Você está na página 1de 17

ASPECTOS SOCIOCULTURAIS

DO ENVELHECIMENTO
AULA 2

Profª Tatiane Calve


CONVERSA INICIAL

Durante o ciclo vital, são muitas alterações que ocorrem no organismo,


proporcionando mudanças funcionais. Espera-se que, com estímulos adequados
e cuidados com a alimentação, o indivíduo possa ter uma vida saudável. No
período da infância e adolescência, os ganhos físicos e funcionais são visíveis e
esperados. Com a chegada da fase adulta, a funcionalidade orgânica se
estabiliza, e, com o passar do tempo, há a tendência de queda na funcionalidade
do sistema como um todo. O avanço da medicina e as pesquisas sobre o
processo de envelhecimento proporcionaram um aumento da longevidade do
indivíduo, assim como a procura por uma velhice com mais saúde e menos
dependência funcional.
Nesta aula, discutiremos os conceitos de saúde e funcionalidade
sistêmica relacionados com o processo de envelhecimento. Iremos abordar as
características funcionais do organismo e as alterações que ocorrem durante o
ciclo vital, interferindo na percepção de saúde do indivíduo.
Entre as mudanças que se observam no organismo dos idosos, iremos
abordar também os acometimentos psíquicos e emocionais, como demência,
depressão e suicídio. Desse modo, será tratada a percepção de saúde dos
idosos, ou seja, como eles reconhecem o bem-estar e o que consideram uma
vida saudável e feliz na velhice.
As alterações orgânicas e funcionais, assim como as mentais,
decorrentes do processo de envelhecimento, são influenciadas por fatores
hereditários e ambientais, os quais serão citados e discutidos aqui.

TEMA 1 – CONCEITO E BREVE HISTÓRICO DA SAÚDE

Conceituar saúde não é uma tarefa fácil, devido ao fato de ser


multidimensional e de caráter subjetivo. Durante o ciclo vital, a percepção de
saúde se modifica devido às alterações intrínsecas e experiências externas. Com
a chegada da velhice, ela pode estar diretamente relacionada com a capacidade
de sentir-se bem, seja no âmbito físico, seja mental, seja social.
A definição de saúde passou por diferentes fases durante a história da
humanidade, devido às relações religiosas, sociais, políticas e médicas. Em cada
fase, a saúde teve uma concepção distinta, principalmente em relação à

2
ausência de doença, determinada por ações pagãs, presença de epidemias,
avanço nas pesquisas médicas e criação de organizações públicas nessa área.

1.1 Conceituando saúde

O termo saúde depende de variáveis socio-históricas, culturais,


econômicas e políticas (Araújo; Xavier, 2014), daí ser difícil se ter um conceito
preciso. A percepção depende das caraterísticas de vida de cada indivíduo e
pode ser alterada com o passar do tempo, por mudança no estilo de vida,
padrões econômicos e sociais.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) (1986), a saúde é
considerada um estado de bem-estar que engloba características físicas,
mentais, afetivas, sociais e econômicas. Dessa maneira, uma pessoa saudável
não deve ser considerada somente aquela que não possui doenças,
enfermidades. Essa abrangência do conceito permitiu que fosse estabelecido um
diálogo global sobre as considerações acerca de doença, epidemiologia,
características das patologias e pesquisas na área da saúde.
Foi pela conceituação de saúde, proposta pela OMS, que se deu
importância, não apenas aos aspectos biológicos relacionados às doenças, mas
também aos vieses psicológicos, sociais e econômicos (Araújo; Xavier, 2014).
Já na Constituição brasileira de 1988, saúde é um direito de todos, e o
Estado tem o dever de assegurar atendimento integral de qualidade, promover
atividades para prevenção de doenças e estabelecer metas para assistência de
cura em todos os níveis de complexidade de tratamento. Para garantia de todos
esses direitos ao povo brasileiro, foi criado o Sistema Único de Saúde (SUS),
cuja responsabilidade é oferecer igualdade de acesso, atendimento integral e
promover campanhas de prevenção de doenças.
Outro conceito de saúde, mais contemporâneo, diz respeito ao consumo
ou capacidade de possuir e usar algo. Assim, o ser humano busca possuir saúde,
consumindo os diferentes meios para tal.
Com base nessas considerações, é possível entender que a condição ou
percepção de saúde depende de vários fatores como local, época, classe
socioeconômica e características individuais, seja como ausência de doenças,
seja como bem-estar global.

3
1.2 Breve histórico sobre saúde

O conceito de saúde, como relatado acima, varia de acordo com os


valores de cada indivíduo e depende de concepções sociais, econômicas,
religiosas e até mesmo filosóficas. Em uma linha temporal, a saúde sempre
esteve atrelada às doenças – até mesmo as doenças tiveram diferentes
significados na história da humanidade.
Para os hebreus, a presença de doenças estava relacionada à fúria dos
deuses, que amaldiçoavam as pessoas, enviando “forças alheias” para que o
organismo reagisse e ficasse doente devido às ações consideradas pecados
(Scliar, 2007).
Na Idade Média, a Igreja condenava os leprosos, considerando-os
pessoas pecaminosas; portanto, eram isolados da sociedade até a cura, pela fé,
ou a morte. Além disso, eram os religiosos que acolhiam os doentes em abrigos
e hospitais administrados por ela.
Por muito tempo, as doenças não tinham causa conhecida; por isso, a
pessoa doente era tratada como um indivíduo amaldiçoado ou pecaminoso.
Além disso, algumas enfermidades oriundas da ingestão de alimentos
contaminados não eram associadas aos animais hospedeiros.
Na Grécia Antiga, inúmeros deuses eram relacionados à saúde, e os
gregos cultuavam as divindades da medicina, como Higieia (deusa da saúde) e
Panecea (deusa da cura). Assim, valorizavam o corpo saudável, a prática da
higiene e o uso de plantas e métodos naturais para a cura das doenças (Scliar,
2007).
Outra referência grega é o deus Hipócrates de Cós, tido como o pai da
Medicina. Ele afirmou que o corpo possuía fluidos, como a bile e o sangue,
considerando que esses elementos deveriam estar equilibrados para que a
pessoa tivesse saúde (Scliar, 2007). Para Hipócrates, a doença era o
desequilíbrio do estado do organismo.
Na cultura oriental, a saúde está relacionada com os fluxos energéticos
do corpo. Nesse sentido, o indivíduo saudável é aquele cujo organismo está
funcionando harmoniosamente.
No século XVII, a área da saúde experimentou um grande avanço com a
descoberta da pasteurização por Louis Pasteur, assim como outros grandes

4
avanços na ciência, com pesquisas microscópicas. A medicina social possibilitou
condições salubres para trabalhadores no século XVIII (Backes et al., 2009).
Em meados do século XIX, surgiu a ideia de que para cada doença existia
um agente etiológico, em virtude do avanço nas pesquisas e da ampliação dos
conhecimentos adquiridos sobre vírus e bactérias (Backes et al., 2009).
Um dos grandes marcos do século XX, para a área da saúde, foi a criação
da Organização Mundial da Saúde (OMS), obrigando o Estado a promover e
proteger a saúde de todos. Além da OMS, a Constituição brasileira de 1988
garante direito à saúde a todos, por políticas socioeconômicas. No Brasil, outro
marco para a área da saúde foi a regulamentação do Sistema Único de Saúde
(SUS) que, mesmo com avanços lentos em termos de oferecimento de serviços,
atende integral e igualmente à população desde 1988.
Atualmente, o conceito de saúde está ligado a um estado comum, normal
de funcionamento do organismo, ou seja, à condição de ausência de doença. A
ciência determina as percepções de saúde e doença da humanidade, atentando,
sempre, para a relação entre todas as alterações que possam vir a ocorrer com
o ser humano, seja no âmbito físico, seja mental, seja socioeconômico.

TEMA 2 – SAÚDE COMO AUSÊNCIA DE DOENÇA

No senso comum, é notório o entendimento de saúde como ausência de


doença. Isso porque são consideradas pessoas saudáveis aquelas que não
possuem alterações metabólicas, não precisam de acompanhamento médico
constante, não fazem uso de medicamentos diariamente e/ou não necessitam
de cuidados extras em relação à alimentação e às atividades da vida diária. Tal
entendimento também é uma prevalência na área médica e na área da saúde,
principalmente no que diz respeito ao diagnóstico e ao tratamento de doenças.
Para Batistella (2016), essa percepção fez surgir uma forte relação da
área da saúde com o âmbito social, no que diz respeito às organizações
assistenciais e de pesquisa, com vistas à identificação, à prevenção e ao
tratamento de diferentes patologias que acometem a população. Assim, a
estreita relação saúde-doença tem significado socio-histórico, ou seja, as
transformações sociais permitiram que houvesse avanços na produção de
conhecimento a respeito das doenças e, até mesmo, mudanças no atendimento
aos que dele necessitam.

5
Desde o século XVIII até a atualidade, há grande preocupação sobre o
reconhecimento epidemiológico das doenças, assim como suas formas de
transmissão, aquisição, manifestação orgânica e sintomas, para que o Estado e
a área médica possam buscar formas de prevenir e tratar as diversas patologias
existentes na sociedade humana. À medida que as pesquisas avançam na
descoberta sobre as patologias, as áreas farmacêutica e tecnológica também
progridem, proporcionando tratamentos mais eficazes e sobrevida aos
pacientes. Dessa forma, fica implícita a busca pela saúde orgânica
(funcionamento adequado de células, órgãos e sistemas) ou “não doença” do
organismo.
Nessa compreensão, prevalece o modelo de saúde individual, voltado
para os aspectos biológicos, com os cuidados médicos, atendimento hospitalar
e clínico (público ou privado), uso de equipamentos e medicamentos (Araújo;
Xavier, 2014). Ainda integrado a tal modelo, o ser humano é visto não como um
ser integral, mas fragmentado, pensado na patologia presente. Assim, seu
atendimento e tratamento são feitos levando-se em conta o tipo de patologia,
com os profissionais de cada área médica cuidando das especificidades clínicas.
A necessidade de cuidados específicos para cada tipo de patologia fez
com que houvesse mudança até mesmo na formação de profissionais da área
médica e da saúde. Para Araújo e Xavier (2014, p. 8), a especialização dos
profissionais trouxe “carência de interdisciplinaridade; surgimento das sub-
especializações; limitado desenvolvimento do espírito crítico e dependência dos
interesses econômicos”.
Sob o ponto de vista de saúde como ausência de doença, em uma
sociedade capitalista, o indivíduo que possui alguma patologia fica refém da
indústria farmacêutica e do consumo de serviços médicos. O aumento
populacional trouxe problemas em relação à qualidade no atendimento público,
e muitas vezes não há especialistas e número suficiente de equipamentos,
instrumentos e exames para detecção de doenças, além de oferecimento de
medicamentos e tratamento a toda população. Na busca pela saúde, quanto ao
tratamento de doenças, houve encarecimento do atendimento como um todo
(atendimento médico, diagnóstico e tratamento), o que fez com que a população
com condições econômicas privilegiadas venha dispor de parte da renda para
contratação de planos de saúde privados.

6
Contudo, podemos afirmar que a saúde considerada como ausência de
doença ainda é um conceito muito presente entre a população mundial,
principalmente na visão ocidental.

TEMA 3 – SAÚDE COMO BEM-ESTAR

Atualmente, o conceito de saúde tem uma conotação mais abrangente do


que aquela de ausência de doença; assim, o indivíduo contemporâneo busca o
bem-estar global. Em um pensamento holístico, a saúde abrange diversos
aspectos do desenvolvimento do ser humano.
A OMS, conforme descrito anteriormente, conceitua saúde como um
estado de bem-estar geral, englobando características físicas, mentais, afetivas,
sociais e econômicas. Assim sendo, atualmente ela reconhece os seguintes
fatores para considerar um indivíduo com saúde:

• renda, status social e educação;


• ambiente físico: água potável, ar puro, ambiente de trabalho sadio, casa
segura e comunidade bem planejada;
• rede de apoio social: família, amigos e comunidade;
• genética: expectativa de vida e risco de desenvolvimento de doenças;
• gênero: homens e mulheres enfrentam riscos de saúde diferentes;
• comportamento pessoal e habilidade de enfrentar dificuldades;
• consumo de fumo, bebidas alcoólicas, hábitos alimentares, atividade física e
forma de lidar com o estresse.

A visão contemporânea da OMS visa se contrapor ao conceito de saúde


cujas ênfases são somente a ausência e o combate a doenças. Porém, essa
definição idealizada não pode ser utilizada pelos serviços da área da saúde, pois
as metas ficam muito abrangentes e difíceis de ser alcançadas.
Além da dificuldade de quantificar a presença de saúde pelo fato de o
indivíduo possuir ou não alguma doença, o conceito de saúde proposto pela
OMS pode ser considerado superficial e abstrato, pois depende de cada
sociedade, momento histórico e percepção individual.
Entretanto, não podemos deixar de lado o fato de que a sociedade é
dinâmica, assim como o ser humano, e que, dependendo das características
sociais e históricas, a percepção de saúde pode ser alterada. Para Araújo e
Xavier (2014), os profissionais de saúde não podem desconsiderar a importância

7
de um atendimento holístico, haja vista que as doenças e a percepção de saúde
são multifatoriais.
Nesse sentido multifatorial, a Organização Pan-Americana de Saúde
(OPAS) (2005), propõe indicadores para mensurar a saúde com base na
observação de grupos e espaços geográficos:

1. Mensuração consolidada em saúde: são medidas (médias, medianas,


proporções) que sintetizam observações de indivíduos em cada grupo
observado (por exemplo, taxa de prevalência de hipertensão em mulheres
e homens em uma faixa etária); ou seja, mensuram a saúde na população.
2. Mensuração ecológica ou ambiental: se refere a características físicas do
lugar onde vive ou trabalha um grupo populacional. Algumas dessas
características são difíceis de ser medidas (por exemplo, exposição à
contaminação atmosférica, exposição diária à luz solar, exposição ao
vetor da dengue). São fatores externos ao indivíduo.
3. Mensuração global: são atributos de um grupo ou do espaço sem
equivalente ao nível individual (densidade populacional, índice de
desenvolvimento humano, Produto Interno Bruto per capita). São
considerados indicadores contextuais.

Esses indicadores são utilizados como sinônimo de "indicador de saúde


da população" – se contrapondo aos indicadores individuais de indivíduo
saudável – e ainda possuem grande importância para as determinações em
saúde pública (OPAS).
Quando a saúde é considerada multifatorial, é possível pensar em um
planejamento para a saúde coletiva, levando em conta o interesse da sociedade
em que o indivíduo está inserido. Assim, a percepção de saúde e bem-estar é
valorizada em seu sentido mais amplo, e não somente em relação à presença
ou não de patologias orgânicas.
Em 2019, a OMS definiu dez prioridades em relação à saúde mundial
(Nações Unidas Brasil, 2019). São elas:

1. Poluição do ar e mudanças climáticas – a poluição do ar é considerada o


maior risco ambiental para a saúde, principalmente para os sistemas
respiratório, cardiovascular e nervoso. Prematuridade e câncer estão
entre as enfermidades associadas à poluição.

8
2. Doenças crônicas não transmissíveis – diabetes, câncer e doenças
cardiovasculares são responsáveis por mais de 70% das mortes no
mundo; são impulsionadas pelo uso do tabaco e álcool, inatividade física,
dietas não saudáveis e poluição do ar.
3. Pandemia de gripe – o mundo está prestes a enfrentar mais uma
pandemia de influenza. Por isso, a OMS, anualmente, recomenda as
cepas que devem ser incluídas na vacina contra a doença a fim de
proteger as pessoas de gripes sazonais.
4. Cenários de fragilidade e vulnerabilidade – a OMS indica que 22% da
população mundial vive em locais onde crises prolongadas (seca, fome,
conflitos e deslocamento populacional) e serviços de saúde mais frágeis
as deixam sem acesso aos cuidados básicos de que necessitam.
5. Resistência antimicrobiana – a resistência aos medicamentos ocorre
devido ao uso excessivo e sem orientação em pessoas, em animais, em
alimentos e no meio ambiente. Por isso, a OMS está realizando um plano
global para conscientização sobre o tema.
6. Ebola – o vírus se espalhou por cidades, afetando mais de 1 milhão de
pessoas e pode se estender ainda mais, principalmente em áreas de
conflito. Além do Ebola, outros vírus são uma ameaça ao mundo, como
zika vírus, o vírus nipah, além de febres hemorrágicas, síndromes
respiratórias e a “doença X”.
7. Atenção primária de saúde – esses cuidados primários devem atender à
maioria das necessidades de saúde de uma pessoa ao longo da vida,
oferecendo cuidados integrados, baseados nas características da
comunidade.
8. Relutância em vacinar – muitas pessoas, no mundo todo, estão resistindo
ou recusando-se a vacinar os filhos, o que pode levar à reversão do
progresso em relação ao combate a doenças que podem ser prevenidas
por meio da imunização.
9. Dengue – essa doença, transmitida por mosquitos, pode levar à morte se
não for tratada rapidamente. A incidência dela vem aumentando
significativamente nos períodos sazonais e não só em países tropicais.
10. HIV – mesmo com enormes progressos no combate ao vírus, com
campanhas de prevenção, a epidemia continua se alastrando pelo mundo.
Nesse sentido, esforços têm sido feitos não apenas em iniciativas de

9
prevenção, mas também de conscientização sobre a importância da
testagem.

Os esforços das Nações Unidas em conjunto com a Organização Mundial


da Saúde se voltam à prevenção de epidemias e para que a população mundial
tenha melhor qualidade de vida e bem-estar; assim, valorizam-se as dimensões
físicas, psíquicas, sociais, culturais e econômicas que compõem a percepção de
bem-estar do indivíduo (Silva; Schraiber; Mota, 2019).

TEMA 4 – SAÚDE FÍSICA E MENTAL DO IDOSO

A saúde pode ser vista como uma necessidade de todos, associada a


diversos fatores, como ausência de doenças, condições financeiras, acesso a
infraestrutura e saneamento básico, cultura e lazer, entre outros bens e serviços
que permitem a pessoa desfrutar da vida.
Segundo Maciel (2010), as políticas públicas nacionais, como Política
Nacional do Idoso, Conselho Nacional do Idoso e Estatuto do Idoso, que
oferecem e legalizam os direitos dos idosos em relação à prevenção e à
promoção da saúde, estão em consonância com as políticas internacionais.
As condições de saúde do idoso possuem várias vertentes e estão
diretamente relacionadas à presença de doenças físicas e mentais que podem
comprometer a independência do indivíduo.

4.1 Saúde física do idoso

As doenças e o aumento da dependência física do idoso estão


relacionados com o perfil de morbidades e comorbidades decorrentes do
processo natural do envelhecimento. Maciel (2010) indica que 69% dos idosos
são acometidos por Doenças e Agravos Não Transmissíveis (DANT). Entre elas,
se incluem hipertensão arterial, artrite, cardiopatias e diabetes, além de
osteoporose, artrose, acidente vascular encefálico (AVE) e patologias
respiratórias. Somam-se a estas alterações neuromotoras e osteomusculares
decorrentes do processo de envelhecimento natural, como osteopenia e
sarcopenia.
As DANT podem afetar a funcionalidade e a independência física dos
idosos, alterando o desempenho na realização das Atividades de Vida Diária
(AVD). De acordo com Maciel (2010), as AVD são subdivididas em:

10
• Atividades Básicas de Vida Diária (ABVD) – são aquelas relacionadas ao
autocuidado como tomar banho, se vestir, se alimentar de maneira
independente.
• Atividades Instrumentais de Vida Diária (AIVD) – são aquelas em que o
indivíduo possui capacidade de levar uma vida independente dentro da
comunidade onde vive, incluindo preparar refeições, utilizar transporte,
cuidar da casa, administrar as próprias finanças e tomar medicamentos,
entre outras.

A capacidade em realizar as AVDs permite ao idoso ser autônomo e


independente, possibilitando o convívio familiar e social de maneira mais intensa.
Ele pode praticar atividade física, encontrar a família e os amigos em eventos
sociais, brincar com os netos e viajar, entre outras atividades que estão
associadas ao bem-estar físico e mental. Entende-se, então, que devido à
dificuldade de realizar as ABVD e/ou AIVD, o idoso desenvolve um quadro de
incapacidade funcional (Maciel, 2010).
Portanto, a prevenção do acometimento pelas doenças físicas é
fundamental para que o indivíduo mantenha a autonomia e a independência com
a chegada da velhice.

4.2 Saúde mental do idoso

A saúde mental está relacionada a diversas atividades que permitem o


idoso sentir-se bem, ser capaz de tomar decisões e perceber-se feliz. As
alterações mentais que podem vir a acometer os idosos modificam a percepção
de felicidade do idoso, trazendo consigo outras comorbidades, até mesmo
físicas.
Entre as doenças mentais mais incidentes na velhice, podemos citar as
demências, as alterações cognitivas e a depressão. O declínio cognitivo e a
depressão, muitas vezes causadas pela aposentadoria, por conflitos familiares
e conjugais, são alterações mentais muito presentes, momento em que o idoso
acredita não ser mais útil à sociedade, além de estar se tornando um “peso” para
a família.
Nesse sentido, é necessário que família e amigos fiquem atentos, pois a
incidência de suicídio de idosos é grande, decorrente de depressão e outras
alterações psíquicas. Estudo realizado por Minayo e Cavalcante, em 2012, no

11
qual foram avaliados 51 casos de suicídio de idosos em dez cidades brasileiras,
indicou que transtornos mentais, depressão, conflitos familiares e conjugais são
as razões prevalentes de suicídio na terceira idade.
Outros aspectos de caráter social também podem ser indicadores de
suicídio nessa faixa etária, tais como aposentadoria, isolamento e perda de
prestígio social, além de atitudes preconceituosas e discriminatórias em relação
ao idoso (Leandro-França; Murta, 2014).
Em 2012, a OMS promoveu uma discussão sobre a implantação de ações
de combate à depressão em idosos, incluindo orientação para prevenção e
tratamento.
Para prevenção, detecção e tratamento dos transtornos mentais, a saúde
pública possui estratégias visando atingir os idosos da sociedade. Para Leandro-
França e Murta (2014), a descoberta precoce das patologias mentais favorece o
tratamento, a recuperação ou a manutenção da doença, utilizando medicação
adequada, psicoterapia e outras possibilidades que venham a beneficiar a saúde
do idoso.

TEMA 5 – PERCEPÇÃO DOS IDOSOS EM RELAÇÃO À SAÚDE

A percepção de bem-estar físico e mental depende das características de


cada indivíduo e se altera no decorrer da vida; ou seja, a percepção de felicidade
de uma criança não é a mesma da de um adolescente, que não difere de um
adulto, que não é igual à de um idoso.
Essa mudança na percepção de bem-estar e felicidade ocorre também
devido às influências intrínsecas, como presença de doenças físico-orgânicas e
mentais, mudanças ambientais e sociais. Assim sendo, o que um indivíduo
pensa em relação à sua saúde depende da presença ou não de doenças,
principalmente as crônico-degenerativas, mudanças no convívio familiar e ciclo
de amizades, independência financeira e outros fatores.
Batistella (2016) explica que, ao definir estado de bem-estar mental e
social, considera-se a história do indivíduo, com sua sensação de felicidade e
angústias no decorrer da vida. Em relação à saúde física, o discurso médico julga
que a doença é um fator predominante na percepção de saúde e bem-estar das
pessoas.
Essas percepções, na velhice, são influenciadas pela história do
indivíduo, com marcas físicas e mentais, decorrentes de suas escolhas durante
12
toda a vida como alimentação, prática de exercício físico regular, uso de álcool
e drogas, trabalho, convívio familiar e social etc.
A chegada da aposentadoria é um divisor de águas entre a idade adulta
e a terceira idade e pode ser positiva ou negativa. A aposentadoria bem-sucedida
permite ao idoso ser mais ativo, se adaptado a esse novo estilo de vida (OMS).
Ao contrário, se a transição entre a vida economicamente ativa e a aposentadoria
não for satisfatória ou o esperado pelo idoso, esse novo modo de viver pode
acarretar grande sofrimento, depressão e até mesmo o suicídio (Leandro-
França; Murta, 2014). Isso ocorre porque muitos idosos se sentem inativos,
inúteis e deixam de ter objetivos e projetos de vida.
Outros fatores que podem levar os idosos a definharem, esperando a
morte, são a perda do(a) parceiro(a) ou entes queridos, mudança forçada de
domicílio e desemparo familiar (Leandro-França; Murta, 2014).
As doenças, principalmente as de caráter crônico-degenerativas como
Alzheimer e Parkinson, também estão entre os motivos pelos quais os idosos se
sentem infelizes em face da incapacidade e da dependência.
Pinto et al. (2012) indicam que o sentimento de felicidade, por serem
ativos e úteis para sociedade, depende de programas de saúde pública, para
prevenir e promover a saúde mental dos idosos.
Para Marques (2018), é necessário que, ao chegar à velhice, o indivíduo
saiba como viver com saúde, mantendo o corpo e a mente equilibrados,
sentindo-se feliz. Para isso, o autor sugere sete dicas:

1) Viver com leveza e otimismo – o hábito de viver com leveza e otimismo


faz com que a pessoa tenha melhor qualidade de vida. Por isso, é
necessário que todos procurem sempre ter gratidão, deixando as
reclamações de lado. Além disso, as pessoas devem se manter afastadas
de pessoas negativas e de tudo que vá contra seus valores e ideais na
vida.
2) Praticar exercícios físicos regulares – a prática regular de exercícios
físicos é recomendação médica para evitar e combater inúmeras
patologias físicas e metabólicas, além, é claro, de melhorar a autoestima
e a qualidade do sono e combater a depressão. O idoso deve se exercitar
da maneira com a qual tenha mais afinidade, assim irá se manter em
atividade e usufruir de seus inúmeros benefícios físicos, cognitivos e
psicossociais.

13
3) Exercitar o cérebro – os exercícios para treinar o cérebro podem ser feitos
diariamente, como memorizar números de telefone, lembrar e mudar os
caminhos para ir até os locais corriqueiros, fazer caça-palavras e outras
atividades de estimulação cognitiva. Aprender novos exercícios físicos e
idiomas, tocar um instrumento musica etc. também são essenciais para
manter o cérebro ativo.
4) Alimentação saudável – a escolha dos alimentos, optando por uma dieta
equilibrada, é fundamental para que o organismo permaneça saudável.
Uma dieta balanceada fornece nutrientes necessários para que o
organismo se mantenha em funcionamento adequado.
5) Cultivar relacionamentos – os laços familiares e sociais são
importantíssimos para compartilhar momentos e experiências. A
socialização, seja no âmbito familiar, seja no social, é essencial para evitar
a solidão e, consequentemente, a depressão.
6) Acompanhamento médico – cuidar da saúde independe da idade, mas os
idosos devem ter sempre o cuidado de fazer checkups para que, em caso
de doença, esta seja diagnosticada com rapidez, e o tratamento, mais ágil
e eficaz. No caso dos idosos, existe uma especialidade, a geriatria, para
que os cuidados sejam ainda mais efetivos.
7) Fazer coisas novas – participar de atividades e realizar coisas que
proporcionem bem-estar e prazer e buscar pelo novo trazem benefícios à
saúde física e psíquica, dando a sensação de felicidade.

Estudo realizado pela OMS indicou que idosos com atitudes e


pensamentos positivos vivem em média 7,5 anos a mais que aqueles com
percepção e ações negativas.
Cada pessoa deve cuidar da saúde, da alimentação e procurar realizar o
que tem vontade e o que lhe faz bem para que tenha a percepção de uma vida
saudável e feliz. Entretanto, a população em geral também carrega uma carga
de responsabilidade sobre as ações que podem trazer benefícios ou prejuízos à
saúde do idoso. Segundo a OMS, as atitudes preconceituosas e de maus-tratos
em relação ao idoso podem trazer consequências negativas à saúde física e
mental dessas pessoas.
A gerontofobia e o medo de morrer estão diretamente relacionados com
o avanço da idade, o que aumenta o preconceito e discriminação contra idosos,
negando os direitos humanos na terceira idade (ONU, 2019).

14
Dessa forma, não somente os familiares, mas a sociedade como um todo
e o Poder Público, devem buscar a valorização do idoso e dar-lhe condições
para usufruir de uma velhice saudável e feliz.

NA PRÁTICA

A percepção de felicidade, por parte da população idosa, depende de


inúmeros fatores intrínsecos e extrínsecos. Assim sendo, cite e comente três dos
sete fatores mencionados no texto que possibilitam ao idoso desfrutar de uma
velhice saudável e feliz.

FINALIZANDO

Nesta aula, foram abordados alguns conceitos e um breve histórico sobre


saúde, categorizando-a em saúde física e mental. Foram descritas também as
maneiras como os idosos se sentem ao chegar à terceira idade, além de fatores
intrínsecos e ambientais que podem melhorar a percepção de saúde e bem-estar
dessa população.

15
REFERÊNCIAS

ARAÚJO, J. S.; XAVIER, M. P. O conceito de saúde e os modelos de assistência:


considerações e perspectivas em mudança. Revista Saúde em Foco, Teresina,
v. 1, n. 1, p. 117-149, jan./jul. 2014.

BATISTELLA, C. Abordagens contemporâneas do conceito de saúde. In:


FONSECA, A. F.; CORBO, A. D. (Org.). O território e o processo saúde-
doença. Rio de Janeiro: EPSJ; Fiocruz, 2007. p. 51-86.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 1988. Disponível


em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>.
Acesso em: 28 nov. 2019.

_____. Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003. Diário Oficial da União, Poder


Legislativo, Brasília, 3 out. 2003. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm>. Acesso em: 28
nov. 2019.

LEANDRO-FRANÇA, C.; GIARDINI, M. S. Prevenção e promoção da saúde


mental no envelhecimento: conceitos e intervenções. Psicologia: Ciência e
Profissão, v. 34, n. 2, p. 318-329, 2014.

MACIEL, M. G. Atividade física e funcionalidade do idoso. Motriz, Rio Claro, v.


16, n. 4, p. 1024-1032, out./dez. 2010. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/motriz/v16n4/a23v16n4.pdf>. Acesso em: 28 nov.
2019.

MARQUES, J. R. Como envelhecer com saúde física e mental? JRM Coaching,


18 maio 2018. Disponível em: <https://www.jrmcoaching.com.br/blog/como-
envelhecer-com-saude-fisica-e-mental/>. Acesso em: 28 nov. 2019.

MINAYO, M. C.; CAVALCANTE, F. Autópsias psicológicas e psicossociais de


idosos que morreram por suicídio no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, v. 17, n.
8, p. 1943-1954, 2012.

MOTTA, L. B. Processo de envelhecimento. In: SALDANHA, A. L.; CALDAS, C.


P. (Ed.). Saúde do idoso: a arte de cuidar. 2 ed. Rio de Janeiro: Interciência,
2004. p.115-124.

16
OMS – Organização Mundial da Saúde. Carta de Ottawa. In: BRASIL. Ministério
da Saúde. Promoção da saúde: Cartas de Ottawa, Adelaide, Sundsvall e Santa
Fé de Bogotá. Brasília: Ministério da Saúde/Fiocruz, 1986.

_____. Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde. 2015. Disponível em:


<https://sbgg.org.br/wp-content/uploads/2015/10/OMS-ENVELHECIMENTO-
2015-port.pdf>. Acesso em: 28 nov. 2019.

OMS define 10 prioridades de saúde para 2019. Nações Unidas Brasil, 16 jan.
2019. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/oms-define-10-prioridades-de-
saude-para-2019/> Acesso em: 28 nov. 2019.

OPAS – Organização Pan-Americana da Saúde. Envelhecimento ativo: uma


política de saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2005.
Disponível em: <https://www.paho.org/bra/>. Acesso em: 28 de outubro.

PINTO, L. et al. Evolução temporal da mortalidade por suicídio em pessoas com


60 anos ou mais nos estados brasileiros. Ciência & Saúde Coletiva, v. 17, n. 8,
p. 1973-1980, 2012.

SCLIAR, M. História do conceito de saúde. PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio


de Janeiro, v. 17, n. 1, p. 29-41, 2007.

SILVA, M. J. S.; SCHRAIBER, L. B.; MOTA, A. O conceito de saúde na Saúde


Coletiva: contribuições a partir da crítica social e histórica da produção científica.
PHYSIS: Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 29, n. 1, e290102, 2019.

17

Você também pode gostar