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PROBLEMATICA DA CONHECIMENTO HISTÓRICO:

CÓDIGO: 31102

DOCENTE: Adelaide Millán da Costa

A preencher pelo estudante

NOME: Luís Filipe Monteiro Pinheiro de Campos

N.º DE ESTUDANTE: 2002619

CURSO: Licenciatura em História

DATA DE ENTREGA: 3 de novembro de 2021

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História e Memória não sendo sinónimos, formam um binómio muitas das vezes de
fronteiras ténues, imbrincadas entre si1. Pierre Nora afirma a grande distância entre
história e memória assim como Paul Ricoeur, embasado pelo pensamento de Platão,
Aristóteles e Bergson, reitera as suas diferenças, alertando quer para o objeto e para o
método da História e para as diferentes memórias que categoriza. Nesse sentido
podemos estabelecer diferentes linhas de união entre passado e presente. No caso da
memória essa linha é um continuum enquanto na História se verificam descontinuidades
e ruturas. Se a História se constrói e desconstrói através da seleção, organização, crítica,
reflexão e interpretação das fontes, a memória alimenta-se de lembranças difusas, por
vezes contraditórias, recebendo um conjunto de contributos para se tornar um campo de
recordações para determinados grupos Relembre-se que para Maurice Halbswachs a
memória é sempre construída por um grupo sendo também um trabalho individual,
atualizando os quadros sociais nos quais as lembranças podem permanecer e articular-se
entre si2. Quando estes grupos se identificam com um dado passado e com uma dada
narrativa, configura-se a sua coparticipação nesse mesmo passado o que fica bem
implícito nos recursos disponibilizados. Tal implica a escolha de factos, condicionando
o esquecimento de outros, opção seletiva que conduz à lembrança e às suas repercussões
nos comportamentos dos grupos com momentos de filiação e de conflituosidade dada a
maior proximidade ou o maior distanciamento com a “sua memória”. Na realidade a
memória também procura a constituição de um sentimento de identidade 3 e é dessa
apropriação e identidade que nascem movimentos extremistas e convulsões
nacionalistas bem patente nos exemplos fornecidos.
Mas que dizer da memória histórica? Situada muitas vezes num limite ténue com a
memória coletiva, partilhada e comum aos membros de um grupo de historiadores ou
outros curiosos e que se rege pelos princípios da historiografia: crítica, distanciamento e
imparcialidade. Esse discurso é assim dotado de uma base sólida e racional, assente em
princípios metodológicos claros e em constante revisibilidade e contraditório com um

1
SILVA, Joelma Tito da – Memória, história e historiografia. Resenha da obra de CATROGA, Fernando. Memória,
história e historiografia. Coimbra: Quarteto, 2001. Trajetos Revista de História [em linha]. 5: 9/10 (2001), p. 295-
298. [consult. 27 out 2021]. Disponível na internet: <URL: http://www.repositorio.ufc.br/handle/riufc/20022>
2
SCHMIDT, Maria Luisa Sandoval; MAHFORD, Miguel – Halbwachs: memória coletiva e experiência. São Paulo:
Instituto de Psicologia, Psicologia USP [em linha]. 4: 1/2 (1993). [consult. 30 out 2021]. Disponível na internet:
<URL: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-51771993000100013>
3
MOTTA, Márcia Maria Menéndez – História e memória. Cadernos do CEOM: Memória Social [em linha]. 16: 17
(2014), p. 183-184. [consult. 26 out 2021]. Disponível na internet: <URL:
https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/article/view/2196/1282>

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discurso jornalístico efêmero, relato de acontecimentos recentes, resultado de um
processo social de construção da realidade4, numa base legitimária da veracidade.
É no presente que a memória se afirma ao recolher do passado os elementos e
acontecimentos que necessita para se afirmar. Está sujeita a mutações e à influência do
momento político e social. É uma memória que remete para a lembrança coletiva,
consubstanciada em fenómenos de comemoracionismo, elegia e apologética. Essa
evocação, essa apropriação do passado e de uma narrativa que foi do outro e que passa a
ser do eu, remete para o sentimento de pertença e filiação de natureza diversa. O
passado é assim relembrado, comemorado e ritualizado. Veja-se nos recursos a questão
da refundação dos mitos para reedificar o antigo esplendor lusitano, sacralizando figuras
e glórias históricas tão presentes na afirmação da identidade nacional e claramente
configuradas com a apologética de determinados períodos históricos. Essa sacralização
permite legitimar acontecimentos ao remeter uma narrativa passada para um presente
que se deseja viver de um dado modo e para um futuro promissor. Veja-se como é
referido o corte com o passado e a representação de uma figura messiânica a par dos
diferentes estereótipos e reminiscências sagradas e sociais. Essa transmissão é
deliberada e destinada a um fim conhecido, como tal é normativa e seletiva, conexa com
a afetividade onde as emoções têm um campo de ancoragem de eleição. Em paralelo é
imprecisa em relação a factos históricos, altamente volátil e vulnerável, presta-se a
interpretações erróneas e deturpadas da narrativa histórica como de resto é claramente
referido nas abordagens feitas por candidatos ao último ato eleitoral presidencial
presentes nos textos facultados onde a visão reducionista, apaixonada e fragmentada do
passado é evidente.
Se a memória histórica se deve pautar em ser crítica, precisa e racional, ela é hoje um
veículo de transmissão da história e que por se encontrar numa fronteira pouco nítida
com a memória coletiva, deve ser transmitida ao público em geral de uma forma
consciente e criteriosa sob pena de recair em armadilhas de intencionalidade e
fragmentação factual5. Apelando para os lugares de memória que Nora tão bem
descreve e bem patentes nas alusões a Coimbra e Guimarães, à tumulária e à estatuária,
faz assistir a uma legitimação de um passado glorioso que se pretende se expanda no

4
MARQUES, Ester – Estruturas do discurso jornalístico. [em linha]. [consult. 27 out 2021]. Disponível na internet
<URL: http://www.intercom.org.br/papers/regionais/nordeste2008/resumos/r12-0528-1.pdf>
5
JOÃO, Maria Isabel – Memória, História e Educação. NW noroeste, revista de História. Braga: Núcleo de Estudos
Históricos, Universidade do Minho, 1, (2005) p. 81-97.

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futuro, alicerçado no presente. Enquanto a História critica e interpreta, a memória
relembra e reproduz; aquela não sacraliza mas esta elogia e glorifica.

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