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SAÚDE: AUSÊNCIA DE ENFERMIDADE?

Já vimos que as concepções de saúde e doença variaram conforme o meio social


e o período histórico.
E para você, qual é a sua definição de saúde?
Para auxiliar nessa definição, vamos retomar alguns aspectos concer- nentes à
saúde.
Há muitos anos atrás a saúde estava relacionada a um estado de harmonia,
do sujeito com a sua visão de mundo, com a natureza e com o mundo espiritual
e que por vezes, o xamã era procurado para ajudar o sujeito a resgatar essa
harmonia (cf. Montal, 1986; Barros, 2008).
Na Grécia Antiga, inicialmente, tanto a saúde como a doença estavam sob a
responsabilidade e vontades dos deuses gregos (Pessoti, 1994). Mesmo saben-
do utilizar plantas e métodos naturais para obtenção da cura, os gregos antigos
também cultuavam três divindades: Asclépio, divindade da medicina, e suas
filhas: Higieia (também chamada de Higiia ou Higeia) relacionada à saúde e
práticas higiênicas e Panacea, a cura (cf. Scliar, 2007).

Imagem retirada: http://pt.wikipedia.org/wiki/Caduceu (03/05/2015)


Somente com Hipócrates que a saúde e doença passaram a ser dissociadas
da vontade dos deuses e começaram a ser entendidas como uma questão de
(des)equilíbrio orgânico, resultante do sistema de humores do sujeito e o am-
biente externo (cf. Pessoti, 1994). Foi com ele que houve a valorização da obser-
vação empírica do processo saúde-doença: os sintomas do doente e fatores do
ambiente (cf. Scliar, 2007).
Na Idade Média europeia, a ideia de saúde foi influenciada por concepções
religiosas e a doença foi vista como forma de punição divina ou ações demoní-
acas (cf. Pessoti, 1994).
Entre os séculos XIV e XV, a Europa assistiu à emer- gência do movimento
Renascentista, cujos ideais de antropocentrismo e racio-nalismo favoreceram o
configuração do movimento Iluminista do século XVII.
No século XVI, houve uma mudança na concepção das formas de cura.
Paracelso (1493-1541) defendeu a ideia de que a doença era oriunda de agentes
externos ao organismo. Entendendo que os processos orgânicos eram proces-
sos químicos, Paracelso concluiu que a saúde deveria ser recobrada por meio
de remédios químicos, e passou a ministrar pequenas doses de minerais e me-
tais aos doentes (Scliar, 2007).
Com o movimento Iluminista vimos o desenvolvimento da ciência. No sé-
culo XVII foi desenvolvido o microscópio e no final do século XIX ocorreu a
“revolução pasteuriana” com a identificação de microrganismos causadores
de doenças e a introdução de soros e vacinas. “Era uma revolução porque, pela
primeira vez, fatores etiológicos até então desconhecidos estavam sendo iden-
tificados; doenças agora poderiam ser prevenidas e curadas” (Scliar, 2007: 34).
Em fins do século XVIII e início do XIX, François Xavier Bichat (1771-1802)
formulou a definição de saúde como “silêncio dos órgãos” (Scliar, 2007: 34).
Tal ideia foi retomada em meados do século XX por Georges Canguilhem:
“Achamos, assim como Leriche, que a saúde é a vida no silêncio dos órgãos
[...]” (Canguilhem, 2000: 90). Podemos depreender, nesse caso, que, quando
sentimos alguma dor ou sentimos que algo não está bem em nosso organismo,
nosso corpo está tentando nos “dizer” que há algo errado e assim nos identifi-
camos com o estado de doença.

O paradigma bioenergético

Até agora vimos concepções de saúde relacionadas às ideias de ausência dos


sintomas de enfermidade física e de combate às doenças. Contudo, se nos vol-
tarmos para algumas visões de mundo orientais, veremos que saúde pode estar
relacionada a um “paradigma1 bioenergético” (Luz, 1995).
Esse paradigma bioenergético oriental está assentado na compreensão de que
a vida, e consequentemente a saúde, está atrelada ao fluxo de energias sutis.
Na Índia essa energia é denominada prana, na China, chi e no Japão ki. Essa
noção de energia sutil, por sua vez, levará a concepção de doença como um de-
sequilíbrio ou bloqueio energético e influenciará na elaboração das teorias e
dos tratamentos de medicinas orientais, como a medicina tradicional indiana
(ayurveda) e a medicina tradicional chinesa (cf. Luz, 1995, 2012, Miwa, 2012).

Se você tiver interesse em saber um pouquinho mais sobre a medicina tradicional indiana
(ayurveda) e a medicina tradicional chinesa (MTC), você pode acessar os seguintes vídeos:
Ayurveda: https://www.youtube.com/watch?v=ao-0zpTW3g0
MTC: https://www.youtube.com/watch?v=1Sim-rTsyio

1 Paradigma: “modelo, padrão” (Ferreira, 1997: 1265).


O que é normal e o que é patológico?

Você se recorda que os conceitos de saúde e doença dependem do contexto so-


ciocultural para serem definidos. Cada sociedade estipula as concepções sobre
o que é um organismo “normal” e o que é um organismo “patológico”. Entre-
tanto, George Canguilhem (2000) questiona a objetividade desses conceitos.
Para ele, a doença, antes de ser diagnosticada pelo médico, passa pela experi-
ência subjetiva do sujeito. A doença não seria apenas uma ausência de norma.

Portanto, se o normal não tem a rigidez de um determinativo para todos os indivídu-


os da mesma espécie e sim a flexibilidade de uma norma que se transforma em sua
relação com condições individuais, é claro, que o limite entre o normal e o patológico
torna-se impreciso. [...] Aquilo que é normal, apesar de ser normativo em determinadas
condições, pode se tornar patológico em outra situação, se permanecer inalterado. O
indivíduo é que avalia essa transformação porque é ele que sofre suas consequências, no
próprio momento em que se sente incapaz de realizar as tarefas que a nova situação lhe
impõe. (Canguilhem, 2000: 145)

A doença não seria a ausência de qualquer norma, pois a doença ainda é


uma norma de vida “que não tolera nenhum desvio das condições em que é
válida, por ser incapaz de se transformar em outra norma” (Caguilhem, 2000:
146). A saúde, no caso, não seria um simples estado “normal”, mas a capaci-
dade de “admitir uma mudança para novas normas” (idem: 188) e a cura seria
uma forma de retornar à estabilidade fisiológica (idem: 188). “Curar é criar para
si novas normas de vida, às vezes superiores às antigas” (idem: 188).

Você sabia que “ser doente” nem sempre é visto como algo ruim?
Segundo Phillipe Adam e Claudine Herzlich (2001): “O doente viverá a doença como
‘destrutiva’ se, a partir da interrupção da atividade provocada pela mesma, que se
acompanha tanto da destruição dos laços com os outros como de perdas diversas em
suas capacidades e em seus papeis, ele não conseguir visualizar nenhuma pos-
sibilidade de reconstruir sua identidade, dependente inteiramente da integração so-
cial. [...] Ao contrário, a doença é vivida como ‘libertadora’ se quando ela é entendi-
da como possiblidade de fuga de um papel social repressor de sua individualidade.
Neste caso, a doença, longe de representar somente uma série de destruições, permite
reencontrar o ‘verdadeiro sentido da vida’. Ela oferece a possibilidade de uma revela-
ção, ou mesmo uma superação de si.” (p. 78)
Para os românticos do século XVIII a tuberculose era algo desejável: “era um índice de ser
distinto, delicado, sensível”, “sinal de distinção de uma origem nobre”, “simbolizava uma
vulnerabilidade atraente, uma sensibilidade superior” (Sontag, 2007: 30-31).

Quando a questão da saúde está relacionada à deficiência física, é impor-


tante distinguir o conceito de “disfunção” e “incapacidade”. Segundo Helman
(2009), disfunção seria o “corpo que não possui parte de um membro ou todo
ele, ou tem um membro ou algum outro mecanismo corporal defeituoso” (p.
41); Já o corpo incapacitado “se refere às muitas desvantagens sociais e outras
impostas pela sociedade às pessoas com restrições físicas” (p. 41). Um corpo
incapacitado não significa um corpo doente, contudo o estigma associado à in-
capacidade pode acarretar desvantagens sociais ao sujeito considerado incapa-
citado (cf. Helman, 2009: 41).

Corpos que fogem aos padrões estéticos de beleza e normalidade podem causar estranha-
mento e serem alvos de estigmas. Houve um período da história humana, entre os séculos
XIX e XX, em que corpos diferentes serviram ao entretenimento dos considerados “normais”.
Esses eventos de “entretenimento” ficaram conhecidos como “circo de horrores”, “show de
horrores”, “show de aberrações” ou freak show.
Você pode conhecer um pouco mais sobre esses shows de horrores no seguinte link:
https://www.youtube.com/watch?v=hp-QwsYeBdg

Mesmo compreendendo que normal e patológico dependem da experiência


subjetiva dos sujeitos, temos de reconhecer que todas as sociedades formulam re-
presentações sobre a “normalidade”. Quando tiramos o foco da normalidade bio-
lógica e olhamos para a ideia de normalidade de comportamento, veremos que não
se trata mais de normal x patológico, mas de comportamento normal x desviante.
Segundo Gilberto Velho (1981), “a ideia de desvio, de um modo ou de outro,
implica a existência de um comportamento ‘médio’ ou ‘ideal’ que expressaria
uma harmonia com as exigências do funcionamento do sistema social” (p. 17).
Sujeitos incapazes de corresponder a esse padrão de comportamento social são
considerados desviantes ou inadaptados.
Os conceitos de “inadaptado” ou de “desviante” estão amarrados a uma vi-
são estática e pouco complexa da vida sociocultural. Por isso mesmo devem ser
utilizados com cuidado. (Velho, 1981: 21)
Velho (1981) chama a atenção para o fato que nem sempre ser “inadapta-
do” seja algo ruim, às vezes ser inadaptado denota que o sujeito consegue atri-
buir outros significados à realidade que sujeitos “normais” ou “ajustados” não
conseguem compreender. A cultura é multifacetada, ambígua e dinâmica (cf.
Velho, 1981:21) o que permite uma pluralidade de comportamentos e signifi-
cados. Por vezes, essa classificação normal/desviante pode ser um reflexo de
relações de poder, uma vez que o desviante apenas pode emergir no momen-
to em que um determinado grupo estabelece o que é o “normal” socialmente
aceito. Em outras palavras, o desviante só pode aparecer quando inserido em
determinado contexto, dependendo das relações de forças (jogo político) que
se estabelece com a cultura dominante (cf. Velho, 1981).

Patologia e produtividade

Os estudos de Marx mostraram que o capitalismo hipervalorizou a questão da


produtividade. A busca pelo lucro e pelo acúmulo de capital desencadeou uma
crescente exploração e regulação da mão-de-obra operária. O historiador E. P.
Thompson (1998) ilustrou bem o impacto da Revolução In-dustrial na vida dos
sujeitos. Em sua obra Costumes em comum, o autor nos conta, por exemplo, a
necessidade do uso do relógio para sincronizar o trabalhodos operários e reduzir
o tempo ocioso, aumentando, assim, a produtividade. O trabalhador perdeu a
autonomia sobre seu corpo, foi submetido ao relógio da fábrica e pela linha de
produção.
Além das exigências do capital, no século XVIII, segundo Foucault (2002)
a concepção do corpo humano como máquina colaborou com o movimento
de “disciplina” dos corpos, no intuito de moldar corpos dóceis, submissos,
disciplinados, especializados, que não oferecessem resistências, facilitando a
dominação. A disciplina dos corpos serviria para organizar o espaço entre os
homens (lugares, fileiras, etc), controlar das atividades (horários, gestos) e au-
mentar a eficiência das atividades. Mesmo nos hospitais, os internos deveriam
disciplinar até suas necessidades fisiológicas de acordo com os horários e nor-
mas estabelecidos. O comportamento, os gestos, as reações, passaram a se sub-
meter a regras socialmente instituídas, visando a otimização do uso do corpo.
Essa intensa disciplina do corpo e o controle de suas atividades, somados à
lógica de produção capitalista, colaboraram para a configuração das ideias de
saúde como capacidade para o trabalho e doença associada a não produtivida-
de, tão difundidas no senso comum.

A Organização Mundial de Saúde e o


conceito de saúde

O conceito ampliado de saúde

Até agora trabalhamos com a ideia de saúde ligada diretamente com o estado
patológico do sujeito, isto é, a saúde concebida pela ausência de sinais e sinto-
mas do organismo. No entanto, devemos entender que saúde não é a simples
ausência de doenças, o conceito engloba muitos outros aspectos como vere-
mos a seguir.
Anteriormente, mencionamos que a partir do século XIX começou a
aumentar a preocupação com os aspectos sociais da saúde, especialmente no
que dizia respeito à saúde dos trabalhadores. Tais questionamentos e estudos
contribuíram para o surgimento de uma medicina social e posteriormente uma
sociologia da saúde (cf. Nunes, 2007).
Questões como nível de renda, questões sanitárias, desigualdades sociais,
relações de poder, passaram a ser reconhecidas como influentes no processo
saúde-doença (Laurell, 1989).
A revolução pasteuriana, em fins do século XIX, permitiu identificar fatores
etiológicos de certas doenças e com isso foi possível realizar uma “contabilida-
de da doença”, seus indicadores poderiam ser estudados por análises estatísti-
cas sobre a distribuição saúde-doença (cf. Scliar, 2007: 35).
“Caráter pioneiro nas estatísticas de saúde é atribuído a William Farr (1807-1883).
Médico, Farr tornou-se em 1839 diretor-geral do recém estabelecido General Regis-
ter Office da Inglaterra, e aí permaneceu por mais de 40 anos. Seus Annual Reports,
nos quais os números de mortalidade se combinavam com vívidos relatos, chamaram
a atenção para as desigualdades entre os distritos “sadios” e os “não-sadios” do país.
Em 1842, Edwin Chadwick (1800-1890) escreveu um relatório que depois se tornaria
famoso: As condições sanitárias da população trabalhadora da Grã-Bretanha. Chadwi- ck,
que não era médico nem sanitarista, mas advogado, impressionou o Parlamento, que
em 1848 promulgou lei (Public Health Act) criando uma Diretoria Geral de Saúde,
encarregada, principalmente, de propor medidas de saúde pública e
de recrutar médicos sanitaristas. Dessa forma teve início oficial o trabalho de saúde
pública na Grã-Bretanha.” (Scliar, 2007: 35)

A preocupação com as condições sanitárias da população não se restringiram


à Inglaterra. Os Estados Unidos, a Alemanha e a França também apresentaram
ações em direção ao incremento da saúde pública. Porém, ainda não havia um
consenso do que era saúde. A primeira tentativa para alcançar uma definição de
saúde para todos os países foi com a Liga das Nações, organismo internacional
que surgiu após a Primeira Guerra Mundial, contudo, o esforço não deu certo.
Somente com o término da Segunda Guerra Mundial e consequente surgimento
da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização Mundial da Saúde
(OMS) que foi possível atingir um consenso sobre saúde (Scliar, 2007: 36).
Em 1948, a OMS publicou em sua constituição (WHO, 2006) a seguinte defi-
nição de saúde: “saúde é um estado completo de bem-estar físico, mental e so-
cial, e não apenas ausência de doença ou enfermidade”. Reconhecendo a saúde
como um direito de todas as pessoas sem distinção de etnia, religião, concep-
ção política e condições econômicas ou sociais. Sendo um dever dos Estados:
promover a saúde e protege-la.

“Health is a state of complete physical, mental and social well-being and not merely the
absence of disease or infirmity.
The enjoyment of the highest attainable standard of health is one of the fundamental
rights of every human being without distinction of race, religion, political belief, econo-
mic or social condition.
The health of all peoples is fundamental to the attainment of peace and security and is
dependent upon the fullest co-operation of individuals and States.
The achievement of any State in the promotion and protection of health is of value to
all.” (WHO, 2006)

Como se pode observar, esse conceito da OMS traz uma visão mais abran-
gente de saúde e não apenas a parca ideia de saúde como ausência de doença.
Considerando o contexto do pós-guerra, de países arrasados pelos confrontos
bélicos e pela polarização político-econômica entre capitalistas e socialistas,
encabeçados pelos EUA e Rússia respectivamente, esse conceito amplo de saú-
de também foi importante para ressaltar a ideia de saúde como um “direito a
uma vida plena, sem privações” (cf, Scliar, 2007: 37).
Em 1974, Marc Lalonde, então ministro da Saúde e do Bem-estar do Canadá,
enriqueceu a compreensão da saúde e os estudos em saúde pública ao refor-
mular o conceito de “campo da saúde” (cf. Scliar, 2007). Em seu texto, A new
perspective on the health of Canadians – a working document (Lalonde, 1981),
Lalonde reconhece que um estado de completo bem-estar poder ser difícil de
alcançar, contudo, muito pode ser feito de forma a aumentar a liberdade de
doenças e promover bem-estar suficiente para realização de atividades físicas,
metais e sociais. Baseando-se no sistema de saúde canadense, Lalonde consta-
ta a necessidade de estabelecer uma estrutura de análise e avaliação do campo
da saúde. Para isso, ponderou que o campo da saúde deveria ser estudado a par-
tir de quatro elementos principais: a) biologia humana; b) ambiente; c) estilo
de vida e d) organização dos cuidados de saúde.

a) Biologia humana: inclui todos os aspectos da saúde, tanto física como


mental. Diz respeito à herança genética, ao processo de envelhecimento, assim
como, aos sistemas internos do organismo (por exemplo: muscular, nervoso,
digestivo, etc.)
b) Ambiente: abarca as questões de saúde que são externas ao corpo hu-
mano, as quais os sujeitos têm pouco ou nenhum controle. Essa categoria
envolve qualidade do solo, ar, água, alimentação, controle de poluição, sanea-
mento básico, etc.
c) Estilo de vida: relaciona-se com as decisões e escolhas dos sujeitos que
podem influenciar em sua saúde. Podemos pensar em exemplos como hábitos
alimentares, tabagismo, etc.
d) Organização dos serviços de saúde: consiste em apreender a quantida-
de, qualidade, arranjo / organização, natureza e relações de pessoas e recursos
na prestação de cuidados em saúde. São relevados aspectos como: assistência
médica, serviços hospitalares, medicamentos, serviços de saúde públicos e co-
munitários, tratamento odontológico, etc. (Lalonde, 1981: 31-32)

Lalonde (1981: 33) aponta para cinco contribuições do conceito “campo da


saúde”. Primeira, foi reconhecer que as categorias biologia humana, ambiente
e estilo de vida são tão importantes quanto a categoria organização dos servi-
ços de saúde. Segunda, é que ele é abrangente, atentando para vários aspectos
da saúde. Terceira, o conceito permite um sistema de análise porque qualquer
questão pode ser examinada sob os quatro elementos, a fim de avaliar sua im-
portância relativa e interação. Quarta, admite uma maior subdivisão de fatores
e quinta, fornece uma nova perspectiva de saúde, explorando campos até então
negligenciados.
Apesar de se reconhecer os benefícios que o conceito de saúde ampliado da
OMS gerou, especialmente na época que foi postulado, ele não passou ileso de
críticas. Baseando-se na tradução de saúde como “situação de perfeito bem-es-
tar físico, mental e social”, há quem o avalie como “irreal, ultrapassado e unila-
teral”, uma vez que a ideia de “perfeição” é uma utopia, além de não existir mais
a necessidade de distinguir físico, mental e social, uma vez que se percebe que
não há grandes separações entre eles (Segre e Ferraz, 1997: 539).
Um opositor desse conceito ampliado de saúde foi Christopher Boorse, pro-
fessor de filosofia da biologia e filosofia da medicina na Universidade de Delaware
(EUA). Na década de 1970, voltou-se para os problemas filosóficos e conceituais
de saúde e doença, que alguns autores denominaram Teoria Bioestatística da
Saúde. Boorse seguia uma vertente “naturalista” que entendia que saúde e do-
ença não dependiam de julgamentos de valor ou das experiências dos sujeitos,
mas poderiam ser puramente descritivos, isentos de valor. Para Boorse, doença
era um conceito teórico e saúde seria o oposto de doença (cf. Almeida Filho. Jucá,
2002). Dessa forma, “a classificação dos seres humanos como saudáveis ou do-
entes seria uma questão objetiva, relacionada ao grau de eficiência das funções
biológicas, sem necessidade de juízos de valor” (Scliar, 2007: 37).
Em 1978, a Conferência Internacional de Assistência Primária à Saúde, or-
ganizada pela OMS, em Alma-Ata (atual Cazaquistão) evidenciou a oposição às
ideias de Boorse (cf. Scliar, 2007). A Declaração de Alma-Ata enfatizou o concei-
to ampliado de saúde apresentado pela OMS em 1948, ressaltou a influência
das desigualdades sociais sobre a manutenção e acesso à saúde, destacando a
responsabilidade dos governos pela saúde de seus povos e defendeu os cuida-
dos primários à saúde como cuidados fundamentais.

Você pode ler a Declaração de Alma-Ata, basta acessar o seguinte link:


http://cmdss2011.org/site/wp-content/uploads/2011/07/Declara%C3%A7%-
C3%A3o-Alma-Ata.pdf

Os cuidados primários em saúde deveriam seguir as seguintes estratégias:

1) as ações de saúde devem ser práticas, exequíveis e socialmente aceitáveis; 2) de-


vem estar ao alcance de todos, pessoas e famílias - portanto, disponíveis em locais
acessíveis à comunidade; 3) a comunidade deve participar ativamente na implantação
e na atuação do sistema de saúde; 4) o custo dos serviços deve ser compatível com a
situação econômica da região e do país (Scliar, 2007: 38)

Essas ações não deveriam se restringir às práticas clínicas de saúde, mas


envolver também educação em saúde, nutrição adequada, saneamento básico,
planejamento familiar, imunizações, prevenção e controle de doenças, ao invés
de usar tecnologias caras e sofisticadas, preferir o uso de tecnologias simples e
acessíveis à população (cf. Scliar, 2007: 39).

Sobre determinantes sociais de saúde

A partir da década de 1970, sobretudo com o conceito de campo da saúde de


Marc Lalonde, ressaltou-se a importância dos fatores sociais no processo saú-
de-doença. A relevância do contexto, isto é, dos aspectos socioambientais sobre
a saúde ficou conhecido como “determinantes sociais de saúde”. Em 2005, a
OMS criou uma comissão sobre determinantes sociais de saúde para apoiar pa-
íses e chamar a atenção dos governos e das sociedades para esses determinan-
tes, buscando melhores condições sociais de saúde, especialmente para popu-
lações mais vulneráveis. Essa comissão foi extinta em 2008, após entregar um
relatório com recomendações para reduzir as iniquidades em saúde (cf. http://
www.who.int/social_determinants/thecommission/en/ - acessado 03/05/2015).
Em 2011, a OMS publicou outro documento sobre determinantes sociais
em saúde (OMS, 2011) com objetivo de: estimular ações sobre esses determi-
nantes, promover a participação da população e de lideranças comunitárias
nas decisões e ações de políticas de saúde; orientar serviços de saúde e progra-
mas de saúde pública para diminuir as iniquidades em saúde; estabelecer prio-
ridades e reconhecer interesses em nível local como internacional e desenvol-
ver estudos para avaliar a efetividade dessas ações e divulgar seus resultados e
informações. As recomendações da Comissão sobre determinantes sociais da
saúde têm como foco: a) melhorar as condições de vida; b) combater a distribui-
ção desigual de poder, dinheiro e recursos; c) medir a magnitude do problema,
compreendê-lo e avaliar o impacto das intervenções (OMS, 2011: 05).

A maior parte da carga das doenças - assim como as iniquidades em saúde, que exis-
tem em todos os países -, acontece por conta das condições em que as pessoas nas-
cem, vivem, trabalham e envelhecem. Chamamos esse conjunto de “determinantes so-
ciais da saúde”, um termo que resume os determinantes sociais, econômicos, políticos,
culturais e ambientais da saúde.
Nem todos os determinantes são igualmente importantes. Os mais importantes são
aqueles que geram estratificação social - os determinantes estruturais -, tais como a
distribuição de renda; o preconceito com base em fatores como o gênero, a etnia ou
deficiências; e estruturas políticas e de governança que alimentam - ao invés de reduzir
- iniquidades relativas ao poder econômico. Esses determinantes geram posicionamen-
tos socioeconômicos dentro de estruturas de poder, prestígio e acesso a recursos.
(OMS, 2011: 07)
A 8ª Conferência Nacional de Saúde e a
Constituição Federal de 1988

A saúde antes da década de 1980 no Brasil

O fim da escravidão, pós 1888, e a crescente onda de imigrantes europeus para


suprir a falta de mão-de-obra nas lavouras de café, favoreceu o aumento do con-
tingente populacional nas áreas urbanas no país (Fausto, 1998). No período de
1897 a 1930, os assuntos de saúde eram tratados pelo Ministério da Justiça e Ne-
gócios Interiores, especificamente pela Diretoria Geral de Saúde Pública, com
ações voltadas para o saneamento e endemias (cf. Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006).
Uma das intervenções mais famosas desse período foi a Revolta da Vacina,
ocorrida no Rio de Janeiro, em 1904. A ideia era modernizar a antiga capital bra-
sileira, derrubando cortiços e construindo novas edificações, tal fato revoltou a
população desapropriada de suas habitações. Em meio a esse movimento de mo-
dernização, o sanitarista Oswaldo Cruz defendeu o combate à peste bubônica, a
malária e a varíola. Em 1904, tornou-se obrigatória a vacinação de todos contra a
varíola. A população, desconfiada dos efeitos da vacina, revoltada contra o autori-
tarismo e violência do governo, insurgiu-se contra o poder público (cf. Vicentino,
Dorigo, 1997: 298-300). Nesse período surgiu também uma Liga do Saneamento,
caracterizada por “criticar os excessivos urbanismo e regionalismo da política de
saúde então vigente.” (Merhy, Queiroz, 1993: 178). A corrente médico-sanitária
predominou nos grandes centros urbanos (cf. Merhy, Queiroz, 1993).
A Previdência Social foi criada no Brasil em 1923, estabelecendo as Caixas
de Aposentadorias e Pensões (CAPS) que deveriam ser organizadas pelas em-
presas e oferecer assistência médica, medicamentos, aposentadorias e pen-
sões. Em 1933 surgiram os Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAP), enti-
dades que abrangiam os trabalhadores conforme ramos de atividades. Nesse
período, a assistência médica estava atrelada aos vínculos trabalhistas e os be-
nefícios eram restritos aos trabalhadores que contribuíam com a Previdência
(cf. Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006).
Em 1930, durante o governo de Getúlio Vargas, foi criado o Ministério da
Educação e Saúde. Somente em 1953 que o Ministério da Saúde separou-se do
Ministério da Educação. Contudo, a assistência médica continuou vinculada às
instituições previdenciárias (cf. Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006).
Nos anos 1940, os gastos públicos começaram a favorecer a assistência mé-
dica individual em detrimento da saúde pública. Nos anos 60, as ações institu-
cionais não eram mais capazes de combater “a miséria e as péssimas condições
de saúde da população brasileira” (Merhy, Queiroz, 1993: 179).
Passados alguns anos, durante o governo militar de Castelo Branco, surgiu o
Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), em 1966, com a fusão dos IAPs,
uniformizando e centralizando a previdência social. O INPS tornou-se o “princi-
pal órgão de financiamento dos serviços de saúde” (Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006:
14). Em 1974, as políticas de saúde privilegiaram a privatização dos serviços e
acentuou a ênfase na assistência médica individualizada. Nesse mesmo ano,
surgiu o Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS) que foi um fundo de
recursos públicos que emprestava dinheiro predominantemente para a constru-
ção de hospitais privados. Ainda em 74, também foi instituído o Plano de Pronta
Ação (PPA) que abarcava uma série de ações para desburocratizar o atendimento
de emergência ao segurado e “permitiu atendimento ambulatorial a toda a popu-
lação nos casos de urgência” (cf. Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006: 15). Vislumbramos,
nesse momento, o começo da universalização do atendimento à saúde.
A partir de 1977, quando se ampliou o atendimento de urgência a todos os
indivíduos, tornaram-se mais frequentes déficits no orçamento previdenciário,
indicando a necessidade de maior racionalidade do serviço de saúde. Algumas
das medidas tomadas foram o Programa de Nacional de Serviços Básicos
de Saúde (Prev-Saúde) e o Conselho Consultivo de Administração da Saúde
Previdenciária (Conasp) (cf. Merhy, Queiroz, 1993).
Este último, em particular, propunha a descentralização do sistema de as-
sistência médica através da criação de uma “única porta de entrada”, integran-
do, numa rede básica de serviços públicos de saúde, a capacidade instalada já
existente no Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
(Inamps), nos estados e nos municípios, entrando a rede privada apenas onde
não existissem unidades estatais. (Merhy, Queiroz, 1993: 180)
Um ano antes, 1976, foi fundado o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
(Cebes) que marcou a mobilização social em relação à saúde, sendo também
identificado como Movimento da Reforma Sanitária Brasileira (cf. Paulus Jr;
Cordoni Jr, 2006).
No início de 1980, foi instituído do Plano de Ações Integradas de Saúde (AIS)
com o objetivo de descentralizar a assistência médica, com a regionalização do
sistema e gerenciamento com a participação da comunidade usuária dos servi-
ços (cf. Pimenta, 1993). As AIS integraram “os serviços estaduais e municipais à
rede de serviços pagos pelo Inamps” (Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006: 16).
O processo de integração dos serviços de saúde, a possiblidade da universali-
zação da assistência e as discussões suscitadas pelo movimento da reforma sani-
tária brasileira ganharam força e forma com a 8ª Conferência Nacional de Saúde.

A 8ª Conferência Nacional de Saúde (CNS)

A 8ª CNS ocorreu em Brasília, em 1986, durante o governo de José Sarney. Sua


Comissão foi presidida pelo professor Sérgio Arouca, um dos principais líderes
da Reforma Sanitária.

“Reforma Sanitária foi a denominação substituiu aquela do movimento da democratiza-


ção da saúde” (Paim, 2012: 10)

As discussões da 8ª CNS giraram em torno dos seguintes itens: “1) saúde


como direito; 2) reformulação do Sistema Nacional de Saúde; e 3) financiamen-
to do setor” (Brasil, 2009: 17). Os textos produzidos para a Conferência contem-
plaram ainda conceitos como “determinação social da saúde-doença”, “orga-
nização das práticas de saúde”, “consciência sanitária”, “promoção de saúde”,
“intersetorialddade” e contaram com a colaboração de professores e pesquisa-
dores do Cebes e da Abrasco (Paim, 2012: 10).
No relatório final da 8ª CNS (Brasil, 1986:02-03), destacaram-se: a) a neces-
sidade de modificações no setor da saúde, não se restringindo a reformas ad-
ministrativas ou financeiras, mas revendo o conceito de saúde, assim como,
a própria legislação no que diz respeito à promoção, proteção e recuperação da
saúde; b) um novo sistema de saúde nacional, reconhecendo a importân- cia do
fortalecimento e expansão do setor público; c) separação da Saúde da
Previdência; d) conveniência de discussões mais aprofundadas sobre o finan-
ciamento do setor saúde.
Dentre os ideais defendidos no relatório da 8ª CNS, destacamos:

Em seu sentido mais abrangente, a saúde é a resultante das condições de alimentação,


habitação, educação, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade,
acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É, assim, antes de tudo, o re-
sultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes
desigualdades nos níveis de vida.
Direito à saúde significa a garantia, pelo Estado, de condições dignas de vida e de
acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação
da saúde, em todos os seus níveis, a todos os habitantes do território nacional, levando
ao desenvolvimento pleno do ser humano em sua individualidade.
A reestruturação do Sistema Nacional de Saúde deve resultar na criação de um Siste-
ma Único de Saúde que efetivamente represente a construção de um novo arcabouço
institucional separando totalmente saúde de previdência, através de uma ampla Refor- ma
Sanitária.
Os Fundos de Saúde, em diferentes níveis, serão geridos conjuntamente com a partici-
pação colegiada de órgãos públicos e da sociedade organizada. (Brasil, 1986: 04-19).

Você pode acessar o Relatório Final da 8ª CNS pelo seguinte link:


http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/relatorios/relatorio_8.pdf
Como também pode assistir à abertura da 8ª CNS realizada pelo professor Sérgio Arouca:
https://www.youtube.com/watch?v=NtdIGv8mfDI

No ano subsequente, os ideais da Reforma Sanitária começaram a ganhar


forma com o SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde, mas ainda
com algumas restrições. Foi em 1988, por meio da Constituição Federal, que o
conceito de saúde foi efetivamente ampliado e vinculado a políticas socioeco-
nômicas, e lançaram-se as bases para o Sistema Único de Saúde (cf. Paulus Jr;
Cordoni Jr, 2006).
A Constituição Federal de 1988

A Constituição Federal de 1988, também chamada de Constituição Cidadã (cf.


Minayo, 2000), assimilou muitas das proposições da Reforma Sanitária, reco-
nhecendo o direito à saúde e a responsabilidade do Estado em garantir “um
conjunto de políticas econômicas e sociais, incluindo a criação do Sistema Úni-
co de Saúde (SUS), universal, público, participativo, descentralizado e integral”.
(Paim, 2013: 1928).
No título VIII – Da ordem social; capítulo II – seção II, da Saúde, os artigos
196 a 200, destacamos os seguintes trechos:

Art. 196. A saúde é direito e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e
econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso
universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Art. 198. As ações e serviços públicos integram uma rede organizada e hierarquizada e
constituem um sistema único [...]
§ 1°. O sistema único de saúde será financiado [...] com recursos do orçamento da
seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além
de outras fontes.
Art. 199. A assistência à saúde é livre à iniciativa privada.
§ 1°. As instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema
único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou con-
vênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos;
§ 2°. É vedada a destinação de recursos públicos para auxílio ou subvenções às insti-
tuições privadas com fins lucrativos.
Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:
I. controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para
a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos,
hemoderivados e outros insumos;
II. executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde
do trabalhador;
III. ordenar a formação de recursos humanos na área da saúde; [...]
VIII. colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho. (Bra-
sil, 2013: 33-34).
A consolidação do SUS se deu ao longo da década de 90. A lei 8.142/90 es-
tabeleceu a criação de conselhos de saúde em cada esfera do governo, como
órgãos colegiados deliberativos compostos por “representantes do governo,
prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários” (Brasil, 1990) com
capacidade de avaliar e fiscalizar serviços e recursos em saúde. A lei 8.142/90
também definiu as transferências de recursos financeiros, dispensando a ne-
cessidade de convênios (cf. Paulus Jr; Cordoni Jr, 2006: 17).
Não obstante os incentivos do poder público, passadas algumas décadas,
o SUS ainda enfrenta desafios semelhantes aos da época de seu surgimento.
Segundo o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), em documen-
to publicado em 2006 (Brasil, 2006), o SUS precisa superar grandes desafios:

• Desafio da universalização;
• Desafio do financiamento;
• Desafio do modelo institucional;
• Desafio do modelo de atenção à saúde;
• Desafio da gestão do trabalho no SUS; e
• Desafio da participação social (Brasil, 2006: 19).

Em documento mais recente, o conselheiro da Organização Pan-Americana


de Saúde, Eugênio Vilaça Mendes (2013) concedeu entrevista refletindo a res-
peito dos benefícios alcançados pelo SUS assim como sobre os seus desafios.
Entre os benefícios e conquistas, Mendes (2013) reconheceu que, apesar do
SUS ter uma história recente, ele já é responsável exclusivo pela assistência à
saúde de 140 milhões pessoas.

O SUS apresenta números impressionantes: quase seis mil hospitais e mais de sessen-
ta mil ambulatórios contratados, mais de dois bilhões de procedimentos ambulatoriais
por ano, mais de onze milhões de internações hospitalares por ano, aproximadamente dez
milhões de procedimentos de quimioterapia e radioterapia por ano, mais de duzen- tas mil
cirurgias cardíacas por ano e mais de 150 mil vacinas por ano. O SUS pratica
programas que são referência internacional, mesmo considerando países desenvolvi-
dos, como o Sistema Nacional de Imunizações, o Programa de Controle de HIV/AIDS
e o Sistema Nacional de Transplantes de Órgãos que tem a maior produção mundial
de transplantes realizados em sistemas públicos de saúde no mundo, 24 mil em 2012.
O programa brasileiro de atenção primária à saúde tem sido considerado, por sua ex-
tensão e cobertura, um paradigma a ser seguido por outros países. (Mendes, 2013: 28)

Contudo, mesmo considerando os êxitos do SUS, ele ainda se depara com


três grandes desafios: “a organização macroeconômica do sistema de saúde no
Brasil; a organização microeconômica expressa no modelo de atenção à saúde
que pratica; e financiamento.” (Mendes, 2013: 28).
A eficácia do SUS não depende somente das ações governamentais e da am-
pliação de investimentos. A participação social, no gerenciamento e na formu-
lação de políticas, também é muito importante para melhorar os serviços de
saúde e reduzir as iniquidades em saúde (OMS, 2011).
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