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I – Nos autos de inquérito de que o presente recurso foi extraído, requereu o Ministério
Público – renovando, aliás, despachos/promoções que já anteriormente deduzira e
invocando, para tanto, o teor da investigação do SEF apensa aos mesmos autos – a
realização de buscas a dois escritórios de advocacia da Dr.ª B..., situados,
respetivamente, em Lisboa e em Cascais, “com busca, pesquisa e apreensão de dados
informáticos nos computadores e demais aparelhos eletrónicos aí existentes para recolha
de elementos e documentação relevante”, com vista a “apreender todos os documentos
em arquivo físico ou digital associados às manifestações de interesse na regularização
extraordinária que verte do nº 2 do artigo 88° [da Lei 23/2007, de 4 de julho] em nome de
imigrantes ilegais não enquadráveis nesse mecanismo legal”.
Sobre tal promoção, incidiu o seguinte despacho do Ex.mo Juiz de Instrução Criminal
(transcrição):
«O Digno Magistrado do Ministério Público veio mais uma vez promover a realização de
buscas a dois escritórios de advocacia, em Lisboa e em Cascais, “com busca, pesquisa e
apreensão de dados informáticos nos computadores e demais aparelhos eletrónicos aí
existentes para recolha de elementos e documentação relevante», com o intuito de
«apreender todos os documentos em arquivo físico ou digital associados às
manifestações de interesse na regularização extraordinária que verte do nº 2 do artigo
88° [da Lei 23/2007, de 4 de julho] em nome de imigrantes ilegais não enquadráveis
nesse mecanismo legal”.
O requerente especifica, como documentos com interesse para a prova, “cópias de
documentos de viagem, notas referentes às circunstâncias migratórias individuais,
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dados de tráfego, dispõe dos meios legais que permitem a sua preservação e revelação,
nomeadamente os previstos nos artigos 13° e 14° da Lei nº 109/2009, de 15 de
setembro. Nesse sentido, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu, por acórdão de
22/04/2013, que "a obtenção de um concreto endereço IP que esteve na origem de uma
determinada comunicação efetuada é da competência do Ministério Público e não do
juiz."
Como refere a Professora Catedrática Teresa Armenta Deu, nas suas “Lecciones de
Derecho Procesal Penal”, o princípio da proporcionalidade compreende três
subprincípios, nomeadamente o da idoneidade, o da necessidade e o da
proporcionalidade stricto sensu:
«1) A idoneidade refere-se à adequação objetiva e subjetiva de causalidade da medida
limitativa em relação aos seus fins, de modo a que as ingerências sejam adequadas
qualitativa, quantitativamente e no seu âmbito subjetivo de aplicação.» (...) «2) A
"necessidade" ou "alternativa menos gravosa" ou "intervenção mínima" implica a
manifestação externa e comparativa da proporcionalidade. Compara-se a medida
restritiva que se pretende adotar com outras possíveis, devendo acolher-se a menos
lesiva para os direitos dos cidadãos. (...)
3) A proporcionalidade "stricto sensu" refere-se à necessidade de ponderar os interesses
em conflito na hora de limitar o exercício do direito fundamental de que se trate, de
maneira a ponderar os interesses individuais (...) com o interesse estatal que se pretende
salvaguardar com a limitação.» (Ob. cit., p. 70 e 71).
Também Manuel Monteiro Guedes Valente se refere ao princípio da proporcionalidade,
que relaciona com o princípio do respeito dos direitos e interesses legalmente protegidos
dos cidadãos:
“O respeito por este princípio pela Polícia emerge, desde logo, do nº 1 do artigo 272° da
CRP (...). A proteção dos direitos dos cidadãos - todos os direitos e os fundamentais por
excelência - apresenta-se como uma obrigação do Estado, quer em uma vertente
positiva - defendendo-os e garantindo-os face à ameaça de outrem - quer em uma
vertente negativa - não atuar de modo que os ofenda e sacrifique arbitrária e
desmesuradamente - i. e., os direitos e interesses do cidadão são, por um lado,
fundamento da atuação da polícia -um fim em si mesmo - e, por outro, um limite
imanente da atividade administrativa em geral e, em especial, da atividade policial, muito
em especial no âmbito do direito administrativo sancionatório e criminal.” (Manuel
Monteiro Guedes Valente, «Teoria Geral do Direito Policial», Tomo I, ed. Almedina,
outubro 2005, p. 98-99).
Efetivamente, não se nos afigura justificada, à luz dos referidos princípios de
necessidade, intervenção mínima, proporcionalidade e adequação, buscar, pesquisar e
apreender documentos e dados informáticos de dois escritórios de advocacia que
seguramente contêm inúmeros documentos e outros dados cobertos pelo sigilo
profissional sem qualquer interesse para os presentes autos, com a consequente
devassa e perturbação da atividade ali exercida.
Nos termos do artigo 208.º da Constituição da República, «a lei assegura aos advogados
as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como
elemento essencial à administração da justiça.»
Em anotação ao citado normativo constitucional, Jorge Miranda e Rui Medeiros
sublinham: «I - A Constituição não ignora o papel fundamental que os advogados são
chamados a desempenhar, seja na perspetiva da plena efetivação do direito fundamental
de acesso ao direito e aos tribunais para defesa de direitos e interesses legalmente
protegidos, seja na ótica da própria administração da justiça. (...)
III - O artigo 208° tem unicamente em vista a atividade dos advogados no exercício do
mandato e o patrocínio forense enquanto elemento essencial à administração da justiça.
O legislador constitucional, ao salvaguardar as imunidades dos advogados e ao
reconhecer o interesse público do patrocínio forense, não se limita a remeter para a lei
ordinária a tarefa da definição dos atos próprios dos advogados que beneficiam da
proteção qualificada prevista no artigo 208°.
(...) A relevância que a Lei Fundamental confere à advocacia, neste preceito, inserido
num título respeitante aos tribunais, tem subjacente o reconhecimento da função social
dos advogados na administração da justiça (…).
A alusão genérica ao mandato tem um alcance expansivo, não se esgotando
necessariamente no mandato (forense) conferido para ser exercido perante um órgão
jurisdicional (...). A abertura da formulação constitucional permite, nomeadamente,
abranger o mandato para a defesa dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos
particulares através da apresentação à Administração Pública de requerimentos,
reclamações ou recursos administrativos. (...)
IV - O artigo 208° refere que a lei assegura aos advogados as imunidades necessárias
ao exercício do mandato. (...) As imunidades existem para defender os advogados de
ações ou intromissões provindas do exterior e, em última análise, para preservar a
independência dos advogados no exercício do mandato» ("Constituição Portuguesa
Anotada", Coimbra Editora, 2007, Tomo III, p. 98 a 103).
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modificar, apagar ou suprimir dados informáticos ou por qualquer outra forma interferir
num tratamento informático de dados, produzindo dados ou documentos não genuínos,
com a intenção de que estes sejam considerados ou utilizados para finalidades
juridicamente relevantes como se o fossem".
[4] Sobre os requisitos gerais dos meios de obtenção de prova, ver Francisco Marcolino
de Jesus, ‘Os Meios de Obtenção de Prova em Processo Penal’, Almedina, 2011,
páginas 139-140.
[5] Ver também Francisco Marcolino de Jesus, obra citada, páginas 180-181.
[6] Para obviar a situações possivelmente chocantes, vem entendendo alguma doutrina
que, no juízo de ponderação, deverá sempre ter-se presente o tipo de crime, em
confronto com a danosidade social da medida, por forma a que se possa evitar a
realização da busca em casos bagatelares (neste sentido, cfr., ainda Francisco
Marcolino, obra citada, nota 499, na página 181.
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