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CHEUNG, A. B.; SCALIANTE, R. de M.; LINDQUIST, M.; CHRISTOFORO, A. L.; CALIL JUNIOR, C. Confiabilidade estrutural 221
de uma ponte protendida de madeira considerando o tráfego real. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 2, p.
221-232, abr./jun. 2017.
ISSN 1678-8621 Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído.
http://dx.doi.org/10.1590/s1678-86212017000200154
Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 2, p. 221-232, abr./jun. 2017.
Introdução
No Brasil pequenas pontes de estradas vicinais são para uma viga com largura efetiva, referente à
essenciais para o transporte de produtos agrícolas, distribuição de carregamento. Para a aplicação
e uma boa alternativa consiste no uso de sistemas dessa metodologia faz-se necessária a obtenção
em pontes protendidas de madeira, que são mais dos parâmetros elásticos equivalentes, tais como os
leves do que as pontes tradicionais e apresentam módulos de elasticidade longitudinais em duas
grande rigidez e facilidade de montagem. Esse tipo direções perpendiculares (Ex, Ey) e o módulo de
de ponte foi originalmente desenvolvido em torção no plano longitudinal-transversal (Gxy).
Ontário, no Canadá, na década de 1970, como Nesse modelo a complexidade do tabuleiro da
forma alternativa de reabilitação de tabuleiros ponte é reduzida para uma largura efetiva. Devido
laminados pregados de pontes antigas (CHEUNG; à simplicidade e ao grau razoável de aproximação,
LINDQUIST; CALIL JUNIOR, 2004). No Brasil a esse modelo ainda é apresentado pelas normas
primeira ponte de madeira laminada protendida nacionais e internacionais como um possível
projetada foi construída sobre o Rio Monjolinho e modelo de cálculo. Muitos são os fatores que
está localizada na região da cidade São Carlos, influenciam a determinação da largura efetiva:
interior do estado de São Paulo (FONTE, 2004). nível de protensão, propriedades ortrotópicas da
A madeira laminada protendida consiste de uma madeira, deformação lenta da madeira, variação de
umidade e tipo de sistema de protensão
série de peças de madeira serrada dispostas lado a
(CHEUNG; CALIL JUNIOR, 2006).
lado e comprimidas transversalmente por barras de
protensão de alta resistência (GÓES et al., 2006; Existem na literatura vários tipos pontes
CALIL JUNIOR, 2006). A força de compressão protendidas de madeira (GÓES; DIAS, 2005). No
transversal aplicada pelas barras de protensão atua Brasil a grande maioria foi projetada sem o recurso
solidarizando as lâminas, como ilustra a Figura 1. de análises baseadas em confiabilidade, visto que a
Como vantagem do sistema pode-se citar a norma brasileira NBR 7190 (ABNT, 1997) não
facilidade de pré-fabricação, o peso próprio apresenta as premissas, os métodos de cálculo e os
reduzido, quando comparado a outros materiais, e índices de confiabilidade para a análise de
o comportamento de placa. estruturas considerando-se o critério de
confiabilidade estrutural (CHEUNG; PINTO;
A solidarização das lâminas de madeira pela
CALIL JUNIOR, 2012).
protensão confere à placa formada um
comportamento anisotrópico, e nesse sentido Com o intuito de evidenciar a importância do
diversos pesquisadores demonstram que os estudo da confiabilidade em estruturas de madeira
tabuleiros protendidos podem ser tratados como projetadas ou a ser projetadas, esta pesquisa
placas ortotrópicas (RITTER, 1990; TAYLOR; objetivou avaliar a confiabilidade estrutural da
BATCHELOR; VAN DALEN, 1982; OLIVA; ponte de madeira laminada protendida projetada
DIMAKIS, 1988; OKIMOTO, 1997; CHEUNG; construída sobre o Rio Monjolinho, em São
CALIL JUNIOR, 2006). Alguns métodos utilizam Carlos, SP, com ênfase na resistência à flexão e na
a transformação do problema de placa ortrotópica perda de protensão do sistema.
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Figura 2 - Ponte sobre o Rio Monjolinho (a) e esquema estrutural idealizado (b)
(a) Localização: GPS coordenadas S 21 59' 25.5" e W 47 53' 30.6", altitude de 849 m
IMPERMEABILIZAÇÃO
REVESTIMENTO ASFÁLTICO
(b)
Fonte: adaptado de Fonte (2004).
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Figura 3 - Falhas típicas: ruptura por flexão transversal (a) e por cisalhamento (b), fator de junta de
topo [Cbj] (c) e determinação de Dw (d)
(d)
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Figura 4 - Largura efetiva obtida pela teoria de placa ortotrópica (a) e expressão ajustada (b)
4,5
4,0 Ajustado
Teórico
3,5 a=0,7
a=0,3
3,0 a=0,1
q 2,5
2,0
1,5
1,0
0,5
70 85 100 115 130 145 160 175 190
Dw(cm)
(a) (b)
A Equação 4 mostra que a largura efetiva (Dw) realizados por Okimoto (1997). Além disso, o
pode ser obtida por meio dos parâmetros α e θ autor indica funções que relacionam os parâmetros
(Figura 4), onde Dw é expresso em centímetros. elásticos com a tensão de protensão, expressos na
Embora o valor da largura efetiva necessite apenas Equação 6, em que ϕ é o fator da perda de
dos parâmetros θ e α, outras variáveis são protensão, que é uma simplificação do efeito real,
necessárias para a avaliação, tais como o módulo e σN é o nível de protensão inicial, expresso em
de elasticidade longitudinal, o módulo de kN/m2.
elasticidade transversal, o módulo de cisalhamento
Ey
transversal, o fator de junta de topo e o nível de = 28,78 10-5 φ σ N - 0,001008
protensão. Ex
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Washington Luiz. O estudo forneceu dados expresso pela Equação 7, em que f(x) denota a
estatísticos sobre os pesos brutos dos veículos função densidade de probabilidade mista, pi são os
(GVW – gross vehicle weight) e carga por eixo de pesos ( m pi = 1 ) e fi(x) [i=1, 2,...,m] consiste
i=1
uma rodovia de alta capacidade de tráfego, e,
apesar de a ponte nesse estudo não ter as mesmas nas funções densidade de probabilidade de
características de tráfego, os dados apresentados variáveis aleatórias.
neste trabalho representam a distribuição mais f(x)= i=1 pi fi (x)
m
Eq. 7
provável de carga nos eixos. Isso decorre do fato
da inexistência de dados reais para pontes em A Figura 7a ilustra o histograma das cargas do
estradas vicinais. Os caminhões foram separados eixo traseiro do caminhão do tipo 3C. Os
por geometria dos eixos, como ilustrado na Figura resultados, analisados com os dados fornecidos
6. pela Centrovias, mostraram que as distribuições
A partir das frequências obtidas dos dados unimodal, bimodal e trimodal representaram bem
experimentais foi diagnosticado que os os dados experimentais. Para a obtenção dos pesos
carregamentos seguem distribuições unimodal, e dos parâmetros das distribuições normais foi
bimodal e trimodal. Com isso foram estimadas as utilizado o método dos mínimos quadrados (Figura
distribuições de probabilidade dos caminhões nas 7b), que consiste em uma técnica para minimizar
condições vazio e totalmente carregado, os resíduos obtidos das diferenças quadráticas
utilizando-se para isso o método da composição, entre os valores observados e estimados.
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Figura 7 - Histograma das cargas do eixo traseiro do caminhão do tipo 3C (a) e função de probabilidade
acumulada (b)
0,016
Carregado
0,014
0,012
0,010
Densidade
0,008
Vazio
0,006
0,004
0,002
0,000
90 135 180 225 270 315 360
(a)
1,00
0,90
0,80
0,70
0,60
FX(x)
0,50
0,40
0,30
0,20
Experimental
0,10
Ajustado
0,00
0 25 50 75 100 125 150 175 200 225 250 275 300 325 350
Carga dos eixos traseiros: Caminhão 3C (kN)
(b)
Fonte: adaptado de Lindquist (2006).
O histograma (que representa o eixo traseiro do O segundo pico indica a procura por se utilizar
caminhão do tipo 3C) aponta para dois tipos mais toda a capacidade prevista na legislação, que é de
prováveis de pesos nesse tipo de veículo. O 170 kN para o eixo tandem duplo (LINDQUIST,
primeiro pico no histograma, com valores ao redor 2006). A solução encontrada para analisar
de 50 kN, indica provavelmente a carga com o estatisticamente os dados consistiu em encaixá-los
caminhão vazio, sendo o peso nos eixos traseiros em três distribuições normais, conforme Lindquist
de um caminhão do tipo 3C sem a carroceria de et al. (2005). Para uma distribuição que resulta na
aproximadamente 40 kN, de acordo com as combinação de três funções normais, a função
especificações encontradas em manuais de cumulativa fica expressa por (Eq. 8):
fabricantes de veículos dessa natureza.
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Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 17, n. 2, p. 221-232, abr./jun. 2017.
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