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—— Muito bom dia senhora, —— Isto aqui não é Vitória —— Agora se me permite
que nessa janela está minha vez de perguntar:
sabe dizer se é possível como senhora, comadre,
nem é Glória do Goitá
algum trabalho encontrar? pode manter o seu lar?
e além da terra, me diga,
que mais sabe trabalhar?
—— Trabalho aqui nunca falta —— Vou explicar rapidamente,
a quem sabe trabalhar logo compreenderá:
—— Sei também tratar de gado,
o que fazia o compadre
entre urtigas pastorear
na sua terra de lá?
gado de comer do chão como aqui a morte é tanta,
ou de comer ramas no ar. vivo de a morte ajudar.
—— Pois fui sempre lavrador,
lavrador de terra má
—— Aqui não é Surubim —— E ainda se me permite
não há espécie de terra
nem Limoeiro, oxalá! que volte a perguntar:
que eu não possa cultivar.
mas diga-me, retirante, é aqui uma profissão
que mais fazia por lá? trabalho tão singular?
—— Isso aqui de nada adianta,
poucos existe o que lavrar
—— Em qualquer das cinco tachas —— é, sim, uma profissão,
mas diga-me, retirante,
de um bangüê sei cozinhar e a melhor de quantas há:
o que mais fazia por lá?
sei cuidar de uma moenda, sou de toda a região
de uma casa de purgar. rezadora titular.
—— Também lá na minha terra
de terra mesmo pouco há
—— Com a vinda das usinas —— E ainda se me permite
mas até a calva da pedra
há poucos engenhos já mais outra vez indagar:
sinto-me capaz de arar.
nada mais o retirante é boa essa profissão
aprendeu a fazer lá? em que a comadre ora está?
—— Também de pouco adianta,
nem pedra há aqui que amassar
—— Ali ninguém aprendeu —— De um raio de muitas léguas
diga-me ainda, compadre,
outro ofício, ou aprenderá vem gente aqui me chamar
que mais fazias por lá?
mas o sol, de sol a sol, a verdade é que não pude
bem se aprende a suportar. queixar-me ainda de azar.
—— Conheço todas as roças
que nesta chã podem dar
—— Mas isso então será tudo —— E se pela última vez
o algodão, a mamona,
em que sabe trabalhar? me permite perguntar:
a pita, o milho, o caroá.
vamos, diga, retirante, não existe outro trabalho
outras coisas saberá. para mim nesse lugar?
—— Esses roçados o banco
já não quer financiar
—— Deseja mesmo saber —— Como aqui a morte é tanta,
mas diga-me, retirante,
o que eu fazia por lá? só é possível trabalhar
o que mais fazia lá?
comer quando havia o quê nessas profissões que fazem
e, havendo ou não, trabalhar. da morte ofício ou bazar.
—— Melhor do que eu ninguém Imagine que outra gente
sei combater, quiçá, de profissão similar,
—— Essa vida por aqui
tanta planta de rapina farmacêuticos, coveiros,
é coisa familiar
que tenho visto por cá. doutor de anel no anular,
mas diga-me retirante,
remando contra a corrente
sabe benditos rezar?
da gente que baixa ao mar,
—— Essas plantas de rapina sabe cantar excelências,
retirantes às avessas,
são tudo o que a terra dá defuntos encomendar?
sobem do mar para cá.
diga-me ainda, compadre sabe tirar ladainhas,
Só os roçados da morte
que mais fazia por lá? sabe mortos enterrar?
compensam aqui cultivar,
e cultivá-los é fácil:
—— Tirei mandioca de chãs —— Já velei muitos defuntos, simples questão de plantar
que o vento vive a esfolar na serra é coisa vulgar não se precisa de limpa,
e de outras escalavras mas nunca aprendi as rezas, as estiagens e as pragas
pela seca faca solar. sei somente acompanhar. fazemos mais prosperar
e dão lucro imediato
nem é preciso esperar
—— Pois se o compadre soubesse pela colheita: recebe-se
rezar ou mesmo cantar, na hora mesma de semear.
trabalhávamos a meias,
que a freguesia bem dá.
APROXIMA-SE DO RETIRANTE O MORADOR DE UM DOS MOCAMBOS QUE EXISTEM ENTRE O CAIS E A ÁGUA DO RIO
O CARPINA FALA COM O RETIRANTE QUE ESTEVE DE FORA, SEM TOMAR PARTE DE NADA