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Sistemática Vegetal

Material Teórico
Classificação e Sistemática de Fungos

Responsável pelo Conteúdo:


Profa. Dra. Cristine Gobbo Menezes

Revisão Textual:
Prof. Ms. Luciano Vieira Francisco
Classificação e Sistemática de Fungos

• O Que São Fungos, Afinal?


• Origem e Evolução dos Fungos
• Sistemática e Classificação de Fungos
• Sub-Reino Dikarya: Ascomycota e Basidiomycota
• Demais Filos do Reino Fungi
• Material Complementar

OBJETIVO DE APRENDIZADO
· Apresentar a nomenclatura específica à morfologia e classificação
dos fungos, características da morfologia e biologia que diferem
fungos de plantas e animais, classificação atual e filogenia.

ORIENTAÇÕES
Nesta Unidade veremos um pouco mais sobre o que são fungos, como
evoluíram, sua biologia e classificação atual. Talvez você não saiba, mas os
fungos podem estar presentes na sua alimentação, no remédio utilizado para
infecção e tratamentos contra o câncer, ou mesmo causar doenças que vão
de um simples desconforto a tumores ou cegueira.

Trata-se de um grupo de organismos especialmente excitante, portanto,


procure ler com atenção o conteúdo disponibilizado e o Material complementar.
Não se esqueça: a leitura é o momento oportuno para formular suas dúvidas;
por isso, não deixe de registrá-las e transmiti-las ao professor-tutor.

Além disso, para que a sua aprendizagem ocorra em um ambiente mais


interativo possível, na pasta de atividades, você encontrará a Avaliação, a
Atividade reflexiva e a Videoaula. Cada material disponibilizado é mais um
elemento para seu aprendizado, por isso, estude todos com atenção!
UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Contextualização
É comum associar os fungos à produção de bebidas – cerveja e vinho –, pães
e queijos, ou mesmo a doenças conhecidas como micoses. Há também o uso
disseminado de diferentes tipos de cogumelos na alimentação, como o champignon,
shimeji, shitake, trufa, entre outros. Mas o papel dos fungos na reciclagem dos
nutrientes em diferentes ecossistemas não pode ser deixado de lado. Com isso em
mente, que tal ler esta reportagem publicada na revista Scientific American Brasil?

Fungos armazenam quantidades surpreendentes de carbono


Por Mark Fischetti
O solo de uma floresta pode armazenar montes de carbono atmosférico, ajudando
a limitar o aquecimento global que resulta de emissões de dióxido de carbono.
Cientistas acreditavam que a maior parte dessa armazenagem era encontrada em
ramos e folhas de árvores que absorvem carbono, caem no chão e lentamente se
transformam em solo. Um novo estudo feito na Suécia, porém, indica que de 50
a 70% do carbono retido no solo na verdade depende de árvores e dos fungos que
crescem nelas.
[...] a quantidade de carbono armazenado no solo estava ligada aos fungos
micorriza, que crescem ao longo de sistemas de raízes de árvores e ajudam
a mantê-los saudáveis. “Esses fungos vivem em simbiose com raízes de
plantas e transportam carbono da fotossíntese diretamente para o solo”,
[...] “uma grande proporção do carbono armazenado nestas florestas
[boreais] entra no solo pelo subterrâneo, através de raízes e de seus fungos
associados”. [...] são necessárias mais pesquisas para determinar se
árvores mais antigas (as chamadas “florestas primárias”) de todo o mundo
significariam uma armazenagem maior. Conforme árvores envelhecem,
elas alocam menos carbono para fungos de raiz, mas resíduos de antigos
fungos mortos fixam carbono com mais eficiência do que folhas mortas e
madeira sobre o solo.

Outros estudos, porém, sugerem que micorrizas decompõem matéria


orgânica no solo, assim liberando carbono. Como esses fatores interagem
para formar um solo estável “é uma pergunta muito interessante e
intrigante que ainda não sabemos responder” [...]. O que está claro é que
fungos micorriza são muito mais importantes para o sequestro de carbono
do que se imaginava (grifos nossos).

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O Que São Fungos, Afinal?
Organismos eucariotos, que compartilham ancestral com as plantas, animais
e protistas. Portanto, não é estranho notar que existam semelhanças entre esses
grupos (Figura 1). Os fungos podem ser unicelulares – leveduras – ou multicelulares
e, neste caso, são constituídos de filamentos finos — as hifas — que se entrelaçam,
formando o micélio. Os fungos estão presentes em praticamente todos os
ambientes, inclusive marinho, e podem tolerar temperaturas bastante baixas –
abaixo de 0˚C, tais espécies são chamadas psicrófilas – ou altas – acima de 50˚C,
denominadas termófilas.

Os fungos são heterótrofos, ou seja, não produzem seu próprio alimento. Na


verdade, são sapróbios — crescem sobre ou dentro da sua fonte de alimento. A
digestão é externa e a alimentação é absortiva, ou seja, ocorre a absorção do
alimento previamente digerido através da secreção de enzimas digestivas sobre
a fonte de alimento. Por isso ocupam o papel de decompositores nas cadeias
tróficas, mas também podem ser parasitas ou simbiontes importantes.

Suas células possuem parede celular externa à membrana celular, contudo,


diferem daquelas encontradas em plantas devido à sua composição química: paredes
de células vegetais são compostas por microfibrilas de celulose, um polissacarídeo
complexo e resistente; nos fungos, no entanto, a parede celular é composta de
quitina, o mesmo polissacarídeo presente no exoesqueleto de artrópodes. A quitina
é mais resistente ao ataque microbiano que a celulose.

As hifas são, em geral, divididas por paredes transversais, chamadas septos.


Nos casos em que os septos estão ausentes, as hifas são chamadas de asseptadas
ou cenocíticas, que significa com “citoplasma comum” ou multinucleada. Hifas
especializadas para a fixação do fungo ao substrato ou ao corpo do hospedeiro,
no caso de fungos parasitas, são conhecidas como rizoides e haustórios,
respectivamente. Os haustórios também permitem a absorção diretamente das
células do organismo parasitado.

Plantas Fungos Animais

São heterótrofos

Possuem parede celular

Glicogênio como polissacarídeo


de reserva

Produzem esporos

Não possuem clorofila

Figura 1 – Características de fungos compartilhadas com plantas e animais.

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Diálogo com o autor:

Todos os fungos são heterótrofos. Para obtenção do alimento eles


agem como sapróbios (vivendo sobre matéria orgânica proveniente de
organismos mortos), como parasitas ou como simbiontes mutualistas.
Alguns fungos, principalmente leveduras, obtêm energia por meio da
fermentação, produzindo álcool etílico a partir da glicose. O glicogênio é o
principal polissacarídeo de reserva de muitos fungos, bem como de animais
e bactérias. Os lipídeos são substâncias de reserva importantes em outros
membros do grupo (RAVEN; EVERT; EICHORN, 2007, p. 301).

Os fungos se reproduzem sexuada e assexuadamente e em ambos os casos


há formação de esporos. No entanto, hifas fragmentadas podem regenerar-
se produzindo novos indivíduos assexuadamente; já leveduras podem dividir-se
por fissão. Os esporos de fungos são secos ou mucilaginosos, de acordo com
o mecanismo de dispersão. Aqueles secos são dispersos pelo ar e podem viajar
longas distâncias permanecendo viáveis. Esporos mucilaginosos são dispersos por
insetos que visitam o corpo de frutificação – o cogumelo. No entanto, existem
ainda estratégias de dispersão explosiva, como em Pilobolus sp.

O programa Earth unplugged da BBC registrou em câmera lenta a dispersão explosiva do


Explor

esporângio de Pilobolus sp. e comparou-a à velocidade de uma bala disparada de um rifle. O


disparo do esporângio atingiu o dobro da velocidade da bala, nas condições testadas.
https://youtu.be/T8OAmcUnm4g

Figura 2 – Esporangióforo de Pilobolus sp.


Fonte: BBC.co.uk

O esporângio – porção escura – permanece no topo do esporangióforo, acima


de uma vesícula que armazena líquido para produzir a pressão necessária ao disparo.

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Os esporos são produzidos em esporângios – angios: urna, proteção – ou em
células especializadas chamadas conidiogênicas. Os esporos produzidos nessas
células são solitários ou dispostos em cadeia, neste caso denominados conídios
(Figura 3). Os esporângios podem ser suportados por hastes, como na Figura 2,
que são chamadas de esporangióforos – spora: semente; pherein: carregar, portar.

A reprodução sexuada divide-se em três fases: plasmogamia, cariogamia


e meiose. Portanto, duas hifas atraídas uma pela outra através, provavelmente,
de ferormônios liberados no ambiente, tocam-se e fundem os protoplastos –
citoplasma, organelas, núcleo, ou seja, toda a porção viva da célula. Em algumas
espécies após a fertilização, determinada pela plasmogamia, ocorre imediatamente
a cariogamia – fusão dos núcleos –; em outras, porém, a hifa fertilizada permanece
com dois núcleos, condição denominada dicário. O dicário pode persistir por tempo
suficiente para produzir um micélio dicariótico através de múltiplas mitoses. As
espécies que produzem hifas dicarióticas estão atualmente agrupadas em um sub-
reino chamado Dikarya – que inclui as divisões Ascomycota e Basidiomycota.

Após a cariogamia forma-se um núcleo diploide que imediatamente inicia a


meiose, restabelecendo a condição haploide. A reprodução por meiose resulta em
esporos especializados: ascósporos, basidiósporos e similares.

Figura 3 – Conidióforos e conídios.


Fonte: Wikimedia Commons

As setas indicam os conídios na representação (A) e na imagem obtida por


microscopia de luz das hifas de Phialophora verrucosa (B). Observe também que
nas espécies ilustradas as hifas são septadas.

Diferente de outros organismos, no ciclo de vida dos fungos a condição diploide ocorre
Explor

exclusivamente no zigoto. Alguns grupos produzem gametas em estruturas chamadas


gametângios, no entanto, não existe diferença morfológica para determinar sexos
distintos, por isso são chamados de isogametas. Ademais, na maioria dos fungos o
núcleo age como gameta.

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Origem e Evolução dos Fungos


Estima-se que existam cerca de 1,5 milhão de espécies de fungos, portanto,
trata-se de um reino quase tão diversificado quanto o Plantae. Contudo, apenas
cerca de 100.000 espécies foram descritas até hoje. Em 2007, uma análise em
um fóssil encontrado na Arábia Saudita em 1843 e que imaginava-se corresponder
a um ancestral das coníferas, permitiu a identificação de um fungo gigante:
Prototaxites, que poderia atingir até 6 m, muito mais do que as plantas vasculares
que dominavam a Terra no período devoniano – há cerca de 350 milhões de anos.
Imaginar um fungo gigante era completamente absurdo até 2007. Trata-se de um
ótimo exemplo da diversidade desse grupo.

A origem dos fungos permanece incerta, contudo, algumas evidências


moleculares sugerem que a divergência a partir de um ancestral comum semelhante
a um protista colonial — um tipo de coanoflagelado (Figura 4) — deu origem
aos fungos e animais entre novecentos e quinhentos milhões de anos. Os fósseis
mais antigos de fungos são de hifas cenocíticas, datados do período cambriano –
cerca de 544 milhões de anos. Hifas ramificadas, semelhantes às micorrizas atuais,
foram identificadas em um fóssil de Aglaophyton major, uma planta do período
devoniano inferior, datado em mais de quatrocentos milhões de anos. Acredita-se
que essas micorrizas tiveram papel fundamental na evolução das plantas (RAVEN;
EVERT; EICHORN, 2007).

Figura 4 – Colônia de Choanoflagellata.


Fonte: Wikimedia Commons

A filogenia dos grupos atuais de fungos permanece mal resolvida, especialmente


quanto ao relacionamento entre os táxons superiores – filos e classes –, contudo,
é possível identificar grupos monofiléticos. Uma classificação recente baseada nas
filogenias disponíveis (HIBBETT et al., 2007) subdividiu o Reino Fungi em sete
filos, modificando assim a circunscrição de Chytridiomycota e dividindo as espécies
de Zygomycota entre outros filos. Estes filos foram sempre considerados basais
na evolução dos fungos, especialmente Chytridiomycota, o qual manteve flagelos
em seus zoósporos, característica interpretada como plesiomorfia – indício da
ancestralidade comum com os coanoflagelados e animais.

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No período siluriano (438-408 milhões de anos) foram encontrados
esporos de prováveis Ascomycota associados a formas terrestres
de microartrópodos (SHERWOOD-PIKE; GRAY, 1985 apud
ALEXOUPOULOS et al., 1996), assim como hifas fósseis associadas a
madeira deteriorada e vesículas de Endogonales, Glomales e quitrídios
associadas a sítio paleontológico em Rhynie, Escócia (ALEXOPOULOS
et al., 1996; SMITH; READ, 2008). Ao mesmo tempo, surgiam as
rinófitas, licófitas e progimnospermas, acarretando a diversificação de
plantas terrestres. Na Era paleozoica, a diversidade fúngica aumentou
consideravelmente e, na época pensilvaniana (320-286 milhões de anos),
todas as classes modernas de fungos já eram encontradas. Da mesma
forma, na Era paleozoica houve grande diversificação das gimnospermas,
licófitas, esfenófitas, Pterodermales e samambaias (ALEXOPOULOS et
al., 1996) (MAIA; CARVALHO JÚNIOR, 2010).

Sistemática e Classificação de Fungos


Como dito, o Reino Fungi atualmente possui um sub-reino – Dikarya – e sete
filos – Ascomycota; Basiodiomycota; Blastocladiomycota; Chytridiomycota;
Glomeromycota; Microsporidia; Neocallimastigomycota. Mas esta classificação
pode ainda sofrer modificações. Além disso, alguns grupos tradicionalmente
tratados como fungos, anteriormente classificados como Oomycota,
Myxomycota, Acrasiomycota e Labyrinthulomycota, foram transferidos para o
Reino polifilético dos protistas.

Talvez você esteja estranhando os nomes utilizados aqui, mas segundo o Código
de Nomenclatura de Algas, Fungos e Plantas, há um sufixo adequado para cada
grupo de organismos tratados pelo Código. Assim, uma divisão de plantas terminará
sempre com –phyta, é o caso de Briophyta; para algas utiliza-se a terminação
–phycota, como em Euglenophycota; e para fungos utiliza-se –mycota, como
em Ascomycota. A alteração segue para os demais níveis hierárquicos, portanto,
para fungos os subfilos terminam com –mycotina, classe –mycetes e subclasse –
mycetidae ( PRADO et al, 2011).

Ascomycota e Basidiomycota reúnem as espécies mais “populares” entre os fungos


e com grande importância econômica, que estão agrupadas sob o sub-reino Dikarya.

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Você Sabia? Importante!

Que no mundo estão descritas aproximadamente 99.000 espécies de fungos (KIRK et al.,
2008), das quais cerca de 13.800 existiriam no Brasil (LEWINSOHN; PRADO, 2006), ou
seja, aproximadamente 14% da diversidade mundial?
Entretanto, no mais recente catálogo de espécies de fungos do Brasil, estão registradas
78 ordens, 924 gêneros e 3.608 espécies, correspondendo a apenas 3,7% das descritas
mundialmente. Esse número está muito aquém dos 14% estimados por Lewinsohn e
Prado (2006). Independentemente dos problemas encontrados nas estimativas, esses
valores denotam que muito esforço ainda deve ser despendido na sistematização de dados
e na composição de coleções para se obter uma lista mais aproximada da condição real.

Sub-Reino Dikarya: Ascomycota e


Basidiomycota
Neste grupo surgiu uma novidade evolutiva que modificou o mundo: as
lignocelulases. Estas enzimas digerem a lignina, que tornam o lenho de
gimnospermas e angiospermas mais resistente. A lignina é de difícil digestão pelos
demais fungos, motivo pelo qual até o surgimento dos fungos lignocelulíticos
os troncos de árvores mortas acumulavam-se no ambiente, o que originaria
posteriormente o carvão mineral.

Ascomycota compreende cerca de 64.000 espécies, certamente o mais


diversificado grupo de fungos caracterizado por uma estrutura em forma de saco
denominada asco; dentro do asco são produzidos os ascóporos haploides – após
a meiose. Os ascos são produzidos, em geral, dentro de uma estrutura mais
complexa formada por hifas entrelaçadas, denominadas ascocarpo ou ascoma. Os
ascomicetos são extremamente variáveis quanto à morfologia (Figura 5) e ecologia;
são decompositores de lignina e queratina, materiais orgânicos de difícil degradação
e, por isso, desempenham um importante papel na ciclagem dos nutrientes. Além
disso, nesse grupo surgiram associações simbióticas importantes como as micorrizas
e líquens (BEIMFORDE et al., 2014; RAVEN; EVERT; EICHORN, 2007).

Você Sabia? Importante!

Que muitos ascomas são macroscópicos, ou seja, podem ser vistos a olho nu e seus
diferentes formatos recebem nomes distintos?
Assim, apotécio é o ascoma aberto em forma de xícara, cleistotécio é fechado e esférico –
como uma trufa –, peritécio tem forma de pera, com pequeno poro por onde os ascósporos
são liberados (Figura 5). A camada de ascos dentro do ascoma é chamada de himênio.

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O ciclo de vida de um ascomiceto (Figura 6) é semelhante ao explicado
anteriormente, porém há algumas particularidades que precisam ficar esclarecidas,
tanto na estrutura, como na nomenclatura. O micélio surge a partir da germinação
de um ascóporo em ambiente adequado. O micélio começa a produzir conídios e
se reproduzir assexuadamente, dispersando-se pelo ambiente. O mesmo micélio
que produziu os conídios produzirá os gametângios para a reprodução sexuada:
anterídio – masculino – e ascogônio – feminino. Os núcleos masculinos do anterídio
passam para o ascogônio através de uma ramificação do próprio ascogônio,
chamada tricógine, seguida da plasmogamia. Os núcleos masculinos e femininos
permanecem pareados, sem se fundir. As hifas ascógenas começam a crescer
para fora do ascogônio, os núcleos migram para dentro das hifas de tal modo
que as células resultantes são dicarióticas. Os ascos se formam na ponta das hifas
ascógenas dicarióticas, até formarem um gancho ou crozier. Nesta célula recurvada
ocorrem divisões celulares de tal modo que se formam três células dicarióticas,
mas apenas a célula intermediária sofrerá cariogamia, iniciando a meiose, seguida
de uma mitose, a qual produzirá, ao final, de quatro a oito ascósporos (RAVEN;
EVERT; EICHORN, 2007).

Figura 5 – Representantes de Ascomycota


Fonte: Wikimedia Commons

a. Sarcoscypha coccinea;
b. Morchella esculenta, as setas indicam os vários apotécios presentes no ascocarpo;
c. Peritécios de Nectria perithecia;
d. São esquemas de ascocarpos do tipo apotécio e peritécio, respectivamente.

Além da importância ecológica e diversidade morfológica, grande parte


dos fungos de relevância econômica são encontrados nesse filo, como a levedura
Saccharomyces cerevisae, amplamente empregada na produção de vinhos,
cervejas e pães; as espécies de Penicilium sp., empregadas na produção de queijos
finos – rockfort, gorgonzola, camembert e brie – e antibiótico – penicilina –, além
de causar perdas pela decomposição de pães e outros alimentos – bolor. Os
ascomicetos podem ter também relevância médica devido à produção de toxinas
– micotoxinas –, igualmente relacionados a infecções graves – Aspergillus sp.,
Candida sp. etc.

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Figura 6 – Ciclo de vida de um ascomiceto


Fonte: adaptada de M. Piepenbring.

Os fungos de interesse médico, agentes de micoses, são de dois tipos


morfológicos: leveduras, que são unicelulares e bolores ou fungos
filamentosos, que são multicelulares. Existe um sub-grupo dentro dos
filamentosos, chamados fungos dimórficos, que se apresentam sob ambas
as formas, dependendo principalmente da temperatura, mas sob influência
também do teor de CO2 e condições nutricionais. Com o advento da
terapia com antibióticos de largo espectro e o tratamento de pacientes com
doenças metabólicas crônicas, neoplásicos e transplantados, em uso de
agentes citotóxicos e imunossupressores, além da AIDS, a diferença entre
fungos contaminantes e patogênicos (classicamente os agentes de micoses
superficiais, subcutâneas e profundas), tornou-se pouco clara. Agentes
como Aspergillus, Candida, Cryptococcus (Basidiomycota) e espécies de
zigomicetos, considerados antigamente, de pouca importância clínica,
são agora conhecidos como causadores de enfermidades disseminadas,
endocardites, infecções pulmonares, ceratites entre outras, em pacientes
imunodeprimidos (BRASIL, 2004).

Basidiomycota é o segundo filo mais diverso do Reino Fungi, com cerca de


29.914 espécies (KIRK et al., 2008), basicamente terrestres, incluindo os cogumelos
comestíveis, venenosos, as orelhas-de-pau e alguns fitopatógenos importantes –
que causam doenças em plantas –, como as ferrugens.

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Você Sabia? Importante!

Que as espécies de Basidiomycota têm papel importante na decomposição de material


vegetal e representam frequentemente dois terços da biomassa viva do solo – não
incluindo os animais?

Seu corpo de frutificação, denominado basidiocarpo – ou basidioma –, distingue-o


dos demais fungos e é constituído de micélio secundário e micélio terciário, únicos
para esse grupo. O basidiocarpo divide-se em chapéu, lamelas e estipe (Figura 7),
os quais caracterizam o cogumelo comum. Na porção mais externa das lamelas, o
himênio, localizam-se os basídios, que são as estruturas produtoras de esporos. No
entanto, alguns basidiomicetos — os gasteromicetos — não expõem seus basídios,
havendo uma membrana chamada perídio, que pode ser bastante fina ou muito rígida,
a qual recobre as lamelas e protege os basidiósporos. A maioria dos basidiomicetos
reproduzem-se principalmente através de basidiósporos.

Figura 7 – Representação de um basidiocarpo típico e suas partes.


Fonte: Wikimedia Commons

O micélio dos basidiomicetos é sempre septado e pode passar por duas fases
distintas — monocariótica – células com um núcleo – e dicariótica – dois núcleos —
durante o ciclo de vida do fungo.

A germinação do esporo – basidiósporo – dá origem a um micélio monocariótico


também denominado micélio primário. Duas hifas monocarióticas produzidas
por indivíduos diferentes podem se encontrar e ocorrer a plasmogamia – micélio
heterocariótico. Dessa fusão de protoplasmas surge o micélio dicariótico, chamado
também de micélio secundário. Cada basídio desenvolve-se a partir da célula
terminal de uma hifa dicariótica, passando por um breve período de crescimento
celular, seguido da cariogamia. Imediatamente após a fusão dos núcleos, inicia-se
a meiose que resultará na produção de quatro – às vezes oito – basiósporos. O

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

basídio permanece exposto na camada himenial mesmo antes dos esporos estarem
maduros para a dispersão. Os basidiocarpos, no entanto, são formados por um
micélio terciário, que consiste do encontro de dois micélios dicarióticos.

Um único basidioma é capaz de produzir bilhões de basidiósporos. A quantidade


exagerada de esporos produzidos aumenta as chances de sucesso da dispersão, pois
aumenta a probabilidade do esporo cair sobre um substrato adequado e germinar.

Além das características distintivas dos basidiomicetos – produção de basídios,


micélios secundários e terciários, basidiósporos –, esse grupo diverso guarda
ainda peculiaridades, tais como fungos com bioluminescência. A ordem Agaricales
– Basidiomycota – agrupa praticamente todas as espécies — em torno de 70 spp.
— de fungos bioluminescentes conhecidos – exceto uma espécie de ascomiceto
da ordem Xylariales. A bioluminescência em fungos é decorrente de uma reação
química que leva à emissão constante de luz e depende da presença de oxigênio,
mas não existe consenso de como e porque surgiu nos fungos. Duas hipóteses
atualmente concorrentes tentam explicar a emissão da luz para atração de insetos
noturnos, que dispersariam os seus esporos; ou atração de insetos predadores que
se alimentariam de insetos prejudiciais ao fungo.

A Faculdade de Química da Universidade de São Paulo possui um laboratório dedicado ao


Explor

estudo da bioluminescência em fungos.


http://www.iq.usp.br/stevani

Em 2013 foi publicada uma revisão sobre bioluminescência em fungos por um grupo de
Explor

pesquisadores brasileiros: Anderson Garbuglio Oliveira, Rodrigo Pimenta Carvalho, Hans


Eugene Waldenmaier e Cassius Vinicius Stevani.
https://goo.gl/aobSe8

Neste filo ocorrem também espécies venenosas, das quais dá-se atenção à
Boletus satanas – Boletaceae –, assim como alucinógenas, caso das espécies dos
gêneros Psilocibe, Panaeolus, Capelandia e Amanita. No Brasil são encontrados
apenas Psilocibe e Panaeolus, porém, o tipo mais conhecido é a Amanita muscaria.
O gênero Amanita inclui algumas das espécies mais venenosas, como a A. virosa,
assim como outras comestíveis. A distinção entre espécies comestíveis e tóxicas
ou alucinógenas não é simples, sendo necessário o conhecimento aprofundado do
grupo para reconhecê-las.

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Demais Filos do Reino Fungi
Chytridiomycota teve sua circunscrição alterada com a transferência de alguns
táxons para novos filos, como o gênero Allomyces, o qual se tornou referência
para o filo Blastocladiomycota (HIBBETT et al., 2007). Chytridiomycota
conta com 706 espécies distribuídas atualmente em oito ordens: Chytridiales;
Cladochytriales; Lobulomycetales; Polychytriales; Rhizophlyctidales;
Rhizophydiales; Spizellomycetales e Monoblepharidales (JERÔNIMO et
al., 2015). Contudo, caracteriza-se pela presença de flagelos nos zoósporos e
gametas, inclui espécies saprófitas, parasitas e simbiontes, além de poder viver
no trato digestivo de animais herbívoros, solo e água. Acredita-se ser um filo basal
na história evolutiva dos fungos, especialmente pela manutenção de flagelos em
algum estágio do seu ciclo de vida.

Blastocladiomycota colonizam o solo e água, em geral são anaeróbios


facultativos, agrupando espécies decompositoras e patogênicas. A reprodução
é frequentemente sexuada pela fusão de gametas – zoósporos com flagelo
único. Juntamente com as quitrídias, é considerado um filo basal pela presença
de flagelo em algum estágio do ciclo de vida. O filo possui uma única classe –
Blastocladiomycetes – e é composto por 179 espécies (KIRK et al., 2008), cujos
representantes divergem do clado das quitrídias e são considerados constituintes de
um grupo-irmão juntamente com Zygomycota, Glomeromycota e Olpidium.

Microsporidia agrupa parasitas unicelulares de insetos, crustáceos, peixes


e animais que no passado eram classificados como protistas. Contudo, estudos
filogenéticos recentes reclassificaram o grupo como um fungo (HIBBETT et al.,
2007). Algumas espécies são letais e outras são utilizadas em controle biológico.
Suas células não possuem mitocôndria, tendo em seu lugar mitossomas – sem
DNA. Seus efeitos sobre o hospedeiro são variados, podendo inclusive afetar a
reprodução, causando esterilidade, mudança de sexo ou gigantismo. As doenças
causadas por esses fungos são chamadas genericamente de microsporidioses. A
reprodução, tanto assexuada quanto sexuada, ocorre através de esporos imóveis.

Neocallimastigomycota são organismos anaeróbios obrigatórios do sistema


digestivo de animais herbívoros que auxiliam na nutrição desses animais, degradando
a celulose da dieta. Sua reprodução assexuada ocorre por zoósporos com ou
sem flagelos. Não apresentam mitocôndrias, uma vez que o metabolismo dessa
organela depende da presença de oxigênio; em seu lugar possui hidrogenossomos,
uma organela recentemente descoberta – há cerca de vinte anos. Tais organelas
degradam ácido pirúvico ou ácido málico, produzindo gás hidrogênio, gás carbônico,
ácido acético e energia para a produção de ATP; além disso, multiplicam-se por
divisão e podem possuir DNA próprio – como as mitocôndrias.

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Glomeromycota são simbiontes obrigatórios que formam redes de hifas entre


plantas vizinhas, chamadas arbúsculos e, assim como outros fungos micorrízicos,
podem contribuir para a comunicação planta-planta. Melhoram a qualidade química,
física e biológica do solo. O filo é monofilético e possui cerca de duzentas espécies
descritas atualmente, das quais apenas uma faz simbiose com cianobactéria:
Geosiphon pyriformis; as demais criam associações frequentemente específicas
com plantas

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Apesar de trazer uma classificação desatualizada, vale a leitura porque o seguinte autor
trata do conceito de espécie micológica, tipificação – escolha do material-tipo para a
classificação –, nomenclatura específica e características gerais dos ascomicetos

Sites
Os fungos foram os responsáveis pelo fim dos depósitos naturais de carvão. Isso porque em um
grupo mais recente na evolução dos fungos surgiu uma enzima capaz de decompor a lignina,
um polissacarídeo mais resistente que a celulose e de difícil digestão. O texto sobre este assunto
foi publicado no blog Cientistas descobriram que..., de modo que vale a pena a leitura:

Uma pequena história sobre fungos, plantas fósseis e mudanças climáticas


SANTOS, E. R. D. dos. Uma pequena história sobre fungos, plantas fósseis e mudanças
climáticas. Cientistas descobriram que..., 25 mar. 2014.
https://goo.gl/33aqXA

O que acontece com o cerébro de quem usa Cogumelos Alucinógenos


Quais são os efeitos dos cogumelos alucinógenos sobre o cérebro? As regiões afetadas e seu
potencial uso farmacêutico são assuntos explorados na reportagem intitulada O que acontece
com o cérebro de quem usa cogumelos alucinógenos, publicada na revista Galileu:
https://goo.gl/jKzi7x
List of bioluminescent fungi
A bioluminescência em fungos é uma característica, no mínimo, interessante. No seguinte link
é possível conferir uma lista das espécies de fungos bioluminescentes conhecidos:
https://goo.gl/bnxvrC

Leitura
Moderna taxonomia dos Ascomycota
BEZERRA, J. L. Moderna taxonomia dos Ascomycota. In: CONGRESSO NACIONAL DE
BOTÂNICA, 56., São Paulo. Resumos... São Paulo, [20--].
https://goo.gl/4hsYW2

Industrial and Biotechnological applications of ligninolytic enzymes of the basidiomycota: A review


Uma revisão das aplicações biotecnológicas dos fungos
https://goo.gl/JD6Wgm

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UNIDADE Classificação e Sistemática de Fungos

Referências
ALEXOPOULOS, C. J.; MIMS, C. W.; BLACKWELL, M. Introductory mycology.
4th ed. New York: John Wiley & Sons, 1996.

BEIMFORDE, C. et al. Estimating the phanerozoic history of the Ascomycota


lineages: combining fossil and molecular data. Molecular Phylogenetics and
Evolution, v. 78, p. 386-398, 2014.

BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Detecção e identificação dos


fungos de importância médica. 2004. Disponível em: < https://goo.gl/ocKOD3
>. Acesso em: jan. 2016.

Hibbett, D.S., James, T.Y. & Vilgalys, R. 2007. In D.S. Hibbett et al., Mycological
Research 111, 13 Mar 2007.

JERÔNIMO, G. H. et al. Diversidade de Blastocladiomycota e Chytridiomycota


do Parque Estadual da Ilha do Cardoso, Cananéia, SP, Brasil. Hoehnea, v. 42, p.
135-163, 2015.

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brasileira. In: LEWINSOHN T. M. (Org.). Avaliação do estado do conhecimento
da biodiversidade brasileira. Brasília, DF: Ministério do Meio Ambiente, 2006.

MAIA, L. C.; CARVALHO JUNIOR, A. A. Introdução: os fungos do Brasil. In:


FORZZA, R. C. et al. (Org.). Catálogo de plantas e fungos do Brasil. v. 1. Rio de
Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio; Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio
de Janeiro, 2010. p. 43-48.

PRADO, Jefferson; HIRAI, Regina Yoshie; GIULIETTI, Ana Maria. Mudanças no


novo Código de Nomenclatura para Algas, Fungos e Plantas (Código de Melbourne).
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33062011000300026&lng=en&nrm=iso>.

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