remunerador dos Bons, e Castigador dos maus (Lisboa, 1831, p.143).

Depois viriam Harmonias da criação, de Caetano Lopes de Moura


(Paris, 1846); Catecismo da doutrina cristã, do cônego Joaquim Caetano
Fernandes Pinheiro (Rio de Janeiro, 1855); Catecismo (doutrinas cristãs)
de Fleury, tradução de Joaquim José da Silveira (Rio de Janeiro, 1866)
e, por último, recendiam os evangelhos e os catecismos de Montepelier
e Fleury. Na superfície da escavação, o popularíssimo História de Simão
de Nantua ou o mercador de feiras, de Laurent Pierre de Jussieu, tradução
de Felipe Ferreira de Araújo Castro (Lisboa, 1832), seguidos de Mimo
à infância ou Manual de história sagrada para uso das crianças “Que
frequentam as aulas, tanto em Portugal como no Brasil”, por Emílio
Aquiles Monteverde (Lisboa, 1859).
Sobre a saúde fisica e moral, educação fisica, mais regras
higiênicas, as belas obras, o volumoso Tratado de educação físico-moral
dos meninos, de Joaquim Jerônimo Serpa, “extraído das obras de Mr.
Gardien, doutor em medicina” (Pernambuco, 1828), título original
Traité d’accouchemens, de maladies des feuvres, et de maladies propres a
56 • Carlos Monarcha

cetage, Generalidades acerca da educação física dos meninos, de Joaquim


Pedro de Melo (Rio de Janeiro, 1846); Relações sobre a educação física
e moral da infância, de Xavier Inácio Firmo (Rio de Janeiro, 1854); A
educação física das meninas, de Casimiro José de Morais Sarmento (Rio
de Janeiro, 1858). Por fim, o estudo memorizado da Constituição do
Império, conforme prescrição legislada, complementa o rol de leituras
recomendadas. Para formação de professores, nalguma medida recorre-
se ao Curso normal para professores de primeiras letras, subintitulado
“Direções relativas à educação física, moral e intelectual nas escolas
primárias” (Niterói, 1839).

Regulações dos compêndios

O marco inicial da regulagem da afluição de compêndios é,


certamente, o Decreto nº 1.331-A, de 17 de fevereiro de 1854, o
qual “Aprova o Regulamento para a reforma do ensino primário e
secundário da Corte”. Em conformidade com o artigo 2º, parágrafo
4º, ao Inspetor Geral compete “Rever os compêndios adotados nas
escolas públicas, corrigi-los ou fazê-los corrigir, e substituí-los, quando
for necessário”; regulação expandida no artigo 11º – “O Conselho
Diretor tomará parte em todos os negócios em que a sua intervenção é
exigida por esse Regulamento. Terá especialmente a seu cuidado: 1º –
O exame dos melhores métodos e sistemas práticos de ensino. 2º – A
designação e revisão dos compêndios na forma do Art. 4º”.
Desdobramentos desse marco inicial remetem ao Código de
Instrução Pública da província de São Paulo, 1857, elaborado por
sujeitos notáveis, Antonio Joaquim Ribas, João Dabney de Avellar
Brotero, Diogo de Mendonça Pinto, inspetor-geral da Instrução. Ao
inspetor compete “Prescrever os livros, compêndios e modelos que
devem ser adotados no ensino público, e vedar ao ensino privado os
que forem contrários à religião, à moral, ou às leis”; e proibir “qualquer
traslado, livro ou método, que não estejam completamente autorizados”.
Conforme o artigo 159, o poder público atuaria como indutor de
I. Da Assembleia Nacional Constituinte à consolidação do Império • 57

cultura, encomendando a pessoas ilustradas compêndios “adaptados


à compreensão dos alunos” para o ensino de moral, religião católica
apostólica romana, aritmética, gramática; aos autores se concederia
gratificação não excedente a 600 mil réis, revertendo-se à província a
propriedade intelectual. Na sequência, uma comissão decidiria haver
ou não a necessidade de revisar os conteúdos, depois viria a impressão
de “número avultado de exemplares, a fim de que possam ser expostos
à venda por preço módico.”
Para a instrução média, o mesmo artigo estipula gratificação não
excedente a 1:000$000 réis para autores de compêndios de geografia,
história, história natural, física, igualmente “adaptados à compreensão
dos alunos cuja propriedade ficará pertencendo à Província”. Ainda
que dispersamente, ainda que localizadamente, esses são os atos de
edição e regulação de compêndios efetuados numa conjuntura de
escolarizarão de conhecimentos.
Parte II
Do apogeu ao fim do Segundo Reinado

Pouco depois este aborrecimento legítimo teve uma distração que


acabou com ele: puseram-na escola. Era inteligente, ou, como dizia D.
Feliciana às suas amigas contando-lhes as qualidades da filha, tinha
boa memória, e fez progressos.
Ao cabo de dois anos saiu da escola sabendo o catecismo, lendo
Simão de Nantua e o Tesouro de menina e escrevendo sem muita
ortografia, com letra bonita, mas banal, do geral das obidenses.
José Veríssimo, Cenas da vida amazônica (1886)
61

No “plano inclinado” da monarquia

Brasil mental

Não há lugar aqui para expor todos os aspectos do esgotamento


da fórmula monárquica, mas tão somente assinalar os fatos
momentosos associados a sua agonia, os quais, quando reunidos,
compõem o “plano inclinado” da monarquia.24 Em poucas palavras,
tanto a forma patrimonial do Estado quanto o liberalismo estamental/
aristocrático e o regime de trabalho escravo entram em desagregação.
Nos imprevisíveis últimos decênios do regime, o inconformismo com
a ordem dinástica e a consciência dos embaraços do país abalam a
autoridade das instituições. No mais e sobretudo, desde a década de
1870, alvoroçava-se a dissintonia do regime de governo, dentre outros,
dado por incapaz de desembaraçar o povo vivente ao léu.

A maioria da população vegeta na mais triste miséria. A parte que


não vive na miséria, afetada pela solidariedade dos interesses sociais,
não está contente com a sua sorte, e debalde procura melhorá-la.
Semelhante a um carro atrelado por trás e pela frente, a sociedade
acha-se presa por forças opostas, e nesse estado penosamente ensaia
algum passo no caminho das suas aspirações. Parte do sul, do Norte,
do Centro do Império uma voz uníssona se levanta, como um grito de

24
A formulação “plano inclinado” é de Sérgio Buarque de Holanda (1960), no
estudo das disfunções da política parlamentar monárquica, entre 1870 e 1880.
62 • Carlos Monarcha

dor, e deplora a situação do país votado pela providência aos mais altos
destinos (Oliveira, 1874, p.24).

Na conjuntura, de uma parte, a negação da legitimidade do Poder


Moderador, Senado vitalício, Conselho de Estado, trabalho servil,
privilégios senhoriais, mormente recusa do trabalho escravo, regras do
exercício do voto e, é evidente, a crítica ao estado da instrução pública;
de outra, a edição das leis abolicionistas, a introdução do trabalho
livre, as ondas imigratórias, a extensão de linhas férreas, o travejar das
aspirações republicanas, os progressos econômicos do centro-sul, o
declínio econômico do Nordeste e os investimentos estrangeiros no
país. “Solto, pois o trono dos alicerces fundamentais, visceralmente
abalados pela abolição dos escravos, perigava, sobremodo, a manutenção
da realeza. E viria fatalmente o desequilíbrio econômico e financeiro
como veio a República” (Cardoso, 1924b, p.1.089).
No quadro de investimentos de energias, firmava-se a instrução
popular como tema consabido do repertório dos valores modernos,
o intuito, materializar a igualdade formal ditada em lei. “Em
verdade, o mais digno objeto das cogitações dos brasileiros é, depois
da emancipação do trabalho, a emancipação do espírito cativo da
ignorância sob o ponto de vista da própria instrução elementar (e não
falemos do estudo das ciências), nosso povo não entrou ainda na órbita
do mundo civilizado” (Tavares Bastos, 1937 [1870], p.33).
Inatual aos olhos dos anticonformistas, venturosos partidários
de soluções positivas para o Brasil social, o cânon imperial, isto é, a
ordem dinástica, estamental, patrimonial estava aquém do moderno
viver. Nesse final do Segundo Reinado com seus rituais próprios de
uma sociedade de corte, a solução monárquica aparece como passado
a caminho da extinção. Nas visões de futuro, um sistema político e
social entrara em extinção, e outro alcançara a maturidade; outro
invariavelmente explicado com recurso aos discursos analíticos e
impessoais, isto é, as teleologias imanentes e suas leis de evolução
da humanidade e do conhecimento, – a “lei dos três estados”, o
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 63

teológico, o metafísico, o positivo ou científico (Comte). Ou a “lei de


heterocronia”: mudanças evolutivas positivas pela ação do superior,
isto é, o mais desenvolvido, sobre o inferior (Spencer). Chaves de
entendimento, a teleológica visão de mundo desenrola a gramática das
formas de pensar e modos de sentir, querer e agir da humanidade.

Tendo começado por uma reação aparente contra os princípios dos


Enciclopedistas, contra as doutrinas dos terroristas de 93, nosso século
será provavelmente assinalado na história por haver feito triunfar
definitivamente na intuição geral, dos espíritos a doutrina da evolução
lenta e gradativa de todos os fenômenos econômicos, biológicos,
políticos, artísticos e sociais (Romero, 1898, p.14, grifo do autor).

Heterodoxa, a autoridade moralizante das teleológicas visões


de mundo impõe-se, e embora a motilidade das mentalidades
representacionais seja notória, a meta é consensual –, superar a imediação
da vida, desdobrar a substancialidade das teorias construtivistas
de Estado, vida coletiva e melhoramentos materiais. Socialmente
heterogênea, no decênio de 1870, adentravam na conjuntura político-
cultural, simultaneamente anticlerical, antirromântica, antimetafísica,
as fileiras de sectários alistados nos torrenciais sistemas de pensamento
científico, sistemas próprios de uma época que se via rica de tesouros da
ciência e técnica. “Foi o Século XIX, pois, que nos deu o conhecimento
total e completo do nosso planeta, quer no passado, quer no presente.
Tudo o que possa fazer de futuro, e sob este aspecto pouco será, está
nele em germe. E é quase certo que novas descobertas no domínio
da erudição ou da geografia, em nada alterarão o nosso quase cabal
conhecimento dele” (Veríssimo, 1981 [1899], p.120).
Nos enunciados da “geração de 1870”, a percepção de um
tempo social imóvel, de um passado que não quer passar, ou se se
preferir do esgotamento de experiências malsucedidas ou inatuais,
patenteiam os benefícios da instrução. Na cena da Corte, nas cenas
provinciais, cativantes, acotovelavam-se lidadores, libelistas, ativistas,
64 • Carlos Monarcha

doutrinários, todos a compendiar o corpo e a alma do Brasil,


sobretudo, os modos de pensar e os usos das políticas nacionais.
Numa eflorescência de ações contenciosas, tomam lugar na hierarquia
do sistema intelectual as figuras de Aarão Reis, Alberto Salles,
Américo Braziliense, Antonio da Silva Jardim, Benjamin Constant,
Godofredo Furtado, Joaquim Nabuco, José Feliciano de Oliveira,
José Veríssimo, Júlio de Mesquita, Lauro Muller, Lauro Sodré, Lopes
Trovão, Miguel Lemos, Miranda Azevedo, Muniz Barreto, Luiz
Pereira Barreto, Prudente José de Morais Barros, Quintino Bocaiúva,
Raimundo Teixeira Mendes, Rangel Pestana, Silvio Romero, Tobias
Barreto, para mencionar alguns poucos.
Em termos ideal-típicos, ainda que fracionada e heterogênea,
na “geração de 1870”, o campo intelectual douto se funde com as
doutrinas de uso político, muitos se inclinam ao republicanismo
liberal-federalista, outros ao republicanismo positivista-ditatorial,
outros mais, ao jacobinismo. Da recusa aos dogmas turvados da
tradição, desprendem-se propósitos de intervenção teórico-ativa.
Para a “geração de 1870”, segundo usual formulação acadêmica25, a
inteligibilidade da mecânica do mundo e seus fenômenos não repousam
nas revelações transcendentais da fé religiosa, cujo passado mítico
se perdera ou da filosofia espiritualista e eclética ou por ventura da
burocrática orientação liberal, mas na atualidade da ciência organizada
em sistemas de pensamento. Nas dogmáticas de teor indutivo inerente
às doutrinas iniciáticas, a realidade sensível e seus objetos desfrutam de
transparência e incolumidade..

25
Na tradição historiográfica, ver Cruz Costa (1950) e Lins (1967). Revisão
do tema “geração de 1870” consta em Alonso (2002, p.32), segundo a autora:
“Categorias como ‘darwinismo’, ‘positivismo’, ‘spencerismo’, ‘liberalismo’
sofreram apropriações, redefinições, usos políticos. Isso é evidente nas polêmicas
entre facções: termos como ‘positivistas laffitistas’ e ‘littreístas’, ‘darwinistas’
e ‘spencerianos’, ‘liberais’ e ‘conservadores’ foram criados nas controvérsias.
As categorias são contrastivas, exprimem relações entre grupos: a própria
nomeação é uma arma em meio a conflitos de definição de identidades.”
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 65

A essa geração de ânimo alteado, nela processava-se a


intelectualização dos processos conflitivos (e emocionais) – bacharéis,
escritores, juristas, médicos, militares, políticos, professores, em suma,
mestres-pensadores contemporâneos não só dos êxitos das ciências
convertidos em técnicas aplicadas, mas também das tempestades
sociais –, coube impulsionar a analítica dos descaminhos da fórmula
monárquica e, nalguma medida, suportar o afluxo das campanhas
abolicionistas e republicanas. Transluzidas, as escolhas cientistas não
se reduzem às modas intelectuais do momento ou a entusiasmos
doutrinários passageiros, ao contrário, alicerçam projetos de intervenção
na vida cultural e política. De sorte que as filosofias sociais caudatárias
do “espírito do século XIX”, o materialismo de Taine, o transformismo
de Lamarck e Darwin, o evolucionismo biológico de Spencer, a teoria
filogenética de Haeckel, o positivismo de Comte, com vivo sentimento,
exteriorizam as profundidades das novíssimas teorias societárias para
as quais homens e coisas inteligíveis são objetos cognoscíveis na sua
totalidade. Escreve Euclides da Cunha (1975 [1909], p.196-197).

As novas correntes, forças conjugadas de todos os princípios e de


todas as escolas – do comtismo ortodoxo ao positivismo desafogado de
Littré, das conclusões restritas de Darwin às generalizações ousadas de
Spencer –, o que nos trouxeram, de fato, não foram os seus princípios
abstratos, ou leis incompreensíveis à grande maioria, mas as grandes
conquistas liberais do nosso século; e estas compondo-se com uma
aspiração antiga e não encontrando entre nós arraigadas tradições
monárquicas, removeram, naturalmente, sem ruído – no espaço de
uma manhã – um trono que encontraram.

Da primazia concedida à língua cientista, deflui a homologia


entre evolução e progresso, experiência social e melhoramento
material. Com o fito de clarear o destino social da política
moderna, exorbita-se a crítica moral, donde a difusão da analítica
das relações entre meio natural, raça, cultura e instituições.
66 • Carlos Monarcha

Ciência e procedimentos de observação levariam a descoberta


de objetividades pré-existentes à consciência dos sujeitos, isto é,
para tais ideologias científicas, nos objetos reside a verdade, que a
seu turno dirige pensamentos, convicções e sentidos dos homens.
Para lidadores, libelistas, ativistas, doutrinários, a língua cientista
substitui o Deus da religião, justo e reto, pela Razão esclarecida
e ativa, ou se preferir, substitui a luz reveladora da fé, pela luz da
ciência falante da língua do amanhã.

Na praça de guerra, hinos à claridade

É tempo de saltar da boca dos heróis


O hino da vitória:
Os Novos Ideais, brilhantes como sóis
Surgem... são visões fantásticas da glória!

Dois atletas estão lutando em agonia:


A Treva com a Luz... a Noite com o Dia.
De um lado – a Ignorância, o pavoroso abutre
Que rasga o próprio seio e com seu sangue nutre
Os filhos do furor, do desespero insano
Que chama-se miséria – o grande Pelicano!...

Doutro lado a Instrução, a boa mãe, que ensina


O caminho da Escola, as portas da Oficina,
Aos filhos varonis, que a trabalhar sem susto,
Seguem para o futuro, alegres e robustos.

Não tarda a começar a Liberdade a Missa


No templo da Razão:
Vai-se desenvolver o tema da Justiça,
À luz da Nova Ideia, ao sol – Revolução!...
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 67

Mais do que simples curiosidade ou demonstração de apreço ao


gênio do autor dessas poéticas e viris efusões, cujo lirismo doutrinário,
desnecessário dizer, enche os olhos e fere os ouvidos. “Novos ideais”,
de Múcio Teixeira (1880, p.35), estetiza os sobrepoderes da instrução
capazes de mover o “espírito brasileiro” em direção à luz do século.
Figurando a si como homens da civilização do momento, os críticos de um
passado histórico indébito anunciam a passagem dos obscurecimentos
aos renascimentos. Para eles, a crise não era senão entrechoques de
movimentos e de mentalidades. “Dois atletas estão lutando em agonia.
A Treva com a Luz... a Noite com o Dia”, nos termos de Múcio Teixeira
ou nos termos não menos sonoros de Luiz Pereira Barreto. “O mundo
antigo é um tecido de milagres, e o milagre é a negação das leis naturais;
o mundo moderno é o filho da ciência, e a ciência nada mais é que
a sistematização das leis naturais. A incompatibilidade é completa
e irremediável entre a tradição e a noção científica. Toda a tentativa,
por consequência, de aquartelar na mesma cabeça o mundo antigo e
o mundo moderno é uma desnaturada.” Nas palavras desse mestre-
pensador, diplomado em ciências naturais e medicina pela Universidade
de Bruxelas, convicto positivista, ainda que heterodoxo.

Ao tratar-se, pois, da questão da instrução e da educação, o


problema, que temos a resolver, é da distinção entre os elementos vivos
e os elementos mortos do organismo social. Trata-se na realidade de
saber se os elementos psíquicos que já se desintegraram da economia
mental, terão a preferência da conservação sobre os elementos vivos, ou
se estes deverão ter a exclusiva supremacia na direção teórica e prática
do movimento social. Temos de um lado partes vivas e funções ativas;
de outro, partes mortas, envolvidas no silêncio da inércia (Pereira
Barreto in Barros, 2003, p.364).

É de se supor que os malditosos índices de analfabetismo geral,


fenômeno propagador da escuridão, senão maculador do Brasil social,
constituíssem a fonte dos elogios à vara mágica da instrução, apetitiva
68 • Carlos Monarcha

matéria, cuja contrapartida lógica propicia a troca dos juízos e noções


ilusórias pelo entendimento objetivo. Donde, mais do que antes, a urgência
de uma primeira instrução de Estado ajustada às normas da vida civil,
distribuída como serviço gratuito e obrigatório, porquanto propriedade
comum, pois toda educação, dizia-se, é educação para as normas da
vida civil. Nesse quadro de valores e críticas, o republicanismo educativo
arma-se para enfrentar o contencioso que há de vir. “E nesta crença que
julgamos de máximo alcance a educação pública, gérmen da regeneração
do país uma sólida base onde se firmará uma nova ordem de coisas nascida
do progresso e consciência da nação, quando convencida da esterilidade do
primeiro e segundo império” (Braziliense, 1878, p.85).
Agitava-se a equação formulada pelos sujeitos do republicanismo
federalista:centralização=desmembramento,descentralização=unidade.
Na revisão geral do país, em substituição ao centralismo monárquico,
cogitam-se as qualidades do liberalismo localista como apregoa o
Manifesto Republicano de 1870. “Somos da América, e queremos
ser americanos. A nossa forma de governo é, em sua essência e em
sua prática, autônoma e hostil ao direito e aos interesses dos estados
americanos”. Doutrina forte e falante, o republicanismo engendra
o ativismo político nos setores médios urbanos e cafeicultores do
Sudeste. No programa de atualização das estruturas, o desmerecimento
do Trono e do Altar redunda na valoração das teorias contratualistas, o
país seria livre para transformar-se por vontade própria. Solidamente
distribuída, grande benefício em si, a instrução popular, “arredando
os perigos das comoções sociais”, constituiria a “base mais sólida das
sociedades civis”, “necessidade urgente dos povos regidos pelo sistema
constitucional”, no dizer arroubado de um figurão da época.

Retração dos direitos, o fosso civil aumenta

Excluam o homem da participação na soberania popular,


e a liberdade ou a igualdade deixarão de ser um direito para ele, e
se tornarão em mera concessão e tolerância de uma tirania mais
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 69

ou menos generosa. Inexplicável aberração! Pugnam pelo sistema


representativo, e o destroem; querem a eleição popular, e excluem dela
o povo; apreciam os movimentos generosos da multidão, e põem à
margem essa mesma multidão de cujos entusiasmos tudo confiam
(Alencar, 1997 [1868], p.85).

Asseverava José de Alencar, em Sistema representativo.26 Expressão


bem-acabada do indianismo oitocentista, sem o saber, o autor de O
guarani futurava o que de fato viria a acontecer. De maioria liberal, a
Câmara dos Deputados aprovava em janeiro de 1881 a Lei nº 3.029. A
reforma da legislação eleitoral visa a converter o voto em algo aceitável,
entrementes, note-se, não constam referências às defraudações habituais
praticadas por coronéis e seus agentes, os emboladores, os calígrafos
e os cabalistas. Nos discursos intermináveis, nas incontáveis sessões
parlamentares, predominam os sorites: instrução bem difundida=boas
eleições=democracia=bom regime representativo.
Após debates intensos, aprovava-se a “Lei Saraiva” (ou “Lei do
Censo”), em referência ao idealizador do projeto conselheiro José
Antonio Saraiva a sua vez secundado pelo deputado Rui Barbosa. Com
efeito, a Lei Saraiva altera substancialmente as regras de representação
política ao instituir eleições diretas para todos os cargos, extinguir a
distinção entre votantes e eleitores, introduzir o voto facultativo para
senadores, deputados gerais e provinciais e o “censo pecuniário”, ou
seja, para alistar-se como eleitor, a pessoa comprovaria renda anual de
400 mil réis, atestada por terceiros.
À Lei Saraiva acresceu-se o “censo literário”, os novos eleitores
comprovariam ser alfabetizados (com isso inviabiliza-se o alistamento
dos libertos). Por conseguinte, reduziu-se drasticamente o alistamento
eleitoral.27 Conforme o levantamento da diretoria-geral de Estatística,
em 1874, a “população eleitoral” totalizava 1.114.066 indivíduos, ou
seja, 11% da população total e 13% da população livre, aprovada a

26
Cf. Alencar (1997 [1868], p.83 et seq.).
27
Cf. Carvalho (2011, 2012).
70 • Carlos Monarcha

Lei Saraiva, “população eleitoral” caia para 145.296.28 “E a situação


não mudará apreciavelmente nos 40 anos que se seguirem à queda
do regime” (Buarque de Holanda, 1948 [1936], p.84). Para aquela
que seria a última participação do Brasil nas exposições universais do
século XIX, a de Paris, alusiva ao centenário da Revolução Francesa e
à inauguração da Torre Eiffel, o barão de Santa-Anna Nery, Frederico
José de Santa-Anna Nery, autor do Le pays des amazones, rasgado
elogio ao maravilhoso da região norte do país, organizara Le Brésil
en 1889, volumoso relato dos progressos materiais e espirituais do
Segundo Reinado. Recordativo, esse dublê de jornalista e aristocrata
vazava o contraditório.

Eleitorado. O Império do Brasil está dividido em 125 distritos


eleitorais, que elegem 125 representantes temporários (deputados
eleitos para 4 anos), 60 representantes vitalícios (senadores) e 641
membros das assembleias provinciais (eleitos por dois anos).
Esses 125 distritos compreendem 20 províncias e 892 municípios,
com 330 cidades, 562 burgos (vilas) e 1.886 paróquias.
Até a revisão de 1887, o número de eleitores no Brasil era de mais
ou menos 220.000, numa proporção de 1,5 para cada 100 habitantes
da população total. Trata-se de um dos menores eleitorados que se
conhece (Santa-Anna Nery, 1889, p.202).

Como é visto, o constitucionalismo exigia a representação


legitimada pelo voto, conquanto no dia a dia se desconhecesse em
extensão e profundidade o seu livre exercício. Numa palavra, a Lei
Saraiva não amplia os direitos, mas os restringe. Sujeito adverso aos
ditames da reforma eleitoral, o deputado José Bonifácio de Andrada
e Silva, o moço, em discurso memorável proferido em 28 de maio
de 1879, discurso maiêutico que adentrará nos anais do parlamento
brasileiro, tempesteava.

28
Cf. Nicolau (2012).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 71

Saber ler e escrever é a questão pela questão. Como se define


essa quantidade certa? Em quê a leitura e a escrita por si só afirmam
os conhecimentos necessários para votar? Forçar a instrução se
necessário, ou disseminá-la para que todos cheguem, compreende-se,
mas esquecê-la, excluir em nome da Democracia a massa do povo, é
de um liberalismo, que em honra dos nossos maiores, não conheceu a
Constituição do Império (Andrada e Silva, 1879, p.435).

Malcontente, José Bonifácio exteriorizava sonoro anátema.


“Neste país a pirâmide do poder assenta sobre o vértice, em vez de
assentar sobre a base”.
73

Duas figuras de reformadores

Se aceitarmos os documentários compilados por Primitivo


Moacyr A instrução e o império: reformas do ensino e A instrução e o
império: subsídios para a história da educação no Brasil, poder-se-ia
dizer que, no Segundo Reinado, não escassearam iniciativas dos
estadistas da monarquia. Nas compilações, Moacyr arrola projetos,
regimentos e regulamentos elaborados pela ronda de conselheiros de
Estado, ministros do Império, presidentes de províncias, senadores,
deputados gerais e provinciais, bem como de marqueses, barões,
duques, condes e viscondes.29
Num tratado memorável, pleno de dados e comentários
finos, A instrução pública no Brasil, Liberato Barroso, ex-ministro
e secretário de Estado dos Negócios do Império, ao minutar o
ensino primário, secundário, superior, profissional, militar, declinava
números restritivos: matrícula escolar geral, 107.500 de alunos, numa
população livre de 8.830.000.

29
“A multiplicação de projetos de reforma do ensino coincide com as duas
últimas décadas do regime imperial e, através deles, podemos observar a
intensificação das preocupações com o problema educativo em fase das
transformações que vinha sofrendo a sociedade brasileira, bem como, a
influência das ideias liberais em geral e suas consequências com respeito às
ideias educativas” (Paiva, 1973, p.71).
74 • Carlos Monarcha

As Assembleias Provinciais não têm curado dos importantes


interesses da instrução pública: o ensino oficial oferece ainda esse
espetáculo de anomalia e desordem que assusta os espíritos mais
intrépidos e porque nele contemplam o descalabro e a ruína moral do
país. Tem sido contestada a necessidade da intervenção do Estado no
ensino e instrução popular. A seita dos economistas, que seguem à risca
o princípio do laissez faire, laissez passer, e os católicos retrógrados, que
pretendem entregar o ensino à direção exclusiva da Igreja, a combatem
(Liberato Barroso, 1867, p.59-64).

Se na base material do Segundo Reinado coexistiam a estrutura


de latifúndio e a exploração do trabalho servil ou prevalecem os
costumes patriarcais, ou ainda se a formação intelectual das elites
fosse o alvo prioritário, é inegável que nalguma medida a instrução
evoluíra nas dimensões teóricas e práticas. No período assiste-se
a um conjunto significativo de planos de reforma da instrução na
Corte e nas províncias, neles, quase toda força propositiva, quase
todo ímpeto legislador, quase todo trabalho de imaginação dirigem-
se à instrução elementar. Enfim, sem forçar a nota em demasia, é
lícito supor que os belos planos apregoados na sala de leilões de
ideias fustigassem a imaginação dos homens do reino. Na galeria,
há uma série de planos, alguns com os usuais artifícios da retórica
política, outros determinados a estatuir o grão de conhecimento a
ser dado à prole do povo. Planos que, ao partilharem de um léxico
comum, neles pressentem-se afinidades, levam à compreensão de
que, para além do ler-escrever-contar, coexistia o afã de instituir
a escola societária destinada revelar os méritos individuais pelo
cultivo das faculdades naturais (é demasiado dizer que o elogio
da instrução, como fato e valor, funcionasse como metáfora
sublimadora da sociedade real?).
Nos belos planos, a consciência de antecipação do futuro anuncia
a inevitabilidade da reforma da instrução. Os ares do tempo, falava-se,
haviam trazido nas suas asas um estado social particular animado por
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 75

outras atitudes e sentimentos. Nesses planos fiéis à causa social, há


exalação de fluidos humanitaristas: a meta fazer da instrução popular
propriedade comum.
Por exemplo, quer por desvelo aos interesses sociais quer pelos
progressos das luzes, Tavares Bastos, em palavras inspiradas, incitava
a extensão da instrução e sua obrigatoriedade com recurso a um
imposto justificado como auxílio moral para anular a “ignorância e a
rudeza do povo”. Cauteloso, não quer ferir o princípio constitucional
da gratuidade, a “taxa escolar” não incidiria no ato da matrícula,
o meio seria outro, as províncias adicionariam um percentual aos
impostos diretos. A arrecadação custearia salários, aposentadorias
de professores e seus adjuntos, aluguéis de casas, onde inexistissem
prédios escolares, assistência aos meninos indigentes, elaboração
de compêndios “acomodados aos métodos”, criação de bibliotecas
populares, cursos noturnos para adultos e escolas normais. De olho
nos sistemas escolares estadunidenses e seus teóricos, em particular,
Horace Man predicava. “Não são escolas elementares do abc, como as
atuais, que recomendamos às províncias. O sistema que imaginamos,
é muito mais vasto.”

É ensino primário completo como nos Estados Unidos, único


suficiente para dar aos filhos do povo uma educação que todos permita
abraçar qualquer profissão, e prepare para o altos estudos científicos
aqueles que puderem frequentá-los. Dispam-se de prejuízos europeus
os reformadores brasileiros: imitemos a América. A Escola moderna,
a escola sem espírito de seita, a escola comum, a escola mista, a escola
livre, é a obra original da democracia do Novo Mundo (Tavares Bastos,
1937 [1870], p.233).

Sintomático desejo, melhor ainda, aspiração falante, desde o


decênio de 1870 reclamavam-se planos para a educação popular
organizada em associação nacional. Pela exemplaridade, convém
relembrar Instrução pública e educação nacional, de Joaquim Inácio
76 • Carlos Monarcha

Silveira da Mota; Educação nacional, de Afonso Herculano Lima;


Questões relativas à educação nacional, de Joaquim Teixeira de Macedo
e O ensino primário e secundário em um “Plano Nacional de Ensino”, de
Antonio Cândido Leitão. Como é de se notar, o qualificativo “nacional”
volta a colorir a retórica dos escritos de cultura política.
Nas cogitações, a notificação de reforma forra os títulos dos
relatórios oficiais, projetos de leis e estudos tais como: Projeto de reforma
da instrução na Bahia, de Antonio Ferrão Muniz; O ensino público
primário, de Manuel José Pereira Frazão; Reforma do ensino primário:
parecer e projeto, de Januário da Cunha Barbosa; Estudo sobre o ensino
público, de Aprígio Justiniano da Silva Guimarães; A instrução pública
em Minas Gerais, de Alcides Catão da Rocha Medrado; Ideias sobre a
instrução primária e secundária, de Afonso Celso de Assis Figueiredo;
Colonização e ensino popular, de Guilherme Francisco Cruz; Ensino
primário, de César Augusto Viana de Lima; O Brasil para a instrução
primária, de Alberto Brandão.
Na cultura política, firmava-se o ideal de uma escola societária
sustentada nacionalmente pelos poderes públicos. Sem incorrer no
risco de efetuar ultraleitura ou sobressignificar fontes textuais, é licito
supor que, na série de planos encaixilhados em ideias esclarecidas,
destacam-se as figuras de Carlos Leôncio de Carvalho e Rui Barbosa.
De iniciativa de Leôncio de Carvalho, ministro de Estado dos
Negócios do Império no gabinete liberal de 1878, o Decreto de nº
7.247, de 19 de abril de 1879, do qual muito se disse e se continuará a
dizer, reforma o ensino primário e secundário no município da Corte
e o superior em todo o Império. Nas palavras de um contemporâneo,
“liberal com assomos de republicano”, Leôncio de Carvalho, bacharel
em Direito pela academia de São Paulo, nela viria a ser professor
catedrático, e deputado pela mesma província, na legislatura de 1881.
A decretação da reforma ocorre em meio às vagas liberais encabeçadas
por dissidentes, clamava-se pela limitação dos poderes do Conselho
de Estado, garantia de liberdade de consciência, ensino livre, livre-
concorrência no comércio e indústria e autonomia provincial.
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 77

Sancionado ad referendum do Poder Legislativo, o Decreto nº 7.247


estipula o ensino livre. “Art. 1º – É completamente livre o ensino
primário e o secundário no município da Corte e o superior em todo
o Império, salvo a inspeção necessária para garantir as condições de
moralidade e higiene.”
No nível superior, o ensino livre redundava na desobrigação de
frequência ao mesmo tempo em que eximia a interferência do Estado,
na criação de faculdades e recrutamento de professores.30 Dentre as
disposições complementares, a obrigatoriedade da instrução elementar,
organização escolar em 1º e 2º graus, dispensa dos acatólicos das aulas
de religião, coeducação até a idade de dez anos, jardins de infância,
contrato de professores ambulantes “à moda sueca” e ensino normal.
Em conformidade com os ares do tempo, revogava-se a proibição da
matrícula de escravos. Encaminhadas à Câmara como fato consumado,
as medidas são bem aceitas pela imprensa liberal e setores estudantis.31
Nas escolas de 1º e 2º graus, no modo de “noções” e “princípios
elementares” com recurso aos métodos intuitivos, ensinar-se-iam
conteúdos de gramática, história, geografia, moral, organização
política, aritmética, álgebra, geometria, sistema de pesos e medidas,
física, química e história natural, noções e princípios completados
com o ensino dos deveres do homem e cidadão, economia social e
doméstica, lavoura e horticultura e prática de oficio para meninos.
Como bem explica a historiografia acadêmica, a queda do Gabinete
Sinimbu precipita a demissão de Carlos Leôncio de Carvalho, com
isso inviabilizava-se a apreciação do decreto por parte da Comissão
de Instrução Pública, de modo que vingam tão somente as medidas
da alçada do Executivo consubstanciadas no Aviso de 21 de abril de

30
Em 1868, Felício dos Santos encaminha à Assembleia Geral projeto favorável
à liberdade de ensino: “A partir de então, o movimento favorável à liberdade
de ensino iniciado nas províncias e até então quase que exclusivamente
baseado em considerações de natureza prática encontra decisivo apoio nas
ideias liberais que se radicalizam e nos princípios positivistas que difundem
celeremente, conquistando definitivamente os espíritos” (Haidar, 1972, p.72).
31
Cf. Buarque de Holanda (1960).
78 • Carlos Monarcha

1879, a saber, faculdades livres, desobrigação de frequência, liberdade


de exames, livre-docência, suspensão do juramento de catolicidade,
vale dizer, o Estado e suas instituições se eximiam de julgar métodos
e doutrinas, ademais inovava ao conceder “a liberdade e o direito de a
mulher frequentar os cursos das faculdades e obter título acadêmico”.32
Tais medidas guardariam vigência até a reforma conduzida por
Benjamin Constant Botelho de Magalhães, no governo provisório
republicano. Na década de 1890, o já citado barão de Loreto renderia
tributos à monarquia. “A reforma esboçada nesse ato reúne em si
traços notáveis de uma constituição liberal do ensino público, e está,
em geral, na altura das maiores verdades e das mais inteligentes
aspirações contemporâneas” (Dória, 1899, p.20). E não será de todo
desnecessário retornar ao ajuizamento expresso na Notícia histórica
dos serviços, instituições e estabelecimentos pertencentes a esta repartição,
publicada por ordem do ministro Amaro Cavalcanti. “A reforma veio
iniciar no país uma fase de progresso e preparo do terreno à adoção
de ideias sobre o ensino principalmente nas escolas primárias, que
deviam frutificar mais tarde” (Brasil, 1898a, p.64). Mas, antes disso,
com veemência e erudição sensíveis, Leôncio de Carvalho voltaria à
carga na “Seção filosófica” do relatório Primeira Exposição Pedagógica,
conforme Sacramento Blake. “É um grosso volume em que o Dr.
Leôncio, numa introdução de 259 páginas, trata dos fatos mais notáveis
da exposição e mostra, com o estudo das legislações e dos pareceres aí
exibidos, quais os princípios geralmente adotados na organização do
ensino primário” (Sacramento Blake, 1883-1902, p.82-83). De fato,
num longo exórdio liberal e liberalizante, o ex-ministro querelava
ponto a ponto as restrições ao seu plano reformador, as quais, como
se sabe, estão na origem dos sempiternos pareceres ruianos. E ainda
que os belos planos e a profusão de ações inovassem, na Corte, centro
da grande política, normas de bom-tom no vestir e falar e das vogas
científico-literárias, numa palavra, lugar de condensação da vida civil
ilustrada, nela habitava uma população de 50% de analfabetos.

32
Cf. Briquet (1946, 1949).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 79

Momento Rui

Por último, convém deter-se nos pareceres da Comissão de


Instrução Pública da Câmara dos Deputados, composta pelos
deputados Rui Barbosa, relator, Tomás do Bomfim Espínola e Ulisses
Machado Pereira Viana, encaminhados como substitutivos ao Decreto
nº 7.247. “É um trabalho do longo fôlego devido à pena do Dr. Rui
somente”, comentava Sacramento Blake. Entalhados com erudição
científica e retórica política invejáveis, Reforma do ensino primário e
várias instituições complementares da Instrução Pública e Reforma do
ensino secundário e superior são escritos sociais ímpares; em ambos,
exterioriza-se a instrução como fundamento da vida viva (e da vara do
poder). “Se quereis, pois, cimentar a ordem necessária das sociedades
em classes estáveis, é na escola que as deveis lançar” (Barbosa, 1947
[1882], p.53). Fulgurantes, esses escritos denotam um estadista
arrebatado pelas coisas do ensino. Pré-cognição do amanhã, os
pareceres clareiam um porvir anticlerical e científico para a instrução
popular (e a cultura nacional). Ostentosos, neles a imaginação do
tribuno faísca ao prescrever modalidades de ensino concatenadas
em nível elementar, médio e superior, facundos, endereçam reflexões
consoantes às verdades das recém-surgidas ciências do homem.
O parecer sobre ensino primário e normal remói as implicações
científicas, políticas e filosóficas, ao mesmo tempo em que remói os
programas de matérias e processos de ensino em suas profundidades
teóricas. Propugnador, sobre isso não há dúvidas, o parecer bate-se pela
criação de um ministério de Instrução Pública, Museu Pedagógico
Nacional, Fundo Escolar, com receita vinculada à arrecadação,
recenseamento anual da população em idade escolar, e frequência
obrigatória no Município Neutro. Palmo por palmo, o jurista
descortina os cenários educacionais da França, Inglaterra, Alemanha
e Estados Unidos. Propositivo, esmiúça um nunca-acabar de aspectos
vitais: mobiliário escolar, efetivos das classes, horários, métodos,
construções escolares, higiene da visão, educação moral, física e
80 • Carlos Monarcha

sanitária, metodologia da linguagem, aritmética, geografia, história,


ciências físicas e naturais, desenho, música, metodologia do “Jardim de
Crianças” e técnicas de aferição do rendimento escolar.
Na apreciação de diferentes sujeitos, de diferentes épocas, os
pareceres transparecem um pensador liberal contrário à abstenção do
Estado na esfera social. Acolhidos como repositórios de obstinada
presciência do amanhã, nas décadas seguintes, as idealidades ruianas
constituiram referências vivas para Benjamim Constant, Vicente Licínio
Cardoso, Azevedo Sodré, Afrânio Peixoto, Lourenço Filho e tantos mais.
Em síntese e sobremodo, igualmente a outros sujeitos cosmopolitas e
cidadãos, o pensamento liberal-social de Rui Barbosa, um estadista da
monarquia, manifesta uma doutrina de invertidos sinais: não é a defesa
do indivíduo contra o poder despótico, tal como no entendimento
iluminista, mas projeto civilizador num país inculto (e bárbaro), donde
a tendência de pelo Alto reformar o Baixo e arrastá-lo para a civilização
política consubstanciada em pacto social. “A nosso ver a chave misteriosa
das desgraças, que nos afligem, é esta, e só esta: a ignorância popular,
mãe da servilidade e da miséria. Eis a grande ameaça contra a existência
constitucional e livre da nação; eis o formidável inimigo, o inimigo
intestino, que se asila nas entranhas do país” (1947 [1882], p.47). E,
porventura, não será de todo inoportuno retornar à severidade cortante
de Vicente Licínio Cardoso (1927, p.1.075, grifo do autor).

Não esqueci Rui Barbosa. Apenas o seu procedimento me parece


de todo inexplicável. Aquele relatório de 1882 é de fato monumental:
modelar nas medidas sugeridas; admirável na oportunidade do
diagnóstico; opulento no propósito dos alvitres propostos. Quem
esquece o relatório foi o Rui republicano, o tribuno, o jornalista, o
político, o colaborador robusto da Constituinte, o senador de três
décadas republicanas, o candidato várias vezes à presidência da
República. Foi ele próprio quem nunca mais falou naquele seu
programa magistral, molde oracular em que podia ter sido vasto o
idealismo orgânico da República.
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 81

Na série de planos anunciados na sala de leilões de ideias


sociais, belo objeto, a instrução popular não é apregoada como tema
contingencialmente político, mas sim constitutivamente.
83

Ao sol da ciência

Fundar a educação nas ciências do homem

Um dos aspectos chamativos da cultura intelectual do Segundo


Reinado refere-se à importância atribuída às ciências do homem,
no estudo do fato educativo. Isso numa época sobre-excitada pelas
invenções mecânicas e domínio da natureza pela inteligência técnica. No
campo intelectual, expande-se a orientação utilitarista e antimetafísica,
sobrevalorada, a ciência do útil dá o tom nos debates sobre os rumos
futuros do país. Frutíferas, as recentes verdades da antropologia
física, fisiologia, biologia, psicologia estimulam o armamento da
pedagogia prática com as teorias endossadas pela indução, observação
e experimentação. O clima mental de renovação e de contrastes acentua
as manifestações a favor da vinculação do ensino aos sistemas de
pensamento científico; ou por outra, o tempo da ciência, até então dado
por incógnito, fazia a sua aparição. “Não pode haver dúvida: podendo
e devendo apoiar-se hoje em princípios científicos, a educação entrou
também na sua fase positiva” (Veríssimo, 1901, p.67). No intento de dar
uso inteligível à cultivação das novas gerações, efetiva-se o duplo sentido
de educação quer como processo quer como resultado.
Direta ou indiretamente, os evolucionismos moldam as análises
caldeadas nas sínteses dos progressos da educação na história da
humanidade e, por ventura, do conhecimento. Acompanhemos
José Afonso de Paula e Costa, professor primário na província
de São Paulo, autor da Dissertação pedagógica: ligeiro estudo sobre
84 • Carlos Monarcha

a arte da leitura, manuscrito apresentado à comissão examinadora


da Escola Normal de São Paulo, presidida por Antonio Carlos
Ribeiro de Andrada Machado e Silva. Em acelerada rotação de
palavras, o professor desembaralhava as mentalidades temporais,
ao situá-las em ordem de sucessão, assertivo escandia à aventura do
autodesenvolvimento humano.

A educação varia com o tempo, porque está subordinada ao


conjunto de ideias que dominam uma época. Assim, ela tem o cunho
do sistema filosófico predominante; e como cada época deteve sua
doutrina especial, sua forma de religião, a educação em cada uma
dessas épocas era feita sob modo diverso, mas consentâneo com as
ideias gerais, políticas e religiosas de então.
Na época fetichista, que é comum a todos os povos, a educação
dirigia-se a atividade; na politeica, representada pela Grécia, ocupava-
se da inteligência; na monoteica, especialmente sob a influência do
catolicismo, cuidara do sentimento; e finalmente na época positivista,
que é a época normal, a educação há de abranger três partes: será física,
intelectual e moral.
A estes dois últimos períodos interpõe-se a transição
revolucionária que hoje nos assola, e na qual a educação – como tudo
o mais – é anárquico e dissolvente. São ainda os restos dos resultados
negativos da Revolução Francesa, dessa grande crise, a qual devemos
o aniquilamento do regime antigo – a teologia e a guerra – e o
levantamento gradual do novo regime caracterizado pela Ciência e
pelo Trabalho (Costa, 1884, p.2-3, grifo do autor).

Operador dos métodos de ensino dignos de ciência, isto é, em


correspondência com os sistemas filosóficos do momento, José Afonso
de Paula e Costa, ao dissertar sobre a questão “Qual método de leitura
é verdadeiramente científico?”, encadeava argumentos a favor da
palavração, “estado definitivo” dos métodos de aquisição da leitura e
escrita, como bem quisera João de Deus, em Cartilha maternal.
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 85

Sínteses cientistas análogas, suportadas na concepção de etapas


causalmente ordenadas, constam em Dissertação pedagógica que para
obter diploma de professor normalista apresentou em janeiro de 1884, de
Antonio Victor Macedo, e em Educação física:  dissertação pedagógica
apresentada à Escola Normal de S. Paulo em dezembro de 1883, de João
Batista Freitas. Em meio à realidade trêfega, generaliza-se a demanda
por uma instrução esteada na ossatura da ciência, de pronto imune
à arbitrariedade, de pronto em sintonia com a marcha do espírito
humano, porquanto a favor de uma pedagogia do interesse, do concreto,
da observação, da atividade, da intuição, porquanto em harmonia com
a fisiologia do organismo, logo habilitada a remover os obstáculos ao
desenvolvimento natural das aptidões.
Nas primeiras linhas dessa trincheira inquieta a favor dos
benefícios coletivos proporcionados pela instrução imbuída de ciência,
abriga-se Abílio César Borges, didata de projeção, médico pela
faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, bem-sucedido proprietário
de colégios na Bahia, em Minas Gerais e na Corte, mormente autor
de libelos irrepreensíveis (e sempre relembrados) – Vinte anos de
propaganda contra a palmatória e outros meios aviltantes no ensino da
mocidade, opúsculo de distribuição gratuita, do qual extraímos esta
sentença moral. “Não haverá meio de reger a alma humana senão
fazendo padecer o corpo? A ciência é coisa que se introduza no espírito
à força de pancadas? É o corpo ou a alma que aprende ou sente?”
(Borges, 1876, p.6); ou como futurava, em Dissertação lida no Congresso
Pedagógico Internacional de Buenos Aires em 2 de maio de 1882, escrito
social a versar a influência benéfica dos internatos e os meios de excitar
o gosto pela instrução.

E o que é que quer, senhores, o ensino moderno, intuitivo,


razoável, positivo, natural e, portanto, agradável e convidativo, tão
brilhantemente descrito e proclamado aqui, desta tribuna, por alguns
dos ilustrados membros deste Congresso?
86 • Carlos Monarcha

Quer redimir a infância da materialidade e das torturas do velho


ensino: quer aliviá-la dos vexames, do martírio do ensino rotineiro, além
de indigesto e amargoso, imposto pela violência; quer fazer dos mestres
prestantes obreiros do progresso da instrução dos povos, em vez de
tristes mantenedores da rotina; – quer tornar a escola amada, agradável
e feliz, tanto para quem ensina como para quem aprende; – quer que os
meninos as busquem em vez de fugir delas; em suma, senhores:
— Quer esclarecer as inteligências,
— Quer formar os corações,
— Quer fundar o império da razão (Borges, 1884, p.22-23).33

Demandas essas intensificadas noutras conjunturas da vida do


país quando retornam os debates sobre a instrução como nervo vital do
corpo coletivo, a saber, nos primórdios da República, no nacionalismo
do pós-guerra e na Era Getuliana, em tais conjunturas políticas
multiplicam-se os planos de formação reta das novas gerações, com
recurso a uma pedagogia do interesse, do concreto, da observação, da
atividade e da intuição. De sorte que a sensibilidade cientista assim
dispõe ao suavizar a dor das dores da aprendizagem, visto que a relação
professor-aluno não deve ser intimidativa, mas colaborativa, seria
possível desatar o nó saudável da emulação e do interesse pelo estudo.
Para esse ponto de vista humanitarista, métodos e processos de ensino
naturais são coextensão da essência biopsicológica da pessoa.
Tito Lívio de Castro, jovem médico, estudioso da psicologia,
economia política, história, antropologia, psiquiatria, filosofia,
poesia, literatura, leitor assíduo de teoristas arquicitados – Buckle,
Darwin, Galton, Haeckel, Le Bon, Lombroso, Maudsley, Ribot,
Spencer, Tarde, em A mulher e a sociogenia, tratado médico-científico
longamente prefaciado por Silvio Romero, ao concentrar-se na
análise do paralelismo entre ontogênese e psicogênese, psicogênese e

33
Sobre esse importante proprietário de estabelecimentos de instrução
e teórico do ensino, ver Alves (1924) e “Notas sobre o finado Barão de
Macaúbas” (1892).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 87

sociogênese e seus desdobramentos na pedagogia escolar, dardejava


argumentos críticos.

Na escola a criança nada encontra de atraente, ela só deseja


brincar e em vez de encaminhar-se a força excessiva do organismo
para um estudo que não tenha a aparência de estudo (do atual, ao
menos) procura-se reprimir o que é fisiológico, o que absolutamente
indispensável para o desenvolvimento regular do indivíduo, procura-se
pelo medo aniquilar-se-lhe a espontaneidade orgânica diante de um
mestre que não lhe entende e que a obriga a trabalhos sistematicamente
penosos, deprimentes nocivos (Castro, 1893, p.68).

Num Rui Barbosa tocado pelas hipóteses evolucionistas,


os métodos de ensino científicos correspondem aos processos
psicogênicos. “Haveis de educar o menino como a natureza
educou o gênero humano” (1947 [1882], p.100). Denotadoras,
nos enunciados esclarecidos habitam aspirações concernentes a
um ensino ético-moral isento de férula, isso sob suposto de guiar
brandamente pensamentos e condutas. Tudo levava a crer que, ao
transitar da teoria à prática, a humanidade entrara no período viril,
logo capaz de refletir racionalmente as coisas da vida e dos negócios
públicos. Dotado de fascínio sutil, o anteriormente descrito, resulta
na negação dos protocolos de ensino suportados na palavra do
professor, na leitura mecânica, no recurso da memória –, protocolos
condenáveis, pois contrários à autoeducação, isso por habituarem
as novas gerações a ler, ver e sentir o mundo pelo olhar alheio e
experiência de outrem, assim dizia-se.
Entrava em curso outra denegação, a da psicologia das faculdades
da alma, grupo inato de potências residentes no sujeito empírico,
ou seja, inteligência, volição e sensibilidade, operações elevadas do
espírito, dadas como produtoras da atividade mental; donde a recusa
da pedagogia consuetudinária, dita rígida, mnemônica, dogmática,
disciplinar, donde ainda o estudo da natureza infantil como objeto
88 • Carlos Monarcha

(científico) legítimo. Efloresce o desejo de regular os passos do ensino


conforme o desenvolvimento psicofisiológico e o crescimento físico
da criança; como rota didática, apregoa-se a percepção das imagens
das coisas existentes e seus nomes, isto é, os signos. Ora bem, posto o
problema desse modo, é facultado dizer que triunfava o associacionismo
empirista para o qual as experiências sensoriais condicionam o
conhecimento e o pensamento.
Uma das primeiras expressões desse estado de espírito é
Antonio de Almeida Oliveira, deputado paraense pelo Partido
Liberal, homem público empático ao gênio das técnicas pedagógicas
norte-americanas, nação por ele conhecida de viso em excursão
por aquele país-continente. Num livro sobrecarregado de análises
e dedicado ao nascente republicanismo, O ensino público, Almeida
Oliveira recomendava o uso das “lições das coisas”, método por ele
observado nos Estados Unidos da América, sob a denominação de
object lessons, lesson on objects, teaching objects. “As lições das coisas as
acostumarão a ver bem, a observar, a distinguir, a julgar, a comparar e
a raciocinar. As lições das coisas ainda não constituem a ciência, mas
preparam maravilhosamente o espírito para um ensino científico”
(Oliveira, 1874, p.139).
No plano global, Europa e Estados Unidos, ao lado da organização
dos sistemas nacionais de educação, ensaiava-se o nascimento de
uma pedagogia científica e experimental, domínio de conhecimento
cumulativo mediatizado pelos domínios disciplinares da antropologia
física, biologia, fisiologia, história, psicologia, sociologia e estatística.
Pedagogista, no entendimento esclarecido, é o conhecedor da natureza
da puerícia, da gênese e formação de ideias, das fases ontológicas
da pessoa e claro das etapas de crescimento físico. No cerne dessa
pedagogia à procura de status científico, aloja-se a ideia de “maturação
do organismo”, noção conceitual chave na regulagem da processuação
dos métodos de ensino objetivos.
Em Education as science, 1872, obra traduzida para o francês
e português por iniciativa de Gabriel Compayrè e Adolfo Portela,
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 89

Alexander Bain desposava ideias. E, com efeito para ele, a “educação


dos sentidos” exercitava a faculdade superior de discriminação das
sensações e, ao discernir cores, cheiros, gostos, tatos, lograr-se-
ia melhor memória para vistas, sons e sabores, melhor distinção e
retenção das formas aparentes, propriedades e grandezas das coisas.
Diferentemente da instrução sob a severidade externa do professor, a
associação de emoções, sensações, volições constituiriam a “matéria”
da vida mental,ou por outra, a educação dos sentidos implica
autoeducação (self-government).
A denegação do escolasticismo encorpa-se com a tradução e
adaptação de Rui Barbosa “para os países de língua portuguesa”, do
manual para professores Primary object lessons for training the senses
and developing the faculties of children, de Norman Allison Calkins,
sob o título Primeiras lições de coisas. “Obra unanimemente aprovada
pelo Conselho Superior da Instrução Pública da Bahia, pelo Conselho
Diretor da Corte, e adotada pelo governo imperial”, a época de Carlos
Leôncio de Carvalho à frente da pasta ministerial. Para o tradutor-
adaptador, o método intuitivo não se reduz às “lições de coisas”, ao
contrário, é o cerne de uma presumível didática geral. Rui despertara
para esse “manual de ensino intuitivo aplicável a todas as matérias”,
ao ler Rapport sur l’instruction primaire à l’Exposition Universelle
de Philadelphie, de Ferdinand Buisson, secretário da comissão de
estatística do ensino primário da França.34 Nessa exposição alusiva
ao centenário de Independência dos Estados Unidos da América, em
que D. Pedro II se fizera presente,35 o ensino intuitivo fora posto em
evidência por corresponder às faculdades perceptivas da pessoa.
Primeiras lições de coisas ou “método de Calkins” como
popularizado, prescreve o ensino pela observação e atividades refletidas.
“O ensino pelo aspecto, pela realidade, pela intuição sensível, pelo
exercício reflexivo dos sentidos, pelo cultivo complexo das faculdades
de observações está destinado a suceder triunfantemente aos processos

34
Cf. Lourenço Filho (2001 [1954]).
35
Cf. Pesavento (1994).
90 • Carlos Monarcha

verbalistas, ao absurdo formalismo da escola antiga” (Barbosa, 1886,


p.5). Dessa forma, para o ensino intuitivo em classes de instrução
primária, circulavam coleções para “lições de objetos” e “noções de
coisas”: “O museu Escolar – Caixa Saffray para lições de coisas”,
reunião metódica de coleções de objetos comuns; Lições de coisas, de
Manoel José da Silva Guanabara; Lições de coisas: sentido, formas, cores
(método de Calkins), de Luiz Carlos Duque-Estrada; Noções de coisas, de
Uchoa Cavalcanti e Lições de coisas pelo Dr. Saffray.

Este livro tem por fim servir-vos de um companheiro, de um


amigo. Abri-o nas horas de ócio, levai-o para os passeios, lede-o
enfim quando puderdes que não vós enfastiareis, por isso que ele vos
ensinará constantemente coisas que vos são mais ou menos familiares;
não o desprezareis, porque haveis de compreender que ele vos é útil, e
aumenta os vossos conhecimentos, ensinando-vos a apreciar e a julgar
aquilo que vos cerca (Saffray, 1881, p.6).

Em pauta, a aprendizagem pela observação sensível e visível,


melhor, pelo sensorialmente perceptível, antiga e irretorquível
recomendação esteada nas autoridades de Locke, Condillac, Rousseau
e Spencer, e nas práticas conceituais de Pestalozzi e Fröebel. Entre
brasileiros, temperava-se tal entendimento com as reflexões de Vitor
Cousin, conselhos práticos de Hippeau, filantropismo de Basedow e, não
menos importante, a legislação instituinte da escola primária francesa. É
de então a urgência de um ensino atualizado conforme a civilização do
momento de modo a incutir naquele que ensina o despertar da vontade
por meio de recursos ativos, desenvolver as faculdades intelectuais e
sobremodo formar bons corações, como bem quer Antonio Jansen de
Mattos Pereira, presidente da província do Maranhão.

Porque há de ficar limitado o conhecimento dos que frequentam


as escolas – da província – a esse ler, escrever e contar, a essa gramática e
catecismo, que se antigamente foram o máximo da instrução, hoje não
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 91

se podem ser, porque as aspirações do espírito moderno são outras?


Porque não dar nas escolas – por meio de um estudo conveniente –
noções de fisica, química e história natural, pelo menos com explicação
de suas principais aplicações à indústria e aos usos da vida?
Porque negar aos meninos noções gerais dos deveres do homem
e do cidadão? Porque não falar-lhes na higiene? Porque não dar a eles
um conhecimento – ainda sucinto – da nossa organização política?
Porque não instruí-los desde logo no que toca a economia social, a
lavoura e horticultura? Porque desprezar a música e o canto, de que
bons resultados se tem colhido, e essas lições de coisas de que tanto falam
os educadores, por isso que estendem-se a tudo o que serve à vida e
a todas as ações da natureza? (Mattos Pereira apud Fernandes, 1929,
p.240-241, grifo do autor).

Se, porventura, os fatos até aqui descritos e narrados não


representam o princípio e o fim das continuidades e descontinuidades
da instrução pública, ainda que as cifras e os diagnósticos desconsolem,
ainda que os belos planos permaneçam imaterializados, ainda que a
instrução nacional seja simples alínea a encabeçar as Falas do Trono
ou ainda que inexistam ações emanadas de um centro nacional, sem
sombra de dúvidas, há uma pedagogia escolar em movimento.

Mediadores da relação mestre-aluno, os compêndios

Ao passar a limpo o panorama do final do Império, José


Ricardo Pires de Almeida constatava a existência de certos grupos de
publicações: obras gerais de educação para “institutores, institutoras e
professores”, obras dirigidas aos “alunos, meninos e meninas”, “obras
administrativas” – leis e regulamentos da instrução pública.

Os livros do primeiro grupo são pouco numerosos, o que é


uma prova deplorável da indiferença em que a ciência da educação
se encontra entre nós; e infelizmente, pecam pela qualidade, mais
92 • Carlos Monarcha

ainda pelo número. Há alguns que, por, por títulos diversos, fazem
uma honrosa exceção e desfrutam de reconhecido mérito junto aos
professores” (Pires de Almeida, 1989 [1889], p.158).

Na sua explicação, os métodos de leitura dividiam-se em


ortográficos, composição da palavra e sílaba “em todos os seus elementos,
consoantes e vogais”, métodos novos, “admitindo apenas dois elementos,
os sons e as articulações”, métodos “que se apoiam ou pretendem apoiar-
se nestes dois sistemas”, “métodos ditos fonomímicos ou datilógicos” – os
sons e articulações de sons correspondem aos sinais da mão ou gestos do
corpo, apreensíveis pelos olhos, destinando-se aos surdos-mudos; “para
ensinar pelos olhos”, os “aparelhos escolares”: letras móveis, silabários,
contadores mecânicos, aritmômetros, material de Fröebel, mostradores
de ponteiros de relógio, quadro de pesos e medidas, cores do espectro
solar, ofícios e profissões, história natural, “retratos de grandes homens
do Brasil”. Quer dizer requeriam-se outras vias, em vez da “verbiagem”,
o “realismo”, em vez das abstrações, a intuição e os sentidos, em vez do
salmodiar, a imaginação imaginativa. Aduzidas de uma pedagogia que se
quer científica, nessas preocupações subjazem as dimensões do homem
social, donde a recusa da figura do prático em pedagogia, o mestre-escola
régio, pois os saberes a respeito da infância encareciam novas atitudes,
donde o descrédito do anexim legitimado pelo costume: “Só se sabe bem
o que se aprende dificilmente”.
Se, no plano geral, retomam-se as discussões da urgência de
uma educação nacional, no plano particular da pedagogia escolar,
incrementam-se as edições de compêndios a ostentarem, cada qual com
as suas palavras e modos, a vinculação entre ciência da educação e arte
de ensinar. E, mais do que antes, o compêndio é chamado a interceder
nas relações mestre-discípulo, e mais do que antes, o bom compêndio é
o legitimado pela experiênciação do autor na condição de professor.36 E,

36
“A partir do século XIX, com a constituição dos estados nacionais e com o
desenvolvimento, nesse contexto, dos principais sistemas educativos, o livro
didático se afirmou como um dos vetores essenciais da língua, da cultura e
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 93

por paradoxo, a pedagogia do concreto, do interesse, da observação, da


intutição e da atividade não prescinde de compêndios, muito embora
se sabe hoje mais arejados e refinados com ilustrações, cores e tipos
gráficos variados. Breve reportação de títulos e autores transparece
o empenho na elaboração de “obras acomodadas à inteligência dos
meninos”, em maioria, formuladas em linguagem a gabar os méritos
do raciocínio, observação e experimentação, sobremodo aplicáveis aos
“usos da vida”. Associadamente à fixação e à elevação do status dos
autores didáticos, em maior parte, vinculados ao magistério, instalam-
se instâncias de controle da adoção, aquisição e distribuição de livros
de leitura, cartilhas e cadernos de caligrafia.
Por precaução, convém dizer que, ao lado dos avanços, há escolhos
dos mais graves. No parecer “Métodos e programas de ensino nas escolas
primárias, adoção de compêndios”, encaminhado à Primeira Exposição
Pedagógica, Manoel Olímpio Rodrigues da Costa pronunciava palavras
duras. “A história do ensino, em nosso país, mostra-nos que compêndios
imprestáveis e inúteis à instrução primária, só pela importância social de
seus proprietários, são aprovados e vendidos a altos preços, e distribuídos
pelas escolas, muitas vezes para pasto de traças” (Costa, 1884, p.4). Noutro
parecer, José Manoel Garcia problematizava mais ainda. “O Estado tem
incontestável obrigação de prevenir que, nas escolas primárias tanto
públicas como particulares, sobre as quais a lei lhe confere o direito de
inspeção, se leia por livros subversivos dos bons princípios da sociedade,
da moral, da religião fundamental.”

Cumpre-lhe ainda, em relação nos destinados ao ensino, que não


contenham doutrinas ofensivas daqueles princípios, evitar a adoção
dos que, por sua incorreção e viciosa locução, só servem para barbarizar
o idioma nacional em vez de concorrerem para criar gosto e fazer

dos valores das classes dirigentes. Instrumento privilegiado de construção de


identidade, geralmente ele é reconhecido, assim como a moeda e a bandeira,
como um símbolo da soberania nacional e, nesse sentido, assume um
importante papel político” (Choppin, 2004, p.553).
94 • Carlos Monarcha

conhecidos os primores e opulência da língua vernácula. Devem esses


livros ser: 1º, metódicos e apropriados aos programas de ensino, já
na linguagem, já na extensão e na intensidade das matérias; 2º, bem
impressos e devidamente corretos; 2º, de preço módico, a fim de que se
facilite a todas as posses a sua aquisição (Garcia, 1884b, p.6).

Seja do modo que for, somados aos títulos e autores citados em


capítulo anterior, o rol declinado a seguir não deve ser negligenciado
como quinquilharia passadista. Em atenção ao ato de ler articuladamente
as polêmicas quanto à aquisição da leitura pelo método da soletração
ou sibilação ou da palavração, circulavam: Bacadafá, ou método de leitura
abreviada, de Antonio Pinheiro Aguiar (Rio de Janeiro, 1870); Método
de leitura oferecido à infância e ao povo, de Otaviano Hudson (São Paulo,
1875); Silabário ou primeiro livro de leitura, de Manuel Ribeiro de Almeida
(Rio de Janeiro, 1875), título premiado pelo governo imperial; Silabário
português ou novo método para aprender a ler em breve tempo a língua
portuguesa e o sistema métrico ilustrado com numerosas estampas, “traduzido e
composto” por J. R. Galvão, “à venda no Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco
e S. Paulo” (1879); Método racional e rápido para aprender a ler sem soletrar,
dedicado à infância e ao povo brasileiro, de João Köpke (São Paulo, 1879);
Cartilha da infância, de Tomás Paulo do Bom Sucesso Galhardo (São
Paulo, 1880); Cartas de nomes para se ensinar em pouco tempo a ler e a escrever,
figurado a pronúncia do Brasil, dedicada aos mestres e pais brasileiros, de José
Jorge Paranhos da Silva (Rio de Janeiro, 1880); Abecedário Mascarenhas ou
método repentino de aprender a ler, organizado e dedicado à infância brasileira,
de Francisco de Paula Mascarenhas (Rio de Janeiro, 1881); Lições no lar
(1° livro – Silabário, 2º livro – Contos e diálogos, 3° livro – Conhecimentos
úteis e 4º livro – Estudos de homens e coisas), de Hilário Ribeiro (Pelotas,
1881, 28ed. 1893), “adotado no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e
Paraná”; Escola primária. Lições à infância baseadas nos princípios fisiológicos
da linguagem articulada para aprender a ler sem soletrar, de Manuel Paulino
de Assunção (Rio de Janeiro, 1882); Silabário nacional ou novo método de
aprender a ler, imitado e composto, de Antonio de Araújo Ferreira Jacobina
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 95

(Rio de Janeiro, 1883); e Cartilha maternal ou arte da leitura, de João de


Deus (Lisboa, 1881).

É ao Dr. Zeferino Candido, diretor do Colégio São Pedro


de Alcântara, que deve a introdução e real aplicação do método
de leitura chamado Método de João de Deus ou Método intuitivo e
apreensível intelectual. Cartilha maternal, principal livro de João de
Deus, é uma das maiores obras de ensino moderno. Este livro abriu
uma nova via aos institutores, levou-os a ensinar pela inteligência
mais que pela memória, reduzida ao papel de colaboradora e
instrumento de conservação dos conhecimentos. Se, a Cartilha
Maternal não está ainda espalhada por todo o país, pode-se,
entretanto, considerar como generalizada, apesar das diversas
modificações introduzidas na forma em que se apresenta hoje
(Pires de Almeida, 1989 [1889], p.170-171).37

Nesse rol adventício, a novidade consiste nas “cartilhas


nacionais”, por exemplo, Cartilha nacional ou novo primeiro livro
de leitura, de Hilário Ribeiro (Rio de Janeiro, 9ed. 1887), título
premiado na Exposição de Objetos Escolares e Medalha de Prata
na Exposição de Paris de 1889. Destinada ao “ensino simultâneo de
leitura e escrita”, ornamentada com belas gravuras, na abertura da
cartilha consta breve nota metodológica.

A Cartilha Nacional tem por fim ensinar simultaneamente a ler e a


escrever. Como a arte da leitura é a análise da fala, levemos desde logo
o aluno a conhecer os valores fônicos das letras, porque é com o valor
que há de ler e não com o nome delas.
Uma vez que o aluno conheça perfeitamente o elemento fônico
correspondente a cada vogal, começará o professor a ensinar-lhe a

37
Quanto às campanhas do sectário do positivismo de Comte, Zeferino
Candido, visando ao uso da Cartilha maternal, ver Monarcha (1999); quanto à
experiência de aculturação da cartilha, ver Trindade (2004).
96 • Carlos Monarcha

escrever com giz, no quadro preto, primeiro o i, que é a vogal mais


elementar, e sucessivamente o u, e, o, e o a (Ribeiro, 1887, p.5, grifo
do autor).

Bem-sucedido autor didático, Hilário Ribeiro publica também a


série graduada de leitura Cenário infantil, Na terra, no mar e no espaço, e
Pátria e dever. Elementos de educação física e moral (Rio de Janeiro, 1884,
1885, 1887).
Pois bem, para o ensino de português, circulam “seletas” e
“florilégios”: Florilégio brasileiro da infância “destinado ao exercício
de leitura de verso e de manuscritos nas escolas públicas primárias”,
de João Rodrigues da Fonseca Jordão, “Obra adotada pelo Conselho
Superior da Instrução Pública, com aprovação do Governo Imperial,
para uso das escolas públicas do ensino primário e do Imperial Colégio
de Pedro II, e composto com diferentes tipos de letras impressas e
manuscritas” (Rio de Janeiro, 1874).
Para a aritmética: Tabuada segundo o método Pestalozzi, de José
Ramos Paz e Guia pedagógico de cálculo mental e uso do contador mecânico ou
aritmômetro no ensino elementar da aritmética, de Brazilicus [pseudônimo]
(Rio de Janeiro, 1882), premiado pelo júri da Exposição Pedagógica.
Num contexto histórico de relativização do ensino de história
sagrada e valoração da história nacional, observando que alguns autores
são publicistas republicanos, outros monarquistas, apareciam Lições de
história pátria, do prócer republicano Américo Braziliense (Campinas,
1876); História do Brasil contada aos meninos, de Estácio de Sá e Menezes
(Rio de Janeiro, 1880); Pequena história do Brasil por perguntas e respostas, de
Joaquim Maria de Lacerda e Resumo da história do Brasil para uso das escolas
primárias, de Maria Guilhermina Loureiro de Andrade (Boston, 1888).
Para o ensino da geografia do Brasil e das províncias: Noções de
geografia e de história do Brasil para uso das escolas de instrução primária
da província do Pará, de Joaquim Pedro Corrêa de Freitas (Pará, 1879);
Compêndio de corografia do Brasil para uso das escolas de instrução primária,
de Brito Aranha (Lisboa, 1872); Noções de geografia do Brasil para uso da
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 97

mocidade brasileira, de Manuel José Pereira Frazão (Rio de Janeiro, 1883) e


Geografia da Província do Rio Grande do Sul, de Hilário Ribeiro, “adaptado
às classes elementares, adornado de oito mapas coloridos e acompanhado
de noções sobre a América do Sul e a do Norte” (Pelotas, 1881). Em nota
introdutória, o didata deblaterava. “Uma reforma tem custado muito, e
vai lentamente: é a da escola primária, por isso que ameaça a tranquila
imbecilidade dos espíritos chatos e rotineiros que fogem à discussão e à
verdade e temem a luz da civilização e da história”.

Os gregos e os atenienses esmeravam-se na educação intelectual e


física das crianças; para eles o movimento do espírito não era menos
útil e necessário que o movimento dos músculos. Diferentemente
procedemos. Nem vida do pensamento, nem a atividade física!
A memória imobilizando as faculdades ativas, atrofiando a palavra
e o raciocínio; e, onde a memória, que faz parte do entendimento, não
se utiliza em proveito da inteligência e de si mesma, pode ser exaltada
muito embora pelo pai imprevidente e pelo mestre ignorante, mas em
verdade sua ação não produz senão imbecis e idiotas (Ribeiro, 1881, p.3).

Dentre os códigos de decoro, manuais de civilidade, melhor é


dizer, controle da imediatez dos instintos e formação de suditos-cidadãos
responsáveis e de boa índole, Deveres do homem, de Eusébio Vanerio; e
Ensino de moral e religião nas escolas primárias, secundárias e normais, de
Rodolfo Epifânio de Souza Dantas (Rio de Janeiro, 1884). Para o ensino
de diversas matérias, em moldes de crestomatias: Novo método de ensino a
ler e escrever, acrescentado da Civilidade de Chantal, de um resumo da doutrina
cristã, extraído do catecismo histórico de Fleury e das primeiras noções de cálculo,
de Augusto Freire da Silva (Paris, 1875); Lições de coisas inanimadas e
animadas, de Emílio Zaluar (Rio de Janeiro, 1875); Compêndio de doutrina
cristã, “coligido, aumentado e publicado”, por José Dias da Cruz Lima
(Rio de Janeiro, 1875) e o bem-acolhido Noções de direito para as escolas
primárias, de Antonio Francisco Bandeira Júnior (Rio de Janeiro, 1885),
elogiado por Machado de Assis e Quintino Bocaiúva. Tirantes esses
98 • Carlos Monarcha

títulos e autores, há os tratados de exercícios ginásticos: Da educação física,


intelectual e moral da mocidade no Rio de Janeiro, de A. F. M. Andrade (Rio
de Janeiro, 1874) e Tratado elementar da ginástica escolar, de Pedro Manoel
Borges (Rio de Janeiro, 1888).
Uma última observação, quanto ao conhecimento do corpo da
pátria, o Instituto Filomático, sediado no Rio de Janeiro, publicava o Atlas
do Império do Brasil, em 1868, do político, jurista e geógrafo maranhense
Candido Mendes de Almeida, ex-professor de Geografia e de História
do Liceu de São Luis na Província do Maranhão. Uma das primeiras
representações cartográficas mais fiéis, o atlas reproduzia as divisões
administrativas, eclesiásticas, eleitorais e judiciárias, e fora elaborado
mediante consultas a mapas, documentos antigos, relatos de viagens,
expedições e alvarás régios.38 Com efeito, no Atlas do Império do Brasil
constavam as novas divisões administrativas, as províncias do Amazonas e
Paraná, desmembradas do Pará e São Paulo, em 1853 e 1854.
E a disposição territorial das províncias setentrionais: Amazonas,
Grão-Pará, Maranhão, Piauí, províncias orientais, Ceará, Rio Grande do
Norte, Paraíba do Norte, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Espírito-
Santo; das províncias meridionais: Município Neutro, Rio de Janeiro,
São Paulo, Paraná, Santa Catarina, São Pedro e das províncias ocidentais:
Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso. Ademais, Mendes de Almeida propõe
a elevação da parte setentrional do Grão-Pará à categoria de província
autônoma, sob a denominação de Pinsonia (hoje, Rondônia). Em síntese,
a edição do atlas ofertava a percepção inteiriça do Império do Brasil.
Contudo, certas fronteiras externas e internas bem como certos
aspectos naturais permaneciam indeterminados, de fato, em O ensino
público, o paraense Antonio de Almeida Oliveira (1873, p.15) lamentava
– “Seus rios ainda ninguém pode contar e descrever”. Que conclusões
podem ser extraídas dos argumentos antes expostos? Tema fecundo,
na edição de obras didáticas incidem demandas de ordem educacional
e pedagógica, fatores econômicos e tecnológicos, injunções de ordem
política e científicas.

38
Cf. Guerra e Santos (2011).
99

De mestre-escola a professor primário

Seria possível contrabalançar certos quadros aflitivos e


cenas desencantadas no tocante a figura do mestre de escola e sua
desconfortável rotina? Melhor, referir-se ao declinar da palmatória
que, por antonomásia, se apelidava de “Santa Luzia”, por ter “olhos
ou buracos no centro”, donde o mote – “Santa Luzia de cinco buracos,
que tira a mandinga de todos velhacos”. Como colocar em estado de
suspensão as narrativas que esbatem a fisionomia patibular do mestre
de escola quer em relatos de viagens e explorações quer em recordações
tardias de ex-alunos e ex-professores quer ainda na literatura de ficção?
Nessas narrativas, a catadura do mestre punitivo retorna como
imagem da infelicidade da puerícia. Em registro desafortunado, narra
o anônimo autor de História da pedagogia compilado por um professor.
“Submetidos ao regime dos castigos corporais, aos péssimos métodos
instrutivos e educativos preconizados pelos jesuítas, os meninos tinham
horror à escola, que consideravam um instrumento de insuportável
martírio. Ainda mesmo em nossos dias há muita gente que se recorda
com aperto de coração das tão célebres escolas régias, que ainda proliferam
nalguns Estados Brasileiros” (História..., 1914, p.251, grifo do autor).
Por sua vez, em inspirado impulso autobiográfico, Candido Mota, em
São Paulo e a República, retraz os idos desolados da infância escolar.

Como essa eram as demais escolas primárias, nas próprias


residências dos professores, que ficavam assim à vontade. Quase
100 • Carlos Monarcha

de chinelos, sem meias, cabelos em desalinho, acolitados por uma


inclemente “Santa Luzia” de forte cabriúva, nome esse dado à
palmatória de cinco furos, e que era o terror da meninada. De longe
ouvia-se o eco do vozerio dos alunos obrigados a cantar, em tom
invariável, a tabuada; e, às sextas-feiras o “sois cristãos”; meio esse
mais prático encontrado para manter a ordem, sem o emprego da tal
santa, dos puxões de orelhas ou cocorotes que deixavam sinal no couro
cabeludo (Mota, 1935, p.49, grifo do autor).

Esses recorridos desconsoladores, esses ajuizamentos do


desamparo da puerícia, e deles há um rol sem fim, não esgotam
a interpretação, nalguma medida, é preciso colocar em causa as
visões demasiadamente hegemônicas a respeito do estado de coisas
no Segundo Reinado. Se a instrução elementar atravessa o antigo
regime descridamente pelos vaivéns de ministros de Estado e
presidentes de províncias, exiguidade de recursos, desencontros entre
Executivo e Legislativo, extensão territorial e dispersão demográfica,
por certo não significa concluir que tal situação pesarosa encerre toda
interpretação do passado.

Da formação de professores

De raro em raro, os marcos escolares provinciais ganhariam


alguma diversidade, por exemplo, com a criação de escolas normais.
Premidas por injunções e eventualidades, abrindo e fechando a
qualquer momento, com professores recrutados entre bacharéis,
engenheiros, médicos, esses estabelecimentos conhecem existência
conturbada. Contudo, o Brasil situa-se entre os primeiros países da
América a instalar escolas normais mantidas pelos poderes públicos,
pátria-mãe das escolas normais, a França instala estabelecimentos de
preparação profissional para o magistério apenas na Revolução de
Julho de 1830.39

39
Cf. Bowen (1986).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 101

No Brasil, conforme cronologia estabelecida, ainda que


porventura haja discrepâncias, a sequência espiralada e cambaleante
de manifestações da tomada de consciência quanto à preparação
profissional de mestres é esta: Niterói e Minas Gerais –1835, Bahia
– 1836, Pará – 1839, São Paulo – 1846, Pernambuco – 1864, Piauí
– 1864, Paraíba – 1864, Rio Grande do Sul – 1869, Pará, Paraná e
Sergipe – 1870; e mais adiante, Amazonas – 1872, Espírito Santo e
Rio Grande do Norte – 1873, Maranhão e Mato Grosso – 1874, Santa
Catarina e Município da Corte – 1880, Goiás – 1881, Ceará – 1884.40
Como regra medianamente geral, o aspirante à matrícula deveria
comprovar ser maior de 17 ou 18 anos, homem, e 14 ou 15, “sendo
senhora”; ambos instruiriam a petição com certidão de batismo,
atestado de moralidade autenticado por párocos ou autoridade policial,
atestado médico comprovando estar livre de moléstias ou defeito físico
incompatível com o magistério, certidão de vacinação e revacinação,
licença do pai ou marido, se menor de idade ou mulher casada. Os
conteúdos de ensino abarcavam agrimensura, aritmética, caligrafia,
desenho linear, gramática, história e geografia pátria, história e
doutrina sagrada, música, sistema métrico. Quanto às matérias
profissionalizantes, estudava-se didática, metodologia e pedagogia,
com exercícios de aplicação em escolas anexas ou outras quaisquer.
A bem dizer, o programa da matéria Moral, Doutrina Cristã e
Pedagogia, organizado pela diretoria da Sociedade Onze de Agosto,
da província do Maranhão, em conformidade com o artigo 4° da Lei
nº 1.089, de 17 de julho de 1874, assinado pelo vice-presidente José
Francisco de Viveiros, exemplifica o ideal-tipo de mestre a ser regrado
em conformidade com a Religião de Estado.
1. Fundamento da moral. A consciência, distinções, fundamentos
entre o bem e o mal, apreciação dos sistemas que tentam explicar o
fundamento da moral; a lei moral, lei eterna, natural e positiva e lei
humana. Diversos motivos de nossas ações. Sanção moral. Destino do

40
Sobre o tema a produção memorialística e acadêmica é extensa e profícua,
entre outros, ver Araújo, Freitas e Lopes (2008) e Neves (2002).
102 • Carlos Monarcha

homem. Imortalidade da alma. Moral religiosa ou deveres do homem


para com Deus. Culto interno, externo, público. Moral individual.
Deveres para com a alma, inteligência, vontade e sensibilidade. Deveres
para com o homem em geral, com a família e o Estado. Doutrina cristã.
Preliminares. Símbolo dos apóstolos. Deus-Trindade. Anjos-Homem
e sua queda. Mistério da encarnação-Jesus Cristo-Redenção. Espírito
Santo-Igreja. Virtudes teologais. Decálogo. Religião. Mandamentos
da Igreja. Meios que Deus estabeleceu para a santificação do homem
– Graça – Orações, Sacramentos.
2. O que é pedagogia, sua divisão em suas partes. Didática e
metodologia. O professor, sua missão, seus deveres, suas qualidades
naturais quanto ao físico e à alma, suas qualidades morais: bondade,
firmeza, regularidade, zelo, pureza de costumes, boa educação,
civilidade, modéstia, piedade, prudência, recolhimento, pudor, caridade,
justiça, desinteresse, amor pelo estudo.
Quanto à ordenação jurídico-política do Império, na Escola
Normal da Corte, ensinava-se os seguintes conteúdos de educação
cívica: a nação, a divisão, a forma de governo, a dinastia e a religião.
Os cidadãos brasileiros. Poderes e representação nacional. Poder
Legislativo e suas atribuições. Eleições. Poder Moderador. Poder
Executivo. Família Imperial. Conselho de Estado. Força Militar.
Poder Judicial. Administração e economia das províncias. Municípios.
Direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros.41
Novamente é preciso não sobre-estimar o andamento dos
acontecimentos: ao lado dos professores provindos das escolas normais,
por sinal, sempre em número insuficiente, há os mestres recrutados em
exames encabeçados por comissões de notáveis, e considerados dignos
de estima, como recomendava a Lei nº 1.089, de 17 de julho de 1874,
sancionada pelo presidente do Maranhão, João Antonio Coqueiro. “Se
alguns dos atuais professores públicos catedráticos do município da
capital, de um e de outro sexo, quiser frequentar as aulas do Curso
Normal, terá assento em lugar especial ao lado da mesa do professor.”

41
Cf. Pereira Júnior (1889).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 103

Pedagogia compendiada

A fim de transcender o restrito círculo das rotinas empíricas,


surte efeito uma demanda de manuais de pedagogia a versar a teoria
e a prática de princípios, métodos e processos de ensino, elaborados
por autores nacionais e estrangeiros: O ensino Praxedes, compêndio de
didática para ensino das matérias, de Praxedes Pacheco (Rio de Janeiro,
1861); Curso prático de pedagogia destinado aos alunos-mestres das
escolas normais primárias e aos instituidores em exercício, de Daligault,
em tradução de Joaquim Pires Machado Portella (Recife, 1865);
Compêndio de pedagogia, de Carlos Augusto Soares, (Rio de Janeiro,
1878); Compêndio de pedagogia para uso dos alunos da escola normal do
Rio de Janeiro, de Antonio Marciano da Silva Pontes (Niterói, 1881);
Doutrinas pedagógicas e elementos de instrução pública para uso das escolas
de ensino primário, especialmente das províncias do Amazonas e Pará,
de Joaquim Maria Nascentes de Azambuja (Pará, 1884); Pedagogia e
metodologia: teoria e prática, de Camilo Passalácqua (São Paulo, 1887);
Tratado de metodologia coordenada, para uso de professores e alunos das
escolas normais, de Felisberto Rodrigues Pereira Carvalho (Rio de
Janeiro, 1888); Lições de coisas, de João Barbalho Uchoa Cavalcante,
“guia prático para uso dos professores e aspirantes ao magistério,
contendo preceitos e regras do método intuitivo acompanhado
de lições e exercícios de aplicação” (Pernambuco, 1888), Catecismo
de economia política para uso das escolas normais do Império, de Pedro
Autran da Matta e Albuquerque (Rio de Janeiro, 1888) e Princípios
de pedagogia, de Augusto Coelho (São Paulo, 1891-1893), alentado
tratado em quatro tomos e dois volumes, decalcado de A educação
intelectual, moral e física de Spencer.
Quanto às “lições de coisas”, convém acrescentar aos já citados
Primeiras lições de coisas, de Calkins; Lições de coisas, de Manoel José
da Silva Guanabara; Lições de coisas: sentido, formas, cores (método de
Calkins), de Luiz Carlos Duque-Estrada; Noções de coisas, de Uchoa
Cavalcanti e Lições de coisas pelo Dr. Saffray. No geral, os autores
104 • Carlos Monarcha

didáticos indiciam crucialidades: formar mestres com domínio de


conteúdos para além de aqueles a serem ensinados, fazer a escola servir
à criança, conceber a sala de aula como banco de ensaios.

A realidade e suas antinomias

Se ao mestre de escola, a princípio fiel auxiliar do padre e do


médico, delega-se a sustentação dos alicerces da identidade nacional
centrada na aliança entre Estado, Coroa e Igreja, monotonamente, no
espacejar dos anos, os relatórios de ministros do Império, presidentes
de províncias e inspetores gerais esbatem idênticas queixas: relaxação
dos costumes dos mestres, imerecimento literário dos aspirantes ao
magistério, extemporaneidade dos métodos e processos de ensino,
inadequação dos locais de ensino, abusiva presença de leigos no
magistério, mesquinhez de ordenados.
No mais, as fileiras do magistério nacional são exíguas e assim
permaneceriam nos presentes vindouros, fato que não impede de
relembrar a nota de bom-senso declinada em Americus: cartas políticas
extraídas do Padre Amaro. “Não pode haver boas escolas sem bons
mestres e nem pode haver bons mestres sem lhes pagar bem. Na
fundação de um Estado tudo quanto se poupar neste objeto é economia
ainda mais absurda que a do avaro que nega a si próprio o pão de cada
dia” (Americus, 1825, t.1, p.54).
Minas Gerais e Bahia, de longe as províncias mais populosas,
1.669.276 e 1.211.792 habitantes, possuíam tão somente 1.453 e
771 professores respectivamente.42 Essa “estatística moral”, isto é, a
correlação entre o número de professores e a população geral, é acolhida
pelas falas oraculares centradas nos sobrepoderes da instrução primária
de Estado, mais concretamente, pelos sujeitos dispostos a modificar
a condição subjetiva da nação e da nacionalidade infusa. Mal pago,
malquerido e mal-ouvido, o dia a dia do mestre-escola, comumente
designado “proprietário da cadeira da escola”, ou melhor, aquele que

42
Cf. Apêndice A – Tabela A.
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 105

oferta “quilates de luz”, no dizer arroubado de certo figurão, não


desfruta de melhores condições de vida. Na Fala de 13 de março de
1886, endereçada à Assembleia Provincial do Maranhão, o conselheiro
Bandeira de Mello ponderava.

Em meu conceito, dois meios há de remediar estes males, e é


robusta a fé que alimento de que a ação combinada de ambos dará
novo impulso à instrução popular, o melhor benefício que podeis fazer
as classes menos felizes de vossos concidadãos. São esses meios: o
aumento de ordenado, e a criação de uma escola normal.
Pelo primeiro, tornareis o professorado uma carreira procurada
da gente honesta e laboriosa, que tenha sentimento da própria
responsabilidade, e queira servir com honra; pelo segundo apurareis
as vocações, e serão por uma vez expelidos do magistério a ignorância
protegida, os incapazes, que as outras carreiras repelem (Mello apud
Fernandes, 1929, p.243).

Vice-diretor e professor de matemáticas do “Colégio do Exmo.


Sr. Barão de Tautphoeus”, professor da 1ª cadeira da freguesia do
Sacramento na Corte, membro da Imperial Sociedade Amante da
Instrução, credenciais dignas de atenção, Manoel José Pereira Frazão
desabafa, em Cartas do professor da roça, série de artigos relativos à
instrução pública da Corte, publicada no jornal Constitucional.

Agora (aqui para nós) qual é o papel que representa um


professor, propriamente tal, perante uma sociedade como a nossa?
De que importância goza? Obrigado pelas circunstâncias a resignar-
se a uma tarefa tão espinhosa quão inglória, e tendo como garantia
única seus pingues ordenados, não perde por certo a ocasião de se
deixar devorar por algum dos minotauros de que acima lhe falei. O
professorado hoje é a pior das recomendações! Perguntai a um pai
o que é o professor de seu filho, e ele vos responderá: “Um criado de
ensinar meninos” (Frazão, 1864, p.31, grifo do autor).
106 • Carlos Monarcha

No palavrear de Tavares Bastos em Cartas de solitário, intelectual


de proa e contundente crítico da monarquia. “Pois um moço, no
Amazonas, ou no Paraná, ou em Goiás que saiba ler, escrever, aritmética,
doutrina, elementos de Geografia e Gramática nacional, prestar-se-á a
ensinar meninos por 400$ anuais? De certo que não. Vai aprender latim
e formar-se em Direito ou procura logo um emprego público de certa
ordem, ou, finalmente, é escolhido delegado de polícia, eleito vereador,
nomeado membro de assembleia” (Tavares Bastos, 1863, p.70). Saído
das camadas populares, aos poucos o mestre de escola teria sua imagem
social reconfigurada para além de fiel auxiliar do padre e do médico,
seria rebatizado professor primário, e a esse prometeico intermediário
da cultura atribuiu-se o exercício de uma profissão eminentemente
intelectual.

Comparar a diferença

Em atos de pensamento e projeções mentais, monarquistas e


republicanos ritualizam o halo da instrução pública como fundamento
da civilização política, donde pensar e medir o Brasil por comparação,
comumente os bons exemplos recaem no sistema escolar da Prússia ou
no modelo político e social da Terceira República francesa ou ainda
no progressimo liberal-federalista dos Estados Unidos. Monarquistas
e republicanos, os homens públicos acompanham a ordenação dos
sistemas escolares unitários, centralizados e legislados pelas burocracias
dos Estados nacionais.
Em âmbito internacional, o método comparativo, cujo uso
é perceptível nos estudos das línguas, folclore, costumes, direito,
política, comparece nos estudos dos sistemas de ensino e certamente
ganha maior visibilidade nas exposições universais de Viena, Áustria,
Filadélfia, Estados Unidos, em que constavam seções de Instrução
Pública. São desse período, os célebres estudos do republicano
Ferdinand Buisson, a saber, Rapport sur l’instruction primaire à
l’Exposition Universelle de Vienne en 1873, Rapport sur l’instruction
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 107

primaire à l’Exposition Universelle de Philadelphie en 1876 e Conférence


sur l’enseignement intuitif, faite aux Instituteurs délégués à L’Exposition
Universelle en 1878.43
No Brasil, a voga comparativa desperta nos idos de 1870
com a tradução e edição pela Imprensa Nacional dos relatórios de
Celéstin Hippeau, Rapport sur l’instruction publique aux États Únis
e L’instruction publique en Angleterre. Tal voga assenta a recolha de
modelos e experiências dos sistemas nacionais de educação próprios
das nações liberais. Conjugadamente, a literatura político-sociológica
publicada no Brasil intensifica a busca de fontes exteriores de
inspiração. É de então o incremento de estudos prescritivos e relatos
de viagens de observação patrocinados pelas autoridades, no amplo
repertório, dentre muitos, O ensino primário no Reino Unido da Grã-
Bretanha e Irlanda, por César Augusto Viana Lima; O ensino público
primário em Portugal, Espanha, França e Bélgica, por Luis Augusto Reis;
O ensino público primário na Itália, Suíça, Suécia, Bélgica, Inglaterra e
França, por Manoel José Pereira Frazão; O ensino público primário
em França, Espanha e Portugal, por Luisa Leopoldina Tavares Porto-
Carrero; O jardim infantil: sua natureza, seu fim e seus meios de ação, por
Antonio Herculano de Souza Bandeira, abarcando França, Áustria,
Alemanha e Suíça; Estudo sobre o ensino primário no Reino Unido da
Grã-Bretanha e Irlanda, por César Augusto Viana de Lima; Exposição
e crítica da legislação alemã sobre as escolas normais e jardins da infância,
por Dias da Silva Júnior e O ensino público primário na Itália, França e
Bélgica, por Amélia Fernandes da Costa. Desse primigênio de estudos
comparados, deduziam-se ações e iniciativas reformadoras.
Pela repercussão obtida, sobreleva-se a obra ampla de Joaquim
Teixeira de Macedo, aliás, premiada na Primeira Exposição Pedagógica
do Rio de Janeiro: A instrução pública na Prússia, O ensino normal primário
na Prússia, Breves apontamentos para o estudo das questões relativas ao
ensino normal primário e a educação popular, Novos apontamentos de origem
alemã para o estudo das questões relativas à educação nacional.

43
Cf. Bastos (2013).
108 • Carlos Monarcha

No intento de melhorar a administração escolar, vem a público um


rol de estudos aqui impossível de entremostrar à exaustão: Coeducação
dos sexos nas escolas primárias, normais e secundárias, por João Barbalho
Uchoa Cavalcanti; Medidas conducentes a tornar efetiva a inspeção do
ensino, por Josino do Nascimento Silva; Sistema disciplinar e meios de
emulação nas escolas de diversos graus, por Augusto Cândido Xavier
Cony; Jardim das crianças, de W. Hacilman, “tradução de G. L. A.”,
exposição do sistema de Fröebel; Organização dos jardins de infância,
por Joaquim José de Meneses; Organização dos jardins de infância, por
Maria Guilhermina de Andrade e Regulamento geral e programas do
ensino e horários das escolas normais primárias, por João José Barbosa
de Oliveira. Da infância ao limiar da idade adulta, cria-se ser possível
envolver a infância e a adolescência num sistema de ensino uniforme
e eficiente. Isto é, sente-se a infância e a adolescência como etapas
dotadas de faculdades próprias, para essa despontante sensibilidade,
as crianças não nascem homens, tornam-se, antecâmara da vida
social, a instrução, força cultural politicamente relevante, certificaria a
agregação à esfera convivial e mundana.
109

Da química moral

A gestão dos serviços públicos demanda dados quantitativos. No


ministério do Barão de Rio Branco, mais exatamente em 1872, a recém-
instalada diretoria-geral de Estatística efetuava a única contagem geral
da população no Império. À primeira vista, parece ser impensável realizar
um censo demográfico geral num país de territorialidade infindável,
rural, escravocrata e, claro, destituído de comunicações e transportes. No
escrutínio dos atributos da população, aplicaram-se “boletins de família”,
indagando-se nome, sexo, idade, “raça” (definida pela cor, branco, preto,
pardo, caboclo), estado civil, naturalidade, nacionalidade, residência,
religião, defeitos físicos, enfermidades e grau de instrução.
Ao final de 1876, o relatório apresentado pelo diretor-geral,
conselheiro Manoel Francisco Correia, revelava os índices definidores
da demografia do país: massa da população – 9.930.478 almas, sendo
8.419.672 livres e 1.510.806 escravos; “raças”: branca – 3.787.288,
negra – 1.954.452, indígena – 386.944, parda (mulatos e mestiços)
– 3.801.782. Províncias “mais bem povoadas”: Rio de Janeiro, Ceará,
Pernambuco, Alagoas, Sergipe; “menos povoadas”: Amazonas, Mato
Grosso – “cinquenta quilômetros quadrados para cada pessoa”. Nas
palavras do conselheiro. “É pouco animador o quadro da estatística
intelectual; mas o impulso que entre nós vai tendo a instrução popular
faz esperar que não decorrerá muito tempo sem que varie para melhor
proporção ora existente entre os que sabem e os que não sabem ler”
(Brasil, 1877, p.19-20).
110 • Carlos Monarcha

Na massa da população livre, 1.563.078 “sabem ler e escrever”,


6.856.000 “não sabem ler e escrever”. Entre os que “sabem ler”:
1.012.097 são homens, 550.981 mulheres; analfabetos 80% da
população livre e 99,9% da população escrava. Províncias nas quais
avultam analfabetos: Alagoas, Amazonas, Ceará, Goiás, Minas Gerais,
Paraíba; em situação menos acabrunhante: Rio de Janeiro, Rio Grande
do Sul, Paraná, Maranhão. Há variação relativa na coluna “Instruídos”
se observamos que os percentuais incluem a população de 0 a 6 anos
de idade.44 Das populações em atividade, 80% se dedicam ao setor
agrícola, 13% ao de serviços e 7% à indústria. Na categoria “serviços”,
mais da metade referia-se a empregados domésticos.45

Da obrigatoriedade

Uma das províncias do Império em que a instrução está mais


generalizada é a do Rio de Janeiro. Pois bem, leia-se o relatório do Sr.
visconde de Prados, ver-se-á qual a distribuição das escolas e quais as
facilidades que lá mesmo encontram para aprender a ler e escrever. Há
perímetros de tal extensão, em que os moradores das extremidades
precisariam do dia inteiro para ir às escolas e voltar das apetecidas lições.
José Bonifácio de Andrada e Silva, o moço, discurso de 28 de maio
de 1879.

O artigo 179, §32, da Constituição Política do Império estipulara


a gratuidade da instrução primária, mas não a obrigatoriedade. Desde

44
“Mesmo descontando-se o fato de que os percentuais se referem à população
total, sem excluir crianças nos primeiros anos de vida, eles são bastante
elevados. Apurou-se que somente 16,85% da população entre seis e quinze
anos frequentavam escolas. Havia apenas 12 mil alunos matriculados em
colégios secundários. Entretanto, calcula-se que chegava a 8 mil o número
de pessoas com educação superior no país. Um abismo separava, pois, a elite
letrada da grande massa de analfabetos e gente com educação rudimentar”
(Fausto, 2000, p.237).
45
Cf. Apêndice A – Tabela B.
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 111

o decênio de 1840, os relatórios das públicas autoridades debatiam


o estatuto da obrigatoriedade escolar, só assim, dizia-se, as crianças
estariam a salvo da ignorância e indiferença dos pais, tutores e amos.
Dentre os argumentos, a convicção herdada dos reis-filósofos e seu
esclarecido despotismo, a necessidade de compelir as massas humanas
para formas de vida civilizadas.
O vozerio dos homens hábeis da monarquia, vozerio a defrontar
o embotamento popular, enuncia com veemência o estatuto da
obrigatoriedade, assunto pertinente à razão de Estado, dele, o estatuto
dependeria o aperfeiçoamento da sociedade civil, donde a ênfase nas
luzes do conhecimento para o bem do Estado e suas instituições
políticas. Ou por outra, pela obrigatoriedade, o longo braço do Estado
alcançaria franjas sociais e rincões, os mais longínquos, a escola primária
não apenas alfabetizaria, mas também ensinaria maneiras, moralidades
e significado das estruturas jurídicas e institucionais.46 Se assim for,
ativada por propósitos políticos nacionais, a instrução pública forjaria
a identidade nacional (empresa fartamente compartilhada, note-se,
pelos conselheiros José de Alencar e Gonçalves de Magalhães em suas
respectivas obras literárias). Na construção identitária, a nação (e o
Estado), expurgada as contradições, aparece como síntese americana
de brancos europeus, negros africanos e indígenas.

Formar o espírito público

Num âmbito mais significativo, o marco legislador referencial


do estatuto da obrigatoriedade escolar é, mormente, o regulamento da
instrução primária e secundária do Município Neutro, Decreto nº 1.331-

46
Inexistindo a separação entre Estado e Igreja, o catolicismo é a religião
oficial, a Igreja atua onde o braço do Estado não logra interiorizar-se, e
exercia parte das funções administrativas e políticas. No dizer do visconde de
Bom Retiro, Luís Pedreira do Couto Ferraz, o catolicismo “[...] esclarecendo
a população de nossos sertões e do interior do Brasil que, em geral, pouco
ilustrada, tanto carece de autoridades e a chame ao caminho legal.” Atas do
Conselho de Estado, 1875, citado por Alonso (2002, p.64).
112 • Carlos Monarcha

A, de 17 de fevereiro de 1854, de iniciativa de Luiz Pedreira do Couto


Ferraz. Além da gratuidade, o decreto estatuía a obrigatoriedade, reforçada
pela aplicação de penalidades aos responsáveis omissos e contumazes.

Art. 64 – Os pais, tutores, curadores ou protetores que tiverem em


sua companhia meninos maiores de sete anos sem impedimento físico
ou moral, e lhes não derem o ensino pelo menos de primeiro grau,
incorrerão na multa de 20$ a 100$ conforme as circunstâncias.
A primeira multa será dobrada na reincidência, verificada de seis
meses. O processo nestes casos terá lugar ex officio, da mesma sorte que
se pratica nos crimes policiais.
Art. 65 – O Inspetor Geral, por si e por seus Delegados, velará
eficazmente na execução dos artigos antecedentes; e para este fim haverá
das Autoridades locais as listas das famílias, contendo os nomes e idades
dos meninos pertencentes a cada uma (Brasil, 1854, art. 64-65).

Na interpretação de José Ricardo Pires de Almeida. “O ensino


obrigatório estava, depois de 1854, inscrito na imortal reorganização
elaborada, sob o olhar do imperador, por aquele que se tornou mais
tarde visconde de Bom Retiro.” Mais à frente, o ministro Carlos
Leôncio de Carvalho, pelo Decreto nº 7.247, de 19 de abril de 1879,
reativaria a obrigatoriedade nas escolas primárias de 1º grau, fazendo-a
acompanhar de penalidades aos recalcitrantes.

Art. 2 – Até se mostrarem habilitados em todas as disciplinas que


constituem o programa das escolas primárias do 1º grau, são obrigados
a frequentá-las, no município da Corte, os indivíduos de um e outro
sexo, de 7 a 14 anos de idade.
Esta obrigação não compreende os que seus pais, tutores ou
protetores provarem que recebem a instrução conveniente em escolas
particulares ou em suas próprias casas, e os que residirem à distância
maior, da escola pública ou subsidiada mais próxima, de 1½ quilômetro
para os meninos, e de 1 quilômetro para as meninas (Brasil, 1879, art. 2).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 113

Os responsáveis omissos sujeitavam-se a multas de 20 a 100$000,


meninos chegados aos 14 anos sem concluir a escola de 1º grau
prosseguiriam em paróquias, se houvesse ensino para adultos. No mais,
pelos atos dos presidentes de províncias, o estatuto da obrigatoriedade é
retomado como parte da afirmação do poder público, em âmbito local.
Orgulhosa de si, a publicação oficial, O Império do Brasil na
Exposição Universal de 1876 em Filadélfia, atestava a gratuidade do
ensino público primário articuladamente à tendência à obrigatoriedade,
no Brasil império, segundo a publicação, o “fato deixara de ser
proclamado para ser fato praticado”.

Como em todo o mundo civilizado, ocupa a atenção dos governos


geral e provinciais a necessidade de tornar efetiva esta medida, e,
pois, tratam de prover as sua execução atentando as suas dificuldades
provenientes das grandes distâncias, e da variedade da lavoura nos
distritos rurais, em que nossos meninos de certa idade auxiliam os
pais, nos trabalhos de campo (O Império..., 1875, p.133).

Conforme os dados da publicação, o país contava com 20


províncias, 685 municípios, incluindo o Município Neutro, 255
cidades, 460 vilas, 1.553 paróquias, 12 dioceses. Ceará, Maranhão,
Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Pernambuco, Santa
Catarina, São Paulo, Sergipe estatuíam a frequentação obrigatória, Rio
Grande do Norte a circunscrevia às sedes das cidades, vilas e povoações.
À época, certas províncias fixam a idade escolar entre a idade de
7 e 10 anos outras de 7 e 12 ou ainda de 7 e 14 e 7 e 15. Entrementes,
era frequente condenar as escolas por contrariarem a moralidade exigida
pelas famílias. “As crianças das classes razoavelmente abastadas não vão
à escola pública porque seus pais têm, mais ou menos, o preconceito
de cor ou porque temem, e com razão, pela moralidade de seus filhos,
em contato com esta multidão de garotos cujos pais os enviam à escola
apenas para se verem longe deles algumas horas (Pires de Almeida, 1989
[1889], p.90). Assim como é frequente invocar a precisão dos filhos, no
114 • Carlos Monarcha

ganha-pão da família, contudo há outro dado a ser considerado nos


lugares sob o predomínio da oralidade como meio de comunicação
pessoal e da aprendizagem imitativa e intracomunitária, isto é, com
adultos, remanesce certa indisposição quanto a matrícula e frequentação,
a escola aparece como algo ostentatório e desviante, a letradice, cria-se,
acabaria por desmerecer o trabalho no campo e na oficina.

“Boa é a lei se dela faz uso legítimo”

O Código de Instrução da província de São Paulo, 1857, é um


dos bons exemplos dos extremos da legislação provincial quanto à
escolarização das populações alheias à alfabetização, ao mesmo tempo
em que ilustra a perfeição a tese da construção do poder local. Entre os
tantos propósitos do código, consta o enquadramento das populações
ralas viventes em rotinas obscuras e pertinazes, ensimesmadas em
sobradões ou dispersas em casebres de taipa rude em chácaras e
lugarejos à beira de estradas, então a província guardava antiquíssima
fisionomia colonial.47
Elaborado por conhecedores do Direito Público, Antonio
Joaquim Ribas, João Dabney de Avelar Brotero e Diogo de
Mendonça Pinto,48 o código, pela abrangência das disposições, 493
artigos, dezenas de capítulos, centena de parágrafos, quer galgar
o Céu e abraçar a Terra. Para fins de inspeção, o dispositivo legal
segmenta a província em Círculos Literários com sedes nas cabeças
de comarcas; em cada círculo, um inspetor literário nomeado dentre
os residentes, se graduados em Letras ou Ciências ou se professores
distinguidos pela aplicação.
Aos subinspetores reserva-se a tarefa de “Inculcar nos pais de
família a necessidade de mandarem seus filhos à escola de primeiras
letras, e dispor de meios adaptados a fazê-los sentir a necessidade de se
estender, e progredir a instrução primária.”

47
Cf. Marcílio (2014).
48
Cf. Sacramento Blake (1883-1902).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 115

O capítulo “Da obrigatoriedade do ensino” estatui a


obrigatoriedade entre 7 e 15 anos de idade para crianças residentes
no raio de ¼ de légua da povoação em que houvesse escola pública
ou particular. Os subinspetores requisitariam às autoridades policiais
do Distrito uma relação dos menores de 15 anos residentes no raio da
obrigatoriedade, certificariam nome, idade e naturalidade do menor,
se era analfabeto, se completara a instrução primária ou se apenas a
começara. No caso de ser menor órfão ou não residir com os pais,
seria anotado o nome do tutor, curador, amo ou pessoa com a qual
residia. “Sendo o menor filho natural, e não querendo os pais serem
conhecidos, se lançará a nota – filho de pais incógnitos.”
O subinspetor corrigiria as inexatidões e omissões nas relações
nominais dos contumazes, em seguida solicitaria informações
aos párocos, Juízes de Paz e demais autoridades. Se necessário,
convocaria os menores, acompanhado de um professor, pároco ou
pessoa habilitada, verificaria se a criança é analfabeta ou de instrução
incompleta. Em editais nos jornais ou afixados em escolas e igrejas, o
subinspetor comunicaria os resultados da verificação aos responsáveis
pelo menor. Findo o prazo, intimaria pessoalmente os responsáveis,
impondo-lhes multas, se refratários, sujeitar-se-iam à duplicação
cumulativa do valor previsto, se ausentes pais e amos, as mães saldariam
os débitos. Se preciso fosse, o subinspetor requisitaria aos Juízes de
Órfãos a nomeação de tutores ou curadores para órfãos e filhos de
pais suspensos do pátrio poder ou portadores de “defeitos intelectuais
ou morais”; nesses casos, os juízes colocariam os menores à soldada,
cabendo aos novos amos mandá-los à escola ao “menos uma vez por
dia”. No fecho do capítulo, severa disposição: autoridades policiais, da
instrução pública, ou quaisquer outras, descumpridoras das disposições,
sujeitavam-se à multas de 50$000 a 100$000 réis.
Apesar das disposições severas, a realidade do dia a dia prossegue
ao arrepio da lei, por décadas, os relatórios do inspetor-geral, crônicas
documentadas da vida na província, Diogo de Mendonça Pinto,
realçam o quadro mazelado. Tirocínio inepto e moralidade frágil dos
116 • Carlos Monarcha

mestres, cadeiras vagas ou ocupadas minoritariamente por professores


“definitivos” e majoritariamente por interinos, ordenados mesquinhos,
métodos ineficazes, falta de utensílios, resistência em mandar a meninice
à escola.49 E, muito embora os apelos se repetissem, “Prevaleça-
se a Autoridade Pública do seu direito de forçar aos Cidadãos dos
povoados que se instruam”, como ditara Antonio Saraiva, presidente
da província de S. Paulo, apelo reforçado por João Theodoro Xavier,
também presidente de S. Paulo, na Lei nº 9, de 22 de março de 1877,
o estatuto da obrigatoriedade permanece na estaca, numa frase, a lei é
dura, mas a aplicação é flácida.

Não à “liberdade de persistir na ignorância”

Os “homens do mais avançado espírito”, empenhados em


demonstrar que a natureza humana pode ser aperfeiçoada, avizinham-
se na imposição do ensino público. No contencioso das doutrinas
jurídicas, nos embates sobre o dobramento autoridade/liberdade,
liberdade/autoridade, as posições são excludentes. Para uns, “o direito
de fazer o que era contra o direito natural da pessoa era inadmissível”,
para esse ponto de vista, o Estado deveria fiar os direitos conaturais
da pessoa. “Tão legítimo, como é legítimo o pátrio poder, o qual não
envolve certamente o direito desumano de roubar ao filho o alimento
do espírito, – o ensino obrigatório é às vezes o único meio de mover
pais e tutores remissos ao cumprimento de um dever sagrado. Nas
cidades, por exemplo, onde haja escolas suficientes, como não sujeitá-
los a multas, ou a trabalhos e prisão no caso de reincidência” (Tavares
Bastos, 1937 [1870], p.139).
Posição semelhante demonstrara Liberato Barroso, ex-
ministro da Justiça no gabinete de Francisco José Furtado. Convicto
monarquista, sincero abolicionista, a seu turno, o conselheiro João
Alfredo expressava idêntico ponto de vista (apud Oliveira, 1874,
p.133-134). “O Estado tem o direito de obrigar os pais, tutores,

49
Cf. Kubo (1986) e Monarcha (1999).
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 117

todos os que, enfim estão encarregados de qualquer indivíduo em


idade de frequentar a escola, de fazê-lo aprender a ler e escrever.
Este direito decorre da proteção devida pelo poder público àquele
que tem necessidade de intervenção da sociedade, para gozar das
garantias que lhe são conferidas pela lei.” Em conferência literária
na Glória, 1873, Afonso Celso de Assis Figueiredo, visconde de
Ouro Preto, compartia idêntica convicção. “Da instrução pública
depende a aspiração suprema das sociedades modernas, a liberdade
consorciada com a ordem”; e citava Laveley, autor de L’instruction
du peuple. “‘A criação da escola importa a supressão da cadeia: o
Estado que não instrui, carece amedrontar, porque os dois grandes
mantenedores da ordem social são – o carrasco e o professor
público’. Não pode haver hesitação na escolha, senhores”.

Se o pai degenerado, que seus filhos dos alimentos, é responsável


perante a lei, que intervindo em favor das míseras crenças, lhe pede
severas contas e o obriga a cumprir tão sagrado dever, não há razão
para que não seja igualmente responsável, não preste as mesmas
severas contas, quando deixa de satisfazer necessidades muito mais
importantes que as físicas. Demais, senhores, as conveniências gerais,
o interesse de todos exige por vezes a sujeição da vontade individual à
vontade da lei (Figueiredo, 1924, p.268).

Ademais o visconde introduzia uma interpelação crucial, a


instrução dos libertos. “Se não cuidarmos de proporcionar os meios
para a educação dos libertos, teremos em poucos anos um crescido
número de brasileiros, que, vegetando na ignorância e na miséria, irão
povoar as enxovias ou os hospitais, depois de terem sido elemento
de desordem e perversão.” Para Afonso Celso, nas províncias de
populações aglomeradas em cidades, vilas, aldeias e povoados, a
exigência de frequentação assomava como algo factível. “Mas, nas
nossas vastas províncias, onde se dizem vizinhos indivíduos residentes
a cinco e mais léguas uns dos outros, e fazenda há que ficam a 10
118 • Carlos Monarcha

e 20 das povoações mais próximas, claro é que uma exigência seria


impossível” (Figueiredo, 1924, p.268, grifo do autor).
Por seu lado, ao colocar o estatuto da obrigatoriedade no espelho
da reflexão, Rui Barbosa sentenciava. “Assim como a obrigação escolar
pressupõe, em boa doutrina que, aliás, a prática nem sempre tem
observado, a gratuidade da escola, assim a escola gratuita sem a frequência
imperativa representa uma instituição mutilada” (1947 [1882], p.181).
Para outros tantos, a ação do Estado contrariava a liberdade individual.
“A instrução e a educação obrigatórias são exorbitantes da missão natural
do Estado e atentatórias ao direito de personalidade e aos direitos da
família.” Doutrinava José Maria Correia de Sá e Benevides em Elementos
de filosofia do Direito privado (1884, p.35).
Noutro plano, questionava-se a inconstitucionalidade do estatuto
da obrigatoriedade face às franquias provinciais, o poder legislativo
geral não teria legitimidade para fixar leis comuns para as províncias. De
qualquer modo, no decênio de 1870, firmavam-se certezas, a lógica da
boa organização escolar recomendava a gratuidade e a obrigatoriedade.
Dogma social benquisto, o “regime coercivo” representaria ato de
proteção perante os cometimentos paternos. Grosso modo, os debates
remetem à decretação da obrigatoriedade, respeitando-se a distância
entre a moradia e a escola.
Num ato de generosidade, o Estado, províncias e municípios
forneceriam aos “meninos filhos das classes pobres”, roupas,
compêndios, utensílios; aos pais, tutores e protetores desidiosos
seriam aplicadas penalidades gradualmente mais fortes, por exemplo,
a infração acarretaria perda de direitos políticos ou prisão, em caso
de reincidência. Acompanhemos os termos do Regulamento geral
da instrução do Espírito Santo, baixado em 1882, no governo de
Herculano Marcos Inglês de Souza.

Artigo 3º – O ensino elementar é obrigatório para todas as


crianças de 7 a 10 anos de idade. Para eximirem os filhos e tutelados
da frequência da escola elementar, os pais e tutores provarão:
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 119

§1º – Que no seio da família, ou em aula particular, se lhes ministra


o ensino exigido por esse regulamento;
§2º – Que os filhos tutelados têm moléstias ou defeito físico que
os inibem de ir à escola;
Artigo 4º – Para esse fim os pais e tutores são obrigados a
comunicar a autoridade competente, logo que seus filhos e tutelados
atingirem a idade prescrita, que os estão instruindo em casa ou em
aula particular, ou a participar o motivo porque não lhes proporciona o
ensino (Espírito Santo, 1882, art. 3-4).

Considera-se a obrigatoriedade arrimo das instituições sociais e


políticas, figura-se a escola primária de Estado como crisol da consciência
civil. Em defesa do estatuto da obrigatoriedade, evocava-se o exemplo
das “nações esclarecidas”, Bélgica, Dinamarca, Espanha, França,
Holanda, Inglaterra, Itália, Portugal, Prússia, Suécia, Suíça, Estados
da união americana. De fato, assistia-se à aprovação quase universal da
obrigatoriedade escolar (e da conscrição militar), mais pontualmente,
Prússia e França assomavam como faróis-guias em matéria de organização
e pedagogia escolar. E não raramente se imputava ao estatuto da
obrigatoriedade a causa do soerguimento da Prússia abatida pelas tropas
de Napoleão I, donde repetir-se a exaustão uma sentença atribuída a
Bismarck. “Quereis saber o que tem levantado a Prússia? São duas coisas:
a obrigação do serviço militar e a obrigação do serviço escolar.”
Variantes dessa frase proverbial, ecoam no tempo longo:
“Creio ter sido Guilherme II quem afirmou dever a Alemanha a sua
fulminante vitória de 70 ao mestre-escola e ao sargento” (Camargo,
1931, p.56). E, de algum modo, a Primeira Exposição Pedagógica, as
atas e os pareceres do malogrado Congresso da Instrução condensam
as expectativas vigentes.50 Exarados por Silvio Romero, Antonio Bahia
da Silva Araújo e Antonio da Cunha Leitão, os pareceres sobre o
ensino obrigatório e os meios de efetivá-lo, simulavam cartas rogatórias
a favor da autoridade pública, justiça e penalidades.51

50
Cf. Collichio (1987).
51
Cf. Atas... (1884).
120 • Carlos Monarcha

Rogava Silvio Romero. “Os meios práticos de tornar efetiva


a obrigatoriedade de ensino são de três ordens: a sua gratuidade
aos pobres, a difusão de escolas por todo o país, especialmente nos
centros populosos, e imposição de penas aos pais, tutores, protetores
que não mandarem seus filhos, pupilos e protegidos” (Atas..., 1884,
p.2). Rogava Antonio Bahia da Silva Araújo. “Obrigado pela lei civil
a alimentar os filhos, não menos obrigado deve ser o pai a prestar-lhes
o alimento do espírito, as antigas leis do direito romano colocavam a
prole como propriedade do pai, no direito moderno aos pais cumprem
o dever de cumprir o que natureza lhes impõe em relação à prole”
(Atas..., 1884, p.3). No mesmo diapasão, Antonio da Cunha Leitão. “O
ensino obrigatório não é uma utopia, como pretendem alguns, é não só
praticável, como eficaz. A lei não pode ser indiferente ao cumprimento
deste dever, que tão de perto afeta os interesses do Estado; e como a
principal mantenedora da ordem social, tem o direito, que também
assume as proporções de um dever, de exigir que o pai cuide do
primeiro desenvolvimento intelectual dos filhos, não só para prepará-
los afim de bem poderem desempenhar os ônus da cidadania, como
também em benefício da própria sociedade de que eles têm de fazer
parte” (Atas..., 1884, p.15).
Em escala modesta, nem por isso menos significativa, nas
províncias multiplicam-se opúsculos e conferências referidos à
liberdade de ensino e à obrigatoriedade escolar. Breve balanço permite
situar a circulação de escritos sociais em tom de manifesto de opinião:
O ensino obrigatório, carta aberta endereçada à Assembleia Provincial
de Santa Catarina, por Joaquim dos Remédios Monteiro; Ensino
obrigatório, de Oliveira Fernandes, discursos na Assembleia Provincial
Legislativa de São Paulo; Ensino obrigatório, de Manuel Francisco
Correia, conselheiro do Império, conferência sobre a legitimidade
das Assembleias Provinciais na imposição de penalidades. E, apesar
das diferenças inter-regionais, os presidentes de províncias operam
idênticos dispositivos jurídicos; mas aqui é preciso acautelar a palavra
e distinguir a lei formal da aplicação real. Se a legitimidade dos regimes
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 121

representativos demanda a manifestação da vontade do povo, fazia-se


preciso ofertar serviços de instrução pelo Estado. Na rotação do tempo,
firmar-se-ia tripla convicção, formação da nacionalidade, segurança do
Estado e funcionamento das instituições dependeriam de uma primeira
instrução de Estado comum a todos. Em tom teratológico, replica hábil
estadista da monarquia, Alfredo do Nascimento Silva, em “Um átomo
de história pátria. Histórico da Sociedade Amante da Instrução”. “A
higiene social tem de proceder do mesmo modo, vigiando de perto
a podridão, queimando as pústulas sociais, sacrificando os membros
para salvar o corpo e, sobretudo, amparando na queda os que tombam,
sendo mãe da orfandade e regaço dos abandonados, fortificando os
espíritos, lhes difundindo a instrução, e pregando-lhes a moral!” (Silva,
1892, p.102). Para reviver metáforas e anseios da época, purificar
costumes, fecundar corações, distribuir benefícios da lavoura, comércio
e indústria, promover higiene social, emancipar a pessoa pela assunção
do autogoverno, engrandecer o país e cimentar os laços provinciais,
seriam fins alcançáveis pelo alastramento de uma luz geral entre as
massas analfabetas viventes em franjas sociais e confins territoriais.
123

Vozes testamentárias

Na antemanhã da República, o estado da instrução era este: ensino


primário, secundário no Município Neutro e superior em todo o país
a cargo do governo central e gerido pelo ministro do Império; ensino
primário, normal e profissional sob a alçada dos poderes locais, legislados
pelas Assembleias provinciais e administrados pelas inspetorias gerais. E
como a contradizer os avanços civilizacionais do Segundo Reinado, Carlos
Leôncio de Carvalho, sincero estadista liberal, eriçava reflexões.

Um dos maiores benefícios da Exposição Pedagógica foi patentear


o estado da nossa instrução primária, que muitos ignoravam. Pouco se
cuida da educação do sexo feminino, para o qual apenas existem em
todo o país 1.315 escolas. Os meninos que ainda não têm atingido
a idade escolar (7 anos) vagam pelas ruas, contraindo maus hábitos,
importunando os transeuntes, atropelados pela polícia, que não sabe o
que fazer deles (Carvalho, 1884, p.34-35).

Às análises especulativas, Leôncio de Carvalho encarrilhava


números ao mesmo tempo comprobatórios e restritivos: massa da
população – 9.930.478 habitantes, analfabetos – 8.365.997, população
em idade escolar de 6 a 15 anos – 1.902.454, frequência escolar –
321.449 alunos; escolas públicas – 4.486; escolas particulares – 913;
colégios – 286; para adultos analfabetos, 4/5 da população, 47 escolas
frequentadas por 1.121 discípulos.
124 • Carlos Monarcha

Grande parte dos mestres não possuía as habilitações


necessárias ao exercício do magistério, “cabendo a culpa disso
aos poderes públicos, que não lhes querem dar escolas normais.
São demasiadamente mesquinhos os vencimentos do magistério
primário; paga-se a um professor menos do que a empregados
subalternos de muitas repartições.” A essas condenatórias, Leôncio
de Carvalho acrescia a intolerância com os acatólicos, a inexistência
de matérias para educação intelectual, moral e física, a ausência de
inspeção escolar, os métodos de ensino “morosos e difíceis”, a jornada
escolar em dois períodos separados por longo intervalo obrigando os
pais a mandarem os filhos duas vezes a escola.
Num exercício de educação comparada, a querer demonstrar o
atraso nas coisas da instrução, o liberalista Leôncio de Carvalho alude
às realidades progressivas da Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica,
Canadá, Escócia, Hungria, Inglaterra e Irlanda. E por essas coisas do
destino, sempre insondável, sempre imprevisível senão surpreendente,
ao barão de Santa-Anna Nery, na companhia do barão de Saboia,
Luiz Cruls e do contra-almirante barão de Teffé, coube oficializar o
derradeiro balanço do Segundo Reinado em Le Brésil en 1889, obra
organizada para documentar a participação do Brasil na Exposição
Universal de Paris em 1889. No introito “Le Brésil actuel”, Santa-Anna
Nery enfileira imagens afirmativas. “Não há mais, senão cidadãos livres
submetidos aos mesmos deveres e gozando dos mesmos direitos”,
“O Brasil veio a Paris não para se impor, mas fazer a velha Europa
constatar que ele não é indigno, pelos progressos que realizou, de
entrar mais profundamente ainda no concerto econômico dos grandes
Estados.” Na sequência, sólidos capítulos de hidrologia, climatologia,
mineralogia, estatística, história, geografia, demografia, agricultura,
comércio, indústria, finanças, ferrovias, migração e artes, assinados
por grandes nomes, Henri Gorceix, José Maria da Silva Paranhos,
André Rebouças, Leitão da Cunha, Eduardo Prado e outros mais. No
capítulo “Instruction publique”, repertório extenso, Santa-Anna Nery
estocava dados significativos.
II. Do apogeu ao fim do Segundo Reinado • 125

No Brasil, o ensino primário é de responsabilidade da província


e das municipalidades, exceto no Município Neutro onde a
responsabilidade é do ministério do Império. O ensino secundário
parte dos governos provinciais, mas o Estado mantém duas escolas
secundárias em duas províncias; e, no Rio de Janeiro, esse ensino, da
mesma forma que a instrução primária, parte do Estado. Apenas o
ensino superior constitui, de fato, um monopólio do Estado, que
distribui os programas e dispõe dos estabelecimentos especiais onde
esse ensino é dado.
Nossos municípios e, sobretudo nossas províncias são livres na
escolha do pessoal do ensino, na fixação dos programas, na adoção dos
métodos e na criação de escolas. O Estado não impõe a eles nenhum
encargo administrativo, nenhum direito de inspeção.

E estocava mais ainda.

O ensino primário é gratuito para todos, em virtude do artigo


179, parágrafos 32 e 33, título VIII da Constituição brasileira de 25 de
março de 1824; e o Ato Adicional de 12 de agosto de 1834 declarou
que é parte das Assembleias Provinciais legislar sobre a instrução
pública e sobre os estabelecimentos aptos a distribuí-la, exceção feita
aos estabelecimentos de instrução superior então existentes como
também a todos os outros que seriam criados no futuro por uma lei
geral do Estado.
O ensino primário é obrigatório em certas províncias; em outras
torna-se facultativo. Quanto à laicidade, essa palavra não está ainda em
nosso vocabulário pedagógico. A instrução religiosa é dada em quase
todos os estabelecimentos escolares, e, mais frequentemente, pelos
laicos, sem que seja resultado até aqui de graves inconvenientes. Fora
da capital, todas as províncias se colocam como um dever e como um
ponto de honra possuir, e manter, ao menos uma escola secundária
e uma escola normal primária na sua cidade principal (Santa-Anna
Nery, 1889, p.231 – grifo do autor).
126 • Carlos Monarcha

Nesse ano de 1889, mais exatamente no mês de maio, na Fala


do Trono, abertura da quarta sessão da vigésima legislatura, solene
e elevada, a voz monárquica de Pedro II sugere à Assembleia Geral
Legislativa a criação de um ministério da Instrução e demais ações
necessárias à instrução pública, algumas, note-se, debatidas por ocasião
da Assembleia Geral Constituinte.

Entre as exigências da instrução pública, sobressai a criação de


escolas técnicas adaptadas às condições e conveniências locais; a de
duas universidades, uma ao sul e outra ao norte do Império, para
centros de organismo científico e proveitosa emulação, donde partirá
o impulso vigoroso e harmônico de que tanto carece o ensino;
assim como a de faculdades de ciências e letras, que, apropriadas às
províncias, se vinculariam ao sistema universitário, assentando tudo
livre e firmemente na instrução primária e secundária (Falas do
Trono..., 1977 [1889], p.145).

Meses depois, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, José do


Patrocínio confirmava a proclamação da República. A essa altura dos
fatos, viria a público o decreto de banimento da família real redigido
por Rui Barbosa. Exilada, a família real, embarca para a Europa no
vapor “Alagoas” escoltado pelo couraçado “Riachuelo”; no bolso da
sobrecasaca, conta-se, o imperador guardava um exemplar de Cenas
da vida amazônica, de José Veríssimo. Na comitiva, uns tantos poucos
desventurados, o engenheiro negro André Rebouças, os barões de
Loreto e de Muritiba. Num breve e melancólico ato, encerrava-se
o teatro do mundo monárquico. No mais, entre silabários, cartilhas,
cartas do ABC, compêndios, crestomatias, livros de leitura, catecismos,
métodos de ensino os mais diversos, processava-se a escolarização de
parcelas de crianças brasileiras.
Parte III

Do Governo Provisório
republicano à virada do século

Nós tivemos já a reforma radical no governo, cumpre-nos completar


a obra da revolução pela reforma profunda da nossa educação nacional.
José Veríssimo, A educação nacional (1890)
129

Sob a bandeira fraternal

Liberdade! Liberdade!
Abre as asas sobre nós,
Das lutas na tempestade
Dá que ouçamos tua voz
Nós nem cremos que escravos outrora
Tenha havido em tão nobre País...
Hoje o rubro lampejo da aurora
Acha irmãos, não tiranos hostis.
Hino à Proclamação da República do Brasil
Letra de Medeiros e Albuquerque. Música de Leopoldo Miguez

O povo como sujeito de direito

Em uníssono, os instituidores da República elaboram versões


dos fatos da hora. No arrazoado de vozes, o contrato social anterior
convertera-se em alvo de desafeição; corroída pelo tempo, a solução
monárquica, dinástica e constitucional atestara o declínio dos padrões
públicos. Nova forma de legalidade, a República, consciência de si feita
razão, aparece como governo revolucionário e de bem-estar, a seu favor,
dizia-se, estava a jornada de futuro, daí a figuração da república como
bela totalidade e governo bem-acabado.
Votivas e embelezadoras, as fórmulas sagradas herdadas da
Revolução Francesa retornam à cena política; “Cidadão”, “Saúde
130 • Carlos Monarcha

e Fraternidade” auguram o futuro do presente. Como solução


reconciliatória, concretizava-se a ideia obstinada de res publica.
Perquirição absorvente dos últimos e incondicionados valores,
o novo regime tornou-se realidade ao reunir frações ideológicas
diversas, cada qual a prodigalizar doutrinas opostas: republicanos
radicais, positivistas, maçons, liberais e, claro, adesistas de última
hora. No contra-ataque, os monarquistas aclamam outras versões
dos acontecimentos, com efeito, nomeiam o “episódio de 15 de
novembro de 1889” como “sedição militar”, “exortação às armas” e
“golpe de Estado”.
Magnificado como aurora da civilização política, “dilúvio de
luz” no dizer extravasado de um contemporâneo, em tese o novo
regime afiançava o começo de uma era de livre associação. No
imaginário prometeico, espécie de lição de energia ministrada pelos
revolucionários, a república concentrava em si o encontro da razão
com a história. Nessa teleologia da perfectibilidade, a figura do Povo-
soberano desponta como herói coletivo, ente legislador e fonte da
legitimidade do poder. Daí em diante, os publicistas iriam propor às
massas os motivos constitutivos da trindade republicana – liberdade,
igualdade, felicidade.
Se a Independência despedira o jugo colonial, se a monarquia
demitira o trabalho servil, a República fora mais além, ao despedir
o Poder Moderador, a vitaliciedade do Senado, a eleição à base
de renda, a escolha dos governantes locais pelo poder central,
os privilégios de nascimento, a nobreza titulada e o estatuto do
padroado. E, mais ainda, num gesto de fraternidade universal,
naturalizara os estrangeiros residentes no país. Porquanto, instituía-
se uma república democrática e social – a igualdade na forma de
liberdade, o governo pelo consentimento dos governados. Em tese,
ao vencer duro percurso, virava-se uma página da história; para o
imaginário político, o mar de escolhos, ficara para trás, o presente
figurava-se inteligível, o porvir, dizível. Diz Euclides da Cunha
(1975 [1909], p.45).
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 131

Impertinente em 1822, inoportuna em 1831, abortícia em 1848,


era-o a República, sobretudo porque se não podia inverter a série
natural da evolução humana. Aspiração política, requeria que lhe
propiciasse o advento do desenvolvimento social. A sociedade não a
repelia; prorrogava-a. E a partir da de 1875 começou a incorporá-la.

Na passagem de um estado de coisas, marcado pela agonia


para outro imarcescível, os doutrinários aprofundam o sentido
dos acontecimentos, em oposição à monarquia, ao absolutismo,
ao centralismo e ao arbítrio do privilégio, triunfara a soberania
popular pela representação política, o consentimento espontâneo
e a coesão coletiva constituiriam os vigamentos do novo regime.
Experimentava-se solene vontade cívica; ao profetizar o vir a ser, as
consciências republicanas pressentiam decididas evoluções, uma vez
que os direitos usurpados pela monarquia eram devolvidos ao povo.
No mais, a exaltação vitalista do povo levava a interpretar a República
como recomeço determinado pela vontade geral.52 Inaudito, o estado
de coisas aparece como correlato de revolução.53
Regime fundado sob o primado da isonomia, a República, em
termos ideais, exterioriza a majestade do governo popular, melhor,
materialização da vontade política racional. Tomados pela exaltação
vitalista do Povo-soberano, os sujeitos auguram o devir de um governo
fundado num contrato social livre de contingências, donde o empenho
em transfigurar o povo em corpo político juridicamente regulado,
porquanto sede física da soberania. Invocava-se a magistratura

52
Cf. Monarcha (1989).
53
O tema da revolução representado como ato de fundação (e construção) de
um novo corpo político expressivo de novos valores sociais, como liberdade e
felicidade públicas, próprios de sociedades populares e analisado por Arendt
(1988). Para a autora: “O conceito moderno de revolução, inextricavelmente
ligado à noção de que o curso da História começa subitamente de um novo
rumo, de que, uma História inteira nova, uma História nunca antes conhecida
ou narrada está para se desenrolar, era desconhecido antes das duas grandes
revoluções no final do século XVIII” (p.23).
132 • Carlos Monarcha

da história, a verdade da consciência de si, de súbito, a linguagem


enriquece-se com dísticos absolutos – moralidade, liberdade, felicidade,
fraternidade, justiça, ordem, progresso, igualdade civil, paz pública.
Multiplicam-se as preocupações com a vida nacional em suas diferentes
manifestações: instituições, política, Estado, cultura, melhoramentos
de material, agregação coletiva. O novo regime, imaginava-se, abrigaria
a nação laica e igualitária, a federação harmoniosa e progressiva, ao
outorgar existência política ao povo, retiraria do anonimato homens e
mulheres comuns, alçando-os à cidadania política. Em síntese, o feixe
de aspirações gira em torno do discurso autorreferencial da República
como regime antecipatório da humanidade futura.

Dos relatos e versões

Em cena aparentemente captada em oitiva, o republicano radical,


Alexandre Dias Ferreira Júnior, descrevia os acontecimentos da hora.

O Marechal Deodoro e Quintino Bocaiuva, aureolados de glória,


se puseram à frente de 4.000 soldados, e percorreram as principais ruas
do Rio de Janeiro, erguendo frenéticos vivas a República, aclamando a
deposição da monarquia. A passagem dos batalhões o povo abria alas
e saudava o exército vitorioso, atirando sobre ele radiantes grinaldas,
que estrelavam majestosamente o solo por onde transitavam, jubilosos,
pelo triunfo da grandiosa causa da liberdade da pátria.
Nas ruas. Durante todo o dia e até alta hora da noite o povo
percorreu as ruas do centro da cidade, formando diversos grupos
precedidos de bandas de música. Expansiva em seu entusiasmo, a
população erguia vivas e saudações à imprensa livre, aos bravos do
exército e da armada, ao Marechal Deodoro, a Quintino Bocaiúva, ao
país e à República Brasileira (Ferreira Júnior, 1890, p.68).

De resto, coube a Henrique Bernardelli oficializar na tela


“Proclamação da República” a iconografia do “15 de novembro”. Em
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 133

perspectiva ultrarrealista, ele figurava a passagem ao ato. No centro


da tela, a cavalo, num gesto decidido, Deodoro da Fonseca alça
o barrete militar e proclama a República; o cenário, o Campo de
Santana em manhã radiosa, ao fundo Quintino Bocaiúva, Aristides
Lobo e Benjamin Constant Botelho de Magalhães. Recorrentemente
estampada nos compêndios escolares, tal iconografia visa testemunhar
o gesto pacífico e decidido do marechal.
Para a historiografia acadêmica, a República não resultou de uma
revolução social e popular, mas da ação militar circundada por pacto de
recomposição das classes dominantes, imprensa e povo teriam saudado
o acontecimento com moderado entusiasmo. “Nem nesse momento
nem ao deixar o portão do quartel-general, estava certo Deodoro de
que as oligarquias monárquicas pertenciam ao passado, e ia começar o
tempo da oligarquia republicana” (Buarque de Holanda, 1960, p.360).
“Parada original” no dizer de uns, “ato revolucionário” no dizer de
outros, um dado é inegável: as descontinuidades. A República aparece
como aula nova ao instituir o sistema federalista, a autonomia local,
o casamento civil, a secularização dos cemitérios. Os atos inaugurais
culminam com a reforma do código penal, a oficialização da instrução
laica, a liberdade de culto religioso, ao extinguir o Padroado, separava
Estado e Igreja. E, ao se reinventarem os símbolos e as armas nacionais,
no pavilhão nacional, ainda que mantidas as cores da bandeira
imperial, gravava-se a divisa regeneradora de Augusto Comte, “Ordem
e Progresso”, divisa a indiciar resumo e coroamento dos modernos
regimes de governo social.

República, ato de criação dos homens

Instalava-se o Governo Provisório e, nele, as figuras de primeira


plana, Deodoro da Fonseca – chefe do Governo; Aristides da Silveira
Lobo – ministro do Interior; Rui Barbosa – Fazenda; tenente-coronel
Benjamin Constant Botelho de Magalhães – Guerra; Eduardo
Wandenkolk – Marinha; Quintino Bocaiúva – Relações Exteriores;
134 • Carlos Monarcha

Demétrio Ribeiro – Agricultura, Comércio e Obras Públicas; Campos


Salles – Justiça. De imediato no entrançado da hora, encaminha-se
a organização de um sistema visível de governo. O Decreto nº 1, de
15 de novembro de 1889, funda o governo em moldes de República
Federativa, com isso pretendia assinalar um armistício produtivo
entre os poderes central e locais, reunidas em laço da federação, as
ex-províncias constituíam os Estados Unidos do Brasil.54 No mais, o
novo regime ganharia existência jurídica pelas mãos de um mestre-
pensador. “Rui Barbosa vai ser, na nova ordem de coisas, o centro de
gravitação de todas as consciências verdadeiramente liberais” (Oliveira
Vianna, 1923, p.297).
Não cabe aqui pormenorizar os embates tensos ocorridos durante
o Congresso Constituinte.55 A comissão integrada por Saldanha
Marinho, Rangel Pestana, Antônio Luiz dos Santos Werneck,
Américo Braziliense e José Antônio Pedreira de Magalhães Castro
redige o anteprojeto, Rui Barbosa revisa o texto. Feitas as discussões
e as emendas, a Assembleia Nacional, com Prudente José de Moraes
Barros, presidente do congresso e senador por São Paulo, promulga a

54
“Se a política foi marcada, ainda na Colônia, pela dicotomia centralização-
descentralização, o processo é mantido no Império apesar do caráter unitário
da Carta de 1824. A questão ganha vivacidade na República, em 1889, com
adoção do federalismo. Há uma dialética na alternância do predomínio do
centro sobre o todo ou em concessões por vezes bem determinadas às várias
partes” (Iglésias, 1993, p.243).
55
Para análise detalhada dos embates relativamente aos trabalhos constituintes,
ver Cury (2001). Na analítica de Carvalho (1987, p.45): “A República ou os
vitoriosos da República fizeram muito pouco em termos de expansão de direitos
civis e políticos. O que foi feito já era demanda do liberalismo imperial. Pode-
se dizer que houve até retrocesso no que se refere a direitos sociais. Algumas
mudanças, como a eliminação do Poder Moderador, do Senado vitalício e
do Conselho de Estado e a introdução do federalismo, tinham sem dúvida
inspiração democratizante na medida em que buscavam desconcentrar o
exercícios do poder. Mas, não vindo acompanhadas por expansão significativa
da cidadania política, resultaram em entregar o governo mais diretamente
nas mãos dos setores dominantes tanto rurais quanto urbanos. O Estado
republicano passou a não impedir a atuação das forças sociais, ou, antes, a
favorecer as mais fortes, no melhor estilo spenceriano.”
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 135

Constituição em 1891, assim legitima-se o regime presidencialista, o


federalismo, a triparticipação do poder, a representação popular.

Moldada a nova Constituição brasileira sobre a da República


norte-americana, nossos estudiosos de Direito passaram a inspirar-
se direta ou indiretamente em tratadistas norte-americanos; a
intensificação de relações políticas e econômicas entre os dois países
foi também refletindo-se em nossa literatura política, econômica
e pedagógica. Os livros, panfletos e documentos do período estão
salpicados de sugestões norte-americanas; às vezes de revolta contra
norte-americanismos (Freyre, 1949, p.675).

O Estado assoma como órgão de governo de uma sociedade


regida por valores solidaristas, as instituições políticas, como órgãos
de gestão e de representação popular, ambos, Estado e instituições,
garantiriam os direitos do homem e da cidadania; o regime continuaria
a ser bicameral, Senado e Câmara dos Deputados; os presidentes de
estados seriam eleitos. Ato contínuo, o Congresso Nacional elege
Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto, presidente e vice-presidente.
Na conjuntura política, o grande acontecimento refere-se ao
“Encilhamento”: Rui Barbosa, ministro da Fazenda, facilita a obtenção
de crédito e emissão de moeda a fim de promover o capitalismo
industrial, como se sabe, operação frustrada pela especulação.
No entendimento dos constituintes, embora detendo o monopólio
da força, o melhor poder de Estado é o alheio às intervenções, à
exceção das situações de desordem civil, ameaça à inviolabilidade da
propriedade privada e constrangimento das liberdades individuais.
Resumidamente, a Carta Política legitima o complexo democracia-
república-federação-laicicismo (malgrado as declarações de princípios,
a mão pesada do Estado, sua coorte de funcionários, sua polícia, sua
máquina de arrecadação, mão providencial fiadora da autoconservação,
mão protetora da vara do poder, virá a ser realidade profunda na vida
das pessoas). Ao Governo Federal compete arrecadar impostos de
136 • Carlos Monarcha

importação, criar bancos emissores de moeda, organizar e comandar


Exército e Marinha; aos Estados, adjudicavam-se poderes e direitos
amplos: organização das forças públicas, contratos de empréstimos
no exterior, criação de impostos e justiça própria. Por conseguinte,
a fórmula federativa soa compatível com um país sobrecarregado
de diversidades antropogeográficas e às voltas com o imperativo da
unidade territorial.
Instituía-se o voto direto, poderiam se alistar como eleitores,
nos pleitos para câmaras gerais, estaduais e municipais, os cidadãos
maiores de 21 anos no gozo dos direitos civis e políticos, desde que
soubessem ler e escrever. Aos abaixo de 21 anos, esses poderiam
votar se casados ou alunos de escolas militares ou superiores,
vetado o alistamento eleitoral de filhos-famílias, mendigos,
analfabetos, praças de pré, e religiosos em regime de claustro, por
fim desconsiderava-se o voto da mulher.56 Direito individual com
função social, o voto continua aberto, o alistamento eleitoral e o
voto não são obrigatórios.57 Como bem explica a historiografia
acadêmica, no transcurso da Primeira República, os coeficientes de
votantes e taxas de comparecimento nas eleições seriam reduzidos,
de outro modo estava ausente o símbolo da democracia, qual seja o
sufrágio universal e seu livre exercício.
Quanto à educação e cultura, a Constituição assim estatuía: a
União legislaria o ensino superior, na Capital da República, dando-lhe,
não privativamente, atribuições de animar no país o desenvolvimento

56
Na fase do governo provisório, o Decreto nº 200A, de 8 de fevereiro de 1890,
no artigo 24, assim estipulava: “Em todos os casos em que a comissão ignorar
ou tiver dúvidas se o cidadão sabe ler ou escrever, convidá-lo a lançar em uma
folha de papel, perante ela, a data, o dia, seguido de sua assinatura ou procederá
a qualquer outro exame, sempre rápido, que julgar conveniente”.
57
“Os novos eleitores deveriam requerer individualmente a sua inscrição.
Para tal, era preciso apresentar algum documento que comprovasse a idade
e ainda demonstrar que se sabia ler e escrever, servindo de prova a assinatura
no requerimento (com firma reconhecida) ou a assinatura feita no momento
da solicitação. Depois de cadastrados, os eleitores recebiam um novo título
eleitoral” (Nicolau, 2012, p.55).
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 137

das letras, artes e ciências, criar instituições de ensino superior e


secundário nos estados, prover a instrução primária e secundária no
Distrito Federal e, cumulativamente com os governos federados, criar
instituições de ensino secundário e superior nos estados. Ademais,
lembremo-nos, o ensino livre introduzido no Segundo Reinado por
Leôncio de Carvalho, note-se, facilitara a expansão do ensino superior
pela via das faculdades livres de Direito, Medicina e Engenharia.
Quanto à instrução primária, em tese, as convicções pautadas no
princípio da pessoa como responsável por si mesma e por seu destino
derrotavam os princípios da gratuidade e da obrigatoriedade escolar, as
unidades federadas decidiriam por si a adoção ou não de tais princípios.
Em suma, desatava-se o enredo republicano e, ao lado da defesa dos
direitos civis primordiais – vida, liberdade, propriedade –, a instrução
popular era um valor dos mais aclamados: por ela, a instrução, ao
religar numa mesma moral as gerações e as classes sociais, instituir-se-
ia a Boa Sociedade, isto é, livre da necessidade desafortunada.

Antinomias da doutrina liberal

A cosmologia republicana apoia-se no elogio das liberdades


individuais. Ideia em ato de criação, os publicistas estipulam a
vinculação contratual fundada na livre convergência das autonomias
individuais, note-se, mergulhadas na determinação e promoção de
si, conquanto concordantes a respeito de um princípio comum, a
saber, a moral individual conforme a unidade de direitos: é de então
o jogo semântico com as expressões “liberdade política” e “liberdade
econômica”. Se assim for, a eloquência destemerada dos doutrinadores,
homens graves, numes tutelares permanentemente citados pela
exemplaridade, concebe o indivíduo como sujeito de direitos, e o corpo
coletivo como ente virtuoso (isto é, a república é o grande teatro em
que se confrontam termos opostos – individualidade e fraternidade,
livres e iguais, os indivíduos por decisão voluntária pactuam entre si
um contrato político-existencial).
138 • Carlos Monarcha

Agravava-se a simbolização da unidade pelo Estado e a


universalidade abstrata do cidadão, daí ser a sociedade civil o lugar
das vontades particulares e das iniciativas individuais em livre-
concorrência pelo “pão de cada dia”, vale dizer, da força atomizada
de cada indivíduo portador de direitos, defluem os melhoramentos
coletivos. E, muito mais do que antes, a paixão pelo recomeço
exorbita a doutrinação de François Quesnay: laissez-faire, laissez-
passer, le monde va de lui-même (“deixai fazer, deixai passar, que
o mundo vai por si mesmo”). É lícito dizer que o entrejogo do
ser e do parecer dilui a grave antinomia inerente à doutrina
liberal. Melhor dito, da associação egoísta das necessidades e dos
interesses individuais, derivaria a associação atraente de homens
regenerados pela sanidade social, por fim e sobretudo, os caprichos
do acaso decidiriam os vencedores da competição (para além dos
circunlóquios dialéticos próprios de uma retórica em ebulição, fica a
questão: como falar em satisfação de apetites privados, comunidade
de interesses e felicidade individual e coletiva?). Entrementes, é
preciso não confundir forma de governo com administração de
governo: tanto a criação do Povo-novo, as populações humanas em
vias de fusão, quanto a elevação do indivíduo indeterminado ao status
de cidadão e da multiterritorialidade ao status de pátria, demandam
reforço do poder público e da centralização da autoridade.
Não obstante, o que parecia contido, a instalação de um poder
executivo forte retorna à cena, quer por cisões parlamentares quer pelo
prestígio crescente de Prudente de Moraes, líder do PRP; acossado,
Deodoro da Fonseca veta o projeto de lei que define os crimes de
responsabilidade do supremo mandatário da República. Em novembro
de 1891, o marechal-presidente dissolve o Congresso Nacional,
deslegitimado pelos setores civis, militares e políticos, renuncia. À
frente do contragolpe, Floriano Peixoto, em cujo redor se aglutina a
oficialidade formada na Escola Militar, logo sensível à doutrinação
positivista, donde o engajamento na concretização de uma república
forte, centralizada, sobremodo energicamente jacobina.
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 139

Quantos somos?

Sob a bandeira da República, Aristides Lobo trouxera para si a


primeira operação censitária. Ainda na fase do Governo Provisório, o
Decreto nº 113, de 2 de janeiro de 1890, restabelece a diretoria-geral
de Estatística com o propósito de recensear a população na data de
31 de janeiro de 1890. Em formato de “boletim ou lista de família”, o
questionário inquire sexo, raça, estado civil, nacionalidade, filiação de
culto, grau de instrução, defeitos físicos, títulos científicos, literários e
artísticos, profissões, estatística predial e outros mais.
A exacerbação federalista da primeira hora condiciona negativamente
a coleta de dados. Alguns estados resistem às ordens emanadas do Distrito
Federal, a conjuntura interna é instável, mesmo assim realizava-se o
recenseamento cuja exatidão será contestada nas décadas seguintes.58 Seja
como for, um dos quesitos inquire a “habilitação intelectual” da pessoa, se
sabia ler e escrever, se tinha instrução secundária ou superior, se possuía
título ou diploma científico, literário ou artístico; igualmente a 1872, o
recenseamento de 1890 não separava a população por grupos de idade.
Em 1898, a diretoria-geral da Estatística estampa a esperada sinopse.
Os dados consolidados revelavam que o país possuía 1.024 municípios,
3.236 distritos, 1.883 paróquias, massa geral da população: 14.333.915
habitantes. Estados mais populosos: Minas Gerais – 3.184.099 habitantes,
Bahia – 1.919.802, São Paulo – 1.384.753, Pernambuco – 1.030.224; nas
demais unidades, menos de um milhão de habitantes. Completava-se a
toada numérica com os índices gerais de analfabetismo: do total geral da
população, “sabem ler e escrever” – 2.120.559, “não sabem ler e escrever”
– 12.213.356. Nas diferentes instâncias políticas e intelectuais, tenciona-
se idêntica profecia, República com povo analfabeto era um salto no
desconhecido, podendo resvalar abismo abaixo. Ideia de futuro e força
em progressão, das preocupações cidadãs advinha grave expectativa, causa
fundamental, a instrução elementar, laica, gratuita, obrigatória representava
o pilar da democracia política e social.

58
Cf. Senra (2006).
141

Republicanismo educativo

A despeito dos fatos afogados em sangue, as tantas insurreições


como a Revolução Federalista, a Revolta da Armada, Canudos, o
primeiro decênio republicano coloca em evidência grupos influentes
de homens de cultura convictos da instrução de um novo pupilo, o
povo político. Das visões de mundo teleológicas, visões desdobradas do
ser dos homens e das coisas, defluem técnicas de direção da consciência
coletiva. Ora bem, na passagem do centralismo autocrático e dinástico
ao federalismo democrático, quer pela religião da república quer pela
mística do progresso infinito, as vontades acometidas pelo espírito de
reforma, ritualizam o calor vital da instrução como fonte de felicidade,
utilidade e riqueza comum.
Anseio claramente expresso por Franklin Ramiz Galvão, inspetor-
geral da Instrução do Distrito Federal, em relatório ao ministro Benjamin
Constant. “O analfabeto é um elemento pernicioso no seio da nação, e a
república jamais será uma realidade auspiciosa e feliz, se a educação do
povo lhe não trouxer a base substancial e estável por excelência” (Ramiz
Galvão, 1890, p.9). Seja como for no chão fraterno em que medram os
moralizantes laços imaginários, liberais, maçons, jacobinos, positivistas,
spencerianos, elites doutrinárias concorrentes entre si, sobrelevam o
significado do republicanismo educativo. Na medida em que o regime
se objetiva em instituições, na medida em que o ativismo apossa-se
das variadas cabeças, expande-se a crença nos poderes superlativos da
instrução como elemento formativo do cidadão completo por ser capaz
142 • Carlos Monarcha

de, por si mesmo, querer, discernir e julgar (em poucas palavras, dotado
de entendimento, o homem é fórmula de si).
A outorga da função educativa ao Estado, instituição
ilusoriamente acima e além das classes sociais, o converte em preceptor
universal dos pupilos recém-chegados a este mundo por nascimento,
a meta, promover o trânsito da esfera privada, familiar e afetiva
para o mundo da civilização política. Porquanto, o republicanismo
educativo soa como amor paternal pela grande sociedade, donde
sucessões ininterruptas de palavras quentes e sacudidas. Em exposição
ao presidente do estado, Prudente de Moraes, Antonio Caetano de
Campos, homem hábil na arte de falar sobre o povo, mas não para o
povo, ao correr da pena, pleiteava um plano de ensino coletivo e popular
consoante o momento. “A vida do povo desaparece sob as guerras dos
potentados. Só mui gradualmente consegue o proletariado adquirir um
pouco de ar e de luz, e isso se dá quando ele se vai apoderando dos
princípios científicos”. Nas figuras de retórica do professor de Biologia
e diretor da Escola Normal de São Paulo, na República, o povo, fonte
de soberania, conduz. “Senhor governador”.

Já que a revolução entregou ao povo a direção de si mesmo, nada


é mais urgente do que cultivar-lhe o espírito, dar-lhe a elevação moral
de que ele precisa, formar-lhe o caráter, para que saiba querer. Dantes
pagava a Nação os professores dos príncipes sob o pretexto de que
estes careciam de uma instrução fora do comum para saber dirigi-la.
Hoje o príncipe é o povo, e urge que ele alcance o self-government –
pois só pela convicção científica pode ser levado, desde que não há que
zelar o interesse de uma família privilegiada. A instrução do povo é,
portanto sua maior necessidade.
Para o Governo educar o povo é um dever e um interesse; dever,
porque a gerência dos dinheiros públicos acarreta a obrigação de
formar escolas; interesse, porque só é independente quem tem o
espírito culto, e a educação cria, avigora e mantém a posse da liberdade
(Caetano de Campos, 1891, p.4).
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 143

De mais a mais advinda da pressão dos positivistas, a separação


do Estado e da Igreja encaminha a educação ao laicismo e ao
enciclopedismo científico, portanto, à neutralidade confessional e à
instrução integral. Nesse primeiro decênio republicano, encantados
pelas filosofias sociais, vogam os lidadores do republicanismo educativo.

Avenidas da instrução (e sua linguagem materialista)

Nas intelecções teóricas, mecanicamente os sujeitos relacionam


valores republicanos, ciência, laicidade, democracia, pátria com o ser
e estar no mundo ao ensinar o povo a operar os negócios públicos,
em suma, a ter noção positiva da vida de todos os dias e das coisas
animadas e inanimadas. Os anseios convergem para um princípio
dinâmico e automotivo, qual seja formar o indivíduo pela veridicidade
das ciências fundamentais.
Com efeito, usuários de uma linguagem materialista, os mentores
da forma republicana alvoroçam programas de matérias legitimados
pela classificação das ciências, assim postulam um ensino esteado na
recapitulação dos progressos do entendimento humano, com essa
eficácia, selava-se o vínculo entre instrução e cientismos do momento.
Discursa Antonio Caetano de Campos na formatura dos professores
normalistas. “A educação do homem moderno exige uma notável
soma de conhecimentos, que resultam sinteticamente das noções
enciclopédicas hauridas em diversos ramos do estudo” (Caetano
de Campos, 1891, p.5). Prestigioso professor primário, combativo
dirigente do Grêmio do Professorado Paulista, Arthur Breves, em
artigo no Diário Popular, edição de 23 de fevereiro de 1891, ao incitar
vontades, partilhava do mesmo recitativo.

Saber ler, escrever e contar não é instrução, é simples instrumento


de aquisição. Se é verdade, porém, que o ensino primário estende-se
às noções de todas as ciências, não é menos que tais noções obedecem
uma lei de classificação.
144 • Carlos Monarcha

Hoje, seja qual for o credo que se adote, não é dado a ninguém
contestar que cada ciência se apóia sobre verdades das ciências que a
precedem; que os fatos sociais dependem das condições da vida animal
e estas dependem das leis do mundo inorgânico; é esta a ordem das
matérias, esta é, portanto, a lei dos programas. Subordinando-se assim
a uma lei, o programa de ensino, é um fato científico, é problema que
não admite muitas soluções.

No intuito de dissipar a inconsciência das massas em fusão,


esse é o elo entre a escola e a república, certos preceptores da forma
republicana batem-se pelas sínteses explicativas escoradas ou na
classificação das ciências de Augusto Comte ou de Herbert Spencer.
Como é bem sabido, em Comte, a lógica divisionária das ciências
fundamentais parte do estudo dos fenômenos mais gerais para os mais
complexos: da matemática à astronomia, à física, à química, à biologia
e por fim, à física social (sociologia). Cada ramo do saber é irredutível
a outro, cada patamar científico é base para o seguinte: a matemática
oferece o paradigma da cientificidade, a astronomia, o procedimento
da observação, a química, a arte da nomenclatura, a física, o recurso da
experimentação, a biologia, a observação comparada, a sociologia, por
excelência ciência moral, a comparação histórica afere a progressão da
Humanidade.59 Quanto à psicologia, Comte não a reconhece como
saber objetivo, situando-a na esfera da especulação religiosa e da
filosofia metafísica.
Outra lógica divisionária é justificada por Spencer: “ciências
abstratas”: lógica e matemática; “ciências abstrato-concretas”:
mecânica, física e química; “ciências concretas”: astronomia, geologia,
biologia, psicologia e sociologia.60 Diversamente de Comte, Spencer
vê a psicologia como disciplina autônoma duplamente centrada
no estudo das conexões dos fenômenos internos e externos e das
estruturas e funções do sistema nervoso. Ciência experimental, a

59
Cf. Verdenal (1981).
60
Cf. Ferrarotti (1975).
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 145

psicologia identifica, descreve e classifica as sensações e as formas


de pensamentos na evolução mental, lenta e contínua, operada na
passagem do homem primitivo ao civilizado. Populares entre as
elites dirigentes, as teorizações spenceristas versam a passagem do
estado de homogeneidade incoerente a heterogeneidade coerente
e/ou convergente.
Seja o que for e como for, em que pesem as diferenças desses
sistemas de pensamento, há mesmíssimo escopo especulativo: o
progresso das ciências está em consonância com a lei da complicação
crescente e generalidade decrescente, porquanto em correspondência
com a marcha do entendimento das regiões fenomênicas, porquanto
ainda, na pedagogia escolar genuinamente científica, caberia o
estudo dos temas mundo, homem e sociedade. Espécie de reação
ao abstracionismo escolástico o intento de instrução integral atinge
altitudes inimagináveis. Se o entendimento é o caráter divinal do
gênero humano, sabia-se que esse atributo é tão só estrutura virtual
para materializar-se demandava obstinado cultivo. Ao ver dos sectários
dos exuberantes sistemas evolucionistas, a escola popular é terra de
missão civilizadora, compreendendo-se por civilização, como dito
noutro lugar, não apenas o abrandamento de costumes, como se sabe
civil e civilidade estão na origem do vocábulo, mas também elevação
dos espíritos, progresso das artes, melhoramentos no comércio,
indústria, agricultura e conforto material.

“Cosmopolitismo do futuro”

Não por acaso, de imediato os esforços manifestantes do


espírito de reforma partem da Capital Federal, lugar apreciado como
paradigma civilizador da nação, e de São Paulo, paradigma do moderno
progresso. De par, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa
Catarina experimentam reformas da instrução pública. As expectativas
gerais aludem a um futuro próximo quando as diretrizes emanadas
dos marcos citadinos atingiriam latitudes e longitudes do território
146 • Carlos Monarcha

nacional por iniciativa de administradores vivazes e competentes.


Ao findar o decênio vulcânico, a primeira década republicana,
certos marcos escolares encontravam-se acometidos por realizações
consoantes a nova ordem de certezas, a saber, implantação de núcleos
oficiais de cultura estruturados em modalidades verticais de ensino
e classes de idades, programas de matérias unificados e graduados,
legislação específica para aprovação de compêndios e regulação de
horários, calendários escolares, controle de frequência, mobiliário
moderno, carreira do magistério e, sobretudo, elevação contínua, ainda
que insatisfatória, da matrícula escolar geral. De par, certos mestres-
pensadores aclamam a reconciliação das classes sociais, para eles a
instrução de Estado comum a todos religaria gerações e pessoas numa
mesma moral.

Uma das causas do antagonismo das classes sociais é que elas não
se conhecem e não se podem apreciar, visto que não se encontram em
um terreno comum e não têm por isso, umas em relação às outras o
sentimento das dificuldades em face das quais se acham colocadas.
Certo, no estado atual das coisas, se o futuro operário ombreou
nos bancos da escola primária com o futuro burguês, poderá apreciar
as vantagens que este tiver obtido pela sua evolução intelectual e
poderá estimá-lo no seu justo valor. Mas, onde aprendeu o burguês a
conhecer o operário e o seu valor? Em parte alguma. Desde a infância
o perdeu de vista, e não sabe quanta habilidade exige o exercício de
uma profissão, não conhece as dificuldades que há na construção de
um vigamento ou no corte de uma pedra (Prestes, 1892, p.51).61

61
Calorosa, essa profissão de fé de Gabriel Prestes nalguma medida retraduz a
fé do grande Michelet em O povo (1988, p.178): “Se duas crianças, a pobre e a
rica, se assentassem aos bancos de uma mesma escola, e, ligadas por amizade,
divididas pela carreira, se vissem frequentemente, fariam mais entre elas que
todas as políticas, todas as morais do mundo. Conservariam em sua amizade
desinteressada, inocente, o nó sagrado da Cidade... O rico conheceria a vida,
a desigualdade, e as lamentaria; todo seu esforço visaria a partilha. O pobre se
tocaria e consolaria o rico de ser rico.”
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 147

Diferentemente dos tempos idos e vividos, a figura do mestre


de escola, agora rebatizada de professor primário, em tese, superava
em definitivo a função de auxiliar incensado do padre, muito embora
é bom lembrar, sobre seus ombros recaísse a tarefa de missionar o
amor republicano pelas instituições. Sagrava-se a “educação liberal”:
no lugar do ensino das abstrações, conhecimento útil atinente à vida
e aos negócios, quer dizer, entendimento do mundo, do homem
e da sociedade. E não será por demais dizer que em certos marcos
regionais arde a grave determinação de envolver as almas em formação
no estudo, introspecção e atividades físicas, e sobremaneira no
culto respeitoso dos símbolos pátrios, a Bandeira Nacional, o Hino
Nacional, o Escudo de Armas, na reverência aos heróis emergentes
– Tiradentes, o “cristo cívico”, Silva Jardim, “o tribuno da República”.
Todo esse republicanismo educativo levará Silvio Romero a palavrear
em História do Brasil ensinada pela biografia de seus heróis.

Nós somos entusiastas convictos da ilustre nação americana; mas


sonhamos missão ainda mais fulgente para nossa pátria; queremos
formar aqui a mansão democrática do congraçamento não dos
deserdados da Europa somente, mas dos deserdados de todo mundo
e, pela reunião, pela igualdade de todos, formar o povo do porvir, o
tipo novo, que não é oriundo, do exclusivismo europeu, ou africano,
ou asiático, ou americano, o tipo novo que há de ser a mais perfeita
encarnação do cosmopolitismo do futuro (Romero, 1892, p.22).

Virada do século XIX ao XX, duplamente momento de


afirmação e percalços do Estado republicano, a escola elementar tende
a integrar-se nas estruturas societárias regionais denotadamente nas
áreas de economia aberta e de mercado. Se a Bandeira Nacional
é o pendão da esperança e símbolo augusto da paz, a escola laica
e científica é o penhor da vida civil e melhoramento material. Na
conjuntura comocionada, as vozes dos homens públicos, homens
hábeis, numes tutelares, sistematizam a instrução em módulos
148 • Carlos Monarcha

articulados e hierarquizados. Para melhor sorte do republicanismo


político, trata-se de compartir valores comuns, visando à efetuação de
relações contratuais estáveis, logo cidadãs, logo abertas à fraternidade,
logo dispostas à igualdade, logo ainda menos reservadas. É quando
afloram mais nitidamente as singularidades da escola moderna,
instituição social cujo real potencial emancipador é permanente
objeto de debates à medida que nela se acentua mais a ordem do que
a liberdade, ainda que em nome dela, a liberdade.
149

Regeneração didática

Na Capital Federal, Benjamin Constant, “formador de almas”

Baixado no Governo Provisório, o Decreto nº 346, de 19 de abril


de 1890 cria a secretaria de Estado dos Negócios da Instrução Pública,
Correios e Telégrafos.
De status ministerial, a pasta é entregue ao tenente-coronel
Benjamin Constant Botelho de Magalhães, ex-professor na Escola
Militar, fundador da Escola Normal da Corte, sectário da doutrina
de Augusto Comte, embora não extremado. Nas versões aceitas de
Dunshee de Abranches, Eduardo Prado e José Veríssimo, a pasta fora
criada em meio a manipulações, por conveniência, a esperteza política
decidira afastar Benjamin Constant do ministério da Guerra.
Aos olhos dos discípulos, ele assoma como professor-cientista,
cujas ideias conduziriam o país ao rumo certo; essa é a imagem idealizada
por Oscar de Araújo, em Le fondateur de la Republique brésilienne,
Benjamin Constant (1891), e Raimundo Teixeira Mendes, em Benjamin
Constant: esboço de uma apreciação sintética da vida e da obra do fundador da
república. “Exaltado no seu ardor republicano, pregou os sãos princípios
inspirados no sentimento da fraternidade universal, preparou os moços
que mais tarde haveriam de acompanhá-lo ao campo da glória, executou
o plano que idealizara, sendo, então, o primeiro estadista do mundo
que implantou o regime republicano sobre bases científicas” (Teixeira
Mendes, 1937, p.5). Já na fria apreciação de Vicente Licínio Cardoso.
150 • Carlos Monarcha

Benjamin Constant ilustra, talvez, um caso único na história: o


de uma revolução política dirigida por um professor de matemática.
O fundador da República Brasileira foi, de fato, antes de tudo um
professor.
Na composição do título do Ministério, ficou apenas arquivado
esse receio, e conservado até agora vergonhosamente pela república, em
tratar diretamente o problema político magno do Brasil, qual aquele
que se refere a instruir um povo composto dos milhões apavarontes
e deprimentes de analfabetos qual é o nosso (Cardoso, 1924a, p.308,
grifo do autor).

Sob as normas do positivismo de Comte, para quem ciência,


progresso e ordem moral são elos duma mesma corrente, Benjamin
Constant vê na instrução científica o vigamento de uma república social
virtuosa. No ministério da Guerra, na pele do reformador, expande a
atividade doutrinária ao revisar a didática das escolas militares. Já à
frente da Secretaria da Instrução Pública, apoiado pelos majores Lauro
Sodré e João Bittencourt Costa, promove modificações substanciais nas
modalidades de ensino. Num jorro de decretações, regulava no Distrito
Federal o ensino primário, a Escola Normal, o Colégio Nacional, ex-
Pedro II, o ensino superior no âmbito maior da federação, as escolas
Politécnica, de Minas de Ouro Preto e de Belas Artes, as faculdades
de Direito e de Medicina e o Conservatório de Música. Convicto de
si, concede sobrevida à “desoficialização do ensino” superior deflagrada
por Leôncio de Carvalho. “Os primeiros atos do ministro da Instrução
do Governo Provisório, mais que justificar, autorizavam a suposição de
que havíamos enfim entrado no período de ouro da educação nacional”
(Mennucci, 1932a, p.47).62

62
“Três dias depois (do encontro de Benjamin com Deodoro em 05/11/1890),
consumava-se a reforma da instrução pública. Como queria, antes das
comemorações do primeiro aniversário da República. O novo regulamento da
Instrução Primária e Secundária do Distrito Federal equacionou algumas das
questões gerais que haviam polarizado as discussões sobre o ensino na última
década. Por exemplo, o caráter livre, gratuito e leigo da instrução primária
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 151

O Decreto nº 407, de 17 de maio de 1890, regulamenta a Escola


Normal, para tanto Benjamin Constant retoma as ideias exaradas
em “Escolas Normais. Sua organização, plano de estudo, métodos e
programas de ensino”, parecer encaminhado ao Congresso de Instrução
do Rio de Janeiro, 1884. No caput do decreto, solene expectativa, a
formação intelectual, moral e prática dos alunos-mestres regeneraria
progressivamente a escola pública de instrução primária. De óbvia
orientação enciclopédica, isto é, sob a dependência lógica das ciências,
o programa de matérias da Escola Normal requeria 18 professores
lotados no “Curso de “Ciências e Letras” e no “Curso de Artes”. O
programa abarcava os elementos da “suprema coordenação científica”:
ao estudo do “mundo inorgânico” ou “ordem material” corresponderia
à matemática, à astronomia, à física, à química; ao “mundo orgânico”
ou “ordem humana”, à biologia, à sociologia e à moral. A biologia atua
como prolegômeno da sociologia, a moral, como culminância.
Repercutindo a voga dos museus pedagógicos nacionais, note-se
de passagem, voga difundida nas exposições universais, os decretos nº
667 de 16 de agosto e nº 980 de 8 de novembro de 1890 instituem o
Pedagogium, inicialmente dirigido por Joaquim José Menezes Vieira,
secretariado por Felisberto de Carvalho. Nas palavras do diretor, dentre
as funções previstas, a intenção de informar a administração pública
e o corpo do magistério dos progressos nacionais e estrangeiros, em
matéria de instrução primária e secundária, clarear e fortificar os
conhecimentos do professorado primário “A fim de exercer a delicada
função de educador do povo”, e fraternizar o magistério na obra
nacional. De curta existência, o Pedagogium é dirigido por Menezes
Vieira, José Veríssimo, Manoel Bomfim, Olavo Bilac e José Barbosa
Sobrinho. Veríssimo, a sua vez, define o Pedagogium como agente da
unidade na variedade e fator consciente da obra de unificação moral.

oferecida pelo governo na capital federal. Fez-se, também, uma opção clara
em relação à diretriz filosófica do plano de ensino secundário, com a adoção
do modelo positivista [...] Essas eram as reformas que Benjamin Constant
reputava essenciais à fase de ‘regeneração’ da sociedade brasileira” (Lemos,
1999, p.517).
152 • Carlos Monarcha

Na virada do século, transferiu-se o estabelecimento para a alçada da


Intendência Municipal, cambaleante, pois inexistiam sede apropriada,
verbas e quadro de funcionários, é encerrado por “custosa inutilidade”.
Por seu turno, o Decreto nº 981, de 8 de novembro de 1890, visa
dar forma positiva aos ensinos primário e secundário. O primário é
formalizado como livre, leigo, gratuito, mas não obrigatório, a coeducação
vigoraria até a idade de oito anos. Para imprimir feição integral ao ensino,
seriam criadas escolas primárias de 1º e 2º graus para crianças de 7 a 13
anos e de 13 a 15 anos. Graduada em três níveis, a escola de 1º grau
comportaria curso elementar, de 7 a 9 anos, regido por professoras, curso
médio, de 9 a 11, e curso superior, de 11 a 13. De essência altruísta, a
instrução moral e cívica consistiria em preleções e leituras sobre atitudes
morais opostas: generosidade e egoísmo, economia e avareza, atividade e
preguiça, moderação e ira, amor e ódio, benevolência e inveja, sinceridade
e hipocrisia, prazeres e dores físicas e morais. Recomendações: o método
intuitivo serviria de didática geral, os compêndios apenas auxiliariam a
execução dos programas de matérias por muitos, note-se, considerados
belos, porém inabordáveis.
Quanto ao ensino secundário, seria concedido o título de
bacharel em Ciências e Letras aos diplomados pelo Ginásio Nacional,
o programa de matérias seguiria a lei do desenvolvimento do espírito
humano: começaria na matemática e culminaria na sociologia e moral
– “foco único de luz capaz de alumiar e esclarecer o destino racional
de todas as concepções humanas.” Com fundamento nas inter-
relações dos ramos do saber, tal programa situa o ensino secundário na
antecâmara das Escolas Politécnicas e afins.63

Espólio inacabado e controverso

Morto Benjamin Constant, janeiro de 1891, o Decreto nº


1.160, de 6 de dezembro de 1892, extingue o ministério híbrido;

Para um estudo amplo das reformas aventadas por Benjamin Constant, ver
63

Cartolano 1994.
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 153

passo seguinte, os serviços são realocados na secretaria da Instrução


do ministério da Justiça e Negócios Interiores. Sem sucesso, em 1894,
o deputado Medeiros e Albuquerque tenta aprovar a criação de um
ministério de Instrução Pública e Belas Artes. Que sentido poderá
ser atribuído às ações do construtor austero e doutrinador pertinaz?
Teria se equivocado José Veríssimo ao contabilizar restritivamente o
ativo reformador?

Como todos os seus antecessores no dificílimo encargo de dirigir o


ensino público no Brasil, também ele não compreendeu, ou esqueceu,
que a instrução é uma função de ordem moral, em cujos órgãos não se
deve exigir somente capacidade técnica ou estritamente profissional,
nem mesmo o exato cumprimento do dever regulamentar, mas
também uma convicção filosófica dos seus efeitos, o devotamento de
apóstolos na sua execução e um ideal nos seus propósitos (Veríssimo,
1906, p.19-20).

Teria acertado Bulhões Carvalho ao inventariar meritoriamente


as iniciativas do reformador no introito da Estatística da Instrução?

Mas, se as reformas empreendidas por Benjamin Constant não


lograram realizar as esperanças dele, retalhadas e esfaceladas que
foram, logo após a sua morte, sem sequer poderem passar pela prova
de uma experiência leal, do conjunto de seus esforços frustrados,
de suas tentativas infelizes, de suas dolorosas decepções, fique-nos
ao menos, uma lição, que bem merece ser aproveitada: a de que,
em matéria de ensino, o que há de fazer, de mais essencial, de mais
urgente, é começar pelo princípio, é estender à generalidade dos filhos
da terra os benefícios das luzes que no presente podem cobrar a todos,
é ministrar-lhe a instrução primária, que o futuro integrará, sem
dúvida, nas atribuições maternas, em nossos dias, por força do estado
social, cumpre figurar ainda entre os encargos mais sérios dos poderes
públicos (Bulhões Carvalho, 1916, p.xiv).
154 • Carlos Monarcha

Um dado é inegável, qual seja a determinação invulgar do


reformador na construção de um núcleo estatal de ensino a servir
de modelo as demais unidades federadas. Como designada nos anais
historiográficos, a “reforma Benjamin Constant” selava o Distrito
Federal como vitrine da pedagogia escolar. No respeitante à concepção
e estruturação do ensino, há, sem dúvida, tendência tecnocrática própria
do positivismo comtiano, fato delatado na linguagem performativa dos
decretos, neles transparecem a supremacia da razão prática e da ideia
pura de lei.
Virada do século, apurada em 1898 pela 3ª seção da diretoria-
geral da Intendência Municipal do Rio de Janeiro, a estatística escolar
expõe dados constrangedores, conquanto a frase de Jules Simon, em
L’école – “O povo que tem as primeiras escolas é o primeiro povo; se
não é hoje, sê-lo-á amanha” – epigrafasse os discursos engajados. Total
da população escolar: 106.390 crianças de 7 a 15 anos, matriculados
19.067 alunos. A matrícula nas primárias particulares iguala-se à
matrícula das escolas públicas; o coeficiente geral de matrícula atinge
40% das crianças em idade escolar. Nas palavras e cifras do barão
de Loreto, Franklin Menezes Dória, na publicação monarquizada A
década republicana (1899), outra realidade: a frequência regular não
ultrapassava 600 alunos por 1000.

Em São Paulo, Antonio Caetano de Campos

Igualmente na fase do Governo Provisório, São Paulo


reorganiza os serviços de saneamento, saúde e instrução. No
quadro de racionalização administrativa, sob as diretivas do PRP
hegemonizado pelos “fazendeiros republicanos”, a vontade de
reforma dirige-se à Escola Normal. Com Prudente de Moraes no
governo do Estado, e injunções de Rangel Pestana, arquiteto do
plano reformador, baixava-se o Decreto nº 27, de março de 1890. No
caput do decreto, valoroso princípio.
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 155

A instrução bem dirigida é o mais forte e eficaz elemento do


progresso e ao governo incumbe o rigoroso dever de promover o seu
desenvolvimento, e de todos os fatores da instrução popular o mais
vital, poderoso e indispensável é a instrução primária largamente
difundida e convenientemente ensinada (São Paulo, 1890).

Por recomendação de Rangel Pestana, Prudente de Moraes


nomeia Antonio Caetano de Campos executor dos planos de ação,
inicialmente cogitara-se o nome de João Köpke. Durante 20 meses,
a partir de janeiro de 1890, Caetano de Campos conduz a cadeira de
Biologia e a direção da Escola Normal.64
Outrora médico clínico na Santa Casa de Misericórdia e
Beneficência Portuguesa, professor na Sociedade Propagadora da
Instrução, Colégio Pestana e Escola Primária Neutralidade, de
propriedade de João Köpke e em sociedade com o “tribuno da República”,
Antonio da Silva Jardim, Caetano de Campos, é personalidade em
evidência. Na juventude, sob a proteção do barão de Tautphoeus, cursa
os estudos preliminares com o propósito de ingressar na faculdade
de Medicina do Rio de Janeiro. Diplomado, atua como cirurgião da
Armada na Guerra do Paraguai, ao retornar à vida civil, inscreve-se no
concurso para professor na Faculdade de Medicina: aprovado, não vê o
direito reconhecido, contrariado, transfere-se para São Paulo.
Grosso modo, o liberal-federalismo das vanguardas intelectuais e
das elites proprietárias paulistas compartilha as fórmulas metafóricas
desdobradas dos cientismos vogantes – “darwinismo social”,
“sobrevivência do mais apto” e outras mais. Ao redor do editor e
livreiro Abílio A. S. Marques, por exemplo, reúnem-se políticos e
intelectuais de calibre: Américo de Campos, Américo Braziliense,
Joaquim Ribeiro de Mendonça, Miranda Azevedo, Silvio Romero,
José Leão. Na “Biblioteca útil”, empreendimento editorial orquestrado

64
Pensamento científico, estrutura curricular, formação de professores,
dimensões da Escola Normal constam em Monarcha (1999), Reis Filho
(1981) e Tanuri (1979).
156 • Carlos Monarcha

por Abílio A. S. Marques, são publicados Do espírito novo, de Augusto


Comte, Traços gerais de linguística, de Júlio Ribeiro, Soluções positivas
da política brasileira, de Luiz Pereira Barreto, Da educação, de França
Leite, Darwinismo, de Caetano de Campos, e A teoria da seleção
aplicada à sociedade, de Rangel Pestana, conforme anúncio n’O Estado
de S. Paulo. Bem seja, no modelo materialista de Caetano de Campos,
convergem as fontes teóricas de um ensino condizente com a fisiologia
do organismo humano. “Já não há empirismo; há ciência da educação
do homem. É da psicologia da infância que se deve deduzir o melhor
modo de ensiná-la” (Caetano de Campos, 1891, p.5). O reformador
pleiteia uma reforma consoante a civilização do momento. “A educação
do homem moderno exige uma notável soma de conhecimentos,
que resultam sinteticamente das noções enciclopédicas hauridas em
diversos ramos do estudo.”
Setembro de 1891. A morte prematura irmana Caetano de
Campos à sina de Benjamin Constant, igualmente o canteiro de obras
quedará incompleto. Anexa à Escola Normal, visando desenvolver
as faculdades intelectivas dos alunos, a Escola-modelo continuara
a demonstrar métodos e processos de ensino menos teóricos e mais
empíricos, menos escolásticos e mais ativos. Na direção da seção
feminina, Maria Guilhermina Loureiro de Andrade, na seção
masculina, Márcia Browne, ambas indicadas por Horace Lane, diretor
da Escola Americana. No tempo republicano, os métodos de ensino
e os processos didáticos ali demonstrados e praticados conquistariam
propagadores apaixonados.

Gabriel Prestes conclui o canteiro de obras

Desde os debates na Comissão de Instrução Pública do


Congresso Estadual, Gabriel Prestes, professor primário diplomado
pela Escola Normal, afervora o poder agregador da escola. “É preciso
que, como Garfield, vejamos a escola o único meio de evitar a ruína
da República, e que baseados nesse pensamento, sigamos os exemplos
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 157

dos povos que melhor souberam compreender essa verdade” (Prestes,


1893, p.17). Tocado pela experiência francesa, Gabriel Prestes reclama
a criação de uma escola normal superior dotada de museu pedagógico.
E sob o lema – “bem aprender a fim de bem ensinar”, denega os
“antigos processos metafísicos”; no lugar da pedagogia escolástica,
preconiza o modo correto. “Partir do simples para o composto; do
indefinido para o definido; do concreto para o abstrato; do empírico
para o racional, ensinando pouco e fazendo descobrir muito” (Prestes,
1893, p.64). Promulgada a Constituição Estadual, em 1891, fixava-se a
competência do Congresso para legislar o ensino primário, secundário,
superior e profissional. Mudanças na política conduzem Bernardino
de Campos ao governo estadual.65
Em sua eloquência, a Lei nº 8, de 8 setembro de 1892, reorganiza
o ensino público sob as seguintes bases: curso primário modulado em
preliminar, obrigatório até a idade de 12 anos, e complementar. Nas
localidades com 20 a 40 alunos matriculáveis, constaria uma escola
preliminar; em havendo menos de 20 alunos, apenas uma escola mista;
para cada dez escolas preliminares, haveria uma complementar; a juízo
do Conselho da Instrução Pública seriam criadas escolas ambulantes
e escolas para adultos. Para formar professores dos cursos preliminares
e complementares, seriam instaladas quatro escolas normais primárias;
em anexo à Escola Normal, seria instalado um Curso Superior para
formar professores de escolas normais primárias e ginásios.
Anualmente, o governo consagraria 500:000$000 para a construção
de edifícios escolares, preferindo-se os municípios que contribuíssem
pecuniária e materialmente. A direção do ensino caberia ao presidente
do Estado, auxiliado pelo Conselho Superior de Instrução integrado
por inspetores distritais, diretor-geral, diretores de escolas normais e
escolas-modelo, um professor eleito pelo professorado primário e outro
pelo professorado ginasial. O governo contrataria a impressão de livros
e mapas, forneceria gratuitamente cadernos, pedras, lápis e objetos
escolares, compêndios adotados e objetos escolares.

65
Cf. Motta (1947) e Rodrigues (1945).
158 • Carlos Monarcha

Embalada pelo ativismo republicano, a Lei nº 169, de 7


de agosto de 1893, adita disposições à Lei nº 88, dentre outras,
sanciona a criação de um curso normal de quatro anos e programa de
matérias alocado em 17 cadeiras. É quando Gabriel Prestes assume
a direção da Escola Normal. Organizado em tópicos, por exemplo,
o programa da 14ª Cadeira, Pedagogia, é por assim dizer, dotado de
valor de demonstração das aspirações esclarecidas sancionadas pelos
antepassados da pedagogia.
1º – Ideia sumária da evolução social e mental das sociedades
humanas. Sua evolução pedagógica, solidariedade existente entre uma
evolução e outra. Lei fundamental da evolução pedagógica. 2o – A
evolução pedagógica na antiguidade oriental e no período clássico. 3o –
A evolução pedagógica na Idade Média e Moderna. 4o – Pedagogistas
célebres: Comenius, Locke, Rousseau. 5o – Ação pedagógica da
Revolução. Pestalozzi, sua ação pedagógica, sua influência na
escola popular. 6º – Fröebel: caráter pedagógico de sua concepção.
Comparação entre Comenius, Rousseau, Pestalozzi e Fröebel. 7o –
Herbert Spencer. Situação atual da evolução pedagógica. Instituição
da Ciência da Educação.66
Dispositivos legais minuciosos, Regimento Interno das Escolas
Públicas e Regulamento da Instrução Pública sobreditam o ritmo
dos afazeres diários. Neles, os dispositivos, reverenciadas como
“colaboradores da felicidade nacional”, conclamam as fileiras do
magistério a aderirem aos programas matérias e métodos de ensino
utilizados nas escolas-modelo.
Tratava-se de prevalecer o tirocínio concreto dos alunos, como
bem apregoava A Escola Pública, subintitulada “Pedagogia prática”,
revista com lições-modelo de linguagem, aritmética, ciências naturais.
Ademais, note-se, os programas dos grupos escolares e das escolas
provisórias preliminares são organizados de acordo com a trilogia
spencerista. O programa de educação física previa marchas e o ensino
com armas: noções da nomenclatura da arma, manejo da arma com

66
Cf. Prestes (1894).
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 159

sabre-baioneta armado ou desarmado. O de educação moral, deveres


da moral individual: temperança, prudência, coragem, sinceridade,
cumprimento da palavra, dignidade, trabalho. O de moral social:
deveres de justiça, caridade, familiar, profissional, cívico e das nações
entre si. Enciclopédico, o programa de educação intelectual envolvia
leitura, linguagem, caligrafia, aritmética, geometria, desenho, geografia,
cosmografia, história do Brasil, educação cívica, botânica, zoologia,
física, química, geologia, leitura de música e canto.
Nas vestes simples de apóstolo do futuro, o imperativo moral
parece devorá-lo, a Gabriel Prestes, arquétipo do republicanismo na
República, não bastava falar em instrução, era preciso vivê-la intensa
e racionalmente. Respeitável professor de Astronomia na Escola
Normal, proeminente sectário da Sociedade Positivista de São Paulo,
para José Feliciano de Oliveira, a gestão de Prestes representou o
“período áureo” da instrução paulista. “Num lustro ou mesmo sete
anos (1892-1899), que ele consagrou a reformas e a direção do ensino
público, Gabriel Prestes, sem contestação documental, tornou-se o
primeiro ‘educacionista’ de São Paulo, como disse Valentim Magalhães”
(Oliveira, 1932, p.11).

Demais inovações

Desde a última década do Império, Gabriel Prestes debatia


a organização funcional do ensino elementar, desde então
propugnava a instalação de “escolas centrais” organizadas em ciclos.
Em discurso na Câmara dos Deputados, exalta a superioridade
da organização empírica das escolas centrais de Lisboa, Porto,
Bruxelas e certas capitais da América. “Para criá-las não é preciso
nada mais do que reunir em um só prédio as diversas escolas que
funcionem no mesmo bairro, acrescentando ainda a circunstância
de ficar ao Governo a mais ampla liberdade para organizá-las
convenientemente, atendendo e remediando as deficiências que só
a prática pode indicar” (Prestes, 1893, p.11).
160 • Carlos Monarcha

A Lei nº 169 concretiza tais aspirações. Em efeito, ao existir


mais de uma escola no raio fixado para a obrigatoriedade, o
Conselho Superior poderia fazê-las funcionar em um único prédio.
Surgem os grupos escolares, a “criação mais feliz da República” na
voz de um contemporâneo dos acontecimentos. Os novíssimos
estabelecimentos singularizam-se pela “metódica distribuição
do ensino” –, um professor por classe, gestão unificada na pessoa
do professor nomeado pelo governo, investido de poder diretivo
e função pedagógica. No palavreado douto de Alfredo Pujol,
secretário dos Negócios do Interior.

A reunião de escolas, sob a denominação de Grupos Escolares,


tem produzido resultado fecundo, quer pelo lado do aproveitamento,
quer pelo da disciplina: o ensino. Dividido em cinco anos, cada qual
a cargo de um professor, oferece incontestáveis vantagens; revive a
emulação entre os mestres, mantêm-se o estímulo entre as crianças,
facilita-se a inspeção, diminuem-se os encargos do Estado, quanto à
construção dos prédios escolares (Pujol, 1896, p.39).

Como resposta à pressão demográfica, instalavam-se grupos em


aglomerados urbanos da capital e do interior do estado; nas zonas de
populações rarefeitas, prevaleciam as escolas reunidas e isoladas. Em
1893, o Decreto nº 218, de 27 de novembro, aprova o Regulamento da
Instrução para execução das leis nº 88 e nº 169. Dentre outros, regula
os cursos complementares de Itapetininga, Piracicaba e o curso anexo
à Escola Normal da capital. Na sequência, o Decreto nº 400, de 16 de
novembro de 1896, sanciona fatos da realidade.

As escolas complementares são estabelecimentos de ensino


público, destinados a explicar e completar o ensino primário de modo a
facilitar a formação de professores preliminares mediante a necessária
prática didática nas escolas-modelo do Estado (artigo 1º § 3º, da Lei
nº 88 e artigo 1º § único da Lei nº 371).
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 161

Seja como for, na década de 1910, em severo processo


de adensamento demográfico, adotava-se o desdobramento e
tresdobramento de turnos dos grupos escolares. E fosse a quantidade
que fosse de estabelecimentos, muitos afogados em dificuldades,
afloravam os vincos demarcatórios da escola paulista (e brasileira):
evolução positiva da matrícula inicial, seguida de reprovação,
abstinência e deserção de alunos.

Teofania republicana, o ativo reformador.

Da potência prática e inventiva dos planos, da condensação


retórico-discursiva de Benjamin Constant, Rangel Pestana, Caetano
de Campos e Gabriel Prestes, entre tantos mais, professores laicos
e missionários dos valores de “15 de novembro de 1889”, a ânsia de
uma Humanidade fraterna une os preceptores do homem-povo. E
sob o pressuposto de uma pedagogia atraente, firmava-se a ubiquação
pragmática da instrução popular cujos axiomas assim podem ser
enunciados: “professor da nação”, o Estado incentiva as virtudes
privadas e públicas; a escola pública como via e meio de iniciação
social; a educação da infância em correspondência, quer no modo quer
na ordem, com a evolução da humanidade considerada biológica e
historicamente; processos atraentes de autoeducação, quer dizer, ativos,
concretos, intuitivos. E suma, força centrípeta, a instrução integral
fiaria a ordem contratual e velaria a concórdia social; noutros termos,
pela instrução primária de Estado, o eu individual se converte em o
nós social. No tempo histórico e seu trabalho de diferença, instituição-
chave, a escola primária de Estado abrir-se-ia às massas.

Da obrigatoriedade

Na primeira década republicana, a demanda de obrigatoriedade


de uma escolaridade comum a todos retorna, atentos à providência
social, legisladores e administradores estaduais revalidam o estatuto
162 • Carlos Monarcha

da obrigatoriedade outrora formulado pelos estadistas da monarquia.


No Pará, o governo de Justo Leite Chermont, com José Veríssimo à
frente da diretoria-geral da Instrução, aprova o Regulamento de 7 de
maio de 1890 ao declarar a obrigatoriedade de frequência em escolas
públicas das cidades, vilas, povoações para crianças de 6 a 13 anos.
Ficariam desobrigadas crianças portadoras de incapacidade física e
mental, indigência ou aquelas que recebessem instrução em casa ou
de escolas particulares; pais tutores, professores, proprietários, gerentes
de estabelecimentos omissos penalizados com multas de 30$000, se
admoestados por escrito pela autoridade, em 50$000, se reincidentes,
em 100$000, se despossuídos de recursos, prisão de 24 a 48 horas.
Em São Paulo, o presidente do estado, Bernardino de Campos,
secundado por Cesário Motta Júnior, amparado nas leis nº 88, de
8 de setembro de 1892 e nº 169, de 7 de agosto de 1893, aprova o
Regulamento da Instrução, Decreto nº 218, de 27 de novembro de
1893, 529 artigos e centenas de parágrafos. O regulamento estatui a
obrigatoriedade em 17 artigos desdobrados em parágrafos imperativos:
obrigadas as crianças de idade entre 7 e 12 anos, à exceção das
residentes a dois quilômetros da escola mais próxima, se meninos, e um
quilômetro, se meninas. Isentadas as que sofressem de inabilidade física
ou intelectual ou instruídas em casa ou em escolas particulares. Mais
ainda, o regulamento determina o recenseamento escolar anual, a cargo
do inspetor do distrito, comunicando-se os resultados aos presidentes
das municipalidades, cabendo-lhes executar matrículas ex officio, aplicar
multas, realizar exames em crianças instruídas em domicílios. Além
mais, os inspetores distritais provocariam as autoridades municipais a
proclamarem em editais públicos a abertura das aulas, locais horários
de funcionamento das escolas. Passados 30 dias da abertura das aulas,
a falta de declarações dos pais, tutores e patrões quanto à educação dos
filhos, tutelados, curatelados, empregados, importaria em matrícula ex
officio, e multa de 10$000, duplicada na reincidência.
No Maranhão, o presidente, capitão-tenente Manuel Inácio
Belfort Vieira, aprova o Decreto nº 94, de 1º de setembro de 1891,
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 163

dentre outros, proíbe os castigos corporais, e declara o ensino


primário leigo, gratuito, obrigatório. “Mas essa obrigatoriedade era
toda platônica, porquanto não encontrava sanção em lei. O bacharel
Alfredo da Cunha Martins reorganiza o ensino de acordo com a lei
de 15 de maio de 1893, que no artigo 7º determinava ser o ensino
primário gratuito, sem cogitar, porém da obrigatoriedade desse.”
Conforme notação de Henrique Costa Fernandes (1929, p.247), em
Administrações maranhenses: 1822-1929. É de supor que a vida social
e/ou comunitária circunscreve-se ao raio da obrigatoriedade escolar.
Igualmente ao Império, o estatuto da obrigatoriedade continuaria a
ser debatido no âmbito das relações humanas, políticas e jurídicas.
Para muitos e muitos, a emancipação do Brasil mental e social
começaria pelo aclaramento das consciências individuais. Nessa
ordem de certezas, a instrução pública, divisa mágica a palpitar no
entendimento ilustrado, é o baluarte das instituições políticas e dos
melhoramentos materiais.

Do contraditório

Na virada do século, dispostos a intervirem no curso dos


acontecimentos republicanos, Raimundo Teixeira Mendes, Miguel
Lemos, diretores do Apostolado Positivista do Brasil e demais sectários
da Religião da Humanidade, e de Augusto Comte contraditam a
obrigatoriedade escolar, em circulares do Apostolado Positivista e em
artigos na imprensa. Apareciam Bases de uma constituição ditatorial
federativa para a república brasileira, Exposição da doutrina positivista em
relação à obrigatoriedade do ensino (1890), de Mariano Oliveira, Contra o
ensino obrigatório (1902, 1ed. 1885), A obrigatoriedade do ensino (1890),
Ainda contra o ensino obrigatório, a propósito do projeto apresentado ao
conselho municipal desta cidade estabelecendo o ensino primário obrigatório
(1908) e O Ensino primário oficial e a regeneração humana (1913).
Consoante a singular dogmática positivista, a ingerência coerciva
dos poderes públicos na vida familiar anula a função materna na formação
164 • Carlos Monarcha

da moral altruísta da prole. Tutelada pela mãe, a educação das primeira e


segunda infâncias deve ser estética. No modo da Religião da Humanidade,
o comtismo exalta as figuras da mulher e da família, pilares da ordem
afetiva e doméstica, a sua vez, pilares da ordem pública. Pois bem aos olhos
dos sectários da Religião da Humanidade, ao usurpar os direitos maternos,
a instrução pelo Estado embarga a liberdade espiritual.

A obrigatoriedade do ensino, isto é, exigir que a criança frequente


a escola consiste em uma agressão a organização familiar: destinado à
segunda infância, semelhante ensino é um apanágio insubstituível das
Mães. A escola primária é uma instituição dissolvente da Família, por
isso que constitui uma usurpação das funções maternas.
Cada criança deve ser instruída, até a adolescência por sua Mãe,
porque só a solicitude materna pode, – e, na Família, – reunir o
conjunto de condições afetivas e mentais indispensáveis ao preparo da
inteligência infantil (Teixeira Mendes, 1908, p.67).

Dos 14 anos em diante, o ensino instruiria o conhecimento


sintético do mundo, sociedade, homem e natureza com recurso ao
estudo sucessivo da matemática, astronomia, física, química, biologia,
sociologia e moral. A essa etapa formativa, sucederia o ensino profissional
em meios práticos de trabalho. Noutros termos, a dogmática singular
recusa os conhecimentos regulados pelo Estado ou crenças religiosas:
pensar e conhecer implica a livre adesão a uma das doutrinas codificadas
em sistemas de pensamento, dentre elas o positivismo de Augusto
Comte. Em tom de crítica social e grande estilo argumentativo, quer-
se dotar a República de arcabouço intelectual, espiritual e político,
Teixeira Mendes contraditava. A formação dogmática levava-o a
recusar a obrigatoriedade, grave obstáculo à cultivação de sentimentos
altruístas necessários à regeneração da Humanidade.

A escola primária, como a creche, o asilo, o hospital, etc., são


instituições atestando a miséria extrema em que se acha a família
III. Do Governo Provisório republicano à virada do século • 165

proletária, em virtude da dissolução geral da sociedade. Todas essas


instituições resultam de tal dissolução, e tendem a fomentá-la, quando
não se tomam as cautelas necessárias. Porque as paixões egoístas e a
cegueira das classes dominantes as levam a erigir tristes expedientes,
sugeridos por uma época de profunda e imensa subversão social, em
instituições normais, destinadas a manter as posições burguesocratas
(Teixeira Mendes, 1908, p.67).

Ou por outra, elaborada sob a doutrina positivista, a Constituição


do Rio Grande do Sul, território de circulação e aprovação da moral
política sobreditada pelo comtismo, por decisão dos líderes do Partido
Republicano Rio-grandense, Júlio de Castilhos, Demétrio Ribeiro,
Borges de Medeiros, sancionava a prevalência do Poder Executivo, a
liberdade espiritual, o ensino livre, a liberdade de profissões pela supressão
dos privilégios escolásticos ou acadêmicos e a não obrigatoriedade.

A boa didática

Por assim dizer, a primeira década do novo regime assiste à


celebração compensatória da vida nacional e da moral republicana,
quer dizer não do estrito combate ao passado corroído, mas do ensino
do amanhã. O afã de uma humanidade fraterna une os sujeitos
do republicanismo educativo, regenerada pelo saber científico, a
pedagogia escolar aparece como sábia invenção técnico-normativa por
assim dizer; para insinuar-se na alma infantil, o bom autor didático
associaria a mestria da palavra às leis da evolução mental da criança e
seu grau de cultura. Esse é o instante feliz dos compêndios in-8º no
formato de brochura ou capa cartonada ilustrada com cenas evocativas.
Nos critérios das comissões do livro didático, a boa didaticidade
reside na linguagem escorreita, na propriedade do assunto, no método
e na clareza de exposição. O modelo-fundador é Cuore de Amicis,
primoroso produto do Risorgimento italiano em tradução de João Ribeiro,
narrativa original em primeira pessoa no formato de diário, cujos valores
166 • Carlos Monarcha

atiçam a brasa do amor à pátria e família e, claro, dedicação à escola.67 É


de então os bem-sucedidos, Cartilha das mães, de Arnaldo de Oliveira
Barreto; Cartilha da infância, de Tomás do Bonsucesso Galhardo; Cartilha
infantil, de Gomes Cardim; Cartilha analítico-sintética, de Mariano
de Oliveira; Prática da língua portuguesa, de Olavo Bilac; Gramática
portuguesa, de João Ribeiro; Princípios de composição, de Guilherme Prado;
Aritmética escolar, de Ramon Rocca Dordal; Meu livro, de Theodoro de
Moraes; Leituras morais e instrutivas para uso das escolas primárias e Grande
pátria, ambos de João Köpke; Leituras morais, de Arnaldo de Oliveira
Barreto; Coisas brasileiras, de Romão Puiggari; Primeiro livro de leitura,
de Guilhermina de Andrade; Contos infantis, de Adelina Lopes e Júlia
Almeida; História de São Paulo e Geografia elementar, ambos de Tancredo
do Amaral; A terra fluminense (educação cívica), de Coelho Neto e Olavo
Bilac, “unanimemente aprovado pelo Conselho Superior de Instrução do
Estado do Rio de Janeiro” – “Neste livro, a História e a Fantasia andam
unidas; e procuramos aproveitar os assuntos, de maneira que pudessem
eles interessar não somente a inteligência, mas também o coração das
crianças” (Coelho Neto; Bilac, 1898, p.10).
No rol comum dos cânticos de vitória, Festas nacionais de Rodrigo
Otávio destoa com a esquentada (senão desiludida) carta-prefácio
de Raul Pompeia, agregada ao compêndio. “A alma nacional segue
sofrendo, dia a dia, o suplício de todas as dores” (1893, p.5). No mais, esse
é o instante do método intuitivo, da didática centrada nas faculdades
sensoriais a induzir a percepção das propriedades das coisas: forma,
cor, som, grandeza, número, movimento, percepção acompanhada
de expressão pictórica e escrita. Nas tantas idealidades, acatava-se a
trilogia ler-escrever-calcular como propedêutica à educação integral
de seres viventes em condição de isonomia. Comocionadas, as vozes
dos homens públicos, vozes sonoras senão altissonantes, ritualizavam a
urgência de uma instrução insertada em sistemas articulados em níveis e
hierarquizados. Virada do século, a escola de instrução primária tende a
integrar-se nas estruturas gerais do país.

67
Cf. D’Ávila (1946).
Parte IV

Da política dos governadores


à década dos centenários

O Brasil é um mosaico. No espaço e no tempo. Geograficamente,


já mais de uma vez tem sido apontado que este país é constituído
por uma contiguidade territorial que não significa continuidade. Do
“inferno verde” amazônico às planícies pampianas do Rio Grande do
Sul, dos areais litorâneos nordestinos aos pantanais de Mato Grosso,
todos os climas e todos os aspectos geofísicos se acotovelam na
vastidão brasileira.
Através do tempo, a história pátria é formada de episódios
destacados, de capítulos mal cosidos, de evoluções distintas que
obedecem a ritmos diversos, uns mais acelerados, tardos e lentos
outros, a tornar confuso e duvidoso o paralelismo de suas diretrizes.

Vivaldo Coaracy, “O caso de São Paulo” (1931)


169

Sobre a natureza do bom e do mau governo

O entrelaçado da Primeira República é por assim dizer traumático.


Os desnorteios da ordem federativa agitam descontentamentos, vem
à tona o requisitório do avesso da “coisa pública”. Numa espécie de
maiêutica ensimesmada, questionava-se: Que há feito a República para
elevar o nível moral do povo? O país está à altura dos usos civilizados?
Onde a grandeza do republicanismo?
Conforme os tratados historiográficos acerca das refregas políticas,
a fase dos presidentes militares sucede à ordem civil de conteúdo
político pragmático e acomodatício dos interesses locais, à “política
dos governadores”, arranjo consolidado nos mandatos presidenciais
de Campos Sales e Rodrigues Alves, neles acionara-se a máquina
hegemonizada pelos mandatários dos partidos republicanos estaduais.
“É de lá [dos estados] que se governa a República, por cima das multidões
que tumultuam, agitadas, nas ruas da capital da União”, verbera Campos
Sales (1983 [1908], p.23) em Da propaganda à presidência.
A descentralização e/ou federalização, conjugadamente à
apropriação da receita de exportação, gera blocos oligárquicos
abrigados nos PRs. Em termos histórico-sociais, transitava-se do
mandonismo do Império ao coronelismo da República, em essência,
o fenômeno é o mesmo, o chefe político local e o município como
esteios do jogo político.68 Ao assegurar consenso interoligárquico

68
Cf. Leal (1975) e Lessa (1988).
170 • Carlos Monarcha

relativamente às eleições presidenciais, a política de reciprocidade


reduz a presença do poder federal nos Estados. De mais a mais, não
constava a obrigatoriedade de voto e, por não ser secreto, assujeitava-se
à pressão dos coronéis e caudilhos, via de regra, convertia-se em objeto
de troca entre pequenos e grandes.
Em nome da fórmula definitiva da civilização do momento,
liberalismos e regionalismos seriam colocados de lado pela Revolução
de Outubro de 1930. Enquanto isso não acontecia, a hegemonia nos
processos decisórios, protagonizada por São Paulo e Minas Gerais,
interrompe-se momentaneamente em 1910 por ocasião das primeiras
eleições presidenciais competitivas: num lado, marechal Hermes da
Fonseca, apoiado por Minas Gerais e pelo gaúcho Pinheiro Machado,
noutro lado, Rui Barbosa e a “campanha civilista” apoiada por São
Paulo e Bahia. Durante o mandato presidencial, o marechal deflagra
as “salvações nacionais”, ao destituir as oligarquias no poder em
Pernambuco, Bahia, Ceará e Alagoas. O mandato transcorre entre
dissidências, crise nas finanças, insurgências e motins – Revolta da
Chibata, criação do Partido Republicano Conservador por Pinheiro
Machado, levantes de setores do Exército, Sedição de Juazeiro e
Guerra do Contestado.

Amarguras dos veteranos da “República de 89”

Os arranjos na grande política colocam em xeque a doutrina do


governo do povo, para o povo e pelo povo, deletério, o primarismo
dos profissionais da política corrói o regime. A exteriorização das
contradições internas, crises extensas e profundas das estruturas torna-
se perceptível aos olhos dos contraditores.69 Do pacto adstrito das
elites contestatárias emanam chamamentos à comunhão nacional, nas
muitas análises atribui-se o definhamento do regime ao liberalismo de
cópia, ao federalismo excessivo, à anarquia mental e ao desregramento

69
Cf. Carone (1976, 1977) e Fausto (1970).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 171

originado pela politicagem.70 Entalhada com argumentos bem-


pensantes a retórica dos contraditores promove a intelecção das
malquistadas disfunções do Brasil social –, nas muitas vozes, o regime
desmentia-se, no Alto, entre as elites, ambição incontida de mando e
insobriedade, no Baixo, entre as classes populares, ausência de vontade
e alheamento nos processos decisórios. Na retórica crítico-negativa, o
país aparece tardio, melhor, atrasado na corrente civilizatória, afastado
do espírito do século, a vagar em lento desmoronar. Intimorato
crítico social, diretor da Instrução Pública, professor de Psicologia e
Pedagogia na Escola Normal do Distrito Federal, Manoel Bomfim
verberava, a República encontrava-se sob o domínio de um gênio
maligno, entidade fabricante de ilusões.

Adota-se o regime republicano para possuir-se esta coisa mirífica


– República! [...] não pensam que tal regime tenha sido adotado por
aquele capaz de dar ao povo a maior dose de felicidade, e que é por
isso, unicamente e exclusivamente por isso, que ela deve existir. Era um
estado social melhor que se pedia, quando se pedia República. Sim, esta
palavra, só ela transportava os corações, porque em cada letra ardia um
ideal: justiça, reparação, solidariedade, beleza nas almas e nas coisas
(Bomfim, 1993 [1905], p.201, grifo do autor).

No meio do fórum, troantes as vozes engajadas

No âmbito das relações internacionais, a Grande Guerra


colocara em xeque a estabilidade da civilização ocidental e, em

70
“Esvaziado o ideário republicano pelo progressivo afastamento dos
ideólogos, a República, que não tivera tempo de se popularizar, nem razões
para a conquista de prestígio junto ao povo foi tragada pelos que dela fizeram
apenas um expediente continuísta para os interesses econômicos e políticos
estabelecidos. Dessa maneira, quando a historiografia republicana refere-se
à República oligárquica, tal denominação encerra um dado de realidade, ou
seja, uma verdade objetiva, mas também uma avaliação implícita da derrota do
ideário republicano” (Penna, 1999, p.88).
172 • Carlos Monarcha

muitos países, entravam em andamento programas de reforço e


centralização do aparato estatal. No Brasil, em particular, o Estado,
esteado na doutrina liberal, convertera-se em alvo de contestação,
recrudescia o chamamento por um poder indivisível, fiador de
interesses gerais, promotor e provedor de melhoramentos materiais,
enfim um poder racional.
Se o gênio da República se encontrava em declínio solar, se o
regime estava em estado de glaciação, se os governantes recorriam a
contraverdades, se o Estado não detinha a função de governo geral,
se a democracia era ilusória, se o país era episódico, se a nação não
falava de si e por si, se o povo era vazio de pensamento, era preciso,
assim se imaginava, que alguém tomasse o poder da palavra e a eficácia
da ação. Em efeito, na sua multiplicidade visionária, homens públicos
de talentos multiformes trazem para si os exames das antinomias da
realidade. Em linguagem breve, exteriorizavam a intelectualização
dos processos socioculturais conflitivos no intento de dominá-los
e solucioná-los. Na intelectualização, prevalece o elogio do poder
de Estado, instrumento agregador num território geograficamente
delimitado e do culto a Nação, comunidade humana, historicamente
constituída e unificada pela língua e cultura. Entrava em andamento
a investidura de homens públicos provenientes de horizontes e
firmamentos distantes conquanto entrelaçados por desejos comuns, a
saber, endireitar os caminhos nacionais. Vozeava-se para que pensar o
Brasil senão para oferecer-lhe significações e valores virtuosos, senão
para cessar a debilitação do senso moral, senão para conformar um
destino isento de parcialidades políticas.
Na conflagração dos discursos formulados em linguagem de
profecias, tornara-se evidente que a mecânica cega das vontades únicas
tornara-se anacrônica. Da refutação ao abstencionismo do Estado, os
contraditores evoluem para a doutrina do Estado como centro unitário
e da nação como sentido do país. O que por certo não significa dizer que
o Estado estivesse ao largo das questões econômicas, políticas e sociais,
basta citar o Convênio de Taubaté, as leis de imprensa, o combate às
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 173

sublevações militares, a repressão política, as decretações de estado de


sítio, a outorga da legislação social. Dispostos a protagonizarem um
Brasil renovado, reconhecendo-se como parentes, diferentes sujeitos,
em diferentes lugares e propósitos, trazem para si o imperativo da ação
transformadora. Proliferam interpretações das realidades mais gerais,
algumas de maior fôlego, outras nem tanto, algumas originais, outras
não, contudo irmanadas na pré-figuração de uma “nação imaginada”.71
E, ao delatar o contraditório entre a “República das altas esferas
institucionais” e a “República do povo”, entre a nação juridicamente
idealizada e o país das franjas urbanas e grotões habitados por
populações alheias à vida coletiva e ao sentimento comum. Voluptuoso,
o verbo social quer atingir o fundo sólido da vida civil, por essa e outras
razões, multiplicam-se as interpretações da vida social, quase sempre
excessivamente retóricas, quase sempre excessivamente declamatórias.
Nelas, as interpretações, uma impetuosidade, expor o país inteiriço,
desvelar, guiar, tirar a venda, purgar o corpo enfermiço.
A República aparece aferrolhada à imagem da decadência, o
federalismo rodeado de suspeitas, o analfabetismo o grande mal. E, aos
motivos constitutivos da trindade republicana, liberdade, igualdade,
felicidade, acrescenta-se o motivo da unidade-unitária pela ação social
da instrução elementar constituída e instituída em dimensão nacional.
Nos contraditórios infindáveis, a função catalisadora antes concedida
à ideia de civilização dará lugar às noções de civilização industrial e,
sobretudo, de modernização.
No movimento difuso, aspirações de democracia, progresso, voto
esclarecido, recrudesce o apelo à agregação moral pela via da escola
primária de Estado. “Compreende-se, por ventura, uma democracia
donde 90% dos indivíduos são excluídos por analfabetos. Povo,
consciente de sua existência, tal como o exige uma democracia, não
existe aqui; é preciso fazê-lo” (Bomfim, 1993 [1905], p.46-47). Desde
que organizada e coordenada num sistema nacional, cogitava-se, a
instrução popular exerceria efeitos dinamogênicos sobre as energias

71
Cf. Anderson (1991, 2007).
174 • Carlos Monarcha

sociais. Nos chamamentos, o sinete do momento: despertar o país do


sono comatoso, cessar o indiferentismo, abrandar os costumes, dirigir
o povo inculto, modernizar as estruturas, esclarecer o voto, combater o
analfabetismo. E, ao assumir a extensão da escola como salvaguarda da
nacionalidade, os portadores de futuros possíveis firmam a identidade
reputada de sujeitos sabedores dos meios (e técnicas) congregantes do
corpo coletivo.

Capital Federal, observatório da vida coletiva

Intérminos, os debates e juízos sobre passado, presente e futuro


concentram-se na Capital Federal, lugar determinante dos modos
de pensar o país, sua história, sociedade, cultura, e claro, transes
coletivos. Intentando elevar a Capital Federal à altura da civilização do
momento, realizavam-se reformas urbanísticas, obras de saneamento
e combate aos surtos de febre amarela, cólera, tuberculose, varíola
e peste bubônica.72 No front sobressaem Oswaldo Cruz, médico
sanitarista, Lauro Muller, Paulo de Frontin, engenheiros, e Francisco
Pereira Passos, prefeito conhecedor da reforma de Paris executada por
Haussmann, engenheiro-prefeito designado por Napoleão III.
No sóbrio dizer de um cronista da Belle Époque carioca, “o
Rio civiliza-se”, breve apreciação assinaladora de transformações
de hábitos e costumes, o que, por ventura, não significa hoje atestar
realidades róseas; sem meias-tintas, Azevedo Sodré, diretor-geral da
Instrução Pública, exarava duras palavras. “Na sua quase totalidade,
as nossas escolas públicas se acham instaladas em prédios de aluguel,
construídos para residências particulares, e onde as classes funcionam
em saletas, quartos, copas, cozinhas e porões, em flagrante divórcio
com os mais rudimentares preceitos da higiene e da pedagogia” (Sodré
apud Corrêa, 1916, p.51).
Como dito, em maior parte da Capital Federal, emanam os
ajuizamentos dos movimentos milenaristas, bem como denúncias

72
Cf. Pechman e Fritsch (1985).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 175

dos descaminhos do regime, equívocos dos governos civis e militares


e, sobretudo, das condições sanitárias dos sertões extensos e das
cidades densamente povoadas. Nas muitas análises, nas muitas vozes,
confrontam-se as imagens dos desequilíbrios. No dizer de Euclides da
Cunha (1907, p.30. “O verdadeiro Brasil nos aterra; trocamo-lo de bom
grado pela civilização mirrada que nos acotovela na Rua do Ouvidor.”
Nos lotes interpretativos das realidades do país, baldados os
esforços, tirante a orla litorânea onde se concentravam as grandes
e médias cidades, constatava-se a existência de um país distante de
si, melhor, de lugares minados por falares engrolados, tradições
semicoloniais e modos desusados de trabalhar e viver. Realistas aos olhos
dos contraditores, o Brasil, continente distendido e indeterminado,
de territorialidade vasta e inculta, era frágil Estado geográfico e pré-
nacional. Nos circuitos intelectuais, literários e políticos, enfim nos
circuitos da inteligência brasileira, debatia-se a difícil territorialização
do poder de Estado, num país de impressionantes diversidades étnico-
culturais e profundas desigualdades sociais.73 Para a razão racionalista
que articula conhecimento, planificação e intervenção, desde que
provido de instituições sociais e técnicas de governabilidade, o Estado
exerceria um poder corretivo aos excessos e desníveis desagregadores.

Nação enferma, país no microscópio

As projeções mentais sobre-excedem a crueza dos fatos de


realidade e, embora cada intérprete os descrevessem a bel-prazer,
havia consensos: riscos de cissiparidade, escassez de comunicações,
territórios escandalosamente desamparados, depauperação do povo,
bruteza de modos de viver, individualismo desordenado, perversão do
senso moral.

73
“Em outras palavras, para construir um tipo específico de nação, os líderes
precisariam estender o alcance do governo brasileiro àqueles que, a exemplo
do perplexo fazendeiro de Santa Catarina, não reconheciam nenhum dos
símbolos da nação nem seu governo” (Diacon, 2006, p.22). Para o autor, a rigor
existiam duas instituições nacionais, o Exército e a Igreja católica.
176 • Carlos Monarcha

Fecho os olhos, um momento, e passam nitidamente na tela da


minha memória, as praias do Norte, de coqueirais, sussurrantes, com
a sua população de impaludosos e catequéticos, tremendo de maleitas,
o dia inteiro, ou certos trechos dos sertões do sul, terras malditas de
barbeiros e opilados.
E aqui, ali, por toda a parte, sob o sol ardente do Norte, ou sob
o frio dos sertões paranaenses, a mesma sub-raça de indolentes e
vencidos, vivendo ao Deus dará, esquecidos dos senhores do país, cem
anos distanciados da civilização contemporânea (Bello, 1918, p.124,
grifo do autor).

Decretavam-se judiciosas ordens de certezas, na sua escassez,


a instrução e a saúde flagelavam a nacionalidade, de modo que as
inauditas formulações – “instruir para sanear” e “saneamento pela
educação” – estalavam nas línguas dos partidários de um poder
central no aprovisionamento de serviços públicos. De sorte que nas
primeiras décadas do século XX, o sanitarismo fez-se presente pelas
ações dos cientistas-expedicionários do Instituto de Oswaldo Cruz,
“Manguinhos”. A rigor palmilham áreas da Bahia, Ceará, Goiás,
Minas Gerais, Pernambuco, Piauí, São Paulo, Amazônia e vales dos
rios São Francisco e Tocantins, inspecionando as regiões-sedes de
projetos em grande escala – hidrelétricas da Companhia Docas de
Santos e Ligth and Power, reservatórios de água, prolongamentos ou
construções de estradas de ferro, Central do Brasil, Noroeste do Brasil
e Madeira-Mamoré. De par, efetuam estudos encomendados pelas
superintendências de Obras Contra a Seca e de Defesa da Borracha.
De caráter ativo e documentário, um dos resultados das
expedições consiste na elaboração de surpreendentes relatórios médicos,
etnográficos e sociológicos.74 Obra-prima do registro documentalista
Viagem científica pelo norte da Bahia, sudoeste de Pernambuco, sul do Piauí
e de norte a sul de Goiás, dos médicos-sanitaristas Belizário Penna e
Arthur Neiva é o melhor exemplo. “Os sertões que conhecemos, quer

74
Cf. A ciência a caminho da roça... (1991).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 177

os do extremo norte quer os centrais quer os do norte de Minas, são


pedaços do purgatório, como no-lo pintam os padres, onde se purgam
os pecados em vida, sem outra compensação que a inconsciência em
que cai o desgraçado que nele se afunda” (Neiva; Penna, 1916, p.35).
E, ao delatarem as misérias físicas e morais das populações, deploram
quadros fantasmáticos. Desse registro documentalista, defluem
análises médico-etnográficas concernentes aos modos de viver a vida
do país interior. Convictos de si, médicos higienistas, sanitaristas
desencadeiam campanhas visando à constituição de populações
hígidas, imunes às doenças tropicais e à ignorância. Tal como bem
quis Aleixo de Vasconcellos (1924) em Luta contra o analfabetismo,
de como esta campanha favorece o saneamento do Brasil. E apreciados
em si mesmos como tonificantes, os temas saneamento e instrução
são nacionalmente cadastrados sob o ângulo da economia política.
Elucidava o médico Miguel Couto, em “A educação nos sertões”.

Pondo de parte outras causas possíveis de aviltamento na espécie,


como certas doenças regionais, malária, doença de Chagas, a nutrição
insuficiente ou avitamonósica e monótona, etc. três são, como acabamos
de ver, as origens gerais da corrupção que campeiam nos nossos
sertões, entrelaçadas, gerando-se e complicando-se mutuamente
e indefinidamente: a verminose, o alcoolismo e a incultura. Se me
perguntarem qual a maior, a pior, a genetriz, a que primeiro deve
ser combatida com todas as forças concentradas, eu não hesito em
responder: a incultura (Couto, 1937, p.108).

E prosseguia no encadeamento de soluções. “No que concerne


a educação, não avanço porque ignoro, presumo apenas. Discute-
se pedagogia pelo menos desde Platão e Aristóteles; mas apesar
da incessante produção de obras notáveis em todas as línguas e da
diversidade de sistemas, de país a país, no que toca aos princípios
gerais, J.-J. Rousseau, Basedow, Pestalozzi, podiam ser servidos e
seguidos ainda hoje” (Couto, 1937, p.50-51).
178 • Carlos Monarcha

De mais a mais, em sua ambição terapêutica, o sanitarismo fez-se


presente nas frentes de combate e propaganda de salubridade médico-
social: as ligas Contra o Analfabetismo, Pró-Saneamento do Brasil,
Defesa Nacional, Nacionalista de São Paulo, Brasileira de Higiene
Mental, Sociedade Brasileira de Higiene, Associação Brasileira de
Educação e Sociedade Eugênica de São Paulo, ou seja, em associações
civis dispostas a eliminar os extremos negativos.
Dentre outros, data de 1919, a criação do Departamento
Nacional de Saúde Pública e do Serviço de Profilaxia Rural. Ao
ministério da Justiça e Negócios Interiores, competiam os assuntos
da instrução, para tanto era auxiliado pelo Conselho Superior de
Ensino, substituído pelo Conselho Nacional de Ensino, em 1911, e
posteriormente pelo Departamento Nacional de Ensino, em 1925.
Unissonamente se reconhece e proclama a importância da instrução
elementar nas democracias, único regime de liberdade.

São meras ficções legais os regimes democráticos que não


se firmam no esclarecimento da pública opinião. Democracia e
analfabetismo são termos que se excluem, são expressões antitéticas.
Só pode ser chamado, a justo título, republicano o país cujos cidadãos
estão em condições de cultura mental embora rudimentar de discernir
o que é o interesse público (Medeiros, 1918, p.215).

As insuficiências do “aparelho didático” nacional legitimam os


argumentos circulantes no Congresso Nacional, imprensa e estudos,
a favor da participação do poder central nos serviços de instrução.
Sobrinho e homônimo do marquês de Abrantes, e ex-ministro da
Viação e Obras Públicas e da Agricultura, Indústria e Comércio,
Miguel Calmon Pin e Almeida – a ele se deve a permissão de Maria
Montessori para verter em língua portuguesa Método da pedagogia
científica aplicado a educação infantil nas “Casas dos Meninos”, replicava
em As promessas e os resultados da pedagogia moderna.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 179

Mas, não é só aqui, nem só agora, que isso se vê: alunos sem-
teto e professores sem-pão, de muito, que nos são familiares! Onde
se viram escolas, construídas pelo povo e para o povo, desviadas dos
seus lídimos fins, e até demolidas?! Onde se iniciam obras de grupos
escolares, que se não acabam, despertando, nos moços, a impressão de
que um povo acometido de caquexia precoce?! (Almeida, 1915, p.3).

Fosse por vaga humanidade, fosse por razões políticas,


nacionalismo, patriotismo e civismo popular constituem os temas
encampados pela inteligência brasileira nas primeiras décadas do
século XX quando, talvez mais do que antes, retornam as teses
respeitantes à capacidade generativa da instrução popular, como via de
enfrentamento dos aspectos associais e da superação do atraso. Com
efeito, desde a virada do século, as vozes mais autorizadas apelavam
para a intervenção da União na extensão do ensino primário, que,
por costume, isto é, desde a monarquia, decidira-se ser competência
das províncias e dos municípios, demanda essa interrompida com a
instituição do federalismo republicano.
Se, para uns, é preciso banir a ideia do “Estado-professor”, para
outros, o Estado não seria indiferente à extensão do ensino, “um dos
grandes elementos da prosperidade das nações”, no dizer entusiástico
de um contemporâneo. Para uns mais, o encargo vigoraria até a
eliminação do analfabetismo, para outros mais, essencial e indeclinável,
o encargo seria permanente. Por iniciativa do Poder Legislativo ou
de atos ministeriais em determinadas conjunturas, o Congresso
Nacional abandona momentaneamente a rigidez liberal federalista ao
autorizar emendas no orçamento geral a fim de subsidiar a instrução
popular nos Estados. Se a Carta de 1891 instituíra a descentralização
político-administrativa, conquanto isso não se autoriza a concluir que
as demandas de coordenação nacional da instrução popular estivessem
ausentes nos debates parlamentares, nos quais sobressaem José
Augusto, Monteiro de Sousa, Passos de Miranda Filho, Barbosa Lima
Sobrinho, José Bonifácio. Ademais, ministros da Justiça e de Negócios
180 • Carlos Monarcha

do Interior, como Tavares de Lira e Esmeraldino Bandeira, alinhavam-


se a favor da participação direta e imediata da União no provimento da
instrução popular.75
No âmbito legislativo, a Lei nº 1.617, de 30 de dezembro de
1906, autoriza a União a auxiliar os estados que despendessem 10%
da receita anual com vencimentos de professores que ministrassem
instrução leiga e gratuita.
Em mandato presidencial impetuosamente centralizador, Hermes
da Fonseca edita as leis orçamentárias nº 2.356, de dezembro de 1910,
2.544, de janeiro de 1912. A sua vez, a Lei nº 2.738, de 4 de janeiro
de 1913, autoriza o governo a promover e animar o ensino primário
mediante acordos estaduais, a União auxiliaria os estados com 20% do
montante despendido no ensino primário, leigo e gratuito, podendo
elevá-lo a 25%, desde que as unidades acordantes despendessem pelo
menos 10% da receita geral. Incluso, subvencionaria as associações
estrangeiras ou nacionais capazes de ofertarem instrução elementar,
contudo as autorizações em lei não se concretizam. E a despeito de
tudo, um fato é inegável: assistia-se ao crescimento da importância
social e extensão da escola, fenômeno descontinuado e mais expressivo
nas áreas abertas à economia de mercado. Nos centros urbanos,
escolas-modelo anexas às escolas normais, grupos escolares, escolas
reunidas oferecem condições de conforto e higiene; nos núcleos de
baixa densidade demográfica, escolas isoladas sob a regência de um
professor, invariavelmente desmobiliadas e refugiadas em locais
improvisados; nas regiões remotas, escolas ambulantes, escolas de
emergência e outras ditas rudimentares.

75
Cf. Moacyr (1916).
181

Os números revelados

Médico, demógrafo e redator da revista Brasil Médico, José Luiz


Sayão de Bulhões Carvalho, no introito do relatório apresentado a
João Pandiá Calógeras, ministro da Agricultura, Indústria e Comércio,
endereçava argumentos a favor da lei dos números e sua utilidade.
“A estatística, considerada por alguns uma ciência, um método por
outros, é indubitavelmente uma especialidade técnica, cuja aplicação
facilita o conhecimento dos fatos sociais, susceptíveis de estudo pela
comparação numérica”.

Não é apenas um método prático para o estudo comparativo de


algarismos. Serve também de base ao progresso da ciência relacionada
com os fatos sociais, quer sob o ponto de vista físico ou material, quer
sob o ponto de vista intelectual e moral. Com esse objetivo os países
mais civilizados organizaram repartições de estatística, destinadas
a coligir, elaborar, coordenar e publicar toda sorte de informações
relacionadas com o estado físico, político, administrativo, demográfico,
econômico, intelectual e moral dos respectivos domínios (Bulhões
Carvalho, 1915, p.39).

Nas décadas inicias do século XX brasileiro, a afirmação da


atividade estatística, em diversos domínios da formação social, materializa
em números as ditas realidades nacionais. É sob esse aspecto que se
recruta um saber objetivo a serviço das políticas públicas que afetam as
182 • Carlos Monarcha

populações consideradas como agregados naturais dotados de atributos


próprios. De modo geral, os números consolidados correlacionam gentes
e coisas submetidas à contagem (por certo, ao revelar cifras globais, o
saber estatístico adquire ares de pesquisa social); dentre outros, concluía-
se que a instrução, fenômeno de massa, pode ser objetivamente descrita
e avaliada com recurso aos números.

Das cifras

Entre 28 de janeiro e 15 de novembro de 1908, na cidade do Rio de


Janeiro, realizou-se a Exposição Nacional Comemorativa da Abertura
dos Portos, evento solene recamado de efeitos de teatralidade, nele
exibiam-se os índices de progressos na “Agricultura, Indústrias e Artes
Liberais”. A dupla finalidade, irradiar a face de um país industrioso
e moderno, entremostrar a capital da República recém-saneada e
reurbanizada. Com o propósito de “elevar o conceito do Brasil no
mundo civilizado”, o Boletim Comemorativo da Exposição Nacional
exultava os progressos concretizados entre 1808 e 1908; com títulos
em português, francês e esperanto, no formato de gráficos de coluna, os
quadros numéricos ilustravam as potencialidades do país. No introito
do Boletim, por sinal, sobrecarregado de imagens auspiciosas, Bulhões
Carvalho condensava a pujança e a vitalidade do país.

A vasta rede telegráfica que une pelo pensamento os pontos


mais longínquos do nosso território entre si e com todos os centros
industriais e intelectuais do mundo; as vias férreas que ligam os
Estados e caminham pelo interior, galgando as serras, transpondo
os rios, conquistando para a civilização os sertões bravios, desertos e
demandando as fronteiras, hoje limitadas por tratados internacionais;
as cidades, as vilas antigas e novas, os povoados e as colônias nascentes;
a navegação nos rios e lagos e na cabotagem de imensa costa marítima;
os correios multiplicando sob todas as formas e todos os meios de
comunicação, a correspondência com desenvolvimento tamanho, que
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 183

só por milagre se consideraria possível há cem anos passados: toda


essa perspectiva do território assim transformado e movimentado pela
atividade dos seus habitantes deve apresentar na Exposição Nacional
de 1908, num quadro magnífico, a imagem do progresso do Brasil,
fazendo num século de apressada marcha o percurso necessário para
alcançar o grau de cultura, que as antigas nacionalidades atingiram em
milhares de anos (Bulhões Carvalho, 1908, p.V-VI).

Decidido a repropor uma imagem global do país, o Boletim


Comemorativo da Exposição Nacional preenchia severa lacuna, entretanto
havia controvérsias quanto ao total da população, os cálculos otimistas
estimavam o total de habitantes em 25 milhões, outros, mais modestos,
em 18 milhões. A diretoria-geral de Estatística opta por termo médio,
o total oscilaria entre o máximo de 22 e o mínimo de 20 milhões, a
densidade demográfica média não excederia a 2,40 habitantes por km².
Quadriculado, o território nacional assim aparecia no Boletim:
Distrito Federal, 722 habitantes por km²; Rio de Janeiro 14; Alagoas
11; Pernambuco e Sergipe 9; Ceará e São Paulo 8; Santa Catarina 7;
Paraíba e Minas Gerais 6; Bahia e Rio Grande do Sul 5; Espírito Santo
e Rio Grande do Norte 4; Paraná, Piauí e Maranhão 1; Pará, Goiás,
Amazonas, Mato Grosso, menos de 0,50. Cidades mais povoadas
com mais de 500 mil habitantes, Rio de Janeiro; com mais de 200 mil
habitantes, São Paulo e Salvador, com mais de 100 mil, Recife.
Quanto à situação do “aparelho didático”, Bulhões Carvalho,
constrangido, sentenciava. “Sob o ponto de vista intelectual, não são
ainda notáveis os progressos da instrução pública no Brasil” (1908,
p.XXXIV ). Em seguida, declinava os totais gerais da matrícula e da
frequência no ensino público e privado, respectivamente, 565.922 e
391.188 alunos. No âmbito do ensino público primário estadual, as
“casas de ensino existentes no país”, “consoante a forma didática e
distribuição regional”, o Boletim totalizava 169 “escolas especiais”, isto
é, escolas complementares, escolas-modelo, grupos escolares e jardins
de infância; e 6.920 “escolas comuns”, isto é, escolas elementares e
184 • Carlos Monarcha

isoladas. E como era de se esperar, os 7.089 estabelecimentos de


ensino encontravam-se irregularmente distribuídos pela extensão
territorial do país.
Se concedido confiabilidade aos subtotais e totais estatísticos
consolidados, as maiores quantidades de estabelecimentos de ensino
encontram-se em Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul; as
menores, no Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Espírito Santo e
Goiás. A modalidade jardim de infância é quase nula, mas não menos
importante, um estabelecimento em São Paulo, e outro no Paraná.76
Valiosos os dados a seguir demonstram o descompasso entre a matrícula
geral nas escolas públicas, 348.327 alunos, e a frequência real, 240.690
e, por ventura igualmente notar os descompassos regionais: Minas
Gerais, matrícula geral de 88.701 alunos e frequência de 47.399; São
Paulo, 60.983 e 45.857; Rio Grande do Sul, 46.166 e 33.634; Bahia,
28.120 e 19.235; Goiás, 3.158 e 2.053; Mato Grosso, 4.253 e 3.828;
Amazonas, 4.102 e 3.355.
Já na Estatística escolar de 1916, Bulhões Carvalho divulgava
os números relativos aos ensinos superior, secundário, profissional e
primário nas esferas pública civil, militar e particular nas 21 unidades
da federação. Persistente, o estatístico consegue neutralizar a resistência
dos poderes locais e o descaso com registros administrativos e civis.

No nosso centro mais adiantado, na própria Capital Federal,


segundo o último recenseamento a que aqui se procedeu, há nada
menos de 48 analfabetos em 100 habitantes de todas as idades, 40 entre
as pessoas maiores de 6 anos e 37 entre aquelas que já completaram
três lustros de existência.
Mais da terça parte, portanto, dos indivíduos que, pela idade, já
deviam ter saído das escolas primárias, ainda se acham nesta brilhante
metrópole, em pleno século XX, à míngua de instrução, no que tem
esse de mais rudimentar! (Bulhões Carvalho, 1916, p.XII).

76
Cf. Apêndice A – Tabela C.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 185

Cauteloso contrabalançava a apreciação negativa. “Mas também


se há de ver que nem por toda a parte é desalentador o espetáculo do
ensino; pois se pontos há em que a instrução esteja estacionária, ou
sofra alternativas de melhora e descenso, também não falta onde ela
se apresente em progresso firme, contínuo, animador” (1916, p.XII).
Excluídos aqui os dados referentes ao ensino militar, a situação global
dos ensinos superior, secundário, primário e profissional em 1916 era
esta: 12.997 cursos (15 federais, 6.986 estaduais, 2.647 municipais,
3.349 particulares), dos quais 25 superiores, 373 secundários, 12.448
primários e 151 profissionais. 20.166 docentes, 671 no ensino superior,
1.603 em institutos profissionais, 2.306 em colégios e 15.586 em
escolas primárias.
Quanto à instrução primária pública e privada:
– 12.448 “institutos de ensino elementar”, 9.553 públicos
e 2.895 privados; dentre os primeiros, 6.918 estaduais e
2.635 municipais; dentre os últimos, 213 com subvenção
municipal e 2.682 sem “proteção oficial”.
– 15.586 professores, 11.402 em escolas públicas, 4.184 em
particulares; 8.068 professores lotados no magistério estadual,
3.334 no municipal, 239 em estabelecimentos subvencionados,
3.945 em estabelecimentos “sem auxílio oficial”.
– 638.378 alunos matriculados em cursos primários públicos e
privados; 504.706 “inscrições” em estabelecimentos oficiais;
133.672 em institutos particulares; 367.287 em escolas
estaduais; 137.419 em municipais, 7.253 em “colégios
subvencionados pelos governos municipais”; 126.419 em
“casas de educação de iniciativa privada”.
– 355.150 alunos do sexo masculino, 283.228 do sexo
feminino.
– dos 638.378 alunos matriculados, 447.614 frequentavam
as escolas; 256.787 em escolas estaduais; 95.531 em escolas
municipais, 5.954 em escolas particulares subvencionadas;
93.342 em escolas não subvencionadas.
186 • Carlos Monarcha

E ao proceder-se à localização de escolas conforme critérios


previamente estipulados, isto é, organização didática, pessoal docente,
população em idade escolar segundo o sexo, matrícula, frequência,
conclusão de curso, concretizava-se uma estatística dotada de método
confiável e ineditismo, cujos resultados viriam a público na mesma
ocasião em que o Congresso Nacional retomava os debates sobre a
erradicação do analfabetismo nacional.
De resto, coube a Oziel Bordeaux Rego, chefe da 4ª seção
da diretoria-geral, conduzir a coleta de dados, no seu ajuizamento
técnico. “A matrícula e a frequência não bastam, porém, para
julgarmos com segurança a eficácia do aparelho didático. É necessário
ainda o conhecimento de um terceiro fator de real importância, a
população escolar” (1916, p.VII). A bem dizer, os números coletados
alarmavam. “Em todo Brasil, de 1.000 indivíduos em idade de cursar
escola primária, 137 apenas estavam matriculados, e deles, somente
96 frequentavam as escolas.” Prudentemente à procura de certezas
proporcionadas pela objetividade dos números, Bordeaux Rego
estipulava os quesitos da boa estatística, a saber, conhecimento do
quadro do pessoal docente, total de alunos concluintes dos cursos,
“impersistência nos estudos”, dispêndios com o ensino público,
dados por ele considerados esquivos. De qualquer modo as cifras
consolidadas dimensionavam a organização empírica, a extensão
e a distribuição do “aparelho didático” pelos estados, municípios
e Distrito Federal. Segundo a estatística de 1916, o “aparelho
didático”, conforme terminologia técnica, comportava “escolas
comuns” e “escolas especiais”. O “total do discipulado”, a população
discente, encontrava-se assim distribuída: 58% em “aulas estaduais”,
21% em escolas municipais, 20% em escolas particulares, e 1% em
escolas subvencionadas.
Mato Grosso comparecia com maior número de alunos em
escolas estaduais, visto ser nula a participação municipal; Alagoas,
Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Sergipe, Amazonas, Ceará, São
Paulo possuíam escolas estaduais em quantidades expressivas; já nos
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 187

estados do Rio Grande do Sul, Piauí, Maranhão, Bahia, Pará, Paraíba,


Espírito Santo, Rio Grande do Norte, Goiás, Santa Catarina, São
Paulo, Pernambuco avultavam a participação dos municípios na oferta
de escolas.
No tocante à matrícula geral, como vimos, constatava-se déficit
entre os totais gerais da população em idade escolar – 4.642.676
crianças; matrícula geral – 638.378; frequência – 447.614, déficit
sujeito a variações regionais. Conquanto, é preciso acautelar a
estimativa da população em idade escolar, os executores da estatística
contabilizam os dados estocados em recenseamentos anteriores. Além
do que, o conceito assumido de “idade escolar” refere-se não à idade
de frequentação obrigatória sujeita à variação nas unidades federadas,
mas, segundo Bordeaux Rego. “Ao que se nos afigura mais próprio
para a assimilação normal do primeiro grau do ensino intelectual, que
a maioria dos educando não soe transpor. E é por isso que damos por
balizas a esse período os 7 e os 15 anos” ( 1916, p.CCIX).
Ao cotejar os números coligidos, o estatístico concluía. “A
impressão que deixa o exame desse quadro é, sem dúvida, antes
de tristeza que de satisfação.” No Distrito Federal, o coeficiente
de crianças fora da escola alcançava 58%, em Santa Catarina,
75%. O coeficiente de matrícula no Rio Grande do Sul, 23%, no
Pará, São Paulo, Mato Grosso, próximo a 20%; em Minas Gerais,
Paraná, Sergipe, Espírito Santo, Maranhão, Rio de Janeiro “não
atingia 15%”; na Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Goiás,
Paraíba, Alagoas, Piauí, Amazonas, Ceará, o coeficiente “estava
aquém de 10%”. Na apreciação de Oziel Bordeaux Rego, os impulsos
significativos de escolarização provinham do Distrito Federal, São
Paulo e Minas Gerais, contudo, a seu ver, as taxas da matrícula
geral demonstravam-se insuficientes no tocante à incorporação das
populações infantis presentes e futuras. Mesmo assim, ressalvava as
evoluções positivas, desde a Proclamação da República, a proporção
entre matrícula geral e população em idade escolar aumentara três se
comparada às últimas décadas do Império.
188 • Carlos Monarcha

Em vez de recuo, portanto, o que havido é, indubitavelmente,


marcha progressiva. Se a velocidade desse movimento está longe de
satisfazer as nossas aspirações, algo consoladora, entretanto, já se nos
afigura a certeza de que, apesar da interferência maléfica de tantas
causas profundamente perturbadoras da evolução nacional, não há
sido de todo perdida a esperança no melhoramento da cultura comum
a fase que às esperanças de nosso povo, há vinte e seis anos, abriu a
aurora do 15 de Novembro (Bordeaux Rego, 1916, p.CCXXIX).

Reveladores, os números brutos levantados pelas estatísticas de


1908 e 1916 indiciam os males, de uma parte, repetência, de outra,
duração mínima da escolaridade. Era sobre esse solo numérico que
se assentavam os vigamentos da escolarização da infância. Mais não
seja, sob as inexcedíveis inventivas de Bulhões Carvalho e Bordeaux
Rego, o “aparelho didático” nacional (e regionais) adquire forma
numérica.77 Doravante, com as estatísticas da instrução, cujos números
colossais impressionavam a todos aqueles às voltas com os direitos da
cidadania, reacendia antigo pressuposto filosófico-utilitarista –, qual
seja, converter a função do Estado em fonte da felicidade coletiva. Sob
impacto da ciência estatística, há a transfiguração das realidades em
cifras reconhecíveis. Monocrômicas, as irrefutáveis moles numéricas
e sua linguagem objetiva engendram verdades quanto ao ser real do
Brasil e dos brasileiros, e delas, as verdades, aduziam-se políticas para
os serviços setoriais.

Poder local, passo à frente

Compreendendo a instrução elementar como cidadela do poder


público, algumas câmaras municipais paulistas arriscam instituir a
obrigatoriedade escolar. No âmbito do poder local, por exemplo, José
Augusto de Barros, prefeito de Mogi Mirim, promulga tal estatuto na
forma de lei.

77
Cf. Apêndice A – Tabela D.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 189

Artigo 1º – É obrigatório, em todo o território do município o


ensino primário para as crianças de 7 a 12 anos.
Artigo 2º – Excetuam da obrigatoriedade:
As crianças que residirem à distância da escola pública maior de
dois quilômetros, para meninos, e de um quilômetro para meninas;
As crianças que sofrerem de inabilidade física ou intelectual,
comprovada por atestado médico, ou, em falta deste, do Juiz de Paz ou
da autoridade policial do distrito.
Artigo 3º – As crianças, em idade escolar obrigatória, poderão
receber o ensino: a) nas escolas públicas; b) nas escolas particulares; c)
em suas próprias casas.
Parágrafo único. No caso da letra (c) são obrigados a fazer
exames nas escolas públicas, na época para isso designada, sob pena
de incidirem os responsáveis por elas, na multa de 10$000 (O ensino
primário e as municipalidades..., 1918, p.4).

Os demais artigos e parágrafos da lei incidem na criação de


escolas em localidades nas quais, no “perímetro da obrigatoriedade”,
a população em idade escolar fosse igual ou superior a 100 indivíduos,
realização de estatística da população escolar, decretando-se, se
necessária, a matrícula ex officio, secundada de multas aos pais, tutores,
curadores ou patrões desleixados. Compartilhando dos arroubos de
progresso civil e riqueza material, a Câmara Municipal de Atibaia,
interior paulista, igualmente legislava a obrigatoriedade nos termos
da Lei nº 88 de 1892 e do Decreto nº 218 de 1893. O ato legislador
inovava ao proibir o trabalho de menores de 12 anos em fábricas,
oficinas, casas comerciais ou particulares, durante tempo e horas de
aulas (A obrigatoriedade do ensino..., 1917, p.3).
Ao votar o anteprojeto de Raul Fonseca, diretor do Grupo
Escolar “Cesário Mota”, a Câmara Municipal de Itu sancionava a
obrigatoriedade igualmente em acordo com a Lei nº 88 e Decreto
nº 218. Nas considerações, a razão dos legisladores: estimular o
nacionalismo pela unificação da língua e conhecimentos da história e
190 • Carlos Monarcha

geografia pátria, difundir a ética do trabalho, conscientizar homens e


mulheres de seus direitos e deveres, reduzir o analfabetismo, elevar a
moral, incutir energia, revigorar o caráter do povo.
Excluídos da obrigatoriedade, meninos residentes a mais de
três e meninas a mais de um quilômetro da escola ou portadores de
incapacidade física ou intelectual, atestada por médico. Pais, tutores,
curadores ou patrões eram obrigados a matricularem filhos, tutelados,
curatelados ou empregados em grupos escolares, escolas isoladas ou
particulares; a inobservância da lei autorizava a matrícula ex officio.
Aos refratários, multas de 10$000 a 50$000, outra multa concerniria
a 15 faltas consecutivas. Ademais proibia o trabalho de menores de
12 anos em fábricas, oficinas ou casas comerciais no período diário de
aulas. Os maiores de 12 e menores de 16, analfabetos, empregados em
fábricas, oficinas ou casas comerciais, frequentariam escolas noturnas.
A Câmara Municipal efetuaria a estatística anual da população escolar,
criaria escolas municipais nos bairros e instaria o governo estadual a
criar e a prover escolas.
191

E continuam a revelar...

Nas proximidades do centenário da Proclamação da


Independência, Epitácio Pessoa, presidente da República, em clima
patriótico, patrocina a Exposição Internacional do Centenário
da Independência. Na abertura, parada militar e juramento à
Bandeira Nacional nas escolas primárias da Capital Federal. Na
cena celebrante, pavilhões dos estados brasileiros e países da
América – Argentina, Estados Unidos, México; Europa – Bélgica,
Checoslováquia, Dinamarca, França, Inglaterra, Itália, Portugal,
Noruega, Suécia; Ásia – Japão.78
Dentre as maravilhas técnicas destinadas a provocar emoção e
prazer, a exibição de “No país das amazonas”, premiado documentário
produzido pelo fotógrafo português Silvino Santos: pela primeira
vez, exibiam-se imagens movimentadas da Região Norte, suas gentes
morenas, riquezas vegetais e exuberâncias da fauna. Paralelamente,
com Roquette-Pinto à frente, inaugurava-se a primeira transmissão
radiofônica no país, o discurso de Epitácio Pessoa, seguido da
execução da ópera “O guarani”, de Carlos Gomes. Após recepcionar
milhares de visitantes, em 7 de setembro de 1923, encerrava-se a
Exposição Internacional, nessa ocasião o poeta pernambucano
Joaquim Osório Duque-Estrada entregava a letra do Hino Nacional
ao presidente da República.

78
Cf. Motta (1991, 1992).
192 • Carlos Monarcha

Enquanto tecnologias de governabilidade, excetuando-se o


recenseamento geral de 1920, os recenseamentos decenais foram
operações malsucedidas.79 O recenseamento geral de 1890 realizara-se
na conjuntura instável do Governo Provisório, o de 1900, no governo
de Campos Sales, será contestado, suspendendo-se a divulgação
dos resultados, o de 1910, cancelado por Hermes da Fonseca.
Independentemente do planejamento e execução, havia obstáculos de
peso, por exemplo, a resistência ao uso obrigatório do registro civil, as
pessoas optavam pelo registro nas paróquias ou associavam o agente
recenseador à conscrição militar, ao aumento de impostos ou ainda à
tentativa de reescravização.
1º de setembro de 1920. Convertido em questão patriótica,
entrava em andamento o recenseamento geral do Brasil, como dito
em outro lugar, até então o “quem somos” e o “quanto somos” eram
assuntos controversos. Conduzido pela diretoria-geral de Estatística,
novamente Bulhões Carvalho à frente, o recenseamento, inovador nos
aspectos técnicos, reclama para si a apreensão inteiriça das realidades
nacionais, população, agricultura, indústria e comércio.
Quanto à demografia, a “lista de família” inquire,
individualmente, nome, sexo, idade, estado civil, nacionalidade,
profissão, grau de instrução, residência e defeitos físicos (cegueira e
surdomudez). Por questões aparentemente técnicas, suprimiram-se
os quesitos relativos à cor e religião, alegando-se que os “mestiços” se
demonstravam refratários à declaração da cor da pele, e a confissão
de fé mereceria inquérito específico. Apesar das dificuldades, da
resistência em declarar dados pessoais, da imensidão territorial, da
precariedade de vias de comunicação e de transportes, levava-se a
termo a faina escrutinadora.80
Formalizados em quadros numéricos, os resultados parciais
são expostos no Pavilhão de Estatística da Exposição Internacional,
popularizado como “Pavilhão da Ciência da Certeza”. Para além da

79
Cf. Senra (2006).
80
Cf. Senra (2006).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 193

simples contagem, os resultados da faina escrutinadora, ao repercutirem


números maciços, multiplicam as imagens perceptivas do país: massa
da população 24.139.299 habitantes; juntos, os maiores estados, Minas
Gerais, São Paulo, Bahia, Rio Grande do Sul, Pernambuco, totalizavam
59% da população, Minas Gerais e São Paulo, 34%.81
Distribuição desigual da população ocupada nos setores
produtivos: agricultura, pecuária, extração – 70,2%; indústria – 12,9%;
transporte – 2,8%; comércio – 5,4%; administração pública, civil e
militar – 2,1%; administração particular – 1,1%; profissões liberais –
1,8%; “pessoas que vivem de rendas” – 0,4%; serviço doméstico – 4,0%;
ocupação indefinida – 9.191.044; profissão não declarada – 416.568.
Um dos resultados divulgados no transcorrer da década fere de
morte as boas consciências: em cada mil brasileiros de todas as idades,
“245 sabiam ler e escrever”, “755 não sabiam ler nem escrever”. Isto é,
confirmava-se a permanência dos índices históricos do analfabetismo
nacional, em aparência, inamovíveis.

Tabela 3 – Evolução do grau de cultura

Sabem ler Não sabem ler Total


1872 1.564.481 6.834.253 8.398.734
1890 2.120.559 9.324.332 11.444.891
1900 4.448.681 8.973.578 13.422.259
1920 7.454.698 16.684.601 24.139.299
Excluídos os menores de 0 a 6 anos.
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Recenseamento do Brasil. Rio de Janeiro:
Tipografia da Estatística. 1929, v.4 População – População do Brasil, por estados e
municípios, segundo o grau de instrução por idade, sexo e nacionalidade.

81
Apanhado da evolução populacional de 1872 a 1950 consta em Carone
(1976). Nas cogitações comparativas dos sujeitos de época, no século XX,
Portugal, Rússia, Romênia e Sérvia apresentavam índices de analfabetismo
mais elevados quando comparados aos índices brasileiros.
194 • Carlos Monarcha

Os números a seguir indicam, conforme sexo e grupos de idades,


os coeficientes de “alfabetismo” e analfabetismo nas unidades da
federação. Nos estados, Distrito Federal e Território do Acre, quanto
ao sexo masculino, os números de indivíduos alfabetizados oscilam
entre o mínimo de 74 por mil no Piauí e o máximo de 632 por mil, no
Distrito Federal; quanto ao sexo feminino, o mínimo de 67 por mil no
Piauí e o máximo de 624, no Distrito Federal. Para tornar os subtotais
regionais mais expressivos, optou-se pelo agrupamento por zonas –
Norte, Sul, Centro e, separadamente, Distrito Federal, Rio de Janeiro
e Espírito Santo, por motivos não muito claros.

Tabela 4 – Grau de instrução no grupo de 7 a 14 anos

Homens Mulheres
Não
Zonas Sabem ler Sabem ler Não saber ler
sabem ler
Norte 184.127 1.208.757 174.430 1.183.844
Sul 263.995 617.761 245.039 603.944
Centro 123.147 634.660 106.084 615.644
Distrito Federal 60.563 35.233 60.353 36.343
Espírito Santo 9.978 40.458 8.187 41.601
Rio de Janeiro 32.835 133.699 30.393 130.942
Brasil 674.645 2.670.568 624.486 2.612.318
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Recenseamento do Brasil. Rio de Janeiro:
Tipografia da Estatística, 1929 (v.4 População – População do Brasil, por estados e
municípios, segundo o grau de instrução por idade, sexo e nacionalidade).

Cômputo geral: em mil habitantes de cada sexo, 429 homens e


272 mulheres “sabem ler”, 571 homens e 728 mulheres “não sabem
ler”. Os índices de escolarização apresentam acentuada variação
regional.82 Ora bem, da operação censitária elogiada pela excelência

82
“Por mais que as coisas tenham mudado dos censos de 1872 e 1890 para
o de 1920, nenhum outro estado chega a juntar-se à dupla constituída por
Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul na liderança das taxas mais baixas de
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 195

técnica, sobressaem os totais restritivos da escola primária brasileira:


população em idade escolar: 5.704.393, matrícula geral: 1.249.449,
frequência escolar: 678.684.83
Na apresentação do Recenseamento do Brasil, um julgamento
antigo, contudo considerado atual. “O problema da instrução popular
não pode ser resolvido simplesmente pelo aumento progressivo
da despesa. A sua solução está na dependência, principalmente, de
medidas que obriguem a frequência escolar” (Brasil, 1929, p.VII).
No clima histórico-psicológico propício à compreensão das
realidades do país, a expectante década dos centenários, em linguagem
de tragédia, os homens públicos os mais diferentes não titubeiam, em
nomear, mais uma vez, o analfabetismo de “mal nacional” e “chaga
social”. Dotados de poder de atração, sempre colossais, os números
impressionam fundamente os debates políticos e culturais, e da justa
reação resultam planos construtivos os mais diversos como é possível
notar, por exemplo, nas monografias concorrentes aos prêmios
ofertados pela Academia Brasileira de Letras. Antes de falecer, em
1917, o editor português, Francisco Alves legara a sua fortuna pessoal,
cinco mil contos de réis, à ABL, e por disposição do testador, a
academia premiaria anualmente três estudos sobre “O melhor meio de
disseminar o ensino primário no Brasil”.84 Nos concursos comparecem
nomes sonoros, entre muitos, José Augusto Büchler e Pedro Deodato de
Moraes, Achilles Lisboa, Manoel Bomfim, Sud Mennucci e Marques
Pinheiro, autor da monografia intitulada Contra o analfabetismo, da
qual extraímos o seguinte excerto elucidativo.

O analfabetismo no Brasil tem dois aliados terríveis e quase


invencíveis: a grandeza do território e a pouca densidade da população.

analfabetismo. Em resumo, os estados da Região Nordeste são os únicos a


constituir-se em formação regional perfeitamente identificável, em termos
de analfabetismo, ao término do período de 1872/1890 a 1920” (Ferraro,
2009, p.173).
83
Cf. Apêndice A – Tabela E. 
84
Cf. Monarcha (2014).
196 • Carlos Monarcha

Logo a lei do ensino obrigatório, sendo uma lei sábia, e indispensável


mesmo no Brasil, ainda assim, ela é entre nós absurda e inexequível, se
procurarmos aplicá-la diretamente (1923, p.23-25).

No mais, assim dizia-se, o fardo do analfabetismo esmagava


os anônimos da história; por desconhecerem a chave da felicidade
e da fortuna, a alfabetização, nada lhe restava a não ser o fardo
pesado de todos os dias, isto é, a servidão proletária no ganha-pão,
deserdado da fortuna, o iletrado sobrevivia no degredo, desditosa,
sua vida transcorria ao deus-dará. Com efeito, essa era a mensagem
enegrecida da Cartilha do operário, de Theodoro de Moraes, cartilha
de alfabetização pela processuação do método analítico destinada ao
uso de adolescentes e adultos.

Serviço rude e pesado o de carregador!


Este que se vê na estampa é Rafael.
Pobre Rafael!
Não frequentou a escola.
Não sabe ler, não sabe escrever, não sabe fazer contas.
Cresceu analfabeto.
E agora, para ganhar a vida, precisa fazer o serviço rude e pesado de
carregador.
Trabalha tanto na fábrica desde cedo, carrega tantos pesos e, no fim de
contas, ganha tão pouco!
Esta é a triste vida dos que perdem tempo e crescem analfabetos.
Esta é a triste sorte dos que não têm coragem de aprender o que não
sabem.
Nunca adianta, vivem sempre atrasados e carregados de desgosto
(Moraes, 1924, p.24).

Pois bem, no centenário da lei imperial sancionada por Pedro


I, mandando “criar escolas de primeiras letras em todas as cidades,
vilas e lugares mais populosos do Império”, vinha a público Ensino
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 197

primário, resultados provisórios do inquérito sobre a instrução primária


no Brasil em 1926, divulgados por ocasião do centenário da lei de 15
de outubro de 1827, referentes ao mesmo ensino. No inquérito aplica-
se um questionário simples, mas eficiente: aos governos estaduais
inquiria-se o número de escolas primárias estaduais, municipais
e particulares, alunos matriculados, frequência média de alunos,
números de concluintes e total de professores com distribuição por
sexo. Excetuando o Acre, após insistentes telegramas e ofícios, os
governos estaduais e a prefeitura do Distrito Federal retornam os
questionários preenchidos. E, conquanto admitisse a precariedade
dos dados relativos as escolas municipais e particulares, Bulhões
Carvalho exultava, a seu ver, os resultados do inquérito evidenciavam
“incontestável progresso da instrução pública primária”.

Apesar das lacunas, um valioso acervo de dados demonstrativos


do grande esforço já despendido, no Brasil, em prol da difusão do
ensino primário, com a manutenção, em condições mais ou menos
satisfatórias, de milhares de casas de educação popular, nas quais já
se acham matriculados mais de um milhão e meio de educandos,
recebendo por intermédio do professorado quase exclusivamente
feminino, as primeiras noções para a cultura intelectual (Bulhões
Carvalho, 1927, p.III).

Para efeito de demonstração, no comentário introdutório, o


competente estatístico fez constar uma sinopse didática: em 1926, o
país possuía 24 mil escolas de ensino primário desdobradas em 33
mil “cadeiras ou classes”, 35 mil professores, em sua quase totalidade
mulheres, 1.350 mil alunos matriculados e frequência de 70% do total.
Comparados entre si, os sistemas escolares delatam acentuada
heterogeneidade: São Paulo possuía 6.601 “cadeiras ou classes
estaduais”, 6.635 professores, 290.288 alunos matriculados, frequência
de 190.279; Goiás, 208 cadeiras ou classes estaduais, 222 professores,
11 mil alunos matriculados e frequência de 10.406, por exemplo.
198 • Carlos Monarcha

Otimista, o estatístico concluía que o período de 1920 a 1926


presenciara um aumento de 38% no número de escolas primárias
estaduais, de 56% no número de “cadeiras ou classes” e de 55%, na
matrícula geral. Embora lacunares, os números concernentes às escolas
municipais e particulares não desencorajam, diz Bulhões Carvalho.
Malgrado as diferenças regionais, a nomenclatura utilizada na
designação dos estabelecimentos é relativamente homogênea: grupos
escolares, escolas-modelo, escolas complementares, escolas reunidas,
jardins de infância, escolas isoladas. Porém, não há referências às
escolas ambulantes e de emergência existentes em regiões remotas,
a Amazônia, por exemplo. Nomenclaturas regionais aparecem no
Rio Grande do Norte, “escolas isoladas ou rudimentares”, no Rio
Grande do Sul, “colégios elementares”, em Santa Catarina, “escolas
reunidas ou grupos escolares de 2ª classe”, no Distrito Federal, “escolas
diurnas” e “escolas noturnas”. Em determinadas regiões, consta
mínima quantidade de escolas municipais. Na média, comparado ao
total de grupos escolares, o número de escolas reunidas e isoladas é
bastante significativo. É de ver que a heterogeneidade demográfica e a
economia condicionam a extensão do ensino primário. Desempenhos
quantitativamente significativos ocorrem nas regiões abertas à
economia de mercado: Distrito Federal, São Paulo, Minas Gerais,
secundariamente, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Seja o que for,
novamente, o torniquete do analfabetismo é por assim dizer, objeto de
comoções e vertigens de pensamentos.

Os censos estaduais

Encaminhada à Conferência Interestadual de Ensino Primário,


a “Memória sobre a educação nacional”, assinada por Antonio de
Sampaio Dória, delegado da Liga Nacionalista de São Paulo, ultimava
o povo analfabeto como uma das causas ruinosas do regime; hoje as
suas palavras relembram bíblicas lamentações.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 199

Se dever há que pareça repelido pela República, é o do combate


ao analfabetismo, que lhe cancera as entranhas. A grande maioria dos
brasileiros, mazelada pelas endemias, e abandonada pelos governos,
jaz imersa na mais rasa ignorância nativa. As virtualidades poderosas
da sua raça não se positivam (Conferência Interestadual de Ensino
Primário, 1922, p.352).

Torrencial, a fluidez dos números valida juízos idênticos sobre


um objeto comum, ao mesmo tempo em que insufla a retórica
circulante no Congresso Nacional, imprensa jornalística e estudos
técnicos, ademais isso é inegável, empurra certas autoridades públicas
para o campo das ações construtivas.
Desde o ponto de vista da Liga Nacionalista de São Paulo,
Oscar Thompson, diretor-geral da Instrução, abordava a crucialidade
da educação do imigrante e do caboclo. Para o diretor-geral,
“indiferentes ao destino da Pátria”, os núcleos caboclos levavam
“existência quase selvagem”. Para superar o estado de coisas, expede
circular solicitando planos de combate ao analfabetismo. Em carta
aberta, Sampaio Dória responde ao apelo. E, ao propor um “tipo novo
de escola alfabetizante”, esse professor de Psicologia e Pedagogia da
Escola Normal da Praça rebramava os tropos da Liga Nacionalista.
“Governo de origem popular e ignorância rasa do povo são coisas
que se chocam, se repulsam, se destroem, como as trevas e a luz, o
inferno e o céu” (Sampaio Dória, 1923, p.16).
Eleito presidente do Estado pelo Partido Republicano Paulista,
Washington Luís Pereira de Souza decide-se pela alfabetização total,
mas a Assembleia Legislativa considera inviável elevar de 17% para
40% o montante de gastos com a instrução. Por decisão pessoal,
Washington Luís nomeia Sampaio Dória diretor-geral da Instrução
com duplo propósito, diminuir as taxas de analfabetismo e evitar o
aumento de gastos públicos.
Dados do Recenseamento Federal de 1920 acusavam, para São
Paulo, 4.600 milhões habitantes, 1.500 residentes em vilas e cidades;
200 • Carlos Monarcha

das quatro mil classes escolares existentes, 75% localizavam-se em


vilas e cidades, os 25% restantes em áreas rurais. Para erradicar “a
desanalfabetização popular”, Sampaio Dória promove o recenseamento
escolar, objetivando localizar os “núcleos de analfabetos”. O corpo
de recenseadores é constituído de professores de classes ou escolas
isoladas, trabalho difícil, considerando-se as extensas áreas, a densidade
demográfica rala e a precariedade de estradas e transportes.
O recenseamento visa a estabelecer o número de analfabetos
em idade escolar, local de residência e condições de vida. Num mapa,
registram-se nome, sexo, idade, filiação, nacionalidade, profissão do
pai, residência, frequência escolar ou não, se sabe ler ou não; noutro
mapa, esboça-se a carta geográfica do município a fim de orientar a
posterior instalação de escolas. Do recenseamento escolar, saltam
grandes números: total de 656.114 de crianças entre 6 e 12 anos,
358.978 meninos, 297.136 meninas; do total de crianças de 7 a 14
anos, 175.830 frequentam escolas, 372.145 não o faziam; 373.382 são
filhas de pais brasileiros, 282.732 de pais estrangeiros.

Hoje sabemos ao certo a extensão do analfabetismo infantil em


São Paulo. É maior que se esperava. E por ele se pode imaginar o que
vai por outros Estados, onde a instrução não correr par a par com a de
São Paulo. O Brasil deve considerar seriamente a chaga que hoje se lhe
corroí o seio. O recenseamento escolar, aqui, e um brado e um aviso.
Que a União se interessava pelo problema e se salvará, ou estaremos
na iminência de ver medrar, entre nós, os horrores da anarquia (São
Paulo, 1920, p.6).

Sancionada a Lei nº 1.750, dezembro de 1920, expedido o


regulamento da reforma, Decreto nº 3.356, março de 1921, a reforma
entra em vigência e, com ela, um “tipo novo de escola”, visando
intensificar o fluxo alfabetizador. De modo polêmico, estipulava-se o
ensino gratuito e obrigatório entre 9 e 10 anos de idade, a não reprovação
para otimizar a matrícula inicial e a criação do “curso médio”, 3o e 4o
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 201

ano primário, com taxa de matrícula. Nas escolas isoladas, o professor


ministraria dois períodos de aulas com duração de duas horas e meia,
demais, oficializa-se o método intuitivo de ensino.

Nas escolas primárias, o método natural do ensino é a intuição,


a lição de coisas, o contato da inteligência com as realidades que se
ensinam, mediante a observação e a experimentação, feita pelos alunos
e orientação pelo professor. São expressamente banidas da escola as
tarefas de mera decoração, os processos que apelem exclusivamente para
a memória verbal, a substituição das coisas e fatos pelos livros que se
devem apenas usar como auxiliares de ensino (São Paulo, 1920, p.27).

A essas medidas, somava-se a unificação das escolas normais


primárias e secundárias num mesmo padrão, a valorização da prática
de ensino, a autonomia didática dos professores. Divergências com
Washington Luís levam o diretor-geral a exonerar-se. Em Questões
de ensino, obra de defesa de princípios, Sampaio Dória ajuizaria “A
escola urbana de quatro anos tal como tínhamos antes da Reforma é
a mais pura, a mais acabada ideologia delirante. É um aparelhamento
que não alcança, nem pode jamais alcançar os fins que visava”
(Sampaio Dória, 1923, p.299).
Para Sud Mennucci, chefe do recenseamento escolar de 1920, a
reforma consistira num esforço louvável de interiorização da escola. “A
solução só podia ser esta: diminuir os anos de obrigatoriedade escolar, e o
número de anos de curso primário. O Estado estava diante de um dilema
fatal: ou dar muito a poucos ou dar pouco a todos [...] o que se perdeu em
profundidade, ganhou-se em extensão” (Mennucci, 1932a, p.63).
A reforma vigora de 1921 a 1925, de uma parte, altera a
organização didática dos grupos escolares, de outra, converte parcela
das escolas isoladas em escolas reunidas. Na observação seca de
Guilherme Kuhlmann, diretor-geral da Instrução, comparadas aos
grupos escolares, as escolas reunidas eram estabelecimentos de fácil
administração e de baixo custo.
202 • Carlos Monarcha

Noutro extremo do território nacional, Manoel Bergström


Lourenço Filho executa a reforma da instrução pública do estado do
Ceará. O catedrático de Higiene e Ciências Físicas e Naturais e diretor
da Escola Normal Pedro II, Fortaleza, João Hyppolito de Azevedo e
Sá, propusera a Justiniano de Serpa, presidente de Estado, solicitar a
Washington Luís a vinda de um “professor paulista” para renovar as
cadeiras de Psicologia, Pedagogia e de Didática da Escola Normal.
Lourenço Filho lá permanecerá entre 1922 e 1923. Então, Fortaleza
vivenciava um clima de modernização, ao mesmo tempo, estavam na
memória coletiva acontecimentos malsãos: a “salvação” levada a cabo
pelo presidente da República, Hermes da Fonseca, a deposição da
oligarquia Accyoli, a derrubada do presidente de Estado, tenente-
coronel Marcos Franco Rabello, a prisão do intendente municipal,
Ildefonso Albano, a chamada Sedição de Juazeiro, capitaneada pelo
padre Cícero Romão Batista e Floro Bartolomeu (e nalguma medida
Pinheiro Machado).85
Logo mais Lourenço Filho será nomeado diretor-geral da
Instrução. De súbito, a reforma adquire ares de campanha contra o
analfabetismo e de ação social pela escola. Na voz de uma professora
primária aderente aos trabalhos da reforma. “Bem sabeis que a escola
primária não é só a fonte da instrução das camadas populares; é, mais
ainda, a forja onde se devem formar caracteres, onde se deve fornecer
ao futuro cidadão uma educação nacional, baseada no culto do civismo”
(Mello, 1923b, p.448, grifo do autor).
Auxiliado pelos prefeitos, Arcebispado de Fortaleza, Inspetoria
de Obras contra as Secas, Administração dos Correios, Repartição
dos Telégrafos e Associação Comercial, o reformador coloca em
andamento o Cadastro Escolar. Consolidado, o cadastro apura 161.572
mil crianças em idade escolar, matrícula geral de 36.058. Na sequência,
entre 1921 e 1923, instalam-se grupos escolares e escolas reunidas em
vários municípios; com isso a matrícula elevava-se de 19.360 alunos
para 32.079, evolução positiva, conquanto aquém da demanda, o

85
Cf. Castelo (1970) e Monarcha (2010a) e (2015).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 203

que não impede Lourenço Filho de proclamar. “O sertanejo não é


impenetrável à máquina e à escola; os governos, em geral, é que têm
mantido uma criminosa indiferença pelo problema da cultura popular”
(Lourenço Filho, 1923, p.473).
Num futuro próximo, as operações censitárias paulista e cearense
servirão de modelo no planejamento dos serviços em educação.
Aparentados pelo lema “estatística, condição de eficiência”, Fernando
de Azevedo, no Distrito Federal, em 1928-1930, e novamente
Lourenço Filho, em São Paulo, em 1930, por exemplo, recenseariam
as populações escolares como ato preliminar e princípio de eficiência
na elaboração de políticas para o setor. De modo geral, a técnica
recenseadora ganha maior efetividade ao discriminar a matrícula
efetiva da matrícula geral, taxas de alfabetização em separado das taxas
de promoção geral, médias de matrícula e frequência.

Do professorado e sua condição existencial

Uma tabela inédita! Sob o título “Ensino pedagógico estadual”,


o Boletim comemorativo da Exposição Nacional de 1908 divulgava a
localização geográfica e o número de estabelecimentos de preparo de
professores.
Tabela 5 – Ensino pedagógico estadual

Sede das escolas Escolas Matrícula

Escolas Outras Nas escolas Nas outras


Estados Cidades e vilas Total Total
normais escolas normais escolas
Amazonas Manaus 1 1 2 75 3 78
204 • Carlos Monarcha

Bahia S. Salvador 1 - 1 153 - 153


Ceará Fortaleza 1 - 1 344 - 344
Espírito Santo Vitória 1 - 1 79 - 79
Goiás Goiânia 1 - 1 1 - 1
Maranhão São Luís 1 - 1 105 - 105
Minas Gerais Belo Horizonte 1 - 1 110 - 110
Pará Belém 1 - 1 165 - 165
Paraíba Paraíba 1 - 1 158 - 158
Paraná Curitiba 1 - 1 125 - 125
Pernambuco Recife 1 - 1 173 - 173
Campos 1 - 1 74 - 74
Rio de Janeiro
Niterói 1 - 1 141 - 141
Continua na página 205
Continuação da página 204

Porto Alegre
- 1 1 - 63 63
Rio Grande do Santa Cruz
- 1 1 - 31 31
Sul Santa Maria
- 1 1 - 57 57
São João de
- 1 1 - 33 33
Montenegro
Santa Catarina Florianópolis 1 - 1 49 - 49
Campinas - 1 1 - 172 172
Guaratinguetá - 1 1 1 200 200
São Paulo
Itapetininga - 1 1 - 217 217
Piracicaba - 1 1 - 201 201
São Paulo 1 1 2 374 290 664
Sergipe Aracaju 1 - 1 64 - 64
Soma 16 10 26 2.190 1.267 3.457
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Estatística da Instrução. Boletim comemorativo da Exposição Nacional de 1908. Rio de Janeiro: Tipografia da
Estatística, 1908.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 205
206 • Carlos Monarcha

Como se deduz, o “ensino pedagógico” público e privado realiza-


se em 44 estabelecimentos: “19 normais e 25 de outras espécies”, quer
dizer, escolas normais e instituições de ensino cujos diplomas são
aceitos para o magistério; quanto aos estabelecimentos, esses diferem
no tamanho, programas de ensino e nível de estudos.
Mais ao largo, nos meios parlamentares, Miguel Calmon, 1912,
encaminhava a criação de uma escola normal superior na Capital
Federal; Raul Alves, 1917, exacerba-se por uma escola normal em
regime de internato e externato para preparar as fileiras de professores
do sexo masculino para atuarem em todo o território nacional; mais
adiante, com idêntico propósito, isto é, formar as fileiras do magistério
primário, Tavares Cavalcanti, 1923, advogaria uma escola normal
superior ou faculdade de letras a ser criada no Rio de Janeiro. Tal como
aos tempos idos, as projeções mentais de futuros benquistos recaem na
figura do mestre-escola/professor primário, com efeito, os faróis de ideias
sobressaltam a imagem social do magistério. Relicário de virtudes, anjo
tutelar de imensas asas abertas a flanarem sobre a meninice, atribuía-se
ao exercício do magistério um código moral drástico.

O magistério é apostolado e quem diz apostolado diz dedicação e


desinteresse. Quem o exerce não trabalha para si, mas para os outros, não
para o presente, mas para o futuro. O professor em sua escola é como o
enviado na sua missão, prudente, modesto, delicado, perseverante.
O homem em quem a sociedade deposita a sua grandeza pela
perpetuação dos princípios que a sustentam, em quem a família confia as
suas esperanças e a pátria os seus defensores de amanhã, não pode se um
homem vulgar. O seu ministério é sagrado, a sua função social, imensa.

Verberava Deodato de Moraes (1919,p.12),professor de Pedagogia


da Escola Normal de Casa Branca, interior paulista, ao paraninfar
a turma de alunos-mestres diplomados pela Normal. Comumente
nos mais variados meios sociais e intelectuais, por exemplo, nas
conferências da Liga de Defesa Nacional, sobressaltavam-se a imagem
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 207

social do professor primário. “A palavra que ele dá ao discípulo é como


a hóstia, que, no templo, o sacerdote dá ao comungante. É a eucarística
cívica. Na lição há a transubstanciação do corpo, do sangue, da alma da
nacionalidade” (Bilac, 1924, p.61). E na década dos centenários, 1920,
oficializava-se a data de 15 de outubro como “Dia do Professor”, e não
faltaram celebrações do trabalho anônimo do mestre e do benefício
universal da instrução. Nas palavras aquecidas de Agnello Bittencourt,
diretor-geral da Instrução do estado do Amazonas. “Ninguém poderá
negar ao obscuro ‘mestre-escola’ o papel de pioneiro da civilização
brasileira, nos surtos de desenvolvimento a que ascendemos, entre as
nações sul-americanas.”

A gênese da nossa evolução, desde 1827, tem estado e continuará


a estar ainda por muitas décadas, nesses pequenos centros de
combate ao analfabetismo, que se vai restringindo diante da luz que
o professor espalha. Mártir da desconsideração dos tempos é justo
que o serventuário do magistério tenha o seu dia, como homenagem à
sua obra realizadora de patriotismo e humanidade (Bittencourt apud
Lima, 1927, p.30, grifo do autor).

É quando como dito anteriormente, a diretoria-geral de


Estatística publica Ensino primário – resultados provisórios do inquérito
sobre a instrução primária no Brasil em 1926, divulgados por ocasião do
centenário da lei de 15 de outubro de 1827, referentes a esses. Nos números
dados a conhecer, as fileiras do professorado primário apresentam
adensamento significativo. Considerando-se o número de professores
em exercício nas escolas estaduais, municipais e particulares nos
estados da região Norte, a distribuição quantitativa é a seguinte:
Amazonas – 249 professores; Pará – 1.160; Maranhão – 346. Na
região Nordeste: Piauí -109; Ceará – 665; Paraíba do Norte – 574;
Pernambuco – 1.466; Alagoas – 663; Sergipe – 301; Bahia – 1.915.
Na região Sudeste: Espírito Santo – 586; Minas Gerais – 6.875; Rio
de Janeiro – 1.591; Distrito Federal – 2.324; São Paulo – 7.824; Na
208 • Carlos Monarcha

região Sul: Paraná – 1.659; Santa Catarina – 1.070; Rio Grande do Sul
– 6.875. Na região Centro-Oeste: Goiás – 222; Mato Grosso – 237.
Adensamento visível se compararmos tais quantidades àquelas
consolidadas pela estatística de 1916: 15.586 professores, 11.402 em
escolas públicas e 4.184 em particulares; 8.068 professores lotados no
magistério estadual (52% do conjunto); 3.334 no municipal (21%);
239 vinculados a estabelecimentos subvencionados (2%); 3.945 a
estabelecimentos “sem auxílio oficial” (25%). E muito embora se
falasse em “missão” e “sacerdócio”, certamente as condições existenciais
das fileiras do magistério nacional não eram das melhores. De fato,
amparado em documentação variada, leis, decretos e regulamentos, o
potiguar Nestor dos Santos Lima, em Um século de ensino primário,
publicado em Natal, no ano de 1927, compilava os vencimentos anuais
do magistério público nos estados da federação. Referida ao período
de 1924 a 1927, da compilação salta tanto a modicidade dos salários
quanto a heterogeneidade de escolas e de tipos de professores.

– Rio Grande do Norte: professores de 1ª categoria (capital) –


4:200$; 2ª categoria (cidades) – 3:600$; 3ª categoria (vilas);
– 3:000$; 4ª categoria (povoações e escolas rudimentares)
– 2:400$. Diretores de grupos – 5:400$ (capital), 4:800$
(cidades), 3:800$ (vilas).
– Maranhão: professores de escola-modelo, grupo escolar
e instituto pré-escolar – 2:400$; professores de escolas
isoladas, urbanas e rurais – 180$ 2:160$.
– Paraíba: professores de escolas isoladas: 1ª categoria (capital)
– 3:000$; 2ª categoria (cidades) - 2:760$; 3ª categoria (vilas)
– 2:520$; 4ª categoria (povoados) – 2:280$; professores-
adjuntos de 1ª, 2ª, 3ª e 4ª categoria – 1:560$, 1:480$, 1:430$
e 1:430$; professores de escolas rudimentares – 1:248$.
– Paraná: professores normalistas – 2:400$; efetivos de 3ª
classe (capital) – 2:160$; efetivos de 2ª classe (cidades) –
1:900$; efetivos de 1ª classe (vilas) 1:440$.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 209

– Obs.: As quatro categorias percebiam em 1896, 2:800$,


2:300$, 1:900$ e 1:500$.
– Santa Catarina: professor normalista ou de grupo escolar –
3:480$; professor de 4ª classe – 1:560$; Diretor de Grupo
Escolar – 4:560$.
– Bahia: professores de 1ª classe – 4:000$, 2ª classe – 3:500$,
3ª classe – 2.880$; professores de escola complementar –
4:000$; professor diretor de grupo escolar: gratificação
anual de 840$.
– Minas Gerais: professores de 1ª, 2ª e 3ª classes – 4:000$,
3:900$ e 3:200$; professor-diretor de grupo escolar da
capital – 4:560$; professor-diretor de grupo escolar de
cidade – 3:960$; professor de grupo escolar da capital
– 2:544$; professor de grupo escolar de cidade – 2:376$;
professor de distrito 1.860$; professor de colônia – 1:584$.
– São Paulo: professor rural – 3:480$; professor urbano –
3:480$; professor de grupo escolar – 4:910$. Diretor de
grupo escolar 1º grau – 7:200$, 2º grau – 7:800$, 3º grau
– 8:400$, 4º grau – 9:000$.

Como exercício de comparação do poder de compra de


professores e diretores convém retomar o levantamento dos
militantes anarquistas Hélio Negro e Edgar Leuenroth na brochura
O que é marxismo ou bolchevismo: programa comunista, publicado em
1919. O salário mensal de um trabalhador urbano ou rural variaria
entre 80$000 e 120$000, o consumo mínimo duma família operária,
dois adultos e duas crianças, orçaria em 207$000. Evidente por si,
o déficit se acentua se se considerar as crises cíclicas de carestia
do decênio de 1920, seguidas de elevação de aluguéis e preços de
mantimentos. A despeito de tudo é preciso interrogar: Quem eram
professores primários? Qual a condição existencial de uma categoria
socioprofissional de natureza intelectual em regiões onde prevaleciam
o trabalho manual e o analfabetismo?
211

Verbo social, pátria viva

“O Brasil é um mundo” (ou o grande dia tropical)

Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste!


Criança! não verás nenhum país como este!
Olha que céu! que mar! que rios! que floresta!
A Natureza, aqui, perpetuamente em festa,
É um seio de mãe a transbordar carinhos.
Vê que vida há no chão! vê que vida há nos ninhos
Que se balançam no ar, entre os ramos inquietos!
Vê que luz, que calor, que multidão de insetos!
Vê que grande extensão de matas, onde impera
Fecunda e luminosa, a eterna primavera!

Dotados de apelos cálidos, no sentido de dar a conhecer e fazer


amar o Brasil, por gerações, os versos romântico-patrióticos desse poema
de circunstância, “A Pátria”, de Olavo Bilac (1904, p.15), impressionam
a meninice escolar. Desde os fins do século XIX, a pedagogia escolar
encontra-se acometida por manifestações de patriotismo e civismo,
considerada instituição social capaz de superar divisões e desarmonias,
via-se na escola a efígie do nacionalismo. Conhecer as “pequenas
pátrias”, as regiões brasileiras, amar a “grande pátria”, a Nação, são os
apelos duma literatura didática de cunho nacional e nacionalizante,
com isso intentava-se estimular o patriotismo, a exemplo das nações
212 • Carlos Monarcha

liberais Estados Unidos, Itália, França e Alemanha, cujos valores


ecumênicos e missionários desbordavam em solidarismos.
Tudo leva a crer que a idolatria da nação (e da pátria) preenche
o vazio gerado pela ausência de instrução religiosa; e, como não
há educação sem fé, opta-se pela adoração do altar da Pátria. No
intento de consubstanciar um povo feito de irmãos fraternos, cedo
ou tarde, dos Céus encantados e radiantes, a Nação desceria a Terra.
Resumidamente, para esse ponto de vista, o agir coletivo harmonioso
tem suas raízes na educação comum, donde o contínuo estampar de
certificados de civismo, isto é, os compêndios centrados na elegia da
natureza, no culto das origens, no caráter do povo e, acima de tudo, no
bem coletivo como referencial a ser incutido na infância escolar.
Nessa figuração cívico-nacionalista dos fatos de realidade, o
entendimento e o coração da prole da nação são instruídos e afeiçoados
não com referência às classes sociais, às crenças religiosas, às doutrinas
políticas, mas à Sociedade, ao Estado e à Nação. Que escopos? Suscitar
sentimento de lealdade e estima a uma totalidade maior e anterior à
existência individual, porquanto isenta de quaisquer egoísmos sociais
ou lealdades facciosas. Transfundir espíritos, ou seja, o brasileirismo
pela boa vontade cívica, amar e servir o corpo e alma da nação, espalhar
a cultura heroica e republicana. De resto, como se afirmava, as escolhas
individuais subordinam-se ao bem coletivo, muito embora sabe-se
hoje que o pressuposto de sentimento nacional recalcasse a origem e o
fundamento das desigualdades entre as classes sociais.
Bussolada pelo nacional e nacionalizante, melhor dizendo, pelo
intento de atrair o povo para si e nele reconhecer-se, desponta uma
literatura didática desejosa de afetar o leitor com imagens benfazejas,
na qual, por assim dizer, há credulidade excessiva; nela, a literatura,
destacava-se o gênio distintivo das regiões brasileiras e sua junção
num todo unitário, inextrincável, sobremodo pulsátil.86 Certamente as
origens dessa literatura a exultar a imagem material do país remontam

86
A nação como semióforo, ou seja, objeto do qual brotam incessantes efeitos
de significação, é analisada por Chauí (2000).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 213

a Por que me ufano de meu país? – do monarquista Afonso Celso, livreto


publicado no 4º Centenário do Descobrimento do Brasil. Na folha de
rosto, o anexim – “Right or wrong, my country”; na sequência, Afonso
Celso descreve um país exuberante, incomensurável, imerso num
sonho agradável. O excerto a seguir, embora longo, capta à perfeição o
exotismo brasileiro, segundo a visão do autor.

O Brasil é um dos mais vastos países do globo, o mais vasto da raça


latina, o mais vasto do Novo Mundo, à exceção dos Estados Unidos. É
pouco menor que toda a Europa.
Rivaliza em tamanho com o conjunto dos outros países da
América Meridional. Representa uma décima quinta parte do orbe
terráqueo. Só a Rússia, a China e os Estados Unidos o excedem em
extensão. É quatorze vezes maior do que a França, cerca de trezentas
vezes maior do que a Bélgica.
A sua circunscrição territorial menos dilatada, Sergipe, sobreleva
a Holanda, a Dinamarca, a Suíça, o Haiti e Salvador. Cada um dos
municípios em que se subdivide a mais ampla, Amazonas, equivale a
Estados, como Portugal, Bulgária e Grécia. Pará, Goiás, Mato Grosso
ultrapassam qualquer nação européia, salvante a Rússia.
O Brasil é um mundo (Figueiredo, 1901, p.9).

Insinuante e agregador, ainda que hoje soe irreal, Afonso Celso,


um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, elabora uma
mitologia das origens e destinação social do país. De saída diverge,
motivo edênico, a fusão das raças como fato benquisto, embora muitos
a caluniassem. “Negros, brancos, peles-vermelhas, mestiços vivem aqui
em abundância e paz”, “Deus não nos abandonará. Se aquinhoou o
Brasil de modo especialmente magnânimo, é porque lhe reserva
alevantados destinos.” Mais à frente de Por que me ufano de meu país?
de Afonso Celso, viriam outros artífices desse gênero empenhado na
descrição afetuosa das singularidades do país, Alfredo Varela, Livro
da mocidade; Olavo Bilac, A pátria brasileira; Júlia Lopes de Almeida
214 • Carlos Monarcha

Histórias da nossa terra; Viriato Correia, Histórias de nossa história;


Afrânio Peixoto, Minha terra e minha gente; Olavo Bilac e Manoel
Bomfim, Através do Brasil e Olavo Bilac e Coelho Neto, Contos pátrios.
E, mais ao largo no corpo real da pátria, remanesciam litígios de
fronteiras entre Brasil e países sul-americanos, de sorte que a demarcação
histórico-geográfica dos limites era objeto de disputas contenciosas.
Sob as ações de um dos expoentes da tradição diplomática do Segundo
Reinado, José Maria da Silva Paranhos, ministro plenipotenciário, aos
poucos se resolvem as pendências relativas às fronteiras externas.87 De
sorte que os tratados internacionais finalizam o bordado das fronteiras,
mesmo assim, ainda é relativo o conhecimento da territorialidade
comum, as representações cartográficas mais exatas concernem ao
Distrito Federal, Minas Gerais, São Paulo, e Rio Grande do Sul.
No introito da Estatística da instrução, 1916, Oziel Bordeaux Rego
desabafa: para estabelecer a divisão administrativa do país, enumerar
municípios, cidades, vilas e paróquias, fora obrigado a recorrer ao
“precioso Atlas do Império do Brasil”, de Cândido Mendes de Almeida,
e às fontes antigas, isto é, relatórios de presidentes de províncias,
legislação anterior ao Ato Adicional, legislações provinciais, obras
de Robert Southey, Ferdinand Denis, Aires de Casal, Costa Pereira,
Jaboatam, Silva Lisboa, Fernandes Gama, Accyoli, Saint-Hilaire,
Koster, Perdigão Malheiro e Cortines Laxe.

Instruir entendimento e coração da prole da nação

Um dos pontos altos da literatura didática a exultar a grandeza e


o orgulho nacional, quer dizer, a noção abstrata da Pátria (e de povo-
nação), é, sem dúvida, Através do Brasil, de Olavo Bilac e Manoel
Bomfim, o primeiro, inspetor escolar, o segundo professor e diretor na
Escola Normal do Distrito Federal. O compêndio é decalcado de Le
tour de la France par deux garçons, subintitulado “Devoir et patrie”, de G.
Bruno, pseudônimo, um dos melhores produtos do clima pedagógico

87
Cf. Escobar (1995, [1940]) e Vianna (1935).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 215

do começo da Terceira República francesa.88 O entrecho do livro


incita o leitor a acompanhar as jornadas de norte a sul do país por dois
adolescentes, Carlos e Alfredo em busca do pai desaparecido. Misto
de périplo educativo e enciclopédia popular, a narrativa descreve os
meandros geográficos e as peculiaridades regionais.

E acreditamos – escrevem Bomfim e Bilac – que isso se dá com o


nosso trabalho. Estamos certos que a criança, com a sua simples leitura,
já lucrará alguma coisa: aprenderá a conhecer um pouco o Brasil; terá
uma visão a um tempo geral e concreta, da vida brasileira – as suas
gentes, os seus costumes, as suas paisagens, os seus aspectos distintivos.

Em capítulo seguinte. “E então o professor apelará para a


observação da criança, para que ela note a diferença entre o estado
selvagem e as indústrias, instituições, obras e costumes que distinguem
a civilização; mostrará que essas instituições e indústrias faltam ainda
em grande parte algumas terras do interior, onde a civilização ainda
não penetrou” (Bomfim; Bilac, 1910, p.15). Desse título foram tiradas
60 edições em cinco décadas.89
Em Viagem de uma família brasileira ao norte do país, Coelho Neto
tenta emular a façanha de Bilac e Bomfim; logo seria a vez de Minha
terra, minha gente, obra de iniciação etnográfica e antropogeográfica,
de Afrânio Peixoto, diretor da Escola Normal e da Instrução Pública
do Distrito Federal. No compêndio, o autor aborda os problemas de
raça, clima e meio social a emperrar a formação da nacionalidade.
“Nem lamúrias de uns, nem o lirismo de outros, produzem nada.
Pareceu, pois, ao autor novidade útil escrever para as crianças de
sua terra um livro sincero, sem reservas nem veemências, no qual
procurasse, sobre os problemas essenciais da nossa nacionalidade,
dizer-lhes verdades necessárias”.

88
Cf. Lajolo (1982, 2000).
89
Cf. Botelho (2002), Hansen (2007).
216 • Carlos Monarcha

A fusão lenta das misturas malfeitas ainda, a seleção reiterada


da cultura, a disciplina forçada da vida social, farão dessa massa um
povo forte, são e feliz? O esboço de hoje dará um povo voluntarioso,
sentimental, inteligente, digno da terra e do tempo em que vive?
Haja liberdade de comunicações, de comércio, de indústria; é o
que reclama um país agrícola, distante dos mercados, distante de si
mesmo, tão apartados são os núcleos disseminados da sua população.
As nossas riquezas tão faladas, quase em ser, sejam exploradas, pois
da riqueza virá progresso, conforto, civilização (Peixoto, 1916, p.225).

Guardadas as inclinações pessoais desses autores tão diferentes


entre si, há propósitos extraliterários comuns, a fidelidade à ideia do
nacional, o despertar de afeto, o amor à causa pública, a consciência
da comunidade de destinos, isso no intento de enraizar o sentimento
nacional e promover a amabilidade humanitária, em suma. “É, então,
ali, a ideia sagrada da Pátria se apresentou, nítida e bela, diante da
alma de Anselmo. E ele compreendendo enfim que a sua vida valia
menos do que a honra de sua nação, pediu a Deus, com os olhos cheios
de lágrimas, que o fizesse um dia morrer graciosamente, abraçado às
dobras daquela formosa bandeira, toda verde e dourada, verde como
os campos, dourada como as madrugadas de sua terra.” Enterneciam
Olavo Bilac e Coelho Neto (1904, p.15), em Contos pátrios.
Nem ideia abstrata nem produto raciocinante, figurava-se a pátria,
como ente coletivo vivo tal como em Breviário cívico, de Coelho Neto,
“Publicação da Liga de Defesa Nacional” ou em Tradições nacionais:
episódios históricos e brasileiros notáveis, de Carlos Alberto Gomes
Cardim, sinceros produtos e subprodutos da ideia plasmática de nação
e nacionalidade.90 Enquanto isso, no aquecido circuito de edição e
comercialização de obras didáticas, a Livraria e Editora Francisco Alves
e a Companhia Melhoramentos destacavam-se na atração de autores

90
A literatura cívico-patriótica endereçada à infância escolarizada é analisada
por Correa (2006) e Hansen (2007); a edição e comercialização do livro
didático, por Bragança (2000) e Razzini (2010).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 217

didáticos, em maioria lotados em aparelhos escolares.91 Nesse gênero


em evidência, carregado de audácias divinatórias, o país aparece mais
moderno e menos arcaico, não se alude ao latifúndio, à monocultura de
exportação, tampouco às condições de vida e trabalho do povo pobre
ou aos entrechoques sociais e às disparidades espaços-temporais.
Objetivando incrementar o “são brasileirismo”, como escrevera
Silvio Romero ou conhecer um país “distante de si mesmo”, como
queria Afrânio Peixoto, essa literatura de ficção destinada à infância
e a juventude (a copiosidade de reedições chama a atenção) assume
a feição de certificados de civismo votados à construção simbólica da
coletividade social, quer dizer, à supremacia da grande pátria sobre as
“pequenas pátrias” ao mesmo tempo em que coligem a antropogeografia
e a antropossociologia “da nossa terra e nossa gente”.
De par, nos planos regionais, expandem-se a montagem
de aparelhos escolares, as causas são as mais diversas, surtos de
modernização das oligarquias estaduais, expansão de fronteiras
agrícolas, ondas imigratórias, crescente urbanização e claro demanda
social por escola. Nos circuitos políticos e nas instâncias do sistema
intelectual, um consenso radical, o Brasil, país jovem e promissor,
dotado de horizontes geográficos infindos, em que a natureza
prodigiosa armara panoramas sedutores e deslumbrantes, carecia de
direção e soberania mental.92
Vazados em registro de convocatória social, as vozes faladas e as
palavras escritas estimam lições intensas extraídas da firmeza cívica
e da coragem marcial. Porventura, não mais bastava singularizar
a nacionalidade pelos atributos externos, a extensão territorial, a
variedade climática, a fertilidade dos solos, as florestas luxuriosas, os
rios caudalosos, as cachoeiras majestosas, as praias magníficas, o céu
de anil, e, as tradições populares. Porventura, não mais bastavam as
ofuscantes tomadas panorâmicas (e extasiantes) enunciadas pelo

91
Cf. Monarcha (1997) e Bragança (2000).
92
A ideia de nação é abordada por Gellner (2008); quanto à interpretação
imaginária da vida coletiva, ver Brescianni (1998) e Girardet (1987).
218 • Carlos Monarcha

indianismo-romântico dos poetas oitocentistas ou pelo ufanismo


orgulhosamente aristocrático de Afonso Celso: era preciso ir além do
ficcional maravilhoso, pois se dizia, a pátria não é apenas natureza
Das lições auriverdes ministradas entre os escuros horizontes
do presente, as noites estreladas e os fulgores da nova manhã,
origina-se uma “religião cívica”, crente, fervorosa, assemelhada à dos
primeiros cristãos. “Pátria, família e sociedade”, “O Brasil para os
brasileiros”, “Tudo pela Pátria!”, “Tudo pela República!”, “Tudo pela
Humanidade!”, “Pátria, Nação, Humanidade e Civismo”. E, muito
mais do que antes, clamava-se por um filtro admirável, a ação social
da escola e sua cultura letrada na formação de uma identidade coletiva
mais congregante, mais hegemônica, mais unitária. Esmerilhava-se a
confiança na escola social, nela se concentram as intenções educativas
da prole da nação, considerada porvir do amanhã futuro. Em suma, na
sua variedade, o pensamento nacionalista e suas “invenções históricas
arbitrárias”93 avultam uma literatura social caracterizada pela cofiança
na instrução popular.
Dos extravasamentos das inquietudes morais, desdobra-se um
chão forrado de publicações vibráteis, apostólicas mesmo, por vezes,
mera ficção verbal, nem por isso menos sonoras, contudo aparentadas
no desejo de construir uma consciência didática nacional – O Brasil e a
educação popular, de Antonio Carneiro Leão; Educação primária escolar,
de Raul Alves de Sousa; Pela instrução primária no Brasil, de A. C.
Sales Júnior; Problemas de educação nacional e de instrução pública, de
Egas Muniz Barreto de Aragão; O problema da educação nacional, de
Azevedo Sodré; Eduquemo-nos, de José Augusto Bezerra de Menezes;
Educação nacional, de Monteiro de Souza; Ensino popular no Brasil,
de Orestes Guimarães; Educar-se para educar, de Venancio Filho;
Educação popular, de Firmino Costa; A educação nacional e Virilização
da raça, ambos de Mario Pinto Serva e No Brasil só há um problema
nacional: a educação do povo, de Miguel Couto.

93
Cf. Gellner (2008).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 219

Tempos idos, tempos novos, num crescendo

Irmãos do norte! Irmãos do sul, amigos! Unamo-nos em torno da


nossa bandeira; que os elos que nos ligam não se dessoldem nunca,
para que seja grande a sua glória e poderosa a sua força!
Júlia Lopes de Almeida, “A nossa bandeira” (1907).

Na linguagem diagnóstica, o liberalismo-federalista ressoa


espécime estrangeiro enxertado em florestas tropicais, por consequência,
dizia-se, nelas efloresciam vinte hinos e bandeiras das vinte pátrias
estaduais e sobre elas, a tremular, o fantasma da cissiparidade. Na
segunda edição de A educação nacional, possivelmente influenciado
pelo Os sertões de Euclides da Cunha, a quem demonstrara apreço e
admiração, José Veríssimo colocava o problema claramente. “Estas
diferenças fundamentais na evolução e índole da nação e da federação
encerram os perigos intrínsecos desta forma, perigos que aos políticos
previdentes cabe antever e conjurar. Além desses a federação brasileira
encerra um outro e gravíssimo, qual é a indicada falta ou pobreza
de sentimento nacional, tornando acaso prováveis, e em todo caso
possíveis, as tentativas de separação” (Veríssimo, 1906, p.10). Nas
imagens anoitecidas, alardeia-se a existência de um país indeterminado,
sujeito à incoesão e à indisciplina. “O que me aterra é a possibilidade
do desmembramento.”

Amedronta-me este espetáculo: este imenso território, povoado por


mais de vinte e cinco milhões de homens, que não são continuamente
ligados por intensas correntes de apoio e de acordo, pelo sem ideal, pela
educação cívica, pela coesão militar, conflitos ridículos sobre fronteiras,
dentro da integridade da pátria, explorados pela retórica, envenenados
pelo fanatismo; originando guerras fratricidas, a desigualdade entre
Estados irmãos, desirmanados pela diferença das fortunas e das
prendas (Bilac, 1917, p.23).
220 • Carlos Monarcha

Apreensão verbalizada por Oliveira Vianna em Evolução do povo


brasileiro, obra em que fixava na forma de mural o desenrolar histórico-
sociológico-cultural do país. “Repartindo os poderes da soberania
entre a União e os Estados, o novo regime cria, ao lado da história
geral das suas instituições, uma história local, que se capitula em vinte
histórias particulares, correspondentes aos vinte Estados da Federação”
(Oliveira Vianna, 1923, p.29). É de então os ciclos afervorados de
conferências, palestras, fundação de sociedades patrióticas, pregoante,
o poder da palavra acena ensino cívico, linhas de tiro e escotismo,
chegara o tempo atiçado das ligas e associações civis votadas a sublimar
a proto-história nacional.94 Na tábua de prioridades, a debelação do
analfabetismo, a conscrição militar compulsória, o voto obrigatório e
secreto, a obrigatoriedade escolar.
Sediada no Rio de Janeiro, com ramificações em Sergipe, Espírito
Santo, Pernambuco, a Liga Brasileira contra o Analfabetismo bate-se
pelo ensino primário obrigatório, educação nacional, caixas escolares.95
A Liga de Defesa Nacional conclama a defesa da pátria, educação
cívica, voto secreto, batalhões patrióticos, linhas de tiro, escotismo,
moralização da política, ensino da língua materna, valoração do
trabalhador, serviço militar e instrução obrigatórios.96
A sua vez, a Liga Nacionalista de São Paulo desfralda a bandeira
negra do perigo: a fidelidade dos imigrantes e descendentes à sua
cultura de origem e a inexistência de patriotismo entre brasileiros.97
Sob os influxos da Liga, Sampaio Dória, ao reformar a engrenagem
dos serviços de instrução, subordina as escolas ditas estrangeiras às
determinações da diretoria-geral da Instrução, além de proibir o
ensino em língua estrangeira aos menores de dez anos, as obrigava
a guardar os feriados nacionais, a prover ensino de língua portuguesa
por professor brasileiro ou português nato, a prover ensino de história
e geografia por brasileiro, e sobretudo a entoar os hinos nacionais.

94
As trajetórias das ligas e seus programas são exaustivamente analisados por
Nagle (1966).
95
Cf. Nofuentes (2008) e Sousa (2004).
96
Cf. Oliveira (2012).
97
Cf. Bandecchi (1980) e Estatutos da Liga Nacionalista de São Paulo (1917).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 221

Donde campanhas na imprensa, discursos nas tribunas,


distribuição gratuita de brochuras para “educar o povo no amor à Pátria,
à Lei, à Liberdade e às tradições nacionais”. Em chave socialmente
empenhada com frequência destrinçavam-se os mandamentos cívicos.
“Amai a liberdade! Defendei a Pátria! Pagai impostos! Votai! Cooperai
na política! Não vos esquiveis do dever do júri! Respeitai a lei! Fiscalizai
a execução das leis! Falai bem a língua nacional! Não desdenheis a
civilidade, o cavalheirismo, as boas maneiras!”.

Eis aí, Srs. e Exas. Sras., o decálogo da religião da Pátria que a Liga
Nacionalista houve por bem mandar fosse espalhado hoje pelo Estado
inteiro. Realizar esses dez mandamentos é ter educação cívica, pois já
o referi, educação é ato, educação é prática de preceitos; ter educação é
agir no sentido da instruída possuída (Silveira, 1919, p.3).

Nas elocuções hiperbólicas, reserva-se à escola a celebração


hagiográfica dos fastos nacionais, o ensino da língua, história e geografia
pátrias. Se o analfabetismo possibilitava a troca injusta da vontade geral
pela vontade de minorias votantes, concluía-se que, a ativação do ensino
cívico seria o corretivo, de tal sorte que o vozerio das ligas e associações
converge para a qualificação do voto. “Onde não se permite a válvula
das oposições à maioria, sociedades secretas, subversivas, carcomem o
solo, sobre que se alteiam os governos descuidados. O melhor preventivo
contra a explosão das rebeliões, sempre iminentes, é dar-lhes uma
tribuna, por onde se desabafem, se queixem, preguem as suas ideias,
trovejem as suas reclamações.” Encarecia Sampaio Dória (1919, p.142),
em O que o cidadão deve saber. Manual de instrução cívica, opúsculo
editado pela Tipografia Olegário Ribeiro, Lobato & Cia. Ltda., com
a tiragem espetacular de 10 mil exemplares. Nesse decálogo popular de
direito constitucional, o autor explica as noções de júri, serviço militar,
estado de sítio, partidos políticos, soberania nacional, Estado e federação.
Ora bem, assim se idealizava a superação da malformação do
país. No mais, é bom lembrar que o alistamento eleitoral é reduzido,
222 • Carlos Monarcha

na eleição presidencial de 1918-1919, por exemplo, girou em torno de


1,5%, nas demais eleições, 2,3% a 2,4%, e em 1930, excepcionalmente
em 5%.98 Além do que predominam as defraudações habituais
praticadas pelo mandonismo local, o “bico de pena”, a adulteração das
atas pelas mesas eleitorais e a “degola” ou “depuração”, isto é, o não
reconhecimento dos diplomas dos opositores eleitos.
Na aura ingente de cogitações nacionalistas, o escotismo de
Baden-Powell, sumariado no manual A educação pelo amor substituindo
a educação pelo temor, efloresce nos marcos escolares tanto pelo apoio
das autoridades quanto pela iniciativa da Associação Brasileira de
Escotismo.99 Elaborado pelo jornalista e folclorista Amadeu Amaral,
o decálogo de imperativos, assim preceitua a ética do boy-scout, pré-
figuração do adulto reto.

1 – A palavra do scout é sagrada; 2 – O scout é leal; 3 – O scout tem o


dever de ser útil e de ajudar a outrem; 4 – O scout é amigo de todos e é
irmão de qualquer outro scout; 5 – O scout é cortês; 6 – O scout é amigo
dos animais; 7 – O scout sabe obedecer; 8 – O scout é alegre sorri e
assobia; 9 – O scout é econômico; 10 – O scout é puro de pensamentos,
de palavras e de atos (Amaral, 1916, p.4).

E raras, muito raras, foram as vozes a contraditar a pressão da voga


nacionalista na subjetividade infantil. A de José Getúlio Frota-Pessoa,
certamente, é uma delas. “A força de se inocular na criança essa idolatria,
acabaremos formando gerações de fetichistas, para as quais o sentimento
da Pátria, ideal e nebuloso, se substituirá pela adoração a esse ídolo concreto
e palpável, que se vê fulgir e tremular” (Frota-Pessoa, 1924, p.117).
Num quadro social pintado e repintado a golpes e a contragolpes,
translações de futuros, difusão de valores embandeirados e construções
de futuro possíveis, avantaja-se o afã de engendrar de uma vontade
única devotada a um todo transcendental preexistente aos indivíduos

98
Cf. Buarque de Holanda (1948 [1936], 1960) e Nicolau (2012).
99
Cf. Nascimento (2008).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 223

e às classes sociais. Resumidamente o corte histórico-cultural é feito


pelo nacional, valer dizer, trata-se de transfigurar o país para além das
contingências da situação histórica (na lógica nacionalista, há uma
inversão de sinais, é a nação que faz o homem e não o inverso). Com
isso origina-se uma figura de destino coletivo, uma fé comum, isto
é, a escola e sua cultura, para além da alfabetização, modelariam as
novas gerações ao formar hábitos mentais e atitudes comportamentais
necessários à coesão da vida nacional.

Ensinar o b a ba ou dar os rudimentos de um oficio, abandonando


o espírito, a inteligência do jeca-tatu, do caipira e do alfabetizado em
geral, no mesmo estado de inconsciência, desorientação ou anarquia,
em que eles vivem há quatro séculos, é em nada resolver o problema de
nossa cultura e de nossa grandeza. Uns e outros, quer os aprendizes de
artífices, quer os alfabetizados se constituirão, talvez mais facilmente
do que até agora, pasto da demagogia impenitente, ou das doutrinas
extremistas, em voga (Carneiro Leão, 1923, p.133-4).

O elo é a pátria, a reação congregante

O recenseamento geral de 1920 estimara em 1,6 milhão o total


de estrangeiros radicados no Distrito Federal, São Paulo, Paraná,
Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Desse total, São Paulo abrigava
53%. Sob a pressão da antífona nacionalista, ascendente e alarmista,
a estrangeirização do país soa como perigo iminente. Entrava em
marcha o abrasileiramento das áreas do Sul do Brasil. Em relatório
à Conferência Interestadual de Ensino Primário, Orestes Guimarães
contabiliza 310 escolas mantidas pela Itália: 87 no Rio Grande do Sul,
38 em Santa Catarina, 102 em São Paulo, 39 no Paraná, 11 na Capital
Federal, 23 em Minas Gerais, 10 no Espírito Santo.100 Em memorial
ao ministro da Justiça e Negócios Interiores, esse inspetor federal
estribilha o desnacionalismo.

100
Cf. Conferência Interestadual de Ensino Primário (1922).
224 • Carlos Monarcha

Quistos da alma brasileira, frequentados a dezenas, senão as


centenas de milhares de crianças, filhas de estrangeiros, tais escolas,
pela dinâmica educativa de que revestem reduzem os novos imigrantes
avultadíssimo número de crianças aqui nascidas, as quais, infelizmente,
as tornam os piores estrangeiros entre nós, embora com foros de
cidadãos brasileiros.
Ao deixarem essas escolas, de cursos de seis a oito anos, as crianças
saem perfeitamente estrangeiradas e assim, mais tarde, educarão seus
filhos, só com o tempo com o convívio dos balcões e das estradas
passarão a papaguear algumas palavras da língua vernácula, mas a
leitura, a cultura, enfim, só a podem fazer nos diários, revistas e livros
estrangeiros (Guimarães, 1925, p.3-4).

E a respeito “desses brasileiros feitos estrangeiros que sequer


sabíamos assimilar”, dizia Afrânio Peixoto. “O senhor Orestes
Guimarães, pedagogo de responsabilidade, fez ainda notar que não
se toma providência alguma a respeito das escolas alemãs, em outros
centros do país, em S. Paulo e no Rio, por exemplo, que continuaram
e continuam livremente a funcionar, fazendo de estrangeiros patrícios
nossos, que não sabemos nem podemos instruir” (1930, p.112).
1917. No esforço de outorgar identidade à vida coletiva,
Wenceslau Brás, presidente da República, decreta o fechamento de
centenas de escolas em áreas de colonização no Paraná, Santa Catarina
e Rio Grande do Sul por ensinarem em língua alemã. Passo seguinte,
o Decreto nº 13.014, de maio de 1918, estipula a criação de escolas
subvencionadas em núcleos de descendentes de imigrantes, ao todo,
404 unidades, 120 no Rio Grande do Sul, 168 em Santa Catarina, 116
no Paraná. De par, Orestes Guimarães, professor paulista comissionado
em Santa Catarina, é nomeado inspetor escolar federal das Escolas
Subvencionadas pela União.101 Na contiguidade, o Decreto nº 13.175,

Na sua diversidade, o tema “escolas estrangeiras” é analisado por Kreutz e


101

Luchese (2011). Ver Seyferth (1999). Sobre a obra de Orestes Guimarães, ver
Auras (2007).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 225

de setembro de 1918, abriria crédito de 100:198$548 para auxiliar 96


escolas oficializadas ou instaladas em núcleos coloniais no Paraná.
No mandato do vice-presidente, Delfim Moreira, o ministério
da Justiça e Negócios Interiores concede crédito de 113:937$580 para
a instalação de 167 escolas no Rio Grande do Sul, já o Decreto nº
13.014, de 4 de maio de 1918, credita 175:900$160 para 148 escolas
em Santa Catarina. Enfim, alardeia-se o poder agregador da escola
primária, instituição social essencial às instituições políticas, ao
civismo, à saúde e ao rendimento econômico Se se atribuía à escola
a finalidade de homogeneizar as populações – a cada nova geração,
seriam concedidos o domínio da língua na forma culta, noções de
geografia e história pátria, folclore, civismo e moral; paulatinamente,
as finalidades da educação constantes nos regulamentos e regimentos,
“o fim da escola é alfabetizar”, “promover a educação física, moral e
intelectual”, o “ensino de letras”, são substituídas por outra finalidade,
o ideal de construção da identidade nacional.
227

Hermeneutas da República iletrada

Fenomenologia das festas nacionais

1920 é a década dos centenários, melhor dito da compulsão à


lembrança dos fatos salientes da história do país. Além do centenário
da Independência, em 1922, celebravam-se os centenários de instalação
do ensino jurídico e do nascimento de Pedro II, 1925 – imperador e
monarquia são fatos sublimados –, do Poder Legislativo, 1926, e da
lei geral das escolas de primeiras letras, 1927. Em tom de odisseia,
avaliava-se trajetória do país, para alguns a meio-caminho, para outros,
irrealizada. Mormente os esforços almejam estabilizar a flutuante
memória nacional, por paradoxo, não será errôneo afirmar que nessa
década há simultaneamente excesso de solidez memorial e ausência
de memória. No teatro dos balanços, homens públicos de talentos
multiformes irmanam-se na construção de memórias (como se sabe
a memória não é tão só repetição do passado, o ato retrospectivo tem
função propiciatória).
As vozes se avolumam, hieráticos homens públicos de talentos
multiformes pronunciam-se sobre o estado de coisas, alguns descreem
da pátria, outros fitam o vir a ser; de qualquer modo, abundante, a obra
ideológico-escritural dos reformadores e teoricistas lota os proscênios
celebrantes, e, por ventura, a organização nacional da instrução é um
dos motes centrais, talvez o mais querido, talvez o mais bem aceito.
Encarnados na pele de hermeneutas da República iletrada, diferentes
228 • Carlos Monarcha

sujeitos, em diferentes lugares, ao interrogarem em seus escritos “Qual


instrução?”, “Qual Brasil?”, “Qual futuro?”, entoam vistosos elucidários.
Nos escritos de circunstâncias, predominam objeções a um presente
imóvel, melhor, a um passado que não quer passar.

As ideias de organização e progresso vinham, no entanto, tendo


expressões locais, como o atestam as reformas de ensino nos Estados
de São Paulo, 1920; Ceará, 1922; Minas Gerais, 1927; Espírito Santo,
1927; Pernambuco, 1928, e ainda no Distrito Federal, em 1925 e 1928.
Essas reformas agitavam as novas ideias técnicas e os objetivos sociais
da educação.
Em 1924, funda-se, no Rio de Janeiro, a Associação Brasileira
de Educação, que inicia reuniões de estudos, cursos de conferências e
congressos anuais (Curitiba, 1927; Belo Horizonte, 1928; São Paulo,
1929). Ramos dessa associação, ou instituições autônomas fundam-se
também nalguns estados. Há um movimento de agitação de ideias
semelhantes ao período final do Império, e a que não seriam estranhas
as consequências econômicas e sociais provocadas pela Primeira
Grande Guerra Mundial, e os progressos da industrialização do país
(Lourenço Filho, 1949, p.243).

A década de 1920 transcorre em meio ao clima de guerra civil,


decretação do estado de sítio, dissidências interoligárquicas, levantes
“tenentistas”, marcha da Coluna Miguel Costa-Prestes, agitações
populares, carestia de vida, balburdia orçamentária e corrosão das
finanças públicas; numa palavra, estalava a crise de hegemonia da
república oligárquica. Dos sobressaltos de consciências, deriva uma
vertigem de programas de salvação pelo saneamento das relações
sociais, em síntese. De modo que, o verbo social dos publicistas forra
o chão das festas centenárias com ensaios de sociologia retrospectiva e
psicologia social. E ao clamarem por acelerações e mutações da história
pátria, suas palavras adquirem caráter ativo e valor documentário, pois
marcadas pelo espírito de crítica e pelo desejo de renovação.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 229

É o caso do severo inquérito conduzido por Vicente Licínio


Cardoso, À margem da história da República. Emendar vícios, difundir
virtudes republicanas, propor rumos são as expectativas dos depoentes.
Antonio Carneiro Leão assina “Os deveres das novas gerações
brasileiras”, Celso Vieira – “Evolução do pensamento republicano
no Brasil”, Jonathas Serrano – “O clero e a República”, José Antônio
Nogueira – “O ideal brasileiro desenvolvido na República”, Nuno
Pinheiro – “Finanças nacionais”, Oliveira Vianna – “O idealismo da
Constituição”, Pontes de Miranda – “Preliminares para a reforma
constitucional”, Ronald de Carvalho – “Bases da nacionalidade
brasileira, uma síntese histórica”, Tasso da Silveira – “A consciência
brasileira”, Tristão de Athayde – “Política e letras”, Vicente Licínio
Cardoso -“Benjamin Constant, o fundador da República” e o
antológico “À margem da história da República”, Gilberto Amado –
“Instituições políticas e o meio social no Brasil”, depoimento judicioso
em que as tonalidades auriverdes idelizadas por Afonso Celso cedem
aos tons pardo-acinzentados na composição de um mural de sinuosas
linhas. Alongadamente, detalhadamente o mural de palavras figura a
visão de um país em ruínas. Ouça-se a voz a descrever paisagens físicas
e culturais saturadas de perfis antropológicos fantasmáticos. “Povo
propriamente não o temos, sem contar o das cidades que não pode se
dizer uma população culta, a população do Brasil politicamente não
tem existência.”

Compõem-se de 15 milhões de desassimilados que no Norte e


no Centro constituem, os pescadores e seringueiros do Amazonas,
os agregados das fazendas, os vaqueiros e campeadores do sertão, os
pequenos negociantes nômades, os operários rurais primitivos e sem
fixidez, trabalhando um dia para descansar seis na semana, o matuto
ignorante e crendeiro, vivendo numa choupana, quando não desabrigado
de todo, e ainda os jagunços da Bahia, os cangaceiros de Pernambuco,
os “fanáticos” do Contestado, os capangas das vilas e aldeias do interior,
a multidão de pequenos artífices e trabalhadores das cidades e das roças,
230 • Carlos Monarcha

toda uma gens complexa, pouco produtiva, entregue a sua própria miséria
e alheamento do mundo, emigrando do Ceará para o Amazonas, nos
Estados do Norte se arrastando ao abandono do desconforto de um
voluntário, sem saúde, sem hábitos de trabalho, dada às superstições das
raças selvagens, inúteis quase como força econômica, e tendo, na sua
maioria, é o Brasil, a ideia que nos deu Euclides da Cunha n’Os sertões
(Amado, 1924, p.57, grifo do autor).

Homem da palavra exuberante, ideal-tipo do cidadão da


República das Letras, no fecho do inquérito, Vicente Licínio retoma
ancestral profissão de fé liberal. “Instruir é formar cidadãos, é sanear
mentalmente, é fundamentar os laços da coletividade dentro da unidade
da Pátria. Instruir é, pois, demonstrar o homem e republicanizar as
instituições políticas. Num meio inculto, instruir é de fato governar
sabiamente” (Cardoso, 1924b, p.109).102
E, como em épocas anteriores da vida nacional, retornava a cena
uma vigorosa cultura de reforma, por vezes, perdida em devaneios.
Sem pretender estabelecer uma genealogia de mestres e discípulos, é
possível dizer que, na vigília comum, subjazem as verdades da razão
racionalista: instruir o entendimento, regular as vontades, afeiçoar os
corações, construir a unidade de fins, ou por outra, ao se constatar o
decaimento do país, receita-se instrução.

Ultimamente o problema vai tomando a mentalidade de espírito


de elite no sentido de tornar uniforme e praticamente eficiente a

102
Comenta Carvalho (2002, p.70): “Não se pode dizer que as críticas desses
autores estivessem equivocadas. Todos comparavam um regime republicano
idealizado com a dura realidade e tiravam a conclusão inescapável da distância
entre o Brasil real e o Brasil legal. No entanto, havia em todos eles uma
incapacidade de ver o povo sob uma luz favorável, de perceber o lado positivo
das ações do que chamei de povo da rua. Esse povo ativo ou era considerado
fanático ou obscurantista ou desordeiro. O povo civil era simplesmente
ignorante, analfabeto, doente, um Jeca-Tatu. O povo das eleições era massa
passiva de manobra”.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 231

propagação do ensino público. É preciso, porém, que o objetivo


pedagógico, resumindo toda a obra de educação do povo, vá também
até onde a civilização é precária e se torne amplamente eficaz em todas
as zonas do país (Fernandes, 1929, p.228).

Na esteira de obras embaladas pela vontade de reforma saiam


escritos sociais irmanados na autenticação dos fatos de realidade,
dentre outros, A educação nacional, de Mario Pinto Serva. “Jeca-Tatu
só desaparecerá com a escola espalhada por todo o interior do país,
escola que eduque física e mentalmente o nosso povo” (1924, p.19);
Pela instrução primária no Brasil, de Antonio Salles Júnior. E “O
ensino público no Brasil: decepções e esperanças” (no Livro de ouro do
centenário da Independência do Brasil), “Cem anos de ensino primário”
(no Livro do centenário da Câmara dos Deputados), ambos de Afrânio
Peixoto. Esteira ampliada com Da divulgação do ensino primário no
Brasil, de Alfredo Lopes da Cruz; Contra o analfabetismo, de Marques
Pinheiro; Luta contra o analfabetismo, de como esta campanha favorece o
saneamento do Brasil, de Aleixo de Vasconcelos; O ensino que nos convém,
de Vicente Licínio; Instrução pública, de Benjamin Franklin Ramiz e
Problemas da educação nacional, de Egas Moniz Barreto de Aragão.
No vórtice celebrante, reaviva-se a memória de uma efeméride
desbotada pelo tempo, a lei geral de criação das escolas elementares
baixada em 1827, com a publicação de “Centenário das primeiras
letras”, de Max Fleiuss; “Evolução do ensino primário no Brasil”,
de Sud Mennucci; “Centenário do ensino de primeiras letras”, de
Oswaldo Orico; “Um centenário pedagógico”, de Rocha Pombo; “O
primeiro centenário da organização do ensino primário”, de Antonio
Carneiro Leão (1923, p.35). “Que estão fazendo, pois, os outros três
milhões de crianças em idade escolar? Estarão os nossos dirigentes
com a consciência tranquila por haverem cumprido, patrioticamente, o
dever na elaboração da cultura popular?”.103

103
Esses artigos saíram com destaque na revista Educação, órgão da diretoria-
geral da Instrução Pública e da Sociedade de Educação de São Paulo, nos anos
232 • Carlos Monarcha

A favor da desanalfabetização geral, em edição dedicada ao


centenário da Independência, n’O Estado de S. Paulo saía “Cem
anos de instrução pública: 1822-1922”, de Sud Mennucci, texto
posteriormente ampliado em livro e bem visto pelo público leitor. Ao
mesmo tempo, as edições diárias de O Estado de S. Paulo transcrevem
um a um os depoimentos concedidos ao inquérito coordenado por
Fernando de Azevedo acerca da instrução em São Paulo. Opinavam
Antonio de Almeida Júnior, Renato Jardim, José Escobar, Francisco
Azzi, Lourenço Filho, Theodoro Braga, Paim Vieira, Rui de Paula
Souza, Mario de Souza Lima, Amadeu Amaral, Ovídio Pires de
Campos, Raul Briquet, Theodoro Ramos, Reynaldo Porchat, Artur
Neiva, Sud Mennucci.
No ano de 1927, viriam a público Um século de ensino, de Ach.
Matos, e Um século de ensino primário, de Nestor Lima. À proporção
que surge a luz, reafirmava-se antiga certeza, pela instrução popular
organizada em dimensão nacional, seria possível superar dissensões
e remediar males, só assim, pensava-se, o país deixaria de ser reflexo
ou sombra de si. Noutros termos, é o momento da sublimação
da consciência infeliz; ilusoriamente, abstratamente desaparecem
as realidades antinômicas e, mais uma vez, a construção de uma
comunidade orgânica pela vivência das normas de unidade recairá
no regaço da instrução popular. Nas tantas construções de futuros,
não raramente se confundem a realidade dos fatos com a percepção
equívoca do momento.

Não tem conta entre nós os pedagogos da prosperidade que,


apegando-se a certas soluções onde, na melhor hipótese, se abrigam
verdades parciais, transformam-nas em requisito obrigatório e único
de todo progresso. É bem característico, para citar um exemplo, o que
ocorre com a miragem da alfabetização do povo. Quanta inútil retórica
se tem desperdiçado para provar que todos os nossos males ficariam

de 1927 e 1928; alguns anteriormente publicados em jornais prestigiosos: O


País, Correio da Manhã, Diário da Noite.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 233

resolvidos de um momento para outro se estivessem amplamente


difundidas as escolas primárias e o conhecimento do ABC (Buarque
de Holanda, 1948 [1936], p.124).

Compulsivo, o verbo social aspira às verdades da história nacional,


entrementes, um dado é inegável, o crisol de balanços, à primeira vista
explicitadores de devotamentos generosos, ao sinalizarem os erros do
passado e do projeto, projetam o porvir sonhado. De súbito, diferentes
sujeitos, em diferentes lugares, com diferentes propósitos, fazem da
história historiografia: “A história não deve ser fabricante de elogios
ou depósito sebento de críticas póstumas. A história deve explicar:
decompor o passado com a experiência do presente, animado o espírito
pela crença do futuro” (Cardoso, 1924b, p.107).

Das iniciativas

Na antevéspera do centenário da Independência, agosto de


1921, Alfredo Pinto Vieira de Mello, ministro da Justiça, comunicava
a Epitácio Pessoa, Presidente da República, a urgência de coordenar
os sistemas estaduais de ensino e nacionalizar as escolas primárias.
“Passou a fase de literatura, das considerações enfáticas e pessimistas,
das estatísticas impressionantes, apontando os males do analfabetismo.
Precisamos, antes, de uma resolução, eficientemente prática.”

Dados oficiais recentes, colhidos por este Ministério permitem


asseverar que, em várias circunscrições do país, mais de 90% das
crianças estão privadas do ensino e na mais absoluta ignorância. E,
como se esse mal não bastasse, surge outro não menos grave: a lenta,
mas segura desnacionalização da infância nos Estados do Sul, onde
inúmeras crianças brasileiras frequentam escolas, em que o ensino
é ministrado exclusivamente em idiomas exóticos, rendendo-se
assim a alheia pátria o culto devido à nossa (Vieira de Mello apud
Lourenço Filho, 1946, p.8).
234 • Carlos Monarcha

Para o ministro, as ações emergenciais seriam objeto de estudos


em evento auspiciado pelo governo federal, para tanto convoca a
Conferência Interestadual de Ensino Primário a fim de formular ações
conjuntas entre União, Estados e municípios.
Na comissão preparatória grandes nomes, José Augusto
Bezerra de Medeiros, Vitor Vianna, Antonio Carneiro Leão,
Orestes Guimarães, Ester Pedreira de Melo, João Batista de Mello
e Sousa, Raimundo Pinto Seidl. Sob a presidência de Vieira de
Mello, em clima de promoção de síntese de ideias, instalava-
se a conferência. Presentes, as delegações do Amazonas, Ceará,
Rio Grande do Norte, Pernambuco, Sergipe, Rio de Janeiro, Rio
Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Piauí, Bahia,
Maranhão, Espírito Santo, Alagoas, Goiás. Presentes também
autoridades públicas representantes dos ministérios da Justiça,
Fazenda e Agricultura, e intelectuais aderentes as ligas de Defesa
Nacional, Nacionalista de São Paulo, Contra o Analfabetismo e
Pedagógica de Ensino Secundário, do Rio de Janeiro.
Na abertura, Vieira de Mello pronuncia-se. “A Constituição
Federal, art. 35, nº 2, 3, 4, não exclui a intervenção da União mediante
acordo com os estados para a solução do problema da difusão do ensino
primário, ou antes, para diminuir senão extinguir o analfabetismo, que
se alastra no país” (Conferência Interestadual de Ensino Primário,
1922, p.11). Sob a presidência de José Augusto, instalam-se as
comissões de trabalho, imperativo, o temário aborda assuntos cruciais,
a saber, difusão do ensino primário, auxílio da União, obrigatoriedade
escolar, organização das escolas rurais e urbanas, simplificação dos
programas de matérias, uniformização do ensino normal, deveres e
garantias do professorado; mais ainda, fontes de recursos financeiros,
nacionalização do ensino primário, criação do Conselho de Educação
Nacional e Patrimônio do Ensino Primário Nacional. Em nome dos
estados, Tavares Cavalcanti releva a escola primária como centro de
cultura construtor do caráter brasileiro e instância de defesa nacional;
ao mesmo tempo em que adverte.
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 235

É uma verdade dolorosa: temos poucas escolas, grande número


não provido e em todas a frequência pouco excede a 50% da matrícula
e esta não alcança a 50% da população em idade escolar nas regiões do
país pretendidamente modelares. Nas zonas rurais longínquas onde o
próprio trato da terra é sobrevivência do velho ensino dos Jesuítas, o
que convém é fazer do professor primário um elemento de progresso,
um agente civilizador e não um simples ensinador limitado do alfabeto
e das quatro operações que se esquecem quando não se praticam
(Conferência Interestadual de Ensino Primário, 1922, p.234).

No clima comocionado, João Batista de Mello e Sousa e Orestes


Guimarães, relatores de um plano de nacionalização do ensino,
apresentam as delegações um quadro de dispêndios com o ensino
primário, pelo ineditismo, os dados gerais impressionam fundamente.
“Mudou, definitivamente, a feição do problema: tirou-o da esfera
declamatória em que ainda se encontrava e encaminhou-o para o
terreno das soluções práticas” (Mennucci, 1932a, p.69). O quadro de
dispêndio conjuga dados demográficos gerais, populações escolares
de 7 a 14 anos, rendas estaduais e despesas com o ensino primário
em números absolutos e percentuais. Santa Catarina despende 21%;
Ceará, 17,8%; São Paulo, 16,9%; Distrito Federal, 16,5%; Mato Grosso,
17,8%; Rio Grande do Sul, 11,9%; Minas Gerais, 11,3%; Amazonas
e Pará, 10,4%; Paraná, 11,1%; Rio de Janeiro, 11,2%; Paraíba, 10,1%;
Rio Grande do Norte, 10,7%; Piauí, 10,1%; Espírito Santo, 9,8%;
Sergipe, 9,2%; Maranhão 8,4%; Alagoas, 7,8%; Goiás, 7,2%; Bahia,
4,9%; Pernambuco, 3% (Mennucci, 1932a, p.69).
Novembro de 1921. Mello e Sousa, secretário geral e relator,
encaminha as teses aprovadas na plenária de delegados. Em nome dos
interesses nacionais, apela ao Poder Executivo para a criação de “órgãos
propulsores da difusão e da nacionalização do ensino primário”;
dentre as tantas deliberações, a participação da União na extensão e
nacionalização do ensino, a criação de escolas primárias e normais
federais, o ensino em língua vernácula, a proibição de cadernos, livros,
236 • Carlos Monarcha

mapas e quadros didáticos em línguas estrangeiras, a escolaridade


obrigatória entre 6 e 11 anos de idade; a esse respeito, em voto separado,
o delegado do Rio Grande do Sul declara que, por dispositivo da
Constituição estadual, o governo não decretaria a obrigatoriedade.
“Pois que semelhante medida atacaria a autoridade paterna e destruiria,
ao mesmo tempo, a liberdade espiritual” (Conferência Interestadual de
Ensino Primário, 1922, p.350).104
Nas deliberações um consenso geral. “A opinião da grande maioria
reconhece, pois, a competência da União para intervir na difusão do ensino
primário no país, mediante prévio acordo com os Estados, e na forma
constante das supracitadas conclusões” (p.300). A União subvencionaria
a extensão do ensino primário nas seguintes bases: os estados acordantes
aplicariam pelo menos 10% de sua receita na instrução elementar, os
índices variariam de 10% a 60% do montante despendido pelo estado
acordante, carreando-se os recursos às escolas primárias e normais, desde
que equiparadas ao padrão federal a ser adotado.
O alcance patriótico da escola seria potencializado com a
criação de escolas normais superiores para preparar professores de
normais primárias. Segundo os dados do relator, Mello e Sousa, no
país existiriam 30 escolas normais e 12 mil professores primários, a
seu juízo, a desanalfabetização total demandava 100 escolas normais,
200 mil professores e uniformização dos métodos de ensino. À
parte, veementes, José Rangel, Américo de Moura e Correa de Brito,
relatores, enaltecem a federalização das escolas normais. “Se o regime
atual caducou, se não temos docentes em número suficiente, não há
outro recurso senão apelar para uma organização nova”.

Essa remodelação incumbe, por certo, à União. A federação,


fundando, encampando e fiscalizando escolas normais; a União irá
assumindo o encargo de formar e aparelhar um corpo de normalistas
verdadeiramente nacional. O Brasil carece de um professorado único,

104
Os usos do positivismo no Rio Grande do Sul são analisados por Bosi
(1992), Lins (1967) e Tambara (1995).
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 237

saído de escolas com programas e métodos mais ou menos comuns,


com a mesma maneira de sentir o patriotismo de todos (Conferência
Interestadual de Ensino Primário, 1922, p.234-235).

E, das tantas e entusiásticas deliberações, poucas são concretizadas,


contudo a conferência legitima as ações prioritárias. Anos depois, o
Decreto nº 16.782-A, de 13 de janeiro de 1925, baixado na presidência
de Arthur Bernardes, a “Lei Rocha Vaz”, criaria o Departamento
Nacional do Ensino vinculado ao Ministério da Justiça e Negócios
Interiores. Ao Departamento caberia a “aplicação dos meios tendentes
à difusão e ao progresso das ciências, letras e artes”, “animar e promover
a difusão do ensino primário nos estados”, por seu lado, a União
subvencionaria os salários do magistério até o máximo de 2:400$
anuais, aos estados competiria fornecer casa para professores, escola e
material didático, entrementes o Congresso Nacional não consigna a
respectiva dotação orçamentária.
A convergência de vozes se acentuará na 1ª Conferência Nacional
de Educação, auspiciada pela Associação Brasileira de Educação, entidade
civil sediada no Distrito Federal. Instalada em Curitiba, dezembro de
1927, sob o impulso de Lisymaco Ferreira da Costa, o evento reúne
400 congressistas. Em parte das 113 teses debatidas, reeditam-se os
acumulados precedentes, unidade nacional pela cultura cívica, literária
e moral, uniformização do ensino primário, liberdade de programas,
criação de escolas normais superiores.105 Na presidência das relatorias,
os nomes autorizados de Belizário Penna, Leoni Kassef, Deodato de
Moraes, Orestes Guimarães, Renato Jardim, Ubaldo Ramalhete, Raul
Bittencourt e Renato de Alencar. Presentes na plenária, professores,
inspetores-escolares, diretores-gerais da instrução, médicos, jornalistas,
engenheiros, escritores, políticos. Altissonante a rede de vozes clama
pela participação do Governo Federal na elaboração e subvenção de
políticas públicas gerais para os serviços da instrução popular.

105
Essas discussões prosseguem nas conferências posteriores da Associação
Brasileira de Educação. Cf. Carvalho (1998).
238 • Carlos Monarcha

Revisão do pacto contratual

Embora não houvesse na Constituição dispositivo claro a


respeito da colaboração entre a União e os entes federados quanto
ao ensino primário e profissional, outras eram as opiniões dos
“constitucionalistas cismáticos”; para eles, as realidades do século
XX ultrapassaram a lei geral, a Carta Política. Nos meios políticos
e intelectuais desde antes, citava-se o parecer exarado por Araripe
Júnior, consultor geral da República.

Em vista da letra do nosso pacto fundamental a União


não está inibida de exercitar atos legislativos concernentes à
instrução primária, contanto que estes atos respeitem a autonomia
estadual e não contravenham ao que as legislaturas respectivas
tenham estabelecido. Função supletória bem caracterizada
pela Constituição, ela pode ser exercida com aquela amplitude
compatível com a dualidade de jurisdições e na conformidade
do regime escolar adotado em cada Estado (Araripe Júnior apud
Büchler; Moraes, 1923, p.26).

Por seu turno, os “constitucionalistas ortodoxos”, ao pretextarem


a defesa das franquias individuais, reforçam argumentos contrários
à legislação social e à participação da União na oferta dos serviços
de saúde pública e instrução popular. No começo do século, Teixeira
Brandão, já havia denunciado os desacertos constitucionais, a seu
ver, a Constituição federalista quebrara a unidade do ensino público
ao atribuir aos estados a instrução primária, e à União e aos estados,
conjuntamente, o ensino secundário e superior.

Nesse descarte, por parte do Estado, de um assunto que se liga


à sua própria defesa, ou da negligência dessa obrigação social tem
derivado o aumentar-se do analfabetismo ou o subministrar-se uma
instrução falha nas suas bases, nos seus princípios e nos seus fins:
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 239

os dois males da República, causas eficientes dos seus desastres, do


falseamento das suas instituições e, por ventura de presumíveis
calamidades, se, antevendo-as na sua fatalidade evolutiva, o governo
não tomar a firme resolução de opor-se um paradeiro que obste o
naufrágio das instituições democráticas ou o predomínio do governo
de facções (Teixeira Brandão, 1907, p.32).

Assertivo, esse eminente médico-psiquiatra lotado no Hospício


Nacional diagnosticava o mal e agitava perigos. “Porquanto a
liberdade política é incompatível com a ignorância que engendra
a anarquia, pois a igualdade incompreendida pela multidão ignara
gera a utopia igualitária; as decepções da vida política amortecem as
esperanças, acarretam a indiferença pelos negócios públicos, e a apatia
da vontade. Nessa situação, pode-se dizer, o regime democrático
deixa de existir de fato.”
Teórico de prestígio, sua crítica sociológica moldura
inumeráveis condenatórias dos desgovernos do governo, Alberto
Torres, por assim dizer, ditara os argumentos mais cabais do
pensamento dissidente. No seu entendimento o Estado arbitrado
pela Carta Política tornara-se anacrônico, como outros sujeitos,
para Alberto Torres o espírito do tempo requeria uma ordenação
contratual fiada por um executivo forte, a seu ver, estabilidade das
instituições políticas e governabilidade dos regimes democráticos
estavam na dependência direta da instrução popular nacionalmente
distribuída. Numa inversão idealista, apostrofava. “Formar o
homem nacional é o primeiro dever do Estado moderno” (Torres,
1914, p.229). Esse sociólogo sistematiza suas teses revisionistas
em A organização nacional, inicialmente planejara o livro em três
partes, constituição, instrução e economia, mas apenas a primeira
é concretizada. Valendo-se da sua formação jurídica e experiência
como juiz do Supremo Tribunal Federal, conjecturava uma nova
constituição para o país, e nela, inseria caprichados parágrafos
sobre a educação nacional e as competências da União.
240 • Carlos Monarcha

§ 7º Será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos.


§ 8º O ensino primário e o profissional agrícola, no campo, serão
gratuitos, sendo condição do exercício dos direitos políticos e civis a
posse de um título de habilitação pelas escolas primárias e o exercício
de uma profissão, com a necessária habilitação técnica. Nenhum
indivíduo será declarado maior, para os efeitos da capacidade física e
mental sem que satisfaça os requisitos deste artigo.
§ 9º Todo cidadão tem direito aos meios de trabalho, de educação
e de cultura, competindo ao Poder Público supri-los, de acordo com as
aptidões demonstradas.
§ 10º Os governos das províncias [sic] e o federal promoverão
a educação gratuita, até os cursos superiores, dos brasileiros que
demonstrarem capacidade (Torres, 1914, p.340).

Nos debates, as questões do momento: intervenção da União


nos estados e Distrito Federal, expulsão de militantes estrangeiros,
decretação do estado de sítio, voto secreto e obrigatório, voto da mulher,
regulamentação do trabalho ou liberdade de contrato entre patrões e
empregados, ensino leigo ou religioso nas escolas oficiais, participação
da União na sustentação do ensino primário. Deputado constituinte
pela Bahia, Afrânio Peixoto, convicto propugnador de uma escola única,
apresentava emenda propondo a centralização do ensino elementar.
“Não é ele que dá o núcleo à formação da personalidade civil e moral?”.
Ao mesmo tempo reclamava a democratização do ensino secundário,
a fiscalização do ensino profissional e a criação de um fundo escolar
nacional. Confiante, vê na criação de uma escola normal superior na
Capital da República, o “instrumento de nacionalização e de unidade
espiritual do ensino”.

O Brasil não se pode desinteressar da formação dos brasileiros.


Há mister um orçamento “nacional” da educação, com fundos
próprios, imposto especial ou patrimônio de terras devolutas para
termos a “nossa” escola única, disseminada, profusa, usina “em série”
IV. Da política dos governadores à década dos centenários • 241

de formação dos “mesmos” brasileiros, educados e cultos, e não,


como agora, diversos pela alma e pela capacidade, isolados nos seus
confinamentos regionais, nortistas e gaúchos, litorâneos e sertanejos,
nordestinos e sulistas, Brasil que se desagrega porque a educação
fundamental não pode fazer brasileiros, mas alguns cearenses, baianos,
mineiros, paulistas ou rio-grandenses... Só este problema justifica uma
reforma da Constituição (Peixoto, 1930, p.11).

Embora assinada por 66 parlamentares, a emenda não iria


adiante, à revelia dos fatos, o governo força os signatários a desapoiá-
la. Um dos tantos a lamentar o desfecho da reconstituinte, Fernando
de Magalhães, deblaterava.

Há cem anos, o preceito constitucional velava pela pátria única


com a escola única, entretanto, o regime da federação desarticulada,
golpeou pelo Ato Adicional por contaminação americana, a
previdência dos legisladores de 1824: a Constituição republicana
corroeu a coesão nacional, firmando o princípio da escola primária
regional, estreitada no emperro das pequenas pátrias, com seus
dirigentes, os seus costumes, seus exclusivismos, suas tradições, suas
justiças, seus exércitos e suas bandeiras.
A reforma constitucional de 1925, atropelada no desejo da
compreensão, sacrificou por um acordo de conveniências o advento
da escola única. E para poder conspurcar a nacionalização do ensino
primário, garantia única da integridade intelectual e territorial do país
(Magalhães, 1927, p.294).

No mais, a emenda constitucional de 3 de setembro de 1926


autorizava o Poder Executivo a legislar as questões abertamente
sociais, assim promulgava-se o Código de Menores, a lei de expulsão
de estrangeiros acusados de subversão, a decretação do estado de sítio,
a limitação do habeas corpus. Seja o que for, por força das realidades
histórico-sociais, sempre movediças, o Brasil ortodoxamente liberal e
242 • Carlos Monarcha

federalista entrara em desuso. Se o país não possuía um sistema escolar


dotado de sentido nacional e finalidade social, era preciso construí-
lo, porque a moralidade da raça, objeto capital da instrução pública,
residia na sua saúde e vigor.106 Não obstante as diferenças pessoais,
ao decifrarem distorções sociais e contornarem desajustes políticos,
diferentes homens públicos, ao reivindicarem visões fáticas da vida
civil, figuram para si o papel de hermeneutas da República iletrada.
Em linguagem hermética ou desataviada, expõem os modos de sentir,
pensar e praticar instrução pública, e nela a alfabetização geral, na
contrastada formação sociocultural do país. E, ao dissertarem sobre
os meios de viabilizar planos de desanalfabetização geral, transportam
o Brasil indomado e rejeitado ao primeiro plano da vida nacional.
No país das franjas sociais insondáveis e dos grotões desconhecidos,
a instrução popular, como bem dissera Oswaldo Orico, seria o “fio
de Ariadne”, fio sutil a entrelaçar as existências numa mesma cadeia
de vibração, a pátria dentro da humanidade. Vivaz e polifônica,
sobremodo descortinadora de diagnósticos, a macedônia de soluções
até aqui entremostradas, decantam as visões de intelectuais que, ao
clamarem para si o gênio do entendimento, entrecruzavam ciência e
governo, conhecimento e atitudes decisórias.

Interpretação acurada da revisão constitucional de 1925-1926 consta em


106

Cury (2003).
Parte V
Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo

Mas não se espante. Teremos a nossa cultura. Devemos, pois,


trabalhar para isso. O essencial é que não se perca tempo, pois já
perdemos séculos... Somos uma nação continental, no entanto a
nossa população mal chega a povoar a vigésima parte do nosso solo
ubérrimo. Mal temos explorado a centésima parte de nossa riqueza
natural. Quase tudo está por fazer-se, como o senhor mesmo o
reconheceu há pouco.
-- É verdade. O Brasil é ainda o grande desconhecido. É uma
fabulosa riqueza em potencial. Vivem em nós todas as idades pré-
históricas e históricas, desde o homem da pedra lascada até o cidadão
supercivilizado do Rio e São Paulo, sem esquecer outras zonas do
litoral. O Oeste é ainda um enigma de mistérios.

Ferdinando Martinho Filho,


Professores anônimos: romance social (1943)
245

Sentido do Brasil, república agrícola

Consorciar o homem a terra

Nas pessoas de Joaquim Francisco de Assis Brasil, advogado e


estadista gaúcho, e Luiz Pereira Barreto, médico e intelectual paulista,
a doutrina fisiocrata, a terra como fonte de riqueza, encontrara abrigo
e ressonância. O primeiro bate-se pelas técnicas de mecanização da
lavoura e educação agrícola, sua propriedade, a Granja de Pedras Altas,
é citada pela exemplaridade; o último, um dos mentores da Sociedade
Paulista de Agricultura, bate-se pela racionalização da lavoura em moldes
norte-americanos. Em poucas palavras, o agrocentrismo e suas divisas
revalorizam a terra fecunda, boa mãe e fonte do ser verdade da substância
nacional. Ao mesmo tempo se rediscute o trabalho na lavoura realizado
em moldes desusados (ou se se preferir pré-capitalistas). De fato, esforços
a evidenciar a imbricação do tema do agrocentrismo nas associações
classistas e instituições políticas remontam à Sociedade Nacional de
Agricultura e à Sociedade Brasileira para Animação da Agricultura.107
Da crítica à industrialização, à monocultura, à urbanização, defluem
reivindicações dos setores à margem da economia agrícola monopolizada
pelo exclusivismo concedido à cultura e à exportação do café.
Ademais, desde a virada do século, o apreço por uma escola
conforme o meio cultural e geográfico tornara-se assunto opulento

107
Cf. Mendonça (1997).
246 • Carlos Monarcha

no verbo social de Silvio Romero a Alberto Torres. Opulência


magnificada pela Sociedade dos Amigos de Alberto Torres e nos
escritos agrocêntricos de Antonio Carneiro Leão, Belizário Penna e
Sud Mennucci, sujeitos sociais aparentados na rejeição de um provável
feudalismo vigente nos desvãos geográficos. Aos olhos de muitos,
conquanto reservas prodigiosas, interior, campo e sertão subsistiam à
custa de atroz medievalismo e servidão. No auge da projeção política
e intelectual, Fernando de Azevedo é uma das vozes a alardear a
existência de um povo amortalhado na ignorância.

O quadro sombrio da vida, que arrastam esses grupos disseminados


pelo interior e recolhidos em choças de pau a pique, em ranchos de sapé
ou em casebres em ruína, contrasta violentamente com a suavidade
bucólica ou a grandeza soberba das paisagens, que se desenvolvem,
para o prazer dos olhos, à contemplação dos forasteiros, mas a cuja
própria beleza a miséria física e social já tornou quase indiferentes e
insensíveis às populações locais (Azevedo, 1937a, p.49).

Num dos primeiríssimos livros a repercutir a tese da escola


orientada para o aprendizado de técnicas exploratórias da pequena
propriedade, Pela educação rural, Antonio Carneiro Leão proclamava.
“Soou, afinal, para o Brasil a hora da construção econômica.
Consolidando politicamente o país, o que se pode julgar realizado com
a estabilidade da República, o problema é não já de construção da
nacionalidade, no ponto de vista político, mas da consolidação nacional
no ponto de vista econômico” (Carneiro Leão, 1918, p.5). À figura
do cidadão portador de direitos, o publicista agrega à do trabalhador
produtivo e cultivador esclarecido.
Logo se fazia sentir a influência do pensamento agrocêntrico de
Félix-Jules Méline e seu elogio ao princípio ativo da terra nutriz. Na
condição de ministro da Agricultura e primeiro-ministro da França, à
época da Terceira República, Méline manifestara-se pela modernização
da atividade agrícola, políticas protecionistas para o setor e ensino
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 247

modificador da mentalidade camponesa. Nos seus ensaios doutrinais,


Retour à la terre et la surproduction industrielle e Le salut par la terre
et le programme économique de l’avenir, o ministro aclama a valoração
da terra. É de supor que à consigna de Saint-Simon, “Tudo na
indústria, para a indústria”, Méline houvera por bem contrapor “Tudo
na agricultura, para a agricultura”. Para esse pertinaz doutrinador do
agrocentrismo, da terra feracíssima, brota a felicidade nacional.

Com o fim do século XIX, o espetáculo muda bruscamente e


encontra-se entregue ao desconhecido; há de repente uma lacuna, um
corte seco e profundo. Em menos de cinquenta anos, tudo é atingido
de cima a baixo, a indústria, a agricultura, o comércio, os transportes,
os meios de produção, de consumo, de circulação e as relações entre os
homens são profundamente modificados.
Não resta mais que um único campo de ação e de expansão capaz
de absorver todas as forças sem emprego, e que tem a vantagem de ser
inesgotável, ao menos por alguns séculos, é a terra que dá consolo a
todas as misérias e que não deixa nunca morrer de fome aqueles que a
amam e que se confiam a ela... Então, retornemos a terra e dirijamos
para ela o máximo possível a atenção do grande público; tentemos se
interessar pela questão e em breve ela será tão apaixonante quanto a
indústria. Mostremos a ele que tanto a prosperidade do dia quanto a
serenidade do dia seguinte têm esse preço (Méline, 1905, p.36).

Promessa bíblica de messe farta, as consignas agrocêntricas –


“retour à la terre” e “salut par la terre” –, prosperam em certas instâncias
do magistério brasileiro.

O que diz Méline da Europa tem muita aplicação ao nosso país.


Aqui, como lá, se tem dado o êxodo dos campos. As cidades atraem
as populações rurais com o engodo de uma vida mais brilhante,
mais movimentada e os bairros da roça se despovoam. Os que ficam,
pertencem, não raro, ao tipo do caboclo tão bem caracterizado
248 • Carlos Monarcha

nos artigos publicados no Estado de S.Paulo pelo doutor Monteiro


Lobato, que parece conhecer a fundo o assunto de seus trabalhos
(Couto, 1917, p.13).

Ponto de vista disseminado, a terra como fonte nutriz


corrobora a urgência de ações votadas à fixação da população rural,
quer apelando-se a uma pedagogia escolar sensível ao primado
agrícola quer apelando-se ao apego a terra.108 Porquanto, não é de
se estranhar que a comissão de expertos, integrada por Antonio
de Sampaio Dória (relator), Américo de Moura e Plínio Barreto,
reunida para aprovar o uso de livros didáticos, assim se manifestasse.
“Também não há obras que despertem o amor a terra, ao ar livre,
à cultura dos campos. Sobretudo, para as escolas rurais, conviria
abolir os livros que sugiram a sedução da cidade, e o desamor à
vida produtiva e saudável dos campos. Animar a produção daquelas
obras é um beneficio prestado às crianças nascidas e habituadas
com as ‘fazendas’, e uma necessidade pública de países agrícolas
como o nosso” (Anuário do Ensino..., 1918, p.152).
Excetuando-se os compêndios de dignificação da agricultura
e idilização da vida rural de Mario Bulcão, outrora inspetor-geral
da Instrução de São Paulo, Rumo ao campo, Noções de agricultura e
educação cívica e Vida infantil: uma viagem imaginária pelos estados
do Brasil, aprovados e adotados em São Paulo, Minas Gerais, Pará,
Paraná, Capital Federal, não eram muitos os títulos sobre a temática
rural. Em Rumo ao campo, segundo livro da série “Vida infantil”,
aproximadamente 32 edições, Bulcão enuncia noções de civilidade,

108
“Abolição acomodou-se à República e durante anos viveram ainda
patriarcado semiescravocrata e República federativa quase tão simbioticamente
como outrora patriarcado escravocrata e Império unitário. Várias sobrevivências
patriarcais ainda hoje convivem com o brasileiro das áreas mais marcadas pelo
longo domínio do patriarcado escravocrata – agrário ou mesmo pastoril – e
menos afetadas pela imigração neoeuropeia (italiana, alemã, polonesa, etc.) ou
japonesa; ou pela industrialização e urbanização da economia, da vida social e
da cultura” (Freyre, 1949, p.670).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 249

civismo, rudimentos de agricultura, “higiene animal e vegetal” e cantos


românticos relativamente à vida na natureza.

Na roça vive-se mais. Com maior tranquilidade, corre a vida mais


feliz. Os gozos da cidade não se comparam à tranquilidade da vida do
lavrador. Este trabalho, sem o luxo das cidades, pode fazer economias
e assegurar melhor a existência de todos da família, já que produz-se
de tudo um pouco. É um erro quererem todos educar os filhos como
doutores. Se o mundo fosse cheio de sábios, morreriam todos de fome
(Bulcão, 1925, p.179).

De par coexistiam compêndios e cartilhas editados por associações


classistas, ABC do agricultor, de Francisco Dias Martins e Cartilha
agrícola, de Ezequiel Ubatuba ou títulos de diletantes, como Alfeu
Domingues, O ensino agrícola nas escolas primárias e Silvio de Andrade
Maia, As escolas rurais e o êxodo dos campos. Nesse rol de títulos e autores,
habita um corpo de crenças e valores destinados a convencer a massa de
lavradores a vibrarem o conteúdo fisiocrático da terra pela exploração
racional. De modo geral, os conteúdos desse gênero textual contrapõem
a sobriedade da vida rural às ilusões da cidade, reprova-se a vida nas
cidades, invariavelmente descritas como antros povoados de proletários
e subproletários viventes em penúria e sobrecarregada de vícios morais
e doenças. De outra forma, descabida a vontade de viver a vida citadina,
elemento disgênico no organismo nacional, deveria ser combatida.

Não vos deixeis embriagar pelas seduções das cidades. Elas não são,
como vos parecerem, a fonte de grandezas e de venturas, mas de vícios
e de misérias, são ninhos de ambições desenfreadas, de hipocrisias mal
contidas, de maldades horripilantes. Ali, no torvelinho das excitações
e dos prazeres, o nosso sangue se envenena, os nossos músculos se
enfraquecem, o nosso organismo se depaupera, as nossas faculdades se
atrofiam, gastam-se a nossa saúde a força física da nossa raça. A cidade
é uma ilusão perversa (Moraes, 1919, p.8).
250 • Carlos Monarcha

A esse juízo condenatório, Pedro Deodato de Moraes saturava


com palavras idealizadas o vigor e a serenidade, melhor, a pureza
existencial no campo. “A vida campestre, ao contrário, longe de
ser agitada e mecânica, aproxima os homens uns dos outros, dá ao
corpo robustez e riqueza, desenvolve o sentimento da vida íntima,
é cheia de ensinamentos práticos que exigem mais iniciativa,
invenção e experiência pessoal” (Moraes, 1919, p.15). Em boa-fé,
esse professor normalista superioriza o terreno paterno em Rumo
ao campo... a escola social, enfática predicação aos professorandos da
Escola Normal de Casa Branca, predicação, diga-se de passagem,
retomada não sem certo estardalhaço por ocasião da 1ª Conferência
Nacional de Educação.

O sertão brasileiro será eternamente triste, inculto e estéril


enquanto o professor primário para ele não transportar os modernos
preceitos das ciências práticas e das artes úteis. Todo mal, como todo
bem de um país, vem da escola primária. É na escola popular que
devem nascer a tradição agrícola e o prestígio do trabalho da roça.
Parti. Ide ao campo (1ª Conferência Nacional de Educação, 1997
[1927], p.194).

Donde o zelo em despertar gosto e encanto pela vida rural.


É quando se publica Saudade, do professor Thales Castanho de
Andrade, livro de leitura em que se encampa no plano da ficção
o discurso oficial acerca da urgência de estancar a depopulação
rural. Bem recepcionado, Saudade constituir-se num dos tesouros
do nacional-popular; os demais são Narizinho arrebitado, “segundo
livro de leitura para uso das escolas primárias”, de Monteiro Lobato;
As férias no Pontal, de Rodolfo Ihering, Coração brasileiro, de F. Faria
Neto e Campos e arrebóis, de Túlio Espínola. Se o nacionalismo
traveja a indivisibilidade da sociedade de classes, portanto da nação
como corpo social orgânico, o agrocentrismo instrui as diferenças
econômicas e as funções produtoras das classes.
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 251

Trazer os desvãos para o século XX

A tese construtivista a projetar nas vastidões territoriais os


fundamentos da nação e da nacionalidade, elege o interior do país
como lócus da autenticidade e contraponto ao artificialismo da cidade,
para muitos simples “civilização de cópia” dos centros europeus e
norte-americanos. Quaisquer que fossem as apostas, de fato, o sistema
econômico era determinado pela monocultura de exportação.
Nas vozes as mais autorizadas, o interior guardava em si o
sublime mistério da nacionalidade. Donde intensos e afetivos apelos
cujos sinais são invertidos, não se explica o mundo rural como origem
mítica das sociedades, mas futuro previdente, donde ainda a intenção
de retornar às profundezas da terra e raça, história e geografia,
celebrá-las, significa valorizar o homem comum, o anônimo pé-
descalço. Com efeito, o homem do campo, esquecido de si (e pelos
outros), dizia-se, era detentor imprevidente e improdutivo da terra,
estático nos vazios geográficos de sua existência recolhida, transcorria
num tempo indiviso e imóvel, quer dizer, intocado pelos modos de
pensar e viver das civilizações avançadas e suas modernas técnicas de
trabalho. De sorte que a expressão “zona rural” soa como contrafação
da economia de sobrevivência das vilas, arraiais e bairros rurais.
Nesses cenários silenciosos de população rala, habitavam pequenos
proprietários, arrendatários, colonos, parceiros, meeiros, tipos
desde sempre submetidos aos mandatários locais. Noutras palavras,
maratimbas, caipiras, caboclos, cafuzos, caiporas, curibocas, tabaréus,
paroaras compunham os reservatórios dos políticos locais, fenômeno
analisado pela literatura sociológica sob a epígrafe “coronelismo,
enxada e voto”.109
O mote era este, soerguer o povo pequeno, trazer os rincões
desfrequentados pela racionalidade técnica para a história das
relações de produção capitalistas e para a geografia na nação. Como
dissera Oliveira Vianna no ensaio introdutório ao Censo Geral de

109
Cf. Leal (1975).
252 • Carlos Monarcha

1920, sobriamente intitulado O povo brasileiro e a sua evolução. “É


no campo que se forma a nossa raça e se elaboram as formas íntimas
da nossa civilização o dinamismo da nossa história, no período
colonial, vem do campo do campo, as bases em que se assenta a
estabilidade admirável da nossa sociedade, no período imperial”
(Oliveira Vianna, 1923, p.282).

O recrudescer do agrocentrismo

Intelectuais formuladores de sínteses sociológicas decisivas


no tocante a formação social brasileira, em conjunturas de exames e
reexames do país, Euclides da Cunha, Alberto Torres e Oliveira Vianna
assomam como ascendentes intelectuais dos críticos do republicanismo
liberal-estadualista e seu implacável laissez-faire. Ex-aluno no colégio
de Menezes Vieira, Alberto Torres ingressara aos 14 anos na escola de
Medicina do Rio de Janeiro e, aos 16, na faculdade de Direito de São
de Paulo. Na mocidade vivida no final do século XIX, na companhia
de Antonio da Silva Jardim, declarara-se abolicionista e republicano,
no decênio de 1910, sobressaíra como propositor de uma organização
nacional em tom diverso do verbalismo patriótico de Olavo Bilac. Aos
olhos dos discípulos, esse sociologista prima como pensador adverso
à imaginação arbitrária e a seus excessos. Em O problema nacional
brasileiro e em A organização nacional, compreende o industrialismo e
o urbanismo como fenômenos desagregadores.

O Brasil tem de ser uma república social, por força de seu


destino, e da fatalidade de seu surto na era da questão social, e tem
de ser, intuitivamente, uma república agrícola. É preciso, porém uma
república social, previdente e conservadora, para que o povo não
sinta um dia a necessidade de arrancar à força o que os governos
lhes podem dar dentro da ordem, sem prejuízo de terceiros. Poder-
se-ia, talvez, temer que os proletários, aglomerados nas cidades,
não aceitassem de bom grado à volta ao trabalho rural; e que a
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 253

falta de preparo e indolência a que se habituaram trouxessem certa


dificuldade à execução da ideia (Torres, 1914, p.132).110

Republicano moderado, contraditor do domínio econômico das


grandes potências e monopólios internacionais, esse dublê de jurista e
sociólogo, concebe uma organização econômica esteada em pequenos
produtores. “O Brasil tem por destino evidente ser um país agrícola:
toda a ação que tender a desviá-lo desse destino, é um crime contra a sua
natureza e contra os interesses humanos” (Torres, 1982 [1914], p.74).
Incitante desaprova a instrução em moldes urbanos. “Organizávamos
uma ‘instrução pública’ que, da escola primária às academias, não é
senão um sistema de canais de êxodo da mocidade do campo para as
cidades e da produção para o parasitarismo” (1982 [1914], p.273).

Ressurgência da obra

Na Era Getuliana, segundo formulação de Humberto Grande,


as ideias torreanas retornam à cena. Editam-se estudos de divulgação,
exegese e síntese para guiar leitores que “quiserem se aventurar no oceano
alto do pensamento de Torres, pela leitura direta das suas obras”, conforme
Oliveira Vianna, no prefácio de As ideias de Alberto Torres, livro curioso
no qual Alberto Gentil reúne extratos do pensamento do mestre, por
exemplo. “Se o analfabetismo é o estado mental de quase toda a população,
o nível da nossa mentalidade superior desceu até à incapacidade para o
raciocínio”. A sua vez, A. Saboia Lima publica Alberto Torres e sua obra; já
Edgard Roquette-Pinto, em Ensaios de antropologia brasileira, não hesita
em revalidar as teses do “homem de gênio”.

110
“Ruralismo – O Brasil é essencialmente agrícola e assim deve ser. A terra
é a base da riqueza, tudo mais é diversionismo perigoso. O autor crê em uma
espécie de divisão internacional do trabalho, em visão ingênua que não percebe
as vantagens de uns e as desvantagens dos outros (dos ligados à terra, como
pretende ser o seu país). Tem atitude de desconfiança ante a indústria, insiste
na ideia de indústrias naturais, como em seu tempo, às vezes encobrindo
interesses escusos de forças por ela tão combatidas” (Iglésias, 1993, p.35-36).
254 • Carlos Monarcha

De onde, então, provém a insuficiência? Única e exclusivamente de


um elemento decisivo: falta de organização nacional. (Alberto Torres).
O Brasil, pregava o homem de gênio, tem de ser obra de arte da política.
É uma nação que será o que as classes cultas fizerem dela. Organização
nacional, no Brasil, quer dizer principalmente, educação do povo,
nacionalização da economia, e circulação de ideias e da riqueza (1933,
p.125, grifo do autor).

É quando são reeditados na prestigiosa série “Brasiliana” da


Companhia Editora Nacional, O problema nacional brasileiro e A
organização nacional, livros que bussolariam parcela do pensamento
social crítico-dissidente na década de 1930. Com efeito, no trabalho
de exegese e divulgação do pensamento do mestre, perfilam homens
irmanados na esperança de um Brasil unido e melhorado: Alcides
Gentil, Aprígio Gonzaga, Celso Kelly, Atílio Vivacqua, Belizário
Penna, Everardo Backheuser, Fernando de Azevedo, Leoni Kassef,
Lourival de Almeida, Mario Casassanta, Edgard Roquette-Pinto,
Simões Lopes, Sud Mennucci, Mario Augusto Teixeira de Freitas
e outros mais.111 Passo seguinte, intelectuais empáticos às correntes
estatizantes concretizam certos propósitos torreanos, qual seja
a criação de um instituto de estudos nacionais, com efeito, em
1932, no Rio de Janeiro, fundava-se a Sociedade dos Amigos de
Alberto Torres, com núcleos em Minas Gerais, Espírito Santo,
Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Goiás, São Paulo. A entidade
apega-se às soluções torreanas: ensino rural, exploração de recursos
naturais, representação classista, soluções acatadas como objetivas
numa conjuntura de fomento da consciência da singularidade (e/ou
identidade) do país, seu destino ulterior, bem como de repúdio ao
anarquismo, socialismo e individualismo liberal.112

111
Cf. Lima (1935).
112
Cf. Barbosa Lima Sobrinho (1968). Contemporaneamente, a obra de
Alberto Torres é analisada por Marson (1979), ver também Fausto (2001).
Quanto à perspectiva torreana dos fins públicos da educação, ver Almeida
(1963). 
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 255

Dentre as iniciativas da Sociedade dos Amigos de Alberto Torres,


constam estudos sobre as secas do nordeste, proteção à natureza,
instalação de lactários, higiene infantil, cursos para professores
de escolas regionais e realizações muitíssimo bem-sucedidas, o 1º
Congresso de Ensino Rural, semanas ruralistas, clubes rurais. No mais,
para além da crítica ao exclusivismo agroexportador, há aparatosos
consensos: diversificação da estrutura produtiva rural, cooperativismo,
povoamento, colonização, educação rural e uma urgência não declarada,
arregimentar, estabilizar e qualificar a força de trabalho rural.

Vibração emocional

Entre as tormentas e desconformidades da Era Getuliana,


a tese da escola condizente com os quadros sociais e naturais do
país triplica o fôlego. É quando acontece a 4ª Semana Nacional
de Educação, promovida pela Associação Brasileira de Educação,
organizada sob o tema geral “A escola regional”. Nesse evento,
Fernando de Magalhães pronuncia a conferência de abertura “A
emancipação mental do Brasil pelo ensino rural”. Na sequência
discursam C. A. Barbosa de Oliveira, “A escola regional nos seus
aspectos urbano, rural, marítimo e fluvial”; Armando Pinna, “A
escola marítima e fluvial e os seus cursos de pesca”; Belizário Penna,
“A educação rural: o problema brasileiro e sua enorme importância
social e econômica”; H. Rolfs, “O ensino agrícola no grau médio e
sua organização no Brasil”; Everardo Backheuser, “A escola ativa
nos centros urbanos”.113 E sob a trilogia povoar-escolarizar-unir,
acontecem o 1º Congresso Brasileiro de Ensino Rural, promovido
pela Sociedade “Luiz Pereira Barreto” com o apoio do governo de
São Paulo, a 3ª Conferência Nacional de Educação, o 1º Congresso
Nacional de Ensino Regional e, por último, o 8º Congresso
Nacional de Educação da ABE, de par ocorre a fundação da
Sociedade Brasileira de Educação Rural.

113
Cf. A escola regional... (1931).
256 • Carlos Monarcha

Nesse quadro de iniciativas, popularizam-se os Clubes Agrícolas


Escolares decalcados dos Clubs Works norte-americanos, vulgarizados
como “4-H Clubs”: “health” (saúde), “hand” (exercitar a mão), “head”
(cultivar a inteligência), “hearth” (formar o coração). Em São Paulo, o
ruralismo escolar e nele a prática do clubismo ganha rumos certeiros
com a atuação de Thales de Andrade em postos administrativos,
ou seja, na Escola Normal de Piracicaba, na Assistência Técnica do
Ensino Rural e à frente do Departamento de Ensino. É quando
vicejam os “Clubes do Milho”, apoiados pela Sociedade dos Amigos de
Alberto Torres e oficializados sob a denominação de “Clubes Agrícolas
Escolares” por iniciativa do interventor federal general Daltro Filho.114
Mais à frente, o Decreto-lei estadual nº 8.951, de 1938, cria os grupos
escolares rurais, o mais bem-sucedido, o do Butantã, subúrbio da
capital, cuja direção é exercida por Noêmia Saraiva de Matos Cruz,
pessoa de projeção no 1º Congresso Brasileiro do Ensino Regional.

O gênio de Sud

Sem procurar inserção na intriga biográfica, é possível dizer


que na Era Getuliana, Sud Mennucci assume a condição de vulto
paradigmático da “Cruzada pela escola rural” e “ensino rural”. Naquele
passo, era recepcionado como construtor político dotado de honesto
entusiasmo; ademais, notabilizara-se como defensor do mundo rural
e suas possibilidades.
Filho de imigrantes italianos, Sud Mennucci cursara o ensino
elementar no Grupo Escolar “Moraes Barros” e, em 1908, diplomara-
se professor primário na Escola Complementar de Piracicaba, interior
paulista, a “Meca do ruralismo brasileiro”, por sediar a Escola de
Agricultura “Luiz de Queiroz”.
No magistério, leciona em escolas isoladas, grupos escolares
do interior; nos serviços de instrução, ocupa cargos importantes,
delegado regional de ensino em Campinas e Piracicaba, e chefe dos

114
Cf. Andrade (1933).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 257

recenseamentos escolares nas reformas capitaneadas por Sampaio


Dória e Fernando de Azevedo em São Paulo e Distrito Federal, bem
mais tarde chefiará em São Paulo os trabalhos do recenseamento de
1940. Embora portador do diploma de normalista, apenas, projeta-se
como homem “de sete instrumentos” – crítico, ensaísta, historiador,
sociólogo, geógrafo e jornalista.115 Na temperatura alta do Governo
Provisório, 1930-1934, presidido por Getúlio, Sud Mennucci ocupa
por duas vezes a diretoria de Ensino da Secretaria de Educação e
Saúde Pública do estado de São Paulo. No embaralhado ideológico
da hora, Sud adere à Legião Revolucionária de São Paulo, organizada
por Miguel Costa e o tenente João Alberto, interventor federal no
mesmo Estado.116
Nacionalista (e corporativista), o Manifesto à Nação, expedido
em 1931 pela Legião Revolucionária, postula eleições indiretas para
a presidência da República, representação parlamentar por classe
social, poder legislativo integrado por técnicos e não por políticos
profissionais, e por fim posiciona-se contrariamente aos latifúndios e
à ditadura de qualquer classe, fosse burguesa, fosse proletária.117 De
súbito, a Legião Revolucionária é reconvertida no efêmero Partido
Popular Paulista, cujo programa partidário é redigido por Plínio
Salgado, cuja plataforma programática propugna a continuidade das
ações revolucionárias mediadas por um Estado forte, bem como a
extensão da instrução popular “a fim de se combater o patriotismo lírico
e o pessimismo”. No desenrolar da década de 1930, a Sud Mennucci
concede-se as investiduras de “Pai do ruralismo brasileiro”, “Campeão
do ruralismo nacional”, “Pontífice da ruralização do ensino”. Em
suma, sob a fronde das ideias torreanas, Sud Mennucci publica A crise
brasileira de educação, obra premiada no concurso “O melhor meio de
disseminar o ensino primário no Brasil”, levado a efeito pela Academia
Brasileira de Letras. No parecer exarado pela comissão indicada pela

115
Cf. Melo (1954).
116
Cf. Mennucci (1931).
117
Cf. Carone (1975).
258 • Carlos Monarcha

ABL, Roquette-Pinto, relator, Miguel Couto e Aloísio de Castro,


solene elogio ao realismo do autor.

O livro de Sud Mennucci é o mais claro, o mais lógico, o mais


prático. É também o mais original no modo de encarar o problema
e na solução que propõe. Sud Mennucci no seu livro indica, pois,
de maneira realmente superior, todas as condições sociais em que se
define o problema considerado. E indica, com clareza, simplicidade,
entusiasmo, de maneira prática, soluções modernas e possíveis. Deve
receber o primeiro prêmio Alves (Mennucci, 1934, p.7).

É de Sud Mennucci a sentença trovejante. “O alfabeto em vez


de ser um auxiliar, um amparo, um sustentáculo da lavoura, virou um
tóxico violento. Põe na cabeça da juventude aldeã o desejo louco de
aprender para libertar-se do fardo agrícola” (Mennucci, 1934, p.45).
Nas páginas de A crise brasileira de educação, o autor endossa a crítica
ao regime de latifundiário de propriedade, a seu ver, o pleno domínio
do meio físico implicaria a revisão do regime de propriedade, não em
moldes soviéticos ou romenos, isto é, a coletivização da propriedade
fundiária, mas, nos moldes franceses, isto é, em pequenos lotes.
Igualmente movidos pelo diapasão torreano viriam Cem anos de
instrução pública, O que fiz e o que pretendia fazer, Aspectos piracicabanos
do ensino rural, Pelo sentido ruralista da civilização, A ruralização,
Discursos e conferências ruralistas. Quanto aos pródromos relativos ao
ensino rural, não hesitava.

O que foi que nos faltou? Faltou o complemento natural da


política imigratória. Faltou-nos a visão clara de que só a obra educativa,
corrigindo o erro fundamental dos escravocratas, poderia tornar a dar
ao homem do campo brasileiro aquela noção do valor supremo do
trabalho, que nós lhe havíamos roubado em quase quatro séculos de
instituição servil (Mennucci, 1944a, p.21).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 259

No conjunto da obra teórica, Sud repropõe a organização das


escolas normais rurais em três níveis, o pedagógico, o higiênico/
sanitário e o agrícola. Os estabelecimentos comportariam professores
“propriamente ditos”, “professores-médicos” e “professores-agrônomos.”
Como diretor do Departamento de Ensino, em decreto-lei por ele
lavrado, mas não promulgado, estipula a criação de cinco normais rurais,
grupos escolares e escolas isoladas vocacionais, além de uma inspetoria
técnica do Ensino Rural integrada por inspetores-escolares, inspetores-
médicos e inspetores-agrônomos. Em O que fiz e pretendia fazer: defesa e
fundamentação da reforma do ensino de 1932, Sud reafirma a necessidade
de escolas ajustadas às cidades e aos meios rurais e marítimos com o
intuito de formar “três mentalidades absolutamente diversas e que, no
entanto, reciprocamente se complementem para o equilíbrio social do
organismo nacional” (Mennucci, 1932b, p.118-119).
Na condição de diretor-interino, Sud lavra o Decreto nº 6.047,
de 19 de agosto de 1933. “Artigo 1º – O governo do Estado São Paulo
instalará uma Escola Normal, rural, em Piracicaba, que manterá íntima
colaboração com a Escola Superior de Agricultura ‘Luiz de Queiroz’”.
Por falta de verba, o decreto é revogado sem que se concretizasse a
experiência de formar professores rurais.
Simultaneamente aos fatos anteriormente narrados, na escalada
nacional, em 1931, na sede do Rádio Clube do Brasil, Sud Mennucci
profere a conferência “A reforma do ensino rural em São Paulo”; em
1934, no Congresso Pedagógico Regional, pronuncia a conferência
“Aspectos piracicabanos do ensino rural”; em 1933, a convite da
Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, participa do Curso da
Escola Regional, no Distrito Federal, lá profere a célebre conferência
“A guerra à zona rural”. Nesse evento, Celso Kelly, Anísio Teixeira,
Fernando de Azevedo, respectivamente, diretores do ensino no Rio de
Janeiro, Distrito Federal, São Paulo, proferem as demais conferências.
Em 1934, na Bahia, o reformador participa do 1º Congresso Brasileiro
do Ensino Regional; em 1935, “A vida rural e a educação nacional”,
na sede da ABE para o curso da Universidade Rural, na Exposição
260 • Carlos Monarcha

do 1º Centenário da Revolução Farroupilha, Porto Alegre; em 1939,


a pedido do Grêmio Universitário “Alberto Torres” da Faculdade
de Direito de São Paulo, a conferência “O pensamento de Alberto
Torres”. E por iniciativa de Joaquim Moreira de Sousa, diretor-geral
do Ensino do Ceará, a criação de uma normal rural ocorreria não
em São Paulo, mas em Juazeiro, Ceará.118 A Sud Mennucci coube a
honra de paraninfar as primeiras professoras imbuídas das promessas
ruralistas. Transbordante de certezas, para a solenidade, dezembro de
1937, ele compôs “Hino Juazeiro”.

Professorandas. À medida que se contemplam os vários aspectos


que, como um feixe de luz, se reúnem nesta festa, mais avulta e mais
cresce o significado desta cerimônia.
Vede-lhe a colocação da Escola: pleno interior do Brasil,
naquilo que nós outros, supercivilizados habitantes da orla do litoral,
convencidos e presumidos de nossa cultura de empréstimo, chamamos
o “sertão”, o que implica dizer “Farwest”, isto é, a zona que se atrasou
nas conquistas do século, que se foi deixando ficar à margem das
vitórias modernas e não acompanhou o rito da expressão humana.
Porque para nós outros, “caranguejos das praias”, como no apelidou
expressiva e pitorescamente um historiador colonial, só o que nos
chega de fora, com o rótulo e o sinete do estrangeiro, representando o
adiantamento da civilização (Mennucci, 1944a, p.3).

No tempo, estabelecimentos semelhantes são criados no Pará,


Bahia, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Goiás, Rio Grande do Sul,
cujos planos didáticos são submetidos à apreciação do reformador.119
No retorno à vida democrática, sucedem os 1º e 2º Congressos
Normalistas de Educação Rural, Campinas, 1945, e Piracicaba, 1947.
Sud Mennucci é eleito vice-presidente de honra do primeiro evento.
Com temário amplo, as comissões debatem temas ligados à saúde,

118
Cf. Sousa (1944) e Souza (1994).
119
Cf. Monarcha (2007).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 261

higiene, formação do professor, carreira do magistério, povoamento,


assimilação dos imigrantes e descendentes, demografia, escola rural,
prédios escolares. No segundo evento, debatem-se a alfabetização de
adultos e os programas de matérias das normais.

***

Sob o protagonismo de diferentes sujeitos, em diferentes


momentos, em diferentes lugares, os discursos respeitantes ao país
interior, o Brasil distante de si, deixam de ser mensagem mística
saturada de idealidades compensatórias para serem programas da
alçada técnica e civilizatória. Nos enunciados agrocêntricos, para
muito além das visões tardo-românticas, o homem, radicado na bela
natureza, fazia-se sentir a concepção organicista e/ou corporativista de
sociedade, quer dizer, a especialização produtiva das classes insertas
em meios geográficos diversos. Em suma, das vozes a profetizarem
futuros e até aqui ouvidas a plenos pulmões, é possível discernir
urgências, relevando-se, obviamente, as circunstâncias históricas: visão
fisiocrática da produção de riquezas, elogio do usufruto da pequena
e média propriedade, alargamento do mercado interno, oposição
ao exclusivismo concedido ao regime industrial e à monocultura de
exportação, combate aos fluxos migratórios, regulação de força de
trabalho agrícola, ampliação das terras agricultáveis. De outro modo,
entrecruzavam-se a razão de Estado com os postulados da economia
política, visando a elevação do corpo e do espírito das populações.
Para esse ponto de vista, saúde e instrução constituem os princípios da
riqueza da nação, porquanto assuntos a serem apreciados pelo ângulo
da economia política – desde que saudáveis e ativas, as populações
representam as fontes de produção, distribuição, consumo de bens
materiais e de ativação monetária.
263

Da escola de instrução primária e seu magistério

Estatísticas na Era Getuliana

Ainda na fase do Governo Provisório, Francisco Campos,


no ministério da Educação e Saúde Pública, instala a diretoria-
geral de Informações, Estatística e Divulgação, sucessora das
atribuições da extinta 4ª seção da diretoria-geral de Estatística. De
imediato materializa-se a demanda anteriormente formulada por
Fernando de Magalhães, presidente da ABE, a saber, uma convenção
intergovernamental para efetuar estatísticas educacionais nacionais.
Apoiado pelo ministro, Mario Augusto Teixeira de Freitas, leva
a termo o Convênio Interadministrativo de Estatísticas Educacionais
e Conexas em parceria com a União, estados e o Território do Acre.
Os números levantados pela estatística nacional troam. Conforme a
“linguagem severa dos números”, para cada 325 km2 há uma escola;
para cada grupo de 1.421 habitantes, uma escola; em cada grupo de
100 alunos matriculados, 69 são frequentes; em cada grupo de 100
alunos frequentes, 47 são aprovados; em cada centena de alunos
aprovados, oito concluem o curso primário.
Na analítica calçada em números, os problemas são estes:
extensão deficiente e rendimento ineficiente, donde deserção e
êxodo de alunos. “Todos agiam livremente e na proporção que
supuseram de acordo com suas possibilidades. E se fez o caos
educacional, uma balburdia indescritível, desigualdades chocantes,
264 • Carlos Monarcha

desperdícios inacreditáveis, nulificação quase dos resultados reais”


(Teixeira de Freitas, 1937, p.160).
Outros entraves referem-se aos antigos modos de ensinar
e aprender calcados no papel, lápis, tinta, giz, recursos incapazes
de transformar “o ensino de ouvir em ensino de praticar”, no dizer
diagnóstico do diretor do Inep (Lourenço Filho, 1940). Ora bem,
entre as décadas de 1920 e 1940, as estatísticas estaduais e nacionais,
cuja frialdade numérica concretiza realidades vitais, suscitando
ações imediatas sob o ímpeto de competentes estatísticos – Bulhões
Carvalho, Bordeaux Rego, Teixeira de Freitas –, a heterogeneidade
nacional, com seus ritmos próprios e variados, adquirem visibilidade
regional e totalidade nacional. Contudo, em si mesma, a linguagem
dos números não desvela o todo real, a não ser se anexada aos discursos
políticos, interpretações historiográficas e sínteses sociológicas, vale
dizer, os números maciços aguçam o pensamento social. Colossais,
as paisagens estatisticamente construídas sustentam análises das
mais variadas, ao mesmo tempo em que autorizam a argumentação
de homens graves dispostos a se legitimarem como intérpretes do
país. Doravante, sob a saturação dos serviços de estatísticas, a noção
jurídico-política, historicamente considerada de “povo republicano”,
sujeito coletivo dotado de direitos, dará lugar à noção objetiva de
“população”, agregado natural, diferenciado por comparação.
Decênio de 1940. Vem a público os dados consolidados pelo
recenseamento geral da República; precedidos da “Introdução”
da Série Nacional sob o título A cultura brasileira, de Fernando
de Azevedo, os dados escrutinados assinalam mínima densidade
demográfica em 2/3 dos 8.500.000 de superfície; a média teórica
indicava 6 habitantes por km2, sendo que a distribuição real era de
menos 1 habitante por km2.
Grosso modo, perdurava o povoamento insulado e descontínuo
herdado da Colônia e do Império. Desde a Colônia, a ocupação
do território figurava desenho idêntico – concentração nas franjas
litorâneas de Leste, vazios espetaculares e rarefação demográfica nas
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 265

áreas central e setentrional.120 Daí que o antigo alerta de Fernando


Magalhães, um dos fundadores da ABE, “povoar, unir, educar”, por
assim dizer, permanecera desouvido. Além mais, no vozerio dos
doutrinários da ocupação do Brasil distante de si, sobressaía a frase
hipotasiada de Fernando de Azevedo – “a escola faz a nação” e, por ser
acanhada a extensão da escola, concluía-se ser exíguo o espaço social e
cultural da nação, fenômeno resumido na equação negativa: dispersão
+ deseducação = déficit de sociabilidade e unidade.
O precário enquadramento das populações nas estruturas
jurídico-estatais pela via de sistemas escolares de maior alcance é
analisado por Teixeira de Freitas em Dispersão demográfica e escolaridade,
tese apresentada no 9° Congresso Brasileiro de Geografia, em
Florianópolis, 1940; o estatístico concluía que a área “não escolarizável”
por “escolas do tipo comum” seria de 7.186.809 a 7.468.719 km2, isto
é, de 84,44% a 87,75% da superfície territorial, por sua vez as áreas
escolarizáveis não seriam superiores a 1.500.000 km2, irregularmente
distribuídas pelas zonas litorâneas e aglomerados interioranos.
Simultaneamente, o recenseamento geral de 1940 apurava no
grupo da população de “10 anos e mais” o índice geral de analfabetismo
de 57%. Quanto ao grupo de “5 anos e mais”, a distribuição da instrução
por sexo e cor também é negativa.121
A categoria “pardos” abarcava os declarados como caboclos,
mulatos e morenos. Menos da metade da população em idade escolar
está matriculada. Por sua vez, os alunos inscritos nas zonas rurais não
alcançavam a metade da matrícula total, dados que levaram o diretor
do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos, em conferência na
Academia Brasileira de Letras, a convite da Liga da Defesa Nacional, a
interpelar. “Por que tipos de escolas se têm exercido a educação primária
no país?” Passo seguinte replicava. “Dois tipos fundamentais existem:
o da escola isolada e o da escola agrupada, este último especialmente
difundido nos últimos trinta anos”.

120
Cf. Apêndice A – Tabela F.
121
Cf. Apêndice A – Tabela G.
266 • Carlos Monarcha

O primeiro é o da escola de um só professor, a que se entregam


40, 50 ou, às vezes, mais crianças. Funciona quase sempre em prédio
improvisado. É de pequeno rendimento, em geral, pelas dificuldades
decorrentes da matrícula de alunos de todos os graus de adiantamento,
falta de direta orientação do professor, falta de fiscalização, falta de
material, falta de estímulo ao docente. É a escola típica dos núcleos de
pequena densidade de população, a escola da roça, a escola geralmente
capitulada de “rural”.
A segunda toma o nome de “escolas reunidas”, se poucas classes
possui; de “grupo escolar”, se as mantém numerosas. Aqui o prédio
oferece melhores condições de conforto e higiene, mesmo quando
adaptado. As classes apresentam, em geral, efetivo menos numeroso
que o das escolas isoladas, e os alunos se distribuem por elas segundo
os respectivos graus de adiantamento. Aí temos a escola comum dos
meios urbanos (Lourenço Filho, 1940, p.85-87).

E esmiuçava mais ainda as diferenças regionais, vários estados


experimentavam “instituições de tipo diverso”: Alagoas e Paraíba,
“escolas-granjas”, Rio de Janeiro, “escolas rurais típicas”, Acre, Paraná,
Mato Grosso, “escolas ambulantes”, Amazonas, “escolas de emergência”,
Pará, “escolas auxiliares suburbanas”, Rio Grande do Norte, “escolas
rudimentares”. E declinava números coletados pelo Inep, em 1937, o
país possuía 31.566 escolas isoladas e 3.176 escolas agrupadas, dessas,
2.069 denominavam-se grupos escolares. Realidades agravadas pelo
excesso de regentes leigos: em 1937, 25% no ensino estadual de todo
o país, 69%, no municipal; 68%; no particular. Acre e Pará lideravam
com 90% e 62% de leigos.122
E muito embora as legislações municipais, estaduais e federal
estatuíssem o ensino obrigatório, a instrução primária esbarrava
no déficit demográfico, inviabilizando o trabalho alfabetizante
articuladamente a construção do caráter nacional pela ação social
da escola. Improfícua, como regra, a escola existente caracterizava-

122
Cf. Apêndice A – Tabela H.
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 267

se pelo baixo rendimento, infrequência de alunos, instabilidade de


professores. Se há evolução positiva na matrícula geral, fenômeno a
suscitar vontade de conferir sentido e orientação nacional à educação
popular, as estatísticas globais, ao apurarem a abstinência, a reprovação
e a deserção, indiciavam diminuta escolaridade real.
Em suas análises técnicas, Teixeira de Freitas concluía pela
“regressão cultural” não por falta de escolas, mas pela ineficiência
de ensino e baixo rendimento dos sistemas escolares; para ele, fatos
prejudiciais ao preparo cultural e psicológico das gerações vindouras.
Os coeficientes regionais de alunos repetentes no período de 1934 e
1937 indicavam em 1º lugar Alagoas, com 53% de alunos reprovados;
em 2º, Espírito Santo – 35%; em 3º, Santa Catarina – 30%; em 4º,
Bahia – 27%; em 5º Sergipe e Rio de Janeiro – 25%; em 6º, Minas
Gerais – 22%; em 7º Paraná, São Paulo e Acre – 21%; em 8º, Rio
Grande do Norte – 19%; em 9º, Distrito Federal – 18%; em 10º,
Maranhão e Pará – 17%; em 11º, Piauí – 14%; em 12º, Ceará e
Paraíba –12%; em 13º, Mato Grosso – 11%; em 14º, Amazonas –
10%; em 15º, Pernambuco e Rio Grande do Sul – 8%; em 16º, Goiás
– 5%.123 Na maioria dos casos, as zonas afastadas e desfrequentadas
são atendidas por escolas isoladas, cujas rotinas evocam as velhas
escolas régias, alunos de diferentes idades numa única classe, bancos
compridos, caixotes, luz de lampião, mestres improvisados, em suma,
escolas que testemunhavam a sobrevivência do passado num presente
despossuído de futuro.

Magistério rural e sua composição

Em estudo inédito apresentado no 8º Congresso Brasileiro


de Educação, Maria Aparecida Oliveira expôs a composição e a
exiguidade das fileiras do magistério rural segundo formação e sexo.

123
Cf. Teixeira de Freitas (1937).
Tabela 6 – Corpo docente rural -1939
Homens Mulheres
Dependência % de
Não Não % de % de
Administrativa Total Normalistas Normalistas cada
normalistas normalistas mulheres normalistas
do ensino ensino
Federal 31 9 22 — — — 29,03 0,13
268 • Carlos Monarcha

Estadual 11.217 256 770 6.106 4.085 90,85 56,71 46,03


Municipal 9.026 55 1.444 1.741 5.785 83,38 19,90 37,53
Particular 3.778 67 1.068 683 1.960 69,95 19,85 15,71
Total 24.052 388 3.304 8.530 11.830 84,64 37,07 100,00
Fonte: OLIVEIRA, Maria Aparecida. O professor primário das zonas rurais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO, 8., 1942,
Goiânia. Anais... Rio de Janeiro: IBGE, 1944.
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 269

O sexo feminino concorre com o maior contingente de professores,


84,64%, por sua vez a quantidade de professores diplomados, 37,07%,
estava aquém do desejável. O ensino estadual reúne o maior número
de professores, 46,63%, quanto à mínima percentagem do ensino
federal, 0,13%, assim se explica, o Governo Federal mantinha alguns
estabelecimentos no Distrito Federal. No estudo da técnica do Serviço
de Estatística de Educação e Saúde, no ano de 1939, o país totalizava
332 estabelecimentos para a formação de professores, desses apenas 20
destinavam-se à formação do professorado rural.
Quanto à dependência administrativa, Alagoas possuía dois
estabelecimentos estaduais e dois particulares; Amazonas, um estadual;
Bahia, um estadual e um particular; Ceará, dois estaduais; Pará, três
estaduais e um particular; Paraná, dois estaduais e dois particulares;
Pernambuco, nove estaduais. Das 22 unidades federadas, sete
mantinham escolas normais rurais, cujos diplomas são reconhecidos
somente no estado de expedição. Dos 20 estabelecimentos, seis
formam “alunos-mestres” em curso elementar de dois anos; do total
de 1.046 alunos-mestres, 224 concluem o curso, ou seja, 21,41% da
matrícula efetiva.

O único meio de evitar esses desastres seria colocar nos centros


rurais um “imã maravilhoso”, capaz de, com sua força de atração,
impedir a desagregação desses núcleos, com seu brilho ofuscar
as luminárias das cidades, com sua tempera vencer a inópia, a
incompreensão, o preconceito e o fanatismo.
É o professor primário rural que compete, simbolizado nesse “imã”
ser, em cada ponto obscuro do país, a célula formadora dos núcleos
rurais. A responsabilidade é imensa – o futuro de nossa Pátria. A
missão é nobre e gigantesca – construir o Brasil (Oliveira, 1944, p.360).

Por outro ângulo de apreciação. Indubitavelmente, a


heterogeneidade das fileiras do magistério nacional era significativa. Se
diplomado por um instituto de formação de maior ou menor prestígio,
270 • Carlos Monarcha

o professor goza de certa autoridade, além de encarnar o acesso ao


conhecimento e, de algum modo, aparecer simbolicamente vinculado
ao poder público. Se mestre-escola em recantos afastados, em maior
parte prático improvisado, vê-se desprovido de reconhecimento, no
mais das vezes, seu ensino limita-se a conhecimentos irregulares,
mal se pode falar em pedagogia a despeito dos muitos progressos da
disciplina.

Quanto aos professores, prendê-los na dependência exclusiva do


governo federal é o único meio de pô-los a coberto da política de
campanário.
O pobre mestre-escola, sobretudo nas regiões afastadas dos
grandes centros, não tem sido até hoje mais do que um farrapo nas
mãos dos todo-poderosos chefetes locais.
Cabo eleitoral malgré lui, sujeito aos vaivéns da política, sempre
na aterrorizada expectativa de uma remoção, – só a custa de renúncias
e subserviências consegue manter a conquista do amargo pão diário
(Camargo, 1931, p.55).

São Paulo, por exemplo, contava com escolas isoladas rurais, com
curso de dois anos e programas simplificados, situadas em lugares diversos
– propriedades agrícolas, núcleos coloniais e centros fabris distantes
das sedes municipais. Na fala desabafada do diretor do departamento
de Ensino, Antonio de Almeida Júnior: “Salvo algumas dezenas de
casos felizes, a escola rural está mal instalada e o professor vive nela em
situação de dependência.” E refinava a descrição do descalabro. “Dão-
lhe uma tulha velha ou uma sala pequena e anti-higiênica para as suas
aulas. Arranjam-lhe pensão em casa de um sitiante que desconhece as
condições mais elementares de conforto. Sujeitam-na, certas vezes, a
vexames e humilhações” (São Paulo, 1936, p.13).
De resto no conjunto do país, o magistério primário era
tão diversificado quanto às próprias escolas elementares o eram.
Diversificação espelhada nos vencimentos próximos ao mínimo
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 271

vital. Conforme estudo do Inep, em Alagoas, o professorado vencia


mensalmente salário de 165$0 a 500$0; Bahia, de 384$0 a 645$0;
Ceará, de 100$0 a 400$0; Espírito Santo, de 200$0 a 420$0; Goiás, de
250$0 a 384$0; Maranhão, 310$0; Rio de Janeiro, de 400$0 a 850$0;
Mato Grosso, de 180$0 a 330$0; Minas Gerais, de 99$0 a 370$0;
Paraíba, de 83$ a 430$; Pará, de 150$0 a 350$0; Paraná, de 100$0
a 420$0; Pernambuco, de 300$0 a 400$0; Piauí, de 120$0 a 384$0;
Rio Grande do Norte, de 250$0 a 416$0; Rio Grande do Sul, 360$0
a 720$0; Santa Catarina, de130$0 a 375$0; São Paulo, de 240$0 a
900$0; Sergipe, de 205$ a 338$; Território do Acre, de 400$0 a 700$0;
Distrito Federal, de 240$0 a 1: 200$0. Conquanto fossem concedidas
pequenas vantagens aos professores das zonas rurais e dos subúrbios
de difícil acesso, o estudo “Vencimentos do professor primário” (1942)
concluía que o “ordenado mensal do mestre-escola equiparava-se ao
ganho mínimo do mais modesto trabalhador.”

Da apoteose da lei

Nas décadas iniciais do século XX, a matrícula escolar geral nas


unidades federadas apresentava-se contrastada, as causas possíveis
eram as mais diversas; de uma parte, a amplitude da economia de
mercado, o desenvolvimento urbano-industrial e comercial, e a
crescente demanda social favoreciam o incremento da matrícula
geral; de outra parte, a rarefação demográfica e o absenteísmo escolar
engendravam obstáculos a expansão e ao rendimento escolar. Como
era usual, nas vozes expectantes, poderoso reagente químico, o estatuto
da obrigatoriedade escolar promoveria a padronização linguística
pela alfabetização, conhecimento das instituições jurídico-políticas e
fomento das riquezas da nação.
Nas falas diagnósticas, a eficácia da obrigatoriedade estaria
na dependência da abertura e manutenção de vias de comunicação,
serviços de saneamento rural, assistência escolar e auxílio supletivo da
União, em parceria com as iniciativas dos estados e municípios. E, a
272 • Carlos Monarcha

bem dizer, numa espécie de síntese de opiniões, concluía-se pelo ensino


primário como prioridade de Estado, antiga e irrealizada promessa
intermitentemente anunciada pela cultura política da Monarquia e
da República. Se a massa do povo é refratária à instrução, assim se
pensava, era preciso encontrar meios de demovê-la.124
Entre as cabeças esclarecidas, a declaratória de uma lei geral
relativa à obrigatoriedade soa inadiável. Assim o melhor a fazer
é expor o essencial das visões em circulação, no caso as visões de
Antonio de Sampaio Dória, Miguel Couto, Fernando de Azevedo,
Orestes Guimarães e Alberto Conte, homens públicos diferentes
entre si, embora compartilhassem idêntica profissão de fé: à vontade
de servir, acrescia-se a vontade de conduzir pela persuasão ou coerção,
no mais, órgão do poder, o Estado, ao luzir a instrução popular, fiaria
as conquistas civilizacionais.
Em Instrução pelo Estado coaduna-se a instrução primária
obrigatória com os princípios que regem a ação social do Estado?,
dissertação apresentada em concurso de ingresso na cátedra de Direito
Constitucional da Faculdade de Direito de São Paulo, Sampaio Dória
retoma a trilogia clássica da ação jurídico-social do Estado, a saber,
a defesa do país, no caso de agressões externas, a manutenção da
segurança interna no caso de desordem civil e, por fim, a distribuição
de justiça entre querelantes em dissídios individuais e coletivos. No
seu pensar, tal trilogia carecia de atualização. “Na mesma missão de
distribuir a justiça e manter a ordem, não se inclui, acaso, o assegurar
as condições que previnem as graves iniquidades?” (Sampaio Dória,
1922, p.52). Argumentativo, posiciona-se pela obrigatoriedade escolar
dos 7 aos 14 anos com vistas à formação mental e ao disciplinamento
da vontade coletiva, ações necessárias aos “povos em menoridade de
civilização”. “O povo não pode ser composto de imbecis, de ignorantes,
de indiferentes à democracia, em povos analfabetos é o despenhadeiro
para a demagogia. Mil vezes uma autocracia hábil à onipotência da
plebe sem cultura” (Sampaio Dória, 1922, p.100).

124
Cf. Apêndice A – Tabela I.
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 273

1º A instrução primária obrigatória é a mais fértil sementeira da


riqueza pública, que a ação social do Estado promove;
2º A instrução primária obrigatória é o mais sábio preventivo pela
ordem pública, cuja mantença é ação jurídica do Estado;
3º A instrução primária obrigatória não só se concilia com os
princípios que regem a ação social do Estado, mas é a ação social mais
característica;
4º A instrução primária, por fim, posto não privativa do Estado,
mas dever supletivo da insuficiência particular, é a condição primeira
da democracia íntegra e pura. A democracia não vinga senão nos povos
instruídos (Sampaio Dória, 1922, p.100).

O chamamento final assemelha-se ao de um herdeiro do


entendimento iluminista. “A instrução é o gênio misterioso, que
conduz os povos à independência, à liberdade e à riqueza.”
República adentrada em manifestação em nome da Academia
Brasileira de Letras, Miguel Couto, afamado médico sanitarista,
manifestava-se em termos da economia política: o homem é a
primeira riqueza da nação e o mais rendoso emprego do capital. “I
– É compulsória a educação elementar, obrigados os pais e irmãos
mais velhos a ministrá-la aos seus filhos ou irmãos mais moços e os
governos aos desamparados. II – Vinte por cento, pelo menos, das
rendas dos municípios dos estados e da União destinam-se à educação
elementar do povo (A reforma da Constituição..., 1925, p.159-160)”.
Manifestação subscrita por personalidades notórias, Amadeu Amaral,
Afrânio Peixoto, Athaulfo de Paiva, Coelho Neto, Constâncio Alves,
Dantas Barreto e Goulart de Andrade.
Noutro lugar e noutra circunstância mais exatamente em
“A educação nos sertões” Miguel Couto carregaria ainda mais nas
soluções radicais.

A União penetrará pelo interior do Brasil, onde é sempre recebida


quando portadora do bem, – para fundar escolas em todas as aldeias e
274 • Carlos Monarcha

aldeolas, vilas e viletas, lugarejos e estações de ferro com uma população


escolar de 40 crianças no âmbito de dois quilômetros e construirá
grandes Institutos, em número variável em cada Estado, onde serão
internadas sob a tutela do governo todas as crianças domiciliadas em
lugares não servidos por escolas (Couto, 1937, p.153).

Marco documentário no rol dos debates fantasmáticos respeitantes


aos “perigos da desnacionalização” representados pelos núcleos de
colonização estrangeira, Orestes Guimarães em Sugestões sobre a educação
popular no Brasil encaminha ao ministro da Justiça e Negócios Interiores
medidas de erradicação da desordem didática nas escolas rurais, isoladas
ou singulares, dentre as sugestões, a obrigatoriedade escolar entre 9 e 11
anos para crianças residentes num raio de três quilômetros da escola.

1ª – evitará o possível congestionamento ou excesso de lotação


das escolas, o que trará grande benefício à eficiência do ensino, sem
prejudicar aos menores de oito anos;
2ª – assegurará melhor a regularidade da frequência. Nas zonas
rurais, devido à disseminação das suas populações, à distância das
escolas, aos maus caminhos, as crianças menores de nove anos não são,
nem podem ser assíduas (Guimarães, 1924, p.108-109).

Para esse inspetor federal das Escolas Subvencionadas, após


os cinco primeiros anos, contados da instalação duma escola, a
obrigatoriedade se estenderia às crianças de 12 a 15 anos.

Há pais, tutores e protetores de crianças, sobretudo estes últimos,


que descuram por completo, da alimentação de seus filhos, tutelados
ou protegidos. Uns, por se levantarem tarde, outros, por desleixo,
outros, finalmente, por inconcebível maldade, mandam as crianças
à escola, sem lhes darem um pedaço de pão, queijo ou carne. Milhares
de crianças permanecem cinco horas nas escolas, sem a mais ligeira
refeição! (Guimarães, 1924, p.123, grifo do autor).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 275

Posição não menos original concerne a Fernando de Azevedo,


em “O Estado e a educação”, intervenção na 5ª Conferência Nacional
de Educação, antevéspera da Assembleia Geral Constituinte. Para
escudar tese doutrinária, recorre a Durkheim e a Dewey; em sua
evolução, o Estado acata as ideias condizentes com as mutações sociais
e políticas da vida moderna. No seu entender, a “função educacional”
implicava a reordenação das relações entre escola e sociedade de modo
a converter a “competição estéril dos grupos” em harmonia social. Em
síntese construtiva, predizia o dever ser do Estado moderno como
instituição mediadora de interesses múltiplos e coletivos, conquanto
competitivos entre si.
Por fim, a visão radical de Alberto Conte: igualmente ao
seu quase homônimo, Augusto Comte, ele não é democrata nem
socialista, liberal ou iliberal, é um homem da ordem e do progresso.
Em “Estado e educação: necessidade de uma ditadura educacional
e de um novo sentido da educação popular”, artigo doutrinário
igualmente veiculado às vésperas da Assembleia Constituinte de
1934, seguro de si, esse professor tomava partido pela “ditadura
republicana” – governo de salvação social em nome e interesse do
povo, nos moldes filosóficos de Augusto Comte. (Aqui o melhor a
fazer é dar a palavra a José Maria, historiador das coisas brasileiras.
“A autoridade moralizante do comtismo erige a República ditatorial
em forma perfeita do Estado”) (Bello, 1940, p.31). Ao alardear a
necessidade urgente de clarear a consciência coletiva, Alberto Conte
pintava e repintava um quadro sombrio.

Pois bem, o Estado devia assumir essa delicada e importantíssima


tarefa de educar, comme il faut, o povo, não só no sentido de alfabetizá-
lo e dar a uma parte dele instrução secundária, profissional secundária
e superior, mas no sentido de fazer de todo esse povo um povo de
mentalidade alta, despindo-os das superstições, das fraquezas e
temores místicos exagerados que o tornam um joguete nas mãos dos
espertalhões e de perigoso instrumento contra o próprio Estado.
276 • Carlos Monarcha

E se para levar a cabo essa tarefa o Estado tiver que usar de poder
discricionário, justificar-se-ia uma ditadura educacional cuja duração
tem de ser pelo menos de 20 anos, ou seja, o tempo indispensável
para poder-se arrancar o povo mistificado e sempre pronto a defender
os seus próprios exploradores, das garras desses seculares exploradores
(Conte, 1934, p.6, grifo do autor).

E, ao expressar intolerância com a incultura popular, Alberto


Conte reclama o pleno exercício da autoridade pública, recurso
prático de proteção contra as estultices de si e dos outros de sorte
a evitar a fatalidade das ações incompreensíveis fossem individuais
fossem coletivas.
Quanto ao memorável A reconstrução educacional no Brasil, ao Povo
e ao Governo: Manifesto dos Pioneiros da “Educação Nova” (1932), os
signatários ao pleitearem a educação como “direito biológico” da pessoa
endossavam a trilogia clássica, laicidade, gratuidade, obrigatoriedade.
No plano jurídico-formal, o desfecho das antiquíssimas demandas
viria com a Carta Política de 1934, na qual se abre um capítulo para a
educação e cultura nos moldes da Constituição de Weimar, 1919.

Artigo 150 – Parágrafo único:


a) Ensino primário integral e de frequência obrigatória, extensivo
aos adultos;
b) Tendência à gratuidade do ensino educativo ulterior ao primário
a fim de o tornar mais acessível;
Artigo 156 – A União e os Municípios aplicarão nunca menos
de dez por centro e os Estados e o Distrito Federal nunca menos de
vinte por cento da renda resultante dos impostos na manutenção e no
desenvolvimento dos sistemas educativos.
Parágrafo único – Para a realização do ensino nas zonas rurais, a
União reservará, no mínimo vinte por cento das quotas destinadas à
educação no respectivo orçamento (Brasil, 1934, art. 150, 156).
277

Segundo o texto constitucional, da União emanariam as diretrizes


da educação nacional e, em conjunto com os estados, difundiria
a instrução pública em todos os seus graus. Paixão fundamental e
irremovível, velho e antigo marco cravado no tempo da história e da
cultura política nacionais, o ensino elementar obrigatório e de Estado
concretizava-se no plano jurídico-formal, contudo, se a lei é dura como
pode ser visto em minúcias nos mais diferentes dispositivos legais e
elucubrações pessoais, por muito tempo a prática da obrigatoriedade
permanecerá in vacuo.
279

Marcha territorial

Dissolvido o Congresso Nacional, incremento de força política


num momento tempestuoso, o Estado Novo reforça a centralização
e a intervenção do poder federal na política, sociedade, economia,
educação e cultura. Simultaneamente coloca em andamento um plano
de integração antropogeográfica. O fenômeno unificador principiara
em 1936, com a decretação da obrigatoriedade de execução do Hino
Nacional em estabelecimentos de ensino, associações desportivas e de
radiodifusão, e prosseguira ao extinguir os partidos políticos, hinos,
pavilhões e escudos estaduais e municipais. Conforme a Constituição
de 10 de novembro 1937.

Art. 1º – O Brasil é uma República. O poder político emana do


povo e é exercido em nome dele e no interesse do seu bem-estar, da sua
honra, da sua independência e da sua prosperidade.
Art. 2º – A bandeira, o hino, o escudo e as armas nacionais são de
uso obrigatório em todo o País. Não haverá outras bandeiras, hinos,
escudos e armas. A lei regulará o uso dos símbolos nacionais.

Distrito Federal, praia do Russel. Sob um céu azul, ocorre


cativante simulacro, ombreando propósitos comuns, Getúlio, ministros
de Estado, corpo diplomático, alta hierarquia da Igreja Católica; por
todos os lados aglomeram-se multidões, à frente dos desfiles, colunas
de escolares e normalistas. Sinalizando uma só alma, mil mãos agitam
280 • Carlos Monarcha

bandeirolas. A emoldurar os monumentais altares da Igreja e da


Pátria, em mastros enfileirados drapejam as 22 bandeiras estaduais.
Concentrado em si, D. Sebastião Leme celebra a missa campal.
Inaudito ritual encerra o ato cênico, isto é, a cremação das bandeiras
estaduais, logo em seguida substituídas por 22 réplicas de um mesmo
pavilhão, uno e protetor, a Bandeira do Brasil.
Cenográfico, o ato coletivo sobredoura a unidade-unitária
da Pátria, em aparência, assim pensava-se representar a nação, suas
gentes, seu governo (contudo, antes de ser um tecido de ideias, valores
e símbolos a revestir o corpo da pátria, o nacionalismo estadonovista
exterioriza imperativos objetivos). Seja como for, soberbas, tais
encenações de antifederalismo, hoje fantasmagorias de uma história
passada, simbolizam a supremacia do corpo orgânico da pátria sobre as
“pequenas pátrias”, melhor, o fim dos regionalismos desagregadores, ou
seja, o estadualismo vigente, relíquias de um federalismo dito estiolado.
Nas vontades de reforma envolvidas na racionalização das práticas de
governo, todo impulso vital emanaria de um centro diretor, órgão de
comando previdente e provedor, acima de tudo, neutralizador da ação
centrífuga dos regionalismos. Modernizar pela ação do Estado é o
credo abastecedor dos sujeitos às voltas com projeções construtivas
de futuros. Em suma, com a queima das bandeiras estaduais, quer-se
assinalar o advento de uma nova idade na história nacional, passagem
mediada pela substituição da força pelo consenso; numa palavra,
totalizar uma direção geral para a sociedade conforme ideias, valores e
significações comuns.
Grandes iniciados, Getúlio e ideólogos do Estado Novo, novo por
ser autêntico, quer dizer, distinto das “ideologias exóticas e dissolventes”,
liberalismo, socialismo, integralismo, comunismo, segundo os discursos
e as doutrinas oficiais, destilavam o ímpeto de infundir comunhão
espiritual das orlas do Atlântico às funduras do Planalto Central.
Encampada como programa oficial, a escalada de unificação, pela via da
extensão do poder de Estado como realidade jurídico-territorial, duplica
o feixe de poder centralizador. Ou, por outra, a exaltação da unidade
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 281

nacional, como é usual de ser, leva a política a desembocar na mística


unitarista.125 Novamente acionava-se a máquina de formação do sentido
mítico da nacionalidade enquanto comunidade restaurada. Quer dizer,
a construção identitária aciona uma epopeica demanda das origens, por
exemplo, a “marcha para Oeste”, empresa mítico-retórica cujo canto de
partida fora anunciado por Getúlio em discurso radiofônico na noite de
31 de dezembro de 1937.

Caminhamos para a unidade, marchamos para o centro, não


pela força de preconceitos doutrinários, mas pelo fatalismo de nossa
definição racial. O verdadeiro sentido de brasilidade é a Marcha para
Oeste. No século XVIII de lá jorrou a caudal de ouro que transbordou
na Europa e fez da América o continente das cobiças e tentativas
aventurosas (Vargas, 1938, p.124).

Mito e empolgação da pátria virtual se consubstanciam na


incorporação dos inominados sertões ao circuito encantatório da
civilização do valor de troca. Para os porta-vozes dessa “comunidade
imaginada” em que a sensação pessoal e cultural de pertencer a um
todo vital é sintomática,126 por assim dizer, a marcha para o centro,
nada mais é senão fluxo desimpedido dos fiéis da economia de
mercado. Se ocupação e a urbanização das regiões nordeste, sul e
sudeste estavam consolidadas, diferentemente era a situação de Goiás,
Mato Grosso, Acre, Rondônia, Amazonas, regiões etnolinguísticas
dadas por abandonadas ainda que interconectadas pelas linhas
telegráficas cravadas pela Comissão Rondon. Donde o desatar de
metas contraentrópicas a fim de mobiliar o extenso assoalho nu,
no intento de coincidir as fronteiras terrestres e marítimas com as
fronteiras econômicas, mormente modificar a hierarquia das formas

125
Cf. Girardet (1986). Em Gellner (2008, p.17, grifo do autor). “O
nacionalismo não é o despertar de uma velha força, latente e adormecida,
embora seja assim que de fato se apresenta”.
126
Cf. Anderson (1991, 2007).
282 • Carlos Monarcha

de existência, nas vozes dos portadores de futuros, a unidade nacional


e a unidade política condicionam-se mutuamente. É mais do que antes
concebia-se o Estado como força constitutiva e ordem visível.
No rol das questões excruciantes, de uma parte, a subjunção
do Estado e nação, aprofundamento do poder central, controle das
oligarquias regionais, integração territorial, ativação do mercado de
produção e consumo, expansão das terras agricultáveis, distribuição
e consumo de bens e circulação monetária; de outra, a resolução
de questões sociais e demográficas: esvaziamento de conflitos
entre latifundiários e excedentes de mão de obra, colonização dos
vazios, estancamento da depopulação pela via da assistência rural,
qualificação da mão de obra, instalação de cooperativas de produção
e comercialização. Em síntese, a afirmação da unicidade das classes
produtivas e de pessoas úteis é sobressignificada.
Na retórica de mobilização, as autoridades acenam com
linhas de penetração, comunicações, transportes, serviços sanitários
e escolas.127 E certamente depois das antológicas expedições da
Comissão Rondon, as viagens científicas encetadas pelo Instituto
Oswaldo Cruz, a marcha da Coluna Prestes-Miguel Costa, a
“marcha para o Oeste” assinalaria o quarto marco memorial na
redescoberta do “Brasil real”, tema central da pedagogia histórica da
Era Getuliana. É o que ensinava Getúlio Vargas para crianças, cartilha
de Alfredo Barroso, publicada sob as diretivas do Departamento de
Imprensa e Propaganda (DIP).

“O verdadeiro sentido da brasilidade é a marcha para o Oeste”! –


exclamou, certa vez em discurso, o presidente Getúlio Vargas. Dando
o exemplo ao povo brasileiro, ele mesmo iniciou, em viagem que
passará à nossa história, essa Marcha para Oeste, viajando, em avião
até Goiânia e visitando os pontos mais pitorescos do “Hinterland”
goiano. Os resultados dessa viagem não se fizeram esperar e numerosas
providências estão contribuindo para dar maior vida e maior atividade

127
Cf. Lenharo (1985, 1986).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 283

às regiões ocidentais do Brasil, cuja riqueza sem medida estava


exigindo uma valorização imediata, em benefício total de nosso país
(Barroso, 1942, p.5).

Nacionalismo oficial, propaganda estatal, reescrita historiográfica,


sanitarismo e ensino primário de Estado gratuito e obrigatório
convergem na determinação de promover o enquadramento jurídico-
estatal das populações esquecidas de si e dos outros. Até então
indizível, corrigia-se a geografia pela sua história a favor da empresa
integracionista, a “marcha para Oeste”, nacionalismo unitário e
vontades centralizadoras reencontravam-se. De sorte que, na duração
do Estado Novo, o debate sobre a extensão da escola elementar
em ambientes geográficos e culturais isomorfos é sobressaltado ao
incorporar as questões referidas à demografia, à segurança nacional e
à colonização interna.

A máquina mitológica

O ideólogo da “marcha para o azul” é o poeta verde-amarelo


Cassiano Ricardo, diretor do Departamento Estadual de Imprensa e
Propaganda de São Paulo, o célebre DEIP. Seu ambicioso Marcha para
Oeste: a influência da “bandeira” na formação social e política do Brasil,
1940, estetiza em prosa a ocupação dos vazios, estetização, adensada
por Heitor Villa-Lobos na composição para o canto coral “Marcha
para Oeste”. E, a bem dizer, aqui e ali surgiam obras expressivas da
pulsão marchadora: O Brasil em marcha, de Paula Aquiles; Uma
revolução em marcha, de Leão Machado; O rio Paraná no roteiro da
marcha para o oeste, de Teófilo de Andrade; A marcha para Oeste – Couto
de Magalhães e Getúlio Vargas, de Ildefonso Escobar e Oeste, ensaio sobre
a grande propriedade pastoril, de Nelson Werneck Sodré do qual cito
a seguinte passagem. “Corrigidas pela marcha evolutiva da produção,
as anomalias que se traduzem na instabilidade e na pobreza, o Oeste
assumirá condições bem diversas e poderá estruturar uma fase nova
284 • Carlos Monarcha

no seu desenvolvimento – fase de riqueza e de libertação” (1941, p.4).


Em Cassiano Ricardo, o motivo legendário “expedições
bandeirantes”, uma das míticas narrativas das origens identitárias
da nação, remonta a nascente do país-nação. “Quando entra no
mato a primeira bandeira, termina a história de Portugal e começa
a do Brasil” (p. 229).128 Mediada pela nostalgia das origens heroicas,
na prosa ricardiana, bandeiras e bandeirantismo testemunharam
o entrosamento das cores raciais em soberbas paisagens naturais.
Não é simples reevocação do passado heroico, para ele, Ricardo,
imagem marcializada, as bandeiras do século XVII prefiguravam a
iridescente democracia caldeada por brancos, índios e negros. Profecia
de destino e culto do heroísmo, em si e por si, a marcha simboliza a
origem da nação em devir.129 Noutros termos, providas de valor de
intemporalidade, bandeiras e bandeirantismo da Era Getuliana
assinalam o redescobrimento do povo em sua diversidade.

Ontem, eram os bandeirantes só os que partiram do planalto de


Piratininga seus subfocos de irradiação; hoje são todos quantos tomam
parte na nova marcha destinada a preencher os vazios demográficos,
regiões que pedem “novos bandeirantes equipados de nova técnica”
para o seu melhor aproveitamento econômico e social... as duas
palavras “bandeirismo” e desenvolvimento se justapõem (Ricardo,
1940, p.652).

Na arte político-literária do escritor verde-amarelo, o país


ressurge como exterioridade de imagens cromáticas: o céu de anil, o
verde das florestas, o vermelho do pau-brasil, o amarelo-dourado do
sol. Noutras palavras, a natureza é mais referida do que vista; e não
será demasiado dizer que sob esse Brasil aquarelado, coexistissem a

128
“O espaço físico unificado constitui o lastro empírico sobre o qual os outros
elementos constitutivos da Nação se apoiam: a unidade étnico-cultural, a unidade
econômica, política, o sentimento comum de ser brasileiro” (Lenharo, 1986, p.56).
129
Cf. Esterci (1972).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 285

violência dos conflitos ideológicos e sociais, estremecimentos políticos


e traumas profundos.
No plano aparente da ontologia social do país, a “marcha para o
azul”, marcha real e simbólica em direção às funduras baldias, o planalto
central, reencontraria a quintessência do país e seu povo. Queria-se
defrontar as questões de ordem geral, incorporar o país distante de si e
diferente na mentalidade ao país demográfico e econômico. E do pulsar
marchador, originaram-se os territórios federais, criações justificadas
em nome da segurança de fronteiras externas e povoamento das áreas
vazias. De fato, ao desmembrar porções do Amazonas e Pará, criam-
se os territórios de Guaporé, atual Rondônia, Amapá, Ponta-Porã,
hoje integrado ao Mato Grosso do Sul, Iguaçu e Rio Branco.130 Nesse
desatar de iniciativas reconstrutoras, o “batismo de Goiânia”, nova
capital de Goiás, estala como acontecimento venturoso, mais à frente
ampliado com as iniciativas coordenadas pelo ex-tenente João Alberto,
a Expedição Roncador-Xingu e a Fundação Brasil Central. Até então,
a demografia do país registrava 10 milhões de habitantes nas “cidades
e vilas” e 30 milhões no “campo”.

Festa pública, Goiânia no mapa

Sobejava o sol no firmamento azul, Goiânia rescendia a concreto


fresco e seiva do cerrado, o canteiro de obras é notório, quando, entre
luzes e festas, é inaugurada em 2 de julho de 1942. Planejada para ser
a capital de Goiás, em substituição à colonial Goiás Velha, a “nova
metrópole”, marco avançado da civilização, cuja pedra fundamental
fora relançada em 1933, torna-se realidade sob o impulso de Pedro
Ludovico Teixeira, interventor federal, e do projeto urbanístico
idealizado por Atílio Correia de Lima.
Para tirar partido da perspectiva e monumentalidade, escolhera-
se o art déco, estilo que interpenetra desenho industrial e arquitetura.
Expressão da vontade de ordem, o plano-piloto radioconcêntrico

130
Cf. Guerra (2011).
286 • Carlos Monarcha

organiza a cidade em zonas funcionais, a central abriga o setor


administrativo; a norte, o setor comercial e industrial; a sul, o setor
residencial, praça de esportes, praça central e terrenos reservados à futura
edificação da catedral, palácio arquiepiscopal, centros de educação e
ensino,131 em duas palavras, modernismo tecnocrático e devoração do
cerrado se entrecruzavam. Festejava Pedro Ludovico Teixeira.

A cidade moderna é o repositório de todos os afetos do homem.


Ali tem ele seu lar, sua família, os seus amigos, as reservas para a
sua subsistência e os focos de sua cultura. A cidade moderna educa
e civiliza. É o fator mais valioso para reforçar a homogeneidade das
pátrias (Congresso Brasileiro de Educação, 1944, p.33).

No centro da festa pública, a figura estelar do interventor federal,


saudado “Fundador de Goiânia”, é ladeada por Mario Augusto Teixeira
de Freitas e José Carlos de Macedo Soares, esse presidente do IBGE e
orador oficial dos apelos prometeicos.

O Brasil possui no sentido “imperialista” das bandeiras – essas


grandes forças vivas e móveis a que tanto deve a formação social do país
– o melhor signo para a nova era da sua história, cujo objetivo especial
tem de traduzir-se, como tão bem definiu o próprio Chefe de Estado,
no “reatamento da campanha dos construtores da nacionalidade”, a
fim de sanar os vácuos demográficos do nosso território e fazer com
que as fronteiras econômicas coincidam com as fronteiras políticas
(Congresso Brasileiro de Educação, 1944, p.15).

Cidade de 42 mil habitantes, inaugurada, Goiânia assinalava a


tomada de posse do Brasil central.132 Na voz do secretário-geral do
IBGE, Teixeira de Freitas (1942), o evento evidenciava passo decisivo
na interiorização da capital da República. Expectativa, é bom lembrar,

131
Cf. Azevedo (1941).
132
Cf. Vidal e Souza (2002).
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 287

deflagrada pela Constituição de 1891 e robustecida por Floriano Peixoto


ao nomear o belga Luis Cruls, diretor do Observatório Astronômico
do Rio de Janeiro, para liderar a comissão exploradora do Planalto
Central a fim de demarcar o quadrilátero de terras apalavrado pela
Constituição. O “Quadrilátero Cruls”, como ficara conhecido, passa
a constar no Pequeno Atlas do Brasil publicado no ano de lançamento
da pedra fundamental da futura capital da República, 1922. Ainda
que temporariamente Goiânia sedia a comunhão nacional, e, como a
cavalgar um promontório, o interventor federal precipitava o olhar do
centro às extremidades do país.

Saúdo a Amazônia, tão cheia de mistérios e tão rica de promessas;


as terras dos palmares babaçuais esplêndidos do Parnaíba longínquo.
Saúdo o nordeste, de atitudes heróicas e fecundas ante as durezas do
clima que o flagela; os Estados do leste de riquezas tão numerosas e
de um labor tão intenso em benefício da economia nacional. Saúdo
as terras dos vales históricos do Paraíba e do Tietê, onde vicejam os
cafezais, os algodoais e tantas outras riquezas; as regiões admiráveis
dos pinheirais paranaenses e catarinenses.
Saúdo os pampas do sul, berço de heróis, celeiro do Brasil; as terras
que, a leste e a oeste de Goiás, com ele se irmanaram na grandeza
das suas glebas, na variedade dos seus produtos e no labor intrépido
dos seus filhos. Saúdo o Brasil todo, símbolo da pujança, dignidade e
elevação moral (Congresso Brasileiro de Educação, 1944, p.58).

Verdadeira imersão batismal, a inauguração da cidade radiosa


soa simultaneamente como farol a iluminar as escuridões fechadas
e centro propulsor das forças civilizadoras no desconhecido (quer
dizer, a exteriorização da consciência da territorialidade da pátria,
assinala material e imaginariamente a posse do país interior).
Em poucas palavras, o espetáculo proporcionado pela Goiânia
inaugurada é a metonímia do país em seu devir uno, coeso, vibrátil,
progressivo, civilizador.
288 • Carlos Monarcha

Em 1942, Getúlio assinava o Decreto-lei nº 4.092, autorizando


as cerimônias cívicas concernentes ao feito admirável. Sujeitos da
inteligência técnica fraternizados numa comunidade de visões
encenam um espetáculo de colorido leve, agradável e formalmente
provido de consistência, conquanto rigorosamente político-
ideológico na essência. Encadeado num mesmo laço ontológico,
acontecem o 8º Congresso Brasileiro de Educação promovido
pela ABE, a 2ª Exposição Nacional de Educação, Cartografia e
Estatística, as assembleias gerais dos conselhos nacionais de
Estatística e Geografia e a Semana Ruralista patrocinada pelo
ministério da Agricultura.
Na exhibitio desbravadora, os estandes dos ministérios e
repartições oficiais, as maquetes dos edifícios da Imprensa Nacional,
do Instituto Médico Legal e do Serviço de Alimentação e Previdência
Social, os projetos arquitetônicos de estabelecimentos penais e
educacionais, os quadros murais ilustrativos da riqueza mineral,
potência agrícola e pastoril, estatísticas escolares, livros didáticos e
materiais de ensino. Os estandes de São Paulo e do Rio Grande do
Sul monopolizam as atenções: fotos de cenas escolares, títulos da
Livraria Globo, panorâmicas das escolas técnicas e profissionais; o
estande do Paraná, idem, com estatísticas e fotos escolares, depois,
painéis e impressos das ligas Brasileira de Higiene Mental e
Esperantista Brasileira.
Na monotonia e rusticidade do planalto do Brasil central, sucessão
de personalidades notórias e eventos propiciatórios. Sobrecarregada
de atrativos, a 2ª Exposição Nacional de Educação, Cartografia e
Estatística expõe inéditos conhecimentos, a Carta geográfica do Brasil,
na escala de 1: 500 000, o Vocabulário geográfico de Goiás, a Bibliografia
geográfica e cartográfica do Estado de Goiás. Em palavras mais diretas,
predominava a vontade de mostrar e contar homens e coisas, seres e
artefatos, redirecionar fenômenos coletivos, penetrar na essencialidade
das coisas, reconstruir realidades.
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 289

Escolarizar os vazios da nação

Com o apoio do IBGE e poderes públicos, realiza-se o 8º


Congresso Brasileiro de Educação, presidido por José Augusto Bezerra
de Medeiros. Em cartas, circulares, cartazes, notas de publicidade,
palestras radiofônicas, IBGE, Inep e DIP divulgam o evento país afora.
Ao referir-se aos congressos abeanos até então realizados, Teixeira de
Freitas penitenciava-se. “De tais Congressos, só três tiveram por sede
cidades interiores – Belo Horizonte, São Paulo e Curitiba”.

Nenhum deles, portanto, deu lugar a um contato íntimo dos


nossos educadores com os aspectos particularíssimos e genuinamente
brasileiros de nossa vida sertaneja, daquela vida apagada, morosa,
retardada que se vive em mais de 80% do território nacional. Vida
essa que, no seu rudimentarismo, nos seus desajustamentos, no seu
abandono, na inexistência ou na precariedade dos seus elementos de
civilização e de cultura, propõe aos dirigentes do país em geral, e aos
educadores em particular, os mais complexos, os mais sérios, os mais
angustiantes problemas. Problemas de cuja urgente e aceitada solução
depende a sobrevivência da Nação através dos tempestuosos tempos
que a humanidade está vivendo (Teixeira de Freitas, 1942, p.381).

Congresso e congressistas viriam a ser um marco memorioso na


legitimação da empresa integracionista, amplo, o temário sindicava
a adaptação da escola elementar aos ambientes diversos. No intuito
de produzir consciência social educativa e professores aptos a
redirecionarem mentalidades ditas tradicionais, os delegados debatem
as teses relativas a práxis didática a ser acionada em regiões afastadas.
E, ao jurarem o trabalho qualificado em código social, congresso e
congressistas validavam a escola de trabalho e a atividade profissional.
Nas vozes, a escola rural reaparece como peça central na aventura de
ocupação de lugares viventes em formidáveis silêncios, estimulada
a tese do “desafogo das grandes cidades” desdobra o fôlego. Em
290 • Carlos Monarcha

demonstração de unidade, aglomeram-se as “forças morais e culturais


do Brasil” para elaborarem as bases antropossociológicas da escola
regional. Possuído por uma visão de esplendores, solene o padre José
Bruno Teixeira, diretor do Departamento de Educação do Ceará,
anuncia a emancipação do homem rural. “É, portanto a nossa hora, a
hora do Brasil.”

A hora de fazermos surgir a verdadeira civilização brasileira, mas


sobretudo a civilização do sertão, a civilização do Oeste, paralela à
civilização litorânea e completando-a, para integrar a grandeza da
Pátria. É a civilização do sertanejo e do caboclo, sadio e instruído,
robusto de corpo e forte de espírito, iluminado pelos clarões da Fé e
abrasado pelos ardores do patriotismo, embora continue de “alpercatas
e chapéu de couro”, na faina sagrada do labor cotidiano, desfraldando
uma bandeira que é a própria bandeira do Brasil (Teixeira, 1944, p.15).

Atividade intelectual e política-ideológica se fundem. Ao lado dos


professores, as novas identidades profissionais em evidência, demógrafos,
estatísticos, sanitaristas, técnicos em educação, sociólogos, geógrafos
e psicólogos. Unidos na empresa de interiorização das estruturas
civilizacionais, comparecem os mais diversos intermediários do presente
histórico. No face a face, na Comissão de Honra, o presidente da
República, Interventor Federal em Goiás, ministros de Estado. Na
Comissão Patrocinadora Nacional, interventores federais, governador
do Acre, cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro, inspetor-geral do ensino
do Exército, diretores do Ensino Naval, da Escola de Aeronáutica, dos
departamentos de Educação, de Rodagem e da Criança, dos institutos de
Cinema Educativo e de Agronomia, do Conselho Nacional de Imprensa,
da Escola Nacional de Educação Física. Mais além, presidentes do
IBGE, Associação Brasileira de Imprensa, Cruzada Nacional de
Educação, Comissão Censitária Nacional, por último o comandante da
2ª Região Militar, secretário de Educação e Cultura do Distrito Federal
e reitores das universidades do Brasil e Católica.
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 291

Na Comissão Organizadora Nacional, o grande Cândido


Mariano Rondon, Fernando de Azevedo, Fernando de Magalhães,
José Getúlio Frota-Pessoa, Branca Fialho, Gustavo Lessa, Levi
Carneiro, Odilon Braga, Sud Mennucci. Na Executiva, Artur Torres
Filho, Celso Kelly, Francisco Venancio Filho, Jonathas Serrano, José
Augusto, Juraci Silveira, Lourival Fontes, Lourenço Filho e Otávio
Tomaz Newland Neto.
Igualmente presentes, as personalidades notórias de Antonio de
Almeida Júnior, Celina Padilha, Dom Amaro van Emelen, Gervásio
Leite, Helena Antipoff, Joaquim Moreira de Sousa, Jacir Maia, Mário
Pinto Serva, Noêmia Saraiva de Matos Cruz, Ulysses Pernambucano
e Maurício Vinhas de Queiroz.
Global e minudente, o tema geral do congresso – “A educação
primária fundamental: objetivos e organização; (a) nas pequenas
cidades e vilas do interior; (b) na zona rural comum; (c) nas zonas
rurais de imigração; e (d) nas zonas rurais de alto sertão” – sinaliza uma
urgência, a extensão da escola para além dos centros urbanos.
Aladas pela ventania de vozes promissoras, exorbitam-se
imagens saneadoras. “Nas zonas de alto sertão as escolas deverão
aproximar as populações primitivas, bem como os remanescentes
indígenas, dos círculos sociais civilizados, dando um sentido de culto
nacional às manifestações de arte popular” (Congresso Brasileiro de
Educação, 1944, p.89).
Complementando o tema geral, uma macedônia de temas
especiais: “O provimento de escolas para toda a população em
idade escolar e de escolas especiais para analfabetos em idade não
escolar; o problema da obrigatoriedade”, “Tipos de prédios para
escolas primárias e padrões de aparelhamento escolar, consideradas
as peculiaridades regionais”, “O professor primário das zonas rurais:
formação, aperfeiçoamento, remuneração assistência”, “A frequência
regular à escola: o problema da deserção escolar, assistência aos alunos,
transporte, internatos e semi-internatos”, “Encaminhamento dos
alunos que deixam a escola primária para escolas de nível mais alto
292 • Carlos Monarcha

ou para o trabalho”, “O rendimento do trabalho escolar: o problema


das medidas”, “As missões culturais como instrumento de penetração
cultural”, “As colônias-escolas como recurso para a colonização
intensiva das zonas de população rarefeita ou desajustada”, “A
coordenação dos esforços e recursos da União, dos estados e municípios
e das instituições particulares, em matéria de ensino primário”.
Acatadas por maioria, as decisões vão à plenária. Raul Bittencourt
relata as conclusões do tema geral: a educação primária teria por
finalidades desenvolver a personalidade (objetivo individual), integrar
o educando na sociedade brasileira em geral (objetivo nacionalista);
formar o sentimento de solidariedade humana (objetivo humano),
ajustar o educando ao ambiente regional (objetivo vocacional).
As leis reguladoras do ensino primário indicariam os meios e as
normas de organização escolar conforme as regiões. Além da educação
visando à uniformidade cultural mínima, as escolas atenderiam aos
propósitos regionais, quer sob a forma de educação sanitária, quer sob a
forma de ensino pré-vocacional. Nas zonas de imigração a substituição
das “escolas estrangeiras” por escolas nacionais para o ensino de
português, geografia e história pátria, educação cívica e celebração das
datas nacionais.
No alto sertão, a solução do problema educacional demandaria
vias de comunicação para unir as regiões distantes com os “núcleos
de maior densidade demográfica e de civilização já sensível”;
aprovisionamento das escolas com jornais, cinemas, rádios, bibliotecas
ambulantes e associações; planificação precedida de inquérito das
condições geográficas, demológicas e culturais da região considerada.
E, ao invocarem solidez sociológica, congresso e congressistas
determinavam o lugar da escola no âmbito do projeto estratégico
de melhoramentos pela via da mudança cultural provocada. Nas
palavras diagnósticas do mato-grossense, Gervásio Leite. “A instrução
primária na zona rural, por isso, necessita, sobretudo de equilíbrio, de
ser, primordialmente, fator de valorização do homem em função do
meio em que vive, fazendo do Jeca-Tatu, essa indiferença acocorada,
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 293

um elemento enérgico, ativo no enriquecimento nacional” (Congresso


Brasileiro de Educação, 1944, p.135). Ou como esclarece um certo
Francisco L. Azevedo na tese “As ‘colônias-escolas’ como recurso para
a colonização das zonas de população rarefeita ou desajustada.”

Nas regiões de rarefação demográfica, a falta de contato entre


os elementos seus componentes, provoca o fenômeno social de
estacionamento, do qual decorre, com o passar do tempo, a formação
dos grupos arcaicos que, agindo isoladamente, enfraquecendo-
se por degenerescências físicas ou mentais, tendem a desaparecer
ou permanecer num estado em que constituem peso morto para a
sociedade (Congresso Brasileiro de Educação, 1944, p.553).

No tumultuado fertilizador, congresso e congressistas em uníssono


sancionam o anexim: “Educar é mais do que alfabetizar, é preparar
para o meio.” A percepção esclarecida apregoa soluções condizentes
com os meios geográficos, antropológicos e culturais, concordantes
com finalidades práticas: granjas escolares, internatos rurais, clubes de
trabalho, semanas ruralistas, assistência técnica, sanitária, formação
do professorado rural. E, para radicar as massas humanas em solos e
climas da hinterlândia pré-moderna, essa mesma percepção propugna a
reforma do regime de propriedade agrária, fomento da produção, crédito
agrícola, comunicações, transportes, alfabetização de jovens e adultos,
missões de assistência técnica e cultural, abrasileiramento das “escolas
estrangeiras”, unidade intelectual e moral pelo ensino obrigatório.
Raciocinava-se, ao envolver as populações na soberania
nacional, a educação elementar transcenderia as culturas tradicionais
e os limites comunitários pela ação social da escola, assim o centro
civilizacional atingiria os territórios culturais pré-modernos, nos
quais, dizia-se, remanesciam formas antigas de sentir e pensar, viver
e produzir, e sobremodo relações arcaicas entre o homem, a terra e o
trabalho. Tudo isso porque tanto a economia de mercado e as trocas
competitivas quanto a democracia social e a representação popular
294 • Carlos Monarcha

seriam incompatíveis com a desculturação geral. Do até agora exposto,


resta a seguinte impressão: congresso e congressistas viam-se como
artífices da Pátria Nova... mais do que fundar, refundavam... mais do
que construir, reconstruíam...

Ente fundamental, o professor rural

Coube a Sud Mennucci, sociólogo tarimbado em matéria de


instrução popular e aplaudido teórico do agrocentrismo, relatar o tema
“O professor primário das zonas rurais: formação, aperfeiçoamento,
remuneração e assistência”. No relatório, ele revalidava o argumento
vital de Alberto Torres, transplantada para o interior, campo e sertão, a
escola urbana e sua cultura concretizavam-se como norma invertida ao
ofertar uma educação negativa.

A escola rural não pensa nisso, é livresca e pedante, e não se lembra


de que essa população brasileira só terá oportunidade – quando a tem
– de receber a educação ministrada nas escolas primárias. E como
essa população terá de viver de seus braços, em fainas manuais, que
não podem deixar de ser as que o meio ambiente consente e permite,
a única maneira de adquirir hábitos de trabalho e conhecimentos
para fazê-lo produtivo, será preciso dar à escola primária a feição
especializada que consiga valorizar o homem como fator de progresso,
pelo aproveitamento de suas energias, conduzidas e disciplinadas com
o espírito racional (Mennucci, 1944b, p.290).

Para o relator, mais do que antes, o ensino rural adquiria


nítida função sociocultural ao integrar-se no formidável afresco
antropogeográfico constituído pelos seringais amazônicos, várzeas
pastoris, planaltos paulistas, encostas vinhateiras gaúchas, canaviais
pernambucanos, caatingas cearenses, campos goianos, encostas
capixabas e serras catarinenses. Solidários à produção de bens e riquezas,
os aparelhos educativos em ambientes agrícolas, pastoris, marítimos e
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 295

ribeirinhos teriam inequívoco caráter profissional e de formação de


hábitos mentais. A contrapelo da visão de mundo industrializante, Sud
revalidava antiga profissão de fé fisiocrata.

Sem a cultura da gleba, e, portanto, sem o trabalho do homem da


roça, o planeta seria um deserto. É inútil que a indústria progrida e se
aperfeiçoe e obtenha graus de rendimento fora de todos os limites: ela
será sempre satélite da terra. Sem que esta lhe proporcione a matéria-
prima, que só se arranca do campo, pela agricultura, a indústria não
poderia subsistir (Mennucci, 1944b, p.295).

Construtor imaginativo projetava, face às dificuldades materiais,


o professorado rural ganharia mais que o urbano, seria assistido pelas
autoridades pedagógicas, sanitárias e agrícolas, o Estado organizaria
cooperativas de serviços odontológicos, farmacêuticos e médicos,
além de ofertar melhoramentos “que são o conforto da cidade”, rádio,
telefone, luz elétrica, cinema, jornais, revistas e bibliotecas circulantes.
Esperançoso senão confiante encerrava o relatório com uma moção
política conforme o “espírito do Estado Novo”.

Sua Excelência, o Senhor Presidente da República, que traçou


o programa magnífico do “rumo ao Oeste”, como retorno à marcha
tradicional do povo brasileiro, e que se revelou admirável ruralista no
celebrado discurso da Bahia, de agosto de 1933, sente as necessidades
do homem da terra.
É, pois, para ele, para esse grande guia da nacionalidade, que desejo
se faça um apelo no sentido de que, comemorando esta expressiva e
significativa inauguração da cidade de Goiânia, no coração do Brasil,
funde e mande instalar, desde já, uma escola normal rural, em cada
estado e território da Nação, as quais, atendendo às peculiaridades
regionais, hão de coroar a obra da grande transformação que Getúlio
Vargas está operando em nossa Pátria (Mennucci, 1944b, p.300).
296 • Carlos Monarcha

Com essa apoteose do professorado e da escola rural, a rigor uma


carta enviada ao futuro da nação e da nacionalidade, Sud finalizava
seu relatório. Convertidas em paradigma da razão agrocêntrica e da
ética de restituição de direitos usurpados do campo, a contraofensiva
congressual oficializava o modo de dizer e o modo de fazer ensino rural.
Legitimada e institucionalizada, a empresa de ocupação dos vazios,
acentuava os efeitos civilizatórios da escola (e da instrução) condizentes
com os meios geográficos e culturais.
Sob a proteção de Ceres, congresso e congressistas lavram
uma norma comum, a potencialização máxima da seiva do país e da
força de suas gentes. Por paradoxo, não será demasiado dizer que,
ao demandarem infraestrutura de serviços, obras públicas, estradas,
comunicações, hospitais, escolas profissionais, por assim dizer, os
melhoramentos citadinos, congresso e congressistas decidiam-se pela
urbanização do interior, campo e sertão. Fácies primitivas da vida
vivida no Brasil, o povo na sua diversidade – índios, caboclos, cafuzos,
mulatos, sertanejos, caipiras, caiçaras, curibocas, matutos, tabaréus,
vaqueiros, seringueiros, lavradores, pescadores, mestiços, pretos,
paroaras, populações arcaicas de um Brasil arcaico, ora à mercê do
nomadismo ora insulado na inanidade dos tempos ora ainda ermado
em trabalhos e dias antigos que escapavam à história e geografia, era
chamado à nova grandeza nacional.

O essencial dedutível

E como dito e redito nos capítulos anteriores, assemelhada


a uma estrutura profunda, melhor, marco de esperança cravado em
presentes passados e desejados futuros, incólume, a confiança no
halo da instrução, atravessa as temporalidades das formas políticas
e suas instituições. Entre o desatar da pátria monárquica e da pátria
republicana, entre paixões desconcertantes, interesses litigiosos,
devoções ardentes, projeções utópicas, e condenações de descasos, o
mapa da cultura política das épocas de formação de um país quase-
V. Do imediato pós-30 à mitologia do Estado Novo • 297

continente, ritualiza na ordem das certezas, a instrução popular como


sumo civilizatório, fonte de melhoramento material, fator de concórdia
coletiva. Com efeito, nas vozes dos sujeitos às voltas com a efetuação
de cortes histórico-culturais, a instrução popular surge e ressurge
como moto-contínuo das relações sociais (e de produção) e, por
desdobramento, concludente morigeração de normas, valores, crenças
e atitudes. Em contraposição a malformação do corpo coletivo, para
um país mais verdadeiro e lídimo, receitava-se o letramento geral. Sob
o ardor dilatado de um céu estelar ou sob a luz de um intenso meio-
dia, diferentes sujeitos sociais, em diferentes lugares, com diferentes
propósitos, irmanavam-se numa mesma razão discursiva, conquanto
cada qual conforme sua visão do mundo, cada qual com sua concepção
de processos de vida social, cada qual com sua voz esclarecida.
299

Fontes e bibliografia

Fontes impressas

I) Periódicos

A Escola Pública, São Paulo


Educação, órgão da Diretoria de Ensino, São Paulo
Revista Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro
Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Rio de Janeiro
Revista de Ensino, órgão da Associação Beneficente do Professorado Público
de São Paulo
Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro
Revista Nacional, São Paulo
Revista Pedagógica, Rio de Janeiro
O Estado de S. Paulo
Diário Popular, São Paulo

II) Leis, decretos, regulamentos e regimentos

BRASIL. Constituições do Brasil: 1824, Ato Adicional, 1891, Reforma de 1926,


1934 e 1937; e leis constitucionais posteriores. São Paulo: Cristo-Rei, 1944.
BRASIL. Constituição. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil.
Rio de Janeiro, 16 jul. 1934.
BRASIL. Constituição. Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Ja-
neiro, 10 nov. 1937.
300

BRASIL. Decreto nº 1.331-A, de 17 de fevereiro de 1854. Aprova o Regulamen-


to para a reforma do ensino primário e secundário do Município da Corte.
Coleção de Leis do Império do Brasil, Palácio do Rio de Janeiro, v.1, pt.1,
p.45, 17 fev. 1854.
BRASIL. Decreto-lei nº 7.247, de 19 de abril de 1879. Reforma do ensino pri-
mário, secundário e superior no município da Corte em todo o Império. Rio
de Janeiro, 1879. Coleção das leis do Império do Brasil.
BRASIL. Decretos do Governo Provisório da República dos Estados Unidos do
Brasil. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890.
BRASIL. Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Notícia histórica dos
serviços, instituições e estabelecimentos pertencentes a esta repartição elaborada por
ordem do respectivo ministro Dr. Amaro Cavalcanti. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1898a.
ESPÍRITO SANTO. Regulamento geral da instrução pública da Província do
Espírito Santo. Vitória: Tipografia do Horizonte, 1882.
MATO GROSSO. Regulamento da instrução pública primária. Cuiabá: Tipo-
grafia Oficial, 1910.
PARÁ. Direção Geral da Instrução Pública do Estado do Pará. Ensino pri-
mário. Regulamento, programa, horário, instruções pedagógicas. Pará: Ed. Tavares
Cardoso, 1890.
SÃO PAULO. Código de Instrução Pública da Província de São Paulo. Organi-
zado pela comissão composta dos Srs. Dr. Antonio Joaquim Ribas, Dr. João
Dabney de Avellar Brotero e Dr. Diogo de Mendonça Pinto. São Paulo: Tipo-
grafia 2 de Dezembro, de Antonio Louzada Antunes, 1857.
SÃO PAULO. Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Decreto nº 27, de
12 de março de 1890. Estabelece a Escola Normal e converte em Escolas Mode-
los as Escolas anexas. Palácio do Governo do Estado de São Paulo, 12 mar. 1890.
SÃO PAULO. Relatório apresentado ao Exmo. Sr. Dr. Secretário do Interior
por Oscar Thompson, Diretor Geral da Instrução Pública. In: ANUÁRIO do
Ensino do Estado de S. Paulo. Publicação organizada pela Diretoria Geral da
Instrução Pública com autorização do Governo do Estado. São Paulo: Tipo-
grafia Augusto Siqueira & C., 1918.
SÃO PAULO. Lei nº 1.750, de 8 de dezembro de 1920. Reforma a Instrução
Pública do Estado de São Paulo. São Paulo, 1920.
SÃO PAULO. Decreto nº 3.356, de 31 de maio de 1921. Regulamenta a Lei
nº 1.750, de 8 de dezembro de 1920, que reforma a Instrução Pública. São
Paulo, 1921.
301

III) Anais, anuários, relatórios, Falas do Trono

ANUÁRIO do ensino do estado de São Paulo. Publicação organizada pela


Diretoria Geral da Instrução Pública, com autorização do Governo do Estado.
São Paulo: Augusto Siqueira & C., 1918.
ATAS e pareceres do congresso de instrução pública do Rio de Janeiro. Rio de
Janeiro: Tipografia Nacional, 1884.
CONFERÊNCIA INTERESTADUAL DE ENSINO PRIMÁRIO, 1922,
Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Empresa Industrial “O Norte”, 1922.
Convocada em nome do Sr. Ex. Dr. Epitácio Pessoa, Presidente da República,
pelo Sr. Ministro da Justiça e Negócios Interiores e realizada de 12 de outubro
a 16 de novembro do mesmo ano.
CONGRESSO BRASILEIRO DE EDUCAÇÃO, 8., 1942, Goiânia.
Anais... Rio de Janeiro: IBGE, 1944.
CONGRESSO NORMALISTA DE EDUCAÇÃO RURAL, 1., 2., 3.,
1948, São Paulo. Anais... São Paulo: Associação dos Antigos Alunos da Escola
Normal “Dr. Francisco Tomás de Carvalho” – Associação dos Ex-Alunos da
Escola Normal “Carlos Gomes”, 1948.
DOCUMENTOS com que o ilustríssimo e excelentíssimo senhor Dr. José
Antonio Saraiva, presidente da Província de S. Paulo, instruiu o relatório da
abertura da Assembleia Legislativa Provincial no dia 15 de fevereiro de 1855.
São Paulo: Tipografia 2 de Dezembro de Antonio Louzada Antunes, 1855.
FALAS do Trono desde o ano de 1823 até o ano de 1889. Prefácio de Pedro
Calmon. Brasília, DF: INL, Mec, 1977.
O IMPÉRIO do Brasil na exposição universal de 1876 em Filadélfia. Rio de
Janeiro: Tipografia Nacional, 1875.

IV) Estatísticas e recenseamentos

BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Recenseamento Geral do Império de


1872. Rio de Janeiro: Tipografia Leuzinger, Tipografia Comercial, 1876.
BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Relatório dos trabalhos estatísticos
apresentado Ilmo Exmo Sr. Conselheiro Dr. José Bento da Cunha Figueiredo, Mi-
nistro e Secretário de Estado dos Negócios do Império pelo Diretor Geral conselheiro
Manoel Francisco Correia em 31 de dezembro de 1876. Rio de Janeiro: Tipografia
de Hipólito José Pinto, 1877.
302

BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Sexo, raça e estado civil, nacionalidade,


filiação culto e analfabetismo da população recenseada em 31 de dezembro de 1890.
Rio de Janeiro: Oficina da Estatística, 1898b.
BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Relatório apresentado ao Dr. Miguel
Calmon Du Pin e Almeida, ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas pelo Dr.
José Luiz S. de Bulhões Carvalho. Rio de Janeiro, 1906.
BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Estatística da instrução. Boletim Co-
memorativo da Exposição Nacional de 1908. Rio de Janeiro: Tipografia da
Estatística, 1908.
BRASIL. Diretoria Geral de Estatística. Relatório apresentado ao Dr. João Pan-
diá Calógeras, Ministro da Agricultura, Indústria e Comércio, pelo Dr. José Luiz
S. de Bulhões Carvalho, Diretor Geral de Estatística. Rio de Janeiro: Tipografia
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Transcrição.
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II. Dissertações e teses

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Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas.
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(Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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NEVES, Fátima Maria. O método lancasteriano e o processo de formação disciplinar
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Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesqui-
ta Filho”, campus de Assis.
NOFUENTES, Vanessa Carvalho. Um desafio do tamanho da Nação: a campanha
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Mestrado (Dissertação em História Social da Cultura) – Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro, 2008.
OLIVEIRA, Tiago Siqueira de. A Liga da Defesa Nacional: um projeto de mo-
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da Liga Sergipense contra o Analfabetismo (1916-1950). Sergipe, 2004. Disser-
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VILLELA, Heloísa O. S. A primeira escola normal no Brasil: uma contribuição
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III – Artigos em periódicos

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AURAS, Gladys Mary Teive. O professor paulista Orestes Guimarães e a moder-
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BASTOS, Maria Helena Camara. Método intuitivo e lições de coisas por Ferdi-
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CHOPPIN, Alain. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da
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COLLICHIO, Terezinha A. Ferreira. Dois eventos importantes para a história
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MONARCHA, Carlos. Convocando os hermeneutas da República iletrada: o
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set./dez. 2014.
PECHMAN, Sérgio; FRITSCH, Lílian. A reforma urbana e seu avesso: algumas
considerações a propósito da modernização do Distrito Federal na virada do sé-
culo. Revista Brasileira de História, São Paulo, v.5, n.8/9, p.1391-1196, set. 1984/
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TRINDADE, Iole Maria Faviero. A Cartilha Maternal e algumas marcas de sua
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VECHIA, Ariclê. O plano de estudos das escolas públicas elementares na Pro-
víncia do Paraná. Revista Brasileira de História da Educação, Campinas, SP, n.7,
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IV – Obras de referência

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BRETAS, G. F. História da instrução pública em Goiás. Goiânia: CEGRAF,
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BRIQUET, Raul. História da educação: evolução do pensamento educacional.
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1889. Marília: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, 1963, 3v. (Coleção de
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Arquivo Nacional (RJ)


Arquivo Público do Estado de São Paulo
Associação Brasileira de Educação (RJ)
Biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo
Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (USP)
Biblioteca “Mario de Andrade” – Seção de Obras Raras e Seção de
Hemeroteca – (SP)
Biblioteca “Nadir Gouvêa Kfouri” – Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo
Biblioteca da Faculdade de Direito (USP)
Biblioteca do Museu Paulista (USP)
Biblioteca Central da Unicamp
Biblioteca Nacional – Acervo Geral, Seção de Obras Raras – (RJ)
Casa de Oswaldo Cruz (Fiocruz, RJ)
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (RJ)
Instituto de Estudos Brasileiros (USP)
Biblioteca da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp-Araraquara.
Apêndice A – Outras tabelas
335

Tabela A – Número de professores por 10.000 habitantes livres – 1872

Provivíncias Habitantes livres Professores %


Alagoas 312.268 226 7,2
Amazonas 56.631 33 5,8
Bahia 1.211.792 771 6,4
Ceará 689.773 426 6,2
Espírito Santo 59.478 94 15,8
Goiás 149.743 179 12,0
Maranhão 284.101 258 9,1
Mato Grosso 45.851 19 4,1
Minas Gerais 1.669.276 1.453 8,6
Pará 247.779 301 12,1
Paraíba 354.700 183 5,2
Paraná 116.162 106 9,1
Pernambuco 746.753 526 7,0
Piauí 178.427 101 5,7
Rio de Janeiro 716.120 1.701 23,8
Rio Grande
220.959 104 4,7
do Norte
Rio Grande
367.022 559 15,2
do Sul
Santa Catarina 144.818 168 11,6
São Paulo 680.742 870 12,8
Sergipe 153.620 127 8,3
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Relatório dos trabalhos estatísticos apresentado
Ilmo Exmo Sr. Conselheiro Dr. José Bento da Cunha Figueiredo, Ministro e Secretário de
Estado dos Negócios do Império pelo Diretor Geral conselheiro Manoel Francisco Correia
em 31 de dezembro de 1876. Rio de Janeiro: Tipografia de Hipólito José Pinto, 1877.
336

Tabela B – Porcentagem da população livre que sabe ler e escrever – 1872

Habitantes
Províncias População total Instruídos %
livres
Alagoas 348.009 312.268 41.860 13,4
Amazonas 57. 610 56.631 7.613 13,4
Bahia 1.379.616 1.211.792 249.072 20,6
Ceará 721.686 689.773 79.560 11,5
Espírito Santo 82.137 59.478 9.732 16,4
Goiás 160.395 149.743 22.656 15,1
Maranhão 359.040 284.101 68.571 24,1
Mato Grosso 51.745 45.851 9.721 21,2
Minas Gerais 2.039.735 1.669.276 224.539 13,5
Pará 275.237 247.779 60.395 24,4
Paraíba 376.226 354.700 41.212 11,6
Paraná 126.722 116.162 31.816 27,4
Pernambuco 834.314 746.753 146.663 19,6
Piauí 202.222 178.427 27.770 15,6
Rio de Janeiro 1.057.696 716.120 213.756 29,8
R. G. do
233.979 220.959 39.822 18,0
Norte
Rio Grande
434.813 367.022 95.303 26,0
do Sul
Santa
159.802 144.818 21.926 15,1
Catarina
São Paulo 837.354 680.742 141.067 20,7
Sergipe 176.243 153.620 29.138 19,0
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Relatório dos trabalhos estatísticos apresentado ao
Ilmo Exmo Sr. Conselheiro Dr. José Bento da Cunha Figueiredo, Ministro e Secretário de
Estado dos Negócios do Império pelo Diretor Geral conselheiro Manoel Francisco Correia
em 31 de dezembro de 1876. Rio de Janeiro: Tipografia de Hipólito José Pinto, 1877.
Tabela C – Ensino primário – número de escolas

Escolas Especiais Escolas comuns


Escolas
Escolas- Grupos Jardim de Do sexo Do sexo
Sede das escolas comple- Total Mistas Total
modelo escolares Infância fem. masc.
mentares
Alagoas – – 2 – 2 – – – 220

Amazonas 2 – – – 2 – – – 213

Bahia 21 – 1 – 22 185 179 207 571

Ceará – – 1 – 1 73 75 166 314

Espírito Santo – 1 1 – 2 – – – 95

Goiás – – – – – 28 28 26 82

Maranhão – 1 3 – 4 52 48 33 133

Mato Grosso 3 – – – 3 – – – 83

Minas Gerais – – 22 – 22 641 552 170 1.363

Pará – – 27 – 27 115 56 57 228


337

Continua na página 338


Continuação da página 337 338
Escolas Especiais Escolas comuns
Escolas
Escolas- Grupos Jardim de Do sexo Do sexo
Sede das escolas comple- Total Mistas Total
modelo escolares Infância fem. masc.
mentares
Paraíba – 1 – – 1 49 47 3 99

Paraná – – – 1 1 69 38 132 239

Pernambuco – – – – – 66 70 – 136

Piauí – – – – – 40 39 22 101

Rio de Janeiro – – – – – 115 86 188 389

R. G. do Norte – – – – – – – – 52

R. G. do Sul – – – – – 450 132 562 1.144

Santa Catarina – – – – – 49 42 53 144

São Paulo – 1 80 1 82 517 442 163 1.122

Sergipe – – – – – 57 57 78 192
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Estatística da Instrução. Boletim comemorativo da Exposição Nacional de 1908. Rio de Janeiro: Tipografia da
Estatística, 1908.
Tabela D – Ensino primário – Escolas públicas

Escolas estaduais Escolas municipais


Sede das escolas
Escolas Escolas Escolas Escolas
Estados e Soma Soma Total
comuns especiais comuns especiais
Distrito Federal
Alagoas 220 3 223 16 16 239
Amazonas 213 2 215 12 12 227
Bahia 571 26 597 227 1 228 825
Ceará 314 1 315 22 22 337
Distrito Federal – – – 291 11 302
Espírito Santo 101 – 101 62 – 62 163
Goiás 68 – 68 51 – 51 119
Maranhão 135 5 140 54 54 194
Mato Grosso 80 5 85 85
Minas Gerais 1.364 15 1.379 486 486 1.865
Pará 105 32 137 196 196 333
Paraíba 78 1 79 66 66 145
339

Continua na página 340


Continuação da página 339 340
Escolas estaduais Escolas municipais
Sede das escolas
Escolas Escolas Escolas Escolas
Estados e Soma Soma Total
comuns especiais comuns especiais
Distrito Federal
Paraná 238 1 240 14 14 254
Pernambuco 136 – 136 377 377 513
Piauí 101 – 101 13 13 114
Rio de Janeiro 389 389 45 45 434
R. G. do Norte 68 68 52 52 120
R. G. do Sul 1.037 1.037 158 158 1.195
Santa Catarina 161 161 106 106 267
São Paulo 1.166 82 1.248 363 363 1.611
Sergipe 199 199 12 12 211
Total 6.745 137 6.918 2.623 12 1.058 9.553
Fonte: Brasil. Diretoria Geral de Estatística. Estatística da Instrução. Primeira Parte: Estatística escolar. Rio de Janeiro: Tipografia da Estatística,
1916, v.1.
341

Tabela E – Número de escolas de instrução primária em 1920 nos


estados e Distrito Federal

Escolas No de alunos
Estados e Distrito Federal Por escola
comuns matriculados
Alagoas 528 16.059 30
Amazonas 232 8.249 36
Bahia 1.695 68.782 41
Ceará 697 31.671 45
Distrito Federal 680 11.955 165
Espírito Santo 365 16.537 45
Goiás 245 9.679 40
Maranhão 415 21.043 51
Mato Grosso 232 8.961 39
Minas Gerais 3.694 254.445 69
Pará 620 31.154 50
Paraíba do Norte 439 19.816 45
Paraná 723 27.625 38
Pernambuco 1.290 52.445 41
Piauí 226 8.571 38
Rio de Janeiro 1.076 58.852 55
Rio Grande do Norte 337 16.330 48
Rio Grande do Sul 3.244 136.599 42
Santa Catarina 881 46.984 53
São Paulo 3.757 289.291 77
Sergipe 369 13.400 36
Brasil 21.748 1.249.449
Fonte: Diretoria Geral de Estatística. Recenseamento do Brasil. Rio de Janeiro:
Tipografia da Estatística, 1929 (v.4 População – População do Brasil, por estados e
municípios, segundo o grau de instrução por idade, sexo e nacionalidade).
342

Tabela F – Distribuição da população pelas áreas urbanas, suburbanas e rurais, segundo as regiões fisiográficas e
unidades da Federação – Divisão territorial e área das unidades da Federação.

Regiões fisiográficas e
Totais Área km2 Quadro urbano Quadro suburbano Quadro rural
unidades da Federação
Brasil 41.236.315 8.498.079 9.189.735 3.690.447 28.356.133
Norte 1.462.420 3.336.990 321.758 84.024 1.101.628
Nordeste 9.973.642 976.546 1.246.318 1.031.043 6.696.281
Este 15.625.953 1.232.049 2.517.770 1.649.576 10.458.347
Sul 12.915.621 814.313 3.903.477 855.109 8.157.035
Centro-Oeste 1.258.579 2.138.181 200.412 90.445 987.842
Norte
Acre 79.768 148.027 9.751 4.387 65.630
Amazonas 438.008 1.825.997 72.652 32.137 333.219
Pará 944.644 1.362.966 239.355 47.511 657.779
Nordeste
Maranhão 1.235.169 346.217 115.817 69.735 1.103.617
Piauí 817.601 245.582 62.431 61.796 693.404

Continua na página 343


Continuação da página 342

Ceará 2.091.032 148.591 274.796 199.232 1.616.004


Rio Grande do Norte 768.018 52.411 95.000 59.248 603.770
Regiões fisiográficas e
Totais Área km2 Quadro urbano Quadro suburbano Quadro rural
unidades da Federação
Paraíba 1.422.282 55.920 194.688 116.734 1.110.880
Pernambuco 2.688.240 99.254 370.606 414.202 1.900.432
Alagoas 951.300 28.571 110.000 109.126 721.174
Este
Sergipe 542.326 21.552 115.750 50.481 376.085
Bahia 3.918.112 529.379 736.246 201.325 1.980.561
Minas Gerais 6.736.416 585.804 1.173.165 519.875 5.043.376
Espírito Santo 750.107 42.846 112.270 44.738 593.099
Rio de Janeiro 1.847.857 42.404 563.572 129.661 1.154.656
Distrito Federal 1.764.141 1.167 875.479 703.531 245.131
Sul
São Paulo 7.180.316 247.239 2.687.327 480.784 4.022.265
Paraná 1.236.276 199.897 212.890 89.372 436.004
Santa Catarina 1.178.340 94.998 207.954 45.763 924.623
Rio Grande do Sul 3.320.689 272.179 795.306 239.210 2.286.203
Centro-Oeste
Goiás 826.414 661.140 111.448 30.662 684.304
343

Mato Grosso 432.265 1.477.041 88.964 39.763 303.538


Fonte: Recenseamento geral do Brasil: 1940. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1950 (Série
Nacional, v.2. Censo demográfico: População e habitação).
344

Tabela G – Pessoas de 5 anos e mais, por sexo, segundo a instrução e


a cor

Instrução e cor Total Homens Mulheres

Totais 34.796.665 17.358.587 17.458.078

Sabem ler e escrever 13.292.605 7.344.772 5.947.833

Brancos 10.339.796 5.662.197 4.677.599

Pretos 954.905 553.469 401.434

Amarelos 117.713 71.321 46.392


Pardos e de cor
1.880.193 1.057.785 822.408
não declarada
Não sabem ler
21.295.490 9.908.255 11.387.235
nem escrever
Brancos 11.587.489 5.340.045 6.247.444

Pretos 4.186.728 1.979.605 2.207.123

Amarelos 80.000 35.195 44.805


Pardos e de cor
5.441.273 2.553.410 2.887.863
não declarada
De instrução
208.570 105.560 103.010
não declarada
Brancos 28.608 65.377 63.231

Pretos 1.004 15.546 15.458

Amarelos 2.239 1.095 1.144


Pardos e de cor não
46.719 23.542 23.177
declarada
Fonte: IBGE. Recenseamento geral do Brasil: 1940. Rio de Janeiro: Serviço Gráfico
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1950 (Série Nacional, v.2. Censo
demográfico: População e habitação).
Tabela H – Unidades escolares do ensino público primário em 1937 – Ensinos estadual e municipal

Unidades Total de
Segundo o tipo
Federadas escolas
Grupos Escolas
% Escolas reunidas % %
escolares Isoladas
Alagoas 683 30 4,39 – – 653 95,61
Amazonas 504 22 4,37 3 0,60 479 95,03
Bahia 1.590 – – 159 10,00 1.431 90,00
Ceará 1.191 48 4,03 58 4,87 1.085 91,10
Distrito Federal 929 – – – – 929 100,00
Espírito Santo 1.043 26 2,47 8 0,78 1.009 96,75
Goiás 460 45 9,78 – – 415 90,22
Maranhão 412 38 9,22 63 15,29 311 75,49
Mato Grosso 421 11 2,61 14 3,32 396 94,07
Minas Gerais 4.863 311 6,40 112 2,30 4.440 91,30
Pará 1.312 42 3,20 18 1,37 1.252 95,43
Paraíba 905 42 4,64 – – 863 95,36
Paraná 1.317 58 4,40 – – 1.259 95,60
Pernambuco 2.027 59 2,91 7 0,35 1.961 96,74
345

Continua na página 346


Continuação da página 345 346
Unidades Total de
Segundo o tipo
Federadas escolas
Grupos Escolas
% Escolas reunidas % %
escolares Isoladas
Piauí 407 44 10,81 27 6,63 336 82,56
Rio de Janeiro 1.622 118 7,27 10,81 10,81 1.504 92,73
R. G. do Norte 519 35 6,74 45 8,67 439 84,59
R. G. do Sul – – – – – – –
Santa Catarina 2.286 81 3,54 – – 2.205 96,46
São Paulo 6.428 654 10,33 553 8,74 5.221 80,93
Sergipe 422 18 3,45 10 1,91 394 94,64
Território do Acre 65 7 10,77 2 3,08 56 86,15
SOMA 29.406 1.689 5,75 1.079 3,67 26.638 90,58
Fonte: Lourenço Filho. Estatística e educação. Revista Brasileira de Estatística, Rio de Janeiro, ano 1, n.1, p.66-85, jan./mar. 1940.
Tabela I – Alunos matriculados nas escolas públicas e particulares em 1927

% sobre a
Estados e Distrito Superfície em Densidade da População em Crianças em
População população
Federal km2 população idade escolar escolas
escolar
R. G. do Sul 285.289 2.683.683 9.5 268.368 197.424 73%
Paraná 199.987 870.255 4.5 87.025 59.997 70%
Santa Catarina 94.998 847.656 8.5 84.765 53.646 62%
São Paulo 247.239 5.751.822 24.5 575.182 349.770 60%
Distrito Federal 1.167 1.360.586 1.165.0 136.058 68.883 50%
Minas Gerais 539.810 6.902.511 13.0 690.251 318.947 48%
Espírito Santo 44.684 587.451 13.0 58.745 28.060 48%
Rio de Janeiro 42.404 1.884.304 43.0 184.430 70.173 39%
Ceará 148.591 1.520.335 10.0 152.033 43.994 35%
R. G. do Norte 52.411 666.903 12.0 66.990 21.780 34%
Pará 1.362.962 1.269.344 0.9 126.634 37.113 30%
Alagoas 28.571 1.117.045 39.0 111.705 31.446 28%
Amazonas 1.825.997 409.699 0.2 40.969 11.085 27%
Mato Grosso 1.477.041 312.671 0.3 31.266 8.157 26%
Sergipe 21.552 525.095 24.0 52.409 11.456 21%
347

Continua na página 348


Continuação da página 347 348
% sobre a
Estados e Distrito Superfície em Densidade da População em Crianças em
População população
Federal km2 população idade escolar escolas
escolar
Pernambuco 99.254 2.617.310 26.0 261.731 53.428 20%
Bahia 529.379 3.859.241 7.0 375.924 75.202 20%
Goiás 660.193 640.491 0.9 64.049 11.000 17%
Paraíba 55.920 1.193.260 21.0 119.326 18.864 15%
Maranhão 346.217 1.047.206 3.0 104.720 8.613 8%
Piauí 245.582 738.740 3.0 73.874 8.611 8%
Acre 140.800 106.374 0.9 10.674 – –
TOTAL 8.449.958 36.870.982 4.5 3.677.128 1.487.649 35%
Fonte: LOURENÇO FILHO, Manoel Bergström. A uniformização do ensino primário no Brasil. Educação, órgão da Diretoria Geral da
Instrução Pública e da Sociedade de Educação, de São Paulo, v.2, n.1, p.9-18, jan. 1928.
Apêndice B – Imagens antigas, quase esquecidas
351

1. Lugares de escolas nas lentes da câmera óptica

A caminho da escola - núcleo de colonização - SP (APESP)

Alunas em núcleo de colonização - SP (APESP)


352

Cartão postal - Jardim de Infância da Escola Normal da Praça - SP - 1911


(MP-USP)

Cena rural - (SP) (APESP)


353

Escola de perímetro - SP (APESP)

Escola de perímetro em dia de inauguração - SP (APESP)


354

Escola em núcleo colonial - SP - 1915 (APESP)

Escola mista urbana - SP (APESP)


355

Escola Normal da Praça - SP (APESP)

Escola particular - SP (APESP)


356

Escola rural mista - SP (APESP)

Escola-modelo feminina - abrindo a caixa de costura - SP (APESP)


357

Escolas reunidas - SP (APESP)


358

Escolas reunidas - SP (APESP)

Jardim de Infância da Escola Normal da Praça - 1909 (APESP)


359

Leitura silenciosa - Escola-modelo masculina -SP (APESP)


360

Na fazenda - SP (APESP)
361

Na fazenda -SP (CRPHE)

Na roça - SP (APESP)
362

No quadro-negro, a sentença: O sol do pensamento é a instrução - Grupo


Escolar - SP (MP-USP)

No subsolo da roça - SP (CRPHE)


363

Primeira turma de professorandos da Escola Normal de Pirassununga - SP


-1911 (APESP)

Professora e alunos de escola isolada -SP (APESP)


364

Professoras da Escola Normal da Praça - SP -1911 - (APESP)


365

2. Infância escoteira nas manhãs de abril

Acrobacias - SP - 1922 (CRPHE)

Escoteiras em ação - SP - 1933 (CRPHE)


366

Escoteiros em núcleo de imigrantes - SP (APESP)

Exibindo a farda (CRPHE)


367

Formação escoteira - SP -1922 (CRPHE)

Primeiros socorros - SP (CRPHE)


368

3. Da higiene e saúde, panorama

A harmonia do movimento - SP (APESP)


369

Crianças de um lotista - Pariquera-Açu - SP (APESP)


370

Crianças tracomatosas em núcleo colonial - SP (APESP)

Educando o corpo - Escola Normal da Praça -SP (APESP)


371

Hora do banho no Grupo Escolar - SP (APESP)

Miséria pública - Distrito Federal - 1925 (CRPHE)


372

No dentista -Escola-modelo anexa à Normal do Brás - SP (APESP)

No labirinto dos subúrbios - SP(DPH)


373

4. Compreender o mundo, os compêndios

Alfabetizando a infância (CRPHE)


374

Alfabetizando a infância (CRPHE)


375

Alfabetizando adultos (CRPHE)


376

Alfabetização racional - 1879 - (CRPHE)


377

Arte da leitura (CRPHE)


378

Biografia dos heróis nacionais (CRPHE)


379

Cultuando exemplos (CRPHE)


380

Da moral e civismo (CRPHE)


381

Da salubridade (CRPHE)
382

Do ufanismo (CRPHE)
383

Leitura de versos e manuscritos - (CRPHE)


384

Leituras morais (CRPHE)


385

Livro de leitura para o meio rural (CRPHE)


386

Métodos modernos (CRPHE)


387

Na roça (CRPHE)
388

Primeiras leituras - 1931 (CRPHE )


389

Suavizando as dores da aprendizagem (CRPHE)


390

Útil instrução (CRPHE)


391

5. Celebrações sob o céu azul

À sombra de Getúlio - escola particular - SP (APESP)


392

Ama com fé e orgulho a terra em que nasceste, criança! - SP (APESP)


393

Celebração do Natal - SP (APESP)

Festa da Árvore - SP (APESP)


394

O dia esperado (CRPHE)

Orfeão da Escola Normal de Piracicaba - SP (CRPHE)


395

Pavilhão Escolar do Estado de São Paulo (CRPHE)


396

6. Entrecruzando recordações

Belo uniforme (CRPHE)


397

Boletim de Promoção (CRPHE)

Boletim escolar (CRPHE)


398

Copiando Coração de Amicis (APESP)


399

Esboço da pequena pátria (APESP)


400

Exercício de linguagem (APESP)


401

Minha leitura (CRPHE)


402

Moderno reclame (CRPHE)


403

Ninguém deve ser curioso - 1894 (APESP)


404

Retirando livros na biblioteca (CRPHE)


405

7. Nos núcleos de imigrantes, perspectivas

A pompeai iskola - SP (APESP)


406

Alunos de origem húngara - SP (APESP)

Atento ao professor - SP (APESP)


407

Colégio evangélico, antiga escola alemã - SC (AAHJS)

Escola alemã - Rio Claro - SP - 1900 (APESP)


408

Escola alemã e seu fundador pastor Theodoro Koelle - SC (AAHJS)

Escola húngara - SP (APESP)


409

Escola Jaraguá - Prof. Wendelin Schmidt com livro na mão -SC (AAHJS)

Escola Prof. Abramo Pradi - Jaraguá do Sul - SC (AAHJS)


410

Escola Rio da Luz - Comunidade evangélica - SC (AAHJS)

Filhas de imigrantes japoneses - SP (APESP)


411

No mapa, o fluxo imigratório


412

Núcleo de colonização japonesa - SP (CRPHE)

Si parla italiano - Escola Avenire - SP (DPH-SMC)


413

Crédito das imagens

Acervo Arquivo Histórico de Jaraguá do Sul “Eugênio Victor Schmökel” –


PR - (AAHJS)

Arquivo Público do Estado de São Paulo - (APESP)

Casa de Oswaldo Cruz – Rio de Janeiro – (COC)

Centro de Referência para Pesquisa Histórica em Educação – Faculdade de


Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista – campus de Araraquara
– (CRPHE)

Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura


de São Paulo (DPH-SMC)

Museu Paulista da Universidade de São Paulo - (MP-USP)


415

Índice onomástico

A Andrada, Martim Francisco Ribeiro de 21-


Abreu e Lima, José Inácio de 50 23, 26, 29, 47, 307
Aguiar, Antonio Pinheiro 94 Andrada e Silva [O moço] 70, 71, 110, 303
Aires de Casal 214 Andrade, Elyseo Castanho de 303
Alberto, João 257, 285 Andrade, A. F. M. 98
Albuquerque, Pedro Autran da Matta e 103 Andrade, Aguiar de 22
Albuquerque, Salvador Henrique de 49 Andrade, Maria Guilhermina Loureiro de
Alcântara, Pedro de 33, 35 96, 156
Alencar, José 69, 111 Andrade, Thales Castanho de 250
Alencar, Renato de 237 Andrade, Teófilo 283
Almeida Júnior, Antonio de 232, 270 Antipoff, Helena 291
Almeida, Cândido Mendes de 98, 214 Aragão, Egas Moniz Barreto de 231
Almeida, Júlia Lopes de 213, 219 Araripe Júnior 238
Almeida, Lourival de 254 Araújo, Antonio Bahia da Silva 119, 120
Almeida, Manuel Ribeiro de 94 Araújo, José Carlos 318
Almeida, Miguel Calmon du Pin e 29 Arendt, Hannah 131, 318
Almeida, Miguel Calmon du Pin e 178, Araújo, José Paulo de Figueroa Nabuco de 52
206, 302 Araújo, Oscar de 149, 303
Almeida, Rui Guimarães de 326 Armitage, John 24, 303
Alonso, Ângela 317 Assis Brasil, Joaquim Francisco de 245
Alves, Isaías 316 Assunção, Manuel Paulino de 94
Alves, Constâncio 273 Athayde, Tristão de 229
Alves, Raul 206, 218 Auras, Gladys Mary Teive 326
Amado, Gilberto 229, 303 Azambuja, Joaquim Maria Nascentes de 103
Amaral, Amadeu 222, 232, 273, 311 Azevedo, Fernando de 203, 232, 246, 254,
Amaral, Tancredo do 166 257, 259, 264, 265, 272, 275, 291
Americus 26-30, 104, 303 Azevedo, Francisco L. 293, 303
Amicis 165, 398 Azevedo e Sá, João Hyppolito de 202
Anderson, Benedict 318 Azzi, Francisco 232
Andrada, Antonio Carlos de 22, 23, 84
416

B Bosi, Alfredo 236, 318


Backheuser, Everardo 254, 255 Botelho, André 318
Baden-Powell 222 Bowen, James 100, 318
Baena, Antonio Ladislau Monteiro 52 Braga, Odilon 291
Bain, Alexander 89, 303 Braga, Theodoro 232
Balmat, Alexandre 49 Bragança, Aníbal 318, 324
Bandecchi, Brasil 220, 318 Brandão, Alberto 76
Bandeira Júnior, Antonio Francisco 97 Brás, Wenceslau 224
Bandeira, Antonio Herculano de Souza 107 Braziliense, Américo 64, 68, 96, 134, 155,
Bandeira, Esmeraldino 180 304
Barbosa de Oliveira, C.A. 255 Brescianni, Stella 217, 318
Barbosa, Januário da Cunha 27, 29, 76 Briquet, Raul 78, 232, 328
Barbosa, Rui 69, 76, 79, 80, 87, 89, 118, 126, Breves, Arthur 143
133, 134, 135, 170 Brito Aranha 96
Barbosa Lima Sobrinho 179, 254, 318 Brotero, João Dabney de Avelar 56, 114, 300
Barreto, Arnaldo de Oliveira 166 Browne, Márcia 156
Barreto, Plínio 248 Bruno, G. 214
Barreto, Tobias 64 Buarque de Holanda, Sergio 61, 304, 319
Barros, José Augusto de 188 Büchler, José Augusto 195, 238, 304
Barros, Roque Spencer Maciel de 304, 309 Buckle 86
Basedow: 90, 177 Buisson, Ferdinand 89, 106, 326
Basile, Marcello Otávio Neri de Campos 318 Bulcão, Mario: 248, 249, 315
Bastos, Maria Helena Camara 304, 326 Bulhões Carvalho, José Luiz Sayão de 153,
Beaumont, Jeanne Marie Leprince de 53, 315 181-184, 188, 192, 197, 198, 264, 302, 304,
Beaurepaire, Jacques Antonio Marcos de 52 305
Bell, Andrew 40
Bellegarde, Henrique Luiz de Niemeyer 52 C
Bello, José Maria 176, 275, 311, 318 Cabanis 28
Bentham, Jeremy 27 Caetano de Campos, Antonio 142, 143,
Berlinck, Eudoro Brasileiro 52 154-156, 161, 305, 312, 316
Bernardes, Arthur 237 Calkins, Norman Allison 89
Bilac, Olavo 151, 166, 207, 211, 213-216, Calógeras, João Pandiá 181, 302, 305
252, 304, 315 Camargo, Cristovam 305
Bittencourt, Raul J. 237, 292 Camargo, Vicente Tomás Pires de
Bittencourt, Agnello 207 Figueiredo 40
Blanchard, Pedro 53 Campos Sales 169, 192, 305, 322
Bocaiuva, Quintino 64, 97, 132, 133 Campos, Américo de 155
Bomfim, Manoel 304, 315, 321 Campos, Bernardino de 157, 162
Bordeaux Rego, Oziel 186-188, 214, 264, Campos, Francisco 263
304 Campos, Ovídio Pires de 232
Borges, Abílio César 85, 304 Cardoso, Vicente Licínio 80, 149, 229, 230,
Borges, Pedro Manoel 98 231, 312,
417

Carneiro Leão, Antonio 218, 223, 229, 231, Conte, Alberto 272, 275, 276, 312
234, 246, 305 Cony, Augusto Cândido Xavier 108
Carneiro Leão, Honório Hermeto 36 Coqueiro, João Antonio 102
Carone, Edgard 170, 193, 257, 319 Corrêa, Gustavo 305
Cartolano, Maria Teresa Penteado 152, 325 Correia, Manoel Francisco 109, 301, 335,
Caruso, Marcelo: 42, 320 336
Carvalho, Bernardino de 46 Correia, Viriato 214
Carvalho, Carlos Leôncio de 20, 76, 77, 89, Coruja, Antonio Álvares Pereira 52
112, 123, 305, 314 Costa, Amélia Fernandes da 107
Carvalho, Felisberto 103 (??), 151 Costa Pereira 214
Carvalho, José Luiz Sayão de Bulhões 181 Costa Pereira, José Saturnino 52
Carvalho, José Murilo de 319 Costa, Firmino 218
Carvalho, Ronald de 229 Costa, João Bittencourt 150
Casalecchi, José Ênio 26 (??), 319 Costa, José Afonso de Paula e 83, 84, 305
Casassanta, Mario 254 Costa, Lisymaco Ferreira da 237
Castelo, Plácido Aderaldo 319 Costa, Manoel Olímpio Rodrigues 93, 314
Castilho, Antonio Feliciano 50 Costa, Miguel 228, 257, 282
Castilho, Francisco Alves da Silva 50 Cousin, Vitor 90
Castilhos, Júlio de 165 Couto Ferraz, Luiz Pedreira do 36, 37, 38,
Castro, Felipe Ferreira de Araújo 55 111, 112
Castro, José Antônio Pedreira de Magalhães Couto, Miguel 177, 218, 258, 272, 273, 306,
134 316, 317
Castro, Aloísio de 258 Cruls, Luiz 124, 287
Castro, Tito Lívio de 86, 305 Cruz, Alfredo Lopes da 231
Cavalcante, João Barbalho Uchoa 103, 108 Cruz Costa, João 64, 319
Cavalcanti, Amaro 78, 300 Cruz, Guilherme Francisco 76
Chauí, Marilena 212, 319 Cruz, Noêmia Saraiva de Matos 256, 291
Chermont, Justo Leite 162 Cruz, Oswaldo 174, 176, 282, 308, 316, 327,
Chizzotti, Antonio 37, 309, 325 Cruz, Policarpio José Dias da 50
Coaracy, Vivaldo: 167, 305 Cunha, Euclides da 65, 130, 175, 219, 230,
Choppin, Alain 93, 326 252, 306
Coelho Neto 166, 214-216, 273, 315 Cury, Carlos Roberto Jamil 319, 320
Coelho, Augusto 103
Collichio, Terezinha Alves Ferreira 119, 326
Comenius 158
D
D’Ávila, Antonio 166, 312
Comte 63, 65, 95, 133, 144, 149, 150, 156,
Daligault 103
163, 164, 275, 320, 325
Daltro Filho 256
Condillac 27, 90
Dantas, Rodolfo Epifânio de Souza 97
Condorcet 22
Darwin 28, 65, 86
Conduru, Felipe Benício de Oliveira 40
Delermando, Cirilo 50
Constant, Benjamin 64, 78, 133, 141, 149,
Denis, Ferdinand 214
150-154, 156, 161, 229, 303, 305, 308, 317,
Deus, João de 84
321, 325
418

Dewey, John 275 Fontes, Lourival 291


Diacon, Todd A. 175, 320 França, Antonio Ferreira 29
Dolhnikoff, Miriam 35, 320 França Leite 156
Domingues, Alfeu 249 Franklin, Benjamin 53, 231, 309
Dordal, Ramon Rocca 166 Frazão, Manoel José Pereira 76, 97, 105,
Dória, Franklin Menezes 38, 78, 154, 306 107, 306
Duarte, Marcelino Pinto Ribeiro 49 Freeze, João Henrique 53
Duby, Georges 11, 320 Freitas, Anamaria Gonçalves Bueno de 318
Dunshee de Abranches 149 Freitas, Joaquim Pedro Corrêa de 96
Duque-Estrada, Luiz Carlos 90, 103 Freyre, Gilberto 135, 248, 320
Duque-Estrada, Joaquim Osório 191 Frias, Joaquim Inácio de 53
Durkheim, Émile 275 Fritsch, Lilian 174, 327
Dussel, Inés 42, 320 Fröebel 90, 92, 108, 158
Frontin, Paulo de 174

E Frota-Pessoa, José Getúlio 222, 291, 306

Emelen, Amaro van 291


Escobar, Ildefonso 24, 214, 283, 320 G
Escobar, José Ribeiro 232, 328) Galhardo, Tomás Paulo do Bom Sucesso 94,
Espínola, Tomás do Bomfim 79 166
Espínola, Túlio 250 Galton, Francis 86
Esterci, Neide 284, 325 Galvão, J. R. 94

F Galvão, Franklin Ramiz 141, 231, 309

Falcon, Francisco 11, 320 Gama, Fernandes 214

Falloux 37 Garcia, José Manoel 38, 39, 93, 314

Faria Filho, Luciano Mendes de 304 Gardien 55

Fausto, Boris 110, 170, 254, 320 Gellner, Ernst 217, 218, 281, 320

Feijó, Diogo Antonio 33, 34 Gentil, Alberto 253

Fernandes, Henrique Costa 163, 306 Giesbrecht, Ralph 316

Fernandes, Henrique Costa 163, 306 Girardet, Raoul 217, 281, 320

Fernandes, Oliveira 120 Godofredo Furtado 64

Ferraro, Alceu 195, 320 Gomes, Carlos 191

Ferrarotti, Franco 144, 320 Gomes Cardim, Carlos Alberto 166, 216

Ferreira Júnior, Alexandre Dias 132, 306 Gonçalves Dias, Antonio 35, 48, 306

Fialho, Branca 291 Gontard, Maurice 37, 321

Figueiredo, Afonso Celso de Assis 76, 117, Gonzaga, Aprígio 254

312, 315 Gorceix, Henri 124

Figueiredo, José Bento da Cunha 301, 335, Goulart de Andrade 273

336 Grande, Humberto 253

Firmo, Xavier Inácio 56 Gréard, Octave 42, 306

Fleiuss, Max 43, 231, 306 Guanabara, Manoel José da Silva 90, 103

Fonseca, Deodoro da 133, 135, 138 Guerra, Amanda Estela 321, 327

Fonseca, Hermes da 170, 180, 192, 202 Guimarães, Aprígio Justiniano da Silva 76
419

Guimarães, Orestes 218, 223, 224, 234, 235, Kubo, Elvira Mari 46, 116, 321
237, 272, 274, 306, 326 Kuhlmann, Guilherme 201
Guizot 37, 38

L
H Lacerda, Nelson Nogueira de 307
Hacilman, W. 108 Lacerda, Joaquim Maria de 96
Haeckel 65, 86 Lajolo, Marisa 215, 321
Haidar, Maria de Lourdes Mariotto 77, 321 Lamarck 65
Hamel, Joseph 40, 41, 307 Lancaster 28, 29, 40, 41
Hansen, Patrícia Santos 215, 216, 325 Lane, Horace 156
Hartly 27 Le Bon, Gustave 86
Haussmann 174 Leal, Victor Nunes 169, 251,321
Hawthorne, Daniel 52 Leão, José 155
Hébrard, Jean 48, 321 Leão Machado 283
Helvécio 27 Leitão, Antonio Candido 76
Hippeau, Celéstin 90, 107 Leitão, Antonio da Cunha 119, 120
Hobbes 27 Leite, Gervásio 291, 292, 321
Hudson, Otaviano 94 Leme, Sebastião 280
Hume 27 Lemos, Miguel 64, 163
Lemos, Renato 321

I Lenharo, Alcir 282, 284, 321

Ibirapitanga, Antonio Gentil 50 Lesage, Pierre 42, 322

Iglésias, Francisco 33, 134, 253, 321 Lessa, Gustavo 291

Ihering, Rodolfo 250 Lessa, Renato 169, 322

Inglês de Souza, Herculano Marcos 118 Leuenroth, Edgar 209, 308


Levi Carneiro 291
Lima, Araújo 22, 35
J Lima, Nestor dos Santos 20, 32, 50, 207,
Jaboatam 214
208, 232, 307
Jacobina, Antonio de Araújo Ferreira 94,
Lima, A. Sabóia 253, 322
138
Lima, Afonso Herculano 76
Jardim, Antonio da Silva 64, 155, 252
Lima, Atílio Correia de 285
Jardim, Renato 232, 237
Lima, César Augusto Viana de 76, 107
Jordão, João Rodrigues da Fonseca 96
Lima, José Dias da Cruz 97
Jussieu, Laurent Pierre de 55
Lima, Mario de Souza 232
Lima, Pedro de Araújo 35
K Lins, Ivan 64, 236, 322
Kassef, Leoni 237, 254 Liberato Barroso 73, 74, 116, 307
Kelly, Celso 254, 259, 291 Lisboa, Achilles 195
Koeffer, Carlos 50, 51 Lisboa, José da Silva 54, 55, 316
Köpke, João 94, 155, 166 Lobo, Aristides da Silveira 133, 139
Kreutz, Lúcio 224, 321 Locke 27, 90, 158
420

Lombroso 86 Melo, João Crisóstomo do Couto 40


Lopes, Adelina 166 Melo, Joaquim Pedro de 56
Lopes, Antonio de Pádua Carvalho 318 Melo, Luís Correia de 328
Lopes Trovão 64 Mello, José Baptista 307
Lourenço Filho, Manoel Bergström 202, Mello, Maria de Jesus 313
307, 312, 323, 328, 348 Mello e Sousa, João Batista de 234
Luchese, Terciane Ângela 224, 321 Mendonça, Joaquim Ribeiro de 155
Lustosa, Isabel 21, 322 Mendonça, Sonia Regina 322
Menezes Vieira, Joaquim José de 151, 252

M Menezes, Djacir 322,

Macedo, de Antonio Victor 85 Mennucci, Sud 150, 195, 201, 231, 232, 235,

Macedo, Joaquim Teixeira de 76, 107 246, 254, 256-260, 291, 294, 295, 307, 308,

Machado de Assis 97 313, 314, 316, 323

Machado, Martim Francisco Ribeiro de Mesquita, Julio de 64

Andrada 21, 26, 29, 47 Michelet, Jules 146, 322

Magalhães, Benjamin Constant Botelho 78, Miguez, Leopoldo 129, 322

133, 149 Miranda Azevedo 64, 155

Magalhães, Fernando 265 Moacyr, Primitivo 30, 73, 308

Magalhães, Valentim 159 Monarcha, Carlos 116, 131, 155, 195, 202,

Maia, Jacir 291 217, 260, 322, 323, 327

Maia, Silvio de Andrade 249 Moniz, Antonio Alves Branco 53

Man, Horace 75 Monteiro, Joaquim dos Remédios 120

Marcílio, Humberto 34, 322 Monteiro Lobato 248, 250

Marcílio, Maria Luiza 114, 322 Monteiro de Souza 218

Marques Pinheiro 195, 231, 307 Monteverde, Emilio Achilles 50, 55

Pombal, marquês de 20 Moraes Filho, Evaristo 30, 311, 323

Macedo Soares, José Carlos 286 Moraes, Deodato de 195, 206, 237, 313

Marques, Abílio A. S. 155, 156 Moraes, Theodoro de 196, 316

Marson, Adalberto 254, 322 Morais, Alexandre J. Melo 53

Martins, Alfredo da Cunha 163 Moreira de Azevedo, Manuel Duarte 19,

Martins, Francisco Dias 249 26, 313

Mascarenhas, Francisco de Paula 94 Moreira, João 323

Matos, Ach. 232 Mota, Candido 99

Mattos Pereira, Antonio Jansen 90, 91 Mota, Carlos Guilherme 323

Maudsley, Henry 86 Mota, Joaquim Inácio Silveira da 75

Medeiros, Borges de 165 Motta Júnior, Cesário 162, 308

Medeiros e Albuquerque 129, 153, 317 Motta, Cássio 317

Medeiros, José Augusto Bezerra de 218, Motta, Marly Silva da 323

234, 289, 307 Moura, Caetano Lopes de 55

Medrado, Alcides Catão da Rocha 76 Muller, Lauro 64, 174

Méline, Félix-Jules 246, 307 Muniz, Antonio Ferrão 76

Melo, Ester Pedreira de 234 Muniz Tavares 22


421

N Penna, Belizário 176, 237, 246, 254, 255,


Nabuco, Joaquim 64 308
Nagle, Jorge 220, 326 Perdigão Malheiro 214
Nascimento, Jorge Carvalho do 323 Pereira Barreto, Luiz 64, 67, 156, 245, 255,
Negro, Hélio 209 309
Neiva, Arthur 176 Pereira Júnior 102, 309
Neves, Fátima Maria 326 Pereira Passos, Francisco 174
Neves, Lúcia Bastos Pereira das 324 Pereira, José Saturnino da Costa 52
Newland Neto, Otávio Tomaz 291 Pernambucano, Ulysses 291
Nicolau, Jairo 25, 70, 136, 222, 324 Pesavento, Sandra Jatahy 89, 327
Nofuentes, Vanessa Carvalho 220, 326 Pessoa, Epitácio 191, 233, 301
Nogueira, José Antônio 229 Pestalozzi 90, 96, 158, 177
Pinheiro, Joaquim Caetano Fernandes 55
Pinheiro Machado 170, 202
O Pinheiro, Nuno 229
Oliveira, Antonio de Almeida 88, 98, 308
Pinna, Armando 255
Oliveira, Cândido Batista de 51
Pinto, Diogo de Mendonça 56, 114, 115,
Oliveira, João José Barbosa de 108
300
Oliveira, José Feliciano de 64, 159, 308
Pires de Almeida, José Ricardo 31, 43, 91,
Oliveira, Maria Aparecida 267, 268, 315
92, 95, 112, 113, 309
Oliveira, Mariano 163, 166
Pontes, Antonio Marciano da Silva 103
Oliveira, Tiago Siqueira 326
Pontes de Miranda 229
Oliveira Vianna 32, 134, 220, 229, 251, 252,
Porchat, Reynaldo 232
253, 308
Portella, Joaquim Pires Machado 103
Olympio, Mathias 308
Porto-Carrero, Luisa Leopoldina Tavares 107
Orico, Oswaldo 231, 242
Portugal, Tristão da Cunha 53
Otávio, Rodrigo 166
Prado Júnior, Caio 36, 324
Prado, Eduardo 124, 149
P Prado, Guilherme 166
Pacheco, Praxedes 103 Prestes, Gabriel 146, 156-159, 161, 317
Padilha, Celina 291 Prost, Antoine 324
Paiva, Athaulfo de 273 Prudente de Moraes 138, 142, 154, 155
Paiva, Vanilda Pereira 324 Puiggari, Romão 166
Paranhos, José Maria da Silva 35, 124, 214 Pujol, Alfredo 160, 309
Parley 52
Passalácqua, Camilo 103
Q
Passos de Miranda Filho 179
Queiroz, Maurício Vinhas de 291
Patrocínio, José do 126
Quesnay, François 138
Paz, José Ramos 96
Pechman, Sérgio 174, 327
Peixoto, Afrânio 80, 214, 215, 217, 224, 231, R
240, 273, 309, 316, 317 Rabello, Marcos Franco 202
Peixoto, Floriano 135, 138, 287 Ramalhete, Ubaldo 237
422

Ramos, Theodoro 232 Sampaio Dória, Antonio de 198-201, 220,


Rangel, José 236 221, 248, 257, 272, 273,302, 310
Rangel Pestana 64, 134, 154-156, 161 Santa-Anna Nery, Frederico José de 70, 124,
Razzini, Márcia de Paula Gregório 216, 324 125, 309, 310
Rebouças, André 124, 126 Santos, Márcia Maria Duarte dos 327
Rego, António 51 Santos, Silvino 191
Reis, Aarão 64 Saraiva, José Antônio 47, 69, 301
Sarmento, Casimiro José de Morais 56
Reis Filho, Casemiro dos 324
Seidl, Raimundo Pinto 234
Reis, Luis Augusto Reis 107
Senra, Nelson 139, 192, 324
Rémond, René 11, 324,
Serpa, Joaquim Jerônimo 55
Ribas, Antonio Joaquim 56, 114, 300
Serrano, Jonathas 229
Ribeiro, Demétrio 134, 165
Serva, Mario Pinto 218, 231, 291, 310
Ribeiro, Hilário 94-97
Seyferth, Giralda 224, 324
Ribeiro, João 165, 166, 316
Silva Jardim, Antonio da 64, 155, 252
Ribeiro, Júlio 156 Silva Júnior, Dias da 107
Ribeiro, Lourenço José 52 Silva, Alfredo do Nascimento 121, 313
Ribot 86 Silva, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada
Ricardo, Cassiano 283, 284 Machado e 84, 305
Rocha, Marlos Bessa Mendes da 327 Silva, Augusto Freire da 97
Rocha, Mateus José da 53 Silva, João Cândido de Deus 53
Rodrigues Alves, 169 Silva, José Bonifácio de Andrada e 70, 110
Rodrigues, Antonio Marques 51 Silva, José Jorge Paranhos da 94
Rodrigues, João Lourenço 309, 317 Silva, Josino do Nascimento 108
Rodrigues, José Honório 324 Silveira, Carlos da 313
Romero, Silvio 64, 86, 119, 120, 147, 155, Silveira, Joaquim José da 55
217, 246, 305, 317 Silveira, Juraci 291
Rondon, Candido Mariano 291 Silveira, Tasso da 229
Roquette-Pinto, Edgar 191, 253, 254, 258, Simon, Jules 154
Simões Lopes 254
310
Soares, Carlos Augusto 103
Rousseau 90, 158, 177
Soares, Francisco de Paula 50, 51
Sodré, Lauro 64, 150
S Sodré, Nelson Werneck 283, 310
Sá e Benevides, José Maria Correia de 118, Sousa, Clotildes Farias de 326
310 Sousa, João Batista de Mello e 234, 235
Saboia Lima 253 Sousa, Joaquim Moreira de 260, 291, 315
Sacramento Blake 29, 37, 78, 79, 114, 328, Sousa, Raul Alves de 218
329 Southey, Robert 214
Saffray 316 Souza, José Boaventura de 324
Saint-Hilaire 214 Souza, José Paulino Soares de 40
Saldanha Marinho 134 Souza, Justiniano José de 53
Salgado, Plínio 257 Souza, Rui de Paula 232
Salles Júnior, Antonio 231 Souza, Washington Luís Pereira de 199
Salles, Alberto 64 Spencer, Herbert 144, 158
423

Stockler, Francisco de Borja Garção 26, 30 Vasconcelos, Bernardo Pereira de 33


Stuart Mill 27 Vechia, Ariclê 46, 327
Veiga, Evaristo da 33

T Venancio Filho, Francisco 34, 218, 291,

Taine  65 313, 329

Tambara, Elomar 236, 324, 328, 329 Verdenal, René 144, 325

Tanuri, Leonor 155, 325 Veríssimo, José 59, 63, 64, 83, 126, 127, 149,

Tautphoeus 105, 155 151, 153, 162, 219, 311, 317

Tavares Bastos 35, 62, 75, 106, 116, 310 Veyne, Paul 10, 325

Tavares Cavalcanti 206, 234 Viana, Ulisses Machado Pereira 79

Tavares de Lira 180 Vianna, Vítor 234

Teixeira, Anísio 259 Vianna, Hélio 311, 325

Teixeira Brandão 238, 239, 310 Vidal e Souza, Candice 325

Teixeira de Freitas, Mario Augusto 254, 263, Vieira, Celso 229

264, 265, 267, 286, 289, 311, 313 Vieira de Mello, Alfredo Pinto 233

Teixeira Mendes, Raimundo 64, 149, 163, Vieira, Manuel Inácio Belfort 162

164, 165, 314, 317 Vieira, Paim 232

Teixeira, José Bruno 290, 313 Vilar, Pierre 329

Teixeira, Múcio 67, 317 Villa-Lobos, Heitor 283

Teixeira, Pedro Ludovico 285, 286 Villela, Heloísa 326

Thompson, Oscar 199, 300 Vivacqua, Atílio 254

Torres Filho, Artur 291 Viveiros, Jerônimo José de 40, 51, 327

Torres, Alberto 239, 246, 252, 253, 254, 255, Viveiros, José Francisco de 101

256, 259, 260, 294, 306, 318, 322, 326 Vovelle, Michel 11, 325

Torres, Artur 291


Trindade, Iole Maria Faviero 327 X
U Xavier, João Theodoro 116

Ubatuba, Ezequiel 249


Uchoa Cavalcanti 90, 103, 108 W
V Walsh, Robert 45, 317

Vanerio, Eusébio 97 Werneck, Antônio Luiz dos Santos 134

Varela, Alfredo 213


Vargas, Getúlio 282, 283, 295, 315 Z
Vasconcellos, Aleixo de 177 Zaluar, Emílio 97
Sobre o livro

Formato 15cm x 21cm


Tipologia Adobe Caslon Pro
Papel Pólen 80 g
de guerra das doutrinas societárias, ao se debaterem COLEÇÃO
por atos fundados na moral, ética, razão, virtude, “HISTÓRIA, PENSAMENTO E EDUCAÇÃO”
justiça, e, sobretudo, ao reivindicarem para si a
Compartindo do investimento de formar súditos da monarquia ou cidadãos
A instrução pública nas vozes

Carlos Monarcha
autoconsciência do tempo vivido, precipitam-se nas
cenas como portadores de futuros possíveis. da República, irrequietos e desacomodados, ora em chave realista ora fanta- Direção de
siosa, publicistas provindos de horizontes diversos, guardadas as ipseidades, dos portadores de futuros DÉCIO GATTI JÚNIOR
Nas vozes encartadas e nas atitudes de sujeitos encar- GERALDO INÁCIO FILHO
nados como porta-vozes dos interesses gerais,
convergem na urgência de uma instrução primária de Estado, gratuita e
obrigatória (e no evoluir do tempo, laica), como marco da estratégia geral de
(Brasil – séculos XIX e XX)
escritores, políticos, jornalistas, professores, bacharéis,
funcionários, médicos, militares, politécnicos, juristas, governo pacificado e liberação de forças produtivas. Desnecessário dizer que SÉRIE
administradores, em suma, frações da inteligência nesses sobrevoos de imaginação a instrução popular aparece como prope- “NOVAS INVESTIGAÇÕES”
brasileira, irmanam-se numa comunidade de propó-
dêutica ao homem social pela efetividade da cultura. No aglomerado de Carlos Monarcha
sitos: instruir a massa bruta de analfabetos, cuja
linguagem, dizia-se, recordava à infância das primei- vozes, paz pública, razão de Estado e economia política se entrecruzam. Direção

A instrução pública nas vozes dos portadores de futuros


ras sociedades e costumes de uma humanidade Endosso prático e anteparo firme viriam da instrução organizada como ARMINDO QUILLICI NETO
vivente no subsolo da história. instituição nacional, valioso tonificante, poderoso moto-contínuo, adorável DÉCIO GATTI JÚNIOR

anjo da paz. Eis, leitor, o todo e o porquê de A instrução pública nas vozes dos
Nas visões desdobradas, a luz geral a ser propagada
pelo mestre de escola do Império e pelo professor portadores de futuros (Brasil – séculos XIX e XX). VOLUME 8
primário da República eliminaria a parte malsã dos A instrução pública nas vozes
regimes constitucionais e representativos consubs- Carlos Monarcha dos portadores de futuros

(Brasil – séculos XIX e XX)


tanciados em pacto de união e/ou corpo político (Brasil – séculos XIX e XX)
estável. Entrementes, malformada e exígua, a instru-
ção pública é a metonímia de um país perplexo de si, AUTOR
o analfabetismo nacional, o torniquete. CARLOS MONARCHA

Certamente, provém do século XIX brasileiro –


Carlos Monarcha é doutor em Educação: História e momento em que se consuma a doutrina liberal como
Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade fundamento jurídico-político do regime dinástico,
Católica de São Paulo. Professor titular no Departa- constitucional e representativo – a determinação mais
mento de Ciências da Educação da Faculdade de clara de engendrar coletividades harmoniosas pela via
Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista, da instrução pública.
campus de Araraquara. Autor, entre outros, de A
reinvenção da cidade e da multidão - dimensões da Assemelhada a uma estrutura profunda, melhor,
modernidade brasileira: a Escola Nova (Cortez/ marco de esperança cravado em presentes passados,
Autores Associados, 1990), Escola Normal da Praça: o incólume, a confiança no halo da instrução, antiga
lado noturno das luzes (Editora da Unicamp, 1999), figura fractal, atravessará in extenso as temporalidades
Lourenço Filho e a organização da psicologia aplicada à do Império e da República. Formulo então uma
educação. São Paulo 1921-1934 (Inep, 2001) – obra questão que leve para além da percepção do nível
premiada pela Academia Brasileira de Educação, e manifesto da realidade e fragilidade das aparências.
Brasil arcaico, Escola Nova: ciência, técnica e utopia nos
anos 1920-1930 (Editora Unesp, 2009) – prêmio Coleção Série Na tempestividade das épocas, comungantes, em
Jabuti 2010. História, Pensamento Novas Investigações coextensão especulativa - homens públicos da monar-
e Educação Volume 8 quia e da república, conquanto discordantes na praça

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