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O futebol feminino tupiniquim

Segundo o livro "Futebol, Carnaval e Capoeira - Entre as gingas do corpo


brasileiro", de Heloísa Bruhns, enquanto os homens da elite brasileira começaram a
praticá-lo no final do século XIX no Rio de Janeiro e em São Paulo, o grupo feminino
que aderiu à prática do futebol era pertencente às classes menos favorecidas. Por conta
disso, as mulheres que jogavam futebol eram consideradas "grosseiras, sem classe e
malcheirosas". Às mulheres da elite cabia o papel de torcedoras. "As partidas de futebol
masculinas eram um evento da alta sociedade e as mulheres se arrumavam para ir
assistir aos jogos", afirma o livro.
Apesar de remota datação deste acontecimento, a história quase recente do país
do futebol, praticado por mulheres, não passou a ser visto de um modo diferente. Os
primeiros registros de partidas mistas, com homens e mulheres juntos, datam de 1908 e
1909. Dentre partidas não oficiais e muito menos bem quistas, a discriminação latente,
que por anos ignorada e encorajada, chegou ao seu ápice com a criminalização da nossa
prática. Em 1941, ano em que aconteceu o primeiro jogo masculino apitado por uma
mulher, num amistoso entre o Serrano de Petrópolis contra o América do Rio. Na
ocasião, o árbitro passou mal e uma atleta da partida preliminar ao amistoso assumiu o
apito. Dia 14 de Abril do mesmo ano, durante a presidência de Getúlio Vargas, foi-se
criado o Decreto-Lei 3199, proibindo a “prática de esportes incompatíveis com a
natureza feminina”, entre eles o futebol. Este só seria revogado em 1979.
Em 1967, Asaléa de Campos Micheli, mais conhecida por Léa Campos, foi a
primeira mulher a terminar um curso de arbitragem. O Decreto-Lei 3199 proibia as
mulheres apenas de jogarem, mas não faziam menção sobre arbitragem. Essa brecha foi
o que garantiu a Léa o direito de participar do curso de árbitros em Minas Gerais, feito
no Departamento de Futebol Amador da Federação Estadual. Em entrevista ao
programa Esporte Espetacular, da Rede Globo, em 2007, ela informou que não pode
participar sequer da formatura do curso, por represálias machistas.
Desde então, com a pós-modernidade advinda da terceira onda feminista,
chegando ao Brasil em meados dos anos 80, pela primeira vez, foi vista uma verdadeira
revolução na sociedade e nos campos. A primeira seleção Brasileira de futebol feminino
foi convocada pela CBF em 1988, para disputar - e vencer - o “Women’s Cup of Spain”.
Atualmente, a principal pauta em debate é o detrimento salarial no mundo olímpico,
especialmente o futebol, que é um dos mais lucrativos e populares esportes mundiais.
Anos se passaram, mas ao menos um aspecto, para o nosso progresso, podemos ter
orgulho em afirmar: no século XXI, podemos assistir as nossas meninas, orgulhos da
nação, em campo. E vibrar, torcer, se emocionar. Seguir na luta incansável pela
igualdade, dentro e fora da quadra.

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