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VITALISMO E HOMEOPATIA

CONCEITO
O Vitalismo é a doutrina que afirma a existência de um princípio irredutível ao domínio físico-
químico para explicar os fenômenos vitais. Nesta concepção o corpo físico dos seres vivos é
animado e dominado por um princípio imaterial chamado força vital, cuja presença distinguiria o
ser vivo dos corpos inanimados e sua falta ou falência determinaria o fenômeno da morte. A
tendência da medicina moderna é a não aceitação do vitalismo.O paradigma da medicina é
materialista, por excelência. O paradigma da homeopatia é vitalista.
No Vitalismo a força vital é definida como a unidade de ação que rege a vida física,
conferindo-lhe as sensações próprias da vida e da consciência. Este princípio dinâmico, imaterial,
distinto do corpo e do espírito, integra a totalidade do organismo e rege todos os fenômenos
fisiológicos. O seu desequilíbrio gera as sensações desagradáveis e as manifestações físicas a que
chamamos doença. No estado de saúde mantém as partes do organismo em harmonia. Sua natureza
não pôde até hoje ser comprovada, mas admite-se que estaria próxima de outras manifestações
energéticas do ser vivo, como a energia calórica e a bioelétrica. Tal força não seria dotada de uma
inteligência própria e independente, mas funcionaria como um sensor da inteligência espiritual, que
comanda o ser como um todo. A maioria dos vitalistas não distinguiu força, energia e princípio
vital.

SUA EXISTÊNCIA
Em todos os corpos vivos há um princípio vital essencialmente superior às forcas
psico-químicas da matéria e único.
Estado da questão, - Podemos dispor as diferentes teorias em dois qrupos principais: 1° O
mecanismo bio1ógico de Helmholz, Haeckel, Richet, Le Dantec, etc. que atribui as operaçoes
veqetativas às forcas psico-químicas complexas da matéria, ao mesmo tempo que
reconhece que a vida não pode ser explicada pelas teorias atualmente conhecidas.
Todos os defensores desta teoria não são materialistas; alguns a limitam à vida vegetativa e
exigem um princípio de atividade superior para as vidas sensível e intelectual. 2° O
vitalismo afirma pelo contrário, a necessidade de um princípio vital cujos partidários
concebem de maneira diferente. como uma substância ou separada do corpo, ou
distinta da alma, ou múltipla (Vitalismo de Barthez e da Escola de Montpel1ier), etc. A mais
sólida das explicações vitalistas é o o animismo de Arist6teles: qualquer corpo vivo qoza de
uma forma substancial única. essencialmente superior à dos corpos
inanimados, chamada princípio vital ou até alma veqetativa, que forma com a
matéria primeira deste corpo, uma substância viva de tal espécie que nos
animais e no homem, se identifica com a alma sensível e intelectual.(H.
Collin, Manual de Filosofia Tomista).
O Vitalismo influenciou a Medicina até o século XIX, quando a mentalidade mecanicista
ofereceu novas explicações ditas racionais para a compreensão dos fenômenos vitais, banindo-o das
concepções médicas. A partir desses avanços considerados científicos, os postulados vitalistas
sofreram ataques imediatos dos anti-vitalistas, chamados mais tarde de materialistas, que
consideravam um retrocesso científico-ideológico atribuir aos fenômenos da vida as conotações
metafísicas do Vitalismo.
A energia a que os vitalistas se referiam não era apenas aquela medida pelo trabalho
mecânico, nem tampouco a hoje denominada energia potencial da física. Eles evocam a existência
de uma energia essencial que move a vida, que antecede a atividade mecânica e elétrica do
organismo e que, na verdade, é sua mantenedora.
Distinguem-se duas escolas principais na evolução do pensamento vitalista:
VITALISMO DUALISTA: o princípio vital e o corpo, embora unidos, são substâncias separadas –
concepção platônica, parcialmente admitida por Hahnemann no parágrafo 9 do Organon.
VITALISMO UNICISTA: também chamado animista, distingue o princípio vital em ação no

Dra. Rebeca Chapermann1


organismo, mas sua natureza não é distinta da alma, sendo desta um desdobramento, com a qual
mantém a unidade do organismo – concepção aristotélica, mantida por Hahnemann, no
parágrafo 15 do Organon.

EVOLUÇÃO DO PENSAMENTO VITALISTA

O VITALISMO NA MILENAR CULTURA CHINESA


O tratado de Medicina mais antigo que se conhece, o de Nei King, atribuído ao imperador
Hoang Ti, da dinastia Han, data de 500 a.C., já mencionava que o corpo humano funcionava devido
à presença de forças ocultas, estabelecendo as primeiras concepções de Vitalismo. Desde a sua
origem, concebeu a existência de uma energia vital dividida em uma potência positiva (yang) e uma
negativa (ying) de cujo equilíbrio dependeria a saúde. Suas afirmações foram preponderantes para o
sustento do pensamento filosófico e médico da China antiga até os nossos dias e sua história se
confunde com a do Taoísmo, do Confucionismo e da Acupuntura.
O VITALISMO NA GRÉCIA ANTIGA
No século 5 a.C. Hipocrates fundou a escola médica da ilha de Cos, considerada a primeira
escola formalmente instituída de Medicina na História. O pai da Medicina pregava uma ciência que
priorizava o enfermo como uma unidade. A doença era vista como uma perturbação deste e não
como processos independentes de seus órgãos. A escola de Cos, como ficou conhecida, procurava
ressaltar os aspectos do temperamento e da constituição na concepção da enfermidade,
preconizando a existência de doentes e não de doenças. Esta escola esboçou a idéia de um
princípio unificador e diretor do organismo, chamado de “eidolon” que fazia parte da natureza e
era considerada a psique individual trazendo a mesma conceituação que hoje se dá à alma.
Hipócrates (460-377 a.C.) – considerado o pai da Medicina, dizia que havia na natureza dos seres
vivos um duplo dinamismo que os faziam crescer e movimentar-se, um princípio de ação que seria
a alma – o anima, aquilo que anima, que atuaria através do cérebro, nutrindo e animando o corpo.
Essa alma se desprenderia com a morte. Era um sopro (pneuma) que vem de fora e opera as
maravilhas do pensamento, uma espécie de ar que penetrava no corpo ao nascer, animando-o de
vida, e preenchia em graus de qualidades diferentes, sendo mais pura no cérebro, onde produzia o
pensamento. Assim segundo este pensador, a vida é produto da alma. Estabeleceu ainda que a alma
impunha a vis medicatrix nature como o impulso que opera em todos os seres vivos para a
manutenção da saúde, trazendo em si a possibilidade da própria cura. O médico deveria limitar-se a
agir como servidor dessa força natural. Para ele a alma e força vital eram um só princípio, o anima,
tendo sido o fundador do pensamento animista, que admite a alma como entidade que organiza e
dinamiza, vivificando, todo o organismo. Pode-se considerar Hipócrates como o pai do pensamento
vitalista.
Platão (427?-347? a.C) – estabelece um pensamento dualista, admitindo a alma como entidade
separada do corpo. Além disso, a divide em três porções: razão, emoção e animalidade, que
residiam no cérebro, no tórax e no abdome, respectivamente.
Aristóteles (384-322 a.C.) – discípulo de Platão, para ele a alma não é o corpo, mas não pode existir
sem ele, assim como não há luz sem objeto luminoso. As funções da alma seriam a nutrição e o
pensamento. Mas há uma unidade de corpo e alma, diferentemente do dualismo platônico. Junto
com Hipócrates representa os principais pensadores animistas. A alma forma e dá vida ao corpo,
diferenciando-o da matéria bruta. Aristóteles confere ainda à alma uma concepção de substância.
Galeno (130?-200? d.C) – médico grego que priorizava a parte em detrimento do todo e com isso
“materializou” a alma. Estabeleceu a teoria dos humores, que foi a base da Medicina medieval, até
o século XVII. Segundo essa teoria, a saúde estava vinculada à combinação harmoniosa dos quatro
humores, correspondentes aos quatro elementos: o sangue, correspondendo ao fogo, a bílis negra à
terra, a bílis amarela ao ar e o fleugma (linfa), ao elemento água. Foi na verdade um médico
romano, filho de pais gregos, que ficou famoso por ter curado o imperador Marco Antônio de uma
ferida de guerra. Seguia os ensinamentos da escola grega de Cnido, tendo sido o seu maior
representante. Firmando o principio dos contrários, influenciou a Medicina dos nossos dias.
O VITALISMO NA IDADE MÉDIA
Durante a Idade Média, no entanto, o médico deveria tratar o corpo, a alma era assunto da
Igreja e nesta não lhe cabia meter-se. Talvez por isso, a Medicina galênica tenha prevalecido com o
apoio da Santa Sé. A teoria dos humores foi largamente empregada, onde se via nos doentes
excessos ou falta dos quatro elementos constituintes da natureza. Para retirá-los empregava-se as
sanguessugas, os vesicatórios, os purgativos e as sangrias. O conhecimento hipocrático ficou
restrito aos mosteiros, mantido pelos monges ao longo da noite escura da Idade Média. Este
conhecimento foi ressuscitado por Paracelsus, considerado o precursor da Homeopatia.
Os principais pensadores que influenciaram a evolução da concepção vitalista neste período
foram:
Avicena (980-1037) – médico e filósofo persa autor do “Cânon da Medicina”, o livro em que se
baseou a Medicina européia até o século XVII. Admitia a existência da alma, que mantinha as
relações do corpo com a mente, obedecendo a princípios teleológicos.
Santo Agostinho – afirmava que a alma que pensa é a mesma que anima o corpo, dando-lhe vida. E
a ela atribuía as doenças do corpo.
São Tomás de Aquino – considera a unidade do homem, dizendo que todas as almas são na verdade
uma só que tanto controla a razão como a vida vegetativa do homem.
Venetus – responsável pela crença predominante na época de que a alma se dividia em alma
sensível, a sua parte corruptível, a alma racional, a parte imortal e as almas vegetativas, diversas
almas que animavam e desempenhavam as variadas funções orgânicas.
Paracelsus (1493-1541) – médico suíço, ressuscita os ensinamentos de Hipocrates, voltando-se à
visão unitária do homem, sendo considerado o precursor da Homeopatia. Segue também o mesmo
raciocínio de Venetus, admitindo um princípio ativo e organizador dos seres vivos, mas expande
esse conceito para todos os corpos da natureza. Por isso considerava o espírito do sal, do enxofre,
do mercúrio, dos cristais, etc. No corpo ele divide este princípio vital em arqueus, as almas menores
que presidem as funções dos órgãos. Aproxima seu pensamento da lei dos semelhantes de
Hipocrates e cria a Lei das signaturas – uso de plantas orientado pela forma aproximada do órgão
doente. Considerado o pai da bioquímica, foi um dos primeiros médicos medievais a rejeitar a teoria
dos humores de Galeno. Influenciou o pensamento de Hahnemann que incorporou a concepção de
uma força oculta no homem, capaz de amplas ações em todo o organismo, inclusive na mente.
O VITALISMO NA ERA MODERNA
Até meados do século XVII dominavam a Medicina os mesmos pensamentos que moviam a
Idade Média, subordinada-a a um empirismo dogmático, destituído de qualquer sustento lógico. A
cirurgia era exercida pelos barbeiros e a teoria dos humores ainda era a única a favorecer algum
subsídio para as práticas médicas. No século XVIII a escola vienense de Medicina passou a dominar
o pensamento médico da época, trazendo uma forte necessidade de se implantar uma metodologia
no estudo desta disciplina. Nesta época são criados os ambulatórios, as enfermarias e a teoria dos
humores começa a ser contestada.
Na mesma ocasião, florescem duas outras escolas médicas: a alemã e a francesa. A escola
francesa, defendida pelos Enciclopedistas, oriundos do Iluminismo, pregava também a necessidade
de se racionalizar o estudo médico. Os iluministas lutavam para libertar o pensamento científico das
imposições religiosas, passando a caminhar por vias livres e divergentes dos teólogos medievais.
Nasce a metodologia científica nesta época, com a necessidade de se chegar ao conhecimento pelas
vias da experimentação objetiva. Surge aí o movimento mecanicista e materialista da Medicina, que
estrutura a visão do organismo como uma máquina, em obediência a separação da ciência e da fé, e
refletindo a mentalidade moderna que se apoiava em raciocínios objetivos, exigentes de lógica.
Surge a necessidade da busca de novas etiologias para as doenças, segundo a compreensão
mecanicista do homem, nascendo a nosologia, ao se estabelecer critérios para a classificação
metodológica das enfermidades. Estava dado o primeiro passo para as especializações médicas. O
organismo humano era destituído definitivamente da alma, apartando-se a Medicina do Vitalismo
hipocrático.
A escola alemã, embasada pelos idealistas e influenciados por Leibniz, mantinha a visão do
ser humano como uma unidade de funcionamento, baseada no magnetismo animal. Era a única que
ainda fomentava fortemente o Vitalismo, mantendo-se uma escola universalista, vendo o ser
humano como uma totalidade e com tendências naturalistas, imitando nos procedimentos
terapêuticos as ações da natureza, em consonância com o pensamento hipocrático.
Seguindo a história do vitalismo no pensamento médico, nesta época se destacam:
René Descartes (1596-1650) – filósofo francês que propôs resolver os grandes enigmas da filosofia
e da ciência com o uso da razão e com ela alcançar a verdade. Empregando o método analítico deu
origem ao reducionismo que consiste em decompor pensamentos e problemas em suas partes
mínimas e dispô-las em uma ordem lógica, a fim de se compreendê-los. Via o corpo humano como
uma máquina funcionando com a força motriz gerada pelo calor que vinha do coração. Esta
concepção vital é classificada como dinamismo – concepção que pressupõe a existência de forças
agindo no organismo, determinando os seus variados movimentos. A influência de Descartes foi
preponderante para o surgimento do pensamento moderno na ciência, estendendo-se à Medicina.
Suas idéias racionalizaram a compreensão do homem, distanciando-a do animismo hipocrático,
estabelecendo-se as práticas iatroquímicas e iatromecânicas da Medicina atual. Identificando na
alma a essência do pensamento, proferiu a sua famosa frase: “penso, logo existo”. A alma, sendo
pensamento, só pode fazer o que é sua função, pensar, portanto o corpo não é mais sua função,
estabelecendo-se a dicotomia alma e corpo. A vida passa a ser atributo do corpo e não da alma, e
este adquire uma existência própria e independente. A alma é apenas pensamento puro. A vida,
destituída de alma, tornou-se, deste modo, um ato mecânico, embora Descartes admitisse a
existência nela de uma espécie de fogo animador, uma essência vital mal definida. O maior golpe ao
Vitalismo veio do mecanicismo cartesianismo, quando a Medicina, dominada pelo pensamento
iluminista, orienta-se finalmente para o uso do quimismo na solução dos problemas do ser e da dor.
Leibniz (1646-1716) – este importante filósofo alemão manteve-se no pensamento vitalista, sendo
considerado o maior animista da filosofia moderna. O corpo estaria sob a ação da mônada, o “eu”
feito de também de uma substância, porém de essência puramente imaterial. Enquanto que a
mônada seria uma substância simples, o corpo seria um agregado de várias substâncias ou mônadas
compostas. Contudo, o corpo seria uma espécie de planta, organizado pela alma, a mônada superior,
que o nutre com a sua força organizadora e mantenedora, que ele chama de energia vital, e que lhe
mantém em constante atividade.
Ernest Stahl (1660-1734) – este filósofo seguiu Leibniz, aplicando o Vitalismo à Medicina na
Alemanha, partindo da idéia de que a vida não é produto de um funcionamento mecânico e o ser
vivo não é uma máquina, reagindo contra a Medicina mecanicista e química que nascia do
pensamento cartesiano. Para ele a origem dos movimentos orgânicos é a alma, princípio vital, da
qual os órgãos são simples instrumentos. Concebe assim a doença como uma alteração não do
corpo, mas do seu governo, retornando ao animismo de Hipócrates. Possivelmente baseando-se em
Paracelsus, já pregava que a ação do semelhante podia tratar as doenças. Segundo o seu animismo,
somente descobrindo-se a finalidade das atividades corporais, que servem às potencias da alma, se
poderia entender as suas perturbações.
Von Haller (1708-1777) - pertenceu à Escola Médica de Montpellier que foi o centro máximo de
produção e sustentação das teses vitalistas entre os séculos XVII e XIX. Com ele o Vitalismo
encontrou uma observação experimental renovada. Suas observações terminaram apontando para a
necessidade de uma nova ordem de conhecimento em Medicina. Propôs a experimentação dos
medicamentos no homem, para se estudar os seus efeitos, que no entanto não chegou a praticar. Sua
veemente crença no Vitalismo ajudou a mantê-lo vivo nas escolas médicas da época e dizem que
exerceu positiva influência em Hahnemann.
Paulo Josef Barthez (1734-1806) – médico da escola de Montpellier, filósofo e poeta francês
promoveu uma separação entre animismo e Vitalismo. Em seu trabalho “Ensaio para um novo
princípio para o homem” concebeu um princípio vital que anima e confere vida ao homem.
Princípio, no entanto que não é idêntico à alma, o que coincide com a visão do Vitalismo
hahnemaniano. Considera-se que seja ele o criador do conceito de princípio vital.
Samuel Hahnemann (1755-1843) – de origem presbiteriana, nasceu em meios às diferenciadas
visões que iniciavam a morte do Vitalismo, a exceção da Medicina alemã que ainda se mantinha na
mesma idéia, sustentada por Leibniz. Contam seus biógrafos que ele se encantou de início com o
Corpus hipocráticus e ressuscitou-o com a Homeopatia. Pela observação ele logo notou a presença
dos miasmas contagiantes nos barbeiros que drenavam abscessos e nas parturientes que se
contaminavam pela falta de assepsia. Em sua fase pré-homeopática foi um grande químico,
experimentava tudo que lia. Desencantado com a prática médica vigente, passou a se dedicar a
traduções e à solução de problemas de química. Atuou na saúde pública e na higiene industrial ao
estudar a intoxicação dos trabalhadores das minas de carvão. Dizia-se na época que era o mais
ilustre médico entre os químicos e o mais ilustre químico entre os médicos. De 1777 a 1796 ele
publicou 37 trabalhos científicos e efetuou 17 traduções. Em 1790, no entanto, é que inicia a
Homeopatia, ao traduzir a obra de Culen que descrevia os efeitos curativos da quina na malária,
imputando sua ação ao fato de ser um tônico para o estômago. Hahnemann não estando de acordo
com essa explicação, decidiu procurar outra e resolveu experimentar em si mesmo os efeitos da
quina, sendo acometido, para surpresa sua, de um acesso febril. Recordou-se então de Hipocrates
que já anunciara o princípio do semelhante: uma doença se cura por uma droga capaz de produzir os
seus mesmos sintomas. Juntou ao fato a sua observação de que as doenças semelhantes se excluíam
mutuamente e não podiam conviver simultaneamente no organismo. Por exemplo, um episódio
agudo de diarréia trata uma colite crônica, a vacina curava e prevenia a varíola pelos mesmos
motivos. Hahnemann criou então a experimentação no homem são, estabelecendo assim um dos
princípios fundamentais da Homeopatia. E graças a isso chegou ao estudo do psiquismo humano, o
que não conseguiria com experimentações em animais. Desta forma, foi o precursor do método
experimental em Medicina, iniciando-as no homem antes mesmo de Claude Bernard instituí-las nos
animais.
Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz (1821-1894) – médico alemão, criador do
oftalmoscópio e professor da Faculdade de Medicina de Berlin. No ano de 1813 realiza estudos de
termodinâmica, eletrodinamismo e movimentação de fluídos, concluindo e afirmando que nenhuma
força de natureza espiritual atua no organismo humano, senão as forças físico-químicas conhecidas.
Exclui assim, das escolas médicas, o que ainda restava de Vitalismo, como se simplesmente por não
enxergá-lo com seus grosseiros métodos de pesquisas, ele não fosse uma realidade. A escola alemã,
onde o pensamento de Leibniz mantinha vivo as idéias animistas, tem assim abolida todas as
práticas médicas que visavam estimular estas pretensas forças, como o magnetismo.
Claude Bernard (1813-1878) – fisiologista francês que procurou estabelecer um neovitalismo
imaginando que a força vital seria somente uma força legislativa e não executiva. Foi o pai da
fisiologia moderna. Seu primeiro trabalho, datado de 1843, concluiu pela inexistência do Vitalismo
ou qualquer força de natureza espiritual que atue no interior do homem, de forma invisível e
material. Todas as forças que atuam no organismo podem ser conhecidas e seriam provenientes de
agentes físicos. Considera-se que foi o iniciador do método experimental em Medicina,
introduzindo os testes em animais, dando origem à técnica de conhecimento da ação dos
medicamentos em cobaias, tal como hoje é realizada, onde se pretende conhecer apenas a sua ação
puramente fisiológica e material, mesmo no plano mental. Os conhecedores da Homeopatia, no
entanto, sabem que a primazia de tal método pertence, merecidamente, a Hahnemann.
A Era Moderna, com o advento destes pensadores, assiste, paulatinamente, às idéias
mecanicistas dominarem o campo médico, extinguindo o que ainda havia de vitalismo. Restava
apenas um dos maiores trunfos dos vitalistas, até meados do século XIX, o de que as substâncias,
ditas orgânicas, ao contrário das inorgânicas, somente podiam ser produzidas pelos seres vivos e
jamais seriam obtidas de uma síntese artificial. Esta era a última cartada do Vitalismo, servindo-se
para atestar a existência da força vital, a única entidade capaz de produzi-las. Estas jamais seriam
copiadas, este era o trunfo final que, como uma vingança, estreitava os mecanicistas, pois estes
jamais seriam capazes de copiar artificialmente a vida. Contudo, um fato em 1828, cuidou de mudar
radicalmente tal crença, apunhalando de morte o Vitalismo e firmando as idéias mecanicistas da
vida: o químico alemão Friedrich Wohler, misturando duas substâncias inorgânicas: o cianato de
prata e o cloreto de amônio, conseguira produzir uréia. Wohler rompeu a “barreira do organicismo”.
A teoria de que somente a força vital era capaz de produzir substâncias mediante atributos sagrados
e divinos, estava derrubada. Abriram-se as portas, não somente para se contestar o Vitalismo, como
para se iniciar a produção de materiais sintéticos em substituição aos orgânicos, como as vitaminas
e depois os hormônios, nascendo aí a farmacoquímica moderna.
Com o predomínio do pensamento materialista, o Vitalismo é nesta época definitivamente
banido da Medicina. As escolas de Berlin e Viena se juntam nesta nova idéia à escola francesa,
influenciando de modo decisivo todo o pensamento médico moderno, na Inglaterra e nos Estados
Unidos. O Vitalismo começou a ser combatido na Alemanha e Hahnemann se refugiou na França,
em 1835.
A escola francesa, embora embalada pelas novas idéias mecanicistas, felizmente sempre
teimou em fazer ao contrário do que seus amigos anglo-saxônicos e deu guarida ao maior
representante do Vitalismo na época: Hahnemann. Acolheu-o depois que sua presença foi
indesejada na Alemanha, mantendo a Medicina homeopática em suas escolas e dando o impulso
inicial à Homeopatia, que dali se difundiu para todo o mundo. Os oito últimos anos de Hahnemann
foram vividos em Paris, para onde se mudou e aonde veio a falecer. A Homeopatia unicista, com
seus avançados postulados, foi basicamente formulada na fase francesa da vida de Hahnemann,
quando se dedicou a escrever sobre as doenças crônicas.
O VITALISMO NA ATUALIDADE
Vitalismo no final do século XIX acompanha as peripécias do médico austríaco, Constantin
Hering. Por ser um brilhante aluno, foi encarregado por um de seus professores a defender uma
tese contra a Homeopatia. No entanto, após estudá-la detidamente, deixa-se convencer pela sua
veracidade e passa a defendê-la ardorosamente, tornando-se um homeopata. Era um missionário
presbiteriano e por isso foi enviado em missão religiosa para as Guianas, trazendo consigo a
Homeopatia para a América. Das Guianas mudou-se para os EUA e na Filadélfia criou a primeira
escola americana de Homeopatia, no início do século, a Post-Graduate School of Homeopathy.
Posteriormente transferiu-se para Chicago, onde fundou a Hahnemann Medical College and
Hospital e depois a Hering Medical College. Aí se formou um dos mais eminentes e conhecidos
homeopatas depois de Hahnemann: James Tyler Kent. Outro renomado homeopata que nos legou
importantes obras, Henry Allen, formou-se também na escola médica de Hering, onde passou a
lecionar. Kent criou a sua própria escola de Homeopatia em Nova York, deixando como
seguidores nomes como Timoty Allen e Pablo Paschero, o famoso homeopata argentino.
O VITALISMO DE HAHNEMANN

Hahnemann foi sem dúvida alguma o maior pensador médico vitalista depois de Hipócrates, no qual
se inspirou. Graças a ele o Vitalismo sobreviveu até os nossos dias, apesar dos avanços da Medicina
no campo orgânico. Em seu Vitalismo continuou e perpetuou as idéias de Barthez e de Von Haller.
Em oposição a Hipócrates, entretanto, considerou a vis medicatrix nature impotente para curar o
organismo, cujas ações não deveriam ser copiadas. Concebeu a força vital, pela qual somos
governados, como superior à natureza inanimada dos corpos materiais, porém ela seria inacessível
aos nossos sentidos. Selou sua união com o Vitalismo admitindo sua ação primordial na gênese da
enfermidade do homem, dando-lhe expressão terapêutica. Utilizou o termo força vital como
princípio, espírito e poder. Nos parágrafos 9 a 16 de sua obra principal, O Organon da Medicina,
trata do princípio vital imaterial que coordena e anima o corpo, desenvolvendo ora uma concepção
dualista, como a do parágrafo 9, ora unitária, como a do parágrafo 15.
Talvez tenha deduzido a realidade do Vitalismo ao se perguntar o que havia em seus
medicamentos altamente diluídos, supondo que eles estivessem tão sutilizados a ponto de se
tornarem apenas energias, por isso chegou a afirmar que seriam apenas essências espirituais (spirit
like). Se o organismo respondia a essa essência era porque possuía a mesma natureza. Passa assim a
apregoar a existência da energia vital e a ver as doenças como alterações dinâmicas dessa força
imaterial, manifestada em nossa maneira de sentir e agir. Ou seja as enfermidades são de natureza
imaterial, as modificações mecânicas e químicas são as conseqüências últimas destas alterações.
Chega, mediante esses raciocínios, a conceber um novo conceito para o homem, como uma unidade
governada por um espírito e animada por uma energia, a qual confere à dualidade corpo e alma uma
unidade indissolúvel.
Constata a presença dessa força vital como uma entidade imaterial, isto é, como um agente
agregado e unido à matéria, porém distinto desta, formando com ela um só organismo, atestando a
veracidade do Vitalismo. Para ele a energia vital comporta-se como elemento capaz de manter a
saúde, mas passível de desequilibrar-se pelas interferências de forças desarmônicas de igual
natureza. Seria capaz de auto-equilibrar-se quando essas desarmonias são agudas, tendo porém ação
limitada na auto-regeneração nas interferências de ação profunda e prolongada, levando ao
aparecimento das doenças crônicas. No entendimento desde autor, seus desequilíbrios se dão a
conhecer pelos sinais e sintomas percebidos no organismo como um todo, objetivos ou subjetivos.
Toda patologia antes que se manifeste no físico se dá a conhecer nestas sutis alterações das
sensações, que ele nos ensinou a perceber no enfermo.
Concebeu uma visão ternária e unitária do homem, composto de espírito, energia e corpo
físico, concepção bastante arrojada para o seu tempo, estabelecendo nele a cabalística trindade
apregoada nas chamadas revelações místicas e religiosas. Unidade vital indissolúvel que não separa
arbitrariamente o fator espiritual do orgânico. O corpo é manifestação do espírito e a energia lhe
mantém a unidade. A doença não é mero distúrbio do corpo do homem, mas um reflexo de sua
própria essência e diz respeito à sua natureza energética e psíquica – conceito arrojado que ainda
consumirá tempo para ser plenamente compreendido e se tornar a única realidade do fenômeno
doença.
Estabeleceu em seus postulados vitalistas as propriedades da força vital, segundo os quais
ela preserva e mantém a vida. É autocrática, onipotente, atuando por leis próprias, com poder
absoluto sobre a constituição material, a qual submete às suas leis. Mantém em ordem os
constituintes materiais do organismo vivente quando equilibrada mas, quando em desordem
estabelece a enfermidade, responsabilizando-se assim pela saúde e pela doença. Não tem
inteligência em seu funcionamento que seria puramente automático. É passível de se auto-equilibrar
e espontaneamente recuperar a sua própria harmonia. E quando desequilibrada torna-se suscetível
de ser influenciada pelo meio.
E, finalmente, postulou que a saúde é um estado de harmonia da mente e do corpo que tem como
única e precípua finalidade favorecer instrumentos sadios para que o espírito possa livremente
conquistar os elevados fins de sua existência.

VITALISMO EM KENT
Kent apresenta uma visão mais elevada e complexa do Vitalismo, baseando-o em conceitos
estruturados no que ele chamou de substância simples (SS). Através deste pensamento a energia
não tem existência independente, mas como tudo no universo, se encadeia em um ciclo de
transformismo. Segundo esse genial pensamento, que seguramente nasceu das concepções
filosóficas de Emanuel Swedenborg (1688-1772), do qual Kent revelou retirar seus conhecimentos,
a criação se configura como uma teia de eventos intercomunicáveis e transmutáveis. Ler O 8 o
capítulo da Filosofia de Kent.

CONCLUSÃO
Vitalismo consiste na apreensão de um PRINCÍPIO VITAL que rege a vida e que percebemos
através de suas manifestações, pois não temos os instrumentos para perceber o imaterial. sem o
critério de Força vital e de Unidade Hierarquizada do Ser Humano não há Homeopatia.

LEITURAS
1. O espírito da doutrina homeopática. Hahnemann.
2. Substância simples. Kent, Lição VIII.
3. Homeopatia e vitalismo. Paulo Rosenbaum. RobeEditorial, SP, 1996.

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