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BARRAGENS DE REJEITOS DA
MINERAÇÃO: O PRINCÍPIO DA
PREVENÇÃO E A
IMPLEMENTAÇÃO DE NOVAS
ALTERNATIVAS
Romeu Thomé
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Barragens de rejeitos da mineração: o princípio da
prevenção e a implementação de novas alternativas
Romeu Thomé
Doutor em Direito Público com ênfase em Direito Ambiental pela PUC-MG. Mestre em
Direito Econômico com ênfase em Direito Ambiental pela UFMG. Professor de Direito
Ambiental da Escola Superior Dom Helder Câmara (BH/MG) e da Faculdade de Direito do
UNIFEMM (Sete Lagoas/MG). Advogado. romeuprof@hotmail.com
Sumário:
1 Introdução
Esta pesquisa se justifica, portanto, pela atualidade e relevância do tema face à tímida
abordagem do assunto pela doutrina jurídica pátria.
“Obras de barramento destinadas à contenção dos sedimentos gerados nas áreas das
Unidades Industriais, geralmente implantadas a jusante de pilhas de estéreis ou de
locais com grandes movimentos de terra. Comumente designadas de Barragens de
Contenção de Finos, essas obras podem requerer manutenção permanente de
desassoreamento dos reservatórios, durante o ciclo de operação da Unidade Industrial.
Algumas Barragens de Contenção de Sedimentos podem ser construídas na forma de
diques de enrocamento, com estruturas galgáveis que funcionam como vertedouro. Nos
casos de a barragem ser construída de forma convencional, têm-se as seguintes
estruturas hidráulicas componentes: vertedouro, canal de descarga e bacia de dissipação
de energia. Características especiais condicionadoras de critérios: localização em áreas
com elevado potencial de geração de sedimentos e ausência de dados de
monitoramento, necessidade de manutenção antes do esgotamento total do volume
morto, vida útil de curta duração.” (PINHEIRO, 2011, p. 21).
Ressalta-se que, no caso da mineração de ferro, tanto o sedimento, quanto o rejeito são
considerados inertes, ou seja, conforme NBR (10.007/2004) aqueles materiais que, ao
serem submetidos aos testes de solubilização, não têm nenhum de seus constituintes
solubilizados em concentrações superiores aos padrões de potabilidade da água. Estes
resíduos não se degradam ou não se decompõem quando dispostos no solo, pois se
deterioram lentamente. Estão nesta classificação, por exemplo, os entulhos de
demolição, pedras e areias retirados de escavações. Já outros tipos de mineração que
apresentam contaminantes na composição do rejeito devem observar para a disposição
final, além da referida norma, a NBR 11.174/1990.
A disposição final dos rejeitos da mineração pode ser realizada de diversas formas. O
método de barragens por meio de aterro hidráulico é o mais convencional e utilizado
pelas empresas. Essas barragens podem ser de solo natural ou podem ser implantadas
e/ou alteadas com os próprios rejeitos. Existem três métodos mais comuns de
alteamento de barragens de rejeitos: o método de montante, o método de jusante e o
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Barragens de rejeitos da mineração: o princípio da
prevenção e a implementação de novas alternativas
método da linha de centro, sendo que uma barragem pode ser alteada com mais de um
método. Com o intuito de esclarecer melhor alguns termos técnicos e os três métodos
citados, vejamos a figura abaixo:
Afirma David Chambers (2015) que não há dúvida de que os estragos causados pela
ruptura de barragens da mineração teriam sido muito menores se os resíduos das minas
fossem menos fluídos. Tal afirmação atesta a necessidade de aperfeiçoamento e
utilização de novas formas de disposição final dos rejeitos da atividade minerária.
5 A prevenção como princípio norteador da implementação de medidas mais protetivas e
da substituição gradual dos aterros hidráulicos
Paulo Affonso Leme Machado (2015, p. 118) lembra, ainda, que a Corte Internacional de
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Justiça, no processo Gabcíkovo-Nagymaros (Hungria/Eslováquia), sentenciou que “A
Corte não perde de vista que, no domínio da proteção do meio ambiente, a vigilância e a
prevenção impõem-se em razão do caráter frequentemente irreversível dos prejuízos
causados ao meio ambiente e dos limites inerentes aos mecanismos de reparação deste
tipo de dano”.
O Princípio 8 da Declaração do Rio de Janeiro de 1992, por sua vez, dispõe que, “ a fim
de conseguir-se um desenvolvimento sustentado e uma qualidade de vida mais elevada
para todos os povos, os Estados devem reduzir e eliminar os modos de produção e de
consumo não viáveis e promover políticas demográficas apropriadas”.
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Barragens de rejeitos da mineração: o princípio da
prevenção e a implementação de novas alternativas
A questão deve ser debatida sob a perspectiva multidisciplinar, não apenas por envolver
aspectos jurídicos e técnicos, mas também sociais, econômicos e políticos. Uma
determinação dessa envergadura acarretaria desemprego e crise social, além de
degradação do meio ambiente com a utilização de técnicas ainda pouco pesquisadas.
A própria Lei 12.305/2015, nesse sentido, dispõe como princípio da Política Nacional de
Resíduos Sólidos “a visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as
variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública” (art. 6º,
III).
Antes da adoção pelo poder público de qualquer medida tendente a vedar a disposição
final de resíduos da mineração em aterros hidráulicos, necessário sopesar se o impacto
positivo de tal vedação seria mais relevante que os impactos socioeconômicos
decorrentes da mesma. Além do meio ambiente ecologicamente equilibrado, outros
princípios também estão constitucionalmente protegidos, como aqueles relativos às
garantias sociais e à ordem econômica.
Assim, mesmo que os acidentes com as barragens por aterro hidráulico demonstrem a
necessidade de substituí-las por outros métodos de disposição de rejeitos, parece-nos
mais harmônico com a disciplina constitucional que essa transição se dê de maneira
planejada e gradual.
realizado gradualmente.
De acordo com seu art. 7º, é objetivo da Política Nacional de Resíduos Sólidos o
“incentivo ao desenvolvimento de sistemas de gestão ambiental e empresarial voltados
para a melhoria dos processos produtivos”. O aperfeiçoamento das formas de disposição
de resíduos, parte integrante dos sistemas de gestão ambiental e da melhoria dos
processos produtivos, depende de tempo hábil para o aprofundamento das pesquisas e
para a realização de testes de campo.
Não remanescem dúvidas de que o atual cenário envolvendo ocorrências com barragens
de contenção de rejeitos e seus consequentes impactos ambientais vêm despertando
uma mudança de paradigma, propiciando o incentivo pela busca de novas alternativas
para essas estruturas.
Não se pode olvidar que a metodologia de disposição dos rejeitos está atrelada à
qualidade do minério e do seu processo de beneficiamento. Assim, nem todas as
alternativas propostas tornam-se viáveis para qualquer tipo de exploração do minério de
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Barragens de rejeitos da mineração: o princípio da
prevenção e a implementação de novas alternativas
Nesse sentido, têm sido avaliadas, além das formas geotécnicas mais convencionais de
disposição do rejeito, como o lançamento em aterro hidráulico, empilhamento de rejeito
grosso e rejeito ciclonado, outras alternativas como o empilhamento após secagem da
lama, o espessamento do rejeito em forma de pasta, a filtragem e o desaguamento.
Estas alternativas, apesar de menos tradicionais e de pouca utilização pela indústria
minerária nacional, deveriam ser mais fomentadas, tendo em vista apresentarem
grandes vantagens ambientais, como otimização de áreas e elevado potencial de
recuperação da água, além de reduzirem significativamente os custos operacionais do
empreendimento ao longo do tempo se considerada a necessidade ad eternum de
monitoramento de uma barragem convencional, seu custo com o descomissionamento e
as possíveis reparações ambientais e sociais no caso de ocorrência de dano ambiental.
Além dessas alternativas, destaca-se a disposição concomitante dos rejeitos com estéril,
que pode ocorrer em forma de pasta, pode ser confinada, espessada ou misturada, por
meio do rejeito em qualquer granulometria e estéril (homogeneizado ou em camadas).
Muitos experimentos vêm sendo realizados com o intuito de verificar a viabilidade destes
procedimentos, também denominados ‘empilhamento drenado’. Estas estruturas podem
apresentar vantagens ambientais quando comparadas a uma barragem convencional,
pois otimizam o uso de áreas e possibilitam a utilização de dois tipos de resíduos do
processo de mineração, o estéril e o rejeito, sendo o impacto maior desta estrutura
verificado na paisagem local.
É razoável considerar, sob o ponto de vista econômico, que a substituição dos aterros
hidráulicos por novas alternativas de disposição final de resíduos se dê de maneira
gradual. Os altos custos de investimento para a implantação de novas tecnologias e
métodos, associados ao cenário econômico nacional desfavorável, poderia inviabilizar
inúmeros empreendimentos minerários. Não se pode ignorar que a mineração constitui a
base da economia nacional.
A Lei 12.305/2010 (LPNRS), por exemplo, apresenta em seu art. 21 o conteúdo mínimo
necessário para a elaboração do plano de gerenciamento de resíduos sólidos, que deve
conter, dentre outros dados e informações, metas e procedimentos relacionados à
minimização da geração dos mesmos (art. 21, VI). A implementação de novas
tecnologias durante o processo produtivo da mineração, mesmo para aqueles
empreendimentos que ainda se utilizarem de barragens por meio de aterros hidráulicos,
é uma das medidas possíveis e indicadas aos empreendimentos no sentido de
proporcionar a redução gradual da geração de resíduos da mineração.
“o setor mineral deve estabelecer uma clara diretriz quanto à reciclagem de metais e
outros minérios, considerando-se a entrega em vigor da Lei 12.305 de 12 de agosto de
2010, que institui o a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Essa lei responsabiliza todos
os elos das cadeias produtivas de grandes, médias e pequenas empresas sobre o
processo de coleta, destino, reciclagem e restituição dos descartes sólidos (...)”.
Ao Poder Executivo cabe diagnosticar, analisar e propor alterações nas normas que
regulamentam a disposição de resíduos da mineração, com o intuito de aumentar os
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níveis de segurança, além de, por meio dos seus respectivos órgãos ambientais, exigir
dos empreendimentos a utilização de técnicas mais modernas de disposição de resíduos,
sempre em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, que
orientam a atuação da Administração Pública. Pode o Executivo, dentre outras medidas,
vedar a utilização do método a montante clássico para o alteamento de barragens de
rejeitos. Vale lembrar que, nos termos do art. 24 da Lei 12.305/2012, o plano de
gerenciamento de resíduos sólidos é parte integrante do processo de licenciamento
ambiental do empreendimento. Pode o poder público, ainda, instituir medidas indutoras
e linhas de financiamento para atender, prioritariamente, às iniciativas de prevenção e
redução da geração de resíduos sólidos no processo produtivo e o desenvolvimento de
pesquisas voltadas para tecnologias limpas aplicáveis aos resíduos sólidos (art. 42, I e
VII da Lei 12.305/2010).
Os acidentes com barragens de rejeitos da mineração ocorridos nos últimos anos nos
permite constatar que os mecanismos jurídicos direcionados à recuperação e indenização
dos danos causados têm se apresentado insuficientes para a reparação integral do meio
ambiente degradado.
Além disso, para possibilitar a transição gradual dos aterros hidráulicos para novas
alternativas de disposição de rejeitos, compete ao poder público, dentre outras medidas:
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