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Os Lusíadas 9º ano

OS LUSÍADAS de Luís Vaz de Camões


Análise de Os Lusíadas

Os Lusíadas (1572) canta a glória de um povo centrada no período histórico dos


descobrimentos. Dedicado a D. Sebastião, tem como herói coletivo o povo português “... o
peito ilustre lusitano.”

O que é uma epopeia?


Palavra de origem Grega, epopeia significa canto e é uma narrativa, geralmente em verso, que
conta (canta) os feitos grandiosos de um herói, que pode ser individual (Ulisses – em Odisseia -
e Aquiles – em Ilíada, ambas de Homero) ou coletivo (Os Portugueses – o povo português – em
Os Lusíadas). Estes heróis ficam imortalizados através da narração dos seus sucessos gloriosos.

Necessidade de uma epopeia portuguesa


Em Portugal, intensifica-se, no século XV, a necessidade de conhecimento e domínio do espaço
físico. Desenvolveu-se, então, um espírito de ousadia que levou a uma abertura de
mentalidades – Humanismo – e uma consequente perceção mais rigorosa do mundo a nível
físico, científico e económico.
Decorrente deste espírito humanista – aberto, crítico, de valorização do real e do saber - surge
a necessidade de reler os escritores greco-latinos (os clássicos) para compreender o seu
conteúdo ideológico, psicológico e científico em oposição às crenças religiosas que dominavam
o pensamento anterior ao humanismo. A este movimento que reclama os ideais clássicos dá-
se o nome de Renascimento. O Renascimento tem como origem o desejo de retomar os
valores e modelos da Antiguidade Clássica. Um outro fator que contribuiu para uma mudança
cultural foi a expansão ultramarina. Através dos Descobrimentos, surgiu ao Homem um novo
mundo, repleto de saber, experiência e observação, que permitiu o desenvolvimento do
espírito crítico. Assim, houve uma conjugação de aspetos que permitiram que o Homem se
tornasse o centro do Universo, exaltando as suas capacidades e a sua força física e mental.
Os feitos Portugueses eram a demonstração evidente da força humana, do domínio da
inteligência do Homem sobre os elementos da natureza. O orgulho português estava no seu
auge. Havia, então, a necessidade de uma obra que cantasse esses feitos.

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Luís de Camões viveu numa época em que Portugal gozou o seu ponto mais alto de domínio do
mundo, devido aos Descobrimentos. Esta vivência serviu-lhe de estímulo (histórico) que, aliado
ao renascimento cultural, lhe deu a conhecer as epopeias clássicas, originando então a criação
de uma epopeia nacional.
Os Lusíadas acabam, então, por surgir com um duplo objetivo: exaltar os feitos Portugueses
(ideal cavaleiresco) e enobrecer a Língua Portuguesa.

Estrutura de Os Lusíadas
Estrutura externa
Os Lusíadas estão divididos em dez cantos, cada um deles com um número variável de
estrofes, que, no total, somam 1102. Essas estrofes são todas oitavas (têm oito versos)
decassilábicas (cada verso tem dez sílabas métricas), obedecendo ao esquema rimático
“abababcc” (rima cruzada, nos seis primeiros versos, e emparelhada, nos dois últimos).

Estrutura interna
Camões respeitou com bastante fidelidade a estrutura clássica da epopeia. A obra é
constituída por quatro partes:
Proposição — O poeta começa por declarar aquilo que se propõe fazer, indicando de forma
sucinta o assunto da sua narrativa; propõe-se, afinal, tornar conhecidos os navegadores que
tornaram possível o império português no oriente, os reis que promoveram a expansão da Fé e
do Império, bem como todos aqueles que se tornam dignos de admiração pelos seus feitos
(Canto I, estâncias 1-3).
Invocação — O poeta dirige-se às Tágides (ninfas do Tejo), para lhes pedir o estilo e eloquência
necessários à execução da sua obra; um assunto tão grandioso exigia um estilo elevado, uma
eloquência superior; daí a necessidade de solicitar o auxílio das entidades protetoras dos
artistas (Canto I, estâncias 4 e 5).
Dedicatória — É a parte em que o poeta oferece a sua obra ao rei D. Sebastião (Canto I,
estâncias 6-18).
Narração — O poeta canta os feitos dos Portugueses, tendo como ação central a viagem de
Vasco da Gama à Índia. A par desta, surge a narração da História de Portugal. A narração
constitui o núcleo fundamental da epopeia. Aqui, o poeta procura concretizar aquilo que se

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propôs fazer na “proposição”. Surge “in media res”, ou seja, já na viagem (característica da
epopeia clássica).

A narração desenvolve-se em quatro PLANOS DIFERENTES, mas estreitamente articulados


entre si:

1. Plano da viagem — A ação central do poema é a viagem de Vasco da Gama. Luís de Camões
percebeu a importância histórica desse acontecimento, devido às alterações que provocou,
tanto em Portugal, como na Europa.
2. Plano da História de Portugal – O objetivo de Camões era enaltecer o povo português e não
apenas um ou alguns dos seus representantes mais ilustres. Tinha, por isso, que introduzir na
narrativa todas aquelas figuras e acontecimentos que, no seu conjunto, afirmavam o valor dos
Portugueses ao longo dos tempos. O poeta utilizou, então, alguns artifícios para contar a
História de Portugal:
a) Narrativa de Vasco da Gama ao rei de Melinde — O rei recebe Vasco da Gama e procura
saber quem é ele e donde vem. Para lhe responder, Vasco da Gama localiza o reino de Portugal
na Europa e conta-lhe a História de Portugal até ao reinado de D. Manuel. Ao chegar a este
ponto, conta inclusivamente a sua própria viagem desde a saída de Lisboa até chegarem ao
Oceano Índico, visto que a narrativa principal se iniciara “in media res”, isto é, quando a
armada já se encontrava em frente às costas de Moçambique.
b) Narrativa de Paulo da Gama ao Catual —Em Calecut, uma personalidade hindu (Catual)
visita o navio de Paulo da Gama, que se encontra enfeitado com bandeiras alusivas a figuras
históricas portuguesas. O visitante pergunta-lhe o significado daquelas bandeiras, o que dá a
Paulo da Gama o pretexto para narrar vários episódios da História de Portugal.
c) Profecias — Os acontecimentos posteriores à viagem de Vasco da Gama não podiam ser
introduzidos na narrativa como factos históricos. Para isso, Camões recorreu a profecias
colocadas na boca de Júpiter, Adamastor e Tétis, principalmente.
3. Plano Mitológico, dos Deuses ou Maravilhoso (conflito entre os deuses pagãos) — Camões
imaginou um conflito entre os deuses pagãos: Baco opõe-se à chegada dos Portugueses à
Índia, pois receia que o seu prestígio seja colocado em segundo plano pela glória dos
Portugueses, enquanto Vénus, apoiada por Marte, os protege. O maravilhoso tem uma função
simbólica: esta intriga dos deuses reflete indiretamente as dificuldades que os Portugueses

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tiveram que vencer e inculca a ideia de que os portugueses eram seres predestinados para
estas façanhas do destino e que os próprios deuses o desejavam.
A mitologia permite a evolução da ação (os deuses assumem-se como adjuvantes ou como
oponentes dos portugueses) e constitui, por isso, a intriga da obra.
Júpiter - Deus do Céu e da Terra, pai dos deuses e dos homens.
Neptuno - Deus do mar.
Vénus - Deusa do amor e da beleza.
Baco - Deus do vinho e do Oriente.
Apolo - Deus do Sol, das artes e das letras.
Marte - Deus da Guerra, velho apaixonado de Vénus.
Mercúrio - Mensageiro dos deuses.
4. Plano das considerações do poeta — Por vezes, normalmente em final de canto, a narração
é interrompida para o poeta apresentar reflexões de carácter pessoal sobre assuntos diversos,
a propósito dos factos narrados.

≈ Breve apontamento sobre os episódios estudados nas aulas

1. Proposição (Canto I – estâncias 1-3)


O poeta apresenta o assunto do poema: vai cantar as façanhas guerreiras dos homens que se
fizeram heróis devassando o mar, dos reis que dilataram a Fé e o Império e de todos aqueles
que se tornaram imortais pelas suas obras. Afirma também que vai cantar a glória do povo
português. O poeta acrescenta ainda que os feitos portugueses são mais grandiosos do que
aqueles cantados nas epopeias clássicas, logo, merecem ser exaltados.

“As armas e os barões assinalados/ (...) as memórias gloriosas/ Daqueles Reis (...)/ (...) E
aqueles (...)/ Se vão da lei da Morte libertando:/ Cantando espalharei por toda parte,/ (...) Que
eu canto o peito ilustre Lusitano/ A quem Neptuno e Marte obedeceram.”

Neste excerto, encontram-se todos os agentes do engrandecimento da Pátria que o poeta vai
cantar. Todos eles são sintetizados na força do povo português “...o peito ilustre Lusitano/”, a
quem Neptuno (venceram os mares) e Marte (conquistaram as terras através da guerra)

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obedeceram. O povo português é tão sublime, tão digno que glória, determinado e corajoso,
que até os deuses lhe obedecem.

Notar o uso da conjugação perifrástica,


- foram dilatando;
- andaram devastando;
- se vão libertando;
que exprime o aspeto durativo, apresentando a ação no seu fluir. São expressões que
conferem visualidade e impressionismo à linguagem e sugerem também que esses feitos
heroicos são um trabalho aturado e persistente.

2. Consílio dos Deuses (Canto I – estâncias 20-41, plano mitológico)


- Enquanto a armada portuguesa navega no oceano, dá-se uma simultaneidade de dois planos.
- Os deuses são convocados por Mercúrio (o seu mensageiro) e dirigem-se ao Olimpo para
decidirem sobre o futuro dos Portugueses no Oriente.
- Na estância 22, temos uma descrição de Júpiter (o pai dos deuses), através da qual vemos o
seu destaque, a sua responsabilidade e o seu poder.
- Discurso de Júpiter: o pai dos deuses afirma que o Fado (destino) tornará os portugueses
superiores aos povos da antiguidade clássica. Enuncia heróis do passado e refere a presente
ousadia e persistência portuguesas na demanda de vencer os mares. A sua opinião é que se
deve cumprir o Fado, os portugueses devem conseguir chegar à Índia.
- Os outros deuses vão intervindo, dando as suas opiniões: Baco manifesta-se contra, com
receio de perder a sua fama; Vénus pronuncia-se a favor, por gostar dos portugueses, dada a
sua semelhança com os romanos; Marte intervém a favor de Vénus, interpelando Júpiter para
cumprir com a sua determinação.
- Júpiter concorda com Marte, pelo que fica decidido que os Portugueses serão ajudados a
chegar à Índia. (de notar a intenção de Camões: os portugueses são tão valorosos que até os
Deuses estão a seu favor)

“Do mar que vê do Sol a roxa entrada/” – Perífrase para Oceano Índico, Oriente.

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3. Inês de Castro (Canto III – estâncias 118-137, plano da História de Portugal)


- episódio trágico e lírico

Trágico
Contempla momentos da tragédia clássica:
- a paixão entre Pedro e Inês é um desafio ao poder.
- a punição, a decisão de matar Inês.
- a piedade, presente no discurso de Inês quando tenta demover o rei.
- a catástrofe, quando se consuma a morte de Inês.

Lírico:
O narrador interpela o Amor acusando-o de ser responsável pela tragédia, sendo a
inconformidade do “eu” poético expressa ao longo de todo o episódio, bem como a repulsa
pela morte de Inês, chorada até pela natureza.

- Vasco da Gama relata ao rei de Melinde o episódio trágico de Inês de Castro, cujo
responsável é o Amor.
- Descreve-se a vida feliz e tranquila de Inês nos campos do Mondego. O narrador, neste
momento, vai introduzindo indícios de que essa felicidade não será duradoira “Naquele
engano de alma, ledo e cego” (est. 120, v.3).
- Condenação de Inês – D. Afonso IV decide a morte de Inês, no entanto, tendo-a na sua
presença, vacila, mas as razões do reino levam-no a prosseguir.
- Discurso de Inês – Inês inicia a sua defesa, apelando à piedade do rei através: dos animais
que se humanizam ao cuidar de crianças; da afirmação da sua inocência; do respeito devido às
crianças; do apelo ao desterro.
- Sentença e execução da morte – A determinação do rei mantém-se. Inês é executada.
- Considerações do narrador – vê a morte de Inês como uma atrocidade. Afirma que a própria
natureza chora Inês.
- Vingança de D. Pedro – D. Pedro, quando sobe ao trono, manda matar os carrascos de Inês.

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“Tu, só tu, puro Amor,...” – Apóstrofe


Amor – divindade sedutora – prazer e felicidade vs. tragédia, dor e sofrimento.
Sentimento antitético. Provoca sentimentos contrários, opostos.
“... puro Amor, com força crua,/ (...) fero Amor,(...)/ (...) áspero e tirano,/ Tuas aras banhar em
sangue humano.”
Antítese do amor – o amor é puro, mas age com força crua, é cruel, tirano, e causador das
maiores desgraças.

“Do teu príncipe ali te respondiam/ As lembranças que na alma lhe moravam,/ Que sempre
antes seus olhos te traziam,/ Quando dos teus fermosos se apartavam;” – Hipérbato
De notar a impressionista animização da natureza, que chora a morte de Inês “As filhas do
Mondego a morte escura/ Longo tempo chorando memoraram,/” - Animismo

4. Despedidas de Belém (Canto IV, estâncias 83 a 89, plano da Viagem)


Os que partem – referência ao estímulo dado pelo rei aos marinheiros; Vasco da Gama refere
o entusiasmo de marinheiros e soldados nesta demanda; orações de despedida.
Os que ficam – A gente da cidade deixa transparecer saudade e tristeza; os mais chegados
revelam a sua tristeza (os homens com “suspiros”; as mulheres, as mães, as esposas e as irmãs
“cum choro piadoso”).
“De ser do Olimpo estrelas,.../” – Metáfora para tornarem-se imortais.

Grandeza épica – os navegadores tinham consciência do perigo mas, mesmo assim,


enfrentaram os obstáculos. A verdadeira coragem só aparece perante o medo (mais uma vez,
a exaltação do povo português)

5. Adamastor (Canto V, estâncias 39 a 60, plano mitológico)


- O Adamastor é um dos episódios mais significativos da obra, pela inter-relação dos planos da
narração e pela sua simbologia. Pertence ao plano da Viagem – “aquele oculto e grande Cabo”

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-, como figura mitológica, pertence ao plano mitológico e faz profecias dos acontecimentos
futuros de Portugal, logo, pertence também ao plano da História de Portugal.
- Simbolicamente, este episódio representa os perigos do mar, perigos esses que os
portugueses enfrentaram e ultrapassaram, assemelhando-se, pela grandeza, ao próprio
gigante. Este episódio, por isso mesmo, adquire uma dimensão épica.
- Aparecimento e descrição do Adamastor – figura gigantesca que surge no mar numa atitude
ameaçadora, deixando os marinheiros completamente paralisados “Arrepiam-se as carnes e o
cabelo, / A mi e a todos, só de ouvi-lo e vê-lo!”(est. 49, vv. 7 e 8).
- As profecias: Adamastor começa o seu discurso elogiando os Portugueses. Depois, profetiza
dificuldades futuras na passagem do Cabo.
- A história do Adamastor: era um dos filhos do Céu e da Terra; confrontou-se com Júpiter e
Neptuno; apaixona-se por Tétis, filha de Nereu e Dóris; Dóris promete interceder, dadas as
ameaças de Adamastor em conquistar Tétis pelas armas; Tétis aparece e surge a deceção do
gigante quando se vê abraçado a um rochedo, pensando que abraçava a amada;
transformação de Adamastor em penedo como castigo de Júpiter que venceu os gigantes.
- O Adamastor desaparece, chorando, emocionado com a sua triste sorte – símbolo do
domínio dos mares por parte dos portugueses.
Adamastor
Corpo de super-homem contrasta com a fragilidade psicológica de um herói enganado –
frustração amorosa.

6. A tempestade e a chegada à Índia (Canto VI, estâncias 70-93, plano da Viagem)


- Aproximação da tempestade.
- Descrição da tempestade: do interior e do exterior.
- Súplica de Vasco da Gama: Vasco da Gama dirige-se à “Divina Guarda” pedindo clemência e
argumentando que aquela é uma viagem ao serviço de Deus “Se este nosso trabalho não Te
ofende,/ Mas antes Teu serviço só pretende?” (est. 82, vv.7 e 8)
- Continuação da descrição da tempestade.
- Intercessão de Vénus – Vénus manda as Ninfas enfeitarem-se e irem ao encontro dos ventos
que, perante a sua beleza, logo desfalecem “À vista delas, logo lhe falecem/ As forças com que
dantes pelejaram” (est. 88, vv.1 a 3) – simbologia.
- Pela manhã, avistam a Índia. Vasco da Gama agradece a Deus.

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A Tempestade

1.ª parte: a tempestade (est. 70-79)


O episódio inicia-se com o conector mas («Mas, neste passo, assi prontos estando» - est. 70) a
marcar o contraste entre a calmaria descrita anteriormente e a violência da tempestade que se
avizinha. Esta é anunciada por uma «nuvem negra que aparece» (est. 70). Logo de seguida, a
agitação, a confusão e uma certa desorientação instalam-se a bordo, o que é expresso, entre
outros recursos, pela repetição dos verbos «Amaina» (est. 71) e «Alija» (est. 72). Está presente
também o realismo descritivo associado às sensações auditivas (o apito, os gritos, os ruídos da
destruição de partes dos barcos, os trovões) e visuais («correm logo os soldados» - est. 73; «A
nau grande, em que uai Paulo da Gama, / Quebrado leva o masto pelo meio, / Quási toda
alagada» - est. 75). As sensações auditivas evocam sobretudo os barulhos do mar e do vento
dando nas naves, bem como os ruídos das próprias embarcações e da agitação dos seus
marinheiros. São também muito expressivos os adjetivos («grande e súbita procela» - est. 71;
«ventos indinados» - est. 71; «súbito temor e desacordo» - est. 72; «possante nau» - est. 74;
«gritos vãos» - est. 75; «Neptuno furibundo» -est. 76), que ajudam a criar e a descrever todo o
ambiente de agitação, violência, gritos e ruídos de toda a espécie, não esquecendo os
sentimentos/ atitudes que vão invadindo os marinheiros.
A violência da tempestade está expressa também: na descrição dos movimentos violentos das
naus no mar revolto («Agora sobre as nuvens os subiam / As ondas de Neptuno furibundo; /
Agora a ver parece que deciam / As íntimas entranhas do Profundo» (est. 76); na forma
hiperbólica como é descrita («Nunca tão vivos raios fabricou / Contra a fera soberba dos
Gigantes / O grão ferreiro sórdido» - est. 78); na sua influência sobre os animais marinhos que,
tristes e aterrorizados, fogem («As Alciónias aves triste canto / Junto da costa brava
levantaram, / Lembrando-se de seu passado pranto, / Que as furiosas águas lhe causaram. / Os
delfins namorados, entretanto, / Lá nas covas marítimas entraram, / Fugindo á tempestade e
ventos duros, / Que nem no fundo os deixa estar seguros.» - est. 77); nas suas consequências
destruidoras na natureza envolvente («Quantos montes, então, que derribaram / As ondas que
batiam denodadas! / Quantas árvores velhas arrancaram / Do vento bravo as fúrias
indinadas!» - est. 79).

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2.º parte: suplica de Vasco da Gama (est- 80-83)


Vasco da Gama, temendo um fim trágico para a sua viagem, dirige uma prece a Deus («Divina
guarda» - est. 81). Este seu discurso apresenta vários argumentos, que são organizados com o
intuito de sensibilizar Deus para a causa portuguesa, levando-o a Interceder junto dos
marinheiros em dificuldades: 1.º argumento: evoca o grande poder de Deus, que já libertara
homens de grandes dificuldades e perigos em momentos passados; 2.º argumento: refere que
Deus abandonou os marinheiros, que iam em missão religiosa («Mas antes teu serviço só
pretende?» - est. 82); 3.º argumento: louva aqueles que tiveram a sorte de morrer lutando
pela fé cristã («Oh ditosos aqueles que puderam / Entre as agudas lanças Africanas / Morrer,
enquanto fortes sustiveram / A santa Fé nas terras Mauritanas» - est. 83).

3.ª parte: descrição da tempestade (est. 84)


Apesar da súplica de Gama, a tempestade aumenta a sua violência: os ventos gritavam como
"touros Indómitos" (est. 84) e os «Relâmpagos medonhos» (est. 84) não paravam.

4.ª parte: intervenção de Vénus (est. 85-91)


Neste momento, surge o plano mitológico em paralelo com o plano da viagem, Vénus aparece
e afirma que Baco é responsável pela tempestade, mas que não o deixará levar avante os seus
intentos. Para tal, reúne as «Ninfas amorosas» (est. 86), que se embelezam com o intuito de
dominarem os ventos. A ninfa Oritia dirige-se ao vento Bóreas e diz-lhe que não poderá voltar
a amá-lo se este mantiver a ferocidade, pois o amor não é compatível com o medo. Galatéia
utiliza os mesmos argumentos junto do vento Noto. Os ventos amansam, submissos às belas
ninfas, e a tormenta acalma. Por isso, Vénus, feliz, afirma que os protegerá.

Chegada à Índia (est. 92-94)

Na manhã seguinte, já num ambiente calmo, os marinheiros avistam Calecut. Gama agradece
a Deus por ter livrado os portugueses dos perigos da tempestade.

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7.Ilha dos amores [preparação] (Canto IX, estâncias 18-29)

Estrutura externa: canto IX, est. 18-29


Estrutura interna: Narração
Narrador: Poeta
Plano narrativo: Plano mitológico

As estâncias relativas à preparação da Ilda dos Amores têm como narrador o poeta e fazem
parte do plano mitológico. Este momento d'Os Lusíadas pode organizar-se em várias partes.

1.ª parte: a decisão de Vénus (est. 18-20)


Vénus pretende dar aos portugueses um prémio pelas vitórias alcançadas e pelos danos
sofridos. Decide, então, pedir ajuda ao seu filho, Cupido.

2.ª parte: o prémio (est. 21-22)


Vénus decide preparar uma ilha divina, que será colocada nas águas, no caminho dos
marinheiros. Nessa ilha, encontrar-se-ão «aquáticas donzelas» (est. 22), que serão escolhidas
entre as mais belas e as mais devotas do amor. Estas ninfas terão como missão aguardar pelos
marinheiros e recebê-los com cânticos e danças, para despertarem neles «secretas afeições»
(est. 22).

3.ª parte: a ajuda de Cupido (est. 23-24)


Cupido é o ajudante ideal, pois já tinha colaborado com Vénus numa situação similar: tinha
levado Dido a apaixonar-se por Eneias.
Vénus vai, então, procurar Cupido no seu carro puxado por cisnes («as aves que na vida / Vão
da morte as exéquias celebrando» - est. 24) e rodeado de pombas que se beijam.

4.ª parte: a missão de Cupido (est. 25-29)


Cupido encontrava-se em Idália, cidade da ilha de Chipre, famosa pelo culto de Vénus,
procurando reunir um exército de cupidos para realizar uma expedição com o fim de emendar

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os erros dos humanos, pois «estão, / Amando coisas que nos foram dadas, / Não pera ser
amadas, mas usadas» (est. 25).
São apresentados vários exemplos de situações em que se ama mal, para a expedição de
Cupido: o caçador Actéon, que não soube amar a «bela forma humana» (est. 26) - representa
os que não sabem amar; os homens que se amam a si próprios (est. 27); os aduladores (est.
27); aqueles que amam as riquezas e deixam de lado a «justiça e integridade» (est. 28); os
tiranos (est. 28); as leis feitas a favor do rei e contra o povo (est. 28).
Afirma-se, em síntese, que a expedição de Cupido tinha lugar porque «ninguém ama o que
deve» (est. 29). Por estas razões, Cupido juntou os «Seus ministros» para ajudar a «mal regida
gente» (est. 29) a evoluir no campo do amor.

8. Ilha dos Amores (Leonardo) (Canto IX, estâncias 75-84)


Estrutura externa: canto IX, est. 75-84
Estrutura interna: Narração
Narrador: Poeta
Plano narrativo: Plano mitológico
Após o desembarque dos marinheiros portugueses na Ilha dos Amores, a atenção do narrador
centra-se em Leonardo. Este marinheiro persegue uma ninfa que parece ser mais difícil de
apanhar do que as restantes.

1.ª parte: Caraterização de Leonardo (est. 75 - v. 5 est. 76)


Leonardo é caracterizado, do ponto de vista psicológico, como «bem disposto / Manhoso,
cavaleiro e namorado» (est. 75). O narrador dá uma atenção especial aos amores do
marinheiro, referindo que este nunca tivera sorte neste campo.

2.ª parte: Discurso de Leonardo (v. 6 est. 76 – est. 81)


Enquanto persegue Efire, Leonardo procura convencê-la a parar, usando diferentes
argumentos: ainda que Efire esperasse por ele, o azar do nauta impedi-lo-á de a alcançar; ele
gostaria de saber o que faria a sorte para o impedir de apanhar a ninfa; se ela abrandasse, já
estaria a alterar a má sorte de Leonardo; ela estava a colocar-se do lado da má sorte do
marinheiro, quando se deveria colocar do lado do mais fraco; ela levava, com ela, a alma de

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Leonardo, que até ao momento tinha sido livre; ele continuava a persegui-la apenas porque
tinha esperança de que ela mudasse o destino dele, apaixonando-se.

3.ª parte: Descrição de Éfire (est. 82)


A ninfa já não corria para fugir de Leonardo, mas apenas para ouvir as suas belas palavras. Por
fim, parou e entregou-se ao marinheiro.

4.ª parte: A união amorosa (est. 83)


O narrador descreve o enlace amoroso e termina, afirmando, relativamente ao que foi
descrito, «Milhor é experimentá-lo que julgá-lo; / Mas julgue-o quem não pode experimentá-
lo».

5.ª parte: O casamento (est. 84)


Os marinheiros são coroados como heróis, recebendo Louro e ouro. Por fim, celebra-se uma
cerimónia de casamento com as ninfas.

9. Considerações do poeta (Canto X, estâncias 142-146, 154-156)


Estrutura externa: canto X, est. 142-146,154-156
Estrutura interna: Narração
Narrador: Poeta
Plano narrativo: Plano mitológico (a), da viagem (b) e das considerações do poeta (c)

[a] Despedida de Tétis (est. 142 – v. 2 est. 143)


Tétis, antes de avisar os portugueses que já podem partir, recorda dois factos fundamentais:
que lhes foi concedido o privilégio de conheceremos feitos gloriosos que Portugal ainda há de
vir a realizar e que realizaram, eles próprios, grandes feitos que lhes proporcionaram o contato
com as ninfas.

[b] Regresso a Portugal (v. 3 est. 143 – 144)


Os portugueses levam da ilha provisões e memórias dos tempos que passaram com as ninfas,
recordações que os acompanharão para sempre. Em mar sereno, com vento calmo, fazem a
viagem de regresso, até ao Tejo.

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[c] Considerações do poeta (est. 145-146,154-156)


As estâncias finais d'Os Lusíadas são momentos em que o poeta reflete sobre o país que lhe
era contemporâneo e dirige conselhos ao rei D. Sebastião.

Est. 145
O poeta, que, por diversas vezes, ao longo do poema, convocou as ninfas para que estas o
inspirassem, vem agora afirmar que não precisa mais da sua inspiração. Tem a lira
«Destemperada» e a «voz enrouquecida», ou seja, não consegue mais continuar o seu canto, o
seu poema. Este cansaço deve-se não ao Longo poema construído, mas à consciência de que
está a cantar para uma «gente surda e endurecida».
Constata, assim, tristemente, que a pátria não o protegerá, por que «está metida / No gosto da
cobiça e na rudeza / Düa austera, apagada e vil tristeza». Os portugueses do tempo de Camões
são, assim, apresentados como totalmente diferentes daqueles que o poeta louvou ao longo
do poema, pois vivem dominados pela cobiça e pela tristeza.

Est. 146
O poeta mostra não compreender por que razão a pátria (os portugueses do seu tempo) não
encara, com alegria e vontade de trabalhar, os desafios que vão surgindo.
Dirige-se a D. Sebastião, apelando a que este se rodeie de «vassalos excelentes», ou seja, de
portugueses que ainda sejam capazes de grandes sacrifícios e que não estejam dominados
pela tristeza, pela preguiça e pela cobiça.

Est. 154-56
Dirigindo-se a D. Sebastião, o poeta autocaracteriza-se de forma humilde, mostrando a sua
pouca Importância: «humilde, baixo e rudo, / De vós não conhecido nem sonhado». Não
obstante, oferece os seus serviços ao rei, mostrando as suas mais-valias: o honesto estudo, a
experiência e o engenho, «Cousas que juntas se acham raramente», como conclui Camões.
Deste modo, o poeta declara-se pronto para servir D. Sebastião tanto na guerra como
enquanto poeta, cantor dos grandes feitos a serem praticados. Se D. Sebastião o aceitar, o
poeta cantará de forma gloriosa todas as grandes vitórias que terão lugar, numa nova epopeia.

Prof. Elisabete Freitas Página 14


Os Lusíadas 9º ano

ESTILO DE LUÍS DE CAMÕES


Na Invocação, Camões pede às Tágides um estilo grandioso e um “som alto e sublimado”.
Como o conseguiu?
Através de aliterações, anáforas, antíteses, apóstrofes, comparações, eufemismos,
enumerações, hipérboles, hipérbatos, metáforas, perífrases, personificações, pleonasmos, do
uso invulgar da conjugação perifrástica, do verbo e do adjetivo.

Aliteração - Repetição de um ou mais sons consonânticos para intensificar e aumentar a


expressividade "Sois senhor superno" (I, 10).

Anáfora - Repetição (de que resulta sobressair o que se repete) de uma palavra ou de um
membro de frase "Vistes que, com grandíssima ousadia/ Vistes aquela insana fantasia/ Vistes,
e ainda vemos cada dia," (VI, 29).

Antítese - Confronto de dois elementos ou ideias antagónicas, no intuito de reforçar a


mensagem:
"Tanto de meu estado me acho incerto,
Que em vivo ardor tremendo estou frio."

Apóstrofe - Apelo do autor, através de interrupções, invocando pessoas ausentes, coisas ou


ideias sob forma exclamativa "E tu, nobre Lisboa, que no mundo..." (III, 57).

Comparação - Aproximação entre dois termos ou expressões através de uma partícula


comparativa (como), levando à compreensão mais profunda do primeiro termo "Qual aos
gritos…// Tal do rei…" (III, 47-48).

Eufemismo - Expressão que atenua ou modifica o sentido violento, mau ou desonesto da


narrativa "Tirar Inês ao mundo determina," (III, 23).

Hipérbato - Inversão violenta da posição dos membros de uma frase:


Ex.: "...os duros/Casos que Adamastor contou, futuros" (V, 60).

Prof. Elisabete Freitas Página 15


Os Lusíadas 9º ano

Hipérbole - Exagero de qualquer realidade para a tornar mais saliente, exagero este que serve
para ferir o pensamento quando tomada à letra "Que a vivos medo, e a mortos faz espanto,".

Ironia - Exprime o contrário do que as palavras ou frases significam, para que se compreenda
ou a estupidez ou a fraqueza que se pretende castigar após se verificar a discordância:
Ex.: "Oulá, Veloso amigo, aquele outeiro (...)
Por me lembrar que estáveis cá sem mim;" (V, 35).

Metáfora - Consiste em designar um objecto ou ideia por uma palavra que convém a outro
objecto ou outra ideia - ligados aqueles por uma analogia. A metáfora é num único, os dois
termos da comparação sem a partícula comparativa (como) "Tomai as rédeas vós do reino
vosso:" (I, 15).

Onomatopeia - Representação auditiva ou visual pelos sons das palavras, além do respetivo
sentido: tentativa de imitação dos ruídos naturais através dos fonemas da linguagem: "Polas
concavidades retumbando." (III, 107).

Perífrase - Expressão por diversas palavras daquilo que se poderia dizer mais concisamente ou
apenas por uma palavra "Pelo neto gentil do velho Atlante." (=Mercúrio) (I, 20).

Personificação - Atribuição de qualidades, atributos e impulsos humanos a seres inanimados e


a animais irracionais "Os altos promontórios o choraram," (III, 84).

Sinédoque - Consiste em tomar o todo pela parte e a parte pelo todo, o plural pelo singular ou
o singular pelo plural "Que da Ocidental praia Lusitana" (=Portugal) (I,1).

Prof. Elisabete Freitas Página 16

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