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Fonética e Fonologia do Português

Aula 01: Linguística – objeto de estudo

Apresentação
Diferentemente das abordagens sintáticas, semânticas, morfológicas e textuais, os conteúdos atinentes aos estudos
fonéticos e fonológicos não são tão prestigiados nos cursos de português, nos concursos públicos, tampouco nos
manuais de redação de Direito, Jornalismo, Administração etc. Por isso mesmo, discutiremos nesta aula o quão
importante é o domínio dos compêndios desta disciplina, visto que trabalha com conceitos muitos peculiares e próprios,
como o fone e o fonema.

Aprenderemos um pouco mais sobre as variações linguísticas presentes em nosso dia a dia, traçando um paralelo com os
conceitos de dialeto e idioleto. E já que estaremos abordando diferentes manifestações linguísticas, seja em âmbito social,
seja no individual, lançaremos mão dos conceitos de pidgin e crioulo dentro da abordagem de língua arti cial, criada para
determinado m.

Ao nal, mostraremos o leque avantajado de possibilidades para um pro ssional de fonética e fonologia no mercado de
trabalho da atualidade, deixando de lado alguns mitos que cercam a área de Letras, mas trazendo novos caminhos inter e
multidisciplinares, que enxergam os formados nessa área com muito bons olhos.

Objetivo
Identi car o objeto da Linguística e seus objetivos na relação com a Fonética e com a Fonologia;

Reconhecer as diferenças mais salientes entre as variantes padrão e não padrão, e o papel da Fonética e da
Fonologia nesse âmbito;

Relacionar os estudos de Fonética e Fonologia com as diversas áreas do saber atuantes com linguagem.

Aspectos fonéticos nas variações linguísticas

Uma pergunta importantíssima antes de começarmos este estudo:


Você sabe o que é a Linguística? O que ela estuda? Com que objetivos?

Nesta aula, faremos um panorama inicial sobre os principais aspectos dos estudos linguísticos relacionados com a nossa
disciplina: Fonética e Fonologia.

Começando a responder às perguntas feitas, podemos a rmar que, segundo Ferdinand de Saussure (considerado o fundador
da Linguística como ciência autônoma, com seu Curso de Linguística Geral):

"A Linguística é a ciência que investiga os fenômenos


relacionados à linguagem e que busca determinar os
princípios e as características que regulam a estrutura das
línguas. Seu objeto de estudo é a língua como um sistema
autônomo, dissociado da fala – que é individual."

Bem, tendo dito isso, podemos começar a analisar as situações de língua por que passamos e veremos como os estudos
linguísticos fazem parte de nossa vida sem que percebamos. O que a Linguística vai fazer é teorizar essas experiências que
temos com a linguagem, trazendo um aparato cientí co inovador na abordagem sistêmica da língua.

E como a Fonética e a fonologia se encaixam nisso?

Vejamos os estudos das variantes linguísticas abaixo:


Seu amigo de BH pronuncia a seguinte frase:

Suponha que você, nascido e criado no Rio de Janeiro, vá


receber um amigo seu de Belo Horizonte em sua casa.

Logo que ele chega, você convida outros amigos para


compartilhar esse momento de amizade.

No instante em que as pessoas começarem a conversar,


haverá certamente observações quanto ao sotaque, às
escolhas lexicais e aos arranjos fonéticos das palavras.

 Fonte: Mascha Tace / Shutterstock

Não demora muito e os amigos cariocas começam a fazer observações (jocosas ou curiosas) sobre essa variante linguística
utilizada pelo seu amigo mineiro:

A palavra trem em vez de negócio, por exemplo;

As reduções do diminutivo das palavras cadin e poquin;

A supressão da letra “d” no gerúndio comendo.

Todos esses apontamentos mostram que, no RJ, a variante utilizada pelo


seu amigo de MG não é a padrão e assim conseguimos identi car falantes
nativos e não nativos de determinado país, região ou mesmo comunidade.

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Falando nisso, aposto que você também já passou pela experiência de não entender ou não ser entendido por alguém que
mora perto da sua casa, ou que nasceu no mesmo lugar que você. Isso acontece porque - também dentro de um mesmo
grupo, comunidade, bairro, cidade, e até na mesma casa - as pessoas usam variantes linguísticas distintas.

Imagine você com 13 anos e seu avô com 75.

Ambos estão conversando e, de repente, você diz assim:

 Fonte: Ann131313 / Shutterstock

Obviamente que não só o avô, mas qualquer um que estude um pouco das regras gramaticais de nossa língua sabe que essa
não é a variante padrão ou a variante de prestígio adotada pela gramática da língua portuguesa. Isso porque as variantes
prestigiadas não estão ligadas somente a questões linguísticas, mas sociais e culturais.

É claro que você já percebeu os erros de concordância da frase acima, mas há também detalhes fonéticos que mostram uma
transformação dentro da estrutura fônica da palavra: vemos que, na produção oral de determinados grupos, “a gente” pode virar
“a rente”, e “não” pode se tornar “num”. Essas transformações fonéticas muitas vezes indicam qual a origem geográ ca e social
do falante, sua idade, sexo, pro ssão etc.

Às vezes falar uma frase ou palavras de um jeito extremamente certo


pode indicar que você não é um falante nativo, visto que na maioria
dos casos os falantes nativos de uma língua sabem como e quando
usar as simpli cações.

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Esses exemplos nos dão uma ideia melhor da diferença entre língua, dialeto (ou variante) e idioleto:
As variantes ou dialetos são Os idioletos são escolhas
A língua é a unidade sistemática
exatamente a forma como nos pessoais, modo bem individual
da estrutura comunicativa, a
valemos da língua para nos de comunicação, e isso inclui
base com que e pela qual todos
comunicarmos uns com os aquelas gírias bem especí cas,
nós nos comunicamos, nos
outros; ou palavras que só dentro de um
entendemos e continuamos
pequeno grupo são usadas
uma conversa, introduzindo
daquele modo.
assuntos diversos;

Exemplo

A língua portuguesa estabelece, na sua ordem direta, a forma Sujeito-Verbo-Objeto. Então, essa sintaxe da língua nos permite,
mesmo em variantes diferentes, não sair do limite normativo que a língua estabelece.

Temos na variante padrão: Você pode pôr o pó aqui?

A resposta vem na variante não-padrão: Pó pô o pó ocê.

As diferenças fonéticas entre as duas frases não impedem a compreensão, apesar de sabermos que o primeiro se vale da
norma culta e o segundo de uma norma coloquial para se comunicar.

Estamos vendo como os estudos sobre Fonética e Fonologia vão além das questões fônicas e permeiam também as questões
sociais. É claro que você não vai deixar de falar do seu jeito, quando a ocasião não exigir de você um uso mais culto da língua,
no entanto é muito importante que você perceba que as simpli cações fonéticas, substituições de letras e acréscimo de outras
revelam muito sobre os falantes.

Atenção

Pode parecer, mas Fonética e Fonologia não são ramos idênticos de estudo da língua. A respeito do assunto, há a explicação: A
Fonética estuda os sons da fala como entidades físico-articulatórias isoladas (aparelho fonador). É a Fonética que descreve os
sons da linguagem e analisa suas particularidades acústicas e perceptivas. Ela fundamenta-se em estudar os sons da voz
humana, examinando suas propriedades físicas independentemente do seu papel linguístico de construir as formas da língua.
Sua unidade mínima de estudo é o som da fala, ou seja, o fone.

A Fonologia estuda as diferenças fônicas intencionais, distintivas, isto é, que se unem a diferenças de signi cação; estabelece a
relação entre os elementos de diferenciação e quais as condições em que se combinam entre si para formar morfemas,
palavras e frases. Sua unidade mínima de estudo é o som da língua, ou seja, o fonema.

A Fonologia e o estudo do fonema


 Fonte: Lassedesignen / Shutterstock).

Na maioria dos estados brasileiros, no que diz respeito à produção oral dos falantes em geral, o fonema /t/ é pronunciado de
duas formas diversas, dependendo da vogal que lhe procede: diante de [i], o fonema é materializado como [tʒ] (como em tia, na
fala do carioca), à proporção que, diante das outras vogais, é materializado como [t] (tato, teu, tua).

Já em regiões como Pernambuco, o fonema /t/ diante de [i] é pronunciado da mesma forma que diante das outras vogais (o
vocábulo tia é pronunciado de maneiras diferentes no Rio de Janeiro e em Pernambuco).

Mas como não existe uma contraposição semântica entre as duas formas de pronúncia, a Fonologia não concebe os dois sons
como fonemas diferentes. Na verdade vai concebê-los como uma mesma unidade (funcionalmente falando) e examina as
condições sob as quais se dá a alternância entre eles (geogra camente, por exemplo).

Mais à frente, entenderemos que essas ocorrências se dão porque [d͡ʒ] e [dão] são alofones. Mas isso é assunto para outra
aula.

Fonética – qual seu objeto de estudo?

A unidade básica de estudo para a Fonética é o fone. A fala humana é capaz de produzir inúmeros fones. A forma mais comum
de representar os fones pelos linguistas é através do Alfabeto Fonético Internacional (AFI), desenhado pela Associação
Internacional de Fonética (IPA).
Quando fazemos a transcrição fonética de uma palavra, devemos utilizar a tabela acima.

A palavra casa, por exemplo, seria foneticamente escrita /’kazɐ/. Observe que a tabela fonética fornece uma letra especí ca
para cada som, e mesmo as letras “a”, por serem pronunciadas diferentemente devido à tonicidade, recebem um símbolo
distinto (uma é vogal, a outra semivogal).

Pidgins e crioulos

Você já ouviu falar de pidgins e crioulos?

Vimos que a língua é um conglomerado complexo de estruturas que tornam a linguagem codi cada e relativamente uma para
um grande grupo de falantes.

Foneticamente, as línguas são bastante ricas, complexas, valem-se de combinações variadas entre consoantes (encontros
consonantais) e vogais (ditongos, tritongos e hiatos). Mas existem estruturas linguísticas que são extremamente simples, não
usam quase nenhuma combinação complexa e são formadas por palavras dissílabas, basicamente compostas por consoante
+ vogal.

Exemplos:
Estamos falando de pidgins: línguas em estágios primitivos, construídas para contatos entre povos de diferentes origens, com
objetivos bastante delimitados. Os pidgins não possuem muita variedade de palavras, quase nenhuma exão de gênero ou
número, e a combinação fonética é basicamente como vimos anteriormente, consoante + vogal.

Comentário

Os primeiros registros de um pidgin foram quando do contato entre portugueses e nativos africanos com o propósito de permitir o
comércio entre eles.

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A evolução de um pidgin se dá quando os falantes nativos adotam essa estrutura linguística como sua língua materna,
passando a se chamar crioulo.

Crioulo é, portanto, quando um pidgin permanece como língua de um grupo, mesmo que pequeno, e é passado pelas gerações.
Áreas de trabalho

Poucos são os quem sabem que pro ssionais especializados na área de fonética e fonologia possuem um mercado de
trabalho bastante amplo e não somente na área do magistério.

Um levantamento feito pela pesquisadora Silva (2009) nos mostra esses dados:

a) Ensino de língua materna;

b) Teórico da linguística;

c) Ensino de língua estrangeira;

d) Planejamento linguístico-social;

e) Tradução e interpretação;

f) Dramaturgia;

g) Fonoaudiologia;

h) Linguagem de surdo;

i) Linguística computacional;

j) Linguística forense;

k) Ciência da telecomunicação;

l) Linguística indígena.

Atividades
1. Dentre os objetos de estudo da Linguística, assinale aquele que mais se relaciona com a Fonética e a Fonologia:

a) Investigação da língua como sistema, sem observar as produções de fala dos indivíduos.
b) Investigação da língua em estado sincrônico, sem avaliar a evolução da fala pelos tempos.
c) Análise das produções de livros e revistas em língua portuguesa.
d) Pesquisas sobre a aplicação de textos em contextos profissionais.
e) Investigação e análise das produções de fala dos falantes de uma dada língua, mostrando as variedades e especificidades das
construções linguísticas.
2. Relacione as colunas com as devidas informações acerca do que estudamos na aula de hoje:

Fonética 1 Sintaxe 2 Semântica 3 Gramática 4

a) Abrange todos os elementos de estudo.

b) Estuda os sons da fala, precisamente.

c) Estuda a estrutura das frases e orações.

d) Estuda os signi cados das palavras.

3. Aponte um aspecto do português que marque a variação linguística entre faixas etárias diferentes. Dê exemplos para
melhorar sua resposta.

4. Analisando o amplo mercado que possui um especialista em Fonética e Fonologia, marque (V) para verdadeiro e (F) para falso:

a) Um pro ssional especializado em Fonética e Fonologia jamais poderia trabalhar com fonoaudiologia, pois não tem formação em medicina.

b) O pro ssional de Letras com especialização em Fonética e Fonologia está restrito à sala de aula.

c) Para ser um bom professor de língua portuguesa para estrangeiros, é bom ter domínio de Fonética e Fonologia, pois nem todos os sons da
fala produzidos por um nativo o são por um estrangeiro. Daí a necessidade de um especialista.

Referências
Notas
BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. ver. ampl. Rio de Janeiro: Lucerna, 2001.

CALLOU, D.; LEITE, Y. Iniciação à Fonética e à Fonologia. 5. ed. Rio de Janeiro, Zahar, 1995.

MORAES, R. Fonética e Fonologia da língua portuguesa. Rio de Janeiro: SESES, 2015.

SANTOS, P. P. Distinção entre Fonética e Fonologia. In: InfoEscola. Disponível em:


https://www.infoescola.com/portugues/distincao entre fonetica e fonologia/
<https://www.infoescola.com/portugues/distincao-entre-fonetica-e-fonologia/> . Acesso em: 11 abr. 2019.

SILVA, T. C. Fonética e Fonologia do português: roteiro de estudos e guia de exercícios. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Dupla articulação da linguagem;

Dois planos de constituição dos enunciados;

Objetos da Fonética e da Fonologia.

Explore mais

Assista ao documentário. Você fará uma imersão em um universo linguístico riquíssimo e aprenderá muito com as variedades
nordestinas sertanejas:

Sertão como se fala. Direção: Leandro Lopes. Brasil: Bil’s Cinema e Vídeo, 2016. 71 min, son., color.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 02: Dupla articulação da linguagem

Apresentação
Na primeira aula, vimos alguns fundamentos da Linguística e agora daremos início ao estudo de conceitos mais
aprofundados na Fonética e na Fonologia.

Uma primeira de nição que ajuda a delimitar o campo de atuação dessas áreas é o tema que abordaremos neste
encontro: a teoria da dupla articulação da linguagem, estruturada pelo linguista francês André Martinet.

Objetivo
De nir o conceito elaborado por Martinet e sua relação com a produção de linguagem;

Comparar a comunicação animal com a linguagem humana.

Palavras iniciais

Você já se perguntou o quanto a comunicação humana difere da comunicação


entre os outros animais? Se sim, já identi cou o que as torna distintas?

Nesta aula, vamos construir as respostas a essas duas perguntas por meio do entendimento do conceito que dá nome a este
segundo encontro.

Vamos, entretanto, elencar antes algumas semelhanças para, depois, entender alguns motivos que tornam a expressão do ser
humano tão característica e única.
Em segundo lugar, podemos
Primeiro, nota-se que os animais
também reconhecer que a
conseguem, assim como o ser
recepção dessa mensagem é
humano, transmitir informações
efetiva, tendo em vista que
entre si, inclusive por meio de
bandos inteiros são alertados
sons e movimentos.
quanto a determinados perigos,
por exemplo.

A partir dessas duas justi cativas, já conseguimos entender que existe


também na comunicação animal um código comum entre determinada
espécie, que possibilita a transmissão bem-sucedida de uma mensagem.

Ainda assim, é possível mencionar um terceiro aspecto, de acordo com o qual pode-se reconhecer que a comunicação entre
animais também é afetada pelas emoções, que podem incluir, por exemplo, o aumento de volume na emissão sonora em
contextos de gravidade.

Tendo em vista essas semelhanças, vamos compreender agora a dupla articulação da linguagem e, assim, estabelecer uma
diferença essencial que torna a comunicação humana bastante especí ca.

As articulações da linguagem

Como você já sabe, a dupla articulação da linguagem é um conceito sistematizado por André Martinet. Vamos, então,
compreender essa teoria por partes, começando por de nir o que é articulação.

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Do latim articulus, é uma palavra do gênero masculino de segunda


declinação que signi ca parte, subdivisão, membro. Disso depreende-
se que a articulação da linguagem diz respeito à possibilidade de
segmentar uma produção linguística em unidades menores, as quais
podem unir-se de diversas formas para produzir estruturas maiores.
Pense, por exemplo, na anatomia do corpo humano: os ossos interligam-se por meio das articulações. Assim, embora uns
sejam menores que outros, todos estão unidos e formam grupos que, por sua vez, também conectados, constituem o corpo.

Tendo em vista esse entendimento, vamos compreender quais são os dois planos em que, segundo Martinet, a linguagem é
articulada.

 A dupla articulação

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Primeira articulação
Todos os elementos de uma determinada língua são formados de unidades mínimas dotadas de sentido, os
morfemas, a que Martinet se refere como monemas. Essas estruturas, por sua vez, para manterem seu sentido, não
podem ser divididas em unidades menores, como o próprio linguista explica:

[...] é o conjunto cabeça que signi ca cabeça, e não a soma de eventuais sentidos de cada um dos segmentos em que
podemos dividi-lo: ca -be e -ça, por exemplo. (MARTINET, 1978)

Martinet ilustra de maneira bastante clara, mas é importante destacar que os morfemas nem sempre coincidem
perfeitamente com vocábulos. Tomemos, por exemplo, a palavra gatos. Há mais de um elemento formando essa
estrutura:

gat-, radical que signi ca mamífero felino, geralmente pequeno e peludo, criado como bicho de estimação;

-o, morfema de masculino;

-s, morfema de plural.

Esse radical ainda pode unir-se a outros morfemas e dar origem a mais vocábulos, como gatil, engatinhar, gatinho etc.

Segunda articulação

Lembra-se de que dissemos que os morfemas não podem ser divididos? Isso ocorre porque, como também
explicamos, eles são unidades mínimas. Assim, para manterem o sentido que veiculam, não podem ser partidos em
elementos menores.

Vamos fazer novamente um paralelo com os ossos do corpo humano: um osso longo (o fêmur, por exemplo) é
composto pelas epí ses (as extremidades do osso) e pela diá se (o corpo do osso). Mas repare: a epí se não é o osso,
ela faz parte da composição do osso.

 Fonte: //ral.fmrp.usp.br/tumores_osseos.pdf
<//ral.fmrp.usp.br/tumores_osseos.pdf>

Assim também, o /g/ de gatos não é um morfema porque gat- não pode ser dividido. A esse elemento dá-se o nome de fonema,
que é uma unidade desprovida de sentido e que compõe o morfema gat-, junto com os fonemas /a/ e /t/.
Os fonemas, então, fazem parte da segunda articulação da linguagem e têm apenas valor distintivo, o que signi ca dizer que, se
substituirmos, no morfema gat-, o fonema /g/ por /p/, teremos outro radical, pat-, que forma patos, por exemplo.

Quanto ao caráter distintivo dos fonemas, que não possuem signi cado, observe, ainda, a seguinte explicação:

Um simples grito de dor, inanalisável e inserido no contexto da expressão, pode ser o mesmo em comunidades diferentes. Já a
construção estou com dor de cabeça, na exempli cação de Martinet, além de ser analisável em unidades dotadas de uma
expressão fônica e de um conteúdo semântico, será também diferentemente construída conforme o sistema linguístico em que se
situa. (VIEGAS, 1986)

Para sistematizar, podemos pontuar que a primeira articulação diz respeito às unidades signi cativas, situadas no plano do
conteúdo, relaciona-se, portanto, com a morfologia. Já a segunda articulação, que aponta as relações entre os fonemas, opera no
plano da expressão e está inserida no campo da fonologia. Repare também que os morfemas são sempre indicados utilizando-se
hífen para limitar seu início ou m. Já os fonemas são sempre representados entre barras.

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Economia linguística

Repare no fato de que unidades mínimas podem, nos dois planos identi cados por Martinet, unirem-se a outras unidades e,
mesmo dentro de um conjunto nito de itens, formar uma in nidade de estruturas. resume bem essa qualidade:

"Com poucas dezenas de fonemas, cujas possibilidades de


combinação estão longe de serem todas exploradas em cada
língua, formam-se milhares de unidades de primeira
articulação. Com algumas milhares de unidades de primeira
articulação, forma-se um número ilimitado de enunciados. Se
os homens produzissem um som diferente para expressar
cada uma de suas experiências ou para designar cada
elemento da realidade, teriam uma sobrecarga na memória e,
além disso, o aparelho fonador não seria capaz de emitir a
quantidade de sons diferentes necessários para isso nem o
ouvido seria capaz de apreender todas essas produções
fônicas".
PIETROFORTE, 2004
Poesia e a lapidação da expressão linguística

Uma forma muito palpável de analisar o domínio da dupla articulação proposta por Martinet é observar como poetas de todos
os tempos valeram-se dessa possibilidade para expressar conceitos novos, unindo, por exemplo, morfemas que nunca haviam
sido utilizados conjuntamente.

É provável que, ao mencionar essa forma de manipular a linguagem, você logo pense em Guimarães Rosa ou, mais
contemporaneamente, em Manoel de Barros e Ondjaki. Esses são, de fato, bons exemplos do trabalho minucioso de
observação do comportamento da língua e do polimento linguístico que possibilita a expressão poética.

A comunicação animal e a linguagem humana

Iniciamos esta aula propondo a questão de se a linguagem é uma faculdade exclusiva dos seres humanos ou se os outros
animais também a possuem. Esse assunto foi tópico de ampla explicação de Margarida Petter (2004), que menciona estudo de
Karl von Frisch sobre a estrutura e a comunicação das colmeias, especialmente quanto a fontes de alimentos encontradas por
abelhas-obreiras.

Neste estudo, foi possível observar a precisão com que a


abelha informa, por meio de dança, a distância do alimento,
a direção em que se encontra e a natureza da comida, por
exemplo.

Essas são informações muito sensíveis e que são


codi cadas por uma componente da colmeia e
decodi cadas pelas outras.
Porém, mesmo diante desse exemplo de tamanha habilidade em comunicar-se e de exatas informações transmitidas, vamos
elencar alguns exemplos que se relacionam com o conteúdo que estudamos nesta aula.

O primeiro ponto a ser citado é que a qualidade articulatória da linguagem humana não se replica na comunicação animal: não
há a possibilidade de se decompor uma determinada mensagem em elementos mínimos que sejam combinados com outros
elementos em outras situações para formar uma mensagem distinta. A dança feita pela abelha, por exemplo, atende ao
propósito único de informar determinadas coordenadas quanto à posição e tipo do alimento encontrado.

Uma segunda questão diz respeito ao conteúdo da mensagem: enquanto animais têm certa limitação sobre o que comunicar, a
linguagem humana permite que se produza conteúdo sobre basicamente tudo, inclusive — e aqui está a terceira diferença —
sobre a própria linguagem, que é o que temos feito ao estudar Linguística. O exercício metalinguístico permite-nos pensar
concreta e abstratamente sobre a linguagem humana.

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Atividades
1. Explique o que postula a dupla articulação da linguagem e quais são as áreas da Linguística que se relacionam diretamente
com cada uma delas.

2. Estudamos, nesta aula, que a dupla articulação da linguagem sistematiza a análise da constituição lexical em nível
morfológico e fonológico. Vamos, então, praticar, relembrando as aulas dos ensinos fundamental e médio. Para isso,
decomponha as seguintes palavras, apontando os morfemas que as compõem (lembre-se de que a divisão dos morfemas é
apontada com hífen): meninos; bobo; falamos; ta; in nitamente. Após, escolha quatro desses morfemas e faça novas
composições.
3. Observe o seguinte texto do poeta Manoel de Barros:

Escrever nem uma coisa

Nem outra —

A m de dizer todas —

Ou, pelo menos, nenhumas.

Assim,

Ao poeta faz bem

Desexplicar —

Tanto quanto escurecer acende os vagalumes.

(BARROS, 2009)

O autor cria a palavra desexplicar, uma palavra ainda não dicionarizada. Qual é o sentido que o morfema des- confere ao
sentido de explicar:

a) Certeza.
b) Afirmação.
c) Dúvida.
d) Negação.
e) N.R.A.

4. Quantos morfemas compõem a palavra menininhos?

a) 2.
b) 3.
c) 4.
d) 5.
e) 6.
5. O estudo da dupla articulação da linguagem permite que a rmemos que:

a) O falante faz uso de um número ilimitado de fonemas para criar dezenas de morfemas que, combinados, dão origem a uma finitude de
palavras, qualidade expressa no princípio da economia linguística.
b) O falante faz uso de um número limitado de morfemas para criar milhares de fonemas que, combinados, dão origem a uma infinidade
de palavras, qualidade expressa no princípio da economia linguística.
c) O falante faz uso de um número limitado de fonemas para criar milhares de palavras que, combinados, dão origem a uma infinidade de
morfemas, qualidade expressa no princípio da economia linguística.
d) O falante faz uso de um número limitado de fonemas para criar milhares de morfemas que, combinados, dão origem a uma infinidade
de palavras, qualidade expressa no princípio do desperdício linguístico.
e) O falante faz uso de um número limitado de fonemas para criar milhares de morfemas que, combinados, dão origem a uma infinidade
de palavras, qualidade expressa no princípio da economia linguística.

Referências
Notas
BARROS, M. O guardador de águas. Rio de Janeiro: Record, 2009.

MARTINET, A. Elementos de linguística geral. São Paulo: Martins Fontes, 1978.

PETTER, M. Linguagem, língua, linguística. In: FIORIN, J. L. Introdução à linguística. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2004.

PIETROFORTE, A. V. A língua como objeto da Linguística. In: FIORIN, J. L. Introdução à linguística. 3. ed. São Paulo: Contexto,
2004.

VIEGAS, A. M. A dupla articulação da linguagem. In: Revista do Centro de Estudos Portugueses, [S.l.], v. 9, n. 12, p. 53-57, dez.
1986. ISSN 2359-0076. Disponível em: //www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/cesp/article/view/4442/4217
<//www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/cesp/article/view/4442/4217> . Acesso em: 4 jun. 2019.

Próxima aula

Bases siológicas da produção da fala;

Aparelho fonador;

Fonética articulatória.

Explore mais

Além das obras indicadas no decorrer da aula e nas referências, você pode ler mais sobre o assunto em:

MARTELOTTA, M. E. Dupla articulação. In: MARTELOTTA, M. E. Manual de Linguística. São Paulo: Editora Contexto, 2008.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 03: Fonética e Fonologia – introdução

Apresentação
Na aula passada, entendemos o conceito de dupla articulação da linguagem, esquematizada pelo linguista André Martinet.

Nesta etapa, vamos entender melhor a produção da voz pelo viés anatomo siológico e, com isso, dar início aos estudos
da fonética articulatória, começando pelo entendimento de como funciona o aparelho fonador e suas características, além
de brevemente reconhecer o campo de estudo da fonética.

Objetivo
Descrever o funcionamento do aparelho fonador e as bases siológicas da produção da fala;

Explicar a unidade de estudo da fonética.

O processo fonatório

A produção da fala é um processo complexo que envolve quase metade do nosso corpo, utilizando recursos desde o cérebro
até o diafragma, um músculo localizado abaixo dos pulmões que tem papel fundamental na respiração.

Mas, antes de entendermos um pouco sobre todo o processo fonatório, precisamos saber que a fala não é uma habilidade
possibilitada por um órgão especí co e dedicado apenas a essa função. Isso porque produzir a fala é uma atividade secundária
de diversos órgãos do corpo.
 Fonte: Africa Studio / Shutterstock

A faringe, por exemplo, é um órgão que participa ativamente dos sistemas digestivo e respiratório, fazendo a função de
passagem do ar e de alimentos ingeridos para os outros órgãos, nunca permitindo que esses dois se encontrem, pois a faringe
possui mecanismos que bloqueiam a entrada de cada um nas vias erradas.

Assim, a fala é um processo sensório-motor resultado de uma complexa estrutura que inclui a formação dos pensamentos,
ideias e a execução, da qual participam múltiplos sistemas.

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"A produção da fala começa com uma programação


neuro siológica (...). A programação neurológica comanda o
desenrolar de uma série de contrações e distensões
musculares que, por sua vez, provocam o movimento de
órgãos do corpo, tornando possível a produção dos sons da
fala."
CAGLIARI, 2007
Esse conhecimento é importante, porque, para trabalharmos com a Fonética, precisamos saber como se dá a produção de
sons, tendo em vista que, como de ne Silva (2009), a Fonética é a ciência que apresenta os métodos para a descrição,
classi cação e transcrição dos sons da fala, principalmente aqueles sons utilizados na linguagem humana.

Bases siológicas da produção da fala

Como vimos no texto de Cagliari, há várias instâncias envolvidas na produção da fala humana. Nós, porém, nos deteremos
nesta aula a estudar o aparelho fonador, composto pelos sistemas:

Produtor de coluna de ar Vibrador Ressoador/articulador

Antes de entendermos cada um desses sistemas, vamos observar como eles estão estruturados:

 Sistemas do aparelho fonador

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Sistema produtor de coluna de ar
Este sistema (identi cado na imagem como área da respiração) é composto por nariz, caixa torácica, pulmões e
musculatura e, a partir do movimento exalatório, tem-se o uxo de ar subglótico. Como você pode reparar, esse
sistema está abaixo da laringe, onde estão localizadas as pregas vocais. Por isso, denomina-se estrutura subglótica.

Sistema vibrador
Nesta etapa, as pregas vocais emitem o som glótico a partir do uxo de ar expirado. É neste sistema que se encontra a
laringe, onde estão as pregas vocais, músculos estriados que podem causar obstrução à passagem do ar na
expiração. Quando não ocorre essa obstrução, o espaço decorrente é chamado glote.

Sistema ressoador/articulador
É composto pelos articuladores (lábios, dentes, língua, mandíbula, palato e faringe) que modi cam os espaços
supraglóticos a m de garantir a ressonância no trato vocal e a geração das fontes de ruído, ou seja, o som que é
produzido na laringe aumenta sua amplitude no trato vocal e com a barreira total ou parcial que se produz na
articulação é que são produzidas as vogais e as consoantes.

Articulador ativo
São considerados articuladores ativos os que têm possibilidade de movimentar-se, causando uma mudança no trato
vocal. Fazem eventualmente a função de articuladores ativos:

O lábio inferior e a língua (que modi cam a cavidade oral);

As pregas vocais (que alteram a cavidade faringal).

A língua tem subdivisões importantes para a produção da fala:

O ápice;

A lâmina (na imagem, um pouco abaixo do sulco longitudinal mediano);

Parte anterior;

Parte medial;

Parte posterior.

Articulador passivo
Uma vez que a mandíbula superior não se move, são seus componentes mais o véu palatino (localizado na parte
posterior do palato) que atuam como articuladores passivos:

Lábio superior;
Dentes superiores;

Céu da boca, que se divide em alvéolos (localizados um pouco acima dos dentes superiores);

Palato duro;

Véu palatino;

Úvula.

Características articulatórias

Agora que temos uma noção melhor da produção da fala, vamos estudar com mais profundidade os conjuntos de sons que se
assemelham pelas características articulatórias. Assim sendo, vamos entender como os segmentos consonantais podem ser
descritos.

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Corrente de ar 

Como mencionamos, o sistema produtor de coluna de ar faz parte da produção da fala, porém há alguns poucos sons que
são realizados por seres humanos sem a necessidade de ar, como é o caso do ranger dos dentes. Excetuando-se esses
raros casos, a maioria dos sons da fala faz uso da corrente de ar, que pode ser pulmonar, glotálica ou velar. No português,
apenas o primeiro tipo é o mecanismo utilizado.

Direção da corrente de ar 

O ar pode ser egressivo (quando o diafragma exerce pressão nos pulmões e o ar é expelido) ou ingressivo (quando o ar é
aspirado, em direção ao pulmão). No português, há apenas os sons produzidos pela corrente de ar egressiva.

Estado da glote 

Como explicamos, a glote é o espaço entre as pregas vocais, que, na produção da fala, podem ou não causar obstrução à
saída do ar. Quando as pregas vocais vibram durante essa obstrução, o estado da glote é denominado vozeado ou sonoro.
Quando a passagem do ar ocorre sem a vibração das pregas vocais, tem-se a glote desvozeada ou surda.

Posição do véu palatino 

Se você abrir sua boca na frente do espelho, vai reparar que, atrás de todos os dentes, no fundo da boca, há uma
campainha, como costuma ser chamada a úvula. Ela localiza-se no m do véu palatino ou palato mole e pode ajudar a
identi car se um som é oral ou nasal, haja vista que, nos sons orais, a úvula ca levantada e, por isso, o ar não é expelido
pela cavidade nasal.

Já nos sons nasais, a úvula abaixa e o ar consegue ressonância na cavidade nasal. Essa observação é mais facilmente
feita na produção das vogais (sons de a e ã, por exemplo) porque, nesses casos, a observação do interior da boca é mais
fácil tendo em vista que não há obstrução da passagem de ar.

Fonética e sua unidade de estudo

Na aula passada, estudamos a dupla articulação da linguagem e, com isso, entendemos que um dado conteúdo linguístico
pode ser segmentado em morfemas, na primeira articulação da linguagem, e em fonemas, na segunda, sendo esses dois
conceitos aprofundados, respectivamente, na morfologia e na fonologia.

Para a Fonética, a unidade mais importante de estudo é o fone. Conforme explicam Santos e Souza (2008), o fone é o som
discreto (segmentável, divisível) e concreto (realização material de um segmento) que pode ser medido sicamente. Isso
signi ca que o fone é um produto material que pode decompor-se em unidades formativas, os traços, os quais se combinam e
ocorrem ao mesmo tempo, invariavelmente.

Exemplo
Veja o exemplo é o da letra [p] que, decomposta, explicita os seguintes traços:

[+consonantal] trata-se de uma consoante, que causa algum tipo de obstrução à passagem de som;

[-vocálico] sendo consonantal, não pode ser vocálico;

[-nasal] o som não é expelido por meio do nariz;

[-sonoro] a letra não faz as pregas vocais vibrarem.

Esses traços se aglutinam para formar o som [p], então são elementos que ocorrem ao mesmo tempo, o que não acontece
com os fones, que não podem se sobrepor no momento de uma produção linguística.

Mas, embora não possam ser produzidos linearmente, os traços são substituíveis. Se, por exemplo, em vez de [-sonoro] e [-
nasal] fossem colocados [+sonoro] e [+nasal], o fone seria [m].

Santos e Souza (2008) explicam que ao contrário dos traços, os sons são segmentáveis, isto é, podem ser separados numa
sequência sonora. Essa segmentação só é possível dado o caráter linear dos segmentos. É impossível produzir dois
segmentos ao mesmo tempo. Por exemplo, não é possível produzir os quatro sons da palavra pata ao mesmo tempo. Um
ocorre depois do outro. Além da operação de segmentação, também é possível a substituição. Por exemplo, no lugar de pata,
podemos ter cata, lata, bata substituindo o primeiro fone dessas palavras.

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Atividades
1. Espalme suas mãos sobre seu pescoço, na parte central, onde os homens têm o pomo de Adão. Pronuncie, então, as
seguintes consoantes e perceba se elas são vozeadas ou desvozeadas:

[v] – [p] – [f] – [t] – [z] – [b]

A seguir, indique qual das opções é a correta:

a) Vozeada – vozeada – desvozeada – desvozeada – desvozeada – vozeada


b) Vozeada – desvozeada – desvozeada – desvozeada – vozeada – vozeada
c) Desvozeada – vozeada – desvozeada – vozeada – desvozeada – vozeada
d) Vozeada – desvozeada – vozeada – desvozeada – vozeada – desvozeada
e) Desvozeada – desvozeada – desvozeada – vozeada – vozeada – vozeada

2. Explique a participação do sistema produtor de coluna de ar na fonação.


3. Explique como a úvula participa da nasalidade de um segmento da fala.

4. Identi que a opção que descreve, de maneira correta, os traços das consoantes representadas:

a) [m] – [+nasal], [+sonoro], [+consonantal]


b) [b] – [-nasal], [+sonoro], [+consonantal]
c) [t] – [+nasal], [-sonoro], [+consonantal]
d) [d] – [-nasal], [-sonoro], [+consonantal]
e) [g] – [-nasal], [+sonoro], [+consonantal]

5. Os articuladores ativos desempenham papel importante na produção dos sons, pois causam mudanças no trato vocal.
Dentre eles, podemos destacar a língua, que interage com vários dos articuladores passivos na produção do som.

Observe, de frente para o espelho, que parte da língua é utilizada na produção do som [l] — você pode pronunciar, por exemplo,
a palavra be[l]o. Trata-se:

a) Da lâmina.
b) Do ápice.
c) Do palato duro.
d) Dos alvéolos.
e) Da úvula.

6. Marque a opção correta:

a) A unidade de estudo mais importante para a Fonética é o fonema.


b) Os traços são compostos por fones, que não podem ser substituídos.
c) O sistema produtor de coluna de ar é uma estrutura supraglótica.
d) O véu palatino é um articulador ativo.
e) Embora importante para a comunicação em sociedade, a fala exerce papel secundário para a anatomia humana.

Notas
Referências

CAGLIARI, L. C. Elementos de fonética do português brasileiro. São Paulo: Paulistana, 2007.

SANTOS, R. S.; SOUZA, P. C. Fonética. In: FIORIN, J. L. Introdução à Linguística II: Princípios de análise. São Paulo: Contexto,
2008.
SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Fonética e seus métodos de análise;

Fonética acústica e instrumental: uma visão laboratorial;

Fonética auditiva: percepção da fala.

Explore mais

Além dos livros indicados nas referências, sugerimos também a seguinte leitura:

MARTINS, M. R. D. Ouvir falar: Introdução à fonética do português. Lisboa: Editora Caminho, 1998.

Assista ao vídeo:

Pregas/Cordas Vocais (PPVV) Masculinas em Funcionamento. <https://www.youtube.com/watch?v=qUkK98PfXew>


Fonética e Fonologia do Português

Aula 04: Várias faces da fonética

Apresentação
Nesta aula, vamos relembrar alguns conceitos importantes de Física e Biologia que apoiam o entendimento do trabalho
com Fonética.

Estudaremos alguns aspectos de acústica, processamento auditivo, sua utilização nas pesquisas fonéticas e como esses
conhecimentos são largamente aplicados na sociedade contemporânea.

Objetivo
Examinar conceitos físicos e biológicos relacionados à fala;

Descrever a atuação da fonética acústica e auditiva.

Palavras iniciais

Focamos na produção da fala como assunto principal na aula passada, tendo em vista que, após os sinais cerebrais, é a partir
do aparelho fonador que emitimos e articulamos os sons. Para isso, fazemos uso de uma lista de fones que, combinados, dão
origem aos morfemas, os quais, por sua vez, vão também se unir para formar os vocábulos de um idioma (lembra-se da aula 2,
em que estudamos a dupla articulação da linguagem, de Martinet?).

Nesta aula, vamos entender o percurso do som, começando ainda no sistema vibrador, passando pelo sistema
ressoador/articulador até chegar aos ouvidos do interlocutor e, a partir daí, como é recebido e processado.

Som e silêncio

Antes de prosseguirmos, vamos, por meio da poesia, observar nossa relação com os sons do cotidiano e com o silêncio. A
seguir, leia em voz alta a poesia de Fernando Pessoa, que descreve um som particularmente conhecido do nosso cotidiano:
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O som do relógio
Tem a alma por fora,
Só ele é a noite
E a noite se ignora.

Não sei que distância


Vai de som em som
Pegando, no tique,
Do taque do tom.

Mas ouço de noite


A sua presença
Sem ter onde acoite
Meu ser sem ser.

Parece dizer
Sempre a mesma coisa
Como o que se senta
E se não repousa.

(PESSOA, 2016)

Em uma rápida análise, que pontos podemos ressaltar dessa poesia? Há o registro de um modo de expressão, uma alusão ao
cotidiano social e a um dos cinco sentidos humanos, concorda?

Pois é, Pessoa menciona o relógio como um objeto que produz um som contínuo e ininterrupto, sem variação, que faz
referência a um dado momento (a noite). Esse som é captado pelos ouvidos.

Agora, vamos ver um texto que, dentre outros assuntos, aborda a ausência do som, especi camente na terceira estrofe:
A perda do olfato
eu não lamento
A nal o olfato
Só serve para cheirar
Os quatro elementos
Vamos ao fato

O paladar eu perdi
Mas não porque o perdesse
Tirei da cabeça
O gosto do abacaxi

Do ouvido não olvido


Pois tendo desenvolvido
A guerra dos sentidos
Me voltei para o silêncio
O som não faz sentido

Uma consequência
Toma conta de mim
Como se fosse um barato.

(LEMINSKI, 2013)

O poeta, nesse texto, busca fazer o caminho inverso ao proposto por Pessoa, pois começa a negar os estímulos externos, que
são captados pelos sentidos humanos, relatando a perda do olfato, do paladar e a procura pelo silêncio.

Iniciamos esta aula com essas duas formas de análise do som (sua existência contínua e sua ausência) para entender a
importância de se observar o que captamos com nosso ouvido.

Limpeza da audição
Vamos ainda continuar esse exercício de atenção aos estímulos sonoros que recebemos. O compositor, escritor e educador
musical canadense Schafer (2011), em um de seus cursos, propôs aos alunos que abrissem seus ouvidos:

[...] procurei sempre levar os alunos a notar sons que na


verdade nunca haviam percebido, ouvir avidamente os sons
de seu ambiente e ainda os que eles próprios injetavam
nesse mesmo ambiente.
SCHAFER, 2011
Vamos fazer essa mesma atividade para treinar nossos ouvidos a perceber com clareza e de nição os estímulos que, neste
curso, estamos passando a descrever e, mais à frente, transcreveremos.

Como pontua Schafer (2011), ao contrário de outros órgãos dos sentidos, os ouvidos são expostos e vulneráveis, tendo em
vista que, diferentemente dos olhos, por exemplo, os ouvidos não podem ser fechados, de forma a isolá-los dos estímulos.
Além disso, os olhos podem focalizar e apontar nossa vontade, enquanto os ouvidos captam todos os sons do horizonte
acústico, em todas as direções.

Primeiro, vamos prestar atenção aos ruídos a que estamos expostos. A depender do local e das condições com as quais você
lida enquanto acompanha esta aula, há pouco ou muito ruído com o qual seu ouvido entra em contato e talvez grande parte
seja ignorada por você.

Schafer (2011) de ne ruído como o som indesejável ou qualquer som que


interfere, o destruidor do que queremos ouvir. Tente elencar três ruídos que
estão neste momento sendo captados por você.

Reconhecer o que é ruído e valorizar a existência do silêncio são atitudes importantes no trabalho fonético porque qualquer
interferência sonora pode atrapalhar e di cultar a catalogação e análise dos dados. Como vimos nas aulas passadas, há traços
que estabelecem diferenças muito pequenas entre sons (o traço [+sonoro] diferencia, por exemplo, o fone [p] de [b]).

Fonética acústica

Tendo feito esse reconhecimento da importância do silêncio e aprendendo a reconhecer os ruídos, vamos agora relembrar
alguns conceitos de Física a m de entender as contribuições da fonética acústica para o estudo das línguas.

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 Conceitos de Física

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Sistema produtor de coluna de ar
Vamos primeiro lembrar que o som é uma onda, ou seja, um movimento causado por uma perturbação que se
propaga através de um meio. Assim, se você atira uma pedra em um lago cuja água se eConceiyoncontra parada, a
pedra é a fonte que causa a perturbação, chamada de pulso a partir do qual são formadas as ondas que se propagam
em um meio, neste caso, a água.

O som é um tipo de onda mecânica, ou seja, precisa de um meio material para se propagar (não se propaga no vácuo
como as ondas eletromagnéticas, como é o caso da luz e das ondas do rádio).

Na imagem anterior, vemos uma pessoa movendo verticalmente uma corda para cima e para baixo em intervalos de
tempo iguais. Esses movimentos periódicos causam pulsos que se propagam ao longo da corda. Como podemos ver,
a parte mais elevada da onda tem o nome de crista e o vale é a cavidade entre duas cristas. O tempo que duas cristas
consecutivas levam para passar pelo mesmo ponto é denominado período T, e frequência f representa a quantidade
de cristas consecutivas que passam pelo mesmo ponto em uma unidade de tempo. A frequência é medida em Hertz
(Hz). Assim, pode-se calcular a frequência de uma determinada emissão com a seguinte equação: f = 1/T.

Na imagem, ainda aparecem o comprimento de onda, que é a distância entre duas cristas ou dois vales consecutivos,
representado pela letra grega ƛ, e a amplitude da onda, representada pela letra a.

Lembra-se de quando falamos de som e ruído? Agora temos condições de de nir acusticamente o que podemos
chamar de som e como entender o ruído. O som do relógio, que Pessoa descreve como o que parece dizer/sempre a
mesma coisa, é um exemplo de onda periódica, um tipo de onda que se repete com intervalos de tempo iguais. Um
ruído é um tipo de onda inconstante, irregular e imprevisível, o que o torna uma onda aperiódica. A fala possui também
esse tipo de produção, como é o caso das sibilantes (o [s] de [sus], por exemplo).

Frequência fundamental e seus harmônicos

Abordamos até agora os aspectos de onda simples, porém grande parte dos corpos que produzem som emitem
ondas complexas, que são compostas pela junção de ondas simples, como a que vimos.

Quando um corpo vibra, ele emite ondas em determinada frequência. Pense, por exemplo, nas pregas vocais. Quando
há a produção de som, elas estão vibrando. Porém, outras partes também se movem (por exemplo, os músculos que
participam da fonação). Temos, então, a frequência fundamental, sendo a primeira produzida pelo corpo por inteiro, e
os harmônicos, ou seja, as frequências múltiplas da frequência fundamental.

Ressonância e teoria fonte- ltro

Cada corpo possui uma frequência, pela qual podemos reconhecê-lo. Características como cor, formato e textura, por
exemplo, são frequências que nossos olhos captam. Assim também, quando as ondas sonoras são emitidas, elas são
reforçadas ao entrar em contato com os corpos que têm a mesma frequência, a chamada frequência natural. Por
exemplo: se você emitir um som agora em 200Hz, um corpo que vibra nessa mesma frequência agirá como um
reforço desse som, apoiando na propagação dele. A isso dá-se o nome de ressonância.
Essas ressonâncias, dentro de um tubo acústico (como é o caso do trato oral, no sistema ressoador/articulador do
aparelho fonador), são chamadas de formantes. Por meio dos formantes, podemos reconhecer os traços que
compõem determinado fone.

Tendo em vista as noções de frequência fundamental e formantes, poderemos entender a teoria fonte- ltro na qual,
segundo Fukuyama (2001), a fonte é a vibração laríngea e o ltro é o trato vocal. Assim, temos o sistema vibrador, no
qual:

A laringe (a fonte - onde estão localizadas as pregas vocais) emite um som na produção da fala, a frequência
fundamental;

Os articuladores ativos modi cam o formato do tubo no sistema ressoador/articulador, agindo como um ltro
que reforça determinadas frequências que serão ressoadas.

Fonética no laboratório

As noções de Física que trabalhamos aqui, embora introdutórias, são elementares para as pesquisas acústicas em Fonética e,
portanto, para as análises laboratoriais. Com essas noções, os pesquisadores têm condições de analisar, por meio de
espectrogramas, a qualidade dos fones e o que muitas vezes é imperceptível ao ouvido humano.

Lembra-se da tabela do IPA, na primeira aula? Fica muito mais fácil, por exemplo, observar as diferenças entre dois fones com
traços muito semelhantes, com a análise de um espectro, que indica vozeamentos, oclusões da boca etc., características que
nem sempre são notadas por não falantes de determinado idioma. Além disso, também é possível determinar padrões de
entonação, segmentando a produção oral de homens e mulheres, adultos, crianças, idosos, até mesmo paradigmas individuais,
que são muito úteis na análise forense, tendo em vista que se trata de um instrumento cientí co.

Outro uso muito comum que tem base nas pesquisas de fonética acústica são:

A síntese de voz (conversão de texto para fala);

Reconhecimento de voz (conversão de fala para texto);

Análise de disfonias, como patologias da laringe.

Porém, como este não é o foco do nosso curso, não nos deteremos nos instrumentos laboratoriais utilizados na análise de
dados da fonética instrumental. Ainda assim, incentivamos com muito ânimo que você se aventure nos programas gratuitos
Audacity ou Praat, que são muito intuitivos e oferecem, inclusive, um manual de utilização.

Saiba mais

Você pode conferir trabalhos que exempli cam as possibilidades de pesquisa em Fonética fazendo uso dos programas citados,
como é o caso da obra de Masip, 2015. Além disso, você também pode acessar as produções do laboratório de Fonética Aplicada
da Universidade Federal de Santa Catarina (FONAPLI), em cujo site você encontra um corpus com áudios para trabalhar nos
programas e extensa indicação bibliográ ca.

Fonética auditiva
Até agora, vimos conceitos importantes para as abordagens:

Articulatória (com a qual trabalharemos mais), relacionada à emissão de som;

Acústica da fonética, referente ao próprio som e sua propagação.

Vamos, nesta etapa, entender o processamento auditivo da fala, que dá base para a fonética auditiva. Para um som ser
detectado pela audição humana, precisa estar em uma faixa de frequência entre 20 e 20.000 Hz; os sons com maior frequência
são chamados de ultrassônicos, e os de menor frequência, infrassônicos.

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 Fonte: Pixsooz / Shutterstock

Mesmo dentro dessa faixa de captação possível da audição humana, estamos muitas vezes expostos a estímulos múltiplos.
Assim, por meio do processo da atenção auditiva, é possível monitorar um determinado sinal acústico e, dessa forma, de nir
sua prioridade em detrimento dos outros estímulos sonoros que porventura estejam competindo.

Audição humana

A audição faz parte do sistema sensorial do ser humano e é possibilitada pelas orelhas. Cada uma delas está dividida em três
partes: a orelha externa, a orelha média e a orelha interna.
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Orelha externa 

A orelha externa é um canal que tem início no pavilhão auricular (veja na foto onde estão a concha, a hélice e o lóbulo
auricular, por exemplo) e termina na membrana timpânica. A estrutura do pavilhão amplia o campo de captação sonora e
direciona o som para a orelha média. Assim, quando um som é produzido, as moléculas do ar são agitadas pela onda
originada pela fonte sonora e vão transmitindo a energia recebida às outras moléculas, até chegar, conduzido pelo meato
acústico externo, ao tímpano, que passa a vibrar com a mesma frequência das ondas.

Orelha média 

A membrana timpânica tem o formato de um cone e separa a orelha externa da orelha média, também chamada de
cavidade timpânica. Trata-se de um espaço oco no osso temporal, preenchido por ar, entre o tímpano e a orelha interna,
onde estão os três ossículos auditivos, o martelo, a bigorna e o estribo, que são articulados entre si. Quando a membrana
timpânica é excitada, ela move esses três ossos, responsáveis pela condução da vibração até a orelha interna.
Há também, nessa parte da orelha, a tuba auditiva que, conectando a cavidade da orelha média à nasofaringe, iguala a
pressão na orelha média à pressão atmosférica, pois devem ser sempre a mesma nos dois lados do tímpano. Quando
isso não ocorre, ou seja, enquanto há desequilíbrio, não ouvimos bem.

Orelha interna 

De acordo com o Dr. Dráuzio Varella (2019), a orelha interna é formada por escavações no osso temporal, cobertas por
membranas e preenchidas por líquido. Pode ser dividida em:

Labirinto anterior - constituído pela cóclea, responsável pela audição;

Labirinto posterior - formado pelos vestíbulos e canais semicirculares, ligados ao equilíbrio.

A orelha também é responsável pelo equilíbrio. Porém, nos interessa mais entender o processo de audição. Segundo
Varella (2019), após a recepção das vibrações sonoras, os ossículos auditivos transmitem essas ondas até a janela oval,
entrada da orelha interna, onde movimentam o líquido da cóclea. As células ciliadas da cóclea, por sua vez, transmitem,
por meio de impulsos nervosos, as vibrações até o córtex cerebral, onde as informações são interpretadas.
Processamento auditivo da fala e a Fonoaudiologia

Os conhecimentos biológicos são muito importantes para a pesquisa fonética. Como vimos nesta etapa, desde a produção até
a recepção da fala muitos fatores estão envolvidos. Porém, um elemento também relevante é o processamento auditivo desse
estímulo sonoro.

Para a Fonoaudiologia, esses conhecimentos são indispensáveis, pois muitas vezes a produção da fala não é comprometida,
mas há uma desordem do processamento auditivo central (PAC), o que causa diversas di culdades, como aprender a ler e a
escrever, letra feia, inversões de letras etc.

 Fonte: Indypendenz / Shutterstock

Atividades
1. Tendo em vista que no espaço sideral existe o vácuo, ou seja, não há moléculas e, portanto, não há meio material, podemos
concluir que nesse ambiente:

a) A fala pode se propagar, mas o som, não.


b) O som e a fala não se propagam.
c) O som e a fala se propagam.
d) O som e a fala se propagam com dificuldade.
e) N.R.A.

2. Para que a orelha humana pudesse captar um som de 24.500Hz produzido por um gol nho, o ideal seria estar longe ou perto
do animal? Justi que.
3. Explique o que postula a teoria fonte- ltro.

Referências

Notas
FUKUYAMA, E. E. Análise acústica da voz captada na faringe próximo à fonte glótica através de microfone acoplado ao
brolaringoscópio. In: Rev. Bras. Otorrinolaringologia. v. 67, n. 6, p. 776-786. São Paulo, 2001. Disponível em:
//www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0034-72992001000600005&lng=en&nrm=iso <//www.scielo.br/scielo.php?
script=sci_arttext&pid=S0034-72992001000600005&lng=en&nrm=iso> . Acesso em: 5 jun. 2019.

LEMINSKI, P. Toda poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

MASIP, V. Fonética e fonologia portuguesas: um modelo didático latoratorial. In: Linha D’Água, v. 28, n. 1, p. 177-196, 30 jun.
2015. São Paulo: USP, 2015. Disponível em: //www.revistas.usp.br/linhadagua/article/view/89281
<//www.revistas.usp.br/linhadagua/article/view/89281> . Acesso em: 5 jun. 2019.

PESSOA, F. Obra poética de Fernando Pessoa. v. 1. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016.

SCHAFER, M. O ouvido pensante. São Paulo: Editora Unesp, 2011.

SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

VARELLA, D. Orelha interna. In: Portal Drauzio Varella. Disponível em: https://drauziovarella.uol.com.br/corpo-humano/orelha-


interna/ <https://drauziovarella.uol.com.br/corpo-humano/orelha-interna/> . Acesso em: 5 jun. 2019.

Próxima aula

Os segmentos consonantais;

Sistema consonantal brasileiro;

Os segmentos vocálicos.

Explore mais

Um livro bastante importante para aprofundar-se nos conceitos da fonética acústica é:

LADEFOGED, P. Elements of acoustic phonetics. Chicago: Universidade de Chicago, 1996.

Outras fontes de conhecimentos práticos são:

MOLLICA, M. C. Limites entre normal e patológico. In: MOLLICA, M. C. (org.). Linguagem para formação em letras,
educação e fonoaudiologia. São Paulo: Contexto, 2009;

MOLLICA, M. C. Distúrbios fonoarticulatórios na Síndrome de Down. In: MOLLICA, M. C. (org.). Linguagem para formação
em letras, educação e fonoaudiologia. São Paulo: Contexto, 2009.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 05: Consoantes – descrição fonética

Apresentação
Agora que conhecemos em linhas gerais as bases biológicas da produção da fala, vamos adentrar mais propriamente na
análise fonética.

Nesta aula e na próxima, trabalharemos mais detidamente a análise, a descrição e a transcrição dos sons da fala do
português brasileiro, comparando, quando possível, com o português europeu e com outros idiomas.

Iniciaremos estudando as consoantes e as características formais de análise. Após, daremos início ao estudo das vogais,
o qual será aprofundado na aula seguinte.

Objetivo
Identi car os segmentos consonantais com base na tabela do IPA;

Empregar os conhecimentos de fonética na transcrição de palavras.

Palavras iniciais
Hoje retomaremos os conceitos articulatórios da fala, aqueles que estudamos na aula 3. Se puder, revise com mais a nco os
conceitos e os itens que estudamos lá para que possamos dar prosseguimento à análise da língua portuguesa levando em
consideração a segunda articulação proposta por Martinet, ou seja, os fones.

Sendo assim, vamos recuperar o que estudamos na terceira aula, no item 2, sobre as características articulatórias, em que
elencamos:

a) O mecanismo da corrente do ar (no português, apenas pulmonar);

b) A direção da corrente do ar (egressiva ou ingressiva);

c) O estado da glote (vozeado/sonoro ou desvozeado/surdo);

d) A posição do véu palatino (oral ou nasal);

e) Os articuladores ativos;

f) Os articuladores passivos.

Nesta aula, vamos trabalhar com mais ênfase os dois últimos itens, ou seja, os articuladores ativos e os passivos. Como
dissemos, é importante que esses conhecimentos estejam sólidos na sua memória para que possamos avançar.

Vamos lembrar também que as consoantes apresentam algum tipo de barreira para a passagem do ar, assim, não existe uma
facilidade para que o ar saia e é essa obstrução o principal elemento dos segmentos consonantais. O que vamos ver a seguir é
que essa obstrução ocorre de diferentes modos e em diferentes lugares, o que gera sons diferentes uns dos outros.

 Fonte: Photographee.eu / Shutterstock

Lugar de articulação
Quando pensamos nos articuladores, não devemos imaginar que a sua ação ocorra isoladamente. Como vimos anteriormente,
a posição de cada elemento do trato vocal cria uma con guração que promove a ressonância de determinado som. Dessa
forma, mesmo que não haja contato direto entre articulador ativo e passivo, é a atuação de ambos que cria certo formato do
sistema ressoador/articulador.

À posição de ambos analisada conjuntamente, damos o nome de lugar de articulação. Vamos ver, então, quais são as
possibilidades para o português. Revise, antes, as indicações dos pontos importantes do aparelho fonador:

Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online


Bilabial
01 Esse tipo de som é produzido ativamente pelo lábio inferior e tem como articulador passivo o lábio superior. Pense, por
exemplo, no som de [b] em bom.

Labiodental
02 O articulador ativo é também o lábio inferior, já o articulador passivo são os dentes. Basta lembrar de como [f] soa em
fazenda.

Dental
03 Para produzir esse som, você utiliza o ápice ou a lâmina da língua como articulador ativo e os dentes incisivos
superiores (os quatro primeiros dentes da parte de cima da arcada dental). Fale, por exemplo, a palavra data.

Alveolar
O articulador ativo também é o ápice ou a lâmina da língua, enquanto o articulador passivo são os alvéolos. A
diferença entre esse tipo de consoante e o tipo anterior é o articulador passivo: enquanto as consoantes dentais são
04 produzidas com os incisivos superiores, as alveolares têm como articulador passivo os alvéolos. Experimente falar a
palavra data tocando os dentes incisivos superiores com o ápice ou a lâmina da língua, e depois tente essa mesma
palavra com a língua tocando os alvéolos.

Alveopalatal (ou pós-alveolares)


05 Esse tipo de consoante é produzido com a parte anterior da língua (articulador ativo) tocando a parte média do palato
duro, um pouco atrás dos alvéolos. Pronuncie, para reconhecer essa área, a palavra chá.

Palatal
06 O articulador ativo para produzir essa consoante é a parte média da língua, que encosta no m do palato duro, o
articulador passivo. Reconhecemos esse tipo de consoante na palavra palha.

Velar
07 Para esse tipo de consoante, o articulador ativo é a parte posterior da língua (ou seja, a parte mais próxima da úvula) e
o articulador passivo é o véu palatino, também chamado de palato mole. Exemplo desse som: gata.

Glotal
08 Como explica Silva (2009), os músculos ligamentais da glote comportam-se como articuladores, produzindo, assim,
sons como rata, na pronúncia típica de Belo Horizonte.

Modo de articulação
À lista que retomamos no início desta aula, vamos adicionar o grau e a natureza da estrutura. Assim, a lista atualizada ca
sendo:

a) O mecanismo da corrente do ar (no português, apenas pulmonar);

b) A direção da corrente do ar (egressiva ou ingressiva);

c) O estado da glote (vozeado/sonoro ou desvozeado/surdo);

d) Posição do véu palatino (oral ou nasal);

e) Articuladores ativos;

f) Articuladores passivos;

g) Grau e natureza da estrutura.

Esse elemento diz respeito à posição do articulador ativo em relação ao articulador passivo, levando em consideração como e
quanto a corrente de ar passa pelo trato vocal.

A partir dessa de nição, temos como categorias para descrever, no português, o modo de articulação:

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Clique nos botões para ver as informações.

Oclusiva 

Os articuladores criam uma obstrução total para a passagem do ar na boca. Assim, o ar sai como uma explosão (por isso,
muitas vezes esse tipo de consoante é também chamada de plosiva), após a abertura para a corrente de ar. Nesse tipo de
consoante, o véu palatino está levantado, o que impede a passagem do ar para a cavidade nasal. Assim, esse tipo de som
é oral. Em português, temos as consoantes oclusivas: pá, bar, cá, gata e dá.

Nasal 

Nesse tipo de consoante, os articuladores também criam uma obstrução total para a passagem do ar na boca, também
provocando uma explosão quando o ar sai. A diferença essencial aqui é a posição do véu palatino: como ele está
abaixado, permite que o ar passe pelas cavidades oral e nasal. Essa, portanto, é a única diferença entre as nasais e as
oclusivas. As consoantes nasais do português são: má, nasal e banho.

Fricativa 

Os articuladores se aproximam, mas não causam obstrução total à passagem do ar, como no caso das consoantes
oclusivas. Assim, o ar passa pela cavidade oral com obstrução parcial, causando uma fricção entre os articuladores. Em
português, as consoantes fricativas são fava, sol, zelo, racha (pense no som desse r como o feito no Rio de Janeiro.
Vamos em breve diferenciar modos de articulação existentes para essa consoante).

Africada 

Pense nesse modo como sendo uma junção de uma consoante oclusiva e uma fricativa, pois o que ocorre é basicamente
isto: no início da produção, há uma completa obstrução da passagem do ar e o véu palatino encontra-se levantado (como
nas oclusivas), ou seja, o ar passa apenas pela cavidade oral. Na fase nal, o ar atravessa com fricção entre os
articuladores (como nas fricativas) e o véu palatino permanece levantado, então essa consoante também é oral. Além
disso, as duas etapas da produção da africada ocorrem no mesmo lugar de articulação.

No português, temos as africadas dia e tia (pense também na pronúncia feita no Rio de Janeiro, em que falamos *djia e
*tchia).

Tepe (ou vibrante simples) 

Para produzir esse som, o articulador ativo toca rapidamente o articulador passivo, causando uma oclusão breve, que
obstrui a passagem do ar pela boca. Em português, temos como exemplos da realização dessa consoante em arara e
brava.
Vibrante (múltipla) 

O articulador ativo realiza vários toques no articulador passivo. Esse tipo de som ocorre em algumas variantes do
português, como no estado de São Paulo na pronúncia de "marra" (pense na língua fazendo vibrações múltiplas, o que
diferencia essa palavra de "Mara").

Retro exa 

A ponta da língua toca o palato duro, ou seja, geralmente há um encurvamento da língua que se dobra para alcançar o
palato duro. Pense na pronúncia do interior de São Paulo para falar as palavras mar e carta.

Laterais 

Existe uma oclusão da passagem do ar, mas não é total nem causa saída com fricção dos articuladores. O que ocorre é a
obstrução do ar na parte central do trato vocal, fazendo com que o ar seja expelido pelos lados.

No português, esse tipo de consoante está em lá, palha e sal (pense, neste caso, em pronunciar sal como se fosse
pronunciar sala, e não como saudade).

Notação dos segmentos consonantais


Agora que conhecemos os lugares e modos de articulação, podemos já começar a classi car as consoantes de forma
completa. Convencionou-se descrever as consoantes com:

Modo de articulação + Lugar de articulação + Grau de vozeamento.


Assim:

[p] oclusiva bilabial desvozeada;

[b] oclusiva bilabial vozeada.

Articulação secundária

Há ainda descrições que consideram o que é chamado de articulação secundária, que tem a ver com o contexto em que as
consoantes são produzidas. Observe, por exemplo, que sala e Sula têm pronúncias bastante similares, mas o segmento [s]
apresenta um arredondamento em Sula (a título de curiosidade, esse fenômeno é descrito como labialização).

Porém, neste curso, não trabalharemos com a transcrição fonética restrita, que leva em consideração esses dados. Vamos,
então, usar a transcrição fonética ampla, que, como descreve Silva (2009), explicita apenas os aspectos que não sejam
condicionados por contexto ou características especí cas da língua ou dialeto.

Sistema consonantal do português brasileiro


Na primeira aula deste curso, você observou a tabela proposta pela Associação Internacional de Fonética. Ela é um compilado
completo dos sons coletados e descritos a partir das línguas do mundo, reunindo o que já foi catalogado, levando em
consideração consoantes com ar pulmonar, não pulmonar, vogais, suprassegmentos, diacríticos, dentre outros símbolos.

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Neste momento, interessa-nos apenas conhecer a representação dos segmentos consonantais produzidos no português. Por
isso, con ra, a partir do conhecimento que você já adquiriu, a localização das consoantes que indica as três informações
apontadas no item 3. Aproveite para observar também os símbolos usados na transcrição fonética desses sons:
Articulação
Dental ou
Bilabial Labiodental Alveopalatal Palatal Velar Glotal
alveolar
Maneira Lugar

Desv p t k
Oclusiva
Voz b d g

Desv t∫

Africada
Voz 𝑑3

Desv f s ∫ X h
Fricativa
Voz v z 3 Ɣ ʱ

Nasal Voz m n ɲỹ

Tepe Voz

Vibrante Voz

Retroflexa Voz

Lateral Voz

Fonte: Silva, 2009.

Segmentos vocálicos: uma introdução


Nós estudamos, até aqui, as consoantes, com mais foco às que são produzidas no português. Agora, introduziremos o estudo
dos segmentos vocálicos, observando os seus critérios de descrição.

Vamos começar já entendendo que os segmentos vocálicos não apresentam interrupção da corrente de ar na linha central,
assim, não se trata de obstrução ou fricção no trato vocal durante a produção das vogais.

Na próxima aula, iniciaremos esse estudo, entendendo os três aspectos que interferem na qualidade das vogais:

Posição da língua no sentido da altura que ela apresenta durante a passagem do ar;

Posição da língua em relação à boca, sendo mais anterior ou menos posterior;

Arredondamento ou não dos lábios.


 Fonte: Photographee.eu / Shutterstock

Atividades
1. Assinale a opção incorreta a respeito da palavra churrasqueira:

a) Apresenta 13 letras e 10 fones.


b) Apresenta 1 consoante alveopalatal representada graficamente por duas letras.
c) Apresenta 1 consoante que pode ser vibrante ou fricativa.
d) A letra s representa uma consoante retroflexa.
e) Apresenta 1 tepe.
2. Utilize os números para correlacionar as transcrições fonéticas às notações dos segmentos consonantais (articulação + grau
de vozeamento):

[f] 1 [dʒ] 2 [ɾ] 3 [m] 4 ɲ 5 [z] 6

a) Africada alveopalatal vozeada.

b) Nasal palatal vozeada.

c) Nasal bilabial vozeada.

d) fricativa labiodental desvozeada.

e) tepe dental [ou alveolar] vozeada.

f) fricativa dental [ou alveolar] vozeada.

3. Transcreva as palavras NASA, parada, sala e catraca. Para isso, use o símbolo [a] para todas as vogais (estudaremos com
mais detalhes os segmentos vocálicos na próxima aula) e lembre-se de usar os colchetes, que indicam que se trata de
transcrição fonética.

Notas
Referências

SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Os segmentos vocálicos;

Sistema vocálico do português brasileiro.

Explore mais
Pesquise na internet sites, vídeos e artigos relacionados ao conteúdo visto.

Em caso de dúvidas, converse com seu professor online por meio dos recursos disponíveis no ambiente de aprendizagem.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 06: Vogais – transcrição fonética

Apresentação
Até aqui, você já deve ter reparado que estamos reestruturando muitos conhecimentos que formamos no Ensino Básico.
Começamos a entender os sons que produzimos de maneira mais cientí ca, identi cando os mecanismos que entram em
jogo para que um som seja produzido e reconhecido.

Vimos as bases biológicas da fala e da audição, bem como relembramos conceitos físicos. Esses conhecimentos,
somados, capacitaram-nos a descrever os sons que ouvimos, distinguindo qualidades que, no caso do português
brasileiro, já são internalizadas e reconhecidas porque somos falantes nativos.

Com esta aula, analisando os segmentos vocálicos, terminamos nossos estudos de Fonética. A partir desse
conhecimento, conseguiremos partir para um estudo mais especí co do português e suas regras fonológicas.

Objetivo
Classi car os segmentos vocálicos com base na tabela da IPA;

Empregar os conhecimentos de Fonética na transcrição de palavras.

Segmentos vocálicos

Na aula passada, vimos as consoantes e aprendemos a identi car os traços que as formam, levando em consideração, por
exemplo, o ponto em que ocorrem no trato vocal e o modo como se dá a obstrução (total ou parcial). Na aula de hoje, vamos
mudar um pouco a perspectiva porque os segmentos vocálicos da fala seguem parâmetros diferentes.

Lembra-se de quando mostramos que as consoantes são oclusões que ocorrem à passagem do ar e que esse bloqueio pode
ser completo ou apenas parcial? Segundo Cagliari (2007), o que ocorre com as vogais não é uma oclusão, mas uma
aproximação dos articuladores de modo que o estreitamento do canal fonatório bucal não produza fricção local.

Vamos recorrer, novamente, à tabela da IPA para observar como estão dispostas as vogais e entender as categorias que
entram em jogo para as suas descrições.
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Altura da língua
Uma das qualidades que utilizamos para descrever um som vocálico é a posição que a língua ocupa na estrutura bucal.

Exemplo

Fale a vogal [a] e perceba em que altura está a sua língua. Agora, produza o [i]. Reparou que a língua subiu para que esse som
fosse produzido? E como se dá a localização da língua produzindo [u], [e] (como em você) e [o] (como é vovô)?

Essa mudança ocorre porque a língua move-se verticalmente. Assim, ela pode localizar-se em uma posição mais alta, mais
baixa ou em posições intermediárias, de onde vêm os títulos que as vogais recebem nesse quesito.

No português, há quatro níveis de abertura:


1 2

Baixa Média-baixa

3 4

Média-alta Alta

Como da posição da língua decorre maior ou menor abertura da boca,


alguns autores nomeiam as vogais como sendo abertas, meio-abertas,
meio-fechadas e fechadas. Perceba, por exemplo, que não é possível
produzir a vogal [e] com a boca completamente aberta. O som será
provavelmente de [e], representação de pé. Isso porque quanto mais baixa a
vogal, mais a boca se abre.

Anterioridade/posterioridade da língua

A posição horizontal do corpo da língua também é levada


em consideração na descrição dos segmentos vocálicos. Se
você puder, observe a sua boca aberta diante do espelho.
Foi a partir dessa visão que foram propostas as
nomenclaturas dentro dessa categoria.

Assim, a parte da frente da cavidade bucal é nomeada


anterior, pois é a que vem antes na observação externa da
boca. A parte mais interna, no nal da cavidade bucal, é
chamada posterior. E há, entre elas, a parte central. Essas
são, assim, as três partes numa perspectiva horizontal em
que a língua se posiciona durante a produção de uma vogal.
 Fonte: Shutterstock

Câmara Junior (2009), ao tratar do verbete vogal, explica que, nesta categoria, que descreve o avanço ou recuo da língua, outra
forma de nomear as vogais anteriores e posteriores é, respectivamente, palatal e velar.

Vamos fazer o mesmo exercício que zemos na categoria acima: onde você diria que sua língua se posiciona horizontalmente
para produzir a vogal [i]? E a vogal [u]? Reparou que a primeira ca mais à frente do que a segunda? Há uma outra diferença
também entre essas duas vogais, que é tema da próxima categoria.

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Saiba mais

Continue lendo sobre os aspectos que utilizamos para descrever um som vocálico.

Sistema vocálico brasileiro


Como já conhecemos melhor as consoantes descritas na tabela da IPA, vamos olhar com mais atenção às particularidades do
uso dos segmentos vocálicos no português brasileiro.

É importante observar como é a sua realização vocálica para que a sua transcrição fonética seja o mais el possível à
produção. Vamos, assim, olhar para alguns exemplos. Indicamos, de antemão, que as vogais átonas (as que cam em posição
pretônica ou postônica) são as que mais demandam nosso cuidado, haja vista que as variações em todo o Brasil demonstram
uma pluralidade de possibilidades de realização desses segmentos, o que exige igualmente a delidade na transcrição. Observe
bem o quadro e lembre-se também dos glides:

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Atenção

Pedimos a atenção para a transcrição, uma vez que as realizações podem ser diversas, a depender do local de onde o falante é.
Por exemplo: a palavra beleza poderia ser transcrita como [bɛ'lezə] ou [be'lezə]. Esse é um caso de vogal pretônica. No entanto,
essa não é a única ocorrência desse tipo de variação. Para a palavra pérola, poderia haver tanto a possibilidade de transcrever
['pɛɾolə] quanto ['pɛɾɔlə].
Atividades
1. Selecione entre os colchetes o símbolo que representa a vogal descrita. Siga o exemplo:

[ ĩ ] vogal alta anterior não arredondada nasal

a) [  ] vogal alta posterior arredondada nasal

b) [ ] vogal baixa central não arredondada

c) [ ] vogal média-baixa anterior não arredondada

d) [  ] vogal média-alta anterior não arredondada

e) [ ] vogal média-baixa posterior arredondada

2. Complete a indicação na transcrição fonética das palavras com a vogal que melhor representa a pronúncia na sua região:

a) terreno [t 'xẽnʊ]

b) seriedade [s ri 'da ɪ]

c) pedal [p 'daw]

d) moleza [m 'lezə]

e) sobriedade [s bɾi 'da ɪ]

3. Transcreva as palavras a seguir, lembrando-se de indicar a vogal tônica com o símbolo ['] antecedendo a sílaba acentuada.

[i]        vi         saci         aqui

[e]        lê         cadê         ipê

[ɛ]        fé         chalé         acarajé

[a]        pá         mamá         cajá

[ɔ]        avó         xodó         pó

[o]        avô         alô         agogô

[u]        anu         caju         urubu

4. Explique brevemente as três categorias que de nem as qualidades principais das vogais.


5. De acordo com o que estudamos, selecione a opção incorreta:

a) Um ditongo é formado por duas vogais.


b) O núcleo de uma sílaba, no português, pode ser uma vogal ou uma consoante.
c) As vogais nasais são produzidas com o véu palatino levantado.
d) Um glide é uma consoante velar.
e) Uma sílaba pode conter mais de duas vogais tônicas.

6. Explique foneticamente a diferença entre um ditongo e um hiato.

Referências
Notas

CAGLIARI, L. C. Elementos de fonética do português brasileiro. São Paulo: Paulistana, 2007.

CAMARA JR., J. M. Dicionário de linguística e gramática: referente à língua portuguesa. 27. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.

CAMARA JR. Estrutura da língua portuguesa. 40. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.

FIORIN, J. L. Introdução à linguística II: princípios de análise. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2008.

SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Introdução aos estudos fonológicos;

Análise de fonemas do português.

Explore mais

Você pode explorar mais a pronúncia das vogais, comparando-as, por meio do site:

//www.ipachart.com/ <//www.ipachart.com/>

O site também oferece a realização dos outros símbolos descritos na tabela da IPA.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 7: Fonologia

Apresentação
Comentamos em uma das aulas que o elemento de estudo da Fonética é o fone, ou seja, determinado segmento sonoro
sem sentido vinculado e sem peso contrastivo.

Assim, nas últimas aulas, preocupamo-nos em entender quais são os fatores que entram na produção e na recepção do
som e, principalmente, em aprender como reconhecer e descrever os fones, com especial atenção aos segmentos
consonânticos e vocálicos.

Nesta e na próxima aula, começaremos a utilizar esse conhecimento para notar como as línguas organizam-se em
sistemas com regras nem sempre nomeadas claramente pelos seus falantes, mas de usos bastante comuns.

Objetivo
Explicar a Fonologia;

Descrever o fonema e os alofones;

De nir pares mínimos e pares análogos.

Conhecimento fonológico

Em sua crônica A favor do medo, de 11 de novembro de 1967, Lispector (1984) faz uso da palavra passeíto, narrando um
convite que havia recebido.

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O que você, sendo um falante do português, entende dessa palavra?


Vamos investigar o que pode ser depreendido dessa forma.

Primeiro, é possível estabelecer uma relação com outro


vocábulo da língua portuguesa, levando em consideração o
que poderíamos supor ser o radical dessa palavra? É
provável que, ao ler, você já tenha feito relação com a
palavra passeio, correto? Além disso, o que, pelos nossos
conhecimentos prévios de português, poderia signi car
essa terminação, -íto? Talvez, mesmo sem imediatamente
conseguir nomear essa forma como su xo, você a tenha
relacionado à ideia de diminutivo, tendo em vista que são
comuns no português formas como casita, rapazito etc.

Assim, é bem provável que você não tenha precisado


recorrer ao dicionário para entender a palavra (embora
certamente ela não seja uma entrada lexical dicionarizada,
por ser gerada por um processo completamente comum na
língua portuguesa, a derivação su xal).

Vamos para outro exemplo. Se você lê a palavra estrepurizoital, mesmo sem saber seu signi cado ou se ela existe na realidade,
é bem provável que a classi que como um adjetivo, tendo em vista a partícula nal.

Essa capacidade só é possível porque há um conhecimento fonológico


adquirido pelo falante de uma língua, que o permite identi car processos
nas palavras e reconhecê-las como sendo ou não do idioma em questão,
embora nem sempre consiga dar nomes aos fenômenos.

Isso ocorre não só morfologicamente, relacionado à forma das palavras, mas também fonologicamente, tendo em mente que a
estrutura vocabular segue determinadas regras.

Por exemplo:

Se em vez de estrepurizoital você tivesse que ler eshthypwrizoitap, certamente a rmaria que essa palavra não pode ser da
língua portuguesa. Falantes de determinada língua são profundos conhecedores do inventário fonético de tal idioma, ou seja,
sabem quais sons de todos os possíveis nas línguas do mundo são utilizados num dado código e dominam também a
organização desses sons em sequências carregadas de signi cado.

Isso é importante porque muitas vezes falantes nativos com pouco conhecimento acadêmico de seu idioma se consideram
não conhecedores. Porém, o uso de uma língua e a habilidade de entender seus processos muitas vezes complexos
independem de um estudo mais aprofundado e cientí co. Buscaremos mostrar, a partir da fonologia e, mais ao m do curso,
com a sociolinguística, como todo falante tem conhecimento cabal de regras linguísticas nas.
Fonema

Vamos novamente resgatar nossa segunda aula: a dupla articulação da linguagem. Você se lembra? Lá, adiantamos que a
segunda articulação se relaciona à fonologia, que se ocupa com o plano da expressão. Assim, nessa segunda forma de
decomposição de um enunciado, chega-se aos fonemas, os quais são, segundo Fiorin (2008), as suas menores unidades
linearmente segmentáveis, não dotadas de signi cado, mas que permitem a distinção de signi cado.

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 Fonte: Undrey / Shutterstock

Vamos por partes.

Os fonemas, a unidade de estudo da fonologia, são linearmente segmentáveis porque não podem ser produzidos sobrepostos,
ao mesmo tempo. Sua execução se dá de maneira sequencial. Essas unidades, como já mostramos, não carregam signi cado,
mas, como veremos, são capazes de alterar o signi cado.

Vejamos as palavras:
Pata

Bata

Mata

Cata

Gata

Data

Nata

Com exceção das consoantes iniciais, todo o restante da palavra permanece igual. Mas essa mínima mudança foi su ciente
para que sentido também fosse alterado.

O que estamos mostrando, com isso, é que [p], [b], [m], [k], [d] e [n] —
a representação fonética das consoantes — não carregam signi cado
em si, mas possibilitam que os signi cados sejam alterados pela
simples alternância dessas consoantes. Assim, essas consoantes são
consideradas fonemas no português brasileiro. Para representar os
fonemas, utilizamos os símbolos grá cos entre barras, assim: /bata/.

Câmara Junior (2007) explica que o fonema é um conceito da língua oral e não se confunde com a letra na língua escrita.
Nesta, o mesmo fonema pode ser representado com letra diferente, como em aço e asso, chá e xá (o rei da Pérsia), o su xo -
esa (de portuguesa) e -eza (de tristeza) e assim por diante.
Alofones

Vimos então que os fonemas são elementos que têm caráter distintivo em um dado sistema fonológico. Há ainda os alofones,
que são realizações possíveis e equivalentes para um mesmo fonema.

Vamos pensar, por exemplo, olhando novamente a tabela da IPA, quais seriam as possibilidades de pronúncia de r da palavra
mar, em português, sem perda de sentido. Essa consoante, na posição de nal de palavra, costuma ser pronunciada como:

Realização típica de Belo Horizonte, pense em um som levemente aspirado, pois essa fricativa é produzida na glote.

É típica do Rio de Janeiro e é produzida pelo dorso da língua contra o véu palatino, assim, a fricção gera um pouco mais de
som.

É uma aproximante e é característica de falantes caipiras (pense em como uma pessoa que mora no interior de São Paulo
produziria a palavra mar).

Realização típica de Portugal. Para entender como é essa pronúncia, pense, por exemplo, na palavra ma[ɾ]inho e pronuncie
apenas até o tepe ma[ɾ]. Lembre-se de que o tepe é uma batida rápida e única do articulador ativo no articulador passivo;
quando há mais de uma batida, já se trata de uma vibrante.

Vamos pensar em mais um exemplo: a palavra más tem uma consoante fricativa no m. Ocorre, porém que, dependendo da
região de onde você seja, a realização muda sem perdas para o entendimento. Por enquanto, vamos ignorar o contexto em que
a palavra está se inserida, ou seja, se há antes ou depois outra palavra. Estamos, assim, considerando-a isoladamente.

Para um falante, digamos, do Rio de Janeiro, a pronúncia dessa palavra será ['maʃ]. Considerando outro local, que poderia ser o
centro de São Paulo, a pronúncia seria ['mas].

Percebe a diferença?

No primeiro exemplo, a consoante é produzida na região pós-alveolar. Já no segundo, a obstrução ocorre nos dentes/alvéolos.

Todas essas possibilidades são alofones, ou seja, fones possíveis de realizar um mesmo fonema sem perda ou troca de
sentido.
Par suspeito, par mínimo e par análogo
Para iniciar uma análise fonológica, é importante levantar um corpus que leve em consideração o maior número de palavras de
uma língua, de modo que o recorte não seja prejudicado por uma seleção incompatível ou de pouca representação do código
linguístico. Assim, ao analisar uma nova língua, é importante que a seleção leve em consideração todos os sons utilizados no
sistema linguístico nas mais variadas posições (início de sílaba, m de sílaba, pretônica, postônica etc.).

Após o levantamento dos fones de um determinado idioma, localizar os pares suspeitos é simples: procure por dois sons
foneticamente semelhantes (SFS), que podem ser um som vozeado e seu correspondente desvozeado.

Exemplo

[p] e [b];

as nasais [m] e [n];

as laterais [l] e [ʎ);

as fricativas com pontos de articulação próximo [f] e [s], [s] e [ʃ].

Quando esses pares são identi cados, é a hora de con rmar se tais fones são fonemas nessa língua. Para fazer isso, nós
precisamos selecionar pares mínimos, ou seja, duas palavras com signi cados diferentes cuja cadeia sonora seja idêntica.

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A ideia é que as hipóteses de fonemas levantadas com os pares suspeitos


sejam validadas ou não de acordo com a realização lexical, tendo em vista
se tais sons representam traço distintivo na estrutura do código linguístico.

Vamos continuar observando os exemplos que citamos acima. As palavras pata e bata têm sentidos diferentes e possuem a
mesma estrutura, o que demonstra que [p] e [b], em português, são fonemas e podem, no âmbito da fonologia, ser transcritos
como /p/ e /b/. O par pata e bata, assim, demonstra uma oposição fonêmica, caracterizando os fonemas /p,b/ por contraste
em ambiente idêntico (CAI). Para que dois sons sejam classi cados como fonemas, é necessário pelo menos um par mínimo.

Ocorre também, às vezes, que não são encontrados pares de palavras com cadeia sonora idêntica, mas contextos muito
semelhantes. Suponhamos, por exemplo, que não tivéssemos encontrado a palavra cata e que a palavra que mais oferecesse
contexto fonético próximo de gata para a constituição de um par fosse cada. Haveria aqui um contraste em ambiente análogo
(CAA), pois as palavras, neste caso, assemelham-se muito, diferenciando apenas no vozeamento da consoante da sílaba
seguinte ao par cuja classi cação como fonemas estamos tentando con rmar. Nesse caso, mesmo esse par quase mínimo,
quase perfeito também pode ser utilizado para designar fonemas de uma língua.
Atividades
1. Selecione qual das opções abaixo fornece pares suspeitos de sons foneticamente semelhantes, tendo em vista sua
proximidade de traços:

a) [p,b]; [e,ɛ]; [k,l]


b) [i,u]; [o,ɔ]; [k,p]
c) [e,i]; [f,d]; [s,f]
d) [t,d]; [o,ɔ]; [p,b]
e) [s,z]; [k,l]; [f,d]

2. Explique o que são alofones.

3. Indique a alternativa correta:

a) Os fonemas, a unidade de estudo da fonologia, não são linearmente segmentáveis.


b) Ao analisar uma nova língua, é importante que a seleção leve em consideração alguns sons utilizados no sistema linguístico nas mais
variadas posições.
c) Um par quase mínimo, quase perfeito não pode ser utilizado para designar fonemas de uma língua.
d) A segunda articulação da linguagem, proposta por Martinet, relaciona-se à morfologia, que se ocupa com o plano da expressão.
e) O tepe é uma batida rápida e única do articulador ativo no articulador passivo.

4. De acordo com Fiorin (2008), para entendermos o funcionamento do sistema fonológico de uma língua, precisamos fazer
um levantamento dos fones que nela ocorrem e depois passar a examiná-los para veri car quais são distintivos e quais não
nessa língua. Como os sons podem ser modi cados de acordo com o contexto em que ocorrem, pode ser que dois sons
diferentes sejam apenas versões ligeiramente modi cadas de um mesmo elemento. A frase destacada faz referência ao:

a) Morfema.
b) Fonema.
c) Alofone.
d) Contraste em ambiente idêntico.
e) Lugar de fala.
5. Marque a opção que esclarece quais são os aspectos da língua portuguesa analisados na fonologia:

a) A fonologia trata do estudo das palavras formadas apenas por vogais.


b) A fonologia estuda as vogais e as consoantes das línguas latinas.
c) A fonologia é a parte da gramática destinada ao estudo da organização e classificação dos fonemas.
d) Na fonologia, estudamos apenas os fonemas (sons) e as letras das línguas. É a fonética que trata do estudo das sílabas e acentuação
das palavras.
e) A fonologia busca na literatura a realização dos fones descritos pela fonética.

6. Com relação aos estudos dos fonemas, assinale a opção incorreta:

a) As semivogais são os fonemas /i/ e /u/ quando aparecem com outras vogais em uma mesma sílaba.
b) Na palavra nexo, há 4 letras e 5 fonemas.
c) Sons orais são aqueles cuja corrente de ar é liberada apenas pela boca.
d) As palavras terça e peço são pares mínimos.
e) As letras são as representações gráficas dos fonemas.

Referências
Notas

CÂMARA JR., J. M. Dicionário de linguística e gramática: referente à língua portuguesa. 27. ed. Petrópolis: Vozes, 2009.

CÂMARA JR. Estrutura da língua portuguesa. 40. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.

FIORIN, J. L. Introdução à linguística II: princípios de análise. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2008.

LISPECTOR, C. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Distribuição complementar e variação livre;

Arquifonema;

Processos fonológicos.

Explore mais
Um estudo mais aprofundado sobre a representação grá ca dos fonemas do português pode ser encontrado no livro:

FERREIRA NETTO, W. Introdução à fonologia da língua portuguesa. São Paulo: Hedra, 2001.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 08: Fonologia e seus processos

Apresentação
Estudamos duas maneiras principais de analisar a linguagem humana. A primeira, a Fonética, tinha seu enfoque nas
unidades sonoras mais elementares da fala oral. Identi camos, nesse âmbito, os traços que constituem os sons, partindo
de conhecimentos da Física e da Biologia para entender sua produção, propagação e recepção. Assim, conseguimos
descrever esses sons de maneira objetiva.

Na aula passada, conhecemos com mais profundidade a segunda maneira: a Fonologia. Nessa área do conhecimento
linguístico, olhamos os idiomas e sua utilização das amplas possibilidades de sons, aprendendo a reconhecer formas
usuais em cada grupo de falante.

Nesta aula, veremos que essas formas não são tão rígidas porque sua produção pode variar dependendo da faixa etária
do falante, do gênero, da sua localização geográ ca e do estrato social ao qual pertence. Além disso, expandiremos para a
próxima aula, quando faremos algumas re exões levando em consideração também os conhecimentos da
Sociolinguística.

Objetivo
Descrever a distribuição complementar e a variação livre;

De nir o arquifonema;

Explicar alguns processos fonológicos.


Variação livre e distribuição complementar

Vimos que o elemento de estudo da fonologia é o fonema, uma unidade distintiva de uma língua, e que, como mencionamos
também acima, as realizações às vezes podem ser múltiplas sem que, no entanto, haja mudanças de sentido (se não se
lembrar desse conceito, reveja, na última aula, nossa explicação sobre os alofones).

Mas não é porque pode haver variação que estamos impedidos de estudar e sistematizar essas possibilidades.

Quando falamos em alofones, entendemos que certos sons, próximos em alguns traços linguísticos, podem ser equivalentes
na produção de determinada palavra. Demos o exemplo, na aula passada, da palavra mar, em que o som de r pode ser descrito
como [h], [X], [ɹ] e [ɾ] (reveja a tabela da IPA e tente comparar esses sons).

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A relação entre esses alofones é chamada de variação livre porque


não há nenhum tipo de diferença semântica entre ['mah], ['maX],
['maɹ] e ['maɾ] (por isso não são fonemas) e porque é possível
pronunciar essa palavra com qualquer um desses sons.

Lembre-se de que estamos tratando aqui de uma análise fonológica e, por isso, restringindo-nos aos elementos puramente
linguísticos. Logo, há equivalência dessas formas na produção da palavra que estamos estudando, não sendo possível
hierarquizá-las com base em fatores sociais, por exemplo.

Repare também que nosso exemplo apresenta essa variação em nal de palavra, mas esse não é o único contexto em que tal
relação ocorre. Esse tipo de fenômeno aparece em nais de sílabas, e não somente em nais de palavras. Pense, por exemplo,
nas palavras Marta, mirtilo, mortal, camurça (nesses casos a consoante é sucedida por oclusiva ou fricativa surda, e isso faz
diferença na fala, como veremos melhor no item que trata da assimilação).
 Fonte: Undrey / Shutterstock
Mas é preciso chamar a atenção a outro fator: até aqui, essa variação livre apresenta essas quatro formas equivalentes na
produção da consoante em nal de sílaba.

Você consegue pensar em um exemplo em que a consoante está em início de sílaba?

Podemos usar como exemplo as palavras carro e caro. Essas, aliás, podem ser descritas fonologicamente como pares
mínimos porque a variação entre os quatro sons não é mais livre. Para falar caro, inevitavelmente é preciso usar o tepe — [ɾ].
Qualquer dos outros três sons vai ser a produção sonora de carro.

Nesse contexto, ainda será possível produzir com uma vibrante [r], que pode ser associada a falantes de faixa etária mais
avançada. Percebe a diferença entre essas situações?

Voltemos, então, à sistematização do uso dos alofones. Além da variação livre, existe uma outra forma de relação entre eles na
organização das palavras: a distribuição complementar. Vamos pensar na distribuição dos fones [t] e [t∫] em palavras do
português, especialmente na produção do sudeste do país.

Pronuncie as palavras:

Tanque;

Tato;

Tempo;

Teto;

Tipo;

Time;

Tolo;

Tombo;

Tuba;

Tumba.

Considerando o modo de articulação (a maneira como som


é produzido), você notou que em quase todos os contextos
o primeiro som era produzido como [t]? Apenas em duas
palavras ocorria uma diferença signi cativa, você reparou?
Nas palavras tipo e time, a primeira consoante é produzida
como [t∫].

A partir desse exemplo e com base no nosso conhecimento


linguístico prévio, restringindo nossa análise à fala típica do
sudeste do Brasil, podemos concluir que onde ocorre [t] não
ocorre [t∫] e vice-versa, tendo em vista que esses dois fones
acontecem em distribuição complementar.  Fonte: Axel Bueckert / Shutterstock

Essa conclusão decorre do fato de que, estando diante de [i] e suas variantes (incluindo aí aquelas que não são grafadas nas
entradas lexicais, como é o caso de atmosfera), /t/ é realizado como [t∫]. Nos outros contextos, a fala utilizará [t].
Arquifonema e neutralização

Você reparou que alguns sons foram classi cados como fonemas, mas em determinados contextos perdem o traço
distintivo e são utilizados com certa equivalência e sem alteração de signi cado?

Reveja, por exemplo, o caso da palavra mar. Podemos pensar também em outras situações, como dos sons [s, z, ∫, ʒ].
Conseguimos identi car no português os pares mínimos assa, asa, acha e haja, correto?

Com esses exemplos, é possível a rmar que os sons [s, z, ∫, ʒ] em posição intervocálica apresentam contraste fonêmico e, por
isso, são considerados fonemas. Assim também, em início de palavra, há igualmente contraste fonêmico desses sons, haja
vista os exemplos (ele) seca, Zeca, (ele) checa e jeca.

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A rmamos que esses casos comprovam que se trata de fonemas porque,


havendo troca dos sons, o sentido também muda. Mas não encontramos
esse mesmo resultado procedendo com a comparação em nal de sílaba.

Note que, para a palavra mês, encontramos como formas possíveis de realização: ['mes] ou ['me∫] mês; [mezbu'nitʊ] ou
[meʒbu'nitʊ] mês bonito; e [mezatra'zadʊ] mês atrasado. Mesmo com as variações apresentadas, conseguimos entender que
todas fazem referência à palavra mês.

Comentário

Com esses exemplos, podemos concluir que, no português brasileiro, os fones [s, z, ∫, ʒ] são fonemas em posição de início de
palavra e entre vogais, mas não apresentam o mesmo contraste fonêmico em m de sílaba. A esse último caso, então, damos o
nome de neutralização, tendo em vista que o que ora era um contraste foi neutralizado na posição nal de sílaba.

Quando ocorre neutralização de sons que representam fonemas em uma língua, descrevemos fonologicamente com um
arquifonema, um símbolo que indica a perda de traço fonêmico e que, por isso, em determinado contexto linguístico, há dois ou
mais sons que são possíveis. No caso descrito acima, o arquifonema que indicará tal possibilidade é /S/.

No caso do exemplo que também demos nessa aula (a análise de mar), temos também uma neutralização. O arquifonema que
representa esse caso é /R/.

Processos fonológicos
Continuemos estudando os contextos fonológicos e como
eles podem afetar a realização dos sons. Um fone pode ser
afetado de forma a tornar-se mais parecido com um ou
mais sons próximos. Esse processo é nomeado
assimilação.

Também é possível que haja o caminho inverso e a unidade


sonora modi que-se, diferenciando-se de um ou mais sons
que estejam perto. A esse processo dá-se o nome de
dissimilação.

Uma vogal, por exemplo, pode também se modi car se


estiver em um contexto átono. A esse tipo de processo,
chama-se redução.
 Fonte: Photographee.eu / Shutterstock
Vamos estudar mais detidamente a assimilação.

Assimilação
Quando se fala em assimilação como um processo fonológico, refere-se genericamente à aquisição de características que
determinado som sofre por conta de outro(s) som(ns) que o rodeia(m).

Esse processo pode ser total, como no exemplo em Fiorin (2008, p. 48), que descreve o su xo transitivizador em ainu, uma
língua falada no norte do Japão:

mak-a (abrir) tas-a (cruzar)

ker-e (tocar) per-e (rasgar)

pis-i (perguntar) nik-i (dobrar)

pop-o (ferver) tom-o (concentrar)

tus-u (agitar) yup-u (apertar)

No caso descrito acima, temos um exemplo de assimilação total porque a vogal que funciona como su xo é uma cópia exata
da vogal da raiz. É mais comum, no entanto, que ocorra uma assimilação parcial, que pode ocorrer de várias maneiras. Vamos
observar algumas.

Assimilação de ponto de articulação


Uma das formas mais recorrentes de assimilação é aquela
em que determinado segmento adquire o mesmo ponto de
articulação de outro elemento sonoro. Vamos pensar nas
palavras campa, canta e canga. Essas palavras apresentam
uma consoante nasal no nal da primeira sílaba.

Há certa variação de pronúncia (que veremos com mais


propriedade no próximo item), mas vamos considerar que
essa consoante é pronunciada. No caso da palavra campa,
teremos como transcrição ['kãmpɐ]. Já no caso de canta,
['kãntɐ]. E, no caso de canga, ['kãŋgɐ].

 Fonte: Africa Studio / Shutterstock

Observemos, assim, que a consoante nasal se modi cou de acordo com o contexto. Como [p] é um som bilabial, o segmento
nasal que o antecede adquiriu esse traço. Da mesma forma, [t], sendo um segmento coronal – ou seja, ocorrendo com a ponta
da língua como articulador ativo que se move em direção ao articulador passivo – também in uencia o som nasal que o
precede. E, por último, a oclusiva velar sonora [g] contamina a nasal anterior com seu traço dorsal.

Nasalização
Continuemos observando as palavras citadas no item anterior. Muitas vezes, no português brasileiro, a realização desses
vocábulos não incluirá uma consoante nasal, mas apenas a nasalização da vogal.

Assim, nem sempre serão pronunciadas as consoantes nasais, o que pode ser descrito da seguinte forma: ['kãpɐ], ['kãtɐ] e
['kãgɐ]. Esse tipo de processo é muito comum no português, em especial no caso de vogais tônicas precedendo consoantes
nasais, como ocorre com as três palavras citadas.

Harmonia vocálica
Podemos observar, em português, casos em que a fala promove uma certa aproximação entre vogais. Vamos analisar, por
exemplo, a palavra Sepetiba, um bairro da Zona Oeste do Rio de Janeiro. É comum ouvir tanto a pronúncia [sepe'tibɐ] quanto
[sepi'tibɐ]. O que ocorre, no segundo caso, é uma harmonização vocálica, pois a vogal da sílaba imediatamente anterior à sílaba
tônica se apropria da altura da vogal tônica. Assim, de [e], uma média-alta anterior não arredondada, passa-se a [i], uma vogal
alta anterior não arredondada.

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 Fonte: YAKOBCHUK VIACHESLAV / Shutterstock

Atividades
1. Veja o exemplo e indique o que muda nos processos indicados a seguir:

[b] —> [G]       Ponto de articulação

[r] —> [l]       Modo de articulação

[g] —> [k]

[s] —> [v]

[u] —> [y]

[o] —> [u]

[θ] —> [t]

[u] —> [ɯ]

2. Explique o que é um arquifonema.


3. Observe esses três grupos de palavras transcritas foneticamente: ['kahtɐ], ['kaɾtɐ]; ['topʊ], ['t∫ipʊ]; e [mas], [ma∫]. Podemos
a rmar que os alofones consonantais indicados podem ser organizados, com base no que estudamos, em:

a) Variação livre.
b) Variação livre, distribuição complementar e variação livre.
c) Distribuição complementar.
d) Distribuição complementar, variação livre e variação livre.
e) Variação livre, distribuição complementar e distribuição complementar.

4. Explique por que a palavra samba pode ser pronunciada, no português do Brasil, tanto como ['sãbɐ] quanto como ['sãmbɐ].

5. O caso descrito nesta aula que tratou da assimilação de ponto de articulação pode ser relacionado a uma regra morfológica
que se aprende no Ensino Fundamental. Escolha a opção que representa corretamente essa regra:

a) Antes de p e t, escreve-se m.
b) Antes de p e t, escreve-se n.
c) Antes de p e b, escreve-se m.
d) Antes de p e b, escreve-se n.
e) Antes de d e b, escreve-se n.

6. Descreva a harmonia vocálica que existe comparando as seguintes pronúncias da palavra botijão, sendo em São Paulo, por
exemplo, pronunciada majoritariamente como [bot∫i'ʒãʊ], e, no Rio de Janeiro, falada como [but∫i'ʒãʊ].

Notas
Referências

FIORIN, J. L. Introdução à linguística II: princípios de análise. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2008.

SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Variação linguística;

Norma culta e dialeto padrão;

Preconceito linguístico.
Explore mais

Sugestões de leitura:

CAMARA JUNIOR, J. M. Para o estudo da fonêmica portuguesa. Rio de Janeiro: Vozes, 2008.

Esta obra explora com mais profundidade os estudos fonológicos e apresenta também uma análise sobre a rima na poesia
brasileira, comparando, por exemplo, o que compõe uma rima no português europeu e não é encarado desse modo por aqui.

SIMÕES, D. Considerações sobre a fala e a escrita – fonologia em nova chave. São Paulo: Parábola Editorial, 2006.

Esta obra apresenta soluções dentro do conhecimento fonológico para apoio especialmente nas tarefas de alfabetização.
Fonética e Fonologia do Português

Aula 09: Dialetos padrão e não padrão do português brasileiro


– análise sociolinguística

Apresentação
Nesta aula, vamos sistematizar uma análise da língua tendo como parâmetros alguns estudos sociolinguísticos, utilizando
ainda os conhecimentos fonéticos e fonológicos que adquirimos neste curso.

Entenderemos os conceitos de língua, norma e fala, que nos ajudarão a compreender como as estruturas sociais in uem
na organização das comunidades de fala. Dessa forma, adentraremos a um campo de estudo importante para futuros
professores: como estabelecer uma educação livre do preconceito linguístico.

Objetivo
Avaliar a variação linguística;

Identi car o preconceito linguístico;

Descrever a norma culta.

Diversidades linguísticas

Os estudos da linguagem têm um grande espaço na área acadêmica e variam de acordo com o campo de pesquisa. A
sociolinguística é um deles, que apresenta análises, dentre outros assuntos, sobre os falares, os quais são diversos a
depender de localização geográ ca (variação diatópica), classe social (variação diastrática), registro (variação diafásica) e
outros fatores.

Assim, um jovem português provavelmente fala diferente de uma senhora angolana e de uma menina brasileira.
Todos eles falam português, mas de maneiras diferentes. Outras variantes linguísticas também são a norma culta padrão e a
linguagem coloquial.

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Análise fonético-fonológica de uma variante

Para início de conversa, preste atenção na tirinha a seguir:

Nessa tirinha, que circulou bastante na internet, vemos dois homens conversando acerca de algum conteúdo que está sendo
transmitido na televisão. Vamos nomeá-los Falante 1 e Falante 2.

O Falante 1 questiona. Ele diz: Iae cumpadi, rme?, ao que o Falante 2 responde: Não, futebor.

Você entende do que se trata essa tirinha?

Vamos por partes.

O Falante 1 está provavelmente chegando no local onde está o Falante 2, haja vista a saudação inicial (iae cumpadi). Ele,
portanto, desconhece do que trata o conteúdo apresentado na tevê. Ao expressar sua pergunta, tem-se a ideia de que seu
questionamento busca saber da situação de seu companheiro ( rme?). Mas esse entendimento é rapidamente modi cado pela
resposta do Falante 2, que diz: Não, futebor.

A partir daí, identi camos com mais clareza o local onde provavelmente o diálogo se dá: em alguma cidade das Minas Gerais. E
identi camos o sentido relacionado à palavra rme, que não é o mesmo que imaginamos quando lemos a primeira fala do
diálogo.

Comentário

Temos em rme e em futebor um fenômeno chamado rotacismo, que é comum no português, talvez mais em outros contextos
fonológicos. Ainda assim, esse é um fenômeno nada raro. E, suponhamos que esse diálogo tivesse sido escutado, não seria muito
difícil entender as palavras utilizadas com a pronúncia apresentada.
Esse exemplo mostra que, além das possibilidades de realização que temos estudado na fonologia (lembre-se dos alofones em
sua variação livre), há muitas outras formas de produção. Talvez você nunca fosse imaginar que palavras como lme e futebol
pudessem ser pronunciadas trocando-se um glide por uma aproximante – ou, mais provavelmente, nesse caso, uma lateral
tenha sido a pronúncia mais próxima dessa variante.

Vamos entender melhor isso. É muito provável que você pronuncie o som do l em lme e em futebol como uma semivogal, ou
um glide, como temos nomeado aqui, e não como uma consoante.

Contudo, no caso que estamos analisando, tendo em vista a realização, uma retro exa alveolar sonora [ɹ], é possível que as
pronúncias mais próximas (e, por isso, mais facilmente convertidas nas pronúncias descritas na tirinha) sejam [' ɬmə; fute'bɔɬ],
com uma lateral alveolar sonora. A proximidade entre os dois fones é grande, sendo diferente apenas o modo de articulação.

Esse tipo de realização sonora muitas vezes é analisado com desprestígio


social. Até aqui, nossa análise tem se rmado em descrições puramente
cientí cas, sem levar em consideração os juízos de valor e não raro a
hierarquização relacionados a dados tipos de fala.

Mas, vamos avançar um pouco mais para entender como o ensino de língua portuguesa nas escolas pode ser positivamente
impactado pelos estudos linguísticos.

Toda língua admite variações


Conforme pontua Leite (2005), o uso propicia variações linguísticas, decorrentes da constante renovação da vida social.

Disso, devemos depreender que toda língua admite uma pluralidade de realizações, sendo todas elas igualmente válidas.
Assim, o que está previsto dentro do código linguístico não pode ser classi cado como erro. Vamos já entender melhor essa
questão.

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Esse dinamismo de que falamos tem a ver com as novas
con gurações que a sociedade adquire ao longo do tempo,
que recebe in uência direta da cultura e das relações
interpessoais.

Assim, não existem formas estagnadas porque as relações


mudam e os contatos culturais se diversi cam:
aprofundam-se ou se espaçam.

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O que estamos pontuando, então, é que não se pode a rmar, linguisticamente, que, de duas formas previstas por dado idioma,
uma é superior ou mais correta do que outra. O que se pode analisar, do ponto de vista da frequência, é se uma ocorre mais que
outra, bem como se uma tende a ser usada em determinado contexto em detrimento de outra.

Vejamos como exemplo o fenômeno que estudamos na aula passada, chamado de alteamento (a vogal passa a ser falada
com um traço mais alto no sentido da posição da língua). A harmonização vocálica que faz com que a pronúncia passe de
[sepe'tibɐ] a [sepi'tibɐ] mostra que ambas são possíveis, não sendo uma mais correta do que outra. Seria interessante,
entretanto, pesquisar qual a frequência em que ambas ocorrem, em que contextos, produzidas por quais falantes etc.

Comunidades de fala
Temos, então, um dado importante: as produções linguísticas individuais têm certas características que as agrupam em
determinadas comunidades de fala porque, segundo Fiorin (2004), embora o indivíduo possa utilizar variantes, é no contato
linguístico com outros falantes de sua comunidade que ele vai encontrar os limites para a sua variação individual.
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Assim, as variações ocorrem no nível individual (cada falante tem um certo uso do sistema linguístico em questão), mas
também em determinado agrupamento de pessoas (as comunidades de fala compartilham certos usos coletivos, que as
diferenciam de outras). Pense, por exemplo, nos casos que estudamos relacionados à pronúncia da palavra mar.

Língua, norma e fala

A dicotomia saussuriana língua/fala dava conta de demonstrar que a língua é um sistema coletivo composto por elementos
gerais e abstratos que se combinam e se diferenciam entre si, mas são igualmente válidos. Já a fala é a realização concreta e
individual desse código linguístico, feita de maneira dinâmica.

O linguista Eugenio Coseriu atualizou essa dicotomia propondo que há ainda uma instância medial que se dá num âmbito mais
abrangente das realizações pessoais, mas que ainda não abarca todo o sistema linguístico.

Com isso, tem-se a ideia de norma linguística que Leite (2005) explica como aquilo que já se realizou e, teoricamente, sempre
se realizará no grupo social; é a tradição à qual todos estão submetidos e obedecem, sem sentir, ou conjunto estruturado de
entidades reais, prescritivas. É a realização coletiva do sistema. Não é estática, mas conservadora por excelência.

Essa ideia está relacionada ao conceito de comunidade de fala.


Sociolinguística e o ensino de português
A educação formal é ponto-chave para revisar e reformular alguns conceitos já ultrapassados, especialmente, no nosso caso,
relacionados ao uso linguístico feito fora de certos padrões sociais.

Arendt (1979) alerta para responsabilidade coletiva, com menção especial à educação formal, de trazer alguém novo ao
mundo, bem como de apresentar esse mesmo mundo, já antigo, para o recém-chegado à educação. É quando decidimos se
amamos nossas crianças o bastante para não as expulsar de nosso mundo e abandoná-las a seus próprios recursos, e
tampouco arrancar de suas mãos a oportunidade de empreender alguma coisa nova e imprevista para nós, preparando-as em
vez disso com antecedência para tarefa de renovar o mundo comum.

Ao se quali car como professor de língua portuguesa, deve-se levar em consideração o trabalho com pessoas diferentes de
origens diversas e vivências várias, que já possuem bagagem cultural, a qual não deve ser desprezada no processo de
educação.

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 Fonte: Shutterstock
"Aqueles de nós que veem a educação como prática da
liberdade não a podem aceitar como transmissão rígida do
saber e da cultura, nem como o despejar de relatos ou fatos
sobre o educando."
LEAHY-DIOS, 2000

Sendo o Brasil um país multiétnico, formado por pessoas de origens diversas, os brasileiros convivem, mesmo sem se darem
conta frequentemente, com a variedade cultural. Entretanto, nem sempre o diálogo intercultural é feito de forma igualitária, nem
mesmo nos bancos escolares.

O sociólogo Fernandes (1966), ao analisar a crise do ensino no Brasil, mostra que as mudanças engendradas na sociedade,
com a dissolução da antiga organização escravocrata e senhorial não foram acompanhadas por alterações também na
estrutura educacional da escola, o que torna essa instituição obsoleta.

"O nosso sistema escolar ainda se organiza sob o imperativo


de servir a tendências predominantemente conservantistas."
FERNANDES, 1966

Fernandes (1966) mostra, então, que o nanciamento dessas tendências vem dos interesses em conservar a ordem
estabelecida, isto é, manter uma hierarquia social, sem propostas e perspectivas de mudança da sociedade.

Norma culta e preconceito linguístico

A noção de norma que explicamos anteriormente tem sido usada para pensar organizações de estrutura linguística comuns a
determinado coletivo, mas também foi utilizada para dar nome a um tipo de uso que seria modelo para a sociedade, a
chamada norma culta.

Bagno (2003) apresenta amplamente esse conceito, terminando por examinar e opor-se ao que ele chama de preconceito
milenar, construído pelo senso comum.
"As pessoas que usam a expressão norma culta como um
preconceito tentam encontrar em todas as manifestações
linguísticas, faladas e escritas, esse ideal de língua, esse
padrão preestabelecido que, como uma espécie de lei, todos
teriam obrigação de conhecer e de respeitar."
BAGNO, 2003

Essa lei é a gramática normativa, prescritiva, aquela tradicional que todo curso de Letras indica como fonte de pesquisa, a qual
leva em consideração os usos considerados corretos e condena as outras formas de utilização da língua.

É preciso que se aborde nas escolas a norma considerada culta de forma cientí ca, analisando-a como um modo de expressão
linguística entre outros. Obviamente, deve-se apresentá-la como a norma utilizada nas comunicações o ciais, pro ssionais e
escolares. Mas não se deve ignorar ou condenar os falares distintos, que são formas construídas e igualmente importantes
dentro do código linguístico.

"[...] o ensino da gramática normativa mais estrita, a obsessão


terminológica, a paranoia classi catória, o apego à
nomenclatura – nada disso serve para formar um bom
usuário da língua em sua modalidade mais prestigiada, falada
ou escrita. [...] Precisamos, portanto, redirecionar todos os
nossos esforços, voltá-los para a descoberta de novas
maneiras que nos permitam fazer de nossos alunos bons
motoristas da língua."
BAGNO, 2003

Atividades
1. Comparando as interjeições destacadas em "Devolve, pô!" e "Devolve, meu!", podemos dizer que estamos diante de uma
variação:

a) Normativa.
b) Diafásica.
c) Prescritiva.
d) Diastrática.
e) Diatópica.
2. A noção de norma linguística versa sobre:

a) Uma substituição da dicotomia proposta por Ferdinand de Saussure.


b) Uma realização do código linguístico por parte de um grupo social, desenvolvida por Eugenio Coseriu.
c) Um conceito inventado por Mattoso Câmara Júnior.
d) Uma contraposição à teoria da língua individual, de Leonard Bloomfield.
e) Uma expansão da teoria de língua social, de Noam Chomsky.

3. Levando em consideração que toda língua admite variações, é correto a rmar que:

a) As línguas do mundo não têm contato entre si.


b) Há variações que são superiores a outras.
c) Algumas variantes são formas erradas de uso da língua.
d) A norma culta é considerada um uso de prestígio da língua.
e) As variações sempre ocorrem com a mesma frequência.

4. Explique o que são comunidades de fala.

5. Explique o que é a norma culta.

6. Como a escola pode contribuir para a evitar a propagação do preconceito linguístico?

Referências

ARENDT, H. A crise na educação. In: Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1979. pp. 221-247.
Notas
BAGNO, M. A norma oculta: língua & poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 54. ed. São Paulo: Loyola, 2011.

COSERIU, E. Teoria da linguagem e linguística geral. Rio de Janeiro: Presença, 1987.

FERNANDES, Florestan. A crise do ensino e Mudança social e educação escolarizada. In: Educação e sociedade no Brasil. São
Paulo: Edusp, 1966. pp. 84-99 e 114-122.

FIORIN, J. L. Introdução à linguística I: objetos teóricos. 3. ed. São Paulo: Contexto, 2004.
LEAHY-DIOS, C. Conceituando di culdade em educação literária. In: Educação literária como metáfora social. Niterói: UFF,
2000. pp. 203-205.

LEITE, M. Q. Variação linguística: dialetos, registro e normas linguísticas. In: SILVA, L. A. A língua que falamos - Português:
história, variação e discurso. São Paulo: Globo, 2005.

SILVA, T. C. Fonética e fonologia do português. São Paulo: Contexto, 2009.

Próxima aula

Novo acordo ortográ co.

Explore mais

Para se aprofundar na temática das variações linguísticas, leia o livro:

BAGNO, M. A língua de Eulália: novela sociolinguística. Rio de Janeiro: Contexto, 2006.


Fonética e Fonologia do Português

Aula 10: Novo Acordo Ortográ co

Apresentação
Nesta aula, conheceremos um breve resumo da origem da língua portuguesa de forma a entender o desenvolvimento do
latim e sua conexão com as diversas formas de falar e escrever português na atualidade.

A partir disso, entenderemos a estratégia do Novo Acordo Ortográ co assinado pelos países lusófonos e aprenderemos as
novas regras que passam a ditar a gra a das palavras em língua portuguesa.

Objetivo
Descrever brevemente a história do português;

Identi car as regras apresentadas pelo Novo Acordo Ortográ co.

Palavras iniciais

Vimos neste curso aspectos importantes do estudo de Fonética e Fonologia, tais como diferenças e proximidades na língua
falada, comparando muitas vezes os diversos falares do Brasil.

Aprendemos formas de descrever, levando em consideração, na Fonética, a pura e simples produção de sons e ainda a
in uência do aparelho fonador, do ambiente em que o som se propaga e do sistema auditivo; e, na Fonologia, as regras que
orientam o uso da língua.

Nesta aula, conheceremos alguns pontos da origem da língua portuguesa de forma a entender o histórico único de várias
realizações linguísticas na contemporaneidade e, a partir disso, reconhecendo o passado comum, entenderemos o que
algumas estratégias políticas têm buscado realizar: tornar mais próxima a forma de expressão escrita em língua portuguesa.

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 Breve história da língua portuguesa

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Podemos dividir as fases da língua portuguesa em:

Pré-Histórica – até o século IX, quando os primeiros documentos latino-portugueses aparecem;

Proto-Histórica – séculos de IX a XII, período em que surgem textos em latim bárbaro;

História Arcaica – do século XII ao XVI, quando surgem os primeiros textos em português propriamente;

História Moderna – século XVI, com a publicação de Os Lusíadas, e vem até os dias de hoje.

No início do século III, os romanos chegam à Península Ibérica, no ano de 218 a.C., durante a segunda das três guerras
púnicas, nas quais a ainda República Romana disputava territórios com Cartago, potência que é arrasada pelos
romanos. A região situava-se em um local bastante privilegiado e estratégico por ser ponto de passagem entre dois
continentes.

Com o estabelecimento do Império Romano, a cultura e, portanto, as línguas romanas passam a impor-se e
expandem-se pelos territórios conquistados. Mas deve-se ressaltar que o latim que se espraiava era o vulgar, o falado
pelos legionários, colonos, comerciantes e funcionários públicos romanos.

Em 409 d.C., povos germânicos invadiram a Península. Vândalos, suevos, alanos e, posteriormente, visigodos
chegaram ao território e, ainda que rompendo a unidade romana, adotaram o latim como língua o cial. Mesmo assim,
agregaram diversas contribuições linguísticas nos três séculos de dominação.

Em 711, os árabes invadem e conquistam os territórios ibéricos, permanecendo neles por oito séculos e em 1492, são
expulsos de nitivamente. Esse tempo foi mais do que su ciente para que novas alterações fossem feitas à língua.

Antes disso, em 1249, após separar-se da Galícia (que integrará posteriormente o reino de Espanha) ao norte e
conquistar terras ao sul, Portugal assume uma extensão territorial bastante próxima da atual.

A língua portuguesa começa a ganhar forma


No m do século XII, o país recém-formado começa a
desenvolver-se culturalmente, o que é motivado pela
inauguração da Universidade de Coimbra por Dom Dinis, um
rei-trovador (até então, era na lírica trovadoresca que
aparecia um português arcaico, denominado galego-
português) que ordena a utilização da língua portuguesa
nos documentos públicos, devendo o latim ser abandonado
em caráter o cial. A tradução da Bíblia também é uma das
exigências de Dom Dinis.

A língua portuguesa, então, continua moldando-se e


estabelecendo-se, até chegar à sua fase moderna, em 1572,
com a publicação de Os Lusíadas, obra de Camões que
marca, conforme dissemos, o início da modernidade da
língua.

Com as grandes navegações, entre os séculos XIV e XVI, as


invasões promoveram um maior contato também
linguístico com idiomas da África, Ásia e Américas, de onde
também surgem diversas contribuições importantes à
constante mudança da língua.

Comentário

Some-se ainda que, entre os séculos XVII e XVIII, o espanhol e o francês, também línguas neolatinas, tinham grande prestígio
entre os falantes mais nobres. Também devem-se levar em consideração as línguas com as quais os falantes nas colônias
tinham contato e que contribuíram de forma signi cativa para a estrutura variável do português, principalmente acerca do léxico:

Tupi e as diversas línguas faladas no Brasil quinhentista;

Iorubá;

Quimbundo.
Esforço para uni car a língua portuguesa escrita

Com esse resumido histórico, construímos base para entender que, embora compartilhando a mesma origem, a língua
portuguesa falada difere quando pensamos nas regiões onde ela é usada o cialmente:

Angola;

Brasil;

Cabo Verde;

Guiné-Bissau;

Guiné Equatorial;

Moçambique;

Portugal (englobando seu território continental e as ilhas de Açores e Madeira);

São Tomé e Príncipe;

Timor Leste.

O português também é o cial em Macau, na China.

Mas não é apenas a língua falada que apresenta distinções — como foi o foco deste curso. A língua portuguesa escrita
também apresentava dois sistemas ortográ cos: o português, que também foi adotado pelos países africanos e pelo Timor
Leste; e o brasileiro. Essa situação é decorrente de um acordo que tentou estabelecer uma uni cação em 1945, mas que foi
adotado apenas por Portugal, haja vista que o Brasil voltou ao acordo de 1943.
Os oito países que têm o português como língua o cial compõem a
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Assim, a diferença
de escrita, embora não seja tão gritante, é considerada possível causa de
di culdades na difusão internacional da língua.

Idiossincrasias brasileiras

Vale a pena citar uma peculiaridade da história brasileira, em sua relação com a língua, que muito in uenciou na diferenciação
signi cativa entre o português europeu e o dos trópicos: desde a chegada dos jesuítas em terras brasileiras até meados do
século XVIII, a população indígena era muito mais numerosa do que o povo português, ou mesmo brasileiros descendentes de
portugueses, e por uma questão lógica a língua mais falada no Brasil nunca fora o português, porém o chamado tupi jesuítico
(uma língua simpli cada pelo Pe. José de Anchieta em sua Gramática da Língua mais falada na costa do Brasil, reunindo
elementos comuns de diversas línguas indígenas da costa brasileira).

 Capa de A Arte de Gramática da Lingoa mais usada na costa do Brasil.


Esse tupi, nal do século XVI até o século XVIII, era falado nas ruas e ensinado nas escolas. Nomes como o dos padres José de
Anchieta e Antônio Vieira foram preponderantes para a construção de uma memória linguística nativa, visto que compuseram
diversas obras em tupi, como teatros, poesias, sermões, entre outras composições litúrgicas e populares, com a nalidade de
sedimentar uma língua que possuía em sua essência uma sintaxe portuguesa e morfologia nativa. Com isso, naturalmente, no
Brasil a língua mais usada para as comunicações cotidianas era a língua tupi, sendo o português apenas a língua o cial
(utilizada nos documentos o ciais da colônia, nas cartas ao rei etc.).

Não su ciente a maciça in uência do tupi no imaginário linguístico do Brasil, o aumento do número de escravos africanos no
país gera uma miscelânea linguística que torna mais difícil ainda uma padronização linguística no que concerne ao português.
Uma medida drástica só seria tomada na segunda metade dos setecentos: o então primeiro-ministro português, o famoso
Marquês de Pombal, institui o Diretório do Índio, o qual proibia o ensino de tupi nas escolas da colônia, obrigando os cidadãos a
usarem apenas a língua portuguesa como língua materna. Consequentemente, com o passar dos séculos, o Brasil foi se
tornando de fato um país legitimamente lusófono. No entanto, as marcas das línguas nativas e africanas já se constituíam
indeléveis em nossa memória linguística e em todos os campos da linguagem: fonética, morfológica e sintaticamente, o Brasil
jamais teria uma unidade genuína com Portugal.

Após algumas tentativas, o Acordo Ortográ co da Língua


Portuguesa, assinado por todos os países lusófonos em Lisboa em
1990, foi promulgado pelo Decreto nº 6.583, de 29 de setembro de
2008. O Acordo promove apenas algumas alterações na gra a das
palavras, não interferindo na realização dos falantes ou sobre o léxico
(ou seja, variações diatópicas continuam existindo).

Vamos, então, conhecer as mudanças decorrentes desse acordo.

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Mudanças do Novo Acordo Ortográ co

O novo acordo propõe mudanças basicamente na constituição do alfabeto, na utilização do trema (a queda desse sinal grá co),
em alguns casos de acentuação e de uso do hífen. Vamos conhecer detalhadamente quais são as novas regras de uso
ortográ co.

Vamos utilizar como referência o Guia Prático da Nova Ortogra a (TUFANO, 2008).
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Alfabeto 

Com a reintrodução das letras k, w e y, o alfabeto completo passa a ser:

ABCDEFGHIJKLMNOPQRSTUVWXYZ

Essas letras são usadas em unidades de medida: km (quilômetro), kg (quilograma), W (watt); e na escrita de palavras e
nomes estrangeiros: show, playboy, playground, windsurf, kaiser etc.

Trema 

A partir do acordo, essa indicação grá ca não mais será marcada. Assim, palavras como bilíngüe e freqüente passam a
ser grafadas como bilíngue e frequente.

Mas, no caso de palavras estrangeiras e suas derivadas, como por exemplo, Bündchen, Müller, mülleriano, o trema
permanece.

Acentuação 

Houve algumas alterações na acentuação, principalmente o acento agudo, mas também com in uência em palavras com
o circun exo.

Hífen 

Veja as observações mais recorrentes no uso do hífen em palavras formadas por pre xos ou por elementos que podem
funcionar como pre xos, como: aero, agro, além, ante, anti, aquém, arqui, auto, circum, co, contra, eletro, entre, ex, extra,
geo, hidro, hiper, infra, inter, intra, macro, micro, mini, multi, neo, pan, pluri, proto, pós, pré, pró, pseudo, retro, semi, sobre,
sub, super, supra, tele, ultra, vice etc.

Curiosidades da Reforma Ortográ ca

Muitos não sabem, mas se no Brasil a reforma ortográ ca ainda é encarada com certa má vontade, em Portugal isso é muito
mais evidente, visto que os portugueses simplesmente desprezam o acordo ortográ co.

Desde o início do texto da reforma, a ideia era aproximar os países lusófonos a m de evitar que a mesma palavra tivesse em
cada país uma regra diferente para acentuação, padronizando, assim, os textos em língua portuguesa. No entanto, o que se vê
em algumas palavras escritas em português de Portugal em comparação ao português do Brasil é exatamente o contrário: o
português corrente lusitano ainda mantém sua escrita tradicional em palavras como académica, bebé, eléctrico, factual, entre
outras.
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 Fonte: Shutterstock

O texto do Acordo Ortográ co até ampara algumas palavras com dupla gra a, em especial aquelas com p ou c após vogais
(factual, eléctrico, exacto etc.), mas não entra no mérito de que uma palavra possa receber tanto acento agudo quanto
circun exo.

En m, ca aí a re exão: se nem os países lusófonos aprovaram a reforma, para quem então foi o acordo ortográ co?

Atividades
1. Assinale a opção em que há um vocábulo cuja gra a não atende ao previsto no Acordo Ortográ co:

a) Água – averiguemos – delinquente – arguir – aguentar.


b) Cinquenta – aguemos – linguística – equestre – eloquentemente.
c) Apaziguei – frequência – arguição – delinquência – sequestro.
d) Averiguei – inconsequente – bilíngue – linguiça – quinquênio.
e) Sequência – redargüimos – lingueta – frequentemente – bilíngue.
2. Assinale a opção em que todas as palavras compostas estão grafadas de acordo com as novas regras:

a) Miniquadro – minissubmarino – minirretrospectiva – mini-saia.


b) Sub-bibliotecário – atéia – sub-hepático – sub-região.
c) Infra-assinado – infra-estrutura – infra-hepático – enjôo.
d) Hiperácido – hiperespaço – hiper-humano – hiper-realista.
e) Contra-acusação – contra-indicação – contraespionagem – contra-harmônico.

3. Como jiboia, a gra a da palavra está conforme o Novo Acordo Ortográ co em:

a) Fieis.
b) Tuiuiu.
c) Trofeu.
d) Papeis.
e) Heroico.

4. Considerando que o Novo Acordo Ortográ co alterou o emprego do hífen em palavras compostas, a sequência de palavras
grafadas corretamente é:

a) Intraracial / antissocial / alémtúmulo / vice-almirante.


b) Auto-escola / minissaia / mandachuva / portarretrato.
c) Hiperrenquitado / semiaberto / microondas / auto-peça.
d) Anti-imperialista / pré-história / semianalfabeto / autoaprendizagem.
e) Hiper-hidratação / hiper-sensibilidade / hiper-esfera / hiperrrancoroso.

5. Indique qual frase está escrita corretamente:

a) É melhor tomar antiinflamatórios com indicação médica.


b) O quarto de Fernando precisa de uma super-reforma urgente.
c) Não agüento mais as piadas da televisão.
d) Meu filho não gosta do superomem.
e) Ana ficou mega-feliz ao encontrar Ricardo no restaurante.
6. Deveriam ter sido acentuadas todas as palavras na opção:

a) Azaleia – estreia – colmeia – geleia – pigmeia.


b) Benzoico – dicroico – heroico – Troia – urbanoide.
c) Chapeu – coroneis – heroi – ilheu – lençois.
d) Alcaloide – reumatoide – tabloide – tifoide – tipoia.
e) Apneia – farmacopeia – odisseia – pauliceia – traqueia.

7. Algumas palavras sofreram alteração de escrita com o advento do Novo Acordo Ortográ co da Língua Portuguesa. Tendo
em vista essas mudanças, assinale a opção incorreta:

a) A palavra pessoa, quando nome próprio, pode vir acentuada com acento circunflexo na penúltima sílaba, o que não altera em nada sua
pronúncia.
b) A palavra ideia perde seu acento agudo na penúltima sílaba, mas em termos de pronúncia, o ditongo continua aberto.
c) As palavras pôr e pôde mantêm seu acento para se diferenciarem das formas por e pode.
d) Acerca do uso de hífen, houve algumas mudanças importantes nas regras concernentes à sua colocação.
e) A palavra paranoia perdeu seu acento agudo na penúltima sílaba, influenciando na forma se pronunciar o ditongo: antes aberto, agora
esse ditongo é pronunciado como fechado. A mudança na escrita afetou a prosódia.

8. O Novo Acordo Ortográ co da Língua Portuguesa obviamente não modi cou todas as palavras presentes em nosso léxico,
pelo contrário, alterou a escrita de um número bem restrito de palavras. Todavia, uniformizou as regras de acentuação, o que,
na teoria, facilita a integração lusófona.

Dito isso, assinale a palavra que não foi alterada quanto à colocação do hífen pelo Novo Acordo Ortográ co, mantendo a sua
regra de antes:

a) A palavra antinflamatório continua sem levar o hífen, visto que, quando o prefixo termina com a mesma letra da iniciada pela palavra
posterior, acontece o fenômeno da composição por aglutinação.
b) A palavra sócio-econômico manteve o seu hífen, visto tratar-se da união de um substantivo (sócio) a um adjetivo (econômico).
c) A palavra mini-saia manteve seu hífen, pois o prefixo mini- requer o uso do hífen sempre que estiver diante de palavras iniciadas com
h, s ou r.
d) A palavra para-choque manteve o seu hífen, pois se trata de uma forma verbal (para) unida a um substantivo (choque).
e) A palavra antissocial sempre foi escrita dessa forma, não havendo intervenção de hífen na separação de prefixo e substantivo. No
entanto, há rumores de que o novo acordo ortográfico esteja viabilizando uma emenda, a fim de hifenizar essa palavra.
9. Alguns pro ssionais que trabalham com a língua portuguesa como objeto especí co e instrumental, como professores da
alfabetização e operadores do direito, reclamam bastante de algumas alterações fonéticas, às quais, vez ou outra, chamam
desnecessárias.

Sem entrar nesse mérito, certo é que a maioria dos professores que ensinam a língua materna não entendem bem o motivo de
palavras como ideia, jiboia, assembleia, heroico, terem perdido seu acento, pois era isso o que os diferenciava de palavras
como baleia, apoio etc.

Já os advogados não gostaram muito da mudança de palavras que fazem parte de seu cotidiano, como por exemplo
contrarrazões, visto que, para formular uma petição, agora é preciso dar uma olhadela no Novo Acordo.

Marque a opção que apresenta a nova regra de acentuação e hifenização das palavras elencadas acima:

a) Acentuam-se todas as paroxítonas com ditongo fechado; não se coloca hífen em prefixos terminados com vogal e iniciados com s ou r.
b) Não se acentuam mais as paroxítonas cuja sílaba tônica tenha um ditongo aberto; não se coloca hífen entre o prefixo terminado por
vogal e a palavra iniciada com r ou s: as palavras se unem com a dobra da letra r ou s.
c) Não se acentuam mais as paroxítonas cuja sílaba tônica tenha um ditongo aberto; coloca-se hífen em prefixos terminados com vogal e
em nomes iniciados com s ou r.
d) Acentuam-se as paroxítonas cuja sílaba tônica tenha um ditongo aberto; não se coloca hífen entre o prefixo terminado por vogal e a
palavra iniciada com r ou s: as palavras se unem com a dobra da letra r ou s.
e) Acentuam-se as paroxítonas cuja sílaba tônica tenha um ditongo fechado; não se coloca hífen entre o prefixo terminado por vogal e a
palavra iniciada com r ou s: as palavras se unem com a dobra da letra r ou h.

10. Analise as seguintes notícias jornalísticas:

I – Texto de aprovação da lei dependerá de votação na assembléia hoje – O texto produzido não levou em conta a reforma
ortográ ca introduzida pelo Novo Acordo.

II – Governo canadense investe mais de 5% do PIB em bolsas para estudantes de iniciação cientí ca. A idéia é modernizar
ainda mais o país, com o auxílio das novas tecnologias - O texto produzido levou em conta a reforma ortográ ca introduzida
pelo Novo Acordo.

III – Farmácia do interior de SP comercializa anti-in amatórios a R$ 1,00 – O uso do hífen está de acordo com o Novo
Acordo Ortográ co da Língua Portuguesa.

IV – Marvel pretende faturar mais que o dobro do valor de 2018 com super-heróis – No texto produzido, há dois erros graves:
o primeiro, o uso indevido do hífen. Por último, o acento equivocado na palavra heróis.

Está correto o que se a rma em:

a) I e III.
b) I, II e III.
c) II e IV.
d) Todas.
e) Apenas III.
11. Acerca do Acordo Ortográ co visto nesta aula, é incorreto a rmar que:

a) Ele visa a uma uniformização da língua portuguesa entre os países lusófonos.


b) Brasil e Portugal são dois dos países que aderiram à reforma.
c) Portugal é o país que mais apoia a reforma ortográfica, visto ser a pátria-mãe da língua.
d) Modificou algumas regras de acentuação gráfica.
e) Modificou algumas regras de uso do hífen.

Referências
Notas

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Dicionário escolar da língua portuguesa. 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional,
2008.

BAGNO, M. Português ou brasileiro? Um convite à pesquisa. São Paulo: Parábola Editorial, 2001.

BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. 37. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2009.

CARDOSO, E. A. A formação histórica do léxico da língua portuguesa. In: SILVA, L. A. A língua que falamos: Português - história,
variação e discurso. São Paulo: Globo, 2005.

TUFANO, D. Guia prático da nova ortogra a. São Paulo: Melhoramentos, 2008.

Explore mais

Se tiver uma dúvida quanto à gra a de determinada palavra, você pode procurar no sistema de busca do Vocabulário
Ortográ co da Língua Portuguesa:

//www.academia.org.br/nossa-lingua/busca-no-vocabulario <//www.academia.org.br/nossa-lingua/busca-no-vocabulario>
.

Além disso, você pode consultar o Acordo Ortográ co e outros documentos do Vocabulário Ortográ co da Língua Portuguesa:

//www.academia.org.br/nossa-lingua/vocabulario-ortogra co <//www.academia.org.br/nossa-lingua/vocabulario-
ortogra co> .

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