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Arabidopsis thaliana: Uma pequena planta

um grande papel

Arabidopsis thaliana: A small plant a big role

Carla Andréa Delatorre1, adriano alves da silva2

RESUMO abstract

Arabidopsis thaliana é uma das espécies Arabidopsis thaliana has been the species
mais utilizadas na pesquisa científica atual- of choice for scientific research. Despite its
mente. Apesar de não apresentar importância lack of economic importance, it has been
econômica direta, esta espécie é o foco de the focus of genetic, biochemical and phy-
pesquisas na área da genética, bioquímica e siological research worldwide. The number
fisiologia. O número de trabalhos publicados of published articles about arabidopsis has
sobre a mesma aumentou significativamen- increased substantially after its genome was
te após o seqüenciamento de seu genoma. sequenced, and outgrew the number of arti-
Apesar do grande número de estudos existe cles related to economically important spe-
ainda muita desinformação sobre qual o seu cies. Despite the great number of studies in-
verdadeiro papel na pesquisa científica de es- volving arabidopsis, there is much disinfor-
pécies cultivadas e de que maneira o avanço mation about the actual role of this species
no conhecimento adquirido com A. thaliana in crop scientific research, as well as how the
pode auxiliar o desenvolvimento de cultiva- breakthroughs in arabidopsis research may
res cada vez mais resistentes, adaptados e help to develop more adapted and productive
produtivos. Os objetivos deste trabalho são crops. This work aims to discuss reasons for
discutir as razões do uso da A. thaliana como using A. thaliana as a model species and the
espécie modelo e a aplicabilidade deste mo- feasibility of this model for crop studies.
delo no estudo de espécies cultivadas.
Key-words: Biotechnology, model orga-
Palavras-chave: Biotecnologia, estresses a nism, abiotic stress, plant breeding.
fatores abióticos, melhoramento de plantas e
organismo modelo.
Introdução

Arabidopsis thaliana é uma das espécies


1
mais estudadas no meio científico atual. Ape-
Dra, Professora Adjunto do Departamento de Plan-
tas de Lavoura, Departamento de Plantas de Lavou- sar de sua proximidade com outras espécies
ra, Faculdade de Agronomia da Universidade Fede- como nabo, repolho, couve, brócolos e colza,
ral do Rio Grande do Sul - UFRGS, Caixa Postal ela não possui importância econômica direta.
15100, 90001-970, Porto Alegre-RS, Brasil, E-mail: A. thaliana é considerada uma planta dani-
cadtorre@ufrgs.br. Autor para correspondência. nha de pequena importância agrícola. Apesar
2
Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Fito-
tecnia, Faculdade de Agronomia-UFRGS. Porto Ale-
disto, esta espécie vem sendo, há mais de 40
gre, RS, Brasil. E-mail: agroadriano@terra.com.br. anos, o foco de muitas pesquisas na área da
genética, bioquímica e fisiologia.
Arabidopsis thaliana foi a primeira planta,
Recepção/Reception: 2007.08.28 e o terceiro organismo multicelular depois
Aceitação/Acception: 2008.04.29 de Caenorhabditis elegans (The C. elegans
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Sequencing Consortium, 1998) e Drosophi- mesmo autor descreveu o número correto de


la melanogaster (Adams et al. 2000), a ser cromossomos da espécie, cinco, no ano de
completamente seqüenciada (The Arabidop- 1907. Laibach coletou um grande número
sis Genome Initiative, 2000). de ecótipos e com a ajuda de Albert Kranz,
O número de trabalhos publicados sobre A. organizou-os na atual coleção de 750 acessos
thaliana é elevado e vem crescendo signifi- naturais (Meyerowitz, 2001).
cativamente nos últimos anos, principalmen- O início de uma comunidade de pesquisa
te após o seqüenciamento do seu genoma no em arabidopsis data de uma newsletter cha-
ano de 2000. Se utilizada a base de dados mada “Arabidopsis Information Service”,
Web of Science (24/04/2007) observa-se que estabelecida em 1964. A primeira Conferên-
foram publicados mais de 10 mil trabalhos cia Internacional de arabidopsis ocorreu em
sobre esta espécie no período de 1995 a 2000 1965, em Göttingen, Alemanha.
e, este número dobrou nos últimos cinco A partir de 1980, a arabidopsis começou
anos, na mesma base de dados. a ser amplamente utilizada em laboratórios
Apesar do grande número de estudos de- de pesquisa vegetal em todo mundo, sendo
senvolvidos com A. thaliana, existe ainda um dos vários candidatos à planta modelo,
muita desinformação sobre o verdadeiro pa- que incluíam milho, petúnia e tabaco. O es-
pel desta planta na agronomia; qual a rela- tabelecimento desta como planta modelo
ção que a mesma possui com a pesquisa de preferencial ocorreu em 1986 quando foram
espécies de grande importância econômica e publicados sua transformação genética me-
como o conhecimento gerado pode ser uti- diada por T-DNA e o isolamento do primeiro
lizado para o desenvolvimento de cultivares gene (Stachel et al., 1986). No ano de 2000,
cada vez mais resistentes, adaptados e pro- obteve-se o primeiro rascunho da seqüência
dutivos. de seu genoma, o que consolidou o uso desta
Com base neste cenário os objetivos des- como modelo (The Arabidopsis Geno-
ta revisão são discutir a razão do uso da A. me Initiative, 2000). A evolução do nú-
thaliana como espécie modelo e a aplicabi- mero de trabalhos publicados foi tão grande
lidade deste modelo no estudo de espécies que, atualmente, são produzidos mais de 20
cultivadas. artigos por dia útil mencionando arabidopsis
(Bevan & Walsh, 2006).

DESENVOLVIMENTO Organismo modelo

Histórico Por definição, organismo modelo é uma


espécie estudada extensivamente para o en-
A Arabidopsis thaliana foi descoberta por tendimento de um fenômeno biológico par-
Johannes Thal nas montanhas de Harz, na ticular, com a expectativa que as descobertas
Alemanha no século XVI. O nome dado a possam facilitar o entendimento do fenôme-
esta espécie na época foi Pilosella siliquosa, no em outros organismos. Esta estratégia é
o qual foi alterado várias vezes até chegar possível porque princípios biológicos, como
ao nome conhecido hoje (Rédei, 1975). O rotas metabólicas e regulatórias, e os genes
primeiro mutante, AGAMOUS, foi descrito que as codificam são conservados durante
em 1873 por Alexander Braun (Arabidopsis a evolução (Borém & Vieira, 2005). Os or-
Home, 2006) e em 1943, Friedrich Laibach ganismos modelo são utilizados não apenas
relatou sobre o potencial desta espécie como para estudar fenômenos, mas também para
planta modelo e começou a construir, junto desenvolver técnicas e identificar genes com
com sua aluna Erna Reinholz, a primeira maior facilidade.
coleção de mutantes induzidos de A. thalia- O primeiro modelo utilizado em biologia
na, utilizando raios-x (Laibach, 1943). Este molecular foi a bactéria Escherichia coli
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(Riley & Labedan, 1997; Thomas, 1999; de seis semanas. Em torno de 20 dias tem-se
Karp et al., 2002). Em eucariótas, Saccha- a formação do botão floral, aos 30 dias visua-
romyces cerevisiae tem sido amplamente liza-se a inflorescência e, aos 45 dias, ocorre
estudada, devido à facilidade e rapidez de o desenvolvimento das sementes, seguido do
crescimento (Kucharczyk & Rytka, 2001; início da senescência (Boyes et al., 2001).
Sutherland et al., 2001). A mosca das fru- As plantas se desenvolvem na forma de
tas, Drosophila melanogaster, também é roseta que varia de 2 a 10 cm de diâmetro,
utilizada como modelo, sendo um organis- dependendo das condições de crescimento.
mo animal multicelular de fácil manipu- As raízes são do tipo axial e as folhas são
lação (Parsell & Lindquist, 1993; Steller, cobertas por tricomas. As flores são compos-
1995; Adams et al., 2000; Guelman et al., tas no verticilo externo por quatro sépalas
2006). Caenorhabditis elegans possui pa- verdes, quatro pétalas brancas, seis estames
drões de desenvolvimento bem definidos e e um gineceu interno. As flores possuem
pode facilmente ser avaliada em relação a um tamanho médio de dois milímetros. Os
anormalidades, sendo utilizada como mo- frutos são do tipo silíqua e, são produzidas
delo em estudos de desenvolvimento na milhares de sementes por planta (Meinke et
biologia animal e humana (Brenner, 1974; al., 1998).
The C. elegans Sequencing Consortium,
1998; Oh et al., 2006; Pang et al., 2006). Por que Arabidopsis thaliana?
Outros modelos usados na biologia huma-
na incluem o ratinho (Mus musculus) e o Uma das vantagens de arabidopsis em re-
anfíbio Xenopus laevis. Na área vegetal, lação as demais plantas diz respeito ao por-
tabaco, petúnia, milho, tomate e mais re- te da planta que é muito pequeno. Este fato
centemente o arroz são alguns exemplos possibilita crescer milhares de plantas em
de espécies eventualmente usadas como espaços reduzidos como casas de vegeta-
modelos. ção ou mesmo câmaras de crescimento. Esta
Entre as características idealizadas em um planta pode ser cultivada inclusive em placas
organismo modelo estão: pequeno tamanho, de Petri o que facilita muito o trabalho e a
curto tempo de geração, alta acessibilidade, condução de um grande número de plantas
fácil manipulação, pequeno genoma, ampla ao mesmo tempo.
conservação de mecanismos e importância Além disso, A. thaliana é uma espécie de
econômica potencial. A. thaliana possui es- reprodução rápida, autógama, com ciclo de
tas características à exceção de importância vida curto e com grande produção de semen-
econômica comercial. tes, em torno de 5.000 por planta (Meinke et
al., 1998). O modo de reprodução autógama
Biologia da espécie permite que genes recessivos possam ser
acessados com maior facilidade.
A A. thaliana é uma planta da família Bras- O pequeno porte de planta aliado à facili-
sicaceae e possui muitos ecótipos, dentre dade de cultivo, hábito reprodutivo e ciclo de
estes, Columbia, Landsberg e Wassilewskija vida, resultam em um terceiro aspecto positi-
se destacam na sua utilização em pesquisas vo, o custo de produção reduzido.
científicas (Mewis et al., 2005; Chen et al., Um fator que foi decisivo no estabeleci-
2006). Esta espécie possui uma vasta distri- mento de arabidopsis como espécie modelo
buição pela Europa, Ásia e América do Norte é o fato de ser possível sua transformação
(Alonso-Blanco & Koornneef, 2000; Hoff- genética com Agrobacterium tumefaciens
mann, 2002). de maneira muito eficiente inclusive pela
O ciclo de vida da arabidopsis, incluindo aspersão de suas flores com solução con-
germinação, desenvolvimento, floração, ma- tendo a bactéria recombinante (Labra et al.,
turação e formação de sementes, é de cerca 2004). A maioria das espécies cultivadas
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apresenta grandes dificuldades para trans- O consórcio estabelecido entre várias ins-
formação, sendo necessária a utilização de tituições com o objetivo de seqüenciar o ge-
biobalística, um processo muito caro, ou noma de arabidopsis construiu uma comuni-
pela própria Agrobacterium tumefaciens dade científica organizada. Diferentemente
com a formação de calos. Estes dois proces- do que ocorre em outras espécies, os genes
sos apresentam baixa eficiência, problemas de arabidopsis não podem ser patenteados,
de regeneração de planta inteira e variação o que aumenta a transparência e o acesso
somaclonal (Larkin & Scowcroft, 1981; La- aos conhecimentos obtidos. Além disso,
bra et al., 2004). uma pletora de métodos e recursos para es-
Outro aspecto a considerar é relativo ao tudos nesta espécie foi desenvolvida. Entre
tamanho do genoma da A. thaliana. Esta estes, as populações contendo inserções de
espécie possui um tamanho de genoma bas- T-DNA e transposões, existem mais de 320
tante reduzido quando comparado a espécies mil inserções seqüenciadas. As linhagens
de importância comercial como arroz, sor- contendo estas inserções estão disponíveis e
go, milho, cevada e trigo. Possui um genoma devem permitir a identificação da função de
com cerca de 146 milhões de pares de base um grande número de genes. Outras popu-
(Bevan & Walsh, 2006), cerca de quatro ve- lações que permitem a detecção de padrões
zes menor que o arroz e 130 vezes menor de expressão ou de localização também já
que o do trigo, por exemplo, (Devos & Gale, foram desenvolvidas. Além disso, estão
2000). A densidade gênica, ou seja, a percen- disponíveis microarranjos (“microarrays”)
tagem de genes por megabases do genoma representando quase a totalidade dos 26
é maior em A. thaliana quando comparada mil genes de arabidopsis, e os dados obti-
a outras espécies como arroz e milho. Em dos estão sendo integrados. Os resultados de
arabidopsis cerca de 85% do genoma é com- 1300 experimentos com microarranjos estão
posto por genes propriamente ditos. Já em disponíveis nas bases de dados do TAIR e
trigo menos de 1% do genoma é composto NASC. Estes recursos no estudo de arabi-
por genes, o resto são seqüências não codi- dopsis abrem um leque bastante grande de
ficantes. Este fato faz com que o sequencia- potencialidades para o seu uso na pesquisa
mento, isolamento e, por conseqüência, o científica agrícola.
entendimento das funções de cada gene em
A. thaliana possa ser realizado com maior Exemplo de estudos
rapidez e menor custo.
A maioria dos processos que ocorrem nas Muitos estudos vêm sendo realizados em A.
espécies de importância econômica comer- thaliana nos mais diversos processos durante
cial ocorre também em arabidopsis. A com- o desenvolvimento da planta. A espécie vem
paração entre os proteomas de arabidopsis sendo usada como modelo tanto em estudos
e de arroz mostrou que 71% das proteínas de crescimento e desenvolvimento, como
previstas para o arroz apresentam similari- nos processos de resposta a estresses bióticos
dade a proteínas de arabidopsis (Bevan & e abióticos. Um estudo de importância para
Walsh, 2006). Esta similaridade sugere que a área agrícola realizado em A. thaliana foi
as funções celulares e bioquímicas dos genes o processo de floração. Esse processo envol-
de arroz e outras culturas possivelmente pos- ve uma complexa rede de vias de sinalização
sam ser estabelecidas a partir de experimen- que regula a floração, sendo modulada pelas
tos conduzidos em arabidopsis. Deste modo, condições ambientais (Reeves & Coupland,
a determinação de relações ortólogas entre 2000; Samach & Coupland, 2000; Araki,
arabidopsis e plantas com grande importân- 2001; Mouradov et al., 2002).
cia econômica é uma forma rápida e fácil de Inúmeros fatores ambientais controlam
se transferir a informação obtida em arabi- a indução à floração em arabidopsis como
dopsis para culturas comerciais. luz, temperatura, nutrientes, ácido giberéli-
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co, sendo o mais importante o fotoperíodo. fatores abióticos. Um dos principais estres-
A arabidopsis é uma planta de dias longos ses é a deficiência hídrica, neste caso um dos
(Corbesier et al., 1996). Outras vias de si- avanços diz respeito aos DREBs (Dehydra-
nalização à floração são percebidas por ara- tion-Responsive Element Binding), os quais
bidopsis, como a via de vernalização, onde são fatores de transcrição que se ligam aos
a exposição à baixa temperatura acelera a promotores de genes específicos induzindo
sua floração (Sheldon et al., 1999; Micha- a expressão destes em resposta a estresses
els & Amasino, 2000) e a via regulada pelo como déficit hídrico, salinidade e tempe-
ácido giberélico que também acelera o ciclo ratura (Kasuga et al., 1999). O efeito dos
(Wilson et al., 1992; Putterill et al., 1995; DREBs foi observado por Liu et al. (1998)
Blázquez et al., 1998). Estudos conduzidos que superexpressaram o gene DREB em A.
com Arabidopsis thaliana levaram à identi- thaliana. A planta transgênica apresentou
ficação de vários componentes de cada uma maior sobrevivência em condição de seca
dessas vias e respectivas posições numa e baixa temperatura quando comparada à
hierarquia de interações moleculares (Bláz- planta controle. Em condição de estresse
quez, 2000). A arabidopsis é um sistema por frio, a sobrevivência foi quase de 84%
modelo excelente para se estudar esta com- nas plantas superexpressando DREB, en-
plexidade, porque responde a muitos dos quanto todas as plantas controle morreram.
fatores ambientais que induzem a floração Este mesmo comportamento foi observado
em outras espécies de plantas e as ferramen- no estresse causado por déficit hídrico onde
tas necessárias para este estudo já estão bem as plantas transformadas obtiveram uma so-
desenvolvidas (Levy & Dean, 1998; Simp- brevivência de 44% e as plantas não trans-
son & Dean, 2002). formadas não apresentaram sobreviventes.
Muitos dos componentes destas vias en- No estudo dos DREBs, gerou-se não só o
contrados em arabidopsis, também foram conhecimento do processo em si, mas este
identificados em espécies com grande im- foi aplicado de maneira prática. Diversas
portância econômica comercial como, por instituições estão envolvidas em pesquisas
exemplo, o gene LFY, para o qual foram en- com o gene DREB no caráter de tolerância
contrados genes homólogos em arroz (Chujo ao déficit hídrico. Como exemplos, a Univer-
et al., 2003), e o gene VRN2 que foi encon- sidade de Cornell, nos Estados Unidos, está
trado em trigo (Yan et al, 2004). desenvolvendo cultivares de arroz resistentes
Todas as vias de floração conduzem à ati- à seca, a Universidade de Missouri, também
vação da transcrição do mesmo grupo de nos Estados Unidos, está desenvolvendo
genes de identidade floral que agem nos pri- plantas transgênicas de soja e o CIMMYT
mórdios dos órgãos florais (Pineiro & Cou- (Centro Internacional de Melhoramento de
pland, 1998). O LFY é o primeiro dos genes Milho e Trigo) no México, já transferiu o
de identidade floral conhecido a ser expresso gene DREB, isolado inicialmente em A. tha-
e, diretamente, ativa genes à jusante da via. liana, para o genoma do trigo. As plantas de
A importância do gene LFY foi confirmada trigo transformadas geneticamente que rece-
por Weigel & Nilsson (1995) que o superex- beram o gene DREB de arabidopsis apresen-
pressaram em A. thaliana fazendo com que a taram uma tolerância ao déficit hídrico muito
planta transgênica florescesse 12 dias antes superior as plantas não transformadas (Pelle-
da planta não transformada. grineschi et al., 2006).
Existe em A. thaliana uma grande varia- Além da estratégia de isolar em arabidop-
ção em crescimento e nas respostas ao am- sis genes de interesse e transferi-los para
biente nos seus diversos ecótipos fornecen- outras espécies induzindo maior tolerância
do, portanto, grande fonte de diversidade a estresses abióticos, outra estratégia em
(Bevan & Walsh, 2006). Assim, arabidopsis uso é tentar encontrar genes homólogos
tem sido usada para estudar a tolerância a em outras espécies. Por exemplo, a partir
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do gene DREB de arabidopsis encontrou- O desenvolvimento de genótipos mais


se um gene homólogo em arroz, denomi- eficientes na utilização dos recursos ambien-
nado de Oryza sativa DREB (OsDREB). tes tem se tornado objetivo nas pesquisas
Este gene isolado de arroz foi transferido agrícolas. Entre os recursos mais limitan-
para arabidopsis com objetivo de testar a tes encontra-se o fósforo. O entendimento
sua função, comparando se a função do do funcionamento da percepção e sinaliza-
gene isolado em arabidopsis apresentava a ção das limitações deste pelas plantas, bem
mesma função do gene homólogo em ar- como dos genes envolvidos no processo de
roz. Para realizar este estudo utilizaram-se aclimatação podem permitir a manipulação
plantas de A. thaliana transformadas com destes e desenvolvimento de genótipos mais
o gene OsDREB, plantas superexpressan- tolerantes a deficiência. Em decorrência das
do DREB e plantas não transformadas. Os facilidades já citadas anteriormente, arabi-
resultados mostraram que o gene OsDREB dopsis tem sido utilizada em diversos es-
isolado em arroz acarretou uma maior so- tudos genéticos buscando identificar genes
brevivência das plantas de arabidopsis, envolvidos na resposta à limitação de fós-
embora de uma maneira menos expressiva foro (Poirier et al. 1991, Trull & Deikman,
quando comparada às plantas superexpres- 1998; Chen et al., 2000; Sánchez-Calderón
sando o gene DREB, mas muito superior ao et al., 2006). Entre os genes identificados,
controle tanto no estresse por frio quanto destacam-se aqueles com possível ação si-
por salinidade (Dubouzet et al., 2003). No nalizadora, como phr1 (Rubio et al., 2001),
trabalho realizado por Ping et al. (2005), pdr2 (Delatorre et al., 2004) e lpi1 (Sánchez-
o gene OsDREB identificado a partir do Calderón et al., 2006). Mais de uma dezena
gene DREB de arabidopsis foi transferido de transportadores de fosfato de alta afini-
para o tabaco, aumentando a tolerância dade também teve seus genes identificados
deste ao frio. Este fato é importante ao se em arabidopsis, e a expressão de um deles
considerar que um dos principais proble- em tabaco gerou significativo aumento na
mas do cultivo do tabaco no Sul do Brasil absorção e acúmulo de fósforo (Mitsukawa
são as baixas temperaturas. et al., 1997). Outro mutante identificado em
Outro exemplo, da utilização de conheci- arabidopsis, pdr1, apresenta redução na ex-
mento obtido em arabidopsis em cultivares pressão de mais de vinte genes envolvidos
de espécies com interesse comercial relacio- na resposta a limitação de fosfato e possui
nado com tolerância a fatores abióticos, é o maior sensibilidade aos níveis de nitrato
do aumento da tolerância à salinidade em to- (Delatorre, 2002), sugerindo integração dos
mate. O gene AtNHX, isolado em arabidop- sinais nutricionais. A elucidação dos genes
sis por Apse et al. (1999) em estudos sobre o envolvidos na sinalização e da inter-relação
caráter tolerância à salinidade, foi transferido entre os mesmos permitirão identificar alvos
para uma cultivar de tomate (Zhang & Blu- para manipulação em plantas de importância
mwald, 2001). As plantas de tomate transfor- agrícola.
madas com o gene AtNHX apresentaram so-
brevivência muito maior quando comparada Perspectivas
àquelas de tomate comum em condições de
excesso de salinidade no solo. É importante São muitas as possibilidades de uso do
salientar que, neste caso, o excesso de sal é conhecimento adquirido em A. thaliana nas
acumulado na folha e não no fruto, o que ga- espécies agrícolas. O grande desafio que sur-
rante a boa qualidade do mesmo. Atualmen- ge a partir de agora é elucidar a função de
te, cerca de um terço das terras agricultáveis cada um dos 26.000 genes de arabidopsis e,
do mundo apresentam níveis de salinidade a partir dessas descobertas, esclarecer como
que afetam o desenvolvimento dos cultivos funcionam e interagem as mais diversas rotas
(Bonetti, 2005). metabólicas e, qual a relação que estas pos-
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