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Título: Municipalismo
Conselho Consultivo:
António Cândido de Oliveira | Universidade do Minho | CEJUR
Universidade do Minho | NEDAL
João
Paulo Zbyszewski | UATLA - Universidade Atlântica
Periodicidade: Bianual
ISBN: 978-972-8896-11-9
Impressão: Europress
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer processo eletrónico,
mecânico ou fotográfico, sem autorização prévia do editor
ÍNDICE
Editorial
- Diretor .................................................................................................................5
Artigos
A Constituição do urbanismo
- Dulce Lopes.......................................................................................................29
Normas de Colaboração.......................................................................................133
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EDITORIAL
Criada em 2009, a revista “Municipalismo”, propriedade da ATAM -
Associação dos Trabalhadores da Administração Local, agora com publicação
bienal, passou, a ser de natureza temática, a partir do presente número que é
dedicado ao Urbanismo.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 5
- A Constituição do urbanismo, Cláudio Monteiro
Claudio Monteiro
Juiz do Tribunal Constitucional
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
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RESUMO
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O urbanismo está presente na Constituição portuguesa de 1976 desde a
sua versão originária1, onde surgiu no artigo 65º funcionalizado à satisfação
do direito fundamental à habitação, mas desde então, sobretudo a partir da
revisão constitucional de 1997, tem vindo a autonomizar-se e a afirmar-se
enquanto um bem constitucional a se2.
1 Seguimos aqui de perto aquilo que escrevemos sobre a Constituição do urbanismo na nossa dissertação de doutoramento O domínio da cidade. A
propriedade à prova no Direito do Urbanismo, AAFDL, Lisboa, 2013. Sobre a mesma matéria v. também Fausto de Quadros, “Princípios fundamentais
de Direito Constitucional e de Direito Administrativo em matéria de Direito do Urbanismo”, In Direito do Urbanismo (Comunicações apresentadas no
curso realizado no Instituto Nacional da Administração), Instituto Nacional de Administração, Oeiras, 1989, pp. 269-300; Fernando Alves Correia, Manual
de Direito do Urbanismo (Vol I), 4ª edição, Almedina, Coimbra, 2008, pp. 115 ss. e Maria da Glória Garcia, Direito do Urbanismo, Lex, Lisboa, 1999, pp.
49-52 e Maria da Glória Garcia, “Constituição e ordenamento do território”, In Os dez anos da Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e
de Urbanismo. Genése e evolução do sistema de gestão territorial, 1998-2008, Ad Urbem, Lisboa, 2010. Para uma perspetiva comparada da dimensão
constitucional do urbanismo, v. Gabriella Mangione, Jus aedificandi e valori costituzionali. Uno studio comparatistico su alcuni aspetti della problematica in
tre ordinamenti dell’Europa attuale, Giuffrè, Milão, 2004 e Barbara Giuliani, “La nozione costituzionale di «governo del territorio»: un’analisi comparata”,
In Rivista Giuridica dell’Edilizia, 2005, pp. 285-302.
2 Esta perspetiva é defendida, entre outros, por Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol I), p. 121. Referindo-se à instrumentalidade
do urbanismo em relação ao direito à habitação, ainda hoje, v. Joaquim Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição Anotada, 4ª edição, Coimbra
Editora, Coimbra, 2007, p. 834.
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1. O urbanismo como função pública
3 Neste sentido v., entre nós, Diogo Freitas do Amaral, “Opções políticas e ideológicas subjacentes à legislação urbanística”, In Direito do Urbanismo
(Comunicações apresentadas no curso realizado no Instituto Nacional da Administração), p. 99, Maria da Glória Garcia, “O Direito do Urbanismo entre
a liberdade individual e a política urbana”, in Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente (13), p. 98; Fernando Alves Correia, Manual de Direito do
Urbanismo (Vol I), pp. 140-142; Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes, “O papel dos privados no planeamento: que formas de intervenção?”, In Revista
Jurídica do Urbanismo e do Ambiente (20), pp. 44 ss. e João Miranda, A função pública urbanística e o seu exercício por particulares, Coimbra Editora,
Coimbra, 2012, pp. 129 ss.
4 Sobre o papel dos particulares no planeamento urbanístico, v. Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes, “O papel dos privados no planeamento”; sobre o
seu papel na execução dos planos, v. João Miranda, “O papel dos particulares na execução dos planos territoriais - uma breve abordagem à luz do direito
português”, In Revista de Derecho de la Universidad Nacional de Educación a Distancia, 2006, pp. 497 ss., e A função pública urbanística e o seu exercício
por particulares.
5 Cfr. Eduardo García de Enterría, “La Ley del suelo y el futuro del urbanismo”, In Anuario de Derecho Civil, XI, p. 492.
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os respetivos limites. Já na segunda, a Administração tem o controlo
absoluto daquele processo, tomando todas as decisões fundamentais a
seu respeito.
9 A distinção entre «ordenação» e «transformação» é proposta por Maria Pardo Álvarez, com o objetivo de reconduzir a função pública urbanística àquela
primeira atividade. Segundo a autora, enquanto a ordenação corresponde à direção e controlo público da atividade urbanística, a transformação física
corresponde à atividade de urbanização e edificação, entendidas aqui no seu sentido estrito de realização das correspondentes obras - cfr. María Pardo
Álvarez, La potestad de planeamiento urbanístico bajo el Estado, social, autonómico y democrático de Derecho, Marcial Pons, Madrid, 2005, pp. 127 e 133 ss.
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O disposto na Lei dos Solos de 1976 é, aliás, fundamental para compreender
a ratio da redação originária do número 4 do artigo 65º da Constituição,
quando este se propunha promover a socialização integral dos solos
urbanos e a definição do “respetivo direito de utilização”.
13 No texto da CRP 1976 existe apenas uma referência aos planos de urbanização como instrumento de «apoio» da política de habitação - cfr. artigo 65º/2ª).
14 Cfr. artigo 9º/e) da CRP 1982 e da CRP 1989. Também foi introduzida no artigo 66º/2/b) pela revisão constitucional de 1989 a incumbência de o Estado
“ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correta localização das atividades, um equilibrado desenvolvimento socioeconómico
14 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Por seu turno, não obstante a maior autonomia reconhecida ao urbanismo
pela revisão constitucional de 1997, a Constituição não deixou de
reconhecer também a íntima relação desta função com a tarefa fundamental
do Estado de promover o correto ordenamento do território, determinado
que a definição das regras de ocupação, uso e transformação dos solos
urbanos seja feita por instrumentos de planeamento, no quadro das leis
respeitantes ao ordenamento do território e ao urbanismo15.
e a valorização da paisagem”. Uma relação entre o ordenamento do território e a política de habitação também pode ser encontrada, desde o texto
originário da Constituição, no artigo 65º/2/a), quando estabelece a incumbência do Estado de “programar uma política de habitação inserida em planos
de ordenamento geral do território”.
15 Cfr. artigo 65º/4 da CRP 1997. Referindo-se a essa relação «íntima», v. Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol I), p. 137.
16 Esse dever está, expresso, nomeadamente, no artigo 8º da Lei de Bases Gerais da Política de Solos, do Ordenamento do Território e do Urbanismo
(LBPSOTU), que dispõe na alínea a) do seu número 2, entre outros, que “o Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais têm o dever de planear
e programar o uso do solo e promover a respetiva concretização”, sendo concretizado, entre outros também, na obrigatoriedade da elaboração do
plano diretor municipal imposta pelo artigo 95º/4 do RJIGT. Na doutrina, no sentido da consagração deste dever de planear o território, v. Fernando
Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol I), pp. 140-142; Maria da Glória Garcia, Direito do Urbanismo, p. 76; João Miranda, A dinâmica do
planeamento territorial, Coimbra Editora, Coimbra, 2002, p. 69 e Gonçalo Reino Pires, A classificação e a qualificação do solo por plano municipal de
ordenamento do território, Edições Alumni FDL, Lisboa, 2015, pp. 53 ss.
18 Como nota Maria da Glória Garcia, Direito do Urbanismo, p. 50, a relação do direito do urbanismo com os direitos fundamentais não se resume à sua
instrumentalidade em relação ao direito à habitação e ao ambiente, inserindo-se antes “numa política urbana global e integrada”.
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Já se disse a esse propósito que vivemos num “Estado de planeamento
e ordenamento do território”, que envolve juspublicamente a atividade
urbanística dos particulares e conforma as suas posições jurídicas subjetiva
patrimoniais, nomeadamente o seu direito de propriedade19.
19 Cfr. Mário Esteves de Oliveira, “O direito de propriedade e o jus aedificandi no direito português”, in Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente (3), p.
194.
20 Cfr. artigo 65º/2/c), onde se estabelece como incumbência do Estado, para garantir o acesso à habitação própria ou arrendada, “promover a construção
privada com subordinação ao interesse geral”.
21 Sobre a centralização como uma característica da Administração Pública do urbanismo em Portugal ao longo da história, v. o que escrevemos em
Claudio Monteiro, Escrever Direito por linhas rectas. Legislação e planeamento urbanístico na Baixa de Lisboa (1755-1833), AAFDL, Lisboa, 2010, pp.
253-256. V. também Fernando Gonçalves, “Evolução histórica do Direito do Urbanismo em Portugal”, in Comunicações apresentadas no curso realizado
no Instituto Nacional da Administração, pp. 225-268 e Fernando Gonçalves, “A organização institucional do planeamento urbanístico em Portugal:
problemas e dificuldades”, In Urbanismo e Poder Local, Centro de Estudos e Formação Autárquica, Coimbra, 1989, pp. 115-162.
22 As prioridades políticas do novo regime foram dirigidas a enquadrar juridicamente o fenómeno da construção clandestina, através da aprovação do
Decreto-Lei nº 804/76, de 6.11, e a controlar o mercado privado de terrenos para construção, através da aprovação de um novo Código das Expropriações,
pelo Decreto-Lei nº 71/76, de 27.1, e de uma nova Lei dos Solos, pelo Decreto-Lei nº 794/76, de 5.11. O que de certa forma era imposto pela própria
Constituição, cujo artigo 65º, na sua redação originária, subordinava a política pública de urbanismo à política de habitação.
16 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
até ao final da década de oitenta do século passado23, ganhou uma nova
dimensão com a emergência de um poder local democrático, tendo
assegurado, pelo menos numa primeira fase do regime, uma considerável
autonomia de decisão às câmaras municipais em matéria urbanística.
23 O Decreto-Lei nº 560/71, de 17.12, que estabelecia o regime dos planos de urbanização e de pormenor, vigorou até à aprovação do Decreto-Lei nº 69/90,
de 2.3, que estabeleceu o regime jurídico dos planos municipais de ordenamento do território. O Decreto-Lei nº 166/70, de 15.4, que estabelecia o regime
de licenciamento municipal de obras particulares, vigorou até à aprovação do Decreto-Lei nº 445/91, de 20 de Novembro, que o substituiu. Só o Decreto-
Lei nº 289/73, de 6.6, que estabelecia o regime do licenciamento municipal de operações de loteamento foi substituído mais cedo, pelo Decreto-Lei nº
400/84, de 31.12.
24 V., nomeadamente, o que escrevemos em Claudio Monteiro, “Cidade, Democracia e Direito. A autonomia do poder local em matéria urbanística”, In
Cidade e Democracia. 30 Anos Transformação Urbana em Portugal, Argumentum, Lisboa, 2006, pp. 349-399, cujas principais conclusões seguimos aqui
de perto, não obstante as correntes doutrinárias e jurisprudenciais maioritariamente adversas que se consolidaram e se desenvolveram desde então.
25 Sobre a descentralização administrativa territorial na Constituição, v. Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo (Vol. I), Almedina,
Coimbra, 206, pp. 479 ss. e 873 ss.
27 Conforme refere António Cândido de Oliveira, a Constituição portuguesa não se limitou a garantir uma autonomia local de conteúdo mínimo, mas o
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A autonomia local não se restringe a uma garantia institucional desprovida
de conteúdo material e assente exclusivamente em normas organizatórias.
Não basta que existam autarquias locais, designadamente municípios e
freguesias, e que as mesmas participem no processo de formação das
decisões que afetem as respetivas populações.
máximo de autonomia dentro do respeito pelos princípios da eficácia e da unidade de ação na prossecução do interesse público - cfr. António Cândido de
Oliveira, Direito das Autarquias Locais, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2014, pp. 225-226.
28 Cfr. Fernando Alves Correia, O plano urbanístico e o princípio da igualdade, Almedina, Coimbra, 1989, p. 64.
18 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
ao Estado a obrigação de assegurar um “correto ordenamento do território”29,
no pressuposto de que esta incumbência abarca tudo o que respeita
à ocupação, uso e transformação dos solos, incluindo aquilo que era
tradicionalmente reservado à competência dos órgãos municipais.
30 V., entre outros, o Decreto-Lei nº 69/90, de 2 de Março, que aprovou o regime dos planos municipais de ordenamento do território.
31 Cfr. Lei n.º 48/98, de 11 de agosto, entretanto substituída Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, que aprovou as bases gerais da política de solos, de ordenamento
do território e de urbanismo.
32 Cfr. Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de setembro, por diversas vezes alterado e finalmente substituído pelo Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio.
33 Com a redação que aquele diploma legal deu então ao artigo 80.º/2 do Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de setembro, a ratificação pelo Governo do plano
diretor municipal passou a ocorrer a solicitação da câmara municipal, deixando de ser genericamente exigível. A mesma solução resulta atualmente do
artigo 91.º/2 do novo RJIGT.
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intervenção de múltiplas entidades encarregues de tutelar interesses
públicos diferenciados do Estado, que na prática nem sempre é possível
identificar com clareza a autoria material dos planos.
34 Rejeitando a adoção de um critério material de distinção entre o ordenamento do território e o urbanismo, e justificando as competências de intervenção
do Estado em matéria urbanística pela necessidade de este prosseguir as suas atribuições próprias relativas ao ordenamento do território v., na doutrina,
Fernando Alves Correia, O plano urbanístico e o princípio da igualdade, pp. 64 e ss., 165 e 271-272, Fernando Alves Correia, As grandes linhas da recente
reforma do Direito do Urbanismo português, Almedina, Coimbra, 1993, pp. 34 e ss., 86 e ss., 105-106 e 120-122 e Fernando Alves Correia, Manual de
Direito do Urbanismo (Vol I), pp. 72 ss., José Perestrelo de Oliveira, Planos Municipais de Ordenamento do Território, Almedina, Coimbra, 1991, pp. 14 e
20 e ss. e Rui Chancerelle de Machete, “Privilégio da Execução Prévia. Embargo de obra nova”, In Estudos de Direito Público e Ciência Política, Lisboa, 1991,
p.511 ss.
35 Neste sentido, em especial, Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol I), pp. 215 ss.; v. também Gonçalo Reino Pires, A classificação
e a qualificação do solo pelos planos municipais de ordenamento do território, pp. 66-67, Jorge Reis Novais, “Ainda sobre o jus aedificandi”, in Estudos
jurídicos e económicos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Sousa Franco, Coimbra Editora, Coimbra, 2006, p. 517 e Rui Medeiros, “Comentário
ao artigo 65º (Habitação e Urbanismo)”, in Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Anotada (i Vol.), 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, p. 1336.
36 A expressão, aliás, é de Fernando Alves Correia, “Problemas actuais do Direito do Urbanismo em Portugal”, In Revista do Centro de Estudos de Direito do
Ordenamento, do Urbanismo e do Ambiente, Ano I (2), p. 15. Na jurisprudência do Tribunal Constitucional, v. Acórdãos nºs 432/93 (Conselheiro António
Vitorino), 379/96 (Conselheiro Messias Bento), 548/97 (Conselheiro Monteiro Diniz), 329/99 (Conselheiro Messias Bento) e 517/99 (Conselheiro Messias
Bento), todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.
20 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
de tutela administrativa, e não estão por isso sujeitas aos limites
constitucionais estabelecidos para este tipo de atuações37.
37 Contra este entendimento pronunciou-se, no âmbito da legislação produzida na referida reforma do Ministro Valente de Oliveira, Diogo Freitas do Amaral,
Direito do Urbanismo (Sumários), policopiado, 1993, pp. 57 ss.
38 Referindo-se à concertação de interesses como a ideia chave expressa pelo artigo 65º/4 CRP, v. Maria da Glória Garcia, Direito do Urbanismo, p. 50.
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Estado e as autarquias locais neste domínio39.
39 Sobre a distinção entre ordenamento do território e urbanismo, v. o que escrevemos em Claudio Monteiro, O embargo e a demolição de obras no
Direito do Urbanismo, Dissertação de Mestrado em Ciências Jurídico-Políticas, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1995, pp. 5-10. V. também
Diogo Freitas do Amaral, “Ordenamento do Território, Urbanismo e Ambiente: Objecto, autonomia e distinções”, In Revista Jurídica do Urbanismo e do
Ambiente, Junho (1) e Fernanda Paula Oliveira, Portugal: Território e odenamento, Almedina, Coimbra, 2009, pp. 7 ss., e em especial pp. 26 ss. Na doutrina
estrangeira v. María Pardo Álvarez, La potestad de planeamiento urbanístico bajo el Estado social, autonomico y democratico de Derecho, pp. 33 ss.
40 O que, inclusive, é reconhecido por Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol I), pp. 127 e 137.
41 Do mesmo modo que no artigo 165º/1/z) CRP se estabelece uma reserva relativa de competência da Assembleia da República quanto às “bases do
ordenamento do território e do urbanismo”.
22 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
atribuição própria das autarquias locais44.
44 Não é sequer evidente que o Estado de que falam os preceitos constitucionais em questão seja sempre o Estado-Administração, e que estas atribuições
não possam ser prosseguidas por outros entes territoriais, designadamente as próprias autarquias locais. No artigo 9º/e), por exemplo, a referência ao
Estado tem de ser interpretada no seu contexto sistemático, relacionando-se com os fins da comunidade política em geral, e não apenas com o exercício
da função administrativa.
45 Sobre as relações entre planos municipais e planos estaduais no sistema de gestão territorial v. o que escrevemos em Claudio Monteiro, “A lei do mais
próximo: as relações entre planos no sistema de gestão territorial”, In GeoINova - Revista do Departamento de Geografia e Planeamento Regional da
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (7), 2003.
46 Já nos havíamos pronunciado neste sentido em Claudio Monteiro, “Urbanismo e interesses públicos diferenciados. O novo regime de consultas a
entidades externas nos procedimentos de controlo prévio das operações urbanísticas”, In Revista de Direito Local e Regional (4), 2008.
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3. O plano como instrumento preferencial de atuação
urbanística da Administração
51 A expressão é de Diogo Freitas do Amaral, em “Opções políticas e ideológicas subjacentes à legislação urbanística”, p. 99.
24 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
A revisão constitucional de 1989 consolidaria definitivamente o modelo de
economia mista, ou economia social de mercado, no quadro de um Estado
de Direito democrático.
Esta opção clara que a Constituição faz pelo plano como instrumento de
54 O entendimento de que vigora no nosso ordenamento jurídico um «princípio da reserva de plano», fundado no artigo 65º/4 CRP e na legislação ordinária
que o concretiza, é defendido por Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol I) e João Miranda, A dinâmica do planeamento territorial,
p. 301. No direito alemão, onde estas posições se fundam, v. Harald Dähne, „Die so genannte baufreiheit: das bauen und die eigentumsgarantie „, In
Jura, 25 (7), 2003, p. 459 e Werner Hoppe, et al., Öffentliches Baurecht, Beck, Munique, 2004, p. 30. Num sentido ligeiramente diferente, mas mais
próximo daquele com que o empregaremos adiante, referindo-se a uma “reserva de ponderação da Administração através do plano”, ou a uma “reserva
de planeamento territorial”, v., respetivamente, Gonçalo Reino Pires, A classificação e a qualificação do solo por planos municipais de ordenamento do
território, p. 134 e Rui Medeiros, “Comentário ao artigo 65º (Habitação e Urbanismo)”, p. 1337.
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atuação urbanística da Administração tem duas consequências importantes.
55 O princípio da proporcionalidade constitui um pressuposto geral de legitimidade da expropriação por utilidade pública, nos termos do artigo 62º/2 CRP
e 3º do CE. Sobre a matéria v. Fernando Alves Correia, As garantias do particular na expropriação por utilidade pública, Coimbra Editora, Coimbra, 1982,
pp. 117 ss. e Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo (Vol. II), pp. 194 ss., e José Osvaldo Gomes, Expropriações por utilidade pública, Lex,
Lisboa, 1997, pp. 126 ss.
56 Em sentido próximo pronuncia-se Gonçalo Reino Pires, A classificação e a qualificação do solo por planos municipais de ordenamento do território, pp.
68-69.
26 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
administrativo57, como inclusive nos casos em que ele procede à definição
de situações jurídicas concretas, apresentando-se como opção alternativa
ao ato administrativo58.
57 A questão coloca-se, sobretudo, na relação entre os planos e os regulamentos municipais de urbanização e de edificação, previstos no artigo 3º RJUE, mas
também na relação entre aqueles primeiros e outros regulamentos administrativos com incidência territorial.
58 A questão coloca-se, sobretudo, na opção entre a elaboração e aprovação de um plano de pormenor e o licenciamento de uma operação de loteamento
urbano como modos «alternativos» de estabelecer a disciplina concreta da ocupação, uso e transformação de uma zona particularizada, podendo dizer-se
a esse respeito que a Constituição estabelece um critério normativo de preferência do plano, sobretudo num quadro legal – como é atualmente o nosso,
que atribui aos particulares iniciativa para fazer propostas de elaboração de planos de pormenor, os quais podem ter efeitos equivalentes às operações de
loteamento urbano no domínio da reestruturação fundiária– cfr. artigos 81º/1 e 108º do RJIGT.
59 Sobre a natureza jurídica do plano, v. Fernando Alves Correia, O plano urbanístico e o princípio da igualdade., pp. 217 ss. e Manual de Direito do Urbanismo
(Vol. I), pp. 602 ss.; Diogo Freitas do Amaral, “Apreciação da dissertação de doutoramento do Licenciado Fernando ALves Correia “O plano urbanístico
e o princípio da igualdade”, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Vol. XXXII, 1991, pp. 96 ss. e João Miranda, A dinâmica do
planeamento territorial, pp. 45 ss.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 27
quadro do sistema de gestão territorial desenhado pela LBPSOTU60, é aos
planos urbanísticos, e não aos demais instrumentos de planeamento físico
do território, que cabe proceder à definição das regras de ocupação, uso
e transformação dos solos61, o que justifica um maior nível de exigência
constitucional em relação à participação dos interessados na sua formação.
60 A LBPSOTU é, necessariamente, a primeira das leis respeitantes ao ordenamento do território e ao urbanismo a que se refere o artigo 65º/4 CRP, como
resulta evidente da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República que o artigo 165º./1/z) passou a prever após a revisão
constitucional de 1997.
28 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
ARTICULAÇÃO DE PROGRAMAS,
PLANOS E REGULAMENTOS
Dulce Lopes
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
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RESUMO
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 31
1. Introdução
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vinculam as entidades públicas e, direta e imediatamente, os particulares1.
Deste modo, a diferenciação, que tem por base o círculo dos destinatá-
rios do plano e o grau de vinculatividade das suas normas, permite distin-
guir entre os planos que gozam da característica da autoplanificação, me-
diante a qual o plano vincula a entidade pública que o aprovou, forçando-o,
sem excepções, a conformar com aquele a sua actividade urbanística; da
heteroplanificação, segundo a qual um plano urbanístico, quando vigente,
vincula todas as demais entidades públicas, que com ele se devem confor-
mar, impossibilitando a concretização de um projecto público em violação
de disposições de planeamento; e a planificação plurisubjectiva que ca-
racteriza os planos que vinculam directa e imediatamente os particulares,
podendo ser-lhes opostos e por eles invocados.
1 Sobre este sistema, cfr. Carlos José Batalhão, “A Revisão do Regime Jurídico de Gestão Territorial de 2015: as novas regras de gestão territorial”, Questões
Atuais de Direito, n.º 6, Abril/Junho, 2015, pp. 41 e ss; e Margarida Pereira, “Sistema de Gestão Territorial. Tipologia e Conteúdo dos Programas e Planos
Territoriais”, O Novo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, coord. João Miranda, Cláudio Monteiro e Mário Vale, Coimbra, Almedina,
2016 pp. 51 e ss.
34 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
alguns institutos jurídicos de importância primacial no direito do urbanismo,
tais como as medidas cautelares, a perequação, o recurso ao embargo e às
contraordenações, bem como a afirmação da nulidade dos actos de gestão
urbanística contrários àqueles planos 2.
No caso dos programas que, por definição, não gozam de eficácia plu-
risubjectiva, a discussão centra-se nos termos e prazos mediante os quais
as suas opções devem ser incluídas nos planos intermunicipais e munici-
pais de ordenamento do território, o que ocorrerá por intermédio de pro-
cedimentos de dinâmica de planos, em especial por via de alterações por
adaptação 3.
Acresce que esta integração é devida, sob pena da aplicação das dis-
posições sancionatórias previstas nos n.os 5 e 6 do artigo 46.º da LB e do
artigo 29.º do RJIGT, segundo os quais ocorrerá uma suspensão do plano
(inter)municipal e da gestão urbanística na parte afectada; bem como a sus-
pensão do direito de candidatura a apoios financeiros nacionais e comuni-
tários, bem como à não celebração de contratos programa, sempre que a
falta de iniciativa por parte do município, tendente a desencadear o proce-
dimento de actualização ocorra por facto que lhe seja imputável.
2 Sobre estas diferenças cfr. o nosso “Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial: evoluções recentes e desafios futuros”, Direito do Urbanismo
e do Ambiente – Estudos Compilados, Quid Iuris, 2010, pp. 77 e ss.
3 Aquele procedimento apenas é, no entanto, passível de ser mobilizado nos casos em que as opções previstas nos planos de nível superior sejam suficien-
temente densas e caracterizadas, que tornem inútil uma qualquer fase adicional de participação dos interessados e de outras entidades públicas. Caso
contrário, necessário será definir outros modos de ajustamento dos planos municipais àqueles instrumentos desprovidos agora de eficácia plurisubjectiva
e que passarão, usualmente, pelo recurso aos procedimentos de alteração (normal) dos planos (cfr. artigos 121.º e 118.º do RJIGT)
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 35
ou integradas nos planos municipais (na medida em que não foram ainda
aprovados planos intermunicipais) para terem aquele tipo de eficácia, tal
como dispõe o n.º 5 do artigo 3.º. do RJIGT Deste modo, o actual sistema
determina a integração ou transposição para os planos municipais de orde-
namento do território, em especial para o plano director municipal, de todas
as opções dos níveis superiores que se pretendam diretamente vinculativas
dos particulares, inicialmente até 29 de Junho de 2017, e, com a alteração
introduzida pela Lei n.º 74/2017, de 16 de Agosto, até 3 de Julho de 2020
(alteração ao artigo 78.º da LB).
Caso este prazo não seja respeitado, o plano especial continuará a vigo-
rar (no sentido de que continua a impender sobre os Municípios a obrigação
do seu respeito e da sua integração, de modo a obviar, logo que possível, à
aplicação das consequências previstas no artigo 46.º, n.ºs 5 e 6 da LB), mas
deixa de ser directamente vinculativo dos particulares.
4 De acordo com a legislação, os programas: “estabelecem o quadro estratégico de desenvolvimento territorial e as suas diretrizes programáticas ou
definem a incidência espacial de políticas nacionais a considerar em cada nível de planeamento”, enquanto que os planos “estabelecem opções e ações
concretas em matéria de planeamento e organização do território bem como definem o uso do solo”.
5 Quanto a este novo nível de planeamento, coloca-se a questão de saber se os interesses supralocais que lhe estão subjacentes são efectivamente diferen-
ciados dos interesses meramente municipais ou se serão, afinal, interesses comuns aos vários municípios, que estes decidem trabalhar conjuntamente.
Na Lei de Bases de 1998 e no anterior RJIGT (Decreto-Lei n.º 380/99) o nível intermunicipal (que compreendia planos, hoje programas, sem eficácia
plurisubjectiva) abrangia apenas interesses municipais agregados, mas hoje, por poderem tais planos ser directamente oponíveis aos particulares e a
circunstância de poderem ser aprovados pela comissão executiva metropolitana e pelo conselho intermunicipal [artigo 65.º, n.º 1, alínea a) e 111.º] parece
apontar no sentido de os mesmos incorporarem interesses próprios da respectiva comunidade.
36 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
o exemplo acabado de intervenção no território e de ordenamento tanto
urbano, como rústico, devendo neles concentrar-se as regras que regem a
ocupação, uso e transformação do solo. Assim se visou evitar a prolifera-
ção de mecanismos de intervenção urbanística dispersos e desconhecidos
dos seus destinatários. São essencialmente, então, razões de previsibilida-
de da actuação administrativa e de segurança jurídica dos administrados
que justificam esta estreita vinculação do sistema de gestão territorial ao
princípio da legalidade, na sua dimensão de tipicidade.
6 Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 5 de Fevereiro de 2015, proferido no proc. 01238/12, “apenas com a aprovação do
PDM se poderia concluir com segurança se efetivamente viriam a ser vedados o loteamento e a construção nos referidos terrenos, já que os estudos só
passariam a ser vinculativos se viessem a ser consagrados no PDM”. Não obstante, o mesmo Tribunal, no seu Acórdão de 8 de Julho de 2009, proferido
no proc. 0814/08, admitia que tais estudos, previstos em planos, pudessem constituir-se como “estudo autónomo de índole arquitectónica e paisagística,
que deve instruir o pedido de licenciamento”.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 37
outros são meros auxiliares na compreensão e interpretação destes). Em
face destas dificuldades, a doutrina tem limitado a questão da natureza
jurídica dos planos ao seu elemento documental escrito mais importante - o
regulamento -, entendendo dominantemente que este tem natureza normati-
va na medida em que, embora tenha, na maior parte das vezes, um carácter
concreto (ao definir as regras de ocupação e os parâmetros urbanísticos
aplicáveis a cada parcela do território), têm um pretensão de duração tra-
duzida no facto de não se esgotarem numa única aplicação 7.
7 Em geral, neste sentido, cfr. Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo, Vol. I, 4.ª ed., Coimbra, Almedina, 2008, pp. 602 e ss.
8 Cfr. Gonçalo Reino Pires, A Classificação e a Qualificação do Solo por Planos Municipais de Ordenamento do Território (contributo para a compreensão do
seu regime substantivo e para a determinação do regime da sua impugnação contenciosa), Associação de Antigos Alunos da Faculdade de Direito de Lisboa,
2015, disponível online em www.alumnifdl.pt, pp. 588 ss., para quem “o contencioso da classificação e qualificação do solo, encarado como um contencioso
de normas jurídicas, não surge efectivamente como um meio de garantia acessória tanto do direito de propriedade como dos outros direitos fundamentais
com expressão territorial, nem tão pouco funcionalizado à prossecução de um correcto ordenamento do território enquanto tarefa fundamental do Estado”,
propugnando pela natureza jurídica da classificação e qualificação do solo como acto administrativo real. Em sentido idêntico, que o princípio da tutela judicial
efectiva e a regra da interpretação conforme à Constituição impõem, na ausência de reponderação das opções legislativas, uma harmonização do regime geral
da declaração de ilegalidade de normas administrativas com a garantia da impugnação directa de planos, abrindo a possibilidade de acesso ao tribunal para
contestar planos com fundamento em razões que não se reflectem, necessariamente, numa ou noutra disposição eventualmente lesiva, cfr. António Duarte
de Almeida, “A garantia da impugnação directa de planos territoriais e urbanísticos”, Os dez anos da lei de bases da política de ordenamento do território e
de urbanismo: génese e evolução do sistema de gestão territorial 1998-2008 : Actas do encontro anual da AD URBEM de 12 de Dezembro de 2008, coord.
Fernando Gonçalves, João Ferreira Bento, Zélia Gil Pinheiro, Lisboa, Ad Urbem, DGOTDU, FCT, 2010, pp. 51 e ss.
38 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
rem sujeitos a um conjunto amplo de exigências de publicidade (do início
do procedimento e do seu decurso), participação (preventiva e sucessiva) e
acompanhamento e concertação, bem como a uma tarefa de ponderação
de interesses e de fundamentação das soluções a adoptar que não têm pa-
ralelo no procedimento regulamentar definido no Código do Procedimento
Administrativo e nos procedimentos regulamentares especialmente estabe-
lecidos na lei (como sucede com os regulamentos identificados no artigo 3.º
do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, aprovado pelo Decreto-
-Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, doravante RJUE) 9.
9 Note-se que não existe um procedimento regulamentar único e sempre utilizável: o CPA e o RJUE enunciam alguns trâmites que terão sempre lugar, mas
para além de o legislador poder “desenhar” procedimentos regulamentares especiais. O próprio CPA dota o responsável pela direção do procedimento, na
ausência de normas jurídicas injuntivas, de discricionariedade na respetiva estruturação (principio da adequação procedimental previsto no artigo 56.º).
O que significa a existência de uma multiplicidade possível de procedimentos regulamentares no âmbito urbanístico.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 39
eficácia (cfr. artigo 139.º do CPA) 10.
10 Cfr., para maiores desenvolvimentos, Fernanda Paula Oliveira, Dulce Lopes e Maria José Castanheira Neves, “Regulamentos Municipais em Matéria Urba-
nística: Perspetivas Atuais”, Questões Atuais de Direito Local, N.º 10, Abril, Junho, 2016, pp. 13 e ss.
40 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
como vimos, extremamente formalizados, obedecendo a uma tramitação
própria que, no caso da revisão, corresponde ao mesmo procedimento que
o da sua elaboração inicial e, no caso da alteração, embora mais simplifi-
cado, cumpre trâmites próprios, ainda assim com alguma complexidade. A
introdução noutro tipo de regulamentos municipais de normas cuja inser-
ção apenas se pode admitir em instrumentos de planeamento municipal
configurará, pois, um verdadeiro desvio de procedimento determinante da
ilegalidade das respetivas normas, para além de se traduzir numa violação
do princípio da tipicidade dos planos e do respectivo conteúdo. De fac-
to, se são nulas as orientações e as normas dos programas e dos planos
territoriais que extravasem o respetivo âmbito material (artigo 3.º, n.º 4 do
RJIGT), também o terão de ser as normas dos regulamentos administrati-
vos que se imiscuam no âmbito àqueles reservado.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 41
o contrário (como, aliás, sucede com alguns importantes actos regulamen-
tares ligados com o fenómeno urbanístico, como as medidas preventivas e
as normas provisórias - artigo 143.º do RJIGT; e, bem assim, com algumas
condicionantes, como sucede com a violação de regimes jurídicos como os
da Reserva Ecológica e Agrícola Nacional).
11 Os regulamentos gerais são sempre externos pois projetam os seus efeitos para o exterior da Administração que os emana (quer relativamente a outras
entidades administrativas, quer em relação aos particulares), os regulamentos especiais são, tendencialmente regulamentos internos (esgotam a sua
eficácia no interior da Administração, não sendo suscetíveis de impugnação contenciosa e podendo não ser seguidos pela Administração). Nem sempre,
porém, se verifica esta coincidência, já que os regulamentos internos criam obrigações para os trabalhadores administrativos (pense-se, por exemplo,
nos regulamentos de serviços de fiscalização, que definem comportamentos aos trabalhadores municipais e prevêem sanções pelo seu incumprimento)
ao mesmo passo que criam expectativas de atuação por parte de todos os interessados na condução e resultado das operações de fiscalização municipal.
Deve, por isso, ter-se cuidado para colocar as disposições que podem gerar efeitos externos (tais como a identificação das situações e dos requisitos
mediante os quais a fiscalização intervirá a solicitação de terceiros) nos regulamentos municipais com eficácia externa, de modo a assegurar as devidas
condições de publicitação daquelas normas (publicitação que hoje passa, por força do artigo 139.º do CPA pela sua publicação no Diário da República).
42 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
medida em que podem ser directamente operativos, quando produzem
efeitos na esfera dos seus destinatários sem necessidade de um específi-
co acto (é o caso de regulamentos que proíbem ou impõem condutas que
não carecem da emissão actos autorizativos) ou mediata ou indiretamente
operativos, nos casos em que necessitem, para produzir os seus efeitos
jurídicos na esfera dos seus destinatários, de actos concretos para a sua
aplicação, sobretudo de actos administrativos.
Mas, mais do que estes regulamentos que são, por inerência, provisó-
rios, outros existem que condicionam a tarefa de planeamento, determinan-
do, ainda que com alguma margem de flexibilidade, as opções a inscrever
nos planos territoriais. De facto, para além dos programas, outros instru-
mentos há que funcionam como condicionantes à tarefa de planeamento,
inscrevendo regimes restritivos públicos e que são qualificados pela juris-
prudência como regulamentos administrativos.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 43
la Nacional, nos termos que ainda hoje se têm por aplicáveis do Acórdão
do Supremo Tribunal Administrativo de 25 de Junho de 1997, proferido no
proc. 030808. Este decidiu que a então Portaria, elaborada ao abrigo do re-
gime jurídico vigente da Reserva Agrícola Nacional tem natureza normativa,
não sendo, por isso, acto administrativo, sendo aquela natureza “corrobo-
rada pela sua génese, porquanto a Administração procedeu à respectiva
elaboração no exercício de poder que lhe foi conferido pelo legislador, ante
a impossibilidade de ele próprio proceder à definição da RAN em causa”.
Nos mesmos termos, também a cartografia da Reserva Ecológica Nacional
é percebida como um regulamento administrativo (cfr. Acórdão do Supremo
Tribunal Administrativo de 30 de Janeiro de 2013, proferido no processo
044729), uma vez que “embora sejam actos normativos, não podem ser
considerados como praticados no exercício da função política ou legisla-
tiva, mas sim actos praticados no exercício da função administrativa, pois
que apenas trataram de reger a vida social, executando prévias escolhas
políticas, procedendo à satisfação das necessidades colectivas definidas,
seleccionadas e ordenadas pela lei” (cfr. Acórdão de 23 de Setembro de
2003, proferido no proc. 01087/03).
12 Para a caracterização dos standards urbanísticos, cfr. Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo, cit., p. 668-672.
44 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
nuam a ser difíceis de qualificar, como sucede com os planos municipais de
defesa da floresta contra incêndios (PMDFCI). Estes instrumentos são simi-
lares, em termos de conteúdo e forma às condicionantes ao uso do solo,
mas encontravam-se tradicionalmente dependentes da sua integração em
planos territoriais, devendo nestes ser vertidos, sob pena de ineficácia pe-
rante os particulares, já que aqueles planos não eram objecto de consulta
pública e de publicação13 . Admitia-se, porém, ainda que sem certezas, que
ao abrigo da LB os PMDFCI pudessem ser considerados regulamentos
«em matéria de recursos florestais» - subsumíveis no n.º 3 do artigo 46.º
deste diploma - podendo dispor de vinculatividade direta e imediata sobre
os particulares, mas apenas se publicados14 .
13 Neste sentido, cfr. o nosso artigo “Defesa das pessoas e bens contra incêndios: A legislação florestal revisitada”, O Municipal, n.º 316, Maio, 2007, pp.
12-13. Cfr. igualmente, a Recomendação do Provedor de Justiça de 1 de Junho de 2009, com o número 6/A/2009, que acentua a ausência de publicação
para que os PMDFCI possam ser opostos directamente aos particulares, para além do défice de cumprimento do princípio da participação democrática).
Esta necessidade de “transposição” em instrumentos de gestão territorial dá-se com excepção das disposições do artigo 16.º, n.º 3 do diploma legal,
que sempre defendemos inscrever normas de eficácia imediata (no mesmo sentido quanto ao artigo 3.º, n.º 3 do RJIGT, Fernanda Paula Oliveira, Regime
Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial Comentado, Coimbra, Almedina, 2016, pp. 34-36).
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 45
que este trâmite seria dispensável em face da integração daqueles con-
teúdos regulamentares nos planos (inter)municipais [ou do seu carácter ur-
gente ou, ainda, da sua radicação legislativa], não obstante, à semelhança
do que sucede com os programas territoriais, a influência dos mesmos no
ordenamento do território, nalguns casos até como regras de operatividade
imediata (como sucede com as condicionantes legais ao uso do solo) ou
como medidas de cariz antecipatório (como acontece com algumas medidas
preventivas), justificaria plenamente a sua sujeição, no respectivo procedi-
mento, a requisitos de participação previstos genericamente hoje no CPA
e, de maneira jusfundamental, na Constituição da República Portuguesa.
46 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
de reabilitação urbana ou do programa estratégico de reabilitação urbana
como parâmetros para a apreciação das concretas operações urbanísticas,
já que, com base neles (no seu incumprimento) é possível invocar-se aque-
les fundamentos genéricos e, assim, indeferir-se uma licença ou reagir-se
contra uma comunicação prévia. Para além destas previsões “postas ao
serviço” do instrumento próprio existe ainda um outro mecanismo que per-
mite retirar dele efeitos jurídicos. Trata-se daquele que se encontra inscrito
no RJUE, que passou a admitir a alteração das condições da licença ou co-
municação prévia de operação de loteamento por iniciativa pública, desde
que tal alteração se mostre necessária à execução de área de reabilitação
urbana (artigo 48.º, n.º 1), o que logicamente apenas pode visar as áreas
delimitadas em instrumento próprio, já que, quanto às demais a existência
de plano de pormenor permitiria chegar acriticamente à mesma solução.
Por último um instrumento próprio dá origem, tal como um plano de por-
menor, à possibilidade de a entidade gestora utilizar, consoante o tipo da
respetiva operação de reabilitação urbana, instrumentos de execução de
política urbana (artigo 54.º do RJRU).
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 47
ração de interesses - ou à impugnação incidental do acto administrativo
praticado, por se fundar numa disposição normativa ilegal 15.
15 Para maiores desenvolvimentos, cfr. o nosso Fernanda Paula Oliveira, Dulce Lopes e Cláudia Alves, Regime Jurídico da Reabilitação Urbana – Anotado,
Coimbra, Almedina, 2011, pp. 90-92, anotação ao artigo 14.
16 “Algumas Questões relativas aos Programas enquanto Instrumentos de Gestão Territorial”, O Novo Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial,
coord. João Miranda, Cláudio Monteiro e Mário Vale, Coimbra, Almedina, 2016, pp. 84-85.
48 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Que fazer, portanto, nestes casos, em que às entidades públicas es-
taduais compete salvaguardar regras relacionadas essencialmente com
actividades que se desenvolvem no solo rústico e que podem ter seve-
ros impactes ambientais (por exemplo actividades desportivas ou especi-
ficamente agrícolas e pecuárias, que não têm lastro urbanístico de maior)?
Pensamos que, neste caso, a remissão do artigo 44.º, n.º 3, in fine, para
a admissão de tais regulamentos em programa deve ser adequadamen-
te interpretada, de modo a permitir, contemporaneamente à cessação de
eficácia directa dos planos especiais de ordenamento do território (ou no
prazo de 30 dias após o termo do prazo para o efeito) a aprovação daqueles
regulamentos de gestão, de acordo com o procedimento previsto no arti-
go 44.º, n.º 3 do RJIGT. Apenas assim, por um lado, se evita a criação de
vazios normativos, já que, sendo os regulamentos de gestão directamente
vinculativos dos particulares, continuariam portanto, a vinculá-los quanto à
exigência de boas práticas ambientais. E, por outro lado, se demonstra que
pode fazer sentido destacar temporalmente os regulamentos de gestão dos
programas que os enquadram, antecipando os primeiros relativamente a es-
tes últimos nas situações de “transposição” em curso dos planos especiais
nos planos territoriais.
E não se diga que é irrelevante este exercício, uma vez que os regula-
mentos orientados para a gestão de interesses específicos têm vindo a ser
previstos amiúde na nossa legislação (pense-se, por exemplo, nos planos
de gestão da rede natura ou nos planos de gestão florestal), sendo neces-
sária uma melhor compreensão dos seus efeitos e limites, para que os mes-
mos não coloquem em causa a lógica de “pirâmide invertida” subjacente ao
sistema de gestão territorial.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 49
É o que se passa com os regulamentos municipais de urbanização e
edificação e de taxas urbanísticas que, muito embora não possam con-
trariar nem incluir normas que integram o elenco típico de questões que
pertencem à esfera de planeamento, contribuem para a plena execução
destes planos e da legislação urbanística, bem como para a integração ou
ampliação do âmbito de aplicação de algumas das suas soluções (pense-
-se, entre muitos outros exemplos, na definição de operações de impacte
urbanístico relevante).
17 Sobre esta influência cfr. o nosso “Repercussões do Licenciamento Zero na Gestão (Urbanística) Municipal”, na Revista Direito Regional e Local, n.º 17,
Janeiro/Março, 2012, pp. 18-29.
50 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
ção de direitos sobre prédios e lotes municipais, que são de particular im-
portância para os objectivos urbanísticos e de ordenamento territorial muni-
cipal. No sentido desta qualificação jurídica, veja-se o Acórdão do Supremo
Tribunal Administrativo, de 21 de Maio de 2008, de acordo com o qual “O
acto publicitado num Edital camarário que se dirige aos moradores de de-
terminado Bairro, estabelecendo as condições a que ficará sujeito o direito
de superfície a transmitir pela Câmara aos moradores que se encontram em
determinadas condições, é um regulamento e não um acto administrativo”,
o que demanda que, hoje, tais actuações fiquem sujeitas às regras de par-
ticipação e publicidade previstas no CPA, não havendo legislação especial
aplicável.
4. Notas conclusivas
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 51
de recepção das condicionantes sobre o ordenamento do território, há
cada vez mais regras dispersas em vários regulamentos externos que
condicionam e, por vezes, inviabilizam a concretização das regras de
planeamento territorial (porque não se cumprem afastamentos, porque
não se mobilizam os materiais ou técnicas aceitáveis, etc.).
Por isso mesmo, estipula o artigo 75.º da Lei de Bases que é obri-
gatória, nos termos e condições previstos na lei, a disponibilização de
informação relativa a regulamentos administrativos e programas e pla-
nos territoriais, incluindo todo o conteúdo documental destes, o que
denuncia as conclusões a que chegámos: as de uma aproximação ou de
continuum, em termos de ocupação do solo, das regras previstas nos
planos e nos vários regulamentos urbanísticos com eficácia externa.
52 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
BIBLIOGRAFIA
Dulce Lopes, “Defesa das pessoas e bens contra incêndios: A legislação flo-
restal revisitada”, O Municipal, n.º 316, Maio, 2007.
Fernanda Paula Oliveira, Dulce Lopes e Maria José Castanheira Neves, “Re-
gulamentos Municipais em Matéria Urbanística: Perspetivas Atuais”, Questões
Atuais de Direito Local, N.º 10, Abril, Junho, 2016.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 53
Fernanda Paula Oliveira, Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Terri-
torial Comentado, Coimbra, Almedina, 2016.
54 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
EXPROPRIAÇÃO,
EXECUÇÃO DO PLANO
E PEREQUAÇÃO:
COMO ARTICULAR?
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 55
RESUMO
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 57
A. O problema de base
Pretendemos, com o presente texto, refletir sobre uma questão que se co-
loca com alguma frequência no âmbito do direito do urbanismo. Ainda que
a mesma tenha subjacente uma situação concreta que tivemos a oportuni-
dade de analisar, tentaremos aborda-la aqui de uma forma genérica, já que
as reflexões que então formulamos são perfeitamente extensíveis a outras
hipóteses práticas.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 59
mentação de equipamentos de utilização coletiva, nomeadamente o campo
de iniciação e aprendizagem de golf, parques infantis e espaços de socializa-
ção.” Por sua vez, segundo a alínea b) desta UOPG, os parâmetros urbanís-
ticos médios definidos eram: “Altura média da fachada admitida de 9 metros
acima da cota da soleira, índice médio de utilização de 0,4 e índice médio de
impermeabilização de 20 % da área total do prédio”.
60 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
d. E invoca-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de abril de
2011 segundo o qual “Os terrenos integrados, seja em Reserva Agrícola
Nacional (RAN), seja em Reserva Ecológica Nacional (REN), por força do
regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como «solo
apto para construção», nos termos do artigo 25º, nº 1, alínea a) e 2 do
Código das Expropriações, aprovado pelo artº 1º da Lei 168/99, de 18 de
Setembro, ainda que preencham os requisitos previstos naquele nº 2.”
B. Ponto de ordem
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 61
flexões com a identificação da função da indemnização nas expropriações
por utilidade pública (1), incidindo de seguida a nossa atenção no papel
que as expropriações desempenham num momento, como o atual, em que
o território nacional se encontra coberto por instrumentos de planeamento
territorial, maxime, por planos municipais. Uma vez que aquela função está
dependente da função que estes mesmos instrumentos de planeamento
desempenham, não pode deixar de se lhe fazer uma referência particular,
bem como à problemática que lhes está associada, da perequação de be-
nefícios e encargos decorrentes dos planos (2).
1 Cfr. atual artigo 130.º do Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio (que coincide no essencial com o artigo 103.º do Decreto-lei n.º 380/99, de 22 de
setembro na versão em vigor à data dos factos).
62 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
harmonia com o qual os atos lesivos de direitos e os danos causados a
outrem determinam uma indemnização.
2 Cfr Fernando Alves Correia, Manual de Direito do Urbanismo, Vol. II, Coimbra, Almedina, 2010, p. 209.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 63
a perda patrimonial que lhe foi imposta seja equitativamente repartida entre
todos os cidadãos.
4 Sobre estas duas vertentes do princípio da igualdade na determinação do montante da justa indemnização vide Fernando Alves Correia, Manual de Direito
do Urbanismo, cit., pp. 211-213.
64 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Pública da expropriação.”5.
A lei não deixou de considerar, porém, nos termos supra referidos, a neces-
sidade de a justa indemnização ter em conta o interesse público que com a
expropriação se pretende prosseguir. É por isso que, nos termos do Código
das Expropriações, não pode tomar-se em consideração, na determinação
do valor dos bens expropriados, as mais-valias que resultarem da própria
declaração de utilidade pública; de obras ou empreendimentos públicos
concluídos há menos de cinco anos, no caso de não ter sido liquidado
encargo de mais-valias e na medida deste; de benfeitorias voluptuárias ou
úteis ulteriores à notificação da resolução de expropriar; e de informações
de viabilidade, licenças ou autorizações administrativas também ulteriores
àquela notificação (artigo 23.º, n.º 2). Na fixação da indemnização não são
também considerados quaisquer fatores, circunstâncias ou situações cria-
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 65
das com o propósito de aumentar o valor do bem (artigo 23.º, n.º 3).
É por este motivo que se afirma que, se bem que o critério para a deter-
minação do conceito de justa indemnização seja o do valor de mercado
(valor venal, comum ou de compra e venda) do bem expropriado, o mes-
mo não pode ser entendido em sentido estrito mas em sentido normativo,
precisamente por ditar a necessidade de efetuar reduções impostas pela
especial ponderação do interesse público que a expropriação serve, bem
como majorações devido à natureza dos danos provocados pelo ato ex-
propriativo.6
66 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
2. A função das expropriações num sistema jurídico assente
em instrumentos de planeamento territorial: a necessidade
de consideração integrada dos dois regimes
Tendo presente este facto, refira-se, antes de mais, que todo o território
nacional se encontra, no momento atual, coberto por planos, com parti-
cular relevo para os planos municipais. É a estes que cabe a importante
tarefa de classificar e qualificar os solos: nos termos dos artigos 72.º e
73.º do RJIGT, os planos procedem, em primeiro lugar, à classificação
dos solos - determinando o destino básico dos mesmos com base na
distinção fundamental entre solo rural e solo urbano - e efetuam, de se-
guida, a sua qualificação - tarefa que se exprime na determinação das
potencialidades dos terrenos em função do uso dominante que neles
pode ser desenvolvido, estabelecendo, para além dos correspondentes
usos, também, quando admissível, a respetiva edificabilidade.8
7 Este Decreto-Lei foi alterado sucessivamente por vários diplomas, sendo a última alteração mais relevante a do Decreto-Lei n.º 46/2009, de 20 de
fevereiro.
8 Esta matéria encontra-se atualmente disciplinada nos artigos 70.º a 74.º do Decreto-Lei n.º 80/2015, de um modo distinto. Sobre as novidades em matéria
de classificação e qualificação dos solos cfr. Jorge Carvalho e Fernanda Paula Oliveira, Classificação do Solo no Novo Quadro Legal, Coimbra, Almedina,
2016.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 67
Segundo o disposto no n.º 4 do artigo 73.º do RJIGT, a qualificação do
solo urbano determina a definição do perímetro urbano - área desti-
nada pelo plano ao processo urbano, isto é, a ser infraestruturada e
edificada -, e compreende os solos urbanizados; os solos cuja urbaniza-
ção é possível programar; e, ainda, os solos afetos à estrutura ecológica
necessários ao equilíbrio do sistema urbano. É esta última categoria de
solo que aqui pretendemos realçar já que, segundo o RJIGT, os solos
urbanos abrangem não apenas as categorias funcionais dos espaços
centrais (destinados a desempenhar funções de centralidade para o
conjunto do aglomerado urbano, com concentração de atividades ter-
ciárias e funções residenciais); dos espaços residenciais; dos espaços
de atividades económicas; dos espaços de uso especial e dos espaços
urbanos de baixa densidade - e isto independentemente de já esta-
rem infraestruturados (solos urbanizados) ou se destinarem a ser in-
fraestruturados (solos com urbanização a programar) -, mas também
a categoria dos espaços verdes (com funções de equilíbrio ecológico
e de acolhimento de atividades ao ar livre de recreio, lazer, desporto
e cultura).9 Ainda que estejamos aqui perante solos que, em princí-
pio, não dispõe de (ou dispõe de diminuta) capacidade edificativa, não
deixam estes espaços verdes de se considerar solos urbanos (desig-
nados de espaços verdes urbanos), valorizando os espaços urbaniza-
dos e edificados (ou a urbanizar e a edificar) envolventes por criarem
externalidades positivas que, sem eles, não existiriam: pense-se na
mais-valia de um terreno localizado na bordadura de um parque verde
urbano ou contiguo a um corredor ecológico dentro de um aglomerado
urbano.
68 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
rias (neste casos porque o valor dos solos depende substancialmente
daquilo que neles se pode fazer).
10 Fernando Alves Correia, O Plano Urbanístico e o Princípio da Igualdade, Coimbra, Almedina, 1989, p. 390.
11 Fernando Alves Correia, “A Execução dos Planos Diretores Municipais. Algumas Questões”, in RJUA, n.º 3, 1995, p. 71.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 69
rentes. Há, assim, uma obrigatoriedade de os planos municipais regula-
rem as questões perequativas e de darem resposta, do ponto de vista
jurídico, às desigualdades por eles introduzidas, o que decorre de a
lei considerar a perequação como um direito dos cidadãos e como
um dever da Administração.12
12 Ainda que nos refiramos aqui às questões da perequação à luz do Decreto-Lei n.º 380/99, as mesmas têm, no Decreto-Lei n.º 80/2015, um enquadramento
e regulamentação substancialmente idênticos.
70 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
- cfr. a título de exemplo, o n.º 7 do artigo 139.º14) -, demonstra que
os proprietários não têm direito à edificabilidade abstrata prevista no
plano para os seus terrenos (e que se traduzirá numa edificabilidade
concreta quando for emitido um ato de licenciamento), na medida em
que se esta edificabilidade concreta for superior à média, o proprietá-
rio terá sempre de pagar por esse excesso (a título de compensação)
- a significar que o proprietário nunca poderia incorporar (nem incor-
poraria) esse excesso de edificabilidade na sua esfera patrimonial.15
14 Quanto a operação se traduza num reparcelamento dentro de uma unidade de execução previamente delimitada, o alvará a que se refere o artigo
mencionado no texto é o correspondente a esta operação, o que significa que nessas situações a perequação não terá por referência cada um dos prédios
que integram a operação de reparcelamento, mas a totalidade da área da unidade de execução. Neste caso, a perequação funciona a uma escala mais
ampla (entre unidades de execução), o que não nos parece problemático por, dentro da unidade de execução, na medida em que o reparcelamento se
baseia no critério da proporcionalidade, a perequação estar à partida garantida (para além de que não rigidifica as regras de relacionamento dentro da
unidade).
15 Ou seja, e dito de outro modo, por força dos mecanismos de perequação, independentemente das concretas opções constantes do plano para cada
parcela, os proprietários somente terão direito à edificabilidade média, apenas podendo utilizar a edificabilidade restante prevista no plano (nas situações
em que a edificabilidade concreta é superior à média) “pagando” por ela (designadamente por via da cedência de terrenos). Donde não terem direito a
esse excesso (só o têm se pagarem por ele), o que significa que ele não integra, à partida, a sua esfera patrimonial.
16 Cfr. o nosso A Discricionariedade de Planeamento Urbanístico Municipal na Dogmática Geral da Discricionariedade Administrativa, Coimbra, Almedina,
Coleção Teses, 2011, pp. 451-452.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 71
ciente, porque deixaria de fora todas as operações urbanísticas não
inseridas em unidade de execução e dificilmente asseguraria as cedên-
cias de terreno para infraestruturas gerais.
17 É isso que determina atualmente o artigo 64.º da Lei das Bases Gerais das Políticas Públicas de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, apro-
vada pela Lei n.º 31/2014 de 30 de maio, que tem por epígrafe, precisamente, redistribuição de benefícios e encargos, segundo o qual “A redistribuição de
benefícios e encargos a efetivar nos termos do número anterior, aplica-se a todas as operações urbanísticas sistemáticas e não sistemáticas que ocorram
no território em causa, concretizando a afetação das mais-valias decorrentes do plano ou de ato administrativo” (n.º 4, com sublinhado nosso).
18 Como procedimento de aquisição de bens, a expropriação envolve sempre uma relação entre três polos: de um lado, o expropriado (o sujeito que é
privado do bem ou do direito), de outro lado o beneficiário da expropriação (aquele que integra, na sua esfera jurídica, o bem ou o direito objeto de
expropriação) e, do outro lado, ainda, a entidade expropriante (aquela que declara a utilidade pública do bem ou do direito para efeitos expropriativos,
isto é, a que é dotada de poder expropriativo).
19 Exemplo típico destas situações no direito do urbanismo é a das previstas no artigo 143.º do RJIGT que podem ser designadas de expropriações do plano
(atualmente previstas no artigo 171.º do Decreto-lei n.º 80/2015).
72 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Correspondendo as expropriações clássicas a um procedimento de
aquisição de bens destinado à prossecução de interesses públicos e
sendo esses bens, essencialmente, bens imóveis (terrenos e edifícios),
resulta claro que existente uma intima ligação entre as expropriações por
utilidade pública e o fenómeno planificador, com particular relevo para as
duas que se seguem:
Cada uma destas situações tem, como veremos (e como não pode dei-
xar de ser, dado o princípio da unidade do sistema jurídico), claras re-
percussões no regime das expropriações e da avaliação dos solos para
efeito de determinação do montante indemnizatório a pagar no seu âm-
bito.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 73
em matéria de determinação do montante da indemnização, devendo
ser articulado com a legislação relativa ao planeamento territorial e sua
execução, sob pena a indemnização que se venha a atribuir não cumprir
a exigência que a Constituição lhe faz: de que seja justa.
Note-se que é esta ligação íntima entre estas duas realidades que tem leva-
do a doutrina a tratar as expropriações quase exclusivamente como instru-
mentos jurídicos de execução dos planos ou como expropriações acessórias
aos planos. O que tem consequências a vários níveis, dos quais aqui realça-
mos os que mais relevam no caso em apreço:
ii. que o cumprimento dos planos por parte do ato expropriativo determi-
na que a avaliação dos bens expropriados, para efeitos da determina-
ção do montante indemnizatório, não pode ignorar nem a classificação/
qualificação dos solos que é feita pelo plano municipal nem o funciona-
mento dos mecanismos que visam corrigir as desigualdades que aquela
classificação/ qualificação introduz (mecanismos de perequação);
74 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
no caso da REN20), estão sujeitas a um regime particularmente limitativo à
ocorrência de determinadas atividades, especialmente de cariz urbanístico.
Tendo em conta este aspeto, e fixando-nos na REN, que é aquela que in-
teressa para a economia do presente texto, não pode ignorar-se que, não
obstante o regime particularmente restritivo da ocupação e utilização ur-
banística destes solos, os mesmos não correspondem (nem nunca corres-
ponderam), de modo algum, a zonas com um estatuto non aedificandi. Aliás,
precisamente porque a visão destas áreas como áreas de “tudo ou nada”
(sistema proibitivo) potenciou o abandono crescente destes solos, o legis-
lador mudou radicalmente o respetivo regime, tendo estes deixado de fun-
cionar exclusivamente pela negativa - particularmente preocupados com a
proibição de atividades urbanísticas (que podiam ser excecionalmente au-
torizadas) -, para passarem a conter uma regulamentação pela positiva, isto
é, pela identificação daquilo que naqueles solos pode e deve ocorrer, por
ser compatível e até desejável, do ponto de vista dos valores fundamentais
a proteger (incluindo algumas ocupações de cariz urbano, isto é, operações
urbanísticas, ainda que limitadas21).
20 Os solos integrados na REN representam valores ambientais fundamentais necessitados de especial proteção, embora de cariz diferenciado, na medida
em que não visam apenas a proteção de determinados ecossistemas ambientalmente sensíveis, mas igualmente a salvaguarda da ocorrência de riscos
naturais, isto é, de riscos decorrentes das características biofísicas dos solos.
21 O aspeto mais marcante ou visível, a este propósito, da alteração do regime da REN consistiu na identificação, num Anexo IV do Decreto-Lei n.º 180/2006,
de 6 de setembro, das ações insuscetíveis de prejudicar o equilíbrio ecológico das áreas integradas na REN (cfr. artigo 4.º, n.º 2), correspondendo, às ações
compatíveis com o seu regime de proteção, cabendo ao Anexo V a determinação, para cada uma daquelas ações, dos requisitos de carácter material a que
as mesmas devem obedecer para a sua viabilização.
Com este novo regime, como foi, então, devidamente explicitado, para além de se pretender garantir uma maior proporcionalidade entre os interesses
privados de ocupação do território e o interesse público da salvaguarda dos recursos, bem como a viabilização de usos e ações que não levantassem
objeções por, reconhecidamente, não colocarem em causa a permanência dos recursos, valores e processos que a REN visa preservar, pretendeu-se,
igualmente, permitir a realização atividades relevantes que não se enquadravam nos procedimentos de reconhecimento de interesse público.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 75
tas aos planos municipais: por um lado a necessidade de estes acolherem
aquelas restrições de utilidade pública como sua determinante heterónoma
(condicionante do planeamento), logo, como limite à margem de confor-
mação das suas regras jurídicas urbanísticas; por outro lado a exigência
de que estes planos não se desonerem da definição de normas de uso,
ocupação e transformação do solo aplicáveis às suas áreas, já que estes
regimes admitem estas afetações - quer em termos normais, desde que
consideradas compatíveis com o regime desta reserva, quer em termos ex-
cecionais -, podendo ainda, se bem que de forma mais excecional, admitir-
-se desafetações.22
22 Nestes casos, valerão as regras plasmadas nos planos municipais que, caso as não contenham, deixam a área em causa sem regras de ocupação dos solos,
atribuindo às entidades competentes grandes margens de discricionariedade na gestão urbanística corrente.
76 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Ou seja, e melhor explicitando, porque a REN não corresponde (não deve
corresponder) nem a uma classe nem a uma categoria de uso do solo, a clas-
sificação e qualificação deste (tarefa do plano municipal), deve abranger
todo o território, incluindo o que está sujeito àquelas condicionantes: nas
áreas abrangidas por servidões administrativas e restrições de utilidade pú-
blica, a disciplina de uso, ocupação e transformação do solo é a inerente à
da classe e categoria de espaço sobre que recaem, condicionada, contudo,
pelas disposições vinculativas que regem tais servidões ou restrições; nos
restantes casos, as referidas áreas estarão descondicionadas.
O que significa, e registamo-lo aqui, que estas áreas (de REN em solo ur-
bano) podem ter (e na maior parte das vezes têm) uma edificabilidade as-
sociada. Esta situação é particularmente visível naquelas situações em que
parte da parcela é abrangida por esta restrição e se pretende ocupar a parte
restante com uma operação urbanística: a não ser que o plano o afaste, no
prédio integrado no perímetro urbano parcialmente ocupado com a REN
apenas poderá haver ocupação urbanística na parte restante, mas a parte
inserida na REN (e que faz parte integrante do prédio objeto da operação
urbanística) pode ser contabilizada para efeitos do cálculo dos parâmetros
urbanísticos a concretizar na outra parte da mesma parcela.23
23 Sobre esta posição, que não é pacífica na jurisprudência, cfr. o nosso “Áreas e Índices em Loteamentos Urbanos Abrangidos por RAN e REN: Brutos ou
Líquidos, Eis a Questão?” – Anotação ao Acórdão do STA de 6.11.2014, P. 1422/13, in Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 111, maio/junho de 2015,
pp. 33-52.
24 Com efeito nem sempre as áreas da REN, dado o carater diferenciado dos bens que a integram, detêm uma continuidade territorial, o que significa que
podemos estar, e muitas vezes estamos, perante uma REN dispersa, como ocorre com aquela que se atém à proteção de riscos naturais (essencialmente
riscos de deslizamento) aliados em regra a encostas com um determinado declive.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 77
do solo incoerentes e desconformes com os desígnios de uma racional e
ocupação urbana do mesmo. O que significa, em consequência, a possi-
bilidade de integrar num loteamento urbano áreas da REN, possibilidade
que se encontra atualmente expressamente prevista no artigo 26.º do
Regime desta restrição de utilidade publica, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 166/2008, de 22 de agosto com as alterações do Decreto-Lei n.º
239/2012, de 2 de novembro, normativo que declaradamente determi-
na, no seu n.º 1, que “as áreas integradas em REN podem ser incluídas
em operações de loteamento desde que não sejam destinadas a usos ou
ações incompatíveis com os objetivos de proteção ecológica e ambiental
e de prevenção e redução de riscos naturais”, dispondo ainda o n.º 2
que “as áreas integradas na REN podem ser consideradas para efeitos de
cedências destinadas a espaços verdes públicos e de utilização coletiva,
infraestruturas e equipamentos que sejam compatíveis, nos termos do
presente decreto-lei, com os objetivos de proteção ecológica e ambiental
e de prevenção e redução de riscos naturais daquelas áreas”.
78 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
seu regime que é o de, para a salvaguarda dos interesses que lhes
estão subjacentes, impedir a implantação de atividades urbanísticas
nas mesmas. Esta posição era já defendida pela Informação n.º 112/
DGS, de 14 de abril de 2004, homologada pelo então Diretor-geral do
Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano em 19 de maio
de 2004, que incidiu, precisamente, sobre a relevância das áreas inte-
gradas na REN para efeitos de cálculo de índice de construção, onde
se concluiu que, na ausência de disposição legal impeditiva, “não se
pode concluir que o legislador não tenha querido contabilizar as áreas da
Reserva Agrícola e da Reserva Ecológica Nacionais no cálculo dos índices
de construção”, apesar de, em princípio, tal edificação só ser permitida
fora das mesmas. Ainda segundo esta informação, tendo em conta que
a forma de contabilização dos parâmetros urbanísticos diz respeito ao
regime do uso do solo de cada classe de espaço ou categoria, esta
matéria é tratada no regime jurídico dos instrumentos de gestão territo-
rial e no regime jurídico da urbanização e edificação, e não no daquelas
restrições de utilidade pública, concluindo, assim, aquela Informação
- que já então aplaudíamos -, que cabe aos municípios definir se as
referidas áreas devem ou não ser contabilizadas no cálculo dos parâ-
metros urbanísticos, embora a edificabilidade apenas possa, na maior
parte das vezes, ser permitida fora das mesmas.25
25 Aos argumentos constantes da Informação n.º 112/DGS, de 14 de abril de 2004, acrescentávamos um outro no nosso “A Reserva Ecológica Nacional e o
Planeamento do Território: a Necessária Consideração Integrada de Distintos Interesses Públicos”, in Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente, n.º
27/28, 2007, p. 33-52: de que uma solução que passe por proibir a contabilização destas áreas para efeitos dos parâmetros urbanísticos corresponderá,
atenta à titularidade privada da maioria delas, à imputação de uma oneração excessiva e desproporcional dos proprietários dos mesmos: tratando-se de
restrições à edificabilidade de terrenos particulares, aquelas devem decorrer explicitamente da lei, que, no entanto, só proíbe a edificação dentro das
áreas das Reservas, não sendo lícito acrescentar a essa restrição uma restrição extra, que consista em descontar a parte de um prédio incluída naquelas
do cálculo da taxa de ocupação da parte restante. Uma adequada ponderação do interesse público e do interesse dos particulares aponta, de facto e
incontornavelmente, para a conclusão de que o direito de propriedade privada não deve ser mais sacrificado do que aquilo que é exigido pela necessidade
de proteção dos interesses públicos subjacentes ao regime da REN e da RAN.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 79
planos, nos termos que decorrem da lei.26
Todas estas sugestões foram acolhidas no atual regime da REN (não ha-
vendo qualquer motivo para que não se estenda, com as devidas adap-
tações, ao regime da RAN) já que aí se determina não só que as áreas
da REN devem ser consideradas, na elaboração dos planos municipais,
para efeitos de estabelecimento dos mecanismos de perequação com-
pensatória dos benefícios e encargos entre os proprietários (n.º 1 do artigo
35.º), como ainda que as mesmas apenas não são contabilizadas para o
cálculo da edificabilidade nos casos em que os planos municipais de assim
o determinem (n.º 2 do artigo 35.º).27
26 Apenas se exigia, para esta opção municipal, a necessidade de ponderação dos resultados da mesma no sentido de aferir se, com a contabilização das
áreas destas reservas, se não estaria a concentrar excessivamente áreas de construção nas áreas nelas não incluídas ou a sobrecarregar a edificabilidade
junto das mesmas; essa ponderação tanto pode levar à não consideração daquelas áreas para efeitos do cálculo dos parâmetros urbanísticos, ou então,
como ocorre com mais frequência, à diminuição dos índices aplicáveis, precisamente por se ter em consideração a contabilização que é feita da área
daquelas reservas.
27 Consideramos que estas normas não têm caráter inovador, mas meramente declarativo, na medida em que se limitam a consagrar um regime que era o
adequado à natureza jurídica destas restrições.
80 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
naquele Aresto na medida em que as parcelas da REN que aí estavam em
causa e foram objeto de expropriação não estavam nem integradas em solo
urbano nem em área de aplicação de mecanismos de perequação que as
tivessem de ter em consideração.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 81
bano, estando a última totalmente integrada na categoria de solo espaços
verdes.” (sublinhados nossos).
82 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
o Plano definir para a totalidade da UOPG parâmetros urbanísticos e pa-
râmetros perequativos (em especial um índice médio de utilização). Tal
não significa que nessa UOPG os referidos espaços verdes pudessem
ser destinados para edificação, mas também não significava que o Pla-
no não lhes reconhecia edificabilidade, na medida em que os integrava
nos mecanismos de perequação com vista à distribuição, entre todos os
proprietários abrangidos por aquela UOPG, dos benefícios (edificabili-
dade) decorrentes do Plano.
Ainda nos termos desse artigo, era fixado, para cada um dos prédios
abrangidos pelas UOPGs, um direito abstrato de construir dado pelo
produto do índice médio de utilização pela área do respetivo prédio, que
se designava por edificabilidade média, determinando-se que quando a
edificabilidade do prédio fosse superior à edificabilidade média, o pro-
prietário tinha de pagar por isso (através da cedência para o domínio
privado do município da área de terreno com a possibilidade construtiva
em excesso, concentrada num ou mais prédios) - o que significava que
o proprietário apenas tinha direito à edificabilidade média: se por acaso
tivesse de ser expropriado, era apenas o correspondente a esse valor
que deveria receber, na medida em que o excesso em relação a essa
média não se incorporaria na sua esfera patrimonial, já que para o incor-
porar o proprietário sempre teria de pagar por ele - e quando a edifica-
bilidade do prédio fosse inferior à edificabilidade média, o proprietário
tinha de ser compensado - o que significava que teria sempre direito a
essa média, mesmo no âmbito de um processo expropriativo, na me-
dida em que, de acordo com o plano, sempre teria o direito de receber
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 83
pela diferença entre o que podia efetivamente fazer (no caso, não fazer)
e a média.
84 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Código de Expropriações. Isto porque a parcela em causa:
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 85
seria beneficiado em relação a todos os outros que, não sendo expropria-
dos, tivessem de concretizar uma operação urbanística de execução deste
plano. E caso o proprietário de um solo com edificabilidade inferior à média
só recebesse uma indemnização correspondente a esse valor inferior, seria
prejudicado em relação a todos os outros não expropriados.
86 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
BIBLIOGRAFIA
fpaula@fd.uc.pt
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 87
BAIRROS SOCIAIS
– URBANISMO PARA POBRES?
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 89
RESUMO
Segundo a ANMP, esta é a área onde, ao longo dos anos, sucessivos governos
tiveram uma atuação ambígua, confusa e indefinida, pois apesar dos municípios
não terem assumido qualquer competência nesta área, há entretanto no terreno
numerosas e confusas intervenções cruzadas de organismos estatais e autarquias
locais. Considera a Associação que só após serem clarificadas e consolidadas as
responsabilidades de cada parte interveniente, se poderá avançar para uma des-
centralização de competências na habitação social.1
91 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
1 - COMPETÊNCIAS DOS MUNICÍPIOS NA HABITAÇÃO SOCIAL
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 93
- A gestão dos parques habitacionais dos municípios;
- O exercício de outras atribuições que lhes viessem a ser cometidas por lei ou
pelos órgãos competentes da administração municipal.
94 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Conhecida a dotação concelhia, havia que selecionar as intervenções prioritárias
de forma a caberem na verba concedida. Podiam concorrer ao PRID as câmaras
municipais e os particulares. As câmaras tinham grande intervenção neste progra-
ma habitacional, uma vez que informava os processos dos particulares candidatos
ao programa e competia-lhes toda a gestão de ordem técnica e administrativa das
obras executadas.
2 Resolução do Conselho de Ministros nº 11/83, tendo por justificação a “descentralização administrativa, decisivamente impulsionada pela Lei nº 1/79, de
2 de Janeiro, que estabelece o regime de autonomia financeira das autarquias locais…”.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 95
A partir de Janeiro de 1983 foi publicado um conjunto de diplomas sobre a inter-
venção dos municípios na área da habitação social. O FAIH é extinto pelo Decreto-
Lei nº 177/84, de 25 de Maio, e criado em sua substituição o Instituto Nacional de
Habitação (INH). Em Fevereiro de 1987 é criado o Instituto de Gestão e Alienação
do Património Habitacional do Estado (IGAPHE). O programa PRID foi substituído
pelo RECRIA, para o qual o Estado estabeleceu, de forma arbitrária, uma interven-
ção financeira dos municípios. No entanto, tais medidas não conseguiram alcançar
os efeitos práticos desejados.
96 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
e visavam a realização de programas de habitação social para arrendamento no
regime de renda apoiada, destinada principalmente ao realojamento da população
residente em barracas, e a construção de habitação de custos controlados desti-
nada a venda. O quadro legal que regeu a promoção dos programas de habitação
social antes citados foi definido pelos Decretos-Lei nº 226/87, de 6 de Junho, e nº
278/88, de 5 de Agosto, com as alterações estabelecidas pelo Decreto-Lei nº 150-
A/91, de 22 de Abril, que regulava também os financiamentos a que os municípios
poderiam aceder para a concretização desses programas.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 97
ou parcialmente insolvente” (Ferreira, 1988). O Estado demonstrou, ao longo dos
anos, a sua intenção de intervir cada vez menos na área habitacional, deixando
tal tarefa para o setor privado, nomeadamente a regulação dos custos de cons-
trução através do mercado, e atribuindo aos municípios responsabilidades de
financiamento em programas (por exemplo, o RECRIA) sem que, em contrapar-
tida, previsse as necessárias transferências de recursos do OE para tal fim, em
conformidade com a lei vigente.
98 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
autarquias locais. Trata-se, também aqui, de matéria em que só depois de clarificar
e consolidar o que já existe, será possível conseguir avançar na regulamentação da
Lei n.º 159/99, concretizando a quem compete o quê”.6
Para além do problema da conservação dos fogos, tem-se também vindo a ques-
tionar a eficiência das políticas de habitação social, no tocante ao favorecimento
da coesão social, à promoção e reforço da cidadania, ao acesso ao emprego e
à melhoria das condições de vida das famílias carenciadas. A intervenção nos
bairros sociais, necessária para melhorar tais aspectos, nunca foi assumida pelos
organismos do Estado e pouco foi feito neste sentido pelos municípios.
6 XIII Congresso da ANMP – Linhas Gerais de Atuação – Defender e Consolidar a Autonomia na 1ª Década do Século XXI.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 99
3 – BAIRROS SOCIAIS: UMA VIVÊNCIA ESTIGMATIZADA?
100 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
De um modo geral, os bairros sociais são para além de espaços segregados e
estigmatizados, lugares caracterizados por uma escassez de equipamentos de
lazer e de sociabilidade (Guerra, 1994; Pinto, 1994).
Refira-se ainda, sobre esta temática, que muitos poucos municípios,7 em alterna-
tiva à construção de bairros sociais, foram ao longo do tempo adquirindo fogos
situados em urbanizações de iniciativa privada, para depois os arrendarem a famí-
lias carenciadas, evitando assim a concentração de famílias carenciados em urba-
nizações construídas especificamente para o efeito e instalando-as aleatoriamente
pelo tecido urbano, no sentido de evitarem a “guetização” (Guerra, 1994) que os
bairros sociais originavam. De acordo com Capucha, “há de facto uma relação
entre o modo de entender os factores de pobreza e exclusão social, o modo de
conceber a luta contra esses fenómenos e a focagem dos processos de territo-
rialização” (Capucha, 2004: 188) e “onde dizemos que os bairros pobres são os
bairros onde os pobres habitam, é preciso acrescentar que são também os bairros
que os tornam pobres ou tecem as redes que os impedem de romper com as suas
condições de vida” (Capucha, 2004: 191).
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 101
e requalificação de fogos arrendados a custos controlados, onde os municípios,
apesar do acesso a empréstimos com juros bonificados (disponibilizados pelo
IHRU), não conseguem garantir a sua parte de autofinanciamento para executarem
tais obras.
102 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
intervenção na conservação do edificado, propriedade do Estado e dos municí-
pios, arrendado a preços controlados a famílias carenciadas, assim como de inter-
venção no meio social, para apropriação das políticas e exercício da cidadania.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 103
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Guerra, Isabel (1994), As Pessoas Não São Coisas Que se Ponham em Gavetas,
Sociedade e Território, nº 20, Porto, Ed. Afrontamento, pp. 11-16.
Ruivo, Fernando (2000), O Estado labiríntico: o poder relacional entre poderes local e
central em Portugal, Porto, Edições Afrontamento.
104 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
MERA COMUNICAÇÃO
PRÉVIA SEM FISCALIZAÇÃO?
TODA A GENTE RALHA
E NINGUÉM TEM RAZÃO!
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 105
I – ENQUADRAMENTO
Do sentido da bússola que presidiu, a tal iniciativa legislativa, a qual veio a ter
concretização nas sucessivas reformas que foram introduzidas, nas diversas áreas
de licenciamento municipal, importa destacar, pela sua importância prática, a
publicação dos seguintes diplomas legais que, com outros zeros, pretenderam dar
corpo e alma a tal espírito centrado, fundamentalmente, na ideia da simplificação
administrativa, a saber:
1 Com a publicação e entrada em vigor do Decreto-Lei nº. 10/2015, de 16 de janeiro, diploma que veio a aprovar, sob a forma de anexo, o regime jurídico
de acesso e exercício de atividades de comércio, serviços e restauração (RJACSRS),o mesmo veio a determinar a revogação, diga-se, quase arrasadora, do
regime do Licenciamento Zero.
De facto, com a exceção das normas atinentes à definição e fixação de mensagens publicitárias e da ocupação do espaço público, em regime simplificado,
todas os demais regimes consagrados, em tal diploma legal, particularmente, no que concerne à instalação e exploração de estabelecimento comerciais,
foram objeto do “vistori” revisionista do legislador, solução, juridicamente, pouco compreensível, fragmentária do quadro normativo, em vigor, sobre
a matéria, e nada compaginável com a “bandeira” da simplificação que esteve subjacente à reforma “Zero”, cujo mérito veio a ser reconhecido, pelas
instâncias da UE.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 107
c) Por último, Decreto-Lei n.º 73/2015, de 11 de maio, diploma que procedeu à
1.ª alteração ao Sistema de Industria Responsável, doravante designado por
“SIR”, aprovado em anexo ao Decreto-Lei nº. 169/12, de 01 de agosto 2.
Embora não seja nosso propósito proceder, nesta sede, a uma análise exaustiva
de todas as implicações emergentes da entrada em vigor de tais diplomas legais,
voltados, pela ordem indicada, para a gestão urbanística, para a instalação e
exploração das atividades económicas e para o exercício da atividade industrial,
não podemos deixar de destacar, no entanto, que, entre todos eles, existe um
denominador comum, e cuja concretização deve ser procurada nos seguintes
pressupostos fundamentais:
2 Tudo isto, sem prejuízo de outras reformas legislativas envolvidas do mesmo espírito de simplificação e com incidência em outras áreas e ou setores de
atividade, nomeadamente, na área da instalação e exploração de empreendimentos turísticos, alojamento local, entre outras.
108 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
ação administrativa, no âmbito do controlo público - que não prévio - das diversas
atividades económicas, industriais e urbanísticas.
Perante tal nova realidade administrativa, fácil se torna concluir que o papel da
fiscalização municipal deve ser recentrado, no sentido da sua intervenção, nos
diversos procedimentos de controlo público, ser cada vez mais exigente, ao nível
do controlo sucessivo, em prejuízo do controlo prévio das diversas atividades
económicas e urbanísticas.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 109
dente melhoramento do controlo sucessivo das atividades que ficam sujeitas ao
seu regime, meramente, declarativo.
3 O estabelecimento de uma adequada conexão ou “mix”, entre o Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação e os demais regimes de licenciamento,
quer das atividades económicas, quer das atividades industriais, constitui uma tarefa fundamental, na busca de soluções, técnicas e administrativas,
adequadas.
E por uma simples razão: os estabelecimentos comerciais e industriais instalam-se – ato de instalação – regra geral, mediante o desenvolvimento de ope-
rações urbanísticas, designadamente, loteamento e ou edificação, sendo, como tal, absolutamente, incontornável, a existência de uma boa coordenação
entre as soluções normativas previstas, sobre a matéria, no regimes especiais de licenciamento – SIR e RJACSRS- com o RJUE.
Por outro lado, considerando que tais atividades não nascem no “Céu”, as mesmas pressupõem, sempre, o apuramento da sua compatibilidade – uso
comercial, de serviços ou industrial – com os usos urbanísticos, preestabelecidos, à luz do RJUE, por força da aplicação do plano urbanístico ou do próprio
loteamento, em vigor.
Estamos convictos de que, nesta dimensão, deverá, no futuro, ser feita uma aposta, por parte da administração municipal, na consagração, sempre que
seja, urbanisticamente, possível, nos respetivos títulos de utilização – autorização – de usos urbanísticos genéricos, de natureza mista, facilitando ou
agilizando a sua compatibilidade com o desenvolvimento das atividades económicas e industriais, simplificando, assim, o correspondente procedimento
de instalação e exploração dos respetivos estabelecimentos - comércio, serviços e ou indústria -, com todas as vantagens daí emergentes para o desenvol-
vimento do tecido económico e para a simplificação do procedimento de instalação e exploração, diga-se, complexo, de tais atividades.
Veja-se, nesse sentido, a solução consagrada no artigo 18º do SIR, admitindo, tal disposição legal, em edifícios ou frações dotados de uma utilização
destinada a habitação, o desenvolvimento de determinadas atividades industriais, legalmente, estatuídas, não sendo, procedimentalmente, necessário
recorrer, para o efeito, ao regime de alteração da utilização, desde que observados todos os pressupostos legais fixados no citado artigo.
110 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Optamos, assim, por desenvolver os presentes comentários, com incidência na
ação de fiscalização protagonizada, pelas Autarquias Locais, com particular inci-
dência, na gestão urbanística, partindo de uma abordagem, não exaustiva, dos
seguintes três tópicos, a saber:
A - Enquadramento
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 111
precisamente, em vista a introdução de mecanismos de simplificação do controlo
das operações urbanísticas efetuado mediante procedimento de comunicação
prévia com prazo4, a qual, quando corretamente instruída, dispensa a prática de
atos permissivos.
De facto, nos termos do disposto no art. 58º da retrocitada Lei, sob a epígrafe,
“controlo administrativo das operações urbanísticas”, tal regime procedimental
deve, essencialmente, assegurar a conformidade das operações urbanísticas com
as disposições legais e regulamentares aplicáveis e a prevenir os perigos ou danos
que da sua realização possam resultar para a saúde pública e segurança de pes-
soas e bens.
4 Na verdade, o regime inovador de aprovação das operações urbanísticas, consagrado no Decreto-Lei nº 136/2014, de 9 de setembro, não se traduz na
introdução da figura da comunicação prévia com prazo, como, erradamente, se anuncia, no preâmbulo do diploma, mas sim, face à natureza e traços ca-
raterizadores do procedimento, à sujeição de determinadas operações urbanísticas ao regime da mera comunicação prévia, considerando a sua natureza,
localização, dimensão e, sobretudo, a prévia formatação de todos os parâmetros urbanísticos relevantes aplicáveis, ficando, assim, as mesmas isentas de
controlo prévio municipal.
112 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
matéria de controlo administrativo das operações urbanísticas, assente na ideia
da redução do arco de intervenção, sempre que possível, dos procedimentos de
controlo prévio, reforçando-se, concomitantemente, os mecanismos de controlo
sucessivo ou à posteriori das operações urbanísticas.
5 Nesse sentido, veja-se, ainda, os princípios definidos, em tal Lei, em matéria de regularização de operações urbanísticas, à luz do seu art. 59º, os quais
acabaram por ter consagração, no âmbito do RJUE, com a criação de um procedimento especial para a legalização de operações urbanísticas, conforme
resulta do disposto no seu art. 102º-A.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 113
ao interessado proceder imediatamente à realização de determinadas operações
urbanísticas, após o pagamento das taxas devidas, dispensando a prática de
quaisquer atos permissivos.
A primeira questão que deve ser colocada, face à definição legal de tal procedi-
mento de mera comunicação prévia, - embora o elemento literal da norma, em
apreço, se refira, expressamente, a comunicação prévia – é saber se tal procedi-
mento constitui, ou não, um verdadeiro regime de controlo prévio de aprovação
das operações urbanísticas previstas no RJUE, a par da licença administrativa e
da autorização administrativa, tanto mais que, nos termos do capítulo II do RJUE,
sob a epígrafe “Controlo Prévio”, são, normativamente, identificados os procedi-
mentos de licença, comunicação prévia6 e autorização de utilização, sendo, para
o efeito, concretizados, nessa área sistemática de intervenção do RJUE, o âmbito
e competência de tais procedimentos de aprovação das operações urbanísticas,
mediante a identificação das operações urbanísticas sujeitas a licença administra-
tiva, a comunicação prévia (mera comunicação) e a autorização de utilização, nos
termos do seu art. 4.º.
6 Sem grande rigor terminológico, o nº1, do art. 4º do RJUE acaba por fazer, expressa, menção ao procedimento de comunicação prévia com prazo, sendo
certo que, pela sua natureza, efeitos e tramitação, o RJUE, na redação do Decreto-Lei nº 136/2014, passou a contemplar, na coleção dos procedimentos
administrativos de aprovação das operações urbanísticas, um verdadeiro procedimento de mera comunicação prévia, não estando esta sujeita a qualquer
prazo.
A comunicação prévia com prazo encontra-se definida na alínea a), do nº. 2, do art. 8º, do Decreto-Lei 92/2010, de 26 de julho, consistindo numa declara-
ção efetuada pelo prestador de serviços necessária ao início da atividade, que permita o exercício da mesma quando a autoridade administrativa não se
pronuncie após o decurso de um determinado prazo, procedimento que nada tem a ver com a geometria procedimental associada à mera comunicação
prévia.
114 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
- é uma declaração apresentada, pelo interessado, acompanhada de todos os
documentos instrutórios de apresentação obrigatória;
- os efeitos de tal declaração, enquanto “via verde” para a realização das opera-
ções urbanísticas ficam, sempre, condicionados ao prévio pagamento das taxas
urbanísticas devidas7;
- tal procedimento não pode ser objeto de declaração de nulidade e não é susce-
tível de revogação, nos termos do disposto nos artigos 68º, 69º e 73º, todos do
RJUE;
- toda a instrução, sob pena de rejeição liminar do procedimento, deve ser con-
7 Pela natureza do procedimento de mera comunicação prévia, não implicando o mesmo a prática de qualquer ato permissivo, por parte da Adminis-
tração municipal, em vista à legítima concretização da operação urbanística, parece-nos que não existe, atualmente, facto tributário justificador, no
âmbito deste procedimento, da liquidação de taxas administrativas associadas à sua tramitação.
Todavia, é de admitir, desde que devidamente fundamentada, nos termos legais, a criação de uma taxa municipal, de natureza administrativa, asso-
ciada ao serviço prestado, pela Administração municipal, no âmbito do saneamento e apreciação liminar da mera comunicação prévia apresentada,
pelo comunicante, acompanhada de todos os documentos de apresentação obrigatória, sendo, nesta sede, defensável a existência de um verdadeiro
sinalagma, entre o serviço público prestado, pela Administração municipal, na apreciação, ainda que preliminar e formal, de tal declaração e a contra-
prestação - taxa - aplicável.
Como é evidente, não se encontra prejudicada, no âmbito da mera comunicação prévia, a liquidação e cobrança das taxas urbanísticas correlacionadas
com a realização, manutenção e reforço de infraestruturas urbanísticas, previstas no art. 116º do RJUE.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 115
quistada no momento da apresentação da respetiva declaração que titula a mera
comunicação prévia;
Isto não significa, porém, que tais operações urbanísticas fiquem, absolutamente,
entregues à sua sorte e arredadas, como tal, de qualquer controlo público muni-
cipal, situação que seria, manifestamente, prejudicial, em geral, para o adequado
ordenamento do território, e, em particular, para a correta e efetiva utilização do
solo para fins urbanísticos.
Neste contexto, falhando tal controlo sucessivo, por parte dos serviços de fis-
calização municipal, assente numa lógica sistemática e preventiva de acompa-
nhamento das operações urbanísticas, então, as mesmas serão, perigosamente,
desenvolvidas, sem qualquer controlo público - prévio e ou sucessivo -, com
todas as desvantagens daí emergentes para a prossecução do interesse público,
particularmente, no que concerne à tutela efetiva dos valores da saúde pública e
da segurança, prejudicando, simultaneamente, a criação de uma cultura efetiva
116 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
e consistente de responsabilidade, a qual deve pautar a ação de todos os atores
envolvidos, direta ou indiretamente, no processo urbanístico: proprietários dos
solos, promotores, construtores civis, técnicos legalmente habilitados8.
O próprio legislador, logo à partida, parece ter desconfiado da sua própria refor-
ma, na área do controlo público das operações urbanísticas, com a introdução do
regime da mera comunicação prévia, quando veio a consagrar, no nº 6 do art. 4º,
do RJUE, a possibilidade dos interessados poderem optar pelo procedimento da
licença administrativa, no perímetro de intervenção, preestabelecido, da comuni-
cação prévia.
8 A matéria fundamental relacionada com a responsabilidade dos diversos intervenientes no desenvolvimento das operações urbanísticas foi alvo das
preocupações, quer na LBPSOTU, quer no RJUE, com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei 136/2014, de 09 de setembro.
Veja-se, nesse sentido, o disposto no artigo 58º da LBPSOTU e a consagração, no RJUE, do novo artigo 100º- A, sobre responsabilidade civil dos interve-
nientes nas operações urbanísticas.
9 A exigente carga instrutória que está determinada para o procedimento de mera comunicação prévia e a ausência, formal, de diálogo técnico e de
compromisso, entre o comunicante e a administração municipal, constituem fatores dissuasores da escolha, pelo interessado, do procedimento de mera
comunicação prévia.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 117
o ponto de vista da sua tramitação, desenvolvida de acordo com as seguintes
fases fundamentais:
10 Sobre esta matéria, torna-se decisiva a aposta centrada na efetiva disponibilização desta plataforma, em vista a ser assegurada a plena tramitação in-
formática do procedimento, sob pena de ficarem, seriamente, comprometidas muitas das virtualidades associadas à simplificação do procedimento e à
segurança e celeridade administrativas do mesmo.
11 Tal Portaria veio a identificar os elementos instrutórios dos procedimentos previstos no RJUE.
118 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
única vez, para, no prazo de 15 dias, compor ou completar a sua comunicação,
sob pena de rejeição liminar da mera comunicação prévia12
Esta fase diz respeito ao início efetivo das obras e ou trabalhos sujeitos ao regime
da mera comunicação prévia, sendo recomendável que o regulamento municipal
da urbanização e da edificação consagre, expressamente, que tais operações
urbanísticas ficam, também, sujeitas ao dever de informação, sobre o início dos
correspondentes trabalhos, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 80º-A
do RJUE.
Nos termos do disposto no nº8, do art. 35º, do RJUE, na sua redação atual, a
12 Embora esta atuação não tenha consagração na disciplina normativa fixada, no RJUE, em matéria de saneamento e apreciação liminar da mera comunica-
ção prévia, julgamos recomendável, por razões de natureza preventiva e em homenagem aos princípios da boa fé procedimental e da boa administração,
que a Administração municipal, perante uma mera comunicação prévia apresentada e que evidencie, grosseiramente, a violação das normas legais e
ou regulamentares aplicáveis, não tenha sido antecedida dos pareceres, autorizações ou aprovações legalmente exigidas ou não se conforme com os
mesmos, emita um “alerta”, dirigido ao comunicante, nesta fase de saneamento, evidenciando, tal desconformidade substantiva, dando-lhe, simulta-
neamente, nota que, do procedimento, em apreciação, não poderão ser extraídos os efeitos associados à declaração apresentada, particularmente, no
que concerne à imediata realização da operação urbanística, sob pena de acionamento dos mecanismos legais colocados à disposição da Administração
- cassação da comunicação e eventual embargo administrativo - que tornem inviável a efetiva materialização da operação urbanística, e desde que o
comunicante não manifeste intenção de proceder à regularização do pedido.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 119
Câmara Municipal deve, em sede de fiscalização sucessiva, inviabilizar a execução
das operações urbanísticas objeto de comunicação prévia e promover as medidas
necessárias à reposição da legalidade urbanística, quando verifique que não foram
cumpridas as normas e condicionantes legais e regulamentares, ou que estas não
tenham sido precedidas de pronúncia, obrigatória, nos termos da lei, das entida-
des externas competentes, ou com ela não se conformem.
Sendo certo que tal dever de fiscalização, nos termos anteriormente configurados,
caduca 10 anos após a data de emissão do título da comunicação prévia13.
13 Este regime de caducidade previsto no nº. 9, do art. 35º do RJUE não pode atingir, salvo melhor opinião, a ação de fiscalização, diga-se, permanente e
intemporal, confiada à Administração municipal, nos termos do disposto no art. 93º do RJUE, ou seja, a fiscalização administrativa que incide sobre a
realização de quaisquer operações urbanísticas, independentemente da sua sujeição, ou não, a controlo prévio municipal.
Tal ação de fiscalização administrativa não pode, nesta perspetiva, sair prejudicada, pela previsão da norma retrocitada, contida no nº. 9, do art. 35º,
devendo a mesma ser, exclusivamente, contextualizada, em sede de controlo sucessivo – que não fiscalização administrativa – das operações urbanísticas
abrangidas por mera comunicação prévia.
120 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Segunda dimensão: definição, do ponto de vista competencial, dos órgãos muni-
cipais que devem assegurar e coordenar as ações de fiscalização municipal, quer
no âmbito das operações urbanísticas sujeitas a mera comunicação prévia – con-
trolo sucessivo -, quer no âmbito das diversas operações urbanísticas sujeitas a
fiscalização administrativa, aplicando-se, se necessário, as medidas de reposição
da legalidade urbanística ofendida previstas no RJUE;
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 121
- aplicação das medidas de reposição da legalidade que se mostrem adequadas
e proporcionais ao devido cumprimento do quadro normativo urbanístico que,
eventualmente, seja ofendido.
122 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
Neste plano de análise, e em resposta à segunda dimensão da matéria, ora, em
apreciação, - competência -, poder-se-á afirmar que o controlo sucessivo das
operações urbanísticas sujeitas a mera comunicação prévia, à luz do argumen-
tário, anteriormente, perfilhado, está, legalmente, confiado, a favor da Câmara
Municipal, não havendo qualquer sobreposição ou conflito com as competências
confiadas, a favor do Presidente da Câmara, no âmbito da fiscalização administra-
tiva das operações urbanísticas prevista no art. 93.º do RJUE.14
14 É de admitir, nos termos das disposições combinadas previstas, sobre a matéria, no anexo I, da Lei 75/2013, de 18 de setembro, diploma que estabelece
o regime jurídico das Autarquias Locais, aprova o estatuto das entidades intermunicipais, estabelece o regime jurídico da transferência de competências
do Estado para as Autarquias Locais e para as entidades intermunicipais e aprova o regime jurídico do associativismo autárquico, e no CPA, em vigor, a
delegação, de tal competência, no Presidente da Câmara, desde que cumpridos todos os pressupostos legais indispensáveis à prática do ato de delegação.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 123
- cassação do título da comunicação prévia, pelo Presidente da Câmara, quan-
do a mesma comunicação caduque, não cumpra as normas legais ou regula-
mentares aplicáveis, não tenha sido antecedida dos pareceres, autorização ou
aprovações legalmente exigidos ou não se conforme com os mesmos, à luz
do art. 79º do RJUE, sendo certo que tal decisão deverá ser operacionalizada
através do averbamento da referida cassação à informação constante da pla-
taforma eletrónica;
124 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
urbanística está sujeita a fiscalização administrativa, tendo a mesma como objeto
garantir a adequada conformidade daquelas operações com as normas urbanís-
ticas aplicáveis.
Sendo certo que, com alguma frequência, tais decisões administrativas acabam
por ser, indevidamente, fundamentadas, não dando cumprimento aos pressupos-
tos, formais e materiais, que estão, legalmente, estatuídos, sobre a matéria, cons-
tituindo, por isso, presa fácil no sentido da sua ulterior impugnação, por parte dos
infratores, com todos os inconvenientes daí decorrentes para a credibilização do
sistema de fiscalização municipal.
Tudo isto, sob pena da realização de tais operações urbanísticas ficarem, exclusi-
vamente, dependentes da sua sorte e da lealdade e ou boa vontade dos comuni-
cantes, ficando, as mesmas, destituídas, quer do controlo prévio, quer do controlo
sucessivo, com claros prejuízos para o interesse público prosseguido, na gestão
do território municipal, comprometendo, ainda, o clima de paz e segurança que
deve prevalecer nas relações que se estabelecem entre todos os atores do pro-
cesso urbanístico.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 125
abalada pelo desgoverno e ou irresponsabilidade indissociáveis de um controlo
público sucessivo das operações urbanísticas sujeitas a mera comunicação prévia,
formalmente, concebido mas, na prática, operacionalmente, inexistente, realidade
que, a verificar-se, acabaria por traduzir a metáfora que deu título aos presentes
comentários, ou seja, “toda a gente ralha e ninguém tem razão!”.
Neste contexto, impõe-se, salvo melhor opinião, uma revisão da carreira de fiscal
municipal, no sentido da mesma ser constituída por diferentes categorias, garan-
16 Dá mesmo vontade de dizer, numa perspetiva caricatural, que, no atual modelo de fiscalização municipal, com honrosas exceções, durante o fim-de-
-semana, não há cometimento de infrações!
126 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
tindo, por esta via, a pluridisciplinaridade da ação de fiscalização, dando a mesma
resposta, não só à componente administrativa, mas também à sua não menos
importante componente técnica, fiscalizando e controlando, sucessivamente, o
cumprimento de todos os projetos, de natureza técnica, que dão suporte à apro-
vação da operação urbanística, em execução, devendo, nesse sentido, tal carreira,
contar com a integração de uma categoria técnica superior 17/18.
17 A convite da Associação Nacional de Fiscais Municipais, veio a ser preparada proposta técnica tendo, precisamente, como objeto a revisão da carreira
de Fiscal Municipal e a criação de uma categoria correspondente a técnico superior. A referida proposta encontra-se, em fase de apreciação, junto da
Secretaria de Estado das Autarquias Locais.
18 A agregação funcional de técnicos superiores, designadamente nas áreas da engenharia e ou da arquitetura, no âmbito das ações de fiscalização municipal
- fiscalização administrativa e ou controlo sucessivo das operações urbanísticas -, constitui, seguramente, uma boa medida de gestão, em vista à melhoria
qualitativa do papel, quotidianamente, desenvolvido, pelas equipas de fiscalização, conferindo-lhes, por esta via, uma dimensão pluridisciplinar, com
ganhos efetivos no controlo técnico, à posteriori, das operações urbanísticas.
Esta solução gestionária dos recursos humanos da Autarquia, afetos à atividade de fiscalização, tem enquadramento legal, nos termos do disposto no
nº. 3, do art. 94º do RJUE, prevendo-se, em tal norma jurídica, que, no exercício da fiscalização, o Presidente da Câmara é auxiliado por funcionários
municipais com formação adequada a quem incumbe preparar e executar as suas decisões.
Neste contexto, na qualidade de técnicos superiores, poderão, tais colaboradores municipais, participar, ativamente, nas ações de fiscalização, aportando,
os mesmos, do ponto de vista técnico, uma resposta mais qualificada, sobretudo, em sede de controlo sucessivo das operações urbanísticas sujeitas a
mera comunicação prévia.
19 O modelo de fiscalização municipal deverá ser recentrado no sentido de permitir uma adequada distribuição de tarefas: os agentes de fiscalização narram
com objetividade os factos suscetíveis de infração; o setor jurídico enquadra, juridicamente, tais factos e propõe as respetivas medidas; os agentes
políticos competentes decidem com oportunidade.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 127
i) identificação de um prazo máximo que deve ser observado, pelo setor
de fiscalização, em vista à realização do primeiro episódio de fiscalização
às operações urbanísticas, em curso, sendo certo, que tal prazo máximo
deverá ser, substantivamente, mais curto, nas operações urbanísticas
sujeitas a mera comunicação prévia, no caso, e como regra geral, 8 dias
contados desde a comunicação do início dos trabalhos, feita, pelo comu-
nicante, à luz do art. 80º-A do RJUE (autovinculação ao primeiro episódio
de fiscalização ou de controlo sucessivo);
128 M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a
IV - CONCLUSÕES FINAIS
Esta parece ser a única via possível, no sentido de repor a necessária credi-
bilidade, nesta área tão decisiva de intervenção municipal, sobre a qual recai,
atualmente, um manto de desconfiança, particularmente, no que concerne à
efetiva aplicação das medidas de tutela da legalidade urbanística.
M U N I C I PA L I S M O | R e v i s t a C i e n t í f i c a 129
E S TAT U T O D A R E V I S TA
Artigo 1.º
Natureza e objeto
a) “Municipalismo” é uma revista científica nas áreas temáticas do Poder Local e afins, cujos
objetivos, estrutura e funcionamento se encontram regulados no presente estatuto.
b) A revista pretende constituir-se como uma referência e um meio de comunicação entre
a comunidade científica, investigadores, docentes, estudantes e profissionais ligados à
Administração Autárquica.
Artigo 2.º
Conteúdo
Os artigos a publicar na revista devem ser originais, sendo sujeitos a parecer prévio do Con-
selho Consultivo.
Artigo 3.º
Difusão
A revista é distribuída às entidades definidas pela Associação dos Trabalhadores da Adminis-
tração Local (ATAM) e vendida mediante preços por esta fixados.
Artigo 4.º
Destinatários
A revista destina-se a ser divulgada pelos municípios e demais entidades ligadas ao Poder
Local, e a ser vendida a todos os interessados da comunidade científica, investigadores, do-
centes, estudantes e profissionais das áreas da Administração Autárquica.
Artigo 5.º
Propriedade
A revista “Municipalismo” é uma publicação que é propriedade da ATAM.
Artigo 6.º
Órgãos
São órgãos da revista “Municipalismo”:
a) Direção;
b) O Conselho Consultivo.
Artigo 7.º
Direção
1. A Direção é constituída por um Diretor e dois Diretores Adjuntos.
2. O Diretor é, por inerência, o Presidente da Direção da ATAM.
3. O Diretor é coadjuvado pelos Diretores Adjuntos, sendo o primeiro, por inerência, um Dele-
gado Distrital ou Regional da ATAM, e o segundo escolhido de entre os parceiros da ATAM.
4. Compete à Direção:
a) Aprovar o Regulamento Interno;
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b) Propor à Direção da ATAM a nomeação, renovação e destituição dos membros do Conse-
lho Consultivo;
c) Sugerir à Direção da ATAM as entidades a quem deve ser distribuída a revista, e o preço de
venda;
d) Manter em sigilo os autores dos artigos recebidos, até decisão da publicação pelo Conse-
lho Consultivo, bem como daqueles que, por decisão do mesmo órgão, não sejam publi-
cados;
e) Deliberar sobre quaisquer assuntos que não estejam previstos no presente estatuto e no
regulamento.
Artigo 8.º
Conselho Consultivo
1. O Conselho Consultivo é composto por cinco membros.
2. Os membros são nomeados pela Direção da ATAM, pelo período de dois anos, renovável.
3. Compete ao Conselho Consultivo:
a) Analisar o teor dos artigos para publicação;
b) Definir o conteúdo da revista e promover a publicação dos artigos, de forma a salvaguardar
a sua coerência e objetivos.
c) Devolver à Direção todos os artigos que não se enquadrem nas áreas científicas da revista;
Artigo 9.º
Remuneração dos Órgãos
Os titulares dos órgãos da revista científica, têm direito a senhas de presença e despesas de
deslocação, nos termos a definir pela Direção da ATAM.
Artigo 10.º
Autonomia
1. A revista científica deverá garantir o pluralismo, de forma a gerar um debate no âmbito do
municipalismo.
2. A revista científica tem autonomia editorial perante a ATAM e será dotada de orçamento
próprio, a suportar por aquela, e por receitas próprias.
Artigo 11.º
Incompatibilidades
1. São incompatíveis as funções de membro da Direção da ATAM e do Conselho Consultivo.
2. Os membros da Direção da ATAM e do Conselho Consultivo só podem apresentar artigos
para publicação se aprovados por aquela.
Artigo 12.º
Interpretação
A resolução de quaisquer dúvidas que, porventura, sejam suscitadas na aplicação do presente
estatuto, são da competência da Direção da ATAM.
Artigo 13.º
Publicidade
O presente estatuto é publicitado na revista e disponibilizado no website da ATAM.
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NORMAS DE COLABORAÇÃO
Os artigos não devem ultrapassar as 20 páginas, com entrelinha a 1,5, em caracteres Times
New Roman, tamanho 12 (Word), enviados para a ATAM por e-mail municipalismo@atam.pt ou
CD-ROM.
1ª página – Na primeira página do trabalho deve constar: Título do artigo, nome e afi-
liação institucional do(s) autor(es), resumo do artigo (não excedendo as 250 palavras).
Última página – Na última página deve constar o endereço de contacto do(s) autor(es).
Quadros e figuras – (Em ambiente Windows, qualquer programa) devem ser apre-
sentados, preferencialmente, no corpo do artigo, numerado sequencialmente e com
título. A indicação da sua localização deve ser feita no corpo do artigo entre parêntesis.
Hill, M., & Cochran, W. (1997). Into print: A pratical guide to writing, illustrating, and pub-
lishing. Los Altos. CA: William Kaufman.
Reisman, S.J. (1962). A style manual for technical writers and editors. New Work:
Macmillan.
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E S TAT U T O E D I T O R I A L
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