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PRÁTICAS RESTAURATIVAS NA VIOLÊNCIA CONTRA MULHER

Palestra realizada no dia 06 de março na Câmara de Vereadores de Capao da Canoa


Tiago Luiz C. Soares

Nós nascemos, crescemos e vivemos sendo moldados por uma


cultura na qual a mais de três mil anos a mulher é a origem de
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todo mal. A religião Cristã talvez tenha pegado carona na


misoginia já existente no mundo ou talvez a tenha ampliado ou
mesmo a inventado. A bíblia que sempre foi o livro mais vendido
e mais lido de todos os tempos, encontramos passagens e
apologias que talvez sejam o maior pecado capital da Igreja. Eva
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sucumbiu a maçã e se tornou a razão pela qual o homem se


tornou mortal e expulso do paraíso, passando o resto de sua
existência lutando pela sobrevivência. Na mitologia grega
Pandora, criada por Zeus como punição aos homens e possui
exatamente a mesma função que Eva. Tertuliano, autor das
primeiras fases do Cristianismo, primeiro autor cristão a produzir
uma obra literária em latim, apenas 200 anos depois da morte
de Cristo, dizia que “a mulher é a Porta por onde o Diabo
avança”. Desde o Genesis a mulher tem relação com o demônio
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e sempre foi ensinado, mesmo que subliminarmente que ela era


o disfarce da serpente e máscara do Diabo.
A mulher sempre foi a encarnação de nossos desejos e todo esse
ódio por ela injetado em nossa cultura, nasceu do desejo
pecaminoso pela carne, pelo sexo e pelo prazer proibido. Fomos
instruídos a sermos bons Cristãos resistindo aos desejos
representados pela mulher. Como bons Cristãos, o homem
deveria adorar, amar e desejar apenas a Deus, e a mulher
concorre com todo esse desejo e amor por Deus. O pecado está
em desejar a mulher, em adorá-la, por isso é mais fácil odiar o
desejo e culpar a mulher por senti-lo.
Na idade média e na renascença o homem dá início a uma caça
às bruxas, torturando, enforcando e queimando em fogueira
mais de 60 mil mulheres acusadas de bruxaria e servirem
ferramenta do demônio tendo poderes para atormentar os
homens. A Bíblia hebraica condenava a bruxaria, em Êxodos
22:18 prescreve "A Feiticeira não deixarás viver;”. Na verdade,
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o demônio coitado, nada teve culpa com essa caça às bruxas. As


“Bruxas” eram mulheres que viviam as margens dos vilarejos,
viúvas, solteiras, objeto do desejo adultero dos homens.
Mulheres livres que recebiam seus amantes em seu leito sem
culpa. Mulheres que não tinham vergonha de ser quem eram.
Mulheres esposas que os maridos não conseguiam controlar ou
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não conseguiam satisfazer. Portanto, mulheres que foram


torturadas, enforcadas, queimadas e mortas não por serem
bruxas, mas por serem Mulheres.
Hoje, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019,
a violência contra mulher aumenta a cada ano e mesmo após a
criação da Lei Maria da Penha de 2006 (Lei Nº11.340) e da Lei
do Feminicídio de 2015 (Lei Nº 13.104), entre outros mecanismos
legais que buscam reduzir a violência domestica contra mulher
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através de punições mais severas, nos últimos dez anos (2007-


2017) ocorreu um aumento de 30% nos feminicídios, ou seja, a
perseguição e morte intencional de pessoas do sexo feminino
mesmo sendo a lei mais rigorosa. Apenas em 2018, foram mortas
mais de 4 mil mulheres sendo que 1,2 mil foram feminicídios.
Além disso ocorreram 260 mil registros de violência contra
mulher (1 registro a cada 2 minutos), 263 mil casos de lesão
corporal dolosa, 180 estupros por dia, sendo que 53,8% eram
meninas de até 13 anos, são 4 crianças estupradas por hora no
brasil.
Estes números revelam que a criação de leis com punições mais
severas muito pouco adiantou, se adiantou alguma coisa, porque
não basta a criação de leis, é preciso identificar e mudar a cultura
geradora de violência. Pensando nisso, surge no Brasil ainda de
forma muito tímida, a Justiça Restaurativa como um método
alternativo e adequado ao tratamento dos conflitos domésticos,
visto que 98% dos feminicídios são cometidos por companheiros,
ex-companheiros ou parentes da vítima. A Justiça Restaurativa
se utiliza de técnicas sensíveis para tratar o conflito, trabalhando
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a cultura do ofensor para uma reabilitação, buscando restaurar


o dano causado, amparando e empoderando a vítima, fazendo
com que o ofensor se responsabilize pelos atos e entenda suas
consequências para a vítima.
A realidade demonstra que violência doméstica tem como causa
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uma espécie de ignorância cultural e ocorre principalmente pela


ausência de esclarecimentos. Mesmo o agressor não
reconhecendo uma mulher como igual, se ela for uma mulher
esclarecida as chances de violência doméstica agravar e reincidir
será, sem dúvida alguma, muito menor. Assim, a prática do
pensamento restaurativo/transformativo, administrado por uma
equipe multidisciplinar, facilitadores habilitados para lidar com o
conflitos e reabilitar ofensores, é capaz de proporcionar a mulher
vítima da violência um maior esclarecimento, assistência e
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empoderamento, capaz de diminuir e restaurar o dano sofrido,


impedindo uma reincidência por parte do agressor que passará
por uma reabilitação onde terá um espaço para refletir sobre sua
conduta e cultura na busca de redenção e realinhamento de
posturas desviantes. O pensamento restaurativo traz a
preocupação com a dignidade de todos envolvidos e por isso
acredita-se que possa ser a resposta mais efetiva para os casos
de violência doméstica contra mulher.

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