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Matéria:

PROCESSO DE
TRABALHO EM SAÚDE

Cursos na Área da Saúde


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CAPÌTULO 1

COMPETÊNCIAS E HABILIDADE A SEREM TRABALHADAS


HABILIDADE
COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS
ESSENCIAL
Conhecer os modelos de saúde (modelo biomédico x modelo
biopsicossocial) Discutir idéias da
Compreender a relação saúde-doença complexidade humana
Conhecer fatores biológicos, ambientais e culturais determinantes no na saúde.
processo saúde-doença.
COMPETÊNCIAS ACESSÓRIAS
Conhecer o conceito de saúde.
Conhecer a história da saúde no Brasil.

1.1 (C.a.1) CONHECER O CONCEITO DE SAÚDE


O conceito de saúde reflete a conjuntura social, econômica, política e cultural. Ou seja, saúde
não representa a mesma coisa para todas as pessoas. Dependerá da época, do lugar, da classe social.
Dependerá de valores individuais, dependerá de concepções científicas, religiosas, filosóficas. O mesmo,
aliás, pode ser dito das doenças. Aquilo que é considerado doença varia muito.
Real ou imaginária, a doença e, sobretudo a doença transmissível, é um antigo acompanhante
da espécie humana, como o revelam pesquisas paleontológicas. Assim, múmias egípcias apresentam
sinais de doença. Não é de admirar que desde muito cedo a Humanidade se tenha empenhado em
enfrentar essa ameaça, e de várias formas, baseadas em diferentes conceitos do que vem a ser a
doença (e a saúde). Assim, a concepção mágico-religiosa partia, e parte, do princípio de que a doença
resulta da ação de forças alheias ao organismo que neste se introduzem por causa do pecado ou de
maldição. Para os antigos hebreus, a doença não era necessariamente devida à ação de demônios, ou
de maus espíritos, mas representava, de qualquer modo, um sinal da cólera divina, diante dos pecados
humanos. Deus é também o Grande Médico: “Eu sou o Senhor, e é saúde que te trago” (Êxodo 15, 26);
“De Deus vem toda a cura” (Eclesiastes, 38, 1-9).
A doença era sinal de desobediência ao mandamento divino. A enfermidade proclamava o
pecado, quase sempre em forma visível, como no caso da lepra Trata-se de doença contagiosa, que
sugere, portanto, contato entre corpos humanos, contato que pode ter evidentes conotações
pecaminosas. O Levítico detém-se longamente na maneira de diagnosticar a lepra; mas não faz uma
abordagem similar para o tratamento. Em primeiro lugar, porque tal tratamento não estava disponível;
em segundo, porque a lepra podia ser doença, mas era também e, sobretudo, um pecado. O doente era
isolado até a cura, um procedimento que o cristianismo manterá e ampliará: o leproso era considerado
morto e rezada a missa de corpo presente, após o que ele era proibido de ter contato com outras
pessoas ou enviado para um leprosário. Esse tipo de estabelecimento era muito comum na Idade Média,
em parte porque o rótulo de lepra era freqüente, sem dúvida abrangendo numerosas outras doenças.
A medicina grega representa uma importante inflexão na maneira de encarar a doença. É
verdade que, na mitologia grega, várias divindades estavam vinculadas à saúde. Os gregos cultuavam,
além da divindade da medicina, Asclepius, ou Aesculapius (que é mencionado como figura histórica na
Ilíada), duas outras deusas, Higieia, a Saúde, e Panacea, a Cura. Ora, Higieia era uma das
manifestações de Athena, a deusa da razão, e o seu culto, como sugere o nome, representa uma
valorização das práticas higiênicas; e se Panacea representa a idéia de que tudo pode ser curado - uma
crença basicamente mágica ou religiosa -, deve-se notar que a cura, para os gregos, era obtida pelo uso
de plantas e de métodos naturais, e não apenas por procedimentos ritualísticos.
Essa visão religiosa antecipa a entrada em cena de um importante personagem: o pai da
Medicina, Hipócrates de Cós (460-377 a.C.). Os vários escritos que lhe são atribuídos, e que formam o
Corpus Hipocraticus, provavelmente foram o trabalho de várias pessoas, talvez em um longo período de
tempo. O importante é que tais escritos traduzem uma visão racional da medicina, bem diferente da
concepção mágico-religiosa antes descrita. O texto intitulado “A doença sagrada” começa com a
seguinte afirmação: “A doença chamada sagrada não é, em minha opinião, mais divina ou mais sagrada
que qualquer outra doença; tem uma causa natural e sua origem supostamente divina reflete a
ignorância humana”.
Hipócrates postulou a existência de quatro fluidos (humores) principais no corpo: bile amarela,
bile negra, fleuma e sangue. Desta forma, a saúde era baseada no equilíbrio desses elementos. Ele via o
homem como uma unidade organizada e entendia a doença como uma desorganização desse estado. A

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obra hipocrática caracteriza-se pela valorização da observação empírica, como o demonstram os casos
clínicos nela registrados, reveladores de uma visão epidemiológica do problema de saúde-enfermidade.
A apoplexia, dizem esses textos, é mais comum entre as idades de 40 e 60 anos; a tísica ocorre mais
freqüentemente entre os 18 e os 35 anos. Essas observações não se limitavam ao paciente em si, mas a
seu ambiente. O texto conhecido como “Ares, águas, lugares” discute os fatores ambientais ligados à
doença, defendendo um conceito ecológico de saúde-enfermidade.
No Oriente, a concepção de saúde e de doença seguia, e segue, um rumo diferente, mas de
certa forma análogo ao da concepção hipocrática. Fala-se de forças vitais que existem no corpo: quando
funcionam de forma harmoniosa, há saúde; caso contrário, sobrevém a doença. As medidas terapêuticas
(acupuntura, ioga) têm por objetivo restaurar o normal fluxo de energia (“chi”, na China; “prana”, na Índia)
no corpo.
Na Idade Média européia, a influência da religião cristã manteve a concepção da doença como
resultado do pecado e a cura como questão de fé; o cuidado de doentes estava, em boa parte, entregue
a ordens religiosas, que administravam inclusive o hospital, instituição que o cristianismo desenvolveu
muito, não como um lugar de cura, mas de abrigo e de conforto para os doentes. Mas, ao mesmo tempo,
as idéias hipocráticas se mantinham, através da temperança no comer e no beber, na contenção sexual
e no controle das paixões. Procurava-se evitar o contra naturam vivere, viver contra a natureza. O
advento da modernidade mudará essa concepção religiosa.
Já o desenvolvimento da mecânica influenciou as idéias de René Descartes, no século XVII. Ele
postulava um dualismo mente-corpo, o corpo funcionando como uma máquina. Ao mesmo tempo, o
desenvolvimento da anatomia, também conseqüência da modernidade, afastou a concepção humoral da
doença, que passou a ser localizada nos órgãos. No famoso conceito de François Xavier Bichat (1771-
1802), saúde seria o “silêncio dos órgãos”. Mas isto não implicou grandes progressos na luta contra as
doenças, que eram aceitas com resignação: Pascal dizia que a enfermidade é um caminho para o
entendimento do que é a vida, para a aceitação da morte, principalmente de Deus. Mais tarde, os
românticos não apenas aceitariam a doença, como a desejariam: morrer cedo (de tuberculose,
sobretudo) era o destino habitual de poetas e músicos como Castro Alves e Chopin. Para o poeta
romântico alemão, a doença refinaria a arte de viver e a arte propriamente dita. Saúde, nestas
circunstâncias, era até dispensável. Mas a ciência continuava avançando e no final do século XIX
registrou-se aquilo que depois seria conhecido como a revolução pasteuriana. No laboratório de Louis
Pasteur e em outros laboratórios, o microscópio, descoberto no século XVII, mas até então não muito
valorizado, estava revelando a existência de microorganismos causadores de doença e possibilitando a
introdução de soros e vacinas. Era uma revolução porque, pela primeira vez, fatores etiológicos até
então desconhecidos estavam sendo identificados; doenças agora poderiam ser prevenidas e curadas.
Um conceito universalmente aceito do que é saúde só poderia ser estabelecido através de um
consenso entre as nações, fato este dependente de um organismo internacional. A Liga das Nações,
surgida após o término da Primeira Guerra, não conseguiu esse objetivo. Foi necessário haver uma
Segunda Guerra e a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Mundial da
Saúde (OMS), para que isto acontecesse.
O conceito da OMS, divulgado na carta de princípios de 7 de abril de 1948 (desde então o Dia
Mundial da Saúde), implicando o reconhecimento do direito à saúde e da obrigação do Estado na
promoção e proteção da saúde, diz que “Saúde é o estado do mais completo bem-estar físico, mental e
social e não apenas a ausência de enfermidade”. Este conceito refletia, de um lado, uma aspiração
nascida dos movimentos sociais do pós-guerra: o fim do colonialismo, a ascensão do socialismo. Saúde
deveria expressar o direito a uma vida plena, sem privações. Um conceito útil para analisar os fatores
que intervêm sobre a saúde, e sobre os quais a saúde pública deve, por sua vez, intervir, é o de campo
da saúde (health field), formulado em 1974 por Marc Lalonde, titular do Ministério da Saúde e do Bem-
estar do Canadá - país que aplicava o modelo médico inglês. De acordo com esse conceito, o campo da
saúde abrange:
- A biologia humana, que compreende a herança genética e os processos biológicos inerentes à vida,
incluindo os fatores de envelhecimento;
- O meio ambiente, que inclui o solo, a água, o ar, a moradia, o local de trabalho;
- O estilo de vida, do qual resultam decisões que afetam a saúde: fumar ou deixar de fumar, beber ou
não, praticar ou não exercícios;
- A organização da assistência à saúde. A assistência médica, os serviços ambulatoriais e hospitalares e
os medicamentos são as primeiras coisas em que muitas pessoas pensam quando se fala em saúde. No
entanto, esse é apenas um componente do campo da saúde, e não necessariamente o mais importante;
às vezes, é mais benéfico para a saúde ter água potável e alimentos saudáveis do que dispor de
medicamentos. É melhor evitar o fumo do que submeter-se a radiografias de pulmão todos os anos. É
claro que essas coisas não são excludentes, mas a escassez de recursos na área da saúde obriga,
muitas vezes, a selecionar prioridades. A amplitude do conceito da OMS (visível também no conceito
canadense) acarretou críticas, algumas de natureza técnica (a saúde seria algo ideal, inatingível; a
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definição não pode ser usada como objetivo pelos serviços de saúde), outras de natureza política,
libertária: o conceito permitiria abusos por parte do Estado, que interviria na vida dos cidadãos, sob o
pretexto de promover a saúde. Em decorrência da primeira objeção, surge o conceito de Christopher
Boorse (1977): saúde é ausência de doença. A classificação dos seres humanos como saudáveis ou
doentes seria uma questão objetiva, relacionada ao grau de eficiência das funções biológicas, sem
necessidade de juízos de valor.
Uma resposta a isto foi dada pela declaração final da Conferência Internacional de Assistência
Primária à Saúde realizada na cidade Alma-Ata (no atual Cazaquistão), em 1978, promovida pela OMS.
A abrangência do tema foi até certo ponto uma surpresa. A par de suas tarefas de caráter normativo -
classificação internacional de doenças, elaboração de regulamentos internacionais de saúde, de normas
para a qualidade da água - a OMS havia desenvolvido programas com a cooperação de países-
membros, mas esses programas tinham tido como alvo inicial duas doenças transmissíveis de grande
prevalência: malária e varíola. O combate à malária baseou-se no uso de um inseticida depois
condenado, o dicloro-difenil-tricloroetano (DDT), tendo êxito expressivo, mas não duradouro.
A seguir foi desencadeado, já nos anos 60, o Programa de Erradicação da Varíola. A varíola foi
escolhida não tanto por sua importância como causa de morbidade e mortalidade, mas pela magnitude
do problema (os casos chegavam a milhões) e pela redutibilidade: a vacina tinha alta eficácia, e como a
doença só se transmite de pessoa a pessoa, a existência de grande número de imunizados privaria o
vírus de seu hábitat. Foi o que aconteceu: o último caso registrado de varíola ocorreu em 1977. A
erradicação de uma doença foi um fato inédito na história da Humanidade.
Quando se esperava que a OMS escolhesse outra doença transmissível para alvo, a
Organização ampliou consideravelmente seus objetivos, como resultado de uma crescente demanda por
maior desenvolvimento e progresso social. Eram anos em que os países socialistas desempenhavam
papel importante na Organização - não por acaso, Alma-Ata ficava na ex-União Soviética.
A Conferência enfatizou as enormes desigualdades na situação de saúde entre países
desenvolvidos e subdesenvolvidos; destacou a responsabilidade governamental na provisão da saúde e
a importância da participação de pessoas e comunidades no planejamento e implementação dos
cuidados à saúde. Trata-se de uma estratégia que se baseia nos seguintes pontos:
1) as ações de saúde devem ser práticas, exeqüíveis e socialmente aceitáveis;
2) devem estar ao alcance de todos, pessoas e famílias - portanto, disponíveis em locais
acessíveis à comunidade;
3) a comunidade deve participar ativamente na implantação e na atuação do sistema de saúde;
4) o custo dos serviços deve ser compatível com a situação econômica da região e do país.

Estruturados dessa forma, os serviços que prestam os cuidados primários de saúde representam
a porta de entrada para o sistema de saúde, do qual são, verdadeiramente, a base. O sistema nacional
de saúde, por sua vez, deve estar inteiramente integrado no processo de desenvolvimento social e
econômico do país, processo este do qual saúde é causa e conseqüência.
Os cuidados primários de saúde, adaptados às condições econômicas, socioculturais e políticas
de uma região deveriam incluir pelo menos: educação em saúde, nutrição adequada, saneamento
básico, cuidados materno-infantis, planejamento familiar, imunizações, prevenção e controle de doenças
endêmicas e de outros freqüentes agravos à saúde, provisão de medicamentos essenciais. Deveria
haver uma integração entre o setor de saúde e os demais, como agricultura e indústria.
O conceito de cuidados primários de saúde tem conotações. É uma proposta racionalizadora,
mas é também uma proposta política; em vez da tecnologia sofisticada oferecida por grandes
corporações, propõe tecnologia simplificada, “de fundo de quintal”. No lugar de grandes hospitais,
ambulatórios; de especialistas, generalistas; de um grande arsenal terapêutico, uma lista básica de
medicamentos - enfim, em vez da “mística do consumo”, uma ideologia da utilidade social. Ou seja, uma
série de juízos de valor, que os pragmáticos da área rejeitam. A pergunta é: como criar uma política de
saúde pública sem critérios sociais, sem juízos de valor? Por causa disso, nossa Constituição Federal de
1988, artigo 196, evita discutir o conceito de saúde, mas diz que: “A saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para a promoção, proteção e
recuperação”. Este é o princípio que norteia o SUS, Sistema Único de Saúde. E é o princípio que está
colaborando para desenvolver a dignidade aos brasileiros, como cidadãos e como seres humanos.

1.2 (C.e.1) CONHECER OS MODELOS DE SAÚDE (MODELO BIOMÉDICO X MODELO


BIOPSICOSSOCIAL).
Ao longo dos tempos diferentes modelos de saúde têm dominado a prática da medicina. Estes
modelos foram-se instalando progressivamente ao longo da história dos cuidados de saúde, sem que se

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verificassem saltos de um modelo para o outro. Existiu sim um modelo dominante numa dada época ou
numa determinada cultura.
O MODELO BIOMÉDICO baseia-se em grande parte numa visão cartesiana do mundo. Este
sistema de pensamento defendeu que o mundo podia ser comparado a uma máquina, mais
concretamente de um relógio, e que o conhecimento do universo passaria assim pelo “conhecimento
detalhado das peças do relógio”. O corpo humano obedecia às mesmas leis que o universo. Assim, o
que interessa à medicina são os fenómenos observáveis, ficando desta forma o Homem reduzido aos
seus aspectos biológicos com todos os outros aspectos negligenciados.
Sendo o corpo humano comparado a uma máquina, facilmente se conclui que para o modelo
biomédico, a doença é encarada como um defeito mecânico (avaria na máquina temporal ou
permanente) localizável numa máquina física e bioquímica. Este defeito pode ser reparado através de
meios físicos (cirurgia) ou químicos (farmacologia). A parte doente pode ser tratada isolada de todo o
resto do corpo. Assim, a cura equivale à reparação da máquina.
Estamos assim perante um modelo que se centra exclusivamente na dimensão biológica da
pessoa. Esta é reduzida às suas estruturas e processos biológicos e físico-químicos.
Devido a esta centração na dimensão biológica, a literatura médica inclui referências a corpos e
a doenças e, raramente ou nunca, a pessoas.
“Não é o sujeito que interessa ao médico, mas o sintoma que este lhe apresenta e que vai poder
incluir no seu reportório de doenças.” (Raymond Gueide, citado por W. Hesbeen, 2000, pg., 16)
É neste modelo que assenta a base conceptual e metodológica da medicina moderna e do seu
ensino.
De acordo com o modelo biomédico a saúde é definida como sendo a ausência de doença. As
pessoas são consideradas como vítimas passivas de agentes externos que provocam doença, sendo a
classe médica totalmente responsável pelo tratamento. Dito de outra forma, o profissional de saúde
assume um papel paternalista, uma vez que toda a autoridade e responsabilidade lhe é delegada. O
papel do doente é assim o de obedecer aos Técnicos de Saúde com vista a alcançar a sua cura.
Este modelo é eficaz em grande parte das situações agudas. Contudo, o progresso científico
levou à alteração dos padrões de morbilidade e a um aumento significativo de doenças crônicas. Ora, a
“medicina” das doenças agudas, apresenta-se como claramente inadequado para responder a estas
patologias.
Não é pois difícil de compreender que esta visão redutora e biomédica tenha sido fortemente
criticada a partir dos anos 70 do séc. XX. Os modelos que surgiram como alternativa/complemento do
biomédico defendem, essencialmente, que a saúde e doença não podem ser reduzidos aos seus
aspectos biológicos ou orgânicos.
“O ser humano é um ser complexo pelo que é inadequado defender que os processos de saúde
e doença existem à margem da pessoa imbuída do seu ambiente físico e social. (...) A capacidade de
construção de significações permite ao ser humano transcender os seus processos meramente
biológicos e criar ideias, antecipações, sentimentos, emoções e acções que colocam problemas às
ciências humanas que não se colocam quando se estudam seres vivos não humanos. A medicina
humana é diferente da biologia geral. (...) A dimensão biológica, psicológica e social não estão pois
separadas, mas integradas, sendo o ser humano uma totalidade biopsicossocial.” (J. Reis, 1998, pg. 62)

Neste contexto, surge nos anos 70 o MODELO BIOPSICOSSOCIAL. De acordo com este
modelo a doença e a saúde só podem ser explicadas considerando as dimensões: psicológica (ex.
cognições, emoções, comportamentos), social (ex. comportamentos da pessoa em relação à família,
amigos; expectativas culturais) e biológica (ex., genética, vírus, bactérias e defeitos estruturais) da
pessoa.
Ao considerar estas três dimensões, o modelo biopsicossocial afasta a noção de saúde como
ausência de doença. Para este modelo as fronteiras entre saúde e doença estão longe de serem claras
uma vez que dependem de aspectos culturais, sociais e psicológicos.
Desta forma, o objetivo deste modelo é estudar os processos de saúde e doença através da
interligação entre estas dimensões. Cada uma destas dimensões, só por si não pode ser indicativa de
bem-estar ou cura. Ou seja, o reequilibro bioquímico não devolve necessariamente a saúde ao paciente.
A dimensão biológica é necessária mas não suficiente para os critérios de saúde e doença.
De acordo com o modelo biopsicossocial, o profissional de saúde deve sempre considerar, no
seu diagnóstico, a interação dos fatores sociais, psicológicos e biológicos, de modo a avaliar o estado de
saúde da pessoa e fazer recomendações, se necessário, para o tratamento. Desta forma, é importante
recolher bastante informação e organizá-la o melhor possível, para conseguir um bom diagnóstico (o
doente não participa neste processo de recolha de informação).
Este modelo enfatiza a interdisciplinaridade e interações entre a componente física (ex. exame
complementar) e tratamento psicossocial (ex. educação / explicação detalhada do exame).
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É clara a importância nas significações que os indivíduos têm sobre saúde e doença, tendo em
mente que é possível modificar essas significações com benefício para a saúde e para a recuperação de
estádios de doença.
Assim, tendo em consideração que no modelo biomédico as significações são desprezadas, a
humanização do atendimento torna-se impossível. Trata-se, como vimos, de um modelo empirista que
não deixa lugar aos conteúdos e processos cognitivos. Indo um pouco mais longe podemos mesmo
afirmar que, ao não considerar vários aspectos inerentes ao Homem, este modelo contribui de forma
clara para a desumanização da saúde.
A ideia de reduzir o ser humano a um conjunto de órgãos é hoje inaceitável, mas, infelizmente,
este modo de trabalho em saúde ainda vigora nos nossos dias e continua a ser dominante em algumas
unidades hospitalares.
Cabe aos profissionais de saúde um atendimento e trabalho baseado cada vez mais no modelo
biopsicossocial, onde o ser humano deixa de ser considerado apenas na sua dimensão biológica e
passa a dar-se igualmente peso às dimensões psicológica e social.

1.3 (C.e.2) COMPREENDER A RELAÇÃO SAÚDE-DOENÇA


O processo saúde e doença devem ser interpretados como uma totalidade, pois o profissional
deve ter uma visão holística de seus pacientes. Ou seja, não deve tratar ou atender somente a doença
ou órgão afetado pela patologia, e sim, tratar e entender o indivíduo como um todo. Tal fato se justifica
em que saúde não é ausência de doença e, muito menos, a doença é ausência de saúde. Os estados de
saúde ou estados de doença são móveis, fluídos e estão em permanente movimento, constituindo o que
chamamos de qualidade de vida.
Esse processo saúde-doença tem sido influenciado ao longo do tempo pelos paradigmas que
regem a saúde e a doença. Segundo Cunha, paradigma significa visão de mundo que predomina em um
momento histórico e que influência o comportamento, as atitudes e os valores das pessoas (Cunha et al,
2003, p. 39). E esses valores estão sofrendo algumas alterações influenciadas pelo contexto social.
Observou-se que a garantia de cuidado individualizado e a promoção de saúde precisam ir além do
conceito “ausência de saúde”. Assim, surgem novos paradigmas com novos conceitos sobre o processo
saúde-doença.

Veja no quadro abaixo alguns paradigmas da área da saúde:


Paradigma Cartesiano Paradigma da
Complexidade
Conceito de saúde Negativo: ausência de doença Positivo: qualidade de vida
Definição de Ser Corpo: máquina composta por Corpo: totalidade
Humano diferentes partes biopsicossocial e cultural
Tratamento Medicalização do corpo e ênfase Promoção e prevenção, cura
no aspecto biológico e reabilitação.
Foco Nos conceitos Nas causas
Situação atual Em crise Em consolidação

Em 1986 foi realizada a Primeira Conferência Internacional sobre a Promoção de saúde, em


Ottawa. Promoção de saúde ficou definido como: “processo de capacitação da comunidade para atuar na
melhoria da sua qualidade de vida e saúde”. Sendo assim o individuo passa a participar mais, sendo
mais ativo na construção do seu estado de saúde, tornando-se um elemento central, e não mais a
doença.
Sendo assim, o processo de promoção de saúde deve levar em consideração a evolução
tecnológica e científica ao longo dos anos. Além disso, promover a valorização do paciente como um ser
humano, é essencial para as ações de promoção de saúde e prevenção das doenças.

1.4 (C.e.3) - CONHECER FATORES BIOLÓGICOS, AMBIENTAIS E CULTURAIS DETERMINANTES


NO PROCESSO SAÚDE-DOENÇA.
Fatores biológicos estão relacionados ao indivíduo, a sua constituição fisiológica, anatômica e
hereditária. Idade e gênero são algumas variantes que podem ser predisponentes a algumas doenças.
Conhecendo-as, será possível detectar fatores de risco a algumas doenças e trabalhar na comunidade
atuante a prevenção e manutenção da saúde.
Determinantes ambientais são condições do meio em que essa comunidade está inserida, sendo:
qualidade do ar, saneamento básico, condições de higiene, qualidade da alimentação e clima. Esses
itens essenciais à qualidade de vida podem ser alterados e se transformarem em agentes agressores à

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saúde da comunidade.
Já os determinantes culturais estão relacionados à cultura, costume, educação, crença e hábitos
dessa comunidade. A inserção de promoção de saúde nessa comunidade não pode ser de forma
violenta ou que anule seus costumes.
Os determinantes psicossociais e socioeconômicos também devem ser analisados na promoção
de saúde. Fatores como depressão, desvios de comportamento e local onde reside podem influenciar
muito no processo de saúde.

1.5 (C.a.2) CONHECER A HISTÓRIA DA SAÚDE NO BRASIL.


No início a atenção à saúde limitava-se aos próprios recursos da terra (plantas, ervas) e,
àqueles que, por conhecimentos empíricos (curandeiros), desenvolviam as suas habilidades na arte de
curar, percebe-se assim que não existia um complexo mesmo que rudimentar que visasse à promoção e
prevenção de doenças.
As famílias abastadas brasileiras possuíam condições para obterem inovações no combate
às doenças vindas principalmente da Europa, e os menos afortunados dependiam do saber popular.
Com a vinda da família real ao Brasil houve a necessidade da organização de uma estrutura
sanitária mínima, capaz de dar suporte ao poder que se instalava na cidade do Rio de Janeiro.
Até 1850, as atividades de saúde pública se limitavam à delegação das atribuições sanitárias
às juntas municipais e a um controle simplório de navios que atracavam em nossos portos.
Verifica-se que o interesse primordial estava limitado ao estabelecimento de um controle
sanitário mínimo da capital do império, tendência que se alongou por quase um século.
O tipo de organização política do império era de um regime de governo unitário e
centralizador incapaz de dar continuidade e eficiência na transmissão e execução à distância das
determinações emanadas dos comandos centrais.
A carência de profissionais médicos no Brasil Colônia e no Brasil Império era enorme, para
se ter uma idéia, no Rio de Janeiro, em 1789, só existia quatro médicos exercendo a profissão (SALLES,
1971). Em outros estados brasileiros eram mesmo inexistentes.
A inexistência de uma assistência médica estruturada, fez com que proliferassem pelo país
os Boticários (farmacêuticos) a estes cabiam a manipulação das fórmulas prescritas pelos médicos, mas
a verdade é que eles próprios tomavam a iniciativa de indicá-los, fato comum até hoje.
Só em 1808, Dom João VI fundou na Bahia o Colégio Médico Cirúrgico no Real Hospital
Militar da Cidade de Salvador. No mês de novembro do mesmo ano foi criada a Escola de Cirurgia do Rio
de Janeiro, anexa ao real Hospital Militar.
Com a Proclamação da República, estabeleceu-se uma forma de organização típica do
estado capitalista. No entanto, essa nova forma de organização do aparelho estatal assegurou apenas as
condições formais da representação burguesa clássica, especialmente a adoção do voto direto pelo
sufrágio universal.
Sem grandes mudanças desde o temo do Império a República permitiu uma enorme lacuna
no modelo sanitário para o país, deixando as cidades brasileiras a mercê das epidemias.
No início desse século, a cidade do Rio de Janeiro apresentava um quadro sanitário caótico
caracterizado pela presença de diversas doenças graves que acometiam à população, como a varíola, a
malária, a febre amarela. Tal fato acabou gerando sérias conseqüências tanto para saúde coletiva quanto
para outros setores como o do comércio exterior, visto que os navios estrangeiros não mais queriam
atracar no porto do Rio de Janeiro em função da situação sanitária existente na cidade.
Rodrigues Alves, então presidente do Brasil, nomeou Oswaldo Cruz, como Diretor do
Departamento Federal de Saúde Pública, que se propôs a erradicar a epidemia de febre-amarela na
cidade do Rio de Janeiro.
Foi criado um verdadeiro exército de 1.500 pessoas que passaram a exercer atividades de
desinfecção no combate ao mosquito, vetor da febre-amarela. A falta de esclarecimentos e as
arbitrariedades cometidas pelos “guarda - sanitários” causam revolta na população.
Este modelo de intervenção ficou conhecido como campanhista, e foi concebido dentro
de uma visão militar em que os fins justificam os meios, e no qual o uso da força e da autoridade eram
considerados os instrumentos preferenciais de ação.
A população, com receio das medidas de desinfecção, trabalho realizado pelo serviço
sanitário municipal, revolta-se. Certa vez, o próprio presidente Rodrigues Alves chama Oswaldo Cruz ao
Palácio do Catete, pedindo-lhe para, apesar de acreditar no acerto da estratégia do sanitarista, não
continuar queimando os colchões e as roupas dos doentes.
A onda de insatisfação se agrava com outra medida de Oswaldo Cruz, a Lei Federal nº 1261,
de 31 de outubro de 1904, que instituiu a vacinação anti-varíola obrigatória para todo o território nacional.
Surge, então, um grande movimento popular de revolta que ficou conhecido na história como a revolta
da vacina.

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Na reforma promovida por Oswaldo Cruz foram incorporados como elementos das ações de
saúde:
- o registro demográfico, possibilitando conhecer a composição e os fatos vitais de
importância da população;
- a introdução do laboratório como auxiliar do diagnóstico etiológico;
- a fabricação organizada de produtos profiláticos para uso em massa.

Em 1920, Carlos Chagas, sucessor de Oswaldo Cruz, reestruturou o Departamento Nacional


de Saúde, então ligado ao Ministério da Justiça e introduziu a propaganda e a educação sanitária na
técnica rotineira de ação, inovando o modelo campanhista de Oswaldo Cruz que era puramente fiscal e
policial.
Criaram-se órgãos especializados na luta contra a tuberculose, a lepra e as doenças
venéreas. A assistência hospitalar, infantil e a higiene industrial se destacaram como problemas
individualizados. Expandiram-se as atividades de saneamento para outros estados, além do Rio de
Janeiro e criou-se a Escola de Enfermagem Anna Nery.
Gradativamente, com o controle das epidemias nas grandes cidades brasileiras o modelo
campanhista deslocou a sua ação para o campo e para o combate das denominadas endemias rurais,
dado ser a agricultura a atividade hegemônica da economia da época. Este modelo de atuação foi
amplamente utilizado pela Sucam no combate a diversas endemias (Chagas, Esquistossomose, e
outras), sendo esta posteriormente incorporada à Fundação Nacional de Saúde.
Em 24 de janeiro de 1923, em uma época de mudanças do sistema de ocupação
estritamente rural para uma crescente urbanização, foi aprovada pelo Congresso Nacional a Lei Eloi
Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil. Através desta lei foram instituídas as Caixas de
Aposentadoria e Pensão (CAP’s).
A propósito desta lei devem ser feitas as seguintes considerações:
 A lei deveria ser aplicada somente ao operariado urbano. Para que fosse aprovado no Congresso
Nacional, dominado na sua maioria pela oligarquia rural foi imposta a condição de que este benefício não
seria estendido aos trabalhadores rurais. Fato que na história da previdência do Brasil perdurou até a
década de 60, quando foi criado o FUNRURAL.
 Outra particularidade refere-se ao fato de que as caixas deveriam ser organizadas por empresas e
não por categorias profissionais.
 A criação de uma CAP também não era automática, dependia do poder de mobilização e
organização dos trabalhadores de determinada empresa para reivindicar a sua criação.
A primeira CAP criada foi a dos ferroviários, o que pode ser explicado pela importância que
este setor desempenhava na economia do país naquela época e pela capacidade de mobilização que a
categoria dos ferroviários possuía.
O regime das CAP’s permaneceu até a criação do INPS (1967), quando foram afastados do
processo administrativo. (POSSAS, 1981)
A crise de 1929 imobilizou temporariamente o setor agrário-exportador, redefinindo a
organização do estado, que vai imprimir novos caminhos a vida nacional. Assim é que a crise do café, a
ação dos setores agrários e urbanos, vão propor um novo padrão de uso do poder no Brasil.
Em 1930, comandada por Getúlio Vargas é instalada a revolução, que rompe com a política
do café com leite, entre São Paulo e Minas Gerais, que sucessivamente elegiam o Presidente da
República.
Vitorioso o movimento, foram efetuadas mudanças na estrutura do estado. Estas
objetivavam promover a expansão do sistema econômico estabelecendo-se, paralelamente, uma nova
legislação que ordenasse a efetivação dessas mudanças. Foram criados o “Ministério do Trabalho”, o da
“Indústria e Comércio”, o “Ministério da Educação e Saúde” e juntas de arbitramento trabalhista.
Em 1934, com a nova constituição, o estado e o setor industrial através dele, instituiu uma
política social de massas que na constituição se configura no capítulo sobre a ordem econômica e social.
A implantação do estado novo representava o acordo entre a grande propriedade agrária e a
burguesia industrial historicamente frágil.
Coube ao Estado Novo acentuar e dirigir o processo de expansão do capitalismo no campo,
de maneira a impedir que nele ocorressem alterações radicais na estrutura da grande propriedade
agrária.
Em 1937 é promulgada nova constituição que reforça o centralismo e a autoridade
presidencial (ditadura).
O trabalhismo oficial e as suas práticas foram reforçados a partir de 1940 com a imposição
de um sindicato único e pela exigência do pagamento de uma contribuição sindical.
Em 1939 regulamenta-se a justiça do trabalho e em 1943 é homologada a Consolidação
das Leis Trabalhistas (CLT).

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A crescente massa assalariada urbana passa a se constituir no ponto de sustentação política


do novo governo de Getúlio Vargas, através de um regime corporativista.
São promulgadas as leis trabalhistas, que procuram estabelecer um contrato capital-
trabalho, garantindo direitos sociais ao trabalhador. Ao mesmo tempo, cria-se a estrutura sindical do
estado. Estas ações transparecem como dádivas do governo e do estado, e não como conquista dos
trabalhadores. O fundamento dessas ações era manter o movimento trabalhista contido dentro das forças
do estado.
No que tange a previdência social, a política do estado pretendeu estender a todas as
categorias do operariado urbano organizado os benefícios da previdência.
Desta forma, as antigas CAP’s são substituídas pelos INSTITUTOS DE APOSENTADORIA
E PENSÕES (IAP). Nestes institutos os trabalhadores eram organizados por categoria profissional
(marítimos, comerciários, bancários) e não por empresa.
Em 1933, foi criado o primeiro Instituto de Aposentadoria e Pensões: o dos Marítimos
(IAPM). Seu decreto de constituição definia, no artigo 46, os benefícios assegurados aos associados:
a) Aposentadoria;
b) Pensão em caso de morte para os membros de suas famílias ou para os beneficiários, na forma
do art. 55;
c) Assistência médica e hospitalar, com internação até trinta dias;
d) Socorros farmacêuticos, mediante indenização pelo preço do custo acrescido das despesas de
administração.
§ 2o - O custeio dos socorros mencionados na alínea c não deverá exceder à importância
correspondente ao total de 8% , da receita anual do Instituto, apurada no exercício anterior, sujeita a
respectiva verba à aprovação do Conselho Nacional do Trabalho.
Até o final dos anos cinqüenta, a assistência médica previdenciária não era importante. Os
técnicos do setor a consideram secundária no sistema previdenciário brasileiro, e os segurados não
faziam dela parte importante de suas reivindicações.
Na era do estado novo poucas foram as investidas no setor da saúde pública, destacando-se:
- Em 1930, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública, com desintegração das
atividades do Departamento Nacional de Saúde Pública (vinculado ao Ministério da Justiça), e a
pulverização de ações de saúde a outros diversos setores como: fiscalização de produtos de origem
animal que passa para o Ministério da Agricultura (1934); higiene e segurança do trabalho (1942) que
vincula-se ao Ministério do Trabalho.
- Em 1941, instituiu-se a reforma Barros Barreto, em que se destacam as seguintes ações:
 Instituição de órgãos normativos e supletivos destinados a orientar a assistência sanitária e
hospitalar;
 Criação de órgãos executivos de ação direta contra as endemias mais importantes (malária, febre
amarela, peste);
 Fortalecimento do Instituto Oswaldo Cruz, como referência nacional; descentralização das
atividades normativas e executivas por 8 regiões sanitárias;
 Destaque aos programas de abastecimento de água e construção de esgotos, no âmbito da
saúde pública;
 Atenção aos problemas das doenças degenerativas e mentais com a criação de serviços
especializados de âmbito nacional (Instituto Nacional do Câncer).
A escassez de recursos financeiros associado à pulverização destes recursos e de pessoal entre
diversos órgãos e setores, aos conflitos de jurisdição e gestão, e superposição de funções e atividades,
fizeram com que a maioria das ações de saúde pública no estado novo se reduzisse a meros aspectos
normativos, sem efetivação no campo prático de soluções para os grandes problemas sanitários
existentes no país naquela época.
Em 1953 foi criado o Ministério da Saúde, o que na verdade limitou-se a um mero
desmembramento do antigo Ministério da Saúde e Educação sem que isto significasse uma nova postura
do governo e uma efetiva preocupação em atender aos importantes problemas de saúde pública de sua
competência.
Em 1956, foi criado o Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERU), incorporando os
antigos serviços nacionais de febre amarela, malária, peste.
O processo de unificação dos IAPs já vinha sendo gestado desde de 1941 e sofreu em todo este
período grandes resistências, pelas radicais transformações que implicava. Após longa tramitação, a Lei
Orgânica de Previdência Social só foi finalmente sancionada em 1960. Foi acompanhada de intenso
debate político a nível legislativo em que os representantes das classes trabalhadoras se recusavam à
unificação, uma vez que isto representava o abandono de muitos direitos conquistados, além de se
constituírem os IAPs, naquela época, em importantes feudos políticos e eleitorais. Finalmente em 1960
foi promulgada a lei 3.807 denominada Lei Orgânica da Previdência Social. Tal lei veio estabelecer a
unificação do regime geral da previdência social, destinado a abranger todos os trabalhadores sujeitos ao
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regime da CLT, excluídos os trabalhadores rurais, os empregados domésticos e naturalmente os


servidores públicos e de autarquias e que tivessem regimes próprios de previdência.
Os trabalhadores rurais só viriam a ser incorporados ao sistema 3 anos mais tarde, quando
foi promulgada a lei 4.214 de 2/3/63 que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural
(FUNRURAL).
A lei previa uma contribuição tríplice com a participação do empregado, empregador e a
União. O governo federal nunca cumpriu a sua parte, o que evidentemente comprometeu seriamente a
estabilidade do sistema (POSSAS 1981).
O processo de unificação só avança com movimento revolucionário de 1964, que neste
mesmo ano promove uma intervenção generalizada em todos os IAPs, sendo os conselhos
administrativos substituídos por juntas interventoras nomeadas pelo governo revolucionário. A unificação
vai se consolidar em 1967.
O golpe de 1964, que instituiu a Ditadura Militar no Brasil, contava com suportes políticos
extremamente fortes. A maioria da burguesia defendia a internacionalização da economia e das finanças
brasileiras, ampliando o processo que era ainda obstaculizado, segundo os capitalistas, pela proposta
populista de fortalecimento das empresas estatais e de economia mista do governo João Goulart.
O processo de unificação previsto em 1960 se efetiva em 2 de janeiro de 1967, com a
implantação do Instituto Nacional de Previdência social (INPS), reunindo os seis Institutos de
Aposentadorias e Pensões, o Serviço de Assistência Médica e Domiciliar de Urgência (SAMDU) e a
Superintendência dos Serviços de Reabilitação da Previdência Social.
O Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), produto da fusão dos IAP’s, sofre a forte
influência dos técnicos oriundos do maior deles, o IAPI. Estes técnicos, que passam a história conhecidos
como “os cardeais do IAPI”, de tendências absolutamente privatizantes criam as condições institucionais
necessárias ao desenvolvimento do “complexo médico-industrial”, característica marcante deste
período (NICZ, 1982).
A criação do INPS propiciou a unificação dos diferentes benefícios ao nível do IAP’s. Na
medida em que todo o trabalhador urbano com carteira assinada era automaticamente contribuinte e
beneficiário do novo sistema, foi grande o volume de recursos financeiros capitalizados. O fato do
aumento da base de contribuição, aliado ao fato do crescimento econômico da década de 70 (o chamado
milagre econômico), do pequeno percentual de aposentadorias e pensões em relação ao total de
contribuintes, fez com que o sistema acumulasse um grande volume de recursos financeiros.
Este sistema foi se tornando cada vez mais complexo tanto do ponto de vista administrativo
quanto financeiro dentro da estrutura do INPS, que acabou levando a criação de uma estrutura própria
administrativa, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) em 1978.
Em 1974 o sistema previdenciário saiu da área do Ministério do Trabalho, para se consolidar
como um ministério próprio, o Ministério da Previdência e Assistência Social. Juntamente com este
Ministério foi criado o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS). A criação deste fundo
proporcionou a remodelação e ampliação dos hospitais da rede privada, através de empréstimos com
juros subsidiados. A existência de recursos para investimento e a criação de um mercado cativo de
atenção médica para os prestadores privados levou a um crescimento próximo de 500% no número de
leitos hospitalares privados no período 69/84, de tal forma que subiram de 74.543 em 69 para 348.255
em 84.
Em 1983 foi criado a AIS (Ações Integradas de Saúde), um projeto interministerial
(Previdência-Saúde-Educação), visando um novo modelo assistencial que incorporava o setor público,
procurando integrar ações curativo-preventivas e educativas ao mesmo tempo. Assim, a Previdência
passa a comprar e pagar serviços prestados por estados, municípios, hospitais filantrópicos, públicos e
universitários.
Este período coincidiu com o movimento de transição democrática, com eleição direta para
governadores e vitória esmagadora de oposição em quase todos os estados nas primeiras eleições
democráticas deste período (1982).
Com o Estado em crise, problemas financeiros, desordem e falta de ações eficazes, foi
concebido um subsistema de ATENÇÃO MÉDICO-SUPLETIVA composta de 5 modalidades
assistenciais: medicina de grupo, cooperativas médicas, auto-gestão, seguro-saúde e plano de
administração.
Com pequenas diferenças entre si, estas modalidades se baseiam em contribuições
mensais dos beneficiários (poupança) em contrapartida pela prestação de determinados serviços. Estes
serviços e benefícios eram pré-determinados, com prazos de carências, além de determinadas
exclusões, por exemplo, a não cobertura do tratamento de doenças infecciosas.
Este sistema baseia-se num universalismo excludente, beneficiando e fornecendo atenção
médica somente para aquela parcela da população que tem condições financeiras de arcar com o
sistema, não beneficiando a população como um todo e sem a preocupação de investir em saúde
preventiva e na mudança de indicadores de saúde.
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Enquanto, isto, ao subsistema público compete atender a grande maioria da população em


torno de 120.000.000 de brasileiros com os minguados recursos dos governos federal, estadual e
municipal.
Em 1990 o Governo edita as Leis 8.080 e 8.142, conhecidas como Leis Orgânicas da Saúde,
regulamentando o SUS, criado pela Constituição de 1988 o constituinte de 1988 no capítulo VIII da
Ordem social e na secção II referente à Saúde define no artigo 196 que: “A saúde é direito de todos e
dever do estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de
doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
proteção e recuperação”.
O texto constitucional demonstra toda a evolução e maturidade que foi necessária até o
surgimento do SUS que hoje se conhece.

EXERCÍCIOS DE COMPREENSÃO

Realizar a leitura em sala de aula do artigo sugerido como leitura complementar ( “O fazer
em saúde: um novo olhar sobre o processo de trabalho na estratégia saúde da família”).

O FAZER EM SAÚDE: UM NOVO OLHAR SOBRE O PROCESSO DE TRABALHO NA ESTRATÉGIA


SAÚDE DA FAMÍLIA
Maísa Paulino Rodrigues
Mariza Sandra de Souza Araújo
Recortes iniciais
Durante os últimos anos, a saúde vem se constituindo como um campo de construção de
práticas cuidadoras, socialmente determinadas, dentro do qual o formato da ação médica tornou-se
hegemônico. Porém percebemos que, mesmo dentro desse modo peculiar de agir tecnicamente na
produção do cuidado, no decorrer de todos estes anos, há uma grande multiplicidade de maneiras ou
modelos de ação.
Nos dias atuais, é comum convivermos com uma gama de problemas que alteram intensamente
a capacidade dos serviços de saúde de responderem de forma eficaz às demandas por saúde na vida
individual e na vida coletiva dos cidadãos brasileiros, o que pode ser detectado por meio da pouca
efetividade das ações de promoção, proteção e recuperação da saúde.
Essa situação tem sido observada cotidianamente nas instituições de saúde do Brasil, sendo
revelada por meio da insatisfação e da insegurança dos usuários com o tipo de atendimento prestado e
pela forma como os profissionais de saúde operam os serviços, ou seja, desenvolvendo práticas
histórico-socialmente determinadas pela ação médico-hegemônica.
Nesse horizonte de crise, a estratégia Saúde da Família pode significar um processo instituinte
de mudanças na atenção à saúde, resgatando conceitos fundamentais de vínculo, humanização, co-
responsabilidade e outros que apontam para a reorientação do modo de operar os serviços de saúde. A
partir desse referencial, buscamos estabelecer um furtivo olhar sobre o processo de trabalho em saúde e
os desafios necessários para a construção de um novo fazer na estratégia Saúde da Família.
Nessa perspectiva, para discutir sobre a natureza do processo de trabalho em saúde, faz-se
necessário resgatar alguns conceitos básicos do trabalho, ou seja, a sua conceptualização e
organização nos serviços de saúde. Para tanto, sintetizamos algumas elaborações de autores como
Merhy, Santos, Nogueira, entre outros.

O trabalho em saúde enquanto produção cooperativa


Falar sobre o processo de trabalho em saúde remete à compreensão que ele compartilha
características comuns a outros processos de trabalho que se dão na indústria e em outros setores da
economia. Evidencia-se a divisão social e técnica do trabalho, resultando em três dimensões básicas: a
primeira, de natureza formativa dos profissionais de saúde; a segunda, da gestão e da gerência dos
serviços; e a terceira, da produção propriamente dita dos serviços, operando ações promocionais,
preventivas e curativas sobre a dor, o sofrimento e as demandas de saúde da população. O foco da
nossa reflexão está direcionado para a última dimensão, ou seja, a produção dos serviços.
A produção de serviços de saúde pode ser entendida dentro da categoria serviço, expressando a
necessidade de cumprir uma finalidade útil, entretanto os resultados do trabalho não constituem
mercadorias passíveis de comercialização, como produtos mercantis em si mesmos (Souza et al. 1993),
mas são serviços produzidos pelo encontro entre quem produz e quem recebe, ou seja, a produção é
singular e se dá no próprio ato.
Dessa forma, o profissional de saúde, durante o exercício de sua atividade, precisa manter uma
relação “humanizada” com seus pacientes. André Levy (2000) nos diz que a abordagem clínica – a
palavra clínica em sua raiz primitiva significa ao “pé do leito” – supõe sujeitos às voltas com um
sofrimento, uma crise que os toca por inteiro. O clínico depara-se com um ser pensante e igualmente
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desejante, assim como ele próprio o é. Nesse encontro entre dois sujeitos, o fluxo das emoções flui entre
ambos, criando uma relação autêntica entre dois seres e não entre um técnico e uma patologia.
Para Merhy (1995), o modo de operar os serviços de saúde é definido como um processo de
produção do cuidado. É um serviço peculiar, fundado numa intensa relação interpessoal, dependente do
estabelecimento de vínculo entre os envolvidos para a eficácia do ato. Por ser de natureza dialógica e
dependente, constitui-se também num processo pedagógico de ensino-aprendizagem.
Muitas pessoas acreditam que o objeto, no campo da saúde, é a cura, ou a promoção e a
proteção da saúde, mas podemos dizer que é a produção do cuidado, através do qual poderá ser
atingidas a cura e a saúde, os reais objetivos que se deseja atingir, sendo os trabalhadores de saúde
sujeitos ativos nesse processo de produção.
Nesse sentido, o trabalho em saúde é um serviço que não se realiza sobre coisas ou sobre
objetos, como acontece na indústria; dá-se, ao contrário, sobre pessoas, e, mais ainda, com base numa
intercessão partilhada entre o usuário e o profissional, na qual o primeiro contribui para o processo de
trabalho, ou seja, é parte desse processo. Ele fornece valores de uso necessários ao processo de
trabalho, não apenas a informação acerca do que ocorreu consigo, qual a história de sua queixa ou
doença; é solicitada dele uma participação ativa, para que sejam corretamente aplicadas as normas e
prescrições médicas. Enquanto fornecedor de valores de uso substantivos, o usuário torna-se um co-
partícipe do processo de trabalho e, quase sempre, um co-responsável pelo êxito ou o insucesso da
ação terapêutica.
Na definição clássica sobre o processo de trabalho, destacam-se os seguintes componentes:
• matéria-prima
• instrumentos de trabalho
• homem
• produto
No caso do processo de trabalho em saúde, é possível sistematizar da seguinte forma:
• matéria-prima  usuário
• instrumentos de trabalho  tecnologia (leve/dura/leve-dura)
• homem  trabalhador em saúde = operador do cuidado
• produto  trabalho em saúde  atos de saúde = produção do cuidado

Trabalhar a partir desses elementos significa refletir sobre como se opera o fazer em saúde,
como ele se organiza e como está dividido. Para Souza et al. (1993), qualquer processo de trabalho em
saúde possui uma dimensão cooperativa, que integraliza a ação e complementa o processo de
produção de serviço, orientado a este fim, e uma direcionalidade técnica, que diz respeito aos
conhecimentos científicos e ao uso de tecnologias que influenciam a produção específica do serviço de
saúde.
Quanto à relação entre práticas de saúde e o modelo assistencial, Merhy (1999) discute que o
modelo assistencial cria missões diferenciadas para estabelecimentos de saúde aparentemente
semelhantes, as quais se traduzem em diretrizes operacionais bem definidas.
É importante lembrar que a organização e a divisão do processo de trabalho define-se pelo
objetivo final que se quer atingir. Nesse sentido, a lógica da produção dos serviços centrada na
concepção médico-curativa tem como finalidade à cura, orientada pela fragmentação dos procedimentos,
pela tecnificação da assistência e pela mecanização do ato em saúde.
Assim sendo, para se pensar um novo modelo assistencial em saúde centrado no usuário, é
fundamental re-significar o processo de trabalho. Essa re-significação exige a mudança da finalidade
desse processo, que passa a ser a produção do cuidado, na perspectiva da autonomização do sujeito,
orientada pelo princípio da integralidade e requerendo, como ferramentas, a interdisciplinaridade, a
intersetorialidade, o trabalho em equipe, a humanização dos serviços e a criação de vínculos
usuário/profissional/equipe de saúde.

O modo de operar os serviços na atenção básica


Diferentemente do que se propaga no discurso médico hegemônico, a atenção básica em saúde
não é uma ação simplificada. Quando assumida de forma integral e resolutiva, ela exige dos
profissionais que nela atuam um arsenal de atributos e recursos tecnológicos bastante diversificados e
complexos.
A característica dos serviços na atenção básica pressupõe a divisão de trabalho a partir de duas
perspectivas: a primeira, de natureza horizontal, exigida pela própria complexidade dos serviços
oferecidos (unidades produtoras); e outra, vertical, necessária à subdivisão das unidades produtoras,
exigindo assim, como pressuposto operacional, a cooperação entre aqueles que executam o trabalho e o
conhecimento técnico para a resolubilidade das ações e a garantia da integralidade do atendimento
(Souza et al., 1993; Nogueira,1991).

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“Um profissional de saúde, no desempenho de uma ação, mobiliza ao mesmo tempo, seus
saberes e modos de agir. Esse modo de agir é definido primeiramente pela existência de um saber muito
específico sobre o problema que vai enfrentar, sobre o qual coloca-se em jogo um saber territorializado
no seu campo profissional de ação, mas ambos envolvidos por um território que marca a dimensão
cuidadora sobre qualquer tipo de ação profissional” (Merhy, p.7,1999).

Exemplo disso pode ser observado no esquema a seguir.

Todos os trabalhadores em saúde possuem potenciais de intervenção nos processos de


produção em saúde, que são marcados pela relação entre os núcleos de competência profissional e o
núcleo cuidador, quer seja esse trabalhador um médico ou um arquivista (Merhy ,1995).
“Na produção de um ato de saúde coexistem os vários núcleos, como o núcleo específico
definido pela intersecção entre o problema concreto que se tem diante de si e o recorte profissional do
problema. Por exemplo, diante de um indivíduo que está desenvolvendo um quadro de tuberculose
pulmonar o recorte passa necessariamente pelo modo como o núcleo profissional médico, ou da
enfermagem, ou da assistente social, entre outras, recorta este problema concreto, portado pelo
indivíduo, e que são núcleos nos quais operam centralmente as tecnologias duras e leveduras. Mas, seja
qual for a intersecção produzida, haverá sempre um outro núcleo operando a produção dos atos de
saúde, que é o cuidador, no qual atuam os processos relacionais do campo das tecnologias leves, e que
pertence a todos os trabalhadores em suas relações interseçoras com os usuários” ( Mehry, p.10, 1999).
No modelo médico-hegemônico, o núcleo cuidador ocupa um papel irrelevante e complementar,
em relação ao núcleo profissional. A implicação mais séria desse modelo é o enfraquecimento da
dimensão cuidadora do trabalho em saúde; em particular, do próprio médico. Um outro problema
existente é a submissão dos outros profissionais da equipe à lógica dominante da ação médica: tal lógica
empobrece consideravelmente o seu núcleo cuidador. Alguns autores advogam que a baixa
incorporação do saber clínico no ato médico compromete seriamente a eficácia da intervenção;
inversamente, podemos dizer que a morte da ação cuidadora dos diversos profissionais de saúde tem
construído modelos de atenção irresponsáveis perante a vida dos cidadãos.
Essa compreensão implica reconhecer que a construção de um novo modelo de saúde
humanizado pressupõe a ampliação da dimensão cuidadora, no sentido de desencadear processos mais
partilhados dentro da equipe de saúde e também entre os profissionais e usuários, para que se garanta o
vínculo e a co-responsabilização. Implica também uma melhor combinação entre a capacidade de
produzir procedimentos e cuidado, requerendo competências diversificadas por parte dos profissionais
atuantes que se expressam, no campo da cooperação (núcleo cuidador), pelo conhecimento ético, pela
destreza nas relações interpessoais, pelo conhecimento institucional e pela compreensão do processo
de trabalho; no campo da direcionalidade técnica (núcleo profissional/específico), pelo conhecimento
técnico-científico, da clínica, do planejamento e ainda o conhecimento sobre gerência e supervisão dos
serviços (Souza et al., 1993).
Moysés e Silveira Filho (2002) afirmam que é necessária a associação dos conhecimentos
técnicos, de novas configurações tecnológicas e novas micro-políticas para o trabalho em saúde,
inclusive no terreno ético. As tecnologias leves, quando apostam no diagnóstico sensível à subjetividade,
nas relações de poder e afeto, nos códigos familiares subliminares etc. induzem à ampliação da pauta
técnica para a pauta ética, baseado em cidadania, solidariedade e humanização.
Nessa perspectiva, pensar a estratégia Saúde da Família como eixo reorientador das práticas,
nas unidades básicas de saúde, pressupõe uma reestruturação sob uma nova lógica, que só poderá ser
concretizada a partir de um novo olhar e um novo fazer, centrado no usuário, dentro desses “novos
serviços”.

A Estratégia Saúde da Família (ESF) e suas ferramentas em análise no processo de trabalho


Apesar da grande polêmica gerada no campo da Saúde Coletiva, por ocasião da implantação da
estratégia Saúde da Família no Brasil, observamos que cotidiana-mente essa estratégia vem se
afirmando como processo instituinte capaz de contribuir para a mudança do modelo assistencial no SUS.
Hoje são 50 milhões de brasileiros atendidos pela estratégia. A potencialidade para a mudança advém
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do conteúdo estratégico, que permite um rompimento no comportamento passivo dentro das unidades
básicas de saúde, com extensão das ações para e com a comunidade, possibilitando o desenvolvimento
do trabalho em equipe, a responsabilização sobre um território, os vínculos de compromisso e de co-
responsabilidade entre serviços de saúde, profissionais e população.
Um outro aspecto que merece destaque está relacionado ao processo de reorganização da
atenção básica, que permite desencadear mudanças nos outros níveis do sistema de saúde. Daí, o seu
potencial instituinte em contribuir para um novo formato de modelo assistencial.
No eixo discursivo, a ESF conclama para a construção de uma nova maneira de operar a saúde,
humanizada e solidária, compreendendo-se humanização em sentido ampliado (resolutividade,
equidade, acesso, autonomização, solidariedade e cidadania).
Entretanto, apesar de os princípios e diretrizes estarem esboçados no campo do conhecimento,
o campo da operação ainda tem muito a ser percorrido, ou seja, necessita incorporar tais fundamentos.
Cabe ressaltar que a implantação de uma nova política pressupõe mudanças em vários níveis (político,
institucional, organizativo e pessoal), exigindo tempo, vontade política e recursos de várias ordens.
Nesse sentido, podemos pensar a estratégia como expressão de processos instituintes, ou seja,
do que pode vir a ser, fazendo-se, assim, necessário pensá-la a partir de dois enfoques: o primeiro, diz
respeito ao seu conteúdo minimalista, normatizador e focalizador, expresso: pela rigidez e a
burocratização do processo de trabalho, extirpando o trabalho vivo; pelo baixo incentivo financeiro
destinado a uma equipe mínima, pela quantidade insuficiente de trabalhadores com perfil adequado à
estratégia; a precarização do processo de trabalho, com a flexibilização dos serviços e a ausência de um
vínculo formal dos profissionais com as instituições executoras; a assunção de outros níveis de
responsabilidade por parte da equipe de Saúde da Família, sem a devida remuneração e capacitação.
O contraponto desse pensar é a possibilidade de a estratégia colocar-se enquanto reorientadora
do processo de trabalho, através do cumprimento dos seus princípios, o que remete para a necessidade
da constituição de um vínculo formal do trabalhador com os serviços de saúde por meio da análise de
desempenho instituído por um plano de carreira no serviço público; a continuidade e o aumento do
incentivo financeiro para as equipes da ESF, como forma de impulsionar a estratégia; a mudança no
ambiente formador tanto nas escolas técnicas como nas instituições de ensino superior; a formação e a
capacitação dos profissionais que estão na rede; o refazer político-institucional, dentro das organizações
e dentro de nós. Isso exige uma nova postura profissional frente aos usuários, redefinindo a finalidade do
processo de trabalho e reconhecendo o usuário como integrante do processo do cuidado, com vistas a
autonomização, remetendo necessariamente a um exercício autofágico, por parte dos profissionais.
A Estratégia Saúde da Família, em seu modo de operar os serviços de saúde, constitui-se num
processo, e, assim sendo, não está concluído, podendo caminhar para o plano da racionalização e
flexibilização do processo de trabalho ou da radicalização do processo de humanização do cuidado,
garantindo acesso, resolutividade, participação social e qualidade da assistência.
Acreditamos que construir novos modelos de processo de trabalho em saúde, em qualquer tipo
de serviço, que possibilitem combinar a produção de atos cuidadores de maneira eficaz com conquistas
de resultados, cura, proteção e promoção, é tarefa urgente a ser realizada pelo conjunto dos gestores e
trabalhadores dos estabelecimentos de saúde.

Questões a serem debatidas/respondidas:

1) Por que o processo de trabalho em saúde se diferencia do processo de trabalho em outras áreas?
2) Como seria o modelo humanizado de saúde?
3) Como funciona o fazer em saúde pela Estratégia Saúde da Família (ESF)?
4) Quais as diferenças entre o cuidado em saúde pelo modelo Biomédico e o trabalho em saúde pelo
modelo da Estratégia Saúde da Família? Em que a ESF se relaciona com o modelo Biopsicossocial de
saúde?
5) Em que ponto as questões culturais e o cuidar pelo modelo Biomédico podem atrapalhar o processo
de trabalho em saúde?

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES

1.6 (H.e.1) DISCUTIR IDÉIAS DA COMPLEXIDADE HUMANA NA SAÚDE.


FUNDAMENTAÇÃO
É de suma importância o profissional conhecer questões que são passíveis de intervenção diante
de um processo organizado de trabalho em saúde.
OBJETIVO
Identificar e compreender a utilidade de se conhecer o conceito de saúde e de organizar o
processo de trabalho em saúde para intervenção diante de uma comunidade.
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PROCEDIMENTO
Reconheça e liste as questões que vão além de um tratamento pelo modelo biomédico, que
estão presentes em vários processos de doenças como, por exemplo, no diabetes, hipertensão entre
outras. Pesquise em Unidades de Saúde as principais doenças que afetam sua comunidade.

ATIVIDADE AUXILIADA PELA MONITORIA


Forme grupos liderados pelos monitores, pesquisem junto às UBS de seu bairro (Unidade Básica
de Saúde), listem e escrevam as principais doenças encontradas, seus sintomas e as principais
questões que vão além do tratamento pelo modelo biomédico. Posteriormente discuti-las em sala com a
turma.

AUTOAVALIAÇÃO

Escreva em seu caderno de autoavaliação o que você aprendeu e o que apresentou dificuldades
diante desse capitulo.

Referências:
BRASIL. 8ª CONFERENCIA NACIONAL DE SAÚDE-Relatório Final, In: Minayo, M.C.S.(org.) A Saúde
em estado de Choque. Rio de janeiro: FASE, 1996. p117-128(Anexo).
CARTA DE OTAWA. In: Brasil. Ministério da Saúde. As cartas da Promoção da Saúde. Brasília: [s.n],
2002. Disponível em: hhtp://dtr2001.saúde.gov.br/bvs/publicações/cartas_promocao.pdf>Ministério da
Saúde. Oficinas de Educação em Saúde e Comunicação. ed.Brasília:Editora Funasa, 2007
GRILO, Ana Monteiro. Os Modelos de saúde – suas Implicações na humanização dos serviços de
saúde. Disponível em: http://www.fedap.es/IberPsicologia/iberpsi10/congreso_lisboa/monteiro3/
monteiro3.htm

SCLIAR, M. História do conceito de saúde. Rev Saúde Coletiva. 2007; 17(1):28-41

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CAPÍTULO 2

COMPETÊNCIAS E HABILIDADES A SEREM TRABALHADAS


COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS HABILIDADE ESSENCIAL
Conhecer a Promoção da Saúde e diferenciá-la da
Discutir as atividades realizadas em
Prevenção em Saúde.
Promoção e Prevenção em Saúde da
Conhecer a Prevenção em Saúde e todos os seus níveis
comunidade em que estiver inserido.
(primário, secundário e terciário).
HABILIDADE ACESSÓRIA
Diagnosticar problemas no processo de saúde na comunidade em que estiver inserido

2.1 (C.e.4) CONHECER A PROMOÇÃO DA SAÚDE E DIFERENCIÁ-LA DA PREVENÇÃO EM SAÚDE.

Segundo o dicionário Houaiss, promoção pode significar: ato ou efeito de promover; ascensão a
cargo, posto ou categoria superior; diligência do promotor; venda de alguns artigos com preços mais
baixos; qualquer atividade (de propaganda, marketing, divulgação, relações públicas, etc) destinada a
tornar mais conhecido e prestigiado um produto, serviço, marca, idéia, pessoa ou instituição.
Promoção da saúde é um conceito antigo, que vem sendo retomado e discutido nas últimas
décadas, principalmente a partir do Informe Lalonde, no início da década de 70, mas é importante
também lembrar que a ideia de promover saúde antecede o uso explícito do termo.
A Organização Mundial de Saúde define como promoção da saúde o processo que permite às
pessoas aumentar o controle e melhorar a sua saúde. A promoção da saúde representa um processo
social e político, não somente incluindo ações direcionadas ao fortalecimento das capacidades e
habilidades dos indivíduos, mas também ações direcionadas a mudanças das condições sociais,
ambientais e econômicas para minimizar seu impacto na saúde individual e pública. Entende-se por
promoção da saúde o processo que possibilita as pessoas aumentar seu controle sobre os
determinantes da saúde e através disto melhorar sua saúde, sendo a participação das mesmas
essencial para sustentar as ações de promoção da saúde.
A concepção moderna de promoção da saúde (e a prática conseqüente) surgiu e se
desenvolveu, de forma mais vigorosa nos últimos vinte anos, nos países desenvolvidos, particularmente
no Canadá, Estados Unidos e países da Europa Ocidental. Quatro importantes Conferências
Internacionais sobre Promoção da Saúde, realizadas nos últimos 12 anos - em Ottawa (1986), Adelaide
(1988), Sundsvall (1991) e Jacarta (1997) -, desenvolveram as bases conceituais e políticas da
promoção da saúde. Na América Latina, em 1992, realizou-se a Conferência Internacional de Promoção
da Saúde (1992), trazendo formalmente o tema para o contexto sub-regional.
As diversas conceituações disponíveis para a promoção da saúde podem ser reunidas em dois
grandes grupos. No primeiro deles, a promoção da saúde consiste nas atividades dirigidas à
transformação dos comportamentos dos indivíduos, focando nos seus estilos de vida e localizando-os no
seio das famílias e, no máximo, no ambiente das culturas da comunidade em que se encontram. Neste
caso, os programas ou atividades de promoção da saúde tendem a concentrar-se em componentes
educativos, primariamente relacionados com riscos comportamentais passíveis de mudanças, que
estariam, pelo menos em parte, sob o controle dos próprios indivíduos. Nessa abordagem, fugiriam do
âmbito da promoção da saúde todos os fatores que estivessem fora do controle dos indivíduos. Já o
segundo grupo de conceituações baseia-se no entendimento que a saúde é produto de um amplo
espectro de fatores relacionados com a qualidade de vida, incluindo um padrão adequado de
alimentação e nutrição, e de habitação e saneamento; boas condições de trabalho; oportunidades de
educação ao longo de toda a vida; ambiente físico limpo; apoio social para famílias e indivíduos; estilo de
vida responsável; e um espectro adequado de cuidados de saúde.
Para uma melhor visualização da cronologia do desenvolvimento no campo da Promoção da
Saúde, a Agência para a Promoção da Saúde da Irlanda do Norte (HPA), propõe o seguinte esquema:
Desenvolvimento em Promoção da Saúde no período de 1974 a 2000:
1974 – Informe Lalonde
1978 – Primeira Conferência Internacional sobre Atenção Primária de Saúde – Declaração de Alma Ata.
1981 – A Organização Mundial de Saúde unanimemente adota uma estratégia global: “Saúde para
Todos no Ano 2000”.
1986 - Carta de Otawa sobre Promoção da Saúde.
1988 – Segunda Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em Adelaide, Austrália.
1991 – Terceira Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em Sundsval, Suécia.
1997 – Quarta Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde em Jacarta.
1998 – Resolução da Assembléia Mundial de Saúde (Promoção da Saúde).

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2000 – Quinta Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, México.


Após este breve histórico do campo da promoção da saúde, torna-se necessário descrever as
estratégias-chave da promoção da Saúde da Carta de Otawa, que foi o principal marco de referência da
promoção da saúde em todo o mundo. Segundo Sheiham em seu artigo de 2001 estas estratégias
podem ser assim resumidas:
1) Promoção de saúde através de políticas públicas: focalizando a atenção no impacto em saúde
das políticas públicas de todos os setores e não somente do setor da saúde.
2) Criação de ambiente favorável através da avaliação do impacto em saúde do ambiente e
evidenciar oportunidades de mudanças que conduzam à saúde.
3) Desenvolvimento de habilidades pessoais: ampliando a disseminação de informações para
promover compreensão, e apoiar o desenvolvimento de habilidades pessoais, sociais e políticas que
capacitem indivíduos a tomar atitudes de promoção de saúde.
4) Fortalecimento de ações comunitárias: apoiando ações comunitárias concretas e eficazes na
definição de prioridades, tomada de decisões, planejamento de estratégias e implementá-las para atingir
melhor padrão de saúde.
5) Reorientação de serviços de saúde: redirecionar o modelo de atenção da responsabilidade de
oferecer serviços clínicos e curativos para a meta de ganhos em saúde.
Segundo a Health Promotion Agency for Northern Ireland – HPA (2004), os principais modelos e
teorias utilizados na promoção da saúde podem ser resumidos assim:
1-Teorias que tentam explicar comportamentos e mudanças comportamentais focalizando no
indivíduo.
2-Teorias que explicam mudanças em comunidades e ações comunitárias para a saúde.
3- Modelos que explicam mudanças em organizações e a criação de práticas organizacionais
que incentivem hábitos saudáveis.
Outro ponto crucial que deve ser abordado é a necessidade da diferenciação entre os conceitos
de promoção, prevenção e educação em saúde que muitas vezes são utilizados simultaneamente como
se fossem sinônimos, ocasionando confusões até mesmo entre os profissionais de saúde. Esta
diferenciação é bastante importante, pois, segundo o autor Breilh, na ciência, uma distorção mil vezes
repetida acaba convertendo-se em ingrediente de uma interpretação da realidade.
A principal diferença encontrada entre prevenção e promoção está no olhar sobre o conceito de
saúde, na prevenção a saúde é vista simplesmente como ausência de doenças, enquanto na promoção
a saúde é encarada como um conceito positivo e multidimensional resultando desta maneira em um
modelo participativo de saúde na promoção em oposição ao modelo médico de intervenção.
Além disto a compreensão adequada do que diferencia promoção de prevenção é justamente a
consciência de que a incerteza do conhecimento científico não é simples limitação técnica passível de
sucessivas superações; buscar a saúde é questão não só de sobrevivência, mas de qualificação da
existência.
Para que se perceba a diferença entre educação em saúde e promoção da saúde faz-se
necessário o esclarecimento de tais conceitos, mesmo se reconhecendo as dificuldades inerentes a tal
esclarecimento. Resumidamente, pode-se afirmar que se entende por educação em saúde quaisquer
combinações de experiências de aprendizagem delineadas com vistas a facilitar ações voluntárias
conducentes à saúde, enquanto a promoção da saúde é uma combinação de apoios educacionais e
ambientais que visam a atingir ações e condições de vida conducentes à saúde.
Deve-se destacar também que a promoção de saúde adota uma gama de estratégias políticas
que abrange desde posturas conservadoras até perspectivas críticas ditas radicais ou libertárias. Sob a
ótica mais conservadora, a promoção de saúde seria um meio de direcionar indivíduos a assumirem a
responsabilidade por sua saúde e, ao assim fazerem, reduzirem o peso financeiro na assistência de
saúde. Noutra via, reformista, a promoção da saúde atuaria como estratégia para criar mudanças na
relação entre cidadãos e o Estado, pela ênfase em políticas públicas e ação intersetorial, ou ainda, pode
constituir-se numa perspectiva libertária que busca mudanças sociais mais profundas - como são as
propostas de educação popular.
É importante também, que se reflita com cuidado antes de se afirmar que a promoção da saúde
é fantástica e fascinante, pois ao mesmo tempo que pode ser em seus aspectos ideológicos, um
empreendimento de natureza holística que, conectado a dinâmicas de transformação social, demanda
estratégias articuladas às necessidades sentidas, percebidas e desejadas pela população, pode também
ser um instrumento de biopoder como afirma Guilam em 2003, isto é, o grande foco da educação e
promoção à saúde são os riscos relacionados aos chamados estilos de vida. Indivíduos identificados
como de alto risco para uma doença em particular são encorajados a mudar aspectos de suas vidas e a
monitorar seu comportamento. Este projeto é dirigido no sentido de maximizar a sua própria saúde e
minimizar o “peso” que o indivíduo possa causar à sociedade.

2.2 (C.e.5) CONHECER A PREVENÇÃO EM SAÚDE E TODOS OS SEUS NÍVEIS (PRIMÁRIO,


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SECUNDÁRIO E TERCIÁRIO)
O termo prevenção significa evitar a emergência e o estabelecimento de estilos de vida que
aumentem o risco de doença. Ao prevenir padrões de vida social, econômica ou cultural que se sabe
estar ligados a um elevado risco de doença, promove-se a saúde e o bem-estar e diminui-se a
probabilidade de ocorrência de doença no futuro. Para tal intuito, procura-se elaborar e aplicar políticas
e programas de prevenção de saúde na comunidade.
A prevenção pode ser classificada em três níveis: primária, secundária e terciária.
Na prevenção primária encontram-se as medidas ou ações especialmente destinadas ao período
que antecede a ocorrência da doença. Dentre elas, destacam-se o saneamento básico, a vacinação e o
controle de vetores, por exemplo. "Significa evitar a ocorrência de uma doença, eliminando fatores de
risco ou tratamento de lesões precursoras. É a prevenção de enfermidades ou profilaxia.”
A prevenção secundária tenta impedir a evolução de doenças já existentes e, em conseqüência,
suas complicações. Os exames periódicos e o auto-exame de mama, entre outros, são procedimentos
de reconhecida eficácia para o diagnóstico precoce, que permite o início imediato do tratamento e evita,
muitas vezes, o agravamento da enfermidade. "Prevenção secundária significa prevenção da evolução
das enfermidades através da execução de procedimentos diagnósticos ou terapêuticos."
Prevenção terciária engloba ações voltadas a diminuir a prevalência das incapacidades crônicas
numa população, reduzindo ao mínimo as deficiências funcionais consecutivas à doença, além da
reabilitação do indivíduo após a cura ou o controle da doença, a fim de reajustá-lo a uma nova condição
de vida. É tratar as doenças sintomáticas já estabelecidas e também evitar suas complicações e a perda
funcional com seqüelas que, muitas vezes, são irreversíveis. Fazem parte dessas medidas a fisioterapia,
a terapia ocupacional e a colocação de próteses, por exemplo, além de adaptações de ambientes para
deficientes físicos e ações que visem facilitação das atividades de vida diária de pacientes.

EXERCÍCIOS DE COMPREENSÃO

1 – Em que se diferencia a promoção em saúde da prevenção?


2 – Exemplifique atividades de promoção em saúde.
3 – Cite exemplos de prevenção em saúde em nível primário, secundário e terciário.

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES

2.3 (H.e.2) DISCUTIR AS ATIVIDADES REALIZADAS EM PROMOÇÃO E PREVENÇÃO EM SAÚDE


DA COMUNIDADE EM QUE ESTIVER INSERIDO.
FUNDAMENTAÇÃO
O profissional da área da saúde precisa, além de identificar e promover a prevenção em saúde,
saber o que realmente está sendo efetivo para a população alvo.
OBJETIVO
Possibilitar a identificação do conteúdo proposto com sua realidade.
PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES
- Em grupos de alunos, identificar e listar as ações de prevenção e promoção de saúde que
estão sendo feitas na sua comunidade.
PROCEDIMENTO
Em grupos de alunos, elaborar e confeccionar cartilhas sobre promoção de saúde que possam
ser utilizadas pela população, envolvendo doenças e patologias mais comuns dentro da comunidade.

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES

2.4 (H.a.1) DIAGNOSTICAR PROBLEMAS NO PROCESSO DE SAÚDE NA COMUNIDADE EM QUE


ESTIVER INSERIDO.
FUNDAMENTAÇÃO
O profissional da área da saúde deve ser capaz de identificar as falhas nos serviços de saúde
prestados à comunidade em que estiver inserido.
OBJETIVO
Possibilitar a identificação do conteúdo proposto com sua realidade.

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES

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Mediante a lista de atividades de promoção e prevenção de saúde citadas na atividade prática


referente à habilidade anterior, identificar quais estão sendo efetivas/benéficas à comunidade e quais
são falhas, apontando possíveis causas do insucesso.

AUTOAVALIAÇÃO

Em seu caderno de auto-avaliação escreva sobre o que você aprendeu e/ou o que teve mais
dificuldade diante desse capitulo.

Referências:

Carvalho, A. I., Da saúde pública às políticas saudáveis: saúde e cidadania na pós-modernidade.


Ciência e saúde Coletiva1, Rio de Janeiro, n. 1, 1996. p.104 – 121.

Silva, J. L.L., O processo saúde-doença e importância para a promoção da saúde. Informe-se em


promoção da saúde, n.2, p. 03 – 05, 2006.

Neves, T. P. Reflexões sobre a promoção da saúde. Revista Espaço Acadêmico, on-line, Maringá, v.
6, n. 62, julho, 2006. Disponível em:http://www.espacoacademico.com.br/062/62neves.htm. Acesso em:
05 Jul 2008.

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CAPÍTULO 3

COMPETÊNCIAS E HABILIDADES A SEREM TRABALHADAS


COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS HABILIDADES ESSENCIAIS
Conhecer sobre o sistema Único de saúde (SUS)
Conhecer os princípios doutrinários do SUS. Relacionar as diretrizes e os
Conhecer os princípios que regem a organização do SUS. princípios do SUS com os
Conhecer as diretrizes, preceitos, bases legais e as atribuições aspectos práticos vividos.
do SUS segundo a Constituição Brasileira.
COMPETÊNCIAS ACESSÓRIAS
Conhecer a origem e história do SUS.

3.1 (c.e.6) CONHECER SOBRE O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)


O Sistema único de saúde é o conjunto de ações e serviços de saúde prestados por órgãos e
instituições públicas Federais, Estaduais, e Municipais de acordo com o artigo 4 da lei Federal 8.080/90.
Sendo instituída com o objetivo de integrar as ações de saúde das três esferas de governo citadas
anteriormente. É um sistema complexo onde se tem a responsabilidade de articular e coordenar ações
promocionais e preventivas assim como as de cura e reabilitação.

3.2 - (c.a.3) CONHECER A ORIGEM E HISTÓRIA DO SUS


O SUS é produto da reforma sanitária brasileira, processo político que mobilizou a sociedade
brasileira para propor políticas e modelos novos de organização de sistemas e serviços na prática da
saúde.
No século XX houve um grande desenvolvimento da agricultura no Brasil, aumentando assim a
movimentação nas cidades, principalmente as portuárias. Tal fato propiciou mudanças de hábitos que
levaram ao surgimento de várias doenças infecciosas e contagiosas. A partir desse momento surgiram
as primeiras tentativas voltadas para a definição de políticas de saúde pública, que passou a ser definida
como: conjunto de disposições, medidas e procedimentos que traduzem a orientação política do Estado
e regulam as atividades governamentais relacionadas às tarefas de interesse público.
Voltando um pouco na história, durante o Brasil colônia, a atenção à saúde limitava-se aos
próprios recursos da terra (plantas, ervas) e, àqueles que, por conhecimentos empíricos (curandeiros),
desenvolviam as suas habilidades na arte de curar. Já durante o Império, houve investimentos em infra-
estrutura, saneamento básico e melhores habitações urbanas. Também houve criação das primeiras
escolas médicas no Rio de Janeiro e Bahia. Durante a República Velha, surgiu um modelo de
intervenção que ficou conhecido como campanhista, que foi aplicado dentro de uma visão militar em que
os fins justificam os meios, e no qual o uso da força e da autoridade. Essa ação gerou um movimento
popular que ficou conhecido como revolta da vacina.
Com a urbanização crescente, os trabalhadores começaram a exigir seus direitos, mobilizando
e organizando a classe operária Brasil. Através desses movimentos, em 24 de janeiro de 1923, foi
aprovada pelo Congresso Nacional a Lei Eloi Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil.
Através desta lei foram instituídas as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAP’s). Esse não se
estenderia a trabalhadores rurais, sendo criado então o FUNRURAL. Em 1939, devido a articulações
políticas, regulamenta-se a justiça do trabalho e em 1943 é homologada a Consolidação das Leis
Trabalhistas (CLT). Promulgadas, as leis trabalhistas procuram estabelecer um contrato capital-
trabalho, garantindo direitos sociais ao trabalhador. O fundamento dessas ações era manter o
movimento trabalhista contido dentro das forças do estado.
Desta forma, as antigas CAP’s são substituídas pelos INSTITUTOS DE APOSENTADORIA E
PENSÕES (IAP). Nestes institutos os trabalhadores eram organizados por categoria profissional
(marítimos, comerciários, bancários) e não por empresa. Seu decreto de constituição definia
aposentadoria, pensão em caso de morte, assistência médica e hospitalar. Promulgada em 1960, a lei
3.807 denominada Lei Orgânica da Previdência Social, estabelecia a unificação do regime geral da
previdência social, abrangendo todos os trabalhadores sujeitos ao regime da CLT. Excluindo os
trabalhadores rurais, os empregados domésticos e naturalmente os servidores públicos e de autarquias
e que tivessem regimes próprios de previdência.
Em 1967, com a implantação do Instituto Nacional de Previdência social (INPS), efetiva-se a
unificação, reunindo os seis Institutos de Aposentadorias e Pensões, o Serviço de Assistência Médica e
Domiciliar de Urgência (SAMDU) e a Superintendência dos Serviços de Reabilitação da Previdência
Social.
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Com essa unificação houve um aumento substancial do número de contribuintes e


conseqüentemente de beneficiários, sendo impossível ao sistema médico previdenciário existente
atender a toda essa população. Sendo assim, o governo militar recorreu à iniciativa privada
estabelecendo convênios e contratos com a maioria dos médicos e hospitais existentes no país,
pagando-se pelos serviços produzidos. Surge assim o complexo sistema médico-industrial. Devido à
complexibilidade administrativa e financeira desse sistema, foi criada uma estrutura própria
administrativa, o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) em 1978.
Por ter priorizado a medicina curativa, o modelo proposto foi incapaz de solucionar os principais
problemas de saúde coletiva, como as endemias, as epidemias, e os indicadores de saúde como a
mortalidade e a desnutrição. Devido à escassez de recursos para a sua manutenção, ao aumento
dos custos operacionais, e ao descrédito social em resolver a agenda da saúde, o modelo proposto
entrou em crise. Sendo assim, o setor liberal percebeu que não mais poderia se manter com o sistema
médico-industrial e procurou novas alternativas para sua estruturação. Direcionou o seu modelo de
atenção médica para parcelas da população de classe média e categorias de assalariados, procurando
organizar uma nova base estrutural. Deste modo foi concebido um subsistema de ATENÇÃO MÉDICO -
SUPLETIVA composta de 5 modalidades assistenciais: medicina de grupo, cooperativas médicas, auto-
gestão, seguro-saúde e plano de administração.
Em 1990 o Governo edita as Leis 8.080 e 8.142, conhecidas como Leis Orgânicas da Saúde,
regulamentando o SUS, criado pela Constituição de 1988. A saúde passa a ser definida de uma forma
mais abrangente: “A saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a
alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o
transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais: os níveis de saúde da população
expressam a organização social e econômica do país”.
Os fundamentos legais do SUS estão explicados no texto da Constituição Federal de 1988, nas
estaduais, e nas leis orgânicas dos municípios que seguem os princípios da Lei Magna do País.

3.3 (C.e.7) - CONHECER OS PRINCÍPIOS DOUTRINÁRIOS DO SUS.


Baseado nos preceitos constitucionais a construção do SUS se norteia pelos seguintes princípios
doutrinários:
 UNIVERSALIDADE – É a garantia de atenção à saúde por parte do sistema, a todo e qualquer
cidadão. Com a universalidade, o indivíduo passa a ter direito de acesso a todos os serviços
públicos de saúde, assim como àqueles contratados pelo poder público. Saúde é direito de
cidadania
 EQUIDADE – É assegurar ações e serviços de todos os níveis de acordo com a complexidade
que cada caso requeira, more o cidadão onde morar, sem privilégios e sem barreiras. Todo
cidadão é igual perante o SUS e será atendido conforme suas necessidades até o limite do que
o sistema puder oferecer para todos.
 INTEGRALIDADE - É o reconhecimento na prática dos serviços de que:
• cada pessoa é um todo indivisível e integrante de uma comunidade;
• as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde formam também um todo indivisível e
não podem ser compartimentalizadas;
• as unidades prestadoras de serviço, com seus diversos graus de complexidade, formam
também um todo indivisível configurando um sistema capaz de prestar assistência integral.
Enfim: “O homem é um ser integral, bio-psico-social, e deverá ser atendido com esta visão
integral por um sistema de saúde também integral, voltado a promover, proteger e recuperar sua saúde”.

3.4(C.e.8) - CONHECER OS PRINCÍPIOS QUE REGEM A ORGANIZAÇÃO DO SUS.


Estes são os princípios organizativos do SUS:
REGIONALIZAÇÃO e HIERARQUIZAÇÃO - Os serviços devem ser organizados em níveis de
complexidade tecnológica crescente, dispostos numa área geográfica delimitada e com a definição da
população a ser atendida. Isto implica na capacidade dos serviços em oferecer a uma determinada
população todas as modalidades de assistência, bem como o acesso a todo tipo de tecnologia
disponível, possibilitando um ótimo grau de resolubilidade (solução de seus problemas).
O acesso da população à rede deve se dar através dos serviços de nível primário de atenção
que devem estar qualificados para atender e resolver os principais problemas que demandam os
serviços de saúde. Os demais deverão ser referenciados para os serviços de maior complexidade
tecnológica.
A rede de serviços, organizada de forma hierarquizada e regionalizada, permite um
conhecimento maior dos problemas de saúde da população da área delimitada, favorecendo ações de
vigilância epidemiológica, sanitária, controle de vetores, educação em saúde, além das ações de
atenção ambulatorial e hospitalar em todos os níveis de complexidade.
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RESOLUBILIDADE - É a exigência de que, quando um indivíduo busca o atendimento ou


quando surge um problema de impacto coletivo sobre a saúde, o serviço correspondente esteja
capacitado para enfrentá-lo e resolvê-lo até o nível da sua competência.
DESCENTRALIZAÇÃO - É entendida como uma redistribuição das responsabilidades quanto às
ações e serviços de saúde entre os vários níveis de governo, a partir da idéia de que quanto mais perto
do fato a decisão for tomada, mais chance haverá de acerto. Assim, o que é abrangência de um
município deve ser de responsabilidade do governo municipal; o que abrange um estado ou uma região
estadual deve estar sob responsabilidade do governo estadual, e, o que for de abrangência nacional
será de responsabilidade federal. Deverá haver uma profunda redefinição das atribuições dos vários
níveis de governo com um nítido reforço do poder municipal sobre a saúde – é o que se chama
municipalização da saúde.
Aos municípios cabe, portanto, a maior responsabilidade na promoção das ações de saúde diretamente
voltadas aos seus cidadãos.
PARTICIPAÇÃO DOS CIDADÃOS - É a garantia constitucional de que a população, através de
suas entidades representativas, participará do processo de formulação das políticas de saúde e do
controle da sua execução, em todos os níveis, desde o federal até o local.
Essa participação deve se dar nos Conselhos de Saúde, com representação paritária de
usuários, governo, profissionais de saúde e prestadores de serviço. Outra forma de participação são as
conferências de saúde, periódicas, para definir prioridades e linhas de ação sobre a saúde.
Deve ser também considerado como elemento do processo participativo o dever das instituições
oferecerem as informações e conhecimentos necessários para que a população se posicione sobre as
questões que dizem respeito à sua saúde.
COMPLEMENTARIEDADE DO SETOR PRIVADO - A Constituição definiu que, quando por
insuficiência do setor público, for necessário a contratação de serviços privados, isso deve se dar sob
três condições:
1ª - a celebração de contrato, conforme as normas de direito público, ou seja, interesse público
prevalecendo sobre o particular;
2ª - a instituição privada deverá estar de acordo com os princípios básicos e normas técnicas do
SUS.
Prevalecem, assim, os princípios da universalidade, eqüidade, etc., como se o serviço privado fosse
público, uma vez que, quando contratado, atua em nome deste;
3ª - a integração dos serviços privados deverá se dar na mesma lógica organizativa do SUS, em
termos de posição definida na rede regionalizada e hierarquizada dos serviços. Dessa forma, em cada
região, deverá estar claramente estabelecido, considerando-se os serviços públicos e privados
contratados, quem vai fazer o que, em que nível e em que lugar.
Dentre os serviços privados, devem ter preferência os serviços não lucrativos, conforme
determina a Constituição.
Assim, cada gestor deverá planejar primeiro o setor público e, na seqüência, complementar a
rede assistencial com o setor privado, com os mesmos concertos de regionalização, hierarquização e
universalização.

3.5 (C.e.9) CONHECER AS DIRETRIZES, PRECEITOS, BASES LEGAIS E AS ATRIBUIÇÕES DO


SUS SEGUNDO A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA.
O direito à saúde tem um lugar de destaque na Constituição Federal de 1988, sendo reconhecido
como um direito fundamental da pessoa humana, o que evidencia o seu caráter essencial para a
satisfação dos interesses individuais e coletivos.
A seção II do capítulo II de nossa Constituição apresenta os artigos referentes à saúde que são
os seguintes:
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público
dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser
feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.
Art. 198. . As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e
hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos
serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.

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Parágrafo Único. O Sistema Único de Saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recurso do
orçamento da seguridade social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de
outras fontes.
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
§ 1º - As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde,
segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as
entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos.
§2º - É vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas
com fins lucrativos.
§3º - É vedada a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na assistência à
saúde no País, salvo nos casos previstos em lei.
§4º - A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de órgãos, tecidos e
substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento, bem como a coleta,
processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo o tipo de comercialização.
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
I - controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e
participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros
insumos;
II - executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do
trabalhador;
III - ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde;
IV - participar da formulação da política e da execução das ações de saneamento básico;
V - incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico;
VI - fiscalizar e inspecionar alimentos, compreendido o controle de seu teor nutricional, bem
como bebidas e águas para o consumo humano;
VII - participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de
substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos;
VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

EXERCÍCIOS DE COMPREENSÃO

1 – Qual o papel do SUS na democratização do Direito à Saúde? Qual foi o grande avanço no que diz
respeito ao atendimento propiciado com a criação do SUS?

2 – Determinar juntamente com o monitor aspectos não respeitados de nossa legislação no que tange à
saúde.

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES

3.6 (H.e.3) RELACIONAR AS DIRETRIZES E OS PRINCÍPIOS DO SUS COM OS ASPECTOS


PRÁTICOS VIVIDOS.
FUNDAMENTAÇÃO
Debater os diversos aspectos da saúde pública identificando problemas e soluções para as
deficiências apresentadas.
OBJETIVO
Possibilitar a comparação de diversos pontos de vista: Utilizadores do SUS versus
Consumidores da Saúde Privada. Estabelecer meios de se trabalhar em saúde de maneira eficaz e
satisfatória, tanto na saúde pública como na privada, identificando as falhas no processo de trabalho em
saúde.
PROCEDIMENTO
Faça uma visita a um órgão do SUS observando as práticas Relacione as Diretrizes e os
Princípios do SUS com os aspectos práticos vividos e sentidos pela população que depende da saúde
pública
ATIVIDADES EM GRUPO AUXILIADA PELOS MONITORES
1 - Elaborem questões acerca da qualidade do atendimento no SUS e façam uma entrevista
entre familiares, amigos, profissionais da área, entre outros.
Apresentar a pesquisa popular à sua turma, levantando as falhas no atendimento público em
saúde e seus motivos, além das qualidades apontadas no serviço.
2 – Visitem Unidades Básicas de Saúde (UBS) da cidade e apresentem ao restante da turma o
que pode ser observado apontando as qualidades e deficiências do serviço prestado no local visitado, as
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dificuldades no trabalho em saúde, as atividades existentes, a estrutura física do local, a equipe de


profissionais, entre outros aspectos.

AUTOAVALIAÇÃO

Diante do que foi estudado, faça uma autoavaliação descrevendo o que mais você aprendeu e
as dificuldades que teve.

Referências:

Cohn, Amélia e Elias, Paulo E. Saúde no Brasil: política e organização de serviços. São Paulo,
Cortez/ CEDEC, 1996.

Vasconcelos, C. M., Pasche, D. F., O Sistema Único de Saúde. In: Tratado de Saúde coletiva, Rio de
Janeiro, Ed. Fiocruz,2006, pag 531 – 562.

Ministério da Saúde Secretaria Nacional de Assistência à Saúde. ABC DO SUS - DOUTRINAS E


PRINCÍPIOS. Brasília/DF: 1990.

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CAPÍTULO 4

COMPETÊNCIAS E HABILIDADES A SEREM TRABALHADAS


COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS HABILIDADES ESSENCIAIS
Reconhecer fatores condicionantes de saúde nos Discutir idéias acerca das condições
diversos ambientes. ambientais e o processo de trabalho
Conhecer o meio ambiente do trabalho. saúde.

4.1 (C.e.10) RECONHECER FATORES CONDICIONANTES DE SAÚDE NOS DIVERSOS AMBIENTES

Sempre que ouvimos ou lemos a expressão Meio Ambiente nos vêm à mente imagens da
floresta amazônica ou do oceano, de espécies em risco de extinção, de fábricas poluidoras. Mas não
mudaria sua forma de pensar o mundo que o cerca se você soubesse que no momento que lê este artigo
(sentado em frente ao computador no seu quarto, no escritório, na faculdade) você está inserido em um
meio ambiente?
Esta idéia de meio ambiente como sinônimo de natureza é apenas um dos aspectos do Meio
Ambiente, hoje definido como meio ambiente natural. O chamado meio ambiente natural, ou físico,
engloba ar, água, solo, subsolo, flora e fauna. Talvez seja o primeiro do qual nos recordamos por sua
condição primordial: a ausência de preservação ou de utilização racional dos recursos ambientais de
nosso planeta pode trazer conseqüências catastróficas. Cenário antes apenas imaginado em filmes
futuristas de gosto duvidoso, com a Terra transformada em um imenso deserto e pessoas travando lutas
mortais pelas fontes de água, agora se tornaram preocupação patente para a Organização das Nações
Unidas (ONU) com a diminuição dos níveis de água potável, através da ocupação das áreas de
mananciais e da poluição dos reservatórios existentes. A consciência ambiental e o controle
governamental aliados ao apoio da população podem, todavia, adiar ou mesmo contornar este e outros
reveses sofridos por nossos rios, matas, fauna etc.
Ao lado do meio ambiente natural, temos o meio ambiente construído, ou artificial, aquele produzido pela
ação do homem ao transformar a natureza: as cidades. Há cidades que nos parecem limpas,
arborizadas, bonitas, pois tiveram seu crescimento planejado, e outras, que ao crescerem
desordenadamente, levam-nos a pensar que seus prédios se acotovelam por uma beira na calçada. A
planejada ocupação do solo urbano, determinando as limitações ao direito de construir, informa como a
cidade irá crescer e para onde, como fluirá o trânsito, onde estarão localizadas as áreas verdes para o
lazer tão necessário aos seus habitantes. Um meio ambiente construído sadio contribui para o bem estar
da população que ali vive; e, ao contrário, um meio ambiente artificial hostil gera não apenas sensação
de angústia em seus habitantes como também termina por levar ao abandono e descaso e, não raras
vezes, à agressão para com o espaço público.
O patrimônio cultural de um povo constitui-se em seu meio ambiente cultural e este conceito
engloba, segundo definição da própria Constituição da República Federativa do Brasil, o que faz
“referência à identidade, à ação e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira,
nos quais se incluem: as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas,
artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às
manifestações artístico-culturais; e, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico,
artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.” A preservação e valoração da cultura de
um povo implicam, em última instância na preservação e valoração deste próprio povo.
E por último, temos o meio ambiente do trabalho. A expressão se refere ao local onde as
pessoas exercem suas atividades laborais. O meio ambiente de trabalho envolve as instalações físicas
do local (ventilação, iluminação natural ou artificial, ruídos, móveis, maquinário etc.), que devem oferecer
um ambiente saudável para a prestação do serviço, bem como deve ser minimizada a possibilidade de
contato com qualquer agente químico ou biológico que traga riscos à saúde do trabalhador. Um meio
ambiente de trabalho sadio proporciona a manutenção da saúde do trabalhador, por sua vez, um meio
ambiente de trabalho agressivo leva ao surgimento de doenças profissionais e, conseqüente, perda da
capacidade laborativa deste trabalhador.

4.2 (C.e.11) CONHECER O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO


É definido como o conjunto de condições necessárias a se conseguir desenvolver atividades que
demandem esforço humano de qualquer natureza, sendo que tais condições devem ter como escopo o
desenvolvimento da obra com menores efeitos negativos à saúde mental e física do obreiro.

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A manutenção de um bom meio ambiente do trabalho deve se dar como colaboração de todos os
indivíduos envolvidos na realização da tarefa, portanto, a responsabilidade de sua boa realização é dada
tanto aos empregadores quanto aos empregados.
O problema está em determinar até que ponto a responsabilidade está em um, em outro ou ao mesmo
tempo nos pólos da relação.
Para solucionarmos este questionamento devemos sempre buscar a resposta em um sentimento de
justiça que garanta sempre um bom amparo para a parte mais fraca da relação.
Ao analisarmos as definições de empregado e empregador, fica claro que as atribuições de mando e
gestão da atividade desempenhada ficam a cargo do empregador, portanto, caberá a este o máximo de
zelo no desempenho desta.
Quanto maior o grau de responsabilidade tanto maior será a possibilidade de errar, e quem erra deve
tentar reverter o erro ou ao menos minorar seus efeitos maléficos.
Um exemplo corriqueiro é o dos funcionários de minas subterrâneas, estes quando no subsolo ficam a
mercê das informações que são passadas por outros funcionários especialmente contratados para zelar
pela vida dos mineiros. Pois bem, caso um destes errar em um cálculo ou informação e ocasionar
alguma lesão nos demais empregados à responsabilidade na desordem do meio ambiente do trabalho
será dada ao empregador que escolheu mal seus prepostos.
No que tange à saúde, o empregador astuto e em alguns casos obrigado pela lei, contrata o bom
trabalho de um profissional habilitado, mas a exigência legal de quantidade de profissionais está bem
longe de ser ao menos plausível.
Quanto ao empregado este tem o dever legal de colaborar com a boa manutenção do salutar ambiente
de trabalho, contudo, suas atribuições são minoradas, deve-se este fato ao princípio de que este é a
parte mais fraca, o elo fraco.
No Brasil, apesar dos brados contrários este princípio é e continuará sendo necessário por longos anos
já que contamos com uma classe de operários subnutridos, analfabetos e expostos por anos, ao mais
amplo desmando de uma minoria rica e dominadora.
Assim, o profissional da saúde irá enfrentar as necessidades de uma população de empregados todos
carentes de saúde e informações. Além disso, ele também será um trabalhador, a se deparar muitas
vezes com um ambiente de trabalho inadequado, mas com a responsabilidade e a função de intervir
sobre ele em prol de sua própria saúde e da saúde dos usuários de seus serviços.

EXERCÍCIOS DE COMPREENSÃO
1 – Defina meio ambiente.
2 – Qual o papel do profissional de saúde no equilíbrio do meio ambiente do trabalho.

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES

4.3 (H.e.4) DISCUTIR IDÉIAS ACERCA DAS CONDIÇÕES AMBIENTAIS E O PROCESSO DE


TRABALHO SAÚDE.
FUNDAMENTAÇÃO
Instigar os envolvidos a definirem seu papel, como sujeitos ativos, na formação do meio ambiente
de trabalho da saúde.
OBJETIVO
Demonstrar a cota de responsabilidade de todos quando se trata de meio ambiente de trabalho
ATIVIDADE
Discutir as forma possíveis de se tentar equilibrar o ambiente de trabalho apontando atitudes que
levem a um ambiente de trabalho saudável.
PROCEDIMENTO
Apresente em sala de aula atitudes do profissional em saúde que levem ao equilíbrio do meio
ambiente de trabalho como um meio de ambiente saudável.

AUTOAVALIAÇÃO
Faça uma autoavaliação sobre o que você aprendeu e/ou o que apresentou dificuldades com
relação ao capítulo.

Referências:
- Tesch, Nilson, Segurança no Trabalho. 1ª ed. São Paulo, SP, EDIOURO, 1979.
- Kupstas, Márcio (org), Trabalho em Debate. 2ª Ed. São Paulo, SP, MODERNA, 1997.
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CAPÍTULO 5

COMPETÊNCIAS E HABILIDADES A SEREM TRABALHADAS


COMPETÊNCIAS ESSENCIAIS HABILIDADES ESSENCIAIS
Conhecer sobre Humanização. Identificar a importância da Humanização
Conhecer sobre Humanização no trabalho em saúde. no trabalho em saúde.
5.1 (c.e.12) CONHECER SOBRE HUMANIZAÇÃO
Para se entender humanização, torna-se necessário o entendimento sobre o que é o ser
humano. O humano é o efeito da combinação de três elementos: a materialidade do corpo, a imagem
do corpo e a palavra que se inscreve no corpo. O que diferencia o ser humano da natureza e dos
animais é que seu corpo biológico é capturado desde o início numa rede de imagens e palavras,
apresentadas primeiro pela mãe, depois pelos familiares e em seguida pelo social. É esse banho de
imagem e de linguagem que vai moldando o desenvolvimento do corpo biológico, transformando-o num
ser humano, com um estilo de funcionamento e modo de ser singulares.
O fato de sermos dotados de linguagem torna possível para nós a construção de redes de
significados, que compartilhamos em maior ou menor medida com nossos semelhantes e que nos dão
uma certa identidade cultural. Em função da dinâmica de combinação desses três elementos, somos
capazes de transformar imagens em obras de arte, palavras em poesia e literatura e sons em fala e
música, ignorância em saber e ciência. Somos capazes de produzir cultura e a partir dela, intervir e
modificar a natureza. Por exemplo, transformando doença em saúde.
Entretanto, acontece que a palavra pode fracassar e onde a palavra fracassa somos capazes
também das maiores barbaridades. A destrutividade faz parte do humano e a história testemunha a que
ponto somos capazes de chegar. Passamos a utilizar tudo quanto sabemos em nome de destruir aos
humanos que consideramos diferentes de nós e por isso mesmo achamos que constituem uma
ameaça a ser eliminada. Essa destrutividade pode se manifestar em muitos níveis e intensidades, indo
desde um não olhar no rosto e dar bom dia, até o ato de violência mais cruel e mortífero.
Então, o que é humanizar? Entendido assim, humanizar é garantir à palavra a sua dignidade
ética. Ou seja, o sofrimento humano, as percepções de dor ou de prazer no corpo, para serem
humanizadas, precisam tanto que as palavras com que o sujeito as expressa sejam reconhecidas pelo
outro, quanto esse sujeito precisa ouvir do outro palavras de seu reconhecimento. Pela linguagem
fazemos as descobertas de meios pessoais de comunicação com o outro, sem o que nos
desumanizamos reciprocamente.
Isto é, sem comunicação não há humanização. A humanização depende de nossa capacidade
de falar e ouvir, pois as coisas do mundo só se tornam humanas quando passam pelo diálogo com
nossos semelhantes. O compromisso com a pessoa que sofre, por exemplo, pode ter basicamente três,
ou quatro, tipos de motivação. Pode resultar do sentimento de compaixão piedosa por quem sofre, ou
da idéia de que assim contribuímos para o bem comum e para o bem-estar em geral. Pode resultar
também da paixão pela investigação científica, que se funda sobre o ideal de uma pura “objetividade”,
com a exclusão de tudo quanto lembre a subjetividade. Um quarto tipo de motivação de compromisso
pode resultar da solidariedade genuína.
Concluindo, a humanização é um processo de construção gradual, realizada através do
compartilhamento de conhecimentos e de sentimentos. No trabalho, humanizar é acolher esta
necessidade de resgate e articulação de aspectos indissociáveis: o sentimento e o conhecimento. Mais
do que isso, é adotar uma prática na qual o profissional encontre a possibilidade de assumir uma
posição ética de respeito ao outro, de acolhimento do desconhecido, do imprevisível, do incontrolável,
do diferente e singular, reconhecendo os seus limites. A possuir uma pré-disposição para a abertura e
o respeito ao próximo como um ser independente e digno.

5.2 (C.e.13) - CONHECER SOBRE HUMANIZAÇÃO NO TRABALHO EM SAÚDE.


O termo “humanização” vem sendo utilizado com freqüência no âmbito da saúde. As iniciativas
identificadas com a humanização do parto e com o respeito aos direitos reprodutivos das mulheres
vêm, há décadas, participando da pauta dos movimentos feministas em saúde. Por sua vez, a
humanização da assistência a crianças faz parte de um escopo mais direcionado ao atendimento de
bebês de baixo peso, internados em UTI. Alguns modelos de assistência pautados por tal princípio, tais
como os projetos Maternidade Segura e o Método Canguru, são amplamente apoiados pelo Ministério
da Saúde e pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 1996) e considerados referência para a rede
pública.
A legitimidade da temática ganha novo status quando, em maio de 2000, o Ministério de Saúde
regulamenta o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH) e a
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humanização é também incluída na pauta da 11a Conferência Nacional de Saúde, realizada em


dezembro do mesmo ano. O PNHAH constitui uma política ministerial bastante singular se comparada
a outras do setor, pois se destina promover uma nova cultura de atendimento à saúde (MS, 2000) no
Brasil. O objetivo fundamental do PNHAH seria o de aprimorar as relações entre profissionais, entre
usuários/profissionais (campo das interações face-a-face) e entre hospital e comunidade (campo das
interações sócio-comunitárias), visando à melhoria da qualidade e à eficácia dos serviços prestados por
estas instituições (MS, 2000). Atualmente o Programa foi substituído por uma perspectiva transversal,
constituindo uma política de assistência e não mais um programa específico (provisoriamente intitulada
“Humaniza SUS”).
Embora constitua o alicerce de um amplo conjunto de iniciativas, o conceito de “humanização
da assistência” ainda carece de uma definição mais clara, conformando-se mais como uma diretriz de
trabalho, um movimento de parcela dos profissionais e gestores, do que um aporte teórico-prático. O
que designa humanizar? Subentende-se que a prática em saúde era (des) humanizada ou não era feita
por e para humanos? Tais provocações não raro ainda são feitas, revelando o estranhamento que o
conceito propicia. Geralmente emprega-se a noção de “humanização” para a forma de assistência que
valorize a qualidade do cuidado do ponto de vista técnico, associada ao reconhecimento dos direitos do
paciente, de sua subjetividade e referências culturais. Implica ainda a valorização do profissional e do
diálogo intra e inter equipes.
Esse conjunto de iniciativas dá voz a demandas antigas na saúde: a) pela democratização das
relações que envolvem o atendimento (Carapinheiro, 1993; Svenson, 1996); b) por maior diálogo e
melhoria da comunicação entre profissional de saúde e paciente (Adam e Herzlich, 1994; Ong et al.,
1995; Caprara e Franco, 1999); c) pelo reconhecimento das expectativas dos próprios profissionais e
as dos pacientes, como sujeitos do processo terapêutico (Laplantine, 1991; Helman, 1994; Pitta, 1994;
Silva, 1994).
Como ainda não são consensuais os contornos teóricos e mesmo operacionais do que se
convencionou designar como humanização, sua abrangência e aplicabilidade não estão inteiramente
demarcadas. Considerando a organização e estrutura física das instituições de saúde da rede pública,
a formação biomédica, as relações de trabalho e sua lógica de produção, e a política pública de saúde
do SUS que, apesar dos avanços acumulados, hoje, ainda enfrenta problemas como a fragmentação
do processo de trabalho e das relações entre os diferentes profissionais, fragmentação da rede
assistencial, precária interação nas equipes, burocratização e verticalização do sistema, baixo
investimento na qualificação dos trabalhadores, formação dos profissionais de saúde distante do
debate e da formulação da política pública de saúde, entre outros aspectos tão ou mais importantes do
que os citados aqui, resultantes de ações consideradas desumanizadas na relação com os usuários do
serviço público de saúde, haveria espaço para mudanças estruturais e para a implementação de novos
conceitos e práticas, voltados para a humanização da assistência?
A reflexão sobre a humanização deve considerar a valorização dos diferentes sujeitos
implicados no processo de produção de saúde: usuários, trabalhadores e gestores; fomento da
autonomia e do protagonismo desses sujeitos; aumento do grau de co-responsabilidade na produção
de saúde; estabelecimento de vínculos solidários e de participação coletiva no processo de gestão;
identificação das necessidades sociais de saúde; mudança nos modelos de atenção e gestão dos
processos de trabalho, tendo como foco as necessidades dos cidadãos e a produção de saúde.
Se considerarmos positivamente, esse movimento pode ganhar contornos de uma nova
“práxis” para a assistência. Então podemos dizer que aí se constitui um novo campo de possibilidades:
tanto para o aumento da qualidade da assistência quanto para uma nova ordem relacional, pautada no
reconhecimento da alteridade e no diálogo. Ponderamos, portanto, que a fundamentação teórico-
prática neste campo necessita, ainda, de exploração e investimento.
Leitura do texto complementar:

HUMANIZAÇÃO, RELACIONAMENTO INTERPESSOAL E ÉTICA.


Wellington Soares da Costa
RESUMO
Este artigo propõe-se a análise de três temas referentes à Administração: 1) humanização; 2)
relacionamento interpessoal; 3) ética. Utilizou-se a pesquisa bibliográfica e o objetivo é demonstrar a
necessidade dessa discussão para que a dignidade das pessoas seja respeitada.
1. INTRODUÇÃO
Tem-se falado em humanização no ambiente de trabalho. Mas o que é humanização e para
que serve?
Humanizar significa respeitar o trabalhador enquanto pessoa, enquanto ser humano. Significa
valorizá-lo em razão da dignidade que lhe é intrínseca. Isso apresenta vários desdobramentos. Por
exemplo, o relacionamento interpessoal, necessidade social, conforme MASLOW (2000), ou fator
higiênico, segundo a teoria herzbergiana – deve se pautar pelo diálogo, sem o qual as relações entre
os indivíduos resvala para conflitos vários. A dignidade jamais deve ser esquecida ou colocada em
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segundo plano. A prática da humanização deve ser observada ininterruptamente. O comportamento


ético deve ser o princípio de vida da organização, uma vez que ser ético é preocupar-se com a
felicidade pessoal e coletiva.
Numa sociedade em que, em geral, valores ético-morais são vilipendiados, é urgente a
necessidade de se humanizarem as organizações. Estas não devem perder de vista a razão maior
graças à qual se dá a sua criação: a promoção humana em todos e quaisquer aspectos (não somente
os econômico-financeiros e tecno-científicos), até mesmo, e principalmente, sob a ótica coletiva.

2. HUMANIZAÇÃO
O desenvolvimento científico-tecnológico tem levado muitas organizações a buscar de forma
desenfreada o lucro econômico-financeiro à custa da necessária valorização real do homem,
notadamente dos indivíduos que nelas trabalham. Paradoxalmente, até mesmo organizações cujo lucro
visado não é econômico-financeiro resvalam para isso.
A cultura predominante nessas instituições caracteriza-se por considerar as pessoas meros
recursos que devem contribuir para o alcance dos objetivos organizacionais. Relegam a abordagem
sistêmica, que estuda o homem como uma totalidade e não apenas como profissional cuja vida deveria
se restringir ao ambiente de trabalho. O relacionamento interpessoal saudável, por exemplo, às vezes
não encontra guarida no âmbito organizacional, gerando os mais diversos conflitos e, portanto,
“desumanizando” as organizações. A desconsideração dos valores humanos e da ética também são
exemplos de realidades “desumanizadoras”.
ROMÃO (2002) registra: Mas, o pior de tudo isso [o autor faz referência à reengenharia, à
terceirização e à globalização como modismos, dentre outros que ele relaciona] foi o fruto gerado: a
desvalorização do ser humano, que participou desses processos, tentando ajudar sua empresa, e hoje
é descartado, como se somente números pudessem indicar lucros, e ótimos resultados fossem o
melhor diagnóstico de um negócio. Hoje temos que nos preparar para viver a era emocional, onde a
empresa tem de mostrar ao colaborador que ele é necessário como profissional, e antes de qualquer
coisa que é um ser humano com capacidades que agregadas à produção da empresa, formarão uma 4
Efetiva é a organização que, além de eficaz, agrega valores à sua atuação. Equipe coesa em que o
maior beneficiado será ele mesmo com melhoria em sua qualidade de vida, relacionamentos com os
pares e, principalmente, o cliente que sentirá isso quando adquirir o produto ou serviço da empresa
gerando a fidelização que tanto se busca. O melhor negócio de uma organização ainda se chama
gente, e ver gente integrada na organização como matéria-prima principal também é lucro, além de ser
um fator primordial na geração de resultados.
MORGAN (1996: 142) diz que “a natureza verdadeiramente humana das organizações é a
necessidade de construí-la em função das pessoas e não das técnicas”.
O PAPA JOÃO PAULO II apud MASLOW (2000: 61) assevera que: O propósito da empresa
não é simplesmente lucrar, mas ser vista em sua base como uma comunidade de pessoas que, de
várias formas, estão se esforçando para satisfazer suas necessidades básicas e que formam um grupo
particular no serviço de toda a sociedade. O lucro é um regulador da vida de um negócio, mas não é o
único regulador; outros fatores, humanos e morais, também devem ser considerados, pois, a longo
prazo, serão igualmente importantes para a vida do negócio.
A empresa humanizada, consoante VERGARA e BRANCO (2001: 20), é: [...] aquela que [...]
agrega outros valores que não somente a maximização do retorno para os acionistas. Nesse sentido,
são mencionadas empresas que, no âmbito interno, promovem a melhoria na qualidade de vida e de
trabalho, visando à construção de relações mais democráticas e justas, mitigam as desigualdades e
diferenças de raça, sexo ou credo [e não apenas em tais aspectos], além de contribuírem para o
desenvolvimento e crescimento das pessoas.
Discutir a humanização no ambiente de trabalho é impostergável, e a efetiva vivência num
ambiente organizacional cujos valores maiores incluam a humanização trará grandes benefícios para
os indivíduos, às organizações e a sociedade em geral.

3. RELACIONAMENTO INTERPESSOAL
As relações interpessoais tiveram como um de seus primeiros pesquisadores o psicólogo Kurt
Lewin. MAILHIOT (1976: 66), ao se referir a uma das pesquisas realizadas por esse psicólogo, afirma
que ele chegou à constatação de que “A produtividade de um grupo e sua eficiência estão
estreitamente relacionadas não somente com a Humanização, relacionamento interpessoal e ética
Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 11, nº 1, p. 17-21, janeiro/março 2004 19
competência de seus membros, mas sobretudo com a solidariedade de suas relações interpessoais”.
Schutz, um outro psicólogo, trata de uma teoria das necessidades interpessoais: necessidade
de ser aceito pelo grupo, necessidade de responsabilizar-se pela existência e manutenção do grupo,
necessidade de ser valorizado pelo grupo. Tais necessidades formam a tríade de que fala MAILHIOT
(1976: 67), quando este faz referência aos estudos de Schutz: necessidades de inclusão, controle e
afeição, respectivamente.

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Ao discorrer acerca da humanização no ambiente de trabalho, COSTA (2002: 21) aponta as


relações interpessoais como um dos elementos que contribuem para a formação do relacionamento
real na organização:
É mister observar a operação real da organização, aqui incluídas as relações interpessoais,
que constituem a sua seiva vital. Os elementos formais (estrutura administrativa) e informais
(relacionamento humano, que emerge das experiências do dia-a-dia) integram-se para produzir o
padrão real de relacionamento humano na organização: como o trabalho é verdadeiramente executado
e quais as regras comportamentais implícitas que governam os contatos entre as pessoas – esta é a
estrutura de contatos e comunicações humanas a partir da qual os problemas de política de pessoal e
de tomada de decisões podem ser compreendidos e tratados pelos administradores.
Os autores são unânimes em reconhecer a grande importância do tema “relações
interpessoais” tanto para os indivíduos quanto para as organizações, relativamente à produtividade,
qualidade de vida no trabalho e efeito sistêmico.

4. ÉTICA
Evidencia-se a necessidade de serem observados pelas organizações os atuais anseios da
sociedade por uma atuação ética. Tal necessidade requer a conscientização de todos sobre a
importância da ética na atualidade. Assim, o tema “ética” faz-se. Citam-se: KANAANE (1995: 47),
HAMPTON (1990: 106 e 119), GLINA e ROCHA (2000: 59), CORREIA (2000: 16), BÓCCIA (1997: 204)
e COSTA (2002: 20). 6 Podem ser citados os seguintes autores: VIVAN, MIRANDA e MORO (1999: 4)
e ISHIKAWA apud VIVAN, MIRANDA & MORO (1999: 4). Citam-se: HAMPTON (1990: 111) e CAPRA
(1982: 260). imprescindível na pauta das discussões, porque, dentre as necessidades do homem
contemporâneo, a necessidade ética desponta como uma das mais prementes.
A intrincada teia de relacionamentos integra a vida do ser humano, tornando inafastável a
necessidade da discussão sobre ética, porque “A dimensão ética começa quando entra em cena o
outro. Toda lei, moral ou jurídica, regula relações interpessoais, inclusive aquelas com um Outro que a
impõe.” (ECO, 2002: 9).
Consoante ZOBOLI (2002: 8): “[...] uma vez que a empresa, enquanto uma organização social
deve dar conta de funções que a sociedade dela espera e exige assumindo suas responsabilidades
neste âmbito, ela está obrigada a tomar decisões com implicações éticas”. Daí ser possível afirmar que
“a empresa que busca somente os resultados ou as vantagens imediatas é suicida, a responsabilidade
a largo prazo é uma necessidade de sobrevivência e neste aspecto a ética constitui um fator importante
para os ganhos. Por si só, a ética não é condição para um bom negócio, mas o propicia.” (ZOBOLI,
2002: 8)
A sociedade atual exige das empresas um comportamento ético – a esse propósito cita-se a
conscientização dos consumidores sobre a necessidade de defesa de seus direitos.
CARAVANTES (2002: 71) afirma:
[...] a economia de mercado e o sistema econômico em que vivemos como que alijaram valores
fundamentais ao convívio social: o bom cedeu lugar ao útil; o correto, ao funcional; o futuro, ao
imediatismo; e o social, ao individualismo exacerbado. Nesse contexto, há uma verdadeira inversão
valorativa [...]. Antes que alguma mudança venha a ocorrer, há que se repensar valores e atitudes hoje
prevalentes, permitindo que o útil venha a se subordinar ao bom; a especulação desenfreada ao
trabalho honesto e sério; o personalismo ao social; a racionalidade funcional à substantiva.
Destaca-se a Carta de Princípios do Dirigente Cristão de Empresa CE/UNIAPAC BRASIL, da
Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa do Brasil, cujos seguintes princípios, entre outros,
merecem ser transcritos:
14 - Embora o desejo de lucro permaneça o estímulo da atividade econômica, o dirigente de
empresa não tem direito de sobrepô-lo ao dever de servir a sociedade a que pertence. [...]
33 - O homem é o centro da vida econômica; negligenciá-lo será ofender a dignidade humana e
votar a empresa ao malogro. [...]
34 - Tal como as técnicas nela utilizadas estão ordenadas aos fins da empresa, assim os fins
da empresa estão subordinados ao homem. (ASSOCIAÇÃO DE DIRIGENTES CRISTÃOS DE
EMPRESA DO BRASIL, 2002)

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise da humanização, da ética e do relacionamento interpessoal permite perceber
facilmente os pontos de contato entre esses temas e a necessidade imperiosa de ser respeitada
ininterruptamente a dignidade de todas as pessoas, incluindo-se os trabalhadores, dos quais sempre é
exigido alto grau de produtividade sem que, em contrapartida, se dispense a eles um tratamento
adequado. É preciso lembrar que uma das maiores exigências sociais na atualidade, no campo dos
negócios públicos e privados, é a vivência irrestrita de valores não hedonistas, voltados para o bem
estar da coletividade e que têm o ser humano como a maior e incalculável riqueza de uma sociedade.

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As implicações daí decorrentes devem ser profundas na escala de valores individuais,


organizacionais e sociais, de sorte que a cidadania no âmbito das organizações não seja vilipendiada,
mas preservada, estimulada e promovida.

EXERCÍCIOS DE COMPREENSÃO
1 – Organizar grupos e realizar um debate juntamente com os monitores e colegas do grupo
sobre a leitura complementar sugerida (“Humanização, relacionamento interpessoal e ética”).
2 – Relacione a Humanização no ambiente de trabalho com o trabalho em saúde apontando atitudes
que levam à uma assistência humanizada.

PRÁTICA AUXILIADA PELOS MONITORES


5.3 (H.e.5) - RECONHECER A IMPORTÂNCIA DA HUMANIZAÇÃO NO TRABALHO EM SAÚDE
FUNDAMENTAÇÃO
Estabelecer o papel dos profissionais em saúde na humanização do atendimento.
OBJETIVO
Demonstrar a cota de responsabilidade do profissional quando se trata de humanizar o trabalho
em saúde.
PROCEDIMENTO
Discutir em grupo com o auxílio dos monitores as forma possíveis de se promover um ambiente
e um atendimento humanizado. Levantar atitudes humanitárias no trabalho em saúde e ações que vão
contra o ato de humanizar o atendimento. Apresentar ao restante da turma o que foi debatido.

AUTOAVALIAÇÃO

Escreva em seu caderno de autoavaliação o que você aprendeu e o que apresentou


dificuldades diante desse capitulo.

Referências:

COSTA W. S. Humanização, relacionamento interpessoal e ética. Caderno de. Pesquisas em


Administração, São Paulo, v. 10, n. 4, p. 17-21, out- dez 2003

Oliveira BRG, Collet N, Viera CS. A humanização na assistência à saúde. Rev Latino-am
Enfermagem 2006 março-abril; 14(2):277-84.

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