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PSICODIAGNÓSTICO-V

P974 Psicodiagnóstico-V [recurso eletrônico] / Jurema Alcides Cunha ...


[et al.]. – 5. ed. rev. e ampl. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre :
Artmed, 2007.

Editado também como livro impresso em 2003.


ISBN 978-85-363-0778-7

1. Psicodiagnóstico. I. Cunha, Jurema Alcides.

CDU 159.9

Catalogação na publicação: Júlia Angst Coelho – CRB 10/1712


Jurema Alcides Cunha
Livre-docente em Psicologia Clínica.
Doutora em Filosofia.
Professora aposentada dos Cursos de Pós-Graduação em Psicologia
da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Pesquisadora associada ao Instituto de Psicologia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

e Colaboradores

PSICODIAGNÓSTICO-V
5a edição revisada e ampliada

3a Reimpressão

Versão impressa
desta obra: 2003

2007
© Artmed Editora S.A., 2000

Capa:
Joaquim da Fonseca

Preparação de originais:
Renato Deitos

Supervisão editorial:
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Colaboradores

Aidyl L.M. de Queiroz Pérez-Ramos – Doutora em Psi- Neuropsicologia do PROTER do Instituto de Psiquiatria
cologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de do Hospital das Clínicas – FMUSP.
São Paulo, com Especialização e Pós-Doutorado nos
Estados Unidos e na França. Professora Titular do Pro- Cícero Emidio Vaz – Psicólogo. Doutor em Psicologia e
grama de Pós-Graduação em Psicologia da Universida- Livre-Docente em Técnicas Psicológicas da Faculdade
de de São Paulo e Docente do Programa de Pós-Gra- de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio
duação da Universidade La Laguna, Espanha. Perito de Grande do Sul, com Pós-Doutorado na Universidade da
diversos programas nacionais e internacionais (ONU, OEA Califórnia, em Berkeley, Estados Unidos. Professor Titu-
e UNESCO), na área de Educação Especial. Titular da Ca- lar de Técnicas Projetivas dos Cursos de Graduação e
deira Paula Souza, no 30, da Academia Paulista de Psico- Pós-Graduação da Faculdade de Psicologia da Pontifí-
logia e Active Member da New York Academy of Science. cia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

André Jacquemin – Doutor e Livre-Docente em Psi- Claudio Simon Hutz – Ph.D em Psicologia pela Univer-
cologia pela Universidade de São Paulo. Professor Ti- sidade de Iowa, Estados Unidos. Professor Titular do
tular Aposentado da Faculdade de Filosofia e Letras Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio
da Universidade de São Paulo. Ex-coordenador do Cur- Grande do Sul. Coordenador do Curso de Psicologia
so de Psicologia da Universidade de Ribeirão Preto, Clínica da UFRGS.
São Paulo.
Denise Ruschel Bandeira – Doutora em Psicologia pela
Anna Elisa de Villemor Amaral – Psicóloga. Doutora Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professora
em Distúrbios da Comunicação pela Escola Paulista de Adjunta do Instituto de Psicologia da Universidade Fe-
Medicina da Universidade Federal de São Paulo. Profes- deral do Rio Grande do Sul. Chefe do Departamento
sora no Curso de Graduação em Psicologia da Pontifí- de Psicologia do Desenvolvimento e da Personalidade
cia Universidade Católica de São Paulo. Professora nos da UFRGS. Coordenadora do Curso de Especialização em
Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Psicologia Avaliação Psicológica do Instituto de Psicologia da UFRGS.
da Universidade São Francisco, de Itatiba, SP. Membro
da Comissão de Coordenação do Mestrado em Avalia- Elizabeth do Nascimento – Mestre em Psicologia So-
ção na Universidade de Itatiba, SP. cial pela Universidade Federal de Minas Gerais. Douto-
ra em Psicologia pela Universidade de Brasília. Profes-
Blanca Guevara Werlang – Mestre em Psicologia So- sora Assistente do Departamento de Psicologia da Uni-
cial e da Personalidade pela Pontifícia Universidade Ca- versidade Federal de Minas Gerais.
tólica do Rio Grande do Sul. Doutora do Curso de Pós-
Graduação em Ciências Médicas, área de Saúde Men- Irani I. L. Argimon – Mestre em Educação pela Pontifí-
tal, da Universidade Estadual de Campinas cia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Douto-
(UNICAMP). Professora dos Cursos de Graduação e ra em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade
Pós-Graduação da Faculdade de Psicologia da Ponti- Católica do Rio Grande do Sul. Professora no Curso de
fícia Universidade Católica do Rio Grande Sul. Graduação em Psicologia na Pontifícia Universidade Ca-
tólica do Rio Grande do Sul. Supervisora de Psicologia
Candida H. Pires de Camargo – Psicóloga. Coordena- Hospitalar no Hospital São Lucas da PUCRS. Superviso-
dora e Supervisora do Programa de Especialização e ra de Psicologia Clínica na Unidade de Dependência Quí-
Aprimoramento de Psicologia e Neuropsicologia do Ins- mica no Hospital Mãe de Deus, Porto Alegre.
tituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. Coorde-
nadora do Serviço de Psicologia do Instituto de Psiquia- Jandyra M.G. Fachel – Ph.D em Estatística pela Uni-
tria do Hospital das Clínicas – FMUSP. Supervisora de versidade de Londres. Mestre em Estatística pela Uni-
versidade de São Paulo. Professora Titular do Departa- Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Profes-
mento de Estatística da Universidade Federal do Rio sora do curso de Rorschach da Sociedade Brasileira de
Grande do Sul. Professora do Curso de Pós-Graduação Rorschach (SBRo), São Paulo.
em Psicologia do Desenvolvimento da Universidade Fe-
deral do Rio Grande do Sul. Silvio A. Erné – Médico Especialista em Psiquiatria pela
Associação Brasileira de Psiquiatria (filiada à Associa-
Leila S.L.P. Cury Tardivo – Doutora em Psicologia Clíni- ção Médica Brasileira). Especialista em Psiquiatria Fo-
ca pela Universidade de São Paulo. Professora de Cur- rense pela Associação Médica Brasileira. Médico de Pe-
sos de Graduação e Pós-Graduação do Instituto de Psi- rícia e Análise do Estado do Rio Grande do Sul – Secre-
cologia da Universidade de São Paulo. Orientadora do taria da Justiça e Segurança Pública, à disposição da
Programa de Mestrado do Instituto de Psicologia da Assembléia Legislativa do Estado. Médico Perito do
Universidade de São Paulo. Poder Executivo Federal – Ministério da Saúde – Funda-
ção Nacional de Saúde do RS. Consultor Técnico-Fo-
Marcelo Tavares – Doutor em Psicologia Clínica pela rense do Hospital Moinhos de Vento na Área de Geren-
United States International University. Professor do ciamento de Risco.
Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psi-
cologia da Universidade de Brasília. Coordenador do Sonia Rovinski – Mestre em Psicologia Social e da Per-
Laboratório de Psicoterapia e Psicodiagnóstico da Uni- sonalidade pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
versidade de Brasília. Grande do Sul. Doutoranda em Psicologia Clínica e da
Saúde pela Universidade de Santiago de Compostela,
Maria da Graça B. Raymundo – Mestre em Psicologia Espanha, em convênio com a Universidade Luterana do
Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Brasil. Psicóloga Judiciária do Tribunal de Justiça do
Grande do Sul. Professora Titular dos Cursos de Gra- Estado do Rio Grande do Sul.
dução e Pós-Graduação em Psicologia da Faculdade
de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Suzi Camey – Mestre em Matemática pela Universida-
Rio Grande Sul. de Federal do Rio Grande do Sul. Doutoranda em Esta-
tística pela Universidade de São Paulo. Professora do
Margareth da Silva Oliveira – Psicóloga. Mestre em Departamento de Estatística da Universidade Federal
Psicologia Clínica pela Pontificia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
do Rio Grande do Sul. Doutora da Universidade Federal
de São Paulo (Escola Paulista de Medicina). Professora Vera L.M. Figueiredo – Mestre em Psicologia Social e
dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação da Pontifí- da Personalidade pela Pontifícia Universidade Católica
cia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. do Rio Grande do Sul. Doutora do Curso de Psicologia
da Universidade de Brasília (DF). Professora do Curso
Neli Klix Freitas – Psicóloga. Doutora em Psicologia pela de Graduação e Pós-Graduação da Escola de Psicologia
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. da Universidade Católica de Pelotas (RS).

Regina Sonia Gattas F. do Nascimento – Doutora em Walter Trinca – Doutor em Ciências, Livre-Docente e
Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São ex-Professor Titular do Instituto de Psicologia da Uni-
Paulo, com formação em psicanálise. Professora no versidade de São Paulo, onde coordenou o programa de
Curso de Graduação em Psicologia da Pontifícia Uni- Pós-Graduação em Psicologia Clínica. Psicanalista e mem-
versidade Católica de São Paulo. Coordenadora do La- bro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São
boratório de Estudos em Psicodiagnóstico (LEPSI) da Paulo e da International Psychoanalytical Association.

VI JUREMA ALCIDES CUNHA


Prefácio

É com extrema satisfação que estou, aqui de


novo, para apresentar o Psicodiagnóstico,
desta vez, em sua quinta edição revisada – o
to, Vera Figueiredo e Walter Trinca; das douto-
randas Sonia Rovinski e Suzi Camey, bem como
de registrar, igualmente, a ajuda da mestra
Psicodiagnóstico-V. Esta reflete certas inova- Maria da Graça Raymundo e dos especialistas Sil-
ções surgidas na área, bem como algumas mu- vio Erné e Candida Pires de Camargo.
danças minhas quanto ao modo de ver as coi- Quando foi lançada a primeira edição, há
sas. Mas, de forma mais importante, decorre quase quinze anos, isso aconteceu pela cora-
do estímulo, apoio e reconhecimento que a gem e apoio essencial com que a Editora Artes
obra tem tido por parte de todos vocês, alu- Médicas recebeu nossas primeiras idéias (mi-
nos, colegas, amigos, assistentes, bolsistas e nhas, da professora Neli e da professora Maria
colaboradores, principais responsáveis por este da Graça) de, ambiciosamente, querer preen-
empreendimento que, só assim, tornou-se viá- cher uma lacuna no que se refere a fontes bi-
vel em poucos meses. Recebam, pois, toda a bliográficas no campo do psicodiagnóstico, ati-
minha gratidão, já que a merecem. tude que a Editora mantém até hoje. As edi-
Os que conheceram as outras edições vão ções subseqüentes ocorreram pela acolhida que
perceber que a estrutura básica da obra conti- a obra teve em quase todo o país e que espero
nua a mesma, embora pouca coisa permaneça que continue.
exatamente igual, com a maioria dos capítulos Nesta quinta edição, entretanto, desejo,
reescritos, sendo outros introduzidos, de for- além de externar meu reconhecimento aos vin-
ma a ser possível absorver novos enfoques e te e dois colaboradores, agradecer imensamen-
idéias. Desse modo, tenho o imenso orgulho te à Blanca Guevara Werlang, que auxiliou, de
de assinalar e agradecer a colaboração dos dou- forma eficiente, na revisão final, e, de maneira
tores Aidyl Q. Pérez-Ramos, André Jacquemin, especial, à Nilza Cidade Cardarelli, pois, sem
Anna Elisa Amaral, Blanca Guevara Werlang, seu inestimável trabalho de secretaria, este li-
Cícero Vaz, Cláudio Hutz, Denise Bandeira, Eli- vro não seria possível.
zabeth do Nascimento, Irani Argimon, Jandyra
Fachel, Leila Tardivo, Marcelo Tavares, Marga-
reth Oliveira, Neli Freitas, Regina do Nascimen- Jurema Alcides Cunha
Prefácio da primeira edição

T rabalhando há vários anos em cursos de pós-


graduação em psicologia clínica, freqüen-
tados por psicólogos de várias partes do Bra-
posição contra a utilização de processos psi-
codiagnósticos ou, embora aceitando a sua
utilidade, a demonstrarem um temor de clas-
sil, muitas vezes tivemos oportunidade de cons- sificar as pessoas. A dificuldade chegou a tal
tatar, e os próprios alunos também, que eles ponto que alguns profissionais recebiam o en-
deveriam ter tido uma preparação melhor e caminhamento de uma criança, por problema
mais extensiva em psicodiagnóstico. Todavia, emocional, e, após a utilização de todo um
tornava-se muito claro que o problema não processo, incluindo uma extensiva bateria de
poderia ser explicado apenas em termos de testes, acabavam por concluir que a criança
deficiências de cursos, mas também pela fal- apresentava um problema emocional.
ta de mais livros de texto e material biblio- Felizmente, após os recentes avanços no
gráfico em geral. Várias vezes, então, nos foi campo do psicodiagnóstico, a maioria dos psi-
solicitado que escrevêssemos um livro sobre cólogos acabou por reconhecer que se, em ca-
psicodiagnóstico. sos específicos, a avaliação psicológica pode
É bem verdade que nem todos os alunos ter levado a classificações errôneas ou discri-
de cursos de Psicologia e nem todos os psicó- minatórias, como lembra Weiner, “isto não re-
logos clínicos se mostram ávidos por aprender flete quaisquer características inerentemente
mais a respeito de psicodiagnóstico. Como desumanizantes dos instrumentos de psico-
Weiner comenta, a emergência, na segunda diagnóstico” (op.cit., p.453).
metade do século, de abordagens humanísti- O psicodiagnóstico é uma tarefa do psicó-
cas de certa maneira levantou juízos moralísti- logo clínico e a única que lhe é privativa. É,
cos a respeito do uso de instrumentos para a pois, de fundamental importância que consi-
classificação diagnóstica. A influência de Mas- ga exercê-la e exercê-la bem.
low e Rogers levou muitos profissionais a con- Por outro lado, à medida que as pesquisas
siderarem que “o que é verdadeiro sobre as vêm demonstrando a importância etiológica de
pessoas é somente como experienciam a si fatores emocionais em muitas doenças, tradi-
mesmas e não qualquer coisa demonstrada cionalmente tidas como da exclusividade do
por qualquer avaliação externa” e, por outro campo da medicina “física”, mais os profissio-
lado, “que as tentativas de classificação, sejam nais vêm considerando a relevância de refinar
de acordo com traços de personalidade ou di- seus recursos de avaliação, porque podem as-
mensões do comportamento, são procedimen- sumir as funções de um expert. Assim, cada
tos desumanizantes, que despem as pessoas vez menos casos são encaminhados para um
de sua liberdade e dignidade” (Weiner, 1983, “exame psicológico” e cada vez mais os psicó-
p.450). logos se dedicam a resolver importantes ques-
A ênfase na individualidade de cada pes- tões diagnósticas. Desse modo, na medida em
soa levou muitos profissionais a adotarem uma que o psicodiagnóstico vai contribuindo subs-
tancialmente para a tomada de decisões vitais básico de um consultório de psicodiagnóstico
na vida dos indivíduos e, em especial, os psi- e a apresentação de uma espécie de catálogo
cólogos vão conseguindo assessorar, de forma de técnicas, oferecendo informações sucintas,
fundamental, profissionais de outras áreas, mas básicas, para o profissional ter acesso fá-
cresce a importância da boa formação e espe- cil a algumas alternativas na escolha de instru-
cialização neste campo. mentos para uma bateria de testes. Aqui, no-
Foi dessa maneira que surgiu o plano deste vamente, a autora sênior introduziu o exame
livro, com uma ambiciosa perspectiva de aten- de recursos para a avaliação, ficando ainda a
der necessidades e interesses de alunos e pro- seu cargo a discussão de recursos na área inte-
fissionais. Aos alunos, oferecemos toda uma lectual. A professora Neli e a professora Maria
visão do processo psicodiagnóstico, mais um da Graça assumiram, respectivamente, as duas
punhado de informações sobre técnicas, ter- áreas seguintes, enquanto o último item foi de-
minando por sugestões para o material básico senvolvido em comum pela professora Neli e por
de um gabinete para psicodiagnóstico. Aos nós. No Catálogo de técnicas úteis, a maior par-
psicólogos, pelo menos parte dessas informa- te dos instrumentos ficou sob a nossa responsa-
ções pode interessar, além de termos procura- bilidade, colaborando as demais autoras confor-
do apresentar alternativas no manejo de vá- me as experiências profissionais de cada uma.
rias técnicas, bem como dados recentes sobre A terceira parte do livro foi acrescentada
o uso de vários instrumentos. ao plano inicial, por parecer necessária a inclu-
Na primeira parte do livro, discutimos as- são de alguns manejos clínicos de técnicas de
pectos conceituais e operacionais do psicodiag- uso comum e que haviam constado no mate-
nóstico, introduzimos questões básicas, enfo- rial básico para um gabinete de psicodiag-
camos o problema do encaminhamento e a nóstico. Um fator que também pesou bastan-
dinâmica da interação clínica, para, então, pas- te na escolha de técnicas foi a sua importân-
sarmos a examinar todo o processo do psico- cia. Assim, num levantamento recente, reali-
diagnóstico, desde a entrevista inicial, através zado nos Estados Unidos, em 221 serviços clí-
de seus vários passos, até a comunicação dos nicos, o WAIS ficou classificado em primeiro
resultados. Os capítulos iniciais, até a coloca- lugar, cabendo o segundo lugar ao MMPI, que
ção de questões básicas, ficaram sob a nossa superou inclusive o Rorschach, que, por mui-
responsabilidade, passando a professora Ma- tos e muitos anos, havia ocupado o primeiro
ria da Graça B. Raymundo a escrever sobre o posto em termos de técnicas de personalida-
contato com o paciente e a dinâmica da inte- de. Todavia, este, o Bender, Complemento de
ração clínica. No Capítulo 4, houve a colabora- Sentenças e outros ficaram entre os instrumen-
ção ativa das três autoras, cabendo à profes- tos mais utilizados pelos psicólogos clínicos da-
sora Neli Klix Freitas, em especial, o desenvol- quele país (Weiner, 1983). Dessa maneira, deci-
vimento dos itens relativos à entrevista, e à pro- dimos dar um destaque especial às escalas
fessora Maria da Graça, a maior parte da res- Wechsler, ao MMPI, ao Bender e ao Rorschach,
ponsabilidade pelos textos sobre os passos do que foram técnicas que ficaram a nosso cargo,
processo. Foi de fundamental importância a além do Complemento de Sentenças. A profes-
contribuição dessas profissionais, nessa altura sora Neli ficou responsável pelo CAT, Família,
do livro, pelo seu contato constante com alu- Garatujas e TAT, enquanto a professora Maria da
nos da graduação e o seu conhecimento sobre Graça desenvolveu o capítulo sobre a Figura Huma-
suas necessidades. na. O capítulo sobre o HTP foi em parte escrito pela
Na segunda parte do livro, procuramos exa- professora Neli e, em parte, por nós. Nesta parte
minar os recursos de avaliação, partindo de do livro, cada autora desenvolveu seu assunto
suas implicações teóricas, referindo, a seguir, como achou melhor, seja do ponto de vista di-
pontos importantes em várias áreas, para che- dático, seja quanto à sua experiência pessoal.
gar à abordagem de questões eminentemente Cabe aqui uma menção especial ao traba-
práticas, tais como sugestões sobre o material lho da equipe. Desde que nós esboçamos o

X JUREMA ALCIDES CUNHA


rascunho inicial sobre o plano do livro, em abril mente escrever este livro. Todavia, foi muito
em 1985, e convidamos as duas professoras, importante a colaboração das duas co-autoras
colegas e amigas, a participarem do projeto, para que fosse desencadeado o processo de
temos tido reuniões praticamente mensais para sua elaboração e levado até o fim.
a discussão de sugestões, no sentido de que a Esperamos, agora, ter correspondido à ex-
obra viesse a atender realmente as necessida- pectativa daqueles alunos e colegas que, há
des e os interesses de seu possível leitor. Du- anos, nos solicitam tal empreendimento e aos
rante esse período, foram examinadas muitas quais agradecemos o estímulo, a confiança e o
questões e introduzidas modificações, de ma- reconhecimento.
neira que o trabalho pudesse refletir o que as
três autoras consideraram mais importante,
válido e adequado. Há muito, tínhamos em Jurema Alcides Cunha

PSICODIAGNÓSTICO – V XI
Sumário

PARTE I
PSICODIAGNÓSTICO

MÓDULO I – Fundamentos ............................................................................................................ 19

1 Estratégias de avaliação: perspectivas em psicologia clínica ............................................ 19


Jurema Alcides Cunha

2 Fundamentos do psicodiagnóstico ........................................................................................ 23


Jurema Alcides Cunha

MÓDULO II – Questões Básicas .................................................................................................... 32

3 O problema .............................................................................................................................. 32
Jurema Alcides Cunha

4 O contato com o paciente ..................................................................................................... 38


Maria da Graça B. Raymundo

MÓDULO III – Recursos Básicos para o Diagnóstico ................................................................ 45

5 A entrevista clínica .................................................................................................................. 45


Marcelo Tavares

6 A história do examinando ...................................................................................................... 57


Jurema Alcides Cunha

7 O exame do estado mental do paciente .............................................................................. 67


Silvio A. Erné

MÓDULO IV – Estratégias Específicas em Entrevista ............................................................... 75

8 A entrevista estruturada para o DSM-IV ............................................................................. 75


Marcelo Tavares

9 Entrevista motivacional .......................................................................................................... 88


Margareth da Silva Oliveira

10 Entrevista lúdica ...................................................................................................................... 96


Blanca Guevara Werlang
MÓDULO V – Operacionalização do Processo ........................................................................ 105

11 Passos do processo psicodiagnóstico .................................................................................. 105


Jurema Alcides Cunha

PARTE II
AVALIAÇÃO, MÉTODOS E TÉCNICAS

MÓDULO VI – Alguns Tipos Específicos de Avaliação .......................................................... 141

12 Avaliação inter e transgeracional da família ..................................................................... 141


Blanca Guevara Werlang

13 Avaliação prospectiva: o exame precoce da criança ........................................................ 151


Aidyl L.M. de Queiroz Pérez-Ramos

14 Avaliação psicométrica: a qualidade das medidas e o entendimento dos dados ........ 158
Jandyra M.G. Fachel, Suzi Camey

15 O ABC da avaliação neuropsicológica ................................................................................. 171


Jurema Alcides Cunha

16 Avaliação de sintomas demenciais em idosos: questões essenciais ................................ 177


Irani I.L. Argimon, Candida H. Pires de Camargo

17 Perícia psicológica na área forense .................................................................................... 183


Sonia Rovinski

18 Avaliação retrospectiva: autópsia psicológica para casos de suicídio ............................ 196


Blanca Guevara Werlang

MÓDULO VII – Catálogo de Técnicas Úteis .............................................................................. 202

PARTE III
MANEJO CLÍNICO DE TÉCNICAS

MÓDULO VIII – Bender ................................................................................................................ 293

19 Bender na criança e no adolescente ................................................................................... 295


Jurema Alcides Cunha

20 Bender no adulto .................................................................................................................. 317


Jurema Alcides Cunha

MÓDULO IX – Técnicas de Manchas de Tinta ......................................................................... 340

21 Rorschach “tradicional”: noções de Klopfer ...................................................................... 341


Jurema Alcides Cunha

XIV JUREMA ALCIDES CUNHA


22 Novas tendências: introdução ao Sistema Compreensivo de Exner ................................ 368
Regina Sonia Gattas F. do Nascimento
Anna Elisa de Villemor A. Güntert

23 Rorschach Temático: um complemento significativo ao Rorschach Tradicional .............. 378


André Jacquemin

24 A técnica de Zulliger no processo de avaliação da personalidade ................................. 386


Cícero Emidio Vaz

MÓDULO X – Técnicas de Contar Histórias ............................................................................. 399

25 TAT – Teste de Apercepção Temática, conforme o modelo interpretativo de Murray .. 399


Neli Klix Freitas

26 TAT, conforme o modelo de Bellak ..................................................................................... 409


Blanca Guevara Werlang

27 CAT e sua interpretação dinâmica ...................................................................................... 416


Neli Klix Freitas

28 Teste das Fábulas: novas perspectivas ................................................................................ 421


Jurema Alcides Cunha, Blanca Guevara Werlang, Irani I.L. Argimon

29 Desenvolvimentos do Procedimento de Desenhos-Estórias (D-E) .................................... 428


Walter Trinca, Leila S.L.P. Cury Tardivo

MÓDULO XI – Inventário Multifásico Minnesota de Personalidade ................................... 439

30 Administração e orientação geral para o manejo do MMPI ............................................ 439


Jurema Alcides Cunha

31 MMPI: Escalas de validade e escalas clínicas ..................................................................... 454


Jurema Alcides Cunha

32 Códigos de dois pontos e outras abordagens do MMPI .................................................. 480


Jurema Alcides Cunha

MÓDULO XII – Técnicas de Fazer Desenhos ........................................................................... 507

33 Desenho da Figura Humana ................................................................................................. 507


Claudio Simon Hutz, Denise Ruschel Bandeira

34 Desenho da Família ............................................................................................................... 513


Neli Klix Freitas, Jurema Alcides Cunha

35 Desenho da Casa, Árvore e Pessoa (HTP) ........................................................................... 519


Neli Klix Freitas, Jurema Alcides Cunha

MÓDULO XIII – Wechsler Intelligence Scales (WIS) ............................................................... 528

36 Escalas Wechsler .................................................................................................................... 529


Jurema Alcides Cunha

37 WISC-III .................................................................................................................................. 603


Vera L.M. Figueiredo

PSICODIAGNÓSTICO – V XV
38 WAIS-III ................................................................................................................................... 615
Elizabeth do Nascimento

Anexo A ........................................................................................................................................... 628

Anexo B ........................................................................................................................................... 630


PASSOS BÁSICOS DO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA (PBDC)
Aidyl L. M. de Queiroz Pérez-Ramos

Anexo C ........................................................................................................................................... 634

Anexo D ........................................................................................................................................... 637

Anexo E ........................................................................................................................................... 639

Referências Bibliográficas ............................................................................................................. 643

Índice Onomástico ......................................................................................................................... 662

Índice ............................................................................................................................................... 668

XVI JUREMA ALCIDES CUNHA


PARTE I
PSICODIAGNÓSTICO
MÓDULO I – Fundamentos

Estratégias de avaliação:
perspectivas em psicologia clínica
Jurema Alcides Cunha
1
A s sementes da avaliação psicológica, que
hoje constitui uma das funções do psicó-
logo, foram lançadas numa fase que abrangeu
damentalmente influenciada, durante o sécu-
lo XX, pelas principais correntes de pensamen-
to que salientaram, cada uma, a primazia do
o fim do século XIX e o início do século XX, comportamento, do afeto e da cognição, na
época que marcou a inauguração do uso dos organização e no funcionamento do psiquis-
testes psicológicos. Historicamente, portanto, mo humano.
justifica-se a imagem que o leigo formou do Na primeira metade do século XX, predo-
psicólogo, como um profissional que usa tes- minaram “conceituações comportamentais e
tes, já que principalmente testólogo é o que psicanalíticas”, enquanto a segunda metade foi
ele foi, na primeira metade do século XX (Gro- assinalada pela chamada “revolução cogniti-
th-Marnat, 1999). Atualmente, o psicólogo uti- va” (Mahoney, 1993, p.8).
liza estratégias de avaliação psicológica, com A tais linhas de pensamento corresponde-
objetivos bem definidos, para encontrar res- ram, originariamente, estratégias de avaliação
postas a questões propostas com vistas à solu- específicas, isto é, métodos e instrumentos tí-
ção de problemas. A testagem pode ser um picos. Mas, já nas últimas décadas, foi toman-
passo importante do processo, mas constitui do corpo uma tendência para a integração, que
apenas um dos recursos de avaliação possíveis. já vinha se esboçando há algum tempo. Desse
Psicodiagnóstico é uma avaliação psicológica, modo, a estratégia da avaliação comportamen-
feita com propósitos clínicos; portanto, não tal foi abdicando da simples identificação de
abarca todos os modelos de avaliação psicoló- comportamentos-alvo, perfeitamente distin-
gica de diferenças individuais (Cunha et alii, guíveis e observáveis, mas numa abordagem
1993; Cunha, 1996). muito idiossincrásica, para começar a incorpo-
Estratégias de avaliação psicológica, como rar modalidades cognitivas e, mesmo, afetivas,
expressão cada vez mais utilizada na literatura apesar das fortes objeções iniciais. Por outro
específica, aplicam-se a uma variedade de abor- lado, até psicólogos da mais tradicional orien-
dagens e recursos à disposição do psicólogo tação dinâmica têm, muitas vezes, recorrido a
no processo de avaliação. estratégias de outra orientação conceitual,
Em primeiro lugar, estratégia de avaliação devido a razões práticas ou científicas, neste
pode-se referir ao enfoque teórico adotado caso, por vezes, pressionados por membros da
pelo psicólogo. A avaliação psicológica foi fun- comunidade acadêmica para serem mais efi-

PSICODIAGNÓSTICO – V 19
cientes, com menos tempo e custo. Também, Goldstein e Hersen (1990) apresentam a en-
profissionais com referencial cognitivo passa- trevista como um exemplo característico desse
ram a lançar mão de técnicas projetivas para tipo de movimento. Historicamente, como o
entendimento de motivações pessoais e de método mais antigo, individualizado e, portan-
outros aspectos idiossincrásicos (Piotrowski & to, não-estruturado, utilizado por psicólogos,
Keller, 1984) e igualmente incorporaram avan- psiquiatras e por seus predecessores, foi con-
ços do campo da neurociência (Mahoney, 1993). siderado não-fidedigno, já em 1967, por Zu-
Tal tendência a mesclar estratégias de dife- bin, ao analisar a concordância entre avaliado-
rentes abordagens teóricas pode ser conside- res em entrevistas psiquiátricas. Não obstan-
rada positiva como um recurso científico de nos te, sob a influência de tendências científicas,
aproximarmos de nosso objeto de estudo, para que incentivavam o uso de critérios mais obje-
explicar aspectos clinicamente relevantes. Po- tivos, a entrevista voltou a ganhar seu status
rém, como salienta Gabbard (1998), “para al- na psiquiatria, num formato estruturado, com
guns clínicos, o desvio de uma perspectiva te- propriedades psicométricas bem estabelecidas
órica para outra, dependendo das necessida- e refletindo avanços recentes.
des do paciente, pode ser embaraçoso e difícil Assim, no momento em que a ciência e o
de manejar”, e, a propósito, lembra que Wal- mercado tornaram acessíveis vários tipos de en-
lerstein, em 1988, “assinalou que é possível trevistas estruturadas, no campo da psiquia-
para os clínicos prestarem atenção ao fenôme- tria, tal estratégia pareceu sobrepor-se, quan-
no clínico descrito através de cada perspectiva to à sua utilidade, em relação a qualquer mé-
teórica, sem adotar o modelo metapsicológico todo da psicologia, objetivo ou projetivo. As
completo”. Ainda comenta que Cooper, em considerações levantadas, em princípio, foram
1977, propugnou por maior flexibilidade teó- absolutamente lógicas, pois, se pensarmos que,
rica, afirmando que “diferentes pacientes e uma vez que a entrevista psiquiátrica tem sido
categorias diagnósticas sugerem diferentes utilizada como critério externo para a valida-
modelos teóricos” (p.57). ção de testes, é claro que a entrevista terá prio-
Outro emprego da expressão estratégia de ridade, “quando se pode usar igualmente, de
avaliação se refere à metodologia adotada pelo preferência o próprio critério de medida do que
psicólogo. Numa avaliação com propósitos clí- o teste” (Goldstein & Hersen, 1990, p.5). Po-
nicos, por exemplo, é possível usar métodos rém, embora a entrevista estruturada tenha
mais individualizados ou qualitativos ou, ain- boas características psicométricas, a questão
da, métodos psicométricos, em que o manejo diagnóstica, ainda que em situação melhor,
se fundamenta em normas de grupos. A tais “permanece mais complexa do que seria dese-
métodos, pode-se acrescentar a entrevista, que jável” (Kendall & Clarkin, 1992, p.833).
tem precedência histórica sobre os demais Já na psicologia, a entrevista estruturada
(Goldstein & Hersen, 1990), bem como a ob- não teve tão grande aceitação, uma vez que,
servação sistemática de comportamentos, da na avaliação com propósitos clínicos, o psicó-
linha comportamental. logo, em princípio, não se limita a um único
Também no que se refere à metodologia, método (como a entrevista), mas tende a aliar
observa-se que o psicólogo não costuma se- enfoques quantitativos e qualitativos e, assim,
guir uma orientação puramente nomotética ou consegue testar, até certo ponto, a consistên-
idiográfica. Por outro lado, a própria opção cia e a fidelidade dos subsídios que suas estra-
quanto a métodos sofre a influência de even- tégias lhe fornecem, para chegar a inferências
tos e avanços que ocorrem nesta e noutras com grau razoável de certeza. Por outro lado,
áreas da psicologia, bem como de outras ciên- mesmo considerando a qualidade psicométrica
cias afins. Nota-se ascensão e declínio de al- da entrevista estruturada, “faltam-lhe elementos
guns métodos e vice-versa, como numa “espi- importantes de rapport, riqueza idiográfica e a
ral histórica, com vários níveis deixados de lado flexibilidade que caracteriza interações menos
e retomados em diferentes níveis” (p.4). estruturadas” (Groth-Marnat, 1999, p.7).

20 JUREMA ALCIDES CUNHA


Aqui, é o momento de lembrar o outro sen- como, da mesma forma, ficou mais abrangen-
tido em que pode ser empregada a expressão te o conceito de co-morbidade, com conse-
estratégias de avaliação, agora com referência qüente melhoria das estratégias de avaliação.
específica às medidas do psicólogo. Embora, Mas estas sofrem, também, reflexos de ques-
como no caso da entrevista, elas tenham sido tões pendentes, tanto no que se refere à in-
algo desacreditadas, durante certo período, em tensidade de sintomatologia, clinicamente im-
vários países, estão numa fase de ascensão, não portante para definir a situação de co-morbi-
só por apresentarem, cada vez mais, melhor dade (Boulenger & Lavallée, 1993), como na
qualidade metodológica, mas porque, especial- caracterização de síndromes e na formulação
mente do ponto de vista clínico, tornaram-se diagnóstica. Por exemplo, se, por um lado, a
mais necessárias para resolver questões diag- classificação do transtorno misto de ansieda-
nósticas, mormente após a valorização cien- de e depressão foi proposta aparentemente
tífica dos quadros de co-morbidade psiquiá- para resolver um problema diagnóstico rela-
trica. cionado com co-morbidade, por outro lado,
Tais casos somente passaram a se consti- “carrega consigo o ônus dessa situação, isto é,
tuir em objeto de investigação por parte da co- confronta a questão de se determinar que ca-
munidade científica a partir de 1987, porque racterísticas distinguem tal categoria nosoló-
antes disso, nas classificações nosológicas, ha- gica, que sintomas se superpõem e em que
via regras de exclusão hierárquica, que leva- medida” (Cunha, Streb & Serralta, 1997b, p.237).
ram a uma considerável perda de informações Em pesquisa, tal problemática pode ser fasci-
clínicas (Di Nardo & Barlow, 1990). nante, mas, na avaliação psicológica do caso
Um dos problemas observados teve relação individual, pode resultar em dúvidas cruciais,
com transtornos de ansiedade que, apesar da se está em jogo uma formulação diagnóstica.
incidência mais tarde verificada, ocupavam Por outro lado, o psicólogo, muitas vezes,
uma posição hierarquicamente inferior ao identifica sintomas subclínicos ou não, reco-
transtorno de depressão maior, no DSM-III nhecendo a necessidade de definir níveis de psi-
(APA, 1980), e, então, mesmo preenchendo copatologia, uma vez que estes costumam di-
critérios diagnósticos de um ou outro trans- ferir se o examinando é um caso que está em
torno de ansiedade específico, eram excluídos tratamento psiquiátrico na comunidade, é um
como diagnóstico adicional. Ora, como a con- sujeito que recorre a centros de atenção médi-
dição de co-morbidade desses transtornos com ca primária ou é um paciente de uma unidade
o episódio de depressão maior, hoje, é reco- psiquiátrica (Katon & Roy-Byrne, 1991). Consi-
nhecidamente muito comum, é possível ima- derando a importância de definir tais níveis de
ginar os reflexos de tal exclusão, como de ou- psicopatologia, vem se observando um cres-
tras, não só para a compreensão do caso clíni- cente interesse por um modelo dimensional,
co e de sua etiologia, como, também, para a relacionado com instrumentos psicométricos,
determinação de focos de intervenção clínica. na avaliação de pacientes, que provavelmente
Entretanto, as mudanças que ocorreram nas terá reflexos no formato do DSM-V (Brown &
classificações, apesar de resolverem uma série Barlow, 1992).
de dificuldades, trouxeram complexas implica- Tais estratégias de avaliação incluem instru-
ções não só para questões diagnósticas e tera- mentos de auto-relato e podem ser considera-
pêuticas, como também tiveram profundos re- das como medidas de sintomas ou de síndro-
flexos em modelos teóricos (Boulenger & La- mes (Clark & Watson, 1991). Um exemplo do
vallée, 1993; Cloninger, 1990; Cunha & Streb, primeiro caso é o Inventário de Depressão de
1998; Hiller, Zandig & Bose; 1989; Lydiard, Beck, que é uma escala sintomática, e do se-
1991; Mineka, Watson & Clark, 1998). gundo caso, um dos instrumentos mais usa-
Dessa maneira, pode-se afirmar que, com dos no mundo, o MMPI. Outras estratégias
o decorrer do tempo, houve, indiscutivelmen- desse tipo podem diferir conforme a orienta-
te, refinamentos nos sistemas de classificação, ção teórica do examinador, de acordo com as

PSICODIAGNÓSTICO – V 21
características do examinando e a questão pro- tos em seus sistemas de avaliação e interpre-
posta. tação” (p.98). Já Dana (1984) comentava, com
Com tais perspectivas do ponto de vista clí- certo senso comum, que também se mantêm
nico, salienta-se a importância do psicólogo os instrumentos que aprendemos a usar em
bem se instrumentalizar, principalmente no que nossos cursos de graduação. É difícil substituí-
se refere a recursos psicométricos, já que a ne- los por instrumentos mais sofisticados e, as-
cessidade principal, em nível de contribuição sim, permanecem como herança acadêmica de
para o diagnóstico, tem sido definida como di- professor a aluno. As substituições, em seu
mensional (Brown & Barlow, 1992). Escalas, in- modo de ver, ocorreriam por razões pragmáti-
ventários e check-lists estão na ordem do dia. cas ou éticas. De nossa parte, acreditamos que
As escalas Wechsler e muitos outros instrumen- um dos mais importantes fatores para a inova-
tos vêm sendo constantemente revisados, re- ção e renovação, na área de testes, é a partici-
normatizados ou reapresentados (Hutz & Ban- pação em encontros ou em congressos de psi-
deira, 1993), e intensificam-se os esforços para cólogos.
adaptações no Brasil. As chamadas WIS (We- De alguma forma, pode-se pensar que as
chsler Intelligence Scales), cada vez menos técnicas projetivas ambicionam medir o que
empregadas para a determinação de nível in- Herman van Praag (1992) chamou de “psico-
telectual, constituem-se em importantes ins- patologia subjetiva”, que, embora considere,
trumentos para atender necessidades muito es- “por definição”, mensurável, verificável e ex-
pecíficas no diagnóstico de psicopatologias e tremamente importante para o diagnóstico, ao
na avaliação neuropsicológica, e são um bom mesmo tempo, acha que tais recursos virtual-
exemplo de tais esforços. mente inexistem (p.255).
Quanto às técnicas projetivas, também po- Na realidade, ainda que as técnicas projeti-
dem ser consideradas estratégias de avaliação. vas não tenham justificado todo o entusiasmo
Historicamente caracterizadas por seu estilo de com que foram recebidas por muitos psicólo-
avaliação impressionista (Cronbach, 1996), que gos, nem mereçam se constituir como meros
causa pruridos em acadêmicos mais compro- estímulos para interpretações subjetivas, bas-
metidos com uma posição científica sofistica- tante literárias, e sejam suficientemente com-
da, tiveram um declínio de seu uso em pesqui- plexas para serem manejadas apenas numa
sa, apesar de continuarem populares. “A maio- base quantitativa, cientificamente muitas de-
ria dos autores que defendem o seu uso o faz las possuem o seu status indiscutível como re-
visando à exploração de aspectos dinâmicos da cursos importantes de avaliação psicológica e,
personalidade, que adquirem significado sob segundo Gabbard (1998), especialmente, na
a ótica de um referencial teórico ao qual há avaliação psicodinâmica.
difícil acesso via psicométrica” (Cunha & Nu- Estratégias de avaliação é, pois, uma expres-
nes, 1996, p.341). Isso significa que não se são com uma abrangência semântica muito
pode simplesmente transformar uma técnica ampla e flexível, ainda que possa ser usada de
projetiva num teste psicométrico, embora mui- maneira muito específica. Psicólogos lançam
tas delas suportem o uso de procedimentos que mão de estratégias quando realizam avaliações.
permitem avaliar sua qualidade como medida. Numa perspectiva clínica, a avaliação que é fei-
As razões pelas quais conservam sua popu- ta comumente é chamada de psicodiagnósti-
laridade são variadas. Hutz e Bandeira (1993) co, porque procura avaliar forças e fraquezas
acham que, dentre as técnicas projetivas, se no funcionamento psicológico, com um foco
mantêm aquelas que “receberam refinamen- na existência ou não de psicopatologia.

22 JUREMA ALCIDES CUNHA


Fundamentos do psicodiagnóstico
Jurema Alcides Cunha
2
J á disseram e repetimos que, enquanto os psi-
cólogos em geral realizam avaliações, os psi-
cólogos clínicos, entre outras tarefas, realizam
sional do psicólogo clínico, oferecendo-lhe, por
um lado, modelos de identificação e, por ou-
tro, acentuando as suas dificuldades nas rela-
psicodiagnósticos. Pode-se dizer que avaliação ções interprofissionais.
psicológica é um conceito muito amplo. Psico- Aquele fim de século e o começo do seguin-
diagnóstico é uma avaliação psicológica, feita te foram marcantes pelos trabalhos de Galton,
com propósitos clínicos e, portanto, não abran- que introduziu o estudo das diferenças indivi-
ge todos os modelos de avaliação psicológica duais, de Cattell, a quem se devem as primei-
de diferenças individuais. É um processo que ras provas, designadas como testes mentais, e
visa a identificar forças e fraquezas no funcio- de Binet, que propôs a utilização do exame
namento psicológico, com um foco na existên- psicológico (por meio de medidas intelectuais)
cia ou não de psicopatologia. Isso não signifi- como coadjuvante da avaliação pedagógica.
ca que a classificação psiquiátrica seja um ob- Por tais razões, a esses três autores é atribuída
jetivo precípuo do psicodiagnóstico, mas sim a paternidade do psicodiagnóstico (Fernández-
que, para medir forças e fraquezas no funcio- Ballesteros, 1986).
namento psicológico, devem ser considerados A nossa tradição psicométrica, assim alicer-
como parâmetros os limites da variabilidade çada, ficou melhor sedimentada pela difusão
normal (Yager & Gitlin, 1999). É esta aborda- das escalas Binet, seguidas pela criação dos
gem que confere a perspectiva clínica a esse testes do exército americano, Alfa e Beta. Se a
tipo de avaliação de diferenças individuais. contribuição da psicometria foi e é essencial-
O psicodiagnóstico derivou da psicologia mente importante para garantir a cientificida-
clínica, introduzida por Lighter Witmer, em de dos instrumentos do psicólogo, torna-se
1896, e criada sob a tradição da psicologia aca- importante, conforme salienta Groth-Marnat
dêmica e da tradição médica. Consta que nem (1999), estabelecer a diferença que existe en-
ao fundador da psicologia clínica agradou a tre o psicometrista e o psicólogo clínico. O pri-
designação “clínica”, adotada apenas por fal- meiro tende a valorizar os aspectos técnicos
ta de melhor alternativa (Garfield, 1965). Não da testagem, enquanto, no psicodiagnóstico,
obstante, tudo indica que essa tradição médi- há a utilização de testes e de outras estraté-
ca, associada à psicologia clínica, teria efeitos gias, para avaliar um sujeito de forma sistemá-
marcantes na formação da identidade profis- tica, científica, orientada para a resolução de

PSICODIAGNÓSTICO – V 23
problemas. O psicometrista “utiliza testes para tornos classificados como funcionais (não-or-
obter dados”, e, em sua abordagem, “o pro- gânicos). Tal distinção foi considerada muito ade-
duto final é muitas vezes uma série de traços quada porque “parecia combinar cinco aspectos
ou descrições de capacidades”. Mas é impor- da psicopatologia, simultaneamente: 1) sintomas
tante lembrar que “essas descrições tipicamen- descritivos; 2) causação presumida; 3) psicodi-
te não estão relacionadas com o contexto to- nâmica; 4) justificação para hospitalização; 5)
tal da pessoa e nem se voltam para os proble- recomendação sobre tratamento” (p.18-19).
mas singulares que ela possa estar enfrentan- Deste modo, Freud, que provinha da me-
do” (p.3). lhor tradição neurofisiológica, representou o
Por outro lado, ainda no século passado, a primeiro elo de uma corrente de conteúdo di-
comunidade científica foi muito marcada pe- nâmico, logo seguido pelo aparecimento do
las descobertas ocorridas no campo da biolo- teste de associação de palavras, de Jung, em
gia, com início na verificação da “correlação 1906, e fornecendo lastro para o lançamento,
de síndromes clínicas com modificações mor- mais tarde, das técnicas projetivas.
fológicas observadas na autópsia” (Klerman, Nesse cenário, Rorschach publicou sua mo-
1990, p.15) e continuada por outra série de nografia, em 1921, que teve maior divulgação
descobertas, como pelas “tentativas feitas para na década seguinte. O teste passou a ser utili-
correlacionar síndromes mentais com achados zado como um passo essencial (e, às vezes,
de autópsia e dados bacteriológicos” (p.16). A único) do processo de diagnóstico. A grande
base científica fornecida à medicina pela bio- popularidade alcançada nas décadas de qua-
logia levava psiquiatras a buscarem as causas renta e cinqüenta é atribuída ao fato de que
da doença mental no organismo e, em espe- “os dados gerados pelo método eram compa-
cial, no sistema nervoso central. Em conseqüên- tíveis com os princípios básicos da teoria psi-
cia, “os pacientes psiquiátricos, não mais con- canalítica” (Vane & Guarnaccia, 1989, p.7).
siderados lunáticos, se tornaram ‘nervosos’ (...) Esse foi o período áureo das técnicas de
ou ‘neuróticos’ ” (Wolman, 1965, p.1121). personalidade. Embora o Rorschach e o TAT
Dessa época data a divisão dicotômica dos fossem os instrumentos mais conhecidos, co-
transtornos psiquiátricos em “orgânicos” e meçaram a se multiplicar rapidamente as téc-
“funcionais”. Foi nessa escola pré-dinâmica da nicas projetivas, como o teste da figura huma-
psiquiatria que surgiu Kraepelin, que se nota- na, o Szondi, o MPAS e tantos outros.
bilizou por seu sistema de classificação dos O entusiasmo que cercou o advento das
transtornos mentais e, especialmente, por seus técnicas projetivas pode ser, em grande parte,
estudos diferenciais entre esquizofrenia e psi- explicado por dois fatores de peso: 1) o fato
cose maníaco-depressiva. Em conseqüência, as de que os testes, tão valorizados na época an-
classificações nosológicas e o diagnóstico di- terior, principalmente na área militar e da in-
ferencial ganharam ênfase. dústria, já não pareciam tão úteis “na avalia-
Não obstante, mesmo no período entre as ção de problemas da vida (neurose, psicose,
duas grandes guerras, a classificação das doen- etc.)” (Groth-Marnat, 1999, p.4), e 2) a valori-
ças mentais pressupunha uma hierarquia, con- zação atribuída pela comunidade psiquiátrica
forme o modelo médico, em grandes classes: ao entendimento dinâmico.
“transtornos mentais orgânicos, psicoses, neu- Entretanto, a partir de então, as técnicas
roses, transtornos de personalidade e estados projetivas começaram a apresentar certo de-
reativos/transitórios”. Quando se evidenciava clínio em seu uso, por problemas metodológi-
uma condição orgânica, esta “tomava prece- cos, pelo incremento de pesquisas com instru-
dência sobre todos os outros diagnósticos” mentos alternativos, como o MMPI e outros
(Klerman, 1990, p.18). Neste cenário, tiveram inventários de personalidade, por sua associa-
especial importância as obras de Freud e Krae- ção com alguma perspectiva teórica, notavel-
pelin, caracterizando bem a diferença entre mente a psicanalítica (Goldstein & Hersen,
estados neuróticos e psicóticos, dentre os trans- 1990), e pela ênfase na interpretação intuitiva

24 JUREMA ALCIDES CUNHA


apesar dos esforços para o desenvolvimento As sugestões apontadas, de conhecer as
de sistemas de escore (Vane & Guarnaccia, necessidades do mercado e de desenvolver es-
1989). Apesar disso, essas técnicas ainda são tratégias de conquista desse mercado, pare-
bastante utilizadas, embora com objeções, por cem se fundamentar na pressuposição de que
parte dos psicólogos que propugnam por avalia- o psicólogo, sobrecarregado com suas tarefas,
ções de orientação comportamental e biológica. não está avaliando a adequabilidade de seus
Atualmente, há indiscutível ênfase no uso dados em relação ao público usuário.
de instrumentos mais objetivos, interesse por Mas que público é esse? Que serviços ou
entrevistas diagnósticas mais estruturadas, profissionais podem ter necessidade de solici-
notadamente com o incremento no desenvol- tar psicodiagnósticos? Primeiramente, vejamos
vimento de avaliações computadorizadas de per- onde costuma trabalhar um psicólogo que lida
sonalidade, que vêm oferecendo novas estraté- com psicodiagnóstico. Segundo Groth-Marnat
gias neste campo (Butcher, Keller & Bacon, 1985). (1999), o psicólogo clínico mais freqüentemen-
Também, as necessidades de manter um te exerce suas funções numa instituição que
embasamento científico para oferecer respos- presta serviços psiquiátricos ou de medicina
tas adequadas e compatíveis com os progres- geral, num contexto legal ou educacional, bem
sos de outros ramos da ciência, especialmente como em clínicas psicológicas. Em termos de
em termos de questões diagnósticas, criadas Brasil, embora cada vez mais se encontrem pro-
por modificações introduzidas nas classifica- fissionais da psicologia trabalhando nesses
ções oficiais, têm levado à revisão, renormatiza- ambientes, especialmente em instituições de
ção e criação de novas estratégias de avaliação. cuidados com a saúde, é muito comum que o
Aliás, Zacker, já em 1989, afirmava que o psicodiagnóstico se realize em clínicas ou em
reconhecimento da qualidade do psicodiag- consultórios psicológicos, em que ele recebe
nóstico tem que ver, em primeiro lugar, com encaminhamento principalmente de médicos
um refinamento dos instrumentos e, em segun- psiquiatras ou de outra especialidade (pedia-
do lugar, com estratégias de marketing de que tras, neurologistas, etc.), da comunidade es-
o psicólogo deve lançar mão para aumentar a colar, de juízes ou de advogados, ou atende
utilização dos serviços de avaliação pelos re- casos que procuram espontaneamente um exa-
ceptores de laudos. Na mesma década, Groth- me, ou são recomendados a fazê-lo por algum
Marnat (1984) salientava a importância do pro- familiar ou amigo.
fissional se familiarizar com as reais necessida- A questão básica com que se defronta o
des do usuário, observando que, muitas vezes, psicólogo é que, embora um encaminhamen-
psicólogos competentes acabam por “fornecer to seja feito, porque a pessoa necessita de sub-
uma grande quantidade de informações inú- sídios para basear uma decisão para resolver
teis para as fontes de encaminhamento” (p.20) um problema, muitas vezes ela não sabe clara-
por falta de uma compreensão adequada das mente que perguntas levantar ou, por razões
verdadeiras razões que motivaram o encami- de sigilo profissional, faz um encaminhamen-
nhamento ou, em outras palavras, por desco- to vago para uma “avaliação psicológica”. Em
nhecimento das decisões que devem ser toma- conseqüência, uma das falhas comuns do psi-
das com base nos resultados do psicodiag- cólogo é a aceitação tácita de tal encaminha-
nóstico. Recentemente (1999), insistiu na mes- mento, com a realização de um psicodiag-
ma idéia, afirmando que o psicólogo clínico nóstico, cujos resultados não são pertinentes
deve “entender o vocabulário, o modelo con- às necessidades da fonte de solicitação.
ceitual, a dinâmica e as expectativas da fonte É, pois, responsabilidade do clínico manter
de encaminhamento*” (p.31). canais de comunicação com os diferentes ti-
pos de contextos profissionais para os quais
trabalha, familiarizando-se com a variabilida-
*N. da A. Em inglês, referral setting, para o que é difícil
de de problemas com que se defrontam e co-
encontrar equivalência precisa em português. nhecendo as diversas decisões que os mesmos

PSICODIAGNÓSTICO – V 25
pressupõem. Mais do que isso: deve determi- clínica, da história pessoal ou com outras, a
nar e esclarecer o que dele se espera, no caso partir do elenco das hipóteses iniciais, para
individual. Esta é uma estratégia de aproxima- permitir uma seleção e uma integração, norte-
ção, que lhe permitirá adequar seus dados às ada pelos objetivos do psicodiagnóstico, que
necessidades das fontes de encaminhamento, determinam o nível de inferências que deve ser
de forma que seus resultados tenham o im- alcançado.
pacto que merecem e o psicodiagnóstico rece- Tais resultados são comunicados a quem de
ba o crédito a que faz jus. direito, podendo oferecer subsídios para deci-
sões ou recomendações.

CARACTERIZAÇÃO DO PROCESSO
Objetivos
Definição
O processo do psicodiagnóstico pode ter um
Psicodiagnóstico é um processo científico, li- ou vários objetivos, dependendo dos motivos
mitado no tempo, que utiliza técnicas e testes alegados ou reais do encaminhamento e/ou da
psicológicos (input), em nível individual ou não, consulta, que norteiam o elenco de hipóteses
seja para entender problemas à luz de pressu- inicialmente formuladas, e delimitam o esco-
postos teóricos, identificar e avaliar aspectos po da avaliação. Portanto, relacionam-se essen-
específicos, seja para classificar o caso e pre- cialmente com as questões propostas e com
ver seu curso possível, comunicando os resul- as necessidades da fonte de solicitação e “de-
tados (output), na base dos quais são propos- terminam o nível de inferências que deve ser
tas soluções, se for o caso. alcançado na comunicação com o receptor”
Caracterizamos o psicodiagnóstico como (Cunha, 1996, p.50).
um processo científico, porque deve partir de Resumidamente, os objetivos mais comuns
um levantamento prévio de hipóteses que se- são apresentados no Quadro 2.1.
rão confirmadas ou infirmadas através de pas- Como se pode pressupor, dependendo da
sos predeterminados e com objetivos precisos. simplicidade ou da complexidade das questões
Tal processo é limitado no tempo, baseado num propostas, variam os objetivos.
contrato de trabalho entre paciente ou respon- As perguntas mais elementares que podem
sável e o psicólogo, tão logo os dados iniciais ser formuladas, em relação a uma capacidade,
permitam estabelecer um plano de avaliação um traço, um estado emocional, seriam:
e, portanto, uma estimativa do tempo neces- “Quanto?” ou “Qual?”. Um exemplo comum
sário (número aproximado de sessões de exa- de exame com tal objetivo seria o de avaliação
me). do nível intelectual, que permitiria uma classi-
O plano de avaliação é estabelecido com ficação simples. O examinando é submetido a
base nas perguntas ou hipóteses iniciais, defi- testes, adequados a sua idade e nível de esco-
nindo-se não só quais os instrumentos neces- laridade. São levantados escores, consultadas
sários, mas como e quando utilizá-los. Pressu- tabelas, e os resultados são fornecidos em da-
põe-se, naturalmente, que o psicólogo saiba dos quantitativos, classificados sumariamente.
que instrumentos são eficazes quanto a requi- Estritamente, se o examinador se restringe
sitos metodológicos. Portanto, a questão, aqui, a tal objetivo, sua tarefa seria caracterizada
é o quanto certos instrumentos podem ser efi- mais como a de um psicometrista do que a de
cientes, se aplicados com um propósito espe- um psicólogo clínico. Todavia, o psicólogo clí-
cífico, para fornecer respostas a determinadas nico, que não perde a referência da pessoa do
perguntas ou testar certas hipóteses. examinando, dificilmente iria se restringir a tal
Selecionada e administrada uma bateria de objetivo, porque analisaria escores dos subtes-
testes, obtêm-se dados que devem ser inter- tes (se tivesse usado um instrumento WIS), bem
relacionados com as informações da história como diferenças inter e intratestes, que são

26 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 2.1 Objetivos de uma avaliação psicológica clínica
Objetivos Especificação
Classificação O exame compara a amostra do comportamento do examinando com os resultados de outros
simples sujeitos da população geral ou de grupos específicos, com condições demográficas equivalen-
tes; esses resultados são fornecidos em dados quantitativos, classificados sumariamente, como
em uma avaliação de nível intelectual.
Descrição Ultrapassa a classificação simples, interpretando diferenças de escores, identificando forças e
fraquezas e descrevendo o desempenho do paciente, como em uma avaliação de déficits neu-
ropsicológicos.
Classificação Hipóteses iniciais são testadas, tomando como referência critérios diagnósticos.
nosológica
Diagnóstico São investigadas irregularidades ou inconsistências do quadro sintomático, para diferenciar
diferencial alternativas diagnósticas, níveis de funcionamento ou a natureza da patologia.
Avaliação É determinado o nível de funcionamento da personalidade, são examinadas as funções do ego,
compreensiva em especial a de insight, condições do sistema de defesas, para facilitar a indicação de recur-
sos terapêuticos e prever a possível resposta aos mesmos.
Entendimento Ultrapassa o objetivo anterior, por pressupor um nível mais elevado de inferência clínica, ha-
dinâmico vendo uma integração de dados com base teórica. Permite chegar a explicações de aspectos
comportamentais nem sempre acessíveis na entrevista, à antecipação de fontes de dificulda-
des na terapia e à definição de focos terapêuticos, etc.
Prevenção Procura identificar problemas precocemente, avaliar riscos, fazer uma estimativa de forças e
fraquezas do ego, de sua capacidade para enfrentar situações novas, difíceis, estressantes.
Prognóstico Determina o curso provável do caso.
Perícia forense Fornece subsídios para questões relacionadas com “insanidade”, competência para o exercício
das funções de cidadão, avaliação de incapacidades ou patologias que podem se associar com
infrações da lei, etc.
Fonte: Cunha, in Taborda, Prado-Lima & Busnello, 1996, p.51 (reproduzido com autorização da Editora).

suscetíveis de interpretação. Então, teria con- ção e memória. Este constitui um exame sub-
dições de identificar forças e fraquezas no fun- jetivo de rotina em clínicas psiquiátricas,
cionamento intelectual. No caso, o objetivo do muitas vezes complementado por um exame
exame seria de descrição. Mas, se se detivesse objetivo.
a examinar certos erros e desvios, poderia le- Freqüentemente, dados resultantes desse
vantar pistas que servissem de base para hipó- exame, da história clínica e da história pessoal
teses sobre a presença de déficits cognitivos. permitem atender ao objetivo de classificação
O objetivo ainda seria o de descrição, mas o nosológica. Essa avaliação com tal objetivo é
processo seria mais complexo. realizada pelo psiquiatra e, também, pelo psi-
Também seria descritivo o exame do esta- cólogo, quando o paciente não é testável. Nes-
do mental do paciente ou o exame das fun- se caso específico, pode-se dizer que ambos
ções do ego, freqüentemente realizados sem a usam preferencialmente um modelo categóri-
administração de testes, pelo que não são de co para analisar a psicopatologia, isto é, de-
competência exclusiva do psicólogo. O exame vem fazer um julgamento clínico sobre a pre-
do estado mental do paciente, por exemplo, é sença ou não de uma configuração de sinto-
um tipo de recurso diagnóstico que envolve a mas significativos (Dobson & Cheung, 1990).
exploração da presença de sinais e sintomas, Dessa maneira, estariam verificando o que o
eventualmente utilizando provas muito sim- paciente tem de similar com outros pacientes
ples, não-padronizadas, para uma estimati- na mesma categoria diagnóstica. Se o traba-
va sumária de algumas funções, como aten- lho se restringisse a chegar a um código classi-

PSICODIAGNÓSTICO – V 27
ficatório, não caberia a sua qualificação como funções do ego estejam relativamente intac-
psicodiagnóstico propriamente dito. tas para que haja uma resposta terapêutica
Não obstante, quando o paciente apresen- adequada para determinados tipos de trata-
ta condições para testagem, é possível se de- mento.
senvolver um psicodiagnóstico em estrito sen- Basicamente, podem não ser utilizados tes-
so: o psicólogo organiza seu plano de avalia- tes. Esse é um objetivo explícito ou implícito
ção e lança mão de uma bateria de testes, para nos contatos iniciais do paciente com psiquia-
verificar cientificamente suas hipóteses, ou, tras, psicanalistas e psicólogos de diferentes
ainda, para levantar outras a serem analisadas, linhas de orientação terapêutica. Entretanto,
conforme a história e o contexto de vida do se o objetivo é atingido por meio de um psico-
paciente. A classificação nosológica, além de diagnóstico, obtêm-se evidências mais objeti-
facilitar a comunicação entre profissionais, con- vas e precisas, que podem, inclusive, servir de
tribui para o levantamento de dados epidemio- parâmetro para avaliar resultados terapêuticos,
lógicos de uma comunidade. Assim, deve ser mais tarde, através de um reteste.
usada, mas, num psicodiagnóstico, a tarefa não O objetivo de entendimento dinâmico, em
se restringe a conferir quais os critérios diag- sentido lato, pode ser considerado como uma
nósticos que são preenchidos pelo caso. forma de avaliação compreensiva, já que enfo-
Outro objetivo praticamente associado a ca a personalidade de maneira global, mas
esse é o de diagnóstico diferencial. O psicólo- pressupõe um nível mais elevado de inferência
go investiga irregularidades e inconsistências clínica. Através do exame, procura-se enten-
do quadro sintomático e/ou dos resultados dos der a problemática de um sujeito, com uma
testes para diferenciar categorias nosológicas, dimensão mais profunda, na perspectiva his-
níveis de funcionamento, etc. Naturalmente, tórica do desenvolvimento, investigando fato-
para trabalhar com tal objetivo, o psicólogo, res psicodinâmicos, identificando conflitos e
além de experiência e de sensibilidade clínica, chegando a uma compreensão do caso com
deve ter conhecimentos avançados de psico- base num referencial teórico.
patologia e de técnicas sofisticadas de diag- Um exame desse tipo requer entrevistas
nóstico. muito bem conduzidas, cujos dados nem sem-
O objetivo de avaliação compreensiva con- pre são consubstanciados pelos passos especí-
sidera o caso numa perspectiva mais global, ficos de um psicodiagnóstico, não sendo, por-
determinando o nível de funcionamento da tanto, um recurso privativo do psicólogo clíni-
personalidade, examinando funções do ego, co. Freqüentemente, combina-se com os obje-
em especial quanto a insight, para indicação tivos de classificação nosológica e de diagnós-
terapêutica ou, ainda, para estimativa de pro- tico diferencial. Porém, quando é um objetivo
gressos ou resultados de tratamento. Não che- do psicodiagnóstico, leva não só a uma abor-
ga necessariamente à classificação nosológica, dagem diferenciada das entrevistas e do ma-
embora esta possa ocorrer subsidiariamente, terial de testagem, como a uma integração dos
uma vez que o exame pode revelar alterações dados com base em pressupostos psicodinâ-
psicopatológicas. Mas, de qualquer forma, micos.
envolve algum tipo de classificação, já que a Um psicodiagnóstico também pode ter um
determinação do nível de funcionamento é objetivo de prevenção. Tal exame visa a identi-
especialmente importante para a indicação te- ficar problemas precocemente, avaliar riscos,
rapêutica, definindo limites da responsabilida- fazer uma estimativa de forças e fraquezas do
de profissional. Assim, um paciente em surto ego, bem como da capacidade para enfrentar
poderia requerer hospitalização e prescrição situações novas, difíceis, conflitivas ou ansio-
farmacológica sob os cuidados de um psiquia- gências. Em sentido lato, pode ser realizado
tra. Um paciente que enfrenta uma crise vital por outros profissionais de uma equipe de saú-
pode se beneficiar com uma terapia breve com de pública. Muitas vezes, é levado a efeito uti-
um psicoterapeuta. Pressupõe-se que certas lizando recursos de triagem, procurando atin-

28 JUREMA ALCIDES CUNHA


gir o maior número de casos no menor espaço Na realidade, comumente o psiquiatra é no-
de tempo, portanto, não pressupondo maior meado como perito e solicita o exame psicoló-
profundidade no levantamento de certos indí- gico para fundamentar o seu parecer. Não
cios de possível patologia, apenas para dar fun- obstante, muitas vezes, o psicólogo é cha-
damentação ao desenvolvimento de programas mado para colaborar com a justiça, de for-
preventivos, com grupos maiores. Não obstan- ma independente.
te, num exame individual, que pode requerer
uma dimensão mais profunda, especialmente
envolvendo uma estimativa de condições do Responsabilidade
ego frente a certos riscos ou no enfrentamen-
to de situações difíceis, seria indicado um psi- O diagnóstico psicológico pode ser realizado:
codiagnóstico. a) pelo psicólogo, pelo psiquiatra (e, even-
Outro objetivo é o de prognóstico, que de- tualmente, pelo neurologista ou psicanalista),
pende fundamentalmente da classificação no- com vários objetivos (exceto o de classificação
sológica, e, neste sentido, não é privativo do simples), desde que seja utilizado o modelo
psicólogo. Em muitos casos, todavia, este pode médico apenas, no exame de funções, identifi-
dar uma contribuição importante, na medida cação de patologias, sem uso de testes e técni-
em que, por meio do psicodiagnóstico, pode cas privativas do psicólogo clínico;
avaliar condições que, de alguma forma, pos- b) pelo psicólogo clínico exclusivamente,
sam ter influência no curso do transtorno. En- para a consecução de qualquer ou vários dos
tretanto, trata-se de uma área que ainda exige objetivos, quando é utilizado o modelo psico-
muitas pesquisas tanto para a coleta de dados lógico (psicodiagnóstico), incluindo técnicas e
estatísticos sobre o curso possível de certos testes privativos desse profissional;
transtornos quanto sobre a utilização mais ade- c) por equipe multiprofissional (psicólogo,
quada da testagem com esse objetivo. psiquiatra, neurologista, orientador educacio-
Por último, existe um objetivo de perícia nal, assistente social ou outro), para a conse-
forense. O exame procura resolver questões cução dos objetivos citados e, eventualmente,
relacionadas com “insanidade”, competência de outros, desde que cada profissional utilize
para o exercício de funções de cidadão, avalia- o seu modelo próprio, em avaliação mais com-
ção de incapacidade ou de comprometimen- plexa e inclusiva, em que é necessário integrar
tos psicopatológicos que etiologicamente pos- dados muito interdependentes (de natureza
sam se associar com infrações da lei, etc. psicológica, médica, social, etc.).
Geralmente, é colocada uma série de que- Na prática, o encaminhamento de casos,
sitos que o psicólogo deve responder para ins- com vistas a um diagnóstico, para o psicólogo
truir um determinado processo. Suas respos- clínico ou para o psiquiatra, tende a obedecer
tas devem ser claras, precisas e objetivas. Por- critérios não completamente explícitos que
tanto, deve haver um grau satisfatório de cer- provavelmente têm uma raiz histórica.
teza quanto aos dados dos testes, o que é bas- O psicodiagnóstico surgiu como conseqüên-
tante complexo, porque “os dados descrevem cia do advento da psicanálise, que ofereceu
o que uma pessoa pode ou não fazer no con- novo enfoque para o entendimento e a classi-
texto da testagem, mas o psicólogo deve ain- ficação dos transtornos mentais. Anteriormen-
da inferir o que ele acredita que ela poderia ou te, o modelo para o estudo das doenças mentais
não fazer na vida cotidiana” (Groth-Marnat, remontava ao trabalho de Kraepelin e outros e
1984, p.25). As respostas fornecem subsídios às suas tentativas para estabelecer critérios de
para instruir decisões de caráter vital para o diagnóstico diferencial para a esquizofrenia.
indivíduo. Conseqüentemente, a necessidade No período anterior a Freud, o enfoque do
de chegar a inferências que tenham tais impli- transtorno mental era nitidamente médico. Os
cações pode se tornar até certo ponto ansio- pacientes de interesse para a ciência médica
gênica para o psicólogo. apresentavam quadros graves, estavam hospi-

PSICODIAGNÓSTICO – V 29
talizados, e eram identificados sinais e sinto- Comportamentos específicos
mas que compunham as síndromes.
No período freudiano, a abordagem mu- Os comportamentos específicos do psicólogo
dou. Os pacientes atendidos não apresentavam podem ser assim relacionados, embora possam
quadros tão severos, não estavam internados, variar na sua especificidade e na sua seriação,
e, embora fossem levados em conta os seus conforme os objetivos do psicodiagnóstico:
sintomas, estes eram percebidos de maneira a) determinar motivos do encaminhamen-
compreensiva e dinâmica. to, queixas e outros problemas iniciais;
Esta tendência de considerar os pacientes b) levantar dados de natureza psicológica,
em termos de duas grandes categorias de trans- social, médica, profissional e/ou escolar, etc.
tornos de certa forma persiste. Os pacientes sobre o sujeito e pessoas significativas, solici-
que apresentam transtornos mais graves e que tando eventualmente informações de fontes
podem precisar de hospitalização tendem a ser complementares;
encaminhados para psiquiatras, enquanto os c) colher dados sobre a história clínica e his-
casos menos graves costumam ser encaminha- tória pessoal, procurando reconhecer denomi-
dos para psicólogos ou psiquiatras, de acordo nadores comuns com a situação atual, do pon-
com o conceito de transtorno mental e da ava- to de vista psicopatológico e dinâmico;
liação da gravidade dos sintomas pela pessoa d) realizar o exame do estado mental do
que identifica o problema e faz o encaminha- paciente (exame subjetivo), eventualmente
mento. Na realidade, a atribuição da respon- complementado por outras fontes (exame ob-
sabilidade pelo diagnóstico tradicionalmente jetivo);
vem se baseando numa avaliação sumária do e) levantar hipóteses iniciais e definir os
caso e numa expectativa do tipo de tratamen- objetivos do exame;
to necessário. Mas essa posição vem tenden- f) estabelecer um plano de avaliação;
do a mudar pela consideração do tipo de exa- g) estabelecer um contrato de trabalho com
me que o caso individual requer. Atualmente, o sujeito ou responsável;
com possível exceção das urgências psiquiátri- h) administrar testes e outros instrumentos
cas, os encaminhamentos começam a ser fei- psicológicos;
tos tendo em vista a complexidade do caso e i) levantar dados quantitativos e qualitati-
não a sua gravidade, e, conseqüentemente, a vos;
necessidade de que o diagnóstico seja feito por j) selecionar, organizar e integrar todos os
meio de um exame mais ou menos sofisticado. dados significativos para os objetivos do exa-
A definição mais explícita dos casos, cujo me, conforme o nível de inferência previsto,
diagnóstico deve ser da responsabilidade do com os dados da história e características das
psicólogo, pelos membros da sociedade em circunstâncias atuais de vida do examinan-
geral, vai depender essencialmente da atua- do;
ção profissional do psicólogo e da adequabi- l) comunicar resultados (entrevista devolu-
lidade das respostas que puder dar às necessida- tiva, relatório, laudo, parecer e outros infor-
des reais do mercado. Sua identidade se associa, mes), propondo soluções, se for o caso, em be-
portanto, à qualidade do seu desempenho. nefício do examinando;
m) encerrar o processo.

OPERACIONALIZAÇÃO
Passos do diagnóstico (modelo psicológico
Em termos de operacionalização, devem ser de natureza clínica)
considerados os comportamentos específicos
do psicólogo e os passos para a realização do De forma bastante resumida, os passos do diag-
diagnóstico com um modelo psicológico de nóstico, utilizando um modelo psicológico de
natureza clínica. natureza clínica, são os seguintes:

30 JUREMA ALCIDES CUNHA


a) levantamento de perguntas relacionadas d) integração de dados e informações e for-
com os motivos da consulta e definição das mulação de inferências pela integração dos
hipóteses iniciais e dos objetivos do exame; dados, tendo como pontos de referência as
b) planejamento, seleção e utilização de hipóteses iniciais e os objetivos do exame;
instrumentos de exame psicológico; e) comunicação de resultados, orientação
c) levantamento quantitativo e qualitativo sobre o caso e encerramento do processo.
dos dados;

PSICODIAGNÓSTICO – V 31
MÓDULO II – Questões Básicas

O problema
Jurema Alcides Cunha
3
O psicodiagnóstico é um processo, desen-
cadeado quase sempre em vista de um en-
caminhamento, que tem início numa consul-
convivem com o paciente, inclusive por aque-
las que podem ser classificadas como agentes
de saúde mental (como professores, orienta-
ta, a partir da qual se delineiam os passos do dores, padres, médicos, etc.).
exame, que constitui uma das rotinas do psi- Já em 1970, Shaw e Lucas lembravam que
cólogo clínico. Entretanto, tal tipo de avalia- muitos pais hesitam em considerar certo com-
ção decorre da existência de um problema pré- portamento do filho como motivo de preocu-
vio, que o psicólogo deve identificar e avaliar, pação, alegando que muitas crianças podem
para poder chegar a um diagnóstico. apresentá-lo, no que muitas vezes têm razão.
Não obstante, entre a emergência de sinais Freqüentemente, é a falta de distinção entre
ou sintomas precoces e incipientes, nem sem- desajustes ocasionais e prolongados que faz
pre fáceis de detectar ou de identificar, e a che- com que as pessoas confiem no tempo para
gada à primeira consulta, podem surgir mui- que desapareçam. Às vezes, há certa tolerân-
tas dúvidas, fantasias e busca de explicações, cia quanto a comportamentos que devem ser
que retardam a ajuda, podem agravar o pro- superados, seja porque deixaram de ser pro-
blema e, eventualmente, interferem na objeti- porcionais às suas causas, porque uma deter-
vidade do relato do caso. minada idade foi ultrapassada, por normas
Dizem que “os sintomas estão presentes mais flexíveis do ambiente ou, ainda, porque
quando os limites da variabilidade normal são alguém da família apresentava os mesmos sin-
ultrapassados” (Yager & Gitlin, 1999, p.694). tomas na infância.
Então, se considerarmos a aparente continui- Quando o problema ocorre com um adul-
dade entre ajustamentos que as mudanças de to, pode-se verificar uma tendência a enfren-
rotina impõem, os estados emocionais asso- tá-lo sem ajuda, ou uma tentativa de explicá-
ciados a acontecimentos da vida diária, as rea- lo em termos de fatores circunstanciais e, as-
ções a situações estressantes freqüentes e os sim, talvez resolvê-lo através de mudanças ex-
sintomas iniciais de um transtorno mental, evi- ternas. De qualquer maneira, desde o surgi-
dencia-se a dificuldade de julgar quando se mento do problema e até a consulta, “a natu-
configura um problema que necessita de uma reza e a expressão dos sinais e sintomas psi-
avaliação clínica. E tal dificuldade tanto pode quiátricos são profundamente alteradas pelos
ser sentida pelo sujeito como pelas pessoas que recursos pessoais, capacidades de enfrenta-

32 JUREMA ALCIDES CUNHA


mento [coping] e defesas psicológicas do pa- os medos, por exemplo, são sentidos pelo su-
ciente” (Yager & Gitlin, 1999, p.692). jeito, mas também podem se expressar atra-
Esta pré-história de um estudo de caso é vés de comportamentos observáveis.
importante porque a percepção da dificulda- Parece que, se tomarmos num sentido am-
de, a gravidade maior ou menor atribuída a plo, a distinção torna-se uma questão de pon-
um ou a vários sintomas, as dúvidas sobre a to de vista. Shaw (1977), por exemplo, afirma-
existência de patologia, a confiabilidade de va que “sintoma é um sinal” (p.8), porque se
quem possa ter sugerido uma avaliação psico- torna significativo na medida em que eviden-
lógica, para não falar em atitudes preconcei- cia uma perturbação. Então, é considerado
tuosas sobre a possibilidade de doença men- como um sinal de perturbação, que pode pre-
tal, além de outros fatores, tudo pode influir cocemente servir de alerta, mesmo que não
na dinâmica da interação clínica, na maior ou tenha sido registrada qualquer queixa explíci-
menor atitude de colaboração durante a tes- ta, isto é, mesmo que não tenha se verificado
tagem e na seletividade das informações pres- a identificação de um sintoma.
tadas. Conseqüentemente, se a consulta foi Por outro lado, na prática, fala-se em sin-
precedida de uma fase tumultuada e crítica, toma quando parece possível atribuir-lhe
com forte sobrecarga emocional, pode haver uma significação mais clínica. Pode-se, en-
uma facilitação da ocorrência de percepções tão, afirmar “que os sintomas estão presen-
distorcidas, de fantasias variadas e de um in- tes quando os limites da variabilidade nor-
cremento de defesas dificultando a coleta de mal são ultrapassados” (Yager & Gitlin, 1999,
dados. p.693).
Cabe, pois, ao psicólogo examinar as cir-
cunstâncias que precederam a consulta, ava-
liar as maneiras de perceber o problema e de- CRITÉRIOS USUAIS DE DEFINIÇÃO
limitá-lo, atribuindo a sinais e sintomas sua sig- DE UM PROBLEMA
nificação adequada. Esta não é uma tarefa fá-
cil, principalmente para o psicólogo iniciante. Um problema é identificado quando são reco-
nhecidas alterações ou mudanças nos padrões
de comportamento comum, que podem ser
SINAIS E SINTOMAS percebidas como sendo de natureza quantita-
tiva ou qualitativa.
Fala-se em sinais e sintomas na psicologia e na Se, como observam Kaplan e Sadock
psiquiatria, mas tal terminologia é oriunda da (1999b), a maioria das manifestações de trans-
medicina. Em sentido lato, tais termos têm uma tornos psiquiátricos representa variações de di-
acepção comparável nas três áreas. Em geral, ferentes graus de um continuum entre saúde
referem-se a sinais, para designar comporta- mental e psicopatologia, então, na maior par-
mentos observáveis, “achados objetivos” (Ka- te das vezes, as mudanças percebidas são de
plan & Sadock, 1999b, p.584), enquanto os sin- natureza quantitativa.
tomas são experiências do sujeito, são por ele Pode-se falar, em primeiro lugar, em altera-
sentidos. Entretanto, essa diferenciação se tor- ções autolimitadas, que se verificariam pela
na vaga ou praticamente inexistente no âmbi- presença de um exagero ou diminuição de um
to da doença mental, porque esta envolve es- padrão de comportamento usual, dito normal.
tados internos, psicopatologia subjetiva, difí- Tais mudanças quantitativas podem ser obser-
cil de descrever. E, “em comparação com os vadas em várias dimensões, como na ativida-
transtornos médicos” – salientam Yager e Git- de (motora, da fala, do pensamento), no hu-
lin (1999) – “os transtornos psiquiátricos não mor (depressão vs. euforia), em outros afetos
podem ser entendidos sem uma completa ava- (embotamento, excitação), etc. Freqüentemen-
liação e compreensão do amplo contexto das te, esse tipo de alterações surge como respos-
queixas do paciente” (p.694). Por outro lado, ta a determinados eventos da vida, e a pertur-

PSICODIAGNÓSTICO – V 33
bação é proporcional às causas, ficando cir- bavam a rotina da vida cotidiana, ignorando
cunscrita aos efeitos estressantes dos mesmos. alguns sintomas mais graves.
Não obstante, se sua intensidade for despro- Quando as mudanças percebidas são de
porcional às causas e/ou tal alteração persistir natureza qualitativa, habitualmente chamam
além da vigência normal dos efeitos das mes- a atenção por seu cunho estranho, bizarro, idi-
mas (por exemplo, no luto patológico), já pode ossincrásico, inapropriado ou esquisito e, en-
ter uma significação clínica. Naturalmente, tão, mesmo o leigo tende a associá-las com
deve ser considerada a possibilidade de outras dificuldades mais sérias. Apesar disso, ainda
variações, quando uma alteração aparentemen- que sejam geralmente tomadas como sinal de
te pareceu ser autolimitada, mas reaparece sob perturbação, eventualmente poderão ser expli-
diferentes modalidades, numa mutação sinto- cadas em termos culturais ou subculturais.
mática, ou da mesma maneira, repetitivamen- Pode-se afirmar que “um comportamento ou
te, de forma cíclica. experiência subjetiva definidos como sintomá-
Por certo, esses critérios de intensidade e/ ticos em um contexto podem ser perfeitamen-
ou persistência podem ser também aplicados te aceitáveis e estar dentro dos limites normais
à dimensão desenvolvimento, considerando os em outro contexto” (Yager & Gitlin, 1999,
limites de variabilidade para a aprendizagem p.694). Uma manifestação inusitada, do pon-
de novos padrões de comportamento, para to de vista qualitativo, deve, assim, ser julgada
certos comportamentos imaturos serem supe- dentro do contexto em que o indivíduo está e,
rados, em determinadas faixas etárias. Por como sintoma, será tanto mais grave se for
exemplo, o controle definitivo do esfíncter ve- compelida mais por elementos interiores do
sical deve ser alcançado, no máximo, ao redor que pelo campo de estímulos da realidade, que
dos três anos. Então, um episódio de aparente é praticamente ignorada. Entretanto, é preci-
fracasso em fase posterior não teria maior sig- so ficar bem claro que um sintoma único não
nificação, se fosse uma reação a uma situação tem valor diagnóstico por si, o que vale dizer
estressante. Mas sua persistência já pode re- que nenhum sintoma é patognomônico de uma
presentar um sinal de alerta, justificando-se determinada síndrome ou condição reconhe-
uma avaliação clínica. cida. Assim, “todos os sintomas psiquiátricos
Note-se que aqui estamos utilizando um devem ser considerados como inespecíficos –
julgamento clínico. Entretanto, sobre questões vistos em uns poucos e, mais provavelmente,
de desenvolvimento, há muita coincidência em muitos transtornos” (Yager & Gitlin, 1999,
entre o senso comum e o que é sancionado p.694).
pela ciência. A expectativa social, porém, às Dada a relatividade dos critérios usuais na
vezes, não é corroborada pelas normas e cos- definição de um problema, a abordagem cien-
tumes de uma ou outra família. Nota-se que, tífica atual para a determinação diagnóstica
na prática, as famílias podem diferir na deter- advoga o uso de critérios operacionais. É, pois,
minação de quais são os limites da variabilida- necessário que o paciente apresente um certo
de normal, por rigidez ou, pelo contrário, por número de características sintomatológicas,
protecionismo. Isso faz com que determinado durante um certo período de tempo, para ser
comportamento pareça sintomático num de- possível chegar a uma decisão diagnóstica.
terminado ambiente familiar, mas não em ou-
tro. Por outro lado, nem sempre os problemas
que chamam a atenção da família são clinica- PROBLEMAS PSICOSSOCIAIS E AMBIENTAIS:
mente os mais significantes. Num estudo de ACONTECIMENTOS DA VIDA
80 crianças, realizado por Kwitko (1984), hou-
ve diferença quanto à média dos sintomas in- O conceito de estresse, termo cunhado no
formados e a registrada pelos técnicos duran- âmbito da pesquisa endocrinológica, pela me-
te o exame. Por outro lado, as queixas de fami- tade do século XX, teve o seu sentido extrema-
liares referiam-se mais a sintomas que pertur- mente expandido para explicar, de um modo

34 JUREMA ALCIDES CUNHA


geral, “a relação entre o indivíduo e o ambien- Dado o rigor científico introduzido nas pes-
te e se comprovou particularmente útil duran- quisas sobre estresse, poucos cientistas assu-
te a Segunda Guerra Mundial” (Klerman, 1990, miriam hoje em dia uma posição tão extrema-
p.34). da. Ainda se mantém como um conceito extre-
Na realidade, pode-se dizer que a impor- mamente importante, no que se refere a duas
tância atribuída ao estresse, no campo da saú- categorias diagnósticas, o Transtorno de Estres-
de mental, é de certa maneira herdada do con- se Agudo e o Transtorno de Estresse Pós-trau-
ceito de crise que, originário de investigações mático. Ademais, o Eixo IV do DSM-IV (APA,
com sobreviventes de desastres, por vezes de 1995) ainda é reservado para “o relato de pro-
grandes proporções, resultou aplicável a uma blemas psicossociais e ambientais que podem
grande variedade de situações pessoais. Atual- afetar o diagnóstico, tratamento e prognósti-
mente, crise se refere mais a uma reação, as- co dos transtornos mentais”, especificados nos
sociada à especificidade de uma situação ou Eixos I e II (p.30).
fase, e envolve uma perturbação, relacionada Por exemplo, embora pesquisas salientem
com a dificuldade de manejá-la pelos meios a existência de uma associação entre fatores
usuais. Pode-se afirmar que o conceito de crise socioeconômicos e esquizofrenia, “poucos te-
é extremamente útil em termos de diagnósti- óricos sustentam, atualmente, que um ambien-
co, especialmente para o entendimento do fun- te socioeconômico fraco causa esquizofrenia,
cionamento psicológico do indivíduo em pon- mas poucos duvidam que este tem um efeito
tos nodais do desenvolvimento, por exemplo. importante sobre o seu curso” (McGlashman
Já a ênfase do conceito de estresse pare- & Hoffman, 1999, p.1035).
ce que está no impacto, no fato de se consti-
tuir como um fator potencial para conse-
qüências futuras, que podem variar em ter- A AVALIAÇÃO DA PSICOPATOLOGIA*
mos do poder do estressor e da vulnerabili-
dade do sujeito. Num sentido lato, psicodiagnóstico consiste,
Durante a Segunda Guerra Mundial, foram sobretudo, na identificação de forças e fraque-
desenvolvidos extensos projetos para pesqui- zas no funcionamento psicológico e se distin-
sas sobre “o papel do estressor como um pre- gue de outros tipos de avaliação psicológica
cipitador da doença mental” (Klerman, 1990, de diferenças individuais por seu foco na exis-
p.34). A comprovação supostamente encontra- tência ou não de psicopatologia.
da pelas observações de estressores em situa- Falando em psicopatologia, é bom lembrar
ções de guerra foi aplicada a estressores civis e que pesquisadores nessa área têm destacado
caiu como uma luva no ambiente de insatisfa- modelos de psicopatologia utilizados. Referem-
ção da comunidade psiquiátrica da época com se ao modelo categórico e ao modelo dimen-
o modelo médico, que adotou a pressuposi- sional (Dobson & Cheung, 1990).
ção teórica de um continuum de saúde men- O modelo categórico, de enfoque qualita-
tal-doença mental, dando ao impacto provo- tivo, exemplifica-se pelo julgamento clínico
cado pelo estresse a significação de um fator- sobre a presença ou não de uma configuração
chave para o desenvolvimento de transtornos de sintomas significativos. Já o modelo dimen-
mentais. sional, de enfoque quantitativo, exemplifica-
Ainda no DSM-III-R (APA, 1987), que já com- se pela medida da intensidade sintomática.
portava a avaliação multiaxial, havia a orienta- Tradicionalmente, o psiquiatra tem dado
ção de avaliar a gravidade da ocorrência de mais ênfase ao modelo categórico, embora
estresse, no ano anterior, quanto ao “desen-
volvimento de um novo transtorno mental”, à
“recorrência de um transtorno mental anterior”
*Grande parte deste tema foi apresentado pela autora,
e quanto à “exacerbação de um transtorno no VIII Congresso Nacional de Avaliação Psicológica,
mental já existente” (p.18). Porto Alegre, 1999.

PSICODIAGNÓSTICO – V 35
cada vez mais não ignore a importância do No DSM-IV (APA, 1995), é reapresentada a
modelo dimensional. Já o psicólogo, na práti- definição de transtorno mental que foi incluí-
ca, costuma dar ênfase ao modelo dimensio- da no DSM-III e no DSM-III-R, não por parecer
nal. Na realidade, avaliar diferenças individuais especialmente adequada, mas “por ser tão útil
envolve algum tipo de mensuração. Além dis- quanto qualquer outra definição disponível”
so, o enfoque quantitativo oferece fundamen- (p.xxi).
tos para inferências com um grau razoável de Na tradução brasileira dessa classificação,
certeza. Mas o psicólogo utiliza, também, o consta que transtorno mental pode ser con-
modelo categórico. Na maioria das vezes, po- ceituado “como uma síndrome ou padrão com-
rém, associa o enfoque quantitativo e o quali- portamental ou psicológico clinicamente im-
tativo, no desenvolvimento do processo psico- portante, que ocorre no indivíduo”, registran-
diagnóstico, utilizando estratégias diagnósti- do-se, a seguir, “que está associado com sofri-
cas (entrevistas, instrumentos psicométricos, mento (...) ou incapacitação (...) ou com um
técnicas projetivas e julgamento clínico) para risco significativamente aumentado de sofri-
chegar ao diagnóstico. mento atual, morte, dor, deficiência ou perda
É evidente que, conforme o objetivo, o pro- importante da liberdade” e, ademais, “não
cesso diagnóstico terá maior ou menor abran- deve ser meramente uma resposta previsível e
gência, adotará um enfoque mais qualitativo culturalmente sancionada a um determinado
ou mais quantitativo, e, conseqüentemente, o evento, por exemplo a morte de um ente que-
elenco de estratégias ficará variável no seu rido”. Além disso, independentemente da cau-
número ou na sua especificidade. sa original, “deve ser considerada no momen-
Embora o psicodiagnóstico tenha um do- to como uma manifestação de uma disfunção
mínio próprio, o seu foco na existência ou não comportamental, psicológica ou biológica no
de psicopatologia torna essencial a manuten- indivíduo” (p.xxi). Comportamentos socialmen-
ção de canais de comunicação com outras te desviantes não são considerados transtor-
áreas, precisando o psicólogo estar atento para nos mentais, a não ser que se caracterizem
questões que são fundamentais na determina- como sintoma de uma disfunção, no sentido
ção de um diagnóstico. já descrito.
A partir dessa conceituação, vê-se que é cla-
ra a exigência de uma associação com sofri-
TRANSTORNOS MENTAIS E mento ou incapacitação ou, ainda, com risco
CLASSIFICAÇÕES NOSOLÓGICAS de comprometimento ou perda de um aspec-
to vitalmente significante. Em segundo lugar,
Se abrirmos o Novo Dicionário Aurélio (Ferrei- fica evidente que os sintomas devam ser com-
ra, 1986), na página 1.703, vamos encontrar que portamentais ou psicológicos, embora possa
transtorno é sinônimo de perturbação mental. haver uma disfunção biológica. Em terceiro
Entende-se que se pode categorizar, como tal, lugar, esse conceito descaracteriza os serviços
uma diversidade de condições, que se situam e os membros da comunidade de saúde men-
entre o que se costuma caracterizar como nor- tal como agentes de controle social, no mo-
malidade e patologia. Portanto, é uma expres- mento em que considera que um conflito en-
são menos compatível com a antiga concep- tre indivíduo e sociedade pode ser identifi-
ção de doença mental. Não obstante, temos cado como um desvio, condenável pelos pa-
de convir que, semanticamente, bastaria o ter- drões sociais, mas que, por si, não é tido
mo transtorno, embora a sua significação não como transtorno mental, a menos que, ao
modificasse a crítica feita à expressão transtorno mesmo tempo, constitua o sintoma de uma
mental, que, “infelizmente, implica uma distin- disfunção.
ção entre transtornos ‘mentais’ e transtornos ‘fí- Essa caracterização de transtorno mental é
sicos’, que é um anacronismo reducionista do apresentada pelo DSM-IV, que é a edição mais
dualismo mente/corpo” (APA, 1995, p.xx). recente da classificação oficial nos Estados

36 JUREMA ALCIDES CUNHA


Unidos. Depois de muitas modificações em re- liação Global de Funcionamento (vide APA,
lação à abordagem e classificação da psicopa- 1995, p.33).
tologia, durante o século XX, o DSM-IV recapi- O DSM-IV é compatível com a classificação
tulou o conceito de transtornos distintos, mas utilizada na Europa, a CID-10, desenvolvida
com um enfoque “ateórico com relação às cau- pela Organização Mundial da Saúde (OMS,
sas” (Sadock & Kaplan, 1999, p.727). O mode- 1993). “Todas as categorias usadas no DSM-IV
lo pode ser considerado categórico, mas a clas- são encontradas na CID-10, mas nem todas as
sificação nosológica passou a se basear em cri- categorias da CID-10 estão no DSM-IV” (Sado-
térios operacionais ou critérios diagnósticos es- ck & Kaplan, 1999, p.727).
pecíficos, que constituem “uma lista de carac- Para quem trabalha com psicodiagnóstico,
terísticas que devem estar presentes para que é essencial a familiaridade com os sistemas de
o diagnóstico seja feito” (Sadock & Kaplan, classificação nosológica, já que a nomenclatu-
1999, p.727). Isso não pressupõe “que todos ra oficial dos transtornos é extremamente útil
os indivíduos descritos como tendo o mesmo na comunicação entre profissionais, além do
transtorno mental são semelhantes em um fato de que outros documentos, como atesta-
grau importante” (APA, 1995, p.xxi). dos, além de laudos, podem exigir o código do
O DSM-IV prevê a possibilidade de uma ava- transtorno de um paciente. Confira cuidado-
liação multiaxial, sendo que toda a classifica- samente todos os critérios a partir de suas hi-
ção dos transtornos mentais consta nos Eixos I póteses diagnósticas, pondere bem sobre
e II. O Eixo III prevê a inclusão de transtorno todas as características do caso, examine o que
físico ou condição médica adicional. O Eixo diferencia o caso de outros transtornos e te-
IV é reservado para o registro de problemas nha em mente critérios usados para a exclusão
psicossociais e ambientais, e no Eixo V é fei- de outros diagnósticos (Consulte o capítulo Uso
to o julgamento do nível geral de funciona- do Manual, no DSM-IV, bem como Sadock &
mento do paciente, conforme a Escala de Ava- Kaplan, 1999, p.737).

PSICODIAGNÓSTICO – V 37
O contato com o paciente
Maria da Graça B. Raymundo
4
A expressão contato, da raiz latina contactum
(Carvalho, 1955), quer dizer exercitar o tato,
com vistas ao toque dentro de uma relação de
Senhora do Mundo Subterrâneo ou mundo
psíquico inconsciente (Hillman, 1997). Ela ma-
nifesta sua força inexorável por desvios, como
influência e de proximidade (Ferreira, 1986). a desordem, a desarmonia, a aflição diante de
De forma metafórica, no processo psico- si próprio e no trato com as coisas do mundo
diagnóstico, o papel do psicólogo é o de tate- circundante. Como conseqüência, a própria
ar pelos meandros da angústia, da desconfi- pessoa procura conviver com os seus sintomas,
ança e do sofrimento da pessoa que vem em e a família tenta tolerá-los, mas há limites para
busca de ajuda. Tatear, então, é lidar com as o sofrimento e para a tolerância. Freqüente-
inúmeras resistências ao processo, sentimen- mente, os sintomas são observados por alguém
tos ambivalentes e situações desconhecidas. mais, por uma pessoa com certo poder de in-
Primeiramente, é preciso ter clareza de que a fluência, que pode assumir o papel de agente
sintomatologia já se fez presente e manifesta de saúde, como um professor, uma assistente
em período anterior à marcação da consulta, e social, um médico, ou, provavelmente, uma
de que, certamente, várias formas de driblar o dessas pessoas é procurada, para apoio e acon-
sofrimento foram experimentadas e várias ex- selhamento, de onde surge a decisão de busca
plicações foram empregadas, resultando no de ajuda.
incremento da angústia. Essas resistências po- A pessoa em sofrimento chega para o pri-
dem passar, também, pelo desconhecimento meiro contato com o psicólogo premida pela
do que seja o trabalho com um profissional em necessidade de ajuda e pela necessidade de
psicologia, pelos estereótipos culturais em tor- rendição e de entrega.
no da área psi e dos preconceitos sobre quem A atitude de respeito do psicólogo, ou seja,
requer esse atendimento. No caso de crianças o “olhar de novo”, com o coração, em conjun-
ou adolescentes, as dificuldades são freqüen- to com o paciente para a sua conflitiva, livre
temente relacionadas com a influência de com- de críticas, menosprezo e desvalia, é basilar no
panheiros, atribuídas à indisciplina ou a “pro- exercício de tocar a psique, para uma ligação
blemas de idade”. de confiança. Estabelecer a proximidade neces-
As resistências mais imperiosas ficam por sária para a consecução do processo significa
conta das questões internas, pois estão sob a mostrar ao paciente que as dificuldades pare-
regência de ananke, a Necessidade, a Grande cem não ir embora enquanto não forem pri-

38 JUREMA ALCIDES CUNHA


meiro bem acolhidas. A solução só ganhará Cabe ao psicólogo observar, perceber, es-
espaço e lugar se houver contato. cutar com tranqüilidade, aproximar-se sem ser
As atitudes de esperança (Hillman, 1993) e coercitivo, inquiridor, todo-poderoso. Somen-
da aceitação por parte do psicólogo, da an- te assim se criam o silêncio necessário e o es-
gústia e “da luta entre os opostos”, enquanto paço para que o paciente revele sua intimida-
expressão da “verdade psicológica do eterno de, ou senão, denuncie os aspectos incoerentes
jogo de antagonismos” (Silveira, 1992, p. 116), e confusos de seus conflitos. Para tanto, é sobre-
são fundamentais para a pessoa que vem para modo importante observar como o paciente tra-
o primeiro contato, dentro do processo psico- ta a si próprio e as suas dores. Isso passa pelo
diagnóstico. vestir-se, pelo comunicar-se verbalmente e não
verbalmente, pela linguagem corporal, pelo con-
teúdo dessas comunicações. Todo movimento
MOTIVOS CONSCIENTES E INCONSCIENTES corpóreo deve ser considerado como indicativo
da realidade interior e expressão do psiquismo
A marcação da consulta formaliza um proces- (Zimmermann, 1992). Assim, o psicólogo pode
so de trabalho psicológico já iniciado (Jung, decodificar as variadas mensagens que recebe,
1985), precedido de intensa angústia e ambi- discriminando o quanto há de reconhecimento
valência. Corresponde à admissão da existência do sofrimento, das motivações implicadas, deli-
de algum grau de perturbação e de dificuldades neando o seu projeto de avaliação.
que justificam a necessidade de ajuda. A emer- Quando os pais levam a criança ou o ado-
gência de fortes defesas nesse período pode, por lescente ao psicólogo, pode ocorrer que o su-
vezes, mascarar as motivações inconscientes da jeito constitua “o terceiro excluído ou incluí-
busca pelo processo psicodiagnóstico. do” (Ocampo & Arzeno, 1981, p.36). Se ignora
Também, nos casos em que o paciente é o motivo, é excluído. Mas é preciso investigar
encaminhado por outrem ao psicólogo, o mo- se está realmente incluído, porque pode ocor-
tivo aparente pode ser a própria solicitação do rer o fato de os pais verbalizarem o motivo,
exame ou fato de ter sido mobilizado por cole- porém não o mais verdadeiro ou o mais autên-
gas, amigos, parentes. Nessas circunstâncias, tico, dentro de sua percepção. Isso se dá em
o paciente pode ter uma percepção vaga de função de fantasias sobre o que pode aconte-
sua problemática, mas preferir chegar ao psi- cer em face da explicitação do que é mais do-
cólogo pelo reforço de um encaminhamento loroso e profundo e, portanto, do mais oculto.
médico, por exemplo. Pode haver algum nível Se a realidade está sendo distorcida, podem
de consciência do problema e lhe ser muito advir algumas dificuldades para o psicodiag-
dolorosa a situação de enfrentamento de sua nóstico, caso o psicólogo não perceba e/ou não
dificuldade. Assim, por suas resistências, o pa- altere essa situação. Em primeiro lugar, o pro-
ciente pode negar a realidade e depositar num cesso pode ser iniciado com o conflito deslo-
terceiro a responsabilidade pela procura. cado, comprometendo a investigação. Em se-
Portanto, há uma tendência para que o gundo lugar, o paciente percebe a discrepân-
motivo explicitado ao psicólogo seja o menos cia e projeta no material de teste suas dificul-
ansiogênico e o mais tolerável para o paciente dades, enquanto o psicólogo “finge estar in-
ou, ainda, para o responsável que o leva. Em vestigando uma coisa, mas sorrateiramente
geral, não é o mais verdadeiro. explora outra socialmente rejeitada” (Ocampo
Conseqüentemente, há tendência para ex- & Arzeno, 1981, p.37). Em terceiro lugar, ou-
plicitação dos motivos, conforme a gradação tras dificuldades podem ocorrer, no momento
e apropriação, pela consciência do paciente. da devolução: a) no caso do parecer técnico
As motivações inconscientes estão no nível estar contaminado e distorcido; b) porque o
mais profundo e obscuro da psique. Consti- psicólogo entra em aliança com os aspectos
tuem-se nos aspectos mais verdadeiramente patológicos; c) por adotar uma atitude ambí-
responsáveis pelas aflições do paciente. gua, não sendo devidamente explícito; ou, ain-

PSICODIAGNÓSTICO – V 39
da, d) deixando claros somente os pontos to- O esclarecimento dos motivos aparentes e
lerados pelo paciente e por seu grupo familiar. ocultos não só permite a determinação dos
Em quarto lugar, as autoras salientam o com- objetivos do psicodiagnóstico como também
prometimento que pode sofrer a indicação para fornece dados sobre a capacidade de vincula-
a terapia, visto que o paciente temerá repetir ção e de concretização da tarefa pelo paciente
o mesmo vínculo dúbio e falso. e/ou responsável.
Pelo exposto, ficam claras a importância e
a complexidade, para o psicólogo, em abarcar
o continuum de consciência-inconsciência do IDENTIFICAÇÃO DO PACIENTE
paciente, em relação a seus conflitos. Todos os
dados psíquicos são relevantes, e cada um ga- A discriminação entre os motivos explícitos e
nha múltiplos significados. Compete ao psicó- implícitos para a busca de ajuda colabora para
logo abordar cada dado sob vários aspectos, que o psicólogo identifique quem é o seu ver-
até que seu sentido adquira maior consistên- dadeiro paciente: a pessoa que é trazida ou
cia e especificidade. assume a procura, o grupo familiar ou ambos.
Quando o paciente chega por encaminha- Em face do encaminhamento e do primeiro
mento, deve-se esclarecer quem o encaminhou, contato do psicólogo com o paciente e/ou com
em que circunstância ocorreu o encaminha- seu grupo familiar, a tarefa fundamental que
mento e quais as questões propostas para a se lhe apresenta é definir quem é o paciente,
investigação. Isso pode ser feito ou comple- em realidade, levantando todas as indagações
mentado através de comunicação telefônica. possíveis em torno dele e da totalidade da si-
MacKinnon e Michels (1981) informam que al- tuação envolvida na busca de ajuda, passando
guns profissionais optam por esse procedimen- pelo grau de consciência das dificuldades.
to, enquanto outros preferem desconhecer Ocampo e Arzeno (1981) referem que, com
qualquer informação diversa da que lhe che- freqüência, dentre um grupo familiar, o elemen-
ga, por escrito ou verbalmente, via paciente. to trazido ao psicólogo e apresentado como
Conclui-se que é fundamental que o psicólo- doente é, realmente, o menos comprometido
go esclareça, o mais amplamente possível e de da família. Cabe ao psicólogo estar alerta e
forma objetiva, as motivações conscientes indi- identificar se o sintoma apresentado é coeren-
cadas e as inconscientes envolvidas no pedido te ou não para o paciente e sua família.
de ajuda. Cabe ter-se sempre presente que a na- De forma abrangente, a identificação do
tureza humana, como já foi dito por Heráclito, verdadeiro paciente verifica-se desde o momen-
tem predileção por ocultar-se, embora a psique to em que ele procura o psicólogo, através de
aspire a expressão e reconhecimento constantes. contato telefônico ou pessoalmente, ou quan-
Nessa linha de pensamento, a consideração do outro profissional refere ter feito o encami-
da objetividade e quantidade de informações nhamento, até o momento final da entrevista
parece emprestar um peso para a coleta de devolutiva.
dados prévios sobre o caso, especialmente O psicólogo começa a conhecer “quem é”
quando os motivos explicitados não parecem o seu paciente, por meio de perguntas iniciais
corresponder aos reais. Portanto, quanto me- quando do primeiro contato.
nos consciente o paciente parecer de sua pro-
blemática ou quanto mais fora da realidade
parecer estar, mais se torna importante a con- DINÂMICA DA INTERAÇÃO CLÍNICA
sideração de informações de terceiros. De qual-
quer modo, sob o nosso ponto de vista, não se Aspectos conscientes e inconscientes
pode prescindir totalmente de informações
subsidiárias, no sentido de melhor entender por A interação clínica psicólogo-paciente verifica-
que o sujeito seleciona certas respostas para se ao longo de todo o processo psicodiag-
lidar com seu ambiente. nóstico.

40 JUREMA ALCIDES CUNHA


Essas duas pessoas entram em relação e psicólogo e do paciente, e é baseado na relação
passam a interagir em dois planos, ou seja, o de confiança básica entre a mãe e a criança.
de atitudes e o de motivações. Ambas têm suas A resistência do paciente à tarefa também
funções e papéis e estão na relação diagnósti- se constitui em uma forma de transferência. O
ca não só como psicólogo e paciente, mas, paciente compete, ou tenta obter provas da
antes de tudo, como pessoas. No plano das aceitação do psicólogo, buscando manipular a
atitudes, está o psicólogo com sua função de situação de testagem, ou espera ser aliviado
examinador e clínico, e está o paciente com de seus sintomas, magicamente, por meio do
sua sintomatologia e necessidade de ajuda. poder que atribui ao psicólogo. O silêncio pro-
No plano das motivações, estão o psicólo- longado e sistemático ou o paciente que fala
go e o paciente com seus aspectos inconscien- sem parar também são manifestações de re-
tes, assumindo papéis de acordo com seus sen- sistência à avaliação.
timentos primitivos e suas fantasias. Igualmente, o paciente pode usar mecanis-
No plano inconsciente, têm-se os fenôme- mos de intelectualização muito fortes, buscan-
nos de transferência e de contratransferência. do o apoio e a concordância do psicólogo.
O primeiro é experienciado pelo paciente ao Outras formas de resistência são a insistên-
se relacionar, no aqui e agora da situação diag- cia do paciente em só falar sobre seus sinto-
nóstica, com o psicólogo, não como tal, mas mas, ou, ao contrário, falar sobre banalidades,
como figura de pai, irmão, mãe. A contratrans- evitando os motivos mais profundos, assim
ferência verifica-se no psicólogo na medida em como as demonstrações excessivas de afeto
que assume papéis na sua tarefa, conforme os para com o psicólogo.
impulsos de seus padrões infantis de figuras A conduta de atuação também encerra re-
de autoridade ou outros padrões primitivos de sistência e se manifesta nas faltas, nos atra-
relacionamento. sos, em freqüentes pedidos de troca de horá-
O fenômeno transferencial não tem um ca- rio, em ir ao banheiro várias vezes durante a
ráter só positivo ou negativo, mas consiste na sessão, por exemplo.
“recriação dos diversos estágios do desenvol- É necessário que se saliente que essas con-
vimento emocional do paciente ou reflexo de dutas devem merecer adequada e sensível ava-
suas complexas atitudes para com figuras-cha- liação do psicólogo, buscando seu significado
ve de sua vida” (MacKinnon & Michels, 1981, dentro da relação vincular com aquele pacien-
p. 22). te, diante da sua história e do aqui e agora do
Na situação de psicodiagnóstico, observam- processo diagnóstico.
se ocorrências de transferência na necessida- Em termos de fenômeno contratransferen-
de do paciente de estar agradando, de se sen- cial, o psicólogo pode ficar dependente do afe-
tir aceito pelo psicólogo, como, por exemplo, to do paciente, deixando-se envolver por elo-
nos pedidos de horário e acerto financeiro es- gios, presentes, propostas de ajuda; pode fa-
peciais. cilitar ou não horários; pode exibir conhecimen-
Podem verificar-se situações transferenciais, to e pavonear-se; ou pode proteger o paciente
envolvendo sentimentos competitivos, como contra os seus sentimentos agressivos. O psi-
no caso do paciente que compete no horário cólogo pode se ver tentado a prolongar o vín-
de chegada, ou daquele que desafia e agride o culo além do que é necessário, ou a competir
psicólogo, atacando o consultório ou ele pró- com o paciente, ou ainda, a conduzir a tarefa
prio (linguagem, vestimentas, conhecimentos, como se o fizesse consigo próprio.
etc.). É fundamental que o psicólogo esteja sem-
É importante que a transferência não seja pre alerta à contratransferência, no sentido de
confundida com o vínculo estabelecido com o percebê-la e entendê-la como um fenômeno
psicólogo, na medida em que este se centra normal, buscando dar-se conta de seus senti-
na realidade da avaliação, através da intera- mentos, não permitindo que eles atuem no
ção entre os aspectos de ego mais sadios do processo psicodiagnóstico.

PSICODIAGNÓSTICO – V 41
Por outro lado, os sentimentos contratrans- ma onipotente, pode considerar as “impressões
ferenciais podem ser considerados adequados iniciais” com amplitude inadequada. Portan-
na medida em que possibilitam que o psicólo- to, é fundamental para o psicólogo o conheci-
go perceba o inconsciente do paciente. mento de si próprio, devendo estar alerta para
Outro aspecto importante a ser considera- o movimento dos processos inconscientes, não
do no psicodiagnóstico é a percepção que o deixando de lado, em nenhum momento, a sua
paciente tem dos objetivos da avaliação e de dimensão única como pessoa.
como ela vai transcorrendo. O psicólogo deve
estar atento às manifestações ocultas e apa-
rentes de como o paciente está se sentindo e Definição de problemas e necessidades
está se percebendo ao longo da tarefa. Assim, do psicólogo
também é imprescindível investigar a motiva-
ção do paciente em termos de conhecimentos Na tarefa de psicodiagnóstico, o psicólogo so-
e de atitudes. Pope e Scott, já em 1967, enfati- fre pressões do paciente, do grupo familiar, do
zavam esse aspecto como a “pré-disposição ati- ambiente, de quem encaminhou o paciente e
tudinal e cognitiva” do paciente ao psicodiag- dele próprio.
nóstico e sugeriam que o psicólogo efetuasse O paciente quer ser ajudado e quer respos-
uma entrevista após a aplicação de testes, ao tas.
final da sessão, buscando detectar os dados O meio ambiente, ou seja, o local de traba-
assinalados (p.28). lho do psicólogo, os colegas, as chefias, mui-
Com relação ao psicólogo, os mesmos au- tas vezes, bem como uma equipe multiprofis-
tores fazem comentários sobre a atitude de sional ou não, conforme o caso, também exer-
estímulo, apoio, encorajamento, bem como cem suas pressões sobre a condução do caso,
sobre a atitude distante na produção do pa- planificação e manejos finais. Num trabalho em
ciente à testagem. A propósito, citam um es- equipe formalizado, ou mesmo entre a própria
tudo americano, que objetivou avaliar a in- classe dos psicólogos, os aspectos competiti-
fluência do rapport positivo e negativo na pro- vos e invejosos são intensamente mobilizados.
dutividade de respostas ao Rorschach, bem A situação de psicodiagnóstico torna-se impor-
como avaliar características de personalidade tante em termos de afirmação e valorização
do psicólogo intervenientes nessa testagem. Os da tarefa do psicólogo. A percepção do am-
resultados apontaram para o fato de que a biente sobre o seu trabalho é uma das pres-
personalidade dos psicólogos exerce maior in- sões exercidas sobre ele.
fluência do que o clima emocional da situação Por outro lado, a sua própria percepção de
de teste. Outrossim, os índices mais produti- como exerce e maneja sua tarefa também é
vos no Rorschach foram associados à forma um fator de pressão sobre a sua auto-imagem.
positiva com que foi administrado o teste (psi- A pessoa que efetuou o encaminhamento
cólogo afável e compreensivo), e os índices aguarda respostas específicas, as quais a auxi-
mais comprometidos e menos sadios foram liarão no seu atendimento e/ou reforçarão ou
associados à administração negativa (psicólo- não a confiança no papel do psicólogo.
go distante e autoritário). À forma de adminis- O psicólogo necessita obter dados que pos-
tração chamada neutra (psicólogo “cortês, mas sam ser por ele empregados, no sentido de
metódico”) corresponderam índices interme- respostas, bem como precisa que esses fatos
diários entre elevada e baixa produtividade sejam úteis para a atribuição de escores na tes-
(p.30). tagem.
Trinca (1983) assinala que o psicólogo se Dessa forma, o psicólogo espera que o pa-
sente ansioso ante os inúmeros dados que ciente colabore, seja franco, forneça todos os
emergem durante o exame psicológico. Em dados necessários e seja “comportado”, man-
função dessa ansiedade, podem ocorrer erros tendo-se no seu papel. Ora, essa exigência é
na formulação diagnóstica, visto que, de for- fantasiosa e decorre da onipotência e arrogân-

42 JUREMA ALCIDES CUNHA


cia do psicólogo, assim como do desejo de b) aspecto autocrático, salientando o po-
satisfazer as suas necessidades internas e ex- der do psicólogo no psicodiagnóstico, na me-
ternas. dida em que diz ao paciente o que deve fazer,
Ele pode ter dificuldades em reconhecer de que forma e quando;
percepções, quer por falta de clareza, quer c) aspecto oracular, pois o psicólogo proce-
pelos dados serem muito precários. Pode re- de como se tudo soubesse, tudo conhecesse,
correr à capacidade de representação, como tudo prevesse, aspecto esse reforçado pelo
uma forma complementar (Kast, 1997), até que encaminhamento, porque o psicólogo vai for-
imagens mais claras tenham se estabelecido. necer as respostas;
Em inúmeras situações, o psicólogo é driblado d) aspecto santificado, pelo qual o psicólo-
por sua própria expectativa. go assume o papel de salvador do paciente.
Não raro se depara com estudantes e pro- Na realidade, a situação de psicodiagnósti-
fissionais da psicologia frustrados, porque o co apresenta “componentes irracionais que
seu paciente não forneceu os dados que eles correspondem a tendências inconscientes, im-
precisavam nem correspondeu ao que eles es- plícitas, primitivas, subjacentes aos aspectos
peravam do paciente. socialmente aceitáveis”, que não podem ser
Caso o paciente se mostre resistente, atra- encarados como patológicos no psicólogo
vés de condutas negativistas, evasivas, ou, ao (Cunha, 1984, p.13).
contrário, provocadoras, com excessiva loqua- Iglesias (1985) comenta que essas constan-
cidade, o psicólogo pode experienciar senti- tes, mencionadas por Schafer, diferem da con-
mentos de raiva e intolerância, os quais, se não tratransferência, já que este é um fenômeno
detectados e conscientizados, podem interfe- específico, que irrompe a partir da mobiliza-
rir gravemente ou até invalidar o processo ava- ção despertada por determinados pacientes.
liativo. Schafer (1954) aponta algumas constantes
Afinal, consiste em sabedoria para o psicó- do paciente na interação clínica:
logo compreender e aceitar que a psique se a) “auto-exposição, com ausência de con-
revela, ao mesmo tempo que se esconde e, ao fiança; intimidade violada”, no sentido de que
esconder-se, dá-se a revelação (López-Pedra- o paciente se sente exposto, vulnerável ao psi-
za, 1999). cólogo, que o devassa; de forma inconsciente,
acha que está psicologicamente se exibindo ao
psicólogo (este como voyeur);
Variáveis psicológicas do psicólogo b) “perda de controle sobre a situação”, pois
e do paciente o paciente fica à mercê do psicólogo, na situa-
ção de testagem, passando a adotar uma pos-
Schafer (1954) refere algumas das necessida- tura defensiva, já que deve cumprir ordens e
des inconscientes e permanentes mobilizadas manejar situações e dificuldades a ele impostas;
no psicólogo-pessoa, durante a tarefa de tes- c) “perigos de autoconfrontação”, já que
tagem. Esse autor as considera e denomina de para o paciente, sofrendo a ambivalência de
constantes, por estarem presentes no psicólo- querer ajuda e recear a confrontação de as-
go, independentemente de aspectos pessoais pectos dolorosos e rechaçados, a testagem
ou circunstanciais e de reações que o profis- implica ataque aos processos defensivos que
sional tenha diante de pacientes específicos. vem utilizando;
Essas constantes relativas ao papel de psi- d) tentação de reagir de forma regressiva,
cólogo são as seguintes: pela dificuldade de aceitação das próprias difi-
a) aspecto “voyeurista”, ou seja, o psicólo- culdades;
go examina e perscruta com “vários olhos” o e) ambivalência diante da liberdade, uma
interior dos pacientes, enquanto se mantém vez que, embora podendo enfrentar a testa-
preservado pela neutralidade e curta duração gem com liberdade relativa, tem também de
do vínculo; enfrentar os riscos de se expor, e assim, no

PSICODIAGNÓSTICO – V 43
Rorschach, por exemplo, o paciente experien- tos dinâmicos da interação clínica, por consi-
cia simbolicamente o enfrentamento da “au- derarem que esses dados podem ser fontes de
toridade real e fantasiada, presente e ausen- erro para a precisão das mensurações que de-
te”, sendo-lhe oferecida excessiva liberdade vem ser efetuadas (Pope & Scott, 1967). Entre-
para o seu grau de tolerância (p. 34-43). tanto, a tarefa do psicólogo, num psicodiag-
Tais constantes reforçam ou provocam rea- nóstico, não se restringe à de um psicometris-
ções transferenciais e defensivas, que merecem ta, assim como também é um erro crasso vê-lo
cuidadoso exame para a ampliação do enten- tão-somente como um aplicador de técnicas
dimento do paciente. projetivas. Mesmo quando o objetivo do psi-
A situação psicodiagnóstica envolve, pois, codiagnóstico parece bastante simples, o psi-
uma dinâmica específica, num vínculo relati- cólogo não pode perder de vista a dimensão
vamente curto, em que se entrelaçam dois global da situação de avaliação, levando em
mundos, o do psicólogo e o do paciente, pas- conta todos os padrões de interação que se
sando a interagirem duas identidades. É uma estabelecem. Portanto, é essencial enfatizar a
situação ímpar, à qual o psicólogo deve dedi- necessidade de o psicólogo estar consciente,
car merecida atenção e valorização. atento e alerta tanto para as suas próprias con-
dições psicológicas, para o uso que faz de seus
recursos criativos e expressivos, como para as
Importância para o psicodiagnóstico reações e manifestações do paciente, perceben-
do a qualidade do vínculo que se cria e levan-
Em defesa da propalada neutralidade científi- do em conta todos esses aspectos para o en-
ca, muitos psicólogos não valorizam os aspec- tendimento do caso.

44 JUREMA ALCIDES CUNHA


MÓDULO III – Recursos Básicos para o Diagnóstico

A entrevista clínica
Marcelo Tavares
5
A entrevista clínica não é uma técnica úni-
ca. Existem várias formas de abordá-la,
conforme o objetivo específico da entrevista e
Por técnica entendemos uma série de pro-
cedimentos que possibilitam investigar os te-
mas em questão. A investigação possibilita al-
a orientação do entrevistador. Os objetivos de cançar os objetivos primordiais da entrevista,
cada tipo de entrevista determinam suas es- que são descrever e avaliar, o que pressupõe o
tratégias, seus alcances e seus limites. Neste levantamento de informações, a partir das
capítulo, vamos definir a entrevista clínica, exa- quais se torna possível relacionar eventos e
minar seus elementos e diferenciar os tipos em experiências, fazer inferências, estabelecer con-
que podem ser classificadas. Em seguida, dis- clusões e tomar decisões. Essa investigação se
cutiremos alguns aspectos das competências dá dentro de domínios específicos da psicolo-
essenciais do entrevistador para a condução gia clínica e leva em consideração conceitos e
de uma entrevista clínica. Concluímos com conhecimentos amplos e profundos nessas
uma reflexão sobre a ética dos temas discu- áreas. Esses domínios incluem, por exemplo, a
tidos. psicologia do desenvolvimento, a psicopatolo-
gia, a psicodinâmica, as teorias sistêmicas. As-
pectos específicos em cada uma dessas áreas
DEFININDO A ENTREVISTA CLÍNICA podem ser priorizados como, por exemplo, o
desenvolvimento psicossexual, sinais e sinto-
Em psicologia, a entrevista clínica é um con- mas psicopatológicos, conflitos de identidade,
junto de técnicas de investigação, de tempo relação conjugal, etc.
delimitado, dirigido por um entrevistador trei- Afirmamos ainda que a entrevista é parte
nado, que utiliza conhecimentos psicológicos, de um processo. Este deve ser concebido, ba-
em uma relação profissional, com o objetivo sicamente, como um processo de avaliação,
de descrever e avaliar aspectos pessoais, rela- que pode ocorrer em apenas uma sessão e ser
cionais ou sistêmicos (indivíduo, casal, família, dirigido a fazer um encaminhamento, ou a
rede social), em um processo que visa a fazer definir os objetivos de um processo psicotera-
recomendações, encaminhamentos ou propor pêutico. Muitas vezes, o aspecto avaliativo de
algum tipo de intervenção em benefício das uma entrevista inicial confunde-se com a psi-
pessoas entrevistadas. Convém agora exami- coterapia que se inicia, devido ao aspecto te-
nar os elementos dessa definição. rapêutico intrínseco a um processo de avalia-

PSICODIAGNÓSTICO – V 45
ção e ao aspecto avaliativo intrínseco à psico- emergência de novos conteúdos na mente do
terapia. Outras vezes, o processo de avaliação sujeito. O entrevistador deve estar atento aos
é complexo e exige um conjunto diferenciado processos no outro, e a sua intervenção deve
de técnicas de entrevistas e de instrumentos e orientar o sujeito a aprofundar o contato com
procedimentos de avaliação, como, por exem- sua própria experiência. Em síntese, concluí-
plo, além da entrevista, os instrumentos pro- mos que todos os tipos de entrevista têm al-
jetivos ou cognitivos, as técnicas de observa- guma forma de estruturação na medida em que
ção, etc. A importância de enfatizar a entrevis- a atividade do entrevistador direciona a entre-
ta como parte de um processo é de poder vis- vista no sentido de alcançar seus objetivos.
lumbrar o seu papel e o seu contexto ao lado Entrevistador e entrevistado têm, nesse pro-
de uma grande quantidade possível de proce- cesso, atribuições diferenciadas de papéis. A
dimentos em psicologia. A entrevista clínica é função específica do entrevistador coloca a
um procedimento poderoso e, pelas suas ca- entrevista clínica no domínio de uma relação
racterísticas, é o único capaz de adaptar-se à profissional. É dele a responsabilidade pela
diversidade de situações clínicas relevantes e condução do processo e pela aplicação de co-
de fazer explicitar particularidades que esca- nhecimentos psicológicos em benefício das
pam a outros procedimentos, principalmente pessoas envolvidas. É responsabilidade dele
aos padronizados. A entrevista é a única técni- dominar as especificidades da técnica e a com-
ca capaz de testar os limites de aparentes con- plexidade do conhecimento utilizado. Essa res-
tradições e de tornar explícitas características ponsabilidade delimita (estrutura) o processo
indicadas pelos instrumentos padronizados, em seus aspectos clínicos. Assumir essas res-
dando a eles validade clínica (Tavares, 1998), por ponsabilidades profissionais pelo outro tem
isso, a necessidade de dar destaque à entrevista aspectos éticos fundamentais; significa reco-
clínica no âmbito da avaliação psicológica. nhecer a desigualdade intrínseca na relação,
Definimos ainda a entrevista clínica como que dá uma posição privilegiada ao entrevis-
tendo a característica de ser dirigida. Afirmar tador. Essa posição lhe confere poder e, por-
que a entrevista é um procedimento dirigido tanto, a responsabilidade de zelar pelo inte-
pode suscitar alguns questionamentos. Mes- resse e bem-estar do outro. Também é do en-
mo nas chamadas entrevistas “livres”, é neces- trevistador a responsabilidade de reconhecer
sário o reconhecimento, pelo entrevistador, de a necessidade de treinamento especializado e
seus objetivos. Como afirmamos antes, os ob- atualizações constantes ou periódicas.
jetivos de cada tipo de entrevista definem as O papel principal da pessoa entrevistada é
estratégias utilizadas e seus limites. É no intui- o de prestar informações. A entrevista pressu-
to de alcançar os objetivos da entrevista que o põe pelo menos uma pessoa que esteja em
entrevistador estrutura sua intervenção. Isso condições de ser um participante colaborati-
nos parece verdadeiro, inclusive para os psicó- vo, e o sucesso da entrevista depende do seu
logos que consideram que é o sujeito entrevis- modo de participação. Essa dependência tor-
tado quem conduz o processo. O entrevista- na-se mais evidente nos casos de participantes
dor precisa estar preparado para lidar com o resistentes ou não voluntários. O entrevistador
direcionamento que o sujeito parece querer dar tem a necessidade de conhecer e compreen-
à entrevista, de forma a otimizar o encontro der algo de natureza psicológica, para poder
entre a demanda do sujeito e os objetivos da fazer alguma recomendação, encaminhamen-
tarefa. Assim, quando o entrevistador confron- to ou sugerir algum tipo de atenção ou trata-
ta uma defesa, empaticamente reconhece um mento (intervenção). Nos casos em que pare-
afeto ou pede um esclarecimento, ele está cer- ce haver dificuldades de levantar a informação,
tamente definindo direções. Até mesmo a ati- é bem provável que o entrevistador tenha de
vidade interpretativa na associação livre ou a centrar sua atenção na relação com a pessoa
resposta centrada no cliente do psicólogo dá entrevistada, para compreender os motivos de
uma direção, facilitando ou dificultando a sua atitude. Geralmente, essas dificuldades

46 JUREMA ALCIDES CUNHA


estão associadas a distorções relacionadas a a prática supervisionada é reconhecida como
pessoas ou instituições interessadas na avalia- melhor estratégia para a consolidação dessa
ção, a idéias preconcebidas em relação à psi- aprendizagem.
cologia ou à saúde mental e a fantasias incons- Supõe-se que a entrevista clínica deve ter
cientes vinculadas a ansiedades pessoais acer- como beneficiado direto as pessoas entrevis-
ca do processo. Tudo isso gera questões trans- tadas. Por outro lado, isso nem sempre é claro
ferenciais importantes, que devem ser esclare- nos dias de hoje, quando os psicólogos têm
cidas adequadamente. Essas formas de resis- que se haver, cada vez mais, com terceiros en-
tência podem atrapalhar, mas, quando escla- volvidos, como juízes, empregadores, empre-
recidas, se transformam em uma das mais im- sas de seguros, etc. Quando uma entrevista
portantes fontes de compreensão da dinâmi- clínica ocorre em uma empresa, por exemplo,
ca do sujeito. o entrevistador deve estar ciente dos conflitos
A complexidade dos procedimentos espe- de interesse e das questões éticas envolvidas,
cíficos de cada tipo de entrevista clínica, dos mesmo quando a entrevista tem apenas a fi-
conhecimentos psicológicos envolvidos e dos nalidade de encaminhamento. Quando a en-
aspectos relativos à competência do entrevis- trevista envolve interesses múltiplos, a defini-
tador, necessários para sustentar uma relação ção de quem são os seus clientes, a clareza de
interpessoal de investigação clínica, requerem suas demandas e a explicitação dos conflitos
treinamento especializado. O resultado de uma poderão ajudar o profissional a estabelecer a
entrevista depende largamente da experiência sua conduta relativa a cada um deles. Nesse
e da habilidade do entrevistador, além do do- exemplo, parece necessário definir em que sen-
mínio da técnica. Alguns temas abordados na tido a empresa é cliente, e que demandas são
entrevista clínica são, pela sua própria nature- apropriadas ou não.
za, difíceis ou representam tabus culturais. Criar A necessidade de delimitação temporal pa-
um clima que facilite a interação nesse contex- rece-nos óbvia, visto que não faz sentido uma
to e a abertura para o exame de questões ínti- avaliação se dela não resulta alguma recomen-
mas e pessoais talvez seja o desafio maior da dação. Essa delimitação não requer, necessa-
entrevista clínica. Essa dependência da expe- riamente, um único encontro. Mesmo quando
riência aproxima a condução de entrevistas da o processo requer encontros em mais de uma
arte – embora ela seja corretamente definida ocasião, no processo de entrevista, não há um
como técnica. A necessidade de ensinar a rea- contrato de continuidade como em um pro-
lizar uma entrevista clínica coloca, portanto, cesso terapêutico, embora, freqüentemente, a
desafios para quem deseja transmitir esses co- entrevista clínica resulte em um contrato tera-
nhecimentos e habilidades. Pequenos detalhes, pêutico. A delimitação temporal entre a entre-
quando desconsiderados, levam a conseqüên- vista inicial e o processo terapêutico tem a fun-
cias não desejadas. Muitas vezes, o profissio- ção de explicitar as diferenças de objetivos dos
nal só se dá conta da importância desses deta- dois procedimentos e dos papéis diferenciados
lhes quando algum problema está configura- do profissional nas duas situações. Essa deli-
do. O treinamento tem o intuito de antecipar mitação define o setting e fortalece o contrato
e evitar essas situações e procura apresentar e terapêutico, que pode ser consolidado como
discutir vários aspectos práticos dos procedi- conclusão da(s) entrevista(s) inicial(is). Essas
mentos. Embora muitas “dicas” possam ser recomendações, o encaminhamento ou a defi-
dadas, em última instância, é a qualidade da nição de um setting e contrato terapêutico
formação clínica e a sensibilidade do avaliador podem ocorrer integrados como parte de uma
para os aspectos relacionais – por exemplo, a única sessão de entrevista ou podem ser reser-
capacidade de trabalho na contratransferên- vados para uma entrevista designada exclusi-
cia – que o assistirão nos momentos mais difí- vamente para este fim (entrevista de devolu-
ceis e inesperados. Além do treinamento for- ção), demarcando, de maneira mais precisa, o
mal nos cursos de graduação e especialização, término do processo de avaliação.

PSICODIAGNÓSTICO – V 47
TIPOS E OBJETIVOS DA ENTREVISTA CLÍNICA demanda e espera um retorno que o auxilie. A
utilidade das entrevistas clínicas depende, por-
Classificar os tipos de entrevista não é uma tanto, do espaço que o procedimento deixa
tarefa fácil, pois exige a consideração de eixos para as manifestações individuais e requer ha-
classificatórios e o exame sistemático dos ti- bilidades e conhecimentos específicos que per-
pos principais de técnicas de entrevistas. Essa mitam ao entrevistador conduzir adequada-
tarefa se estende além dos objetivos deste ca- mente o processo. Essa especificidade clínica
pítulo, mas indicaremos aqui algumas direções. favorece os procedimentos semi-estruturados
Vamos levar em consideração dois eixos: se- e de livre estruturação.
gundo a forma (estrutura) e segundo o obje- É tradição se referir à entrevista de livre es-
tivo. truturação como entrevista livre ou não-estru-
turada. Temos argumentado que toda entre-
vista supõe, na verdade exige, alguma forma
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO ASPECTO de estruturação. É necessário que se conheçam
FORMAL suas metas, o papel de quem a conduz e os
procedimentos pelos quais é possível atingir
Quanto ao aspecto formal, as entrevistas po- seus objetivos. Estes e outros elementos pró-
dem ser divididas em estruturadas, semi-estru- prios das entrevistas lhes conferem uma estru-
turadas e de livre estruturação. As entrevistas tura, mesmo que o entrevistador não a reco-
estruturadas são de pouca utilidade clínica. A nheça explicitamente. Por esse motivo, referi-
aplicação desse tipo de entrevista é mais fre- mo-nos a esse tipo de entrevista como entre-
qüente em pesquisas, principalmente nas si- vista de livre estruturação. A grande maioria
tuações em que a habilidade clínica não é ne- das técnicas de entrevista divulgadas em psi-
cessária ou possível. Sua utilização raramente cologia clínica, desde seus primórdios, enqua-
considera as necessidades ou demandas do dra-se nesse tipo de entrevista. As técnicas de
sujeito avaliado – usualmente, ela se destina entrevista vêm sendo gradativamente especi-
ao levantamento de informações definidas ficadas, de modo que sua estrutura pode ser
pelas necessidades de um projeto. Um exem- mais claramente definida, a partir do desen-
plo típico é a entrevista epidemiológica, que, volvimento das técnicas de avaliação e trata-
como um censo, requer que o entrevistador mento, particularmente com o surgimento de
cubra um grande número de questões em pou- manuais psicoterapêuticos (Luborsky, 1984,
co tempo. Nela, não se pode exigir do entre- 1993; Sifneos, 1993), manuais diagnósticos
vistador experiência ou conhecimento clínico, (APA, 1995; Spitzer, Gibbon, Skodol et alii,
pelos altos custos envolvidos no processo. Este 1994) e critérios de seleção de pacientes (Da-
é o caso da Diagnostic Interview Schedule (DIS); vanloo, 1980; Malan, 1980; Marmor, 1980; Si-
(Robins, Helzer, Croughan et alii, 1981). As en- fneos, 1980, 1993). Tomando-se os objetivos
trevistas estruturadas privilegiam a objetivida- de uma técnica de livre estruturação, é possí-
de – as perguntas são quase sempre fechadas vel desenvolver alguma forma semi-estrutura-
ou delimitadas por opções previamente deter- da de se obter o mesmo tipo de informação.
minadas e buscam respostas específicas a ques- Historicamente, é assim que têm surgido as en-
tões específicas. Quando respostas abertas são trevistas semi-estruturadas, como é o caso
possíveis, geralmente são associadas a esque- da Entrevista Clínica Estruturada para o DSM-
mas classificatórios operacionalizados, que fa- IV (SCID) (Spitzer, Williams, Gibbon et alii, 1992;
cilitam a tradução da informação em catego- Tavares, 1997, 2000b). Esta avalia um conjun-
rias do tipo objetivo. to de 44 psicopatologias mais comuns, facili-
Nas entrevistas clínicas, desejamos conhe- tando o diagnóstico diferencial nos casos mais
cer o sujeito em profundidade, visando a com- difíceis. Um exemplo mais específico é a Positi-
preender a situação que o levou à entrevista. ve and Negative Symptoms for Schizophrenia
Nesse caso, o entrevistado é porta-voz de uma (PANSS) (Kay, Fiszbein & Opler, 1987), uma téc-

48 JUREMA ALCIDES CUNHA


nica de avaliação semi-estruturada que permi- nham, aparentemente, o mesmo objetivo, eles
te discriminar graus de gravidade e compro- atuariam de maneiras completamente diferen-
metimentos na esquizofrenia. Outro exemplo tes. O primeiro exploraria o desenvolvimento
interessante de semi-estruturação é a Entrevista precoce e os processos inconscientes, defesas
Diagnóstica Adaptativa Operacionalizada e conflitos predominantes, enquanto o segun-
(EDAO), de Ryad Simon (1989, 1993), uma en- do procuraria determinar as situações-proble-
trevista de avaliação de fundamentação psico- ma e examinar os antecedentes que mantêm o
dinâmica. comportamento na atualidade. Cada um defi-
As entrevistas semi-estruturadas são assim niria objetivos específicos para os seus proce-
denominadas porque o entrevistador tem cla- dimentos.
reza de seus objetivos, de que tipo de infor- Para abordar essa questão, é necessário dis-
mação é necessária para atingi-los, de como tinguir dois níveis de objetivo. A finalidade
essa informação deve ser obtida (perguntas maior de uma entrevista é sempre a de descre-
sugeridas ou padronizadas), quando ou em que ver e avaliar para oferecer alguma forma de
seqüência, em que condições deve ser investi- retorno. Este objetivo último é comum a todas
gada (relevância) e como deve ser considerada as formas de entrevista clínica, conforme nos-
(utilização de critérios de avaliação). Além de sa definição. Todas elas requerem uma etapa
estabelecer um procedimento que garante a de apresentação da demanda, de reconheci-
obtenção da informação necessária de modo mento da natureza do problema e da formula-
padronizado, ela aumenta a confiabilidade ou ção de alternativas de solução e de encami-
fidedignidade da informação obtida e permite nhamento. Além desses objetivos-fins, existem
a criação de um registro permanente e de um objetivos instrumentais, que são definidos por
banco de dados úteis à pesquisa, ao estabele- todo tipo de entrevista clínica. Em nosso exem-
cimento da eficácia terapêutica e ao planeja- plo hipotético supra, as diferenças podem ser
mento de ações de saúde. Por esses motivos, consideradas instrumentais. São muitos e va-
as entrevistas semi-estruturadas são de gran- riados os exemplos de objetivos instrumentais.
de utilidade em settings onde é necessária ou Quando se pretende avaliar um quadro psico-
desejável a padronização de procedimentos e patológico, torna-se necessário um exame de-
registro de dados, como nas clínicas sociais, talhado dos sintomas apresentados. Na entre-
na saúde pública, na psicologia hospitalar, etc. vista psicodinâmica, é importante a investiga-
Recentemente, desenvolvemos uma entrevista ção do desenvolvimento psicossexual. Cada
clínica semi-estruturada para a avaliação da his- modalidade de entrevista define seus objeti-
tória e do risco de tentativa de suicídio, tendo vos instrumentais, e estes delimitam o alcance
em vista estudar esse fenômeno, com ênfase e as limitações da técnica. Por isso, estratégias
nos aspectos mórbidos e psicodinâmicos asso- diferentes de avaliação podem ser utilizadas
ciados (Tavares, 1999). para atingir os objetivos de cada situação, ou
combinadas para atingir objetivos diversos. Isso
nos parece adequado, considerando os vários
CLASSIFICAÇÃO QUANTO AOS OBJETIVOS contextos em que a entrevista clínica é utiliza-
da, no consultório, na saúde pública, na psico-
Um esforço em classificar as entrevistas quan- logia hospitalar, etc.
to aos seus objetivos seria uma tarefa bem mais Dada a enorme variedade de objetivos ins-
complexa. Essa complexidade decorre da inter- trumentais, conforme variações de abordagem,
dependência entre abordagem e objetivos. A de problemas apresentados e de clientelas
título de exemplo, vamos imaginar dois entre- atendidas, não temos a intenção de tentar clas-
vistadores hipotéticos, um de abordagem psi- sificar as entrevistas neste nível. Por outro lado,
codinâmica e outro, comportamental. Ao en- alguns tipos de entrevista devem ser mencio-
trevistar um sujeito para definir uma estraté- nados quanto à sua finalidade: de triagem, de
gia de intervenção terapêutica, embora te- anamnese, diagnósticas (que podem ser sin-

PSICODIAGNÓSTICO – V 49
drômicas ou dinâmicas), sistêmicas e de devo- aspectos importantes do desenvolvimento,
lução. Uma entrevista para a avaliação na clí- embora de maneira não tão extensiva como
nica psicológica pode ter por finalidade carac- faz a entrevista de anamnese.
terísticas vinculadas a um desses tipos, ou pode De um certo modo, toda entrevista clínica
ter por objetivo uma combinação de aspectos comporta elementos diagnósticos. Nessa pers-
relacionados a mais de um desses tipos de en- pectiva, empregamos o termo de maneira bem
trevistas. Profissionais de todas as abordagens ampla. Em outro sentido, empregamos o ter-
podem realizar entrevistas clínicas com esses mo diagnóstico de modo mais específico, defi-
objetivos. Examinaremos cada um desses tipos nindo-o como o exame e a análise explícitos
de entrevista. ou cuidadosos de uma condição na tentativa
A entrevista de triagem tem por objetivo de compreendê-la, explicá-la e possivelmente
principal avaliar a demanda do sujeito e fazer modificá-la. Implica descrever, avaliar, relacio-
um encaminhamento. Geralmente, é utilizada nar e inferir, tendo em vista a modificação da-
em serviços de saúde pública ou em clínicas quela condição. A entrevista diagnóstica pode
sociais, onde existe a procura contínua por uma priorizar aspectos sindrômicos ou psicodinâ-
diversidade de serviços psicológicos, e torna- micos. O primeiro visa à descrição de sinais
se necessário avaliar a adequação da deman- (baixa auto-estima, sentimentos de culpa) e
da em relação ao encaminhamento pretendi- sintomas (humor deprimido, ideação suicida)
do. Um dos equívocos mais comuns é o de para a classificação de um quadro ou síndro-
pessoas que procuram ajuda individual para me (Transtorno Depressivo Maior). O diagnós-
problemas relacionais. Outra situação impor- tico psicodinâmico visa à descrição e à com-
tante ocorre quando existe a opção de terapia preensão da experiência ou do modo particu-
individual e grupal, tornando-se necessário lar de funcionamento do sujeito, tendo em vista
avaliar a adequação dos membros conforme a uma abordagem teórica. Tanto o diagnóstico
composição e os objetivos dos grupos terapêu- sindrômico quanto o psicodinâmico visam à
ticos. A triagem é também fundamental para modificação de um quadro apresentado em
avaliar a gravidade da crise, pois, nesses casos, benefício do sujeito.
torna-se necessário ou imprescindível o enca- Algumas vezes, a característica classificató-
minhamento para um apoio medicamentoso. ria do diagnóstico sindrômico parece se con-
Embora não pareça tão óbvio, o clínico que trapor a uma compreensão dinâmica do mes-
trabalha sozinho também terá que triar seus mo; contudo, estas duas perspectivas devem
clientes e encaminhar aqueles que não julgar ser vistas como complementares, operando
adequado atender, conforme sua especialida- dentro de uma mesma estratégia de entrevis-
de e competência. ta. Tradicionalmente, os textos tendiam a en-
A entrevista em que é feita a anamnese (vide fatizar uma ou outra abordagem. Hoje em dia,
A história do examinando, nesta obra) tem por entretanto, vemos cada vez mais um esforço
objetivo primordial o levantamento detalhado de integração dessas duas abordagens (Jacob-
da história de desenvolvimento da pessoa, prin- son & Cooper, 1993; McWilliams, 1994; Oth-
cipalmente na infância. A anamnese é uma téc- mer & Othmer, 1994). Por exemplo, sabemos
nica de entrevista que pode ser facilmente es- que pessoas deprimidas (um sintoma ou sín-
truturada cronologicamente. Embora a utilida- drome) freqüentemente dirigem sua agressivi-
de da anamnese seja mais claramente vislum- dade contra si mesmas (um aspecto dinâmi-
brada na terapia infantil, muitas abordagens co), e que isso pode resultar em comportamen-
que integram ou valorizam o desenvolvimento tos autodestrutivos (sinais) ou, no extremo, em
precoce podem se beneficiar deste tipo de en- ideação suicida (um sintoma). Quando existem
trevista. Certamente, aprender a fazer uma sintomas clínicos claros, o diagnóstico sindrô-
entrevista de anamnese irá facilitar a aprecia- mico torna-se necessário por motivos que nos
ção de questões desenvolvimentais por parte parecem óbvios. Contudo, não se podem igno-
do clínico, pois muitas abordagens investigam rar os aspectos dinâmicos nesses casos. É co-

50 JUREMA ALCIDES CUNHA


mum a existência de sinais e sintomas isolados ção. Em muitos casos, essa atividade é inte-
ou subclínicos, que não são suficientes para grada em uma mesma sessão, ao final da en-
dar configuração a uma síndrome, mas que são trevista. Em outras situações, principalmente
importantes por sugerir uma dinâmica e indi- quando as atividades de avaliação se estendem
car um modo particular de adoecer. O reco- por mais de uma sessão, é útil destacar a en-
nhecimento precoce dessas condições tem um trevista de devolução do restante do processo.
papel preponderante na prevenção de crises Outro objetivo importante da entrevista de
ou no desenvolvimento de um quadro clínico devolução é permitir ao sujeito expressar seus
estabelecido. pensamentos e sentimentos em relação às con-
Reconhecendo esta interação entre sinais, clusões e recomendações do avaliador. Ainda,
sintomas e síndromes com os aspectos dinâ- permite avaliar a reação do sujeito a elas. Ou
micos (modos de funcionamento), o entrevis- seja, mesmo na fase devolutiva, a entrevista
tador amplia seu domínio sobre a situação, mantém seu aspecto avaliativo, e tem-se a
torna-se mais capaz de compreender o sujeito oportunidade de verificar a atitude do sujeito
e sua condição e mais capaz de ajudá-lo de em relação à avaliação e às recomendações,
maneira eficaz. Voltemos ao exemplo da pes- ao seu desejo de segui-las ou de recusá-las. Fi-
soa que se apresenta deprimida. Em um pri- nalmente, como objetivo da entrevista de de-
meiro momento, o clínico pode estar interes- volução, destaca-se a importância de ajudar o
sado na severidade do quadro e buscar definir sujeito a compreender as conclusões e reco-
quais sintomas estão presentes e em que in- mendações e a remover distorções ou fanta-
tensidade. Contudo, em seguida, pode julgar sias contraproducentes em relação a suas ne-
importante investigar em mais detalhes os sen- cessidades. A devolução pode ser simples,
timentos de culpa, inutilidade e menos valia como, por exemplo, de que o motivo que o
que a pessoa experimenta subjetivamente e levou a procurar ajuda pode ser atendido em
relacioná-los tanto aos sintomas quanto às fan- um processo terapêutico ou complexo, a pon-
tasias inconscientes e aos eventos importan- to de requerer mais de uma sessão.
tes no desenvolvimento e na história familiar O processo de avaliação psicológica pode
(relações objetais). Tal estratégia integra uma envolver diferentes procedimentos, incluindo
abordagem fenomenológica do quadro sin- vários tipos de entrevista. Por exemplo, na ava-
tomático com a compreensão psicodinâmica do liação de um jovem adolescente que apresen-
seu desenvolvimento – ela busca descrever e com- tava comportamentos estranhos e incompre-
preender o fenômeno em sua complexidade para ensíveis para família, o processo iniciou-se com
sugerir modos de intervenção terapêutica. uma entrevista de família, seguida de uma en-
As entrevistas sistêmicas para avaliar casais trevista com o jovem para avaliação do qua-
e famílias estão se tornando cada vez mais dro sintomático e seus aspectos psicodinâmi-
importantes em psicologia, principalmente, cos. Depois da aplicação de instrumentos de
quando há a demanda de atenção psicológica avaliação psicológica e sua análise, houve uma
para crianças e adolescentes (Féres-Carneiro, entrevista de devolução com o jovem, seguida
1996). Elas podem focalizar a avaliação da es- de outra com ele e seus pais. Essas entrevistas
trutura ou da história relacional ou familiar. tiveram o objetivo específico de ajudar o jo-
Podem também avaliar aspectos importantes vem e seus pais a compreenderem a situação
da rede social de pessoas e famílias. Essas téc- (que envolvia um quadro psicótico), a explorar
nicas são muito variadas e fortemente influen- a sua repercussão no plano afetivo e relacional
ciadas pela orientação teórica do entrevista- e a tomar decisões específicas quanto aos es-
dor. Como exigiriam um capítulo à parte, fica tudos e a outros elementos estressores na vida
aqui apenas o registro de sua existência e do jovem e da família. Houve mais uma entre-
importância. vista com os três, a fim de consolidar o enca-
A entrevista de devolução tem por finalida- minhamento para uma avaliação psiquiátrica
de comunicar ao sujeito o resultado da avalia- (para fazer um acompanhamento medicamen-

PSICODIAGNÓSTICO – V 51
toso) e de determinar uma estratégia psicote- 2) ajudar o paciente a se sentir à vontade e
rapêutica (para o apoio na crise). a desenvolver uma aliança de trabalho;
3) facilitar a expressão dos motivos que le-
varam a pessoa a ser encaminhada ou a bus-
COMPETÊNCIAS DO AVALIADOR E A car ajuda;
QUALIDADE DA RELAÇÃO 4) buscar esclarecimentos para colocações
vagas ou incompletas;
As diversas técnicas de entrevista têm em co- 5) gentilmente, confrontar esquivas e con-
mum o objetivo de avaliar para fazer algum tradições;
tipo de recomendação, seja diagnóstica ou te- 6) tolerar a ansiedade relacionada aos te-
rapêutica. A entrevista, como ponto de conta- mas evocados na entrevista;
to inicial, é crucial para o desenvolvimento de 7) reconhecer defesas e modos de estrutu-
uma relação de ajuda. A aceitação das reco- ração do paciente, especialmente quando elas
mendações ou a permanência no tratamento atuam diretamente na relação com o entrevis-
dependem de algumas características impor- tador (transferência);
tantes desse primeiro contato, que são influ- 8) compreender seus processos contratrans-
enciadas por um conjunto de competências do ferenciais;
entrevistador. A dificuldade de aceitação das 9) assumir a iniciativa em momentos de
recomendações ou a desistência de iniciar um impasse;
processo terapêutico, quando ocorre, se dá nos 10) dominar as técnicas que utiliza.
primeiros contatos. Comentaremos aqui al- Examinaremos, a seguir, cada uma dessas
gumas competências pessoais essenciais para capacidades.
a condução de uma entrevista, independen- Para estar presente e poder ouvir o pacien-
tes da orientação teórica do entrevistador ou te, o entrevistador deve ser capaz de isolar
dos objetivos específicos da entrevista. A outras preocupações e, momentaneamente,
atenção a esses aspectos e o desenvolvimen- focalizar sua atenção no paciente. Para fazer
to dessas competências são elementos fun- isso, é preciso que suas necessidades pessoais
damentais para o êxito na condução de en- estejam sendo suficientemente atendidas, e
trevistas. que ele possa reconhecer os momentos em que
Uma entrevista, na prática, antes de poder isso parece não estar ocorrendo. Isso implica
ser considerada uma técnica, deve ser vista que as ansiedades presentes não sejam tão
como um contato social entre duas ou mais fortes a ponto de interferir no processo. As
pessoas. O sucesso da entrevista dependerá, ansiedades inconscientes do entrevistador le-
portanto, de qualidades gerais de um bom vam à resistência e dificultam a escuta, princi-
contato social, sobre o qual se apóiam as téc- palmente de material latente na fala do entre-
nicas clínicas específicas. Desse modo, a exe- vistado. Cuidando de suas necessidades pes-
cução da técnica é influenciada pelas habilida- soais, o entrevistador poderá ouvir o outro de
des interpessoais do entrevistador. Essa inter- um modo diferenciado. Essa escuta diferencia-
dependência entre habilidades interpessoais e da, por si só, é considerada um dos elementos
o uso da técnica é tão grande que, muitas ve- terapêuticos (Cordioli, 1993).
zes, é impossível separá-las. O bom uso da téc- Por estar atento ao paciente, o entrevista-
nica deve ampliar o alcance das habilidades dor estará mais apto a ajudá-lo a sentir-se à
interpessoais do entrevistado e vice-versa. Para vontade e a desenvolver uma aliança de traba-
levar uma entrevista a termo de modo adequa- lho. A aliança para o trabalho, que mais tarde
do, o entrevistador deve ser capaz de: se desenvolverá em uma aliança terapêutica, é
1) estar presente, no sentido de estar intei- composta de dois fatores: a percepção de es-
ramente disponível para o outro naquele mo- tar recebendo apoio e o sentimento de esta-
mento, e poder ouvi-lo sem a interferência de rem trabalhando juntos (Horvath, Gaston &
questões pessoais; Luborsky, 1993; Luborsky, 1976). Desenvolver

52 JUREMA ALCIDES CUNHA


uma atmosfera de colaboração é essencial para da era real. A segurança para enfrentar essas
o sucesso de uma avaliação. Para isso, é im- situações vem em parte do tipo de escuta e
portante que o paciente perceba que o entre- atenção que percebe estar recebendo, como
vistador está receptivo a suas dificuldades e a também da capacidade do entrevistador de
seus objetivos, que ele demonstra entendê-lo facilitar a expressão de experiências, sentimen-
e aceitá-lo, que ele reconhece suas capacida- tos e pensamentos relevantes.
des e seu potencial, e que ele o ajuda a mobili- Em muitos momentos, o entrevistador de-
zar sua capacidade de auto-ajuda. Essa percep- verá buscar esclarecimentos para colocações
ção fortalece a relação e favorece uma atitude vagas ou incompletas e, gentilmente, confron-
colaborativa e participativa por parte do sujeito. tar esquivas e contradições. Utilizamos o ter-
Facilitar a expressão dos motivos que levam mo confrontar no sentido de “colocar-se dian-
a pessoa a buscar ajuda é o coração da entre- te de...”. Opõe-se a evitar, esquivar-se ou de-
vista. Contudo, nem sempre é fácil. Freqüente- fender-se, e mobiliza a capacidade de enfren-
mente, os motivos reais não são conhecidos, tamento do sujeito, no nível adequado à sua
ou se apresentam de maneira latente. Muitas capacidade e estrutura egóica. Por isso, a con-
vezes, estão associados a afetos ou idéias difí- frontação é uma técnica dirigida ao insight e
ceis de serem aceitos ou expressos. Outras ve- requer certa capacidade de tolerar a ansieda-
zes, existem resistências importantes que difi- de. O clínico experiente saberá criar um con-
cultam o processo. O paciente deverá se sentir texto suficiente de apoio para que o sujeito se
seguro o suficiente para poder arriscar-se. O sinta em condições de enfrentar esses momen-
risco é significativo, pois a entrevista tem o tos. Alguns entrevistadores recuam, em mo-
potencial de modificar a maneira como ele se mentos cruciais, mais freqüentemente do que
percebe (auto-estima), percebe seu futuro pes- gostaríamos de admitir. Respostas pouco ela-
soal (planos, desejos, esperanças) e percebe boradas, colocações vagas ou omissões atuam
suas relações significativas. Portanto, se há es- como defesas que obscurecem o assunto em
perança de que a entrevista venha a lhe trazer questão. Quando o entrevistador deixa passar
ganhos, há também o receio de que possa con- esses momentos, perde uma oportunidade de
duzir a perdas significativas. Abandonar idéias desenvolver uma idéia mais clara sobre o as-
supervalorizadas ou auto-imagem distorcida sunto, além de não ajudar o paciente a am-
pode ser concretamente experienciado como pliar sua percepção da questão. Contrariamen-
perda real. Abrir mão de um desejo pode levar te à noção difundida, o que não foi dito antes
à experiência de luto, como, por exemplo, a freqüentemente permanece sem ser abordado
filha que inconscientemente acreditava que, se mais tarde.
fosse “suficientemente” boa, ela conseguiria Assuntos importantes, afetivamente carre-
recuperar o pai alcoólatra. Todo o seu esforço gados e associados a experiências dolorosas,
era em vão. Para desistir desse pai e poder in- muitas vezes aparecem nas entrevistas clínicas.
vestir na própria vida, ela teve que viver o luto Para sustentar esses momentos, o entrevista-
pela perda do pai que desejava ter e abando- dor deverá desenvolver a capacidade de tole-
nar a fantasia de obter do pai real o apoio que rar a ansiedade e de falar abertamente sobre
se esforçava para dar-lhe, sem resultado. Em- temas difíceis, que têm o potencial de evocar
bora seu comportamento fosse configurado emoções intensas. O entrevistador deverá de-
por um conflito na fantasia*, a vivência da per- senvolver confiança em sua própria capacida-
de de suportar tais momentos com naturalida-
de e de poder dar apoio ao outro que passa
* Compreendemos fantasia não em oposição à realidade, pela experiência, sem ser internamente pres-
mas como realidade interna, subjetiva, com vínculos em sionado a evitá-la. Caso contrário, ele pode
relações objetais e afetos associados, que podem ter um comunicar imperícia ou dificuldades pessoais
impacto na experiência do sujeito tão ou mais forte que a
realidade externa, e que podem, conseqüentemente, in-
relacionadas ao tema em questão, o que cria
fluenciar o comportamento de maneira decisiva. um clima carregado de matizes inconscientes,

PSICODIAGNÓSTICO – V 53
difíceis de serem resolvidos na relação. Tais te- vistador uma via inigualável de compreensão
mas podem vir a ser configurados como tabus da experiência do outro. A contratransferên-
na relação e podem não ser abordados ade- cia foi inicialmente conceituada, como proces-
quadamente. Por exemplo, uma senhora sol- so patológico residual do terapeuta, como “os
teira apresentou-se para terapia com uma his- próprios complexos e resistências internas”
tória de depressões recorrentes. Ficou claro que (Freud, 1910, p.130). Com o tempo e o desen-
tais episódios começaram após um envolvimen- volvimento do conceito de identificação proje-
to amoroso com um padre e a decisão unilate- tiva, percebeu-se a característica universal do
ral dele de abandonar o relacionamento. A processo contratransferencial e sua importân-
perspectiva de falar de experiências sexuais, cia na compreensão profunda da comunicação
neste contexto, com alguém da idade da mãe paciente-terapeuta. Os trabalhos clássicos de
do terapeuta trouxe para ele dificuldades que Heimann (1950), Racker (1981) e Pick (1985),
levaram a um impasse sério na entrevista ini- bem como a revisão detalhada de Hinshelwood
cial. (1991), descrevem e ilustram esses processos.
A capacidade de reconhecer as defesas e o Existem momentos em que a entrevista pas-
modo particular de estruturação do paciente é sa por situações de impasse importantes. Por
de especial interesse. Uma pessoa que adota exemplo, uma pessoa pode, a determinada al-
um estilo rígido de personalidade (p.ex., colo- tura, dizer: “Não sei se realmente deveria estar
ca-se de uma maneira predominantemente falando isso. Não sei se realmente quero fazer
dependente em suas relações) ou persistente- isso”. Ou, mais decididamente: “Essa é a ter-
mente projeta (p.ex., culpa os pais por suas ceira vez que procuro ajuda, e não adiantou
dificuldades), revela aspectos significativos de nada”. Assumir a iniciativa em momentos de
seu modo de ser (estrutura) e funcionar (dinâ- impasse significa poder mobilizar recursos pes-
mica). Reconhecendo esses aspectos, o entre- soais diante de situações difíceis e inespera-
vistador poderá antecipar essas situações de das. Significa poder usar a criatividade para dar
transferência e evitar respostas contratransfe- uma resposta eficaz no momento. Por exem-
renciais inadequadas. Ao reconhecer as dinâ- plo, pode ser crucial ajudar a explorar alterna-
micas e modos de interagir do sujeito, pode- tivas e buscar uma perspectiva em momentos
mos dirigir nosso modo de proceder de ma- de desesperança. Eis alguns exemplos de situa-
neira mais eficiente. O avaliador pode anteci- ções críticas que requerem do entrevistador
par as ansiedades da pessoa e adaptar-se de capacidade de agir: risco de vida (ideação sui-
modo correspondente. Se a pessoa apresenta cida), sintomas psicóticos, violência, impulsi-
uma postura dependente, obsessiva, auto-en- vidade, ou outras situações que podem levar a
grandecedora ou colaboradora, a observação um desfecho prejudicial para as pessoas en-
desta atitude ou comportamento já é informa- volvidas. Uma paciente disse, dez minutos an-
ção diagnóstica a ser integrada na interpreta- tes do final da primeira entrevista: “Não sei se
ção. A observação do comportamento, da co- estarei aqui na semana que vem”. A partir da
municação não-verbal e do material latente exploração cuidadosa dessa fala, tornou-se cla-
contribui de maneira especial. Restringir o ro que ela estava considerando o suicídio. A
âmbito do interpretável somente ao conteúdo terapeuta precisou lidar com isso de forma di-
explícito da comunicação pode acarretar per- reta e decisiva, de modo a evitar um desfecho
da de informação clínica significativa. autodestrutivo. Desenvolver recursos pessoais
Ser capaz de compreender seus processos para lidar com tais situações é fundamental
contratransferenciais é, possivelmente, um dos para que o entrevistador possa trabalhar com
recursos mais importantes do clínico. Reconhe- segurança.
cer como os processos mentais e afetivos são Finalmente, espera-se que o entrevistador
mobilizados em si mesmo e ser capaz de rela- tenha domínio das técnicas que utiliza. É pelo
cionar esse processo ao que se passa na rela- domínio da técnica que o entrevistador pode
ção imediata com o sujeito fornece ao entre- deixar de se preocupar com a sua execução e

54 JUREMA ALCIDES CUNHA


se concentrar no paciente, no que ele apresen- sional pode contrariar o interesse do sujeito
ta e na sua relação com ele. A competência avaliado (por exemplo, o profissional recebe-
técnica dá e comunica segurança ao liberar o ria menos pelo seu serviço se informasse ao
entrevistador para dirigir sua atenção aos as- paciente que atende por um convênio do qual
pectos mais importantes da relação. A falta ele é beneficiário). Segundo, mesmo quando o
desse domínio pode resultar em uma aplica- interesse de ambos parece ser o mesmo, este
ção mecânica e desconexa das diretrizes da pode ter conseqüências que colocam em risco
técnica. Com a prática e a experiência, os as- o bem-estar do outro (por exemplo, manter
pectos mecânicos da técnica tornam-se secun- relações não-profissionais com o sujeito). Ter-
dários, e o sujeito e a relação passam a se des- ceiro, o profissional pode ser chamado a aten-
tacar. Torna-se evidente uma integração natu- der interesses conflitantes (por exemplo, em-
ral dos aspectos técnicos e a valorização da presa-empregados, casais em processo de me-
relação com o sujeito. Assim, a entrevista flui, diação, relação pais-adolescentes, etc.).
e a atuação refinada do profissional transfor- Vendo a ética na perspectiva do conflito,
ma a técnica em arte. destacamos duas maneiras como o profissio-
nal pode manter o compromisso ético em suas
atividades. Primeiro, cabe a ele antecipar os
CONCLUSÃO conflitos inerentes a essas atividades. Na ava-
liação psicológica, encontramos muitos desses
Este capítulo apresentou e discutiu uma defi- casos. Um exemplo são as situações em que
nição de entrevista clínica e seus tipos. Abor- existe a necessidade de definir quem são os
damos as competências pessoais do avaliador clientes e como responder adequadamente às
e a sua responsabilidade profissional no pro- demandas de cada um deles. A avaliação pode
cesso de entrevista. Mencionamos a situação envolver, além do sujeito, familiares, outros
privilegiada e o poder que tem o entrevista- profissionais, instituições, etc. Nesses casos,
dor, diante do entrevistado. A entrevista confi- falamos dos conflitos gerados pela atividade
gura-se como um poderoso meio de influen- e, portanto, colocados externamente aos pro-
ciar o outro, principalmente considerando que fissionais. A estratégia mais simples que temos
as pessoas freqüentemente buscam ajuda ou utilizado nesses casos é a de socializar a dúvi-
são avaliadas em momentos de fragilidade. da. Trata-se de colocar a questão a colegas e
Esse aspecto, aliado aos já discutidos neste ca- procurar verificar como eles têm lidado com
pítulo, nos leva a refletir sobre algumas ques- dilemas similares, em busca de alguma orien-
tões éticas acerca da nossa intervenção. Segun- tação normativa. As comissões de ética dos
do um dito popular, “nada mais prático do que diversos conselhos têm oferecido orientação
uma boa teoria”. Gostaríamos de poder dizer em muitos casos, e os profissionais devem lem-
“nada mais ético do que um bom treinamen- brar deste recurso quando se virem nessas si-
to” (teórico e técnico). Infelizmente, isso não é tuações.
suficiente. Uma prática ética depende desse O segundo tipo de conflito ético importan-
treinamento, mas também dos valores e da te diz respeito à própria relação com o sujeito.
formação pessoal do profissional, que desen- Idealmente, esses conflitos deveriam ocorrer na
volvem nele o respeito e a consideração pelo esfera consciente, e o profissional deveria pro-
outro, e que o colocam em condições de ante- curar resolver seus interesses sem envolver o
cipar como as conseqüências de seu compor- paciente. Nossa experiência em supervisão, no
tamento e de suas omissões poderiam afetar o entanto, mostra que existem situações, não
outro, adversamente. Desejamos enfatizar este raras, em que o conflito não é diretamente
ponto. percebido pelo avaliador. Um exemplo comum
As questões éticas colocam-se em evidên- é o paciente difícil ou inconveniente, que pode
cia em situações de conflito. Primeiro, o inte- ser negligenciado ou até mesmo abandonado
resse (consciente ou inconsciente) do profis- pelo profissional que, inconscientemente, de-

PSICODIAGNÓSTICO – V 55
seja evitá-lo. O melhor contexto para desen- darem opiniões em situações difíceis. Um olhar
volver habilidades internas para lidar com es- diferente tem sempre o potencial de favorecer
sas situações é na supervisão clínica. Ela nos nossa compreensão sobre um caso. Em ambas
permite enxergar com os olhos do outro. A as situações descritas – de conflitos impostos
supervisão é uma atividade que oferece meios pela natureza da tarefa, ou pela experiência do
fundamentais para o profissional entrar em profissional na relação –, o antídoto é não se
contato com entraves pessoais no trabalho clí- isolar, buscar apoio em profissionais e colegas
nico, devendo ser utilizada sempre que possí- de confiança e desenvolver a capacidade pes-
vel, principalmente no início de carreira. Mes- soal de lidar com a complexidade dessas situa-
mo pessoas experientes buscam colegas para ções.

56 JUREMA ALCIDES CUNHA


A história do examinando
Jurema Alcides Cunha
6
INTRODUÇÃO saúde. Dessa maneira, quanto mais grave o
estado do paciente, tanto mais o trabalho do
A história e o exame do estado mental do pa- psicólogo se assemelhará ao do psiquiatra. O
ciente também constituem os recursos básicos objetivo de tal avaliação seria descritivo ou de
de um diagnóstico e se desenvolvem, como classificação nosológica.
outras interações clínicas, no contexto de uma Em segundo lugar, ainda dependendo dos
entrevista (Strauss, 1999). Na realidade, com- objetivos, a tarefa do psicólogo pode se res-
põem rotineiramente a avaliação clínica psi- tringir à história e ao exame do paciente, sem
quiátrica. Num modelo psicológico, a história a administração de testes, se se pretende ape-
e o exame do paciente permitem a coleta de nas chegar a uma avaliação compreensiva com
subsídios introdutórios que vão fundamentar vistas a uma intervenção terapêutica imedia-
o processo a que chamamos de psicodiag- ta, ou a um entendimento dinâmico, para a
nóstico. Caracterizam, portanto, uma área de identificação de conflitos e possíveis fatores
superposição profissional. psicodinâmicos.
Em muitos casos, a tarefa do psicólogo tam- Assim, a avaliação deste tipo, feita pelo psi-
bém vai se restringir à utilização desses recur- cólogo, pode ter um caráter mais descritivo e
sos, dependendo das condições do paciente e/ formal ou mais interpretativo e dinâmico, con-
ou dos objetivos do exame. forme os objetivos do exame e a gravidade ou
Primeiramente, há pacientes que não são não do transtorno.
testáveis, dado o grau de comprometimento Como história, pode-se compreender a his-
das funções do ego ou das funções cognitivas, tória pessoal ou anamnese, a história clínica
pelo menos em determinadas fases da doen- ou história da doença atual e, ainda, a avalia-
ça. Por outro lado, deve-se considerar que a ção psicodinâmica, que também explora a pers-
maioria das técnicas e testes pressupõe algu- pectiva histórica para entender uma problemá-
ma forma de comunicação intacta e um míni- tica atual dentro de um contexto vital de de-
mo de condições de seguir instruções e de co- senvolvimento. Conseqüentemente, a distinção
laborar. Sem estarem preservadas essas condi- que se faz desses itens tem, primordialmente,
ções, dificilmente um paciente será encaminha- um sentido didático, sendo também utilizada
do a um psicólogo, exceto se este trabalha num para sistematizar as informações, ou para or-
contexto hospitalar ou em outros serviços de ganizá-las, na comunicação ao receptor dos

PSICODIAGNÓSTICO – V 57
resultados. Da mesma forma, à medida que o Eventualmente, o paciente não consegue
paciente relata a sua história, o clínico tem determinar o início de seus problemas. Então,
condições de avaliar alguns aspectos que cons- temos de examinar a sua história pessoal, de
tam do exame do estado mental do paciente. maneira a identificar quando ou como, a par-
Nesses dois recursos de avaliação, como sali- tir de um ajustamento global regularmente
entam MacKinnon e Yudofsky (1988b), “exis- bom, começaram a se delinear dificuldades ou
tem várias áreas de superposição” (p.50). O pri- a se evidenciar comprometimentos em uma ou
meiro contato com o paciente, por exemplo, mais áreas de funcionamento social, profissio-
permite não só descrever a sua aparência, como nal, acadêmico, etc. Da mesma forma, embo-
observar detalhes de seu comportamento, isto ra, teoricamente, a história clínica termine com
é, sobre atenção, concentração e pensamen- o encaminhamento, há situações em que se
to, e até sintomas emergentes na história clí- registra uma continuidade, durante o proces-
nica podem ser relatados no exame. Da mes- so psicodiagnóstico, apresentando-se fatos que
ma maneira, a anamnese envolve um levanta- devem ser incluídos neste item na redação do
mento normativo do desenvolvimento, mas laudo.
que, dependendo dos objetivos do exame, Freqüentemente, ao se levantar a história
pode ser de pouca ou nenhuma utilidade se os clínica, já se tem conhecimento das queixas,
padrões de comportamento emergentes ao dos motivos que levaram à consulta, confor-
longo da infância não forem focalizados em me informações prévias dadas por alguém ou
sua significação dinâmica. discriminadas no encaminhamento. Mas sem-
Na realidade, ao longo de sua experiência, pre é importante ter a versão do próprio pa-
o psicólogo vai se dar conta de que as várias ciente. Há casos em que ele não se encontra
perspectivas são áreas de informação tão inte- preparado para o exame, e é conveniente ex-
gradas, que se torna mais econômico e produ- plorar as circunstâncias em que foi tomada a
tivo não separá-las, na prática, completando decisão da consulta. Essa abordagem permite
os dados com perguntas suplementares, de ao profissional antecipar dificuldades e propor-
forma que se termine com um registro siste- ciona-lhe indícios sobre temas mais delicados
mático de cada uma. Não obstante, é bom ter ou ansiogênicos para o paciente.
em mente que a avaliação deve ser feita com Exploradas as circunstâncias do encaminha-
ênfases especiais, em sujeitos de faixas etárias mento, parece importante registrar as queixas
diversas, como veremos mais adiante. literalmente, mesmo que “ele negue absoluta-
mente ter problemas ou faça afirmações ilógi-
cas ou bizarras, porque a resposta dada revela
HISTÓRIA CLÍNICA se ele compreende o propósito do exame” (De-
tre & Kupfer, 1975, p.730).
Por influência do modelo médico, a história Se o paciente nega ter problemas, pode se
clínica é muitas vezes chamada de história da tratar de uma posição defensiva, falta de insi-
doença atual. Porém, especialmente no caso ght, ou ele pode estar falando a verdade, se
do psicólogo, ocorre que muitos problemas considerarmos que certos encaminhamentos
com que se lida não podem ser categorizados ocorrem por pressão do meio ante comporta-
como “doença mental”, ainda que envolvam mentos não aceitáveis convencionalmente ou,
uma sintomatologia que pode justificar uma ainda, por intolerância dos familiares ante uma
intervenção clínica. crise.
A história clínica pretende caracterizar a De qualquer modo, as queixas, os motivos
emergência de sintomas ou de mudanças com- explícitos ou, até, a não-admissão de sintomas
portamentais, numa determinada época, e a fornecem um ponto de partida. Sejam as preo-
sua evolução até o momento atual, que habi- cupações próprias ou das pessoas com as quais
tualmente é entendido como a ocasião em que o paciente convive, elas devem se associar a
o exame foi solicitado. algumas mudanças no comportamento ou a

58 JUREMA ALCIDES CUNHA


sintomas. É preciso descrevê-los, procurando A condução da entrevista pode ser mais, ou
localizar no tempo o seu aparecimento, asso- menos, diretiva, dependendo de característi-
ciá-los com as circunstâncias de vida no mo- cas do paciente e das preferências do psicólo-
mento, analisando o seu impacto em diferen- go. Há muitos profissionais que esperam que
tes áreas da vida pessoal ou dos demais, isto o paciente forneça sua visão pessoal sobre seus
é, procurando avaliar a sua repercussão em problemas e vá escolhendo os temas sucessi-
atividades e relações. É claro que, aqui, tam- vos, que são complementados por perguntas
bém se consideram as perdas secundárias e os específicas. Há outros profissionais que prefe-
ganhos secundários, em comparação com o rem dar início com perguntas abertas para pas-
“ganho primário que resulta da significação sar depois a perguntas fechadas, fazendo uso
inconsciente do sintoma” (MacKinnon & Yudo- também de perguntas em eco, pela repetição de
fsky, 1988, p.58). Neste sentido, deve-se foca- palavras ditas pelo paciente, implicitamente in-
lizar o meio familiar, social, ocupacional e/ou centivando-o a esclarecer melhor (Strauss, 1999).
escolar (acadêmico). Muitas vezes, as mudan- De qualquer modo, espera-se que o psicólogo
ças que se manifestam no comportamento da encerre essa etapa com a convicção de que real-
pessoa, em diferentes ambientes ou grupos mente foram abordados todos os pontos essen-
sociais, não só nos fornecem indícios precio- ciais sobre a emergência da problemática e seu
sos sobre a gravidade do caso e sobre o grau curso, com dados cronológicos.
incapacitante que assumiu, como também
sobre o papel das mesmas em relação com as
necessidades inconscientes, definindo a exten- HISTÓRIA PESSOAL OU ANAMNESE
são e a especificidade de perdas e ganhos se-
cundários. A história pessoal pressupõe uma reconstitui-
Determinado o início da história clínica e ção global da vida do paciente, como um mar-
de seu curso, ainda é necessário um levanta- co referencial em que a problemática atual se
mento da sintomatologia e das condições de enquadra e ganha significação.
vida do paciente, no momento atual, em vá- Freqüentemente, a anamnese é delineada
rias áreas, além da investigação de sua histó- de forma mais sistemática e formal, produzin-
ria psiquiátrica pregressa. No caso, é impor- do um acúmulo de dados que não contribuem
tante examinar as atitudes das outras pessoas, para o entendimento do caso. Um enfoque
investigar a rede social com que conta para puramente normativo pode ter sentido quan-
apoio, definir a sua situação funcional, se tra- do há suspeitas de desvios de desenvolvimen-
balha, e registrar as características de seu de- to numa criança. Caso contrário, muitas vezes,
sempenho profissional e/ou acadêmico. Tam- a série de dados, conseguidos exaustivamen-
bém é essencial uma exploração da área se- te, em busca de uma precisão cronológica,
xual, incluindo relações pré-matrimoniais, ma- pode ser resumida, porque os dados são im-
trimoniais e extramatrimoniais, se for o caso. portantes, em vista de sua “possível conexão
Devem-se considerar relações hetero ou ho- com a enfermidade corrente”, como lembram
mossexuais, quanto a dificuldades específi- MacKinnon & Yudofsky (1988, p.17), criticando
cas na escolha de parceiros ou na própria as deficiências no registro da história pessoal.
relação, bem como a estabilidade ou não das Desta maneira, a história pessoal deve ser
ligações. É bom lembrar que se tais temas enfocada conforme os objetivos do exame e
são às vezes trazidos espontaneamente, este dependendo do tipo e da idade do paciente, o
não é sempre o caso, e, então, devem ser que vai se refletir, logicamente, na natureza e
abordados pelo psicólogo com a mesma na- quantidade de dados que devem constar ou
turalidade com que trata de outros. Eviden- não do laudo.
temente, se o sujeito é do sexo feminino, É praticamente impossível coletar dados
devem ser introduzidos assuntos sobre mens- completos sobre a vida de um paciente. Mui-
truação ou menopausa. tas vezes, também, ele não tem todas as infor-

PSICODIAGNÓSTICO – V 59
mações necessárias (e se deve tentar usar fon- Contexto familiar
tes secundárias) ou as omitirá por motivos de-
fensivos. Porém, no momento em que se tem Geralmente, é útil construir um genetograma,
a queixa e a história clínica, há condições para nem que seja de forma resumida, focalizando,
definir a estrutura da história pessoal necessá- principalmente, o núcleo familiar atual. Em al-
ria, considerando os objetivos do exame, o tipo guns casos, é de interesse diagnóstico obter
de paciente e a sua idade. informações inter e transgeracionais (vide Ca-
Se estamos lidando com uma criança cujo pítulo 12, nesta edição). Deve-se procurar des-
aproveitamento escolar é insatisfatório, temos crever o contexto familiar, por ocasião da con-
de atentar para questões do desenvolvimento cepção (ou da adoção da criança), especifican-
normativo. Entretanto, como tal desenvolvi- do o status marital, as condições sociocultu-
mento se deu num contexto familiar, além de rais (nível de instrução, nível socioeconômico,
dados cronológicos, devem-se explorar variá- rede de apoio social, etc.), o clima das relações
veis afetivas e sociais. Às vezes, importa pouco afetivas do casal ou da família, suas expectati-
saber por quanto tempo o paciente foi alimen- vas quanto à vinda de um bebê ou a existência
tado ao peito sem ter uma noção sobre seus de algum tipo de planejamento familiar, bem
vínculos afetivos com a figura materna nessa como as reações ante a gravidez. Por vezes, é
época. Assim, é importante associar a perspec- conveniente registrar outros aspectos ou pro-
tiva histórica a uma abordagem dinâmica. Por blemas que caracterizavam a vida familiar.
outro lado, dependendo da problemática e da
estrutura de personalidade do paciente, certas
áreas e certos conflitos deverão ser mais ex- História pré-natal e perinatal
plorados do que outros, concentrando-se a
atenção em certos pontos da vida do paciente É importante descrever como transcorreu a
que tenham probabilidade de fornecer expli- gestação (ou o processo de adoção) do ponto
cações para a emergência e o desenvolvimen- de vista físico e psicológico. Não aceite sim-
to do transtorno atual. Conseqüentemente, a plesmente a classificação de “normal” (houve
entrevista pode ser estruturada de forma di- acompanhamento médico sistemático? pré-
versa se o paciente apresentar sintomas obses- natal?). Procure informar-se a respeito de as-
sivo-compulsivos ou uma personalidade anti- pectos nutricionais, doenças, acidentes, uso de
social (MacKinnon & Yudofsky, 1988). A fami- drogas, ou, ainda, de fatos significativos na vida
liaridade com um enfoque teórico-psicodinâ- do casal, em especial para a mãe. Procure sa-
mico e com a técnica de entrevista em casos ber qual o estado psicológico da mãe, em ter-
especiais é de especial importância para que a mos de ansiedades, temores e fantasias e como
história clínica possa ser complementada pela isso repercutiu na vida do casal.
história pessoal, como um marco referencial Em muitos casos, é essencial se informar
que lhe dê significação. quando e como ocorreu o parto, isto é, se foi a
Freqüentemente, o psicólogo segue um ro- termo, natural ou não, sobre o tempo de tra-
teiro, que o ajuda a dar seguimento à sua in- balho de parto e sobre problemas especiais.
vestigação. Não estamos oferecendo exatamen- Procure saber das condições da criança ao nas-
te um roteiro, mas apresentando tópicos que cer, sobre o Apgar e a necessidade de algum
podem servir como pontos de referência para atendimento especial. Investigue as reações dos
a exploração da vida do paciente. A maior ou pais em relação ao bebê, quanto à sua aparên-
menor ênfase a ser dada a cada tópico ou a cia, sexo e estado geral e, também, informe-se
forma de seleção das informações significati- sobre as experiências iniciais (sucção, degluti-
vas têm que ver com o objetivo do exame, tipo ção, qualidade da relação mãe-filho, etc.).
de paciente e sua idade, ou, ainda, com “as Verifique como os pais reagiram afetiva-
circunstâncias da entrevista e da avaliação” mente às mudanças ocorridas pela inclusão de
(Strauss, 1999, p.574). mais um membro na constelação familiar, pro-

60 JUREMA ALCIDES CUNHA


curando saber como a mãe amamentava a Os jogos constituem uma área rica de in-
criança e qual a participação paterna ou de formações, desde que o brinquedo era uma
outras pessoas na nova rotina. parte do próprio corpo ou um objeto simples,
até se tornar o campo para a estruturação das
relações sociais, explorando as respostas a frus-
A primeira infância (até os 3 anos) trações e gratificações e as reações ao apren-
dizado rudimentar de normas. Como a criança
Nessa fase, é de especial importância a qualida- se comportava em tais situações? Isolava-se ou
de da relação materno-infantil, desde a ligação buscava companhia?
simbiótica primária, até a fase de separação-in- Ao se falar em aprendizado de normas, é
dividuação, “que se estende dos doze-dezoito essencial obter informações sobre o treinamen-
meses aos trinta e seis meses” (Mahler, 1983, p.8). to da higiene. A idade em que ocorreu o con-
Assim, a partir de perguntas sobre hábitos e pro- trole dos esfíncteres em geral é fácil de detec-
blemas alimentares, podem-se explorar os con- tar. Mas explorar os conflitos entre obediência
tornos que assumiram as relações de objeto. In- e oposição é mais complexo, embora tais ex-
dícios significativos sobre a experiência afetiva periências tenham repercussões importantes
podem ser encontrados exatamente nos proble- no desenvolvimento caracterológico do indiví-
mas na amamentação ou nos sintomas exacer- duo. Sintomas, atitudes claramente associadas
bados de cólicas. Também, “distúrbios precoces com esse período ficaram circunscritas à fase
nos padrões de sono ou sinais de necessidades ou houve manifestações posteriores? Quais as
não satisfeitas, como bater com a cabeça nos atitudes dos pais ante tais ocorrências?
objetos ou embalar o corpo continuamente, for- Além disso, devem ser considerados sinto-
necem indícios sobre possível privação materna” mas especiais, como o de chupar o dedo, roer
(MacKinnon & Yudofsky, 1988, p.61). unhas, enurese, explosões de raiva, tiques, ter-
A ansiedade básica é de separação, de ma- rores noturnos, medos, etc. (Kaplan & Sadock,
neira que é importante investigar a acessibili- 1999b), especificando-se se ficaram restritos a
dade da mãe e a disponibilidade de mães subs- essa fase ou tiveram continuidade, procuran-
titutas, o papel desempenhado pelas pessoas do-se examinar como foram percebidos e ma-
no lar (em termos de afeto ou disciplina), a nejados pelos pais.
qualidade dos cuidados em creches, bem como
as reações da criança a estranhos ou a perío-
dos de separação. Infância intermediária (3 a 11 anos)
A emergência de padrões de comportamen-
to motores (e, mais especificamente, de mani- Geralmente é nessa fase que há um alargamen-
pulação e deambulação), de linguagem e so- to da rede de relações sociais da criança, pelo
ciais, como também de jogo, deve ser registra- ingresso na “escolinha”. Como se deu a expe-
da e confrontada com as expectativas médias riência de separação, em termos das ansieda-
específicas para cada tipo. Embora tais aspectos des da mãe e do sujeito? Como foram se es-
normativos possam ser de ajuda, é essencial sa- truturando as suas relações no grupo de iguais?
ber o quanto o ambiente foi estimulante para o “Os primeiros padrões de auto-afirmação, im-
desenvolvimento, como foram manejadas as ten- pulsividade, agressividade, passividade, ansie-
tativas frustradas, o quanto o meio parecia ansi- dade ou comportamento anti-social freqüen-
ogênico ou oferecia um clima de afeto. temente emergem no contexto das relações
Os aspectos sociais podem ser bem explo- escolares” (MacKinnon &Yudofsky, 1988, p.63).
rados, principalmente pela análise das ligações Paralelamente, no começo dessa fase, a
afetivas com irmãos e na competição pelo afe- criança vê-se às voltas com a experiência e os
to dos pais. Alianças e rivalidades devem ser conflitos, associados com a situação de trian-
examinadas, com ênfase na caracterização das gularidade edípica do lar, dos quais deve emer-
respostas afetivas usuais do sujeito. gir com novos recursos de socialização e com

PSICODIAGNÓSTICO – V 61
uma nova percepção de sua identidade. É im- ticas, conflitos na relação com pais, professo-
portante analisar a sensibilidade do ambiente res e outras figuras. Da mesma maneira, é con-
no manejo de suas expressões afetivas (de amor veniente identificar figuras idealizadas no con-
ou de ódio), identificar os responsáveis por re- texto familiar ou na sociedade mais ampla, o
compensas ou castigos usuais, as circunstân- que “fornece indícios valiosos com relação à
cias em que ocorriam e evidências de sintomas auto-imagem idealizada do paciente” (MacKin-
específicos. non & Yudofsky, 1988, p.64).
O desempenho escolar é outro campo a ser Em segundo lugar, é importante registrar a
investigado, considerando forças e fraquezas história escolar, em termos de desempenho,
em determinadas áreas. Se houve fracassos, aproveitamento, ajustamento, interesses espe-
deve-se verificar se foram exploradas causas, cíficos em relação às atividades curriculares e
que medidas foram adotadas e qual seu im- extracurriculares (cursos, passatempos, espor-
pacto sobre a criança. Mudanças na escola, tes, etc.), bem como as expectativas quanto
necessidade de reforços para a aprendizagem ao futuro acadêmico ou profissional. Da mes-
e atividades extracurriculares (interesses espe- ma forma, é conveniente analisar fracassos,
cíficos) podem ser importantes no contexto interrupções na vida escolar, por necessidade
vital, pela consideração das épocas e circuns- de trabalhar ou por outras razões, e o conse-
tâncias em que ocorreram, bem como de sua qüente impacto na vida do sujeito.
inter-relação com outros eventos. Em terceiro lugar, é essencial considerar a
“História de pesadelos, fobias, urinar na área sexual, quanto às primeiras experiências,
cama, provocação de incêndios, crueldade com atitudes frente ao outro sexo, práticas sexuais
animais e masturbação compulsiva é também (masturbação, jogos), escolha e variabilidade
importante no reconhecimento dos primeiros de parceiros, dificuldades, conflitos e as rea-
sinais de distúrbio psicológico” (MacKinnon & ções da família frente ao desenvolvimento sexual
Yudofsky, 1988, p.63-64). Mas, igualmente, é (preparação para menarca, esclarecimentos ne-
essencial considerar a freqüência, a intensida- cessários, precauções a serem tomadas, etc.).
de, as circunstâncias do aparecimento de sinto- Em quarto lugar, aparecem problemas es-
mas, sua coexistência com outros sinais de per- pecíficos, com repercussões de ordem emocio-
turbação ou a sua relação com situações críticas. nal, física ou social. As questões psicodinâmi-
cas típicas da fase devem ser examinadas, como
também a presença de sintomas em uma ou
Pré-puberdade, puberdade e adolescência mais áreas de funcionamento (Wilson Jr., 1971),
o que será considerado mais especificamente
Há quatro pontos importantes para os quais adiante. Problemas comuns são sentimento de
se deve dirigir a atenção do examinador. inferioridade, muitas vezes se relacionando
Em primeiro lugar, esta é a época em que com a aparência, comportamentos de atuação
as relações sociais vão se tornando mais im- (fugas de casa, infrações legais, uso, depen-
portantes e devem ser consideradas, enfocan- dência e abuso de drogas ou álcool, etc.).
do irmãos, colegas e amigos. Deve-se analisar Além desses quatro pontos importantes
a facilidade ou não de estabelecer e manter (como em outros períodos do desenvolvimen-
relações, avaliar a extensão da rede de amiza- to), não se pode deixar de investigar a ocor-
des, o grau de intimidade nas amizades, iden- rência de doenças, acidentes ou de experiên-
tificar qual o papel desempenhado nos grupos, cias comuns.
grau de popularidade e liderança, a tendência
de participar de grupos que se envolvem em
atividades não aceitas pelas normas sociais ou, Idade adulta
ao contrário, de organizações com interesses
artísticos, políticos, religiosos, etc. Também, Os principais temas a serem abordados incluem
neste item, devem ser examinadas caracterís- a história e a situação ocupacional, as relações

62 JUREMA ALCIDES CUNHA


sociais, a área sexual, a história conjugal e as monial, abrangendo áreas de satisfação e in-
atitudes frente a mudanças ocorridas na vida. satisfação, de atrito ou concordância, em ter-
A história ocupacional pode ser investiga- mos da rotina cotidiana e em relação à educa-
da em continuidade às expectativas do adoles- ção e outros aspectos da vida dos filhos.
cente com relação ao futuro acadêmico e/ou Por último, a história da vida adulta deve
profissional, examinando-se a concretização ou se deter na análise do enfrentamento de mu-
não dos planos prévios, a escolha profissional, danças e crises ocorridas ao longo da vida.
a preparação e o treinamento para o trabalho Aqui, devem-se incluir as reações, as atitudes
atual, êxitos e fracassos (número de empregos, e os ajustes ocasionados pelo nascimento e
estabilidade ocupacional, fatores positivos ou crescimento dos filhos, por doenças, aciden-
negativos associados com mudanças de em- tes, mortes de membros da família, por mu-
prego ou da ocupação), relações com chefias, danças drásticas na área profissional, social ou
colegas e subordinados, bem como o grau de financeira, pelo casamento dos filhos, nasci-
satisfação quanto ao status profissional alcan- mento de netos, pela ocorrência da menopau-
çado. Deve-se incluir uma análise da situação sa, aposentadoria, etc. Em outras palavras, é
ocupacional atual (emprego, desemprego, su- importante verificar como o sujeito lidou com
bemprego, em benefício), das condições finan- situações críticas e fatores estressantes. As
ceiras do paciente e do impacto de seus pro- maneiras típicas de lidar com o estresse são
blemas atuais sobre a sua situação ocupacio- essenciais para o seu entendimento psicodinâ-
nal e financeira. mico.
Ao examinar as relações sociais, é impor-
tante não só aquilatar a extensão do círculo de
amizades, da rede social que conta como apoio Fontes subsidiárias
(parentes, amigos, etc.), mas também aferir a
qualidade de seu relacionamento, a duração e Como já foi referido, nem sempre o paciente
a profundidade de suas relações interpessoais. dispõe de todos os dados. Mesmo quando o
Aqui, convém chegar a um entendimento dos paciente é adulto, em vista da gravidade de
motivos subjacentes que levam o paciente a seu transtorno, muitas vezes a história deve ser
escolher e manter determinados tipos de rela- complementada por um exame objetivo, atra-
cionamento ou as dificuldades e problemas vés da entrevista com um familiar ou pessoa
para o estabelecimento e manutenção de rela- de seu convívio, como se verá mais adiante.
ções ou, ainda, as dificuldades para comparti- Eventualmente, uma entrevista conjunta com
lhar idéias, interesses e afetos com os demais. todos os membros da família é fundamental
A área sexual pode ser explorada, até certo para uma compreensão da dinâmica familiar,
ponto e em certos casos, junto com a história tanto no caso do paciente adulto, como ado-
conjugal, embora deva incluir experiências (es- lescente ou criança.
colha de parceiros, troca de parceiros, práticas Também, em muitos casos, são, às vezes,
sexuais, etc.) e problemas pré-conjugais, bem de muita valia resultados de exames anterio-
como sintomas de disfunção sexual (frigidez, res, realizados por médicos de várias especiali-
ejaculação precoce, etc.), continuando-se com dades, psicólogos, etc., bem como pode ser de
a análise do ajustamento sexual do casal (ca- interesse o exame de material resultante da
racterísticas da relação, preferências, freqüên- produção espontânea do paciente, de caráter
cia e grau de satisfação dos parceiros), consi- literário, artístico, etc.
derando-se também arranjos maritais homos- No caso do adolescente, dependendo dos
sexuais e experiências e/ou ligações extrama- objetivos do psicodiagnóstico, há profissionais
trimoniais (bem como seus efeitos sociais e que abrem mão da entrevista com pais ou res-
psicológicos para a relação do casal). ponsáveis. Entretanto, quando se pretende um
Todavia, a história conjugal deve descrever entendimento mais global de um sujeito que
também o início e a evolução da vida matri- está ultrapassando uma crise de desenvolvi-

PSICODIAGNÓSTICO – V 63
mento, tal entrevista pode ser essencial para bard (1998) que “uma entrevista dinâmica não
analisar como o sujeito enfrentou e ultrapas- é uma sessão de psicanálise” (p.64). Trata-se
sou as crises psicossociais pré-adolescentes, de um modo específico de compreender os
bem como para obter dados sobre o seu ma- fatos. Desse modo, não se analisam os efeitos
nejo das questões psicodinâmicas sintônicas especiais de um e outro acontecimento, como
com a fase em que se encontra. Como mate- também suas interações. Bellak e Small (1980)
rial suplementar, além dos citados em relação exemplificam: “a perda da mãe na infância do
ao paciente adulto, podem ser utilizadas fon- paciente deve ser posta em relação com a che-
tes de informações da escola (boletins, entre- gada anterior de um irmão e com a ausência
vistas ou contatos telefônicos com psicólogos, prévia e prolongada do pai no lar” (p.51). Os
orientadores, professores, etc.), diários ou ou- acontecimentos também devem ser entendi-
tras produções espontâneas. No caso de pare- dos em função da época em que ocorreram,
cer pertinente, pode-se utilizar material de pro- pois a sua repercussão psicodinâmica pode ser
dução infantil, como dados ilustrativos das fa- intensificada em meio a uma crise de desen-
ses evolutivas precedentes. volvimento, por exemplo, e eventualmente
Em relação à criança, a entrevista com a mãe agravada por vulnerabilidade no desenvolvi-
e, eventualmente, com outros familiares, es- mento anterior.
pecialmente o pai, torna-se essencial, pois cons- Devemos lembrar, por outro lado, que “todo
tituirá realmente a fonte primária de dados, comportamento é uma tentativa de adaptação,
tornando-se quase sempre a própria criança a e a desadaptação atual, que traz o paciente a
pessoa que poderá complementá-los. No en- nós, está baseada em grande parte em modos
tanto, há fontes subsidiárias importantes, des- aprendidos mais antigos de se adaptar aos pro-
de o álbum do bebê, gravações em vídeo, fo- blemas” (p.51).
tografias, desenhos, cadernos escolares, até Como os padrões psicodinâmicos tendem
entrevistas ou contatos telefônicos com pes- a se repetir, devemos entender a situação atual
soas que atendem ou atenderam a criança, seja em termos de denominadores comuns, na vida
de forma sistemática (professores, fonoaudió- do paciente, ou, mais especificamente, no con-
logos, pediatra, etc.) ou assistemática (espe- teúdo de eventos perturbadores e de reações
cialistas na área médica), sendo também even- passadas correlatas. Isso significa que, a partir
tualmente úteis laudos médicos ou psicológi- do quadro atual do paciente, se pode levantar
cos anteriores. Pode-se ainda acrescentar o re- uma série de hipóteses etiológicas, com base
curso da observação do comportamento da em pressupostos teóricos, o “que deve ser jus-
criança no lar ou em outras situações. tificado por dados históricos” (p.53).
Neste processo, partimos de queixas, iden-
tificamos conflitos, pesquisamos causas, inter-
AVALIAÇÃO DINÂMICA relacionamos conteúdos, reunindo e integran-
do informações que embasam o entendimen-
A não ser em casos muito específicos, em que to dinâmico no fluxo da história do paciente.
o objetivo diagnóstico é bastante circunscrito,
a avaliação dinâmica é realizada geralmente
integrada com a história, buscando-se uma Enfoque especial no caso do adolescente
relação entre a pessoa com seus problemas
específicos atuais e as experiências de sua vida Considerando que o paciente adolescente atra-
passada. Pretende-se colocar a problemática vessa uma crise de desenvolvimento, sua pro-
presente numa perspectiva histórica, que per- blemática pode ser entendida dentro de um
mita compreender o transtorno dentro de um esquema multiaxial, inspirado numa classifica-
processo vital, em um contexto temporal, afe- ção diagnóstica de crise da adolescência, pro-
tivo e social, com base num quadro referencial posta por Wilson Jr. (1971) e baseada na linha
teórico. Mas é importante sublinhar com Gab- teórica de Erikson. Embora esta seja uma abor-

64 JUREMA ALCIDES CUNHA


dagem bastante antiga, ainda parece útil, do e, provavelmente, o encaminhamento pode ser
ponto de vista didático. atribuído às dificuldades da família em tolerar
No Eixo I, é examinada a problemática do ou manejar uma reação sadia. Os diagnósticos
paciente, em função das questões psicodinâ- nos Eixos II e III são dispensáveis. O exame pode
micas da fase, categorizando-se a crise da ado- se restringir a esta etapa. Um psicodiagnósti-
lescência em cinco classes. No Eixo II, verifica- co completo (com todos os passos) só seria
se a existência de vulnerabilidades prévias no indicado para confirmação da hipótese de ca-
desenvolvimento psicossocial, com a presença tegorização na Classe I. No caso, o início da
ou não de sintomas anteriores à adolescência. “história clínica” coincidiria com a emergência
No Eixo III, investigam-se sintomas de mau fun- de mudanças associadas com a fase.
cionamento em seis categorias ou áreas (afeti- Na Classe II, o ponto focal da problemática
va, perceptual, cognitiva, somático-visceral, é constituído pela confrontação com as ques-
integrativa e societária). tões psicodinâmicas da fase, que é complicada
As questões psicodinâmicas sintônicas com pela emergência de sintomas, na adolescên-
a fase adolescente têm que ver com: a) impo- cia, que permitem um diagnóstico também do
tência vs. onipotência; b) dependência vs. in- Eixo III, mas não no II. A história clínica tem
dependência; c) altruísmo vs. narcicismo; d) início no aparecimento de sintomas, dentro da
passividade vs. agressão; e) femininidade vs. crise adolescente.
masculinidade. As vulnerabilidades pré-adoles- Na Classe III, há problemas associados com
centes consideradas são: a) sentimento de con- as questões psicodinâmicas da fase, que são
fiança vs. desconfiança; b) autonomia vs. ver- complicadas por vulnerabilidades anteriores,
gonha e dúvida; c) iniciativa vs. culpa; d) ope- que podem ter causado distorções estruturais
rosidade vs. inferioridade. Tais vulnerabilidades na personalidade, mas os sintomas só se evi-
podem ocasionar distorções em nível de ego, denciam no enfrentamento da crise da adoles-
ideal do ego e superego. cência. Justifica-se um diagnóstico também no
Para este enfoque, o clínico deve estar bem Eixo II e no III. A história clínica tem início na
familiarizado com a linha teórica de Erikson emergência dos sintomas, dentro da adoles-
(1971) sobre desenvolvimento, abordando a cência, mas o entendimento dinâmico deve
coleta de dados históricos sob este prisma. Já associar a problemática atual com os conflitos
para o Eixo III são utilizados dados do exame oriundos da crise pré-adolescente, que foi mal
do estado mental do paciente. ultrapassada.
Qualquer problemática do adolescente Na Classe IV, novamente há problemas, as-
pode se enquadrar em uma das cinco classes sociados com as questões psicodinâmicas da
seguintes: fase, mas vinculados à vulnerabilidade ante-
rior, que pode se relacionar com distorções es-
truturais e ocasionou sintomas prévios, que
Classes
Crise da adolescência podem ter sido tolerados antes, mas, manifes-
I II III IV V tando-se na adolescência de forma exacerba-
Vulnerabilidades pré- Não Não Sim Sim Sim da ou diversa, tornam-se fonte de preocupa-
adolescentes ção. Justifica-se o diagnóstico também nos
Sintomas pré-adolescentes Não Não Não Sim Sim Eixos II e III. A história clínica tem início por
Questões psicodinâmicas Sim Sim Sim Sim Não
da adolescência
ocasião da emergência dos primeiros sintomas,
Mau funcionamento de Não Sim Sim Sim Sim antes da adolescência, na crise ou crises mal
uma ou mais áreas ultrapassadas, que devem ser consideradas no
entendimento psicodinâmico.
Na Classe V, os problemas associam-se com
Vemos, assim, que, na Classe I, a proble- crise ou crises anteriores à adolescência, levan-
mática justifica-se exclusivamente pelo enfren- do a prováveis distorções estruturais e à emer-
tamento das questões sintônicas com a fase, gência de sintomas prévios e não permitindo

PSICODIAGNÓSTICO – V 65
o enfrentamento das questões psicodinâmicas uma percepção da sintomatologia atual, que
da adolescência, isto é, o paciente não chegou serve como referencial para identificar confli-
a se “matricular” na adolescência. Justifica-se tos ou áreas de desenvolvimento, que devem
o diagnóstico também no Eixo II e no Eixo III. A ser mais detidamente explorados. Não obs-
história clínica tem início por ocasião do apa- tante, embora a maior densidade dos dados
recimento dos primeiros sintomas, em fase seja obtida por entrevista com a mãe, é bas-
anterior à adolescência, e o entendimento di- tante elucidativo ter a versão da própria
nâmico deve abranger a crise ou crises mal ul- criança. Além disso, em muitos casos, reco-
trapassadas. menda-se a entrevista lúdica (vide Capítulo
Dessa maneira, vemos que um esquema te- 10, nesta edição) para a obtenção de indí-
órico pode fornecer um embasamento, não cios, que podem alargar e aprofundar o en-
só para a compreensão da problemática atual, tendimento dinâmico.
como pode permitir que o clínico se situe no Como foi salientado em relação ao adoles-
enfoque adequado da história clínica e no cente, é importante examinar o enfrentamen-
manejo da avaliação dinâmica. to das questões psicodinâmicas da fase em que
a criança se encontra, tentando determinar se
os problemas estão circunscritos a ela. Caso
Enfoque especial no caso da criança contrário, é importante analisar a sua relação
com fases anteriores, que podem ter ou não
No caso da criança, como no que se refere ao uma vinculação causal com os conflitos atuais,
adolescente, a perspectiva do desenvolvimen- havendo ou não manifestações sintomáticas
to é crucial, o que tem duas repercussões es- prévias. Por exemplo, a criança pode estar en-
senciais. Em primeiro lugar, a precisão crono- frentando mal a crise edípica, e seus sintomas
lógica dos dados da anamnese é muito mais podem se explicar por vulnerabilidade na fase
importante do que em outras fases, porque anal, cujos conflitos explicam os mecanismos
podem se evidenciar desvios no desenvolvimen- obsessivos que vem apresentando. Se os sin-
to por atrasos na emergência de certos padrões tomas eclodiram na fase edípica, aí se inicia a
de comportamento que podem estar direta- história clínica, embora o entendimento dinâ-
mente relacionados com a problemática atual. mico deva abranger as dificuldades mais anti-
Em segundo lugar, é extremamente importan- gas. Se houve sintomas de mau funcionamen-
te que haja uma abordagem dinâmica dos fa- to prévio, aí se inicia a história clínica.
tos do desenvolvimento para permitir uma di- Quando tratamos da problemática do
mensão mais profunda na compreensão do adolescente, lançamos mão da formulação
caso. Na prática, porém, é recomendável so- teórica de Erikson. Aqui, propositalmente,
brepor esses enfoques, na entrevista, diferen- utilizamos pressupostos freudianos, para
ciando-os, depois, no laudo, se for o caso. deixar bem claro que o importante é que o
Para a coleta de dados, contamos funda- clínico eleja uma linha de pensamento e, a
mentalmente com as informações da mãe, e partir dela, tente um entendimento da pro-
pode-se iniciar pela queixa, procurando-se ter blemática do paciente.

66 JUREMA ALCIDES CUNHA


O exame do estado mental
do paciente
Silvio A. Erné
7
O tema do exame do estado mental, em nos-
so meio, já é antigo, mas, lamentavelmen-
te, pouco divulgado, em conseqüência da avas-
tigo 5o, inciso V (Brasil, 1988), e também devi-
do às disposições do artigo 14 do Código de
Defesa do Consumidor (Brasil, 1997), o mais
saladora bibliografia estrangeira, principalmen- prudente é ter provas documentais, registros,
te norte-americana, cuja apresentação dispen- do real estado mental das pessoas que bus-
sa qualquer citação, devido à sua enorme di- cam nossos préstimos de profissionais. A área
vulgação e excelente qualidade técnica. Repro- de Saúde é, particularmente, visada, porque
duzi-la seria, portanto, reeditar ou profetizar lida com o maior patrimônio humano – a vida
o óbvio. alheia. Não há como reparar o dano produzi-
Qual é a importância que este tema tem do se este for letal, deformante ou prejudicial
para a atividade profissional? Varia de acordo de alguma forma. Não há como doar, alugar
com os objetivos e propósitos do exame que ou fazer empréstimo de condições ou dias de
será realizado. Assume grande importância o vida. Conseqüentemente, a responsabilidade
acurado exame do estado mental nos feitos é fundada em comportamentos omissivos ou
periciais judiciais e/ou administrativos, quan- comissivos, em que o ato de fazer, ou não fa-
do a formulação de um diagnóstico nosológi- zer, um exame acurado poderá ter conseqüên-
co deve ser provada, em meio às diversas con- cias inimagináveis para a vida econômica e a
testações, geralmente oriundas do conflito de imagem social do profissional liberal.
interesses entre os que buscam o sistema ad- Além desses aspectos legais, que passaram
versarial para defenderem o que julgam ser a vigorar mais intensamente, no Brasil, desde
seus inalienáveis e legítimos direitos. a Constituição Federal de 1988, o Código de
O assunto também assume importância re- Proteção do Consumidor de 1990 e a criação
levante nas decisões terapêuticas que se utili- do Sistema Nacional de Defesa do Consumi-
zam de psicofármacos, junto com outras abor- dor (Programa de Defesa do Consumidor –
dagens terapêuticas ou isoladamente, desde PROCON), há também uma cultura de acirrada
que o diagnóstico clínico nosológico seja con- disputa narcísica e de disputa pela sobrevivên-
siderado algo importante pelo examinador ou cia econômica como profissional liberal, na área
terapeuta. da Saúde, que nos leva a pensar no ditado de
Na atualidade, face às disposições previs- um renomado advogado norte-americano,
tas em nossa Constituição Federal, em seu ar- Sholem Aleichem, que diz: “Lawyers are just

PSICODIAGNÓSTICO – V 67
like physicians: what one says, the other con- A sensopercepção é a capacidade de cap-
tradicts”* (’Lectric Law Library, 2000). tar as sensações, através dos receptores sen-
Independentemente de qualquer dispositi- soriais, e transformá-las em imagens ou sen-
vo legal sobre a responsabilidade civil ou da sações no sistema nervoso central.
legislação referente a serviços prestados, pre- Os transtornos mais freqüentes são: as ilu-
valecerá, para alguns, o princípio de que é im- sões (do latim illusionem; engano) e as aluci-
possível cientificidade sem apreensão e fixação nações (do latim alucinare; etimologicamente,
de alguns conceitos que disciplinem e organi- privado da razão, enlouquecido).
zem as nossas observações. Para os que en- Fenomenologica e clinicamente, entende-
dossarem essa tese, o exame detalhado do es- se por ilusão a percepção deformada de um
tado mental do examinando, ou do paciente, objeto. As ilusões podem ser causadas pelos
será sempre importante, independentemente seguintes fatores:
dos riscos jurídicos. a) peculiaridades do sistema de refração:
No que diz respeito à ordenação metodo- por exemplo, aberrações cromáticas, deforma-
lógica do exame do estado mental, há um con- ções da imagem de objetos em decorrência do
senso de que as principais alterações envolvem meio em que se encontram (meio líquido, meio
sinais e/ou sintomas nas seguintes áreas da aéreo);
conduta humana: atenção, sensopercepção, b) limitações naturais dos órgãos do senti-
memória, orientação, consciência, pensamento, do: por exemplo, ilusões de ótica, como o pa-
linguagem, inteligência, afetividade e conduta. ralaxe binocular, ocorrendo também na simul-
A atenção é um processo psíquico que per- taneidade de sensações, notadamente se fo-
mite concentrar a atividade mental sobre um rem rítmicas e monótonas, na medida em que
fato determinado. No exame da atenção, é podem provocar um equívoco da síntese per-
importante considerar: a capacidade de con- ceptiva;
centração; quanto tempo é mantida a atenção c) alterações da consciência: por exemplo,
(persistência/fatigabilidade); em quantos obje- nos estados onde há uma turvação ou obnubi-
tos é capaz de estar focada simultaneamente lação da consciência; são as ilusões denomi-
(distribuição); quanto tempo demora para co- nadas metamorfósicas (macroscopia, micros-
meçar a efetiva atenção (excitabilidade). copia e porropsia);
São habitualmente deferidas como trans- d) falta de atenção: tanto nos casos de re-
tornos de atenção: a) aprosexia (ausência de laxamento normal da atenção, como nas ma-
atenção; p.ex., demências graves); b) hipopro- nifestações patológicas que ocorrem nos qua-
sexia (diminuição da atenção; p.ex., demência), dros maníacos ou em outros estados de agita-
c) hiperprosexia (atenção espontânea exage- ção;
rada; p.ex., mania), d) distraibilidade (atenção e) catatimias (denomina-se catatimia a in-
excitável, inconstante; p.ex., síndrome hiperci- fluência exercida pela afetividade, na percep-
nética). ção, na atenção, no julgamento e na memó-
A expressão distração pode ser utilizada em ria): no caso da afetividade manifestar a sua
sentidos opostos. Pode ser entendida como a influência sobre a percepção da realidade, por
impossibilidade de manter constante atenção, exemplo, quando o indivíduo está envolvido
mas também pode ser empregada para identi- em desejos intensos, como a paixão, ou está
ficar aquela situação onde o indivíduo está tão atemorizado, a percepção da realidade pode
concentrado que não se dá conta do que se resultar deformada, e tal deformidade se ma-
passa ao seu redor. Nesse caso, é habitual uti- nifestar por ilusões dos objetos que o cer-
lizar-se a expressão desatenção seletiva. cam; no caso da paixão, a deformação ocor-
re devido ao mecanismo denominado ideali-
zação;
*“Advogados são exatamente iguais aos médicos: o que
f) erros de julgamento: os erros de julga-
um diz, o outro contradiz.” mento auto ou heteroinduzidos, normais ou

68 JUREMA ALCIDES CUNHA


patológicos (delírios) mobilizam a sugestibili- As alterações da memória quanto à fixação
dade e podem resultar em ilusões perceptivas; e à evocação são: a) amnésia (abolição da me-
g) reconhecimento deficiente: um reconhe- mória); b) hipomnésia (enfraquecimento da
cimento equivocado de um objeto pode origi- memória); c) hipermnésia (exagero patológico
nar ilusões perceptivas. da evocação); d) dismnésia (designação geral
Já as alucinações são definidas, simplistica- das perturbações da fixação e/ou evocação).
mente, como a percepção sem objeto, poden- É freqüente o uso de expressões hipomné-
do ser produzidas em relação a qualquer qua- sia anterógrada, hipomnésia retrógrada e hi-
lidade sensorial. pomnésia retroanterógrada. Tais expressões
Utilizando-se como referência a qualidade dizem respeito ao déficit de memória para os
sensorial, podemos classificar as alucinações fatos ocorridos antes, depois ou antes e após
em visuais, auditivas, gustativas, olfativas, tá- o fator desencadeante do quadro.
teis, térmicas, cenestésicas (sensibilidade dos Amnésia lacunar ocorre nos estados crepus-
órgãos viscerais) e cinestésicas ou motoras (fal- culares epilépticos (amnésia lacunar anterógra-
sa percepção de movimentos). da).
Costuma-se também utilizar as expressões As amnésias lacunares histéricas, quando
alucinose e pseudoalucinações. A primeira é uti- ocorrem, são geralmente do tipo retrógrado e
lizada para caracterizar aqueles quadros em que são explicadas pela repressão.
há todas as características da imagem alucinató- As disfunções do reconhecimento mais ha-
ria, menos a convicção da realidade ou partici- bituais são as seguintes: a) agnosias (transtor-
pação da pessoa no processo. Tem sido empre- no do reconhecimento da imagem, sem que
gada, cada vez mais freqüentemente, para de- haja defeitos sensoriais e quando o objeto é
signar delirium alucinatório (causa orgânica). Nas familiar ao paciente); b) paramnésias (também
pseudoalucinações (alucinações psíquicas), falta denominadas de alucinações da memória, por-
também a grande convicção que caracteriza as que nestas se trata de imagens criadas pela
alucinações, mas não há uma patologia orgâni- fantasia e, equivocadamente, aceitas como re-
ca comprovada (p.ex., visão do duplo, a própria cordação de acontecimentos reais). Um exem-
imagem do corpo projetada no mundo exterior). plo comum de paramnésia são os fenômenos
A memória é a função psicológica que ga- de já visto (déjà vu) e nunca visto (jamais vu).
rante o elo temporal da vida psíquica, pois re- A orientação é uma das expressões da lu-
flete o passado no presente e permite a pers- cidez psíquica, que depende, fundamentalmen-
pectiva do futuro. te, da integridade do estado de consciência,
Costuma-se analisar a memória em três di- por meio da qual se identifica a capacidade de
mensões: a fixação, a evocação e o reconheci- consciência temporo-espacial.
mento. Examinam-se a orientação autopsíquica,
A fixação é a capacidade de gravar os da- que permite avaliar a completa identidade pes-
dos. A qualidade da fixação depende de uma soal e as relações com o grupo social, e a orien-
série de fatores, como interesse, atenção, com- tação alopsíquica, que se refere à avaliação da
preensão, conhecimento prévio, quantidade de consciência do lugar, do tempo e quanto à si-
informação (volume), via sensorial envolvida na tuação.
percepção, condições físicas e emocionais, se- Na patologia da orientação, geralmente se
melhança e diferença dos dados, número de fala em desorientação autopsíquica e/ou de-
repetições no tempo e tempo durante o qual sorientação alopsíquica.
se pretende fixar. Segundo a perturbação elementar, as de-
A evocação é a capacidade de atualizar os sorientações são classificadas, geralmente, em
dados já fixados. Esquecimento é a designa- seis tipos: a) apática (falta de interesse); b)
ção dada à impossibilidade de evocar. amnésica (alterações da memória); c) confusi-
O reconhecimento é a capacidade de recor- onal (turvação da consciência); d) delirante
dar uma imagem (engrama). (ajuizamento patológico da realidade); e) his-

PSICODIAGNÓSTICO – V 69
triônica (desorientação temporo-espacial limi- dade. Constituem o segundo nível de comple-
tada); f) oligofrênica (dificuldade de aprender xidade de estruturação qualitativa do pensa-
ou entender). mento. Já por raciocínio, entende-se a capaci-
Quanto à consciência, o termo significa a dade de concluir, podendo ser indutivo (do
capacidade de o indivíduo se dar conta do que particular para o geral), dedutivo (do geral para
está ocorrendo dentro e ao redor de si, ao al- o particular) e analógico (do conhecimento
cance de seu sensório. É apenas neste sentido particular para o particular).
de consciência-vigilância de processo psíquico No exame do pensamento, cabe analisar as
integrador dos demais que essa função do ego denominadas operações racionais: a) análise e
é valorizada clinicamente. Não se refere, por- síntese; b) generalização e sistematização; c)
tanto, a valores éticos, como, por exemplo, a abstração e concreção; d) comparação.
chamada consciência moral, nem tampouco à Nas denominadas manifestações quantita-
capacidade da pessoa saber o porquê das coi- tivas do pensamento, avaliam-se a velocidade
sas. de associação das idéias ou o fluxo de idéias.
O estado de consciência, em conjunto, é De um modo geral, a análise do pensamen-
suscetível de alterar-se de várias maneiras, to clinicamente é feita sob três aspectos: pro-
quanto à sua continuidade, amplitude e clari- dução, curso e conteúdo.
dade. Os mais freqüentes são os estados de As principais patologias do pensamento,
obnubilação (ou turvação), os estados de coma, são, habitualmente, agrupadas em distúrbios
os estados de estreitamento da consciência (ca- da produção do pensamento, curso do pensa-
sos de epilépticos) e os estados de dissociação mento e conteúdo do pensamento.
da consciência (casos de histeria). Quanto à produção, costuma-se distinguir
O pensamento traduz a aptidão do indiví- pensamento mágico e pensamento lógico. O
duo para elaborar conceitos, articular esses primeiro é assim denominado por apresentar,
conceitos em juízos e, com base nisso, cons- na sua contextura, a predominância das idéias
truir raciocínios, de modo a solucionar com próprias do primitivo, do selvagem ou das
algum êxito os problemas com que se depara. crianças no nosso mundo civilizado, as quais,
São características gerais do pensamento: a) de um modo geral, possuem uma mentalida-
as capacidades de generalização; b) a capaci- de pré-lógica, o que não quer dizer ilógico ou
dade de identificar e distinguir nos fenômenos antilógico.
e objetos da natureza o que é o essencial e o No curso do pensamento, observa-se, na
que é o acessório; c) a capacidade de utilizar o prática clínica, que ele se apresenta isolada-
cabedal de conhecimentos acumulado para mente, isto é, sem as alterações concomitan-
elaborar conceitos e fazer raciocínios. tes de todo o pensamento. São exemplos prin-
As denominadas manifestações qualitativas cipais de tais alterações: a) fuga de idéias (ace-
do pensamento incluem os conceitos, os juí- leração do pensamento com exuberância e in-
zos e os raciocínios. Por conceitos entendemos continência verbal), comum nos quadros ma-
a aptidão de relacionar a palavra com o seu níacos; b) inibição do pensamento, que é opos-
significado e a aptidão de relacionar entre si to do anterior, podendo atingir proporções de
os significados das palavras. Constituem o ní- um verdadeiro mutismo, sendo uma anorma-
vel mais elementar das unidades estruturais do lidade comum nos quadros depressivos; c) per-
pensamento. Os juízos representam a possibi- severação/verbigeração, ou seja, aderência in-
lidade de relacionar conceitos entre si. Através voluntária, passiva, automática e obstinada do
do juízo, afirma-se ou se nega algum atributo pensamento a determinados temas, locução,
ou qualidade a um objeto ou fenômeno. Os frases, palavras pronunciadas inúmeras vezes,
interesses, desejos, sentimentos e necessida- sem qualquer propósito identificável com a
des de uma pessoa influem, marcadamente, realidade; d) desagregação, ou perda da capa-
sobre o seu julgamento, se ela não estiver aten- cidade de estabelecer relações conceituais; e)
ta para isso e treinada para manter a neutrali- bloqueio/interceptação ou detenção, em que

70 JUREMA ALCIDES CUNHA


o pensamento é momentaneamente bloquea- Na linguagem, estão contidos dois aspec-
do, de forma abrupta, em seu curso. tos importantes: um, individual, a fala, e o
No exame do conteúdo do pensamento, outro, social, a linguagem ou idioma.
encontra-se, historicamente, o maior acervo de No idioma, são destacados três componen-
estudos sobre essa função psíquica, sendo os tes distintos, em constante evolução: a) a fo-
principais transtornos nessa área os delírios, nética (refere-se aos sons utilizados); b) a sin-
as idéias supervalorizadas e o delirium. taxe (refere-se à articulação lógica entre as
Os delírios (do latim de, fora, e liros, sulco; palavras); c) a semântica (refere-se à mudança
sair da trilha arada, desviar o arado do sulco) do significado das palavras).
podem ser classificados de diversas maneiras: Ninguém sabe exatamente quando as es-
a) conforme a sua temática (de desconfiança, pécies humanas murmuraram as primeiras pa-
de perseguição, de influência, de prejuízo, de lavras. Arqueólogos sugerem que a humani-
referência, de autopreferência, de ciúme, de dade adquiriu a linguagem há 500.000 anos e
grandeza, de descendência ou de linhagem ilus- que a fala tenha cerca de 2.000.000 de anos.
tre [genealógico], de invenção, de transforma- Diz-se que a linguagem é música tocada na
ção cósmica, de prestígio, de missão divina, de flauta da voz humana. Esta escala musical é
reforma social, de possessão diabólica ou divi- composta de mais de 200 sons vocais e cerca
na, de natureza hipocondríaca, de negação e de 600 consoantes possíveis (Hotz, 2000).
transformação, de culpa, de auto-acusação, de Primeiro, devem ter surgido as formas não-
ruína e vários outros, de acordo com a plastici- verbais de expressão e, após, a linguagem fa-
dade da trama delirante); b) conforme o grau lada. Logo depois, veio a necessidade social de
de elaboração (sistematizados e não-sistema- criar o registro gráfico da linguagem. A escrita
tizados); c) conforme o curso evolutivo (agu- surgiu como resposta a essa necessidade, pois
dos e crônicos). a transmissão do conhecimento só pela tradi-
As idéias supervalorizadas são aquelas si- ção oral era algo extremamente limitado.
tuações em que a alteração afetiva do pacien- A primeira forma escrita foi ideográfica,
te causa uma perturbação da capacidade de após sobreveio a escrita fonética. Ler é a capa-
ajuizar, sem a gravidade e a convicção dos de- cidade de atribuir significado a símbolos dese-
lírios. A esta tendência, determinada mais por nhados sobre uma superfície.
fatores afetivos do que por fatores lógicos, Em média, as pessoas conseguem produzir
denomina-se clinicamente de inclinação das 150 palavras por minuto. Cada palavra é esco-
idéias, e, quando tal idéia absorve a perso- lhida em milissegundos entre 50.000 possibili-
nalidade do indivíduo e passa a determinar dades diferentes, organizadas num sofistica-
sua conduta, temos o que se denomina de do manual, onde se entrelaçam fonética, sin-
idéia sobrevalorizada ou juízo desviado. taxe e semântica, obedecendo as diversas leis
Quando tais manifestações se tornam irre- gramaticais de cada idioma.
dutíveis, quando o indivíduo perde a capaci- Os principais quadros patológicos da lingua-
dade de estabelecer o confronto entre o ob- gem falada de causa orgânica são:
jetivo e o subjetivo, então já se fala em juí- a) disartria, ou dificuldade de articular pa-
zos delirantes. lavras; em grau extremo, é anartria;
Quanto ao delirium, emprega-se esta for- b) disfasia, ou dificuldade ou perda da ca-
ma latina para caracterizar uma alteração da pacidade de compreender o significado das
consciência-vigilância de natureza orgânica, palavras e/ou a incapacidade de se utilizar dos
com a presença de delírios, por exemplo, deli- símbolos verbais; em grau extremo, é afasia.
rium tremens, delirium febril. Existem três tipos básicos de afasias: 1) afasia
A linguagem falada é o meio de comuni- de Wernicke (afasia nominal), que é a afasia
cação verbal entre as pessoas. A palavra é o essencialmente de compreensão, resultante da
envoltório material do pensamento e manifes- incapacidade de entender os símbolos verbais,
ta a dimensão perceptível das idéias. falados ou escritos. O paciente pode articular

PSICODIAGNÓSTICO – V 71
e emitir as palavras, mas a fala resulta total- tuações, mediante o consciente emprego de
mente incompreensível; 2) afasia de Broca (afa- meios ideativos (Melo, 1979).
sia mista), quando todas as modalidades de Depreende-se que a inteligência não é so-
linguagem estão afetadas; 3) afasia motora mente a posse de numerosos processos ide-
pura, em que o paciente pode entender o que ativos, mas também a capacidade de aplicá-
lhe é dito, pode ler e escrever, só não pode los. Assim, portanto, resulta que um indiví-
falar; duo inteligente não é só o que pensa muito,
c) disfonia, defeito da fala que resulta em mas, também, em determinadas circunstân-
alteração da sonoridade das palavras, de cau- cias, aquele que pensa pouco. A exigência
sa periférica (traquéia, aparelho respiratório) e fundamental para a caracterização da inteli-
não central (sistema nervoso central, como as gência é sempre de ordem econômica, pois
disfasias e as disartrias); o que se espera da pessoa inteligente é ob-
d) dislalia, quando a linguagem resulta de- ter o máximo de efeito com o menor dispên-
feituosa, sem que haja lesão central. dio possível. Dessa maneira, não adianta ape-
Os principais quadros patológicos da lingua- nas sermos eficientes (dedicados), pois de-
gem falada de causa predominantemente psí- vemos também ser eficazes na execução do
quica são: a) mutismo; b) logorréia: fluxo in- que fazemos.
cessante, com comprometimento da coesão Diz-se que um indivíduo será tanto mais
lógica; o estado mais grave é a chamada fuga inteligente: 1) quanto melhor, mais rápido e
de idéias, e ocorre porque a velocidade do flu- mais facilmente compreenda; 2) quanto maior,
xo do pensamento ultrapassa as possibilida- mais extenso e variado for o número de enla-
des de expressão das idéias); c) jargonofasia: ces e associações que estabeleça entre os da-
as palavras são pronunciadas corretamente, dos da compreensão; 3) quanto mais pronta e
mas não combinam de forma lógica (“salada espontaneamente elabore novas e originais
de palavras”); d) parafrasia: quando são inse- idéias que ampliem e enriqueçam o seu patri-
ridas, numa frase corretamente construída, mônio representativo e ideativo; 4) quanto
uma ou várias palavras, sem o mínimo signifi- melhor saiba ajuizar com segurança e racioci-
cado com as demais; e) neologismo: formação nar com lógica; 5) quanto melhor se adapte às
de uma palavra nova, que passa a ser utilizada exigências das situações vitais.
em lugar de outra, e cujo significado somente As patologias mais freqüentes são os esta-
o paciente sabe qual é; f) coprolalia: uso habi- dos deficitários, congênitos ou adquiridos da
tual e incontrolável de linguagem obscena e atividade intelectual. A exploração da capaci-
grosseira, fora do contexto adequado, deven- dade intelectual e os métodos utilizados para
do ser analisados a intencionalidade e o auto- aferição da inteligência são feitos, basicamen-
matismo do ato; g) verbigeração ou estereoti- te, por testes psicológicos específicos.
pia verbal: repetição de sílabas, vocábulos, A afetividade revela a sensibilidade inter-
palavras e até frases inteiras de forma incon- na da pessoa frente à satisfação ou à frustra-
trolável e monótona; h) pararrespostas: quan- ção de suas necessidades. A necessidade, por-
do a resposta dada a uma pergunta não guar- tanto, é o ponto de partida da afetividade. A
da a mínima relação com o que foi perguntado. necessidade, por sua vez, é definida fenome-
A inteligência, a bem dizer, não constitui nologicamente como a tendência natural que
uma função, faculdade ou função psíquica, a impulsiona o indivíduo a praticar um ato ou a
priori. Tal designação é a resultante funcional buscar uma categoria determinada de objetos.
das diversas funções que integram os proces- Em princípio, considera-se que toda ação de
sos do psiquismo humano. um indivíduo é determinada pelas suas neces-
Inteligência, assim como personalidade, é sidades conscientes e inconscientes. As neces-
uma grande síntese de nosso psiquismo. sidades, também denominadas de impulsos,
Há uma definição clássica de inteligência, manifestam-se como desejos conscientes ou
que é a capacidade de adaptar-se a novas si- como tendências inconscientes.

72 JUREMA ALCIDES CUNHA


As necessidades (impulsos) são considera- Há uma vivência de perigo iminente, porém,
das como primárias quando se referem às mo- de origem indeterminada, e um sentimento de
tivações naturais, herdadas e incondicionadas. insegurança, de impotência diante do iminen-
São também denominadas de biológicas, or- te perigo, que pode chegar à vivência de ani-
gânicas ou primárias. Estão ligadas às satisfa- quilamento e gerar o pânico; b) angústia: quan-
ções das necessidades fisiológicas. Podem ser do as manifestações psíquicas da ansiedade se
exemplificadas pelas necessidades de alimen- acompanham de sintomas físicos do tipo neu-
to, água, oxigênio e satisfação sexual. As ne- rovegetativo (sudorese, hiper ou hipossaliva-
cessidades (impulsos) consideradas como se- ção, taquicardia, hipo ou hipertensão arterial,
cundárias (ou superiores) são determinadas dores angustiantes, etc.); c) apatia: indiferen-
pela prática histórico-social e assimiladas pelo ça afetiva; d) fobias: medo patológico, com
indivíduo no curso de sua vida como um pro- objeto específico e definido conscientemente.
cesso de aprendizado. Originam-se do traba- Distingue-se da ansiedade pela especificidade
lho do homem e do convívio familiar e social. do objeto amedrontador. Na fobia, a pessoa
São exemplos as necessidades de natureza es- tem algo específico, faz crítica da inadequa-
tética, ética e moral. ção de seu comportamento e reações, mas não
Os fenômenos afetivos mais elementares pode inibir, podendo, inclusive, chegar ao pâ-
são as emoções e os sentimentos. Emoção é a nico; e) ambivalência afetiva: foi um termo cria-
resposta afetiva resultante da satisfação ou do por Eugen Bleuler para designar a existên-
frustração das necessidades primárias (bioló- cia simultânea de sentimentos opostos em re-
gicas ou orgânicas). Sentimentos são vivências lação ao mesmo objeto; f) labilidade afetiva:
relacionadas com a satisfação ou frustração das mudança rápida e imotivada das emoções e
necessidades superiores. Fala-se em afeto para dos sentimentos.
tipificar uma explosão incontida de emoções Há várias formas de conceituar a conduta.
ou sentimentos, como medo, ira, alegria, an- Uma delas, de utilidade prática, é a que se re-
gústia, paixão. Tais manifestações psíquicas são fere à conduta como o padrão habitual de con-
normais, desde que a pessoa que as experimen- duta num determinado contexto.
te mantenha a lucidez de consciência, o con- Alguns autores classificam os transtornos
trole de sua conduta e que a intensidade e a da conduta em:
duração da resposta afetiva se situe nos limi- a) Alterações patológicas das pulsões (ten-
tes da normalidade determinada pela contex- dências) instintivas, divididas, por sua vez, em:
tura conjuntural. 1) perturbações das pulsões (tendências)
As alterações patológicas mais freqüentes naturais de conservação da vida (condutas sui-
do humor são: a) distimia: alteração do humor, cidas, automutilações, auto-agressões);
tanto no sentido da exaltação como na inibi- 2) perturbações da tendência natural do
ção. Existem vários graus, os mais comuns são: sono (insônia, hipersonia, cataplexia);
a distimia depressiva (hipotímica ou melancó- 3) perturbações da tendência de alimenta-
lica) e a distimia hipertímica (expansiva ou eu- ção (anorexia, bulimia, polidipsia, dipsomania,
fórica); b) disforia: tonalidade do humor amar- coprofagia, mericismo, pica);
go, “mau humor” (irritabilidade, desgosto e 4) perturbações da tendência de expansão
agressividade); c) hipotimia/hipertimia: triste- motora (impulso natural de poder, impulso
za patológica e alegria patológica (imotivada agressivo). Particular destaque é dado às ma-
ou inadequada). nifestações patológicas que se caracterizam
As alterações mais freqüentes das emoções pelo exagero do impulso agressivo. A palavra
e dos sentimentos são: a) ansiedade: é a ten- agressividade (do latim aggredi, aggredior) sig-
são expectante, que varia da apreensão até a nifica avançar decididamente, tomar a iniciati-
extrema aflição, relacionada com a sensação va de mover-se ativamente para um determi-
subjetiva de que algo vai acontecer, sendo este nado objetivo, partir para a ação com a dispo-
algo geralmente uma situação ou fato ruim. sição de enfrentar os obstáculos em seu cami-

PSICODIAGNÓSTICO – V 73
nho. Este significado de força e de afirmação episódios de agitação psicomotora em pacien-
pessoal, de poder pessoal, não tinha um signi- tes oligofrênicos, portadores de quadros de-
ficado de violência, de hostilidade, de agres- menciais e portadores de afecções do lobo fron-
são física ou moral. Na língua inglesa, aggres- tal e temporal;
siveness significa afrontar, combater as dificul- 5) perturbações da tendência sexual (impo-
dades, enquanto aggressivity é utilizada para tência, frigidez, ejaculação precoce, sadoma-
caracterizar agressão despropositada. Existem soquismo, promiscuidade);
modelos etiológicos, psicológicos e sociológi- 6) perturbações da higiene corporal (incon-
cos para analisar o tema da agressividade. As tinência fecal e/ou urinária; gatismo).
alterações mais freqüentes da agressividade b) Alterações patológicas das necessidades
são a crueldade (infligir sofrimento ou se tor- humanas ditas superiores (não-primárias), por
nar indiferente diante do sofrimento alheio) e exemplo, avareza, prodigalidade, cleptomania,
a agressividade disfarçada auto ou heterodiri- hedonismo, colecionismo patológico, imedia-
gida (geralmente, sob a forma de sintomas tismo sociopático, egoísmo, narcisismo.
psicossomáticos). Uma forma particular de Finalmente, é necessário lembrar que nem
agressividade são as manifestações coléricas de todo exame psiquiátrico será, necessariamen-
pacientes epilépticos (furor epiléptico), as ma- te, tão detalhado. Por esse motivo é que exis-
nifestações de pacientes catatônicos (furor ca- tem os chamados exames simplificados, sen-
tatônico) e as manifestações coléricas de pa- do um deles o Mini-Exame do Estado Mental,
cientes maníacos (furor maníaco). Também são proposto por Folstein e colegas, em 1975 (Mac-
freqüentes esses estados de furor associados a Kinnon & Yudofsky, 1988a). (Vide Anexo A.)

74 JUREMA ALCIDES CUNHA


MÓDULO IV – Estratégias Específicas em Entrevista

A entrevista estruturada
para o DSM-IV
Marcelo Tavares
8
A entrevista é o instrumento mais poderoso
do psicólogo – o mais indispensável de to-
dos que possam ser colocados a seu alcance. Esse
uma técnica de entrevista semi-estruturada,
utilizada para a avaliação sistemática dos prin-
cipais transtornos mentais, segundo os crité-
lugar privilegiado da entrevista clínica nem sem- rios da quarta e última edição do Manual Diag-
pre tem recebido a devida consideração. As téc- nóstico e Estatístico de Transtornos Mentais –
nicas de entrevista favorecem a manifestação das DSM-IV (APA, 1995). As diferentes modalida-
particularidades do sujeito. Com isso, permitem des de estruturação das entrevistas foram dis-
ao profissional acesso amplo e profundo ao ou- cutidas, em detalhe, no Capítulo 5 (Tavares,
tro, a seu modo de se estruturar e de se relacio- 2000a). A SCID tem demonstrado seu valor em
nar, mais do que qualquer outro método de co- psiquiatria, em saúde mental, em psicologia
leta de informações. Por exemplo, a entrevista é clínica, em psicologia forense e em psicologia
a técnica de avaliação que pode mais facilmente hospitalar. Além de sua utilidade nesses set-
se adaptar às variações individuais e de contex- tings, ela tem sido empregada como instrumen-
to, para atender às necessidades colocadas por to de ensino e de coleta de dados de pesquisa
uma grande diversidade de situações clínicas e nessas áreas.
para tornar explícitas particularidades que esca-
pam a outros procedimentos. Por meio dela,
podem-se testar limites, confrontar, contrapor e CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
buscar esclarecimentos, exemplos e contextos
para as respostas do sujeito. Esta adaptabilidade As técnicas de semi-estruturação de entrevis-
coloca a entrevista clínica em um lugar de desta- tas são relativamente novas no Brasil. Por esse
que inigualável entre as técnicas de avaliação. motivo, alguns profissionais estão pouco ha-
Neste capítulo, vamos abordar a Entrevista bituados às discussões sobre o tema da estru-
Clínica Estruturada para o DSM-IV, ou SCID*, turação. Várias técnicas semi-estruturadas, no
entanto, têm sido desenvolvidas: a Schedule
*A tradução adotada para Structural Clinical Interview for
for Affective Disorders and Schizophrenia
the DSM-IV será Entrevista Clínica Estruturada para o DSM- (SADS) (Endicott & Spitzer, 1978), a Positive and
IV, por extenso, porém, ela será referida no texto pela si- Negative Symptoms for Schizophrenia (PANSS)
gla SCID (pronuncia-se SKID), como ela é internacional- (Kay, Fiszbein & Opler, 1987), a Present State
mente conhecida. O projeto de adaptação para o Brasil, Examination (PSE; Wing, Birley, Cooper et alii,
coordenado pelo autor, teve apoio do CNPq e da FAP-DF.

PSICODIAGNÓSTICO – V 75
1967), a Renard Diagnostic Interview (RDI) ração entre quadros psicopatológicos, sinto-
(Helzer, Robins, Croughan et alii, 1981) e a Diag- mas, estrutura, dinâmica e modos de relacio-
nostic Interview Schedule (DIS) (Robins, Helzer, nar-se, de maneira que sua compreensão dos
Croughan et alii, 1981). O único caso brasilei- casos ganha em complexidade. Portanto, de-
ro de uma entrevista clínica semi-estruturada senvolver uma capacidade de reconhecimento
é a Entrevista Diagnóstica Adaptativa Operaci- dos sintomas e de sua organização contribui
onalizada (EDAO), de Ryad Simon (1989, 1993), não somente para a capacidade de estabele-
uma entrevista de avaliação de fundamenta- cer um diagnóstico, mas para a compreensão
ção psicodinâmica. Tendo em vista o ensino e mais profunda e sofisticada de seus pacientes.
a pesquisa, apenas recentemente desenvolve- Outras vantagens mais pontuais derivadas
mos uma entrevista clínica semi-estruturada da existência de instrumentos padronizados no
para a avaliação da história e do risco de ten- diagnóstico das psicopatologias devem ser
tativa de suicídio, com ênfase nos aspectos observadas. Eles têm sido fundamentais para:
mórbidos e psicodinâmicos associados (Tava- 1) aumentar a validade dos diagnósticos atri-
res, 1999). buídos a pacientes com transtornos mentais;
As técnicas de semi-estruturação visam a 2) permitir maior adequação do planejamento
ajudar, e não a substituir, o profissional treina- do tratamento ao quadro clínico apresentado;
do; visam a ampliar, e não a subjugar a intui- 3) aumentar a consistência entre as formula-
ção ou o julgamento clínicos temperados por ções diagnósticas de profissionais de orienta-
anos de experiência. O clínico treinado saberá ções e formações diversas; 4) aumentar a efi-
reconhecer, por exemplo, um momento de fra- cácia do tratamento a partir da maior validade
gilidade ou uma emoção emergente e poderá do diagnóstico e da maior homogeneidade de
adaptar seu comportamento para poder aten- compreensão do quadro clínico pelos membros
der empaticamente uma necessidade do sujei- das equipes de saúde mental; 5) melhorar a
to, durante a entrevista. Todas as competên- qualidade das pesquisas que requerem uma
cias clínicas importantes, aliás, discutidas no maior precisão de classificação diagnóstica
Capítulo 5 (Tavares, 2000a), são essenciais para (como em psicologia clínica e forense, psiquia-
a condução de uma entrevista semi-estrutura- tria, epidemiologia, intervenção em crise, etc.);
da, como, por exemplo, a atenção à natureza 6) permitir a existência de um registro diag-
relacional da atividade, a capacidade de lidar nóstico permanente e a criação de bancos de
com a transferência e com outras formas de dados para uso administrativo e de pesquisa.
resistência, etc. A padronização da técnica não Em geral, observamos que a capacidade de
significa que ela seja destinada a uma aplica- avaliar um quadro sintomático e estabelecer
ção mecânica. Em todos os sentidos, é neces- um diagnóstico diferencial dá maior seguran-
sário conhecimento e experiência clínica para ça ao profissional para trabalhar com o pa-
fazer o melhor uso dela. Por outro lado, o clí- ciente.
nico que decidir utilizá-la, ou ter sua prática
influenciada pela sua forma de estruturação,
perceberá os benefícios que a técnica irá tra- ANTECEDENTES HISTÓRICOS E O
zer para sua capacidade diagnóstica, principal- DESENVOLVIMENTO DA SCID
mente no diagnóstico diferencial.
Tem-se argumentado que a avaliação no- Talvez o fato singular mais importante que fa-
sológica contrapõe-se a uma compreensão re- voreceu o desenvolvimento da área de psico-
lacional, psicodinâmica e estrutural da perso- diagnóstico em saúde mental tenha sido a fi-
nalidade do sujeito. Não há antagonismo im- losofia de classificação dos transtornos men-
plícito nessas abordagens, tema que é discuti- tais do DSM-III. Este manual diagnóstico foi o
do em detalhe no Capítulo 5 (Tavares, 2000a). resultado do esforço de centenas de pesquisa-
À medida que se desenvolve em experiência, o dores e profissionais de psiquiatria, psicologia,
profissional se torna capaz de perceber a inte- assistência social e enfermagem, na constru-

76 JUREMA ALCIDES CUNHA


ção de um sistema de critérios diagnósticos bilidade, mesmo para profissionais familiariza-
específicos para virtualmente todos os trans- dos com um sistema diagnóstico como o DSM.
tornos mentais. A maior contribuição desse sis- Atualmente, existe considerável literatura
tema foi a utilização de uma linguagem des- apontando para a importância clínica da es-
critiva na formulação dos critérios diagnósti- truturação dos procedimentos. Por exemplo,
cos e dos agrupamentos de transtornos men- Kiernan e colegas (1976) observaram muitas
tais por classe (APA, 1980, 1987). Devido a essa falhas na coleta de informação, em hospitais
linguagem fenomenológica, que procurava psiquiátricos. Weitzel e colegas (1973) solici-
estar isenta de vieses teóricos, o DSM-III ga- taram a psiquiatras que avaliassem o estado
nhou popularidade rapidamente. Maser e co- mental de pacientes em entrevistas de acolhi-
legas (1991), em uma pesquisa internacional, mento, tendo verificado que, em apenas oito
investigando as atitudes de profissionais de por cento das entrevistas, os psiquiatras con-
saúde mental fora dos Estados Unidos, chega- sideraram os 15 itens fundamentais na avalia-
ram à conclusão que “o DSM-III e o DSM-III-R ção do estado mental (p.ex., ideação suicida
são mais amplamente utilizados no mundo do ou alucinação). Quando uma lista objetiva foi
que a Classificação Internacional das Doenças utilizada, todos os 15 itens foram considera-
no ensino, pesquisa e prática clínica” (p.271). dos para todas as entrevistas. Climent e cole-
Ao se tornar o padrão utilizado por profis- gas (1975) constataram que a incidência de
sionais de diversas orientações e inclinações, o sintomas psiquiátricos relevantes é mais facil-
DSM-III constituiu-se no principal instrumento mente detectada quando se utiliza uma lista
para aumentar a precisão diagnóstica, favore- estruturada, por exemplo, três vezes mais para
cer a comunicação clínica entre profissionais e ideação suicida e dez vezes mais para delírios
facilitar a generabilidade e comparabilidade en- de controle.
tre conclusões diagnósticas. A edição atual para Apesar das entrevistas estruturadas dispo-
classificação dos transtornos mentais, o DSM- níveis antes da publicação do DSM-III repre-
IV, mantém essa mesma característica descriti- sentarem um avanço, elas ainda apresentavam
va. Além disso, é o resultado de mais de 15 uma série de problemas metodológicos e/ou
anos de testes com esse sistema diagnóstico técnicos, que eram, em geral, resultado de se-
por milhares de profissionais de saúde mental, rem baseadas em sistemas classificatórios he-
tendo corrigido, durante esses anos, erros e terogêneos e/ou de possuírem critérios pouco
imprecisões de suas edições anteriores (APA, precisos. O National Institute of Mental Health
1995). (NIMH, Washington), reconhecendo a necessi-
A linguagem descritiva, fenomenológica, dade da padronização de um procedimento
adotada a partir do DSM-III, favoreceu a estru- diagnóstico clínico de acordo com critérios
turação do julgamento clínico e a sua conse- homogêneos, requisitou propostas para o de-
qüente sistematização. As entrevistas clínicas senvolvimento de uma entrevista estrutu-
estruturadas têm desempenhado um papel cru- rada fundamentada no DSM-III.
cial para o desenvolvimento da qualidade das Robert L. Spitzer, editor do DSM-III (APA,
pesquisas e dos serviços psiquiátricos e psico- 1980) e do DSM-III-R (APA, 1987), vinha coor-
lógicos, por várias décadas, na América do denando um projeto-piloto para desenvolver
Norte e na Europa (Spitzer, Williams, Gibbon uma entrevista vinculada ao DSM-III, na tenta-
et alii, 1992). Notadamente, são reconhecidas tiva de superar as falhas constatadas em ins-
por aumentar ainda mais a confiabilidade e trumentos anteriores para o diagnóstico clíni-
homogeneidade dos psicodiagnósticos dados co (Spitzer, 1984). Ele, juntamente com outros
por psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais três membros da equipe do DSM-III e DSM-III-
e outros profissionais de saúde mental, apesar R, Janet Williams, Miriam Gibbon e Michael
das diferenças, entre esses profissionais, do tipo First, obtiveram financiamento para prosseguir
de formação e da variedade de orientação te- com o desenvolvimento da SCID, entre 1983 e
órica (Greist, 1990). Observa-se maior confia- 1985. Entre 1985 e 1987, receberam financia-

PSICODIAGNÓSTICO – V 77
mento para avaliar a fidedignidade da SCID critérios contidos nessa última classificação.
para vários grupos clínicos e não-clínicos (Spit- Michael First, editor do DSM-IV, e Miriam Gib-
zer, Williams, Gibbon et alii, 1992; Williams, bon, ambos co-autores da SCID, desenvolve-
Gibbon, First et alii, 1992). Durante esse perío- ram essa última versão da SCID, que está atual-
do, o DSM-III-R estava em elaboração, e seus mente passando por uma nova seqüência de
critérios foram incluídos nessa versão da SCID. testes de fidedignidade e validade, com estu-
Desde então, baseando-se na experiência cres- dos multicêntricos nos Estados Unidos. Essa
cente com sua aplicação, a Entrevista Clínica versão modificada é a que foi utilizada para
Estruturada tem sido periodicamente revisada adaptação e padronização no Brasil (Tavares,
para incluir novos desenvolvimentos. Sua lin- 1997). Considerando o atual estado da área
guagem tem sido refinada, diminuindo as am- de saúde mental no Brasil, pode-se prever o
bigüidades nas instruções ao entrevistador e impacto que essa entrevista terá na pesquisa,
tornando suas questões mais acessíveis ao en- no ensino e na prática clínica.
trevistado. Por conseqüência, seus critérios têm
sido mais consistentemente empregados, na
clínica e na pesquisa. A utilização ampla e fre- A SCID, SUA ESTRUTURA E APLICAÇÃO
qüente da SCID, em meios clínicos e acadêmi-
cos, tem feito dela um dos instrumentos mais A SCID existe sob várias formas. A sua versão
importantes para a avaliação e a classificação mais freqüentemente utilizada é a SCID-P, ade-
dos transtornos mentais de acordo com os cri- quada para pacientes com transtornos men-
térios do DSM-III-R. tais do eixo I (DSM-IV). A SCID-B/C é uma va-
A Entrevista Clínica Estruturada para o DSM- riação da SCID-P para ser utilizada em situa-
IV (SCID) é, hoje, o instrumento mais atual e ções nas quais a probabilidade da existência
abrangente para o diagnóstico dos transtor- de um quadro psicótico é mínima. É útil em
nos mentais. Existe considerável literatura situações ou settings nos quais esses quadros
apontando a sua importância clínica para exa- raramente são observados ou esperados. A
mes clínicos na avaliação. Spitzer e colegas SCID-NP foi adaptada para entrevistar sujeitos
(1992) e Williams e colegas (1992) relatam normais, ou para os quais não se presume uma
dados de fidedignidade teste-reteste para a condição psicopatológica, como acontece em
SCID (versão para o DSM-III-R), variando de alguns tipos de pesquisa. Existe ainda uma ver-
razoáveis a muito bons. No primeiro desses são para o diagnóstico dos transtornos da per-
estudos, um teste de fidedignidade em seis sonalidade (Eixo II, DSM-IV), a SCID-II. Este texto
instituições diferentes, com a participação de irá abordar a SCID para o eixo I (SCID-P), mas
592 sujeitos, os índices de fidedignidade (ka- um entrevistador familiarizado com o seu
ppa de Cohen, avaliando consistência entre modo de funcionar não terá dificuldades para
entrevistadores) foram superiores a 0,60 para se adaptar às outras versões. Um entrevista-
diagnóstico atual e anterior. No segundo estu- dor treinado, utilizando a versão não modifi-
do, 13 instituições internacionais colaboraram cada da SCID (SCID-P), leva em torno de uma
com um total de 72 pacientes, em uma pes- hora e meia para completar a entrevista e apre-
quisa avaliando transtorno do pânico. Esses sentar um diagnóstico. A SCID-B/C e a SCID-NP
autores encontraram um excelente índice glo- tendem a levar menos tempo de aplicação, pois
bal de 0,87. Considerando os subtipos de pâ- são geralmente aplicadas a pessoas com qua-
nico, os índices de concordância foram de 0,73 dros e histórias psicopatológicos menos com-
para pânico sem complicação, de 0,61 para plexos e extensos.
pânico com evitação fóbica limitada e de 0,66 Todas as versões da SCID são compostas de
para agorafobia com ataques de pânico. uma série de módulos. Cada módulo se desti-
Com a publicação do DSM-IV (APA, 1995), na à avaliação de conjuntos de categorias diag-
tornaram-se necessárias a reformulação e a nósticas agrupadas nos mesmos padrões do
adaptação da SCID, para adequá-la aos novos DSM-IV. A relação completa dos módulos e

78 JUREMA ALCIDES CUNHA


transtornos específicos diagnosticáveis pela exemplo, quando se deseja somente avaliar a
SCID encontra-se no Quadro 8.1. Essa estrutu- presença ou ausência de transtornos específi-
ra modular da SCID permite uma fácil adapta- cos, o clínico pode utilizar a SCID parcialmen-
ção para uma série de situações e settings. Por te, selecionando apenas aqueles módulos de
interesse. Essa situação é também freqüente-
QUADRO 8.1 Transtornos específicos mente encontrada em pesquisas ou em am-
diagnosticáveis pela SCID bientes clínicos especializados. Portanto, essa
Transtornos psicóticos: característica modular permite adaptabilidade
Esquizofrenia a situações e contextos específicos.
Transtorno esquizofreniforme Outro aspecto importante é que os módu-
Transtorno esquizoafetivo los estão organizados hierarquicamente, se-
Transtorno delirante
gundo uma ordem lógica que procura acom-
Transtorno psicótico breve
Transtorno psicótico SOE* panhar uma seqüência naturalmente encontra-
Transtornos do humor: da em uma entrevista diagnóstica bem condu-
Transtorno bipolar I e II zida. Essa seqüência lógica, chamada algorit-
Outros transtornos bipolares (inclui transtorno bi- mo, representa o raciocínio clínico completo,
polar SOE e ciclotimia)
considerando as alternativas que possam (ou
Transtorno depressivo maior
Distimia (dois últimos anos) devam) ser antecipadas. A Figura 8.1 mostra
Outros transtornos depressivos (inclui transtorno um exemplo de algoritmo, que, juntamente
depressivo SOE, transtorno depressivo sobre- com os critérios diagnósticos (Quadros 8.2 e
posto a transtorno psicótico crônico, etc.) 8.3), tornam explícito o processo de decisão
Transtornos relativos ao uso de substâncias psicoativas
diagnóstica. Os autores da SCID escreveram:
(abuso e dependência):
Álcool “os algoritmos diagnósticos são integrados à
Sedativos, hipnóticos e ansiolíticos estrutura da entrevista, de modo que as várias
Canabis hipóteses diagnósticas são sucessivamente tes-
Estimulantes tadas. Questões são agrupadas por diagnósti-
Opióides
co e por critérios. Dentro de cada diagnóstico,
Cocaína
Alucinógeno/Fenciclidina se um critério não é satisfeito, o entrevistador
Polissubstância é instruído a omitir as questões restantes para
Outras substâncias os outros critérios para aquele diagnóstico.
Transtornos de ansiedade: Portanto, itens de nenhuma significância diag-
Transtorno do pânico (com e sem agorafobia)
nóstica para um caso em particular são deixa-
Agorafobia sem transtorno do pânico
Fobia social dos de lado. Nessa abordagem, o entrevista-
Fobias específicas dor pode fazer o diagnóstico na medida em
Transtorno obsessivo compulsivo que a entrevista progride” (Spitzer, Williams,
Transtorno do estresse pós-traumático Gibbon et alii, 1992, p.625).
Transtorno do estresse agudo
Em outras palavras, as questões que inves-
Transtorno de ansiedade generalizada (seis últimos
meses) tigam cada quadro patológico estão organiza-
Transtornos somatoformes (somente atuais): das em hierarquias. Por exemplo, se nunca
Transtorno de somatização houve humor elevado ou expansivo, não há
Transtorno somatoforme doloroso motivo para examinar detalhes de outros sin-
Transtorno somatoforme indiferenciado
tomas dessa condição. Portanto, o entrevista-
Hipocondria
Transtorno dismórfico corporal dor é dirigido a passar para outra condição. A
Transtornos de alimentação: maioria das perguntas só é formulada se o con-
Anorexia nervosa texto é adequado. Algumas são fundamentais,
Bulimia nervosa sendo feitas a todos. Assim, a entrevista pros-
Compulsão alimentar periódica
segue, de modo que uma pessoa com poucos
Transtorno de ajustamento (episódio atual)
sintomas, ou nenhum, seria entrevistada em
*SOE = Sem Outra Especificação
Fonte: First, Gibbon, Spitzer et alii (1996) menos tempo.

PSICODIAGNÓSTICO – V 79
Início
1 2
Verificar a existência Episódio Maníaco, Não Humor Deprimido Não
de episódios de humor Hipomaníaco ou (HD) atual {critérios
atual passado. Misto, atual ou A(1) e/ou A(2)}
passado ?
? Sim
Condições de exclusão: Sim
Ausência de distimia ou de
Verificar transtornos bipolares qualquer transtorno depressivo
e o Transtorno Esquizofetivo, atual. EDM passado pode justificar
Tipo Bipolar. TDM passado, mas não pode ser
3
Não EDM atual ou Sim
nos últimos
Nenhum EDM nos últimos dois anos
? Há HD atual e há ou houve EDM
anos, portanto, nenhum TDM. nos últimos dois anos. PODE SER
Pode haver distimia, mas NÃO DEPRESSÃO DUPLA.
PODE SER DEPRESSÃO DUPLA
Condições de exclusão:
4 verificar outros 8
Existem outras transtornos que melhor Existem outras
condições que melhor explicam o HD atual condições que melhor
explicam o HD Sim (p.ex.: psicose crônica, Sim explicam o HD
? transtornos bipolares, ?
Não condição médica geral,
Não
transtorno de
5 ajustamento com HD, 9
HD tem duração luto, etc.). HD tem duração de
de pelo menos pelo menos dois anos
Não dois anos sem intercorrência de
? Critério A para Critério A e D Não
EDM
ý

Transtorno
ý

para Transtorno ?
Sim Distímico Distímico Sim

6 10
Durante esses dois Durante esses dois
anos, pelo menos dois Critério B para anos, pelo menos dois
ý
ý

sintomas associados Transtorno sintomas associados


Não à distimia Distímico Não
à distimia
? ?
Sim Sim
Critério C para
Transtorno Distímico
7 11
ý

Períodos de ausência Períodos de ausência


desses sintomas inferiores desses sintomas
Sim Sim inferiores a dois Não
Não a dois meses
? meses
?

Não há Transtorno
Depressão Dupla
Distímico
Verificar HD
Não há
associado a
Transtorno
outras condições Transtorno Transtorno
Distímico
psicopatológicas Distímico Depressivo Maior

Figura 8.1 Diagnóstico diferencial da Depressão Dupla.

80 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 8.2 Critérios para Episódio Depressivo Maior
A. Cinco (ou mais) dos seguintes sintomas estiveram presentes durante o mesmo período de duas semanas e
representam uma alteração a partir do funcionamento anterior; pelo menos um dos sintomas é (1) humor
deprimido ou (2) perda de interesse ou prazer.
Nota: Não incluir sintomas nitidamente devidos a uma condição médica geral ou alucinações ou delírios incon-
gruentes com o humor.
(1) humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias, indicado por relato subjetivo (p.ex., sente-
se triste ou vazio) ou observação feita por outros (p.ex., chora muito). Nota: Em crianças e adolescentes,
pode ser humor irritável.
(2) interesse ou prazer acentuadamente diminuídos por todas ou quase todas as atividades na maior parte do
dia, quase todos os dias (indicado por relato subjetivo ou observação feita por outros)
(3) perda ou ganho significativo de peso sem estar em dieta (p.ex., mais de 5% do peso corporal em 1 mês),
ou diminuição ou aumento do apetite quase todos os dias. Nota: Em crianças, considerar falha em apre-
sentar os ganhos de peso esperados.
(4) insônia ou hipersonia quase todos os dias
(5) agitação ou retardo psicomotor quase todos os dias (observáveis por outros, não meramente sensações
subjetivas de inquietação ou de estar mais lento)
(6) fadiga ou perda de energia quase todos os dias
(7) sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada (que pode ser delirante), quase todos os dias
(não meramente auto-recriminação ou culpa por estar doente)
(8) capacidade diminuída de pensar ou concentrar-se, ou indecisão, quase todos os dias (por relato subjetivo
ou observação feita por outros)
(9) pensamentos de morte recorrentes (não apenas medo de morrer), ideação suicida recorrente sem um
plano específico, tentativa de suicídio ou plano específico para cometer suicídio
B. Os sintomas não satisfazem os critérios para um Episódio Misto.
C. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacio-
nal ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
D. Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância (p.ex., droga de abuso ou medi-
camento) ou de uma condição médica geral (p.ex., hipotireoidismo).
E. Os sintomas não são melhor explicados por luto, ou seja, após a perda de um ente querido, os sintomas
persistem por mais de 2 meses, ou são caracterizados por acentuado prejuízo funcional, preocupação mórbi-
da com desvalia, ideação suicida, sintomas psicóticos ou retardo psicomotor.
Fonte: APA, 1995, p. 312 (reproduzido com autorização da Editora).

O primeiro módulo da entrevista é a Ava- À Avaliação Preliminar são destinados, apro-


liação Preliminar, destinada a obter informa- ximadamente, 15 a 20 minutos iniciais da en-
ções gerais e dados demográficos básicos, trevista, e o entrevistador não deve começar a
como a história escolar e de trabalho, a estru- explorar com perguntas específicas, as quais
tura e composição familiar, etc. Mas tem outra fará depois, de acordo com a seqüência mo-
função importante, a de facilitar o rapport, pois dular da entrevista. Deve apenas criar um es-
inclui perguntas menos ameaçadoras, que per- paço receptivo para expressão voluntária do su-
mitem ao entrevistador e ao entrevistado cons- jeito. Desse modo, observamos alguns indica-
truir uma relação e progredir naturalmente. É dores iniciais relevantes para a avaliação da psi-
composta, predominantemente, de questões copatologia do entrevistado. A partir dessa des-
abertas, em que o entrevistado é encorajado a crição inicial dos sintomas e dificuldades, o en-
falar livremente sobre sua situação atual, in- trevistador deve indicar suas primeiras impres-
cluindo a queixa principal e sua condição atual. sões diagnósticas, anotando as mais prováveis,
Isso cria nova oportunidade para fortalecer o e as alternativas possíveis que devem ser des-
rapport, na medida em que é encorajada a ex- cartadas. Por exemplo, se sintomas de humor
pressão livre, e se permite abordar a história (depressão) e sintomas psicóticos (alucinações)
da queixa e de tratamento, os antecedentes são relatados, o profissional deve anotar pelo
familiares, etc. menos três alternativas: um transtorno de hu-

PSICODIAGNÓSTICO – V 81
QUADRO 8.3 Critérios diagnósticos para Transtorno Distímico
A. Humor deprimido na maior parte do dia, na maioria dos dias, indicado por relato subjetivo ou observação
feita por outros, por pelo menos 2 anos. Nota: Em crianças e adolescentes, o humor pode ser irritável, e a
duração deve ser de no mínimo 1 ano.
B. Presença, enquanto deprimido, de duas (ou mais) das seguintes características:
(1) apetite diminuído ou hiperfadiga;
(2) insônia ou hipersonia;
(3) baixa energia ou fadiga;
(4) baixa auto-estima;
(5) fraca concentração ou dificuldade em tomar decisões;
C. Durante o período de 2 anos (1 ano, para crianças ou adolescentes) de perturbação, jamais a pessoa esteve
sem os sintomas dos Critérios A e B por mais de 2 meses a cada vez.
D. Ausência de Episódio Depressivo Maior durante os primeiros 2 anos de perturbação (1 ano para crianças e
adolescentes); isto é, a perturbação não é melhor explicada por um Transtorno Depressivo Maior crônico ou
Transtorno Depressivo Maior, Em Remissão Parcial.
Nota: Pode ter ocorrido um Episódio Depressivo Maior anterior, desde que tenha havido remissão completa
(ausência de sinais ou sintomas significativos por 2 meses) antes do desenvolvimento do Transtorno Distímico.
Além disso, após os 2 anos iniciais (1 ano para crianças e adolescentes) de Transtorno Distímico, pode haver
episódios sobrepostos de Transtorno Depressivo Maior e, neste caso, ambos os diagnósticos podem ser dados
quando satisfeitos os critérios para um Episódio Depressivo Maior.
E. Jamais houve um Episódio Maníaco, um Episódio Misto ou um Episódio Hipomaníaco e jamais foram satisfei-
tos os critérios para Transtorno Ciclotímico.
F. A perturbação não ocorre exclusivamente durante o curso de um Transtorno Psicótico crônico, como Esquizo-
frenia ou Transtorno Delirante.
G. Os sintomas não se devem aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância (p.ex., droga de abuso, medica-
mento) ou de uma condição médica geral (p.ex., hipotireoidismo).
H. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacio-
nal ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Especificar se:
Início Precoce: se o início ocorreu antes dos 21 anos.
Início Tardio: se o início ocorreu aos 21 anos ou mais.
Especificar (para os 2 anos de Transtorno Distímico mais recentes):
Com Características Atípicas.
Fonte: APA, 1995, p.332-333 (reproduzido com autorização da Editora).

mor deprimido (possivelmente o Transtorno De- experiência e o uso repetido da SCID farão essa
pressivo Maior, Severo, com Aspectos Psicóti- avaliação preliminar mais fácil, e o direciona-
cos); um transtorno psicótico (talvez Esquizo- mento, mais certeiro.
frenia), com uma depressão sobreposta (que Essa avaliação geral prepara o trabalho pos-
pode antecipar ou suceder uma crise psicóti- terior com os módulos específicos. Cada trans-
ca) e o Transtorno Esquizoafetivo (que combi- torno ou condição nos diversos módulos inicia
na sintomas psicóticos e de humor). Há ainda com questões fechadas, destinadas a avaliar
que se eliminar a possibilidade de um Trans- seus sintomas-chave. Quando a resposta é afir-
torno Bipolar, Episódio Mais Recente Depressi- mativa, ela será seguida por questões abertas
vo (com sintomas psicóticos), ou do Transtor- e probatórias, que convidam o entrevistado a
no Borderline, em fase de regressão ou deses- elaborar melhor sua resposta. Com a ajuda dos
truturação aguda acompanhada de psicose critérios e das instruções, o entrevistador vai
breve (reativa) e humor deprimido (labilidade codificando as respostas de tal modo que, ao
afetiva). Outras condições menos prováveis são final da entrevista, ele poderá emitir um diag-
possíveis, mas, notando essas alternativas, o nóstico clínico para o caso. Por exemplo, para
entrevistador terá mais confiança no direcio- o transtorno bipolar, é essencial a confirma-
namento que deverá dar posteriormente. A ção, em algum momento da vida, do critério

82 JUREMA ALCIDES CUNHA


“humor elevado, expansivo ou irritável duran- SCID, suas instruções específicas por módulos
do pelo menos uma semana”. Se esta condi- e à aplicação de suas instruções em estudos
ção não é satisfeita, nenhuma pergunta será de casos adequados a cada módulo. Aplican-
feita acerca dos sintomas associados aos epi- do os algoritmos da entrevista e os critérios
sódios maníacos. diagnósticos no estudo de casos, domina-se
O entrevistador poderá incluir suas próprias mais rapidamente a capacidade de fazer en-
perguntas, por exemplo, para questionar afir- trevistas diagnósticas com validade. A seção
mações contraditórias, ou confrontar negações Diagnóstico Diferencial, que acompanha a des-
diante de outros fatos de seu conhecimento. crição de cada transtorno no DSM-IV, é de es-
Sabemos que, ao permitir ao entrevistador o pecial interesse (APA, 1995). Essa seção, utili-
uso de seu julgamento clínico, se aumenta a zada em conjunto com a SCID, facilita a obser-
validade do diagnóstico. Isso pode ser obser- vação dos pontos decisivos no diagnóstico.
vado comparando-se os índices de concordân- A aprendizagem é facilitada pela observa-
cia (teste-reteste) entre entrevistas estrutura- ção (direta ou em vídeo) de sessões didáticas
das que utilizam ou não o julgamento clínico, de aplicação por um entrevistador treinado.
como é o exemplo da diferença entre a SCID e Elas servem como demonstração dos princípios
a DIS (Robins, Helzer, Croughan et alii, 1981; e técnicas de aplicação da entrevista e devem
Williams, Gibbon, First et alii, 1992). A DIS ba- ser seguidas de treinamento prático com as
seia-se nos critérios do DSM-III; contudo, não entrevistas. A observação (direta, por sala de
utiliza o julgamento clínico por parte do en- espelho ou por meio de vídeo) é um dos recur-
trevistador, o que a torna um instrumento tipi- sos mais importantes da aprendizagem. O
camente de pesquisa, devendo ser aplicada por manual de instruções oferece esclarecimentos
pessoas sem treinamento clínico. cruciais para a utilização da SCID e dos crité-
A seguir, discutiremos o treinamento para rios do DSM-IV nela contidos (First, Gibbon,
o uso da SCID. Após, vamos considerar o diag- Spitzer et alii, 1996).
nóstico diferencial da depressão dupla, como Entrevistadores em treinamento podem
exemplo demonstrativo do processo de deci- comparar seus resultados para um mesmo pa-
sões clínicas. ciente entrevistado ou observado com os de
outros participantes do treinamento ou do su-
pervisor. A verificação da consistência intra e
TREINAMENTO PARA O USO DA interentrevistadores e a verificação de precisão
ENTREVISTA CLÍNICA ESTRUTURADA (SCID) (concordância com o critério) são as caracte-
rísticas principais para se julgar a prontidão de
Antes de exercitar-se com a entrevista, os can- um entrevistador para a tarefa. As fontes de
didatos a entrevistadores com pouca experiên- dúvidas e discrepâncias devem ser discutidas e
cia no diagnóstico clínico deverão se familiari- sanadas com a ajuda do supervisor. Um teste
zar com o DSM-IV e com os livros didáticos mais rigoroso da validade e fidedignidade do
sobre psicopatologia (p.ex., Othmer & Othmer, entrevistador requer que sua entrevista seja
1994). A SCID deverá ser estudada juntamente comparada com outra realizada, com o mes-
com as categorias diagnósticas no DSM-IV, mo entrevistado, por um entrevistador mais
acompanhadas de estudos de casos (como o experiente, alguns dias antes ou depois.
livro de casos do DSM-IV; Spitzer, Gibbon, Sko-
dol et alii, 1994). Estas discussões devem ser
acompanhadas pelo estudo dos procedimen- O PROCESSO DE DECISÃO CLÍNICA NO
tos contidos nos módulos da SCID para cada DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DA
categoria diagnóstica. Profissionais de saúde DEPRESSÃO DUPLA
mental, com experiência com o diagnóstico clí-
nico e com o DSM-IV, poderão passar direta- Um dos diagnósticos diferenciais mais difíceis
mente para o exame cuidadoso do manual da de se estabelecer é o da depressão dupla, que

PSICODIAGNÓSTICO – V 83
ocorre quando há sobreposição de um Trans- tressores externos não a ajudaria, provavelmen-
torno Depressivo Maior (TDM) à Distimia. É te, com o padrão contínuo de depressão. Ten-
condição para o TDM que haja um Episódio tar focalizar esse padrão crônico de humor
Depressivo Maior (EDM), que tem seus sinto- deprimido ficaria mais difícil com os estresso-
mas definidos no Quadro 8.2, ao passo que a res que definem uma situação crítica e deman-
Distimia tem sua definição no Quadro 8.3. dam atenção. A compreensão diagnóstica é
Pode-se ver que, pela semelhança de sintomas, outra, a terapêutica também. Na depressão
diferenciar essas condições pode ser problemá- dupla, precisamos atender à crise (Episódio
tico e, mais ainda, determinar sua sobreposi- Depressivo Maior); a expectativa é de que, tra-
ção. Essa dificuldade de distinguir essas condi- tando-se a crise, o sujeito retorne ao seu pata-
ções complica-se com a possibilidade de haver mar de humor cronicamente deprimido, que
um Transtorno Depressivo Maior residual, crô- também deverá ser tratado adequadamente.
nico ou recorrente. Queremos, com esses exemplos, enfatizar que
Neste caso, é essencial, para confirmar ou o reconhecimento das variações dos quadros
modificar o diagnóstico final, não só a gravi- psicopatológicos, levando em consideração
dade ou a extensão dos sintomas, mas tam- outras informações relevantes, irá ajudar a
bém o seu padrão temporal. Mas que diferen- desenvolver uma compreensão e uma terapêu-
ça isso faz, clinicamente, se já sabemos que o tica mais adequadas a cada situação.
sujeito está deprimido? Não é isso que impor- Vejamos, então, como a SCID nos ajuda a
ta? Não exatamente. Com a experiência, de- determinar o diagnóstico diferencial da depres-
senvolve-se uma percepção mais aguçada para são dupla. Para facilitar nossa discussão, va-
os diferentes modos de se deprimir, e começa- mos considerar a ausência de transtornos psi-
mos a ver a relação disso com os diferentes cóticos crônicos, de sintomas de humor devi-
diagnósticos onde há humor deprimido. Por do ao uso de substâncias ou a condições mé-
exemplo, uma pessoa razoavelmente bem dicas gerais. A seqüência do raciocínio diag-
adaptada pode ficar subjetivamente deprimi- nóstico que iremos acompanhar está diagra-
da como conseqüência de uma reação a um mada pelo algoritmo na Figura 8.1. Nela, cada
estressor externo. Ela pode estar passando por losango representa um critério que requer ava-
uma separação, ou ter perdido o seu empre- liação e tomada de decisão. Estes representam
go. Se, uns dois meses depois, a condição pro- passos diagnósticos e são numerados para re-
vocadora de estresse tiver sido removida, ou ferência no texto. Os retângulos representam
se ela tiver se adaptado à sua nova condição, uma instrução ou uma conclusão diagnóstica.
espera-se que tenha voltado ao seu nível de Os retângulos também podem indicar o fim do
funcionamento anterior, isto é, sem sintomas raciocínio diagnóstico, mostrando uma conclu-
depressivos. O diagnóstico provável é de Trans- são final ou uma instrução para continuar com
torno de Ajustamento com Humor Deprimido. um outro raciocínio não desenvolvido nesse
Nesses exemplos, não havendo outras dificul- algoritmo.
dades, uma psicoterapia de casal, uma psico- Na SCID, deve-se primeiro estabelecer a exis-
terapia breve ou um novo emprego poderiam tência das alterações de humor. Essa é a fun-
ser suficientes, e espera-se uma rápida recupe- ção do Módulo A. Isso ocorre depois da Ava-
ração. liação Preliminar, quando o sujeito já falou li-
Por outro lado, para uma pessoa que se vremente sobre o motivo da entrevista e sobre
apresenta para terapia após ter se separado suas dificuldades. A primeira pergunta do
ou ter perdido o seu emprego, se a avaliação Módulo A procura avaliar se há humor depri-
na entrevista inicial mostra uma história de sin- mido atual, o critério A1 para EDM (Quadro
tomas depressivos compatível com o Transtor- 8.2). Deve-se perguntar: “No último mês, hou-
no Distímico, pode-se esperar um processo te- ve algum período de tempo em que você se
rapêutico mais difícil e de longa duração. A sentiu deprimido(a), ou na pior (pra baixo), na
estratégia terapêutica de se lidar com os es- maior parte do dia, quase todos os dias?”

84 JUREMA ALCIDES CUNHA


A ênfase “na maior parte do dia, quase to- satisfeita a qualquer tempo no último mês. HD
dos os dias” procura distinguir um episódio é definido pelos critérios A1 (humor persisten-
depressivo de variações normais e transitórias temente deprimido) e/ou A2 (falta de interes-
de humor. Outras questões exploratórias vão se ou prazer na maioria das atividades) quase
se sucedendo, e o Módulo A da SCID conduz o todos os dias, na maior parte do dia, por pelo
entrevistador a avaliar a possibilidade de hu- menos duas semanas (Quadro 8.2). Se não há
mor deprimido (HD) atual e passado, elevações HD atual, conclui-se pela ausência de qualquer
atual e passada de humor (maníaco, hipoma- tipo de transtorno depressivo atual. Na SCID,
níaco ou misto) e distimia atual. Somente com o entrevistador é instruído a passar à avalia-
a consideração do estado de humor pode-se ção de HD passado. Isso não é representado
avaliar os transtornos do humor. em nosso algoritmo, pois há a exigência de HD
Na Figura 8.1, somos instruídos para ava- atual para o diagnóstico da distimia na depres-
liar o estado de humor e decidir (passo 1) se já são dupla. Se não houve HD passado, e como
houve alguma situação de humor elevado, ex- já havíamos determinado que nunca houve ele-
pansivo ou irritável, que pode definir um epi- vações de humor, podemos concluir que não
sódio maníaco, hipomaníaco ou misto. Nesses há qualquer tipo de transtorno de humor.
casos, não poderemos concluir pela existência Na presença de HD atual, o passo seguinte
de um TDM ou de uma Distimia. A existência avalia a existência de um EDM. O algoritmo
de um episódio maníaco, hipomaníaco ou mis- pede a avaliação do EDM nos últimos dois anos
to a qualquer momento da vida do sujeito, (passo 3), porque o diagnóstico da distimia
mesmo com a presença de HD ou EDM, já nega exige um padrão de HD por, pelo menos, dois
essas possibilidades diagnósticas e requer ou- anos (critério A, Quadro 8-3). Se houver um
tro raciocínio clínico. Portanto, na SCID, primei- EDM passado, os sintomas de HD podem ser
ro são feitas as avaliações do quadro de hu- de uma depressão recorrente, crônica ou resi-
mor (deprimido, maníaco, hipomaníaco), para dual (de um episódio que tenha sido apenas
depois fazer uma avaliação do quadro psico- parcialmente resolvido). O padrão de dois anos
patológico (transtornos). Ao considerar os de HD para distimia só pode se confirmar ha-
transtornos de humor, na presença de episó- vendo dois anos sem a intercorrência de um
dios maníacos ou hipomaníacos, os transtor- EDM. Quando há um EDM nos dois últimos
nos depressivos não são considerados. Isso é anos, vamos avaliar se o HD teve duração de
representado na Figura 8.1, com a primeira dois anos antes do início do episódio para sa-
instrução para avaliar os estados de humor, ber se ele foi precedido por uma distimia. Igual-
seguida de uma decisão (passo 1), que indaga mente, nesse período anterior, não pode ter
sobre a existência atual ou prévia de episódios tido um outro EDM por, pelo menos, dois anos.
maníacos, hipomaníacos ou mistos. Na presen- Múltiplas ocorrências de EDM sugerem o Trans-
ça de humor maníaco, hipomaníaco ou misto, torno Depressivo Maior Recorrente, e não a
o algoritmo indica ao avaliador que ele deve depressão dupla.
considerar outro raciocínio, que pode levar aos Consideramos que há um EDM se, pelo
transtornos bipolares ou ao Transtorno Esqui- menos, A1 ou A2 é verdadeiro, e se pelo me-
zoafetivo, Tipo Bipolar. Na SCID, o entrevista- nos cinco condições de A1 a A9 são verdadei-
dor é encaminhado, página a página, a encon- ras (Quadro 8.2). Ou seja, A1 e/ou A2 são con-
trar o conjunto de condições que deverá ava- dições necessárias. É também necessário pelo
liar, conforme as possibilidades diagnósticas menos três ou quatro sintomas adicionais de
que identifica. A3 a A9, para completarem pelo menos cinco
Considerando a inexistência de um episó- sintomas. Este quadro compõe uma grande
dio anterior maníaco, hipomaníaco ou misto, variedade de manifestações de EDM. Chega-
o algoritmo pede a confirmação da existência mos, então, a três possibilidades: podemos
de humor deprimido (HD) atual (passo 2). Ge- concluir que não houve EDM nos últimos dois
ralmente, consideramos atual se a condição é anos, ou que houve EDM nos últimos dois anos,

PSICODIAGNÓSTICO – V 85
ou que há EDM atual. O primeiro caso segue a envolve os critérios de exclusão que podem
resposta “Não” ao passo 3 e determina a linha explicar melhor o quadro de humor (critérios
de raciocínio “Não pode ser depressão dupla”, B, D e E para EDM e critérios B e C para TDM).
na Figura 8.1. Os dois últimos casos seguem a Não havendo a possibilidade de que outros
resposta “Sim” e mostram o raciocínio “Pode transtornos ou condições expliquem melhor o
ser depressão dupla”, na Figura 8.1. HD e o EDM ocorridos nos últimos dois anos,
Na primeira linha de raciocínio (“Não pode temos outras decisões a tomar. Como foi men-
ser depressão dupla”), se não houve EDM nos cionado antes, se o EDM se deu há um ano, e a
últimos dois anos, podemos concluir que não pessoa permanece com sintomas depressivos,
há um Transtorno Depressivo Maior, e, portan- estes podem ser de um Transtorno Depressivo
to, não pode ser depressão dupla. Contudo, Maior passado, recorrente, crônico ou residu-
pode ainda ser um Transtorno Distímico ou um al. Por isso, precisamos determinar se havia HD
outro transtorno com humor depressivo, pois por, pelo menos, dois anos, sem intercorrência
já foi determinado que há HD atual. Primeiro, de EDM (passo 9). Este é o critério D para Trans-
somos levados a considerar se existem outras torno Distímico (Quadro 8.3). Se a duração de
condições que melhor explicam o HD (passo HD é inferior a dois anos, ou se houve intercor-
4). Estas são conhecidas como condições de rência de EDM, podemos concluir que não hou-
exclusão para o Transtorno Distímico e estão ve distimia.
listadas nos critérios D, E, F e G (Quadro 8.3). Os passos 10 e 11 são análogos aos passos
Um exemplo é o Transtorno Ciclotímico, que 6 e 7 e visam a avaliar se o HD, que determina-
alterna períodos de HD e episódios hipomaní- mos ter duração de pelo menos dois anos, foi
acos. acompanhado, no mesmo período, dos sinto-
O algoritmo segue instruindo que, para fa- mas associados à distimia (passo 10), sem gran-
zer um diagnóstico, precisamos decidir se o des intervalos assintomáticos (passo 11). Igual-
padrão de HD tem duração de, pelo menos, mente, uma resposta negativa a qualquer des-
dois anos (passo 5), se os sintomas associa- sas condições exclui o diagnóstico de Trans-
dos, além do HD, estão presentes (passo 6; cri- torno Distímico. Contudo, existe um EDM
tério B, Quadro 8.3), e se, durante esse tempo, diagnosticado que nos levaria à conclusão de
havendo algum período assintomático, este um Transtorno Depressivo Maior, atual ou
teria sido inferior a dois meses (passo 7; crité- passado.
rio C, Quadro 8.3). Uma resposta negativa a Caso essas três condições nos passos 9 a
qualquer dessas condições exclui o diagnósti- 11 – duração, sintomas associados e períodos
co de Transtorno Distímico. Contudo, se existe assintomáticos – sejam satisfeitas, então po-
um HD, ele ainda precisa ser avaliado. O algo- demos concluir, não havendo nenhuma condi-
ritmo termina, então, com a instrução de que ção de exclusão, que o HD anterior ao EDM
outras condições nas quais o HD está associa- diagnosticado satisfaz os critérios do Trans-
do devem ser verificadas. Na SCID, o entrevis- torno Distímico, e que o EDM satisfaz os cri-
tador vai ser encaminhado a avaliar essas pos- térios para Transtorno Depressivo Maior. Essa
sibilidades, por exemplo, o Transtorno Depres- situação é comumente chamada de Depres-
sivo SOE, o Transtorno de Ajustamento com são Dupla.
Humor Deprimido, etc. A SCID irá guiar o en-
trevistador através de cada um desses critérios,
orientando sobre que tipo de informação é ne- CONCLUSÃO
cessária e sugerindo como obtê-la.
A segunda linha de raciocínio, “pode ser Alguns comentários acerca do ensino e apren-
depressão dupla”, considera que houve EDM dizagem da técnica são necessários. Algumas
nos últimos dois anos ou há EDM atual (além pessoas comentam, particularmente alunos,
do critério A, foram satisfeitos os critérios C a sobre a dificuldade da tarefa. A SCID é fácil de
E do Quadro 8.2). A próxima decisão (passo 8) ser manuseada, e uma pessoa pode aprender

86 JUREMA ALCIDES CUNHA


a fazê-lo em pouco tempo. Contudo, ela não é petência diagnóstica. A SCID apresenta-se
um substituto para conhecimentos de psico- como um excelente instrumento de ensino-
patologia ou da habilidade para se fazer en- aprendizagem. Lembro-me bem da minha pri-
trevistas. Na verdade, ela requer a integração meira visita, como estudante, a um hospital psi-
desses conhecimentos e capacidades para ser quiátrico. Fomos lançados “a campo”, com a
bem utilizada. Também, como o leitor pode ter missão de estabelecer o psicodiagnóstico de
antecipado, é necessária certa experiência clí- algum paciente. Ficamos lá sem instrumental,
nica para se poder decidir quando um critério sem saber o que ou como falar com essas pes-
se aplica ou não. Por exemplo, temos situações soas. Um colega estava conversando com um
em que a depressão não se manifesta exata- paciente, quando, com grande alívio, excla-
mente como esperávamos (depressão masca- mou: “Ah! Já sei o que ele tem!” Depois disso,
rada), ou em que um paciente nega um sinto- esse colega pareceu perder o interesse por seu
ma quando está presente (como na paranóia), sujeito. A SCID pode ajudar o aluno a desen-
ou que afirma ter um sintoma ou condição volver a habilidade de comunicação com o pa-
quando avaliamos que não (diz ter uma “fo- ciente, a distinguir que informações são rele-
bia” em caso de um medo que não causa sofri- vantes em cada caso e a saber como obtê-las.
mento ou prejuízo de funcionamento). Essas Ela condensa anos de experiência com o julga-
situações devem ser tomadas em consideração mento clínico, que antecipa, ajuda a explicitar
para que não se chegue a conclusões precipi- e evita muitos dos erros e enganos mais co-
tadas por várias razões. Quando a SCID é usa- muns. Essa característica oferece um auxílio
da por uma pessoa com treinamento adequa- prático no ensino, principalmente porque nos-
do, ela é um instrumento para o diagnóstico sos textos de psicopatologia estão sobrecarre-
diferencial inigualável e de valor extraordiná- gados de teorias, enquanto observamos nos-
rio. As vantagens da técnica já foram enume- sos alunos ansiosos por aprender a se comuni-
radas no texto, e não retornaremos a elas aqui. carem com seus pacientes. A SCID sugere o que
Por organizar os critérios em uma seqüên- dizer, literalmente. Com a experiência, pode-
cia lógica, a SCID explicita o raciocínio diag- se desenvolver um estilo pessoal e aprende-se
nóstico, tornando transparente o processo pelo a adaptar a técnica às mais diversas situações,
qual se chega a ele. Essa transparência ajuda o como, por exemplo, alterar um vocabulário
profissional a fazer um diagnóstico mais váli- para ficar compreensível, no nível cognitivo do
do, que é o objetivo primordial da SCID. Outro paciente, ou para incorporar uma terminolo-
desdobramento da transparência diagnóstica gia usada por ele. Facilitando a comunicação,
é o apoio que sua estruturação oferece para a SCID ajuda a desenvolver uma apreciação da
facilitar o processo de devolução. Quando ade- complexidade do psicodiagnóstico, além da
quado, pode-se ajudar o paciente e familiares atribuição de um rótulo. O rótulo é a parte
a acompanharem a conclusão diagnóstica, menos interessante acerca da experiência e do
pareando critério e suas respostas. Essa estra- funcionamento do sujeito. A história de desen-
tégia facilita a abordagem e a aceitação das volvimento dos sintomas e a sua relação com
recomendações terapêuticas, do prognóstico a psicodinâmica são, por exemplo, de especial
e dos critérios para o término do tratamento, interesse para a compreensão e a terapêutica.
tendo ainda a função de aumentar a aderên- Acima de tudo, a SCID ajuda-nos a desen-
cia ao tratamento e de criar condições favorá- volver a consciência da complexidade de nos-
veis ao bem-estar geral do sujeito e à supres- sa tarefa e a competência para lidar com ela. É
são ou ao controle dos sintomas. mais um instrumento técnico de nossa profis-
Talvez o maior desdobramento dessa trans- são, com um potencial excepcional na clínica,
parência esteja no desenvolvimento da com- na pesquisa e no ensino.

PSICODIAGNÓSTICO – V 87
Entrevista motivacional
Margareth da Silva Oliveira
9
A Entrevista Motivacional (EM) é uma técni-
ca descrita originalmente pelo psicólogo
americano William Miller (1983), na Universi-
MATCH Research Group, 1993), um estudo
multicêntrico de grande dimensão, destinado
a tratamentos psicossociais em pacientes al-
dade do Novo México (EUA), amplamente di- coolistas nos Estados Unidos, foi uma das três
fundida na Europa, na Austrália e, mais recen- técnicas testadas, juntamente com Cognitive
temente, no Brasil. O objetivo principal é auxi- Behavioral Coping Skills Therapy (CBT) e Twel-
liar nos processos de mudanças comportamen- ve-Step Facilitation (TSF), com o objetivo de
tais, trabalhando a resolução da ambivalência. verificar interação entre o tipo de cliente e o
Basicamente, foi delineada para ajudar aos tratamento mais apropriado. A aplicação da EM
clientes na decisão de mudança nos compor- no Projeto MATCH foi programada para qua-
tamentos considerados aditivos, tais como tro sessões, distribuídas em doze semanas
transtornos alimentares, tabagismo, abuso de (MET; Miller, Zweben, DiClemente et alii, 1992).
álcool e drogas, jogo patológico e outros com- A EM está baseada no conceito de motiva-
portamentos compulsivos. ção. Wade e Tarvis (1992) descrevem a palavra
A técnica é breve, podendo ser realizada “motivação” como oriunda de raiz latina, que
numa única entrevista, ou, como um processo significa “mover”, e é uma tentativa de com-
terapêutico, é comumente desenvolvida em preender o que nos move ou porque fazemos
quatro a cinco entrevistas. Inspira-se em várias o que fazemos. Uma definição prática foi pro-
abordagens, principalmente na terapia cogni- posta por Miller, em 1995, como a probabili-
tivo-comportamental, terapia sistêmica, tera- dade de que uma pessoa inicie, dê continuida-
pia centrada na pessoa, combinando elemen- de e permaneça num processo de mudança
tos diretivos e não-diretivos. As estratégias da específico (Davidson, 1997).
EM são mais persuasivas do que coercivas, mais Heather (1992) resumiu seu ponto de vista
suportivas que argumentativas (Miller & Roll- na expressão “os transtornos aditivos são es-
nick, 1991). sencialmente problemas motivacionais”
Na literatura, a EM também é reconhecida (p.828), para explicar porque os obesos não
como Intervenção Motivacional (Motivational realizavam as dietas prescritas, pacientes car-
Interviewing – MI), Terapia Motivacional e, fi- díacos não deixavam de fumar, citando situa-
nalmente, como MET (Motivational Enhance- ções similares com diabéticos e hipertensos e
ment Therapy). No projeto MATCH (Project mostrando uma tendência humana antes para

88 JUREMA ALCIDES CUNHA


ignorar do que para reconhecer caminhos aguda, imediata e com dimensões interpessoais
mais curtos da resolução dos problemas, des- e intrapessoais (Isenhart, 1994).
sa forma creditando à motivação a força pro- As respostas dos clientes, tipo “sim, mas...”,
pulsora que move os indivíduos a um objeti- freqüentemente observadas no caso dos fu-
vo específico. mantes, exemplificam a expressão do conflito
Na realidade, quando o sujeito percebe que motivacional (manter o comportamento de
tem um problema, ele próprio encontrará ha- fumar ou parar de fumar) e supostamente su-
bilidades para mudar ou procurará ajuda, su- gerem uma negação, que, provavelmente, foi
gerindo que motivação para a mudança é a provocada pelo terapeuta, quando este tenta
chave do problema comportamental. Contu- persuadi-lo. Os técnicos menos avisados po-
do, encontra-se constantemente presente o dem entender como resistência, e não como
conflito motivacional: “Por que mudar?”, um conflito na interação com o cliente (Rollni-
“Para que mudar?”, “O que irá acontecer?” ck, Kinnersley & Stott, 1993).
Essas situações de prós e contras mostram o Mas Rollnick e colegas (1992) afirmam que
conflito motivacional e, aí, está instalada a a EM explora a ambivalência e os conflitos e
ambivalência. encorajam os pacientes a expressarem suas
Ambivalência, no contexto da EM, é o pri- preocupações a respeito das mudanças. O clien-
meiro princípio norteador do processo de mu- te e o entrevistador dividem responsabilidades
dança. Segundo Davidson (1997), trabalhar a em relação à motivação do cliente no proces-
ambivalência nos comportamentos aditivos é so de mudança.
trabalhar a essência do problema. As aborda- A motivação pode ser entendida, numa vi-
gens atuais de tratamento enfatizam a natu- são abrangente, não como algo que a pessoa
reza situacional da ambivalência. Implícito no “tem ou não tem”, mas como algo que a pes-
modelo de tomada de decisão, encontra-se o soa deve fazer, existindo várias maneiras de
fato de que, se os prós superam os contras, é auxiliar as pessoas a se moverem em direção
mais provável que o indivíduo tome uma deci- ao reconhecimento do seu problema e da ação
são em prol da mudança. efetiva para a mudança.
A ausência de motivação ou de prontidão, O entrevistador evita a confrontação (que
para mudança em comportamentos aditivos, é sinalizada como provocadora de mais confli-
era entendida como uma negação dos pacien- to), e os clientes são estimulados a articular
tes, principalmente em tratamentos confron- para si mesmos suas razões para mudar, por
tacionais. A prontidão para mudança era tra- meio de técnicas de aconselhamento, de feed-
dicionalmente percebida em termos de uma back adequado e de análise de custo-benefí-
dicotomia: os pacientes estão motivados ou cio, entre outros. A balança decisional, nesse
não estão motivados. momento, é uma estratégia fundamental, e
Nas concepções das terapias pós-compor- deve ser utilizada para mostrar os dois lados
tamentais, a ambivalência não é considerada do conflito, como no Quadro 9.1.
um traço de personalidade, mas uma intera- O segundo princípio norteador da EM é o
ção dinâmica entre o paciente e uma situação modelo transteórico, exposto por Prochaska e

QUADRO 9.1 Balança decisional (caso de um cliente com obesidade)


Continuar com o comportamento-problema Fazer mudanças no comportamento-problema
Vantagens Desvantagens Vantagens Desvantagens
a) Satisfação no momento a) Aumento de peso a) Melhora do visual a) Deixar de comer alimentos
b) Não precisar justificar b) Dor na coluna b) Melhor desempenho mais calóricos,
“Estou de dieta” c) Baixa resistência sexual condimentados, mais
c) Não se privar d) Problemas de saúde c) Melhora da saúde bebidas e guloseimas

PSICODIAGNÓSTICO – V 89
DiClemente (1982, 1986), que descrevem a é por pressão dos outros e, freqüentemente,
prontidão para a mudança, baseados nos es- retornam ao problema manifestado. Exempli-
tágios de mudança. O modelo transteórico traz ficamos com o relato de um cliente que busca
vários conceitos teóricos no esforço de descre- tratamento especializado em dependência quí-
ver os processos de mudança do comportamen- mica. “Eu preciso fazer tratamento porque
to humano (Joseph, Breslin & Skinner, 1999). minha esposa ameaçou me deixar e levar nos-
O modelo transteórico está baseado na pre- sa filha com ela”.
missa de que a mudança comportamental é um Resistência para reconhecer ou modificar o
processo e que as pessoas têm diversos níveis problema é a marca da pré-contemplação.
de motivação, de prontidão para mudar. Re- Contemplação: é o estágio em que os su-
centemente, esse modelo passou a ser empre- jeitos estão conscientes de que existe um pro-
gado nos comportamentos sadios, na área da blema, estão seriamente pensando no proble-
educação e da promoção de saúde (Joseph, ma, mas ainda não iniciaram a ação.
Breslin & Skinner, 1999), sendo considerado Os clientes, neste estágio, são mais abertos
uma importante inovação na prática da pro- às tentativas de aumentar a conscientização,
moção de saúde nos últimos anos (Figlie, 1999). tais como observação, confrontações e inter-
Os estágios de mudança, processos de mu- pretações. Os contempladores são mais pro-
dança, balança decisional e auto-eficácia são pensos às intervenções educacionais.
características dos processos de mudança. Pro- Um importante aspecto do estágio de con-
chaska e DiClemente (1982) estudaram a au- templação é a balança decisional dos prós e
tomotivação na cessação do uso do tabaco e, contras do problema. Os contempladores pa-
nesse estudo, identificaram três estágios de recem debater-se com a avaliação positiva do
mudança: decisão para mudança, ação para comportamento de risco e os esforços, a ener-
mudança e manutenção. Em outro estudo gia e os custos para superar o problema. É nesse
sobre fumantes, McConnaughy e colegas estágio que se manifesta a ambivalência. O
(1983) identificaram cinco estágios: pré-con- normal e característico do estilo contemplati-
templação, contemplação, determinação, ação vo é a manifestação do “sim, mas...”, como
e manutenção. Isenhart (1994) cita estudos nas palavras de um cliente, citadas por Miller
subseqüentes, identificando quatro estágios (1995): “Às vezes, eu me pergunto se bebo
confiáveis e relacionados entre si: pré-contem- muito, entretanto, eu na verdade não bebo
plação, contemplação, ação e manutenção. muito, mas meus amigos bebem. Eu posso
Prochaska e colegas (1992) descrevem os parar de beber quando quiser, mas às vezes
estágios como uma trajetória linear no proces- me preocupa em não lembrar o que aconteceu
so de mudança, seguindo progressivamente os na noite anterior, e isso não é normal” (p.92).
estágios de pré-contemplação para contempla- A marca do estágio de contemplação pode
ção, da preparação para a ação e, finalmente, ser exemplificada com a expressão: “Eu sei
para a manutenção. aonde quero ir, mas ainda não estou pronto”
Pré-contemplação: é um estágio em que (Prochaska, Diclemente & Norcross, 1999,
não há intenção de mudança. Muitos indiví- p.674).
duos, nesse estágio, não demonstram consciên- Determinação: ou preparação, é um está-
cia de seus problemas. Os amigos, familiares, gio que combina a intenção e a conduta. É um
vizinhos freqüentemente identificam claramen- ponto hipotético, transicional entre contempla-
te os problemas que os pré-contempladores ção e ação, onde uma decisão ou determina-
estão manifestando, mas eles não tomam co- ção será alcançada, objetivando o momento
nhecimento. de mudar.
Os pré-contempladores não se enxergam As pessoas, neste estágio, verbalizam: “Al-
em tratamento, porque eles não percebem que guma coisa precisa mudar, eu não posso con-
têm um problema e que precisam de ajuda. tinuar desta maneira. O que eu posso fazer?”
Normalmente, quando buscam atendimento, (Miller, 1995, p.92).

90 JUREMA ALCIDES CUNHA


Ação: é o estágio em que o cliente faz al-
guma coisa, a pessoa escolhe uma estratégia
de mudança e a persegue. As modificações do
comportamento de risco, neste estágio, ten-
dem a ser mais visíveis e recebem o reconheci-
mento externo.
Durante esse estágio, é importante que o
cliente esteja baseado no senso de auto-eficá-
cia. Ele precisa acreditar que tem autonomia
para mudar seu modo de viver.
Ação envolve a maioria das mudanças e re-
quer considerável compromisso, tempo e ener- Fonte: McConnaughy, Prochaska & Velicer, 1983.
gia. Os sujeitos, nesse estágio, comumente en-
Figura 9.1 Modelo do processo de mudança.
dossam observações, como: “Qualquer um
pode falar sobre mudanças, mas eu estou real-
mente fazendo alguma coisa sobre isso” (Pro-
chaska, DiClemente & Norcross, 1999, p.675). estágio até sair. Então, sugere a utilização de
A marca deste estágio é a modificação do “estados” de mudança, pois este termo não
comportamento-alvo e os esforços para mu- implicaria ordenamento ou seqüência. Contu-
dança. do, optamos em utilizar o termo estágio em
Manutenção: é o estágio no qual se traba- decorrência de uso corrente na literatura in-
lha a prevenção à recaída e a consolidação dos ternacional.
ganhos obtidos durante a ação. Tradicional- Miller (1995) explica as mudanças de está-
mente, manutenção é vista como um estágio gios como uma porta que se abre por um pe-
estático; entretanto, manutenção é um está- ríodo de tempo, e, se a pessoa consegue atra-
gio dinâmico, pois entende-se como a conti- vessar o próprio estágio, o processo continua,
nuação do novo comportamento para a mu- caso contrário, a porta se fecha, e ele volta para
dança, que demora algum tempo para se esta- a contemplação ou até mesmo à pré-contem-
belecer (Jungerman & Laranjeira, 1999). plação.
Nos comportamentos aditivos, os estágios Prochaska, DiClemente e Norcross (1999)
mantêm-se por cerca de seis meses, mas o es- apresentaram, posteriormente, um modelo em
tágio de manutenção pode ser por toda a vida. espiral para explicar melhor como a maioria das
A estabilização do comportamento em foco, pessoas se movem através dos estágios. Esse
evitando a recaída, é a marca do estágio de modelo permite ao sujeito voltar ao estágio de
manutenção (Prochaska, DiClemente & Nor- pré-contemplação várias vezes, antes de che-
crosss, 1999). gar ao estágio final de manutenção.
Manutenção é o desafio real em todos os A figura em espiral (vide Figura 9.2) permi-
comportamentos de risco, pois não é tão difí- te que os indivíduos se movam do estágio de
cil parar de beber; o difícil é ficar sóbrio; não é contemplação para a ação e da ação para a
difícil parar de fumar, o desafio é não voltar a manutenção, mas a maioria das pessoas reca-
fazê-lo; é fácil fazer uma dieta e perder peso, em. Durante a recaída, os indivíduos voltam
mas o difícil é mantê-lo (Miller, 1995). para estágios anteriores. Infelizmente, as pes-
O modelo inicial de Prochaska & DiClemen- quisas indicam que a grande maioria das pes-
te (1982, 1984) mostrava que o processo de soas recai em curto espaço de tempo. Allsop e
mudança se desenvolvia através da metáfora colegas (1997) citam um estudo realizado por
de uma porta giratória (vide Figura 9.1). Sut- Maddux e Desmond, em 1986, com usuários
ton (1997) faz uma crítica a esse modelo pelo de opiáceos, em que foi verificado que 70%
emprego do termo “estágio”, considerando dos tratados recaíram dentro de um mês, ou
que a pessoa entra por uma porta e fica nesse como no estudo de Prochaska e DiClemente

PSICODIAGNÓSTICO – V 91
Término

Manutenção

Pré- Contemplação Preparação Ação


contemplação

Pré- Contemplação Preparação Ação Recaída


contemplação

Fonte: Prochaska, DiClemente & Norcross, 1999.

Figura 9.2 Modelo em espiral dos estágios de mudança.

(1984), em que 85% dos fumantes voltavam Desenvolver discrepância: é ajudar o clien-
ao estágio de contemplação ou determinação. te a ver e sentir como o seu comportamento
A recaída é considerada como um evento ameaça importantes metas pessoais, eviden-
que marca o final do estágio de ação ou ma- ciando a distância entre onde a pessoa está e
nutenção e deve ser encarada como um esta- onde ela gostaria de chegar. O cliente será es-
do de transição. timulado a desenvolver a consciência das con-
Na abordagem da prevenção da recaída, seqüências de seu atual comportamento.
esta é vista como um processo transicional, Evitar argumentação: a confrontação gera
como uma série de eventos que podem ou não resistência e é um sinal para o técnico mudar
ser seguidos por um retorno aos níveis básicos as estratégias. As discussões são contraprodu-
do comportamento-problema. centes, por exemplo, fazer com que o cliente,
Marlatt e Gordon (1993) sugerem que a no confronto, aceite o rótulo da dependência
recaída faz parte do processo de mudança e de substâncias.
que, muitas vezes, é o modo como a pessoa Fluir com a resistência: é mover-se através
apreende e recomeça de uma forma mais cons- dela, sabendo reconhecer o momento do clien-
ciente. te, auxiliando dessa forma na resolução da am-
Integrando os conceitos de prontidão para bivalência. Várias formas de reflexão podem
mudança e ambivalência, Miller e Rollnick auxiliar na reformulação, como um simples co-
(1991) descreveram cinco princípios para tra- nhecimento da responsabilidade pessoal e li-
balhar na EM: expressar empatia, desenvolver berdade de escolha, assim como envolvendo
discrepância, evitar argumentação, fluir com a o cliente na resolução do problema.
resistência e estimular auto-eficácia. Estimular auto-eficácia: os clientes não vão
Expressar empatia: é a habilidade rogeria- considerar mudança, a não ser que eles pen-
na de ouvir reflexivamente. É utilizada para aju- sem que elas sejam possíveis: é necessário acre-
dar a clarificar a ambivalência sem provocar a ditar na possibilidade de mudança. Auto-efi-
resistência. Este princípio, de certa forma, é cácia é um elemento básico no processo de
paradoxal, pois, ao mostrar a aceitação do pa- motivação para mudança. O conceito foi ela-
ciente como ele é, ele estará livre para mudan- borado por Bandura (1977) como um impor-
ça ou não. tante mediador cognitivo do comportamento,

92 JUREMA ALCIDES CUNHA


sendo definida como um processo cognitivo, Oferecer resultados pessoais é proporcio-
uma vez que lida com julgamentos percebidos nar informações pertinentes e claras sobre a
ou avaliações feitas pelas pessoas sobre sua real situação do cliente e auxiliar no monitora-
competência para desempenhar-se adequada- mento do processo terapêutico.
mente, numa situação de tarefa específica. Responsibility (Responsabilidade): é a ên-
Marlatt e Gordon (1993), no modelo de pre- fase na responsabilidade pessoal do cliente e
venção da recaída, entendem a “auto-eficácia na liberdade de escolha. O entrevistador não
como a capacidade percebida do indivíduo para pode mudar os comportamentos do seu clien-
executar uma resposta de enfrentamento, um te ou fazer com que mude, pois depende dele
comportamento ativo para lidar efetivamente escolher entre continuar com o problema ou
com a situação específica, e não com a sua fazer mudanças. “Ninguém pode mudar ou
capacidade geral para exercer controle ou re- decidir por você. O que você vai fazer com o
sistir à tentação de ceder às compulsões inter- seu problema é só você que vai decidir” (Bien,
nas” (p.119). Miller & Tonigan, 1993, p.327).
A auto-eficácia não é ter habilidades, a auto- Quando é dito aos clientes que eles não têm
eficácia é a percepção, a certeza e a capacida- escolha, eles tendem a resistir à mudança.
de de exercer as habilidades. Advice (Aconselhamento): é proporcionar
Além desses princípios, Miller e Sanchez ao cliente conselhos claros e diretos, sobre por
(1994) enumeraram seis elementos comumen- que ele necessita de mudança e de saber como
te incluídos na EM e que são indispensáveis pode ser obtida; a chave é recomendar a mu-
para trabalhar estratégias de mudanças, po- dança de maneira enfática. Algumas vezes, as
dendo ser sumarizados pelo acrônimo inglês orientações são específicas, e, em outras, a
FRAMES: Feedback, Responsibility, Advice, prescrição é a abstinência total, como em si-
Menu, Empathy e Self-eficacy. tuações de dependência alcóolica (Gossop,
Feedback: é o uso da informação com base 1997). Estudos têm demonstrado que conse-
nos resultados obtidos da avaliação inicial es- lhos breves e intervenções breves podem de-
truturada e objetiva das reais condições do sencadear mudanças mais efetivas que trata-
cliente, por meio da história familiar, severida- mentos longos (Bien, Miller & Tonigan, 1993;
de da dependência, perfis dos exames labora- Heather, 1989).
toriais e neuropsicólogicos, totalizando três a Menu: é fornecer opções de escolha para o
quatro horas de exame. No projeto MATCH, cliente, mostrando alternativas para mudan-
foram em média sete horas de exame. A sim- ça. Por exemplo: “Existem maneiras diferentes
ples participação na avaliação pode produzir de as pessoas mudarem com sucesso seus há-
um efeito motivacional. O cliente recebe infor- bitos de bebida; eu vou dizer algumas delas, e
mações sobre os efeitos do seu problema no você vai escolher o que faz mais sentido pra
organismo e, dessa forma, reflete sobre sua você” (Miller, 1995, p.94).
situação presente. (Orford & Edwards, 1977). Empathy (Empatia): o técnico vai mostrar
Cada escore é explicado ao cliente, assim como ao cliente a aceitação, tentando entender sem
a relação dos seus escores com os dados nor- julgá-lo, escutando-o reflexivamente. O estilo
mativos. Por exemplo, o cliente recebe infor- descrito por Carl Rogers tem demonstrado ser
mações sobre seus níveis de gamaglutamil- preditivo de sucesso no tratamento de trans-
transpeptidase (GGT), que é uma enzima do tornos aditivos. A ambivalência é aceita como
fígado que indica o uso excessivo de bebida; parte da experiência humana. É um dos ele-
se os valores estão acima dos níveis normais, mentos mais significativos da EM, e estudos
serão preditores de doenças hepáticas e de demonstram ser o fator determinante na mu-
outros prejuízos. O cliente irá refletir sobre as dança do cliente (Miller, 1985; Orford & Edwar-
conseqüências negativas no seu organismo e, ds, 1977).
com isso, tomar uma decisão de mudar seu Self-eficacy (Auto-eficácia): o cliente acre-
comportamento aditivo. dita na própria capacidade de mudança, sen-

PSICODIAGNÓSTICO – V 93
do um preditor de resultados positivos em com- “problema” do sujeito. Investiga os estágios
portamentos aditivos. O otimismo do entrevis- de mudança: pré-contemplação, contempla-
tador também é um fator de motivação do ção, ação e manutenção e é composta por 32
cliente, pois o cliente percebe que o seu técni- itens, incluindo oito itens para cada estágio de
co busca e fica mais propenso a permanecer mudança.
no tratamento. Os clientes apresentam diferen- Da EM, também faz parte negociar um pla-
tes níveis motivacionais; portanto, necessitam no de mudanças, ajudando o cliente a estabe-
combinar diferentes estratégias, por exemplo, lecer suas metas.
clientes pré-contemplativos vão se beneficiar Normalmente, existe uma discrepância en-
com a compreensão das conseqüências nega- tre uma meta e o estado atual do cliente. Isso
tivas do seu comportamento aditivo, clientes poderá ser feito pelo feedback pessoal, com
ambivalentes podem se beneficiar com o ba- base na capacidade do cliente de entender sua
lanço decisional, e clientes no estágio de ação ambivalência, e, neste caso, o cliente está no
podem necessitar de técnicas de suporte e re- estágio de contemplação, estando mais cons-
forçadoras do seu novo comportamento. ciente do problema e da decisão de mudar. Ne-
Outras estratégias também são utilizadas gociar mudanças objetivas, como a abstinên-
para trabalhar a motivação do cliente para a cia em situações em que o cliente mostra de-
mudança. A simples identificação de barreiras, pendência do álcool, com graves comprometi-
como o acesso dos clientes ao serviço, o trans- mentos neuropsicológicos, co-morbidade e
porte, horários, entre outros, são obstáculos acentuado grau de ambivalência, é mais ade-
que podem ser removidos. Fatores externos, quado do que impor a abstinência.
como a exigência do empregador que seu fun- Vamos analisar com o caso de Fernando,
cionário faça o tratamento, pode ser uma op- de 42 anos, casado, dependente grave de ál-
ção de escolha no processo de mudança. Por cool, internado para tratamento, que realiza a
outro lado, práticas das instituições em man- avaliação proposta, envolvendo exames labo-
ter contato com seus clientes têm demonstra- ratoriais (GGT, GPT, GPO), provas neuropsico-
do bons resultados na manutenção do trata- lógicas, escalas para avaliar intensidade de sin-
mento, como no exemplo citado por Miller tomas de ansiedade e depressão, bem como a
(1995), em que, quando o telefonema marcan- gravidade da dependência, conseqüências ne-
do o tratamento foi dado pela instituição, 82% gativas do hábito de beber, estágios motivaci-
atenderam; quando foi deixada a iniciativa para onais e, principalmente, freqüência e quanti-
o cliente, somente 37% atenderam. dade de consumo de bebidas alcoólicas e/ou
A utilização de escalas para monitorar as de outras drogas. A devolução dos resultados
mudanças é freqüente e faz parte do estilo de é fornecida passo a passo, esclarecendo ao
trabalho da EM. A escala SOCRATES (Stages of cliente suas atuais condições. O cliente reflete,
Change Readiness and Treatment Eagerness questiona, busca informações e expressa resis-
Scale), desenvolvida por Miller e Tonigan tência, como no exemplo a seguir:
(1996), é empregada especificamente no uso F – “Isto não pode ser verdade, eu nunca me
e abuso de álcool e identifica o grau de moti- sinto bêbado, eu não fico atirado na sarjeta.”
vação para mudança, através dos estágios de E – “Está parecendo que, para você, algo
reconhecimento, ambivalência e ação. A pri- está errado com estes resultados.”
meira versão foi uma escala com 32 itens, sen- F – “Você acha que eu sou dependente?”
do posteriormente desenvolvida uma versão E – “Estes resultados dizem para você como
com 19 itens, validada no projeto MATCH (Mi- você está e que você está apresentando sinais
ller & Tonigan, 1996). Já a escala URICA (Uni- importantes de dependência.”
versity of Rhode Island Change Assessment), F – “Eu não acho que sou alcoólatra.”
criada por McConnaughy e colegas (1983), não O entrevistador continua o feedback. Este
é específica para o tipo de comportamento- processo pode ser muito difícil, e o papel do
problema, mas se refere genericamente ao técnico nessa fase é fundamental, vai ser ativo

94 JUREMA ALCIDES CUNHA


e orientador. Resistência é comum, principal- O que pode interferir nos meus planos:
mente quando o paciente se encontra frente a “Com o passar do tempo, não aparecerem os
frente com os resultados. resultados. A depressão, o desânimo e a falta
Em outro momento da entrevista, o cliente de perseverança”.
passa a considerar necessário fazer mudanças. Neste caso, o tratamento hospitalar está
F – “Eu gosto de beber, mas eu sei que é começando a agir, e o verdadeiro desafio é re-
importante parar de beber.” tornar ao lugar onde vive e, com sucesso, man-
E – “O que você acha que pode acontecer ter a abstinência do álcool. Comumente, a pri-
se você voltar a beber?” meira entrevista da EM será próxima à alta
F – “Bem, pelo que entendi, tudo pode pio- hospitalar e as entrevistas subseqüentes bem
rar, meu fígado, minha memória, minha famí- planejadas e combinadas com o cliente. A se-
lia, meu trabalho.” gunda entrevista e subseqüentes serão utiliza-
E – “Como você se sente em relação ao tra- das para rever o progresso e modificar o pla-
tamento neste momento?” no, caso necessário. O técnico deve reforçar as
F – “Eu tenho que me afastar da bebida, mudanças que o cliente tem feito, salientar a
para recuperar o que perdi.” atitude de responsabilidade dele, incentivar
Neste momento, realiza-se com o cliente o a auto-estima e valorizar seu esforço. O côn-
plano de mudanças, fornecendo-lhe uma va- juge ou outro familiar também é solicitado a
riedade de opções incluindo grupos de AA (Al- comparecer nesses encontros, e, posterior-
coólicos Anônimos), medicação, entre outros. mente, as entrevistas são mais espaçadas e
Solicita-se que expresse, por escrito, com auxí- consideradas de manutenção. O cliente é
lio do entrevistador, a sua proposta de mudan- solicitado a retornar após três meses, para
ça, como no exemplo: outra avaliação, com o objetivo de verificar
As mudanças que eu quero fazer: “Parar de mudanças, sendo mais um elemento moti-
beber, pagar as minhas dívidas, voltar a ser um vador.
bom funcionário, cuidar da minha saúde”. Sumarizando, a Entrevista Motivacional é
As razões mais importantes pelas quais eu uma ferramenta que o técnico especializado
quero fazer mudanças são: “Preservar minha nos tratamentos dos comportamentos aditivos
saúde, meu emprego, minha família”. deverá empregar como recurso, sendo bastan-
Os passos que eu pretendo seguir para a te útil em muitas fases da avaliação para o tra-
mudança são: “Parar de beber, continuar o tra- tamento e, especialmente, nos casos em que
tamento indicado e freqüentar os grupos de AA”. os clientes estão ambivalentes e resistentes à
Como as outras pessoas podem te ajudar: mudança. Jungerman e Laranjeira (1995) citam
“Os incentivos do meu filho e da minha família”. estudos recentes sobre a efetividade da EM.
Como vou saber se meu plano está funcio- Apesar de a EM ser basicamente para transtor-
nando: “Me mantendo sóbrio e começarem a nos aditivos, poderá ser empregada na promo-
aparecer os resultados positivos”. ção da saúde mental.

PSICODIAGNÓSTICO – V 95
Entrevista lúdica
Blanca Guevara Werlang
10
F reud organizou a sua teoria sobre a sexuali-
dade infantil com base nos dados obtidos
na análise de seus pacientes adultos. Em fun-
o ego da criança infantil não estava suficiente-
mente desenvolvido para suportar o peso de
uma interpretação psicanalítica, e por saber
ção disso, durante muito tempo, estimulou que a criança não era motivada a procurar aná-
seus alunos e amigos, em Viena, a coletarem e lise, sendo encaminhada mais por ser um so-
a descreverem observações sobre a vida sexual frimento da família; portanto, a interpretação
de seus filhos, para poder obter um material não significaria nada para essa criança (Ajuria-
que desse provas evidentes daquilo que ele guerra, 1983; Bleichmar & Bleichmar, 1992;
afirmava. O resultado disso foi o caso do pe- Hinshelwood, 1992; Lebovici & Soulé, 1980).
queno Hans. Através dele, Freud (s/d) finalmen- Em compensação, Melanie Klein (1980),
te compreendeu as neuroses infantis e seu pa- desde o início, entendeu que as crianças pode-
pel na organização da neurose dos adultos, riam, sim, ser motivadas dentro de si mesmas
confirmando as hipóteses que havia levantado para a análise, insistindo que elas poderiam ser
no seu artigo Três ensaios sobre a teoria da analisadas, do mesmo modo que os adultos,
sexualidade (Freud, 1989). explorando os conflitos inconscientes, absten-
A exposição do tratamento do pequeno do-se de qualquer medida educativa ou de
Hans deu a Freud, sem dúvida, a oportunidade apoio. Neste sentido, Klein pode ser conside-
de fazer bem mais do que confirmar certas hi- rada como a iniciadora da técnica psicanalítica
póteses sobre a precocidade da vida sexual. para crianças, preconizando a aplicação do
Colocou, sem ser esta sua intenção, na roda jogo, por entendê-lo como o equivalente a um
das discussões psicanalíticas, a possibilidade de fantasma masturbatório.
aplicar os princípios da técnica psicanalítica à Contudo, foi Freud o primeiro estudioso que
criança. refletiu sobre a função e o mecanismo psicoló-
A partir do pequeno Hans, Hermine von gico da atividade lúdica infantil, quando inter-
Hug-Hellmuth observou que o jogo fornecia ex- pretou a brincadeira de seu neto de 18 meses
celentes possibilidades de compreensão dos de idade. O menino brincava com um carretel
fantasmas, instituindo uma primeira forma de amarrado em um barbante e, sempre seguran-
análise infantil que se vinculou, primeiramen- do o fio, lançava o carretel por cima de seu
te, à educação. Ela não utilizou interpretações berço, cercado por uma cortina, onde esse de-
como na análise de adultos, por entender que saparecia. Exclamava, então, “fora” (fort), pu-

96 JUREMA ALCIDES CUNHA


xando logo o barbante, até atirar o carretel para quedo é, então, um meio de comunicação, é a
dentro do berço, saudando seu aparecimento ponte que permite ligar o mundo externo e o
com um alegre “aqui” (da). interno, a realidade objetiva e a fantasia.
Freud compreendeu que essa criança esta- Pode-se dizer, pois, que Freud estabeleceu
va brincando de ir embora e voltar. Era a ma- os marcos referenciais da técnica do jogo, de-
neira que ela tinha para controlar a angústia monstrando que o brincar não é só um passa-
da ausência da mãe. Então, a criança não esta- tempo para viver situações prazerosas, mas
va meramente se divertindo. Pelo contrário, por também uma maneira de elaborar circunstân-
meio da manipulação do brinquedo, estava do- cias traumáticas. Prosseguindo nesse sentido,
minando uma situação que, de outra forma, Melanie Klein, como já mencionamos, colocou
seria impossível. Assim, para Freud (1976), as o brinquedo num lugar de destaque na luta
crianças repetem, nas suas brincadeiras, tudo contra a angústia mobilizada pelas pulsões
que na vida lhes causou profunda impressão sexuais. Segundo essa autora, ao brincar, a
e, brincando, se tornam senhoras da situação. criança domina realidades dolorosas e contro-
O menino do carretel tinha em seu jogo um la medos instintivos, projetando-os ao exterior,
representante da mãe atado ao cordão. Sim- nos brinquedos. Este mecanismo é possível,
bolicamente, deixava-a se afastar, até a atirava porque a criança, desde tenra idade, tem a ca-
longe e, depois, quando sua vontade o deman- pacidade de simbolizar. Assim, para Klein
dasse, a fazia voltar. Tinha, como Freud ressal- (1980), o brincar é a linguagem típica da crian-
tou, transformado a passividade de sua condi- ça, equiparando a linguagem lúdica infantil à
ção infantil em atividade. associação livre e aos sonhos dos adultos. Por-
As crianças, então, segundo Freud (1976), tanto, a neurose de transferência desenvolve-
brincam para fazer alguma coisa que, na reali- se da mesma maneira, não sendo as figuras
dade, fizeram com elas. Nas brincadeiras, após parentais atuais, mas as internalizadas, que são
idas a médicos, onde o corpo é examinado, ou projetadas no analista, que terá como princi-
após alguma cirurgia, muitas vezes, essas lem- pal função interpretar todo o material associa-
branças, mesmo sendo penosas, se transfor- tivo que a criança traz.
mam em conteúdo de jogo. Por quê? Porque, Na mesma época, Anna Freud, seguindo
através do brinquedo, a criança tem a possibi- ensinamentos de Hug-Hellmuth, colocou-se
lidade de realizar o desejo dominante para sua numa posição contrária à de Melanie Klein.
faixa etária, por exemplo, o de ser grande e de Desse modo, com uma concepção diferente da
fazer o que fazem os adultos. Desta maneira, mente infantil, afirmava que a criança não pos-
na situação anterior relatada, a criança poderá sui consciência de doença, estando ainda pre-
ser o médico que estará atacando um corpo, sa a seus objetos originais (pais), pelo que não
passando a provocar, num objeto/brinquedo ou poderia estabelecer uma neurose de transfe-
num companheiro de seu grupo de iguais, a rência com o terapeuta. Afirmava que o tera-
sensação desagradável por ela experimentada. peuta deveria apenas reforçar os aspectos po-
Então, passando da passividade do fato para a sitivos do vínculo, sempre num nível de orien-
atividade do jogo, estará representando, com tação educativa, considerando, ainda, que
algum brinquedo ou companheiro, o que não em nada o brincar da criança poderia ser
pode exercer sobre a pessoa do médico. É, comparado aos sonhos ou à associação livre
portanto, na situação do brinquedo, que a do adulto.
criança procura se relacionar com o real, expe- As discrepâncias entre Melanie Klein e Anna
rimentando-o a seu modo, procurando cons- Freud e o debate dos respectivos pontos teóri-
truir e recriar essa realidade. cos perduram, de certa forma, até hoje, lem-
Através do brinquedo, a criança não só rea- bra Hinshelwood (1992), nas teorias da psica-
liza seus desejos, mas também domina a reali- nálise kleiniana e da psicologia do ego. Mas,
dade, graças ao processo de projeção dos pe- mesmo que discrepantes, ambos os posiciona-
rigos internos sobre o mundo externo. O brin- mentos ajudaram em muito na conceitualiza-

PSICODIAGNÓSTICO – V 97
ção e no desenvolvimento da psicoterapia in- terpretação, porque podem se romper as de-
fantil. Certamente envolvida no mesmo intui- fesas, cuja fragilidade ou rigidez ainda não
to, a conceituada psicanalista argentina Armin- conhecemos, e, como conseqüência, desper-
da Aberastury (1978) entendeu que a criança tar muita ansiedade e/ou culpa, bem como ali-
não só estabelece uma transferência positiva mentar fantasias de que seus impulsos podem
e/ou negativa com o psicoterapeuta, como ex- atacar ou destruir a relação com o psicólogo,
pressava Klein, como também é capaz de es- sentimentos estes que ficariam sem resolver,
truturar, através dos brinquedos, a represen- se a decisão for a de não acompanhar psicote-
tação de seus conflitos básicos, suas principais rapicamente a criança.
defesas e fantasias de doença e cura, deixan- Desta maneira, cabe ressaltar, como expres-
do em evidência, já nos primeiros encontros sam Efron e colegas (1978), que a hora de jogo
do acompanhamento, o seu funcionamento diagnóstica, fundamentada num referencial
mental. Aberastury sugeriu, ainda, que possi- teórico psicodinâmico, é um recurso técnico
velmente esses fenômenos surgem devido ao que o psicólogo utiliza dentro do processo psi-
temor da criança de que seu psicoterapeuta codiagnóstico, que tem começo, desenvolvi-
repita com ela a conduta negativa dos objetos mento e fim em si mesmo, operando como
originários que lhe provocaram a perturbação, unidade para o conhecimento inicial da crian-
prevalecendo agora o desejo de que o psicólo- ça, devendo interpretá-la como tal, e cujos
go assuma uma função através da qual lhe dê dados serão ou não confirmados com a testa-
condição para melhorar. gem. Entretanto, a primeira hora de jogo tera-
Aberastury evidenciou, assim, o valor diag- pêutica é apenas um elo dentro de um contex-
nóstico da entrevista lúdica, falando, pela pri- to maior, onde irão surgir novos aspectos e
meira vez, no nosso meio mais próximo, sobre modificações estruturais em função da inter-
a hora de jogo diagnóstica, estabelecendo di- venção ativa do terapeuta.
ferenças com a primeira hora de jogo terapêu- No psicodiagnóstico infantil, costuma-se
tica. entrevistar os pais, antes de ver a criança, com
Para fins diagnósticos, segundo essa auto- o objetivo de obter informações o mais abran-
ra, não há necessidade de uma caixa com ma- gentes possíveis sobre o problema e sobre
terial lúdico exclusiva para cada criança, con- como a criança é. Após as entrevistas com os
siderando que qualquer tipo de brinquedo, pais, mantém-se o primeiro contato com a
mesmo que sejam os mais simples, oferecem criança, que pode ser por meio de uma entre-
possibilidades lúdicas projetivas para o diag- vista lúdica. Nas entrevistas que foram realiza-
nóstico. Entretanto, quando se trata da primei- das com os pais, deve-se combinar que eles
ra hora de jogo de tratamento, ao finalizar a conversem com a criança a respeito do motivo
sessão, além do terapeuta estabelecer as con- pelo qual é levada ao psicólogo. Assim, esse
dições do contrato psicoterápico, deverá guar- pode ser o início do diálogo com a criança,
dar junto com a criança todo o material lúdico dentro da sala de jogo, sendo importante, en-
numa caixa, que ficará fechada e à qual só te- tão, perguntar se sabe o que está fazendo ali,
rão acesso a criança e o terapeuta. Essa caixa, porque veio ou o que os pais falaram da sua
sem dúvida, se transforma durante o tratamen- vinda ao psicólogo. Esclarecendo esse aspec-
to no símbolo do sigilo, similar ao contrato to, compreender-se-ão as fantasias da criança
verbal que se estabelece com o adulto quando a respeito do processo de avaliação, e, se a res-
se inicia o tratamento. posta for negativa, deve-se fazer um breve re-
Na entrevista lúdica, Aberastury (1978) con- lato do que foi falado com os pais, sem deta-
sidera também conveniente não interpretar, já lhes muitos profundos, mas sempre explicitan-
que ainda não temos como saber se a criança do a verdade.
será tratada ou não e, em caso de encaminha- As instruções específicas para uma entre-
mento, qual a técnica mais adequada para apli- vista lúdica consistem em oferecer à criança a
car. Então, é muito delicado arriscar uma in- oportunidade de brincar, como deseje, com

98 JUREMA ALCIDES CUNHA


todo o material lúdico disponível na sala, es- na como observador, mas também é ativo, na
clarecendo sobre o espaço onde poderá brin- medida em que sua atitude é atenta na com-
car, sobre o tempo disponível, sobre os papéis preensão e formulação de hipóteses sobre a
dela e do psicólogo, bem como sobre os obje- problemática do entrevistado, assim como na
tivos dessa atividade, que possibilitará conhe- ação de efetuar perguntas para esclarecer dú-
cê-la mais e, assim, poder posteriormente aju- vidas sobre a brincadeira. Ainda, dependendo
dá-la. de cada situação, o psicólogo poderá não par-
A entrevista lúdica de cada processo psico- ticipar do jogo ou brincadeira, ou poderá de-
diagnóstico é uma experiência nova, tanto para sempenhar um determinado papel, caso seja
o psicólogo como para a criança, em que se o desejo da criança (Efron, Fainberg, Kleiner et
refletirá o estabelecimento de um vínculo trans- alii, 1978).
ferencial breve. Nos brinquedos oferecidos pelo Em função das características da atividade,
psicólogo, a criança deposita parte dos senti- é mais adequado trabalhar em uma sala que
mentos, representante de distintos vínculos não seja o consultório de adultos. É mais con-
com objetos de seu mundo interno (Efron, Fa- veniente, então, realizar a atividade em uma
inberg, Kleiner et alii, 1978). Assim, muitos fe- sala preparada para brincar, ou seja, uma sala
nômenos que não seriam obtidos pela palavra fácil de limpar, razoavelmente ampla, para não
poderão ser observados através do brincar, prejudicar a liberdade de expressão, e, sempre
onde a criança, segundo Logan (1991), proje- que possível, próxima a um banheiro e/ou co-
tará suas questões-chave, tanto no aconteci- zinha, onde a criança possa ter acesso fácil à
do do jogo quanto na maneira como usa os água, caso deseje brincar com ela, assim como
materiais e os brinquedos. possa limpar a sujeira de material de tinta, ca-
As crianças, de maneira geral, agem, falam netinhas, argila e semelhantes.
e/ou brincam de acordo com suas possibilida- O material lúdico deve ser apresentado sem
des maturativas, emocionais, cognitivas e de uma ordem aparente, em caixas e/ou armários,
socialização, e é pela sua ação (ativa ou passi- sempre com as tampas ou portas abertas, de-
va) que elas exprimem suas possibilidades, des- vendo ser adequado para atender crianças de
cobrindo-se a si mesmas e revelando-se aos diferentes idades, sexo e interesses.
outros. Em função disso, algumas aceitam ra- Procurando representar os objetos mais
pidamente acompanhar o psicólogo até a sala comuns do mundo real circundante, os brin-
de entrevistas, começando facilmente a brin- quedos mais usados são: papel, lápis preto e
car, conversar e interagir com o interlocutor. colorido, canetinhas, borracha, apontador, ré-
Outras podem resistir a se separarem dos pais, gua, cola, fita adesiva, corda, tesoura, massa
ou ficam na sala de entrevista muito inibidas, para modelar, argila, tinta, pincéis, bonecos e
tanto na ação como na fala, tornando-se ne- famílias de bonecos, casa de bonecos, mario-
cessário que o psicólogo faça algum assinala- netes, família de animais selvagens e domésti-
mento, com a finalidade de ajudá-las a lidar cos, blocos de construção, carros, caminhões,
com a angústia. Existem também ocasiões em aviões, bola, armas de brinquedo, soldados,
que a criança, devido à sua problemática emo- super-heróis, cowboys e índios, equipamentos
cional, rompe o enquadramento, exigindo por de cozinha, de enfermagem e de ferramentas
parte do entrevistador a colocação de limites. domésticas, quebra-cabeças, telefone, panos,
A postura do psicólogo deve ser, em todos os jogos de competição e quadro-negro.
casos, a de estimular a interação, conduzindo Analisar e interpretar uma hora de jogo
a situação de maneira tal que possa deixar diagnóstica não é uma tarefa fácil. Requer que
transparecer a compreensão do momento, res- o profissional esteja bem familiarizado com o
peitando e acolhendo a criança, de forma que material teórico de cunho analítico sobre a base
esta se sinta segura e aceita. fundamental do marco teórico-técnico forne-
Em parte, o papel do psicólogo na entrevis- cido por Freud, Melanie Klein e Arminda Abe-
ta lúdica diagnóstica é passivo, porque funcio- rastury, sendo, então, a linha central de inter-

PSICODIAGNÓSTICO – V 99
pretação a análise das fantasias inconscientes um autoconhecimento para o conhecimento e
a partir do jogo. exploração do mundo que o cerca. O surgimen-
Kornblit (1978) salienta que uma análise to de novas etapas indica aumento da vivência
detalhada da hora de jogo permite: “a) a con- e do conhecimento da criança, mostrando a
ceitualização do conflito atual do paciente; b) passagem de seu conhecimento corporal para
coloca em evidência seus principais mecanis- o ambiental, até o início da socialização e aqui-
mos de defesa e ansiedades; c) avalia o tipo de sição de noções simbólicas.
rapport que pode estabelecer a criança com Os brinquedos e jogos, então, devem ser
um possível terapeuta e o tipo de ansiedade analisados do ponto de vista evolutivo, regis-
que contratransferencialmente pode despertar trando cada uma das manifestações de con-
nele; d) põe de manifesto a fantasia de doen- duta lúdica, classificando-as conforme as ida-
ças e cura” (p.225). Por outro lado, a autora des correspondentes dentro de algum dos re-
considera também importante compreender a ferenciais da psicologia do desenvolvimento.
hora de jogo como uma história argumental Erik Erikson, citado por Melvin e Wolkmar
da criança, construída em resposta a uma si- (1993), por exemplo, descreve três fases suces-
tuação de estímulo, avaliando, então, o modo sivas na evolução dos brinquedos das crianças:
como ela se inclui em dita situação. Isso possi- auto-esfera, microesfera e macroesfera. Na
bilita considerar aspectos ou indicadores por auto-esfera, o brinquedo da criança é centrali-
ela chamados de “formais”, que, muitas vezes, zado na exploração do próprio corpo e/ou nos
ficavam esquecidos ou abafados pela princi- objetos que estão imediatamente a seu alcan-
pal preocupação na inferência de conteúdos ce; na microesfera, a criança expressa suas fan-
inconscientes. Alguns desses indicadores for- tasias através de pequenos brinquedos repre-
mais seriam: a maneira como a criança se apro- sentativos; e, na macroesfera, por incorporar a
xima dos brinquedos, a sua atitude no início e vivência social, passa, através de suas relações,
no final da hora de jogo, a sua localização no a dividir o mundo com os outros.
consultório, a sua atitude corporal e o manejo Por outro lado, Piaget, conforme Ajuriaguer-
do espaço. ra (1983), também propõe uma classificação
Efron e colegas (1978) lembram que não que leva em conta, ao mesmo tempo, a estru-
existe um roteiro padronizado para analisar tura do jogo e a evolução das funções cogniti-
esse método de avaliação. Por isso, propõem vas da criança. Conseqüentemente, fala de brin-
um guia de oito indicadores que possibilitam quedos e jogo de exercício (até os 2 anos), em
estabelecer critérios mais sistematizados e co- que a conduta lúdica é destinada exclusivamen-
erentes para orientar a análise com fins diag- te para a obtenção de prazer; de brinquedos e
nósticos e prognósticos, em especial, para a jogos simbólicos (entre 2 e 8 anos), em que a
classificação do nível de funcionamento da criança desenvolve a capacidade de represen-
personalidade, sempre dentro de um entendi- tar uma realidade que não está presente no
mento dinâmico, estrutural e econômico. Os seu campo perceptivo; e, por último, de brin-
indicadores são: escolha de brinquedos e jo- quedos e jogo de regras (a partir dos 8 anos),
gos, modalidade do brinquedo, motricidade, que são uma imitação das atividades dos adul-
personificação, criatividade, capacidade simbó- tos e que pertencem ao domínio do código
lica, tolerância à frustração e adequação à rea- social.
lidade. Sugere-se, pois, que cada uma das condu-
A escolha de brinquedos e jogos está rela- tas lúdicas, identificadas de acordo com a cro-
cionada com o momento evolutivo emocional nologia de cada fase evolutiva corresponden-
e intelectual em que a criança se encontra. Ao te, seja, ainda, comparada, dentro do referen-
nascer, o bebê é um ser passivo, que fica a cial psicanalítico, com as fases de evolução da
maior parte do tempo deitado. Mas, à medida libido (oral, anal, fálica e genital), o que pro-
que se desenvolve, passa a sustentar a cabeça, porcionará uma compreensão mais abrangen-
a sentar-se e assim por diante, passando de te do funcionamento infantil.

100 JUREMA ALCIDES CUNHA


Cada criança, segundo Efron e colegas nha de bonecas, passando o resto do tempo
(1978), estrutura uma modalidade de brinque- organizando os móveis de forma indecisa,
do que lhe é própria, baseada nas formas de mudando-os tantas vezes de lugar que o tem-
manifestação simbólica de seu ego e de seus po da entrevista se esgota.
traços de funcionamento psíquico. Entre as A ação repetitiva de Renata, a sua excessi-
principais modalidades, temos a plasticidade, va necessidade de ordem e perfeccionismo,
a rigidez, a estereotipia e a perseveração. certamente cumpre a finalidade de afastar ou
A plasticidade pode ser observada quando conter algum perigo ou ameaça imaginária,
a criança consegue expressar suas fantasias deixando transparecer uma modalidade de
através de brincadeiras organizadas, com se- brincar rígida, não adaptativa, própria de crian-
qüência lógica, utilizando brinquedos ou ob- ças com componentes neuróticos.
jetos que podem modificar a sua função de Por outro lado, os jogos estereotipados e
acordo com a sua necessidade de expressão, perseverantes são a modalidade mais patoló-
mostrando uma variedade de recursos egóicos gica do funcionamento egóico, típica de crian-
e uma significativa riqueza interna, sem neces- ças com funcionamento psicótico, como é o
sidade de recorrer a mecanismos de controle caso de Antônio, que é um menino de 4 anos,
excessivos. encaminhado para avaliação psicológica pelo
Entretanto, quando a criança fixa certos neurologista para ajudar na classificação diag-
comportamentos ou ações lúdicas de maneira nóstica. Embora tenha aceitado facilmente se
rígida para expressar uma mesma fantasia, separar dos pais para entrar na sala de entre-
mostra grandes dificuldades para aproveitar e/ vista, não realizou nenhum intercâmbio verbal
ou modificar os atributos dos brinquedos e um ou contato visual com o examinador, evitando
ego pobre em recursos frente à ansiedade, re- qualquer tentativa de aproximação por parte
sultando na escolha de brinquedos e jogos deste. Não atendeu a qualquer solicitação di-
monótonos e pouco criativos, como, por exem- reta, desprezando blocos, carrinhos e outros
plo, é o caso de Renata. brinquedos oferecidos, usando apenas um
Renata é uma bonita menina de 7 anos e 6 boneco para bater na sua própria cabeça. Pas-
meses, muito bem arrumada, mostrando sinais sou a maior parte do tempo ora correndo pela
evidentes de cuidados com sua aparência, sala, ora andando em círculos, ora andando
muito perfumada e com uma exigente combi- na ponta dos pés, balançando as mãos e mo-
nação de cores, desde a tiara nos cabelos até vendo os seus dedos, indiferente ao ambiente
os sapatos. Seus pais a trouxeram para avalia- onde estava inserido.
ção por estarem achando-a muito angustiada O comportamento de Antônio, na entrevis-
com suas atitudes repetitivas, contando que a ta lúdica, deixa clara a falta de resposta afetiva
menina não consegue brincar, arrumar seu e a presença de maneirismos e movimentos
quarto ou concluir seus temas escolares, pois estereotipados, assim como de ações auto-
perde muito tempo na tentativa de organizar agressivas, evidenciando uma desconexão com
a atividade proposta. Durante a entrevista lú- o mundo externo, tendo como única finalida-
dica, mostrou-se insegura, pedindo licença para de a descarga de impulsos do id sem fins co-
levantar, sentar ou pegar os brinquedos e mui- municacionais.
to preocupada em não sujar ou amassar sua O desenvolvimento motor é, segundo Mel-
roupa. Em vez de brincar, passou a maior par- vin e Volkmar (1973), uma seqüência de está-
te do tempo arrumando os brinquedos que se dios ordenados, que inicia com o controle pos-
encontravam na prateleira de um armário, pro- tural do pescoço, por volta da terceira ou quar-
curando deixá-los organizados, como se fosse ta semana de vida, até o caminhar indepen-
a exposição de uma vitrine, com a justificativa dente, ao redor dos 18 meses. Aos poucos, as
de ser esta a forma mais fácil de enxergá-los, habilidades motoras tornam-se cada vez mais
para depois poder decidir com quais deles brin- sofisticadas, tornando-se possíveis várias ha-
caria. Finalmente, decide brincar com a casi- bilidades de autocuidado (vestir, desvestir-se,

PSICODIAGNÓSTICO – V 101
pentear-se, comer com utensílios, etc.), assim sintonia com a realidade de seu mundo inter-
como habilidades de parar num pé só, subir e no. A análise desse indicador permitirá com-
descer escadas, pular e dançar. As habilidades preender o equilíbrio existente ou não entre o
percepto-motoras também se aperfeiçoam, superego, o id e a realidade, verificando tam-
sendo que, em torno dos 2 anos, a criança pode bém a capacidade de fantasia na definição de
copiar um círculo, aos 3 anos pode copiar uma determinados papéis, que, com o auxílio da
cruz, aos 5 anos é capaz de desenhar um qua- mágica lúdica, possibilitará, pelo menos por um
drado e, aos 7, um losango. No período entre período limitado, a satisfação dos desejos mais
os 6 e 11 anos, tanto os aspectos quantitati- grandiosos que seu eu consciente, em outras
vos como os qualitativos se consolidam, sen- circunstâncias, não lhe permitiria.
do que partes do desenvolvimento anterior se Marcelo é um menino de 4 anos e 11 me-
organizam subitamente, passando a funcionar ses, que foi trazido para avaliação psicodiag-
de forma fluente e integrada, até que, perto nóstica, por dificuldades para se separar da
dos 9 anos, as habilidade motoras se tornam mãe, tanto em casa como na escola. Na entre-
automáticas e estabelecidas. vista lúdica, desenvolveu uma brincadeira em
Dessa maneira, parece importante que o psi- que ele próprio assumiu o papel de um “gi-
cólogo que conduz a hora de jogo diagnóstica gante”. Um gigante muito forte, corajoso, bra-
tenha, além dos conhecimentos essenciais da vo e malvado, que entra na casa da família das
psicologia evolutiva, conhecimentos básicos de bonecas, à noite, quando todos dormem, para
fisiologia, neurologia e psicomotricidade, que derrubar, esconder e trocar todos os objetos
lhe possibilitem identificar e descrever as pau- de lugar, deixando, como ele mesmo expressa,
tas motoras da criança que está avaliando, para “Tudo bagunçado! Tudo espalhado!”. Expres-
verificar a adequação destas à etapa evolutiva sa claramente satisfação, quando espalha os
em que a criança se encontra. Em casos espe- pequenos móveis e os diversos bonecos, mis-
cíficos de imaturidade ou dificuldades moto- turando-os com os blocos lógicos, carrinhos e
ras, com interferência na aprendizagem esco- demais brinquedos, exclamando: “O temporal
lar, torna-se conveniente a solicitação de ava- do gigante!”. Frente à observação do psicólo-
liação complementar psicopedagógica ou neu- go sobre a proximidade do final da entrevista,
rológica, que auxiliam tanto no diagnóstico Marcelo rapidamente olha ao seu redor e jun-
principal como no diferencial. ta alguns brinquedos, montando, com parte
A avaliação da motricidade é, pois, de es- dos móveis e objetos da cozinha, uma mesa,
pecial importância, uma vez que o manejo ade- com xícaras, pratos, colher, copos e jarras,
quado das possibilidades motoras, no que diz mencionando: “O gigante sumiu. Ele fez uma
respeito à integração do esquema corporal, mágica. Olha o pão, olha a xícara. Eles vão acor-
organização da lateralidade e estruturação es- dar. O pai ficará bravo. A mãe ‘junta’ o filho,
paço-temporal, possibilitará à criança o domí- mas tem café na mesa, todos vão lanchar. Tia,
nio dos objetos do mundo externo no campo foi só uma brincadeira, agora vou arrumar”.
social, escolar e emocional, satisfazendo suas Marcelo certamente está tendo dificulda-
principais necessidades com autonomia, en- des de enfrentar as frustrações e a ansiedade
quanto dificuldades nesse âmbito provocarão típica de sua faixa etária, que surgem com seu
certamente limitações e frustrações. inevitável crescimento e exigência por parte dos
A personificação é a capacidade da criança pais de alcançar mais autonomia, o que lhe
para assumir e desempenhar papéis no brin- deve provocar insegurança e desejos de man-
quedo. É um elemento comum em todos os ter o aconchego materno. Ao se envolver rapi-
períodos evolutivos, através do qual as crian- damente com a tarefa proposta de “brincar
ças transformam seus brinquedos ou a si mes- como o desejasse”, liberou a sua onipotência,
mas em personagens imaginários ou não, de identificando-se com uma figura poderosa, “o
acordo com sua faixa etária, expressando afe- gigante”, para poder fazer tudo aquilo que as
tos, tipos de relações e conflitos, sempre em figuras de autoridade não aprovariam, como

102 JUREMA ALCIDES CUNHA


forma de denunciar seu descontentamento e Com o aprendizado escolar, aparecem no-
castigá-los. Extravasa, assim, seus conteúdos vos jogos, em que se combinam a capacidade
agressivos de ataque e domínio, nem que seja intelectual e o azar, sendo o período da com-
quando a autoridade está dormindo, ou quan- petição e de partilha de papéis com seu grupo
do o superego está mais permissivo, deixando de iguais. Mas, em todos os períodos evoluti-
o ego, dominado pelo id, satisfazer desejos e vos, o simbolismo habilita a criança a transfe-
impulsos. Mas, quando a realidade se impõe, rir interesses, fantasias, ansiedades, culpa, ten-
novamente de forma onipotente, faz uma má- dências destrutivas para outros objetos e/ou
gica para amenizar o caos instalado, com ob- pessoas, revelando preocupações e ansiedades,
jetos e alimentos reparadores, como uma for- aspirações e desejos, na tentativa de obter, atra-
ma de aplacar a culpa provocada pelos seus vés da ação lúdica, o domínio do mundo exter-
impulsos agressivos. no, e, como indicador avaliativo, possibilita
Através dessa personificação, houve clara- compreender também a capacidade expressi-
mente uma regressão a serviço do ego, que, por va da criança e a qualidade do conflito.
meio do relaxamento dos controles internos, fa- Tentando exemplificar, lembramos o caso de
cilitou ao Marcelo a projeção de fantasias e de- João, de 6 anos de idade, que apresenta medo
sejos, desprendendo-se transitoriamente das rí- de dormir sozinho e do escuro, necessitando
gidas regras do processo secundário, represen- ainda dormir com seus pais. Desenvolve, na
tando simbolicamente conteúdos internos. entrevista lúdica, a seguinte brincadeira e diá-
Criar é inventar ou transformar a partir da logo:
própria capacidade. Quando a criança constrói Pega uma caixa que contém madeiras de
um novo objeto ou transforma um já existen- diversas formas e tamanhos e monta o que ele
te, mostra a sua capacidade de relacionar ele- chama de um “dormitório”. Coloca dentro do
mentos novos no brinquedo a partir da reor- cercado de madeiras uma cama de casal, duas
ganização de experiências anteriores. Assim, a mesinhas de cabeceira e dois abajures. Procu-
criatividade é um processo mental de manipu- ra, noutra caixa, os bonecos da família e, en-
lação do ambiente do qual resultam novas quanto isso, fala:
idéias, formas e relações. J – “Este é o pai (boneco maior). Esta é a
Quando a criança utiliza uma variedade de mãe (mostrando uma boneca). Sabes? Estes
elementos para se expressar no brinquedo, está pais vão ter um filho!”
exercitando a sua capacidade simbólica. O jogo E – “É mesmo?”
é uma forma de expressão da capacidade sim- J – “Claro, tu não reparou?”
bólica, e a vida de fantasia se torna mais ob- E – “E tu, como reparaste?”
servável à medida que a criança se torna apta J – “Olha, fica quieta, que a criança precisa
para o jogo simbólico. dormir (fala em voz baixa). Ele vai entrar na
Durante o primeiro ano de vida, por exem- cama deles. Ele agora está quietinho entre os
plo, o brinquedo consiste simplesmente na dois (coloca um boneco pequeno entre os pais
manipulação de objetos; depois desse perío- e cobre a cama de casal com um pano). Psiu!,
do, passa a ser usado funcionalmente, numa Silêncio! Vou pegar outro brinquedo. Psiu! Ele
ação repetitiva, e, quando o jogo de faz-de- está dormindo (João pega do armário um ja-
conta aparece, a criança começa a usar vários caré e, mexendo um pouco ansioso nos outros
brinquedos simbolicamente, visando a objetos brinquedos, pega também um pequeno bone-
que representam outros objetos. Desta manei- co, que ele denomina de ‘diabo’). Olha! O que
ra, uma folha de papel pode se tornar um avião, vai acontecer! Este (diabo) está tentando en-
um pau pode se transformar em cavalo, uma trar no quarto.”
panela e uma colher, no melhor tambor, e o E – “E daí?”
nenê caçula da família pode ser afogado numa J – “Quer pegar a mãe do garoto, quer tirá-
piscina e, depois, levado a passear pelo amis- la da cama, mas isso não vai acontecer por-
toso e simpático irmão. que.... olha! O jacaré lhe morde a perna (faz a

PSICODIAGNÓSTICO – V 103
encenação) e o arrasta para fora do quarto e o projeta e desloca os impulsos agressivos para
fecha num cercado. Quase perdeu a perna!” o ambiente. Simbolicamente, transforma-se em
João monta um cercadinho com as outras diabo para ter coragem de roubar a mãe do
madeiras, sempre fazendo como se fosse o ja- pai, mas a fantasia de culpa e a ansiedade de
caré que estivesse montando o cercado, e co- castração facilitam o deslocamento do poder
loca dentro deste o diabo. Diz então: “Deu! da lei do pai para o jacaré, estabelecendo a
Tudo em paz”. ordem através do castigo.
João expressou, de forma inteligente, con- Por último, a tolerância à frustração e a
teúdos conflitivos através de elementos sim- adequação à realidade são indicadores que têm
bólicos adequados à sua idade evolutiva, dei- relação com a aceitação ou não das instruções
xando transparecer o estádio psicossexual que e enquadramento da hora de jogo, assim como
atravessa. Parece ser uma criança dependente, da aceitação dos limites, do próprio papel e
com traços fóbicos, que teme ser abandonada do papel do outro, da separação dos pais, do
ou rejeitada, especialmente pela figura da mãe, tempo de início e fim, do resultado dos jogos,
o que, de certa forma, se explica pela dinâmi- etc. Tudo isso está intimamente relacionado
ca da fase edípica que atravessa. A brincadeira com as possibilidades egóicas e com o princí-
organizada por ele deixa em evidência a sua pio de prazer e realidade.
preocupação com a relação afetivo-sexual dos Como se pode observar, a entrevista lúdica
pais. Sente-se excluído e vivencia a impossibi- diagnóstica é uma técnica de avaliação clínica
lidade de participar dessa união, através da muito rica, que permite compreender a natu-
fantasia da cena primária. Invadido pelos sen- reza do pensamento infantil, fornecendo infor-
timentos de ansiedade, ciúme e frustração fren- mações significativas do ponto de vista evolu-
te aos rivais (pai e novo filho), precisa se de- tivo, psicopatológico e psicodinâmico, possi-
fender com uma certa dose de atuação, inva- bilitando formular conclusões diagnósticas,
dindo a cama dos pais, mas imediatamente prognósticas e indicações terapêuticas.

104 JUREMA ALCIDES CUNHA


MÓDULO V – Operacionalização do Processo

Passos do processo psicodiagnóstico


Jurema Alcides Cunha
11
FORMULAÇÃO DAS PERGUNTAS BÁSICAS cente”. Tais alternativas de explicação são hi-
OU HIPÓTESES póteses, que serão testadas através do psi-
codiagnóstico.
O processo psicodiagnóstico é um processo Esse exemplo é de um caso muito simples,
científico e, como tal, parte de perguntas es- mas demonstra que o psicólogo precisa de mais
pecíficas, cujas respostas prováveis se estrutu- dados para que as questões iniciais sejam pre-
ram na forma de hipóteses que serão confir- cisas, podendo, então, formular suas hipóte-
madas ou não através dos passos seguintes do ses. O esclarecimento e a organização das ques-
processo. tões pressupostas num encaminhamento são
Geralmente, temos um ponto de partida, tarefas da responsabilidade do psicólogo.
que é o encaminhamento. Qualquer pessoa que Se é um profissional que encaminha, pro-
encaminha um paciente o faz sob a pressupo- vavelmente não o faz com base numa pergun-
sição de que ele apresenta problemas que têm ta vaga. Mesmo que o encaminhamento sugi-
uma explicação psicológica. Existe uma preo- ra, freqüentemente tem em mente uma série
cupação, que pode se expressar por meio de de questões específicas, fundamentadas em
uma pergunta muito vaga, como: “Será que A observações ou informações prévias. Eventual-
não aprende por um problema psicológico?” mente, tais questões estão explícitas no pró-
Por certo, o psicólogo precisa de mais dados prio encaminhamento. Outras vezes não, o que
sobre o caso para desdobrar a pergunta vaga ocorre até em razão de sigilo profissional. As-
de um leigo, numa série de perguntas formu- sim, seguidamente, é através de um contato
ladas em termos psicológicos, como: “Será que telefônico que as questões chegam a ser colo-
A apresenta uma limitação intelectual?”, “Será cadas em termos mais funcionais e claros. En-
que A não aprende por interferência de pro- tão, tais questões, reformuladas em termos
blemas emocionais?” Ainda não são pergun- psicológicos, vão dar um embasamento ade-
tas precisas, mas a história de A vai permitir quado a um exame, permitindo que o laudo
que chegue a alternativas de explicação, como: sirva de fundamento para decisões que devem
a) “A tem um nível de inteligência fronteiriço”; ser tomadas.
b) “A tem um nível de inteligência normal, mas Um médico, por exemplo, pode telefonar,
seu desempenho intelectual atual está limita- dizendo que tem uma paciente com patologia
do, porque sofreu um trauma emocional re- de coluna e que suspeita que os sintomas se-

PSICODIAGNÓSTICO – V 105
jam, pelo menos parcialmente, de fundo psi- derado favorável, e foi recomendada uma psi-
cológico. Poderia ser indicada uma interven- coterapia de reforço do ego para o enfrenta-
ção cirúrgica, para alívio da dor e da restrição mento da situação.
da motilidade, mas lhe é de importância fun- Neste caso, desde o início, foram levanta-
damental saber como a paciente reagiria à ci- das questões claras e funcionais. Eventualmen-
rurgia. te, porém, as entrevistas iniciais com o pacien-
Aqui, por certo, temos algumas questões: te levantarão perguntas complementares, que
Há fatores psicológicos associados à condição definem novos objetivos para o exame.
médica? Como a paciente reagiria à situação Na realidade, cada caso terá as suas pecu-
cirúrgica e à longa recuperação? Qual o prog- liaridades. Às vezes, logo se torna possível le-
nóstico do caso? Delineiam-se, portanto, três vantar as primeiras perguntas a partir do pró-
objetivos para o exame. Por outro lado, as ques- prio encaminhamento, quando este parece
tões colocadas pelo médico já começam a ser confiável pelas questões propostas. Por exem-
traduzidas em termos psicológicos. plo, no caso de um encaminhamento para diag-
Consideremos a primeira questão. A hipó- nóstico diferencial, em que o psiquiatra pro-
tese de trabalho que o psicólogo levanta, pri- põe alternativas, não só as perguntas estão
meiramente, é de que o diagnóstico da pacien- explícitas, como também é possível formular
te, de acordo com o DSM-IV, seja 307.89, do hipóteses. Outras vezes, vai ser possível levan-
Eixo I, ou Transtorno Doloroso Associado tan- tar alguma hipótese (ainda que provisória) só
to com Fatores Psicológicos quanto com uma no início da história clínica. Neste caso, a con-
Condição Médica Geral, sendo que esta é co- dução do restante da história clínica e da his-
dificada no Eixo III. tória pessoal será estruturada em termos de
Não obstante, apenas com os poucos da- uma sondagem para a obtenção de subsídios
dos que possui, o psicólogo pode levantar per- que reforcem a fundamentação da hipótese ou
guntas diferentes, como: a) A paciente apre- para a busca de dados comprobatórios. Não
senta outro transtorno mental associado, em obstante, geralmente o elenco das perguntas
especial depressão? b) Há algum problema só fica inteiramente completo após o levanta-
psicossocial agravante? c) A paciente tem con- mento de toda a história, embora, durante todo
flitos relacionados com dependência-indepen- o processo psicodiagnóstico, se possa, de vez
dência? d) A paciente obtém ganhos secundá- em quando, levantar questões subsidiárias aos
rios a partir de seus sintomas? Aqui, houve tam- objetivos previstos.
bém uma reformulação das perguntas em ou- Porém, no momento em que é possível le-
tros termos, buscando também base em pres- vantar as questões básicas e estabelecer os
supostos psicodinâmicos. O processo que objetivos, o que, em geral, ocorre no fim da
permitiria responder às últimas perguntas primeira ou segunda entrevista, há condições
teria como objetivo básico o entendimento para o estabelecimento de um plano de ava-
dinâmico. liação com base nas hipóteses e, conseqüente-
Assim, os objetivos do psicodiagnóstico mente, para realizar o contrato de trabalho.
dependem das perguntas iniciais. No caso, com
base no encaminhamento, decidiu-se fazer um
psicodiagnóstico com dois objetivos básicos, CONTRATO DE TRABALHO
de classificação nosológica e de entendimento
dinâmico, para que o laudo fornecesse ao mé- O psicodiagnóstico é um processo limitado no
dico não só uma explicação do caso, mas tam- tempo. Esclarecidas as questões iniciais e defi-
bém uma compreensão que lhe facilitasse o nidas as hipóteses e os objetivos do processo,
manejo. A partir dos dados do psicodiagnósti- o psicólogo tem condições de saber qual o tipo
co, também seria possível atender aos objeti- de exame que é adequado para chegar a con-
vos de prognóstico e de prevenção. Confirma- clusões e, conseqüentemente, pode prever o
das as hipóteses, o prognóstico não foi consi- tempo necessário para realizá-lo.

106 JUREMA ALCIDES CUNHA


A duração de um psicodiagnóstico consti- cesso. A não ser em casos de pareceres muito
tui uma estimativa do tempo em que se pode simples, em geral, deve-se prever um período
operacionalizar as tarefas implícitas pelo pla- de duas horas para a preparação dos informes.
no de avaliação, bem como completar as tare- Com base na estimativa do tempo, são estabe-
fas subseqüentes até a comunicação dos re- lecidos os honorários, sendo definidas também
sultados e recomendações pertinentes. a data e as formas de pagamento.
No momento em que é possível ter uma O paciente compromete-se a comparecer
previsão, deve-se formalizar com o paciente ou nas horas aprazadas, nos dias previstos e im-
responsável os termos em que o processo psi- plicitamente a colaborar para que o plano de
codiagnóstico vai se desenvolver, definindo avaliação seja realizado sem problemas. Isso
papéis, obrigações, direitos e responsabilida- pressupõe que sejam esclarecidas as suas dú-
des mútuas. vidas, aproveitando-se a oportunidade para
O momento mais propício para o estabele- trabalhar suas expectativas irrealísticas ou fan-
cimento de um contrato de trabalho, porém, é tasias sobre o psicodiagnóstico.
variável, pois tanto depende da precisão das Finalmente, o contrato de trabalho deve
questões iniciais e dos objetivos, como da ex- envolver certo grau de flexibilidade, devendo
periência do psicólogo. Por certo, há outras ser revisto sempre que o desenvolvimento do
variáveis em jogo, associadas à sintomatolo- processo tiver de sofrer modificações, seja por-
gia do paciente e de seu estilo de trabalho. que novas hipóteses precisam ser investigadas,
Apesar de o paciente ou responsável muitas seja por ficar obstaculizado por defesas do pró-
vezes desejarem apressar o contrato de traba- prio paciente.
lho, por razões emocionais ou financeiras, e, Não obstante, cabe uma ressalva. Vamos
então, se poder dar algumas indicações sobre supor que o psicólogo tenha feito o seu plano
a forma como se costuma trabalhar e sobre de avaliação, o tenha desenvolvido e, na fase
valores médios, freqüentemente é mais dese- de levantamento dos dados, chegue à conclu-
jável estabelecer o contrato, em termos defini- são de que a administração de mais um instru-
dos, depois de o psicólogo se familiarizar com mento seria pertinente para elucidar certas
o desempenho do paciente. dúvidas. O psicólogo hesita entre tirar conclu-
O contrato de trabalho envolve um com- sões com base em dados insuficientes ou con-
prometimento de ambas as partes de cumprir vocar novamente o paciente. E o contrato de
certas obrigações formais. trabalho deve ser revisto? Não, a não ser que,
O psicólogo compromete-se a realizar um previamente, o psicólogo tenha aventado tal
exame, durante certo número de sessões, cada possibilidade. Recomenda-se, pois, que o pa-
uma com duração prevista, em horário prede- ciente seja chamado, que lhe seja explicada a
terminado, definindo com o paciente ou res- necessidade de se submeter a mais um teste,
ponsável os tipos de informes necessários e mas sem qualquer ônus para ele.
quem terá acesso aos dados do exame. Even-
tualmente, tal informação já está determinada
pelo encaminhamento, mas sempre convém ESTABELECIMENTO DE UM PLANO DE
examinar se existe uma aceitação tácita do in- AVALIAÇÃO
teressado a respeito.
Ao considerar a duração do processo, mui- Essencialmente, o plano de avaliação é um pro-
tos profissionais incluem o tempo previsto para cesso pelo qual se procura identificar recursos
contatos ou conferências com outros profis- que permitam estabelecer uma relação entre
sionais (embora nunca o tempo despendido em as perguntas iniciais e suas possíveis respos-
supervisão). Entretanto, quando são necessá- tas.
rios vários tipos de informes ou laudos mais O encaminhamento de um caso freqüente-
elaborados, o tempo estimado para a sua con- mente sugere um objetivo para o exame psi-
fecção deve ser computado na duração do pro- cológico. Por vezes, propõe algumas questões,

PSICODIAGNÓSTICO – V 107
que permitem ao psicólogo estabelecer alguns biente que possam com ela se relacionar (Fer-
pressupostos, que podem ser provisórios ou nández-Ballesteros, 1986). Por outro lado,
não. Via de regra, somente após um contato eventualmente, podem parecer importantes
com os fatos, o clínico poderá definir com mais resultados de exames médicos e a análise de
precisão as perguntas iniciais e os objetivos do outros materiais que não contribuíram para a
psicodiagnóstico, isto é, após complementar e anamnese (Pérez-Ramos, 1966), como fotogra-
confrontar os dados do encaminhamento com fias, gravações em vídeo, diários, desenhos,
informações subjetivas e objetivas sobre o caso, pinturas, cadernos escolares, que constituirão
estará em condições de estabelecer seu plano amostras de comportamentos alheios à situa-
de avaliação. ção de testagem, que podem levar à formula-
Para as questões iniciais, há alternativas de ção de hipóteses subsidiárias ou à confronta-
respostas, que constituem as hipóteses subja- ção de informações de testes ou da interação
centes ao processo diagnóstico. O plano de clínica com dados da vida cotidiana.
avaliação consiste em traduzir essas pergun- O elenco das hipóteses deve ser norteado e
tas em termos de técnicas e testes (Pope & delimitado pelo objetivo do psicodiagnóstico.
Scott, 1967), isto é, consiste em programar a Isto significa que nem todas as hipóteses le-
administração de uma série de instrumentos vantadas devem ser necessariamente testadas,
adequados ao sujeito específico e especialmen- sob pena de o processo se tornar inusitada-
te selecionados para fornecer subsídios para mente longo ou interminável. Por exemplo, se
que se possa chegar às respostas para as per- o objetivo do exame for o de uma classificação
guntas iniciais. Os dados resultantes, portan- simples na área intelectual, para o encaminha-
to, devem possibilitar confirmar ou infirmar as mento ou não da criança para uma classe es-
hipóteses, com um grau satisfatório de certeza. pecial, o plano de avaliação deve incluir ape-
Eventualmente, antes do primeiro contato nas os testes que permitam cumprir tal objeti-
com o paciente, o objetivo do exame já está vo. Então, somente uma hipótese de uma pseu-
bem definido, e as questões iniciais, bem deli- dolimitação intelectual, pela interferência de
mitadas, como, por exemplo, quando há soli- fatores emocionais, justificaria a inclusão de
citação de um diagnóstico diferencial num con- técnicas projetivas no plano de avaliação, con-
texto hospitalar. Há informações prévias sobre siderando que a confirmação ou não da hipó-
o sujeito e o caso em questão. Assim, a primei- tese poderia influir na decisão sobre a vida do
ra entrevista já pode ser estruturada de ma- sujeito. Não obstante, se a modificação no pla-
neira a permitir a resolução de algumas ques- no subentendesse um prolongamento substan-
tões diagnósticas. Então, a entrevista já faz cial do período de testagem, recomendar-se-ia
parte do plano de avaliação, não sendo utili- a revisão do contrato de trabalho. Entretanto,
zada principalmente para oferecer subsídios se fosse levantada alguma questão que não se
para o delineamento do plano de avaliação. associasse ao objetivo proposto, no máximo o
Conseqüentemente, há casos em que o pla- psicólogo deveria aconselhar uma complemen-
no de avaliação é estabelecido previamente tação do exame, estabelecendo, então, novo
quando há dados que permitam formulá-lo. plano de avaliação e acarretando outro con-
Mais freqüentemente, só é estabelecido após trato de trabalho.
a entrevista com o sujeito e/ou com o respon- Da mesma forma, se o objetivo do exame
sável, quando, então, se dá início ao processo for o de diagnóstico diferencial entre transtor-
de testagem. Porém, às vezes, é necessário pro- no bipolar e transtorno de conduta, num ado-
gramar a utilização de recursos complementa- lescente, o plano de avaliação deve se restrin-
res, tais como observações do comportamen- gir a instrumentos na área da personalidade, a
to em situações da vida diária. Aliás, hoje em não ser que os contínuos fracassos escolares
dia, há uma tendência crescente à valorização suscitem questões referentes ao potencial in-
do levantamento de repertórios de conduta do telectual, cuja resposta possa se tornar impor-
paciente e à identificação de variáveis do am- tante para a orientação subseqüente do caso.

108 JUREMA ALCIDES CUNHA


Em resumo, o plano de avaliação deve per- apreciável no tempo de duração previsto no
mitir obter respostas confiáveis para as ques- contrato de trabalho, convém reexaminá-lo
tões colocadas e, ao mesmo tempo, atender com o paciente ou responsável, sempre dando
aos objetivos propostos. Contudo, a testagem uma margem de tolerância, se não temos ain-
de uma hipótese, por vezes, pode ser realizada da uma estimativa segura do ritmo de desem-
com diferentes instrumentos. A opção por um penho do sujeito.
instrumento específico, além de eventualmen- Conseguindo selecionar as técnicas e os tes-
te ficar delimitada pelo objetivo do exame, deve tes adequados, deve-se distribuí-los, conforme
ser feita tanto pela consideração das caracte- as recomendações inerentes à natureza e ao
rísticas demográficas do sujeito (idade, sexo, tipo de cada um, considerando, ainda, o tem-
nível sociocultural, etc.), como por suas condi- po de administração e as características espe-
ções específicas (comprometimentos perma- cíficas do paciente. Como se pode pressupor,
nentes ou temporários de ordem sensorial, o plano de avaliação envolve a organização de
motora, cognitiva, etc.). Também devem ser uma bateria de testes.
levados em conta fatores situacionais, como
hospitalização do paciente e uso de determi-
nadas medicações, que podem ter reflexos nos Bateria de testes
correlatos comportamentais, que têm efeitos
nas respostas aos testes. Então, deve-se ava- Bateria de testes é a expressão utilizada para
liar a urgência dos resultados do exame ou a designar um conjunto de testes ou de técni-
propriedade de adiá-lo, para evitar os efeitos cas, que podem variar entre dois e cinco ou
do estresse situacional e dos produtos quími- mais instrumentos, que são incluídos no pro-
cos. Por outro lado, é importante previamente cesso psicodiagnóstico para fornecer subsí-
saber se o português é o idioma pátrio do su- dios que permitam confirmar ou infirmar as
jeito, se é destro ou canhoto, se usa habitual- hipóteses iniciais, atendendo o objetivo da ava-
mente óculos ou aparelho auditivo, se tem al- liação.
guma dificuldade na discriminação de cores ou A bateria de testes é utilizada por duas ra-
cegueira para cores. Tais informações são es- zões principais. Primeiramente, considera-se
senciais para determinar a opção entre técni- que nenhum teste, isoladamente, pode propor-
cas diversas, para a introdução de procedimen- cionar uma avaliação abrangente da pessoa
tos subsidiários, para a recomendação do uso como um todo. Em segundo lugar, o emprego
de óculos ou do aparelho auditivo durante a de uma série de testes envolve a tentativa de
testagem e para a determinação da validade e uma validação intertestes dos dados obtidos,
utilidade da introdução de certas técnicas no a partir de cada instrumento em particular, di-
plano de avaliação. minuindo, dessa maneira, a margem de erro e
Considerada a especificidade das técnicas, fornecendo melhor fundamento para se che-
uma vez delineado o plano de avaliação, tem- gar a inferências clínicas (Exner, 1980).
se uma idéia de seu número aproximado e do Em relação às técnicas projetivas, como o
tempo necessário para a testagem. Às vezes, número de pesquisas é muito pequeno, e até
são previstos instrumentos alternativos para escasso no caso de crianças (Cunha, Nunes &
testar a mesma hipótese, seja por se desejar Silveira, 1990), é aconselhável corroborar a sig-
uma intervalidação dos resultados, seja porque nificação clínica de indicadores de um deter-
temos dúvida sobre uma determinada técnica minado teste através de indícios sugestivos em
será suficiente para responder, de forma satis- outra técnica. Quanto a técnicas psicométri-
fatória, às questões propostas. De qualquer cas, considerando o número relativamente pe-
modo, nesse momento, pode-se prever, com queno de testes com normas brasileiras, reco-
razoável segurança, o número de sessões ne- menda-se buscar a intervalidação dos resulta-
cessárias para completar o processo diagnós- dos, especialmente nos casos em que as con-
tico. No caso de se pressupor uma diferença clusões deverão servir de base para ações de-

PSICODIAGNÓSTICO – V 109
cisórias na vida do sujeito. Contudo, embora ogênica e características do paciente individual.
tais recursos garantam maior segurança nas Embora a bateria não-padronizada deva aten-
conclusões, devem ser reduzidos ao essencial, der, então, a vários requisitos, ela é organiza-
de modo a não alargar desnecessariamente o da de acordo com critérios mais flexíveis do
processo diagnóstico. que a bateria padronizada. O número de tes-
Há dois tipos principais de baterias de tes- tes, por exemplo, eventualmente pode ser
tes: as baterias padronizadas para avaliações modificado para mais ou para menos.
específicas e as não-padronizadas, que são or- Geralmente, o número é modificado para
ganizadas a partir de um plano de avaliação. mais, quando, por algum motivo, parece im-
No primeiro caso, a bateria de testes não portante buscar uma intervalidação de resul-
resulta de uma seleção de instrumentos de tados ou corroborar dados em função de uma
acordo com as questões levantadas num caso determinada hipótese. Pode ser modificado
individual, pelo psicólogo responsável pelo para menos, quando, por exemplo, o objetivo
psicodiagnóstico, a não ser quando se trata de da avaliação foi atingido antes de a totalidade
bateria padronizada especializada. A organi- dos instrumentos ser administrada. Suponha-
zação da bateria padronizada é efetuada com mos que um dos objetivos do exame é o de
base em pesquisas realizadas com determina- avaliar o nível de funcionamento da personali-
dos tipos de pacientes e recomendada para dade. Contudo, pela administração de uma
exames bem específicos, como em certos tipos escala Wechsler – selecionada para examinar
de avaliação neuropsicológica. É indicada em certos aspectos cognitivos –, surgem indícios
razão de sua eficiência preditiva e para obter que permitem inferir um nível de funcionamen-
uma amostra suficientemente adequada de to psicótico. Trata-se de um caso, conforme su-
funções importantes para a natureza comple- gere Exner (1980), em que se pode perfeitamen-
xa da avaliação proposta (Lezak, 1995). Trata- te prescindir da administração do Rorschach, que
se de uma bateria padronizada, com objetivos constava do plano de avaliação precisamente
explícitos, e deve ser administrada em sua ín- para testar uma hipótese neste sentido.
tegra. Contudo, o psicólogo tem a liberdade Por outro lado, se durante a administração
de acrescentar testes para se adequar à espe- do WAIS-R, mais especificamente no subteste
cificidade do caso individual. de Informação, o paciente fracassa em vários
Assim, em princípio, é possível a organiza- itens, queixando-se de que, em outra época,
ção de uma bateria de testes padronizados para saberia perfeitamente as respostas, o que sus-
casos específicos. Mas isso demanda conside- cita, após o subteste, o relato de vários episó-
rável pesquisa prévia. Nada tem que ver com dios de sua vida, sugestivos de déficit de me-
baterias e testes, usadas de forma sistemática mória (não trazido como queixa inicial), pode-
e regularmente por alguns psicólogos, indepen- se levantar uma hipótese adicional que justifi-
dentemente de aspectos específicos do caso in- ca a administração de instrumentos para ava-
dividual, que envolvem perda de tempo e acú- liar disfunções da memória. Neste caso, pres-
mulo de dados inúteis. Por exemplo, lembraría- supõe-se que estariam sendo avaliadas as fun-
mos que certos psicólogos usam, invariavelmen- ções cognitivas, o que autoriza o levantamen-
te, alguma escala Wechsler, mesmo que não te- to de outra hipótese abrangida pelo objetivo
nha sido levantada qualquer hipótese referente do psicodiagnóstico. Entretanto, se surgem
à área intelectual ou a déficit cognitivo. indícios que levam a questões não pertinentes
Na prática clínica, é tradicional o uso da ao objetivo do exame, não fica justificada a
bateria não-padronizada. No plano de avalia- inclusão de uma técnica adicional na bateria.
ção, são determinados a especificidade e o Em razão da variedade de questões propos-
número de testes, que são programados se- tas inicialmente e adequadas aos objetivos do
qüencialmente, conforme sua natureza, tipo, psicodiagnóstico, freqüentemente a bateria de
propriedades psicométricas, tempo de admi- testes inclui testes psicométricos e técnicas
nistração, grau de dificuldade, qualidade ansi- projetivas. Neste caso, sua seqüência e distri-

110 JUREMA ALCIDES CUNHA


buição relativa, na bateria de testes, devem ser Em terceiro lugar, pelo caráter aparente-
cuidadosamente consideradas, levando em mente lúdico das técnicas que envolvem dese-
conta o tempo necessário para a administra- nho, não recomendamos acumulá-las no iní-
ção, o grau de dificuldade das mesmas, sua cio da testagem. Quando se trata de crianças,
qualidade ansiogênica e as características es- o procedimento não parece indicado, a não ser
pecíficas do paciente. que o plano de avaliação não pretenda ultra-
Ocampo e colegas (1981) dão primordial passar um nível lúdico, incluindo, ainda, uma
importância à questão da mobilização ou não hora de jogo diagnóstica e o Sceno-test. Caso
da ansiedade na distribuição seqüencial das contrário, há sempre o risco de, na sessão se-
técnicas. Dessa maneira, recomendam priori- guinte, a criança desejar persistir no mesmo
dade para instrumentos não-ansiogênicos. tipo de atividade, porque, consciente ou in-
Pressupondo a presença de um certo grau conscientemente, o psicólogo a motivou nes-
de ansiedade no paciente que inicia um pro- se sentido. Quando se trata de adultos, pode-
cesso de testagem, sugerem que as técnicas se pressupor que cheguem com disposições
gráficas sejam utilizadas nesse momento. Sen- bem variadas. Alguns pretendem se submeter
do breves e familiares para o paciente, concor- a um exame científico, que fornecerá dados
rem para baixar o nível de ansiedade, embora importantes para o profissional que os enca-
sejam ricas em conteúdos projetivos. Já, sob o minhou. Outros vêm com muita dificuldade
nosso ponto de vista, concordamos que a téc- para participar do processo do psicodiagnósti-
nica gráfica pode ser bastante recomendável, co, porque isto os coloca num status de pa-
como instrumento introdutório, mormente se ciente, que podem considerar humilhante, en-
tratando de crianças. Contudo, não parece in- quanto outros comparecem sem qualquer pres-
dicado preencher toda a sessão inicial com o suposição do que seja um psicodiagnóstico,
que, para o paciente, não passa de simples simplesmente porque foram encaminhados,
desenhos. Por outro lado, sendo de execução assim como iriam a um laboratório, porque isto
breve, após utilizar uma delas como introdu- lhes foi indicado. Para todos esses casos e,
tória, conviria reservar as demais (se constam possivelmente, para outros, é importante que
da bateria de testes) para outras oportunida- passemos a mensagem de que o psicodiag-
des, por uma série de razões. nóstico é um processo sério, com bases cientí-
Em primeiro lugar, não é só importante ficas. Ora, sabemos que os desenhos do pa-
baixar a ansiedade inicial, mas ter recursos para ciente podem constituir um material rico em
lidar com uma situação ansiogênica, em qual- informações psicodinâmicas, mas ele pode não
quer momento da testagem em que se apre- ter condições de pressupor isso. Então, corre-
sente. Por exemplo, certas técnicas projetivas mos o risco de o nosso trabalho ser desvalori-
podem ter um efeito ansiogênico e, além dis- zado simplesmente por uma distribuição ina-
so, não se pode prever exatamente seu tempo dequada das técnicas. Assim, no primeiro caso,
de administração. Muitas vezes, ao completá- podemos estar desmotivando o paciente que
las, vemos que dispomos de 10 a 15 minutos, vem com uma expectativa de que vai se sub-
quando a introdução de uma técnica gráfica meter a uma investigação científica; no segun-
parece ser recomendável, pois estamos utili- do caso, podemos reforçar as defesas do sujei-
zando o tempo de forma racional, permitindo to que tem dificuldade de aceitar seu status de
que o sujeito se sinta mais confortável. paciente, porque o estamos “submetendo” a
Em segundo lugar, há situações na testa- “atividades de pré-escola”, ao passo que, no
gem em que o paciente demonstra cansaço, último caso, estamos passando uma imagem
seja pela dificuldade da tarefa proposta, seja falsa do que é um psicodiagnóstico.
por seu baixo nível de tolerância à fatigabili- Acreditamos que, exatamente porque as
dade. Neste caso, a introdução de uma tarefa pessoas temem tanto enfrentar seus aspectos
simples, breve e fácil pode constituir uma boa doentios, ainda existam atitudes preconceitu-
alternativa. osas em relação ao psicodiagnóstico, que “ma-

PSICODIAGNÓSTICO – V 111
gicamente” pode revelar “seus pontos fracos” dar conta de uma sucessão de fracassos, num
e “possibilidades para o futuro”. Como profis- teste de inteligência.
sionais, não podemos reforçar tais atitudes. Contudo, as respostas dos pacientes são
Portanto, lidando com adultos, é importante variadas. Por exemplo, a tomada de consciên-
deixar bem claros os objetivos do psicodiag- cia da própria problemática nem sempre é an-
nóstico. Além disso, acreditamos que a distri- siogênica para o sujeito, como se observa par-
buição seqüencial das técnicas bem adequada ticularmente durante a administração do
possa constituir uma mensagem corroborató- MMPI. Neste caso, o simples fato de se depa-
ria de tais objetivos. rar com seus próprios sintomas e preocupa-
Na verdade, na maioria dos casos, existe ções, impressos no caderno do Inventário, que
certo grau de ansiedade inicial, que justifica a é utilizado por outros pacientes, é suficiente
introdução de uma técnica gráfica. Mas, de- para que os mesmos não pareçam tão inusita-
pendendo da atitude do paciente adulto, pres- dos e ameaçadores.
cindimos de tal introdução. No caso de o obje- Finalmente, uma questão que deve ser le-
tivo do exame permitir, damos prioridade ao vada em conta, ao se distribuir testes e técni-
Bender, como técnica introdutória com adul- cas numa bateria, programando-a para as ses-
tos, de preferência ao desenho da figura hu- sões de testagem, é o tempo de administração
mana ou ao HTP. Depois, solicitamos que re- de cada instrumento e a possibilidade ou não
produza os desenhos sem os estímulos, dando de o mesmo ser interrompido para ser concluído
o intervalo de tempo previsto, com uma ob- num outro dia. Evidentemente, o processo pode
servação de que é importante saber como está ficar facilitado, se o psicólogo dispuser de sala
a sua memória. De acordo com nossa experiên- extra para técnicas de auto-administração.
cia, mesmo que tenha percebido o Bender É importante notar que dificilmente se con-
como uma tarefa infantil (copiar desenhos, segue administrar qualquer das escalas Wechs-
ora!), defronta-se, logo, com um desafio, que ler em uma única sessão. Entretanto, cada sub-
o leva a revisar a sua impressão inicial. É claro teste deve ser apresentado em sua íntegra. A
que este é um mero exemplo, e não um proce- possibilidade de se alternar subtestes da esca-
dimento sistemático. la verbal e de execução não só permite manter
À medida que são apresentadas técnicas o bom nível de interesse, como distribuir as
projetivas, há maior mobilização da ansieda- tarefas adequadamente e conforme o tempo
de, porque os estímulos escassamente estru- disponível.
turados não oferecem referencial para a pro- As técnicas projetivas, de um modo geral,
dução de respostas, e o paciente tem de assu- não devem ser interrompidas. O TAT, quando
mir a responsabilidade pelo manejo da situa- aplicado em sua íntegra, é uma exceção. Pode-
ção. Conseqüentemente, se estão previstas téc- se reservar uma sessão para cada série de 10
nicas projetivas e psicométricas, é conveniente lâminas. Não obstante, dificilmente é necessá-
alterná-las, iniciando e completando a bateria rio aplicar todas as 20 lâminas. Shentoub e
com material pouco ou não-ansiogênico. colegas (1990) propõem uma série de 16 lâmi-
Para aquilatar a qualidade ansiogênica de nas, a serem administradas numa única ses-
um instrumento, deve-se levar em conta não são, mas que, com grande número de pacien-
só a natureza dos estímulos, mas também as tes, provavelmente ultrapassará 50 minutos.
características do próprio sujeito. Pressupomos Mais comumente, o psicólogo organiza a sua
que as técnicas projetivas são mais ansiogêni- própria série, conforme os conflitos que pre-
cas. Não obstante, eventualmente, o paciente tende investigar, planejando-a para uma ses-
enfrenta bem um material pouco estruturado, são, ou, no máximo, em duas pequenas séries,
porque diminui a consciência do que poderia com a lâmina 16 no final, em vista de suas pro-
ser uma resposta “certa” ou “errada”, ou, me- priedades ansiogênicas.
lhor, do que constituiria uma “resposta pato- A administração do Rorschach não pode ser
lógica” ou não, mas fica muito ansioso ao se interrompida, mas o inquérito pode ser trans-

112 JUREMA ALCIDES CUNHA


ferido para outro dia, exceto em casos de crian- Mas, para que o psicólogo possa concentrar a
ças ou de pacientes com muito comprometi- sua atenção no paciente, deve estar perfeita-
mento da memória. Neste último caso, sendo mente seguro quanto à adequabilidade do ins-
impossível fazer o inquérito em seguida, faça trumento para o caso em estudo, estar bem
o inquérito de localização logo após a admi- familiarizado com as instruções e o sistema de
nistração, realizando o inquérito em relação às escore, saber manejar o material pertinente e
demais categorias o mais breve possível. Com ter em mente os objetivos a que se propõe para
pacientes comuns, o intervalo não deve ultra- a administração de cada instrumento. Há, pois,
passar uma semana. algumas questões básicas que devem ser con-
No caso do MMPI, é previsto um mínimo sideradas.
de 30 minutos e um máximo de 90 minutos Em primeiro lugar, mesmo que o psicólogo
para a administração. Mas, dificilmente os pa- tenha estabelecido seu plano de avaliação com
cientes terminam em 60 minutos e, em média, cuidado, previamente à sua administração, é
geralmente 90 minutos. Não há sugestões nos importante revisar certas particularidades re-
manuais sobre como manejar o problema, mas ferentes aos instrumentos e às características
não só não é praticável reservar apenas uma do paciente. Por exemplo, se está prevista uma
sessão para tal administração, como a maioria escala ou teste de que há várias versões ou for-
dos pacientes a acham cansativa. Uma suges- mas, é importante conferir se a opção feita é a
tão é a de interromper a administração no item mais apropriada e, principalmente, se o mate-
366 e deixar os restantes para a próxima ses- rial correto está disponível na hora exata. Por
são. A vantagem é que, neste item, fica com- outro lado, se o psicólogo pretende usar algu-
pletada a escala abreviada, e, se houver algum ma escala Wechsler, por exemplo, é bom con-
problema para a continuação (hospitalização, ferir se o paciente é canhoto para providenciar
viagem súbita, desistência), obtêm-se dados uma folha de protocolo extra e evitar que haja
sobre todas as escalas, com exceção da K e da Si. dificuldades na administração de Código.
Também, se o paciente não demonstra sinais de Em segundo lugar, o psicólogo deve estar
fadiga, é bom lembrar que, sendo o MMPI auto- suficientemente familiarizado com o instru-
administrado, o sujeito pode completá-lo numa mento, jamais utilizando uma técnica em que
sala extra, sem problemas de interrupção. não esteja treinado o suficiente para estar se-
Dessa maneira, no momento em que se guro no seu manejo. Não basta conhecer as
estabelece um plano de avaliação e se organi- instruções, mas deve ter muita intimidade com
za uma bateria de testes, convém revisar cer- o material, com a maneira de conduzir o in-
tas particularidades da administração dos tes- quérito, com as normas de atribuição de esco-
tes, individualmente. No caso da Escala de res (se for o caso), com a forma adequada de
Memória Wechsler-Revisada, por exemplo, a registro das respostas e com perguntas e difi-
interrupção, antes do restante de certos sub- culdades que podem surgir durante a admi-
testes, prejudica irremediavelmente o levanta- nistração.
mento do Índice de Evocação Retardada. Tais Em terceiro lugar, antes da entrada do pa-
cuidados são especialmente pertinentes quando ciente, o psicólogo deve organizar todo o ma-
se lida com pacientes com desempenho lento. terial que pretende utilizar, de maneira que fi-
que acessível e o manejo seja facilitado. Isso
requer, por exemplo, que as lâminas do Ror-
ADMINISTRAÇÃO DE TESTES E TÉCNICAS: schach ou do CAT estejam dispostas em ordem
PARTICULARIDADES DA SITUAÇÃO DA numérica, sem que as manchas de tinta ou as
INTERAÇÃO COM O EXAMINANDO E DO figuras fiquem à vista do paciente. O material
MANEJO CLÍNICO das escalas Wechsler deve estar arranjado de
tal maneira que o psicólogo não precise mais
É sempre importante salientar que o foco da de 15 segundos para manejá-lo entre um sub-
testagem deve ser o sujeito, e não os testes. teste e outro. Além disso, deve ter à mão o

PSICODIAGNÓSTICO – V 113
cronômetro e outros materiais necessários, nóstico em paciente em situação clínica espe-
como protocolo do teste (se for o caso), lápis, cial, principalmente internado em clínica psi-
borracha, apontador, papel em branco, even- quiátrica.
tualmente, lápis vermelho para Labirintos do Em tal situação, o rapport torna-se de fun-
WPPSI ou lápis coloridos em geral, se pretende damental importância, não apenas porque o
utilizar o HTP cromático. Sugere-se deixar todo sujeito já deve ter passado por várias entrevis-
o material de teste e folhas de protocolo numa tas diagnósticas, como também porque o seu
mesinha auxiliar, ao lado do examinador, en- estado mental ou, mesmo, a impregnação por
quanto o material complementar pode ficar medicamentos pode torná-lo menos motiva-
sobre a mesa de trabalho do psicólogo. Os lá- do ou acessível para o tipo de exame que está
pis devem estar apontados, e, especialmente sendo proposto. Então, exatamente por se tra-
em certas técnicas, em que o examinando deve tar em geral de um processo diagnóstico mul-
escrever ou desenhar, deve haver mais de um à tidisciplinar, a entrevista inicial e o rapport, para
sua disposição. Por outro lado, se está progra- a administração de instrumentos, praticamen-
mada a realização do inquérito de Rorschach, te podem se superpor, porque não há necessi-
é conveniente ter à mão um conjunto de cane- dade de mobilizar tanto o paciente com per-
tas coloridas para delinear com mais precisão guntas, cujas respostas já constam de regis-
a localização de cada resposta na folha ade- tros hospitalares, e porque os objetivos do exa-
quada. me já estão bem claros e definidos.
Em quarto lugar, é importante ter em men- Naturalmente, a situação torna-se mais
te os objetivos para a inclusão de cada técnica complexa se o psicodiagnóstico for realizado
da bateria. O psicólogo está utilizando seus com objetivos forenses e o paciente tiver co-
instrumentos para colher subsídios para testar nhecimento disso, demonstrando uma atitude
hipóteses e deve tê-las bem presentes, de for- paranóide. Neste caso, o psicólogo deve con-
ma a estar atento a qualquer indício sugestivo tar com sua sensibilidade clínica para poder
e conseguir introduzir as perguntas adequa- manejar a situação com propriedade, propor-
das, no momento oportuno, se for o caso. cionando, na medida do possível, um reasse-
Após a consideração de todas essas ques- guramento que possa atenuar os efeitos de
tões, o psicólogo não deve iniciar a adminis- seus temores e suspeições.
tração de testes e técnicas sem o estabeleci- Para o estabelecimento de um clima ade-
mento de um bom rapport. Um clima descon- quado à testagem, o psicólogo deve ser capaz
traído de confiança e entendimento é neces- de esclarecer as dúvidas do paciente, não só
sário, não só para assegurar o desempenho de durante o rapport, como, eventualmente, an-
teste adequado do paciente, como para eliciar tes da introdução de algum instrumento espe-
um material projetivo genuíno, de forma a cífico. Muitas vezes, como também ocorre nas
obter amostras variadas de comportamento entrevistas anteriores, as questões que surgem
que permitam chegar a um diagnóstico mais têm que ver com confidencialidade. O pacien-
preciso. te deseja saber quem terá acesso aos resulta-
A situação deve ser manejada de modo não dos. O psicólogo deve ser honesto com o pa-
só a diminuir a ansiedade natural do paciente, ciente e nunca prometer o que não poderá
mas a levá-lo a uma atitude de cooperação. cumprir. Contudo, parece importante a existên-
MacKinnon & Yudofsky (1988a), falando de fa- cia de uma autorização tácita do sujeito (a não
tores que podem influenciar a entrevista, cha- ser quando carece de responsabilidade legal)
mam a atenção para situações especiais, que quanto à identidade das pessoas ou institui-
introduzem dimensões diferenciadas no con- ções que podem ter acesso às informações
texto clínico, como no caso do paciente em obtidas. Via de regra, porém, não há proble-
internação hospitalar. Ainda que não consti- mas nesse sentido. O paciente vem para um
tua a rotina usual, muitas vezes o psicólogo é psicodiagnóstico porque tem confiança em
solicitado para a realização de um psicodiag- quem o encaminhou, não criando qualquer

114 JUREMA ALCIDES CUNHA


obstáculo para que os resultados sejam total- recomenda-se memorizá-las, e, em alguns ca-
mente acessíveis a este profissional, mas, ge- sos, é permitido lê-las, ou, ainda, mantê-las ao
ralmente, somente a ele. alcance dos olhos para evitar que o examina-
Para a administração de testes, por vezes é dor omita ou substitua inadvertidamente al-
importante a determinação da posição do pa- guma palavra ou expressão. Observa-se que,
ciente em relação à do examinando. Se há ins- em muitos casos, há uma tendência para o
truções específicas, estas devem ser seguidas psicólogo dar as instruções, com uma formu-
para que a situação de teste seja padronizada. lação que parece “mais fácil” para o examinan-
Noutros casos, há apenas sugestões neste sen- do, sobretudo, quando se trata de crianças,
tido. Em relação ao teste de Rorschach, por mas isto geralmente não é permitido. Também
exemplo, há autores que consideram preferí- o examinador deve estar atento para a possi-
vel que o examinando fique ao lado do exami- bilidade ou não de repetir instruções, bem
nador, e não à sua frente, para diminuir a in- como para a forma de responder a perguntas
terferência de mensagens faciais, gestuais ou adicionais.
posturais deste (Exner, 1980). Dadas as instruções, geralmente não é pre-
Como regra geral, a administração de tes- vista uma ajuda extra (a não ser quando expli-
tes deve ser realizada em ambiente com boa citamente permitida), exceto um reassegura-
iluminação e em que haja condições de priva- mento por meio de estímulos neutros. É preci-
cidade, aeração e silêncio. Ainda que, para so um máximo de cautela para que tais “estí-
muitos testes, não haja restrições quanto à ilu- mulos neutros” não se transformem em indí-
minação artificial, no caso do material de teste cios que podem ser percebidos como suges-
envolver cores, como no Rorschach, a ilumina- tões sobre a maneira de agir. Isto é observável,
ção deve ser natural. Além disso, deve-se ter especialmente, na aplicação de alguns testes,
cuidado para que o examinando se coloque em em que, inadvertidamente, o psicólogo pode
posição adequada em relação à mesa, sentado reforçar a produção de determinadas catego-
de forma que possa trabalhar confortavelmen- rias de respostas. A propósito, um procedimen-
te, especialmente no caso de crianças e de téc- to preventivo em relação a tal comportamento
nicas que exijam maior precisão nos movimen- é a gravação de algumas administrações du-
tos. Por outro lado, se o desempenho envolve rante o período de treinamento. Mas o psicó-
cópia gráfica de figuras, ou desenho, é essen- logo deve estar atento para suas intervenções
cial que a superfície da mesa não tenha aspe- involuntárias, já que nem todos os “vícios” são
reza. Se tiver, aconselha-se colocar um pape- adquiridos durante o treinamento e, inclusive,
lão sob a folha de trabalho ou várias folhas de podem ocorrer seletivamente com determina-
papel. dos tipos de pacientes pelo fenômeno contra-
Geralmente, não há qualquer problema transferencial.
quanto à manutenção de uma situação padro- A contratransferência pode acontecer na
nizada quando a administração de testes é rea- situação de testagem, como na terapia, por-
lizada no consultório do psicólogo. Outro é o que a administração de testes pressupõe uma
caso quando a testagem deve ser levada a efei- interação clínica e, conseqüentemente, pode
to em outro ambiente, como num hospital ou suscitar respostas inconscientes do psicólogo
numa escola. Então, torna-se mais difícil man- a aspectos do comportamento do paciente.
ter condições ideais, sobretudo evitar ruídos e Assim, se o psicólogo percebe em si certas rea-
interrupções. Convém que, antecipadamente, ções afetivas, como intolerância, enfado, an-
o psicólogo tome as providências cabíveis para siedade, raiva, etc., frente a comportamentos
evitar, ao máximo, as interferências. do examinando, deve procurar que não inter-
A situação padronizada na aplicação de um firam, ainda que de forma sutil, no contexto
teste garante, em parte, a fidedignidade de da testagem, mas, antes, deve utilizá-las como
seus resultados. Portanto, as instruções devem fonte de informação para o melhor entendi-
ser seguidas cuidadosamente. Muitas vezes, mento dinâmico do caso. Naturalmente, o psi-

PSICODIAGNÓSTICO – V 115
cólogo terá mais facilidade em se conscienti- logos de registrar textualmente as respostas
zar de suas reações contratransferenciais se ti- a técnicas projetivas e de reduzir a um míni-
ver se submetido à psicoterapia. No entanto, é mo as anotações referentes a testes de inte-
preciso diferenciar reações contratransferen- ligência.
ciais de certas respostas indevidas de psicólo- A recomendação do registro literal das res-
gos inexperientes, por dificuldades comuns no postas não significa prescindir do conhecimen-
manejo de certos testes, especialmente duran- to do sistema de escores. Este é essencial para
te a condução do inquérito, muitas vezes rela- que, após a obtenção da resposta, o psicólogo
cionadas com as expectativas que têm de res- saiba quando e como formular perguntas adi-
postas por parte do paciente. cionais para explorar toda a potencialidade de
É preciso que o psicólogo esteja bem côns- resposta do paciente. Tal inquérito deve reve-
cio dos aspectos estruturais e dinâmicos da si- lar o interesse do examinador em explorar
tuação de testagem para que possa fazer do aquele potencial e não dar a impressão de que
paciente o foco principal de sua atenção. As a resposta foi “errada”. Da mesma forma, re-
respostas deste devem estar anotadas em sua comenda-se a anotação de ensaios e erros ou
íntegra, isto é, não apenas especificamente as de outras particularidades no desempenho de
respostas ao teste, mas também todas as suas uma tarefa, que podem vir a constituir impor-
reações, verbais ou não. Isto vale dizer que to- tantes indícios sobre os aspectos cognitivos e
dos os indícios comportamentais explícitos ou emocionais do paciente. Igualmente, devem ser
implícitos devem ser cuidadosamente observa- registradas as hesitações, as observações es-
dos e registrados durante a administração de pontâneas, as reações de raiva, fadiga ou an-
testes e técnicas. siedade, bem como quaisquer outras que, de
É um hábito comum, quando o psicólogo uma forma ou de outra, constituem respostas
está familiarizado com o sistema de escores, à situação de teste.
num instrumento psicométrico, simplesmente O fato de se recomendar o uso de pergun-
atribuir o escore correspondente e deixar de tas adicionais ou a realização de inquérito, sem-
registrar a resposta dada. Este é um procedi- pre que parecer oportuno e as normas o per-
mento perfeitamente correto quando a respos- mitirem, não significa que o psicólogo se apres-
ta é única ou possível de ser categorizada se em fazê-lo. Primeiramente, é importante
simplesmente como “sim” ou “não”. Contu- utilizar estímulos neutros, como “Que mais?”,
do, sempre que a resposta envolve uma for- “E daí?”, ou “Pode explicar melhor?”, para
mulação verbal, como nos subtestes de Com- obter o máximo de material espontâneo. Só
preensão, Semelhanças e Vocabulário de uma depois pode passar a outras perguntas, sem-
escala Wechsler, deve ser anotada literalmen- pre que possível usando como referencial as
te, porque: a) é difícil ter em mente todos os verbalizações do sujeito, de preferência suas
exemplos do manual, para atribuir um escore próprias palavras. É importante ter isso em
correto; b) nem todas as respostas constam mente, porque pode ocorrer, especialmente
entre os exemplos ilustrativos, e temos de exa- com profissionais novatos, que, no afã de con-
miná-las à luz de critérios gerais para a atribui- seguir dados, o paciente seja interrompido com
ção do escore: c) muitos indícios qualitativos perguntas, que, às vezes, cortam o fluxo de seu
ficam irremediavelmente perdidos, se não são pensamento, induzem determinadas respostas,
registrados. Dessa maneira, a falta de transcri- bloqueiam a produtividade e a fantasia e des-
ção literal pode acarretar tanto uma falha na pertam ansiedade, prejudicando os resultados.
atribuição de escores, quanto uma omissão de Existe uma situação padronizada de testa-
dados úteis. Berg, já em 1983, por exemplo, gem, mas sempre é importante que o psicólo-
chamou a atenção de que, freqüentemente, go lide com ela não meramente como um tes-
transtornos de pensamentos são observáveis tólogo, mas de uma maneira clínica, atento a
em testes projetivos, e não em testes estrutu- um sujeito que reage de forma personalizada
rados, por uma prática tradicional entre psicó- e única ao aqui e agora da interação.

116 JUREMA ALCIDES CUNHA


LEVANTAMENTO, ANÁLISE, escalas Wechsler, o escore bruto deve ser trans-
INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO formado em ponderado. Em algumas dessas
DOS DADOS escalas, se administrou mais ou menos subtes-
tes que os previstos para cálculo do QI, lem-
Independentemente das informações dos tes- bre-se de efetuar a transformação proporcio-
tes, nesse momento, o psicólogo já possui um nal da contagem ponderada antes de determi-
acervo de observações que constitui uma amos- ná-lo. Além disso, deve verificar o percentil
tra do comportamento do paciente durante as correspondente, o percentual da população em
várias sessões em que transcorreu o processo que se localiza o QI, calcular as médias dos es-
diagnóstico, desde o contato inicial até a últi- cores em cada escala e considerar o desvio
ma técnica utilizada. Em resumo, é capaz de padrão da média do sujeito e da população
descrever o paciente. Uma revisão das obser- antes de chegar a um entendimento do caso.
vações feitas é indicada para melhor entendi- A contagem, em alguns outros testes, de-
mento da maneira como respondeu à situação verá ser transformada em percentis, em quar-
do psicodiagnóstico. Dependendo dos objeti- tis ou em escores T. Tais dados devem ser ana-
vos do exame, um sumário de tais observações lisados e entendidos. Resultados de testes psi-
já constituirá uma parte introdutória do laudo. cométricos são medidas estatísticas que, indi-
Convém, também, fazer um exame da his- vidualmente, podem subentender sistemas di-
tória clínica, cujas informações poderão con- versos, de maneira que é importante o psicó-
tribuir para atribuir significação a alguns da- logo se familiarizar com sua significação e equi-
dos e interpretar conteúdos do material da tes- valência. Se tiver alguma dificuldade prática
tagem. Dessa maneira, o relato sistematizado nesse sentido, a consulta ao item sobre enten-
da história clínica não só constituirá uma ou- dimento dos dados, no Capítulo 14, sobre Ava-
tra etapa vencida para certos tipos de laudo, liação psicométrica, nesta edição, é recomen-
como também ajudará o psicólogo a se prepa- dada. Outros testes, que medem funções es-
rar para entender os dados colhidos. Isso não pecíficas, em geral usam os mesmos sistemas
significa que o psicólogo vá procurar nos tes- que os testes de inteligência, de maneira que a
tes a confirmação de dados situacionais ou his- leitura desse texto ajudará a clarear certas dú-
tóricos, mas que se capacite para atribuir sig- vidas.
nificação às respostas e aos escores que ob- Dependendo dos objetivos do exame e das
tém, que podem diferir, muitas vezes, confor- hipóteses levantadas, provavelmente, a essa
me variáveis demográficas e características do altura, algumas respostas podem ter sido en-
funcionamento do examinando. contradas.
É necessário recapitular, então, as hipóte- Em alguns outros testes, como o Bender,
ses levantadas inicialmente e no decorrer do por exemplo, que, conforme o enfoque adota-
processo, tendo em mente os objetivos do exa- do, também envolve contagem, é necessário
me. As hipóteses levantadas servirão de crité- interpretar a significação do escore, eventual-
rios para a análise e seleção dos dados úteis, mente comparando-o com a média e o desvio
enquanto os objetivos fornecerão um enqua- padrão para a idade do paciente.
dramento para a sua integração. Desta manei- Mesmo que o teste seja dito projetivo, mui-
ra, as perguntas indicarão que respostas de- tas vezes é necessária a consideração de nú-
vem ser buscadas, confirmando ou não as hi- meros brutos de percentuais ou da relação
póteses. A presença de mais ou menos indí- numérica entre escores de categorias, como no
cios e a sua compatibilidade e intervalidação Rorschach.
permitirão hierarquizar a importância dos da- Damos ênfase aos dados quantitativos, uma
dos obtidos. O objetivo do exame norteará a vez que, havendo mais pesquisas a respeito,
organização de tais informações. oferecem uma base probabilística maior de
Nos testes quantitativos, se ainda não o fez, acerto do que as informações oriundas de uma
atribua escores para as respostas. No caso das análise qualitativa (Exner, 1983). No entanto,

PSICODIAGNÓSTICO – V 117
quando se pretende ter uma compreensão di- classificação diagnóstica, podendo chegar a in-
nâmica sobre o paciente, muitas vezes, para terpretações mais inclusivas, que pressupõem o
fundamentar a formulação diagnóstica ou para marco referencial de uma teoria de personalidade.
chegar a uma orientação sobre o caso, os da- A comunicação dos resultados (output) não
dos qualitativos assumem grande importância. é mais que a formalização oral e/ou escrita de
Por outro lado, se os dados qualitativos per- conclusões a que o psicólogo chegou, estabe-
dem em objetividade para os dados quantita- lecidas em função de um determinado nível de
tivos, podem ser validados, no caso individual, inferência. Todavia, a comunicação não abran-
com a corroboração de alguns indícios por ou- ge todos os dados e, quase sempre, não com-
tros, e, por sua vez, a integração pode ficar con- preende todas as conclusões. Há uma seleção
substanciada por um embasamento teórico, que de informações que, por um lado, é pertinente
encontre denominadores comuns na história clí- aos motivos do encaminhamento e se mantém
nica e no comportamento sintomático atual. num determinado nível de inferência, previsto
Não entraremos em maiores detalhes sobre pelo objetivo do exame, e, por outro lado, se
a análise e interpretação de dados qualitativos, estrutura conforme a natureza do serviço ao
porque cada técnica tem o seu manejo específi- qual será encaminhado o laudo ou de acordo
co, que é tratado na seção pertinente deste livro. com o tipo de profissional que o solicitou.
Cabe apenas salientar a necessidade de or-
ganizar os dados oriundos das diferentes téc-
nicas, buscando um entendimento de coinci- DIAGNÓSTICO E PROGNÓSTICO
dências e discordâncias, hierarquizando indí-
cios e identificando os dados mais significati- Nem sempre o psicólogo precisa chegar, obri-
vos, que, contrastados com as informações gatoriamente, ao nível mais elevado de infe-
sobre o paciente, são integrados para confir- rência para obter uma hipótese diagnóstica ou
mar ou infirmar as hipóteses iniciais. A seleção o diagnóstico mais provável. Principalmente em
das informações que fundamentam as conclu- casos mais graves, freqüentemente apenas o
sões finais deve atender aos objetivos propos- quadro sintomático e a história clínica contêm
tos para o psicodiagnóstico e pressupõe um informações suficientes para que o profissio-
determinado nível de inferência clínica. nal possa enquadrar o transtorno numa cate-
goria nosológica. Esta modalidade de proces-
so diagnóstico seguiria mais um modelo médi-
Níveis de inferência clínica co do que psicológico, o que não significa que
somente o psiquiatra tenha competência para
Lembramos que psicodiagnóstico é um proces- tal. Entretanto, mesmo quando parece não
so científico, que utiliza técnicas e testes psi- haver dúvidas quanto à classificação nosológi-
cológicos (input) e, através de uma série de pas- ca do paciente, o psicólogo muitas vezes é con-
sos, termina com a comunicação de resultados vocado para identificar déficits ou funções pre-
(output) após a integração e seleção dos dados. servadas, enfim, para coletar dados mais subs-
Vimos que, após a admissão de uma quan- tanciais como base para um prognóstico. Nou-
tidade de dados, estes devem ser trabalhados, tros casos, como há alternativas diagnósticas
conforme os objetivos predeterminados, e in- possíveis, o psicólogo pode assumir a respon-
tegrados em função do nível de inferência que sabilidade de um diagnóstico diferencial, que
se pretende atingir. Inferência é, pois, “o pro- se efetua através de um modelo psicológico,
cesso que vincula o input ao output” (Pope & isto é, pelo psicodiagnóstico.
Scott, 1967, p.34). Para chegar à inferência clínica, chamada
A inferência pode ficar num nível simples, de diagnóstico, o psicólogo deve examinar os
quando se baseia apenas num levantamento dados de que dispõe (que englobam informa-
quantitativo, ou pode ser feita em diferentes ções sobre o quadro sintomático, dados da his-
graus de generalização, como no caso de uma tória clínica, as observações do comportamen-

118 JUREMA ALCIDES CUNHA


to do paciente durante o processo psicodiag- tar o entendimento do médico da estrutura da
nóstico e os resultados da testagem), em fun- personalidade e conflitos psicológicos do pa-
ção de determinados critérios (critérios diag- ciente e desenvolver um plano de tratamento
nósticos), podendo considerar, assim, várias efetivo” (p.217). Como se observa, para tais
alternativas diagnósticas. Se certos critérios es- autores, a avaliação compreensiva utiliza pres-
pecíficos são atendidos, pode classificar o caso supostos psicanalíticos. Mas são possíveis ou-
numa categoria nosológica. Para tal fim, deve tras abordagens, inclusive da psicologia com-
utilizar uma das classificações oficiais conheci- portamental ou cognitiva, por exemplo. O im-
das, como o DSM-IV. Com base em tal classifica- portante é que tal tipo de avaliação esteja fir-
ção e em aspectos específicos da história clínica, memente ancorado numa teoria de personali-
poderá fazer predições sobre o curso provável dade, sendo mais freqüentemente utilizados
do transtorno (prognóstico) e planejar a inter- pressupostos psicanalíticos.
venção terapêutica adequada. Muitos testes uti- Para chegar à avaliação compreensiva, o
lizados no psicodiagnóstico também podem for- psicólogo deve ter um entendimento da natu-
necer indícios muito úteis para o prognóstico. reza da interação clínica, não só na entrevista,
Em alguns casos ou transtornos, há um mas durante a realização da série de tarefas,
grande número de sinais e sintomas que po- implícitas numa bateria de testes, que consti-
dem se apresentar em diferentes categorias tuem um campo fértil para observar vários ti-
diagnósticas e que se organizam numa ordem pos de comportamento e, especialmente, a
hierárquica. O profissional deve fazer um diag- maneira como o paciente “formula ou distor-
nóstico diferencial e, para chegar a ele, deve ce a situação (...) a fim de adaptá-la às suas
tomar uma série de decisões, pelo exame de fantasias, atitudes e expectativas profunda-
várias alternativas, que geralmente pressupõem mente arraigadas (habitualmente inconscien-
um modelo estatístico e se baseiam, freqüen- tes) sobre as relações interpessoais” (APA,
temente, em estudos epidemiológicos. São uti- 1980, p.11).
lizadas considerações probabilísticas para che- Muitas informações úteis, no mesmo senti-
gar a um diagnóstico diferencial e que tam- do, também são fornecidas pelos testes proje-
bém servem de fundamento para o prognósti- tivos. Não obstante, testes mais estruturados
co. Como num diagnóstico médico, há uma podem proporcionar dados, tanto com base
série de passos e questões levantadas, que per- no conteúdo das respostas quanto pela rela-
mitem a eliminação de determinadas alterna- ção transferencial que eventualmente se esta-
tivas e a seleção de outras, chegando, afinal, à belece e que pode ser consubstanciada por
hipótese mais provável, à qual podem ser acres- aspectos da dinâmica familiar. A propósito,
centados diagnósticos alternativos. Baker (1970) dá um exemplo de uma reação
Às vezes, conforme o caso e as razões do agressiva do paciente, em relação ao examina-
encaminhamento, o psicólogo deve realizar dor, durante a administração do subteste de
uma avaliação mais compreensiva, baseada em Compreensão do WAIS, em razão da própria
informações adicionais, pressupondo-se que natureza da prova, “fortemente carregada de
atinja o nível mais elevado de inferência, for- itens pertinentes a valores e comportamento
necendo um embasamento psicodinâmico, que social” (p.365). Assim, principalmente se uma
pode facilitar a opção por um tipo de terapia e reação transferencial for corroborada por ou-
a condução de um processo terapêutico. Isso tros dados da testagem (ou pelo uso pós-diag-
não significa uma desconsideração pela classi- nóstico dos testes, sugerido por essa autora) e
ficação diagnóstica do caso, mas um passo por informações da história clínica, há condi-
subseqüente, que leva a uma formulação in- ções de prever o comportamento futuro do
terpretativa mais abrangente e inclusiva, que paciente durante o processo psicoterápico.
é integrada conforme pressupostos teóricos Assim, tanto as observações sobre o compor-
básicos. Para MacKinnon e Yudofsky (1988), “o tamento do sujeito e suas respostas aos testes
objetivo da formulação psicodinâmica é facili- como as reações contratransferenciais do exa-

PSICODIAGNÓSTICO – V 119
minador fornecem indícios que podem permi- ca, o psicólogo pode e, conseqüentemente,
tir que se chegue a elaborar “uma formulação deve utilizar algum sistema oficial de classifi-
diagnóstica psicodinâmica, que é uma explica- cação de transtornos mentais.
ção da psicopatologia do paciente, em termos Atualmente, os dois sistemas de classifica-
de seus conflitos inconscientes e mecanismos ção mais difundidos e usados são a CID-10
de defesa e das origens de seu comportamen- (OMS, 1993) e o DSM-IV (APA, 1995). Conside-
to atual na experiência de vida precoce” (APA, rando que foram criadas facilidades para “um
1980, p.11). intercâmbio mutuamente produtivo” entre a
Embora forneça informações úteis, em Organização Mundial da Saúde e a Associa-
muitos casos, a formulação psicodinâmica en- ção Psiquiátrica Americana, houve um incre-
volve uma tarefa exaustiva e um registro bas- mento da compatibilidade entre os dois sis-
tante extensivo e é menos freqüentemente so- temas (APA, 1995, p.xiii). Desse modo, va-
licitada do que exames com outros objetivos. mos nos restringir a comentários sobre o
Mais comumente, é realizada de forma mais DSM-IV, uma vez que as classificações ameri-
restrita, limitando-se ao exame de certos as- canas têm suscitado um número extraordi-
pectos psicodinâmicos, que podem facilitar e nário de pesquisas, com amplas repercussões
dar embasamento para certas decisões sobre na área do psicodiagnóstico, inclusive com a
abordagens terapêuticas, inclusive não-psico- criação de instrumentos que visam a facilitar
terápicas, identificando recursos do ego e, o processo diagnóstico.
eventualmente, sistemas de apoio no ambien- O DSM-IV utiliza um modelo categórico,
te sociofamiliar para que o paciente possa en- classificando os transtornos mentais “em tipos
frentar certas situações. Por exemplo, num dos com base nos conjuntos de critérios que os
casos ilustrativos deste livro, é apresentado o definem” (p.xxi), claramente inspirado num
problema de uma paciente que foi encaminha- modelo médico. Tais critérios são apresenta-
da para a avaliação de suas condições psicoló- dos “como diretrizes para a confecção de diag-
gicas para se submeter a uma intervenção ci- nósticos, uma vez que comprovadamente o uso
rúrgica e para prognóstico sobre a sua possí- desses melhora o consenso entre clínicos e in-
vel resposta à mesma. O laudo incluiu uma clas- vestigadores” (p.xxv).
sificação diagnóstica e uma formulação dinâ- A abordagem multiaxial do DSM-IV inclui
mica para permitir uma compreensão dos mo- diversas áreas, dimensões, mais adequada-
tivos que justificaram o encaminhamento. Po- mente denominadas eixos, nos quais cada pa-
rém, se o encaminhamento tivesse que ver com ciente pode ser avaliado, de vez que se refe-
a consideração de uma terapia familiar, por rem “a um diferente domínio de informa-
exemplo, as informações seriam de natureza ções” (p.27).
diversa, focalizando a paciente em interação com Segundo o DSM-IV, o Eixo I inclui todos os
os membros de sua família, como unidade social transtornos mentais – exceto os Transtornos de
e dentro de um contexto social mais amplo. Personalidade e Retardamento Mental, que
constituem o Eixo II – e mais “outras condi-
ções que podem ser foco de atenção clínica”
Classificação diagnóstica (p.28), enquanto, no Eixo III, são classificadas
condições médicas gerais, “que podem estar
“Fica facultado ao psicólogo o uso do Código
Internacional de Doenças – CID, ou outros có- relacionadas aos transtornos mentais de diver-
digos de diagnóstico, científica e socialmente sas maneiras” (p.29).
reconhecidos, como fonte de enquadramento Os Eixos I, II e III permitem o registro de diag-
de diagnóstico.”
nósticos múltiplos, em casos de co-morbidade,
(Parágrafo único, do Art. 1º, da Resolução CFP
nº 015/96, de 13 de dezembro de 1996.) enquanto, no Eixo IV, são considerados proble-
mas psicossociais, e, no V, o nível de funciona-
Como vimos, para verificar se um caso pre- mento. Esse tipo de classificação, portanto, “fa-
enche os critérios de uma categoria diagnósti- cilita a avaliação abrangente e sistemática” (p.27).

120 JUREMA ALCIDES CUNHA


A classificação diagnóstica, conforme esse costumam ser mais extensos, abrangentes e
sistema, além de útil, fidedigna e muito viável minuciosos, ao passo que os pareceres são mais
para a comunicação entre profissionais, leva o focalizados, resumidos e curtos.
psicólogo ou o psiquiatra a realizar a sua cole- Dependendo dos objetivos, podem ser ne-
ta de dados de forma sistemática e organiza- cessários vários tipos de comunicação, como,
da, sendo também adequada para a descrição por exemplo, entrevista de devolução com os
dos sujeitos em trabalhos de pesquisa. Desta pais e com o sujeito, laudo encaminhado ao
forma, consideramos que todo psicólogo que pediatra, laudo encaminhado à escola especial
inclui o psicodiagnóstico entre suas atividades e parecer para o serviço de orientação de uma
específicas deve não só se familiarizar com esse escola, que fez a sugestão inicial do exame.
sistema de classificação, mas utilizá-lo em seus O conteúdo da comunicação é definido tan-
laudos, sempre que for pertinente. to pelas questões específicas, formuladas no
início do processo, como pela identidade do
receptor. Existem questões cuja resposta é do
COMUNICAÇÃO DOS RESULTADOS interesse de um receptor, mas não de outro.
Tomemos um exemplo simples de um menino
O psicodiagnóstico, quanto à sua estrutura, que está tendo reações agressivas contra pes-
possui algumas unidades fundamentais: o su- soas do sexo feminino, que é encaminhado
jeito ou examinando, o psicólogo, os testes ou para exame pela pré-escola. Ao psicoterapeu-
as técnicas psicológicas, o informe psicodiag- ta, ao qual será encaminhado, interessa por que
nóstico e o receptor. Em conseqüência, pode- e para que existe o sintoma, isto é, importa o
se afirmar que o informe ou a comunicação entendimento dinâmico do caso. À escola im-
dos resultados constitui uma unidade essen- porta mais saber como se apresenta, em que
cial do psicodiagnóstico e, portanto, deve ser circunstâncias, e como manejar o problema.
previsto no contrato de trabalho com o sujeito Portanto, o conteúdo pode variar quanto à
e/ou responsável. natureza dos dados, conforme as questões a
Na operacionalização do processo, a comu- que responde.
nicação dos resultados logicamente deve se Eventualmente, as mesmas questões podem
realizar como último passo, seguida apenas ser respondidas através de comunicações dife-
pelas recomendações pertinentes e pelo encer- rentes, mas o conteúdo de cada uma pode ser
ramento. É da responsabilidade do psicólogo diverso, em especificidade, profundidade e ex-
definir seu tipo, conteúdo e forma. tensão, seja o receptor, por exemplo, um psi-
O tipo de comunicação dos resultados ou quiatra, um professor ou um pai de nível so-
do informe é definido basicamente pelos obje- cioeconômico baixo. Então, suponhamos que
tivos do exame. Os laudos, por exemplo, ge- o psicólogo tenha realizado uma avaliação in-
ralmente respondem a questões como “o que”, telectual. Para o psiquiatra, pode-se informar
“quanto”, “como”, “por que”, “para que” e qual o QIV, QIE e QIT, ao mesmo tempo em
“quando”, enquanto os pareceres se restrin- que é possível fazer uma análise das funções
gem à análise de problemas específicos colo- cognitivas. Para o professor, interessará mais
cados por determinado profissional que já dis- ter uma idéia em que percentual da população
põe de várias informações sobre o sujeito. En- está enquadrado o seu aluno, em termos inte-
tão, o tipo de informe depende do objetivo ou lectuais, e em que áreas se concentram mais seus
objetivos do exame, que podem ser, por exem- potenciais e seus pontos fracos. Já para o pai de
plo, de classificação simples, de entendimento nível socioeconômico baixo, provavelmente é
dinâmico, de diagnóstico diferencial, etc. Quase mais importante saber qual pode ser a sua ex-
sempre, os laudos constituem o resultado de pectativa em termos do nível de instrução que
um processo psicodiagnóstico com vários ob- seu filho pode atingir com relativa facilidade.
jetivos, enquanto um parecer pressupõe um Aqui, leva-se em conta não só o nível de
único objetivo. Em conseqüência, os laudos inferência que os resultados podem atingir,

PSICODIAGNÓSTICO – V 121
mas, também, o cumprimento de certas nor- ceptor. Conseqüentemente, o laudo a ser en-
mas éticas. Por exemplo, certas informações caminhado a outro psicólogo vai diferir bas-
podem ser passadas a um receptor, cuja pro- tante, na forma, do encaminhado a um orto-
fissão pressuponha um certo código de ética, pedista e será muito diferente da devolução
mas, talvez, não a outro. O sigilo profissional realizada com pais ansiosos e de nível socio-
compromete o psicólogo a não fornecer certas cultural inferior.
informações, ou a prestá-las somente a quem Para que a comunicação dos resultados seja
de direito e sempre contemplando o benefício cientificamente adequada, é necessário que a
do paciente. Por exemplo, a suspeita da pre- seleção, organização e integração dos dados
sença de traços psicóticos numa criança deve se realize, chegando a inferências sobre o caso,
ser obrigatoriamente comunicada ao profissio- tendo como pontos de referência as pergun-
nal responsável pelo tratamento neurológico, tas iniciais e os objetivos do exame. Tais da-
já que a criança pode responder de forma di- dos, que emergem da testagem numa termi-
ferente a certos medicamentos e contamos nologia científica, precisam, então, ser deco-
com a ética profissional do neurologista. Por dificados, conforme a identidade e a qualida-
outro lado, o informe sobre a mesma criança, de do receptor, sendo comunicados de forma
para a escola, pode perfeitamente dispensar a oral ou escrita.
classificação nosológica, cujo conhecimento O que isto representa para o psicólogo? Em
poderia eventualmente levar a uma discrimi- termos de desempenho profissional, quer di-
nação do sujeito. Para a escola, interessa mais zer que realizou uma tarefa que lhe é específi-
saber que existe um problema, como se mani- ca e dela presta contas. Não obstante, há mui-
festa, qual a melhor maneira de lidar com ele e tas variáveis em jogo, em parte tendo que ver
que está havendo um atendimento diferencia- com a sua identidade como psicólogo clínico.
do para o mesmo. Já no caso de a escola con- Implícita ou explicitamente, o psicólogo per-
tar com uma psicóloga, esta poderá receber cebe o informe psicodiagnóstico como um ates-
um laudo mais extenso e profundo, do qual tado que apresenta de sua competência pro-
saberá selecionar as informações que sabe que fissional. Sem dúvida, variáveis associadas com
deve prestar à professora. Entretanto, se sabe- formação, experiência e com sua própria per-
mos que a escola não dispõe de local onde o sonalidade estão em jogo. Igualmente, devem-
informe possa ser mantido sigilosamente, é se levar em conta variáveis que têm relação com
preferível restringir a comunicação a um con- a competência do receptor e com suas expec-
tato telefônico ou pessoal. tativas, e que também influem na situação, in-
Um outro exemplo seria de uma história de terferindo, bloqueando, acelerando ou croni-
caso, que incluísse uma tentativa de estupro ficando o processo psicodiagnóstico e, conse-
por um membro da família, guardada sigilosa- qüentemente, dificultando ou facilitando a
mente pelos pais de uma menina. Este é um comunicação. Assim como nas terapias, às ve-
tipo de dado que, preferencialmente, deve ser zes os processos psicodiagnósticos parecem
comunicado, de forma pessoal, com autoriza- intermináveis, nem tanto por falta de dados,
ção do responsável, somente ao profissional mas porque o psicólogo não sabe o que fazer
que se encarregará da psicoterapia do sujeito, com eles.
mas não ao técnico que, por exemplo, vai se A ciência ajuda o psicólogo a operacionali-
responsabilizar por um programa foniátrico. zar o seu trabalho através dos passos de um
A forma é definida pela identidade e quali- processo de psicodiagnóstico. Por isso, são
dade do receptor. A terminologia e a lingua- importantes sua formação, sua preparação téc-
gem, de modo geral, devem ser adequadas às nica, sua familiaridade com recursos e manejo
do receptor. Dessa maneira, o informe preser- das técnicas para um bom exame psicológico.
va a comunicação necessária, se estiver de acor- Mas o ponto-chave, o elemento crucial, no pro-
do com a profissão, o nível sociocultural e in- cesso é o próprio psicólogo. O sucesso de seu
telectual e com as condições emocionais do re- trabalho ultrapassa a questão da competência

122 JUREMA ALCIDES CUNHA


profissional e, portanto, recomendamos psi- um modo coloquial de dizer as coisas, com o
coterapia para quem trabalha com psicodiag- uso de um vocabulário acessível e enfatizando
nóstico. Isso se justifica por várias razões, mas, as questões que serão mais úteis, para que se
especialmente em entrevistas de devolução, o possam fornecer novas maneiras de perceber
psicólogo deve ter condições para lidar com a realidade e opções para a solução de proble-
problemas às vezes muito sérios, devendo, mas, em benefício do cliente.
eventualmente, encaminhar decisões cruciais Não obstante, essa questão da comunica-
para a vida de outrem, numa situação poten- ção de resultados envolve aspectos extrema-
cialmente ansiogênica, dentro de uma relação mente complexos, porque é preciso distinguir
restrita no tempo. Deste modo, precisa estar a pessoa que solicita o exame daquela que con-
muito consciente do que está ocorrendo, ser trata o serviço, que nem sempre são coinciden-
muito ágil em suas percepções, muito flexível tes, e, então, por definição, o receptor nem
no manejo da relação, muito seguro de suas sempre é a pessoa que contrata o serviço, des-
conclusões e de si mesmo para manter a sua de que, no contrato de trabalho, tenha havido
sensibilidade clínica e ser hábil em sua comu- um consentimento informado do contratante
nicação. a respeito. Este é um problema muito delica-
Ao falar em comunicação, parece importan- do, devendo ser analisado criteriosamente por
te examinar a questão do receptor em poten- suas implicações interprofissionais, interpes-
cial. Em princípio, quem solicita um psicodiag- soais e éticas.
nóstico deve ter assegurado o seu direito à Vamos imaginar um caso oriundo de um
comunicação dos resultados, o que deve cons- setting terapêutico, sendo o paciente encami-
tar já no contrato de trabalho. Teoricamente, e nhado para psicodiagnóstico na expectativa de
regulamentarmente, o direito à devolução é que os resultados ofereçam subsídios para re-
obrigatório, e, na prática, é exatamente esse solver uma questão naquele contexto. Parece
direito que facilita o rapport e a confiança no que o receptor legítimo deveria ser o profissio-
profissional que escolheu. nal que encaminhou o caso – claro –, desde
Ainda que, tradicionalmente, houvesse um que os termos do contrato garantissem esse
pressuposto de que os resultados de um psi- direito. Senão, vejamos: a) se o encaminhamen-
codiagnóstico não seriam de interesse do clien- to foi feito por um psicólogo-terapeuta para
te, em vista de sua complexidade científica, um psicólogo especialista em psicodiagnósti-
hoje em dia, na prática, acredita-se que o usuá- co, para obter informações que poderão levá-
rio tenha direito a um feedback. Entretanto, lo a modificar certos focos de intervenção te-
embora cada problema tenha a sua especifici- rapêutica; e, por outro lado, b) se o psicólogo
dade, na verdade, pode ser apresentado sob que fez o psicodiagnóstico se sentir obrigado
diferentes perspectivas, conforme as caracte- não só a fornecer informações, como também
rísticas peculiares, nível social e profissão da orientar o paciente, poderá estar descumprin-
pessoa a quem se está relatando os resulta- do o seguinte item do Código de Ética: “o psi-
dos. É claro que, conforme o Código de Ética, cólogo não deve intervir na prestação de servi-
“o psicólogo está obrigado a fornecer a este ços psicológicos efetuados por outros profis-
(ao examinando) as informações que foram sionais, salvo em algumas situações”*.
encaminhadas ao solicitante e a orientá-lo em Como vemos, há situações com implicações
função dos resultados obtidos”*, mas, para que interprofissionais (psicólogo versus psicólogo),
a comunicação seja eficaz, deve ser clara, pre- interpessoais (psicólogo versus paciente e psi-
cisa e inteligível. Portanto, freqüentemente, a cólogo versus examinando) e éticas (qual dos
linguagem científica tem de ser traduzida para itens é o mais pertinente?). Desse modo, acre-

*Transcrito do Guia para o exercício profissional, distri-


buído pelo CRP/07 entre os membros da classe. *Vide nota de rodapé anterior.

PSICODIAGNÓSTICO – V 123
ditamos que, para o desempenho competente dos e soluções cabíveis. A troca de objetivo
de sua tarefa e a bem da ética, o psicólogo ocasiona a mudança do tipo de informe e, even-
deve usar seu bom senso, procedendo em be- tualmente, a troca do receptor. Por outro lado,
neficio do usuário e com sua concordância, em a necessidade de proteção da paciente quebra
casos especiais como este. o compromisso com o sigilo profissional.
Quando se falou que o informe tem nor- Vemos, portanto, que a comunicação de
mas específicas, salientou-se muito a questão resultados pode ser assistemática ou sistemá-
da identidade do receptor. Encaminham-se lau- tica. Entre os informes sistemáticos, os tipos
dos a profissionais, aos quais possam ser de mais comuns são algumas entrevistas de de-
interesse, em benefício do cliente e com sua volução e os laudos. Estes são, habitualmente,
concordância. Entretanto, parece mais reco- encaminhados a profissionais da área médica
mendável dar um feedback ao cliente ou a pes- e a outros, da área de saúde e da educação.
soas de sua família, sempre através de uma Os laudos podem variar em sua estrutura,
entrevista de devolução, que também será di- conforme as questões básicas e os objetivos
ferenciada, dependendo da qualificação pro- do exame ou, ainda, de acordo com o estilo do
fissional, nível social, escolaridade e caracte- psicólogo. Em alguns, por exemplo, os dados
rísticas psicológicas pessoais. A comunicação da anamnese e sobre a dinâmica familiar se
oral parece ser um recurso mais esclarecedor e fazem imprescindíveis para a compreensão do
eficaz que as informações por escrito, porque caso, enquanto outros citam apenas os aspec-
cada item pode ser devidamente analisado e tos mais significativos ou, eventualmente, os
esclarecido, se necessário for. Na realidade, é omitem, quando são do conhecimento do re-
uma forma de se prevenir a ocorrência de in- ceptor. Geralmente, o laudo é iniciado com
terpretações dúbias, especialmente de resulta- dados de identificação, seguidos da época de
dos quantitativos, por entendimento errôneo realização do exame. Registram-se os motivos
de dados estatísticos. explícitos e implícitos da consulta, citam-se as
A comunicação dos resultados pode ser feita técnicas utilizadas (por extenso), comunica-se
de forma sistemática ou assistemática. Tome- a impressão sobre o sujeito, apresentam-se
mos o exemplo do caso de uma criança, em dados sobre o estado mental, relata-se sua his-
que, muito freqüentemente, parece importan- tória clínica, descrevem-se os resultados da
te que, na medida em que os dados colhidos o testagem, comumente organizados em tópi-
justificarem, se forneça um feedback ocasio- cos; conforme os objetivos do exame, faz-se,
nal aos pais, seja para alívio da ansiedade, para se for o caso, o entendimento dinâmico e/ou a
satisfazer necessidades reparatórias, para re- classificação nosológica, com prognóstico e pos-
forço do ego ou para discutir soluções emer- síveis encaminhamentos ou recomendações. Este
genciais. Assim, a devolução vai sendo realiza- é mais um modelo tradicional e, conforme os
da de forma bastante assistemática, de modo objetivos do exame, nem sempre precisa ser
que a entrevista final seja dedicada mais à in- muito extenso, exaustivo ou profundo. Na ver-
tegração das informações já prestadas, com dade, não há regras fixas. O importante não é
vistas à discussão de soluções viáveis. que o psicólogo escreva tudo o que sabe sobre a
Outro tipo assistemático de comunicação pessoa, mas o que for pertinente aos objetivos
ocorre quando surgem situações emergenciais do exame e de interesse para o receptor.
de urgência psiquiátrica. Suponhamos que uma No caso, por exemplo, de um laudo na área
paciente, encaminhada para exame de um pro- forense, o psicólogo deve se restringir a res-
blema de memória, apresente indícios compa- ponder os quesitos propostos de uma forma
tíveis com risco de suicídio. Em conseqüência, clara, concisa e não sofisticada, registrando
deve haver troca imediata do objetivo do exa- apenas dados que possam ser úteis ao objeti-
me, passando-se a avaliar a gravidade do ris- vo a que se destinam e excluindo os que po-
co. Se for o caso, faz-se a comunicação ime- dem ser classificados como impressões, opi-
diatamente ao responsável, apontando cuida- niões ou suspeitas.

124 JUREMA ALCIDES CUNHA


Freqüentemente, não é necessária a reda- processo, conservando-se o material do psi-
ção de um laudo, mas somente de um parecer. codiagnóstico arquivado durante algum tem-
Suponhamos que a questão, proposta por um po (No caso de pareceres ou atestados para o
médico, seja se os problemas de memória apre- serviço público, deve ser mantido por cerca de
sentados por um paciente podem ser justificá- 10 anos.), para poder ser retomado caso o pa-
veis pelos sintomas de depressão que vêm sen- ciente volte para exames complementares, ou
do observados. Embora, até certo ponto, o para fornecer subsídios para responder a even-
exame possa ser complexo, o objetivo é sim- tuais consultas suplementares.
ples e único, e nem há razões para a elabora-
ção de um laudo extensivo. O que se requer é
um parecer, com base no exame realizado, in- CASO ILUSTRATIVO
cluindo justificativas sucintas para o ponto de
vista firmado. Para ilustrar o processo psicodiagnóstico, o
Em alguns casos, não se exige entrevista de caso constante na edição passada foi reformu-
devolução, laudo ou, até, parecer por escrito. lado em termos de novas abordagens do MMPI
Isso muitas vezes ocorre quando o psicólogo é e em relação a critérios do DSM-IV. Este caso é
membro de uma equipe multidisciplinar. Cada interessante não só por causa da complexida-
profissional utiliza o seu modelo próprio, para de que apresenta, mas por envolver uma ques-
o exame do sujeito, e os dados são interde- tão de diagnóstico diferencial.
pendentes. O caso é discutido pela equipe, em A forma escolhida para expor o caso tem
seus vários aspectos, e os dados são integra- finalidades didáticas. Por esse motivo, é dada
dos num informe, conforme os objetivos pro- ênfase a certos pontos, mais de interesse para
postos. Às vezes, o objetivo é o de classifica- o psicólogo, que não seriam tratados tão ex-
ção nosológica, para fins de estudo epidemio- tensivamente num laudo comum. Na realida-
lógico da população atendida por um serviço, de, ao final do processo diagnóstico, o caso
restringindo-se a comunicação à especificação de foi discutido amplamente com o psiquiatra
um código, conforme uma classificação oficial. encarregado do tratamento do paciente, ten-
Vê-se, portanto, que o tema é vasto e com- do-se optado pela elaboração de um laudo
plexo e que existem, além disso, maneiras pes- sucinto, necessário para instruir um processo
soais de elaborar informes, que o psicólogo vai administrativo que havia sido instaurado con-
desenvolvendo ao longo de sua prática profis- tra o paciente, com a observação de que so-
sional. Em resumo, o tipo de comunicação é mente o acompanhamento do caso permitiria
definido pelos objetivos do exame, e seu con- confirmar as hipóteses levantadas, o que aca-
teúdo o é pelas questões específicas iniciais e bou ocorrendo, meses depois, conforme de-
pela identidade do receptor. Dessa maneira, poimento do psiquiatra responsável.
pode variar quanto à natureza dos dados, em Identificação: B.S.
profundidade e extensão, e deve atender a Idade: 35 anos
princípios de ética profissional. Em sua for- Sexo: masculino
ma, é definido pela identidade e qualidade Profissão: bancário
do receptor. Nível socioeconômico: médio
O informe pode ser sistemático ou assiste-
mático, mas, considerando a estrutura do psi-
codiagnóstico, é uma unidade essencial e, no Motivos do encaminhamento
processo, um passo obrigatório e final do psi-
codiagnóstico que, em alguns casos, pode acar- Encaminhado pelo psiquiatra para diagnósti-
retar novo contrato, mas de natureza terapêu- co diferencial, o qual deu, por telefone, as se-
tica. Assim, desta entrevista de devolução de- guintes informações sobre o caso:
correm recomendações, orientações e/ou en- O sujeito, que sempre apresentou uma vida
caminhamento do caso e o encerramento do muito regrada, com bom relacionamento fa-

PSICODIAGNÓSTICO – V 125
miliar, embora com poucos amigos, teve uma Hipóteses e perguntas iniciais
reação de culpa muito intensa em razão do
falecimento do pai há dois anos. O processo precisou ser iniciado apenas com
Durante o último ano, passou a se envolver os dados fornecidos pelo psiquiatra, pelo ir-
com rituais de religião afro-brasileira. Em se- mão e pelo paciente, já que o exame objetivo
guida, sob a influência de uma mãe-de-santo, com a esposa só foi realizado após a testagem,
começou a “encomendar trabalhos” e, para por motivo de viagem.
pagá-los, fez um desfalque de quantia consi- Contudo, tais dados já permitiam rejeitar
derável no banco em que trabalhava. Ao ser ou levantar certas hipóteses. Em primeiro lu-
descoberto e decidido o seu afastamento do gar, pelas informações dadas pelo irmão, foi
banco, apresentou sintomas depressivos, inclu- possível verificar que o caso não atendia aos
sive com tentativa de suicídio, sendo interna- critérios diagnósticos de um transtorno de per-
do em hospital psiquiátrico. sonalidade anti-social. Em segundo lugar, com
A primeira entrevista com o irmão, na casa base em subsídios, fornecidos pelo irmão e pelo
de quem permaneceu após a alta hospitalar, próprio paciente sobre a reação deste ao fale-
não acrescentou muitos dados, exceto a res- cimento do pai, isto é, a um estressor severo,
peito de detalhes sobre o comportamento do foi possível pressupor que estivesse apresen-
paciente após a morte do pai e sobre seus sin- tando um episódio depressivo. Sua personali-
tomas depressivos antes da hospitalização. dade pré-mórbida, bastante dependente, pa-
rece ter desenvolvido uma série de sintomas
ante esse fato, que, por sua gravidade e dura-
Descrição ção, teria ultrapassado um quadro depressivo
normal pela perda de um ente querido. O pa-
B.S. é um homem de 35 anos, casado, com duas ciente informou a respeito de sintomas, que
filhas, com nível de escolaridade de 3o Grau perduraram por meses, e que, por sua especi-
incompleto, que reside numa pequena locali- ficidade, pareciam corresponder a um episó-
dade, no interior de... Seu padrão de vida é dio de depressão maior. Por outro lado, a sin-
considerado muito satisfatório, dadas as con- tomatologia que o levou à internação recente
dições socioeconômicas do lugar. também parecia atender aos critérios de uma
Veste-se de maneira informal e, quase in- depressão maior. A partir daí, era possível le-
variavelmente, chega para as sessões de exa- vantar algumas perguntas.
me de 10 a 15 minutos antes. Uma pessoa, que Estaríamos diante de um transtorno bipo-
cruzou com ele ao sair, comentou que sua apa- lar, em que o envolvimento do paciente em
rência era de quem havia sido padre. atividades altamente prejudiciais para a sua
Sua fala é muito monótona, algo macia, vida, entre os dois episódios depressivos, po-
mas não afeminada. Apresenta-se sempre deria ser explicado como uma sintomatologia
com um sorriso, que mantém, tanto quando maníaca? As informações não permitiam man-
responde a questões de cultura geral como ter essa hipótese como a mais provável, uma
quando relata fatos estressantes, como o fa- vez que, nesse transtorno, o episódio inicial
lecimento do pai. Pode-se dizer que não apre- geralmente é maníaco.
senta uma modulação afetiva nítida. Mostra- Estaríamos, então, diante de um transtor-
se muito constrito. Dá uma impressão de in- no depressivo maior recorrente, em que o en-
genuidade e de ser menos inteligente do que volvimento do paciente, no período interme-
realmente é. Sua linguagem é algo pobre e, diário, em atividades religiosas ritualísticas,
eventualmente, troca termos comuns, como pudesse ser explicado por um transtorno de
“dependente” por “independente” e vice-ver- personalidade esquizotípica? Mas como enten-
sa. der o comportamento impulsivo e imprevisível
Não obstante, o seu comportamento, na (se comparado com sua vida anterior), carac-
entrevista, parece apropriado. terizado pelo desfalque? Poderia ser explicado

126 JUREMA ALCIDES CUNHA


pela presença de um transtorno de personali- Observação
dade borderline? E a subserviência absoluta à
mãe-de-santo poderia ser justificada por um Para facilitar a compreensão do caso, serão
transtorno de personalidade dependente ou apresentados, a seguir, a história clínica, um
por uma tendência à superidealização? exame das funções do ego que parecem im-
Estas últimas perguntas deveriam ser con- portantes para fundamentar o diagnóstico,
sideradas seriamente. A depressão maior é uma uma tentativa de entendimento dinâmico e
complicação comum, tanto no transtorno bor- uma discussão sobre achados nas técnicas e
derline, como no transtorno de personalidade nos testes utilizados, em função das hipóteses e
dependente. Já no transtorno de personalida- perguntas levantadas. Os dados foram, assim,
de esquizotípica, são comuns a ansiedade, a integrados para servir como referencial para
depressão, e podem surgir sintomas psicóticos, um encontro entre o psiquiatra e a psicóloga,
mas são transitórios. em que foram examinados alguns pontos crí-
Considerando as primeiras hipóteses levan- ticos, em especial, a qualidade do contato do
tadas, dever-se-iam excluir fatores orgânicos e paciente e outros sintomas apresentados.
fazer o diferencial com transtorno esquizofrê-
nico. Aliás, cabia a pergunta: a escassa modu-
lação afetiva, observada no primeiro contato, História clínica
seria devida apenas a um controle exagera-
damente constritivo ou a um afeto inadequa- O paciente, segundo o irmão, teve uma vida
do, típico do transtorno esquizofrênico? Na- aparentemente normal, até aproximadamente
turalmente, também seria importante o di- 14 ou 15 anos atrás, quando apresentou com-
ferencial em relação a outros transtornos afe- portamento impulsivo e imprevisível. Tinha
tivos e entre diferentes transtornos de per- passado no vestibular, freqüentava um curso
sonalidade. superior sem problemas, quando foi aprovado
na seleção para um banco. Então, abandonou
a universidade, voltou para o interior, onde
Plano de avaliação nascera, casando-se pouco depois. Já o pacien-
te não descreve o ato como impulsivo, dizen-
O Teste de Bender, que é uma boa técnica in- do que desejava ser bancário, tanto que se sub-
trodutória, foi selecionado como instrumento metia à seleção pela terceira vez. Por outro lado,
de triagem de disfunção cerebral. A seguir, a esposa, que sempre o considerou muito de-
decidiu-se usar o HTP, mais com um sentido pendente, disse que a decisão de voltar para o
exploratório e para retardar a introdução de interior e casar foi “a única atitude que tomou
técnicas mais importantes, porém mais ansio- em sua vida sem consultar alguém” (sic). Con-
gênicas. tudo, em sua opinião, continuou “muito ape-
A seguir, foi programada a administração gado” à família, ao ponto de ela sempre lhe
do MMPI, do Rorschach, do WAIS e do TAT. O afirmar que tinha de “cortar o cordão umbili-
MMPI é bastante indicado, no psicodiagnósti- cal” (sic).
co de adultos, quando o objetivo é o exame Daí por diante, a sua vida é descrita como
diferencial. Por outro lado, todas essas técni- supermetódica e regrada, tido como funcioná-
cas são consideradas adequadas quando exis- rio exemplar e como pessoa honesta e respon-
te a hipótese de transtorno de personalidade, sável. Não obstante, a natureza de suas fun-
especialmente de tipo borderline. ções no banco não exigia muita independên-
Foi planejado, também, um exame objeti- cia e nunca recomeçou os estudos, embora
vo, através de entrevista com a esposa do pa- sempre desse apoio à esposa para fazê-lo. Rela-
ciente, que completaria a coleta de dados, ser- cionava-se bem com a família, mas tinha poucos
vindo, além disso, para corroborar indícios amigos. Se convidado para festas, só ia com a
observados durante a testagem. família, “não se desgrudando da esposa” (sic).

PSICODIAGNÓSTICO – V 127
Com a morte súbita do pai, há dois anos, Instado pela esposa a procurar um psicó-
começou a apresentar problemas. O paciente logo ou psiquiatra, não o fez. Ao invés disso,
relata: “... ele ficou doente. Fiz tudo o que passou a procurar pessoas que, usando bú-
mandaram. Ficou bom. Foi um enfarto... Esta- zios, cartas, etc., pudessem lhe dizer “como
vam fazendo um check-up geral. Teve outro seu pai estava, se se encontrava bem onde
enfarto e, daí, veio a morrer. Eu me senti cul- estava” (sic), buscando avidamente anúncios
pado pela morte dele... (?) Poderia ter levado a a respeito.
um centro maior, mas não havia recomenda- Construíram outra casa. Depois, resolveram
ção médica... Como faleceu e eu era o único comprar um apartamento na praia. Ao mesmo
filho, vieram os irmãos e, daí, veio esse senti- tempo, passou a se envolver, ativa, intensa e
mento... Mas enfarto não se pode prever... cada vez mais freqüentemente, com ativida-
Depois da morte, me senti culpado... (?) Dias, des ritualísticas de religião afro-brasileira, co-
semanas, sem dormir... Tomei medicamentos... meçando a ficar muito dependente de uma
Não houve o sentimento de perda pela morte, mãe-de-santo.
mas o sentimento de culpa, que eu carreguei... Quanto à sua vida com a família, “não par-
Mas o sentimento nunca passou...” Mais adian- ticipava, procurava não conversar, evitava as
te: “Passei meses para tirar da idéia. Não fiz pessoas e, até com a esposa, era muito fecha-
nenhum tratamento com psiquiatra, nada... (?) do. Chegava em casa, não conversava, ia para
Nervoso, o dia inteiro... Na relação afetiva, dei- o quarto, ficava sozinho... Amigos, nem fa-
xei a mulher e as crianças de lado... Levei se- lar...”, e, também, mostrava-se “desinteressa-
manas sem fazer a barba, cortar o cabelo, que- do pelas coisas da casa” (sic). Queria trocar de
rendo, parece, jogar alguma culpa... (?) Que carro, falava em comprar outro apartamento,
os outros percebessem alguma coisa... Demo- um sítio. Parecia não dar valor ao dinheiro. O
rou meses... Ia rezar, ia no cemitério todos os que as filhas queriam, dava. Presenteava exa-
dias. Conversava e saía mais calmo... Chegan- geradamente, em quantidade e preço. Mas “só
do em casa, revertia tudo...” (sic). ficava fazendo contas”. Parecia “alegre, mas
A esposa descreveu o sogro como uma pes- insatisfeito” (sic).
soa fria, sem amigos, mas que procurava mui- Demonstrou uma atitude de subserviência
to esse filho, com quem se parecia, mas com à mãe-de-santo, passando a consultá-la cada
quem “só conversava sobre coisas banais” (sic). vez mais (anotando tudo o que dizia), procu-
Com o falecimento do pai, o paciente “se rando ter contatos telefônicos diários com ela,
fechou, entrou em crise” (sic). Quando conver- mesmo que estivesse em outro estado, para
savam, o assunto era só o pai e sua culpa. saber como estavam os negócios e a vida da
Quando chegava em casa, deitava-se em posi- família. Freqüentemente, queria que a esposa
ção fetal, coberto com acolchoados, muito fizesse tais contatos, ficando numa extensão
deprimido: “estava numa concha” (sic). Tinha para escutar. Uma vez que esta se negou, che-
insônia e tomava comprimidos. Emagreceu gou a ajoelhar-se à sua frente, pedindo para
bastante e, depois, começou a engordar. Tor- fazê-lo. Começou, segundo a esposa, a ficar
nou-se muito parecido com o pai, falando, agin- inseguro.
do como ele. Achou que também tinha proble- No início, a preocupação era com o pai; em
mas cardíacos. Consultou muitos médicos e fez seguida, com sua saúde e, depois, com os fi-
muitos exames. Deixou de ter amigos e usava lhos e a esposa. Então, surgiram “avisos” de
desculpas para não sair, exceto ao cemitério. que alguém, no banco, o estava prejudicando.
Gradualmente, começou a falar mais com Cada vez que havia ameaça de perigos, por
a esposa e filhos, mas não como antes do fale- revelação dos búzios ou de outra forma, “en-
cimento do pai. Principiou a se preocupar exa- comendava trabalhos” à mãe-de-santo, que
geradamente com sua mãe, especialmente eram remunerados acima do exigido, afirman-
quanto à sua saúde, querendo que sua filha do “que valiam mais” e “não admitia que nin-
mais velha morasse com ela. guém falasse mal dela” (sic).

128 JUREMA ALCIDES CUNHA


A situação chegou a um clímax quando a o quê?” – perguntou ela, uma vez que ele sem-
mãe-de-santo lhe disse que sua mãe corria ris- pre lhe dizia que os pagamentos eram feitos
co de vida. Foram contratados novos “traba- com dinheiro da poupança, empréstimos, etc.
lhos”, cada vez mais absurdos e dispendiosos. Foram para casa, porque ele queria telefo-
Na época, a esposa estava viajando, e, segun- nar para a mãe-de-santo, e, em seguida, fo-
do ela, a mãe-de-santo “sentiu nele uma pes- ram procurá-la na cidade onde se encontrava.
soa fácil de manipular” (sic). No caminho, “estava completamente baratina-
Sobre esse período, o paciente relata que, do... Começou a falar sozinho...” Várias vezes,
de início, estava convicto de que poderia se “tentou jogar o carro para fora da estrada, na
comunicar com o pai. Depois, passou a temer serra” (sic). As crianças gritavam, e ela passou
perigos iminentes para si e para sua família, a viajar segurando a trava de mão. Queria as-
dos quais poderia se livrar por meio de “traba- sumir a direção do veículo, mas ele não permi-
lhos”: “Na ânsia de me livrar, comecei a tirar tia. Ela disse-lhe, então: “Se quiser tomar uma
dinheiro do banco... Entrei e não tinha como atitude, tome, mas não quando as crianças es-
sair... Foi se avolumando mais... Diziam que tiverem no carro” (sic).
davam proteção... Fiquei independente... de- Conseguiram chegar à cidade, onde perma-
pendente daquelas pessoas...” (sic). Sentiu-se, neceram uma semana, em que manteve con-
então, “desligado do sentimento de culpa” tatos com a mãe-de-santo, que não se mos-
(sic). trou tão solícita.
Desde a época em que começou a freqüen- Confessou à esposa que “seria melhor ter
tar terreiros e até pouco antes de sua hospita- deixado a mãe morrer e não tocar no dinhei-
lização, relata o que poderiam ter sido ilusões ro” (sic). Só queria dormir. Em vez de um com-
(?) ou alucinações visuais (?). Começou a, even- primido, tomava quatro ou cinco. Deitava-se
tualmente, enxergar um vulto, ao acordar. De- na cama, em dia de calor, com dois acolchoa-
pois, passou a vê-lo em outros momentos e dos. Ficava “em posição fetal, ao desamparo”
situações, chegando a achar que o vulto pas- (sic). Dormia sem trocar de roupa e não cuida-
sou a segui-lo na rua. Também há a história de va de sua higiene. Se não estava deitado, ca-
ilusões auditivas (?): “Já ouvi vozes... já ouvi minhava de um lado para outro, sem conver-
alguma coisa... Eu sentia a sensação de que sar. Nesse período, escreveu bilhetes suicidas,
estava falando... (?) Não sei, talvez fosse um dirigidos à esposa.
aviso de que algo ia acontecer... Não houve um Segundo o paciente, “estava bem maluco,
fato concreto...” (sic). Fala também de odores não acreditava na gravidade do problema”.
peculiares, no serviço (alucinações olfativas?). Não se alimentava e não conseguia dormir:
Além disso, acha que “foi induzido a procurar “Queria só dormir... Queria pegar o carro e me
o centro espírita e a fazer coisas que me man- jogar num barranco... Peguei até um revólver,
davam” (sic). Por outro lado, refere situações mas as pessoas da família não deixaram” (sic).
em que, “quando alguém me olhava forte, fi- Conforme o irmão, “fez uma confissão de
cava meio paralisado, meio tonto e perdia a dívida, para o banco, que foi patética” (sic).
noção da memória, por momentos”, e outras Foi então que o irmão mais velho o levou a um
em que, “por segundos, me dava uma tonteira centro maior e o internou num hospital psi-
e perdia a noção” (sic). Também achava que, quiátrico, onde permaneceu 28 dias.
realmente, havia pessoas no banco querendo Ao sair, suspensa a medicação, para que
prejudicá-lo. realizasse os testes psicológicos, voltou a ter
O desfalque foi descoberto no banco, e, insônia, vagando à noite pela cidade. Na casa
segundo ele, “pediu um tempo”, porque não do irmão, onde ficou durante esse período,
conseguia falar. Procurou a esposa em seu tra- mostrava-se calado, alimentava-se mal e escre-
balho. Ao chegar lá, as pessoas “sentiram que veu duas cartas, sem falar em suicídio, mas com
ele estava diferente”. Disse a ela: “Descobri- teor idêntico às anteriores. Chorava muito. Com
ram tudo, no banco, e eu estou na rua”. “Tudo a visita da mãe e de sua filha, passou a se mos-

PSICODIAGNÓSTICO – V 129
trar preocupado com o futuro da família. Não sinais isolados, mas deve-se considerar que o
obstante, a esposa, que o visitou 10 dias de- nível de inteligência, preservado, também ser-
pois, afirmou que, embora fale no assunto, não ve como variável moderadora em relação à
sabe “até que ponto sofre com isso. Está mais desorganização, em provas intelectuais.
estranho, mais distante... Não é a mesma coi- Observam-se, ainda, erros não compatíveis
sa... (?) Ele não sabe da gravidade do fato... Às com a formação do sujeito, sugerindo pouca
vezes, dá a impressão de que não está nem capacidade para tirar proveito adequado da
aí... (?) Está aéreo, alheio, não está normal, não educação formal, talvez por perda de interes-
colocou os pés no chão” (sic). se no ambiente, embora certas lacunas iso-
A esposa não sabe informar sobre anteceden- ladas possam se associar a dificuldades oca-
tes de doença mental na família do paciente. sionais de atenção, em parte devidas à an-
siedade.
Pensamento e linguagem – Nos testes es-
Integração e seleção dos dados truturados, o escore mais baixo é indicativo de
comprometimento do pensamento abstrato. O
Funções do ego sujeito apresentou respostas incorretas em
muitos itens, chegando a um escore inconsis-
Inteligência e funções cognitivas em geral – O tente com os demais, sugerindo um declínio
QIT de 98 é médio, provavelmente no mesmo da eficácia cognitiva da análise e síntese. Con-
nível da inteligência pré-mórbida. Não obstan- frontado, no reteste de um item, conseguiu dar
te, uma análise mais cuidadosa das produções uma resposta de nível melhor, mas não com-
verbais do paciente, em provas estruturadas, pletamente exata, sem crítica. Por outro lado,
revela a intrusão de aspectos conflitivos em seu comentário sobre o fracasso em certos itens
funções do ego, consideradas teoricamente li- envolveu nitidamente projeção, compatível
vres de conflito. Desta maneira, há respostas com uma opção de resposta paranóide, ao li-
incorretas, na escala de inteligência, que suge- dar com estresse.
rem que a função do juízo pode ficar compro- Em outro subteste, que envolve pensamen-
metida por impulsividade e que há dificuldade to conceitual, o comprometimento evidencia-
na capacidade de considerar as necessidades do foi mais qualitativo do que quantitativo, não
dos outros. só pela emergência de respostas em nível con-
Por outro lado, observam-se irregularidades creto e funcional, mas também por uma ten-
no desempenho, tanto inter como intratestes. dência a apresentar conceitos muito amplos e
Num subteste específico, cujo escore caiu no sincréticos e pelo aparecimento de uma res-
limite inferior da normalidade (ao contrário dos posta isolada de natureza confabulatória.
demais), mostra um tipo de inconsistência que, No Rorschach, apresentou vários lapsos no
por vezes, é encontrada em sujeitos que tive- pensamento lógico, em sua maioria sutis, mas,
ram de fazer ajustamentos caracterológicos ou também, uma resposta isolada, baseada em
cognitivos para manejar uma ansiedade esma- raciocínio falso, em nível possível de ser carac-
gadora, pouco controlada por defesas frágeis. terizado como um tipo de lógica autista, sem
Já a variabilidade parece sugerir uma capaci- atitude crítica por parte do sujeito.
dade inconsistente para moderar pressões Todavia, quanto ao número e grau de gra-
emocionais e resguardar as operações cogniti- vidade, não apresentou distorções de pensa-
vas do afeto, o que pode levar a um funciona- mento mais comuns no transtorno esquizofrê-
mento errático. Tal variabilidade na qualidade nico. Por outro lado, confrontado com um dos
das respostas também aparece em provas não lapsos mais sutis de funcionamento lógico,
estruturadas. Notam-se, portanto, sinais oca- mostrou-se, até certo ponto, capaz de melho-
sionais no funcionamento cognitivo que, quan- rar a resposta.
do ocorrem em quadros de nível “neurótico”, Quanto à linguagem, tanto na entrevista
são muito mais discretos. Contudo, trata-se de como na testagem, foi verificada constante tro-

130 JUREMA ALCIDES CUNHA


ca dos termos “dependente” e “independen- tados interiores na realidade externa e, até,
te”, que corrigiu uma vez, mas observando-se experiências que poderiam se caracterizar como
que, nas outras ocasiões, eles eram usados in- alucinações. Nesse momento, estas estavam
discriminadamente, como se aspectos emocio- ausentes, mas a fachada de constrição pode-
nais se infiltrassem no conteúdo da linguagem. ria estar mascarando certo grau de incerteza
No mais, por vezes, empregou termos não em quanto à capacidade de distinguir o real do
sua forma mais usual, embora tal fato possa irreal. Por outro lado, no exame de limites, no
ser devido, até certo ponto, a diferenças so- MMPI, ao ser solicitado a esclarecer os moti-
cioculturais. vos de sua concordância com a afirmação “Fre-
De um modo geral, é possível considerar qüentemente, sinto como se as coisas não fos-
que a sua linguagem é pobre, e sua produção sem reais”, disse que é “uma fantasia”: “Às
é ingênua, quase infantil. vezes, de uma fantasia, faço uma coisa real...
Teste de realidade e sentido de realidade – de um problema, faço uma fantasia...” (sic),
A análise do nível formal das respostas sugere alongando-se numa explicação complexa, que
que, de um modo geral, lida com a realidade permite concluir que nem sempre a realidade
de uma forma cuidadosamente controlada, o externa é percebida totalmente como real ou
que denota a presença de traços compulsivos que podem ocorrer percepções alteradas da
na estrutura do caráter. Entretanto, a maneira realidade externa.
como se distribuem os escores é compatível Sua auto-imagem parece geralmente de-
com uma constrição superficial, mais situacio- pender do feedback externo. No momento em
nal do que característica, como uma forma de que tal feedback falta ou é negativo, como na
não se envolver emocionalmente na situação. situação atual, diz-se “perdido, com medo”
Contudo, aparecem indícios que nos permitem (sic). Então, mostra fortes sentimentos de fal-
pressupor, pelo menos, a existência de lapsos ta de valor pessoal, mas que não podem ser
transitórios no teste de realidade que, no mí- considerados irrealísticos, em face dos fatores
nimo, autorizam a afirmar que o sujeito não estressantes com que se defronta.
lida adequadamente com a realidade. Organização afetiva – O paciente descreve-
Por outro lado, grande parte das distorções se como “pessoa muito calma, tranqüila até
menos graves, na percepção e interpretação, demais” (sic). Isso pode ter que ver com a fa-
tendem a ocorrer em perceptos que envolvem chada de constrição ou com uma forma de não
símbolos fálicos, parecendo respostas disfun- se envolver afetivamente, manifestando-se de
cionais, associadas com uma fonte de conflito modo estereotipado. Por outro lado, compor-
e não ao acaso, como costumam ocorrer em tar-se conforme a expectativa permite a satis-
pacientes cujo teste de realidade está óbvia e fação de necessidades de dependência, que
grosseiramente comprometido. Também, uma parecem muito intensas. Não obstante, há in-
das respostas de conteúdo humano, no Ror- dícios de que tal atitude possa ser apenas su-
schach, pode levantar a possibilidade de algum perficial. As observações, durante a testagem,
conflito na área sexual ou, no mínimo, uma são reveladoras. Embora com esforços de se
desvalorização de suas próprias projeções: “... mostrar submisso e cooperador, ao ponto de
é um homem... Não do sexo masculino, uma esperar que o examinador terminasse de es-
pessoa adulta”. crever, para continuar a falar, houve momen-
Há, também, indícios que permitem supor tos em que se mostrou evasivo nas respostas,
a presença de um certo enfraquecimento na pouco colaborador no inquérito, reticente ao
capacidade de testar e de discriminar estímu- dar explicações ou dependente, com contínuas
los internos e externos, como, aliás, a história perguntas sobre as instruções. Mas, noutras
do paciente permite pressupor. Quando relata vezes, pareceu ansioso, ao ponto de dar uma
experiências nesse sentido, nota-se ora confu- resposta impulsiva, manifestando uma atitu-
são entre estados interiores e exteriores, às de de oposicionismo ao lidar com o material
vezes, ao acordar, ora possível projeção de es- do teste ou demonstrando irritação e claramen-

PSICODIAGNÓSTICO – V 131
te projetando no examinador a culpa por seus vações, no perfil, é compatível com a presença
próprios erros. de risco de suicídio.
No Rorschach, não há indícios que caracte- Organização das defesas – A série de rituais
rizem uma labilidade contínua, mas, invaria- em que o sujeito se envolveu há algum tempo
velmente, se observou que à produção de uma e nos quais possivelmente ainda confia sugere
resposta com conotação emocional se seguia a utilização maciça do mecanismo de anula-
outra, caracterizada por uma tentativa de con- ção. Da mesma maneira, a forma como o su-
trole mais rígido, de vez em quando com si- jeito se refere aos fatos relativos ao falecimen-
nais prévios de ansiedade, insuficientes para to paterno e a sua reação aos mesmos são ca-
garantir uma boa qualidade. Já no TAT, elabo- racterísticas do uso do mecanismo de anula-
rou histórias em que os afetos se mostram mais ção, que também se evidencia em alguns indí-
lábeis e pelo menos duas em que se notam cios dos testes.
mudanças abruptas, tanto na expressão emo- No MMPI, há sinais de reativação de defe-
cional, como no comportamento dos persona- sas que, envolvendo pensamento mágico, ru-
gens. Desse modo, o quadro geral é de uma minação e rituais, estão associadas com usos
regulação não adequada dos afetos, predomi- menos eficientes de repressão (como negação
nando irrupções de afeto nem sempre bem rígida), mais característicos de níveis mais pre-
controladas e seguidas por inibição afetiva, coces do desenvolvimento psicossexual. Con-
mas, eventualmente, havendo a ocorrência de tudo, a configuração geral do perfil também
mudanças lábeis. O comportamento não foi sugere a incapacidade crescente de o paciente
marcado por inquietação, mas houve eventuais lidar com o estresse, pelo uso de defesas ob-
respostas impulsivas. As histórias do TAT são, sessivo-compulsivas, como também a sua ten-
em sua maioria, focalizadas mais na ação do tativa de mudar a sua visão do mundo através
que na descrição da experiência interior dos da utilização de projeções mais grosseiras. Des-
personagens. Pode-se dizer que a ação é usa- ta maneira, notam-se evidências da presença
da, até certo ponto, como descarga de ten- de defesas mais arcaicas, seguidas ou precedi-
são, mas, especialmente, num nível de fan- das por demonstrações de funcionamento em
tasia. Neste, a descarga de tensão e a gratifi- melhor nível. No próprio processo de diagnós-
cação direta dos desejos, dependentes ou tico, foi necessário propiciar algum encoraja-
agressivos, não sofre a influência das normas mento, por manifestações que sugeriam que
convencionais. Assim, ao contrário da vida ora o paciente considerava o examinador com
sempre regrada que levou, seus personagens confiança, ora, noutro momento, reagia com
jogam, ficam bêbados, brigam e matam um suspeição.
amigo, sem serem punidos ou mostrarem Os indícios de utilização do mecanismo de
remorso e culpa. Todavia, também são pes- negação não são muito conspícuos. Surgiram,
soas muito infelizes, descontentes, ambiva- eventualmente, no TAT, num exemplo de ne-
lentes ou doentes. gação de impulsos agressivos e num percepto
Em relação ao MMPI, os dados sugerem que que envolvia disforia aguda e que evoluiu para
os mecanismos de defesa não são suficientes a expressão e um otimismo ingênuo. Projeção
para o sujeito lidar com a ansiedade ou para é fortemente sugerida pelo MMPI. Nos demais
canalizar apropriadamente impulsos agressi- testes, há indícios, aqui e ali, mas de uma for-
vos. Há mau controle desses impulsos, poden- ma caracteristicamente marcante, já que gran-
do ocorrer episódios de forte atuação. A an- de parte do material produzido foi sobrecarre-
siedade associa-se à ameaça que o sujeito sen- gado por forte tendência à constrição e, às
te em relação a esses impulsos, que não con- vezes, por sinais de impotência e dificuldade
seguem ser liberados adequadamente, mas se de associação das idéias. Uma vez que muitos
dirigem contra si mesmo. Aliás, a história do dos itens do MMPI são expressos no passado,
paciente inclui gestos suicidas recentes. A ele- talvez a diferença em lidar com o estresse,
vação da escala 2, combinada com outras ele- numa e noutra prova, explique, até certo pon-

132 JUREMA ALCIDES CUNHA


to, por que a utilização de certos mecanismos, chegado tarde, o que desgostou a esposa, en-
embora ainda presente, não seja tão marcante quanto se observa outro escapando impune-
como já o foi. mente após assassinar um amigo. Tais discre-
Há, também, alguma sugestão do uso de pâncias, por certo, influem na percepção dos
cisão, como tática de defesa, através de repre- outros em termos de estabilidade e previsibili-
sentações de objeto altamente polarizadas, dade.
corporificando qualidades extremas, acompa- Por outro lado, há personagens muito va-
nhadas por outros sinais de inconsistências, na lorizados ou muito desvalorizados, sugerindo
testagem, que podem se associar com possí- descontinuidade na auto-estima, com reflexos
veis contradições na percepção das pessoas e no mundo objetal.
de si mesmo. Finalmente, há respostas, no Rorschach,
Estrutura do mundo dos objetos – Obser- compatíveis com alguma dificuldade na inter-
vam-se alguns indícios de certas contradições, nalização do papel sexual, o que, junto aos
na autopercepção, a partir da descrição de demais indícios encontrados, aponta para um
pessoas, nas técnicas projetivas, que podem ser problema de identidade e, conseqüentemen-
compatíveis com uma dificuldade para resol- te, na percepção de si mesmo e dos demais.
ver aspectos discrepantes de si mesmo e para
ver os demais como estáveis e previsíveis.
Notam-se, também, certas inconsistências Entendimento dinâmico
em perceptos de objetos, que podem estar
dentro ou fora de outros, que talvez tenham Parece haver uma preocupação ansiosa a res-
que ver com dificuldades do sujeito quanto peito da expressão da agressão e quanto à
à representação dos próprios limites dos ob- agressão como força motivadora, uma vez que
jetos. as histórias que o paciente produz às vezes são
Verifica-se que, no TAT, os personagens, por marcadas por tensão, oposição e frustração,
vezes, mudam de atitude ou de sentimentos e, em algumas, há personagens que são víti-
de forma imprevisível. Assim, ora eles demons- mas de ou responsáveis por homicídio. Mas o
tram falta de modulação afetiva, são superfi- fato de o tema não ser muito freqüente e ha-
ciais ou algo amorfos, ora são levados pelos ver outras respostas, em que símbolos agressi-
impulsos. Quando as histórias envolvem mais vos são desvalorizados ou negados, torna o
de um personagem, quase sempre são descri- caso bem menos severo, embora possa ter al-
tos de forma dicotômica (um é rico, e o outro, guma relação com a intensificação de necessi-
pobre; um é feliz, enquanto o outro, infeliz; dades de dependência, que vão sendo frustra-
um é muito dependente, e o outro, gratifica- das por contingências da vida, apesar de seus
dor). Essas descrições polarizadas sugerem cer- intensos esforços de evitar abandonos imagi-
ta inconstância e instabilidade na percepção nados.
dos demais e de si mesmo. O que parece predominar, no material de
Também se observa que a própria maneira teste, é a ansiedade quanto à possibilidade de
de o sujeito experienciar culpa parece incon- abandono. Nas histórias do TAT, encontram-se
sistente, ora se considerando como uma pes- situações em que indivíduos dependem basi-
soa que prejudicou a si mesmo e à família, camente de outros, e de personagens que en-
pronto para se autocastigar; ora sugerindo que tram em desespero quando esses outros fal-
as preocupações éticas estão ausentes, quan- tam, com a emergência de ansiedade e depres-
do diz que realizou o desfalque com completa são, associadas com sentimentos de abando-
segurança e, mesmo quando descoberto, não no. Por outro lado, há uma qualidade infantil
parecia acreditar na gravidade do problema. na subserviência a alguém idealizado de for-
Tais extremos de ação e fracasso do superego ma onipotente, que pode tomar conta do su-
também se refletem no TAT, com um persona- jeito, relacionada com desejos e expectativas
gem querendo abandonar o lar apenas por ter mágicas de que esse alguém possa compensar

PSICODIAGNÓSTICO – V 133
a incapacidade pessoal de encontrar equilíbrio nas uma porta fechada e uma janela lateral,
e de lidar com a vida. consideravelmente acima de onde se supõe ser
O pai do paciente foi descrito por ele como o chão, já que há o esboço de uma escada,
“bom, calado, bem forte, grandão” (sic), pro- que se liga a um caminho, que não leva a lugar
vavelmente uma figura onipotente, da qual algum. Novamente, o desenho sugere, pelo
dependia. A intensidade das necessidades de menos, dificuldades no contato com a realida-
dependência provavelmente ajuda a entender de, quando não suspeita do rompimento de
a dinâmica do caso. Em primeiro lugar, vemos tal vínculo. Há, também, um sinal de transpa-
a sua incapacidade em tolerar o grau de esti- rência no telhado, compatível com a dificulda-
mulação de um centro maior e as exigências de de estabelecer limites entre a realidade ex-
de um curso universitário, precisando retornar terna e a interna. A figura humana, com a ca-
para seu lugar de origem, para perto da famí- beça exageradamente grande, pode sugerir a
lia e de um ambiente protetor. Em segundo presença de sintomas ideacionais. Por outro
lugar, compreende-se o desespero com que lado, a acentuação dos óculos e das orelhas
reagiu à morte do pai (primeiro episódio de- assinala uma atitude de vigilância frente ao
pressivo). Em terceiro lugar, a mãe-de-santo ambiente. Há traços de dependência. Os deta-
aparece como uma continuidade de sua possi- lhes são poucos e desenhados de forma muito
bilidade de manter vivo seu vínculo com uma esquemática, que tanto podem assinalar ten-
figura onipotente (o pai), de quem dependia, dências regressivas, como lembram desenhos
passando a substituí-lo e garantindo-lhe segu- produzidos por sujeitos com transtornos de
rança, com o que dependência poderia ser per- personalidade.
cebida como independência. E, finalmente, Os resultados do Rorschach são atípicos.
entende-se sua reação ao desmoronamento de Trata-se de um protocolo constrito (percentual
todo um complexo delirante, com nova frus- de F=57%, mas percentual de F’=91%), em
tração de suas necessidades de dependência que o percentual de F+ sugere um ego débil,
(segundo episódio depressivo?). com qualidade apenas pouco inferior à normal,
embora, aparentemente, não tão prejudicada
como num transtorno esquizofrênico. Mas a
Discussão sobre os achados nas técnicas e soma de F’o+F+ indica que o contato com a
testes, em função das hipóteses e realidade é apenas superficialmente bom. Por
perguntas iniciais outro lado, a presença de 3 F’s e 1 F’– é com-
patível, pelo menos, com lapsos transitórios no
O protocolo Bender, levantado conforme o sis- teste de realidade, podendo-se levantar a hi-
tema de Lacks (1984), revelou a presença de pótese de um contato borderline, no teste de
quatro indicadores de disfunção orgânica ce- realidade, mascarado por constrição. Notam-
rebral, que é um número insuficiente, em ter- se, também, vários lapsos sutis no pensamen-
mos probabilísticos, para uma hipótese diag- to lógico, bem como uma resposta caracterís-
nóstica neste sentido e que, também, não en- tica de lógica autista, além de presença de uma
contrava embasamento em outros dados clí- síndrome autista incompleta. Há, ainda, indí-
nicos. cios de algumas defesas de nível “neurótico”
No HTP, foram produzidas figuras muito (obsessivo-compulsivas), embora com a emer-
regressivas, especialmente a da árvore, o que, gência eventual de mecanismos mais arcaicos.
em comparação com o desenho da pessoa e Há sugestão de confusão de identidade, mas
da casa, sugere um mau prognóstico. A estru- não se trata de um Rorschach típico de trans-
tura da árvore é muito primitiva, sem galhos, torno de personalidade borderline, pelo menos
compatível com dificuldades de contato com no que se refere à presença de problemas mais
o ambiente e lembrando desenhos de pacien- sérios no controle dos impulsos, embora não se
tes esquizofrênicos. Já a casa é desenhada pra- possa esquecer que esse quadro é muito hetero-
ticamente sem aberturas, ou melhor, há ape- gêneo (Widiger, Sanderson & Warner, 1986).

134 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 11.1 Desenho da casa de um paciente do sexo
masculino, de 35 anos.

Figura 11.3 Desenho da pessoa de um paciente do sexo


masculino, de 35 anos.

foi observado por Berg (1983), em protocolos de


pacientes com transtorno de personalidade bor-
derline. As figuras humanas são mal delineadas
e dicotômicas, isto é, boas ou más, felizes ou in-
felizes, etc. A ênfase é na relação dependente.
O perfil do MMPI impressiona pela eleva-
ção global que apresenta (com a elevação mé-
dia das escalas 82,67), sugerindo, pela forma
como se delineia, um transtorno de personali-
dade (Código: 6!!!2!!!8!!!1!!4!3!9x1:35:7). As
elevações predominantes 628, à primeira vis-
ta, caracterizam um quadro psicótico, ainda
que a elevação F torne importante a conside-
ração da validade do perfil. Mas, de acordo com
estudos recentes, o F-K de 27 corresponde exa-
tamente ao ponto de corte estimado para pa-
cientes psiquiátricos (Groth-Marnat, 1999) e,
portanto, não invalida o perfil. Na época em
que o paciente foi testado, com um ponto de
Figura 11.2 Desenho da árvore de um paciente do sexo corte admitido do F-K mais baixo, ficamos em
masculino, de 35 anos. dúvida quanto à questão da validade. Por ou-
tro lado, o fato de o sujeito ter levado mais de
duas horas podia ser atribuído a alguns fato-
O TAT foi utilizado mais para um entendimen- res – gravidade da sintomatologia, exagero no
to dos vínculos afetivos e da regulação dos afe- auto-relato da patologia (para passar uma de-
tos. Caracterizou-se pela pobreza na produção e terminada impressão e/ou como pedido de aju-
pela ênfase mais na ação do que na interpreta- da) ou por má compreensão verbal. Mas o ín-
ção do estado interior dos personagens, o que dice TR+CLS é apenas igual a 1 (portanto,

PSICODIAGNÓSTICO – V 135
menor do que 7), indicando que o paciente “Tenho pensamentos estranhos e peculia-
deve ter respondido com honestidade, demons- res”;
trando compreensão verbal suficiente para for- “Ouço coisas estranhas quando estou só”;
necer um protocolo válido (conforme Levitt & “Nunca tive visões” (E).
Gotts, 1995). Levando em conta, ao mesmo tempo, a ele-
Analisando os sintomas principais do pa- vação maior que T70 da escala de Psicoticismo
ciente, através dos indícios do perfil, como a de Wiggins, aumenta a possibilidade da hipó-
elevação maior que T70, na escala D (T=90), e tese de psicose, embora, a partir de um inven-
pelo uso de escalas especiais – a escala de Wi- tário verbal, esta seja só uma probabilidade,
ggins e a escala de Tryon, Stein e Chu (apud viável, até certo ponto, em termos da história
Levitt & Gotts,1995) –, que ultrapassam um clínica do paciente, mas não integralmente
T70, pode-se afirmar que os dados apontam corroborada pelos dados do Rorschach.
para uma depressão clinicamente grave, com Por outro lado, usando escalas suplemen-
indícios compatíveis com risco de suicídio. Tam- tares de transtornos de personalidade, obser-
bém, utilizando a escala de tensão, vê-se que va-se que, para o transtorno de personalidade
o paciente endossou itens que indicam que seu esquizotípica, o paciente preenche critérios (es-
nível atual de ansiedade é elevado, o que, pos- core 16) que o classificariam num nível V, en-
sivelmente, deve-se, em grande parte, à situa- quanto, tanto para o transtorno de personali-
ção estressante que vem atravessando. dade borderline (escore 20) como dependen-
Usando a escala I-RD, de Distorção da Rea- tes, estaria no nível IV. Evidentemente, dada a
lidade (apud Levitt & Gotts, 1995), o escore do natureza do instrumento e o fato de apresen-
paciente ultrapassa um T69, com o que se pode tar itens formulados no tempo presente e no
dizer que o paciente admite apreciável núme- passado, não é possível chegar a inferências
ro de sintomas usualmente considerados com- sem considerar os demais dados da testagem
patíveis com a existência de uma psicose, como e as informações da história clínica presente e
alucinações e experiências peculiares e bizar- passada.
ras, como as seguintes: O WAIS foi administrado para esclarecimen-
“Às vezes, maus espíritos se apoderam de to de aspectos cognitivos, que já foram am-
mim”; plamente discutidos no item sobre as funções
“Tenho tido experiências muito peculiares do ego. Além dos indícios de comprometimen-
e estranhas”; to examinados, especialmente no que tange a
“Quando estou com outras pessoas, abor- pensamento conceitual, os recursos intelec-
rece-me ouvir coisas muito estranhas”; tuais, em geral, encontram-se bastante preser-
“Minha alma algumas vezes deixa meu cor- vados.
po”;
“Vejo pessoas, coisas, animais, ao meu re-
dor, que os outros não vêem”; Fundamentação das hipóteses diagnósticas
“Creio que estão tramando alguma coisa
contra mim”; As hipóteses iniciais centravam-se num trans-
“Creio que estou sendo seguido”; torno afetivo a partir das informações iniciais
“Comumente, ouço vozes sem saber de do próprio paciente e de seu irmão. Não obs-
onde vêm”; tante, nova entrevista com o paciente, a entre-
“Alguém controla a minha mente”; vista com sua esposa, bem como a observação
“Uma ou mais vezes, em minha vida, senti do comportamento do paciente e os dados
alguém hipnotizando-me, induzindo-me a fa- obtidos na testagem sugeriram um quadro
zer coisas”; psicopatológico bem mais complexo.
“Às vezes, sinto odores peculiares”; No momento, sem dúvida, o paciente apre-
“Freqüentemente, sinto como se as coisas senta e relata sintomas depressivos apreciáveis,
não fossem reais”; bem como sinais residuais de natureza psicótica.

136 JUREMA ALCIDES CUNHA


Em relação à hipótese da presença de trans- zoafetivo, em remissão. Todavia, como os sin-
torno de personalidade esquizotípica, obser- tomas de natureza esquizofrênica podem ser
va-se que satisfaz os critérios diagnósticos do emergentes, sendo difícil distinguir formas se-
DSM-IV. Quanto ao transtorno de personalida- veras de transtorno de personalidade esquizo-
de borderline, não preenche todos os critérios, típica de sinais prodrômicos de esquizofrenia,
e o mesmo se pode dizer quanto ao transtor- só um acompanhamento do caso poderá per-
no de personalidade dependente. Mas, sem mitir um diagnóstico mais seguro.
dúvida, apresenta alguns traços. Em relação
ao último, não só foram observados indícios
característicos no MMPI, como a maneira Laudo psicológico
como a esposa o descreveu, desde que co-
meçaram a se relacionar, corresponde pelo Identificação: B.S.
menos a um tipo de personalidade depen- Idade: 35 anos
dente, como uma pessoa dócil, imatura, pas- Época do exame: –
siva e submissa a uma figura mais forte. É Motivo do encaminhamento: diagnóstico
ingênuo e facilmente persuadível. Evita com- diferencial.
petição e tensão social. Parece sentir-se fra- Técnicas utilizadas: Entrevistas com o pa-
co, frágil e, eventualmente, inadequado, em ciente, com o irmão e com a esposa; Teste de
certas circunstâncias. Rorschach, Minnesota Multiphasic Personality
Entretanto, durante o processo do psico- Inventory (MMPI), Thematic Aperception Test
diagnóstico, chamou especial atenção a ausên- (TAT), Wechsler Adult Intelligence Scale (WAIS)
cia de uma modulação afetiva nítida, também e técnicas gráficas.
observada pelo psiquiatra responsável por seu Sumário dos resultados: O paciente apre-
tratamento. Por outro lado, a esposa também senta um quadro depressivo, com sinais resi-
observou diferenças em sua personalidade, duais e/ou incipientes de natureza psicótica. Ao
descrevendo-o como “desligado”, “aéreo”, mesmo tempo, os resultados são compatíveis
“alheio”, “parado”, parecendo que “não é mais com a presença de transtorno de personalida-
o mesmo”, “que não está normal”, “que não de esquizotípica, com traços de transtorno
está nem aí” (sic). Além disso, como há dados borderline, ainda com características de per-
compatíveis com a presença de indícios de sonalidade de tipo dependente.
transtornos de pensamento, da existência de, Confrontando os resultados do exame com
pelo menos, lapsos no teste de realidade, de a história clínica, as características de perso-
problemas no sentido de realidade, de conteú- nalidade de tipo dependente já podiam ser
dos delirantes e de prováveis alucinações, es- observadas na fase pré-mórbida, quando apre-
tão satisfeitos alguns critérios para o diagnós- sentou um episódio que, pela descrição dos
tico de transtorno esquizofrênico, em que os familiares, poderia ter preenchido os critérios
traços de transtorno de personalidade esqui- de episódio de depressão maior, tendo como
zotípica e borderline poderiam ter uma signifi- fator precipitador a ocorrência do falecimento
cação pré-mórbida. Observa-se, porém, que os paterno, com repercussões importantes em
episódios depressivos não podem ser conside- suas relações sociais. Todavia, não houve um
rados curtos. Por outro lado, na história, pelo atendimento especializado, e, assim, as infor-
relato do paciente, parece ter havido períodos mações não são totalmente confiáveis para se
em que se apresentaram sintomas psicóticos, estabelecer um diagnóstico. Considerando que
sem alterações realmente importantes de hu- apresenta um transtorno de personalidade es-
mor. Ainda, pelos dados da testagem, logo quizotípica com traços de personalidade bor-
após a hospitalização, em que foram observa- derline, era muito possível a ocorrência de um
dos sintomas psicóticos, parece haver coinci- transtorno de humor concomitante, com a pro-
dência de ambos os quadros. Esses dados su- funda alteração que se verificou após a morte
gerem a presença de 297.70, transtorno esqui- súbita do pai.

PSICODIAGNÓSTICO – V 137
Apesar de seus antecedentes como pessoa social marcante e comprometimento de seu
de vida muito regrada e honesta, passou a en- papel como esposo e pai de família.
volver-se fanaticamente em atividades ritualís- Considerando-se alguns prováveis sintomas
ticas de religião afro-brasileira e, em razão de anteriores, mais os sintomas emergentes e a
sua subserviência absoluta a uma mãe-de-san- dificuldade de distinguir formas severas de
to, chegou a realizar um desfalque importante transtorno de personalidade esquizotípica de
na agência bancária em que era funcionário sinais prodrômicos de esquizofrenia, as hipó-
para pagamento de “trabalhos”, que visavam teses diagnósticas que podem ser atualmente
a livrá-lo de seus problemas depressivos e levantadas, com base no DSM-IV, são coloca-
prevenir a ocorrência de desgraças imaginá- das a seguir, embora só o acompanhamento
rias. Nessa época, não se pode descartar a do caso poderá permitir chegar a um diagnós-
hipótese da coexistência, no paciente, de as- tico mais seguro.
pectos delirantes e, provavelmente, de sin- Hipóteses diagnósticas
tomas alucinatórios (?). Ao ser descoberto o Eixo 1 – 297.70. Transtorno Esquizoafeti-
desfalque e instaurado processo administra- vo. Tipo depressivo. Em remissão.
tivo, o paciente apresentou outro episódio Eixo 2 – 301.22. Transtorno de Personali-
depressivo, sendo hospitalizado com sinto- dade Esquizotípica, com traços de
mas psicóticos. 301.83. Transtorno de Personali-
No momento, em fase de remissão do epi- dade Borderline e
sódio depressivo, está apresentando traços não 301.6. Transtorno de Personalida-
congruentes, como falta de modulação afeti- de Dependente
va nítida, alheamento, além da ocorrência, nos Eixo 3 – Nenhum
testes, de respostas isoladas compatíveis com Eixo 4 – Problema ocupacional (demissão
a presença de transtorno de pensamento, ob- do emprego), administrativo (pro-
servando-se, também, pobreza da fala e po- cesso) e financeiro
breza do conteúdo da linguagem, isolamento Eixo 5 – 40

138 JUREMA ALCIDES CUNHA


PARTE II
AVALIAÇÃO, MÉTODOS E TÉCNICAS
MÓDULO VI – Alguns Tipos Específicos de Avaliação

Avaliação inter e
transgeracional da família
Blanca Guevara Werlang
12
T odo psicólogo que é solicitado a intervir num
dado problema psicológico, seja este indi-
vidual ou seja familiar, deverá, em primeiro lu-
A família, então, se estrutura em um cer-
to período, através de intercâmbios e retro-
alimentações, regulados por meio de expe-
gar, situar o ponto do ciclo vital em que o soli- riências a respeito do que está e do que não
citante ou os solicitantes se encontram. Esse está permitido na relação, até converter-se
ciclo é constituído pelos momentos mais sig- numa unidade que se sustenta por regras que
nificativos da vida pessoal/familiar, onde exis- lhe são próprias.
tem zonas de estabilidade e/ou inestabilidade, Desta maneira, a organização da família
correspondentes a mudanças na organização está formada por uma rede de relações que é
pessoal/familiar, geradoras tanto de equilíbri- preexistente ao sujeito. O ser humano mantém
os como de desequilíbrios, momentâneos ou vinculação com seus semelhantes, para uma
duradouros, a que o sujeito/família tem de dar adequada satisfação de suas necessidades
resposta, de maneira a atingir uma nova orga- múltiplas e diferenciadas. Numa família, exis-
nização. tem relações conjugais, materno-filiais e rela-
Como o homem não é um ser isolado, ele ções fraternas, cada uma com uma significa-
não pode ser considerado fora de seu ambien- ção diferente para a satisfação das necessida-
te familiar. Cada indivíduo está em interação des do indivíduo, sendo as marcas decorren-
intensa com os outros membros da família. tes impressas na pessoa para toda a sua vida.
Portanto, os problemas individuais não têm Portanto, as famílias desenvolvem uma estru-
só um sentido, mas sim uma função no con- tura característica, um padrão bem definido e
texto mais amplo onde surgem. As famílias, repetitivo de papéis e regras, dentro dos quais
segundo Minuchin (1982), modelam e pro- os seus membros funcionam. Os valores e nor-
gramam o comportamento e o sentido de mas familiares são derivados das experiências
identidade de seus membros, sendo que tam- de crescimento dos pais, em suas famílias de ori-
bém estes e a família crescem juntos e se gem, dos derivativos internalizados dessas expe-
acomodam às mudanças da sociedade. Des- riências, da influência atual da sociedade na qual
ta maneira, a família é um sistema aberto, estão vivendo e de suas histórias desde que se
auto-regulado, com uma história comum, uniram para criar uma nova família.
que define no seu seio normas e padrões Segundo Bucher (1985), são as regras ou
transacionais próprios. normas estabelecidas pela família que nortea-

PSICODIAGNÓSTICO – V 141
rão a conduta de seus membros e irão variar Na família saudável há regras, padrões, que
de família para família, embora haja também servem de guia para o crescimento grupal e
regras similares para um grupo de famílias, individual. Essas famílias percorrem o ciclo vi-
condicionadas por classe social, nível cultural, tal, estando livres para mudar, adaptar-se e
etc. Os ritos são moldados pelas regras esta- crescer sem medo e apreensão. No entanto,
belecidas pela família. Os seus hábitos são ex- em famílias disfuncionais, as regras são usa-
teriorizados através de ritos e ancorados nas das para inibir a mudança e para manter o sta-
regras por ela definidas. Os ritos são produtos tus quo. O comportamento de um indivíduo,
da tradição, transmissíveis culturalmente e san- então, depende do comportamento dos outros,
cionados pelo consenso grupal, e exigem, como e, assim, os padrões de interação transcendem
condição básica, a crença em sua eficácia e a à qualidade dos membros individuais.
repetição constante. Assim, acrescenta a au- Do mesmo modo que a teoria psicanalítica
tora, “tanto os mitos quanto os ritos são a ex- considera que, na vida mental e no comporta-
pressão do aparelho psíquico da família e ex- mento humano, nada acontece por acaso, sen-
pressam sua dinâmica” (p.115), sendo que eles do os fenômenos entendidos através do con-
podem ser tanto altamente criadores quanto ceito de determinismo psíquico (restabelecer e
destruidores, caso se tornem rígidos. repetir situações infantis), a perspectiva inter-
A família é, por si só, uma entidade psíqui- geracional considera os problemas individuais
ca, afirma Vilhena (1988), e não apenas grupal como familiares – com sua raiz também em
ou social. Na família, os mecanismos de proje- fatos passados, constituindo a história natural
ção são constantes e maciços, sendo as proje- da família —, transmitidos de geração em ge-
ções múltiplas próprias do sistema, do grupo ração, por meio de condutas repetitivas.
familiar. Deste modo, a família elabora uma A análise da transmissão dessa cultura fa-
imagem interiorizada, comum ao grupo, unin- miliar, de uma geração para outra e entre os
do seus membros em um projeto comum. Con- membros da mesma geração, identificando
seqüentemente, fala-se em mito familiar, não padrões, costumes, segredos, mitos e proble-
havendo uma organização familiar sem um mas que determinam o funcionamento pessoal/
mito que lhe inscreva em uma ordem de valo- familiar, é a proposta dessa abordagem inter-
res mais gerais, que lhe legitime e lhe dê sua geracional. Assim, o psicólogo trabalha, segun-
lei de composição interna. do Sampaio e Gameiro (1985), em dois eixos:
Segredos e mitos podem ser começados por o eixo vertical, ou transgeracional, onde são
um membro da família (ou um agregado), con- identificados papéis e funções característicos
forme Pincus e Dare (1981), mas eles não per- da família, bem como o nível de autonomia e
manecem como propriedades do indivíduo, já diferenciação de cada elemento face à sua fa-
que os outros membros da família iniciam, mília de origem; e o eixo horizontal, ou eixo
como resposta, um processo de influência mú- do aqui e agora, que inclui o estudo dos pa-
tua, fortalecendo ou enfraquecendo os efeitos drões da interação pessoal e familiar, bem como
dos mesmos. Eles se baseiam sempre no po- o modo como o indivíduo e/ou o grupo fami-
der e na dependência, no desejo de ferir, no liar lida com as dificuldades da sua vida.
amor e no ódio, sentimentos que estão liga- Dentro das perspectivas intergeracionais,
dos ao sexo, nascimento e morte. Dessa ma- destaca-se a posição pioneira de Murray Bo-
neira, nas palavras dos autores, “quando sur- wen, citado por Andolfi e Angelo (1988), Car-
ge na criança a primeira consciência de ter de neiro (1983) e Foley (1990), entre outros, que,
competir com esta mistura de sentimentos, nos anos 50, iniciou um trabalho clínico, em
contraditórios e poderosos, desejos e anseios associação com outros técnicos em saúde men-
secretos, começam a dominar seu mundo in- tal, com famílias de doentes mentais interna-
terno” (p.16). Esse mundo permanece, através dos com o diagnóstico de esquizofrenia, em
de suas vidas, como fonte de dor e conflito, as- instituições psiquiátricas. Mais especificamen-
sim como fonte de imaginação e criatividade. te no ano de 1954, Bowen trabalhou na cida-

142 JUREMA ALCIDES CUNHA


de de Washington, num projeto de investiga- do foi organizado finalmente por um comitê,
ção, onde os pacientes eram internados em integrado principalmente por profissionais vin-
conjunto com sua família, pelo período de seis culados à terapia familiar e à medicina da fa-
meses a dois anos, numa área do hospital re- mília. A representação padronizada desses sím-
servada para esse propósito. A equipe de Bo- bolos e dos procedimentos para o traçado foi
wen identificou aos poucos que muitos dos divulgada por Monica McGoldrick e Randy Ger-
efeitos benéficos do tratamento ao paciente son, pela primeira vez, no ano de 1985.
eram prejudicados pela constante interferên- Tal formato padronizado registra informa-
cia dos elementos da família. Dessa maneira, ções a respeito dos membros da família e de
inicialmente, conceitualizou a esquizofrenia seu relacionamento ao longo de três gerações,
como sendo uma entidade psicopatológica in- mostrando graficamente informações, que for-
fluenciada pela mãe, porque um apego não necem uma “rápida gestalt dos complexos pa-
resolvido e simbiótico à mãe constituía o pro- drões familiares, sendo uma rica fonte de hi-
blema básico do paciente. Após, passou a con- póteses a respeito de como um problema clí-
siderar o papel do pai, dos avós, ampliando a nico pode ter se originado e evoluído no con-
hipótese para toda a família, passando da com- texto familiar, ao longo do tempo” (McGoldri-
preensão intrapsíquica tradicional para uma ck & Gerson, 1987, p.17). Desta forma, o ge-
análise de sistemas (Foley, 1990; Sampaio & netograma ajuda tanto o clínico como a pró-
Gameiro, 1985). pria família a ver os problemas no seu contex-
A conclusão de Bowen, então, é de que a to atual e histórico, em que o paciente identi-
patologia do paciente identificado só pode ser ficado, como identidade isolada portadora de
compreendida em relação ao sistema emocio- sintomatologia, deixa de ser o foco principal,
nal do qual faz parte, afirmando que os pa- passando apenas a ser um dos elos de um sis-
drões vinculares em determinada geração pro- tema disfuncional, que é gerador de sofrimen-
porcionam modelos implícitos para o funcio- to e doença.
namento pessoal e familiar nas gerações se- O pilar de sustentação de um genetograma
guintes. Bowen, recorda Miermont (1994), é o retrato gráfico de como os diferentes mem-
denominou isso de transmissão multigeracio- bros de uma família estão biologicamente e
nal ou intergeracional, propondo uma entre- legalmente relacionados uns com os outros, de
vista de avaliação, durante a qual tenta preci- uma geração para a outra. Este mapa, ou re-
sar nomes, idades e atividades de todos os trato, é uma construção de figuras/símbolos
membros da família durante três gerações, as- (quadrados e círculos), que representam as
sim como os principais acontecimentos: data pessoas, e de linhas (cheias ou pontilhadas),
de nascimento, casamentos, separações, mor- que descrevem os seus relacionamentos.
tes, etc., organizando um mapa que oferece Os principais símbolos para descrever a es-
uma imagem gráfica da estrutura familiar ao trutura e os membros da família básica podem
longo de várias gerações, denominado gene- ser observados nos casos de Maria e de André
tograma. e nas Figuras 12.1 e 12.2, respectivamente.
O genetograma é um instrumento clínico Maria, 48 anos (paciente identificado), é
de investigação inter e transgeracional da fa- professora e está casada em segundas núpcias
mília, baseado na teoria sistêmica familiar de com Carlos, 52 anos, engenheiro. No momen-
Murray Bowen, que, até os anos 80, não apre- to do casamento, Maria era viúva, e Carlos,
sentava um formato aceito por todos os pro- divorciado. Moram com o casal Roberto, de 23
fissionais, existindo várias formas diferentes de anos, Sérgio, de 21 anos (filhos do primeiro
construí-lo, de modo que cada especialista ti- casamento de Maria), Bernardo, de 16 anos,
nha seus próprios símbolos e maneiras de tra- Júlia, de 13 anos (filhos do casal), e Irma, com
çar as constelações familiares, provocando con- 70 anos, enfermeira aposentada, mãe de Car-
fusões e impossibilitando a sua leitura por parte los. Maria é a filha caçula de uma prole de três
de outros profissionais. O formato padroniza- filhas mulheres, e seus pais já são falecidos.

PSICODIAGNÓSTICO – V 143
Figura 12.1 Genetograma do caso Maria

Carlos é filho único, sendo que seu pai faleceu devem ser colocados embaixo do símbolo, sua
quando ele tinha apenas um ano de idade. idade cronológica no centro, e a profissão ao
André, 10 anos de idade, é o primogênito lado do mesmo. Para uma pessoa falecida, co-
de uma prole de três. Suas duas irmãs de seis loca-se um X dentro da figura, com a data de
anos são gêmeas idênticas. Seus pais (38 e 35 nascimento (à esquerda) e de falecimento (à
anos) constituíram família há 12 anos, mas não direita) em cima da mesma.
casaram* e estão aguardando a chegada de As pessoas casadas legalmente estão conec-
mais um filho (gravidez de seis meses). O pai tadas por linhas horizontais e verticais cheias,
de André é filho adotivo, e a mãe é a única e os que moram juntos (concubinatos) por li-
filha mulher de uma prole de quatro, sendo nhas pontilhadas, com o marido situado à es-
por sua vez gêmea fraterna com um de seus querda e a esposa à direita. As letras “c.”, “s.”
irmãos. Os avós paternos de André estão divor- e “d.” seguidas de uma data indicam o ano do
ciados há alguns anos, tendo hoje novos cônju- casamento, separação e divórcio, respectiva-
ges, e os maternos se encontram separados. mente. As barras inclinadas sobre a linha do
Como pode se observar nos casos de Maria casamento significam interrupção do mesmo:
e de André, cada membro da família está re- uma barra, para separação, e duas, para o di-
presentado por um quadrado ou um círculo, vórcio. Quando os cônjugues representados já
de acordo com o seu sexo. Para a pessoa que tiveram outros casamentos ou relacionamen-
centraliza ou gera a construção do genetogra- tos, deve-se dispor os mesmos em ordem, da
ma (paciente identificado), as linhas do sím- esquerda para a direita, colocando o casamento
bolo se duplicam. Os nomes de cada membro mais recente em último lugar ou em lugar que,
com ajuda das datas registradas, permita uma
clara visualização e compreensão da situação.
*Situação identificada no genetrograma com as letras Se o casal tem filhos, o símbolo de cada um
“m.j.” (moram juntos). deles deve ser representado e unido, por uma

144 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 12.2 Genetograma do caso André.

linha, à linha horizontal que conecta este ca- As informações podem ser obtidas entre-
sal. Os filhos devem ser situados, da esquerda vistando um único membro da família ou vá-
para direita, em ordem cronológica do nasci- rios integrantes. Certamente, colher informa-
mento. Utiliza-se uma linha cheia para os fi- ções de diferentes membros da família aumen-
lhos biológicos e uma linha pontilhada para os ta a fidedignidade dos dados, e, quando reu-
filhos adotivos. Linhas convergentes em rela- nidos em entrevista familiar, esta possibilita,
ção à linha dos pais representam gêmeos. Se de forma direta, a observação das interações.
são gêmeos idênticos, graficamente a relação Na entrevista familiar, é aconselhável a atu-
é representada por uma linha, que os une. ação de um coordenador e um observador. O
A linha que é utilizada para cercar os mem- coordenador registrará, com eventual colabo-
bros da família diferencia aqueles integrantes ração de membros da família, o mapa familiar,
que compartilham o mesmo lar. conduzindo as perguntas e coordenando a ati-
Cabe mencionar, ainda, outros símbolos vidade para garantir a participação de todos
bastante comuns nas constelações familiares os integrantes da família. O observador anota-
(vide Figura 12.3). rá as comunicações não-verbais e outros deta-
A construção do genetograma é realizada lhes que pareçam significativos. Nesse tipo de
através de uma entrevista de avaliação clínica. entrevista, o volume de informações é muito
Pode ser realizada no primeiro contato, depois grande e variado, sendo fundamental que nada
de o clínico ouvir o motivo da procura do aten- se perca do expressado, tanto individual como
dimento. Mas, na maioria das vezes, dentro do coletivamente. Para tanto, é recomendável o
processo psicodiagnóstico, é administrada de- uso de gravador, com prévia concordância dos
pois da primeira ou segunda sessão. participantes. O tempo de duração da entre-

PSICODIAGNÓSTICO – V 145
Fontes: McGoldrick & Gerson, 1987; McGoldrick & Gerson, 1995; McGoldrick, Gerson & Schellenberger, 1999; Marlin, 1989.

Figura 12.3 Exemplos de símbolos comuns em constelações familiares (adaptados).

vista varia de caso a caso, mas, em geral, para De maneira geral, as pessoas trazem para
este tipo de atividade, a média de tempo é de avaliação problemas específicos, que se cons-
90 minutos. tituem no ponto de partida da investigação.
Para a montagem do genetograma, o en- Assim, faz sentido começar tomando como
trevistador necessitará colher dados, como se referência o paciente identificado, explorando
estivesse desenrolando uma rede de informa- e registrando informações de todos os mem-
ções em círculos cada vez maiores para captar bros da família imediata (que compartilham a
informações relevantes a respeito da família e mesma casa) e do contexto atual, onde ocorre
de seu contexto mais amplo. Essa rede se es- o problema.
tende em diferentes direções, sendo aconse- Após, torna-se importante orientar as per-
lhável orientar as perguntas: “a) do problema guntas no sentido de explorar o contexto fa-
atual até o contexto maior do problema; b) da miliar mais amplo, identificando dados signifi-
família imediata até a família mais extensa e cativos sobre a família de origem, tanto ma-
os sistemas sociais mais amplos; c) da situa- terna quanto paterna (pelo menos em três ge-
ção atual da família até uma cronologia his- rações), incluindo pais, avós, tios, irmãos, pri-
tórica de eventos familiares; d) de indaga- mos, cônjuges, filhos, investigando também os
ções fáceis e não ameaçadoras até questões agregados e apoios externos (babás, empre-
difíceis que provoquem ansiedade; e) de fa- gadas, vizinhos, médicos, professores, etc.) da
tos óbvios ao julgamento do funcionamento família, que tenham desempenhado um papel
e relacionamentos até hipóteses sobre pa- importante para o funcionamento desta.
drões familiares” (McGoldrick & Gerson, Uma vez identificada a estrutura familiar
1987, p.46; McGoldrick, Gerson & Shellem- nuclear e a ampla, a preocupação deve se cen-
berger, 1999, p.53). tralizar na obtenção de informações objetivas

146 JUREMA ALCIDES CUNHA


sobre os dados mais importantes de cada um cuperação do uso de cocaína, e o pai é depen-
dos membros da família, tanto sob o ponto de dente de álcool, em co-morbidade com um
vista demográfico como socioculturais, médi- transtorno bipolar.
co-psicológicos e profissionais ou legais. A respeito dos avós, observa-se que, na li-
No caso da presença de problemas e/ou nha paterna, o avô faleceu no ano de 1986,
doenças, deve-se investigar e incluir no mapa em função de um acidente vascular cerebral, e
gráfico os mais significativos ou crônicos, usan- a avó encontra-se institucionalizada num lar
do as categorias do DSM-IV (APA, 1995), da para idosos. Na linha materna, o avô também
CID-10 (OMS, 1993) ou abreviações reconhe- já é falecido, a avó é uma senhora de 67 anos,
cíveis. Para algumas situações, existem símbo- que está com câncer de fígado. Por parte de
los específicos, como pode ser observado no pai, Ricardo tem uma tia (48 anos) que é freira
caso representado na Figura 12.4. e que mora, desde sua adolescência, num con-
Nesta família, o paciente identificado é um vento, e um tio (41 anos) dependente de co-
garoto (Ricardo) de 16 anos, que foi trazido caína. Por parte de mãe, tem um tio (39 anos)
pela sua mãe (42 anos) para avaliação psicoló- alcoolista que, no momento, participa do pro-
gica, por suspeita do uso de maconha. A irmã grama de AAA (Associação de Alcoólicos Anô-
de Ricardo encontra-se, no momento, em re- nimos).

*Categorias nosológicas segundo o DSM-IV (1995).

Figura 12.4 Genetograma do caso Ricardo.

PSICODIAGNÓSTICO – V 147
Como pode-se observar, as pessoas que transições, fornecem, então, pistas sobre re-
apresentam transtorno mental ou doença físi- gras familiares, padrões de organização e fon-
ca grave foram representadas preenchendo (em tes de recursos ou de resistência da família.
tonalidade escura) a metade esquerda do sím- O funcionamento dos membros da família
bolo. No caso dos que são dependentes de ál- pode se repetir ao longo de várias gerações.
cool e/ou de drogas, o preenchimento é na Assim, freqüentemente, o problema atual da
metade inferior, e os que apresentam co-mor- família ocorreu em gerações anteriores. Por
bidade de doença mental ou física com depen- exemplo, McGoldrick e colegas (1999), anali-
dência de álcool ou drogas são representados sando o genetograma da família Fonda, ob-
com a metade esquerda e a metade inferior servam a repetição de uma conduta suicida,
também preenchidos com cor escura*. assim como hospitalizações psiquiátricas e fa-
Os integrantes de que se suspeita que fa- tos traumáticos, revelando ainda detalhes,
çam uso ou abuso de álcool e/ou de drogas como: a) casamentos múltiplos são comuns
foram representados preenchendo a metade nessa família: Henry Fonda (pai de Jane) casou
inferior do símbolo com uma cor mais clara, e cinco vezes, sua primeira esposa, Margaret,
aqueles que estão em recuperação da adicção, casou quatro vezes, sendo Henry seu segundo
com um quarto inferior do símbolo preenchi- esposo; b) Margaret suicidou-se, e sua filha
do em tonalidade escura e o outro quarto in- Brigit também; c) a mãe de Jane Fonda, segun-
ferior em tonalidade clara. Por último, aqueles da esposa de Henry, também cometeu suicí-
familiares de Ricardo que se encontram insti- dio, num hospital para enfermos mentais; d)
tucionalizados ou fazem tratamento psicote- Henry Fonda manteve, por certo tempo, segre-
rápico, médico e/ou participam de outros pro- do sobre a morte de sua segunda esposa, rea-
gramas institucionais foram representados com lizando, junto com sua sogra, um funeral pri-
uma linha para fora da figura em direção a um vado, nunca discutindo o fato com Jane e com
triângulo pequeno. Peter, seu outro filho; e) durante a terceira lua-
O próximo nível de dados a serem coleta- de-mel de Henry Fonda, seu filho Peter deu um
dos na entrevista envolve o delineamento dos tiro no estômago, oito meses após o suicídio
relacionamentos entre os membros da família de sua mãe; f) durante a quarta lua-de-mel de
e os papéis de cada um deles. Para isso tam- Henry Fonda, Peter adoeceu por consumo de
bém existem alguns símbolos (vide Figura 12.5). drogas, devendo Henry retornar de sua viagem,
A identificação dos diferentes padrões de para hospitalizá-lo numa unidade psiquiátrica;
interação entre os membros da família (ínti- g) Henry Fonda tinha dois amigos íntimos que
mo, distante, conflitivo, dependente, etc.), as- se suicidaram; h) Peter Fonda apaixonou-se por
sim como os papéis de cada um deles (submis- Brigit Hayward, no ano em que esta se suici-
so, fracassado, dominador, problemático, etc.) dou, sendo que também seu melhor amigo se
e o traçado das mudanças que ocorreram ao suicidou.
redor dos diversos eventos e transições (nasci- Desta maneira, para essas autoras, certas
mentos, morte, separações, fracassos, etc.) regras são transmitidas de geração em gera-
proporcionam ao clínico indícios para a formu- ção, sendo vários os padrões sintomáticos que
lação de hipóteses a respeito do estilo adapta- tendem a se repetir, tais como alcoolismo, in-
tivo ou não da família. A avaliação dos padrões cesto, violência, sintomas físicos e suicídio.
de funcionamento e relacionamentos, princi- Perceber essa repetição possibilitará ajudar a
palmente após determinados eventos e/ou pessoa e sua família a evitar novas repetições,
frustrando esse processo disfuncional.
Durante o processo de traçado do geneto-
grama e da coleta de informação na entrevis-
N. da A. *Provavelmente, devido à importância que tem ta, o aspecto mais difícil, certamente, é o de
a dependência de substâncias na história familiar, os
autores deram tal destaque a esses transtornos men-
estabelecer prioridades para a investigação e
tais. inclusão dos dados da família. O clínico deve

148 JUREMA ALCIDES CUNHA


Fontes: McGoldrick & Gerson, 1987; McGoldrick & Gerson, 1995; McGoldrick, Gerson & Schellenberger, 1999; Marlin, 1989;
Minuchin, 1982.

Figura 12.5 Representação pictórica de padrões de interação (adaptados).

estar atento às conexões que os familiares fa- impacto das mudanças ou transições inopor-
zem ou deixam de fazer em relação a certos tunas no ciclo vital, como nascimentos, ca-
fatos e/ou eventos, mas não pode seguir to- samentos, mortes que se dão fora do espe-
dos os indícios que a entrevista possa sugerir, rado e planejado.
devendo-se estabelecer prioridades. Assim, a Os princípios interpretativos do genetogra-
literatura especializada sugere, como regra ma têm como base a teoria geral dos sistemas
prática, rastear: a) sintomas repetitivos, ou seja, e, nessa, a perspectiva que considera as rela-
padrões de relação e/ou conflitos que se re- ções familiares como determinantes da saúde
petem na família imediata e através das ge- emocional de seus membros. McGoldrick e
rações; b) coincidência de datas, por exem- Gerson (1987) e McGoldrick, Gerson e Shellen-
plo, a morte de um familiar ocorrendo ao berger (1999) propõem a interpretação de seis
mesmo tempo em que inicia o sintoma; c) categorias que sugerem um conjunto geral de

PSICODIAGNÓSTICO – V 149
suposições, a partir do qual se geram hipóte- Sem dúvida, o genetograma é uma ferramen-
ses relevantes do ponto de vista clínico sobre ta clínica muito útil na compreensão do ciclo vi-
os padrões familiares. Essas categorias são: es- tal familiar, possibilitando relacionar os eventos
trutura familiar, adaptação ao ciclo vital, su- atuais com os do passado, os pessoais com os
cessos da vida e funcionamento familiar, pa- grupais, com o objetivo de clarear o funciona-
drões vinculares e triângulos, equilíbrio e de- mento do sistema e permitir um movimento mais
sequilíbrio. saudável do mesmo e dos seus integrantes.

150 JUREMA ALCIDES CUNHA


Avaliação prospectiva:
o exame precoce da criança
Aidyl L.M. de Queiroz Pérez-Ramos
13
É necessário esclarecer, de início, que a ava-
liação prospectiva, quando se trata de
contexto psicológico, e inclusive realizada o mais
gros alcançados nos estudos sobre “resiliên-
cia”, entendida como resistência do próprio
desenvolvimento em defesa daqueles elemen-
precocemente possível, é concebida sempre em tos perturbadores (Coie, Watt, West et alii,
termos probabilísticos. O prognóstico esperado 1993; Lösel, 1994, Pistori & Crovara, 1994) e
depende não somente da natureza do quadro facilitadora, por outro lado, da influência dos
clínico, de sua severidade e complicações, mas efeitos positivos dos fatores de proteção. Nes-
também de uma série de fatores incidentes, se- se contexto de interações dos fatores de risco,
jam individuais, sejam ambientais, que surgem e de proteção e de “resiliência”, é possível de-
vão se acumulando ao longo da infância e pros- tectar aqueles comportamentos que consti-
seguem em outras fases da vida do ser humano. tuem “sinais de alerta”, ou mesmo indicado-
Há necessidade, em muitos casos, de reali- res, prenúncios de futuros quadros clínicos e
zar avaliação o mais cedo possível, acompa- até do desenvolvimento de altas habilidades.
nhada da oportuna intervenção, dando pros- Essas idéias introdutórias permitem justifi-
seguimento à atenção psicológica a esses pri- car o emprego do modelo avaliação-interven-
meiros anos, que são formadores da persona- ção no estudo de caso de crianças pequenas,
lidade e ainda mais vulneráveis às mais diver- elaborado pela autora e amplamente utilizado
sas alterações. Prevê-se, portanto, que quanto em diversos tipos de quadros clínicos (Carpen-
melhor atendida for a criança, nos seus primei- tieri, 1994; Pérez-Ramos, A., 1990; Pérez-Ra-
ros tempos, maior é a probabilidade de, futu- mos, A., 1992; Pérez-Ramos, A., & Pera, 1995).
ramente, desenvolver-se de modo equilibrado. Para complementar essas considerações, serão
Como promissora perspectiva da avaliação apresentados significativos “sinais de alerta”
efetuada nesses primeiros anos de vida e suas ou possíveis indicadores presentes em deter-
projeções futuras, destacam-se os progressos minados bebês, que podem constituir inclusi-
alcançados atualmente no âmbito da preven- ve indícios de superdotação.
ção, referidos aos fatores de proteção, carac-
terizados como variáveis que promovem o de-
MODELO DE AVALIAÇÃO-INTERVENÇÃO
senvolvimento da criança, contrapondo-se aos
efeitos negativos dos de risco, bloqueadores Este apresenta características que o diferenci-
do processo evolutivo, como também aos lo- am claramente do modelo tradicional, no qual

PSICODIAGNÓSTICO – V 151
a avaliação precede à intervenção. Como assi- das intimamente por ações recíprocas, podendo
nalam A. Pérez-Ramos e J. Pérez-Ramos (1996), ser concebidas por uma perspectiva integradora
“as ações de intervenção subseqüentes ao diag- de três etapas sucessivas na sua evolução. O grá-
nóstico nem sempre chegam a ser oportunas e, fico apresentado a seguir, que as define, permite
inclusive, facilitam o aumento da vulnerabilida- esclarecer tal inter-relação (Figura 13.1).
de, presente nas crianças, e, o que é pior, a in- A primeira etapa compreende a identifica-
tensificação dos distúrbios já existentes, devido ção daqueles aspectos que chamam mais a
à demora na realização da intervenção” (p. 91). atenção no desenvolvimento da criança, segun-
O modelo baseia-se em uma perspectiva de do observação direta do mesmo e dos dados
articulação cruzada dos procedimentos de ava- fornecidos pelos seus familiares. A família, e
liação com os de intervenção. À medida que é inclusive a criança, quando possível, são moti-
possível constatar os resultados da avaliação, vadas a participar do processo, na qualidade
vão sendo formuladas e aplicadas as estraté- de facilitadora a primeira, e auto-estimulado-
gias de intervenção decorrentes, e seus resulta- ra, a segunda. Nessa primeira etapa, tem-se a
dos, por sua vez, conseqüentemente avaliados, possibilidade de detecção de possíveis fatores de
configurando-se, desse modo, a continuidade de risco e de proteção, como também dos sinais que
cruzamentos recíprocos nas sucessivas fases em possam identificar as condições específicas de
que esses processos (avaliação e intervenção) se “resiliência”. A partir dessas informações, deri-
desenvolvem, até a conclusão do estudo. vam-se as primeiras hipóteses, e dessas, as perti-
Nesse contexto, entende-se por avaliação a nentes estratégias de intervenção. Note-se que,
compreensão do momento evolutivo da crian- em determinados casos, tais dados avaliativos e
ça nas suas diferentes áreas do seu desenvolvi- estratégias são conclusivos e suficientes.
mento, especificando aqueles aspectos signifi- A segunda etapa caracteriza-se pela explo-
cativos e suas inter-relações com o ambiente ração mais abrangente e organizada de dados
sociofamiliar em que ela vive. Compreende as avaliativos, concretizando-se por ações mais
ações de compilar, analisar, interpretar e inte- sistematizadas de intervenção. Estabelece-se
grar dados que possam conduzir ao efetivo um maior envolvimento da criança e da famí-
conhecimento das condições em que se apre- lia no processo, acompanhado de atitudes ini-
senta o desenvolvimento da criança, inclusive ciais de auto-iniciativa desta última. Começam
seus progressos e limitações. Nessa atividade o reexame e o aperfeiçoamento das hipóteses
investigativa, elaboram-se concomitantemen- iniciais com as novas informações, bem como
te hipóteses que serão aceitas ou rejeitadas ao da avaliação das primeiras intervenções.
longo do seu processo. Identificam-se fatores de A terceira etapa, a conclusiva, é onde se
risco e de proteção, possíveis manifestações de integram os dados coletados e interpretados e
“resiliência” e, inclusive, os “sinais de alerta“ ou de onde derivam as ações terminais da inter-
indicadores de probabilidade prospectiva. venção e o desenvolvimento de estratégias
Quanto ao processo de intervenção, o mes- mais efetivas de autogestão dos familiares e
mo tem por finalidade proporcionar à criança de auto-estimulação por parte da criança. Tam-
condições apropriadas destinadas a promover bém são estabelecidos os passos de seguimen-
seu adequado desenvolvimento, modificando to e de re-avaliação, se forem necessários (Pé-
ou eliminando aquelas variáveis negativas in- rez-Ramos, A., 1990; Pérez-Ramos, A. 1992).
cidentes e proporcionando outras que possam
influir, de maneira positiva, nesse processo evo-
lutivo. Incluem-se, no processo de intervenção, PROCEDIMENTOS DE AVALIAÇÃO E DE
desde pequenas mudanças no ambiente até a INTERVENÇÃO
implementação de programas completos des-
sa natureza. Configurado o modelo em referência, são apre-
Neste modelo, como se pode inferir, a avalia- sentados, sucintamente, os procedimentos de
ção e intervenção passam a ser inter-relaciona- aplicação mais gerais, sem considerar a espe-

152 JUREMA ALCIDES CUNHA


Fonte: Pérez-Ramos, A., 1990, p.71.

Figura 13.1 Etapas de integração ao processo de avaliação-intervenção.

cificidade requerida no estudo de caso, tanto to de estudo, incluindo não somente os aspec-
no que se refere ao processo de avaliação quan- tos comumente empregados (antecedentes,
to ao de intervenção, aplicáveis aos três pri- distúrbios de comportamento, etc.), mas tam-
meiros anos de vida. Alguns desses procedi- bém os fatores de risco e os de proteção, as
mentos são mais explicitados devido ao seu li- manifestações de “resiliência”, os “sinais de
mitado conhecimento e uso em nosso meio, alerta” e os indicadores com possível qualida-
mas com a comprovada experiência clínica da de preditiva.
autora desta contribuição e seus colaboradores. • Observação participante, também denomi-
Em relação ao processo de avaliação, apre- nada “Hora do Jogo”, destinada ao rapport, com
sentam-se os seguintes: a criança e a mãe, e também para obter uma
• Entrevistas de anamnese e de seguimen- primeira impressão do desenvolvimento daque-
to, com roteiros especificativos dos itens obje- la e da atitude desta última frente ao filho.

PSICODIAGNÓSTICO – V 153
• Escalas de desenvolvimento. Sobre esse ções. No que diz respeito ao ambiente do lar,
tipo de instrumento, inclui-se, nesta edição, podem ser apreciados o clima familiar reinan-
a referente aos Passos Básicos do Desenvol- te e os espaços físicos disponíveis para a crian-
vimento da Criança (PBDC), apresentada no ça e para os membros da família, entre outros
Anexo B. elementos importantes. Nesse roteiro, prevê-
• Baby Tests. Apesar das dúvidas quanto a em-se também as normas éticas específicas que
seu valor preditivo, os mesmos são utilizados devem ser seguidas, já que uma visita domici-
em nosso meio sem a devida adaptação. Um liar supõe certa ingerência na vida do lar.
desses testes mais atrativos para a criança, na • O ICEA constitui uma escala de observa-
sua primeira infância, e que possibilita uma ção sistematizada, destinada a avaliar o am-
variedade de observações sobre seu compor- biente físico e social das creches, no sentido
tamento, além de outras qualidades, é a Esca- de verificar suas condições estimuladoras para
la Merrill-Palmer de Testes Mentais, contando as crianças, desde seus primeiros meses de vida
esta com um protocolo especificativo, elabo- até os 6 anos de idade. Esse instrumento per-
rado para o nosso meio (Pérez-Ramos, A., & mite analisar a natureza e as características dos
Pérez-Ramos, J., 1996). estímulos ambientais (pessoas, objetos, ani-
• Técnicas projetivas, aplicáveis à primeira mais, espaços físicos, mobiliário, entre outros),
infância e à idade pré-escolar, a partir de dois especialmente aqueles empregados na rotina
anos de idade. Destacam-se entre essas técni- diária da criança (alimentação, banho, ato de
cas os Jogos Estruturados, de Lynn (1980). Tra- dormir, etc.), cujos efeitos vão se acumulando
ta-se de um instrumento atrativo para essas ao longo da permanência da mesma na insti-
idades, constituído de dramatizações em ce- tuição. São também analisados, com esse ins-
nas montadas com bonecos e outros brinque- trumento, as áreas do desenvolvimento infan-
dos, que permitem à criança representar o quo- til nas quais os estímulos referidos mais inci-
tidiano. As cenas são apresentadas mediante dem. Essa escala consta de parâmetros norma-
a modalidade de histórias incompletas, para tivos para facilitar a avaliação que for realiza-
serem completadas pela criança em forma dra- da em uma determinada creche. Os mesmos
matizada. Tais atividades lúdicas de “faz-de- são resultantes de pesquisa de normatização
conta” estimulam o seu expressivo envolvimen- do instrumento, aplicado em amostras repre-
to nas mesmas, facilitando assim a expressão sentativas de diferentes creches na cidade de
de seus desejos e ansiedades em função do São Paulo (Pérez-Ramos, A., & Pérez-Ramos, J.,
quotidiano (Carpentieri, 1994). 1996). Além disso, outras pesquisas, com se-
• Avaliação do ambiente de convivência da guimento de casos clínicos, mostraram sua
criança. Desse grupo de procedimentos, des- utilidade e adaptação a outros ambientes,
tacam-se aqueles de avaliação do contexto fa- como em lares e em hospitais (Silva, 1997).
miliar, mediante Visita Domiciliar, e o referido Quanto ao processo de intervenção, existe
às creches, o Inventário Cumulativo sobre Esti- uma gama variada de estratégias e programas
mulação Ambiental (ICEA). dessa natureza para proporcionar benefícios ao
• A Visita Domiciliar, previamente organi- desenvolvimento da criança e a partir deles se-
zada, mediante roteiro próprio (Carpentieri, rem elaborados planos individuais de ação.
1994), constitui um efetivo recurso para o psi- Desses recursos, citam-se alguns de compro-
cólogo constatar, in loco, as condições da crian- vada utilidade, a seguir:
ça no seio de seu lar e as características socio- • Guia Curricular para Estimulação Precoce
afetivas e físicas desse ambiente. Quanto ao (GCEP) (Pérez-Ramos, A. & Pérez-Ramos, J.,
primeiro aspecto, podem ser apreciadas a po- 1996). Tem por finalidade proporcionar condi-
sição que a criança ocupa nesse contexto e a ções estimuladoras que facilitam à criança al-
atenção de que é objeto por parte de seus fa- cançar um efetivo progresso em seu processo
miliares, particularmente no que se refere à sua evolutivo, sempre em consonância com suas
rotina, bem como suas reações nessas situa- características individuais e com seu ambien-

154 JUREMA ALCIDES CUNHA


te. A estruturação desse instrumento baseia- Tratando-se de um instrumento ainda em
se em componentes curriculares centralizados fase de experimentação, o mesmo tem sido
no desenvolvimento da primeira infância. São objeto de pesquisas com crianças hospitaliza-
eles: objetivos gerais, objetivos específicos de- das, nos seus dois primeiros anos. Os resulta-
rivados das áreas do desenvolvimento nessas dos têm sido promissores, no sentido de que
idades, conteúdo de atividades, experiências essas crianças, embora doentes, foram signifi-
significativas e avaliação de todos componen- cativamente mais produtivas no seu desempe-
tes da guia. São previstos, através desses ele- nho lúdico quando comparadas com as do gru-
mentos, recursos de seguimento promocional po de controle (Fonseca, 1999).
da criança ao longo dos seus três primeiros
anos de vida.
A referida guia tem sido utilizada para ela- “SINAIS DE ALERTA” E INDICADORES COM
borar programas individuais de estimulação PROBABILIDADES PROSPECTIVAS
precoce em unidades de atendimento a crian-
ças com necessidades especiais, e sua aplica- Tais comportamentos, como já referidos, cons-
ção tem sido satisfatória. Ademais, constituiu tituem possíveis indícios da evolução de qua-
um documento básico na elaboração de dire- dros clínicos, cuja detecção, especialmente em
trizes sobre a matéria, recomendada para pro- crianças pequenas, vem determinar ações de
mover e redimensionar programas de interven- prosseguimento, tendo em vista alcançar um
ção precoce existentes no território nacional pleno processo evolutivo na infância e em ou-
(MEC, 1995a). tras etapas evolutivas.
• Brinquedos e Brincadeiras. Kit para a crian- Destaque-se que os “sinais de alerta” e os
ça, do nascimento aos dois anos de vida. (Pé- indicadores não têm valor diagnóstico; são
rez-Ramos, A., & Pera, 1995). Consta esse kit “avisos” para seguir observando e estimulan-
de um conjunto sistematizado de atividades, do convenientemente o comportamento da
estratégias e recursos lúdicos destinados a oti- criança. A tendência é a de diferenciá-los (“si-
mizar o processo evolutivo da criança nos seus nais de alerta” e indicadores) quanto à sua
primeiros dois anos de vida, facilitando assim qualidade preditiva; os primeiros são ainda de
a construção das bases de seu futuro desen- menor valor probabilístico. Portanto, é comum
volvimento. O kit consta de um Manual de considerar como “sinais de alerta” certos com-
Orientação, de um jogo de materiais lúdicos e portamentos supostamente preditivos, já no
de uma série de fichas, especialmente organi- primeiro ano de vida, e os indicadores, quan-
zadas, para uso por parte dos pais como “me- do o comportamento da criança já está mais
diadores”, sempre que treinados e supervisio- estabilizado; isto é, quando tiver uma idade
nados por psicólogo ou pedagogo. O manual maior. Vale considerar também que a presen-
referido é estruturado em unidades especifica- ça de vários “sinais de alerta” ou de indicado-
tivas do desenvolvimento nesses dois primei- res de um determinado quadro clínico ou, até,
ros anos de vida, contendo cada uma delas in- de comportamentos de altas habilidades au-
dicação dos progressos que a criança pode al- menta as probabilidades de previsão, mas sem
cançar em um determinado período evolutivo, dispensar o necessário seguimento e a inter-
seguido de sugestões de atividades a serem venção oportunos no processo evolutivo infan-
realizadas junto à criança, com o uso de brin- til. Há necessidade, ainda, de considerar que
quedos específicos. Uma escala de avaliação esses preditores podem ser prenúncios de vá-
das realizações efetuadas pela criança comple- rios quadros clínicos aparentemente semelhan-
menta cada unidade. O jogo de materiais lúdi- tes, mostrando também, com isso, a comple-
cos compreende 28 tipos de brinquedos sele- xidade que envolve o estabelecimento, a prio-
cionados, que são distribuídos conforme as ri, do diagnóstico.
unidades de referência, e as fichas indicadas Pelo exposto, deduz-se o quanto é difícil
especificam o uso daqueles. prever até o caminho a seguir na observação

PSICODIAGNÓSTICO – V 155
do comportamento da criança e da pertinen- cialidade profissional, ocupando cargo de alto
te intervenção, especialmente no primeiro nível empresarial.
ano de vida. O uso de escalas de observação Quanto aos possíveis indicadores de altas
do desenvolvimento infantil, como a que se habilidades na idade pré-escolar (de dois a seis
apresenta, pode ser um procedimento auxi- anos), colocam-se em relevo tanto as capaci-
liar de importância para determinar os “si- dades dos pequenos de liderar grupos de ou-
nais de alerta” ou os indicadores que podem tras crianças, de construir com blocos, de dra-
chegar a ser preditivos de deficiência men- matizar cenas familiares e de “criar” em dese-
tal, autismo, dificuldades sensoriais e/ou nhos e materiais diversos, como também de
motoras, entre outros. No entanto, será ne- manter a atenção em forma persistente nas
cessário considerar as diferenças individuais atividades realizadas por eles mesmos ou pe-
na avaliação dos resultados, com o fim de los outros. É importante reiterar que não é su-
determinar o possível atraso evolutivo ou ficiente a detecção de tais comportamentos
condutas atípicas que servirão como compor- para considerá-los preditores de altas habili-
tamentos preditores. dades. É imprescindível um acompanhamento
Como ilustração, citam-se dois exemplos de sistemático (por processos de avaliação e de
um conjunto de “sinais de alerta”, com acom- intervenção oportunas), a fim de se verificar a
panhamento comprovado, durante vários anos, intensidade, freqüência e consistência dessas
do processo evolutivo de dois casos. O primei- habilidades específicas que, provavelmente,
ro refere-se a um possível prognóstico de defi- venham a se desenvolver posteriormente. Tais
ciência mental, cujos “sinais de alerta” foram idéias, no seu contexto geral, foram aceitas por
detectados por meio de uma avaliação psico- um grupo de especialistas que elaboraram as
lógica realizada quando a examinanda conta- diretrizes educacionais referentes aos educan-
va com um ano de idade (caso publicado, com dos com altas habilidades propiciadas pelo MEC
prévia licença de seus familiares e com dados e de aplicação a todo o território nacional (MEC,
pessoais simulados, em 1975): quadro convul- 1995b).
sivo iniciado aos 4 meses de idade, hipotonia Para facilitar a identificação desses “sinais
generalizada e rigidez nas extremidades, pre- de alerta” e de indicadores de altas habilida-
cário nível de balbucio, associado à superpro- des que possam aparecer nos primeiros anos
teção, permissividade e passividade por parte de vida, são apresentadas algumas estratégias
dos pais. Como foi constatado recentemente facilitadoras, acompanhadas de exemplos prá-
(1999), a examinanda é portadora de clara de- ticos, as quais poderão ser modificadas, am-
ficiência mental, não podendo ser alfabetiza- pliadas ou reduzidas, tendo sempre em vista
da, mas apresenta linguagem coloquial sufi- as características do próprio desenvolvimento
ciente para o cotidiano e independência nos da criança e de seu ambiente familiar e escola-
hábitos de cuidado pessoal. maternal, se freqüentar.
No segundo exemplo (considerando que Seguem algumas dessas estratégias:
ainda há poucos trabalhos no gênero), apre- • Conhecer a criança por suas característi-
sentaram-se, quando o bebê tinha 5 meses de cas pessoais e a fase de seu desenvolvimento
idade, certos “sinais de alerta” como prenún- para, nesse contexto, identificar tais sinais ou
cio de provável alto nível de desenvolvimento: indicadores.
comportamento precoce nas áreas motora e • Estimular a criança, de forma gradual,
cognitiva, como manter-se em pé segurando- seguindo o ritmo de seu processo evolutivo e
se na grade do berço, entretenimento prolon- de acordo com as destrezas e capacidades que
gado com brinquedinhos, facilidade para en- vão surgindo no seu desenvolvimento.
contrar objetos escondidos, auto-estimulação • Possibilitar-lhe condições motivadoras
com brincadeiras de sua iniciativa, reações rá- para promover sua participação efetiva nas
pidas a situações estimuladoras, entre outros. atividades que lhe são sugeridas ou mesmo por
Atualmente (25 anos), é doutor na sua espe- elas realizadas.

156 JUREMA ALCIDES CUNHA


• Animá-la a expressar, em forma espontâ- • Indicar-lhe atividades que são dirigidas por
nea e oportuna, suas emoções e pensamen- outras pessoas, a fim de que possa sentir e
tos, induzindo-a a manejar os conflitos que aceitar que, também em muitas situações, pre-
possam surgir em tais situações. cisa ser orientada e guiada pelos demais.
• Facilitar-lhe diversos recursos que estimu- • Possibilitar-lhe a descoberta gradual da
lem sua livre expressão, tanto no seu desen- multicausalidade de certos acontecimentos,
volvimento cognitivo e sócio-emocional quan- com a confrontação de suas próprias suposi-
to motor e de comunicação, como forma de ções, conduzindo-a, assim, a um conheci-
interação com o ambiente, sua representação mento cada vez mais coerente de seu meio
e interpretação. ambiente.
• Utilizar diferentes modalidades de verba- • Proporcionar-lhe recursos destinados a
lização, como são as diversas formas de per- facilitar o desenvolvimento de respostas dife-
guntas, a fim de orientar a criança em sua pró- rentes para a solução de uma dada situação-
pria aprendizagem, tomando decisões por si problema, e a comparação de seus resultados
mesma e dirigindo suas próprias ações. e com os obtidos pelos demais.

PSICODIAGNÓSTICO – V 157
14
Avaliação psicométrica:
a qualidade das medidas e o
entendimento dos dados
Jandyra M.G. Fachel, Suzi Camey

E m vários pontos deste livro, temos insisti-


do em dizer que o psicólogo deve estar ci-
ente das propriedades psicométricas de seus
calas para medir variáveis, conceitos ou cons-
tructos teóricos não diretamente observáveis,
como, por exemplo, inteligência, depressão,
instrumentos, ou, melhor, deve ser capaz de traços de personalidade, etc. O objetivo, ao
avaliar a qualidade de suas medidas. Por outro construir essas escalas, é que essas medidas
lado, quando trabalhamos com instrumentos sejam o mais precisas possível e que meçam
quantitativos, são utilizadas medidas estatísti- realmente o que se estava querendo medir.
cas, que fornecem dados que devem ser ade- Esses dois conceitos dizem respeito à fidedig-
quadamente entendidos para a integração de nidade (precisão, exatidão) e à validade das
resultados, num laudo. Entretanto, parece que, escalas de medidas, respectivamente, e é o que
às vezes, o psicólogo fica em dúvida sobre a abordaremos nesta seção. Para tornar claros
qualidade de seus testes, como também se esses conceitos, costumamos dar o seguinte
observa eventual dificuldade de aplicar seus co- exemplo: para medir o comprimento de uma
nhecimentos de estatística a situações concre- mesa, podemos fazê-lo de várias formas: uma
tas de avaliação psicológica. São questões que maneira seria utilizar uma régua, a outra seria
têm que ver com o estabelecimento do plano utilizar nosso palmo sabendo que ele tem apro-
de avaliação (que instrumentos escolher?) e ximadamente 20 cm, digamos. As duas ma-
com o fechamento da avaliação (como inte- neiras para medir o comprimento da mesa são
grar resultados de diferentes instrumentos, que válidas para medir comprimento, no entanto,
utilizam sistemas diversos, quanto à sua equiva- uma é mais precisa, mais fidedigna do que a
lência, como percentis, QIs, etc.). Como essas outra, isto é, a régua é mais precisa do que o
questões merecem muita atenção, serão, neste palmo.
capítulo, apresentados subsídios a respeito. A maioria das escalas de medida em ciên-
cias do comportamento são escalas aditivas,
A QUALIDADE DAS MEDIDAS isto é, são obtidas a partir da soma de vários
Jandyra M.G. Fachel itens selecionados como indicadores do cons-
tructo teórico que estamos interessados em
Introdução aos conceitos de fidedignidade medir. É muito comum utilizarmos itens medi-
e validade dos, cada um, numa escala de cinco pontos
Na psicologia e em outras áreas de ciências do (embora itens com escalas, normalmente ordi-
comportamento, é usual a construção de es- nais, com um menor ou maior número de ca-

158 JUREMA ALCIDES CUNHA


tegorias são também utilizados); esse tipo de sos (cargas fatoriais) de cada variável ou item
escalas recebe o nome de Escalas de Likert (vide sobre o fator. Para garantir unidimensionali-
Pasquali, 1996). O primeiro passo na constru- dade, cada escala aditiva deveria consistir ape-
ção das escalas aditivas é decidir quantos e nas dos itens com altas cargas fatoriais em um
quais itens vão ser selecionados para compor único fator. No caso da Análise Fatorial de um
a escala. Os itens escolhidos são baseados no conjunto de itens demonstrar mais de uma di-
referencial teórico existente sobre o conceito mensão, cada dimensão ou fator deveria ser
que estamos querendo medir e são, na verda- refletido em escala separada, pois isso signifi-
de, uma amostra de todos os possíveis indica- ca que o conjunto de itens está medindo não
dores do constructo teórico em questão. Na apenas um constructo subjacente, mas mais
pesquisa acadêmica, a construção de escalas de um constructo teórico. Dessa maneira, te-
aditivas é normalmente feita a partir de mar- mos implicitamente colocados os conceitos de
cos teóricos estabelecidos e de resultados em- fidedignidade, no sentido de “consistência in-
píricos de pesquisas já realizadas. Outras ve- terna da medida”, quando falamos que os itens
zes, escalas já construídas em outros países são devem ser fortemente correlacionados uns com
traduzidas e adaptadas para o contexto cultu- os outros, e o conceito de validade, no sentido
ral local, e, após alguns procedimentos formais de validade de constructo, quando falamos de
de tradução e adaptação de escalas, elas de- um constructo teórico latente, segundo defi-
vem ser novamente validadas, e a sua fidedig- niremos adiante. No entanto, nessa fase de cria-
nidade deve ser reavaliada. Tanto para avaliar ção da escala, estamos interessados apenas na
uma nova escala ou teste, como para adaptar unidimensionalidade da escala aditiva. Se não
e reavaliar um escala construída em outro país, houver intercorrelação entre os itens da esca-
devemos ter amostras de tamanho grande. la, isso pode significar que eles não estão me-
Amostras pequenas não são adequadas para dindo o mesmo conceito. A correlação de cada
validação de escalas e testes. item com o total da escala (a soma de todos os
Um tópico importante na pesquisa acadê- itens) também deve ser positiva e relativamen-
mica dentro do contexto de criação de escalas te alta. Itens com baixa correlação com o total
de medida é o conceito de definição operacio- são fortes candidatos a serem excluídos da es-
nal das variáveis da pesquisa, como, por exem- cala como um todo.
plo, as variáveis criadas através das escalas O processo de verificação da fidedignidade
aditivas. Uma definição operacional atribui sig- e de validação das escalas de medida, sejam
nificado a um constructo ou variável especifi- elas aditivas ou não, segue alguns critérios, os
cando as atividades ou “operações” neces- quais exporemos a seguir. É importante salien-
sárias para medi-lo e também especificando tar que os instrumentos de medida para os
as atividades do pesquisador para medir a quais definiremos os conceitos de fidedignida-
variável. É como um manual de instruções de e validade não precisam ser apenas escalas
para o pesquisador, e deve ser utilizada con- aditivas, pois estas são apenas as mais comuns.
juntamente com a definição conceitual do Podemos também avaliar a validade e fidedig-
constructo. nidade de medidas em outros tipos de instru-
Uma suposição essencial para criar uma mentos como, por exemplo, questionários em
escala aditiva é que os itens sejam unidimensi- que os itens não formam uma escala tipo Li-
onais, significando que eles são correlaciona- kert, questionários estruturados ou semi-estru-
dos uns com os outros e que representam um turados, instrumentos qualitativos, técnicas
único conceito. A técnica estatística de Análise projetivas ou outros tipos de instrumento. Para
Fatorial tem um papel fundamental para a de- cada tipo de instrumento existirá uma ou mais
terminação empírica da dimensionalidade de formas apropriadas para medir fidedignidade
um conjunto de itens. A partir da Análise Fato- e validade.
rial, determina-se o número de fatores (variá- Inicialmente, definiremos os diversos tipos
veis latentes ou constructos latentes) e os pe- de coeficientes de fidedignidade mais utiliza-

PSICODIAGNÓSTICO – V 159
dos na literatura e, após, abordaremos o pro- que mais de uma forma de fidedignidade pode
blema da validade de um instrumento de me- ser obtida para uma escala ou teste, mas eles
dida. Uma obra considerada clássica na litera- informam fidedignidade em sentidos diferen-
tura em português sobre fidedignidade e vali- tes. Outra observação importante, no contex-
dade de medidas é a de Vianna (1973). Os con- to da língua portuguesa, é a utilização do ter-
ceitos dos diversos tipos de validade encontra- mo “fidedignidade” para representar precisão,
dos na literatura não são muito claros, e existe consistência das escalas. A palavra “confiabili-
até uma certa discordância entre autores em dade”, como tradução da palavra inglesa reli-
relação a alguns desses conceitos ou em rela- ability, não deveria ser usada nesse contexto,
ção à classificação dos tipos de validade. Um pois por confiabilidade entende-se a área da
dos objetivos deste capítulo é esclarecer e, den- engenharia e estatística que trata da “confian-
tro do possível, unificar as diversas definições ça” que podemos ter em sistemas em geral,
de validade. Escolhemos, por sua importância incluindo sistemas de segurança. Esta área tem
histórica, seguir basicamente os padrões defi- sido denominada Análise de Confiabilidade e,
nidos no manual norte-americano denomina- mais amplamente, Análise de Risco e inclui a
do Standards for Educational and Psychologi- aplicação de sofisticados modelos de regres-
cal Testing, publicado em conjunto pela APA são para o tempo de sobrevivência de peças,
(American Psychological Association), AERA mecanismos e sistemas.
(American Educational Research Association) e Diversos métodos para obter a fidedignida-
NCME (National Council on Measurement in de das escalas e testes são sugeridos na litera-
Education). Esta também é a abordagem da tura. Os métodos são alternativos, em geral,
maioria das obras sobre o tema. São impor- mas mais de um método pode ser utilizado,
tantes neste contexto os comentários e proli- principalmente quando queremos estabelecer
xas considerações desenvolvidas por Silva a fidedignidade em relação aos dois conceitos
(1993) e pela clássica obra de Anastasi (1988) principais: consistência interna e estabilidade
(vide também a edição atualizada de Anastasi no tempo. São os seguintes os métodos de fi-
& Urbina, 1996), os quais, a nosso ver, descre- dedignidade:
vem e esclarecem, dentro de tendências mais • Método do teste-reteste
modernas, a classificação feita pelos padrões • Método das formas paralelas
americanos, a qual é utilizada internacional- • Método das metades
mente. • Coeficientes de consistência interna

Fidedignidade Método do teste-reteste

A fidedignidade de um teste pode ser medida Uma escala ou teste é fidedigno se repetidas
de várias formas. Cada forma é apropriada para mensurações são obtidas em condições cons-
um tipo de teste e depende de que tipo de fi- tantes e dão o mesmo resultado, supondo ne-
dedignidade queremos medir. Os conceitos nhuma mudança nas características básicas,
principais de fidedignidade de um teste dizem isto é, na atitude sendo medida. Idealmente,
respeito ao problema de estabilidade no tem- podemos estimar fidedignidade repetindo a
po e ao problema de consistência interna da aplicação da escala ou teste sobre a mesma
escala. Para escalas aditivas, é usual utilizar-se pessoa usando os mesmos métodos. A dificul-
o Coeficiente Alfa de Cronbach, que é um coe- dade prática do método de teste-reteste é,
ficiente de consistência interna. Já para ques- entretanto, evidente: quanto maior o interva-
tionários que não constituem uma escala adi- lo entre o teste e o reteste, menor o risco do
tiva, podemos utilizar o método do teste-re- efeito de memória, mas maior é o risco de even-
teste, o qual nos fornece um coeficiente de es- tos intervenientes causando modificação na
tabilidade da medida no tempo. Enfatizamos visão do respondente, ou mudanças na carac-

160 JUREMA ALCIDES CUNHA


terística que está sendo medida. O problema é metade da escala, e os itens ímpares para for-
escolher um intervalo de tempo grande o sufi- mar outra metade da escala. Se a correlação
ciente para tratar adequadamente do primei- entre as duas metades for alta, significa que o
ro tipo de risco, e curto o suficiente para tratar teste é fidedigno no sentido de consistência
do segundo. Calculando o coeficiente de cor- em relação à amostragem do conteúdo. A es-
relação entre os escores do teste e do reteste, tabilidade temporal não é medida nesse méto-
teremos uma estimativa da fidedignidade da do, pois as duas formas são aplicadas ao mes-
escala ou teste. Coeficientes de fidedignidade mo tempo. Este tipo de fidedignidade mede
baseados no método do teste-reteste são me- também consistência interna porque só uma
didas de estabilidade, porque se relacionam aplicação de uma única escala é utilizada. No
com constância sobre o tempo. Segundo Vi- cálculo da fidedignidade, devemos observar
anna (1973), esse método não é conveniente que, quanto mais longo for o teste, mais fide-
para medir a fidedignidade de testes de esco- digno ele será, visto que a fidedignidade de
laridade (provas de conhecimento), pois a es- um teste depende diretamente do número de
timativa pode ser viesada, dependendo das itens do teste. O efeito de incluir mais itens em
condições de aplicação do teste (tempo entre um teste ou de diminuir o número de itens
medidas). pode ser calculado pela fórmula de Spearman-
Brown (vide Anastasi, 1988, ou Vianna, 1973).

Método das formas paralelas


Coeficientes de consistência interna
O método das formas paralelas, no qual ver-
sões supostamente equivalentes da escala são O quarto método para calcular fidedignidade
dadas aos mesmos indivíduos e os resultados mede consistência interna do instrumento de
correlacionados, é outra forma de medir fide- medida (escala ou teste), mais especificamen-
dignidade. Aqui, a dificuldade é a suposição te, consistência interitens. Consiste também na
de que não existe diferença entre as duas for- aplicação do instrumento uma única vez e com
mas paralelas. Os itens devem ser escolhidos apenas uma forma. A consistência interna do
segundo essa suposição. Alguns autores deno- instrumento será maior quanto maior for a
minam essa forma de medir fidedignidade de homogeneidade do conteúdo expresso através
método das formas alternadas. Se as formas dos itens. Segundo Hair e colegas (1998), a ló-
paralelas são aplicadas em duas ocasiões dis- gica para medir consistência interna é a de que
tintas para os mesmos sujeitos, esse método os itens individuais ou indicadores da escala
produz medidas de fidedignidade no sentido deveriam todos estar medindo o mesmo cons-
de estabilidade temporal e de consistência de tructo e então serem altamente correlaciona-
respostas a diferentes amostras de itens (ou dos. Existem vários diagnósticos para saber se
formas do teste). Este coeficiente pode, então, o instrumento tem consistência interna, os
combinar dois tipos de fidedignidade. quais incluem a correlação do item com a es-
cala total e a correlação interitem (correlação
do item com cada um dos outros itens). O co-
Método das metades eficiente de fidedignidade que determina a
consistência interna da escala inteira é deno-
O método das metades (split-half) é utilizado minado Coeficiente Alfa de Cronbach (vide
quando uma única forma do teste ou escala Cronbach, 1990). O Coeficiente Alfa deve va-
foi aplicada numa única sessão. O conjunto de riar de 0 a 1; no entanto, valores negativos do
itens do teste é dividido em duas metades, e coeficiente podem ocorrer. Neste caso, o pes-
os escores para as duas metades são correla- quisador deve verificar cuidadosamente cada
cionados. Esse método consiste em, por exem- item para conferir se o item não está sendo
plo, selecionar os itens pares para formar uma respondido no sentido negativo, ou no senti-

PSICODIAGNÓSTICO – V 161
do oposto ao que os outros itens estão medin- defeitos de impressão, podem diminuir a fide-
do. Em caso afirmativo, recodifique o(s) dignidade do teste, além de contribuírem para
item(ns) negativo(s) no sentido inverso e re- uma baixa taxa de resposta.
calcule o Coeficiente Alfa de Cronbach (por
exemplo, itens com escalas de Likert de cinco
pontos devem ter seus escores invertidos, isto Validade
é, o escore 1 é recodificado como 5, o 2 como
4 e assim por diante). Freqüentemente, define-se a validade com a
Não está disponível nos programas compu- seguinte pergunta: você está medindo o que
tacionais nenhum teste da significância esta- pensa que está medindo? A ênfase aqui é dada
tística do Coeficiente Alfa; no entanto, é con- no que está sendo mensurado. Para um teste
senso e é usual considerar que o limite inferior ser válido, ele deve medir o que o pesquisador
para que o Coeficiente Alfa de Cronbach seja deseja e pensa que está medindo. A validade
aceitável é 0,70 (embora coeficientes mais bai- de um teste trata, então, do que o teste mede
xos, como 0,60, possam ser considerados váli- e através de que conceitos ele mede. O traço
dos em pesquisas exploratórias). Quanto mais medido pelo teste pode ser definido apenas
próximo de 1 for o valor do coeficiente, me- por um exame das fontes objetivas de infor-
lhor a fidedignidade do teste. Como todas as mação e operações empíricas utilizadas para
medidas de fidedignidade, o valor do Coefi- estabelecer sua validade. A validade deve ser
ciente Alfa de Cronbach depende diretamente estabelecida em relação ao uso particular para
do número de itens, isto é, quanto maior o o qual ele está sendo considerado.
número de itens da escala, maior o valor do Todos os procedimentos para determinar
coeficiente, e desta forma, os pesquisadores validade tratam, fundamentalmente, das rela-
devem ser mais exigentes com escalas com ções entre o valor obtido no teste ou escala e
grande número de itens. Qualquer escala adi- outros fatos (critérios) observáveis, indepen-
tiva deveria ser analisada em relação à sua con- dentes, sobre as características do comporta-
sistência interna antes de determinarmos sua mento em consideração. Os métodos específi-
validade. cos, empregados para investigar essas relações,
Quando os itens da escala são binários, isto são numerosos e têm sido descritos por vários
é, itens do tipo certo-errado, sim-não, etc., o nomes. Silva (1993) salienta que, embora a
Coeficiente Alfa de Cronbach é equivalente ao validade tenha várias classificações, validade
coeficiente de fidedignidade conhecido como é, essencialmente, um julgamento feito após
Coeficiente de Kuder-Richardson, fórmula nú- compilar todas as informações (teórica, con-
mero 20 (KR20) (vide Vianna, 1973). Embora os ceitual, externa, interna) e não apenas através
programas de computador não apresentem de coeficientes. Muitos autores têm, mais re-
explicitamente o método do Coeficiente de centemente, chamado atenção para a nature-
Kuder-Richardson, basta utilizar os itens binários za unitária do conceito de validade. Na revisão
do instrumento (escala ou teste) no programa feita para a elaboração destas notas, encon-
para o cálculo do Coeficiente Alfa de Cronbach, tramos várias discrepâncias entre os autores
que obteremos o valor do coeficiente KR20. sobre nomes e conceitos de validade, às vezes
Finalmente, descreveremos alguns fatores extremamente contraditórios.
que, segundo Vianna (1973), podem afetar a Segundo Anastasi (1988), na edição de 1985
fidedignidade do teste e que, portanto, deve- do manual Standards for Educational and
riam ser evitados: uso impreciso de palavras; Psychological Testing, foi proposto que a no-
extensão exagerada do item; uso de palavras menclatura sobre validade de medidas fosse
desconhecidas ou pouco familiares; estrutura agrupada em três categorias principais, a sa-
defeituosa da frase; uso de dupla negação. ber: validade relacionada a conteúdo, valida-
Também instruções inadequadas e apresenta- de relacionada a critério e validade relaciona-
ção defeituosa do teste, como, por exemplo, da a constructo.

162 JUREMA ALCIDES CUNHA


Classificaremos os diversos tipos ou concei- aparentemente. É também denominada de
tos de validade utilizando subdivisões dessas validade aparente e diz respeito à linguagem,
três categorias principais, da seguinte forma: à forma com que o conteúdo está sendo apre-
– Validade relacionada a conteúdo: sentado. Por exemplo, quando um teste é pla-
Validade de conteúdo nejado para crianças, mas depois aplicado a
Validade de face adultos, ele não terá validade de face. Se o tes-
– Validade relacionada a critério: te parece infantil, certamente haverá pouca
Validade concorrente cooperação dos respondentes, independente-
Validade preditiva mente da validade original do teste. A valida-
– Validade relacionada a constructo: de de face pode muitas vezes ser melhorada
Validade convergente reformulando os itens do teste em termos apro-
Validade discriminante priados ao grupo ao qual se aplicará o teste.
Validade fatorial Por exemplo, se um teste de raciocínio mate-
mático é aplicado a um grupo de maquinistas,
os itens deveriam ser apresentados numa lin-
Validade relacionada a conteúdo guagem apropriada, de operações com máqui-
nas em vez de operações com “laranjas e ba-
A validade relacionada a conteúdo trata, basi- nanas”. Em resumo, um teste pode estar abor-
camente, da questão do exame sistemático do dando corretamente os conteúdos relativos ao
conteúdo do teste, para determinar se os itens conceito que está sendo medido, mas não ter
cobrem uma amostra representativa do univer- validade de face. Validade de face também não
so do comportamento a ser medido e para é determinada empiricamente por meio de um
determinar se a escolha dos itens é apropriada coeficiente, mas pode ser, em geral, avaliada
e relevante. Podemos, operacionalmente, clas- por juízes ou especialistas.
sificar este conceito de validade com a seguin-
te tipologia: validade de conteúdo propriamen-
te dita e validade de face. Validade relacionada a critério

A validade relacionada a critério aborda a qua-


Validade de conteúdo lidade da escala ou teste de funcionar como
um preditor presente ou futuro de outra variá-
A validade de conteúdo não é determinada vel, operacionalmente independente, chama-
estatisticamente, não é expressa por um coefi- da critério. Por exemplo, o desempenho aca-
ciente de correlação, mas sim resulta do julga- dêmico poderia ser utilizado como preditor do
mento de diferentes juízes ou pessoas de reco- desempenho profissional, ou um teste de inte-
nhecido saber na área da atitude ou traço que ligência poderia funcionar como preditor do
está sendo medido. Esses juízes analisam a re- desempenho acadêmico. Segundo Moser e
presentatividade dos itens em relação aos con- Kalton (1971), em situações onde uma escala
ceitos e à relevância dos objetivos a medir. Os é desenvolvida como um indicador de algum
juízes devem julgar e/ou identificar comporta- critério observável, a validade da escala pode
mentos relevantes e, também, identificar se as ser feita investigando quão bem a escala fun-
áreas do conteúdo em questão foram repre- ciona como um indicador do critério. Por exem-
sentativamente amostradas. plo, um questionário para avaliar pessoas com
distúrbios psiquiátricos poderia ser validado se
os resultados fossem comparados com o diag-
Validade de face nóstico feito com base em entrevistas clínicas.
Dois tipos de validade relacionada a crité-
A validade de face não se refere ao que o teste rio definem-se na literatura: validade concor-
mede realmente, mas ao que o teste mede rente e validade preditiva. Para Silva (1993), o

PSICODIAGNÓSTICO – V 163
elemento tempo é a principal diferença entre Anastasi (1988), a validade relacionada ao
a validade concorrente e a validade preditiva, constructo requer a acumulação gradual de in-
as quais são essencialmente as mesmas, com formação a partir de várias fontes. A validade
exceção de que a primeira se relaciona ao de- relacionada a constructo pode ser classificada
sempenho do sujeito ao tempo em que a esca- em três tipos: validade convergente, validade
la está sendo aplicada, enquanto a segunda se discriminante e validade fatorial.
relaciona ao desempenho futuro sobre o crité-
rio que está sendo medido.
Validade convergente

Validade concorrente A validade convergente verifica se a medida em


questão está substancialmente relacionada a
A simultaneidade da obtenção dos escores do outras formas de medida já existentes do mes-
teste e dos escores de critério identifica a vali- mo constructo. Alta correlação entre um novo
dade concorrente. A validade concorrente é teste e um teste similar já existente é conside-
calculada com base em medidas já existentes rada como evidência de que o novo teste mede
à época do teste. Validade concorrente trata, (aproximadamente) o mesmo traço de compor-
então, da qualidade com que a escala pode tamento (ou constructo) que o antigo teste (já
descrever um critério presente. validado) estava designado para medir.

Validade preditiva Validade discriminante

A validade preditiva fará previsões para o fu- A validade discriminante verifica se a medida
turo. Assim, por exemplo, um teste de depres- em questão não está relacionada indevidamen-
são poderá ser validado se os escores altos no te com indicadores de constructos distintos,
teste forem confirmados por diagnósticos clí- isto é, se a medida ou escala que está sendo
nicos a posteriori. Validade preditiva trata, en- avaliada não se correlaciona significantemen-
tão, da qualidade com que uma escala pode te com variáveis das quais o teste deveria di-
predizer um critério futuro. ferir.

Validade relacionada a constructo Validade fatorial

A validade relacionada a constructo trata do Desenvolvida para identificar traços psicológi-


grau pelo qual um teste mede o constructo cos comuns (ou fatores latentes) em uma ba-
teórico ou traço para o qual ele foi designado teria de testes, a técnica estatística multivaria-
para medir. A dificuldade para estabelecer a da de Análise Fatorial pode ser particularmen-
validade de constructo é que, neste caso, o cri- te útil para definir validade relacionada a cons-
tério, o constructo, não é diretamente mensu- tructo. A Análise Fatorial pode ser utilizada tan-
rável, é uma variável latente não observável; to no caso de verificação da unidimensionali-
logo, a correlação teste-critério não pode ser dade do constructo que está sendo medido,
calculada, como no caso da validade relacio- como no caso em que os itens têm mais de
nada ao critério. Assim, a validade relacionada uma dimensão subjacente. Por exemplo, se um
ao constructo não é validade empírica no sen- teste de vocabulário tem uma carga fatorial de,
tido da correlação do teste com um critério ob- digamos, l=0,86 com o fator de compreensão
servável, mas sim é validade teórica, isto é, é a verbal, a validade fatorial desse teste de voca-
relação entre o teste e algum constructo teóri- bulário, como uma medida do traço de com-
co (variável latente) de interesse. Segundo preensão verbal, é 0,86. Os itens que não têm

164 JUREMA ALCIDES CUNHA


altas cargas fatoriais com o fator subjacente vés de uma tabela 2x2, como a mostrada no
definido como o constructo que está sendo Quadro 14.1, onde o resultado do teste para a
medido deveriam ser excluídos da escala. doença em questão pode ser classificado como
Concluindo, segundo Vianna (1973), vali- positivo ou negativo, e a doença é caracteriza-
dade é uma característica relativa e existente da como presente ou ausente, de acordo com
em diferentes graus. Um teste pode ser válido o padrão ouro. Supondo que o padrão ouro
para certos fins e determinado grupo, mas não seja válido, o resultado do teste pode estar
o ser para outros fins e indivíduos. A validade correto (verdadeiro-positivo e verdadeiro-ne-
é uma característica complexa e não existe iso- gativo) ou incorreto (falso-positivo ou falso-
ladamente. Diferentes tipos de validade coe- negativo). A terminologia verdadeiro-positivo
xistem num teste e se interligam para formar o refere-se aos casos em que a doença estava
todo, onde este ou aquele tipo de validade pre- presente e foram diagnosticados corretamen-
dominam. te como positivos; verdadeiros-negativos são
Finalmente, salientamos que fidedignidade os casos que não têm a doença e foram diag-
e validade são independentes, podendo um nosticados corretamente como negativos. Os
teste ser válido mas não ser fidedigno, como casos falsos-positivos são os casos que não têm
também um teste pode ser fidedigno, mas não a doença, mas são diagnosticados como posi-
ser válido. Por isso, devem ser avaliadas sepa- tivos, e falsos-negativos são os casos com a
radamente, pois uma escala deve ser fidedig- doença, mas diagnosticados como negativos.
na e válida para poder ser usada como instru- A qualidade do teste diagnóstico pode ser
mento de medida. medida pelas taxas de verdadeiros-positivos
entre os doentes e verdadeiros-negativos en-
tre os não-doentes. Essas medidas consti-
Qualidade dos testes diagnósticos: sensibi- tuem-se nas duas propriedades básicas de um
lidade e especificidade teste e são, respectivamente, a sensibilidade
e a especificidade.
A verificação da qualidade de um teste diag- A sensibilidade (s) é definida como:
nóstico, em estudos clínicos, é feita a partir da
comparação do desempenho do teste em dois a
s=
grupos de indivíduos perfeitamente definidos: a+c
um com a doença e outro sem a doença. A
classificação dos indivíduos em doentes e não- ou, em outras palavras, é a capacidade de pro-
doentes é feita a partir de outro teste, normal- duzir resultados positivos em indivíduos com
mente já consagrado como válido, chamado a doença em questão (taxa de verdadeiros-po-
de padrão ouro (gold standard). O Quadro 14- sitivos).
1 mostra como podem ser organizados os re- A especificidade (e) é definida como:
sultados de uma pesquisa para verificar a qua-
lidade de um teste diagnóstico. d
e=
O desempenho do teste contra o teste-pa- b+d
drão ou padrão ouro pode ser avaliado atra-
ou seja, é a capacidade do teste produzir um
resultado negativo em indivíduos sem a doen-
QUADRO 14.1 Forma para apresentação dos dados ça em questão (taxa de verdadeiros-negativos).
para verificar a qualidade de um teste diagnóstico Segundo Soares e Siqueira (1999), sensibi-
Doenças lidade mede a capacidade de reação do teste
Teste Total
Presente Ausente em um paciente doente, enquanto especifici-
Positivo a b a+b dade mede a não-reação do teste em pacien-
Negativo c d c+d tes não-portadores da doença, sendo dessa
Total a+c b+d n forma considerado um teste não-específico

PSICODIAGNÓSTICO – V 165
para a doença em questão. Esses conceitos são a respeito do chamado padrão ouro nos diag-
realmente descrições de probabilidades condi- nósticos em psicologia e psiquiatria (vide Mur-
cionais, ou seja, a sensibilidade é a probabili- phy, 1995).
dade do teste ser positivo, sabendo-se que o Concluindo, a verificação da qualidade de
paciente é doente, e a especificidade é a pro- um teste diagnóstico, a partir dos cálculos de
babilidade do teste ser negativo, sabendo-se sensibilidade e especificidade do teste, pode
que o paciente não é portador da doença. fazer parte da fase de validação de um teste,
Testes altamente sensíveis, de acordo com de acordo com os objetivos específicos do tes-
Rouquayrol (1994), são aqueles que detectam te. Alguns testes e escalas não têm como obje-
todos (ou quase todos) os doentes. Testes al- tivo principal a classificação dos indivíduos em
tamente específicos são aqueles que identifi- doentes e não-doentes, mas sim, são utiliza-
cam somente os que têm a doença em investi- dos como testes para medir o grau ou o nível
gação. Testes sensíveis têm poucos falsos-ne- de uma determinada característica em um in-
gativos, e testes específicos têm poucos falsos- divíduo. Para esses casos, não se aplicam os
positivos. Assim, deve-se usar um teste de alta conceitos de sensibilidade e especificidade.
sensibilidade quando o ônus de não fazer o
diagnóstico é alto, isto é, quando é necessário
saber com certeza se um indivíduo realmente ESCORES BRUTOS E PADRONIZADOS:
não tem a doença. Por outro lado, usa-se um DEFINIÇÃO E INTERPRETAÇÃO
teste específico quando o ônus de um diag-
nóstico errôneo é alto, quando precisamos ter Suzi Camey
a certeza de que realmente o indivíduo tem a
doença. A medida direta de uma determinada caracte-
Outros dois índices que são importantes rística mensurável é chamada escore bruto. Essa
para a qualidade de um teste diagnóstico são medida pode ser o número de acertos em uma
os índices denominados valor preditivo positi- prova, o tempo necessário para realizar um
vo (VPP) e valor preditivo negativo (VPN) de teste, o escore em um teste psicológico, etc.
um teste diagnóstico. No entanto, o cálculo O grande problema das medidas psicológi-
desses índices depende de uma estimativa da cas é encontrar uma escala que represente ade-
prevalência da doença na população de inte- quadamente as diferenças entre os indivíduos.
resse, ou seja, na probabilidade da doença pré- Em geral, os escores brutos desses testes não
teste. Para uma definição desses índices e fór- são as melhores medidas para tais compara-
mulas para o seu cálculo, ver Soares e Siquei- ções, pois:
ra, 1999. a) diferenças entre escores brutos podem
Testes e escalas em psicometria usualmen- não representar a real distância entre os indi-
te envolvem escalas contínuas e não-dicotô- víduos;
micas. Dessa forma, os resultados do teste não b) geralmente não existe um zero absoluto;
são “positivo” e “negativo”, como classificado c) não têm um sentido-padrão.
antes. O que normalmente acontece é a defi- Essas três principais limitações dos escores
nição de um “ponto de corte” na escala numé- brutos podem acarretar má interpretação dos
rica resultante do teste, a partir do qual se clas- escores. Por exemplo, supondo que os candi-
sificam os indivíduos em dicotomias, como, por datos a um emprego fossem submetidos a um
exemplo, doente e não-doente, ou, ainda, po- teste que medisse raciocínio lógico numa es-
sitivo e negativo. Após essa classificação, apli- cala de 0 a 100, uma comparação entre os can-
cam-se as definições de sensibilidade e especi- didatos A e B com relação aos seus respectivos
ficidade de acordo com o exposto no início escores brutos de 20 e 60 nos levaria à conclu-
desta seção. Pode haver controvérsias a respei- são de que o candidato B tem raciocínio lógico
to do ponto de corte em algumas escalas, prin- três vezes melhor do que o candidato A. Mas,
cipalmente as escalas psicométricas, bem como se mudássemos a escala para o intervalo de

166 JUREMA ALCIDES CUNHA


100 a 200, os resultados seriam 120 e 160, e a vem ser calculadas, sempre que possível, com
diferença entre os candidatos seria bem me- base em dados populacionais. Caso contrário,
nor, o que nos mostra a necessidade de um podem ser estimadas a partir de amostras re-
escore onde a escala de medida não tenha in- presentativas da população.
fluência. Os escores mais conhecidos são o percentí-
Na maior parte das escalas de medida físi- lico e o padronizado, com suas derivações. As
cas, temos um zero absoluto, ou seja, se me- interpretações feitas com base no escore pa-
dirmos a quantidade de água mineral que um dronizado têm como pressuposto que o esco-
indivíduo consome por dia, teremos indivíduos re bruto segue uma distribuição normal. A for-
que não bebem água mineral. Este é o zero ma da distribuição normal é apresentada na
absoluto da escala: a ausência de consumo de Figura 14.1 e se caracteriza por ser simétrica
água mineral. No entanto, para algumas me- em relação à média que coincide com a medi-
didas psicológicas, não podemos expressar qual ana. Na Figura 14.1 também podemos perce-
ponto é o zero absoluto. Tomando a situação ber que aproximadamente 68% da população
de um instrumento que meça a depressão, não apresenta escores padronizados entre os valo-
podemos dizer que um indivíduo com escore res –1 e 1, o que corresponde a escores brutos
zero, em tal instrumento, tenha total ausência entre a média menos um desvio padrão e a
de depressão. média mais um desvio padrão (vide Figura
Além dessas duas situações citadas ante- 14.1). Além disso, podemos notar que menos
riormente, temos o problema de que o escore de 0,3% da população atinge escores padroni-
bruto não nos permite comparar o indivíduo zados maiores do que 3 ou menores do que –
com a sua população. Será que um sujeito que 3. Quando a suposição de que os escores têm
tenha 40 pontos num escore de depressão está uma distribuição normal não é satisfeita, deve-
mais deprimido que a maioria dos indivíduos, se ter maior atenção no momento de interpre-
ou a depressão dele é normal quando compa- tar os escores ou talvez buscar escores mais
rada com a população? apropriados.
Quando há necessidade de comparação de Um exemplo da interpretação dos escores
escores brutos de indivíduos de diferentes fai- brutos através do uso da distribuição normal
xas etárias, ou quando um subteste é excluído encontra-se em Cunha, onde se observa que
(ou acrescentado) de uma escala, a melhor al- sujeitos entre 5 anos e 5 anos e 5 meses têm
ternativa são os escores ponderados. Esses es- aproximadamente 68% de chance de apresen-
cores são calculados através de tabelas especí- tarem escores brutos entre 10 e 17,2 na Escala
ficas inclusas em manuais de escalas que ne- de Maturação Viso-Motora, de Koppitz (vide
cessitam dessa ponderação, tais como WAIS, Bender, nesta edição).
WAIS-R, etc. (vide Escalas Wechsler, nesta edi- O escore percentílico é calculado através dos
ção). percentis, que também são medidas estatísti-
Para solucionar tais limitações, os escores cas, e representam qual o percentual de sujei-
brutos são comparados com medidas estatís- tos da população que estão situados abaixo
ticas que sirvam de medida-resumo da popu- deles. Isto é, vamos supor que um indivíduo
lação estudada. As principais medidas empre- tivesse um QI de 92, numa escala Wechsler, que
gadas são a média, a mediana e o desvio-pa- corresponde ao percentil 30, o que nos indica
drão. A média e a mediana dão uma referência que 30% da população têm QI inferior a 92. A
da localização dos dados, enquanto o desvio mediana é o percentil 50, indicando que 50%
padrão dá uma medida da variabilidade dos da população têm um escore bruto inferior ao
dados. Essas medidas são úteis para criarmos valor da mediana e os outros 50% com esco-
escores que possam ser facilmente utilizados res brutos acima do valor da mediana. Esse
para comparar dois indivíduos e que tenham escore é facilmente calculado e interpretado,
valores de referência. Uma vez essas medidas sendo que a sua principal desvantagem vem
vão servir como valores de referência, elas de- do fato que as distâncias entre dois percentis

PSICODIAGNÓSTICO – V 167
diferem de acordo com a posição do percentil. na população (ou número de indivíduos na
Na Figura 14.1, podemos notar que a distân- amostra menos um, para o desvio padrão
cia entre os percentis 10 e 20 não é a mesma amostral). O desvio padrão é a raiz quadrada
que os percentis 40 e 50. dessa divisão.
Tanto o escore padronizado, como o esco- O escore padronizado ou escore Z é calcu-
re T, necessitam da média e do desvio padrão lado com base na seguinte expressão:
para serem calculados. A média do escore bru-
to de uma população nada mais é do que a X–µ
Z=
soma de todos os escores brutos dividida pelo σ
número de sujeitos na população. Para calcu-
larmos o desvio padrão, primeiro precisamos onde, X é o escore bruto, µ é a média, e σ é o
calcular a diferença entre cada escore bruto e desvio-padrão.
a média do escore, que chamaremos de des- Uma desvantagem do escore Z é que seus
vio; então, calcula-se a soma dos desvios ao valores variam de menos a mais infinito (ape-
quadrado e divide-se pelo número de sujeitos sar de, na prática, variarem geralmente entre -

Mediana
1 10 20 30 40 50 60 70 80 90
Percentis

Escore bruto
µ–3σ µ–2σ µ– σ µ µ+ σ µ+2σ µ+3σ *

Escore Z
-3 -2 -1 0 1 2 3
Escore T
20 30 40 50 60 70 80
Escore padrão
0,1 2 16 50 84 98 99,9 normalizado
Estaninos
1 2 3 4 5 6 7 8 9
Percentual
4% 7% 12% 17% 20% 17% 12% 7% 4%
*µ é a média dos escores brutos e σ é o desvio-padrão.

Figura 14.1 Equivalência entre escores brutos e outros escores.

168 JUREMA ALCIDES CUNHA


5 e +5, quando os escores brutos seguem uma base nessa amostra podem ser extrapoladas
distribuição normal), e como o seu cálculo re- para a população.
sulta em valores com casas decimais, muitas
vezes pode causar uma interpretação errada
do escore. Por exemplo, não é raro ouvirmos Sujeito Escore Percentis Escore Escore Estanino
que um sujeito com escore Z de -3,1 tem esco- bruto Z T
re inferior do que um sujeito com escore -3,5, 1 6 0 -2,7 23 1
ou, ainda, que o escore 3,25 é maior que o 2 14 12 -1,2 38 3
escore 3,3. 3 15 17 -1,0 40 3
Para evitar tais confusões, podemos utili- 4 16 22 -0,8 42 3
5 17 28 -0,6 44 4
zar o escore T, que é calculado através de:
6 18 35 -0,4 46 4
T = 50 + 10Z. 7 19 42 -0,2 48 5
A sua interpretação é mais simples, pois 8 20 50 0,0 50 5
temos somente valores positivos, e, se consi- 9 20 50 0,0 50 5
derarmos o escore Z com apenas uma casa 10 20 50 0,0 50 5
11 20 50 0,0 50 5
decimal, o escore T não terá casas decimais.
12 21 57 0,2 52 5
Existem outros escores calculados com base 13 21 57 0,2 52 5
no escore padronizado, como o escore Z nor- 14 22 65 0,4 54 6
malizado, que nada mais é que a transforma- 15 22 65 0,4 54 6
ção do escore Z em percentis, como mostra a 16 23 71 0,6 56 6
17 24 78 0,8 58 7
Figura 14.1.
18 25 83 0,9 59 7
Outro escore utilizado são os estaninos, que 19 27 91 1,3 63 8
são 9 regiões da curva normal, como mostra a 20 31 98 2,1 71 9
Figura 14.1, delimitados por intervalos de 0,5
desvio padrão, exceto o estanino 1 e o 9. Por
exemplo, o estanino 7 compreende o intervalo
de 0,75 a 1,25 desvio padrão. Através desse exemplo, podemos ilustrar a
O escore CEEB (College Entrance Examina- interpretação de tais escores e compará-los
tion Board), também baseado no escore Z, é com o escore bruto. O primeiro fato que deve-
dado pela expressão: mos notar é que a ordem dos indivíduos é a
CEEB = 500 + 100Z , mesma para qualquer escore que esteja sendo
que é o escore utilizado pela Universidade Fe- utilizado.
deral do Rio Grande do Sul para calcular os O Sujeito 1 tem o menor escore bruto, sen-
escores padronizados de cada prova. do que o seu percentil é menor que 1, ou seja,
Todos esses escores e outros que possam existe menos do que 1% da população com
ser derivados desses são importantes pela escore bruto menor do que 6. Através do esco-
possibilidade que eles nos oferecem de com- re Z, podemos dizer que ele está 2,7 desvios
pararmos indivíduos ou de compararmos ha- padrão abaixo da média. Como já foi dito an-
bilidades distintas de um mesmo indivíduo. tes, menos do que 0,3% da população apre-
Temos de ressaltar que, para o uso apropria- senta um escore padrão abaixo de –3, e, com
do desses escores, temos que ter uma boa isso, podemos dizer que esse indivíduo está
aproximação dos escores brutos com a dis- muito abaixo da média. Pelo escore T, chega-
tribuição normal. mos à mesma conclusão sobre o Sujeito 1, mas
Para ilustrar o uso de tais escores, vamos a única diferença é que o escore T é expresso
considerar os escores brutos de 20 indivíduos numa escala de números inteiros positivos e
em relação a um teste de raciocínio lógico, com varia entre 20 e 80, sendo que existe menos
média 20 e desvio padrão 5,2, e que esses su- do que 0,3% de indivíduos que possam obter
jeitos sejam uma amostra representativa da escore T fora desse intervalo. Podemos ver que
população, e, por isso, as conclusões feitas com o Sujeito 1 se encontra no Estanino 1, o que

PSICODIAGNÓSTICO – V 169
significa dizer que ele faz parte dos 4% da po- Outra observação que deve ser feita é que
pulação com escores mais baixos. indivíduos com escores brutos diferentes po-
Se analisarmos o Sujeito 16, que obteve dem apresentar os mesmos, estaninos, como
escore bruto igual a 23, podemos dizer que é o caso dos Sujeitos 15 e 16. O mesmo pode
71% da população deve ter um escore bruto ocorrer com os outros escores, sendo que no
inferior ou igual a 23. Esse sujeito está a 0,6 caso do escore Z isso é menos freqüente.
desvio-padrão da média, ou seja, na região Os escores definidos anteriormente e ou-
onde podemos encontrar aproximadamente tros escores podem ser encontrados em Anas-
68% dos sujeitos. Ainda podemos dizer que o tasi (1988), Cronbach (1990) e Guilford e Fru-
Sujeito 16 pertence ao Estanino 6. chter (1973).

170 JUREMA ALCIDES CUNHA


O ABC da avaliação neuropsicológica
Jurema Alcides Cunha
15
A avaliação neuropsicológica é um tipo bas-
tante complexo de avaliação psicológica,
porque exige do profissional não apenas uma
sua atenção, numa avaliação neuropsicológi-
ca, têm de se adequar às particularidades indi-
viduais do examinando, às suas necessidades,
sólida fundamentação em psicologia clínica e bem como às suas competências e limitações.
familiaridade com a psicometria, mas também Isso vale dizer que, por mais que um psicólogo
especialização e treinamento em contexto em tenha especial preferência pelos ensinamentos
que seja fundamental o conhecimento do sis- freudianos, frente a um adulto que apresen-
tema nervoso e de suas patologias (Lezak, tou mudanças de personalidade marcantes,
1995). Conseqüentemente, foge da abrangên- afetando funções cognitivas, ele não vai se
cia deste livro um maior aprofundamento do contentar em dizer que tais sintomas podem
assunto, tendo nos limitado, na edição ante- ter uma explicação psicodinâmica (Weinstein
rior, a discutir tópicos, como conceito da ava- & Seidman, 1994), ainda que saiba que a de-
liação neuropsicológica, objetivos, métodos de pressão pode ter efeitos sobre a atenção, con-
inferência ou, ainda, tipos de abordagem centração e memória. Não, cada caso é um
(Cunha & Minella, 1993). caso, que deve ser examinado sob todas as
Neste capítulo, vamos nos restringir a cha- perspectivas adequadas, a partir de hipóteses
mar a atenção sobre algumas questões bási- fundamentadas e não na base de idéias pre-
cas, enquanto o próximo capítulo será dedica- concebidas. Portanto, se as questões do enca-
do ao exame de alguns aspectos essenciais na minhamento envolvem menção de dificulda-
avaliação de sintomas demenciais em idosos. des cognitivas associadas com mudanças mar-
Na área da avaliação neuropsicológica, con- cantes de personalidade, num adulto, essas
forme Lezak (1995), uma das maiores autori- dificuldades constituem obrigatoriamente um
dades no assunto, há duas regras que, em hi- primeiro foco de atenção.
pótese alguma, podem ser quebradas: a) “Tra- Entre as dimensões de comportamento, a
te cada paciente como um indivíduo” e b) “Pen- que é o principal objeto de análise, na avalia-
se a respeito do que você está fazendo” (p.110). ção neuropsicológica, é a cognição (e, particu-
Talvez você considere essas regras por demais larmente, a memória), seja por serem os pre-
elementares para serem propostas. Mas a idéia juízos das funções cognitivas os principais cor-
básica é de que todo o exame, todas as estra- relatos de alterações cerebrais, seja por sua
tégias usadas, as tarefas propostas e toda a acessibilidade à mensuração, mas isso não sig-

PSICODIAGNÓSTICO – V 171
nifica que os problemas do SNC não se refli- damentar a seleção de estratégias a serem uti-
tam em outras dimensões do comportamento lizadas. Tais hipóteses podem ser confirmadas
(Lezak, 1995). São prioridades no exame que por achados, utilizando normas quantitativas.
se estabelecem. Outras vezes, servem para dar início ao pro-
Por necessidades de pesquisa, entende-se cesso com endereço predeterminado e, no de-
que certos serviços ofereçam triagem, utilizan- correr do exame, são redefinidas.
do baterias neuropsicológicas compreensivas, Freqüentemente, o processo suscita, por sua
que são fixas, abrangendo um elenco invariá- vez, a testagem de duas hipóteses superpos-
vel de testes administrados a todos os exami- tas: a) a hipótese da presença de um déficit
nandos (Goldstein & Hersen, 1990). Ainda que cognitivo específico, levantada pela emergên-
detenha algumas vantagens, a avaliação neu- cia de uma determinada resposta ou de um
ropsicológica competente implica que o psicó- desempenho anômalo, e b) uma segunda hi-
logo consiga enxergar, através de escores de pótese sobre a presença de determinada dis-
testes, fatores pessoais que podem modificar função cerebral, gerada por achados compro-
o desempenho (Levin, Soukup, Benton et alii, batórios da primeira hipótese (Kaplan, Fein,
1999), com uma focalização mais completa no Morris et alii, 1991). Este é um enfoque basi-
indivíduo. camente qualitativo.
Por outro lado, outros advogam estratégias Conseqüentemente, esse tipo de avaliação
mais flexíveis, propondo uma abordagem de pode se desenvolver a partir de hipóteses oriun-
testagem de hipóteses. Às vezes, estas podem das de várias fontes, inclusive podendo ser eli-
ser derivadas das questões de encaminhamen- ciadas durante a própria testagem. Portanto,
to. Mas, como salienta Lezak (1995), uma vez podemos representá-la da seguinte maneira
que tais questões não provêm de experts em (vide Figura 8.1):
neuropsicologia, nem sempre são apropriadas, Neste esquema, procuramos resumir duas
pelo menos quanto à hierarquização das ne- possíveis abordagens, porque a hipótese sobre
cessidades de investigação. Então, têm de ser um déficit cognitivo pode ser gerada por qual-
consideradas não só tais questões, mas hipó- quer das fontes de indícios ou pode só se defi-
teses podem ser geradas a partir de queixas nir mais adequadamente pela observação do
do paciente, de sua história, do exame de seu desempenho do examinando. Essas duas abor-
estado mental, da impressão que causou ou dagens muitas vezes são equacionadas num
de suas circunstâncias de vida atual. O que se modelo quantitativo e qualitativo, respectiva-
pretende dizer é que iniciar uma avaliação for- mente. Um exemplo do último caso pode ocor-
mal muito precocemente pode ser inadequa- rer quando o encaminhamento se deu para um
do pela perda de informações que acarreta psicólogo clínico, por problemas em dimensão
(Lishman, 1998). Tais informações é que vão do comportamento diferente da cognição, e
definir as áreas de investigação (Weinstein & se verifica a emergência de determinados si-
Seidman, 1994), estabelecer prioridades e fun- nais no desempenho (por exemplo, nas esca-

Figura 15.1.

172 JUREMA ALCIDES CUNHA


las Wechsler), sinais sugestivos o suficiente para deficiências e de alterações disfuncionais da
permitir levantar a hipótese de um déficit cog- cognição, da emocionalidade, bem como da
nitivo, que pode vir a ser confirmado em in- autodireção e manejo (isto é, das funções exe-
vestigação mais especializada, desde que ou- cutivas), que a lesão cerebral se manifesta com-
tras causas possam ser afastadas. portamentalmente” (Lezak, 1995, p.97). Ava-
Os déficits cognitivos podem ocorrer em liar tais déficits e alterações, porém, não dimi-
quatro diferentes funções, que Lezak (1995), nui a importância de fazer uma apreciação das
com muita propriedade, descreve conforme competências do indivíduo, bem como de me-
suas analogias com operações do computador, dir mudanças, no quadro neuropsicológico,
como de input, armazenagem, processamen- através do tempo (Seidman, 1994). Essas refe-
to e output (vide Quadro 15.1): rências a tarefas servem para lembrar que, ver-
dadeiramente, muitas das avaliações neurop-
QUADRO 15.1 Capacidades envolvidas pelas
sicológicas pressupõem propósitos múltiplos,
funções executivas ainda que não raramente o encaminhamento
tenha sido feito apenas por uma razão (Lezak,
Funções cognitivas Manejo das informações
1995).
Funções receptivas (input) seleção, aquisição, Não obstante, um encaminhamento ocor-
classificação e integração
Memória e aprendizagem armazenamento e re-
re quando há pelo menos uma pressuposição
(armazenagem) evocação da presença de déficit ou de comportamentos
Pensamento organização e sintomáticos supostamente “resultantes de
(processamento) reorganização mental danos, doenças ou desenvolvimento cerebral
Funções executivas comunicação ou infor- anormal” (Levin, Soukup, Benton et alii, 1999).
(output) mação posta em ação
Assim, os casos passíveis de encaminhamento
Fonte: Lezak, 1995, p.22 (adaptado do texto).
para avaliação neuropsicológica são muito va-
riados. Weinstein e Seidman (1994), após uma
Portanto, a partir de diferentes fontes de revisão da literatura sobre casos de adultos que
indícios, podem ser geradas hipóteses sobre a poderiam se beneficiar com tal exame, fizeram
presença de déficit ou déficits em determina- uma lista da qual vamos extrair alguns exem-
das funções cognitivas. Com base nas hipóte- plos. Pacientes podem ser encaminhados por-
ses, são selecionadas tarefas (testes) que en- que foi observado que apresentaram “mudan-
volvem o exercício de certas atividades, com- ças marcantes de personalidade, após os 40
preendidas por tais funções. No decorrer do anos” ou após uma intervenção cirúrgica, ou,
desempenho dessas tarefas, ou em seu produ- ainda, por demonstrarem “um gradual declí-
to final, poderão ser encontrados resultados nio na cognição”. Podem ter tido um acidente
comprobatórios da probabilidade de uma dis- vascular cerebral ou terem “uma história lon-
função cerebral. ga de abuso de substâncias”. Podem ter sofri-
Já numa abordagem mais exploratória, será do “um dano cerebral traumático (até aparen-
o desempenho na tarefa que permitirá levan- temente leve)” ou virem apresentando “explo-
tar uma hipótese sobre déficit numa função sões de cólera transitórias, mas incontroláveis”.
cognitiva. Chegar a tal hipótese seria possível, Podem estar sendo submetidos a “medicações
porque certo sinal ou sinais (erros, omissões, múltiplas que afetam cognição/comportamen-
distorções, etc.) sugeriram a possibilidade de to” ou terem “déficits cognitivos secundários
um déficit cognitivo. “Se tal déficit é confirma- a transtornos de ordem médica, como AIDS ou
do por outras respostas, torna-se a base para diabete melito” (p.56).
levantar hipóteses acerca de disfunção do SNC” Na realidade, pode-se concordar que as
(Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, p.107). questões levantadas sobre os mais variados
Tarefas do neuropsicologista, pois, são “a casos podem ser classificadas resumidamente
identificação e a mensuração de déficits psico- em duas categorias: questões diagnósticas e
lógicos, porque é primariamente através de questões descritivas (Lezak, 1995). As questões

PSICODIAGNÓSTICO – V 173
diagnósticas sempre envolvem perguntas que dos, em amostras de sujeitos normais e de gru-
têm que ver com diagnóstico diferencial. É cla- pos de pacientes com diagnóstico formaliza-
ro que a abordagem atual não admite um con- do. Isso demanda tempo. Dessa maneira, os
ceito unitário de patologia cerebral (Cunha & avanços que ocorrem no campo da psicome-
Minella, 1993), mas procura fazer discrimina- tria não podem seguir par a par com progres-
ções importantes entre condições que podem sos tecnológicos que ampliam o conhecimen-
apresentar efeitos comportamentais semelhan- to do SNC e de suas patologias. Por outro lado,
tes, ou comparar, por exemplo, o nível atual inúmeros fatores, como fadiga, motivação,
de desempenho com o presumível desempe- tipos de medicação, etc., podem ocasionar
nho pré-mórbido, etc. Na realidade, “neuro- flutuações no ritmo do desempenho do pa-
psicologistas não podem estabelecer um diag- ciente. Portanto, a contribuição da neuropsi-
nóstico neuropsicológico, mas podem forne- cologia só pode ser feita numa base probabi-
cer dados e formulações diagnósticas que con- lística.
tribuem para as conclusões diagnósticas” (Le- Já a situação parece ser um pouco diversa
zak, 1995, p.111). no acompanhamento da evolução dos casos,
Já as questões descritivas envolvem a ava- pois, tendo-se uma linha de referência prelimi-
liação de capacidades específicas, que vão fun- nar, acréscimos e decréscimos são mais facil-
damentar decisões sobre o indivíduo, seja no mente estimados, considerando que se com-
que concerne à sua vida escolar, profissional para o paciente com ele mesmo, através do
ou, mesmo, no que diz respeito a seus direitos tempo, com grande vantagem para a monito-
e deveres como cidadão. Por outro lado, tam- rização dos casos de interesse.
bém nesta categoria, recaem avaliações que se Mas quaisquer que sejam as razões do en-
sucedem através do tempo, num sentido de caminhamento e a categoria das questões en-
documentar melhora ou deterioração, seja para volvidas no exame, todas as informações e to-
planejar ou monitorar o tratamento. dos os achados só podem ser entendidos den-
Mas há dois pontos dignos de nota, que tro de um contexto, em que são essenciais, pelo
devem ser analisados. Em primeiro lugar, se os menos, a idade do indivíduo, sua história de
encaminhamentos a exame neuropsicológico, vida, seu nível de escolaridade (o número de
em que questões diagnósticas principalmen- anos de educação formal) e sua dominância
te, no passado, tinham que ver com localiza- manual.
ção cerebral, atualmente, são muito pouco fre- Ao se falar em idade, não se tem em mente
qüentes, dada a sofisticação atual de recursos o tipo de bateria de testes utilizados, pois é
técnicos, mas ainda persistem em “condições óbvio que há instrumentos diferenciados con-
em que mesmo os estudos laboratoriais mais forme a faixa etária. Assim, em termos de uma
sensíveis não podem ser esclarecedores, do avaliação neuropsicológica, só nos interessam
ponto de vista diagnóstico” (Lezak, 1995, p.8). normas da população geral, para descrever
Entre tais condições, a autora cita “encefalo- como o sujeito se situa, em termos de forças e
patias tóxicas, doença de Alzheimer e outros fraquezas individuais, quando, por exemplo, ele
processos demenciais”, bem como “trauma vai ter de usar suas capacidades profissional-
cerebral leve” (p.8). mente (isto é, vai competir com os demais).
O outro ponto que seria importante salien- Caso contrário, um dos marcos de referência
tar é que, por vezes, há uma grande expectati- básicos é a idade. Vejamos as escalas Wechs-
va em relação à avaliação neuropsicológica, ler. Constituem conjuntos de subtestes que
sendo “esperado um grau de exatidão dos tes- subentendem tarefas que envolvem atividades
tes psicométricos que é irrealístico” (Lishman, dependentes de funções cognitivas. Ora, fun-
1998, p.108). Assim, por um lado, é essencial ções cognitivas desenvolvem-se com a idade e
lembrar que os instrumentos não podem ser declinam com a idade. Qualquer escore de sub-
utilizados sem serem submetidos a estudos de teste só adquire sentido em relação a normas
suas características psicométricas e normatiza- do grupo etário do examinando, mesmo por-

174 JUREMA ALCIDES CUNHA


que, se existe qualquer déficit, dados globais, ler, 1987) e escolaridade. Assim, um escore do
como o QI, são de escasso interesse como re- Índice de Memória Geral, igual para dois indi-
ferencial. víduos, poderia ser considerado baixo para o
Além disso, a história de vida, colhida com que tivesse mais de 12 anos de educação for-
muito cuidado e minúcia, é sobremodo útil. A mal, e perfeitamente aceitável para aquele com
propósito, há um relato na literatura, aqui apre- oito anos de escolaridade apenas. Tal informa-
sentado muito resumidamente, que parece ção sobre anos de educação formal permite
especialmente ilustrativo a esse respeito. Tra- uma interpretação mais realística de um acha-
ta-se do caso de uma senhora de 34 anos, per- do de teste, quando inexistem dados sobre o
feitamente ajustada ao seu estilo de vida, que funcionamento pré-mórbido da memória.
subitamente apresentou mudanças marcantes Quanto à dominância lateral, é uma infor-
de personalidade e modificações de hábitos. mação também importante, porque o desem-
Certas habilidades manuais, que desenvolvera penho, com a mão preferida ou com a não-
muito bem e lhe davam muito prazer, já não preferida, pode variar quanto à velocidade e
tinham interesse. Na história, chamaram a força e, eventualmente, levar a erros de distor-
atenção as queixas de leves sintomas de cefa- ção. Segundo estudos revisados por Lezak
léia, sonolência, de certa irritabilidade com os (1995), sabe-se que cerca de 90 a 95% dos in-
filhos e algumas dificuldades de memória que divíduos são destros. A mão direita é preferi-
apareceram após um acidente de carro, mas, velmente usada, não só por seres humanos,
aparentemente, sem relação com tal ocorrên- mas pelos primatas em geral, e isso decorre de
cia, uma vez que resultados de exames de roti- uma determinação genética. Conforme a lite-
na (CT e MRI) foram normais. Uma exploração ratura, “trauma precoce ou, mesmo, aconteci-
mais profunda e uma extensiva avaliação neu- mentos pré-natais podem afetar a preferência
ropsicológica não só confirmaram a hipótese manual do adulto” (p.301), embora se regis-
de uma disfunção cerebral, como de uma rea- trem variações em alguns grupos étnicos ou
ção emocional a essa, sentindo-se a mulher em certas famílias. Torna-se, pois, extremamen-
culpada, porque suas limitações não lhe per- te importante verificar qual a mão usada pre-
mitiam dar aos filhos o apoio e a ajuda de an- ferencialmente pelo paciente, pois o fato pode
tes (Weinstein & Seidman, 1994). ter implicações para a organização cerebral. E,
Cada vez mais, tem-se consciência sobre a uma vez que existe determinação genética, é
influência que tem a quantidade em anos de essencial investigar qual a preferência manual
educação formal sobre o desempenho do indi- dos parentes de primeiro grau do examinan-
víduo, não só em instrumentos verbais, como do. Weinstein e Seidman (1994) apresentam
também em tarefas cujo caráter nada tem de exemplos de reproduções gráficas feitas por
verbal. Os dados normativos mais recentes de pessoas normais, chamando a atenção para
vários instrumentos usados em avaliação neu- alguma diferença observável no desenho de um
ropsicológica, como, por exemplo, o Teste Wis- sujeito destro com pais canhotos, situação que
consin de Classificação de Cartas (Heaton, Che- caracterizam como de “dominância anômala”
lune, Taley et alii, 1993), são corrigidos demo- (p.58).
graficamente em relação às variáveis idade e Por certo, essas são apenas algumas infor-
escolaridade. mações, pequenos exemplos, que visam a ilus-
Tal influência do fator escolaridade já vem trar a complexidade da avaliação neuropsico-
sendo reconhecida há bastante tempo, tendo lógica, o que lembra a total superação das an-
importância não só para a seleção de técnicas, tigas formulações de comprometimento cere-
como na interpretação dos achados. Foi feito, bral como condição unitária. Atualmente, como
por exemplo, um estudo que demonstrou a afirma Lezak (1995), “em neuropsicologia, re-
existência de correlação, em nível significante, conhece-se lesão cerebral como um fenômeno
de cada um dos cinco índices da Escala de mensurável multidimensionalmente, que exi-
Memória Wechsler Revisada, a WMS-R (Wechs- ge uma abordagem de exame multidimensio-

PSICODIAGNÓSTICO – V 175
nal”. E acrescenta que, “ainda que lesão cere- o conceito de lesão cerebral só se torna significa-
bral seja útil, como um conceito organizacio- tivo em termos de disfunções comportamentais
nal para uma ampla série de transtornos com- específicas e de suas implicações referentes à
portamentais, ao lidar com pacientes individuais, patologia cerebral subjacente”* (p.19).

*N. da A. O grifo é nosso.

176 JUREMA ALCIDES CUNHA


Avaliação de sintomas demenciais em
idosos: questões essenciais
Irani I.L. Argimon, Candida H. Pires de Camargo
16
A s diferentes imagens sobre a velhice têm
consigo o conceito de que, à medida que
passa o tempo, invariavelmente aconteça um
Um dos principais problemas encontrados é
quanto à motivação e cooperação do idoso no
processo de avaliação.
declínio cognitivo. Giurgea (1995) alerta para a importância da
O funcionamento cognitivo evidencia pos- avaliação em dois níveis, ou seja, examinar se
sibilidade de mudanças durante o envelheci- o idoso está mostrando rendimentos modera-
mento, não só por causa de possível deteriora- dos, porque apresenta uma deficiência cogni-
ção patológica, mas pelo próprio aumento da tiva no autêntico sentido do termo, e, também,
idade. Nos idosos, principalmente dos 80 anos examinar os fatores que não são cognitivos (por
em diante, é comum o funcionamento cogni- exemplo, a motivação), mas que podem influir
tivo se ver associado transitoriamente com sobre o rendimento.
outros padecimentos físicos e/ou de conduta. Isso ocorre principalmente quando a ava-
Cada vez mais o funcionamento cognitivo se liação não se realiza por iniciativa própria, mas,
vê afetado por múltiplos eventos fundamen- sim, de familiares, como, também, em situa-
talmente internos, porém, também externos. ções institucionais, onde a solicitação pode vir
A avaliação neuropsicológica em idosos de um médico, juiz, para examinar a necessi-
apresenta problemas particulares a serem con- dade, por exemplo, de interdição, transferên-
siderados, e, neste caso específico, a “regra” cia de instituição e outras. Outro fator a ser
neuropsicológica de medir déficits em relação considerado é quando perdas sensoriais difi-
ao nível prévio deve ser levada em conta, tam- cultam a comunicação (como perdas auditivas,
bém, dentro dos parâmetros das mudanças perdas visuais), de modo que, muitas vezes, o
evolutivas normais no correr da idade. próprio psicólogo precisa estimular o idoso ou
Na maior parte dos casos, trata-se de esta- seus familiares a procurarem um especialista,
belecer se um determinado déficit cognitivo é com o objetivo de melhorar sua comunicação
produto de um declínio normal ou de uma com o mundo que o rodeia, amenizando suas
deterioração patológica e irreversível e, neste dificuldades e possibilitando um exame real de
último caso, ao que pode estar relacionado, suas condições cognitivas.
assim como de que forma isso acontece. Entre as variáveis que produzem peculiari-
Existe uma série de particularidades especí- dades na avaliação cognitiva de idosos, estão
ficas do funcionamento cognitivo nos idosos. duas das características deficitárias da velhice:

PSICODIAGNÓSTICO – V 177
a lentidão perceptiva e a motora. Estes são as- poral ocorrem, quais são os déficits cognitivos
pectos muito importantes, porque muitos dos característicos do envelhecimento.
testes de medida cognitiva envolvem tarefas Uma discussão mais extensa sobre as mu-
perceptivas e motoras e exigem limitação de danças cognitivas, no decorrer do envelheci-
tempo em sua execução, produzindo uma so- mento, está além do escopo deste capítulo,
brecarga de ansiedade. mas poderá ser encontrada, por exemplo, em
Se a cognição é um constructo cujo objeti- Lezak (1995) e em Bottino e colegas (1997).
vo é a adaptação satisfatória em situações es- De forma geral, ocorrem nas esferas sensório-
pecíficas e a tarefas situacionais, que mudam motoras e viso-espaciais, na atenção, memó-
através do ciclo vital, precisamos saber como ria, linguagem e flexibilidade mental. Têm sido
se caracterizam essas mudanças. atribuídas a uma redução da energia disponí-
Essas mudanças se fazem notar por meio vel, repercutindo nos processos mentais que
das queixas comumente trazidas pelos idosos demandam esforço, ao passo que as capacida-
ou seus familiares: estão mais lentos e distraí- des intelectuais e habilidades desenvolvidas ao
dos, mais “desastrados”, desorientam-se diante longo da vida e por aprendizagem prévia fi-
de qualquer modificação em locais menos co- cam mantidas até muito tarde.
nhecidos, esquecem-se facilmente das coisas Esses aspectos são extremamente importan-
(“menos as do seu interesse”), “são repetiti- tes de serem considerados, porque ao contrá-
vos”, “teimosos”, “inflexíveis”. Esses problemas rio do que é julgado pelo senso comum, as
vão se instalando devagar, em épocas diferen- demências não implicam prejuízo global, a não
tes, geralmente a partir da sexta década. ser em fases muito avançadas.
O problema que se apresenta, então, é iden- Ao nos depararmos com um pedido de ava-
tificar se essas mudanças constituem as alte- liação, antes de mais nada, é necessário esta-
rações normais e esperadas durante o enve- belecer para que ela será feita. A escolha dos
lhecimento ou sugerem um processo demen- testes, ou de baterias, e das formas de relatar
cial. Essa tarefa não é fácil por várias razões: 1) os resultados depende dos objetivos, que po-
os distúrbios cognitivos dos estádios iniciais da dem ir de diagnóstico diferencial a perícia ou
demência, especialmente da Demência de pesquisa. Enquanto, no primeiro e segundo
Alzheimer, são superponíveis aos da senescên- casos, a escolha deve recair sobre testes sensí-
cia normal ou aos da depressão; 2) freqüente- veis para diferenciar finamente entre tipos de
mente, os idosos apresentam condições que déficits, por certo é necessária uma investiga-
interferem na cognição; dentre estas, desta- ção mais abrangente e compreensiva, em pes-
cam-se causas psiquiátricas, principalmente, quisa, onde geralmente a escolha recai sobre
depressão, isolamento social, doenças médi- baterias fixas. Mas a avaliação nem sempre
cas, déficits sensoriais e polifarmácia. ocorre por um encaminhamento, mas também
Entretanto, é fundamental estabelecer a em vista de resultados de triagem prévia, em
distinção entre senescência e demência, já que, clínicas ou outras instituições.
em alguns casos, é possível reverter a síndro- O ponto de partida para qualquer avalia-
me demencial, identificando-se e tratando ade- ção é a história precisa obtida com o paciente
quadamente a doença de base. Mesmo quan- e informantes. Além do registro dos fatores de
do isso não é possível, o estabelecimento do risco para o desenvolvimento de demência, de
diagnóstico correto poderá fornecer a orienta- informações sobre história médica, medicações
ção adequada para melhorar a qualidade de em uso e eventos importantes da vida, é im-
vida do paciente e cuidadores. portante estabelecer o(s) tipo(s) de defeitos
Se o envelhecimento é acompanhado por cognitivos, a época em que ocorreram e o im-
essas mudanças normais, como então distin- pacto na vida diária. As informações angaria-
gui-las de alterações patológicas? Em primei- das com o paciente permitem uma análise ini-
ro lugar, o examinador deve ter claro quais são cial da linguagem, atenção, memória e julga-
as mudanças esperadas, em que ordem tem- mento, a serem contrastadas com as habilida-

178 JUREMA ALCIDES CUNHA


des prévias pressupostas pela vida acadêmica ca abrangente, seja como parte de um scree-
e profissional, ou as responsabilidades desem- ning inicial, para então determinar a necessi-
penhadas na vida cotidiana. dade ou não de uma avaliação mais completa.
As questões que merecem enfoque são: se É importante elaborar estratégias de rotina
houve e quais foram as mudanças no compor- para o exame da capacidade cognitiva das pes-
tamento, hábitos e personalidade; se a mudan- soas que nos procuram por queixas de proble-
ça foi abrupta ou progressiva, se ocorreu pri- mas de memória. Essas estratégias, combina-
meiro, na personalidade e temperamento, ou das com as informações trazidas pelos familia-
depois dos déficits cognitivos; quais foram e res, favorecem uma forma objetiva para, se for
quando apareceram os déficits cognitivos; o caso, tranqüilizá-los e poder mostrar-lhes que
quando e como atingiram a eficiência no fun- este declínio na memória é normal e esperado
cionamento diário; como interferiram nos re- para sua faixa de idade.
lacionamentos e no grau de independência. No DSM-IV (APA, 1994), encontra-se incluí-
Essas questões são importantíssimas por da uma categoria que é definida como “declí-
várias razões, entre as quais a de que, quando nio cognitivo associado à idade”, em que as
o quadro de déficits é leve ou moderado, o alterações são consideradas normais no fun-
diagnóstico diferencial por testes pode ser mais cionamento cognitivo com o processo do en-
difícil, sendo necessário dar mais peso à histó- velhecimento. Os sujeitos com essa condição
ria da apresentação. Outra razão é que testes podem se queixar de problemas de esqueci-
não retratam inteiramente o funcionamento no mento de nomes, de compromissos assumidos,
dia-a-dia. Portanto, ao serem utilizados, deve como, também, de uma dificuldade maior na
se ter em mente que eles permitem examinar resolução de problemas mais complexos.
processos, não sendo eles a medida da função As mesmas estratégias recém-citadas tam-
em si mesma. Uma outra razão a ser conside- bém são importantes nos casos em que os dé-
rada é que especialmente idosos podem se ficits cognitivos apresentam uma evolução (se-
desempenhar mal nos testes, mas funcionarem jam progressivos).
bem na vida diária. Os testes devem então ser Uma abordagem neuropsicológica adequa-
considerados no contexto da vida da pessoa. da sempre envolve a verificação de duas hipó-
Um aspecto importante é a percepção sub- teses sobrepostas. Dessa maneira, “uma res-
jetiva do idoso quanto a suas facilidades e difi- posta específica primeiramente serve para ge-
culdades. Vários trabalhos (vide, por exemplo, rar hipóteses sobre um déficit cognitivo. Se esse
Fernández-Ballesteros, Izal, Montorio et alii, déficit é confirmado por outras respostas, tor-
1992) mostram que os idosos tendem a infor- na-se base para levantar hipóteses acerca de
mar positivamente a respeito de si mesmos, disfunção do SNC” (Kaplan, Fein, Morris et alii,
mostrando uma maior tendência à desejabili- 1991, p.107).
dade social ou uma menor sinceridade que in- Kaplan e colegas (1991) recomendam cau-
divíduos de outros grupos de idade. Entretan- tela para não tirar conclusões sobre déficits
to, a diminuição da memória é uma das quei- cognitivos a partir de poucos indícios, não sen-
xas habituais das pessoas idosas que buscam do possível levantar hipóteses de disfunção no
um serviço especializado. Nesses casos, além SNC a partir de apenas um déficit cognitivo, a
de escutar o “paciente”, é importante ouvir a menos que outras causas tenham sido defini-
família falar sobre as atividades diárias do ido- damente afastadas.
so, sobre a forma como lida com o seu dinhei- As questões suscitadas pela história forne-
ro, os afazeres domésticos, o manejo de sua cem as primeiras hipóteses para o diagnóstico
própria medicação, o uso do telefone, os cui- e as pistas para a escolha dos testes. Esta tam-
dados consigo mesmo (higiene pessoal, apa- bém vai ser determinada pela disponibilidade
rência, roupas adequadas). de tempo, pelo grau de cooperação e fadiga,
Estas últimas informações são úteis, seja além da consideração dos custos para o pa-
como parte de uma avaliação neuropsicológi- ciente.

PSICODIAGNÓSTICO – V 179
Uma vez colhida a história e levantadas as cidos na literatura e que têm sido utilizados
hipóteses iniciais, na prática clínica, o plano de em nosso meio. Alguns destes não apareceram
avaliação deve levar em conta tais hipóteses na literatura especializada, mas foram apresen-
específicas, porque testes de uma bateria fixa tados em congressos e vêm sendo utilizados,
geralmente são construídos sem levar em con- de longa data, em centros especializados, ou
ta o padrão particular das patologias demen- foram validados em amostras específicas, apa-
ciais. Além disso, numa avaliação, os sujeitos recendo em dissertações de mestrado e teses
podem ter níveis culturais diferentes, ou, na de doutorado. Embora não seja habitual, este
suspeita de demência, podem estar em está- tipo de referência pode fornecer informações
dios diferentes de evolução, o que demanda para os leitores que desejem ou estejam traba-
flexibilidade na escolha dos instrumentos, lhando com os mesmos instrumentos.
embora algumas baterias possam ser citadas des- A utilização das Escalas Wechsler de Inteli-
de que seu objetivo seja o do plano de avaliação. gência (WIS – Wechsler Intelligence Scales) no
O examinador poderá optar por fazer uma exame da senescência normal e demência foi
revisão geral dos sistemas e funções, mas isso atestada em inúmeros estudos. Alguns auto-
demanda tempo e, freqüentemente, é exaustivo res elaboraram fórmulas para evidenciar pa-
para idosos. Tendo em mente quais são as mu- drões característicos ou sugestivos de demên-
danças esperadas e associadas à idade, um en- cia. Entre essas, parece ser útil a de Fuld e de
foque especial à atenção, linguagem, praxia cons- Coolidge, citados por Lezak (1995), que, usan-
trutiva, memória e funções executivas geralmente do escores corrigidos para a idade, obtiveram
é suficiente, escolhendo testes específicos para padrões para a Doença de Alzheimer.
o caso individual. Quaisquer que sejam as quei- São apontadas limitações, quando o uso
xas ou patologias suspeitadas, os problemas re- dessas escalas é apenas quantitativo, requeren-
cairão em uma ou várias dessas funções. do, portanto, os dados normativos. Entretan-
Um problema técnico diz respeito ao mate- to, sua utilização qualitativa é de valor indis-
rial das provas (dos testes) mais comuns na cutível na avaliação de qualquer condição.
avaliação cognitiva. Conforme salientam Fer- Pode-se, por exemplo, estimar a estabilidade
nández-Ballesteros e colegas (1992), com o da atenção e da memória nas provas em que o
passar da idade não só mudam as habilidades objetivo é delimitado previamente, como no
cognitivas das pessoas, como também muda a subteste de Completar Figuras (em que o su-
significação, tanto das próprias habilidades, jeito deve sempre dizer o que está faltando)
como de tarefas colocadas à sua disposição. ou Semelhanças (em que ele deve indicar a se-
Uma recente estimativa do National Insti- melhança existente entre dois itens aparente-
tute of Health dos Estados Unidos (Scott, 1999) mente diferentes). Nestes casos, se o sujeito
calcula que entre 5 e 10% da população com passar a responder diferentemente do que é
mais de 65 anos sofre de demência. A preva- solicitado (por exemplo, o que é diferente), se
lência dessa condição aumenta com a idade. O não houver correção da resposta após re-ins-
déficit de memória é uma característica ressal- trução, pode-se levantar a hipótese de distúr-
tada na fase inicial e que se acentua com a pro- bio de memória, se outras causas foram des-
gressão da doença. O prejuízo do pensamento cartadas. Uma outra maneira qualitativa é con-
abstrato e do julgamento, acompanhado por trastar o nível das respostas a itens de nature-
alterações na personalidade, também podem za diversa em Compreensão. Desta maneira,
ser sintomas marcantes do quadro clínico. Se- pobreza nas respostas aos provérbios, enquan-
gundo os estudiosos, não existe uma causa to as demais ou as de Vocabulário são boas,
específica para a demência, visto que várias oferece pistas para a concretude do pensamen-
doenças podem causá-la. to e mudanças na capacidade de abstração.
A seguir, será apresentada uma breve des- No Quadro 16.1, são apresentados exemplos
crição dos testes neuropsicológicos e baterias de baterias mais comumente sugeridas, cujos
com poder discriminativo mais bem estabele- testes são agrupados por domínios ou funções.

180 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 16.1 Baterias cujos testes são agrupados por domínios cognitivos ou funções
Teste Autores/ano Objetivo Adaptação Local de utilização
Mini-Exame do Folstein, Folstein Avalia orientação, Bertolucci, Brucki,
Estado Mental – & McHugh, 1975 memória imediata, Campaci et alii,
MEEM recente, cálculo, 1994
linguagem, habilidade
construtiva.
Consortium to Morris, Heyman, Permite comparações * Protocolos de Pesquisa no
Establish a Mohs et alii, 1989 sobre prevalência e Serviço de Neurologia da
Registry for causas relacionadas com Escola Paulista de
Alzheimer’s a Doença de Alzheimer. Medicina
Disease – CERAD É feita uma quantificação
que classifica o sujeito
como demenciado ou
não-demenciado.
Exame do Estado Strub & Black, Revisão de funções de Camargo e Serviço de Psicologia e
Mental 1985 memória, atenção, colegas, 1987 Neuropsicologia do
linguagem, habilidades (não-publicado) Hospital das Clínicas de
construtivas e São Paulo
julgamento.
Cambridge Roth, Tym, Mount Fornece dados sobre o *
Mental Disorders et alii, 1986 início e progresso dos
of the Elderly déficits cognitivos.
Examination – Avalia atenção, memória,
CAMDEX linguagem, praxia,
abstração, percepção
e cálculo.
The Middlessey Wilson, Cockburn Serve para screening do Bezerra, Bolognani Serviço de Reabilitação do
Elderly & Baddeley, 1989 estado mental, para & Gouveia, 1998 CNP-AFIP-FUNESP
Assessment of idosos. Inclui questões (não-publicado)
Mental State – de orientação, nomeação,
MEAMS evocação, compreensão,
aritmética, habilidade
visoconstrutiva,
percepção visual,
fluência verbal,
perseveração motora.
Entrevista Zandig, Avalia atenção, memória * Protocolos de Pesquisa do
Estruturada para Mittelhammer, imediata e tardia, Serviço de Geriatria do
Diagnóstico da Hiller et alii, 1991 habilidade construtiva, Hospital do Servidor
Demência – cálculo e pensamento Público Estadual de
ENEDAM abstrato. São Paulo
*Não há dados publicados sobre a adaptação para o Brasil.

Todavia, visando a investigar aspectos com- por meio dessas pistas, as suas respostas, é
ponentes de uma função ou atividade, testes mantida na velhice normal e precocemente
específicos podem fornecer maiores dados, perdida na doença de Alzheimer. Aproveitar as
como nos exemplos apresentados no Quadro pistas para recordar alguma situação não lem-
16.2. brada livremente é uma capacidade muito cedo
Segundo Xavier (1999), a capacidade do diminuída em idosos que, posteriormente, virão
examinando de aproveitar pistas e maximizar, a desenvolver o quadro demencial evidente.

PSICODIAGNÓSTICO – V 181
QUADRO 16.2 Testes específicos de memória
Testes Autores/ano Função
Teste de Evocação Buschke & Fuld, 1974 Avaliação da memória com análise simultânea de
de Buschke armazenamento, retenção e recuperação de memória remota
Fuld Object Memory Fuld, 1980 Nomeação tátil e nomeação visual de objetos (fluência verbal,
Evaluation – FOME evocação, rememoração dos objetos)
Teste Comportamental Wilson, Cockburn & Investiga registro e evocação de material verbal e visual,
de Memória de Baddeley, 1985 memória espacial, orientação temporal
Rivermead
Escala Wechsler de Wechsler, 1987 Memória operativa, imediata e tardia, verbal e não-verbal,
Memória III – WMS-III visual, espacial e de eventos

QUADRO 16.3 Médias, desvios padrão e pontos de corte de alguns instrumentos usados num grupo
sadio de longevos (N = 20)
Escolaridade

Instrumentos 0-2 anos (n=9) + de 2anos (n=11)


M DP Ponto de M DP Ponto de
corte corte
Teste de Evocação 89,5 11,0 79 92,6 4,5 88
de Buschke
Lista de Palavras 2,7 1,7 1 3,4 2,7 1
Dígitos 4,8 2,4 2 7,0 1,6 5
Fluência Verbal 11,1 3,9 7 10,6 3,1 7

Em síntese, na triagem de sintomas demen- incluindo, entre os instrumentos, o Teste de


ciais em idosos, é importante tornar esta tes- Evocação de Buschke (Buschke & Fuld, 1974),
tagem uma rotina de maneira simples e no Lista de Palavras (Morris, Heyman, Mohs et alii,
menor tempo possível. Levando em conta a 1989), Dígitos (Wechsler, 1987) e Fluência Ver-
especificidade, sensibilidade e valores prediti- bal (Spreen & Benton, 1977).
vos para a possibilidade de identificação ini- No Quadro 16.3, são apresentados as mé-
cial da demência, segundo a literatura e servi- dias, desvios padrão e pontos de corte estima-
ços especializados, os testes usualmente utili- dos para a classificação de declínio cognitivo
zados são: Queixa Subjetiva da Memória (Tobi- associado ao envelhecimento, em um subgru-
ansky, Blizard, Livingston et alii, 1995), Mini- po saudável (n=20), da amostra total estuda-
Exame do Estado Mental – MEEM (Folstein, da (n=77), distribuídos os sujeitos conforme a
Folstein & McHugh, 1975), Dígitos (ordem di- escolaridade.
reta e inversa) (Wechsler, 1987), Memória Ló- Este capítulo não tem a pretensão de esgo-
gica – WMS-R (Wechsler, 1987), Teste de Lem- tar o assunto, mas, sim, de pontuar aspectos
branças Seletivas livre e com pistas (Buschke & importantes e necessários na avaliação de sin-
Fuld, 1974), Lista de Palavras (Morris, Heyman, tomas demenciais em idosos, período etário
Mohs et alii, 1989) e Fluência Verbal-Categoria ainda pouco estudado, principalmente no que
Animal (Spreen & Benton, 1977). diz respeito a instrumentos adaptados para a
Numa pesquisa realizada com longevos (de nossa população. É indispensável ter em vista
mais de 80 anos) residentes na comunidade a história do sujeito e o uso criterioso de ins-
(Xavier, 1999), a equipe de psicólogos utilizou trumentos na avaliação de sintomas demen-
uma bateria de testes, para fins de triagem, ciais em idosos.

182 JUREMA ALCIDES CUNHA


Perícia psicológica na área forense
Sônia Rovinski
17
A psicologia forense é a psicologia aplicada
ao campo da prática judicial e, como tal,
constitui-se em uma das áreas de estudo re-
necessita que se faça uma adaptação desses
conhecimentos junto às normas legais. Para
Grisso (1986), é fundamental à psicologia fo-
sultante das relações entre a psicologia e a lei. rense estabelecer modelos conceituais diferen-
A psicologia forense, ou judicial, como tam- ciados dos utilizados na área clínica, para que
bém é conhecida, surgiu da necessidade de as- possam produzir conhecimento relevante do
sessorar magistrados em suas tarefas de julga- ponto de vista legal.
mento. Inicialmente, esteve relacionada com a O psicólogo que for atuar com este refe-
psiquiatria forense, sendo suas primeiras inves- rencial teórico deve possuir conhecimentos não
tigações voltadas para a área criminal. Somen- apenas da área psicológica, que está investi-
te a partir do século XX, passaram-se a desen- gando, mas também do sistema jurídico em
volver novos aspectos de investigação, tanto que vai operar; e conhecer as jurisdições e ins-
relacionados com avaliações clínicas ligadas às tâncias com as quais se relaciona, a legislação
questões do direito na área cível quanto aos vigente associada ao seu objeto de estudo e as
procedimentos jurídicos inerentes ao processo normas estabelecidas quanto à sua atividade.
judicial, como avaliação de testemunhos ou Deve, também, familiarizar-se com a termino-
procedimentos dos jurados. logia da área jurídica, pois será constantemen-
Para Ibañez e Ávila (1990), a psicologia fo- te interrogado sob um ponto de vista legal, o
rense é toda psicologia, experimental ou clíni- que poderá acarretar inúmeras dificuldades na
ca, orientada para a produção de investigações “tradução” dos questionamentos jurídicos e,
psicológicas e para a comunicação de seus re- conseqüentemente, nos objetivos da perícia
sultados, assim como a realização de avalia- (Lösel, 1992).
ções e valorações psicológicas, para sua apli- Na área forense, os psicólogos tendem a
cação no contexto legal. Portanto, a coleta de utilizar os mesmos métodos de investigação
dados, o exame e a apresentação das evidên- que são utilizados na clínica, como entrevis-
cias devem ser direcionados aos propósitos ju- tas, testes, recuperação de dados de arquivo
diciais. (protocolos) e informações de familiares e ter-
A realização de uma avaliação psicológica, ceiros. Porém, a natureza específica desta ava-
para fins de perícia junto à área jurídica, parte liação obriga-os a uma adaptação das infor-
de conhecimentos básicos da psicologia, mas mações às questões formuladas, valorizando

PSICODIAGNÓSTICO – V 183
de modo diferenciado as estratégias para ob- no setting clínico está, freqüentemente, asso-
tenção dos dados, de forma a estabelecer uma ciada a aspectos não-conscientes, ao passo que
maior confiabilidade dos mesmos. a resistência frente à avaliação forense é de-
Para se compreender os aspectos distinti- terminada pelo menos por uma das seguintes
vos da avaliação forense, é importante que se razões: primeiro, o cliente pode estar temero-
tenha uma visão diferenciada do contexto do so quanto ao resultado final; segundo, mes-
trabalho do psicólogo na área clínica e em sua mo desejoso do resultado da avaliação, pode
atividade junto ao sistema legal. Melton e co- sentir-se ressentido pela intromissão em sua
legas (1997) propõem uma série de dimensões autonomia.
que possibilitam esclarecer estas especificida- Riscos à validade: Ainda que a distorção
des e orientar o trabalho do psicólogo, a sa- inconsciente da informação seja uma ameaça
ber: à validade em ambos contextos de avaliação,
Escopo: No setting clínico, temas como a ameaça da distorção consciente e intencio-
diagnóstico, funcionamento de personalidade nal é substancialmente maior no contexto fo-
e tratamento para a mudança de comporta- rense. No contexto clínico, a distorção relacio-
mento são aspectos primários. A avaliação fo- na-se mais com fatores de timidez, fantasias
rense, freqüentemente, dirige-se a eventos ou falta de consciência do cliente sobre seus
definidos de forma mais estreita ou a intera- problemas. No contexto forense, em função da
ções de natureza não-clínica, sempre relacio- natureza coercitiva e da importância final de
nados a um foco determinado pelo sistema seus trabalhos, os clientes são incentivados a
legal. Aspectos clínicos, como diagnóstico ou distorcer a verdade. Essa verdade estende-se,
necessidade de tratamento, estão em segun- também, a terceiros que são chamados a in-
do plano, em relação a outros de relevância no formar dados sobre o cliente (parentes, traba-
caso. lhadores de saúde mental, amigos).
A perspectiva do cliente: A precisão da in- Dinâmica do relacionamento: A interação
formação é importante, tanto no setting clíni- orientada pela avaliação clínica enfatiza o be-
co como no forense. Porém, na avaliação clíni- nefício que pode advir, se for mantido o inte-
ca, a compreensão da visão particular do cliente resse em colaborar, havendo um pacto tácito
sobre o problema, que é, geralmente, o moti- de manutenção da confiança, compreensão e
vo do processo, fica em primeiro plano, dei- de segurança da confidencialidade. No contex-
xando a avaliação “mais objetiva” como secun- to forense, o examinador não só ocupa um
dária. O examinador forense deve preocupar- espaço mais distante do cliente, como também
se com a exatidão da informação, na medida necessita confrontá-lo com mais freqüência,
em que sua avaliação deve responder sobre checar as informações dúbias ou inconscien-
fatos que extrapolam a subjetividade do exa- tes. Com isso, a percepção que o cliente tem
minando. Ainda que a visão do cliente seja do papel do examinador nem sempre é de al-
importante, torna-se secundária para os obje- guém que está num papel de ajuda. Caracte-
tivos propostos. As fontes de informação não rísticas como lealdade dividida, limites da con-
devem se restringir ao cliente, mas a todas as fidencialidade e preocupação com a manipu-
fontes consideradas relevantes. lação das informações, em um contexto adver-
Voluntariedade e autonomia: As pessoas so, determinam maior distanciamento emocio-
que buscam um psicodiagnóstico geralmente nal entre o avaliador forense e seu cliente.
o fazem voluntariamente ou por encaminha- O tempo de avaliação forense e o setting:
mento de um profissional da saúde. Pessoas No setting clínico, a avaliação, ainda que limi-
que passam por uma avaliação forense o fa- tada no tempo, tende a se proceder num ritmo
zem por ordem de um juiz ou advogado. As- mais lento. Além disso, o diagnóstico pode ser
sim, existe uma maior possibilidade de encon- reconsiderado durante o curso do tratamento
trarmos clientes não-cooperativos, resistentes e revisado muito além das entrevistas iniciais.
neste último tipo de avaliação. A resistência No setting forense, uma variedade de fatores,

184 JUREMA ALCIDES CUNHA


incluindo a pauta do foro e os limites dos re- tos, considerando a relevância para a questão
cursos, podem reduzir-se às oportunidades legal específica, a relevância hipotética dos re-
para o contato com o cliente. Essa redução de sultados do teste, a limitação na reconstrução
tempo repercute diretamente numa coerção ao de contextos e a consideração sobre a valida-
fechamento do caso e numa diminuição da de aparente, isto é, sua aceitação como instru-
possibilidade de reconsiderar as formulações mento de valor reconhecido junto ao contexto
feitas. Ao mesmo tempo, enfatiza-se a preci- jurídico.
são da conclusão quanto à finalidade das dis- Grisso (1986) propõe que se enfrente o de-
posições legais, uma vez que o resultado da safio da avaliação forense com a criação de um
avaliação se torna um produto e passa a fazer novo conjunto de instrumentos de avaliação
parte dos registros do caso jurídico. que possa responder à demanda legal. Esses
instrumentos já se encontram bastante desen-
volvidos no mundo anglo-saxão, desde a dé-
INSTRUMENTOS DE MEDIDA cada de 70, e são chamados Instrumentos Es-
pecíficos de Avaliação Forense (FAIs – Forensic
Em sua tarefa de avaliação, o psicólogo conta Assessment Instruments). Para o autor, esses
com uma série de instrumentos, testes psico- novos instrumentos foram desenvolvidos para
lógicos, que o auxiliam a objetivar o estado serem utilizados de maneira conjunta com ou-
mental dos indivíduos com maior precisão. tros métodos clínicos de avaliação, especial-
Conforme Ávila e Rodríguez-Sutil (1995), o uso mente para definir a relação entre “termos psi-
desses instrumentos seria o responsável pela cológicos e clínicos” e “critérios legais para
solicitação crescente dos laudos psicológicos. competências”. Eles têm como preocupação
Gudjonsson (1995) salienta que o uso de tes- comum a necessidade de padronização de
tes psicológicos seria um aspecto diferencial métodos quantitativos, com os quais se possa
da avaliação psiquiátrica, pois, enquanto os observar, identificar e medir comportamentos
psiquiatras permanecem na opinião produzi- diretamente relevantes às questões legais sobre
da pela entrevista clínica, os psicólogos levari- as competências e capacidades do homem.
am vantagem ao poder medir de forma padro- Esses instrumentos são ainda bastante desco-
nizada habilidades funcionais, déficits, aspec- nhecidos em nosso meio, uma vez que são
tos de personalidade e status mental. necessários não só a tradução e o estudo de
Em uma pesquisa realizada no estado do suas qualidades psicométricas, como também
Rio Grande do Sul, por Rovinski e Elgues (1999), adaptação às normas legais. Sua produção
levantou-se que 87% dos psicólogos forenses deveria ser estimulada, pois, além de facilitar
pesquisados utilizavam instrumentos além da a comunicação no contexto legal entre técni-
entrevista clínica, dando preferência para os cos e agentes jurídicos, permitiria o desenvol-
projetivos e gráficos (Machover, HTP, Desenho vimento de pesquisas empíricas para funda-
da família, TAT). O uso de instrumentos para mentação de laudos.
avaliações clínicas na prática forense confirma
uma realidade já constatada em outros países
da Europa (Ávila e Rodríguez-Sutil, 1995). Es- COMPETÊNCIAS LEGAIS
ses instrumentos são, geralmente, desenhados
para avaliar estados psicopatológicos, traços Para Grisso (1986), sempre que questões de
de personalidade e inteligência geral. Apesar decisão judicial são colocadas, elas se referem
de terem um papel importante no processo de a capacidades individuais físicas, mentais e/ou
avaliação psicológica, nem sempre são capa- sociais, relacionadas à vida passada, corrente
zes de satisfazer as necessidades impostas pela ou futura do sujeito. As decisões na área cri-
demanda legal, quanto à relevância e à credi- minal ou cível relacionam-se com a avaliação
bilidade. Os autores salientam a importância de competências legais. O objetivo é atribuir
de uma utilização criteriosa desses instrumen- ou não ao sujeito um status de debilidade ou

PSICODIAGNÓSTICO – V 185
insuficiência, que é percebido como compro- ca; ou, c) a pedido de uma das partes litigantes,
metedor do bem-estar do indivíduo ou da so- quando é conhecido como perito assistente.
ciedade. As avaliações podem ser realizadas por um
Cada competência legal se refere a várias ou por vários psicólogos, bem como podem ser
situações (ordinárias ou extraordinárias) na vida feitas em conjunto com outros técnicos de espe-
dos acusados, que necessariamente não preci- cialidades diversas (médicos especialistas, assis-
sam possuir um status legal, desenvolvimen- tente social). Existe, ainda, a possibilidade do lau-
tista ou psiquiátrico específico. A lei não pre- do ser emitido por uma entidade, mas sempre
sume que incompetência legal em alguma área com a identificação dos profissionais envolvidos.
definida previamente produza incompetência Quanto à jurisdição da perícia, esta pode
em outra área da competência legal. Na área estar relacionada à área cível, penal, do traba-
médico-psicológica, esse conceito supõe sempre lho ou administrativa.
a noção de “habilidade para executar determi- A metodologia para a realização da perícia
nada tarefa” (Glass, 1997, p.6). Um modelo con- pode variar de acordo com cada profissional e
ceitual para avaliação pericial pressuporia uma em função da demanda a ser investigada. Po-
análise inicial da visão da lei sobre a competên- rém, Espada (1986) adaptou alguns passos
cia em questão. O modelo de avaliação escolhi- básicos propostos originariamente por Blau, no
do deve refletir sobre, e não reformar o modelo sentido de orientar a prática do psicólogo. Es-
jurídico direcionado à competência legal, ao pas- ses passos são apresentados aqui, na medida
so que a teoria psicológica escolhida deve ser em que parecem viáveis em nosso meio.
apoiada por evidências empíricas.
Salienta-se que a construção dos limites da
competência se encontra estreitamente ligada Iniciação do caso
aos valores da sociedade e serve para reforçar
ou restringir os direitos das pessoas para de- A forma de iniciar o caso dependerá da origem
terminados propósitos. Assim, exatamente do contato com o psicólogo. Se ele for contra-
porque a avaliação de competência serve para tado pela parte litigante, isto é, por um advo-
uma infinidade de objetivos sociais, a interpre- gado que esteja cuidando do caso, deverá
tação da conduta da pessoa que se encontra manter contato com o mesmo de modo a to-
em avaliação reduzir-se-á a certos critérios que mar ciência dos objetivos do processo, ainda
serão influenciados pelos valores daqueles en- que seja o cliente o primeiro a procurá-lo. No
volvidos em sua avaliação. Com isso, surge o caso de ser designado pelo juiz, deverá solici-
perigo de que a noção de competência venha tar os autos processuais para análise e conhe-
a reforçar determinadas instituições sociais, em cimento dos quesitos formulados. O contato
detrimento dos direitos individuais. Na medi- com o juiz poderá ocorrer, ainda que não seja
da em que esses constructos de valor não po- a prática mais freqüente.
dem ser eliminados da avaliação da competên- O primeiro contato com o advogado, com
cia, é importante que sejam ao menos explicita- o juiz ou a leitura inicial do processo deverá
dos para que se possa avaliar sua legitimidade. fornecer as seguintes informações:
– os principais fatos que levaram à solicita-
ção da intervenção do psicólogo, definindo se
UMA PROPOSTA DE METODOLOGIA PARA A o caso é da competência do profissional;
PERÍCIA FORENSE – a data provável da entrega dos resulta-
dos, que pode estar relacionada a uma próxi-
O papel do psicólogo junto ao pedido de uma ma audiência, devendo o psicólogo lembrar
avaliação forense pode se dar: a) como perito que toda perícia exige sempre uma breve revi-
oficial, quando designado pelo juiz no decor- são da literatura de investigação;
rer do processo, b) em função de seu desem- – as “perguntas hipotéticas” ou quesitos
penho profissional em uma instituição públi- que terá de responder como perito;

186 JUREMA ALCIDES CUNHA


– as características e disponibilidades do ploração, com uma articulação e discussão de
sujeito demandante, de modo a apreciar a exis- resultados adequados aos quesitos;
tência de condições adversas de avaliação que – cronologia do caso;
poderão inviabilizar a investigação e levar à – folha com o registro dos honorários (pa-
renúncia do caso; gamentos realizados);
– a necessidade de solicitação de outros – assuntos variados.
informes (internações hospitalares, vida esco- Para facilitar a administração e integração
lar ou de trabalho, exames psicológicos reali- de todos esses dados, o autor sugere que o
zados anteriormente); aqui também é impor- perito psicólogo crie formulários que auxiliem
tante avaliar o tempo de intervalo desde as na organização dos dados.
avaliações psicológicas prévias, a fim de evitar
a contaminação do parecer do psicólogo com
o de outros peritos; Coleta de dados
– a complexidade do caso, para o estabele-
cimento dos honorários e a forma de pagamen- A investigação pericial deve se utilizar de to-
to (devem ser consideradas aqui todas as eta- dos os recursos metodológicos disponíveis, ain-
pas do processo, inclusive a disponibilidade da que seja adequado se avaliar a utilidade e
para responder em juízo). possibilidade de explorações complexas. A co-
De posse desses elementos, o psicólogo es- leta de dados deve ser orientada de forma a
tará em condições de propor um contrato de cobrir os quesitos formulados, mas sem se res-
trabalho dentro das normas éticas de sua pro- tringir estritamente a eles, evitando a distor-
fissão. Se foi chamado pela parte litigante, ção metodológica e a incapacidade de respon-
poderá propor seus honorários diretamente a der novos quesitos relacionados ao caso ou
esta, mas, se foi designado em juízo, deverá detalhes mais específicos.
propor seus honorários por escrito e juntá- Os métodos e as técnicas a serem utiliza-
los ao processo, aguardando o aceite das das devem seguir o nível de conhecimento e
partes litigantes. Antes de iniciar o trabalho, de investigação disponíveis no momento, con-
deverá assinar o termo de compromisso, po- siderando-se a existência de justificações cien-
dendo, a partir desse momento, ser respon- tíficas sobre a validade e fidedignidade desses
sabilizado penalmente pela não-realização do instrumentos, bem como sua capacidade de ex-
mesmo. plicabilidade das categorias utilizadas no laudo.

Preparação do expediente Avaliação de necessidades

As perícias forenses freqüentemente alcançam Nesta etapa, o psicólogo forense avalia se os


grande complexidade de dados e informações. dados que obteve no curso de suas primeiras
Por isso, o autor salienta a necessidade de or- investigações são adequados ou não às neces-
ganização do material de expediente, conside- sidades propostas pelas “perguntas hipotéti-
rando as características próprias quanto aos cas” (quesitos) e, em conseqüência, passa a
conteúdos que deverão ser valorizados: formular novos objetivos de exploração ou a jus-
– documentos iniciais (fichas de dados, in- tificar a impossibilidade de abordagem destes.
formações do advogado, dados do processo);
– outros informes do sujeito (emitidos por
diversas instâncias e outros peritos); Seleção de estratégias
– anotações tomadas no curso da entrevis-
ta com os sujeitos, advogado ou juiz; A discussão sobre a seleção de estratégias rea-
– levantamento de cada uma das provas ou liza-se tanto na etapa de coleta de dados como
procedimentos psicológicos utilizados na ex- na de avaliação de necessidades. A escolha e a

PSICODIAGNÓSTICO – V 187
implementação de certas estratégias deve neira objetiva, detalhando os níveis de confian-
orientar-se pelas seguintes questões: ça das predições e descrições;
– as estratégias escolhidas estão disponí- – concluir-se-á com uma ou várias opiniões
veis? a respeito das “perguntas hipotéticas” (quesi-
– são éticas? tos) formuladas pelo juiz ou advogados.
– são aceitáveis para o meio e o contexto
profissional e social?
– são práticas? SIMULAÇÃO E DISSIMULAÇÃO
Segundo o autor, não seria adequada a pro-
posição de um modelo padronizado para as A avaliação psicológica na área forense possui
explorações periciais, como baterias constituí- um viés próprio, que é a constante preocupa-
das por determinadas técnicas de avaliação, ção que os técnicos devem ter em vista da pos-
que seriam aplicadas independentemente das sível distorção de dados por parte dos pericia-
características de cada caso. Afirma a impossi- dos. Para alguns autores, essa distorção existi-
bilidade de se falar em modelos de investiga- rá sempre, variando apenas em intensidade. A
ção específicos para cada classe de demanda, necessidade de demonstração ou de ocultação
como, por exemplo, disputa de guarda, desti- de fatos e a existência de incentivos financei-
tuição de pátrio poder, responsabilidade pe- ros e afetivos (como a obtenção da guarda de
nal, etc. Cabe ao psicólogo forense a discus- filhos) são fatores coercitivos na produção
são e a estruturação de uma proposta meto- consciente de distorções nas informações pres-
dológica para cada objeto de intervenção. tadas.
É importante o psicólogo estar preparado A distorção dos dados pode-se manifestar
para ser chamado em audiências, com vistas a como simulação, quando o sujeito tenta fingir
responder quesitos. Nesse momento, deve es- sintomas que não existem, ou dissimulação,
tar munido de subsídios para responder a pos- quando procura encobrir ou minimizar os sin-
síveis perguntas sobre a validade de seus acha- tomas que na realidade existem. A simulação
dos e sobre as formas de controle da simula- é caracterizada no DSM-IV (APA, 1995) sem-
ção e falsificação de dados. pre pela existência associada de um incentivo
externo, enquanto a dissimulação, conforme
o senso comum, tem sido associada à tentati-
O informe pericial propriamente dito va de evitação de uma privação de direitos.
Os autores, em geral, reconhecem a dificul-
É importante salientar que a intervenção do dade em detectar esses processos de distorção,
psicólogo nas perícias forenses se resumirá, na recomendando uma série de critérios de ob-
maior parte das vezes, ao laudo emitido. Ape- servação, tanto frente aos testes quanto fren-
sar da importância deste documento, é na área te à entrevista. Porém, como sugerem Ávila e
judicial que ainda se encontra o maior nível de Rodríguez-Sutil (1995), esses indicadores não
conflitos para a realização do mesmo. Com o fim devem ser utilizados isoladamente, como se
de minimizar essas dificuldades, o autor sugere tivessem um valor absoluto. Todos eles devem
que sejam observados alguns pontos: alcançar uma descrição coerente da personali-
– o conteúdo deverá adequar-se aos aspec- dade e do comportamento do indivíduo, cons-
tos básicos do caso, considerando uma dispo- tituindo uma intervalidação de dados. Assim,
sição mínima que se estruture em uma intro- é importante, durante as entrevistas, analisar
dução, procedimentos utilizados, conclusões a concordância entre os níveis de comunica-
derivadas e sua discussão; ção verbal e não-verbal.
– deverá ser evitada a erudição e ser expres- Rogers (apud Melton, Petrila, Poythree et
so com clareza; alii, 1997) alerta para os seguintes indicadores
– excluir-se-á ou se tornará relativo tudo de simulação que poderiam ser observados na
aquilo que não esteja justificado de uma ma- entrevista:

188 JUREMA ALCIDES CUNHA


– apresentação dramatizada e exagerada mais graves, como confabulação e contamina-
(estilo teatral, referência a sintomas extrema- ção. Os simuladores parecem, também, não
mente severos e indiscriminados); diminuir a boa forma das respostas. São refe-
– conduta cautelosa e premeditada (fala ridos, ainda, tempo de reação lento e freqüen-
lenta, repetição de questões, excessiva hesita- te rejeição de cartões.
ção); Nos testes de Bender e Benton, produções
– inconsistências com relação ao diagnósti- extremamente desviadas são próprias de su-
co psiquiátrico (relato de sintomas raros e não jeitos que buscam simular prejuízos cerebrais.
usuais, relato de melhoras repentinas); Lezak (1995), revisando trabalhos sobre simu-
– inconsistências no próprio relato (sinto- lação, salienta que, no Benton, os simuladores
mas contraditórios e disparidade entre sinto- cometem mais erros de distorção e menos er-
ma relatado e observação de conduta); ros de omissão, perseveração e tamanho em
– confirmação de sintomas óbvios (princi- relação aos pacientes orgânicos. No Bender,
palmente os positivos e os mais espalhafato- seguindo as orientações de Hutt, sugere que
sos, em detrimento dos negativos e mais tê- se faça uma retestagem com um intervalo de
nues). vários dias, dificultando a lembrança para o
Quanto aos aspectos a serem observados periciado das distorções que provocou inten-
na testagem, Ávila e Rodríguez-Sutil (1995) cionalmente. Salienta, ainda, os seguintes cri-
voltam a salientar a necessidade de não se uti- térios de avaliação: a) os pacientes orgânicos
lizar os indicadores atribuindo-lhes um valor tendem a simplificar, e não a complicar seus
absoluto. Em nosso meio, as pesquisas desses desenhos; b) as distorções provocadas por um
indicadores são praticamente inexistentes e, na paciente orgânico tendem a se apresentar com
literatura mundial, apresentam muitas vezes elementos semelhantes em mais de um dese-
resultados contraditórios. Em uma revisão te- nho; c) orgânicos dificilmente apresentam re-
órica sobre a simulação na Técnica de Ror- sultados bons e ruins em desenhos de níveis
schach (Kahn, Fox & Rhode, 1988; Meisner, de dificuldades semelhantes; d) existem certos
1988; Netter & Viglione, 1994; Perry & Kinder, tipos de distorções feitas apenas por pacien-
1990), observou-se a existência de contradições tes com prejuízos cerebrais, como rotação e
quanto à possibilidade do sujeito simular de- dificuldades na intersecção do cartão seis.
terminadas doenças em um protocolo, sendo Na área da personalidade, um dos instru-
que um dos fatores discriminativos que favo- mentos mais amplamente estudado e usado
rece a identificação dos simuladores foi a pos- para avaliação de dissimulação e simulação é
sibilidade do examinador aplicar e corrigir os o MMPI / MMPI-2. Esse inventário possui esca-
mesmos protocolos, de forma a poder analisar las de validade (L, F, K) e índices como F-K que
a conduta do periciado. Apesar dos resultados permitem inferir sobre a distorção da informa-
contraditórios, há certo consenso sobre alguns ção por parte do avaliando. Alguns estudos
aspectos que poderiam ser observados na téc- mostram a necessidade de revisar o ponto de
nica de Rorschach, quanto à simulação e à dis- corte do índice F-K em função da severidade da
simulação (Ávila e Rodríguez-Sutil, 1995; Mel- psicopatologia e de fatores socioeconômicos,
ton, Petrila, Poythress et alii, 1997): sugerindo-se como mais adequada a relação F-K
– sujeitos que tentam parecer normais da- >17 (Melton, Petryla, Pothress et alii, 1997).
rão maior número de respostas populares; Sobre instrumentos adaptados à nossa rea-
– sujeitos que tentam parecer doentes men- lidade, podemos citar o Inventário Fatorial de
tais apresentarão maior dramaticidade e res- Personalidade (IFP), que possui escalas de con-
postas com “sangue”, como conteúdo, assim trole (validade e desejabilidade social) para as
como mais respostas com determinantes de 15 necessidades ou fatores de personalidade
textura e profundidade, movimento inanima- que são levantados. Nossa experiência demons-
do e movimento animal. Aparecerão aumen- tra ser um instrumento muito útil na avaliação
tados os fenômenos especiais, porém, não os de funções parentais.

PSICODIAGNÓSTICO – V 189
A REDAÇÃO DO LAUDO bendo lembrar que esta será a base de todas
as conclusões. A descrição deve ser completa,
O laudo faz parte dos documentos oficiais que minuciosa, metódica e objetiva, descartando
tiveram sua origem na área médica. É todo re- o terreno das hipóteses.
latório redigido posteriormente a uma perícia Discussão: Nesta fase, serão abordadas as
e exige sempre consulta a tratados e obras es- várias hipóteses, afastando-se ao máximo as
pecializadas sobre o tema em questão. Uma conjecturas pessoais, podendo-se inclusive ci-
adaptação à prática psicológica foi desenvol- tar autoridades recomendadas sobre o assun-
vida por Skaf (1997), com o apoio do Conse- to. É o momento de um diagnóstico lógico a
lho Regional de Psicologia do Estado do Para- partir de justificativas racionais. É a discussão
ná. Considerando a qualidade da proposta, que, através de sua lógica e clareza, pode as-
apresenta-se como um padrão a ser seguido. segurar a correta dedução das conclusões. Esta
Este roteiro se constitui das seguintes partes: parte do laudo, podendo conter citações e
Preâmbulo: É a parte inicial, onde o perito transcrições, serve para avaliar o nível cultural
se qualifica. É aconselhável que indique, de e científico do relator. Provavelmente, será nes-
modo sucinto, seus principais títulos e funções, te capítulo que ocorrerão as divergências, ge-
sem cair em um histórico funcional. Também rando perícias contraditórias.
deverá indicar a autoridade que lhe atribui o Conclusões: Compreende-se nesta parte a
cargo pericial e, sempre que possível, o pro- síntese diagnóstica, redigida com clareza, dis-
cesso ao qual se encontra vinculado. Deve cons- posta ordenadamente, deduzida pela descri-
tar a data, a hora e o local em que o exame foi ção e pela discussão.
feito. Resposta aos quesitos: Se houver quesitos,
Histórico ou comemorativo: Consiste no o psicólogo deve respondê-los de forma sinté-
registro dos fatos mais significativos que mo- tica e convincente, afirmando ou negando, não
tivam o registro da perícia ou que possam es- deixando nenhum quesito sem resposta. Não
clarecer ou orientar a ação do perito. Corres- havendo dados para a resposta dos quesitos,
ponde à anamnese da entrevista clínica. Refe- ou quando o especialista não pode ser categó-
re-se a dados anteriores aos motivos imedia- rico, deve utilizar-se da expressão “sem elemen-
tos da ação proposta. Esta parte do laudo deve tos de convicção”. Quando houver quesitos mal
ser creditada ao periciado, não se devendo formulados, estes também devem ser respon-
imputar ao perito nenhuma responsabilidade didos, utilizando-se expressões do tipo “preju-
sobre seu conteúdo. Apesar da possibilidade dicado”, “sem elementos” ou “aguarda evolu-
de inverdades neste relato, cabe o direito ao ção”.
periciado de relatar sua versão dos fatos. No Ao término, o relatório deve ser datado e
histórico, o perito deve realizar a descrição dos assinado pelo perito, de preferência rubrican-
fatos de forma mais simples e objetiva possí- do as páginas anteriores.
vel, sem a preocupação de comprometer-se
com a sua veracidade, ou de agradar ou desa-
gradar a quem quer que seja. OS LIMITES ÉTICOS DA PERÍCIA
Descrição: É a parte mais importante, bási- PSICOLÓGICA
ca e essencial do laudo. Tem como função re-
produzir fiel, metódica e objetivamente tudo A legitimação do papel do psicólogo como
o que for observado pelo perito, através de perito se encontra no Decreto-lei 53.664, de
exposição minuciosa dos exames e das técni- 21 de janeiro de 1964, que regulamenta a Lei
cas empregadas. Deve-se considerar que se tra- 4.119, de 27 de agosto de 1962, sobre a pro-
ta de um exame realizado num corte no tem- fissão do psicólogo. Afirma-se, nesse decreto,
po, um instantâneo examinado, e que a des- que caberia ao psicólogo, entre outras atribui-
crição se constitui matéria de fato, resultando ções, “realizar perícias e emitir pareceres sobre
do que pode ser efetivamente observado, ca- matéria de Psicologia”.

190 JUREMA ALCIDES CUNHA


Quanto à discussão dos limites éticos, é citante e orientá-lo em função dos resultados
preciso, inicialmente, buscar-se as diretrizes obtidos.
definidas junto ao Código de Ética Profissional Art. 29 – Na remessa de laudos ou infor-
dos Psicólogos (1996). Nos quatro artigos des- mes a outros profissionais, o psicólogo assi-
critos a seguir, encontramos as informações nalará o caráter confidencial do documento e
pertinentes às relações dos psicólogos com a a responsabilidade, de quem receber, em pre-
Justiça: servar o sigilo”.
“Art. 17 – O psicólogo colocará seu conhe- Ampliando um pouco mais a discussão
cimento à disposição da Justiça, no sentido de sobre os limites éticos da perícia psicológica,
promover e aprofundar uma maior compreen- Monahan (apud Espada, 1986) salienta a ne-
são entre a lei e o agir humano, entre a liber- cessidade de buscar-se nos contextos não vo-
dade e as instituições judiciais. luntários os mesmos níveis de confidencialida-
Art. 18 – O psicólogo se escusará de fun- de dos voluntários, explicitando sempre ao
cionar em perícia que escape à sua competên- cliente o nível possível deste sigilo. Deve-se
cia profissional. considerar que o cliente do psicólogo será tan-
Art. 19 – Nas perícias, o psicólogo agirá com to o sujeito (periciado) como o sistema mais
absoluta isenção, limitando-se à exposição do amplo (sociedade), levando em conta as dife-
que tiver conhecimento através de seu traba- rentes prioridades. Um exemplo típico desta
lho e não ultrapassando, nos laudos, o limite inter-relação é o exame para determinação da
das informações necessárias à tomada de de- probabilidade de reincidência criminal ou a
cisão. determinação da destituição de pátrio poder.
Art. 20 – É vedado ao psicólogo: Em ambos os contextos, é preciso considerar
a) Ser perito de pessoa por ele atendida ou tanto o próprio periciado como os sujeitos,
em atendimento; que sofrerão diretamente os resultados de sua
b) Funcionar em perícia em que, por moti- ação.
vo de impedimento ou suspeição, ele contra- Quanto à atividade prática da perícia, o psi-
rie a legislação pertinente; cólogo deverá ter o dever ético de favorecer a
c) Valer-se do cargo que exerce, de laços de avaliação sistemática de sua atividade, bem
parentesco ou amizade com autoridade admi- como de suas conseqüências. O perito deverá
nistrativa ou judiciária para pleitear ser nome- evitar laudos com o objetivo de rebater ou des-
ado perito”. qualificar um laudo pericial emitido com ante-
No capítulo referente ao sigilo profissional, rioridade por outro perito, a partir do conheci-
podemos salientar dois artigos que apresen- mento do conteúdo deste. Esse aspecto, po-
tam relação com a atividade de perícias: rém, não impede que peritos façam laudos dis-
“Art. 23 – Se o atendimento for realizado tintos e independentes, desde que apoiados
por psicólogo vinculado a trabalho multipro- em suas próprias observações.
fissional numa clínica, empresa ou instituição Por último, há a questão polêmica sobre a
ou a pedido de outrem, só poderão ser dadas devolução dos resultados. Nessa questão, en-
informações a quem as solicitou, a critério do contram-se não só posicionamentos opostos
profissional, dentro dos limites do estritamen- por parte dos profissionais que nela atuam,
te necessário aos fins a que se destinou o exa- como propostas teóricas divergentes. Para
me. Cunha (1993a), de maneira geral, a devolução
§ 1° – Nos casos de perícia, o psicólogo to- é de responsabilidade de quem encaminhou o
mará todas as precauções, a fim de que só ve- processo, isto é, se o pedido de uma avaliação
nha a relatar o que seja devido e necessário ao foi feito pelo médico ou pelo juiz, é a eles que
esclarecimento do caso. os resultados devem ser remetidos, cabendo
§ 2° – O psicólogo, quando solicitado pelo aos mesmos a comunicação ao periciado. Nes-
examinado, está obrigado a fornecer a este as se caso, não estaria o psicólogo se abstendo
informações que foram encaminhadas ao soli- da devolução, mas apenas encaminhando a

PSICODIAGNÓSTICO – V 191
mesma a quem seria o verdadeiro receptor do O exame para verificação de responsabili-
processo. Para Ávila e Rodríguez-Sutil (1995), dade penal é realizado, em nossa realidade, por
o psicólogo teria a obrigação de comunicar a peritos médicos (psiquiatras), estando o psi-
seus clientes as informações obtidas sobre seus cólogo em uma posição auxiliar, principalmente
aspectos psicológicos durante a avaliação. Só através de realização de testagens. Esse exa-
permitem certo relativismo a essa posição ao me tem por objetivo verificar se o culpado de
salientar o princípio da pertinência, em função um delito o cometeu em estado mental idô-
da qual se deve comunicar ao examinando neo; portanto, se possuía, no momento da
aquilo que pode lhe ser de utilidade, em lin- ação, capacidade para reconhecer o caráter
guagem acessível e salientando a segurança injusto e ilegal de seu ato e de dirigir sua ação
relativa das conclusões. de acordo com esse entendimento. Este tipo
O nosso Código de Ética Profissional (Con- de perícia permitirá ao juiz determinar se o
selho Federal de Psicologia, 1996) salienta a sujeito da ação é imputável ou não, isto é, se
obrigação do psicólogo de “fornecer a este deverá responder penalmente pela ação come-
(periciado) as informações que foram encami- tida. Sendo considerado imputável, e culpado
nhadas ao solicitante”; porém, não diz em que da ação, receberá uma pena definida quanto
momento essas informações deveriam ser pres- ao tempo e ao tipo de regime em que vai cum-
tadas. É questionável o fato de oferecer ao su- pri-la (aberto, semi-aberto, fechado); caso con-
jeito uma devolução, antes mesmo de encami- trário, se considerado inimputável, receberá
nhar ao juiz os resultados levantados. Este fato medida de segurança e deverá permanecer in-
poderia interferir no andamento do processo ternado em um manicômio judiciário por tem-
que supõe o momento da ciência das partes po indeterminado, até que seja averiguada, por
envolvidas quanto aos resultados da perícia, perícia médica, a cessação de sua periculosi-
bem como prazo de contestação. A prática dade.
sugere que seria de bom senso o psicólogo O Código Penal de 1984 refere, no artigo
colocar-se à disposição do periciado para es- 26, quem seria o sujeito considerado inimpu-
clarecimento de dúvidas, quanto ao laudo, tável. Diz o artigo: “É isento de pena o agente
depois de o mesmo tornar-se público em au- que, por doença mental ou desenvolvimento
diência com o juiz. Deve-se tomar cuidado para mental incompleto ou retardado, era, ao tem-
não criar uma via de comunicação independen- po da ação ou da omissão, inteiramente inca-
te ao processo judicial, quando, então, o psi- paz de entender o caráter criminoso do fato
cólogo deixaria seu papel original de assessor ou de determinar-se de acordo com este en-
dos agentes jurídicos para assumir a coorde- tendimento”. Assim, conforme salientam Ávi-
nação do próprio processo. Esse tipo de atitu- la e Rodriguez-Sutil (1995), esta avaliação de-
de extrapolaria a função da perícia e colocaria veria determinar: a) o diagnóstico clínico da
o profissional frente a situações que não po- alteração, transtorno ou déficit mental, se hou-
deria manejar. ver, do acusado na época do delito; b) os pro-
cessos de pensamento e estados emocionais
do acusado, bem como as variáveis psicológi-
A PERÍCIA PSICOLÓGICA NO DIREITO PENAL cas mais relevantes, como autoconceito, estra-
tégias defensivas e de enfrentamento, vivên-
O trabalho do psicólogo como perito na área cia da culpa e do juízo moral, vivência do sig-
penal pode dar-se em dois momentos do an- nificado social e legal da ação, controle dos
damento processual: primeiro, num período impulsos e, finalmente, existência, ou não, de
anterior à definição da sentença, quando se transtornos de personalidade (eixo II do DSM).
verificará a responsabilidade penal (imputabi- O exame criminológico, dentre aqueles rea-
lidade) do acusado, ou, depois de promulgada lizados durante a execução da pena, é o único
a sentença, durante a fase de execução da pena, considerado por Sá (1997) como de caracterís-
através do exame criminológico. ticas verdadeiramente periciais. Essa avaliação

192 JUREMA ALCIDES CUNHA


visa à investigação da dinâmica do ato crimi- A PERÍCIA PSICOLÓGICA NO
noso, de suas “causas” e dos fatores a ele as- DIREITO DE FAMÍLIA
sociados. O foco seria o binômio delito-delin-
qüente, com o objetivo de determinar uma O trabalho do psicólogo na área do direito de
maior ou menor probabilidade de reincidên- família é muito amplo, envolvendo principal-
cia. Nesse sentido, difere do exame de perso- mente as questões familiares de maus-tratos,
nalidade e do parecer da Comissão Técnica de guarda de filhos, destituição de pátrio poder e
Classificação, criados a partir da promulgação interdições. A perícia faz-se necessária sempre
da Lei de Execução Penal (LEP) de 1984, já que que se esgotarem os recursos no sentido de as
o primeiro busca uma descrição da personali- partes entrarem em acordo, ou quando é ne-
dade do preso, e o segundo aborda a resposta cessária a avaliação de competências específi-
do preso à terapêutica penal. cas. No primeiro caso, já existem trabalhos em
O exame criminológico foi instituído para nosso meio, no sentido de trabalhar com a fa-
ser aplicado a cada apenado, no início da exe- mília de forma integrada (abordagem sistêmi-
cução de sua pena, para fins de obtenção dos ca), da definição da guarda ou de como de-
elementos necessários a uma adequada classi- vem ocorrer as visitas. Apesar desta ser uma
ficação. Diz o art. 8º, caput da LEP, descrita no orientação atual dos autores (Brito, 1993; Coy,
Código de Processo Penal (1986): 1995), nem sempre é possível se chegar a um
“O condenado ao cumprimento de pena consenso ou, mesmo, ter o envolvimento das
privativa de liberdade, em regime fechado, será partes neste processo, principalmente quando
submetido a exame criminológico para a ob- os mecanismos psicopatológicos são mais in-
tenção dos elementos necessários a uma ade- tensos e podem colocar em risco a integridade
quada classificação e com vistas à individuali- das crianças. Nesses casos, é fundamental uma
zação da execução”. perícia que possa levar em consideração o
No entanto, a realidade nem sempre refle- “melhor” para a criança.
te a proposta esperada. Devido às restrições Na avaliação da destituição de pátrio po-
de recursos humanos e materiais, o exame cri- der, examina-se a competência de determina-
minológico tem se restringido àqueles realiza- do genitor no sentido de poder garantir o bem-
dos para a concessão de benefícios, como o estar de seus filhos (ver Estatuto da Criança e
livramento condicional. do Adolescente, Lei nº 8.069). A descrição de
Na determinação da prognose da reincidên- uma competência (ou incompetência) deve ser
cia, os autores não apresentam uma resposta feita, considerando os padrões relacionais de
clara quanto à possibilidade de uma predição comportamento desse pai com as crianças. A
psicométrica confiável e válida da periculosi- determinação de um diagnóstico mental só terá
dade. Segundo revisão teórica realizada por sentido se estiver diretamente relacionada à
Espada (1986), existem autores que demons- produção de condutas relacionais considera-
tram as deficiências dos testes e escalas, quanto das incapacitantes. Geralmente, o diagnóstico
a este tipo de previsibilidade, sugerindo valo- nos traz poucos dados sobre as habilidades
rizar-se com mais intensidade as observações parentais, práticas e motivações. O conceito de
extraídas da história prévia, em relação ao com- competência requer a descrição do que o pai
portamento agressivo e violento; por outro pensa, faz, conhece e acredita, bem como do
lado, existem trabalhos que demonstram esta- que ele é capaz de vir a fazer como agente cui-
bilidade nos padrões de conduta agressiva ao dador (Grisso, 1986).
longo dos anos. Assim, sugere que o psicólo- Melton e colegas (1997) apontam para dois
go forense não teria outra opção do que mo- pontos básicos na avaliação de pais de crian-
derar suas opiniões acerca das previsões sobre ças maltratadas e abusadas. Primeiramente, a
a reincidência, buscando uma ampla combina- avaliação deve ser funcional, isto é, o foco deve
ção de métodos de avaliação para levantar suas estar na competência parental quanto à rela-
hipóteses preditivas. ção com a criança, e nunca em uma caracterís-

PSICODIAGNÓSTICO – V 193
tica pessoal individual. O pai e a mãe serão estão sendo produzidas por pressão direta por
sempre avaliados em relação a uma determi- parte dos pais ou por vínculos de lealdade.
nada criança e em um certo contexto. Em se-
gundo lugar, em função da multiplicidade de
fatores envolvidos, a avaliação deve ser feita A AVALIAÇÃO DE DANOS PSÍQUICOS PARA
em amplo aspecto, de modo que tanto os pais RESSARCIMENTO (DANO MORAL)
quanto as crianças devem ser entrevistados, e,
sempre que possível, devem ser entrevistados Segundo a literatura jurídica, a indenização do
juntos, sendo observados no setting natural. dano patrimonial já existiria há mais de dois
A avaliação deve ultrapassar a díade e a pró- mil anos nas organizações sociais, porém, o
pria psicologia, atingindo o entorno social, de dano moral ou extrapatrimonial teria ingres-
modo a apreciar os recursos da família exten- sado de forma consistente no direito civil ape-
siva e da própria comunidade. Na medida em nas no século passado. A principal contesta-
que essa competência é compreendida dentro ção a este tipo de ressarcimento diz respeito à
de um continuum, é importante o psicólogo impossibilidade de valorar-se as perdas ligadas
conscientizar-se de seu papel de julgador quan- ao afeto, à moral ou à imagem pessoal. Mas,
to ao grau de incongruência entre as habilida- seus defensores referem que, apesar da dor
des parentais e as necessidades da criança, pois não ter preço, é possível uma compensação.
é a definição deste nível que o orientará quan- Na legislação brasileira, a promulgação da
to à tomada de posição no que se refere à reti- nova Constituição de 1988 veio reforçar esta
rada ou manutenção do pátrio poder. idéia, referindo textualmente os direitos de
Na disputa de guarda dos filhos e determi- ressarcimento por dano à imagem e ao dano
nação de visitas, a avaliação psicológica não moral.
necessita a confirmação de uma incompetên- Essa evolução na área jurídica trouxe uma
cia ou incapacidade, por parte de um dos ge- nova demanda para as perícias psicológicas.
nitores, para que o outro possa receber as crian- Atualmente, é fato bastante comum os psicó-
ças em seu cuidado. Para Grisso (1986), a maio- logos forenses que trabalham na área cível se-
ria das decisões sobre guarda de filhos envol- rem requisitados para a avaliação do dano
ve uma comparação entre as qualidades relati- moral ou psicológico. Apesar do interesse do
vas dos pais – que apresentam, à sua própria Judiciário de buscar ajuda na avaliação psico-
maneira, méritos e responsabilidades – quan- lógica para poder mensurar, de forma mais
to às necessidades e interesses das crianças. justa, as perdas sofridas pela vítima, os psi-
Em nossa realidade, a valorização do direito cólogos têm evoluído lentamente quanto à
de igualdade no exercício do pátrio poder pelo sua instrumentalização para este tipo de
pai e pela mãe já é garantido por lei, segundo abordagem. Se, por um lado, os juristas jus-
o Estatuto da Criança e do Adolescente; po- tificam ser essência do dano moral a arbitra-
rém, os autores alertam para a estereotipia de gem do juiz (Azevedo Jr., 1996), não cabe aos
papéis existentes em nossa sociedade, de for- peritos psicólogos se utilizarem de critérios
ma a tender a contemplar à mãe a posse dos não-científicos.
filhos menores. Dolto (1989) ressalta que os Com esta abordagem, Castex (1997) traz a
filhos menores deveriam ficar com o genitor proposta de diferenciar o dano psíquico do
que exercesse o papel de “guardião maternali- dano moral, de forma que caberia ao técnico
zante”, o qual, em muitas famílias, não é exer- de saúde mental avaliar o primeiro, e aos agen-
cido pela mãe. Assim, nessa avaliação das re- tes jurídicos arbitrar sobre o segundo. Explica
lações entre pais e filhos, é necessário também que, apesar de conceitualmente o dano psíqui-
ouvir as crianças quanto aos seus próprios in- co ter um constructo próprio, diferenciado do
teresses em permanecer com um dos genito- dano moral, se aproximaria deste por não po-
res. Essas informações devem ser consideradas der prescindir do discurso jurídico. O dano psí-
de forma parcimoniosa, avaliando o quanto quico emergiria em uma tarefa psicológico-fo-

194 JUREMA ALCIDES CUNHA


rense, através da atividade de peritos especia- Na literatura mundial, encontram-se tabe-
listas na área mental. las para mensuração do dano psíquico, porém,
O mesmo autor procura diferenciar a no- em nosso meio, elas se restringem apenas aos
ção de dano psíquico daquele utilizado na clí- danos de natureza física. Gomes e colegas
nica. Sob o enfoque forense, o dano supõe a (1998), em um primeiro livro editado no Brasil
existência de uma agressão produzida por um sobre dano psíquico na área forense, sugerem
evento sobre o psiquismo de uma pessoa, de que se adapte uma classificação proposta por
forma a provocar uma perturbação, distúrbio, Miotto, em que se privilegia a avaliação de duas
disfunção, transtorno e/ou diminuição de uma variáveis: a gravidade do quadro psicopatoló-
dimensão vital, de modo a caracterizar-se como gico e a possibilidade de reversibilidade. A clas-
dano não-patrimonial. Em outras palavras, sificação apresenta-se em três categorias:
podemos dizer que haverá um dano psíquico, a) leve: que se refere a uma conformação
em um determinado sujeito, quando este apre- patológica de índole reativa, que não compro-
sentar uma deterioração, disfunção, distúrbio mete substancialmente a vida de relação e,
ou transtorno que, afetando suas esferas afe- portanto, não requer tratamento em forma
tiva e/ou intelectiva, limita sua capacidade de permanente;
gozo individual, familiar, laboral, social e/ou b) moderado: que implica a existência de
recreativo. sintomas manifestos, com acentuação persis-
Retornando à noção de dano moral, pode- tente das características prévias de personali-
mos dizer que este conceito supõe o sofrimen- dade e necessidade de tratamento, não infe-
to e a dor que se padece, independentemente rior a um ano (por exemplo, as depressões, as
de qualquer repercussão de ordem patrimoni- crises de pânico, as crises conversivas, as fo-
al; porém, não se constitui necessariamente em bias, as obsessões);
um dano psíquico. A diferença entre ambos é c) grave: que envolve a irreversibilidade do
que, neste último (dano psíquico), há uma le- quadro psicopatológico, inibindo marcante-
são, parcial ou global, ao funcionamento psi- mente a adaptação.
cológico de uma pessoa; enquanto, no primei- É importante salientar que essas perdas
ro (dano moral), se identifica apenas o sofri- devem ser sempre analisadas em função de
mento, conceito que remete a uma dimensão uma personalidade e de um nível de funciona-
de perturbação psicofísica, que coloca o sujei- mento psíquico prévio. A literatura estrangei-
to entre a enfermidade e o pleno gozo da saú- ra é favorável a responsabilizar o agressor, in-
de, não implicando uma conformação patoló- dependentemente do nível de vulnerabilidade
gica. existente na vítima em período anterior ao trau-
Assim, o sofrimento, enquanto expressão ma (Simon, 1995), fato que também se tem
de uma lesão aos sentimentos de uma pessoa, observado em nossa realidade. Assim, a práti-
também chega a limitar o gozo da plena saú- ca demonstra a importância de uma investiga-
de inerente à personalidade e, por isso, se cons- ção cuidadosa da personalidade pré-mórbida,
titui em uma espécie de dano, no caso do dano com a reconstrução da adaptação prévia ao
moral. Mas, enquanto não se constituir em um trauma, de forma a fazer-se uma comparação
quadro de patologia, escapa ao horizonte pe- com o funcionamento psíquico após o trau-
ricial psicoforense, e a avaliação do sofrimen- ma. As alterações observadas entre o período
to restringe-se à competência dos agentes ju- pré e pós-traumático é que deverão nortear as
rídicos. conclusões do laudo psicológico.

PSICODIAGNÓSTICO – V 195
Avaliação retrospectiva: autópsia
psicológica para casos de suicídio*
Blanca Guevara Werlang
18
O mundo em que vivemos está voltado para
o progresso e para a produtividade. Neste
contexto, a morte por suicídio estabelece um
vários ângulos e múltiplos enfoques, tendo
possibilitado muitas discussões teóricas e ge-
rado um número significativo de publicações.
contra-senso, um paradoxo. É algo que choca Assim, vários métodos têm sido utilizados
e impressiona mais, porque coloca em evidên- para abordar esse tema, tendo sido possível
cia uma situação psicológica mais difícil de se identificar a sua associação com diversas va-
aceitar – que é o fato do indivíduo optar livre- riáveis demográficas, psicossociais e psiquiá-
mente pela sua própria morte. Constitui-se, tricas. Mas, apesar dos avanços nessa área e
assim, em um dos fenômenos mais intrigan- dos cuidados tomados pelos cientistas, tem
tes, para psicólogos e psiquiatras, demonstran- sido difícil compreender as características pes-
do, certamente, que ainda “um dos maiores soais dos sujeitos que realmente cometem sui-
enigmas continua sendo a relação do homem cídio, por não serem passíveis nem de avalia-
com sua vida e, conseqüentemente, com sua ção direta, nem de tratamento de qualquer
morte, já que começamos a nos convencer de espécie.
que a morte é parte da vida, e a maneira de O principal problema, sem dúvida, é saber
morrer é parte integral da maneira de viver de como predizer que indivíduos, potencialmen-
um indivíduo” (Farberow & Shneidman, 1969, te suicidas, vão transformar suas fantasias e/
p.XI). ou ideações em atos concretos. Em função dis-
Procurando compreender essa maneira de so, Litman (1996) afirma que, “no presente
morrer e, mais especificamente, as causas que estado de nosso conhecimento, somos inca-
levam um sujeito a terminar com sua vida, o pazes de prognosticar suicídio” (p.3).
suicídio tem sido estudado e interpretado sob Entretanto, segundo a literatura, há uma
possibilidade de chegar à compreensão do sui-
cídio (ato de se matar intencionalmente) atra-
*Fragmentos de tese de doutorado em andamento no vés de exames retrospectivos. Esta análise re-
curso de Pós-graduação em Ciências Médicas (Área de trospectiva tem possibilitado identificar comu-
Saúde Mental) da Universidade Estadual de Campinas, nicações prévias da intenção de se matar do
bem como de comunicações científicas (VIII Congresso falecido. Sabe-se, assim, que 75% (Litman,
Nacional de Avaliação Psicológica, Porto Alegre, 1999,
1996) ou 90% (Shneidman, 1994) dos casos
e III Congresso Ibero-americano de Psicologia Jurídica,
São Paulo,1999). comunicam previamente a intenção suicida a

196 JUREMA ALCIDES CUNHA


familiares e amigos, o que demonstra que, num homicídio ou suicídio, é bem difícil de precisar.
significativo número de casos, o suicídio não é Especialistas em saúde mental, como cientis-
resultado de um ato repentino e impulsivo, e tas habilitados na compreensão psicológica,
sim, de um plano premeditado, desenvolvido poderão fornecer, conduzindo autópsias psi-
gradativamente. cológicas, informações relevantes para deter-
A avaliação retrospectiva possibilita, então, minar o modo de morte, assessorando, assim,
observar pistas diretas ou indiretas relaciona- os peritos legistas.
das àquele comportamento letal que estava por Para Shneidman e colegas (1969), a causa
vir, permitindo, através do método que se con- da morte, determinada pelo toxicólogo, pelo
vencionou chamar de autópsia psicológica, bioquímico ou pelo patologista, pode ser clara
compreender os aspectos psicológicos de uma e precisa, mas a maneira da morte pode ser
morte específica, esclarecendo o modo da duvidosa, enfatizando que o sine qua non do
morte, refletindo a intenção letal ou não do suicídio é a intenção de autodestruir-se, e esta
falecido. intenção pertence ao domínio psicológico.
A autópsia psicológica foi desenvolvida no Dentro dessa mesma concepção, Curphey
final da década de cinqüenta, nos Estados Uni- (1969), como médico patologista, entende que
dos, no Centro de Prevenção de Suicídio (CPS), cabe ao psicólogo a função de coletar os da-
em Los Angeles (Curphey, 1969; Litman, Cur- dos, através da autópsia psicológica, para di-
phey, Shneidman et alii, 1963; Shneidman, ferenciar a morte por suicídio das que têm
1969; Shneidman & Farberow, 1969; Shneid- outra origem, objetivando compreender a in-
man, Farberow e Litman, 1969). O programa tenção de autodestruição e afirmando que a
desse Centro tinha como finalidade prevenir intenção não é um assunto de química, nem
futuramente o comportamento suicida, utili- de tecidos, e sim, de natureza psicológica.
zando o método de autópsia psicológica para Assim, entendendo o suicídio como o ato
investigar as circunstâncias em que o suicida de se matar intencionalmente e a autópsia psi-
encontrava sua morte, procurando estabelecer cológica como uma forma de avaliar, após a
a intencionalidade de sua ação, esclarecendo morte, o que estava na mente da pessoa antes
se o modo da morte foi por suicídio ou por da morte, pode-se conceitualizar a autópsia
morte natural, acidental ou homicídio. psicológica como um tipo de estratégia de ava-
Shneidman e colegas (1969), como inte- liação restrospectiva, que tem como finalida-
grantes desse Centro, passaram a prestar as- de reconstruir a biografia da pessoa falecida
sessoramento aos médicos forenses. Portanto, por meio de entrevistas com terceiros (cônju-
em casos duvidosos, realizava-se o método de ge, filhos, pais, amigos, professores, médicos,
autópsia psicológica para se obter informações etc.) e da análise de documentos (pessoais, po-
psicológicas valiosas para classificar com maior liciais, acadêmicos, hospitalares, auto da ne-
precisão o registro de suicídio no certificado cropsia, etc.) (vide Figura 18.5).
de óbito, preenchendo uma lacuna, uma fa- Pode-se dizer, então, que a autópsia psicoló-
lha, na certificação da causa de morte. gica é um procedimento retrospectivo com dife-
Através de técnicas específicas para inspe- rentes abordagens (vide Figuras 18.1 a 18.5).
ção externa do cadáver, o médico legista colhe Há, pois, quatro questões básicas a serem
dados que possibilitarão conclusões claras a respondidas na autópsia psicológica: “Por
respeito da causa da morte. Entretanto, a de- quê?”, “Como?”, “De quê?” e “O quê?” E há
terminação da causa não indica, necessaria- quatro constructos subjacentes (vide Figura
mente, o verdadeiro modo da morte. Por exem- 18.1) à estratégia da autópsia psicológica: mo-
plo, um sujeito encontrado morto dentro de tivação, intencionalidade, letalidade e precipi-
uma piscina receberá certamente, concluída a tadores e/ou estressores. A motivação poderá
perícia, a certificação como causa de sua mor- ser compreendida pela identificação das razões
te o registro de asfixia por afogamento. Con- psicológicas para morrer, enraizadas na con-
tudo, se o modo de sua morte foi acidente, duta, no pensamento, no estilo de vida e na

PSICODIAGNÓSTICO – V 197
{

Figura 18.1.
{ {
{
{

Figura 18.2.
{
personalidade como um todo. A avaliação do da escolha do método. Os precipitadores e/ou
grau de lucidez, ou seja, do papel consciente do estressores são os fatos ou circunstâncias que
próprio indivíduo, no planejamento, na prepara- acionariam o último empurrão para o suicídio.
ção e na objetivação da ação autodestrutiva, es- A autópsia psicológica é, então, um tipo de
tabelecerá a intenção do sujeito. O grau de le- avaliação psicológica que enfoca o elemento
talidade será medido através da identificação que está faltando: a intenção do morto em rela-

198 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 18.3.

Figura 18.4.

ção à sua própria morte, e, considerando que a ch, 1992; Ebert, 1991; Isometsa, Heikkinen,
maioria das vítimas comunica de alguma manei- Henriksson et alii, 1997; Jacobs & Klein, 1993;
ra suas intenções, cabe aos psicólogos e psiquia- Jacobs & Klein-Benheim, 1995; Kelly & Mann,
tras encontrar as pistas deixadas atrás por elas. 1996; Litman, 1984; Litman, 1989; Shafii, Car-
Entretanto, as estratégias para identificar rigan, Whittinghill et alii, 1985; Shneidman,
tais pistas variam de autor para autor. A litera- 1981) quanto ao que se refere à forma de con-
tura especializada deixa claro que falta, ainda, tato, momento da realização da entrevista,
um modelo de procedimento estruturado, tan- duração e número de entrevistas e número de
to no que diz respeito ao roteiro básico e/ou informantes.
tópicos que devem ser incluídos (Beskow, Ru- Contudo, existem vários estudiosos que,
neson & Asgard, 1991; Clarck & Horton-Deuts- com o objetivo de diminuir os problemas de

PSICODIAGNÓSTICO – V 199
Figura 18.5.

ordem metodológicos dessa estratégia, têm 1974; Spellman & Heyne, 1989), suicídios de
sugerido padrões ou critérios para a condução crianças, adolescentes, adultos jovens e idosos
de uma autópsia psicológica (Clarck & Horton- (Alexopoulos, 1991; Brent,1989; Lau, 1994;
Deutsch, 1992), enquanto outros têm se es- Marttunen, Aro & Lönnqvist, 1993; Rich, Sher-
forçado em avaliar a confiabilidade do méto- man e Fowler, 1990; Shaffer, Gould, Fisher et
do (Brent, Perper, Kolko et alii, 1988; Brent, alii,1996; Younger, Clark, Oehmig et alii, 1990),
Perper, Moritz et alii, 1993; Kelly & Mann, 1996; em sujeitos com morte duvidosa (Berman,
Terroba & Saltijeral, 1983). 1993; Kelly & Mann, 1996; Litman, 1984; Lit-
Sem dúvida, a primeira utilidade da autóp- man, 1989; Litman, Curphey, Shneidman et alii,
sia psicológica foi a de melhorar a exatidão do 1963; Shneidman & Farberow, 1969) e em pes-
veredicto de suicídio nos certificados de óbi- soas suicidas de diferentes idades do meio urba-
tos, mas, o método também tem sido usado, no e rural (Asgard, 1990; Finkel & Rosman, 1995;
em estudos científicos de suicídios de sujeitos Isometsa, Heikkinen, Henriksson et alii, 1997).
com diagnósticos de esquizofrenia (Farberow, Levantando o acervo de publicações exis-
Shneidmann & Leonard, 1969; Heilae, Isomet- tentes nos bancos de dados computadoriza-
sae, Henrriksson et alii, 1997), de depressão dos, existe um significativo número de estu-
maior (Isometsa, Aro, Henriksson et alii, 1994; dos nas linhas Medline, Psyclit e Lilac, o que
Isometsa, Henrikson, Aro et alii, 1994) e de al- nos permite afirmar que a autópsia psicológi-
coolismo (Heikkinen, Aro, Heriksson et alii, ca tem sido um método aceito e muito utiliza-
1994), como ferramenta em intervenções em do para delinear as características psicológicas
crise, em equipes psiquiátricas, de hospital e sociais de vítimas de suicídio, por quase três
geral e de presídio, após suicídios de pacientes décadas. Pode-se, de certa forma, dizer, como
ou apenados (Neill, Benensohn, Farber et alii, expressa Selkin (1994), que “a autópsia psico-

200 JUREMA ALCIDES CUNHA


lógica é para a suicidologia como uma entre- Para a ciência da psicologia, esse tipo de
vista é para o desenvolvimento da ciência da estudo é uma importante contribuição, já que
psicologia” (p.74). Dessa forma, a autópsia o psicólogo, que trabalha em avaliação psi-
psicológica tem demostrado ser útil como ins- cológica, precisa contar não só com sua qua-
trumento de pesquisa e avaliação clínica. En- lificada experiência clínica para saber admi-
tretanto, em nosso meio, é ainda um tipo de nistrar e avaliar uma determinada técnica,
avaliação pouco divulgado. Portanto, cabe lem- mas também necessita ter a seu alcance ins-
brar que se trata de uma estratégia de avalia- trumentos fidedignos e válidos adaptados à
ção complexa, ainda sem um modelo de pro- realidade brasileira, para não fazer inferên-
cedimento estruturado, que exige a definição cias errôneas.
prévia tanto da nomenclatura usada para con- Por outro lado, a psicologia e psiquiatria
ceitualizar o suicídio como dos critérios espe- clínica, valendo-se de uma estratégia para re-
cíficos nos procedimentos da investigação no construir o perfil psicológico da vítima de sui-
que se refere à forma do contato (carta, tele- cídio, poderá, entre outras contribuições, em-
fone, pessoalmente), momento para o primei- basar programas de prevenção, corroborando
ro contato (velório, após alguns dias ou me- e/ou identificando novos fatores de risco e cor-
ses), momento para a realização da entrevista, relatos sociodemográficos, assim como cola-
duração e número de entrevistas e números borar com os médicos legistas e com os profis-
de informantes, o que deixa muitas vezes o pro- sionais da área do direito penal e cível, no es-
fissional inseguro e sem um grau razoável de clarecimento de casos de morte e processos
certeza para emitir conclusões. judiciais. Assim, a autópsia psicológica é uma
Ciente desse problema e entendendo que estratégia muito utilizada para delinear as ca-
o suicídio constitui um fenômeno presente, sus- racterísticas psicológicas de vítimas de morte
citando em nós, técnicos de saúde mental, a violenta, auxiliando na investigação, em que
preocupação de auxiliar na promoção da saú- não existem elementos suficientes para deci-
de, torna-se fundamental diminuir os proble- dir se se trata de suicídio, homicídio ou aci-
mas de ordem metodológica dos recursos de dente, permitindo também esclarecer, retros-
avaliação disponíveis. pectivamente, a capacidade da pessoa já fale-
Dessa maneira, estamos desenvolvendo cida para reger-se a si mesma, administrar seus
uma entrevista semi-estruturada para a autóp- bens e tomar decisões no momento em que
sia psicológica, trabalho que representa uma assinou documentos legais, como testamentos,
tentativa de sistematização dos subsídios co- seguros de vida, certidões de casamento, re-
lhidos na literatura especializada, principalmen- núncia de propriedades, etc. Do ponto de vis-
te quanto à compreensão do fenômeno do ta clínico, ainda, pode ter efeitos terapêuticos
suicídio, investigando a aplicabilidade desse para os sobreviventes enlutados, que têm o
instrumento para a autópsia psicológica. papel de informantes na entrevista.

PSICODIAGNÓSTICO – V 201
MÓDULO VII – Catálogo de Técnicas Úteis

Jurema Alcides Cunha

“Embora o conhecimento geral referente a testes e à construção


de testes seja essencial, os psicólogos, em sua prática, devem con-
siderar uma ampla série de questões adicionais, para enquadrar os
procedimentos de testagem e a atribuição dos escores num con-
texto apropriado.”
Groth-Marnat, 1999, p.36

E m nosso trabalho de ensino e supervisão,


muitas vezes pareceu que um guia de refe-
rência, como este, seria de muita ajuda para
idade e outras características do sujeito, bem
como ter alguma informação sobre manejo.
A ênfase é dada ao enfoque clínico. Assim,
psicólogos. A sua inclusão nas edições ante- só excepcionalmente será incluída alguma in-
riores foi considerada útil e prática. formação adicional, como, por exemplo, sobre
A idéia foi de oferecer um guia de referên- características psicométricas de instrumentos
cias rápidas para psicólogos, reunindo infor- que, embora consideradas extremamente úteis
mações gerais e sucintas sobre técnicas úteis. para o psicólogo clínico, podem ser encontra-
Como já foi referido anteriormente, para das em fontes especializadas. Portanto, no Ca-
que o plano de avaliação com enfoque clínico tálogo, não há subsídios adequados também
seja devidamente operacionalizado, precisam para a escolha de instrumentos de pesquisa.
ser escolhidas estratégias que permitam obter Trata-se apenas de um leque de alternativas de
as respostas adequadas às questões propostas técnicas (testes, inventários, escalas, técnicas
inicialmente. Entre as possíveis estratégias, há projetivas, etc.) consideradas úteis para o psi-
muita diversidade de instrumentos psicológi- codiagnóstico.
cos e é importante o psicólogo ter fácil acesso De um modo geral, são mantidas as princi-
a informações a respeito, para fazer rapidamen- pais técnicas incluídas em edições anteriores,
te as melhores opções, conforme as hipóteses tendo-se procurado, sempre que possível, atu-
levantadas e as características do examinan- alizar informações. Não obstante, são excluí-
do. Como já salientava, em 1983*, Weiner, a com- das algumas técnicas menos utilizadas (ou cujo
petência do psicólogo exige que saiba com pre- material tem se comprovado pouco acessível
cisão o que pode obter de seus instrumentos. no Brasil) e acrescentadas outras, mais recen-
Além disso, também é importante ter em tes ou que, de alguma forma, parecem úteis
mente ou revisar qual a forma de administra- (ou algo populares) no momento. Por outro
ção, qual o tempo previsto para administrá- lado, os textos citados são identificados nu-
los, qual o material mais indicado, conforme a mericamente e, sempre que oportuno, são in-
cluídas outras fontes bibliográficas, como su-
gestão para leituras subsidiárias, numa lista que
de forma alguma pretende ser exaustiva, abran-
*Weiner, I.B. (1983). The future of psychodiagnostic
revisited. J. Pers. Assess., 47, 3, 451-460. gendo apenas alguns trabalhos importantes.

202 JUREMA ALCIDES CUNHA


Para facilitar a localização, os instrumentos Tanto a percepção dos estímulos como a
de avaliação psicológica não constam confor- resposta motora e expressiva a eles não cons-
me sua classificação por tipo, mas são distri- tituem processos simples, porque envolvem
buídos por ordem alfabética dos nomes ou si- a experiência de uma personalidade [5], que
glas pelas quais são mais conhecidos. pode refletir efeitos do desenvolvimento neu-
Aproveitamos, também, este espaço para ropsicológico, do funcionamento cerebral
externar nosso reconhecimento às co-autoras menos ou mais intacto, de uma multiplicida-
da obra original, que permitiram que o deline- de de fatores conscientes, inconscientes, in-
amento inicial deste Catálogo tomasse corpo, telectuais e, mesmo, fisiológicos. Portanto,
bem como a muitas pessoas, as quais é impos- quando o sujeito entra em contato com os
sível enumerar, que nos forneceram subsídios estímulos, percebê-los e reproduzi-los não
extremamente importantes. representam apenas uma tarefa de aprendi-
zagem, mas um desempenho em que intera-
ge um grande número de variáveis [6]. En-
BENDER (B-G) tão, o fato de constituir uma técnica, que
pode ser interpretada ora sob uma ótica pro-
Dados históricos jetiva, ora que pode permitir o exame de fun-
ções visoconstrucionais, numa avaliação neu-
O Teste Gestáltico Visomotor, também conhe- ropsicológica, também justifica sua popula-
cido como Teste de Bender, simplesmente ridade [3].
Bender ou, abreviadamente, B-G ou BGVMT A complexidade dos fatores envolvidos na
(Bender-Gestalt Visual Motor Test), está his- percepção e cópia de uma série de figuras geo-
toricamente associado a estudos clássicos, métricas, delineadas a partir dos desenhos de
realizados sobre percepção, na década de 20, Wertheimer, começou a ser investigada já an-
por Wertheimer. Na realidade, coube a Paul tes de 1932, por Bender, primeiramente estu-
Schilder, também familiarizado com os prin- dando a inteligência infantil (a partir do nível
cípios gestálticos, a pressuposição de que a de maturação nas reproduções gráficas), de-
percepção visual, exigida para realizar os pois passando a investigar a deficiência men-
desenhos, envolvia fatores de personalidade, tal (identificada através de desvios na maturi-
estimulando outros a explorar melhor tal re- dade esperada) e vários quadros clínicos. Os
lação. Em particular, sua esposa, Lauretta resultados iniciais desses estudos foram divul-
Bender, passou a investigar as formas de re- gados inicialmente pela American Orthopsychi-
produção dos desenhos de Wertheimer, em atric Association, como o Research Monogra-
vários tipos de psicopatologia, embora o tes- ph no 3, em 1938; e apareceram com o título
te tenha vindo a ser utilizado com finalida- de A Visual-Motor Gestalt Test and its clinical
des psicodiagnósticas somente por Hutt e use [7].
outros, devido a exigências da Segunda Guer- Talvez em parte devido à forma de divul-
ra Mundial [1]. gação inicial, os primeiros investigadores
A sua origem histórica, associada com a confeccionaram suas próprias lâminas com
definição da função gestáltica [2], deve contri- base nos desenhos da publicação original. So-
buir para sua popularidade como técnica grá- mente a partir de 1946, depois de registrado
fica, muito estudada e pesquisada, sendo ob- o Copyright da Psychological Corporation, fo-
jeto também de muitos trabalhos teóricos [3]. ram as lâminas reproduzidas em série auto-
Por outro lado, embora a designação do Teste rizadas. Hutt, em sua adaptação do Bender-
de Bender mereça críticas, uma vez que se ori- Gestalt [8], utilizou os desenhos originais de
ginou do estudo sobre leis gestálticas, sendo Wertheimer, sendo, pois, sua série diferente
reivindicado o nome de Bender Gestáltico [4], da publicada com a autoria de Lauretta Ben-
não deixa de estar entre os testes mais utiliza- der [1]. Portanto, para usar a adaptação de
dos, seja com o nome que for. Hutt, a série indicada é a publicada por Gru-

PSICODIAGNÓSTICO – V 203
ne & Stratton. Também são diferentes as sé- Descrição
ries de Halpern, Pascal e Suttel e Woltman, o
que explica divergências entre achados de A técnica é constituída por nove desenhos ge-
pesquisa [2]. ométricos, utilizando pontos, linhas retas e
Embora a monografia inicial não tenha in- curvas, ângulos, dispostos numa variedade de
cluído instruções, estas apareceram em 1946, relações, de forma a se estruturarem como
mas, apesar disso, não existe procedimento- configurações ou Gestalten, baseadas em ilus-
padrão a respeito, o que poderia explicar tam- trações da obra clássica de Wertheimer, Stu-
bém, em parte, a variabilidade de dados das dies in the Theory of Gestalt Psychology [6].
pesquisas. São apresentadas em lâminas ou cartões, com
Da mesma forma, a partir das considera- uma figura A, introdutória, e mais oito dese-
ções clínicas iniciais de Bender [7], multipli- nhos, que devem ser reproduzidos pelo exami-
caram-se os sistemas de inspeção dos proto- nando.
colos, desde uma abordagem mais global, in- Existem diversas edições, com variações
tuitiva (ou até subjetiva), inferencial ou atra- quanto a detalhes formais dos desenhos, quan-
vés de métodos objetivos de escore. Em re- to ao número de unidades e até quanto ao
sumo, o instrumento possibilita tanto uma número de desenhos, como, por exemplo, no
exploração nomotética do indivíduo como sistema de Santucci e Percheux, que abrange
idiográfica. Por essas razões, é levantada a somente cinco figuras [26]. É extremamente
questão de se o Bender deveria ser conside- importante utilizar o conjunto de lâminas cor-
rado um teste (no sentido psicométrico), uma respondente ao sistema de escore que se pre-
técnica projetiva ou, simplesmente, uma for- tenda usar.
ma de abordagem projetiva [2]. Há décadas A série de lâminas originais é editada pela
que se registram tentativas de investigar o Paidós, em Buenos Aires, e distribuída no Bra-
valor simbólico dos estímulos (vide, por sil pelo CEPA e suas concessionárias. Também
exemplo, 9-16). é encontrada em anexo ao livro Bender infan-
Em relação às formas do teste, também tem til [18], distribuído pela Editora Artes Médicas.
havido variação, tanto quanto aos estímulos, Outras séries têm distribuição específica, como
já referida, como pela introdução de modelos a utilizada por Santucci, neste caso por Dela-
plásticos [6, 17], como a elaboração por me- chaux e Niestlé, em Paris.
mória [14, 18, 19], a associação com palavras É uma técnica utilizada a partir dos 4 anos
ou a associação livre, também ligada à identi- de idade, com crianças, adolescentes e adul-
ficação de respostas simbólicas e populares [8- tos.
11, 13, 18, 20-22].
Em relação aos campos de aplicação, em-
bora tenham sido citados variados usos como Administração
legítimos, não há evidências conclusivas a res-
peito de muitos deles, registrando-se resulta- Forma: individual ou coletiva.
dos de pesquisas discordantes [2, 17]. Não Tempo: em adultos normais, 15 minutos,
obstante, nos últimos anos tem se comprova- no máximo (se é utilizado o Bender-Memória,
do como uma técnica especialmente útil no 15 minutos adicionais e, ainda mais, se intro-
campo da neuropsicologia [1, 23, 24], em es- duzidas as fases de elaboração e associação);
pecial na avaliação de déficits em alcoolistas em crianças, em média, de 7 a 9 minutos [27].
[25], e para o diagnóstico diferencial em psi- Manejo: existem vários sistemas de escore,
copatologia [1, 24]. sendo mais utilizados, para adultos, o de Pas-
Dada a sua facilidade de administração e cal e Suttel (1951), o de Hain (1964) e o de
sua versatilidade, vários autores o consideram Hutt (1985) e, para crianças, o de Koppitz
como o teste mais freqüentemente utilizado (1971), o de Clawson (1980) e o de Santucci e
nos Estados Unidos [3]. Percheux (1968), sem considerar aqui os ma-

204 JUREMA ALCIDES CUNHA


nejos mais clínicos e intuitivos, em que não são gência entre dados de pesquisa, como também
fundamentais os aspectos quantitativos. como fatores que têm implicações no ensino,
no treinamento de equipes auxiliares, no uso
clínico e na condução de pesquisas.
Indicações 2. Outro aspecto importante a ser lembra-
do diz respeito à validade do Bender como
1. Medida de inteligência de crianças de 4 medida. Tem sido observado [2], com muita
a 12 anos ou de adolescentes e adultos, com razão, que o que determina que um teste seja
“idade mental” correspondente [7, 17]. ou não usado é mais a “impressão” do psicó-
2. Medida da maturação visomotora ou logo quanto ao seu valor do que resultados de
perceptual [26-29], investigação de alterações trabalhos de pesquisa. Nota-se, especialmente
do desenvolvimento neurológico [30], de sinais em países menos desenvolvidos, que se há in-
sugestivos de comprometimento neurológico dicações simples e acessíveis sobre a interpreta-
[28, 31], de problemas de ajustamento [18, 28, ção de um teste que, por sua vez, seja prático
31] e avaliação do aproveitamento escolar [28] e econômico, muitos psicólogos deixam-se fa-
em crianças. cilmente influir por hipóteses interpretativas,
3. Triagem de disfunção cerebral [1, 8, 17, que conciliam com a sua sensibilidade clínica,
23, 24, 32-37], identificação de alguns tipos não dando grande importância a resultados de
de lesão cerebral, particularmente no lobo pa- pesquisa que podem contradizer a “evidência”
rietal direito, ainda que certos erros específi- encontrada.
cos possam ocorrer em lesões focais à direita 3. Embora há mais tempo tenham sido re-
ou à esquerda [3]. Em resumo, o Bender discri- feridas [17] escassas evidências para avaliação
mina alguns tipos de déficits, embora muitas de efeitos de tratamento, um trabalho mais re-
outras condições possam influenciar o desem- cente [3] registra a documentação, através do
penho e o produto [1]. Bender, de melhoras no estado neuropsicoló-
4. Avaliação de déficits cognitivos em de- gico em alcoolistas, em sujeitos com a doença
pendentes do álcool e seguimento durante a de Parkinson, em pacientes submetidos a cer-
abstinência [3, 19, 25, 38-40]. tas cirurgias cerebrais e em pacientes com obs-
5. Avaliação da presença e severidade de trução pulmonar crônica. Também, no Brasil,
aspectos psicopatológicos [1, 8, 32]. foi possível demonstrar a sensibilidade do Ben-
6. Diagnóstico diferencial entre funciona- der à melhora funcional de pacientes alcoolis-
mento neurótico e psicótico [7, 8, 41]. tas em período de abstinência [25, 38, 39],
7. Levantamento de indícios de atuação [42, como também do Bender-Memória, através de
43] e, em especial, com ideação suicida [15, um novo enfoque para a sua utilização [39, 40].
16, 42, 44]. 4. Kroeff (1988) desenvolveu normas para
8. Identificação de temas de castração [13] a escala de maturidade Koppitz, com base
e de outros simbolismos de conteúdo dinâmi- numa amostra de 1.082 crianças de Porto Ale-
co [9-11, 14-16, 43]. gre. Realizou uma análise comparativa entre
resultados de crianças brasileiras e americanas,
chegando à conclusão de que, em média, as
Comentários crianças brasileiras utilizam um tempo maior
que as americanas para um desempenho de
1. A literatura específica chama muito a menor qualidade [27].
atenção sobre as variações do B-G, em relação 5. Na interpretação do Bender, é importan-
às diferenças entre séries de lâminas, aos pro- te levar em conta a existência de considerável
cedimentos de administração, às formas, em superposição de indicadores. Portanto, há in-
termos de adaptações e revisões, aos campos dicadores que possuem uma significação di-
de aplicação e aos sistemas de escore como nâmica, mas que, igualmente, podem se cons-
responsáveis não só pela discrepância e diver- tituir como sinais característicos de um siste-

PSICODIAGNÓSTICO – V 205
ma de escore para triagem de disfunção cere- 15. Cunha, J.A. (1977). Sinais simbólicos de agressão
bral ou compor uma determinada síndrome no Teste de Bender e a dimensão normalidade-anor-
malidade. Porto Alegre: Instituto de Psicologia da
psicopatológica. Por tal razão, Groth-Marnat PUCRS (Dissertação de mestrado).
[45] diz que o psicólogo deve estar atento para 16. Cunha, J.A. (1977). Suicídio e o Teste de Bender.
todas as alternativas diagnósticas na interpre- Porto Alegre: Instituto de Psicologia da PUCRS (Tese
tação de um determinado sinal. Já sob o nosso de livre-docência).
ponto de vista, recomendamos evitar qualquer 17. Billingslea, F.Y. (1965). The Bender-Gestalt: a review
and a perspective. In B.I. Murstein, Ed. Handbook
interpretação de enfoque projetivo se houver of projective techniques (p.703-726). New York:
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rológico. 18. Clawson, A. (1980). Bender infantil. Porto Alegre:
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J.A. (1989). Exame da melhora da disfunção orgâ- [1], mais conhecido pelo nome de seu autor, é
nica cerebral, através do Bender-Lacks, em alcoo- um teste de desenhos que devem ser copiados
listas, durante o primeiro mês de abstinência. São
Paulo: VII Congresso Brasileiro de Alcoolismo.
ou reproduzidos de memória.
39. Cunha, J.A., Minella, D.M.L., Argimon, I.L. & Perei- Desenvolvido como um teste de memória,
ra, I.T. (1990). Déficits cognitivos e a questão da passou a ter ampla utilização na avaliação neu-
melhora funcional em alcoolistas abstinentes. Psi- ropsicológica, dada a sua sensibilidade à pre-
co, 19, 1, 79-94. sença de lesão cerebral, explicada pelo fato do
40. Pereira, I.T., Argimon, I.L., Minella, D.M.L., & Cunha,
J.A. (1989). Sensibilidade do Bender-Memória à
desempenho exigido envolver muitas funções
melhora clínica em alcoolistas durante o primeiro diferenciadas [2]. Isso faz com que os erros
mês de abstinência. São Paulo: VIII Congresso Bra- cometidos ocorram por várias razões [3].
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44. Sternberg, D. & Levine, A. (1965). An indicator of A, B, C e D, variando o tempo de exposição e o
suicidal ideation on the Bender Visual-motor Ges- tempo para que o sujeito reproduza os dese-
talt Test. J. Proj. & Pers. Assess., 29, 3, 377-379.
45. Groth-Marnat, G. (1984). Handbook of psycholo-
nhos de memória, sendo que a administração
gical assessment. New York: Van Nostrand Reinhold. C envolve simples cópia. O sujeito é solicitado
a reproduzir graficamente os desenhos em fo-
lhas de papel de dimensões equivalentes às dos
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS cartões.
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Existem normas para adultos para as admi-
dós. nistrações A, B e C. As administrações A e C
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assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons. Não há normas para a administração D.

PSICODIAGNÓSTICO – V 207
O material técnico, incluindo os cartões, o com idade [4, 5], mas sua reversibilidade se
manual e as folhas de registro, é distribuído observa, no Benton, num prazo de seis meses
por The Psychological Corporation, nos Esta- [6].
dos Unidos, e pelo CEPA, no Brasil.

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Administração
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1. Lezak [2] observa que, embora o instru- Van Kolck, O.L. (1981). Técnicas de exame psicológico
mento seja apresentado como teste de memó- e suas aplicações no Brasil. Testes de aptidões. Pe-
ria visual, muitos dos estímulos podem ser con- trópolis, RJ: Vozes.
ceituados verbalmente, assim sendo, é sensí-
vel a lesões tanto no hemisfério esquerdo como
no direito. BINET-IV
2. Embora seja um teste sensível a grande
número de disfunções, ainda é o instrumento Dados históricos
de escolha, quando há suspeita de muitos dé-
ficits específicos, fazendo-se, então, a análise A atual escala Binet-IV tem uma longa histó-
dos tipos de erros presentes nas reproduções ria, que remonta às primeiras tentativas de dis-
gráficas [2]. criminação de “débeis mentais”, que resulta-
3. O teste tem sido bastante utilizado na ram na forma preliminar da Escala Binet-Simon,
avaliação neuropsicológica de pacientes alcoo- em 1905, seguida de uma nova versão em
listas, sendo que os déficits se relacionam com 1908, sendo publicada a versão definitiva em
a duração do período de bebida excessiva e 1911, a partir da qual surgiram várias revisões,

208 JUREMA ALCIDES CUNHA


em diferentes países, sendo mais conhecidas e mente selecionada de 3.184 sujeitos, relativa-
utilizadas as revisões preparadas na Universi- mente mais representativa da população ge-
dade de Stanford, na Califórnia. ral, sendo a noção de QI modificada em rela-
Binet tinha um objetivo que era a medida ção aos sujeitos adultos [3]. Foi considerada,
do desenvolvimento mental da criança, basea- na época, um “instrumento clássico de medi-
da em sua concepção de idade mental. Pressu- da de desenvolvimento” [1].
punha que o desenvolvimento se desse atra- A terceira revisão Stanford, de 1960, ocor-
vés de fases sucessivas, idênticas para todos reu por uma seleção de testes ou itens das for-
os sujeitos, e pretendia determinar “o nível de mas L e M, com base nos resultados de 4.498
eficiência característico da média dos sujeitos sujeitos, que já haviam se submetido ao teste,
normais de uma certa idade cronológica” [1]. para permitir a análise de itens existentes e
Historicamente, a Escala Binet-Simon represen- testagem de alterações em alguns itens, resul-
ta o primeiro esforço científico para medida tando numa única forma L-M, com 122 testes
da inteligência, como poderíamos entender e 20 alternativas [4]. Todavia, uma alternativa
hoje, bem como o primeiro teste de desenvol- importante foi introduzida: o “QI passou a ser
vimento, constituindo-se como modelo para a entendido em termos de QI de desvio, (...) com
construção de muitos testes e escalas, poste- uma média de 100 e desvio padrão de 16” [5].
riormente. Apesar do sucesso que marcou o Na revisão de 1960, não houve uma padro-
aparecimento das escalas de Binet-Simon, eram nização, mas principalmente uma seleção de
criticáveis sob alguns pontos de vista, princi- testes, com algumas adaptações no conteúdo
palmente pelo fato de que “os grupos de su- dos itens e em sua colocação. Assim, no início
jeitos normais eram muito pouco numerosos e de 1971, pareceu necessário proceder a uma
pouco representativos da população geral” [1]. nova padronização, com novas tabelas “para
Com o aparecimento imediato de uma série de refletir com precisão os resultados nos anos 70
revisões, a Escala, em sua forma original, pas- dos sujeitos das idades para as quais o méto-
sou a ser menos utilizada, sendo que, na épo- do havia sido ideado” [4], sem modificações
ca atual, não é mais usada. importantes na forma da técnica. Foi utilizada
A primeira revisão Stanford, preparada por uma amostra representativa de cerca de 100
Terman e seus colaboradores, de 1916, consti- sujeitos em cada nível de idade, num total de
tuída de 90 testes (enquanto a última versão 2.100 sujeitos. As tabelas de 1972 não intro-
Binet era de 54 testes), introduziu tantos tes- duziram modificações referentes à idade men-
tes novos, além de modificar (ou eliminar) an- tal. As “IM mantêm a continuidade entre as
tigos, redistribuindo-os nos diversos níveis de normas anteriores e as atuais”, afirmavam os
idade, que, conforme Anastasi [2], “chegou a autores, dizendo que “os novos equivalentes
constituir praticamente um novo teste”. Além de QI” envolviam “as adaptações necessárias
disso, introduziu, de forma prática, pela pri- para levar em consideração as capacidades da
meira vez, a noção de Quociente Intelectual, criança” dos anos 70 [4]. Não obstante, essa re-
ou QI, expressão criada por Stern, em 1912. visão foi muito criticada por não manter o nível
Todavia, “a introdução do QI criou problemas, da qualidade inicial da equipe de Terman [6].
em particular, aquele do limite superior do de- Em 1986, foi lançada a quarta revisão da
senvolvimento mental, que havia sido fixado Stanford-Binet, denominada Binet-IV. Em com-
por Terman em 16 anos, sendo o Quociente paração com as normas de 1972, no que se
Intelectual de um adulto calculado como ten- refere a adultos jovens, enquanto a amostra
do como idade cronológica base 16 anos” [1]. anterior incluía somente 86 sujeitos de 18 anos,
A segunda revisão Stanford, a Nova Revi- nessa revisão foi utilizada uma amostra de 194
são Stanford, apareceu em 1937, com duas sujeitos de 18 anos a 20 anos e 11 meses, numa
formas paralelas (L e M), consideravelmente tentativa de torná-la uma escala competitiva
ampliada (com 129 testes em cada forma), com as escalas Wechsler para o mesmo grupo
padronizada sobre uma amostra cuidadosa- etário. Houve muito mais rigor metodológico

PSICODIAGNÓSTICO – V 209
na seleção da amostra, sendo consideradas as Comentários
variáveis sexo, idade, raça/etnia, ocupação e
escolaridade da família [7]. A estrutura foi in- 1. Ainda não há informações suficientes
teiramente renovada, sendo retidos apenas sobre as propriedades psicométricas do instru-
poucos itens de escalas anteriores. Foi também mento, embora seja considerado por Cronba-
superado o defeito mais sério de edições ante- ch [8] “eficientemente planejado”. Já McGrew
riores, que era a predominância de tarefas ver- e Flanagan [7], como no caso de tantas outras
bais. “O examinando recebe os subtestes e os baterias, o consideram incompleto como me-
itens dentro dos subtestes, apropriados à sua dida de inteligência.
idade e capacidade” [8]. 2. Lezak [9] lamenta que, com a nova edi-
ção, tenham se perdido pequenas provas de
interesse no exame neuropsicológico, embora
Descrição concorde que ainda faltam subsídios sobre as
propriedades psicométricas em pacientes neu-
O Binet-IV é o último descendente da tradição rológicos.
Binet-Stanford, publicada por Riverside Pu- 3. Numa pesquisa de Carvajal e colegas [10],
blishing Company, por Robert A. Thorndike, foram feitos estudos correlacionais entre os
Elizabeth P. Hagen e Jerome M. Sattler. escores do Binet-IV e do WAIS-R. Apesar de ter
Compreende um conjunto de subtestes, sido encontrada certa variabilidade entre es-
cujo número e variedade dependem da idade cores de áreas e de subtestes, em parte atri-
e da capacidade do sujeito (determinada pelo buída a diferenças entre materiais, procedimen-
desempenho no subteste inicial de Vocabulá- tos, conteúdos, limites de tempo, etc., foi veri-
rio). ficado alto índice de correlação entre os esco-
Pode ser utilizado dos 2 aos 24 anos e in- res totais de ambos os instrumentos. A con-
clusive em pessoas com mais idade (embora, clusão é de que o Binet-IV é um instrumento
para tais, não haja normas específicas). viável, como escala alternativa ou para retes-
Não há adaptação brasileira, e a escala é te, em relação ao WAIS-R, em adultos jovens,
introduzida, aqui, apenas por seu valor histó- nível em que o Stanford-Binet, em revisões
rico, e porque provavelmente será um instru- anteriores, tinha sido considerado bastante
mento a competir com as escalas Wechsler, deficitário [2].
embora o volume de pesquisas atual ainda seja
pequeno [8].
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210 JUREMA ALCIDES CUNHA


8. Cronbach, L.J. (1996). Fundamentos da testagem personagens animais do que com figuras hu-
psicológica. 5.ed. Porto Alegre: Artes Médicas. manas [3];
9. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment.
3.ed. New York: Oxford Universities Press.
b) os elementos figurativos animais são mais
10. Carvajal, J.H., Gerber, J., Hewes, P. & Weaver, K.A. acessíveis à projeção de necessidades, impul-
(1987). Correlations between scores on Stanford- sos e complexos do que os elementos huma-
Binet IV and Wechsler Adult Intelligence Scale-Re- nos, não só porque é mais fácil a criança esta-
vised. Psychol. Reports, 61, 83-86. belecer relações emocionais com seres meno-
res do que com adultos [1], como porque ela
pode ter certa dificuldade em sua interação
com estes e, portanto, manter certa distância
CAT emocional [4];
c) o personagem animal constitui uma fi-
Dados históricos gura mais ambígua em termos de sexo e faixa
etária;
O Children Apperception Test (CAT), ou Teste d) a natureza mais primitiva, “menos civili-
de Apercepção Temática Infantil, descendente zada”, do animal permite que lhe sejam atri-
direto do TAT, foi inspirado numa discussão buídos sentimentos e impulsos vivenciados pela
entre o seu idealizador, Leopold Bellak, e Er- criança como negativos.
nest Kris sobre a facilidade que as crianças apre- A propriedade da escolha de figuras animais
sentam de se identificarem com figuras ani- também foi ressaltada por estudos, citados por
mais, dado ao importante papel que estas de- Hirsch e colegas [5], pela freqüência com que
sempenham nas fobias e fantasias infantis, os animais aparecem, como personagens prin-
bastante evidente no caso de Hans, relatado cipais ou secundários, em histórias relatadas
por Freud [1]. por pré-escolares e, ainda, pelas conexões pos-
Considerando que o TAT não parecia pre- síveis entre os aspectos psicodinâmicos da
encher certas necessidades da investigação in- criança e o tipo preponderante de figura ani-
fantil e face ao pressuposto da preferência das mal em suas fantasias. Além disso, chamava a
crianças por animais como figuras de identifi- atenção a freqüência de respostas animais no
cação, Leopold Bellak, em colaboração com Rorschach infantil e o papel do animal nas cul-
Sonya Sorrel Bellak, delineou situações funda- turas primitivas, nas lendas, nos contos de fa-
mentais, que poderiam revelar certos aspectos das, que pareciam justificar a hipótese de que
dinâmicos das relações interpessoais infantis. o CAT-A poderia eliciar temas pertinentes para
A partir dessas primeiras sugestões, Violet La- revelar aspectos da personalidade infantil [6].
mont realizou um conjunto de dezoito dese- Em 1952, foi lançada uma série suplemen-
nhos de cenas, que acabou por ser reduzido a tar ao CAT, o CAT-S, também com figuras ani-
dez, pelo fato de a criança apresentar me- mais, constituído por dez cenas, em encaixes,
nos amplitude da atenção, não sendo indi- para melhor serem manipulados por crianças
cado um material de teste tão extenso [2]. pequenas ou por retardados mentais, com ida-
As lâminas resultantes foram divulgadas em de mental não superior a 5 ou 6 anos. Como
1949, apresentando cenas de animais em si- foi construída exatamente como técnica suple-
tuações humanas, pretendendo com elas mentar, o examinador escolheria a lâmina que
chegar à compreensão da criança em rela- mais se prestasse à investigação de algum pro-
ção com seu mundo externo (figuras impor- blema específico, principalmente no que se
tantes) e com seu mundo interno (impulsos refere às relações do sujeito consigo mesmo
e fantasias). ou com seus equivalentes. Porém, segundo
Os pressupostos básicos para a utilização Hirsch e colegas [5], citando Haworth, faltam
de figuras animais foram os seguintes: maiores dados metodológicos a respeito.
a) com base na literatura psicanalítica, as Nos anos subseqüentes ao aparecimento do
crianças identificam-se mais facilmente com CAT, alguns estudos sugeriram que, para algu-

PSICODIAGNÓSTICO – V 211
mas crianças, por terem mais idade, nível inte- um, de uma série de dez lâminas, que são
lectual mais elevado ou por certos aspectos de aplicáveis a crianças, que devem elaborar uma
personalidade, as figuras humanas poderiam história a partir da cena constante em cada
constituir um estímulo projetivo melhor do que lâmina.
as figuras animais. Desse modo, foi delineada Segundo os autores, seriam instrumentos
uma versão antropomórfica, o CAT-H, que pre- adequados para uso a partir dos 3 anos, até
tendia preencher uma lacuna entre o CAT ini- aproximadamente 10 anos, sendo o CAT-H mais
cial, o CAT-A e o TAT [6]. indicado para as faixas etárias acima de 7 anos
A transformação das cenas que incluíam ou para crianças com nível intelectual corres-
animais em cenas antropomórficas foi fácil, pondente a esta idade. Contudo, pesquisas
uma vez que os personagens animais eram recentes sugeriram que, em geral até os 5 anos,
mais ambíguos, mas ficou evidente que as e até os 6 anos e meio, em crianças de famílias
razões da preferência pelo CAT-H sobrepuja- de renda baixa, ainda predominam respostas
vam “as desvantagens da menor ambigüida- de caráter não-aperceptivo [11-13].
de” [1, 6]. O material, tanto do CAT-A, como do CAT-
A versão final do CAT-H foi divulgada em H, incluindo a coleção de lâminas, o respectivo
1976, mas, anteriormente, já haviam sido pro- manual, bem como o caderno de registro e
postas outras versões, sendo desenvolvidos análise, é editado pela Paidós, Buenos Aires, e
estudos comparativos com o CAT-A. Em con- por Mestre Jou, São Paulo.
seqüência, Haworth criou um esquema de ava-
liação, que Bellak considerou como mais deta-
lhado e de orientação mais dinâmica, incluin- Administração
do-o em vários de seus trabalhos [1, 3, 6].
Embora Bellak [1] tenha considerado seus Forma: individual.
instrumentos livres da influência de aspectos Tempo: variável, recomendando-se que não
culturais, ambas as versões do CAT foram ob- ultrapasse 60 minutos.
jeto de crítica por conterem objetos típicos da Manejo: registram-se, atualmente, quatro
cultura ocidental, surgindo várias adaptações abordagens diferenciadas:
das lâminas, entre as quais podem ser salien- a) interpretação sob enfoque projetivo, com
tadas a versão hindu e a japonesa [7]. uma análise qualitativa de conflitos, impulsos,
A partir do sucesso inicial desses testes aper- estados afetivos, defesas, necessidades e figu-
ceptivos, começaram a ser introduzidas várias ras de identificação, havendo uma lista de
técnicas desse tipo, como o Teste de Nathan e mecanismos adaptativos, de Haworth [14],
Mauco, com lâminas suplementares ao TAT, para a avaliação quantitativa da presença de
para investigação da situação escolar, o Bla- perturbação, que justifique ou não a indica-
cky, de Blum [8], Patte Noire, além do Teste de ção de intervenção terapêutica;
Atitudes Familiares, de Jackson, o Pickford Pro- b) classificação de distúrbios de comporta-
jective Pictures [9], e, mais recentemente, Con- mento, com levantamento de freqüências re-
stantino e colegas desenvolveram o Tell Me A lativas, conforme Fabbiani [15], segundo crité-
Story Test, TEMAS [10], com personagens his- rios de Pérez-Ramos;
pano-americanos e negros, em situações con- c) atribuição de escores às respostas, con-
flituosas, para uso com minorias [2]. forme um sistema, baseado na complexidade
crescente da capacidade infantil de organizar
as ações numa sucessão temporal, o qual,
Descrição embora criado com objetivos de pesquisa, per-
mite detectar desvios no desenvolvimento [12];
O CAT-A, com figuras animais, e o CAT-H, com d) o referencial de análise, proposto por
figuras humanas, são testes projetivos, aper- Tardivo [16], com base em pressupostos kleini-
ceptivos, temáticos, verbais, constituídos, cada anos.

212 JUREMA ALCIDES CUNHA


Indicações 3. Foi possível verificar, também, que os re-
sultados do CAT-A sofrem efeitos do nível so-
1. Investigação diagnóstica, especialmente cioeconômico do qual as crianças provêm, já
com o objetivo de formulação dinâmica. que, entre crianças de famílias de baixa renda,
2. Identificação do estádio de desenvolvi- o instrumento se mostra pouco produtivo, de
mento infantil, especialmente para detectar um ponto de vista clínico, mesmo entre 5 anos
desvios no desenvolvimento. e meio e 6 anos e meio, em que predominam
3. Indicação da necessidade ou não de in- verbalizações que envolvem descrição simples
tervenção terapêutica e de orientação aos pais. [18].
4. Acompanhamento da evolução do pro- 4. Dadas as diferenças encontradas entre
cesso terapêutico. pré-escolares de menos e mais idade, procu-
rou-se verificar se existia correlação entre os
escores do CAT-A e os escores da Escala de
Comentários Maturidade Mental Columbia. Os dados per-
mitiram fazer a estimativa da existência de cor-
1. Embora classificada como técnica pro- relação positiva, porém baixa, corroborando a
jetiva, o próprio Bellak [1], baseado em ou- impressão de que outros aspectos do desen-
tros estudos, refere a freqüência do apareci- volvimento infantil seriam importantes para
mento de respostas não-aperceptivas, na in- explicar a diferença entre os grupos etários [18].
fância, que só chegam a ser mínimas ao re- Procurando-se examinar melhor o papel da
dor dos 8 anos de idade. Por outro lado, os inteligência sobre tais escores, foi selecionado
autores [1, 5, 7], apesar de recomendarem o um grupo de 20 crianças, de 9 a 12 anos de
uso do teste a partir de 3 anos de idade, in- idade, com o diagnóstico de retardamento
cluem poucos exemplos de pré-escolares. mental leve, que foram emparelhadas com um
Nota-se ainda que são poucas as pesquisas grupo de 20 pré-escolares, de 4 a 6 anos e meio,
com o CAT em amostras de pré-escolares e, em termos de escores na Escala de Maturida-
quando são referidas, geralmente utilizam de Mental Columbia. Por outro lado, os sujei-
crianças a partir das faixas etárias de 5 ou 5 tos do primeiro grupo foram emparelhados,
anos e meio [6, 17]. por idade, com outras 20 crianças que freqüen-
2. Num estudo de nossa equipe de pesqui- tavam escola comum, sem história de repetên-
sa [11], com 48 crianças de 4 a 6 anos e meio, cia. A pesquisa revelou que os escores do CAT-
observou-se a predominância de respostas não- A do primeiro grupo foram significativamente
aperceptivas em 68,96% dos casos. A presen- mais altos do que do grupo de pré-escolares,
ça de respostas realmente produtivas de um não apresentando diferenças com os escores
ponto de vista clínico, isto é, daquelas que, de do terceiro grupo de escolares. Como a atri-
acordo com as instruções, envolvem realmen- buição de escores se baseou na capacidade
te a produção de uma história, foi verificada infantil de organizar as ações numa sucessão
em apenas 4,08% da amostra total. Foi possí- temporal, presume-se que os escores mais ele-
vel concluir que, como instrumento de pesqui- vados dos grupos de mais idade tenham que
sa, na área da personalidade, o CAT-A não é ver com o desenvolvimento da noção de tem-
adequado para idades inferiores a 5 anos e po [19].
meio. A partir desta faixa etária, pode ser utili- 5. Além das restrições citadas ao uso do CAT
zado, mas as respostas produtivas ocorrem em em pré-escolares, estudos comparativos entre
menos de 50% dos casos. Como tal estudo esta técnica e o Teste das Fábulas [20], nas
havia sido realizado com um número relativa- mesmas crianças, demonstraram que: a) o tem-
mente pequeno de casos, a pesquisa foi am- po de reação ao Teste das Fábulas é significati-
pliada para abranger 180 crianças daquele pe- vamente menor que ao CAT-A, sugerindo me-
ríodo etário, sendo mantidas as conclusões lhor aceitação do primeiro do que do último,
anteriores [12-13]. nessa faixa etária [21], e b) o CAT-A é menos

PSICODIAGNÓSTICO – V 213
sensível que as Fábulas para a investigação do rão Preto, SP: XX Reunião Anual de Psicologia da
conflito edípico, típico dessa fase de desenvol- Sociedade de Psicologia de Ribeirão Preto.
12. Cunha, J.A., Nunes, M.L.T., Werlang, B.G., Oliveira,
vimento [22]. M.S., & Wagner, A. (1993). CAT e a avaliação da
6. Numa revisão das referências bibliográ- qualidade projetiva das respostas. In J.A. Cunha et
ficas de 100 artigos que relatavam pesquisas alii. Psicodiagnóstico-R. 4.ed.rev. (p.265-270). Por-
utilizando instrumentos psicológicos, em revis- to Alegre: Artes Médicas.
tas científicas estrangeiras de 1988 e 1989, não 13. Cunha, J.A., & Werlang, B.G. (1991). Respostas ao
CAT-A em 180 pré-escolares. Ribeirão Preto, SP: XXI
se encontrou qualquer citação do CAT [23]. Reunião Anual de Psicologia.
Contudo, os estudos recém-referidos sugerem 14. Haworth, M.R. (1966). The CAT: facts about fan-
a importância da realização de pesquisas com tasy. New York: Grune & Stratton.
esta técnica, não só para identificar respostas 15. Fabbiani, D. (1966). Teste de apercepción temática
usuais e sua utilidade clínica em diferentes fai- para niños (CAT). In A.M. Queiroz & Pérez-Ramos,
A.M.Q. Psicología clínica: técnicas de diagnóstico
xas etárias, como para examinar o efeito de (p.277-296). Caracas: Mediterráneo.
diferentes fatores sobre as respostas. Também 16. Tardivo, L.S.P.C. (1998). O Teste de Apercepção In-
parecem recomendáveis estudos do CAT-A e do fantil e o Teste das Fábulas de Düss: respostas típi-
CAT-H, em amostras de crianças brasileiras, cas da população brasileira e aplicações no contex-
para determinar a utilidade de cada uma des- to das técnicas projetivas. São Paulo: Vetor.
17. Kagan, J. (1976). Técnicas de apercepción temática
sas versões. aplicada a niños. In A.J. Ranin & M.R. Haworth, Ed.
Técnicas proyectivas para niños (p.116-135). Bue-
nos Aires: Paidós.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 18. Cunha, J.A., Werlang, B.G., & Nunes, M.L.T. (1990).
Respostas ao CAT-A versus inteligência, renda fa-
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cológicas del TAT, CAT y SAT. México: El Manual SP: XX Reunião Anual de Psicologia da Sociedade
Moderno. de Psicologia de Ribeirão Preto.
2. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycholo- 19. Cunha, J.A., & Oliveira, M.S. (1992). Retardamento
gical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons. mental leve e o uso do CAT-A. Madrid: Congresso
3. Bellak, L., & Bellak, S. (1966). Test de Apercepción Ibero-Americano de Psicologia.
Infantil. Manual. Buenos Aires: Paidós. 20. Cunha, J.A., & Nunes, M.L.T. (1993). Teste das Fá-
4. Jacquemin, A. (1987). Importância dos testes psi- bulas: forma verbal e pictórica. São Paulo: Centro
cológicos no diagnóstico e problemas gerais do Editor de Testes e Pesquisa em Psicologia.
diagnóstico (mesa-redonda). Porto Alegre: III En- 21. Cunha, J.A., Nunes, M.L.T., & Werlang, B.G. (1990).
contro sobre Testes Psicológicos. Estudo do tempo de reação ao CAT e ao Teste das
5. Hirsh, S., Verthelyi, R.F., & Menéndez de Rodríguez, Fábulas, em crianças pré-escolares. Psico, 19, 1, 23-
F. (1979). El CAT en el psicodiagnóstico de niños. 27.
Buenos Aires: Nueva Visión. 22. Cunha, J.A., & Werlang, B.G. (1990). Investigação
6. Bellak, L., & Hurvich, M.S. (1966). A human modifi- do conflito edípico através de duas técnicas proje-
cation of the Children’s Apperception Test (CAT). J. tivas. Ribeirão Preto, SP: XX Reunião Anual de Psi-
Proj. Tech. & Pers. Assess., 30, 3, 228-242. cologia da Sociedade de Psicologia de Ribeirão Preto.
7. Bellak, L., & Adelman, C. (1966). El Test de Aper- 23. Cunha, J.A., & Nunes, M.L.T. (1992). Referências
cepción Infantil (CAT). In A.J. Rabin & M.R. Hawor- bibliográficas: uma questão crítica. Revista de Psi-
th, Ed. Técnicas proyectivas para niños (p.65-90). cologia, 9/10, 1/2, 29-37.
Buenos Aires: Paidós.
8. Blum, G.S. (1966). El Teste de “Blacky” aplicado a
niños. In A.J. Rabin & M.R. Haworth, Ed. Técnicas OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
proyectivas para niños (p.107-15). Buenos Aires:
Paidós. Bell, J. (1964). Técnicas proyectivas. 2. ed. Buenos Ai-
9. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio res: Paidós.
de Janeiro: Campus. Bellak, L., & Bellak, S.S. (1972). Teste de Apercepción
10. Constantino, G., Malgady, R.G., & Rogler, L.H. Infantil con figuras humanas (CAT-H). Manual. Bue-
(1988). Technical manual: the TEMAS thematic nos Aires: Paidós.
apperception test. Los Angeles, CA: Western Psycho- Bellak, L., & Hurvich, M.S. (1966). Test de Apercepción
logical Services. Infantil con figuras humanas. In A.J. Rabin & M.R.
11. Cunha, J.A., Nunes, M.L.T., & Werlang, B.G. (1990). Haworth, Ed. Técnicas proyectivas para niños. Bue-
As respostas ao CAT-A na faixa pré-escolar. Ribei- nos Aires: Paidós.

214 JUREMA ALCIDES CUNHA


Hirsch, S. (1976). Pautas de interpretación del Test de Trata-se de um instrumento bastante rápi-
Apercepción Infantil (CAT-A). In. M.L.S. Ocampo, do e tem sido indicado para triagem [2].
M.E. Arzeno et alii. El proceso psicodiagnóstico y
las técnicas proyectivas. 6.ed. V.1 (p.171-191). Bu-
enos Aires: Nueva Visión.
Lawton, M.J. (1966). Animal and Human CAT’s with a Descrição
school sample. J. Proj. Tech. & Pers. Assess., 30, 3,
243-246. É um teste de classificação pictórica [2]. Ao
Mainord, F.R., & Marcuse, F.L. (1954). Responses to dis-
turbed children to human and animal pictures. J.
contrário da primeira edição, que era constitu-
Proj. Tech. & Pers. Assess., 18, 4, 475-477. ída por uma série, ordenada por grau de difi-
Montagna, M.E. (1989). Análise e interpretação do CAT: culdade crescente, de 100 cartões (de 15 x 48
teste de apercepção temática infantil. São Paulo: cm), a edição atual compreende apenas 92
EPU. cartões, cada um com desenhos grandes e co-
Piccolo, E.G. (1977). Indicadores psicopatológicos en
técnicas proyectivas. Buenos Aires: Nueva Visión.
loridos, de percepção fácil e atraente, sendo
50 deles novos e 42 aproveitados da edição de
1959.
A administração é caracterizada por sua fle-
COLUMBIA xibilidade. Não há regras fixas. A criança é ins-
truída a identificar qual o desenho que não
Dados históricos pertence ao conjunto apresentado. Exige-se
somente uma resposta verbal ou motora míni-
A Columbia Mental Maturity Scale, Escala de ma para a indicação da opção. Há itens muito
Maturidade Mental Columbia ou ainda Escala simples, no início de cada tarefa, que facilitam
de Maturidade Intelectual, de autoria de Bur- o entendimento. Os primeiros itens são mera-
gemeister, Blum e Lorge, começou a ser desen- mente perceptivos, sendo introduzidas, gra-
volvida em 1947, numa tentativa de constru- dualmente, maiores exigências de natureza
ção de um instrumento para a estimativa da conceitual.
capacidade intelectual de crianças com défi- Para que a Escala seja considerada admi-
cits verbais ou motores, particularmente com nistrada, a criança deve responder a mais de
paralisia cerebral. Dadas as limitações de tais 50 itens, independentemente da ocorrência de
sujeitos, a tarefa envolvida não só deveria ser fracassos ou acertos.
bastante simples, com instruções fáceis, como O material, que inclui a série de cartões,
também a resposta deveria exigir um mínimo folhas de respostas e o manual da primeira
de expressão verbal ou motora por parte da edição, foi distribuído pela Vector, em São Pau-
criança, especialmente a de pouca idade. lo. A terceira edição foi padronizada e norma-
Atualmente, está em uso a terceira edição da tizada pela Casa do Psicólogo, São Paulo. Já o
Escala (1972), com características semelhantes à CEPA comercializa o jogo de cartões, a folha
edição original, que é considerada um dos me- de respostas e apuração e a tradução do ma-
lhores instrumentos para a idade pré-escolar [1]. nual da terceira edição, incluindo dados refe-
O instrumento, construído primariamente rentes à padronização e validação do instru-
para a avaliação de sujeitos com paralisia cere- mento, no Brasil.
bral, é também muito útil para crianças com É indicada para crianças de 3 a 9 anos.
qualquer problema de comunicação, como
sujeitos bilíngües ou com dificuldades de au-
dição e linguagem. Embora considerado ade- Administração
quado para a testagem de crianças de grupos
culturais minoritários [2], encontramos esco- Forma: individual.
res significativamente mais baixos em pré-es- Tempo: 15 a 30 minutos.
colares de famílias de baixa renda do que na- Manejo: atribui-se um ponto por acerto,
queles de famílias de renda média [3]. sendo que o escore total, constituído pela soma

PSICODIAGNÓSTICO – V 215
de acertos, é interpretado pelo uso de tabelas 4. Cunha, J.A., Nunes, M.L.T. & Oliveira, M.S. (1990).
adequadas à idade. Escala de Competência Social e Escala Columbia de
Maturidade Intelectual: estudo da fidedignidade e
correlação entre os instrumentos. Ribeirão Preto,
SP: XX Reunião Anual de Psicologia da Sociedade
Indicações de Psicologia de Ribeirão Preto.

1. Avaliação da capacidade de raciocínio


OUTRA FONTE BIBLIOGRÁFICA
geral em crianças normais ou com problemas
de ordem motora e com problemas de ordem Burgemeister, B.B., Blum, L.H., & Lorge, I. (1967). Esca-
motora e comunicacional. la de Maturidade Mental Columbia. Manual de apli-
2. Teste de triagem intelectual. cação. São Paulo: Vector.

Comentários
COMPLETAMENTO DE SENTENÇAS
1. Embora considerado pelas autoras como
uma medida de raciocínio geral ou de maturi- Dados históricos
dade mental, tem sido mais indicado como um
teste de triagem intelectual para selecionar Completamento de Sentenças é um teste ins-
crianças a serem submetidas a uma avaliação pirado no método de associação de palavras.
intelectual completa [2]. Teve sua origem no pensamento original de
2. Ainda que esses autores citados achem Galton (1885), desenvolvido mais tarde por
que a exigência de administração de mais de Jung, Rapaport e outros, para medir inicialmen-
50 itens seja muito frustrante para crianças te variáveis intelectuais e, depois, identificar
pequenas, a nossa experiência de pesquisa, já perturbações que podem ter significação pa-
com mais de 400 administrações em pré-esco- tológica [1].
lares, revela que o instrumento tem muito boa Os pioneiros na utilização do completamen-
aceitação, sendo raras as crianças que se quei- to de sentenças, como instrumentos de avalia-
xam de fadiga ou se recusam a continuar na ção da personalidade, foram Binet, Payne
primeira metade do teste. (1928), Tendler (1930), Rhode e Hildreth (1940)
3. Quando a terceira edição ainda se en- e Stein e Rotter (1947), tornando-se um méto-
contrava em fase de padronização no Brasil, do largamente difundido e popular por suas
realizamos um estudo de fidedignidade (mé- características de flexibilidade e economia, ten-
todo das duas metades), sendo estimado um do proliferado em várias formas, com os mais
coeficiente de 0,96 [4], mais elevado que os diversos objetivos. Por vezes, é considerado
valores de 0,85 a 0,90, verificados em alguns como um teste ou como um método projeti-
estudos revisados por Perlman e Kaufman [1]. vo, dependendo de critérios psicométricos uti-
lizados ou não e da forma específica usada [2],
sendo que, em algumas formas, os itens se
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS apresentam como estímulos projetivos simples
e, em outras, quase se assemelham a um ques-
1. Burgemeister, B.B., Blum, L.H. & Lorge, I. (1972). tionário, levando a respostas mais diretas [3].
Columbia Mental Maturity Scale. 3.ed. San Anto-
nio, TX: Psychological Corporation.
A forma específica, identificada como SSCT
2. Perlman, M.D. & Kaufman, A.S. (1990). Assessment (Sacks Sentence Completion Test), foi idealiza-
of child intelligence. In G. Goldstein & M. Hersen, da por Sacks e outros psicólogos do Veterans
Ed. Handbook of psychological assessment. 2.ed. Administration Mental Hygiene Service, em
(p.59-78). New York: Pergamon Press. New York, para uso clínico. Desde que surgiu,
3. Cunha, J.A. (1992). Problemas na avaliação de crian-
ças na fase pré-escolar. Madrid: Congresso Ibero-
em 1950, foi sendo submetido a uma série de
Americano de Psicologia. investigações para a formulação e substituição

216 JUREMA ALCIDES CUNHA


de itens que tendiam a suscitar respostas su- mina as respostas em termos da presença de
peraprendidas, estereotipadas [4], até sua ree- indícios qualitativos de conflito e perturbação
dição em 1959 [5]. e, mesmo, para levantamento de material in-
É utilizado com adolescentes e adultos. formativo sobre a história do paciente, que não
raras vezes aparece.

Descrição
Indicações
O Teste de Completamento de Sentenças, de
Joseph Sacks e outros, consta de 60 itens ou 1. Investigação do conteúdo e dinâmica de
de frases incompletas que o sujeito deve com- atitudes e sentimentos para identificação de:
pletar, geralmente com a recomendação de que a) principais áreas de conflito e perturbação;
o faça na maior rapidez possível, e que lhe dão b) inter-relação entre atitudes; e
oportunidade de expressar atitudes e sentimen- c) levantamento de dados sobre aspectos
tos ou, eventualmente, de produzir material de personalidade, como: interesses, nível de
diretamente informativo em quatro áreas ou atividade, adaptação emocional, nível de reali-
categorias representativas de adaptação: famí- dade, maneira de expressão de conflitos, etc.
lia, sexo, relações interpessoais e conceito de 2. Técnica auxiliar no diagnóstico.
si mesmo. As quatro áreas são divididas em 3. Triagem.
quinze subcategorias de conteúdo significati-
vo, cada uma das quais representada por qua-
tro itens. Comentários
O material extraído do SSCT pode revelar
conteúdos possivelmente oriundos de diferen- 1. Conforme Baker [6], no caso de testa-
tes instâncias da personalidade [4], cujo con- gem coletiva, a técnica oferece a cada sujeito
teúdo é analisado. “a melhor oportunidade de expressar idéias e
Tanto o modelo do protocolo do teste como sentimentos, em suas próprias palavras, e isso
o de avaliação (ou folha de apreciação) são inclui sua gramática, ortografia e escrita do pró-
apresentados na bibliografia específica. Geral- prio punho”.
mente, os psicólogos costumam tirar cópias 2. Na realidade, pode ser considerado mais
mimeografadas do modelo, já que as instru- como “uma técnica ou um método” do que
ções-padrão prevêem que o estímulo seja lido como um instrumento único [7], embora haja
pelo sujeito, embora o teste possa ser usado formas específicas, até comercializadas.
oralmente [3]. 3. O método é bastante sensível para a ava-
liação da severidade de transtornos psicopa-
tológicos; todavia, em casos leves, as respos-
Administração tas podem depender dos propósitos do exame
[2], da imagem que o sujeito pretende dar, de
Forma: individual ou coletiva. sua colaboração ou do rapport que estabele-
Tempo: variável, no máximo de 30 a 50 ceu com o examinador [3], sendo praticamen-
minutos. te impossível controlar a censura das respos-
Manejo: existem muitos métodos de esco- tas (por simulação ou defensividade) do exa-
re que podem ser aplicados ao SSCT especial- minando.
mente em caso de triagem ou pesquisa; comu- 4. Além de ser uma técnica de administra-
mente, é utilizada uma escala de 4 pontos [2] ção rápida e econômica, exige menos experiên-
ou de 3 pontos [4], conforme a ausência ou cia e treinamento específico, mas pode envol-
presença mais intensa ou não de indícios de ver o alto grau de subjetivismo na interpreta-
conflito e/ou ansiedade; no caso individual; ção, que evidentemente é menor se for usado
com freqüência, o psicólogo simplesmente exa- um processo escalar de avaliação.

PSICODIAGNÓSTICO – V 217
5. A possibilidade de inquérito suplemen- 5. Van Kolck, O.L. (1975). Técnicas de exame psicoló-
tar sobre respostas especialmente significati- gico e suas aplicações no Brasil. Testes de persona-
lidade. Petrópolis, RJ: Vozes.
vas ou obscuras pode ser muito esclarecedora 6. Baker, G. (1970). Post-diagnostic use of the Ror-
e diminui a necessidade de supervisão, mas schach. In B. Klopfer et alii. Developments in the
permanecendo a análise em nível menos pro- Rorschach Technique. V.III (p.321-384). New York:
fundo, mesmo porque, conforme Symonds, Harcourt, Brace & Jovanovich.
citado por Sacks e Levy, “a interpretação do 7. Lanyon, R.I., & Goodstein, L.D. (1982). Personality
assessment. New York: Wiley & Sons.
completamento de frases, como projeção, é 8. Pope, B., & Scott, W.H. (1967). Psychological diag-
duvidosa, questionável, hipotética, está na or- nosis in clinical practice. New York: Oxford Univer-
dem da conjetura e da suposição” [4]. sities Press.
6. Apresenta bom grau de estrutura e focali- 9. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio
zação, podendo-se dizer que é, conforme Forer, de Janeiro: Campus.
citado por Pope e Scott, “um recurso projetivo
controlado” [8], mas, em conseqüência, é muito OUTRA FONTE BIBLIOGRÁFICA
menos dinâmico que o Rorschach ou o TAT [2].
7. É indiscutivelmente uma vantagem a Cunha, J.A. (1993). Completamento de sentenças. In
possibilidade de administração oral não só em J.A. Cunha et alii. Psicodiagnóstico-R. 4.ed.rev.
(p.355-365). Porto Alegre: Artes Médicas.
casos de comprometimento motor e visual,
como com pessoas ansiosas e, principalmen-
te, para estudos da reação a itens específicos
(determinação de tempo de reação e identifi-
DESENHO DA FAMÍLIA
cação de outras manifestações de comporta-
mento não-verbal, como bloqueio, rubor, mo-
Dados históricos
dificações da expressão facial, etc.).
8. Anzieu, ao analisar o Teste de Completa-
Parece não haver inteira concordância, na lite-
mento de Frases de Stein, refere que, para a
ratura, sobre a autoria do Desenho da Família
interpretação, é necessário realizar um inqué-
como instrumento de avaliação. Widlöcher [1]
rito individual aprofundado, além de uma
refere que, em 1931, Appel já utilizara o dese-
anamnese prévia [9]. Parece que também a in-
nho da casa, de uma família e de animais para
terpretação do Sacks deveria pressupor uma
o estudo da personalidade infantil, e, de fato,
entrevista prévia sobre a história pregressa e
tal autor publicou um artigo a respeito [2]. Cita,
atual, de forma que o inquérito suplementar
a seguir, o interesse pela técnica, em 1937, e
poderia ser realizado, de maneira mais escla-
Groth-Marnat [3] registra um trabalho de Wolff
recedora, relacionando as respostas com os
[4], em 1942. Mas parece que o instrumento
dados da história do paciente.
foi melhor desenvolvido por Hulse [5], em 1951,
embora Ortega [6] refira um trabalho de Po-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS rot, quase concomitante, em 1952, que pro-
pôs a sistematização desse tipo de desenho,
1. Pichot, P. (1949). Les tests mentaux en psychiatrie. analisando a composição da família, a valori-
Paris: Presses Univesitaires de France. zação ou desvalorização de seus membros e a
2. Goldberg, P.A. (1965). A review of sentence com-
posição relativa da criança em relação a eles.
pletion methode in personality assessment. J. Proj.
Tech. & Pers. Assess., 29, 1, 7-45. Entretanto, pode-se afirmar que a técnica al-
3. Carr, A.C. (1975). Psychological testing of intelligen- cançou especial popularidade nas décadas de
ce and personality. In A.M. Freedman, H.I. Kaplan & 60 e 70, pelo desenvolvimento e incremento
B.J. Sadock, Ed. Comprehensive textbook of psychi- da terapia familiar [3].
atry. V.2 (p.736-757). Baltimore, MD: The Williams
Há referências, também, a trabalhos de La-
& Wilkins.
4. Sacks, J.M., & Levy, S. (1967). El test de frases in- wton e Reznokoff, em 1962, de Lawton e Se-
completas. In L.E. Abt & L. Bellak. Psicología proyec- chrest, no mesmo ano, de Harris [7], em 1963,
tiva (p.205-225). Buenos Aires: Paidós. e de Koppitz, em 1968. Conforme Klepsch e

218 JUREMA ALCIDES CUNHA


Logie [8], essa última autora afirmava que, por Descrição
meio da representação da família, é possível
identificar atitudes negativas da criança, atra- O teste do desenho de família é uma técnica
vés de alterações nas representações das figu- gráfica. Para a sua administração, são neces-
ras parentais e de irmãos, utilizando inconsci- sários uma folha de papel, lápis preto e borra-
entemente sinais e símbolos especiais. cha. O desenho cinético da família, que geral-
Corman [9] introduziu novas formas de ad- mente é administrado após a técnica tradicio-
ministração e interpretação, solicitando o de- nal, exige material idêntico.
senho de uma família, tal como a criança a Apesar de ser uma técnica mais utilizada
imaginava, analisando-a quanto ao nível grá- com crianças, também pode ser usada com
fico, da estrutura formal e de conteúdo, dan- adolescentes e adultos.
do ênfase, neste último, a um enfoque psica-
nalítico.
Também Klepsch e Logie [8] comentam Administração
sobre outra versão da técnica, proposta por
Shearn e Russell, em 1970, em que pediam à Forma: individual ou coletiva.
criança o desenho de uma família, e não de Tempo: variável, embora seja recomendá-
sua família, e a avaliação era completada pelo vel que não ultrapasse 60 minutos.
desenho da família produzido por um ou am- Manejo: apesar de terem sido propostos
bos os pais, o que possibilitaria a obtenção de vários sistemas de escore, tanto para o dese-
indícios sobre a dinâmica familiar, e procura- nho tradicional da família como para o KFD,
vam determinar a significação dos desenhos freqüentemente a interpretação da técnica ain-
através de estudos de caso. da se restringe a um enfoque dinâmico.
O sistema de interpretação geralmente se
iniciava por uma apreciação global da tona-
lidade afetiva do desenho, passando para Indicação
uma avaliação de tamanho e colocação das
figuras em relação umas com as outras e à 1. Avaliação dinâmica individual e familiar.
representação correspondente ao sujeito.
Outros aspectos estruturais e formais podiam
sugerir “ansiedade, hesitação ou confiança” Comentários
[3].
Nos anos 70, foi introduzida a versão ciné- 1. Hammer [13] refere que a freqüência com
tica da técnica, por Burns e Kaufman [10, 11], que a técnica é utilizada com crianças se asso-
o Kinetic Family Drawings (KFD). Devia ser ob- cia à importância, nessa faixa, da “determina-
servada a ordem em que as figuras eram su- ção da [sua] relação essencial com pais e ir-
cessivamente desenhadas, o tamanho, a colo- mãos”. Não obstante, esse autor oferece exem-
cação e os indicadores de ansiedade, sendo plos de desenhos de adultos, que permitem
desenvolvido um sistema de escore. investigar tanto “o afastamento da interação
Klepsch e Logie [8] citam vários outros sis- familiar”, como tendências regressivas. Orte-
temas de escore, como o de O’Brien e Patton, ga [6] ainda salienta que, segundo Hammer, a
em 1974, e o de Reynolds, em 1978. Ainda na técnica se presta para detectar a projeção que
mesma década, registram os trabalhos de Ja- o adulto faz de suas percepções, sentimentos
cobson, Levenbaerg, Magnum, McPhee e Wen- e relações infantis com sua família.
ger, de Raskin e Pitcher-Bake e outros. 2. Di Leo [14] compara a representação da
Outra versão digna de nota é a de Brem- figura humana, no desenho de uma pessoa e
Gräser [12], que solicita a representação da no desenho da família, observando que, no
família com figuras de animais, analisando o primeiro caso, a produção é mais intelectual,
seu simbolismo. e, no segundo, há a influência de conteúdos

PSICODIAGNÓSTICO – V 219
afetivos, pelo que os desenhos apresentam di- 13. Hammer, E.F. (1991). Aplicações clínicas dos dese-
ferenças quantitativas e qualitativas. Groth- nhos projetivos (p.294-333). São Paulo: Casa do Psi-
cólogo.
Marnat [15] faz observações no mesmo senti- 14. Di Leo, J.H. (1987). A interpretação do desenho in-
do, alertando que “a dinâmica envolvida nos fantil. 2.ed. Porto Alegre: Artes Médicas.
dois procedimentos é completamente diferen- 15. Groth-Marnat, G. (1984). Handbook of psycholo-
te”. Assim, ambos os autores recomendam que gical assessment. New York: Van Nostrand Reinhold.
o desenho da figura humana, usado na repre-
sentação da família, nunca seja utilizado para Outras fontes bibliográficas
a estimativa do nível intelectual do sujeito.
3. Há, na literatura específica, muitas pro- Burns, R.C., & Kaufman, S.H. (1978). Los dibujos kinéti-
postas de análise e de interpretação da técni- cos de la familia como técnica proyectiva. Buenos
ca, sob enfoque psicodinâmico, mas com ên- Aires: Paidós.
Campos, D.M. (1977). O teste do desenho como ins-
fase em aspectos diferentes. Tal diversidade tem trumento do diagnóstico da personalidade. Petró-
sido objeto de críticas sobre a validade do tes- polis, RJ: Vozes.
te, salientando-se a necessidade de pesquisas
que garantam a cientificidade do instrumen-
to, apesar de já terem sido divulgados vários
sistemas de escore. DESENHO DA FIGURA HUMANA (1)

Dados históricos
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Ainda que date do fim do século passado a
d’enfants. Brussels: Dessat & Madaga. pressuposição de que o desenho tem implica-
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personality studies. Am. J. Orthopsych., 1, 129-144. nho da figura humana passou a ser analisado
3. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycho- mais sistematicamente como medida de ma-
logical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons.
4. Wolff, W. (1942). Projective methods for personali-
turidade [2]. Mas o primeiro teste, delineado
ty analysis of expressive behavior in preschool chil- especificamente para avaliar o desenho da fi-
dren. Character & Personality, 10, 309-330. gura humana como medida de desenvolvimen-
5. Hulse, W.C. (1951). The emotionally disturbed child to intelectual, foi de Florence Goodenough, em
draws his family. Quarterly J. Child Behavior, 3, 152- 1926 [3]. Teve ampla divulgação e, durante 35
174.
6. Ortega, A.C. (1981). O desenho da família como
anos, foi inúmeras vezes reeditado, sem pas-
técnica objetiva de investigação psicológica. Arq. sar por alterações.
Bras. Psicol., 33, 3, 73-81. O método baseava-se no número de deta-
7. Harris, D.B. (1963). Children’s drawings as measu- lhes incluídos no desenho e na sua precisão,
res of intelectual maturity: a revision and extensi- que estariam diretamente relacionados com o
on of the Goodenough Draw-A-Man test. New York:
Harcourt, Brace, & World.
nível intelectual da criança. A partir do núme-
8. Klepsch, M., & Logie, L. (1984). Crianças desenham ro de itens, eram determinados a idade men-
e comunicam. Porto Alegre: Artes Médicas. tal e o quociente intelectual [4].
9. Corman, L. (1967). El test del dibujo de la familia. Somente em 1963, Harris promoveu uma
Buenos Aires: Kapelusz. revisão do teste, sob a pressuposição de que
10. Burns, R.C., & Kaufman, S.H. (1970). Kinetic Family
Drawings (KFD): an introduction to understanding
o mesmo refletisse “mudanças de desenvol-
children through kinectic drawings. New York: Brun- vimento” [2], que ficou conhecida como o
ner/Mazel. método Goodenough-Harris Draw-a-Man Test
11. Burns, R.C., & Kaufman, S.H. (1972). Action, styles, [5].
and symbols in Kinetic Family Drawings (KFD). New Outra abordagem foi proposta por Koppitz
York: Brunner/Mazel.
12. Brem-Gräser, L. (1986). Familie in Tiere: Die Famili-
[6], como teste de maturidade mental, identi-
en-Situation in Spiegel der Kinderzeichung. Mün- ficando 30 itens evolutivos, que se correlacio-
chen: Ernst Reinhardt. navam com os níveis de QI. Utilizando o siste-

220 JUREMA ALCIDES CUNHA


ma de Koppitz, Hutz e Antoniazzi [7] desen- O desenho da figura humana destina-se,
volveram normas para a avaliação, no Rio Gran- principalmente, a crianças.
de do Sul. Os dados foram coletados de uma
amostra de 1.856 casos, de 5 a 15 anos.
Na década de 80, Naglieri [8] desenvolveu Administração
uma versão atualizada do sistema Goodenough-
Forma: individual ou coletiva.
Harris. Mais recentemente, no Brasil, Wechsler
Tempo: entre 10 e 15 minutos.
[9] fez sua contribuição na área, baseando-se nos
Manejo: são atribuídos escores, conforme
sistemas de Goodenough-Harris e Koppitz.
as instruções dos respectivos manuais, sendo,
Alguns autores, como Koppitz e Naglieri,
depois, consultadas tabelas para obtenção dos
desenvolveram escores adicionais para identi-
dados a serem interpretados.
ficação de perturbação emocional. Entretan-
to, conforme Groth-Marnat [4], os sistemas
mais usados para o desenho da figura huma-
Indicação
na e com melhor fundamentação psicométri-
ca são os que o utilizam como medida do de-
1. Medida do desenvolvimento cognitivo.
senvolvimento cognitivo.

Comentário
Descrição
1. Tais sistemas de escore se baseiam na pre-
O teste de Goodenough incluía instruções para sença ou não de aspectos formais e estrutu-
o examinador solicitar à criança o desenho de rais do desenho e, assim, parecem mais apro-
um homem. Seu livro descrevia os 51 itens con- priados quando a representação da figura hu-
siderados na avaliação, com exemplos ilustra- mana é produzida de maneira convencional, o
tivos, para facilitar o escore. A presença de cada que começa a ocorrer por volta dos 5 anos de
item recebia o escore de um ponto, com nor- idade [10]. Dessa maneira, exceto pelo teste
mas dos 3 aos 15 anos e 11 meses. de Goodenough, existe escasso embasamen-
Na revisão de Harris, solicita-se o desenho to, na literatura, para a avaliação de desenhos
de um homem, de uma mulher e, por último, da figura humana em idade inferior a 5 anos,
do próprio sujeito testado. A escala utilizada exceto por um enfoque fundamentado na im-
para avaliar o desenho do homem é constituí- pressão global [11], conforme a ordem do apa-
da por 73 itens, e, da mulher, por 71 itens. Há recimento de determinados tipos de represen-
escalas separadas para avaliar desenhos de tação gráfica da figura humana, ao longo do
meninos e meninas. Não há normas para o ter- desenvolvimento [12].
ceiro desenho.
Na forma de Koppitz, é solicitado o dese-
nho de uma pessoa inteira. Avalia-se a presen- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ça de cada um dos 30 itens, mas são conside-
radas as omissões de itens esperados, como 1. Di Leo, J.H. (1984). Interpretação dos desenhos in-
também a presença de itens excepcionais como fantis. Porto Alegre: Artes Médicas.
2. Klepsch, M., & Logie, L. (1984). Crianças desenham
sinais importantes de imaturidade ou de ma- e comunicam. Porto Alegre: Artes Médicas.
turidade mental, respectivamente. 3. Goodenough, F. (1926). Measurement of intelligen-
No sistema de Naglieri, há normas para as ce by drawings. New York: Brace & World.
faixas etárias de 5 a 17 anos. 4. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycholo-
Em todas as formas, o sujeito recebe uma(s) gical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons.
5. Harris, D.B. (1963). Children’s drawings as measu-
folha(s) de papel em branco, tamanho ofício, res of intelectual maturity: a revision and extension
lápis preto e borracha. As instruções são da- of the Goodenough Draw-A-Man test. New York:
das oralmente pelo examinador. Harcourt, Brace, & World.

PSICODIAGNÓSTICO – V 221
6. Koppitz, E.M. (1976). El dibujo de la figura humana com os desenhos, desenvolver uma escala de
en los niños. 3.ed. Buenos Aires: Guadalupe. inteligência, percebendo, então, que eram
7. Hutz, C.S., & Antoniazzi, A.S. (1995). O desenvolvi-
mento do Desenho da Figura Humana em crianças
inundados por fatores da personalidade [3].
de 5 a 15 anos de idade: normas para a avaliação. Pode-se dizer que Machover se inspirou no
Psicologia: Reflexão e Crítica, 8, 3-18. trabalho de Goodenough e desenvolveu um
8. Naglieri, J.A. (1988). Draw a Person: a quantitative conjunto de hipóteses com base na sua expe-
scoring system. San Antonio, TX: Psychological Cor- riência clínica, passando a investigá-las com
poration.
9. Wechsler, S.M. (1996). O desenho da figura huma-
pacientes adultos e adolescentes e, posterior-
na: avaliação do desenvolvimento cognitivo infan- mente, com crianças.
til. Manual para crianças brasileiras. Campinas, SP: A partir de então, proliferaram não só ver-
Editorial Psy. sões de testes gráficos que, de uma forma ou
10. Cox, M.V., & Howarth, C. (1989). The human figure de outra, incluíam a figura humana (desenho
drawings of normal children and those with severe
learning difficulties. British J. Develop. Psychol., 7,
da família, desenho de um amigo, pessoa na
333-339. chuva, etc.), como a utilização do desenho da
11. Shaffer, J.W., Duszynski, K.R., & Thomas, C.B. (1984). figura humana para estudo das variáveis espe-
A comparison of three methods for scoring figure cíficas, como medida da auto-estima [4, 5], de
drawings. J. Pers. Assess., 48, 3, 245-254. identidade étnica [5] ou de ansiedade [6, 7] e
12. Cox, M.V., & Parkin, C.E. (1986). Young children’s
human figure drawing: cross-sectional and longi-
de outras, embora muitos trabalhos apresen-
tudinal studies. Educ. Psychol., 6, 353-368. tassem resultados controvertidos [8]. Entretan-
to, o sistema de Handler, com 20 itens, a ser
usado a partir da adolescência, foi um dos que
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
despertou um certo interesse através de pes-
Hammer, E.F. (1991). Aplicações clínicas dos desenhos quisas realizadas, mostrando-se aplicável em
projetivos. Rio de Janeiro: Casa do Psicólogo. crianças [8-10], embora sendo registradas crí-
Hutz, C.S., & Bandeira, D.R. (1994). Avaliação psicoló- ticas sobre a sua validade [8, 11, 12].
gica com o Desenho da Figura Humana: técnica ou
intuição? Ribeirão Preto, SP: XXIV Reunião Anual
Não obstante e lamentavelmente, muitos
de Psicologia da Sociedade de Psicologia de Ribei- psicólogos clínicos preferem não utilizar abor-
rão Preto, p.1-15. dagens com fundamentação psicométrica, ten-
Loureiro, S.R. (1996). As técnicas gráficas e suas aplica- dendo a fazer interpretações impressionistas,
ções. Ribeirão Preto, SP: Anais do I Encontro da com resultados discutíveis [2], embora seja re-
SBRO, p.11-24.
Van Kolck, O.L. (1984). Testes projetivos gráficos no
comendável uma seqüência de passos, com
diagnóstico psicológico. São Paulo: EPU. base mais científica para a interpretação.
Atualmente, existem alguns sistemas de esco-
re, com adequada fidedignidade e validade,
entre os quais podem ser citados indicadores
DESENHO DA FIGURA HUMANA (2)
de desajustamento [13], dos quais os seis pri-
Dados históricos meiros pertencem à lista de Handler [6], im-
pulsividade [14] e comprometimento cogniti-
Quase concomitantemente, Karen Machover vo (vide, p.ex., 15-17).
[1] e Buck começaram a utilizar pressupostos Por outro lado, Portuondo [18] procurou
teóricos projetivos para fazer interpretações sistematizar as hipóteses interpretativas de
sobre personalidade, a partir de desenhos. Machover, relacionando-as com determinados
Machover partiu do pressuposto de que a fi- traços, sintomas e patologias específicas, e Pic-
gura humana desenhada representava o pró- colo [19] procurou identificar indicadores psi-
prio sujeito, e o papel, o seu ambiente, enquan- copatológicos em desenhos infantis.
to Buck teorizava que, “além da significação Tanto Machover como vários outros pesqui-
atribuída à figura humana, as pessoas também sadores se basearam mais em dados qualitativos
emprestam sentido a casas e árvores” [2]. Isso do desenho, sem “nenhum sistema de tabula-
ocorreu após um período em que procurava, ção, nem dados controlados a partir de investi-

222 JUREMA ALCIDES CUNHA


gações” [20]. Apenas poucos estudos mostraram tologias; c) avaliação numérica de característi-
preocupação com a avaliação numérica de cer- cas formais, abstratas ou de maturidade; d)
tas características do desenho ou com a mensu- avaliação das medidas físicas do desenho [23].
ração de determinados detalhes do desenho.
Segundo Klepsch e Logie [21], foi Koppitz
quem elaborou o “primeiro sistema de escore Indicações
aprimorado para a avaliação de desenhos in-
fantis”. Baseando-se nos achados de Macho- 1. Avaliação da personalidade.
ver [1] e de Hammer [22] e em dados de suas 2. Avaliação de variáveis específicas da per-
próprias pesquisas, identificou sinais qualitati- sonalidade.
vos, esperados e itens omitidos, apesar de es- 3. Identificação de indicadores emocionais
perados, que constituíram uma lista de 38 si- e psicopatológicos.
nais, que podem ser considerados indicadores
emocionais por refletirem “ansiedades, preo-
cupações e atitudes da criança” [20]. Comentários

1. Em relação aos diferentes enfoques, uti-


Descrição lizados no manejo da técnica, a avaliação glo-
bal impressionista é considerada por demais
Basicamente, é solicitado ao sujeito o desenho subjetiva [23]. Além disso, achados de pesqui-
de uma figura humana. Machover [1] pedia o sa demonstraram a existência de uma relação
desenho de uma pessoa e, a seguir, de outra entre a interpretação do desenho e o estilo in-
pessoa do sexo oposto. Entretanto, nas dife- terpessoal do examinador [24], mas há outros
rentes versões e conforme objetivos diversos enfoques que são mais objetivos e devem ser
de exploração, as instruções são muito variá- integrados para uma análise compreensiva do
veis. Alguns autores, como Machover e Por- desenho da figura humana [23].
tuondo, solicitam que o sujeito conte uma his- 2. Uma série de estudos, revisados por Sims,
tória sobre a(s) figura(s) desenhada(s). Even- Dana e Bolton [8], tem demonstrado os efei-
tualmente, é usado um questionário ou feito tos de fatores estressantes sobre os desenhos,
um inquérito adicional. podendo contaminar resultados e confundir
Não requer material técnico específico. O dados sobre ansiedade traço e ansiedade esta-
sujeito recebe folha(s) de papel em branco, lá- do. Handler [6], que desenvolveu um índice de
pis preto e borracha. As instruções são dadas ansiedade, composto por uma série de itens,
oralmente pelo examinador. sugere que se peça ao examinando um dese-
É aplicável a crianças, adolescentes e adul- nho adicional de um automóvel. Se os sinais
tos. de ansiedade estão presentes no desenho da
pessoa, mas não do carro, seriam devidos a
uma fonte interna de conflito e não de um es-
Administração tresse situacional [7].
3. Segundo Klepsch e Logie [21], têm havi-
Forma: individual ou coletiva. do sérias críticas quanto a certas hipóteses in-
Tempo: variável. terpretativas baseadas no desenho da figura
Manejo: conforme a versão utilizada e os humana. Assim, salientam que a ênfase olho-
objetivos da testagem, há diferentes enfoques orelha, sugestiva de aspectos paranóides, para
para o manejo: a) avaliação global impressio- Machover, foi seriamente questionada por pes-
nista, que procura ver o grau de distorção da quisas realizadas com pacientes paranóides que
realidade e outros índices psicopatológicos não salientaram tais detalhes em seus dese-
mais gerais; b) avaliação formal de aspectos nhos. A recomendação é de que qualquer in-
que se associam com traços psicológicos e pa- terpretação deva ser feita com extrema caute-

PSICODIAGNÓSTICO – V 223
la, considerando as hipóteses projetivas subja- 16. McLachlan, J.F.C., & Head, V.B. (1974). An impair-
centes. Groth-Marnat [2] chama a atenção de ment rating scale for human figure drawings. J. Clin.
Psychol., 30, 405-407.
que o desenho da figura humana que o sujeito 17. Mitchell, J., Trent, R., & McArthur, R. (1993). Hu-
faz pode ser uma representação real de si pró- man Figure Drawing Test: an illustrated handbook
prio, de uma imagem idealizada de si mesmo, for clinical interpretation and standardized assess-
de seu “self temido” ou, ainda, pode resultar ment of cognitive impairment. Los Angeles: Wes-
“da percepção que tem de pessoas de seu tern Psychological Services.
18. Portuondo, J.A. (1973). Test proyectivo de Karen
ambiente”. Machover. 2.ed. Madrid: Biblioteca Nueva.
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3.ed. New York: Oxford Universities Press. e colegas, a partir de um catálogo de traços,

224 JUREMA ALCIDES CUNHA


que representavam atributos observáveis, des- O material, editado pelo CEPA, compreen-
critivos de variáveis do comportamento huma- de, além do manual [3], o caderno de teste, a
no. Em comunicação pessoal a Gynther e Gyn- folha de respostas, a folha de perfil de perso-
ther [1], Cattell afirmou que “o seu objetivo nalidade (com instruções para cálculo dos fa-
em pesquisa de personalidade era muito sim- tores globais, no verso) e os crivos.
ples: definir e medir objetivamente os compo-
nentes básicos da personalidade, que a análi-
se fatorial demonstrou serem unitários em sua Administração
natureza”.
Para definir os componentes primários da Forma: individual ou coletiva.
personalidade, partiu do nome de traços de Tempo: em média, de 35 a 50 minutos.
personalidade [2], selecionando 171, que fo- Manejo: os escores são apurados com a
ram avaliados por estudantes, e, a partir da utilização de crivos; os resultados brutos são
intercorrelação de dados, identificou domí- transformados em resultados-padrão (estenos),
nios da personalidade geral (que, após vá- consultando-se tabelas (diferenciadas para sexo
rias revisões do instrumento, agora são cha- combinado, masculino ou feminino), havendo
mados de Fatores Globais [3], apresentando instruções específicas para o cálculo dos este-
uma estrutura similar à original) e 16 fatores nos, para os cinco fatores globais, sendo os re-
primários. sultados estenos para estes e para os 16 fatores
No Brasil, até pouco tempo atrás, eram usa- primários postos num gráfico, para se obter um
das duas formas paralelas do 16 PF, A e B [4], perfil, que é bastante útil para a interpretação.
com 187 itens cada uma, destinadas a adultos
com vocabulário suficiente para a leitura de
jornais. Em 1999, o CEPA publicou a tradução Indicação
e adaptação do The 16 PF® Fifth Edition [3]
(cujo conteúdo foi revisado e modernizado), 1. Medida de personalidade, para a classifi-
originalmente editado por Personality and Abi- cação de comportamentos, como base para de-
lity Testing, de Champaign, Illinois. cisões clínicas.

Descrição Comentário

A Quinta Edição do 16 PF é constituída por 185 1. Ainda que, em 1978, as avaliações do 16


itens, cada um com três alternativas, que abran- PF fossem classificadas como positivas, com re-
gem os 16 Fatores de Personalidade (Expansi- servas e até havendo uma avaliação negativa,
vidade, Inteligência, Estabilidade Emocional, a técnica, nos seis anos anteriores, ocupava o
Afirmação, Preocupação, Consciência, Desen- terceiro lugar quanto a “número de referên-
voltura, Brandura, Confiança, Imaginação, Re- cias, como recurso de avaliação objetiva da
quinte, Apreensão, Abertura a Novas Experiên- personalidade” [1]. Desde então, sua popula-
cias, Auto-suficiência, Disciplina e Tensão, sen- ridade tem sido crescente.
do os Fatores Globais os seguintes: Extrover-
são, Ansiedade, Rigidez de Pensamento, Inde-
pendência e Autocontrole. Além disso, incluem REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
indícios que avaliam tendências de respostas:
o de Administração da Imagem, o de Aquiesci- 1. Gynther, M.D., & Gynther, R.A. (1983). Personality
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É aplicável, em média, a partir dos 16 anos Sons.
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Forma: coletiva (todos os membros da famí-
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abreviado, formas A e B. Rio de Janeiro: CEPA. Tempo: 30 a 90 minutos.
Manejo: são utilizadas escalas de avaliação
de 7 pontos das dimensões, cujos extremos são
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
descritos por adjetivos, associados com a pro-
Burger, G.K., & Kabacoff, R.J. (1982). Personality types moção ou não de saúde emocional nas rela-
as measured by the 16 PF. J. Pers. Assess., 46, 2, ções familiares.
175-180.
Cattell, R.B., & Eber, H.W. (1968). 16 PF, manual abre-
viado, formas A e B. Rio de Janeiro: CEPA.
Honaker, L.M., & Fowler, R.D. (1990). Computer-assis-
Indicação
ted psychological assessment. In G. Goldstein & M.
Hersen, Ed. Handbook of psychological assessment. 1. Avaliação das relações familiares facilita-
2.ed. (p.541-546). New York: Pergamon Press. doras ou não de saúde emocional.

Comentário
EFE – ENTREVISTA FAMILIAR ESTRUTURADA
1. Trata-se de uma técnica diagnóstica com
Dados históricos boas qualidades psicométricas, que, embora
venha sendo mais utilizada em trabalhos de
A primeira versão da EFE foi criada por Terezi- pesquisa, é bastante promissora para a avalia-
nha Féres-Carneiro, em 1975 [1], passando por ção da dinâmica familiar em estudo de caso
uma reformulação e adaptação no final da individual. Peçanha [7], em seu trabalho, fez
mesma década [2] e, por fim, sendo objeto de um estudo de dez crianças asmáticas, discu-
estudos de fidedignidade e validade pela pró- tindo, caso por caso, a dinâmica familiar.
pria autora [3]. Trata-se de um método de ava-
liação das relações familiares, o primeiro mé- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
todo de avaliação familiar desenvolvido no Bra-
sil [4]. Anteriormente, eram utilizadas técnicas 1. Féres-Carneiro, T. (1975). Um novo instrumento clí-
projetivas com esse fim [5, 6]. Posteriormente, nico de avaliação das relações familiares. Rio de
Janeiro: PUC/Rio (Dissertação de mestrado).
Peçanha [7] desenvolveu critérios para a ava- 2. Féres-Carneiro, T. (1979). Reformulação da Entre-
liação de itens da EFE. vista Familiar Estruturada. São Paulo: PUC/SP; Rio
de Janeiro: PUC/Rio (Inédito).
3. Féres-Carneiro, T. (1981). Entrevista Familiar Estru-
turada: sua consistência, validade e aplicabilidade
Descrição em psicologia clínica. São Paulo: PUC/SP (Tese de
doutorado).
Na entrevista com todos os membros da família, 4. Féres-Carneiro, T. (1993). Avaliação da família. In
são propostas seis tarefas pelo entrevistador, que J.A. Cunha et alii. Psicodiagnóstico-R. 4.ed.rev.
(p.130-134). Porto Alegre: Artes Médicas.
coordena a sessão, sendo solicitada a participa-
5. Ceverny, C.M.O. (1982). O Scenotest como instru-
ção de cada um. Além da sessão ser gravada, um mento de investigação das relações familiares, no
observador faz anotações sobre o comportamen- processo psicodiagnóstico com crianças e adoles-
to de cada um dos membros da família. As di- centes. São Paulo: PUCSP (Dissertação de mestrado).
mensões a serem avaliadas são: comunicação, 6. Winter, W.D. & Ferreira, A.J. (1965). Story sequence
analysis of family TAT’s. J. Proj. Techn., 29, 392-397.
regras, papéis, liderança, conflitos, manifestação
7. Peçanha, D.L. (1997). A reciprocidade do desenvol-
da agressividade, afeição física, interação conju- vimento entre a criança com asma e sua família.
gal, individualização, integração, auto-estima. São Paulo: USP (Tese de doutorado).

226 JUREMA ALCIDES CUNHA


OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS ventário de Depressão de Beck [10] e de idea-
ção suicida que a depressão [17].
Féres-Carneiro, T. (1983). Família: diagnóstico e tera-
pia. Rio de Janeiro: Zahar.
Assim, o conceito de desesperança, suben-
Féres-Carneiro, T., & Lemgruber, V. (1979). Padronização tendendo um conjunto de expectativas nega-
de um novo instrumento clínico de avaliação das re- tivas frente ao futuro, foi o pano de fundo
lações familiares. Rio de Janeiro: PUC/RJ (Inédito). sobre o qual se delineou uma série de pesqui-
sas que marcaram os anos 80 e parte dos anos
90. Segundo autores mais atuais [18], deses-
perança engloba uma cadeia de causas próxi-
ESCALA DE DESESPERANÇA DE BECK (BHS) mas e distais da depressão, culminando em
uma causa próxima, que corresponde à expec-
Dados históricos tativa sobre a ocorrência de resultados, ante
os quais o indivíduo se sente desamparado e
A Escala de Desesperança de Beck, ou Beck certo de que nada pode fazer [19]. Em estudos
Hopelessness Scale, a BHS [1], é uma medida de validade de constructo da desesperança,
da dimensão do pessimismo [2], delineada para nossa equipe pôde constatar que desesperan-
operacionalizar um componente cognitivo [3] ça está associada com a possibilidade de res-
da tríade teórica de Beck sobre depressão [4]. trição da existência por motivos intrapsíquicos
Na realidade, desesperança, como construc- ou não [20].
to, havia sido introduzida na literatura psica-
nalítica, já na década de sessenta, relacionada
primariamente com depressão [5]. Desde aí, foi Descrição
sendo citada, às vezes, como um traço que se
associaria com vulnerabilidade a certos trans- A BHS é uma escala de auto-relato, composta
tornos mentais [6]. Também, naquela década, por vinte itens, que constituem afirmações com
Stotland formulou algumas hipóteses, retoma- as quais, conforme as instruções, o sujeito deve
das por vários autores [1, 7], que focalizam a concordar ou discordar [1], medindo a exten-
desesperança como elemento-chave do com- são de expectativas negativas sobre o futuro
portamento suicida, passando a ser teorica- imediato ou mediato. A soma dos escores dos
mente considerada como um elo básico entre itens individuais (0 ou 1) fornece um escore
depressão e suicídio [7]. Entretanto, a defini- total, que pode variar de 0 a 20. Maior escore
ção de desesperança não pressupunha a exis- indica maior pessimismo.
tência de um continuum entre desesperança e A escala é especialmente útil para uso com
esperança, nem hipóteses sobre traço ou esta- pacientes, especialmente pacientes deprimidos,
do [5]. adolescentes e adultos. Pode ser usada na po-
Com a formulação teórica de constructo pulação geral, especialmente com objetivo de
desesperança e suas conseqüências para a triagem. É necessário que o examinando apre-
questão de ideação suicida e risco de suicídio, sente uma compreensão verbal ao nível do
começou a se delinear importante apoio de tra- entendimento do conteúdo de itens.
balhos de pesquisa aos pressupostos teóricos O material (manual e protocolo) é distri-
[8], nos anos subseqüentes [1, 9-13]. Foi pos- buído por The Psychological Corporation.
sível verificar a existência de correlação dos Porém, há alguns anos, tendo a Casa do Psi-
escores da BHS com indicadores de suicídio em cólogo obtido autorização para pesquisa com
grupos clínicos [14] e, por outro lado, consta- o instrumento, desenvolvemos estudos sobre
tou-se que a intenção de suicídio se correlaci- as propriedades psicométricas de uma ver-
onava mais com desesperança do que com são em português da BHS, tendo sido o ma-
depressão [15, 16], sendo desesperança mais nual da versão em português já publicado
preditora de um eventual suicídio do que o In- [22].

PSICODIAGNÓSTICO – V 227
Administração 4. Beck, A.T., Rush, A.J., Shaw, B.F., & Emery, G. (1982).
Terapia cognitiva da depressão. Rio de Janeiro:
Zahar.
Forma: auto-administrada ou oral. 5. Glang, I.M., Haas, G.L., & Sweeney, J.A. (1995). As-
Tempo: 5 a 10 minutos, embora pacientes sessment of hopelessness in suicidal patients. Clin.
obsessivos graves possam levar 15 minutos. Psychol. Rev., 15, 1, 49-64.
Manejo: obtém-se o escore total através da 6. Steer, R.A., Iguchi, M.Y., & Platt, J.J. (1994). Hope-
soma dos escores das respostas aos itens indi- lessness in IV drug users not in treatment and se-
eking HIV testing and counseling. Drug & Alc. Dep.,
viduais, classificando o resultado conforme o 34, 99-103.
nível de desesperança, que pode ser mínimo 7. Minkoff, K., Bergman, E., Beck, A.T., & Beck, R.
(0-4), leve (5-8), moderado (9-13) ou grave (14- (1973). Hopelessness, depression and attempted
20), de acordo com as normas brasileiras para suicide. Am. J. Psych., 130, 4, 455-459.
uso com pacientes psiquiátricos, sendo espe- 8. Cunha, J.A., & Werlang, B.G. (1996). Um estudo com
a Escala de Desesperança de Beck em grupos clíni-
cialmente importante, do ponto de vista clíni- cos e não-clínicos. Psico, 27, 2, 189-197.
co, o escore de 9 ou mais, que, em pacientes 9. Beck, A.T., Steer, R.A., Beck, J.S., & Newman, C.F.
deprimidos, pode aconselhar a avaliação de ris- (1993). Hopelessness, depression, suicidal ideation
co de suicídio [22]. and clinical diagnosis of depression. Suicide Life-
Threat. Behavior, 32, 2, 139-145.
10. Beck, A.T., Steer, R.A., Kovacs, M., & Garrison, B.
(1985). Hopelessness and eventual suicide: a 10-
Indicações year prospective study of patients hospitalized
with suicide ideation. Am. J. Psych., 142, 559-
1. Avaliação do pessimismo ou de expecta- 563.
tivas negativas frente ao futuro em pacientes 11. Beck, A.T., Steer, R.A., & Shaw, B.F. (1984). Hopeles-
sness and alcohol-and heroin-dependent women.
psiquiátricos. J. Clin. Psychol., 40, 2, 602-606.
2. Triagem de atitudes pessimistas em ado- 12. Beck, A.T., Steer, R.A., & Trexler, L.D. (1989). Alco-
lescentes e adultos normais. hol abuse and eventual suicide: a 5– to 10-year pros-
pective study of alcohol-abusing suicide attempts.
J. Stud.Alc., 50, 3, 202-207.
13. Weishaar, M.C., & Beck, A.T. (1992). Hopelessness
Comentário and suicide. Int. Rev. Psych., 4, 2, 177-184.
14. Nekanda-Trepka, C.J., Bishop, S., & Blackburn, I.M.
1. Os resultados de pesquisa indicam que (1983). Hopelessness and depression. Brit. J. Clin.
o instrumento parece ser mais útil em gru- Psychol., 22, 1, 49-60.
pos clínicos do que em não-clínicos [8], por- 15. Emery, G.D., Steer, R.A., & Beck, A.T. (1981). De-
pression, hopelessness, and suicidal intent among
que, em não-pacientes, as respostas tendem heroin addicts. In. J. Add., 16, 3, 452-459.
a serem influenciadas por um traço de dese- 16. Wetzel, R.D., Margulies, T., Davis, R., & Karam, E.
jabilidade social [1] e porque o instrumento (1980). Hopelessness, depression, and suicidal in-
é pouco sensível em níveis baixos de deses- tent. J. Clin. Psychol, 41, 5, 159-160.
perança. 17. Cunha, J.A., Argimon, I.L., & Oliveira, M.S. (1995).
Depressão, desesperança e ideação suicida em al-
coolistas. Belo Horizonte: XI Congresso Brasileiro
de Alcoolismo e Outras Dependências.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 18. Alloy, L.B., Kelly, K.A., Mineka, S., & Clements, C.M.
(1980). Comorbidity of anxiety and depressive di-
1. Beck, A.T., & Steer, R.A. (1993). Beck Hopelessness sorders: a helplessness-hopelessness perspective. In
Scale. Manual. San Antonio, TX: Psychological Cor- J.D. Maser & C.R. Cloninger, Ed. Comorbidity of
poration. mood and anxiety disorders (p.499-493). Washing-
2. Beck, A.T., Weissman, A., Lester, D., & Trexler, L.D. ton: American Psychiatric Press.
(1974). The measurement of pessimism: the Hope- 19. Mineka, S., Watson, D., & Clark, L.A. (1998). Co-
lessness Scale. J. Consult. & Clin. Psychol., 42, 6, morbidity of anxiety and unipolar mood disorders.
861-865, Ann. Rev. Psychol., 49, 377-412.
3. Neimeyer, R.A. & Feixas, G. (1992). Cognitive asses- 20. Werlang, B.G.(1997). Uma investigação sobre o
sment in depression: a comparison of existing me- constructo desesperança. Porto Alegre: Anais do VII
asures. Eur. J. Psychol. Assess., 8, 1, 47-56. Encontro Nacional sobre Testes Psicológicos e I Con-

228 JUREMA ALCIDES CUNHA


gresso Ibero-Americano de Avaliação Psicológica ESCALA DE IDEAÇÃO SUICIDA DE BECK (BSI)
(p.147-150).
21. Cunha, J.A. (1997). Generalidades sobre a versão
brasileira do BDI, BAI, BHS e BSI. Porto Alegre: Anais
Dados históricos
do VII Encontro Nacional sobre Testes Psicológicos
e I Congresso Ibero-Americano de Avaliação Psico- A Escala de Ideação Suicida de Beck, ou Beck
lógica (p.135-139). Scale for Suicide Ideation, a BSI [1], pode-se
22. Cunha, J.A. (2001). Manual da versão em portu- dizer que teve sua semente lançada durante
guês das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicó-
logo.
um extensivo estudo longitudinal, que teve iní-
cio em 1970, levado a efeito por Aaron T. Beck
e sua equipe, na Universidade de Pennsylva-
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS nia, com pacientes com ideação suicida ou ten-
tativa prévia de suicídio, para determinar va-
Cunha, J.A., & Argimon, I.L. (1997). Um estudo sobre
depressão e desesperança em alcoolistas. San Juan,
riáveis preditoras de suicídio [2]. Inicialmente,
Porto Rico: XXV Congresso Interamericano de Psi- foi desenvolvida uma entrevista sistemática
cologia. para a avaliação de idéias, preocupações, de-
Cunha, J.A., Argimon, I.L., & Oliveira, M.S. (1997). Aná- sejos, planos relacionados com suicídio, em
lise da capacidade de instrumentos de auto-relato pacientes hospitalizados por transtornos de-
de discriminarem grupos de alcoolistas com e sem
ideação suicida. Porto Alegre: Anais do VII Encon-
pressivos. Assim foi criada a SSI, ou Scale for
tro Nacional sobre Testes Psicológicos e I Congres- Suicide Ideation (vide [3]), com base não só na
so Ibero-Americano de Avaliação Psicológica observação, como também em subsídios da li-
(p.313). teratura especializada [4-6]. No final da déca-
Cunha, J.A., & Oliveira, M.S. (1996). Indicadores psico- da de setenta, após extensivos estudos, foram
métricos de potencial suicida em pacientes com
dependência do álcool ou com episódio de depres-
feitas modificações nas instruções, e os itens
são maior. São Paulo: Simpósio Internacional De- iniciais passaram a ser usados como um scree-
pressão no Ciclo da Vida. ning da presença ou ausência de ideação suici-
Cunha, J.A., Oliveira, M.S., & Argimon, I.L. (1996). A da, e, assim, ficou criada a BSI, como uma
avaliação do potencial suicida em dependentes de medida escalar de auto-relato.
substâncias. São Paulo: XXVI Congresso Interame-
ricano de Psicologia. Resumos (p.179).
Cunha, J.A., Oliveira, M.S. & Argimon, I.L. (1997). A
avaliação do potencial suicida em dependentes de Descrição
substâncias. Recife: XII Congresso Brasileiro sobre
Alcoolismo e Outras Dependências. A BSI compreende 21 itens, sendo que cada
Cunha, J.A., Oliveira, M.S., Touguinha, L.A., Martins,
M.L., Trentini, C.M., & Christ, H.D. (1995). Depres-
um deles apresenta alternativas, que variam
são, pessimismo e ideação suicida em alcoolistas. quanto à gravidade, de 0 a 2. Os 19 primeiros
Psico, 26, 2, 133-152. itens medem a intensidade de “desejos, atitu-
Cunha, J.A., Oliveira, M.S., & Werlang, B.G. (1997). Con- des ou planos de suicídio” [1], enquanto os
siderações sobre desesperança na avaliação do po- itens 20 e 21 investigam a existência ou não
tencial suicida. São Paulo: XXVI Congresso Intera-
mericano de Psicologia.
de história de tentativa prévia, bem como a
Cunha, J.A., & Werlang, B.G. (1996). Desesperança em seriedade ou não da intenção letal do pacien-
grupos psiquiátricos e não-psiquiátricos. São Pau- te, em sua última tentativa de suicídio.
lo: Simpósio Internacional Depressão no Ciclo da Se, nos cinco primeiros itens, o paciente não
Vida. admite qualquer idéia relacionada com suicí-
Oliveira, M.S. (1997). A complexa questão do potencial
suicida em alcoolistas. Porto Alegre: Anais do VII
dio, deixa de responder os restantes, exceto o
Encontro Nacional sobre Testes Psicológicos e I Con- 20 e o 21.
gresso Ibero-Americano de Avaliação Psicológica É utilizado em pacientes psiquiátricos de 17
(p.143-146). anos ou mais.
O material (manual e protocolo) é distribuí-
do por The Psychological Corporation. Porém,
há alguns anos, tendo a Casa do Psicólogo

PSICODIAGNÓSTICO – V 229
obtido autorização para pesquisa com o ins- 2. Beck, A.T., Steer, R.A., Kovacs, M., & Garrison, B.
trumento, desenvolvemos estudos sobre as (1985). Hopelessness and eventual suicide: a 10-
year prospective study of patients hospitalized with
propriedades psicométricas de uma versão em suicide ideation. Am. J. Psych., 142, 559-563.
português do BSI, já divulgado. 3. Beck, A.T., Rush, A.J., Shaw, A.F., & Emery, G. (1982).
Terapia cognitiva da depressão. Rio de Janeiro: Zahar.
4. Farberow, N., & Shneidman, E.S. (1961). The cry for
Administração help. New York: McGraw-Hill.
5. Resnik, H., Ed. (1968). Suicidal behaviors: diagno-
sis and management. Boston, MA: Little, Brown & Co.
Forma: individual e oral (quando se pressu- 6. Shneidman, E.S., Ed. (1967). Essays in self destruc-
põem problemas de compreensão verbal), in- tion. New York: Science House.
dividual e auto-administrada ou coletiva. 7. Cunha, J.A. (2001). Manual da versão em portu-
Tempo: geralmente, de 5 a 10 minutos (se guês das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicó-
logo.
auto-administrada) ou 10 minutos (se oral).
Manejo: a) verifica-se a presença de qual-
quer escore diferente de zero em qualquer dos OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
primeiros cinco itens, para concluir pela pre-
sença ou não de ideação suicida; b) somam-se Cunha, J.A., Argimon, I.L., & Oliveira, M.S. (1995). De-
pressão, desesperança e ideação suicida em alcoo-
os escores dos 19 primeiros itens, podendo-se listas. Belo Horizonte: XI Congresso Brasileiro de
avaliar a gravidade da intenção suicida; c) os Alcoolismo e Outras Dependências.
escores nos dois últimos itens (20 e 21) não Cunha, J.A., Argimon, I.L., & Oliveira, M.S. (1996). Aná-
entram no cômputo total, fornecendo apenas lise da capacidade de instrumentos de auto-relato
informações adicionais. de discriminarem grupos de alcoolistas com e sem
ideação suicida. Gramado, RS: XVIII Jornada Sul-Rio-
grandense de Psiquiatria Dinâmica.
Cunha, J.A., Argimon, I.L., & Oliveira, M.S., & Werlang,
Indicações B.G. (1997). Depressão, ansiedade, desesperança,
ideação suicida: medida e pesquisa (mesa-redon-
1. Identificação da presença ou não de idea- da). Porto Alegre: VII Encontro Nacional sobre Tes-
ção suicida. tes Psicológicos e I Congresso Ibero-Americano de
2. Avaliação da intensidade (gravidade) da Avaliação Psicológica.
ideação suicida, portanto, do risco de suicídio. Cunha, J.A., Argimon, I.L., & Oliveira, M.S. (1997). A
avaliação do potencial suicida em dependentes de
substâncias. São Paulo: XXVI Congresso Interame-
Comentário ricano de Psicologia.
Cunha, J.A., Oliveira, M.S., Touguinha, L.A., Martins,
1. Sendo uma medida de auto-relato, o pa- M.L., Trentini, C.M. & Christ, H.D. (1995). Depres-
são, pessimismo e ideação suicida em alcoolistas.
ciente pode esconder suas verdadeiras inten- Psico, 26, 2, 133-152.
ções. Em razão disso, os autores sugerem que Cunha, J.A., Werlang, B.G. & Fin, J.N. (1997). Estu-
a BSI seja utilizada juntamente com o BDI e a dos sobre algumas variáveis preditoras de idea-
BHS, para se avaliar melhor sintomas de de- ção suicida em pacientes com história de tentati-
pressão e desesperança, que podem contribuir va de suicídio. Florianópolis: VI Jornada de Psi-
quiatria da Região Sul, VI Jornada Catarinense de
para o esclarecimento do estado atual do pa- Psiquiatria e Encontro de Psiquiatria do MERCO-
ciente. Entretanto, os autores também são cla- SUL.
ros em afirmar que a BSI não substitui a avalia-
ção clínica de um especialista.
FIGURAS COMPLEXAS DE REY
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Dados históricos
1. Beck, A.T., & Steer, R.A. (1993). Beck Scale for Suici-
de Ideation. Manual. San Antonio, TX: Psychologi- Na década de 40, André Rey propôs um novo
cal Corporation. teste, que constava da cópia e reprodução de

230 JUREMA ALCIDES CUNHA


memória de um traçado geométrico, que apre- te os lápis de cor. O próprio sujeito determina-
sentava uma estrutura complexa, formando rá o encerramento da administração.
uma figura sem significação evidente, mas que
não envolvia maiores dificuldades para sua rea-
lização gráfica [1]. Partia da pressuposição de Administração
que só é possível avaliar a memória visográfica
de um sujeito, se for possível afirmar que sua Forma: individual.
atividade perceptiva analítica e organizadora Tempo: variável entre 2 e 25 minutos [2].
está suficientemente intacta, de forma que Manejo: tanto o produto da cópia como o
demonstre, na cópia da figura, que percebeu da reprodução por memória são analisados,
os dados de maneira inteligível [2]. conforme seus componentes, sendo pontua-
O teste tornou-se muito difundido e, na das unidades de escore (são apresentadas ta-
maioria das administrações, é utilizada a figu- belas normativas, francesas e brasileiras), mas
ra elaborada por Osterrieth [3], geralmente a produção do paciente também pode ser ob-
chamada de figura de Rey-Osterrieth ou a fi- jeto de análise qualitativa [5].
gura de Taylor [4]. Observa-se, também, que
variam os examinadores no que se refere à re-
produção de memória imediata ou tardia [4]. Indicação
Aliás, na própria edição, que foi traduzida para
o português, é referido que o teste sofreu de- 1. Avaliação neuropsicológica de funções de
formações, que estão sendo corrigidas [2]. percepção e memória.
A versão original é do Centre de Psycholo-
gie Appliquée, em Paris, e a tradução para a
Casa do Psicólogo foi publicada em 1999. Nes- Comentário
sa edição, foi acrescentado um segundo teste
(Figura B), que inclui uma figura mais simples 1. Embora se reconheça o esforço de apre-
que a original (Figura A), para ser usada dos 4 sentar normas brasileiras, a partir da coleta
aos 7 anos. Em relação à Figura A, pode ser de dados em número apreciável de sujeitos
usada a partir dos 4 anos, e há estudos de (N = 280), a própria coordenação faz algu-
sujeitos idosos, inclusive, com mais de 90 mas ressalvas quanto à heterogeneidade da
anos [4]. amostra. A sugestão, portanto, é que se dê
continuidade a estudos com o teste em gru-
pos clínicos e não-clínicos, possibilitando a
Descrição apreciação de algumas de suas característi-
cas psicométricas.
Ao sujeito é entregue uma folha de papel em
branco, sem pautas, e um lápis de cor, ao mes-
mo tempo que lhe são dadas instruções e é REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
apresentada a lâmina da prova (A ou B). O exa-
minador começa a marcar o tempo e conserva 1. Rey, A. (1959). Test de copie d’une figure comple-
consigo mais cinco ou seis lápis de cores varia- xe. Manual. Paris: Centre de Psychologie Appliquée.
2. Rey, A. (1998/1999). Teste de cópia e de reprodu-
das, que vão sendo entregues sucessivamente ção de memória de figuras geométricas complexas:
ao sujeito, durante as diferentes fases de có- manual. São Paulo: Casa do Psicólogo.
pia, de maneira que fique claramente identifi- 3. Osterrieth, P.A. (1944). Le test de copie d’une figu-
cada a estratégia utilizada. re complexe. Neuchâtel et Paris: Delachaux & Nies-
Conforme as instruções da atual edição, tlé.
4. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment.
depois de um intervalo de três minutos, o su- 3.ed. New York: Oxford Universities Press.
jeito será solicitado a reproduzir de memória a 5. Weinstein, C.S., & Seidman, L.J. (1994). The role of
figura copiada, sendo entregues sucessivamen- neuropsychological assessment in adult psychiatry.

PSICODIAGNÓSTICO – V 231
In J.M. Ellison, C.S. Weinstein & T. Hodel-Malino- sultantes de inquérito ulterior à representa-
fsky, Ed. The psychotherapist’s guide to neurop- ção das mesmas.
sychiatry (p.53-106). Washington: American
Psychiatric Press.

Descrição

HTP O HTP é um teste gráfico e verbal, que utiliza


lápis e papel. É considerado uma técnica gráfi-
Dados históricos ca porque envolve desenho e técnica verbal,
porque se solicita que o sujeito fale sobre cada
O teste da casa-árvore-pessoa, comumente desenho, havendo uma série de perguntas pre-
designado como HTP, foi criado por John N. paradas para este fim.
Buck [1], em 1948, com estudos adicionais de Como técnica gráfica, pode incluir uma fase
Buck e Hammer [2], sob a pressuposição de que acromática e uma cromática.
as pessoas, além de emprestarem significação O material necessário para o HTP acromáti-
à figura humana, também o fazem com obje- co inclui três folhas de papel, lápis preto no 2,
tos familiares, como casas e árvores [3]. Além borracha e apontador. Para o HTP cromático, o
de serem objetos facilmente aceitáveis, tanto sujeito utiliza lápis de cor.
para serem desenhados como para suscitarem Pode ser administrado em crianças, adoles-
associações, também são “conceitos simboli- centes e adultos.
camente férteis, em termos de significação in-
consciente” [4].
Como técnica psicométrica, é possível fa- Administração
zer uma estimativa da inteligência do sujeito,
que é bastante complexa. Utilizando seu siste- Forma: individual ou coletiva, sendo que,
ma quantitativo de escore, Buck fez uma esti- na coletiva, as questões são respondidas não
mativa de satisfatória correlação do HTP com oralmente, mas por escrito.
a Escala Wechsler-Bellevue; já com o QI de exe- Tempo: variável, recomendando-se que não
cução do WAIS-R, a estimativa de correlação exceda 60 minutos.
com o sistema de Buck, ainda que positiva, foi Manejo: existe um sistema de escore bastan-
bem mais baixa [3]. Como técnica projetiva, a te complexo, para o qual há instruções detalha-
hipótese tradicional é de que a figura humana das e bastante rígidas, sendo atribuídos escores
representaria um auto-retrato, sendo a casa e para 34 itens na casa, 17 na árvore e 34 na pes-
a árvore também aspectos de si mesmo, a casa soa, e os valores resultantes permitem inferên-
associando-se com o corpo, bem como com cias sobre inteligência; a análise qualitativa tam-
“aspectos de nutrição, estabilidade e sentido bém leva em conta detalhes dos desenhos, inter-
de pertencimento”, enquanto a árvore teria que pretados em termos da dinâmica individual.
ver com “um sentido de crescimento, vitalida-
de e desenvolvimento”. Ou, ainda, pessoa, casa
e árvore poderiam representar, respectivamen- Indicação
te, o eu, a figura materna e a figura paterna
[3]. Quando desenhadas em folhas separadas, 1. Avaliação da personalidade e de suas in-
são levados em conta, principalmente, o tama- terações com o ambiente.
nho e a qualidade; se numa única folha, consi-
deram-se também a ordem e a colocação de
cada objeto em relação aos demais. Comentários
Na interpretação psicodinâmica, concor-
re não só o simbolismo inerente à casa, ár- 1. O HTP apresenta algumas restrições em
vore e pessoa, mas também conteúdos re- sua aplicabilidade clínica, em especial quanto

232 JUREMA ALCIDES CUNHA


ao seu emprego como medida de inteligência. Inicialmente, foram selecionados itens que
Sua correlação com medida atual de inteligên- apresentassem correlação com escalas de an-
cia, ainda que positiva, é baixa, não se reco- siedade, como as de Cattell e Sheir, de Taylor e
mendando seu uso para a avaliação intelectual. de Welsh. Não obstante, como a maioria das
2. A técnica é promissora, mas sua princi- escalas mediam traço, muitos itens foram re-
pal desvantagem é a falta de pesquisa a res- formulados para chegar a um instrumento que,
peito. Portanto, deve ser considerada como com diferentes instruções, pudesse avaliar tan-
instrumento apenas coadjuvante na avaliação to o estado como o traço de ansiedade [1].
da personalidade. Pouco tempo depois, Levitt, conforme Ra-
manaiah e colegas [2], ao avaliar uma série de
medidas de ansiedade, já considerava o IDATE
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS como “o instrumento mais cuidadosamente
desenvolvido, tanto do ponto de vista teórico
1. Buck, J.N. (1948). The H-T-P techniques: a qualitati-
ve and a quantitative scoring manual. J. Clin.
como metodológico”. Além disso, segundo
Psychol., 4, 317-396. McReynolds [3], é provavelmente o mais am-
2. Buck, J.N., & Hammer, E.F. (1969). Advances in the plamente usado como medida de ansiedade.
House-Tree-Person technique: variations and appli- Com o desenvolvimento das pesquisas, o
cations. Los Angeles: Western Psychol. Services. objetivo inicial foi modificado, e, hoje em dia,
3. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycholo-
gical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons.
o instrumento é constituído por dois conjun-
4. Hammer, E.F. (1989). Aplicações clínicas nos dese- tos de itens para avaliar duas dimensões de
nhos projetivos. São Paulo: Casa do Psicólogo. ansiedade, como estado transitório e “como
traço relativamente estável da personalidade” [2].
Embora tenha sido criado para utilização
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
com pessoas normais, as pesquisas demons-
Campos, D.M. (1977). O teste do desenho como ins- traram a sua utilidade também para a avalia-
trumento de diagnóstico da personalidade. Petró- ção de casos psiquiátricos.
polis, RJ: Vozes. A tradução e adaptação brasileira, por Bia-
Klepsch, M., & Logie, L. (1984). Crianças desenham e ggio e Natalício [4], constituiu um trabalho
comunicam. Porto Alegre: Artes Médicas.
Morris, W.W. (1976). Otras técnicas proyectivas. In H.H.
metodologicamente muito cuidadoso, apresen-
Anderson & J.L. Anderson. Técnicas proyectivas del tando normas para adultos e adolescentes.
diagnóstico psicológico. 3.ed. (p.576-604). Madrid:
Rialp.
Van Kolck, O.L. (1975). Técnicas de exame psicológico Descrição
e suas aplicações no Brasil. Testes de personalida-
de. Petrópolis, RJ: Vozes.
Cada uma das escalas consiste em 20 itens, a
que os indivíduos devem responder, avaliando
a si mesmos, numa escala de quatro pontos.
IDATE As instruções, impressas no protocolo, orien-
tam o sujeito a responder como se sente no
Dados históricos presente momento, em relação aos itens rela-
tivos à ansiedade-estado, e como se sente ge-
O IDATE, ou Inventário de Ansiedade Traço- ralmente, em relação aos itens referentes à
Estado, de autoria de Spielberger, Gorsuch e ansiedade-traço. No entanto, as instruções re-
Lushene, começou a ser construído em 1964, lacionadas com ansiedade-estado podem ser
com o objetivo de criação de um instrumen- modificadas para mensuração da ansiedade
to de pesquisa que pudesse ser utilizado com num momento específico.
adultos normais, como medida objetiva de A ordem de apresentação recomendada é
estado (A-estado) e traço de ansiedade (A- a usada na padronização e a constante no pro-
traço). tocolo, isto é, em primeiro lugar, administra-

PSICODIAGNÓSTICO – V 233
ção da escala A-estado (forma x-1) e, em se- ma a atenção de que dependem do que as
gundo lugar, a escala A-traço (forma x-2). pessoas desejem e “de que sejam capazes de
As categorias escalares para A-estado são as descrever corretamente seus próprios senti-
seguintes: 1. Absolutamente não; 2. Um pouco; mentos e comportamentos”, o que salienta a
3. Bastante; 4. Muitíssimo. As categorias escala- importância do estabelecimento de um bom
res para A-traço são: 1. Quase nunca; 2. Às ve- rapport.
zes; 3. Freqüentemente; 4. Quase sempre. 2. Apesar da facilidade e brevidade da admi-
O material é distribuído pelo CEPA e consta nistração, para que o sujeito seja capaz de des-
de manual e protocolo, denominado Questio- crever como se sente, é necessário que seu nível
nário de auto-avaliação. intelectual seja, no mínimo, médio inferior [1].
Pode ser utilizado com adolescentes e adul- 3. Várias pesquisas foram realizadas para
tos. verificar se as duas escalas estariam “medindo
dimensões separadas de ansiedade”, em vista
da alta correlação entre as mesmas. Ramanai-
Administração ah e colegas [2] confirmaram a hipótese de que
essa correlação elevada fosse “devida à pre-
Forma: individual ou coletiva. sença de itens com baixa saturação de conteú-
Tempo: não há tempo limite; o tempo va- do nessas escalas” e recomendam que seja in-
ria principalmente conforme o nível de escola- cluída alguma medida nesse sentido quando o
ridade e as condições emocionais, sendo ne- instrumento sofrer uma revisão.
cessários de 6 a 12 minutos aproximadamente 4. Pesquisas demonstraram que sujeitos
para cada escala individual, e de 15 a 20 minu- com resultados elevados na A-traço tendem a
tos, aproximadamente, para ambas as escalas; maior elevação na A-estado em situações de
em aplicações subseqüentes, o tempo é menor. estresse e, portanto, podem sofrer interferên-
Manejo: para atribuir o escore, é necessá- cias no desempenho de outros testes. Spiel-
rio identificar previamente quais os itens que berger [5] salienta que “as diferenças indivi-
devem ser contados diretamente e quais os que duais, na disposição de manifestar estados de
se deve inverter (há 10 itens que devem ser ansiedade, variam de uma situação estresssan-
contados inversamente na escala A-estado e 7 te para outra”.
na escala A-traço); obtidos os escores para cada 5. La Rosa [6] desenvolveu uma investiga-
item, estes são somados e, determinada a ção, analisando efeitos dos fatores sexo e ní-
amostra normativa mais apropriada, consulta- vel socioeconômico sobre as médias, em estu-
se a tabela, localizando-se o escore bruto ob- dantes de primeiro, segundo e terceiro graus.
servado e obtendo-se o escore “T”, ou a or- Em relação à ansiedade-estado, observou-se
dem percentílica correspondente, sendo que, que nível socioeconômico suscita diferenças
com folhas de resposta IBM, a avaliação pode significantes entre as médias no sexo femini-
ser feita por meio do computador. no, mas não no masculino.

Indicação REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Spielberger, C.D. (1972). Conceptual and methodo-


1. Avaliação da ansiedade, como estado e logical issues. In C.D. Spielberger, Ed. Anxiety cur-
como traço. rent trends in theory and research. V.2 (p.481-493).
New York: Academic Press.
Comentários 2. Ramanaiah, N.V., Franzen, M., & Schill, T. (1983). A
psychometric study of State-Trait Anxiety Inventory.
J. Pers. Assess., 47, 6, 531-535.
1. Como as respostas autodescritivas podem 3. McReynolds, P. (1989). Diagnosis and clinical asses-
ser “sujeitas à falsificação, através de uma va- sment: current and major issues. Ann. Rev. Psychol.,
riedade de mecanismos”, Spielberger [1] cha- 40, 83-108.

234 JUREMA ALCIDES CUNHA


4. Spielberger, C.D., Gorsuch, R.L., & Lushene, R.E. estado (A-estado) e ansiedade-traço (A-traço).
(1979). Inventário de ansiedade traço-estado. Ma- Cada uma das escalas compreende 20 afirma-
nual. Tradução e adaptação de A.M.B. Biaggio e L.
Natalício. Rio de Janeiro: CEPA.
ções, num formato mais simplificado que o
5. Spielberger, C.D. (1972). Anxiety as an emotional IDATE, e as instruções indicam que a criança
state. In C.D. Spielberger, Ed. Anxiety current tren- deve responder como se sente em determina-
ds in theory and research. V.1 (p.23-49). New York: do momento (na escala de A-estado) ou como
Academic Press. se sente geralmente (na escala de A-traço), se-
6. La Rosa, J. (1991). Inventário de ansiedade traço-
estado: características psicométricas. Ribeirão Pre-
lecionando uma entre três alternativas possí-
to, SP: XXI Reunião Anual de Psicologia da Socie- veis para cada item.
dade de Psicologia de Ribeirão Preto. O material é distribuído pelo CEPA e suas
concessionárias, constando do manual e do
protocolo, denominado Questionário de auto-
IDATE-C avaliação.
Destina-se ao uso com crianças de 9 a 12
Dados históricos anos, mas pode ser utilizado com crianças de
menos idade, dependendo de sua habilidade
O Inventário de Ansiedade Traço-Estado para em leitura, e também tem sido usado com ado-
Crianças, de Charles D. Spielberger, começou a lescentes [3].
ser desenvolvido em 1969, como um instru-
mento de pesquisa, construído com base em
experiências e na forma do IDATE para adoles- Administração
centes e adultos e, portanto, com ele se asse-
melha em termos de concepção e estrutura [1]. Forma: individual ou coletiva.
Assim, para informações gerais, consultar IDA- Tempo: não há limite de tempo, variando
TE, dentro deste tema. de 8 a 12 minutos aproximadamente, para cada
O instrumento, como o IDATE, propõe-se a escala individual, e sendo de pouco menos de
medir duas dimensões ou dois conceitos dis- 20 minutos para ambas as escalas ou ainda de
tintos de ansiedade: 1) estado de ansiedade, menos em aplicações subseqüentes.
ou ansiedade-estado, que, conforme a formu- Manejo: para atribuir o escore, é necessá-
lação teórica de Spielberger, “pode ser concei- rio identificar previamente os itens que devem
tualizado como um estado emocional transi- ser contados diretamente (numa escala de 1 a
tório, que varia em intensidade e flutua com o 3) e os que devem ser invertidos (numa escala
decorrer do tempo”, e 2) traço de ansiedade, de 3 a 1), embora a tarefa possa ser facilitada
ou ansiedade-traço, que “se refere a diferen- com o uso de crivos ou com o uso de folhas
ças individuais relativamente estáveis quanto IBM; o escore bruto é transformado em escore
à propensão para a ansiedade, isto é, a dife- T ou valor percentílico, em tabelas referentes a
renças na disposição em perceber uma ampla cada escala.
série de situações-estímulo como perigosas ou
ameaçadoras, e na tendência de responder a
tais ameaças com reações de A-estado” [2]. Indicações
A tradução brasileira, desenvolvida por Biag-
gio, é metodologicamente muito cuidadosa [1]. 1. Medida de ansiedade transitória (A-esta-
do) em determinadas situações (de orientação,
testagem, terapia, etc.).
Descrição 2. Medida de aspectos mais generalizados
e estáveis da ansiedade (A-traço).
O IDATE-C, como o IDATE, é constituído por 3. Medida da eficácia da terapia comporta-
duas escalas que visam à medida de duas di- mental.
mensões específicas de ansiedade: ansiedade- 4. Pesquisa.

PSICODIAGNÓSTICO – V 235
Comentário econômico e grau de instrução. Pode-se consi-
derar, portanto, que o INV, como medida de
1. Ollendick e Greene [3] afirmam que uma das inteligência geral (fator “g”), foi uma das téc-
vantagens do IDATE-C é de que “a escala de nicas melhor padronizadas no Brasil. Atualmen-
ansiedade-estado é delineada de tal maneira te, está sendo iniciado um estudo para a atua-
que podem ser determinadas as respostas a lização de normas para adolescentes [1].
situações específicas provocadoras de ansieda- Coerente com sua formação acadêmica, o
de”. Além disso, há indicações de manifesta- INV reflete o consenso do autor com as idéias
ções cognitivas, motoras e fisiológicas, impor- de Piaget, embora tal embasamento teórico
tantes numa avaliação. não tenha sido expresso de maneira formal.
Em conseqüência, Eva Nick [2] procurou de-
senvolver uma análise da estrutura do teste,
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS com base na teoria piagetiana e a exemplo da
análise, feita por Sara Paín [3], do teste de
1. Biaggio, A., & Spielberger, C.D. (1983). Inventário
de ansiedade traço-estado – IDATE-C. Manual. Rio
Matrizes Progressivas de Raven. Dessa manei-
de Janeiro: CEPA. ra, aquela autora abriu perspectivas para a
2. Spielberger, C.D. (1972). Anxiety as an emotional apreciação das implicações diagnósticas dos
state. In C.D. Spielberger, Ed. Anxiety current tren- erros cometidos pelo sujeito, ampliando assim
ds in theory and research. V.1. (p.23-49). New York: a utilização clínica do teste.
Academic Press.
3. Ollendick, T.H., & Greene, R. (1990). Behavioral as-
sessment of children. In G. Goldstein & M. Hersen,
Ed. Handbook of psychological assessment. 2.ed. Descrição
(p.403-422). New York: Pergamon Press.
O INV é apresentado em três séries paralelas,
A, B e C, que podem ser utilizadas para teste e
reteste, embora a forma C, usada na pesquisa
INV nacional, seja mais indicada para sujeitos da
zona rural, conforme o Manual do CEPA, que é
Dados históricos o distribuidor do material no Brasil.
Cada uma das formas é apresentada em for-
O INV, ou Teste de Inteligência Não-Verbal, foi mato de caderno, com 60 itens, ordenados pelo
criado originalmente em 1951, por Pierre Weil, grau de dificuldade, além de itens iniciais, usa-
na Sociedade Pestalozzi do Brasil, tendo em dos como exemplos. Os itens, embora originais,
seguida sido utilizado numa pesquisa de âm- denunciaram a inspiração buscada em outros
bito nacional, com o concurso do Serviço de testes, como o de Raven, de Dearbon, etc. [2]. A
Seleção e Orientação Profissional do SENAC e forma de apresentação dos problemas asseme-
a organização de uma Comissão Nacional, en- lha-se ao teste de Raven, com séries de desenhos,
carregada do planejamento e direção geral da dos quais é omitida uma parte, que o sujeito deve
investigação. Planejada para uma amostra por identificar entre as oito figuras apresentadas
quotas, abrangendo 30.000 casos, construída abaixo do problema. Entretanto, os itens são ela-
com base no censo de 1950 do IBGE e também borados de forma mais concreta. Por outro lado,
em dados do Serviço de Estatística da Educa- além de problemas de lacunas, há itens “de in-
ção e Cultura, chegaram a ser testadas mais clusão numa classe, de analogias de figuras, de
de 25.000 pessoas e estudados os resultados seriações concretas e numéricas, de permutações
em função das seguintes variáveis, considera- e de relações espaciais” [2].
das na constituição da amostra: sexo, cor, resi- É um teste não-verbal, de papel e lápis, que
dência, idade, região do país, nacionalidade, pode ser utilizado com crianças, adolescentes
estado conjugal, alfabetização, instrução, lo- ou adultos, independentemente do nível de
cal de nascimento, atividade exercida, nível instrução e do idioma do sujeito.

236 JUREMA ALCIDES CUNHA


O material compreende o manual, o cader- des que esta oferece para a aquisição de pa-
no de teste e o crivo de apuração. drões superiores de pensamento abstrato [6],
que ultrapassam os efeitos da educação for-
mal básica admitidos por Weil e Nick [4].
Administração 3. A partir da análise dos dados da pesqui-
sa nacional, foi observada a presença de uma
Forma: individual ou coletiva. relação entre o nível de escolaridade e do nível
Tempo: livre (embora seja anotado o tem- ocupacional paterno com o nível intelectual dos
po total), variável individualmente, de 15 a 60 filhos, também observada por nós [7].
minutos. 4. No estudo iniciado para a atualização de
Manejo: com o uso do crivo de apuração, normas do INV, para adolescentes, foi utiliza-
contam-se as respostas certas, após anular, da uma amostra de 351 sujeitos, sendo 229
previamente, os itens com respostas duplas, do sexo masculino e 122 do sexo feminino, de
obtendo-se, assim, o número de pontos total, 13 a 16 anos, variando em escolaridade de ter-
que deve ser transformado em percentil, atra- ceira a sétima séries, testados em seleção para
vés de tabelas apropriadas. o Projeto Oficina-Escola, coordenado pela
TRENSURB e encaminhados por instituições. A
média de acertos foi de 42,5 (DP = ±6,93).
Indicações Não foram verificadas diferenças quanto à va-
riável idade, mas sim, quanto à variável sexo (F
1. Medida da inteligência geral (fator “g”), = 6,156, p < 0,014). São resultados apenas
não-verbal. preliminares, e é importante chamar a aten-
2. Avaliação do nível intelectual em analfa- ção de que todos os sujeitos eram de famílias
betos, sujeitos de língua estrangeira, surdos e de baixa renda [1].
sujeitos com problemas de linguagem.
3. Reconhecimento do tipo de operações
mentais concretas ou formais de que o sujeito REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
é capaz, o que permitiria a investigação de
1. Bandeira, D.R., Pereira, D.F., & Alchieri, J.C. (1999).
déficits neuropsicológicos. Teste de inteligência não-verbal (INV). Forma de C
de Pierre Weil: estudo preliminar para a atualiza-
ção de normas para adolescentes. Porto Alegre: VIII
Comentários Congresso Nacional de Avaliação Psicológica. Pro-
grama e pôsters. Pôster no 67.
2. Nick, E. (1977). O teste de inteligência não-verbal
1. Apesar de o teste ser indicado para uso de Pierre Weil: análise de sua estrutura baseada na
com analfabetos, as médias aritméticas desses teoria de Jean Piaget. Rio de Janeiro: CEPA.
sujeitos são consistentemente mais baixas que 3. Paín, S. (1971). Psicometría genética. Buenos Aires:
as de indivíduos alfabetizados. Tais dados re- Galerna.
fletem a existência de diferenças nas operações 4. Weil, P., & Nick, E. (1971). O potencial da inteligên-
cia do brasileiro. Rio de Janeiro: CEPA.
mentais, atribuídas à influência da educação for- 5. Cunha, J.A., Freitas, N.K., & Raymundo, M.G.B.
mal e de fatores ambientais estimuladores [4]. (1991). Psicodiagnóstico. 3.ed. Porto Alegre: Artes
2. A forma A foi padronizada, pelo SENAC, Médicas.
numa amostra de 1.000 adolescentes, de 11 a 6. Cunha, J.A. (1969). O caráter seletivo da escola de
17 anos, do antigo Distrito Federal. Contudo, nível médio. Correio do Povo, III, 66, 6.
7. Cunha, J.A. & Moraes, M.I.B. (1968). Status social e
resultados obtidos numa amostra representa- nível intelectual. Bol. CEPA, 3, 13-15.
tiva de estudantes de Porto Alegre [5, Anexo
1] foram apreciavelmente mais elevados do que
os da amostra que serviu para a padronização OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
do teste, o que parece se associar com um ca-
Cunha, J.A., Carvalho, L.C., Moraes, M.I.B., & Maranin-
ráter seletivo da escola e com as oportunida- chi, S. (1968). Estudo do nível intelectual de estu-

PSICODIAGNÓSTICO – V 237
dantes de nível médio de Porto Alegre, através do avaliar o quanto cada um dos sintomas é apli-
teste INV, de Pierre Weil. Arq. Bras. Psic., 20, 3, 39- cável a si mesmo, numa escala de quatro pon-
44.
Cunha, J.A., & Moraes, M.I.B. (1968). Estudo diferen-
tos, de 0 a 3. O escore total é a soma dos
cial de estudantes do sexo masculino e feminino escores dos itens individuais. Portanto, o BAI
de escolas de nível médio de Porto Alegre. Bol. CEPA, é uma medida de auto-relato da intensidade
3, 39-44. da ansiedade.
Van Kolck, O.L. (1981). Técnicas de exame psicológico O BAI (manual e protocolos) é distribuído
e suas aplicações no Brasil. Testes de aptidões. Pe-
trópolis, RJ: Vozes.
por The Psychological Corporation. Tendo a
Casa do Psicólogo obtido, há alguns anos, au-
torização para pesquisa com o instrumento,
INVENTÁRIO DE ANSIEDADE DE BECK (BAI) desenvolvemos estudos sobre as propriedades
psicométricas de uma versão em português do
Dados históricos BAI, já publicada.
Segundo o manual, o uso mais apropriado
O Inventário de Ansiedade de Beck, ou Beck do BAI é com pacientes psiquiátricos, a partir
Anxiety Inventory, o BAI, foi desenvolvido por de 17 anos. Porém, o manual registra também
Beck e sua equipe [1], na Universidade de estudos realizados com adultos normais. Com
Pennsylvania, como instrumento para medir a a versão em português, foram desenvolvidos
intensidade da ansiedade. É uma medida sin- alguns estudos também com pacientes clíni-
tomática [2]. cos adultos, com universitários e com adoles-
Sempre pareceu importante a consideração centes de 12 a 17 anos.
da gravidade de sintomas de ansiedade ou
depressão e, depois que a co-morbidade pas-
sou a ser encarada com real seriedade científi- Administração
ca, com muito mais razão [3, 4]. Embora cer-
tos trabalhos previamente já tivessem chama- Forma: individual e oral (quando se pressu-
do a atenção sobre a superposição de sinto- põem problemas de compreensão oral); indi-
mas [5], com a aceitação científica da co-mor- vidual e auto-administrada; coletiva.
bidade, aumentou a importância de descrever Tempo: geralmente, de 5 a 10 minutos (se
e avaliar sintomaticamente o paciente e as ca- auto-administrado) ou 10 minutos (se oral).
racterísticas realmente distintivas das síndro- Manejo: a soma dos escores dos itens indi-
mes, bem como a natureza das relações entre viduais é a soma total, usada para classificar a
os transtornos [5-10]. Entende-se, pois, que a intensidade da ansiedade como mínima, leve,
equipe de Beck tenha tentado construir um moderada ou grave [2, 11].
instrumento que, apesar da correlação entre
depressão e ansiedade, compartilhasse o mí-
nimo possível dos sintomas de depressão [2]. Indicação
O BAI foi especificamente desenvolvido para
uso com pacientes psiquiátricos, mostrando- 1. Medida da intensidade da ansiedade.
se posteriormente também útil com a popula-
ção em geral.
Comentários

Descrição 1. A versão em português tem apresentado


excelentes propriedades psicométricas.
O BAI compreende 21 afirmações de sinto- 2. Embora os escores do BAI e do BDI, de
mas de ansiedade, sendo que o sujeito deve um modo geral, se correlacionem e tendam a

238 JUREMA ALCIDES CUNHA


co-variar, há alguma diferença de co-variação Cunha, J.A., Streb, L.G., & Serralta, F.B. (1996). Sinto-
entre pacientes com categorias diagnósticas mas auto-relatados de ansiedade discriminam pa-
cientes com depressão maior e pacientes com trans-
diferenciadas [10]. torno misto de ansiedade e depressão? Gramado,
RS: XVIII Jornada Sul-Riograndense de Psiquiatria
Dinâmica.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Cunha, J.A., Streb, L.G., & Serralta, F.B. (1997). Co-mor-
bidade: um estudo sobre ansiedade e depressão.
Brasília: XV Congresso Brasileiro de Psiquiatria, XXIII
1. Beck, A.T., Epstein, N., Brown, G., & Steer, R.A. Congresso Nacional de Neurologia, Psiquiatria e
(1988). An inventory for measuring clinical anxiety: Saúde Mental, I Congresso da ASMLP e II Encontro
psychometric properties. J. Consult. & Clin. Psychol., Regional da APAL – Cone Sul.
56, 893-897.
2. Beck, A.T., & Steer, R.A. (1993). Beck Depression
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3. Brown, T.A., & Barlow, D.H. (1992). Comorbidity INVENTÁRIO DE DEPRESSÃO DE BECK (BDI)
among anxiety disorders: implications for treatment
and the DSM-IV. J. Consult. & Clin. Psychol., 60, 6, Dados históricos
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4. Cunha, J.A., Streb, L.G., & Serralta, F.B. (1997). Trans- O Inventário de Depressão de Beck, ou Beck
tornos depressivos e transtornos de ansiedade: a
Depression Inventory, o BDI, foi desenvolvido
questão de superposição de sintomas. Psico, 28, 1,
237-248.
por Aaron T. Beck e colegas da Universidade
5. Hiller, W., Zandig, M., & Bose, M. (1989). The over- de Filadélfia, em 1961 [1]. É composto por itens
lap between depression and anxiety on different descritivos e sintomas, para se constituir num
levels of psychopathology. J. Affect. Dis., 16, 223- instrumento, destinado a medir manifestações
231. comportamentais da depressão. A intenção era
6. Cloninger, C.R. (1990). Comorbity of anxiety and de criar um instrumento, sem compromisso
depression. J. Clin. Psychopharm., 10, 3, 435-465.
com qualquer posição teórica específica, que
7. Lydiard, R.B. (1991). Coexisting depression and an-
xiety: special diagnostic and treatment issues. J. Clin. constituísse uma escala sintomática, baseada
Psych., 52, 6 (suppl.), 48-54. no pressuposto de que depressão seja um
8. Boulenger, J.-P., & Lavallée, Y.-J. (1993). Mixed an- constructo dimensional [2]. É uma medida de
xiety and depression: diagnostic issues. J. Clin. auto-relato, e as instruções são de que o su-
Psych., 51, 1 (suppl.), 3-8. jeito escolha uma entre diversas alternativas,
9. Mineka, S., Watson, D., & Clark, L.A. (1998). Co- como resposta aos itens, de acordo como tem
morbidity of anxiety and unipolar mood disorders.
se sentido, sendo que cada uma delas cor-
Ann. Rev. Psychol., 49, 377-412.
10. Cunha, J.A., & Streb, L.G. (1999). A co-variação da responde a um nível diferente de gravidade
ansiedade e depressão. Porto Alegre: IV Jornada da depressão [3]. O instrumento, portanto,
Gaúcha de Psiquiatria. Programa, p.36. pretendia avaliar a intensidade da depressão,
11. Cunha, J.A. (2001). Manual da versão em portu- substituindo julgamentos clínicos a respeito
guês das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicó- e fornecendo, de forma econômica, padro-
logo. nizada e consistente, um escore numérico de
depressão [4].
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
O BDI foi desenvolvido em amostras nor-
mativas clínicas, pois se destinava ao uso com
Cunha, J.A., & Streb, L.G. (1997). Estudo dimensional pacientes psiquiátricos. Dadas as suas carac-
da depressão e da ansiedade em pacientes com terísticas psicométricas satisfatórias, passou a
episódio depressivo maior ou com transtorno mis- ser utilizado em outros contextos, em pesqui-
to de ansiedade e depressão. Brasília: XV Congres- sas e na população geral, e acabou por se tor-
so Brasileiro de Psiquiatria, XXIII Congresso Nacio-
nal de Neurologia, Psiquiatria e Saúde Mental, I
nar a técnica mais comumente usada, como
Congresso da ASMLP e II Encontro Regional da APAL medida de depressão [5], por ser considerado
– Cone Sul. um recurso rápido e objetivo [6].

PSICODIAGNÓSTICO – V 239
No Brasil, foi levado a efeito extenso traba- Manejo: são somados os escores dos itens
lho, por nossa equipe, para desenvolvimento individuais, correspondentes à alternativa mais
de uma versão em português [7] e estudo das elevada, assinalada em cada um (no item 19, é
propriedades psicométricas do instrumento [8], atribuído escore 0, se a perda de peso é pro-
com a autorização de The Psychological Cor- posital), obtendo, assim, um escore total, que
poration e apoio da Casa do Psicólogo, sen- pode ser classificado conforme o nível de in-
do que muitas pesquisas foram conduzidas tensidade da depressão (há normas america-
em grupos clínicos e não-clínicos (vide, p.ex., nas e brasileiras, para pacientes psiquiátricos).
8-12). Na forma abreviada, o procedimento é idênti-
co, mas não consta que existam normas brasi-
leiras.
Descrição

O Inventário de Depressão de Beck, ou BDI, é Indicações


uma escala sintomática, de auto-relato, com
21 itens, cada um com escolha múltipla de res- 1. Avaliação do nível de intensidade da de-
postas, com três alternativas, correspondentes pressão.
a níveis de gravidade crescente de depressão, 2. Triagem de sintomas depressivos (princi-
aos quais são atribuídos escores entre 0 e 2. A palmente com a forma abreviada).
soma dos escores dos itens individuais fornece
um escore total, que corresponde à intensida-
de da depressão, que pode ser classificada em Comentários
níveis: mínimo, leve, moderado ou grave. Os
pontos de corte americanos [13] são diferentes 1. Carson [25] realizou uma revisão de ins-
dos brasileiros [12], em pacientes psiquiátricos. trumentos para medir a depressão, chegando
Esta forma é usada com pacientes psiquiá- à conclusão de que os trabalhos de Beck esti-
tricos e com sujeitos da população geral dos mularam muito o desenvolvimento de pesqui-
17 aos 80 anos [13]. Entretanto, existem da- sas e a criação de novas técnicas com o mes-
dos que demonstram que o BDI pode ser utili- mo objetivo. Entre as pesquisas, destaca-se
zado aquém e além desse período [13]. Na li- uma investigação de Post, Alford, Baker e ou-
teratura, também há referências a vários tra- tros [26], que comparou medidas de auto-
balhos de pesquisa com adolescentes [14-16], avaliação da depressão com o julgamento
sendo que com a versão brasileira há informa- clínico, observando que o instrumento de
ções sobre o uso do Inventário em adolescen- Beck e a escala D no MMPI, mas não a escala
tes [17-19] e em idosos [20-23]. de Hamilton, mostraram significativa relação
Na década de 70, foi desenvolvida uma for- com o diagnóstico de depressão maior uni-
ma abreviada do Inventário, com somente 13 polar.
itens, mais usada como recurso de triagem. A 2. Berndt, Petzel e Berndt [27], revisando
intenção para esse delineamento era de obter uma série de trabalhos com instrumentos de
um instrumento curto, mas com característi- avaliação da depressão, afirmam que, embora
cas psicométricas adequadas [24]. Ambos os tenha havido estudos da validade do Beck em
instrumentos são bastante utilizados em vá- estudantes de college, esse inventário não se
rios países do mundo. destina à população normal, mostrando-se
pouco discriminativo. Na realidade, embora
tenha havido uma tendência histórica a dico-
Administração tomizar os estudantes, como deprimidos ou
não-deprimidos [28-30], nossos estudos suge-
Forma: auto-administrada ou oral. rem que essa classificação simples ignora a
Tempo: 10 a 15 minutos, em média. presença de fatores que suscitam diferenças

240 JUREMA ALCIDES CUNHA


nos escores do BDI, como sexo e idade. Mé- de Beck com medidas baseadas na avaliação clíni-
dias mais elevadas encontradas numa amos- ca. Rev. Psiq. RS, 2, 25-31.
11. Fleck, M.P.A., & Cunha, J.A. (1998). Estudo da va-
tra de universitários não chegaram a ser preo-
lidade convergente da Escala de Lentificação
cupantes, do ponto de vista clínico, em parte Depressiva com outras escalas de depressão. Re-
porque estudos de estabilidade temporal con- vista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, 2, 32-
firmam a hipótese de transitoriedade da sinto- 36.
matologia da depressão em estudantes e, em 12. Cunha, J.A. (2001). Manual da versão em portu-
parte, porque apreciável número de casos que guês das Escalas Beck. São Paulo: Casa do Psicó-
tinham escores em nível pelo menos leve ou logo.
13. Beck, A.T., & Steer, R.A. (1993). Beck Depression
mais alto estava se submetendo a tratamento
Inventory. Manual. San Antonio, TX: Psychological
[31]. Corporation.
14. Ambrosini, P.J., Metz, C., Bianchi, M.D. & Rabinovi-
ch, H. (1991). Concurrent validity of the Beck De-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS pression Inventory in adolescents. J. Am. Acad. Child
& Adol. Psych., 30, 1, 51-57.
1. Beck, A.T., Ward, C.H., Mendelson, M., Moch, J., & 15. Atlas, J.A., & DiScipio, W.J. (1992). Consideration
Erbaugh, J. (1961). An inventory for measuring de- of the Beck Depression Inventory and Reynolds Ado-
pression. Arch. Gen. Psych., 4, 561-571. lescent Depression Scale. Psychol. Reports, 70, 2,
2. Dobson, K.S., & Cheung, B. (1990). Relationship 621-622.
between anxiety and depression: conceptual and 16. Kutcher, S.P., & Marton, P. (1989). Utility of the Beck
methodological issues. In J.D. Maser & C.R. Clonin- Depression Inventory with psychiatrically disturbed
ger, Ed. Comorbidity of mood and anxiety disorders adolescent outpatients. Can. J. Psych., 34, 2, 107-
(p.611-632). Washington: American Psychiatric 109.
Press. 17. Cunha, J.A., & Argimon, I.L. (1997). O uso do In-
3. Williams, J.G., Barlow, D.H., & Agras, W.S. (1972). ventário de Depressão de Beck em adolescentes.
Behavioral measurement of severe depression. Arch. Canela, RS: Congresso Internacional de Saúde Men-
Gen. Psych., 27, 330-333. tal.
4 . Beck, A.T. (1967). Depression: clinical, experi- 18. Cunha, J.A., & Chioqueta, A.P. (1997). Indícios su-
mental & theoretical aspects. New York: Harper gestivos de potencial suicida em adolescentes. Ca-
& Row. nela, RS: Congresso Internacional de Saúde Men-
5. McReynolds, P. (1989). Diagnosis and clinical asses- tal.
sment: current status and major issues. Ann. Rev. 19. Cunha, J.A., & Chioqueta, A.P. (1997). Indícios su-
Psychol., 40, 83-108. gestivos de potencial suicida em adolescentes. Gra-
6. Vincent, K.R. (1987). The full battery codebook: a mado, RS: III Jornada Gaúcha de Psiquiatria.
handbook of psychological test interpretation for 20. Cunha, J.A., Lemes, R.B., & Oliveira, M.S. (1996).
clinical, counseling, rehabilitation, and school O efeito depressivo da institucionalização na ter-
psychology. Norwood, N.J.: Ablex. ceira idade. Gramado, RS: XVIII Jornada Sul-Rio-
7. Cunha, J.A., & Chioqueta, A.P. (1997). O Inventário grandense de Psiquiatria Dinâmica; São Paulo:
de Depressão de Beck: a versão em português. Flo- Simpósio Internacional Depressão no Ciclo da
rianópolis: VI Jornada de Psiquiatria da Região Sul, Vida.
VI Jornada Catarinense de Psiquiatria, Encontro de 21. Cunha, J.A., Lemes, R.B., & Oliveira, M.S. (1997). O
Psiquiatria do Mercosul. efeito depressivo da institucionalização na terceira
8. Cunha, J.A. (1997). Generalidades sobre a versão idade. Porto Alegre: VII Encontro Nacional sobre
brasileira do BDI, BAI, BHS e BSI. Porto Alegre: Anais Testes Psicológicos e I Congresso Ibero-Americano
do VII Encontro Nacional sobre Testes Psicológicos de Avaliação Psicológica.
e I Congresso Ibero-Americano de Avaliação Psico- 22. Argimon, I.L. (1997). Um estudo de fases da vida
lógica (p.135-139). mais vulneráveis à depressão com o Inventário de
9. Cunha, J.A., Barraz, A.C.G., Lemes, R.B., Brenner, Depressão de Beck. Porto Alegre: VII Encontro Na-
M.K., Prieb, R.G.G., & Goulart, P.M. (1995). Notas cional sobre Testes Psicológicos e I Congresso Ibe-
preliminares sobre um estudo de depressão e an- ro-Americano de Avaliação Psicológica.
siedade em estudantes universitários. Psico, 26, 1, 23. Cunha, J.A., & Argimon, I.L. (1999). Capacidade
143-150. de instrumentos de auto-relato de discriminarem
10. Cunha, J.A., & Fleck, M.P.A. (1998). Estudo sobre a pessoas que vivem na comunidade ou em insti-
validade convergente do Inventário de Depressão tuições de idosos. Porto Alegre: VIII Congresso

PSICODIAGNÓSTICO – V 241
Nacional de Avaliação Psicológica. Programa e lações e alterações, que não apenas justificou
pôsters, 74. a mudança do nome do instrumento, como se
24. Scott, N.A., Hannum, T.R., & Ghrist, S.L. (1982).
pode afirmar que se apresenta como um teste
Assessment of depression among incarcerated fe-
males. J. Pers. Assess., 46, 4, 372-379.
mais promissor para o conhecimento da per-
25. Carson, R.C. (1989). Personality. Ann. Rev. Psychol., sonalidade do que o original de Edwards.
30, 227-248. O instrumento baseia-se na teoria das ne-
26. Post, R.D., Alford, C.E., Baker, N.J., Franks, E.D., cessidades básicas de Murray [2].
House, R.M., Jackson, A.M., et alii (1985). Compa-
rison of self-reports and clinician’s ratings of uni-
polar major depression. Psychol. Reports, 57, 479-
Descrição
483.
27. Berndt, D.J., Petzel, T.P., & Berndt, S.M. (1980). De-
velopment and initial evaluation of a multiscore O Inventário compreende 155 itens, que cons-
depression inventory. J. Pers. Assess., 44, 6, 396- tituem afirmações, às quais o sujeito deve res-
404. ponder, utilizando alternativas de uma escala
28. Bumberry, W., Oliver, J.M., & McClure, J.L. (1978). tipo Likert de 7 pontos. Avalia 15 dimensões
Validation of the Beck Depression Inventory in a
de personalidade, abrangendo, ainda, uma
university population using psychiatric estimates as
a criterion. J. Cons. & Clin. Psychol., 46, 1, 150-155.
escala de mentira e uma de desejabilidade so-
29. Hatzenbuehler, I.C., Parpal, M., & Matthews, L. cial, sendo, portanto, ao todo 17 fatores de
(1983). Classifying college students as depressed personalidade.
or non-depressed using the Beck Depression Inven- O material, além do manual, inclui o cader-
tory: an empyrical analysis. J. Cons. & Clin. Psychol., no de teste, a folha de resposta e a folha de
51, 3, 360-366. aplicação. É distribuído pela Casa do Psicólo-
30. Shek, A.T. (1991). Depressive symptoms in a sam-
go, de São Paulo.
ple of Chinese adolescents: an experimental study
using the Chinese version of the Beck Depression Existem normas para adultos de 16 a 60
Inventory. Int. J. Adol. Medic. & Health, 5, 1-16. anos de idade, conforme o sexo. Exige uma
31. Cunha, J.A., Prieb, R.G.G., Touguinha, L.A. & Gou- compreensão verbal correspondente ao sétimo
lart, P.M. (1996). Depressão em estudantes da nível de leitura.
PUCRS (uma pesquisa em andamento). Psico, 27,
2, 97-109.

Administração

Forma: individual ou coletiva (é auto-admi-


INVENTÁRIO FATORIAL DE
nistrável).
PERSONALIDADE (IFP)
Tempo: aproximadamente 45 minutos.
Manejo: a contagem de pontos pode ser
Dados históricos feita com o auxílio de crivos ou computador;
levantam-se os escores percentílicos correspon-
O Inventário Fatorial de Personalidade [1] foi dentes através de tabelas, conforme o sexo, e,
desenvolvido para representar uma adaptação após verificar se o perfil é válido, os percen-
brasileira do Edward’s Personal Preference tis altos e baixos (que representam necessi-
Schedule, criado por Allen L. Edwards, nos anos dades fortes e fracas) são interpretados de
cinqüenta, e, posteriormente, revisado na mes- acordo com as dimensões de personalidade
ma década. O projeto foi conduzido pelo La- pertinentes.
boratório de Pesquisa em Avaliação e Medida
do Instituto de Psicologia da Universidade de
Brasília, coordenado por Luiz Pasquali, com a Indicação
colaboração de uma equipe e de mais de trin-
ta instituições em todo o país. Não obstante, o 1. Medida de variáveis da personalidade
trabalho desenvolvido levou a tantas reformu- normal.

242 JUREMA ALCIDES CUNHA


Comentário bateria neuropsicológica de Luria [2]. Essa in-
clusão em escalas largamente utilizadas, como
1. Embora os autores não considerem o ins- nas escalas Wechsler, tornou muitas vezes “re-
trumento útil para a população clínica, descre- dundante” a administração deste teste. Con-
vem-no como um bom recurso para “subsidiar tudo, o Teste de Kohs inclui mais itens que o
o diagnóstico de problemas”. Subentende-se subteste de Cubos do WAIS, sendo alguns mais
que, tendo sido normatizado na população complexos e difíceis. Observa Lezak [2] que, em
geral, não oferece parâmetros adequados para pacientes bastante inteligentes, certos déficits
grupos psiquiátricos. Entretanto, parece ser um visoconstrutivos leves ficam obscurecidos em
instrumento de triagem útil e também viável, sua execução no WAIS, mas se tornam eviden-
como um recurso subsidiário, mesmo em si- tes pelo desempenho nos Cubos de Kohs.
tuação clínica. Tem se mostrado também útil No Brasil, Silva [3] adaptou o teste original
em perícias psicológicas na área forense. para administração coletiva, utilizando uma
amostra de 506 sujeitos de 7 a 14 anos. Outro
estudo importante foi desenvolvido por Xavier
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS e Jacquemin [4], sobre a influência da variável
tempo, no desempenho do teste. A partir da
1. Pasquali, L., Azevedo, M.M., & Ghesti, I. (1997). In-
ventário Fatorial de Personalidade: manual técnico
observação de que muitas crianças com resul-
e de aplicação. São Paulo: Casa do Psicólogo. tados satisfatórios em outros testes de inteli-
2. Murray, H. (1953). Exploration de la personalité. gência apresentaram dificuldades para cons-
Paris: Presses Universitaires de France. truir itens do Kohs dentro do tempo limite,
esses autores realizaram uma investigação com
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
280 sujeitos de ambos os sexos, de 5 a 11 anos,
em que o tempo normal – Tn (tempo limite,
Edwards, A.L. (1953). Manual for the Edward’s Perso- conforme as instruções da padronização origi-
nal Preference Schedule. New York: Psychological nal) – foi duplicado, com a introdução experi-
Corporation. mental de um tempo suplementar – Ts –, sem-
Edwards, A.L. (1959). Manual for the Edward’s Perso-
nal Preference Schedule. New York: Psychological
pre que a criança não conseguia realizar a ta-
Corporation. refa durante o Tn. Foi constatada a existência
de diferença de desempenho entre as duas si-
tuações em nível estatisticamente significan-
te. No que concerne às faixas etárias, foi ob-
KOHS servado quase o mesmo nível de realização aos
5 ou 6 anos, acentuando-se a diferença aos 7
Dados históricos anos, havendo um ganho de praticamente um
item, em média, com o acréscimo do Ts, aos 9
O Teste de Cubos de Kohs, criado por Samuel e 10 anos, e de dois itens, na faixa de 11 anos.
C. Kohs, para a avaliação do nível intelectual Os autores concluíram que há melhor desem-
de sujeitos, na faixa de 5 a 17 anos, teve sua penho com o acréscimo de um tempo suplemen-
primeira divulgação em 1919, sendo publica- tar, que apresenta um incremento com a idade.
do originariamente em 1923. Os resultados permitiram verificar que, em ter-
Constituindo um teste de execução, que mos clínicos, os Cubos de Kohs podem ser utili-
envolve construção em duas dimensões, teve zados sob duas modalidades, como teste de efi-
bem reconhecida a sua importância diagnósti- ciência intelectual (na administração com o Tn) e
ca ao ser incorporado numa série de escalas como teste de potência intelectual (na adminis-
de avaliação intelectual, como a de Grace Ar- tração com o Ts) a partir dos 9 anos de idade.
thur, Merril-Palmer, Wechsler e Alexander [1], Conforme informações de Silva [3], Chwaki
embora com eventuais modificações. Também realizou uma adaptação desse teste para a ad-
alguns de seus itens foram introduzidos na ministração em cegos, e Grassi criou uma ver-

PSICODIAGNÓSTICO – V 243
são para o diagnóstico de patologia orgânica Tempo: individual, entre 20 e 45 minutos
cerebral. (sem considerar a administração com o Ts);
coletiva, 30 minutos, no máximo.
Manejo: a soma dos pontos obtidos, den-
Descrição tro do tempo limite, constitui o escore bruto
do sujeito, que é transformado em idade men-
O teste é composto de 16 cubos de madeira, tal a partir de tabela apropriada para cálculo
medindo 2,5 cm de aresta cada um. Todos os do QI para classificar o nível de eficiência inte-
cubos apresentam faces coloridas em azul, lectual; os pontos obtidos, com acréscimo de
branco, vermelho e amarelo e duas faces bico- tempo suplementar, na administração indivi-
lores, em amarelo e azul ou em vermelho e dual, fornecem uma estimativa do potencial
branco. O material inclui um conjunto de 17 intelectual.
lâminas (mais uma para demonstração), com
desenhos geométricos dispostos em dificulda-
de crescente, que constituem os modelos em Indicações
tamanho reduzido que devem ser reproduzi-
dos com os cubos. Existe um tempo limite para 1. Medida do nível intelectual (especialmen-
cada modelo. te indicada quando há perturbações da lingua-
Além do objetivo geral de avaliação inte- gem) e do potencial intelectual.
lectual, o teste requer capacidade de organi- 2. Medida de déficits visoconstrutivos, na
zação perceptual, estruturação espacial, bem avaliação neuropsicológica, especialmente
como de análise e síntese. Exige escasso uso sensível em casos com lesões pós-centrais e
da linguagem e pode ser aplicado independen- em transtornos neurológicos degenerativos
temente de escolaridade, sendo mais recomen- [2].
dado para utilização dos 6 aos 11 anos de idade.
A forma dos Cubos de Kohs para aplicação
coletiva tem como instrumento um caderno de Comentários
10 páginas, com dois desenhos em cada uma,
excetuando a última página, que possui somen- 1. Em alguns casos de pacientes com lesões
te um desenho. Há um código no lado esquer- cerebrais que obtêm, no WAIS, um QI de exe-
do do desenho em substituição aos cubos da cução dentro dos limites normais, apesar de
forma individual. Esse código é constituído de apresentarem um escore no subteste de Cu-
12 quadros, cada um com 1 cm de lado. Qua- bos mais baixo que em outros subtestes, a ad-
tro deles são nas cores vermelha, branca, ama- ministração dos Cubos de Kohs torna óbvia a
rela e azul, cada um. Os oito demais quadros presença de déficits, associados às lesões,
são divididos por uma linha diagonal que se- quando é o caso [2].
para de duas em duas essas quatro cores. Há 2. A proposta de Xavier e Jacquemin [4] de
um desenho a mais que funciona como exem- oferecer um tempo suplementar, além do tem-
plo. Os desenhos restantes e o outro exemplo po limite, parece muito útil no diagnóstico clí-
são idênticos ao teste original. nico, não só porque a estimativa do potencial
A forma coletiva é recomendada para su- intelectual pode corroborar resultados deste e
jeitos de 8 a 13 anos de idade. de outros testes, como também porque pode
No Brasil, o CEPA edita Cubos e as figuras, lançar luz sobre casos, com hipótese de atraso
folhas de registro e manual de instrução [5]. intelectual, de crianças que podem se benefi-
ciar com um programa de estimulação para
melhoria de seu desempenho.
Administração 3. Em sua forma coletiva, há maior facilida-
de de administração, levantamento, avaliação
Forma: individual ou coletiva. e interpretação dos dados. Possibilita, outros-

244 JUREMA ALCIDES CUNHA


sim, a aplicação em crianças alfabetizadas em foram administrados a pacientes psiquiátricos,
outros idiomas. em tratamento nos hospitais locais, com diag-
4. O coeficiente de correlação ordinal entre nóstico formalizado, sendo comparadas as res-
os escores do Teste de Kohs e do INV, em crian- postas dadas por parte de cada subgrupo com
ças, é de 0,72 [6], concluindo-se que a técnica o grupo de normais, ficando definidas, assim,
contém boa saturação do fator “g”. as escalas clínicas que, originalmente, recebe-
ram denominações conforme o sistema de clas-
sificação kraepeliano [2].
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Como, de acordo com a posição psiquiátri-
ca vigente, transtornos eram considerados sín-
1. Van Kolck, O.L. (1981). Técnicas de exame psicoló-
gico e suas aplicações no Brasil. Testes de aptidões.
dromes clínicas distintas, a pressuposição era
Petrópolis, RJ: Vozes. de que as escalas facilitariam a identificação
2. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment. do transtorno do paciente, levando à determi-
3.ed. New York: Oxford Universities Press. nação diagnóstica. Mas nem todos os pacien-
3. Silva, A.A.V. (1978). Adaptação do Teste de Cubos tes com o mesmo diagnóstico apresentavam o
de Kohs para a forma coletiva. Porto Alegre: Insti-
tuto de Psicologia da PUCRS (Dissertação de mes-
perfil que, por hipótese, lhes seria típico. En-
trado). tão, foi decidido que as escalas fossem identi-
4. Xavier, M.A. & Jacquemin, A. (1982). Influência de ficadas por dígitos, como uma forma de esca-
variável tempo na realização dos Cubos de Kohs. par de conotações diagnósticas falsas [3]. Pos-
Ciência e Cultura, 34, 1, 68-71. teriormente, ao instrumento original foram
5. Kohs, S.C. (1966). Cubos de Kohs. Manual. Rio de
Janeiro: CEPA.
acrescentadas duas escalas adicionais, cujos
6. Nick, E. (1977). O teste de inteligência não-verbal itens foram selecionados por uma abordagem
de Pierre Weil: análise de sua estrutura baseada na diversa. Mais tarde, foram introduzidas esca-
teoria de Jean Piaget. Rio de Janeiro: CEPA. las de conteúdo, subescalas, listas de itens crí-
ticos e numerosas escalas suplementares.
Apesar de sua crescente popularidade, fo-
ram feitas sérias críticas sobre a construção do
MMPI, MMPI-2, MMPI-A inventário, sua padronização, redação obsole-
ta ou outras dificuldades apresentadas por al-
Dados históricos guns itens, que levaram a uma repadroniza-
ção do MMPI, em 1982, conservando seu for-
As pesquisas originais para o desenvolvimento mato original tanto quanto possível intacto,
do Minnesota Multiphasic Personality Inven- para permitir a utilização de dados de pesqui-
tory, o MMPI, tiveram início em 1939, na Uni- sa colhidos por quase meio século. Entretan-
versidade de Minnesota [1]. Seus autores, Ha- to, no MMPI-2, de Butcher, Dahlstrom, Graham
thaway e McKinley, pretendiam criar um ins- e outros [4], parte dos itens foi modificada,
trumento que possibilitasse uma avaliação de sendo acrescentados outros, e a forma resul-
casos psiquiátricos, permitisse classificar a gra- tante foi administrada a uma amostra similar
vidade do transtorno apresentado e fizesse à distribuição apresentada no censo norte-
uma estimativa de mudanças, ocorridas em americano de 1980. A ordem dos itens foi al-
função de psicoterapia ou de outras variáveis. terada, de maneira a ser possível obter medi-
A seleção inicial de itens incluiu afirmações das das escalas tradicionais nos primeiros 370
colhidas de diferentes fontes, como escalas itens [2].
existentes, material clínico de pacientes e ex- Por outro lado, em vista das diferenças ob-
periência clínica profissional. O critério para a servadas nas elevações das escalas entre ado-
inclusão de cada item foi a referência externa lescentes e adultos, dificuldades em relação às
de se era respondido por pacientes psiquiátri- normas desenvolvidas para adolescentes, bem
cos diferentemente de sujeitos normais. Num como ao conteúdo de certos itens e à exten-
segundo momento, os 504 itens selecionados são do inventário, a comissão que trabalhou

PSICODIAGNÓSTICO – V 245
na repadronização para o MMPI-2 decidiu criar manual, com o uso de crivos, com exceção da
um novo instrumento, o MMPI-A, divulgado escala “?” (o escore consiste no número de
em 1992 [5]. itens com respostas omitidas ou duplas) e da
escala L (total de itens assinalados com “Erra-
do”, dentre os seguintes: 15, 30, 45, 60, 75,
Descrição 90, 105, 120, 135, 150, 165, 195, 225, 255 e
285); a seguir, através de tabelas, os escores
O MMPI, na sua última versão, compreende 566 brutos são transformados em notas T (com ou
itens, que consistem em autodescrições com sem correção, K), podendo ser traçado o perfil
as quais o examinando concorda ou não, assi- das escalas de validade e das escalas clínicas e
nalando “Certo” ou “Errado”, que recebem determinado o código correspondente, sendo
escores quando marcados na direção crítica. que os escores individuais e o código podem
Nesse formato, inclui dez escalas clínicas e qua- ser interpretados comparando-os com normas
tro de validade. Já o MMPI-2 é um inventário de grupos clínicos.
com 567 itens, que, além das escalas clínicas e
de validade tradicionais, fornece várias outras
medidas com propósitos clínicos ou de pesqui- Indicações
sa. O MMPI-A contém 478 itens, acrescentan-
do quatro novas escalas de validade e seis es- 1. Medida do nível de ajustamento emo-
calas clínicas suplementares. cional [2] e identificação da psicopatologia
No Brasil, é apenas acessível o MMPI, que apresentada.
foi adaptado por Benkö e Simões [1]. O mate- 2. Avaliação da atitude frente à testagem.
rial compreende o caderno, a folha de respos-
tas, a folha de apuração e as chaves-gabarito,
além do manual. Comentários
Também é possível usar uma forma abrevi-
ada, excluindo itens que não constam das es- 1. Em vista da forma como foi construído,
calas básicas, havendo indicações de como efe- diferenciando uma amostra bimodal, o MMPI
tuar a contagem no manual [1]. não fornece informações significantes sobre su-
O material original é fornecido por The jeitos normais. Por outro lado, pela mesma ra-
Psychological Corporation, nos Estados Unidos. zão, mede atributos multidimensionais, isto é,
No Brasil, o material para a forma coletiva é compartilhados por várias escalas. Assim sen-
distribuído pelo CEPA, Rio de Janeiro, e tam- do, o psicólogo clínico não só deve estar mui-
bém é usado individualmente. to familiarizado com a significação das escalas
O inventário é indicado para sujeitos a par- e a relação entre elas, mas também deve levar
tir de 16 anos, exigindo um nível de leitura de em conta as variáveis demográficas e a histó-
oitava série. ria clínica do paciente [2].
2. Embora o MMPI-2 apresente melhor qua-
lidade psicométrica, as limitações do MMPI são
Administração contrabalançadas por alguns aspectos, princi-
palmente pela quantidade de pesquisas reali-
Forma: individual ou coletiva (é auto-adminis- zadas, totalizando mais de 10.000 estudos
trável e pode ser administrado com computador). sobre o instrumento ou com o instrumento [2].
Tempo: não existe limite de tempo, mas,
em média, a resposta ao MMPI é de 90 minu-
tos, sendo mais baixa a média na administra- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ção com computador.
1. Hathaway, S.R., & McKinley, J.C. (1971). Inventário
Manejo: o escore bruto das várias escalas é Multifásico Minnesota de Personalidade. Manual.
obtido através de computador ou de forma Rio de Janeiro: CEPA.

246 JUREMA ALCIDES CUNHA


2. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycholo- espanhol Emilio de Mira y López, que o apre-
gical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons. sentou em Londres, em 1940. Foi introduzido
3. Cunha, J.A. (1999). Questões críticas em avaliação
psicológica conforme o ponto de vista clínico. Por-
no Brasil por Gall e Chevreuil, sendo posterior-
to Alegre: Anais do VII Congresso Nacional de Ava- mente objeto de muitos estudos, principalmen-
liação Psicológica (p.180-191). te depois que Mira y López se radicou no Rio
4. Butcher, J.N., Dahlstrom, W.G., Graham, J.E., Telle- de Janeiro.
gen, A., & Kraemmer, B. (1989). Manual for admi- O teste focaliza alguns aspectos grafológi-
nistration and scoring: MMPI-2. Minneapolis, MN:
University of Minnesota Press.
cos e outros, relacionados a movimentos mus-
5. Butcher, J.N., Williams, C.L., Graham, J.R., Archer, culares expressivos. Pressupõe que cada indi-
R.P., Tellegen, A., Ben-Porath, Y.S., & Kraemer, B. víduo tem facilidade em produzir um certo
(1992). MMPI-A (Minnesota Multiphasic Personali- conjunto de movimentos, que, por lhe serem
ty Inventory-Adolescent): manual for administrati- típicos [1], refletem sua atitude mental e tra-
on, scoring, and interpretation. Minneapolis, MN:
University of Minnesota Press.
ços caracterológicos. Desta maneira, podem ser
analisados através de traçados do sujeito, em
diferentes dimensões espaciais. A técnica,
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS portanto, investiga a relação mensurável en-
tre fatores de personalidade e tônus muscu-
Cunha, J.A., & Tambara, N.J.C. (1992). Homossexuali-
dade versus AIDS: aspectos psicopatológicos e psi-
lar [2].
codinâmicos: Madrid: Congresso Ibero-Americano É geralmente classificado como uma técni-
de Psicologia. ca expressiva [3], tendo também potencial
Dahlstrom, W.G., Welsh, G.S., & Dahlstrom, L.E. (1972). como método projetivo [2].
An MMPI handbook: clinical interpretation. V.1.
Minneapolis, MN: University of Minnesota Press.
Gynther, M.D., & Gynther, R.A. (1983). Personality in-
ventories. In I.B. Weiner, Ed. Clinical methods in Descrição
psychology. New York: Wiley & Sons.
Keller, L.S., Butcher, J.N., & Slutske, W.S. (1990). Ob- Trata-se de uma técnica gráfica, que propõe
jective personality assessment. In G. Goldstein & ao sujeito sete tarefas, em seis folhas de 31,5
M. Hersen, Ed. Handbook of psychological asses-
sment. 2.ed. (p.152-232). New York: Pergamon
cm por 26 cm. Estas apresentam modelos de
Press. traçados, que o sujeito deve executar às cegas
Munley, P.H., & Zarantonello, M.M. (1989). A compari- (após recobri-las com controle visual), ora com
son of MMPI profile types across standard and con- a mão direita, ora com a mão esquerda ou com
temporary norms. J. Clin. Psychol., 45, 2, 229-239. ambas simultaneamente. Os traçados incluem
Olin, J.T., & Keatinge, C. (1998). Rapid psychological
assessment. New York: Wiley & Sons.
lineogramas, ziguezagues, escadas, círculos,
Trimboli, F., & Kilgore, R.B. (1983). A psychodinamic cadeias, paralelas, etc.
approach to MMPI interpretation. J. Pers. Assess., O material, além do caderno de teste, exige
47, 6, 514-626. uma mesa de tipo especial, com tampa móvel,
Vincent, K.R. (1987). The full battery codebook: a han- que permita a execução de traçados em plano
dbook of psychological test interpretation for cli-
nical, counseling, rehabilitation, and school psycho-
vertical, e prendedores para fixar o papel. São
logy. Norwood, N.J.: Ablex. necessários, ainda, anteparos, lápis preto, azul
Welsh, G.S., & Dahlstrom, W.G. (1963). Basic readings e vermelho. Inclui, também, um conjunto de
on the MMPI in psychology and medicine. Minnea- máscaras, que são folhas de papel vegetal com
polis, MN: University of Minnesota Press. os modelos dos traçados impressos para o le-
vantamento quantitativo, além do manual.
Destina-se a sujeitos acima de 9 anos, em-
PMK bora seja mais recomendável seu uso a partir
Dados históricos da adolescência.
O material original é do Centre de Psicho-
O Teste Psicodiagnóstico Miocinético, mais co- logie Appliquée, Paris. No Brasil, o material é
nhecido como PMK, foi criado pelo psiquiatra encontrado na Vector, São Paulo. A mesa com

PSICODIAGNÓSTICO – V 247
anteparo, para a administração do PMK, é ven- 3. Van Kolck, O.L. (1981). Técnicas de exame psicoló-
dida pelo CEPA. gico e suas aplicações no Brasil. Testes de aptidões.
Petrópolis, RJ: Vozes.

Administração OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS

Forma: individual. Boccalandro, E.R. (1998). Diagnóstico de disritmia no


PMK. 2.ed.rev.ampl. São Paulo: Vetor.
Tempo: 20 a 30 minutos por sessão, sendo Galland de Mira, A.M. (1960). Psicodiagnóstico mioci-
que a administração completa inclui duas ses- nético. São Paulo: Vector.
sões, com o intervalo de 8 dias. Mira y López, E. (1957). Psicodiagnóstico miokinético.
Manejo: são feitas mensurações nos traça- Buenos Aires: Paidós.
dos, que recebem notas conforme tabelas es-
pecíficas, a partir das quais é feita a interpre-
tação, que considera também dados qualitati-
vos. PROCEDIMENTO DE DESENHOS-ESTÓRIAS*

Dados históricos
Indicações
O Procedimento de Desenhos-Estórias foi pro-
1. Avaliação clínica da personalidade (es- posto em 1972, por Walter Trinca, ao apresen-
pecialmente no que se refere à agressividade, tar sua tese de doutorado, “O desenho livre
emocionalidade, extra e intratensão, tônus psi- como estímulo de apercepção temática” [1],
comotor, tendência à inibição ou excitação, as- difundido e atualizado posteriormente [2, 3].
pectos psicopatológicos, etc.). A partir de pressuposições comuns a várias
2. Avaliação de condições para orientação técnicas projetivas, gráficas e temáticas e, ain-
e seleção profissional. da, à entrevista não-estruturada, Trinca quali-
fica sua técnica não como um teste, mas como
um instrumento com “características pró-
Comentários prias”, que se situa numa posição interme-
diária em relação a outras e, como tal, pode
1. Na literatura, registram-se restrições constituir um valioso auxiliar no diagnóstico
quanto à consistência dos traçados, mesmo psicológico.
quando a interpretação se baseia em dados de
duas administrações, pressupondo-se que um
desvio possa ser atribuído a diferentes fatores Descrição
psicopatológicos. Por essa razão, há certo ce-
ticismo em relação a seus resultados [2]. O material necessário à realização do teste inclui
2. Não obstante, apesar de, posteriormen- folhas de papel em branco (tamanho ofício), lá-
te, ter o seu uso sofrido certo declínio, está pis preto no 2 e uma caixa com 12 lápis de cor.
crescendo novamente no meio empresarial e, As instruções propõem que o sujeito reali-
principalmente, em seleções no âmbito poli- ze um desenho livre (cromático ou acromáti-
cial. co) e, a partir de cada um, deve contar uma
estória. Segue-se uma fase do inquérito e soli-
citação de que dê um título a sua estória. Este
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS conjunto constitui uma unidade de produção.

1. Bell, J. (1964). Técnicas proyectivas. 2.ed. Buenos


Aires: Paidós.
2. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio *Com agradecimentos por informações prestadas por
de Janeiro: Campus. Leila Cury Tardivo.

248 JUREMA ALCIDES CUNHA


É importante conseguir até cinco unidades de 4. Safra, G. (1984). Procedimentos clínicos utilizados
produção, em duas sessões. no psicodiagnóstico. In W. Trinca, Org. Diagnóstico
psicológico: a prática clínica (p.51-66). São Paulo:
É aplicável a sujeitos de 5 a 15 anos, de EPU.
qualquer sexo, nível intelectual ou sociocultu- 5. Tardivo, L.S.P.C. (1998). O Teste de Apercepção In-
ral. Há, porém, referências, na literatura [4] a fantil e o teste das Fábulas de Düss: respostas típi-
pesquisas com adultos e com grupos clínicos. cas da população brasileira e aplicações no contex-
to das técnicas projetivas. São Paulo: Vetor.

Administração OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS

Forma: individual. Lima, C.M.B. (1997). A aliança familiar na adaptação


Tempo: livre. escolar ineficaz. São Paulo: Instituto de Psicologia
da USP (Dissertação de mestrado).
Manejo: a avaliação dos desenhos-estórias Lima, C.M.B. (1997). Desenhos de famílias com estó-
faz-se por meio da análise de dez categorias rias: desenvolvimento e atualização. In: W. Trinca.
ou áreas, segundo Trinca [2] ou de sete gru- Formas de investigação clínica em psicologia. São
pos, conforme Tardivo [5], tentando identifi- Paulo: Vetor.
car fatores expressivos, determinar áreas de Tardivo, L.S.C.P. (1985). Normas para avaliação do pro-
cedimento de desenhos-estórias numa amostra de
perturbação, sempre considerando o contexto crianças paulistanas de 5 a 8 anos de idade. São
global, a seqüência das unidades de produção, Paulo: Instituto de Psicologia da USP (Dissertação
a história clínica do sujeito e resultados de ou- de mestrado).
tros testes psicológicos. Tardivo, L.S.C.P. (1996). O processo de desenhos-estó-
rias: características e potencialidades. In A. Jacque-
min, E.T.K. Okino e J. Vendruscolo, Org. Anais do I
Encontro da Sociedade Brasileira de Rorschach e
Indicação Outros Métodos Projetivos (p.41-51). Ribeirão Pre-
to, SP: Sociedade Brasileira de Rorschach.
1. Avaliação da personalidade em psicodiag- Trinca, W., et alii (1989). O procedimento de desenhos
nóstico (diagnóstico breve, entrevista e segui- de famílias com estórias (DF-E). São Caetano do Sul,
SP: Anais do I Congresso de Psicologia do ABC e III
mento). Simpósio da FEC do ABC (p.49).

Comentário
QUESTIONÁRIO DE SAÚDE GERAL DE
1. A técnica combina procedimentos gráfi- GOLDBERG (QSG)
cos e verbais, de maneira a compensar, em cer-
tas faixas etárias, as dificuldades de projetar Dados históricos
conteúdos, através de uma forma de comuni-
cação, com os recursos de outra, trazendo, as- O Questionário de Saúde Geral de Goldberg,
sim, uma contribuição invulgar para a avalia- ou General Health Questionnaire, GHQ, foi
ção dinâmica da criança. desenvolvido em 1972, por D.P. Goldberg, sob
a pressuposição de que existe um continuum
entre saúde mental e transtorno mental e de
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
que a saúde de um indivíduo seria melhor ca-
1. Trinca, W. (1972). O desenho livre como estímulo tegorizada por índices comportamentais que ca-
de apercepção temática. São Paulo: Instituto de racterizariam desvios da população geral.
Psicologia da USP (Tese de doutorado). O instrumento não foi delineado para dis-
2. Trinca, W. (1987). Investigação clínica de personali- criminar transtornos psiquiátricos específicos,
dade: o desenho livre como estímulo de apercep-
ção temática. 2.ed. São Paulo: EPU.
mas sim para medir a gravidade do estado psi-
3. Trinca, W. (1997). Formas de investigação clínica em copatológico “não-extremado” (não-psicótico)
psicologia. São Paulo: Vetor. de indivíduos, para fins de triagem.

PSICODIAGNÓSTICO – V 249
A adaptação brasileira baseou-se na tradu- Indicações
ção de Giglio [1], com ligeiras alterações, sen-
do desenvolvida no Laboratório de Pesquisa em 1. Triagem do estado de saúde mental, para
Avaliação e Medida, sob a coordenação de Pas- identificar a presença de doença psiquiátrica
quali e colegas [2], apresentando excelentes [3].
características psicométricas. 2. Identificação do perfil sintomático do
sujeito.

Descrição
Comentário
O QSG é um questionário de auto-relato de
1. A partir de resultados obtidos na amos-
60 itens, apresentado aos examinandos em
tra normativa brasileira, de 902 respondentes
folheto, com instruções para que o sujeito
[2], foi possível verificar que sujeitos do sexo
responda a cada item, em comparação com
feminino apresentaram escores significante-
seu estado usual, assinalando um dos pon-
mente mais elevados que os do sexo masculi-
tos de uma escala tipo Likert de quatro pon-
no no fator geral, bem como em quatro ou-
tos. Os itens variam em sua formulação, ora
tros fatores.
como sintomas, ora como comportamentos
normais.
O escore geral indica a gravidade do es- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
tado do sujeito, quanto à ausência de saúde
mental (ou severidade da doença mental), 1. Giglio, J.S. (1976). Bem-estar emocional em univer-
mas também os resultados podem ser apre- sitários: um estudo preliminar. Campinas: Faculda-
sentados como um perfil psiquiátrico, abran- de de Ciências Médicas da UNICAMP (Tese de dou-
torado).
gendo mais cinco dimensões: estresse psíqui- 2. Goldberg, D.P. (1996). Questionário de saúde geral
co, desejo de morte, desconfiança no desem- de Goldberg: manual técnico QSG: adaptação bra-
penho, distúrbios de sono, distúrbios psicos- sileira. São Paulo: Casa do Psicólogo.
somáticos. 3. Marder, S.R. (1999). Escalas de avaliação psiquiá-
O material é distribuído pela Casa do Psicó- trica. In H.I. Kaplan & B.J. Sadock. Tratado de psi-
quiatria. 6.ed. (p.675-691). Porto Alegre: Artes Mé-
logo, constando de manual técnico, caderno dicas.
de aplicação, folha de respostas e crivos de apu-
ração.
Destina-se ao uso com pacientes e também
na população geral. RAVEN

Dados históricos
Administração
O Teste das Matrizes Progressivas, desenvolvi-
Forma: individual ou coletiva. do pelo psicólogo J.C. Raven, na Inglaterra, foi
Tempo: em média, de 30 a 50 minutos. criado como medida do fator “g”, com base
Manejo: verifica-se o escore bruto, em no referencial de Spearman. Apareceu em
cada um dos fatores, com o uso do crivo de 1936, ainda com fins de investigação, sendo
apuração, bem como o escore geral, trans- publicado em 1938. Em 1948, houve uma revi-
formando os escores brutos em escores sin- são das normas, de forma a abranger sujeitos
tomáticos, que devem ser assinalados nas de 6 a 65 anos. Posteriormente, houve uma
tabelas de normas, para a obtenção do per- padronização argentina [1].
fil, mas a apuração também pode ser feita Considerado como tarefa a ser cumprida,
pelo computador. poderia ser descrito como um teste de com-

250 JUREMA ALCIDES CUNHA


pletamento e, em termos do tipo de item, se- As investigações também permitiram o de-
ria um teste de escolha entre soluções alterna- senvolvimento de uma outra escala, conheci-
tivas duplas. Cada série apresenta um proble- da como Escala Especial, considerada mais fá-
ma introdutório, cuja solução é clara, forne- cil para crianças de 5 a 11 anos, sujeitos com
cendo um padrão para a tarefa, que se torna déficits intelectuais e idosos [3]. Lançada em
progressivamente mais difícil nos problemas 1947, foi padronizada também na Argentina
subseqüentes. Exige que o sujeito estabeleça [6], sendo apresentada tanto em caderno,
inferências sobre as relações existentes entre como na forma de tabuleiro, muito satisfató-
itens abstratos, tendo sido considerada a me- ria para crianças pequenas. A revisão de 1956
lhor medida do fator “g” [2]. da Escala Especial foi publicada em 1988,
Como teste não-verbal, foi tido como li- pela Casa do Psicólogo, com padronização
vre de influências socioculturais. Contudo, brasileira.
mais tarde, verificou-se que a instrução sus-
cita efeitos significativos sobre os resultados.
Além disso, algumas pesquisas, embora com- Descrição
provando boa saturação do fator “g”, reve-
laram a influência de outras variáveis, como, Todas as séries, com a exceção do tabuleiro,
por exemplo, a precisão perceptiva e o racio- são apresentadas na forma de cadernos, com
cínio indutivo. uma série de matrizes ou desenhos, impressos
Atualmente, o teste é apresentado em três na parte superior de cada página, entre os quais
escalas. falta um, que completa logicamente o conjun-
As séries iniciais compõem a chamada Es- to. Na parte inferior, há entre seis ou oito al-
cala Geral. Apesar de a padronização de 1948 ternativas de respostas ou soluções, das quais
abranger faixas etárias inferiores, é mais utili- o indivíduo deve selecionar a correta, cujo nú-
zada dos 12 aos 65 anos ou, mais especifica- mero o sujeito deve escrever na folha de res-
mente, para adolescentes e adultos [3]. postas, de acordo com o item. No caso da for-
Consideradas certas limitações da Escala ma de tabuleiro, o sujeito deve inserir na pran-
Geral, foi construída a Escala Avançada para cha a peça que corretamente completa o de-
aumentar o poder discriminativo do instru- senho. As séries são ordenadas por dificulda-
mento. Lançada em 1943 para atender ne- de crescente.
cessidades de seleção de oficiais, foi revisa- A Escala Geral compreende cinco séries –
da em 1947, mas somente o trabalho de Foul- A, B, C, D e E –, a Escala Especial, três séries –
ds, Forbes e Bevens [4] permitiu resolver cer- A, Ab e B –, e a Avançada, duas séries – I e II
tas questões de fidedignidade e validade do (esta última introduzida apenas para os sujei-
instrumento. A edição final de 1962 elimi- tos que resolvem mais da metade dos itens da
nou alguns dos itens e adotou a ordem de série I).
sua apresentação pelo índice de freqüência O material inclui o manual, caderno ou ca-
dos acertos [5]. Essa Escala parece mais útil dernos de matrizes, folhas de respostas e crivo
com sujeitos a partir de 12 anos e meio ou de correção. Para a administração coletiva da
com nível intelectual equivalente. Nesta, a Escala Especial, existem cartazes dos dois pri-
série I serve de treinamento e triagem para a meiros itens.
série II, que é especialmente indicada por sua A Escala Geral e a Especial (correspondente
capacidade discriminativa nos níveis de inte- à edição de 1947) são distribuídas pela Paidós,
ligência superior. Apresenta a vantagem tan- Buenos Aires; a Escala Avançada tem edição
to de poder ser utilizada como teste de rapi- do CEPA, Rio de Janeiro; a Escala Especial (cor-
dez e potência intelectual, como também respondente à edição de 1956) pode ser en-
permite explorar operações intelectuais en- contrada na Casa do Psicólogo e no Centro
volvidas nos processos mais elevados de Editor de Testes e Pesquisas em Psicologia, São
pensamento. Paulo, com padronização brasileira.

PSICODIAGNÓSTICO – V 251
Administração um teste psicológico, não apenas no domínio
cognitivo, deveria partir de uma análise prévia
Forma: individual ou coletiva, em todas as que permitisse inserir os itens dentro de um
escalas, exceto no caso de crianças pequenas, contexto teórico” [7]. Embora essa autora va-
em que deve ser individual. lorize a tentativa feita por Paín, de análise das
Tempo: geralmente livre, podendo ser de- matrizes progressivas dentro de uma perspec-
terminado um período de tempo para avaliar tiva genética com base em Piaget [8], salienta
a eficiência do trabalho do sujeito sob pres- que a construção do teste se baseou nas leis
são, especialmente no caso da Escala Avança- neogenéticas de Spearman, sem referência às
da; via de regra, observa-se que: a) na Escala operações mentais fundamentadas em Piaget,
Geral, o tempo é algo variável, sendo, em mé- enquanto somente nessa linha teórica haveria
dia, de aproximadamente 40 a 60 minutos; b) uma base para explicar sua dificuldade progres-
na Escala Especial, em aplicação individual, siva [7]. Tal enfoque, conforme Nick, permitiria
também é algo variável, mas dificilmente ul- não apenas determinar o nível intelectual, com
trapassando 30 minutos; c) na Escala Especial, base no escore total obtido, mas chegar a “uma
em aplicação coletiva, deve ser previsto um utilização mais adequada do teste como ins-
período de 90 minutos, ainda que, em muitos trumento diagnóstico”.
casos, não exceda 45 minutos; d) na Escala 2. As normas originais da Escala Geral são
Avançada, a série I pode ser administrada em muito semelhantes às da padronização argen-
10 minutos; e) na Escala Avançada, a série II, tina. Aliás, em vários países europeus, pareceu
como teste de rapidez, é recomendável um viável a utilização das normas originais, embo-
período de 40 minutos, mas, sem limite de tem- ra resultados em culturas não-européias não
po, pode ser administrada em aproximadamen- tenham confirmado a universalidade de tais
te 60 minutos. normas. Note-se, também, que, na década de
Manejo: com o uso de uma chave, as res- 50, foi feita uma aplicação em mais de 5.000
postas são classificadas como positivas ou ne- alunos, de 12 a 19 anos, de escolas públicas e
gativas; cada resposta positiva ou certa recebe particulares de Porto Alegre, sendo os resulta-
um ponto; o total de pontos é o escore obtido dos apreciavelmente mais elevados do que das
pelo sujeito; este é transformado em percen- normas argentinas [9], havendo sido as tabelas
til, com o uso de uma tabela selecionada con- de percentis correspondentes incluídas em ou-
forme a escala usada, a forma de administra- tra edição deste livro [10, Anexo I). Na realidade,
ção e a idade do sujeito, e, conseqüentemen- torna-se muito importante uma revisão periódi-
te, pode-se ter uma estimativa do seu nível in- ca das normas (o que está sendo realizado em
telectual. Porto Alegre, sob a coordenação de Denise Ban-
deira, e em outros pontos do país), porque o uso
de normas antigas leva a uma superestimação
Indicações do desempenho, pelo aumento crescente dos
escores, desde o surgimento do teste [11].
1. Medida de inteligência (fator “g”). 3. Seu uso em neuropsicologia, antes valo-
2. Especificamente no caso da série II, ava- rizado, agora, é considerado com certas restri-
liação da capacidade de exatidão e clareza de ções, sendo de alguma utilidade apenas em
raciocínio lógico com poder de discriminação casos muito específicos [12].
nos níveis mais altos de inteligência.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Comentários
1. Raven, J.C. (1950). Test de Matrices Progresivas.
Manual. Buenos Aires: Paidós.
1. Em relação à fundamentação teórica, diz 2. Anastasi, A. (1965). Testes psicológicos: teoria e
Eva Nick que “toda e qualquer construção de aplicação. São Paulo: Herder.

252 JUREMA ALCIDES CUNHA


3. Raven, J.C., Raven, J., & Court, J.H. (1988). Matrizes seu, professor Konrad Gehring, decidira usá-lo
Progressivas Coloridas: manual. São Paulo: Casa do também para diminuir problemas no manejo
Psicólogo.
4. Campos, F. (s/d). Manual para uso da escala avan-
de uma turma de alunos adolescentes. O jogo
çada para Matrizes Progressivas. Rio de Janeiro: era utilizado em muitas variações, para criar
CEPA. poemas, em charadas ou, simplesmente, para
5. Forbes, A.R. (s/d). Análise dos itens das matrizes – as pessoas dizerem o que podiam ver nas man-
escala avançada, 1947, Série II. In F. Campos. Ma- chas. Como o professor Gehring conseguira
nual para uso da escala avançada para Matrizes
Progressivas (p.23-38). Rio de Janeiro: CEPA.
diminuir seus problemas na sala de aula, inter-
6. Raven, J.C. (1955). Test de Matrices Progresivas – calando ensino com um período de jogo, Ror-
escala especial. Manual. Buenos Aires: Paidós. schach incentivou os pacientes a jogá-lo [1, 2].
7. Nick, E. (1977). O teste de inteligência não-verbal No mesmo ano, Bleuler publicou sua obra
de Pierre Weil: análise de sua estrutura baseada na Dementia praecoce, introduzindo o termo es-
teoria de Jean Piaget. Rio de Janeiro: CEPA.
8. Paín, S. (1971). Psicometría genética. Buenos Aires:
quizofrenia e colocando o problema da dife-
Galerna. renciação entre pacientes com demência orgâ-
9. Cunha, J.A. (1960). Contribuição ao estudo do tes- nica e esquizofrênicos. Rorschach observou que
te de Raven. Bol. SPRGS, 1, Separata. as respostas desses dois grupos de pacientes
10. Cunha, J.A., Freitas, N.K., & Raymundo, M.G.B. ao jogo eram diferentes e apresentou um tra-
(1991). Psicodiagnóstico. 3.ed. Porto Alegre: Artes
Médicas.
balho a respeito para a sociedade psiquiátrica
11. Flynn, J.R. (1987). Massive IQ gains in 14 nations: local, que não chamou muita atenção.
what IQ test really measure. Psychol. Bull., 101, 171- Somente em 1917, Rorschach, voltando à
191. Suíça, após um período de treinamento em
12. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment. Moscou, decidiu usar sistematicamente as
3.ed. New York: Oxford Universities Press.
manchas de tinta para obtenção de respostas
de pacientes psiquiátricos. É provável que a
retomada da idéia, segundo Exner, tenha tido
RORSCHACH alguma influência de um trabalho publicado
por Hens, em 1917, sobre o uso de manchas
Dados históricos de tinta com crianças, adultos normais e pa-
cientes. Desenvolveu um conjunto de códigos
A idéia da utilização de manchas de tinta, como para classificar as respostas em termos de lo-
teste, surgiu no século passado, quando Binet calização, dos atributos da mancha responsá-
e Henri tentaram usá-las para estudo da ima- veis pela imagem percebida (forma, cor e mo-
ginação visual, havendo outros ensaios nesse vimento) e conteúdo (humano, animal, anato-
sentido, tanto na Europa, como nos Estados mia, etc.).
Unidos [1]. Há registro, porém, de uma obra Em 1921, havia reunido material suficiente
anterior, de Kerner, de 1857, discutindo suas para demonstrar a utilidade diagnóstica do
possibilidades como material psicológico [2]. método, especialmente com esquizofrênicos.
Entretanto, os antecedentes históricos do uso Desenvolvera, também, dados sobre freqüên-
das manchas de tinta para estimular a imagi- cias de tipos de resposta e relações entre cer-
nação criativa parecem remontar a Leonardo tos determinantes, que pareciam se relacionar
da Vinci, no século XVI [3]. com características psicológicas.
Em 1911, Hermann Rorschach, como um Dessa maneira, evidenciou-se o potencial
médico residente em psiquiatria, teve a idéia desse método para ser utilizado com fins de
de utilizar um jogo muito popular entre crian- diagnóstico, sua capacidade de detectar tra-
ças e adultos, chamado Blotto, para minorar ços ou estilos de personalidade.
os problemas que tinha no manejo dos pacien- Houve muitas dificuldades para a publica-
tes psiquiátricos. O jogo em si fora criado por ção de sua obra, Psychodiagnostik [4], e as
Kerner que, em 1895, sugerira seu uso no es- quarenta manchas, inicialmente utilizadas, fo-
tudo de traços de personalidade, e um amigo ram reduzidas a um conjunto de dez, usadas

PSICODIAGNÓSTICO – V 253
mais freqüentemente e mais consistentemen- Journal of Personality Assessment. Pretendia a
te nas pesquisas. Todavia, as manchas foram divulgação e a troca de informações sobre o
reproduzidas “com marcantes diferenças nos teste. Logo começou uma longa controvérsia
níveis de saturação do colorido”. Rorschach, com Beck, na qual Hertz acabou se envolven-
bastante criativo, decidiu utilizá-las em novas do. Com o correr do tempo, a controvérsia
investigações, achando que poderiam levar a mostrou-se irreconciliável, cada um desenvol-
respostas mais diferenciadas. Entretanto, oito vendo seu próprio sistema e com contínuas crí-
meses após, em abril de 1922, morreu de apen- ticas mútuas. Em 1942, lançou com Kelley seu
dicite aguda, complicada por peritonite [1]. primeiro livro, The Rorschach Technique [1],
Rorschach denominara seu método de Tes- seguido de vários outros.
te de Interpretação da Forma e achava que seu Algum tempo após, Zygment Piotrowski,
trabalho era apenas preliminar. Seus amigos que participara do primeiro seminário de Klop-
Morgenthaler, Oberholzer e Roemer resolveram fer, apareceu no cenário. Seu interesse básico
dar continuidade aos estudos, chamando o tinha que ver com a ajuda que o teste poderia
instrumento de Teste de Rorschach, embora o oferecer “para diferenciar pessoas criativas e
último deles desenvolvesse novo conjunto de não-criativas e (saber) como aqueles com dis-
manchas, enquanto os outros dois, permane- função neurológica poderiam se empenhar
cendo fiéis tanto ao material como ao sistema nesta tarefa, aparentemente ambígua”. Em
original de escore, tentaram, entretanto, de- 1957, tinha desenvolvido outro sistema de
senvolver o trabalho inicial, mas com mais ên- abordagem do teste, muito elaborado. Com o
fase no conteúdo. lançamento de sua obra Perceptanalysis, esta-
Na década de 20, pela reputação de va oficialmente lançada a quarta abordagem
Oberholzer, principalmente no campo da psi- do teste [1, 5].
canálise, David Levy conseguiu uma subvenção Outro profissional, que acabou por lançar
para com ela estudar durante um ano e, vol- a quinta abordagem para o teste, foi David
tando aos Estados Unidos, trouxe consigo vá- Rapaport. Encarregado, na Menninger Foun-
rios conjuntos de manchas, pretendendo rea- dation, de uma unidade de pesquisa, interes-
lizar estudos com as mesmas. Este foi o início sada no uso de testes psicológicos para diag-
do desenvolvimento e florescimento, naquele nóstico, após alguns anos de trabalho com uma
país, do método, para o qual seriam desenvol- boa equipe, lançou uma série de dois volumes,
vidos seis sistemas diferentes, tanto no que se Diagnostic Psychological Testing, em 1946,
refere a escore, como a interpretação. sobre as aplicações clínicas de vários testes,
As primeiras pesquisas a respeito foram de inclusive o Rorschach. Seu interesse tinha pon-
Beck e Hertz, em suas dissertações de douto- tos de contato com o de Klopfer, mas era for-
ramento, que completaram em 1932, continu- temente marcado pela influência da escola psi-
ando depois seus estudos na área. canalítica [6], o que se refletiu, também clara-
Por causa das crescentes pressões sobre os mente, na obra de um de seus discípulos, Roy
judeus, na Alemanha, Bruno Klopfer decidiu Schafer, Psychoanalytic Interpretation in Ror-
deixar o país, primeiramente, para Zürich e, schach Testing, considerada até hoje como um
mais tarde, migrando para os Estados Unidos, trabalho clássico sobre o assunto [7].
passando a trabalhar na Universidade de Co- Ao mesmo tempo em que Klopfer iniciava
lumbia. Por causa de seu treinamento no teste a sua série de seminários, em 1935, foi divul-
de Rorschach, em 1934 começou uma série de gado o Thematic Apperception Test (TAT), com
seminários, primeiro, de maneira informal e, o conceito de projeção, termo cunhado pela
posteriormente, passou a devotar quase todo psicanálise, e do qual derivou o nome de mé-
o seu tempo ao desenvolvimento do teste. Em todos projetivos, aplicado a uma variedade de
1936, deu início a uma publicação, Rorschach técnicas, inclusive o Rorschach. Os instrumen-
Research Exchange, que mais tarde evoluiu tos, em geral, passaram a ser classificados
para o Journal of Projective Techniques, hoje o como técnicas objetivas e projetivas. Apesar da

254 JUREMA ALCIDES CUNHA


popularidade do Rorschach, TAT e de outras com base em pesquisa, que “os estímulos do
técnicas, na época classificadas como projeti- teste... provocam um conjunto muito comple-
vas, foram objeto de numerosas críticas, diri- xo de operações psicológicas”.
gidas para a metodologia projetiva, algumas
das quais bem colocadas e outras que pode-
riam ser caracterizadas como ingênuas. A pró- Descrição
pria dicotomia entre técnicas objetivas e pro-
jetivas também foi uma supersimplificação O material do teste compreende dez lâminas
grosseira, já que alguns testes de inteligência, com manchas de tinta, de 18,5 por 25cm, cin-
classificados sumariamente como objetivos, co das quais são acromáticas e cinco cromáti-
muitas vezes permitem respostas que são ana- cas (duas em vermelho e preto e três policro-
lisadas pelo enfoque projetivo, enquanto em máticas). As manchas são, em geral, escas-
algumas técnicas, destinadas especificamente samente estruturadas, embora possam ser
a favorecer a projeção, foram desenvolvidos consideradas simétricas em termos do eixo
elaborados sistemas de escore, permitindo es- vertical.
tudos sobre validade e fidedignidade, além de São apresentadas, uma a uma, ao exami-
dados normativos que, embora sem compro- nando, em ordem.
meter sua classificação como projetivas, lhes O material é impresso na Suíça, por Hans
emprestam qualidades bastante objetivas [1]. Huber, Medical Publisher, sendo, nos Estados
Todavia, exatamente essa dicotomia das téc- Unidos, distribuído por Grune & Stratton, Inc.,
nicas e críticas à metodologia projetiva leva- New York.
ram Exner a desenvolver um sexto sistema para No Brasil, podem ser adquiridas no CEPA e
o teste de Rorschach, o sistema compreensivo. na Casa do Psicólogo. O CEPA também fornece
Preocupado com a existência de cinco diferen- folhas para localização e sumário de dados,
tes sistemas e principalmente pelo fato de os embora cada sistema adotado exija uma folha
psicólogos mesclarem abordagens de um e de de registro correspondente.
outro autor em algum tipo de sistema indivi-
dual, desenvolveu extensa pesquisa, basica-
mente destinada a examinar aspectos meto- Administração
dológicos e a utilidade clínica dos vários siste-
mas. Em sua equipe, havia psicólogos com Ph.D Forma: individual e consensual (com casais
em psicologia clínica, com treinamento em to- ou outros grupos).
dos os cinco sistemas. Foram colhidos cerca de Tempo: variável, raramente inferior a 15
1.200 protocolos e estudadas questões funda- minutos ou superior a 60 minutos na adminis-
mentais, tais como a posição do examinador e tração propriamente dita; segue-se uma fase
do examinando, instruções, registro de respos- de inquérito, cuja duração varia, principalmente
tas, inquérito, seleção de códigos e de escores. de acordo com o número de respostas, e que
Foram examinados aspectos importantes, como pode ser realizada na mesma ou em outra ses-
de fidedignidade e validação da significação são, recomendando-se que o intervalo entre
na interpretação. Foram feitas análises muito ambas não ultrapasse uma semana; conforme
complexas, utilizando a tecnologia da compu- Klopfer, pode-se ainda usar um período de
tação eletrônica, e, finalmente, em 1974, foi analogia e um para teste de limites; na admi-
divulgada a nova abordagem, o sistema com- nistração consensual, são avaliados principal-
preensivo Rorschach, seguida da publicação de mente aspectos dinâmicos da interação.
várias obras e artigos a respeito. Não obstan- Manejo: cada resposta é geralmente classi-
te, Exner [1] não considera o Rorschach como ficada, no sistema de Klopfer, quanto a locali-
uma técnica projetiva, ainda que admita a ocor- zação, determinantes, conteúdo, popularida-
rência possível do processo de projeção. Acha de-originalidade e nível formal; classificadas as
que “é muito mais do que isso”, afirmando, respostas, levantam-se freqüências, e são fei-

PSICODIAGNÓSTICO – V 255
tos vários cálculos para chegar a determina- de emergir e evoluir a partir de uma experiên-
dos índices; a interpretação leva em conta as- cia pessoal e não de uma situação formal de
pectos quantitativos e qualitativos. aprendizagem.
3. Apesar de ser perfeitamente possível o
manejo de mais de um sistema de escores para
Indicações fins de diagnóstico, é preciso que o psicólogo
esteja adequadamente familiarizado com cada
1. Diagnóstico de personalidade, em clíni- um deles para evitar falhas. Alguns erros fre-
ca, planejamento terapêutico, seleção profis- qüentes são cometidos pelo fato de o exami-
sional e na área forense. nador utilizar um determinado sistema de es-
2. Detecção da dinâmica interpessoal e pla- core e nele basear hipóteses interpretativas,
nejamento da terapia familiar na forma con- desenvolvidas a partir de outro sistema de clas-
sensual [3]. sificação. Assim, embora o sistema de Klopfer
3. Prognóstico. seja largamente utilizado para várias finalida-
des, no momento em que se pretende uma
abordagem com base em pressupostos psica-
Comentários nalíticos, como num estudo das defesas, con-
forme Schafer, é necessário reclassificar as res-
1. Atualmente, o sistema mais em voga, nos postas de acordo com o sistema de Rapaport.
Estados Unidos, é o de Exner, embora ainda Por outro lado, a utilização de listas da quali-
haja adeptos de Klopfer. O de Klopfer é bas- dade formal das respostas também deve ser
tante divulgado, oferece critérios muito bem feita com cuidado pelos clínicos, que usam uma
definidos para a classificação das respostas e combinação de mais de um sistema, uma vez
boa fundamentação para o levantamento de que há casos em que apresentam diferenças,
hipóteses interpretativas. Porém, o sistema de que se refletem no F+% ou no X+%. Kinder e
Exner apresenta qualidades psicométricas in- colegas verificaram, por exemplo, que o méto-
discutíveis e está se difundindo rapidamente, do de Beck, usado com pacientes psiquiátri-
em vários países. Foi desenvolvido principal- cos, produz um X+% significativamente mais
mente para emprestar mais cientificidade ao baixo que o método de Exner [10].
instrumento. 4. Embora haja certos indícios, no Ror-
2. Na realidade, Exner [9], em sua decisão schach, que costumam ocorrer em casos com
de criar um sistema compreensivo, a partir das problemas orgânico-cerebrais, há técnicas es-
experiências de Rapaport, Beck, Klopfer, Hertz pecíficas mais indicadas para diagnóstico nes-
e Piotrowski, demonstrou um reconhecimento ta área [9]. Não obstante, esse teste é utiliza-
da qualidade de todos eles para apresentar “o do com freqüência na avaliação neuropsicoló-
melhor do Rorschach”. Assim, à exceção de gica, não para investigar a etiologia de tais sin-
Rapaport, que faleceu antes de seu empreen- tomas, mas para caracterizar aspectos da per-
dimento, foi muito incentivado pelos demais. sonalidade individual [11].
Também, em sua atividade didática anterior, 5. Trata-se de um teste que exige especiali-
achava aconselhável que seus alunos conhe- zação, constante estudo e atualização. Duran-
cessem pelo menos dois, senão os cinco siste- te muitos anos, o psicólogo que deseja traba-
mas de escore. Conseqüentemente, sua preo- lhar com ele necessita de supervisão de profis-
cupação com o fato de os alunos mesclarem sional notoriamente reconhecido por sua com-
abordagens de mais de um autor nada tinha a petência. A bibliografia é muito extensa (e,
ver com restrições do ponto de vista científico, aqui, reduziremos apenas a algumas obras,
uma vez que refere que seus dados, obtidos consideradas essenciais), mas as fontes só são
com todo o rigor científico, apresentavam “sig- realmente úteis se o psicólogo é capaz de do-
nificativa congruência” com esses enfoques minar aspectos básicos, como conduzir eficaz-
personalizados. Antes, lamentava que tivessem mente um inquérito e classificar as respostas

256 JUREMA ALCIDES CUNHA


com precisão. Além disso, parece importante Adrados, I. (1985). A técnica de Rorschach em crian-
que a experiência inclua testagem de pessoas ças. Petrópolis: Vozes.
Ames, L.B., Learned, J., Metraux, R., & Walker, R. (1942).
dos vários níveis socioeconômicos, com diver- Child Rorschach: development trends from two to
sas características culturais e de vários níveis ten years. New York: Hoeber.
de funcionamento da personalidade. Recomen- Augras, M. (1967). Estudos para padrões brasileiros do
da-se, também, que a pessoa que pretende Rorschach. Arq. Bras. Psicot., XIX, 2, 45-54.
utilizar o Rorschach em psicodiagnóstico se Augras, M. (1967). Problemas metodológicos do Teste
Rorschach no meio brasileiro. Arq. Bras. Psicot., XIX,
submeta a terapia. 1, 105-110.
6. Segundo Groth-Marnat [12], a enorme Augras, M., Sigelmann, E., & Moreira, M.H. (1969). Tes-
quantidade de pesquisas com o Rorschach “é te de Rorschach: atlas e dicionário. Rio de Janeiro:
tanto uma vantagem, quanto uma limitação”, Fundação Getúlio Vargas.
porque muitos achados são contraditórios. Têm Beck, S.J. (1944). Rorschach’s test: variety of persona-
lity pictures. V.1. New York: Grune & Stratton.
havido também muitas restrições em relação à Beck, S.J. (1945). Rorschach’s test: variety of persona-
sua qualidade psicométrica, o que não impe- lity pictures. V.2. New York: Grune & Stratton.
de, entretanto, a sua popularidade. Bochner, R., & Halpern, F. (1948). L’application clinique
du test de Rorschach. Paris: Presses Universitaires
de France.
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4. Rorschach, H. (1948). Psicodiagnóstico. Buenos Ai- Americano de Rorschach e Outras Técnicas Projeti-
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schach. 2.ed. Madrid: Pablo del Río. Rorschach. New York: Grune & Stratton.
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parison of Exner and Beck Systems. J. Pers. Assess., schach. Buenos Aires: Paidós.
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11. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment. Technique. V.1. New York: Harcourt, Brace & World.
3.ed. New York: Oxford Universities Press. Klopfer, B., et alii (1956). Developments in the Rorschach
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l’enfant au moyen du Test du Rorschach. Paris: Her-
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PSICODIAGNÓSTICO – V 257
Olin, J.T., & Keatinge, C. (1998). Rapid psychological cm, dentro da qual há três caixas de pape-
assessment. New York: Wiley & Sons. lão, nas quais o material estandardizado é
Quintela, G.F. (1955). Psicodiagnóstico do Rorschach. Arq.
Bras. Psicot., 7, 1, 7-28; 7, 2, 75-112; 7, 3, 47-55.
disposto de forma a permitir uma visão glo-
Quintela, G.E. (1955). Psicodiagnóstico de Rorschach. bal sem chamar uma atenção especial para
Arq. Bras. Psicot., 7, 2, 75-112. alguma peça específica. Numa das caixas, há
Quintela, G.E. (1955). Psicodiagnóstico de Rorschach. marionetes flexíveis, representando 8 adul-
Arq. Bras. Psicot., 7, 3, 47-55. tos e 8 crianças. Noutra caixa, há retângulos
Rickers-Ovsianka, M.A., Ed. (1961). Rorschach Psycho-
logy. New York: Wiley & Sons.
de madeira de diversas cores e tamanhos.
Santos, M.A. (1996). Aplicação da prova de Rorschach Além disso, há um material suplementar,
no campo da psicopatologia. Ribeirão Preto, SP: constituído de 10 animais, 3 veículos, 3 per-
Anais do I Encontro da SBRO, p.257-281. sonagens simbólicos, elementos da nature-
Small, L. (1956). Rorschach locations and scoring ma- za (como árvore, grama, etc.) e itens casei-
nual. New York: Grune & Stratton.
Windholz, M.H. (1969). Rorschach em crianças. São
ros (móveis e objetos).
Paulo: Vetor. O material e o manual são distribuídos por
Vaz, C.E. (1980). O Rorschach: teoria e desempenho. Delachaux & Niestlé, na Suíça.
Porto Alegre: Artes Médicas. É usado em crianças, adolescentes e adul-
tos [5], sendo que Ceverny [6] apresenta uma
experiência desenvolvida com o grupo familiar.
SCENO-TEST

Dados históricos Administração

O Sceno-test foi inspirado numa situação tera- Forma: individual, ainda que, eventualmen-
pêutica, analisada por sua autora, Gerhild Von te, no caso de grupo familiar, com a participa-
Staabs [1]. A idéia surgiu, em 1938, a partir da ção de vários filhos e observação dos pais.
dramatização de um diálogo de um casal, en- Tempo: variável; no caso de sessões fami-
cenada com elementos do ambiente, por uma liares, de 30 a 50 minutos.
criança de 5 anos, cena que, segundo Von Sta- Manejo: não há um sistema de escores,
abs, representava a situação familiar da pacien- embora Knehr [7] tenha apresentado sugestões
te. Desde então, começou a reunir objetos que para a análise formal; em nível individual, ofe-
pudessem constituir o universo de uma famí- rece a possibilidade de análise de conteúdos
lia, além de outros suplementares, com base conscientes e inconscientes para a interpreta-
na pressuposição de que tais materiais permi- ção dinâmica; em nível familiar, a avaliação
tissem que os sujeitos fizessem a reprodução tende a um enfoque comunicacional, pela iden-
mais fácil de situações de vida diária. tificação do tipo de sistema familiar, de subsis-
O Sceno-test foi divulgado, pela primeira temas, permeabilidade ou rigidez dos mesmos,
vez, em 1943 [2], tendo tido outras edições diferenciação de papéis e interação entre os
posteriores, inclusive em 1951 [3], na Alema- membros do grupo.
nha, e em 1964, na Suíça [4].
No desenvolvimento de seus estudos, a au-
tora constatou que, além de importante coad- Indicações
juvante na psicoterapia, o instrumento também
era útil no processo psicodiagnóstico. 1. Avaliação dinâmica da personalidade.
2. Avaliação do desenvolvimento psicomo-
tor.
Descrição 3. Exploração das relações familiares.
4. Psicoterapia em geral e intervenção em
O material é apresentado numa caixa de ma- crises.
deira, com dimensões de 60 cm x 40 cm x 10 5. Orientação profissional.

258 JUREMA ALCIDES CUNHA


Comentários vido e sofrendo algumas modificações até
1943, na Universidade de Harvard. Sua criação
1. Embora relativamente pouco divulgado foi influenciada pela ênfase no enfoque psico-
no Brasil, Van Kolck [4] cita trabalhos de Ka- dinâmico, durante as duas décadas anteriores,
zenstein e de Vidal. Na década de 80, Ceverny pela demanda de instrumentos de psicodiag-
[5] desenvolveu interessante pesquisa sobre a nóstico e pelo reconhecimento da importân-
utilização do instrumento na avaliação da fa- cia do teste de Rorschach. Como outras técni-
mília. cas projetivas, baseava-se em pressupostos
2. Após mais de 50 anos de trabalho clínico psicodinâmicos.
com o Sceno, Biermann e Biermann [5], em Inicialmente, a tarefa proposta ao sujeito
mais de 1.000 crianças e adolescentes (com consistia em solicitar-lhe interpretações e co-
problemas psicossomáticos, transtornos de mentários sobre as cenas das figuras das lâmi-
conduta, etc.) e em cerca de 100 adultos es- nas. As instruções foram modificadas depois,
quizofrênicos, opinam que, embora fossem pedindo-se a elaboração de uma história com
aconselháveis pequenas modificações para se princípio, meio e fim, com base nos estímulos
adaptar aos tempos modernos, o material de de cada lâmina. A pressuposição básica é de
teste pode ser considerado atualizado, mesmo que o sujeito se identifique como herói e se
em nossos dias. solicita que informe sobre sentimentos e pen-
samentos do personagem, acreditando-se que,
assim, ele expresse necessidades, motivos, ati-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS tudes, crenças pessoais, etc.
Após o lançamento do TAT, muitos estudos
1. Van Staabs, M.G. (1964). Der Sceno-Test. Bern/Stut-
tgart: Hans Huber.
foram realizados, embora não exista um siste-
2. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio ma de escore único. Pelo contrário, segundo a
de Janeiro: Campus. literatura [2], em 1986, foi registrada por Mur-
3. Zamorani, P. (1993). Lo Sceno Test di V. Staabs ne- ray a existência de métodos de interpretação
llo studio del Defeck Schizofrenico. Revista de Psi- para o TAT, propostos por 22 psicólogos dife-
chiatria, 28, 5 (Suppl.), 21-25.
4. Van Kolck, O.L. (1975). Técnicas de exame psicoló-
rentes. Grande parte dos sistemas de interpre-
gico e suas aplicações no Brasil. Testes de persona- tação se baseava na teoria de personalidade
lidade. Petrópolis, RJ: Vozes. de Murray. Mas houve outras abordagens,
5. Biermann, G., & Biermann, R. (1998). Das Scenos- como as de Arnold, Bellak, Dana [3] e, mais
piel im wandel der zeiten. Praxis der Kindergarten recentemente, a de Vica Shentoub e colegas
und Kinder psychiatrie, 47, 186-202.
6. Ceverny, C.M.O. (1982). O Scenotest como instru-
[4, 5].
mento de investigação das relações familiares, no Após o aparecimento do TAT, surgiu uma
processo psicodiagnóstico com crianças e adoles- série de técnicas projetivas utilizando figuras
centes. São Paulo: PUCSP (Dissertação de mestra- como estímulo, como o CAT (Children’s Apper-
do). ception Test), para crianças, o PST (Picture Story
7. Knehr, E. (1961). Konflikt-Gestaltung in Scenotest.
München/Basel: Ernst Reinhardt.
Test), para adolescentes, o SAT (Senior Apper-
ception Test), para idosos, e, mais recentemen-
te, o TEMAS [6], para sujeitos de grupos mino-
ritários, e, inclusive, o Teste de Frustração é
TAT considerado um herdeiro do TAT [3].

Dados históricos
Descrição
O TAT, Thematic Aperception Test, ou Teste de
Apercepção Temática [1], foi idealizado pelo O TAT é composto por 31 lâminas: 30 com gra-
psicólogo e médico americano Henry Murray e vuras e uma em branco. Destas, 11 são univer-
Christina Morgan, em 1935, sendo desenvol- sais, aplicando-se a todos os sujeitos: 1, 2, 4,

PSICODIAGNÓSTICO – V 259
5, 10, 11, 14, 15, 16, 19 e 20. As demais são 5. Análise da capacidade de organização e
específicas conforme sexo e faixa etária. Logo, manutenção de idéias [7].
a forma completa do TAT abrange 20 lâminas
para cada sujeito (11 universais e 9 de acordo
com o sexo e a faixa etária). Comentários
O material é editado pela Paidós, em Buenos
Aires, e pela Casa do Psicólogo, em São Paulo. 1. Apesar de Murray [1] ter considerado o
Ainda que eventualmente usado com crian- TAT como um dos instrumentos projetivos de
ças, destina-se principalmente a adultos e ado- mais amplo uso e credibilidade por parte dos
lescentes. psicólogos, já não se verifica a atmosfera de
entusiasmo que o cercava por volta da metade
do século XX [8], o que é atribuído, às vezes,
Administração ao tempo exigido para sua administração e in-
terpretação [9]. Também, no meio acadêmico,
Forma: parece ter diminuído sua valorização, embora,
a) conforme o número de sujeitos: indivi- num levantamento de técnicas utilizadas, em
dual (podendo ser auto-administrada ou não), 221 serviços clínicos dos Estados Unidos, há
coletiva (auto-administrada) ou grupo (em co- pouco mais de uma década, fosse classificado
laboração); em quinto lugar [10]. Da mesma forma, já foi
b) conforme o número de lâminas: comple- registrado seu declínio como instrumento de
ta, abreviada ou reduzida (selecionando-se as pesquisa [11]. Entretanto, ultimamente, cons-
lâminas segundo faixa etária, sexo, problemá- ta em quarto lugar na produção de pesquisas
tica do paciente, método adotado ou depen- [3]. Porém, em nosso meio, o TAT ainda tem
dendo de dados derivados da história ou do sido considerado um instrumento útil tanto em
material de testagem). psicodiagnóstico como em pesquisa [12-17].
Tempo: variável, recomendando-se que, no 2. Na realidade, o TAT foi em parte delinea-
total, não ultrapasse de 90 a 120 minutos, dis- do para avaliar traços de personalidade. Da-
tribuídos em duas sessões. dos de pesquisa, entretanto, têm indicado que,
Manejo: embora tenham sido propostos ao contrário, o TAT é mais sensível a estados
vários sistemas de escore para o TAT [2], usual- afetivos do que a traços [9]. Cabe referir tam-
mente, na clínica, a interpretação é realizada bém que sofre influências situacionais [18] e
através de uma abordagem psicodinâmica. do nível de escolaridade [7].
3. Ainda que sejam muito questionadas a
fidedignidade e a validade do TAT, como ocor-
Indicações re com a maioria dos instrumentos de sua ca-
tegoria [19], as críticas geralmente se centrali-
1. Avaliação da personalidade, principal- zam na inexistência de um sistema de escore
mente para analisar a natureza dos vínculos único e na ausência de dados normativos, con-
afetivos, regulação dos afetos, qualidade das forme a idade [7], sendo uma técnica orienta-
relações interpessoais e identificação de con- da mais para uma interpretação impressionis-
flitos e mecanismos de defesa. ta [18]. Dessa forma, a ambigüidade da pro-
2. Avaliação de condições para indicação dução do sujeito e a quantidade de variáveis
psicoterápica. que podem surgir em duas sessões de admi-
3. Acompanhamento da evolução durante nistração podem ser alvo de inúmeras inter-
o processo psicoterápico. pretações do ponto de vista qualitativo. Isso
4. Coleta de subsídios sobre a função cog- faz com que muitos psicólogos de orientação
nitiva de planejamento, através da análise do não-dinâmica o classifiquem como não-cientí-
manejo que o examinando faz de idéias verba- fico [2]. Não obstante, teóricos de orientação
lizadas seqüencialmente [7]. dinâmica desconsideram tais críticas, achando

260 JUREMA ALCIDES CUNHA


que a produção do sujeito pode ser perfeita- 13. Eizirik, L.S. (1982). Depressão puerperal: efeitos de
mente alvo de uma avaliação qualitativa, sen- prematuridade e risco de vida do recém-nascido no
estado emocional da puérpera. Porto Alegre: Insti-
do solidamente fundamentada em uma teoria tuto de Psicologia da PUCRS (Dissertação de mes-
da personalidade. trado).
4. Outra crítica, levantada por Anzieu, no 14. Freitas, N.K. (1982). Um estudo sobre a negação
prefácio à obra de Vica Shentoub e outras [4], maníaca e a depressão nas mães de pacientes can-
é quanto ao enfoque adotado por Murray na cerosos terminais. Porto Alegre: Instituto de Psico-
logia da PUCRS (Dissertação de mestrado).
interpretação do teste, que não considera vali- 15. Rian, I. (1984). Um estudo sobre os aspectos psico-
dado pela experiência clínica. Assim, dá ênfase lógicos da depressão e negação maníaca em pa-
ao método de interpretação dessas autoras por cientes mastectomizados. Porto Alegre: Instituto de
utilizarem uma perspectiva rigorosamente psi- Psicologia da PUCRS (Dissertação de mestrado).
canalítica. 16. Knijnik, J. (1985). Amamentação natural ou artifi-
cial: estudo de indicadores da libido e da agressão.
Porto Alegre: Instituto de Psicologia da PUCRS (Dis-
sertação de mestrado).
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Sadock. Tratado de psiquiatria. 6.ed. (p.592-613).
Porto Alegre: Artes Médicas.
10. Pruitt, J.A., Smith, M.C., Thelen, M.H. & Lubin, B.
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TESTE DAS FÁBULAS
toward projective techniques: 1968-1983. Prof.
Psychol.: Research & Practice, 16, 781-788. Dados históricos
11. Pollyson, J., Norris, D., & Ott, E. (1985). The recent
decline in TAT research. Prof. Psychol.: Research & O Teste das Fábulas [1] retomou uma série de
Practice, 16, 26-28.
12. Felippe, Y.M.L. (1980). Gravidez e depressão: um
fábulas inacabadas, que originalmente foi di-
estudo comparativo entre gestantes primíparas e vulgada por Louisa Düss, na França, em 1940
não-gestantes. Porto Alegre: Instituto de Psicolo- [2], e, logo em seguida, na Alemanha [3]. O
gia da PUCRS (Dissertação de mestrado). instrumento, apresentado inicialmente como

PSICODIAGNÓSTICO – V 261
Método das Fábulas, visava a explorar confli- compreende dez pequenas fábulas, cujo herói
tos inconscientes, pretendendo chegar a um (animal ou criança) se encontra em uma deter-
“diagnóstico do complexo”, com uma base minada situação-problema, ambígua e simbó-
teórica essencialmente freudiana. Nos anos lica, que permite a emergência de material de
seguintes, a autora levantou dúvidas sobre o qualidade projetiva.
método, que envolviam a questão de validade Desenvolvemos, pois, uma série de lâminas
[4], desenvolvendo estudos de caráter pionei- com material ilustrativo dos temas, do tipo de
ro na época [5-7]. Entretanto, o Teste das Fá- histórias em quadrinhos. Por exemplo, na Fá-
bulas [1] propõe, na administração, a apresen- bula 1, na versão verbal, é apresentada uma
tação concomitante da forma verbal e de uma pequena historieta sobre um filhote de passa-
forma pictórica. Utiliza, para a análise das ver- rinho que sabe voar um pouco. Ele, com os
balizações, um sistema de categorização de seus pais, estava no ninho, em uma árvore,
respostas, identifica respostas populares e fe- quando veio um vento muito forte, que derru-
nômenos específicos e se fundamenta em um bou o ninho. Os pais voaram cada um para uma
referencial teórico mais completo e complexo, árvore. Então, pergunta-se à criança o que vai
para a interpretação dos resultados, do que o fazer o filhote. Portanto, a fábula envolve três
usado em trabalhos anteriores com historietas momentos-chave, que são apresentados em
incompletas. ilustrações.
Ainda na década de 40, as fábulas foram Estudos realizados comprovaram a fidedig-
traduzidas para o inglês, nos Estados Unidos, nidade da versão pictórica, em termos de pro-
por Louise Despert, para utilizá-las numa pes- dutividade e aspectos psicodinâmicos, na ver-
quisa com crianças [8], ficando conhecidas balização espontânea da criança [18]. As van-
nesse país como Fábulas de Despert [9]. Ape- tagens de utilizar concomitantemente as duas
sar da popularidade que alcançou, essa tradu- formas se reflete no nível de interesse obser-
ção sofreu críticas, por imprecisões semânti- vado e, principalmente, no material obtido no
cas e por não preservar suficientemente “certo inquérito subseqüente, que fornece conteúdos
caráter sugestivo das fábulas, em consonância muito mais ricos, resultando num melhor apro-
com o cunho psicanalítico do original” [10]. fundamento do entendimento psicodinâmico.
Desde seu lançamento, as fábulas foram Porém, utilizar um instrumento projetivo em
importadas em vários países, muitas vezes so- pesquisa envolve um problema, uma vez que
frendo modificações e acréscimos e servindo autores, que propugnam pelo uso clínico de
como instrumento em várias pesquisas e em tais técnicas, o fazem “visando à exploração
casos clínicos (vide, p.ex., 10-16). de aspectos dinâmicos da personalidade que
Há pouco mais de uma década se come- adquirem significado sob a ótica de um refe-
çou, na Pontifícia Universidade Católica do Rio rencial teórico ao qual há difícil acesso via psi-
Grande do Sul, Brasil, uma ampla pesquisa com cométrica” [19].
crianças pré-escolares, bem como outros pro- Desenvolvemos, então, um sistema de ca-
jetos menores paralelos, e a equipe sob nossa tegorização de respostas. É sabido que, na li-
coordenação decidiu utilizar as fábulas como teratura, encontra-se uma série de críticas em
um dos instrumentos na área de personalida- relação a sistemas de escore ou categorias em
de. Entretanto, os subsídios da literatura sobre instrumentos projetivos (vide, p.ex., 20– 26),
o uso das fábulas, nesse período etário, eram que procuramos considerar devidamente. Pri-
escassos. meiramente, listamos todas as variáveis psico-
A experiência anterior, bem como observa- dinâmicas identificadas pelos autores, nas fá-
ções na Argentina [17], apontaram para as van- bulas. Em segundo lugar, examinamos e anali-
tagens de desenvolver uma versão pictórica samos o referencial teórico a respeito, para ter
para uso com crianças de menos idade e, en- subsídios sobre a validade de constructo de
tão, nos propusemos a tal tarefa. A versão ori- possíveis alternativas. A seguir, a lista de variá-
ginal de Düss, que retomáramos e traduzimos, veis foi apreciada em relação às verbalizações

262 JUREMA ALCIDES CUNHA


produzidas por cerca de 500 crianças “para série de lâminas tem duas a mais do que o
verificar se as respostas apresentaram consis- número de fábulas.
tência lógica com o constructo implícito pelas A administração individual é utilizada em
variáveis relacionadas, se poderiam ser cate- processo psicodiagnóstico. Obtêm-se as verba-
gorizadas conforme as alternativas ou, ainda, lizações do sujeito e se realiza um inquérito
se o material real permitiria a identificação de para aprofundar o entendimento dinâmico.
variáveis descritoras ou categorias não previs- Com crianças de 3 até aproximadamente 8 ou
tas anteriormente com base na revisão teórica 9 anos, deve-se utilizar a forma pictórica con-
ou nas discussões de casos e relatos de pes- comitantemente com a verbal. Na adolescên-
quisa na literatura” [27]. cia e com adultos, pode-se utilizar apenas a
Anteriormente, num estudo prévio, já se ti- forma verbal, mas o uso da forma pictórica
nha feito a identificação de respostas popula- também tem parecido ser bastante útil. Com
res em pré-escolares e escolares [27] e procu- tais sujeitos, as fábulas são apresentadas como
rado verificar a significação de tais respostas teste de imaginação.
[28-31]. Por outro lado, a análise da verbaliza- A administração coletiva é usada com o
ção dos 500 casos permitiu a identificação de objetivo de triagem. Utiliza-se geralmente a
um certo número de fenômenos específicos forma verbal. Existem, porém, diapositivos ou
que, junto com as respostas populares, cons- transparências no caso de parecer recomendá-
taram no sistema de categorização de res- vel introduzir a forma pictórica com crianças
postas. Ultimado tal sistema, foram desen- de idade escolar.
volvidos estudos de fidedignidade interava- O manual da forma original é distribuído
liadores. pela Casa do Psicólogo, São Paulo. Existe uma
versão com a forma verbal e pictórica, incluin-
do manual, lâminas e protocolo, distribuída
Descrição pelo Centro Editor de Testes e Pesquisas em
Psicologia, São Paulo.
Em sua forma verbal, o teste compreende dez
historietas incompletas, que são apresentadas
uma a uma ao sujeito, que as deve completar. Administração
As fábulas são as seguintes: F1: do passarinho;
F2: do aniversário de casamento; F3: do cor- Forma: individual (para fins de diagnósti-
deirinho; F4: do enterro ou da viagem; F5: do co) e coletiva (para fins de triagem).
medo; F6: do elefante; F7: do objeto fabrica- Tempo: aproximadamente 15 minutos, ou
do; F8: do passeio com a mãe ou com o pai; e até 30 minutos, dependendo do inquérito.
F10: do sonho mau. Em sua forma atual, são Manejo: são considerados o tempo médio
praticamente mantidas as formulações propos- de reação, o número de respostas populares,
tas por Düss [32] (a não ser na F8, em que o outros tipos de respostas e fenômenos especí-
texto de Fine [12] foi preferido). Apenas são ficos; as verbalizações são analisadas confor-
sugeridas discretas modificações, a partir do me um sistema de categorização e faz-se a in-
exame do material original, para melhorar a terpretação dinâmica dos resultados.
precisão semântica ou manter as característi-
cas essenciais da situação originalmente pres-
suposta pela autora. Indicações
A forma pictórica é composta por doze lâ-
minas, com ilustrações adequadas a cada uma 1. Psicodiagnóstico de crianças, especial-
das fábulas, que devem ser apresentadas ao mente pré-escolares.
sujeito concomitantemente à forma verbal. 2. Avaliação dinâmica de adolescentes e
Como há duas alternativas possíveis na F4 (con- adultos, inclusive de terceira idade.
forme a idade) e na F8 (conforme o sexo), a 3. Avaliação dinâmica em casos clínicos.

PSICODIAGNÓSTICO – V 263
4. Triagem de conflitos emocionais em crian- 7. Düss, L. (1964). Fabelmethode und Untersushun-
ças, adolescentes e adultos por meio de admi- gen über den Widerstand in der Kinderanalyse. Biel:
Institut für Psycho-Hygiene.
nistração coletiva. 8. Despert, L. (1946). Psychosomatic study of fifty stut-
tering children. Am. J. Orthopsych., 16, 100-113.
9. Würsten, H. (1966). Complemiento de cuentos de
Comentários Madeleine Thomas y otros métodos similares. In A.J.
Rabin & M.R. Haworth, Ed. Técnicas proyectivas para
niños (p.181-192). Buenos Aires: Paidós.
1. É um dos testes projetivos mais bem acei- 10. Kramer, E. (1968). The Fables Test. J. Proj. Tech. &
tos por crianças que reagem a ele mais pron- Pers. Assess., 32, 6, 530-532.
tamente que ao CAT [33], e fornece informa- 11. Ducros, M.M. (1959). Des responses fournies aux
ções úteis dentro do contexto de uma bateria “fables de Düss” par les enfants vivant dans un mi-
de testes psicológicos [17]. lieu familial anormal. Enfance, 2, 153-180.
12. Fine, R. (1948). Use of Despert Fables (revised form)
2. Exige do examinador um sólido referen- in diagnostic work with children. Rorschach Res.
cial teórico e boa compreensão de representa- Exch. & Proj. Tech., 12, 106-118.
ções simbólicas. 13. Malhorta, M.K. (1971). Über den diagnostichen
3. Pode servir como método para a investi- Wert der Düsschen Fabelmethod. Zeitschrift für ex-
gação de constructos teóricos de base [19, 27, perimentelle und angewandte Psychologie, XVIII,
285-306.
33-36]. 14. Mosse, H.L. (1954). The Duess Test. Am. J. Psycho-
4. Em São Paulo, foi desenvolvido, por Pe- th., 8, 251-264.
çanha [37], um sistema de categorização de 15. Rossi, L. (1965). Utilitá del test delle Düss
indicadores de somatização, com crianças as- nell’indagine psicodinamica degli psicotici. Neurop-
máticas, bem como categorias relativas a as- sichiatria.
16. Schwartz, A.A. (1950). Some intercorrelations
pectos estruturantes das relações dos pais among four tests comprising a test battery: a com-
sobre o ego infantil. parative study. J. Proj. Tech., 14, 153-172.
5. Tardivo [38] desenvolveu interessante 17. Bernstein, J. (1964). Apendice. In J.E. Bell. Técnicas
trabalho, procurando relacionar categorias proyectivas. Buenos Aires: Paidós.
de conteúdo relativas a cada uma das fábu- 18. Cunha, J.A., Werlang, B.G., Oliveira, M.S., Nunes,
M.L.T., Porto Alegre, A., Heineck, C., & Silveira, H.R.
las e analisando a distribuição de respostas (1989). Método das Fábulas: uma versão pictórica.
de 128 crianças de 5 a 8 anos. Além disso, Psico, 17, 1, 51-59.
discute o desempenho desses sujeitos nas 19. Cunha, J.A., & Nunes, M.L.T. (1996). Medida proje-
fábulas, no CAT e no Procedimento Desenhos- tiva. In L. Pasquali, Org. Teoria e métodos de medi-
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264 JUREMA ALCIDES CUNHA


27. Cunha, J.A., & Werlang, B.G. (1995). O uso de téc- te, com a colaboração de Robert Heiss e Hil-
nicas projetivas em pesquisa: o Teste das Fábulas. degard Hiltman, de Friburgo, foram feitos
Psicologia: Reflexão e Crítica, 8, 1, 31-42.
28. Cunha, J.A., Oliveira, M.S., Werlang, B.G., Nunes,
estudos sobre a técnica que, com melhor em-
M.L.T., Porto Alegre, A., Heineck C., et alii (1989). basamento, chegou à sua forma final em
Respostas populares ao Teste das Fábulas. Psico, 19, 1951. Também, em vez da construção de uma
2, 28-42. única pirâmide, na nova forma de adminis-
29. Cunha, J.A., Oliveira, M.S., & Heineck, C. (1990). tração, passaram a ser solicitadas três. Tra-
Tendências socioclínicas sugeridas pelas respostas
populares ao Teste das Fábulas. Porto Alegre: Ciên-
ta-se de uma técnica projetiva que visa a in-
cia e Cultura, 42, 7, 467. vestigar aspectos psicodinâmicos, com base
30. Nunes, M.L.T., Cunha, J.A., Oliveira, M.S. (1990). O nas relações entre as cores, seu manejo e seu
valor clínico do escore de concordância social no simbolismo.
Teste das Fábulas. Psico, 20, 2, 77-84. Foi desenvolvido através de três etapas, a
31. Martins, M. (1990). Um estudo do transtorno de
conduta através do Teste das Fábulas. Porto Ale-
partir do significado dado às cores pela tradi-
gre: Instituto de Psicologia da PUCRS (Monografia, ção popular e normatizado após um estudo de
com divulgação restrita). validade discriminativa, usando, como amos-
32. Düss, L. (1986). Fábulas de Düss: o método das fá- tra, um grupo de sujeitos considerado repre-
bulas em psicanálise infantil. São Paulo: Casa do sentativo da população geral e um grupo de
Psicólogo.
33. Cunha, J.A., Nunes, M.L.T., Werlang, B.G., Oliveira,
dependentes de substâncias, sendo, além dis-
M.S. & Wagner, A. (1993). CAT e a avaliação da so, desenvolvido um estudo clínico, em que os
qualidade projetiva das respostas. In J.A. Cunha et achados foram analisados em vista do perfil
alii. Psicodiagnóstico-R. 4.ed.rev. (p.265-270). Por- psicológico dos sujeitos.
to Alegre: Artes Médicas.
34. Cunha, J.A. (1991). Uma investigação sobre o Édi-
po, hoje. Gramado, RS: Primeiro Congresso Gaú-
cho de Psiquiatria. Descrição
35. Cunha, J.A., & Nunes, M.L.T. (1995). Referencial te-
órico para a investigação do conflito edípico atra- O teste compõe-se de uma folha de papel com
vés de técnicas projetivas. Psicologia: Reflexão e o desenho de uma pirâmide de cinco andares,
Crítica, 8, 1, 19-29.
36. Cunha, J.A., & Werlang, B.G. (1992). Conflito edípi-
constituída de 15 quadrados de 2,5 cm de lado,
co e descontinuidades no desenvolvimento. Madri: além de quadrados de papel glacê de 24 tona-
Congresso Ibero-americano de Psicologia. lidades diferentes, a partir de 10 cores funda-
37. Peçanha, D.L. (1997). A reciprocidade do desenvol- mentais: vermelho, laranja, amarelo (cores de
vimento entre a criança com asma e sua família. extroversão), verde (cor da regulação), azul,
São Paulo: USP (Tese de doutorado).
38. Tardivo, L.S.P.C. (1998). O Teste de Apercepção
violeta (cores da introversão), branco, marrom,
Infantil e o Teste das Fábulas de Düss: respostas cinza e negro (cores da personalidade profun-
típicas da população brasileira e aplicações no da).
contexto das técnicas projetivas. São Paulo: Ve- Aplica-se a sujeitos adultos.
tor. O material, editado e distribuído pelo CEPA,
inclui manual, folha de protocolo e as cartelas.
O teste propriamente dito (isto é, os quadrícu-
TESTE DAS PIRÂMIDES COLORIDAS los) é importado de Berna, Suíça.

Dados históricos
Administração
O Teste das Pirâmides Coloridas foi criado por
Max Pfister, em 1946, em Zurique, mais com Forma: individual.
base em suas intuições sobre a significação Tempo: livre.
das cores do que, propriamente, com uma Manejo: as cores utilizadas são classifica-
fundamentação científica [1]. Posteriormen- das em quatro categorias, sendo que a inter-

PSICODIAGNÓSTICO – V 265
pretação se baseia numa série de relações nu- OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
méricas estabelecidas entre as categorias e nos
Carnio, E.C., & Loureiro, S.R. (1993). Caracterização da
percentuais de utilização das diferentes cores percepção do real de pacientes esquizofrênicos,
e tonalidades, que são avaliados conforme ta- avaliados através das pirâmides coloridas de Pfis-
belas por sexo e idade, sendo analisada a sua ter. Psico, 24, 1, 35-47.
significação a partir do simbolismo da cor, além Villemor Amaral, F. (1966). Pirâmides coloridas de Pfis-
de serem considerados o modo de execução e ter. Rio de Janeiro: CEPA.
aspectos formais.

TESTE DAS RELAÇÕES OBJETAIS


Indicação
Dados históricos
1. Avaliação da personalidade, especialmen-
te como técnica introdutória. O Teste das Relações Objetais [1] foi desenvol-
vido na Inglaterra, a partir da observação de
sessões psicoterápicas de grupos, realizadas
Comentários por Herbert Phillipson, com a colaboração e
sugestões de colegas, na Clínica Tavistock, em
1. Segundo Güntert [1] e Anzieu [2], a téc- Londres. Embora considerado um dos descen-
nica oferece uma adequada abordagem da afe- dentes do TAT, seu referencial teórico teve
tividade do ponto de vista dinâmico, deixando ampla influência de Melanie Klein e Fairbairn.
a descoberto alguns aspectos importantes den- Focalizava especificamente a relação entre pa-
tro de uma avaliação psicológica mais geral do ciente e terapeuta. Apesar de ter sido começa-
ponto de vista clínico. do a ser delineado em 1948, foi publicado so-
2. Além de outras modificações propostas mente em 1955.
para a técnica, Heiss e Hiltman sugeriram a A normatização do teste foi feita com base
construção suplementar de três pirâmides fei- em 600 histórias produzidas por uma amostra
as, pressupondo que, nestas, fossem projeta- de 50 pacientes psiquiátricos ambulatoriais e
das tendências inconscientes, e Shaia e Holder em material coletado de outra amostra, cons-
propuseram a redução das diversidades de tituída por 40 adolescentes normais, cujos da-
nuanças. Tais modificações, porém, parecem ter dos foram comparados com 50 sujeitos do sexo
sido sujeitas a sérias críticas [2]. feminino, com história de delinqüência. Entre-
3. Ao mesmo tempo que se afirma que o tanto, o próprio autor considerou com restri-
teste pode ser repetido, porque a aprendiza- ções seus estudos, sugerindo investigações
gem não influi nos resultados, sua fidedigni- adicionais.
dade no reteste é questionada por não dife- Somente na década seguinte à sua divul-
renciar suficientemente afetos estáveis e ins- gação, em Londres, o teste foi introduzido na
táveis no sujeito. Argentina, onde teve ampla aceitação, conti-
nuando seu enfoque interpretativo a sofrer a
influência de idéias de Freud e Klein, mas tam-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS bém recebendo contribuições decorrentes de
1. Güntert, A.E.V.A. (1996). A técnica das pirâmides
pontos de vista de Bion e de Liberman [2].
coloridas de Pfister para diagnóstico da personali-
dade. In A. Jacquemin, E.T.K. Okino e J. Vendrusco-
lo, Org. Anais do I Encontro da Sociedade Brasileira Descrição
de Rorschach e Outros Métodos Projetivos (p.3-9).
Ribeirão Preto, SP: Sociedade Brasileira de Ror-
schach.
O material do teste de Phillipson é composto
2. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio de três séries de quatro lâminas com figuras e
de Janeiro: Campus. mais uma lâmina branca. Cada série é denomi-

266 JUREMA ALCIDES CUNHA


nada, respectivamente, de A, B e C, assim como 2. Considera-se que essa técnica amplia o
as lâminas integrantes de cada uma são cha- referencial do teste de Rorschach, em termos
madas de A1, A2, A3 e AG. Cada figura mede do emprego de textura, de cor em duas moda-
15,5 cm x 19,5 cm e está impressa sobre uma lidades e das gradações de preto, bem como
lâmina branca de 22,5 cm x 29 cm. Essas fi- pela inclusão de figuras humanas.
guras representam situações de relações obje-
tais básicas, havendo situações de uma, duas,
três pessoas e situações grupais. Em todas REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
as figuras, as representações são de luz e
1. Phillipson, H. (1977). Test de Relaciones Objetales.
sombras, as silhuetas humanas são vagas [3] Manual. Buenos Aires: Paidós.
e ambíguas quanto a sexo e idade, não pos- 2. Grassano, E. (1996). Indicadores psicopatológicos
suindo detalhes nem precisão, em especial nas técnicas projetivas. São Paulo: Casa do Psicólo-
no rosto. Também não aparece movimento go.
ou esboço de movimento em qualquer das 3. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio
de Janeiro: Campus.
situações.

OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS


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Arzeno, M.E.G. (1995). Psicodiagnóstico clínico: novas
contribuições. Porto Alegre: Artes Médicas.
Forma: individual. Ocampo, M.L.S., Arzeno, M.E., et alii (1979). Las técni-
Tempo: aproximadamente 90 minutos. cas proyectivas y el proceso psicodiagnóstico. V.2.
Manejo: são consideradas três característi- Buenos Aires: Nueva Visión.
cas essenciais na produção das histórias: a) Ocampo, M.L.S., Arzeno, M.E., et alii (1981). O proces-
percepção da situação da lâmina; b) as pes- so psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. São
Paulo: Martins Fontes.
soas incluídas nas histórias e suas relações; e Piccolo, E.G. (1977). Indicadores psicopatológicos en
c) a história como estrutura e como realização, técnicas proyectivas. Buenos Aires: Nueva Visión.
e a interpretação é realizada, principalmente,
com base na teoria das relações objetais.

TESTE DE COMPLETAMENTO DE DESENHOS


Indicações (WARTEGG)

1. Avaliação da personalidade. Dados históricos


2. Avaliação de condições para indicação
de processo psicoterápico. O Teste de Completamento de Desenhos tam-
bém é chamado de Teste de Wartegg, por ter
sido Ehrig Wartegg que o divulgou, num con-
Comentários gresso de psicologia, realizado na Alemanha,
em 1937, e o publicou, em Leipzig, em 1939
1. É uma técnica de produção verbal, a par- [1-3]. Sua idéia de utilizar o completamento
tir de estímulos visuais, bastante ambíguos de desenhos, como técnica projetiva, foi inspi-
para se tornarem isentos da influência de as- rada numa técnica desenvolvida em 1928, o
pectos socioculturais. Concilia tendências de te- Teste da Fantasia. Como embasamento de seu
mática neutra e de dramatização, assim como teste, criou um sistema tipológico, elaboran-
enfatiza o presente, embora investigue a or- do, ao mesmo tempo, um esquema de fun-
dem temporal do que é projetado. Oferece a ções básicas da personalidade, cada um com
oportunidade de menor expressão da agressi- duas características em oposição. Teorica-
vidade, predispondo a um maior dinamismo mente, baseava-se em pressupostos da Ges-
quanto à transferência. talt e de Jung.

PSICODIAGNÓSTICO – V 267
Posteriormente, foi desenvolvido um estu- Wartegg não podem ser consideradas adequa-
do sobre o Wartegg por Marian Kinget, numa das no Brasil, por diferenças socioculturais e ha-
amostra de 383 sujeitos, considerados normais, vendo uma listagem de conteúdos mais freqüen-
incluindo crianças, adolescentes e adultos. Ela tes, numa amostra brasileira, embora a autora
abandonou o sistema tipológico criado ante- considere este como um estudo preliminar [1].
riormente, mas utilizou o esquema de funções
da personalidade, como um esquema metodo-
lógico, para considerar as características indi- Indicação
viduais, usando um critério diagnóstico que, se-
gundo Stipp [1], serve de fundamentação para 1. Avaliação da personalidade, em clínica,
as avaliações do teste que se fazem no Brasil. na área escolar e organizacional.

Descrição Comentário

A folha de protocolo do teste apresenta oito 1. Como todas as técnicas projetivas, o War-
quadrados de 4 cm de lado (“campo”), com tegg tem sido objeto de críticas, apesar de es-
uma moldura preta, sendo que, em cada um tar apresentando certa popularidade entre psi-
deles, há o esboço de um desenho (“sinal ar- cólogos, especialmente pelo fato de sua admi-
quétipo”), que é um estímulo para que o sujei- nistração se caracterizar por baixo custo e ser
to, a partir dele, construa uma configuração, simples e rápida. Estudos sugerem uma ade-
completando o desenho, conforme as caracte- quada revisão dos procedimentos adotados
rísticas gestálticas que lhe atribui. para levantamento e interpretação, uma vez
Após a entrega do protocolo, lápis e borra- que a fidedignidade interavaliadores é baixa
cha, é feito o estabelecimento de um rapport, [4], o que é uma crítica que deve ser encarada
e o sujeito recebe instruções para completar o com muita seriedade pelos psicólogos, pois põe
desenho iniciado da forma que mais lhe agra- em xeque a qualidade de suas decisões.
de e na ordem que quiser (que é anotada).
O teste pode ser aplicado a qualquer pes-
soa, independentemente de idade, sexo ou REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
escolaridade, bastando apenas estar o suficien-
1. Freitas, A.M.L. (1993). Guia de aplicação e avaliação
temente familiarizada com lápis e papel, para do teste de Wartegg. São Paulo: Casa do Psicólogo.
poder desenhar. 2. Stipp, V.D. (1996). Teste de Wartegg ou teste de
O manual e as folhas de aplicação são pu- completamento de desenhos. In A. Jacquemin, E.T.K.
blicados, no Brasil, pelo CETEPP, Centro Editor Okino e J. Vendruscolo, Org. Anais do I Encontro
de Testes e Pesquisas em Psicologia. da Sociedade Brasileira de Rorschach e Outros Mé-
todos Projetivos (p.35-40). Ribeirão Preto, SP: So-
ciedade Brasileira de Rorschach.
3. Anzieu, D. (1981). Os métodos projetivos. 3.ed. Rio
Administração de Janeiro: Campus.
4. Mattlar, C.E., Lindholm, T., Haasiosalo, A., Vesala,
Forma: individual ou coletiva. P., et alii (1991). Interrater agreement when asses-
sing alexithymia using the Drawing Completion Test.
Tempo: de 15 a 20 minutos. Psichot. & Psychos., 56, 1-2, 98-101.
Manejo: são utilizadas uma abordagem
projetiva (com análise da seqüência e do con-
teúdo, em relação às qualidades do estímulo) OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
e uma abordagem expressiva (análise de as-
Kinget, M.G. (1952). The drawing completion test. New
pectos formais da produção), enquanto a inter- York: Grune & Stratton.
pretação é feita numa base probabilística [2], já Wartegg, E. (1987). Teste de Wartegg, Diagnóstico de
que as listas de respostas normais, ou não, de Camadas. São Paulo, CETEPP.

268 JUREMA ALCIDES CUNHA


TESTE DE SONDAGEM INTELECTUAL nual. O seu limite inferior de idade é de 6 anos,
e há tabelas de percentis para níveis de esco-
Dados históricos laridade equivalentes até a atual sétima série
do ensino fundamental.
O Teste de Sondagem Intelectual foi planejado
para se constituir numa adaptação da Series
of Emergency Scales, de Grace H. Kent, que é Administração
um instrumento utilizado como medida preli-
minar a um exame intelectual mais completo Forma: individual, para pré-escolares e
[1]. crianças da 1a série, e coletiva para todos os
A partir do modelo de Kent, foi desenvolvi- outros níveis.
da uma série unificada de provas verbais – A, Tempo: livre, chegando aproximadamente
B, C e D –, organizadas por ordem de dificul- a 30 minutos.
dade crescente, com zonas de superposição – Manejo: atribui-se escore, de 1 a 4, às res-
AB, BC e CD –, construídas com a finalidade de postas corretas, conforme o grau de generali-
serem usadas como índices do nível em que zação de abstração e de precisão, obtendo-se
cada sujeito deve ser enquadrado para classifi- a soma dos escores, que são classificados con-
cação. forme tabelas de percentis existentes no ma-
Para a construção do instrumento, foi utili- nual.
zada uma amostra de 877 sujeitos, represen-
tativa e proporcional à população estudantil
de Porto Alegre. Os níveis de referência para a Indicações
construção e padronização (atualizados em
função da seriação escolar atual) são: nível A, 1. Triagem intelectual.
até a 2a série completa, nível B, até a 5a série 2. Avaliação intelectual [4].
completa, nível C, até a 7a série completa, e
nível D, até a 8a série completa.
Os instrumentos foram apresentados em Comentário
1967 e publicados em 1968 e 1969.
1. Tanto a série total, como o Teste de Son-
dagem Intelectual, reúnem as características de
Descrição rapidez, economia e flexibilidade, mas foram
criados como uma medida preliminar, que aten-
A série total inclui 75 itens, compreendendo de a um propósito de triagem. Kaufman e Rey-
três conjuntos – AB, BC e CD. Cada conjunto se nolds [5] recomendam o uso de medidas des-
compõe de 40 itens, organizados como dois se tipo para avaliar grande número de crian-
subtestes unitários, com igual número de itens. ças em um período curto de tempo, para, numa
Os itens são questões do tipo do subteste de base probabilística, identificar crianças que
Informação das Escalas Wechsler. podem apresentar problemas intelectuais e que
A série total foi desenvolvida para ser apli- devem ser encaminhadas a uma avaliação mais
cada em folhas de questões e folhas de res- completa. Assim, um mau resultado num tes-
postas próprias para cada conjunto [2]. Pode te de triagem não significa que o sujeito tenha
ser usada em crianças a partir de 6 anos, ado- problemas intelectuais, mas que tem probabi-
lescentes e adultos. lidade de apresentá-los.
O conjunto AB, que apresenta uma correla-
ção satisfatória com o teste INV, foi publicado
pelo CEPA, com o título de Teste de Sondagem REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Intelectual [3]. Seu material inclui folhas de
1. Kent, G.H. (1946). Series of Emergency Scales. New
questões do teste, folhas de respostas e ma- York: Psychological Corporation.

PSICODIAGNÓSTICO – V 269
2. Cunha, J.A., Moraes, M.I.B., Rocha, N.S., Werba, L., sujeito ser analisada sob diferentes enfoques
Valle, R.R., Spader, M. et alii. (1968). Construção da teóricos.
série unificada de provas de sondagem intelectual.
Bol. de Psicol., XX, 55/56, 15-24.
3. Cunha, J.A., Moraes, M.I.B., Rocha, N.S., Werba, L.,
Valle, R.R., Spader, M., et alii. (1969). Teste de Son- Descrição
dagem Intelectual. Rio de Janeiro: CEPA.
4. Van Kolck, O.L. (1975). Técnicas de exame psicoló- O Teste Desiderativo coloca o sujeito numa si-
gico e suas aplicações no Brasil. Testes de persona-
lidade. Petrópolis, RJ: Vozes.
tuação imaginária, respondendo à pergunta:
5. Kaufman, A.S. & Reynolds, C.R. (1983). Clinical eva- “Que desejaria ser se tivesse de voltar a este
luation of intelectual function. In I.B. Weiner, Ed. mundo não podendo ser pessoa?” A seguir, são
Clinical methods in psychology. 2.ed. (p.100-151). propostas outras opções, entre animal, planta
New York: Wiley & Sons. e objeto, bem como rejeições, sendo estabele-
cida uma hierarquia de desejos e rejeições. São
investigadas as condições de integridade do
ego, diante da situação de morte, que é fanta-
TESTE DESIDERATIVO siada através das indagações do teste.
Destina-se a crianças, adolescentes e adultos.
Dados históricos

Criado em 1946, por Pigem e Córdoba, em Administração


Barcelona, este instrumento passou por várias
modificações, até a forma em que hoje é mais Forma: individual.
utilizado na América Latina. Primeiramente, Tempo: 10 a 15 minutos, aproximadamente.
Krevelen, na Holanda, fez uma adaptação para Manejo: a interpretação é feita a partir
administrá-lo em crianças. Em seguida, na Fran- do simbolismo das respostas e das motiva-
ça, Zazzo e Mathon [1], em 1950, apresenta- ções dinâmicas, expressas na explicação de-
ram outra versão, publicada, em 1956, como siderativa.
Teste do Bestiário. Também, em 1956, o teste
foi modificado por Jaime Bernstein [2], na Ar-
gentina, onde ficou conhecido como Questio- Indicação
nário Desiderativo ou Teste Desiderativo. As-
sim, seu referencial teórico, que derivava de 1. Avaliação dinâmica.
Spranger, passou a ser um marco psicanalíti-
co, havendo mudanças não só na interpreta-
ção, como na própria administração [3]. Comentários
No Bestiário, a criança faz escolhas e esta-
belece restrições em relação a animais. As res- 1. Ainda que o trabalho de Bernstein tenha
postas são consideradas quanto ao simbolis- representado um avanço sobre a versão origi-
mo dos animais, que são objeto de opções ou nal de Pigem e Córdoba, a técnica apresenta
rejeições. Não obstante, embora o Bestiário e agora melhores perspectivas para diagnóstico,
o Desiderativo tenham aspectos em comum, considerando novas abordagens interpretati-
exploram diferentes níveis de personalidade. vas, propostas por Grassano [4], com base em
Por outro lado, comparando o Teste Desi- pressupostos teóricos kleinianos.
derativo, de Pigem e Córdoba, com a versão 2. Apesar do uso de indicadores psicopato-
do Desiderativo, de Bernstein, segundo ele lógicos introduzir certa sistemática na tarefa
opina, no Apêndice do livro de Bell [2], a últi- de interpretação, parece que se poderia obter
ma forma permite uma avaliação mais dinâmi- mais riqueza de subsídios, se fosse possível
ca e supõe um enfoque idiográfico, ao contrá- desenvolver pesquisas sistemáticas com o ins-
rio da versão original, podendo a produção do trumento em grupos não-clínicos, bem como

270 JUREMA ALCIDES CUNHA


em grupos clínicos diferenciados quanto ao nio analógico abstrato. O Fator 1 compreende
diagnóstico ou “quadro psicopatológico”, na os itens mais fáceis do teste e envolve uma ta-
terminologia de Grassano [3]. refa de preenchimento de uma lacuna simples,
completando uma gestalt e exigindo da crian-
ça capacidade de percepção da gestalt e ha-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS bilidade visoespacial. Já o Fator 2, com itens mais
difíceis que o anterior, envolvendo uma tarefa
1. Zazzo, R., & Mathon, T. (1968). A prova do bestiá-
rio. In R. Zazzo. Manual para o exame psicológico
de descobrir a parte faltante de um todo, esta-
da criança (p.496-595). São Paulo: Mestre Jou. belecendo uma relação por analogia, exige, as-
2. Bell, J. (1964). Técnicas proyectivas. 2.ed. Buenos sim, capacidade de abstração e dedução. Em vis-
Aires: Paidós. ta da correlação entre esses dois fatores, foi pos-
3. Celener de Nijamkin, J., & Guinzbourg de Braude, sível identificar também um fator geral que com-
M. (1993). El cuestionário desiderativo. 2.ed. Bue-
nos Aires: Lugar Editorial.
preende os conteúdos de ambos os fatores e que
4. Grassano, E. (1996). Indicadores psicopatológicos representa o constructo de raciocínio analógico.
nas técnicas projetivas. São Paulo: Casa do Psicólogo. O instrumento, nos estudos realizados até
sua divulgação, em edição experimental (1998),
vinha apresentando muito boa qualidade psi-
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
cométrica, devendo ser reapresentado, dentro
Arzeno, M.E.G. (1995). Psicodiagnóstico clínico: novas de pouco tempo, com normas baseadas em
contribuições. Porto Alegre: Artes Médicas. cerca de 3.000 casos, em versão definitiva para
Ocampo, M.L.S., Arzeno, M.E., et alii (1981). O proces- o Brasil.
so psicodiagnóstico e as técnicas projetivas. São
Paulo: Martins Fontes.
Piccolo, E.G. (1977). Indicadores psicopatológicos en
técnicas proyectivas. Buenos Aires: Nueva Visión. Descrição

O TNVRI é um instrumento não-verbal consti-


tuído por um caderno com 60 itens ou figuras,
TESTE NÃO-VERBAL DE RACIOCÍNIO PARA que representam cada uma um problema, cuja
CRIANÇAS (TNVRI) solução deve ser escolhida entre seis alternati-
vas de resposta. Os problemas estão ordena-
Dados históricos dos por ordem de dificuldade crescente.
É utilizado com sujeitos de 5 a 12 anos, sen-
O TNVRI foi desenvolvido recentemente, no do que, na fase atual, as normas para as faixas
Laboratório de Avaliação e Medida da Univer- de 8 a 12 anos são consideradas as mais con-
sidade de Brasília, sob a coordenação de Luiz fiáveis.
Pasquali [1]. O autor, influenciado pelos pres- O material é composto de um caderno de
supostos teóricos de Spearman sobre o fator questionário, folha de respostas e crivos de
“g”, bem como pelas idéias de Raven, sobre o apuração, sendo que, na administração coleti-
desenvolvimento cognitivo das crianças, que va, faz-se necessária uma reprodução de dois
originaram as escalas de Matrizes Progressivas exemplos em tamanho de cartaz, e é distribuí-
(vide Raven, neste Catálogo), e, ainda, também do pela Casa do Psicólogo, São Paulo.
inspirado nas pesquisas de Pierre Weil (vide INV,
neste Catálogo), delineou um teste destinado
a medir o potencial intelectual de crianças e Administração
adolescentes brasileiros.
A análise fatorial, com rotação oblíqua, pro- Forma: individual (com sujeitos com idade in-
duziu uma solução fatorial de dois fatores, re- ferior a 8 anos ou com limitações intelectuais
presentando o Fator 1 o constructo de raciocí- ou psicomotoras) ou coletiva (em grupos de,
nio analógico concreto, e o Fator 2, o raciocí- no máximo, 8 a 9 sujeitos),

PSICODIAGNÓSTICO – V 271
Tempo: de 45 a 90 minutos, em média. New Jersey, tendo aparecido a primeira ver-
Manejo: na apuração manual (é possível são, em caráter experimental, em 1935, se-
também a apuração por computador), as res- guida por uma segunda, em 1936. A terceira
postas certas para cada fator são computadas foi publicada em livro, denominado The me-
com o uso de crivos, sendo o escore bruto asurement of social competence, incluindo
transformado em valor percentílico, consultan- uma tabela de conversão para transformar a
do-se tabelas normativas em função da idade. soma total dos escores em valores de idade
social. A quarta, publicada em 1965, consti-
tui uma revisão e padronização da anterior,
Indicação apresentando uma melhor e mais prática dis-
tribuição dos itens, com modificações impor-
1. Medida de raciocínio analógico. tantes na faixa dos 10 aos 15 anos e no nível
adulto.
Pela última revisão, que foi divulgada em
Comentários 1984, o instrumento recebeu o nome de Vine-
land Adaptive Behavior Scales, ou, simplesmen-
1. Segundo o autor, o Fator 1 envolve itens te, Vineland, e sofreu modificações importan-
muito fáceis para medir o raciocínio analógico tes no que se refere à sua aplicação em dife-
concreto de crianças normais de cerca de 10 rentes idades e populações, na padronização
anos, mas é considerado útil quando existem e normatização, desenvolvida em amostra de
déficits de percepção espacial ou dificuldades 3.000 sujeitos para cada versão, apresentando
de raciocínio concreto. melhores qualidades psicométricas [1]. É apre-
2. Uma vez que as normas do INV, para a sentada em três versões, a Survey Form, a Ex-
população brasileira, foram desenvolvidas na panded Form e a Classroom Edition, por Spar-
década de 50 [1], é muito conveniente se con- row, Ball e Cicchetti [2].
tar com um teste também não-verbal e com
normas atuais, principalmente, pressupondo
possíveis modificações do desempenho inte- Descrição
lectual do brasileiro, já que, em vários países,
foi observado que tem havido um ganho apre- O instrumento é composto por uma série de
ciável em QI por década [2]. itens, distribuídos conforme “a progressão
comportamental da vida normal”, nas mesmas
oito categorias da escala original, relacionadas
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS com “competência social” [1]: auto-ajuda ge-
ral, auto-ajuda para comer, auto-ajuda para
1. Pasquali, L.(1998). Teste não-verbal de raciocínio
para crianças (TNVRI). Manual técnico e de aplica-
vestir, autodireção, ocupação, comunicação,
ção. São Paulo: Casa do Psicólogo. locomoção e socialização.
2. Flynn, J.R. (1998). WAIS-III and WISC-III IQ gains in As duas primeiras versões destinam-se à
the United States from 1972 to 1995: how to com- avaliação de sujeitos desde o nascimento e
pensate for obsolete norms. Perc. & Motor Skills, até os 18 anos e 11 meses ou de adultos mais
86, 1231-1239.
limitados, por meio de entrevista semi-estru-
turada com um dos pais ou pessoa que tome
conta do sujeito. A terceira versão destina-
VINELAND se à avaliação de crianças de 3 a 11 anos,
através de questionário respondido pelo pro-
Dados históricos fessor.
O material é distribuído pelo American Gui-
A escala Vineland original, de Maturidade So- dance Service, em Circle Pines, MN, Estados
cial, foi desenvolvida por Edgard A. Dool, em Unidos.

272 JUREMA ALCIDES CUNHA


Administração foi aplicado à mãe ou responsável. O coeficien-
te de fidedignidade (método das duas meta-
Forma: individual, seja por entrevista semi- des) dessa escala de Competência Social foi
estruturada (nas duas primeiras versões), seja por estimado em 0,87 [4]. Pela análise de variân-
meio de questionário (na terceira versão). cia, verificou-se que as variáveis renda familiar
Tempo: 20-60 minutos, para a Survey Form, e idade e a interação entre esses dois fatores
60-90 minutos para a Expanded Form e 20 têm efeitos significantes sobre as médias [5].
minutos para a Classroom Edition. Não obstante, tais achados devem ser inter-
Manejo: são atribuídos escores, nas três pretados à luz de resultados parciais sobre o
versões, que fornecem escores padrões, sendo desempenho de crianças nas diferentes cate-
transformados em percentis, estaninos, níveis gorias, que sugerem que a composição do es-
adaptativos e equivalentes de idade, havendo, core total varia em termos dos escores de cer-
também, para as duas primeiras versões, nor- tas categorias, que possivelmente se associam
mas para grupos específicos, com retardamen- “com restrição ou não de liberdade e autono-
to mental, perturbação emocional, incapacida- mia, bem como da maior ou menor estimula-
de visual e de audição. ção em algumas áreas”, nos diferentes níveis
socioeconômicos e níveis de idade [5, 6].

Indicações
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Avaliação do funcionamento adaptativo. 1. Perlman, M.D., & Kaufman, A.S. (1990). Assessment
2. Avaliação de condições para colocação e of child intelligence. In G. Goldstein & M. Hersen,
institucionalização. Eds. Handbook of psychological assessment. 2.ed.
(p.59-78). New York: Pergamon Press.
2. Sparrow, S.S., Balla, D.A., & Cicchetti, D.V. (1984).
Vineland Adaptive Behavior Scales. Circle Pines, MN:
Comentários American Guindance Services.
3. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycholo-
1. É um instrumento especialmente reco- gical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons.
4. Cunha, J.A., Nunes, M.L.T., & Oliveira, M.S. (1990).
mendado para integrar baterias para diagnós- Escala de Competência Social e Escala Columbia de
tico e avaliação do retardamento mental [3]. Maturidade Intelectual: estudo de fidedignidade e
Assim, é introduzido, aqui, como sugestão para correlação entre os instrumentos. Ribeirão Preto,
ser objeto de estudo e adaptação para o Brasil. SP: XX Reunião Anual de Psicologia da Sociedade
2. Conforme Perlman e Kaufman [1], em- de Psicologia de Ribeirão Preto.
5. Cunha, J.A. (1992). Problemas na avaliação de crian-
bora as versões atuais representem considerá- ças pré-escolares. Simpósio: Diferencias sociocultu-
vel avanço sobre o instrumento original, são rales y evaluación psicológica. Madrid: Congreso
criticadas pela existência de poucos itens em Ibero-americano de Psicología.
alguns níveis de idade (como era o caso nas 6. Cunha, J.A., & Nunes, M.L.T. (1990). Escala de Com-
versões anteriores), e, assim, na análise de al- petência Social versus renda familiar, sexo e idade
em crianças pré-escolares. Ribeirão Preto, SP: XX
gumas subcategorias, o examinador deve es- Reunião Anual de Psicologia da Sociedade de Psi-
tar suficientemente familiarizado com o instru- cologia de Ribeirão Preto.
mento e suas características para levar em con-
ta sua fidedignidade em diferentes idades.
OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
3. Uma tentativa de adaptação da escala
de 1965, para pré-escolares, foi feita por nos- Cunha, J.A., & Nunes, M.L.T. (1990). Análise do desem-
so grupo de pesquisa da PUCRS, incluindo ape- penho de crianças pré-escolares nas diferentes ca-
nas itens relacionados com competência social, tegorias da Escala de Competência Social. Ribeirão
Preto, SP: XX Reunião Anual de Psicologia da So-
que não dependem do aprendizado formal (ori- ciedade de Psicologia de Ribeirão Preto.
ginais, modificados ou substituídos). O siste- Dool, E.A. (1965). Vineland Social Maturity Scale. Cir-
ma de escore foi simplificado, e o instrumento cle Pines, MN: American Guindance Service.

PSICODIAGNÓSTICO – V 273
WAIS e WAIS-R Assim, dando continuidade a seu mais an-
tigo antecessor, o W-B, essas escalas servem a
Dados históricos outros propósitos diversos da simples classifi-
cação do QI, permitindo aplicações clínicas di-
A Wechsler Adult Intelligence Scale, WAIS, ou ferenciadas com diversos objetivos psicodiag-
Escala de Inteligência para Adultos, foi publi- nósticos [9].
cada, originalmente, em 1955 [1], como resul-
tado da revisão, extensão e padronização da
Forma I da Wechsler Bellevue Scale, ou W-B Descrição
(1939). Foi considerada extremamente impor-
tante a introdução das Escalas Wechsler, atra- Tanto o WAIS como o WAIS-R compreendem
vés da W-B, atingindo o monopólio da Stan- duas escalas, verbal e de execução, com seis e
ford-Binet, na área da avaliação intelectual [2], cinco subtestes, respectivamente. No WAIS, a
e propondo o uso de critérios estatísticos para escala verbal inclui os subtestes de Informa-
o cálculo do QI, em substituição à idade men- ção, Compreensão, Aritmética, Semelhanças,
tal, em uso até o momento [3]. Como revisão Dígitos e Vocabulário. A escala de execução
da Escala de Inteligência para Adultos, ou do abrange os subtestes de Símbolos, Completa-
WAIS (como é mais popularmente conhecida mento de Figuras, Cubos, Arranjo de Figuras e
entre psicólogos), o WAIS-R [4] foi publicado Armar Objetos. No WAIS-R, os subtestes são
em 1981, padronizado para adultos de 16 a os mesmos. Não obstante, subtestes verbais e
74 anos e 11 meses. Esse instrumento, embo- de execução são alternados, para manter o in-
ra objeto de modificações, ainda reflete o teresse do sujeito [4].
conceito básico de David Wechsler de que os Os subtestes avaliam diferentes aspectos do
testes de inteligência são instrumentos psi- funcionamento mental e, neste sentido, podem
cométricos, constituídos por uma série de ta- ser considerados como uma bateria. Entretan-
refas, para a avaliação do potencial do sujei- to, através da soma dos escores de cada escala,
to para apresentar “comportamento com obtêm-se um QI verbal e um QI de execução, e
propósito e útil”. os resultados globais fornecem um QI total.
Já antes do aparecimento do WAIS-R, o W- Tanto o WAIS como o WAIS-R exigem ma-
B [5] e o WAIS começaram a ser utilizados, não terial técnico específico (somente Cubos e três
só como medida de QI, mas também para a conjuntos de Armar Objetos são comuns a
mensuração de diferentes funções cognitivas ambos), folha para registro de respostas (pro-
e na avaliação da organização da personalida- tocolo) e manual, sendo que o WAIS-R ainda
de [2], principalmente sob a luz de pressupos- inclui uma folha de análise. O material original
tos da psicologia do ego, sendo que esta últi- de ambos é de The Psychological Corporation.
ma perspectiva foi defendida especialmente O WAIS, de edição da Paidós, é distribuído pela
por Rapaport e colegas [6], em obra lançada Casa do Psicólogo, São Paulo.
em 1945. Ainda que tais escalas não tenham Alguns subtestes verbais do WAIS já foram
sido originariamente delineadas para tal fim, traduzidos e relativamente adaptados no Bra-
hoje em dia, o WAIS e, principalmente, o WAIS- sil. A folha de registro de respostas é distribu-
R são amplamente utilizados em avaliações ída pelo Centro Editor de Psicologia Aplicada,
neuropsicológicas [7], tendo sido criado um Rio de Janeiro, ou por suas concessionárias. Do
instrumento complementar, o WAIS-R NI [8], WAIS-R não existe tradução publicada no Bra-
que é um poderoso coadjuvante em tais exa- sil, nem qualquer tentativa de padronização, o
mes. Por outro lado, em completo acordo com que é lamentável, não só porque seu conteú-
o conceito de Wechsler sobre inteligência [4], do foi atualizado, mas porque apresenta con-
as duas escalas continuam a ser usadas em dições psicométricas melhores que o WAIS [1].
psicodiagnóstico de personalidade, com base São utilizados com sujeitos de 16 anos ou
em resultados de pesquisas. mais.

274 JUREMA ALCIDES CUNHA


Administração Aritmética, sugere-se adaptar a formulação dos
problemas às circunstâncias do momento eco-
Forma: individual. nômico atual, de forma a ser mantido o mes-
Tempo: existe tempo limite para a adminis- mo raciocínio implícito.
tração dos itens individuais em alguns subtes- 2. A ausência de normas padronizadas para
tes; o tempo de administração total mínimo é a população brasileira faz com que o psicólo-
de aproximadamente 60 a 90 minutos, poden- go tenha que recorrer a tabelas americanas.
do variar conforme as condições culturais, in- Porém, a comparação com resultados de ou-
telectuais e emocionais dos sujeitos. tros instrumentos sugere que a classificação
Manejo: são atribuídos escores brutos às original é utilizável para finalidades clínicas.
respostas individuais, conforme as instruções Para laudos com objetivo forense, parece es-
detalhadas nos manuais; as somas dos escores sencial a utilização de outras técnicas para con-
brutos é convertida em escore ponderado, atra- firmação de resultados.
vés de tabela; a soma dos escores ponderados 3. O WAIS possui pouca capacidade de dis-
de cada escala e a de ambas as escalas são, criminação nos extremos da curva de inteligên-
por sua vez, convertidas em QI, através de ta- cia, o que significa que a sua aplicabilidade é
bela selecionada conforme o grupo etário do restrita, especialmente em casos de limitação
sujeito; porém, se apenas cinco subtestes ver- intelectual mais severa, porque leva a uma su-
bais ou quatro de execução são administrados, perestimação da capacidade desses sujeitos
no WAIS-R, previamente deve ser utilizada uma [11]. Já o WAIS-R é indicado para a avaliação
tabela específica de proporcionalização da con- do retardamento mental [9].
tagem ponderada. 4. Ainda há certa discrepância em resulta-
dos de pesquisas que comparam resultados de
QI no WAIS e no WAIS-R. Na amostra de pa-
Indicações dronização, Wechsler encontrou coeficientes de
correlação para o QIV, QIE e QIT de 0,91, 0,79
1. Medida da inteligência geral. e 0,88, respectivamente, numa amostra de su-
2. Avaliação do nível intelectual com base jeitos de 35 a 44 anos. Já em sujeitos de 16
em apenas uma das escalas, quando compro- anos, dessa amostra, encontrou diferenças de
metimentos específicos (da fala, sensoriais, 7 a 9 pontos, nos QIs, a favor do WAIS [4]. Le-
motores, etc.) prejudicam ou impedem a utili- zak [7] também cita vários autores que obser-
zação de todos os subtestes. varam esse tipo de diferença. A comparação
3. Identificação de indícios psicopatológi- sistemática entre escores das amostras de nor-
cos. matização dessas escalas Wechsler e de sua
4. Instrumento de avaliação neuropsicoló- sucessora, o WAIS-III, revelou que isso resulta
gica. do fato de que os sujeitos estão se desempe-
nhando cada vez melhor em testes de QI, tor-
nando as normas recentes mais rígidas que as
Comentários anteriores [12]. Comparando dados de quatro
países, Flynn [13] observou que o ganho em
1. Na tradução do WAIS, foi praticamente QI fica ao redor de 6 pontos por década.
mantida a ordem dos itens da escala original, 5. Jacquemin [14], examinando resultados
com exceção daqueles do subteste de Vocabu- de um estudo, realizado em 1985, entre 194
lário. Não obstante, a experiência clínica suge- membros da Sociedade de Avaliação da Perso-
re que a ordem de dificuldade crescente dos nalidade dos Estados Unidos, comenta o fato
itens não é a mesma no Brasil. Apresentamos de que o WAIS foi colocado em primeiro lugar
recomendações de como lidar com o proble- entre os instrumentos de psicodiagnóstico uti-
ma no tema específico sobre as Escalas We- lizados, ressaltando que tal popularidade ocor-
chsler. Quanto ao conteúdo do subteste de reu após o lançamento do WAIS-R. Por outro

PSICODIAGNÓSTICO – V 275
lado, Lezak, em 1995 [7], lamentava o fato de 11. Zimmerman, I.L., Woo-Sam, J.M., & Glasser, A.J.
o WAIS-R ter conservado a sistemática das esca- (1976). Interpretación clínica de la Escala de Inteli-
gencia de Wechsler para adultos (WAIS). Madrid: Tea.
las anteriores, em vez de assumir um formato 12. Flynn, J.R. (1998). WAIS-III and WISC-III IQ gains in
mais científico. O esquema dicotômico das Es- the United States from 1972 to 1995: how to com-
calas Wechsler também é criticado por não le- pensate for obsolete norms. Perc. & Motor Skills,
var em conta modelos teóricos mais atualiza- 86, 1231-1239.
dos sobre inteligência [15]. 13. Flynn, J.R. (1999). Searching for justice: the disco-
very of IQ gains overtime. Amer. Psychol., 54, 1, 5-
6. O WAIS tem sido incluído entre as bate- 20.
rias neuropsicológicas mais comumente utili- 14. Jacquemin, A. (1987). Importância dos testes psi-
zadas [16], sendo empregado para a identifi- cológicos no diagnóstico e problemas gerais do
cação de déficits cognitivos, na determinação diagnóstico (mesa-redonda). Porto Alegre: II Encon-
da natureza e extensão de tais déficits e, espe- tro sobre Testes Psicológicos.
15. McGrew, K.S., & Flanagan, D.P. (1998). The Intelli-
cialmente, no caso de alcoolistas para a avalia- gence Test Desk Reference (ITDR): Gf-Gc cross-bat-
ção da reversibilidade de déficits após a absti- tery assessment. Boston, MA: Allyn & Bacon.
nência [17, 18]. Entretanto, autores assinalam 16. Hesselbrock, M.N., Weidenmann, M.A. & Reed,
que uma série de fatores pode influenciar o H.B.C. (1985). Effects of age, sex, drinking, and anti-
padrão desses déficits que se refletem no de- social personality in neuropsychology of alcoholics.
J. Stud. Alc., 46, 4, 313-320.
sempenho nos testes. 17. Cunha, J.A., Minella, D.M.L., Argimon, I.L., & Perei-
ra, I.T. (1990). Déficits cognitivos e a questão da
melhora funcional em alcoolistas abstinentes. Psi-
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WAIS-R NI. Manual: WAIS-R as an neuropsycholo-
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ment of adult intelligence. In G. Goldstein & M. WAIS-III
Hersen, Ed. Handbook of psychological assessment.
2.ed. (p.79-101). New York: Pergamon Press. Dados históricos
10. Kaufman, A.S., & Reynolds, C.R. (1983). Clinical eva-
luation of intelectual function. In I.B. Weiner, Ed.
Clinical methods in psychology. 2.ed. (p.100-151). Seguindo a trilha da família Wechsler, foi lan-
New York: Wiley & Sons. çado, em 1997, a Wechsler Adult Intelligence

276 JUREMA ALCIDES CUNHA


Scale, o WAIS-III [1], desenvolvido principal- ao grupo etário do sujeito, sendo que uma
mente para atualizar dados normativos, mas, abordagem comum para interpretar os resul-
ao mesmo tempo, incluindo mudanças impor- tados é por meio do exame de discrepância en-
tantes e mantendo a estrutura tradicional de tre os escores, e, no caso de haver discrepân-
seis subtestes verbais e cinco de execução, para cia significante entre o QIV e o QIE, recomen-
cálculo dos QIs. Entretanto, introduziu três da-se o cálculo dos índices, podendo-se dizer
novos subtestes, que permitem o cálculo de que as conclusões possivelmente resultarão de
quatro índices [2]. Na realidade, no total, são informações combinadas sobre os escores dos
sete subtestes que usam medida verbal, e ou- QIs, dos índices e dos subtestes.
tros sete, medida de execução [3]. Outro as-
pecto importante é sua integração com a Es-
cala Wechsler de Memória-III [4] e, ainda, com Indicações
um teste de aproveitamento [2], para as ida-
des de 16 a 19 anos. 1. Medida de inteligência geral.
2. Identificação de forças e fraquezas no
funcionamento cognitivo.
Descrição 3. Avaliação do impacto de problemas psi-
copatológicos sobre o funcionamento cog-
O WAIS-III compreende 14 subtestes, mas, de- nitivo.
pendendo dos objetivos da avaliação, não se
faz necessária a administração de todos eles.
Para cálculo do QI total, são utilizados onze Comentários
subtestes (seis verbais e cinco de execução). Os
quatro índices, cujos escores são calculados 1. Ao contrário das escalas Wechsler ante-
combinando onze subtestes, são os seguintes: riores, criticadas por pouca capacidade de dis-
Compreensão Verbal (Vocabulário, Semelhan- criminação nos extremos da curva de inteligên-
ças e Informação), Organização Perceptual cia, o WAIS-III é o único teste de inteligência
(Completamento de Figuras, Cubos e Raciocí- para adultos com característica de satisfatória
nio Matricial), Memória de Trabalho (Aritméti- fidedignidade quanto às suas normas abaixo
ca, Dígitos e Seqüência de Letras e Números) e do QI 70 [5] e apresenta uma amplitude de QI
Velocidade de Processamento (Símbolos e Pro- de 45 a 155.
curar Símbolos). 2. Apesar de sua posição de honra na tradi-
Pode ser utilizado dos 16 aos 89 anos. ção psicométrica, o WAIS-III mantém o mode-
É distribuído por The Psychological Corpo- lo dicotômico verbal-não-verbal de Wechsler,
ration. apresentando os mesmos três fatores verifica-
No Instituto de Psicologia da Universidade dos em estudos do WAIS-R, excetuando-se os
de Brasília, está sendo desenvolvido um proje- três novos subtestes, para os quais se aplica a
to de adaptação brasileira do WAIS-III. classificação lógica Cf-Cc – inteligência cristali-
zada/inteligência fluida [6].
3. O WAIS-III é especialmente indicado para
Administração a avaliação de pessoas idosas, não só porque
foi padronizado até 89 anos, como porque o
Forma: individual. material foi feito para facilitar a visão [3].
Tempo: variável, conforme o objetivo, mas
a administração de todos os subtestes é consi-
derada muito demorada [3]. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Manejo: escores brutos são convertidos em
1. Wechsler, D. (1997). WAIS-III administration and
escores ponderados, e, em seguida, são calcu- scoring manual. San Antonio, TX: Psychological
lados os QIs, consultando a tabela adequada Corporation.

PSICODIAGNÓSTICO – V 277
2. Groth-Marnat, G. (1999). Wechsler Adult Intelligen- crito, para examinandos com problema de au-
ce Scale-III Supplement. In G. Groth-Marnat. Hand- dição ou de compreensão auditiva e, ainda, a
book of psychological assessment. 3.ed. New York:
Wiley & Sons.
opção de escolha entre respostas múltiplas, que
3. Olin, J.T., & Keatinge, C. (1998). Rapid psychologi- permite uma análise mais refinada de erros
cal assessment. New York: Wiley & Sons. cometidos. Além disso, é apresentado um novo
4. Wechsler, D. (1997). WMS-III-administration and subteste verbal, de Arranjo de Sentenças e vá-
scoring manual. San Antonio, TX: Psychological rias formas de administrar Aritmética.
Corporation.
5. Flynn, J.R. (1998). WAIS-III and WISC-III IQ gains in
Entre os subtestes de execução, são propos-
the United States from 1972 to 1995: how to com- tas modificações importantes na administra-
pensate for obsolete norms. Perc. & Motor Skills, ção de cubos. Aos quebra-cabeças do WAIS-R
86, 1231-1239. é acrescentado o Carro do WISC-III e mais dois
6. McGrew, K.S., & Flanagan, D.P. (1998). The Intelli- adicionais, o Círculo e a Vaca. Além disso, são
gence Test Desk Reference (ITDR): Gf-Gc cross-bat-
tery assessment. Boston, MA: Allyn & Bacon.
incluídos outros subtestes – Expansão Espacial
e Cópia de Símbolos.
Para administrar o NI, é necessário o mate-
WAIS-R NI rial do WAIS-R e um conjunto suplementar, que
compreende o manual, o protocolo, o cader-
Dados históricos no de resposta, o blocos de estímulos, o de
Arranjo de Sentenças, os quebra-cabeças adi-
Como o WAIS-R tem sido um instrumento am- cionais, a prancha de Extensão Espacial e cu-
plamente utilizado em avaliações neuropsico- bos extras, para uso com o subteste de Cubos.
lógicas, embora não tenha sido delineado para
este fim, em 1991, foi lançado por Kaplan, Fein,
Morris e Delis [1] um novo método, que cons- Administração
titui uma abordagem processual para adminis- Forma: hétero-administrada individualmente.
trar e atribuir escore nesse instrumento. Desta Tempo: variável e, além disso, a adminis-
maneira, introduz modificações no manejo do tração pode requerer duas ou mais sessões,
WAIS-R, propõe alternativas diferenciadas de especialmente se há problemas de atenção ou
administração, além de acrescentar outros sub- limitação da persistência do examinando.
testes para permitir um entendimento mais Manejo: a ordem de administração dos sub-
completo do funcionamento neurocognitivo de testes precisa ser adaptada ao caso individual,
um examinando. sendo usada a forma padrão apenas quando
são requeridos escores de QI; há instruções
específicas para a administração, a avaliação
Descrição dos acertos e a análise dos erros, sendo os re-
sultados apresentados num perfil.
O WAIS-R NI mantém a estrutura básica das
escalas Wechsler, com subtestes verbais e de
execução. Não obstante, introduz dois méto- Indicações
dos de opção, caso o examinador necessite
derivar escores de QI ou não, apresentando 1. Avaliação neuropsicológica.
normas referentes ao limite de tempo e des- 2. Triagem para a determinação da necessi-
continuidade. Em todos os subtestes originais, dade de uma avaliação mais completa.
exceto Cubos, é possível atribuir escores para
cálculo do QI, se for indispensável.
Como complementação aos subtestes de Comentários
Informação, Vocabulário e Semelhanças, que
originariamente solicitam uma resposta livre, 1. Conforme Lezak [2], várias sugestões e
há possibilidade de apresentar os itens por es- considerações do WAIS-R NI são aplicáveis à

278 JUREMA ALCIDES CUNHA


análise do desempenho de outras escalas We- Descrição
chsler. Assim, embora apresente alguns recur-
sos que não podem ser utilizados no Brasil, por A WASI compreende quatro subtestes – Voca-
falta de normatização desses instrumentos, de bulário, Cubo, Semelhanças e Raciocínio Ma-
um modo geral, a abordagem qualitativa dos tricial –, com itens semelhantes aos de outras
erros, em especial, parece extremamente útil escalas Wechsler. Fornece QI total, verbal e de
na avaliação de déficits neurológicos. execução. O conjunto constituído por Vocabu-
2. Ainda que os autores considerem serem lário e Raciocínio Matricial permite obter uma
necessárias pesquisas adicionais para reforçar estimativa de capacidade intelectual geral.
a cientificidade de certas hipóteses diagnósti- Existem normas dos 6 aos 89 anos.
cas apresentadas, o fato de nomes de peso, O material é distribuído por The Psycholo-
como Lezak [2] e outros, sugerirem o uso de gical Corporation.
vários procedimentos recomendados no NI
empresta um bom grau de confiabilidade às
estratégias propostas. Administração

Forma: individual.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Tempo: de 15 a 30 minutos.
Manejo: similar a outras escalas Wechsler.
1. Kaplan, E., Fein, D., Morris, R., & Delis, D.C. (1991).
WAIS-R NI Manual: WAIS-R as a neuropsychologi-
cal instrument. San Antonio, TX: Psychological Cor-
poration. Indicação
2. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment.
3.ed. New York: Oxford Universities Press. 1. Medida rápida de inteligência.

WASI Comentário

Dados históricos 1. Note-se que o lançamento do WASI é tão


recente que, até o momento, não foram publi-
The Psychological Corporation, que, há mais cados resultados de pesquisas, obtendo-se
de 50 anos, vem produzindo as escalas Wechs- sobre o mesmo apenas material de divulgação
ler, e seguindo os preceitos de David Wechsler, de The Psychological Corporation.
lançou, recentemente, a Wechsler Abbreviate
Scale of Intelligence, a WASI, Escala Wechsler
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
de Inteligência Abreviada, que é apresentada
como “o instrumento de testagem de inteli- 1. Psychological Corporation (1999). WASI. Wechsler
gência mais fidedigno que já foi desenvolvi- Abbreviate Scale of Intelligence. San Antonio, TX:
do”, destinado a ser utilizado na área clínica, Psychological Corporation.
psicoeducacional e de pesquisa, como medida
rápida, quando as circunstâncias não permi-
tem uma avaliação mais abrangente [1].
Não se trata de uma forma reduzida de ins- WISC & WISC-R
trumentos anteriores, embora seja semelhan-
te em seu formato às demais escalas Wechsler, Dados históricos
sendo os subtestes incluídos pela importância
de sua “associação com capacidades cogniti- Ambas de autoria de David Wechsler, a Wechs-
vas gerais e por sua relação com constructos ler Intelligence Scale for Children (WISC), pu-
de inteligência” [1]. blicada em 1949, bem como a Wechsler Inte-

PSICODIAGNÓSTICO – V 279
lligence Scale for Children – Revised (WISC-R), cada escala, sendo Dígitos e Labirintos subtes-
publicada em 1974, são, como o WAIS, o WAIS- tes suplementares. A inclusão desses subtes-
R, o WAIS-III, o WPPSI, o WPPSI-R e, recente- tes no cálculo do QI tem sido muitas vezes cri-
mente, o WASI, descendentes da Wechsler-Be- ticada, em razão de sua baixa correlação com
llevue Scale, ou W-B (1939). Após a versão ori- os outros subtestes. Não obstante, na prática,
ginal do W-B, foi acrescentada outra alternati- muitas vezes são considerados alternativos (a
va ou forma paralela, em 1946. Posteriormen- serem usados em substituição a outros sub-
te, após extensivo trabalho de revisão, cons- testes) ou subsidiários (quando interessa a sua
trução e padronização, surgiu uma extensão aplicação de um ponto de vista clínico). Dessa
do W-B, em termos de faixas etárias, para bai- maneira, podem ser utilizados quatro, cinco ou
xo, o WISC [1]. Metodologicamente, represen- seis subtestes, em cada escala, mas, no primeiro
tou um avanço sobre o W-B, embora sua natu- e no último caso, é necessária a transforma-
reza não tenha sido modificada essencialmen- ção proporcional da contagem ponderada.
te, pelo que qualquer análise crítica dessa téc- O WISC-R compreende os mesmos subtes-
nica deva a esta se referir, tanto em seu uso tes, ainda que a sua seqüência seja diversa. Na
como instrumento psicométrico quanto como administração, o próprio manual prevê a alter-
um recurso mais amplo, embora auxiliar, no nância de subtestes verbais e de execução para
diagnóstico clínico. Na forma revisada, o WISC- a manutenção do interesse e cooperação do
R [2] segue basicamente o modelo do WISC, sujeito. Na escala verbal, Dígitos é apresenta-
mantendo muitos itens (64%) em sua forma do como subteste suplementar, que deve ser
original e outros (8%) com modificações im- utilizado quando houver disponibilidade, mas
portantes [3]. De um modo geral, a nova for- rotineiramente não é considerado para o côm-
ma procurou atender interesses infantis, in- puto do QI. Só é usado como teste alternativo
cluindo figuras de ambos os sexos e de dife- quando algum dos outros subtestes for invali-
rentes raças. A padronização foi realizada numa dado. Na escala de execução, Labirintos é o
amostra estratificada e representativa de mui- subteste suplementar, mas pode ser utilizado
tas variáveis demográficas dos Estados Unidos. indiferentemente, em lugar de Código. A não
Por outro lado, já foi objeto de muitas pesqui- ser neste caso específico, Dígitos e Labirintos
sas, de forma que, em termos de suas proprie- só serão usados como alternativos quando
dades psicométricas, pode-se afirmar que cons- outro subteste da escala específica for invali-
tituiu um expressivo progresso sobre o WISC. dado. Não é permitida substituição por prefe-
O WISC foi traduzido por Ana Maria Po- rência, conveniência ou mau desempenho do
ppovic [4], sendo introduzidas pequenas mo- sujeito [5].
dificações e adaptações. Quando ao WISC-R, Os subtestes avaliam diferentes aspectos do
é acessível apenas em sua forma original, no funcionamento intelectual, e os resultados glo-
Brasil. bais são convertidos em QI.
Exigem material técnico específico (sendo
que o WISC-R não pode ser administrado com
Descrição o material do WISC), folhas de registro de res-
postas e uso de tabelas, conforme os grupos
O WISC e o WISC-R incluem duas escalas, ver- etários, que constam do manual.
bal e de execução. No WISC, a escala verbal O material original é distribuído por The
compreende os subtestes de Informação, Com- Psychological Corporation, nos Estados Unidos.
preensão, Semelhanças, Dígitos, Aritmética e Há uma edição argentina do WISC da Paidós, e
Vocabulário. A escala de execução abrange os existe uma tradução brasileira do CEPA, Rio de
subtestes de Completamento de Figuras, Ar- Janeiro.
ranjo de Figuras, Cubos, Armar Objetos, Códi- O WISC pode ser usado dos 5 aos 15 anos e
go e Labirintos. Na realidade, para o cálculo 11 meses, e o WISC-R, dos 6 aos 16 anos e 11
do QI, são considerados cinco subtestes em meses.

280 JUREMA ALCIDES CUNHA


Administração 4. Levantamento de indícios associados com
vários transtornos específicos.
Forma: individual.
Tempo: existe tempo limite para a adminis-
tração dos itens individuais de alguns subtes- Comentários
tes; com exceção de Informação, Compreen-
são, Semelhanças e Vocabulário, o tempo de 1. A padronização original do WISC foi cri-
administração total é de aproximadamente 60 ticada principalmente por ter incluído na amos-
minutos, podendo variar conforme as condi- tra somente crianças de cor branca e predomi-
ções culturais, neuropsicológicas, intelectuais nantemente de classe média, o que prejudica-
e emocionais do sujeito. ria a avaliação de grupos culturais desprivile-
Manejo: as respostas individuais recebem giados [7]. O WISC-R levou em conta uma sé-
escores brutos, conforme a natureza do teste, rie de variáveis, inclusive raça, região geográfi-
dependendo do grau de generalização e/ou ca, ocupação do chefe da família e residência (ur-
qualidade e/ou rapidez; a soma dos escores bana-rural) na seleção da amostra para padroni-
brutos de cada subteste é convertida em esco- zação, mas também recebe críticas quanto à sua
re ponderado, através de tabela corresponden- adequabilidade para a testagem de minorias [8].
te à faixa etária do sujeito; a soma dos escores 2. Uma crítica feita ao WISC seria a de que
ponderados dos subtestes utilizados em cada testaria principalmente o potencial para o apro-
escala é proporcionalizada para cinco subtes- veitamento escolar e não o funcionamento
tes, existindo uma tabela para tal fim, já que a social adequado [9].
conversão em QI é obtida com base na soma 3. Enquanto o WISC-R tem apreciável po-
correspondente a escores ponderados de cin- der discriminatório em níveis intelectuais ele-
co subtestes; têm-se, então, o QI verbal e o de vados, o WISC possui pouco poder discrimina-
execução, através de tabela específica; a soma tivo em ambos os extremos da curva de inteli-
dos escores ponderados da escala verbal mais gência e de idade, sendo pouco fidedigno para
a soma dos escores ponderados da escala de crianças com QI inferior a 50, e sendo mais
execução fornecem um escore global, que é adequado para crianças entre 8 e 13 anos, sen-
convertido em QI total. do possível uma criança de 5 anos ter escore
zero em todos os subtestes e ser seu escore
global convertido num QI de 52.
4. Silverstein [10] pôs em dúvida a suges-
Indicações tão de, no WISC-R, utilizar Dígitos e Labirintos
como testes suplementares, pressupondo ser
1. Medida de inteligência geral. mais adequado o seu uso como testes alterna-
2. Avaliação do nível intelectual, através da tivos, fazendo a transformação proporcional
escala de execução, em crianças que apresen- da soma ponderada. Não obstante, através de
tam atraso da fala ou outras dificuldades que pesquisa, verificou que, se com a proporciona-
interfiram nos resultados dos subtestes verbais. lização havia ganho em validade, com a subs-
A escala de execução do WISC-R também foi tituição havia ganho em fidedignidade, sendo
padronizada, por Anderson e Sisco [6], para pequenas as diferenças observadas. Portanto,
uso com crianças surdas. cabe ao psicólogo a decisão de utilizar tais sub-
3. Avaliação do nível intelectual, através da testes como suplementares ou alternativos.
escala verbal, em crianças com problemas de 5. Glasser e Zimmerman [7] criticam o enun-
visão, inclusive cegueira total, ou com proble- ciado um tanto complicado de alguns itens do
mas de psicomotricidade fina ou, mesmo, em WISC, como “caridade organizada” (traduzido
casos com maior comprometimento motor, para o português como “instituição de carida-
como hemiplegia do lado dominante, paraple- de”) e a inclusão de itens mobilizadores de
gia superior ou quadriplegia. emoção, no subteste de Compreensão. Estes

PSICODIAGNÓSTICO – V 281
últimos, entretanto, resultam úteis do ponto WISC-III
de vista qualitativo, podendo fornecer dados
de interesse clínico. Dados históricos
6. Comparando o material brasileiro e o
argentino no subteste de Armar Objetos do Mantendo o mesmo conceito de inteligência,
WISC com o original da American Psychologi- subentendido pelas demais escalas Wechsler,
cal Corporation, percebem-se diferenças no foi lançada, em 1991, uma revisão do WISC-R,
material empregado, que podem constituir denominada Wechsler Intelligence Scale for
uma variável que talvez venha a afetar o de- Children – Third Edition [1].
sempenho. Seriam necessárias pesquisas no As normas se basearam numa amostra de
sentido de determinar se o tempo limite com 2.200 crianças de 6 a 16 anos, com número
esses materiais deve ser o mesmo que com o idêntico de sujeitos de cada sexo, mas sendo,
material original. sob outras variáveis, uma amostra bastante
7. Como há muitas críticas em relação a representativa das características demográficas
esses instrumentos, não obstante, ainda em dos Estados Unidos, inclusive de um ponto de
uso no Brasil, recomenda-se o WISC-III, em fase vista étnico.
final de adaptação (vide a seguir). A revisão incluiu uma atualização de itens,
considerados em termos de gênero e etnia,
novo delineamento do material de teste, com
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
uso da cor e a inclusão de novos itens em sub-
1. Wechsler, D. (1949). WISC – Wechsler Intelligence testes para aumentar o poder discriminativo
Scale for Children. Manual. New York: Psychologi- nos grupos etários extremos. Por outro lado,
cal Corporation. além de estudos de correlação com o WISC-R e
2. Wechsler, D. (1974). WISC – Wechsler Intelligence o WPPSI-R, o manual inclui dados sobre dife-
Scale for Children – Revised. San Antonio, TX:
Psychological Corporation.
rentes grupos clínicos.
3. Vance, H.R., Brown, W., Hankins, N., & Ferguson,
S.C. (1987). A comparison of the WISC-R and the
WAIS-R with special education students. J. Clin.
Psychol., 43, 3, 377-380.
Descrição
4. Poppovic, A.M. (s/d). Introdução do tradutor. In D.
Wechsler. WISC – Escala de Inteligência para crian- O WISC-III mantém a estrutura básica do WISC-
ças (p.7-19). Rio de Janeiro: CEPA.
5. Boyd, T.A., & Hooper, S.R. (1987). Psychometric va-
R, compreendendo duas escalas, verbal e de
lidity of proration and Digit Span substitution for execução, que permitem a obtenção de três
estimating WISC-R verbal and full scale IQs. Perc. & medidas, o QIV, o QIE e o QIT. A escala verbal é
Motor Skills, 65, 19-25. composta pelos mesmos cinco subtestes bási-
6. Psychological Corporation (1985). Tests, products cos do WISC-R, com um subteste suplementar
and services for psychological assessment. Cleve-
land, OH: Harcourt, Brace Jovanovich.
(Dígitos). A escala de execução também é cons-
7. Glasser, A.J., & Zimmerman, I.L. (1972). Clinical in- tituída pelos cinco subtestes básicos do WISC-
terpretation of the Wechsler Intelligence Scale for R, com dois subtestes suplementares: Labirin-
Children. New York: Grune & Stratton. tos, que já constava da versão anterior, e Pro-
8. Kaufman, A.S., & Reynolds, C.R. (1983). Clinical eva- curar Símbolos.
luation of intelectual function. In I.B. Weiner, Ed.
Clinical methods in psychology. 2.ed. (p.100-151).
Exige material técnico específico, diverso do
New York: Wiley & Sons. WISC-R, folhas de registro e manual, que são
9. Cytrin, L., & Lourie, R.S. (1975). Mental retardati- distribuídos por The Psychological Corporation,
on. In A.M. Freedman, H.I. Kaplan & B.J. Sadock, nos Estados Unidos. Não obstante, o instru-
Ed. Comprehensive textbook of psychiatry. V.2 mento está sendo padronizado no Brasil, com
(p.1158-1197). Baltimore, MD: The Williams & Wilkins.
10. Silverstein, A.B. (1989). On the use of the WISC-R
coordenação de Vera Figueiredo. Os dados já
supplementary subtests as alternates. Psychol. Re- obtidos a respeito apresentam propriedades
ports, 64, 580-582. psicométricas satisfatórias [2].

282 JUREMA ALCIDES CUNHA


Administração área do psicodiagnóstico. Além disso, oferece
subsídios para o acompanhamento de crianças,
Forma: individual. ao longo de seu desenvolvimento, facilitando a
Tempo: 50 a 70 minutos, para os subtestes comparação de diferentes escalas Wechsler.
básicos, e 10 a 15 minutos, para os três sub- 3. É importante salientar que o WISC-III está
testes suplementares. vinculado a outro instrumento, o Wechsler In-
Manejo: os escores brutos são transforma- dividual Achievement Test (WIAT), lançado em
dos em ponderados, e a soma dos escores pon- 1992, compondo uma bateria com a finalida-
derados verbais, de execução e totais é con- de de analisar a existência de discrepâncias
vertida em QIs. entre o nível de capacidade e o nível de apro-
veitamento escolar, o que pode enriquecer a
avaliação de problemas clínicos que interferem
Indicações na aprendizagem.
4. Além do trabalho de adaptação do WISC-
1. Avaliação clínica e neuropsicológica. III, que está sendo desenvolvido em Pelotas,
2. Diagnóstico de excepcionalidade na ida- RS [2, 3], há notícia de estudos realizados e em
de escolar. andamento sobre os subtestes verbais, em
3. Avaliação, colocação e planejamento psi- Campinas, SP, sendo interessantes os resulta-
coeducacionais. dos já obtidos com a análise do item [7].

Comentários REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Wechsler, D. (1991). Wechsler Intelligence Scale for


1. Estudos com o WISC e o WISC-R permiti- Children – Third Edition (WISC-III). San Antonio, TX:
ram identificar, além dos fatores de Compre- Psychological Corporation.
ensão Verbal e de Organização Perceptual, um 2. Figueiredo, V.L.M., Pinheiro, S., & Nascimento, E.
terceiro fator, de Resistência à Distratibilidade. (1998). Teste de inteligência WISC-III: adaptação
A inclusão do novo subteste suplementar, nes- para a população brasileira. Psic. Esc. e Educ., 2, 2,
101-107.
ta edição, permitiu esclarecer mais a explica- 3. Figueiredo, V.L.M. (1999). WISC-III: mais uma esca-
ção desse terceiro fator, em termos de variân- la Wechsler para avaliar a inteligência das crianças.
cia no espaço dos fatores, bem como levou à Expressão Psi, 3, 1, 29-36.
identificação de um quarto fator, Velocidade 4. Flynn, J.R. (1998). WAIS-III and WISC-III IQ gains in
no Processamento, de maneira a haver mais the United States from 1972 to 1995: how to com-
pensate for obsolete norms. Perc. & Motor Skills,
informações quanto a aspectos cognitivos. Es- 86, 1231-1239.
ses fatores, ou índices fatoriais [3], são impor- 5. Flynn, J.R. (1999). Searching for justice: the disco-
tantes recursos para melhor entendimento clí- very of IQ gains overtime. Amer. Psychol., 54, 1, 5-
nico de transtornos associados à aprendiza- 20.
gem. Uma vez que foi observado que os sujei- 6. Groth-Marnat, G. (1999). Handbook of psycholo-
gical assessment. 3.ed. New York: Wiley & Sons.
tos estão se desempenhando cada vez melhor 7. Schelini, P.W. & Wechsler, S.M. (1999). WISC-III: pro-
nos testes de QI [4], com um ganho médio de posta de adaptação brasileira de subtestes verbais.
6 pontos por década, as normas tendem a se Porto Alegre: VIII Congresso Nacional de Avaliação
tornar obsoletas [5], e, então, recomenda-se o Psicológica. Programa, pôster nº 5.
uso de índices, de categorias ou perfis [6] que
se baseiam em escores de subtestes que foram OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
normatizados na mesma época [5].
2. O WISC-III também representa um avan- Figueiredo, V.L.M. (1996). A influência do tipo de esco-
ço sobre o WISC-R, no sentido da ampliação la nos resultados dos subtestes verbais do Teste
da análise de sua validade em diferentes gru- WISC-III. Psico, 27, 2, 111-115.
Kaufman, A.S. (1994). Intelligent testing with the WISC-
pos clínicos, o que é de grande importância na III. New York: Wiley.

PSICODIAGNÓSTICO – V 283
WISCONSIN corretamente classificadas ou até ter usado
todas as cartas dos dois baralhos.
Dados históricos O material inclui o manual do WCST, dois
baralhos idênticos com quatro cartas-estímu-
O Wisconsin Card Sorting Test, WCST, ou Teste lo, bem como outras 64 cartas cada um e o
Wisconsin de Classificação de Cartas, foi cria- protocolo de respostas. As cartas dos baralhos
do em 1948, sendo ampliado e revisado pos- apresentam figuras de várias cores (vermelho,
teriormente [1]. Delineado para uso na popu- azul, amarelo ou verde), formas (cruzes, círcu-
lação geral, passou a ser empregado, cada vez los, triângulos ou estrelas) e número de figu-
mais, como um instrumento clínico na avalia- ras (uma, duas, três ou quatro). É distribuído
ção neuropsicológica de funções cognitivas, par- por Psychological Assessment Resources, de
ticularmente as que envolvem os lobos frontais. Odessa, Flórida, nos Estados Unidos.
É vasto o número de investigações em su-
jeitos adultos com alterações nas funções exe-
cutivas, sejam ocasionadas por declínio no de- Administração
sempenho cognitivo, sejam pela esclerose múl-
tipla, doença de Parkinson, doença de Alzhei- Forma: hétero-administrada individualmente.
mer ou envolvendo lesões cerebrais focais, etc. Tempo: 20 a 30 minutos, em média.
[2-9]. Multiplicam-se também as pesquisas com Manejo: a atribuição do escore, no WCST,
o instrumento para avaliar disfunções cogniti- não é fácil, e cada resposta deve ser considera-
vas em transtornos psicopatológicos [10-12]. da em três dimensões – (a) Correta-Incorreta,
Em crianças e adolescentes normais, obser- (b) Ambígua-Não-ambígua e (c) Perseverativa-
va-se um interesse no desenvolvimento de ta- Não-perseverativa –, que são avaliadas confor-
belas normativas [1, 13, 14], como referencial me uma série de regras, e, além disso, ainda
para discriminar casos com problemas, que têm são levados em conta: o nível conceitual das
repercussões importantes, principalmente no respostas, o fracasso em manter o contexto e
aproveitamento escolar e no comportamento, a eficiência em aprender. As normas america-
como ocorre em sujeitos com déficit de aten- nas apresentam a correspondência entre o es-
ção/hiperatividade, transtornos de aprendiza- core bruto e o escore padrão, escore T e per-
gem, além daqueles com lesões cerebrais trau- centil, para indivíduos entre 6 anos e meio e
máticas, transtornos convulsivos, etc. [1, 15, 16]. 90 anos e para adultos com menos de 8 anos
de escolaridade até mais de 18 anos de escola-
ridade. Está em andamento a coleta de dados,
Descrição sob nossa coordenação, para o desenvolvimen-
to de normas brasileiras.
É um teste em que o sujeito deve classificar
cartas de um baralho, uma por uma, procu-
rando casá-la com uma de quatro cartas-estí- Indicações
mulo com que mais combine, conforme um
princípio preestabelecido (a categoria pode ser 1. Medida do pensamento abstrato.
cor, forma ou número), conhecido pelo exami- 2. Medida da flexibilidade na resolução de
nador, mas não pelo examinando, que se ba- problemas.
seia apenas no feedback que é dado à sua res- 3. Avaliação de déficits neuropsicológicos.
posta, como certa ou errada. No momento em
que o examinando consegue dar dez respos-
tas corretas consecutivas, o princípio de classi- Comentários
ficação é mudado pelo examinador, sem pré-
vio aviso ao examinando. O procedimento é 1. Embora amplamente usado na investi-
repetido até que o sujeito complete seis séries gação das funções executivas, algumas pesqui-

284 JUREMA ALCIDES CUNHA


sas sugerem que o desempenho prejudicado Wisconsin Card Sorting Test. J. Clin. Psychol., 47, 5,
não é específico de lesão frontal, como tam- 684-690.
13. Paniak, C., Miller, H.B., Murphy, D., Patterson, L., et
bém ainda não são conclusivas as evidências alii (1996). Canadian developmental norms for 9 to
de correspondência entre mau desempenho e 14 years-old on the Wisconsin Card Sorting Test.
o local de lesão na região frontal [1, 17]. Can. J. Rehabil., 9, 4, 233-237.
2. O treinamento de examinadores é uma 14. Rosselli, M., & Ardilla, A. (1993). Developmental
etapa essencial e crucial para assegurar a qua- norms for the Wisconsin Card Sorting Test in 5- to
12-year-old children. Clin. Neuropsychol., 10, 4,
lidade da testagem, uma vez que tem sido 493-512.
questionada a precisão de examinadores, prin- 15. Reader, M.J., Harris, E.L., Schuerholtz, L.D., & Den-
cipalmente novatos, na anotação das respos- ckla, M.B. (1994). Attention deficit hiperactivity di-
tas ao WCST [18]. sorders and executive dysfunction. Develop. Neu-
ropsychol., 12, 3, 343-363.
16. Snow, J.H. (1992). Mental flexibility and planning
skills in children and adolescents with learning di-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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17. Levin, H.S., Soukoup, V.M., Benton, A.L., Fletcher,
1. Heaton, R.K., Chelune, G.J., Taley, J.L., Gay, G.G., & J.M., & Satz, P. (1999). Avaliação neuropsicológica
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e intelectual de adultos. In H.I. Kaplan & B.J. Sado-
nual (revised and expanded). Odessa, FL: Psycholo-
ck. Tratado de psiquiatria. 6.ed. (p.613-633). Porto
gical Assessment Resources. Alegre: Artmed.
2. Beatty, W.W., Hames, K.A., Blanco, C.R., Paul, R.H.,
18. Paolo, A.M., Axelrod, B.N., Ryan, J.J., & Goldman,
et alii (1995). Verbal abstration deficit in multiple
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4. Collins, B., & Tellier, A. (1994). Differences in con-
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13, 3, 368-377.
5. Hänniken, T., Hallikainen, M., Koivisto, K., Partanen,
K., et alii (1997). Decline of frontal lobe functions
Dados históricos
in subjects with age-associate memory impairment.
Neurology, 48, 1, 148-153. A WMS, Escala de Memória Wechsler [1], foi
6. Horner, M.D., Flashman, L.A., Freides, D., Epstein, divulgada em 1945, por seu autor, David We-
C.M., et alii (1996). Temporal lobe epilepsy and per- chsler, que a descrevia como um instrumento
formance on the Wisconsin Card Sorting Test. J. Clin.
Neuropsychol., 18, 2, 310-313.
“rápido, simples e prático”, após dez anos de
7. Huber, S.J., Bornstein, R.A., Rammohan, K.W., Chris- investigação. A amostra de normatização foi
ty, J.A., et alii (1992). Magnetic resonance imaging criticada por seu número e pela pequena am-
correlates of executive function impairment in mul- plitude etária, deixando de incluir idades em
tiple sclerosis. Neuropsych., Neuropsychol., & Beha- que o declínio cognitivo normal ou patológico
vior Neurol., 5, 1, 33-36.
8. Paolo, A.M., Troster, A.I., Axelrod, B.N., & Koller, W.C.
é mais provável. Ademais, o constructo de
(1995). Construct validity of the WCST in normal memória pressuposto correspondia a uma fun-
elderly and persons with Parkinson’s disease. Arch. ção unitária e superinclusiva [2]. Outras críti-
Clin. Neuropsychol., 10, 5, 463-472. cas são citadas pelo próprio Wechsler [3], rela-
9. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment. tivas à sua limitação em termos da abrangên-
3.ed. New York: Oxford Universities Press.
10. Capleton, R.A. (1996). Cognitive function in schi-
cia das funções da memória, à inclusão de ape-
zophrenia: association with negative and positive nas um subteste de memória visual, ao fato de
symptoms. Psychol. Reports, 78, 1, 123-128. o Quociente de Memória refletir quase exclusi-
11. Chanon, S. (1996). Executive dysfunction in depres- vamente memória verbal e não permitir “a dife-
sion: the Wisconsin Card Sorting Test. J. Affect. Di- renciação de funções separadas da memória”.
sorders, 39, 2,107-114.
12. Martin, D.J., Oren, Z., & Boone, K. (1991). Major
Não obstante, ainda na década de 70, o
depressives’ and dysthimic’s performance on the próprio Wechsler deu início a um programa de

PSICODIAGNÓSTICO – V 285
pesquisas para o desenvolvimento da WMS-R, A forma abreviada da WMS-R compreende
Escala de Memória Wechsler – Revisada, con- os seguintes subtestes: Informação e Questões
seguindo levar a efeito as modificações essen- de Orientação, Controle Mental, Memória de
ciais antes de seu falecimento, em 1981. Pos- Figuras, Memória Lógica, Pares Visuais Asso-
teriormente, foram finalizados os estudos, com ciados, Pares Verbais Associados, Reprodução
a contribuição de Edith F. Kaplan, Prigatano, Visual, Dígitos e Amplitude da Memória Visual,
Schwartz e outros, sendo lançada a revisão em sendo que os índices resultantes se baseiam
1987, com normas de 16 a 74 anos. apenas nos oito últimos. O reteste inclui os
A WMS-R constitui indiscutivelmente uma subtestes de Memória Lógica II, Pares Visuais
importante melhoria, no sentido de não man- Associados II, Pares Verbais Associados II e Re-
ter um escore unitário, o QM, nem a dicoto- produção Visual II. A WMS-R proporciona os
mia de memória verbal/não-verbal, incluindo índices de Memória Geral (composto de dois
medidas de memória tardia e usando uma índices, de Memória Verbal e Memória Visual),
amostra mais adequada para sua normatização Atenção e Concentração e de Evocação Retar-
[4], incluindo normas dos 16 aos 74 anos [3]. dada.
Em 1997, porém, foi lançada a última revi- A WMS-III é constituída por 12 subtestes
são da escala, a WMS-III [5], que apresenta primários (sendo 4 medidas tardias) e 6 sub-
adequadas propriedades psicométricas e per- testes suplementares (2 são medidas tardias).
mite uma avaliação clínica mais detalhada e Inclui subtestes de Orientação (Informação e
satisfatória, além de se basear em pressupos- Orientação), do Domínio da Memória Auditi-
tos teóricos mais atualizados e poder ser utili- va/Verbal (Memória Lógica I e II, Pares Verbais
zada dos 16 aos 89 anos [6]. Associados I e II e Lista de Palavras I e II), do
Nunca houve uma tradução formal em por- Domínio da Memória Visual-Não-Verbal (Figu-
tuguês da WMS. Quanto à WMS-R, foi feita ras de Famílias I e II, Rostos I e II e Reprodução
uma adaptação para o português, com vistas Visual) e do Domínio da Memória de Trabalho
à realização de estudos de validade e fidedig- (Seqüência de Letras e Números, Extensão Es-
nidade [7], com normas de 18 a 70 anos. pacial, Dígitos e Controle Mental). Os últimos
subtestes são comuns ao WAIS-III.
A WMS só exige material específico para o
Descrição subteste de Reprodução Visual e o manual. A
WMS-R e a WMS-III, além do manual, reque-
A WMS original incluía duas formas, sendo que rem material especializado, que é fornecido por
a normatização e as pesquisas mais importan- The Psychological Corporation.
tes foram feitas apenas com a escala I. Esta
compreende sete subtestes: Informações Pes-
soais e Atuais, Orientação, Controle Mental, Administração
Memória Lógica, Dígitos, Reprodução Visual e
Aprendizagem Associada. Permite determinar Forma: individual.
o QM, ou Quociente de Memória. Tempo: 15 minutos, para a WMS; 30 minu-
A WMS-R manteve certo número de itens tos, aproximadamente, para a forma abrevia-
de vários subtestes da WMS, com algumas da da WMS-R, mas, se utilizado o reteste, este
modificações e maior refinamento nas instru- deve ser iniciado, pelo menos, 30 minutos após
ções e no sistema de escore, além de acrescen- a administração de Memória Lógica I, mas na
tar outros. Tal conjunto de oito subtestes (for- mesma sessão de testagem; a WMS-III é consi-
ma abreviada) visa à mensuração da evocação derada por demais demorada, se for aplicada
imediata. Também, representando outro avan- na sua íntegra.
ço sobre a WMS, inclui o reteste de alguns Manejo: para a WMS, são atribuídos esco-
subtestes, com procedimentos específicos para res brutos às respostas corrigidas de cada sub-
mensuração da evocação retardada. teste e somados os escores parciais dos sub-

286 JUREMA ALCIDES CUNHA


testes, obtendo-se um total, que é corrigido, pe verificou que também o fator nível socioeco-
conforme o grupo etário do sujeito, encontran- nômico suscita diferenças entre as médias [11].
do-se, pelo uso de uma tabela, sua equivalên- 2. Apesar das críticas sobre a WMS-R, pes-
cia com um quociente, o QM (Quociente de quisas demonstram sua capacidade discrimi-
Memória); para a WMS-R, são atribuídos esco- nativa nos primeiros estádios da doença de
res brutos para cada subteste (com exceção de Huntington e de Alzheimer, que diminui em
Informação e Orientação), que são multiplica- quadros mais severos [4]. Já a WMS-III é espe-
dos cada um por um peso específico e combi- cialmente indicada para o screening de pro-
nados para formar compostos, cuja equivalên- blemas demenciais, para obter uma “avaliação
cia com diferentes índices é determinada, con- abrangente da memória” [6].
forme o grupo etário, pelo uso de tabelas, no
manual; para a WMS-III, são derivados oito ín-
dices, combinando escores dos subtestes (Ín- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
dice Auditivo Imediato, Índice Visual Imediato,
1. Wechsler, D. (1945). A standardized scale for clini-
Índice de Memória Imediato, Índice Auditivo cal use. J. Psychol., 19, 87-95.
Tardio, Índice Visual Tardio, Reconhecimento 2. Lezak, M.D. (1983). Neuropsychological assessment.
Auditivo Tardio, Memória Geral e Memória de New York: Oxford Universities Press.
Trabalho); a seguir, é feita uma análise de dis- 3. Wechsler, D. (1987). WMS-R. Wechsler Memory Sca-
crepâncias, com o auxílio de tabelas e ques- le – Revised. Manual. San Antonio, TX: Psychologi-
cal Corporation.
tões normativas, sendo utilizadas também es- 4. Lezak, M.D. (1995). Neuropsychological assessment.
calas suplementares, às quais são atribuídos 3.ed. New York: Oxford Universities Press.
valores percentílicos; existem, ainda, diferen- 5. Wechsler, D. (1997). WMS-III – administration and
tes métodos para comparar escores da WMS- scoring manual. San Antonio, TX: Psychological
III e do WAIS-III. Corporation.
6. Olin, J.T., & Keatinge, C. (1998). Rapid psychologi-
cal assessment. New York: Wiley & Sons.
7. Plass, A.M. (1991). Adaptação da Escala de Memó-
Indicações ria Wechsler – Revisada: fidedignidade e validade.
Porto Alegre: Instituto de Filosofia e Ciências Hu-
1. Avaliação clínica das funções mnêmicas. manas da UFRGS (Dissertação de mestrado).
8. Gilleard, E., & Gilleard, C. (1989). A comparison of
2. Avaliação neuropsicológica para diagnós- Turkish and Anglo-American normative data on the
tico de déficits de memória e acompanhamento Wechsler Memory Scale. J. Clin. Psychol., 45, 1, 114-117.
do estado das funções mnêmicas do paciente du- 9. Löberg, R. (1980). Alcohol misuse and neuropsycho-
rante o tratamento, treinamento e reabilitação. logical deficits in man. J. Stud. Alc., 41, 119-128.
10. Parsons, O.A. (1980). Cognitive disfunction in alco-
holics and social drinkers. J. Stud. Alc., 41, 115-118.
11. Cunha, J.A., Minella, D.M.L., Argimon, I.L., & Perei-
Comentários ra, I.T. (1992). Memória visual e nível sócio-econômi-
co. Madrid: Congresso Iberoamericano de Psicologia.
1. Apesar das objeções contra a WMS, tem
havido tentativas para a sua padronização em OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
vários países. Gilleard e Gilleard [8] observam
Goldstein, G. (1990). Comprehensive neuropsycholo-
que, para tal normatização em países em de-
gical assessment batteries. In G. Goldstein & M.
senvolvimento, devem ser controlados não só Hersen, Ed. Handbook of psychological assessment.
a idade, mas também o nível de instrução. Tam- 2.ed. (p.197-227). New York: Pergamon Press.
bém Löberg [9] e Parsons [10], em estudos com MacKinnon, R.A., & Yudofsky, S.C. (1988). A avaliação
alcoolistas, notaram efeitos do período de al- psiquiátrica na prática clínica. Porto Alegre: Artes
Médicas.
coolismo e do tempo de abstinência sobre os
Shum, D.H.K., Murray, R.A., & Kathy, E. (1997). Effect
escores. Por outro lado, numa pesquisa, utili- of speed of presentation on administration of the
zando o subteste de Reprodução Visual, numa Logical Memory Subtest of the Wechsler Memory Sca-
amostra de alcoolistas abstinentes, nossa equi- le-Revised. Clin. Neuropsychologist, 11, 2, 188-191.

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Butters & P.E. Nathan, Ed. Neuropsychology of al-
coholism (p.76-102). New York: Guilford.

Descrição
WPPSI & WPPSI-R
O WPPSI, como o WISC e o WISC-R, compreen-
de um conjunto ou uma bateria de subtestes,
Dados históricos
cada um envolvendo aspectos intelectuais di-
O WPPSI, ou Wechsler Preschool and Primary versos, mas que são “combinados num escore
Scale of Intelligence, não se fundamentou em composto, como uma medida da capacidade
quaisquer pressupostos teóricos sobre o desen- total ou global” [2]. É constituído por duas
volvimento cognitivo infantil [1]. Antes, pode escalas, verbal e de execução, com seis e cinco
ser considerado um descendente direto das es- subtestes, respectivamente. A escala verbal
calas WISC e WAIS, também da autoria de Da- abrange Informação, Vocabulário, Aritmética,
vid Wechsler. Entretanto, não representa uma Semelhanças, Compreensão e Sentenças, sen-
extensão para baixo do WISC, embora origina- do este último um subteste suplementar. A
riamente projetado para tal fim, idéia que foi escala de execução inclui Casa de Animais,
abandonada por razões teóricas e metodoló- Completamento de Figuras, Labirintos, Dese-
gicas [2]. Ainda que semelhante ao WISC em nhos Geométricos e Cubos.
forma e conteúdo, apresenta características O WPPSI-R mantém os 11 subtestes do
próprias, constituindo uma escala distinta e WPPSI, incluindo outro subteste, Arranjo de
separada. Oito de seus subtestes são deriva- Objetos, na escala de execução. Casa de Ani-
dos do WISC, e três são inteiramente novos: mais, agora com a denominação de Animal
Sentenças, Casa de Animais e Desenhos Geo- Pegs, passa a ser um subteste opcional, assim
métricos. como Sentenças. Por outro lado, Desenhos
Casa de Animais foi incluído com a inten- Geométricos é apresentado atualmente com
ção de substituir Código, mas não pode ser duas versões, sendo selecionada uma delas
considerado estritamente como seu equiva- conforme a idade do sujeito.
lente. Ambas as escalas permitem obter um QI
A exclusão de Código e Dígitos constitui a verbal, um QI de execução e um QI total.
explicação provável para que o Fator III do Exigem material técnico específico, além de
WISC-R [3] não emerja na estrutura fatorial do folhas impressas para a execução de Labirin-
WPPSI, em que são identificados apenas Com- tos e Desenhos Geométricos, folhas para re-
preensão Verbal e Organização Perceptual, con- gistro das respostas e manual. O material ori-
forme análise de Sattler (1988), citado por Perl- ginal, diverso para cada uma das escalas, é pro-
man e Kaufman [1]. duzido por The Psychological Corporation.
O WPPSI foi lançado em 1967. Contudo, O WPPSI é indicado para uso com crian-
face a limitações observadas, foi objeto de re- ças de 4 a 6 anos e meio, e o WPPSI-R, com
visão e de nova padronização, surgindo o WPP- sujeitos de 2 anos e 11 meses a 7 anos e 3
SI-R em 1989, após estudos que abrangeram meses.
1.700 crianças, amostra estratificada em ter-
mos de variáveis demográficas [4].
Nesta versão, muitos itens foram testados Administração
e revisados, sendo alguns eliminados. Os sub-
testes que incluíam ilustrações foram redese- Forma: individual.
nhados, sendo incrementado o uso da cor. Tempo: 50 a 70 minutos para o WPPSI e
Houve uma extensão dos grupos etários com- para o WPPSI-R, e 10 a 15 minutos para opcio-
preendidos. Não obstante, do ponto de vista nais do último.

288 JUREMA ALCIDES CUNHA


Manejo: são atribuídos escores brutos às do WPPSI [1] e, pelas informações sobre o
respostas individuais, conforme as instruções WPPSI-R, parece ainda constituir um problema,
detalhadas no manual, sendo que, em alguns pelo menos com crianças de menos idade.
subtestes, levam-se em conta a qualidade do 3. Apesar de não ser considerado meramen-
conteúdo, o grau de generalização, o número te uma extensão para baixo do WISC, mas uma
de erros permitido, dentro do tempo limite, e, nova escala, o WPPSI compreende alguns sub-
a partir daí, a soma dos escores brutos de cada testes que constam do WISC ou constituem
subteste é convertida em escore ponderado, extensões de alguns do mesmo, o que permite
conforme a idade, sendo a soma dos escores estudos longitudinais e comparativos, na me-
ponderados de cada escala (com base em cin- dida em que ambas as escalas podem medir
co subtestes) utilizada para a determinação do capacidades em diferentes níveis de desenvol-
QIV e do QIE, e a total para o QIT. vimento. Tal possibilidade é grandemente re-
forçada no WPPSI-R, uma vez que apresenta
uma superposição de um ano com o WISC-III,
Indicações de maneira que o examinador possa selecio-
nar o instrumento que lhe parece mais ade-
1. Avaliação intelectual. quado neste período de transição.
2. Avaliação do nível intelectual, com base 4. Pesquisa com o WPPSI-R em crianças de 4
em apenas uma das escalas, quando compro- anos e meio a 6 anos, de classe média e média
metimentos específicos prejudicam ou impe- alta, antes de ingressarem no jardim-de-infân-
dem a administração de todos os subtestes. cia, demonstrou que medidas de subtestes ver-
3. Instrumento auxiliar na avaliação neurop- bais podem ser usadas para predizer o sucesso
sicológica. escolar nos três primeiros anos escolares [7].
4. Levantamento de indícios associados a
transtornos no desenvolvimento e/ou psicopa-
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
tológicos.
1. Perlman, M.D., & Kaufman, A.S. (1990). Assessment
of child intelligence. In G. Goldstein & M. Hersen,
Comentários Ed. Handbook of psychological assessment. 2.ed.
(p.59-78). New York: Pergamon Press.
2. Wechsler, D. (1967). WPPSI – Wechsler Preschool
1. Não existe tradução de qualquer das duas and Primary Scale of Intelligence. Manual. New York:
escalas publicada em língua nacional e muito Psychological Corporation.
menos qualquer tentativa de padronização. Em 3. Wechsler, D. (1974). WISC-R – The Wechsler Intelli-
Porto Alegre, foi feita uma tradução do WPPSI, gence Scale for Children – Revised. Manual. San
Antonio, TX: Psychological Corporation.
estritamente para fins de pesquisa, que, na área 4. Wechsler, D. (1989). WPPSI-R – Wechsler Preschool
psicológica, foi coordenada por J.A. Cunha, and Primary Scale of Intelligence – Revised. Manual.
mas os resultados foram apresentados em ter- San Antonio, TX: Psychological Corporation.
mos de escores brutos [5]. A análise de itens, a 5. Guazzelli, E.T.F. (1979). A criança marginalizada.
partir das respostas dos sujeitos da amostra Porto Alegre: Globo.
6. Cunha, J.A., Freitas, N.K., & Raymundo, M.G.B.
utilizada, dadas aos subtestes de Vocabulário, (1991). Psicodiagnóstico. 3.ed. Porto Alegre: Artes
Completar Figuras, Aritmética, Semelhanças e Médicas.
Compreensão, demonstrou que a ordem de di- 7. Kaplan, C. (1996). Predictive validity of the WPPSI-
ficuldade dos itens, nesses subtestes, é diversa R: a four-year follow-up study. Psychol. in the Scho-
da verificada na padronização americana [6]. ols, 33, 3, 211-220.
2. A experiência em nosso meio tem mos-
trado que dificilmente é possível a administra- OUTRA FONTE BIBLIOGRÁFICA
ção do WPPSI em apenas uma sessão de testa-
McGrew, K.S. & Flanagan, D.P. (1998). The Intelligence
gem. Aliás, o longo tempo de administração Test Desk Reference (ITDR): Gf-Gc cross-battery as-
tem sido apontado como uma das limitações sessment. Boston, MA: Allyn & Bacon.

PSICODIAGNÓSTICO – V 289
Z-TESTE Tempo: aproximadamente 15 minutos, para
a administração coletiva, e variável, para a in-
Dados históricos dividual.
Manejo: cada resposta é classificada con-
O Z-teste, desenvolvido por Hans Zulliger, é forme sua localização, determinantes e conteú-
considerado um descendente direto do teste do, considerando-se, ainda, o número de res-
de Rorschach, que talvez se deva ao fato de o postas e a presença de fenômenos especiais,
próprio autor ter continuado as experiências sendo que a interpretação leva em conta as-
científicas de Hermann Rorschach [1]. Assim, pectos quantitativos e qualitativos.
já em 1938, divulgou, com Behn-Eschenburger,
sua primeira técnica, utilizando manchas de
tinta, como estímulo. No início da década se-
Indicação
guinte, fez várias tentativas para desenvolver
um instrumento que pudesse atingir objetivos
similares ao teste de Rorschach, mas com eco- 1. Avaliação da personalidade, principal-
nomia de tempo, para a seleção de oficiais mente em seleção profissional, em clínica e na
durante a Segunda Guerra Mundial. Dessa ma- área escolar.
neira, em 1948, divulgou um conjunto de três
diapositivos, para administração coletiva, sen-
do que, em 1954, a versão em cartões e o ma- Comentário
nual foram publicados por Hans Huber, na Suíça.
1. A forma preferencial de administração
da técnica de Zulliger é a coletiva, já que, no
Descrição que se refere à administração individual, o tes-
te de Rorschach oferece, indiscutivelmente,
O material do teste é constituído por três di-
subsídios mais ricos. Por outro lado, no Brasil,
apositivos, para a forma coletiva, ou três cartões,
foi objeto de extensivo trabalho de pesquisa,
às vezes denominados lâminas ou pranchas, para
desenvolvido por Cícero E. Vaz [1].
a administração individual. Como o teste de Ror-
schach, é uma técnica projetiva, e os estímulos
utilizados são manchas de tinta, escassamente REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
estruturadas, embora possam ser consideradas
simétricas, em termos do eixo vertical. 1. Vaz, C.E. (1998). Z-teste: Técnica de Zulliger: for-
Os diapositivos ou as lâminas são apresen- ma coletiva. São Paulo: Casa do Psicólogo.
tados um a um, sendo necessária uma folha
de localização, para mapeamento das respos- OUTRAS FONTES BIBLIOGRÁFICAS
tas; além disso, na administração coletiva, é
Freitas, A.M.L. (1996). Teste Zulliger: aplicação e ava-
preciso material e ambiente adequado à pro- liação. São Paulo: Casa do Psicólogo.
jeção dos diapositivos. Guerra, G.A. (1977). O Teste de Zulliger: uma experiên-
O material é produzido, na Suíça, por Hans cia brasileira. Rio de Janeiro: CEPA.
Huber. No Brasil, é distribuído pelo CEPA e pela Macedo, R.M.S. (1968). O Teste Z em adolescentes. Rev.
Psicol., 14, 1/2, 3-47.
Casa do Psicólogo.
Vaz, C.E. (1996). O Teste de Zulliger, suas aplicações e o
número de respostas como desempenho e produ-
ção. In A. Jacquemin, E.T.K. Okino e J. Vendruscolo,
Administração Org. Anais do I Encontro da Sociedade Brasileira de
Rorschach e Outros Métodos Projetivos (p.53-66).
Ribeirão Preto, SP: Sociedade Brasileira de Ror-
Forma: individual ou coletiva. schach.

290 JUREMA ALCIDES CUNHA


PARTE III
MANEJO CLÍNICO DE TÉCNICAS
MÓDULO VIII – Bender

Problemas na administração

N a literatura específica, este teste é freqüen-


temente identificado como Bender ou,
mais resumidamente, como B-G, embora Bach
nho 4, com variações em todos os autores, e
na subparte reta desse mesmo desenho, em
dois autores; c) à inclinação das subpartes do
(1987) considere mais adequado chamá-lo de Desenho 6 e do 7 (por exemplo, a figura da
Bender-Gestáltico. Como o nome, encontram- direita, no Desenho 7, é inclinada para a es-
se acentuadas diferenças no material de teste querda, nos conjuntos de Bender e de Pascal e
e no sistema de abordagem para a avaliação, Suttell, enquanto nos conjuntos de Halpern,
conforme os diversos autores. Hutt e Woltman fica na posição vertical); d) ao
Assim, antes de administrar o Bender, é formato e colocação de subparte, como no lo-
importante que o psicólogo tenha em mente sango do Desenho 8.
por que pretende fazê-lo, porque a resposta O que pode ocorrer é que, utilizando o con-
vai determinar qual o método ou o sistema junto de um autor e a lista de desvios de ou-
escolhido para exame do protocolo, com o que tro, facilmente o psicólogo pode incorrer em
pode ser definido qual o material mais ade- erros de escore. É bom lembrar que, além de
quado. Tal exame se baseia na identificação e modificações nos estímulos quanto a detalhes
consideração de desvios na reprodução de formais do desenho e ao número de unidades,
modelos de desempenho. Mas existem vários existem edições com diferenças quanto ao nú-
conjuntos de desenhos. Se o psicólogo não mero de desenhos, como a de Santucci e Per-
decide, a priori, como pretende avaliar o pro- cheux (1968), que inclui apenas cinco.
tocolo, poderá ter dificuldades em fazê-lo. Portanto, antes de testar, assegure-se de
Dana, Field e Bolton (1983) referem um es- que tem em mãos o material de teste adequa-
tudo desenvolvido por Popplestone, em 1956, do. Além disso, sempre verifique se os dese-
que procurou comparar as lâminas originais de nhos estão na ordem e na posição correta, co-
Bender de 1983 com as de 1946, bem como os locados de face para baixo, na sua frente.
conjuntos utilizados por Halpern (1951), Hutt É importante também que use as instruções
(1953), Pascal e Suttell (1951) e Woltman adequadas, conforme o método e sistema es-
(1950). Só identificou como realmente equiva- colhido para o exame do protocolo. As princi-
lentes os desenhos A, 1, 3 e 5. As diferenças pais diferenças entre os autores envolvem “o
referiam-se: a) ao número e formato das uni- número de folhas fornecidas, a quantidade de
dades do desenho, como, por exemplo, “no De- detalhes usada nas instruções, o fornecimento
senho 2, a maioria das formas tem 10 colunas de informações referentes ao número de dese-
de ovais, enquanto Hutt usa 10 colunas de cír- nhos e à exatidão esperada na reprodução”
culos”, mas o conjunto de Pascal e Suttell apre- (Dana, Field & Bolton, 1983, p.78). Portanto,
senta 11 colunas de círculos e “Bender tem 10 verifique se tem todo o material necessário,
colunas ovais” (p.77); b) ao formato das antes de iniciar a testagem. Lezak (1983) acon-
subpartes, como na subparte curva do Dese- selha que se deixem sobre a mesa, ao alcance

PSICODIAGNÓSTICO – V 293
do paciente, três lápis bem apontados de nú- lado, se faz perguntas sobre motivos ou signi-
mero 1 ou 2, de preferência com borracha de ficado do teste, transfira a resposta para de-
qualidade na ponta, e um bom número de fo- pois do período de testagem (Lacks, 1984).
lhas de papel em branco. Verifique também se Alguns clientes, às vezes, tentam reprodu-
a mesa onde o testando vai trabalhar tem a zir as figuras, esboçando-as com uma série de
superfície lisa (já que uma superfície rugosa linhas leves, ao invés de usar uma linha firme.
pode prejudicar fundamentalmente o desem- É preciso que o examinador esteja atento para
penho) e apresente a folha (exceto quando há isso, porque em alguns sistemas, como a adap-
instruções em contrário) na posição usual (po- tação Lacks do sistema Hutt-Birskin, um pro-
sição vertical), embora o examinando possa tocolo esboçado não se presta para o escore e,
ajustá-la para trabalhar mais confortavelmen- então, o examinador deve dizer ao cliente para
te, mas ainda mantendo uma orientação verti- não desenhar dessa maneira.
cal. Comece a marcar o tempo após colocar a Foi descrita a fase da cópia, que constitui a
primeira lâmina na frente do examinando. La- administração total, para muitos autores. Even-
cks (1984) recomenda que não se utilize cro- tualmente, pode-se seguir a reprodução por
nômetro, para o examinando não pensar que memória, a fase de associação e, por vezes, de
existe um limite de tempo. Um relógio de pul- elaboração.
so ou de parede são suficientes. Há autores que O procedimento que foi descrito foi para a
não valorizam o fator tempo, mas, às vezes, é administração individual, que é a mais comum.
importante. Nessa forma de administração, a técnica pode
A primeira lâmina é colocada na frente do ser usada no início de uma testagem, como
examinando, para que copie. Eventualmente, procedimento para warming-up, para facilitar
o examinando a aproxima para ver melhor. O o rapport ou tranqüilizar um examinador in-
examinador só intervirá, de forma não-verbal, quieto. Também se aconselha como um instru-
corrigindo a posição, se o examinando mudar mento de transição entre técnicas mais objeti-
a orientação da lâmina. Se insiste, o examina- vas e as projetivas.
dor não deve intervir novamente, mas, logo que Caso tenha se decidido por uma adminis-
terminar a testagem, deve indicar a posição do tração coletiva, siga as instruções do autor se-
estímulo, por uma flecha, no protocolo, indi- lecionado.
cando a direção da parte superior do estímu- Seja com administração individual ou cole-
lo, no momento em que foi copiado. Da mes- tiva, o problema realmente importante em ter-
ma maneira, se o examinador mudou a posi- mos de administração é, pois, o de selecionar,
ção do papel, também deve ser feita uma fle- a priori, o método de abordagem a ser utiliza-
cha, indicando sua parte superior, durante a do, se projetivo ou objetivo, e, então, o siste-
cópia. ma de escore a ser adotado, para utilizar, des-
As perguntas ocasionais do examinando de o início, um procedimento padronizado.
devem ser respondidas de maneira neutra, re- Existem muitas estratégias, que variam con-
petindo as instruções ou dizendo que proceda forme os propósitos da avaliação, e vários sis-
“como quiser” ou “como achar melhor”. A temas de escore. Aqui, neste capítulo, exami-
pergunta de se pode usar uma régua deve ser naremos apenas as abordagens que parecem
respondida com um simples “não”. Por outro mais úteis.

294 JUREMA ALCIDES CUNHA


Bender na criança e no adolescente
Jurema Alcides Cunha
19
BENDER NA CRIANÇA de 8 a 16 anos, quanto a 15 variáveis, propos-
tas originalmente por Hutt, entre as quais en-
Indicadores de perturbação emocional, controu seis que diferenciavam significativa-
segundo Clawson e Koppitz mente os dois grupos: seqüência dos desenhos,
mudanças na curvatura e na angulação, difi-
Na área emocional, os principais trabalhos rea- culdades de fechamento, rotação dos desenhos
lizados com crianças foram de Clawson e Kop- e mudanças de tamanho (Clawson, 1959). To-
pitz. Vamos aqui comparar o trabalho de pes- davia, o trabalho não teve maior significação
quisa de ambas, tentando avaliar principalmen- clínica, porque não houve uma tentativa para
te sua validade científica. o levantamento de hipóteses interpretativas.
Na investigação realizada por Clawson
(1959), as hipóteses foram as seguintes:
Subsídios históricos e metodológicos I – “Os tipos e desvios das figuras-estímulo
são significativamente maiores, quando medi-
Em 1959, Aileen Clawson publicou um artigo dos quantitativamente, nos casos clínicos do
com resultados de importante pesquisa, desen- que nos não-clínicos.
volvida em sua tese de doutoramento, na Uni- II – Desvios das figuras-estímulo podem ser
versidade de Houston, Texas (Clawson, 1959), relacionados com perturbações infantis.
trabalho que veio a ser ampliado mais tarde e III – No grupo clínico, os padrões do
publicado na forma de livro (Clawson, 1980). BVMGT* podem estar relacionados com deter-
Esse trabalho sobre sinais ou desvios no B- minantes e conteúdos Rorschach”.
G, como indicadores de perturbação emocio- Os desvios a que se refere a primeira hipó-
nal, pode ser considerado como pioneiro na tese derivaram de pesquisas, com adultos, de
época em que, segundo a autora, só existia um Hutt, Billingslea ou Peck e Quast. As sub-hipó-
único trabalho sobre o assunto, de Byrd (1956),
cujas hipóteses não foram devidamente traba-
lhadas, mas que Koppitz considerou como um
estudo com um bom delineamento de pesqui- *Bender Visual Motor-Gestalt Test, ou BVMGT, sigla uti-
sa (Koppitz, 1971). Byrd estudou cerca de 400 lizada por Clawson, embora o teste seja mais costu-
crianças (200 adaptadas e 200 inadaptadas), meiramente abreviado como B-G (Bender-Gestalt).

PSICODIAGNÓSTICO – V 295
teses relativas à segunda hipótese foram ex- experiência da autora e nos achados de outros
traídas da pesquisa de Hutt com adultos, com investigadores, sendo citados Byrd, Clawson,
algumas extrapolações para adaptação ao de- Hutt e Birskin, Kitay, Murray e Roberts, Pascal e
senvolvimento infantil. E, em relação à tercei- Suttell e Tucker e Spielberger (Koppitz, 1971;
ra hipótese, as relações procuradas entre o B- Koppitz, 1987).
G e o Rorschach precisavam ser determinadas Koppitz desenvolveu seu projeto de pesqui-
empiricamente, por não se registrar, até então, sa em 1963, elaborando um manual de escore
qualquer trabalho desse tipo na literatura es- de dez indicadores (Koppitz, 1971; Koppitz,
pecífica. 1987). Dois outros indicadores foram melhor
A amostra utilizada por Clawson compreen- examinados em seu trabalho de 1975 – figuras
deu um grupo “experimental” e um grupo de em quadros* e elaboração** – e não são in-
controle. O primeiro era constituído por 80 cluídos na comparação feita no item seguinte,
crianças, de 7 a 12 anos, clientes do Wichita em que são citadas hipóteses interpretativas.
Guindance Center, em Wichita, Kansas, com
ampla gama de sintomas, de forma que pode-
riam ser descritas como apresentando compor- Comparação das pesquisas de Clawson e
tamento desajustado, com perturbações emo- Koppitz
cionais, mas sem que qualquer uma fosse ca-
racterizada como psicótica, deficiente mental Os resultados das duas pesquisas são apresen-
ou lesada cerebral. O grupo de controle era tados, resumidamente, nos Quadros 19-1, 19-
constituído por 80 crianças, também de 7 a 12 2 e 19-3. Os itens estão organizados, nos três
anos, de escolas públicas, julgadas como nor- quadros, basicamente de acordo com a siste-
mais por um professor, quanto a desenvolvi- mática usada por Clawson, em seu livro, sen-
mento, escolhidas randomicamente, mas sen- do acrescentados itens de Koppitz, que não
do o grupo estratificado em termos dos níveis constaram da pesquisa original daquela auto-
socioeconômicos da cidade. Os grupos foram ra. Da pesquisa de Clawson de 1959, são in-
equiparados quanto a idade, QI e nível socioe- cluídos aqui apenas os itens que apresentaram
conômico. significação estatística, embora os demais tam-
Pouco tempo depois, Koppitz realizou sua bém sejam discutidos em seu livro quanto à
investigação sobre problemas emocionais em sua possível interpretação clínica. No caso da
crianças. Na literatura em que buscou subsídios, pesquisa de Koppitz, são incluídos todos os
citou Byrd (1956), Eber (1958), Simpson (1958) e itens, independentemente dos resultados te-
Clawson (1959). A hipótese levantada foi: rem sido considerados estatisticamente signi-
“As crianças com problemas de ajustamen- ficativos ou não, em vista de a autora manter
to mostrarão, no Bender, uma incidência mui- suas hipóteses, desconsiderando esse aspec-
to maior de indicadores emocionais do que to. Para os leitores identificarem bem os casos
crianças bem-adaptadas”. em que não foi encontrada significância esta-
Para seu estudo, utilizou uma amostra de tística, a interpretação consta como Hip K (hi-
272 crianças, de 5 a 10 anos, da qual um gru- pótese de Koppitz).
po era constituído por 136 crianças, encami- As iniciais das autoras, C (Clawson) ou K
nhadas a uma clínica de conduta ou ao psicó- (Koppitz) são empregadas para identificação
logo, por problemas emocionais, enquanto o de suas respectivas definições operacionais,
outro grupo, também de 136 crianças, era
constituído por alunos sem história de desa-
juste emocional. Os grupos foram equiparados *As figuras, desenhadas dentro de um quadro ou cai-
em termos de idade e sexo, não sendo incluída xa, relacionam-se com fracos recursos de controle, de
qualquer criança que pudesse ser caracteriza- forma que são necessários limites externos para o com-
portamento.
da como deficiente. Foram examinados indi- **Elaboração ou adições espontâneas relacionam-se
cadores emocionais, selecionados com base na com medos e ansiedade.

296 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 19.1 B-G: Fatores organizacionais, segundo Clawson e Koppitz
Categoria Item Definição operacional Critério de escore Figuras Hipótese P Interpretação
Ordem da Ordenada C: Todas as figuras desenhadas Presença ou I 0,001 C: Típico de criança bem
seqüência em sucessão, em seqüência ausência ajustada. Parece razoável a
horizontal ou vertical, hipótese de que fatores
exceto uma perturbadores resultem em
padrões inusitados, desde
arranjos rígidos, compulsivos,
até uma ordem confusa
Confusa C: No máximo, três figuras Presença ou I 0,01
desenhadas em sucessão; ausência
as demais, espalhadas na
página
K: Figuras espalhadas Presença ou K NS (5-7a) K: Planejamento pobre e
arbitrariamente na página ausência 0,001 incapacidade de organizar o
(8-10a) material; confusão mental
Fig. A central C: Sucessão confusa com a Presença ou A I 0,01 C: Típico de criança
Fig. A central ausência desajustada

Organiza- Estilo C: Dois terços das figuras Presença ou I 0,05 C: Personalidade que tende ao
ção compressivo dispostas na borda, no topo ausência retraimento de um mundo, que
ou na base, considerando parece ameaçador e hostil
a metade da página, esteja
esta na horizontal ou na
vertical
K: Uso de menos de metade Presença ou K NS (5-7a) Hip K: Retraimento, timidez,
da folha ausência depressão
NS (8-10a) C: Personalidade que se
expressa por comportamento
de atuação
Estilo C: Figuras espalhadas na pági- Presença ou II 0,001
expansivo na ou páginas, com considerá- ausência
vel espaço entre as mesmas II 0,001
K: Uso de duas folhas ou mais Presença ou K 0,001 K: Impulsividade, atuação
ausência (5-7a)
0,01
(8-10a)
Modifica- Tamanho C: Aumento linear maior que Presença em 5 I NS Hip C: Tamanho da figura e
ção no aumentado ¼ do eixo vertical ou ou mais figuras controle dos afetos estão
tamanho horizontal em relação à relacionados em casos de
figura-estímulo crianças perturbadas
K: Aumento de 3 vezes o Computa-se só K NS (5-7a) Hip K: Atuação
tamanho do estímulo, em uma vez NS (8-10a)
ambas as direções na figura
ou em ambas as subpartes
Tamanho C: Diminuição linear menos Presença em 5 ou I 0,01 C: Comportamento de
diminuído que ¼ do eixo vertical ou mais figuras 0,001 retraimento. Associada a
horizontal, em relação à padrão Rorschach, indicativo
figura-estímulo de personalidade
supercontrolada, com canais
inadequados de expressão
K: Tamanho da metade do Computa-se só K NS (5-7a) K: Ansiedade, retraimento,
modelo em ambas as direções uma vez 0,02 constrição, timidez
na figura ou em ambas as (8-10a)
subpartes
Tamanho C: Aumento ou diminuição C: Baixa tolerância à frustração.
irregular progressiva do tamanho ou, Padrão encontrado em 75% das
pelo menos, uma figura crianças com comportamento
muito grande de atuação; relacionado com
sinais de reação mais explosiva,
no Rorschach
K: Aumento progressivo no Computa-se só 1,2,3 K NS (5-7a) Hip K. Baixa tolerância à
tamanho, de forma que as uma vez NS (8-10a) frustração e explosividade
últimas unidades são, pelo
menos, três vezes maiores
que as primeiras
Fontes: Clawson, 1959, p.198-206; Clawson, 1980, p.20-44 e p.82-83; Koppitz, 1971, p.161-181 (adaptado).

PSICODIAGNÓSTICO – V 297
QUADRO 19.2 B-G: Modificação da Gestalt, segundo Clawson e Koppitz
Categoria Item Definição operacional Critério de escore Figuras Hipótese P Interpretação
Fechamen- C: Problema na junção nas A,2,4, II 0,01 C: Medo nas relações inter-
linhas ou subpartes, como 5,6,7,8 III 0,01 pessoais. O conflito relaciona-
no caso de: se, no Rorschach, com
Lacuna C: Quebra de um contorno A,2,4, I NS respostas M agressivas, cuja
que é contínuo no estímulo 6,7,8 interpretação não foi
Transpasse C: Extensão de uma linha além A,2,4, I NS estabelecida. (A categoria
do ponto de junção 6,7,8 foi significativa como
Separação C: Pequeno espaço na junção conjunto de vários itens.)
de suas subpartes A,2,4, I 0,5
5,6,7,8
Superposi- Penetração C: Reprodução de uma A,4,5,8 I NS
ção de subparte sobre a outra, em
partes local em que ambas somente
se tocam no estímulo
Absorção C: Contato de subpartes, mas A,4,7,8 I NS
o vértice de uma subparte
faltando por causa da
interseção com as outras
Outros
Simplifi- C: Falta de maturação nas Presença em 3 ou II 0,01 C: Falha na maturação
cação reproduções (incluindo mais unidades
vários itens)
Uso de círcu- 1,2,3,5
los, traços ou
vírgulas por 2
pontos ou A,1,2,
laçadas 3,4,5,
Pontos por 6,7,8
laçadas
Forma básica
da figura e a
junção das
subpartes,
compostas
por linhas,
abaixo da IM*
Traços por K: Traços de 2 mm ou mais em 2 K NS (5-7a) Hip K: Impulsividade, falta de
círculos lugar de círculos NS (8-10a) interesse ou de atenção
Rotação C: Giro da figura total, de A,1,2, I 0,001 Hip C: Pequenas rotações têm
forma que o ângulo 3,4,5, maior valor que as severas, para
subentendido entre o eixo 6,7,8 indicar desajustamento (?)
horizontal da figura e a borda
do papel é igual ou maior
que 15º do que na figura
estímulo
Mudança C: Mudança na curvatura, de A,4,5 I 0,01 C: Sinal de perturbação
na curva- modo que o arco assume uma emocional
tura forma retangular achatada
ou uma forma triangular
pontuda
Presença em 3 ou 6 Hip C: (Hutt) Aumento como
mais unidades hiper-resposta emocional e
diminuição como supressão
do afeto (?)
Mudança C: Mudança maior que 15º no Presença de A,2,3, I 0,001 C: Sinal de perturbação
na angu- tamanho de qualquer ângulo ângulos aumen- 4,5,6, emocional; interpretação não
lação de uma figura ou no ângulo tados ou dimi- 7,8 formulada
de interseção entre subartes nuídos em 4 ou
de uma figura mais figuras
Limites da C: Número incorreto de 1,2,3, II 0.01 Hip C: Relacionado com a
figura unidades 5,6 aprendizagem percentual;
Perseveração C: Duas ou mais unidades que significação diversa conforme
o estímulo a idade
Mutilação C: Duas ou mais unidades a
menos que o estímulo

Fontes: Clawson, 1959, p.198-206; Clawson, 1980, p.20-44 e p.82-83; Koppitz, 1971, p.161-181 (adaptado).
*IM medida pelo teste de Goodenough, na pesquisa original de Clawson.

298 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 19.3 B-G: Medida de trabalho, segundo Clawson e Koppitz
Item Definição operacional Critério de escore Figuras Hipótese P Interpretação
Rasura C: Número de reproduções às quais foi II 0,01 C: Típico de crianças bem
aplicada a borracha ajustadas. Desejo de agradar os
adultos. Sentimento de
liberdade na escola.
Repassa- C: Repassamento de uma linha ou I 0,01 C: Típico de crianças bem
mento ponto já feito ajustadas. Mesmas possibili-
dades anteriores.
K: Todo o desenho repassado ou Computa-se só uma k 0,01 (5-7a) K: Impulsividade, agressividade,
reforçado vez NS (8-10a) possível atuação
Direção do C: Parte oblíqua desenhada para fora ou 5 I 0,05 C: Tendência da oblíqua para
desenho para dentro, em relação ao corpo da fora, em crianças bem ajusta-
criança das. Tendência da oblíqua para
dentro em crianças desajusta-
das. Hip C (Hutt): personalida-
de egocêntrica.
Linha K: Duas ou mais mudanças abruptas na Computa-se só uma 1,2 K 0,01 (5-7a) K: Instabilidade na coordenação
ondulada direção da linha de pontos ou círculos vez NS (8-10a) motora e na personalidade, por
fatores orgânicos e/ou
emocionais
Linha fina K: Traço tão fino que é preciso esforço K NS (5-7a) Hip K: Timidez, retraimento
para ver o desenho completo NS (8-10a)
Segunda K: Abandono do desenho ou de parte K NS (5-7a) K: Impulsividade, falta de
tentativa do mesmo, sem haver terminado, e 0,01 controle interno suficiente,
realização de um segundo desenho (8-10a) ansiedade
Fontes: Clawson, 1959, p.198-206; Clawson, 1980, p.20-44 e p.82-83; Koppitz, 1971, p.161-181 (adaptado).

bem como de suas conclusões interpretativas. No grupo de 5 a 7 anos, apenas três dos 11
Note-se que, quando Clawson considera a in- indicadores de Koppitz, de acordo com os da-
terpretação apenas tentativa, constará também dos apresentados pela autora, se mostraram
como Hip C (hipótese de Clawson), eventual- significativos: linha ondulada, repassamento e
mente seguida pelo nome do autor no qual se expansão. No grupo de 8 a 10 anos, dos mes-
baseou. Por outro lado, se considera duvidosa mos 11 indicadores, somente quatro se mos-
a interpretação tentativa, é colocado um pon- traram significativos: ordem confusa, tamanho
to de interrogação entre parênteses. pequeno, segunda tentativa e expansão. Por-
As três hipóteses de Clawson são identifi- tanto, dos 11 indicadores emocionais de Kop-
cadas como I, II e III, e a de Koppitz apenas pitz, somente um, expansão, é significativo dos
com um K. 5 aos 10 anos. Dois indicadores, isto é, linha
Os quadros não são apresentados com o ob- ondulada e repassamento, só são significati-
jetivo de substituir a consulta aos livros das duas vos dos 5 aos 7 anos, e três, ordem confusa,
autoras, pois não abrangem todos os aspectos tamanho pequeno e segunda tentativa, só são
ou itens por elas considerados ou discutidos. Pre- significativos dos 8 aos 10 anos. Em conseqüên-
tendemos apenas comparar os dois sistemas e cia, de todos os indicadores emocionais de
apresentar dados que permitam identificar os Koppitz, apenas seis são clinicamente úteis.
desvios mais válidos, do ponto de vista de sua Entretanto, Koppitz inclui em seu livro mesmo
significação estatística. Todavia, não podemos os itens que ela própria informa não terem sig-
deixar de admitir que são estes os que se pode nificação estatística, atribuindo-lhes significa-
dizer que possuem utilidade clínica. ção clínica, o que nos parece cientificamente
criticável, pelo que não recomendamos seu uso.
Já no caso de Clawson, verificamos que
Análise dos resultados e comentários demonstra o cuidado de não tirar conclusões
além do que é justificado pelos dados da pes-
No sistema de Koppitz, são considerados 11 quisa. No caso da significação não poder ser
indicadores emocionais, em dois grupos etá- determinada, eventualmente levanta hipóteses,
rios, de 5 a 7 anos e de 8 a 10 anos. baseadas em dados de outros autores, citan-

PSICODIAGNÓSTICO – V 299
do devidamente a fonte utilizada, ou deixa as to (ou reforço de linhas), segunda tentativa
conclusões em suspenso. Porém, em seu livro, (sem corrigir o original) e tamanho pequeno”
discute mais amplamente cada item e, inclusi- (Groth-Marnat, 1999, p.566-567). Outros qua-
ve, formula hipóteses, comparando com da- tro indicadores não foram considerados rela-
dos de outros autores, mesmo em relação a cionados com psicopatologia por Rossini e Kas-
itens que, na pesquisa inicial, não haviam sido par (1987), mas, segundo Groth-Marnat
significativos, mas se restringe a hipóteses e (1999), são citados por outros autores: linha
salienta a necessidade de maiores investiga- ondulada, riscos por círculos, tamanho aumen-
ções. tado e elaboração. Conforme o autor, os indi-
Devido à popularidade que alcançou o tra- cadores não considerados úteis por Rossini e
balho de Koppitz, resolvemos comparar as duas Kaspar possivelmente se associavam a outros
pesquisas, para que os leitores possam julgá- tipos de psicopatologia não apresentados por
las. De nossa parte, consideramos o trabalho sua amostra de sujeitos de 7 a 10 anos de ida-
de Clawson de melhor qualidade científica que de. Sugere, inclusive, que sejam desenvolvidos
o de Koppitz, no que se refere a indicadores estudos sobre os indicadores com adolescen-
emocionais. tes ou sujeitos mais velhos.

Considerações críticas Os aspectos simbólicos e as respostas


populares no Bender infantil
Não obstante a popularidade das hipóteses
interpretativas dos indicadores emocionais de Segundo Clawson (1980), além da administra-
Koppitz, conforme a literatura, dados de pes- ção pelo procedimento-padrão, pode-se utili-
quisa não lhe conferiram apoio suficiente. En- zar ainda o Bender como técnica projetiva, em
tretanto, foi possível verificar que conjuntos de alternativas que parecem promissoras em ter-
indicadores poderiam ter utilidade clínica e, mos de um psicodiagnóstico, que seriam a fase
inclusive, em obra de 1975, a própria Koppitz de associação e de elaboração. Na primeira
recomendou o uso de um ponto de corte de fase, os cartões são apresentados à criança,
três ou mais indicadores para levantar hipóte- solicitando-lhe que diga com que se parecem
ses sobre a presença de problemas emocionais, ou o que é que eles lembram. Na segunda, a
cuja natureza deveria ser investigada (Groth- criança é convidada a “desenhá-los da manei-
Marnat, 1999). Aliás, Rossini e Kaspar (1987) ra como quiser: alterando, combinando ou ela-
estiveram entre os autores que se preocupa- borando à vontade”. Num exemplo de seu li-
ram com a questão da validade dos indicado- vro, inclui as duas fases, discutindo o valor sim-
res emocionais de Koppitz. Desenvolveram es- bólico das associações e das produções (p.2).
tudos com crianças de 7 a 10 anos, comparan- Um dos problemas que surgem para se po-
do grupos com transtorno de ajustamento e der utilizar um esquema de referência simbóli-
com transtorno de conduta com controles nor- co, no que tange às associações, é poder defi-
mais. Os dois primeiros grupos apresentaram nir até que ponto tal associação é individual,
um número significativamente maior de indi- isto é, se realmente é o resultado de uma pro-
cadores que o grupo normal, sendo que a pre- jeção do indivíduo ou se é o estímulo que a
sença de três indicadores foi muito caracterís- impõe ou suscita, em vista de suas qualidades
tica entre eles: ordem confusa, tamanho au- estruturais. No Rorschach, em que os estímu-
mentado e figuras em quadros. No caso de los são muito menos estruturados do que no
outros cinco indicadores, embora não especi- Bender, não se considera legítima uma inter-
ficamente relacionados com psicopatologia, pretação simbólica, quando a resposta é po-
sua pouca freqüência no grupo normal “suge- pular. Brown, citado por Endara (1967), cha-
riu alguma relação possível com dificuldade ma a atenção para a facilitação de uma per-
emocional: expansão, linha fina, repassamen- cepção básica nas populares, que “põe de lado

300 JUREMA ALCIDES CUNHA


a natureza ‘acidental’ das manchas” (p.223). tológica. Lápis é um conceito relativamente
Schafer (1954) também acentua que as respos- comum e um símbolo fálico socialmente acei-
tas P, a menos que dadas com um toque pes- to por crianças escolares” (p.46).
soal, constituem exemplos da percepção dis- Note-se que, no seu estudo sobre freqüên-
tanciada, relativamente impessoal e não-dinâ- cia de associações, “lápis” apareceu com 15%,
mica, de que fala Schachtel. Embora essas res- na Figura 7, e 8%, na 8 (Clawson, 1980, p.55).
salvas sejam feitas em relação ao Rorschach, Na pesquisa de Lopes, citada acima, “lápis”
achamos que sejam válidas em relação às as- constitui resposta popular tanto para a Figura
sociações de Bender. 7 como para a 8. Se o exemplo ocorresse em
Dessa maneira, para quem utiliza a fase de nosso meio, embora lápis não deixe de consti-
associações, no Bender, parece muito impor- tuir um símbolo fálico, a sua percepção não
tante o conhecimento de uma pesquisa, reali- poderia ser interpretada em termos de aspec-
zada em Pelotas, RS, sobre respostas popula- tos dinâmicos individuais, uma vez que, coleti-
res do teste de Bender, que constituiu o tema vamente, é a resposta mais usual para ambas
de dissertação de Mestrado em Psicologia Clí- as figuras.
nica, na PUCRS, da psicóloga Maria Carmem F. É importante nos darmos conta desses as-
Mattar Lopes. A amostra foi constituída por pectos, ao usar essa modalidade projetiva, no
860 sujeitos, de 8 a 13 anos, de ambos os teste de Bender, sob pena, por exemplo, de
sexos e de nível socioeconômico baixo, mé- concluir que uma criança deu 30% de respos-
dio e alto. As respostas populares encontra- tas que envolvem simbolismo fálico, quando
das são apresentadas no Quadro 19-4 (Lo- apenas deu três respostas populares, “cobras”,
pes, 1984). para a Figura 6, e “lápis”, para a 7 e a 8.
Feitas essas ressalvas, as associações se tor-
nam um enfoque promissor, assim como as
QUADRO 19.4 Respostas populares no Bender,
elaborações, embora seja muito possível que
numa amostra de 860 crianças, de ambos os
sexos, de 8 a 13 anos também, entre as elaborações, possam ser en-
contradas respostas populares, facilitadas pela
Figura Categoria Respostas populares
estrutura básica de estímulos, ainda que, nes-
A 1 Figuras geométricas te caso, é provável que sempre haja algum to-
A 2 Figura humana, boneco
que pessoal.
1 3 Pontos, pontos em linha
2 4 Bolinhas De toda maneira, desejando usar o Bender
3 5 Árvore de Natal, árvore, pinheiro como técnica projetiva em crianças, achamos
6 6 Cobras, minhocas, podendo que essas são as alternativas mais válidas, uma
estar em movimento vez que muitos dos desvios e sinais habitual-
6 7 Água, mar, ondas, rio,
mente utilizados para basear interpretações
podendo estar em movimento
6 8 Linhas projetivas, podem, na realidade, se apresen-
7 9 Lápis tar, num protocolo, por problemas na matura-
8 10 Lápis, podendo estar em ção visomotora, quando não se associam com
movimento transtornos no desenvolvimento neuropsicoló-
Fonte: Lopes, 1984, p.101-102. gico. Portanto, a não ser em relação a sinais
identificados como significativos, através de
pesquisas sérias, cremos que não existe o di-
Se examinarmos o caso discutido por Cla- reito de usar simplesmente um referencial sim-
wson (1980), veremos que a associação da bólico, em crianças. E, mesmo em tal caso,
criança, para as Figuras 7 e 8, foi “lápis”. Sua parece só ser possível um enfoque projetivo
interpretação foi a seguinte: “Uma vez que o para a interpretação de desvios quando se tem
seu B-G não teve padrão de perseveração, a plena consciência de que a criança apresenta
associação única, para as duas formas hexa- um nível de maturidade visomotora compatí-
gonais, não precisa ser interpretada como pa- vel com sua faixa etária.

PSICODIAGNÓSTICO – V 301
O sistema de escore de Santucci-Percheux de nível inferior, cuja freqüência decresce com
a idade”. O escore ou nota 2 atribui-se “aos
Para a aplicação do Bender como prova de or- casos intermediários” (Santucci & Percheux,
ganização grafoperceptiva, é necessário ter em 1968, p.2). Pode haver, portanto, até três ní-
mãos o Manual, as máscaras e a cinco lâminas veis esperados, embora a maioria dos itens
do teste (edição de Delachaux & Niestlé, Paris), pressuponha um nível de sucesso ou dois, mas,
na seguinte ordem: A, 2, 4, 3 e 7. Devem ser dependendo do grau de dificuldade para atin-
usadas as instruções específicas do Manual. A gir o nível de sucesso, o escore varia de 1 a 3.
folha, por exemplo, é apresentada com o lado Voltemos à Folha de Registro. Eventualmen-
maior na horizontal. te, o número do item é repetido e seguido por
Não podemos aqui reproduzir todos os cri- uma letra minúscula. No Modelo I, temos, por
térios utilizados na correção. Todavia, prepa- exemplo, 1a, 1b, 1c. Isso significa que, no item
ramos uma Folha de Registro, que auxilia con- 1, há três níveis possíveis de sucesso. Em se-
sideravelmente tal correção. Vamos ensinar a guida à coluna de Guia, de que já falamos, exis-
utilizá-la. te outra coluna, encimada pelas letras NE e, a
Cada uma das lâminas do teste é denomi- seguir, outra coluna, NO. As letras NE signifi-
nada modelo e identificada por um algarismo cam nível esperado. Vemos que o NE de 1a é
romano. Temos, pois, Modelo I (correspondente 3, o NE de 1b é 2 e o NE de 1c é 1. Nesse caso,
à Figura A), Modelo II (Figura 1), Modelo III (Fi- é fácil de entender. Logo a seguir, porém, te-
gura 4), Modelo IV (Figura 3) e Modelo V (Fi- mos o NE do item 2. Isso significa que, no item
gura 7). Cada um dos modelos é apresentado 2, se espera apenas um determinado nível de
num quadro diferente, na Folha de Registro. sucesso e que corresponde ao escore. Já as le-
Em cada um dos quadros, à direita, tem-se tras NO significam nível observado, e há espa-
o número de itens, seguido de sua especifica- ços para registro de escore. Então, vimos que,
ção que, eventualmente, se encontra abrevia- no item 1, podemos esperar três níveis de su-
da. A seguir, você encontrará a palavra Guia. cesso, 3, 2 ou 1, e, através da correção, se fo-
Refere-se às guias de correção, que são as rem respeitadas as condições para um escore
máscaras. Elas são identificadas por letras 3, por exemplo, este será o nível observado (NO
maiúsculas, e, conforme o item que tiver de = 3), e o escore é registrado no espaço corres-
ser corrigido, deve ser selecionada a guia ade- pondente. Caso contrário, devemos ver se a
quada. Elas vão servir para medir ângulos, ava- reprodução preenche as condições para um NO
liar comprimentos, alinhamentos, paralelismos, = 2 ou NO = 1. Caso nem essas condições fo-
inclinações em relação à vertical ou à horizon- rem preenchidas, não se atribui escore ou te-
tal, para apreciar dimensões da reprodução do mos um NO = 0. No item 2, só um NE é possí-
modelo, etc. No Manual, há instruções sobre vel, 2, e o NO só pode ser 2 ou 0. Esclarecemos
como utilizá-las. que Santucci e Percheux falam em nível de su-
Na técnica de Santucci-Percheux, o escore cesso e em nota. Introduzimos a noção de ní-
é atribuído conforme o nível de sucesso da re- vel esperado (possível) e de nível observado
produção. Há três níveis de sucesso, que fo- para facilitar o manejo dos dados e, conseqüen-
ram definidos pelas autoras com base no per- temente, o seu registro na Folha.
centual de acertos, encontrado em três faixas Após corrigir todos os itens de um modelo,
etárias. Desse modo, o escore ou nota 3 se “atri- a soma de NO (escore) é escrita no espaço à
bui aos aspectos raramente reproduzidos pe- direita, abaixo do quadro do modelo. Após
las crianças de 6 anos e melhor respeitados de corrigir todos os modelos, o escore de cada
idade a idade ou, ainda, relativamente pouco um deles é transposto para o retângulo, em
respeitados, mesmo nas idades superiores”. Já posição vertical, abaixo do Modelo V. Somam-se
o escore 1 ou nota 1 é atribuído “aos aspectos os escores dos cinco modelos para obter o total.
bem reproduzidos por grande porcentagem de O sistema de escores padronizados da pro-
crianças, desde 6 anos, ou a certos sucessos va utiliza os conceitos de mediana e, conse-

302 JUREMA ALCIDES CUNHA


PROVA DE ORGANIZAÇÃO GRAFOPERCEPTIVA (SANTUCCI-PERCHEUX)
FOLHA DE REGISTRO DE J. A. CUNHA

Identificação: Idade: Escolaridade: Série: Data:

Item Modelo I Guia NE NO Item Modelo IV Guia NE NO


1a Quadr.: lados e ângulos iguais A 3 1 Metade do no total = pontos 2
1b Retângulo; losango; paral., trap. — 2 2 A1 correto B 1
1c Quadril.: 4 ângulos, 4 lados — 1
3a A2 correto B 2
2 Eixo horizontal C 2 3b A2 curvo B 2
3a Tangência correta — 2 4a A3 correto B 3
3b Quase-tangência — 1 4b A3 curvo B 2
4 Ponto de tangência sobre eixo — 2 5 No correto — 2
5 Círculo = modelo D1 3 6 Eixo horizontal: S – S3 C 3
6 Quadrado = modelo D2 3 7 S, S1, S2, S3 alinhados B 3
8 S-S1, S1-S2, S2-S3 eqüidistantes B 3
9 Simetria — 3

Item Modelo II Guia NE NO Item Modelo V Guia NE NO


1 No correto de colunas (10) — 2 1a Hexágono A correto, vertical — 2
2 Ausência de contato dos círculos — 1 1b Hexágono A: 1 só ângulo mal — 1
3 Inclinação para a esquerda B 2 2a Hexágono B correto — 3
4 Paralelismo das colunas B 3 2b Hexágono B: 1 só ângulo mal — 1
5 Inclinação eixo 0 a 5o 2 3 Orientação correta de A e B C 2
6 Alinhamento círc. linha superior B 1 4a Secância correta — 3
7 Alinhamento círc. linha inferior B 2 4b Alguma secância — 2
8 Comprimento 8-14 cm B 3 5 Hexágono A = modelo F 3
6 Hexágono B = modelo F 3

Item Modelo III Guia NE NO Modelo Escore


1 2 ângulos corretos (90º) A 3 I
2 Mesmo nível de parada — 1 II
3 Curva correta — 1 III
4 Ganchos corretos — 1 IV
5 Localização curva entre med. — 1 V
6a Ponto de tangência correto — 2 Total
6b Alguma tangência — 1
7 Quadrado = modelo E 3

Interpretação Idade (anos) Meninos Meninas


Q1 Med. Q3 Q1 Med. Q3
6 17,0 22,5 27,5 12,5 20,0 26,5
7 29,0 34,5 40,0 24,5 32,0 36,0
8 33,0 40,0 48,0 32,5 36,5 43,0
9 41,0 48,5 55,5 41,0 45,0 50,0
10 47,5 52,0 58,0 47,0 53,0 59,5
12 52,0 58,0 61,0 56,0 61,0 67,0
14 56,0 62,0 67,0 57,0 63,0 67,0
Fonte: Santucci & Percheux, 1968, p.29.

Psicólogo:_________________________________________________________

PSICODIAGNÓSTICO – V 303
qüentemente, quartis. Foi reproduzida a tabe- vê, o menino alcançou um escore apenas de 7.
la de resultados apresentada pelas autoras com Como tem 6 anos, seu escore se localiza no
base em protocolos colhidos entre escolares da quartil 1, para meninos. Nota-se sensível atra-
cidade de Paris. Não é do nosso conhecimento so no seu desenvolvimento grafoperceptivo.
a existência de normas brasileiras. Todavia, Além disso, a disposição dos desenhos na pá-
como a organização grafoperceptiva depende gina denota desorganização espacial, o que
da maturação, os dados locais não podem ser torna o prognóstico menos favorável.
muito discrepantes, pelo menos nas idades in-
feriores.
Além de considerações diretamente asso- O sistema de escore de Koppitz
ciadas à organização e ao desenvolvimento
grafoperceptivo, as autoras fazem algumas Em 1963, Koppitz desenvolveu um método do
observações, que parecem clinicamente úteis: B-G denominado Developmental Bender Test
1 – No caso de uma criança de 7 ou 8 anos Scoring System, composto de 30 itens, desti-
apresentar um resultado inferior a 6 anos, as nado a avaliar o nível de maturidade de crian-
autoras sugerem o uso do Pré-Bender, ou o ças de 5 a 10 anos, que é fácil de utilizar, bas-
PGOP. Se nesta prova o resultado é satisfató- tante popular por isso mesmo, e que, em 31
rio, o mau resultado anterior é atribuído a ra- estudos, alcançou uma fidedignidade entre os
zões emocionais e sugerido um reteste, após examinadores que varia entre 0,79 e 0,99, sen-
alguns dias. do que 89% desses estudos alcançaram um
2 – Se, em caso de ter havido um diagnósti- coeficiente de 0,89 ou mais (Lacks, 1984).
co de retardamento mental, com base em tes- Para o desenvolvimento de sua chamada
te de inteligência, e o resultado nesta prova escala de maturação, cada item foi validado
for superior ao encontrado, devem se pôr em tomando como critério o desempenho escolar
dúvida os resultados do teste de nível intelec- e partiu do pressuposto de que “um aluno prin-
tual. cipiante, com sua percepção visomotora bem
Vejamos um exemplo. Trata-se de um me- desenvolvida, será provavelmente um bom es-
nino de 6 anos e 1 mês. A reprodução do pro- tudante, enquanto uma criança cuja percep-
tocolo encontra-se na Figura 19.1. Os escores ção visomotora não amadureceu terá dificul-
dos itens estão na Folha de Registro. Como se dades em suas tarefas escolares”. Os resulta-

Figura 19.1 Proto-


colo Bender (San-
tucci-Percheux) de
menino de 6:1.

304 JUREMA ALCIDES CUNHA


PROVA DE ORGANIZAÇÃO GRAFOPERCEPTIVA (SANTUCCI-PERCHEUX)
FOLHA DE REGISTRO DE J. A. CUNHA

Identificação: Idade: Escolaridade: Série: Data:

Item Modelo I Guia NE NO Item Modelo IV Guia NE NO


1a Quadr.: lados e ângulos iguais A 3 1 Metade do no total = pontos 2 0
1b Retângulo; losango; paral., trap. — 2 2 A1 correto B 1 0
1c Quadril.: 4 ângulos, 4 lados — 1 1
3a A2 correto B 2
2 Eixo horizontal C 2 3b A2 curvo B 2 1
3a Tangência correta — 2 4a A3 correto B 3
3b Quase-tangência — 1 0 4b A3 curvo B 2 0
4 Ponto de tangência sobre eixo — 2 0 5 No correto — 2 0
5 Círculo = modelo D1 3 0 6 Eixo horizontal: S – S3 C 3 0
6 Quadrado = modelo D2 3 0 7 S, S1, S2, S3 alinhados B 3 0
0 8 S-S1, S1-S2, S2-S3 eqüidistantes B 3 0
9 Simetria — 3 0
1

Item Modelo II Guia NE NO Item Modelo V Guia NE NO


1 No correto de colunas (10) — 2 0 1a Hexágono A correto, vertical — 2
2 Ausência de contato dos círculos — 1 0 1b Hexágono A: 1 só ângulo mal — 1 0
3 Inclinação para a esquerda B 2 2 2a Hexágono B correto — 3
4 Paralelismo das colunas B 3 0 2b Hexágono B: 1 só ângulo mal — 1 0
5 Inclinação eixo 0 a 5o 2 0 3 Orientação correta de A e B C 2 0
6 Alinhamento círc. linha superior B 1 0 4a Secância correta — 3
7 Alinhamento círc. linha inferior B 2 0 4b Alguma secância — 2 2
8 Comprimento 8-14 cm B 3 0 5 Hexágono A = modelo F 3 0
2 6 Hexágono B = modelo F 3 0
2

Item Modelo III Guia NE NO Modelo Escore


1 2 ângulos corretos (90º) A 3 0 I 1
2 Mesmo nível de parada — 1 0 II 2
3 Curva correta — 1 0 III 1
4 Ganchos corretos — 1 1 IV 1
5 Localização curva entre med. — 1 0 V 2
6a Ponto de tangência correto — 2 Total 7
6b Alguma tangência — 1 0
7 Quadrado = modelo E 3 01

Interpretação Idade (anos) Meninos Meninas


Atraso no desenvolvimento grafoperceptivo. Q1 Med. Q3 Q1 Med. Q3
Sinais sugestivos de desorganização espacial. 6 17,0 22,5 27,5 12,5 20,0 26,5
7 29,0 34,5 40,0 24,5 32,0 36,0
8 33,0 40,0 48,0 32,5 36,5 43,0
9 41,0 48,5 55,5 41,0 45,0 50,0
10 47,5 52,0 58,0 47,0 53,0 59,5
12 52,0 58,0 61,0 56,0 61,0 67,0
14 56,0 62,0 67,0 57,0 63,0 67,0
Fonte: Santucci & Percheux, 1968, p.29.

Psicólogo:_________________________________________________________

PSICODIAGNÓSTICO – V 305
dos mostraram (ou demonstraram) correla-
ção satisfatória com o TMP (Teste Metropoli-
tano de Prontidão), e os dados normativos
apresentados basearam-se em uma amostra
de 1.104 alunos de escolas de estados do les-
te e meio-oeste dos Estados Unidos (Koppitz,
1971, p.28).
As instruções são simples: “Aqui tenho nove
cartões com desenhos para que você copie. Aqui
está o primeiro. Faça um igual a este” (p.36). O
manual inclui também orientação sobre como
responder a perguntas ou resolver outras difi-
culdades, durante a testagem. Não orienta sobre
a posição do papel, quando é apresentado. Po-
rém, como na grande maioria dos exemplos in-
cluídos a orientação é vertical, pressupõe-se que
esta seja a posição usual de apresentação.
Conforme Koppitz, existem quatro catego-
rias de desvios, que podem ser computados
como presentes ou ausentes ou, em termos de
escore, como um ou zero, sendo que cada des-
vio só pode ser considerado como tal se está
nítido. As categorias são as seguintes:
Distorção de forma: Esta categoria diz res-
peito aos aspectos formais: pontos, linhas re-
tas, linhas curvas e ângulos.
Existe distorção da forma quando os as-
pectos formais do estímulo são reproduzidos
sem razoável precisão, sem conservar pon- Figura 19.2 Exemplos de distorção da forma, segundo
tos, linhas retas, linhas curvas e ângulos Koppitz.
como tais, isto é, quando são substituídos
(por exemplo, 5 ou mais círculos por pon-
tos), omitidos ou multiplicados (ângulos) ou
partes (com separação de mais de 3 mm),
deformados exageradamente ou quando há per-
omissão, acréscimo ou substituição de elemen-
da de sua proporção relativa (eixo de = ½ do
tos componentes, seja por perda da posição
outro). Verifica-se distorção da forma nos itens:
relativa ou modificação grosseira do aspecto
1a, 1b (Figura A); 4 (Figura 1); 10 (Figura 3); 15
estrutural do estímulo. Verifica-se desintegra-
(Figura 5); 18a, 18b (Figura 6); 21a, 21b (Figura
ção nos itens: 3 (Figura A); 8 (Figura 2); 12a e
7) e 24 (Figura 8) de Koppitz, ou nos de 1 a 10 da
12b (Figura 3); 14 (Figura 4); 17a e 17b (Figura
Folha de Registro. Vide exemplos na Figura 19.2.
5); 19 (Figura 6); 23 (Figura 7) de Koppitz, ou
Desintegração*: Esta categoria diz respei-
nos números de 11 a 19 da Folha de Registro.
to à configuração total ou partes componen-
Vide exemplos na Figura 19.3.
tes (subpartes).
Rotação: Esta categoria diz respeito à orien-
Existe desintegração quando há perda da
tação no espaço.
configuração, seja por fracasso na união das
Existe rotação quando há uma variação
no eixo da figura ou de parte da mesma em
*N. da A. No livro consultado de Koppitz (1971), a de- 45º ou mais, inclusive quando resulta de có-
nominação usada é integração. Usamos desintegração pia correta, após rotação do cartão (a rota-
por motivos óbvios. ção da folha não se computa). Verifica-se

306 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 19.3 Exemplos de desintegração, segundo Ko- Figura 19.4 Exemplos de rotação, segundo Koppitz.
ppitz.

rotação em todos os desenhos, com exceção da Escore e interpretação da Escala de


Figura 6, isto é, nos itens 2, 5, 7, 11, 13, 16, 22 Maturação
e 25 de Koppitz, ou nos de 20 a 27 da Folha
de Registro. Vide exemplos na Figura 19.4. A partir das categorias recém-relacionadas aci-
Perseveração: Esta categoria se refere ao ma, preparamos uma Folha de Registro que é
número de unidades. aqui incluída. Computa-se cada item como pre-
Existe perseveração quando há um aumen- sente ou ausente, ou com um ou zero, respec-
to no número de elementos formais (pontos, tivamente. A correção por categoria e não por
colunas, curvas), em comparação com o dese- figura, como faz Koppitz, parece-nos que faci-
nho-estímulo. lita a tarefa, porque, ao avaliar rotação, por
Verifica-se a perseveração na Figura 19.1 (au- exemplo, já se faz a inspeção de todo o proto-
mento de 3 ou mais), na Figura 19.2 (aumento colo, com exceção da Figura 19.6, medindo as
de 4 ou mais) e na Figura 19.6 (aumento de 2 ou que parecem apresentar o desvio.
mais curvas sinusoidais completas), isto é, nos Após a inspeção dos desenhos e a atribui-
itens: 1, 9 e 2 de Koppitz ou nos de 28 a 30 da ção de escores, estes são somados. A seguir,
Folha de Registro. Vide exemplos na Figura 19.5. deve ser consultada a tabela. No Quadro 19.5,

PSICODIAGNÓSTICO – V 307
QUADRO 19.5 Distribuição de médias e desvios
padrão na Escala de Maturação, segundo a idade,
conforme Koppitz (N = 1.104)
Idade M DP +/– DP
5-0 a 5-5 13,6 3,61 10,0 a 17,2
5-6 a 5-11 9,8 3,72 6,1 a 13,5
6-0 a 6-5 8,4 4,12 4,3 a 12,5
6-6 a 6-11 6,4 3,76 2,6 a 10,2
7-0 a 7-5 4,8 3,61 1,2 a 8,4
7-6 a 7-11 4,7 3,34 1,4 a 8,0
8-0 a 8-5 3,7 3,60 0,1 a 7,3
8-6 a 8-11 2,5 3,03 0,0 a 5,5
9-0 a 9-5 1,7 1,76 0,0 a 3,5
9-6 a 9-11 1,6 1,69 0,0 a 3,3
10-0 a 10-5 1,6 1,67 0,0 a 3,3
10-6 a 10-11 1,5 2,10 0,0 a 3,6
Fonte: Koppitz, 1971, p.231.

QUADRO 19.6 Distribuição de médias e desvios-


padrão na Escala de Maturação, segundo a idade,
conforme Kroeff (N = 1.082)
Idade M DP +/– DP
5-0 a 5-5 11,8 3,32 8,48 a 15,12
5-6 a 5-11 10,7 3,87 6,83 a 14,57
6-0 a 6-5 9,5 3,90 5,60 a 13,40
6-6 a 6-11 7,1 4,04 3,06 a 11,14
7-0 a 7-5 6,3 3,76 2,64 a 10,16
7-6 a 7-11 6,0 4,14 1,86 a 10,14
8-0 a 8-5 4,8 3,57 1,23 a 8,37
8-6 a 8-11 4,2 2,75 1,45 a 6,95
9-0 a 9-5 3,8 3,24 0,56 a 7,04
Figura 19.5 Exemplos de perseveração, segundo Ko- 9-6 a 9-11 3,4 2,84 0,56 a 6,24
ppitz. 10-0 a 10-5 3,1 2,86 0,24 a 5,96
10-6 a 10-11 2,7 2,41 0,29 a 5,11
Fonte: Kroeff, 1988, p.12 (dados resumidos e publicados com
temos uma tabela de médias e desvios padrão autorização do autor).
organizada por Koppitz. Tais normas são ame-
ricanas. Como o processo de maturação é pre-
dominantemente do desenvolvimento neuro- cio mais tardio dessa no sistema educacional
psicológico e, portanto, possivelmente livre de brasileiro. Assim, parece recomendável a utili-
influências culturais, pareceria confiável utili- zação da tabela brasileira e não da americana,
zá-la. Porém, no Quadro 19.6, são apresenta- embora seja aconselhável ampliar as pesqui-
das médias e desvios padrão de crianças brasi- sas em grupos mais diversificados do país.
leiras, a partir de uma amostra de 1.082 sujei- Mas voltemos à utilização da tabela. Para
tos, de um estudo desenvolvido por Kroeff melhor interpretar os dados, os leitores devem
(1988). A partir de tais resultados, observa-se se reportar à noção de curva normal (vide Ca-
que, exceto no primeiro grupo etário, o núme- pítulo 14 sobre Avaliação psicométrica, nesta
ro de pontos é mais baixo entre as crianças edição). Aqui basta recordar que “a área total
brasileiras, sugerindo “uma maturidade menor sob a curva representa o número total de es-
que as crianças norte-americanas” (p.15), que cores na distribuição” (Psychological Corpora-
o autor atribui à possibilidade de menor esti- tion, 1955, p.7). Tomemos um exemplo da ta-
mulação na área perceptomotora ou talvez iní- bela, de Koppitz, de 5-0 a 5-5. A partir da mé-

308 JUREMA ALCIDES CUNHA


dia, 13,6, supondo que se trate de uma distri- referida representam variações dentro da mé-
buição normal, a zona compreendida entre dia. Então, a zona compreendida por 13,6 ±
mais e menos um desvio padrão abrange 3,61, ou melhor, os escores entre 10,0 e 17,2
68,26% dos escores nessa faixa etária (vide Fi- estão dentro de limites médios. Portanto, se
gura 19.6). O desvio padrão é um índice de uma criança, nessa faixa etária, tem um escore
variabilidade, e os escores que recaem na zona total de 18 ou 19, por exemplo, seu escore ul-

ESCALA DE MATURAÇÃO DE KOPPITZ


FOLHA DE REGISTRO DE J. A. CUNHA

Identificação: Idade: Data:


Categoria Item Especificação Fig. Escore
1. Distorção da forma 1 Achatamento do eixo 1:2 (A) ou deformação excessiva A
2 (A,7,8) ou adição ou omissão de ângulos 7
3 8
4 Desproporção 1:2 nas subpartes A
5 7
6 5 ou mais círculos por pontos 1
7 3
8 5
9 3 ângulos por curvas 6
10 Ausência de curvas em uma linha ou em ambas 6
2. Desintegração 11 Separação > 3 mm (A,4) ou curva tocando os 2 vértices A
12 4
13 Adição ou omissão de fil. ou Fig. 1. como fil. sup. ou 2
4 ou mais círculos na maioria dos fil.
14 Aglomerado ou uma só fil. de pontos ou sem aumento 3
de pontos em cada nova fil. ou cabeça de flecha
irreconhecível ou invertida
15 Linha contínua por fil. de pontos (3), pelo arco ou 3
16 extensão (5) 5
17 Aglomerado; reta ou círculo de pontos pelo arco; 5
extensão atravessando arco
18 Sem cruzamentos ou mau cruzamento; duas linhas 6
onduladas entrelaçadas
19 Sem superposição ou superposição exagerada 7
3. Rotação 20 Rotação do eixo > 45º na figura (A,1,2,3,8) na figura A
21 ou parte (4,5,7) 1
22 2
23 3
24 4
25 5
26 7
27 8
4. Perseveração 28 > 15 unidades na 1 1
29 > 14 unidades na 2 2
30 > 6 unidades na 6 6
Soma

PSICODIAGNÓSTICO – V 309
Não obstante, quando foi considerado o
tipo de escola freqüentada – pública ou priva-
34,13% 34,13% da –, foi possível observar que, aparentemen-
te, as normas são diferentes, conforme os da-
-3,61 +3,61 dos do Quadro 19.8.
Por outro lado, levando adiante os seus es-
10,0 13,6 17,2 tudos, Kroeff observou que, em cada nível de
Figura 19.6 Distribuição da média e desvios padrão para escolaridade, a média de idade de crianças de
a idade de 5-0 a 5-5, na Escala de Maturação, confor- escolas públicas tende a ser maior que a de
me a Tabela de Koppitz. crianças das escolas privadas, embora apresen-
tem pior desempenho perceptomotor do que
estas, conforme os dados dos Quadros 19.9 e
trapassa o desvio admitido para limites nor- 19.10.
mais, o que significa que a sua percepção viso-
motora é imatura para a sua idade. Natural-
mente, quanto mais desvios padrão se afasta-
rem da média, mais sério será o déficit na per- QUADRO 19.8 Distribuição de médias e desvios
padrão na Escala de Maturação, de crianças de
cepção visomotora. Dizemos que essa criança escolas públicas e privadas, segundo a idade,
está a mais de um desvio padrão abaixo da conforme Kroeff (N = 1.082)
média, correspondente à sua idade. Se o seu
Escolas públicas Escolas privadas
escore total fosse de 8, estaria a mais de um Idade
desvio padrão acima da média para a sua faixa M DP M DP
etária, e seu nível de maturação corresponde- 5-0 a 5-5 12,1 3,3 11,7 3,4
ria à faixa etária de 6-0 a 6-5, porque a média 5-6 a 5-11 12,2 4,1 9,8 3,5
6-0 a 6-5 10,6 3,9 8,0 3,2
deste grupo é de 8,4.
6-6 a 6-11 7,4 4,2 6,4 3,7
A exemplo de Koppitz, Kroeff (1992) pro- 7-0 a 7-5 7,0 4,0 5,1 3,0
curou analisar o desempenho perceptomotor 7-6 a 7-11 6,3 4,0 5,3 4,6
das crianças, conforme o nível da escolarida- 8-0 a 8-5 5,5 3,7 3,8 3,2
de, uma vez que o Bender “é reconhecido como 8-6 a 8-11 4,8 2,7 3,1 2,6
9-0 a 9-5 4,2 3,4 3,1 2,9
válido para predizer o aproveitamento nos pri-
9-6 a 9-11 4,0 3,0 2,6 2,4
meiros anos escolares” (p.827). No Quadro 10-0 a 10-5 3,2 3,1 2,4 1,7
19.7, é apresentada a distribuição das médias 10-6 a 10-11 3,1 2,7 2,0 1,6
e desvios padrão, segundo o nível de escolari- Fonte: Kroeff, 1982, p.828 (dados resumidos e publicados com
dade, sendo incluída também a idade média autorização do autor).
das crianças de cada nível.

QUADRO 19.9 Distribuição de médias e desvios


QUADRO 19.7 Distribuição de médias e desvios padrão na Escala de Maturação, de crianças de
padrão na Escala de Maturação, segundo o nível escolas públicas, segundo o nível de escolaridade
de escolaridade, conforme Kroeff (N = 1.082) e idade média, conforme Kroeff (N = 651)
Nível de escolaridade Idade média Média DP Nível de escolaridade Idade média Média DP
Jardim A 5-2 12,2 3,4 Jardim A 5-6 13,2 3,6
Jardim B 6-1 9,8 4,2 Jardim B 6-3 19,3 4,5
1a série 7-4 6,7 3,8 1ª série 7-6 6,9 3,8
2a série 8-5 4,3 3,1 2ª série 8-6 4,8 3,1
3a série 9-5 3,5 3,0 3ª série 9-7 3,8 3,1
4a série 10-1 2,8 2,5 4ª série 10-3 2,9 2,6
5a série 10-8 2,2 1,7 5ª série 10-8 2,1 5,1
Fonte: Kroeff, 1982, p.828 (dados resumidos e publicados com Fonte: Kroeff, 1982, p.828 (dados resumidos e publicados com
autorização do autor). autorização do autor).

310 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 19.10 Distribuição de médias e desvios F ig ur a A F ig u r a 1 F ig ur a 2 F ig u r a 3 F ig u r a 4 F ig ur a 5 F ig u r a 6 F ig ur a 7 F ig ur a 8

padrão na Escala de Maturação, de crianças de


escolas privadas, segundo o nível de escolaridade A du lt os
1 0 0% 23 % 10 0% 1 0 0% 1 0 0% 10 0 % 10 0% 1 0 0% 10 0%

e idade média, conforme Kroeff (N = 431)


95 % 99 % 65 % 60 % 95 % 90 % 70 % 75 % 90 %
Nível de escolaridade Idade média Média DP
Jardim A 5-1 11,9 3,3 90 % 90 % 60 % 60 % 80 % 80 % 60 % 90 % 90 %

Jardim B 5-11 9,2 3,6


1ª série 7-0 6,4 3,8 80 % 73 % 60 % 70 % 80 % 70 % 80 % 65 % 70 %
9 an os
2ª série 8-2 3,5 2,8
3ª série 9-0 2,9 2,8 75 % 75 % 75 % 60 % 80 % 65 % 70 % 65 % 65 %

4ª série 9-9 2,4 2,2 8 an os

5ª série 10-7 2,2 1,6 75 % 75 % 70 % 60 % 75 % 65 % 60 % 65 % 60 %


7 an os
Fonte: Kroeff, 1982, p.828 (dados resumidos e publicados com
autorização do autor). 75 % 75 % 60 % 1 0 0% 80 % 75 % 60 % 60 % 75 %
6 an os

85 % 85 % 60 % 80 % 70 % 60 % 60 % 60 % 75 %
5 a no s
Kroeff (1992), a partir desses estudos, dis-
cute a importância de se utilizar normas dife- 90 % 85 % 75 % 80 % 10 % 60 % 65 % 1 0 0% 10 0%
4 a no s
renciadas, quando se quer avaliar a maturida-
de perceptomotora infantil. Entretanto, cha- 3 a no s G ar atuja

ma a atenção para o fato de que “as crianças


das escolas privadas são menos discrepantes Fonte: Bender, apud Clawson, 1980, p.90.
entre si, tanto na maturidade perceptomotora Figura 19.7 Quadro-resumo de tipos de respostas de
como na idade cronológica” (p.827) do que as crianças, conforme a faixa etária. Reproduzida com
crianças de escolas públicas. Atribui essas di- autorização.
ferenças à diversidade do nível socioeconômi-
co familiar dessas últimas.

Como se trata de um teste que envolve per-


Desvios no Bender relacionados com cepção e coordenação neuromuscular, pressu-
transtornos no desenvolvimento põe-se que “dependa de certas áreas intactas
neuropsicológico (estudos de Cunha, de integração cortical, para sua execução sa-
Brizolara, Fulgêncio et alii, 1991) tisfatória” (Clawson, 1980, p.66).
Todavia, como Clawson salienta, “não exis-
Já por ocasião da divulgação de sua monogra- te uma entidade única de lesão cerebral” (p.66),
fia sobre o B-G, em 1932, Lauretta Bender afir- há vários graus e tipos de comprometimento,
mava: “A cópia dessas figuras, por crianças, além de existirem outros fatores individuais que
constitui um teste que permite estabelecer o concorrem para dificultar um diagnóstico re-
nível de maturação infantil da função gestálti- ferencial, a partir de um teste psicológico. A
ca visomotora” (Bender, 1955, p.150). Após a par dessas considerações, podem-se levantar
padronização do teste, em uma amostra de 800 algumas questões de conhecimento do psicó-
crianças de 3 a 11 anos, organizou um qua- logo que lida com o Bender:
dro-resumo de tipos de respostas, conforme a a) Os autores que tratam do assunto rara-
faixa etária, que é aqui representado na Figura mente apresentam definições operacionais das
19.7. Esse foi o ponto de partida para nume- variáveis em estudo, de maneira que apresen-
rosas pesquisas posteriores, que procuraram tam indícios, sinais, desvios ou indicadores de
não só estabelecer critérios mais objetivos para “patologia orgânica”, de “alterações do SNC”
a avaliação da maturação, como a escala de ou de “lesão cerebral”, etc., sem que o psicó-
Koppitz, que acabamos de examinar, da mes- logo saiba com certeza a que estão se referin-
ma forma que para identificar sinais, desvios do, já que não existe unanimidade prática
ou indicadores de patologia orgânica cerebral. quanto a essa terminologia.

PSICODIAGNÓSTICO – V 311
QUADRO 19.11 Escala de Maturação e indicadores de patologia cerebral, segundo Koppitz
Fig. No Item
1 Distorção da forma 1a. deformação; achatamento; eixo 1:2; omissão 1a
ou adição de ângulos (S)
A 1b. desproporção 1:2 (S7) 1b
2 Rotação (S) 2
3 Integração (S) 3
4 Distorção da forma: 5 ou mais círculos por pontos 4
1 5 Rotação (A, S) 5
6 Perseveração: mais de 15 pontos (AS 8) 6
7 Rotação (S9) 7
omissão ou adição de fileira(s) (S7); Fig. 1
2 8 Integração como fileira da Fig. 2; 4 ou mais círculos na
maioria das colunas; adição de uma fileira 8
9 Perseveração: mais de 14 círculos numa fileira (AS 8) 9
10 Distorção da forma: 5 ou mais círculos por pontos (S7) 10
11 Rotação (S8) 11
desintegração: sem aumento de pts. em cada
3 fileira sucessiva
12 Integração 12a. cabeça de flecha irreconhecível ou invertida; (S6) 12a
aglomerado ou uma só fileira de pontos
12b. linha contínua por fileira de pontos (AS) 12b
13 Rotação parcial ou total (AS) 13
4 14 Integração: separação de 5 mm ou curva tocando os dois ângulos (s) 14
15 Distorção da forma: 5 ou mais círculos por pontos (S9) 15
16 Rotação parcial ou total (S) 16
5 17a. desintegração; aglomerado; reta ou círculo de
17 Integração pontos por arco; extensão atravessando arco 17a
17b. linha contínua no arco ou na extensão (AS) 17b
18 Distorção da forma 18a. 3 ou mais ângulos por curvas (S) 18a
6 18b. sem curvas em uma ou em ambas as linhas (AS) 18b
19 Integração: sem cruzamento ou com mau cruzamento: duas linhas onduladas entrelaçadas (S) 19
20 Perseveração: 6 ou mais curvas sinusoidais em qualquer direção (AS8) 20
21 Distorção da forma 21a. desproporção de 2:1 (S8) 21a
21b. deformação excessiva;
7 adição ou omissão de ângulos (S) 21b
22 Rotação (S7) 22
23 Integração: sem superposição ou superposição exagerada (S7) 23
24 Distorção da forma deformação excessiva 24
8 adição ou omissão de ângulos (S)
25 Rotação 25
Total
Fonte: Koppitz, 1971 (adaptação).

b) Há excelentes autores, como Clawson c) Às vezes, há informações sobre amostra-


(1980), que apresentam desvios no Bender que gem e, mesmo, sobre o procedimento estatís-
podem fundamentar “uma hipótese de que a tico utilizado, como no caso da Escala de Kop-
criança em questão tem um transtorno do sis- pitz (Koppitz, 1971). Além da Escala, essa au-
tema nervoso central” (p.66), porque diferen- tora apresenta “indicadores de lesão cerebral”,
ciam significativamente grupos com e sem tal classificados como significativos ou altamente
patologia. significativos em todas ou em algumas faixas

312 JUREMA ALCIDES CUNHA


etárias, que se encontram identificados por S A administração do Bender foi feita confor-
ou AS, eventualmente seguidos pela idade, em me as instruções de Koppitz, sendo utilizados
que passam a ter significância, no Quadro os mesmos protocolos para a avaliação segun-
19.11. Entretanto, esses dados, colhidos de seu do Clawson e Koppitz.
livro (p.232-233), mostram algumas divergên- Para o estudo dos itens individuais de am-
cias com os resultados significantes ou não do bos os métodos, foi utilizado o qui-quadrado;
qui-quadrado, apresentados em quadro cons- para o estudo da diferença entre os dois gru-
tante da mesma obra. pos, usou-se a prova U de Mann-Whitney. Para
d) Embora autores como Hutt (1975) con- o estudo adicional do número de desvios com
siderem que o Bender, como teste percepto- significação diagnóstica, foi aplicado o teste
motriz, está bastante desvinculado da experiên- de diferença de proporções. As conclusões fo-
cia cultural, acabamos de discutir, no item an- ram as seguintes:
terior, resultados de pesquisas sobre a Escala a) Os oito desvios Clawson (vide Quadro
de Maturação que sugerem diferenças nas 19.12) podem ser usados como indícios diag-
crianças brasileiras. Fica-se, portanto, com dú- nósticos na triagem de transtornos do desen-
vidas sobre a propriedade de utilizar “sinais volvimento neuropsicológico, sendo recomen-
significativos”, identificados num meio socio- dável manter a exigência da presença de 4 ou
cultural diferente, mesmo que meramente com mais desvios, para se formular uma hipótese
objetivo de triagem. nesse sentido, dos 8 aos 12 anos de idade.
A grande maioria de crianças com proble- b) Dos 23 desvios Koppitz considerados, por
mas de aprendizagem que são encaminhadas serem os que apresentavam um nível de signi-
ao psicólogo para diagnóstico não se caracte- ficância igual ou maior que 5%, sete não se
riza por transtornos neurológicos mais seve- mostraram presentes na amostra, e oito apre-
ros, ainda que apresente, muitas vezes, irregu- sentaram um nível de significância de 1% e são
laridades no desenvolvimento neuropsicológi- apresentados no Quadro 19.13, e, face aos re-
co. E ainda que tais casos sejam bastante passí-
veis de recuperação, esta fica muito depen-
dente do diagnóstico precoce e correto. Tam-
QUADRO 19.12 Desvios de Clawson altamente
bém, embora esta seja uma área multidisci-
significativos e sugestivos da presença de
plinar, a importância do manejo adequado transtornos no desenvolvimento
da testagem, em especial do Bender, é indis- neuropsicológico*
cutível. No Desvios Clawson Condições
Em conseqüência, desenvolvemos uma pes-
1 Simplificação num nível de Presença em 2 ou
quisa, pretendendo examinar se os critérios de
3 anos abaixo da IM mais figuras
Clawson, para identificar crianças “com inca- 2 Fragmentação Presença em 1 ou
pacidades orgânicas”, e os de Koppitz, os cha- mais figuras
mados “indicadores de patologia cerebral”, 3 Colisão de uma figura Presença
eram capazes de diferenciar crianças com e sem com outra ou com a borda
do papel
transtornos do desenvolvimento neuropsicoló-
4 Rotação de 90º ou mais Presença em 1 ou
gico. mais figuras
A pesquisa, melhor descrita noutro local 5 Número incorreto de Presença em 3 ou
(Cunha, Brizolara, Fulgêncio et alii, 1991, Ane- unidades mais figuras
xo 2), foi desenvolvida em uma amostra de 55 6 Perseveração de unidade Presença
figura a figura
crianças, de 8 a 12 anos, divididas em dois gru-
7 Qualidade da linha trêmula Presença
pos, com e sem alteração do ENE, mas equiva- 8 Vírgulas e/ou traços Presença em 2 ou
lentes quanto a nível socioeconômico, idade e mais figuras
sexo. Não foram incluídas crianças psicóticas, * A hipótese aplica-se somente após 8 anos, e é necessária a
pré-psicóticas ou que apresentassem retarda- presença de 4 ou mais desvios.
Fonte: Clawson, 1980; Cunha, Brizolara, Fulgêncio et alii, 1991
mento mental definido. (adaptado).

PSICODIAGNÓSTICO – V 313
sultados de um teste de diferença de propor- Nervoso Central, no desenvolvimento neuro-
ções, pode-se concluir que a ocorrência de psicológico, como por fatores emocionais. Des-
quatro ou mais desses desvios pode justificar sa maneira, ainda que o Bender costume ser
uma hipótese de transtorno no desenvolvimen- usado como recurso de triagem de déficit ce-
to neuropsicológico, dos 8 aos 12 anos de idade. rebral, há grande probabilidade de classifica-
ção errônea, tornando-se especialmente impor-
tante, além de um escore específico, um exa-
QUADRO 19.13 Desvios Koppitz altamente signifi- me cuidadoso do tipo de erros e da observa-
cativos e sugestivos da presença de transtornos no ção do comportamento apresentado durante
desenvolvimento neuropsicológico*
o desempenho, e a obtenção de informações
No Desvios Koppitz Figura adicionais.
1 Adição ou omissão de ângulos A A respeito, Groth-Marnat (1999) apresenta
2 Integração 3 uma lista de erros, baseado num estudo sobre
3 Integração 4 os indicadores de Koppitz, realizado por Taylor,
4 Rotação 4
5 Ângulos por curvas 6
Kaufman e Partenio, em 1984, lembrando que,
6 Perseveração 6 se existe a expectativa de que crianças de 5 a 8
7 Adição ou omissão de ângulos 7 anos cometam alguns desses erros, isto é raro
8 Adição ou omissão de ângulos 8 ou muito improvável após os 8 ou 9 anos, exi-
*A hipótese aplica-se somente após 8 anos, e é necessária a gindo-se a presença de, no mínimo, quatro das
presença de 4 ou mais desvios.
Fonte: Clawson, 1980; Cunha, Brizolara, Fulgêncio et alii, 1991
características do Quadro 19.14, para se levan-
(adaptado). tar uma hipótese de disfunção cerebral.

c) Apesar de tanto os desvios Clawson como BENDER NO ADOLESCENTE


os desvios Koppitz poderem ser usados como
indícios na triagem de transtornos no desen- Embora existam muitas pesquisas utilizando o
volvimento neuropsicológico, dentro dos cri- Bender em crianças e adultos, estudos siste-
térios referidos, não há superposição prática máticos com adolescentes têm sido muito es-
entre eles, sendo que a sua identificação se cassos, exceto pela existência de normas para
deve fundamentar rigorosamente nas normas a população adulta que se estendem até os 15
apresentadas pela autora adotada para a ava- anos de idade (Hain, 1964a, Hain, 1964b; Pas-
liação. cal & Suttell, 1951).

A hipótese de disfunção cerebral a partir Indicadores emocionais de Koppitz e a Es-


dos indicadores de Koppitz cala de Psicopatologia de Hutt

Ao se avaliar um Bender, para triagem de dis- Conforme Belter e colegas (1989), Koppitz não
função cerebral, na realidade, julga-se o grau considerava que o somatório de seus indica-
da precisão na reprodução dos desenhos, bem dores emocionais constituísse um “escore sig-
como da integração global da figura (Groth- nificativo”, mas afirmava que “a presença de
Marnat, 1999). Portanto, levantam-se hipóte- três indicadores emocionais ou mais, num pro-
ses que têm que ver com o funcionamento vi- tocolo, é fortemente indicativa de dificuldades
soperceptivo e construcional. Conseqüente- emocionais” (p.416). Não obstante, decidiram
mente, a hipótese de disfunção cerebral en- pesquisar em adolescentes como se compor-
contra apoio numa primeira hipótese de que tavam os indicadores emocionais propostos por
existe um déficit numa função cognitiva. To- Koppitz, em 1975, para crianças.
davia, dificuldades na realização da tarefa po- A amostra foi constituída por um grupo de
dem ocorrer não só por problemas no Sistema 150 adolescentes normais, 140 adolescentes

314 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 19.14 Características importantes em Os autores concluem que, como instru-
crianças, após 8 ou 9 anos, segundo Taylor, mento projetivo, o Bender apresenta limita-
Kaufman e Partenio, para basear a hipótese de
disfunção cerebral (critério: presença mínima de 4)
ções em seu uso com adolescentes, exceto
no que se refere aos indicadores emocionais,
No Características Condições
mas “somente como um componente de uma
1 Simplificação num nível de Presença em 2 ou bateria de métodos de avaliação psicológi-
3 ou mais anos abaixo da mais figuras ca” (p.422).
idade cronológica
2 Colisão de uma figura com Presença
outra ou com a borda do
papel Indicadores de atuação de McCormick e
3 Fragmentação Presença em 1 ou Brannigan
mais figuras
4 Rotação de 90º ou mais Presença em 1 ou
mais figuras
Vários autores, como Brown, Hutt e Koppitz,
5 Número incorreto de Presença em 3 ou McCormick e Brannigan, em 1984 (apud Gro-
unidades mais figuras th-Marnat, 1999), elaboraram uma lista de in-
6 Perseveração de unidade Presença de um dicadores, com base nos quais seria possível
figura a figura tipo ou mais chegar a um escore de atuação na adolescên-
7 Qualidade da linha trêmula Presença
8 Linhas por pontos Presença
cia, incluindo os seguintes sinais:
9 Linha reta por curva Presença • “Figuras espalhadas na página
Fonte: Groth-Marnat, 1999, p.563 (adaptado).
• Aumento progressivo no tamanho das fi-
guras
• Aumento global no tamanho das figuras
• Colisões
• Riscos por pontos ou círculos
com perturbação emocional e 47 adolescentes • Círculos por pontos
com perturbação emocional e diagnóstico se- • Pontos por círculos
cundário de retardamento mental ou de com- • Linha excessivamente densa
prometimento cerebral. • Segunda tentativa
Atribuído escore para os 12 indicadores • Angulação aguda” (p.58)
emocionais nos protocolos Bender, os resulta-
dos demonstraram a presença de diferenças
apenas em alguns grupos de idade e a ausên- Bender como prova de maturidade
cia de correlação entre esses escores e o QI. A percepto-visomotora, segundo Koppitz
conclusão foi de que “a falta de um padrão
consistente de interação sugere que a soma Conforme comentários de McIntosh e colegas
dos indicadores emocionais não é um sinal (1988), Koppitz não estendeu seu sistema de
consistente de perturbação emocional em ado- escore além dos 12 anos, tendo dúvidas quan-
lescentes” (p.421). Por outro lado, a presença to à sua utilização na adolescência, porque a
de três sinais não foi considerada um critério sua expectativa era de que naquela idade se
indicativo de perturbação emocional. No en- completasse a maturação percepto-visomoto-
tanto, parece ter um caráter probabilístico, que ra. Não obstante, esses autores decidiram con-
deve ser melhor explorado. duzir uma investigação com sujeitos de 12 a
Da mesma forma, foram atribuídos escores 16 anos, sob a pressuposição de que a quali-
aos protocolos, conforme a severidade e/ou a dade dos desenhos melhorasse durante a ado-
freqüência da ocorrência dos 17 fatores da es- lescência, bem como a de que o Bender pu-
cala de psicopatologia de Hutt, melhor descri- desse diferenciar adolescentes normais de ado-
ta na seção sobre o Bender adulto. Os resulta- lescentes com perturbação emocional, com ou
dos indicaram a relação desses fatores com QI sem retardamento mental (QI < 70) ou com-
e idade, mas não com psicopatologia. prometimento neurológico.

PSICODIAGNÓSTICO – V 315
A amostra foi composta por 150 adolescen- 12 e 18 anos, não se mantenha tão evidente a
tes normais, 140 com perturbação emocional relação com idade, como anteriormente.
e 47 também com perturbação emocional e
diagnóstico secundário de retardamento men-
tal ou de comprometimento neurológico. O sistema Bender-Lacks
Os resultados demonstraram que os esco- (adaptação Hutt-Briskin)
res Koppitz tendiam a diminuir com a idade,
nos três grupos. Contudo, não se verificaram O sistema Bender-Lacks (melhor descrito na
diferenças entre o grupo normal e o grupo com seção sobre o Bender adulto) foi utilizado na
perturbação emocional, embora tenham sido mesma amostra do estudo anterior (McIntosh
encontradas diferenças entre os normais e o et alii, 1988). Os resultados indicaram a mes-
grupo com perturbação emocional e um diag- ma tendência de decréscimo dos escores com
nóstico secundário de retardamento ou com- o aumento da idade. O grupo com diagnósti-
prometimento neurológico. Os resultados são co secundário de retardamento mental ou de
apresentados no Quadro 19.15. comprometimento neurológico diferenciou-se
significativamente dos outros dois, que, não
obstante, não apresentaram diferenças entre
QUADRO 19.15 Médias e desvios padrão de si. As médias e os desvios padrão do grupo nor-
escores Koppitz em adolescentes normais e com
mal e do grupo com diagnóstico secundário
retardamento mental/comprometimento
neurológico, dos 12 aos 16 anos de retardamento mental ou de comprometi-
mento neurológico são apresentados no Qua-
Normais C/retardamento mental/
Idade dro 19.16, porém, convém salientar que o nú-
comprometimento neurológico
(anos) mero de sujeitos neste último grupo era relati-
M DP M D.P.
vamente pequeno.
12 3,50 2,84 5,13 3,04
13 1,83 1,49 5,63 4,75
14 1,27 1,76 6,63 4,57 QUADRO 19.16 Médias e desvios padrão de
15 1,27 1,39 3,25 2,59 escores Lacks em adolescentes normais e com
16 1,67 1,52 3,29 2,87 retardamento mental/comprometimento
Fonte: McIntosh e colegas, 1988, p.228 (dados resumidos).
neurológico, dos 12 aos 16 anos
Normais C/retardamento mental/
Idade comprometimento neurológico
(anos)
M DP M D.P.
Pesquisa de Shapiro e Simpson, de 1995,
12 2,67 1,49 4,87 2,58
referida por Groth-Marnat (1999), confirma os 13 2,43 1,43 5,63 2,26
resultados de McIntosh e colegas (1988), de- 14 2,30 1,44 5,00 2,51
monstrando que a escala de Koppitz pode ser 15 2,27 1,48 3,94 2,46
útil na adolescência, uma vez que os escores 16 2,17 1,29 3,57 1,72
diminuem progressivamente, embora, entre os Fonte: McIntosh e colegas, 1988, p.229 (dados resumidos).

316 JUREMA ALCIDES CUNHA


Bender no adulto
Jurema Alcides Cunha
20
O ENFOQUE PROJETIVO testagem (Billingslea, 1965), pela história clí-
nica ou por indícios do comportamento verbal
Regras básicas para a interpretação e não-verbal.
individual

As hipóteses interpretativas de caráter dinâmi- Pressupostos básicos


co não se aplicam quando:
a) existe baixa escolaridade e, conseqüen- 1. O protocolo, como um todo, fornece a im-
temente, escassa experiência com lápis e pa- pressão sobre o desempenho do sujeito (recur-
pel; sos de controle dos impulsos, manejo da an-
b) os desvios podem se associar, pelo me- siedade e da agressividade e método de
nos, com uma suspeita de disfunção cerebral abordagem dos problemas), e, assim, confor-
(existem indicadores idênticos); me Pascal e Suttell (1951), bom ajustamento
c) há possíveis irregularidades no desenvol- tende a se associar com uma impressão de coe-
vimento (retardamento mental, por exemplo); rência e de integração, enquanto mau ajusta-
d) existe déficit de visão. mento emocional se relaciona com má quali-
As hipóteses interpretativas aplicam-se dade.
quando: 2. O papel representa o microcosmo espa-
a) vários sinais concorrem para se chegar a cial do sujeito, e sua maneira de lidar com o
uma inferência, porque um sinal isolado, ain- mesmo pode refletir seu estilo de adaptação e
da que considerado significativo, é pouco váli- defesa em seu espaço vital, “que incluem po-
do (Hutt, 1975), sem confirmação; laridades como impulsividade-restrição, expan-
b) vários sinais concorrem para se chegar a são-constrição, plasticidade-rigidez e compla-
uma inferência, para a qual não haja, no pro- cência-oposição” (Brown, 1967, p352), ou, em
tocolo, uma evidência contraditória (Billings- outras palavras, a abordagem do sujeito é a
lea, 1965); mesma que “assume diante de seu mundo”
c) podem ser considerados por seu caráter (Groth-Marnat, 1984, p.94).
probabilístico (Brown, 1967), já que dificilmen- 3. Alguns significados simbólicos são qua-
te se apresentam com consistência interna, se universais (como círculo = figura feminina
devendo ser confirmados por outros dados da ou quadrado = figura masculina), mas outros

PSICODIAGNÓSTICO – V 317
resultam de investigações com grupos especí- Significados simbólicos das figuras
ficos, cujas características podem não ser idên- Bender, indicadores emocionais e algumas
ticas às do sujeito. Assim, é necessário exami- hipóteses interpretativas
nar a aplicabilidade para o indivíduo em ques-
tão (Hutt, 1975) ou investigar se está em jogo Tentaremos, a seguir, resumir dados de vários
material do sistema simbólico individual, o que autores, relativos aos significados simbólicos
pode ser feito na fase de associação. das figuras, no Quadro 20-1. As referências

QUADRO 20.1 Significado simbólico das figuras Bender e algumas hipóteses interpretativas
de alguns autores
Fig. Significação simbólica Foco de interesse Hipóteses interpretativas
A Relações interpessoais e Desequilíbrio e assimetria; A produção reflete potencialidades de integração dos
heterossexuais (B1); ponto de contato (S & K). elementos de “conflito” ou desarmonia da personalida-
dependência (G & I); de (p. ex.: falta de contato ou penetração de uma figura
conflito e falta da na outra = dificuldade na integração de elementos
harmonia (S & K). desarmônicos da personalidade (S & K).
Círculo = figura O aspecto tangencial (i.é., fatores de união e
feminina (H & B); fechamento) pode refletir dificuldades em catexias
objeto feminino (H2). interpessoais (H2).
Quadrado = figura O aumento relativo de uma das subpartes pode denotar
masculina (H & B); problemas na autopercepção (H1).
objeto masculino (H2). Dificuldade na reprodução da figura curva =
dificuldade na expressão de impulsos agressivos (H1).
Dificuldades na reprodução da figura reta =
dificuldades em relação à passividade (H1).
1 Agressividade e tensão Falta de regularidade na Reflete a atitude e o sentimento em relação à
(B1); perseveração, distância e imperfeição da regularidade, sistematização e importância do detalhe
repetitividade, figura total (S & K). Falta de (p. ex.: a reprodução cuidadosa e compulsiva =
importância do detalhe limites bem definidos. conformidade com regras e regulamentos) (S & K).
pequeno (S & K). Linha de pontos como um arco = egocentrismo (H).
Linha com pontos iniciais; depois círculos e formas “Z”
finais = progressiva debilidade dos controles (B2).
2 Relações interpessoais Regularidade e ordem Reflete a boa vontade para atender à ordem imposta
(G & I); para o sexo completa do padrão e a externamente (S & K).
feminino, ordem no irregularidade no detalhe É difícil para indivíduos com conflitos interpessoais (H & B).
ambiente (S & K); para os (S & K). Redução na angulação = redução da afetividade (H1).
homens, imposição de Abertura da figura, sem Aumento na angulação = aumento da afetividade (H1).
ordem nas pessoas por indicação de limites (H1). Figura como um arco = egocentrismo (H1).
autoridade (S & K).
Linha central = humor
em relação com fatores
de controle (B1).
3 Agressividade (H & B); Movimento, direção de Reflete a atitude frente à expressão dos próprios
agressividade e auto- movimento, arranjo ou sentimentos e impulsos instintivos (p.ex.: redução do
afirmação (B2); padrão, aumento da linha tamanho, aumento do ângulo à direita e/ou
agressividade (ameaça-, de pontos (S & K). preocupação maior com o detalhe do que com a forma
dora) (H2). Abertura da figura (H). da figura = medo da expressão emocional (S& K).
Compressão da figura ou Simplificação da figura = regressão (H1).
destruição da Gestalt (H2). Pequenas rotações = depressão (H1).
Pontos como círculos e expansão da Gestalt =
probabilidade de fracasso no controle dos impulsos (B2).

318 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 20.1 Continuação
Fig. Significação simbólica Foco de interesse Hipóteses interpretativas

4 Relações que envolvem Imperfeição, discordância, Reflete a atitude característica em relação às


oralidade (B1); implicações falta de equilíbrio físico e incongruências e ambivalências em si mesmo e em sua
orais-receptivas (B2); no ponto de contato vida emocional (p. ex.: dificuldade na reprodução,
interação entre o sexo (S & K). repassamento, esboço nas linhas, relacionar de forma
masculino e feminino precisa as partes = presença de incongruências internas
(H & B); desequilíbrio, é fonte de ansiedade) (S & K).
falta de integração e Achatamento da curva = achatamento emocional (H1).
perfeição (S & K). Fragmentação das subpartes = deterioração do ego, em
Quadrado = objeto estados depressivos (H1).
masculino (H1). Dificuldades na execução de uma das subpartes em
Curva = objeto relação à outra = problemas de identificação sexual
feminino (H1). (comparar com A) (H1).
Curva = peito; figura Falha na integração + anelos simbióticos (favorecendo,
completa = desejo em alguns casos, solução suicida) (B2).
hipotético de reunião Acréscimo de mais uma volta na parte curva = mau
com a figura materna, controle emocional, impulsividade (H2).
em nível psicossexual Dificuldades com lados verticais = dificuldades com
muito precoce, figuras de autoridade (H2).
representando
possivelmente regressão a
um plano de vida intra-
uterina (B2).
5 Vínculos orais (B1); Para os homens, a extensão; Reflete a atitude frente à identificação sexual básica
sexualidade genital para as mulheres, o espaço (p. ex.: ênfase na extensão = valorização da
(S & K); figura de “mãe fechado (S & K). masculinidade) (S & K).
substituta” (H & B); Parte curva como círculo completo = insegurança e
dependência (G & I). dependência (H2).
Secante = símbolo fálico
(H & B).
6 Afeto (B1); impulsos Movimento irregular, Reflete a atitude e o modo característico do indivíduo
instintivos primitivos ou contorcido e alterado e no em relação ao manejo dos impulsos instintivos
emoção, em sentido amplo cruzamento ou interseção primitivos ou de seus derivados (p. ex.: redução do
(S & K); emoção (H & B); das linhas (S & K). tamanho, da curvatura = atitude tímida e tendência ao
emocionalidade (H1). supercontrole; impulsos isolados ou intelectualizados
Interseção = relações (S & K).
interpessoais (H & B). Curvas com “Us” tangenciais = temor nas relações
Representação pictórica interpessoais (H1).
da emocionalidade (H2). Leve rotação no sentido do relógio, linhas leves
ondulantes = depressão (H1).
Elaboração da curva como um perfil de um rosto ou
inserção de um ponto, por olho = aspectos paranóides
(H1).
Aumento no tamanho das curvas e pressão da linha =
impulsividade (H2).
Linha ultrapassando o limite do papel = controle
emocional difícil, fuga de uma situação de tensão;
atuação (B2).
7 Relações com figuras de Complexidade, eficácia e Reflete o sentimento de poder do indivíduo, sua
autoridade (B1); relações imutabilidade da figura. capacidade de enfrentar e lidar com as situações
interpessoais (H & B); Sobreposição das figuras, complexas da vida (p. ex.: dificuldade na reprodução,
aspectos fálicos e às vezes, vista como uma manifesta no desenhar e redesenhar ou pela
agressivos, principalmente figura partida em duas simplificação da relação de superposição = sentimentos
para o sexo feminino (S & K). de impotência) (S & K).

PSICODIAGNÓSTICO – V 319
QUADRO 20.1 Continuação
Fig. Significação simbólica Foco de interesse Hipóteses interpretativas
(G & K), e homossexuais Figura inclinada parecendo empurrar a vertical, com a
(H2); complexidades impressão de que esta se inclina para a direita
intelectuais da vida, (particularmente com aumento da pressão da linha, no
forças imutáveis e, extremo superior da inclinada = potencial para a
ainda, agressão e atuação; atitude agressivamente exigente frente a
destruição (S & K); figuras de autoridade (B2). Dificuldades de fechamento,
relações interpessoais, de cruzamento, variações na qualidade da linha,
que incluem o pai e/ou dificuldade com ângulos = ansiedade e dificuldade nas
figuras masculinas em relações interpessoais (H1; H2).
posição de autoridade (B2). Separação ou simplificação das figuras = problemas
graves de superego ou transtornos sexuais (H1; H2).
Amenização das características fálicas da figura =
defesa contra a ameaça fálica (homossexualismo) (H).
8 Implicações fortes de Parte central da figura, cuja Reflete a atitude frente à sexualidade fálica (p. ex.:
sexualidade (parte da presença precisa ser desenhar, redesenhar, rasurar = atitude de tensão e
esquerda = anal, explicada ou racionalizada ansiedade frente à sexualidade fálica (S & K).
regressiva, imatura; e, ainda, a ambivalência de Dificuldades com os extremos da figura = conflito sobre
parte da direita: fálica, direção (dois pontos) e no homossexualidade ou masturbação (H1).
adaptativa, madura); fato de que a figura pode Dificuldades na reprodução do losango interno
concepção de si mesmo ser partida em duas (S & K). (diminuição, má colocação, dificuldade de fechamento
e lugar no mundo (B1); ou união) = conflito com o sexo feminino e temor na
sexualidade fálica; para os relação (comparar com A) (H1).
homens, algo desejável e Tamanho da figura o dobro das outras em direção
decorativo; para as vertical = atuação contra as figuras de autoridade (B2).
mulheres, algo agressivo Linhas ultrapassando o ponto de união = impulsividade
e poderoso (S & K); e indiferença pelas exigências de controle do meio (B2).
características sexuais,
particularmente fálicas (H).
Código: B1 = Brown, 1954, p.1-10; B2 = Brown, 1967, p.348-460; H1 = Hutt, 1975, p.153-163; H2 = Hutt, 1985, p.160-167; H & B = Hutt &
Briskin, apud Goldfried & Ingling, 1964, p.185-190; G & I = Goldfried & Ingling, 1964, p.185-190; S & K = Suczek & Klopfer, 1952, p.64-72.

utilizadas são identificadas por código, apre- dos com boa qualidade metodológica. Entre
sentado abaixo do Quadro. esses, destacam-se os indicadores já referi-
Indicadores como os de Hain, além do peso dos de atuação na adolescência e os indica-
que lhes foi atribuído na triagem da disfunção dores de impulsividade, identificados por
orgânico-cerebral, podem ser interpretados Oas, em 1984. Na pesquisa realizada, foram
com um sentido projetivo, de onde o cuidado controladas as variáveis QI, idade, capacida-
que se deve ter para excluir patologia neuroló- de para o desenho, organicidade e motiva-
gica, antes de considerá-los como indicadores ção. Os indicadores são apresentados no
emocionais. Groth-Marnat (1984) fez um le- Quadro 20.3.
vantamento desses e de outros indicadores, Como se pode ver pelo exame desses qua-
na literatura específica, relacionando a sua dros, observam-se diferenças entre as conclu-
possível interpretação. São apresentados, de sões dos vários autores, tendo em vista que
forma adaptada, no Quadro 20.2, com o deixamos de incluir, pelo menos, índices de sen-
acréscimo de outros dados, e, como no caso sibilidade fálica e reações a sentimentos de cas-
anterior, os autores citados são identificados tração de Hammer (1955), bem como muitas
por código. das hipóteses de Brown (1964) e Hutt (1975).
Na realidade, poucas hipóteses interpre- Acontece que, embora, em muitos casos, as
tativas encontram fundamentação em estu- conclusões sobre o significado simbólico te-

320 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 20.2 Indicadores emocionais, conforme compilação de Groth-Marnat
Indicador emocional Descrição
Perseveração Disposição rígida, cognitiva (H2; M), comum em personalidades compulsivas (H &
B); mau controle do ego e teste de realidade comprometido (H3); dificuldade de
planejamento e má concentração (M).
Rotação Grau severo de disfunção, possivelmente psicose (H & G); tendências oposicionis-
tas (H1); atenção má e capacidade limitada para aprendizagem nova (M).
Concretismo Estados regressivos (Ha); dificuldade de pensamento abstrato (H).
Acréscimo de ângulos Má coordenação visual-motora (H; M); insegurança e hesitação (Ha).
Superposição Insegurança e dúvida compulsiva (H3; H & G); potencial para a atuação agressiva
(B, H2).
Distorção Capacidade comprometida para abstrair e formar categorias, revelando perturba-
ção severa (H3).
Embelezamento Intensa preocupação com necessidades anteriores (Ha); intensa ansiedade e difi-
culdade de concentração (H & B).
Omissão Dificuldade de síntese e integração, perturbação em atos motores coordenados
(M); ruptura de funções do ego (H2).
Abreviação Possível negativismo e/ou baixa tolerância à frustração (H & B).
Falta de fechamento Ansiedade, hesitação, dúvida sobre si mesmo, com dificuldade de completar tare-
fas (H3); relações difíceis e provocadoras de ansiedade (H & G); comportamento
atuador agressivo (B).
Bosquejo Depressão, ansiedade, tensão e hesitação (C; H1).
Expansão Controle emocional insuficiente, impulsividade (Mu; B); atuação agressiva (Ha);
expansividade compensatória por causa de sentimentos de inadequação (H & B).
Redução no tamanho Sentimentos de inadequação, insegurança, tendência ao retraimento e constrição
emocional (H & B; Mu).
Arranjo rígido, metódico Rigidez e meticulosidade (H1); tentativa de criar um sentimento de segurança,
com sentimentos subjacentes de vulnerabilidade e inadequação (Ha).
Arranjo confuso, caótico Fortes sentimentos de ansiedade (H1); desorientação, má compreensão e julga-
mento comprometido (M).
Arranjo constrito, Depressão ou ansiedade (J; W & McG), com insegurança e sentimentos de inferio-
comprimido ridade (J; Mr & R).
Fonte: Groth-Marnat, 1984, p.110-111 (resumido e adaptado).
Código: B = Brown, 1965; C = Clawson, 1962; H & B = Hutt & Briskin, 1960; H & G = Hutt & Gibby, 1970; H1 = Hutt, 1968; H2
= Hutt, 1969; H3 = Hutt, 1977; H = Hain, 1964; Ha = Halpern, 1951; J = Johnson, 1973; M = Marley, 1982; Mr & R = Murray &
Roberts, 1956; Mu = Mundy, 1972; W & McG = White & McGraw, 1975; todos apud Groth-Marnat, 1984.

nham se originado de pesquisas bem conduzi- agressão, tentando mostrar as dificuldades


das, em outros se basearam apenas em obser- envolvidas para que se chegue a algumas hi-
vação, inclusive de um único caso. Dessa ma- póteses interpretativas.
neira, quando se trata de um caso individual, a
aplicabilidade de tais hipóteses é duvidosa. Os
indícios encontrados devem ser verificados, de- Agressão no teste de Bender
vidamente, na fase de associação e somente (estudos de Cunha)
utilizados com muita cautela.
Relataremos, a seguir, o estudo que desen- Partimos de uma revisão da literatura, para
volvemos sobre alguns sinais simbólicos de procurar instrumentos que contribuíssem para

PSICODIAGNÓSTICO – V 321
QUADRO 20.3 Indicadores de impulsividade,
segundo Oas, 1984*
(Critério: presença de 5 ou mais)
No Indicador
1 Completamento em tempo curto
2 Qualidade global pobre
3 Interrupção da tarefa
4 Omissão
5 Colisões
6 Transformações
7 Aumento de tamanho
8 Mudanças em ângulos
9 Mau planejamento
10 Perseveração
11 Rabiscagem
12 Agressão
Fonte: Oas, 1984, p.1013 (adaptado).

a identificação de sinais premonitórios de com-


portamento suicida. Havia algumas tentativas
de uso de técnicas projetivas para tal fim, mas
parecia importante se encontrar instrumentos
comuns, rápidos, econômicos e de fácil manejo.
Encontramos um trabalho de Sternberg e
Levine (1965) que, através de pesquisa, esta-
beleceram a presença de uma relação signifi-
cativa entre ideação suicida e um tipo de pe-
netração da Figura 5 pela Figura 6 no Bender
(vide Figura 20.1). De acordo com os autores,
Figura 20.1 Sinal de Sternberg e Levine no teste de
essa distorção representaria tanto uma agres- Bender.
são como um desejo de volta ao útero, impul-
sionado pelo afeto. Em trabalho anterior,
Brown (1954) havia relacionado a superposi- recem outros, com as mesmas características
ção ou interpenetração dos elementos ou formais, num total que varia de amostra para
subpartes da Figura 4 como indício suicida (vide amostra, de 5 a 30%. Tais sinais, com possíveis
Figura 20.2). Mais tarde, salientou o valor sim- implicações simbólicas agressivas, pareciam
bólico do fenômeno como “um desejo hipoté- abrir novas perspectivas de investigação.
tico de reunião com a figura materna”, de ní- Dessa maneira, iniciamos uma investigação,
vel muito primitivo e simbiótico, sugerindo cuja pressuposição subjacente era de que o si-
“uma regressão a um plano de vida intra-ute- nal de penetração, no B-G, possivelmente re-
rino”, que facilitaria, em alguns casos, “solu- presentaria uma projeção agressiva, que po-
ção suicida” (p.358). deria se associar com ideação suicida.
Os sinais considerados têm aspectos formais Se Perlstein (1966) tivesse razão quando
em comum e, possivelmente, implicações sim- disse que “parece haver um continuum, desde
bólicas idênticas. Por outro lado, examinando o que ameaça o suicídio, através do que o ten-
cerca de 2.964 protocolos Bender, de sujeitos ta e até o que o completa” (p.3.017), as infor-
normais ou não, de diversas idades, níveis de mações da literatura permitiriam crer que, cer-
escolaridade e de diferentes classes sociais, foi tamente, os doentes mentais se fariam repre-
possível verificar que, além desses sinais, apa- sentar, em todo esse continuum, com pesadas

322 JUREMA ALCIDES CUNHA


lógicas do que um grupo de controle empare-
lhado, sem tais sinais. Os resultados mostra-
ram que o grupo normal, com sinais hipoteti-
camente “suicidas”, teve escores significativa-
mente mais elevados do que o grupo de con-
trole, em ansiedade, depressão, agressão, neu-
rose e psicose (Cunha, 1977a).
A seguir, procuramos investigar o aspecto
simbolicamente agressivo dos sinais, em qua-
tro grupos de sujeitos normais e anormais (con-
forme a ausência ou presença de diagnóstico
psiquiátrico de doença mental, conhecido e
referido aos sujeitos em estudo). Os resulta-
dos indicaram que os sinais no Bender se asso-
ciaram com agressão, enquanto identificada
pelo teste do desenho da figura humana, in-
dependentemente de normalidade ou anorma-
lidade, embora, de forma independente dos
sinais, os normais apresentassem menos agres-
são do que os anormais. Não se comprovou
efeito de interação entre a variável sinais e a
variável dimensão normalidade-anormalidade.
As conclusões de que os sinais de penetração,
no Bender, se associam com agressão parecem
ter aplicações práticas, tanto no exame clínico
como em processos de seleção para cursos ou
funções, em que os aspectos psicopatológicos
estudados e, em especial, os agressivos, cons-
tituem contra-indicação.
Figura 20.2 Sinal de Brown, no teste de Bender.
Noutro trabalho de pesquisa (Cunha,
1977b), ainda com a preocupação de explorar
mais a significação de tais sinais, partimos de
incidências. Todavia, também a partir da lite- pressupostos teóricos de Menninger (1970) e
ratura, haveria motivos para supor que casos de seus três componentes do ato suicida: o
sem uma patologia específica também se fi- desejo de morrer, o desejo de matar e o desejo
zessem presentes, ainda que num grau mais de ser morto.
discreto, possível pelo menos estatisticamente. Menninger (1970), em relação ao simbolis-
Porém, se as pessoas aparentemente nor- mo comum do desejo de morrer, sugere uma
mais apresentassem idéias mais persistentes de interpretação inversa, dizendo que é possível
suicídio ou comportamento nessa linha, então que fantasias de nascimento e desejos de vol-
haveria uma probabilidade da existência, pelo ta ao útero “talvez sejam apenas representa-
menos incipiente, de um transtorno mental em ções pictóricas do que, no nível mais profun-
evolução. Este foi o raciocínio básico para a do, é o desejo inconsciente de morte” (p.82).
seleção do que chamamos de características Esse autor recapitula Freud, quando este diz
psicopatológicas no teste de Machover, sendo que ninguém se mata sem que “esteja ao mes-
levantada a hipótese de que um grupo de su- mo tempo matando um objeto com o qual se
jeitos normais, com os “sinais suicidas”, no identificou” e, também, “voltando contra si
Bender, apresentaria um número significativa- próprio um desejo de morte antes dirigido con-
mente maior de tais características psicopato- tra outrem” (p.202). Assim, serve-se do termo

PSICODIAGNÓSTICO – V 323
identificação ou, mais precisamente, de intro- A partir de tais pressupostos teóricos e com-
jeção (Menninger, 1979), delimitando o con- provada a significação estatística dos sinais
ceito de internalização e diferenciando expres- estudados, como indicadores de agressão, de-
sões muitas vezes usadas como sinônimos na senvolvemos uma pesquisa, utilizando grupos
psicanálise (Moore & Fine, 1968; Moore & Fine, equivalentes, com e sem sinais no B-G, de pa-
1992). cientes psiquiátricos, de pacientes psiquiátri-
Suicídio “é antes de tudo um homicídio”. cos delinqüentes, de operários da indústria e
Em alemão, “o homicídio de si próprio”, signi- de motoristas, para verificar se os grupos com
ficação literal também presente em formas fi- sinais se diferenciavam dos grupos sem sinais,
lológicas mais antigas. Portanto, se há “no sui- quanto à maior incidência de ideação suicida e
cídio um eu que se submete ao homicídio e de fatores de risco de suicídio, entre os pacien-
parece desejoso de fazê-lo”, deve haver uma tes psiquiátricos; de homicídio ou de tentativa
explicação para isto (Menninger, 1970, p.36). de homicídio, entre os pacientes psiquiátricos
O desejo de matar seria resultante da des- delinqüentes; de acidentes, entre os operários
trutividade primária. Sob certas condições, os de indústria e entre os motoristas. Todas as
impulsos destrutivos, investidos em um ou mais hipóteses levantadas foram confirmadas
objetos, desprendem-se dos mesmos, e, dessa (Cunha, 1977b) (vide exemplos de protocolos
maneira, o impulso homicida, libertado, pode Bender nas Figuras 20.3 a 20.6).
se aplicar “sobre a pessoa de sua origem, como Dada a possível capacidade dos sinais sim-
objeto substituto, realizando assim um homi- bolicamente agressivos no B-G de diferenciar
cídio deslocado” (p.57). grupos com e sem ideação suicida, história de
Sobre o terceiro componente do ato suici- comportamento homicida e de acidentes, re-
da, afirma Menninger (1970): “Ser morto é a comendamos a administração sistemática do
forma extrema da submissão, assim como teste de Bender:
matar é a forma extrema de agressão”. E acres- a) em hospitais psiquiátricos, para pesqui-
centa, pouco mais adiante: “A explicação do sa de ideação suicida, não só porque esta ten-
desejo de sofrer e submeter-se à dor e mesmo de a persistir em muitos casos, como porque
à morte é encontrada na natureza da consciên- os sinais que a identificam se associam a con-
cia” (p.58). Dessa forma, Menninger lembra dições psiquiátricas, que agravam o seu risco;
Freud, ao explicar as dificuldades do ego em b) em pacientes psiquiátricos delinqüentes,
se ajustar às exigências do superego e aplacar- desde que tais sinais parecem corresponder a
lhe a severidade: “Quem alimenta desejos ho- um componente agressivo latente, e, por ou-
micidas sente também, pelo menos inconsci- tro lado, o paciente homicida muitas vezes não
entemente, a necessidade de uma punição da se restringe à primeira vítima;
espécie correspondente” (p.61). c) em processo de seleção para funções que
Freqüentemente, acidentes encobrem com- envolvem risco e em exame psicotécnico de
portamentos suicidas, segundo vários autores. motoristas.
Em conseqüência, se a existência de agressão É importante salientar o fato de que o es-
fosse comprovada nos vários tipos de compor- tudo foi desenvolvido em grupos, portanto,
tamento que, segundo Menninger, poderiam sem se ter oportunidade de examinar, indivi-
ou assumir manifestamente a forma de um dualmente, alternativas de explicação para o
suicídio ou mascará-lo, poderíamos pressupor aparecimento das distorções, como, por exem-
que a presença mais evidente de uma ou outra plo, a presença de disfunção cerebral, que,
forma representativa dos vários componentes, como veremos adiante, pode levar a distorções
teorizados por Menninger, provavelmente se bastante semelhantes a alguns dos sinais es-
deveria aos mecanismos em jogo na dinâmica tudados. Assim, embora achemos que os si-
individual, que fazem com que tal agressão seja nais devem ter uma significação premonitória,
atuada ou expressa predominantemente em no caso individual, acreditamos que os sinais
um ou outro sentido. devem ser predominantemente utilizados na

324 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 20.3 Protocolo Bender de paciente psiquiátrico
com tentativa de suicídio e comunicação de idéias sui-
cidas. Figura 20.5 Protocolo Bender de um motorista ama-
dor, com história de acidente.

Figura 20.6 Protocolo Bender de paciente psiquiátrico


com história de homicídio.

triagem de grandes grupos, submetendo os


casos individuais a exame mais completo. En-
Figura 20.4 Protocolo Bender de paciente psiquiátrico tretanto, embora tenhamos, noutro momen-
com tentativas de suicídio, anterior e durante a inter- to, levantado a questão da necessidade de se
nação. estudar a influência ou não de variáveis socio-

PSICODIAGNÓSTICO – V 325
culturais, no aparecimento de determinadas
distorções no Bender, foi possível observar, em
relação aos sinais estudados, que se fizeram
presentes, em protocolos de sujeitos tanto clas-
sificados como analfabetos e até com nível de
escolaridade superior (vide Figura 20.7). Nota-
mos, inclusive, que o treinamento em desenho
parece não impedir a emergência de sinais
agressivos. Desse modo, na Figura 20.8, temos
o protocolo Bender de um desenhista, no qual
apareceu, aliás como no anterior, nitidamen-
te, o sinal identificado por Sternberg e Levine.

O ENFOQUE OBJETIVO

Note-se que, apesar de o Bender ter sido origi-


nariamente desenvolvido por Lauretta Bender,
com o intuito de buscar relações entre desvios
nas reproduções gráficas e vários tipos de psi-
copatologia, os trabalhos iniciais ficaram mais
num nível descritivo, que foi seguido por um
enfoque projetivo, introduzido pela metade dos
Figura 20.8 Protocolo Bender de um desenhista, mo-
anos 40 (Hutt & Briskin, 1960). Desde aí e até
torista amador, com história de acidente de trânsito.
1960, conforme Schulberg e Tolor, citados por
Lacks (1984), o Bender, “de uma medida relati-
vamente obscura, passou ao terceiro teste mais
popular, utilizado por 95% dos clínicos mais ex-
perientes”, mas, quanto mais era usado, mais
“era reconhecida a necessidade de algum tipo
de sistema de escore objetivo e fidedigno” (p.2).
A primeira tentativa de um sistema objeti-
vo de escore foi de Billingslea, ainda nos anos
40, utilizando 137 indicadores para compor o
escore total. Porém, apresentou problemas
metodológicos e envolvia um manejo muito
complexo (Billingslea, 1965). No entanto, a
importância de sua monografia parece ter sido
a de desencadear uma série de estudos com o
mesmo propósito. Os mais importantes pare-
cem ter sido o de Pascal e Suttell (1951), o de
Hutt e Briskin (1960), com poucas ilustrações,
tornando o processo de escore difícil (Lacks,
1984), o de Hain (1964), a adaptação Hutt,
desenvolvendo uma escala de psicopatologia
(Hutt, 1975) e a adaptação Lacks (1984) do sis-
Figura 20.7 Protocolo Bender de um motorista ama- tema de Hutt e Briskin. Lacks (1984) ainda cita
dor, de nível de escolaridade superior, com história de um sistema de Pauker, de 1976, mas assinala a
acidente de trânsito. necessidade de mais pesquisas para a avalia-

326 JUREMA ALCIDES CUNHA


ção de sua qualidade científica. Aqui nos res- róticos”, psicóticos e normais, parece que o
tringiremos aos sistemas de Pascal e Suttell e poder discriminativo verificado em grupos não
de Hutt e, mais especificamente, na triagem é adequado para a interpretação do protocolo
da disfunção cerebral, ao sistema de Lacks. individual (Billingslea, 1965; Hutt, 1985). Da
mesma forma, não parece útil para diferenciar
sujeitos com disfunção orgânico-cerebral de
O sistema de escore de Pascal e Suttell pacientes psiquiátricos (Lacks, 1984).
O sistema de escore é complexo, e os auto-
O trabalho da Pascal e Suttell apareceu em res dedicam quase cem páginas de sua obra
1951, com uma abordagem psicométrica, para definindo os itens e exemplificando-os. Dessa
adultos. Comparando protocolos de indivíduos maneira, não é possível tentar aqui um exame
“normais” e de pacientes psiquiátricos, verifi- discriminado dos itens. Vamos, entretanto, apre-
caram que estes geralmente tendiam a distor- sentar um caso de uma paciente, internada em
cer mais os estímulos, em sua reprodução, que hospital psiquiátrico, de 25 anos e 10 anos de
os normais. Desse estudo, resultou uma lista de escolaridade, apenas como exemplo da atribui-
105 desvios. Finalmente, foi realizada uma aná- ção de escores, conforme a presença e o tipo de
lise de item, com base num grupo de 260 indiví- desvios (vide Figura 20.9 e a folha de escore).
duos (não-pacientes), de 15 a 50 anos, com nível
de escolaridade variando do primeiro ano da high
school até o nível de graduação pelo college, e
de um grupo equivalente, em termos de nível de
escolaridade, idade e sexo, de 260 pacientes psi-
quiátricos. A partir da freqüência de ocorrência
dos desvios, foram atribuídos pesos aos itens.
Além dos 105 itens referentes aos desenhos
individuais, ainda são considerados mais sete
itens, relativos a aspectos configuracionais. A
soma total dos valores dos itens, presentes no
protocolo, constitui o escore total, e há tabe-
las, preparadas pelos autores, para a conver-
são do escore total bruto em escore z. Todavia,
o sistema aplica-se a sujeitos de 15 a 50 anos,
que tenham um nível de escolaridade equiva-
lente a pelo menos um ano de high school. Os
escores têm um sentido probabilístico em re-
lação à presença de psicopatologia. Escores
muito elevados, com indícios qualitativos, as-
sociam-se a uma elevada probabilidade de um
transtorno mental grave. Assim, um escore de
75 tem uma probabilidade de apenas 1% de
que o protocolo correspondente seja de um
sujeito normal, porque está dois desvios pa-
drão e meio acima da média da população
normal. Não obstante, a não ser pelo registro
de alguns desvios, que seriam comuns em cer-
tas categorias nosológicas, o sistema não ofe-
rece maiores indicações diagnósticas. Desse
modo, apesar de vários estudos registrarem di- Figura 20.9 Protocolo Bender de uma paciente psiquiá-
ferenças significativas entre grupos de “neu- trica, de 25 anos.

PSICODIAGNÓSTICO – V 327
FOLHA DE ESCORE DO TESTE DE BENDER (SISTEMA DE PASCAL & SUTTELL)*

Identificação: 6:0 Idade: 25 anos

Nível de escolaridade: Sexo:

DESENHO 1 Escore DESENHO 4 Escore DESENHO 7 Escore


1. Linha ondulada (2) 1. Assim. da curva (3) 3 1. Extr. não unidas (8)
2. Pontos, traços, círc. (3) 2. Quebra da curva (4) 2. Adição âng. (3)
3. Traços (2) 3. Curva não centr. (1) 3. Omissão âng. (3)
4. Círculos (8) 4. Encaracol. (4) 4. Pontos ou traços extras (3)
5. No de pontos (2, cada) 12 5. Falta junção (8) 5. Linha dupla (1, cada) 7
6. Carreira dupla (8) 6. Rotação curva (3) 3 6. Tremor (4) 4
7. Repassamento (2) 2 7. Retoque (8) 7. Distorção (8, cada) 8
8. Segunda tent. (3, cada) 8. Tremor (4) 4 8. Linhas-guia (2)
9. Rotação (8) 9. Distorção (8) 9. Segunda tent. (3, cada) 9
10. Parte des. faltando (8) 10. Linhas-guia (2) 10. Rotação (8) 8
Total desenho 14 11. Segunda tent. (3, cada) 11. Parte des. faltando (8)
12. Rotação (8) 8 Total desenho 36
13. Parte des. faltando (8)
Total desenho 18

DESENHO 2 DESENHO 5 DESENHO 8


1. Linha ondulada (2) 1. Assimetria (3) 3 1. Extr. não unidas (8)
2. Traços ou pontos (3) 2. Pontos, traços, círc. (3) 2. Adição âng. (3)
3. Forma dos círc. (3) 3 3. Traços (2) 3.Omissão âng. (3)
4. Círc. omit. ou extras (3) 4. Círculos (8) 8 4. Pontos, traços extras (3)
5. Círc. se tocando (5) 5. Ext.unida a ponto (2) 5. Linha dupla (1, cada)
6. Desvio inclinação (3) 6. Rotação ext. (3) 3 6. Tremor (4)
7. No de colunas (2, cada) 7. No de pontos (2) 7. Distorção (8, cada) 8
8. Fig. em 2 níveis (8) 8. Distorção (8) 8. Linhas-guia (2)
9. Linhas-guia (2) 9. Linhas-guia (2) 9. Repassamento (3, cada)
10. Repassamento (2) 10. Repassamento (2) 10. Segunda tent. (8)
11. Segunda tent. (3, cada) 11. Segunda tent. (3, cada) 11. Parte des. faltando (8)
12. Rotação (8) 12. Rotação (8) Total desenho 8
13. Parte des. faltando (8) 13. Parte des. faltando (8)
Total desenho 3 Total desenho 14

DESENHO 3 DESENHO 6 ASPECTOS CONFIGURACIONAIS


1. Assimetria (3) 3 1. Assimetria (3) 3 1. Coloc. Des. A (2)
2. Pontos, traços, círc. (3) 2. Ângulos (2) 2. Superposição (2, cada) 2
3. Traços (2) 3. Ponto cruzam. (2, cada) 2 3. Compressão (3)
4. Círculos (8) 8 4. Curva extra (8) 4. Linhas desenh. (8)
5. No de pontos (2) 5. Linha dupla (1, cada) 5. Ordem (2) 2
6. Carreira extra (8) 6. Retoque (8) 6. Falta de ordem (8)
7. Achatamento (8) 7. Tremor (4) 4 7. Tamanho relat. (8) 8
8. Distorção (3) 8. Distorção (8) Total 12
9. Linhas-guia (2) 9. Linhas-guia (2)
10. Repassamento (2) 10. Repassamento (2) TOTAIS DOS DESENHOS 113
11. Segunda tent. (3, cada) 11. Segunda tent. (3, cada) 1.14 3.11 5.14 7.26 2.3
12. Rotação (8) 12. Rotação (8) 4.18 6.9 8.8
13. Parte des. faltando (8) 13. Parte des. faltando (8) Configuração 12
Total desenho 11 Total desenho 9 Escore total bruto 125
Escore padrão (z) 163

*Traduzida de Pascal & Suttell, 1951, p.209. Os escores referem-se ao protocolo Bender da Figura 20.9.

328 JUREMA ALCIDES CUNHA


O sistema de escore de Hutt e a Escala de uma medida global do grau de psicopatologia
Psicopatologia manifestado”, supondo-se que a psicopatolo-
gia tenha uma qualidade linear, que pode se
O sistema de escore de Hutt (1985), originário expressar num continuum, de modo que “um
de sua experiência clínica, vem passando por escore mais elevado representa um grau mais
várias revisões, face a evidências de achados alto de psicopatologia” (p.106), podendo va-
de pesquisa. Na realidade, o trabalho de Hutt riar os escores da Escala de Psicopatologia en-
é muito complexo e extenso, não sendo possí- tre 17,0 e 170,00, valor que constitui a soma
vel apresentar aqui mais do que simples infor- dos escores ponderados dos 17 fatores do tes-
mações a respeito. te. Ilustrando essa relação entre o escore obti-
Primeiramente, o material de teste é específi- do e a severidade da psicopatologia, vamos
co, e a administração envolve procedimentos reproduzir dados normativos da Escala de Psi-
definidos, sendo que mesmo as instruções são copatologia de Hutt (Quadro 20.4):
apresentadas, pretendendo ressaltar aspectos
não-estruturados da tarefa para mais facilmente
QUADRO 20.4 Dados normativos da Escala de
suscitar projeção. Não obstante, para a utiliza-
Psicopatologia de Hutt
ção das escalas objetivas, somente a fase de có-
pia é necessária. As fases de elaboração, associa- Grupo N Média DP
ção e clínica-experimental não se resumem na Normais 140 32,8 4,9
análise do produto do desempenho (cópia), mas Neuróticos ambulatoriais 150 43,0 9,5
Neuróticos internados 55 61,7 8,7
procuram explorar “respostas idiossincrásicas e
Depressivos unipolares 68 66,2 6,4
projetivas significantes” (p.4), sendo proposto um Esquizofrênicos ambulatoriais 60 78,3 11,8
uso clínico, mas também terapêutico. Esquizofrênicos internados 155 97,1 12,1
Dentre suas várias abordagens do Bender, Lesão orgânica cerebral 147 100,1 14,5
a Escala de Psicopatologia é a mais popular e Fonte: Hutt, 1985, p.110.
envolve 17 fatores de teste: seqüência, posi-
ção do primeiro desenho, uso do espaço, coli-
são, variação na posição do papel, dificuldade A comparação dessas médias revela a pre-
de fechamento, dificuldade no cruzamento, sença de diferenças significantes, ao nível de
dificuldade na curvatura, mudança na angula- 0,001 ou melhor com p < 0,001 na maioria
ção, rotação perceptual, retrogressão, simpli- dos casos, apenas a diferença entre neuróticos
ficação, fragmentação, dificuldade de super- internados e depressivos unipolares foi de
posição, elaboração, perseveração e repassa- p = 0,01, e entre os dois últimos grupos apre-
mento. No seu livro, esses fatores são discuti- sentados no Quadro acima, foi de p = 0,05.
dos em quatro agrupamentos principais: orga- Isso significa que a escala tem validade dis-
nização, desvios no tamanho, desvios na for- criminativa em relação a grupos clínicos. Por
ma e distorção maciça. Tais fatores têm, cada certo, para o diagnóstico individual, são ne-
um, uma significação psicológica, que não é cessários muito mais dados comprobatórios.
considerada se o que se deseja é atribuir esco-
re para as escalas objetivas. Cada fator é defi-
nido e recebe um escore bruto, sendo-lhe atri- A abordagem configuracional
buído depois um valor escalar (de 1 a 10), que
depende de aspectos qualitativos do desem- Um procedimento também inspirado na Esca-
penho (por exemplo, colocação do primeiro la de Psicopatologia de Hutt é a abordagem
desenho: anormal, egocêntrica ou normal) ou configuracional, que é utilizada para fins de
quantitativos (freqüência da ocorrência), que triagem, isto é, para um exame preliminar, que
constituem subcategorias de cada fator (e que basearia a recomendação, ou não, de uma in-
se baseiam em pressuposições projetivas do vestigação mais completa. Os padrões confi-
comportamento de teste). A escala “fornece guracionais propostos reúnem alguns fatores

PSICODIAGNÓSTICO – V 329
da Escala de Psicopatologia, que seriam capa- senhos, que, por si, já são sugestivas de déficit
zes de diferenciar grupos de determinadas ca- cerebral (como grande dificuldade de percep-
tegorias nosológicas. “No caso de indivíduos, ção ou da cópia dos estímulos, a elaboração
a análise configuracional leva, antes, a uma ou a reprodução do desenho como um objeto
inferência de que este indivíduo, que mostra concreto, o longo tempo necessário para reali-
um comportamento de teste, comumente as- zar a tarefa, etc.), mas não podem ser incluí-
sociado com uma categoria psiquiátrica espe- dos com os demais, porque não têm poder dis-
cífica, possa também pertencer a essa catego- criminativo. Em resumo, são apresentados
ria” (Hutt, 1985, p.116). como indicadores (Quadro 20.5):
Cada configuração tem um escore total, que
representa a soma dos escores ponderados QUADRO 20.5 Indicadores de lesão cerebral, de Hutt
(com peso 1 ou 2) dos componentes pertinen-
Indicadores Peso
tes. O escore de uma certa configuração pode
ser classificado como crítico ou marginal. Se o Colisão moderada 2
escore de um determinado paciente recai no Angulação em quatro desenhos 2
Rotação severa 2
nível crítico, no caso de uma categoria psiquiá- Simplificação severa 2
trica, existe probabilidade estatística de que Fragmentação severa 2
possa pertencer à mesma. Se é apenas margi- Superposição severa 2
nal, tal possibilidade é questionável. No livro, há Perseveração moderada 2
padrões configuracionais para vários quadros Dificuldade de fechamento severa 1
Incoordenação da linha 1
nosológicos. Aqui, vamos nos limitar a apresen-
Escores críticos: 10 ou mais; escores marginais: 7 a 9.
tar o padrão configuracional para lesão orgâni- Fonte: Hutt, 1985, p.120 (resumido).
ca cerebral no item seguinte, uma vez que, se-
gundo o autor, pela triagem, é possível identifi-
car cerca de 80% de casos verdadeiros-positivos. Explicações sucintas sobre os indicadores

a) Colisão refere-se ao toque ou à superposi-


Bender na triagem da disfunção ção do perímetro de uma figura pelo de outra.
orgânico-cerebral Neste indicador, não se considera a penetra-
ção de parte do estímulo de uma figura no es-
A triagem rápida de Hutt paço aberto de outra, sem ocorrência de to-
que ou superposição (o que seria apenas uma
Para bem entender os fundamentos deste tipo tendência à colisão). Uma colisão é moderada
de triagem, recomendamos a leitura prévia dos quando é verificada por duas vezes.
dois itens anteriores, para depois considerar a b) Angulação refere-se a um aumento ou
análise configuracional para a lesão orgânica diminuição de, no mínimo, 15º, na angulação
cerebral, conforme Hutt. no interior da Figura 2, 3, 4, 5, 6 e 7. Por exem-
Antes de introduzir uma discussão sobre as plo, na Figura 6, considera-se como interior do
subcategorias incluídas neste padrão configu- estímulo o cruzamento das duas linhas curvilí-
racional, é conveniente mostrar que o autor neas. No caso, deve estar presente em quatro
recomenda cautela, ao julgar os fenômenos figuras para ter peso 2.
configuracionais, dada a multiplicidade de fa- c) Rotação severa seria considerada quan-
tores (como idade na emergência do proble- do existe uma inversão, ou quase, a partir do
ma, tempo transcorrido, gravidade do dano, eixo (de 80 a 180º) em qualquer figura.
localização, personalidade do indivíduo, etc.) d) Simplificação refere-se à reprodução mais
que podem afetar o desempenho. Além disso, simplificada ou mais fácil de desenhar, como
chama a atenção para o fato de que, freqüen- reproduzir as duas partes da Figura A como
temente, há características no comportamen- separadas (mas sem destruição da Gestalt),
to do paciente, durante a reprodução dos de- reproduzir partes da Figura 7 ou 8 como mais

330 JUREMA ALCIDES CUNHA


primitivas (retângulos ou elipses), ou reduzir O sistema de escore de Hain
unidades (número de curvas, na Figura 6, ou
diminuir pelo menos em três unidades o dese- O sistema de escore de Hain (1964a; 1964b),
nho na Figura 1, 2, 3 e 5). Considera-se severa que foi divulgado nos anos sessenta, ainda era
quando presente em mais de duas figuras. recomendado por autores na década de oiten-
e) Fragmentação refere-se à quebra da fi- ta (Groth-Marnat, 1984; Vincent, 1987), em-
gura em partes ou omissão de parte, com des- bora já então fosse salientada a sua desvanta-
truição da Gestalt. Considera-se severa, quan- gem em vista do aparecimento de grande nú-
do presente em mais de duas figuras. mero de falsos-negativos, confirmado por es-
f) Superposição refere-se à grosseira super- tudos posteriores (Groth-Marnat, 1984; Gro-
posição de áreas componentes que não existe th-Marnat, 1999). Como, em comparação, a
no estímulo (Figura A e 4) e, ainda, à omissão, adaptação Lacks dos sinais de Hutt-Birskin (La-
simplificação ou distorção na área de super- cks, 1984) apresenta melhor índice de acertos,
posição (Figura 7). Considera-se severa quan- idêntico ao registrado pelo Índice de Compro-
do ocorre em mais de uma figura. metimento da bateria neuropsicológica de
g) Perseveração refere-se à substituição da Hasltead-Reitan, atualmente se considera que
unidade do estímulo, que está sendo copiado, tal sistema é mais recomendável que o de Hain
pela unidade do estímulo da figura preceden- para propósitos de triagem (Groth-Marnat,
te (por exemplo, uso de pontos na Figura 2) ou 1999). Assim, deixamos de apresentar em de-
à repetição de unidades ou sua continuação talhe o sistema de Hain, como havíamos feito
no desenho, além dos limites demarcados pelo na última edição (Cunha et alii, 1993).
estímulo (por exemplo, 14 pontos na Figura 1,
em vez de 12, ou presença de 12 ou mais colu-
nas na Figura 2, em vez de 10). No primeiro Adaptação Lacks do sistema Hutt-Briskin
caso, deve haver a ocorrência de dois ou mais
elementos perseverados e, no segundo, a adi- Um estudo de Robiner, de 1978, citado por
ção de dois ou mais elementos na mesma fi- Lacks (1984), demonstrou que a maioria dos
gura. É considerada moderada quando presen- psicólogos ainda não faz muito uso de siste-
te em duas figuras. mas de escore para a interpretação do Bender,
h) Dificuldade de fechamento refere-se à por várias razões, uma das quais sendo que
dificuldade de junção de subpartes ou de par- muitas pesquisas têm apontado para superpo-
tes adjacentes de uma figura. Aplica-se ape- sições nas distribuições de escore de casos or-
nas às Figuras A, 2, 4, 7 e 8, como, por exem- gânicos ou não, o que faz com que as decisões
plo, dificuldade de completar o círculo ou o e predições, no caso individual, sejam arrisca-
losango na Figura A ou as unidades circulares das. Decidimos, então, dar uma ênfase espe-
da 2, como se vê na Figura 20.11. Também pode cial à adaptação Lacks do sistema de escore
ocorrer, por falhas, rasuras ou correções no Hutt-Briskin, embora pudesse ter sido incluída
ponto de junção. O escore bruto é o número entre as modalidades de enfoque objetivo, em
total de ocorrências. Para atribuição do esco- razão de suas qualidades metodológicas, que
re, há certos critérios: a) não podem ser consi- asseguram suas propriedades psicométricas
deradas mais de duas dificuldades de fecha- satisfatórias nesta área tão controvertida.
mento na mesma figura, e b) na Figura 2, duas
dificuldades têm escore bruto de 1, e três ou
mais têm escore bruto de 2. Considera-se se- Administração
vera quando o escore bruto está entre 6 e 8.
i) Incoordenação da linha ou má coordena- O material para a aplicação do B-G inclui uma
ção, que “se manifesta por irregularidades, pilha de folhas de papel (tamanho ofício), vá-
variabilidade na qualidade e tremor” (Hutt, rios lápis no 2, com borracha, uma superfície
1985, p.147). lisa e os cartões com desenhos Bender, que

PSICODIAGNÓSTICO – V 331
podem ser os originais de Lauretta Bender (edi- QUADRO 20.6 Observações comportamentais
ção de 1946) ou os levemente modificados do para o B-G
conjunto de Hutt (1975) e que devem estar jun- ___ Evidência de fadiga
to do examinador, na ordem apropriada e de ___ Atenção insuficiente ao estímulo
___ Rapidez extrema e execução descuidada
face para baixo. Antes de dar as instruções,
___ Extremo cuidado e deliberação
deve-se colocar uma folha de papel na frente ___ Insatisfação expressa em relação aos desenhos
do examinando, na posição vertical, deixando mal executados (esforços repetidos do cliente
os lápis e as folhas restantes, “sem comentá- para corrigi-los, que não têm sucesso)
rio, ao lado, próximos do cliente”. São dadas ___ Falta de coordenação motora ou tremor da mão
___ Rotação (indique em qual figura)
as seguintes instruções, idênticas às de Hutt:
___ Aparente dificuldade de enxergar as figuras
“Eu vou lhe mostrar estes cartões, um de (por exemplo, diz que necessita de óculos)
cada vez. Cada cartão tem um desenho sim- ___ Outro ____________________________________
ples. Gostaria que você copiasse o desenho no Tempo ____________________________________
papel, o melhor que puder. Trabalhe da ma-
Fonte: Lacks, 1984, p.24.
neira que for melhor para você. Este não é um
teste de habilidade artística, mas tente copiar
tão exatamente quanto for possível. Trabalhe
rápido ou devagar, como desejar” (Lacks, 1984, sofrendo de disfunção cerebral, mas mais pro-
p.210). vável que esteja se recusando a cooperar. Sem
As demais considerações ou explicações ter observado pessoalmente este desempenho
sobre perguntas, modificações da posição do ou sem que lhe fosse contado pelo examina-
papel e do cartão-estímulo, marcação de tem- dor, o clínico poderia achar 5 erros e, erronea-
po, etc., feitas pela autora, são as mesmas que mente, diagnosticar disfunção orgânica cere-
constam no princípio deste Módulo. A autora bral.”
também recomenda que sejam feitas observa- 2 – “No extremo oposto, uma pessoa, real-
ções sobre o comportamento do examinando: mente sofrendo de problemas orgânicos, pode
“o examinador deve tentar determinar se um ser capaz de produzir um protocolo adequado
erro foi feito por causa de dificuldades percep- (ou um protocolo com 4 erros), mas com ex-
tomotoras verdadeiras ou por causa de outros tremo esforço, levando muito tempo (pode ser
fatores, como falta de cuidado. Somente no até 20 ou 30 minutos) e fazendo inúmeras ra-
primeiro caso se deve atribuir escore a um erro” suras. Novamente, as observações comporta-
(p.23). Apresenta uma lista de observações mentais seriam cruciais para fazer o diagnósti-
comportamentais, que estão incluídas no Qua- co correto” (p.24). Ora, uma vez que o tempo
dro 20.6. Estas são muito importantes para a médio para pacientes psiquiátricos (não-orgâ-
identificação dos erros verdadeiros, já que ape- nicos) fazerem o teste é de 6 minutos, levar
nas 5, entre 12 erros possíveis, são suficientes, mais de 15 minutos para completar o teste
“para indicar comprometimento ou disfunção pode ser contado como um ponto extra.
orgânica” (p.23).
A autora faz algumas ponderações a res-
peito: Histórico do sistema de escore
1 – “Por exemplo, suponhamos que um
cliente reproduziu a Figura 1 com apenas qua- O sistema de escore apresentado por Lacks é
tro pontos. Ademais, suponhamos que esse originário de uma lista de 12 discriminadores
cliente demonstrou hostilidade ao fato de ser essenciais de lesão intracraniana, descritos em
testado, mal olhou de relance o cartão-estímu- 1960, por Hutt e Briskin, e que se encontram
lo, antes de copiá-lo, fez algum comentário a no Quadro 20.7.
respeito de haver pontos demais para copiar e Entretanto, as definições dos autores eram
que levou somente 2 minutos para completar por demais resumidas para orientar adequa-
todo o teste. É improvável que o cliente esteja damente o escore. Lacks desenvolveu um ma-

332 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 20.7 Doze discriminadores essenciais de discriminador único. Assim, conforme lembra
disfunção orgânica, de Hutt-Briskin Groth-Marnat (1999), embora seja possível
1. Rotação: severa observar que pacientes com problemas no he-
2. Dificuldade de superposição misfério direito “têm mais probabilidade de
3. Simplificação
cometer erros relacionados com capacidades
4. Fragmentação
5. Retrogressão visoespaciais (por exemplo, rotações, assime-
6. Perseveração tria, fragmentação, desenhos irreconhecíveis,
7. Colisão ou tendência à colisão linhas não-unidas)”, e, por outro lado, saiba-
8. Impotência se que os que têm “lesões no hemisfério es-
9. Dificuldade de fechamento: marcante e severa
querdo mais freqüentemente fazem desenhos
10. Incoordenação motora
11. Dificuldade na angulação: severa que são instáveis (tremores na linha) e meno-
12. Coesão res quanto ao tamanho, com cantos arredon-
Fonte: Hutt & Briskin, apud Lacks, 1984, p.32. dados e partes omitidas (supersimplificação)”,
também se sabe que, muitas vezes, o Bender
não detecta casos com déficit orgânico cere-
nual sobre os 12 erros, que pareceram mais bral, especialmente no caso de pacientes com
eficientes para o uso clínico. Posteriormente, lesões no hemisfério esquerdo (p.556).
Hutt e Gibby (1970) publicaram ilustrações para
exemplos de erros, e Hutt continuou a revisão
de sua lista de sinais. A partir daí, seu interesse O Bender-Lacks no estudo de pacientes
pelo enfoque projetivo e o desenvolvimento de alcoolistas
sua escala de psicopatologia não colaboraram
para a melhoria da lista inicial. Em conseqüên- O Bender-Lacks foi utilizado em pesquisas com
cia, Lacks, que já vinha trabalhando há vários pacientes alcoolistas, demonstrando possuir
anos com os sinais Hutt-Birskin, decidiu-se pela um bom poder de discriminação entre alcoo-
publicação de um manual sobre a sua adapta- listas de abstinência recente (máximo de oito
ção do sistema de escore inicial, com dados dias) e prolongada (mínimo de um ano). O es-
importantes sobre fidedignidade e validade, core médio de discriminadores presentes nos
incluindo a comparação com outros sistemas protocolos Bender do primeiro grupo foi de
de escore e com outros testes neuropsicológi- 6,98, e do segundo grupo foi de 4,92. Uma
cos, como os de Benton, Graham-Kendall, Hals- vez que, conforme o critério estabelecido por
tead-Reitan, etc. Todavia, conforme Hutt Lacks, é necessária a presença de cinco indica-
(1985), o Bender-Lacks é mais “útil para pro- dores para um diagnóstico positivo de disfun-
pósitos de triagem, e não para diagnóstico” ção cerebral e que, em sujeitos com uma lon-
(p.40). Porém, como afirma Groth-Marnat ga história de alcoolismo, a presença de qua-
(1999), a utilidade clínica desse sistema está tro indicadores seria compatível com um qua-
em sua capacidade de discriminar pacientes dro borderline, a média, no primeiro grupo,
com e sem disfunção cerebral e normais, com parece justificar um diagnóstico de disfunção
base no ponto de corte de 5, uma vez que 74 a cerebral, enquanto a média encontrada no se-
96% dos sujeitos sem comprometimento or- gundo grupo, dada a história de alcoolismo de
gânico apresentam escore dentro da faixa de no mínimo 10 anos desses pacientes, pressu-
0 a 4, enquanto apenas 18% de sujeitos com põe a presença de um problema residual (Mi-
disfunção cerebral recaem nessa faixa de escore. nella, Pereira & Argimon, 1987).
Naturalmente, é sumamente importante a A mesma equipe, com a colaboração desta
abordagem da utilização de um ponto de cor- autora*, procurou investigar se os escores Ben-
te, porque, ainda que alguns erros possam con-
correr mais para diferenciar esses grupos, ha-
vendo certas diferenças qualitativas no desem- *Agradecemos às demais autoras pela permissão de
penho, nenhum deles pode ser usado como reprodução dos dados.

PSICODIAGNÓSTICO – V 333
der-Lacks permaneciam estáveis ou não, duran- serão apresentadas a seguir. Mas, antes da atri-
te o primeiro mês de abstinência. O Bender foi buição de escores, é importante excluir outras
aplicado em quatro sessões, com intervalo de causas alternativas para o aparecimento de
sete dias, a partir do sétimo dia de abstinência erros, como irregularidades na superfície da
(com tolerância de mais ou menos 24 horas). mesa em que as reproduções são feitas, apre-
Os protocolos foram examinados às cegas para sentação imprópria do cartão-estímulo, “capa-
identificação dos indicadores Lacks. Os resul- cidade física debilitada ou um instrumento de
tados da análise de variância demonstraram desenho inadequado” (Lacks, 1984, p.83).
que os escores Bender-Lacks não permanece- O procedimento a ser utilizado é uma abor-
ram estáveis, durante o primeiro mês de absti- dagem de sinais. Cada sinal tem escore único,
nência, sendo observadas as seguintes médias não importando se aparece uma ou várias ve-
nas quatro sessões: 6,45, 5,45, 4,45 e 4,27 zes. Entretanto, um desenho pode conter mais
(Minella, Pereira, Argimon et alii, 1989). de uma distorção. Mas, para que se identifi-
Como se pode notar, a média da primeira que uma distorção como erro, ela deve ser se-
semana (6,45) é muito próxima da encontrada vera ou persistente.
no estudo anterior, em alcoolistas com absti- Rotação. Este erro se refere à orientação no
nência de, no máximo, oito dias (6,98). Perce- espaço. Rotação implica a variação da posição
be-se, por outro lado, que as médias das duas do eixo principal da figura de 80 a 180º, inclu-
primeiras semanas confirmam um diagnóstico sive no caso de uma reprodução espelhada do
positivo de disfunção orgânico-cerebral, com estímulo. Não há rotação quando é feita uma
pouca diferença entre as médias seguintes, in- cópia exata, após a rotação do cartão ou do
feriores a 5. Levando-se em conta os critérios papel. Aplica-se a todas as figuras (vide exem-
de Lacks, foi possível afirmar que os escores plos, Figura 20.10).
sugerem melhora funcional, a partir da segunda Dificuldade de superposição. Este erro se
semana (Argimon, Minella, Pereira et alii, 1989). refere à dificuldade na reprodução da área de
Numa seqüência da mesma pesquisa, pro- superposição das subpartes componentes e se
curou-se verificar que indicadores apresenta- aplica às Figuras 6 e 7. Pode se verificar por:
vam diferenças de freqüência nas quatro ad- omissão de partes que se superpõem; simplifi-
ministrações. Fragmentação e tempo superior cação ou marcante tracejamento, apenas no
a 15 minutos foram indicadores ausentes em ponto de superposição; distorção no ponto de
todos os casos, enquanto dificuldades de fe- superposição; superposição em lugar errado ou
chamento e coesão foram identificadas em falta de superposição (mas, se o espaço entre
todos os protocolos. Embora somente com as subpartes é maior que 3,2 mm, atribui-se
maiores investigações seja possível chegar a escore para Simplificação) (vide Figura 20.10).
conclusões sobre implicações clínicas, os resul- Simplificação. Este erro se refere à repro-
tados estimados pela prova Q de Cochran su- dução mais simplificada ou mais fácil do estí-
gerem que diferenças na freqüência da apre- mulo, embora não mais primitiva, em termos
sentação dos indicadores de fragmentação, de maturação, e se aplica a todas as figuras.
retrogressão, perseveração e dificuldades de Pode se verificar por círculos, em vez de pon-
angulação podem ter alguma relação com a tos, na Figura 1; ausência de superposição; es-
melhoria do quadro clínico, já que mostraram paço entre as subpartes maior que 3,2 mm;
uma tendência decrescente em sua ocorrência cópias muito simplificadas, como ângulos de
(Argimon, Minella, Pereira et alii, 1989). linhas em vez de ângulos de pontos, na Figura
3, embora a substituição de ângulos por cur-
vas, nas Figuras 7 e 8, não seja considerada
Descrição do sistema de escore erro (vide Figuras 20.10 e 20.11).
Fragmentação. Este erro se refere à quebra
Embora muitos erros sejam possíveis no Ben- da figura em partes, com destruição da Ges-
der, o sistema inclui apenas 12 distorções, que talt ou ao incompletamento da figura (exceto

334 JUREMA ALCIDES CUNHA


ROTAÇÃO ras, exceto a 4 e a 6. Exemplos: na Figura 1,
DIFICULDA DE fazer traços em vez de pontos (se o desvio é
DE FECHAMENTO
extremo e persistente); na Figura 2, laçadas,
em vez de círculos; na Figura A, triângulo ou
quadrado, pelo losango, ou, na Figura 7, re-
ROTAÇÃO tângulos, pelos hexágonos; na Figura 8, qua-
DIFICULDADE DE
drado pelo losango, ou retângulo, em vez do
SUPERPOSIÇÃO
hexágono. Porém, ângulos por curvas não são
ROTAÇÃO considerados erros, nem a omissão da forma
DIFICULDADE angular da Figura 7 (vide Figura 20.11).
DE
ANGULAÇÃO Perseveração. Este erro se refere à substi-
tuição da unidade do estímulo, que está sen-
IMAGEM do copiado, pela unidade de estímulo da figu-
ESPELHADA
SIMPLIFICAÇÃO
ra precedente (como no caso de substituir os
círculos da Figura 2 pelos pontos da Figura 1,
de substituir os pontos da Figura 3 e da 5 pe-
FIG. 2 FRAGMENTAÇÃO
los círculos da Figura 2) ou à repetição das
PERSEVERAÇÃO unidades ou à sua continuação no desenho,
ROTAÇÃO (INVERSÃO DA ANGULAÇÃO)
além dos limites impostos pelo estímulo (como
fazer 4 pontos ou mais, na Figura 1, ou 13 ou
mais colunas, na Figura 2). O primeiro tipo de
COESÃO
perseveração se aplica às Figuras 2, 3 e 5 e o
SIMPLIFICAÇÃO IMAGEM ESPELHADA segundo tipo, às Figuras 1, 2 e 3, mas, embora
SIMPLIFICAÇÃO haja dois tipos, conta-se como um erro só. Tam-
bém se considera perseveração quando são
SIMPLIFICAÇÃO acrescentadas uma ou mais carreiras de círcu-
los na Figura 2 ou na Figura 3 (vide Figuras
20.10 e 20.11).
Colisão ou tendência à colisão. Este erro se
Figura 20.10 Exemplos de erros considerados no siste- refere ao toque ou à superposição de uma fi-
ma de escore de adaptação Lacks.
gura por outra ou, mesmo quando não chega
a haver toque, quando duas figuras são dese-
nhadas de forma que o espaço entre elas seja
por recusa do sujeito em completá-la) e se apli- menor que 6,35 mm, caso em que se caracte-
ca a todas as figuras. Exemplos: Figura 1, divi- riza uma tendência à colisão. Aplica-se a todas
dida em duas carreiras; Figura 2, com quatro as figuras.
grupos de duas colunas cada um, separados Impotência. Este erro se refere a “expres-
entre si, ou como uma longa carreira de 33 cír- sões comportamentais ou verbais de incapaci-
culos, ou, ainda, como amontoado de círcu- dade de desenhar uma figura corretamente
los, com destruição da Gestalt; Figura 5, com a (muitas vezes acompanhada de afirmações
extensão para a esquerda ou penetrando no como ‘Eu sei que este desenho não está corre-
arco; Figuras 1 ou 2, com seis ou menos unida- to, mas não consigo fazê-lo certo’)”. Aplica-se
des; Figura 4, sem a curva ou sem uma das três a todas as figuras. O sujeito pode repetir vá-
retas; Figura 5, sem a extensão, etc. (vide Figu- rias vezes o mesmo desenho, apagá-lo repeti-
ra 20.10). damente, sem conseguir corrigir as impreci-
Retrogressão. Este erro se refere à repre- sões, ou o próprio sujeito reconhece o erro e
sentação do estímulo de forma mais primitiva, “tenta corrigi-lo sem sucesso, ou expressa in-
de um ponto de vista maturacional (compare capacidade para corrigi-lo”. Não se atribui es-
com Simplificação) e se aplica a todas as figu- core quando o sujeito realmente consegue cor-

PSICODIAGNÓSTICO – V 335
FIG. 1 SIMPLIFICAÇÃO

FIG. A
DIFICULDADE
DE
FECHAMENTO

FIG. 2
RETROGRESSÃO

FIG. 1 E 2
PERSEVERAÇÃO

Figura 20.11 Exemplos de erros de simplificação, retrogressão, dificuldade de fechamento e perseveração da


adaptação Lacks.

rigir o erro feito, numa segunda tentativa guras A, 4, 7 e 8. Atribui-se o escore, quando
(p.100-101) (vide Figura 20.12). há problemas consistentes, pelo menos em
Dificuldade de fechamento. Este erro se re- duas figuras, entre três (A, 4 e 8), ou quando
fere à junção de subpartes ou das partes adja- existe “um problema significativo, no fecha-
centes de uma figura. Aplica-se apenas às Fi- mento dos círculos ou figuras, ou, ainda, nas

Figura 20.12 Exem-


plos do erro de impo-
tência da adaptação
Lacks.

336 JUREMA ALCIDES CUNHA


partes adjacentes de uma figura”, ou, além dis- tória de homicídio, mas com o diagnóstico de
so, quando há “marcantes aberturas, superposi- esquizofrenia paranóide.
ções, reelaboração do desenho, tracejamento, Para o registro dos resultados, será utiliza-
rasuras, pressão aumentada, nos pontos em que da uma cópia traduzida do sumário de escores
as partes do desenho se juntam”. Todavia, quan- de Lacks (as Figuras 20.13, 20.14 e 20.15 refe-
do há um espaço entre as subpartes maior que rem-se aos casos 1, 2 e 3 respectivamente).
3,2 mm, atribui-se escore para Simplificação
(p.102-104) (vide Figuras 20.10 e 20.11).
Falta de coordenação motora. Este erro se Caso ilustrativo no 1
refere à “irregularidade das linhas (semelhantes
a tremor), especialmente com forte pressão”. É Sumário de escore do teste Bender-Gestalt*
importante observar a conduta e verificar se a (adaptação Lacks)
superfície em que o sujeito desenha é lisa (p.105).
Dificuldade de angulação. Este erro pode Nome: F.M.
ser definido como “dificuldade severa na re- Idade: 30 anos Sexo: masculino
produção da angulação das figuras”. Aplica- Educação: analfabeto Raça:
se somente à Figura 2 e à 3, especialmente à
última. Por exemplo, atribui-se este escore
quando as colunas da Figura 2 são desenha-
das sem inclinação, ou quando mais da meta-
de das colunas varia quanto à angulação (se a
inclinação é contrária à do estímulo, atribui-se
escore para Rotação), quando toda a figura
apresenta uma angulação de 45 a 80º (mas, se
é maior que 80º, atribui-se escore para Rota-
ção) (p.106-107) (vide Figura 20.10).
Coesão. Este erro se refere ao tamanho re-
lativo e se aplica a todas as figuras. Considera-
se que existe coesão quando uma subparte da
figura é reproduzida “mais de 1/3 menor que
as dimensões usadas no restante da figura”,
ou quando existe “aumento ou diminuição no
tamanho de uma figura de 1/3 das dimensões
usadas nos outros desenhos (não se compara
com o tamanho das figuras dos cartões-estí-
mulo). Exclua as partes do desenho que são
mais compridas, devido à Perseveração” (p.108-
109) (vide Figura 20.10).
A seguir, são apresentados dois casos, am-
bos internados em hospital psiquiátrico foren-
se por história de homicídio e com diagnóstico
de transtorno mental orgânico, com sintomas
convulsivos e psicóticos; o primeiro, com 30
anos, do sexo masculino, levou mais de 30
minutos para a cópia das figuras Bender; o se-
gundo, com 35 anos, do sexo masculino, le- Figura 20.13 Protocolo Bender de um paciente de 30
vou cerca de 14 minutos. A seguir, será apre- anos, com transtorno orgânico cerebral.
sentado um terceiro caso, de outro paciente,
internado no mesmo local, também com his- *N. da A. Tradução do sumário de escore Lacks.

PSICODIAGNÓSTICO – V 337
Ocupação: sem emprego fixo ___ Evidência de fadiga
Observações comportamentais ___ Atenção insuficiente ao estímulo
___ Extremamente rápido e execução
___ Evidência de fadiga descuidada
___ Atenção insuficiente ao estímulo ___ Extremo cuidado e deliberação
___ Extremamente rápido e execução ___ Insatisfação expressa em relação aos
descuidada desenhos mal executados ou tentativas
___ Extremo cuidado e deliberação repetidas de corrigir erros, sem sucesso
___ Insatisfação expressa em relação aos X Falta de coordenação motora ou tremor
___
desenhos mal executados ou tentativas da mão
repetidas de corrigir erros, sem sucesso X Rotação (nas Figuras 3 e 5)
___
___ Falta de coordenação motora ou ___ Aparente dificuldade de enxergar as
tremor da mão figuras
X Rotação (na Figura 5)
___ X Outros comentários: A superfície da mesa
___
___ Aparente dificuldade de enxergar as figuras era áspera, mas foi possível observar
___
X Outros comentários: A superfície da tremor nas mãos.
mesa era áspera. ___ Tempo: 14 minutos
Tempo: 40 minutos
Lista de escore
Lista de escore
X
___ 1. Rotação
___
X 1. Rotação ___ 2. Dificuldade de superposição
___
X 2. Dificuldade de superposição ___
X 3. Simplificação
___ 3. Simplificação ___ 4. Fragmentação
___ 4. Fragmentação ___
X 5. Retrogressão
___
X 5. Retrogressão ___ 6. Perseveração
___ 6. Perseveração ___ 7. Colisão ou tendência à colisão
___
X 7. Colisão ou tendência à colisão ___ 8. Impotência
___ 8. Impotência ___ 9. Dificuldade de fechamento
___ 9. Dificuldade de fechamento ___
X 10. Falta de coordenação motora
___ 10. Falta de coordenação motora ___
X 11. Dificuldade de angulação
___ 11. Dificuldade de angulação ___
X 12. Coesão
___ 12. Coesão ___ Tempo maior que 15 minutos
___
X Tempo maior que 15 minutos
Escore total: 6 erros
Escore total: 5 erros Diagnóstico do teste: Disfunção orgânica
Diagnóstico do teste: Disfunção orgânica cerebral cerebral

Caso ilustrativo no 2 Caso ilustrativo no 3

Sumário de escore do teste Bender-Gestalt Sumário de escore do teste Bender-Gestalt


(adaptação Lacks) (adaptação Lacks)

Nome: D.B. Nome: C.S.


Idade: 35 anos Sexo: masculino Idade: 24 anos Sexo: feminino
Educação: 5 anos Raça: Educação: 5 anos Raça:
Ocupação: agricultor Ocupação: desempregada
Observações comportamentais Observações comportamentais

338 JUREMA ALCIDES CUNHA


Lista de escore

___ 1. Rotação
___ 2. Dificuldade de superposição
___ 3. Simplificação
___ 4. Fragmentação
___ 5. Retrogressão
___
X 6. Perseveração
___ 7. Colisão ou tendência à colisão
___ 8. Impotência
___
X 9. Dificuldade de fechamento
___ 10. Falta de coordenação motora
___ 11. Dificuldade de angulação
___ 12. Coesão
___ Tempo maior que 15 minutos

Escore total: 3 erros


Diagnóstico do teste: Ausência de disfunção
orgânica cerebral

Figura 20.14 Protocolo Bender de um paciente de 35


anos, com transtorno orgânico cerebral.

___ Evidência de fadiga


___ Atenção insuficiente ao estímulo
___ Extremamente rápido e execução
descuidada
___ Extremo cuidado e deliberação
___ Insatisfação expressa em relação
aos desenhos mal executados ou
tentativas repetidas de corrigir erros,
sem sucesso
___ Falta de coordenação motora ou tremor
da mão
___ Rotação (na Figura 5)
___
X Aparente dificuldade de enxergar as
figuras
___ Outros comentários: A superfície da
mesa era áspera. Figura 20.15 Protocolo Bender de um paciente psiquiá-
Tempo: 10 minutos trico de 24 anos, com esquizofrenia paranóide.

PSICODIAGNÓSTICO – V 339
MÓDULO IX – Técnicas de Manchas de Tinta

A o se utilizar técnicas de manchas de tinta,


a pressuposição básica é de que a forma
como o sujeito percebe estruturalmente os es-
estímulo à fantasia”. Neste caso, a pressuposi-
ção é de que a ambigüidade dos estímulos
constitua um veículo apropriado para a proje-
tímulos ambíguos reflete o seu comportamen- ção das necessidades do sujeito, por meio do
to em outras situações de vida real, que envol- uso de representações simbólicas, de modo que
vem operacionalmente idênticos aspectos psi- o psicólogo lança mão de seu “referencial teó-
cológicos. Em outras palavras, pode-se supor rico e de sua experiência clínica para associar
que, ao testar o sujeito, obtém-se uma amos- símbolos e dinâmica” (Erdberg, 1990, p.389).
tra perceptocognitiva de sua experiência de Neste tema, serão apresentadas, em breves
contato com a realidade. Em princípio, a tare- tomadas, diferentes abordagens de técnicas de
fa proposta constitui um processo de solução manchas de tinta – a) do Rorschach como ta-
de problema “que não força os sujeitos neces- refa perceptocognitiva, segundo Klopfer (como
sariamente à projeção” (Exner, 1983, p.77), abordagem tradicional) e conforme Exner (por
“exigindo uma adaptação a estímulos exterio- sua importância metodológica), b) do Rorschach
res estabelecidos, quer dizer, põe em jogo a como estímulo à fantasia (como proposta de
função de realidade” (Rorschach, 1948, p.120). avaliação projetiva das respostas), e, finalmente,
Entretanto, o material de manchas de tinta c) do Z-teste (por reunir vantagens como técnica
também pode ser conceitualizado “como um de manchas de tintas, mas de forma sucinta).

340 JUREMA ALCIDES CUNHA


Rorschach “tradicional”:
noções de Klopfer*
Jurema Alcides Cunha
21
INTRODUÇÃO poder ser analisado o seu comportamento ver-
bal e não-verbal, para a identificação de pe-
Inicialmente, serão considerados alguns aspec- quenos sinais ou da emissão de interjeições
tos em parte comuns a outras técnicas, mas (como “ham”, “hem”), não controladas, espon-
que devem ser levados em conta com muita tâneas, mas que podem servir de estímulos para
seriedade, dada a complexidade específica do suscitar certas respostas do examinando.
instrumento. Em segundo lugar, sendo o instrumento
Em primeiro lugar, é preciso ter em mente bastante complexo e difícil, a adequação de
que a situação em que o teste é realizado é sua utilização fica muito dependente do apren-
escassamente estruturada, tornando-se difícil dizado do estudante. Portanto, desde o enten-
o controle de certas variáveis associadas a ca- dimento da interação clínica, a identificação
racterísticas individuais do psicólogo, durante do que é uma verbalização classificável, até a
a administração e o inquérito. Entretanto, pes- atribuição correta dos escores, levantamento
quisas têm demonstrado que determinadas de freqüências e cálculo de índices, como base
atitudes do examinador podem facilitar ou ini- para o estabelecimento de hipóteses interpre-
bir a produtividade, e certos reforços incons- tativas, o traçado de um psicograma, a inte-
cientes podem induzir alguns tipos de respos- gração dos dados para permitir chegar a in-
tas, influenciando escores e pondo em risco a ferências diagnósticas, há todo um trabalho
validade da técnica. Ora, geralmente, durante exaustivo, cuja qualidade depende, de um modo
a fase do aprendizado ou de um curso de es- geral, da formação de graduação e pós-gradua-
pecialização na técnica, o que o professor ou o ção, da experiência com variado tipo de pacien-
supervisor recebe é o produto final, após a rea- tes e do constante manejo dos manuais de tex-
lização do exame. Não obstante, por razões to. Contudo, tudo isso não substitui a capacida-
didáticas, parece recomendável observar e gra- de de realizar um bom inquérito, o que pressu-
var várias administrações do aluno, natural- põe anos de supervisão segura e competente.
mente feitas sem finalidades diagnósticas, para Em terceiro lugar, embora clinicamente po-
tente, o Rorschach tem suas limitações, e deve-
se discernir quando o seu uso é indicado. Nota-
*Este texto foi apresentado, de forma mais extensa, na
se que, se por um lado, num protocolo, é rela-
edição anterior, com o título de “Rorschach, como ta-
refa perceptocognitiva”. tivamente fácil distinguir uma depressão situa-

PSICODIAGNÓSTICO – V 341
cional de quadros depressivos crônicos, por A administração propriamente dita, ou per-
outro lado, é extremamente difícil fazer o dife- formance, também é denominada de fase de
rencial entre “o depressivo unipolar crônico do associação livre. Contudo, essa denominação
bipolar (maníaco-depressivo) usando apenas os não parece englobar todas as operações e pro-
dados do Rorschach, porque o último inclui, cessos que ocorrem no sujeito, além de se re-
muitas vezes, os mesmos tipos de característi- ferir apenas a um comportamento ulterior às
cas que o primeiro”. Também, “a diferencia- instruções. A administração propriamente dita
ção diagnóstica de perturbações menos seve- abrange desde a maneira como sentam o E e o
ras é ainda mais difícil, embora nem sempre S, a entrega da lâminas e instruções, a anota-
impossível” (Exner, 1983, p.88). Ademais, o ção do tempo de reação e do tempo total e o
teste é sensível a variações dentro de um qua- registro do comportamento verbal e não-ver-
dro clínico, associadas com a duração da doen- bal do sujeito. Por outro lado, segundo estu-
ça, à sua severidade, à ação de algumas dro- dos realizados, a primeira operação que ocor-
gas terapêuticas, de modo que a lista de indi- re no sujeito é a da classificação. Dados prove-
cadores diagnósticos nem sempre é adequada nientes do input são comparados com aqueles
ao caso individual. Por tais razões, muitas ve- já armazenados, de onde pode resultar um gran-
zes as conclusões baseadas unicamente no de número de respostas para cada lâmina. En-
Rorschach apresentam discordâncias com diag- tretanto, o output decorre de algum processo
nósticos clínicos, calcados em observações pro- de censura ou discriminação, sendo a resposta
longadas. Assim, não se pode fazer uma supe- também determinada sob a influência do estilo
restimativa do instrumento, e não é adequado próprio do sujeito e de seu estado psicológico
usá-lo para uma análise às cegas, exceto com no momento da testagem (Exner, 1983). Portan-
objetivo de pesquisa. O conhecimento da histó- to, parece que a denominação de associação li-
ria do sujeito é fundamental e representa uma vre é por demais específica para caracterizar to-
garantia em termos de precisão diagnóstica. E, das as operações e processos que têm lugar.
mesmo que nem sempre os dados permitam O inquérito parece constituir a fase mais im-
conclusões diagnósticas, eles são importantes na portante de toda a administração, porque deve
avaliação da personalidade e na identificação de fornecer subsídios para tornar clinicamente
áreas que devem ser focalizadas na terapia. úteis as verbalizações registradas durante a
Em quarto lugar, uma vez que toda a fun- primeira fase. Como o seu objetivo é o de ave-
damentação para a classificação das respostas riguar aspectos perceptocognitivos subjacen-
está na existência de um material que desen- tes às respostas, deve partir das próprias ver-
cadeia operações perceptocognitivas e em re- balizações do sujeito, restringindo-se, tanto
lação ao qual se testam a qualidade e a especi- quanto possível, à terminologia por ele utiliza-
ficidade das respostas do sujeito, somente uma da. Não obstante, seu referencial básico é o
administração adequada e um inquérito satis- material da mancha, de modo que envolve um
fatório podem garantir a qualidade científica constante redirecionamento do sujeito para a
dos resultados. área da lâmina selecionada. Em razão disso, o
examinador precisa ter uma familiaridade mui-
to grande com as características da mancha,
O exame porque estas vão subsidiar as hipóteses que
serão testadas durante o inquérito, embora
O exame inclui quatro partes ou fases: adminis- suas perguntas devam ser, na medida do pos-
tração propriamente dita, inquérito, período de sível, neutras e rotineiras, subentendendo-se a
analogia e teste de limites. Seus objetivos, os existência de um roteiro implícito.
comportamentos específicos do examinador, as Geralmente um bom inquérito torna dispen-
características da situação e o tipo de interação sável o período de analogia. Porém, este se jus-
que se estabelece entre o examinador (E) e o su- tifica quando permanecem dúvidas sobre as-
jeito (S) são resumidos no Quadro 21.1. pectos importantes, em especial se são essen-

342 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 21.1 Teste de Rorschach: fases do exame
Fases do exame e objetivos Comportamentos específicos Características Interação ExS
do examinador da situação
ADMINISTRAÇÃO PROPRIA 1. Obter respostas ao mate- 1. Relativamente padro- 1. Mínima, em nível
MENTE DITA, PERFORMANCE rial-estímulo: verbalizações e nizada quanto a material consciente.
OU FASE DE ASSOCIAÇÃO reações não-verbais. e instruções. 2. O papel do S é ativo,
LIVRE 2. Registrar o comporta- 2. Permissiva, não estru- assumindo o controle
Objetivo: obter uma mento verbal e não-verbal turada: o S deve interpre- da situação.
amostra do comportamento do sujeito. tar as instruções e assu-
do sujeito. mir a responsabilidade
pelo manejo da situação.
3. Nova (teste) ou relati-
vamente nova (reteste).
INQUÉRITO 1. Identificar unidades de 1. Mais padronizada: o 1. Há mais interação ExS
Objetivo: averiguar aspectos escore e área da mancha à referencial essencial para que na fase anterior.
perceptocognitivos subja- qual se referem. o sujeito é o material da
centes às respostas. 2. Identificar características mancha; as perguntas
do estímulo que determina- são neutras e rotineiras.
ram o percepto. 2. Mais estruturada: há
3. Explorar as especificações regras e um roteiro implí-
do percepto. cito, e o vocabulário
4. Avaliar o grau de usado deve usar a termi-
adaptação do conceito à nologia do sujeito, ou
área da mancha. ficar muito próximo à
5. Classificar as respostas, mesma.
atribuindo escores principais 3. Tanto quanto possível
e adicionais e avaliar o nível não diretiva, não suges-
formal. tiva.
PERÍODO DE ANALOGIA 1. Investigar se o determi- 1. Mais diretiva. 1. Há mais interação ExS
(fase facultativa) nante usado numa resposta 2. Mais padronizada. que na fase anterior e
Objetivo: esclarecer proble- é aplicável a outras. 3. Menos estruturada, menos que na
mas de escore. 2. Atribuir escore adicional embora o referencial subseqüente.
para determinante, nas para as perguntas sejam
respostas a que se aplica. os perceptos de S.
TESTE DE LIMITES 1. Reestruturar a situação, 1. Mais diretiva e, se 1. A relação pode ser
(fase facultativa) reorientando o sujeito, para necessário, sugestiva. alterada, a critério do E,
Objetivo: testar testar atitudes, capacidades 2. Menos padronizada. de qualquer maneira
hipóteses do E. subjacentes, dificuldades, 3. Altamente estruturada útil.
através de procedimentos para o S e flexível para
variáveis. o E.

ciais para um diagnóstico diferencial. Caso con- desempenho do sujeito em futuro reteste, de
trário, não deve ser utilizado, pois, se resolve modo que deve se restringir à testagem de hi-
problemas na testagem atual, pode trazer in- póteses realmente fundamentais no contexto
terferências para a produção de respostas ge- geral da avaliação.
nuínas, numa situação de reteste. Há autores que sugerem a utilização de pro-
Teste dos limites é um recurso conveniente cedimentos adicionais. Um deles prevê a soli-
para testar reações específicas a determinadas citação de uma última resposta, após o com-
lâminas (como indícios de choque, manifesta- pletamento da lâmina X, embora alguns prefi-
ções afetivas, etc.) e para avaliar potenciais do ram pedir uma resposta diferente. O procedi-
sujeito. Entretanto, quanto menos sugestiva mento não altera a administração tradicional,
puder ser esta fase, menos comprometerá o mas acrescenta um item, que pode ter impli-

PSICODIAGNÓSTICO – V 343
cações importantes não só no que se refere a Dificuldades ou fracasso na realização ou
recursos intelectuais pessoais, mas de um pon- no manejo da situação do teste
to de vista qualitativo.
Subentende-se que, antes da administração,
haja necessidade do estabelecimento de um
ADMINISTRAÇÃO bom rapport. Contudo, para Klopfer e Kelley
(1946), ainda que o considerem desejável, não
Objetivo, definições operacionais e lhes parece que seja essencial, achando que o
pressuposição básica que realmente importa é que o examinador
realmente perceba e compreenda o tipo de re-
O objetivo da administração é o de obter uma lação estabelecida entre S e E e o valor-estímu-
amostra do comportamento do sujeito, numa lo de sua pessoa, dentro da interação. Não obs-
situação-estímulo relativamente padronizada, tante, as condições atuais do sujeito podem
mas ambígua, não-estruturada, nova para o su- interferir ou comprometer o seu desempenho
jeito. e devem ser adequadamente avaliadas. Tais
dificuldades são apresentadas no Quadro 21.2.
Entretanto, em geral, não há problemas
Definições operacionais dignos de nota, no sentido de invalidar os re-

Amostra do comportamento do sujeito refere-se


ao conjunto de verbalizações e de respostas não- QUADRO 21.2 Dificuldades que interferem ou
verbais do sujeito frente à situação-estímulo. comprometem o desempenho no teste de
Rorschach
Situação-estímulo relativamente padroniza-
da refere-se a uma situação em que o material 1. O sujeito parece incapaz de comunicar-se de forma
útil; seu comportamento oferece alguns indícios
é padronizado, assim como o são os aspectos
qualitativos significativos, apenas.
essenciais das instruções e as respostas a per- 2. A presença de sintomas alucinatórios, delirantes ou
guntas ou solicitações do S. Porém, como po- confusionais compromete a produção de respos-
dem ser subentendidos fatores conscientes e tas úteis.
inconscientes concernentes ao S e ao E e à in- 3. O sujeito mostra-se errático, sem controle para evi-
tar referências freqüentes a fatos da vida pessoal,
teração, tal situação é apenas relativamente
preocupações e/ou sintomas, de modo a não man-
padronizada, por não ser possível o controle ter a atenção dirigida para o estímulo, a não ser
de todas as variáveis. por momentos eventuais.
Situação ambígua, não-estruturada, refere- 4. O sujeito demonstra evidente dificuldade de se con-
se à vaguidade das instruções do E, de modo centrar, por fatores situacionais que envolvem con-
dições físicas (fadiga, fome, frio, etc.).
que o S as interpreta e assume a responsabili-
5. O sujeito manifesta sinais ou refere sintomas de
dade sobre o modo de agir. inibição, excitação, sono, etc., provavelmente as-
Situação nova refere-se ao desconhecimen- sociados a efeitos de drogas utilizadas como medi-
to do material ou da situação por parte do su- camento ou não.
jeito, no caso de teste. Em reteste, pressupõe- 6. O sujeito é tão limitado intelectualmente, ou tão
deteriorado, que a tarefa resulta desencorajadora,
se que uma série de fatores (como desenvolvi-
tanto para ele, quanto para o examinador.
mento, psicoterapia, etc.) haja influído sobre 7. O sujeito demonstra dificuldade em se concentrar,
o S, no intervalo entre teste-reteste, de modo associada a uma situação de vida estressante.
que a sua aproximação da situação-estímulo 8. O sujeito mostra dificuldades, aparentemente por
contenha elementos novos. problemas socioculturais, tais como baixo nível edu-
cacional, falta de familiaridade com tarefas dessa
A pressuposição básica é de que a amostra
natureza, etc.
do comportamento de S possa fundamentar 9. O sujeito demonstra dificuldades de outra nature-
hipóteses interpretativas, que permitam se che- za. Especifique:
gar a inferências sobre a estrutura e o funcio- 10. Não há informações específicas ou não se observa-
namento de sua personalidade. ram dificuldades especiais.

344 JUREMA ALCIDES CUNHA


sultados, podendo ocorrer com pacientes que postas de sujeitos cujas condições de vida en-
apresentam transtornos mentais mais severos. volviam ou não fatores estressantes. Os resul-
Assim, numa pesquisa, em que coordenamos tados apoiaram a hipótese de que o estresse
a testagem de pacientes psiquiátricos, em sua se torna manifesto no material Rorschach, po-
maioria de classe baixa, examinados em uni- rém, o autor achou que seriam necessárias mais
dades hospitalares no Rio de Janeiro, verificou- investigações para averiguar os tipos específi-
se que mais da metade apresentou uma atitu- cos de estresse que produzem tais efeitos, as
de submissa, dócil e cooperadora, e cerca de condições em que isso se verifica e a duração
19% deles “mostraram dúvida, suspeição ou da influência dos mesmos, admitindo também
medo, seja em relação ao teste ou à situação”, a existência de diferenças individuais.
mas “27% manifestaram a emergência de com-
portamento delirante ou confusional ou, ain-
da, sinais de inibição ou de excitação” (Brody AS INSTRUÇÕES
et alii, 1973, p.468).
Entre sujeitos com problemas menos sérios Rorschach (1948) costumava entregar as lâmi-
ou considerados normais, dificilmente se veri- nas sucessivamente ao sujeito, com a pergun-
fica alguma dificuldade. Pode ocorrer, eventual- ta: “Que você vê aí?” (p.20). Klopfer e Kelley
mente, um problema, porque o paciente só ao (1946) acham que tal instrução pode ser mal-
final da administração refere dificuldades por entendida, suscitando respostas descritivas.
falta de óculos e, usando-os durante o inqué- Exner (1983), por exemplo, comenta que o fato
rito, no dia subseqüente, chega a alterar uma de Beck acrescentar às instruções “... e diga-
série de respostas. Esta é uma situação rara, me tudo o que você vê aí” (p.81) acarreta um
mas convém preveni-la, perguntando ao exa- acréscimo de mais dez respostas do que com
minando, antes da administração, se costuma as instruções padronizadas que utiliza, que
fazer uso de óculos ou de lentes. proporcionam um protocolo comumente com
Mais comumente, pode acontecer que es- 18 a 23 respostas.
tados emocionais, provocados por fatores si- Klopfer e Davidson (1966) procuram dar
tuacionais, levem à emergência de determina- uma explicação sucinta sobre como se pode
dos tipos de respostas. Sempre lembramos uma obter as manchas de tinta (mantendo as lâmi-
situação, em que utilizávamos o Rorschach nas sobre a mesa, com as manchas para baixo)
numa seleção para uma universidade, atenden- e acrescentam: “Nestas lâminas com manchas
do a vários candidatos, durante a tarde. Cedo, de tinta, as pessoas vêem todo tipo de coisas.
começara um incêndio de proporções calami- Agora, diga-me o que você vê, o que poderia
tosas, com um grande número de vítimas fa- ser, em que o faz pensar?”(p.35).
tais, em um magazine de vários andares, no Costumamos, com as lâminas viradas para
centro da cidade, cerca de seis quarteirões de baixo sobre a mesa, dizer: “Vou lhe mostrar
distância do local de testagem. Apesar de dar- isto aqui e quero que você me diga o que vê,
nos conta do deslocamento de bombeiros, não com que se parece, o que poderia ser”. Apre-
sabíamos precisamente o que estava ocorren- sentamos a primeira lâmina, acrescentando ao
do. Todavia, foi impressionante o número de mesmo tempo: “Quando terminar, me entre-
respostas de “nuvem” e “fumaça” produzido gue a lâmina”. No momento em que se passa
pelos candidatos, que iam chegando durante a lâmina para o sujeito, começamos a marcar
a tarde. Porém, só ficaram claros tais indícios o tempo.
de ansiedade quando tomamos conhecimen- Não fazemos referência ao fato de serem
to das proporções da tragédia, algumas horas manchas de tinta, nem à maneira como são
depois. Aliás, há estudos que demonstram feitas. Se o sujeito diz “É uma mancha de tin-
como acontecimentos estressantes se manifes- ta”, confirmamos simplesmente: “Sim, é uma
tam nos protocolos Rorschach. Aron (1982) mancha de tinta. Com que se parece? Que é
desenvolveu uma pesquisa, comparando res- que poderia ser?” Também não salientamos

PSICODIAGNÓSTICO – V 345
que não existem respostas certas ou erradas,
como alguns autores. Se o sujeito dá uma res-
posta e pergunta se está certo, respondemos:
Stop
“Não há respostas certas ou erradas”.
Não dizemos que a lâmina pode ser olha-
da em qualquer posição, exceto quando o su-
jeito, após trabalhar com a lâmina na posi-
ção normal, a gira, voltando à posição ini- Start
cial. Neste caso, se pergunta se pode girar a
lâmina, dizemos que pode olhá-la como qui-
ser. Esta, como qualquer outra observação
do examinador, deve ser feita em tom casual,
não sugestivo. A posição da lâmina deve ser
registrada com um ângulo, cujo vértice indi-
ca a parte superior, e os giros, com uma es-
piral. Fonte: Exner, 1983, p.80.
Anota-se o tempo transcorrido até a primei-
ra resposta e o tempo total. Às vezes, a pessoa Figura 21.1 Atividade de exploração ocular da Lâmina
III de uma mulher de 24 anos, durante um intervalo de
faz um comentário ou começa com observa- 900 milissegundos.
ções de caráter descritivo. Recomenda-se que
seja anotado o tempo até que o sujeito verba-
lize qualquer coisa, pareça esta um comentá- IDENTIFICAÇÃO DAS UNIDADES DE ESCORE
rio ou não, e o tempo até o que constitui apa-
rentemente uma resposta. Isto é importante Os padrões de comportamento do sujeito,
porque há verbalizações que são classificáveis como reação aos estímulos das manchas, pro-
e outras não, o que, às vezes, só se pode iden- duzem-se, fundamentalmente, na forma de
tificar no inquérito. verbalizações e, só complementarmente, são
Sobre o tempo que o sujeito deve perma- verificáveis por outras características.
necer com a lâmina, antes que se caracterize É preciso que o sujeito seja capaz de se co-
um fracasso, os autores variam. Geralmente, municar de forma útil para que forneça verba-
após um minuto, costumamos usar algum es- lizações classificáveis ou respostas. Uma res-
tímulo como “Com que se parece?” ou “Pode posta é uma unidade básica de escore.
começar!”, utilizando o mesmo tipo de incen- É necessário dividir o protocolo em respos-
tivo ou outros, sempre neutros, quando o su- tas isoladas ou unidades básicas de escore. A
jeito chega aos dois minutos, sem resposta. Na identificação das unidades de escore nem sem-
Figura 21.1, vemos que um sujeito é capaz de pre é fácil e exige a consideração de três as-
explorar visualmente toda a lâmina, num pe- pectos essenciais: a intenção do sujeito e sua
ríodo de 900 milissegundos, padrão que é capacidade de lidar com os estímulos de ma-
muito semelhante ao usado por outros indiví- neira interpretativa, as pressuposições do su-
duos. jeito sobre a área da mancha e a organização
A experiência mostra que o tempo além de ou o grau de independência dos conceitos.
três minutos dificilmente resulta proveitoso.
Neste caso, costumamos dizer “Vamos experi-
mentar outra”, recolhendo a lâmina, a não ser A intenção do sujeito e sua capacidade de
que o sujeito expresse o desejo de continuar. lidar com os estímulos de maneira
No caso de fracasso ou rejeição, não se conta interpretativa
o tempo que o sujeito permaneceu com a lâ-
mina para cálculo da média do tempo por res- Geralmente, é relativamente simples distinguir
posta. respostas de comentários. Entende-se uma res-

346 JUREMA ALCIDES CUNHA


posta isolada como um conceito independen- como uma unidade de escore, determinada seja
te, nitidamente separado dos demais, referido pela forma, pelo sombreado ou pela cor.
a uma porção da mancha claramente identifi-
cável ou a toda a mancha, que pode ser classi-
ficável em termos das características dos estí- As pressuposições do sujeito sobre a área
mulos que a determinam. Portanto, se na ad- da mancha
ministração propriamente dita o sujeito vê uma
borboleta preta, referente a toda a mancha, e Uma área da mancha desperta a atenção do
o corpo de uma mulher, no detalhe central da sujeito e provoca reações de sua parte, que
Lâmina I, podemos destacar dois conceitos in- podem ser identificáveis como uma ou mais
dependentes, nitidamente separados e dados unidades de escore, de acordo com as pressu-
a áreas da mancha claramente identificáveis e posições que o sujeito faz a respeito.
suscetíveis de classificação. As respostas podem envolver alternativas,
Entretanto, por vezes, é necessário investi- correções ou rejeições, conforme o que o su-
gar qual a verdadeira intenção do sujeito e jeito considera que a localização pode “ser”.
definir sua capacidade para lidar com os estí- As pressuposições do sujeito servem de base
mulos ou sua atitude frente a eles. Assim, são para o escore e para a distinção entre respos-
os padrões do comportamento do sujeito que tas principais e adicionais. Existem três pressu-
vão servir de base para a distinção entre res- posições possíveis de parte do sujeito.
posta e comentário. Em primeiro lugar, o sujeito pode pressu-
Em primeiro lugar, pode-se verificar a in- por que cada localização possa “ser” apenas
tenção do sujeito por meio de informações ob- uma coisa. Então, conforme a evidência obti-
tidas no inquérito. Ela pode ser: da, atribui-se o escore correspondente.
a) explícita, quando o sujeito afirma que sua
verbalização constitui uma resposta, embora, Evidência Escore correspondente
em caso de dúvida, deva ser feita uma pergun-
O sujeito mantém a sua atribua escore para uma
ta direta, ainda que não sugestiva, no sentido resposta no inquérito resposta principal
de esclarecer se a verbalização é considerada
O sujeito corrige espon- atribua escore para uma
pelo sujeito como uma resposta ou um comen-
taneamente sua resposta resposta principal somente
tário; no inquérito, elaboran-
b) implícita, quando o sujeito indica a loca- do-a de forma mais
lização, apresenta elaborações e explicações. apropriada
Em segundo lugar, pode-se verificar a ca- O sujeito substitui sua atribua escore para uma
pacidade interpretativa do sujeito por seu resposta por outra resposta principal e um
modo de manejar os estímulos e independen- escore adicional, para a
temente de informações prestadas. Desse resposta rejeitada
modo, a designação de cores, por exemplo, só O sujeito rejeita sua res- atribua escore adicional,
é considerada uma verbalização classificável se posta, sem corrigi-la com uma seta apontando
para a coluna principal
constitui a única maneira de o sujeito lidar com
os estímulos.
Em terceiro lugar, a atitude do sujeito pode Em segundo lugar, o sujeito pode pressu-
ficar definida por sua intenção, explícita ou im- por que cada localização pode “ser” várias coi-
plícita, de dar ou não uma resposta descritiva. sas, e há possibilidade de três alternativas.
Não obstante, é preciso verificar se não se trata
apenas da elaboração de um conceito CF ou C, Evidência Escore correspondente
porque, geralmente, tal atitude revela somente O sujeito dá duas ou mais atribua escore para duas ou
tendências que não são classificáveis. Contudo, respostas para a mesma mais respostas principais
quando ocorrem cinco a seis observações descri- área da mancha, com
tivas em uma lâmina, passam a ser consideradas determinantes diversos

PSICODIAGNÓSTICO – V 347
O sujeito insiste que são atribua escore para duas ou indígenas dançando em torno de um totem”,
duas ou mais respostas, mais respostas principais que pode ser de dois tipos.
embora tenham o mesmo Organização compacta é um tipo de orga-
determinante nização que não justifica a subdivisão das par-
O sujeito usa apenas atribua escore para uma tes componentes. Portanto, estas não recebem
nomes diferentes para o resposta principal escore como respostas principais, a não ser que,
mesmo conceito ou refere na elaboração da resposta, esteja incluído um
conceitos que essencial-
mente representam a
conceito popular ou de nível popular. Neste
mesma coisa caso específico, é atribuído escore como res-
posta principal também a esse conceito, e a
organização é indicada por um parêntese. As
lâminas que mais comumente suscitam respos-
Em terceiro lugar, o sujeito pode pressupor
tas de organização compacta, com localização
que cada localização pode “ser” uma ou outra
W, são a I, IV, V e, às vezes, a II, VI e IX.
coisa.
Organização frouxa é um tipo de organiza-
ção em que as partes componentes podem ser
Evidência Escore correspondente vistas separadamente, quer na administração
Na administração pro- atribua escore para uma propriamente dita, sendo-lhes atribuído esco-
priamente dita, o sujeito resposta principal re principal, quer no inquérito, caso em que
dá duas ou mais recebem escore adicional. A organização das
respostas para a mesma
partes no conceito mais amplo deve ser indi-
localização, admitindo
que são intercambiáveis cada por um parêntese. Respostas de organi-
zação frouxa são mais freqüentes na Lâmina III
Na administração pro- atribua escores para duas
priamente dita, o sujeito respostas principais
e na X.
dá duas respostas para separadas Grau de independência dos conceitos. É
a mesma localização, necessário identificar o que são respostas indi-
insistindo que não são viduais, já que elas constituem as unidades de
intercambiáveis escore. As respostas individuais são registra-
O sujeito dá a segunda atribua escore para uma das separadamente, na folha de escore, classi-
resposta para a mesma resposta principal e para ficadas como principais ou adicionais.
localização, somente no uma adicional
A resposta individual pode ser constituída
inquérito
por um conceito independente ou semi-inde-
O sujeito dá duas res- atribua escore para duas pendente. As especificações são partes essen-
postas para a mesma respostas principais
localização, que têm separadas
ciais de um conceito amplo, acessórios ou atri-
elementos diferentes butos de uma resposta, mas não são respostas
de escore individuais.
O sujeito dá duas res- atribua escore para duas Conceito independente é uma resposta in-
postas para a mesma respostas principais dividual que não se subordina a outra. Ao con-
localização, com espe- separadas ceito independente, atribui-se um escore prin-
cificações diferentes cipal de localização e um escore principal para
para cada uma
cada uma das outras classificações (determi-
nante, conteúdo e popular ou original, se for o
caso), fazendo-se uma estimativa do nível for-
A organização e o grau de independência mal. Além do escore principal, pode compor-
dos conceitos tar escores adicionais. À resposta individual,
com tal característica, mas produzida apenas
Tipos de organização. Nem sempre um concei- no inquérito, atribuem-se escores correspon-
to é simples, como “uma borboleta”. Freqüen- dentes, mas eles são registrados na coluna de
temente, envolve uma organização, como “dois adicionais. Um conceito independente pode ser

348 JUREMA ALCIDES CUNHA


simples ou ter uma organização, compacta ou familiarizado com as categorias de escore, com
frouxa. sua significação interpretativa e, também, com
Conceito semi-independente é uma respos- as características das manchas. Como regra
ta individual que possui uma relação de subor- geral, o examinador deve elaborar suas pergun-
dinação com um conceito global, seja princi- tas com base nas verbalizações do sujeito, mas
pal ou adicional. Justifica um escore separado deve direcionar a atenção deste continuamen-
de localização (principal ou adicional) e um te para as manchas.
escore para cada uma das outras classificações Pode-se introduzir o inquérito dizendo ao
(principal ou adicional), com base nas caracte- sujeito que o teste tem uma segunda parte,
rísticas da área da mancha admitida pelo su- que se vai ler suas respostas e fazer algumas
jeito. Numa organização frouxa, o conceito perguntas a respeito de onde viu cada coisa
semi-independente pode e comumente é visto (se no todo ou em parte da mancha) e do que,
separadamente. Numa organização compacta, na mancha, o levou àquela resposta. Pode-se
corresponde a uma resposta popular ou de ní- acrescentar que, uma vez que duas pessoas
vel popular. podem ver a mesma coisa, cada uma de sua
Especificações são partes essenciais de um maneira, é exatamente esta maneira de ver que
conceito mais amplo, acessórios ou atributos nos interessa conhecer.
de uma resposta individual, que habitualmen-
te não são vistos separadamente. Supõem uma
relação de dependência estrutural ou funcio- Inquérito de localização
nal com uma resposta individual. Não justifi-
cam escores de localização, nem principais nem Segundo Klopfer e Kelley (1946), “é essencial
adicionais. Contudo, podem servir de base para saber exatamente a parte da mancha que está
que se acrescentem escores adicionais de de- sendo utilizada para poder avaliar a precisão
terminantes ao escore da resposta individual, das respostas e a maneira de abordagem usa-
bem como podem contribuir para elevar o seu da pelo sujeito” (p.9). Assim, após a leitura da
nível formal. No entanto, eventualmente, as resposta, pergunta-se a ele se usou o todo ou
especificações são irrelevantes (nada acrescen- parte da mancha e, neste caso, solicita-se que
tando ao escore da resposta individual) ou des- a mostre.
trutivas (que podem acrescentar escores adi- Não se aconselha que o sujeito a delineie
cionais de determinantes, mas diminuir o nível na folha de localização. Além de o examinador
formal). estar mais familiarizado com ela do que o su-
jeito, sendo a reprodução acromática, sem cer-
tas nuanças de sombreado e tendo dimensões
Classificação das respostas conforme o diversas, seria ingênuo pressupor que o sujei-
tipo de organização e o grau de to fosse capaz de localizar com precisão deter-
independência dos conceitos minadas áreas. Então, é preferível solicitar-lhe
que passe o dedo em torno da área seleciona-
As classificações das respostas variam confor- da na lâmina. Às vezes, o próprio desenvolvi-
me o tipo de organização e o grau de indepen- mento do inquérito facilita a localização. Su-
dência dos conceitos, como pode ser observa- ponhamos que o sujeito diga: “Uma pessoa...
do no Quadro 21.3. Aqui estão as pernas”. Pode-se perguntar que
mais vê da pessoa, pedindo-lhe que vá mos-
trando as partes, à medida que as descreve.
INQUÉRITO Mesmo quando parece que se trata de um
conceito popular, é importante proceder da
No que se refere à participação do examinador mesma forma, não só porque a localização
na testagem do Rorschach, esta é a fase mais pode ser diversa da popular, como também
crítica, exigindo que ele esteja completamente porque, às vezes, são feitos acréscimos ou di-

PSICODIAGNÓSTICO – V 349
QUADRO 21.3 Classificação das respostas conforme o tipo de organização e o grau de independência
dos conceitos
Tipo de organização Grau de independência dos conceitos Escore correspondente
Atribua escore principal para localização,
determinante, conteúdo, popular versus
original (se for o caso) e proceda à
Organização compacta Conceito independente estimativa do nível formal. No caso de
haver especificações, acrescente escores
adicionais e considere-os em termos do
nível formal.
Conceito independente Atribua escore principal para localização e
para as demais classificações
Organização compacta e e
Conceito semi-independente atribua escore principal para localização e
de nível popular para as demais classificações, indicando a
conexão por parênteses.
Conceito independente Atribua escore principal para localização e
para as demais classificações
Organização frouxa e e
Conceitos semi-independentes atribua escore principal para localização e
para as demais classificações, para cada um
dos conceitos indicando a conexão por
parênteses.
Conceitos semi-independentes Atribua escore principal para localização e
para as demais classificações, para cada um
dos conceitos,
Organização frouxa e e
construindo cumulativamente um atribua escore adicional para localização e
conceito, com o qual não têm relação outros escores adicionais para o conceito
de dependência essencial global, indicando a conexão por
parênteses.
Conceito independente Atribua escore principal para localização e
para as demais categorias
e e
Organização frouxa Conceitos semi-independentes atribua escore adicional para localização e
dados no inquérito para as demais categorias, para cada um
dos conceitos.

minuições, com a introdução de especificações, subcategorias de Dd, bastante importantes do


construtivas ou destrutivas, que se refletem na ponto de vista diagnóstico.
atribuição dos escores e no nível formal. Em Como há sujeitos muito produtivos, sem-
suma, como uma das nossas tarefas subse- pre é conveniente ter à mão lápis de cor ou
qüentes é a de avaliar a adequação do concei- uma série de canetas de cores variadas, para
to à área da mancha, é muito importante que evitar problemas posteriores na identificação
utilizemos todos os meios para nos assegurar das áreas selecionadas, que devem, ainda, ser
de que sabemos exatamente onde o conceito enumeradas conforme as respostas.
foi percebido. Eventualmente, são utilizadas áreas muito
Para a atribuição do escore de localização, pouco usuais, tornando-se um pouco difícil
é essencial que o examinador tenha um conhe- delimitá-las. Embora nem sempre tal delinea-
cimento perfeito das diferentes classificações mento seja essencial para a atribuição do es-
de localização, em especial no que se refere às core, pode ser importante para o melhor en-

350 JUREMA ALCIDES CUNHA


tendimento do conceito enunciado. Há, inclu- ram dadas especificações (pernas laterais), que
sive, casos muito raros de crianças que seleci- enfraquecem o grau de adequação do concei-
onam uma pequena área no espaço em bran- to à mancha, com conseqüente reflexo no ní-
co circundante, sem uso de qualquer porção vel forma. Forma, então, é sempre uma hipó-
da mancha, que parecem representar uma tese possível, mas precisamos de subsídios para
“aberração alucinatória na função do ego de avaliar a qualidade formal.
percepção da realidade” (Siegel & Marion, Para figuras humanas e de animais, o mo-
1973, p.243). vimento também é sempre uma hipótese pos-
sível. Tal determinante, às vezes, fica comple-
tamente evidente, quando, ao elaborar a sua
Inquérito de determinantes resposta, o sujeito demonstra o movimento ou
a postura. Entretanto, há respostas em que o
Nesta tarefa, é muito importante que o exami- movimento parece implícito, mas o sujeito não
nador esteja familiarizado com os determinan- o admite. Por exemplo, “uma ave com as asas
tes que são facilitados pela própria configura- abertas” é uma resposta que sugere uma pos-
ção e as características das manchas. Como os tura vital, mas que exige um inquérito ulterior,
estímulos desencadeiam operações percepto- porque, muitas vezes, por “asas abertas” o
cognitivas no sujeito, as peculiaridades da área sujeito pretende somente dizer que uma está
selecionada devem servir de base para o levan- de um lado e a outra do outro, sem que esteja
tamento de hipóteses, que serão confirmadas realmente subentendido um mínimo de movi-
ou não, através do inquérito. Não obstante, o mento ou qualquer elemento vital, como no
examinador deve estar atento para não incor- caso de uma borboleta de museu.
rer no erro freqüente de pressupor que o sujei- Outro ponto importante a ser discutido é
to usou um certo determinante numa área es- sobre uma tendência, comum em indivíduos
pecífica, porque a maioria das pessoas costu- mais intelectualizados, a afastar-se do contex-
ma fazê-lo, como, por exemplo, utilizar cor, to do exame e fazer generalizações. Se um su-
numa resposta de “gravata” ou “laço”, para o jeito diz “Um morcego. Os morcegos voam à
detalhe central da Lâmina III. Como comentam noite”, o examinador deve imediatamente in-
Klopfer e Kelley (1946), “o fato de a maioria quirir: “E aqui, na mancha?”, surpreendendo-
das pessoas empregar ou não a cor, sob essas se, às vezes, com a não-admissão do movimen-
circunstâncias, não é tão significativo quanto to na resposta. Dessa maneira, se devemos
o fato de nosso sujeito admitir tê-la usado ou sempre nos ater às verbalizações do sujeito,
não” (p.10). Assim, a pergunta óbvia e funda- usando cada palavra, cada especificação como
mental, no inquérito, é: “O que, na mancha, apoio para novas hipóteses, da mesma manei-
fez com que parecesse....?” ra que este é o nosso referencial, o referencial
“O uso da forma é uma hipótese em qual- do sujeito é a mancha, e o inquérito de deter-
quer caso” (p.10). Além disso, é a justificativa minantes consiste em redirecioná-lo sempre
mais fácil para o sujeito. Contudo, como preci- para o material de teste. São as operações per-
samos avaliar a adequação do conceito à man- ceptocognitivas do sujeito, desencadeadas pela
cha, não devemos nos contentar se o sujeito mancha, que nos interessam, porque é nos
nos diz que foi o formato que determinou a subsídios sobre as mesmas que baseamos o
sua resposta, incentivando-o a falar mais a res- escore que atribuímos.
peito. Por exemplo, um sujeito pode nos dar a Toda área colorida pode suscitar o uso da
resposta “morcego”, para a lâmina V, por cau- cor como determinante. Geralmente, a pergun-
sa da forma. É uma resposta popular e pode- ta “O que, na mancha, faz com que se pareça
ríamos de imediato atribuir o escore. Entretan- com...?”, leva à verbalização do uso da cor, se
to, pedindo-lhe para falar mais a respeito, pode esta constituiu um determinante da resposta,
responder que vê as asas, as pernas, a cabeça a não ser que o sujeito não o admita, por mo-
e mais umas pernas aos lados. Portanto, fo- tivos psicológicos. Sempre é bom utilizar mais

PSICODIAGNÓSTICO – V 351
um incentivo, perguntando “Algo mais, na lâmina acromática, porque há três hipóteses
mancha, ajuda a pensar em...?” Todavia, há possíveis:
casos em que permanecem dúvidas, como na a) o sujeito está usando cor acromática, com
resposta: “Este vermelho me faz pensar em uma escore provável de FC’;
borboleta”. A questão é se o vermelho foi usa- b) está considerando uma “representação
do para localizar o conceito ou funcionou como acromática de cores vivas, como numa foto-
determinante. Deve-se iniciar o inquérito como grafia” (p.134), e o escore é de Fc;
sempre, dizendo: “Você falou em borboleta...” c) está projetando cores, sem o respaldo de
Pode-se utilizar os estímulos usuais, para veri- características da mancha, o que constituiria
ficar se o sujeito elabora espontaneamente o um fenômeno qualitativo.
uso da cor. Caso contrário, convém proceder Por outro lado, numa resposta de “noite,
de forma mais direta, repetindo toda a verba- por causa da cor”, não se subentende cor acro-
lização e perguntando ao sujeito se, ao falar mática, porque o escuro, então, tem “qualida-
em vermelho, houve intenção de localizar a des de difusão e de preenchimento de espa-
borboleta ou se o vermelho ajudou de alguma ço” (p.156).
maneira. Não se pode considerar a pergunta Às vezes, o sujeito fala em cor quando a
sugestiva, porque o próprio sujeito mencionou impressão que teve foi de textura (como na
a cor, e, se sua intenção fosse a de negar o uso resposta “pele de animal”, na Lâmina IV ou VI),
da cor, a pergunta não o impediria de fazê-lo. ainda que este caso seja menos freqüente. É
Assim, mesmo quando a verbalização sugere claro que, se o sujeito acompanha suas pala-
o uso da cor, somente o inquérito vai definir a vras com um movimento dos dedos sobre a
sua utilização. Klopfer e colegas (1954) dão um superfície da mancha, roçando-a de leve, está
exemplo de uma resposta para o D lateral da concretamente nos comunicando a sua impres-
Lâmina X: “Aqui estão duas aranhas azuis”. são de textura. Contudo, em sua maioria, os
Mesmo nesse tipo de verbalização, o uso da sujeitos preferem usar apenas a comunicação
cor não pode ser pressuposto sem ulterior in- verbal. O fato de o sujeito verbalizar que sua
vestigação. Cabe a pergunta: “Você pensa ne- resposta pode envolver textura, em lâminas
las como aranhas azuis ou apenas quis dizer densamente sombreadas, aumenta a probabi-
que estas manchas azuis são aranhas?”. Dessa lidade do uso de tal determinante, mas é o in-
maneira, “o inquérito é essencial” (p.147). En- quérito que vai determinar a sua utilização. A
tretanto, há outra questão crítica, quando a resposta “pele de animal” pode sugerir três
área da mancha cromática apresenta baixa sa- possibilidades:
turação de cor, em especial em marrom, azul e a) o uso do sombreado como textura (Fc);
verde, ou, mesmo, no caso do uso aparente de b) o uso de cor acromática para uma pele
cor em áreas acinzentadas. No inquérito, não mais lisa e malhada (FC’);
basta que o sujeito verbalize que o que o levou c) referência apenas à forma (F+).
ao conceito foram a forma e a cor. É preciso Nem sempre o sujeito tem facilidade de nos
solicitar-lhe que explique melhor a utilização comunicar a impressão que teve. Uma pergunta
da cor, como em um exemplo daqueles auto- adequada é: “Esta pele é vista pelo lado de
res: “Eu não estou muito certo do que você dentro ou pelo lado de fora?” Como a forma
quer dizer por cor. Qual é a cor do...?” (p.170). implícita é a mesma, a resposta à pergunta
Se o sujeito cita uma tonalidade cromática subseqüente, “O que na mancha faz com que
(como azul, verde ou marrom), configura-se o pareça ser vista pelo lado de...?”, muitas vezes
uso da cor e um escore provável de FC, porque é esclarecedora. Se, mesmo assim, não é pos-
a forma foi tomada em consideração. Mas, se sível estabelecer o uso do sombreado como
refere uma tonalidade acromática (cinza, bran- textura, é provável que uma das outras possi-
co ou preto), o escore seria de FC’. bilidades esteja em jogo.
A mesma pergunta deve ser feita quando o Outra hipótese relativa à mesma resposta é
sujeito dá como determinantes forma e cor, em a presença ou não de movimento inanimado,

352 JUREMA ALCIDES CUNHA


como determinante (principal ou adicional), b) uma menção a um animal excessivamen-
quando a pele de animal é vista como “esten- te grande, desproporcional, que pode ser clas-
dida” ou “estendida para secar”. Se está mera- sificado como A ou (A);
mente estendida, a ausência de movimento c) uma figura mitológica, que pode ser (H)
inanimado é quase certa. Este fica estabeleci- ou (A);
do, porém, se, ao explicar a sua impressão, o d) uma pessoa cruel, que seria classificada
sujeito a descreve como “esticada” ou “repu- como H.
xada”, subentendendo algum sentido de ten- Então, é preciso explorar os conceitos, que
são. A pergunta que cabe é: “Você vê esta pele devem ser descritos ou explicados, porque a
de animal como se estivesse no chão ou, por sua classificação vai se refletir não só nas fre-
exemplo, numa parede?” Quando é vista no qüências de certas categorias, como pode ofe-
chão, quase sempre existe uma implicação recer subsídios para a avaliação das relações
meramente posicional, enquanto, se estiver objetais do sujeito e de seu autoconceito.
“pendurada numa parede” ou “esticada para Também, quando é verbalizada uma parte
secar”, a hipótese perdura. A pergunta “O que, do corpo humano, sugere-se uma análise mais
na mancha, dá esta impressão?” quase sem- cuidadosa. Um “dedo”, por exemplo, pode ser:
pre resolve a dúvida. a) uma parte da figura humana ou Hd;
De um modo geral, esses são os problemas b) um “dedo de Deus” ou (Hd);
mais comuns do inquérito de determinantes. c) o “dedo da Justiça” ou (Hd), simb.
O importante, na formulação das perguntas, é Ainda pode existir alguma dúvida com res-
sempre enunciá-las usando a verbalização do postas aparentemente classificáveis como A ou
sujeito como ponto de partida, levando-o a usar Pl, que podem ter conteúdo Alim, se fica su-
a mancha como seu ponto de referência. As- bentendido que estão preparados para comer,
sim, qualquer palavra usada pelo sujeito para ou, também, com conceitos como “ilha” ou
qualificar seus conceitos deve ser levada em “lago”, que podem ser classificados com con-
conta e explorada com cuidado. São as várias teúdo Geo (geografia), Pais (paisagem) ou N
hipóteses possíveis de serem levantadas que fa- (natureza). Nota-se que a paisagem, que en-
zem do inquérito uma tarefa interessante para o globa seres humanos, precisa ser explorada
examinador. Por outro lado, o fato de o sujeito para que se possa definir, pelo inquérito, qual
sentir que o examinador está realmente interes- o componente mais importante, podendo o
sado em sua maneira de perceber os conceitos conteúdo ser N, H ou H, N.
faz com que procure se esforçar em colaborar.

Inquérito de populares
Inquérito de conteúdo
Ainda que quase sempre a resposta popular
O inquérito de conteúdo comumente é dispen- seja óbvia, às vezes subentende certos requisi-
sável, porque a resposta geralmente o torna tos para ser classificada como tal. Por exem-
óbvio. Entretanto, há alguns aspectos aos quais plo, os “animais” da Lâmina II, conforme Klop-
convém fazer alguma referência. Por exemplo, fer e colegas (1954), não podem ter escore
uma “mulher com asas” pode ter um conteú- como popular, a menos que “o focinho esteja
do (H) ou AH. No primeiro caso, trata-se de na região central superior, as orelhas nas pro-
uma figura mitológica, aceitável de um ponto jeções exteriores superiores e as patas (se hou-
de vista lógico; no segundo, refere-se a uma ver) nas projeções inferiores exteriores” (p.205),
adição arbitrária de asas, numa figura em par- além de precisarem ser vistos na posição nor-
te humana e em parte animal. Por outro lado, mal da lâmina. Isso demonstra que a popular
a resposta “monstro” pode constituir: não pode ser classificada sem alguma investi-
a) uma referência a um ser humano com gação do conceito, ainda que mínima. Basta a
configuração anômala, com conteúdo (H); pergunta: “O que na mancha faz com que se

PSICODIAGNÓSTICO – V 353
pareça...?” Se o sujeito responde que “tem o to. Por outro lado, aplica-se o W’ quando o
formato de um cachorro, aqui está o focinho”, sujeito utiliza dois terços da mancha e os con-
pergunta-se o que mais vê do “cachorro”, pe- sidera a parte principal da mesma.
dindo-lhe para indicar a localização. A classificação DW somente é utilizada
Evidentemente, devem ser investigados quando o sujeito faz uma generalização arbi-
outros determinantes, nas populares, que os trária, a partir de um detalhe bem visto, che-
incluem para classificação como tal. gando a um conceito global que é inadequa-
do, embora tenha implicações de forma defi-
nida. Alguns autores, como Vaz (1980), utili-
A CLASSIFICAÇÃO DA RESPOSTA zam a classificação DW ou DG não apenas no
caso específico de resposta confabulatória,
Localização das respostas conforme Klopfer, mas para todos os casos em
que a generalização é precedida pela percep-
A localização das respostas é o primeiro passo ção de um detalhe, com o que a global resul-
para a sua classificação. Atribui-se um escore tante poderia ter diferentes níveis de qualida-
de localização principal para qualquer concei- de global. Portanto, DW, conforme Klopfer,
to, caracterizado como independente ou semi- nunca se aplica a um conceito global vago.
independente, que é verbalizado na fase de Assim, o exemplo típico de resposta confabu-
administração. O escore de localização adicio- latória (DW) é a resposta “gato” para a Lâmina
nal é atribuído também para tais conceitos, se VI, em que o sujeito parte de um detalhe bem
formados durante o inquérito; para os concei- visto, “a cara do gato”, no D superior, e insiste
tos verbalizados na administração, mas rejei- em que a mancha toda seja um gato, conceito
tados no inquérito; para os detalhes semi-in- que tem implicações de forma definida, mas
dependentes de uma organização frouxa, só não é adequado para a Lâmina VI. Se a partir
mencionados no inquérito; para tendências à do mesmo detalhe, generalizando porém para
globalização; e para o uso complementar do um conceito de forma vaga, como na resposta
espaço em branco. “um gato esmagado por um caminhão”, não
Os maiores problemas, em relação à classi- cabe o escore de DW. Por outro lado, se gene-
ficação de localização, referem-se à discrimi- raliza a partir de um detalhe bem visto, para
nação entre escore principal e adicional, que um conceito global, com implicações de for-
podem ser resolvidos com facilidade, se o psi- ma definida, mas que seja adequado para a
cólogo tiver em mente os tipos de organiza- mancha, o escore é de W, mesmo que não seja
ção e o grau de independência dos conceitos capaz de verbalizar a adequação das partes do
explicados anteriormente. No mais, é de espe- conceito às partes da área da mancha. Por
cial importância considerar, nas respostas glo- exemplo, se, na Lâmina V, disser “Uma cabeça
bais, a intenção do sujeito, para a distinção de rato... é um rato”, trata-se de uma DW, mas,
entre W e W’, e a lógica implícita, nos casos se disser “Uma cabeça de morcego.... É um
em que o sujeito generaliza adequadamente morcego”, trata-se de uma W, mesmo que no
ou não, a partir de um detalhe bem visto. inquérito dê a mesma explicação para abran-
A diferenciação entre W e W’ baseia-se, fun- ger o restante da mancha: “É o resto do ani-
damentalmente, na intenção do sujeito. O es- mal”. Esta é a única classificação de localiza-
core W’ só é atribuído se o sujeito, espontânea ção que utiliza o critério de qualidade ou lógi-
e deliberadamente, exclui uma porção equiva- ca do conceito.
lente a um terço ou menos da mancha, mes- O escore de WS não envolve problemas,
mo que, no inquérito, o examinador se dê conta nem o de D e d. As localizações D e d corres-
de que o conceito não engloba completamen- pondem a subdivisões óbvias da mancha, di-
te toda a mancha, excetuando-se apenas as Lâ- ferenciadas pelas características configuracio-
minas II e III, em que a exclusão de manchas nais e definidas pela freqüência de seu apare-
vermelhas pode ser determinada pelo inquéri- cimento. Portanto, há um número limitado de

354 JUREMA ALCIDES CUNHA


localizações D e d e devem ser identificadas mento que dele sobressai, mas que não pre-
em listas reproduzidas em manuais em que domina (como “nuvens”, “ilhas”, etc.). Se apa-
Klopfer é o autor principal. Porém, no caso de recem apenas no inquérito, são classificadas
o profissional preferir utilizar outro sistema, como respostas adicionais. Todas as respostas
deve utilizá-lo para todas as respostas. com qualquer localização, em que o espaço em
Em relação aos chamados detalhes inusita- branco for usado complementarmente, são
dos, Dd, é preciso haver certo cuidado em sua classificadas com um S adicional.
distinção.
Os dd, como D e d, correspondem a subdi-
visões óbvias da mancha, justificadas por suas Escore da forma e qualidade da forma
qualidades configuracionais, mas não são tão
freqüentes quanto aqueles e, geralmente, são Conforme Peterson e Schilling (1983), “o
insulares e peninsulares. exemplo mais óbvio da realidade do estímu-
Para a discriminação entre de e di, é preci- lo e de seu impacto sobre o processo de res-
so ter claros os critérios de diferenciação da posta é o escore do determinante F” (p.268).
mancha usados pelo sujeito, que devem ser Assim, são as características reais do estímu-
esclarecidos pelo inquérito. Na localização de, lo que fornecem o material para a resposta F
o sujeito desconsidera a superfície da mancha, do sujeito, que, “não podendo identificar o
utilizando só segmentos do contorno, como estímulo como uma mancha de tinta, o iden-
em muitas respostas de “perfis” e de “contor- tifica como algo mais” (Exner, 1983, p.77).
no da costa”. Os di, ao contrário, são detalhes Tais características do estímulo vão servir para
internos, delimitados a partir de diferenças no testar a congruência entre um conceito ver-
sombreado. Geralmente, não envolvem áreas balizado e uma área selecionada. Essa afir-
óbvias e nem sempre é fácil identificá-los, mas, mação é verdadeira em relação ao uso de
quando é possível fazê-lo com a ajuda do su- qualquer determinante, mas se torna mais
jeito, observa-se que a sua delimitação não é flagrante no caso do escore F.
arbitrária. O escore F aplica-se a todos os casos em
Os detalhes dr, denominados detalhes ra- que não existe outro determinante, não impor-
ros, o são porque a sua delimitação não se jus- tando se o conceito pressupõe uma forma pre-
tifica pelos aspectos configuracionais da man- cisa, semidefinida, indefinida ou vaga. Tal es-
cha, mas se define pela necessidade de ade- core é sempre principal, quando a classifica-
quação do conceito à área selecionada. As com- ção é de uma resposta principal. Como fica
binações de D e d (não suficientemente fre- pressuposto pela classificação de outros deter-
qüentes para serem, por sua vez, classificadas minantes que também envolvem forma, F só
como D) também são categorizadas como dr. justifica um escore adicional quando uma lo-
O dr é, pois, uma seleção inusitada de uma calização separada o exige.
porção da mancha, que não chega a abranger Em geral, os autores costumam classifi-
dois terços de seu total. Nada tem a ver com a car as respostas F, em termos do grau de de-
qualidade do conceito, havendo respostas dr finição do conceito e de sua adequação à área
excepcionalmente boas. O conceito, em si, não da mancha, como F+, F± e F-. Inicialmente,
é necessariamente inusitado; a área seleciona- a classificação F era reservada para as res-
da é que o é. postas de nível medíocre ou popular. A clas-
As respostas de espaço branco, S, envolvem sificação F+ era atribuída às respostas de
a inversão de figura-fundo, focalizando o es- forma definida de nível de precisão marcan-
paço em branco como figura, a mancha ser- temente superior ao medíocre, e a F– era uti-
vindo como fundo. Contudo, podem não su- lizada em respostas em que se observava
bentender tal inversão, utilizando o espaço em grande discrepância entre o conceito e a área
branco como o elemento predominante (como da mancha (Klopfer & Kelley, 1946). As res-
“céu”, “mar”, etc.) e a mancha como um ele- postas vagas, comumente identificadas como

PSICODIAGNÓSTICO – V 355
F±, eram consideradas de nível medíocre e Escore de outros determinantes e de
incluídas na classificação F. Quando foi in- conteúdo
troduzida a avaliação do nível formal das res-
postas, as questões de definição da forma e No escore de determinantes, há critérios defi-
de sua adequação à área da mancha ficaram nidos para classificação como principais ou
melhor explicitadas. Não obstante, implici- adicionais, caso sejam mencionados ou fiquem
tamente foram mantidas as classificações de implícitos na verbalização espontânea, na ad-
F, para as respostas de forma, conforme sua ministração propriamente dita ou no inquéri-
definição e adequação, que são muito impor- to; sejam referentes a respostas dadas apenas
tantes, quando não se faz a avaliação do ní- no inquérito; sejam atribuídas apenas à parte
vel formal. Mesmo quando esta é realizada, da localização; surjam somente após muita
o cálculo de percentual de ‘F+ permanece estimulação; ou sejam usados com certa hesi-
como um dado valioso do ponto de vista clí- tação ou dúvida. Tais critérios são facilmente
nico. encontrados nos manuais em que Klopfer apa-
Outros autores têm proposto também mé- rece como um dos autores, citados nesta obra.
todos de escore do nível formal de F, como Entretanto, um dos pontos importantes, den-
as sete categorias de aderência à realidade tro do sistema proposto por esse autor, são as
de Mayman, sistema considerado por Lo- regras para determinar prioridades, na distin-
hrenz e Gardner (1967) de muito valor em ção de determinantes principais e adicionais. É
análises qualitativas, que foi mantido em utilizado apenas um escore, como principal, e,
parte no sistema compreensivo de Exner para defini-lo, usam-se as regras seguintes:
(1980). a) se o próprio sujeito dá prioridades ou
Para a estimativa global da qualidade da ênfase a um certo determinante, este deve ter
forma, existem vários métodos, mas que sem- o escore como principal;
pre pressupõem a estimativa prévia da qua- b) se um determinante se torna explícito na
lidade das respostas individuais. Existem lis- administração propriamente dita, este deve ter
tas de respostas possíveis (atlas), que podem prioridade sobre outros que só aparecem no
ser consultadas quanto à qualidade das res- inquérito;
postas, sendo as americanas mais numero- c) se dois ou mais determinantes parecem
sas, mas havendo, também, atlas desenvol- ter a mesma importância, a prioridade é dada
vidos no Brasil (Adrados, 1967; Adrados, e mantida sempre na ordem seguinte, a não
1973; Augras, Sigelmann & Moreira, 1969; ser que haja hesitação, dúvida ou caso pareça
Quintela, 1955). um uso secundário: M, sobre todos os demais
Um dos problemas que se tem, ao consul- determinantes; CF ou C, nesta ordem, sobre
tar um atlas ou vários, é o de não encontrar a todos os demais, exceto M; Fc, sobre todos os
resposta procurada. Neste caso, os autores demais, exceto M e cor (Klopfer, Ainsworth,
sugerem que se procure comparar a resposta Klopfer, W., et alii, 1954).
com conceitos similares, procurando fazer ex- Essas regras foram criticadas por alguns
trapolações ou, ainda, utilizar o julgamento autores, não só porque forçam o clínico a fa-
clínico. Na realidade, parece mais aceitável a zer escolhas difíceis, mas, principalmente, por-
combinação desses dois critérios, evitando-se que o escore adicional entra com a metade do
fazer a estimativa da qualidade da forma com peso atribuído ao escore principal, nos cálcu-
base apenas no julgamento clínico. Por outro los finais. Exner, que, num levantamento feito
lado, ainda que não haja muitas listas disponí- entre psicólogos americanos, verificou que um
veis, parece preferível utilizar, predominante- grande número deles atribuía peso idêntico a
mente, aquelas que foram desenvolvidas com todos os determinantes, optou por adotar tal
base estatística e a partir de uma população critério em seu sistema, sem discriminação en-
de faixa etária equivalente ou próxima da do tre respostas principais e adicionais, mas des-
sujeito em estudo. considerando como respostas as verbalizações

356 JUREMA ALCIDES CUNHA


surgidas durante o inquérito. Entretanto, Na- da organização perceptual, que se associa a
vran (1983), que fez uma acurada análise dos um conteúdo específico, ou, como salientam
motivos que levaram Exner a assumir tal posi- Peterson e Schilling (1983), analisando o pon-
ção, apresentou uma argumentação bastante to de vista de Rapaport, tais áreas “represen-
sólida a favor da diferenciação de escores em tam uma parte da realidade relativamente de-
principais e adicionais, defendendo, inclusive, finida, que é tão compulsória, que o seu signi-
a manutenção das regras que estabelecem as ficado ‘é uma questão de concordância social’.
prioridades na escolha entre determinantes A responsividade de um sujeito a essas áreas
principais e adicionais, em especial quanto à compulsórias, nas manchas, assim se torna a
precedência preferencial de M. Sustentou a medida de seu senso do óbvio” (p.268).
importância da classificação das respostas da- No Quadro 21.4, encontram-se as listas de
das no inquérito e sugeriu que o sistema de respostas populares de cinco autores. Há áreas
Exner seria aperfeiçoado, de um ponto de vis- e respostas que praticamente se repetem em
ta clínico, pela adoção de tais abordagens de todas as listas, o que parece reforçar o concei-
Klopfer. to de card pull implícito. Há algumas diferen-
Quanto ao escore do conteúdo, as princi- ças, que podem ser relacionadas tanto com
pais dificuldades foram discutidas no item aspectos culturais como com a diversidade de
sobre inquérito. critérios utilizados pelos autores. Enquanto,
para Rorschach, a popular era a resposta de
conteúdo idêntico, dada pelo menos uma vez
Respostas populares em cada três pessoas, outros autores variam
quanto a tais critérios: “uma vez em cada cin-
Tendo em mente que o estímulo provoca uma co sujeitos (Rapaport e Schafer), quer dizer, de
série de operações mentais de parte do sujei- 20 a 25% num protocolo de 25 respostas; uma
to, é interessante a consideração das caracte- vez em cada seis (Loosli-Usteri); 6,4 a 7 (Ch.
rísticas do estímulo, para compreender por que Bühler); 7 (Beck); 5 a 7 (Bohm), determinadas
certas respostas se tornam suficientemente fre- estatisticamente pela freqüência com que apa-
qüentes para serem classificadas como respos- recem nos grupos normais (Hertz)” (Endara,
tas populares. 1967, p.256). Augras, Sigelmann & Moreira
O sujeito é levado a prestar atenção no es- (1969) consideraram populares as respostas
tímulo e, de forma tácita, chega a reconhecer dadas, no mínimo, por uma pessoa em cada
que “existe uma realidade, que serve tanto para seis. Klopfer e Kelley (1946) preferiram usar o
informar quanto para limitar a resposta” (Pe- número de sujeitos e não a freqüência das res-
terson & Schilling, 1983, p.267). Peterson e postas, selecionando os conceitos populares de
Schilling (1983) adotam o conceito de card pull, acordo com os seguintes critérios:
apresentado por outros autores, que se refere a) de freqüência de seu aparecimento em
“àquelas propriedades da mancha de tinta que qualquer amostra de protocolos, ainda que esta
predispõem o sujeito a usar certos aspectos da seja específica quanto à idade ou limitada a
mancha” (p.266). Também Rapaport e colegas um certo grupo cultural;
(1965), ao definirem as respostas populares b) de inclusão dos determinantes mais fre-
como as que são dadas, pelo menos, por um qüentes em certas áreas, além da forma;
em cada cinco sujeitos da população geral, c) de aceitação dos conceitos corresponden-
deixam implícito o mesmo conceito, ao afir- tes por qualquer sujeito classificado como “nor-
marem que “a sua alta freqüência indica que mal”;
essas respostas são, até certo ponto, compul- d) de sua localização como W ou, ainda, D,
sórias e que exigem pouca flexibilidade associ- já que “os detalhes usuais são eles próprios
ativa ou riqueza dos processos associativos para determinados pela freqüência” (p.178).
a sua produção” (p.228). Assim, a própria es- As listas de Quintela (1955) e de Augras e
trutura da mancha facilitaria uma determina- colegas (1969) podem ser consideradas como

PSICODIAGNÓSTICO – V 357
QUADRO 21.4 Comparação entre cinco listas de populares
Lâmina e Rorschach Klopfer Beck Quintela Augras
localização
I–W Morcego Morcego Morcego Morcego Morcego
Borboleta ou Borboleta Borboleta Borboleta
qualquer criatura Osso da bacia Pássaro
alada com o corpo
no D central e as
asas dos lados
(pode ser W’*)

D central Forma humana


mulher ou criança
II – W Dois palhaços Dois animais (ou Figuras humanas Figura humana Duas pessoas
parte), tais como Urso, cachorro Dois animais (pode ser W’)
cachorro, urso, Dois animais
touro, coelho, etc.
(pode ser D
lateral)
III – W’ ou D Dois homens Duas figuras hu- Duas pessoas Duas pessoas Duas pessoas
lateral manas em
movimento
D vermelho Gravata, laço de Borboleta Borboleta
central fita, borboleta
IV – W Pele de animal Pele de animal Pele de animal
Gorila Morcego Pessoa fantasiada
V–W Qualquer criatura Morcego Morcego Morcego
alada, com o Borboleta Borboleta Borboleta
corpo no D central Pássaro
e as asas dos
lados (pode ser W’)
D lateral Perna de animal
VI – W Pele de animal Pele de animal, Pele de animal Pele de animal Pele de animal
com textura
(pode ser D)
VII – D superior Máscara Cabeças Figura
(1/3) humanas humana
D 2/3 superiores Dois animais
VIII – D rosa Quadrúpede em Ursos, ratos, Dois Dois animais
lateral movimento roedores quadrúpedes (pode ser W)
D central Esqueleto
IX – D rosa Cabeça de homem Cabeça humana
D alaranjado Pessoas
X – D azul lateral Caranguejo, Qualquer animal Crustáceo, aranha Crustáceo, polvo, Aranha, caran-
polvo, aranha com muitas pernas, aranha guejo
como aranha, ca-
ranguejo ou polvo
D verde claro Cabeça de coelho Cabeça de animal Cabeça de coelho
central com orelhas
longas ou chifres,
como coelho,
burro ou bode
D verde central Qualquer animal
(exceto o anterior) verde alongado,
como lagarta, co-
bra de jardim, etc.
D cinza superior Dois animais
Fonte: Augras, 1978, p.53; Augras, Sigelmann & Moreira, 1969, p.XIX:; Klopfer, Ainsworth, Klopfer, W., et alii, 1954, p.203-205
*São utilizados os símbolos de Klopfer.

358 JUREMA ALCIDES CUNHA


as primeiras tentativas de identificação de res- forma semidefinida ou indefinida, mas é refe-
postas populares brasileiras. Entretanto, am- rido a uma mancha ou área da mancha que apre-
bas se basearam em dados colhidos de amos- senta uma configuração muito especificada.
tras de uma população que procurava os servi- Especificação refere-se à elaboração do con-
ços do Instituto de Seleção e Orientação Pro- ceito, que está diretamente relacionado com o
fissional, da Fundação Getúlio Vargas, no Rio grau de diferenciação perceptual do sujeito. As
de Janeiro. Portanto, seria importante a coleta especificações podem ser construtivas, irrele-
de dados semelhantes em outras regiões do vantes e enfraquecedoras ou destrutivas, con-
país, para se chegar à definição de uma lista forme a sua contribuição para melhorar, ou
genuinamente brasileira. não, o grau de adequação entre o conceito e a
Adrados (1967), utilizando, como nós, o sis- área da mancha à qual se aplicam.
tema de Klopfer, admite os critérios desse au- Organização refere-se a qualquer procedi-
tor, sugerindo pequenas modificações, de acor- mento utilizado pelo sujeito para integrar par-
do com sua experiência. Por exemplo, na Lâ- tes da mancha num conceito mais amplo e sig-
mina II, refere que “figuras humanas” é uma nificativo.
resposta que aparece quase com a mesma fre- Para avaliar o nível formal, é utilizada uma
qüência que a resposta de “dois animais”, que escala, cujo limite inferior é -2,0, passando por
consta de quase todas as listas. O fato de, em 0,0 e chegando até 5,0.
nossa experiência, a resposta “figuras huma- Em primeiro lugar, atribui-se um escore
nas” não aparecer com uma freqüência tão ele- básico, geralmente positivo, mas que, no caso
vada reforça nosso ponto de vista de que são de respostas imprecisas, é negativo. A seguir,
necessários dados de outros pesquisadores e a resposta é considerada em termos de suas
de outros locais do Brasil, antes de se chegar a especificações e organização, podendo ser
uma lista definitiva de populares. acrescentado o crédito de 0,5 para cada espe-
cificação construtiva ou organização adequa-
da, ou, pelo contrário, ser subtraído um crédi-
CONCEITOS BÁSICOS PARA A ESTIMATIVA to de 0,5 para “uma especificação ou organi-
DO NÍVEL FORMAL zação que enfraquece a adequação do concei-
to à mancha” (Klopfer, Ainsworth, Klopfer, W.,
Na estimativa do nível formal, devem ser con- et alii, 1954, p.219).
siderados três conceitos importantes, a partir
dos quais se define todo o sistema de quantifi-
cação ou de escore. Definição da forma do conceito e
Precisão refere-se à adequação entre o con- atribuição do escore básico
ceito e a área da mancha à qual se aplica. Con-
forme o grau de adequação, as respostas po- Os conceitos podem ter uma forma definida,
dem ser precisas, semidefinidas ou indefinidas semidefinida ou indefinida. O escore básico
ou imprecisas. A resposta precisa corresponde pode variar conforme a definição da forma do
a um conceito de forma definida, cujo forma- conceito (vide Quadro 21.5).
to implícito se mostra adequado ao contorno “Aranha” é um conceito de forma definida,
da área da mancha selecionada. A resposta mas simples, isto é, suas implicações formais
semidefinida ou indefinida subentende um essenciais se reduzem basicamente a corpo e
conceito que se caracteriza por uma forma pernas. Para a configuração da mancha ser
implícita tão vaga ou tão variada, que pode se adequada a este conceito, deve compreender
adequar praticamente a qualquer área total ou uma área arredondada (corpo) e projeções (per-
parcial da mancha. A resposta imprecisa su- nas). Portanto, subentende apenas dois ou, no
põe um conceito cuja forma é definida, mas máximo, três requisitos. Tais conceitos são pou-
que não se adequa à área da mancha escolhi- co exigentes em termos das operações percep-
da, ou, ao contrário, o conceito implícito é de tocognitivas que ocorrem no sujeito. Podem

PSICODIAGNÓSTICO – V 359
QUADRO 21.5 Definição da forma do conceito te” dadas a áreas da mancha bastante óbvias
1. Conceito de forma definida e que requerem cerca do mesmo nível de ca-
1.1.Conceitos de forma definida, mas simples, exi- pacidade organizacional que as próprias res-
gindo pouca imaginação (populares ou con- postas populares. Seu escore básico é 1.
ceitos com 2 ou 3 requisitos), com escore 1.
“Perfil humano” também é um conceito de
Exemplos:
Borboleta: corpo (área central, estreita, peque- forma definida, mas não é simples, porque suas
na) + asas (áreas laterais, simétricas) implicações formais essenciais (nariz+testa+
Árvore: tronco (área estreita) + copa (área lar- boca+queixo, em proporções adequadas) são
ga, espalhada) mais diferenciadas. Tais conceitos de forma
Aranha ou siri: corpo (área arredondada) +
definida, mas diferenciada, subentendem qua-
pernas (projeções)
Animal: corpo (qualquer área de forma razoá- tro requisitos ou mais, são mais exigentes em
vel) + cabeça + pernas termos das operações perceptocognitivas en-
Peixe, cobra: corpo (área comprida, estreita) volvidas e quanto à configuração da mancha a
Cachorro: corpo + cabeça + patas que se aplicam. Seu escore básico é 1,5.
Cabeça de cachorro: focinho + cara + orelhas
O determinante de um conceito de forma
Tórax, osso ilíaco
Dedo, braço ou perna, olho definida, seja simples ou diferenciada, é F ou
Taça de sorvete qualquer outro, em que forma assume um pa-
1.2.Conceitos de forma definida, diferenciada (4 pel prioritário (M, FM, Fm, FC, FC’, FK ou Fc).
requisitos ou mais), com escore 1,5. Exemplos: “Nuvem” é um conceito de forma semide-
Perfil humano: nariz + testa + boca + queixo
finida, isto é, suas implicações formais são mí-
(proporções adequadas)
Figura humana: corpo (mais comprido do que nimas, vagas ou variáveis quanto à forma. Para
largo) + cabeça (porção superior, menor e ar- ser adequada a esse conceito, a configuração
redondada) + pernas e, talvez, braços (coloca- da mancha é constituída por uma área insular,
dos no lugar correto). Figura de animal especí- sem forma definida. Os conceitos de forma
fico: coelho, cão de caça, elefante
semidefinida podem se aplicar quase a qual-
2. Conceito de forma semidefinida: forma vaga, se-
midefinida ou muito variável, mas não completa- quer mancha ou área da mancha, exceto às que
mente negligenciada (1 requisito, muitas vezes com envolvem características formais bastante es-
ênfase no determinante em que forma tem um pa- truturadas, como o D vermelho central da lâ-
pel secundário), com escore 0,5. Exemplos: mina III ou o D rosado lateral da Lâmina VIII.
Nuvem (área insular, forma vaga)
Subentendem apenas um requisito, muitas
Flor, folha (área insular de forma variável)
Ilha (área insular de forma variável) vezes, com ênfase num determinante em que
Desenho (geralmente áreas simétricas, forma va- a forma tem um papel secundário (F±, mF, C’F,
riável) KF, kF ou cF). Seu escore básico é 0,5.
Sorvete “Céu” é um conceito de forma indefinida,
Conceitos anatômicos vagos
não envolvendo qualquer implicação formal.
Conceitos organizacionais (dependendo da posição
relativa de elementos sem forma), como “terra, mar A área da mancha adequada a este conceito
e céu” também não pressupõe quaisquer caracterís-
3. Conceitos indefinidos: sem envolver qualquer es- ticas formais definidas. Há negligência da for-
trutura, forma negligenciada, com escore 0. Exem- ma e, portanto, não subentende qualquer re-
plos: céu, terra, mato, massa de sorvete
quisito. Seu determinante é C, Cdes, Cn, Csim,
c, C’, K, k e m e aparece muito raramente. Seu
escore básico é 0,0.
ser suscitados, também, em razão das caracte-
rísticas estruturais de certas áreas das manchas,
que compelem o sujeito a determinadas per- Respostas imprecisas e atribuição de
cepções, como no caso das respostas popula- escore básico negativo
res. Também são incluídas entre os conceitos
de forma definida, mas simples, as respostas Resposta imprecisa pressupõe uma inadequa-
de nível popular, que são as “freqüentemen- ção do conceito à mancha, que justifica a atri-

360 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 21.6 Respostas imprecisas
Conceito Configuração da mancha Atitude do sujeito Tipo de resposta Escore
básico
Semidefinido Muito estruturada Sem crítica Imprecisa -0,5
ou indefinido
Definido Estruturada, mas inadequada, Esforço fracassado para Combinação -1,0
não nos detalhes, mas na conciliar a F da mancha com confabulatória*
maneira como se organizam os requisitos do conceito
estruturalmente
Definido Estruturada, mas com Generalização ilógica a partir Confabulação** -1,5
apenas um detalhe bem visto de um detalhe bem visto com
insistência em usar W
Definido Inadequada Sem esforço para conciliar a F Perseveração -2,0
da mancha com os requisitos
do conceito; resposta
automática
Definido Inadequada Sem esforço para conciliar a F Imprecisa (com- -2,0
da mancha com os requisitos qualidade absurda)
do conceito
Fusão de dois Possivelmente adequada Sem crítica; sem senso de Contaminação*** -2,0
conceitos incom- para cada conceito separa- humor
patíveis damente, mas fusão absurda
* Se o esforço é bem-sucedido, com base na mitologia, por exemplo, não se trata de uma combinação confabulatória.
** Se a generalização envolve um conceito vago, não é DW.
*** Só é contaminação se o sujeito a toma seriamente.

buição de um escore negativo. Deve-se consi- Em segundo lugar, uma resposta imprecisa
derar a definição da forma do conceito e as pode envolver um conceito definido, que se
características da mancha, bem como a atitu- aplica a uma mancha ou área da mancha es-
de do sujeito. truturada com esforço por parte do sujeito para
Não obstante, muitas vezes, são encontra- indicar “partes”, que justificariam o conceito,
das respostas de forma definida, que envolvem como bem vistas e precisas, mas com inclusão
certo grau de imprecisão, mas não são com- de outras que não são adequadas ou, ainda,
pletamente inadequadas à mancha a que se com todas as partes do conceito bem vistas,
aplicam. Tais respostas não são classificadas mas organizadas de forma ilógica, como no
como imprecisas, nem justificam um escore caso da combinação confabulatória. Seu esco-
básico negativo, embora, em razão de suas re básico é -1,0.
especificações destrutivas, possam resultar A resposta também pode envolver um con-
num escore final negativo. ceito definido, mas observar a imprecisão pela
Na resposta imprecisa mais simples, a ina- generalização inadequada para o todo, a par-
dequação seria caracterizada pela aplicação de tir de um detalhe bem visto, caracterizando,
um conceito de forma semidefinida ou indefi- assim, uma confabulação. Seu escore básico
nida a uma mancha ou área da mancha, muito é -1,5.
estruturada. Um exemplo seria a resposta de Um exemplo de resposta imprecisa encon-
“nuvem” para o D vermelho central da Lâmina tra-se em casos de perseveração, em que, após
III ou para o D rosado lateral da Lâmina VIII. uma resposta inicial eventualmente adequada
Seu escore básico é -0,5, não tendo as mesmas (como “morcego”, na Lâmina I), a mesma res-
implicações psicopatológicas de outros tipos posta continua a ser dada nas lâminas seguin-
de respostas imprecisas. tes, com completa desconsideração das carac-

PSICODIAGNÓSTICO – V 361
terísticas da mancha. Tal resposta, comum em sórios ou mencionando atributos, procurando
crianças pequenas, é encontrada entre pacien- embelezar a sua resposta.
tes esquizofrênicos muito regressivos e em Quando assinala partes que são essenciais,
muitos casos com disfunção cerebral. Seu es- como requisitos do conceito (como nariz, boca
core básico é -2,0. e queixo, num perfil humano), suas especifica-
A completa desconsideração pelas caracte- ções são irrelevantes, porque são abrangidas
rísticas da mancha também se verifica em res- pelos requisitos do conceito e não o melho-
postas para as quais não há qualquer justifica- ram nem o enfraquecem. Da mesma forma, a
tiva de parte do sujeito, de modo que se carac- especificação “vermelha”, para uma resposta
terizam por sua qualidade absurda. Klopfer e de “borboleta”, embora permita o escore de
colegas (1954) dão um exemplo ilustrativo da FC, também é irrelevante, porque borboletas
resposta “casa”, como resposta global para a podem ser de qualquer cor. Não obstante, se a
Lâmina VII, sem justificativas. Outra possibili- resposta do sujeito for de “um morcego escu-
dade de resposta, também classificada nesse ro”, há uma especificação construtiva, já que
nível, é a contaminação, em que o sujeito su- aos requisitos essenciais do conceito “morce-
perpõe ou faz a fusão de dois conceitos incom- go” o sujeito ofereceu uma elaboração ade-
patíveis em uma mancha ou área da mancha. quada dos detalhes da mancha, acrescentan-
Rapaport et alii (1965) dão como exemplo a do um aspecto essencial, porque os morcegos
resposta de “ilha sangrenta, em que sempre são necessariamente escuros.
há revoluções”, para o D vermelho superior da As especificações construtivas revelam uma
lâmina III, em que, separadamente, poderia ser capacidade de percepção altamente diferencia-
vista “ilha” ou “sangue”, mas que não com- da e se evidenciam pelos detalhes verbaliza-
porta a “fusão arbitrária e rebuscada desses dos em relação aos conceitos, que constituem
dois conceitos”. Também citam a seguinte res- elaborações adequadas de características da
posta para a Lâmina I: “Isto parece com um V mancha. Assim, para a avaliação do nível for-
(contorno interno das figuras laterais), uma mal, é conveniente incentivar o sujeito a am-
vitória alada; aqui está o V da vitória e, aqui, pliar as especificações dos conceitos, por meio
as asas”. Neste caso, “a figura alada familiar de perguntas não-diretivas, além das necessá-
(W) e uma linha vaga em forma de ‘V’ se fun- rias para a simples atribuição de escore.
dem, para dar a resposta final” (p.235). As especificações construtivas podem ser
Dessa maneira, a resposta imprecisa pode formais, referindo-se a aspectos essenciais,
se caracterizar por desconsideração completa consubstanciados pelas características da man-
das características da mancha, como na perse- cha, que ultrapassam os requisitos essenciais
veração, em respostas de qualidade absurda do conceito. Cumpridas tais condições, justifi-
ou pela fusão de duas respostas inteiramente cam, cada uma, um crédito de 0,5, que é acres-
incompatíveis, nas respostas contaminadas. centado ao escore formal básico. Por exemplo,
Seu escore básico é -2,0. “chapéu” numa bruxa, “bigodes” num gato,
“seios” numa mulher, etc. são todas especifi-
cações essenciais, que ultrapassam os requisi-
Especificações e o acréscimo ou tos essenciais desses conceitos.
diminuição do nível formal Já as especificações construtivas de movi-
mento, além de pressuporem o escore de mo-
Uma vez que os conceitos de forma definida vimento em conceito de forma definida (M, FM
subentendem requisitos formais essenciais, e Fm), devem ser “justificadas por qualidades
pode-se avaliar a adequação do conceito à área estruturais da mancha e não simplesmente pro-
da mancha. Contudo, geralmente o sujeito não jetadas” (Klopfer, Ainsworth, Klopfer, W., et alii,
se limita a verbalizar o conceito, mas procura 1954, p.212) e, então, permitem acrescentar
torná-lo mais diferenciado, assinalando partes 0,5 cada uma, ao escore formal básico. Assim
que considera essenciais, acrescentando aces- os autores citados dão o exemplo da resposta

362 JUREMA ALCIDES CUNHA


“um pião rodando”, para o S central da Lâmi- Organização
na II, invertida, em que a especificação de mo-
vimento ficou consubstanciada por pequenos Organização refere-se a qualquer procedimen-
traços da mancha, que justificaram a impres- to utilizado pelo sujeito para integrar as par-
são referida. No caso, a falta de justificativa tes da mancha num conceito mais amplo e sig-
nas características da mancha tornaria a espe- nificativo, embora possa resultar numa orga-
cificação irrelevante, embora permitisse o es- nização frouxa. O sujeito pode organizar seu
core Fm. conceito “pela interação de figuras em movi-
As especificações de cor e sombreado, mento, por interdependência funcional, posi-
além de pressuporem o escore corresponden- ção ou, mesmo, simbolismo” (Klopfer, Ainswor-
te em conceito de forma definida (FC, FC’, th, Klopfer, W., et alii, 1954, p.18), fazendo jus
Fc, FK), devem corresponder a um componen- ao crédito de 0,5 a ser acrescentado ao escore
te essencial do conceito e ser justificadas pelo formal básico. Não obstante, não se justifica
material da mancha, quando, então, como tal crédito se a tentativa de organização não
nos casos anteriores, fazem jus ao crédito de se fundamentar numa conexão adequada, ge-
0,5 cada uma, como acréscimo ao escore for- nuína e significativa, constituindo uma mera
mal básico. justaposição.
Há, porém, casos em que as especificações
podem ser destrutivas ou enfraquecedoras. No
primeiro caso, a adequação do conceito à man- Cálculo do nível formal
cha fica completamente comprometida, por-
que as especificações afetam “a parte focal do Calcula-se a média não ponderada do nível
conceito”. Os autores antes citados dão o formal pela soma algébrica de todos os esco-
exemplo da resposta “interior da cabeça”, res formais das respostas, dividindo-os por R
acrescentando as especificações de “olhos” (número de respostas). Utilizam-se apenas as
e “nariz”, que são “incompatíveis com o con- respostas principais no cálculo.
ceito” e com as características da mancha. Calcula-se a média ponderada do nível for-
No segundo caso, a parte focal do conceito mal (a mais utilizada) multiplicando cada es-
não fica afetada pelas especificações, “por- core formal de 2,5 ou acima de 2, e, a seguir,
que são periféricas ou secundárias em impor- fazendo a soma algébrica desses com os de-
tância”, mas pioram a adequação geral e mais escores inferiores a 2,5 e dividindo por R.
enfraquecem o nível formal (p.217), como, Pode-se ainda calcular a média não ponde-
por exemplo, na resposta “morcego”, para a rada do nível formal das lâminas cromáticas e
Lâmina V, na qual são especificadas pernas acromáticas; verificar a diferença entre a mé-
extras nas asas. dia do nível formal de lâminas muito sombrea-
Quando está presente uma especificação das e as levemente sombreadas; e, finalmente,
enfraquecedora, numa resposta com um nível pode-se calcular a média não ponderada do
formal básico de 1,0 (ou, às vezes, de 1,5), não nível formal para cada categoria de determi-
se faz a simples subtração de 0,5 (como no caso nantes e localização. Eventualmente, a média
do escore formal básico mais elevado), mas do nível formal em certas categorias de con-
convencionalmente lhe é reservado um escore teúdo também parece útil.
de -0,5. Considerando que os escores formais
básicos de 0,5 e 0,0 correspondem a conceitos
semidefinidos e indefinidos, toda vez que a INTERPRETAÇÃO
subtração ocasiona tais níveis, automaticamen-
te passa para -0,5. Quando houver mais de uma Como já ficou claro em relação ao manejo
especificação enfraquecedora, em geral, isso dos dados Rorschach, estamos nos detendo
leva à destruição do conceito, e, então, o esco- apenas naqueles aspectos que parecem sus-
re de -1,0 é justificado. citar mais dúvidas nos psicólogos que habi-

PSICODIAGNÓSTICO – V 363
tualmente nos procuram para supervisão. Em barras com linhas contínuas e as adicionais com
termos de interpretação, seguiremos na mes- linhas pontilhadas.
ma linha. A folha-resumo não deve deixar de incluir a
relação dos fenômenos específicos observados,
as verbalizações inusitadas, os conteúdos im-
Seleção dos dados portantes para a análise temática e o registro
de atitudes especiais do sujeito frente ao tes-
Para chegar a uma interpretação do teste, é te, ao examinador ou durante a testagem. É
importante se distribuir os dados quantitati- claro que, enfocando a natureza da tarefa como
vos e qualitativos num quadro-resumo. São estritamente perceptocognitiva, alguns desses
especialmente importantes os dados quantita- dados não parecem pertinentes. Não obstan-
tivos, porque sobre eles existem mais subsídios te, eventualmente, permitem levantar algumas
na literatura, e, assim, “as interpretações deri- hipóteses sobre a variabilidade dos escores. Por
vadas desses dados têm maior probabilidade outro lado, de um ponto de vista diagnóstico,
de serem corretas” (Exner, 1983, p.90). são importantes os subsídios que oferecem
Em primeiro lugar, é conveniente listar as informações sobre o nível de funcionamento,
relações básicas, conforme a orientação de sobre modalidades defensivas e de indícios
Klopfer. Para a sua consideração, esse autor sobre a organização do ego.
utiliza apenas as respostas principais. Não obs-
tante, para uma visão mais completa dos da-
dos, suplementarmente, o psicólogo precisa de Análise dos dados
algumas informações sobre respostas adicio-
nais, que não entram nos cálculos, mas dão A análise dos dados pode permitir chegar a
indicações sobre potenciais do sujeito. Além uma descrição geral da personalidade, bem
da composição das respostas F, com os respec- como a hipóteses diagnósticas. Porém, não se
tivos percentuais de F e de F+, sugerimos, ain- fará uma tentativa de um exame detido de
da, a consideração do F estendido e do F+ es- possibilidades neste sentido, porque seria por
tendido, não incluídos por Klopfer. Entretan- demais longa e exaustiva, exigindo o espaço
to, para chegar a seu cálculo conforme Scha- correspondente a outro livro. Assim, vamos nos
fer (1954), por exemplo, as respostas devem restringir à discussão de alguns pontos im-
ser reclassificadas de acordo com critérios di- portantes.
ferenciados. Tipo de vivência: A relação entre M e a soma
É conveniente, também, uma listagem das C, muito ressaltada por Rorschach, foi retoma-
relações secundárias, para o que se pode se- da por outros autores, por denotar o modo
guir a orientação de Klopfer, atribuindo aos preferencial de o sujeito lidar com situações
determinantes das respostas adicionais o peso estressantes. Ainda que os conceitos de orien-
de meio ponto. tação introversiva, extratensiva e ambiversiva
Deve-se relacionar os dados que permitam já não sirvam como subsídios para tantas infe-
avaliar o tipo de enfoque, comparando o per- rências clínicas como era suposto anteriormen-
centual observado e esperado das diferentes te, ainda fornecem indícios importantes.
respostas, classificadas nas diversas categorias Tradicionalmente, sabe-se que o peso pre-
de localização. A seguir, registram-se o nível dominante de M se associa com a maior pro-
formal médio e a média do nível formal, sendo babilidade da utilização de recursos interiores,
acrescentados outros dados que complemen- enquanto a primazia da soma C sugere que o
tem a estimativa do nível intelectual, inclusive sujeito se volta para o ambiente, com ele inte-
o tipo de sucessão. ragindo. No ambiversivo, nenhum desses esti-
O psicograma deve ser traçado cuidadosa- los é identificável.
mente, assinalando o número das diversas ca- Organização da experiência perceptual: O
tegorias de respostas principais por meio de número proporcional e a qualidade das respos-

364 JUREMA ALCIDES CUNHA


tas W são dados que permitem levantar hipó- tegrada. Se ocorre o contrário (D abaixo da
teses sobre a presença ou não de uma capa- média, com bom nível formal), a hipótese é de
cidade do sujeito de conceitualizar e de or- que haja capacidade de diferenciação, mas
ganizar a experiência perceptual num todo menor uso do senso comum.
integrado. À medida que a abordagem se detém pre-
A ênfase em respostas W de boa qualidade ferencialmente em áreas menores, pode ser
associa-se com um interesse abstrato, teórico indício de uma responsividade perceptual mais
e com a existência de uma capacidade de or- rica (com W e percentual de D normais), po-
ganização. Não obstante, somente a evidência rém, eventualmente, com um toque inusitado,
de respostas altamente articuladas e integra- ou pode representar uma busca de adesão a
das é que reflete maior sofisticação na abor- áreas limitadas de certeza, como defesa con-
dagem do mundo exterior, em decorrência de tra a insegurança ou necessidade de precisão
maturidade e de capacidade de organizar a (d), hesitação em chegar a conclusões mais glo-
experiência perceptual (boa proporção de W, bais (ênfase de Dd+S, à custa de W), despreo-
com nível formal elevado, integrando zonas D). cupação com os aspectos práticos da vida (ên-
Assim, não é a mera presença de um número fase de Dd+S, à custa de D) ou afrouxamento
grande de W que garante o interesse e a capa- dos laços com a realidade (ênfase de Dd+S, à
cidade de organização. A ênfase em W, com custa de W e D). As tendências que levam à
formas vagas e indefinidas, pode sugerir uma ênfase de áreas diminutas devem ser reconhe-
incapacidade de o sujeito ultrapassar uma per- cidas pela abordagem escolhida (ênfase de dd,
cepção mais global, por limitação ou interfe- de, di, dr ou S) e pela relação de sua propor-
rência no uso construtivo de sua inteligência; ção com D e W. Se principalmente esta não é
com muitas W de nível medíocre, pode denun- adequada, sinais de imaturidade ou dificulda-
ciar uma necessidade compulsiva de realização de em nível de ego devem ser considerados.
intelectual, com ou sem êxito, ou, se há uma Estratégias para o manejo de problema:
superacentuação de W, pode indicar ambição Ainda que os estilos pessoais para lidar com
intelectual, sem o respaldo de capacidade cor- situações de estresse sejam muito importan-
respondente. Por outro lado, a qualidade de tes e tendam a perdurar, é necessário avaliar
W é garantia da presença de uma capacidade não só as estratégias utilizadas pelo sujeito no
crítica. A ausência desta (W) sugere que o su- manejo de seus problemas, mas as interferên-
jeito pode chegar a conclusões errôneas com cias que elas podem sofrer.
base em evidência inadequada, por enfraque- Exner, em 1980, segundo Erdberg (1990),
cimento dos laços com a realidade. desenvolveu um escore para fazer uma estima-
O manejo da localização D permite levan- tiva do material psicológico desorganizado, que
tar hipóteses sobre os modos do sujeito de li- pode agir em tal sentido e que contém alguns
dar com problemas práticos e sobre o uso que elementos da relação de orientação secundá-
faz do senso comum. A ausência de transtor- ria de Klopfer e colegas (1954), mas que não
nos de ordem intelectual e afetiva pressupõe, lhe corresponde exatamente. Assim sendo,
pelo menos, uma capacidade média de o su- analisaremos apenas algumas variáveis, que
jeito manejar os problemas e reconhecer os parecem apresentar um potencial de interfe-
fatos de sua vida. rência no estilo pessoal de lidar com estresse e
Se o enfoque intelectual privilegia grande- que podem ser levantadas de acordo com este
mente D, com bom nível formal, isto é compa- último autor.
tível com a existência de uma capacidade de A ênfase em FM (maior que M) associa-se
diferenciação dos dados da experiência e de com a repercussão no ego de impulsos mais
aplicação prática da inteligência, mas sem um desorganizados e arcaicos. Com a ausência de
esforço para organizá-la. Se o nível formal cai, recursos de controle adequado, pode haver a
a ênfase do enfoque prático justifica-se por ocorrência de comportamento imaturo, irres-
uma incapacidade de haver uma visão mais in- ponsável, impulsivo ou atuador. Erdberg (1990)

PSICODIAGNÓSTICO – V 365
refere pesquisas em que se verificou que a pos- um distanciamento dos problemas, que pode
sibilidade de recaída para pacientes psiquiátri- ter uma tonalidade depressiva, numa resposta
cos em alta foi maior para os que tinham essa controlada (FK), ou, pelo contrário, pode de-
predominância de FM do que para os que não nunciar ansiedade difusa (KF, K). Já as respos-
a apresentavam. Uma das razões para isso se- tas acromáticas podem sugerir que o afeto está
ria a consciência de “estados de necessidade, contido, isolado, não chegando a se expressar
para os quais não tinham estratégias suficien- diretamente no mundo externo.
tes de enfrentamento e adiamento e aos quais A responsividade à experiência emocional:
responderam de forma impulsiva e inapropria- A reação às três lâminas cromáticas oferece
da” (p.391). indicações de como o sujeito responde à expe-
A resposta m representa outro componen- riência emocional. A ausência de reação, inibi-
te com potencial semelhante: “a m sugere idea- ção ou, por outro lado, a superestimação cro-
ção provocada pela experiência de situações mática são comuns nos grupos clínicos e têm
estressantes, sobre as quais a pessoa tem pou- que ver com a maneira como se dá o proces-
co controle” (p.391). Pode ser considerada uma samento dos estímulos de uma experiência
variável de estado ou situacional e costuma emocional complexa e como o sujeito a eles
estar presente em protocolos de indivíduos que dá uma resposta, que potencialmente não é
se encontram em situações tensionais e amea- adaptativa.
çadoras. A relação entre respostas cromáticas me-
Outros componentes, que se associam com nos ou mais controladas reflete a natureza dos
aspectos perturbadores de um ponto de vista contatos afetivos com o ambiente.
emocional, são as respostas que utilizam de- Quando as respostas cromáticas controla-
terminantes de claro-escuro ou a cor acromá- das (FC) têm precedência sobre as demais, sem
tica. serem por demais abundantes, pode-se pres-
As respostas que envolvem textura (Fc, cF e supor um afeto mais bem modulado e expres-
c) dão indicações sobre o grau de consciência so de forma mais socializada, enquanto a pre-
e de aceitação da necessidade afetiva e quan- dominância de respostas menos controladas
to à disposição de buscar interações que en- sugere a presença de componentes emocionais
volvem um elemento afetivo. Pessoas normais mais intensos no comportamento, podendo a
produzem, pelo menos, uma resposta de tex- expressão afetiva se apresentar como inade-
tura, geralmente controlada. A ausência ou a quada ou mal modulada.
superacentuação de respostas de textura são Recursos de controle interior: As respostas
mais comuns em grupos clínicos, sugerindo ou M parecem se associar com a presença de re-
a falta de aceitação ou de disposição de bus- cursos interiores para integrar a vida dos im-
car contatos com tonalidade afetiva ou a ênfa- pulsos com a realidade externa, envolvendo
se da necessidade neste sentido. No caso da uma capacidade para retardar a ação o sufi-
superacentuação se verificar por respostas ciente para obter um controle sobre a mesma.
menos controladas, pode-se subentender uma Têm relação com processos intelectuais de na-
necessidade mais crua, imatura e indiferencia- tureza abstrata, estando presentes em proto-
da de contato. As mais controladas podem ain- colos de sujeitos com nível geral de eficiência
da expressar necessidade de dependência, intelectual elevado e denotando uma capaci-
embora mais adaptada. Entretanto, tais hipó- dade de imaginação ou de atividade mental
teses devem ser examinadas considerando não em nível de fantasia.
só a quantidade dessas respostas específicas, Na consideração de tais respostas, é impor-
mas o equilíbrio do restante do psicograma. tante examinar o número de M+, mas tam-
O sombreado, usado para efeitos tridimen- bém suas relações com indícios sobre a esfera
sionais (excetuando respostas de reflexo), pode dos impulsos (FM) e sobre o manejo afetivo da
se associar com o manejo da ansiedade atra- experiência (respostas cromáticas). A diminui-
vés de esforços introspectivos, criando, assim, ção de M, com acentuação de FM+m, mostra

366 JUREMA ALCIDES CUNHA


que as tensões são demasiadamente fortes mento menos preciso do mundo interpessoal”
para que os recursos interiores de controle (Erdberg, 1990, p.396).
possam ser utilizados. A qualidade do teste de realidade: Os da-
Entretanto, as implicações diagnósticas va- dos básicos a serem considerados são a pro-
riam se há uma sobreacentuação de M (em porção dos diferentes tipos de respostas F e de
relação à soma C), se o movimento é projeta- F estendido. Assim, é fundamental a análise
do apenas num detalhe humano ou em figu- da precisão da forma dos conceitos.
ras humanas distanciadas em nível de realida- Se ocorrem respostas imprecisas, é impor-
de, porque tais dados denotam interferências tante examinar se elas se apresentam apenas
na aceitação de si mesmo. Também as hipóte- em situações de maior complexidade afetiva
ses podem ser diversas, se o movimento é ativo (lâminas cromáticas), para definir se ainda está
ou passivo, se envolve interação ou não e se esta preservada uma precisão perceptual pelo me-
implica agressão ou tem sentido positivo. nos na rotina da vida diária.
Principalmente, é preciso levar em conta a A predominância de respostas de nível for-
qualidade de M. Se é positiva, o indício pode mal elevado sugere uma boa congruência nos
se associar com um prognóstico terapêutico laços com a realidade e, também, boa dose de
favorável. Se é negativa, fica sugerido um en- imaginação que se associa com uma originali-
fraquecimento do controle dos processos da dade espontânea. Porém, tal enfoque precisa
imaginação e da integração com a realidade, o se combinar com uma boa proporção de res-
que interfere nas relações empatéticas com os postas D e P, como garantia do reconhecimen-
demais. M é, pois, um dado muito importan- to dos fatos práticos da vida, utilização do sen-
te, mas muito complexo em sua interpretação. so comum, apreciação do óbvio e da capaci-
Qualidade dos contatos com os demais: As dade de compartilhar o ponto de vista do gru-
respostas de movimento dão algumas indica- po social, porque, caso contrário, mesmo com
ções sobre interação, dependendo de seu tipo, um F+ elevado, pode haver um contato defi-
mas é muito importante verificar a categoria ciente com a realidade.
de conteúdo a que se aplicam. Erdberg (1990) Deve-se ter certo cuidado na avaliação das
comenta que, sob o ponto de vista de Exner, a respostas imprecisas, especialmente quando se
presença de mais de três respostas de movi- trata de resposta única. Todavia, mesmo com
mento de natureza agressiva sugere uma ati- a presença de um único desvio mais sério, em
tude negativa ou mesmo hostil no contato in- termos de lógica, pode levantar a suspeita, pelo
terpessoal. menos, de lapsos transitórios na percepção da
Não obstante, um dado que se associa com realidade.
interesse em contatos humanos é a quantida- Dentre as respostas imprecisas, é necessá-
de de respostas de conteúdo humano. Essas rio distinguir as que podem se caracterizar
respostas estão habitualmente presentes na como “verbalizações patognômicas”, pois elas
maioria dos protocolos. Sua diminuição é com- sugerem a presença de transtornos de pensa-
patível com a existência de dificuldades nas mento. A combinação de uma má precisão for-
interações com os demais, escasseando princi- mal com indícios de transtornos de pensamen-
palmente em quadros clínicos em que a rela- to é compatível com a probabilidade de pro-
ção com a realidade se encontra prejudicada. blemas mais sérios, que envolvem defeitos
Por outro lado, quando o conteúdo humano é grosseiros no teste da realidade, como num
fragmentário (H) ou se caracteriza por dimi- quadro esquizofrênico, ou, se menos severos e
nuição de seu nível de realidade, como em fi- conspícuos, de transtorno de personalidade,
guras míticas, etc., fica sugerido “um entendi- especialmente de tipo borderline.

PSICODIAGNÓSTICO – V 367
22
Novas tendências: introdução ao
Sistema Compreensivo de Exner
Regina Sonia Gattas F. do Nascimento
Anna Elisa de Villemor A. Güntert

N o atual momento de desenvolvimento do


exame de Rorschach, não poderíamos dei-
xar de incluir uma breve introdução ao Siste-
te, deu-se, inicialmente, graças aos esforços de
Morgentahaler e Oberholzer, mas as primeiras
sistematizações que faltavam foram empreen-
ma Compreensivo desenvolvido por John Ex- didas no continente americano, ainda no final
ner, Jr.* Tal inclusão, neste módulo, é plena- da década de 20 e durante as décadas de 30 e
mente justificável, pois, como já vimos, se tra- 40, dando origem a diversos sistemas. Cada
ta de um sistema de classificação, análise e in- um dos sistemas desenvolvidos guardava se-
terpretação que nasceu com o objetivo de in- melhanças entre si, pois todos mantinham-se
tegrar algumas das principais contribuições a fiéis às idéias originais de Rorschach, mas con-
esse método de psicodiagnóstico. tinham diferenças decorrentes das distintas
Na década de 70, Exner, com o consenti- formações teóricas de seus autores. A expan-
mento e estímulo de quatro dos principais sis- são do uso desses diversos sistemas, por um
tematizadores do Rorschach nos Estados Uni- lado, permitia um desenvolvimento cada vez
dos – Samuel Beck, Marguerite Hertz, Bruno maior da técnica, seja nos Estados Unidos, seja
Klopfer e Zigmunt Piotrowski –, empreendeu na Europa, e depois, também em outros conti-
seus primeiros esforços no sentido de reunir nentes, mas, por outro lado, dificultava a co-
os conhecimentos e as investigações destes e municação entre os diversos pesquisadores e
também de Rapaport, que, desde muitos anos, a aplicação dos desenvolvimentos e descober-
vinham arduamente desenvolvendo o método. tas de um sistema para os outros. Portanto, a
Mas o que teria levado Exner a tal empreita- proposta inicial de Exner não era a criação de
da? A resposta a essa questão quiçá remonte mais um sistema entre tantos, mas sim a unifi-
à morte prematura de Hermann Rorschach, cação das principais contribuições dos autores
que, em 1922, deixou sua obra como um rico americanos em um só sistema que pudesse
procedimento a ser ainda bastante explorado. superar as complicações advindas de um para-
Assim, a divulgação do método, após sua mor- lelismo – uma babel – que impossibilitava a tro-
ca entre pesquisadores, criando obstáculos a
maiores desdobramentos do método.
Exner criou, então, em 1968, a Rorschach
*Este texto foi redigido tendo como fontes as obras de
Research Foundation, hoje conhecida por Ror-
Exner (1994), Exner (1999), Exner & Sendín (1999) e
Weiner (1998). schach Workshops, e começou suas investiga-

368 JUREMA ALCIDES CUNHA


ções. Iniciou por fazer um levantamento exaus- Esse ideal continua sendo perseguido até
tivo entre os clínicos e pesquisadores registra- hoje, e o atual Rorschach Council – grupo de
dos na American Psychological Association e, pesquisas criado por Exner, em 1997 – prosse-
após vários estudos, concluiu que a grande gue empenhado em incluir e integrar, de modo
maioria dos que se utilizavam do Rorschach em compatível, os desenvolvimentos mais signifi-
sua prática profissional, além de seguirem li- cativos na área. Os componentes atuais desse
nhas diferentes, “personalizavam” os procedi- grupo, liderados por Viglione, Eksberg e Perry
mentos de aplicação e codificação conforme revelaram, no recente Congresso Internacional
sua experiência pessoal, sendo que a prática de Rorschach e Outras Técnicas Projetivas, ocor-
mais comum era incorporar características de rido em julho de 1999, em Amsterdã, que, além
sistemas diferentes, sem se pautar por crité- de seguirem aprimorando os elementos de
rios precisos. Ora, continuando com as investi- codificação das respostas, têm se empenhado
gações, Exner pôde também demonstrar que, em sistematizar a análise dos conteúdos e dos
entre os mais de 4.000 artigos e 29 livros que modos de expressão verbal na formulação das
constavam na literatura sobre o Rorschach, até respostas, incluindo também critérios de fun-
1970, além do manual original, muitos temas damentação psicanalítica.
relacionados com aspectos cruciais da aplica- A iniciativa de Exner trouxe ao método al-
ção ou classificação nunca tinham recebido gumas soluções que até então pareciam im-
uma investigação sistemática. Finalmente, após possíveis, o que explica a ampla difusão do Sis-
um criterioso trabalho de compilação de mais tema Compreensivo e sua adoção por impor-
de 1.300 protocolos recebidos de experientes tantes pesquisadores em todo o mundo. Hoje
rorschachistas da época, constatou que os di- em dia, temos trabalhos relevantes com esse
ferentes modos de aplicação de cada sistema sistema nos Estados Unidos (incluindo o Alas-
produziam cinco tipos relativamente diferen- ca), Canadá, México, Venezuela, Peru, Chile,
tes de protocolos. Além disso, observou que, Argentina, Portugal, Espanha, França, Grã-Bre-
embora os cinco sistemas contivessem elemen- tanha, Itália, Finlândia, Holanda, Dinamarca,
tos empiricamente comprovados, todos eles para mencionar apenas aqueles de que temos
incluíam alguns códigos ou critérios de classi- conhecimento direto.
ficação sem confirmação empírica ou sobre os No Brasil, já contamos com algumas pes-
quais já existiam resultados negativos quanto quisas utilizando-se do Sistema Compreensi-
à sua confiabilidade. Esses dados, somados à vo, e outras que visam à produção de normas
constatação de que menos de 20% dos pro- para a população brasileira (Güntert, 1996;
fissionais que usavam o Rorschach acredita- Güntert, Nascimento, Cardoso et alii, 1997;
vam e seguiam um único sistema, fizeram Nascimento, 1993; Nascimento, Güntert, Frei-
com que as investigações da Fundação pas- tas et alii, 1997; Semer, 1999; Silva Neto, 1999;
sassem a tentar integrar características de Yazigi, Antúnez, Duarte et alii, 1999).
qualquer sistema que pudessem encontrar
uma justificação empírica (para informações
mais detalhadas, vide o primeiro capítulo de A APLICAÇÃO
Exner, 1994).
Daí em diante, houve 25 anos de pesquisas Considerando os sistemas estudados, Exner
com o Sistema Compreensivo, que continua se começou a investigar questões relativas às ins-
desenvolvendo, de forma bastante dinâmica, truções de aplicação, registro da prova e posi-
até nossos dias. Integrações, revisões e acrés- ção do examinador em relação ao sujeito. Suas
cimos são feitos constantemente, apoiados em pesquisas mostraram que, dependendo dos
investigações extensas e fundados em meto- procedimentos e instruções adotados em cada
dologias de pesquisa atualizadas, todas elas sistema, obtinham-se diferentes protocolos,
descritas na obra organizada por Exner, em incluindo médias de quantidade de respostas
1995. por protocolo, que variam de 23,9 (sistema

PSICODIAGNÓSTICO – V 369
Klopfer) a 36,4 (sistema Rapaport). Isso de- ros e facilmente aplicáveis. Além disso, a con-
monstra que, não importando qual o sistema firmação empírica do significado interpretati-
adotado, as instruções devem ser coerentes vo de cada elemento da classificação serviu
com esse sistema, o que garante maior confia- como critério para sua inclusão no sistema.
bilidade dos resultados. Apesar de suas novidades, o Sistema Compre-
Para o Sistema Compreensivo, a recomen- ensivo não apresenta tantas modificações que
dação quanto à aplicação é de que a posição impeçam um especialista, com uma certa prá-
da dupla aplicador-examinando deve ser lado tica, de compreender bem as mudanças. Para
a lado e, nunca, face a face, para evitar a inter- aqueles que estão iniciando, traz a clareza com
ferência do aplicador, por meio de suas expres- que estes elementos são descritos, o que faci-
sões não-verbais. As instruções são curtas e lita a sua utilização, embora seja maior a com-
simples, perguntando-se apenas “O que isso plexidade no processo de codificação do que
poderia ser?”, ao se apresentar as pranchas. nos outros sistemas americanos. Muitos dados,
Exner estabeleceu ainda alguns critérios que antes eram apenas trabalhados de manei-
quanto ao número de respostas para que um ra qualitativa, foram incorporados na forma de
protocolo seja aceito, pois, por meio de suas categorias codificáveis, para um trabalho mais
pesquisas, verificou que um protocolo com objetivo. Essa complexidade, no entanto, é o
menos de 14 respostas não é favorável para a que garante a riqueza de seus dados, paralela-
análise e apresenta baixa correlação em caso mente à consistência do sistema.
de reteste. Propõe, para evitar essa situação, Os elementos convencionais de classifica-
alguns procedimentos que estimulem um nú- ção das respostas foram mantidos com leves
mero suficiente de respostas, chegando, se for modificações e são os seguintes: localização,
o caso, a um repasse de todas as pranchas. No determinantes, conteúdos e respostas popula-
seu ponto de vista, o viés introduzido com esse res. A esses, Exner acrescentou códigos para
procedimento, se necessário, é menos nocivo qualidade evolutiva, qualidade formal (tradi-
do que o de trabalhar com material escasso, cionalmente usado, porém, agora com altera-
principalmente estando o profissional ciente de ções muito significativas), respostas de pares
quando e como interferiu na produção do exa- e escores especiais.
minando. Da mesma forma, propõe que se in-
terrompa a associação nas duas primeiras pran-
chas, após cinco respostas, a fim de desesti- Localização
mular protocolos muito longos, que mostra-
ram não possuir resultados essencialmente di- A classificação da localização das respostas é
ferentes para a interpretação, quando compa- bastante simples, considerando apenas as áreas
rados a protocolos com um número médio de utilizadas. As respostas podem ser globais (W),
respostas. detalhes comuns (D), detalhes incomuns (Dd)
ou nos espaços em branco (S), que são sempre
associados a um dos critérios de codificação
A CLASSIFICAÇÃO DAS RESPOSTAS anteriores (WS, DS ou DdS).

Exner estabeleceu que nenhuma categoria de


classificação seria introduzida em seu sistema, Qualidade evolutiva
se não alcançasse um nível de fidedignidade
de 0,85, na comparação da classificação de 10 Este novo elemento de classificação comple-
a 15 diferentes codificadores, trabalhando com menta a localização, acrescentando um segun-
um mínimo de 10 protocolos que apresentas- do código, que diferencia a qualidade dos pro-
sem freqüência significativa do elemento de cessos perceptivos envolvidos na formação da
classificação em estudo. Dessa forma, conse- resposta e visa a discriminar respostas vagas,
guiu estabelecer critérios de classificação cla- respostas simples – ordinárias –, que envolvem

370 JUREMA ALCIDES CUNHA


uma forma, e respostas que introduzem uma 1) Forma: F – apenas a forma determina a
relação entre seus elementos – sintetizadas. imagem percebida.
Neste caso, os critérios são os seguintes: 2) Movimento: M, FM, m – para respostas
Resposta sintetizada (+): resposta na qual que envolvem atividade ou movimento de se-
dois ou mais objetos são descritos como sepa- res humanos, de animais ou de objetos inani-
rados, mas havendo uma clara relação entre mados, respectivamente. Exner acrescentou,
eles. Nesse caso, pelo menos um dos objetos é ainda, um critério para classificação de M,
descrito de modo a introduzir uma forma es- quando a resposta envolve uma experiência
pecífica. humana, mesmo que não tenha forma algu-
Resposta ordinária (o): em que um objeto ma, como, por exemplo, “Isto me lembra de-
simples é descrito, e essa descrição lhe confere sentendimento”. Além disso, deve-se, obriga-
uma determinada forma. toriamente, atribuir um código complementar
Resposta sintetizada (v/+): dois ou mais a cada resposta de movimento, qualificando-o
objetos são descritos como separados, há uma como ativo, a, ou passivo, p. Portanto, tere-
relação entre eles, mas não há nenhuma de- mos, necessariamente, Ma ou Mp, FMa ou FMp
manda de forma específica para qualquer das e ma ou mp.
partes da resposta. 3) Cor cromática: FC, CF, C, Cn – respostas
Resposta vaga (v): neste caso, o examinan- influenciadas pela cor da mancha.
do refere apenas um elemento na resposta, sem 4) Cor acromática: FC’, C’F, C’ – respostas
que nenhuma demanda específica de forma influenciadas pelas cores preta, branca ou cin-
seja introduzida. za.
5) Sombreado:
a) Textura: FT, TF, T – respostas onde o som-
breado produz impressões táteis.
Determinantes b) Dimensão (Vista): FV, VF, V – respostas
nas quais as características de sombreado da
Estes são os elementos mais complexos da clas- mancha causam efeitos de profundidade.
sificação das respostas, que indicam qual, ou c) Difusão: FY, YF, Y – respostas baseadas
quais características da mancha estimularam nas características claro-escuro das manchas
o sujeito e influenciaram a formação da res- sem efeitos mais específicos.
posta, ou seja, quais elementos determinaram 6) Forma-dimensão: FD – respostas que en-
a resposta. volvem impressão de profundidade, distância
Os critérios para a classificação dos deter- ou dimensão, mas nas quais essa impressão
minantes são praticamente os mesmos da não é baseada nas características de sombrea-
maioria dos sistemas existentes: forma, movi- do da mancha, e sim no seu tamanho ou posi-
mento, cor, cor acromática e sombreado. A ção.
esses foram acrescidas as categorias de forma- 7) Reflexo: Fr, rF – quando imagens idênti-
dimensão (FD), pares (2) e reflexos (Fr e rF). cas, devido à simetria da mancha, são referi-
Todos os determinantes possuem subcategori- das como espelhadas.
as, conforme a importância dada à forma na
elaboração do conceito. Por exemplo, FC, onde Pares (2) – considerado como um determi-
a cor aparece como um elemento secundário, nante, mas classificado em uma coluna à par-
e as características formais são mais relevan- te; utiliza-se este código para todas as respos-
tes, ou CF, quando o elemento principal é a tas que envolvem a percepção da imagem du-
cor, e a forma aparece de modo secundário, pla, quando essa impressão é determinada pelo
ou C, quando apenas a cor determinou a for- aspecto de simetria da mancha.
mação da resposta.
Os determinantes do Sistema Compreensi- Determinantes únicos e determinantes mis-
vo são: tos. Uma resposta pode ter um ou mais deter-

PSICODIAGNÓSTICO – V 371
minantes em sua classificação. Quando existe tem critérios muito precisos de inclusão de uma
apenas um determinante, é chamado de de- resposta em cada categoria, já que algumas
terminante único, e, quando aparece mais de delas comporão fórmulas importantes para a
um em uma mesma resposta, diz-se que são interpretação dos resultados. Por exemplo,
determinantes mistos ou blends. Natureza (Na) e Paisagem (Ls) seguem critérios
estritos, que não podem ser confundidos.
Existem 26 categorias, sendo quase todas
Qualidade formal utilizadas em outros sistemas de codificação
do Rorschach. Foi introduzida uma categoria
A classificação da qualidade formal das respos- para as respostas que não se ajustam facilmen-
tas fica mais complexa do que alguns dos sis- te a nenhuma das já existentes. Essas respos-
temas anteriores, uma vez que Exner amplia tas são codificadas como conteúdo idiossincrá-
os critérios de codificação, além de introduzir tico (Id).
a obrigatoriedade de atribuir uma qualidade
formal a todas as respostas, onde entra a for-
ma, mesmo que secundariamente. Assim, no Populares
lugar de termos apenas respostas bem vistas
ou mal vistas, temos os seguintes critérios: As respostas populares (P) são as respostas que
1) Resposta superior/superelaborada (+): aparecem com uma freqüência muito alta na
este código é específico para uma resposta população em que foi realizado o levantamen-
bem-vista, que foi articulada de maneira não to. Podem existir diferenças entre as respostas
usual, excessivamente detalhada, à qual é atri- populares, em diferentes grupos culturais. O
buída uma série de características descritivas, Sistema Compreensivo definiu 13 respostas P,
sem alterar a sua qualidade formal. grande parte delas coincidentes com o que já
2) Resposta ordinária (o): este código é es- considerávamos popular em nosso meio.
pecífico para uma resposta que é facilmente
identificada pela maioria das pessoas, constan-
do, portanto, das tabelas normativas. O crité- Atividade organizativa
rio estatístico para respostas o é de que tenham
sido dadas, pelo menos, por 2% da popula- Este item de classificação refere-se à atribui-
ção. ção de um valor numérico, quando diferentes
3) Resposta incomum (u): trata-se de uma elementos da resposta são integrados pela atri-
resposta que, apesar de pouco freqüente, se buição de uma relação entre eles. Esse critério
comparada ao critério anterior, mantém a ca- foi introduzido por Beck (1944) e empregado
racterística de poder ser facilmente identifica- de forma diferente por Hertz (1977), que atri-
da por outras pessoas, não apresentando dis- buía o mesmo valor a todas as respostas orga-
torção significativa da forma. nizadas – e foi, de certa forma, considerado
4) Resposta menos (-): é a resposta que re- por Klopfer e colegas (1954), ao atribuírem
cebe este critério por tratar-se de uma respos- valores à qualidade formal das respostas, co-
ta que distorce a forma, podendo apresentar dificação quase nunca utilizada, por ser muito
pequenas distorções ou ser totalmente arbitrá- subjetiva. O critério adotado no Sistema Com-
ria. preensivo é o de Beck, segundo o qual existem
relações que são mais fáceis de serem estabe-
lecidas, em função das características formais
Conteúdos da própria mancha (compacta ou fragmenta-
da) e da área escolhida pelo sujeito para for-
Tal como todos os sistemas, a classificação dos mar sua resposta (toda a mancha, detalhes
conteúdos é simples e praticamente não traz adjacentes, detalhes distantes e espaços bran-
modificações, a não ser pelo fato de que exis- cos). Em função do grau de facilidade ou de

372 JUREMA ALCIDES CUNHA


dificuldade para se estabelecer essas relações, a.2) Respostas desviantes (DR), quando a
atribui-se um valor menor ou maior. Esses va- resposta apresenta palavras que mostram um
lores variam de 1,0 (a mais fácil) a 6,5 (a mais afastamento da tarefa ou uma distorção, na
complexa, ou de aparecimento mais raro). forma de frases inadequadas, que são comen-
No Sistema Compreensivo, trabalha-se com tários relativos à resposta, mas completamen-
a atribuição desses valores citados, que são cha- te desnecessárias e até mesmo inoportunas,
mados de notas Z, e, em cada protocolo, estima- não acrescentando nada à compreensão da
se a freqüência com que tais valores aparecem resposta, ou de respostas circunstanciais que
(Zf) e mais a soma desses valores (Zsum). aparecem na forma de divagações e comentá-
rios.
b) Combinações inadequadas: são combi-
Códigos especiais nações que violam o princípio de realidade nas
condensações dos diferentes elementos de uma
Esses códigos também vão integrar a análise única resposta. Apresentam três diferentes ti-
quantitativa e são elementos da resposta que, pos, que são: INCOM, FABCOM e CONTAM.
em outros sistemas, costumam ser considera- b.1) Combinação incongruente (INCOM),
dos de modo qualitativo. Eles indicam a pre- quando diferentes elementos são combinados,
sença de uma característica incomum na fala de forma incoerente, em um único conceito
do sujeito, ao emitir uma resposta. Temos 14 formulado como resposta, como, por exemplo
Códigos Especiais (special scores), dos quais seis “uma pessoa... que tem bico; mistura de gen-
são utilizados para verbalizações inusuais, dois te e ave”.
para perseveração e falha na integração, qua- b.2) Combinação fabulada (FABCOM), in-
tro para características especiais do conteúdo, dicando uma relação impossível entre diferen-
um para resposta personalizada e um para fe- tes elementos combinados em uma resposta,
nômeno especial de cor. como em “dois cachorros dançando animada-
1) Verbalizações inusuais. Na maioria des- mente”, “dois ursos subindo em uma taça de
ses códigos, existe uma discriminação em dois sorvete” ou “um monstro com braços levanta-
níveis, dependendo da gravidade do fenôme- dos e aqui no centro é o seu coração”.
no ocorrido, sendo o nível 1 (lvl 1) atribuído a b.3) Contaminação (CONTAM), quando di-
deslizes mais leves e indicando falhas mais ferentes elementos se fundem para formar uma
brandas, e o nível 2 (lvl 2) atribuído a respos- resposta, violando, de forma bastante grave,
tas mais bizarras, que podem indicar a presen- o princípio de realidade, como, por exemplo,
ça de problemas mais graves. “estômago de um urso” (D1 da prancha VIII).
São três categorias diferentes: c) Lógica inadequada (ALOG), quando uma
a) Verbalizações desviantes: referem-se a resposta é justificada, espontaneamente, por
modos de expressão que apresentam deslizes um raciocínio forçado, indicando a presença
cognitivos, indicados por meio de uma verba- de um raciocínio frouxo e simplista, como no
lização inadequada à tarefa, que dificultam a exemplo “Aqui é o pulmão. Se o rim tá na par-
clareza na comunicação do sujeito. São de dois te inferior, aqui seria o pulmão”.
tipos: verbalização desviante e resposta des- Estes são os denominados Seis Códigos Es-
viante: peciais Críticos (DV, DR, INCOM, FABCOM,
a.1) Verbalização desviante (DV), atribuída ALOG e CONTAM), que, em diferentes graus,
a neologismos e redundâncias. Nesta catego- indicam a presença de incompetência ou dis-
ria, estão incluídas as más utilizações das pa- função cognitiva, estando relacionados a dis-
lavras, ou seja, quando seu uso é equivocado, funções da ideação, e que, para efeito de in-
ou quando são verbalizadas incorretamente, terpretação, aparecem em soma bruta e em
tais como as mãos do animal, ou estrupo, até soma ponderada (Sum 6 ou Wsum 6). Esses
formas mais graves, como “rabatana” (por fenômenos indicam lapsos ou falhas lógicas no
barbatana). pensamento. Eles podem ocorrer em protoco-

PSICODIAGNÓSTICO – V 373
los de muitas pessoas, como fenômenos isola- todos eles para que a ação aconteça e onde a
dos, e que não chegam a comprometer o fun- ação seja considerada positiva ou cooperativa.
cionamento do pensamento, mas, quando os Entram nessa categoria respostas tais como:
mais graves são utilizados ou quando apare- “duas pessoas balançando numa gangorra”,
cem em um grande número de respostas, indi- “duas pessoas fazendo um brinde” ou “duas
cam falhas severas no pensamento, que devem pessoas dançando juntas”.
ser consideradas como elementos graves e per- d) Conteúdo mórbido (MOR): pode-se utili-
turbadores. zar esse conteúdo sempre que houver uma res-
2) Perseveração e falha na integração: posta cujo conteúdo apareça como destruído,
a) Perseveração (PSV): é um elemento de morto, estragado, etc., ou quando aparecer um
codificação que deve ser atribuído em três di- sentimento de conteúdo disfórico, tal como
ferentes circunstâncias: a) quando encontra- triste, sombrio, infeliz, etc. Essas respostas in-
mos um mesmo modo de responder, aparecen- dicam a presença de uma auto-imagem nega-
do respostas com os mesmos elementos de tiva, baixa auto-estima e uma visão negativa e
classificação, na mesma prancha (perseveração pessimista do meio.
em um mesmo cartão); b) quando um mesmo 4) Respostas personalizadas (PER): Este có-
conteúdo é repetido em diferentes pranchas digo indica que, ao responder, o indivíduo re-
(perseveração de conteúdo); c) quando uma correu a seus conhecimentos ou experiência
mesma resposta aparece de uma forma sim- pessoal anterior para justificar a resposta. São
plista (perseveração mecânica). interpretadas como necessidades inusuais do
b) Confabulação (CONFAB): é atribuído sujeito justificar-se defensivamente, costuman-
quando o sujeito faz sua associação de resposta do aparecer em número elevado em pessoas
a partir de um detalhe da mancha, geralmente inseguras. Quase sempre deve vir acompanha-
de maneira apropriada, e generaliza sua res- da de pronome pessoal, como eu, mim ou nós.
posta para a mancha inteira, o que é feito de Exemplos dessas respostas são: “eu já vi dese-
um modo inadequado. nhos como este em meus livros de biologia”,
3) Características especiais de conteúdo: “lá em casa tinha um quadro igual a este”.
a) Conteúdo abstrato (AB): é um código 5) Fenômeno especial de cor:
atribuído para respostas que expressam uma Projeção de cor (CP): é o escore que mostra
representação simbólica. Em alguns dos siste- que o sujeito identificou uma parte ou toda a
mas anteriores, era considerado como um con- mancha acromática como colorida. Costuma
teúdo e, no Sistema Compreensivo, foi agru- aparecer em pessoas deprimidas, que procu-
pado com os códigos especiais. Algumas ve- ram negar a presença dos afetos negativos,
zes, essa característica aparece de maneira di- substituindo defensivamente por emoções po-
reta, como na resposta “alegria”, cujo conteú- sitivas.
do é Hx (experiência humana), e, outras vezes,
aparece como um elemento secundário, atri-
buído a um outro objeto, como em “cachimbo SUMÁRIO ESTRUTURAL
da paz”.
b) Movimento agressivo (AG): como o pró- O modo como os dados são analisados tam-
prio nome diz, esta categoria é atribuída quan- bém obedece a um esquema original. Os ele-
do aparece uma ação claramente agressiva, seja mentos da classificação das respostas, bem
ela em movimento humano (M), animal (FM) como as fórmulas e proporções, são organiza-
ou inanimado (m), mas sempre junto com de- dos no sumário estrutural, preparando os da-
terminante de movimento. dos para a interpretação do protocolo. Ele é
c) Movimento cooperativo (COP): é atribuí- dividido em duas partes: na primeira, ou seção
do para qualquer dos determinantes de movi- superior, anota-se a freqüência de cada um dos
mento, desde que a ação envolva dois ou mais códigos; na segunda, ou seção inferior, regis-
elementos, de forma que haja necessidade de tram-se as proporções, razões, porcentagens

374 JUREMA ALCIDES CUNHA


ou derivações. Ou seja, nessa segunda parte, construtiva, ou, ao contrário, mostrar um
são efetuados os cálculos de porcentagens de pensamento incoerente e ilógico, rígido e
códigos isolados (por exemplo, as porcenta- pouco construtivo. Incluem-se aqui dados
gens da qualidade formal das respostas), ou relativos às respostas de movimento (M-,
de índices (por exemplo, o índice de egocen- Mnone, Ma:Mp, ativos passivos de todas as
trismo, relacionado ao nível de autocentramen- respostas de movimento) e os Códigos Espe-
to da pessoa) ou, ainda, a nota D, que nos in- cias Críticos (Sum6, WSum6), que são os ele-
forma sobre a tolerância ao estresse. mentos que indicam alterações na atividade
Uma novidade do sumário estrutural é que, ideacional.
na seção inferior, os dados já são agrupados 3) Seção da mediação: nesta seção, estão
em blocos organizados por seções, onde to- agrupados os dados que fornecem as diretri-
dos os elementos são relativos à interpretação zes para se conhecer como se dá a tradução
de uma esfera da personalidade. Temos sete das informações a respeito de si mesmo e da
seções: realidade, convencional ou não convencional,
1) Seção principal: neste bloco, são agru- ou se há uma percepção adequada ou distor-
padas as freqüências das respostas de movi- cida, ou seja, os dados referentes à qualidade
mento, cor e sombreado, o número de respos- formal das respostas.
ta (R) e Lambda (L). Além dos dados a respeito 4) Seção do processamento: reúne os da-
do Tipo de Vivência, ela reúne os dados que dos das localizações das respostas, da ativida-
trazem informações a respeito da capacidade de organizativa e da qualidade evolutiva, que
de Controle e Tolerância ao Estresse. nos trazem elementos interpretativos, relativos
Nesta seção, temos os índices D e Adj D, ao modo como a pessoa apreende e incorpora
que indicam a capacidade de controle para as informações da realidade, indicando tam-
enfrentar as situações estressantes. Esses índi- bém o nível do desenvolvimento intelectual e
ces discriminam os recursos habitualmente dis- a capacidade para realizar operações de análi-
poníveis para enfrentar situações de estresse se e síntese.
com ações deliberadas (Adj D,) da presença de 5) Seção do afeto: agrupa os elementos
ansiedade mobilizada por acúmulo de fatores relativos às emoções da pessoa, como ela lida
estressantes vividos no momento que poderiam com situações emocionais e como expressa
interferir na capacidade habitual de controle seus sentimentos. Aqui são incluídas as respos-
da pessoa (D). Quando os valores D e/ou Adj D tas de cor, o quociente afetivo (Afr – propor-
forem negativos, indicam a presença de uma ção de respostas às pranchas cromáticas), a
sobrecarga de estímulos, que podem levar a proporção SumC:SumC e as respostas de pro-
pessoa a reações impulsivas, devido à falta de jeção de cor (Cp).
recursos suficientes para enfrentar dificulda- 6) Seção interpessoal: neste agrupamento,
des. Cabe ressaltar que os determinantes estão diversos índices relativos à maneira com
FM+m e a soma das respostas de sombrea- que o indivíduo percebe o outro e estabelece
dos, que entram nos cálculos para se chegar suas relações, indicando suas necessidades,
às notas D e Adj D, são indicadores de uma atitudes e estilos quanto a esse aspecto. Entre
sobrecarga de tensão, quando mais elevados esses índices, podemos citar as respostas COP
que os resultados de M e Wsum C. Já os deter- e AG, e o índice de isolamento (Isolate/R), que
minantes m e Y apontam a presença de estres- indica tendência à convivência ou afastamen-
se situacional. to das pessoas.
2) Seção da ideação: seção relativa à área 7) Seção da autopercepção: aqui são reu-
do pensamento. Traz os elementos que indi- nidos os elementos que revelam o modo como
cam como a pessoa pensa suas experiências, o a pessoa se descreve e os conceitos e atitudes
que dá origem às decisões e condutas delibe- que constrói sobre si mesma, dando-nos infor-
radas do sujeito. A pessoa pode ser capaz de mações sobre a auto-imagem e o valor que
pensar de maneira lógica, coerente, flexível e atribui a essa imagem, a auto-estima. São eles:

PSICODIAGNÓSTICO – V 375
o índice de egocentrismo, calculado a partir revelado variações em diferentes culturas, e de-
de respostas de pares e de reflexo, que assina- vemos seguir pesquisando neste sentido.
la o autocentramento; respostas de reflexo, que Agrupamentos: A interpretação deve par-
indicam a presença de componentes narcisis- tir dos agrupamentos de dados que formam
tas; respostas MOR; anatomia e raio X; o de- as seções do sumário estrutural, já que os mes-
terminante FD, bem como a qualidade das res- mos estão relacionados com uma determina-
postas de seres humanos. da esfera da personalidade, o que evita a aná-
Além da organização dos dados por agru- lise de variáveis isoladas. Exner e Sendín (1999)
pamentos, como vimos antes, o Sistema Com- acrescentam algumas outras variáveis a esses
preensivo apresenta as constelações, que são agrupamentos, inclusive elementos qualitati-
conjuntos de índices relacionados a patologias vos, que deverão ser levados em conta para
ou desajustes, mas que também trazem ele- uma interpretação completa.
mentos para se compreender a estrutura da A análise por agrupamentos aumenta a
personalidade e estilos ou traços dominantes possibilidade de uma interpretação integrada
do sujeito: Constelação de Suicídio (S-CON), Ín- do Rorschach, seguindo o modelo do Sistema
dice de Esquizofrenia (SCZI), Índice de Depres- Compreensivo, como Weiner (1998) enfatiza.
são (DEPI), Índice de Déficit Relacional (CDI), A subdivisão dos agrupamentos apenas orga-
Índice de Hipervigilância (HVI) e Índice de Esti- niza as informações que serão relevantes para
lo Obsessivo (OBS). cada um deles, indicando quais os elementos
que deverão constar da análise daquele tema,
incluindo códigos de classificação, fórmulas
INTERPRETAÇÃO específicas e análise temática. Lembra esse au-
tor que os agrupamentos não funcionam como
Com os dados organizados de forma bastante resultados compartimentalizados dos testes,
objetiva, a interpretação fica facilitada também que apresentam seus resultados em traços iso-
por diretrizes claras e sistematizadas que per- lados, mas são agrupamentos das informações
mitem a um iniciante começar a entender as relevantes de algumas funções da personali-
manifestações da personalidade, a partir dos dade.
resultados do Rorschach. A interpretação re- Estratégias de interpretação/variáveis-cha-
comendada pelo sistema sugere analisar, em ve: Também são fornecidas as melhores estra-
primeiro lugar, os elementos do sumário es- tégias de interpretação, que iniciam pelo ele-
trutural; em seguida, a seqüência das classifi- mento mais importante de cada protocolo, ou
cações e, finalmente, a análise dos conteúdos a chamada variável-chave. O sistema determi-
temáticos. na qual a melhor seqüência de agrupamentos
Tabelas normativas: O sistema fornece ta- a seguir, ou seja, oferece o melhor roteiro para
belas bastante completas, indicando padrões uma boa interpretação. Essa organização, a
que dão maior segurança para a compreensão partir da variável-chave, possibilita que sejam
dos valores encontrados no sumário estrutu- analisados, em primeiro lugar, os resultados
ral, além de orientar a interpretação. Sabemos, mais significativos do protocolo, aqueles que
no entanto, que esses dados podem sofrer va- fornecerão mais elementos de interpretação,
riações culturais, e pesquisas normativas pre- esclarecerão melhor os dados encontrados nos
cisam ser realizadas para a nossa população. agrupamentos subseqüentes e apontarão para
Iniciamos em São Paulo uma pesquisa para es- onde devemos dirigir nossa atenção naquele
tabelecer índices adequados para nosso meio, caso.
começando pelos itens da mediação, relativos Projeção e percepção: O Sistema Compre-
à qualidade formal (Nascimento, pesquisa em ensivo propõe ainda uma clara diferenciação
andamento) e também quanto à constelação entre dois processos envolvidos na formação
de depressão (Güntert & Nascimento, pesqui- das respostas, ou seja, os perceptivos e os pro-
sa em andamento), que são os que mais têm jetivos. Essa diferenciação orienta também a

376 JUREMA ALCIDES CUNHA


seqüência da interpretação. Devemos começar RIAP: Outro avanço do sistema é o progra-
pelos aspectos estruturais que, em geral, são ma de informática, o RIAP, que oferece assis-
mais determinados por processos perceptivos tência para utilização em computador, que fa-
(localização, forma, colorido, sombreado) e cilita a atividade de análise do teste, sem, con-
seguir com o material projetivo, que se encon- tudo, substituir a interpretação realizada pelo
tra com maior probabilidade em respostas que especialista.
envolvem movimento (o sujeito cria o movi- O objetivo de integrar as diversas contribui-
mento, este não é um estímulo provocado pela ções de vários sistemas de modo coerente e
mancha), distorções perceptivas (respostas com científico foi alcançado, apoiado em numero-
qualidade formal [menos]) e “floreamentos”, sas pesquisas, que continuam enriquecendo o
que acrescentam indícios reveladores de vários trabalho com o método original de Hermann
aspectos da dinâmica da personalidade. Entre Rorschach. Já foram apresentados, em congres-
as respostas com conteúdo projetivo, temos so, estudos sobre um novo agrupamento, cujo
algumas com material mais significativo do que nome é Ego Impairement Index, bem como
outras. Cabe ao examinador com boa experiên- estudos a respeito das respostas de agressão
cia identificar qual material é mais significativo, (AG), para uma possível modificação do esco-
porém, Weiner (1998) nos dá uma orientação, re e também das perseverações (PSV).
no sentido de procurar aquelas que combinam Muitos estudos ainda devem ser feitos, prin-
dois ou três indícios de projeção, que devem ser cipalmente no Brasil, e esse fato apenas con-
analisados em conjunto com as características firma que estamos diante de um método vivo
de cada prancha. A associação dos diversos com- de investigação da personalidade, que acom-
ponentes da resposta torna a interpretação mais panha a evolução da ciência, da cultura e da
consistente, dinâmica e profunda. sociedade.

PSICODIAGNÓSTICO – V 377
Rorschach Temático: um complemento
significativo ao Rorschach Tradicional*
André Jacquemin
23
D entre as diversas pesquisas desenvolvidas
com o Método de Rorschach no Centro de
Pesquisa em Psicodiagnóstico da Universidade
za do procedimento, no sentido de fornecer
dados clínicos significativos para uma compre-
ensão dinâmica da personalidade. Entretanto,
de São Paulo, Ribeirão Preto, é de especial in- empregada na forma sugerida pelos estudos
teresse o trabalho de Iozzi (1988), que propõe citados, a técnica de associações livres torna-
um procedimento para completar a explora- se bastante restrita, pois focaliza cada respos-
ção das respostas Rorschach, visando a am- ta isoladamente, o que não possibilita a apre-
pliar a sua interpretação. Em contato com ensão das possíveis relações existentes entre
Draime (1980), na Universidade de Louvain, as respostas, e que poderia trazer à tona ele-
Bélgica, tivemos oportunidade de conhecer mentos expressivos da vida afetiva dos indiví-
seu trabalho, referente ao estudo do valor duos avaliados. Outros estudos solicitaram a
simbólico da prancha IV do Rorschach. Uma elaboração de histórias.
técnica diferente, chamada de “Rorschach Elizur (1976) descreve uma nova técnica,
Temático”, tinha sido utilizada, com vistas a administrada em dois momentos. Na primeira
preencher as lacunas existentes entre as res- fase, o sujeito é convidado a imaginar uma his-
postas fornecidas no teste, em sua aplicação tória, tomando como tema central a resposta
tradicional. Com efeito, na maioria das ve- fornecida durante a aplicação tradicional. No
zes, essas respostas são lacônicas e, em con- caso de várias respostas por prancha, o sujeito
seqüência, sem evidência de articulação e escolhe uma delas ou o próprio examinando
concatenação entre si. opta por aquela resposta julgada mais apro-
A idéia de ampliar as informações sobre os priada, para estimular a fantasia. Na segunda
conteúdos das respostas no Rorschach não é fase, chamada de auto-interpretação, o sujei-
nova. Diversos trabalhos sugeriram a utiliza- to deve identificar-se com a figura principal de
ção da técnica de associações livres para este cada história e buscar temas comuns entre suas
fim. Podem-se citar as pesquisas de Aronov e histórias e sua vida real. Usando o referencial
colegas (1979) e de De Tichey e Lighezzolo teórico da Gestalt-terapia, o autor considera
(1983), cujos resultados apontam para a rique- que as histórias, baseadas nas manchas do
Rorschach, podem suscitar um material mais
inconsciente e idiossincrásico que as histórias
* Projeto financiado pelo CNPq e pela FAPESP. baseadas nas figuras do TAT.

378 JUREMA ALCIDES CUNHA


Edington (1980) solicita que as crianças ela- Além do material original do Rorschach,
borem histórias a partir do percepto provenien- foram utilizadas fichas para a apresentação das
te de manchas criadas por elas próprias. As respostas aos sujeitos, durante a segunda fase
histórias assim obtidas revelam uma tonalida- da pesquisa. A aplicação ocorreu em duas fa-
de disfórica acrescida de violência, que pode ses distintas, em uma ou duas sessões. Na pri-
caracterizar a faixa etária estudada (de 6 anos meira fase, foi feita a aplicação do Rorschach,
e meio a 16 anos), assim como as condições incluindo o processo completo de investigação.
precárias de vida dessas crianças. Frente aos Na segunda fase, solicitava-se ao sujeito que
resultados obtidos, Edington recomenda não imaginasse uma história que incluísse todas as
atribuir um significado simbólico a determina- interpretações dadas a cada um dos estímu-
do percepto sem considerar os dados adicio- los, durante a aplicação do teste. As pranchas
nais. foram reapresentadas, uma por uma, junta-
Dentro desse contexto, o procedimento pro- mente com uma ficha, onde constavam as res-
posto traduz sua originalidade, ao induzir uma postas fornecidas para cada uma delas. As ins-
articulação das respostas fornecidas pelo indi- truções foram as seguintes: “Vou lhe mostrar
víduo, o que será obtido numa segunda fase, novamente os dez cartões que já apresentei.
após a aplicação tradicional do teste. Solicita- Aqui estão as respostas que você me deu. Eu
se ao sujeito a elaboração de uma história que gostaria que você me contasse uma história
integra as respostas, impondo, assim, uma di- para cada cartão, utilizando todas as respostas
nâmica aos conteúdos aparentemente estáti- que me deu. Então, neste cartão você viu ‘x’, ‘y’
cos. Desse modo, pretende-se ampliar a pro- e ‘z’. Conte-me então uma história com ‘x’, ‘y’ e
posta de Rorschach (1948), que, originalmen- ‘z’ ”. Na quase totalidade dos casos, os sujeitos
te, deu maior ênfase aos aspectos perceptivos reagiram positivamente a essas instruções, con-
de sua técnica. Com efeito, no seu Psicodiag- seguindo realizar a tarefa a contento.
nóstico, Rorschach deixa claro o seu enfoque A utilidade e a viabilidade do Rorschach Te-
perceptivo: “As interpretações destas figuras mático, como técnica complementar e capaz
casuais pertencem ao campo da percepção e de fornecer subsídios significativos para a com-
da apercepção, mais do que da imaginação” preensão da personalidade, já foram examina-
(p.21). Ou, ainda, “não há dúvida que esta pro- das em diversos contextos.
va de interpretação de figuras casuais possa
ser chamada de prova de percepção” (p.22).
Embora, a princípio, esse autor buscasse uma ESTUDO EM CRIANÇAS
técnica para a avaliação do funcionamento
psíquico por meio de processos perceptivos, Cinqüenta crianças, de ambos os sexos, com
pela forma de apreensão do real imediato, es- idade de 9 a 10 anos, foram submetidas a esse
tudos posteriores ampliaram esse pressupos- procedimento. Em função das características
to, sem, contudo, desconsiderá-lo. Neste sen- socioeconômico-culturais e educacionais, fo-
tido, Rausch de Traubenberg (1983) propôs a ram constituídos quatro grupos:
hipótese de que o teste de Rorschach seria um a) grupo A (n=20), com escolaridade regu-
espaço de interações entre a atividade percep- lar, boa alimentação, nível socioeconômico-
tiva e a fantasmática, entre a realidade exter- cultural inferior;
na do objeto conhecido e a realidade interna b) grupo B (n=10), com escolaridade irre-
do objeto vivenciado. Considerando esses ele- gular e atraso escolar, condições gerais de vida
mentos, o Rorschach Temático oferece maior bastante precárias no nível material e afetivo;
possibilidade de investigação da inter-relação c) grupo C (n=10), em instituição, nível so-
entre o real e o imaginário. Enquanto a aplica- cioeconômico-cultural inferior, boa alimenta-
ção tradicional tende a alcançar o nível percep- ção e escolaridade regular;
tivo, sobretudo na normalidade, a elaboração d) grupo D (n=10), com escolaridade regular
de uma história atingiria o nível fantasmático. e nível socioeconômico-cultural médio-superior.

PSICODIAGNÓSTICO – V 379
Os resultados tradicionais do Rorschach senciadas por todos. A pobreza e a falta de
(psicograma) deixam de ser apresentados, já condições materiais de vida são características
que o objetivo maior era o de verificar o quan- predominantes. Desse modo, poder-se-ia pen-
to o procedimento seria exeqüível e clarifica- sar que essas privações reais – além daquelas
dor com crianças. Nesse trabalho, as histórias em nível fantasmático –, com suas conseqüên-
foram analisadas de acordo com a lista de ne- cias vivenciais cotidianas de frustrações, aca-
cessidades do Thematic Apperception Test, de bam por estimular a alta manifestação de com-
Murray (1951), tendo como referencial Ombre- ponentes agressivos e destrutivos nas histórias
dane (1969) e Morval (1982). Além de uma contadas. Vale ressaltar que as crianças do gru-
objetivação das histórias, a configuração das po D, em condições de vida melhor – classe
necessidades permite “uma avaliação dinâmi- socioeconômica média, vida familiar mais es-
ca da personalidade, visto que evidencia em tável, escolaridade normal –, com vivência
que consiste o elemento motor da conduta” menor de frustrações, diminuem apreciavel-
(Morval, 1982, p.31). mente as temáticas agressivas nas suas histó-
No Quadro 23.1, são apresentadas as por- rias, mostrando o quanto o meio pode estar
centagens das necessidades mais freqüentes, influindo nas suas reações.
encontradas nas histórias das crianças dos gru- Observa-se, também, uma maior tendência
pos em estudo. dos grupos B e D a apresentarem necessidade
de afiliação. No grupo B, pode caracterizar um
QUADRO 23.1 Distribuição das necessidades
mecanismo compensatório, uma tentativa pre-
obtidas nas histórias contadas no Rorschach pelos mente de preencher o vazio decorrente da au-
diferentes grupos de crianças sência de afeto, reforçada pela situação fami-
Porcentagem liar difícil. As crianças realmente mais carentes
manifestam claramente suas insatisfações em
Necessidades Grupo Grupo Grupo Grupo
A B C D
nível afetivo, solicitando fortemente que o
n=20 n=10 n=10 n=10 ambiente exerça sobre elas ações protetoras.
Denotam, assim, sentimentos de insegurança
Agressão-destruição 43 42 44 27
Afiliação 14 23 15 23 e fragilidade pessoal com maior intensidade do
Proteção exercida 6 2 3 7 que as outras crianças dos grupos A e C, que
Realização 5 3 2 5 recebem ainda um mínimo de apoio externo.
Aquisição 6 0 3 4 No grupo D, pode se tratar da necessidade
Alimentação 6 3 13 11
de receber proteção e apoio devido ao con-
Diversão 6 10 8 12
Outras necessidades 6 7 4 5 texto socioeconômico-cultural, que torna as
Sem histórias 8 10 8 6 crianças menos autônomas e mais dependen-
tes do auxílio dos pais para atender suas ne-
cessidades.
Observa-se que mais de 40% das necessi- Os grupos C e D diferem notavelmente do
dades encontradas, nos grupos A, B e C, cara- grupo B em relação à necessidade alimentar,
terizam-se pela agressão e destruição. São si- caracterizando a busca da manutenção de co-
nais preocupantes, que denotam que as crian- mida, já que as crianças desses grupos têm
ças são marcadas por impulsos de tipo primiti- acesso a uma variedade maior de alimentos.
vo, com reduzido controle. Nesses grupos, to- Quanto às demais características das neces-
das as crianças avaliadas provêm de uma clas- sidades expressas pelas crianças em suas his-
se social totalmente desprovida de recursos, tórias, os grupos A e B, melhor estruturados,
embora aquelas do grupo A vivenciem priva- tendem a produzir maior número de necessi-
ções de forma menos acentuada. As famílias, dades do tipo obter conhecimentos, realização,
geralmente numerosas, moram em favelas ou ser reconhecido, além de proteção exercida, si-
casa com espaço vital mínimo, onde as atua- nal evidente de uma maior diversidade de suas
ções impulsivas (agressivas e sexuais) são pre- necessidades.

380 JUREMA ALCIDES CUNHA


Concluindo, parece, então, que as condi- No entanto, analisando-se as histórias pro-
ções socioeconômico-culturais desfavoráveis venientes de tal interpretação, detectam-se
desempenham um papel importante na mani- índices muito mais reveladores, praticamente
festação das necessidades relacionadas com a evidentes pela forma de elaboração particular
agressão e a destruição. Quanto às outras ne- do enredo produzido por parte de cada crian-
cessidades, as condições externas podem ter ça. Assim, o sujeito A expressa claramente si-
um papel maior ou menor na sua presença. nais de um relacionamento agressivo entre os
Após essas considerações sobre os tipos de elementos viventes, sugerindo uma percepção
necessidades detectados nas produções infan- ameaçadora dos contatos interpessoais. A pró-
tis, por meio dessa nova técnica, apresentar- pria forma da história dessa criança é bastante
se-ão, a seguir, outros elementos demonstrati- diferente da segunda, em que “o não saber”
vos do material que pode ser recolhido através aparece como sinal de maior fragilidade na
do Rorschach Temático. identidade, mesmo porque a borboleta acaba
Como já foi comentado anteriormente, as se desvitalizando por seu próprio cansaço, por
respostas ao teste de Rorschach, em sua apli- atuação pessoal (talvez autodestrutiva), mas
cação tradicional, não tornam explícitos os sig- sem envolver um elemento externo agressor.
nificados particulares dos perceptos, limitan- Por sua vez, o sujeito C apresenta indicadores
do a possibilidade de análise do nível fantas- de maior riqueza formal em sua história, es-
mático subjacente aos conteúdos. Recorrendo truturando-a com elementos de presente e fu-
a essa nova técnica, uma simples resposta de turo. Embora, inicialmente, expresse uma auto-
“borboleta”, na prancha V (uma única inter- imagem negativa (“feinha”), através do conta-
pretação), de três crianças, pode tornar-se, atra- to com a realidade (há outros também “fei-
vés das histórias elaboradas, sinalizadora das nhos”), parece ser capaz de reelaborar essa
vivências afetivas e fantasmáticas, de uma percepção e encontrar estímulo e apoio ambi-
maneira bastante esclarecedora. Como ilustra- ental para a continuidade de sua vida.
ção, considerar-se-ão as histórias a seguir. Essas breves considerações sobre a produ-
Do sujeito A, do sexo masculino, com 10 ção de crianças no Rorschach Temático permi-
anos: “Uma vez, uma borboleta queria ir no tem identificar elementos esclarecedores e en-
pantanal. Chegando lá, ela viu bastante ani- riquecedores para a análise dos significados
mais bonitos. Só que ela achava feio o jacaré. pessoais atribuídos aos perceptos.
Um dia, quando ela foi dormir na escuridão, ela
pousou em cima da cabeça dele. Naquela hora,
o jacaré acordou e devorou a borboleta. Só”. ESTUDO EM IMIGRANTES
Do sujeito B, do sexo feminino, com 10
anos: “Uma borboleta voou no mato e depois Quarenta descendentes de imigrantes de ori-
voltou. No campo, a borboleta morreu, por- gem japonesa e portuguesa, de ambos os se-
que ela cansou de voar. Não sei mais”. xos, foram submetidos ao procedimento do
Do sujeito C, do sexo feminino, com 10 Rorschach Temático, como complemento de
anos: “Era uma vez uma borboleta muito fei- um estudo com o Teste de Apercepção Temáti-
nha. Ela era muito triste, porque todas eram co – TAT, cujo objetivo é de verificar o nível de
bonitas. Aí, ela conheceu uma tartaruga, e a aculturação de povos de origem diversa (Jac-
tartaruga era muito feia. Então, a borboleta e quemin, 1997).
a tartaruga ficaram felizes para sempre”. Na fase atual, os resultados são prelimina-
Tomando-se a cotação da resposta “borbo- res e devem servir como ilustração da aplicabi-
leta” – Gp F+ A Ban –, ter-se-iam poucos ele- lidade do Rorschach Temático. São apresenta-
mentos pessoais de análise, caracterizando, dos comentários sobre a prancha I do Ror-
apenas, uma apreensão “banal” do estímulo, schach, a partir das histórias dos sujeitos mas-
embora bem adaptada, indicadora de aparente culinos japoneses (n=10) e portugueses
organização em termos da integridade psíquica. (n=10).

PSICODIAGNÓSTICO – V 381
A prancha I, segundo Rausch de Trauben- Sua história: “As pessoas envelhecem por
berg (1983), associa-se com o desconhecido. dentro, tornam-se opacas, seus sentimentos
De acordo com Chabert (1987), a prancha I co- são recalcados.... não se sabe por que, mas esta
loca o indivíduo frente ao teste, de modo que pessoa não se perturbou pela notícia..... o re-
torna possível que (re)viva a experiência de um sultado do exame indicava um câncer dos os-
contato inicial com algo desconhecido. Já para sos.... este dia mesmo, sozinha como sempre,
Monod (1963), a prancha I significa o estabe- ela morreu”.
lecimento de contatos, que testemunha a A riqueza das informações obtidas pelo pro-
maneira de adaptação e de defesa e a forma cedimento temático é evidente. Deve-se, assim,
de vivenciar a situação aqui-agora. Em fun- possibilitar efetuar uma interpretação clínica e
ção dessa significação, é interessante verifi- simbólica das pranchas do Rorschach de ma-
car como as histórias do Rorschach Temático neira mais científica. Em função da significa-
ampliam a compreensão dos sujeitos quan- ção da prancha I, a apresentação que os des-
to a esse aspecto. cendentes de imigrantes fornecem no Ror-
Uma leitura das histórias, num contexto schach parece ser bastante problemática, sen-
interpretativo-dinâmico, permite constatar que do indicativa de que a sua identidade não está
a apresentação dos dois grupos é nitidamente completamente resolvida, com mais evidência
negativa, um pouco mais acentuada nos des- para os japoneses, por causa dos prováveis
cendentes de imigrantes japoneses, em que se conflitos existentes entre a cultura de origem
observam sete histórias negativas, uma ambi- de seus pais e a cultura de adoção e pelas ca-
valente e duas positivas enquanto, nos portu- racterísticas fenotípicas da raça.
gueses, se encontram seis histórias negativas,
uma ambivalente e três positivas. Esse aspecto
negativo se caracteriza, nos dois grupos, por ESTUDO EM MULHERES COM INFECÇÃO
problemas de identidade, atitudes agressivas VAGINAL RECORRENTE
manifestadas de modo franco ou desviado, de
autodestruição. Os aspectos positivos salien- Dez mulheres (cinco com candidíase de repeti-
tam a busca de contato, de estabelecimento ção e cinco sem problema) foram submetidas
de relacionamentos sociais e/ou heterossexuais, a um conjunto de testes, inclusive o Rorschach
acompanhados, nos portugueses, de uma ne- Temático, com o objetivo de investigar a possí-
cessidade de religiosidade e misticismo. vel vinculação entre necessidades e motivos
Pode-se ilustrar esses aspectos negativos psicológicos e a recorrência da candidíase va-
por meio de exemplos de histórias contadas ginal, isto é, verificar qual a influência que os
pelos descendentes de imigrantes. aspectos psicológicos (e quais) assumem sobre
Problema de identidade: Japonês, 25 anos, a permanência dessa sintomatologia ou, de
solteiro, secundário completo. outra forma, na resistência ao tratamento me-
No Rorschach clássico, fornece três respos- dicamentoso (Palma, 1996).
tas: “uma máscara, uma borboleta e um mor- Nessa pesquisa, as histórias foram interpre-
cego”. tadas tomando em consideração o valor sim-
Sua história: “Eu fui no baile do colégio e bólico latente de cada prancha, de acordo com
cada um devia se fantasiar e escolhi uma más- Rausch de Traubenberg e do referencial teórico
cara para me fantasiar. No salão, tinha uma freudiano. O procedimento será ilustrado a par-
outra pessoa com uma máscara de borboleta tir de duas histórias contadas por uma paciente.
e um homem fantasiado de morcego...”. Mulher de 31 anos, casada, um filho. Des-
Problema de agressividade, autodestruição: de sua adolescência, sofre de infecção vaginal.
Português, 24 anos, solteiro, nível universitá- Após a primeira relação sexual, apresenta epi-
rio. sódios freqüentes de candidíase vaginal.
No Rorschach clássico, forneceu uma res- No Rorschach clássico, fornece as seguin-
posta: “um esqueleto”. tes respostas: na prancha VI, “uma vagina, uma

382 JUREMA ALCIDES CUNHA


pele de urso aberta”; na prancha VII, “duas ESTUDO EM CRIANÇAS QUE
mulheres que dançam, uma vagina”. EXPERIENCIARAM A PERDA DE SEUS PAIS
No Rorschach Temático, conta as histórias
seguintes: Nove crianças (cinco meninas e quatro meni-
Prancha VI: “Tinha uma cabana nas monta- nos), na faixa etária de 5 a 7 anos, sob custó-
nhas; era o inverno. Estava frio e tinha uma dia materna. O objetivo central do trabalho era
pele de urso na sala, perto da lareira; tinha um verificar as representações internas das figu-
casal na sala. Então, a mulher estava deitada ras parentais de crianças que viveram grandes
sobre a pele, sem roupas e com as pernas aber- conflitos familiares, culminando na separação
tas de modo que se via claramente sua vagi- de seus pais. Em particular, pretendia-se inves-
na.... Eles tinham tido uma relação. Ele tinha tigar a capacidade do Rorschach Temático, in-
saído; ela não sabia onde ele tinha ido”. terpretado de modo psicodinâmico, em ampliar
Prancha VII: “Eram duas bailarinas que o material obtido com o Rorschach clássico
dançavam uma na frente da outra, se olhan- (Barreto, 1998).
do e fazendo gestos idênticos. Então.... nes- Menina, com 6 anos e 3 meses de idade,
ta dança, uma bailarina escorregou e caiu tendo vivenciado a separação aos 4 anos de
com as pernas abertas; sua vagina se chocou idade.
contra a perna da outra e sangrou... Não,... No Rorschach clássico, fornece duas respos-
sangrou, é trágico demais... não há verme- tas na prancha IV: “pés” (Do F+ Hd) e “calça”
lho. Ela se feriu e foi obrigada a desistir do (Dd F– Obj-Vest).
espetáculo”. No Rorschach Temático, conta a história
Nessas duas pranchas, o sujeito mostra o seguinte:
quanto sua vida sexual é problemática e viven- “Era uma vez um homem que morreu por-
ciada de maneira invasiva e dolorosa: “com as que era velhinho. Aí chegou a mãe e falou:
pernas abertas, de maneira que se via nitida- – Meu querido marido, já que você morreu,
mente a vagina” (prancha VI) e “caiu com as vamos enterrar. Não queria que você morres-
pernas abertas, sua vagina chocou-se contra a se, mas nós vamos enterrar você e pôr no cai-
perna da outra e sangrou...” (prancha VII). É xão, já que ninguém matou você. E enterrou
revelador também da frieza e da solidão res- ele.
sentida após o ato sexual: “... acabam de ter Aí chegou com cara triste e cada criança
tido uma relação. Ele tinha saído...” (prancha falou:
VI). O sujeito tenta controlar a angústia pela – Mamãe, por que você está triste? (repete
negação: “Não,... sangrou, é trágico demais..” 4 vezes)
(prancha VII). – Porque seu pai morreu.
Na prancha VII, considerada a prancha da – Por que, mãe? (repete 4 vezes)
feminilidade, o sujeito mostra os aspectos re- – Porque ele estava velho demais, ninguém
lacionados com a figura materna, que parece matou ele. Ele morreu sozinho. Agora vamos
ter sido carregada de uma identificação maci- viver nós.
ça: “... duas bailarinas... fazendo gestos idên- – Coitado do pai! Eu amava tanto ele (re-
ticos....”, e de sentimentos agressivos fortes pete 4 vezes).
que parecem ter impedido o desenvolvimen- – Mãe, por que será que o pai ficou velho
to, de maneira adequada, de uma imagem fe- demais?
minina independente e, deste fato, um papel – Não sei.
sexual satisfatório. Acabou”.
Esses dados reforçam e clarificam a proble- No Rorschach clássico, o processo inibitó-
mática fundamental do sujeito: dificuldade rio frente à autoridade é bastante claro, im-
franca na relação heterossexual, acompanha- possibilitando uma apreensão mais global da
da de conflitos não-resolvidos com a figura prancha. No Temático, o homem decrépito, que
materna. morreu de velhice, pode estar representando a

PSICODIAGNÓSTICO – V 383
figura paterna “perdida”, endeusada, até per- rígido e ineficaz. Suas demandas internas não
ceber, não sem sofrimento, pelas lições da rea- ocorrem ou, quando se apresentam, não po-
lidade, que ele era falível e incapaz de respon- dem ser consideradas, porque são passivas de
sabilizar-se pelo seu desenvolvimento e edu- levar a um sentimento de desintegração. A
cação. O sujeito mostra, por meio de sua his- necessidade que este grupo tem de se manter
tória, que poderá contar apenas com a sua em tensão vigilante, para que as emoções não
mãe, em termos de cuidados, porém, sem en- emerjam, pode significar dificuldade para to-
tender a causa dessa situação. lerar a dor e a angústia. A relação com o mun-
do externo dá-se de modo cauteloso e pruden-
te, com a utilização do racional como meio de
ESTUDO EM MULHERES contato. As emoções encontram-se como que
COM HIV+ E/OU AIDS congeladas, o que faz restringir a personalida-
de e leva a inibições, à repressão do mundo
Dois grupos de mulheres (cada um composto imaginativo e criativo, produzindo fortes reper-
de sete indivíduos), com idade entre 20 e 40 cussões sobre sua vida. No Temático, há uma
anos, sendo que o primeiro grupo apresenta- total ou parcial impossibilidade de construir
va soropositividade para o vírus HIV, enquanto uma história, o que significa que essas mulhe-
o segundo grupo era composto por mulheres res têm dificuldades para brincar, já que o brin-
com AIDS. O objetivo da pesquisa era verificar car só pode ser alcançado se o indivíduo abdi-
a relação entre integração psíquica e fragilida- car de algumas funções egóicas, como a lógi-
de diante do vírus HIV, tanto em mulheres so- ca e o contato com o mundo real e objetivo.
ropositivas quanto naquelas portadoras da Duas histórias ilustram, com clareza, a
doença (Abduch, 1997). As histórias contadas diferença de produtividade que ocorreu no
no Rorschach Temático foram avaliadas, levan- Rorschach Temático, indicando a capacidade ou
do em conta a construção das mesmas (pro- não de “brincar” dos pacientes.
cesso narrativo com temática, cujo enredo te- Mulher, 39 anos, soropositiva com AIDS,
nha começo, meio e fim) e o quadro teórico primário completo.
proposto por Winnicott (1975). No Rorschach clássico, na Prancha II, forne-
Nas mulheres com AIDS, existe uma articu- ce uma resposta: “dois palhaços batendo pal-
lação entre os mundos interno e externo de mas, um frente ao outro”.
maneira diferenciada daquela do outro grupo. No Rorschach Temático:
As mulheres que desenvolveram a doença uti- “Um instante mágico”.
lizam o pensamento racional como uma ma- “Eles trabalhavam no circo, então quando
neira de adaptação e controle, embora consi- eles vestiam aquelas roupas, colocavam a ma-
gam levar em consideração suas necessidades quiagem, era só alegria, eles esqueciam de to-
internas, suas emoções, seus impulsos. Verifi- das as tristezas e só pensavam na alegria que
ca-se, então, uma maior integração psíquica, eles tinham que passar para aquelas pessoas
o que pressupõe capacidade para vivenciar de que tanto esperavam deles. Aqueles momen-
modo mais significativo os aspectos mais do- tos de trabalho eram mágicos, só pensavam
lorosos da vida. No Temático, são capazes, na na alegria, era como se eles esquecessem tudo
maioria da vezes, de elaborar histórias a partir ao redor deles, os problemas que eles tinham
de seus perceptos, caracterizando a possibili- e junto com as crianças eles esqueciam mes-
dade de imaginar e fantasiar. mo. Eles voltavam a ser crianças e um mundo
As mulheres apenas soropositivas são me- de fantasia se criava ao redor deles. Mas quan-
nos espontâneas e criativas, não possibilitam do eles tiravam as roupas, maquiagem, eles
de forma tão intensa o surgimento de fanta- eram homens comuns com a vida cheia de pro-
sias, de emoções. Essas mulheres utilizam o blemas. E quantos problemas eles tinham! Ti-
pensamento lógico como forma de controle e nham a família para sustentar, que dependia
adaptação, que se apresenta extremamente deles. E assim eles iam tocando a vida, até o

384 JUREMA ALCIDES CUNHA


instante mágico voltar e eles voltavam a ser tiva que pode vir a ser alcançada por meio des-
crianças outra vez”. sa forma complementar de investigação das
Mulher, 28 anos, soropositiva, superior respostas. Não se pretende, com esse procedi-
completo. mento, substituir testes temáticos, como o CAT
No Rorschach clássico, fornece uma só res- ou o TAT, por exemplo, mas sim obter informa-
posta na Prancha II: “aranha”. ções adicionais valiosas para a análise do pró-
No Rorschach Temático: “Era uma vez uma prio método de Rorschach.
aranha, estava sempre de boca aberta”. Ainda que com objetivo diferente, buscan-
do uma análise estritamente psicanalítica de
associações livres, De Tichey e Lighezzolo
COMENTÁRIOS FINAIS (1983) também apontam para a contribuição
desse tipo de procedimento, para a análise do
Os resultados que acabam de ser apresenta- protocolo clássico do Rorschach, sem, contu-
dos mostram, de maneira clara e evidente, a do, desconsiderar a proposta original do au-
importância das informações fornecidas pelas tor. Comentam que as duas abordagens se si-
histórias contadas pelos sujeitos, a partir de tuam numa relação de complementaridade, e
seus perceptos. Parece importante salientar não de concorrência. Julgam que, com efeito,
que, a priori, não há modelo teórico único para elas atingem dois níveis diferentes de funcio-
interpretar as histórias. O pesquisador e/ou clí- namento da personalidade. Nesse sentido, o
nico poderão utilizar seja um modelo mais procedimento clássico está mais centrado na
objetivante – tipo necessidade, de Murray –, organização estrutural do sujeito, ao passo que
seja um modelo mais interpretativo – tipo psi- a técnica associativa privilegia a dinâmica pre-
canalítico, fundamentado na sua prática e for- sente e passada, que predeterminou essa or-
mação. ganização.
Embora sejam necessários outros estudos Confirma-se, portanto, a possibilidade de
de sistematização dessa técnica, para a avalia- utilização do Rorschach Temático como um ins-
ção de sua validade clínica, os trabalhos apre- trumento de grande importância clínica para
sentados demonstram a amplitude interpreta- o estudo da personalidade.

PSICODIAGNÓSTICO – V 385
A técnica de Zulliger no processo de
avaliação da personalidade
Cícero Emidio Vaz
24
H ans Zulliger, psicólogo clínico suíço, que,
por ocasião da Segunda Grande Guerra,
trabalhou também em seleção de pessoal, nas-
experiências coletivas com novas manchas de
tinta. A aplicação individual do Rorschach com
os dez Cartões durava muito tempo, tornan-
ceu em 1893 e faleceu em 1965. Sua amizade do-se economicamente dispendiosa para sele-
com o pastor e psicanalista Oskar Pfister con- ção em grande escala. O final das experiências
tribuiu para que ele se dedicasse à psicanálise, resultou num conjunto de três figuras, que foi
integrando o grupo de Emil Oberholzer, Hans aplicado pareadamente à administração indi-
Behn-Eschenburg, Walter Morghenthaler e Her- vidual com o Rorschach, numa amostra de 800
mann Rorschach, fundadores da Sociedade de pessoas, surgindo assim o Zulliger Diapositi-
Psicanálise de Zurique. Foi amigo pessoal de ve-Test (1948), para aplicação coletiva. O pró-
Hermann Rorschach e participou dos trabalhos prio autor fez a adaptação do instrumento,
de Rorschach nos experimentos com manchas para a aplicação individual em três Pranchas
de tinta feitas ao acaso na avaliação da perso- ou Cartões, com o nome de Der Zulliger-Ta-
nalidade. feln-Test (1954). As sucessivas publicações,
O primeiro trabalho com manchas de tinta, em 1955, 1959 e 1962, feitas pela Hans Hu-
metodologicamente baseado na técnica de ber, atestam muito bem a receptividade des-
Rorschach, feito por Zulliger, após a morte de se instrumento de trabalho no campo das
Hermann, foi Der Rorschasche Testversuch im técnicas projetivas.
Dienste der Erziehungsberatung (Teste de Ror- Qual o nome mais adequado, teste ou téc-
schach na assistência educacional), em 1932, nica de Zulliger? A literatura pertinente permi-
em que investigava a criatividade e a integra- te-nos constatar diferentes denominações:
ção humana. No ano de 1938, em co-autoria a) Z-Teste, pelo próprio autor (Zulliger,
com Hans Behn-Eschenburg, publicou o BERO 1948), Maza, (1952), Salomon, na publicação
(Behn-Rorschach Test), técnica paralela à de Ror- original (1962) e Someonoff (1990); b) Teste Z,
schach e constituída igualmente de dez Cartões por Zulliger e Salomon, na versão espanhola
contendo manchas de tinta feitas por acaso (man- (1970), Macedo (1968), Xavier (1985) e Mora-
chas fortuitas), construído para aplicação em li-Daninos e Canivet (1986); c) Teste de Zulli-
crianças e publicado pela Hans Huber. ger, por Guerra (1977) e Mahmood (1990),
Em 1942, realizando seleção de oficiais para entre outros autores; d) Técnica de Zulliger
as Forças Armadas suíças, iniciou as primeiras (Vaz, 1998).

386 JUREMA ALCIDES CUNHA


A denominação Técnica de Zulliger parece e dinâmicos da personalidade. É uma técnica,
mais adequada, muito embora, por respeito ao um método no sentido amplo, e não um teste,
próprio criador, usamos também a designação uma unidade estímulo padrão para obtenção
Z-Teste, como sinônimo. Teste é um meio ins- de resposta-padrão. O que Hans Zulliger cons-
trumental através do qual se mede o que de- truiu para avaliação da personalidade foi, a
terminado produto tem, tratando-se de coisas, nosso ver, uma técnica, e não um simples tes-
o que determinado sujeito é capaz de render, te. As denominações Teste de Zulliger e Z-Teste
tratando-se de pessoas, relativamente a um são usadas e devem ser entendidas como sinal
padrão previamente estabelecido. O que mede de respeito ao autor e à tradição, mas nos pa-
um instrumento com base metodológica no rece mais respeitoso ao ser humano avaliá-
Rorschach como uma unidade? “Com o Ror- vel e mais metodologicamente adequado di-
schach, que tem sido tradicionalmente consi- zermos técnica de Zulliger, quer coletiva quer
derado como um teste de personalidade, nós individualmente, conforme a modalidade de
não conseguimos, em medida, quanto de per- aplicação.
sonalidade a mais ou a menos a pessoa tem”
(Weiner, 1994, p.499). O que mede o Z-Teste
como uma unidade? A personalidade é um Aplicação coletiva
complexo dinâmico plurifacetado de elemen-
tos estruturais e funcionais. Sabiamente, diz A aplicação coletiva é recomendada para fins
Weiner: “O Rorschach é útil como médias de de seleção ou classificação de pessoal e de pes-
medidas e descrições sobre vários aspectos do quisa. O número de pessoas a serem examina-
funcionamento da personalidade” (p.499). Tan- das não deve ser superior a 35. A sala, não
to o Rorschach como o Z-Teste apresentam ca- muito grande e com circulação adequada do
tegorias, tais como número de respostas, res- ar e temperatura não demasiadamente eleva-
postas globais (G), detalhe comum (D), forma da, deve ter condições de poder ser escureci-
precisa (F+), movimento humano (M), movi- da, quando a aplicação for feita durante o dia.
mento animal (FM), altamente quantificáveis, Outros cuidados com espaço físico, interrup-
e que, conseqüentemente, possibilitam estu- tores de luz, tamanho da tela para projeção
dos comparativos e correlacionais em elevado dos diapositivos, folhas de aplicação e de ma-
padrão estatístico. Entretanto, tais medidas, peamento das respostas, equipamentos neces-
por mais objetivas que sejam, expressam mui- sários, assim como o rapport, instruções e pro-
to pouco, se o psicólogo deixar de lado a inte- cedimento de toda a aplicação, devem ser ob-
gração dessas variáveis com outros dados do jeto de preocupação para a aplicação coletiva
contexto familiar, profissional, social, para (Vaz, 1998).
aproveitar melhor as possibilidades de avalia-
ção da personalidade através do Zulliger.
As manchas não estruturadas, projetadas Aplicação individual
fisicamente sobre a tela (aplicação coletiva) ou
visualizadas nos Cartões (aplicação individual), A aplicação individual possibilita uma coleta
suscitam, na pessoa que está sendo psicologi- mais minuciosa de dados sobre a personalida-
camente examinada, situações que vêm asso- de do examinando. O ambiente físico consiste
ciadas ao seu contexto. O Z-Teste é capaz de de uma sala relativamente pequena, arejada,
propiciar ao examinador essas informações, com claridade correspondente à luminosidade
que, transformadas em categorias, passam a solar, e que não sofra influência de ruídos per-
ser quantificadas e interpretadas no todo plu- turbadores à conversa entre duas pessoas, com
rifacetado de dinamismos perceptivo-associa- uma mesa de 2,0 m x 1,5 m, duas cadeiras em
tivos que é a personalidade. A técnica de Zulli- que possam se sentar o examinador e o exami-
ger é um conjunto de variáveis, por meio das nando e uma mesinha pequena para os três
quais se pode quantificar aspectos funcionais Cartões de Zulliger.

PSICODIAGNÓSTICO – V 387
Como material necessário, deve o examina- que o sujeito recebe o Cartão e emite a primei-
dor ter à disposição, além do conjunto dos três ra resposta) e de duração (desde o momento
Cartões de Zulliger, um razoável número de em que o sujeito recebe o Cartão até o da de-
folhas de papel almaço, folha para mapeamen- volução).
to das respostas, ou Folhas de Localizações das 4) Fase do inquérito. Nessa fase, o psicólo-
respostas do Z-Teste, publicadas pela Editora go deve procurar saber onde o examinando
Vetor e pela Casa do Psicólogo, caneta ou lápis situou as respostas nas manchas do Cartão;
e um cronômetro. Ao contrário da aplicação identificar os conteúdos verbalizados e diferen-
coletiva, quem escreve as verbalizações e o ciar bem o que influiu no processo perceptivo-
mapeamento das áreas da mancha em que associativo do examinando. Em outras palavras,
foram localizadas respostas é o examinador. vai identificar onde e que conteúdo foi verbali-
A aplicação individual da técnica de Zulli- zado, o que levou o examinando a emitir cada
ger pode se dividir em quatro fases: 1) rapport, resposta, se foi de forma precisa, duvidosa ou
2) instruções, 3), aplicação propriamente dita; confusa e vaga, se foi algum tipo de ação hu-
4) inquérito ou investigação, à semelhança do mana, animal ou inanimada, cor, sombreado e
Rorschach. fenômenos especiais – categorias básicas da
1) Rapport. Esta é uma fase de contato ini- técnica de Zulliger. Nessa fase, o psicólogo pas-
cial, que se caracteriza por uma conversa in- sa a conversar com o examinando, com sereni-
formal, simples, descontraída, sem finalidade dade, procurando esclarecimentos sobre um
de coletar dados mais profundos do examinan- dado e outro, trazido na fase de verbalização
do, extremamente necessária para o êxito e fi- ou que está sendo falado agora no inquérito,
delidade da aplicação. com todo o cuidado para não induzi-lo a qual-
2) Instruções: “ Nós vamos, agora, fazer um quer tipo de determinante ou outra categoria.
teste bastante simples. Não se trata de um tes- É de extrema importância que os dados,
te de acerto ou erro. Eu vou lhe apresentar al- levantados no inquérito, posteriormente sejam
guns Cartões, um de cada vez, você olha e, à classificados e tabulados quanto a localização,
medida que vai olhando, você vai falando tudo determinantes, conteúdos e fenômenos espe-
aquilo que as manchas lhe sugerem, o que elas ciais (dados qualitativos) das verbalizações e
lhe lembram ao olhar para o Cartão. Procure reflitam o que o examinando quis dizer, e não
não se preocupar com erros nem com acertos, o que o psicólogo imaginou ou simplesmente
nem com o que é bom ou não falar. Procure deduziu que fosse.
falar, bem livremente, tudo aquilo que lhe vem
à lembrança. Algumas pessoas vêem mais,
outras vêem menos. Enquanto você vai falan- CLASSIFICAÇÃO E INTERPRETAÇÃO
do, eu vou tomando nota. Durante algum tem- BÁSICAS
po, eu não conversarei com você, pois preciso
anotar o que você fala, depois sim, irei conver- Classificar as verbalizações de um protocolo do
sar para ver se entendi bem tudo que você ti- Zulliger quanto a localizações, determinantes,
ver falado. Não vendo mais nada, devolva-me, conteúdos e fenômenos especiais requer certo
por favor, o Cartão. Está bem? Compreendeu cuidado, principalmente quando se trata da
bem? Vamos começar” (Vaz, 1997, p.16). aplicação coletiva. Nem sempre o examinando
3) Fase da aplicação propriamente dita. Uma consegue mapear com a devida clareza a área
vez que a pessoa examinanda manifestou ter da mancha em que visualiza o conteúdo ver-
entendido as instruções, inicia-se a aplicação balizado, fornecendo subsídios claros para a
propriamente dita. O examinador oferece-lhe classificação exata das localizações, dos deter-
o primeiro Cartão, com uma pequena frase: minantes e outras categorias. A aplicação in-
“Por favor, pode dizer o que as manchas lhe dividual, para um diagnóstico clínico ou com-
lembram, lhe sugerem?” Controla o tempo de preensão dinâmica mais acurada, é, sem dúvi-
reação (tempo decorrido desde o momento em da, a forma mais apropriada. Uma investiga-

388 JUREMA ALCIDES CUNHA


ção (Inquérito) na aplicação individual, feita Procuraremos apresentar as categorias bá-
pelo examinador, descontraidamente e com sicas, cada uma seguida da interpretação, que,
todo o cuidado, para não induzir o examinan- uma vez relacionadas dinamicamente com os
do, realmente possibilita uma coleta de dados demais dados coletados pelo colega profissio-
que facilita a classificação mais do que a apli- nal, através da entrevista, de outros testes e
cação coletiva. técnicas projetivas, poderão servir de ajuda na
Uma outra questão a considerar é o siste- avaliação da personalidade, na elaboração do
ma de classificação adotado para a codifica- psicodiagnóstico. Para uma interpretação mais
ção no Rorschach e, conseqüentemente, no detalhada e específica em função de faixa etá-
Zulliger. Embora as categorias globais, deta- ria, gênero e ocupações profissionais do exa-
lhes comuns, movimento, cor, forma, sombrea- minando, recomendam-se as referências Vaz
do, conteúdo humano, conteúdo animal man- (1998), nos casos de aplicação coletiva, e Frei-
tenham as mesmas características básicas, es- tas (1996), nos de aplicação individual.
pecialmente no que tange à interpretação nos
vários sistemas (Beck, 1945; Exner, 1974; Ex-
ner, 1991; Exner, 1993; Exner & Weiner, 1995; RESPOSTAS
Hertz, 1951; Klopfer, 1937; Klopfer, Ainswor-
th, Anderson et alii, 1956; Klopfer, Ainsworth, Resposta é um conteúdo verbalizado, é uma
Klopfer et alii, 1954; Klopfer & Davidson, 1940; idéia, um conceito vinculado diretamente a
Klopfer & Sender, 1936; Ombrendane-Canivet, determinada área-estímulo do diapositivo ou
citado por Anzieu, 1960; Rappaport, Gill & do Cartão. A pessoa dá configuração à man-
Schaffer, 1946, Piotrowski, 1957), as diferen- cha que lhe é proposta como um estímulo di-
ças existentes entre um e outro sistema são fuso, não organizado, não estruturado, dan-
irrelevantes, no que tange ao resultado final; do-lhe, em resumo, um conteúdo com nome e
diferenças de codificação não implicam discre- características peculiares. Não se considera res-
pâncias fundamentais na interpretação e no posta um simples comentário, nem tampouco
diagnóstico. uma pergunta, uma exclamação, ou uma ex-
Adotamos, como linha básica de trabalho, pressão de admiração, de susto ou coisa se-
o sistema de Bruno Klopfer, quer com o Ror- melhante, feitos pelo examinando diante da
schach, quer com o Z-Teste, desde 1966. Em figura. Por exemplo, no diapositivo I, “Este é
pesquisa normativa com a técnica de Zulliger, mais difícil...”, ou no II, “Não gostei disso”, ou
verificamos que não há necessidade de se le- no III, “Este foi mal feito”. “Por que o psicólo-
var em conta as subdivisões de movimento ina- go procura complicar tanto a vida da gente com
nimado (conteúdo em ação por forças da na- essas manchas?” Tais comentários, críticas,
tureza ou abstratas) em Fm, mF, m, de textura apreciações, depreciações, etc. são elementos
(Fc, cF, c) e de sombreado sobre superfície pla- que poderão ser levados em consideração na
na (conteúdos vistos através de transparência, integração dinâmica e compreensão diagnós-
radiografia ou foto) em Fk, kF, k. O índice de tica da pessoa, porém, não como um dado
freqüência desses determinantes é quase sem- quantitativo. Nestes exemplos, no diapositi-
pre muito irrelevante ou, dependendo do gru- vo/Cartão I, “No total, eu vejo um morcego”,
po, nulo. Para uma melhor compreensão dinâ- no III, “Duas mulheres”, no II, “Vejo duas
mica do examinando, numa aplicação coletiva crianças bricando de subir e descer numa
para seleção de pessoal, e numa avaliação clí- gangorra”, há, em cada verbalização, uma res-
nica, entretanto, torna-se vantajosa essa mi- posta. Podemos dizer que a resposta, no Z-Tes-
nuciosidade quer nos determinantes aponta- te, responde à pergunta que tecnicamente se
dos, quer nas localizações, como, por exem- faz: “O que viu o examinando na figura ou
plo, os detalhes diminutos (dd), para discrimi- em partes da figura?” Esta é a parte mais im-
nação de personalidade obsessiva e pessoa com portante na classificação das verbalizações
defesas obsessivas. expressas por uma pessoa no Z-Teste, porque

PSICODIAGNÓSTICO – V 389
é a partir do número de respostas que se ex- pessoa percebe racionalmente a realidade. As
traem os parâmetros quantitativos das de- localizações expressam como a pessoa usa sua
mais categorias. inteligência: a) a percepção de síntese, senso
O total de respostas (ou somatório de res- de organização, capacidade de planejamento
postas), verbalizadas num protocolo, constitui e capacidade de abstração do sujeito (G); b) a
o produto de todo o trabalho da pessoa du- capacidade de discriminação perceptiva dos
rante a fase de testagem, e, como tal, pode ser dados da realidade e o senso de objetividade,
interpretado como a expressão da sua capaci- por meio das respostas emitidas em área de
dade de adaptação à tarefa, sua capacidade detalhes comuns (D); as respostas de D podem
de produção, de desempenho e realização; é o ser interpretadas como o uso da inteligência
resultado de uma tarefa constituída de dificul- voltada para o concreto e pragmático; c) as res-
dades que ela teve que enfrentar e resolver, postas dadas em áreas com baixa freqüência
usando do potencial de sua inteligência e de estatística, denominadas detalhes incomuns
suas condições de personalidade. Diversos fa- (Dd), significam a capacidade de análise e sen-
tores podem influir no total de respostas de so de observação. A presença de espaço bran-
uma pessoa considerada normal. co (S), combinado com essas variáveis, pode
ser interpretada como interferência da ansie-
dade situacional sobre o que cada uma repre-
LOCALIZAÇÕES senta (Vaz, 1997; Vaz, 1998). Convém verificar
as tabelas de número 4 a 7, em Vaz (1998),
Denominam-se localizações as áreas da man- pois, de acordo com a ocupação profissional
cha em que o examinando situa a resposta ver- da pessoa testada, varia o percentual conside-
balizada. Em função das áreas, as respostas rado normal e esperado. Pessoas com propen-
podem ser classificadas em categorias globais, são ao uso da fuga e da fantasia apresentam
codificadas como G, detalhes comuns, que le- percentual de globais elevado. Um índice de
vam como código, D, e respostas de detalhe globais inferior à média conduz à hipótese de
incomum, classicamente Dd, e que, seguindo pessoa pouco inteligente, com a capacidade
Klopfer, se dividem em quatro subcategorias: de síntese prejudicada e com falta de visão de
Detalhe raro (dr), Detalhe diminuto (dd), Deta- conjunto da realidade. Deficientes mentais têm
lhe interno (di) e Detalhe externo (de) ou de dificuldades para se organizar ante as manchas,
borda. Quando o examinando inclui o branco caindo num processo de repetição, na perse-
do diapositivo ou Cartão, o registro assume a veração de globais com o mesmo conteúdo.
classificação GS, ou SG, no caso em que fique Pessoas com quadro obsessivo de personalida-
clara a preocupação com o branco. Exemplo de manifestam elevado percentual de D e Dd
de GS: “um morcego voando no espaço” (in- combinado com elevado número de respostas,
cluindo o branco do Cartão); de SG: “um mor- enquanto defesas obsessivas de personalida-
cego voando num espaço muito amplo, este de se caracterizam pelo elevado percentual de
espaço é amplo demais, não gostei”. Para clas- Dd, mas com o número de respostas conside-
sificar a localização, há necessidade do uso de rado normal.
Atlas de localizações na técnica de Zulliger, que
pode servir de referencial normativo, especial-
mente para profissionais com pouca experiên- DETERMINANTES
cia, assim como quanto aos critérios objetivos
para a classificação das respostas (Freitas, 1996; Determinante é uma palavra usada nas técni-
Guerra, 1977; Macedo; 1968; Vaz, 1998). cas de Rorschach e Zulliger para identificar
De modo geral, podemos dizer que as cate- quais fatores psíquicos que levaram ou deter-
gorias de localizações (globais – G, detalhes minaram o examinando a dar essa ou aquela
comuns – D e detalhes incomuns – Dd) das res- resposta. Rorschach parecia atribuir aos deter-
postas do Z-Teste significam o modo como a minantes a expressão de algo estrutural da

390 JUREMA ALCIDES CUNHA


personalidade. Os determinantes mobilizam comentário. Classificação: F+ (como determi-
não apenas a maneira como são captados os nante) (Vaz, 1998, p.35).
perceptos, mas a mobilização dos engramas 2) Quando o examinando emitiu a resposta
do mundo interno do examinando pelas man- levado simplesmente pela forma, a resposta
chas, ou seja, são a expressão da memória viva situa-se numa área que não é comum naquela
das experiências passadas e projetadas pelo figura, mas ele caracteriza bem o conteúdo,
examinando sobre as manchas. São a expres- descrevendo-lhe o formato e o configurado à
são do modo como o examinando estabelece área. Exemplo, no diapositivo II, dr 20: “Esqui-
a relação entre o mundo externo através das lo”. No comentário, o examinando explica “Tem
manchas e o seu mundo interno. patas, cabeça e corpo perfeitos de um esqui-
lo” (Vaz, 1998, p.35). Determinante F+. Não
se trata de uma resposta comum nesta área,
Forma entretanto, o examinado descreve bem a for-
ma do conteúdo verbalizado e em consonân-
Considera-se como determinante forma, um cia com o modo como a área selecionada da
conteúdo percebido de modo particularizado, mancha se apresenta. Em caso de ocorrer dú-
singularizado pelo examinando, tendo sido este vida do examinador que está efetuando a clas-
levado simplesmente pela forma. O conteú- sificação, quanto à atribuição de precisão for-
do é verbalizado sem nenhuma combinação mal (+), convém recorrer à opinião de um se-
de ação, colorido, sombreado ou de preto e gundo e de um terceiro colegas, prevalecendo
branco. então a maioria dos três.
O uso da freqüência estatística das respos- Para as respostas de Forma confusa e vaga
tas nas áreas de detalhes e globais nas figuras, ou de má qualidade (F-), utilizamos como cri-
não resta dúvida, é o critério mais consistente térios:
para a classificação de F+. Fenômenos espe- 1) Quando, na resposta, o conteúdo é per-
ciais como a contaminação, a confabulação, cebido com forma simples, porém confusa e
idéia de auto-referência, idéia de referência e vaga, e dá para se observar que o próprio exa-
resposta de posição interferem negativamen- minando, quando não é psicótico, sente difi-
te no processo perceptivo, na precisão da for- culdades para descrever e mesmo objetivar o
ma, e, pelos estudos de casos clínicos, consta- conteúdo verbalizado. Exemplo II, no conjun-
ta-se que prejudicam decisivamente a precisão, to: “Uma coisa que não dá para saber bem”.
a coerência e a clareza do raciocínio lógico. No inquérito: “É uma coisa assim parecida. Flo-
Adotamos, para a classificação Forma precisa resta não é, é qualquer coisa nesse tipo”. Há,
ou de boa qualidade (F+), um dos dois crité- por parte da pessoa, confusão e falta de clare-
rios seguintes: za em perceber e caracterizar o conteúdo. Às
1) Quando a resposta dada é considerada vezes, a pessoa que está sendo examinada tem
comum pela área em que está localizada e en- dificuldades para se expressar. Classificação: G
cerra um conteúdo com forma simples (isto é, F– Pl. Quando assim acontece, o examinador
sem nenhuma combinação com cor, preto/cin- deve procurar uma maneira de buscar a expli-
za/escuro, movimento e sombreado), quer o cação, usando um modo mais simples de per-
examinando descreva o formato do conteúdo guntar, com cuidado, para não induzir a res-
verbalizado, quer não o descreva. Exemplo: posta.
diapositivo II, área D1: “Dois touros”. Não foi 2) Forma combinada com fenômenos espe-
feito comentário. Classificação: D (como loca- ciais comprometedores. Quando o conteúdo,
lização) F+ (como determinante). Na mesma de forma simples, vem associado, na verbali-
área: “Vejo dois touros”. Comentário: “Dá para zação, a um ou mais dos fenômenos especiais
se notar bem o formato da cabeça, das patas e – contaminação, confabulação (ou confabuli-
do corpo”. Classificação: F+. Diapositivo I, no zação), idéia de auto-referência, idéia de refe-
total da figura: “Um morcego”. Não foi feito rência e resposta de posição (PO) –, considera-

PSICODIAGNÓSTICO – V 391
mos esses fenômenos como fortemente com- expressam as funções do superego. A nosso
prometedores da personalidade e temos cons- modo de ver, esta é uma das variáveis mais con-
tatado, no Rorschach, que costumam ocorrer sistentes para avaliar o funcionamento do pen-
em transtornos neuróticos e transtornos esqui- samento lógico em seu aspecto de precisão,
zofrênicos. coerência e organização. “Quando F+ % dimi-
Significados do somatório Forma (F+, F– e nui e não há distúrbios afetivos, trata-se de
F±). O somatório F num protocolo é indicativo baixo potencial de inteligência (de raciocínio).
consistente de o examinando perceber as coi- Quando o percentual de F+ diminui numa pes-
sas com objetividade, com adequado senso soa intelectualmente bem dotada, é sinal de
lógico; é a expressão da capacidade para per- que ela sofre interferências de fatores afetivos,
ceber as coisas como elas se apresentam na especialmente estados depressivos ou constri-
realidade e sem interferência prejudicial ou dis- tivos” (Serebrinski, 1948, p.96). Psicóticos de-
torciva das emoções; é a expressão racional e pressivos, esquizofrênicos, neuróticos ansiosos
intelectual do controle geral adequado que a e depressivos, sempre, pelo que temos podido
pessoa tem sobre seus dinamismos psíquicos observar, apresentam F+% inferior a 70 no Z-
(como instintos, reações afetivo-emocionais e Teste. A diminuição de F+% com correspon-
impulsivas). Pessoas cuja categoria de ocupa- dente aumento de F±% acontece mais comu-
ção profissional se caracteriza por atividades mente em pessoas com perturbação afetiva e
burocráticas, sistemáticas e de rotinas apresen- emocional, sem, contudo, se tratar de psicose;
tam um percentual do somatório F entre 35 e isso ocorre mais em neurose de ansiedade e
60% do total de determinantes do protocolo, neurose de histeria. Já, por outro lado, a dimi-
enquanto as de atividades menos rigorosas nuição de F+% com correspondente aumento
quanto à sistematização e método apresentam de F-% é comum de acontecer em caso de psi-
um percentual situado entre 25 e 50% (Vaz, cose ou de neurose depressiva.
1998). A forma, sob nosso ponto de vista, ex-
pressa um importante papel da inteligência no
aprendizado do ser humano, no desenvolvi- Movimento humano
mento de seus dinamismos. Retardar uma rea-
ção impulsiva (M) em determinado momento, Rorschach define movimento como “interpre-
diferenciar adequadamente os estímulos e si- tações determinadas pela percepção da forma
tuações (F+) para não se dar mal, trabalhar e acrescidas de sensações cinestésicas” (1967,
com as emoções e assim ser mais afetivo (FC), p.25); é a manifestação do mundo interno da
são exemplos de como a forma, em técnicas pessoa, através de imagens cinestésicas. Para se
com base em manchas de tinta, é a expressão classificar como movimento humano, é necessá-
clara de uma operação da inteligência no pro- rio que o conteúdo expresso pelo examinando
cesso de aprendizado do ser humano. seja percebido em ação vital. Classificam-se como:
A presença do percentual do somatório F 1) M+, movimento de boa qualidade: a res-
significativamente elevado é um sinal de aler- posta em que o examinando verbaliza uma fi-
ta; é indicativo de controle demasiado, de re- gura humana inteira em ação, quer de deslo-
pressão dos afetos e emoções, com prejuízo camento (correndo, etc.), quer de extensão (em
na espontaneidade. Já um protocolo com F% ação com braços, etc.), quer de postura ou fle-
baixo ocorre mais comumente em casos de po- xão (olhando, respirando, etc.). Exemplo no
breza intelectual. Deficientes mentais tendem diapositivo ou Cartão III (áreas vermelhas late-
a dar baixo percentual de F. Também pode ser rais inferiores): “Duas crianças”; no comentá-
indício de descontrole emocional, como tam- rio feito pelo examinando: “Uma cena em que
bém de pouco senso de responsabilidade. Scha- vejo duas crianças brincando de pula-pula”
fer (1954) interpreta, sob o ponto de vista psi- (Vaz, 1998, p.37).
canalítico, o somatório F% como a variável mais 2) M-, movimento secundário ou de não boa
importante do Rorschach, por meio da qual se qualidade: 1) quando a resposta é de conteú-

392 JUREMA ALCIDES CUNHA


do de detalhe humano percebido em ação. cidade de integração do ser humano e empa-
Exemplo na área D2: “Dois olhos de pessoa tia (Cristiano de Souza, 1971; Rappaport, 1946;
braba” (Vaz, 1998, p.37); 2) nos casos de res- Rorschach, 1967; Schachter 1973; Schafer,
posta de conteúdo humano, mesmo visto como 1954). A ação vital dos conteúdos humanos
figura inteira, mas descaracterizado como hu- autênticos é, em nosso entendimento, a expres-
mana, como: ser humano mitológico (figuras são do mundo interno da pessoa, da esponta-
lendárias), monstros, com maior conotação neidade e do seu poder de adaptação ao meio
expressa pelo examinando, de gente, fantas- externo; é a expressão da imaginação criado-
mas humanos, caricaturas, vistos em movimen- ra, da empatia e das funções integradoras de
tos, em ação. Exemplo no dr1 do diapositivo sua personalidade.
III: “Uns duendes, meio gente com uns traços Espera-se como normal um índice de 1 a 2
estranhos, uns humanóides” (Vaz, 1998, M num protocolo, na forma coletiva, e um
p.167); 3) classifica-se como M– resposta de mínimo de 2 M, na aplicação individual. A fre-
conteúdo humano acompanhada de: a) uma qüência de duas respostas de movimento hu-
confabulação, em que o examinando amplia a mano de boa qualidade (M+), num protocolo,
verbalização como se estivesse contando uma com F+ acima de 70% e F% dentro da média
história; conta uma história; b) contaminação, (do grupo) e com DG elaborada, indica tratar-
caracterizada por um processo de dissociação se de pessoa dotada de inteligência criativa,
em que ele tenta fazer uma junção de elemen- dinâmica e com boa capacidade de planeja-
tos que na realidade é impossível; c) idéia de mento.
auto-referência, quando o examinando verba- Índice elevado de M, mais do que três em
liza um conteúdo levado pela idéia de idêntico aplicação coletiva, pode significar inteligência
a parte ou propriedade sua; d) idéia de refe- altamente criativa ou propensão da pessoa tes-
rência, quando fica claro que não é pelas pe- tada a reações ou defesas de tipo maníaco.
culiaridades do conteúdo verbalizado, mas pelo Tornam-se mais delicadas essas reações se o
que de idêntico esse conteúdo tem com fatos, índice elevado de M vier combinado com CF
acontecimentos, pessoas próximas ao mundo (reações emocionais com controle precário) e
do examinando. FM (reações impulsivas) também com índice
3) M±: aquelas respostas cujo conteúdo é elevado. A ausência de M é freqüente em ca-
uma figura humana vista por inteiro, mas em sos de pessoas ansiosas, tensas, inibidas, de-
que o examinando tem dúvida se está em mo- pressivas ou pouco inteligentes. A ausência de
vimento ou não, ou quando a pessoa não che- M é freqüente, ainda, em casos de deficiência
ga a definir bem se o percepto é visto em mo- mental, de esquizofrenia simples com estereo-
vimento humano da pessoa inteira, de modo tipia de pensamento. É necessário, no entan-
bem claro. Também assumem a cotação de M± to, para se aceitar a hipótese de deficiência
os conteúdos humanos vistos por inteiro, mas mental, ser apurado se é muito baixo o núme-
quando o examinando tem dúvida se se trata de ro de respostas, o percentual de F e de F+, e se
uma pessoa do mundo real ou imaginário, quan- há perseveração do mesmo conteúdo nos três
do o conteúdo visto é descaracterizado como diapositivos, e, para a hipótese de esquizo-
humano. Exemplo I, no conjunto da mancha: frenia, se há contaminação (dissociação de
“Uma dança”. No comentário: ”Pessoa ou bru- idéias), F+% baixo com conseqüente aumen-
xa... não dá para ver bem... numa dança”. to de F-% e ausência (comprometimento do
raciocínio lógico) de respostas cromáticas
(bloqueio ou outra problemática de origem
Movimento humano (M): expressão de afetivo-emocional).
criatividade, espontaneidade e empatia Respostas com conteúdo humano em ação
são do tipo movimento de boa qualidade (M+)
O movimento humano tem sido interpretado e indicam boas condições intelectuais e imagi-
pelos rorschachistas como criatividade, capa- nação criadora, ao passo que as de tipo M–

PSICODIAGNÓSTICO – V 393
são mais comuns em casos de pessoas inibi- com F% baixo, com ausência de M e de FC, é
das, ansiosas e de relacionamento interpessoal sinal de impulsividade descontrolada. Quando
receoso e tenso. o índice de FM é alto, combinado com CF+C >
FC e F% baixo, pode-se levantar a hipótese de
compulsividade do sujeito testado.
Movimento animal

Movimento animal, classificado como FM, ca- Movimento inanimado


racteriza-se por ser uma resposta de conteúdo
animal visto em ação vital, quer de desloca- Classificam-se as respostas de movimento ina-
mento, quer de postura. Exemplos: I -“Um nimado como aquelas em que o conteúdo está
morcego voando”, movimento de deslocamen- sendo visto em movimento, em ação não vital
to; II – “Dois touros parados se olhando”, mo- humana ou animal, isto é, está sendo movido
vimento de postura. por forças físicas, químicas, mecânicas ou abs-
Movimento animal como indicativo de im- tratas. Se o conteúdo é verbalizado com for-
pulsos, dinamismo. A verbalização de conteú- ma definida, o determinante assume a classifi-
dos animais em ação é uma característica da cação de Fm. Exemplo, “Um avião subindo”;
infância. Alcock (1956) ressalta a importância como mF, quando o percepto é visto pelo exa-
dos FMs, num protocolo, também do adulto, minando em movimento inanimado, mas o
como uma “válvula de escape aos impulsos libi- conteúdo não é expresso com forma definida,
dinais e como uma precária tolerância à frustra- por exemplo, “algo parecido com um avião, só
ção” (p.63). Os autores, em sua grande maioria, que não sei se é um avião ou outro objeto subin-
são de opinião que FM deve ser superior ao índi- do”. Assumem o determinante m as respostas
ce M, em casos normais de personalidade. caracterizadas por ação, conteúdos abstratos,
O movimento animal (FM) no Z-Teste cole- sem forma definida e difusos (Vaz, 1998, p.39).
tivo, aplicado para finalidade psicotécnica, é O somatório de movimento inanimado
uma variável muito importante para se verifi- (Fm+ mF+ m) tem significado, para Klopfer
car como se encontra a pessoa testada quanto (1954) e Alcock (1956), de conflitos internos,
à iniciativa e capacidade para competição. Con- com os quais a pessoa está encontrando difi-
vém se levar em consideração o grupo huma- culdades para conviver. Ressalta a última au-
no em que o examinando se situa, em função tora que o m (puro), sem o mínimo indicativo
da ocupação profissional (Vaz, 1998), da faixa de forma, expressa forças e tensões internas
etária, do grau de instrução e de papéis de sentidas como hostis e que o sujeito não con-
gênero. De modo geral, pessoas com pouca segue controlar.
iniciativa, dependentes e acomodadas (Vaz, Somos de opinião de que a presença de
1997; Vaz, 1998) apresentam menor incidên- movimento inanimado, num protocolo de Zulli-
cia de FM do que as dinâmicas, competitivas e ger, em forma coletiva ou individual, é indica-
com senso de iniciativa, como pudemos cons- tivo de conflito intrapsíquico, em conseqüên-
tatar em pesquisa realizada, inclusive com o cia de tensões vivenciadas pelo examinando
Rorschach, aplicado em índios Tükuna e bran- entre o esquema de valores formado e presen-
cos da mesma região geográfica (Vaz, 1996; te no seu mundo interno, e o esquema de va-
Vaz, 1997). Convém relacionar a ausência de lores socioculturais que o mundo externo, em
FM com o percentual de F, pois pode aconte- transformações, está lhe apresentando.
cer que o F% esteja elevado (conforme o gru-
po humano de referência), o que, no caso, deve
ser interpretado como repressão dos impulsos Cor cromática
ou coartação quanto a tomadas de iniciativa.
Elevado índice de FM pode significar ima- As cores constituem um dos aspectos mais re-
turidade e infantilismo, e quando combinado levantes no Rorschach e no Z-Teste, não só pela

394 JUREMA ALCIDES CUNHA


importância na percepção visual, mas, princi- car bem seu formato. A forma é vaga, confu-
palmente, porque, como estímulos de impac- sa. Exemplo no diapositivo II (áreas verdes la-
to do mundo externo, têm o poder de mobili- terais): “Duas coisas verdes”. Na coluna reser-
zar o mundo interno da pessoa, provocando- vada a comentário: “São umas coisas verdes,
lhe reações emocionais, quer de aproximação não sei bem do que se trata”. Na realidade,
(euforia, entusiasmo, encantamento, estima, pode-se aceitar que existam coisas verdes, há
amor), quer de afastamento (retraimento, in- compatibilidade entre cor de área e de conteú-
diferença, desencanto, hostilidade, ódio) com do, mas o examinando não particularizou o con-
as mais variadas repercussões em todo o apa- teúdo, falta a precisão formal. CF, visto isolada-
rato psíquico da personalidade. Os diapositi- mente, indica que a pessoa reage aos estímulos
vos ou cartões de Zulliger caracterizam-se por emocionais de forma precariamente controlada;
dois aspectos fundamentais na constituição das seu sistema emocional se mobiliza com a míni-
manchas: por um lado, os estímulos coloridos ma intensidade de estímulo. Pessoas com ten-
de vermelho, verde, marrom e matizes e, por dências a excitabilidade emocional, escapes
outro, os não-coloridos, preto, cinza, escuro. agressivos e a atitudes sem o adequado controle
Considera-se resposta de cor cromática tendem a dar mais respostas CF do que as consi-
quando o examinando emite a resposta, leva- deradas “emocionalmente controladas”. Pode
do em seu processo de percepção pelo colori- indicar irritabilidade e inquietude interior quan-
do. O examinando inclui o colorido da mancha do associado a S, K ou KF (ansiedade situacional
ou da sua imaginação no conteúdo verbalizado. elevada) e expressões de crítica ao teste ou à
Forma e cor (FC). Classifica-se FC quando é pessoa do examinador (Vaz, 1998, p.40).
verbalizado conteúdo visto com forma defini- Cor pura (C). Denomina-se de cor pura, C,
da, com colorido e que sua cor seja compatível aquele determinante correspondente à respos-
com a da área de localização dessa resposta. O ta em que há compatibilidade entre o colorido
determinante forma e cor (FC) pode ser inter- da área e o conteúdo verbalizado, entretanto,
pretado como a capacidade de a pessoa rece- visto sem forma. Exemplo no II (no total): “Co-
ber e retribuir afeto adequadamente, investir res”. Comentário: “Muitas cores e bonitas”.
afeto nas demais e de se permitir ser objeto de Também se consideram respostas de cor pura:
afetos dos outros, também adequadamente. conteúdos tipo disfóricos, em estado líquido
As condições afetivo-emocionais são tanto mais ou gasoso, vistos como coloridos em áreas de
maduras quanto mais autênticas e de boa qua- manchas coloridas. Exemplo no III, D2 (áreas
lidade sejam as respostas de forma e cor. Mui- vermelhas laterais): “Sangue”. Comentário:
tas vezes não basta a presença de FC. “Sangue vermelho” (Vaz, 1998, p.42).
A freqüência média de FC não é alta, de modo A cor pura (C) pode ser interpretada como
geral, nem no Rorschach nem no Z-Teste, forma o determinante específico no Rorschach e Z-
coletiva. Pelo que se pode observar (Vaz, 1998), Teste, por meio do qual o examinando projeta
a média por protocolo gira em torno de 1 a 2 FC, suas reações emocionais livres, intensas e car-
no geral de 15 grupos profissionais. Profissionais regadas de sentimentos, quer de apreciação,
da área da saúde, como psicologia, enfermagem estima, admiração, amor e paixão, quer de de-
e odontologia, tendem a aumentar o índice de preciação, desprezo, ódio, raiva e agressivida-
respostas de forma e cor (Vaz, 1998). de. A presença de C é sempre motivo de aten-
Cor e forma (CF). São consideradas respos- ção sobre a capacidade de controle emocional
tas de cor com forma imprecisa (CF) aquelas do examinando, por parte do psicólogo. Faz-
cujos conteúdos são percebidos como colori- se necessária apropriada integração dessa va-
dos, em área também colorida, mas sem que o riável a todo o quadro geral dos dados do Z-
examinando consiga precisar o formato; são Teste. Às vezes, a presença de um C puro, num
as respostas em que a pessoa, sendo levada protocolo com índices adequados de F%, F+%,
pela cor, emite um conteúdo sem poder (por M, e G% e D%, pode ser interpretada como
razões emocionais, ver interpretação) identifi- um dado positivo: sinal de iniciativa e capaci-

PSICODIAGNÓSTICO – V 395
dade de reação emocional firme e necessária Proporção FC ³ CF+C. Quando, na razão
para tomada de decisão. proporcional, forma e cor (FC) é maior que cor
Cor descrita (Cdesc). O sujeito, diante de e forma (CF) mais cor pura (C), pode-se dizer
uma mancha colorida, por se perturbar e não que o examinado é capaz de liberar seus senti-
conseguir organizar seu processo de percep- mentos, afetos e emoções de forma adequada
ção objetiva da realidade, simplesmente des- e madura, bem como de estabelecer bom rela-
creve as tonalidades das cores; detém-se em cionamento interpessoal. É a proporção consi-
descrever as nuanças de cor, daí a classificação derada como o parâmetro ideal.
Cdesc. Exemplo no II, D1: “Cor marrom”. Co- Podemos dizer, conforme pesquisa, que, à
mentário feito pelo examinando: “Percebe-se medida que as pessoas vão avançando na ida-
um marrom mais claro e que aos poucos vai de cronológica, tendem a diminuir as respos-
ficando com a tonalidade mais forte”. Trata-se tas com cor pura C e CF no Z-Teste, forma cole-
de um outro tipo de reação à cor. O examinan- tiva (Vaz, 1998).
do, diante das cores do material do teste, ten- Há atividades em que se faz necessária a
de a se desorganizar, levado, não tanto por presença de maior potencial agressivo (não
transtorno da personalidade, mas por dificul- destrutivo), correspondente à iniciativa, com-
dade de ordem intelectual. Pessoas limitadas petição e disputa. Donde, além da presença em
de inteligência descrevem as cores, sem expres- percentual adequado, de movimento animal
sar sentimento de hostilidade ou outras mani- (FM), de forma bem definida (F+) e do total de
festações comprometedoras da personalidade; respostas com forma (F+, F– e F±), é de se
pelo contrário, de forma direta, manifestam esperar a presença de CF, que deve ser inter-
sentimentos de impotência (Vaz, 1998, p.42). pretado como liberação da emoção com certa
Cor nomeada ou enumerada (Cn). O sujei- intensidade, para reforçar a pulsão instintiva
to, sentindo-se emocionalmente perturbado, na busca do desempenho do objetivo. Em se-
não conseguindo coordenar seu pensamento leção de pessoal ou situação similar, a propor-
lógico, com objetividade e precisão, simples- ção invertida (FC<CF+C), dependendo de
mente nomeia ou enumera as cores que visua- como se apresentam os percentuais de F, F+ e
liza, Cn. Trata-se de uma resposta de cor pura os tipos de cor pura, pode ser favorável à pes-
e que, via de regra, quando aparece, chama a soa cujo protocolo está em avaliação.
atenção do examinador, como indicador de Proporção FC < CF+C. Neste caso, cabe a
possível comprometimento emocional. Exem- interpretação: a pessoa, ao ser mobilizada afe-
plo no II: “Três cores”, “Marrom, vermelho e tiva e emocionalmente, sofre dificuldades em
verde” (Vaz, 1998, p.42). reagir de modo adequado quanto à adapta-
A cor nomeada aparece mais freqüentemen- ção no relacionamento interpessoal.
te em protocolos de pessoas que, ao se depa- Cor forçada (F-C e C-F) e Cor arbitrária (F/C e
rarem com estímulos coloridos, se perturbam C/F). Respostas dessas duas categorias no Z-Tes-
emocionalmente, de tal forma, que não con- te coletivo quase nunca ocorrem. Quando isso
seguem perceber qualquer conteúdo; apenas acontece, convém o examinador verificar, pois,
enumeram ou dão o nome das cores. Desor- comumente, se se devem à alteração do colori-
ganizam-se no processo lógico do pensamen- do dos “diapositivos”. No Z individual, é mais fre-
to. A presença de cor nomeada num protocolo qüente, podendo significar labilidade afetiva,
de Zulliger deve ser estudada com bastante relacionamento interpessoal cauteloso e tímido.
cuidado em relação a outras variáveis dessa Cor simbólica (Csimb). De todas as respos-
técnica e de outros instrumentos, inclusive de tas cromáticas sem forma, é a que menos com-
exame neurológico. Em deficientes mentais, isso promete o diagnóstico sobre o examinando.
também pode ocorrer, embora em menor inci- Diante da mobilização que as cores provocam
dência. Respostas com cor nomeada, no Zulli- em seu sistema afetivo emocional, ele usa a
ger, podem aparecer também nos casos de pes- cor como símbolo de conteúdos abstratos,
soas com baixo poder intelectual ou epilépticas. numa tentativa de fuga, mas de forma não-

396 JUREMA ALCIDES CUNHA


agressiva. A presença de Csimb é sinal indica- emocionais e sentimentos para o mundo exte-
tivo de que o sujeito está tentando sublimar rior. A nosso ver, as cores acromáticas FC’, C’F
suas pulsões agressivas. e C’, conforme classificação detalhada (Vaz,
1997), expressam depressão como traço de
personalidade e não apenas reações depressi-
Textura vas transitórias.
Algumas pessoas, na aplicação individual, quer Na prática, devem ainda ser levadas em
do Rorschach quer do Z-Teste, friccionam a área conta, no protocolo, as proporções FC´/C´F+C´
da mancha do Cartão, ao mesmo tempo em +C´, FC´ ³ C´F+C´, se o total de respostas está
que dizem o que ali estão percebendo; é como dentro da média esperada, e os percentuais de
se estivessem acariciando a área onde verbali- F, F+ além de outras variáveis. Se a proporção
zam a resposta. Textura (Fc, cF, c), como per- for FC´ ³ C´F+C´ e nos demais índices a pes-
cepção tátil, é a expressão do contato. soa está bem, é sinal de que ela consegue con-
Torna-se difícil, às vezes, ao examinador viver adequadamente com as condições depres-
identificar uma resposta caracterizada pela tex- sivas; quando, no entanto, a proporção for
tura no Z coletivo. O processo de luminosida- FC´< C´F+C´ e os demais índices estão abai-
de, projeção em tela, assim como a falta de xo do mínimo esperado, o diagnóstico quanto
uma apuração (inquérito) por parte do exami- às condições depressivas não parece ser favo-
nador, são fatores que levam o examinando a rável. Comprometedor se torna o quadro ge-
não deixar claro se é pela sombra sobre a su- ral quando FC’ é menor que C’F+C´, especial-
perfície que ele está sendo levado a dar tal mente se houver a presença de C’ (pura) que
resposta ou se por outro fator, como, por exem- pode indicar se tratar de depressão crônica. Em
plo, o escuro com simples tonalidades ou outros casos de transtorno neurótico depressivo, além
fatores. Para que diminua essa dificuldade, reco- das respostas acromáticas, sem o devido con-
menda-se que, durante a aplicação, na hora das trole, aparecem outros fenômenos especiais,
instruções sobre o mapeamento das áreas onde como expressão de sentimentos de incapaci-
cada examinando viu o conteúdo verbalizado, dade, queixas durante a aplicação e o tempo
solicite-se que comente detalhadamente o que de reação e duração prolongados.
foi escrito na primeira parte da testagem.
Em nosso entender, textura é uma forma Sombreados radiológico e perspectiva
tátil de expressão das condições afetivas da
pessoa, quer buscando o afeto em alguém ou O determinante sombreado radiológico, pre-
em alguma coisa, quer investindo o afeto em sente em conteúdos vistos em transparências,
outras pessoas, situações e objetos. Aquelas imagens fotográficas, radiológicas ou radiográ-
que são capazes de atitudes adequadas (com ficas e subclassificado em Fk, kF e k, conforme
a devida percepção de limites), na dinamiza- o grau de definição da forma, revela sentimen-
ção dessa busca ou de investimento, apresen- tos desagradáveis da pessoa, vividos intensa-
tam, na técnica, o Fc proporcionalmente igual mente ante situações novas e desconhecidas a
ou maior que cF+c. Por outro lado, as que não serem superadas por ela, e, conseqüentemen-
o fazem adequadamente (sem a devida per- te, representa a ansiedade situacional. O som-
cepção de limites) têm Fc menor que cF+c. breado perspectiva se caracteriza pelo conteú-
do visto pelo examinando em plano tridimen-
sional, em perspectiva e profundidade, e clas-
Cor acromática sifica-se como FK, KF e K, conforme a forma
esteja bem definida, não bem definida ou vaga,
As respostas em que aparecem o preto e o cin- respectivamente. São dois grupos de determi-
za, verbalizados e integrados ao conteúdo, são nantes que não aparecem com freqüência na
interpretadas como tendência de a pessoa evi- aplicação coletiva, sendo mais freqüentes na
tar estímulos que lhe possam mobilizar reações forma individual.

PSICODIAGNÓSTICO – V 397
Convém que, na interpretação, sejam con- conteúdos; já aquelas que produzem menos
siderados em função das proporções. A pro- de três tendem a ser estereotipadas e inflexí-
porção Fk > k+kF indica que o examinado veis, até mesmo na própria conduta.
consegue controlar a ansiedade situacional H+Hd como conteúdos humanos. De modo
pela intelectualização; porém, se dispõe de geral, significa adequada capacidade de rela-
poucas condições para controle da ansieda- cionamento com as pessoas. Considera-se
de, apresenta a proporção invertida, Fk < como normal num protocolo, de pessoa adul-
k+kF. A reação adaptativa ou o mecanismo ta, o percentual dentro da faixa dos 15 a 25 do
utilizado para tolerar a ansiedade é mais ade- total de respostas.
quado e, por certo, sadio. FK > KF+K indica (H) e (Hd) – Conteúdo humano descaracte-
que a pessoa usa a introspecção, partindo rizado. Os conteúdos humanos com caracte-
de auto-avaliação como processo adaptati- rísticas de animais, de monstro, podem indi-
vo para tolerar a ansiedade. O determinante FK, car relacionamento interpessoal receoso, cau-
combinado com a presença de F+%, F%, índice teloso e controlador.
de M e FC considerados adequados no caso, é, a Dentro de detalhes humanos, existem al-
nosso ver, um indicativo altamente positivo de guns que podem ajudar o psicólogo na com-
capacidade de insight e de reparação. preensão de alguns dinamismos psíquicos.
Recomenda-se ao examinador verificar, Por exemplo, olhos fixos indicam controle,
nas outras variáveis do Zulliger, como estão tendência a reação defensiva de tipo para-
o controle e as condições afetivas do exami- nóide.
nando, para poder integrar melhor as rela- A +Ad – Conteúdo animal. Os conteúdos
ções Fk, kF e k, assim como FK, KF e K. Essas animais são comuns em crianças. Tendem a
relações permitem ajudar o examinador a diminuir à medida que a pessoa amadurece
entender como o indivíduo procura meios de psicologicamente. É de se esperar que as pes-
adaptação ou ajustamento, quando enfren- soas de nível cultural primário apresentem um
ta uma situação, que lhe aumenta o nível de índice de A mais elevado do que as de nível
ansiedade e, conseqüentemente, lhe mobiliza sociocultural mais destacado.
sentimentos de insegurança, de temor ou medo. Anat – Respostas com conteúdo anatômi-
O determinante K (p.ex., nuvem, água, fu- co. Os conteúdos anatômicos, como já enten-
maça sem nenhum indicativo de forma), como dia Hermann Rorschach, são indício de que a
subcategoria do sombreado perspectiva e pro- pessoa “supervaloriza a inteligência”: um índi-
fundidade, estudada separadamente, signifi- ce superior a 14% das respostas no Z-Teste pode
ca, para alguns autores (Allen & Dorsey, 1954; ser indício de uso da intelectualização para
Klopfer, Ainsworth, Anderson et alii, 1956), tolerar a ansiedade, tensão e sentimentos de
ansiedade livre-flutuante, o que corresponde frustração, ressalvado quando se tratar de pro-
à incapacidade de suportar o mínimo de in- fissional da área médica, que, por prática fun-
tensidade de um estímulo ansiogênico. A pre- cional, tende a dar mais conteúdos anatômi-
sença de KF indica que a pessoa fica ansiosa, cos do que quem não tem vivência profissio-
mas tenta suportar, não projetando as dificul- nal envolvida com imagens radiográficas ou
dades no mundo externo e, sim, usando do fotográficas.
processo de introjeção, buscando por si mes- Ao efetuar a interpretação, com base no
ma as causas de sua dificuldade, embora ain- estudo dos conteúdos – análise de conteú-
da de forma precária. dos –, convém ao psicólogo levar em consi-
deração que este grupo de variáveis, quer no
Zulliger forma coletiva, quer individual, so-
CONTEÚDOS fre maior influência do ambiente cultural e,
conseqüentemente, tem menor consistência
Pessoas flexíveis no modo de perceber e ava- em comparação com as localizações e deter-
liar as coisas dão de três ou mais categorias de minantes.

398 JUREMA ALCIDES CUNHA


MÓDULO X – Técnicas de Contar Histórias

TAT – Teste de Apercepção Temática,


conforme o modelo interpretativo de Murray
Neli Klix Freitas
25
CONSIDERAÇÕES GERAIS Para ele, é tão importante o passado, ou a
história do indivíduo, como o presente e seu
Escrever sobre o manejo clínico de um teste meio. Como a psicanálise, considera que as vi-
projetivo complexo como o TAT representa um vências infantis são determinantes decisivos
desafio. Por um lado, é necessário lembrar pre- para a conduta do adulto. Outra semelhança
missas teóricas do autor do teste, Henry Mur- com a posição psicanalítica está na considerá-
ray, que formulou uma teoria da personalida- vel importância atribuída à motivação incons-
de. Existe, pois, uma teoria da técnica do TAT. ciente e no profundo interesse pela verbaliza-
Por outro lado, é indispensável expor como se ção, subjetiva ou livre, do indivíduo, inclusive
analisa e se interpreta o teste, sem correr o ris- pelas produções da sua imaginação.
co de repetir, simplesmente, o que consta do Dá, pois, ênfase à motivação. Seu esquema
manual. A tarefa reveste-se de importância. de conceitos motivacionais tem sido ampla-
Após vinte anos ininterruptos de emprego do mente usado. Insistiu na importância da des-
TAT na clínica e em pesquisa, seguindo o mo- crição pormenorizada como um preliminar
delo de Murray, pode-se oferecer algumas con- necessário à formulação diagnóstica. Corrobo-
tribuições importantes na sistematização dos rando esse ponto de vista, encontra-se seu pro-
dados, na análise clínica e no emprego do tes- fundo interesse pela taxonomia e as classifica-
te em pesquisas. ções exaustivas que estabeleceu para muitos
Murray, em sua teoria, a Personologia, ex- aspectos da conduta.
plica a dinâmica da personalidade alicerçada Murray fez sérios esforços para estabelecer
na dualidade das necessidades e pressões (ne- um acordo entre as exigências, muitas vezes
eds – press). Sua obra Explorations in persona- conflitantes, da complexidade clínica e da in-
lity (1938) expõe a teoria, que deve ser estuda- vestigação. Criou meios de representar a di-
da pelos técnicos que se aventuram a empre- versidade da conduta humana e, ao mesmo
gar o TAT. Seus principais conceitos podem ser tempo, dedicou-se à tarefa de organizar ope-
encontrados em manuais de teorias da perso- rações para avaliar as variáveis que ocupam
nalidade (vide, por exemplo, Hall e Lindzey, uma função central no seu esquema teórico.
1973; Schultz e Schultz, 1992). Para proceder Essa dupla ênfase resultou numa maior apro-
ao manejo clínico do TAT, é indispensável rever ximação entre a prática clínica e a pesquisa
alguns princípios teóricos de Murray. psicológica.

PSICODIAGNÓSTICO – V 399
Com base nessas questões teóricas, surgiu em um instrumento importante para avaliar a
o TAT (Teste de Apercepção Temática). Murray eficácia do tratamento em situações estressan-
partiu da pressuposição de que pessoas dife- tes da vida.
rentes, frente à mesma situação vital, experi-
mentá-la-ão cada uma ao seu modo, de acor-
do com sua perspectiva pessoal. Essa forma ADMINISTRAÇÃO DO TAT
pessoal de elaborar uma experiência revela a
atitude e a estrutura do indivíduo frente à rea- O TAT compreende 30 lâminas com gravuras e
lidade experienciada. Expondo-se o sujeito a uma em branco. Dessas, onze são considera-
uma série de situações sociais específicas, pos- das universais, no sentido de que são aplicá-
sibilitando a expressão de sentimentos, ima- veis a todos os sujeitos: 1, 2, 4, 5, 10, 11, 14,
gens, idéias e lembranças vividas em cada uma 15, 16, 19 e 20. Para homens adultos, acres-
dessas confrontações, pode-se ter acesso à centam-se as seguintes: 3RH, 6RH, 7RH, 8RH,
personalidade subjacente. A Personologia de 9RH, 12H, 13H, 17RH e 18RH. Para mulheres
Murray procura considerar o indivíduo naqui- adultas, além das universais, são indicadas as
lo que tem de mais próprio na sua relação con- lâminas 3MF, 6MF, 7MF, 8MF, 9MF, 12F, 13HF,
sigo e com o mundo. Essa singularidade é o 17MF e 18MF.
que o TAT procura revelar. Trata-se, pois, de Para jovens do sexo masculino, são recomen-
um teste projetivo. dadas as lâminas: 3RH, 6RH, 7RH, 8RH, 9RH,
Desde o surgimento do TAT, diferentes au- 12RM, 13R, 17RH e 18RH. Para jovens do sexo
tores têm se dedicado a estudos e pesquisas feminino, são relacionadas as seguintes: 3MF,
sobre o seu manejo, como Balken (1940), Be- 6MF, 7MF, 8MF, 9MF, 12RM, 13M, 17MF e 18MF.
llak (1954), Dana (1959), Hartmann (1954), Desta forma, tradicionalmente, a adminis-
Rapaport et alii (1965) e Shentoub (1954). tração abrange 20 lâminas para cada sujeito,
Em sua grande maioria, tem sido dada uma o que inclui as 11 chamadas universais e mais
ênfase especial a aspectos estritamente quali- uma série de nove, selecionadas conforme o
tativos. Mas houve esforços para o desenvolvi- sexo e a faixa etária.
mento de sistemas de escores, ou de normas Pode-se recorrer a formas abreviadas do TAT,
formais, a partir do material produzido (Lanyon para testar determinadas hipóteses diagnósti-
e Goodstein, 1982). Não obstante, conforme o cas. Recomenda-se recorrer ao manual do tes-
ponto de vista de Exner (1983), nenhuma des- te (Murray, 1977).
sas tentativas chegou ao ponto de “estabele- Cada uma das lâminas tem um significado
cer uma base empírica vigorosa para o teste. e explora questões específicas. Selecionar as
Dessa maneira, parece adequado identificar o lâminas pelo significado é uma forma. Outra
TAT como sendo fundamentalmente uma téc- forma de seleção abreviada consiste em supri-
nica projetiva” (p.71). mir lâminas que proporcionam dados equiva-
O TAT tem sido empregado no psicodiag- lentes.
nóstico prévio à psicoterapia breve, onde uma Recomenda-se o uso de formas abreviadas
compreensão dinâmica do paciente é impres- somente após um período de treinamento com
cindível ao bom andamento do processo tera- a forma completa. No caso da forma comple-
pêutico. Em uma pesquisa com 30 mães enlu- ta, pode-se empregar duas sessões para a apli-
tadas pela perda de um filho (Freitas, 1997; cação.
Freitas, no prelo), aplicaram-se quatro lâminas No que se refere às instruções propriamen-
do TAT no início do tratamento dos sujeitos: 1, te ditas, deve ser dada ênfase à criatividade do
2, 5 e 7MF. As mesmas lâminas foram aplica- sujeito, que é solicitado a inventar uma histó-
das em sessões de follow-up, três meses após ria. As instruções têm certo caráter de flexibili-
o término do tratamento. O TAT é um instru- dade, no sentido de levar em conta a idade, o
mento clínico por natureza. Revela a ocorrên- nível intelectual e outras características do su-
cia de insight na psicoterapia, constituindo-se jeito. Assim, quando é possível pressupor cer-

400 JUREMA ALCIDES CUNHA


to grau de inteligência e nível cultural, bem ou “só expressa indiretamente seus conteúdos
como com adolescentes, aconselha-se que a ideacionais essenciais”, e, assim, sua resposta
tarefa seja apresentada como um teste de ima- nem sempre “constitui necessariamente o ma-
ginação. Mas, de um modo geral as instruções terial essencial e vital da vida do sujeito” (Ra-
básicas são as seguintes: “Este é um teste que paport,1965, p.262).
consiste em contar histórias. Aqui tenho algu-
mas lâminas que vou lhe mostrar. Quero que
me conte uma história sobre cada uma. Você O MANEJO DO TAT
me dirá o que aconteceu antes, e o que está
acontecendo agora. Explique o que sentem e O manejo clínico do TAT, ou a sua elaboração,
pensam os personagens, e como terminará. é um processo que consta de análise, interpre-
Pode inventar a história que quiser” (Murray, tação, síntese dinâmica e diagnóstico.
1977, p.102).
É importante que o psicólogo tenha em
mente que, ao expor o sujeito a uma ampla Análise
variedade de representações de situações so-
ciais, pretende chegar à exploração da estru- Analisar um TAT consiste em destacar as mo-
tura de sua personalidade subjacente, levan- dalidades do discurso que precedem à cons-
do-o a comunicar imagens, sentimentos, idéias trução das diversas narrativas, produzidas a
e lembranças vividas diante de cada um desses partir das diferentes lâminas. A forma como
enfrentamentos. os relatos são construídos e comunicados ao
Basicamente, Lanyon e Goodstein (1982) clínico possibilita o acesso aos mecanismos de
acham que existem duas pressuposições ori- defesa do ego. Através da sua análise, pode-se
entadoras no trabalho de Murray. Em primeiro obter informações acerca da normalidade, ou
lugar, “os atributos do herói, ou do persona- da patologia, nas diferentes organizações da
gem principal, na história, representam tendên- personalidade, e, também, tem-se o acesso à
cias da própria personalidade de quem respon- problemática de cada sujeito, a sua conflitiva,
de”, e, em segundo lugar, “as características a sua subjetividade, que o torna único, em re-
do ambiente do herói representam aspectos lação com o outro e com o meio.
significantes do próprio ambiente do respon- Na análise do TAT, o psicólogo deve exami-
dente” (p.60). Dessa maneira, a pressuposição nar as histórias do sujeito e a sua conduta du-
básica é de que o sujeito se identifique com o rante a testagem. A história representa o con-
herói. Com a liberdade que consegue, através teúdo manifesto e subentende um conteúdo
do relato de uma história dramática completa, latente, que reflete os dinamismos subjacen-
espera-se que comunique a sua experiência, tes da personalidade do sujeito (Rapaport,
que inclui aspectos perceptivos, mnêmicos, 1965). A partir de ambos, da história e da con-
imaginativos e emocionais. Tudo provém da duta do sujeito durante a testagem, é possível
memória, ou, melhor, da experiência passada, abstrair dados significativos.
tanto os personagens descritos, como as ati- Pela análise de conteúdo, o psicólogo des-
tudes atribuídas às ações referidas nas histó- membra cada história nos conteúdos expres-
rias. Os personagens, reais ou fantasiados, já sos no tema central, chegando à identificação
tiveram algum papel importante na vida do do herói, ao reconhecimento de seus motivos,
sujeito, talvez por um longo tempo, ou mes- tendências e necessidades, à exploração de seus
mo recentemente. As atitudes, os sentimentos estados interiores, ao exame das pressões am-
e as ações também se relacionam com tais ex- bientais e do desfecho.
periências (Rapaport,1965). Identificação do herói: Segundo Murray
Bem, em princípio, isso é o que espera o (1977), o primeiro passo, na análise de uma
psicólogo. Na verdade, muitas vezes, o sujeito história, é a identificação do herói. Este é o
foge dos conflitos, mascara, nega, se defende personagem com quem o sujeito se identifica.

PSICODIAGNÓSTICO – V 401
Ele é, também, via de regra, o mais parecido sempenham (de frustração, de estimulação,
com o sujeito, não só quanto ao sexo e faixa etc.). Quando não são introduzidas relações
etária, como no que se refere a sentimentos, interpessoais, pode-se levantar a hipótese de
motivos, dificuldades e emoções. pobreza quanto à sociabilidade e às relações
Na maioria das vezes, o herói é representa- objetais.
do por um personagem. Contudo, pode ocor- Em relação ao herói, é importante identifi-
rer que o sujeito se identifique com mais de car traços e tendências, bem como atitudes
um personagem. Isso pode se verificar de dife- frente à autoridade. Em termos de traços e ten-
rentes formas. dências, é possível se relacionar: a) superiori-
Em primeiro lugar, a identificação do sujei- dade (capacidade, prestígio, poder); b) inferio-
to pode modificar-se no decorrer da história, ridade (incapacidade, desprestígio, debilidade);
com o aparecimento de diversos heróis: primei- c) extroversão; d) introversão. Algumas das
ro, segundo, etc. atitudes frente à autoridade, facilmente iden-
Em segundo lugar, pode haver heróis com- tificáveis, são: a) domínio, submissão; b) de-
petidores (por exemplo, um policial e um la- pendência, independência; c) medo, agressão;
drão). Neste caso, um deles pode estar repre- d) gratidão, ingratidão; e) orgulho, humilda-
sentando forças do superego (o policial que de, etc.
faz cumprir a lei) contra impulsos anti-sociais Motivos, tendências e necessidades do(s)
(ladrão). É a expressão de uma situação confli- herói(s): As necessidades podem ser expressas
tiva interna, configurando um conflito entre como impulsos, desejos ou intenções ou, ain-
duas instâncias da personalidade, projetado no da, como traços de conduta manifestos nas
conteúdo manifesto da verbalização. histórias.
Em terceiro lugar, o sujeito pode narrar uma A necessidade é um constructo que repre-
história que contenha outra: o herói conta uma senta uma força, de modo a transformar uma
história, em que observa outro herói, com situação insatisfatória existente. A necessida-
quem simpatiza e a quem admira, e que, nesta de gera um estado de tensão que conduzirá à
história, desempenha um papel principal. Por ação, reduzindo a tensão inicial e restabelecen-
exemplo, na lâmina 7MF, um sujeito do sexo do o equilíbrio. Pode ser produzida por forças
feminino pode narrar uma história sobre uma internas ou externas, sendo sempre acompa-
mulher que, por sua vez, conta uma história nhada por um sentimento ou emoção (Mur-
sobre outra, que cuida de uma criança, que é ray, 1977).
uma mãe amiga, etc. Neste caso, há um herói O autor relacionou 28 necessidades (ou ten-
primário (a mulher que conta uma história) e dências), classificadas segundo a direção ou
um secundário (a outra mulher, que cuida de objetivo (motivos). Essas necessidades são iden-
uma criança). tificadas na conduta do herói, traduzindo-se
Eventualmente, aparece apenas um herói, por: a) ações de iniciativa do herói, em relação
mas o sujeito se identifica com um persona- a objetos, situações e pessoas, ou b) reações
gem do sexo oposto, expressando deste modo do herói às ações de outras pessoas.
essa parte de sua personalidade. As necessidades por ele relacionadas, defi-
As características demográficas (sexo, ida- nidas por suas manifestações na conduta do
de, etc.) e físicas (aparência, etc.) do herói su- herói, no manual, são as seguintes: realização,
gerem aspectos da imagem – real ou ideal – aquisição, aventura, curiosidade, construção,
que o sujeito tem de si mesmo. Outros perso- oposição, excitação, nutrição, passividade,
nagens podem representar identificações múl- gozo lúdico, retenção, sensualidade, conheci-
tiplas do sujeito. As relações que se estabele- mento, afiliação, agressão, domínio, exposição,
cem entre o herói e os demais personagens proteção, reconhecimento, rejeição, sexo, so-
podem refletir atitudes conscientes ou incons- corro, humilhação, autonomia, evitação da
cientes do sujeito frente aos mesmos, bem culpa, deferência, evitação de dano e exibicio-
como podem revelar os papéis que estes de- nismo.

402 JUREMA ALCIDES CUNHA


Estados interiores do herói: Neste item, é Há, entretanto, outros tipos de manifesta-
importante a identificação dos estados interio- ções afetivas que precisam ser analisados com
res do herói, procurando examinar que tipos cuidado, para se chegar a um bom entendi-
de afetos se manifestam, em que direção e de mento dinâmico, que pode servir de subsídio
que forma. Também é preciso analisar como para o diagnóstico diferencial. Por exemplo, é
surgem e como se resolvem. Além disso, é ne- essencial estar atento para aspectos disfóricos
cessário analisar que estados interiores pare- e maníacos, presentes no protocolo. Como
cem importantes. Como são as manifestações aparecem? Como se sucedem e se resolvem?
de amor e de sentimentos de culpa? Que con- Pressões do ambiente: É essencial identifi-
flitos aparecem? car as pressões que o herói percebe como ad-
Os conflitos transparecem através da ação vindas do ambiente e os efeitos das mesmas.
de forças e/ou tendências opostas da persona- As pressões são determinantes do meio ex-
lidade. Estas podem se expressar pela oposi- terno, que podem facilitar ou impedir a satis-
ção entre as necessidades, pela presença de fação da necessidade, representando a forma
heróis com traços opostos ou pelas oposições como o sujeito vê ou interpreta seu meio. Para
manifestas nos personagens. Murray (1938), a personalidade é o agente or-
Refletem o choque de forças de diferentes ganizador e administrador do indivíduo, cuja
instâncias da personalidade e se evidenciam, função é a de integrar conflitos e pressões, vi-
mais nitidamente, entre pares de opostos: pas- sando à satisfação das necessidades.
sividade/atividade, dependência/independên- Nas verbalizações do TAT, é essencial iden-
cia, realidade/prazer, etc. Assim, o conflito tificar as pressões que o herói percebe como
transparece na ação de forças conscientes e advindas do ambiente e os efeitos das mes-
inconscientes da personalidade, em busca de mas.
objetivos incompatíveis. O conflito também Em primeiro lugar, é preciso examinar os
pode ocorrer entre os impulsos do sujeito, nor- personagens ou outros elementos, justificados
mas e valores do grupo social ao qual perten- pela realidade da lâmina, que são ou não apro-
ce, que foram ou não internalizados. Se inter- veitados no contexto da história. Em segundo
nalizados, vão aparecer como sanções do su- lugar, é importante reconhecer aqueles presen-
perego. Senão, vão se manifestar como medo tes no estímulo, mas que se apresentam de
de castigo, de perda da liberdade ou medo de forma distorcida. Em terceiro lugar, deve-se
perda de outras condições importantes, mas identificar os personagens ou objetos, não sus-
sem envolvimento de culpa. citados pelos elementos de realidade da lâmi-
A ação do superego pode ser identificada na, mas que são introduzidos pelo sujeito, jus-
nas expressões de culpa, ficando implícito que tificados pela imaginação, mas freqüentemente
um castigo é merecido, seja autocastigo, ou a serviço de objetivos defensivos. O ponto bá-
não. Também pode surgir na forma de auto- sico a ser considerado é se o sujeito percebe o
justificativa, em termos de aprovação e desa- seu ambiente para dificultar, obstaculizar ou,
provação, crítica e na exigência de reparação. pelo contrário, para favorecer as necessidades,
A intensidade do conflito também precisa os motivos ou as intenções do herói. Especial-
ser avaliada. A vulnerabilidade a um conflito mente importantes parecem ser os elementos
costuma transparecer através de forte mobili- utilizados, distorcidos ou acrescentados, com
zação afetiva, com a emergência de sinais de o fim de obstruir o confronto com um deter-
ansiedade e/ou com o surgimento de defesas minado estímulo ou conflito, bem como per-
para manejá-la, as quais podem ser eficazes, ceber como tais pressões são enfrentadas, des-
ou não. Também é importante identificar o tipo viadas, negadas ou deformadas, enfim, che-
de ansiedade que se faz presente (persecutó- gar a uma compreensão dinâmica da situação.
ria? de separação, de abandono? outra?) e sa- Murray (1977) relacionou algumas das prin-
ber em que circunstâncias surge, como se ex- cipais pressões, reais ou fantasiadas, que o
pressa e se consegue ser resolvida. sujeito recebe e que representariam as neces-

PSICODIAGNÓSTICO – V 403
sidades das pessoas com as quais ele se rela- Em primeiro lugar, quanto mais uma história
ciona: aquisição, afiliação, agressão, conheci- se desvia do material padronizado, tanto mais
mento, deferência, conformismo, respeito, significativo e importante será o seu conteúdo
domínio, exemplo, exposição, proteção, rejei- ideacional. Em segundo lugar, quanto maior
ção, retenção, sexo, socorro, carência, perigo for o número de histórias que se desviam dos
físico, ataque físico. significados padronizados, menor é a proba-
Desfecho: Qual o desenlace? Há vários des- bilidade de que uma, em particular, expresse a
fechos possíveis, que vão indicar como o herói história interna do sujeito. Em terceiro lugar,
resolve as suas dificuldades, os seus conflitos, um grande número de histórias que se desvi-
como trabalha com suas necessidades internas am dos significados padronizados pode indi-
e como enfrenta as pressões que provêm do car a presença de patologia.
ambiente.
O examinador pode identificar o êxito ou o
fracasso na resolução das dificuldades, verifi- Exemplos de análise de conteúdo em ver-
cando qual a proporção existente entre os fi- balizações
nais felizes e infelizes, claros e indecisos, oti-
mistas e pessimistas, mágicos e realistas ou, Caso 1:
ainda, convencionais. Pode-se examinar se o
herói demonstra insight das suas dificuldades, Informações básicas: Trata-se de um rapaz de
se dissocia no desfecho, ou integra suas per- 19 anos, solteiro, filho único, cujo pai é médi-
cepções, conseguindo chegar a conclusões, ou co. Refere ter namorada, de quem “gosta mui-
não. to” (sic). Durante o ensino médio, diversas ve-
O desfecho, além de permitir a avaliação zes manifestou a vontade de cursar Engenha-
da adequação ou não à realidade, fornece al- ria Civil. Contudo, seus pais sempre desejaram
guns dados para a formulação das indicações que fosse médico e que, após a graduação,
terapêuticas. Assim, por exemplo, nas verbali- fosse se especializar no exterior. O jovem fez
zações, se o herói demonstrar capacidade de vestibular para Medicina, sendo aprovado. Não
auto-observação, de flexibilidade para mudan- obstante, ao longo do primeiro semestre, sen-
ça de atitudes, de insight, de adaptação e, ain- tiu-se “desmotivado, tendo tirado notas bai-
da, se suas relações interpessoais são basea- xas”. Então, decidiu procurar uma psicóloga
das no diálogo e é um personagem ativo, pode- para “conversar e descobrir o que estava acon-
se recomendar uma terapia de esclarecimen- tecendo com ele” (sic).
to. Ao contrário, se o herói é dependente, pre- Lâmina l: “O jovem estuda música e gosta
cisa ser orientado, a psicoterapia aconselhável de música desde pequeno. Certo dia, estudan-
seria a de apoio. Contudo, nesta decisão de- do as partituras musicais, começou a tocar.
vem ser consideradas tanto a história do pa- Parou logo... não conseguiu tocar mais. Estava
ciente como informações do exame das fun- difícil. Os professores estavam observando e
ções do ego (Freitas, 1997). insistiram para que ele tocasse. Ele ficou triste
Tema: Portuondo (1977a) define tema como e pensou: ‘Preciso ir em frente... O que vai me
“a ‘interação’ entre uma ‘necessidade’ (ou fu- acontecer, se não conseguir? Estão exigindo
são de necessidades) do herói e uma ‘força’ muito de mim’. Ficou quieto, pensando no que
(ou fusão de forças) do ambiente, unida ao fazer. Por um lado, quer tocar, mas receia não
desfecho (triunfo ou fracasso do herói)” (p.23). conseguir. E logo ele, que sempre foi tão estu-
O tema pessoal pode adequar-se, ou não, dioso... E fica assim durante o tempo todo da
aos significados padronizados das lâminas. O aula”.
tema pessoal, não-padronizado, pode revelar Título: O jovem estudioso e o violino.
a linha de pensamento do sujeito. Herói: O jovem estudioso, com traços de
Rapaport (1965) propôs três regras para a incapacidade e de introversão. É submisso, sen-
avaliação do significado do tema nas histórias. te medo, não tem confiança em si.

404 JUREMA ALCIDES CUNHA


Motivos, tendências e necessidades do he- Herói: Um jovem, com traços de incapaci-
rói: O herói sente necessidade de realização dade, de introversão, de submissão, de depen-
pessoal e de conhecimento. Quer pensar, re- dência.
fletir, para resolver suas dificuldades. Motivos, tendências e necessidades do he-
Estados interiores: Está inseguro e quer rói: Sente necessidade de conhecimento, de
se sentir seguro quanto ao que é importante reconhecimento, de proteção e de socorro.
em seus estudos. Sempre foi estudioso, aten- Estados interiores: Está em conflito, porque
dendo às suas expectativas e às dos profes- se sente incapaz de um bom desempenho. Sen-
sores (pais). Submissão e desejo de indepen- te-se exigido demais: o que pode dar não con-
dência. Quer se sentir seguro, confiante em diz com o que exigem dele. Não tem autono-
si, mas não consegue. Este é o seu conflito. mia para resolver o problema e pede ajuda à
O afeto predominante é de tristeza. Mas há mãe. Há desejo de autonomia, mas há depen-
também sinais de ansiedade: sente-se exigi- dência materna. O afeto predominante é tris-
do, pressionado e tem medo de não conse- teza. Mas há ansiedade: sente-se pressionado,
guir. Há ansiedade de perda de aprovação, com medo. A ansiedade manifesta-se como
de amor (“O que vai me acontecer, se não temor do fracasso, de perda de prestígio pela
conseguir?”). As defesas mais evidentes são incapacidade pessoal e de perda de aprovação.
repressão e negação. O superego é severo: é Utiliza as defesas de repressão e negação. O
exigente consigo mesmo. superego é severo, exigente consigo mesmo.
Pressões do ambiente: Nas relações inter- Pressões do ambiente: Agressão, conheci-
pessoais, sente pressões de aquisição, de co- mento.
nhecimento, de afiliação, de respeito e de pro- Desfecho: Não consegue resolver o confli-
teção. to. Pede auxílio à mãe, mas nada ocorre.
Desfecho: O herói não resolve seu conflito, Tema: O filho que comunica à mãe que não
suas dificuldades. Reage às pressões com pas- consegue mais lidar com o seu ambiente. Pre-
sividade (fica em silêncio, parado). cisa de ajuda.
Tema: O tema é de um jovem inseguro dian-
te das pressões pessoais e sociais.
Lâmina 6MF: “Um jovem... é, é jovem. Ele Caso 2:
está muito triste, porque não está conseguin-
do um bom desempenho no trabalho. Não Informações básicas: Trata-se de uma mulher
compreende bem os livros que precisa ler, para adulta, com 45 anos, casada, com uma filha
levar para a frente o trabalho, com precisão. viva (19 anos), e um filho falecido há três me-
Fica calado. Aí chega a sua mãe. Ela vê o filho ses, com 21 anos. Seu filho teve leucemia. Fo-
quieto, andando de um lado para outro. Ela ram três anos de tratamento, mas morreu. Foi
pergunta o que é que está acontecendo. O jo- encaminhada para atendimento psicológico em
vem pensa. Diz que não é nada. Mas não um ambulatório hospitalar. Refere “sentir-se
agüenta e começa a chorar. A mãe pergunta angustiada, infeliz, com uma tristeza insupor-
por que chora. ‘O que aconteceu?’. Ele diz: ‘Não tável (sic)”.
adianta, não consigo mais fazer nada bem fei- Lâmina 2: “Essa jovem mulher sai para es-
to no trabalho. Quero sair do emprego’. E pede tudar. Uma vez, ela teve muitos sonhos: queria
a ela que avise o chefe de que não vai mais casar, trabalhar fora, ter filhos. Ela deixou sua
trabalhar. A mãe diz que ele deve tentar. Mas família lá no interior e foi para a cidade estu-
não adianta. Ele pede, ele implora que ela te- dar. Mas os sonhos que se realizaram duraram
lefone e avise seu chefe. Tem que estudar mui- pouco: uma dor muito grande se atravessou, e
to, para trabalhar... É pesado demais! E a mãe ela fez tudo para vencer a morte. Agora segue
fica ali, calada, preocupada. O filho continua só com sua dor. Está desesperada. Não tem
sem saber o que fazer”. ninguém. E a dor é forte demais...será que ela
Título: O jovem que não sabe o que fazer. errou? Acho que esta história terminou”.

PSICODIAGNÓSTICO – V 405
Título: A mulher que teve seu sonho inter- pa, acha que falhou: falhou como mãe e como
rompido. filha. Quer ser ajudada, mas não se acha mere-
Herói: Uma jovem mulher, com traços de cedora da ajuda. Este é o seu conflito. O afeto
incapacidade, debilidade e introversão. Sente- é a tristeza, o desespero. Sente ansiedade e
se dependente, sem perspectivas, com medo. solidão.
Motivos, tendências e necessidades do he- O superego é severo: a culpa é intensa. As
rói: Sente necessidade de proteção, de socor- defesas predominantes são a negação e a ra-
ro, de evitação da culpa, de realização pessoal. cionalização. É muito exigente consigo mes-
Estados interiores: Está desesperada, sen- ma. Há ansiedade de perda do amor e de apro-
te-se culpada porque não conseguiu evitar uma vação.
morte. Seus sonhos e projetos de vida desmo- Pressões do ambiente: Sente pressões de
ronaram. Sente-se só, com muito medo de não afiliação, proteção, perigo, rejeição.
conseguir enfrentar a dor. Tenta fugir, negar (a Desfecho: O herói não resolve seu conflito.
história terminou). Sente-se culpada (Será que Não tem com quem compartilhar sua dor.
errou?). O superego é severo. É exigente con- Nega. “Vai viver só de formalidades.” A confli-
sigo. “Não conseguiu vencer a morte, e errou”. tiva persiste. Reage às pressões com confor-
Pressões do ambiente: Sente-se só, com mismo.
pressões de rejeição, carência e perigo. Tema: O tema é o de uma mulher desespe-
Desfecho: O herói não resolve seu conflito: rada e sozinha diante das pressões e da dor da
“Não tem ninguém”. Foge do enfrentamento perda.
da realidade. “A história terminou”. Está sem Análise formal: Segundo Murray (1977), a
perspectiva. análise formal do TAT deve considerar os se-
Tema: O tema é o de uma jovem mulher que guintes itens:
se sente só diante da dor da morte. a) atitude frente ao teste: disponibilidade
Lâmina 7 MF: “Uma mulher... ela senta no ou não; tranqüilidade; temor;
sofá e lembra da sua criança pequena... Eu se- b) atitude frente ao psicólogo: colaboração;
gurava ela no colo e era a mais feliz das mu- hostilidade; críticas ao psicólogo e ou ao tes-
lheres. Ninguém me contou que isso ia termi- te; boa vontade;
nar. Mas terminou... Não cuidei direito da crian- c) atitude frente às lâminas: o sujeito cum-
ça. Ela se foi... Estou desesperada... Só ficou pre as instruções ou não; ajusta a história ao
um brinquedo, um sofá vazio, tão vazio como que a lâmina explora ou não; produz omis-
meu coração. É que eu só tinha esse sonho, o sões, adições ou distorções dos estímulos da
de ter a criança, e não ficou nada... A mulher lâmina; e
do sofá espera a sua mãe... Mas não foi boa d) manifestações de conduta: linguagem;
filha, e a mãe não chega. Vai levar sua vida só tempo de reação; velocidade na voz ou lenti-
de formalidades daqui para frente... sem dão; pausas, hesitações; desejos de fumar, de
sonhar...sem sofrer. Deu...” sair da sala; transpiração; tiques; clareza da lin-
Título: A mulher sofredora e formal. guagem; tipo de vocabulário, etc.
Herói: Uma mulher sozinha, com traços de
incapacidade e de introversão; sem confiança
em si. Interpretação
Motivos, tendências e necessidades do he-
rói: O herói, a mulher, sente necessidades de A análise das verbalizações do sujeito permite
afiliação, de proteção, de socorro, de evitação o reconhecimento de dados significativos, sen-
da culpa e de reconhecimento. Precisa de aju- do possível a interpretação dos mesmos. Inter-
da, para vencer sua dor e diminuir sua culpa. pretar, conforme Murray (1977), significa “tra-
Estados interiores: Está desesperada porque duzir os motivos (problemas, necessidades,
perdeu sua criança. Dedicou-se ao seu sonho pressões, etc.), encontrados no repertório das
de ser mãe, com exclusividade. Mas sente cul- histórias, em termos dos fatores internos e ex-

406 JUREMA ALCIDES CUNHA


ternos da personalidade do sujeito (sentimen- estudo ou da profissão e a vida no lar, junto aos
tos, tendências e atitudes íntimas subjacentes; filhos, optou pela segunda alternativa.
ambiente, pessoas, objetos que operam sobre Reafirma-se, portanto, que um dado é sig-
ele)” (p. 61). Desta maneira, a postura inter- nificativo quando fica corroborado por duas
pretativa deve orientar-se para o conhecimen- ou mais histórias. No mesmo sentido, devem
to da dinâmica da personalidade do sujeito. ser avaliadas as distorções, omissões e/ou as adi-
Exige do psicólogo conhecimentos sólidos da ções de personagens e/ou de outros elementos.
psicologia dinâmica e experiência clínica (Ra-
paport, 1965).
Além disso, para interpretar o TAT, é indis- Elaboração da síntese
pensável o conhecimento da história pessoal
do caso, porque a precisão e a riqueza das con- Após o procedimento de análise, levando-se
clusões do teste têm uma correlação direta com em consideração aspectos da observação, e da
este material. história, deve-se elaborar uma síntese, que tra-
Por outro lado, para chegar à compreensão duza a dinâmica da personalidade do indiví-
da personalidade, é necessário o exame do re- duo testado (Freitas, 1996). Uma análise em
pertório completo de histórias, para avaliar a seqüência permite ao profissional a constru-
consistência entre os conteúdos. ção gradativa de um quadro mais abrangente.
Na interpretação do TAT, o psicólogo não Isso requer uma certa prática. Pode-se recorrer
deve buscar, apenas, a comprovação da parti- a um esquema de interpretação como, por
cipação do sujeito nas formas de conduta do exemplo temas abordados, características e
grupo normativo ou, ainda, verificar se há des- necessidades dos heróis, que são reveladoras
vio significativo dos mesmos. Importa obter a da auto-estima do sujeito. Pode-se identificar
gestalt do conjunto das respostas, relacionan- as possibilidades de ação na busca de resolu-
do as coincidências e os desvios das normas ção das tramas do herói. É importante a análi-
aperceptivas e temáticas. se do ambiente externo, saber que tipo de re-
Cada dado significativo deve ser compre- lações procura estabelecer, como reage às pres-
endido no conjunto dinâmico, incluindo o sões externas. Aborda-se, também, relaciona-
que o antecede, sua intensidade e suas con- mentos específicos, tais como figuras paren-
seqüências. tais, relações sociais, heterossexuais, etc. A se-
Quando o psicólogo encontra um motivo, guir, importa relatar os conflitos do herói nas
uma seqüência dinâmica em uma história, deve diversas lâminas; a presença da ansiedade per-
examinar a possibilidade de sua repetição nas turbadora e dos mecanismos de defesa comu-
demais. Para esclarecer esta afirmação, tome- mente empregados. Finalmente, importa en-
mos como exemplo verbalizações ao TAT de focar como ocorre a elaboração dos conflitos,
uma jovem de 22 anos. Na Lâmina 2, sua res- que indica a disponibilidade do indivíduo po-
posta foi: “A moça olha para a mulher do cam- der entrar em contato com seus conteúdos in-
po e pensa que talvez esta seja feliz, vivendo ternos; suas possibilidades de mudança e de
para o lar e para os filhos”. Na Lâmina 7MF, crescimento pessoal. Para isso, os desfechos das
disse: “A mãe, bem jovem, conta uma história histórias são particularmente reveladores da
para a sua filha, em que a boneca-mãe estu- integração do ego (Freitas, 1995).
dou muito, mas ficou feliz mesmo quando cui- Concluindo, a síntese deve descrever uma
dou da boneca-filha”. Na Lâmina 5, sua verba- pessoa real e não uma coleção de itens isolados.
lização foi de que: “A mãe saiu correndo do
trabalho para a sua casa, porque sabia que era
ali que estava a sua felicidade. Abriu a porta e Diagnóstico
até se emocionou de alegria”. Neste caso, e ape-
nas após o exame desta seqüência, pode-se afir- Pela própria natureza da técnica, o TAT é es-
mar que essa jovem, indecisa entre a escolha do sencialmente indicado para o entendimento

PSICODIAGNÓSTICO – V 407
dinâmico da personalidade. Assim, só secun- base também em outros autores, e os de Ra-
dariamente, oferece subsídios para a classifi- paport (1965) e de Portuondo (1970), podere-
cação nosológica. mos verificar que cada um dos autores se apóia
Quando se pretende o entendimento dinâ- na experiência dos demais, de maneira que uma
mico, a análise dos dados deve ser enfocada tentativa de síntese incorrerá numa repetição
de modo a apresentar “um quadro global do de conteúdos. Por outro lado, tais informações
mundo interno do indivíduo” (Rapaport, 1965, são pouco sistemáticas. Ora esclarecem aspec-
p.283), ou seja, é preciso compreender o sujei- tos dinâmicos, ora são descritivas em termos
to em função de suas principais áreas vitais, das verbalizações de sujeitos que apresentam
em suas relações familiares, em suas relações determinados estados afetivos, ora pretendem
hetero ou homossexuais (com referência à sua apontar indicadores diagnósticos para certo
vida afetiva, sexual e/ou matrimonial), em suas nível de funcionamento ou relacionam mani-
relações sociais (e anti-sociais) e com o traba- festações encontradas em algum quadro clíni-
lho. Murray (1977) apresenta a orientação de co. São, portanto, bastante vagas, se levarmos
Tomkins, para chegar a uma análise “do com- em conta os critérios diagnósticos específicos,
portamento da personalidade frente às princi- incluídos nas classificações nosológicas mais
pais regiões existenciais” (p.101). Recomenda- recentes. Assim, os subsídios encontrados nas
se, sobretudo ao psicólogo iniciante, um estu- obras citadas podem eventualmente auxiliar a
do cuidadoso desse material, para experiência corroborar outros achados.
no manejo dos dados, até que possa chegar Não obstante, o TAT pode oferecer uma
ao seu próprio entendimento da dinâmica pes- contribuição importante em termos de diag-
soal do sujeito. nóstico, se considerarmos que refinamentos
Em relação a informações básicas para che- no entendimento dinâmico podem servir de
gar a um diagnóstico nosológico, se compa- subsídios básicos para um diagnóstico dife-
rarmos os subsídios de Murray (1977), com rencial.

408 JUREMA ALCIDES CUNHA


TAT, conforme o modelo de Bellak
Blanca Guevara Werlang
26
Pressupostos básicos partir da observação de alguns casos patológi-
cos, compreendeu que a psique desenvolve
O Teste de Apercepção Temática – TAT – é uma uma neurose de angústia, quando não se sen-
técnica para a investigação da dinâmica da te em condições de realizar a tarefa de contro-
personalidade. O procedimento básico consis- lar a excitação sexual que surge endogenamen-
te em apresentar ao sujeito que está em ava- te, comportando-se como se a tivesse projeta-
liação um conjunto de imagens (lâminas), in- do no mundo exterior.
centivando-o a que relate histórias, seguindo Posteriormente, em 1896, analisando um
o curso de sua inspiração no momento. Espe- caso de paranóia grave, no artigo Observações
ra-se que o examinando utilize a sua reserva adicionais sobre as neuropsicoses de defesa,
de experiência, elaborando narrações, em que, Freud (1986b) melhorou e ampliou o conceito
sem se dar conta, se identifica com os perso- de projeção, postulando que este processo
nagens da cena. Tais histórias denunciarão da- consiste em atribuir os próprios impulsos e afe-
dos sobre a relação do examinando com as fi- tos a outras pessoas ou ao mundo exterior,
guras de autoridade e outros tipos de víncu- como um mecanismo de defesa, que possibili-
los, revelando também o funcionamento das ta ignorar os próprios fenômenos indesejáveis.
relações familiares, a natureza dos temores, Ainda, analisando o caso Schroeber, Freud
desejos, dificuldades, assim como a hierarquia (1969) passou a considerar que a projeção é o
das necessidades e da estrutura das transações mecanismo de defesa do paranóico, explican-
entre id, ego e superego. do que, para sujeitos com este tipo de patolo-
Para Murray, lembram França e Silva e cole- gia, é mais fácil enfrentar um perigo externo
gas (1984), o valor do TAT está no seu poder do que um interno. Para isso, esses indivíduos
de evocar fantasias suscetíveis de traduzir ten- utilizam três operações: primeiro, reprimem o
dências inconscientes inibidas. Em função dis- sentimento de amor, para depois converter o
so, o conceito fundamental, para a compreen- amor em seu contrário (ódio) e, finalmente, atri-
são e interpretação do conteúdo das histórias buir esse ódio ao objeto amoroso original. Nessa
das lâminas, é o da projeção. defesa do paranóico, só nesta última operação é
Aqui, cabe lembrar que o termo projeção que se processa o mecanismo projetivo.
foi introduzido por Freud (1986a), em 1894, Por último, em 1913, no artigo Totem e
no seu artigo Neuroses de angústia, em que, a tabu, Freud (1974) generalizou mais o concei-

PSICODIAGNÓSTICO – V 409
to de projeção. Neste, Freud salientou que, nos haver um processo hipotético de apercepção
povos primitivos, as almas dos que morrem são não interpretado (percepção objetiva), e que
transformadas em demônios, e, para se prote- toda interpretação subjetiva constitui uma
gerem da hostilidade dos mesmos, os sobrevi- apercepção, dinamicamente significante, sen-
ventes recorrem a tabus, ou seja, concebem os do também um processo natural e comum a
demônios como projeções dos sentimentos todos os indivíduos. Desse modo, a resposta
hostis que os sobreviventes abrigam em rela- “um menino tocando violino” para a lâmina 1
ção aos mortos. “Este procedimento comum, do TAT constitui uma norma de percepção (ob-
tanto na vida mental normal quanto na pato- jetiva) comum para a maioria das pessoas. En-
lógica, é conhecido com o nome de projeção” tretanto, a interpretação dessa situação como
(p.82). “um menino feliz, triste, agressivo, tímido ou
A projeção, pois, desempenha “um papel ambicioso” é singular para cada indivíduo.
muito grande na determinação da forma que Desta maneira, embora haja uma percepção,
toma nosso mundo exterior” (p.86). Portanto, toda pessoa “deforma” aperceptivamente, de
quando se projeta alguma coisa na realidade acordo com seus conteúdos internos, diferin-
externa, o que sucede é o reconhecimento de do de uma para as outras, apenas em grau.
um estado em que algo está presente nos sen- Bellak (1967b, 1979) distingue cinco formas
tidos e na consciência, junto a outro estado, de apercepção: a) projeção invertida; b) proje-
em que a mesma coisa está latente, podendo ção simples; c) sensibilização; d) percepção
reaparecer. Em outras palavras, Freud afirmou autista; e) externalização.
a coexistência “da percepção e da memória ou, A projeção invertida é, na realidade, o meca-
em termos mais gerais, a existência de proces- nismo de defesa descrito por Freud na para-
sos mentais inconscientes ao lado dos cons- nóia, podendo ser observada como uma pas-
cientes” (p.117). sagem do inconsciente “eu o amo” para a cons-
Dessa maneira, a principal suposição de ciência de “eu o odeio”. A projeção aqui en-
Freud é que as lembranças conscientes ou in- volve quatro passos:
conscientes influenciam na percepção de estí- “1) eu o amo (um objeto homossexual):
mulos contemporâneos. Assim, a interpretação impulso do id inaceitável pelo ego;
do TAT, segundo Bellak (1967b, 1979), baseia- 2) eu o odeio: formação reativa;
se justamente neste fundamento. Exemplifican- 3) a agressão é também inaceitável e repri-
do, esse autor comenta que a percepção pas- mida;
sada que um indivíduo tem de seus próprios 4) finalmente, ele me odeia: projeção sim-
pais influirá na percepção das figuras paren- ples” (Bellak, 1967b, p.28; 1979, p.21-22).
tais no TAT, sendo isso uma prova válida e con- Como se pode observar, a projeção inverti-
fiável das percepções habituais das figuras pa- da representa o grau máximo de distorção aper-
ternas do sujeito. ceptiva em oposição à projeção simples, que é
Entretanto, Bellak (1967b, 1979) considera uma pequena distorção ou transferência, pela
que o termo percepção está vinculado a um aprendizagem ou pela influência de imagens
sistema da psicologia, que não tem relação com prévias. Por exemplo, uma pessoa chega tarde
o conceito de personalidade da psicologia di- ao trabalho e passa a inferir incorretamente
nâmica. Em função disso, prefere adotar a no- que seu chefe o olha com raiva. Isso represen-
ção de apercepção de Herbart (já utilizada por ta, certamente, uma consciência de culpa, ca-
Murray), entendida como o processo pelo qual racterizando, na concepção de Bellak (1979),
uma experiência é assimilada e transformada uma projeção simples, dentro do contexto si-
pelo resíduo da experiência passada, ou seja, é tuacional onde foi operacionalizada.
a interpretação subjetiva da percepção, que é Já a sensibilização não é a construção de
apenas a interpretação objetiva de um estímulo. um percepto objetivamente inexistente: é uma
Esta definição de apercepção sugere, segun- percepção mais sensível de estímulos existen-
do França e Silva e colegas (1984), que pode tes. A sensibilização, então, significa que o

410 JUREMA ALCIDES CUNHA


objeto que se “ajusta a um padrão preestabe- tras são ligadas a ideais de longo curso (ideal
lecido se percebe mais facilmente do que aque- de ego), e outras governam a conduta moral
le que não se ajusta”. Um exemplo comum dis- (superego).
so pode ser observado nos problemas percep- Sem dúvida, os pressupostos básicos que
tuais da leitura, em que as palavras previamen- sustentam o TAT são de cunho psicanalítico, e
te aprendidas se percebem com maior facili- a interpretação e a análise, propostas por Be-
dade pela sua configuração que pela sua orto- llak, fundamentam-se na teoria estrutural freu-
grafia (Bellak, 1967b, p.29). diana (id, ego, superego), em que o conceito
A percepção autista acontece quando a de determinismo psíquico tem um lugar de des-
personalidade está sob tensão ou em estado taque. Desta maneira, como lembra Dewald
de grande necessidade. Um indivíduo, por (1981), todos os fenômenos da vida e do com-
exemplo, com muita fome, passa a perceber portamento são determinados seletivamente
objetos comestíveis frente a estímulos que pela “interação simultânea de todas as forças
objetivamente não representam comida. Des- e experiências, passadas e presentes, do indi-
ta maneira, alcança, por meio da distorção gra- víduo, sejam elas conscientes, pré-conscientes
tificante, satisfazer seus impulsos básicos. ou inconscientes” (p.60-61).
Por último, Bellak (1979) descreve a exter-
nalização como uma apercepção que, diferen-
temente dos anteriores, não é um processo ADMINISTRAÇÃO DO TAT
inconsciente, e sim pré-consciente. Na lâmina
5 do TAT, uma pessoa pode contar que “se tra- Ao contrário de Murray, que propunha a ad-
ta de uma mãe que olha para dentro do quar- ministração de 20 lâminas, Bellak (1979) opta
to de seu filho para se certificar de que o mes- por um procedimento reduzido, administran-
mo terminou sua tarefa, passando a xingá-lo do, numa única sessão, o número máximo de
por estar demorando muito”. Após uma pe- 12 lâminas. Justifica esta sua escolha tanto no
quena pausa, o sujeito verbaliza “era isso o que sentido de economizar tempo, como por en-
acontecia seguidamente entre minha mãe e tender que esse número de lâminas é suficien-
eu”. Sem dúvida, o conteúdo não era conscien- te para obter material dinâmico do paciente.
te, enquanto essa pessoa contava a história, Contudo, considera essencial administrar 9 lâ-
mas, em um determinado momento, facilmen- minas, que, segundo ele, investigam todas as
te se tornou consciente, passando a reconhe- relações humanas básicas. São elas, para os
cer o episódio como parte de sua própria his- homens, 1, 2, 3RH, 4, 6RH, 7RH, 11, 12H e 13HF,
tória pessoal (p.25). e, para as mulheres, 1, 2, 3RH, 4, 6MF, 7MF,
Anzieu (1981) sintetiza com muita clareza 9MF, 11 e 12HF. Bellak inclui a lâmina 3RH
como Bellak entendia a psicanálise. Ele a con- para as mulheres por ter comprovado, empi-
siderava como uma teoria da aprendizagem, ricamente, que ela funciona tanto em sujei-
relacionada com a história de vida do sujeito: tos do sexo masculino como do feminino,
“aquisição da apercepção dos estímulos orais, possibilitando histórias mais ricas que sua
anais e genitais e das reações das figuras pa- equivalente 3MF.
rentais a estes; interação das apercepções (atos Além da idade e do sexo do examinando,
falhos, formação de sintomas e de traços de existem outros fatores que podem ser critérios
caráter); influência das primeiras apercepções para a escolha das lâminas, como a suscetibili-
sobre a apercepção de estímulos ulteriores dade e/ou vulnerabilidade das mesmas para
(mecanismos de defesa)” (p.266). A personali- mobilizar, com maior probabilidade, determi-
dade é vista, então, como um sistema comple- nadas situações, problemas e/ou aspectos di-
xo de apercepções de natureza diversa, influ- nâmicos (vide Quadro 26.1).
enciando o comportamento de maneira seleti- Às nove lâminas básicas, deve-se acrescen-
va. Assim, existem percepções que levam em tar, segundo Bellak, o máximo de três lâmi-
conta as dificuldades da realidade (ego), ou- nas específicas (aquelas que sejam necessá-

PSICODIAGNÓSTICO – V 411
QUADRO 26.1 Lâminas segundo o aspecto mobilizador
Aspecto mobilizador Lâminas universais Lâminas masculinas Lâminas femininas
Id 4, 10, 11, 15 8VH, 18VH, 13HF 9MF, 12F, 13HF, 17MF,
18MF
Superego 5, 15, 30 3RH, 7RH, 9RH, 13HF 3MF, 6MF, 7MF, 13HF
Ideal de ego 1, 2, 16 8RH, 17RH 8MF, 9MF
Depressão e suicídio 10, 14, 15, 20 3RH, 6RH, 8RH 3MF, 8MF, 17MF
Perigo, medo 6, 11, 19 8RH, 12H, 13HF, 18RH 9MF, 13HF, 17HF
Relações familiares 5, 10 6RH, 7RH, 13R, 8RH 6MF, 7MF, 12F
Sexualidade 2, 4, 5, 10 9RH, 12H, 13HF, 17RH, 3MF, 6MF, 8MF, 9MF, 12F,
18RH 13HF
Trabalho, profissão 1, 2 9RH
Agressão 15 12H, 13HF, 18RH 13HF, 18MF
Situação mãe-filha 7MF, 9MF, 12F, 18MF
Situação pai-filho 7RH, 12H
Situação pai-filha 10
Situação mãe-filho 10 6RH
Fonte: Murray, 1975, p.20 (adaptado).

rias) para atender a situação particular da INTERPRETAÇÃO E ANÁLISE DAS LÂMINAS


pessoa que está sendo avaliada, de acordo DO TAT
com os dados obtidos na história clínica. As-
sim, por exemplo, se um paciente do sexo Para Bellak (1967a, 1979), o TAT é um teste
masculino apresenta medos homossexuais, projetivo que tem a capacidade de despertar o
podem ser incluídas as lâminas 9RH, 17RH e conteúdo e a dinâmica das relações interpes-
18RH. soais e os padrões psicodinâmicos de funcio-
As instruções utilizadas por Bellak para a namento. Em função disso, propõe um méto-
administração do teste são praticamente as do interpretativo, constituído por dez catego-
mesmas que as propostas por Murray (1975), rias de classificação, que se relacionam, em
exceto no fato de que Bellak omite a informa- primeiro lugar, com estas dimensões e, só se-
ção de ser esta “uma prova de imaginação, uma cundariamente, com as características formais.
forma de inteligência” (p.23), por considerar As dez categorias são: 1) tema principal; 2)
isto inapropriado no contexto clínico. O que herói principal; 3) necessidades e impulsos do
deve ser enfatizado é que serão mostradas herói; 4) conceito do meio ambiente; 5) atitu-
algumas lâminas, para cada uma das quais des frente às figuras de vinculação; 6) confli-
deve ser elaborada uma história sobre o que tos significativos; 7) natureza das ansiedades;
está ocorrendo, enfatizando que aconteci- 8) principais defesas; 9) adequação do supere-
mentos levaram a essa situação e qual será o go; 10) integração do ego.
desfecho. Utilizaremos a história produzida para a lâ-
A respeito do inquérito, Bellak (1979) pro- mina 12H, por um indivíduo do sexo masculi-
põe que seja realizado depois de completar no, de 28 anos, como exemplo didático, para
todas as histórias, e não após cada história, interpretar as categorias recém-mencionadas.
por considerar que o material pré-consciente L. 12H
se faria consciente, interferindo no resto das “Bem! Parece duas pessoas, uma mulher e
respostas ao teste. um homem mais idoso. João é tio de Clara que

412 JUREMA ALCIDES CUNHA


vem visitar João, que mora noutra cidade. Ela Nível interpretativo: Para evitar pensar, é
tem um mal-estar e fica doente, não é bem o melhor ficar doente e/ou dormir, mas isto pode
termo, é mal-estar, e João está cuidando dela não ser suficiente, então, tem que ficar atenta,
com certa preocupação, embora seja algo pas- observando.
sageiro. Clara está dormindo, está observan- Nível diagnóstico: Dificuldades com a se-
do. Vou dar um título: Tio João.” xualidade.
Inquérito: Nível simbólico: Dormir representando o
– O que Clara fazia na casa de João? controle dos desejos instintivos. Mulher versus
– “Ela viajou e a casa de João era passagem doença, imagem feminina desvalorizada.
e ela tinha um certo relacionamento, não ago- O herói principal da história é aquele per-
ra, mas maior no tempo de infância. Foi rever sonagem do qual se fala mais e, geralmente, é
o tio.” com quem o examinando se identifica. É im-
– Em que pensam? portante avaliar a auto-imagem e a adequa-
– “Clara está dormindo, não pensa. João ção do mesmo, o que certamente deixará em
pensa na sobrinha que está ali, como era pe- evidência as qualidades que o examinando
quena, o quanto cresceu (25 anos), pensa sobre possui ou deseja possuir.
ela e sobre ele. Acha que também ficou velho, A adequação do herói será observada atra-
50 anos. Pensa que já teve aquela idade e o vés da habilidade do personagem para realizar
quanto o tempo passa.” tarefas em circunstâncias de dificuldades ex-
– Como foi esta viagem? ternas e/ou internas, de maneira que resultem
– “Era para uma cidade maior, Curitiba. De aceitáveis social, moral, intelectual e emocio-
Passo Fundo foi para outra cidade e passou por nalmente. Por sua vez, a auto-imagem relacio-
Blumenau para visitar a cidade e talvez partici- na-se com o conceito de si mesmo e com o
par de algum congresso.” papel social representado.
– Como termina? O herói principal do nosso exemplo é visto
– “Ela se recuperando e indo para Curitiba como uma mulher (num personagem que é do
e voltando depois para sua cidade e João tam- sexo masculino) doente ou que passa mal
bém. Voltando a sua rotina de vida.” (auto-imagem). Apresenta dificuldades para
O tema principal refere-se ao núcleo princi- enfrentar a situação de se encontrar com seu
pal da história, ou seja, é o tema básico do tio, precisando dormir (ação passiva) para evi-
enredo. Para interpretá-lo, Bellak recomenda tar (negar) a consumação do desejo de cunho
desmembrá-lo em quatro níveis: descritivo, in- sexual incestuoso.
terpretativo, diagnóstico e simbólico. No nível Identificando a ação do herói principal,
descritivo, a proposta é resumir a história rela- podem-se detectar as suas necessidades, que,
tada pelo examinando numa forma mais sim- do ponto de vista de Portuondo (1970a), se
ples. No nível interpretativo, deve-se alcançar expressam, subjetivamente, como impulsos,
o significado oculto do resumo obtido no nível desejos ou intenções e, objetivamente, como
descritivo, ao passo que, no nível diagnóstico, traços de conduta. Uma vez identificadas as
se procura transformar as impressões do nível necessidades, procura-se inferir o seu signifi-
interpretativo numa formulação definitiva, cado dinâmico. As necessidades e os impulsos
para, no nível simbólico, interpretar os símbo- do herói podem ser categorizados seguindo o
los que possam existir na história, de acordo esquema apresentado no Quadro 26.2.
com as hipóteses psicanalíticas. As necessidades da conduta da mulher, com
Deste modo, no exemplo da lâmina 12H, que o examinando se identifica, parecem ser a
temos: de esconder os desejos sexuais, tanto no sentido
Nível descritivo: Clara visita seu tio João, da sua identidade quanto na vinculação com o
passa mal, fica doente, dorme, não pensa, mas outro personagem, podendo-se pressupor a pre-
continua observando. Recupera-se e continua sença de sentimentos de culpa. As circunstân-
sua rotina de vida. cias introduzidas são o estar doente e a viagem.

PSICODIAGNÓSTICO – V 413
QUADRO 26.2 Principais necessidades e impulsos erarquicamente abaixo dele. Do mesmo modo,
do herói é importante examinar qual é a reação dele a
a) Necessidades da conduta do herói (tal como tais figuras, para poder compreender o tipo de
aparecem na história): _________________________ relações e vínculos estabelecidos e os fatores
______________________________________________
dinâmicos básicos das mesmas.
inferência dinâmica: ___________________________
______________________________________________ Atitudes frente às figuras de autoridade: Tio
b) Personagens, objetos ou circunstâncias introduzidas:
visto como uma figura que relembra relacio-
______________________________________________ namentos anteriores, sendo a reação de pre-
pressupondo a necessidade de: _________________ caução, observação e controle.
______________________________________________ O id, o ego e o superego são forças ou es-
c) Personagens, objetos ou circunstâncias omitidos: truturas psíquicas que estão, ao mesmo tem-
______________________________________________ po, na psique do indivíduo. Quando essas for-
______________________________________________
ças têm objetivos contraditórios, surgem situa-
pressupondo necessidade de: __________________
______________________________________________ ções de conflito psíquico. Nas histórias das lâ-
minas do TAT, é importante identificar quais as
Fonte: Bellak, 1979, p.85. tendências impulsivas ou forças que estão em
conflito, assim como é importante, também,
especificar a conduta resultante disso.
A doença pode estar pressupondo a neces- O conflito significativo do herói da lâmina
sidade de se afastar da idéia de ser mulher, 12H parece estar relacionado com um choque
porque isto representaria um “mal-estar”, e a de forças provenientes do id versus as do su-
viagem representaria a necessidade de voltar perego, tanto no que se refere à identidade do
para a realidade. próprio herói principal quanto à manifestação
Quando o examinando inclui na história de sentimentos de culpa pela proibição do in-
determinado personagem, objeto ou circuns- cesto. Cabe ressaltar que o herói principal nes-
tância, que não está presente na lâmina, ou sa história, como já foi mencionado, é do sexo
exclui o que é evidente, no estímulo, é porque feminino, e que o narrador da história é um
se trata de elementos que representam deter- jovem de 28 anos. Neste caso, a identificação
minadas necessidades, merecendo, então, uma com um herói feminino precisaria, ainda, ser
atenção especial para compreender o papel que comparada com os heróis de outras histórias,
desempenham dinamicamente. para levantar e/ou confirmar a hipótese de um
A concepção do meio, ou seja, do mundo, problema de identidade sexual. Entretanto,
é, segundo Bellak, uma mistura de autopercep- essa identificação feminina tão convincente,
ção inconsciente e da apercepção dos estímu- num estímulo onde aparece claramente a fi-
los provocada pelas imagens do passado. gura de personagens do sexo masculino, pare-
Quanto mais consistente aparece nas histórias ce indicar algo significativo.
a imagem do meio ambiente, mais poderemos Identificadas as forças que estão em confli-
considerá-la como parte integrante da perso- to, deve-se determinar a natureza das ansie-
nalidade do sujeito. Dessa maneira, podem-se dades. Sabemos que a ansiedade pode proce-
encontrar referências de meios protetores, der de várias fontes do aparelho mental. Deste
ameaçadores, hostis, amistosos, rejeitadores, modo, como lembra Dewald (1981), a ansie-
acolhedores, exploradores, etc. dade instintiva é “o resultado de uma expecta-
Meio. Aparentemente, acolhedor, protetor, tiva de invasão do organismo por excesso de
embora o herói mantenha uma atitude de vi- tensões e estímulos oriundos de seus próprios
gilância frente à situação. impulsos e relaciona-se com as primeiras ex-
É importante fazer, também, uma análise periências infantis de acúmulo de tensão com
de como o herói vê as figuras dos pais ou ou- ausência de gratificação” (p.41). Por outro lado,
tras figuras de autoridade, bem como as da a ansiedade do ego surge da percepção de
sua mesma faixa etária, as mais jovens e as hi- “uma situação perigosa incorporada, que uma

414 JUREMA ALCIDES CUNHA


vez foi sentida como externa, correspondente dens do superego, poder-se-á compreender a
a várias fantasias e distorções do pensamento integração ou não do ego.
do processo primário, na infância” (p.41). Em A ansiedade que pode ser identificada, no
contrapartida, a ansiedade do superego surge exemplo da lâmina 12H, resulta do superego:
da introjeção de ameaças de punição ou perda desaprovação social. O superego demonstra ser
de amor, sustentadas nas normas morais, ex- severo, sendo, até certo ponto, eficaz na sua
perienciadas pelo indivíduo como sentimento função de controlar as fantasias sexuais, suge-
de culpa. rindo que assumir uma identificação feminina
Analisados o conflito psíquico e a natureza é algo “doentio”. Por sua vez, o ego parece ser
das ansiedades, cabe identificar os mecanismos frágil para enfrentar a realidade do estímulo,
de defesa. Estes são operações efetuadas pelo precisando de artifícios através dos mecanis-
ego perante os perigos que procedem do id, mos de defesa para conseguir mediar os im-
do superego e da realidade externa. Manifes- pulsos do id e do superego. Dessa maneira,
tam-se, segundo Kusnetzoff (1982), como con- nega as implicações sexuais da relação, procu-
dutas, porque “derivam de um processo de rando projetar no tio seus próprios impulsos.
abstração e generalização das condutas defen- Parece capaz de atender as exigências da reali-
sivas, que exprimem a idéia de um sujeito numa dade, “voltando à sua rotina de vida”. A dinâ-
situação determinada” (p.206). Assim, cada mica não pode ser completamente inteligível,
sujeito seleciona, inconscientemente, um de- pois, no inquérito, o psicólogo deixou de exa-
terminado número de estruturas defensivas, minar como o sujeito imagina o que acontece-
que utiliza para lidar contra os perigos inter- rá imediatamente, para perguntar sobre o pas-
nos e externos em quase todos os contextos sado (“Como foi esta viagem?”) e sobre o fu-
dos quais faz parte, constituindo-se no seu es- turo (“Como termina?”).
tilo característico de agir. Uma vez analisada cada uma das histórias,
Existem várias maneiras de estudar os dife- de acordo com as dez categorias, Bellak (1967a,
rentes mecanismos de defesa. Bellak (1974) 1979) propõe realizar um pequeno resumo dos
apóia-se na classificação de Anna Freud (1974), principais dados. Esses resumos facilitarão para
que ordena os mecanismos conforme os peri- o clínico a visualização dos padrões repetitivos
gos, sejam internos ou externos. nas respostas do sujeito, como a organização
O grau de severidade do superego deve ser do informe final, onde deverão constar dados
avaliado, analisando a relação existente entre sobre a estrutura inconsciente e necessidades
o tipo de castigo e a magnitude da ofensa. do sujeito, concepção do meio e relação com
Deste modo, poder-se-á determinar se o supe- as figuras significativas, assim como informa-
rego do herói principal é severo, rígido ou in- ções sobre as características da personalidade.
dulgente. Bellak deixa claro que, no seu entender, o
O desenlace da história possibilita compre- TAT é um instrumento que auxilia muito o
ender a força do ego. Dependendo de como o estabelecimento do diagnóstico dinâmico e
herói lida com os problemas, que enfrenta nas estrutural do examinando, mas não é uma
lâminas, e de acordo como maneja os impul- prova que propicie uma classificação noso-
sos do id, as exigências da realidade e as or- lógica.

PSICODIAGNÓSTICO – V 415
CAT e sua interpretação dinâmica
Neli Klix Freitas
27
CONSIDERAÇÕES GERAIS ração do material do CAT, que, além do con-
teúdo projetivo, expressa a aquisição de fun-
O CAT (Children’s Apperception Test) é um ins- ções mentais e as conquistas intelectuais. Por
trumento de grande utilidade aos psicólogos essa razão, uma esquematização completa
que se dedicam às atividades de diagnóstico e deveria conter um modelo das configurações
de tratamento dos diferentes transtornos clí- verbais esperadas, de acordo com a idade cro-
nicos infantis: problemas neuróticos, psicóti- nológica.
cos, psicossomáticos, bem como a repercus- Na abordagem interpretativa do material
são de situações traumáticas no psiquismo da projetivo infantil, é indispensável trabalhar com
criança. Dentre essas, pode-se citar: negligên- esquemas claros do desenvolvimento evoluti-
cia, abuso, abandono, maus tratos, perdas. É vo normal e, portanto, das conquistas de pen-
um instrumento clinicamente útil para deter- samento e adequação à realidade de cada
minar os fatores dinâmicos relacionados com momento cronológico. A partir daí, interpre-
as reações infantis em um grupo, na escola e tando o teste, lâmina por lâmina, pode-se in-
diante dos acontecimentos familiares. vestigar modalidades clínicas manifestas e la-
Inúmeras tentativas foram feitas para pa- tentes na estruturação da personalidade.
dronizar o CAT, empregando critérios estatísti- Nos últimos cinco anos, diferentes autores
cos. Mas todas as evidências apontam para a realizaram pesquisas com o CAT, ressaltando a
maior utilidade do emprego do CAT como um sua utilidade como teste projetivo, no psico-
teste projetivo. Seu manejo requer do psicólo- diagnóstico infantil (Arzeno, 1995; Cassidy,
go conhecimentos aprofundados sobre a psi- 1998; Gambos, 1998; Grassano, 1996; Lafond,
codinâmica, bem como sobre o desenvolvimen- 1999; Sanders, 1998; Seligman, 1999; Setten,
to infantil. Como o CAT é a forma infantil do 1998).
TAT, é imprescindível conhecer a Teoria da Per- É de fundamental importância que o clíni-
sonalidade de Murray, a Personologia (1953), co conheça a história da criança, antes de apli-
e as proposições de Bellak e Bellak (1981a; car o teste: situação familiar, questões de saú-
1981b) para sua análise e interpretação. de/doença, desenvolvimento da criança. Esses
Na sistematização da produção das crian- dados devem ser integrados à dinâmica do tes-
ças, o psicólogo defronta-se com o vetor evo- te, por ocasião do psicodiagnóstico infantil. É
lutivo. Este é de grande importância na elabo- função do psicólogo clínico integrar e interpre-

416 JUREMA ALCIDES CUNHA


tar, com base nos fatos e achados, as dificul- plo, o herói secundário pode ser do sexo opos-
dades da criança e pesquisar formas de auxi- to. Neste caso, é possível encontrar certas con-
liar a ela e às pessoas envolvidas com seus cui- tradições nas histórias.
dados. Necessidades do herói: As necessidades
expressas podem corresponder às do sujeito,
em termos de realidade ou de fantasia. Assim,
ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DO CAT, a inclusão de personagens agressivos nas his-
SEGUNDO BELLAK E BELLAK tórias pode ocorrer em crianças com compor-
tamento agressivo, ou não. Na análise das ver-
O CAT é um teste aperceptivo, um instrumen- balizações, deve-se atentar para a seqüência
to que permite a investigação da personalida- da história, para poder identificar como a crian-
de, o estudo da dinâmica significativa das di- ça maneja a agressividade e o grau de controle
ferenças individuais na percepção de estímu- que tem, ou não, sobre ela. Por outro lado, é
los padronizados. As verbalizações do CAT re- importante confrontar tais dados com o com-
fletem o conteúdo latente, os processos psí- portamento do sujeito, tal como é descrito na
quicos da criança. Assim, a partir das verbali- história clínica e/ou observado pelo psicólogo.
zações do CAT, é possível levantar hipóteses Figuras, objetos ou circunstâncias introdu-
sobre a organização da personalidade infantil. zidos: A análise dos elementos introduzidos,
Cada história, seguindo-se as proposições de que não constam nas lâminas, constitui um
Bellak e Bellak (1981a; 1981b), deve ser anali- passo importante na interpretação. Por exem-
sada nos seguintes itens: plo, circunstâncias externas que sugerem de-
Tema principal: A história pode conter um cepção, injustiça, indiferença e outras são in-
tema ou vários temas importantes. É necessá- dicadores auxiliares para a compreensão do
rio saber o que é verbalizado e por quê. Procu- mundo em que a criança pensa estar vivendo.
ra-se, então, identificar um denominador co- Figuras, objetos ou circunstâncias omitidos:
mum ao longo das histórias. A criança também pode omitir ou ignorar ele-
Herói: O herói é o personagem com quem mentos presentes nas lâminas, o que sugere
o sujeito mais se identifica, a figura em torno que não os deseja naquele lugar, fornecendo
da qual a história se desenvolve. Costuma ser indícios sobre conflitos com eles relacionados.
semelhante a ele, em sexo e idade. É necessá- Concepção do mundo: Trata-se de um con-
rio reconhecer qual a figura que constitui o ceito complexo, que pode envolver percepções
herói e quais são os outros personagens. É inconscientes e distorções aperceptivas pela
importante ver como é descrito; por exemplo, memória. Em geral, duas ou três descrições de
se é bom, bonito, corajoso ou sujo, deficiente, termos, como hostilidade e perigo, são sufi-
perigoso. A imagem do herói retrata a imagem cientes para denotar reações costumeiras dian-
que o sujeito tem de si mesmo e/ou o papel te do ambiente.
social que desempenha. Representa as atitu- Como são vistas as figuras: Importa consi-
des, as habilidades que o sujeito tem, ou dese- derar como a criança vê, percebe as figuras com
ja possuir. É necessário, então, examinar a ade- relação a si mesma e, principalmente, como
quação do herói às características da socieda- reage diante delas. A qualidade dessa reação
de à qual o sujeito pertence. Isso permite uma (simbiótica, oral-dependente, ambivalente,
estimativa da adequação do ego. Não obstan- etc.) permite identificar vulnerabilidades rela-
te, pode haver identificação com diferentes cionadas com diferentes estágios do desenvol-
heróis, o que deve ser analisado cuidadosamen- vimento da personalidade.
te. O sujeito pode se identificar inicialmente Conflitos significativos: É importante pro-
com um e, depois, com outro herói. A identifi- curar identificar a natureza dos conflitos ma-
cação com o herói secundário também é im- nifestos nas histórias, assim como os mecanis-
portante, porque este representa sentimentos mos de defesa empregados diante da ansieda-
e atitudes inconscientes do sujeito. Por exem- de. Este item fornece indícios sobre aspectos

PSICODIAGNÓSTICO – V 417
do funcionamento da personalidade, revelan- Integração do ego: O modo como a crian-
do dados para a compreensão de componen- ça enfrenta as demandas dos impulsos e da
tes neuróticos e sobre a formação do cará- realidade externa mostra-nos o funcionamen-
ter. Assim, possibilita o levantamento de hi- to de seu ego. O desenvolvimento do ego deve
póteses sobre o diagnóstico e prognóstico do ser avaliado, com referência à fase em que a
caso. criança se encontra, observando-se: a) a ade-
Natureza das ansiedades: O enredo das his- quação de cada história à fase evolutiva da
tórias fornece subsídios para reconhecer an- criança e aos estímulos reais das lâminas, que
siedades associadas a desejos inconscientes e refletem a percepção que o self tem do mun-
defesas empregadas contra as mesmas. A an- do interno e externo; b) o enfrentamento da
siedade depende das experiências pessoais ao realidade, ao longo de cada história, que se
longo das etapas de desenvolvimento, e, as- traduz por verbalizações adequadas, originais,
sim, é possível identificar vulnerabilidades es- inteligentes: c) a inclusão, ao longo da histó-
pecíficas, que facilitam a formulação do diag- ria, de soluções adequadas, completas e rea-
nóstico e do prognóstico, como a ansiedade lísticas.
frente ao abandono dos objetos pré-edípicos, Haworth (1966) propôs um guia útil para a
em relação a conteúdos edípicos, ou mesmo à análise dos principais mecanismos de defesa
ansiedade, que pode advir das pressões do manifestos no CAT, tais como formação reati-
superego. Este pode ser visto como persecutó- va, ambivalência, isolamento, repressão, nega-
rio, numa fase pós-edípica. Não obstante, as ção, simbolização, regressão. Esse guia consta
principais ansiedades, evidenciadas no CAT, dos manuais do CAT (Bellak & Bellak, 1981a;
referem-se à punição, agressão física, medo de 1981b).
perda do amor (manifestado por desaprova- O CAT tem sido empregado com crianças
ção) ou de menosprezo (observado por indí- enlutadas (Freitas, 1998; 1999a; 199b). Se a
cios de solidão e desamparo). perda de uma das figuras parentais, de um ir-
Principais defesas: As defesas mostram a mão, de um dos avós ocorreu recentemente,
habilidade ou não do sujeito de lidar com estí- espera-se que a criança expresse seu pesar nas
mulos externos e internos, sendo reveladoras verbalizações do teste. A morte de um familiar
de aspectos de seu desenvolvimento. É impor- próximo ou de uma pessoa amiga constitui-se
tante procurar identificar os principais meca- em um dos eventos estressores mais significa-
nismos de defesa utilizados frente à ansiedade tivos. Se, nas verbalizações do CAT, nenhuma
para a compreensão psicodinâmica da crian- referência ao pesar e à perda se fizer presente,
ça. Por exemplo, podem aparecer defesas ob- há sinal de alguma patologia. Se as manifesta-
sessivas, com conteúdos perturbadores. Temas ções de negação forem intensas, há um mas-
curtos, de natureza descritiva, em número de caramento do pesar e dos sentimentos depres-
quatro ou cinco, também revelam o emprego sivos. Conseqüentemente, essa criança pode-
de defesas obsessivas. De qualquer modo, a rá apresentar dificuldades de aprendizagem e/
introdução de diferentes temas em uma histó- ou de conduta; manifestações psicossomáticas
ria pode significar o quanto a lâmina específi- e outros desajustamentos.
ca perturba o sujeito. Crianças enlutadas podem narrar histórias
Severidade do superego: A severidade do com expectativas mágicas. A culpa é uma ma-
superego pode ser avaliada pela punição, com- nifestação comum. Pode-se exemplificar com
parada com a natureza da defesa. A despro- duas verbalizações de um menino, de 8 anos,
porção do castigo, em relação à transgressão, que perdeu seu pai recentemente, em aciden-
reflete a severidade do superego. Se o supere- te automobilístico.
go se mostra severo diante de certas condições, Lâmina 3 – “O leão fuma o seu cachimbo.
e, em outras, a sua pressão é leve, displicente, Ele ri bem alto: ah, ah, ah, ah! Ele gosta tanto
este dado remete-nos às dificuldades de rela- de fumar cachimbo, que fica sorrindo. Aí, o
cionamento com os demais. ratinho olha o leão e pensa: que bom que ele

418 JUREMA ALCIDES CUNHA


está feliz. Feliz para sempre. O leão é muito Pode-se exemplificar:
forte. Ele agüenta todas as coisas e é muito, Lâmina 1 – “Três pintos queriam comer. E a
muito, muito bonito. O ratinho fica ali, bem mamãe galinha não chegava. Eles pensaram
quieto, só olhando...”. que ela vinha vindo. Mas não era ela: era só
Nessa verbalização, o herói é o leão, com tra- uma sombra. Ela morreu e eles ficaram sozi-
ços de superioridade, beleza, força. Há evidên- nhos, abandonados... Deu.”
cias de negação: o leão ri, está feliz. Há expecta- Tendências maníacas: rápida resposta à lâ-
tivas mágicas: “Feliz para sempre”. Não há refe- mina, grande número de associações, histórias
rências à morte: o leão (pai) é idealizado. longas, coloridas; presença de temas como ale-
Lâmina 8 – “ Os macacos estavam no ani- gria, passeios, satisfação oral, ênfase nos de-
versário do macaquinho. Todos estavam bem talhes; os personagens solucionam todos os
felizes. Ele ganhou muitos presentes. Todos problemas: dão e recebem prêmios e recom-
comeram bolo, cantaram ‘Parabéns a você’. O pensas; desfechos felizes e mágicos; presença
macaquinho pensou no avô: ele só está no re- de negação, controle onipotente e identifica-
trato. E o macaquinho, brincando com a bola, ção com o objeto idealizado; personagens in-
chutou e quebrou o vidro do retrato. Machu- fantis independentes, que não sofrem, mani-
cou o vovô. O macaquinho ficou triste e cho- pulam os personagens adultos.
rou muito. Aí, a vovó falou: é só o retrato. Não Pode-se exemplificar com uma verbalização:
faz mal, a gente arruma. E ficaram felizes para Lâmina 4 – “Aqui tem uma família: todos
sempre”. os cangurus vão fazer piquenique. O papai can-
Também nessa verbalização, observa-se a guru passa chispando na bicicleta. Ele é bem
negação: há uma festa, todos cantam, são fe- forte. Faz musculação. Vai pedalando... A mãe
lizes. Aparece culpa, quando o macaquinho vai atrás, porque tem um filhinho e carrega a
quebra o vidro do quadro. Mas, logo aparece comida. Mas ela também vai ligeiro. Vão che-
uma solução mágica, e todos são felizes para gar todos no campo. Os filhinhos saem pulan-
sempre. do no campo cheio de flores... Bonito, lindo.
Este menino certamente necessita de ajuda Aí, estendem a colcha, sentam e comem bas-
terapêutica. A família também deve ser orien- tante lanche. O papai chama os filhos para jo-
tada. Nesse sentido, o CAT constitui-se em um gar bola. São muito, muito felizes. Para sem-
instrumento projetivo muito útil para o psico- pre, porque os filhinhos são muito bonzinhos
diagnóstico infantil. Permite, ainda, a formu- com o papai e com a mamãe canguru...”.
lação de indicações terapêuticas adequadas. Indicadores de esquizofrenia infantil: per-
Pode-se encontrar configurações, nas his- cepções distorcidas, adições indiscriminadas,
tórias do CAT, que permitem referi-las a moda- associações fracas, histórias vagas, confusas,
lidades nosológicas específicas. Em trabalhos desajustes em relação ao estímulo, projeções
de pesquisa (Freitas, 1998; 1999a; 199b), usan- da criança; contaminações com lâminas ante-
do o CAT, foram encontrados indicadores de riores; palavras sem sentido; confusão, perda
depressão, tendências maníacas e de esquizo- de limites, produção empobrecida, falta de
frenia. adequação ao estímulo, dissociação (figuras ou
Indicadores de depressão e tendências ma- boas, ou más), os personagens são persegui-
níacas no CAT: dos, devorados; presença de animais ferozes;
Depressão: capacidade associativa inibida, o personagem não desenvolve condutas coe-
produção pobre, histórias curtas, com reduzi- rentes, o desfecho é indefinido, ou destrutivo.
da expressão de emoção, finais pessimistas; Exemplo:
temas referentes à fome, insatisfação, priva- Lâmina 2 – “ Dois ursos... os cachorros es-
ção, solidão, tristeza, separações, viagens, ini- tão brigando muito. Um urso deu um tiro com
bições para aprender, falta de entusiasmo, vo- uma arma. Os cachorros caíram da corda. Saiu
cabulário pobre, culpa, temor ao castigo e à sangue da perna do cachorro. Está com medo,
solidão. vai cair...”

PSICODIAGNÓSTICO – V 419
O CAT permite corroborar hipóteses diag- Mecanismos de defesa: É fundamental iden-
nósticas. Os itens descritos, que resultam de tificar as defesas mais comuns que aparecem
estudos clínicos e pesquisas feitas ao longo dos nas verbalizações.
últimos 20 anos, representam uma tentativa Integração do ego e ajustamento: Hawor-
de abrir uma investigação sistemática no cam- th (1966) propôs, ainda, a importância de ob-
po do psicodiagnóstico infantil, em especial, servação de outros aspectos que considera
no que se refere às patologias descritas. Ou- básicos, na síntese integrativa, tais como ati-
tros autores (Piccolo, 1977; Portuondo, 1970a; tudes para consigo mesmo: competência, segu-
Rapaport, 1965) descreveram categorias noso- rança pessoal, egoísmo, domínio, independên-
lógicas, associando o CAT a diferentes testes cia: como o herói de cada história é considerado,
projetivos. como se considera na trama desenvolvida.
Níveis de desenvolvimento psicossexual:
Identificação da maturidade infantil, através
SÍNTESE INTERPRETATIVA E CONCLUSÃO dos temas e das respostas às situações especí-
ficas de cada história.
Haworth (1966) propôs alguns itens para a sín- Desenvolvimento do superego: As histó-
tese global do CAT, que deve ser feita após a rias podem revelar imaturidade, fragilidade,
análise de todas as lâminas. Esses itens são: culpa, expectativa de punição, severidade do
Nível intelectual: Não é objetivo do CAT clas- superego.
sificar a inteligência, mas pode-se chegar a uma Por fim, é relevante observar o ajustamen-
compreensão de aspectos intelectuais, a partir to global da criança à situação do teste: capa-
da escolha das palavras nas verbalizações, da cidade de adaptação, produção adequada à
formulação coerente das idéias. O uso de refe- idade cronológica, controle pertinente. São
rências pessoais, com freqüência, descrições indicadores desses itens: “desfechos felizes,
simples e banais, histórias com elaboração realísticos, exitosos; ações responsáveis, lógi-
pobre é compatível com pobreza intelectual. cas; consciência de que o sonho era somente
Por outro lado, descrições minuciosas e histó- sonho; temas concentrados em atividades do
rias articuladas demonstram bom nível intelec- cotidiano familiares, identificações predomi-
tual. nantes com figuras adultas e/ou infantis do
Contato com a realidade: Produção de ma- mesmo sexo” (p.161).
terial não adequado aos estímulos da lâmina, Pode-se seguir o que Haworth (1966) reco-
com distorções, denota prejuízo no contato menda para a síntese final integrativa. Mas,
com a realidade. sugere-se ainda:
Relações interpessoais: As lâminas do CAT a) a observação dos temas, heróis e suas
permitem o acesso às atitudes da criança para necessidades, que permitem a descrição da es-
com seus pais, irmãos e outros personagens. trutura psíquica e das necessidades do sujeito;
Tais atitudes podem mostrar dependência, b) a concepção do ambiente e das figuras
medo, solidão. que são significativas para o sujeito;
Padrões afetivos: É necessário, na síntese c) os conflitos, as ansiedades, os mecanis-
final, retomar os sentimentos manifestos nas mos de defesa e a severidade do superego, que
verbalizações: alegria, tristeza, pesar e outros. permitem a formulação da psicodinâmica do
É importante verificar quem oferece apoio ao sujeito;
personagem da história, em momentos de es- d) os desfechos das histórias, que são reve-
tresse. Importa avaliar, também, o manejo da ladores de como o sujeito lida com as diferen-
agressividade, quem agride, quem é agredido; tes situações; se necessita de tratamento e qual
se há presença de culpa ou não. o tratamento mais recomendado.

420 JUREMA ALCIDES CUNHA


Teste das Fábulas: novas perspectivas*
Jurema Alcides Cunha, Blanca Guevara Werlang,
Irani I.L. Argimon
28
A exploração de historietas incompletas
como estímulo para investigar conflitos in-
conscientes, na avaliação psicológica, começou
Examinando o contexto de cada fábula, vê-
se que, basicamente, apresenta uma situação-
problema, para a qual deve ser encontrada uma
a ser feita por Louisa Düss, em 1940. Desde solução. Fornece determinadas informações
então, firmou-se a sua popularidade, especial- que devem ser elaboradas por meio de opera-
mente como um método projetivo infantil, em ções cognitivas, com base nas quais o sujeito
vários países, ainda que grande parte das pes- pode produzir uma resposta lógica, derivada
quisas publicadas utilizassem apenas amostras da esfera do ego livre de conflitos (Hartmann,
de sujeitos em idade escolar. 1968). Pode-se dizer que as “respostas nor-
Após vários anos de experiência com a téc- mais” de Düss e nossas respostas populares
nica, utilizando a forma verbal e pictórica com estão neste nível: são isentas de simbolismo
crianças, resolvemos avaliar a sua utilização personalizado e não envolvem indícios de con-
clínica com outros grupos etários. Na realida- flito. Isso pode ocorrer por duas razões: a) o
de, embora a literatura tenha vários exemplos conteúdo da fábula não produziu uma mobili-
de trabalhos que falam no valor das fábulas zação afetiva ou b) o sujeito é capaz de con-
em diferentes idades, tal possibilidade não trole de sua expressão afetiva, produzindo uma
parecia muito prática, uma vez que o conteú- resposta que está em concordância com a ex-
do das fábulas é caracteristicamente infantil. pectativa social. Somente o inquérito ou a
Aliás, segundo Anzieu (1981), a criança se iden- transposição de elementos da fábula para ver-
tifica com o herói, porque este está “colocado balizações posteriores nos dirá qual das alter-
em uma situação representativa do desenvol- nativas é verdadeira.
vimento infantil” (p.69). Por exemplo, a F1, ou Fábula do Passarinho,
é a seguinte:
“Um papai e uma mamãe pássaros e seu
*Este trabalho reúne fragmentos de várias comunica-
ções científicas (vide, p.ex., Argimon, Werlang, Cunha filhote passarinho estão dormindo num ninho,
et alii, 1998, e Cunha, 1998), apresentadas em con- no galho. De repente, começa a soprar um ven-
gressos e baseadas em trabalhos de pesquisas, em que to muito forte, que sacode a árvore, e o ninho
colaboraram, na coleta de dados, as psicólogas Marile- cai no chão. Os três passarinhos acordam num
ne da Fonseca Seger, Maísa Silva dos Santos e Tatiana
instante e o passarinho papai voa rapidamen-
Escovar e a graduanda em psicologia Tânia Michelena,
a quem agradecemos. te para uma árvore, enquanto a mamãe passa-

PSICODIAGNÓSTICO – V 421
rinho voa para outra. O que vai fazer o filhote ça, pela identificação com o herói, fornecesse
passarinho? Ele já sabe voar um pouco...” elementos para que se pudesse inferir sua fi-
(Düss, 1986, p.18). xação no pai ou na mãe ou, pelo contrário, sua
Em crianças pré-escolares, a resposta po- independência. Na realidade, o material que
pular (que aparece numa freqüência de um em se obtém é muito mais produtivo, podendo-se
cada cinco sujeitos) é “Vai para outra árvore”; extrair elementos sobre o processo de separa-
já, entre escolares, as respostas populares (que ção-individuação. Por outro lado, por estudos
se apresentam em um de cada quatro sujeitos) realizados com psicóticos (Cunha, Werlang,
são “Vai para uma árvore, para um galho, um Oliveira et alii, 1999; Rossi, 1965) e pelo exa-
lugar abrigado” (Cunha & Nunes, 1993, p.241- me de protocolos infantis, vê-se que é possível
243). inferir, muitas vezes, qual a atitude básica do
Entretanto, a situação proposta também sujeito frente ao mundo.
tem aspectos críticos, emergenciais que podem Vejamos o exemplo de um menino de 6 anos
ser interpretados em função de experiências e 4 meses, que é apresentado no manual: “Mor-
particulares e pessoais. Antes, vimos que era reu... Caiu da árvore e se machucou muito...
possível captar, no problema, dados reais, que Morreu...” (Cunha & Nunes, 1993, p.99).
poderiam ser trabalhados para resolvê-lo. Ago- A situação de separação suscita uma fanta-
ra, chamamos a atenção para os seus dados sia de perda do objeto real. A ansiedade de
potencialmente estressantes, conforme o Qua- abandono é absolutamente esmagadora, já
dro 28-1. que o herói não faz uma opção possível para a
autonomia (o passarinho sabia voar um pou-
co), e o ego se deixa morrer. Não consegue
QUADRO 28.1 Dados potencialmente enfrentar as exigências da situação de separa-
estressantes da F1 ção-individuação, ingressando num processo
a) veio um vento muito forte (presença de um ele- regressivo sem retorno.
mento potencialmente destruidor); Outro exemplo, também de um menino de
b) o ninho caiu (ameaça da perda de proteção e esta-
6 anos e 7 meses: “O pequeno se perdeu... Ele
bilidade);
c) os pais passarinhos voaram cada um para uma ár- não tinha muita força e o vento levou ele. O
vore diferente (ameaça de separação dos pais); pai e a mãe foram procurá-lo. A mãe foi por
d) o filhote passarinho sabe voar um pouco. um lado e o pai por outro. E o encontraram. O
Fonte: Cunha e Nunes, 1993, p.7. ninho se espalhou todo. Os pais procuraram
mais palha para fazer o ninho. Quando aca-
bou o ninho, botaram o filhote dentro” (Cunha
Todavia, é exatamente a ênfase nos aspec- & Nunes, 1993, p.99).
tos estressantes que torna as fábulas sensíveis Esta criança também não enfrenta bem a
a interpretações extremamente particulariza- situação, já que também não usa os recursos
das, que se associam com problemas circuns- autônomos de que dispõe, talvez porque o
tanciais da vida diária e com conflitos tanto mundo pareça demasiadamente ameaçador. Há
conscientes como inconscientes. Tal fato de- um trauma de separação passageiro, mas ru-
monstra que, apesar dos esforços de Düss para dimentarmente há um vestígio de confiança
“eliminar situações familiares ou escolares, ex- numa fonte externa de ajuda.
cessivamente particularizadas” (Düss, 1986, Vejamos, agora, um outro caso de um me-
p.18), isso não foi possível, o que torna o ins- nino de 12 anos e 5 meses, que já apresenta-
trumento mais rico e promissor. mos em outro trabalho: “Ele vai tentar subir
Então, como já mencionamos, do ponto de até a arvore onde estão os pais; só que não vai
vista de Anzieu (1981), “a criança se identifica conseguir. Fica esperando os pais virem bus-
naturalmente com o herói” (p.69), e, sem dú- car, até que a mãe vem buscar. Os três se reú-
vida, esta era a intenção de Düss. Dessa ma- nem novamente e constroem um novo ninho”
neira, na F1, criou uma situação em que a crian- (Cunha & Werlang, 1997, p.289).

422 JUREMA ALCIDES CUNHA


Nota-se que o sujeito inicia uma ação, que “Vai ficar muito brabo e com ciúmes, pois
é insegura, tornando-se passiva. Aparentemen- pensa: ‘Eu sou o primeiro e eu devo beber o
te, poder-se-ia dizer que se trata de uma res- leite, pois esse aí é apenas um intruso, se me-
posta imatura que, não obstante, poderia ser tendo no meu caminho, e eu vou me vingar
melhor caracterizada como pseudo-infantil. Na dele. Colocarei veneno na comida dele... Não,
realidade, os estímulos da F1, para um menino melhor! Pisotearei ele. Não, melhor ainda! Eu
que está se matriculando na fase da adoles- vou esmagá-lo a chifradas’. Mas, quando ia
cência, fazem com que enfrente uma questão, fazer isso, olha e diz: ‘Ele é tão bonitinho, o
caracteristicamente egossintônica com a fase, meu maninho...’. Então, sua mãe é levada para
isto é, a crise que envolve impotência versus o ‘tosamento’ e raposas a atacam e matam.
onipotência. Em seu ingresso nessa fase, ain- Então, ao invés dele matar o irmão, leva para
da lhe é penoso assumir a tarefa de elaborar uma amiga, que também tem filhos já gran-
seu crescimento, desapegando-se de objetos des, e ela amamenta o filhote” (Cunha & Wer-
infantis, dos pais de sua infância (Aberastury lang, 1997, p.289).
& Knobel, 1991). Em tal enfrentamento, numa Vemos, neste exemplo, que o adolescente
situação de estresse, proposta pela F1, parece vivencia o conflito entre altruísmo e narcisis-
normal certa ambivalência, que explica suas os- mo de forma violenta, mas muito sofrida, po-
cilações. Pode desejar, por um momento, ter aces- dendo-se dizer, numa linguagem vulgar, que,
sível o colo antigo, que o fazia sentir-se seguro. em sua fantasia, “viaja”, “louqueia” e, até, re-
Mas não se entrega a uma ansiedade esmaga- gressivamente, faz com que a agressão recaia
dora. Antes, confiantemente, espera ajuda. Ob- sobre a figura materna, perdendo a mãe de
serva-se que, então, é capaz de um comporta- sua infância. Mas tenta uma solução, buscan-
mento mais maduro, participando da constru- do reparar seus impulsos agressivos. Vamos,
ção do ninho. Portanto, ainda que a F1 seja emo- então, comparar essa história com a de um
cionalmente muito mobilizadora para o adoles- menino de 4 anos e 2 meses, também com
cente, diferencia-se freqüentemente do modo conteúdo agressivo, mas sem qualquer desfe-
infantil de elaborar o desfecho, sendo o sujeito cho adaptativo:
capaz de buscar uma “solução” mais madura. “Foi e roubou o leite do cordeirinho. (Por
Entretanto, dentre todas as fábulas, na ado- que fez isto?*) Porque ele estava com fome...
lescência, destaca-se a F3, a Fábula do Cordei- (E daí?) Daí, que ela não era mãe do outro.
rinho, como a mais mobilizadora, uma vez que Então, o leite era dele... Acabou”.
é a que mais suscita a categorização de esta- Noutro exemplo, de um menino de 5 anos
dos emocionais, fantasias e defesas. Isso não e 8 meses, também fica claro que o herói não
significa que não seja comum a emergência da abre mão do leite e fica magoado com a mãe:
resposta “Vai comer capim fresco”. Não obs- “Comprou leite. (Quem comprou o leite?)
tante, enquanto a tônica da elaboração infan- O cordeirinho. (Como se sente comprando lei-
til se situa na ovelha mãe, o adolescente cos- te?) Triste, chorando. (Por quê?) Porque a mãe
tuma dar maior realce à figura do cordeirinho, não dá leite para ele. (Por que não dá?) Porque
do irmão que toma o seu lugar. Sendo assim, a o outro tomou tudo. (Daí?) Daí, ele teve que
menção do estado afetivo de ciúme é comum. comprar”.
É claro que se poderia considerar que, dentro Pode-se ver que o manejo é diferente. Am-
do contexto, tal referência é probabilisticamen- bos os pré-escolares se sentem privados, mas
te a mais lógica, se a freqüência de pausas no enquanto o primeiro se mostra hostil, o segun-
relato e outras conotações não denunciassem do chora pela perda simbólica, mas drástica
o quanto o tema afeta outra vulnerabilidade do afeto materno e tenta aliviar sua ansieda-
egossintônica com a fase, isto é, a questão do
altruísmo versus narcisismo. Vamos examinar
uma história, para a F3, produzida por um *As intervenções entre parênteses foram feitas pela
menino de 12 anos e 11 meses: psicóloga, como inquérito.

PSICODIAGNÓSTICO – V 423
de, sem agredir a mãe ou o irmão. Já o adoles- com as de adolescentes. Primeiramente, vamos
cente sente-se ferido em seu narcisismo e so- apresentar a resposta de um pré-escolar à F2:
fre com a perda de seu papel de criança e com “Ele não gostou da festa. (Por quê?) Por-
a sua dificuldade em aceitar mudanças que fra- que está o pai... (E daí?) O pai não deixa ele
gilizam o seu ego. Por outro lado, deve-se con- falar. (O que a criança faz?) Vai embora e fica
siderar que, em adolescentes, o alargamento sentada aqui. (Como a criança se sente?) Tris-
da rede social, com a participação em grupos te. (O que vai acontecer?) Ele vai ficar sem mãe?
cada vez maiores, favorece a reedição de emo- (O que tu achas?) A mãe ficou com o pai... (E
ções originárias das primeiras rivalidades infan- daí?) Não sei...”
tis com irmãos, agora, sob nova roupagem. Conteúdos edípicos invadem a história de
Considerando os resultados de uma amos- forma tão intensa, que há um bloqueio. Va-
tra de um estudo de 48 adolescentes, os da- mos ver, então, a resposta de uma menina de
dos de categorização de estados emocionais e 12 anos e 5 meses para os mesmos estímulos:
das fábulas e, a partir da tabela de contingên- “Porque ela tá achando muito... tá muito
cia, utilizando a técnica de análise de corres- desenturmada, pois só tem gente adulta e ela
pondência, pode-se visualizar, na Figura 28.1, está sozinha, sem ninguém para conversar ou
como ciúme se associa mais com a F3, assim brincar...”.
como dependência se associa mais com a F1, Comparando os dois exemplos, fica eviden-
nesta, em função do conflito de impotência te a presença de vínculos afetivos de natureza
versus onipotência, como já foi discutido. diversa. No primeiro caso, os pais, sem dúvida,
Na Figura 28.1, também se verifica que so- ocupam a primazia no mundo objetal infantil
lidão se associa mais com a F2, a Fábula do e, no segundo, eles são percebidos como pes-
Aniversário de Casamento. soas que fazem parte do mundo social do su-
Os estímulos da F2 e da F8, a Fábula do jeito, não existindo apenas em função de seu
Passeio, envolvem uma situação de triangula- self. Nesta última alternativa, entende-se que
ridade, muito mobilizadora na fase edípica. deve ter havido a resolução completa do con-
Neste caso, também se torna sumamente inte- flito edípico ou os aspectos dinâmicos associa-
ressante comparar respostas de pré-escolares dos com o conflito não emergem, pela ação

Dependência Estados emocionais


Fábulas
F1

Solidão
F2
Ciúme
F3

Figura 28.1 Análise de correspondência entre estados emocionais e as Fábulas 1, 2 e 3.

424 JUREMA ALCIDES CUNHA


da repressão e de outros mecanismos de defe- o uso farto de mecanismos de defesa, ficando
sa (Spiro, 1988). Aliás, este deve ser o caso, no racionalização e repressão em bastante evidên-
exemplo referido, em que parece ter sido usa- cia. Aliás, racionalização foi o mecanismo mais
da racionalização, além de repressão, já que a utilizado pelos sujeitos desta amostra, segui-
presença exclusiva de adultos na festa não en- do por repressão e introjeção. Assim, foi pos-
contra subsídios na representação pictórica. sível constatar que, entre esses adolescentes,
Mas, talvez, exemplos à F8, a Fábula do Pas- foi pequena a emergência de mecanismos pri-
seio, sejam mais esclarecedores. Vejamos, pri- mitivos. Note-se que também apareceram fan-
meiro, a resposta de um pré-escolar: tasias edípicas, mas não foram as mais obser-
“Por causa que foi passear com a mãe dele e vadas, podendo-se dizer que, entre esses su-
não podia deixar o pai sozinho. (O que vai acon- jeitos, ainda há casos que apresentam indícios
tecer?) O pai vai dar na mãe e nele e, então, vão de vulnerabilidades pré-adolescentes. Todavia,
embora para o Rio de Janeiro. ( Quem vai embo- quando tais indícios são concomitantes com o
ra?) A mãe e o filho. (E o pai?) Fica sozinho”. uso de defesas mais maduras, considera-se que
Esboça-se, claramente, uma situação edí- o conflito edípico já foi parcialmente supera-
pica que culmina com um triunfo edípico. Mas, do (Spiro, 1988).
vejamos a resposta de uma adolescente: É possível que a questão fique mais clara,
“Porque... Eles são separados? Eles não avi- se examinarmos os resultados da análise de
saram que iam sair e deixaram ela preocupa- correspondência entre as categorias de meca-
da. (Por que perguntaste se eles são separa- nismos de defesa e das fábulas. Com base na
dos?) Se forem separados e não fosse o dia de Figura 28.2, pode-se examinar a questão da F2
visita do pai, podia a filha ter sido seqüestra- e da F8, as duas fábulas que mais mobilizam
da, isto se a mãe fosse a responsável. E, se fos- conteúdos edípicos.
se o pai o responsável, a mãe ia ficar braba, Vemos que, enquanto a F8 se associa mais
porque não pode ver a filha no dia de visita... com racionalização, a F2 situa-se numa posi-
(Como sabes isto?) Vi na novela...” ção praticamente eqüidistante de racionaliza-
O tema, no último caso, é manejado de for- ção e de repressão. Com isso, fica sugerido que,
ma impessoal. A resposta, entretanto, sugere embora tais conteúdos edípicos tenham certo

Defesas
Fábulas

F2 Repressão
F8
F3
Racionalização
Introjeção
F7 F5
F4

Figura 28.2 Análise de correspondência entre defesas e as Fábulas 2, 3, 4, 5, 7 e 8.

PSICODIAGNÓSTICO – V 425
poder de mobilização afetiva, indicando a pre- ção catártica e de controle” (Cunha & Nunes,
sença de alguma vulnerabilidade ao conflito, 1993, p.14).
as fábulas correspondentes associam-se mais Foi possível observar que o primeiro sub-
com defesas típicas da fase de dissolução do conjunto, com exceção da F3, foi afetivamente
Édipo. Mas, por que dizemos que, na amostra, mais mobilizador na terceira idade, constatan-
tais fábulas mobilizam estados emocionais que do-se que, na F4 e na F5, se concentrou a gran-
podem se relacionar com conteúdos dessa na- de maioria das ocorrências de fenômenos es-
tureza? Na Figura 28.3, temos os resultados pecíficos. Lembrando que os temas das duas
da análise de correspondência entre catego- fábulas são a morte e o medo, respectivamen-
rias de fantasias e de fábulas. te, parece que, por certo, a reação observada
Pode-se ver, então, que a F2 e a F8 se asso- é sintônica com a fase.
ciam mais com rejeição que, envolvendo senti- Num levantamento de indícios de estados
mentos de exclusão, aponta para um tema emocionais, nas respostas às fábulas, em su-
básico do conflito edípico, relacionado com a jeitos da terceira idade, muitos destes institu-
vivência da impossibilidade de união com o cionalizados, predominam estados emocionais
progenitor do sexo oposto. Não devemos es- de tonalidade depressiva, como tristeza e soli-
quecer, porém, que a adolescência oferece uma dão, chamando a atenção, também, para aque-
segunda chance de reelaboração de conflitos les ligados ao manejo de afetos, como depen-
infantis. dência. Então, nos enredos produzidos, há fre-
Já, na terceira idade, a situação é outra. qüente solicitação de ajuda, não atendida, com
Lembramos que, em termos de estrutura do indícios de manifestações de ansiedade e medo.
instrumento, as fábulas se caracterizam por Aliás, as referências são a medos abstratos, que
dois subconjuntos de historietas, constituídas possivelmente se associam com uma ansieda-
pelas Fábulas 1, 2 e 3 e 6, 7 e 8, “que são en- de frente à morte.
tremeadas por duas fábulas (F4 e F5) e com- Salienta-se que, enquanto na Fábula 1 a
plementadas por outras (F9 e F10)”, que, na resposta popular entre crianças é de solução
infância, “freqüentemente assumem uma fun- independente, para o enredo criado, não se

Fantasias
Privação Fábulas
F3

F10
F5 Agressão
F6

Rejeição
F8 F2

Figura 28.3 Análise de correspondência entre fantasias e as Fábulas 2, 3, 5, 6, 8 e 10.

426 JUREMA ALCIDES CUNHA


verificou qualquer caso que envolvesse mais do diferente dos pais sobre o casamento. Ele está
que uma tentativa nesse sentido. se sentindo traído, acabrunhado. Os pais, se
Um exemplo de resposta típica é de um vendo sozinhos, vão atrás dele e, numa con-
sujeito de 66 anos, que, após sinais iniciais de versa franca com o filho, eles notam e sentem
choque, respondeu: que o casamento seria outra coisa e não o que
“Ele vai chamar o pai, gritar e pedir socorro eles têm vivido. O menino se sente revoltado,
para salvar ele dali. Ele vai começar a gritar, mas dá nova chance aos pais”.
chamar o pai e mãe para vir socorrer ele. Mas Observa-se, portanto, uma variabilidade de
daí a mãe não foi... (E aí?) Mas a mãe ficou indícios que denotam ora uma posição depen-
cuidando para os outros bichos não chegar dente, ora sinais de autonomia do ego, basea-
perto dele... (E então?) Não sei... ele ficou no dos numa sábia experiência de vida.
chão, não conseguiu voar porque não tinha Tanto em crianças como em adolescentes e
asa... (E como se sentia?) Aflito”. na terceira idade, o material suscitado é muito
Depois de outras considerações, a história rico, porque oferece importantes indícios de
termina com um lavrador pondo os passarinhos vulnerabilidades egossintônicas com cada fase,
no ninho. Entretanto, apesar da posição, mui- uma vez que as situações-problema que as fá-
tas vezes dependente, o desfecho das histó- bulas apresentam são suficientemente ambí-
rias é, geralmente, adaptativo. guas e simbólicas, para o sujeito poder proje-
Mas, com esse tipo de conteúdo, na análi- tar aspectos pessoais intrapsíquicos, possibili-
se das respostas, justificam-se as fantasias tando ao examinador identificar questões bá-
emergentes, com predominância de fantasias sicas, na perspectiva da fase etária atual e con-
de abandono e rejeição, e tal situação é tolera- flitos não resolvidos de etapas anteriores. Fica,
da por um uso intensificado de racionalização portanto, demonstrada a utilidade clínica do
como defesa, seguido por outras defesas, como instrumento em várias idades.
negação e repressão. Esses trabalhos, que deram subsídio ao pre-
Entretanto, apesar do ressurgimento de sente capítulo, desenvolvidos nos últimos anos,
aspectos mais infantis, observa-se que defesas permitem-nos concluir que as perspectivas de
de tipo mais imaturo constituem minoria, sen- entendimento psicodinâmico variam conforme
do mais freqüentes mecanismos oriundos da o período etário, embora a F1, a Fábula do Pas-
fase de dissolução do Édipo ou mais maduros. sarinho, seja bastante mobilizadora do ponto
Aliás, um traço que chama especialmente a de vista afetivo em todas as idades. Na infân-
atenção é a flexibilidade da identificação, ob- cia, principalmente, na faixa pré-escolar, além
servando-se que, em certas fábulas, a identifi- da F1, salientam-se, especialmente, a F2, Fá-
cação tende a se fazer com o herói infantil, em bula do Aniversário de Casamento, e a F8, a do
outras, com o herói adulto, às vezes, com o Passeio, todas elas com temas que envolvem
herói infantil num papel adulto, ou variando, uma situação triangular. Já na adolescência, são
na mesma fábula, o nível de identificação. principalmente mobilizadoras as fábulas com
Como exemplo, vamos dar a resposta de um temas egossintônicos com a fase, isto é, a F1 e
sujeito de 67 anos à Fábula 2. a F3, a Fábula do Cordeirinho. Por outro lado,
A Fábula 2 conta a história do aniversário na terceira idade, os temas da morte e do
de casamento de um pai e uma mãe, que se medo, suscitados pelas Fábulas 4 e 5, parecem
amam muito. Durante a festa, a criança se le- desencadear intensas reações afetivas, assim
vanta e sai, indo ficar sozinha no fundo do como a F1. Aliás, isso nos permite sugerir que
quintal. À pergunta “por quê?”, o sujeito res- a F1, no sentido diagnóstico, seja universal,
pondeu: porque é uma fábula que, quase invariavelmen-
“Porque ele acha que aquilo é uma fantasia te, produz conteúdos importantes, em várias
e não tem nada para comemorar. Ele pensa idades e em diferentes grupos clínicos.

PSICODIAGNÓSTICO – V 427
Desenvolvimentos do Procedimento de
Desenhos-Estórias (D-E)
Walter Trinca, Leila S.L.P. Cury Tardivo
29
INTRODUÇÃO de investigação psicanaliticamente fundamen-
tadas, como a Hora de Jogo Diagnóstica (Abe-
O Procedimento de Desenhos-Estórias (abrevi- rastury, 1982) e o Jogo de Rabiscos (Winnicott,
adamente, D-E) é uma técnica de investigação 1984), ajudou a consolidar uma nova maneira
da personalidade que emprega, basicamente, de se conceber e realizar o diagnóstico psico-
desenhos livres associados a estórias*, no con- lógico. Importante, acreditamos, é sublinhar
texto do diagnóstico psicológico. Foi introdu- que o D-E veio se inserir no processo diagnós-
zido por Walter Trinca, em 1972, para se pres- tico de tipo compreensivo (Trinca, W., 1984),
tar à exploração da dinâmica inconsciente da que trouxe uma abordagem clínica renovado-
personalidade, em setores que outros meios ra e uma visão humanística integradora dos
utilizados na época deixavam muito a desejar. propósitos do diagnóstico psicológico. Não
Ou seja, necessitava-se de instrumento com somente a psicanálise, como também a psico-
sensibilidade bastante para uma exploração logia fenomenológico-existencial, a psicologia
inconsciente de tipo vertical e focal, relaciona- da Gestalt, o behaviorismo, os estudos sobre a
da especialmente às queixas e outras angús- dinâmica familiar, a análise dos processos de
tias emergentes em dada situação. Nessa épo- desenvolvimento da criança e outras áreas da
ca, o exame psicológico, como um todo, ocu- psicologia lançaram luz sobre o foco da pro-
pava-se, na clínica psicológica, prioritariamen- blemática humana que foi incorporada no diag-
te com a horizontalidade e a extensão da per- nóstico compreensivo.
sonalidade em seus múltiplos aspectos. Havia Foi, inicialmente, apresentado como tese de
predominância do uso de testes objetivos, e doutorado no Instituto de Psicologia da USP
os psicólogos afiliavam-se, preferencialmente, (Trinca, W., 1972). Algum tempo depois, essa
a modelos médicos e psicométricos. tese foi transformada em livro (Trinca, W.,
Nesse contexto, o Procedimento de Dese- 1976). Encontram-se hoje, referidos ao D-E,
nhos-Estórias, juntamente com outras técnicas mais de 100 trabalhos publicados, dentre os
quais mais de 30 teses de doutorado e disser-
tações de mestrado, feitas a seu respeito ou
* N. dos A. Apesar de alguns autores recomendarem a com o seu emprego. Um resumo, ainda que
grafia história, quando se trata de narrativa de ficção,
pálido, dessa produção encontra-se em Trinca,
o uso consolidou e justifica a forma estória, já incorpo-
rada à língua portuguesa. W. (1997).

428 JUREMA ALCIDES CUNHA


NATUREZA E CARACTERÍSTICAS gicos. Estes, geralmente, se prendem a ques-
tões fundamentais de fidedignidade, sensibili-
O Procedimento de Desenhos-Estórias é uma dade e padronização, que não são igualmente
técnica de investigação da personalidade que consideradas no D-E. Não o são justamente por
se coloca, no contexto do diagnóstico psicoló- ser ele uma técnica de exploração livre e am-
gico, como meio auxiliar de ampliação do co- pla, e por visar a uma compreensão da dinâ-
nhecimento da personalidade, em situações mica psíquica profunda.
clínicas ou não-clínicas. Tem por base, como Podemos sintetizar, dizendo que o Procedi-
afirmamos, a combinação do emprego de de- mento de Desenhos-Estórias tem como carac-
senhos livres com o recurso de contar estórias. terísticas principais: 1) o uso de associações li-
O examinando realiza uma série de desenhos vres por parte do examinando; 2) o objetivo
livres, associados às estórias que eles contam, de atingir aspectos inconscientes da persona-
também de modo livre. Por isso, o D-E já foi lidade; 3) o emprego de meios indiretos de
referido como uma técnica de desenhos livres expressão; 4) a participação em recursos de
que servem como estímulos de apercepção te- investigação próprios das técnicas projetivas;
mática. Nesse caso, ele se constitui em instru- 5) a ampliação das possibilidades da observa-
mento com características próprias, que se vale ção livre; 6) a extensão dos processos da en-
de processos expressivo-motores e apercepti- trevista semi-estruturada e não-estruturada.
vo-dinâmicos.
Os desenhos livres servem para eliciar as
estórias, mas o resultado desse par se compõe TÉCNICA DE APLICAÇÃO
em um todo uno e indiviso. Além disso, a inte-
gridade do conjunto exige a utilização de “in- A administração do Procedimento é individual,
quéritos” e títulos para as unidades gráfico- devendo ser aplicado por profissionais devida-
verbais. O examinando realiza um primeiro mente qualificados. Usam-se folhas de papel
desenho livre e, a partir deste, inventa uma em branco de tamanho ofício, lápis preto e uma
estória. Responde, em seguida, às perguntas caixa de lápis de cor. Preenchidas as condições
do examinador e dá um título à produção. A requeridas, o sujeito é colocado sentado, tra-
unidade gráfico-verbal é normalmente repeti- balhando em uma mesa, e o examinador sen-
da, na mesma seqüência, por cinco vezes. Tal ta-se à sua frente. É dada a tarefa após verifi-
reiteração seqüencial não resulta em unidades cação de bom rapport entre examinando e
isoladas, mas em uma comunicação contínua, aplicador. Espalham-se os lápis sobre a mesa,
que serve aos propósitos da constituição de um ficando o lápis preto (ponta de grafite) locali-
todo, denominado Procedimento de Desenhos- zado ao acaso dentre os demais.
Estórias. Coloca-se uma folha de papel na posição
Trata-se de uma técnica que deixa o exami- horizontal, com o lado maior próximo do su-
nando livre para se comunicar; simultaneamen- jeito. Não se menciona a possibilidade de este
te, fornece um substrato básico de meios está- alterar essa posição, nem se enfatiza a impor-
veis para os participantes se conduzirem. As tância do fato. Solicita-se ao examinando que
informações advindas do emprego do Proce- faça um desenho livre: “Você tem essa folha
dimento são habitualmente reunidas a outras em branco e pode fazer o desenho que quiser,
para a composição da compreensão clínica. Em como quiser”. Aguarda-se a conclusão do pri-
particular, o uso conjugado do D-E com as en- meiro desenho. Quando estiver concluído, não
trevistas clínicas vem propiciar a obtenção de é retirado da frente do sujeito. O examinador
informações focais e nodais dentro do setting solicita, então, que ele conte uma estória as-
do diagnóstico psicológico. sociada ao desenho: “Você, agora, olhando o
O D-E é uma técnica de investigação que desenho, pode inventar uma estória, dizendo
não se restringe às noções habituais e particu- o que acontece”. Na eventualidade de o exa-
lares que temos a respeito dos testes psicoló- minando demonstrar dificuldades de associa-

PSICODIAGNÓSTICO – V 429
ção e de elaboração da estória, pode-se intro- uso se estendeu a crianças de três e quatro
duzir recursos auxiliares, dizendo-lhe, por anos, bem como a adultos de todas as idades.
exemplo: “Você pode começar falando a res- Os examinandos podem pertencer a quaisquer
peito do desenho que fez”. níveis mental, socioeconômico e cultural (Trin-
Concluída, no primeiro desenho, a fase de ca, A., 1997).
contar estórias, passa-se ao “inquérito”. Nes-
te, podem-se solicitar quaisquer esclarecimen-
tos necessários à compreensão e interpretação FINALIDADES
do material, produzido tanto no desenho quan-
to na estória. O “inquérito” tem, também, o O D-E foi proposto, inicialmente, para o estu-
propósito de obtenção de novas associações. do dos conteúdos psicodinâmicos da persona-
Ainda com o desenho diante do sujeito, pede- lidade, que abrangem especialmente os pro-
se o título da estória. Chegando a esse ponto, cessos de natureza inconsciente. Ele é de gran-
retira-se o desenho da vista do examinando. de valor na detecção de componentes das ex-
Com isso, temos concluída a primeira unidade periências subjetivas. Ultimamente, contudo,
de produção, composta de desenho livre, es- tem se enfatizado que se presta, também, ao
tória, “inquérito”, título e demais elementos reconhecimento das características formais e
relatados. estruturais da personalidade. A produção grá-
O examinador tomará nota detalhada da fica revela, como afirma Grassano (1996), a
estória, da verbalização do sujeito enquanto concepção e os conflitos inerentes ao manejo
desenha, da ordem de realização, dos recur- espacial, às funções e ao interior do próprio
sos auxiliares empregados, das perguntas e corpo, bem como as angústias e fantasias do-
respostas da fase de “inquérito”, do título, bem minantes com relação ao corpo de outras pes-
como de todas as reações expressivas, verbali- soas, construídas desde as primitivas relações
zações paralelas e outros comportamentos de objeto. Como, no D-E, os desenhos livres
observados durante a aplicação. Pretende-se não são somente substitutivos de pranchas
conseguir uma série de cinco unidades de pro- destinadas a provocar estórias, mas constituem
dução. Assim, concluída a primeira unidade, importantes fatores a serem avaliados de for-
repetem-se os mesmos procedimentos para as ma integrada com os demais elementos pre-
demais. Na eventualidade de não se obterem sentes, podemos dizer que tal produção gráfi-
cinco unidades em uma única sessão de 60 ca é reveladora de características formais e es-
minutos, é recomendável combinar o retorno truturais. Hammer (1991), Van Kolck (1981) e
do sujeito a nova sessão de aplicação. Não se a própria Grassano (1996) oferecem indicado-
alcançando o número de unidades igual a cin- res para interpretá-los desse modo. Tardivo
co, ainda que utilizado o tempo de duas ses- (1985; 1997) enfoca os aspectos formais da
sões, será considerado e avaliado o material produção gráfica no D-E e sua coerência den-
que nelas o examinando produziu. Se as asso- tro do conjunto da produção global.
ciações verbais forem pobres, convém reapli- De início, essa técnica de investigação da
car o processo, a partir da fase de contar estó- personalidade foi concebida para avaliar sujei-
rias. Não é aconselhável o uso de borracha. Para tos normais, neuróticos e psicóticos em situa-
outros esclarecimentos quanto à aplicação, vide ção eminentemente clínica. Com o passar do
Trinca, W. (1976). tempo, verificou-se que, em função de sua ex-
O D-E foi introduzido como técnica de ava- trema adaptabilidade, se prestava a diversas
liação psicológica individual. Alguns estudos outras situações, como, por exemplo, aos con-
atuais, contudo, consideram a possibilidade de textos da psicologia escolar, da saúde pública,
ser aplicado coletivamente (Aiello-Vaisberg, da psicologia forense, das instituições de aten-
1997; Gavião & Pinto, 1999). Originalmente, dimento a pessoas carentes, deficientes, etc.
foi apresentado para sujeitos de ambos os se- Temos encontrado uma ampla utilização do D-
xos, de cinco a 15 anos de idade. Hoje, esse E na pesquisa, seja dentro, seja fora da clínica

430 JUREMA ALCIDES CUNHA


psicológica. Além disso, ele se revela útil em tatar que os adultos, muitas vezes, têm essa
diagnóstico breve, psicoterapia breve, entre- preferência.
vista devolutiva, follow-up e inúmeras outras 6) Determinada seqüência reiterada de
áreas. provas gráficas e temáticas tende a produzir
um fator ativador dos mecanismos e dina-
mismos da personalidade, levando a maior
FUNDAMENTAÇÃO profundidade e clareza na comunicação. A
reiteração do par desenho-estória conduz a
O Procedimento de Desenhos-Estórias encon- um processo unitário de comunicação, com
tra sua fundamentação nas seguintes suposi- início, meio e fim.
ções:
1) O indivíduo pode revelar suas disposi-
ções, esforços e conflitos ao estruturar ou com- AVALIAÇÃO
pletar uma situação incompleta. Essa suposi-
ção fundamenta as técnicas projetivas em ge- O D-E é uma técnica que permite várias moda-
ral. Ela vem sendo comprovada por meio de lidades de avaliação. Do vértice da análise de
pesquisas e de experiência clínica. conteúdo com fundamentação psicanalítica,
2) As associações livres tendem a se dirigir temos observado, tanto em pesquisas realiza-
a setores em que o indivíduo é emocionalmen- das, como na clínica psicológica, o uso do
te mais sensível. Essa hipótese, que fundamen- método denominado “livre inspeção do mate-
ta a própria psicanálise, aplica-se ao D-E, que, rial”. Essa forma de avaliação se baseia em uma
como vimos, deixa o examinando livre para análise globalística. Ou seja, levando-se em
realizar a tarefa. Nesta, ele tende a exprimir conta o conjunto da produção (desenhos, es-
seus impulsos, conflitos, angústias, fantasias tórias, respostas aos “inquéritos” e outras as-
inconscientes, etc. sociações), são levantadas hipóteses referen-
3) Nas técnicas projetivas, quanto menor for tes à natureza dos impulsos, das fantasias in-
a estruturação e a direção do estímulo, tanto conscientes, das angústias e conflitos predo-
maior será a tendência de surgir material emo- minantes, dos vínculos mais significativos, das
cionalmente significativo. Quando são solici- defesas mais utilizadas, entre outros aspectos.
tados livremente desenhos e estórias, e quan- Tenta-se relacionar tudo isso com as queixas.
do é minimizada a direção oferecida pelo exa- Podemos mencionar, aqui, a profundidade do
minador, pode-se esperar que os núcleos sig- método, que depende da experiência clínica.
nificativos da personalidade tenham a oportu- Contudo, ao utilizá-lo, o profissional corre o
nidade de se manifestar. risco de se equivocar, especialmente se não
4) No contato inicial, o cliente tende a co- dispõe de muita experiência clínica.
municar seus principais conflitos e fantasias Dada a riqueza do material que surge no
inconscientes sobre a doença e a cura. Aberas- Procedimento de Desenhos-Estórias, há a pos-
tury (1982) explica, de modo geral, esse fenô- sibilidade de se realizar uma análise dos aspec-
meno, dizendo que, no caso da criança, esta tos formais e estruturais, como foi menciona-
espera que os profissionais que a atendem não do. Nesse caso, a ênfase é colocada nas quali-
reproduzam a conduta de seus objetos origi- dades aparentes dos desenhos (localização,
nais, que provocaram a doença ou o conflito. qualidade do grafismo, temas predominantes,
Tanto para as crianças quanto para os adultos, uso das cores, significado das cores, etc.). São
têm se verificado nas consultas iniciais evidên- consideradas, também, as qualidades da ver-
cias empíricas e clínicas para essa hipótese. balização: adequação ao nível evolutivo do
5) Crianças e adolescentes preferem co- sujeito, grau de coerência entre os desenhos,
municar-se por desenhos e fantasias apercep- as estórias e os títulos, além de outros aspec-
tivas a se expressar por comunicações ver- tos. Por intermédio dessa análise, pode-se ava-
bais diretas. A surpresa, para nós, foi cons- liar o grau de organização das funções egói-

PSICODIAGNÓSTICO – V 431
cas, como o raciocínio, a memória, a lógica, a timentos de autovalorização, auto-imagem e
estruturação espacial, temporal, etc. Tardivo autoconceito reais e positivos; busca de iden-
(1985; 1997) propôs itens para a análise dos tidade e identificação com o próprio sexo); 5.
aspectos formais. Focalizou, de modo especial, Identificação Negativa (este traço se opõe ao
a produção gráfica e a coerência entre os as- traço 4 e se refere aos sentimentos de menor
pectos que compõem o D-E. Christofi (1995) valia, menor capacidade, menor importância e
utilizou esse esquema, comparando os dados identificação com o outro sexo).
de Tardivo (numa amostra de crianças normais) Grupo II – Figuras Significativas (traços de
com crianças que apresentavam problemas de 6 a 11): 6. Figura Materna Positiva (mãe senti-
aprendizagem. O estudo revelou a utilidade do da como presente, gratificante, boa, afetiva,
D-E no diagnóstico psicopedagógico, de acor- protetora, facilitadora – objeto bom); 7. Figu-
do com as características formais. As crianças ra Materna Negativa (mãe vivida como ausen-
com dificuldades de aprendizagem apresenta- te, omissa, rejeitadora, ameaçadora, controla-
ram maior imaturidade emocional, incapacida- dora, exploradora – objeto mau); 8. Figura Pa-
de de adequação ao meio e baixa tolerância à terna Positiva (sentida como próxima, presen-
frustração. Acreditamos ser interessante usar te, gratificante, afetiva e protetora); 9. Figura
esse tipo de análise em combinação com a Paterna Negativa (semelhante ao traço 7, aqui
análise de conteúdo, pois ambas se comple- em relação ao pai); 10. Figura Fraterna Positiva
mentam. e/ou Outras Figuras (aspectos de relacionamen-
Passemos, agora, aos referenciais de análi- to com irmãos e/ou com outros iguais, compa-
se de conteúdo. Mencionamos, inicialmente, nheiros, amigos, etc., ou seja, cooperação, co-
o trabalho de Trinca, W. (1972). Ele propôs um laboração, etc.); 11. Figura Fraterna Negativa
referencial de análise elaborado desde as res- e/ou Outras Figuras (aspectos negativos do re-
postas de 53 sujeitos que compunham a amos- lacionamento: competição, rivalidade, confli-
tra de sua pesquisa. Esse referencial é composto to, inveja).
por dez áreas, ou categorias: Atitude Básica, Grupo III – Sentimentos Expressos (traços
Figuras Significativas, Sentimentos Expressos, 12 a 14): 12. Sentimentos Derivados do Instin-
Tendências e Desejos, Impulsos, Ansiedades, to de Vida (ou de tipo construtivo: alegria,
Mecanismos de Defesa, Sintomas Expressos, amor, energia instintiva e sexual); 13. Sentimen-
Simbolismos e Outras Áreas da Experiência. tos Derivados do Instinto de Morte (ou de tipo
Tomando por base esse referencial, Tardivo destrutivo: ódio, raiva, inveja, ciúme persecu-
(1985) analisou 80 protocolos de crianças nor- tório); 14. Sentimentos Derivados do Conflito
mais, criando um outro referencial de análise. (sentimentos ambivalentes, que surgem da luta
Das dez áreas apresentadas, as sete primeiras entre os Instintos de Vida e de Morte, ou seja,
foram consideradas relevantes por Tardivo e sentimentos de culpa, medos de perda, de
denominadas Grupos. Estes foram numerados abandono, sentimentos de solidão, de triste-
de I a VII, reunindo cada qual certo número de za, de desproteção, ciúme depressivo e outros).
traços, num total de 33. Resumimos, em se- Grupo IV – Tendências e Desejos (traços 15
guida, esse referencial de análise. a 17): 15. Necessidades de Suprir Faltas Bási-
Grupo I – Atitude Básica (traços de 1 a 5): cas (as mais primárias, como desejo de prote-
1. Aceitação (estão incluídas, neste traço, as ção e abrigo, necessidades de compreensão,
necessidades e preocupações com aceitação, de ser contido, de ser cuidado com afeto, ne-
êxito, crescimento e as atitudes de segurança); cessidades orais, etc.); 16. Tendências Destru-
2. Oposição (atitudes de oposição, desprezo, tivas (as mais hostis, como desejo de vingan-
hostilidade, competição, negativismo, etc.); 3. ça, de atacar, de destruir, de separar os pais);
Insegurança (inclui as necessidades de prote- 17. Tendências Construtivas (as mais evoluídas,
ção, abrigo e ajuda, as atitudes de submissão, como necessidades de cura, de aquisição, de
inibição, isolamento e bloqueio e as atitudes realização e autonomia, de liberdade e cresci-
de insegurança); 4. Identificação Positiva (sen- mento).

432 JUREMA ALCIDES CUNHA


Grupo V – Impulsos (traços 18 e 19): 18. mília. Selma pretende se casar brevemente. Não
Amorosos; 19. Destrutivos. contou esse fato ao menino, porque teme uma
Grupo VI – Ansiedades (traços 20 e 21): 20. reação desfavorável da parte dele. Além disso,
Paranóides; 21. Depressivas. não sabe quem cuidará dele após seu casamen-
Grupo VII – Mecanismos de Defesa (traços to. A avó pensou em enviá-lo ao pai. A preocu-
22 a 33): 22. Cisão; 23. Projeção; 24. Repres- pação de Selma é grande, visto que são muito
são; 25. Negação/Anulação; 26. Repressão ou ligados entre si: o menino a espera todas as
Fixação a Estágios Primitivos; 27. Racionaliza- noites, antes de ela chegar do trabalho e do
ção; 28. Isolamento; 29. Deslocamento; 30. curso que faz. Quanto aos tios, é mais ligado a
Idealização; 31. Sublimação; 32. Formação Rea- um deles do que ao outro. Tem ciúmes quan-
tiva; 33. Negação Maníaca ou Onipotente. do a avó e a tia dão atenção a outras crianças.
Outros autores, também, propuseram re-
ferenciais de análise para o D-E. Em especial,
indicamos Castro (1990), Mázzaro (1984), Procedimento de Desenhos-Estórias
Mestriner (1982) e Paiva (1992). Além da orien-
tação psicanalítica, o D-E permite outros tipos Verbalização: “A menina foi para a casa dela.
de avaliação. Já tivemos oportunidade de ofe- Ela tava pensando: que casa pequenina, vou
recer exemplos de avaliação junguiana, beha- ficar logo nessa casa? Que raiva que tem essa
viorística e fenomenológico-existencial, consi- casa pequenina, minha mãe foi logo morar
derando-se um caso clínico (vide Tardivo, 1997). nessa casa? Queria morar no castelo, o castelo
é tão gostoso, já pensou se eu casasse com o
filho do príncipe? Nessa rua deserta não tem
ILUSTRAÇÃO CLÍNICA ninguém para brincar. Só brincar na rua, só
brincar na rua não adianta, nem tem jogo,
Fabiano tem sete anos de idade. Foi encami- porque não brinca com ninguém. Posso aca-
nhado pela professora da escola que freqüen- bar? Ai, tchau gente, vou para minha casa.
ta, porque, sem motivos aparentes, passou a Acabou”. (Psicólogo: Quem é menina?) “É uma
ir mal na escola, a não conseguir assimilar as menina, eu não sei o nome dela, não conheço,
lições. Até o meio do ano, ia bem, depois dei- vou inventar. Renata, eu acho que ela tá certa,
xou de aprender, tendo sido reprovado. Quem numa rua deserta não dá para brincar, o quin-
o trouxe à consulta foi Selma, uma tia paterna tal é pequeno, não tem muita flor, o castelo é
de Fabiano, que, juntamente com a avó pater- maior.” (Psicólogo: Aconteceu alguma coisa?)
na e dois outros tios, cuidam da criança desde “Um dia uma cobra já mordeu, ela tava assim
bebê. O pai mora em uma cidade distante, no
Nordeste, e vê o filho, no máximo, uma vez
por ano. Da mãe não se tem notícia, desde que
ela abandonou o lar, quando Fabiano era bebê.
Ao vir para a casa da avó e dos tios, o bebê
estava descuidado e muito doente. Desde cedo,
ele se afeiçoou aos parentes, especialmente a
Selma, que praticamente foi quem o criou. Ele
se mantém desligado do pai e da nova mulher
deste. Selma tem um namorado, e, por vezes,
Fabiano chama a ambos de mamãe e papai. A
criança é sustentada financeiramente por ela e
pelos dois tios. Sempre se sentiu bem na famí-
lia, que o ama.
Nas entrevistas, verificou-se que há um fa-
tor encoberto, escondido, de Fabiano pela fa- Figura 29.1.

PSICODIAGNÓSTICO – V 433
passeando nos matos, tropeçou na pedra e a de sol quente’. Eu coleciono borboletas”. (Psi-
cobra mordeu. Ela deu um grito, o pai dela veio, cólogo: Por que queriam ser gente?) “Porque
já tinha mordido, foi na esquina pegou um táxi, quando chovia elas não tinham lugar, elas caí-
foi para o Pronto-Socorro.” (Psicólogo: E de- am com as asas pesadas e os meninos que co-
pois?) “Vai dar uma tempestade, a casa dela lecionavam pegavam elas. Eu tenho uma bor-
vai cair, a mãe dela e ela vão morrer, menos o boleta tão bonita, mas por trás tá toda feia.
pai dela, porque a casa tá um pouco torta, por Quando tiver muitas eu jogo essa fora, vou fa-
isso que eu fiz torta.” (Psicólogo: E com o cas- zer umas árvores e colo as borboletas com cola
telo, o que aconteceu?) “Caiu os tijolos, o rei tenaz.” (Psicólogo: Como termina?) “Um dia
morreu, ficou o príncipe e o filho dele. O prín- as pedras começaram a rolar, mataram todas
cipe foi ser o rei, ele tinha muito dinheiro, as plantas, a semente caiu e nasceram outras.”
moravam cinco pessoas, o dinheiro era dele. O (Psicólogo: Vai acontecer mais alguma coisa?)
pai dele falava que quando ele morresse podia “Vai dar uma grande chuva, vai passar aqueles
fazer o que quisesse com o castelo, podia pe- ratos, e as plantas, as borboletas vão morrer,
gar empregada. Cinco empregadas. Aí ele pe- as águas vão levar as sementes para outro jar-
gou, fez outro castelo.” dim, vai ficar florido e esse vai ficar seco, me-
Título: A casa pequenina. nos a flor amarela porque ela tem semente.”
Interpretação: Oposição entre uma situação Título: Jardim florido.
favorável e outra desfavorável. Angústia de que Interpretação: Receios de perdas e de trans-
tenha de se haver com restrições e frustrações. formações ameaçadoras, destruidoras dos vín-
Mais ainda: angústia de ficar só. Receia passar culos amorosos. Por detrás da aparente segu-
por mudanças e sofrimentos traumáticos, com rança, esconde-se a angústia de abandono e o
perdas relacionadas à figura materna. medo de uma grande catástrofe. Insegurança
quanto à manutenção da própria identidade.

Figura 29.2.
Figura 29.3.

Verbalização: “Um jardim, aí as borboletas


falavam: bem que a gente podia ser gente, para Verbalização: “O que eu desenho?” (Psicó-
morar numa casa, gente bem bonita. Tinha logo: O que você quiser.) “Queria fazer uma
muitos rubim em ouro, mas mesmo assim a locomotiva.” Tenta fazer mas não consegue.
gente se transformava em borboleta para nin- Rabisca a folha, diz que errou, devolve o pa-
guém roubar. Acabou.” (Psicólogo: O que acon- pel.
teceu ao jardim?) “Um dia esse jardim ficou Verbalização: “Era uma vez um zoológico.
muito seco, faz de conta, porque era um dia Aí deu uma tempestade, os bichos entrou tudo
verão, ficou muito seco, queimava e a borbo- para a casinha. Aí o dono, a casa do dono caiu.
leta falava: ‘que pena que minha irmã morreu Era muito forte, o dono abandonou o zoológi-

434 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 29.3. Figura 29.4.

co. Tinha muitos animais, mas os animais foi cer mais alguma coisa?) “Vai dar uma chuva
jogado pela chuva. Tinha onça, tinha mais ca- bem forte e as plantas vão sair bem bonitas.”
melo, tinha jacaré, tinha patos, tinha mais pei- Título: Jardim horroroso. Deu uma risada,
xe, tinha um monte de jaula maior, assim com olhou para o psicólogo e disse: “Não tá feio
tubarão. Tinha tigre, tinha serpente, tinha mesmo? Não é melhor o título buquê horroro-
águia, tinha rinoceronte e tinha hipopótamo. so? Eu tou com uma preguiça de fazer dese-
Eu tenho um jogo de zoológico, com vários nho, não quero mais!”
bichos. Acabou. Só ficou esses bichos. Esse Interpretação: Apesar da angústia e da re-
zoológico era numa ilha que ninguém sabia sistência que a situação provoca, pela reitera-
onde ficava. Quando eu crescer, eu vou achar ção do tema principal da iminência de uma
ossos antigos nas cavernas. Assim, vou estu- catástrofe afetiva, ainda resta uma vaga espe-
dar muito, vou ser isso, vou viajar para Paris, rança de recomposição (“as plantas vão sair
para achar bichos antigos, ir no espaço.” (Psi- bem bonitas”).
cólogo: Vai acontecer alguma coisa?) “Não vai
acontecer, a tempestade já aconteceu. Eu vejo Discussões: A queixa escolar em relação a
muitos monstros em desenhos. Gosto do fil- Fabiano representa apenas o aspecto visível de
me de trem fantasma, assisto ‘Sexto Sentido’. um drama vivido inconscientemente por ele,
Eu queria ter 18 anos para assistir filmes de quando o ambiente familiar lhe esconde a
fantasma, de mistério.” ameaça de abandono e de subtração de víncu-
Interpretação: A reviravolta, que ele teme, los essenciais. Ele capta essa situação e a ex-
pode atingir as bases de sustentação de sua pressa claramente no Procedimento de De-
personalidade. Uma poderosa força destruido- senhos-Estórias. Permanece, porém, a ques-
ra ameaça levar tudo de roldão. Ele tem de tão de saber se a situação atual não corres-
buscar forças no fundo de si próprio para en- ponderia à reativação de um conflito primi-
frentar os males, que já aconteceram. Em face tivo, de natureza mais profunda, relacionado
dos medos pelos quais passa, gostaria de ser ao abandono.
adulto a fim de desvendar os mistérios que são
dele escondidos.
Verbalização: “O que eu vou desenhar?” Avaliação segundo o referencial de Tardivo
(Psicólogo: O que você quiser.) “Pode ser algo
simples?” (Psicólogo: Como quiser.) “Não te- Como Atitude Básica, há o predomínio da In-
nho mais vontade de desenhar.” Desenha ra- segurança, já que se evidencia a percepção que
pidamente. “Esse daqui não tem estória. Nes- Fabiano tem do mundo e de sua realidade atual
se jardim deu uma seca muito forte. As folhas como desproteção. Encontramos conteúdos de
entortaram todas. Só.” (Psicólogo: Vai aconte- abandono e perda em quatro unidades de pro-

PSICODIAGNÓSTICO – V 435
dução. Na terceira (que ele não conseguiu con- suas angústias primitivas. Poderá ser devolvi-
cluir), há um “trem que não pôde andar”. Pai e do a um pai que ele não conhece direito. A
Mãe surgem como Figuras Significativas, mas mãe que ele conhece, e que o criou, deverá se
não são capazes de oferecer contenção às an- casar, não pretendendo levá-lo consigo. Pelo
gústias de Fabiano. Ele sente que perde essas D-E, nota-se que Fabiano percebe, inconsci-
figuras, sendo abandonado por elas (na ter- entemente, essa situação e se vê muito amea-
ceira unidade, o dono abandona os animais). çado. São claros, também, seus pedidos de
Outras figuras (borboletas, na segunda unida- ajuda e proteção.
de) perdem-se e morrem. Em relação aos Sen-
timentos Expressos, temos a presença domi-
nante de sentimentos derivados do conflito, PROCEDIMENTO DE DESENHOS DE FAMÍLIA
embora estejam presentes, também, os deri- COM ESTÓRIAS (DF-E)
vados do Instinto de Vida. Há tentativas de rea-
lizar a construtividade (chuva para o jardim, o Desde 1978, tem sido divulgada uma técnica
castelo para morar), mas elas se mostram in- de investigação psicológica introduzida, tam-
suficientes e ineficazes. O que prevalece é a bém, por Trinca, W. (1989) e denominada Pro-
sensação geral de perda dos bons objetos: sen- cedimento de Desenhos de Família com Estó-
timentos de abandono e extrema desproteção. rias (abreviadamente, DF-E). Esse instrumento
O menino torna-se muito ameaçado por esses de avaliação se origina, igualmente, das técni-
sentimentos, mas vem se equilibrando. Pode cas gráficas e temáticas, sendo um desdobra-
não suportar e, então, corre o risco de desmo- mento relativamente recente da técnica de
ronamentos no self. Assim, no Grupo IV (Ten- desenhos de família (Trinca, W., et alii, 1991).
dências e Desejos), notamos o predomínio de Consiste na realização de uma série de quatro
Necessidades de Suprir Faltas Básicas. São cla- desenhos de família, na ordem corresponden-
ros seus pedidos de abrigo, proteção e a ne- te às seguintes instruções: 1) “Desenhe uma
cessidade de ser acolhido. Estão presentes os família qualquer”; 2) “Desenhe uma família que
Impulsos amorosos (nos pedidos de ajuda e você gostaria de ter”; 3) “Desenhe uma família
proteção), mas também os destrutivos (nas em que alguém não está bem”; 4) “Desenhe a
casas que caem, nos incêndios que queimam sua família”. Após a realização de cada dese-
os jardins e matam as borboletas). Parece que nho, é solicitado ao examinado que conte li-
sobressaem as Ansiedades Depressivas, mas vremente uma estória, tomando por base o
não se descartam, de modo algum, as Para- desenho. Faz-se, a seguir, o “inquérito” e, fi-
nóides. Fabiano refere-se aos monstros que nalmente, pede-se o título da produção. As-
gosta de ver, aos filmes de terror, aos trens fan- sim como o D-E, o DF-E é composto por unida-
tasmas, provavelmente como projeções de fi- des de produção gráfico-verbais, cada qual
guras ameaçadoras. Mas o que predomina, contendo desenho, estória, “inquérito” e títu-
acreditamos, são as intensas ansiedades de lo. A reiteração seqüencial de quatro unidades
perda, portanto, de natureza depressiva. Nos de produção, com a anotação completa das
Mecanismos de Defesa, há a dificuldade de reações do examinado, constitui a base da téc-
Fabiano poder utilizá-los eficazmente. Tenta se nica. Esse conjunto passa a ter características
controlar, mas está presente, sempre, o perigo unitárias e indivisas.
de cair, de ruir, de se desmoronar; e assim, fa- A administração é individual, podendo ser
lhando as defesas, o próprio self pode se des- aplicado indistintamente a ambos os sexos e a
moronar. todas as idades, quando o examinando conse-
O D-E foi bastante eficaz para fazer ressal- gue desenhar e verbalizar. As condições de
tar angústias que Fabiano vivencia nesse mo- aplicação e o material necessário são os mes-
mento de sua vida. Tendo sido já abandonado mos descritos para o Procedimento de Dese-
numa primeira vez, vê-se novamente ameaça- nhos-Estórias. Ou seja, há oferecimento de lá-
do de perder laços afetivos, sendo reeditadas pis preto e coloridos, livre utilização das cores,

436 JUREMA ALCIDES CUNHA


impedimento do uso de borracha e recomen- dências, necessidades e desejos; m) tonalida-
dação do retorno do examinando, caso não seja des das angústias e das fantasias inconscien-
possível a obtenção das quatro unidades em tes predominantes; n) características das for-
uma única sessão de aplicação. Informações ças de vida e de destrutividade; o) mecanis-
mais detalhadas encontram-se em Trinca, W. mos de defesa; p) fatores de aquisição da indi-
(1997). vidualidade e de integração do self; q) outras
O DF-E tem por finalidade a detecção de áreas de experiência emocional.
processos e conteúdos psíquicos de natureza Lima (1997c), por sua vez, acrescenta ou-
consciente e inconsciente, relacionados aos tros aspectos de avaliação, como, por exem-
objetos internos e externos que dizem respei- plo, o modo pelo qual o examinando concei-
to à dinâmica da família. É empregado com tua a família, o valor atribuído a esta no con-
vistas a ampliar o conhecimento das relações texto de vida, a vivência das funções paren-
intrapsíquicas e intrafamiliares do examinan- tais, o grau de maturidade do examinando em
do. Por isso, espera-se que sejam postos em relação às figuras parentais, as expectativas
evidência, relativamente a essas relações, con- sobre cada membro do grupo familiar, o grau
flitos psíquicos, fantasias inconscientes, angús- de contato do examinando em relação a si
tias atuais e pregressas, defesas e outros mo- mesmo e aos membros da família, a relação
vimentos das forças emocionais. Sua aplicação entre os sintomas e a dinâmica familiar, etc.
é recomendada quando o profissional percebe O DF-E tem se verificado eficaz no diagnós-
ou intui que as dificuldades emocionais têm tico individual e de casal, na utilização cruza-
relação com conflitos e fatores familiares pre- da entre a criança e os pais e na avaliação da
sentes no mundo interno e/ou no mundo ex- dinâmica da família como um todo. Além dis-
terno do examinando. so, é empregado com sucesso nos processos
A fundamentação do Procedimento de De- de psicoterapia de casal e de família.
senhos de Família com Estórias sustenta-se,
mutatis mutandis, nos pressupostos que ser-
vem de base para o Procedimento de Desenhos- PROCEDIMENTO DE DESENHOS-ESTÓRIAS
Estórias. Em particular, funda-se em conheci- COM TEMA
mentos sobre a dinâmica inconsciente da per-
sonalidade, a regra da associação livre, a dinâ- Trata-se de uma extensão do D-E para estudos
mica da família, os princípios gerais das técni- específicos de determinados temas, propostos
cas projetivas, os princípios de condução das de maneira explícita. O examinando é convi-
entrevistas clínicas não-estruturadas e semi- dado a desenhar algum tema, que o examina-
estruturadas, etc. dor indica de antemão. Depois, pede-se que
Para um roteiro de avaliação, Trinca, W conte uma estória associada livremente ao de-
(1997) sugere alguns itens: a) características senho. Seguem-se as mesmas recomendações
peculiares das figuras paterna e/ou materna; que se fazem para a aplicação do D-E comum,
b) tipos de vínculo e formas de interação com ou seja, mantém-se o “inquérito”, o título, as
as figuras parentais; c) trocas sexuais e afeti- cinco unidades de produção, a oportunidade
vas entre as figuras parentais; d) relacionamen- do uso das cores, etc. Há grandes benefícios
tos com figuras fraternas e outras figuras do na utilização do D-E temático, quando o set-
meio familiar; e) determinantes da estrutura e ting, por si só, não ofereça indicações a respei-
da dinâmica familiar; f) forças psicopatológi- to da estruturação da tarefa, e o examinando
cas e psicopatogênicas existentes na família; tenha dúvidas sobre o que se espera de suas
g) eventos familiares reveladores de conflitos realizações.
e dificuldades; h) pontos centralizados de con- Tem-se verificado que essa forma de apre-
flitos e dificuldades no examinando; i) descri- sentação do D-E é válida para a pesquisa, para
ção que o examinando faz de si próprio; j) ati- as práticas na escola, na empresa, em institui-
tudes para com a vida e a sociedade; l) ten- ções públicas, etc. Possui sobre o D-E comum

PSICODIAGNÓSTICO – V 437
a vantagem de poder ser facilmente aplicado, diagnóstico breve, pode ser comodamente
também de modo coletivo. Aiello-Vaisberg associada às entrevistas não-estruturadas. No
(1997) diz que o D-E com Tema é uma alterna- caso do exame epidemiológico das popula-
tiva fecunda para pesquisa da representação ções carentes, seu valor é inestimável. Além
social. Ela costuma fazer a aplicação em gru- disso, trata-se de um tipo de exame que tem
po, pedindo aos sujeitos para criar uma estó- sido descrito como altamente motivador para
ria, que eles mesmos registram no verso da os seus participantes. Pela liberdade e espon-
folha desenhada. A técnica permite, assim, o taneidade de sua penetração psíquica, opõe-
estudo de temas, como o doente mental, o se aos métodos invasivos e insere-se no espí-
deficiente físico, a situação escolar, a pessoa rito de uma nova forma de se conceber a ciên-
gorda, o hospital, a casa, a velhice, a equipe cia (por contraste com a ciência dita “clássi-
de trabalho, etc. ca”).
A validação dessa técnica tem sido perse-
guida com afinco, seja pelo método estatístico
CONSIDERAÇÕES FINAIS (vide Mestriner, 1982), seja pelo método clíni-
co (vide Amiralian, 1997). Como não dispomos
Temos, assim, uma técnica de investigação de espaço suficiente para descrever os estudos
da personalidade que permite um amplo le- de validação já realizados, remetemos o leitor
que de possibilidades de uso. Em relação a aos trabalhos dessas autoras, que fizeram re-
muitas outras técnicas, é de fácil manejo, e sumos detalhados dos mesmos, bem como à
os custos são baixos. Para a realização do bibliografia sobre o assunto.

438 JUREMA ALCIDES CUNHA


MÓDULO XI – Inventário Multifásico Minnesota de Personalidade

Administração e orientação geral


para o manejo do MMPI
Jurema Alcides Cunha
30
Problemas na administração sujeitos, como a impressão do caderno ade-
quada a pessoas com déficits de visão e a ver-
A versão mais conhecida e mais usada do MMPI são em braille. Ainda é possível a versão oral,
é a do caderno. Criada originalmente para uso sendo os itens gravados e a resposta indicada
com grupos, o fato de ser auto-administrada por cartões em pilhas de “Certo” e “Errado”.
permite sua utilização tanto na forma coletiva De qualquer modo e em qualquer caso, o
como individual. importante é que o sujeito seja capaz de com-
Em princípio, qualquer pessoa, com 16 anos preender os procedimentos do teste e de res-
ou mais e escolaridade equivalente ao ensino ponder adequadamente. Às vezes, o próprio
fundamental, pode ser testada. Eventualmente, preenchimento dos dados de identificação já é
é possível a administração com adolescentes de uma referência para uma dificuldade óbvia de
menos idade e, até, com crianças inteligentes de compreensão. Já na forma individual, se o exa-
cerca de doze anos, desde que o sujeito seja minador ainda não chegou a uma conclusão,
capaz de ler e compreender os itens – o que através da realização de outros testes, sobre a
supõe um campo vasto de interesse e certo competência do sujeito, convém que, após as
grau de cultura geral – e persistência suficien- instruções, acompanhe o sujeito durante os
te para levar a cabo a tarefa. Cabe lembrar, en- primeiros itens, fazendo-o lê-los em voz alta,
tretanto, que não há normas brasileiras para antes de assinalar a resposta. Neste procedi-
essas faixas etárias. Por outro lado, não se re- mento, o examinador pode inclusive discuti-
comenda a administração em sujeitos cujo QI los, para examinar o raciocínio subjacente. Na
seja inferior a 80, a não ser com muita supervi- versão em português, observa-se, às vezes, uma
são, que envolve, às vezes, a necessidade de for- dificuldade, em sujeitos sem muita escolarida-
necer algumas definições comuns de dicionário de ou pouco afeitos a este tipo de questioná-
sobre certos termos (Dahlstrom, Welsh & rio, na resposta a itens redigidos na forma ne-
Dahlstrom, 1972). Não obstante, a falta aparen- gativa, precedidos por vários itens na forma
te de cooperação muitas vezes não interfere na afirmativa. Por exemplo, se o sujeito, ante itens
validade dos resultados, como no caso de certos como “Sou acordado facilmente por ruídos”,
pacientes internados em hospitais psiquiátricos. raciocina assim – “Eu não me acordo facilmen-
Autores têm sugerido algumas modifica- te por ruídos. Está errado, não se aplica a mim”
ções no sentido de superar as dificuldades dos –, ao chegar a um item como “Não leio, diaria-

PSICODIAGNÓSTICO – V 439
mente, todos os editoriais dos jornais”, persis- jovens podem ser encorajados a responder
te no mesmo raciocínio – “Eu não leio, diaria- como se a referência fosse ao presente.
mente, todos os editoriais dos jornais, está er- No caso de o sujeito ter passado recente-
rado, não se aplica a mim” – e assinala uma mente por uma situação estressante ou ter sido
resposta incorreta. Por um problema talvez de internado num hospital, surge a pergunta sobre
atenção, como que persevera no mesmo ra- se a resposta deve se referir a como se sentia
ciocínio dos itens anteriores. Convém, então, antes ou depois do acontecimento. Em tal caso,
depois de acompanhar seu raciocínio nos pri- a recomendação é de que responda de acordo
meiros itens, tomar uns dois exemplos, inicia- com suas reações e sentimentos atuais. Porém,
dos pela palavra “Não” ou “Nunca” e ver como em casos em que não é referido um fator bas-
responde. É quase desnecessário dizer que, tante estressante, mas simplesmente circuns-
para tal fim, devem ser usados itens sem ne- tâncias de vida, o sujeito deve responder de
nhum conteúdo perturbador, ou, melhor ain- acordo com o que a ele se aplica na maior par-
da, exemplos inócuos não constantes no ca- te do tempo ou na maioria das vezes.
derno. Uma vez que há interesse em manter num
Groth-Marnat (1999) aconselha que, além mínimo os itens não respondidos, recomenda-
das instruções-padrão, sejam fornecidos alguns se que, antes de o sujeito sair, o examinador
esclarecimentos sobre o motivo da testagem e examine a folha de respostas, e, quando há
o uso previsto dos dados. Lembra que parece muitos itens cuja resposta foi omitida, deve-se
conveniente informar que o instrumento per- solicitar-lhe que reconsidere tais itens e tente
mite “determinar se a pessoa está se apresen- respondê-los. Em nossa experiência, preferimos
tando de uma maneira irrealisticamente posi- salientar a importância de dar alguma respos-
tiva ou exageradamente perturbada” (p.270), ta a cada item, mas sugerindo que, no caso de
sugerindo ao examinando que procure ser sin- parecer difícil responder, assinale o item na
cero e claro. Além disso, convém acrescentar folha de respostas com uma cruz ou círculo em
que certos itens parecerão um tanto inusita- torno do número, seguindo adiante. Após o
dos, porque o teste foi feito para avaliar sujei- término, pede-se ao sujeito que diga quais fo-
tos com personalidade e problemáticas muito ram as dificuldades. Geralmente, essas não são
variadas. Conseqüentemente, havendo itens diversas das já citadas anteriormente, de ma-
que não se aplicam, é só assinalar a alternativa neira que facilmente o sujeito é levado a re-
adequada. Tais considerações, em sua opinião, considerar os itens e a respondê-los. Este pro-
geralmente deixam a pessoa mais à vontade e cedimento oferece a oportunidade de o exa-
pronta para colaborar, embora, às vezes, sur- minador indicar tais itens que, muitas vezes,
jam perguntas. Mas, geralmente, quando os não são respondidos, pelo seu conteúdo
sujeitos são de inteligência aproximadamente perturbador. Naturalmente, o número de itens
média, não aparecem dificuldades, e, se há deixados para posterior reconsideração será
dúvidas sobre certos termos, eles devem ser menor, se previamente se disser ao sujeito que
estimulados a interpretá-los. não necessita ponderar sobre uma possível res-
Em nossa própria experiência, e também posta e que é desejável que responda confor-
conforme observação dos autores citados, sur- me sua primeira impressão. Apesar disso, sem-
gem às vezes perguntas sobre itens formula- pre é conveniente que se forneça ao sujeito um
dos no passado (p.ex.: “Meu pai foi um bom lápis, e não uma caneta, para que possa modi-
homem”), especialmente entre sujeitos jovens, ficar uma resposta, no caso de desejar fazê-lo
que se confundem, por acharem que a afirma- ou de se enganar. Ao se fornecer uma borra-
ção no passado implica a falta de continuida- cha, deve-se recomendar que apague bem a
de até o presente. Os autores sugerem que se resposta não desejada, salientando que, como
responda que o teste foi elaborado para todos o levantamento das respostas é feito através
os tipos de pessoas e que tal formulação seria de chaves ou crivos, as marcas que podem fi-
adequada para a maioria delas, mas os mais car podem alterar os resultados. Tal observa-

440 JUREMA ALCIDES CUNHA


ção casual também pretende deixar o sujeito prontos a interferirem no caso de surgirem rea-
mais à vontade, em relação a itens cuja res- ções, que podem se tornar contagiosas, como
posta pode achar muito comprometedora. risadinhas, arrastar os pés, suspiros, etc.
Dahlstrom e colegas (1972) fazem uma sé-
rie de recomendações para a administração em
grupos, das quais as mais importantes pare- ORIENTAÇÃO GERAL PARA O MANEJO
cem ser as seguintes: CLÍNICO
1 – O examinador deve estar previamente
familiarizado, não só com o material e as ins- Os passos atualmente recomendados para che-
truções, como com os problemas que a gar à interpretação do MMPI-2 e MMPI-A, de
testagem em grupo envolve e com as condi- um modo geral e até certo ponto, podem (com
ções que o local de testagem deve ter (ilumi- alguma adaptação) se aplicar ao manejo do
nação, ventilação, etc.). MMPI, embora esses inventários mais recentes
2 – Sempre que possível, deveria saber que apresentem mais recursos numa avaliação psi-
atividades são previstas para os sujeitos antes cológica. Assim, neste capítulo, discutiremos
da testagem, uma vez que fadiga, tensão, ex- os passos a serem seguidos, para, posterior-
citação, etc. podem interferir no interesse e na mente, analisar as escalas.
sua eficiência, durante a mesma.
3 – Os cadernos devem ser sempre previa- Passo 1: Verifique o tempo requerido para
mente examinados, uma vez que alguns sujei- completar as respostas
tos ocasionalmente neles escrevem comentá-
rios ou as próprias respostas. Antes do levantamento dos escores, Groth-
4 – A sessão deve ser iniciada com uma bre- Marnat (1999) recomenda que se verifique o
ve informação sobre o que será feito e com tempo que o sujeito levou para completar a
que propósito. Também os sujeitos devem ser tarefa, que usualmente é de 60 a 75 minutos.
informados sobre a duração aproximada e se Se esse tempo ultrapassar duas horas, pode ter
podem deixar a sala, ao terminarem, bem como havido dificuldades de compreensão, por pro-
a maneira de entregar o material. O examina- blemas de leitura ou de ordem intelectual, pode
dor deve falar de forma amigável e interessa- se tratar de patologia mais severa, especialmen-
da, de forma a dar aos sujeitos a impressão de te de tipo depressivo, ou de psicose funcional.
que o teste é importante, interessante e que Ainda, uma possibilidade a ser descartada é a
vale a pena ser levado a sério. É essencial que de comprometimento cerebral. Por outro lado,
se faça a recomendação de que os sujeitos res- se o tempo for rápido, de menos de uma hora,
pondam a todos os itens possíveis, apesar de a pode haver uma invalidação do perfil ou se tra-
mesma constar no caderno. tar de uma personalidade impulsiva.
5 – No caso de o número de testandos ser Também é aconselhável que se examine a
pequeno, o próprio examinador é suficiente folha de respostas. No caso de se observar al-
para controlar problemas que podem surgir. guns sinais de rasura ou marcas de lápis, é pro-
Em caso de grandes grupos, o examinador ne- vável que a tarefa tenha sido assumida com
cessitará de um assistente para cada grupo de seriedade, o que geralmente resulta num per-
vinte a vinte e cinco testandos. O assistente de- fil válido. Não obstante, a abundância de tais
verá observar que sujeitos estão assinalando mal sinais sugere aspectos obsessivo-compulsivos.
suas respostas, que estão “colando” ou mostran-
do falta de persistência, mas não deve ficar de-
masiadamente próximo de alguém, de forma a Passo 2: Atribua o escore bruto,
parecer que está interessado em respostas espe- transforme em escore T e trace o perfil
cíficas. Os assistentes devem manter uma atitu-
de mais profissional, sem conversarem entre si. Previamente à atribuição de escore, verifique
Devem manter uma atmosfera de seriedade, se houve algum problema na administração

PSICODIAGNÓSTICO – V 441
que ainda seja sanável (caso não o tenha feito K a ser acrescentada às escalas Hs, Pd, Pt, Sc e
no fim da sessão de testagem), como itens não- Ma. A escala K é composta de itens com base
respondidos (para verificar a importância da na comparação entre respostas de sujeitos
questão, consulte o item sobre a Escala “Não normais, mas cujos perfis se apresentaram
posso dizer” ou “?”). menos desviantes do que seria esperado, em
Prossiga, agora, realizando a atribuição de vista de uma atitude defensiva. Serve, pois, para
escores e transformação em escores T, através a correção estatística das escalas clínicas, res-
das seguintes etapas: saltando os indícios diagnósticos do perfil. To-
1 – No caso de aplicação coletiva, o primei- davia, apesar de considerável justificativa exis-
ro passo é separar os protocolos por sexo, já tente na literatura para o uso das correções K,
que a escala Mf (5) tem chaves diferentes para as características que representa (defensividade
homens e mulheres, e, também, para facilitar e exibicionismo psicológico) podem estar pre-
a consulta posterior às tabelas, ao transformar sentes em diferentes graus e freqüências em
os escores brutos em escores T. grupos diferentes, pelo que se recomenda le-
2 – A contagem de pontos das escalas é feita vantar o perfil com e sem correções K
por meio de chaves, exceto no caso das esca- (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.65-
las “?” e “L”, em que a contagem é direta. 66).
2.1 – Para a contagem de pontos da escala Para efetuar a correção K, veja qual o es-
“?”, marque com um lápis vermelho todas as core bruto de K e consulte a Tabela III do
respostas omitidas ou duplas, cuja soma cons- Manual (Hathaway & McKinley, 1971, p.15),
titui o escore bruto nesta escala e deve ser re- para ver as frações correspondentes de K a
gistrado, no lugar correspondente. A marca serem acrescentadas na escala Hs (0,5), na
em vermelho deve cobrir os dois espaços do Pd (0,4), na Ma (0,2), sendo que, para as es-
item (Certo e Errado), para ficarem identifica- calas Pt e Sc, acrescenta-se o total do escore
das principalmente as respostas duplas, que bruto de K. Registre abaixo do resultado bru-
não devem ser contadas quando forem usa- to, na folha de apuração, as correções de K
das as chaves. (K a acrescentar), efetuando a soma (Resul-
2.2 – A seguir, obtém-se o escore de “L”. O tado com K).
escore bruto de “L” é constituído simplesmen- 3 – Consulte, agora, a Tabela XII do Manual
te pela soma dos itens marcados como “Erra- (p.42-65), para transformar os escores brutos
do”, entre os seguintes: 15, 45, 75, 105, 135, com K em escores T. Na Tabela XIII do mesmo
165, 195, 225, 255, 285, 30, 60, 90,120 e 150. Manual (p.46-67), encontram-se os escores T
Observe onde estão colocados na folha de res- para as escalas Hs, Pd, Pt, Sc e Ma, sem o acrés-
postas. cimo de K. Observe que as escalas clínicas apre-
3 – Para todos os outros escores brutos, as sentam escores T diferentes para os sexos mas-
chaves devem ser colocadas adequadamente culino e feminino. Registre os escores T, na fo-
sobre a folha de respostas, e os espaços que lha de apuração, como resultado ponderado
aparecem, assinalados a lápis pelo examinan- (com K e sem K).
do, devem ser contados. Some os totais, e, 4 – Localize onde deve marcar os escores T
como nas escalas anteriores, o escore bruto na folha de apuração. Una, com uma linha, os
deve ser registrado no lugar adequado. No caso pontos referentes às escalas de validade (?, L,
de aplicação individual, lembre que, na escala K e F) e una, com uma linha, os pontos refe-
Mf (5), há chaves diferentes para cada sexo. rentes às escalas clínicas (Hs, D, Hy, Pd, Mf, Pa,
A seguir, para levantar o perfil, observe os Pt, Sc, Ma, Si). Está traçado o perfil. Se desejar,
seguintes passos: também, traçar o perfil sem K, faça-o com uma
1 – Transporte os escores brutos ou resulta- linha interrompida.
dos brutos para a folha de apuração. Dependendo da história clínica e do qua-
2 – Transcritos os escores brutos, o próxi- dro sintomático, atribua escore também a ou-
mo passo é verificar a quantidade de correção tras escalas (sutis, de conteúdo, suplementa-

442 JUREMA ALCIDES CUNHA


res), que lhe sejam acessíveis* e que possam quanto a significação de um escore T abaixo
fornecer mais subsídios sobre o caso. Identifi- de 30 (dois desvios padrão abaixo da média)
que, também, itens críticos assinalados (vide não parecia muito clara. O perfil traçado entre
Itens críticos), procurando, sempre que possí- os dois pontos críticos seria considerado apa-
vel, discuti-los com o examinando, para ava- rentemente normal, porque recairia na zona
liar o sentido que ele lhes atribuiu. normal. Estudos posteriores têm tentado en-
contrar a significação clínica também para va-
lores T baixos, e, por outro lado, a zona nor-
Passo 3: Procure entender o perfil e codifi- mal ficou em geral caracterizada como com-
que o caso posta daqueles escores entre 54 e 46.
Ainda que pareça existir uma relação entre
Descrição do perfil a elevação do perfil e psicopatologia, esta não
é uma relação simples, porque devem ser con-
Os grupos de referência para a construção das siderados outros atributos do perfil, conheci-
escalas incluíram pacientes psiquiátricos e su- dos como características da fase. Estas incluem
jeitos normais, que serviram como grupo de elevações isoladas, únicas, denominadas
controle. Os itens de cada escala foram seleci- spikes, e os platôs. Observe as figuras 30.1,
onados com base na existência de diferenças 30.2 e 30.3. Na Figura 30.1, verifica-se um
estatisticamente significantes entre tais grupos, spike, por uma elevação acentuada em uma
portanto, com um sentido bimodal. A partir única escala 3 (Hy), que será discutida pos-
da média e do desvio padrão, baseados nos teriormente.
dados da amostra normal, foram estabelecidos Os platôs caracterizam-se por elevações de
os escores T. “O escore bruto médio de cada es- duas, três ou quatro escalas. Na Figura 30.2,
cala é convertido num escore T de 50 e seu des- observam-se elevações simultâneas nas esca-
vio padrão num intervalo de escore T de dez pon- las 1 (Hs), 2 (D) e 3 (Hy), configuração que foi
tos” (Pope & Scott, 1967, p.90). Desta maneira, chamada de tríade neurótica. Na Figura 30.3,
o procedimento adotado torna o instrumento observa-se um platô, formado por elevações
pouco adequado para a sua utilização com pes- simultâneas nas escalas 7 (Pt), 8 (Sc) e 9 (Ma),
soas normais. Por outro lado, os escores eleva- numa configuração denominada tríade
dos permitem inferências mais confiáveis que os psicótica. Na realidade, as quatro escalas clíni-
escores moderados (Groth-Marnat, 1999). cas finais – 6 (Pa), 7 (Pt), 8 (Sc) e 9 (Ma) – são
Procure entender, então, o perfil. A linha
correspondente aos escore T 50 corresponde a
um escore bruto médio. Cada linha para cima 1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
120
e para baixo corresponde a intervalos de des- 110
vio em relação à média. Observe que as linhas 100

correspondentes ao escore T 70 e 30 foram 90

duplicadas. Representam um afastamento de 80

dois desvios padrão da média e são considera- 70

dos pontos críticos. Nos estudos iniciais com o 60

MMPI, todos os escores T que recaíam acima 50

40
de 70 (dois DP acima da média) foram consi-
30
derados como indicativos de patologia, en-
20

10

? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si
*A abrangência deste livro permite incluir apenas algu-
mas escalas mais comumente usadas, dentre a imensa
Fonte: Pope & Scott, 1967, p.102
variedade existente. Caso seja de seu interesse, procu-
re em outras obras, dentre as quais indicamos a de Levitt Figura 30.1 Perfil do MMPI com elevação em spike (his-
e Gotts, constante nas referências bibliográficas. teria).

PSICODIAGNÓSTICO – V 443
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
120 ou três dígitos, que representam configurações
110 clínicas do perfil.
100
Por outro lado, há configurações que são
90
consideradas típicas, como o “V da conversão”,
80
que se observa do lado esquerdo da Figura 30.3
70
(escala 2 com uma diferença de 10 pontos das
60

50
escalas 1 e 3), melhor descrito no código 13
40
ou 31.
30

20

10 Codificação
? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si

Figura 30.2 Perfil do MMPI com elevação nas escalas


A partir dos exemplos das Figuras 30.1, 30.2 e
Hs, D e Hy (tríade neurótica). Código 13. 30.3, pode-se introduzir a idéia de padrão, em
que as escalas não são consideradas individu-
almente, mas se leva em conta a forma singu-
120
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0 lar como fica delineado todo o conjunto de
110
escalas, não somente clínicas, mas também de
100 validade. Pode-se falar na forma singular que
90 assume o padrão, uma vez que os padrões
80 podem variar indefinidamente, praticamente
70 sem repetições. Exatamente para que se possa
60
lidar com tal variabilidade, foi aplicado um sis-
50
tema de codificação, “que reduz o número
40
possível de diferentes perfis a uma quantidade
30
mais praticável” (Dahlstrom, Welsh &
20

10
Dahlstrom, 1972, p.70).
O procedimento para codificação, confor-
? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si
me os autores do MMPI, o chamado Código
Figura 30.3 Perfil do MMPI com elevação psicótica. Hathaway, envolve os seguintes passos:
Código 89.
1 – Em primeiro lugar, atribua um número
a cada escala clínica, tal como foram identifi-
cadas, acima do diagrama, nas Figuras 30.1,
extremamente importantes no sentido 30.2 e 30.3. Assim, a escala Hs fica designada
psicopatológico, constituindo a tétrade como 1, a D se torna 2, a Hy, 3 e assim por
psicótica, freqüentemente associada, ainda, diante, até a Ma, como 9. A escala Si, quando
com uma elevação na escala 2 (D). Aliás, “na incluída, é identificada como 0. A numeração
interpretação do MMPI, os dois atributos bási- das escalas, além de fundamental para a codi-
cos do perfil, elevação e características da fase, ficação, é usada rotineiramente por muitos
interagem” (Pope & Scott, 1967, p.97). profissionais, para evitar falsas implicações
No desenvolvimento de estudos com o psiquiátricas da identificação tradicional das
MMPI, houve uma tendência para facilitar o escalas, já que elas correspondem apenas a
manejo dos dados através de uma codificação “conjuntos de variáveis de personalidade”
do perfil. Justamente a idéia da existência de (Groth-Marnat, 1999, p.207).
uma inter-relação entre as escalas e, conse- 2 – Escreva o número da escala com escore
qüentemente, de uma inter-relação entre os T mais elevado e, em ordem decrescente, os
atributos do perfil, parece estar subjacente ao seguintes, cujo escore T esteja acima de 54.
sistema de codificação. Alguns são extensos e 3 – Coloque um ! ou ‘ (plica) após o último
complexos, enquanto outros usam apenas dois número, na codificação, cujo T seja igual ou

444 JUREMA ALCIDES CUNHA


maior que 70. Por exemplo, no caso do padrão 7 – À direita do código, devem ser escritos
da Figura 30.3, ter-se-ia 132’47 (elevação com os escores brutos de L, F e K, nesta ordem, e
uma plica). Não obstante, alguns autores separados entre si por dois pontos. Entretan-
acham importante assinalar os escores T com to, se o escore bruto de L for igual ou maior
valor igual ou maior que 80 com duas plicas, e que 10 e se o escore bruto de F for igual ou
aqueles com valor igual ou maior que 90, com maior que 16, registra-se um X (maiúsculo) logo
três plicas, para indicar quantos desvios padrão após o código das escalas clínicas, que é uma
a escala está acima da média. Na tradução em indicação de que há possibilidade do perfil não
português, é usado o sinal !, e não a plica. En- ser válido.
tão, no exemplo citado, teríamos 1!!3!2!47. O Código Hathaway foi examinado aqui
Estes números representam os pontos altos do com mais detalhes, não só por ser o sistema
perfil. originalmente desenvolvido, como por ser útil
4 – Sublinhe todos os números adjacentes, na consulta a certas obras clássicas, como no
cujo escore T seja igual ou apenas com a dife- manejo de alguns atlas, para uso clínico. Serve
rença de um ponto. No exemplo da Figura 30- como um referencial para exame de casos com
3, teríamos 89!!7!645213*. No caso em que a padrões MMPI semelhantes ao que está sendo
escala 9 tivesse um escore um ponto acima do considerado pelo clínico. Todavia, existe outro
escore da escala 8, o código seria sistema de codificação, de Welsh, mais exten-
98!!7!645213*. Quando duas ou mais escalas so do que o de Hathaway, cujo procedimento
têm o mesmo escore T, o código convencional- é um tanto diverso. Parece importante, para
mente segue uma seqüência ordinal, muito quem trabalha com o MMPI, estar familiariza-
embora o fato de serem os números sublinha- do com a notação de ambos os sistemas, por-
dos signifique que não são diferentes quanto que parte do material bibliográfico se baseia
ao seu valor. Por outro lado, os números à di- em um ou outro, e, ultimamente, há trabalhos
reita do 7, que é assinalado com um !, repre- que são publicados nos dois sistemas. Assim,
sentam, em ordem decrescente, as escalas com transcrevemos no Quadro 30.1 um sumário,
valor T entre 70 e 54. que permite comparar ambos os sistemas de
5 – Lembre que os valores entre 54 e 46 codificação.
representam a zona normal. Os escores entre Torna-se fácil, agora, seguir os passos do
tais valores T não são incluídos no código. Co- método ampliado de codificação de Welsh. Da
loque um hífen após o último número escrito, mesma maneira que fazem os autores citados
que caracteriza essa separação entre os pon- (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972), vamos
tos altos do perfil, que ficam à esquerda, e os fazê-lo, através de exemplos:
pontos baixos, que ficarão à direita do mes-
mo.
6 – Após o hífen, escreva o número da es- Escala Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma
cala menor, entre os valores T abaixo de 46; a
seguir, escreva os números das outras escalas Código 1 2 3 4 5 6 7 8 9
que tenham escores T entre este e 46, em or-
dem crescente. Siga a regra anterior de subli- Escore T 59 94 52 43 61 32 87 76 28
nhar os números adjacentes iguais ou com
apenas um de diferença. Esses números escri-
tos são os pontos baixos do perfil. Igualmen- 1 – Primeiramente, registre o número das
te, há autores que costumam assinalar (!) os escalas, do escore T mais alto ao mais baixo. A
valores abaixo de 40. seqüência será a seguinte: 278513469.
2 – A seguir, tome como referência as oito
classes-padrão do quadro anterior. Cada clas-
*Atualmente, há alguns autores que excluem também
a escala 5, além da escala 0 do código, por não consti-
se em que recai um escore T será assinalada,
tuírem especificamente escalas clínicas. no código, por um sinal gráfico, assim:

PSICODIAGNÓSTICO – V 445
QUADRO 30.1 Sumário e comparação do método de codificação original (Hathaway) e o método de
codificação ampliado (Welsh)
Item Método de Hathaway Método de Welsh
Comprimento do Variável: desde nenhum, até dez dígitos. Constante: Sempre dez dígitos (se todas
código as escalas são usadas).
Código sem todas as Pode ser impossível dizer se uma certa Se uma escala (como a 5, que não foi
escalas escala foi usada ou se simplesmente está usada no Atlas, ou a 0, que não tem escore
no intervalo não codificado, do escore atribuído rotineiramente por todos) não
T 46 a 54. está no perfil, isto fica imediatamente
aparente no código.
Ordem do código Variável e inconsistente: Constante: Sempre do mais alto ao mais
1. Do mais alto ao mais baixo, acima do baixo, numa seqüência natural, por toda a
T=54. série de escores.
2. Escores entre T=46 e T=54 não
codificados.
3. Do mais baixo ao mais alto para escores
abaixo do T = 46.
Posição da escala Variável ou indeterminada: Constante: Sempre o primeiro dígito do
mais alta 1. Será o primeiro dígito, se o escore T está código.
acima de 54.
2. Se recai no intervalo de escore T, entre
46 e 54, e todas as outras escalas também
recaem nesse intervalo, a escala alta não
pode ser determinada.
3. Se a escala mais alta está abaixo de 46,
será o último dígito no código.
Posição da escala Variável ou indeterminada: Constante: Sempre o último dígito no
mais baixa 1. Será o último dígito, se todos os escores código (cada vez mais importante, desde
T no perfil estão acima de 54. que foi iniciado o trabalho com pontos
2. Será o primeiro dígito, se todas as baixos, p.ex., Cantor, 1952, e Sulton, 1952).
escalas do perfil estão abaixo de 46.
3. Se recai no intervalo de escore T, entre
46 e 54, e todas as outras escalas também
recaem neste intervalo, a escala baixa não
pode ser determinada.
4. Será o último dígito, se duas escalas
estão abaixo de 46, etc.
Indicação da Quatro classes originais:
elevação 1. ≥ 70 Oito classes-padrão:
2. 55-69 1. ≥ 90
3. 46-54 2. 8-89
4. < 46 3. 70-79
4. 60-69
5. 50-59
6. 40-49
7. 30-49
8. < 30
Reprodutibilidade É possível apenas a reconstrução grosseira Todos os perfis com escores entre 20 e 29
do perfil a partir do da maioria dos perfis; alguns não podem podem ser reproduzidos absolutamente,
código ser reproduzidos absolutamente. com uma precisão de cinco pontos de
escore T; habitualmente, é obtida uma
precisão de dois pontos.
Fonte: Welsh, 1963, p.131-132.

446 JUREMA ALCIDES CUNHA


Classe-padrão Sinal gráfico Uso do código
≥ 90 *
80-89 ‘’ Em primeiro lugar, a codificação dos casos per-
70-79 ‘ mite um armazenamento de dados de pacien-
60-69 - tes, de acordo com suas características domi-
50-59 / nantes (pontos altos ou pontos baixos), que
40-49 : facilita a localização de perfis similares. O ar-
30-39 = quivamento de fichas ou digitação em banco de
dados de cada paciente com seu respectivo có-
3 – O sinal gráfico é colocado logo após a digo, dados de identificação e diagnóstico é um
escala que recai na citada classe-padrão. O có- recurso aconselhável para clínicas e serviços, não
digo fica, então, assim expresso: 2*7'’8'5-13/ só para um levantamento de características de
4:6=9* . uma população atendida, como rápida referên-
4 – Vejamos, agora, como registrar as esca- cia para comparação com um caso em questão.
las de validade. Suponhamos que tenham os Os casos geralmente são descritos usando
seguintes escores: como referência códigos de dois ou três pon-
Escala ? L F K tos, embora, para discussão, sejam considera-
Escore T 60 51 45 72 das outras elevações ou quedas de perfil.
A significação de códigos de dois pontos é
Tomam-se novamente as classes-padrão encontrada neste e em outros livros de textos
como referência e tem-se K’?-L/F. específicos. Baseia-se em pesquisas realizadas
5 – Como no sistema de Hathaway, os es- e não tem que ver com as categorias diagnós-
cores T iguais ou com um ponto de diferença ticas tradicionais aparentemente pressupostas
são sublinhados. Apenas há algumas regras a pelas escalas clínicas.
seguir: Nas discussões e comentários, sempre que
5.1 – No caso da presença de duas ou mais possível, serão utilizadas como referenciais clas-
escalas com o mesmo escore T, os números são sificações mais recentes. Não obstante, quan-
colocados na seqüência ordinal e sublinhados. do não houver subsídios consistentes mais
Por exemplo, se D e Pd têm o mesmo escore T, atualizados, será usada a terminologia dos
o código será 24. autores consultados, deixando ao clínico a ta-
5.2 – No caso de haver um ponto de dife- refa de integrar seus dados conforme critérios
rença, por exemplo, sendo D 81 e Pd 82, o có- diagnósticos em voga hoje em dia.
digo será 24”. O refinamento das abordagens do MMPI
5.3 – Quando há um ponto de diferença, deixa bem claro que a utilização diagnóstica
mas cada escala recai numa classe diferente, baseada unicamente em elevações isoladas não
isto é assinalado. No caso de D ser 80 e Pd 79, teve o êxito previsto e pode ser considerada
a notação é 2”4. Tomemos um exemplo hipo- ultrapassada. Todavia, será incluída discussão
tético: sobre a significação das escalas individuais,
tomando basicamente como referência pesqui-
Escala Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma sas isoladas, porque tal conhecimento é im-
Código 1 2 3 4 5 6 7 8 9 portante para o entendimento do perfil.
Escore T 55 56 59 60 55 54 69 53 68 Por outro lado, é importante lembrar que
as elevações acima de 70 são mais confiáveis
O código seria 79 4-3 21568*. em termos diagnósticos ou, em outras pala-
vras, mais características da dinâmica indivi-
dual, enquanto elevações de 60-65 correspon-
dem mais a tendências do sujeito. Por isso,
devem ser interpretadas com mais cautela
*Vide nota de rodapé da p.445. (Groth-Marnat, 1984). Elevações de 65 são

PSICODIAGNÓSTICO – V 447
consideradas com significação clínica, porém, go, pode haver vantagem em produzir uma boa
no MMPI-2, após ser normatizado de forma impressão, que se reflete em determinadas
diferente do MMPI (Groth-Marnat, 1999). configurações do perfil. Por outro lado, pode
ocorrer o caso oposto, que pode ser identifica-
do por uma elevação isolada da escala F, com
Passo 4: Determine a validade do perfil escores baixos na L e K (e, eventualmente, a
elevação das escalas óbvias). Afastadas algu-
Este é um passo extremamente importante, em mas alternativas, como as associadas a limita-
que se analisam os indicadores de validade ções especiais do sujeito, pode ser considera-
(vide Escalas de Validade) para definir se o pro- da a hipótese de que a situação de teste seja
tocolo é válido ou não. percebida como uma oportunidade de um pe-
São vários os aspectos a serem considera- dido de ajuda, com base na fantasia de que, se
dos, sendo essencial procurar identificar se o a sintomatologia não for ressaltada ou exage-
examinando procurou dar respostas honestas rada dramaticamente, não haverá atenção ou
ou, por alguma razão, adotou um estilo de- assistência. Tal atitude pode provocar a eleva-
fensivo – minimizando ou exagerando a sinto- ção exagerada das escalas óbvias (Peterson,
matologia – ou, ainda, se mostrou inconsisten- Clark & Bennett, 1989) ou da escala 2, neste
te em sua maneira de responder (vide também caso, “quando o indivíduo está experiencian-
Nível global de ajustamento, no Passo 5). do perturbação e deseja comunicar isto ao exa-
minador” (Trimboli & Kilgore, 1983, p.614).

Passo 5: Determine qual a atitude do


examinando e o nível global de ajustamento Nível global de ajustamento

Atitude do examinando O nível geral de elevação do perfil fornece uma


primeira impressão sobre o nível global de ajus-
A atitude do examinando depreende-se de seu tamento. Um perfil elevado pode correspon-
auto-relato, através de subsídios proporciona- der a uma ME* alto (ME = média dos escores T
dos, em grande parte, pela configuração que das escalas clínicas**), que daria “um índice
assumem os indicadores de validade (como foi grosseiro de psicopatologia” (Levitt & Gotts,
visto antes), eventualmente complementados 1995, p.19).
por outros dados do perfil e entendidos no con- Na realidade, a grande maioria dos perfis
texto de sua história, quadro sintomático e apresenta uma ME muito abaixo de 70. De um
condições atuais de vida. Aliás, como salienta modo geral, quando essa média da elevação
Groth-Marnat (1999), é essencial “determinar global do perfil é superior a 75 (com correção
a probabilidade com que o examinando obte- K; ou 70, sem tal correção), pode-se conside-
ria algum ganho potencial por exagerar ou di- rar que é anômala, pressupondo-se a presença
minuir o relato da psicopatologia” (p.225). de patologia implícita por várias escalas, mas
A informação básica obtida diz respeito à podendo acontecer, também, em muitos ca-
atitude do sujeito frente ao teste e permite sos, como “uma conseqüência de confusão,
começar a entender qual a imagem ou impres- compreensão inadequada da leitura ou um
são que nos quer transmitir. Assim, o sujeito,
consciente ou inconscientemente, ao respon-
der, pode transmitir uma imagem favorável ou *Em inglês, Mean Elevation, embora, originalmente,
desfavorável de si mesmo, que é de especial fosse identificado por AV (Modlin, 1963).
importância no entendimento diagnóstico. Por **Quando criado, eram incluídas as nove escalas então
exemplo, em determinadas circunstâncias e sob existentes (sem a Si). Posteriormente, da média, foi ex-
cluída também a escala 5, por não medir patologia pro-
certas motivações, como o desejo de alta hos- priamente dita, e porque, quando são usadas táticas
pitalar ou o interesse em conseguir um empre- de simulação, a 5 e a 0 geralmente não são envolvidas.

448 JUREMA ALCIDES CUNHA


1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
contexto de respostas de simulação” (Levitt & 120

Gotts, 1995, p.20). 110

No caso da ME estar por volta de 70 ou 100

90
pouco mais, é preciso que o T de quatro esca-
80
las de sintomas seja igual ou maior que 70,
70
para ser reforçada a hipótese de patologia gra-
60
ve, por exemplo, num episódio psicótico agu- 50
do (que raramente é encaminhado à avaliação). 40
Entretanto, trata-se apenas de uma impres- 30

são inicial, uma vez que, conforme Graham, 20

citado por Trimboli e Kilgore (1983), “a proba- 10

bilidade de psicopatologia séria e de compro- ? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si

metimento no funcionamento aumenta à me- Figura 30.4 Enviesamento da direita para a esquerda
dida que cresce o número de escalas acima do no MMPI.
escore T=70 e à medida que a elevação das
escalas se torna maior” (p.614-615).
Assim, consideremos o diagrama da folha 120
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0

de apuração, em que está delineado o perfil. 110

Se este recai na chamada área normal, isto é, 100

entre T=46 e T=54, há várias possibilidades: 90

de que não haja perturbação significativa, de 80

que se trate de um “normal falso”, de que o 70

60
paciente esteja procurando transmitir uma boa
50
imagem de si mesmo (confirme a presença de
40
elevação de L e K) ou, ainda, de que o perfil 30
esteja atenuado, porque o paciente se habi- 20
tuou às suas dificuldades. 10
Ao examinar um perfil, com escalas eleva- ? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si
das acima dos limites normais, é importante
Figura 30.5 Enviesamento da esquerda para a direita
considerar a presença ou não de um enviesa- no MMPI.
mento e a direção em que se configura. O en-
viesamento do perfil ajuda a determinar o pos-
sível nível de funcionamento do paciente.
Examinemos o perfil da Figura 30-4. A dire- (Trimboli & Kilgore, 1983, p.624). Numa consi-
ção do enviesamento é nitidamente da direita deração mais precisa, há elevação das escalas
para a esquerda, havendo elevação significati- 4 e 6, predominando sobre K e 3, e em menor
va apenas da “tríade neurótica”, que é compa- grau, sobre a escala 5, que sugere atuação.
tível com um funcionamento em nível neuróti- Examinemos, agora, um quarto tipo de per-
co. Comparemos agora este perfil com o apre- fil, também sem enviesamento definido, que
sentado na Figura 30-5. Temos um enviesamen- eventualmente apresenta: uma ou mais eleva-
to da esquerda para a direita, que é sugestivo ções em nível neurótico (uma ou mais escalas
de um funcionamento em nível psicótico. da “tríade neurótica”), uma característica de
Comparemos, agora, os dois perfis com o “patologia do caráter” e, pelo menos, uma ou
apresentado na Figura 30.6. Não existe envie- duas elevações, típicas de funcionamento psi-
samento, tal como parece delineado nas ou- cótico. Tal perfil é mais característico de trans-
tras figuras. Esse tipo de perfil foi especialmente torno de personalidade e, conforme Gustin e
destacado por uma elevação central, associa- colegas (1983), apresenta maior elevação no
da especialmente com “patologia do caráter”, transtorno de personalidade borderline (vide
cuja “marca distintiva é a elevação da escala 4 Figura 30.7).

PSICODIAGNÓSTICO – V 449
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
120 a elevação nessa escala representa uma con-
110 tra-indicação de comportamento psicótico. Na
100
presença de uma configuração que sugere o
90
funcionamento em tal nível, a simultânea ele-
80
vação da escala 3 representaria um efeito ate-
70
nuante e modificador do quadro. Na mesma
60

50
direção, pode ser interpretada a elevação da
40
escala K e 5. “Desta maneira, elevações nas
30 escalas K, 3 e 5, mesmo na presença de eleva-
20 ções em outras escalas no mesmo perfil, ten-
10 deriam a diminuir o potencial para o compor-
? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si tamento atuador ou psicótico”, uma vez que a
Figura 30.6 Ausência de enviesamento definido. Ele-
tendência de tais escalas é de se elevarem em
vação nas escalas 4, 6 e 5 (MMPI). quadros clínicos mais em nível neurótico, re-
fletindo inibição da expressão de impulsos,
possivelmente associada com ambivalência e
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
120 culpa (p.624).
110
Já a elevação da escala 6 tem um efeito que
100
pode ser considerado oposto. Ao se falar no
90
desvio ou enviesamento da esquerda para a
80
direita, bem como quando nos referimos an-
70

60
teriormente à tétrade psicótica, ficou claro que
50
a gravidade da patologia costuma se associar
40 com elevações à direita do perfil. “Isto reflete
30 a negação (escala 9) e distorções da realidade
20 (escala 8), características deste nível de funcio-
10 namento.” Nessa configuração, a elevação da
? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si escala 6 tem um efeito potencializador das im-
Fonte: Gustin, Goodpaster, Sajadi et alii, 1983, p.52. plicações patológicas das outras escalas. “Por-
tanto, quando uma elevação na escala 6 se
Figura 30.7 Escores médios (com K) das elevações de
pacientes com transtorno de personalidade borderline combina com elevações na escala 7 e 9, a psi-
(–) e de pacientes com outros transtornos de persona- copatologia é caracteristicamente manifesta-
lidade (–). da em suas manifestações mais floridas”
(p.625).
Dahlstrom e Welsh (1962) examinaram uma
Não obstante, há fatores modificadores, série de escalas, para avaliar a gravidade do
que devem ser considerados, ao se tentar infe- quadro, mas acabaram por concluir que se fa-
rir o nível de patologia, através da configura- ria necessária uma definição mais explícita de
ção geral do perfil. Por exemplo, em relação à severidade do transtorno, antes de se poder
atuação, devem ser levadas em conta também chegar a uma medida escalar mais precisa. Fi-
as elevações das demais escalas. Segundo nalmente, consideraram que, no caso de pa-
Graham, citado por Trimboli e Kilgore (1983), cientes colaboradores e sem limitações defini-
uma vez que as escalas 1, 2, 3, 5, 7 e 0 se asso- das, que comprometem o escore, a elevação
ciam com controle e inibição de impulsos, o da escala F constitui a medida mais adequada
comportamento de atuação é mais provável da gravidade da doença.
quando há elevação das escalas 4, 6, 8 e 9, do Rogers e colegas (1983), revisando a litera-
que quando aquelas predominam no perfil. tura, afirmaram que as escalas clínicas marcan-
Por outro lado, como a escala 3 se associa temente elevadas, com uma elevação extrema
com a utilização de defesas de nível mais alto, na F, superior a T=80 e um índice de F-K médio

450 JUREMA ALCIDES CUNHA


de 19,4*, poderiam ser interpretadas como O aumento da perturbação subjetiva refle-
sugestivas de psicopatologia extrema ou de te-se, no MMPI, pela elevação das escalas de
simulação. É evidente que, se fosse possível sintoma, isto é, das escalas 2, 7, 8 e 9 e, um
afastar a hipótese de que as respostas tives- pouco menos, da escala 1. A consciência de
sem sido dadas de forma randômica e se, pela que existe algo muito mal ou fora do comum
avaliação da atitude do paciente, fosse possí- fica caracterizada pela elevação na escala F,
vel excluir o exagero intencional da sintoma- enquanto a crescente incapacidade de lidar
tologia (o que não é fácil), consideravam que com o estresse se associaria a uma baixa na
esses dados poderiam servir como indícios de escala K, que, como vimos, pode ocorrer por
gravidade do quadro clínico. pânico, confusão e desorganização. Tal grau
De um modo geral, a elevação global do de desorganização ou de cisão no funciona-
perfil parece ainda se constituir como um dos mento global, que o paciente está experien-
indicadores mais usados na avaliação do grau ciando, tem sido avaliado pela escala de força
de gravidade, ainda que seja também afetada do ego, ou escala Es (Ego Strenght), de Bar-
pela “agudização da perturbação e pela falta ron, desenvolvida para medir aspectos da efi-
de defensividade no teste” (Dahlstrom & Wel- cácia do funcionamento pessoal (Barron, 1963)
sh, 1962, p.283). (Quadro 30.2).
Na realidade, no MMPI não se encontra uma Segundo Caldwell (1978), citado por Trim-
medida válida de ajustamento psicológico. O boli e Kilgore (1983), os escores dessa escala
nível geral de elevação das escalas fornece-nos podem ser usados como indicadores do grau
apenas uma indicação grosseira nesse sentido. de desorganização de tal funcionamento, ex-
O exame de como se delineia o perfil orienta- perienciado pelo paciente. Assim, os escores
nos um pouco mais em termos da presença do baixos, isto é, abaixo do escore T de 30, “im-
tipo de patologia. Sabemos que “pessoas com plicam vasta desorganização das estratégias de
transtornos neuróticos ou psicóticos podem, luta, enquanto escores que recaem próximos a
hipoteticamente, com tratamento apropriado, um escore T de 50 implicam uma elasticidade
se tornar não-neuróticas ou não-psicóticas”, na personalidade e uma maior capacidade para
enquanto se considera de forma diversa trans- resistir à investida da perturbação atual” (Trim-
tornos de personalidade, já que “estão basea- boli & Kilgore, 1983, p.619). Trabalho mais re-
dos em traços e comportamentos da persona- cente (Levitt & Gotts, 1995) faz uma revisão de
lidade, que são mais duráveis do que sintomas” estudos sobre a Es, criticando a metodologia
(Levitt & Gotts, 1995, p.76). Assim sendo, em- usada por Barron, considerada muito primiti-
bora não tenhamos uma medida específica do va e demonstrando que tal escala possui ape-
nível global de ajustamento, poderemos levan- nas a capacidade de discriminar pessoas emo-
tar algumas hipóteses. cionalmente comprometidas de pessoas
normais. Já Groth-Marnat (1999), baseado em
estudos de Graham, de 1978, afirma que a Es
Diferenciação entre síndromes agudas e “avalia o grau com que um cliente tem proba-
crônicas bilidade de se beneficiar com a psicoterapia”
(p.297), mas faz a ressalva que, no caso, se trata
As síndromes agudas caracterizam-se freqüen- do benefício que podem ter pacientes neuróti-
temente pela quantidade de perturbação sub- cos em terapia orientada para o insight.
jetiva experienciada, associada com o insight a Na síndrome crônica, há uma tendência a
respeito de tal perturbação e por uma crescen- modificar os indícios usados para caracterizar
te incapacidade de lidar com o estresse. a síndrome aguda. Em primeiro lugar, as esca-
las de sintoma não se mostram marcantemen-
te elevadas, e, quando existe elevação, esta se
*Atualmente, são adotados outros pontos de corte para
apresenta em relação às escalas 1 e 8, com uma
F-K. Vide adiante. elevação mais significativa que as escalas 2 e

PSICODIAGNÓSTICO – V 451
QUADRO 30.2 Escala de força do ego (Es)*
Certo
2 36 51 95 109 153 174 181 187 192 208
221 231 234 253 270 355 367 380 410 421 430
458 513 515
Errado
14 22 32 33 34 43 48 58 62 82 94
100 132 140 189 209 217 236 241 244 251 261
341 344 349 359 378 384 389 420 483 488 489
494 510 525 541 544 548 554 555 559 561
Fonte: Barron, apud Dahlstrom & Welsh, 1962, p.454.
*As tabelas para transformação de escores brutos em notas T podem ser encontradas no Anexo C.
Nota: O escore bruto de 50 corresponde ao escore T de 59. Espera-se um escore bruto de 51 ou mais, como aceitável. O escore T
de 30 corresponde ao escore bruto de 32. (2) A escala é de Barron, apud Dahlstrom & Welsh, 1963, p.454.

7. Em segundo lugar, a escala K mostra-se num mostravam elevações das escalas 6, 8 e, às ve-
nível considerado pelos autores como mode- zes, da 0, mostra uma atenuação dessas eleva-
radamente baixo, isto é, entre um escore T de ções. Segundo Trimboli e Kilgore (1983), “indi-
45 a 55, que corresponderia aproximadamen- víduos psicóticos crônicos muitas vezes produ-
te à zona média de Dahlstrom e colegas (1972). zem perfis em que as elevações das escalas 6 e
Em terceiro lugar, enquanto nos casos agudos 8 caem para elevações entre 70 e 80. As esca-
a elevação da escala F se situa freqüentemente las 2 e F também caem para níveis moderados,
acima de um escore T de 70, tal elevação dimi- enquanto a escala 0 freqüentemente sobe até
nui, ficando seu escore T ao redor de 60, refle- um escore T de aproximadamente 70, com o
tindo o fato de o sujeito ir se habituando com passar do tempo” (p.619-620).
suas dificuldades. Da mesma forma e no mes-
mo sentido, devem ser interpretados os esco-
res T da escala Es, que podem subir para o ní- Passo 6: Descreva sintomas,
vel de 35 a 40. comportamentos e/ou características da
Ainda que, de um modo geral, os casos personalidade
agudos apresentem maiores elevações e os crô-
nicos elevações mais moderadas, deve ser con- Este é um passo nuclear da interpretação, que
siderado também o nível de funcionamento, se baseia tanto nas elevações e baixas escala-
pois “parece haver uma interação entre o nível res, como nas inter-relações entre as escalas.
da elevação e a natureza da síndrome clínica. O objetivo é o de descrever e predizer sinto-
Isto é, pacientes neuróticos mais crônicos po- mas, correlatos comportamentais e outras ca-
dem apresentar elevações aumentadas, en- racterísticas – em função da freqüência com
quanto pacientes psicóticos freqüentemente que costumam se associar com dados presen-
obtêm elevações mais moderadas” (p.619). Por tes no perfil – “e/ou os meios característicos
exemplo, em pacientes com código 13, que pelos quais [o sujeito] lida com o mundo” (Trim-
tendem a somatizar ou negar seus problemas boli & Kilgore, 1983, p.614), na medida em que
emocionais, à medida que se encontram em fazem sentido no contexto de informações
fase mais avançada do quadro, freqüentemente sobre o examinando.
acentua-se a elevação nas escalas 1 e 3, que se Via de regra, as elevações caracterizadas por
acompanha por queda simultânea da escala 2, um T de 70, ou mais, tendem a ser mais carac-
que, por sua vez, passa a se constituir como terísticas da personalidade do sujeito. Não
um indicador da cristalização de tal tipo de obstante, uma elevação idêntica da mesma
adaptação específica. Por outro lado, a evolu- escala deverá ser interpretada diversamente,
ção de quadros psicóticos, que na fase aguda se o perfil for de um paciente psicótico ou de

452 JUREMA ALCIDES CUNHA


uma pessoa com um funcionamento psicoló- tes de informação, como escalas óbvias, sutis,
gico adequado. Como salienta Groth-Marnat de conteúdo, suplementares e itens críticos.
(1999), “quaisquer das descrições são modais. Mas, principalmente, tenha extrema precau-
Elas devem ser consideradas como interpreta- ção em verificar com que tipo de dados está
ções possíveis, que não se aplicam necessaria- lidando, se com um perfil bem-definido, com
mente a todas as pessoas que têm um deter- elevações bem caracterizadas, ou se, pelo con-
minado escore. São meramente hipóteses que trário, os escores levantados permitem, ape-
necessitam verificação ulterior” (p.266). Por nas, um delineamento mal-definido, que recai
exemplo, com a idade, naturalmente podem predominantemente na chamada área normal,
ocorrer elevações das escalas, por preocupa- que autoriza uma pressuposição de ausência
ções com a saúde (como da 1 e da 3) e por de patologia, mas não é garantia. Aliás, a for-
perdas, que ocorrem (da 2), ou baixa (da 9), ma como o instrumento foi construído favore-
por diminuição da energia. Por outro lado, ce a ocorrência desse tipo de perfil, de forma
sexo, nível socioeconômico, escolaridade e in- que o MMPI é um recurso mais indicado, numa
teligência são fatores que podem produzir efei- avaliação, quando o quadro sintomático e/ou
tos nos escores, assim como outros, associa- a história pregressa sugerem a presença de psi-
dos ao funcionamento psicológico e neuroló- copatologia. Desta maneira, quanto menos ele-
gico e ao bem-estar físico. vado tiver o perfil, mais será necessário ate-
É exatamente por essas razões que a litera- nuar ou deletar certos descritores, dando mais
tura sobre o MMPI, ao discutir sintomas, com- importância a achados corroborados por ou-
portamentos e caraterísticas de personalidade, tros indícios.
associadas com escalas ou códigos específicos,
costuma se referir a elevações e baixas, ou a
escores altos e baixos, e muito raramente defi- Passo 7: Forneça hipóteses diagnósticas
nem o valor de T, porque um determinado es- ou um diagnóstico
core pode ser considerado elevado para uma
pessoa e dentro da expectativa para outra. Ainda que este não seja um objetivo precípuo
Neste nível de interpretação, o psicólogo do MMPI, pode-se dizer que um protocolo vá-
não deve se ater apenas à significação das es- lido muitas vezes pode fornecer subsídios que,
calas. É preciso verificar se é possível constatar avaliados dentro do contexto geral do caso,
a presença de configurações específicas. Além podem oferecer valiosas informações, que per-
disso, é bom lembrar que a interpretação será mitem levantar hipóteses diagnósticas ou,
mais consistente, se mais de uma elevação per- mesmo, estabelecer um diagnóstico formal, se
mitir levantar hipóteses compatíveis. Por ou- este for o objetivo do psicodiagnóstico.
tro lado, é essencial considerar fatores modifi-
cadores dos efeitos atribuídos a características
Passo 8: Recomendações
do perfil (por exemplo, influência de escalas
excitatórias ou inibitórias). Assim, se é impor- Uma vez que, freqüentemente, o protocolo
tante estar familiarizado com os códigos de oferece subsídios sobre pontos fortes e pon-
dois pontos (vide adiante), também é preciso tos fracos no funcionamento psicológico, in-
avaliar como se relacionam com outros aspec- dícios sobre o sistema de defesas, maneiras tí-
tos do perfil. Recomenda-se, ainda, que, neste picas de lidar com agressão e ansiedade, estilo
nível, não sejam descritos somente sintomas e de relacionamento, insight e força do ego, ge-
correlatos comportamentais, mas que se pro- ralmente o psicólogo tem condições de julgar
cure identificar necessidades, defesas e estra- a respeito da necessidade ou não de uma in-
tégias no manejo dos afetos. Entretanto, utili- tervenção e, também, avaliar o tipo de inter-
ze, sempre que possível, também outras fon- venção mais benéfico para o paciente.

PSICODIAGNÓSTICO – V 453
MMPI: Escalas de validade e
escalas clínicas
Jurema Alcides Cunha
31
ESCALAS OU INDICADORES DE VALIDADE nifica que tanto o escore bruto de 15, como os
inferiores a ele, são registrados na folha de
Os indicadores de validade são fornecidos pe- apuração como T=50, entendendo que tais
las chamadas escalas de validade: “Não posso omissões não enfraquecem ou afetam o valor
dizer” ou escala “?”, a escala L, a escala F e a das outras escalas, desde que sua distribuição
escala K. Segundo Trimboli & Kilgore (1983), seja aleatória. A hipótese, relacionada com um
os indicadores de validade fornecem dados escore bruto que ultrapassa 15, é de que o su-
para o primeiro nível de interpretação do MMPI, jeito omitiu itens, como uma forma de defesa
de auto-relato, que “é freqüentemente útil para contra o medo de admitir problemas pessoais,
compreender a atitude do paciente ante o tes- e, dessa maneira, as interpretações devem ser
te e a impressão que deseja nos transmitir feitas com cautela (Vincent, 1987). Não obs-
com base no MMPI” (p.614). Tal atitude, bem tante, escores moderados (T entre 50 e 70)
como a competência em responder, podem podem ser explicados, muitas vezes, por difi-
levar a uma distorção das respostas, à de- culdade na leitura, retardamento psicomotor
fensividade, etc. ou por dúvidas obsessivas. A indecisão pode
A validade também pode ser avaliada pelo se associar ao uso conspícuo de intelectualiza-
Índice TR e pela escala CRL (vide adiante). ção, à interpretação pouco usual dos itens ou
a uma superprecaução relacionada com aspec-
tos paranóides (Groth-Marnat, 1999). Depres-
Escala “Não posso dizer” ou “?” sivos também podem apresentar a tendência
a omitir itens, por uma atitude de desesperan-
Segundo Groth-Marnat (1999), o indicador “?” ça: a idéia de que não podem ser ajudados faz
não chega a ser uma escala formal, uma vez com que achem que não vale a pena o esforço
que não representa qualquer medida de per- de responder (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom,
sonalidade. Simplesmente corresponde ao nú- 1972).
mero de omissões, que pode ou não afetar o Na realidade, quanto mais o escore ultra-
protocolo. passar o T=50, mais probabilidade existe de o
Na tabela oriunda da padronização brasi- perfil ser inválido, e, atingindo o escore de
leira, um escore bruto de 15 corresponde ao T=100, o perfil não comporta qualquer inter-
T=50 (Hathaway & McKinley, 1971). Isso sig- pretação clínica (Groth-Marnat, 1984).

454 JUREMA ALCIDES CUNHA


1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
De qualquer forma, como o número exces- 120

sivo de omissões tem um efeito que se difunde 110

através das outras escalas, tem sido proposta 100

uma série de medidas no sentido de corrigir 90

80
esse estado de coisas. Parece que procedimen-
70
to mais defensável é tentar dar ao sujeito nova
60
oportunidade de responder aos itens omitidos,
50
entrevistando-o para tentar saber as razões das 40
omissões. Todavia, o sujeito deve entender as 30
razões do examinador, para não aumentar uma 20

possível defensividade ou comprometer a ati- 10

tude de colaboração fundamental para o pros- ? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si


seguimento da avaliação psicológica. Vejamos Figura 31.2 Segundo perfil.
um exemplo de um perfil delineado com base
nas respostas ao MMPI, com apreciável núme-
ro de omissões (vide Figura 31.1). A seguir, o
sujeito foi solicitado a tentar examinar e pro- ma de apresentar uma imagem favorável de si
curar responder os itens omissos. É apresenta- mesmo. Tal atitude se manteve, levando à ele-
do, então, o perfil delineado após ter sido dada vação de L e K.
tal oportunidade ao sujeito (vide Figura 31.2).
É importante observar como se modificou o
perfil. O spike na escala 5, que se elevava bem Escala L
acima da zona média, diminui sensivelmente,
ficando dentro de limites normais. Foram assi- Uma elevação acima do normal na escala L
naladas respostas que tinham sido omitidas pode ser interpretada como rigidez e ingenui-
nesta escala, e, crescendo o escore bruto, di- dade (Gilberstadt & Duker, 1965) e, ainda, fal-
minuiu o escore T (que representa uma rela- ta de insight (Marks & Seeman, 1963). Já De-
ção inversa nesta escala para o sexo feminino). Mendonça e colegas (1984), numa revisão da
Por outro lado, entre as escalas de validade, literatura, acharam que traços de convencio-
diminuiu o escore T de “?”, mas cresceram os nalismo, rigidez e autocontrole podem se as-
escores T de L e de K. É possível que o escore sociar com tal elevação. Groth-Marnat (1999)
elevado em “?” fosse o resultado de uma ati- considera que a escala pode identificar um su-
tude defensiva, omitindo respostas, como for- jeito que está apresentando “uma visão exa-
geradamente perfeccionista e idealizada de si
mesmo” (p.233). Aliás, os itens da escala L
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
(Mentira) se referem a pontos fracos ou pe-
120
quenas falhas, que as pessoas admitem que
110
têm, embora em geral não sejam considera-
100

90
dos como positivos, de um ponto de vista so-
80
ciocultural. Por exemplo, responder como er-
70
rado a um item como “Às vezes, fico zanga-
60 do” “sugere uma autopercepção irrealistica-
50 mente positiva” (Groth-Marnat,1984, p.270).
40 Então, se o sujeito não admite que é capaz de
30 determinadas fraquezas, essa atitude tende a
20 se manter no restante dos itens, havendo um
10
efeito supressor nas demais escalas. Assim,
? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si quanto mais se eleva a escala L, menores ten-
Figura 31.1 Primeiro perfil (com 110 omissões). dem a ser as elevações nas outras escalas. Des-

PSICODIAGNÓSTICO – V 455
ta forma, se o escore bruto de L for igual ou Escala F
maior do que 10, há possibilidade de os de-
mais resultados não serem válidos. A escala F “não mede qualquer traço específi-
Diferentes níveis na escala L sugerem dife- co, mas, antes, uma diversidade de respostas
rentes alternativas de interpretação: inusitadas” (Groth-Marnat, 1984, p.271). As-
T = 36-43. É um escore baixo e atípico. En- sim, um spike na escala F pode subentender
contra-se em sujeitos que tentam dar uma ima- uma forma de pensamento confuso ou auto-
gem extremamente patológica de si mesmo, depreciação (Gilberstadt & Duker, 1965). Pon-
bem como em pessoas normais, pouco con- tos altos podem corresponder a um sujeito
vencionais e independentes, que se sentem à descrito como inquieto, instável, mutável, con-
vontade para admitir seus pontos fracos. fuso, insatisfeito, mal-humorado, opiniático, e
T = 46-53. É um escore médio, típico e nor- pontos baixos, como simples (DeMendonça,
mal. Os sujeitos seletivamente admitem certas Elliot, Goldstein et alii, 1983).
falhas, mas tendem a se defender em relação A escala F, também chamada de Freqüência
a outras, que lhes parecem mais criticáveis, de (ou infreqüência), foi criada para detectar res-
um ponto de vista social ou moral. postas atípicas, inusitadas, incluindo “desde
T = 56-63. É um escore moderado. Os su- sensações bizarras, idéias estranhas, experiên-
jeitos querem passar uma imagem favorável de cias peculiares, até sentimentos de alienação”
si mesmos, e “pode indicar uma rigidez psico- e “atitudes atípicas” em relação a instituições
lógica ou simulação consciente” (Groth-Mar- sociais, bem como “certo número de crenças,
nat, 1984, p.270). Tal escore pode ser encon- expectativas e autodescrições improváveis e
trado em pessoas extremamente religiosas ou contraditórias” (Dahlstrom, Welsh & Dahls-
moralistas, refletindo convencionalismo, con- trom, 1972, p.114-115). Portanto, o escore
formismo com valores e normas socioculturais baixo representa conformidade com os padrões
ou uma tendência a responder em função da do grupo normal, que serviu para a padroniza-
desejabilidade social. ção do teste. Isso corresponderia a um escore
T = 64-69. É um escore alto. Pressupõe bruto de 9 ou menos (T=50). Um escore alto
“uma visão ingênua, irrealística do mundo” e significa um exagero da sintomatologia ou uma
se associa com negação, repressão e, às vezes, indicação de psicopatologia. Porém, isso nem
com simulação consciente. Esses sujeitos “exa- sempre é verdadeiro. Muitas vezes, respostas
geram suas qualidades morais e escrúpulos na direção desviante refletem importantes pro-
positivos, de forma rígida, autocentrada e não blemas na vida da pessoa (como perdas signi-
compromissada”, mas, “subjacentemente, ten- ficativas), tanto que muitos dos itens são in-
dem a ser ‘autocríticos e frustrados’ ” (p.270). cluídos também na lista dos chamados itens
Seu prognóstico em terapia não é bom, por- críticos, a ser examinada mais adiante, neste
que carecem de um insight suficiente. livro.
T – 70 ou mais. É um escore marcante e Diferentes níveis na escala F sugerem diver-
raro. Pode se associar com: a) intensificação sas alternativas de interpretação. Via de regra,
dos traços correspondentes aos níveis ante- considera-se que um escore bruto de 16 assi-
riores; b) os mecanismos citados, especial- nala uma probabilidade de que o protocolo não
mente negação da psicopatologia; c) tendên- seja válido. Não obstante, não existe um pon-
cias ruminativas e introspectivas, que se re- to de corte exato. Dessa maneira, mesmo es-
fletem nas relações sociais, com aspectos cores de 70 a 90 nem sempre indicam um pro-
paranóides; ou d) simulação consciente tocolo inválido, especialmente entre pacientes
(Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972; Gro- psiquiátricos internados ou, até mesmo, entre
th-Marnat, 1984). detentos. Elevações moderadas muitas vezes
Nota-se que o escore cresce inversamente sugerem “abertura para experiências inusita-
ao nível socioeconômico e a antecedentes edu- das e possível psicopatologia, mas só se sus-
cacionais do sujeito (Groth-Marnat, 1999). peita de um protocolo inválido ante elevações

456 JUREMA ALCIDES CUNHA


mais extremas” (Groth-Marnat, 1999, p.234). patologia” (Groth-Marnat, 1999, p.235). Mas
Aliás, uma das formas de se verificar se a ele- é importante excluir erros de apuração, como
vação da escala F ocorre por respostas dadas também problemas de compreensão na leitu-
ao acaso é por meio do Indicador TR, especial- ra, porque o perfil pode ser invalidado. Fre-
mente em combinação com a escala de Des- qüentemente, a elevação deve-se ao mau con-
cuido (vide adiante). tato com a realidade, por desorganização psi-
T = 55 ou menos. Este nível se associa com cótica, alcoolismo em estado próximo ao deli-
ausência de estresse. São sujeitos que podem rium tremens, etc. Neste caso, o perfil ainda
ser descritos como honestos, simples, calmos, pode oferecer informações válidas. Entretan-
confiáveis e convencionais. Geralmente, um to, é preciso excluir ainda a falta de colabora-
escore baixo significa que o sujeito “percebe o ção (que pode ocorrer em transtornos de con-
mundo como as outras pessoas” (Groth-Mar- duta) e a tentativa de simular patologia (verifi-
nat, 1999, p.235). Não obstante, neste nível se car se há elevação da escala L). Aliás, todos
inclui, também, se os dados clínicos sugerem esses problemas podem ser exacerbados se o F
psicopatologia, a possibilidade de o sujeito ultrapassar T=90. Com um F igual ou superior
minimizar ou negar seus problemas. (Verifique ao T = 95, as possibilidades são de que o perfil
a elevação de K e o Índice F-K.) “possa ser inválido, distorcido ou exagerado”
F = 55-65. É um escore médio. Os sujeitos (Vincent, 1987, p.105). Novamente, as hipóte-
apresentam um tipo de pensamento indepen- ses relacionam-se com um nível de compreen-
dente, menos convencional e não conformis- são de leitura inferior ao exigido pelo instru-
ta, o que pode envolver negatividade e pessi- mento, com a presença de um quadro psicóti-
mismo (Groth-Marnat, 1999). Já os escores co agudo ou com um pedido de socorro. Se a
mais elevados, neste nível, podem refletir cir- pessoa tem menos de 40 anos e foi encami-
cunstâncias especiais numa área circunscrita da nhada pela Justiça, é grande a possibilidade
vida, resultante de um tipo de rebeldia contra de se tratar de um problema de conduta, com
padrões, normas e valores ou de alguma for- probabilidade de comportamento de atuação
ma de comportamento socialmente desviante ou autodestrutivo. Se a pessoa possui instru-
(Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972) ou de ção em nível adequado e não é psicótica, é pre-
certa inquietação ou alteração do humor. ciso considerar o diagnóstico de um transtor-
F = 65-80. É um escore moderadamente no de personalidade borderline. Numa pesqui-
alto. Pode envolver uma intensificação dos sa com pacientes psiquiátricos, o escore de T
comportamentos anteriormente descritos, po- = 95 ou mais foi encontrado em sujeitos dos
dendo ser aqui incluídos adolescentes com pro- quais 50% eram psicóticos (com transtorno
blemas de identidade e de não-conformismo esquizoafetivo ou afetivo bipolar, do tipo ma-
(conferir o escore, utilizando normas para ado- níaco), e a maioria dos demais tinha transtor-
lescentes), pessoas com grandes envolvimen- no de ajustamento. Cerca de um terço com este
tos em movimentos políticos ou religiosos mais perfil recebeu diagnóstico adicional de abuso
radicais e “personalidades rebeldes, anti-so- de drogas (Vincent, 1987). Já quando o F é igual
ciais, esquizóides e ‘boêmias’ ” (Groth-Marnat, ou superior a F = 100, há probabilidade de que
1984, p.271). Especialmente com T = 70 a 80, o instrumento tenha sido respondido de for-
é importante considerar a possibilidade de ma randômica (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom,
“neurose” severa ou psicose (desorientação do 1972).
ego), de um estado fronteiriço ou, ainda, de
simulação. Porém, problemas de leitura e com-
preensão também podem constituir a causa Escala K
subjacente do escore.
T = 80 ou mais. “Escores de 80 a 99 suge- Se os demais indicadores de validade são ca-
rem simulação, exagero de dificuldades, resis- pazes de detectar casos mais grosseiros, que
tência à testagem ou significantes níveis de permitem a invalidação do perfil, a escala K

PSICODIAGNÓSTICO – V 457
possibilita a identificação de fatores sutis, mulação ingênua, mas deliberada, para a ob-
mas eficazes, aumentando a sensibilidade do tenção de ganhos secundários, ou como pedi-
instrumento e “proporcionando um meio de do de socorro. Pode também se associar com
correção estatística” das escalas clínicas pânico ou confusão. De qualquer modo, pode
(Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, revelar um sistema de defesas precário, de-
p.120). “Enquanto somente indivíduos ingê- sorientação, confusão, insatisfação, cinismo
nuos, moralistas e não-refinados têm escore e baixo nível de insight (Groth-Marnat, 1999).
elevado em L, pessoas mais inteligentes e Não obstante, tais problemas são menores,
psicologicamente mais refinadas têm esco- à medida que os escores são maiores, neste
res mais altos em K e, ainda assim, não apre- nível. Nota-se, porém, que as pessoas de bai-
sentam qualquer probabilidade de uma ele- xo nível socioeconômico podem ter escores
vação importante em L” (Groth-Marnat, 1999, altos, sem evidenciarem essas características,
p.236). já que suas respostas refletem a maneira
A construção da escala foi bastante com- como percebem a si mesmas, seu mau auto-
plexa e seguida por muitas pesquisas para ava- conceito. De forma idêntica, encontram-se
liar se haveria vantagem real com a introdu- escores baixos em adolescentes, o que pode
ção do sistema de correção. indicar mais abertura e “maior grau de sen-
Escores altos na escala K revelam defensivi- sibilidade a seus problemas” (Groth-Marnat,
dade ou inibição (DeMendonça, Elliot, Golds- 1999, p.237).
tein et alii, 1984; Gilberstadt & Duker, 1965). T = 56-64. É um escore moderado. Corres-
Em outras palavras, embora se possam suben- ponde a um sistema de defesas adequado, com
tender conflitos subjacentes, em sujeitos com aceitação de si mesmo e boa força de ego (Gro-
tais escores, eles “não estão dispostos a discu- th-Marnat, 1999). Há certa exposição de pro-
tir essas dificuldades e fazem esforços para blemas, mas também certa preservação de al-
defensivamente disfarçar seus verdadeiros pen- guns conflitos. As respostas refletem ajusta-
samentos e sentimentos” (Groth-Marnat, 1984, mento, equilíbrio e competência em lidar com
p.272). Essa defensividade tem um efeito su- problemas.
pressor da psicopatologia, manifestando-se em T = 65-70. Trata-se de sujeitos que, tendo
menores elevações do perfil, enquanto esco- problemas psicológicos, fazem um esforço para
res baixos em K se acompanham de acentua- manter uma imagem positiva para os demais,
das elevações das escalas clínicas. Por tal ra- inclusive negando seus problemas. A defensi-
zão, o escore de K permite a correção estatísti- vidade aumenta com a elevação dos escores,
ca do perfil, procedimento geralmente aceito. observando-se falta de insight e “resistência à
Todavia, os autores recomendam que os servi- avaliação psicológica”, não se apercebendo tais
ços examinem a propriedade de sua utilização sujeitos das impressões que as outras pessoas
para fins clínicos (Dahlstrom, Welsh & Dahls- podem ter deles. Todavia, conforme Groth-
trom, 1972). Marnat (1984), “percebem os problemas psi-
Diferentes níveis da escala K sugerem di- cológicos dos outros como fraquezas e relu-
versas alternativas de interpretação, ainda que, tam em ser colocados no papel de pacientes”
na realidade, se possa dizer que “não existe (p.272). Esse autor coloca o T = 65 como um
um ponto de vista nítido para diferenciar força marco significativo em termos de prognóstico
do ego positiva (ajustamento), defensividade para a psicoterapia, de forma que os sujeitos
do ego ou simulação positiva” (Groth-Marnat, com um T menor que 65 poderiam se benefi-
1999, p.236). ciar com o tratamento, enquanto aqueles com
T menor que 56. É um escore baixo e, quan- um T maior que 65 encontrariam dificuldades
to menor, maior a probabilidade de que as res- nesse sentido. Se o protocolo é válido, passam
postas tenham sido assinaladas por patologia a impressão de controle e funcionamento efi-
aguda ou para dar a impressão de psicopato- caz, mas deixando de observar os próprios pro-
logia, o que pode ocorrer por exagero ou si- blemas (Groth-Marnat, 1999).

458 JUREMA ALCIDES CUNHA


Configurações específicas das escalas de psicológica do sujeito; c) é o chamado padrão V
validade das escalas de validade, encontrado em pacien-
tes psiquiátricos, com perturbações leves de ajus-
No desenvolvimento dos estudos sobre o tamento, mas na fase pré-hospitalar (sobretudo
MMPI, num primeiro momento, cada uma das no sexo masculino), mau ajustamento social.
escalas de validade procurou ser entendida por Elevação de F e K. Subentende a mesma con-
sua significação específica e pelos efeitos sobre tradição que na “Elevação de L e F”, atribuível à
as escalas clínicas. Num segundo momento, “difusa falta de auto-insight, estados confusio-
procuraram ser compreendidas em suas inter- nais ou a dificuldade em captar a natureza da
relações, principalmente quando formam con- tarefa ou suas instruções e procedimentos”
figurações específicas. (p.171) e associada a um mau prognóstico.
Elevação de L, F e K. Más relações interpes-
soais e desorganização severa do comporta-
Hipóteses de Dahlstrom, mento, em pacientes psiquiátricos, com agita-
Welsh e Dahlstrom ção e desintegração psicótica.
Elevação de F; L e K moderados. Provável
Elevação de ? e L. Configuração comum em quadro randômico das respostas.
pessoas com limitações de vários tipos, que
fazem esforços grosseiros para dar boa im-
pressão. Hipóteses de Vincent
Elevação de ? e F. Geralmente se associa com As hipóteses de Vicent (1987), referentes a con-
a presença acentuada de perturbação emocio- figurações específicas, são apresentadas no
nal e confusão, o que também pode se expli- Quadro 31.1.
car por dificuldades intelectuais. Validade du-
vidosa das escalas clínicas. É necessário inves-
tigar a causa das dificuldades. Índice TR e a escala de Descuido
Elevação de ? e K. Atitude muito defensiva e
similar à configuração “Elevação de ? e L”. Há Há 16 itens que se repetem no caderno de tes-
rebaixamento das escalas clínicas. Recomenda- te, que compõem os seguintes pares:
se que o sujeito retome a tarefa e tente respon- 8 e 318 20 e 310 24 e 333 37 e 302
der os itens deixados em branco. Tal atitude de- 13 e 290 21 e 308 32 e 328 38 e 311
fensiva pode ter efeitos em outras técnicas. 15 e 314 22 e 326 33 e 323 (305 e 366)
Elevação de L e F. Envolve uma contradição 16 e 315 23 e 288 35 e 331 (317 e 362)
básica, pela negação de padrões que não são
socialmente aprovados e reconhecimento de “O índice TR é o número total de itens res-
algumas “experiências, sentimentos e reações pondidos de forma oposta nas duas ocasiões”
inusitadas, bizarras ou atípicas”, que, muitas (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.95).
vezes, podem se associar com “comportamen- É necessário comparar as respostas dadas a
to contrastante em contextos diferentes”, o que cada par. Para facilitar o escore, especialmente
pode decorrer “de uma falta de apreciação quando a folha de apuração é impressa dos
completa do que está sendo revelado” ou de dois lados, os dois últimos pares foram excluí-
“má integração de diversas tendências com- dos. O escore, então, é atribuído ao número
portamentais, que caracterizam os vários pro- de itens cuja resposta, duplicada no par, não é
cessos psicóticos” (p.168 e 169). a mesma. Considera-se que um escore de 3 ain-
Elevação de L e K. Pode envolver três possi- da representa um nível de consistência aceitá-
bilidades: a) expressa um processo de mudan- vel. Já um escore de 4 ou mais indicaria “uma
ça social, em que L reflete defesas anteriores, questionável confiabilidade” (p.141).
e K, sentimentos e preocupações recentes; b) Embora tenha havido dúvidas sobre a vali-
há simulação para passar uma boa imagem dade discriminativa do Índice TR, para diferen-

PSICODIAGNÓSTICO – V 459
QUADRO 31.1 Hipóteses de Vincent (1987)*, só aplicáveis em ambiente clínico
Elevação das escalas de validade Perfil Características dos pacientes
L: T=70 ou maior Provavelmente inválido Admitem a patologia; apresentam grande
F: T=70 ou maior e menor que T=95 estresse; mostram-se defensivos.
K: T=70 ou maior
L: T=70 ou maior Provavelmente válido Admitem a patologia e grande estresse;
F: T=70 ou maior e menor que T=95 mostram-se defensivos e ingênuos.
K: T menor que 70
L: T menor que Validade questionável Admitem a patologia; procuram dar a
F: T=70 ou maior e menor que T=95 imagem de bom ajustamento (provável
K: T=70 ou maior ajustamento a uma psicopatologia
duradoura ou presença de transtorno
grave, com defensividade sem sucesso).
L: T=70 ou maior Infreqüente Possível defensividade ingênua, com
F: T menor que 70 rebaixamento indevido das escalas clínicas;
K: T menor que 70 comum em “neuróticos”, com pouco
insight, repressão e negação.
L: T menor que 70 Validade questionável Defensividade extrema, com rebaixamento
F: T menor que 70 indevido das escalas clínicas; procuram dar
K: T=70 ou maior impressão de adequação e normalidade;
resistência à psicoterapia; freqüentemente,
problemas psicológicos afetando a
condição física.
L: T menor que 70 Válido Sentimentos negativistas em relação a si
F: T entre 80 e 94 mesmos; acentuada perturbação emocional;
K: T menor que 70 aceitam psicoterapia; pode haver
“superdramatização” e/ou reação a aguda
crise emocional.
L: T menor que 70 Válido Presença de importante perturbação
F: T entre 70 e 89 emocional.
K: T menor que 70
L: T entre 60 e 69 Válido Acentuada defensividade e evasividade;
F: T menor que 70 insight escasso; comum em “neuróticos”.
K: T entre 60 e 69
L: T menor que 60 Válido Defensividade, inibição, pouco insight;
F: T menor que 70 relações interpessoais difíceis; comum em
K: T entre 60 e 69 “neuróticos”.
L: T entre 60 e 69 Válido Ingenuidade e defensividade; procuram dar
F: T menor que 70 boa imagem de si mesmos; convenciona-
K: T menor que 60 lismo e certa rigidez; pouca tolerância ao
estresse.
L: T menor que 60 Válido Apresentam atitude honesta na testagem.
F: T menor que 70
K: T menor que 60
*Resumidas e adaptadas.

ciar sujeitos que respondem de forma randô- do, em combinação com a escala de Descuido
mica ou não (Rogers, Dolmetsh & Cavanaugh, (CLS), cujos itens são apresentados no Quadro
1983), hoje em dia, seu uso está incrementa- 31.2.

460 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 31.2 Escala de Descuido (CLS) b) ME e, pelo menos, o escore T de quatro
Par de itens Resposta desviante escalas ≥ 70,
10-405 Mesma
pode-se afirmar que o sujeito está dando a
17-65 Diferente impressão de apresentar um grave transtorno,
18-63 Diferente embora haja provável exagero na sintomato-
49-113 Mesma logia relatada, como possível apelo para se
76-107 Mesma submeter à psicoterapia. Não obstante, “está
88-526 Mesma
137-216 Mesma
ansioso em vista da possibilidade de ser rejei-
177-220 Diferente tado para tratamento” (Levitt & Gotts,1995,
178-342 Mesma p.128). As hipóteses diagnósticas prováveis são
286-312 Diferente de transtorno psicótico grave, transtorno de
329-425 Mesma personalidade borderline ou, ainda, de trans-
388-480 Diferente
torno obsessivo-compulsivo grave.
Fonte: Levitt & Gotts, 1995, p.115.

Índice F-K
O escore da escala de Descuido (CLS) cor-
responde ao número de pares em que a res-
Os estudos a respeito de simulação ou da ten-
posta foi desviante.
dência a distorcer as respostas, no sentido de criar
uma melhor ou pior imagem de si mesmo, leva-
ram ao desenvolvimento de um índice especial,
Hipóteses de validade de Levitt e Gotts
F-K, que resulta da diferença entre escores bru-
tos de F e K, chamado de índice de dissimulação
Segundo Levitt e Gotts (1995), a validade de um
(Gough, 1963), que pretende avaliar “a probabi-
protocolo pode ser avaliada pela fórmula
lidade de uma pessoa estar produzindo um per-
TR + CLS. fil inválido” (Groth-Marnat, 1999, p.238).
F-K = +12 (mulheres normais) ou +17 (ho-
• Se o total é inferior a 7, isso significa que
mens normais)/+25 (pacientes psiquiátricos do
o sujeito respondeu com honestidade, sendo
sexo feminino) ou +27 (pacientes psiquiátri-
possível considerar o protocolo como válido.
cos do sexo masculino)**. Para indicar simula-
• Se a soma recai entre 7 e 9, a validade é
ção entre pacientes psiquiátricos, os valores são
questionável, devendo-se ter muito cuidado
bem mais altos do que para a população nor-
para fazer alguma interpretação, com base nas
mal, em vista da correlação existente entre a
escalas de sintomas (1, 2, 7 e 8) e das escalas
escala F e algumas escalas clínicas.
sutis (vide em Escalas clínicas, mais adiante).
Via de regra, pode-se afirmar que quanto
• Se o total é maior que 9, isso pode ocor-
mais elevado esse índice, maior é a probabili-
rer por várias razões:
dade de simulação, porém, sem esquecer que,
a) confusão mental (podendo ser atribuível
às vezes, F-K cresce, seja por uma intenção de
a estresse ou a ingestão de drogas);
pedir ajuda, seja como uma reação temporária
b) escassa compreensão verbal ou limita-
a uma situação estressante. Ainda, observa-se
ção intelectual;
que pode haver uma tendência à elevação deste
c) falta de cooperação.
escore em pessoas que dramatizam exagera-
• Se o total é inferior a 7, mas se cumpre
damente suas dificuldades, para obter atenção
uma das duas condições seguintes:
ou para manipular os demais. Conseqüente-
a) ME (média dos escores T das escalas clí-
mente, o índice F-K pode ser alto em persona-
nicas*) ≥ 75 e
lidades narcisistas ou histriônicas.

*Vide como calcular ME em Nível global de ajustamen-


to, no Passo 5, do Capítulo 30. **Dados apresentados por Groth-Marnat, 1999, p.238.

PSICODIAGNÓSTICO – V 461
F-K = -11 ou menos. Este nível de escore tão grande como no caso de preocupações hi-
costuma indicar minimização ou negação de pocondríacas (Brozek & Kjenaas, 1963). Não
dificuldades, bem como uma tendência a dar obstante, nem sempre as queixas são simples-
uma impressão favorável de si mesmo. Em con- mente funcionais, principalmente em idosos.
seqüência, qualquer interpretação sobre outros Mas, quando pode ser documentada uma
dados do perfil deve ser feita com muita cau- doença física, é possível reconhecer um forte
tela. componente psicológico, com exagero da sin-
F-K = -20 ou menos. Tal índice se associa tomatologia, sem que os sujeitos demonstrem
com extrema defensividade. Pode ser atribuí- insight sobre as implicações emocionais de suas
do “a fraude consciente ou a uma incapacida- queixas. Então, passam de médico a médico,
de das pessoas de admitirem qualquer inade- já que os problemas são duradouros, não se
quação pessoal” (Groth-Marnat, 1999, p.238). associando com estresse imediato (Vincent,
Este nível de escore pode sugerir negativismo, 1987). Entretanto, os sujeitos apresentam a
recusa em cooperar e pouco insight, sendo mau habilidade de frustrar os médicos, pois “solici-
o prognóstico para a psicoterapia. tam cuidado e atenção e, contudo, criticam e
rejeitam a ajuda que lhes é oferecida” (Groth-
Marnat, 1984, p.274). Conseqüentemente, pro-
ESCALAS CLÍNICAS cedimentos cirúrgicos, em casos de lombalgia,
com elevação na 1, envolvem um mau prog-
No desenvolvimento deste item, procuraremos nóstico. Por outro lado, psicoterapia com tais
dar uma idéia do conteúdo e da significação pacientes é um processo difícil. São pessoas
de cada escala clínica. Serão apresentadas tam- pessimistas, queixosas, inseguras, defensivas,
bém as descrições mais comuns de indivíduos imaturas, egocêntricas e manipuladoras.
que se caracterizam por escores baixos, mode- A escala 1 é considerada uma escala de sin-
rados ou altos. Convém salientar, porém, que toma, assim como a 2, a 7 e a 8 (Trimboli &
tais características podem vir a ser bastante Kilgore, 1983).
diferentes, quando interagem com outras es- A elevação da escala 1, muitas vezes, pode
calas, constituindo determinados padrões (ti- ser concomitante a elevações das escalas 2, 3
pos de códigos), que serão discutidos mais e 7, refletindo “graus correspondentes de de-
adiante. Por outro lado, a menos que haja re- pressão, conversão ou de estados de ansieda-
ferência explícita a adolescentes, as descrições de” (Groth-Marnat, 1999, p.240). Uma confi-
aplicam-se mais especificamente a adultos. guração típica é caracterizada pela elevação da
Eventualmente, serão sugeridas algumas hipó- 1 e da 3, acompanhada por baixa significante,
teses diagnósticas a serem consideradas no de 10 pontos ou mais, da escala D. Trata-se do
contexto clínico do caso em questão. “V conversivo”, que será analisado no item
sobre o código 13/31.
Escores altos. De um modo geral, aplicam-
Escala 1 (Hs) se as descrições referentes à significação clíni-
ca da escala 1, do início deste item, isto é, são
A escala 1 compreende basicamente queixas, indivíduos imaturos, autocentrados, lamurien-
preocupações e sintomas relacionados com a tos, queixosos, exigentes, pessimistas, teimo-
saúde corporal. Em casos típicos, essa série de sos, cínicos (DeMendonça, Elliot, Goldstein et
queixas persiste, mesmo na ausência de acha- alii, 1983), narcisisticamente egocêntricos e
dos médicos que as justifiquem, restringindo manipuladores (Groth-Marnat, 1999). Entre as
a extensão das atividades e relações interpes- últimas, registram-se queixas que envolvem o
soais do sujeito. Na realidade, queixas genuí- aparelho digestivo, de fadiga e cefaléia, mas
nas, sem complicações neuróticas, embora ele- raramente chegam a ser incapacitantes. Esco-
vem um pouco os escores, em comparação com res muito elevados relacionam-se com uma
os de sujeitos normais, não causam elevação variedade muito grande de sintomas. Isso pode

462 JUREMA ALCIDES CUNHA


ocorrer em pacientes com traços de tipo psi- QUADRO 31.3 Itens da escala Drev
cótico (como esquizóides, esquizoafetivos, es- 002(F) 008(F) 009(F) 020(F) 032(V)
quizofrênicos ou na depressão psicótica, “que 041(V) 046(F) 052(V) 067(V) 076(V)
estão tendo delírios somáticos (verifique ele- 082(V) 086(V) 088(F) 107(F) 122(F)
152(F) 159(V) 178(F) 182(V) 207(F)
vações nas escalas 6, 7, 8 e 9)” (Groth-Marnat,
217(V) 236(V) 242(F) 259(V) 272(F)
1999, p.240). 290(V) 301(V) 309(F) 317(V) 335(V)
Implicações terapêuticas. Pessoas com es- 356(V) 371(F) 379(F) 397(V) 403(F)
core elevado na escala 1 apresentam enorme 407(F) 473(V) 549(V)* (C013)(V)* (C094)(V)*
dificuldade de admitir alguma explicação psi- (C184)(V)* (C346)(F)* (C146)(V)* (C149)(V)* (C463)(V)*
cológica para seus problemas. Em vista disso, Símbolos: V – verdadeiro; F – falso.
Fonte: Beckwith, Hammond & Campbell, 1973, p.608.
mostram-se críticas e rebeldes sobre possibili- *Itens do California Psychological Inventory, incluídos na cons-
dades de ajuda terapêutica. No entanto, se há trução da escala originalmente, mas que, segundo os autores,
podem ser excluídos.
elevação concomitante na escala 7, o prognós-
tico pode ser melhor, pela presença de ansie-
dade. Também é recomendável um assegura-
mento de que seus sintomas físicos não serão sem os itens de correção da escala D original,
ignorados. mas que apresenta uma correlação de 0,86,
Escores baixos. Os sujeitos podem ser des- para o sexo masculino, e 0,87, para o sexo fe-
critos como ativos, capazes e responsáveis (De- minino, com a escala 2. Abrange “sentimen-
Mendonça, Elliot, Goldstein et alii, 1983), es- tos de infelicidade, pessimismo, desesperança,
crupulosos ou, até, moralistas (Groth-Marnat, apatia, descontentamento e inadequação pes-
1984). Contudo, as interpretações devem ser soal” (p.607).
feitas com cautela, porque o escore, no sexo Da mesma forma, parece importante citar
feminino, basicamente se associa com ausên- o desenvolvimento das subescalas D-O e D-S,
cia de preocupações e queixas somáticas. criadas por Wiener e Harmon, que, ainda hoje,
parecem ter boa aplicação clínica (Wiener,
1963), com sua divisão dos itens da escala D
Escala 2 (D) em óbvios e sutis (vide Quadro 31.4).
Os itens óbvios são considerados mais dis-
A escala D foi desenvolvida para medir o sinto- criminativos de casos de depressão, enquanto
ma clínico da depressão. É considerada, como os itens sutis parecem importantes no exame
a escala 1, a 7 e a 8, como uma escala de sinto- de sujeitos defensivos, mas mais inteligentes e
ma (Trimboli & Kilgore, 1983). Aliás, nos estu- sofisticados (Dahlstrom & Welsh, 1962).
dos iniciais, explicitamente é dito que esta es- A escala 2 é uma medida muito sensível de
cala foi desenvolvida para medir a depressão depressão, mas se recomenda verificar as rela-
sintomática, e o autores justificaram a expres- ções da 2 com a 7 (que sugere intrapunitivida-
são em vista de seu desejo de evitar que o ter- de) e com as escalas 1, 2 e 3, a “tríade neuróti-
mo depressão se associasse a algo diverso do ca”, procurando os códigos correspondentes,
que a presença de baixo moral, falta de espe- porque, naturalmente, a sintomatologia não
rança e insatisfação do paciente em seu esta- será somente de depressão.
do atual, no momento da testagem (Hathaway A elevação da escala 2 é bastante impor-
& McKinley, 1967). Não obstante, os itens da tante, se considerarmos a sua unidimensiona-
escala 2 abrangem melancolia, lentidão física, lidade teórica com a escala 9, sendo que a dis-
sentimentos subjetivos de depressão, apatia tância entre os escores T de ambas pode ca-
mental e mau funcionamento físico (Groth- racterizar a gravidade de um quadro depressi-
Marnat, 1999). vo. Assim, a elevação da escala 2 cinqüenta
Beckwith e colegas (1983) desenvolveram pontos de escore T acima da 9 é compatível
uma subescala, de grande consistência interna, com a hipótese da presença de uma depressão
para medir depressão, a Drev (vide Quadro 31.3), psicótica (Trimboli & Kilgore, 1983). Porém,

PSICODIAGNÓSTICO – V 463
QUADRO 31.4 Escala D-O (Depressão Óbvia) e escala D-S (Depressão Sutil)
Depressão óbvia Depressão sutil
Certo Certo
23 32 41 43 52 67 86 104 138 142 158 159 5 130 193
182 189 236 259 290
Errado Errado
2 8 9 18 36 46 51 57 88 95 107 122 30 39 58 64 80 89 98 145 155 160 191 208
131 152 153 154 178 207 242 270 271 272 285 233 241 248 263 296
Sexo masculino:* Sexo masculino:*
Média: 7,84 Desvio padrão: 4,43 Média: 10,36 Desvio padrão: 2,77
Sexo feminino: Sexo feminino:
Média: 9,64 Desvio padrão: 4,92 Média: 11,03 Desvio padrão: 2,71
*As escalas e os dados estatísticos são de Wiener & Harmon (1946), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.405.

nem sempre os dados do MMPI são adequa- trom & Welsh, 1962). Contudo, não significa
dos para o levantamento de uma hipótese diag- essencialmente um sinal de mau prognóstico.
nóstica, porque é necessário levar em conta Enquanto envolve um descontentamento “em
diversos aspectos do perfil para verificar a com- relação ao autoconceito pessoal e uma dispo-
patibilidade com um determinado transtorno. sição para mudar, ou tentar mudar, pode ser
Contudo, a relação entre a 2 e a 9 permite, um sinal prognosticamente promissor” (Marks
muitas vezes, a identificação de um estado & Seeman, 1963, p.51). Para melhor avaliar a
emocional que, embora transitório, pode ser motivação para mudar, é importante observar
motivo para uma internação ou constituir o se existem elevações moderadas da 2 e da 7,
foco de uma terapia. As regras do estado de- que subentendem a presença de uma orienta-
pressivo, apresentadas por Gilberstadt e Du- ção introspectiva, associada com tensão, a
ker (1965), são as seguintes: a) D entre 70 e consciência da problemática pessoal, que cons-
79, Ma < 40; b) D entre 80 e 89, Ma < 50; c) D tituem uma indicação para o êxito de uma psi-
> 100, Ma < 60. coterapia (Groth-Marnat, 1999).
Escores altos. Se os escores são mais mode- A elevação na escala e suas combinações
rados, pode-se tratar de uma resposta a uma com algumas outras escalas podem se asso-
crise situacional. Na realidade, é possível que ciar com comportamento auto-agressivo. A ele-
traços pessoais se acentuem frente aos proble- vação da 2 não se relaciona só com depressão,
mas, observando-se mais pessimismo, desam- mas é uma indicação de que as defesas contra
paro e desesperança, o que pode suscitar sen- a ansiedade não são suficientes (particularmen-
timentos de inadequação, com reflexos na área te com escores altos). Ao atingir o escore 80,
de trabalho e na vida em geral (Groth-Marnat, há um quadro de depressão clínica, podendo,
1999). À medida que os escores crescem, pa- a partir daí, estar presente um potencial suici-
recem maiores os problemas, aumentam as da, cujo risco é maior se há elevação de outras
dificuldades, tornando-se o sujeito sensível, ir- escalas, especialmente da 4 e da 9 (Trimboli &
ritável e, eventualmente, distraído, com refle- Kilgore, 1983) ou, segundo Groth-Marnat
xos nas relações interpessoais. “Seu sentimen- (1999), da 4, 7, 8 e/ou 9. Se isso ocorrer, reco-
to de desencorajamento pode resultar em re- menda-se uma avaliação nesse sentido, princi-
tardamento psicomotor, letargia e isolamen- palmente se tendências suicidas são confirma-
to” (p.242). Aumentam as queixas somáticas, das pelos itens críticos (ver adiante). Tal avalia-
podendo surgir idéias de morte ou de suicídio. ção se torna extremamente importante para
Implicações terapêuticas. É a elevação mais avaliar se, no caso, seria recomendável uma
freqüente na população psiquiátrica (Dahls- internação psiquiátrica.

464 JUREMA ALCIDES CUNHA


Escores baixos. Os sujeitos podem ser des- Por outro lado, a escala 3 é muito impor-
critos como entusiastas, gastadores, desinibi- tante na investigação da operação de meca-
dos, autoconfiantes, ativos, atentos, alegres e nismos de defesa, parecendo ficar sugerido o
enérgicos (DeMendonça, Elliot, Goldstein et alii, uso da negação, já em elevações de 60 ou mais;
1984). Não obstante, o escore baixo pode ser porém, de um modo geral, as elevações da 3
compatível com negação da depressão ou, sim- parecem associadas com uma tendência de
plesmente, ausência das características asso- evitar a consciência de conflitos internos, seja
ciadas com os escores altos, já que a escala é mantendo-os em nível inconsciente, seja cana-
unipolar (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, lizando-os através de sintomas somáticos, isto
1972). é, através da repressão. Assim, os sintomas fí-
sicos desses pacientes “servem como uma ex-
pressão indireta de seus conflitos. Seus traços
Escala 3 (Hy) podem ser consistentes com os de uma perso-
nalidade histriônica, no sentido de que eles
A escala 3 foi desenvolvida no interesse de diag- requerem amor e apoio social, mas fazem isto
nosticar pacientes que apresentavam transtor- de uma maneira indireta e manipulativa. Têm
nos com base psicogênica. A tendência desses facilidade em estabelecer relações, mas estas
pacientes de utilizar sintomas somáticos no são superficiais. Podem atuar sexual ou agres-
manejo de seus conflitos ou, ainda, para evi- sivamente, mas “têm uma conveniente falta de
tar responsabilidades mais maduras, embo- insight seja sobre seus motivos subjacentes ou
ra possa aparecer somente em situações de sobre seu impacto nos outros” (Groth-Marnat,
estresse, foi considerada no desenvolvimen- 1999, p.243).
to da escala. A escala tem um efeito atenuante sobre as
A escala inclui itens que se associam com a demais escalas, inclusive sobre a 6 e a 8, cons-
presença de queixas e sintomas somáticos e tituindo o seu escore alto uma contra-indica-
com a habilidade social de negar tais sintomas, ção de psicose, ou, segundo Groth-Marnat
de forma que, muitas vezes, “parecem ser (1999), reduzindo as possibilidades de um diag-
mutuamente contraditórios” (Dahlstrom, Wel- nóstico de psicose, mesmo ante a presença de
sh & Dahlstrom, 1972, p.191). Esta caracterís- elevações das escalas 6 e 8.
tica permitiu o desenvolvimento de suas su- A elevação na escala 3 freqüentemente se
bescalas, Ad (administração de sintomas) e Dn acompanha por elevações nas escalas 1 e 2
(negação de sintomas), que apresentam corre- (vide códigos correspondentes).
lação negativa, em normais (vide Quadro 31.5). Escores altos. Se os escores são moderada-
Da mesma forma, a correlação das subescalas mente elevados, pessoas oriundas de bons
Hy-I (escala Hy óbvia) e Hy-S (escala Hy sutil), ambientes socioculturais podem demonstrar
apresentadas no Quadro 31.6, é negativa em um bom ajustamento. Também tende a haver
normais, mas positiva em pacientes. certa elevação da 3 em indivíduos que querem
A escala 3, embora construída especifica- se apresentar de forma favorável e negar pro-
mente visando ao diagnóstico da sintomato- blemas (como em situação de seleção para
logia clássica da conversão, só é geralmente emprego). Não obstante, quando a elevação
sugestiva deste, com um escore T = 80 ou mais aumenta, “há um exagero da negação, soma-
(Trimboli & Kilgore, 1983). Já McKinley e Ha- tização, dissociação e baixos níveis de insight”
thaway (1963) consideravam que, se no mo- (Groth-Marnat, 1999, p.244). Os sujeitos são
mento da testagem o sujeito estivesse sob ten- descritos como imaturos, autocentrados, exi-
são e apresentasse indícios sintomáticos, a es- gentes, egoístas, sugestionáveis e amigáveis
cala o identificaria, o mesmo ocorrendo, pro- (DeMendonça, Elliot, Goldstein et alii, 1983).
vavelmente, se estivesse numa zona fronteiri- Suas relações interpessoais são superficiais,
ça. Mas, se o contrário fosse verdadeiro, a es- imaturas, narcisistas e sugestionáveis, buscan-
cala não se mostraria sensível à problemática. do produzir efeitos emocionais e conseguir afei-

PSICODIAGNÓSTICO – V 465
QUADRO 31.5 Subescalas Ad e Dn da escala 3

Ad – Admissão de sintomas (32 itens) Dn – Negação de sintomas (26 itens)


Certo Certo

10 23 32 43 44 47 76 114 179 186 189 238


Errado Errado

2 3 7 8 9 55 103 107 128 137 153 160 6 12 26 30 71 89 93 109 124 129 136 141
163 174 175 188 190 192 230 243 147 162 170 172 180 201 213 234 265 267 279
289 292
Sexo masculino:* Sexo masculino:*
Média: 4,91 Desvio padrão: 4,23 Média: 12,13 Desvio padrão: 4,52
Sexo feminino: Sexo feminino:
Média: 6,84 Desvio padrão: 4,91 Média: 12,45 Desvio padrão: 4,26
*As escalas e os dados estatísticos são de Little & Fischer (1958), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.408.

QUADRO 31.6 Subescalas Hy-O e Hy-S da escala 3

Hy-O – Histeria óbvia (32 itens) Hy-S – Histeria sutil (28 itens)

Certo Certo

10 23 32 43 44 47 76 114 179 186 189 238 253

Errado Errado

2 3 7 8 9 51 55 103 107 128 137 153 6 12 26 30 71 89 93 109 124 129 136 141 163
174 175 188 192 230 243 274 147 160 162 170
172 180 190 201 213 234 265 267 279 289 292

Sexo masculino:* Sexo masculino:*


Média: 4,67 Desvio padrão: 4,22 Média: 12,76 Desvio padrão: 4,53
Sexo feminino: Sexo feminino:
Média: 6,66 Desvio padrão: 4,77 Média: 13,18 Desvio padrão: 4,20
*As escalas e os dados estatísticos são de Wiener & Harmon (1946), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.408.

ção e apoio, utilizando manobras manipulati- terapeuta ou a se mostrar verbalmente agres-


vas para isso. Têm grande dificuldade de lidar sivos.
com agressão e estresse, e seus sintomas físi- Escores baixos. Os sujeitos são descritos
cos tendem ou a se acentuar ou a se atenuar, como convencionais, constritos, isolados e con-
reativamente, com a intensificação ou diminui- trolados, apresentando campo de interesses
ção do estresse (Groth-Marnat, 1999). estreito e sendo, socialmente, pouco partici-
Implicações terapêuticas. Como, no núcleo pantes (DeMendonça, Elliot, Goldstein et alii,
de seus sintomas, encontra-se um conflito en- 1983; Groth-Marnat, 1984).
tre dependência e independência, os pacien-
tes aparentam entusiasmo no início da tera-
pia, mas terão dificuldade em demonstrar al- Escala 4 (Pd)
gum progresso, em vista de seu uso extensivo
de repressão e negação de seus problemas, De acordo com um ponto de vista atual, a es-
chegando, finalmente, a tentar manipular o cala 4 avalia “o nível de ajustamento social”,

466 JUREMA ALCIDES CUNHA


sendo que os seus itens abrangem várias áreas, nante, por terem estilos de vida pouco con-
como “o grau de alienação da família, imper- vencionais ou por apreciarem modos de vida
meabilidade social, dificuldades com a escola, que envolvem risco. É bom lembrar, ainda, que
ou com figuras de autoridade, e alienação de os sujeitos utilizados no desenvolvimento da
si mesmo e da sociedade” (Groth-Marnat, escala eram muito jovens e apresentavam uma
1999, p.248). longa história de atos delinqüentes (furtos,
A escala 4 foi desenvolvida para medir o vagabundagem, promiscuidade sexual, alcoo-
padrão que, na época, era conhecido clinica- lismo, falsificação de assinatura, etc.), mas não
mente como personalidade psicopática, ou, em as chamadas transgressões capitais. Como con-
termos de MMPI, como desvio psicopático. De troles, foram usados estudantes de college.
um modo geral, destinava-se a identificar um Desta maneira, as características associadas à
desajustamento social ou, mais especificamen- escala podem lembrar os efeitos que podem
te, “transtornos de caráter, associados com ter as mudanças de uma personalidade em
déficits no controle dos impulsos” (Vincent, transição (Hathaway & Monachesi, 1965), in-
1987, p.139), que levam a comportamentos de clusive a resistência do adolescente às repres-
atuação. Assim, indivíduos com elevação nes- sões sociais.
ta escala muitas vezes apresentam caracterís- Na escala, há pelo menos nove itens que se
ticas associais e amorais, mostrando um pa- referem a dificuldades no lar e dois que alu-
drão de comportamento repetitivo e persisten- dem explicitamente à escola. Considerando,
te de natureza anti-social, em flagrante des- além desses, alguns itens que envolvem senti-
consideração de normas sociais e com viola- mentos disfóricos e dificuldades no relaciona-
ção dos direitos dos demais. Freqüentemente, mento social e heterossexual, que são comuns
causam boa impressão inicial e mantêm um na adolescência, facilmente a média é ultra-
relacionamento aparentemente adequado, até passada. Na verdade, alguns problemas implí-
ocorrer uma situação que envolva um teste de citos parecem sintônicos com a fase da ado-
sua consideração pelos demais, de seu sentido lescência, especialmente os que tratam de dis-
de responsabilidade e da manifestação de sua córdia familiar, dificuldades com figuras de
lealdade. Na realidade, são imaturos, egocên- autoridade e moral baixo. Então, a elevação
tricos, impulsivos, emocionalmente instáveis. na 4 é considerada menos desviante quando
Julgados em termos dos sintomas de “neuro- ocorre no fim da adolescência e no começo da
se”, dariam uma impressão de normalidade, idade adulta.
por parecerem imunes a sentimentos de ver- Portanto, só é possível levantar alguma hi-
gonha e embaraço (Hathaway & Monachesi, pótese, considerando o restante do perfil, uma
1965), à ansiedade e à depressão, quando a vez que certas escalas podem ter efeito exci-
punição é vista apenas como possível (Dahls- tante ou inibitório sobre certas tendências ou
trom, Welsh & Dahlstrom, 1972), embora os comportamentos, associados à elevação da
apresentem, como reação situacional, se che- escala 4.
gam a ser presos (Vincent, 1987), com senti- A 4 é considerada uma escala fortemente
mentos de tédio e irritação. Assim, têm dificul- excitativa, no sentido de que as características
dade em aprender a partir da conseqüência de a ela associadas, inclusive a delinqüência, são
seus atos (Groth-Marnat, 1999). Mostram alie- exacerbadas, à medida que sua elevação au-
nação em relação à sua família e sociedade e, menta. Mas, quando se combina com escalas
freqüentemente, têm histórias de fracasso es- inibitórias, como a 1, a 7 e, mais especialmen-
colar e ocupacional. Portanto, as elevações da te, com a 2, a expectativa de delinqüência é
4 parecem se associar com delinqüência ou pro- muito menor, em vista da ansiedade e culpa
pensão à delinqüência. refletida sobretudo pela 2. Quando se combi-
Entretanto, muitos grupos podem ter es- na com a escala 9, a possibilidade de compor-
cores um tanto elevados, por sua desconfor- tamento impulsivo e atuador é muito elevada,
midade com valores e regras da cultura domi- mesmo que haja elevações na 1 e na 7 (Dahls-

PSICODIAGNÓSTICO – V 467
trom, Welsh & Dahlstrom, 1972). Mas, se as to escolar, profissional, marital e envolvimen-
elevações da 4 e da 9 são apenas relativamen- to com álcool, drogas e Justiça.
te altas, tais tendências, embora presentes, são Implicações terapêuticas. Indivíduos com
canalizadas por meios e limites socialmente escores elevados na escala 4 aparentam ser
aceitáveis, enquanto, se a combinação é com bons candidatos à psicoterapia, porque geral-
a 2, o comportamento anti-social aparece de mente se mostram “fluentes, vigorosos e inte-
forma menos manifesta e disfarçada. Já sua ligentes”. Não obstante, “sua hostilidade sub-
elevação concomitante com a 8 ainda se asso- jacente, impulsividade e seus sentimentos de
cia com comportamento anti-social, porém, alienação eventualmente vêm à tona” (Groth-
num nível sugestivo de psicose (Groth-Marnat, Marnat, 1999, p.246). Isso ocorre tanto por não
1984; Groth-Marnat, 1999). assumirem as conseqüências de seus atos, ten-
Escores altos. Os sujeitos são descritos como tando projetar a culpa nos outros, por não se
levianos, rebeldes, ressentidos, impulsivos, comprometerem numa relação, como porque
autocentrados, agressivos, hostis, irresponsá- dificilmente aceitam a terapia voluntariamen-
veis, sociáveis (DeMendonça, Elliot, Goldstein te. Conseqüentemente, o término do tratamen-
et alii, 1984), hedonistas, anti-sociais (Butcher to é breve, a menos que apresentem algum
& Pancheri, apud Trimboli & Kilgore, 1983), ira- desconforto (vide escalas 2 e 7) e desejem
dos, impulsivos, alienados, alheios a leis e re- mudar. Intervenções terapêuticas breves, com
gulamentos, com dificuldade de planejamen- objetivos bem definidos de mudanças ou
to, superficiais em suas interações sociais, des- motivações externas (continuidade no empre-
leais, com descaso pelas conseqüências de seus go, por exemplo) podem ser mais eficazes.
atos e dificuldade de aprender com a experiên- Escores baixos. Os sujeitos são descritos
cia, mesmo em psicoterapia (Groth-Marnat, como convencionais e rígidos (DeMendonça,
1984). Se confrontados com as conseqüências Elliot, Goldstein et alii, 1984), submissos, com-
dos seus atos, podem apresentar remorso ge- placentes, conformistas, bonachões, alegres,
nuíno, mas de curta duração (Groth-Marnat, confiáveis, despretensiosos (Dahlstrom, Welsh
1999). Suas características negativas geralmen- & Dahlstrom, 1972). Se confrontados com as
te se tornam manifestas em períodos de es- conseqüências dos seus atos, podem apresen-
tresse, já que, inicialmente, causam boa impres- tar remorso genuíno, mas de curta duração
são. Da mesma forma, embora aparentemen- (Groth-Marnat, 1999). Apesar disso, parece
te livres de conflitos e de ansiedade, os demons- haver uma diferença entre homens e mulhe-
tram numa situação de dificuldade mais séria. res, possivelmente sendo estas mais coopera-
Muitas vezes, têm histórias de mau ajustamen- doras e agradáveis.

QUADRO 31.7 Subescalas Pd-O e Pd-S da escala 4


Pd-O – Desvio psicótico óbvio (28 itens) Pd-S – Desvio psicótico sutil (22 itens)
Certo Certo
16 24 32 33 35 38 42 61 67 84 94 106 21 102 127 239
110 118 215 216 224 244 245 284

Errado Errado
8 20 37 91 107 137 287 294 82 96 134 141 155 170 171 173 180 183 201 231
235 237 248 267 289 296
Sexo masculino:* Sexo masculino:*
Média: 5,88 Desvio padrão: 3,62 Média: 8,89 Desvio padrão: 2,51
Sexo feminino: Sexo feminino:
Média: 5,30 Desvio padrão: 3,48 Média: 8,68 Desvio padrão: 2,41
*As escalas e os dados estatísticos são de Wiener & Harmon (1946), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.409.

468 JUREMA ALCIDES CUNHA


Escala 5 (Mf) homem, sugere que “ele expressa sua insatis-
fação através da ação; tem pouco insight a res-
A escala 5 foi desenvolvida para identificar ca- peito de seu comportamento e enfatiza a for-
racterísticas de personalidade da inversão se- ça física”, enquanto um escore alto na escala
xual masculina, tida como um subgrupo da 5, com um escore elevado na escala 4, sugere
personalidade psicopática (Dahlstrom, Welsh que o indivíduo “é mais introspectivo, sensí-
& Dahlstrom, 1972), numa época em que a vel, se expressa com clareza, podendo canali-
homossexualidade era ainda considerada como zar seus sentimentos anti-sociais através da
transtorno mental. criação de mudança social” (p.248). Entretan-
A literatura inclui poucos dados, nesse sen- to, a determinação da presença ou não de uma
tido, sobre a escala 5, que foi excluída de gran- elevação na escala 5 deve levar em conta o ní-
de parte dos estudos tradicionais de Minneso- vel de instrução e o status socioeconômico do
ta, por parecer não ter tido êxito quanto à sua sujeito.
destinação (Wong, 1984). São citados vários A interpretação da escala 5, também consi-
estudos, cujos resultados mostram que, em derada uma escala de caráter, é, segundo Trim-
geral, os homossexuais não apresentam esco- boli e Kilgore (1983), bastante complexa, por-
res muito elevados nesta escala, e, hoje em dia, que ela sofre a influência de fatores psicológi-
segundo Groth-Marnat (1999), existem evidên- cos e demográficos, sendo que um desvio ex-
cias claras de que a elevação da escala 5 não tremo, nesta escala, pode “refletir um proces-
se associa com preferência sexual, mas “se re- so de identificação falho, que comprometeria
laciona com o grau com que uma pessoa en- o desenvolvimento de um funcionamento de-
dossa itens que se associam com papéis e inte- fensivo eficaz”, de forma que “os déficits na
resses masculinos ou femininos tradicionais”. identificação também provavelmente enfraque-
Os itens da escala agrupam-se em cinco dimen- ceriam a formação de funções associadas ao
sões, que focalizam “a estabilidade pessoal e ego”. Identificação relaciona-se, no caso, com
emocional, a identificação sexual, o altruísmo, o processo de internalização de papéis sexuais.
a identificação ocupacional feminina e a nega- É importante lembrar, porém, que também a
ção das ocupações masculinas” (p.247). Além escala 2 tem que ver com outro aspecto de
disso, a variação dos escores sofre especial in- identidade, de auto-identidade. A combinação
fluência da inteligência e do nível de escolari- de ambas as escalas “pode se relacionar com
dade. uma forma bastante primitiva de identificação
Embora levando em conta as mudanças com o agressor”, e, assim, “um indivíduo que
ocorridas na sociedade, desde que a escala foi apresenta uma deficiência na auto-identidade
criada, estudos recentes sugerem que os cor- e cuja experiência precoce foi com uma figura
relatos de personalidade, associados com a 5, sádica, pode se identificar com esse sadismo e
continuam idênticos aos relacionados nas pri- lidar com a sua agressão, voltando-se contra si
meiras pesquisas. Entretanto, trata-se de uma mesmo” (p.616 e 621).
escala extremamente complexa, e é difícil a sua Conseqüentemente, mesmo que uma pes-
interpretação. Na realidade, não pode ser con- soa do sexo masculino tenha escores eleva-
siderada uma escala clínica, em estrito senso, dos na 5, isto não é indicativo de homosse-
de vez que não oferece subsídios para identifi- xualidade. Escores muito elevados apenas
car categorias diagnósticas. Não obstante, poderão dar alguma sugestão nesse sentido,
pode ser utilizada subsidiariamente, após a em vista da associação de tal elevação com
interpretação das escalas clínicas propriamen- determinados interesses ou tipos de senti-
te ditas, analisando seus efeitos sobre as ou- mentos, que tradicionalmente foram relacio-
tras escalas. Groth-Marnat (1999) dá o exem- nados com o sexo feminino. Além disso, deve-
plo dos efeitos da escala 5 sobre a escala 4. se assinalar o caráter transparente dos itens,
Diz ele que um escore alto na escala 5, acom- que torna a simulação muito fácil (Groth-
panhado de um escore baixo na escala 4, num Marnat, 1999).

PSICODIAGNÓSTICO – V 469
Níveis de escore para o sexo masculino dos são mais freqüentes no nível socioeconô-
mico baixo, de instrução baixa ou média-infe-
Escores altos. Os sujeitos são descritos como rior, sendo sujeitos com interesses práticos e
espertos, curiosos, espalhafatosos, idealistas, pragmáticos e com capacidade para apresen-
submissos, preocupados, sensíveis, efemina- tar um comportamento dogmático.
dos, imaginativos, inteligentes (DeMendonça,
Elliot, Goldstein et alii, 1984), pacíficos, sociá-
veis (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972), Níveis de escore para o sexo feminino
passivos, com interesses artísticos, muitas ve-
zes, com conflito relacionado com a identida- Escores altos. Uma vez que, na escala 5, para
de sexual, com possíveis tendências homosse- as mulheres, os escores são atribuídos em di-
xuais ou história de problemas matrimoniais. reção oposta do que para os homens, as mu-
Às vezes, observa-se o desenvolvimento de “for- lheres, neste nível de escore, são descritas como
mação reativa contra a passividade, em que “agressivas, dominantes, desconfiadas, hostis”
pode se manifestar uma expressão exagerada (DeMendonça, Elliot, Goldstein et alii, 1984,
de masculinidade, como no escore 5 baixo” p.484), confiantes, espontâneas, desinibidas,
(Groth-Marnat, 1999, p.249). com atividades e ocupações tradicionalmente
Porém, os indivíduos com elevação mode- masculinas, desconformes com estereótipos
rada caraterizam-se por possuírem interesses femininos, “desconfortáveis em muitas situa-
estéticos, artísticos e literários, sendo um es- ções heterossexuais” (Groth-Marnat, 1999,
core freqüente entre estudantes de college. São p.250), quando a expectativa é de que se colo-
pessoas sensíveis, introspectivas, imaginativas, quem num papel feminino (Vincent, 1987). Em
psicologicamente sofisticadas, idealistas, com comparação com as mulheres de escore baixo,
amplo campo de interesses e facilidade de co- apresentam melhores condições de saúde (Gro-
municação. th-Marnat, 1999).
Implicações terapêuticas. Homens com es- Implicações terapêuticas. As mulheres com
cores moderadamente elevados são bons can- escores altos podem demonstrar problemas
didatos à psicoterapia, e é importante frisar que para se ajustar a um programa psicoterápico
a elevação na 5 diminui a probabilidade de atu- mais tradicional, por não valorizarem a intros-
ação de aspectos patológicos. Não obstante, peção e o insight, bem como terem dificulda-
crescendo os escores, podem surgir questões des para expressar verbalmente problemas e
importantes, associadas com traços passivos, emoções, em contraste com as que têm esco-
dependentes, bem como dificuldades de lidar res baixos, exceto quando têm escassa educa-
com agressão e de se relacionar com o sexo ção formal.
oposto. Por outro lado, o homem com escores Escores baixos. Atualmente, sabe-se que os
baixos terá dificuldade de se ajustar a um pro- descritores de mulheres com escores baixos se
grama psicoterápico, pela série de dificulda- diferenciam conforme o nível de escolaridade.
des que o distinguem (Groth-Marnat, 1999). Por exemplo, a mulher com uma escolaridade
Escores baixos. Os sujeitos podem ser des- equivalente ao college é descrita como “terna,
critos como afoitos, à vontade, masculinos, emotiva, tendo uma visão equilibrada sobre o
grosseiros (DeMendonça, Elliot, Goldstein et comportamento típico do papel feminino”.
alii, 1984), práticos, alegres, autoconfiantes, Demonstra interesses estéticos e assume pa-
equilibrados, independentes (conforme Hatha- péis femininos tradicionais, mostrando-se “ca-
way & Meehl, apud Wong, 1984), narcisistas, paz, competente e conscienciosa” (Groth-Mar-
com interesses estreitos, pouco insight e ênfa- nat, 1999, p.250), enquanto as que têm baixo
se “em expressões tradicionais de masculini- nível de instrução podem ser descritas como
dade” no comportamento manifesto (Groth- “caricaturas do papel feminino tradicional”,
Marnat, 1984, p.281). Conforme Trimboli e Kil- tendo probabilidade de serem “modestas, pas-
gore (1984), os escores de baixos a modera- sivas, constritas e submissas”, mas também

470 JUREMA ALCIDES CUNHA


culpando os outros por suas dificuldades. Fre- interpessoal, etc., compatíveis com o uso de
qüentemente, apresentam a chamada “tría- defesas paranóides, podem se encontrar tam-
de neurótica”. Por outro lado, se o escore bai- bém naqueles sujeitos com um T inferior a 35,
xo na escala 5 é acompanhado de uma eleva- desde que eles “sejam capazes de inibir expres-
ção na escala 4, tem-se uma configuração que sões mais manifestas de patologia”, mas que
ficou conhecida como o perfil Scarlett O’Hara, façam uso “de várias formas de projeção e de
caracterizado por “um grau exagerado de fe- variantes primitivas de externalização” (p.616).
mininidade, combinado com manipulações dis- Isso é especialmente verdadeiro quando se tra-
simuladas, sentimentos anti-sociais subjacen- ta de pessoas intelectualmente brilhantes (Gro-
tes e hipersensibilidade” (p.251). th-Marnat, 1999).
Na realidade, observam Marks e Seeman
(1963) que, em 75% dos casos de sujeitos pa-
Escala 6 (Pa) ranóides incluídos no atlas de Hathaway e
Meehl (1967), a elevação desta escala é infe-
A escala 6 foi desenvolvida visando ao diag- rior ao T = 70, e, entre pacientes paranóides,
nóstico do quadro clínico da paranóia. Não cerca de 30% não apresentam absolutamente
obstante, a amostra em que se baseou incluiu escores superiores à área normal. Por tal ra-
outras categorias, que envolviam sintomato- zão, a escala é considerada fraca. Não obstan-
logia paranóide, isto é, quadros clínicos “em te, sua elevação acentuada é típica de sujeitos
que idéias de referência, delírios persecutórios psicóticos, com sintomas paranóides, o que
e de grandeza eram manifestos” (Dahlstrom, vale dizer que há poucos falsos-positivos (Trim-
Welsh & Dahlstrom, 1972, p.207). boli & Kilgore, 1983). Por outro lado, sua com-
Grande parte dos itens envolve “idéias de binação com a escala 8, a despeito de outros
referência, crenças delirantes, suspeição difu- aspectos do perfil, é grandemente sugestiva de
sa, sentimentos de perseguição” e outros (Gro- diagnóstico de esquizofrenia paranóide (Drake
th-Marnat, 1999, p.251). Assim, o conteúdo de & Oetting, 1967; Groth-Marnat, 1999).
alguns itens é claramente psicótico, enquanto Em alguns casos, parece ser de ajuda a uti-
outros envolvem apenas preocupação com os lização das subescalas Pa-O e Pa-S (vide Qua-
motivos percebidos nas ações de outras pes- dro 31.8).
soas. Há uns, inclusive, que parecem menos Escores altos. Os sujeitos são descritos como
pertinentes, se considerados os critérios atuais rígidos, suspeitosos e hostis e, de forma me-
para o diagnóstico da esquizofrenia paranói- nos freqüente, como ressentidos, desconfiados,
de ou do transtorno de personalidade paranói- emocionais e preocupados (DeMendonça, Elli-
de. Ainda há outros cuja direção prevista na ot, Goldstein et alii, 1984), ainda que, numa
resposta é oposta à que seria esperada dentro dimensão normal, segundo Hathaway e Me-
do quadro. ehl, apud Dahlstrom e colegas (1972), os ho-
Marks e Seeman (1963) consideram que o mens possam ser descritos como sensíveis,
fato de alguns itens terem um conteúdo ob- emocionais, prontos a se preocuparem, afetu-
viamente bizarro representa um ponto fraco osos, generosos, agradáveis, sentimentais,
da escala, já que o paciente que deseja ocultar bondosos, pacíficos, cooperadores, corajosos
pensamentos inusitados pode fazê-lo, respon- e com amplitude de interesses. Já as mulheres
dendo na direção não comprometedora. Essa são emocionais, bondosas, sensíveis, francas,
transparência da escala pode mudar a atitude tensas ou dependentes, submissas e com pou-
frente ao teste, pelo próprio fato de o trans- ca autoconfiança. É preciso notar, entretanto,
torno envolver suspeição (Trimboli & Kilgore, que, embora haja na literatura listas de carac-
1983). Conseqüentemente, um escore baixo terísticas da população normal, há probabili-
não exclui essa possibilidade diagnóstica. Trim- dade muito grande da presença de uma pato-
boli e Kilgore (1983) sugerem que sintomas logia mais grave, se o perfil é válido. Por isso, é
mais sutis, como suspeição, hipersensibilidade importante não só a consideração de outras

PSICODIAGNÓSTICO – V 471
QUADRO 31.8 Subescalas Pa-O e Pa-S da escala 6
Pa-O – Paranóia óbvia (23 itens) Pa-S – Paranóia sutil (17 itens)

Certo Certo
16 24 27 35 110 121 123 151 158 202 275 284 15 127 157 299 365
291 293 305 317 326 338 341 364

Errado Errado
281 294 347 93 107 109 111 117 124 268 313 316 319 327 348
Sexo masculino:* Sexo masculino:*
Média: 2,68 Desvio padrão: 2,88 Média: 6,05 Desvio padrão: 2,33
Sexo feminino: Sexo feminino:
Média: 2,87 Desvio padrão: 2,48 Média: 5,54 Desvio padrão: 2,13
*As escalas e os dados estatísticos são de Wiener & Harmon (1946), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.412.

elevações no perfil, bem como o esclarecimen- do sujeito, sua dificuldade de lidar com temas
to, junto ao paciente, do motivo para o assina- afetivos, escasso insight e tendência a projetar
lamento de certas respostas. É possível que se nos outros a culpa. Dificilmente o paciente re-
trate de “uma pessoa paranóide, que é cismá- torna após a primeira sessão, exceto quando
tica e suspeitosa, rumina com rancor e sente sente que foi realmente entendido. Mas, mes-
que não conseguiu da vida a melhor fatia” (Gro- mo assim, tentará manipular a situação, man-
th-Marnat, 1984, p.284). Com escores muito tendo-se em tratamento com dificuldade, em
altos, pode-se registrar desorganização do pen- vista de suas características pessoais. Caso se
samento, idéias de referência, pensamento mostre por demais ressentido, é preciso ava-
delirante, além de obsessões, compulsões e liar o potencial de sua heteroagressão (Groth-
fobias. A suspeição é acentuada, e as pessoas Marnat, 1999).
podem ser descritas como rígidas, irritadas, Escores baixos. Os sujeitos são descritos
ressentidas, vingativas e cismáticas (Groth- como confiáveis e alegres (DeMendonça, Elli-
Marnat, 1999). ot, Goldstein et alii, 1984). Já Dahlstrom e co-
Escores moderados associam-se com maior legas (1972), com base em alguns estudos, re-
probabilidade de tendências psicóticas, mas ferem o termo equilibrado como a caracterís-
ainda é possível haver suscetibilidade e senti- tica mais comum para ambos os sexos. Os ho-
mentos de os sujeitos se acharem de alguma mens são alegres, decididos, mas, constante-
forma prejudicados, com possibilidade de su- mente, descrentes de si mesmos, sem escrú-
gerir suspeição, ressentimento, com base real pulos, pacíficos, autocentrados, cautelosos e
ou imaginária. Os sujeitos projetam a culpa e a com interesses estreitos. As mulheres são con-
hostilidade, expressando os conteúdos agres- vencionais, sérias, maduras, pacíficas, razoá-
sivos de formas indiretas, que envolvem ou- veis, confiáveis ou, ainda, de ajustamento rá-
tras pessoas, enquanto assumem uma atitude pido, firmes, à vontade com os outros, mas não
aparentemente intrapunitiva (Groth-Marnat, confiáveis. Nota-se, pois, que as característi-
1999). cas das pessoas deste nível são muito variá-
Implicações terapêuticas. Uma vez que es- veis, quando não contraditórias. Groth-Marnat
cores muito elevados comumente ocorrem (1984) assinala, então, a importância de dis-
quando está presente um processo psicótico cernir pessoas normais das pessoas paranói-
(a ser confirmado por outros subsídios), é im- des, que conseguem ocultar as manifestações
portante avaliar a possibilidade de o paciente mais flagrantes de patologia. Na realidade,
necessitar medicação. Além disso, as condições estas devem compartilhar das características
para psicoterapia não são boas, dada a rigidez dos escores altos, no que se refere à suscetibi-

472 JUREMA ALCIDES CUNHA


lidade, mau humor, manifesta cautela e sensi- ser quando as elevações são extremamente al-
bilidade acentuada em suas interações. tas, e, então, o desconforto interno deve ser
manejado com recursos farmacológicos pré-
vios. Já sua elevação com a escala 8 deve ser
Escala 7 (Pt) examinada cuidadosamente. Se a 7 ultrapas-
sar a 8, isso significa que o sujeito ainda conti-
A escala 7 foi desenvolvida tendo em vista a nua a lutar contra um processo psicótico, mas,
avaliação do padrão neurótico que, na época, à medida que a 7 vai se tornando significativa-
era designado como psicastenia, incluindo as- mente mais baixa que a 8, quer dizer que a
pectos fóbicos e obsessivo-compulsivos (Ma- luta foi abandonada, e o processo psicótico
rks & Seeman, 1963), e que, embora não mais pode ficar caracterizado (Groth-Marnat, 1999).
em uso, corresponde a “uma característica Escores altos. Escores altos na escala 7 as-
importante e persistente de muitos transtor- sociam-se com apreensão, preocupação, per-
nos psiquiátricos” (Dahlstrom, Welsh & Dahls- feccionismo e tensão, podendo estar presen-
trom, 1972, p.211), semelhante a um trans- tes medos variados. Já quando a elevação não
torno de ansiedade com sintomas obsessivo- é tão acentuada, apesar da presença de certa
compulsivos (Groth-Marnat, 1999). ansiedade, é possível se observar um compor-
A escala 7 é considerada uma escala de sin- tamento mais organizado e persistente, em-
toma, isto é, como a 1, 2 e 8, uma escala “mais bora pouco original, havendo preocupação
vulnerável a flutuações, em função de uma com causas mínimas, que são supervaloriza-
perturbação experienciada” (Trimboli & Kilgo- das. Tais indivíduos com escores altos procu-
re,1983, p.615). Sua elevação isolada pode ser ram manejar a ansiedade com o uso de racio-
interpretada, em termos simples, como ansie- nalização e intelectualização, mas essas defe-
dade e pensamento obsessivo (Gilberstadt & sas são pouco eficazes. Quanto mais se elevam
Duker, 1965), a que se pode acrescentar me- os escores, mais ficam conspícuas as dúvidas,
dos, compulsões e dúvidas (Groth-Marnat, incertezas, indecisões, bem como há um incre-
1999). Não obstante, é algo transparente em mento de meticulosidade da rigidez e há difi-
termos do que avalia e, então pode ser afeta- culdades de concentração. Em vista de certa
da por esforços defensivos, razão pela qual timidez, intensificam-se as dificuldades nas in-
necessita da adição de 1K, como recurso cor- terações sociais, notando-se uma preocupação
retivo. com a aceitação dos outros e a popularidade
É importante observar que pessoas com social. Essas pessoas podem ter padrões rígi-
transtorno obsessivo-compulsivo podem apre- dos, do ponto de vista moral, para julgar a si
sentar baixa do escore T, na escala 7, “porque mesmos e aos demais. Utilizam grande núme-
seus comportamentos e obsessões são efica- ro de rituais para manejo da ansiedade. Quan-
zes na redução de seus níveis de ansiedade” do os escores são extremamente elevados,
(Groth-Marnat, 1999, p.253). Por outro lado, pode ocorrer uma incapacidade para desem-
ainda que o escore alto, na escala 7, “sugira a penho das atividades cotidianas (Groth-Mar-
possibilidade de um transtorno obsessivo-com- nat, 1999).
pulsivo, outros transtornos ou estados situaci- Implicações terapêuticas. Como já foi ob-
onais, relacionados com ansiedade, também servado antes, sujeitos com escores elevados
podem produzir uma elevação” (p.253-254). na escala 7 sentem muito desconforto e ten-
Além de a elevação na 7 se relacionar com são, além de apresentarem certa ineficiência
ansiedade e dúvidas ruminativas, constitui-se cognitiva. Por tal razão, têm motivação para
num indicador importante, do ponto de vista se tratar, bem como para permanecer no pro-
diagnóstico, se for considerada a sua combi- grama terapêutico. Não obstante, seu progres-
nação com algumas outras escalas. A elevação so costuma ser lento. Um foco terapêutico im-
da 2 com a 7 sugere desconforto interno, com- portante envolve a redução das ansiedades,
patível com motivação para a terapia, a não sendo que vários tipos de intervenção podem

PSICODIAGNÓSTICO – V 473
ser indicados, inclusive, em certos casos, com zarros e inusitados e, muito comumente, pela
o uso de medicamentos. Notam-se dificulda- qualidade específica do afeto, enquanto ou-
des no desenvolvimento da terapia de insight, tros, por sua inacessibilidade. Assim, é consi-
em virtude de tendência à intelectualização e derada uma escala fraca, apesar de ser a mais
ruminação, que interferem no processo, em numerosa, pelos itens que inclui e pelo tempo
especial, na adoção de uma atitude voltada devotado a seu desenvolvimento, porque a sin-
para a solução de problemas. Assim, muitas tomatologia é muito heterogênea e complexa
vezes, devem ser considerados outros tipos de para ser avaliada por uma medida escalar. Não
intervenção. Observa-se que, entre pessoas que obstante a melhora operacional obtida com a
procuram terapia, são raros os casos com es- correção K, é preciso muita cautela no diag-
cores baixos na escala 7 (Groth-Marnat, 1999). nóstico, mesmo ante a presença de elevações
Escores baixos. Os indivíduos são descritos importantes.
como autoconfiantes, calmos, capazes, relaxa- Classificada como uma escala de sintoma,
dos e eficientes (DeMendonça, Elliot, Goldstein reflete distorções da realidade (Trimboli & Kil-
et alii, 1984). Em pesquisa citada por Dahls- gore, 1983) ou pensamento confuso, esquizói-
trom e colegas (1972), os homens são equili- de e bizarro (Gilberstadt & Duker, 1965). Além
brados, controlados, independentes e, ainda, disso, inclui temas relacionados com alienação
são descritos como eficientes, capazes, orga- social (e familiar), sentimento de perseguição,
nizados, adaptáveis, polidos, embora tímidos ausência de interesses profundos, dificuldades
e cautelosos. de concentração e de controle, dificuldades na
Tanto homens como mulheres têm menor área sexual, sensações peculiares, medos, preo-
probabilidade de serem críticos e, em geral, têm cupações, etc. Em conseqüência, têm havido
poucos temores. Apesar de as mulheres não numerosos estudos introduzindo refinamentos
costumarem parecer “nervosas”, apresentam para medir aspectos sintomatológicos especí-
tendência a terem pesadelos e se preocupam ficos ou para facilitar o diagnóstico diferencial.
com pequenas coisas. Já em 1965, Harris e Lingoes (apud Dahlstrom,
Welsh & Dahlstrom, 1972) identificaram três
conjuntos de itens, a partir da escala 8: a) a
Escala 8 (Sc) escala de perda do objeto (com a subescala de
alienação social e a de alienação emocional);
O desenvolvimento da escala 8, construída para b) de ausência de domínio do ego (com as su-
diferenciar sujeitos esquizofrênicos de normais, bescalas de funcionamento cognitivo, de fun-
não foi fácil, em parte, pela heterogeneidade cionamento conativo e de defeito de inibição
da própria sintomatologia e por abranger ca- e controle); c) uma escala que compreendeu a
racterísticas contrastantes e, em parte, pela dissociação sensório-motora ou experiências
contaminação com outros quadros que as pri- sensoriais bizarras.
meiras escalas refletiam. Na situação atual, a De um modo geral, as elevações associam-
questão coloca-se de forma mais complexa, se com dificuldades nas interações sociais, afas-
porque, embora esquizofrenia ainda seja uma tamento das mesmas, até a alienação, com uma
classificação utilizada largamente, em certos ênfase na fantasia interior. Há dificuldades de
ambientes psiquiátricos, em outros, os crité- comunicação, que se relacionam com proble-
rios são usados de forma mais precisa, e trans- mas de concentração e de pensamento, che-
tornos que antes se enquadravam na catego- gando ao comprometimento dos processos de
ria esquizofrênica, como o transtorno esqui- pensamento. Os sujeitos não se sentem com-
zotípico e borderline, agora passaram a ser preendidos e enfrentam importantes questões,
abrangidos pelos transtornos de personalida- que têm que ver com valor pessoal e auto-iden-
de (Vincent, 1987). De qualquer modo, a esca- tidade.
la identifica indivíduos que se caracterizam pela Idade, nível de instrução e outras variáveis
presença de idéias e de comportamentos bi- podem contribuir para a determinação do ní-

474 JUREMA ALCIDES CUNHA


vel de elevação verificada. Adolescentes geral- O contato com a realidade vai se tornando mau,
mente apresentam certa elevação, o que pode e o comportamento, excêntrico, podendo se
ser atribuído à sua “maior abertura a experiên- registrar a presença de alucinações. Todavia,
cias inusitadas, à sua perturbação no estabele- entre esquizofrênicos, raramente se apresen-
cimento de um sentido sólido de identidade e tam elevações extremas. Estas, habitualmen-
a maiores sentimentos de alienação” (Groth- te, “refletem experiências inusitadas, relatadas
Marnat, 1999, p.256). por pacientes inusualmente ansiosos, como
Escores também podem se elevar em virtude adolescentes com reações de ajustamento, pré-
de comprometimentos sensoriais, déficits cog- psicóticos, indivíduos com personalidade bor-
nitivos, pelo efeito de drogas ou, ainda, pela derline, ou por pessoas relativamente bem-
familiarização com as práticas de certos gru- ajustadas, que estão simulando” (Groth-Mar-
pos subculturais. nat, 1999, p.257).
Não obstante, é extremamente importante Implicações terapêuticas. Dadas as condi-
examinar a elevação da 8 no contexto do per- ções de personalidade desses pacientes, o pro-
fil. Tal elevação, concomitante com a 4 (vide cesso terapêutico é difícil, mas eles tendem a
código 48/84), está associada com uma per- permanecer em tratamento, chegando, às ve-
cepção do mundo como algo perigoso, ante o zes, a estabelecer uma relação quase estreita,
qual se reage com uma atitude hostil. Já sua se bem que o prognóstico é mau. Dependen-
elevação junto à da escala 9 (vide 89/98) suge- do do grau de desorganização do pensamen-
re uma visão distorcida da realidade e a possi- to, podem necessitar medicação adequada.
bilidade de o sujeito se comportar de acordo Escores baixos. Os sujeitos são descritos
com tal distorção. É preciso, também, atentar como convencionais, conservadores, responsá-
para a elevação relativa da 8 e da 7, em vista veis, submissos (DeMendonça, Elliot, Goldstein
do valor prognóstico do padrão, e para o per- et alii, 1984). Já Dahlstrom e colegas (1972),
fil característico, em que se associam as esca- revisando algumas pesquisas, usam os termos:
las F, 2, 4, 8 e 9, já discutido no item sobre a equilibrados, moderados, tímidos, conservado-
escala 2. res, convencionais, responsáveis, precisos, pa-
Escores altos. Escores elevados estão asso- cíficos, amigáveis, alegres e honestos. Groth-
ciados a aspectos diferentes, inusitados e não- Marnat (1999) ainda acrescenta que esses in-
convencionais, seja em termos de idéias, cren- divíduos podem ser descritos como de boa ín-
ças ou perspectivas, e a dificuldade nas rela- dole, confiáveis e adaptáveis, além de submis-
ções com o mundo circundante. Mas, caso os sos, porém, evitam relações mais profundas e
escores fiquem num nível mais moderado, tais próximas.
aspectos podem caracterizar interesses filosó-
ficos, religiosos ou abstratos, e esses sujeitos
podem ser descritos como arredios, reservados Escala 9 (Ma)
ou tímidos.
À medida que crescem os escores, mais di- A escala 9 foi desenvolvida para diagnóstico
ficuldades serão observadas em termos de pen- do estado hipomaníaco e de casos leves de
samento (na organização e no direcionamen- mania, caracterizado por hiperatividade, exci-
to) e dos sentimentos (agressivos e hostis, mas tação emocional e fuga de idéias (Dahlstrom,
não expressos). Aparentemente e na melhor Welsh & Dahlstrom, 1972). Já Groth-Marnat
das hipóteses, tais sujeitos ainda podem ser (1999) o descreve por “períodos cíclicos de
considerados pacíficos, generosos, interessan- euforia, irritabilidade aumentada e excessiva
tes e criativos. Não obstante, crescendo os es- atividade improdutiva, em parte, consideradas
cores, esses sujeitos já se sentirão inadequa- como manobras distrativas para evitar uma
dos, incompetentes, cheios de dúvidas e preo- depressão obstrutiva” (p.257). Portanto, não
cupações, de caráter sexual, ao mesmo tempo se espera que sirva para a avaliação do episó-
que terão crenças religiosas bastante incomuns. dio maníaco, quando o paciente se hospitali-

PSICODIAGNÓSTICO – V 475
za, uma vez que o prejuízo acentuado que en- plosões agressivas” (p.661-617). Porém, quan-
volve (Gaviria & Flaherty, 1990) compromete a do os dados do MMPI não se prestam para
testagem. Assim, quando o paciente melhora, caracterizar determinadas síndromes ou “cons-
a elevação da escala não é tão pronunciada. tructos diagnósticos”, segundo Gilberstadt e
Conseqüentemente, uma elevação moderada Duker (1965), ainda é possível identificar o es-
não exclui aquela possibilidade diagnóstica. tado maníaco, a partir das seguintes regras: a)
Por outro lado, é preciso levar em conta a Ma > 70; b) D < 55.
natureza transitória do estado hipomaníaco. Os itens da escala 9 envolvem sentimentos
As flutuações do humor e, naturalmente, o ní- de grandiosidade, grau de excitação e nível de
vel de energia são fatores que influem na tes- atividade, abrangendo sintomas do estado hi-
tagem. Uma vez que a escala reflete o nível de pomaníaco e, também, questões morais, inte-
energia, tende a se elevar entre jovens, enquan- rações sociais e familiares, bem como temas
to há uma baixa, entre idosos. Além disso, exa- somáticos.
tamente por tal razão, muitas vezes se encon- A discriminação dos itens das subescalas
tram elevações entre sujeitos não-psiquiátricos, Ma-O e Ma-S é apresentada no Quadro 31.9.
que se caracterizam pelo grau de energia que É importante, também, considerar combi-
demonstram e que se reflete em característi- nações com a escala 9.
cas de personalidade. Não obstante, as eleva- Sua combinação com a escala 2 pode ocor-
ções na escala 9, segundo McKinley e Hatha- rer em determinados quadros nosológicos,
way (1980), citados por Trimboli e Kilgore como lesões orgânico-cerebrais, ou em ado-
(1983), dependendo do perfil, podem ser en- lescentes perturbados e que enfrentam proble-
contradas na “personalidade psicopática”, na mas relacionados com identidade, mas, em
forma agitada de depressão, em síndromes geral, se associa com um estado agitado, em
orgânico-cerebrais, bem como em estados hi- que a pessoa está tentando manejar defensi-
pomaníacos. Conforme a experiência desses vamente impulsos hostis (Groth-Marnat, 1999).
autores, mesmo elevações moderadas tendem Também muitas vezes se combina com K. A ele-
a se associar com superatividade ineficaz, uti- vação simultânea de 9 e K (com a 2 e a 7 bai-
lização de negação como defesa e autoconcei- xas) se encontra numa personalidade autocrá-
to grandioso, além de tais sujeitos demonstra- tica, que procura compulsivamente exercer li-
rem “nítidas dificuldades nas áreas de contro- derança.
le dos impulsos, tolerância à frustração e re- Já a elevação de 9 com um K baixo se asso-
gulação afetiva, muitas vezes, com uma pro- cia com competitividade, narcisismo e medo
pensão para episódios de irritabilidade e ex- do sujeito de se sentir submisso ou dependen-

QUADRO 31.9 Subescalas Ma-O e Ma-S da escala 9


Ma-O – Hipomania óbvia (23 itens) Ma-S – Hipomania sutil (23 itens)

Certo Certo
13 22 59 73 97 100 156 157 167 194 212 226 11 21 64 109 127 134 181 222 228 232 233 240
238 250 251 263 266 277 279 298 268 171

Errado Errado
111 119 120 101 105 148 166 171 180 267 289
Sexo masculino:* Sexo masculino:*
Média: 5,88 Desvio padrão: 2,92 Média: 9,27 Desvio padrão: 2,60
Sexo feminino: Sexo feminino:
Média: 5,22 Desvio padrão: 3,02 Média: 9,04 Desvio padrão: 2,55
*As escalas e os dados estatísticos são de Wiener & Harmon (1946), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.415.

476 JUREMA ALCIDES CUNHA


te, mas, ao contrário, procura fazer com que de negação, como defesa, interferem em seu
os demais se sintam fracos e dependentes, rendimento terapêutico, e, eventualmente, é
como meio de conseguir auto-estima. preciso considerar qual o tipo de intervenção
Escores altos. Escores extremamente eleva- que será mais eficaz, no caso em questão. In-
dos podem ser sugestivos de um episódio ma- clusive, é importante verificar se o paciente não
níaco moderado, porque, quando os sintomas preenche os critérios para um diagnóstico de
são mais graves, o paciente não é testável. As- transtorno bipolar, encaminhando-o para que
sim, é uma escala útil para discriminar pacien- tenha uma prescrição farmacológica adequa-
tes maníacos moderados, mas também pessoas da. Outra avaliação recomendada se baseia
sem histórico psiquiátrico, caracterizadas por numa hipótese de abuso de substâncias.
seu alto grau de energia, embora, geralmente, Já pacientes com escore baixo se mostra-
as elevações que apresentam na escala 9 se- rão deprimidos, pouco motivados, requeren-
jam mais moderadas ou até leves. do um tipo de intervenção mais estruturada
Em indivíduos com escores altos, é possível (Groth-Marnat, 1999).
observar a presença de sintomas maníacos, Escores baixos. Os sujeitos são descritos
como hiperatividade, exagerado sentimento de como apáticos e confiáveis (DeMendonça, Elli-
importância pessoal, fuga de idéias e mau con- ot, Goldstein et alii, 1984) e, ainda, como pes-
trole dos impulsos. Ainda que sua atitude en- simistas, com baixa da auto-estima e da auto-
tusiástica, alegre e agradável possa causar uma confiança, falta de iniciativa e energia. Se os
boa impressão inicial, há aspectos em seu com- escores são muito baixos, é provável um qua-
portamento que acabarão por criar dificulda- dro depressivo grave, mesmo que não haja con-
des no relacionamento interpessoal. Aparen- firmação por presença de elevação da escala
temente, podem parecer criativos, mas sua 2. Este tipo de perfil, mais comum entre pes-
avaliação do que podem realizar é irrealística. soas idosas, reveste-se de importância quan-
Sob uma fachada de otimismo, no fundo, po- do encontrado em jovens (Groth-Marnat,
dem se irritar desproporcionalmente com pe- 1999).
quenas coisas. Apesar de passarem uma ima-
gem de grande energia, podem ser improduti-
vos ou, ainda, podem ser percebidos como in- Escala 0 (Si)
quietos e agitados.
Quando a elevação é mais moderada, os A escala 0 foi desenvolvida a partir de uma
sujeitos podem canalizar sua energia de forma análise conceitual do continuum introversão-
mais direcionada e produtiva. Não-pacientes extroversão, em termos de traços de pensamen-
são descritos como energéticos, sociáveis, oti- to, participação e expressão emocional. Foram
mistas, mas podem ser impulsivos, hiperativos delineadas medidas para esses três aspectos,
e, eventualmente, apresentar problemas de através de um instrumento publicado como um
humor. Considerando apenas os escores, às teste psicológico, por Drake (1946), com o
vezes é difícil diferenciar “uma pessoa normal, nome original de Social I-E, que deu origem à
energética e ambiciosa, com uma viva produ- escala 0, principalmente com base em estudos
tividade, de uma hipomaníaca” (Groth-Marnat, com alunos de college, realizados com a cola-
1999, p.280), sendo necessário utilizar outras boração de Oetting (Drake & Oetting, 1967),
fontes de informação. visando à avaliação do ajustamento social. As-
Implicações terapêuticas. Dadas as suas ca- sim, “a escala é uma medida muito estável da
racterísticas de personalidade, pacientes com extensão em que o indivíduo participa de even-
escores altos na escala 9 terão dificuldades para tos sociais e de seu grau de conforto nas rela-
enfocar seus problemas e, portanto, de aceitar ções interpessoais” (Groth-Marnat, 1984,
interpretações, apesar de, aparentemente, te- p.290).
rem grandes planos de mudar. Sua baixa resis- Apesar de a escala 0 poder ser considerada
tência à frustração e sua tendência a fazer uso como uma escala de caráter, isto é, entre as

PSICODIAGNÓSTICO – V 477
escalas capazes de refletir mecanismos de de- to pelas elevações de outras escalas”, enquan-
fesa caracteristicamente utilizados (Trimboli & to um escore elevado “sugere uma exageração
Kilgore, 1984), em geral não é incluída como das dificuldades indicadas pelas outras esca-
uma escala clínica, num sentido estrito, sendo las” (Groth-Marnat, 1999, p.260). É necessário
qualificada como mais útil em ambientes não observar, especialmente, se a elevação da es-
hospitalares, tais como serviços de aconselha- cala 0 se acompanha por alta das escalas 2 e 8,
mento e orientação (Hathaway & McKinley, configuração que pode pressupor alienação
1951). Dessa maneira, foi excluída de conside- social, retraimento, autocrítica e pensamentos
rável número de estudos e pesquisas, de modo inusitados, com apoio social inadequado. To-
que não se tem uma apreciação de sua ocor- davia, é preciso considerar que, se um aumen-
rência em várias populações, nem dados em- to na escala 0, por um lado, se associa com um
píricos substanciais sobre seus correlatos de incremento de dificuldades pessoais, por ou-
personalidade importantes. tro lado, diminui a possibilidade de atuação,
Os itens envolvem a “falta de comodidade especialmente se tal dado foi corroborado pe-
da pessoa em situações sociais e ao lidar com los escores das escalas 2 e 5 (elevados, para o
os outros”, sensibilidade, sentimentos de inse- masculino, e baixos, para o sexo feminino). Por
gurança e preocupações (Dahlstrom, Welsh & tal razão, as escalas 0 e 5 são freqüentemente
Dahlstrom, 1972, p.225). classificadas como escalas inibitórias (Groth-
Portanto, de um modo geral, a elevação na Marnat, 1999).
escala 0 se associa com desconforto nas situa- Escores altos. As dificuldades característi-
ções sociais. Os sujeitos com tal elevação, se- cas de pessoas com escores altos na Si podem
gundo Trimboli & Kilgore (1983), podem até ser resumidas em presença de sentimentos de
parecer sensíveis, porém, são frios e distantes, desconforto no relacionamento social e escas-
evitando enfrentar determinadas situações, sas habilidades sociais. Tais pessoas podem ser
“seja fazendo concessões ou, passivamente, descritas como socialmente apagadas, caren-
resistindo a pressões através do não-envolvi- tes de autoconfiança e tímidas, podendo ser
mento”. Conforme tais autores, quando o es- percebidas como distantes, frias e rígidas. Es-
core é alto (T ao redor de 70), os indivíduos, de sas características são tanto mais evidentes
um ponto de vista dinâmico, “parecem lidar com quanto mais elevados forem os escores, po-
sua vida interna e com as dificuldades externas, dendo-se observar retraimento, insegurança,
através de evitação e retraimento, que podem suscetibilidade à opinião alheia, especialmen-
ser acompanhados de suspeição” (p.617). te quando a pessoa não dispõe de uma rede
Pode-se dizer que a escala 0, como a escala de apoio social, que a auxilie em relação a seus
5, em sentido estrito, não é uma escala clínica. problemas. Já se os escores forem moderados,
Apenas, deve ser considerada pela tonalidade as características também serão moderadas,
que empresta aos subsídios oferecidos pelo sendo os sujeitos descritos como supercontro-
restante do perfil. Portanto, este deve ser ana- lados, sérios, cautelosos, conservadores, etc.
lisado de forma independente, para, depois, (Groth-Marnat, 1999).
se levar em conta as implicações resultantes Implicações terapêuticas. Segundo Groth-
do nível de elevação da escala 0 e da 5. Pode- Marnat (1999), a elevação relativa da escala 0
se dizer que a escala 0 fornece informações pode fornecer uma indicação extremamente
sobre “quão confortáveis as pessoas estão em útil no planejamento terapêutico, porque cons-
suas interações, sobre seu grau de envolvimen- titui “um indicador do grau de conforto social,
to manifesto com os outros, sobre a eficácia da inibição e do controle do indivíduo nos re-
de suas habilidades sociais e a probabilidade lacionamentos”, podendo se pressupor “o grau
de que tenham um sistema de apoio social bem em que a pessoa é capaz de ficar envolvida em
desenvolvido”. Portanto, um escore baixo, na relações interpessoais” (p.261).
escala 0, apresentará um efeito de “redução Em razão de seus problemas específicos,
do grau de patologia, que possa estar implíci- tanto pacientes com escores altos como aque-

478 JUREMA ALCIDES CUNHA


les com escores baixos têm dificuldade em es- ausência de elevações significativas (T = 70 ou
tabelecer uma boa aliança terapêutica, os pri- maior) em todas as escalas clínicas. Não obs-
meiros, por serem retraídos e ansiosos, e os tante, eventualmente, tal perfil se apresenta
últimos, por causa de sua superficialidade. No entre pacientes ambulatoriais e, mesmo, em
primeiro caso, há uma expectativa de que o hospitais psiquiátricos. Esse perfil em pacien-
terapeuta seja diretivo, e a atitude contrária tes é denominado de “normal falso”.
pode incrementar sintomas de ansiedade. Even- A metade das pessoas que apresentam esse
tualmente, a terapia de grupo e o treinamento perfil entre pacientes ambulatoriais tem, em
de habilidades sociais seriam boas opções. sua maioria, um diagnóstico de transtorno de
Escores baixos. Os sujeitos, de ambos os ajustamento e/ou problemas maritais, enquan-
sexos, são descritos como sociáveis, isto é, o to, entre pacientes psiquiátricos, apresenta um
escore baixo associa-se com “calor interpessoal funcionamento psicótico, em primeiro lugar
e um grau relativamente alto de conforto nas por transtorno afetivo maior e, em segundo
relações sociais”. Não obstante, embora os es- lugar, por esquizofrenia. Nos 50% restantes,
cores muito baixos possam ser encontrados em seja qual for o ambiente clínico (ambulatório
pessoas com muitos contatos pessoais, estes ou internamento), em sua maioria, os pacien-
tendem a ser superficiais: há necessidade de tes apresentam transtornos crônicos mistos, em
aprovação por parte dos outros, por conflito nível neurótico, como transtorno somatofor-
na dimensão dependência-independência (Gro- me, fatores psicológicos afetando a condição
th-Marnat, 1984, p.290). física, transtornos de ansiedade e distímico
(Vincent, 1987).
É, entretanto, sumamente importante ten-
Ausência de elevações nas escalas clínicas tar um entendimento dos motivos do delinea-
mento do perfil. Volte ao Passo no 5 no Capítu-
Em ambientes não-clínicos, é bastante comum lo 30 e considere escores de subescalas e itens
se encontrar perfis que se caracterizam pela críticos, dentro do contexto geral do caso.

PSICODIAGNÓSTICO – V 479
Códigos de dois pontos e outras
abordagens do MMPI
Jurema Alcides Cunha
32
N o desenvolvimento deste capítulo, serão
consideradas as combinações das eleva-
ções de duas escalas. Serão apresentados os
referências somente podem ser utilizadas de
forma muito criteriosa, e, sob um ponto de vista
psicopatológico, “as descrições mais extrema-
códigos de dois pontos, cuja ocorrência é fre- das devem ser consideravelmente modificadas
qüente, têm relevância clínica e sobre os quais ou, até, excluídas” (Groth-Marnat, 1999,
existem subsídios adequados na literatura. Por- p.262).
tanto, certos códigos deste tipo não serão in- Ainda, é importante observar que a inter-
cluídos, por falta de referencial adequado. pretação se aplica às duas escalas mais altas,
Embora, na literatura específica, algumas com elevações mais ou menos similares. As-
vezes sejam apresentados códigos de três ou sim, não importa a ordem com que se apre-
quatro pontos, aqui serão fornecidas apenas sentam no perfil individual. Por exemplo, a in-
descrições relativas às duas elevações mais al- terpretação do código 12 é a mesma do códi-
tas, fazendo-se alguma menção a elevações go 21, a menos que haja uma diferença de 10
subsidiárias, quando isso parecer pertinente. ou mais pontos do escore T entre as escalas.
Não obstante, às vezes, quatro escalas apre- Nesse caso, os dados devem procurar ser inte-
sentam elevações aproximadamente similares, grados, considerando as características asso-
como 2468. Neste caso, é preciso consultar os ciadas à escala predominante, que deve ser
códigos, 24, 26, 28, 46 e 48 e o código 68, mais enfatizada na interpretação.
procurando integrar os dados da maneira mais Por outro lado, a menos que expressamen-
acurada possível, isto é, dando mais ênfase às te especificado, as interpretações são pertinen-
implicações do código mais elevado e às ca- tes a pacientes adultos e não a adolescentes.
racterísticas descritivas comuns entre os vários Não obstante, nem todas as hipóteses são ade-
códigos. quadas a um caso individual. É necessário con-
A interpretação dos códigos de dois pon- siderá-las em função da história do paciente e
tos aplica-se a casos clínicos, em que as eleva- de outras fontes de informação disponíveis.
ções características se elevam ou ultrapassam Os códigos de dois pontos são particular-
um T = 70, e as características visam à descri- mente úteis para o desenvolvimento de hipó-
ção da psicopatologia. Deste modo, se as ele- teses interpretativas, recomendando-se, po-
vações se situarem numa área moderada (T = rém, que sejam continuamente consideradas
65 a 70), conforme Groth-Marnat (1984), as as significações específicas de cada escala, in-

480 JUREMA ALCIDES CUNHA


cluída no código, conforme sua elevação rela- lino e entre pessoas idosas. O mecanismo mais
tiva, sem esquecer que certos aspectos serão usual é a repressão.
enfatizados ou amenizados, em função dos Segundo Groth-Marnat (1999), há três ca-
efeitos de outras escalas ou de características tegorias de pacientes pressupostas por este
do perfil. Deste modo, nunca parece demais código. O paciente hipocondríaco seria o pro-
ressaltar que se deve levar em conta não só as tótipo do código 12, com importantes traços
implicações especiais do par de escalas que depressivos. Se suas queixas são de caráter fun-
compõem o código, como as de cada uma de- cional, tende a ser tímido e retraído, enquan-
las individualmente, tomando em considera- to, se existe alguma base orgânica, se mostra
ção sua relação com as demais e tendo em mais manifestamente lamentoso. As dificulda-
mente as variáveis que podem influir, dentro des que apresenta envolvem principalmente o
do contexto do caso clínico. sistema cardíaco e digestivo. A segunda cate-
Tanto quanto possível, será utilizada a ter- goria abrange pacientes com dor crônica, com
minologia do DSM-IV. Porém, alguns termos forte componente emocional intensificando-a.
mais amplos serão às vezes usados, como for- A dor é utilizada para manobras manipulado-
ma de resumir certos quadros, como, por exem- ras e explica uma tendência para a adição ao
plo, “neurose”. álcool e às drogas, aparentemente por inten-
tos de automedicação, especialmente quando
há elevações simultâneas da 3 e da 4. A tercei-
12/21 ra categoria é composta por pacientes com
história recente de acidentes, reagindo com
Sintomas, comportamentos e características da depressão a seus efeitos incapacitantes.
personalidade. Uma característica importante Numa pesquisa em uma amostra de pacien-
desses pacientes é desconforto físico (Olin & tes psiquiátricos, cerca de metade dos casos
Keatinge, 1998) ou dor, seja expressa através com o código 12/21 apresentava transtorno
de sintomas ou queixas, e tendo como causa somatoforme ou fatores psicológicos afetan-
problemas orgânicos ou funcionais. A outra do a condição física (Vincent, 1987). Além de
característica observada é depressão (Groth- transtorno somatoforme, parece que tais ca-
Marnat, 1999). sos freqüentemente apresentam algum trans-
Queixas comuns são de dor, ansiedade, ten- torno depressivo ou de ansiedade e, mais rara-
são, irritabilidade, fadiga e preocupação com mente, esquizofrenia (Olin & Keatinge, 1998).
questões somáticas, principalmente na forma O código 123 é encontrado em pacientes
de sintomas físicos reais ou imaginados, com deprimidos, com múltiplas queixas, supervalo-
base na interpretação distorcida do próprio rizadas, comuns ao padrão 12, e representan-
funcionamento do corpo e na medida em que do, em idosos, o declínio da saúde física (Vin-
isso possibilita ganhos secundários ou a mani- cent, 1998).
pulação dos outros. Na combinação do 12 com a escala 7, além
Mesmo quando existe uma patologia física de depressão e dificuldades somáticas, a an-
documentada (freqüentemente em casos de siedade dá um colorido especial ao quadro
úlcera e problemas pulmonares ou reumáticos), neurótico, com importantes sentimentos de
a tendência é a exacerbação das queixas e sin- inadequação. Se o código 12 se acompanha
tomas. Os pacientes concentram-se em suas por elevações na 8 e/ou na 0, pode ser eviden-
dores e não apresentam insight quanto aos ciado um funcionamento pré-psicótico, com
componentes emocionais de seu ajustamento, prováveis alucinações somáticas. As dificulda-
funcionando, predominantemente, em nível des são de caráter funcional, embora, em al-
neurótico (Hathaway & Meehl, 1963). guns casos, possa haver uma “síndrome orgâ-
Este tipo de código freqüentemente se as- nico-cerebral, muitas vezes secundária a trau-
socia com um caráter passivo-dependente e é ma, senilidade ou toxicidade alcoólica” (Vin-
mais comumente encontrado no sexo mascu- cent, 1987, p.111). Na combinação menos co-

PSICODIAGNÓSTICO – V 481
mum com a escala 9, mantém-se a sintoma- dade emocional, na realidade este padrão en-
tologia do padrão 12, que é manejada pela volve uma negação da possibilidade de pertur-
negação, observando-se aspectos hipomanía- bações mentais (Dahlstrom, Welsh & Dahls-
cos. trom, 1972). Mas tais pacientes, sob estresse,
Em termos de personalidade, os sujeitos demonstram um incremento de dificuldades
mostram-se introvertidos, passivos e depen- somáticas.
dentes das pessoas, em relação às quais se res- De um modo geral, pacientes com esse có-
sentem, por se sentirem carentes em suas ne- digo caracterizam-se por queixas de dor crôni-
cessidades de afeto. Conseqüentemente, nas ca, não tratável, que se acentua com o decor-
interações, não só tentam manipular os outros rer do tempo. Suas dificuldades físicas “se tor-
para atender suas exigências de afeto, aten- nam recrutadas a serviço de conflitos psicoló-
ção e apoio, mas também para a obtenção de gicos”, e, à medida que tal adaptação vai se
ganhos secundários, para eles justificáveis em cristalizando, maior parece ser a discrepância
função de suas queixas e sintomas. entre as escalas 1 e 3, que se elevam, e a escala
Implicações terapêuticas. Os sujeitos com 2, que baixa (Trimboli & Kilgore, 1983, p.620),
este código não são bons candidatos à psico- “aumentando a possibilidade de um transtor-
terapia, principalmente, orientada para o insi- no conversivo” (Groth-Marnat, 1984, p.294),
ght, em virtude de não admitirem, nem de lon- com escassa manifestação de ansiedade, que
ge, que sua problemática possa pressupor qual- se converte em sintomas funcionais (confirmar
quer explicação psicológica. Além disso, em a ausência de elevação das escalas 2 e 7). Já
vista de suas necessidades de dependência, é quando a 2 e a 7 estão elevadas, isso significa
quase inviável aceitarem se comprometer em que a repressão não está sendo eficaz para o
assumir a responsabilidade por seu comporta- manejo dos conflitos, verificando-se sintomas
mento pessoal. Por outro lado, como tendem de depressão e ansiedade. Porém, principal-
a somatizar a ansiedade, estão pouco moti- mente entre pacientes de mais idade, pode
vados para mudança, já que aprendem a to- haver documentação física para alguns proble-
lerar o desconforto. Na realidade, o que de- mas (Vincent, 1987), ainda que com forte com-
sejam é atendimento médico (Groth-Marnat, ponente psicológico. Pesquisas de Lair e Tratt,
1999). de 1962, e de Caldwell e Chase, de 1977, cita-
dos por Levitt e Garron (1982), mostraram que
doenças orgânicas podem elevar as escalas
13/31 1 e 3 e, também, a 2, acima dos escores mé-
dios, inclusive em casos de lombalgia. Esses
Sintomas, comportamentos e características da autores também referem resultados de pes-
personalidade. O padrão 13/31, com elevações quisa mais recente, em que foi apurado que
características das escalas Hs e Hy, em relação tais elevações também podem ocorrer com a
à escala D (com diferença de 10 pontos ou crescente duração da dor, da mesma forma
mais), é a combinação mais comum entre pa- que quando há compensação financeira, por
cientes psiquiátricos e é freqüentemente refe- ganho secundário.
rida como “vale conversivo”, “V conversivo” ou, O V conversivo tornou-se, numa época,
ainda, como “V psicossomático”. muito usado como critério para diferenciar a
Não obstante, é interessante notar que, lombalgia funcional da lombalgia orgânica,
muitas vezes, o tipo 13/31 é compatível com sendo desenvolvida a subescala Lb (Hanvick,
uma elevação em nível moderado ou normal, 1963). Entretanto, a partir de estudos poste-
abrangendo seletivamente itens somáticos, riores, observou-se que, embora entre tais pa-
combinados com negação da ansiedade, sem cientes seja comum o perfil sugestivo de “neu-
elevação na 2 e na 7. Ainda que exista certa rose de conversão” (Elkins & Barrett, 1984),
contradição psicológica na concomitância da indicando a presença de distúrbio psicológico,
admissão de sintomas e protesto de estabili- mas não necessariamente conversivo (Leavitt

482 JUREMA ALCIDES CUNHA


& Garron, 1982), outros perfis têm aparecido bém costuma ser apresentada por doentes com
com bastante freqüência, tanto em casos de problema de dor, por lesão orgânica, que pio-
sintomatologia de causa orgânica como fun- ram em situações de estresse. Ansiedade tam-
cional. Na realidade, muitas formas de patolo- bém é registrada, se há elevação concomitan-
gia são encontradas nesses pacientes, indepen- te na 7 ou na 8 (Groth-Marnat, 1999).
dentemente de etiologia, o que pôs em dúvida Neste tipo de personalidade, o que mais
a utilidade da escala Lb (Elkins & Barrett, 1984). chama a atenção são as relações com os de-
Contudo, os escores pré-operatórios desses mais, que costumam ser superficiais e, even-
pacientes, nas escalas Hs e Hy, ainda parecem tualmente, com uma tonalidade imatura, ego-
importantes para a predição de resultados ci- cêntrica. Aparentemente, esses sujeitos querem
rúrgicos (Elkins & Barrett, 1984; Leavitt & Gar- dar a impressão de estar a serviço de ideais
ron, 1982). sociais. Reprimem a hostilidade, gerada pelo
O chamado padrão de histeria (V conversi- ressentimento contra os outros, que não satis-
vo) também aparece, de forma proeminente, fazem suas necessidades de dependência. Tam-
em alguns quadros psicossomáticos de asma, bém, para obterem atenção e apoio, por ve-
de sintomas cardíacos e envolvendo problemas zes, mostram-se extrovertidos, e seu compor-
dermatológicos. As queixas são muito variadas, tamento se torna um tanto exibicionista.
desde sintomas gastrintestinais, cefaléia, lom- No caso da presença da configuração do
balgia, até dificuldades aparentemente “neu- “V conversivo”, numa área de normalidade, os
rológicas” (Groth-Marnat, 1984). Queixas po- sujeitos podem se mostrar otimistas, embora
dem envolver problemas centralizados no co- um pouco imaturos. “Podem ser descritos
mer (como obesidade, anorexia ou bulimia) ou como responsáveis, prestativos, normais e sim-
ainda sintomas aparentemente “neurológicos” páticos” (Groth-Marnat, 1999, p.268).
(Groth-Marnat, 1999). Nota-se, porém, uma Implicações terapêuticas. Tais sujeitos care-
falta de preocupação com os sintomas, isto é, cem de insight, querendo dar a impressão de
um “correlato, no teste, da belle indifférence serem normais, mas sentindo-se ameaçados,
clínica” (Marks & Seeman, 1963, p.52). Os pa- quando sentem desafiadas as suas defesas.
cientes são imaturos, sugestionáveis e, ainda Conseqüentemente, são maus candidatos à
que procurem passar aos outros uma imagem psicoterapia mais tradicional. São melhor acei-
socialmente satisfatória (principalmente com tas intervenções para redução do estresse, as
a elevação de K), são histriônicos, manipulati- que lhes pareçam estratégias de caráter médi-
vos, para conseguir a atenção dos familiares, co ou dentro de um contexto médico, porque
utilizando seus sintomas exagerados como pre- não afetam a imagem de hipernormalidade
texto para evitar assumir responsabilidades e psicológica que querem passar aos demais. Na-
obter ganhos secundários. Estabelecem rela- turalmente, a questão torna-se mais crítica, se
ções superficiais e querem parecer socialmen- for um caso de transtorno de personalidade.
te aceitáveis (Groth-Marnat, 1999).
Observa-se que, quando a escala 3 ultra-
passa a escala 1, o foco de conversão tende a 14/41
ser o tronco do corpo, enquanto, se há predo-
minância da 1, o foco é constituído pelas ex- Sintomas, comportamentos e características da
tremidades corporais. Mas, se há também ele- personalidade. Embora o código 14/41 não seja
vação na 8, além do pico na 1, podem ocorrer freqüente porque se associa com quadros gra-
delírios somáticos. ves de hipocondria, estes se caracterizam por
As hipóteses diagnósticas mais freqüentes queixas somáticas, em relação às quais os pa-
são transtornos depressivos (depressão maior cientes expressam grande preocupação e, sen-
e distimia), hipocondria, transtorno conversi- do bastante egocêntricos, demandam atenção,
vo e transtorno de personalidade (histriônico sendo descritos, porém, como indecisos e re-
e passivo-agressivo). Esta configuração tam- beldes. Além disso, a elevação 4 é compatível

PSICODIAGNÓSTICO – V 483
com a hipótese de história de comportamento temperadas pelas conotações da escala 8, re-
aditivo, associado ao uso ou abuso de subs- presentadas por confusão mental, desorienta-
tâncias, com possíveis problemas de ajusta- ção e pouca concentração. Desta combinação,
mento ao trabalho e nas interações sociais. resultam crenças de caráter delirante sobre os
Não obstante, é necessário examinar a ele- sintomas físicos. Por outro lado, há uma mar-
vação relativa das duas escalas, para estabele- ca de alienação e de distanciamento nas rela-
cer o diagnóstico diferencial. Quando predo- ções pessoais, uma vez que há sentimentos de
mina a escala 1 (possivelmente acompanhada hostilidade que não são expressos, pois, no
de escores altos na 2 e/ou na 3), o quadro clí- caso de o serem, isso ocorre de forma inapro-
nico caracteriza-se especialmente por traços priada e belicosa. Dessa maneira, há escassa
neuróticos (como transtornos de ansiedade, confiança, e a desconfiança dos outros pode
transtorno somatoforme, dissociativo e distí- levar ao rompimento de relações. Isso vale di-
mico). Por outro lado, se a elevação mais acen- zer que pode existir um tipo de ideação para-
tuada ocorre na escala 4, é possível a presença nóide, que pode se refletir (ainda que não ne-
de algum transtorno de personalidade, sendo cessariamente) numa elevação adicional da
mais freqüente a hipótese de personalidade escala 6.
anti-social (Groth-Marnat, 1999). Outras elevações concomitantes, que cos-
Características que chamam a atenção são tumam se apresentar com este código, são da
o comportamento atuador e o comprometi- 2, 3 e 7, acrescentando novas dimensões à
mento na função do juízo, que se refletem prin- interpretação, como um toque de pessimis-
cipalmente nas interações com os demais. O mo pelo efeito da 2, de temores e ansieda-
sujeito utiliza manobras manipulativas, embo- des expressos pela 7 e de aspectos conversi-
ra raramente seja anti-social por demais. Tem vos ou de delírios somáticos, sugeridos pela
má adaptação no trabalho e ao sexo oposto. elevação da 3.
Apresenta problemas em relação a regras e li- O diagnóstico mais freqüentemente encon-
mites, que transparecem por uma atitude de trado é o de esquizofrenia, quando há eleva-
rebeldia no lar. Entretanto, uma vez que é ca- ção também da escala F. Porém, se esta escala
paz de controlar os impulsos, tal rebeldia não se encontra dentro dos limites normais, uma
se expressa diretamente, mas, sim, mostran- hipótese provável é de hipocondria, ou, se há
do-se amargo, ressentido, insatisfeito e exi- elevação também da 7, é importante conside-
gente. rar a possibilidade de um transtorno de ansie-
Implicações terapêuticas. Dadas as carac- dade.
terísticas, as pessoas com este código demons- Em nível de personalidade, será provavel-
tram resistência no contexto terapêutico e di- mente possível confirmar, pela história clínica,
ficuldade de se manterem num processo de que os problemas são de longa duração.
tratamento longo, sendo pouco assíduas, ten- Implicações terapêuticas. Com essas ca-
sas, com manifestações de hostilidade e res- racterísticas de personalidade, esses sujeitos
sentimento contra o terapeuta. Não obstante, têm más condições de se envolver ativamen-
pode haver êxito através de intervenções tera- te, num processo terapêutico, mesmo por-
pêuticas breves, com foco específico na sinto- que carecem do necessário insight (Groth-
matologia (Groth-Marnat, 1999). Marnat, 1999).

18/81 19/91

Sintomas, comportamentos e características da Sintomas, comportamentos e características da


personalidade. Neste código, a elevação na personalidade. Este código é pouco citado na
escala 1 é compatível com um foco em sinto- literatura e pouco freqüente entre pacientes,
mas físicos, com queixas vagas e inusitadas, mas é importante porque o quadro sintomáti-

484 JUREMA ALCIDES CUNHA


co pode sugerir dificuldades “relacionadas com negação. Apresentam muitos sintomas somá-
disfunção endócrina ou com o sistema nervo- ticos, mas, muitas vezes, abandonam o trata-
so central”, e as queixas podem incluir “pro- mento médico, ao saberem que seus proble-
blemas gastrintestinais, exaustão e cefaléia” mas não têm uma causa física.
(Groth-Marnat, 1999, p.267). Os homens são ambiciosos, mas imaturos
O comportamento tem uma tonalidade e dependentes. Desejam aumentar suas respon-
paradoxal, porque é o resultado de uma com- sabilidades, mas as temem por medo de fra-
binação entre uma atitude queixosa e de preo- casso, e isso provoca estresse e insegurança.
cupação a respeito de problemas orgânicos Apesar disso, seus esforços são geralmente re-
com uma tendência concomitante de negá-los conhecidos, embora se sintam inadequados. As
e escondê-los. O paciente escapa do enfrenta- mulheres são mais deprimidas, fracas e apáti-
mento de suas dificuldades, fazendo um es- cas. Suas relações são superficiais, e, muitas
forço para evitá-las. Para isso, mostra-se ex- vezes, têm uma história de matrimônio infeliz,
trovertido e falador, mas, ao mesmo tempo, mas raramente de divórcio. São resignadas em
tenso, por causa da experiência de ansiedade. sua insatisfação.
Diagnósticos freqüentes são de hipocondria Os diagnósticos mais comumente encontra-
e/ou de estados maníacos, “desencadeados ou dos são de transtornos depressivos.
exacerbados seja por uma condição orgânica Se o código se combina com a elevação da
subjacente, seja por uma depressão iminente, escala 4, têm conflitos em relação à hostilida-
ou por ambos” (p.268). Caso se verifiquem ele- de, mostrando-se cismáticos em sua depres-
vações concomitantes nas escalas 4 e 6, deve são, com idéias anti-sociais subjacentes, não
ser avaliada a possibilidade da presença de expressas em seu comportamento, que se mos-
transtorno de personalidade passivo-agressiva. tra controlado. Com a elevação da 6, os pa-
O quadro explica-se por fortes necessida- cientes têm conflitos de dependência, o que
des de dependência, que são consideradas ina- se reflete nas interações, na forma de susceti-
ceitáveis. O paciente sente-se tenso e depen- bilidade e desconfiança. Com a elevação da O,
dente, enquanto procura manter uma impres- observam-se retraimento e introspecção. Além
são de que tudo está e continuará bem. disso, caso haja elevação concomitante da es-
Implicações terapêuticas. Como não existe cala F e/ou da 8, há hipótese de depressão, em
uma franca admissão de que os sintomas pos- nível psicótico. Se a escala 1 está elevada, uma
sam ter uma explicação psicológica, não são hipótese a ser considerada é a de dor crônica.
pacientes fáceis para se comprometer num pro- Como indivíduos que aprenderam a convi-
grama terapêutico (Groth-Marnat, 1999). ver com um alto grau de insatisfação, são pas-
sivos, dóceis e dependentes, suscitando cuida-
dos por parte dos demais. Todavia, “como
23/32 mantêm superficiais suas relações, conseguem
sentir um certo nível de segurança”(Groth-
Sintomas, comportamentos e características da Marnat, 1999, p.269), mas de maneira imatu-
personalidade. O código 23/32 associa-se es- ra, infantil. Assim sendo, não se sentem ade-
pecialmente com sentimentos de ineficiência quados numa relação heterossexual adulta,
e inadequação, inclusive no que se refere a ta- podendo apresentar disfunções sexuais (impo-
refas cotidianas, principalmente quanto à difi- tência, frigidez) e, também, não se sentem con-
culdade de iniciá-las. Os sujeitos apresentam fortáveis em situações que envolvem competi-
dificuldades de expressão emocional, depres- ção. Por outro lado, apesar de desejarem pro-
são, tensão, ansiedade, inibição, carência de gredir profissionalmente, não se sentem reco-
energia e inadequação social. Os sintomas vêm nhecidos em seu desempenho.
de longa data, e, geralmente, os pacientes Implicações terapêuticas. O insight de pa-
aprendem a conviver e viver com sua depres- cientes com este código não é bom. Além dis-
são. O mecanismo de defesa mais utilizado é a so, como fazem uso conspícuo da negação, não

PSICODIAGNÓSTICO – V 485
melhoram durante um processo terapêutico, O abuso de álcool e drogas, bastante co-
que se baseia no insight, porque contraria seu mum, poderia se associar com sua depressão,
estilo de vida. Porém, conseguem se beneficiar como uma forma de automedicação (Groth-
de uma terapia de apoio. Por outro lado, como Marnat, 1999). Aliás, em um estudo, este có-
fazem também uso de somatização, para lidar digo se relacionou com o nível mais alto de
com alguns conflitos, tendem a aceitar “solu- uso do álcool (Vincent, 1987), e outras pesqui-
ções” médicas, usando tranqüilizantes e medi- sas registraram a presença da 2 e da 4 entre as
camentos para a dor. Em muitos casos, entre- maiores elevações do perfil, em alcoolistas (Bar-
tanto, são recomendados antidepressivos (Gro- nes, 1979).
th-Marnat, 1999). A hostilidade (que pode ser expressa direta
ou indiretamente) pressuposta pelo código 24/
42 deve ser considerada em relação às escalas
24/42 6 e 9. A elevação concomitante da 6 sugere
que os impulsos hostis podem ser expressos
Sintomas, comportamentos e características da de forma direta contra pessoas. Ao contrário,
personalidade. Este código é encontrado em quando a 6 é baixa, “pode refletir a supressão
pacientes com tendências anti-sociais e insta- ou negação inconsciente da hostilidade” (Gro-
bilidade emocional. Sua dificuldade de controle th-Marnat, 1999, p.270). Já a combinação com
dos impulsos os leva à atuação, com subse- a elevação da escala 9 pode se associar a com-
qüente depressão e culpa, mas que parecem portamento violento.
ter mais um sentido situacional face às conse- O código 24/42 é encontrado mais comu-
qüências de seus atos, do que constituir um mente em pacientes com transtorno de perso-
efeito da ação coercitiva do superego. Embora nalidade, especialmente passivo-agressiva e
tais elevações teoricamente possam se asso- anti-social, mais provável ainda se há uma ele-
ciar com incremento do risco de suicídio, se a vação concomitante da escala 6. Outra alter-
escala D se eleva a um T = 80 ou mais (Trimbo- nativa diagnóstica seria transtorno de ajusta-
li & Kilgore, 1984), este não constitui o padrão mento, com humor depressivo.
predominante nos grupos de pacientes que Parece importante, também, procurar dis-
Farberow (1963) utilizou para estudo do com- cernir se a depressão é crônica ou reativa. A
portamento suicida. Suas tentativas de suicí- depressão crônica associa-se com aspectos
dio, então, teriam um caráter manipulativo neuróticos e fica evidenciada pela presença da
(Vincent, 1987), ainda que, no caso de eleva- “tríade neurótica” (1, 2 e 3 elevações). A de-
ção extremada das escalas, associada com fun- pressão reativa é mais típica da personalidade
cionamento psicótico ou pré-psicótico, o sui- anti-social.
cídio possa ser considerado um risco sério Quando, no código 24/42, a escala 4 ultra-
(Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972). passa um T = 90, a hipótese de funcionamen-
As dificuldades desses pacientes preverem to pré-psicótico ou psicótico deve ser conside-
as conseqüências de seus atos os levam a no- rada, principalmente se estão presentes eleva-
vas atuações. Desta maneira, “embora essas ções da F e da 8.
pessoas possam prometer mudar, e sua culpa À primeira vista, são personalidades que
seja geralmente autêntica, suas atuações são parecem amistosas e sociáveis. Com o passar
resistentes à mudança” (Groth-Marnat, 1984, do tempo, em ambiente clínico, tentam mani-
p.297). Conseqüentemente, têm problemas em pular a equipe. Socialmente, suas atitudes ten-
sua vida familiar, acadêmica, profissional, che- dem a provocar ressentimento. Da mesma for-
gando a envolvimentos com a Justiça. Já Vin- ma, ainda que possam parecer competentes,
cent (1987) não acredita que esses sujeitos se- sentem-se insatisfeitas, pessimistas e autocrí-
jam sinceros em sua culpa e remorso, a não ticas. Procurando manejar tais sentimentos,
ser quando estes se relacionam com sua frus- “muitas vezes desenvolvem relação passivo-
tração. dependente” (Groth-Marnat, 1999, p.270).

486 JUREMA ALCIDES CUNHA


Implicações terapêuticas. É importante sa- zofrenia paranóide (Groth-Marnat, 1999). Me-
lientar que, em razão da freqüência da depen- lhor ajustamento pode ser suposto se há ele-
dência de substâncias entre indivíduos com este vação moderada das escalas 2, 6 e F. Já no caso
tipo de código, o paciente deveria ser devi- de ocorrência de elevação da 4, convém anali-
damente avaliado nesse sentido e acompa- sar a possibilidade de uma personalidade pas-
nhado (vide Capítulo sobre Entrevista moti- sivo-agressiva.
vacional, nesta obra), com algum tipo de mo- A hipersensibilidade, a hostilidade e os tra-
nitoração. ços passivo-agressivos desses indivíduos favo-
Os problemas implícitos são de longa dura- recem o desenvolvimento de más relações in-
ção, com muita resistência à mudança, de for- terpessoais, que são difíceis de ser modifica-
ma que o prognóstico do paciente, em pro- das, mesmo com o decorrer do tempo.
grama terapêutico duradouro, é mau, ainda Implicações terapêuticas. Qualquer trata-
que haja “promessa de mudar, e sua culpa seja mento tem resultados pouco eficazes, em vis-
geralmente autêntica” (Groth-Marnat, 1999, ta da dificuldade dos pacientes de manterem
p.270). uma aliança terapêutica. De qualquer modo,
Dadas as características de personalidade uma providência essencial e inicial é a investi-
do paciente, terapia de apoio parece ser o tra- gação sobre a presença e gravidade de possí-
tamento de melhor opção. vel processo psicótico.

26/62 27/72

Sintomas, comportamentos e características da Sintomas, comportamentos e características da


personalidade. Os pacientes com este tipo de personalidade. Este código pode ser conside-
código caracterizam-se por serem muito sus- rado como o mais comum entre pacientes psi-
cetíveis, hostis, sentindo-se facilmente ressen- quiátricos, tanto em regime de internação
tidos e funcionando, principalmente, com base quanto ambulatorial, como também entre pa-
num mecanismo de projeção. Fundamentan- cientes médicos, pelo que é tido como mani-
do-se em dados sempre insuficientes ou ima- festação de anormalidade, conforme Dahls-
ginários, pressupõem críticas e rejeições, das trom, Welsh & Dahlstrom (1972). Aliás, Trim-
quais procuram se preservar, muitas vezes re- boli e Kilgore (1983) citam uma observação
jeitando as pessoas e induzindo igual rejeição desses autores em trabalho posterior, em que
dos demais, o que usam como confirmação da assinalaram que tais pacientes, quando exami-
pressuposta atitude anterior, projetando a cul- nados em regime hospitalar, costumam ser clas-
pa e não se dando conta de seu verdadeiro sificados como psicóticos, mas sem transtorno
papel em tal interação. Conseqüentemente, de pensamento, e, quando examinados em
suas relações interpessoais são muito difíceis. regime ambulatorial, são habitualmente cate-
Contudo, podem, alternativamente, inter- gorizados como “neuróticos”.
nalizar a culpa, voltando sua hostilidade con- Tais pacientes são descritos como ansiosos,
tra si mesmos, com possível ideação suicida ou tensos, deprimidos, agitados, muitas vezes
tentativa de suicídio. obsessivos, meticulosos e perfeccionistas, po-
Uma hipótese diagnóstica possível para dendo apresentar fobias e medos variados.
este padrão é transtorno distímico, mas é Suas queixas são de fraqueza, fadiga, insônia,
muito importante a consideração do restan- dor no peito, constipação, tontura e, eventual-
te do perfil. mente, lentidão psicomotora, além de senti-
Com a elevação também das escalas 7, 8 e, mentos de inadequação. Enfim, podem ser ca-
possivelmente, da 9, a hipótese de funciona- racterizados como queixosos, pessimistas,
mento psicótico ou pré-psicótico deve ser con- apresentando sintomas neuróticos múltiplos e
siderada, com provável diagnóstico de esqui- variados, além de “correlatos somáticos de

PSICODIAGNÓSTICO – V 487
ansiedade” (Vincent, 1987, p.125). Dessa ma- quados e inseguros. Muitas vezes, apresentam,
neira, “as escalas 2 e 7 refletem o grau relativo também, medos e fobias.
de perturbação subjetiva que a pessoa está Implicações terapêuticas. Ainda que não
experienciando, e, portanto, são muitas vezes considerem com confiança nem a perspectiva
referidas como ‘escalas de aflição’ ” (Groth- de um tratamento, nem do futuro, com o de-
Marnat, 1999, p.272). correr de uma terapia, essas pessoas acabam
Em pacientes com este código, é especial- melhorando. Entretanto, quando as escalas
mente importante a história clínica. Além dis- estão muito elevadas, há pouca concentração
so, quando há também a elevação da escala 8 para que os sujeitos possam participar de pro-
(código 278), é necessário o diferencial com gramas psicoterápicos, sendo necessária me-
esquizofrenia. Roy (1984) utilizou o cálculo do dicação, para relaxarem e reduzirem o nível de
Índice de Goldberg (IG), com esta finalidade, depressão e de ansiedade e terem motivação
isto é, L+6+8-7-3, chegando às seguintes re- para um tratamento, que passa a ter um bom
gras: “a) se IG<40, qualifique como ‘não-es- prognóstico, quando as elevações recaem
quizofrênico’; b) se GI>100, qualifique como numa zona moderada. Aliás, embora esses su-
‘esquizofrênico’; c) se GI = 41-49, qualifique jeitos possam ter alguma dificuldade nas rela-
como ‘indeterminado’ ” (p.401). ções interpessoais, são capazes de estabelecer
Diagnósticos mais prováveis são de trans- um vínculo emocional, pelo que podem apre-
tornos depressivos, especialmente depressão sentar um ajustamento estável no casamento
maior, embora haja outras possibilidades, como e na área profissional. Quando as escalas es-
de transtorno de ajustamento com humor de- tão elevadas, cresce a probabilidade de idea-
pressivo, de transtorno de ansiedade (princi- ção suicida ou de tentativas de suicídio (Vin-
palmente, transtorno obsessivo-compulsivo) ou cent, 1987), e, assim, o potencial suicida des-
de transtorno de personalidade (esquiva, com- ses sujeitos deve ser cuidadosamente exami-
pulsiva ou passivo-agressiva). nado, especialmente quando as escalas 6 e 8
Este código, de forma moderada, também também estão elevadas (Groth-Marnat, 1999).
ocorre entre não-pacientes, entre pessoas nor- Ainda que pessoas com o código 27/72
mais “que estão fatigadas e exaustas, com um possam se beneficiar com uma terapia de insi-
alto grau de rigidez e excessiva preocupação” ght, se a escala 4 também está elevada, tal in-
(Groth-Marnat, 1999. p.272). tervenção não tem probabilidade de ser muito
Não obstante, o código 42 também pode produtiva. Em pacientes com os códigos 247/
ser encontrado com elevação concomitante da 427/724, deve se investigar, inicialmente, se há
escala 4. Tal configuração reflete ansiedade e um envolvimento com álcool que, possivelmen-
depressão, associadas a dificuldades na fun- te, é de longa duração. Tal fato complicaria os
ção do juízo e, talvez, relacionadas com com- planos de tratamento, porque, ainda que com
portamento aditivo. Por essa e várias outras uma melhora inicial, pode se registrar compor-
razões, a personalidade dos indivíduos, com o tamento atuador, em períodos de estresse.
código 27/72, caracteriza-se por traços obses- Nesses casos, terapia de grupo, com objetivos
sivo-compulsivos, tanto no que se refere ao bem definidos, é uma opção melhor (Groth-
pensamento, como na maneira perfeccionista Marnat, 1999).
e meticulosa de lidar com as coisas da vida.
Freqüentemente, são bastante rígidos, em suas
normas e padrões, e quase sempre são muito 28/82
religiosos. Sentem certo desconforto nas suas
relações sociais, apesar de serem dóceis, pas- Sintomas, comportamentos e características da
sivos, dependentes da família e amigos, rara- personalidade. O código 28/82, embora infre-
mente sendo provocadores, já que lidam com qüente, parece muito importante, porque pode
seus sentimentos agressivos de forma intrapu- indicar perturbação séria no contato com a
nitiva, percebendo a si mesmos como inade- realidade, inclusive com a ocorrência de frag-

488 JUREMA ALCIDES CUNHA


mentação dos processos de pensamento num meiro lugar, em vista de sua ambivalência, a
transtorno afetivo grave. agressão pode ser dirigida contra o terapeuta,
Os sujeitos com este padrão caracterizam- especialmente em situações de estresse, pro-
se como retraídos, alienados, ansiosos, agita- vocando uma resistência a mudanças. Em se-
dos, tensos, irritáveis e, também, podem ser gundo lugar, o potencial suicida deve ser ava-
não-sociáveis, suscetíveis e suspeitosos. Têm liado no início e durante a terapia. Vemos, as-
dificuldades de concentração e memória, pen- sim, que um, dentre os múltiplos problemas
samento confuso, sentimentos de desamparo que o cliente enfrenta, se refere à expressão
e desvalia, e podem apresentar delírios, aluci- da raiva, que, naturalmente, também pode se
nações e idéias de referência, especialmente manifestar em suas relações sociais e, por cer-
quando a 8 é T>85. Suas queixas são de de- to, na relação terapêutica, levando-o a se re-
pressão, ansiedade, insônia, fraqueza, fadiga, trair. O processo terapêutico pode ser longo, mas
perda de memória e tonturas. é possível afirmar que “o terapeuta potencial-
Também é importante lembrar que a eleva- mente pode fornecer um ponto de estabilidade
ção da 8 é compatível com deficiência na função numa vida que, de outra maneira, é caótica e
do juízo, e, num quadro de depressão (especial- imprevisível” (Groth-Marnat, 1999, p.274).
mente quando a 2 é maior que T = 80), pode
haver risco de suicídio (Trimboli & Kilgore, 1983).
Na realidade, ideação suicida e tentativas de sui- 29/92
cídio são comuns. Os pacientes têm dificuldade
de controlar os impulsos, e isso inclui o controle Sintomas, comportamentos e características da
dos impulsos agressivos contra si mesmos. personalidade. Este código é paradoxal, no sen-
Como se pode ver, as características deste tido de que, teoricamente, se esperaria que am-
código são muito variadas e só em parte são bas as escalas não apresentassem uma eleva-
aplicáveis num caso individual. Para melhor ção simultânea.
interpretação, é preciso não só examinar ou- Os sujeitos com este código apresentam gran-
tras elevações, mas também analisar os itens de perturbação e podem ser descritos como an-
críticos, considerar os resultados das escalas siosos, deprimidos e agitados. O nível de energia
óbvias e sutis, bem como outras fontes de in- pressuposto pela 9 representa um esforço de-
formação disponíveis (Groth-Marnat, 1999). fensivo para lidar com os componentes depres-
O diagnóstico diferencial é de fundamental sivos subjacentes. Como este manejo não tem
importância, porque esse código pode tanto sucesso, pode-se esperar adição ao álcool.
ocorrer em transtornos de humor (transtorno Por outro lado, se há elevação simultânea
bipolar II ou transtorno depressivo maior), de 4 (que, junto com a 9, pressupõe mau con-
como na esquizofrenia ou no transtorno esqui- trole dos impulsos) e no caso de a 2 ser maior
zo-afetivo ou, ainda, em transtornos de perso- que T = 80, pode-se configurar um quadro de
nalidade (borderline, esquiva, obsessivo-compul- urgência psiquiátrica, se outros dados sugeri-
siva ou esquizóide) (Groth-Marnat, 1999). rem risco de suicídio. A elevação extrema na 2
O indivíduo tanto pode ser negativista, res- pode indicar intensificação de cargas agressi-
sentido e irritado, como dependente, assumin- vas, associadas com a incapacidade do sujeito
do excessiva culpa. “Justificadamente, pode ter de descarregá-las, que se voltam contra ele
medo de perder o controle de suas emoções”, e, mesmo, com aumento do risco de suicídio, que
então, a estratégia para lidar com isso “é negar fica potencializado pelo mau controle dos im-
impulsos inaceitáveis, mas isso, às vezes, resulta pulsos, implícito pela 4 e a 9.
em períodos dissociativos de atuação” (p.273). As hipóteses diagnósticas incluem duas al-
Implicações terapêuticas. Uma vez que um ternativas principais: a) transtorno afetivo bi-
dos problemas do paciente é a possibilidade polar misto e b) síndrome orgânico-cerebral.
de perder o controle, inclusive da agressão, Como vimos, a dinâmica da personalidade
duas questões devem ser salientadas. Em pri- se centraliza em sentimentos de inadequação

PSICODIAGNÓSTICO – V 489
e desvalia, que procuram ser negados através lecer relações com outras pessoas, por vezes, com
de intensa atividade (Groth-Marnat, 1999). um indivíduo anti-social, e “atuam através de-
Implicações terapêuticas. Uma vez que o qua- las” (Vincent, 1987, p.128), isto é, estimulam
dro sintomático tende a se alterar de forma cícli- nelas manifestações hostis, embora, aparente-
ca, um problema nuclear da terapia é a tentativa mente, pareçam discordar de tal comportamen-
de estabilização do humor. Isto pode se tornar to e apresentando pouco insight sobre o seu
complicado em vista de possível comportamen- papel na interação, especialmente com elevação
to aditivo e por causa do potencial suicida, em também da escala 6.
razão do que o paciente precisa ser monitorado. A atuação é comum e de vários tipos. As
Dadas as características do quadro, os as- dificuldades na vida matrimonial são crônicas,
pectos depressivos podem não ser aparentes, e, freqüentemente, há história de abuso do
mas a história clínica possivelmente oferece álcool e de drogas. “Tentativas impulsivas de
subsídios sobre diferentes fases com alterações suicídio usualmente são subseqüentes a perío-
de humor (Groth-Marnat, 1999). dos de atuação ou de bebida excessiva” (Vin-
Como vimos, a dinâmica da personalidade cent, 1987, p.127-128), e podem ocorrer fe-
centraliza-se em sentimentos de inadequação nômenos dissociativos.
e desvalia, que procuram ser negados por meio A descrição é compatível com uma perso-
de intensa atividade (Groth-Marnat, 1999). nalidade passivo-agressiva. Quando as eleva-
Implicações terapêuticas. Uma vez que o ções ultrapassam um T = 85, são possíveis es-
quadro sintomático tende a se alterar de for- tados de fuga, em que “impulsos agressivos
ma cíclica, um problema nuclear da terapia é a ou sexuais são atuados” (Groth-Marnat, 1999,
tentativa de estabilização do humor. Isso pode p.278). Numa pesquisa entre pacientes psiquiá-
se tornar complicado em vista de possível com- tricos de clínica privada, o diagnóstico modal
portamento aditivo e por causa do potencial foi de transtorno de ajustamento, e os tipos de
suicida, em razão do que o paciente precisa personalidade mais comuns foram histriônica,
ser monitorado. borderline ou passivo-agressiva (Vincent, 1987).
Dadas as características do quadro, os as- Há conflitos subjacentes de dependência
pectos depressivos podem não ser aparentes, versus independência. Tais necessidades são
mas a história clínica possivelmente oferece intensas e podem caracterizar períodos em que
subsídios sobre diferentes fases com alterações os indivíduos buscam afeto e proteção, mas,
de humor (Groth-Marnat, 1999). também, fortes sentimentos de hostilidade
podem ser suscitados, uma vez que podem ser
ativados facilmente por críticas. “Superficial-
34/43 mente, eles podem parecer conformistas, mas,
subjacentemente, têm fortes sentimentos de
Sintomas, comportamentos e características da rebeldia” (Groth-Marnat, 1999, p.275).
personalidade. Sendo a elevação 3 atenuante de Implicações terapêuticas. A imaturidade, as
outras variáveis no perfil e estando a 4 associada dificuldades de controle e o estilo passivo-
com mau controle dos impulsos, é fácil entender agressivo, que marcam os relacionamentos
que, no caso de elevações marcantes de ambas desses indivíduos, têm probabilidades de tu-
as escalas, principalmente se a 3 ultrapassa a 4, multuar o processo terapêutico. Por outro lado,
se encontre um estilo passivo-agressivo de ma- seu escasso insight faz com que tenham difi-
nejo da hostilidade, em que “o indivíduo expres- culdade de assumir a responsabilidade pelos
sa a ira de uma maneira encoberta ou oculta’ seus atos, projetando a culpa nos demais. As-
(Trimboli & Kilgore, 1983, p.621). Observa-se que sim, a tendência é de que a resistência à tera-
tais sujeitos procuram agradar superficialmente pia, bem como seus sentimentos de raiva, os
as outras pessoas, mas “ainda experienciam con- levem à interrupção do processo que, muitas
siderável grau de raiva e necessitam encontrar vezes, teve início por pressão externa. Entre-
meios para controlá-la ou descarregá-la” (Gro- tanto, parece que a terapia de grupo é uma
th-Marnat, 1999, p.275). Podem, então, estabe- opção mais adequada, especialmente se hou-

490 JUREMA ALCIDES CUNHA


ver algum tipo de monitoração e motivação acentuada perturbação emocional, em que se
externa (Groth-Marnat, 1999). observam ansiedade, depressão, tensão e in-
quietação. A ansiedade, porém, pode ser ca-
nalizada por vias somáticas, com queixas de
36/63 cefaléias, problemas gastrintestinais, etc., prin-
Sintomas, comportamentos e características da cipalmente quando a 3 é maior que a 8.
personalidade. Este é um código importante na Embora a elevação na 3 seja considerada
avaliação do manejo da agressão dirigida aos tipicamente como uma contra-indicação de
demais, de forma não direta. Às vezes, a agres- psicose, este código pode constituir uma exce-
são chega a ser manifesta e observada por ou- ção, especialmente quando há preponderân-
tras pessoas (principalmente quando a 6 ultra- cia significativa da 8 sobre a 3. Então, o sujeito
passa a 3 por mais de cinco pontos), mas o sujei- apresenta transtornos de pensamento, dificul-
to tem escasso insight (Groth-Marnat, 1984), dades de concentração e memória, com má
surpreendendo-se quando os outros assinalam capacidade de insight, podendo ter sintomas
a natureza de seus atos (Trimboli & Kilgore, 1983), de confusão mental, desorientação e, even-
ficando ressentido e culpando-os (geralmente, tualmente, pensamento delirante e perda de as-
pessoas da família) por suas dificuldades, o que sociações de idéias. Socialmente, os pacientes
resulta num problema nas relações interpessoais. mostram-se alienados, esquizóides ou dependen-
Quando a 3 ultrapassa a 6 por mais de cin- tes. Assim, muitas vezes, têm conflitos em rela-
co pontos, o uso da projeção não é tão conspí- ção a necessidades de dependência, requerendo
cuo, mas, antes, há uma tendência para negar atenção e afeto e desejando parecer normais, mas
os problemas e os conflitos, através de uma temendo serem rejeitados, em função da natu-
imagem muito idealizada de si mesmo e do reza inusitada de suas experiências interiores.
mundo. Os pacientes “têm mais probabilidade Quando a escala 8 está grandemente eleva-
de desenvolverem queixas somáticas do que da, concomitantemente com a F, o diagnóstico
uma ideação paranóide, e a chance de um pro- provável é de esquizofrenia. Contudo, se a esca-
cesso psicótico fica significativamente reduzi- la 3 é bem mais alta que a 8, com F menor que T
da” (Groth-Marnat, 1999, p.276). = 70, as alternativas diagnósticas prováveis são
Ainda que existam sentimentos hostis e res- de transtorno somatoforme ou dissociativo.
sentimento, que envolvem principalmente fa- Quando o perfil, com o código 38/83, apresenta
miliares, esses são manejados pela repressão, de um K elevado e um F baixo, os indivíduos costu-
forma que raramente se manifestam. A pessoa é mam ser inibidos, muito convencionais, sendo
muito sensível à crítica, mas procura reprimir as- que quaisquer sentimentos de rancor e tensão
pectos agressivos. Às vezes, entre os indivíduos se tornam intoleráveis, passando a ser negados,
com este código, alguns são descritos como “in- e eles manifestam, então, um otimismo irrealis-
gênuos e tolos” (Groth-Marnat, 1999, p.276). ta e uma necessidade de afiliação exagerada.
Implicações terapêuticas. Não são bons can- As necessidades de atenção e afeto são de
didatos à psicoterapia, por escasso insight, di- nível imaturo, apesar de eles tentarem passar
ficuldades de estabelecer vínculos afetivos, de uma imagem de pessoas muito convencionais,
admitir causas psicológicas para seus proble- comuns, estereotipadas, embora suas experiên-
mas e de se responsabilizar pelos próprios atos, cias interiores sejam inusitadas, o que lhes cau-
o que os torna muito defensivos, pouco cola- sa desconforto.
boradores, geralmente interrompendo o pro- Implicações terapêuticas. São maus candi-
cesso terapêutico. datos para a terapia orientada para o insight,
já que seu insight é escasso, têm dificuldade
de estabelecer um vínculo e em admitir que
38/83 possam apresentar problemas mentais. Entre-
tanto, poderão aceitar melhor uma interven-
Sintomas, comportamentos e características da ção mais diretiva de reforço do ego (Groth-
personalidade. Este código está associado com Marnat, 1999).

PSICODIAGNÓSTICO – V 491
45/54 46/64

Sintomas, comportamentos e características da Sintomas, comportamentos e características da


personalidade. Este código se associa com com- personalidade. A escala 4 é considerada por
portamento manifestamente não-conformista Trimboli e Kilgore (1983) como “a marca dis-
que ainda pode se apresentar como imaturo tintiva do caráter” (p.264), relacionando-se a
ou autocentrado. É um padrão comum em sua elevação extrema a uma falta de controle
minorias, que se ressentem e expressam sua dos impulsos. A combinação da 4 com a 6 cons-
desconformidade em relação à cultura domi- titui um padrão significativo em termos do
nante. De forma subjacente, podem-se pres- entendimento das relações objetais, uma vez
supor problemas de identidade, inclusive de que ao egocentrismo, refletido pela elevação
identidade sexual. Pode ser consistente, às ve- 4, se associa uma aversão manifesta e dirigida
zes, com a orientação homossexual em homens contra pessoas específicas, caracterizada pela 6,
ou com atitudes feministas, em mulheres, consi- ocorrendo, então, uma potencialização mútua
derando-se tais sujeitos como membros de uma dos efeitos de ambas, crescendo a possibilidade
subcultura. Assim, não serve como “diagnósti- de atuação (especialmente se a 4 e a 6 se mos-
co” de homossexualidade, especialmente como tram mais altas que a K e a 3 e, em menor grau,
elevações únicas, embora não seja comum entre que a 5). Por outro lado, este código pode suge-
pessoas que declaram abertamente serem ho- rir a utilização de mecanismos mais arcaicos.
mossexuais. No sentido em que se consideram Os sujeitos com este código são descritos
as minorias, insatisfeitas socialmente, mas com como hostis, irritáveis, suspeitosos, autocentra-
um nível de energia para abrir espaços e mudar, dos, mal-humorados, desagradáveis, com pro-
espera-se que este código se acompanhe de uma blemas em relação a figuras de autoridade, ques-
elevação na escala 9. Entretanto, se a 5 for baixa, tionadores e defensivos (especialmente com L e
sendo elevadas a 4 e a 9, esse perfil é consistente K elevadas), altamente suscetíveis a qualquer
com atuação sexual do tipo “Don Juan”. exigência e sensíveis a críticas imaginárias ou não,
Conforme Groth-Marnat (1999), “para obter desconfiados das intenções dos outros, culpan-
maiores informações sobre este ou sobre qual- do-os pelas próprias dificuldades e, naturalmen-
quer perfil, em que a escala 5 é um ponto alto, é te, apresentando pouco insight sobre os moti-
extremamente proveitoso interpretar a terceira vos de suas atitudes pessoais. Assim, para evitar
elevação. Desta maneira, um perfil, em que 4, 5 a rejeição imaginada, procuram manipular os
e 6 são todos altos, pode ser interpretado como demais, o que lhes dá um certo sentido de segu-
se fosse do tipo de código 46/64” (p.278). rança (Groth-Marnat, 1999; Vincent, 1987).
São personalidades imaturas, autocentra- Dentro deste quadro, é de se esperar desa-
das, não-conformistas, com baixa tolerância à justamento nas relações interpessoais, em várias
frustração, abrigando sentimentos latentes de áreas, e, muitas vezes, adição ao álcool e às drogas.
raiva e ressentimento, expressando seus pro- Num estudo em pacientes psiquiátricos, a
blemas num estilo passivo-agressivo. Têm pro- maioria com este código apresentou um diag-
babilidade de apresentarem dificuldades em nóstico dual de transtorno afetivo (depressi-
nível de identidade sexual e conflito na dimen- vo) e abuso de drogas (Vincent, 1987). No sexo
são dependência-independência. masculino, a concomitância da elevação 8 tor-
Implicações terapêuticas. Apesar de sua de- na o caso compatível com um funcionamento
fensividade, têm boa capacidade de insight, pré-psicótico ou psicótico, com diagnóstico
mas raramente chegam a ser pacientes em tra- possível de esquizofrenia paranóide. Já, se es-
tamento, porque geralmente estão satisfeitos tão elevadas também a 2 e/ou a 3, há probabili-
consigo mesmos. Se chegam à terapia, freqüen- dade de um transtorno de personalidade border-
temente, é por dificuldades relacionadas com line. No sexo feminino, esse código é mais en-
dependência versus domínio, mas não devem contrado em psicóticos ou pré-psicóticos, porém,
ser esperadas mudanças significantes (Groth- mais comumente, apresentam uma personalida-
Marnat, 1999). de passivo-agressiva (Groth-Marnat, 1984).

492 JUREMA ALCIDES CUNHA


Utilizando projeção como defesa, têm pro- trado entre pacientes com problemas de adi-
blemas de ajustamento e dificuldades de criar ção (ao álcool, drogas, etc.), encaminhados por
vínculos profundos, sendo hostis, desconfia- seu estilo de vida impulsivo-compulsivo.
dos, irritados e imaturos. As questões nucleares concentram-se em
Implicações terapêuticas. Além de apresen- insegurança e ambivalência, relacionadas com
tar escasso insight, focalizando mais o com- um conflito básico entre dependência e inde-
portamento dos demais do que o seu próprio, pendência.
geralmente são contra a idéia de se submete- Implicações terapêuticas. Durante os perío-
rem a um tratamento. Se o fazem, é por pres- dos de remorso, há procura de ajuda terapêu-
são dos outros, e, eventualmente, haverá di- tica, mas sem muito êxito, porque o alívio da
ficuldade em estabelecer uma relação terapêu- ansiedade dá lugar a novas atuações. Dessa
tica. “Planos de tratamento devem ser concre- maneira é que se estabelece um padrão crôni-
tos, claros, realísticos e descritos de maneira a co, e “os esforços terapêuticos para diminuir a
não suscitarem suspeição ou antagonismo” ansiedade podem realmente resultar num au-
(Groth-Marnat, 1999, p.279). mento de atuação, porque o controle criado
pela culpa e pelo remorso pode se aliviado”
(Groth-Marnat, 1999, p.280). Esses pacientes
47/74 conseguem se adaptar a um programa tera-
pêutico de apoio, mas mudanças básicas não
Sintomas, comportamentos e características da devem ser esperadas.
personalidade. Este é um padrão que envolve
comportamentos contraditórios, sendo os su-
jeitos caracterizados por insensibilidade em 48/84
relação aos demais (pelos quais se sentem re-
jeitados, com manifestação de impulsos hos- Sintomas, comportamentos e características da
tis, culpa e remorso em relação à própria con- personalidade. Sujeitos com este código são
duta). São imaturos, inseguros, mal-humora- descritos como estranhos, peculiares, esquisi-
dos, cismarentos e têm conflitos de dependên- tos, impulsivos, imprevisíveis, erráticos, não-
cia-independência. Seu estilo é cronicamente conformistas, com severas perturbações emo-
cíclico, no sentido de que se alternam perío- cionais, podendo apresentar comportamentos
dos em que não controlam seus sentimentos anti-sociais e associação no submundo ou com
de raiva, que são atuados, seguidos por fases minorias políticas e religiosas estranhas e inu-
de supercontrole, com culpa genuína, senti- sitadas.
mentos de remorso, autocondenação e auto- Provêm geralmente de lares muito pertur-
piedade. O sujeito, “frustrado por esses senti- bados, podendo ter sofrido rejeições e maus
mentos, pode tentar egoisticamente satisfazer tratos, de modo a desenvolver uma atitude de
suas necessidades através de meios como abu- desconfiança em relação a um mundo frio e
so do álcool, promiscuidade ou atuação agres- perigoso, com problemas de auto-identidade.
siva. Assim, o ciclo continua e, habitualmente, Estabelecem, assim, um padrão de vida mar-
é muito resistente à mudança” (Groth-Marnat, cado pela rejeição e o fracasso. Com mau au-
1999, p.280). toconceito, têm fortes necessidades de aten-
Embora com necessidade de afeto, as re- ção e afeto. “Essas pessoas são basicamente
lações interpessoais não são boas, e o sujei- medrosas, instáveis e prontas a atuar” (Vincent,
to pode chegar a ter envolvimentos com a 1987, p.132). Por medo de rejeição e por difi-
Justiça. culdades de comunicação, tornam-se aliena-
Groth-Marnat (1984) relaciona, como hipó- das e hostis, apesar de sua intensa necessida-
teses diagnósticas, transtorno de personalida- de de afeto.
de anti-social ou transtorno de ansiedade, e Seu ajustamento pode ser considerado
afirma que este código é comumente encon- marginal ou mau, em várias áreas, como aca-

PSICODIAGNÓSTICO – V 493
dêmica e profissional. Apresentam, freqüente- a atuação direta dos impulsos agressivos, sem
mente, disfunções sexuais de vários tipos, são consideração pelas conseqüências de seus atos,
capazes de atos anti-sociais, com envolvimen- já que a elevação 9 é compatível com o uso do
to com a Justiça, sendo que há um cunho bi- mecanismo de negação (Trimboli & Kilgore,
zarro e persistente em muitas de suas atua- 1983).
ções. São comuns as tentativas de suicídio e São indivíduos impulsivos, anti-sociais, ego-
tendência à adição ao álcool ou às drogas. Na cêntricos, hedonistas, sensuais, desejosos de
verdade, é o padrão mais comum entre os usuá- excitação, extrovertidos, irritáveis, violentos,
rios de drogas (Vincent, 1987). alienados, manipulativos, energéticos e atua-
Algumas combinações com outras escalas dores. Apresentam histórias de mau ajustamen-
podem ser dignas de nota. Assim, quando se to familiar, mau aproveitamento escolar, além
observa uma elevação da escala F e uma baixa de dificuldades no trabalho e com a Justiça.
da escala 2, a hipótese é de que os sujeitos Contudo, tais dificuldades, em pessoas mais
tenham tendências agressivas e punitivas, que moças, não são tão intensivas e extensivas. Por
conseguem sanção social, pela função que eles exemplo, ambas as escalas costumam ser ele-
ocupam, mas podendo chegar, eventualmen- vadas em adolescentes normais ou não, pelo
te, a verdadeiro sadismo. “Subjacentemente a que a interpretação deve ser feita com mui-
seus comportamentos manifestos, habitual- to cuidado, uma vez que casos de delinqüên-
mente eles têm um profundo senso de aliena- cia e evasão escolar também comumente
ção, vulnerabilidade e solidão, que podem sus- apresentam este código (Hathaway & Mona-
citar sentimentos de ansiedade e desconforto” chesi, 1965). No entanto, tal tipo de código,
(Groth-Marnat, 1999, p.281). após os 25 ou 30 anos, já tende a se associar
Em homens, quando há combinação com a com um padrão crônico (Vincent, 1987),
elevação 9, comportamento criminoso é uma “muito resistente à mudança” (Groth-Mar-
possibilidade, com atos violentos, bizarros, que nat, 1999, p.282).
podem envolver homicídio e/ou ataque sexual. Se a escala 0 está baixa, parece aumentar a
Em mulheres, tal hipótese é pouco provável, capacidade de manipulação dos demais, de
mas seus problemas se caracterizam por uma forma acentuadamente anti-social. Com a ele-
tendência a escolherem parceiros sexuais de vação da 3, a atuação diminui, e o manejo da
nível inferior. hostilidade é semelhante ao associado ao có-
Groth-Marnat (1999) associa este padrão digo 34/43. Quando a escala 6 se eleva, a atu-
com personalidade esquizóide ou paranóide e, ação pode ser violenta, perigosa e bizarra.
se há elevação também da escala 6, com es- Em termos diagnósticos, a hipótese prová-
quizofrenia paranóide. vel é de personalidade anti-social. Se há eleva-
Implicações terapêuticas. São maus candi- ção da escala 8, deve-se considerar a possibili-
datos à psicoterapia. A multiplicidade de pro- dade de um estado maníaco ou de esquizofre-
blemas torna difícil manter um foco terapêuti- nia (Groth-Marnat, 1999). Contudo, num es-
co, e o processo tende a ser caótico, improdu- tudo de pacientes psiquiátricos de hospitais
tivo, de curta duração e complicado por possí- particulares, abuso de drogas foi encontrado
vel história de álcool ou drogas. em 75% dos sujeitos (como diagnóstico pri-
mário ou secundário), tendo, como hipótese
alternativa, transtorno de ajustamento (Vin-
49/94 cent, 1987).
Ainda que os sujeitos passem inicialmente
Sintomas, comportamentos e características da uma boa imagem, não são capazes de relações
personalidade. As escalas 4 e 9 estão associa- mais profundas, e os problemas tendem a apa-
das com mau controle dos impulsos, e esta recer, muito em função do egocentrismo, ir-
configuração é encontrada em sujeitos em que responsabilidade, hostilidade e tendência a
se observa não só tendências anti-sociais, mas manipular os demais, embora busquem racio-

494 JUREMA ALCIDES CUNHA


nalizar as suas atitudes e culpar os outros por Freqüentemente, este padrão é associado
seus erros. à psicose, principalmente com esquizofrenia
Implicações terapêuticas. Podem ser consi- paranóide (em especial, quando há elevação
derados como maus candidatos à psicoterapia, da escala 4). “Se a escala 7 está dez pontos ou
porque “o tratamento deve provavelmente ser mais abaixo das escalas 6 e 7, este código é
lento, frustrante e, muitas vezes, improdutivo” referido como o ‘vale paranóide’ e enfatiza a
(Groth-Marnat, 1999, p.282). Tais pacientes não presença de ideação paranóide” (Groth-Mar-
apenas não aprendem pela experiência, como nat, 1999, p.283). Outra hipótese possível é de
também, uma vez que sentem pouca ansieda- estado paranóide, e, com menos freqüência,
de, não têm motivação para mudar. A terapia podem ser encontradas síndromes orgânico-
de grupo, bem como a modificação compor- cerebrais ou transtornos de ansiedade graves
tamental, podem ser de melhor ajuda. (Groth-Marnat, 1999).
É importante observar que, com este códi-
go, se as elevações são superiores a T = 80,
68/86 um F elevado não invalida o perfil.
Sendo sintomas nucleares a suspeição e a
Sintomas, comportamentos e características da desconfiança, as pessoas com tais característi-
personalidade. Trimboli & Kilgore (1983) citam cas têm só poucas amizades ou nenhuma, pre-
a afirmação de Dahlstrom e colegas, em traba- ferindo estarem sós, em vista do desconforto
lho de 1975, de que um escore maior que 80, em situações sociais.
seja na escala 6, 8 ou F, de forma característi- “Suas defesas são mal-desenvolvidas, e, sob
ca, “se associa com um contato perturbado estresse, elas têm probabilidade de regredir”
com a realidade” (p.622). (Groth-Marnat, 1999, p.283).
A combinação da escala 6 com a 8 é um Implicações terapêuticas. Dadas as carac-
dos códigos mais marcados por sintomas psi- terísticas de personalidade desses pacientes, a
copatológicos. Os sujeitos são descritos como terapia voltada para o insight não é recomen-
suspeitosos, desconfiados, inibidos, com sen- dável. Intervenções cognitivas podem ser ten-
timentos de inferioridade, falta de auto-esti- tadas, mas com alguma dificuldade, em vista
ma e de autoconfiança, distantes, com dificul- do sistema de crenças e lógica inusitadas des-
dade extrema de estabelecer vínculos afetivos ses pacientes. Intervenção comportamental
e acentuadamente voltados para um mundo parece ser mais proveitosa. Todavia, há ques-
de fantasia. Apresentam comprometimento tões cruciais que devem ser consideradas, em
das funções de juízo, sentido de realidade e caso de piora sintomática: a) o regime de tra-
teste de realidade. Seu pensamento geralmen- tamento (em internação ou ambulatorial); b) a
te “é considerado como autista, fragmentado, necessidade de tratamento psicofarmacológi-
tangencial ou circunstancial” (Vincent, 1987, co); c) eventual treinamento de habilidades
p.133), tem “conteúdo inusitado, senão bizar- sociais básicas; d) conhecimento e familiarida-
ro, freqüentemente contendo delírios de gran- de com recursos de atendimento (Groth-Mar-
deza e/ou de auto-referência” (Groth-Marnat, nat, 1999).
1999, p.283). Alucinações, confusão mental,
afeto inapropriado e depressão podem estar
presentes, além de problemas de concentra- 69/96
ção e memória, medos e fobias.
Esses sujeitos habitualmente são solteiros Sintomas, comportamentos e características da
e podem ter tido uma história profissional pré- personalidade. Indivíduos com este código têm
via aparentemente adequada, até que fatores dificuldades na modulação dos afetos, além de
estressantes tenham levado a uma intensifica- se mostrarem, eventualmente, irritados, ansio-
ção de sintomas, que os incapacita (Groth- sos, suscetíveis, desconfiados, vulneráveis a
Marnat, 1999). ameaças reais ou imaginárias, fugindo para um

PSICODIAGNÓSTICO – V 495
mundo de fantasia, quando estão sob estres- sas de nível neurótico, e uma hipótese prová-
se, ou ficando extremamente excitados. Podem vel é de transtorno de ansiedade, em vez de
ter sinais claros ou sutis de transtornos de pen- um quadro psicótico. A predominância da 8
samento, inclusive chegando a apresentar de- (especialmente quando maior que T = 75) as-
lírios, dificuldades de concentração, alucina- socia-se com sintomas mais em nível psicóti-
ções, associações tangenciais, fala incoerente, co, e o prognóstico é pior. Se ambas as escalas
parecendo perplexos e desorientados, e sen- estão bem elevadas, com T maior que 75, é
do, muitas vezes, “obsessivos, ruminativos e provável a presença de esquizofrenia, princi-
sobreideacionais”(Groth-Marnat, 1999, p.284). palmente quando a “tríade neurótica” está
Com fortes características de suspeição e des- baixa. “Mesmo que esquizofrenia possa ser des-
confiança, estabelecem relações de tipo passi- cartada, a condição tende a ser resistente à mu-
vo-dependente, havendo grande diferença en- dança, como, por exemplo, num grave trans-
tre a imagem que têm de si e a percebida pe- torno de personalidade alienada” (Groth-Mar-
los demais. nat, 1999, p.285). Com a elevação da 2, a hi-
Implicações terapêuticas. Este código é mais pótese de um transtorno distímico ou obsessi-
comum entre pacientes, em internação psiquiá- vo-compulsivo deve ser considerada (Groth-
trica. Dadas as suas condições de personalida- Marnat, 1984).
de e, principalmente, a desorganização do pen- Implicações terapêuticas. Este código é en-
samento, a terapia de insight não é tratamen- contrado, mais comumente, entre pacientes
to de opção, dificilmente tendo alguma eficá- psiquiátricos. Dadas as características de per-
cia. Comumente, necessitam de tratamento sonalidade, deve ser levado em conta risco de
psicofarmacológico (Groth-Marnat, 1999). suicídio, especialmente com elevação na 2.
Neste caso, devem ser examinados os itens crí-
ticos e outras fontes de informações (Groth-
78/87 Marnat, 1999).

Sintomas, comportamentos e características da


personalidade. Segundo Groth-Marnat (1999), 89/98
a emergência do quadro associado a este có-
digo relaciona-se com uma crise. Assim, quan- Sintomas, comportamentos e características da
do o paciente é internado, freqüentemente personalidade. Conforme Marks e colegas,
apresenta muita perturbação, dificuldades de apud Trimboli e Kilgore (1983), as elevações 8
concentração e, eventualmente, um estado de e 9 potencializam-se mutuamente, e, então,
pânico (Vincent, 1987). São pacientes ansio- quando o T de ambas está ao redor de 80, “vê-
sos, deprimidos, tensos, retraídos, supersensí- se um indivíduo psicótico, errático, que eviden-
veis, obsessivos, com sentimentos de insegu- cia considerável confusão e perplexidade”
rança, inadequação e inferioridade, que tam- (p.622). Além disso, caracteriza-se por ser al-
bém podem se relacionar com problemas na tamente energético, hiperativo, agitado, inde-
vida sexual, especialmente no que se refere a ciso, emocionalmente lábil, irrealístico, desor-
relações heterossexuais em nível adulto. Podem ganizado, muitas vezes com delírios de gran-
apresentar uma vida de fantasia (inclusive de- deza de sentido religioso (especialmente com
vaneios), delírios e alucinações, pelo que, fre- elevação da 6). Há probabilidade de apresen-
qüentemente, são classificados como psicó- tarem pensamento tangencial, fala bizarra,
ticos. com neologismos e ecolalia. São sujeitos que
Este código deve ser cuidadosamente ana- se frustram se não recebem atenção e afeto e
lisado em função da elevação relativa das duas são imaturos, desconfiados, irritáveis, evitan-
escalas. A predominância da escala 7 torna o do as interações mais íntimas ou interagindo
quadro mais benigno, porque significa que o de forma infantil. Têm planos ou objetivos que
sujeito ainda está conseguindo utilizar defe- podem ultrapassar o seu nível de realização,

496 JUREMA ALCIDES CUNHA


pelo que têm sentimentos de inadequação e me de várias pesquisas, afirmam que a ques-
de inferioridade, e seu desempenho não é bom tão de sua utilidade não está suficientemente
na escola e na profissão. analisada. Não obstante, observa-se que, há
Têm escasso insight e negam a necessida- mais de uma década, tem se intensificado o
de de ajuda terapêutica. interesse no conteúdo dos itens e do antigo
As hipóteses mais comuns são de esquizo- conceito (Christian, Burkhart & Gynther, 1978).
frenia ou de transtorno esquizoafetivo, com Hryckowian & Gynther (1989) consideram a
episódios maníacos. Para avaliar a gravidade possível utilidade clínica do conceito para a
do quadro clínico, é importante considerar a interpretação do MMPI, embora assinalem a
elevação da escala F. necessidade de mais pesquisas sobre os pa-
Implicações terapêuticas. Com escasso in- drões de respostas. Entretanto, a literatura re-
sight, dificuldades para focalizar um tema, ne- cente critica a metodologia utilizada, conside-
gação de problemas psicológicos, qualquer rando-a por demais simplista (Levitt & Gotts,
intervenção terapêutica é extremamente difí- 1995).
cil. Dependendo da gravidade do quadro, pos- Na verdade, apesar de alguma divergência
sivelmente será indicado tratamento psicofar- em nível técnico, as escalas óbvias e sutis são,
macológico. às vezes, utilizadas no trabalho clínico, por
apresentarem uma informação extra e útil. Por
outro lado, Peterson e colegas (1989), em pes-
ESCALAS ÓBVIAS E SUTIS quisa realizada, chegaram à conclusão de que
as escalas óbvias “são mais suscetíveis de dis-
Como foi referido no item sobre as escalas bá- torção deliberada, e as escalas sutis, menos”
sicas, em conseqüência de estudos desenvolvi- (p.582), se considerada a possibilidade de si-
dos com o MMPI, para algumas escalas (2, 3, mulação ou de exagero de patologia, também
4, 6 e 9) foram criadas, em 1946, por Wiener e em relação às escalas tradicionais, parecendo
Harmon (Wiener, 1963), escalas óbvias e sutis, que a informação pode ser complementada
para obter dados mais precisos que os ordina- pelo uso da escala de Dissimulação (Walters,
riamente fornecidos pelas escalas tradicionais White & Greene, 1988), que é apresentada no
(Greene, 1988). Quadro 32.1.
O desenvolvimento dessas escalas baseia- A composição dessas escalas é encontrada,
se no fato de que muitos itens possuem con- neste livro, nos itens sobre as escalas clínicas
teúdo óbvio e transparente, permitindo que as
respostas possam ser manipuladas numa de-
terminada direção, numa tentativa de forne- QUADRO 32.1 Escala de Dissimulação
cer certa impressão positiva ou negativa ao Certo
examinador. Uma imagem positiva geralmen-
10 14 16 19 23 24 29 31 35 42 44
te resulta de uma defensividade deliberada ou 47 50 53 73 93 97 104 125 179 206 210
de negação da psicopatologia. Uma imagem 211 212 216 226 241 246 247 297 303 320 325
negativa ocorre a partir de um exagero ou si- 328 341 344 352 360 375 388 419 422 433 438
mulação de psicopatologia. Pressupostamen- 443 453 458 459 471 475 476 480 481 485 518
te, os itens sutis estariam mais isentos de uma 519 525 535 541 543 545 565
manipulação num ou noutro sentido. Tais es-
Errado
calas permitem, assim, avaliar os efeitos da
tendência consciente ou inconsciente do sujei- 68 83 88 96 137 207 257 306 405 466 524
528
to para apresentar uma determinada imagem
de si mesmo (Wiener, 1963). Amostras clínicas Amostras não-clínicas
Média: 15,94 Média: 15,88
Gynther e Gynther (1983), embora consi-
Desvio padrão: 9,99 Desvio padrão: 7,90
derem muito razoável a argumentação a favor
Observação: A escala é de Gough (1954), apud Dahlstrom &
da utilização dessas subescalas, a partir do exa- Welsh, 1962, p.453. Os dados são de Gough (1963).

PSICODIAGNÓSTICO – V 497
correspondentes, das quais derivam. A tabela Como não se torna possível fornecer todas
(americana) para transformar os escores bru- as escalas especiais que pareceriam desejá-
tos em notas T é incluída no Anexo C, e a faixa veis, vamos apresentar, pelo menos, dois
de normalidade situa-se entre T = 40 e T = 60. quadros, que permitem levantar hipóteses
sobre transtornos de personalidade, cujo
diagnóstico, evidentemente, não pode ser
ESCALAS ESPECIAIS feito com base apenas no MMPI (vide Qua-
dros 32.2 e 32.3).
Segundo Levitt e Gotts (1995), já em 1975,
Butcher, falando do desenvolvimento de esca-
las, “sugeriu que havia mais escalas especiais OUTRAS SUBESCALAS E ÍNDICES
do que itens” no MMPI (p.6). É evidente que
algumas escalas metodologicamente são dis- Desde a criação do MMPI, o sucessivo desen-
cutíveis, mas, na realidade, é bem mais seguro volvimento de estudos deu lugar ao apareci-
apoiar as hipóteses diagnósticas de uma ava- mento de considerável número de subescalas.
liação não só nas escalas originais, mas buscar Nos últimos anos, tais esforços foram dirigi-
também subsídios no uso de escalas especiais. dos principalmente para o desenvolvimento de

QUADRO 32.2 Itens hipoteticamente associados com transtornos de personalidade


Transtorno Certo Errado
Anti-social 49 56 93 118 124 135 145 146 37 113 294
205 218 250 269 271 298 313 381
419 437 471 472 475
Borderline 22 39 61 67 74(‘) 75 94 104 8 37 74(a) 379 399 407
129 139 145 158 208 234 236 299
301 305 381 383 418 468 506 555
Dependente 82 86 141 259 357 394 398 443 46 73 112 122 170 228 235 257
531 549 564 371 501 520
Esquiva 86 138 191 267 301 304 305 321 79 187 371 521
344 368 382 509
Esquiva-esquizotípica- 52 292 312 377 384 473 54 57 309 440 449 451 479 547
esquizóide (núcleo)
Esquizotípica 27 33 50 110 121 136 265 284 450 464 482
293 345 348 349 364 551
Histriônica 22 25 126 158 181 248 266 336 171 180 240 262 304 306 312 407
353 381 386 482 506 521 555
Narcisista 19 24 35 73 122 165 247 257 86 198
264 271 280 282 299 317 336 353
400 411 415 417 469 511 521
Obsessivo-compulsiva 64 112 148 213 232 233 343 346 Nenhum
359 390 404 427 431 461 499 558
Paranóide 16 28 35 110 136 157 162 200 79 347
247 265 278 284 303 348 364 448
507
Passivo-agressiva 13 41 109 157 212 233 244 245 83 96
259 342 487 536
Fonte: Levitt & Gotts, 1995, p.87 (adaptado e resumido).

498 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 32.3 Freqüência dos escores esperados
Masculino Feminino
Transtorno Provável Definido Marcante Provável Definido Marcante
Anti-social 12 13 15 11 12 14
Borderline 17 19 22 20 23 27
Dependente 12 13 15 14 16 19
Esquiva 9 11 13 11 13 16
Esquiva-esquizo- 9 10 13 8 10 12
típica-esquizóide
(núcleo)
Esquizotípica 9 10 12 10 11 14
Histriônica 13 14 15 14 15 17
Narcisista 15 16 18 15 16 19
Obsessivo-compulsiva 10 11 13 11 13 15
Paranóide 11 12 14 12 14 17
Passivo-agressiva 8-9 9 11 10 11 14
Fonte: Levitt & Gotts, 1995, p.89 (adaptado e resumido).

subescalas destinadas mais especificamente ao (1963) propõe uma relação entre “a soma das
diagnóstico de novas entidades clínicas, incluí- três escalas de queixa, humor ou sentimento –
das no DSM-IV. Não obstante, como não é ob- Hs, D e PT” e “a soma das três escalas de trans-
jetivo deste livro a discussão de tais escalas, tornos do comportamento ou de caráter – Hy,
recomenda-se o uso das referências bibliográfi- Pd e Ma” (p.302), da seguinte forma:
cas do MMPI, inclusas no Catálogo de técni-
cas úteis. A pedido, são incluídas no texto a IR = Hs + D + Pt
escala de Força do Ego e a escala de Dissi- Hy + Pd + Ma
mulação.
AV – Trata-se da antiga identificação para a O valor esperado do IR, para a população
média da elevação do perfil (ME), já apresen- normal, é de 1, sendo que valores mais eleva-
tada no item Nível global de ajustamento do dos são encontrados “em sujeitos que tendem
Passo 5, no Capítulo 30. a ter muitos sintomas somáticos e o sentimen-
AI – Trata-se do índice de ansiedade, de- to subjetivo de estresse”, enquanto valores
senvolvido por Welsh (1963) e que inclui esco- mais baixos são freqüentes em sujeitos que
res de quatro escalas e utiliza três característi- tendem à atuação e “externalizam” seus con-
cas do perfil de ansiedade: um aumento geral flitos (p.300). Valores concomitantemente al-
da “tríade neurótica”, a relação anticlinal de D tos de AI e IR são encontrados em casos carac-
(considerada em relação a Hs e Hy) e uma ele- terizados principalmente por ansiedade e de-
vação secundária de Pt, da seguinte forma: pressão. Já os valores baixos de ambos (ou só
com leve elevação do IR) são mais comuns em

[ ] [
AI = Hs + D + Hy + (D + Pt) – (Hs + Hy)
3
] casos de atuação.

O valor esperado de AI, para a população ITENS CRÍTICOS


normal, é de 50, sendo que valores mais eleva-
dos são mais freqüentes em grupos clínicos, Os itens críticos constituem indicadores de
em que a ansiedade é um componente signifi- comportamento desviante (Koss, Butcher &
cativo. Hoffman, 1976), ou indicadores de dificulda-
IR – Trata-se do quociente de internaliza- des clínicas especiais. Se respondidos na dire-
ção, útil para ser associado ao AI, mas enfati- ção crítica, têm pressupostamente um caráter
zando um aspecto diverso do perfil. Welsh “patognomônico”. Por tal razão, devem ser

PSICODIAGNÓSTICO – V 499
objeto de inquérito, para explorar a possibili- QUADRO 32.4 Lista de itens críticos de Grayson
dade de envolverem um significado patológi- Item Direção crítica Item Direção crítica
co específico e importante para a identifica- 20 (310) Errado 179 Certo
ção de crises e transtornos, no exame indivi- 27 Certo 182* Certo
dual, em triagem e em descrições computado- 33 (313)* Certo 184* Certo
rizadas. Tal inquérito é feito por meio de en- 37 (342) Errado 200* Certo
trevista individual, com duração de 5 a 20 minu- 44 Certo 202* Certo
48* Certo 205 Certo
tos, após a administração individual ou coletiva. 66* Certo 209* Certo
O inquérito é dirigido de forma que o sujei- 69 Certo 215* Certo
to fale mais a respeito de sua resposta a itens 74 M:Certo; F:Errado 251* Certo
desviantes (Schlanck, 1985). Na realidade, o 85 Certo 275 Certo
inquérito é necessário, porque a interpretação 114 Certo 291 Certo
121* Certo 293* Certo
se baseia “em itens isolados, que são mais vul- 123 Certo 334* Certo
neráveis a marcas errôneas ou a interpretações 133 Errado 337 Certo
erradas pelo paciente do que as escalas” (Gyn- 139* Certo 339* Certo
ther & Gynther, 1983, p.174). Porém, nem sem- 146 Certo 345 Certo
pre é necessária a investigação de todos os 151 Certo 349* Certo
156 Certo 350 Certo
itens, respondidos na direção crítica. Schlanck 168 Certo 354 Certo
(1985) sugere alguns itens específicos, que, na
Observação: Estes itens foram selecionados por Grayson, a partir
lista de Grayson (vide Quadro 32.4), estão de uma lista de Hellman (apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom,
marcados por asterisco, mas recomenda que, 1972, p.377-378), que pretendia reunir sintomas, impulsos ou
experiências, considerados sérios, e, portanto, se os itens são
em diferentes clínicas, sejam selecionados os respondidos na direção crítica, podem requerer inquéritos ou
itens que parecem mais importantes. exploração científica na triagem de pacientes, para identifica-
ção de estados de crise.
As listas de itens críticos de Grayson é com- *Itens sugeridos para inquérito (Schlanck, 1985).
posta por 38 itens e foi publicada, originalmen-
te, em 1951 (Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom,
1962). Têm sido utilizadas para caracterizar
estados de crise, ainda que, em grande parte,
os itens se relacionem com crises de propor- tas. Como ponto de partida, são apresentadas
ções psicóticas e não com crises situacionais as áreas da lista de Caldwell, conforme são re-
ou de desenvolvimento (Gynther & Gynther, lacionadas por Groth-Marnat (1984), acrescen-
1983). Posteriormente, Caldwell, conforme tando itens ou áreas que constam da lista de
Koss e colegas (1976), procurou melhorar a Grayson. São marcados com asterisco os te-
qualidade dos itens críticos, abrangendo no- mas da lista de Caldwell:
vas áreas de conteúdo (vide lista de Caldwell, a) álcool* e drogas*: 156, 215, 251, 460;
no Quadro 32.5). Apesar disso, ainda há áreas b) atuação: 85, 139, 146, 205, 354;
que estão sub-representadas. Assim, além de c) culpa*, depressão e suicídio*: 88, 139,
dúvidas sobre se os itens representam amostras 202, 209, 339;
do comportamento real do paciente, ainda há d) dificuldades sexuais*: 20, 37 (302), 69,
críticas quanto ao seu uso como uma escala 74, 133, 179, 297;
do estado psiquiátrico do sujeito. Espera-se que e) experiências peculiares* e alucinações*:
pessoas normais dêem, no máximo, três respos- 27, 33 (323), 48, 66, 184, 291, 334, 345, 349,
tas na direção crítica, sendo um escore de 4 ou 350;
mais já sugestivo de patologia. Contudo, as mé- f) idéias de referência*, perseguição* e de-
dias, tanto de grupos normais como clínicos, lírios*: 33 (323), 110, 121, 123, 151, 200, 275,
apresentam certa variabilidade no escore de itens 284, 293, 347, 364;
críticos (Koss, Butcher & Hoffman, 1976). g) perturbação*, ansiedade, tensão e de-
A seguir, serão definidas as áreas de con- pressão*: 5, 27, 44, 86, 142, 152,158, 168, 178,
teúdo especialmente abrangidas pelas duas lis- 182, 259, 337;

500 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 32.5 Lista de itens críticos de Caldwell típicos do indivíduo”, e as escalas de sintoma,
Item Direção crítica Item Direção crítica isto é, as escalas 1, 2, 7 e 8, que “são mais
2 Errado 168 Certo
vulneráveis a flutuações, como função de per-
5 Certo 175 Errado turbação experienciada”. Para Trimboli e Kilgore
9 Errado 178 Errado (1983), “mecanismo de defesa é um processo
20 Errado 179 Certo intrapsíquico inconsciente que funciona para
21 (308) Certo 182 Certo aliviar a ansiedade associada com impulsos e
23 Certo 184 Certo
27 Certo 189 Certo
pulsões conflituados” (p.615).
33 (323) Certo 200 Certo Sabe-se que a elevação da escala 3, espe-
37 (302) Errado 202 Certo cialmente quando igual ou maior que o escore
38 (311) Certo 205 Certo T de 80, se associa com a sintomatologia de
48 Certo 209 Certo conversão clássica. Por outro lado, há autores
55 Errado 212 Certo
59 Certo 215 Certo
que consideram que sua elevação igual ou
66 Certo 216 Certo maior que o escore T de 60 seria sugestiva de
69 Certo 237 Errado uso de negação. Como, de um modo geral, em
74 M:Certo; F:Errado 243 Errado relação à escala 3, os autores do MMPI se refe-
86 Certo 245 Certo rem “a comportamento sugestivo de indivíduos
88 Errado 251 Certo
96 Errado 259 Certo
que tentam evitar conflitos internos, manten-
110 Certo 275 Certo do-os fora da consciência ou canalizando-os
114 Certo 284 Certo através de vagas queixas físicas”, os autores
118 Certo 291 Certo citados acreditam que a escala 3, de um ponto
121 Certo 293 Certo de vista psicanalítico, reflita o mecanismo de
123 Certo 294 Errado
125 Certo 297 Certo
repressão (p.615).
133 Errado 334 Certo Considerando os correlatos de personalida-
137 Errado 337 Certo de geralmente associados com a escala 4, em
139 Certo 339 Certo especial no âmbito das interações familiares e
142 Certo 345 Certo sociais, parece que pacientes com elevações
151 Certo 347 Errado
152 Errado 349 Certo
nesta escala procuram lidar com a ansiedade,
153 Errado 350 Certo apoiando-se fortemente nos mecanismos de
156 Certo 364 Certo externalização, atuação e racionalização ou
158 Certo 460 Errado intelectualização.
Fonte: Groth-Marnat, 1984, p.428-430 (lista adaptada). A escala 5 implica uma interpretação bem
mais complexa. Sabe-se que “qualquer desvio
extremo nesta escala pode refletir um proces-
so de identificação defeituoso que comprome-
h) problemas com autoridade*: 38 (311), teria o desenvolvimento do funcionamento
59, 118, 205, 294; defensivo eficiente, com repercussões prejudi-
i) preocupações somáticas*: 2, 9, 23, 44, ciais na formação de funções do ego associa-
55, 114, 125, 153, 175, 189, 243; das”. As chamadas elevações “femininas” (ele-
j) transtorno familiar*: 21 (308), 96, 137, vadas nos homens e baixas nas mulheres) são
212, 216, 237, 245. compatíveis com melhor nível educacional e
tidas como refletindo interesses estéticos e
culturais, conforme Lavon, apud Trimboli e Kil-
MECANISMOS DE DEFESA gore (1983). “Assim, elevações femininas leves
e moderadas (determinadas à luz do nível edu-
Para a presente abordagem, é importante a dis- cacional) podem ser conceitualizadas como
tinção, já anteriormente citada, entre escalas refletindo alguma capacidade de sublimação,
de caráter, isto é, as escalas 3, 4, 5, 6, 9 e 0, um dos mecanismos de defesa de nível mais
que “refletem os mecanismos de defesa mais elevado e mais adaptativo. Perfis com a escala

PSICODIAGNÓSTICO – V 501
5 com escores T de moderados a elevados, na dos afetos, já descritos no item referente à es-
direção feminina, são considerados como re- cala 9. A hipótese psicodinâmica corresponden-
fletindo passividade marcante... [e] tais esco- te seria de que os sujeitos com escores pelo
res podem servir para inibir a expressão direta menos moderados na escala 9 utilizam o me-
dos impulsos”, isto é, parecem associados com canismo de negação e, também, “tendem a
o uso da supressão, “uma defesa mais cons- descarregar a ansiedade relacionada com o
ciente e relativamente menos eficaz”, embora conflito psíquico, através de canais psicomo-
classificada como madura (Gabbard, 1998). Por tores”. Além disso, conforme Lanyon (1968),
outro lado, as elevações leves e moderadas, na apud Trimboli e Kilgore (1983), tais defesas fre-
direção “masculina” (elevadas nas mulheres e qüentemente se associam com atuações, es-
baixas nos homens), encontram-se mais, se- pecialmente com a elevação simultânea da es-
gundo Lachar (1984), apud Trimboli e Kilgore cala 4 (p.616-617).
(1983), em níveis sociais e educacionais médi- Dada a caracterização de indivíduos com
os e baixos, em indivíduos com interesses mais escores elevados na escala 0, em especial seu
práticos e pragmáticos, e, segundo esses au- desconforto em situações sociais, sua dificul-
tores, associam-se com comportamento dog- dade de enfrentar diretamente situações per-
mático ou insistente, que se acentua quando turbadoras, os autores consideram que, numa
os escores são de moderados a altos, poden- linha psicodinâmica, os sujeitos com escores
do-se classificar mesmo como comportamen- elevados, isto é, com escores T ao redor de 70,
to agressivo, rude e dominador. Então, de um “parecem estar lidando com as dificuldades
ponto de vista psicodinâmico, estas elevações com sua vida interna e com as dificuldades
“parecem refletir uma capacidade defensiva externas, através de evitação e retraimento, que
diminuída para canalizar apropriadamente podem ser acompanhadas por suspeição”
impulsos agressivos” (p.616). (p.617).
Considerando os correlatos de personalida- Além das escalas de caráter, também as es-
de, bem como os sintomas, tais como idéias calas de validade podem proporcionar indícios
de referência, delírios de grandiosidade, asso- sobre mecanismos que o indivíduo utiliza para
ciados com escores elevados na escala 6 e, ain- manejar a ansiedade.
da, sintomas mais sutis, como suspeição, hi- Quando examinamos a escala K, vimos
persensibilidade e rigidez, toda essa variedade que níveis altos da escala K se associam com
de comportamentos sugere que “indivíduos uma relutância em reconhecer seus proble-
com escore T acima de 65 (ou abaixo do esco- mas e fraquezas psicológicas, chegando a
re T de 35, em pessoas que são capazes de ini- usar a racionalização para assinalar respos-
bir expressões mais manifestas de patologia) tas aceitáveis. Segundo Caldwell (1968), apud
tendem a usar várias formas de projeção e va- Trimboli e Kilgore (1983), é possível levantar
riantes de externalização” (p.616). a hipótese de que tais escores elevados indi-
Conforme McKinley e Hathaway (1980), quem uma constrição marcante, com conse-
apud Trimboli e Kilgore (1983), as elevações qüente restrição da responsividade afetiva ou
na escala 9 tendem a se associar com uma va- inibição da mesma. Essas considerações per-
riedade de transtornos, desde a antes denomi- mitem que se pressuponha que a elevação
nada personalidade psicopática, e a síndrome da escala K se associe ao uso de repressão e
orgânico-cerebral, até o tipo agitado de depres- racionalização. Já a configuração represen-
são, algumas formas de esquizofrenia e o es- tada por uma elevação da escala F, acompa-
tado hipomaníaco. Segundo os últimos auto- nhada de escores baixos nas escalas L e K,
res citados, mesmo elevações moderadas, isto “implica uma ausência de funcionamento
é, com escore T acima de 65, já “tendem a evi- defensivo eficaz”, enquanto um escore bai-
denciar uma forma não eficaz de superativida- xo na escala F seria consistente com a repres-
de e um autoconceito bastante grandioso”, são ou negação sugeridas por escores eleva-
além de dificuldades no manejo de impulsos e dos na escala K” (p.617).

502 JUREMA ALCIDES CUNHA


Neste trabalho que vem sendo citado, Trim- tensão pela qual as defesas típicas do indiví-
boli e Kilgore (1983) afirmam que uma das suas duo estão sendo rompidas”, ou, melhor, pode
hipóteses principais é que, quando não exis- ser interpretado como um sinal de que o me-
tem elevações marcantes nas escalas de sinto- canismo de repressão não está sendo eficaz ou
mas, isto é, nas escalas 1, 2, 7 e 8, a presença capaz de manter o conflito neurótico abaixo
de elevações marcantes nas escalas de caráter, de um nível consciente. Então, “à medida que
ou de pares de elevações de tais escalas, isto é, o conflito se torna mais intensificado, pode-
na 3, 4, 5, 6, 9 e 0, pode ser utilizada para mos compreender uma elevação na escala 7,
descrever os mecanismos defensivos do pacien- como indicando uma reativação daquelas de-
te. Já no caso em que existam elevações das fesas que, envolvendo pensamento mágico,
escalas de sintomas, “pode-se inferir, a partir ruminação e rituais, estão associadas com usos
das escalas de caráter, que tipos de operações menos eficientes de repressão, característicos
de defesa estão sendo rompidos pelos sinto- de níveis mais precoces de desenvolvimento
mas ou que defesas características o indivíduo psicossexual”. Por outro lado, quando as defe-
está tentando empregar para controlar os sin- sas se mostram muito comprometidas e dete-
tomas que emergiram”. Como exemplo, apre- rioradas, isso pode se refletir por uma nítida
sentam o caso de um sujeito cujo perfil apre- elevação da escala 8. “Tal elevação reflete a
senta apenas elevações moderadas nas esca- confusão cognitiva, o crescente isolamento e
las K e 3, o que seria indicativo que “suas ope- o tumulto emocional que acompanham as des-
rações ou defesas estão organizadas em torno compensações mais severas” (p.617-618).
da repressão. Isto implicaria um indivíduo fun- Já a escala 1, embora seja considerada uma
cionando num nível relativamente elevado, que escala de sintoma, funciona de forma similar
não está presentemente perturbado (sem ele- às escalas de caráter. A elevação da escala 1
vações das escalas de sintoma) e que é capaz associa-se com a tendência a canalizar as difi-
de usar os mecanismos de defesa mais efica- culdades emocionais através do plano somáti-
zes”. Este caso pode ser comparado com o co, ou, melhor, as preocupações psicológicas
perfil de um sujeito que apresenta elevações refletem-se em queixas somáticas. Envolve, en-
notáveis nas escalas 4 e 6, que poderiam se tão, uma função defensiva, o mecanismo de
relacionar com a utilização de mecanismos mais deslocamento, como resposta ao estresse. À
primitivos. Em conseqüência, tal pessoa per- medida que o estresse experienciado pelo pa-
cebe o mundo ao seu redor com uma atitude ciente aumenta, raramente se observam ele-
de suspeição e utiliza defesas muito menos vações apenas nas escalas de sintoma, come-
eficazes (p.617). çando a se elevar as escalas de caráter, cujas
elevações pressupõem “uma intensificação das
defesas típicas que o indivíduo usa em épocas
Manejo da ansiedade de estresse. Quanto maior é o estresse e quan-
to maior a ruptura do funcionamento, mais
Das últimas considerações, pode-se concluir que provavelmente se observam elevações através
a ausência de elevações marcantes das escalas de todo o perfil” (Graham, 1977, apud Trim-
de sintoma se associa com um sistema de de- boli & Kilgore, 1983, p.618).
fesas organizado para manejar a ansiedade. Nas descompensações de nível neurótico,
Então, na medida em que surgem elevações verifica-se primeiramente a elevação nas esca-
nas escalas de sintoma, isso seria uma indica- las 2 e 7, como já vimos, e, talvez, da escala 1,
ção de que os mecanismos de defesa não são representando um incremento dos esforços
suficientes para lidar com a ansiedade. Entre para tentar a repressão do conflito. Embora
tais elevações, merece uma menção especial a haja muita variação nos casos individuais, co-
da escala 2, já que os autores citados conside- mumente o passo seguinte seria o aparecimen-
ram “a magnitude de elevação na escala 2 to de elevações secundárias nas escalas 4 e,
como sendo o melhor indicador isolado da ex- provavelmente, nas 6 e 9, “refletindo tentati-

PSICODIAGNÓSTICO – V 503
vas auxiliares de dissipar a ansiedade, que 4 se apresenta elevada, acima de um escore T
ameaça dominar o funcionamento do indiví- de 70, associa-se com hostilidade dirigida con-
duo. Nesta categoria de configuração do per- tra figuras parentais e seus substitutos sociais,
fil, as escalas de sintoma permanecem mais principalmente enquanto representativos cul-
proeminentes do que as escalas de caráter”. turais de autoridade. Todavia, a agressão é ra-
Entre estas últimas, as escalas 3 e 7 predomi- cionalizada pelo sujeito e, usualmente, não é
nam sobre as escalas 6 e 9, assegurando que a focalizada especificamente contra determina-
descompensação permanece em nível neuróti- das pessoas, mas é mais difusa. Se a elevação
co (p.618). da escala 4 se combina com a elevação na es-
Para entender a descompensação em nível cala 9, os sujeitos são descritos como hostis,
psicótico, é preciso examinar as interações en- impulsivos, e sua baixa tolerância à frustração
tre as escalas 7 e 9 e as escalas 6, 8 e 0. As os leva à atuação de seus impulsos agressivos
elevações das escalas 7 e 9 envolvem agitação (Gilberstadt & Duker, 1965) de forma mais di-
e desconforto; todavia, enquanto estas esca- reta, contra os demais. Já no caso da elevação
las predominam sobre as escalas 6, 8 e 0, há da escala 6, a agressão também é expressa de
menos distorção da realidade e ainda um bom forma direta, mas “a ira se focaliza em pes-
prognóstico. Contudo, quando o funcionamen- soas específicas” (p.65). Conforme Trimboli &
to defensivo vai se deteriorando, em vista do Kilgore (1983), citando também observações
fracasso nas tentativas de enfrentar a pertur- de Corson (1969), as elevações da escala 6, ao
bação, isso se expressa geralmente por meio redor do escore T de 80, “quase sempre são
de uma inversão da configuração anterior. “Por um indicador de projeção delirante da hostili-
exemplo, as escalas 8 e 0, significativamente dade. Quando a escala 6 é elevada com a esca-
elevadas acima da escala 9, indicam aumento la 4, elas caracteristicamente se potencializam
do isolamento emocional, acompanhado de mutuamente, e podemos observar mau con-
apatia e retraimento. De forma similar, à me- trole dos impulsos, explosividade e uma pro-
dida que a escala 8 se eleva acima da 7 (por pensão à violência”. Trata-se de uma configu-
mais de 10 escores T), vemos a evidência níti- ração característica de violência, especialmen-
da da incapacidade do paciente de evitar a frag- te se estiver associada também à elevação da
mentação cognitiva pelo uso de defesas rumi- escala 9 (Trimboli & Kilgore, 1983, p.621).
nativas. Finalmente, à medida que a escala 6 Como já vimos, a escala 3 associa-se com
se eleva acima da 7, temos a evidência da ten- repressão e tem um efeito atenuante sobre o
tativa do paciente de reconstituir sua percep- comportamento atuador, e, então, a agressão
ção do mundo, através do uso de projeções pode se expressar de forma mais indireta, es-
grosseiras, que se refletem clinicamente na pecialmente se existem elevações nas escalas
formação de delírios elaborados e/ou bizarros” 1 e 2. Segundo Graham (1977), citado por Trim-
(p.618-619). boli e Kilgore (1983), tais configurações apa-
recem em sujeitos que podem usar seus sinto-
mas físicos ou apatia como forma de punição,
MANEJO DA AGRESSÃO E DA HOSTILIDADE que pode se dirigir a familiares, médico ou psi-
coterapeuta, portanto, usando a agressão de
No manejo da agressão, seja dirigida para os forma mais velada e indireta. No entanto, quan-
outros de forma direta ou indireta, seja dirigi- do a elevação da escala 3 se associa com ele-
da contra si mesmo, devemos considerar princi- vações nas escalas 6 ou 4, a expressão ainda
palmente as elevações nas escalas 1, 3, 5, 8 e 9. pode ser considerada indireta, mas se mani-
Ao se considerar a expressão direta da festa de forma menos velada. A combinação
agressão em relação aos outros, assumem das escalas 3 e 6, conforme referência da mes-
importância primordial a elevação das escalas ma fonte, associa-se com expressões de agres-
4 e 6, ainda que o foco da ira se defina de for- são “facilmente observadas pelos outros”, mas
ma diferente, nos dois casos. Quando a escala das quais o indivíduo não está consciente, ma-

504 JUREMA ALCIDES CUNHA


nifestando reações de surpresa e descrença Quando a escala 4 apresenta escores T abai-
quando os outros sugerem sua intenção. A xo de 40, especialmente quando há uma ele-
combinação da escala 3 com a escala 4 asso- vação simultânea da escala 3, segundo Graham
cia-se com intensos impulsos agressivos, e, (1977), apud Trimboli e Kilgore (1983), fica
“quando as escalas se encontram notavelmen- sugerida a presença de um supercontrole dos
te elevadas, a pessoa é incapaz de expressar a impulsos agressivos, que se faz com ônus para
ira de uma maneira adequada”. No caso da o equilíbrio do indivíduo, podendo-se pressu-
escala 3 predominar sobre a 4, comumente se por que tal repressão excessiva possa vir a se
observa um estilo passivo-agressivo, “através expressar por um comportamento intrapunitivo.
do qual o indivíduo expressa a ira de uma ma- Ainda outra configuração importante seria
neira encoberta ou oculta”. Os autores ainda a elevação simultânea das escalas 5 e 8, am-
assinalam, referindo-se a observações de Per- bas relacionadas com a formação da identida-
son e Marks (1971), que os indivíduos cujo de. Os autores cujo trabalho está sendo citado
perfil apresenta a escala 4 predominando sobre sugerem que tal configuração “possa ser rela-
a 3 “tendem a ser supercontrolados na maior cionada com uma forma mais primitiva de iden-
parte do tempo; todavia, podem ocorrer epi- tificação com o agressor”. Assim, “um indiví-
sódios curtos de violenta atuação” (p.620-621). duo com uma fraca auto-identidade e cujas
Quanto à agressão dirigida contra si mes- experiências precoces tenham sido com figu-
mo, associa-se mais com a elevação da escala ras sádicas, pode se identificar com esse sadis-
2 e com suas combinações com outras escalas, mo e manejar sua agressão voltando-se contra
principalmente com escalas de caráter. Já vi- si mesmo”, num ato destrutivo isolado. Por
mos que a elevação na escala 2 se associa à outro lado, existe uma configuração em que a
depressão e também é um indicador de que as chamada elevação “feminina” na escala 5 (ele-
defesas não são suficientes no manejo da an- vada nos homens e baixa nas mulheres) se com-
siedade. Indícios de tal ansiedade, por meio de bina com uma elevação da escala 1, que pode
sintomas de inquietação, leve agitação, senti- ser encontrada “em indivíduos mais primitiva-
mentos de insatisfação, já podem ser observa- mente organizados, que têm uma história de
dos em elevações moderadas da escala 2, isto múltiplas cirurgias. Esta seria entendida como
é, quando os escores T se situam entre 65 e uma variante da agressão voltada contra si
75. A ansiedade associa-se à ameaça que o in- mesmo, em indivíduos que tentam lidar com
divíduo sente frente aos seus impulsos agres- seus “maus” introjetos de uma maneira bas-
sivos, que não conseguem ser liberados de for- tante concreta” (p.621-622).
ma apropriada, mas se dirigem contra si mes-
mo. À medida que tais impulsos se intensifi-
cam, aumenta a possibilidade de comporta- CASO ILUSTRATIVO
mentos autopunitivos, de maneira que, quan-
do a elevação da escala 2 chega ou ultrapassa Informações básicas. Trata-se de um rapaz,
um escore T de 80, se instala um quadro clíni- de 21 anos, solteiro, cursando a terceira sé-
co de depressão, e, quanto mais elevada é a rie do ensino médio de um curso supletivo,
escala, mais evidência há de um potencial sui- encaminhado à avaliação psicológica por vir
cida que, muitas vezes, se expressa por idea- apresentando problemas de aproveitamento
ção suicida. É mais provável, porém, a existên- escolar, que se agravaram a partir da sétima
cia de risco de suicídio quando a elevação da série do ensino fundamental. Confessa que
escala 2 se associa com elevações em outras “matava muita aula” (sic) e não tinha bom
escalas, particularmente com uma ou mais es- relacionamento com professores. Gosta de
calas de caráter, como na 4 e na 9, com a esca- ler, escutar música e tem grupos de amigos.
la de sintoma 8 (quando há deficiência do juí- Não refere envolvimentos afetivos. Quanto
zo) e, de forma mais atenuada, com as escalas ao convívio com os demais, descreve-se como
de caráter 3 e 6. uma pessoa tímida, “mas nem por isso au-

PSICODIAGNÓSTICO – V 505
1 2 3 4 5 6 7 8 9 0
sente” (sic). Acha que sabe muitas coisas e 11 0

que, por tal motivo, não necessita fazer co- 110


100
mentários. Na avaliação*, não apresentou 90
problemas de ordem cognitiva. Na sua his- 80

tória médica, só se registra a necessidade de 70

60
reposição hormonal, no início da adolescên- 50
cia. 40

Este caso* é apresentado por ser um perfil 30

pouco definido, como muitas vezes acontece, 20

10
quando se utiliza o MMPI em examinandos cujo
nível de psicopatologia não é significativo. São ? L F K Hs D Hy Pd Mf Pa Pt Sc Ma Si
perfis que devem ser interpretados com muita 50 62 77 50 47 55 50 61 68 50 55 47 46 54

cautela, atribuindo mais peso a indícios que se Figura 32.1 Perfil do MMPI de um rapaz de 21 anos.
confirmam. Código: 5 4 2 7 8:5:22.
Descrição clínica. O protocolo é válido
(1TR+0CLS)<7: os dados indicam que o pacien-
te apresenta um nível de compreensão verbal
adequado. Portanto, é possível pressupor que Também o índice F-K (-17) confirma a pre-
tenha respondido com honestidade. Não obs- sença de muita defensividade, com minimiza-
tante, o perfil é pouco definido, com nenhu- ção das próprias dificuldades, o que recomen-
ma escala ultrapassando um T = 70. Nas esca- da cautela para a interpretação de quaisquer
las de validade, observa-se uma elevação aci- indícios.
ma de um nível moderado na escala L (escore Uma análise, usando a escala de Desajusta-
8/T=62) e uma elevação definidamente alta na mento social (SOC = 15, que se classifica 1DP
escala K (escore 22/T=77). acima da média) e a de Introversão social (TSC/
No primeiro caso, a hipótese é de que o 1 = 17, mais de 2DP acima da média), reforça
sujeito, consciente ou inconscientemente, de- a tendência à timidez, à inibição e à baixa tole-
seja passar uma imagem favorável de si mes- rância ao estresse, especialmente quando a si-
mo ou a imagem que tem de si mesmo não é tuação envolve relações interpessoais. Por ou-
realística. Como conseqüência, deve ter baixa tro lado, considerando o código 54, em que a
tolerância ao estresse e pouca capacidade de escala 5 está pelo menos cerca de 8 pontos de
insight, o que se reflete nas relações com os escores T acima da média esperada para o sexo
demais. e nível de escolaridade do sujeito, combinada
A segunda elevação corrobora a hipótese com uma elevação moderada da escala 4, há
de desconsiderar ou negar suas próprias difi- uma sugestão de que o sujeito possa se opor a
culdades, provavelmente tentando dar uma ou desafiar maneiras convencionais de ser.
idéia de estar com a própria vida sob controle Embora indicadores de problemas mais sé-
e de ter um desempenho eficiente, embora rios, em relação com laços com a realidade,
possa não se dar conta da impressão que cau- estejam ausentes, a forma como o sujeito en-
sa nos outros. Sua maneira de ser limita sua dossou as afirmações sugere que não se trata
interação social, podendo parecer tímido e ini- de um bom candidato à psicoterapia, sendo pou-
bido. co colaborador numa avaliação psicológica.

*Agradecemos à psicóloga Clarissa Trentini o forneci-


mento de dados da avaliação.

506 JUREMA ALCIDES CUNHA


MÓDULO XII – Técnicas de Fazer Desenhos

Desenho da Figura Humana


Claudio Simon Hutz, Denise Ruschel Bandeira
33
J á no final do século XIX, acreditava-se que o
desenho de crianças podia ser visto como in-
dicador do desenvolvimento psicológico (Goo-
cia. Pela primeira vez, surgia um sistema quan-
titativo objetivo de avaliação do DFH para o
diagnóstico de problemas de aprendizagem e
denough, 1974). A primeira escala com crité- distúrbios emocionais. Isso permitiu que, já na
rios de análise do Desenho da Figura Humana década de 70, o DFH se tornasse mais abran-
(DFH), como medida de desenvolvimento inte- gente e tivesse seu uso intensificado, sendo
lectual de crianças, foi desenvolvida por Flo- que, hoje, é um dos testes mais empregados
rence Goodenough, em 1926. Posteriormente, em pesquisa e na prática profissional do psi-
essa escala foi revisada e expandida por Harris cólogo em várias áreas (Hutz & Bandeira, 1993;
(1963). Lubin, Larsen & Matarazzo, 1984; Lubin, Lar-
Duas décadas após a publicação do traba- sen, Matarazzo et alii, 1985; Lubin, Walls &
lho seminal de Goodenough, em 1926, Karen Paine, 1971).
Machover (1949a) publicou os resultados de Entretanto, a validade do DFH como teste
uma série de observações clínicas sobre a re- psicológico, bem como sua utilidade clínica,
presentação gráfica de figuras humanas dese- têm sido questionadas sistematicamente (Ma-
nhadas por crianças e adultos que apresenta- loney & Glasser, 1982). Reynolds (1979) mos-
vam problemas psicológicos diversos, fornecen- trou que o julgamento dos psicólogos profis-
do um caráter projetivo ao DFH. Esse trabalho sionais sobre a utilidade de testes psicológicos
popularizou o DFH como método de avaliação apresenta uma baixa correlação com o julga-
da personalidade, que, já na década de 60, mento de psicólogos acadêmicos sobre a qua-
havia se tornado uma das técnicas mais em- lidade desses testes. Anteriormente, Thelen e
pregadas por psicólogos americanos (Lubin, colegas (1968) já alertavam para o fato de que,
Walls & Paine, 1971; Sundberg, 1961). Na dé- embora professores e pesquisadores na área
cada de 50, vários autores deram contribuições da psicologia clínica sistematicamente expres-
importantes para a utilização do DFH como sassem atitudes negativas sobre o valor clínico
técnica projetiva. Entre eles, destacam-se as de das técnicas projetivas, elas continuavam en-
Hammer (1958), Jolles (1952) e Levy (1991). tre os 10 testes mais utilizados. Cerca de 15
A publicação do trabalho de Koppitz (1968) anos mais tarde, essa situação era essencial-
forneceu mais do que uma alternativa à escala mente a mesma (Pruitt, Smith, Thelen et alii,
de Harris-Goodenough para avaliar inteligên- 1985).

PSICODIAGNÓSTICO – V 507
A continuidade do uso do DFH, em vários sileiras e americanas. A invariabilidade do estí-
países, até o presente, mostra, porém, seu mulo básico não implica, necessariamente, que
amplo grau de aceitação e demonstra a con- os itens investigados tenham a mesma saliên-
vicção de psicólogos que trabalham com psi- cia ou o mesmo significado psicológico em
codiagnóstico de que o DFH é uma técnica útil ambas as culturas, ou mesmo entre níveis so-
na avaliação de crianças, adolescentes e até cioeconômicos na mesma cultura.
mesmo adultos, não obstante a dificuldade de Porém, psicólogos brasileiros têm aplicado
produzir demonstrações empíricas de valida- o DFH utilizando normas desenvolvidas com
de e utilidade clínica. amostras americanas na década de 60, ou an-
O DFH é uma técnica muito atrativa para teriores. A utilização de um teste psicológico,
psicólogos em várias áreas, devido à sua abran- sem conhecer sua fidedignidade e validade, é
gência, simplicidade e aparente objetividade. um procedimento de alto risco que pode levar
Além de ser uma técnica de baixo custo (re- a erros de diagnóstico, provocando prejuízos
quer apenas lápis e papel), é também uma ta- importantes para os indivíduos avaliados.
refa de fácil execução e de boa aceitação espe- Exceto pelo trabalho sistemático de Van
cialmente por crianças. Não é, portanto, sur- Kolck (Van Kolck, 1966; Van Kolck, 1984), pou-
preendente que o DFH tenha sido rapidamen- co foi publicado no Brasil sobre o DFH até muito
te incorporado ao arsenal de técnicas utiliza- recentemente (Hutz & Bandeira, 1993). Essa
das por psicólogos brasileiros, sem que os es- situação começou a se modificar apenas na
tudos necessários para um uso confiável des- década de 90, com o desenvolvimento de es-
sa técnica tivessem sido realizados (Hutz & tudos de normatização, padronização e vali-
Bandeira, 1995). Além disso, há uma crença dação do DFH realizados pelo Laboratório de
(infundada) de que essa técnica é pouco afe- Mensuração da UFRGS e pelo Laboratório de
tada pela cultura. Argumenta-se que o estí- Avaliação e Medidas Psicológicas da PUCCAMP,
mulo básico – uma pessoa – é essencialmen- culminando com a publicação de normas lo-
te o mesmo em todas as sociedades e em cais atualizadas (vide Anexo D) para os indica-
todas as épocas. dores evolutivos e emocionais de Koppitz (Hutz
Desenhos pré-históricos são, às vezes, apon- & Antoniazzi, 1995) e de um manual para uso
tados como evidência de que pessoas têm re- em crianças brasileiras (Wechsler, 1996).
presentado seres humanos, praticamente, da
mesma forma por muitos milênios. O efeito da
cultura sobre o desenho seria, portanto, mui- DFH: AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO
to pequeno e se limitaria, apenas, a alguns INFANTIL
detalhes da figura (por exemplo, vestimenta,
adornos, comprimento do cabelo). Se isso fos- Ao revisar e ampliar a escala de Goodenough,
se realmente verdade, escaparíamos da neces- Harris (1963) já questionava o uso do DFH como
sidade de adaptações e repadronizações one- teste de inteligência, preferindo entendê-lo
rosas e teríamos um instrumento que nos per- como medida de maturidade conceitual, ou
mitiria realizar comparações transculturais. seja, o conceito que a criança tem do corpo
Infelizmente, há evidência de que diversos humano. Introduz-se, então, o enfoque do
tipos de indicadores (evolutivos, emocionais e desenvolvimento infantil no desenho, profun-
outros) não têm, com amostras brasileiras, a damente estudado por Koppitz (1968), que
mesma validade e significado clínico encontra- produziu um sistema de avaliação objetivo
dos em amostras americanas para as quais eles muito utilizado internacionalmente. Para apli-
foram padronizados (Bandeira & Hutz, 1994; car a técnica de Koppitz, solicita-se à criança o
Hutz, 1986; Hutz, 1989a; 1989b; Hutz & Anto- desenho de uma pessoa inteira em uma folha
niazzi, 1995). É possível que isso reflita dife- branca tamanho ofício, lápis número dois e
renças evolutivas na produção de desenhos ou borracha. A avaliação, feita com um único de-
na representação do corpo entre crianças bra- senho, inclui 30 itens evolutivos, pontuados

508 JUREMA ALCIDES CUNHA


como ausentes ou presentes. Os itens presen- de crianças pequenas. De todos os itens, este
tes são somados, e a criança recebe, então, um é o que apresenta a menor concordância entre
escore global. A análise também pode ser rea- juízes. Burley e Handler (1997) demonstraram,
lizada na avaliação pela presença de itens es- inclusive, que variáveis de personalidade de
perados, comuns, incomuns e excepcionais, avaliadores de desenho, tais como empatia,
conforme a idade da criança. A categorização intuição e criatividade, interferem no processo
desses itens deve sempre advir de amostras avaliativo. Por outro lado, estudos do nosso
locais (ver Hutz & Antoniazzi, 1995, para nor- laboratório têm demonstrado que tanto psi-
mas locais). cólogos treinados como leigos são capazes de
A análise dos itens evolutivos é relativamen- fazer avaliações globais do DFH, apresentando
te clara no livro de Koppitz (1968). Em nossos altas correlações entre juízes (Hutz & Bandei-
estudos, encontramos apenas dois problemas. ra, 1995).
Um deles envolve um conjunto de itens (itens O trabalho da equipe de Wechsler (1996)
27, 28 e 29), que devem ser pontuados se o trouxe contribuições positivas para a melhoria
desenho apresentar nenhum ou um item de da fidedignidade da avaliação, apresentando
roupa, um ou dois, e três ou mais itens, res- uma boa operacionalização dos itens a serem
pectivamente. Se a análise for realizada sobre avaliados no DFH, com exemplos gráficos e
os itens esperados, comuns, incomuns e excep- tabelas da nossa realidade. Além disso, alguns
cionais, não há problema algum. Porém, se o estudos têm mostrado que há correlação sig-
interesse for na soma do conjunto total de itens nificativa entre o sistema utilizado por Wechs-
(escore global), o item 27 sempre será pontua- ler e o de Koppitz (Donadussi, Medina, Lucca
do (o desenho necessariamente tem ou não et alii, 1999).
tem roupa representada, não há uma terceira
possibilidade). Isso torna o item inútil e traz
problemas psicométricos para a escala. Para DFH: AVALIAÇÃO DA PERSONALIDADE E
sanar esse problema, modificamos a definição AJUSTAMENTO EMOCIONAL
do item 27, em nossos estudos, para “somen-
te um item de roupa”, não pontuando dese- Uma das formas de avaliação de aspectos emo-
nhos que não apresentam nenhuma represen- cionais no DFH em crianças também foi desen-
tação de vestimenta. Observe-se, também, que volvida por Koppitz (1968). Baseada nos estu-
o primeiro item evolutivo a ser pontuado é dos de Machover e de Hammer, bem como na
“presença de cabeça”. Em nossos estudos nor- sua própria experiência, estabeleceu uma es-
mativos, com mais de 2.000 crianças e adoles- cala de 30 indicadores emocionais capazes de
centes que freqüentam escolas, nunca encon- diferenciar crianças sem e com problemas emo-
tramos uma omissão de cabeça (exceto quan- cionais (em atendimento clínico). A presença
do são produzidas figuras bizarras, em que de três ou mais indicadores, especialmente em
partes do corpo não são diferenciadas). Mes- crianças com mais de nove anos de idade,
mo assim, esse item foi mantido, porque algu- apontaria para a possível presença de desajus-
mas crianças psicóticas podem desenhar figu- tamento emocional. Alguns indicadores são
ras sem cabeça. pontuados conforme a idade da criança.
O outro item que apresenta dificuldade na A avaliação dos indicadores emocionais ca-
sua análise (item 30) requer que o avaliador racteriza-se por apresentar um pouco mais de
decida se o desenho apresenta boas propor- dificuldade na análise dos indicadores do que
ções. Koppitz (1968) não é clara nesse sentido, a avaliação dos indicadores evolutivos, a co-
apenas afirmando que o desenho deve estar meçar pela definição do que é sombreamento,
bem, mesmo que incorreto do ponto de vista presente nos indicadores três e quatro. Hand-
anatômico. Essa definição faz com que o item ler (1967) é um dos poucos autores que defi-
se torne suscetível ao viés do avaliador, dificul- nem claramente o sombreamento como um
tando, em especial, a avaliação de desenhos dos índices de ansiedade, referindo-se ao uso

PSICODIAGNÓSTICO – V 509
de traços ou marcas de padrão recorrente. É soal, e não em dados de pesquisa. A literatura
uma definição mais operacional, mas não se disponível pode, portanto, gerar uma certa in-
pode assegurar, evidentemente, que essa defi- segurança, em especial para aqueles que es-
nição seja a mesma para Koppitz, ou que o tão iniciando sua formação em interpretação
sombreamento realmente expresse problemas de desenhos. Acreditamos que, neste momen-
emocionais se avaliado dessa forma. to, o estudo dos diversos manuais de interpre-
Outra forma de avaliação do DFH, abordan- tação, a leitura da pesquisa na área e a orien-
do a personalidade e seus aspectos estruturais tação ou supervisão por pares com mais expe-
e dinâmicos, teve origem nos estudos de Ma- riência é indispensável. Certamente, não se
chover (1949b). Na aplicação, solicita-se tam- pode pretender, a partir de uma leitura de um
bém o desenho de uma figura do sexo oposto livro, fazer interpretações e diagnósticos.
à primeira desenhada, sempre em folha sepa- É importante também registrar que a visão
rada. Ainda há a possibilidade de se solicitar o geral do desenho, levando em conta aspectos
desenho de uma pessoa na chuva, o que per- de normalidade, traz informações sobre o in-
mitiria investigar as reações do examinando a divíduo que está sendo avaliado, tão válidas
situações de tensão. Recomenda-se, ainda, a quanto os aspectos específicos (Hutz & Ban-
realização de um inquérito ou a construção de deira, 1995). Contudo, há que se tomar cuida-
uma estória sobre a figura. Van Kolck (1984) do com aspectos pessoais do interpretador,
apresenta sugestões de perguntas a serem fei- tendo em vista estudos que mostram a influên-
tas no inquérito (vide no Anexo E). cia de fatores de personalidade na avaliação
Ao desenhar uma pessoa, o indivíduo pro- de desenhos (Burley & Handler, 1997; Hammer
jeta sua imagem corporal no papel, definida & Piotrowsky, 1997). Mais uma vez, aponta-se
por Schilder (1981) como “a figuração de nos- para a necessidade de supervisão, de utiliza-
so corpo formada em nossa mente, ou seja, o ção de outras técnicas complementares ao DFH
modo pelo qual o corpo se apresenta para nós” e, sobretudo, de um conhecimento profundo
(p.11). Essa imagem envolve uma apercepção de psicologia. Nenhum teste substitui a neces-
do corpo, possuindo bases fisiológicas, libidi- sidade de conhecimento atualizado em psico-
nais e sociológicas e está intimamente relacio- logia do desenvolvimento, personalidade e
nada com o conceito que o indivíduo tem de si psicopatologia.
mesmo.
Contudo, segundo Van Kolck (1984), o de-
senho também pode ser a representação de DFH E ANSIEDADE
outros aspectos do indivíduo, tais como aspi-
rações, preferências, pessoas vinculadas a ele, O DFH também pode ser utilizado para avalia-
imagem ideal, padrões de hábitos, atitudes ção de aspectos específicos, tais como ansie-
para com o examinador e a situação de testa- dade. Handler (1967) propôs uma escala com
gem. Essa variedade de possibilidades torna a 20 índices de ansiedade, que, dentre os diver-
técnica muito rica, mas também dificulta a in- sos sistemas de escores, tem recebido muita
terpretação acurada e fidedigna de um DFH. atenção dos pesquisadores na área e gerado
Existe uma ampla literatura que auxilia o um grande número de pesquisas (Sims, Dana
psicólogo a interpretar o Desenho da Figura & Bolton, 1983). A sua base está, em parte,
Humana, desde obras mais esquemáticas e nos trabalhos de Hoyt, de 1955, e de Bolton,
objetivas (p.ex., Campos, 1978; Van Kolck, de 1950 (citados em Handler, 1967). Handler
1984) até aquelas que fornecem uma visão introduziu modificações, preocupando-se em
mais dinâmica e interpretativa do desenho estabelecer critérios de escore para a análise
(p.ex., Di Leo, 1987; Hammer, 1981). Os pri- de maneira formal, que abrangem tanto a an-
meiros pecam por falta de definições claras ou siedade causada por situações externas estres-
exemplos, enquanto os demais passam a idéia santes como por causas intrapsíquicas. Vinte
de interpretações baseadas na experiência pes- índices foram descritos, atribuindo-se escores

510 JUREMA ALCIDES CUNHA


de acordo com as características do desenho mostraram uma grande proporção de desenhos
para cada um deles, em escalas de quatro ou do mesmo sexo em crianças, e que esta pro-
dois pontos, onde, nesta última, a presença é porção tendia a aumentar com a idade, embo-
um indicador de ansiedade. ra as meninas apresentassem um padrão mais
A escala de Handler foi elaborada para a inconstante. Muitos estudos da década de 50
avaliação da ansiedade nos desenhos de ado- apresentaram resultados similares. Os achados
lescentes e adultos. A sua utilização em crian- de Jolles (1952), porém, mostraram que as
ças tem se mostrado contraditória. Parte dos meninas tendem a desenhar figuras do sexo
estudos encontrou alta correlação na aplica- oposto com mais freqüência, à medida que se
ção da escala em crianças (Sopchak, 1970; Van tornam mais velhas, enquanto exatamente o
Kolck, 1973), enquanto, mais recentemente, foi oposto ocorria com meninos. Esses resultados
comprovada a sua falta de validade para uso foram corroborados por Swensen e Newton
nessa faixa etária (Bandeira, Loguercio, Cau- (1955). Butler e Marcuse (1959) argumentaram
mo et alii, 1998). Outros estudos criticaram a que esses resultados apontavam para um pa-
validade dessa escala e mesmo da utilização drão evolutivo que seria compatível com o
do DFH como instrumento diagnóstico de an- fato de que mulheres adultas desenham fi-
siedade (Engle & Suppes, 1970; Handler, 1984; guras do sexo oposto muito mais freqüente-
Sims, Dana & Bolton, 1983). Recomenda-se, mente do que homens (Aranoff & McCormi-
portanto, cautela na utilização dessa escala. ck, 1990).
Como de regra, outras técnicas devem também Mais recentemente, Heinrich e Triebe (1972)
ser empregadas, e os resultados nunca devem revisaram 19 estudos e confirmaram que há
ser interpretados sem considerar o contexto e uma tendência geral a desenhar, primeiro, uma
a história do indivíduo. figura do mesmo sexo, mas que a proporção
de meninas que desenham figuras do sexo
oposto aumenta com a idade. Esses achados
SEXO DA FIGURA foram explicados com base em influências cul-
turais, com pouca ênfase em variáveis psicoló-
O Desenho da Figura Humana é considerado gicas. Numa tentativa de encontrar uma expli-
como a expressão da auto-imagem de crian- cação psicológica para esse padrão diferencial,
ças que, teoricamente, projetam suas identifi- Dickson e colegas (1990) correlacionaram tra-
cações e conflitos no desenho. Portanto, seria ços de personalidade com a incidência de de-
esperado que desenhassem figuras de seu pró- senhos do sexo oposto, feitos por meninos e
prio sexo. Machover (1949a) afirmou que crian- meninas, mas não encontraram correlações sig-
ças que desenham figuras do sexo oposto pro- nificativas.
vavelmente apresentam um problema no de- No Brasil, um estudo recente, feito por Hutz
senvolvimento da sua identidade sexual. Nos e Antoniazzi (no prelo), com mais de 1.500
últimos 50 anos, muitos estudos com crianças crianças de 5 a 15 anos de idade, encontrou o
e adultos mostraram que existe uma tendên- mesmo padrão evolutivo citado na literatura.
cia geral a desenhar figuras do mesmo sexo A maioria das crianças desenha figuras do
(Dickson, Saylor, & Finch, 1990; Houston & mesmo sexo, mas a proporção de figuras do
Terwilliger, 1995). Todavia, não há evidência sexo oposto aumenta, consistente e sistemati-
sólida que apóie a hipótese de Machover, e camente, para meninas e diminui para meni-
alguns estudos (por exemplo, Roback, 1968) nos. Não foram encontradas correlações entre
não encontraram relação entre o sexo da fi- o sexo do desenho e medidas de desenvolvi-
gura, identificação sexual e problemas emo- mento e de ajustamento emocional em qual-
cionais. quer faixa etária.
Em um estudo delineado para investigar o Não se tem conhecimento sobre as razões
desenvolvimento da identificação sexual no que levam uma criança ou um adulto a dese-
DFH, Bieliauskas (1960) obteve resultados que nhar primeiro uma figura do sexo oposto. Po-

PSICODIAGNÓSTICO – V 511
rém, está claro que, por si só, o sexo do DFH não mento seguro sobre a personalidade de uma
é indicador de normalidade ou de patologia. pessoa.
O DFH pode ser um instrumento extrema-
mente útil para o psicólogo que sabe utilizá-lo
CONCLUSÃO e entende suas limitações. As aplicações des-
critas neste capítulo são apenas parte das pos-
Testes psicológicos medem constructos hipo- sibilidades dessa técnica. O DFH, em conjunto
téticos e de forma indireta. A única coisa que com outras técnicas gráficas, tem sido utiliza-
podemos realmente observar é o comporta- do também para diagnóstico e avaliação de
mento do indivíduo face à tarefa, suas respos- vítimas de abuso sexual (p.ex., Kaufman &
tas, seus atos, gestos, verbalizações e outras Wohl, 1992; Wohl & Kaufman, 1985) e para
expressões públicas. Não se pode, portanto, variadas finalidades de pesquisa em muitas
esperar de um teste psicológico, por melhor áreas (por exemplo, Koller, Hutz & Bandeira,
que sejam suas qualidades psicométricas, a 1997). Nota-se uma redução significativa na
objetividade e a precisão que se obtêm em exa- pesquisa internacional com o DFH, principal-
mes laboratoriais que medem a quantidade de mente em função do grande número de ins-
certas substâncias em circulação no sangue, a trumentos que têm surgido nas últimas déca-
presença ou ausência de microrganismos, e das para a avaliação de crianças e adolescen-
assim por diante. A utilização de um teste psi- tes. Porém, na nossa realidade, considerando
cológico pode trazer muita informação para um os custos e as dificuldades de traduzir, adaptar
psicólogo, pode corroborar outras fontes de e validar essas novas técnicas, o DFH deverá
informação, pode apontar hipóteses diagnós- continuar sendo um instrumento importante
ticas que devem ser investigadas. Nenhum tes- para o psicólogo ainda por várias décadas. Sua
te, porém, pode substituir o julgamento clí- utilidade, porém, dependerá de um investimen-
nico, e, isoladamente, fora de um contexto to constante em pesquisa e de bom treinamen-
específico, nenhum teste permite um julga- to de psicólogos em avaliação psicológica.

512 JUREMA ALCIDES CUNHA


Desenho da Família
Neli Klix Freitas, Jurema Alcides Cunha
34
ADMINISTRAÇÃO fazer, entregando-lhe uma nova folha, quan-
do deseja suprimir uma figura.
Na administração, geralmente se solicita ao Assim, recomenda-se que o psicólogo pre-
sujeito que desenhe a sua família e, a seguir, viamente decida que subsídios vai utilizar em
se pede que nomeie as figuras desenhadas sua interpretação, para evitar problemas por
(Campos, 1977). Mas há outras versões, como uma administração que deixe de oferecer as
a de instruir o sujeito a desenhar uma família, informações de que necessita.
como imagina (Corman, 1967), ou uma famí-
lia em movimento (Burns & Kaufman, 1978),
sendo este um procedimento complementar ao INTERPRETAÇÃO
desenho tradicional da família.
Na primeira opção, não há outras instru- Não existe um roteiro padronizado para a in-
ções, a não ser a de oferecer ao sujeito algum terpretação do desenho da família, embora
encorajamento, se há indícios de hesitação ou, haja certa concordância entre autores sobre
mesmo, de confusão (Groth-Marnat, 1984). Já algumas hipóteses interpretativas.
Hulse, conforme Klepsch e Logie (1984), em seu A impressão geral transmitida pelo desenho
trabalho com crianças, estimulava-as “a dizer parece ser explícita ou implicitamente valori-
o que quisessem a respeito de seus desenhos” zada por vários autores. Há mais ênfase nos
(p.87). Por outro lado, Corman (1967) propôs sentimentos do sujeito em relação à sua famí-
que, após a representação da família imaginá- lia “do que no estilo das pessoas individuais”
ria, se introduza um questionário, para que o (Groth-Marnat, 1984, p.143).
sujeito indique, dentre os diferentes membros, Hulse, que, segundo Klepsch e Logie (1984),
qual é considerado o melhor, o pior, o mais sugeriu a utilização do desenho da família
infeliz, o mais feliz e qual o seu preferido. Com- como técnica projetiva, propunha uma abor-
plementarmente, deve dizer quem seria, se fi- dagem gestáltica como especialmente útil para
zesse parte dessa família, e as razões da esco- explorar aspectos psicodinâmicos, principal-
lha desse personagem de identificação. mente para revelar precocemente conflitos da
Observa-se, também, que, enquanto há criança, a percepção que ela tem de sua famí-
autores que sugerem que se forneça uma bor- lia, bem como seus sentimentos e atitudes em
racha ao sujeito, Corman (1967) prefere não o relação aos diferentes membros. Destacava a

PSICODIAGNÓSTICO – V 513
importância de se considerar o tamanho de terna sugere uma mãe dominante, enquanto
cada pessoa representada, o tamanho relativo um pai pequeno, apenas maior que o próprio
de alguns membros em relação aos outros, a sujeito, indica que este percebe aquele como
distância das figuras entre si e a sua posição sendo somente um pouco mais importante que
no papel, que são itens também levados em ele. Por outro lado, chama a atenção para a
conta por Hammer (1991). existência ou não de uma relação entre tama-
Conforme Klepsch e Logie (1984), só secun- nho e idade, levantando algumas hipóteses.
dariamente Hulse se detinha na distribuição Tamanhos diversos para representar gêmeos
seqüencial das figuras, nas omissões, nos “exa- podem revelar sentimentos diferenciados para
geros caricaturescos”(p.87), no sombreado e com esses membros da família. A criança que
em outros tipos de ênfase, que são valoriza- desenha um irmão menor (até um bebê) de
dos por outros autores. Não obstante, Cam- igual tamanho ao seu está pressupondo que
pos (1977) relaciona hipóteses interpretativas ele represente uma figura competitiva, ame-
de Hulse associadas com alguns desses itens. açadora para sua posição na família. Mas se
Assim, lembra que há omissão do próprio su- um adulto desenha a si próprio no colo ma-
jeito na representação da família, quando ele terno, está manifestando tendências regres-
não se sente nela incluído, dela não participa, sivas.
não recebe afeto ou se há um problema de re- Outra relação que esse autor estabelece é
jeição. Por outro lado, tanto a distribuição se- entre proximidade ou afastamento das figuras
qüencial, como ênfases especiais no desenho e distância emocional entre as pessoas dese-
de algum membro da família, podem se rela- nhadas. Membros da família distantes uns dos
cionar com a valência afetiva que ele tem para outros configuram um grupo familiar desuni-
o sujeito, seja num sentido positivo como ne- do, como se as pessoas fossem desenhadas
gativo. Se o próprio sujeito se coloca em pri- individualmente e não como família, e sem
meiro lugar, a hipótese é de egocentrismo e, evidência de “troca emocional” (p.296). Ao
se em último, de cerceamento. A representa- contrário, uma criança pode se colocar, no de-
ção de algum membro da família em negrito senho, ao lado de um dos pais, demonstrando
pode identificar um conflito com essa pessoa. suas próprias preferências ou efeitos do con-
Uma figura riscada pode indicar simbolicamen- flito edípico. Por outro lado, o distanciamento
te o desejo de afastá-la da família ou suben- afetivo pode ter uma representação simbólica
tender um desejo de sua morte. Igualmente, pela interposição de elementos extras entre
se um membro da família é circunscrito num membros da família, que denunciam uma in-
círculo, pode ter essa mesma significação ou terferência no canal de comunicação ou no in-
pode denotar uma ênfase especial por razões tercâmbio afetivo. Um exemplo disto seria o
afetivas ou circunstanciais (problema de doen- desenho de uma árvore entre as figuras do pai
ça, por exemplo). A inclusão, na representa- e da mãe, que pode sugerir dificuldades no
ção familiar, de pessoas já falecidas pode su- relacionamento do casal ou o desejo de sepa-
gerir fixação. E se a família é desenhada em rá-los. Aliás, para clarear a significação afetiva
grupos que se distanciam uns dos outros, há das relações mútuas, é importante observar a
uma hipótese de divisão na constelação fa- expressão facial que o sujeito empresta a cada
miliar. figura, que pode apresentar um ar afetuoso,
Hammer (1991), que também considera bondoso ou, pelo contrário, agressivo ou proi-
valioso o desenho da família se o psicólogo está bitivo.
interessado “na percepção que o paciente tem O sujeito que se sente rejeitado, não aten-
de si mesmo na família e/ou na percepção de dido, carente, desenhará a si mesmo (caso se
sua relação com as figuras parentais e dos ir- inclua na representação familiar) de um modo
mãos” (p.297), pondera que, na sua análise, o diferente daquele que se percebe como o filho
tamanho “talvez seja a variável mais importante preferido. A inclusão ou a omissão do próprio
(p.294). Deste modo, uma grande figura ma- sujeito se associa com a presença ou não de

514 JUREMA ALCIDES CUNHA


um sentimento de pertinência. A omissão de zonas proibidas. Assim, o movimento do tra-
irmãos pode denunciar sentimentos de rivali- çado da esquerda para a direita tem um senti-
dade da criança, que tenta simbolicamente do progressivo e, da direita para a esquerda,
excluir da família figuras competitivas. tem um sentido regressivo.
Se os membros da família são representa- No nível das estruturas formais, a represen-
dos por figuras muito diferenciadas daquelas tação da figura humana é pressuposta como o
do grupo sociocultural do sujeito, como, por esquema corporal do sujeito, sendo possível
exemplo, por marcianos, isso pode significar avaliar a sua maturidade (muito embora haja
que somente num plano muito distante do ní- influência também de aspectos emocionais,
vel de realidade ele pode conceber um maior além dos cognitivos) e a presença de transtor-
contato ou integração com eles, o que tam- nos do esquema corporal. Leva em conta, nes-
bém sugere que busca refúgio na fantasia. te nível, uma diferenciação em tipos de repre-
Finalmente, quando Hammer (1991) anali- sentação das figuras, como as mais espontâ-
sa seus casos, observa-se que leva em conta neas, em que predominariam linhas curvas, e
aspectos formais e estruturais de cada figura as mais rígidas, em que se salientam as linhas
e, em especial, da que representa o próprio retas. Destaca, assim, um tipo sensorial (o mais
sujeito, integrando dados relativos ao grupo espontâneo e livre) e um racional (o mais rígi-
familiar com hipóteses interpretativas do de- do), que começa a se fazer mais freqüente, nos
senho da figura humana. desenhos, depois do ingresso na fase escolar.
Corman (1967) diferencia três níveis de in- Realmente, é em nível de conteúdo que são
terpretação do desenho de uma família: o ní- principalmente considerados os aspectos pro-
vel gráfico, o das estruturas formais e o do con- jetivos do desenho, notando-se, entretanto,
teúdo. que, nesse teste, “as defesas operam de forma
No nível gráfico, leva em conta a amplitu- mais ativa, as situações geradoras de ansieda-
de, a força e o ritmo do traçado, a localização de são afastadas mais resolutamente, e as iden-
na página e o movimento do traçado. tificações se regem, de bom grado, pelo prin-
A amplitude do traçado, se é maior ou mais cípio do poder” (p.41). Corman (1967) exem-
restrita, associa-se com expansão vital ou ini- plifica com o caso de uma criança que tem ci-
bição. A força do traçado representa a força úme do irmão menor e, então, pode omiti-lo
dos impulsos, com liberação ou inibição dos no desenho, negando a sua existência, pode
instintos. Esses aspectos podem ser considera- trocar de papel com ele ou se colocar em seu
dos em relação ao desenho total ou podem ser lugar, com ele se identificando. Não obstante,
usados para enfatizar um personagem; por antes de qualquer interpretação num sentido
exemplo, desenhando-o bem maior que os projetivo, recomenda que se examine em que
demais. medida o desenho obedece ao princípio de rea-
Por ritmo, subentende-se como o sujeito de- lidade (com a representação exata da família
senvolve a tarefa de forma mais espontânea real) ou resulta puramente da fantasia do su-
ou, pelo contrário, estereotipadamente, numa jeito, que, então, projetará tendências pessoais
repetição simétrica de traços, pontos, etc., até diversas em personagens distintos. Assim, “as
atingir um grau de minuciosidade que pode regras que dirigem a análise variam segundo o
chegar a ser compulsivo. nível de projeção” (p.49), que deve ser deter-
A localização é considerada em termos do minado pela comparação da família desenha-
simbolismo do espaço, na folha que o sujeito da com a família real, autêntica. Recomenda,
desenha, em que a parte superior representa a também, não fazer uma interpretação às ce-
expressão da fantasia, e a inferior, de ausência gas, mas buscar uma “convergência de indí-
de fantasia, de energia, como zona de depres- cios” (p.51) em dados de outras fontes (de tes-
são. Já o lado esquerdo se relaciona com o tes e de informações clínicas), para a confir-
passado, e o lado direito, com o futuro, en- mação das hipóteses levantadas a partir do
quanto os lugares que ficam vazios significam desenho.

PSICODIAGNÓSTICO – V 515
Neste nível de conteúdo, salienta quatro sentações simbólicas, deve-se tentar analisar a
pontos que devem ser especialmente conside- sua possível significação.
rados: a valorização do personagem principal, Finalmente, observa-se que, neste nível de
a desvalorização de um personagem, a distân- conteúdo, Corman (1967) dá uma ênfase im-
cia entre as figuras e a presença de represen- portante à interpretação dos conflitos infan-
tações simbólicas. tis, principalmente aos que considera mais
O personagem principal é o mais importante notórios, “os conflitos de rivalidade fraterna e
no sentido de que as relações do sujeito com os conflitos edípicos” (p.59).
ele são especialmente significativas, seja por- Groth-Marnat (1999) salienta a forma como
que “o admira, inveja, teme” (p.54), seja por- as figuras são representadas, bem como a or-
que com ele se identifica. Evidencia-se como a dem seqüencial em que aparecem, que permi-
primeira figura a ser desenhada; pela coloca- tiriam explorar as relações interfamiliares e a
ção em primeiro lugar; pelo maior tamanho; maneira como o sujeito se percebe dentro do
por merecer um traçado mais cuidado, mais contexto. Valoriza, especialmente, a primeira
caprichado ou com mais adornos; por sua lo- colocação, que identifica a pessoa com a qual
calização ao lado de uma figura importante (do estão associados os sentimentos mais fortes
pai, por exemplo); por ser desenhado em posi- do sujeito, sejam positivos ou negativos. A
ção mais central, de modo que chame a aten- omissão do sujeito é explicada por ausência de
ção entre as outras figuras ou concentre a aten- poder ou de influência na família. Variações no
ção dessas figuras; por ser aquela mais enfati- traçado, borraduras ou o uso da cor podem
zada, por representar o próprio sujeito, que indicar sentimentos em relação a membros fa-
com ela se identifica. miliares específicos.
A desvalorização implica intentos de nega- Já no desenho cinético da família, a dinâ-
ção, que é indicada, freqüentemente, pela mica das relações familiares é especialmente
omissão total de uma figura ou de detalhes da focalizada, sendo importante identificar a pre-
mesma. Mas pode também ser sugerida pelo sença ou a natureza das interações. As ativida-
tamanho menor que as outras figuras; pela des representadas, às vezes, são estereotipa-
colocação seqüencial em último lugar; por sua das, refletindo papéis do cotidiano da família,
localização distanciada das demais, horizontal- mas, mesmo assim, o fato de a criança selecio-
mente ou em plano inferior; por sua represen- nar uma ação específica pode ter significação.
tação menos caprichada, cuidada ou detalha- Burns e Kaufman (1978) lembram que a ação
da; por ser depreciada de alguma maneira, de cozinhar, por exemplo, aparece freqüente-
como pela omissão do nome; ou, ainda, por mente, porém, simboliza uma figura materna
ser uma figura com que raramente o sujeito se protetora, enquanto a atividade de limpar se
identifica. associa “com mães compulsivas que se preo-
A distância entre as figuras associa-se com cupam mais com a casa do que com a gente
dificuldades no relacionamento e tanto pode que a habita” (p.27). Já o pai, que é represen-
ser indicada pelo afastamento entre as re- tado guiando um carro ou no trabalho, parece
presentações dos personagens quanto por não estar tão integrado na família como aque-
outros indícios, como por um traço de sepa- le que está lendo o jornal, pagando as contas
ração. ou brincando com os filhos, que “são ativida-
Outro ponto importante a ser considerado des freqüentes de pais normais” (p.27).
é a inclusão de animais, domésticos ou selva- Conforme Groth-Marnat (1999) comenta,
gens, no desenho do sujeito, que serviriam para se um membro da família é representado “em
a expressão mais livre de diferentes tendências posição precária” (p.331) ou no verso do pa-
pessoais, que podem, assim, ser mascaradas. pel, pode-se pressupor a existência de tensão
Desta maneira, desenhar irmãos como figuras ou, mesmo, de conflito não resolvido do sujei-
de animais seria uma forma de desvalorizá-los to com essa pessoa. No caso de o sujeito não
como pessoas. Mas, como se trata de repre- bem desenhado, há “insegurança quanto aos

516 JUREMA ALCIDES CUNHA


seus sentimentos de pertencer à família” (Gro- um irmão de 12 anos. O pai deixou de ser fun-
th-Marnat, 1984, p.145), que, quando são exa- cionário público quando ficou com um defeito
cerbados, se traduzem pela omissão do sujei- na perna e um problema de visão, por causa
to, no desenho. de um acidente, passando a trabalhar como
Qualquer ênfase numa figura identifica uma pipoqueiro na frente do colégio de César. Este
característica marcante ou um envolvimento o auxilia, diariamente, a empurrar a carroci-
específico. Figuras em plano mais elevado as- nha de pipoca até o portão da escola, indo
sociam-se com sentimentos de dominação e buscá-lo à tardinha. A mãe trabalha como bal-
poder, enquanto braços estendidos podem conista de uma grande loja, tendo melhor re-
sugerir “uma tentativa de controle do ambien- muneração que o marido. Conseguiu para o
te” (p.145). filho mais velho, que também trabalha como
Determinadas dificuldades no relaciona- office-boy de um banco, uma bolsa de estu-
mento podem transparecer no estilo do dese- dos num colégio particular. É o filho para quem
nho (Burns & Kaufman, 1978), como pela com- a mãe “passa bem as roupas”, “compra rou-
partimentalização, que denuncia isolamento, que pas” e com quem conversa. Afirma que ele “vai
pode ser inclusive da criança e de seus sentimen- ser alguém na vida” (sic). Ellen, a irmã gêmea
tos. Pessoas podem ser representadas encapsu- de César, mora com os padrinhos, pessoas de
ladas ou enquadradas de forma simbólica. posses que lhe dão tudo, porque não têm fi-
Podem, também, ser colocadas barreiras lhos. Visita a família nos fins de semana, e a
entre as figuras, denotando um bloqueio da mãe quer que ela “estude e faça um bom casa-
energia emocional. Como se trata de represen- mento” (sic).
tações simbólicas, devem ser examinadas com Motivos do encaminhamento: César foi
cuidado. “Bolas”, por exemplo, são freqüente- encaminhado pelo SOE à psicóloga porque tem
mente usadas para indicar interação, às vezes se isolado dos colegas, não brinca no recreio
com um sentido competitivo. Certas ativida- e, às vezes, chora. Diz não gostar de sua casa,
des agressivas entre irmãos, que também po- porque fica muito só.
dem envolver o arremesso de uma bola ou de Interpretação: A figura mais importante,
uma faca, podem indicar rivalidade fraterna talvez por uma questão de identificação, é o
(Burns & Kaufman, 1978). “Luz” e “fogo” po- pai. Foi desenhada em primeiro lugar. Nota-se
dem ser consideradas como representações que foi representado com seu defeito físico
concretas de sentimentos positivos na intera- (com uma perna mais curta) e com chapéu,
ção (Groth-Marnat, 1999), relacionados com indicando que precisa de proteção.
afeição e amor, embora “fogo” possa suben- A mãe é a figura maior, possivelmente por
tender raiva por falta de gratificação das ne- ser quem trabalha mais, recebe melhor orde-
cessidades correspondentes. “Nuvens pesadas” nado e comanda a organização da casa.
podem ter relação com preocupações e depres- O irmão mais velho, Robson, é representa-
são. Por outro lado, se há sentimentos de ins- do próximo da mãe e num plano superior aos
tabilidade, o sujeito pode “tentar criar alguma
estabilidade, sublinhando todo o desenho ou
os indivíduos com os quais as suas relações pa-
recem instáveis” (Groth-Marnat, 1984, p.145).
É um outro estilo do desenho (Burns & Kauf-
man, 1978).

CASO ILUSTRATIVO

Informações básicas: César é um menino de Figura 34.1 Desenho da família de um menino de 10


10 anos de idade, que tem uma irmã gêmea e anos.

PSICODIAGNÓSTICO – V 517
dos irmãos, o que condiz com o fato de ser ter a mesma idade. Identifica-se com o pai (pelo
mais valorizado por ela. Mas, mesmo sendo desenho), mas também não se aproxima dos
mais velho, sua figura é menor que a de César, demais. Permanece de braços abertos, mas não
o que se relaciona, por certo, à competição dá nem recebe. O sentimento de rejeição fica
entre ambos e com o desejo deste de que Rob- evidente, assim como a valorização dos irmãos
son seja inferior a ele. ou, mais especificamente, da irmã, embora
Ellen, a irmã gêmea de César, é desenhada valorize mais o pai, com quem se identifica.
em tamanho maior que ele, inclusive maior que As figuras são pobres, com expressão hu-
todas as figuras do sexo masculino, assim como milde, sem adornos. Falta riqueza expressiva.
a mãe é a maior da família. Evidencia-se a va- Além disso, não há uma percepção integrada
lorização das figuras femininas, talvez em fun- da estrutura familiar (as figuras estão distan-
ção do papel da mãe, que é o mais produtivo tes, flutuando), o que denuncia a distância afe-
da família. tiva, que é real na família.
César sente-se o mais rejeitado, o menor. É Tais dados foram corroborados por outros
o último a ser representado, distante de to- de outras fontes, durante o processo psicodiag-
dos. Desenha-se depois da irmã, apesar de esta nóstico.

518 JUREMA ALCIDES CUNHA


Desenho da Casa, Árvore e Pessoa (HTP)

ADMINISTRAÇÃO
Neli Klix Freitas, Jurema Alcides Cunha
35
de papel: uma, com linhas incompletas, para o
sujeito completar o desenho, e as demais para
Para a administração do teste, o psicólogo en- que desenhe uma casa, uma árvore, uma pes-
trega ao sujeito três folhas de papel em bran- soa (completa), uma pessoa do sexo oposto
co, lápis e borracha, solicitando-lhe que dese- (completa), ele mesmo (completo) e qualquer
nhe uma casa, uma árvore e uma pessoa. Con- outra coisa que queira. Segue-se um questio-
tudo, Hammer (1991) propõe que se dê uma nário de quinze perguntas, numa base de faz-
folha de cada vez, colocando-a com a dimen- de-conta.
são maior horizontalmente na frente do sujei- Hammer (1991) faz a complementação dos
to, para o desenho da casa, e verticalmente, desenhos acromáticos com uma fase cromáti-
para o desenho da árvore e da pessoa. Já Gro- ca, que constitui um recurso para explorar “ca-
th-Marnat (1999) lembra a versão que foi su- madas mais profundas da personalidade” (p.1),
gerida por Burns e Kaufman, em 1970, em que permitindo obter um quadro “da hierarquia de
é fornecida uma única folha de papel para que conflitos e defesas do paciente” (p.31). Neste
o sujeito nela faça os três desenhos. Essa pro- caso, são fornecidas mais três folhas em bran-
posta é valiosa para se analisar as inter-rela- co, borracha e lápis de cor. As instruções são
ções dos três desenhos. as mesmas, e, após a fase cromática, é feito
Costumeiramente, a fase gráfica é seguida um interrogatório como anteriormente.
por uma fase verbal. Nesta, pode-se utilizar Morris (1976) salienta também a importân-
uma abordagem mais aberta, sugerindo ao cia das observações durante a testagem. De-
sujeito que fale sobre a casa, a árvore e a pes- vem-se registrar as reações do sujeito às ins-
soa que desenhou, que conte uma história truções, que podem envolver indícios de an-
usando os três elementos, ou, ainda, pode ser siedade, resistência, desconfiança ou, pelo con-
usado um procedimento mais estruturado. No trário, de cooperação ou de aceitação passiva
Anexo E, pode ser encontrada uma lista de per- da tarefa. Além disso, devem-se anotar o tem-
guntas utilizada no interrogatório. po de reação e os comportamentos verbais e
Para muitos psicólogos, a administração do não-verbais. Caso o sujeito manifeste ansieda-
HTP resume-se a essas fases. Não obstante, en- de, resistência ou desconforto, recomenda-se
contram-se outras versões. Topper e Boring dizer que não se preocupe em chegar a uma
(1969) propuseram a utilização de sete folhas produção artística, porque não se pretende

PSICODIAGNÓSTICO – V 519
avaliar sua aptidão, mas sim a maneira como outras pessoas significativas, “uma vez que as
desenha. projeções que fazemos em outras pessoas (in-
cluindo nossos pais) são, na verdade, projeções
externas de autopercepções e de sentimentos”
INTERPRETAÇÃO (p.142).
Hammer (1991) acha que os três desenhos
Simbolismo da casa, árvore e pessoa. Para ana- proporcionam simultaneamente informações
lisar os desenhos da casa, árvore e pessoa, é em diferentes níveis de personalidade. O dese-
essencial “considerar as áreas mais amplas da nho da pessoa revela “o grau de ajustamento
personalidade investigadas por esses três con- num nível psicossocial”, enquanto a árvore,
ceitos” (Hammer, 1991, p.125). como investiga os “sentimentos e auto-atitu-
De um modo geral, pensa-se na casa como des mais duradouros e profundos” (p.41), é o
o lar e suas implicações, subentendendo o cli- desenho menos suscetível a mudanças em si-
ma da vida doméstica e as inter-relações fami- tuações de reteste. Por outro lado, consideran-
liares, tanto na época atual como na infância. do a pessoa e a árvore como extremos de um
Em conseqüência, há uma tendência para as continuum, a casa estaria em algum ponto
crianças expressarem suas relações com pais e entre ambas. Já os desenhos cromáticos suple-
irmãos, enquanto as pessoas casadas vão re- mentam os acromáticos, porque atingem ca-
fletir, no desenho, aspectos de suas relações madas mais profundas da personalidade, em
adultas com os demais membros. Contudo, razão do impacto emocional da cor, de sua
quanto mais comprometido estiver o sujeito, associação com aspectos infantis (lápis de cor,
mais existe a probabilidade de projeções de usados na infância) e em decorrência do fato
relações mais regressivas. Nesta linha de pen- de que o sujeito, ao chegar à fase cromática,
samento, entender-se-ia o ponto de vista de está afetivamente mais vulnerável do que no
que, “para algumas pessoas, a casa reflete suas início da tarefa.
relações com a mãe” (Groth-Marnat, 1984, Impressão geral. Na análise do desenho, em
p.141), já que a interação infantil mais carac- primeiro lugar é essencial identificar a impres-
terística é com a figura materna. Assim, a casa são geral que causa. Pressupondo-se que a
envolve a percepção de família, seja numa óti- casa, a árvore e a pessoa especificamente de-
ca atual, passada ou, ainda, num futuro ideali- senhadas tenham sido selecionadas por terem
zado, mas também aspectos do ego que tem uma significação simbólica para o sujeito, como
tal percepção, que podem representar um auto- temas importantes de sua vida passada ou por
retrato (Hammer, 1991). se associarem com aspectos mais profundos
A árvore e a pessoa permitem investigar o de sua personalidade, algo de muito pessoal
que se costuma chamar de auto-imagem e se comunica pela impressão geral transmitida
autoconceito (Hammer, 1991) ou “diferentes pelos conteúdos projetados. Um salgueiro, por
aspectos do self” (Groth-Marnat, 1999, p.525). exemplo, batido pelo vento, sugere sentimen-
Aspectos projetados na árvore associar-se-iam tos e atitudes bem diversos de um carvalho
com conteúdos mais profundos da personali- frondoso, assim como a figura de um príncipe
dade, enquanto, na pessoa, revelariam “a ex- altaneiro provoca uma impressão contrastan-
pressão da visão de si mesmo mais próxima da te com a de um mendigo maltrapilho deitado
consciência e de sua relação com o ambiente” numa calçada. Campos (1977) faz comentários
(Hammer, 1991, p.126). Não obstante, existe sobre a impressão global de vazio, de nudez,
uma hipótese de que a árvore reflete a relação transmitida por alguns desenhos, enquanto
com o pai, assim como o desenho da casa en- outros se caracterizam por harmonia e, ainda
volveria aspectos da relação com a mãe. Gro- outros, por inquietude.
th-Marnat (1984) diz que não é absurda a pres- Interpretação de aspectos projetivos e ex-
suposição de que as três figuras explorariam pressivos globais. Van Kolck (1975) e Campos
sentimentos sobre si mesmo ou em relação a (1977) recomendam o exame de uma série de

520 JUREMA ALCIDES CUNHA


itens, que podem ser avaliados sem referência a uma necessidade de união da família ou de
aos desenhos individuais, como a posição, o busca de proteção, mas, muito pelo contrário,
tamanho, as características do traçado, as cor- se vincularia a um desejo de se interpor, de in-
reções, os retoques, o sombreado, as borradu- terferir na relação.
ras, a simetria, a estereotipia e vários outros Eventualmente, o sujeito desenha casas ou
detalhes. árvores adicionais (Groth-Marnat, 1984); nes-
Posição e tamanho, segundo Groth-Marnat te caso, considera-se a hipótese de haver mais
(1984), são muito importantes, principalmen- de uma imagem de uma das figuras parentais
te quando os três desenhos são feitos na mes- ou de ambas. Isso também poderia ser apre-
ma folha, pressupondo-se casa e árvore como sentado pelo desenho de uma única árvore ou
representações parentais e a figura humana casa, mas “composta por dois (ou mais) esti-
como envolvendo mais implicações pessoais. los diversos” (p.142).
Então, posição e tamanho relativos podem in- Por certo, este nível de interpretação será
dicar não só características específicas da cons- mais preciso se levar em conta, além dos itens
telação familiar, mas também podem se asso- da série acromática, os das representações cro-
ciar com certos aspectos dinâmicos da intera- máticas e os dados da elaboração complemen-
ção. A proximidade da figura humana com a tar, por meio de comentários, história ou ques-
casa ou com a árvore, por exemplo, pode su- tionário.
gerir uma relação mais estreita ou uma identi-
ficação mais definida. A colocação da pessoa
entre casa e árvore pode se vincular à necessi- INTERPRETAÇÃO DO DESENHO DA CASA
dade de união da família ou de se sentir mais
protegida. A percepção da relação dos pais Na interpretação do desenho da casa, são con-
pode ser vislumbrada também pelo manejo dos siderados seus elementos essenciais (telhado,
elementos posição e tamanho. A separação dos paredes, porta, janelas) e acessórios (chaminé,
desenhos individuais pode corresponder a dis- perspectiva, linha de solo, etc.). A ausência de
tanciamento emocional ou, mesmo, a antago- qualquer dos elementos essenciais, conforme
nismo, enquanto a predominância no tamanho vários autores citados por Groth-Marnat
de um deles pode sugerir uma posição de po- (1984), suscitaria a hipótese da presença de
der, dominação ou, até, de opressão. Por ou- transtornos mais graves.
tro lado, a ausência real ou não pode ser indi- Como regra básica, pode-se afirmar que
cada por uma figura pequena ou distante. Po- quanto mais lógica e estruturada é a represen-
rém, se é a figura humana que se destaca pelo tação da casa, tanto mais adequadas podem
tamanho, a questão deve ser analisada com ser consideradas as condições de funcionamen-
cuidado, porque pode se relacionar com ego- to do ego. Ao contrário, quanto mais aparece-
centrismo, exibicionismo, com uma necessida- rem indícios bizarros e ilógicos, mais probabi-
de de chamar a atenção ou, ainda, de com- lidade há da presença de problemas psicopa-
pensação por sentimentos de inadequação ou tológicos.
insegurança. A forma de representação das paredes as-
Esta perspectiva de uma triangularidade socia-se com a força do ego. Paredes desenha-
relacional pode formar maior riqueza de con- das com linhas frágeis ou inadequadas corres-
teúdos interpretativos, se outros dados permi- pondem a dificuldades sérias nas funções do
tirem que se levante a hipótese de que elemen- ego. Porém, se há tentativas de reforçar os li-
tos representativos de natureza edípica estão mites das paredes, o ego ainda luta contra a
em jogo. Então, posição, tamanho e outros sua desintegração. Por outro lado, a presença
detalhes que esclareçam conexões afetivas as- de transparências sugere problemas nos limi-
sumem significação mais específica, a partir do tes pessoais com a realidade ou, ainda, no tes-
embasamento teórico. Neste caso, a colocação te de realidade, a menos que tal característica
da pessoa entre a casa e a árvore não se ligaria ocorra em etapas de desenvolvimento em que

PSICODIAGNÓSTICO – V 521
pode ser atribuída à imaturidade. Da mesma modificada se ela se apresenta com uma quan-
maneira, só é adequado fazer interpretações tidade densa de fumaça, o que pode refletir
com enfoque projetivo com base em aspectos tensão ou sugerir conflito nas relações fami-
que podem envolver coordenação visomanual liares (Hammer, 1991).
e organização perceptoespacial, se puderem ser A linha de solo dá indícios sobre o contato
desconsiderados outros fatores etiológicos com a realidade, principalmente no que se re-
para a explicação das dificuldades encontradas. fere à qualidade e à firmeza do traço. Os cami-
O tamanho do telhado relaciona-se com a nhos devem ser examinados com cuidado. Em
medida em que a fantasia distorce ou invade o princípio, significam vias de acesso e de comu-
funcionamento mental. Em casos extremos, o nicação, mas também podem ser usados como
telhado acaba por se constituir na representa- barreiras ou meios de proteção, dificultando
ção total da casa toda, em que são acrescenta- as interações. Os demais acessórios, como cer-
das portas e janelas, tipo de desenho mais fre- cas, arbustos, flores, etc., sempre devem ser
qüentemente encontrado em pacientes esqui- considerados em termos de sua finalidade de
zofrênicos. Num outro extremo de um conti- facilitar o intercâmbio com o mundo externo
nuum, a ausência de telhado verifica-se em ou, pelo contrário, de estabelecer meios de
sujeitos geralmente incapazes de regressão a defesa ou de proteção.
serviço do ego, “em personalidades reprimidas
e com orientação concreta” (Hammer, 1991,
p.128). Já o reforço do telhado denota esfor- INTERPRETAÇÃO DO DESENHO DA ÁRVORE
ços defensivos contra impulsos que buscam
expressão na fantasia. A árvore, além dos aspectos já discutidos sobre
Portas e janelas representam canais de co- simbolismo, de acordo com Buck, conforme
municação ou vias de acesso ao mundo exter- Burns e Kaufman (1978), representa o cresci-
no. Portanto, a sua ausência significa inacessi- mento, e, como Campos (1977) comenta, pode
bilidade, isolamento. Tentativas do ego de per- revelar sentimentos do sujeito em várias fases
manecer inacessível também são indicadas pela de seu desenvolvimento, simbolizado pela pro-
colocação da porta muito acima da linha de gressão da raiz até a copa. Assim, o tronco re-
solo, inclusive sem o acesso por degraus. Já a fletiria sentimentos de poder e a força do ego,
porta de tamanho muito grande sugere fortes a estrutura dos galhos forneceria indícios sobre
necessidades de dependência, e a porta aber- como o sujeito percebe sua capacidade de en-
ta, “intensa necessidade de reforço emocional contrar satisfação no ambiente e a organiza-
de fora” (Hammer, 1991, p.129). Ainda que as ção total teria que ver com seus sentimentos
janelas constituam uma forma de contato se- sobre o próprio equilíbrio emocional. Entretan-
cundária com o ambiente (Hammer, 1991), to, em termos essenciais, conforme o ponto
podem denotar uma diminuição na interação, de vista de vários autores, citados por Groth-
na medida em que aparecem fechadas ou tran- Marnat (1984), a representação de uma árvo-
cadas, pois tal tipo de representação já teria re pressupõe um tronco e, pelo menos, um
um sentido defensivo. Por outro lado, o acrés- galho. “Se esses elementos críticos estão fal-
cimo de cortinas, persianas ou o desenho da tando, deve ser considerada uma deterioração
janela apenas parcialmente aberta, são com- intelectual” (p.139).
patíveis com a existência de interações com o A impressão geral do desenho é, em gran-
ambiente, mas controladas. de parte, determinada pela colocação no pa-
A presença ou não de chaminé pode ser pel e pelo tipo de árvore.
explicada por motivos socioculturais. Mas, ape- A árvore bem centrada relaciona-se com
sar disso, é freqüentemente representada, por equilíbrio e bom relacionamento com ambos
se prestar como um símbolo de “calor psicoló- os sexos. A colocação para a esquerda já não
gico”, conforme Buck, em referência de Gro- sugere equilíbrio emocional e se associa com
th-Marnat (1984). Porém, tal hipótese deve ser forte influência materna, ao passo que, para a

522 JUREMA ALCIDES CUNHA


direita, denuncia identificação com a figura pa- de um self ideal, embora possa resultar “da
terna. Quando o desenho é feito na parte su- percepção de outras pessoas significativas
perior da folha, indica fuga na fantasia, mas, (pais, irmãos, etc.)” (p.143). Deste modo, fre-
na parte inferior, inibição da fantasia e senti- qüentemente, há representação das caracte-
mentos depressivos. rísticas pessoais, físicas ou psicológicas, como
O tipo de árvore resulta principalmente da são na realidade (inclusive, muitas vezes, com
forma como o tronco e os galhos são dese- registro de defeitos físicos), como são percebi-
nhados. O tronco representa a força do ego, a das, sentidas, imaginadas ou projetadas nos
auto-estima. Se delineado com linhas reforça- demais. Por isso, é extremamente importante
das, sugere a necessidade de uso de recursos verificar o tipo de pessoa desenhada, definin-
defensivos para proteger a integridade do ego. do-o melhor pelo confronto com os comentá-
Já as fracas se associam com fragilidade das rios do sujeito ou com suas respostas ao ques-
defesas e conseqüente vulnerabilidade. Irregu- tionário. A seguir, é preciso considerar outros
laridades no tronco podem indicar sentimen- itens do desenho, como a cabeça, que se asso-
tos de inadequação, e cicatrizes costumam ser cia com aspectos intelectuais e “freqüentemen-
identificadas com experiências traumáticas, te reflete a necessidade de controle racional
cuja ocorrência tem que ver com sua localiza- de impulsos e/ou da fantasia” (Groth-Marnat,
ção na árvore. Já a copa representa a organi- 1984, p.131), os detalhes associados com a
zação da personalidade e a maneira desta in- comunicação e interação com o ambiente (prin-
teragir com o ambiente (Groth-Marnat, 1999). cipalmente os traços faciais, os braços e as
Os galhos, portanto, sugerem sentimentos que mãos) e com a atitude do sujeito frente aos
podem ser bastante diversificados, caso sejam seus impulsos (tronco). Finalmente, é conve-
abundantes (busca de excessiva satisfação), niente lembrar que qualquer ênfase ou elabo-
diminutos (incapacidade de obter satisfação), ração específica de alguma parte do corpo pode
voltados para dentro (egocentrismo), quebra- ter uma conotação real ou simbólica de pro-
dos (sentimentos de impotência, castração e blema ou conflito, merecendo, por certo, uma
trauma), mortos (desesperança, depressão) ou análise especial.
ausentes (falta de contato). Quando os galhos Sob outros pontos de vista, o desenho da
estão cheios de folhas, associam-se com meti- pessoa, no HTP, pode ainda ser examinado con-
culosidade e precisão, mas, se elas são elabo- forme as considerações sobre o desenho da fi-
radas, detalhadas, identificam traços perfecci- gura humana.
onistas. A ausência de folhas pode se relacio-
nar com vulnerabildade ou, eventualmente,
com insatisfação, embora tais pressuposições CONSIDERAÇÕES ESPECIAIS NA
devam ser corroboradas por outros dados, já INTERPRETAÇÃO DO HTP
que árvores deste tipo também são desenha-
das por pessoas normais, particularmente no Já foi referido que a omissão de partes essen-
inverno. A presença de frutos, em desenhos de ciais na representação da casa ou da árvore
adultos, associa-se com sentimentos de satisfa- pode-se associar com deterioração intelectual
ção e criatividade (desejo de ter filhos?). Em de- (Groth-Marnat, 1984). Por outro lado, o pró-
senhos infantis, maçãs pendentes sugerem ne- prio HTP já foi utilizado para estimativa da in-
cessidades de dependência, mas, quando se apre- teligência adulta, ainda que já não haja senti-
sentam caídas no chão, sentimentos de rejeição. do em usá-la com tal objetivo, uma vez que o
psicólogo dispõe de recursos mais sofisticados
e precisos para este fim. Não obstante, parece
INTERPRETAÇÃO DO DESENHO DA PESSOA importante que ele esteja familiarizado com os
efeitos do nível intelectual sobre a representa-
Conforme Hammer (1991), o desenho da pes- ção das figuras, para que não chegue a fazer
soa pode conter elementos do auto-retrato ou interpretações indevidas sobre a pobreza das

PSICODIAGNÓSTICO – V 523
produções gráficas, eventualmente atribuindo-
a a aspectos emocionais, quando outros fato-
res estão em jogo.

INDICADORES DIAGNÓSTICOS

Traços psicóticos

O HTP foi utilizado por Deabler (1969), na tria-


gem de pacientes psiquiátricos. Após um estu-
do de 3.000 casos, identificou uma série de
indicadores diagnósticos, corroborando seus
dados com conclusões psiquiátricas sobre os
sujeitos. São interessantes, especialmente, as
observações que faz sobre desenhos produzi-
dos por psicóticos.
Em pacientes com funcionamento em nível
psicótico, são freqüentes as produções bizar-
ras, com distorções importantes, que resultam
no aparecimento de figuras ilógicas e irrealís-
ticas. Pacientes esquizofrênicos (com exceção
de alguns casos paranóides bem integrados)
são os que apresentam o HTP mais compro-
metido.
No desenho da casa, observam-se:
a) ausência de partes essenciais (portas, ja-
Figura 35.1 Desenho da casa de um paciente psicótico
nelas), sugerindo inacessibilidade ou mau con- de 24 anos (HTP).
tato com o ambiente;
b) representação ilógica, pela presença de
transparências; a) ausência de partes essenciais (olhos,
c) representação sincrética, em que o telha- mãos, braços, tórax, cabeça, etc.), sugerindo a
do substitui a casa total, refletindo a exacer- falta de percepção do corpo como totalidade
bação da fantasia; ou “incapacidade para lidar com os problemas
d) problemas de perspectiva, com a repre- da vida” (p.175);
sentação simultânea de três lados da casa, ou b) representação ilógica, com transparên-
com a parede extrema desproporcionalmente cias, observando-se órgãos internos, através do
maior que a parede principal, mesmo em ca- vestuário;
sos com bom nível intelectual; c) ambivalência no perfil, com corpo e ca-
f) paredes com a extremidade fendida, de- beça em direções opostas;
nunciando quebra dos laços com a realidade. d) omissão da roupa ou ênfase nos órgãos
No desenho da árvore, notam-se: sexuais, como desconsideração de normas so-
a) tronco fendido, compatível com desor- ciais ou, ainda, sugerindo aspectos agressivos;
ganização de personalidade; e) superacentuação de olhos ou de orelhas,
b) copa com tamanho mínimo, revelando denunciando hipervigilância paranóide ou su-
mau contato ou tendências de se afastar do bentendendo componentes alucinatórios;
ambiente. f) perfil típico esquizofrênico: “sem cabelo,
No desenho da pessoa, são as seguintes as um rosto parecido com máscara e um físico
características: magro, rígido, desvirilizado” (p.174).

524 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 35.3 Desenho da pessoa de um paciente psicó-
Figura 35.2 Desenho da árvore de um paciente psicó-
tico de 24 anos (HTP).
tico de 24 anos (HTP).
Observação: Tentativa de desenhar a pessoa completa

Disfunção cerebral lações das partes com o todo. No desenho da


casa, essas dificuldades aparecem mais preco-
Em casos com problemas de disfunção cere- cemente.
bral, foram observadas muitas rasuras e piora
no desempenho a cada nova tentativa de re-
presentar o conceito, com queixas dos pacien- Traços depressivos e traços hipomaníacos
tes de não se sentirem capazes de realizar a
tarefa. Numa pesquisa de Freitas (1997), com trinta
As figuras são simples, concretas. A quali- casos de pacientes que sofreram perdas signi-
dade da linha está comprometida, e o dese- ficativas, foram identificados traços caracteri-
nho é feito com linhas quebradas, esboçadas, zados como depressivos e como hipomanía-
irregulares. As dificuldades de simetria suge- cos.
rem falta de equilíbrio em pacientes com esse Traços depressivos:
problema. Por outro lado, a fadiga leva à piora a) casa simples, vazia, pobre, com portas
do desempenho nos últimos desenhos, princi- abertas;
palmente quando é usada a fase cromática. b) árvore desprotegida, tênue, desvitaliza-
Em todos os desenhos, há problemas de da, podendo apresentar nódulos, sombrea-
organização, em especial considerando as re- mentos, ramos frágeis e copa pequena.

PSICODIAGNÓSTICO – V 525
c) figura humana frágil, mas organizada,
sugerindo impotência; ênfase na cabeça e no
tronco; semblante triste; figura simétrica rela-
cionada com controle obsessivo;
De um modo geral, os desenhos apresen-
tam tamanho pequeno, sem sugestão de mo-
vimento, com traçado débil, trêmulo, cortado,
inibido. A localização pode variar, mas, habi-
tualmente, são desenhos soltos “no ar”. Nas
Figuras 35.4, 35.5 e 35.6, têm-se as produções
no HTP de uma mulher, de 41 anos, com crise
depressiva, em razão da perda recente de um
filho de 16 anos por leucemia.

Figura 35.5 Desenho da árvore de uma mulher, de 41


anos, com crise depressiva (HTP).

b) árvore com grande dimensão, em expan-


são, ultrapassando os limites da folha; copa
esférica; ramos para fora e para o alto;
c) figura humana de tamanho grande, com
os braços para fora e para o alto; fisionomia
com expressão de triunfo (sorriso do tipo “boca
de palhaço”); impressão de imaturidade, de in-
fantilidade.
De um modo geral, os desenhos são localiza-
dos no canto da folha, voltados para o “alto”.
Observam-se movimentos de expansão, mas as
Figura 35.4 Desenho da casa de uma mulher, de 41 linhas são grossas, e o traçado é forte, feito com
anos, com crise depressiva (HTP). pressão. Nas Figuras 35.7, 35.8 e 35.9, têm-se as
produções gráficas de uma mulher, de 43 anos,
que perdeu o marido há seis meses, por enfise-
Traços hipomaníacos: ma pulmonar. Após enviuvar, passou a gastar
a) casa desenhada em perspectiva, com ta- excessivamente, a participar de jogos de azar, com
manho grande; ênfase nas portas e presença apostas altas, e a discutir com as pessoas, com
de flores; agressividade verbal desproporcional à situação.

526 JUREMA ALCIDES CUNHA


Figura 35.6 Desenho da pessoa de uma mulher, de 41 Figura 35.8 Desenho da árvore de uma mulher, de 43
anos, com crise depressiva (HTP). anos, com traços hipomaníacos (HTP).

Figura 35.7 Desenho da casa de uma mulher, de 43 Figura 35.9 Desenho da pessoa de uma mulher, de 43
anos, com traços hipomaníacos (HTP). anos, com traços hipomaníacos (HTP).

PSICODIAGNÓSTICO – V 527
MÓDULO XIII – Wechsler Intelligence Scales (WIS)

E ste módulo abrange importantes recursos


psicométricos para medida da inteligência,
as Escalas Wechsler. Como conjuntos de tare-
senvolvidas pesquisas a respeito. Dessa manei-
ra, resolvemos delinear a apresentação deste
tema do seguinte modo.
fas, não oferecem maiores dificuldades para o Em primeiro lugar, vamos expor aspectos
examinador, uma vez que as instruções dos ma- gerais sobre as Escalas Wechsler, só eventual-
nuais costumam ser bastante explícitas. Há, mente nos referindo de forma especial a uma
porém, alguns pontos precípuos que precisam determinada escala. Em segundo lugar, se-
ser considerados. rão reservados dois capítulos especificamen-
Obviamente, as escalas mais populares en- te para características e manejo do WISC-III
tre os psicólogos, no Brasil – o WISC, o WISC- e do WAIS-III.
R, o WAIS e o WAIS-R –, não foram adaptadas Esta parece ser a única forma de lidar com
para nossas condições socioculturais, e não essa fase de transição da utilização desses ins-
existem normas brasileiras. O WPPSI e sua for- trumentos, a partir das escalas mais antigas,
ma revisada, embora eventualmente usados, ainda úteis (pelo acervo de trabalhos existen-
são um pouco menos acessíveis e estão nas tes), para considerar, então, as mais atuais,
mesmas condições. O WISC-III e o WAIS-III já psicometricamente com maior excelência, mas
começaram a ser utilizados, e estão sendo de- com poucos estudos em nosso meio.

528 JUREMA ALCIDES CUNHA


Escalas Wechsler
Jurema Alcides Cunha
36
INTRODUÇÃO: OS QIS E A SUA cia, na realidade, só mede “algumas áreas de
SIGNIFICAÇÃO funcionamento”. Em suma, “um QI é uma es-
timativa do nível atual de funcionamento, en-
Tradicionalmente, as Escalas Wechsler têm sido quanto este é medido pelas várias tarefas reque-
incluídas entre os instrumentos mais conheci- ridas num teste” (Groth-Marnat, 1999, p.153).
dos para a avaliação do QI, embora também E, no momento em que se salienta que é uma
sirvam a outros propósitos, quando, então, medida do nível atual, fica claro que não se trata
eventualmente, o QI pode ser o dado menos de um dado fixo e imutável, podendo variar con-
importante entre os subsídios obtidos. forme uma série de fatores ambientais, psicopa-
Em todo caso, principalmente entre leigos, tológicos ou outros, que afetam as funções cog-
medida de inteligência associa-se a QI, e muita nitivas, além de variáveis que podem influenciar
gente pensa que QI é uma síntese da inteli- o desempenho nas tarefas envolvidas, como com-
gência de uma pessoa. preensão das instruções, motivação, empenho
Na realidade, sabe-se que “o constructo de em dar uma determinada impressão, etc.
inteligência tem sido proposto para explicar e Entretanto, o fato de os testes de inteligên-
esclarecer o complexo conjunto de fenômenos cia não nos oferecerem uma visão mais abran-
que justificam as diferenças individuais em ter- gente do que parecem medir tem, no momen-
mos de funcionamento intelectual” (McGrew to, mais interesse teórico do que prático, por-
& Flanagan, 1998, p.1). que a avaliação intelectual geralmente é feita
Spearman, considerado o pai da psicome- para se ter uma idéia do possível êxito do su-
tria, foi quem primeiramente tentou explicar o jeito, do ponto de vista escolar (acadêmico) e
que era inteligência, nos primórdios do século ocupacional, o que, a grosso modo, pode ser
XX. Depois que propôs o fator g como pressu- possível por meio dos instrumentos disponíveis.
posto, em seu referencial teórico, surgiram
muitos pensadores, ora apresentando um mo-
delo dicotômico, ora criando explicações que CONSIDERAÇÕES GERAIS E NORMAS PARA
envolviam fatores múltiplos ou capacidades A ADMINISTRAÇÃO E ESCORE
cognitivas múltiplas. Entretanto, no estado
atual de nosso saber, pode-se afirmar que qual- Antes de usar uma das Escalas Wechsler, é ne-
quer instrumento de mensuração da inteligên- cessário que a escala escolhida e o sujeito se-

PSICODIAGNÓSTICO – V 529
jam compatíveis. É preciso, então, conhecer as certo ponto semelhantes, mas que podem ob-
escalas e o sujeito. A escala deve corresponder ter escores diversos; em segundo lugar, para
à idade do sujeito. Mas há superposição de al- evitar certa tendenciosidade ou um efeito de
gumas escalas em certas faixas etárias, e é im- halo. Freqüentemente, após uma série de res-
portante considerar qual a mais adequada, postas de boa qualidade (ou, ao contrário, de
conforme os objetivos do exame. Por outro má qualidade), pode ocorrer que o examina-
lado, são importantes certas informações pré- dor não se empenhe muito no inquérito de uma
vias sobre o sujeito, para prevenir fatores que resposta não muito completa, porque parece
podem interferir no desempenho (como pre- que já “sabe” o que o examinando quer dizer.
sença de dificuldades verbais ou motoras, ne- Entretanto, se vai atribuir o escore só mais tar-
cessidade do uso de óculos para a leitura e mão de, procurará reunir o máximo de dados para
preferencial). fundamentá-lo.
A cada escala corresponde um material es- Segundo uma revisão feita por Groth-Mar-
pecífico e pressupõe instruções, que variam de nat (1999), entre os erros mais freqüentes, na
um instrumento para outro. O psicólogo deve administração, estão a omissão do registro de
estar suficientemente familiarizado com este, respostas e do tempo de desempenho do su-
de modo que o sujeito constitua o seu princi- jeito; omissão de inquérito, quando indicado,
pal foco de atenção, e não o material, as nor- bem como inquérito inadequado (em desacor-
mas e as instruções. É evidente que estas de- do com as instruções).
vem ser seguidas, para que o resultado seja Quando o psicólogo não registra a respos-
uma medida válida. Devem ser adequada e in- ta textual, atribuindo logo o escore, ou quan-
teiramente memorizadas. Por outro lado, a fa- do anota apenas lembretes resumidos, com a
miliaridade com o material pressupõe o seu finalidade precípua de manter apenas os da-
manejo prévio, para garantir segurança em sua dos pertinentes e adequados para a atribuição
manipulação. Assim, o psicólogo, antes de ini- posterior do escore, muitas vezes são perdidos
ciar a testagem, deve dispor de todo o mate- indícios clínicos importantes, ainda que às ve-
rial de forma acessível e organizada, de ma- zes sutis, para a compreensão de dificuldades
neira a não usar mais de quinze segundos para em nível de ego.
manipulá-lo, entre um subteste e outro. Assim, a partir do pressuposto de que qual-
Além de memorizar as instruções para a quer das escalas Wechsler, mais do que uma
administração, é importante que o psicólogo medida de inteligência, é um importante auxi-
tenha em mente as normas para a atribuição liar no processo diagnóstico total, pode-se con-
de escores, não com a intenção de quantificar cluir que o psicólogo não deve orientar o in-
imediatamente as respostas, mas para ser ca- quérito apenas para fundamentar o escore, mas
paz de conduzir perguntas adicionais, para para uma compreensão mais ampla e profun-
obtenção das informações necessárias a per- da, que possa revelar não só peculiaridades na
mitir precisão na atribuição posterior do es- organização do pensamento, mas também
core. conteúdos emocionais, que não devem passar
Sendo o sujeito o principal foco de aten- despercebidos. Matarazzo (1976) comenta o
ção, todo o seu comportamento verbal e não- caso de um sujeito ter um bom desempenho
verbal deve ser observado e, tanto quanto pos- nos subtestes de execução do WAIS e, inclusi-
sível, anotado. Desse modo, desaconselhamos, ve, em boa parte do Arranjo de Figuras, mas
na maior parte dos subtestes, a atribuição de demonstrar dificuldade especial no item Táxi,
escores imediata à resposta do sujeito, da mes- podendo-se pressupor que seu conteúdo teve
ma forma que aconselhamos que as respostas um efeito perturbador, pela ansiedade que o
sejam registradas textualmente, a não ser quan- tema de cunho sexual despertou. Trata-se de
do muito objetivas ou estereotipadas. Em pri- um instrumento psicométrico, mas isso não
meiro lugar, porque realmente é difícil evitar constitui impedimento para que certas respos-
uma boa margem de erro ante respostas até tas ou a omissão de respostas assumam uma

530 JUREMA ALCIDES CUNHA


qualidade projetiva. Comenta o autor que se ção, embora o seu ritmo seja lento. Também
poderia argumentar que, se tais respostas são pode parecer importante verificar se o sujeito
categorizadas como erro, num sentido psico- que conseguiu a solução após o tempo limite
métrico, isso não poderia pôr em xeque a ques- manterá o mesmo padrão nos itens seguintes
tão da precisão do instrumento. Não obstan- ou, pelo contrário, conseguirá se recuperar,
te, tais fracassos são anômalos e, por conse- dando a solução dentro do limite de tempo. É
guinte, não chegam a afetar substancialmente evidente que o item respondido após o tempo
a soma dos escores do subteste. Aliás, já Rapa- limite terá zero como escore, e os itens res-
port e colegas (1965) ressaltavam a necessida- pondidos com acerto, após o número de fra-
de de interrogar o sujeito, não só pela falta de cassos previstos, não serão considerados para
clareza, mas ante qualquer indício peculiar ou o cálculo do QI, mas podem dar uma idéia
estranho, porque considerável desorganização dos limites do próprio sujeito, no desempe-
pode estar subjacente a uma aparência sadia, nho de tarefa idêntica, mas sem que esteja
que é denunciada apenas por um ou outro in- sob pressão.
dício. Da mesma forma, as respostas “Não sei” Por outro lado, quando o sujeito erra itens
podem ocultar lapsos incipientes que, com in- fáceis, atingindo o número de fracassos pre-
quérito, podem demonstrar a presença de si- vistos para interromper o subteste, e tal de-
nais de transtorno de pensamento, como sa- sempenho está em desacordo com o que vem
lienta Berg (1983), apoiando-se no ponto de apresentando em outros subtestes, convém
vista de Carr e colegas, expresso em 1979. administrar mais alguns itens, ainda que o su-
É precípua, pois, a compreensão do racio- cesso nestes não possa ser computado para o
cínio subjacente às respostas dadas, assim cálculo do QI, na escala de execução. Preten-
como o entendimento dos bloqueios, das he- de-se apenas examinar se o sujeito é capaz de
sitações e das manifestações de certos esta- vencer os itens mais difíceis, apesar de seu fra-
dos emocionais. Ademais, as modificações no casso inicial, o que qualitativamente pode se
comportamento (variações da atenção, concen- tornar um dado significativo. Trata-se assim do
tração e das atitudes) frente ao examinador ou que se denomina teste dos limites, um recurso
ao material e, especialmente, particularidades mais usual no Rorschach, mas que pode ser
e peculiaridades no manejo deste material po- empregado nas escalas Wechsler, para explo-
dem ajudar consideravelmente na interpreta- rar melhor o potencial do sujeito e esclarecer
ção de flutuações no desempenho inter e in- questões diagnósticas. Deste modo, a não-in-
tratestes. Da mesma forma que variáveis do terrupção do desempenho do examinando, nos
sujeito, variáveis do examinador (sexo, atitu- subteste de Cubos e Armar Objetos, por exem-
de, etc.) devem ser consideradas, para avaliar plo, é clinicamente importante, porque vai per-
o comportamento numa série de dimensões, mitir compreender se o insucesso em comple-
além das de natureza estritamente cognitiva tar a tarefa se deve a uma incapacidade de
(Glasser & Zimmerman, 1972). encontrar a solução ou a outros problemas,
Outro aspecto importante parece ser a ques- como ansiedade, lentificação dos movimentos
tão do limite de tempo nos subtestes de exe- por depressão, problemas de coordenação ou
cução. Este deve ser considerado quanto à atri- problemas perceptuais. Entretanto, se o sujei-
buição do escore, mas parece importante que to ficar muito perturbado com sucessivos fra-
o sujeito não seja interrompido na tarefa, se cassos, é melhor interrompê-lo, porque o ga-
deseja continuar, a não ser quando se observa nho possível em compreensão não compen-
que o fracasso o está perturbando ou quando sa a insegurança que pode se transferir a
já utilizou um tempo demasiado, digamos, outros desempenhos sob a forma de subpro-
mais ou menos, o dobro do tempo limite. Tal dutividade.
procedimento ajuda a identificar a natureza da Acima, falamos sobre subtestes de execu-
dificuldade encontrada, como também a veri- ção, em geral, e a estes podem ser acrescenta-
ficar se o sujeito é capaz de encontrar a solu- dos os subtestes de Dígitos e Aritmética da

PSICODIAGNÓSTICO – V 531
escala verbal, porque a graduação de dificul- tamos desconsiderando normas, uma vez que
dades, nessas provas, é muito menos sujeita a não existem normas brasileiras. Entretanto,
influências socioculturais. ainda que consideremos tal procedimento cli-
Quanto a subtestes essencialmente verbais, nicamente defensável, admitimos que só deva
não padronizados para o nosso meio, a nossa ser usado em caráter precário.
opinião já é diversa. Acontece que os itens de Nas escalas Wechsler mais recentes, foi ado-
subtestes essencialmente verbais são ordena- tado o recurso de entremear subtestes verbais
dos em função do grau de dificuldade crescen- com os de execução, como meio de manter o
te, verificado na padronização americana, e nível de interesse do sujeito. No WISC e no
nada nos autoriza a pensar que seja idêntico WAIS, não consta tal recomendação. Entretan-
no Brasil. Aliás, numa pesquisa em que anali- to, parece viável que, se durante os testes fo-
samos o grau de dificuldade dos itens de al- ram observados sinais de fadiga ou de insatis-
guns subtestes do WPPSI, verificamos que a fação, principalmente porque as tarefas se pa-
ordem encontrada em nosso meio foi bastan- recem muito com atividades escolares, seja
te diversa da original. Assim sendo, enquanto possível utilizar o mesmo procedimento.
não houver pesquisas que nos autorizem a pro- Para concluir, insistimos na necessidade de
ceder de outra forma, nos subtestes de Infor- registrar todo o comportamento verbal e não-
mação, Compreensão e Vocabulário, costuma- verbal do sujeito, bem como as impressões que
mos administrar todos os itens, com exceção nos transmite. Além disso, é importante pro-
dos casos com suspeita de limitações intelec- curar explorar todas as possibilidades de res-
tuais mais severas, em que fazê-lo seria não só posta do sujeito, na escala verbal, a não ser
uma perda indevida de tempo, como poderia em caso de resposta única, como em Aritméti-
representar uma pressão demasiada para o ní- ca. O potencial deve ser examinado não só para
vel de tolerância do sujeito. Contudo, intro- investigar suas implicações clínicas, mas para
dutoriamente, no caso de crianças, costuma- diminuir as probabilidades de que fatores emo-
mos dizer que o teste se aplica a crianças pe- cionais venham a interferir na produtividade.
quenas e até a adolescentes, e que, natural- Por exemplo, a resposta “Não sei” pode indi-
mente, há itens muito fáceis e outros bem mais car desconhecimento, mas também oposição,
difíceis. Tal explicação geralmente é suficiente insegurança ou medo de errar. Subjacentemen-
para que a criança não se sinta por demais te, podem se encontrar fatores cognitivos ou
ansiosa ante possíveis fracassos. Além disso, emocionais, envolvendo um potencial inusita-
quando os fracassos começam a ocorrer mais do ou dados qualitativos. Portanto, o sujeito
amiúde, costumamos comentar que parece que deve ser estimulado a desenvolver sua respos-
“isto” ela ainda “não teve na escola”. ta, mesmo que esta seja dada como “palpite”.
Entre os subtestes de execução, Completar Naturalmente, tais perguntas, no inquérito,
Figuras também parece apresentar o mesmo devem ser devidamente assinaladas, assim
problema quanto ao grau de dificuldade dos como as perguntas que o sujeito faz para es-
itens. Neste, como nos subtestes essencialmen- clarecer uma situação, explorar possibilidades
te verbais, costumamos administrar todos os ou controlá-la e dominá-la (Glasser & Zimmer-
itens, considerando, para o escore, todos os man, 1972).
acertos. Em relação a possíveis críticas referen- Evidentemente, para tal fim, quase sempre
tes à conduta adotada, lembramos apenas que, a folha de registro tradicional é insuficiente,
para a padronização de qualquer teste, são mas vale a pena o trabalho. Não só facilitará a
aplicados todos os itens, e somente a partir do supervisão, quando se tratar de psicólogo ini-
processamento de dados é possível definir nor- ciante, como oferecerá a todos uma riqueza
mas. Neste caso, não se costuma levar em conta de dados clínicos, muito importantes na inter-
as possíveis frustrações ou ansiedades devidas pretação final dos resultados. A folha de regis-
a fracassos inevitáveis. Assim, não cremos que tro tradicional continua indispensável do pon-
estamos exigindo demais do sujeito e não es- to de vista quantitativo. Podem ser acrescen-

532 JUREMA ALCIDES CUNHA


tadas folhas adicionais para facilitar as obser- respostas deve ser julgada pelo examinador,
vações e registro de inquéritos especiais ou de que, não raro, deve até consultar pessoas es-
respostas a itens não considerados na conta- pecializadas ou obras específicas, para se cer-
gem. Finalmente, no caso de uso de quaisquer tificar de qual escore pode ser razoável. É claro
dos procedimentos não ortodoxos aqui suge- que tal tipo de resposta é bastante raro. Já nos
ridos, é importante que os mesmos sejam de ocorreu ter de consultar uma pessoa ligada ao
alguma forma indicados no registro das res- escotismo para julgar da adequabilidade de al-
postas, para não haver qualquer interferência guns procedimentos para quem se encontra
no cálculo tradicional do QI. perdido numa floresta, ou até precisar realizar
Aliás, o próprio psicólogo clínico deve deci- uma pesquisa bibliográfica para levantar par-
dir qual a melhor forma de registro e manejo ticularidades não muito divulgadas sobre fei-
de seus dados. tos de Gengis Khan.
Estes fatos acontecem mais quando se tra-
ta de pessoas muito intelectualizadas e, parti-
PROBLEMAS GERAIS NO ESCORE cularmente, aquelas que dão muitos detalhes,
respostas múltiplas ou alternativas. Entretan-
Em relação ao escore, geralmente, as instru- to, freqüentemente ocorre o fato de pessoas
ções constantes nos manuais são suficientes. darem uma resposta correta e acrescentarem
É importante que o examinador esteja com- detalhes, ou alternativas, que podem envolver
pletamente familiarizado com as exigências incorreções. Neste caso, o examinador deve
para a atribuição de diferentes escores, para procurar discernir o que é essencial e o que é
que saiba quando os seus dados são suficien- secundário ou irrelevante. Se a idéia essencial
tes, de um ponto de vista quantitativo, ou é conservada, embora sejam acrescentados ele-
quando deve estimular o sujeito a falar mais. mentos que não a melhoram, mas que tam-
As recomendações anteriores, no sentido de bém não prejudicam o pensamento implícito,
melhor entender o raciocínio subjacente à res- ainda é possível atribuir escore, valorizando os
posta, não implicam quebra de instruções na aspectos essencialmente positivos. Se, porém,
administração, a não ser no caso específico do as especificações acabam comprometendo o
número de fracassos, para a interrupção do que é essencialmente exigido da resposta, ou
subteste, exclusivamente em tipos de tarefas a primeira resposta correta é manifestamente
que parecem mais afetadas por fatores socio- substituída por uma inadequada, não temos
culturais. outra alternativa que atribuir um escore zero.
Por outro lado, mesmo que o sujeito deva Pode acontecer, entretanto, que seja dada uma
ser o principal foco de atenção, a testagem e a resposta de nível superior (escore 2) e uma res-
atribuição de escores devem constituir um pro- posta inadequada. Neste caso, Glasser e Zim-
cesso inteligente de parte do examinador. Isto merman (1972) ainda atribuem o escore 1 à
significa que, embora o manual deva ser se- resposta. Concordamos com tal critério, desde
guido, sempre haverá situações em que o exa- que a segunda resposta não seja dada como
minador deve decidir por si próprio que deci- correção à primeira.
são tomar. Desta maneira, freqüentemente Pode ocorrer que também o oposto se veri-
ocorre que sejam apresentadas respostas inu- fique e seja dada uma resposta incorreta, se-
sitadas, bem diversas das constantes entre os guida de uma resposta adequada, até de bom
exemplos do manual. É claro que não estamos nível. Neste caso, procuramos verificar se a
aqui falando de respostas inusitadas no senti- intenção do sujeito é de corrigir a primeira ou de
do de conterem elementos extravagantes ou manter ambas como alternativas possíveis. No
bizarros. Algumas dessas respostas, não rela- primeiro caso, parece-nos que o escore deva ser
cionadas, podem ser adequadas e, por vezes, positivo e, no segundo, negativo, isto é, zero.
envolverem alto grau de conhecimento e so- Um caso específico ocorre no subteste de
fisticação. A adequabilidade ou correção de tais Vocabulário, quando o sujeito apresenta vários

PSICODIAGNÓSTICO – V 533
sinônimos, digamos que um é bom, outro, re- erros mais comuns na questão do escore dos
ferente a um uso secundário ou pouco comum itens: a) omissão ou erro no assinalamento do
do vocábulo ou, ainda, que seja vago e impre- escore correspondente, em testes executivos,
ciso e um que pode ser considerado como uma em que a correção e o tempo são critérios para
resposta errada. Neste caso, conduzimos o in- escore e bônus de tempo; b) indulgência ou
quérito, para verificar qual o sentido que a severidade na atribuição do escore; c) cálculo
palavra realmente tem para o sujeito. Às ve- incorreto do escore bruto ou erro por não con-
zes, é suficiente perguntar qual, dentre as vá- versão do escore bruto em ponderado. Enfim,
rias opções, a que o sujeito considera a mais erros de cálculo, no manejo das escalas, são
adequada, tentando ver as razões para tal es- apontados como surpreendentemente eleva-
colha. Se o sujeito consegue optar pela resposta dos.
correta e justifica a sua opção, utilizamos tal
explicação para fins de escore. Se o sujeito in-
siste em que o sinônimo adequado e o vago PROBLEMAS ESPECÍFICOS NA
podem ser usados como alternativas, todavia, ADMINISTRAÇÃO E ESCORE DOS
demonstrando compreensão, ainda concede- SUBTESTES*
mos o escore. Mas se insiste que tanto o si-
nônimo correto como a resposta obviamente in- Informação
correta podem ser usados como alternativas,
consideramos a resposta negativa, pois não de- Informação é bastante satisfatório como sub-
monstrou conhecer a significação da palavra. teste introdutório, porque não contém aspec-
Já nas provas com limite de tempo, parece tos por demais ansiogênicos ou ameaçadores.
ser possível aceitar correções, desde que não Assim, mesmo quando se costuma intercalar
ultrapassem o tempo previsto. Assim, no caso subtestes da escala verbal e de execução, esta
de uma resposta imediata, mas hesitante, ou tarefa, como inicial, parece muito aceitável tan-
obviamente impulsiva, costumamos perguntar to para adultos, como para crianças. Porém,
ao sujeito se está seguro de que esta é a res- certo grau de reserva, falta de espontaneidade
posta e alertar que há tempo disponível. Fre- ou, até mesmo, certa apreensão, constituem
qüentemente, isso ocorre por influência de modos adaptativos frente a uma situação des-
ansiedade, exatamente na primeira prova em conhecida. Entretanto, geralmente tais atitu-
que se começa a marcar o tempo. Uma obser- des não chegam a prejudicar a produtividade.
vação deste tipo, feita em tom casual, por ve- Sinais mais acentuados de timidez, ansiedade
zes leva o sujeito a se recuperar de uma inefici- ou de algum outro comportamento em desa-
ência temporária. cordo com a expectativa devem ser observa-
Como já referimos, muitas vezes parece dos (Glasser & Zimmerman, 1972).
importante que o sujeito complete a tarefa em Os primeiros itens são cruciais para indiví-
que se empenha, apesar de ultrapassar o tem- duos com limitações mais severas, tanto que,
po limite, no caso, por exemplo, de Cubos ou em caso de fracasso completo, é importante
de Armar Objetos. Isso nos permite avaliar se considerar a conveniência de interromper a
o sujeito tem um desempenho eficaz, embora prova, substituindo-a por uma mais discrimi-
lento. Todavia, deve-se ter o máximo cuidado nativa nos níveis mais baixos. As escalas We-
de registrar o que o sujeito conseguiu realizar chsler atualmente cobrem praticamente todas
até o limite do tempo; por exemplo, quais as as faixas etárias em que o sujeito é testável, a
peças do objeto que conseguiu juntar, para que não ser em idades muito precoces. De forma
o escore se baseie exclusivamente em tal de- que, eventualmente, se pode utilizar o mesmo
sempenho.
Quanto ao escore, em geral, as informações
dos manuais são bastante claras. Entretanto, *Subtestes específicos do WISC-III e do WAIS-III são in-
é bom recapitular, com Groth-Marnat (1999), cluídos noutros capítulos.

534 JUREMA ALCIDES CUNHA


subteste, mas de outra escala menos exigente tas e, principalmente, com adolescentes que
e, se necessário, recorrer a equivalentes de ida- ainda não elaboraram seus problemas frente a
de escalar, para avaliação da capacidade. figuras de autoridade, bem como frente a seus
Naturalmente, ante hesitações, respostas substitutos simbólicos. E justamente pelo fato
incompletas ou pouco claras, o examinando de o subteste poder ser mobilizador de com-
deve ser estimulado ou interrogado a respei- ponentes emocionais, é de particular importân-
to. A pergunta pode ser repetida, se necessá- cia o registro textual das respostas.
rio, mas não alterada em sua formulação es- Conforme Zimmerman e colegas (1976), a
sencial. Não obstante, modificações mínimas, causa de grande parte das dificuldades que
que não mudem o estilo, podem ser introduzi- ocorrem neste subteste está “na aceitação, por
das, especialmente com crianças. parte do examinador, de respostas vagas ou
As correções ou reformulações das respos- incompletas” (p.89). Conseqüentemente, tor-
tas podem ser aceitas e consideradas no esco- na-se importante a realização de um inquéri-
re, mas não se ocorrem numa segunda sessão to, em que se solicite ao sujeito que explique
de testagem. Desta maneira, se o sujeito diz um pouco mais ou diga mais alguma coisa,
que não lembra no momento, após ser-lhe mesmo ante respostas que parecem conven-
dado o tempo necessário, é melhor não insis- cionais, estereotipadas ou “superaprendidas”,
tir, mas a resposta pode ser considerada, se a já que o sujeito pode repetir normas socialmen-
lembrar durante a mesma sessão de testagem, te aprendidas sem as compreender, ou apre-
o que raramente acontece. Porém, se o sujeito sentar, de forma subjacente, pensamentos ex-
hesita, pode-se sugerir-lhe que tente um pal- travagantes. Esses autores dão um exemplo de
pite sobre a resposta, especialmente no caso uma menina que, ao item Más companhias,
de a mesma ter implicações numéricas. Por respondeu: “Má fluência. Má fluência” (p.89).
outro lado, ante uma resposta aparentemente É que não conhecia nem a palavra correta “in-
absurda, como “A capital da Itália é a Espa- fluência”, nem suas implicações.
nha”, convém investigar cuidadosamente se se Glasser e Zimmerman (1972) sugerem gran-
trata de um lapso, uma resposta impulsiva de de flexibilidade no manejo dos itens, inclusive
uma pessoa limitada cultural e intelectualmen- a necessidade de reformular a pergunta, com
te ou se é o caso de uma desorganização da base em itens específicos ou na resposta dada,
memória (Zimmerman, Woo-Sam & Glasser, para que a criança entenda o conceito implíci-
1976; Rapaport et alii, 1965, p.57). to no vocábulo utilizado em alguns itens.
Determinados fracassos ou respostas errô- Outro aspecto que justifica o estímulo para
neas parecem ser bastante discrepantes em falar mais e que os autores citados conside-
relação ao nível de instrução do sujeito. Se exis- ram uma desvantagem do subteste é a neces-
te qualquer suspeita ou notícia de comprome- sidade de respostas múltiplas, em alguns itens,
timento cerebral do sujeito, Lezak (1995) su- que pode ser desfavorável para a criança que
gere que se pergunte se alguma vez sabia a se esforça por dar uma resposta única (no seu
resposta que, agora, não recorda. Acha que entender, a melhor) e para a criança que, não
este recurso oferece dados sobre o compro- sendo compulsiva, “acha (não sem razão) que
metimento do sujeito, bem como de sua rea- uma resposta é suficiente” (p.53). Aliás, isto
ção emocional ao mesmo. também pode ser observado em adultos, in-
clusive com tendências compulsivas, mas cuja
compulsão se caracteriza por ambição de qua-
Compreensão lidade.
Entretanto, embora achemos que o inqué-
O subteste de Compreensão envolve uma mu- rito é fundamental, não deixamos de observar
dança brusca em termos das exigências colo- que tal inquérito deve ser feito com cuidado.
cadas, especialmente com sujeitos que tendem Os autores citados, por exemplo, notam que
a adotar atitudes contestatórias e oposicionis- crianças criativas podem ser prejudicadas, neste

PSICODIAGNÓSTICO – V 535
subteste, por procurarem dar soluções inusi- estamos lhe dando uma oportunidade para
tadas aos problemas. O inquérito não deve in- chegar à resposta correta, se usa princípios ló-
duzir o sujeito a tal atitude. Neste subteste, o gicos, resposta esta que será considerada, se
inquérito visa primordialmente a verificar o for dada dentro do tempo limite. Se a resposta
grau de compreensão, tentando deslindar o certa ocorre após esse tempo, o escore é zero,
raciocínio subjacente à resposta. sugerindo apenas um indício qualitativo.
A distratibilidade freqüentemente afeta os
escores, em conseqüência da ansiedade. Por-
Aritmética tanto, a presença de indícios a este respeito,
no comportamento do sujeito, deve ser obser-
Este é o subteste mais semelhante à experiên- vada e anotada, pois poderá ser de ajuda na
cia com atividades escolares que o sujeito tem interpretação de flutuações de escore. Por ou-
ou teve. Por um lado, este fato pode influir tro lado, as respostas obviamente estranhas
desfavoravelmente, no caso de o indivíduo ter podem eventualmente ocorrer nos itens mais
alguma atitude negativa ou insegurança, por difíceis, tornando o subteste “uma medida de
fracassos na área escolar ou, ainda, por julgar processos de pensamento desviantes” (Glasser
que sua aptidão para a matemática é escassa. & Zimmerman, 1972, p.5).
Por outro lado, especialmente em crianças e
adolescentes, permite levantar indícios sobre
atitudes a respeito da aprendizagem, aprovei- Semelhanças
tamento escolar e sobre sucessos e fracassos
na área escolar. A administração de Semelhanças geralmente
Exatamente por causa da atitude que os não envolve problemas maiores, mas apenas
sujeitos possam ter sobre a sua capacidade para algumas dificuldades específicas. Estas ocorrem
resolver problemas aritméticos, nas escalas quando o sujeito diz que não existem seme-
para adultos, não se menciona a natureza da lhanças ou começa a assinalar diferenças. Vá-
tarefa ao introduzi-la. rios autores sugerem diferentes recursos para
Outro aspecto que deve ser observado é que se maneje a situação. Tais dificuldades ocor-
que, dentro da escala, Aritmética é o primeiro rem especialmente no WISC e no WAIS, em que
subteste em que o cronômetro é utilizado. As- não havia instruções especiais a respeito. Logi-
sim, eventualmente, o sujeito dá uma respos- camente, tais dificuldades passaram a ser con-
ta errada, de forma insegura, bem antes do sideradas no desenvolvimento das escalas. No
tempo limite. Neste caso, costumamos pergun- WAIS-R, por exemplo, se no item Laranja-ba-
tar ao sujeito se está certo de sua resposta ou nana o sujeito dá uma resposta de nível 1, como
se quer pensar um pouco mais, pois ainda dis- “Você come as duas”, o examinador deve di-
põe de tempo. Pretendemos, pois, que o sujei- zer: “Está certo, você come as duas. Também,
to entenda que não deve ser apenas rápido, ambas são frutas” (Wechsler, 1981a, p.86).
mas também eficiente. Igualmente, os dois tipos de resposta são apre-
Rapaport e colegas (1969), ante um fracas- sentados, se o sujeito fracassa ou dá uma res-
so, consideravam importante determinar o tipo posta errada. Nos itens subseqüentes não se
de raciocínio implícito, já que o pensamento dá qualquer ajuda.
pode ser lógico, mas haver erro de cálculo. Na Zimmerman e colegas (1976) apresentam
realidade, muitas vezes a própria resposta ofe- uma dificuldade extra. Trata-se do caso em que
rece indícios neste sentido. Portanto, aconse- o sujeito responde corretamente o item Laran-
lhamos registrá-la, em vez de simplesmente ja-banana e, ao lhe ser apresentado o item se-
classificá-la como certa ou errada. Por outro guinte, diz: “O mesmo que nas frutas”. Segun-
lado, quando estimulamos o sujeito a pensar, do esses autores, essa resposta deve ter um
sem lhe dizer que a resposta está certa ou er- escore zero, mas, se o sujeito acrescentar
rada, mas sugerindo apenas que tem tempo, “...ambos servem para vestir”, deve-se dar dois

536 JUREMA ALCIDES CUNHA


pontos (p.116). Sob o nosso ponto de vista, com dados de 2.200 sujeitos, que faziam par-
esta é uma situação em que o inquérito se faz te da amostra de padronização do WISC-R, com
necessário, para que o sujeito explique melhor uma abordagem metodológica mais adequa-
o que quer dizer com “o mesmo que nas fru- da, chegando à conclusão, face às escassas di-
tas”, antes de decidir qual o escore que deve ferenças encontradas, que o psicólogo pode-
ser atribuído. Aliás, parece imprescindível que ria decidir pelo procedimento que julgasse mais
o examinador esteja completamente familia- conveniente.
rizado com exemplos de respostas, que cor- Também convém lembrar que os dígitos,
respondem a diferentes graus de abstração, seja em que ordem for, devem ser apresenta-
para que possa conduzir bem o inquérito. dos com o intervalo de um segundo, evitando-
Convém lembrar ainda que às vezes uma res- se qualquer alteração do ritmo. Rapaport e
posta correta fica comprometida por serem colegas (1969) chegam a recomendar que, se
introduzidas idéias aparentemente extrava- eventualmente o examinador alterou inadver-
gantes ou ilógicas. Então, a não ser que o tidamente o ritmo (fato que pode perturbar
inquérito possa demonstrar a presença de sujeitos ansiosos e inseguros), deve apresen-
vinculações lógicas, o escore a ser atribuído tar uma outra série equivalente, no caso de os
é zero (Zimmerman, Woo-Sam & Glasser, resultados terem sido comprometidos. De nos-
1976). sa parte, achamos que o psicólogo deve se pre-
parar suficientemente, para que nem eventual-
mente ocorra tal problema de modificação de
Dígitos ou Números ritmo. Sob o nosso ponto de vista, esse proce-
dimento de apresentação de uma série equi-
Uma vez que dígitos se referem a algarismos valente só poderia ser utilizado excepcional-
arábicos de 0 a 9, por motivos óbvios prefe- mente, se ocorresse um ruído súbito e alto ou
rimos manter a designação usada por We- se alguém inadvertidamente batesse na porta,
chsler para o subteste, e não a designação quando poderia haver uma interferência na
Números, utilizada na tradução brasileira do audição ou na atenção.
WISC. Outra exceção parece ser o caso quando o
O subteste de Dígitos compõe a escala ver- sujeito fracassa nas duas tentativas de uma
bal no WAIS e no WAIS-R. No WISC, é um sub- série curta, quando se deveria dar outra da
teste suplementar que, na prática, muitas ve- mesma extensão, para “distinguir entre dete-
zes é usado como alternativo. No WISC-R, e rioração e grande diminuição de atenção, as-
também no WISC-III, é um subteste suplemen- sociada com ansiedade” (Rapaport et alii, 1969,
tar, que deve ser utilizado quando houver dis- p.58). Achamos que isso pode ser feito com
ponibilidade, mas rotineiramente não é con- interesse clínico, mas sem utilizar o eventual
siderado para o cômputo do QI. Quando apli- sucesso para fins de escore.
cado como subteste subsidiário, Dígitos pro- Durante a administração de Dígitos em
porciona informações importantes e pode ser qualquer das escalas, parece importante ob-
incluído no cômputo do QI no WISC, mas não servar se o sujeito utiliza algum tipo de méto-
no WISC-R. Como alternativo, é incluído na do para memorização, como repetir os dígitos
contagem em ambos os casos. Não obstante, em voz baixa, tentar reter imagens visuais, pro-
têm havido pesquisas para examinar a adequa- curar agrupá-los ou transformá-los em totais.
bilidade de aplicar rotineiramente Dígitos, Também é recomendável registrar as des-
como subteste subsidiário no WISC-R, utilizan- culpas que o sujeito apresenta em relação aos
do a transformação proporcional da contagem seus fracassos, verificando quando existe pelo
ponderada. Boyd e Hooper (1987) considera- menos um esforço em direção ao êxito (Rapa-
ram válido esse procedimento. Silverstein port et alii, 1969), quando projeta a culpa no
(1989), observando que esses autores utiliza- examinador ou quando há evidência de déficit
ram uma amostra atípica, replicou o estudo auditivo.

PSICODIAGNÓSTICO – V 537
Vocabulário cure a definição do vocábulo em dicionários
usuais, para verificar a adequabilidade de uma
Vocabulário, geralmente, não apresenta difi- determinada acepção, e, em seguida, que se
culdades maiores em sua aplicação, pois é bem determine o escore, a partir dos critérios cons-
aceito pela maioria dos sujeitos. Se o examina- tantes nos manuais.
dor está bem familiarizado com o sistema de
escore, também não terá dúvidas para decidir
se deve estimular o examinando ou não. Não Código e Casa de Animais
obstante, há alguns aspectos para os quais é
necessário chamar a atenção. É importante que, antes de dar as instruções,
Quando administramos o subteste a sujei- o psicólogo se informe se o sujeito é destro ou
tos inteligentes, às vezes são dadas respostas não. Se o sujeito é canhoto, geralmente cobre
por demais casuais para os itens fáceis. Zim- a chave com a mão, ao copiar os símbolos, e é,
merman e colegas (1976) acham que se deve então, necessário colocar uma segunda folha
explorar respostas lacônicas, mesmo que me- de registro, dobrada, à sua frente, de maneira
reçam escore 2, solicitando explicação mais que uma chave de código extra fique bem visí-
ampla. Por vezes, o que se observa é uma preo- vel. Nas escalas WISC-R mais recentes, as ins-
cupação de que a resposta constitua um sinô- truções prevêem que tal folha seja colocada
nimo perfeito. A solicitação de uma resposta quando, ao iniciar a tarefa, se observar que o
mais ampla não só permitirá verificar se a sig- sujeito está cobrindo o código com a mão.
nificação atribuída é realmente adequada, O subteste não apresenta muitas exigências
como facilitará a resposta do sujeito a itens que para o examinador, exceto no caso de Casa de
não podem ser respondidos com simples sinô- Animais, em que as instruções devem ser se-
nimos. guidas muito cuidadosamente, devendo-se
Muitas vezes, apresentam-se dúvidas e va- anotar, além do tempo, erros e omissões. Nas
cilações através das respostas: “Não sei” ou “Sei demais escalas, os erros e as omissões ficam
o que quer dizer, mas não sei explicar”. Nestes registrados, e o examinador, além do tempo,
casos, o sujeito deve ser estimulado a falar, no deve apenas observar comportamentos espe-
primeiro caso, sugerindo-se que adivinhe, ou, ciais. No entanto, se essas falhas ocorrerem du-
no segundo caso, que procure usar a palavra rante o exercício prévio, devem ser corrigidas
numa frase e, depois, tente defini-la. Rapaport imediatamente, revisando-se o uso do código.
e colegas (1969) observam que a vacilação Estando este bem compreendido, prossegue-
pode ser devida apenas ao temor do fracasso se com o teste, marcando o tempo, exceto que,
ou a uma ineficiência temporária, e a adivinha- no primeiro caso de omissão de um item, deve-
ção não pode resultar numa resposta correta. se dizer que “não pule” nenhum e siga em or-
Por outro lado, a insegurança pode “encobrir dem.
associações extravagantes” (p.141). Às vezes se observa um tipo especial de erro,
Quando a resposta parece não se relacio- em que o sujeito copia corretamente certo
nar com o item proposto, pode ser que o sujei- número de símbolos e, então, deixa um espa-
to haja entendido uma palavra diferente, ou ço vazio e registra, no espaço seguinte, o sím-
pode-se tratar de uma resposta arbitrária, que bolo que corresponderia ao espaço omitido,
pode constituir um indício de patologia. continuando, depois, normalmente, para, em
Em geral, os exemplos e os critérios de es- seguida, persistir com o mesmo procedimen-
core dos manuais são suficientes para avaliar to, mesmo que advertido após a primeira omis-
as respostas e atribuir o escore. Eventualmen- são. Essa recusa tácita de seguir instruções
te, o sujeito dá uma definição que não parece não impede que se atribua escore aos acer-
arbitrária, mas que não consta nos manuais, tos, mas é importante tomar anotações a
ou, ainda, utiliza o termo numa acepção re- respeito da conduta do sujeito, como vere-
gional. Neste caso, recomendamos que se pro- mos mais tarde.

538 JUREMA ALCIDES CUNHA


Os sujeitos que apresentam dificuldades te de tempo, por item. Envolve uma tarefa ge-
especiais costumam ser os que têm pouca ex- ralmente bem aceita pela maioria dos sujeitos.
periência com lápis e papel, os que têm defi- As instruções, em todas as escalas, exceto
ciências de aprendizagem, de visão e de motri- no WPPSI, são claras para o caso em que o su-
cidade, bem como aqueles com pouca motiva- jeito dá, como resposta, uma parte não essen-
ção (Zimmerman, Woo-Sam & Glasser, 1976). cial, quando é lícito dizer: “Sim, mas qual a
Naturalmente, o examinador deve estar aten- parte mais importante que está faltando?”
to para qualquer indício sugestivo dessas difi- Porém, há uma situação prevista apenas no
culdades que possa auxiliar na interpretação. WPPSI e no WISC-R, que ocorre freqüentemente
Há sujeitos que, a partir dos primeiros en- com crianças pequenas, na qual acreditamos
saios, aprendem a consultar o código, cada vez que, mesmo no WISC, se possam adotar as ins-
com mais facilidade, buscando o lugar correto truções propostas naquelas escalas. Ocorre
para encontrar o símbolo que procuram, en- quando a criança simplesmente denomina o
quanto outros não demonstram qualquer pro- objeto da figura, quando parece lícito dizer:
gresso na aprendizagem. Deve-se observar, “Sim, mas o que é que está faltando?” Há ain-
também, se, após consultar o código, copiam da outro caso, também previsto no WPPSI e
o símbolo em seguida ou apresentam um com- no WISC-R, que é comum entre crianças, mas
portamento de verificação permanente, de- também acontece entre adultos, e é quando o
monstrando vacilação, ansiedade e dúvida (Ra- sujeito menciona algo que não está no cartão
paport et alii, 1969). Como o subteste é muito (como o “Remador”, no “Barco”, do WAIS, ou
vulnerável à ansiedade, mas também ocorrem o “Homem”, no “Casaco”, do WISC). De acor-
escores baixos por outras causas, tal compor- do com as instruções daquelas escalas, seria
tamento do sujeito é sobremodo importante. permissível dizer: “Está faltando uma parte na
Por vezes, o sujeito trabalha lentamente. figura (ou no cartão). O que é que está faltan-
Isso pode acontecer por uma exigência de qua- do?” De nossa parte, costumamos dizer: “Diga-
lidade na representação do símbolo, revelan- me o que está faltando no que está desenha-
do uma tendência perfeccionista (Glasser & do”. Acontece que, eventualmente, o sujeito
Zimmerman, 1972), por dificuldade de se de- continua a insistir que a figura não está com-
cidir ou por lentidão motora (Rapaport et alii, pleta ou que, no cartão, faltam as partes alu-
1965). Também ocorre por dificuldades de coor- didas. Ao falar no que está desenhado, fica
denação visomanual ou por mau controle do pressuposto que pode não estar desenhado
lápis. Se já na cópia dos exemplos se identifica tudo o que a criança tem em mente, mas que
uma atitude perfeccionista, é importante refe- deve atentar apenas para o que foi desenha-
rir que “não é necessário, nem essencial, dese- do. A observação pode ser feita apenas duas
nhar corretamente” (Zimmerman, Woo-Sam & vezes no WPPSI. Acreditamos que possa ser
Glasser, 1976, p.157). feita, mas uma única vez, nas outras escalas.
Observam-se ainda distorção, simplificação, Todas essas particularidades no comporta-
desconsideração ou inversão dos símbolos, di- mento do sujeito devem ser anotadas, porque,
ficuldades de concentração, irritação com a se continuam ocorrendo, especialmente após
monotonia da tarefa, bem como outras carac- ser feita a observação de praxe, têm significa-
terísticas individuais, na maneira de realizar o ção clínica. Da mesma forma, convém anotar
subteste, que devem ser cuidadosamente re- as respostas do sujeito, especialmente se in-
gistradas, para consideração posterior. corretas ou não coincidentes com as comumen-
te esperadas. Outras particularidades também
devem ser registradas, como as respostas “Não
Completar Figuras sei” (quando convém insistir, se está dentro do
tempo limite) e “Nada está faltando”.
Trata-se de um subteste constante em todas Ainda que se peça uma resposta verbal,
as escalas Wechsler, variando os itens e o limi- aceita-se, quando o sujeito apenas mostra cor-

PSICODIAGNÓSTICO – V 539
retamente o que está omitido na figura. Toda- queça de dizer ao examinador” (Wechsler,
via, isso só é admitido se o examinador está 1981a, p.68).
certo de que o sujeito está apontando realmen- Parece que, se o examinador tem bem pre-
te para a parte que falta. sentes os aspectos envolvidos, se torna relati-
O fato de se aceitar a resposta não-verbal vamente fácil observar e, conseqüentemente,
apenas faz com que alguns examinadores ten- anotar o que pode ser significativo. Aliás, o
dam a ser generosos, quando, por exemplo, a primeiro ponto a ser observado é como o su-
criança aponta corretamente e diz: “Falta uma jeito ordena sua seqüência. Na grande maioria
coisinha”. Esta resposta não é admissível. É cla- dos casos, a ordenação é da esquerda para a
ro que, às vezes, a criança não sabe o nome direita. Ocasionalmente, encontramos crianças
exato do que falta. No WISC, fica claro que se que seguem a ordem inversa. Se, na colocação
pode aceitar um sinônimo, o WPPSI especifica das figuras, o sujeito parece começar pela di-
um sinônimo próximo, e o WISC-R aceita tan- reita, pergunta-se: “Onde começa a sua histó-
to um sinônimo como uma explicação com as ria?” Se a seqüência está correta, o item é con-
próprias palavras da criança. No WAIS-R, não siderado. Especialmente em avaliações neurop-
há exigência do nome exato, mas a parte cor- sicológicas, algum paciente pode ordenar suas
reta deve ser adequadamente descrita. Toda- figuras verticalmente. Não o corrija, porque
via, em caso de dúvida, sempre convém solici- pode se tratar de uma estratégia para evitar
tar que o sujeito mostre o lugar onde está fal- erros por dificuldade de atenção relativa a um
tando alguma coisa. Mesmo assim, se a indi- lado do espaço.
cação está correta mas a resposta verbal é in- Alguns examinadores solicitam sempre a
dubitavelmente incorreta, o escore é zero. É verbalização da história correspondente. Ou-
preciso que “o examinador esteja razoavelmen- tros o fazem apenas em face de um desempe-
te seguro de que a resposta verbal seja corre- nho incorreto ou falho (Glasser & Zimmerman,
ta, antes de atribuir-lhe crédito” (Wechsler, 1972; Rapaport et alii, 1965). A não ser em caso
1981a, p.46). de desempenho incorreto, costumamos soli-
citar a verbalização de uma história, mesmo
antes de uma seqüência incorreta, quando a
Arranjo de Figuras história da série anterior pareceu confusa, es-
tranha, extravagante ou, de alguma forma,
Arranjo de Figuras é um subteste em que o significativa. Também solicitamos a verbali-
sujeito, distribuindo figuras em seqüência, zação de todas as histórias quando parece
constrói historietas e, ao fazê-lo, demonstra importante avaliar os aspectos cognitivos do
compreensão de situações que envolvem in- sujeito, ou este, espontaneamente, dispõe-
ter-relações sociais, comuns na cultura atual. se a contá-las.
O sujeito precisa ter uma percepção visual das Como exame dos limites, Glasser e Zimmer-
figuras, antecipar seu seguimento e organizá- man (1972) sugerem a investigação da com-
las, usando relações de causa e efeito. Con- preensão latente, por meio de perguntas sobre
vém não esquecer as instruções para que o aspectos específicos da história. Também su-
sujeito avise quando considera a tarefa termi- gerem que se ordene a seqüência correta para
nada. Observamos muitos casos em que a or- a criança, se misturem imediatamente as figu-
denação está correta, e o sujeito a desmancha ras e se solicite que a reproduza. Já Zimmer-
e dá outra seqüência às figuras. É importante man e colegas (1976) recomendam que, ante
observar, porém, que, no WAIS-R, a recomen- um fracasso, se dê alguma pista ao sujeito,
dação para que o sujeito avise, quando ter- como, no item 8 do WAIS, dizer: “O homem
minar, é feita apenas no item 2. Entretanto, leva um manequim” ou “É a mesma pessoa em
do item 2 ao 10, o examinador deve parar o todos os desenhos”, para, a seguir, se solicitar
cronômetro, quando considera óbvio que a que apresente outra história, porque, então,
tarefa está pronta, mesmo que o sujeito “es- se pode ter “uma informação valiosa acerca de

540 JUREMA ALCIDES CUNHA


sua rigidez e enfoque da realidade, no exa- Cubos
me” (p.198). Outro recurso seria o de mos-
trar qual a primeira figura da série e “fazer Cubos envolve uma tarefa geralmente bem
com que o sujeito realize as antecipações cor- aceita por crianças e por adultos, embora es-
respondentes” (Rapaport et alii, 1965). De tes eventualmente a considerem como algo
nossa parte, acreditamos que tais recursos infantil. Zimmerman e colegas (1976) sugerem
devem ser utilizados estritamente nos casos que, conforme o tipo do sujeito, convém dizer
em que pareça importante avaliar um acen- que a prova se relaciona com “habilidades para
tuado prejuízo cognitivo ou outra probabili- a construção” (p.182), para torná-la mais acei-
dade de patologia grave e não, indiferente- tável.
mente, porque possibilitam um treinamento Em relação à construção do modelo e à
e comprometem eventuais retestes. Entretan- apresentação do desenho, há nos manuais uma
to, se imprescindíveis, devem ser usados ape- série de instruções, que devem ser seguidas à
nas após a testagem padronizada de todo o risca. Em geral, chamam especial atenção para
subteste. o cuidado que o examinador deve ter no senti-
Naturalmente, ter-se-ia provavelmente uma do da orientação correta tanto do modelo com
boa compreensão sobre as antecipações do cubos, como do bloco de desenhos impressos.
sujeito se fosse possível anotar toda movimen- No WAIS-R, há uma recomendação que, ao
tação das figuras, em suas tentativas de en- nosso ver, deve ser seguida nas demais esca-
saio e erro. Trata-se, porém, de um recurso las. Se o sujeito é destro, o modelo deve ser
bastante exaustivo para o examinador e nem colocado um pouco à sua esquerda e, se o su-
sempre compensador; pois, se o sujeito se dá jeito é canhoto, um pouco à direita, devendo-
conta de que estamos fiscalizando todos os se observar se ele se encontra sentado correta-
seus movimentos, isto pode ser bastante ansi- mente, em relação à borda da mesa.
ogênico. A definição de fracasso pode ser considera-
Embora não pareça ser o caso de anotar da idêntica para todas as escalas. Existe fra-
todas as movimentações das figuras, é reco- casso quando a reprodução do sujeito não é
mendável observar se o sujeito se limita a tro- igual ao modelo ou quando não foi completa-
car uma única figura, se persevera nos mes- da dentro do tempo limite.
mos movimentos ou, ainda, se, em vez de pro- Quanto à rotação, geralmente os manuais
curar ordenar as figuras, procura simplesmen- não são muito claros. O WISC inclui uma nota
te unir os bordos das mesmas. Estes compor- de rodapé sobre inversão do desenho, cujo
tamentos têm implicações clínicas que exami- exemplo envolve uma inversão de cores. Deve-
naremos mais adiante. se, então, chamar a atenção da criança, fazen-
Como a presença de problemas de visão do a rotação dos cubos, para que fiquem iguais
pode causar dificuldade no desempenho, con- ao modelo. A palavra rotação não aparece mais
vém observar e anotar qualquer particularida- no restante das instruções, e o escore é atri-
de que levante suspeitas nesse sentido. buído ao desenho realizado com êxito (Wechs-
Finalmente, recomendamos anotar sempre ler, 1949). No WPPSI, são aceitas rotações nos
a seqüência dada como resposta e não sim- desenhos de 1 a 4, que não são contadas como
plesmente considerá-la como certa ou errada, erros, mas corrigidas; contudo, são considera-
comparando-a com a ordem das figuras, im- das como fracassos nos desenhos de 5 a 10.
pressa na folha de respostas. Isto permitirá Entretanto, uma restrição é imposta: “Rotação
comparar melhor com as histórias contadas, não inclui a inversão de cores” (Wechsler, 1967,
se for o caso, ou avaliar melhor os erros come- p.74). Afinal, é possível perguntar: “O que é
tidos. rotação?” Alguns manuais resolvem essa dúvi-
Quanto ao escore, basta apenas seguir as da, ao esclarecer que somente quando chega
instruções, uma vez que não apresenta maio- a aproximadamente 30 graus ou mais a rota-
res dificuldades. ção será considerada um fracasso (Wechsler,

PSICODIAGNÓSTICO – V 541
Modelo 1a cópia 2a cópia

Porém, o procedimento, sugerido no WAIS-


R NI, é bem mais complexo e permite identifi-
car: “a) a seqüência da colocação dos cubos”
(que se anota no canto superior esquerdo da
representação do cubo); “b) o tipo de superfí-
cie do cubo” (um pequeno círculo = superfície
toda branca; um ponto = superfície toda ver-
Fonte: Wechsler, 1981a, p.52. melha; pequeno círculo e ponto, separados por
Figura 36.1 Exemplos de rotação em Cubos no WISC-R. diagonal = superfície metade vermelha e me-
tade branca); e “c) a maneira de colocação dos
cubos” (indicando rotações através de setas)
(p.141-142).
1981a; Wechsler, 1981b), dando exemplos bas- No caso, o exemplo da primeira cópia do
tante ilustrativos. modelo supramencionado ficaria representa-
Portanto, a partir de tais exemplos, temos do assim, indicando a ordem de colocação e a
a resposta do que constitui uma rotação do rotação observada, o que pode ser feito atra-
desvio que deve haver, em relação à perpendi- vés de várias representações, para acompanhar
cular, para ser considerada como tal, e tam- o raciocínio do sujeito, ao manusear os cubos,
bém concluímos que a inversão de cores, quan- registrando suas estratégias (de ensaio e erro,
do envolve rotação do desenho, deve ser con- de análise e síntese, de insight), bem como os
siderada rotação. Quanto aos itens do subtes- tipos de erros no desenvolvimento da tarefa e
te em que pode ser tolerada, como do 1 ao 4, soluções finais incorretas ou mesmo bizar-
no WPPSI, corrigida ou considerada como erro, ras, como na perda da configuração quadran-
é só seguir o manual e anotar a presença de gular.
erro ou não. Desta maneira, é possível registrar erros e
Quanto aos demais erros, recomenda-se correções, anotando todos os movimentos do
que sejam registrados, assim como certos com- examinando. Ao registrar todos os tipos de erro
portamentos inusitados, como a tentativa de de construção, pode-se identificar déficits, que
copiar as faces laterais, além da parte de cima
dos modelos, ou a tentativa de copiar os dese-
nhos na posição vertical.
No WAIS-R NI (Kaplan, Fein, Morris et alii,
1991), é indicado um procedimento que per-
mite representar graficamente o curso da cons-
trução do sujeito. Evidentemente que o proto-
colo utilizado pode ser substituído por folhas
com quadriculado grande, ou, ainda, o exami-
nador pode confeccionar folhas de registro.
Já havíamos, em edição anterior, sugerido
algo semelhante, como no modelo hipotético
a seguir, em que b = branco e v = vermelho.

542 JUREMA ALCIDES CUNHA


podem refletir o papel desempenhado por um cos ou vermelhos onde deveria ser usado um
ou outro hemisfério cerebral. Assim, quando bicolor, ou para a confusão com a direção cor-
há suspeita ou conhecimento de algum com- reta das diagonais, buscando outro cubo bico-
prometimento cerebral, é sumamente impor- lor, em vez do que tem na mão, ou, ainda, cons-
tante ter um registro completo do desempe- truindo o desenho com menos cubos que os
nho do paciente. disponíveis, para a falta de atenção ou minu-
Já em 1965, Elizur chamava a atenção para ciosidade excessiva, etc.
alguns fracassos típicos de pacientes com dé- Parece importante, em alguns casos, quan-
ficits cerebrais, como nos exemplos a seguir. do o sujeito não consegue iniciar ou comple-
tar o desenho, considerar como fracasso e, após
completar a prova, fazer a demonstração do
modelo com cubos, desmanchar o modelo e
propor-lhe que tente, copiando o modelo im-
presso. Esse procedimento permitirá avaliar a
capacidade que o sujeito tem de aprender, pa-
recendo também poder ser usado quando o
sujeito usou algum tipo de solução em que o
processo do pensamento subjacente não ficou
claro para nós, para determinar o grau de de-
sorganização ou a medida em que o sujeito
necessita que o problema seja oferecido em
termos mais concretos.
Alguns autores sugerem vários tipos de aju-
da, para melhor avaliar as condições do sujei-
to, inclusive, logo após o item em que o sujei-
to fracassou, como sugerem, por exemplo, Alli-
son e colegas (1988). Acreditamos, porém, que
procedimentos que sugerem qual o erro feito
ou ainda como usar os cubos, para conseguir
determinadas configurações, mesmo que não
sejam empregados no decorrer do subteste,
poderão afetar o desempenho em retestes fu-
O manuseio que o sujeito faz com os cubos turos e, de preferência, não devem ser utili-
também pode ser importante. Glasser e Zim- zados.
merman (1972) referem que parece ser dife- Em relação ao escore, não parece haver
rente, se os movimentos são organizados; se o maiores dificuldades. Quando o sujeito tenta
sujeito manuseia os cubos desajeitadamente e várias vezes e desiste, mas ainda está dentro
se atrapalha, quando o desenho está quase do tempo limite, costumamos avisá-lo que ain-
completo; se dá voltas ou gira incessantemen- da tem tempo disponível e estimulá-lo a ten-
te os cubos, particularmente quando os gira, tar achar a solução correta, considerando o
ao mesmo tempo, um em cada mão; preocu- desempenho como sucesso, se consegue fazê-
pa-se com detalhes insignificantes, como dife- lo dentro do tempo limite. Por outro lado, no
renças mínimas de cor; deixa de conferir a có- WISC-R e no WAIS-R, há uma observação de
pia com o modelo ou se mostra alguma forma que o examinador deve parar o cronômetro,
de construção descuidada. após os modelos iniciais, quando a criança
Rapaport e colegas (1969) citam alguns obviamente terminou sua cópia, mesmo que
desses comportamentos e chamam a atenção não avise o examinador (Wechsler, 1981a; We-
também para a dificuldade de lidar com cubos chsler, 1981b). Achamos que tal procedimen-
com faces bicolores, para o uso de cubos bran- to deve ser usado em outras escalas, particu-

PSICODIAGNÓSTICO – V 543
larmente nos itens em que há bonificação pelo
tempo despendido. Apenas, cremos que nem
5
sempre se tem segurança completa de que o 1
4
6
sujeito haja realmente ficado satisfeito com sua 3
construção, embora obviamente tenha para-
do de manusear os cubos. Neste caso, parece 2
que devemos anotar o tempo, em vez de parar
o cronômetro, perguntando simplesmente se 7

está pronto o desenho.

Armar Objetos

Armar Objetos envolve uma tarefa bem aceita Fonte: Wechsler, 1955, p.53 (A numeração é nossa.)
por crianças e adultos, a qual, como Cubos, Figura 36.2 Peças do item “Mão” no WAIS.
implica a combinação de peças para formar um
conjunto, com duas diferenças: a) não envolve
cópia, e o objeto a ser construído deve ser de-
duzido, e b) representa um objeto simples, fa- Quanto à observação do comportamento
miliar, e não um desenho geométrico (Glasser do sujeito, Rapaport e colegas (1969) recomen-
& Zimmerman, 1972; Zimmerman, Woo-Sam dam que o examinador registre a sucessão de
& Glasser, 1976). todas as manipulações, em justaposições bem
As instruções dos manuais devem ser se- sucedidas ou não. Embora tal procedimento
guidas cuidadosamente. É muito importante pareça difícil, na prática, é possível, sendo um
que o examinador esteja bem treinado na dis- procedimento indicado no WAIS-R NI (Kaplan,
tribuição das peças, em termos de localização, Fein, Morris et alii, 1991). Evidentemente, com
orientação e da distância relativa entre as mes- o auxílio de um diagrama, a seqüência dos su-
mas. Muito cuidado é preciso ter no sentido cessivos ensaios pode ser registrada, com a
de observar se, no manuseio, o sujeito vira uma indicação das peças justapostas e sua respec-
das peças com a parte superior para baixo, caso tiva posição. Não obstante, em tal manuseio,
em que o examinador deve discretamente des- o que parece importante observar é se:
virá-la. Especialmente, no item “Mão” do WAIS, 1 – O sujeito parece claramente compreen-
tal cuidado deve ser redobrado, pois o fato de der as relações parte-todo, prosseguindo em
algumas peças (dedos) serem muito semelhan- movimentos organizados.
tes e não terem traços na superfície faz com 2 – O sujeito hesita, por longo tempo, de-
que, por vezes, se o sujeito vira um deles, ao monstrando falta de compreensão do que re-
manuseá-lo, sem que o examinador se dê con- presenta o todo.
ta, haja prejuízo para o examinando, que não 3 – O sujeito parece compreender do que
consegue justapô-la. Assim, na Figura 36.2, se trata, mas tem dificuldades para conseguir
entre as peças do item “Mão”, as de número 3 construir o todo. (Isto acontece muito comu-
e 6 são muito semelhantes em formato, de mente no item “Elefante”, em que o sujeito
modo que se o sujeito virar uma delas, isto pode conclui tratar-se de um elefante, mas não con-
passar facilmente despercebido pelo examina- segue encaixar determinadas partes para che-
dor. Uma solução seria a de numerar o verso gar a um todo integrado.)
das peças, num procedimento sugerido para 4 – O sujeito prossegue, por ensaio e erro,
facilitar o escore (Zimmerman, Woo-Sam & com altos e baixos, e só tardiamente, às vezes
Glasser, 1976) e que chamariam mais a aten- até após o tempo-limite, descobre do que se
ção do examinador, no caso de ser virada a trata. (Este procedimento é especialmente co-
parte posterior para cima. mum na “Mão”.)

544 JUREMA ALCIDES CUNHA


5 – O sujeito inicia a tarefa, aparentemente que se, mesmo atento, o examinador não con-
por ensaio e erro, e, de forma acidental, des- seguiu detectá-lo, pergunte ao sujeito, após ter-
cobre uma pista, um indício, que lhe permite minada a construção, a respeito de sua idéia
um insight e, então, trabalha organizadamen- inicial e de quando ou como chegou a ter a
te para atingir a síntese. idéia correta. Já no WAIS-R, pede-se ao sujeito
6 – O sujeito demonstra flexibilidade ou ri- que comunique ao examinador quando con-
gidez em seu manuseio e/ou persevera em jus- segue identificar e nomear o objeto (Kaplan,
tapor insistentemente a mesma peça numa Fein, Morris et alii, 1991).
localização incorreta. No subteste das escalas mais recentes, existe
7 – O sujeito insiste em unir peças com bor- a recomendação de que o examinador pare o
das curvas ou sinuosas com peças com bordas cronômetro no momento em que o sujeito haja
retas, sem ver que não encaixam (como, por obviamente terminado a sua construção, em-
exemplo, o bordo superior sinuoso da peça bora não comunique ao examinador (Wechs-
central do “Cavalo” com o bordo reto da peça ler, 1981a; Wechsler, 1981b). Entretanto, nem
traseira do mesmo). sempre o examinador pode estar completa-
8 – O sujeito consegue chegar a um todo, mente seguro de que o sujeito está completa-
mas troca certas peças, como as pernas do “Ca- mente satisfeito com o resultado. Isso é parti-
valo” ou “Manequim”. cularmente verdadeiro em casos em que se
9 – O sujeito consegue chegar a um todo, nota alguma pequena inversão de peças. Pare-
mas inverte certas peças, como a porta do “Car- ce, então, mais prudente anotar o tempo, sem
ro”. parar o cronômetro, perguntando, de forma
10 – O sujeito consegue chegar a um todo, casual, ao examinando se terminou.
mas omitindo uma parte, como a peça central Em relação ao escore, não há dificuldades
do “Cavalo”. maiores, exceto para soluções parciais ou in-
11 – O sujeito consegue chegar a um todo completas. Podem-se usar diagramas dos ob-
perfeitamente integrado, mas com uma rota- jetos também para este fim, colocando uma
ção de 90 graus. cruz nas junções bem sucedidas, caso não te-
12 – O sujeita tenta colocar as peças (espe- nha ainda sido utilizado o procedimento já pro-
cialmente da figura humana), em posição ver- posto, para acompanhar todo o processo.
tical, perpendicular à mesa. Da mesma forma que em Cubos, pode-se,
13 – O sujeito perturba-se, trabalha sem um após o sujeito ter terminado a tarefa, construir
planejamento ou desiste, manifestando senti- um ou outro objeto rapidamente, recolocan-
mentos de desânimo. do-os na posição original de apresentação, para
14 – O sujeito constrói figuras absurdas. avaliar a capacidade de aprender do sujeito.
15 – O sujeito tenta justapor as peças, orien- Alguns autores sugerem, inclusive, ajudas mais
tando-se por linhas internas do desenho, às extensivas, com as quais não concordamos por
expensas do formato global (Kaplan, Fein, achar que podem prejudicar o reteste. Seria
Morris et alii, 1991). então preferível, para testar os limites do su-
16 – O sujeito tenta justapor as peças, pro- jeito, utilizar material de outra escala.
curando o alinhamento das bordas (focalizan-
do o contorno) (Kaplan, Fein, Morris et alii,
1991). Labirintos
De um modo geral, esses são os procedi-
mentos, características e fenômenos mais co- Este subteste é incluído no WISC, no WISC-R,
mumente encontrados, uns com maior fre- no WISC-III, no WPPSI e no WPPSI-R. No WISC-
qüência, outros com menos. R, os labirintos são 9 e não 8, como no WISC, e
Em relação ao momento em que o sujeito são impressos em duas cores. Também o x do
se deu conta do que se trata, ou teve um insi- centro dos labirintos do WISC foi substituído
ght, Rapaport e colegas (1969) recomendam pela figura diminuta de um menino ou uma

PSICODIAGNÓSTICO – V 545
menina, e o tipo e número de fracassos foi al- las, não é suficiente para que o examinador
terado em conseqüência das modificações nas aplique bem o subteste em outras escalas.
definições de erro (Wechsler, 1981b). As observações a serem realizadas devem
No WISC, é um subteste suplementar, mas se direcionar principalmente para dificuldades
pode ser utilizado como alternativo, no caso quanto à coordenação visomotora, para com-
da invalidação de outro subteste de execução. portamentos atribuíveis à impulsividade ou a
Não obstante, seu uso como teste alternativo outras manifestações do estado emocional in-
é questionável, dada a sua correlação relati- fantil.
vamente baixa com outros subtestes (Wechsler,
1949). Em conseqüência, parece mais adequado
utilizá-lo de forma complementar e, então, pro- Desenhos Geométricos (WPPSI)
porcionalizar a contagem ponderada da escala.
No WISC-R e no WISC-III, pode ser usado Este subteste foi introduzido no WPPSI em vis-
de forma suplementar, quando houver dispo- ta da capacidade da criança de reproduzir fi-
nibilidade de tempo, para obter informações guras geométricas. No WPPSI-R, destina-se à
subsidiárias, embora o seu escore não seja in- criança de mais idade (para crianças de menos
cluído no cômputo para o QI. Contudo, con- idade, é uma tarefa apenas de reconhecimen-
forme as instruções, Labirintos pode substituir to e discriminação visual). Envolve aspectos per-
Código, no WISC-R, se for a preferência do exa- ceptivos, visuais e motores. Assim, todos os
minador, ou pode, ainda, ser usado como al- indícios que surgirem nesse sentido, a partir
ternativo a outro subteste de execução, que da observação do comportamento da criança,
for invalidado. Não obstante, como no caso do podem se tornar importantes na interpretação
WISC, tem sido questionada a sua validade dos resultados. Além disso, seguem-se as con-
como substituto de outro teste, tendo em vis- siderações gerais no sentido da observação do
ta as suas propriedades psicométricas (Boyd & comportamento.
Hooper, 1987), supondo-se que seria preferí- A administração do subteste é relativamente
vel considerá-lo como um subteste suplemen- simples, mas os critérios de escore devem ser
tar, utilizando o procedimento da transforma- seguidos muito cuidadosamente.
ção proporcional da contagem, do que incluí-
lo no cômputo, com mais quatro subtestes, para
a obtenção do QI. No entanto, Silverstein (1989), Sentenças (WPPSI)
com base em resultados de pesquisa, demons-
trou que ambos os procedimentos são viáveis. Sentenças envolve a tarefa de repetir verbali-
No WPPSI, não é considerado como subteste zações e constitui um subteste suplementar no
suplementar e difere do WISC, pela introdu- WPPSI e opcional no WPPSI-R.
ção de três labirintos não quadrangulares, em Não há dificuldades especiais na adminis-
que a criança trabalha na direção horizontal, tração, e os erros de pronúncia não assumem
já que foi observado que a criança menor de 6 importância. Todavia, o examinador deve estar
anos fica confusa quando se lhe exige que co- muito bem treinado para a identificação de
mece a tarefa num centro fechado, o que pode possíveis erros. Podem ocorrer erros por omis-
ser atribuído a um desconforto de “se sentir são, transposição, adição ou substituição, e
‘fechada’ ou a uma capacidade ainda limitada existem exemplos para a orientação do exami-
de orientação espacial” (Wechsler, 1967, p.10). nador (Wechsler, 1967).
A principal recomendação que se pode fa-
zer é que sejam seguidas cuidadosamente as
instruções para a administração e escore dos ESCORES BRUTOS E PONDERADOS
manuais. Estas apresentam variações conside-
ráveis, de uma escala para outra. Assim, a ex- Nas escalas infantis, os escores brutos pressu-
periência, embora apreciável numa das esca- põem uma utilização específica somente quan-

546 JUREMA ALCIDES CUNHA


do se deseja trabalhar com equivalentes de ida- para a avaliação dos resultados, especialmen-
de ou idades escalares, que podem fornecer te após o lançamento do WAIS-R NI, que per-
uma base para a introdução de programas re- mite uma análise mais precisa das funções cog-
mediais. Caso contrário, sempre devem ser nitivas.
transformados em escores ponderados, con-
forme a idade, por meio de consulta a tabelas
específicas, constantes nos manuais, cuja con- NÍVEIS DE INTERPRETAÇÃO DAS ESCALAS
tagem vai permitir chegar à classificação do QIV, WECHSLER
do QIE e do QIT. Não obstante, é imprescindí-
vel lembrar que, quando se administram me- Analisando o trabalho de vários autores, Gro-
nos ou mais subtestes que o número previsto th-Marnat (1999) sugere um procedimento
para a avaliação do QI, torna-se essencial fazer seqüencial, na análise do material colhido, que
a transformação proporcional da contagem permite, através de sucessivos passos, “confir-
ponderada, conforme tabelas constantes nos mar, infirmar ou alterar as hipóteses derivadas
manuais, antes de converter as somas dos es- das questões do encaminhamento e de qual-
cores em QIs. quer informação acessível sobre antecedentes”
Nas escalas para adultos, os escores brutos (p.157). Mas deve ficar claro que todas as infe-
são transformados em equivalentes de esco- rências feitas com base em dados das escalas
res ponderados, através de uma tabela, desen- devem encontrar apoio em outras fontes.
volvida com base num grupo de referência da Considerando que tal abordagem tem um
população geral. Todavia, os valores de QI, en- caráter didático, vamos procurar segui-la de um
contrados com base na soma dos escores bru- modo geral e na medida em que parece apli-
tos, são determinados com o uso de tabelas cável à maioria das Escalas Wechsler, pois as-
específicas, conforme a idade do sujeito. Nas pectos mais específicos relacionados com o
escalas para adultos, a avaliação do QI é feita WISC-III e o WAIS-III serão objeto de capítulos
com base em 6 subtestes verbais e em 5 de próprios.
execução. No caso específico do WAIS-R, a
Tabela 23 do manual permite fazer a trans-
formação proporcional da contagem ponde- Nível I. O QI total
rada, no caso de ter sido omitido um subtes-
te verbal ou de execução, antes de utilizá-la Pode-se afirmar que o QI total (QIT), como es-
para encontrar o equivalente de QI corres- core singular, “é o escore mais fidedigno e vá-
pondente. lido” (Groth-Marnat, 1999, p.159). Não obs-
Outro ponto importante a ser observado é tante, Kaufman e Reynolds (1983) chamam a
sobre o uso dos escores ponderados, equiva- atenção para um ponto que nos parece impor-
lentes aos escores brutos, conforme o grupo tante. Afinal, o QI é apenas um número, e cabe
etário, para a avaliação neuropsicológica. A um julgamento do nível intelectual do indiví-
tabela que consta na Folha de resposta se ba- duo em relação ao seu grupo de iguais” (p.121),
seia em dados de um grupo de referência da que pode ser proporcionado em termos de
população geral, mas não deve ser utilizada percentis, com uma classificação descritiva.
quando o objetivo da testagem é a avaliação Ao se registrar o resultado, em termos de
neuropsicológica. Neste caso, o QI não é um QI, é aconselhável referir o percentil equiva-
dado de interesse, mas sim a avaliação de dé- lente, porque este vai nos dar a posição relati-
ficits específicos. Devem-se transformar os es- va do indivíduo na população. Evidentemente,
cores brutos em escores ponderados, de acor- além de nos dar uma idéia da posição relativa
do com a idade do sujeito, conforme tabelas do sujeito, este procedimento facilitará a com-
específicas para tal fim, encontradas na seção paração com os resultados de outros testes de
final de ambos os manuais. Note-se, entretan- nível intelectual. No Quadro 36.1, é apresenta-
to, que o WAIS-R é o instrumento de escolha da uma classificação descritiva, que tem sido

PSICODIAGNÓSTICO – V 547
geralmente associada ao QIT, nas escalas We- a classificação descritiva pertinente ao WISC-
chsler. Estão incluídos os valores percentílicos III e ao WAIS-III, a ser exposta posteriormente,
e o percentual teoricamente esperado em cada nos capítulos 37 e 38.
nível, em termos da população geral. Por outro lado, mesmo considerando as
qualidades psicométricas das escalas Wechs-
ler, sempre existe uma margem de erro. Sem
QUADRO 36.1 Classificação descritiva entrar em particularidades estatísticas, bas-
correspondente aos vários níveis de QI, nas ta dizer que se considera que “o nível de con-
Escalas Wechsler*, e percentual incluído
fiança de 85% a 90% é apropriado para a
QI Percentis Classificação Percentual maioria dos propósitos clínicos”. Em termos
descritiva incluído
práticos, isso significa que, de um modo ge-
130 e mais 98 e mais Muito superior 2,2 ral, o QI total pode variar cerca de 5 pontos,
120 – 129 91 – 87 Superior 6,7 para mais ou para menos. Essa noção, ba-
110 – 119 75 – 90 Médio superior 16,1
90 – 109 25 – 73 Médio 50,0
seada no conceito de erro padrão de medi-
80 – 89 9 – 23 Médio inferior 16,1 da, permite encarar um determinado QI, sem
70 – 79 3–8 Limítrofe 6,7 os riscos de uma “superinterpretação ou ri-
69 e menos 2 e menos Deficiente 2,2 gidez” no uso dos escores (Kaufman & Rey-
cognitivo nolds, 1983, p.121-122). Evidentemente,
Fontes: Kaufman e Reynolds, 1983, p.122; Wechsler, 1981, p.13. para cada escala, existe informação sobre o
*As classificações específicas referentes ao WISC-III e ao WAIS- erro padrão médio, que sempre deve ser in-
III serão apresentadas nos capítulos 37 e 38.
cluído e discutido ao informar os resultados,
num laudo.
No Quadro, a classificação descritiva não é Outro aspecto que deve ser considerado
uma transcrição literal das comumente apre- com o maior cuidado é o resultado obtido no
sentadas nas escalas Wechsler. Usamos a ter- reteste de sujeitos. Sabe-se que, quando trans-
minologia utilizada por Poppovic, quando de corre pouco tempo entre o teste e o reteste, se
sua tradução do WISC (Wechsler, s/d), que é a pode esperar um aumento discreto nos esco-
mais divulgada no Brasil, com exceção de seu res, devido ao efeito da prática (Quereski, Treis
nível mais baixo. Poppovic usou a expressão & Riebe, 1989), principalmente em alguns sub-
“débil mental”. Em várias escalas Wechsler, é testes específicos, como Símbolos, Completar
utilizada a expressão tradicional de “deficien- Figuras e Cubos. Tal diferença dificilmente che-
te mental”, ou “deficiente intelectual”, mas, no ga a ser significativa, exceto em intervalos
WAIS-R, registra-se “retardado mental”. Entre- muito curtos, como de um mês ou menos. Na
tanto, Kaufman & Kaufman, em 1977, ponde- prática, parece que um intervalo de seis meses
raram que, embora esta última possa ser pre- entre teste e reteste é bastante confiável. Tam-
cisa, é muito severa, propondo adaptá-la para bém Lezak (1983) acha que não é comum o
“deficiente cognitivo” (Kaufman & Reynolds, aumento expressivo de escores, no reteste de
1983, p.121). A tendência atual, porém, é de pessoas normais. Inclusive em pacientes com
evitar expressões que possam sugerir a inclu- comprometimento neurológico, os efeitos da
são de uma categoria diagnóstica. Por isso, prática tendem a ser pequenos. Não obstante,
numa apresentação de resultados, deve se ter o examinador deve estar atento para não fazer
certa cautela para evitar interpretações errô- interpretações indevidas, a partir do aumento
neas, deixando bem claro o significado de cer- de escore num subteste isolado.
tas expressões. Por exemplo, quando no WAIS- Na administração individual, a estabilidade
R é utilizada a classificação “retardado men- temporal do QI, entre teste e reteste, é tanto
tal”, deve ficar bem esclarecido que não se tra- mais fidedigna quanto menor for o intervalo
ta de um diagnóstico, pois para isso teria sido entre ambos e quanto maior for a idade do
necessária uma avaliação do comportamento sujeito na época da primeira testagem (Schuer-
adaptativo. Ademais, deixa de ser considerada ger & Witt, 1989).

548 JUREMA ALCIDES CUNHA


Um quadro um pouco diverso pode ser en- Além disso, Groth-Marnat (1999) chama a
contrado quando escalas diferentes são usa- atenção para o fato de que “um QI elevado, de
das para teste e reteste, recurso comum na nenhuma maneira é garantia de sucesso”
faixa etária de 16 anos. Ainda que inicialmen- (p.154); apenas aponta para a existência de
te houvesse uma pressuposição de equivalên- uma condição. Ao contrário, um QI baixo ten-
cia, nesse período etário, entre as escalas (We- de a se associar com restrições de opções, de
chsler, 1981a), estudos posteriores revelaram forma que as predições costumam ser mais
resultados diversos e até contrários, sob alguns precisas.
aspectos (Quereski, Treis & Riebe, 1989; Van- Embora, inicialmente, se tenha salientado
ce, Brown, Hankins et alii, 1987). as propriedades psicométricas do QIT, é preci-
Por outro lado, estudos realizados em al- so esclarecer que, se a diferença QIV-QIE é sig-
guns países esclarecem esta questão de resul- nificante, o QI total “torna-se inadequado como
tados discrepantes, sendo observado que, a sumário estatístico que represente o nível ge-
cada década, o desempenho intelectual tende ral de capacidade do indivíduo” (Kaufman &
a melhorar, com um ganho nos QIs (Flynn, Reynolds, 1983, p.123). Da mesma maneira, ele
1998; 1999). perde em importância como medida, quanto
O laudo de um cliente, portanto, deve ser maiores forem as discrepâncias existentes en-
bastante completo. Parece importante que se tre fatores ou, mesmo, se houver acentuadas
registrem não só o QI e a classificação descriti- flutuações entre os subtestes individuais (Gro-
va, mas também o percentil e considerações th-Marnat, 1999).
nele baseadas, para o entendimento da posi- Vamos recapitular aqui um exemplo, apre-
ção relativa do indivíduo na população e, ain- sentado noutro capítulo da edição anterior
da, que se acrescente alguma referência sobre (Cunha et alii, 1993). Foram administrados, a
o erro de medida. É aconselhável, ainda, in- um menino de 8 anos e 5 meses, o WISC-R, o
cluir informações adicionais, no caso de testa- INV e os Cubos de Kohs, cujos dados foram
gem incompleta, com utilização somente de transcritos no Perfil de Desempenho, para me-
uma das escalas ou de apenas alguns subtes- lhor serem comparados (Figura 36.3).
tes, devendo-se recorrer à transformação pro- Pelos dados apresentados, vemos que exis-
porcional da contagem ponderada. Isso pode te uma diferença de 17 pontos de escore entre
ocorrer por dificuldades físicas ou médicas ou o QI verbal e o de execução. No WISC-R, uma
por motivos de ordem psicológica (recusa em diferença de 15 pontos ou mais é considerada,
continuar, intensa ansiedade ou depressão, estatisticamente, significativa ao nível de 1%.
etc.), bem como por dificuldades em respon- Se, para fins clínicos, o nível de 5% (12 pontos
der os itens verbais em pessoa de origem es- de diferença) é tido como significante, conclu-
trangeira. ímos que existe uma discrepância assaz impor-
Esses dados todos permitem que se expli- tante entre os QIs, o que torna o QIT inade-
que, por exemplo, o atual desempenho esco- quado para classificar o nível de funcionamen-
lar, que se façam predições sobre o aproveita- to intelectual.
mento, bem como que se examinem outras Embora o QI, em alguns casos específicos
conseqüências, como o grau de sucesso em de avaliação, não constitua a informação
certas atividades profissionais ou a resposta a mais importante ou sequer um dado essen-
outros tipos de terapia. Dessa maneira, con- cial, como em exames de pacientes com dé-
forme Kaufman & Reynolds (1983), “ainda que ficits cognitivos (Lezak, 1983), há muitas
crucial, a interpretação normativa é insuficiente outras situações em que dá subsídios quan-
numa testagem inteligente”, e “as diferenças in- to ao possível desempenho na escola ou no
tra-individuais podem ser importantes na altera- trabalho, ou pode fundamentar, até certo
ção das predições feitas pelos QIs, porque essas ponto, o prognóstico do aproveitamento es-
predições não pressupõem alterações importan- colar, sempre num sentido extremamente
tes, que ocorrem no ambiente” (p.122). probabilístico.

PSICODIAGNÓSTICO – V 549
PERFIL DE DESEMPENHO

Identificação: G.A. _______________________________ Data do nascimento: _____________________________


Psicólogo: ______________________ Escola: _________ Série: 1a esp. (repte) Data: _________________________

Escala verbal Escore bruto Escore ponderado Escala de execução Escore bruto Escore ponderado
Informação 7 6 Arranjo de Figuras 18 8
Semelhanças 5 8 Completar Figuras 12 14
Aritmética 5 6 Cubos 6 8
Vocabulário 21 8 Armar Objetos 17 10
Compreensão 9 10 Código 25 10
Dígitos 3 3 Labirinto 7 7

Escala Escore QI Classificação Média


Verbal 41/34 80 Médio inferior 6,81
Execução 57/48 97 Médio 9,50
Total 98/82 87 Médio inferior 8,17
INV – Perc. 70
KOHS – IM 7 a 6 m (QI 89)

PERFIL DE DESEMPENHO

Identificação: G.A. _______________________________ Data do nascimento: _____________________________


Psicólogo: ______________________ Escola: _________ Série: 1a esp. (repte) Data: _________________________

Desvios padrão –1 –2 –1 0 +1 +2 +3
Q.I. 55 65 70 75 81 85 90 96 100 104 110 115 119 125 130 135 145
Escores ponderados 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19
Percentis 1 5 10 16 20 25 40 50 60 75 80 84 90 95 99
WISC-R – Q.I.v 34 80
WISC-R – Q.I.e 48 97
WISC-R – Q.I.t 82 87
Informação 7 6
Compreensão 9 10
Aritmérica 5 6
Semelhanças 5 8
Dígitos 3 3
Vocabulário 21 8
Compl. Figuras 12 14
Arr. de Figuras 18 8
Cubos 6 8
Armar Objetos 17 10
Código 25 10
Labirintos 7 7
INV Perc. 70
KOHS Q.I. 89

Figura 36.3 Perfil de desempenho, no WISC-R, INV e KOHS, de um menino de 8 anos e 5 meses.

Vincent (1987) procura interpretar a sig- dos, sem correspondência exata com os bra-
nificação do QI para a predição do êxito es- sileiros. No Quadro 36.2, apresentamos, a
colar e ocupacional, com referência a cursos título de ilustração, algumas das relações que
e títulos acadêmicos usuais nos Estados Uni- estabelece.

550 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 36.2 Significação do QI para a predição do êxito escolar e ocupacional
QI Cursos Ocupações (exemplos)
80-89 High school* Auxiliar de enfermagem, copeiro, etc.
90-99 High school + junior college Cosmetologista, montador eletrônico, técnico de
laboratório, empregado de escritório, etc.
100-109 Bacharelato em college Ocupações técnicas, ocupações mais complexas de
escritório, professor de high school, etc.
110-119 Bacharelatos em colleges Gerente de grandes empresas, engenheiro, assistente
mais competitivos, mestrado social, programador de computador, etc.
ou doutorado
120-129 MD ou PhD Ocupações do mais alto nível, com exigência de soluções
de problemas mais complexos
Fonte: Vincent, 1987, p.43-44 (resumido).
*Habitualmente requerendo ajuda extra em disciplinas básicas.

Nível II. QI verbal e de execução, fatores e fortes evidências nas escalas mais recentes),
outras medidas exista um fator mais geral que seria determi-
nante para os escores da escala total, assim
Passo II.a. Diferença entre o QI verbal e o como de que um fator de compreensão verbal
de execução (QIV-QIE) esteja subjacente à escala verbal e um de or-
ganização perceptual, à escala de execução.
Durante os primórdios das investigações com Todavia – salienta Groth-Marnat (1999) – os
as escalas Wechsler, um dos achados que mais clínicos sabem que “um teste puro de compre-
impressionou os pesquisadores foi a diferença ensão verbal ou de organização perceptual não
freqüente entre o QI verbal e o de execução existe” (p.160).
(QIV-QIE), chegando a constituir um dos indi- Neste tipo de enfoque, o primeiro passo a
cadores diagnósticos mais comuns na literatu- ser seguido consiste em examinar a diferença
ra (Portuondo, 1970b; Rapaport et alii, 1965; existente entre o QIV e QIE (QIV-QIE). Como já
Wechsler, 1958). Blatt e Allison, em 1968, cita- se viu antes, se a diferença QIV-QIE é estatisti-
dos por Zimmerman e colegas (1976), chega- camente significante, o QI total “torna-se
ram ao exagero de afirmar que a discrepância inadequado como um sumário estatístico que
entre os QIs “permite ao clínico descrever a represente o nível geral de capacidade do in-
organização dos processos psicológicos do su- divíduo” (Kaufman & Reynolds, 1983, p.123),
jeito”, possibilitando fazer inferências sobre e deve-se procurar o significado de tal dife-
defesas, motivações, impulsos, grau de pato- rença.
logia, assim como sobre “seu potencial e suas Mas, quando tais diferenças podem ser con-
capacidades para enfrentar a realidade e se sideradas estatisticamente significantes? We-
adaptar” (p.21). Após um exame da literatura, chsler apresenta diferenças mínimas requeri-
porém, estes últimos definiram seu ponto de das, em vários grupos etários, para serem sig-
vista de que uma diferença significativa pode nificantes ao nível de confiança de 15% e 5%
ser comparada com a febre, isto é, constitui (Wechsler, 1981b). Kaufman & Reynolds (1983)
apenas uma indicação de uma condição de dão informações em relação a algumas esca-
anormalidade ou de um desvio da normalida- las: a) no WISC-R, “uma diferença entre estes
de, e afirmam que “o significado deste desvio dois escores (QIV-QIE) de 12 pontos é estatisti-
só pode ser estabelecido com a ajuda de ou- camente significante, ao nível de p>5, e de 15
tras indicações mais específicas e diferenciais” pontos, ao nível de p<0,01”; b) no WAIS-R,
(p.24). “os valores comparáveis são de 10 e 13, res-
Existe uma pressuposição básica de que, em pectivamente”; e c) no WPPSI, “os valores cor-
praticamente todas as escalas Wechsler (com respondentes estão mais próximos de 11 e 14”

PSICODIAGNÓSTICO – V 551
(p.123). Em relação ao WPPSI, conforme We- a) déficits sensoriais;
chsler (1967), embora 11 seja de fato o valor b) diferenças na inteligência verbal e não-
para certos grupos de idade (4, 4 ½ e 6 ½ anos), verbal;
a média para todos os seis grupos é de 10,29, c) diferenças da inteligência fluida versus a
ao nível de confiança de 5%, e de 7,56 ao nível inteligência cristalizada;
de confiança de 15%. Quanto ao WAIS, Zim- d) deficiências psicolingüísticas;
merman e colegas (1972) apresentam dados e) bilingüísmo;
de Newland e Smith, que indicam que uma di- f) efeito do dialeto negro;
ferença de 10 pontos é significante, num nível g) problemas de coordenação motora;
de confiança de 5%, nos grupos de idade de h) reação à pressão do tempo na escala de
18-19, 25-34 e 45-54 anos. “Nos dois grupos execução;
de sujeitos mais jovens, basta uma diferença i) diferenças na dependência-independên-
de 13 pontos para alcançar o nível de 1%, en- cia de campo;
quanto que, nos sujeitos de 45-54 anos, este j) diferenças nas operações de avaliação de
valor é só de 12 pontos”(p.21). Ainda, em rela- Guilford, ou
ção ao WAIS, Vincent (1987) afirma que uma k) influências socioeconômicas” (Kaufman
discrepância de 15 pontos entre as escalas é & Reynolds, 1983, p.123-124).
significante ao nível de 0,01 e que, quando os
autores referem que tal diferença, ou até maior, Embora grandes discrepâncias entre os QIs
pode ser encontrada em 25% da população tenham sido sistematicamente associadas com
dita normal, é preciso lembrar que os dados anormalidade, Kaufman e Reynolds (1983) sa-
da população geral incluem indivíduos com lientam que não basta considerar a magnitu-
vários tipos de comprometimentos clínicos e de das diferenças, mas também é preciso levar
portanto, numa distribuição de freqüência, em conta a freqüência com que aparecem.
estariam abaixo do percentil 25. Já em relação Desse modo, “para que uma diferença em QIV-
ao WISC, nem Wechsler (1949), nem Glasser e QIE tenha significação diagnóstica, deveria ser
Zimmerman (1972) apresentam diferenças sig- relativamente infreqüente na população nor-
nificativas. Koppitz (1976), em sua pesquisa, mal” (p.124).
considerou significante uma diferença de 10 Já Field, em 1960, citado por Zimmerman e
pontos entre o QIV e o QIE, no WISC, sem indi- colegas (1976), chamara a atenção para o as-
car a fonte em que se baseou. sunto. No Quadro 36.3, a porcentagem, com
Generalizando, pode-se dizer que, quando
é observada uma diferença entre os QIs ao re-
dor de 12 pontos, em qualquer das escalas QUADRO 36.3 A anormalidade das diferenças
Wechsler, convém que seja melhor investiga- QIV-QIE, no WAIS
da. Isso não quer dizer que tal diferença seja
% da população Grupos de idade (WAIS)*
uma ocorrência rara. Trata-se, apenas, de uma
com uma diferença 18-19 45-54 60-64
informação útil (Groth-Marnat, 1999). Cons- igual ou menor 25-35
tatada uma diferença significante entre os QIs,
50,0 6,8 6,2 6,3
a primeira hipótese que se pode levantar é de
25,0 11,7 10,6 10,9
que “o indivíduo não pensa, raciocina ou se 20,0 13,0 11,8 12,1
expressa num nível equivalente, através da 10,0 16,7 15,2 15,6
modalidade verbal de linguagem e através de 5,0 19,9 18,1 18,6
métodos mais concretos, não-verbais” (Kauf- 2,0 23,7 21,5 22,1
1,0 26,2 23,8 24,5
man & Reynolds, 1983, p.123). Já em relação à
0,1 33,5 30,4 31,2
explicação possível de tais diferenças, Kaufman,
em 1979, sugere que, no WISC-R e, na maioria Fonte: Field, 1960, apud Zimmerman, Woo-Sam & Glas-
ser, 1976, p.35.
dos casos, no WPPSI e no WAIS-R, “possam *Neste quadro não foram incluídos todos os grupos de
refletir: idade constantes do original.

552 JUREMA ALCIDES CUNHA


uma diferença igual ou maior, é apresentada, 15 pontos ou mais ocorrem em menos de 2%
para quatro grupos de idade, no WAIS. das vezes e assim por diante. “Estes valores per-
Num estudo realizado por Kaufman, em mitem que os examinadores avaliem cada dis-
1976 (citado por Kaufman & Reynolds, 1983), crepância QIV-QIE significativa (p<0,05), que
com as crianças da amostra de padronização observem e determinem se a diferença, nas ca-
do WISC-R, a discrepância QIV-QIE (indepen- pacidades verbais e não-verbais da criança, é
dentemente da direção) encontrada foi de 9,7 inusitada ou anormal” (Kaufman & Reynolds,
pontos, com um desvio padrão de 7,6, em 1983, p.125). O quadro também fornece nor-
média a mesma para todos os grupos de ida- mas, conforme cinco categorias socioeconômi-
de. “A discrepância média foi aproximadamente cas.
de 11 pontos para crianças com pais profissio- Os psicólogos clínicos “podem selecionar
nais liberais, e que diminui para uma média de qualquer grau de anormalidade que pareça
9 pontos para filhos de trabalhadores não es- adequado para um dado propósito”. Num lau-
pecializados” (p.125). A distribuição das dis- do comum, parece que uma discrepância “me-
crepâncias QIV-QIE foi resumida pelo mesmo nor que 15%” é um critério adequado para
autor, em 1979, e está transcrita no Quadro caracterizá-la como rara; porém, quando um
36.4, em que se podem ver as discrepâncias diagnóstico de excepcionalidade pretende ser
“inusitadas” ou “anormais”. Consultando a feito, em parte, com base na discrepância, de-
última coluna, é evidente que discrepâncias de veria ser empregado um critério de “menor que
5%” ou “menor que 2%” (p.125).
Os autores citados estabelecem uma distin-
QUADRO 36.4 Porcentagem das crianças normais ção a respeito das discrepâncias, em termos
com discrepâncias QIV-QIE, de determinada
magnitude ou maior, distribuídas conforme a
de diagnóstico e tratamento. Acham que, em
ocupação parental* termos de diagnóstico de uma anormalidade,
deve-se considerar tanto a significância como
Tamanho da Ocupação parental** Amostra
discrepância 1 2 3 4 5 total a infreqüência da discrepância. Todavia, em
termos terapêuticos, podem-se considerar ape-
9 52 48 48 46 43 48
10 48 44 43 41 37 43
nas as diferenças significativas, que “indicam
11 43 40 39 36 34 39 discrepâncias reais nas capacidades do indiví-
12 40 35 34 31 29 34 duo e, portanto, fornecem um valioso input
13 36 33 31 28 26 31 para fazer recomendações educacionais e prá-
14 32 29 29 25 24 28 ticas” (p.126).
15 29 25 26 21 22 24
16 26 22 22 19 19 22
Na realidade, qualquer diferença deve ser
17 24 19 18 15 16 18 interpretada num contexto, em que devem ser
18 20 16 16 14 15 16 considerados o grupo etário, antecedentes
19 16 15 13 12 14 14 educacionais e aspectos socioculturais, mas
20 13 13 12 10 13 12 será melhor discutida no item sobre Escala
21 11 11 8 9 10 10
22 10 9 7 7 9 8
Verbal ou Escala de Execução. No exemplo dado
23 8 8 6 6 8 7 na Figura 36.3, vemos que concorrem para a
24 7 7 5 5 6 6 baixa, na Escala Verbal, escores de subtestes
25 6 6 4 4 5 5 muito afetados pela educação formal e, então,
26 5 5 3 3 4 4 já teríamos evidentemente uma área a ser me-
27 4 4 2 2 3 3
28-30 3 3 1 1 2 2
lhor investigada, antes de qualquer interpre-
31-33 2 2 <1 <1 1 1 tação.
34+ 1 1 <1 <1 <1 <1 Groth-Marnat (1999) aponta para duas
* Classificação da ocupação parental: 1. Profissionais liberais e questões verdadeiramente importantes para
técnicos; 2. Administradores, empregados de escritório e ven- melhor interpretar dados obtidos. Em primei-
dedores; 3. Trabalhadores especializados; 4. Trabalhadores ro lugar, ele diz que, mesmo que haja uma di-
semi-especializados. 5. Trabalhadores não-especializados.
**Independente da direção. ferença significante entre as escalas, não pode

PSICODIAGNÓSTICO – V 553
ser levada em conta, se Dígitos e Aritmética a variância dos escores, permitissem um me-
tiverem escores muito baixos ou muito altos, lhor entendimento dos resultados.
porque esses subtestes estão mais associados Alguns achados se mostraram algo contra-
ao fator de Resistência à Distratibilidade do que ditórios, mas, na maioria dos casos, os estu-
ao de Compreensão Verbal, principalmente se dos permitiram chegar a uma conclusão fato-
for observada baixa também de Código. rial, com três fatores: Compreensão Verbal,
Neste caso, faz mais sentido interpretar os Organização Perceptual e Resistência à Dis-
achados a partir dos subsídios que se têm sobre tratibilidade. Os dois primeiros estão obvia-
a solução fatorial, com três fatores, do que mente relacionados com as duas escalas, ver-
dentro de um modelo dicotômico, verbal/não- bal e de execução, e colaboram tanto para a
verbal. interpretação dos QIs, como para a diferen-
Em segundo lugar, lembra a importância de ça entre eles. O terceiro corresponde a um
se observar se existe uma grande amplitude de atributo comportamental e tem sido objeto
escore na Escala Verbal ou de Execução (como, de muitas pesquisas.
por exemplo, de 9 pontos, na Escala Verbal, e No Quadro 36.6, tem-se a distribuição dos
9, na de Execução do WAIS-R). Este autor ob- subtestes, resultante da análise fatorial, reali-
serva que um grau elevado de discrepância vai zada por Kaufman, em 1975, e apresentada,
contra o constructo implícito no QI, que é uni- posteriormente, por ele e colega.
tário. Quando as diferenças são muito gran- É preciso chamar a atenção, entretanto, de
des, é, então, recomendável lidar com forças e que, no WAIS-R, Arranjo de Figuras não é in-
fraquezas que aparecem no perfil. cluído no fator de Organização Perceptual.
Para se ter uma idéia dessa questão da Da mesma forma, Resistência à Distratibili-
amplitude dos escores ponderados, para jul- dade é um constructo que tem sido extensiva-
gar a discrepância, estamos transcrevendo, no mente examinado em crianças e tem sido me-
Quadro 36-5, um resumo da análise que Kauf- nos estudado em adultos. Também, no WAIS-
man e Reynolds (1983) fizeram para a inter- R, conforme a literatura, só em alguns grupos
pretação de dados, em crianças. específicos (idades 18 e 19 e 45-54), Código
parece se associar com Resistência à Distratibi-
lidade. Apesar do nome específico, este fator
Passo II.b. Fatores envolve uma série de variáveis, além de distra-
tibilidade, como atenção, concentração, me-
Desde a década de 50, isto é, a partir dos tra- mória imediata, ansiedade, etc. Portanto, a
balhos de Cohen, citado por vários autores, baixa desse fator significa fraqueza em certas
começaram a se verificar tentativas no sentido funções, que tendem a influenciar o desempe-
de realizar análises fatoriais das escalas, pro- nho também em outras áreas (Groth-Marnat,
curando isolar fatores que, contribuindo para 1999).

QUADRO 36.5 Grau de anormalidade de um índice de discrepância dos subtestes (amplitude dos escores
ponderados)*
Freqüência de ocorrência Escala verbal Escala de execução Escala total
na população normal 5 subtestes 6 subtestes 5 subtestes 6 subtestes 10 subtestes 12 subtestes
< 15% 7 8 9 9 10 11
< 10% 8 9 10 10 11 12
< 5% 9 10 11 11 12 13
< 2% 10 11 12 13 13 14
< 1% 11 12 13 13 14 14
Fonte: Kaufman & Reynolds, 1983, p.130.
*Amplitude dos escores ponderados igual ao maior escore ponderado menos o menor escore ponderado de uma criança.

554 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 36.6 Distribuição dos subtestes do WISC- E, para avaliar se a variação da diferença
R, resultante dos dados da análise fatorial fica num nível de 5%, de novo, Groth-Marnat
realizada por Kaufman (1975)
(1999) cita Kaufman:
Compreensão Organização Resistência à
Verbal Perceptual Distratibilidade
Informação Completar Aritmética Fatores 16 a 19 anos 20 a 74 anos
Semelhanças Figuras Dígitos
Compreensão Verbal 8 7
Vocabulário Arranjo de Figuras Código
Compreensão Cubos Organização Perceptual 11 9
Resistência à Distratibilidade 11 9
Armar Objetos
Labirinto Fonte: Groth-Marnat, 1999, p.164 (adaptado).
Fonte: Kaufman & Reynolds, 1983, p.116.

Novamente, existe a condição de que não


haja muita flutuação entre os subtestes, para
Da mesma forma, com a inclusão de novos se poder fazer interpretações com base nos
subtestes no WISC-III e WAIS-III, há diferenças fatores, porque a existência de muita discre-
quanto aos fatores que emergiram da análise, pância entre os escores dos subtestes, dentro
que serão tratados nos capítulos corresponden- de cada fator, significa que estes, na verdade,
tes. seriam compostos, e os resultados poderiam
Como exemplo de um tipo de análise, ado- ser melhor interpretados sob outro enfoque.
tando esta abordagem, vamos apresentar a Se a diferença entre o subteste de escore mais
fórmula para determinar escores padrão, de alto e o de escore mais baixo chegar a 7 em
Kaufman, de 1990, para o WAIS-R, citada por Compreensão Verbal, 8 em Organização Percep-
Groth-Marnat (1999): tual e 4 em Resistência à Distratibilidade, não é
possível dar prosseguimento à interpretação com
base nos fatores (Groth-Marnat, 1999).
Fórmulas para determinar escores-padrão
(M=100l; DP=15), no WAIS-R
Fatores Fórmula* Passo II.c. Outras abordagens: categorias
de Bannatyne, Perfil ACID e
Compreensão 1,4 (Informação +
Verbal Vocabulário + Compreensão Agrupamentos de Horn
+ Semelhanças) + 55
Organização 2,0 (Completar Figuras + Cubos Análises fatoriais do WISC mostram que os fa-
Perceptual + Armar Objetos) + 40 tores isolados no WISC-R já contribuíram para
a explicação de vários subtestes (Glasser & Zim-
Resistência à 2,8 (Dígitos + Aritmética) + 44
Distratibilidade merman, 1972). Assim, a partir de estudos com
o WISC, já era conhecido o quociente, que re-
Fonte: Groth-Marnat, 1999, p.163 (adaptado).
*Devem ser usados escores ponderados corrigidos por idade. sulta da divisão da soma de subtestes essen-
cialmente verbais pela soma dos que envolvem
fatores perceptuais, isto é, (Informação + Com-
É importante apresentar os passos que, se- preensão + Semelhanças + Vocabulário) ÷
gundo o autor, devem ser seguidos: (Completar Figuras + Arranjo de Figuras +
“1. Encontre a média para os três escores Cubos + Armar Objetos).
padrão baseados nos fatores. Esperava-se que o quociente em crianças
2. Calcule a diferença entre cada um dos sem problemas específicos de aprendizagem
três escores padrão e a média do total dos es- fosse igual a 1,00 ou próximo. O quociente
cores padrão. acima de 1,00 seria sugestivo de problemas
3. Determine se a diferença dos escores va- perceptuais; abaixo de 1,00, de problemas na
ria a partir da média” (p.163). área de linguagem.

PSICODIAGNÓSTICO – V 555
Num caso de um menino com problemas dual, podendo servir como ponto de partida
neurológicos, os escores ponderados foram: para planejamentos educacionais.
Informação = 9; Compreensão = 11; Seme- Apresentamos, até agora, um resumo dos
lhanças = 11; Vocabulário = 11; Completar primeiros estudos que sugerem tais aborda-
Figuras = 6; Arranjo de Figuras = 7; Cubos = gens. As Categorias de Bannatyne, por exem-
8; Armar Objetos = 9. Seu quociente de 1,4 plo, foram inicialmente desenvolvidas para o
seria sugestivo de problemas de ordem percep- melhor entendimento de transtornos de apren-
tual. Não obstante, esse quociente nada infor- dizagem. Porém, atualmente, são usadas para
ma sobre problemas de resistência à distratibi- melhor interpretação do perfil e não, apenas,
lidade, tão comuns nessas crianças. para diagnosticar determinados quadros. Ain-
Alguns estudos chamaram a atenção para da pode se utilizar o método tradicional de
um achado consistente em crianças com inca- calcular as médias de cada categoria e compa-
pacidade para a aprendizagem, o perfil ACID, rá-las. Entretanto, para o WAIS-R, Kaufman, em
que consiste em escores baixos em Aritmética, 1990 e 1994, citado por Groth-Marnat (1999),
Código, Informação e Dígitos. Na realidade, delineou uma fórmula para a obtenção de um
reúne subtestes associados com aproveitamen- escore padrão (M=100; DP=15), nas diferen-
to escolar (Aritmética e Informação), mas que tes categorias:
ficam mesclados com os que envolvem resis-
tência à distratibilidade (Aritmética, Código e
Dígitos), de forma que este último fator (que Categorias Fórmula*
representa 75% do perfil) poderia “ser a chave Espacial 2,0 (Completar Figuras + Cubos +
para a avaliação da incapacidade para a apren- Armar Objetos) + 40
dizagem” (Kaufman & Reynolds, 1983, p.132). Conceitualização 1,9 (Vocabulário + Compreensão
Todavia, as características desse perfil parecem Verbal + Semelhanças) + 43
Seqüencial 2,3 (Dígitos + Aritmética +
adquirir mais significação se consideramos as Símbolos) + 30
categorias, propostas por Bannatyne, segun- Conhecimento 1,9 (Informação + Vocabulário +
do Kaufman e Reynolds (1983), para a classifi- Adquirido Aritmética) + 43
cação dos subtestes: Conceitual (Semelhanças, Fonte: Groth-Marnat, 1999, p.163 (adaptado).
Vocabulário e Compreensão), Espacial (Com- *Devem ser usados escores ponderados corrigidos por idade.
pletar Figuras, Cubos e Armar Objetos), Se-
qüencial (Aritmética, Dígitos e Código) e Co-
nhecimento Adquirido (Informação, Aritméti- Depois de usar as fórmulas, calcula-se a
ca e Vocabulário), que se superpõem, até cer- média dos quatro escores padrão, e, para veri-
to ponto, aos fatores recém-referidos. A partir ficar se o grau de diferença de cada um em
de tal categorização dos subtestes, foi carac- relação à média é significante ao nível de 5%,
terizado um perfil que seria típico de crianças são usados os seguintes valores:
com incapacidade para leitura e aprendizagem:
Espacial > Conceitual > Seqüencial. Se exami-
narmos aquele caso de um menino de 8 anos e Categorias 16 a 19 anos 20 a 74 anos
5 meses, apresentado no item anterior, vemos Espacial 11 10
que o seu perfil é exatamente este: Espacial = Conceitualização Verbal 9 8
32 > Conceitual = 26 > Seqüencial = 19. Seqüencial 11 9
Conhecimento Adquirido 8 7
Entretanto, pesquisas desenvolvidas com
grupos diferenciados apontaram para outros Fonte: Groth-Marnat, 1999, p.165 (adaptado).

fatores que parecem ter efeitos sobre a ordem


das categorias, sendo necessárias mais pesqui-
sas a respeito. Não obstante, as categorias Ban- Outro tipo de abordagem, algo semelhan-
natyne parecem ser de alguma utilidade para te, a que já nos referimos, é chamado Perfil
caracterizar forças e fraquezas no caso indivi- ACID, que ocorre muitas vezes em pessoas com

556 JUREMA ALCIDES CUNHA


problemas de aprendizagem. Para calcular o idade. Para fazer comparações entre os três
escore padrão (com M=100 e DP=15), usan- escores padrão, apresentados por Groth-Mar-
do dados do WAIS-R, tem-se a fórmula de Kau- nat (1999), primeiramente é necessário calcu-
fman, de 1990, citada por Groth-Marnat (1999, lar a média dos três (soma dos 3 agrupamen-
p.166): tos/3). A seguir, verifica-se se há diferença (ao
nível de 5%), caso os seguintes valores sejam
alcançados:
ACID: 1,6 (Aritmética + Símbolos + Informação + Dí-
gitos)* + 36
Agrupamentos 16 a 19 anos 20 a 74 anos
*Devem ser usados escores ponderados corrigidos por idade. Inteligência Fluida 9 9
Inteligência Cristalizada 7 6
Retenção 9 7
Verifica-se a variação do escore em relação Fonte: Groth-Marnat, 1999, p.147-148 (adaptado).
ao QIT, que, ao nível de 4%, deve ser diferente
pelo menos 11 pontos (nas idades de 16-19
anos) e 9 (de 20 a 74 anos).
Na história do desenvolvimento de teorias Nível III. Interpretação da variabilidade
sobre a inteligência, Cattell, em trabalhos de intertestes
1941 e 1957, propugnou por um modelo dico-
tômico, de inteligência fluida e inteligência cris- Neste nível, vai-se procurar interpretar as flu-
talizada, modelo este aperfeiçoado por estu- tuações dos escores dos subtestes, na medida
dos de Horn, nas décadas de 60 a 90. Inteli- em que se desviam seja da média dos escores
gência fluida incluiria “raciocínio indutivo e da escala total, seja da escala verbal ou da de
dedutivo, capacidades que se considerou se- execução. Tal abordagem permitirá que se faça
rem influenciadas principalmente por fatores uma análise das forças e fraquezas do funcio-
biológicos e neurológicos e pela aprendizagem namento intelectual do indivíduo, que somen-
incidental, através da interação com o ambien- te é necessária quando existe suficiente varia-
te”, enquanto inteligência cristalizada consis- bilidade intertestes. Para realizar tal aborda-
tiria “principalmente de capacidades (especial- gem, é preciso conhecer quais as capacidades
mente conhecimento), que refletem diferenças que podem ser envolvidas pelas tarefas de cada
individuais, devidas à influência da acultura- subteste, ter experiência clínica, bem como fa-
ção” (McGrew & Flanagan, 1998, p.8). miliaridade com as especificidades do caso in-
O enfoque de Horn e Cattell serviu de base dividual (queixas no encaminhamento, sinto-
para delinear agrupamentos de subtestes. No mas observados e história clínica).
WAIS-R, para obter um escore padrão de Inte- Groth-Marnat (1999) também faz uma ob-
ligência Fluida (com M=100 e DP=15), pode- servação muito importante: “quanto mais tes-
se usar a seguinte fórmula: tes podem ser combinados, para fazer inferên-
1,1 (Dígitos + Semelhanças + Completar cias, baseadas nas capacidades compartilhadas,
Figuras + Arranjo de Figuras + Armar Obje- mais apoio pode ser encontrado para uma cer-
tos) + 34. ta inferência” (p.168). Por outro lado, muita
A fórmula para o escore padrão de Inteli- cautela deve ser usada para elevações ou bai-
gência Cristalizada seria a seguinte: xas isoladas. Assim sendo, apresenta três pas-
1,4 (Informação + Vocabulário + Compre- sos que considera fundamentais:
ensão + Semelhança) + 44. a) determinar a significância das flutuações
E um terceiro Agrupamento de Horn é Re- encontradas;
tenção, cuja fórmula é a seguinte: b) desenvolver hipóteses sobre as possíveis
2,0 (Informação + Dígitos + Aritmética) + 40. significações de tal ocorrência;
No cálculo dessas três fórmulas, devem ser c) integrar as hipóteses no contexto do caso
usados os escores ponderados corrigidos por total.

PSICODIAGNÓSTICO – V 557
Passo III.a. Determinação da significância Desvios dos escores do subtestes, em termos
das flutuações da média do sujeito e em termos da
população geral, no WAIS e no WISC
Em relação às escalas mais recentes, há mui-
to mais recursos para a determinação da sig- O primeiro passo para analisar se existem ou
nificância das flutuações. Em todo caso, algo não flutuações importantes num perfil é o cál-
que deve ser feito, independentemente da es- culo da média. Calcula-se a média da escala
cala utilizada, é determinar se a comparação verbal, dividindo-se a soma dos escores pon-
do escore (alto ou baixo) será feita em rela- derados pelo número de subtestes verbais apli-
ção à média global, à média da escala verbal cados. Utiliza-se o mesmo procedimento para
ou de execução. Existe uma norma geral que a escala de execução e para a escala total. En-
deve ser seguida: se a diferença QIV-QIE não tretanto, o mínimo crítico de subtestes, para
é significante, utilize a média da escala to- que se possa calcular a média da escala total,
tal. é 8 (Vincent, 1987). Vejamos um exemplo no
Também, obras mais recentes recomendam Quadro 36.7.
que, para realizar tal análise, devam ser utili- A partir da média, são determinados os
zados escores ponderados corrigidos por ida- desvios do perfil. Na literatura específica, en-
de, embora, evidentemente, isto não seja viá- contram-se várias definições do que constitui
vel em todas as escalas. Assim sendo e, a pro- um desvio da média do sujeito. A princípio,
pósito, sabendo que o WAIS e o WISC, embora Wechsler (1958) considerou que um desvio de
considerados por muitos como instrumentos 2 ou mais pontos, a partir da média do sujeito,
ultrapassados, ainda são utilizados no Brasil, seria um “corte” adequado para a maioria dos
vamos recapitular como manejá-los, antes de propósitos. Isto quer dizer que, segundo tal
entrar em discussão sobre escalas usadas ulte- critério, em nosso exemplo, na escala verbal,
riormente. cuja média é de 9,83, os valores de 11,83 e

Quadro 36.7 Levantamento quantitativo dos resultados do WAIS de um sujeito do sexo masculino de 26 anos
Subtestes do WAIS Escore Escore Desvio 2 DP 3 Distribuição Desvio de
bruto ponderado na curva Vincent
Informação 15 10
Compreensão 24 16 (+) (+) (+) (+)
Aritmética 4 4 (-) (-) (-) (-)
Semelhanças 11
Dígitos 9 7 (-)
Vocabulário 59 13 (+) (+) (+)
Soma verbal: 59
Código 29 6 (-) (-) (-)
Completar Figuras 10 8
Cubos 28 9
Arranjo de Figuras 23 10
Armar Objetos 34 11 (+)
Soma de execução: 44

Escala Escore QI Classificação Média + / – DP


Verbal 59 98 Médio 9,83 12,83-6,83
Execução 44 93 Médio 8,80 11,80-6,80
Total 103 96 Médio 9,36 12,36-6,36

558 JUREMA ALCIDES CUNHA


7,83 (9,83±2,00) constituiriam os limites da menos oito subtestes), porque as dispersões vão
zona de escores médios do sujeito. Os escores se concentrar precisamente na área em que as
iguais ou que ultrapassassem tais limites indi- deficiências do sujeito são mais acentuadas.
cariam forças e fraquezas em seu desempenho Até aqui, as considerações basearam-se na
intelectual. O mesmo critério valeria para a es- média observada do sujeito. Não obstante, se
cala de execução, cuja média é 8,80. Assim, levarmos em conta a curva de distribuição da
haveria desvios nos subtestes de Compreensão, população normal, sabemos que, nas Escalas
Aritmética, Dígitos, Vocabulário, Código e Ar- Wechsler, a média esperada é 10. Como os es-
mar Objetos. cores ponderados variam de 0 a 20, com uma
Conforme Wechsler (1958), tais desvios se média de 10 na população geral, os extremos
baseavam num nível de significância de 15%. da curva também se tornam pontos de refe-
A rigor, supõem maior probabilidade de erro rência importantes num psicodiagnóstico. En-
do que nos níveis geralmente exigidos para a tão, os escores de 16 ou mais e de 4 ou menos
pressuposição da significância de diferenças seriam considerados extremamente altos ou
(Anastasi, 1965). Portanto, esses desvios não extremamente baixos, porque se situam dois
são estatisticamente significantes e não podem desvios padrão acima ou abaixo da média da
se prestar para uma interpretação diagnósti- população normal (10,00 ± 2 x 3,00). Nes-
ca. Na prática, podem apenas auxiliar o enten- ta comparação entre o desempenho do sujei-
dimento do desempenho individual, se corro- to e os dados da população normal, em nosso
borados por outros dados, como indícios so- exemplo, chamariam a atenção o escore extre-
mente discretos, já que podem resultar de um mamente alto em Compreensão (16) e o esco-
erro de medida, de um efeito de um fator não re extremamente baixo em Aritmética (4).
controlado. Assim, chamamos tais afastamen- Vincent (1987) combina o procedimento
tos da média de desvios discretos. que toma como ponto de referência a média
Para uma análise mais precisa é indicado o total do sujeito, mais ou menos um desvio pa-
uso do desvio padrão, que, de um ponto de drão (3,00), com o procedimento que leva em
vista estatístico, é plenamente justificável. conta os afastamentos da média da popula-
No WAIS e no WISC, o desvio padrão é de 3 ção geral (10,00), também utilizando o desvio
pontos (Wechsler, 1955). Em nosso exemplo, padrão (3,00). Independentemente da média
os limites da zona de escores médios seriam do sujeito, define os escores de 13,00 e 7,00,en-
12,83 e 6,83, na escala verbal (isto é, a média tre os quais estariam compreendidos os esco-
de 9,83±3,00), e 11,80 e 6,80, na escala de res médios. De acordo com os critérios desse
execução (8,80±3,00). Então, na escala verbal, autor, seriam significantes os desvios da mé-
podemos considerar significantes as elevações dia total do sujeito, iguais ou maiores de 3,00,
de Compreensão (16) e Vocabulário (13) e que- e que, simultaneamente, fossem iguais ou ul-
da em Aritmética (4), enquanto, na escala de trapassassem os escores de 13,00 e 7,00. As-
execução, é significante somente a baixa em sim, em nosso exemplo, sendo a média total
Código (6). Apenas esses desvios devem servir 9,36, constituem desvios os escores que são
de base para conclusões diagnósticas. Conse- iguais ou ultrapassam 12,36 e 6,36 e, simulta-
qüentemente, os desvios relativos de Dígitos e neamente, são iguais ou ultrapassam 13,00 e
Armar Objetos, baseados nos critérios iniciais 7,00. Portanto, segundo os critérios de Vincent,
de Wechsler, constituem meramente indícios podem ser considerados como desvios as ele-
discretos, que podem auxiliar o entendimen- vações em Compreensão (16) e em Vocabulá-
to, se corroborados por outros dados. rio (16) e as quedas em Aritmética (4) e em
Embora vários autores sugiram calcular as Código (6). Não obstante, é preciso lembrar
médias das duas escalas separadas, Vincent que, conforme esse autor, a média total só pode
(1987) discorda de tal procedimento, defen- ser utilizada se estiver baseada, pelo menos,
dendo a utilização clínica apenas da média total nos escores ponderados de oito subtestes ad-
(desde que tenha havido a administração de pelo ministrados.

PSICODIAGNÓSTICO – V 559
Desvios dos escores dos subtestes, em termos tes valores são indicados para se considerar a
da média do sujeito e da adequabilidade da existência de uma diferença real, não suscita-
especificidade dos subtestes, no WAIS-R, no da por erro de medida ou resultante de algum
WISC e no WPPSI fator não controlado. Assim, qualquer subtes-
te que apresente um desvio da média que seja
No WAIS-R, no WISC e no WPPSI, as flutuações igual ou maior que o número de pontos citado
de escore devem ser justificadas do ponto de deve ser considerado com “candidato à inter-
vista psicométrico e estatístico, para que possam pretação individual, que pode refletir uma for-
ser consideradas significantes em nível suficien- ça ou uma fraqueza significante no espectro
te para autorizar uma interpretação clínica. da capacidade da criança” (Kaufman & Reynol-
Conforme Kaufman & Reynolds (1983), duas ds, 1983, p.127).
condições devem ser satisfeitas para tal fim: Entretanto, não é suficiente a certeza da
a) o desvio do escore do sujeito, em rela- presença de uma discrepância significativa.
ção à média, deve ser estatisticamente signifi- Deve-se considerar a proporção relativa da va-
cante; riância específica do subteste e julgar a sua
b) o subteste deve ter especificidade pelo adequabilidade, como base da interpretação.
menos adequada. Conforme Kaufman e Reynolds (1983), “a es-
Calculada a média, como já foi exposto, pecificidade do subteste refere-se à quantida-
para cada escala, verifica-se a diferença entre de de variância, num escore, que é tanto fide-
a média e o escore ponderado de cada um dos digna, quanto única para esse subteste”
subtestes de cada escala. O desvio, para ser (p.127). A classificação dos subtestes, nas es-
significante, deve ser de 3,0 a 4,0, para o WISC- calas do WISC-R, WPPSI e WAIS-R, é apresen-
R e para o WAIS-R, e de 3,0, para o WPPSI. Es- tada no Quadro 36.8, num resumo de Kauf-

QUADRO 36.8 Classificação dos subtestes da Escala Wechsler, de acordo com a proporção relativa na
variância específica de cada subteste
Ampla Adequada Inadequada
WPPSI Vocabulário Aritmética Informação
Semelhanças Desenho Geométrico Compreensão
Casa de Animais (exceto aos 4 Casa de Animais (4 anos)
anos)
Completar Figuras
Labirintos
Cubos
WISC-R Informação Vocabulário Semelhanças (de 9 ½ a 16 ½
Semelhanças (de 6 ½ a 8 ½ anos) Compreensão anos)
Aritmética Completar Figuras (de Armar Objetos
Dígitos 9 ½ a 16 ½ anos)
Completar Figuras (de
6 ½ a 8 ½ anos)
Arranjo de Figuras
Cubos
Código
Labirintos
WAIS-R* Dígitos Informação Vocabulário
Aritmética Compreensão (de 25 a 74 anos) Compreensão (de 16 a 24 anos)
Completar Figuras Semelhanças Armar Objetos
Arranjo de Figuras Cubos
Código
Fonte: Kaufman & Reynolds, 1983, p.128.
*Somente observadas as tendências etárias importantes.

560 JUREMA ALCIDES CUNHA


man e Reynolds (1983), a partir de pesquisas para a escala de execução, com ou sem inclu-
desenvolvidas por Kaufman, Carlson e Reynol- são de Código, e para a escala total (como uso
ds, Gutkin, Reynolds e Galvin. de 9 ou 11 subtestes). Se a diferença da mé-
Como se pode ver, cada subteste pode pos- dia, num subteste, em relação à média, é igual
suir uma especificidade ampla, adequada ou ou ultrapassa o valor crítico correspondente e
inadequada. Uma vez que um subteste apre- é positiva, é assinalada como força; se negati-
senta um desvio significativo, em relação à va, é assinalada como fraqueza, podendo-se,
média do sujeito, e possui uma especificidade portanto, fazer inferências com referência aos
pelo menos adequada, deve-se examinar qual correlatos do subteste.
a interpretação possível. Esta pode ser influen- Deve-se considerar, também, a freqüência
ciada pelas observações realizadas durante a com que ocorre a flutuação observada. Groth-
testagem, sobre o comportamento do sujeito, Marnat (1999) refere dados de pesquisas que
baseando-se nos aspectos medidos pelo sub- registraram que 9 pontos de desvio da escala
teste. Estes decorrem “de uma análise de con- total (7, na verbal e na de execução) não são
teúdo das operações mentais necessárias para dados inusitados.
desempenhar as tarefas exigidas pelo subteste Outra observação importante desse autor
e pela revisão dos correlatos fundamentais na é de que os indivíduos com QI baixo têm me-
literatura de pesquisa” (Kaufman & Reynolds, nos possibilidade de apresentar grande quan-
1983, p.127-128). tidade de desvios, mas, se isto ocorre, deve ter
significação clínica. Entretanto, “uma elevada
amplitude de discrepância entre subtestes pode
Desvios dos escores ponderados dos simplesmente indicar mais um estilo cogniti-
subtestes, corrigidos por idade, no WAIS-R vo, do que patologia ou excepcionalidade”
(p.170). Pode-se considerar elevada, se a dife-
Atualmente, para a interpretação do perfil do rença entre o escore mais alto e o mais baixo
WAIS-R, são sempre utilizados escores ponde- no WAIS-R chegar a 7 na escala verbal, 9 na de
rados, corrigidos pela idade. execução e 10 na total.
Os escores ponderados equivalentes aos Evidentemente, se não foi possível deter-
escores brutos por idade são determinados a minar a presença de flutuações consideradas
partir de tabelas, constantes no manual do significantes, não é possível levar a análise aos
WAIS-R (p.142-150). No manual, há dados para níveis subseqüentes.
as idades de 16-74 anos. Normas para idades
não abrangidas no manual podem ser encon-
tradas em Ryan e colegas (1990) ou em Ivnik e Passo III.b. Desenvolvimento de hipóteses
colegas (1992). São, então, calculadas as mé- com base nas flutuações dos subtestes
dias para cada escala e para a escala total e
determinadas as diferenças, em relação à mé- Dois tipos de raciocínio são de importância na
dia em cada subteste. Estas são consideradas consideração do desenvolvimento de hipóte-
em termos de valores críticos, calculados para ses com base nas flutuações dos subtestes.
cada subteste, com base nos dados da popu- Em primeiro lugar, flutuações dos escores
lação geral por Silverstein, citados por Wechs- ocorrem em razão de vários fatores. Sabe-se
ler (1981a). Por exemplo, se forem usados to- que a elevação ou a baixa de escores podem
dos os subtestes da escala verbal, os valores envolver diferentes funções. Vamos pensar no
críticos são: Informação: 2,4; Dígitos, 2,9: Vo- subteste de Cubos, que pode envolver análise
cabulário: 1,8; Aritmética: 2,8; Compreensão: e síntese, coordenação visomotor-espacial, ve-
2,9; Semelhanças: 3,0. São relacionados, na locidade perceptual, etc. Um escore alto não
folha de análise do WAIS-R (Wechsler, 1981a), significa que o sujeito esteja bem em todas as
também os valores críticos para os subtestes funções, assim como um escore baixo não sig-
da escala verbal, quando foi omitido Dígitos, nifica fraqueza em todas elas. Então, deve-se

PSICODIAGNÓSTICO – V 561
examinar outros dados do perfil, que nos dêem vação” (p.171). Ou poderia ser um efeito da
subsídios para levantar hipóteses num ou nou- ansiedade? O psicólogo deve julgar com inteli-
tro sentido. É preciso, pois, conhecer as impli- gência, temperada por sensibilidade clínica,
cações clínicas de cada subteste, estar familia- para decidir como interpretar uma elevação ou
rizado com as configurações que se apresen- baixa de escore com significação estatística.
tam com freqüência, comparar dados do per- Portanto, não é suficiente a evidência de uma
fil, para poder levantar uma hipótese de que flutuação significativa, para obter uma indica-
uma baixa, por exemplo, em Cubos, significa, ção precisa. É o examinador que deve julgar o
por acaso, um déficit de coordenação ou uma significado clínico de tal dado.
dificuldade de análise e síntese. Por outro lado, este modo de focalizar as
Outra abordagem seria comparar os pa- informações permite às vezes que um peque-
drões de teste com os padrões da sintomato- no indício, mesmo sem significação estatísti-
logia, para decidir se existe base para o desen- ca, adquira sentido clínico dentro do contexto
volvimento de hipóteses. mais geral de observações, durante a testagem,
Esta etapa, portanto, envolve um processo ou de informações sobre o examinando. As-
inteligente de comparar forças e fraquezas sis- sim, no início desta seção (Nível III), lembra-
tematicamente. mos que Wechsler considerava desvios com
base num nível de significância de 15%, que
caracterizamos como desvios discretos (não
Passo III.c. Integração das hipóteses significantes), pois, na verdade, poderiam re-
levantadas com outras informações sultar de um erro de medida, mas poderiam
auxiliar o entendimento do caso.
Em continuação ao passo anterior, aqui é pre- Conforme lembra Groth-Marnat (1999), in-
ciso considerar informações adicionais. Esta é tegrar indícios mesmo sem significação esta-
uma etapa em que a habilidade e sensibilida- tística com outras observações sobre o com-
de clínica do psicólogo é de especial importân- portamento do examinando seria um procedi-
cia, ao apreciar e julgar as hipóteses, dentro mento em harmonia com “a filosofia subjacen-
de um contexto mais amplo, principalmente te da interpretação das escalas e subtestes
cotejando os dados de teste com as observa- Wechsler” (p.171).
ções durante a testagem e com as outras in-
formações que tem sobre o paciente.
Por exemplo, certas quedas de escore po- Nível IV. Variabilidade intrateste
dem se relacionar com determinadas funções
cognitivas, com aspectos afetivos, anteceden- Esta é uma fonte de informação importan-
tes, etc. Por outro lado, um escore baixo em tíssima, que é especificamente explorada no
Aritmética envolve atenção, concentração, mas WAIS-R NI (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991),
também capacidade seqüencial e habilidade em e que se baseia na ordenação crescente da
cálculos ou, mesmo, ansiedade. Como foi o dificuldade dos itens. Como, na maioria das
desempenho em outras tarefas, quanto à sua escalas Wechsler, não houve, no Brasil, uma
atenção? Ou quanto a determinadas séries de análise de item que permitisse uma adapta-
instruções? Suas experiências anteriores fazem ção da ordem de dificuldade dos itens do
com que tenha uma atitude de não aceitação subteste, esta é uma fonte de informação em
de problemas aritméticos? Qual seu resultado parte prejudicada, se quisermos trabalhar
em Dígitos? E mais: Quais seus escores, com- com rigor científico.
parativamente, em Aritmética, Dígitos e Códi- Na verdade, com um pouco de bom senso,
go? Estes subtestes, conforme registra Groth- é possível observar, por exemplo, quando o
Marnat (1999), “têm sido referidos como es- examinando fracassa em itens fáceis e tem êxi-
calas de validade, uma vez que têm probabili- to nos mais difíceis. Apenas, não poderíamos
dade de baixar em conseqüência de má moti- medir, como no WAIS-R NI.

562 JUREMA ALCIDES CUNHA


Podemos observar não apenas em termos queda dos escores. Portanto, só analisando
de acerto e erro, como também em variações cuidadosamente todas as possibilidades, den-
na qualidade da resposta (isto é, irregularida- tro de um contexto amplo (que inclui desde
de de desempenho), independentemente da observações de testagem, história de vida e até
dificuldade do item. Desse modo, obtêm-se da- dados de ordem médica), é possível chegarmos
dos que podem nos dar indícios sobre déficits a interpretações mais acuradas e considerar-
cognitivos (atenção, memória), simulação ou mos as implicações clínicas do perfil. Estas sem-
problemas nas funções do ego. pre devem ser referidas com um caráter pro-
babilístico, como possibilidades a serem me-
lhor investigadas.
Nível V. Análise qualitativa Limitar-nos-emos à discussão das impli-
cações clínicas dos subtestes, com base na
Neste nível, é feita uma abordagem do con- literatura específica, sem uma tentativa de
teúdo das respostas, especialmente nos sub- relacionar indicadores diagnósticos com cri-
testes de Informação, Vocabulário, Compreen- térios diagnósticos de categorias nosológi-
são e Semelhanças. Tais subtestes, primeira- cas, na forma de sua classificação atual, por-
mente o de Compreensão, cujas respostas a que consideramos os estudos a respeito mui-
questões abertas suscitam formulações mais tas vezes insuficientes, quando não insatis-
elaboradas, permitem a intrusão eventual de fatórios. Assim, a eventual referência a cate-
aspectos conflitivos em funções do ego teori- gorias diagnósticas atuais dependerá da ade-
camente livres de conflito. Por vezes, chega-se quabilidade dos achados de pesquisa a res-
a observar uma capacidade inconsistente de peito. Conseqüentemente, caberá ao psicó-
resguardar as operações cognitivas da invasão logo integrar as informações oferecidas com
de aspectos afetivos, principalmente caracte- a observação sobre o sujeito, com sua histó-
rizadas em respostas impulsivas e agressivas. ria clínica e os resultados de outros testes,
Já no subteste de Semelhanças, muitas vezes tendo em mente suas próprias hipóteses de
se notam dificuldades em nível conceitual, com trabalho e os critérios exigidos para a classi-
a emergência de respostas de nível concreto e ficação nosológica.
funcional, eventualmente em desacordo com É fundamental, também, antes de levantar
a capacidade intelectual. Também neste sub- qualquer hipótese interpretativa, que o psicó-
teste e no de Vocabulário, às vezes, são apre- logo se assegure de que está se baseando em
sentados conceitos muito amplos e sincréticos, diferenças reais e não resultantes de erro. As
aspectos confabulatórios, perseverativos, res- escalas Wechsler são instrumentos extrema-
postas inusitadas, absurdas, idiossincráticas, mente valiosos do ponto de vista clínico, mas
etc., bem como associações anômalas, sendo devem ser utilizadas com propriedade cien-
possível obter importantes subsídios em dife- tífica.
rentes dimensões do funcionamento cogniti-
vo ou da personalidade.
Escala verbal

IMPLICAÇÕES CLÍNICAS DAS ESCALAS E A escala verbal envolve as seguintes variáveis:


DOS SUBTESTES WECHSLER • Capacidade de lidar com símbolos abs-
tratos
Como já deve ter ficado implícito, em várias • Qualidade da educação formal e estimu-
das considerações precedentes, as tarefas as- lação do ambiente
sociadas a cada subteste envolvem diferentes • Compreensão, memória e fluência verbal
capacidades, que podem sofrer influências va- Pelas habilidades que as tarefas incluídas
riadas. Em conseqüência, razões muito diferen- na escala verbal exigem, é possível aquilatar
ciadas podem contribuir para a elevação ou que englobam subtestes extensivamente sujei-

PSICODIAGNÓSTICO – V 563
tos à influência de variáveis socioculturais, en- O subteste de Informação mede basicamen-
quanto as escalas de execução são mais isen- te o fundo de conhecimentos que o sujeito
tas de tal influência. Portanto, por uma série mantém armazenado e é capaz de lembrar.
de razões, muitas pessoas costumam ter esco- Exige informações que um indivíduo comum
res mais elevados na escala verbal do que na pode ter a oportunidade de adquirir, seja pela
de execução. Como já foi referido, uma dife- sua experiência geral, seja por meio da educa-
rença de 12 pontos entre os QIs é considerada ção formal. Particularmente, para crianças mais
significante. velhas, adolescentes e adultos, pode-se dizer
Desempenham-se melhor, nos subtestes que mede a capacidade de inteligência cristali-
verbais, pessoas mais inteligentes, com nível zada, considerando que esta “se refere à ex-
de escolaridade elevado, bem como com ten- pressão e à profundidade do conhecimento
dência para valorizar a auto-realização. Tam- adquirido que uma pessoa tem de uma cultu-
bém terão resultados melhores os sujeitos que, ra e a efetiva aplicação deste conhecimento”
por alguma razão, tendem a se desempenhar (McGrew & Flanagan, 1998, p.14). Trata-se de
pior nos subtestes de execução, por lentifica- informações “baseadas em material habitual,
ção depressiva, ou estilo de trabalho lento, di- superaprendido” (Groth-Marnat, 1999, p.174),
ficuldades visomotoras, ou com tarefas práti- sendo, junto com Vocabulário, um subteste es-
cas, ou, ainda, por impulsividade. O QIV maior pecialmente resistente a comprometimento
que o QIE (5-6 pontos) também é mais comum cerebral ou psicopatológico. Oferecendo, as-
entre grupos psiquiátricos e em pacientes com sim, importantes subsídios sobre conhecimen-
problemas de coordenação motora (Groth- to geral, é incluído em praticamente todas as
Marnat, 1999). Por outro lado, registra-se ape- baterias neuropsicológicas em uso (Lezak,
nas uma tendência para diminuição dos esco- 1995), sendo considerado uma excelente medi-
res verbais, em casos com lesão predominan- da da capacidade geral, apesar de altamente cor-
temente ou unicamente no hemisfério esquer- relacionada com o aproveitamento escolar. Re-
do, porém, isto não ocorre de forma muito re- sultados de Informação e Vocabulário, no
gular (Lezak, 1995). Há referências na literatu- WAIS-R, constituem uma variável preditora do
ra de maior freqüência da ocorrência de QI nove desempenho escolar (Groth-Marnat, 1999).
pontos acima do QIE em casos com lesão no Apresenta, pelo menos, seis áreas de con-
hemisfério direito (Groth-Marnat, 1999). Não teúdo de informações (Kaplan, Fein, Morris et
obstante, Lezak (1995) pensa que tal diferen- alii, 1991). Indivíduos com pouca escolarida-
ça não pode ser considerada um indício diag- de, mas inteligentes, podem ter um escore to-
nóstico, porque há várias razões para baixa nos tal baixo no subteste, mas serem capazes de
subtestes de execução em pacientes com défi- ter particular êxito em uma área específica,
cits muito diferenciados, enquanto o próprio dependendo de seu campo de experiência pro-
Groth-Marnat (1999) salienta que “existe uma fissional (Lezak, 1995). Por outro lado, dificul-
complexa interação de um amplo número de dades marcantes em uma ou outra área – ex-
variáveis” (p.173). ceto se devidas a problemas escolares – e as-
sociadas ao tipo específico de erro podem per-
mitir levantar hipóteses sobre determinados
Informação déficits cognitivos (Kaplan, Fein, Morris et alii,
1991).
Extensão do conhecimento adquirido A elevação ou baixa significativa dos esco-
Qualidade da educação formal e motivação res, quando não se explica por aspectos socio-
para o aproveitamento escolar culturais, pode oferecer indícios sobre como a
Estimulação do ambiente e/ou curiosidade pessoa lida com as coisas de seu ambiente,
intelectual sobre seu maior ou menor interesse no meio
Interesse no meio ambiente circundante, e, qualitativamente, podem ser
Memória remota encontrados subsídios a respeito do seu con-

564 JUREMA ALCIDES CUNHA


tato com a realidade. Como se trata de tarefa Roupas escuras x roupas claras: “Roupas
fácil, similar a trabalho escolar, presta-se para escuras são mais leves, roupas claras, mais pe-
se observar indícios de desorganização do pen- sadas” (esquizofrênico).
samento, que se caracterizam por respostas Alcorão: “Como um couro ou um pedaço
inusitadas, bizarras, ou, ainda, pela presença de cordão” (esquizofrênico) (Wechsler, 1958,
de auto-referências. p.180).
Rapaport e colegas (1965) chamam a De nossa experiência clínica, lembramos de
atenção para a propriedade de se inquirir o um caso de uma moça de 21 anos, com um
sujeito sobre uma resposta aparentemente quadro de esquizofrenia paranóide, que res-
absurda, como “A capital da Itália é a Espa- pondeu que “o ano tem 400 semanas”, que o
nha”, por poder se tratar de um lapso de fermento faz crescer a massa do pão porque
atenção, uma informação errônea de um re- “as moléculas do fermento expulsam as molé-
tardado mental ou resultado de uma desor- culas do pão, tomando conta da massa”, que
ganização psicótica. De particular interesse Alcorão é “uma doença alcoólica”, que Apó-
são fracassos ou mesmo sucessos em desa- crifa é o “oposto de aprofofagia” (neologismo),
cordo com a formação cultural do indivíduo. e que quem escreveu Hamlet “foi Alan Kardec...
É muitas vezes possível converter a “fonte de não, foi Shakespeare... não, foi Chico Xavier”.
erro” num indicador diagnóstico útil (Wechs- Não obstante, este último tipo de resposta, que
ler, 1958, p.180). parece envolver um processo de adivinhação,
Outras vezes, não é preciso inquérito, por- também costuma aparecer em transtornos de
que a resposta é reveladora por si só. Assim, conduta e em transtornos de personalidade (May-
sobre a distância entre São Paulo e Rio, se for man, Schafer & Rapaport, 1976). Aliás, as res-
dada a resposta de que “Nunca viajei para lá”, postas citadas antes, que refletem transtornos
não são necessários outros esclarecimentos. Tal de pensamento, têm sido observadas especial-
resposta, que pode aparecer no retardamento mente no WAIS de pacientes com transtornos
mental, foi dada no caso por uma adolescente de personalidade borderline (Hymowitz, 1983).
de inteligência fronteiriça, mas que apresenta- Todavia, é uma tarefa em que geralmente a
va uma depressão grave. Wechsler (1958), po- maioria das pessoas alcança resultado bom,
rém, registra uma resposta similar de um ado- idêntico ou levemente abaixo ao de Vocabulá-
lescente “psicopata”. Todavia, além de hipóte- rio. Na realidade, o escore de Informação de-
ses sobre retardamento mental, de retirada de pende grandemente do conhecimento adqui-
interesse do mundo circundante ou meramen- rido de maneira mais formal, ao passo que o
te de uma atitude impulsiva de oposição ne- de Vocabulário tem muito que ver com o co-
gativista, tal resposta pode envolver um nível nhecimento adquirido espontaneamente, ao
de pensamento mais concreto e, também, uma longo do desenvolvimento. Dada a associação
auto-referência que, se for acompanhada por entre ambos, Rapaport (1965) já observava que
outros indícios no mesmo sentido, poderia su- o escore significantemente mais baixo em In-
gerir uma tendência autista. formação poderia denunciar uma diminuição
Todavia, as respostas bizarras são ainda mais da disponibilidade do conhecimento geral. Se-
significativas e, segundo Wechsler, são dadas gundo ele, isto poderia ocorrer por não-aqui-
principalmente por esquizofrênicos, maníaco- sição (como no retardamento mental), pela in-
depressivos e, ocasionalmente, por “psicopa- terferência de repressão, por perda de interes-
tas”, embora o conteúdo seja diverso. Eis al- se no meio ambiente (por depressão grave) ou
guns exemplos que dá: por perda de contato com a realidade (na es-
Capital da Itália: “Roma, mas pode ter mu- quizofrenia). Entretanto, nos dois últimos ca-
dado” (maníaco-depressivo). sos, os dados devem ser corroborados por evi-
Direção Rio de Janeiro-Panamá: “Eu tomo dências em outros subtestes.
um avião e deixo que o piloto se preocupe com Como Lezak (1995) chama a atenção, quan-
a direção” (“psicopata”). do o escore baixo é observado em pacientes

PSICODIAGNÓSTICO – V 565
com disfunção cerebral sabida ou suspeitada, se, principalmente ou apenas, na maneira su-
torna-se muito importante examinar a diferen- perelaborada de formular respostas, seja pela
ça entre “fracassos devidos à ignorância, à per- riqueza de minúcias, pela prolixidade da lin-
da de informações uma vez armazenadas e à guagem, seja na ostentação de conhecimen-
incapacidade de recordar antigos aprendiza- tos. Estes aspectos podem representar apenas
dos ou verbalizá-los sob ordem” (p.556). Deve- um modo de defesa da personalidade, embo-
se considerar o grau de escolarização e a his- ra, em pacientes obsessivos adultos, o escore
tória social do paciente para julgar se, de um de Informação possa estar acima do de Voca-
ponto de vista probabilístico, algum dia deve- bulário. Todavia, às vezes, as tendências per-
ria conhecer a resposta. Se seu nível de escola- feccionistas podem levar a vacilações, por exi-
ridade for adequado, deve-se inquirir se anti- gências de precisão indevida, baixando o es-
gamente sabia a resposta. Então, o armazena- core (Zimmerman, Woo-Sam & Glasser, 1972).
mento da informação pode ser testado por O escore baixo pode se relacionar, princi-
meio de um recurso de escolha múltipla de res- palmente em crianças, com não-aproveitamen-
postas, como é usado no WAIS-R NI (Kaplan, to escolar, com aspectos culturais, ou com o
Fein, Morris et alii, 1991). Tal estratégia permi- pressuposto de que “conhecimento é uma coi-
te fazer uma estimativa do fundo de conheci- sa perigosa” (Glasser & Zimmerman, 1972,
mento pré-mórbido, comparando-o com o ní- p.45). Isto se associa com uma atitude de “não
vel atual de funcionamento. ver, não ouvir, não falar” em temas que po-
Uma discreta queda em Informação é pos- dem se vincular com conflitos ou suscitar an-
sível em qualquer tipo de disfunção cerebral. siedade. “Depois de um certo tempo, a repres-
Uma baixa marcante pode ser preditora de um são pode deixar de ser dirigida somente para
envolvimento do hemisfério esquerdo, se é conflitos focalizados e se tornar um modo ge-
corroborada por outras diminuições em testes neralizado de adaptação” (Pope & Scott, 1967,
verbais e se outra hipótese não é viável. Por p.73). Assim, os indivíduos que usam repres-
outro lado, pesquisas recentes, ao contrário do são de forma mais generalizada ou maciça
que se pensava, apontam Informação como apresentam escores baixos em Informação. Não
uma medida adequada da gravidade de casos obstante, a ansiedade praticamente não afeta
de demência (Lezak, 1995). os escores (Groth-Marnat, 1999).
Escores elevados podem denotar não só boa Os escores baixos, em crianças, também
memória remota, interesses culturais, interes- podem refletir hostilidade contra aspectos in-
se no meio ambiente, como também uma ati- telectuais ou uma orientação do comportamen-
tude de alerta ou vigilância frente aos estímu- to mais para a ação do que para aspectos cog-
los circundantes. Portuondo (1970b) observou nitivos (Glasser & Zimmerman, 1972). Tal orien-
elevação de escores em indivíduos com traços tação, que subentende a desvalorização de
paranóides, inclusive em casos agudos de es- questões intelectuais, provavelmente justifica
quizofrenia paranóide, que tendiam a baixar o resultado baixo, neste subteste, em adoles-
com a cronicidade. centes com transtornos de conduta.
Os escores elevados também podem se as-
sociar com ambição intelectual ou com uma
forma intelectualizada de lidar com as coisas, Dígitos
uma defesa de caráter obsessivo-compulsivo.
O pressuposto seria de que é necessário co- Extensão da atenção
nhecer tudo, para saber qual a coisa certa a Retenção da memória imediata (dígitos na
ser feita (Pope & Scott, 1967). Em crianças, ordem direta)
ocorre a necessidade exagerada de armazenar Memória e capacidade de reversibilidade
informações, quando o conhecimento signifi- (dígitos na ordem inversa)
ca segurança (Glasser & Zimmerman, 1972). Concentração
Muitas vezes, os aspectos obsessivos refletem- Tolerância ao estresse

566 JUREMA ALCIDES CUNHA


Este subteste é composto por duas partes, inversa ultrapassando dígitos na ordem dire-
que têm em comum a exigência da retenção ta. Essa disparidade “provavelmente reflete a
de dígitos, que são apresentados pelo exami- falta de esforço numa tarefa simples” (Lezak,
nador e que devem ser repetidos pelo sujeito. 1995, p.354), em que se pode pressupor que o
Aparentemente, envolve uma tarefa simples que desempenho do sujeito poderia ser, pelo me-
exige atenção auditiva e memória imediata, tan- nos, tão satisfatório quanto na outra. Eventual-
to que uma criança de três anos pode ter su- mente, tanto em adultos como em crianças,
cesso numa série de três dígitos (Zimmerman, isso pode ser explicado por uma atitude oposi-
Woo-Sam & Glasser, 1976). Talvez em parte cionista, rejeitando o sujeito a ordem direta e
devido à sua vulnerabilidade, esse subteste não se sentindo desafiado frente à ordem inversa.
foi incluído nem no WPPSI, nem no WPPSI-R. Contudo, pode ser suposta a presença de uma
Contudo, Wechsler (1967) justificou a exclusão resistência à tensão numa situação difícil e, por
pela limitada amplitude dos escores. certo, capacidade de controle dos processos
Apesar de envolver memória imediata, es- mentais e flexibilidade.
cores satisfatórios no subteste não significam As causas mais simples para a baixa do es-
memória preservada para tarefas mais comple- core total são déficits auditivos e fadiga. Por-
xas (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991). tanto, qualquer hipótese clínica só é aplicável
Os escores das duas partes do subteste são quando esses dois fatores puderem ser defini-
somados para obter o escore em Dígitos, o que damente excluídos. Uma vez excluídos esses
parece envolver o pressuposto de que as duas fatores, ante a evidência de um escore baixo, o
tarefas subentendam “o mesmo comportamen- único dado real que se tem é da existência de
to ou comportamentos altamente correlacio- um problema de atenção e de memória ime-
nados” (Lezak, 1995, p.357), o que não é o diata, eventualmente associado com interferên-
caso. cia da ansiedade, mas que pode constituir a
Espera-se que adultos com inteligência nor- indicação precoce de algum transtorno mais
mal sejam capazes de reter pelo menos cinco grave, de ordem funcional ou orgânica (Glas-
dígitos na ordem direta e três na ordem inver- ser & Zimmerman, 1972). Contudo, é impor-
sa (Pope & Scott, 1967), enquanto uma crian- tante observar que o estresse também pode
ça normal, de 7 anos e meio, consegue reter, afetar os escores. Quando se suspeita que esta
no mínimo, quatro dígitos na ordem direta e pode ser a explicação, Lezak sugere que o sub-
dois na ordem inversa (Glasser & Zimmerman, teste seja readministrado mais tarde, durante
1972). Essa diferença de dois pontos, ou de o processo psicodiagnóstico. Nesse caso, a
um ponto, é a usualmente encontrada em pes- melhora do desempenho confirma os efeitos
soas normais. Com o passar dos anos, e até os do estresse. Se o escore continua baixo, ou-
70 anos aproximadamente, o número de dígi- tros fatores devem ser considerados.
tos na ordem direta tende a permanecer está- Sujeitos com dificuldades no manejo da
vel, podendo haver a diminuição da extensão ansiedade podem ter problemas neste subtes-
dos dígitos na ordem inversa, o que depende te. Assim, transtornos em nível neurótico ge-
também do nível de escolaridade. Se a dispari- ralmente se associam com uma queda no es-
dade encontrada for maior do que dois pon- core, embora eventualmente obsessivo-com-
tos, isto pode se associar com rigidez do pen- pulsivos obtenham bons resultados (Portuon-
samento, pensamento concreto e falta de re- do, 1970b).
versibilidade do esquema de referência. Tal di- É importante mencionar que o bom desem-
ferença é verificada com mais freqüência em penho exige capacidade de controle do ego
grupos de pacientes com problemas de disfun- sobre os processos do pensamento, além do
ção cerebral, sendo raramente observada en- manejo adequado do input dos estímulos, sem
tre pessoas normais. a intrusão da ansiedade e de componentes
Também pouco comum é se verificar a rela- depressivos. É de se esperar, pois, que os esco-
ção inversa, com o escore de dígitos na ordem res sejam baixos ou muito variáveis, quando

PSICODIAGNÓSTICO – V 567
certas funções do ego estão enfraquecidas, há nal. O escore de 4 seria classificado como bor-
problemas na organização do pensamento derline e o de 3, deficiente, em termos da efi-
(Groth-Marnat, 1999) ou quando existem dé- ciência da atenção (Lezak, 1995).
ficits de ordem cognitiva. O escore de dígitos na ordem direta é baixo
Segundo Portuondo (1970b), os psicóticos na disfunção cerebral, especialmente quando
apresentam escores baixos, além de ocorrer é afetado o hemisfério esquerdo, porém não
disparidade de desempenho entre a ordem di- se apresenta vulnerável a lesões difusas, per-
reta e a inversa. Às vezes, os esquizofrênicos manecendo estável em muitos casos de demên-
utilizam recursos mnemônicos arbitrários, cia. Com o tempo, os déficits são reversíveis,
como o de somar os dígitos (Mayman, Schafer após trauma craniano e psicocirurgia. Com a
& Rapaport, 1976). idade, entretanto, o escore tende a baixar dis-
Nas primeiras edições das escalas Wechs- cretamente, principalmente após os 70 anos
ler, o segundo ensaio de cada série era admi- (Lezak, 1995).
nistrado somente no caso de ocorrência de fra- Dígitos na ordem inversa introduzem uma
casso no primeiro ensaio. Todavia, nas edições dificuldade extra para pacientes com pensa-
mais recentes, ambos os ensaios são adminis- mento concreto, que podem ter problemas
trados e recebem escore, independentemente para compreender a tarefa proposta. Neste
da presença de erro ou de acerto no primeiro caso, Lezak (1995) costuma usar como exem-
ensaio. “A mudança no procedimento de esco- plo a série de dois dígitos ou, mesmo, exem-
re serve para aumentar a variabilidade dos es- plificar a tarefa com uma série de 1-2-3, que,
cores no subteste” (Wechsler, 1981a, p.12). sendo um “padrão inerentemente familiar”, é
Contudo, o escore total continua a ser obtido facilmente revertido. O desempenho, avaliado
pela soma da extensão correta dos dígitos na em termos de escores brutos, pode ser assim
ordem direta e inversa. Segundo Lezak (1995), classificado: “4 ou 5, como dentro de limites
esse procedimento envolve perda de informa- normais, 3 como deficiente borderline ou defi-
ções significativas. Esta crítica pode ser consi- ciente, dependendo dos antecedentes educa-
derada pertinente no campo da neuropsicolo- cionais do paciente, e 2 como deficiente”
gia, já que, sob outros pontos de vista, a ino- (p.367).
vação melhora a qualidade psicométrica do Tal capacidade de reverter dígitos apela mais
subteste. para a memória de trabalho do que a tarefa de
Em caso de avaliação neuropsicológica, dí- dígitos na ordem direta, que envolve mais um
gitos na ordem direta e na ordem inversa são tipo de apreensão passiva. Caracteristicamen-
considerados como dois testes, que “envolvem te, dígitos na ordem inversa associam-se com
atividades mentais diferentes e que são afeta- um funcionamento cognitivo sadio, dependen-
dos diversamente por lesão cerebral” (Lezak, do provavelmente de funções do lobo tempo-
1995, p.357). Por outro lado, se o psicólogo ral. Tanto pacientes com lesão cerebral no he-
estiver interessado em examinar a fidedignida- misfério esquerdo, como com déficits visuais,
de da atenção do paciente e não a extensão apresentam escores baixos nesta parte do sub-
dos dígitos reproduzidos, Lezak sugere a apre- teste. É considerado também vulnerável a com-
sentação de mais ensaios em cada série. prometimentos difusos que ocorrem em qua-
Para propósitos neuropsicológicos, em que dros demenciais, exceto na psicose de Korsako-
o QI é um dado de menor valia, o escore bruto ff. Por outro lado, observa-se reversibilidade
é considerado uma medida suficiente. Na or- dos déficits, no decorrer do tempo, após a psi-
dem direta, em pessoas normais, a variação do cocirurgia (Lezak, 1995).
escore bruto é de 6±1, ainda que possa ser O desempenho do paciente pode ser ava-
influenciada pelos antecedentes educacionais liado quanto à extensão da série de dígitos que
do paciente. Assim, a obtenção de um escore repete, ou qualitativamente, em relação ao tipo
de 6 ou mais estaria dentro de limites normais, de erros cometidos, como erros no seqüencia-
enquanto 5 seria tido como um escore margi- mento dos dígitos, omissão ou adição de dígi-

568 JUREMA ALCIDES CUNHA


tos, respostas perseverativas, etc., que podem ou da vida extracurricular, como por interesses
ter uma significação clínica e são analisados pessoais e idéias. Em outras palavras, para o
no WAIS-R NI (Kaplan, Fein, Morris et alii, desempenho em Vocabulário, é essencial a in-
1991). fluência do ambiente precoce, mas o fundo de
conhecimento semântico pode ser aperfeiçoa-
do por fatores ulteriores (Groth-Marnat, 1999).
Vocabulário A estabilidade temporal dos escores e o
caráter refratário deste subteste têm sido sali-
Desenvolvimento da linguagem entados, inclusive quando à sua insensibilida-
Conhecimento semântico de a vários comprometimentos psicológicos e
Inteligência geral (verbal) neurológicos (Groth-Marnat, 1999) e os depen-
Estimulação do ambiente e/ou curiosidade dentes da idade (Carr, 1975a). Não obstante,
intelectual com a idade, parece se verificar uma queda no
Antecedentes educacionais nível das respostas (Zimmerman, Woo-Sam &
Glasser, 1976). Storck e Looft, em 1973, cita-
Entre os subtestes essencialmente verbais, dos por Lezak (1983), observaram uma dimi-
Vocabulário é especialmente importante. Em nuição de sinônimos, que é a resposta mais
primeiro lugar, porque a sua alta correlação freqüente entre adultos, quando os sujeitos
com a soma da escala verbal o torna uma boa ultrapassam os 60 ou os 70 anos, com uma
medida da inteligência verbal. Em segundo lu- intensificação no uso de definições funcionais
gar, pelo fato de ser uma medida bastante es- ou instrumentais, descrições e demonstração
tável, pouco vulnerável a transtornos, tem sido (mais comuns em crianças) e explicações.
considerado como possível referencial para a Segundo Feifil, citado por Zimmerman e
estimativa da inteligência pré-mórbida (Rabin, colegas (1976), as respostas podem ser cate-
1965), podendo servir de parâmetro para ava- gorizadas em quatro níveis: “1) sinônimos; 2)
liar a diminuição de outras funções. Inspira- uso da descrição; 3) explicação) e 4) explica-
dos nos estudos de Rapaport e colegas (1965), ção de tipo inferior, ilustração e demonstração”
baseados em pressuposições da psicologia do (p.139). Na realidade, quando se pede ao su-
ego, Allison e colegas (1988) sustentam que é jeito que dê o significado de uma palavra, ele
possível avaliar forças e fraquezas no funcio- “a assinala num esquema referencial comple-
namento adaptativo, a partir de dispersões dos xo, no qual o dito conceito é um elemento in-
escores de diferentes subtestes em relação ao ter-relacionado. A definição do mesmo se rea-
de Vocabulário. Não obstante, alertam para o liza, precisamente, tornando explícitas essas
fato de que tal escore não pode ser tomado relações” (Paín, 1971, p.198). A resposta refle-
como referência para pesquisa de certos gru- te um nível de generalização conceitual, com
pos minoritários que viveram, na infância, em base num sistema de referência, que pode ser
ambientes muito empobrecidos ou pouco es- mais primitivo, obtendo-se uma definição em
timulantes do ponto de vista intelectual. nível funcional ou instrumental, ou mais ma-
Para o desempenho neste subteste contri- duro, classificando-se a definição em nível abs-
bui, de forma fundamental, o vocabulário trato. Tal diferenciação permite a atribuição de
adquirido por meio das experiências precoces diferentes escores.
de socialização, cuja extensão e qualidade re- Muitas vezes, porém, a resposta pode ob-
fletem aspectos socioeconômicos e a escolari- ter o mesmo número de pontos, mas ser qua-
dade inicial, não sendo afetado tão decisiva- litativamente diferente. Glasser e Zimmerman
mente pelo aproveitamento acadêmico, como (1972) observam que “existe uma diferença
o são os subtestes de Informação e Aritmética óbvia entre uma criança que define ‘burro’
(Lezak, 1995). Todavia, a qualidade das respos- como um animal, e uma criança que diz: ‘uma
tas reflete a sofisticação do ambiente socio- besta de carga de quatro patas, que é classifi-
cultural, tanto pelas experiências acadêmicas cada com os mamíferos’”. Realmente, a res-

PSICODIAGNÓSTICO – V 569
posta dá ao examinador a oportunidade de te: “Cachorros e leões são semelhantes porque
apreciar tanto a riqueza de idéias da criança, ambos têm células”;
sua qualidade e tipo de linguagem, quanto o c) elipse, verificada pela “omissão de uma
seu grau de pensamento abstrato. Além disso, ou mais palavras (algumas vezes apenas síla-
sucessos e fracassos fornecerão indícios sobre bas) necessárias para completar o significado
o ambiente sociocultural da criança. Esses au- numa frase ou sentença”, como na resposta
tores chamam a atenção, por exemplo, para o ao item “Microscópio”: “Germes’ (omitido ou
fato de crianças de lares de bom nível educa- implícito, um instrumento para aumentar pe-
cional serem capazes de responder a palavras quenos objetos, como germes)” (p.446). Nes-
não comuns, como “dólar” e “espionagem” e te caso, não se inclui a omissão da palavra pro-
fracassar em itens mais fáceis. Por outro lado, posta para definição. Há pacientes com difi-
salientam a importância clínica do “caráter se- culdade de recordar palavras (especialmente
mântico de uma definição, que dá uma com- nomes) e consistentemente deixam de usá-la,
preensão sobre a natureza dos processos de substituindo-a por “alguma coisa” ou “coisa”,
pensamento da criança” (p.67). Do mesmo apesar de conseguirem dar uma definição ade-
modo que Compreensão, Vocabulário oferece quada, podendo-se pensar em anomia (Kaplan,
uma oportunidade de colher indícios bastante Fein, Morris et alii, 1991);
importantes e úteis, do ponto de vista clínico, d) auto-referência, que consiste na “incor-
sobre antecedentes, experiências de vida, to- poração a uma definição de elementos perso-
lerância à frustração, nível e organização do nalizados ou de detalhes que reflitam auto-
pensamento. envolvimento, como para ocultar”, “Esconder-
Lezak (1995) assinala a importância deste se de olhos perspicazes”;
subteste no diagnóstico diferencial, entre ca- e) bizarria, caracterizada por “definições
tegorias que envolvem transtornos nos proces- que implicam associações marcadamente idi-
sos de pensamento e comprometimento cere- ossincrásicas ou justaposição de idéias desco-
bral, dizendo que os pacientes que apresen- nexas”, como, em relação a item “Sentença”*,
tam um transtorno funcional do pensamento “um modo de pensar em gramática” (Matara-
ocasionalmente deixam de lado suas defesas, zzo, 1976, p.446). Pacientes esquizofrênicos,
ante uma prova que “parece um teste inócuo às vezes, dão definições que constituem asso-
de habilidade verbal, revelando um problema ciações retumbantes às palavras-estímulo (Ka-
de pensamento em expressões ‘clangorosas’, plan, Fein, Morris et alii, 1991).
associações idiossincrásicas ou em respostas Entre as categorias citadas, as três últimas
personalizadas ou confabulatórias” (p.541). têm um caráter definidamente desviante e co-
Matarazzo (1976) classifica as verbaliza- mumente se associam com um nível de fun-
ções desviantes, que podem denunciar per- cionamento psicótico. Quanto à primeira, como
turbações no processo do pensamento, em é completamente aceitável para a atribuição
cinco tipos: de escore, pode passar despercebida. Wechs-
a) superelaboração, constituída pela “ten- ler (1958) salienta que a sua interpretação pode
dência a dar significados alternativos e deta- ser variável, já que: a) muitas vezes, constitui
lhes irrelevantes, ou a ser excessiva e desne- apenas um leve indício de uma atitude pedan-
cessariamente descritiva”, que pode ser exem- te; b) noutras, associar-se-ia com sentimentos
plificada pela seguinte resposta ao item “Dia- de insegurança e ambivalência: c) em outros
mante”: “Uma gema; parte da joalheria que casos, assinalaria uma tendência à superinte-
consiste em pedras preciosas; o que se dá a lectualização, que, eventualmente, poderia re-
uma moça quando se está comprometido”; presentar um sinal precoce de esquizofrenia,
b) superinclusão, caracterizada por “uma mesmo que outros sinais estivessem ausentes.
resposta que se refere a um atributo que é
partilhado por tantos objetos que o conceito
perde seu aspecto delimitador”, como a seguin- *No original, consta “Plural, e não “Sentença”.

570 JUREMA ALCIDES CUNHA


Quanto à segunda categoria, é relacionada WAIS-R NI, pois é possível investigar se a pa-
apenas por Matarazzo (1976), mas não por lavra era, ou não, do conhecimento do pacien-
Wechsler (1958). Respostas circunstanciais e te ou se ele não retém o conhecimento semân-
tangenciais são freqüentes entre pacientes psi- tico pré-mórbido (Kaplan, Fein, Morris et alii,
quiátricos. Não obstante, respostas prolixas, 1991).
superdetalhadas e, até, personalizadas ou, de A própria descrição de aspectos qualitati-
outra forma, desviadas, não aparecem apenas vos das respostas, como acabamos de ver, já
em casos com perturbações psiquiátricas, mas demonstra que o caráter refratário do sub-
também podem ocorrer em algumas disfun- teste é realmente relativo. Não obstante, Vo-
ções neurológicas. cabulário é pouco vulnerável a transtornos
Além das respostas desviantes, já examina- “neuróticos”, exceto em casos de depressão
das, Zimmerman e colegas (1976) chamam a grave.
atenção para a possibilidade de serem obser- Em alcoolistas, Vocabulário raramente apre-
vadas, nas respostas, “associações fonéticas senta queda nos escores (Parsons, 1980). Du-
(caverna-taberna), palavreado com termos in- rante o primeiro mês de abstinência, observa-
coerentes, mescla confusa de palavras e perse- mos que os escores se mantêm estáveis (Cunha,
veração inadequada” (p.152). Comumente, Minella, Argimon et alii, 1990), o que corrobo-
quando o examinando oferece uma definição rou os dados da literatura (Wilkinson & Pou-
de uma palavra, que é foneticamente associa- los, 1987).
da à palavra-estímulo (como ao definir a pala- Os escores costumam cair quando há trans-
vra agregar, quando se solicita o conceito de tornos de linguagem (Zimmerman, Woo-Sam
segregar), é porque a palavra ultrapassa o fun- & Glasser, 1976), e, se estão significativamen-
do de conhecimento semântico que possui (Ka- te abaixo da média de outros subtestes essen-
plan, Fein, Morris et alii, 1991). Porém, exis- cialmente verbais, isto pode significar atraso
tem outras possibilidades, como de que tenha do desenvolvimento dessa dimensão específi-
um problema de percepção auditiva ou esteja ca ou a sua diminuição (Rapaport, 1965).
desatento, por falta de motivação. Outra res- Em crianças, problemas emocionais não
posta algo semelhante, porque pode refletir costumam afetar os escores, mas às vezes se
uma extensão de vocabulário limitada, é aquela refletem nos aspectos qualitativos das respos-
em que o examinando responde apenas a uma tas. Por exemplo, para “Catacumba”, “Um bu-
parte da palavra-estímulo, por exemplo, para raco fundo, um lugar que deixa com medo”, e,
compaixão, o sujeito responde amor, definin- para “Isolar”, “É a coisa mais ruim da vida; a
do, portanto, paixão. Ainda outra explicação gente fica vivendo sozinho”. São auto-referên-
possível para tal resposta é de que o paciente cias. Encontram-se, também, auto-referências
se prende a um estímulo que é mais comum. de sentido depreciativo, que não apenas po-
As respostas podem também revelar um sin- dem dar indícios referentes ao autoconceito,
toma de perseveração consistente, que fre- como em relação ao convívio num ambiente
qüentemente se caracteriza pela repetição de que não é sadio, como nas respostas: “Eu sou
expressões, como começar as definições com um burro”; “Eu dou prejuízo”. Em casos mais
“...é uma coisa que...” ou “...é quando...”. As severos, além de desvios já examinados, po-
perseverações podem refletir uma tendência dem-se observar associações pelo som das pa-
não-adaptativa, mas, se aparecerem também lavras, sendo dada, então, a definição da pala-
em outras circunstâncias, podem suscitar uma vra associada; sucessões incoerentes de pala-
hipótese em nível neuropsicológico (Kaplan, vras ou a perseveração da mesma definição,
Fein, Morris et alii, 1991). dada a várias palavras diferentes (Glasser &
O entendimento da significação dos erros Zimmerman, 1972). A confusão entre sons pa-
do examinando, muitas vezes, é mais adequa- recidos (dizer-se “isolar” e o sujeito entender
do quando se utiliza adicionalmente uma ver- “escolar”) é atribuída por Moor (1969) a um
são de escolha múltipla, como no caso do transtorno da percepção auditiva.

PSICODIAGNÓSTICO – V 571
Os resultados altos refletem boa inteligên- ção de operações matemáticas fundamentais,
cia geral, principalmente boas condições so- não ultrapassando o que é usualmente apren-
cioculturais e necessidade de auto-realização. dido na escola ou, conforme Wechsler (1958)
Entre os grupos clínicos, escores altos tendem refere em relação ao WAIS, não indo além do
a se associar com mecanismos de intelectuali- que um adulto comum poderia adquirir em
zação e compulsivos (Groth-Marnat, 1999). Já suas transações diárias. Não obstante, esse
escores baixos refletem fundo de informação ponto de vista não reduz a influência da edu-
pobre (que pode se explicar por fracos antece- cação formal ou da ocupação dos indivíduos
dentes escolares, ambiente desprivilegiado ou sobre os escores. Na verdade, tanto as expe-
inteligência geral limitada), mas também po- riências escolares como as atitudes frente a elas
dem denotar imotivação, hipoatividade (pou- podem afetar o desempenho. Todavia, dificil-
ca responsividade aos estímulos) ou problemas mente os sujeitos atribuem fracassos à falta
de linguagem expressiva. de conhecimento, alegando “nervosismo” ou
problemas de atenção. E, por certo, problemas
de concentração, manipulação conceitual e
Aritmética memória imediata podem comprometer o de-
sempenho de pessoas muito habilidosas em
Capacidade computacional e rapidez no ma- problemas matemáticos (Lezak, 1995). Desse
nejo de cálculos modo, espera-se que o adulto que tenha cur-
Memória auditiva sado o equivalente ao ensino fundamental ou
Antecedentes/oportunidades/experiências pouco mais não encontre qualquer dificulda-
escolares de, a não ser por problemas de concentração.
Concentração, resistência, distratibilidade, Entretanto, em comparação com Informação
raciocínio lógico, abstração e Vocabulário, é um subteste mais estressan-
Contato com a realidade te, por impor mais exigências e pelo limite de
tempo. “Assim, pessoas que são suscetíveis aos
O subteste de Aritmética foi incluído nas perturbadores efeitos da ansiedade têm pro-
escalas Wechsler pela existência de um nível babilidade de serem afetadas desfavoravelmen-
satisfatório de correlação entre raciocínio arit- te” (Groth-Marnat, 1999, p.178). Aliás, já Ra-
mético e inteligência geral (Wechsler, 1958). Por paport e colegas (1965) chamaram a atenção
tal razão, esse subteste consta de várias for- para o fato de que o fator concentração fica
mas reduzidas das escalas. Kaufman, citado por reforçado, neste subteste, pela restrição do
Kaufman e Reynolds (1983), compôs a sua for- tempo de que o sujeito dispõe para chegar à
ma reduzida do WISC-R com a díade Aritméti- solução. Mayman e colegas (1976) afirmavam
ca-Vocabulário, considerando as capacidades que esta “é uma prova de concentração, por-
mentais envolvidas, o potencial desses subtes- que requer uma focalização da atenção, uma
tes para a predição do aproveitamento esco- abstração dos aspectos essenciais do proble-
lar, a saturação do fator g em Vocabulário e o ma e uma elaboração das relações implicadas”
fato de que “a inclusão de Aritmética assegura (p.620). Para Glasser e Zimmerman (1972), o
que o fator de Resistência à Distratibilidade seja subteste explora “a capacidade da criança para
representado” (p.113). Já Rapaport e colegas utilizar conceitos abstratos de número e de
(1965), em vista da vulnerabilidade deste sub- operações numéricas, que constituem medidas
teste entre “neuróticos” e, até, entre normais, do desenvolvimento cognitivo” (p.55). Porém,
achavam que não deveria integrar uma díade em crianças, além de concentração, o desem-
que tivesse como objetivo a triagem de trans- penho pode se associar com atitudes frente às
tornos intelectuais. atividades escolares ou em relação à autorida-
Aritmética é um subteste composto por de, bem como pode refletir a resistência à dis-
problemas, cujas soluções têm que ver com tratibilidade, sendo, também, muito vulnerá-
situações cotidianas, que envolvem a utiliza- vel a estados emocionais. Contudo, escores

572 JUREMA ALCIDES CUNHA


muito baixos, caso não possam ser explicados neste caso, isso pode estar relacionado a seu
por retardamento mental, podem ser sugestivos comprometimento nos laços com a realidade
de transtornos mais sérios, podendo envolver até (Portuondo, 1970b; Rapaport et alii, 1965; Zim-
o comprometimento dos laços com a realidade. merman, Woo-Sam & Glasser, 1976).
Em adultos, as implicações são semelhan- No campo da neuropsicologia, são sugeri-
tes. A atitude frente a tarefas escolares ou aca- das algumas estratégias para avaliar melhor o
dêmicas pode também influir os escores, as- desempenho do paciente. Por exemplo, se há
sim como o uso de intelectualização como de- suspeita ou conhecimento de lesão no hemis-
fesa. O indivíduo com pouca escolaridade, ou fério direito, é recomendada a administração
aquele que acha que não tem aptidão para dos itens iniciais, mais fáceis, porque tais indi-
raciocínio aritmético, geralmente não aceita víduos podem não ser capazes de contar, ain-
bem a tarefa e demonstra tensão e ansiedade. da que resolvam “problemas aritméticos bas-
Escores baixos podem refletir desde simples tante difíceis de um ponto de vista conceitual”
erros de cálculo, interferência da ansiedade ou (Lezak, 1995, p.641). Outra sugestão é a de
“até a despreocupação provocada por uma registrar a resposta do paciente na íntegra,
tendência ao fracasso ou por perda do conta- mesmo quando incorreta. No último item do
to com a realidade, quando são dadas respos- WAIS ou do WAIS-R, isto se torna particular-
tas extravagantes” (Zimmerman, Woo-Sam & mente importante, porque, dependendo da
Glasser, 1976, p.111). resposta, é possível identificar se o paciente foi
Rapaport e colegas (1965) observaram que, capaz de selecionar os dados e aplicar a opera-
no perfil, o escore de Aritmética se apresenta ção matemática correta, errando o cálculo, ou
um pouco acima do de Dígitos e levemente se a resposta resulta de mau raciocínio e de
abaixo da tendência central da escala verbal, o confusão. Também é recomendada a obtenção
que atribuem à ansiedade, mesmo em pessoas de dois escores, um deles atribuído conforme
normais. Tal padrão também é encontrado em as normas do teste, e outro, com desconside-
“neuróticos”, ainda que em nível um pouco ração do limite de tempo. O segundo consti-
mais baixo, embora tendências à intelectuali- tuiria uma estimativa da capacidade aritméti-
zação possam elevar os escores, como no caso ca propriamente dita. Esta orientação é usada
de obsessivos que conseguem associar meti- no WAIS-R NI.
culosidade com rapidez. Também encontraram Ainda duas outras estratégias seriam apli-
resultados mais altos em pessoas com traços cáveis. Tais estratégias são utilizadas no WAIS-
esquizóides. R NI (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991), sendo
Tudo parece indicar que a atitude do sujei- especialmente úteis na avaliação de pacientes.
to frente ao mundo influencia seu desempe- A primeira delas seria a de fornecer ao pacien-
nho. “Uma vez que números provêm do am- te uma folha de papel em branco para os cál-
biente externo, e criam regra e ordem, alguns culos, “se o fracasso parece ser devido a um
indivíduos reagem de forma rebelde”. Assim, déficit de memória imediata, concentração ou
sai-se bem o aluno obediente e o sujeito em clareza conceitual” (Lezak, 1995, p.642). A se-
boas condições socioeconômicas, mas saem- gunda consiste em apresentar o problema im-
se mal personalidades anti-sociais e histriôni- presso, para que o paciente o estude durante
cas, “que não aceitam ordem com facilidade e o tempo que desejar. Com isso, podem ser ob-
geralmente recusam assumir a responsabilida- tidos dois escores: um, como “medida da ex-
de por suas ações” (Groth-Marnat, 1999, tensão em que os problemas de memória e de
p.178). Isso não significa que o escore baixo eficiência mental estão interferindo no mane-
seja característico desses grupos; é, apenas, jo mental dos problemas”, e o outro, como
compatível com sua atitude face ao mundo. “estimativa de suas habilidades aritméticas em
Escores baixos, além de serem comuns em si” (p.643).
retardados mentais e pacientes com déficits A justificativa para a utilização dessas es-
cognitivos, são encontrados em psicóticos, e, tratégias é de que o escore do subteste de Arit-

PSICODIAGNÓSTICO – V 573
mética, obtido em condições-padrão, com su- No mesmo sentido que o subteste de Infor-
jeitos que apresentam disfunção cerebral, mação, o subteste de Compreensão é uma
“pode ser mais confuso do que revelador” medida da capacidade de inteligência cristali-
(p.644), pela exigência de concentração e de zada (McGrew & Flanagan, 1998), já que, para
memória, impostas pela administração oral. realizá-lo, o indivíduo deve demonstrar conhe-
Segundo Lezak (1995), esse tipo de adminis- cimentos práticos adquiridos e aplicá-los a si-
tração baixa os escores de certos pacientes. Por tuações-problema propostas. Na realidade, este
outro lado, o examinador deixa de explorar “os é um ponto crítico do subteste, devendo-se
efeitos do tipo espacial de discalculia, que se primeiramente avaliar se o sujeito está usando
tornam aparentes quando o paciente deve subsídios, aprendidos ao longo de seu desen-
organizar os conceitos aritméticos no papel” e volvimento no meio social, para resolver um
pode deixar de identificar a presença da “ale- problema que lhe é apresentado, de maneira
xia numérica que apareceria se o paciente ti- adaptativa, ou está dando apenas uma de-
vesse de olhar os símbolos aritméticos no pa- monstração de conhecimento superaprendido.
pel” (p.644). Por outro lado, pode não estar utilizando o
Tendem a ser um pouco mais baixos os es- conhecimento de que realmente dispõe de
cores em pacientes com déficits no hemisfério maneira eficiente para resolver o problema.
esquerdo do que no direito. Em alguns casos, Esta é uma hipótese possível, afirma Groth-
também pacientes com lesões no hemisfério Marnat (1999), se o escore de Informação é
direito apresentam queda no escore, em rela- significantemente maior que o de Compreen-
ção aos demais subtestes verbais. Às vezes, o são. Groth-Marnat (1999) sugere também ve-
mau desempenho associa-se com “comprome- rificar se certas respostas, como, por exemplo,
timento na capacidade de organizar os elemen- ao item “Floresta”, “Más companhias” ou aos
tos dos problemas, enquanto em outros casos provérbios soam estereotipadas, como “fala de
pode ser atribuível a “déficits de atenção e papagaio”, ou parecem indicar “uma solução
memória” (p.644). acurada de problema, bom julgamento ou ra-
Em suma, escores altos associam-se com ciocínio abstrato” (p.179). Na realidade, os
boa capacidade computacional associada a itens envolvem temas de interesse comum, isto
uma boa concentração e, conseqüentemen- é, assuntos sobre os quais o sujeito já opinou
te, resistência à distratibilidade, com uma ou já presenciou discussões a respeito, e é ne-
atitude de alerta aos estímulos e bom conta- cessário avaliar como utiliza as informações de
to com o ambiente, além de rapidez no ma- que dispõe sobre normas e regras sociais.
nejo dos números e memória auditiva ime- O contexto do subteste é composto por
diata. Escores baixos, ao contrário, sugerem duas grandes unidades críticas, e é convenien-
pouca capacidade de raciocínio matemático, te analisar as respostas separadamente. A pri-
escassa concentração e, portanto, distratibi- meira é constituída por itens que envolvem
lidade, além de dificuldades de memória au- raciocínio prático, e outra, por provérbios (Le-
ditiva imediata. zak, 1995). Na primeira, como no subteste de
Informação, por exemplo, no WAIS-R, os itens
podem ser agrupados em diferentes áreas de
Compreensão conteúdo: “legal/governamental (itens 4, 8-9,
11 e 16), comportamento pessoal socialmente
Capacidade de senso comum, juízo social, co- aceitável (itens 2, 6-7 e 10) e de conhecimento
nhecimento prático e maturidade social geral (itens 1, 3, 5 e 13)”, sendo possível que o
Conhecimento de normas socioculturais sujeito possa apresentar “um déficit específico
Capacidade para avaliar a experiência pas- de conhecimento ou de juízo em qualquer des-
sada sas áreas” (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991,
Compreensão verbal, memória e atenção p.99). Um déficit na primeira área pode resul-
Pensamento abstrato (provérbios) tar da má qualidade ou falta de aproveitamen-

574 JUREMA ALCIDES CUNHA


to das oportunidades ou experiências educa- pectos qualitativos, assumindo eventualmen-
cionais. Já uma deficiência na área de conteú- te conotações bastante personalizadas e idi-
dos de comportamento pessoal socialmente ossincrásicas. Assim, apenas a título de ilus-
aceitável pode estar associado com impulsivi- tração, são apresentados, nos Quadros 36.9 e
dade ou com um déficit nas funções executi- 36.10, alguns exemplos do WAIS e do WISC, já
vas. constantes da edição anterior.
A pressuposição de que o desempenho nes- Mas nunca é demais lembrar que, pelas ra-
te sentido reflete o quanto o sujeito apresenta zões citadas antes, quaisquer interpretações em
conformidade com normas de sua cultura e se nível de personalidade devem ser feitas com
beneficiou das experiências e oportunidades extrema cautela e dentro do contexto das in-
educacionais é grandemente aceita e, até cer- formações colhidas na história clínica e dos
to ponto, validada pelo fato de que escores de demais subsídios do psicodiagnóstico. Na ver-
Compreensão, segundo pesquisa de Sippo e dade, como afirma Lezak (1995), já ficou ple-
colegas, citados por Groth-Marnat (1999), namente demonstrado por muitos pacientes
apresentaram, junto com Arranjo de Figuras, com lesão no hemisfério direito que “altos es-
relação substancial com medida de inteligên- cores em Compreensão não são garantia de
cia social. Entretanto, o conhecimento do que senso comum prático ou de comportamento
é convencionalmente aprendido traduz-se na razoável” (p.629). Por tal razão, é conveniente
verbalização do que é considerado certo, mas comparar os indícios observados, por exemplo,
isto não constitui uma garantia de que o sujei- “de impulsividade com o que é conhecido do
to seja capaz de manifestar tal conformidade comportamento real do examinando, porque
em seu comportamento, ou, melhor, de que a ambos podem ser completamente incongruen-
resposta realmente expresse “um julgamento tes” (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, p.99).
independente e criador” (Mayman, Schafer & Porém, também parece oportuno lembrar que,
Rapaport, 1976, p.620). Então, há dois aspec- embora uma resposta isolada não possa servir
tos a serem considerados. Um deles é a pro- de base para muitas inferências, “uma respos-
priedade da compreensão do sujeito, a respei- ta infreqüente ou inusitada pode ser significa-
to de certa situação, em que utiliza uma infor- tiva”, já que “um comportamento inesperado
mação prática, internalizada a partir de nor- não é habitualmente uma questão de acaso”
mas socioculturais, particularmente no que (Wechsler, 1967, p.44), devendo ser conside-
concerne a juízo moral. Outro, é o sentimento rado no contexto do teste e associado a outras
que o sujeito tem a respeito. Assim, o conceito fontes de informação.
de juízo envolve um fator emocional, além dos Por outro lado, nessas formulações mais
fatores intelectuais, que o torna “um conceito elaboradas, têm-se uma amostra mais sistemá-
fronteiriço entre as áreas a que freqüentemen- tica da produção da linguagem do que em
te chamamos de ‘intelectual’ e de ‘emocio- outros subtestes, e o examinador deve estar
nal’ ” (Rapaport et alii, 1965, p.42). Em con- alerta para erros que podem resultar de pro-
seqüência, o escore baixo em Compreensão blemas na compreensão da linguagem, da
reflete a possível dificuldade de “entender os memória e da atenção, que podem suscitar
componentes sociais das situações” (Groth- hipóteses de dificuldades cognitivas.
Marnat, 1987, p.75). Por outro lado, ao contrário de subtestes
É importante lembrar que este “é um dos que aceitam respostas de uma única palavra
poucos subtestes com questões abertas, reque- ou de uma única sentença, como nos de Infor-
rendo, de certo modo, formulações verbais ela- mação e Semelhanças, este subteste oferece
boradas” (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, oportunidade para observar aquele examinan-
p.99). do que tende a apresentar uma responsivida-
Isso permite, por um lado, a intrusão de de mínima, o que pode ser atribuído a possí-
indícios associados a conteúdos emocionais, veis razões, como “comprometimento do sis-
que podem ser evidenciados por meio de as- tema subcortical frontal, depressão, ansieda-

PSICODIAGNÓSTICO – V 575
QUADRO 36.9 Exemplos de respostas ao subteste de Compreensão no WAIS que podem envolver
indícios clínicos significativos
Item Resposta Hipóteses interpretativas
1. Roupas “Minha mãe disse.”* Auto-referência; dependência
2. Locomotiva “Porque fabricam assim.” Retardamento mental (?) Bloqueio (?)
“Nunca vi um trem.” Auto-referência; pensamento concreto
3. Envelope “Procuraria me informar de quem é e ia levar Infantilidade; ganho secundário
para o dono. Talvez até fosse recompensado,
se fosse coisa importante.”
“Não é assunto meu.” Esquizofrenia.** Delinqüência*
4. Más companhias “A companhia é a gente que escolhe e se Pseudo-sofisticação; moralismo
escolhe pessoas parecidas.”
... o sujeito arqueia as sobrancelhas, discute o Personalidade histriônica
conceito formulado, ri entre dentes ou faz
referências a si mesmo.**
“Eu não creio necessariamente que devamos Pensamento obsessivo
fazê-lo; há possibilidade de levá-los ao bom
caminho.”
5. Cinema “Pegava o extintor e ia apagar o fogo. Depois, Impulsividade; pensamento ilógico.
chamaria os bombeiros.”
“Se eu percebo, alguém vai perceber em Estado de ansiedade, tonalidade
seguida... (?) Depende do lugar em que obsessiva
estivesse sentado... se estivesse na porta,
ia sair. Se fosse o primeiro, avisava o pessoal
de fora... (?) Os bombeiros.”
“Cantar o hino nacional.”** Esquizofrenia
6. Impostos “Tudo teve sua origem na idéia de que, Conformismo; necessidade de
se não houvesse impostos, não existia controles externos
representação”**
“Porque o Governo obriga. Acham que o povo Esquizofrenia
deve pagar; senão, multam.”
7. Ferro “Sim, pela eletricidade... vai aquecendo... Esquizofrenia
vai aquecendo...”
“Não se pode passar, quando o ferro está frio.” Retardamento mental
8. Menores “Quase todos os menores não são responsáveis... Transtorno de conduta
Caso aconteça alguma coisa... erro no trabalho,
roubo, ele não pode responder e, se não quiser,
não precisa...”
“Evitam que consiga trabalho e dinheiro.” Referência pessoal. Projeção
9. Floresta “Ia tentar encontrar alguém que estivesse lá.” Dependência
“Do mesmo modo que entrei, saía. Negação (?) Falta de reflexão; atitude
Não me perco.” de oposição
“Se estivesse perdido na floresta de dia, me Pensamento obsessivo
guiaria pelo sol.. ou, pelo musgo, que cresce
do lado norte das árvores... ou, talvez, seguiria
uma corrente d’água. Teria uma bússola?
Neste caso, eu... (?) Depende de como fosse o
terreno. Se... (etc.).”**
10. Surdos (em tom confidencial) “Algumas pessoas Esquizofrenia paranóide.** Fobia,
querem manter em segredo, mas eu sei que é hipocondria, auto-referência*
porque sofrem dessa doença. (?) Sim, uma
enfermidade venérea.”
“Porque Deus não quis que nascessem assim.” Desatenção histérica

576 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 36.9 (continuação)
Item Resposta Hipóteses interpretativas
11. Terrenos “Isto não é bem assim. Procurando, se Pensamento concreto, atitude de
consegue uma ‘barbada’.” oposição, contestação
“Eu prefiro o campo.” Auto-referência; contestação
12. Casamento “Para proteção dos filhos.” Atitude ingênua, moralista
“Os homens continuam casando com as Fobia, temores de exploração,
mulheres, se aproveitam delas.” referência pessoal
13. Cão “Enquanto está latindo, não pode morder.” Pensamento concreto, atitude ingênua
“Está errado este ditado, porque o meu late Pensamento concreto; auto-referência,
bastante e morde bastante.” atitude de contestação
14. Andorinha “Precisaria muitas para voarem e fazerem Esquizofrenia
vento, se for o caso.”
“Porque chega o inverno, os passarinhos vão Pensamento concreto; atitude ingênua
para outro lugar, migram para um lugar quente.
Uma só andorinha não vai ir. Vai ir todas.”
* Exemplos apresentados por Zimmerman, Woo-Sam & Glasser, 1976, p.83-85.
**Exemplos apresentados por Mayman, Schafer & Rapaport, 1976, p.632-645.
Observação: Quando se incluem hipóteses com * ou com **, trata-se de caso em que os autores apresentam hipóteses diversas,
para exemplo similar.

QUADRO 36.10 Indícios clínicos em respostas ao subteste de Compreensão no WISC


Item Tipo possível de resposta emocional Exemplos
1. Cortar dedo Preocupação com mutilação, punição “Se saísse sangue, eu choraria.”
por desobediência, dependência dos “Você não deve brincar com faca. Você é mau –
pais diz a mamãe.”
2. Perder bola Empatia, sentimentos de culpa, de “Eu daria todas as minhas.”
falta de cuidado, sentir-se vítima, “Eu não ia dar a minha bola para ele.”
evasão do problema, sentimentos de
responsabilidade e de levar a efeito
3. Comprar pão Desobediência, dependência ou “Comprava bala.”
independência, manejo de temores, “Ia para casa avisar, se a mãe me mandasse, aí eu ia
por causa de dinheiro noutra padaria.”
“Eu teria medo de ir noutra venda; poderia ser
raptado.”
4. Brigar Tendências à atuação, necessidade “Começava a dar nele.”
excessiva de defesa contra a tendência “Não me importava que batesse em mim.”
a atuar, negação da hostilidade, rigidez “Ficava com raiva. É como meu irmão: bate em mim
parental, sentimentos a respeito de e sai correndo.”
irmão
5. Trem Respostas pressagiando mal, respostas “Chamava os bombeiros, saía correndo. Pode ser
demonstrando a responsabilidade (ou que desvie, venha em cima de mim. Não quero ser
impotência) da criança em relação à morta pelo trem.”
ação, sentimentos de culpa, reações “Não sei onde fica o homem que dirige o trem; não
de ansiedade podia fazer nada.”
“Dizer que não fui eu que fiz. A culpa não é minha.”
6. Casa Temas de destruição “Se venta forte, a casa de madeira não é bem
colada e vai morro abaixo.”
7. Criminosos Temas de culpa, de punição “Eles são maus, como eu.”
(de restrição de atividade), problemas “No tempo que estão lá dentro, não fazem mais.”
de atuação

PSICODIAGNÓSTICO – V 577
QUADRO 36.10 (continuação)
Item Tipo possível de resposta emocional Exemplos
8. Naufrágio Temas de diferença sexual e de papel “Mulher vale por muitas pessoas, porque dá para
sexual, papel da criança versus papel ter nenê.”
do adulto, confusão e dificuldade “São mais fracas e têm mais medo.”
“É um ato de cavalheirismo.”
“As crianças têm menos saúde e não sabem nadar,
e as mulheres são fracas, podem estar grávidas e
vão para o fundo.”
9. Cheques Sentimentos de culpa, ênfase no gastar, “No cheque, a gente sempre tem dinheiro.”
orientação de comprar agora e pagar “Não precisa pedir dinheiro a toda hora, para o pai
depois, discussões parentais sobre ou marido.”
dinheiro
10. Caridade Preocupação com dissipação. “O pobre pode comprar algo que faz mal.”
Preocupação com exploração “Quem pede é maloqueiro, muito espertinho.”
11. Empregos Preocupação com comunismo e “Para pegar espiões.”
infiltração.** Preocupação com saúde “Para ver quem tem mais saúde, quem não
provoca desastres.”
12. Algodão Preocupação com gastos. Preocupação “É barato.”*
com asseio** “Para limpar os germes.”*
13. Senadores Preocupação com exploração.** “Assim, se tem um Hitler.”
(Preocupação com necessidade de ajuda) “O Presidente não pode governar sozinho.
Tem de haver pessoas para darem idéias.”
14. Promessa Exploração, culpa. (Tema religioso) “Agradecer o favor, senão, da outra vez, não será
atendido.”
“Porque é um pecado.”
“Se faz e não cumpre, não tem fé no que faz.”
“Se não cumpre, está mentindo.”
*O tipo de respostas e os exemplos marcados com um asterisco foram transcritos de um quadro da obra de Glasser & Zimmer-
man, 1972, p.48-49.
**Estão marcados com dois asteriscos os tipos de preocupações que não parecem comuns em nosso meio.
Observação: Os tipos de respostas registrados entre parênteses, bem como os exemplos sem asterisco, são de material clínico
colhido pela autora sênior.

de ou comportamento oposicionista” (Kaplan, êxito em itens deste tipo, enquanto a resposta


Fein, Morris et alii, 1991, p.98). E, assim, uma correta traz dúvidas ao obsessivo, na pressu-
vez que as instruções induzem a respostas aber- posição de que “se o fogo é tão grande, ao
tas, o subteste oferece, dentro do WAIS-R, por ponto de perturbar a pessoa, e, ainda assim,
exemplo, “a melhor oportunidade do clínico tão pequeno que presumivelmente ninguém
observar a disfluência, a dificuldade de encon- mais se deu conta, num grande cinema, pode
trar palavras, a parafasia e a perseveração ver- ser tolice sair procurando o gerente ou um
bal” (p.99). porteiro” (p.742). Dessa maneira, a seleção de
Carr (1975) examina o item do WAIS (man- alternativas lógicas suscita dúvidas e vacilações,
tido no WAIS-R) sobre o princípio de incêndio, que podem provocar incerteza, associada a
num cinema, para demonstrar como a atitude “uma atitude pedante, que leva o sujeito a re-
diversa do “histérico” e do obsessivo, ao lon- jeitar as opiniões mais vulgares” (Mayman,
go da prova, pode influir decisivamente no es- Schafer & Rapaport, 1976, p.631), que se re-
core. Assinala que os sujeitos que se baseiam flete em escores baixos, nos obsessivos, en-
“na estrutura externa e na aprendizagem pre- quanto o seu uso de intelectualização os leva
coce”, no caso os “histéricos”, tendem a ter a apresentar escores elevados em Informação

578 JUREMA ALCIDES CUNHA


e Vocabulário. Como salienta Groth-Marnat mento desta função (Groth-Marnat, 1999).
(1999), indivíduos muito analíticos encontram Também é importante observar que “o fracas-
dificuldade de compreender o contexto social so nos itens fáceis indica juízo comprometido”,
das situações. mesmo que haja êxito em alguns outros mais
Entendido plenamente o contexto do sub- difíceis (p.179). Eventualmente, porém, até
teste, não fica muito clara a inclusão, em algu- esquizofrênicos crônicos alcançam bons esco-
mas escalas, de três provérbios, que não são res, por perdurarem vestígios de juízo, desen-
consistentes com o propósito dos demais itens, volvido na fase pré-mórbida, e observam-se,
refletindo mais qualidades de pensamento abs- então, respostas estereotipadas ou clichês ver-
trato (Carr, 1975a), e que requerem, portanto, bais, associados a normas convencionais (Ra-
um nível de capacidade mais elevado para a paport, 1965). Da mesma forma que, para al-
solução de problemas. Neste sentido, as res- guns pacientes com disfunção cerebral, “Com-
postas corretas, nesses itens, associam-se com preensão se tornou um teste de aprendizado
um bom nível de inteligência geral. antigo” (Lezak, 1995, p.630).
As respostas do examinando aos itens de Por outro lado, os escores podem baixar em
provérbios “requerem que o respondente tra- sujeitos com dificuldade de expressão verbal
te os elementos (‘andorinha’, ‘verão’, etc.) e, especialmente, naqueles com pensamento
como metáforas, para identificar o conceito mais concreto, que terão dificuldade de elabo-
abstrato que cada um representa, identificar rar suas respostas com base numa premissa
as relações entre os elementos, captar a idéia hipotética (Zimmerman, Woo-Sam & Glasser,
geral expressa e para encontrar palavras espe- 1976).
cíficas com as quais expressar a idéia” (Kaplan, No caso de Compreensão recair quatro pon-
Fein, Morris et alii, 1991, p.99). A má qualida- tos de escore ponderado, abaixo de Vocabulá-
de da educação formal e do meio sociocultu- rio, conforme Groth-Marnat (1999), possivel-
ral, bem como uma limitação intelectual pré- mente há algum comprometimento da função
mórbida, são fatores que podem levar a uma do juízo, impulsividade ou comportamento
resposta que denota um pensamento concre- hostil em relação ao ambiente. Não obstante,
to ou a uma resposta que constitua um pro- pacientes psiquiátricos muitas vezes têm esco-
vérbio não-equivalente. Não obstante, even- res baixos não apenas por prejuízo desta fun-
tualmente os aspectos concretos podem se ção do ego, mas também por problemas na
associar com uma disfunção cerebral. Tais res- percepção, idéias idiossincrásicas ou, ainda, por
postas concretas ou aquelas que constituem impulsividade ou aspectos anti-sociais.
uma interpretação literal dos componentes do Em crianças, os escores elevados podem se
item tendem a aumentar com a idade e apare- associar com pensamento prático, amplitude
cem com freqüência em casos com patologia no campo experiencial, elevada capacidade de
frontal ou no hemisfério direito. organização de conhecimentos, maturidade
Considerando o subteste como um todo, social e da função do juízo, bem como uma
Lezak (1995) afirma que, “quando o dano é capacidade satisfatória de verbalização de
difuso, bilateral ou localizado no hemisfério idéias. Superprodutividade e respostas múlti-
direito, o escore de Compreensão provavelmen- plas podem ser devidas a tendências compul-
te fica entre os melhores indicadores da capa- sivas ou a um alto nível de aspiração. Já os es-
cidade pré-mórbida”, e, por outro lado, “sua cores baixos podem ser atribuídos a uma série
vulnerabilidade a déficits verbais o torna um de fatores, como: a) restrições de ordem física
indicador útil de envolvimento do hemisfério ou psicológica, que limitam a capacidade de
esquerdo” (p.630). lidar com o ambiente, como em casos de su-
Os bons resultados encontram-se em sujei- perdependência; b) pensamento concreto; c)
tos que têm a função do juízo bem preserva- dificuldades de verbalização, seja por escassa
da, caindo sensivelmente quando o nível de experiência de transmitir idéias de forma ver-
funcionamento é psicótico, por comprometi- bal, seja por necessidade de perfeccionismo,

PSICODIAGNÓSTICO – V 579
que leva a acréscimos e especificações, que rências possíveis do ponto de vista cognitivo,
comprometem a qualidade da resposta; d) pre- parece importante que seja capaz de deter-
sença de idéias fóbicas associadas a temas sus- minar o nível em que o sujeito pode estabe-
citados por alguns itens; e) atitude de oposi- lecer relações de classificação entre duas “coi-
ção à testagem; f) mau controle dos impulsos sas”, como as apresentadas nos itens de Se-
(Glasser & Zimmerman, 1972). melhanças.
Um conceito possui um âmbito ou uma ex-
tensão própria e um conteúdo. No âmbito de
Semelhanças um conceito, pressupõem-se todas as coisas
ou idéias por ele subentendidas. Elas precisam
Raciocínio lógico e formação conceitual verbal apresentar qualidades semelhantes para serem
(pensamento abstrato) abrangidas pelo conceito. A soma dessas coi-
Raciocínio indutivo, com identificação de sas qualitativamente semelhantes é o âmbito
aspectos essenciais de não-essenciais ou extensão. Portanto, o âmbito do conceito
Desenvolvimento da linguagem e fluência “laranja” abrange todas as coisas que apresen-
verbal tam qualidades tais que permitam que sejam
pensadas como “laranjas”. As qualidades pres-
Esta também é uma medida da inteligência supostas num conceito são várias. A soma des-
cristalizada (McGrew & Flanagan, 1998), no sas qualidades, comuns às coisas incluídas no
sentido de que o indivíduo busca subsídios em âmbito de um conceito, denomina-se conteú-
sua memória remota, pelo que é muito impor- do (Mayman, Schafer & Rapaport, 1965; Rapa-
tante a influência de antecedentes ambientais port et alii, 1965). As relações de classificação
e da estimulação da linguagem, mas sem dú- estabelecem-se a partir do conteúdo conside-
vida não é possível o indivíduo prescindir de rado, isto é, com base neste é feita uma rela-
sua capacidade de abstração e de sua fluência ção qualitativa entre as coisas, de forma a clas-
verbal para chegar a obter altos escores (Gro- sificá-las ou colocá-las numa determinada ca-
th-Marnat, 1999). tegoria. Portanto, as relações fundamentam-
O subteste apresenta uma tarefa em que o se em qualidades, que podem ser superficiais,
sujeito tem de explicar o que um par de obje- funcionais ou essenciais. Isso envolve a idéia
tos ou temas têm em comum, proposta em de ordem ou de hierarquia de abstração. Pode-
itens ordenados por dificuldade crescente. Tal se falar também em níveis, nos quais os sujei-
seqüência crescente de dificuldade envolve, tos buscam subsídios para elaborar as suas res-
inicialmente, memória, compreensão e capa- postas.
cidade associativa, passando gradativamente À medida que a criança cresce, vai ampli-
a requerer uma capacidade conceitual, que ando seu campo experiencial e vai sendo cada
exige que o sujeito distinga características es- vez mais capaz de generalizar, isto é, de definir
senciais das não-essenciais. Essa variação gra- o âmbito de um conceito, como também de
dativa de dificuldade pode ser observada prin- verbalizar relações entre as coisas, que vão
cipalmente no WPPSI, no WISC, no WISC-R e denotando um nível mais alto de abstração.
no WISC-III, introduzidos com itens que envol- Da mesma forma, quanto mais inteligente for
vem analogias simples, para passar, posterior- um indivíduo, mais capacidade terá para esta-
mente, a uma formulação que leva a uma com- belecer abstrações de nível mais elevado. Em
paração, que exige que o sujeito estabeleça termos de formação de conceitos, podemos
relações de classificação. Nas escalas para adul- considerar três níveis hierárquicos, exemplifi-
tos, este tipo de comparação está implícito a cados, a seguir, em relação ao item “Em que
partir do primeiro item. são parecidas uma laranja e uma banana?”
No momento em que o examinador não se Uma resposta tipo “As duas têm casca” seria
propõe apenas a reunir elementos para deter- classificada no nível concreto. Isto é, o sujeito,
minar o QI, mas pretende fazer todas as infe- dentre o conteúdo possível a ser explorado,

580 JUREMA ALCIDES CUNHA


utiliza uma característica ou qualidade concre- genérico que expressa seu vínculo conceitual”,
ta, comum a ambas. Da mesma forma, pode- como no caso de “laranja-banana-fruta”. Esta
ria usar uma situação concreta em que ambas “constitui uma série verbal coerente, que pode
se encontrem, no caso de uma mesa e uma permanecer intacta até quando a formação
cadeira, por exemplo, dizendo que “ambas es- ativa de conceitos sofra certa desorganização
tão na sala de jantar”. e as implicações do termo genérico ‘fruta’ se
As respostas de que “Uma laranja e uma percam” (Rapaport et alii, 1965, p.42). Entre-
banana são parecidas porque ambas se co- tanto, nem sempre os itens envolvem conexões
mem” ou “a madeira e o álcool porque quei- tão simples, de modo que, entre os subtestes
mam” caracterizam o nível funcional. O con- essencialmente verbais, esta é a prova mais
teúdo vinculador seria constituído por uma vulnerável a transtornos que afetam o pensa-
função que se executa com ambas, no primei- mento conceitual. Portanto, para avaliar o
ro exemplo, e que ambos “executam”, no se- quanto são lógicos o pensamento do sujeito e
gundo. o nível de abstração de que é capaz, geralmente
Num terceiro nível, conceitual abstrato, são a análise não é tão fácil como se poderia su-
consideradas apenas as características essen- por. Mesmo o indivíduo que apresenta certo
ciais, comuns a ambos os objetos, e o conteú- comprometimento de seu pensamento abstra-
do vinculador seria um termo geral ou genéri- to geralmente pode dar alguma resposta de
co, que os abrange. Em comparação com este, nível 2, nos itens mais fáceis, em função da
o conteúdo dos dois primeiros níveis é “dema- memória, caindo para respostas de nível 1,
siado limitado e não implica todo o conteúdo quando tem de usar ativamente a sua capaci-
essencial comum a ambos os objetos” (May- dade de abstração. Essa possibilidade de ava-
man, Schafer & Rapaport, 1976, p.619). liar o funcionamento cognitivo do ponto de
Esta distinção em níveis – concreto, funcio- vista conceitual faz com que esse subteste seja
nal e abstrato – é, pois, muito importante para considerado uma ótima medida da capacida-
que se possa fazer uma estimativa sobre o fun- de mental geral.
cionamento conceitual do sujeito. Duas crian- O subteste apresenta elevada correlação
ças ou dois adultos podem somar 10 pontos com a inteligência geral, pelo que pode ser
de escore ponderado no subteste, situando-se utilizado como estimativa do potencial, quan-
num nível médio e, em termos de pensamento do os escores dos demais subtestes se apre-
conceitual, terem respondido em níveis dife- sentam muito irregulares e é possível excluir
rentes. Por exemplo, muitos casos de lesão ce- certos fatores como responsáveis pela varia-
rebral que apresentam comprometimento da ção do escore. Conseqüentemente, a elevação
capacidade de raciocínio abstrato tenderão a deste escore contra-indica a hipótese de uma
dar respostas concretas no subteste de Seme- limitação intelectual definida, especialmente se
lhanças. Neste caso, saber que um sujeito ob- o escore de Cubos não é igual ou não está abai-
teve 10 pontos de escore ponderado no sub- xo de dois desvios padrão da média da popu-
teste de Semelhanças nos informa pouco, mas lação geral. Mas, evidentemente, quando o es-
saber que estes 10 pontos resultaram de res- core é considerado isoladamente, é importan-
postas em que o escore bruto individual de um te determinar o escore ponderado, em termos
era a regra e não a exceção realmente nos diz do grupo etário, em muitos casos de adultos,
alguma coisa sobre o funcionamento cogniti- como também é conveniente examinar como
vo do sujeito. o escore se compõe, no que se refere ao nível
O subteste de Semelhanças pressupõe uma conceitual das respostas individuais.
“formação verbal de conceitos”, em que “o Em crianças, também esta distinção de ní-
sujeito pode resolver os problemas sem recor- veis é importante, porque diferencia uma res-
rer às próprias ‘coisas’ ”, mas elabora a sua posta superior de uma resposta superficial,
resposta a partir “de uma relação de coerên- fornecendo indícios quanto ao funcionamen-
cia... entre o nome das duas ‘coisas’ e o termo to intelectual. Alguns escores totais, mesmo

PSICODIAGNÓSTICO – V 581
que possam ser considerados relativamente 1975a), como no item Cachorro-Leão, “Depen-
satisfatórios, porque ficam numa zona média, de da hereditariedade” ou “O cachorro pode
podem indicar um nível de funcionamento in- ser animal de estimação” (Matarazzo, 1976,
telectual que tende a ser medíocre, porque o p.450). Podem ter sucesso nos itens mais difí-
escore total é constituído predominantemen- ceis e fracassar nas respostas fáceis, contami-
te de respostas cujo escore é um, ainda que a nando-as com incorreções, como “Uma laran-
fase de desenvolvimento da criança deva ser ja e uma banana são frutas cítricas” (Mayman,
considerada. Por outro lado, há casos com pro- Schafer & Rapaport, 1976, p.642), ou produ-
porções variáveis de respostas, que recebem zem respostas superabstratas, por demais am-
créditos de 0, 1, e 2, que, embora possam ter plas e sincréticas, como, para Cachorro-Leão,
um funcionamento irregular, provavelmente “Ambas são formas de vida” (Matarazzo, 1976,
apresentam maior potencialidade e possibili- p.450), “São compostos de células” ou “Caren-
dades (Glasser & Zimmerman, 1972). tes de inteligência humana” (Mayman, Scha-
A capacidade de pensamento conceitual, fer & Rapaport, 1976, p.642). Tais respostas se
exigida pelo subteste, sofre menos a interfe- caracterizam por serem sobreideacionais, mas,
rência de estados emocionais e de problemas às vezes, aparecem respostas concretas (We-
na função do juízo do que Compreensão. chsler, 1958) e confabuladas, como “O ovo e a
Em crianças com traços obsessivos, o esco- semente se parecem, porque se dá semente aos
re pode ser bom, uma vez que se beneficiam pintos, para que cresçam e ponham ovos”
com o fato de respostas múltiplas correspon- (Mayman, Schafer & Rapaport, 1976, p.642).
derem a maior crédito. Já os escores mais bai- É, pois, um subteste indicado para detectar
xos se encontram, às vezes, em crianças mais “formas idiossincrásicas ou patológicas de for-
velhas, caracterizadas por um pensamento mação de conceito” (Groth-Marnat, 1999,
mais concreto, “rigidez nos processos de pen- p.180).
samento (‘Eles não são parecidos’) e distorção As respostas perturbadas, caóticas, desor-
séria dos processos de pensamento”, como ganizadas, que caracterizam a emergência do
também como resultado de “profunda descon- processo de pensamento primário, também são
fiança (‘Você está tentando me lograr; eles não encontradas em pacientes com transtorno de
são parecidos’)” (Glasser & Zimmerman, 1972, personalidade borderline, ainda que, especifi-
p.64). camente neste subteste, os esquizofrênicos
E, em seguida, o subteste é especialmente demonstrem maior comprometimento que
sensível a disfunções cerebrais, independente- eles.
mente de localização, com exceção de algu- No grupo esquizofrênico, quando se obser-
mas categorias muito específicas, nas quais va um escore relativamente elevado, é prová-
pode permitir uma estimativa da capacidade vel a existência de traços paranóides (Mayman,
pré-mórbida. Já quando o déficit cerebral afe- Schafer & Rapaport, 1976). O subteste geral-
ta funções verbais, Semelhanças torna-se gran- mente não é afetado na esquizofrenia para-
demente vulnerável, e a baixa correspondente nóide, a não ser em casos crônicos e deteriora-
“se associa com envolvimento temporal e fron- dos, em que o escore cai abaixo de Vocabulá-
tal esquerdo” (Lezak, 1995, p.606). rio (Rapaport et alii, 1965). Já Portuondo
Tanto pacientes com comprometimento (1970b) acha que, com o aprofundamento do
cerebral como esquizofrênicos tendem a apre- inquérito, se verifica que as “abstrações” dos
sentar escores baixos, mas o estilo das respos- pacientes paranóides representam apenas res-
tas é diferente. Os primeiros têm maus resul- postas estereotipadas, subjacente às quais “só
tados por dificuldades de abstração, produzin- existe um conceito concreto” (p.62).
do mais respostas “Não sei” do que esquizo- Altos escores indicam não apenas alto ní-
frênicos e normais (Lezak, 1983); os segundos, vel de abstração, mas conseqüentemente boas
principalmente pela incursão de idéias bizar- condições para insight, sugerindo um bom
ras e idiossincrásicas nas respostas (Carr, prognóstico em processo psicoterápico (Gro-

582 JUREMA ALCIDES CUNHA


th-Marnat, 1999). Quando os escores são mui- tenha se associado com possível história de
to altos, pode-se levantar a hipótese de ten- lesão no hemisfério esquerdo, não há compro-
dências à intelectualização. Já escores baixos vação, registrando-se apenas uma tendência
podem se associar com déficit da capacidade não regular nesse sentido (Lezak, 1995).
de abstração e rigidez do pensamento. Toda-
via, eventualmente, traços obsessivos podem
ocasionar uma queda dos escores, em vista do Completar Figuras
aspecto polêmico e pedante no manejo dos
temas (Mayman, Schafer & Rapaport, 1976). Reconhecimento e memória visual, organiza-
ção e raciocínio
Interesse e atenção ao ambiente, concen-
Escala de execução tração e percepção das relações todo-parte
Discriminação de aspectos essenciais de
A escala de execução, segundo Groth-Marnat não-essenciais
(1999), envolve:
• “O grau e a qualidade do contato não- Sendo um teste que envolve reconheci-
verbal do indivíduo com o ambiente mento de material pictórico, pode oferecer
• A capacidade de integrar estímulos per- eventuais dificuldades para quem tem algum
ceptuais e respostas motoras pertinentes déficit visual, particularmente para pessoas
• A capacidade de trabalhar em situações idosas (Lezak, 1995). Por isso, exclua qual-
concretas quer hipótese nesse sentido, antes de tentar
• A capacidade de trabalhar rapidamente interpretar a qualidade e a quantidade das
• A capacidade de avaliar informações vi- respostas.
soespaciais” (p.180). O sujeito deve reconhecer o estímulo, usan-
A escala de execução sofre menos a influên- do subsídios da memória remota, e organizar
cia da educação formal. Uma diferença signifi- o material evocado, estabelecendo relações.
cante (p<0,05) com a escala verbal é de 12 Para fazer isso, recorrerá ao raciocínio, poden-
pontos. Pessoas que têm o QIE significantemen- do usar juízo prático ou estabelecer relações
te mais elevado do que o QIV apresentam ca- em nível conceitual. Para isso, concorrem fato-
pacidades de organização e perceptuais em alto res cognitivos e/ou emocionais. Por exemplo, a
nível, têm facilidade de trabalhar sob pressão pessoa que responde que “falta o mastro”, no
do tempo, e “a solução imediata dos proble- item Bandeira, “responde ao óbvio ou tende a
mas é melhor desenvolvida do que a solução pensar em termos concretos simples” (p.634).
de problemas baseada no conhecimento acu- Também, pode dizer que “falta o remador no
mulado” (Groth-Marnat, 1999, p.181). Mane- barco”, pela mesma razão, ou por ter pouca
jam bem problemas práticos e, geralmente, não iniciativa. Na realidade, personalidades passi-
provêm de bom nível socioeconômico, nem vas, dependentes, podem dar tal resposta, por
têm bom aproveitamento escolar, têm dificul- sentirem a ausência de agentes para as ações
dades de linguagem, problemas em nível de que percebem nas figuras (Groth-Marnat,
conduta e comportamento atuador. A predo- 1999). Tal referência a detalhes obviamente
minância dos escores de execução ainda é co- ausentes, como a água ao redor do carangue-
mum “no autismo, retardamento mental, jo, a cores, ao outro lado num perfil, especial-
transtornos de aprendizagem, analfabetismo, mente quando se repete, sugere um tipo de
delinqüência, transtorno de conduta ou psico- pensamento anormalmente concreto e é co-
patia, populações bilíngües e indivíduos de ocu- mum na esquizofrenia, embora não exclusi-
pações (...) que enfatizam habilidades visoes- vamente. Pope e Scott, já na década de 60,
paciais” (p.181). observavam que, para tais sujeitos, o objeto
Ainda que, tradicionalmente, a predomi- parece tão vívido e real que o leva a uma asso-
nância dos escores de execução sobre verbais ciação de caráter eminentemente pessoal.

PSICODIAGNÓSTICO – V 583
Dinamicamente, este tipo de resposta po- prejuízo lateral, os escores de Completar Figu-
deria ser entendido como uma forma caracte- ras costumam ser mais elevados que os dos
risticamente extrema de projeção, em que algo subtestes especialmente vulneráveis à disfun-
é inserido na figura e, depois, removido. Em ção específica. Assim, se o paciente tem um
crianças, parece sugerir “fluidez excessiva do comprometimento no hemisfério esquerdo, o
pensamento” (Glasser & Zimmerman, 1972, escore deste subteste costuma ser mais eleva-
p.75). do do que nos subtestes de caráter eminente-
No WAIS-R, são principalmente os itens 2, mente verbal. Se é no hemisfério direito, o es-
4, 6, 10-11, 14 e 20 que, por “requererem in- core de Completar Figuras é mais elevado que
ferências cognitivas de nível mais elevado, os demais subtestes de execução. Desta ma-
muitas vezes eliciam respostas concretas, tais neira, pode servir como o “o melhor indicador
como ‘A mão segurando o jarro’, para o item de teste da capacidade prévia”, especialmente
6” (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, p.77). Tais quando o paciente apresenta dificuldade para
erros de percepção também ocorrem por dis- formulações verbais complexas” (Lezak, 1995,
funções cognitivas, em pacientes com compro- p.636). Observa-se que pacientes com anomia
metimento neurológico. são capazes de localizações corretas, mas sem
A elevada correlação deste subteste com denominá-las. Por exemplo, um paciente res-
Informação, no WAIS, sugere que também pondeu o seguinte ao item 4 do WAIS-R (apon-
memória remota e informação geral sejam as- tando o centro da carta de jogar): “Deveria
pectos implícitos por Completar Figuras (Lezak, haver outra dessas coisas aqui” (Kaplan, Fein,
1995). Morris et alii, 1991, p.77).
No WAIS-R, os itens “que exigem correta Entretanto, algumas disfunções localizadas
identificação da parte omitida e acurada me- se caracterizam por detalhes negligenciados
mória visual” são 1, 5, 7, 8, 15, 18 e 19 (Ka- num dos lados da figura ou por percepções
plan, Fein, Morris et alii, 1991, p.77). falhas em determinado quadrante da figura
Observa-se que uma atitude negativista (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991).
muitas vezes leva a uma queda dos escores, Por outro lado, ainda que pareça que a preo-
por insistência de que nada falta. Mas essa cupação com minúcias da experiência possa
necessidade de negar a omissão pode se asso- favorecer os obsessivos, geralmente este não
ciar a uma preocupação com a integridade é o caso, porque a ansiedade pode compro-
corporal (Glasser & Zimmerman, 1972; Zimmer- meter a sua eficiência, em razão de suas dúvi-
man, Woo-Sam & Glasser, 1976), possivelmen- das e vacilações.
te relacionada com ansiedade de castração. Os esquizofrênicos caracterizam-se por
Entretanto, ao expressar a necessidade de ne- fracassos nos itens fáceis e sucessos nos mais
gar a omissão, o sujeito, criança ou adulto está difíceis. Também a incapacidade de reconhe-
projetando a culpa pela sua dificuldade no cer o objeto, com um nível intelectual médio
material de teste, embora também possa fazê- ou alto, é típica de confusão psicótica, na es-
lo em relação ao examinador. Eventualmente, quizofrenia. Todavia, pacientes paranóides,
quando se critica pela dificuldade, está inter- “manifestamente alertas a discrepâncias e de-
nalizando a culpa. Tais indícios de projeção e talhes menores, podem se sair bem neste sub-
internalização são observados mais freqüente- teste” (Carr, 1975a, p.742). Diríamos que o es-
mente em crianças (Glasser & Zimmerman, quizofrênico (pelo menos, quando deteriora-
1972), mas também são encontrados em adul- do) fracassa neste subteste em função de dis-
tos. Já Groth-Marnat (1999) comenta que tal torções perceptuais e conceituais ou, funda-
tipo de resposta algumas vezes é dado por in- mentalmente, pela natureza de seus laços com
divíduos oposicionistas, negativistas e rígidos. a realidade; o paranóide pode ter escores rela-
Completar Figuras freqüentemente não é tivamente bons ou até elevados, por sua atitu-
um subteste discriminativo para lesões cere- de de vigilância frente ao mundo. Já o depres-
brais, no sentido de que, quando existe um sivo não vai bem, porque o subteste envolve

584 JUREMA ALCIDES CUNHA


interesse na realidade e exige rapidez. Os de- bonificação por tempo é um fator que influi
pressivos psicóticos constituem o grupo clíni- consideravelmente.
co com escores mais baixos neste subteste. Compreendendo a significação dos estímu-
Uma vez que tanto esquizofrênicos como los, o sujeito deve dispor as figuras numa se-
depressivos psicóticos apresentam escores bai- qüência temporal lógica (Carr, 1975a). Portan-
xos neste subteste, excetuando a análise qua- to, “pensamento seqüencial – incluindo a ca-
litativa das respostas, o diferencial faz-se pelo pacidade de perceber relações entre eventos,
exame dos demais resultados da escala de exe- estabelecer prioridades e ordenar atividades
cução, porque os depressivos apresentam uma cronologicamente – também desempenha um
baixa sistemática de todos eles, enquanto os papel significativo neste subteste” (Lezak,
esquizofrênicos não (Rapaport et alii, 1965). 1995, p.639).
Em resumo, escores elevados costumam se Basicamente, o sujeito deve ver e perceber
associar com boa acuidade visual, interesse e os estímulos visuais de maneira correta, com
familiaridade com o mundo circundante, per- atenção aos detalhes, para, então, poder ar-
cepção acurada das relações todo-parte, capa- ranjar os cartões numa seqüência adequada.
cidade de julgar o que é essencial, diferencian- Portanto, desatenção, problemas visuais e per-
do-o do não-essencial (já que, segundo Cohen, ceptivos constituem fatores de fracasso. A ob-
citado por Lezak [1995], este é o subteste de servação durante a testagem e a comparação
execução análogo a Compreensão) e bom con- do escore obtido com o de Completar Figuras,
tato com a realidade. Escores baixos podem se que também envolve organização visual, aju-
associar com a ausência ou diminuição de tais dam a discriminar quando o escore baixo se
capacidades ou presença de depressão, ansie- deve a transtornos visuais ou perceptuais (Ra-
dade ou impulsividade. paport et alii, 1965), ou quando se associa a
dificuldades na organização da seqüência pro-
gressiva (Glasser & Zimmerman, 1972). A soli-
Arranjo de Figuras citação de uma história pode ser muito eluci-
dativa, porque eventualmente um sujeito pode
Capacidade para organizar e integrar lógica e conseguir chegar a um arranjo correto, “sem
seqüencialmente estímulos complexos qualquer apreciação do ponto principal da sé-
Compreensão da significação de uma situa- rie”, como salientam Kaplan e colegas (1991,
ção interpessoal, julgando suas implicações, p.82), sendo o contrário também possível. Na
determinando prioridades e antecipando suas realidade, tem de haver uma avaliação certa
conseqüências, num certo âmbito sociocultural dos detalhes (elementos-chave) e uma aprecia-
Processamento visual ção do ponto essencial ou idéia principal para
o êxito no desempenho.
Este subteste pressupõe que o sujeito te- Cada arranjo pressupõe uma idéia princi-
nha capacidade para captar a significação de pal, que deve ser captada. Como exemplo,
uma situação social, que ocorre num contexto no Quadro 36.11, vamos reproduzir os pon-
sociocultural. Portanto, a falta de familiarida- tos principais das séries incluídas no WAIS-
de com aspectos socioculturais, por provir o R, como são apresentadas por Kaplan e cole-
sujeito de ambiente desprivilegiado ou diferen- gas (1981).
te, pode prejudicar o desempenho, por dificul- A consideração da percepção dos elemen-
dade de entender implicações e o humor su- tos-chave e da apreciação do ponto principal
bentendido, recomendando Groth-Marnat pode ter interesse clínico numa avaliação neu-
(1999) cautela ao interpretar resultados em tais ropsicológica de pacientes, já que o descuido
casos específicos. Esse autor também chama a com pequenos detalhes é mais freqüente em
atenção para o fato de que muitas hipóteses casos com disfunção no hemisfério esquerdo,
interpretativas não se aplicam ao subteste de enquanto dificuldades na captação do ponto
Arranjo de Figuras do WISC-III, já que, neste, a principal da história ou do humor são mais

PSICODIAGNÓSTICO – V 585
QUADRO 36.11 Idéias principais pressupostas dificar o esquema de referência seja “um sinal
pelas séries de figuras dos itens de Arranjo de clássico de problemas perceptuais” (p.80).
Figuras do WAIS-R
Essa abordagem passiva, em que o exami-
Item Ponto principal nando manuseia pouco os cartões (se é que
1. Construção de uma casa do início ao fim. faz algum movimento) é um erro que costuma
2. Rei namorando mulher. aparecer em casos de lesão frontal direita, se-
3. O rapaz confunde o pai da moça com ela, para gundo McFie, em trabalho de 1975, citado por
quem é a serenata.
4. Homem põe fim à briga de meninos por causa
Kaplan e colegas (1991). Mas, evidentemente,
de livro cômico e o toma. devem também ser consideradas hipóteses em
5. Mulher puxa a porta para abri-la, ao invés de nível psicológico, como falta de motivação, por
empurrá-la. exemplo.
6. Prisioneiro rouba as roupas de outro recluso. Outras dificuldades que causam interferên-
7. Mulher termina ajudando o homem que está
tentando ajudá-la.
cias no arranjo seqüencial são “confusão con-
8. Criado esteve pondo peixe na linha de pescar ceitual, distorção perceptual ou problemas de
do rei. juízo e raciocínio” (Lezak, 1995, p.617), mes-
9. Homem, depois de dar a um pedinte uma maçã, mo em sujeitos sem comprometimento neuro-
este o assalta à mão armada para roubar seu lógico.
dinheiro.
10. Homem fica envergonhado, porque, do lado de
A necessidade de compreensão de situações
fora da janela do táxi, o busto parece ser de uma sociais, para a realização do subteste, parece
mulher real. ter três conseqüências imediatas.
Fonte: Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, p.82-84 (adaptado). Em primeiro lugar, a facilidade de estabele-
cer relações sociais genuínas e de participar
mais extensivamente de atividades sociais pa-
rece favorecer o desempenho. Assim, são refe-
ridas pesquisas em que pessoas introvertidas,
associadas com disfunção no hemisfério direi- mas normais, tiveram escores mais baixos nes-
to, segundo os autores citados antes. te subteste, enquanto universitários que desen-
Por outro lado, para arranjar as figuras em volviam muitas atividades extracurriculares ten-
ordem ou para captar a significação da situa- diam a apresentar escores acima de 10 pontos
ção, o sujeito precisa compreendê-la ou ter o (Matarazzo, 1976).
que se costuma chamar de “inteligência social”. Em segundo lugar, a utilização da chama-
As condições essenciais para tal pressupõem da “inteligência social”, em proveito próprio,
um funcionamento cerebral e intelectual satis- desconsiderando direitos alheios, parece levar
fatório. Na realidade, pode-se supor que o con- a um incremento no escore deste subteste.
teúdo seqüencial do subteste só seja acessível Matarazzo (1976) cita uma pesquisa em que
a determinado nível intelectual. Aliás, este sub- foi verificado que indivíduos com escores ele-
teste, junto com Cubos, é considerado como vados eram “mais sensíveis a estímulos sutis”
medida de inteligência não-verbal (Groth-Mar- (p.415) do que aqueles com escores baixos.
nat, 1999). Então, espera-se que os sujeitos Também existem referências de que um escore
com limitações ou problemas cognitivos mui- de 3 pontos acima da média, neste subteste, é
tas vezes tendam meramente a trocar uma fi- encontrado em adolescentes com transtorno
gura de lugar ou apresentem um comporta- de conduta, havendo a sugestão de que a ten-
mento perseverativo, utilizando sempre os dência à atuação, à manipulação de pessoas,
mesmos movimentos. Glasser & Zimmerman com sentido anti-social, pode levar a uma pre-
(1972) explicam que o fato de que, na primei- dominância deste subteste, no perfil (Portuon-
ra série do subteste, no WISC, seja necessário do, 1970b; Zimmerman, Woo-Sam & Glasser,
mudar apenas a primeira figura pode levar à 1976).
manutenção do contexto dessa solução, ainda Em terceiro lugar, dificuldades de estabele-
que considerem que tal incapacidade de mo- cer vínculos afetivos ou problemas no relacio-

586 JUREMA ALCIDES CUNHA


namento em geral levam a uma queda no es- externos que estejam direta ou indiretamente
core deste subteste. Assim, tanto “neuróticos” com esses relacionados” (p.36). Hartmann
como principalmente psicóticos têm um mau (1968) afirma que “o princípio de realidade
desempenho. também implica algo essencialmente novo, a
Portanto, desconsiderando antecedentes saber, a conhecida função de antecipação do
socioculturais, pode-se levantar a hipótese de futuro, orientando nossas ações de acordo com
que escores baixos se associam a dificuldades ela e relacionando os meios e os fins entre si”
de interpretar situações sociais, por problemas (p.40).
no teste de realidade (psicóticos) ou oriundos Já foi referido que, em geral, o subteste se
do próprio envolvimento emocional na situa- mostra vulnerável a comprometimento cere-
ção (“neuróticos”). Já quando as relações são bral, mas os escores tendem a se mostrar mais
adequadas (normais), a expectativa é de que baixos no caso de lesões no hemisfério direito
os escores sejam adequados. Quando as rela- do que no esquerdo, especialmente no lobo
ções são estabelecidas mais em função dos in- temporal direito (Lezak, 1995).
teresses e desejos pessoais (em transtornos de Groth-Marnat (1995), revisando estudos de
conduta e transtorno anti-social), os escores outros autores, afirma que: a) um escore mui-
tendem a se elevar. to baixo em Arranjo de Figuras, quando a dife-
Pressuposições deste tipo devem estar sub- rença QIV-QIE é escassa, pode se associar com
jacentes a uma fórmula antiga, que examina a a hipótese de lesão no lobo temporal direito
relação entre subtestes – Completar Figuras + anterior; b) lesões mais generalizadas no he-
Cubos e Arranjo de Figuras + Armar Objetos – misfério direito ocasionam baixa neste subtes-
para obter indícios do nível de funcionamento te, bem como em Cubos e Arranjo de Objetos;
do sujeito. No caso, a predominância do pri- c) também pode haver queda de escores neste
meiro par sobre o segundo sugere um funcio- subteste em casos com disfunção no lobo fron-
namento “neurótico”, enquanto a predominân- tal, mas principalmente atribuída a uma res-
cia do segundo par sobre o primeiro é compa- posta impulsiva, com desconsideração da si-
tível com a pressuposição de uma tendência tuação total.
“psicopática” (Portuondo, 1970b). Na realida- Em crianças, além das dificuldades já cita-
de, a primeira díade envolve aspectos mais li- das, a ansiedade pode levar à mistura das fi-
vres de conflito, e a segunda seria mais vulne- guras ao acaso, assim como a distração transi-
rável a conflito emocional. Desta maneira, exis- tória ou o comportamento impulsivo podem
te alguma lógica, nessa fórmula, que estabele- baixar os escores. Assim, em muitos casos, a
ce uma relação em que a ênfase, para um ou história contada pode ser muito ilustrativa.
outro lado, parece depender, ponderavelmen- Conforme Glasser e Zimmerman (1972), “os
te e em grande parte, do escore mais baixo ou temas infantis podem ser diretamente infor-
mais elevado em Arranjo de Figuras. Não obs- mativos; os temas bizarros podem esclarecer a
tante, considerando o número de variáveis que extensão da patologia” (p.80), de modo que
podem afetar os escores, inclusive questões as histórias contadas freqüentemente envol-
associadas à organização perceptual, essa fór- vem punição ou fuga, por causa de travessu-
mula só pode ser usada com muita cautela e ras e de outros aspectos de importância cru-
com o apoio de dados subsidiários. cial na vida da criança. A associação de uma
A queda de escores parece poder ter outra história incorreta com uma seqüência correta
explicação, associada ao fato de que o subtes- ou vice-versa, tanto em crianças como em adul-
te exige uma capacidade de antecipação e pla- tos, é um indício importante e pode denunciar
nejamento. Arieti, citado por Dickstein e Blatt falhas na função do juízo, perturbação nos pro-
(1967), considerando a importância da anteci- cessos de pensamento, disfunção cerebral ou,
pação como função do ego, a conceituou como apenas, impulsividade.
“a capacidade de prever ou de predizer even- Os escores baixos em crianças também po-
tos futuros, mesmo quando não há estímulos dem sugerir problemas na organização visual

PSICODIAGNÓSTICO – V 587
(como nas figuras colocadas “de lado”) ou, até, Além disso, a observação da maneira como o
falha no teste de realidade, como em soluções indivíduo trabalha oferece indícios sobre aspec-
bizarras, que não podem ser explicadas por tos emocionais, atitudes para consigo mesmo,
déficit perceptual (Glasser & Zimmerman, limitações e erros.
1972). Os escores altos devem ser considera- Na escala para pré-escolares, este subteste
dos em função dos aspectos clínicos envolvi- representa basicamente uma tarefa de classifi-
dos no subteste. cação e perceptomotora (Wechsler, 1967). As-
Já Groth-Marnat (1999) diz que os indiví- sim, muitas das hipóteses aqui levantadas a ela
duos com escores altos “são usualmente refi- não se aplicam.
nados, têm alto nível de inteligência social e O sucesso no desempenho de Cubos exige
demonstram uma capacidade de rapidamente que o sujeito seja capaz de decompor o mode-
antecipar as conseqüências de atos iniciais”, lo em partes ou unidades e de escolher, entre
enquanto aqueles com escore baixo “podem os cubos disponíveis, as unidades com que
ter uma pobreza de idéias, dificuldade de pla- pode reconstruir o todo. Basicamente, portan-
nejar, processamento de informações lento, um to, requer que o sujeito utilize a sua capacida-
mau senso de humor, dificuldade nas relações de de análise e síntese, buscando relações en-
interpessoais e mau rapport” (p.184). tre as faces dos cubos e o modelo. A rapidez e
a facilidade com que estabelece tais relações
fornecem indícios quanto ao seu nível de con-
Cubos ceitualização visoespacial, conforme Lezak
(1995). O insight precoce favorece a boa quali-
Capacidade de análise e síntese dade do desempenho. O nível mais alto de con-
Capacidade de conceitualização visoespacial ceitualização é demonstrado pelo paciente que
Coordenação viso-motor-espacial, organiza- percebe a gestalt num relance e constrói o de-
ção e velocidade perceptual senho de forma correta e rápida, raramente
Estratégia de solução de problema precisando olhar novamente o modelo. Num
segundo nível, o paciente demora um pouco
Cubos é um subteste não verbal, bastante mais para compreender o modelo, tenta ma-
isento de influências socioculturais ou da edu- nipular um cubo ou dois e, a seguir, constrói o
cação formal, apresentando uma relação subs- desenho corretamente e sem vacilações, ou,
tancial com a inteligência geral, constituindo, por outro lado, o paciente consulta o modelo
portanto, uma boa medida de inteligência para repetidas vezes durante a sua construção. Num
a avaliação de pessoas provenientes de dife- terceiro nível, o paciente constrói o desenho,
rentes ambientes culturais (Groth-Marnat, através de ensaio ou erro, prosseguindo cubo
1999), sendo afetado quase exclusivamente por a cubo, na busca da coerência entre a sua có-
disfunção cerebral e depressão. Assim, no caso pia e o modelo. Este desempenho é típico do
de estarmos seguros de que os escores não sujeito com capacidade média. Pode não che-
estão rebaixados por problemas de coordena- gar a perceber a gestalt como um todo e até
ção (geralmente fáceis de observar), déficits “nem considerar o formato quadrangular, mas,
perceptocognitivos ou por interferências emo- em virtude de sua percepção acurada e seus
cionais, podemos utilizar o escore deste sub- hábitos de trabalho ordenados, muitos podem
teste como uma boa estimativa do potencial resolver mesmo os problemas de desenho mais
intelectual do sujeito. difíceis” (Lezak, 1995, p.590). Tais indivíduos,
O desempenho neste subteste fornece uma de capacidade média, podem compreender
boa amostra das estratégias que o sujeito tem imediatamente, pelo menos, os problemas dos
para a solução de problemas, uma vez que a cinco itens mais fáceis, passando, a seguir, a
tarefa permite que se observem seus hábitos utilizar ensaio e erro. Conforme Lezak (1995),
de trabalho, se não existe prejuízo maior de “outro indicador do nível de capacidade, nes-
suas capacidades visoespaciais (Lezak, 1995). ta tarefa de organização perceptual, é o nível

588 JUREMA ALCIDES CUNHA


do desenho mais difícil, que o sujeito compre- laterais dos cubos, além da parte de cima,
ende imediatamente” (p.590). quando eles são usados para a demonstração.
Segundo Paín (1971), é principalmente o Isto poderia sugerir uma abordagem “inusita-
elemento duração que pode nos sugerir o ní- damente concreta” ou, ainda, tendências com-
vel de desempenho, porque “por ensaio e erro pulsivas, perfeccionistas. Por outro lado, os
é provável chegar a representar o modelo, mas autores também sugerem que a criança possa
isto consome um tempo próximo ao limite” estar sendo hostil em relação ao examinador,
(p.200). Na realidade, o tempo relaciona-se sob uma aparência de supercomplacência, que
com o nível conceitual e com eficiência. Assim, poderia constituir a “sua resposta típica a exi-
“escores elevados, neste teste, dependem, até gências de autoridade” (p.86). Outra alternati-
certo ponto, da velocidade, particularmente em va seria a de que tal tipo de construção pudes-
sujeitos mais jovens” (Lezak, 1995, p.590). En- se indicar uma atitude de alerta excessiva aos
tretanto, para melhor entendimento do sujei- detalhes do ambiente, às vezes por medo de
to, é sumamente importante, além de regis- ser acusada por não fazer tudo exatamente
trar indícios sobre as características tempera- como foi solicitado. Todavia, acreditamos que
mentais e críticas positivas ou negativas ver- tais interpretações possam não se aplicar a
balizadas, que o examinador se detenha no crianças com menos idade. No WPPSI, os cu-
desempenho seqüencial e na abordagem, con- bos não são tridimensionais, justamente por-
ceitual ou de ensaio e erro, e, nesta, verificar que havia sido observado que as cores e as for-
se o sujeito prossegue metodicamente ou ao mas das faces laterais atrapalham a criança e,
acaso, observando, também, as soluções errô- mesmo que a demonstração com cubos tridi-
neas. mensionais melhore um pouco a confusão,
Glasser e Zimmerman (1972) fazem uma pareceu insuficiente para as de 4 a 5 anos (We-
série de observações sobre o desempenho in- chsler, 1967).
fantil neste subteste, as quais, em grande par- Na criança, a falha em se dar conta de que
te dos casos, parecem ser úteis quando se lida o desenho deve ser quadrangular sugere defi-
com adultos. Assim, um manuseio marcado por ciência na capacidade de formar conceitos sim-
excessiva atividade, dando sucessivas voltas nos ples, enquanto a dificuldade de usar cubos bi-
cubos que estão na mesa, ou girando-os in- colores para a construção de um modelo, se-
cessantemente, particularmente quando o su- gundo Glasser e Zimmerman (1972), “usual-
jeito os gira ao mesmo tempo, um em cada mente indica uma falha no desenvolvimento
mão, é um comportamento que se observa tan- perceptual, uma vez que isto deveria ter sido
to em crianças como em adultos, e que está atingido aos sete anos de idade” (p.86). Entre-
freqüentemente associado com ansiedade tanto, esses autores não são claros quanto ao
manifesta, por dificuldades com o controle ini- tipo de modelo a que se referem, porque há
bitório. Outra forma de manifestação de an- dois padrões distintos, que envolvem o uso de
siedade ocorre quando o modelo é copiado de cubos bicolores, para formar uma diagonal,
forma rápida e correta, com exceção de um que pressupõem erros diversos. Em alguns
cubo, que não chega a ser corrigido. Talvez isso modelos, a diagonal ocorre “discretamente”,
possa se dever “aos efeitos incapacitantes da e o erro fica caracterizado pela má orientação
repressão sobre a consciência da integridade de um cubo, mais do que por um fracasso em
do padrão” (p.85). A ansiedade também pode relação à configuração total. Conforme Lezak
se evidenciar no manuseio desajeitado, sem (1995), este erro é cometido não só pelo sujei-
planejamento, no fracasso em conferir a có- to que apresenta problemas visoespaciais, mas
pia com o modelo e em outras abordagens por descuido ou por indivíduos com capacida-
casuais. de abaixo da média. Em outros modelos, a di-
Um procedimento não muito freqüente, agonal delineia-se pela justaposição de dois ou
mas que se observa tanto em crianças como mais cubos. Ocorre fracasso em pessoas com
em adultos, é a tentativa de copiar as faces pensamento mais concreto e em sujeitos que

PSICODIAGNÓSTICO – V 589
apresentam déficits visoespaciais, “particular- MODELO
mente naqueles com lesão no hemisfério di-
reito” (p.588). A a) rotação
De um modo geral, problemas perceptuais
e a má organização espacial refletem-se nos A b) inversão
escores. Os transtornos de estruturação espa-
cial ficam evidentes, não só pela observação
do desempenho do paciente, mas no próprio B considerado como exato
modelo construído. Podemos ver, na Figura
36.4, modos de reprodução de modelos no sub-
C
teste de Cubos do W-B, de sujeitos com tais
transtornos, apresentados por Moor (1969),
que são muito ilustrativos. Foram observados I
em crianças com problemas de dislexia e dis-
grafia, apresentando as seguintes característi-
II
cas:
a) rotação;
b) inversões; III
c) dificuldade de orientação nos cubos bi-
colores;
d) muitas hesitações, lentidão extrema, com IV
conclusão do modelo após o limite de tempo;
e) fracasso em modelo fácil e êxito em itens
mais difíceis; V
f) construção correta, a seguir desfeita, para
voltar a ser reiniciada;
g) reprodução inexata, da qual a criança não VI
se dá conta, apesar de resultados elevados em
outros subtestes.
Fonte: Moor, 1969, p.201.
Note-se que algumas dessas características
são atribuídas à ansiedade, por Glasser e Zim- Figura 36.4 Modos de reprodução de Cubos, na escala
W-B, apresentados por sujeitos com transtorno de es-
merman (1972).
truturação espacial.
Outras características dos modelos constru-
ídos que envolvem fracassos na reprodução da
gestalt foram classificados por Elizur (1965)
como desconsideração da cor, da forma, da ção elevada entre esses dois subtestes, e que
localização e lentidão, e associados por ele com ambos são sensíveis à patologia cerebral. Mas
problemas orgânico-cerebrais. Na realidade, não é sempre que ambos baixam simultanea-
tais fracassos também são comuns em casos mente. Na discussão sobre o subteste de Ar-
que estritamente não podem se classificar mar Objetos, serão apresentados certos pa-
como “orgânicos”, decorrentes de alterações drões de combinação entre os dois subtestes e
no desenvolvimento neuropsicológico em sua significação específica.
crianças. De um modo geral, nos adultos há baixa
Portuondo (1970b), a partir de sua expe- em Cubos em qualquer comprometimento ce-
riência com o W-B, afirma que o escore muito rebral, especialmente em lesões lateralizadas,
baixo em Cubos, combinado com o escore sendo o desempenho pior quando a localiza-
muito baixo em Armar Objetos, é um sinal pa- ção é parietal, no hemisfério direito. Os esco-
tognômico de “complicação orgânica” (p.66). res não baixam tanto se a lesão é no hemisfé-
Hoje em dia, sabe-se que existe uma correla- rio esquerdo, “exceto quando o lobo parietal

590 JUREMA ALCIDES CUNHA


está envolvido”, conforme McFie, citado por meiro mês de abstinência. Posteriormente, em
Lezak (1995, p.592). Na realidade, existem pes- trabalho desenvolvido pelo mesmo grupo
quisas que demonstram que ambos os hemis- (Cunha, Minella, Argimon et alii, 1989a), veri-
férios desempenham algum papel no proces- ficou-se que a média dos escores, neste sub-
samento visoespacial. “A análise de erro é es- teste, se mostrava baixa, após uma semana de
sencial para fazer distinções entre os déficits abstinência, tendendo a se normalizar na quar-
espaciais de pacientes com lesão cerebral uni- ta semana, já que a primeira medida era
lateral” (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, p.88). compatível com a presença de déficit cogniti-
Observam-se confusão, simplificação dos mo- vo, havendo uma reversibilidade aparente du-
delos e manejo concreto dos padrões. Também rante o primeiro mês. Por outro lado, uma vez
apresentam maus resultados pacientes com a que Vocabulário se mostrou uma medida está-
doença de Alzheimer e aqueles com lesões fron- vel, durante o período, foi utilizado como pa-
tais que não têm problema perceptivo, mas râmetro, para analisar as diferenças em rela-
apresentam “apraxia construcional” (Lezak, ção a outros subtestes. Na primeira adminis-
1995, p.593). Lesões no hemisfério direito as- tração, verificou-se a existência de diferença
sociam-se com “desorientação, distorções do significativa entre Vocabulário e Cubos, que
desenho e percepções errôneas” (p.592). São não se manteve na outra administração. Toda-
típicas suas construções fragmentadas, que via, melhora, no caso, poderia significar rever-
raramente ocorrem em casos de pessoas nor- sibilidade de um déficit na capacidade de aná-
mais ou com lesões à esquerda. lise e síntese ou remissão de um déficit na ve-
O desempenho lento, neste subteste, pode locidade psicomotora e na coordenação viso-
se relacionar com efeitos do envelhecimento e motora, também exigidas pelo subteste. En-
da demência, sendo encontrado também em tão, realizou-se outro estudo (Cunha, Minella,
pacientes com patologia frontal, traumatismo Argimon et alii, 1989b), em que se procurou
craniano e depressão. Sabe-se que, às vezes, é controlar o acréscimo no escore, que pode
muito difícil fazer o diagnóstico diferencial ocorrer por melhor velocidade psicomotora,
entre demência de Alzheimer e depressão, mas pela exclusão de pontos brutos, obtidos no
o fato de Cubos se apresentar extremamente reteste, de bonificação por tempo extra. A aná-
baixo, nas fases iniciais, em pacientes com lise de variância dos escores da segunda admi-
Alzheimer é um indício útil para o diagnóstico nistração não acusou diferença significativa
diferencial (Lezak, 1995). entre Vocabulário e Cubos, concluindo-se que
O escore baixo em Cubos tem sido citado houve, provavelmente, reversibilidade do défi-
como muito freqüente entre alcoolistas, tanto cit cognitivo, durante o primeiro mês de absti-
do sexo masculino como do feminino (Fabian nência. Aliás, Wilkinson (1987), baseado num
& Parsons, 1983; Löberg, 1980; Silberstein & trabalho de Carlen, considerou Cubos como o
Parsons, 1978; Wilkinson & Poulos, 1987). De instrumento mais sensível à melhora neurop-
um modo geral, sabe-se que, entre alcoolistas, sicológica em alcoolistas.
fica mais afetado “o desempenho em tarefas Em relação à discriminação de pacientes
que envolvem solução de problemas e coorde- com comprometimento cerebral e esquizofrê-
nação perceptomotora” (Parsons, 1980, p.108), nicos, as pesquisas não são muito conclusivas,
e sabe-se que Cubos, além de exigir coordena- mas sugerem que os esquizofrênicos tendem
ção perceptomotora, pressupõe a existência de a um bom desempenho, exceto os mais confu-
“um julgamento rápido na avaliação de uma sos e desorientados (Portuondo, 1970b; Rapa-
situação-problema” (Hesselbrock, Weidenmann port et alii, 1965; Zimmerman, Woo-Sam &
& Reed, 1985, p.319). Glasser, 1976). Mayman e colegas (1976), po-
Numa pesquisa realizada em nosso meio rém, dão uma série de exemplos de erros (como
(Minella, Pereira, Argimon et alii, 1989), ob- persistência em considerar corretos desenhos
servou-se que, em alcoolistas, os escores de Cu- incorretos, inverter sistematicamente a posição
bos não permanecem estáveis durante o pri- dos cubos, etc.), que atribuem ao contato de-

PSICODIAGNÓSTICO – V 591
ficiente com a realidade e à diminuição do pen- Rapaport, 1976; Zimmerman, Woo-Sam & Glas-
samento conceitual em esquizofrênicos. ser, 1976).
Considerando o desempenho de pacientes Exceto os obsessivo-compulsivos, outros
esquizofrênicos, no teste de Cubos de Golds- “neuróticos” apresentam um bom desempe-
tein-Scheerer (Goldstein & Scheerer, 1941), fica nho neste subteste, já que a ansiedade, quase
muito claro que, na medida em que estiver sempre, leva apenas a uma ineficiência tem-
comprometida a sua capacidade de pensamen- porária e só eventualmente a uma queda do
to abstrato, haverá também, neste subteste, escore.
uma série de fracassos, caracterizados por ti- O fator de personalidade especialmente res-
pos concretos de solução aos problemas en- ponsável pela queda dos escores é a depres-
volvidos. são, sendo a sua baixa proporcional à gravida-
Tais soluções concretas, associadas a es- de do quadro (Rapaport et alii, 1965). Os psi-
cores baixos, também podem ocorrer em su- cóticos caracterizam-se por uma diminuição
jeitos com retardamento mental. Por outro acentuada e relativamente parelha em todos
lado, eventualmente pessoas normais e inte- os subtestes de execução, mais evidenciada em
ligentes podem adotar uma atitude concre- Cubos e levemente menor nos subtestes de
ta, quando constroem com cubos, mas que Completar Figuras e Arranjo de Figuras. Em-
é reversível, o que não costuma acontecer bora os “neuróticos” depressivos graves apre-
quando existem certos déficits, seja de etio- sentem uma queda parelha, esta não é tão acen-
logia orgânica, seja funcional. Às vezes, en- tuada como nos psicóticos. Já a co-morbidade
tão, é aconselhável utilizar a demonstração com outro transtorno, como esquizofrenia, as-
com os cubos, num exame de limites, rea- socia-se com a diminuição de Cubos e Código,
presentando um item, em que o sujeito fra- especialmente do primeiro, mas a queda em exe-
cassou, após a conclusão do subteste, para cução não seria parelha (Portuondo, 1970b).
verificar se mantém ou não a solução con- Os escores altos devem ser considerados em
creta anterior. função dos aspectos envolvidos no subteste,
As soluções extravagantes e bizarras (como como capacidade de análise e síntese, nível de
tentar a construção diretamente sobre o mo- pensamento conceitual, rapidez, precisão e fle-
delo impresso ou em posição vertical), em crian- xibilidade na solução de problemas, etc. Cabe
ças ou em adultos, são apontadas como indí- assinalar, porém, que a experiência com este
cios de séria perturbação do teste de realidade tipo de construção na infância ou com outros
(Glasser & Zimmerman, 1972; Zimmerman, instrumentos que envolvem cubos pode me-
Woo-Sam & Glasser, 1976). lhorar o desempenho, até certo ponto (Glas-
O escore baixo também pode ocorrer por ser & Zimmerman, 1972; Zimmerman, Woo-
insegurança e por tendências compulsivas. A Sam & Glasser, 1976). Assim, este é um fator a
atenção a detalhes não essenciais (por exem- ser considerado no reteste, seja no âmbito clí-
plo, a diferenças insignificantes de cor) pode nico, seja em pesquisas.
indicar, em crianças e em adultos, uma neces-
sidade compulsiva de precisão ou, ainda, “uma
rejeição hostil da tarefa, através do uso nega- Armar Objetos
tivo do perfeccionismo” (Zimmerman, Woo-
Sam & Glasser, 1976, p.191), que pode levar a Capacidade de síntese de um conjunto inte-
uma queda nos escores em obsessivos. Esta grado
também pode ser devida a um estilo compulsi- Capacidade de reconhecer configurações
vo que leva a um desempenho vagaroso (Gro- familiares (formação de conceitos visuais) e de
th-Marnat, 1999), a tentativas lentas e suces- antecipar relações parte-todo (organização vi-
sivas de comprovação da coerência entre a soespacial)
cópia e o modelo ou a um estado de tensão, Processamento visual, velocidade percep-
que diminui a eficiência (Mayman, Schafer & tual e manipulativa

592 JUREMA ALCIDES CUNHA


Este subteste envolve basicamente a capa- Evidentemente, deve-se considerar a idade
cidade de síntese de partes num conjunto or- da criança e a qualidade do erro, se a dificul-
ganizado e integrado e requer do sujeito per- dade é eventual, ocorrendo apenas quando o
cepção adequada, concentração, manipulação encaixe é mais complexo. O item “Carro”, por
visoespacial, antecipação e estabelecimento de exemplo, geralmente não apresenta qualquer
relações parte-todo, portanto, de relações vi- problema para uma criança de 10 anos. A in-
soespaciais para a conceitualização do objeto. versão da porta revela falta de atenção ao de-
Sujeitos neurologicamente intactos têm “uma talhe, possivelmente associada à ansiedade ou
reação imediata ao todo”, que é seguida por com “descuido impulsivo” (p.91). A ansiedade
“um entendimento da relação com as partes pode chegar a comprometer os escores, mas
individuais” (Wechsler, 1944, p.97). O subtes- freqüentemente transparece na forma de ma-
te oferece indícios sobre o pensamento e hábi- nuseio do material, sem planificação ou obje-
tos de trabalho do sujeito. Já de um ponto de tivo, por meio de manifestações de insegurança,
vista dinâmico, como envolve figuras familia- inibição e de impotência (“não consigo”), de de-
res em pedaços, às vezes “é muito sensível aos sesperança, de pedidos de ajuda e, também, pode
efeitos da ansiedade a respeito da integridade se evidenciar pela baixa também de escores de
ou vulnerabilidade do corpo” (Carr, 1975a, outros subtestes vulneráveis a seus efeitos.
p.742). A ansiedade também pode elevar os esco-
É importante observar que este subteste res até três pontos acima da média, numa “ên-
apresenta baixa fidedignidade, tendo sido ex- fase compensatória na manipulação do am-
cluído do WPPSI exatamente por esse motivo biente” (p.90). Carr (1975) explicou essa eleva-
(Wechsler, 1967). Entretanto, a partir de novas ção do escore por possível ênfase na reação
pesquisas, foi introduzido no WPPSI-R (Wechs- contra sentimentos de vulnerabilidade corpo-
ler, 1989). Assim sendo, em relação às escalas ral ou ansiedade de castração mobilizada pela
mais antigas, as hipóteses interpretativas nele presença de figuras mutiladas. Todavia, tam-
baseadas devem ser utilizadas com cuidado, bém pode baixar o escore, porque a tarefa exi-
uma vez que, até certo ponto, a variabilidade ge tolerância à frustração, mas, quando a an-
dos escores pode ser atribuída ao acaso. Ape- siedade baixa os escores, não o faz à custa de
sar disso, Glasser e Zimmerman (1972) acham distorções severas. Por exemplo, quando a
que “parece medir a capacidade de organiza- criança insiste em unir bordos sinuosos com
ção perceptual” (p.89). Mas é uma medida bordos retos, a hipótese será mais provavel-
apenas moderada de inteligência geral (Gro- mente de uma distorção perceptual do que de
th-Marnat, 1999). ansiedade. Este comportamento, encontrado
Em geral, os problemas perceptivos não por Moor (1969) em crianças com transtornos
ocorrem nos itens mais fáceis. Se isto aconte- disléxicos e disgráficos, também foi observado
ce, é possível pensar em problemas mais sé- por nós em crianças com alterações no desen-
rios. A troca das pernas do “Manequim” no volvimento neuropsicológico e em adultos com
WISC, segundo Glasser e Zimmerman (1972), disfunção cerebral.
costuma se associar com rigidez e problemas Embora a rotação da reprodução não este-
perceptivos, “particularmente se não é corrigi- ja prevista nos manuais, para fins de escore, é
da, a despeito de questionamento” (p.91). Da um fenômeno que ocorre e que deve ser inter-
mesma forma pode ser interpretada a troca de pretado qualitativamente, em termos da pre-
pernas do “Cavalo”, embora não seja tão sig- sença de indícios de transtorno na estrutura-
nificativa, se a criança tem menos de oito anos, ção espacial, exceto em crianças muito peque-
quando, então, seria considerada uma distor- nas. Também foi referido por Moor e observa-
ção perceptual leve. Igualmente, em crianças do por nós, em crianças com alterações no
menores, não parece ser especialmente impor- desenvolvimento neurológico, embora seja um
tante, se usam a peça central do “Cavalo” como fenômeno relativamente raro, se forem consi-
uma espécie de pescoço. deradas rotações de 180º.

PSICODIAGNÓSTICO – V 593
A tentativa de construir, especialmente a na periferia), em esquizofrênicos (em razão de
figura humana, em posição vertical, também alguma disfunção no SNC?).
observada por Moor, só foi por nós encontra- Há casos em que a conceitualização visoes-
da em crianças muito pequenas, e a atribuí- pacial não está tão comprometida como no
mos à falta de experiência com jogos de encai- grupo anterior, porém, fica muito dependente
xe ou de construção, já que não foram encon- da atividade visomotora. Tais sujeitos não são
trados outros indícios significativos. capazes de antecipar o objeto, mas, à medida
As observações feitas durante a testagem que vão manipulando as peças, por ensaio e
são muito úteis para avaliar a falta de destreza erro, vão sendo capazes de identificar relações
motora, a flexibilidade e/ou a agilidade na ex- e “usam os conceitos visuais que (assim) se
ploração de soluções ou, pelo contrário, a rigi- desenvolvem para se orientar” (Lezak, 1995,
dez ou a perseveração (Zimmerman, Woo-Sam p.598). Em Cubos, apresentam o mesmo com-
& Glasser, 1976). portamento e têm um provável comprometi-
Dificuldades verificadas nas estratégias para mento parietal direito.
chegar a uma solução oferecem indícios para Outros, ainda, fixam a sua atenção nos
discriminar pacientes com lesões no hemisfé- contornos globais, mas demonstram incapa-
rio esquerdo – que tendem a juntar as peças cidade para discriminar detalhes, tais como
guiando-se pelo contorno – e aquelas com le- as características internas das peças ou o seu
sões no hemisfério direito – que costumam tamanho relativo, como os dos dedos da
guiar-se pelas linhas internas. Exatamente para Mão. Geralmente, a baixa dos escores, neste
melhor investigar esses tipos de estratégias, o subteste e também em Cubos, associa-se com
WAIS NI incluiu mais dois quebra-cabeças, em comprometimento do hemisfério cerebral
Armar Objetos: o Círculo e a Vaca (Kaplan, Fein, esquerdo.
Morris et alii, 1991). Há pacientes que apresentam muitos pro-
Há pacientes em que se nota um compro- blemas em Armar Objetos, apesar de terem
metimento da manipulação visoespacial, sem bom resultado em Cubos. Seu sucesso na cons-
evidência de problemas na conceitualização e trução dos cubos deve-se ao fato de que, nes-
organização visoperceptual. Observa-se que o se subteste, há um esquema de referência dis-
sujeito identifica o objeto (forma o conceito), ponível (modelo), enquanto, em Armar Obje-
mas é incapaz de construí-lo (Lezak, 1995). tos, têm problemas para antecipar a identifi-
Em outros, a dificuldade é oposta, já que cação do produto final (objeto). A localização
está comprometida a conceitualização visoes- provável de seu comprometimento cerebral é
pacial, ainda que sua coordenação e controle frontal.
visomotor possam ser satisfatórios. Trabalham Por outro lado, sujeitos que têm um tipo
metodicamente na justaposição de contornos de pensamento mais concreto se saem relati-
e linhas, mas não sabem do que se trata, até, vamente bem neste subteste, porque “envolve
eventualmente, terem sucesso na construção. objetos concretos, significativos” (Lezak, 1995,
Às vezes, não chegam à solução e são capazes p.598), apesar de terem mau desempenho em
de aceitar figuras absurdas. Também seu esco- Cubos, em função dos aspectos abstratos im-
re é baixo em Cubos, e seu déficit geralmente plícitos e do tamanho reduzido dos modelos.
se associa com comprometimento do córtex Tal dificuldade é usualmente atribuída a algu-
posterior no hemisfério direito (Lezak, 1995). ma patologia frontal.
É interessante observar que já Portuondo Lentidão pode ser observada também em
(1970b) considerava a tendência para a cons- pacientes com patologia frontal, embora não
trução absurda como um indicador diagnósti- seja um indício específico deste grupo.
co de patologia cerebral. Porém, Mayman e Além disso, pode-se dizer que, em vista do
colegas (1976) encontraram certas construções componente velocidade, Armar Objetos é afe-
absurdas (como colocar a metade da orelha no tado por comprometimento cerebral em geral
lugar adequado, em Rosto, e a outra metade e, mais especificamente, por lesões posterio-

594 JUREMA ALCIDES CUNHA


res no hemisfério direito, que também se as- velocidade psicomotora e não à reversibilida-
sociam a escores baixos em Cubos (Lezak, de de outros aspectos disfuncionais.
1983). Não obstante, um estilo compulsivo Sujeitos que apresentam bons escores nes-
pode baixar o teste, por perda na bonificação te subteste apresentam, antes de mais nada,
por velocidade (Groth-Marnat, 1999). uma adequada coordenação motora e se ca-
Armar Objetos tem sido citado entre os ins- racterizam por uma “organização visual supe-
trumentos mais sensíveis aos efeitos do alcoo- rior e podem manter um enfoque mental flexí-
lismo (Wilkinson & Poulos, 1987) ou entre os vel”, enquanto aqueles com escores baixos,
que apresentam escores mais baixos em alcoo- pelo contrário, “mostram desorganização vi-
listas do sexo masculino (Löberg, 1980), mas somotora, pensamento concreto e dificuldades
não do sexo feminino (Fabian & Parsons, 1983; com a formação de conceitos visuais” (Groth-
Silberstein & Parsons, 1978). Em pesquisa rea- Marnat, 1999, p.186).
lizada em nosso meio (Minella, Pereira, Argi-
mon et alii, 1989), observou-se que os escores
de Armar Objetos não permaneceram estáveis Código
durante o primeiro mês de abstinência. Poste-
riormente, em trabalho desenvolvido pelo mes- Velocidade de processamento
mo grupo (Cunha, Minella, Argimon et alii, Capacidade de seguir instruções sob pres-
1989b), foi possível verificar que a média dos são de tempo
escores dos pacientes, após uma semana de Atenção seletiva, concentração (resistência
abstinência, estava baixa, tendendo a uma à distratibilidade) e persistência motora numa
aparente normalização no reteste, na quarta tarefa seqüencial
semana de abstinência, se considerados a mé- Capacidade de aprender e eficiência mental
dia e o desvio padrão da população geral. To- Flexibilidade mental
mando Vocabulário como parâmetro, já que
este subteste se comportou como uma medi- Código propõe uma tarefa que envolve
da estável durante o mês, os resultados acusa- coordenação visomotora, manutenção da aten-
ram uma diferença, na primeira administração, ção e memória e exige rapidez, precisão, moti-
que não se manteve no reteste. Esses resulta- vação e persistência numa tarefa monótona.
dos são compatíveis com uma melhora funcio- O subteste é particularmente difícil para
nal em correlatos comportamentais que se re- sujeitos com deficiências visuais e motoras,
fletem no desempenho de teste. Não obstan- especialmente porque a tarefa deve ser execu-
te, seria difícil afirmar se a melhora, no caso, tada sob a pressão do limite de tempo. Dessa
se devia a uma reversibilidade de estabelecer maneira, os escores são muito afetados pela
relações espaciais ou à remissão de complica- idade, particularmente pela lentidão do desem-
ções secundárias ao alcoolismo, que podem penho, que se torna mais acentuada com o
afetar a velocidade psicomotora. Então, foi fei- passar do tempo. Igualmente, pessoas pouco
to outro estudo (Cunha, Minella, Argimon et habituadas ao uso do lápis também encontram
alii, 1989a), em que se procurou controlar a dificuldades. Adultos que se ocupam com tra-
diferença de escore, que pode ocorrer por me- balhos manuais não especializados, pessoas
lhora na velocidade psicomotora, pela exclu- com pouca escolaridade ou que concluíram sua
são, na segunda administração, de pontos bru- formação escolar há mais de 15 anos apresen-
tos obtidos por bonificação por tempo extra tarão escores baixos, independentemente da
(quando não houve tal bonificação na primei- presença ou não de problemas neuropsicoló-
ra administração). Os resultados revelaram a gicos ou psicopatológicos.
presença de diferença entre os escores deste Algumas dificuldades na produção grafo-
subteste e Vocabulário, podendo-se excluir a motora podem ser identificadas pela observa-
hipótese de melhora funcional, porque a ele- ção, como tremor, repasse ou outras distorções
vação dos escores teria se associado à maior associadas a distúrbios motores. Quanto a di-

PSICODIAGNÓSTICO – V 595
ficuldades na persistência motora, há autores Aliás, o mau contato com a realidade prejudi-
que sugerem que, num diagrama extra, se ano- ca o desempenho, com a emergência de fre-
te o número de símbolos completados a cada qüentes erros, distorções e muita variabilida-
30 segundos. Pode haver um desempenho ini- de no ritmo de trabalho. Isso parece ser parti-
cial mais vagaroso, que se intensifica, por uma cularmente verdadeiro no caso de esquizofrê-
necessidade de aquecimento, ou o contrário nicos (Mayman, Schafer & Rapaport, 1976),
pode ocorrer, por efeito de fadiga. “O desem- embora sua má eficiência também seja rela-
penho que é uniformemente lento pode suge- cionada com comprometimento na concentra-
rir um defeito na ativação generalizada ou uma ção (Rapaport et alii, 1965).
lentidão generalizada da depressão.” Assim, Um comportamento um pouco menos raro
“pela observação dos movimentos oculares, que o citado se caracteriza pela cópia de ape-
pode-se identificar uma checagem constante nas um tipo de símbolo de cada vez. Mesmo
associada a uma falta de aprendizagem inci- com explicação adicional, o sujeito mantém-
dental dos pares de dígito-símbolo, à rigidez se numa recusa tácita em levar em conta as
(isto é, manutenção do contexto da resposta), instruções dadas pelo examinador. Fica implí-
ou insegurança a respeito da própria aprendiza- cita uma atitude de oposição, de desconformi-
gem” (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991, p.101). dade com a autoridade, que pode ser observa-
Em crianças, também se observam distor- da tanto em crianças como em adultos. Glas-
ções e omissões. Omissões eventuais (que ocor- ser e Zimmerman (1972) associam tal compor-
rem uma ou duas vezes) podem se associar com tamento com rebeldia e, em caso de bom de-
ansiedade e com um impulso para a realiza- sempenho, “com o grau em que a criança acha
ção, mesmo com prejuízo da precisão. Quan- necessário vencer, através de qualquer meio,
do são mais freqüentes, já deve ser considera- apropriado ou não” (p.95).
da a possibilidade de problemas de nível per- Outro comportamento que tivemos ocasião
ceptual, podendo ser mantido o mesmo pres- de observar, que parece também refletir uma
suposto em relação a distorções. Pode também recusa em seguir as instruções, subentenden-
se observar uma perda de orientação da tare- do uma atitude de oposição e desconformida-
fa, quando a criança simplifica os símbolos ou de, mas, talvez, também a necessidade de ado-
os reproduz em seqüência, desconsiderando a ção de um padrão pessoal de realização, foi o
chave oferecida. Pode ser atribuída a proble- de uma criança que, preenchendo todas as
mas perceptomotores, cuja explicação pode ser carreiras e colunas exteriores (apesar de ser
de caráter funcional ou neuropsicológico. En- advertida a respeito), ao ser completado o tem-
tretanto, quando ela apresenta uma boa orien- po, havia formado uma verdadeira moldura,
tação nas tarefas verbais, a última hipótese exceto por apenas uma quadrícula em branco.
parece mais provável (Glasser & Zimmerman, Já vimos que o subteste de Código, junto
1972). com Dígitos e Aritmética, está bastante satu-
Às vezes, a criança, depois de copiar alguns rado pelo fator de Resistência à Distratibilida-
símbolos corretamente, deixa um espaço va- de, sendo especialmente vulnerável à ansieda-
zio e copia, no espaço seguinte, o símbolo que de, variando os escores conforme a forma de
corresponderia ao espaço anterior. Tal fenôme- manejá-la. Em grupos “neuróticos”, os esco-
no parece se associar com problema de per- res tendem a uma queda que, contudo, não é
cepção espacial. Já Moor (1969) observara esse tão acentuada quando a ansiedade costuma
erro em crianças disléxicas e disgráficas, rela- ser liberada por meio de canais somáticos (Por-
cionando-o a um transtorno na estruturação tuondo, 1970b).
espacial. Mayman e colegas (1976) descreve- As tendências depressivas, a minuciosida-
ram o fenômeno, referindo tê-lo encontrado de e a dúvida também ocasionam um desem-
em pacientes esquizofrênicos. Não o interpre- penho lento, e o escore tende a cair. A compa-
taram, mas é de se supor que possa se asso- ração dos escores de Código, Cubos e Armar
ciar com uma distorção de dados da realidade. Objetos pode ajudar no diferencial, porque a

596 JUREMA ALCIDES CUNHA


compulsividade não costuma afetar os escores primeira tarefa requer tanto aprendizagem
dos dois últimos subtestes, enquanto a lenti- nova como atividade motora continuada”, en-
dão psicomotora, associada à depressão, tem quanto “a memória incidental para informa-
efeitos sobre os três subtestes. ção repetida requer menos esforço cognitivo
Assim, Código é bastante valorizado como do que outras tarefas de memória” (p.238).
teste de velocidade, em especial por sua vul- Nota-se que não só os efeitos especiais de
nerabilidade aos efeitos da depressão, tanto depressão, seja por lentificação, seja por agi-
em termos de lentificação, como de agitação tação psicomotora, afetam os escores. A hi-
psicomotora (Carr, 1975a). peratividade e a impulsividade também influen-
Em alguns casos, porém, torna-se impor- ciam o desempenho, o que é particularmente
tante fazer o diferencial entre demência leve observado em crianças.
do tipo de Alzheimer e transtorno afetivo. O subteste é mais sensível a problemas ce-
Quando se discutiram detalhes da administra- rebrais que os demais (Vincent, 1987), mesmo
ção de Código, foi apresentado um procedi- quando o comprometimento é mínimo e a des-
mento, citado por Hart e colegas (1987). A peito da localização da lesão; assim, é pouco
pesquisa desses autores partiu do pressupos- útil nesse sentido, exceto em pacientes com com-
to de que tanto pacientes com demência leve, prometimento de scanning, que podem apresen-
como os pacientes depressivos, apresentam tar omissões ou apresentar mais erros no hemi-
lentificação psicomotora e déficit de memória, espaço do diagrama do teste oposto ao da lesão
mas estes últimos seriam menos afetados por (Kaplan, Fein, Morris et alii, 1991; Lezak, 1995).
problemas de atenção na evocação incidental Tal sensibilidade à disfunção cerebral não
exigida na tarefa. Os resultados encontrados deve causar surpresa, dada a diversidade de
são resumidos no Quadro 36.12. fatores ou a interação deles que podem afetar
A partir dos dados do Quadro 36.12, pode- os escores. Assim, a lentificação psicomotora
se concluir que, em termos de presença de baixa os escores de alcoolistas e, também, de
déficit na memória psicomotora, medida por pacientes com lesão no hemisfério direito e
Código, no WAIS, os dois grupos de pacientes com a psicose de Korsakoff. Todavia, estes dois
se diferenciam significantemente dos sujeitos últimos grupos apresentam escores muito mais
normais. Mas, entre os dois grupos, há dife- baixos que os primeiros. Modificações intro-
rença na tarefa de memória incidental. Con- duzidas na estratégia de administração suge-
forme os autores, há um “déficit motivacional riram que isso se devia a um componente viso-
geral”, que tem mais influência sobre Código perceptual presente apenas nos últimos gru-
do que sobre a Memória Incidental, “porque a pos (Lezak, 1983).

QUADRO 36.12 Resultados de Código do WAIS e de memória incidental de sujeitos normais, depressivos
e com demência leve
Medida Normais Depressivos C/demência leve
(N=18) (N=18)
F
M DP M DP M DP
Código
Escore bruto (90s) 43,7 1,8 27,0* 2,7 25,1* 2,5 21,2***
Tempo total 178,8 6,9 314,5* 32,0 362,8* 42,8 11,7***
Memória incidental
Pares de dígito-símbolo 6,4 0,4 4,3* 0,6 0,7** 0,2 43,7***
Total de símbolos 6,9 0,3 6,1 0,5 1,7** 0,5 39,0***
Fonte: Hart, Kwentus, Wade et alii, 1987, p.237 (tabela resumida).
*p>0,05 comparado com controles (teste de Tukey).
**p<0,05 comparado com controles de depressivos (teste de Tukey).
***p<0,0001.

PSICODIAGNÓSTICO – V 597
Apesar de tais diferenças observadas, Có- marcenaria, mas agora alega ter esquecido.
digo tem sido citado como o subteste com es- Não tem profissão definida. Atualmente, tra-
core mais baixo em alcoolistas (Miller & Orr, balha como office-boy, restringindo-se a tare-
1990), tanto no sexo masculino (Wilkinson & fas simples. Na sua história, há a ocorrência de
Poulos, 1987) como no feminino (Fabian & Par- convulsões por volta de um ano de idade e de
sons, 1983; Silberstein & Parsons, 1978). provável traumatismo craniano entre 4 e 5 anos.
Em investigação com um grupo de alcoo-
listas (Minella, Pereira, Argimon et alii, 1989),
observou-se que os escores deste subteste não Motivo do encaminhamento
permaneceram estáveis durante o primeiro mês
de abstinência. Não obstante, a comparação Avaliação intelectual, por suspeita de retarda-
das médias da primeira e da quarta semana de mento intelectual, e avaliação das condições
abstinência com a média e desvio padrão da mnêmicas.
população geral revelou que, embora com al-
guma melhora dos escores, os de Código per-
maneceram baixos, os mais baixos entre os Técnicas administradas
subtestes utilizados, não sendo possível carac- WAIS-R e WMS-R
terizar a presença de reversibilidade dos défi-
cits (Cunha, Minella, Argimon et alii, 1990).
Aliás, a este respeito os achados na literatura Índices no WMS-R
não são coincidentes. Goldman (1987), por
exemplo, constatou melhora na terceira sema- Verbal: 75 (médio inferior); visual: 50 (deficien-
na de abstinência em alcoolistas com menos te); total: 55 (limítrofe); atenção e concentra-
de 40 anos, enquanto Parsons (1980), após ção: <50 (deficiente); evocação retardada: 62
quatro anos de abstinência, verificou a presen- (limítrofe).
ça de melhora sob vários aspectos, exceto em
Código. Assim, convém lembrar a diversidade
de fatores que podem suscitar diferenças en- Comentário sobre o comportamento
tre os escores. Hesselbrock e colegas (1985) durante a administração do WAIS-R
citam sexo, idade, duração do período de al-
coolismo e quantidade de álcool ingerida no O paciente procurou colaborar, embora, em
mês anterior à hospitalização. Aritmética, não tivesse demonstrado interesse
Escores elevados podem possivelmente se ou empenho em encontrar a resposta correta.
associar com “excelente capacidade visomoto- Em Cubos, seu método de trabalho foi de en-
ra, eficiência mental”, capacidade para tal tipo saio e erro, desistindo da construção dos mo-
de aprendizagem e “reações psicomotoras rá- delos 4 e 7. No modelo 8, substituiu duas pe-
pidas”, enquanto escores baixos podem indi- ças bicolores por branco e inverteu um cubo
car “capacidade reduzida para a aprendizagem com a face bicolor. No item Mão, de Armar
visual associativa, funcionamento visomotor Objetos, foi possível observar que fixou a aten-
prejudicado” (Groth-Marnat, 1999, p.188). ção no contorno global, desconsiderando o
detalhe de tamanho dos dedos, trocando a
posição de duas peças. Em Código, apresen-
CASO ILUSTRATIVO No 1 tou uma omissão e uma troca de símbolos.

Informações básicas Indicadores diagnósticos

Paciente do sexo masculino, solteiro, de 22 anos QIV – QIE = 6


de idade. Cursou até a 3a série do primeiro grau Extensão dos dígitos na ordem direta: 3
em escola especial. Nesta, teve treinamento em Extensão dos dígitos na ordem inversa: 2

598 JUREMA ALCIDES CUNHA


Escores por idade: todos abaixo do percen- tante, se considerarmos os limites de confian-
til 25 ça (QIT+5), vemos que 61 e 71 é a amplitude
Desvios dos escores ponderados em rela- na qual pode se situar o QIT real do sujeito. A
ção à média do sujeito: nenhum ultrapassa o pressuposição de que seu desempenho possa
valor crítico eventualmente ser um pouco melhor fica re-
Vocabulário – Semelhanças = 3 forçada pelo QIV igual a 70, classificado como
Compreensão – Semelhanças = 3 fronteiriço, mas com uma possível variação
Arranjo de Figuras – Completar Figuras = 3 entre 65 e 75, tomando como referência os li-
Escores em nível igual ou inferior a 2 DP mites de confiança (QIV±5). Por outro lado, o
da média da população geral: Dígitos (2), Arit- QIE é 64, que se classificaria no nível de retar-
mética (3), Semelhanças (3), Completar Figu- damento mental leve, mas considerando os
ras (3), Cubos (4), Código (4) níveis de confiança (QI+-8 QI±8?), o QI real
Presença de distorções em Cubos e Armar estaria entre 56 e 72. Portanto, pode-se dizer
Objetos que, embora o desempenho de teste seja mais
característico de retardamento mental leve, não
se pode excluir a hipótese de um funcionamen-
Discussão sobre os resultados do WAIS-R to em nível fronteiriço.
A consideração do perfil não fornece indí-
A diferença entre o QIV e o QIE é de 6 pontos, cios especialmente úteis. A posição relativa dos
portanto, não significativa. Conseqüentemen- escores do sujeito, em comparação com os de
te, o QIT pode ser utilizado como sumário ade- outros indivíduos da população geral de sua
quado da capacidade intelectual. O QIT é igual idade, recai sempre abaixo do percentil 25,
a 66, justificando uma classificação de retar- evidenciando que, sob todos os aspectos me-
damento mental leve (Código 317, no DSM- didos, seu desempenho pode ser caracteriza-
IV), situando-se o sujeito entre os 2,3% mais do como fraco. Por outro lado, os desvios dos
baixos da curva da população geral. Não obs- escores ponderados, em relação à própria mé-

QUADRO 36.13 Levantamento quantitativo dos resultados no WAIS-R de um sujeito de 22 anos, do sexo
masculino
Subtestes do WAIS-R Escore Escore Percentual Escore Diferença Valor
bruto por idade ponderado da média crítico
Informação 6 5 5 5 +0,67 2,4
Dígitos 3 1 1 2 -2,33 2,9
Vocabulário 27 7 16 6 +1,67 1,8
Aritmética 4 5 5 4 -0,33 2,8
Compreensão 13 6 9 6 +1,67 2,9
Semelhanças 2 3 1 3 -1,33 3,0
Soma verbal: 26
Completar Figuras 3 3 1 3 -1,40 3,0
Arranjo de Figuras 6 6 9 6 +1,60 3,2
Cubos 7 4 2 4 -0,40 2,5
Armar Objetos 18 5 5 5 -0,60 3,5
Código 24 3 1 4 -0,40 3,0
Soma de execução: 22

Escala Escore QI Classificação Média


Verbal 26 70 65 – 75 4,83
Execução 22 64 56 – 74 4,40
Total 48 66 61 – 71 4,36

PSICODIAGNÓSTICO – V 599
dia do sujeito, não são compatíveis com a iden- laridade do sujeito e pelo seu baixo nível ocu-
tificação da presença de forças e fraquezas es- pacional.
pecíficas, já que a diferença do escore de qual- O escore de Cubos reforça a hipótese da
quer subteste, quanto à média, não ultrapassa presença de déficit no raciocínio abstrato, su-
o valor crítico correspondente, seja para mais gerida pelo escore de Semelhanças. A presen-
ou para menos. ça não só de uma baixa, neste subteste, mas
Examinando as flutuações dos escores en- também de alguma distorção, observada tam-
tre pares de subtestes, verifica-se a existência bém em Armar Objetos, é compatível com a
de uma diferença real (que deve ser de 3 ou possibilidade de problemas na organização
mais) entre Vocabulário e Semelhanças e entre perceptual.
Compreensão e Semelhanças. Esses dados per- O desempenho de Dígitos é digno de nota.
mitem pressupor que o vocabulário do sujeito O sujeito só conseguiu reter uma extensão de
subentende um nível conceitual mais concre- três dígitos na ordem direta, denunciando uma
to, já que o escore em Semelhanças é compa- deficiência da atenção, e uma extensão de dois
tível com déficit do pensamento abstrato. É de dígitos na ordem inversa, que é um nível tam-
se supor que o vocabulário encontre suporte bém classificado como deficiente. Isto é corro-
na memória verbal, já que o índice correspon- borado pelos resultados da WMS-R. Mesmo
dente, no WMS-R, está num nível médio infe- considerando os antecedentes educacionais do
rior. Ademais, a diferença entre Compreensão sujeito e o seu nível intelectual, o resultado é
e Semelhanças sugere a presença de certo grau tão baixo que não é possível afastar uma hipó-
de senso comum e de conformidade com nor- tese da presença de déficit cognitivo, possivel-
mas sociais, ainda que de forma mais estereo- mente associado a problema neurológico.
tipada e não dependente de um juízo social Como tal hipótese também pode ser reforçada
maduro, pelas dificuldades de abstração, jus- por indícios de comprometimento do pensa-
tificadas por um escore em Semelhanças abai- mento abstrato, pela sugestão de problemas
xo de 2 DP da média da população geral. de organização perceptual, pelos índices da
Outro escore extremamente baixo é o de WMS-R e, finalmente, por antecedentes da his-
Completar Figuras, que pode se associar com tória pessoal, sugere-se uma avaliação neurop-
problemas de atenção e concentração, eviden- sicológica mais completa.
ciadas também pela WMS-R. Mas a diferença
entre o escore deste subteste e o de Arranjo de
Figuras exclui transtornos visuais ou visoper- CASO ILUSTRATIVO No 2
ceptivos, porque senão a queda de ambos se-
ria parelha. Informações básicas
O escore de Arranjo de Figuras beirando
menos 1 DP da média da população geral su- D, menino de 6 anos e 11 meses, foi adotado
gere, no sujeito, alguma capacidade de pensa- aos 2 anos e 8 meses (idade constatada radio-
mento seqüencial na compreensão de situações graficamente) por uma família de nível so-
sociais. O fato de este subteste estar no mes- cioeconômico médio. Nesta, a filha mais velha
mo nível de Compreensão, que supõe algum apresentava um retardamento mental profun-
recurso na função do juízo, representa um do e teve poucos anos de vida. Por receio de
indício positivo sobre a adaptabilidade do su- ter outro filho com problema idêntico, os pais
jeito. adotaram uma menina. Pouco mais tarde, fi-
Finalmente, resta considerar outros subtes- cou comprovado que apresentava retardamen-
tes que apresentam escores extremamente to mental moderado, além de problemas de
baixos, levando em conta a média da popula- natureza neurológica. Então, adotaram D, ten-
ção geral. Os escores de Aritmética e Código do, a seguir, dois filhos normais. Não obstan-
não são muito reveladores, já que podem ser te, não existiam informações sobre a família
explicados, em grande parte, pela pouca esco- de origem de D, exceto quanto à precariedade

600 JUREMA ALCIDES CUNHA


de seu meio socioeconômico. Em relação ao QUADRO 36.14 Levantamento qualitativo dos
desenvolvimento de D, após a adoção, parece resultados do WISC de um sujeito de 6 anos e 11
meses, do sexo masculino
não ter havido atrasos substanciais, a não ser
quanto a hábitos de higiene. Por ocasião da Subtestes do WISC Escore Escore Valor
bruto ponderado crítico
avaliação psicológica, em novembro, o controle
vesical ainda era muito deficiente, e, até o iní- Informação 8 11
cio do ano letivo em curso, havia tido episó- Compreensão 8 11
Aritmética 9 19 (+)
dios de falta de controle anal, inclusive na es- Semelhanças 9 15
cola. Apresentava intensa irritabilidade, com Dígitos 7 9 (-)
manifestações de hetero e auto-agressão, tei- Vocabulário 17 9 (-)
mosia, muita dificuldade de se relacionar com Soma verbal: 74
os irmãos, sendo muito ciumento. Além disso,
Completar Figuras 9 13
chorava muito e se lamentava. Arranjo de Figuras 12 10
Cubos 8 12
Armar Objetos 14 11
Motivos do encaminhamento Código 46 15
Soma de execução: 61
Não conseguiu se alfabetizar. Tanto a profes-
sora como a mãe suspeitavam que fosse “defi- Escala Escore QI Perc. Classificação Média
ciente mental”. Verbal 79/62 115 80 Médio superior 12,3
Execução 61 113 80 Médio superior 12,2
Total 123 117 80 Médio superior 12,3
Resultados do WISC

Trata-se de um caso muito interessante, por


ter sido encaminhado por suspeita de “defi- pontos no item Rosto e só 1 ponto de esco-
ciência mental”, tendo apresentado um QIT de re, no Carro.
117 (médio superior), que corresponde a um Na escala verbal, a queda em Vocabulário é
percentil de 80, incluindo-se nos 26,1% supe- compatível com um atraso na área de lingua-
riores da curva de distribuição da população gem, já que está significativamente abaixo dos
geral. O QIV é de 115 (médio superior), e o escores em subtestes que podem nos oferecer
QIE, de 113 (médio superior), não havendo di- indícios sobre o seu potencial intelectual, isto
ferença significante entre ambos. é, em Semelhanças (p<0,05) e Cubos (p<0,05).
Considerando a média do sujeito e utilizan- Por outro lado, a baixa em Dígitos deve refletir
do o desvio padrão para avaliar as flutuações problemas de atenção, embora denote capaci-
dos escores, apresenta escores significativa- dade de concentração, quando números são
mente baixos em Dígitos e Vocabulário e um apresentados num contexto que faz sentido
escore significativamente alto em Aritmética. (Aritmética=19). Observa-se, ainda, que a di-
O escore em Semelhanças, embora esteja qua- minuição em Dígitos não se acompanha por
se a dois desvios padrão da média da popula- diminuição correspondente em Aritmética e
ção geral, foi constituído predominantemente Código, o que pode excluir ansiedade como
de respostas de nível 1, com apenas uma res- fator de interferência na atenção.
posta de escore 2. Em Cubos, conseguiu re- Tanto Cubos como Arranjo de Figuras e Ar-
produzir dois itens, além dos considerados mar Objetos envolvem coordenação visomo-
para o escore, após o limite de tempo. Em tora, mas se observa que, nos dois primeiros,
Arranjo de Figuras, o mesmo se verificou em houve itens só completados após o tempo-li-
um item mais difícil, além do tempo-limite. mite, o que prejudicou o escore, até certo pon-
Em Armar Objetos, tentou, várias vezes, unir to. Contudo, em Código, o sujeito apresentou
bordos sinuosos com retos, obtendo só três boa velocidade psicomotora, tanto que obte-

PSICODIAGNÓSTICO – V 601
ve um escore significativamente elevado. mento escolar fique muito aquém do espera-
Seus problemas, portanto, não parecem se do, em termos de seu nível intelectual. Por
justificar por dificuldades visomotoras, mas outro lado, os dados clínicos associados a seu
sim de organização perceptual, se conside- desempenho no Bender, bem como os indícios
rarmos o desempenho nos subtestes entre si encontrados no WISC, pareceram compatíveis
e no comportamento observado na constru- com a presença de algumas alterações no de-
ção em Cubos e, especialmente, em Armar senvolvimento neuropsicológico, hipótese que
Objetos. ficou corroborada por exame neurológico evo-
A hipótese que é possível levantar é a de lutivo. Além disso, o psicodiagnóstico permi-
que o sujeito apresenta um atraso na dimen- tiu identificar também a presença de dificul-
são específica da linguagem, dificuldades de dades no desenvolvimento de algumas funções
atenção e problemas de organização percep- do ego, que complicavam mais o quadro, o que
tual, que colaboram para que seu aproveita- não cabe discutir no momento.

602 JUREMA ALCIDES CUNHA


WISC-III
Vera L.M. Figueiredo
37
O DESENVOLVIMENTO DA TERCEIRA por este terceiro fator pudesse ser melhor dis-
EDIÇÃO DO WISC tinguida. Entretanto, como conseqüência,
emergiu um quarto fator, intitulado Velocida-
A principal razão para a uma nova edição do de de Processamento (VP), oportunizando qua-
WISC-R de 1974 foi a desatualização de suas tro escores adicionais para a interpretação da
normas em aproximadamente 15 anos, consi- habilidade cognitiva. O subteste Procurar Sím-
derando os estudos de Flynn (1984), que mos- bolos avalia discriminação perceptual, habili-
traram que a média do QI vem aumentando, dade para explorar estímulos visuais, velocida-
no mínimo, em torno de três pontos por déca- de e precisão, atenção, concentração e memó-
da, principalmente no que se refere à habilida- ria a curto prazo. A tarefa exigida no subteste
de de execução. Num estudo de correlação é observar, dentro de um tempo limite, se o(s)
entre o WISC-R e o WISC-III, os dois testes fo- símbolo(s) modelo(s), exibido(s) à esquerda da
ram aplicados numa amostra de 206 crianças, Folha de Registro, encontra(m)-se ou não num
e, em relação às médias dos QIs, o WISC-III outro grupo de símbolos apresentado à direita.
apresentou escores menores, com as seguin- A estrutura de bonificação dos subtestes de
tes diferenças: QIV = -2; QIE = -7 e QIT = -5. execução foi revisada, sendo dada maior ênfa-
Essas discrepâncias evidenciam que a pontua- se ao aspecto da velocidade no desenvolvimen-
ção do QI geralmente se apresenta dilatada, to da tarefa. Uma criança de 16 anos que exe-
quando o desempenho de uma criança é aferi- cuta corretamente todos os itens do subteste,
do numa amostra de padronização retrógrada dentro do tempo limite, sem ganhar pontos
(Wechsler, 1991). adicionais pela rapidez de desempenho, obte-
Outro objetivo do WISC-III foi investigar a rá um escore ponderado abaixo da média nos
estrutura fatorial do teste resultante de pes- subtestes Código (8), Cubos (7), Armar Obje-
quisas com o WISC e WISC-R. Eram identifica- tos (7) e Arranjo de Figuras (6).
dos dois fatores maiores, denominados de Alterações também ocorreram no conteú-
Compreensão Verbal (CV) e Organização Per- do dos itens de alguns subtestes. Em Arranjo
ceptual (OP), e um terceiro fator menor, reco- de Figuras, por exemplo, itens considerados
nhecido como Resistência à Distratibilidade clínicos (briga, ladrão e fogo) foram elimina-
(RD). O subteste Procurar Símbolos foi incluí- dos ou alterados na tentativa de minimizar o
do no WISC-III para que a habilidade medida conteúdo emocional, a violência e os conflitos

PSICODIAGNÓSTICO – V 603
pessoais. Kaufman (1994) recomenda aos que a) Subtestes Verbais: Informação, Seme-
se lamentam que, após a sessão de aplicação lhanças, Aritmética, Vocabulário, Compreensão
do WISC-III, dediquem mais alguns minutos e e Dígitos;
administrem estes itens para obter as informa- b) Subtestes de Execução: Completar Figu-
ções clínicas desejadas. ras, Código, Arranjo de Figuras, Cubos, Armar
O WISC-III incluiu, ainda, mudanças no ma- Objetos, Procurar Símbolos e Labirintos;
terial do teste, no conteúdo dos itens e nos c) Subtestes Suplementares: Dígitos, Procu-
procedimentos de administração, proporcio- rar Símbolos e Labirintos;
nando mais interesse e motivação para a crian- d) Escalas de QI: QI Verbal (QIV), QI de Exe-
ça e maior qualidade ao teste. Essas alterações cução (QIE) e QI Total (QIT);
referem-se a: e) Índices Fatoriais: Compreensão Verbal
a) proposta de aplicação do teste numa (CV), Organização Perceptual (OP), Resistência
única sessão, sendo estabelecida uma seqüên- à Distratibilidade (RD) e Velocidade de Proces-
cia determinada para a apresentação dos sub- samento (VP), obtidos a partir da somatória
testes (Completar Figuras, Informação, Códi- dos escores ponderados alcançados nos sub-
go, Semelhanças, Arranjo de Figuras, Aritméti- testes que formam cada fator, conforme arran-
ca, Cubos, Vocabulário, Armar Objetos, Com- jo do Quadro 37.1.
preensão, Procurar Símbolos e Dígitos); Sendo aplicados todos os 13 subtestes, Pro-
b) apresentação de novos itens em vários curar Símbolos, Dígitos e Labirintos não entram
subtestes e introdução de mais itens com nível para o cômputo dos QIs, que são calculados a
de dificuldade pequena e grande, para melhor partir da aplicação de cinco subtestes de cada
discriminação da habilidade intelectual da po- escala. Procurar Símbolos e Dígitos são reque-
pulação extrema da curva normal; ridos para a avaliação dos Índices Fatoriais, e,
c) alteração de itens, visando a minimizar o quando for necessária a aplicação de menos
viés de sexo, etnia e região, principalmente nos de cinco subtestes, Dígitos pode ser usado
subtestes Informação, Vocabulário e Com- como alternativa para a escala verbal e Labi-
preensão; rintos para a escala de execução. Procurar Sím-
d) introdução da cor nos estímulos dos sub- bolos substitui somente o subteste Código para
testes Completar Figuras, Arranjo de Figuras e o cálculo do QI de Execução, e, no caso de ape-
no exemplo de Armar Objetos. nas quatro subtestes estarem disponíveis para
alguma das escalas de QI, o manual do teste
oferece uma tabela (A.8) para as equivalências
A ESTRUTURA GERAL proporcionais.

São 13 subtestes que, individualmente, predi-


zem várias dimensões da habilidade cognitiva INTERPRETAÇÃO
e, quando agrupados de forma específica, ofe-
recem as escalas de QI e os Índices Fatoriais A interpretação das dispersões das escalas de
que estimam diferentes construtos subjacen- QIs, dos Índices Fatoriais ou dos subtestes deve
tes ao teste. Os subtestes do WISC-III estão ser precedida pela estimativa das significâncias
organizados nos seguintes conjuntos: das diferenças e das freqüências de ocorrência

QUADRO 37.1 Índices fatoriais do WISC-III


Compreensão Verbal Organização Perceptual Resistência à Distratibilidade Velocidade de Processamento
Informação Completar Figuras Aritmética Código
Semelhanças Arranjo de Figuras Dígitos Procurar Símbolos
Vocabulário Cubos
Compreensão Armar Objetos

604 JUREMA ALCIDES CUNHA


na população de padronização do teste, e os lia a compreensão verbal e proporciona infor-
valores críticos aparecem nas tabelas do apên- mações sobre processamento da linguagem,
dice B do manual do WISC-III. Kaufman (1994) raciocínio, atenção, aprendizagem verbal e
recomenda que a interpretação do protocolo memória. O QI de Execução é a medida da or-
do WISC-III deve iniciar com os escores mais ganização perceptual e avalia processamento
gerais e finalizar com os específicos, modelo visual, capacidade de planejamento, aprendi-
sugerido também para a redação das conclu- zagem não-verbal e habilidades para pensar e
sões dos resultados da avaliação. manipular estímulos visuais com rapidez de
Sugere-se a seguinte seqüência para a in- velocidade.
terpretação dos resultados obtidos na admi- A análise das discrepâncias entre as escalas
nistração do teste: verbal e execução é feita a partir de valores crí-
a) cálculo dos QIs com os respectivos Inter- ticos considerados estatisticamente significa-
valos de Confiança; análise das discrepâncias tivos (tabela B.1 do manual). Esses valores va-
significativas e das conseqüentes implicações; riam de 10 a 13 pontos para um nível de con-
b) cálculo dos Índices Fatoriais com os res- fiança de 0,05, e de 13 a 17 pontos para um
pectivos Intervalos de Confiança; análise das nível de 0,01. Kaufman (1994) sugere que uma
discrepâncias significativas e das conseqüen- diferença ≥11 pontos pode ser interpretada
tes implicações; como significativa. A escala verbal do WISC-III
c) identificação de dispersão entre os sub- enfatiza a inteligência auditiva e oral, avalian-
testes e interpretação das habilidades que se do a facilidade de expressão verbal e percep-
apresentam discrepantes da média. ção de diferenças sutis diante de conceitos ver-
bais. A escala de Execução enfatiza a habilida-
de visomotora, exigindo rapidez no desempe-
As escalas de QI nho da tarefa. Uma grande discrepância entre
V>E ou CV>OP reflete facilidade oral e auditi-
A ponderação dos escores brutos obtidos em va e capacidade para expressar idéias em pala-
cada subteste oportuniza o cálculo das escalas vras, enquanto que E>V ou OP>CV expressa
de QIs que apresentam resultados ponderados facilidade visomotora.
com média 100 e desvio padrão 15. Os três Segundo Kaufman (1994), identificar a pre-
QIs, segundo Groth-Marnat (1999), são medi- sença de discrepâncias significativas não indi-
das integradas do funcionamento intelectual, ca que automaticamente devem ser interpre-
e dispersões nas escalas prejudicam a unicida- tadas, pois as medidas de QI podem não re-
de do construto. presentar uma habilidade unitária. O WISC-III
O QI Total é considerado como a melhor inclui dimensões mais puras das habilidades
medida da habilidade cognitiva produzida no verbal e não-verbal, expressas nos Índices Fa-
WISC-III, apresentando um coeficiente de fide- toriais Compreensão Verbal e Organização Per-
dignidade de 0,96 e um erro padrão de medi- ceptual. Os escores destes fatores podem me-
da (EPM) de 3,20. Entretanto, diferenças signi- lhor informar sobre as habilidades verbal e não-
ficativas entre os QI Verbal/Execução, flutua- verbal do que os escores produzidos por uma
ções dos Índices Fatoriais, dispersões entre os discrepância grosseira entre as escalas de QI.
escores dos subtestes ou, ainda, a presença de A amplitude dos escores ponderados, que evi-
variáveis, como fadiga, ansiedade, desmotiva- dencia a dispersão entre os escores dos sub-
ção ou privação cultural, diminuem a impor- testes, é um método conveniente para deter-
tância do QIT como um índice do nível de inte- minar, empiricamente, se cada QI está medin-
ligência geral da criança. A escala verbal é mais do um constructo unitário. A dispersão entre
precisa que a de execução, considerando os os subtestes verbais, por exemplo, indica que
coeficientes de fidedignidade e do erro padrão a inteligência dita verbal não foi a responsável
de medida do QIV (rxx = 0,95; EPM = 3,53) e pelos escores nos subtestes, mas que outras
QIE (rxx = 0,91; EPM = 4,54). O QI Verbal ava- variáveis mais importantes influenciaram. Nesta

PSICODIAGNÓSTICO – V 605
situação, o QI Verbal representaria uma visão lisada pela amplitude dos escores ponderados,
grosseira das habilidades, não corresponden- comparando-se o escore ponderado mais alto
do a uma habilidade unitária. Se uma das es- com o mais baixo, dentro de cada um dos dois
calas não representa uma medida unitária, a fatores. Uma amplitude ≥ 7 pontos para CV e ≥
discrepância dos QIs não parece ser uma me- 8 pontos para OP indica presença de dispersão
dida interpretável. significativa, uma vez que os valores ocorrem
Para calcular a amplitude dos subtestes, em somente 15% da amostra de padroniza-
tanto para a escala verbal como para a de exe- ção. Identificada a dispersão, a diferença en-
cução, basta diminuir o escore ponderado mais tre os fatores CV e OP não deve ser interpreta-
baixo do escore mais alto da escala, conside- da, pois indica que a dimensão do fator não é
rando somente os cinco subtestes usados para unitária. Em relação às discrepâncias encontra-
o cômputo do QI. Para analisar as diferenças das nas análises, quando significativas, indi-
significativas entre os escores fatoriais, a esca- cam diferenças de funcionamento nas duas
la verbal é avaliada por (CV-RD) e a de execu- escalas, sendo valiosas para ajudar o profissio-
ção por (OP-VP). Os valores considerados como nal a fazer recomendações importantes e pro-
significativos para interpretação, propostos por por sugestões para o planejamento educacio-
Kaufman (1994), baseados nas tabelas B.1 e nal; quando pequenas e comuns na popula-
B.5 do manual do teste, são os seguintes: ção, não devem ser usadas como diagnóstico
a) Amplitude da dispersão entre os subtes- de anormalidade.
tes, presente em 15% da amostra de padroni-
zação:
Escala Verbal (5 subtestes): ≥ 7 pontos Os índices fatoriais
Escala de Execução (5 subtestes): ≥ 9 pon-
tos Os quatro fatores subjacentes ao WISC-III pro-
b) Diferenças entre escores fatoriais a nível porcionam informações adicionais, refletindo
de 0,05: diferentes aspectos da habilidade cognitiva. Os
Escala Verbal (CV-RD): ≥ 13 pontos escores ponderados têm média = 100 e des-
Escala de Execução (OP-VP): ≥ 15 pontos vio padrão = 15 e apresentam qualidades psi-
Se algum desses critérios for identificado, a cométricas satisfatórias. Os coeficientes de fi-
discrepância entre QIV/QIE não deve ser inter- dedignidade e os erros de medida estão
pretada, e, assim, deve-se tentar analisar a di- apresentados no Quadro 37.2, na ordem cres-
ferença entre os fatores Compreensão Verbal cente de validade e fidedignidade.
e Organização Perceptual, explicada logo a se-
guir. Entretanto, se os critérios não são encon-
trados, a interpretação das diferenças dos QIs QUADRO 37.2 Coeficientes de fidedignidade e erro
procede. Discrepâncias altas entre os QIs indi- padrão de medida dos índices fatoriais
cam diferenças reais entre a inteligência ver- Fatores Fidedignidade EPM
bal e não-verbal; diferenças pequenas mostram Compreensão Verbal 0,94 3,78
que a criança tem habilidades verbais ou não- Organização Perceptual 0,90 4,68
verbais pobremente desenvolvidas. Resistência à Distratibilidade 0,87 5,43
Na análise da discrepância entre Compre- Velocidade de Processamento 0,85 5,83
ensão Verbal e Organização Perceptual, feita
no caso da inadequação da interpretação da
disparidade dos QIs, considera-se uma diferen- Segundo Wechsler (1991), uma vez que
ça de 12 pontos como significativa em nível de envolvem mais de um subteste correlato, a in-
0,05. Segundo Kaufman (1994), deve-se tam- terpretação dos escores fatoriais é mais fide-
bém analisar a unicidade do constructo dos digna que a interpretação individual dos sub-
dois fatores por meio da presença ou não de testes e oferece importantes informações de
dispersão entre seus escores. A dispersão é ana- interesse clínico e educacional. Entretanto, es-

606 JUREMA ALCIDES CUNHA


tudos de Glutting e colegas (1997) sobre a va- mática e, além de atenção, avalia concentra-
lidade dos escores fatoriais, como prognóstico ção e memória imediata. Alguns autores re-
do rendimento acadêmico, apontam o QIT ain- ferem-se a uma denominação inadequada do
da como o mais poderoso preditor do poten- constructo, que, segundo Roid e colegas
cial de aprendizagem, uma vez que, para os (1993), seria melhor identificado por Memó-
autores, as medidas do QIV, QIE e dos Índi- ria de Trabalho. O rendimento no fator é in-
ces Fatoriais não acrescentam informações di- fluenciado pela ansiedade, carência de estra-
ferentes. tégias mentais e pobreza de automonitora-
As medidas de QI foram sempre considera- mento. Não deve ser interpretado se os es-
das como duas dimensões subjacentes às es- cores de Aritmética e Dígitos diferirem em
calas de inteligência de Wechsler e estudadas quatro ou mais pontos.
para investigar discrepâncias que caracterizas- Velocidade de Processamento surgiu em
sem grupos específicos. Entretanto, para Kau- função do acréscimo do subteste Procurar Sím-
fman (1994), os profissionais que priorizam bolos e reflete velocidade psicomotora (Códi-
essa interpretação desconsideram as inúmeras go) e velocidade mental (Procurar Símbolos)
análises fatoriais desenvolvidas em meio sécu- para resolver problemas não-verbais, avalian-
lo, que evidenciaram a falta de unicidade das do, também, a capacidade de planejar, organi-
escalas de QI em relação aos Índices Fatoriais, zar e desenvolver estratégias. Suas habilidades
sendo os últimos mais confiáveis de serem in- incluem-se em dois domínios, pois processa-
terpretados qualitativamente. Mais do que mento implica cognição e velocidade e têm
pelas escalas de QI, uma versão mais pura e componentes tanto comportamentais como
precisa da dimensão verbal e não-verbal da cognitivos (Kaufman, 1994). O fator sustentou-
habilidade intelectual da criança é dada pelos se diante das análises fatoriais exploratórias e
fatores Compreensão Verbal e Organização confirmatórias, feitas com a amostra de padro-
Perceptual, que refletem habilidades do domí- nização, com exceção do grupo de crianças de
nio cognitivo. O objetivo de Wechsler com o 6 e 7 anos. Entretanto, Kamphaus (1993) reco-
QIE, por exemplo, era avaliar a inteligência não- menda precaução na sua interpretação, até que
verbal, que consiste na habilidade de utilizar mais pesquisas evidenciem a validade e a utili-
estímulos visoespaciais na resolução de novos dade deste índice. Escore baixo reflete pobre-
problemas. Algumas vezes, entretanto, a pes- za no controle motor, o qual não deve ser in-
soa pode obter resultados baixos nesta dimen- terpretado se os valores alcançados em Arit-
são, devido a variáveis não cognitivas, como mética e Dígitos diferirem em quatro ou mais
pobreza de coordenação motora, falta de re- pontos.
flexão ou compulsividade, aspectos refletidos Segundo Groth-Marnat (1999), a dispersão
no fator Velocidade de Processamento. Neste entre os Índices Fatoriais pode ser analisada,
caso, a escala de execução fica rebaixada pela calculando-se, inicialmente, a média geral dos
deficiência de rendimento em Código e Procu- resultados ponderados para os quatro escores
rar Símbolos, tornando-se inadequada a inter- fatoriais, para ser comparada com o escore
pretação deste QI, uma vez que a escala de ponderado de cada um dos Índices Fatoriais.
execução deixa de ser um constructo único. As O autor sugere, como pontos de corte para
análises referentes às diferenças fatoriais já fo- identificar discrepâncias significativas: 7 pon-
ram comentadas no tópico anterior relativo às tos para Compreensão Verbal, 8 pontos para
discrepâncias dos QIs. Organização Perceptual e 4 pontos para Resis-
Resistência à Distratibilidade, segundo tência à Distratibilidade e Velocidade de Pro-
Groth-Marnat (1999), é o mais complexo e cessamento. Não encontrando discrepâncias
controvertido constructo. Está dentro do do- significativas, interprete as diferenças; caso
mínio verbal e depende de memória auditiva contrário, desconsidere-as, a não ser que as di-
e processamento seqüencial. O fator apresen- ferenças sejam muito grandes para serem ig-
ta grande correlação com habilidade mate- noradas.

PSICODIAGNÓSTICO – V 607
Os subtestes mínimas consideradas significativas para os
níveis de confiança 0,15 e 0,05. O resultado
Para Sattler (1992), os escores individuais dos ponderado em Informação, por exemplo, pode
subtestes não devem ser usados como um meio ser comparado com a média obtida nos esco-
fidedigno de descrever as habilidades cogniti- res ponderados nos cinco ou seis subtestes
vas específicas. Eles devem ser usados para verbais, com a média dos 10 subtestes que
gerar hipóteses gerais sobre as habilidades da contribuem para o QI geral, com a média de
criança, identificando-se as capacidades defa- todos os subtestes ou, ainda, com a média dos
sadas, as medianas e as dominantes. Geralmen- quatro subtestes que formam o índice Com-
te, os resultados obtidos nos subtestes mos- preensão Verbal. O Quadro 37.3 reproduz as
tram certa variabilidade, e, segundo Groth- diferenças consideradas significativas, em ní-
Marnat (1999), a interpretação da variabilida- vel de 0,05, para os escores ponderados dos
de dos subtestes é procedente, no caso de ha- subteste e a média de escores de diferentes es-
ver dispersão, pois resultados eqüitativos dis- calas.
pensam interpretação do perfil. O autor suge- A amplitude geral dos escores ponderados
re três passos para interpretar a variabilidade proporciona informações sobre a variabilida-
dos subtestes: a) determinar se as flutuações de ou dispersão dos subtestes, e a medida con-
são significativas; b) desenvolver hipóteses re- siste na distância entre dois escores pondera-
lacionadas com o significado da flutuação de dos extremos, subtraindo-se o escore mais bai-
cada subteste; c) integrar essas hipóteses com xo do mais alto. No grupo de padronização, as
informações relevantes referentes ao exami- amplitudes médias encontradas foram de 7,5
nando. pontos para 10 subtestes da escala Total, de
Um procedimento comum para avaliar as 4,6 pontos para cinco subtestes da escala Ver-
discrepâncias dos escores envolve a compara- bal e de 6,0 pontos para cinco subtestes da
ção do escore ponderado de cada subteste com escala de Execução. Se forem escolhidos como
o escore médio de todos os subtestes, ou com pontos de corte, a freqüência de dispersão
o escore médio do grupo de subtestes (escala) ocorrida em 15% da amostra de padronização,
que inclui o subteste em questão. A tabela B.3 os valores aumentam para 7, 8 e 10, conforme
do manual do teste apresenta as diferenças a tabela B.5 do manual do teste.

QUADRO 37.3 Diferenças significativas entre os escores ponderados de cada subteste e o escore médio das
escalas formadas por diferentes números de subtestes
Subtestes Número de subtestes na escala
5 6 7 10 12 13 Compreensão Organização
Verbal Perceptual
Informação 2,88 2,99 - 3,32 3,41 3,45 2,69 -
Semelhanças 3,00 3,12 - 3,48 3,58 3,63 2,79 -
Aritmética 3,19 3,34 - 3,74 3,86 3,91 2,48 -
Vocabulário 2,62 2,70 - 2,97 3,04 3,08 3,01 -
Compreensão 3,26 3,41 - 3,84 3,96 4,01 - -
Dígitos - 2,87 - - 3,26 3,30 - -
Completar Figuras 3,31 3,47 3,60 3,81 3,94 3,99 - 3,11
Código 3,28 3,43 3,56 3,77 3,89 3,94 - 3,17
Arranjo de Figuras 3,38 3,55 3,68 3,91 4,04 4,09 - 2,66
Cubos 2,76 2,85 2,93 3,04 3,12 3,16 - 3,45
Armar Objetos 3,72 3,92 4,08 4,37 4,52 4,58 - -
Procurar Símbolos - 3,55 3,68 - 4,04 4,09 - -
Labirintos - - 4,02 - - 4,50 - -
Nota: p < 0,05; dados parciais da tabela B.3 do manual.
Fonte: Wechsler, 1991, p.263.

608 JUREMA ALCIDES CUNHA


Sendo a amplitude dos subtestes muito ele- ficuldades na leitura, na aprendizagem e na
vada, não é recomendável usar os subtestes atenção evidenciaram escores baixos no WISC-
como medidas isoladas. A interpretação dos R, nos subtestes Aritmética, Código, Informa-
subtestes é feita pela comparação dos escores ção e Dígitos. O perfil agrupa subtestes asso-
ponderados da criança com os alcançados pelo ciados com aproveitamento escolar (Aritméti-
grupo de normatização do teste. Uma pontua- ca e Informação) e com resistência à distratibi-
ção isolada maior que a média pode refletir lidade (Aritmética, Código e Dígitos). Segundo
uma potencialidade relativa, enquanto uma Kaufman (1994), no WISC-III, o perfil ACID foi
diferença significativamente menor pode indi- encontrado, com maior freqüência, entre as
car uma relativa debilidade. Essa análise deve crianças que apresentavam dificuldades de
sempre ser feita em relação ao nível de capaci- aprendizagem e déficit de atenção do que en-
dade geral da criança, pois um escore acima tre as da população normal; entretanto, esse
de 10 pode representar um déficit para uma sucesso é aparente, uma vez que, no subteste
criança com capacidade geral extremamente Informação, o rendimento das crianças se apre-
alta (Wechsler, 1991). Para descrever os sub- sentou dentro da média. Para o autor, o perfil
testes, pode-se utilizar as categorias sugeridas ACID assemelha-se aos fatores Resistência à
por Sattler (1992), para identificar as poten- Distratibilidade e Velocidade de Processamen-
cialidades e debilidades cognitivas. 1 a 7 = to, constructos validados e de características
abaixo da média; 8 a 12 = média; 13 a 19 = psicométricas reconhecidas, devendo sua inter-
acima da média. pretação ser priorizada pelos clínicos. O autor
Outro critério é sugerido por Kaufman ainda sugere que esse perfil seja substituído
(1994), que considera interpretável um desvio pelo SCAD.
de ±3 pontos para os subtestes Informação, A validade do perfil ACID foi investigado
Semelhanças, Aritmética e Vocabulário; ±4 num grupo de 612 crianças, com problemas
pontos para Compreensão, Dígitos, Completar de aprendizagem, por Watkins e colegas
Figuras, Arranjo de Figuras, Cubos, Armar Ob- (1997), e o mesmo não se mostrou eficiente
jetos e Procurar Símbolos e ± 5 pontos para para discriminar crianças que apresentavam ou
Código. não dificuldades. Ward e colegas (1995) tam-
bém investigaram a utilidade dos perfis ACID,
ACIDS e SCAD, e os resultados embasaram o
Interpretação de índices adicionais uso dos perfis, uma vez que se apresentaram
freqüentes na população estudada; entretan-
Além das escalas de QI e dos Índices Fatoriais, to, nenhum deles é recomendado como crité-
outros agrupamentos de subtestes podem ofe- rio para determinar excepcionalidade. Wechs-
recer interpretações úteis a partir dos escores ler (1991) examinou a freqüência do perfil
obtidos no WISC-III. São interpretações opcio- num grupo de crianças com problemas de
nais e podem ser empregadas quando parece- aprendizagem, e os resultados estão comen-
rem relevantes na investigação. Caracterizam- tados a seguir, no tópico referente a Popula-
se pela apresentação de escores baixos em de- ções Especiais.
terminados subtestes, produzindo perfis ca-
racterísticos encontrados, com maior freqüên-
cia, na população que apresenta dificuldades SCAD
cognitivas.
Kaufman (1994) propôs a substituição do per-
fil ACID pelo SCAD, em que é eliminado o sub-
ACID teste de Informação, que geralmente apresen-
ta escores altos na investigação do perfil ACID
O perfil ACID surgiu na década de 70, quando em populações especiais. O perfil caracteriza-
pesquisas com crianças que apresentavam di- se por um rebaixamento nos escores de Procu-

PSICODIAGNÓSTICO – V 609
rar Símbolos, Compreensão, Aritmética e Dígi- espaciais aparecem superiores à Conceitualiza-
tos, os quatro subtestes que compõem os fa- ção Verbal, as quais são superiores às habili-
tores Resistência à Distratibilidade e Velocida- dades seqüenciais, e estas, mais elevadas que
de de Processamento. Segundo o autor, o índi- Conhecimento Adquirido, evidenciando o mo-
ce SCAD, além de indicar presença de dificul- delo Espacial > Conceitualização Verbal > Se-
dades de aprendizagem, é adequado também qüencial > Conhecimento Adquirido. Segun-
para identificar crianças com dificuldades neu- do Groth-Marnat (1999), muitos autores já pro-
rológicas ou com excepcionalidades associadas varam que nem todos os indivíduos com pro-
à disfunção cerebral. blemas de aprendizagem apresentam o perfil
A fórmula 1,7 (Si + Cd + A + D) + 32 per- proposto. Atualmente, o modelo tem sido apli-
mite calcular o índice SCAD, que apresenta cado mais para estudar o entendimento do
média 100 e desvio padrão 15 (Groth-Marnat, funcionamento cognitivo do que para diagnos-
1999). O perfil SCAD pode ser comparado com ticar condições específicas. As categorias são
o desempenho da criança em Organização Per- formadas pelos subtestes especificados no
ceptual, considerada a melhor estimativa do Quadro 37.4.
funcionamento cognitivo para a maioria das Os escores ponderados de cada categoria
crianças encaminhadas para avaliação. Uma têm média 100 e desvio padrão 15 e, segundo
diferença (OP – SCAD) de 9 (p<0,05) ou 12 Groth-Marnat (1999), podem ser calculados
pontos (p<0,01) é significativa. Grandes dife- pelas seguintes fórmulas:
renças não indicam presença ou ausência de Espacial: 2,0 (CF + Cb + AO) + 40
determinada excepcionalidade, mas são mais Conceitualização Verbal: 1,9 (V + Co + Se)
prováveis de ocorrerem em amostras de crian- + 43
ças com deficiências na aprendizagem e na Seqüencial: 2,3 (D + A + Cd) + 31
atenção. Em crianças com dificuldades visoper- Aquisição de Conhecimento: 1,9 (I + V +
ceptuais moderadas ou graves, que provavel- A) + 43
mente têm dificuldade nos subtestes Cubos e Após a identificação da magnitude de cada
Arranjo de Figuras, o índice de Compreensão categoria, os escores individuais podem ser
Verbal é mais adequado para ser comparado comparados com o escore médio alcançado nas
com o índice SCAD, e uma diferença de 8 e 11 quatro categorias. As diferenças consideradas
pontos entre os dois índices aponta significân- significativas em nível de 0,05 são: 10 pontos
cia em nível de 0,05 e 0,01, respectivamente. para Espacial, 8,5 para Conceitualização Ver-
bal, 12 pontos para Seqüencial e 8,5 pontos
para Aquisição de Conhecimento.
Categorias de Bannatyne

As categorias desenvolvidas por Bannatyne, em FORMAS REDUZIDAS DO TESTE


1971, foram criadas para diagnosticar dislexia,
estendendo-se, posteriormente, para identifi- Formas reduzidas para as escalas Wechsler sem-
car problemas de aprendizagem em geral. O pre foram estudadas, com o objetivo de eco-
modelo caracteriza-se quando as habilidades nomizar tempo de aplicação. Apesar da prati-

QUADRO 37.4 Categorias de Bannatyne


Habilidades
Espacial Conceitualização Verbal Seqüencial Conhecimento Adquirido
Completar Figuras Semelhanças Dígitos Informação
Cubos Vocabulário Aritmética Vocabulário
Armar Objetos Compreensão Código Aritmética

610 JUREMA ALCIDES CUNHA


cidade referente ao tempo, este procedimento melhoram à medida que o número de subtes-
não apresenta coeficientes muito fidedignos tes usados para a avaliação também aumenta,
para a estimativa da capacidade intelectual, por oferecendo maior confiança no diagnóstico.
produzir uma margem grande de erro, além
de oferecer poucas informações clínicas. As
formas reduzidas seriam úteis apenas como um QUADRO 37.5 Índices de fidedignidade e validade
grosseiro indicador de inteligência, ou como de formas reduzidas do WISC-III
sugestão da necessidade de uma avaliação Subtestes Fidedignidade Validade
completa. Segundo Kaufman (1979), vários Vocabulário e Informação (2) 0,92 0,80
critérios devem ser levados em consideração Vocabulário e Cubos (2) 0,91 0,86
na formação de uma bateria reduzida, entre Informação, Vocabulário e
eles, uma correlação mínima de 0,90 com os Cubos (3) 0,93 0,88
Informação, Semelhanças,
resultados de uma aplicação completa. Vocabulário e Cubos (4) 0,94 0,87
O manual do WISC-III não apresenta nenhu- Informação, Semelhanças,
ma proposta de forma reduzida para o teste, e Aritmética, Vocabulário e
o QI é calculado a partir da aplicação de 10 Cubos (5) 0,95 0,90
subtestes, sendo cinco verbais e cinco de exe- Fonte: Tabela L-11, de Sattler, 1992, p.1170 (dados resumidos).
cução, oferecendo a possibilidade de cálculos
proporcionais apenas no caso da administra-
ção de quatro subtestes, em uma das escalas Donders (1997) testou um modelo de oito
(tabela A.8 do manual do teste). subtestes (Vocabulário, Semelhanças, Aritmé-
Em relação às formas reduzidas citadas na tica, Dígitos, Completar Figuras, Cubos, Códi-
literatura, a menor estrutura usada tem sido a go e Procurar Símbolos), que proporcionou
díade formada pelos subtestes Vocabulário e adequados coeficientes de validade e fidedig-
Cubos, considerando serem os que apresentam nidade maiores ou iguais a 0,85. A forma opor-
maior correlação com o QI Verbal (0,87) e com tuniza, além do Desvio de QI Total, a interpre-
o QI de Execução (0,80), respectivamente. Gro- tação dos Índices Fatoriais, oferecendo uma
th-Marnat (1999) sugere a proposta de Kauf- avaliação mais ampla das diferentes habilida-
man e colegas, de 1996, formada por quatro des cognitivas da criança, vantagem sob o pon-
subtestes (Semelhanças, Aritmética, Comple- to de vista clínico, em relação às demais pro-
tar Figuras e Cubos), cuja administração leva posições que produzem somente a estimativa
em torno de 27 minutos. A fórmula para o cál- do QI geral. Foram produzidas tabelas para o
culo do QIT apresenta-se diferenciada para cada cálculo dos Quocientes de Desvio do QI Total e
faixa etária: dos fatores Compreensão Verbal e Organiza-
6, 8-14, 16 anos e amostra total = (1,6 S4s ção Perceptual. Para a ponderação dos índices
+ 36), de Resistência à Distratibilidade e Velocidade
7 anos = (1,7 Ss + 32) e de Processamento, a tabela A.7 do manual do
15 anos = (1,5 Ss + 40), teste pode ser utilizada.
sendo Σs = soma dos resultados pondera- Um modelo de forma reduzida do WISC-R,
dos dos 4 subtestes (Se + A + CF + Cb). usado com sucesso na reavaliação de crianças
Sattler (1992) propõe vários arranjos de com problemas de aprendizagem, incluindo os
dois, três, quatro e cinco subtestes, com os subtestes Informação, Vocabulário, Completar
respectivos coeficientes de validade e fidedig- Figuras, Cubos e Código, foi testado para o
nidade, como também os Quocientes de Des- WISC-III, por Dumont e Faro (1993). Na deter-
vio, para as respectivas formas reduzidas. As minação do QI Total, os escores ponderados
combinações que apresentam os melhores re- são somados, e a seguinte fórmula deve ser
quisitos psicométricos de cada conjunto de 2, aplicada: 1,29 (CF + I + Cd + Cb + V) + 34,56.
3, 4 e 5 subtestes encontram-se no Quadro Os resultados da pesquisa mostraram que os
37.5, podendo-se observar que os coeficientes diagnósticos obtidos com a forma reduzida do

PSICODIAGNÓSTICO – V 611
WISC-III foram preditivos dos encontrados na escores fatoriais poderiam proporcionar diag-
aplicação completa do teste, entretanto, os nóstico diferencial de dificuldades específicas,
autores salientam que os resultados são preli- num grupo de 476 crianças com dificuldades
minares e recomendam replicações dos dados de aprendizagem, com retardo mental e sem
com outras amostras. diagnóstico de deficiência. Observou-se que,
como no grupo de normatização, as discrepân-
cias estavam presentes, e o QIE apresentou-se,
ESTUDOS DO WISC-III COM GRUPOS na maioria das vezes, superior ao QIV, não sen-
ESPECIAIS do as discrepâncias muito úteis como indica-
doras de anormalidade.
Segundo Hishinuma (1995), o WISC-III apresen- A seguir, apresentam-se algumas das inú-
ta algumas características, tanto nos seus itens meras pesquisas desenvolvidas com o WISC-III
como no procedimento de administração, que em amostras específicas, objetivando a confir-
facilitam a avaliação de crianças com certo grau mação do modelo fatorial do teste e a busca
de comprometimento. O teste não exige habi- de um perfil característico para os grupos es-
lidades para leitura, a não ser para os últimos peciais.
itens de Aritmética, que, no caso de dificulda-
de, podem ser lidos pelo examinador; não re-
quer a expressão escrita, com exceção de dois Superdotação
subtestes, em que um demanda a reprodução
de símbolos (Código) e outro em que seja assi- No manual do teste, é relatada pesquisa com
nalada a resposta “sim” ou “não”, após a um grupo de 38 crianças identificadas como
identificação da inclusão ou não de símbolos- superdotadas, quando foram investigadas as
modelo numa série (Procurar Símbolos). A apli- propriedades psicométricas do teste para essa
cação de cada subteste, de forma individual, população. Os escores médios para as escalas
permite ao psicólogo maior controle sobre as de QI foram 128 (QIV), 124 (QIE) e 128 (QIT),
dificuldades relacionadas a déficit de atenção observando-se rendimento menor e maior va-
(impulsividade, distratibilidade) e a distúrbios riabilidade nos escores de Velocidade de Pro-
de conduta (recusa em responder). O teste fa- cessamento (média = 110, DP = 17,9).
cilita também a avaliação de deficientes sen- Fishkin e colegas (1996) verificaram a es-
soriais, pois os subtestes de execução podem trutura do WISC-III, numa amostra de 42 crian-
ser aplicados a deficientes auditivos ou, mes- ças superdotadas, que apresentaram escores
mo, todo o instrumento, se tiver o auxílio de altos em Semelhanças, Compreensão, Código
um intérprete que domine linguagem de sinais; e Procurar Símbolos. Cubos encontrou-se re-
aos deficientes visuais, podem ser administra- baixado, contradizendo estudos anteriores da
dos somente os subtestes verbais. literatura, que apontavam o subteste como
Segundo Kaufman (1994), os estudos reali- um dos escores máximos no perfil de super-
zados com os diversos grupos clínicos têm en- dotados.
contrado um modelo claro, em que a maioria
dos grupos apresenta escores baixos nos Índi-
ces Fatoriais RD e VP. Nos grupos que envol- Atraso mental
vem prejuízos na aprendizagem ou no desen-
volvimento da linguagem, o fator CV aparece O WISC-III foi aplicado a um grupo de 43 crian-
comprometido direta ou indiretamente, e, con- ças que apresentavam retardo mental, e as
seqüentemente, esse fator não avalia a capa- médias dos escores das escalas de QIV, QIE e
cidade intelectual na maioria destas amostras, QIT foram, respectivamente, 59, 59 e 56. A
sendo OP a melhor estimativa do potencial menor variabilidade dos resultados foi obser-
cognitivo destes grupos. Slate (1995) analisou vada entre os Índices Fatoriais, e VP (70) apa-
se as discrepâncias entre as escalas de QI e os receu com o escore mais alto, formado por

612 JUREMA ALCIDES CUNHA


subtestes que normalmente apresentam a me- hiperativas e/ou portadoras de déficit de aten-
nor correlação com habilidade intelectual geral. ção. Os escores nas escalas de QIs apresenta-
ram-se dentro da média, apesar da defasagem
nos subtestes Código (7,7) e Dígitos (8,2) e
Dificuldades de aprendizagem baixo rendimento em RD. Wechsler (1991) re-
comenda cautela na interpretação desses re-
A dificuldade de aprendizagem caracteriza-se por sultados, uma vez que essas defasagens não
um pobre processamento de informações e difi- se encontram em grande proporção de crian-
culdade no desenvolvimento de habilidades para ças deste grupo.
leitura, escrita, linguagem, discriminação auditi- O perfil ACID foi observado em 11% da
va e raciocínio. As crianças com adequado nível amostra, e uma diminuição em três dos qua-
intelectual mostram defasagem nas habilidades tro subtestes do perfil foi encontrada em 28%
cognitivas, provavelmente devidas à disfunção da amostra, sugerindo que, quando ele está
do sistema nervoso central (Groth-Marnat, 1999). presente, a hipótese de déficit de atenção deve
As escalas de inteligência de Wechsler facilitam a ser considerada, mas, quando o perfil está au-
identificação das habilidades cognitivas defasa- sente, a hipótese não deve ser descartada.
das, e inúmeros estudos são realizados, desde
a primeira edição do WISC, à procura de um
perfil que caracterize a dificuldade de aprendi- Distúrbios de conduta
zagem. Estudos com o WISC-III comprovam
escores baixos nos subtestes do perfil SCAD Os resultados da aplicação do WISC-III a um
apenas em alguns grupos de crianças com di- grupo de 26 crianças com distúrbios de con-
ficuldades na aprendizagem. Segundo Wechs- duta mostraram predomínio no desempenho
ler (1991), o WISC-III foi administrado a 65 da escala de execução em relação à verbal, con-
crianças que apresentavam dificuldades de firmando pesquisas anteriores da literatura.
aprendizagem, em que o escore médio do QIV Nas escalas de QI, os escores médios apresen-
(92) se apresentou um pouco inferior a QIE (97), taram-se entre 78 (QIV e QIT) e 82 (QIE) e, en-
discrepância encontrada na mesma direção tre os escores fatoriais, OP foi o mais alto (85)
entre CV (94) e OP (100). Os índices de RD (87) e CV (78) o mais baixo. Escores inferiores nas
e VP (89) mostraram-se rebaixados, e os esco- escalas verbais (QIV e CV) são esperados, dado
res mais altos foram encontrados em Comple- o atraso acadêmico e o empobrecimento das
tar Figuras (10,5) e Armar Objetos (10,1); en- oportunidades culturais e educacionais que
tre os mais baixos, Código (7,5), Aritmética normalmente este grupo apresenta (Wechsler,
(7,6), Procurar Símbolos (8,0) e Dígitos (7,5). 1991).
A evidência do perfil ACID foi examinada nesta
amostra, sendo observado rebaixamento nos
quatro subtestes que constituem o perfil em 5% Deficiência auditiva
do grupo e rebaixamento em três dos subtestes
(menos Informação) em 20% da amostra. Os re- O WISC-III foi administrado a crianças com de-
sultados sugeriram que, quando o perfil estiver ficiência auditiva grave e profunda, com pro-
presente, a hipótese de dificuldade de aprendi- cedimento adaptado para a linguagem de si-
zagem deve ser investigada; mas, quando está nais. A média dos escores foi QIV = 81, QIE =
ausente, não pode ser desconsiderada. 115, QIT = 92, CV = 81, OP = 106, RD = 87 e
VP = 101, confirmando melhor desempenho
na área não-verbal. Segundo Wechsler (1991),
Hiperatividade e déficit de atenção os resultados devem ser interpretados com
precaução, uma vez que a padronização do
O WISC-III foi administrado a um grupo de 68 procedimento de aplicação do teste foi altera-
crianças, diagnosticadas pelo DSM-III-R como da, podendo o uso da linguagem de sinais

PSICODIAGNÓSTICO – V 613
modificar o constructo avaliado. Memória para tra, evidenciando aplicabilidade de interpreta-
Dígitos, por exemplo, ao ser aplicado pela lin- ção dos quatro Índices Fatoriais, que foram
guagem de sinais, estima a memória visual, e bons preditores do rendimento acadêmico dos
não a auditiva. Maller e Ferron (1997) investi- pacientes estudados.
garam a invariância do modelo fatorial do
WISC-III com crianças surdas (N = 110), sendo
todas as instruções e os itens verbais do teste CONCLUSÃO
também traduzidos para a linguagem de sinais.
Os resultados da análise fatorial confirmatória O WISC-III, assim como as edições anteriores,
indicaram que o modelo se manteve, conclu- continua entre os instrumentos mais popula-
indo-se que o teste pode ser indicado com a res de avaliação psicológica com crianças, in-
população em estudo. dependentemente de exigir um tempo consi-
Sullivan e Montoya (1997), ao administra- derável para sua administração e intensivo trei-
rem o WISC-III a 196 crianças surdas, para in- namento dos examinadores. Apesar dos inú-
vestigar a estrutura do teste, encontraram meros melhoramentos e do substancial núme-
médias de 75 (QIV), 101 (QIE) e 86 (QIT), es- ro de itens alterados, a estrutura básica das
tando o QIV e o QIT em torno de 1 desvio pa- escalas anteriores mantém-se, assim como a
drão abaixo da média dos sujeitos da amostra consistência dos requisitos psicométricos, que
de padronização, que era de ouvintes. Os re- foram amplamente demonstrados pelos estu-
sultados da análise fatorial não confirmaram a dos de fidedignidade e validação, numa amos-
estrutura de quatro fatores da inteligência, mas tra de padronização bastante representativa (N
sim de dois fatores denominados Organização = 2.200). A nova edição oferece, além das in-
Visoespacial (Armar Objetos, Arranjo de Figu- formações referentes às escalas de QI, dados
ras, Cubos, Código, Procurar Símbolos, Com- produzidos pelos quatro escores fatoriais, opor-
pletar Figuras e Labirintos) e Compreensão da tunizando uma ampla interpretação das habi-
Linguagem (Informação, Vocabulário, Seme- lidades cognitivas da criança. Padrões de esco-
lhanças, Compreensão, Aritmética e Dígitos), res rebaixados vêm sendo pesquisados para
já identificados anteriormente por Sullivan e identificar características específicas de deter-
Schulte (1992), com o WISC-R, aplicado a crian- minados grupos clínicos. Entre os mais investi-
ças com o mesmo tipo de dificuldade. gados, encontram-se as categorias de Banna-
tyne e os perfis ACID e/ou SCAD, que, ao se-
rem identificados, levantam a hipótese de de-
Distúrbios psiquiátricos ficiência, mas, quando ausentes, não a elimi-
nam. O WISC-III deve ser utilizado com precau-
Tupa e colegas (1997) investigaram os mode- ção para grupos especiais, considerando que
los de um, dois, três e quatro fatores para o os estudos apresentados por Wechsler (1991)
WISC-III, em 177 pacientes portadores de dis- são baseados em amostras de tamanho redu-
túrbios relacionados ao humor, conduta, hi- zido (25 a 60), e mais estudos são necessários
peratividade e ansiedade. Por meio de análise para investigar as características psicométricas
fatorial confirmatória, o modelo de quatro fa- do WISC-III, quando utilizado com crianças que
tores apresentou o melhor ajuste para a amos- exigem auxílio especial.

614 JUREMA ALCIDES CUNHA


WAIS-III
Elizabeth do Nascimento
38
INTRODUÇÃO teúdo e formato dos itens; uso de estatísticas
para análise do viés dos itens durante o desen-
As Escalas Wechsler de Inteligência para Adul- volvimento do teste; aumento da utilidade clí-
tos (WAIS) foram elaboradas com a finalidade nica pela inclusão de novos procedimentos
de auxiliar na avaliação do funcionamento in- diagnósticos; diminuição da ênfase no tempo
telectual de adolescentes e adultos. Apresen- de execução; ampliação da base para avalia-
tam-se como importantes recursos diagnósti- ção do extremo inferior da curva de distribui-
cos para a identificação de diferentes habilida- ção por meio da adição de itens fáceis para
des cognitivas, possibilitando também a inves- melhorar a avaliação de retardo mental; adi-
tigação do impacto de problemas emocionais, ção de medidas de raciocínio fluido, memória
psiquiátricos e neurológicos no funcionamen- de trabalho e velocidade de processamento;
to cognitivo. A avaliação de problemas de fortalecimento das bases teóricas e psicomé-
aprendizagem, a predição do desempenho aca- tricas, pelo desenvolvimento de quatro Índices
dêmico futuro, o diagnóstico de transtornos Fatoriais suplementares aos QI Verbal e QI de
neurológicos e psiquiátricos que afetam o fun- Execução, da normatização conjunta com o
cionamento mental estão entre os objetivos WMS-III (Wechsler Memory Scale – Third Edi-
mais freqüentes para sua utilização. tion) e com o WIAT (Wechsler Individual Achie-
As Escalas Wechsler de Inteligência consti- vement Test), além das análises psicométricas
tuem importantes instrumentos psicométricos, de precisão e validade.
sendo reconhecidas mundialmente. O WAIS-III A atualização de normas é requisito básico
consiste na mais recente revisão realizada da para a utilização de testes psicométricos, pois
versão para adultos (WAIS), tendo sido publi- permite proceder comparações dos desempe-
cado nos Estados Unidos em 1997, por The nhos entre pessoas de um mesmo tempo e lu-
Psychological Corporation. gar e controlar o fenômeno de que há aumen-
Embora o WAIS-III represente uma continui- to do resultado em QI ao longo do tempo. A
dade do WAIS-R, introduz aperfeiçoamentos normatização americana do WAIS-III foi feita
substanciais, a saber: atualização e expansão com base em uma amostra composta por 2.450
das normas americanas; extensão da faixa etá- pessoas, com idades entre 16 e 89 anos. No
ria, passando o limite etário superior de 74 anos delineamento da amostra, foram controladas
para a idade de 89 anos; modernização do con- as variáveis sexo, idade, nível escolar e região

PSICODIAGNÓSTICO – V 615
geográfica de residência, de acordo com os (a cópia dos símbolos permite avaliar a veloci-
dados do censo americano de 1995. A variável dade grafomotora e perceptual).
raça/etnia também foi considerada. Com rela- A ênfase no tempo de execução foi reduzi-
ção à idade, a amostra foi dividida em 13 gru- da com o propósito de não prejudicar pessoas
pos etários (16-17, 18-19, 20-24, 25-29, 30- com mais idade. Assim, o número de itens
34, 35-44, 45-54, 55-64, 65-69, 70-74, 75-79, com bônus por tempo de execução foi dimi-
80-84 e 85-89 anos). nuído, e Armar Objetos foi substituído pelo
O aumento da faixa etária de 74 anos para subteste Raciocínio Matricial, que não tem
89 anos, na normatização do WAIS-III, reflete limite de tempo.
o aumento da expectativa de vida da popula- Considerando que o WAIS-R não possui sub-
ção americana e conseqüente aumento da po- testes que meçam adequadamente o raciocí-
pulação de idosos. A extensão da faixa etária nio fluido, e considerando a importância que
gerou a necessidade de proceder modificações esse domínio possui para compreensão do fun-
nos materiais e procedimentos de aplicação dos cionamento cognitivo, foi criado o subteste
subtestes, de forma a torná-los apropriados Raciocínio Matricial. Da mesma forma, em vis-
para a avaliação de pessoas com mais idade. ta da constatação na literatura da importância
As modificações de itens do WAIS-R justifi- da memória de trabalho e da velocidade de
ca-se em função da existência de vários itens processamento no processo de aprendizagem,
que se tornaram obsoletos, tanto no formato foram incluídos dois novos subtestes no WAIS-
quanto no conteúdo. Para a elaboração do III (Seqüência de Números e Letras e Procurar
WAIS-III, os conteúdos de alguns itens verbais Símbolos), de forma a permitir a avaliação des-
foram atualizados, e os estímulos dos subtes- ses componentes.
tes Completar Figuras e Arranjo de Figuras fo- A inclusão desses três novos subtestes ge-
ram redesenhados e modernizados, com a fi- rou a principal mudança estrutural no WAIS-
nalidade de torná-los condizentes com os tem- III. Os resultados das análises fatoriais proce-
pos atuais, tornando-os mais atrativos. Com a didas com os dados de normatização para a
finalidade de não prejudicar pessoas com pro- população americana permitiram identificar a
blemas de acuidade visual, o tamanho da maio- existência de quatro importantes dimensões do
ria dos estímulos foi aumentado. funcionamento intelectual, a saber: Compre-
Em razão da crítica feita ao WAIS-R, de que ensão Verbal, Organização Perceptual, Memó-
não era capaz de discriminar adequadamente ria de Trabalho e Velocidade de Processamen-
pessoas com retardo mental leve e moderado, to. Esses fatores passam a ser sintetizados nu-
foram incluídos itens extremamente fáceis, com mericamente em quatro Índices Fatoriais, for-
o objetivo de ampliar a base para a avaliação talecendo, assim, a utilidade clínica do instru-
do extremo inferior da curva de distribuição. mento.
Para tal, sujeitos diagnosticados com retardo
mental leve ou moderado foram testados. Des-
ta forma, no WAIS-III, o limite inferior dos re- PROPRIEDADES PSICOMÉTRICAS
sultados em QIs foram ampliados, sendo de DO WAIS-III
45 para o QI Total, 48 para o QI Verbal e 47
para o QI de Execução. Para avaliação das propriedades psicométri-
Para aumentar a utilidade clínica, auxilian- cas do WAIS-III, foram realizados estudos
do o examinador a testar os limites do desem- sobre a fidedignidade e validade do referido
penho ou a examinar, mais acuradamente, os instrumento.
tipos de erros cometidos pelos examinandos, As médias dos coeficientes de fidedignida-
foram incluídos dois procedimentos opcionais de para os subtestes na amostra total ameri-
no subteste Códigos, a saber, Aprendizado Es- cana variaram de 0,70 (Armar Objetos) a 0,93
pontâneo (avalia a habilidade do examinando (Vocabulário), enquanto as médias dos coefi-
de recordar os símbolos do Códigos) e Cópia cientes de fidedignidade dos resultados em QI

616 JUREMA ALCIDES CUNHA


e Índices Fatoriais foram de 0,88 (IVP) a 0,98 WAIS-III também foi aplicado em diferentes
(QIT). Os subtestes que apresentam maiores grupos clínicos (demência de Alzheimer, danos
índices de estabilidade temporal, em média, cerebrais, retardo mental, transtornos psiquiá-
foram Informação e Vocabulário (em torno de tricos, transtornos de aprendizagem, proble-
0,90). mas de audição).
Estudos sobre a validade concorrente foram Em geral, os resultados acerca da fidedig-
feitos comparando os resultados no WAIS-III nidade e validade indicam que o WAIS-III se
com diferentes instrumentos (WAIS-R, WISC- revela adequado para avaliar inteligência de
III, WIAT e Matrizes Progressivas de Raven, en- adolescentes e adultos em diferentes contex-
tre outros). Os resultados da comparação dos tos e populações.
desempenhos do WAIS-III com o WAIS-R e com
o WISC-III permitem afirmar que tais instrumen-
tos medem essencialmente o mesmo construc- DESCRIÇÃO DO WAIS-III
to. No estudo sobre a validade de constructo,
encontraram-se correlações estatisticamente O WAIS–III mantém a mesma estrutura do
significativas entre os subtestes, indicando que WAIS–R e das outras Escalas Wechsler de inte-
são interdependentes, o que permite fazer in- ligência. Apesar dos inúmeros aperfeiçoamen-
ferências acerca da inteligência geral. As inter- tos realizados, incluindo o aumento de novos
correlações médias foram maiores entre os itens, aproximadamente 68% dos itens (113
subtestes verbais que os de execução, sendo dos 165 itens) do WAIS–R (excluindo o Códi-
que o subteste Vocabulário é o que se correla- gos) foram mantidos, seja na forma original
ciona mais fortemente com a Escala Verbal, ou ligeiramente modificada.
enquanto Cubos e Raciocínio Matricial com a O Quadro 38.1 permite identificar o núme-
de Execução. Para a validade de constructo, o ro total de itens em cada subteste do WAIS-III,

QUADRO 38.1 Número total de itens em cada subteste do WAIS-III e número de mudanças ocorridas nos
itens em relação ao WAIS-R
Subteste Total de itens Não modi- Substancial- Itens novos Total de itens
no WAIS-R ficados ou mente no WAIS-III
ligeiramente modificados
modificados
Escala Verbal
Vocabulário 35 25 0 8 33
Semelhanças 14 11 0 8 19
Aritmética 14 13 1 6 20
Dígitos 14 14 0 1 15
Informação 29 18 1 9 28
Compreensão 16 12 0 6 18
Seqüência de Números e Letras – – – 7 7
Escala de Execução
Completar Figuras 20 8 2 15 25
Códigos 93 93 9 40 133*
Cubos 9 9 0 5 14
Raciocínio Matricial – – – 26 26
Arranjo de Figuras 10 5 0 6 11
Procurar Símbolos – – – 60 60
Armar Objetos 4 2 1 2 5
Fonte: Wechsler, 1997, p.19.
*Não foram incluídos os itens das tarefas opcionais: Pareamento (18), Recordação Livre (9) e Cópia (133).

PSICODIAGNÓSTICO – V 617
bem como o número de mudanças ocorridas juntos: Verbal e de Execução (com sete subtes-
nos itens em relação ao WAIS-R. tes cada). O Quadro 38.2 apresenta a compo-
Como pode ser observado no Quadro 38.1, sição de cada conjunto, e o número que prece-
no WAIS-III, houve o aumento no número de de cada subteste indica a posição que ele ocu-
itens em nove subtestes e um ligeiro decrésci- pa na ordem padronizada de aplicação.
mo em apenas dois, quando comparado com
o WAIS-R. No entanto, oito subtestes apresen-
tam de três a cinco itens extremamente fáceis SUBTESTES DO WAIS-III
que compõem a seqüência inversa, aplicada
somente quando o examinando fracassa nos Os 14 subtestes do WAIS-III foram elaborados
dois primeiros itens do ponto de início da apli- para avaliar diferentes aspectos do funciona-
cação do subteste. Deste modo, esses itens mento cognitivo. A investigação sobre a espe-
tendem a ser aplicados em uma minoria de cificidade de cada subteste constitui aspecto
examinandos. Os subtestes que apresentam a importante, uma vez que tal avaliação oferece
regra de reversão ou seqüência inversa são: fundamentação para a interpretação dos re-
Vocabulário, Semelhanças, Aritmética, Informa- sultados, no que se refere às habilidades espe-
ção, Compreensão, Completar Figuras, Cubos cíficas atribuídas aos subtestes, evitando inter-
e Raciocínio Matricial. pretações errôneas sobre as forças e fraquezas
Dos três novos subtestes integrados ao do funcionamento cognitivo da pessoa em ava-
WAIS-III, Procurar Símbolos consiste em uma liação. O grau de especificidade pode ser cal-
adaptação do já existente no WISC-III. culado estatisticamente e diz respeito à pro-
Dessa forma, atualmente, o WAIS-III é com- porção da variância que é fidedigna e peculiar
posto de 14 subtestes agrupados em dois con- ao subteste, não sendo compartilhada com
outros subtestes e nem devida ao erro. Os sub-
testes são classificados como tendo ampla,
QUADRO 38.2 Subtestes do WAIS–III que adequada ou inadequada especificidade (vide
compõem os conjuntos Verbal e de Execução e a Quadro 38.3).
ordem de aplicação Os estudos realizados por Kaufman e Li-
Verbal Execução chtenberger (1999) e por Sattler e Ryan (1999)
2. Vocabulário 1. Completar Figuras sobre o grau de especificidade dos subtestes
4. Semelhanças 3. Códigos do WAIS-III, com base na amostra de normati-
6. Aritmética 5. Cubos zação americana, permitiram constatar que
8. Dígitos 7. Raciocínio Mental vários subtestes do WAIS-III possuem suficien-
9. Informação 10. Arranjo de Figuras
te especificidade. Enquanto Sattler e Ryan apre-
11. Compreensão 12. Procurar Símbolos
13. Seqüência de Números (suplementar) sentam a avaliação do grau de especificidade
e Letras (suplementar) 14. Armar Objetos de cada subteste de forma detalhada, consi-
(opcional) derando em que faixas etárias os subtestes
Fonte: Wechsler, 1997, p.3. apresentam algum grau de especificidade, Kau-

QUADRO 38.3 Subtestes do WAIS-III categorizados de acordo com o grau de especificidade


Ampla especificidade Adequada especificidade Inadequada especificidade
Dígitos Arranjo de Figuras Procurar Símbolos
Raciocínio Matricial Cubos Armar Objetos
Códigos Informação
Completar Figuras Compreensão
Seqüência de Números e Letras Semelhanças
Aritmética Vocabulário
Fonte: Kaufman & Lichtenberger, 1999, p.80.

618 JUREMA ALCIDES CUNHA


fman e Lichtenberger fazem uma avaliação letras apresentadas oralmente, colocando os
geral, independente dos grupos etários. Em li- números em ordem crescente e as letras em
nhas gerais, os autores apresentam resultados ordem alfabética. A aplicação do subteste é
concordantes acerca do grau de especificida- suspensa após o fracasso nas três tentativas
de dos subtestes. de um item. O subteste é composto de sete
Segundo Sattler e Ryan (1999), aqueles sub- séries de números e letras, com três tentativas
testes com inadequada especificidade não de- cada. O número de elementos em cada série
vem ser interpretados no sentido de estarem aumenta progressivamente, sendo que a pri-
medindo funções específicas. Eles podem ser meira é composta de dois elementos, e a últi-
interpretados como sendo boas ou razoáveis ma, de oito.
medidas de g, e, quando apropriado, represen- Os dados empíricos obtidos pelos estudos
tando um dos quatro fatores identificados no conduzidos para a elaboração da versão origi-
WAIS-III (vide Quadro 38.4). nal americana do WAIS-III apontam que, do
A seguir, dos 14 subtestes, serão apresen- ponto de vista psicométrico, o subteste Seqüên-
tados os subtestes Seqüência de Números e cia de Números e Letras pode ser considerado
Letras, Raciocínio Matricial e Procurar Símbo- uma razoável medida da capacidade intelec-
los, que representam importantes inovações no tual geral, sendo que, no WAIS-III, 42% de sua
WAIS-III, de vez que os subtestes restantes variância pode ser atribuída ao fator g. Contri-
mantêm a mesma estrutura das edições ante- bui substancialmente para o Índice Memória
riores. de Trabalho, apresentando carga média de
0,61. Apresenta coeficientes de fidedignidade
entre 0,75 e 0,88 nos 13 grupos etários. Se-
Seqüência de Números e Letras qüência de Números e Letras correlaciona-se
mais com os subtestes Dígitos (r = 0,57) e Arit-
O subteste Seqüência de Números e Letras foi mética (r = 0,55). Em relação às escalas, apre-
introduzido no WAIS-III com o objetivo de au- senta correlação moderadamente alta com a
xiliar na avaliação da atenção e memória de Escala Total (r = 0,64) e a Escala Verbal (r =
trabalho. O seu formato foi inspirado no tra- 0,62), e correlação moderada com a Escala de
balho de Gold, Carpenter, Randolph, Goldeberg Execução (r = 0,57).
e Weinberg, em 1997 (apud Psychological Cor- Segundo Sattler e Ryan (1999), o subteste
poration, 1997), que desenvolveram tarefa si- Seqüência de Números e Letras apresenta es-
milar para determinar o comprometimento da pecificidade ampla ou adequada para cinco
memória de trabalho em indivíduos com es- grupos etários (18-19; 30-34; 45-54; 70-74; 85-
quizofrenia. 89 anos) e inadequada para oito grupos etá-
A tarefa requer que o examinando organi- rios (16-17; 20-24; 25-29; 35-44; 55-64; 65-69;
ze, seqüencialmente, 21 séries de números e 75-79; 80-84 anos). As habilidades investiga-

QUADRO 38.4 Subtestes do WAIS-III enquanto medidas de habilidade geral (g)


Boa medida da habilidade geral Razoável medida da habilidade geral
Subteste Carga média de g Subteste Carga média de g
Vocabulário (0,83) Procurar Símbolos (0,70)
Semelhanças (0,79) Arranjo de Figuras (0,66)
Informação (0,79) Seqüência de Números e Letras (0,65)
Compreensão (0,77) Completar Figuras (0,64)
Aritmética (0,75) Armar Objetos (0,62)
Cubos (0,72) Códigos (0,59)
Raciocínio Matricial (0,72) Dígitos (0,67)
Fonte: Sattler & Ryan, 1999, p.1218 (adaptado da tabela N-12).

PSICODIAGNÓSTICO – V 619
das por esse subteste e compartilhadas com Do ponto de vista psicométrico, o subteste
outros subtestes são: percepção auditiva de Raciocínio Matricial pode ser considerado, jun-
estímulo verbal simples, memória de trabalho, tamente com Cubos, como sendo a melhor
inteligência fluida, visualização, aquisição e medida da capacidade intelectual geral entre
recuperação de curto prazo, memória do estí- os subtestes da Escala de Execução, sendo que,
mulo simbólico, processamento seqüencial, no WAIS-III, 52% de sua variância pode ser atri-
codificação da informação para posterior pro- buída ao fator g. Ele contribui moderadamen-
cessamento cognitivo, facilidade com seqüên- te para o Índice Organização Perceptual, apre-
cias superaprendidas, memória de curto prazo sentando carga média de 0,49, correlacionan-
(auditiva), habilidade de aprender, habilidade do-se mais com os subtestes Cubos (r = 0,60)
de planejamento e verbalização (Kaufman & e Aritmética (r = 0,58). Apresenta coeficientes
Lichtenberger, 1999). de fidedignidade entre 0,84 e 0,94 nos 13 gru-
Dentre os fatores que afetam os resultados pos etários. Esse subteste apresenta ampla es-
no subteste estão: atenção, ansiedade, concen- pecificidade para todos os grupos etários.
tração, distração, flexibilidade, analfabetismo Entre as habilidades investigadas em Racio-
(não sabe as letras e o alfabeto no nível auto- cínio Matricial e compartilhadas com outros
mático) ou dislexia, transtornos de aprendiza- subtestes, estão: percepção visual de estímulo
gem, hiperatividade, negativismo e persistên- abstrato, percepção auditiva do estímulo ver-
cia. As condições ambientais e físicas também bal complexo (seguir as instruções), capacida-
podem prejudicar o desempenho, como por de de distinguir os detalhes essenciais dos não-
exemplo, barulho ou problemas de audição. essenciais, organização perceptual, inteligên-
cia visual, inteligência fluida, produção conver-
gente, processamento holístico, habilidade de
Raciocínio Matricial aprendizado, raciocínio não-verbal, processamen-
to simultâneo, visualização espacial e organiza-
A configuração do subteste Raciocínio Matri- ção visual (Kaufman & Lichtenberger, 1999).
cial é semelhante à de testes como o de Matri- Dentre os fatores que afetam os resultados
zes Progressivas de Raven. O subteste Raciocí- no subteste, estão: habilidade para responder
nio Matricial foi introduzido no WAIS-III com o quando inseguro, estilo cognitivo, cegueira
objetivo de aprimorar a investigação do racio- para cor (em alguns itens, o uso de várias co-
cínio fluido (habilidade geral de raciocínio não- res pode confundir pessoas com cegueira para
verbal). cor), flexibilidade, nível motivacional, negati-
O subteste é composto de 26 itens, além vismo, predomínio do pensamento concreto,
dos três exemplos que servem de treino na ta- persistência e problemas visoperceptuais (Kau-
refa. É composto de quatro tipos de itens: pa- fman & Lichtenberger, 1999).
drões contínuos e discretos, classificação, ra-
ciocínio analógico e raciocínio serial. O fato de
não apresentar limite de tempo tem se mos- Procurar Símbolos
trado favorável para pessoas de mais idade que
apresentam velocidade de resposta mais len- O subteste Procurar Símbolos foi introduzido,
ta. Foi inspirado no teste de Raven, em 1938, inicialmente, no WISC-III. No entanto, algumas
(Kaufman & Lichtenberger, 1999). A tarefa modificações foram efetuadas para a sua in-
consiste em completar uma série de padrões clusão no WAIS-III. A inclusão desse subteste
incompletos, apontando ou dizendo o núme- no WAIS-III permitiu chegar a uma estrutura
ro do estímulo que está faltando entre as cin- fatorial semelhante à do WISC-III, o que se
co alternativas apresentadas. Após quatro mostra relevante para efeitos de comparação
erros consecutivos ou quatro erros em cinco longitudinal dos resultados obtidos com as
itens consecutivos, a aplicação do subteste é duas Escalas, tanto nos contextos clínico quan-
suspensa. to de pesquisa.

620 JUREMA ALCIDES CUNHA


A tarefa consiste em identificar se os sím- lhar sob pressão do tempo (Kaufman & Lichten-
bolos mostrados no grupo-alvo estão presen- berger, 1999).
tes no grupo de busca, marcando a resposta
no campo apropriado. O subteste apresenta
tempo limite de 120 segundos. O subteste apre- APLICAÇÃO E CORREÇÃO DO WAIS-III
senta apenas uma forma composta de 60 itens,
e cada item apresenta dois símbolos no gru- A aplicação, correção e interpretação do WAIS-
po-alvo e cinco símbolos no grupo de busca. III mantêm os mesmos princípios e passos con-
Do ponto de vista psicométrico, Procurar tidos nas outras versões das Escalas Wechsler
Símbolos pode ser considerado uma medida de Inteligência.
razoável da capacidade intelectual geral entre A aplicação é individual e tem como re-
os subtestes da Escala de Execução, sendo que, quisito básico o treinamento, por parte do
no WAIS-III, 49% de sua variância pode ser atri- examinador, no manuseio dos materiais e das
buída ao fator g. Como seria esperado, contri- instruções contidas no manual. A aplicação
bui substancialmente para o Índice Velocidade padronizada permanece em torno de 90 mi-
de Processamento, apresentando carga média nutos.
de 0,70 e maior correlação com o subteste Para se obter tanto os resultados dos QIs
Códigos (r = 0,65). Foram estimados coeficien- quanto dos Índices Fatoriais, deve-se aplicar 13
tes de fidedignidade entre 0,74 e 0,82 nos 13 subtestes, excluindo-se o subteste Armar Ob-
grupos etários e correlação moderadamente jetos, que passa a ser considerado opcional.
alta com a Escala Total (r = 0,66) e com a Esca- Este subteste é aplicado em circunstâncias es-
la de Execução (r = 0,69). pecíficas, podendo substituir qualquer subtes-
O subteste tem como objetivo investigar as te da Escala de Execução, que, por algum mo-
habilidades de atenção, velocidade de proces- tivo, foi invalidado durante a aplicação. No
samento mental e de inspeção visual. Segun- entanto, essa possibilidade de substituição
do Sattler e Ryan (1999), sua especificidade é pode ser usada somente em pessoas com ida-
ampla ou adequada para três grupos etários des entre 16 e 74 anos. Os subtestes Seqüên-
(30-34; 35-44; 45-54 anos) e inadequada para cia de Números e Letras e Procurar Símbolos
10 grupos etários (16-17; 18-19; 20-24; 25-29; são considerados suplementares por contribuí-
55-64; 65-69; 70-74; 75-79; 80-84; 85-89 anos). rem exclusivamente para os Índices Fatoriais,
Entre as habilidades investigadas em Pro- entrando no cálculo do QI apenas em situa-
curar Símbolos e compartilhadas com outros ções em que Dígitos ou Códigos foram invali-
subtestes, estão: percepção visual de estímulo dados por alguma razão. Desse modo, o sub-
abstrato, percepção auditiva do estímulo ver- teste Seqüência de Números e Letras poderá
bal complexo (seguir as instruções), organiza- substituir apenas o primeiro, enquanto Procu-
ção perceptual, produção convergente e ava- rar Símbolos somente o segundo.
liação do estímulo simbólico, planejamento, Com base no Quadro 38.2, observa-se que
codificação da informação para processamen- a ordem de aplicação dos subtestes se dá de
to cognitivo posterior, habilidade de aprendi- forma alternada, com a finalidade de manter
zado, memória de curto prazo (visual), visuali- o interesse do examinando, procedimento este
zação espacial, velocidade do processamento adotado a partir do WAIS-R.
mental, habilidade com lápis e papel, coorde- No WAIS-R, os resultados ponderados no
nação visomotora e acurácia (Kaufman & Li- teste, que serviam de referência para o cálculo
chtenberger, 1999). Os fatores que afetam os do QI, eram baseados unicamente nos resulta-
resultados no subteste são: ansiedade, distra- dos do grupo etário de 20 a 34 anos da amos-
ção, transtornos de aprendizagem, hiperativi- tra de normatização. Este procedimento foi
dade, nível motivacional, preocupação obses- alvo de crítica, uma vez que prejudicava a in-
siva com acurácia e detalhes, persistência, pro- vestigação do desempenho de sujeitos com
blemas visoperceptuais e capacidade de traba- maior idade. Não obstante o fato de ter sido

PSICODIAGNÓSTICO – V 621
mantido como procedimento opcional à pon- 3) informações sobre a história de vida do
deração dos resultados a partir do grupo de examinando;
referência (20 a 34 anos), no WAIS-III, outra 4) observações diretas do comportamento;
importante inovação foi que os resultados bru- 5) resultados de outras avaliações.
tos passaram a ser ponderados, a partir de to- Com o objetivo de levantar hipóteses sobre
dos os grupos etários contemplados na nor- as capacidades cognitivas do examinando, a
matização, de forma que cada indivíduo possa interpretação dos resultados quantitativos (QI
ser comparado com o grupo etário ao qual Total, QI Verbal, QI de Execução, os quatro Ín-
pertence. dices Fatoriais e os 14 resultados ponderados nos
No que se refere ao cálculo dos Índices Fa- subtestes) serve de referência para a interpreta-
toriais, o procedimento é semelhante ao ado- ção qualitativa. A recomendação é que se parta
tado para obtenção dos resultados em QI. Cada dos resultados globais para os específicos.
índice é obtido a partir da soma dos resulta-
dos ponderados dos respectivos subtestes que
o compõem. As somas dos resultados pon- Passo 1 – Interpretação do QI Total
derados são convertidas para uma escala nor-
malizada, com média de 100 e desvio padrão O primeiro resultado a ser levado em conside-
de 15, a mesma utilizada para os resultados ração é o QI Total, que consiste no resultado
em QI. que expressa o nível de funcionamento global.
No entanto, juntamente com o resultado quan-
titativo, é importante estabelecer o intervalo
INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS de confiança, ou seja, a margem de erro, o
ALCANÇADOS NO WAIS-III percentil e a descrição da categoria intelectual.
As categorias diagnósticas correspondentes
A interpretação do WAIS-III segue basicamen- são apresentadas no Quadro 38.5. É importan-
te os mesmos passos para interpretação das te também verificar se o QI Total se apresenta
outras Escalas Wechsler de Inteligência. A in- consistente com o quadro de pré-morbidade
clusão dos Índices Fatoriais e de procedimen- (quando for o caso), o nível educacional e pro-
tos alternativos possibilita o levantamento de fissional do examinando.
informações que enriquecem a interpretação Como pode ser observado no Quadro 38.5,
do WAIS-III. As discrepâncias entre os resulta- a classificação utilizada no WAIS-III para o li-
dos ponderados nos subtestes, entre os QI e mite extremo inferior do QI foi alterada em re-
entre os Índices Fatoriais, são consideradas lação às versões anteriores, cuja classificação
importantes indicadores diagnósticos para era deficiência mental ou retardo mental. Essa
identificar as forças e fraquezas do funciona- alteração teve como objetivo evitar que o re-
mento intelectual. A análise qualitativa dessas sultado apresentado seja considerado como
discrepâncias tem sido objeto de inúmeros es- uma evidência suficiente para efetuar o diag-
tudos referidos na literatura (Kaufman, 1990; nóstico de retardo mental. O resultado extre-
Kaufman & Lichtenberger, 1999; Matarazzo, mamente baixo no WAIS-III indica que este é
1976; Matarazzo, 1990; Sattler & Ryan, 1999). muito inferior à média, podendo ser indicativo
Em linhas gerais, a análise dos padrões de de presença de um déficit no funcionamento
desempenho no WAIS-III é feita com base nos cognitivo.
seguintes aspectos:
1) discrepâncias significativas do ponto de
vista estatístico e freqüência clinicamente im- Passo 2 – Interpretação da discrepância
portante das diferenças entre os resultados em entre o QI Verbal e o QI de Execução
QI e entre os Índices Fatoriais;
2) análise das variações nos desempenhos O segundo passo consiste em analisar a dis-
nos subtestes; crepância apresentada entre o QI Verbal (QIV)

622 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO 38.5 Descrição qualitativa do QI Total no WAIS-III
Percentual incluído
QI Classificação
Curva normal teórica Amostra atual
130 e acima Muito Superior 2,2 2,1
120-129 Superior 6,7 8,3
110-119 Média Superior 16,1 16,1
90-109 Média 50,0 50,3
80-89 Média Inferior 16,1 14,8
70-79 Limítrofe 6,7 6,5
69 e abaixo Extremamente Baixo 2,2 1,9
Fonte: Wechsler, 1997, p.25.
*As porcentagens apresentadas são do QI Total, estando baseadas na amostra total de normatização americana (N = 2.450). As
porcentagens obtidas para o QI Verbal e QI de Execução são muito semelhantes.

e o QI de Execução (QIE). Como nas outras cem informações sobre as habilidades do exa-
Escalas Wechsler de Inteligência, o QIV cons- minando, permitindo identificar os pontos for-
titui uma medida do conhecimento adquiri- tes e fracos no desempenho. Embora a identi-
do, raciocínio verbal e facilidade com mate- ficação de diferenças extremas entre os resul-
riais verbais, ao passo que o QIE é uma me- tados permita levantar hipóteses mais seguras
dida do raciocínio fluido, processamento vi- acerca da existência de algum problema cog-
soespacial, atenção para detalhes e integra- nitivo decorrente de transtorno neurológico ou
ção visomotora. psíquico, fatores como classe social, histórico
Esses resultados em QI são analisados, se- educacional e fatores étnicos também podem
paradamente, somente quando apresentam contribuir para tais discrepâncias. A existência
diferenças significativas e relativamente in- de diferenças moderadas ou extremas entre os
freqüentes na amostra de normatização. O QIV e QIE torna inadequada a interpretação
manual americano de aplicação e correção inicial do QIT, uma vez que esse resultado pas-
do WAIS-III (Wechsler, 1997) apresenta as sa a não expressar com clareza as forças e fra-
tabelas B.1 e B.2, necessárias para identifi- quezas cognitivas identificadas (Olin & Keatin-
cação de tais aspectos. Para a maioria dos ge, 1998).
grupos etários, a diferença de 8 a 9 pontos Olin e Keatinge (1998) oferecem algumas
entre o QIV e o QIE são significativas (p < hipóteses possíveis para interpretação das di-
0,05). ferenças entre os QIV e QIE, desde que os re-
Considerando que a diferença significativa sultados nos subtestes sejam homogêneos:
encontrada pode ser comum na população, 1) QIV > QIE sugere, possivelmente, lenti-
refletindo muitas vezes flutuações normais nas dão psicomotora, falta de motivação ou esfor-
habilidades intelectuais dos indivíduos, é ne- ço, reduzida coordenação visomotora e de pro-
cessário identificar se ela é infreqüente na cessamento, estresse ou ansiedade devido à
amostra de normatização para fins de análise. pressão do tempo, dano orgânico, déficit vi-
Para se ter uma idéia, diferenças significativas sual ou de organização perceptual, depressão,
de 15 pontos entre os dois resultados em QI ansiedade, melhores habilidades intelectuais
mostraram-se freqüentes, tendo sido encon- verbais.
tradas em aproximadamente 18% da amostra 1) QIE > QIV sugere, possivelmente, falta
de normatização americana. Em linhas gerais, de educação formal ou fatores culturais, im-
consideram-se as diferenças de 10 a 20 pontos pulsividade, falta de atenção, problemas com
como sendo moderadas, enquanto diferenças o raciocínio verbal, problemas de audição e
maiores que 20 pontos podem ser considera- fala, ou melhores habilidades intelectuais não-
das extremas. As diferenças moderadas ofere- verbais.

PSICODIAGNÓSTICO – V 623
Passo 3 – Análise das discrepâncias entre aqueles que medem outros domínios de habi-
os Índices Fatoriais lidades. No entanto, embora os subtestes Com-
preensão e Arranjo de Figuras apresentem cor-
Os Índices Fatoriais constituem medidas de relações com Compreensão Verbal e Organiza-
domínios mais discretos. Dessa forma, além dos ção Perceptual, respectivamente, não foram
QI tradicionais (Verbal, Execução e Total), o incluídos no cômputo dos respectivos Índices
WAIS-III permite o levantamento de quatro Ín- Fatoriais. O subteste Armar Objetos não foi in-
dices Fatoriais: Compreensão Verbal, Organi- cluído na investigação dos quatro domínios
zação Perceptual, Memória de Trabalho (seme- recém-apresentados, embora esteja correlacio-
lhante ao fator de resistência à distratibilidade nado com a Organização Perceptual.
do WISC–III) e Velocidade de Processamento. A análise dos Índices Fatoriais pode ser fei-
O Índice Compreensão Verbal (ICV) reflete ta com base na discrepância entre os pares de
o conhecimento verbal adquirido e o processo Índices, permitindo, assim, seis possíveis com-
mental necessário para responder às questões, parações (ICV-IOP, ICV-IMT, IOP-IVP, ICV-IMT,
que seria a capacidade de compreensão (ra- IOP-IMT, IMT-IVP). O critério para interpretação
ciocínio verbal). É obtido pela soma dos resul- dos pares de Índices é o mesmo utilizado para
tados ponderados dos subtestes Vocabulário, comparação dos QIV e QIE, ou seja, a análise e
Informação e Semelhanças. interpretação é feita verificando se os valores
O Índice Organização Perceptual (IOP) con- obtidos são significativamente diferentes ou
siste na medida do raciocínio não-verbal, ra- suficientemente grandes para serem conside-
ciocínio fluido, atenção para detalhes e inte- rados anormais ou raros, e se tais diferenças
gração visomotora. É obtido pela soma dos re- são passíveis de interpretação. As tabelas utili-
sultados ponderados dos subtestes Cubos, zadas para identificação de diferenças signifi-
Completar Figuras e Raciocínio Matricial. cativas entre os QIV e QIE e a freqüência em
O terceiro Índice, Memória de Trabalho que aparecem na amostra de normatização em
(IMT), relaciona-se com a capacidade de aten- cada grupo etário também apresentam tais
tar-se para a informação, mantê-la brevemen- valores para os pares de Índices Fatoriais. Em
te e processá-la na memória, para, em segui- linhas gerais, observa-se que diferenças meno-
da, emitir uma resposta. É obtido por meio da res de 15 pontos entre os pares de Índices são
soma dos resultados ponderados dos subtes- esperadas, enquanto diferenças de 15 a 25
tes Aritmética, Dígitos e Seqüência de Núme- pontos são moderadas, e aquelas acima de 25
ros e Letras. pontos podem ser consideradas extremas. As-
O quarto Índice, Velocidade de Processa- sim, as diferenças moderadas oferecem infor-
mento (IVP), está relacionado com a resistên- mações relevantes sobre as forças e fraquezas
cia à distratibilidade, medindo, então, os pro- cognitivas e as diferenças extremas levantam
cessos relacionados à atenção, memória e con- suspeita de algum prejuízo cognitivo (Olin &
centração para processar, rapidamente, a in- Keatinge, 1998).
formação visual. É obtido pela soma dos resul-
tados ponderados dos subtestes Códigos e Pro-
curar Símbolos. Passo 4 – Interpretação dos resultados nos
Embora os dois primeiros Índices meçam subtestes
habilidades semelhantes aos QI Verbal e de
Execução, respectivamente, eles consistem em Após a interpretação dos resultados em QI e
medidas mais refinadas de tais capacidades, dos Índices Fatoriais, é possível proceder a aná-
de vez que não incluem aqueles subtestes que lise dos resultados individuais nos subtestes
estão correlacionados com os outros dois do- aplicados, o que permite a investigação mais
mínios. Os subtestes que contribuem para um acurada de possíveis flutuações no desempe-
Índice apresentam correlações maiores com nho do examinando. Nessa etapa, o grau de
subtestes no mesmo domínio do que com especificidade de cada subteste deve ser con-

624 JUREMA ALCIDES CUNHA


siderado, conforme descrito no tópico referente ponente forte, enquanto 3 pontos abaixo da
aos subtestes do WAIS-III. média indicam componente fraco.
As variações nos desempenhos nos subtes- 3) A partir da identificação dos subtestes
tes são analisadas a partir de dois procedimen- que devem ser analisados mais detidamente, é
tos opcionais: cálculo do desempenho médio importante considerar o que cada um avalia e
a partir de todos os subtestes aplicados, ou a variabilidade de desempenho intra-subteste.
cálculo do desempenho médio em cada con- Tais aspectos permitem nortear o levantamen-
junto (Verbal e de Execução). to de hipóteses acerca das forças e fraquezas
Neste último, a média do desempenho no cognitivas identificadas. É importante conside-
conjunto serve como ponto de comparação rar também os possíveis fatores que possam
para identificar a diferença entre a média no ter afetado o desempenho do examinando.
conjunto e o resultado em cada subteste do Entre esses fatores, destacam-se os de nature-
mesmo conjunto. Para identificar se as diferen- za não-cognitiva, que podem ser identificados
ças encontradas são freqüentes, o manual pela análise qualitativa das respostas, das ob-
americano apresenta tabelas nas quais as dife- servações clínicas, como também, pelo uso de
renças significativas foram calculadas a partir outros instrumentos. Ao se constatar discre-
da amostra de normatização americana. pâncias que merecem ser interpretadas, é im-
O sistema de correção proposto por Kauf- portante identificar se variações ocorreram em
man (1990) está entre os mais utilizados por função de tais fatores secundários, apresenta-
profissionais brasileiros para interpretação dos dos no Quadro 38.6.
resultados ponderados obtidos nos subtestes.
O autor propõe os seguintes passos:
1) Examinar a diferença entre o QIV e o QIE QUADRO 38.6 Fatores não-cognitivos que
para determinar se os respectivos subtestes tendem a diminuir ou aumentar o
desempenho no WAIS-III
devem ser analisados separadamente ou em
combinação um com o outro. Se a diferença Tendem a diminuir o desempenho:
humor (ansiedade, depressão, negativismo, hostilida-
entre o QIV e o QIE é menor que 10 pontos,
de); imaturidade; impulsividade; falta de socialização;
deve-se comparar todos os subtestes em con- cultura/etnia/língua/educação; pressão do tempo
junto. Caso a diferença seja superior a 10 pon-
Tendem a aumentar o desempenho:
tos, devem-se interpretar os conjuntos separa- obsessividade para detalhes, perfeccionismo (po-
damente. Desta forma, se a discrepância for dendo também lentificar o desempenho); supera-
menor que 10 pontos, o examinador deve com- prendizado teórico/livresco (aumento superficial);
parar cada resultado ponderado de cada sub- flexibilidade no raciocínio
teste com a média geral de todos os subtestes O grau de motivação ou persistência pode contribuir
(11 a 14 subtestes). Se a discrepância for maior tanto para o aumento quanto para a diminuição do
que 10 pontos, o examinador deve comparar desempenho nos subtestes.
cada resultado ponderado dos subtestes verbais
com a respectiva média dos subtestes verbais (6
ou 7 subtestes). O mesmo é feito com relação Com base nos passos sugeridos para inter-
aos subtestes do conjunto de execução, sendo a pretação do perfil, torna-se possível gerar hi-
média calculada a partir dos resultados nos sub- póteses sobre o funcionamento cognitivo da
testes de execução (5, 6 ou 7 subtestes). pessoa em avaliação.
2) Para identificação das diferenças signifi-
cativas entre os resultados individuais e as
médias calculadas, a regra de considerar as di- Procedimentos opcionais auxiliares na
ferenças de ±3 pontos é usada para identifi- interpretação
car as forças e fraquezas. Desse modo, subtes-
tes com resultados ponderados 3 pontos aci- No WAIS-III, foram incluídos procedimentos
ma da média indicam a presença de um com- opcionais que auxiliam na interpretação do

PSICODIAGNÓSTICO – V 625
desempenho em dois subtestes, a saber, Códi- porcentagens cumulativas para as maiores sé-
gos e Dígitos. ries alcançadas pela amostra americana, tanto
Considerando que a realização da tarefa na ordem direta quanto na ordem inversa. A
proposta no subteste Códigos envolve diferen- amostra americana foi capaz de recordar, em
tes habilidades, muitas vezes se torna difícil média, seis dígitos na ordem direta e cinco dí-
para o profissional identificar as razões que gitos na ordem inversa. Conforme a tabela B.7,
levaram o examinando a apresentar fraco de- em todos os grupos etários e na amostra total,
sempenho no subteste. Dentre os fatores que ocorreu a recordação de maior número de dí-
contribuem para o fraco desempenho, estão a gitos na ordem direta que inversa, sendo a di-
dificuldade em memorizar o estímulo e a baixa ferença entre os resultados em torno de dois
velocidade de processamento. Assim, dois pro- pontos. A diferença no resultado bruto de três
cedimentos opcionais foram incluídos no sub- pontos ou mais entre a ordem direta e inversa
teste Códigos, com o objetivo de identificar que deve ser alvo de análise (Sattler & Ryan, 1999).
habilidades podem estar comprometidas. Como pode ser observado na tabela B.7, a
O primeiro procedimento, chamado apren- recordação de maior número de dígitos na or-
dizagem espontânea, consiste em uma medi- dem inversa que na direta é relativamente rara
da da habilidade do examinando em recordar de ocorrer, sendo que a porcentagem da amos-
os pares de números e símbolos e de recordar tra de padronização americana que apresen-
os símbolos independentemente dos números. tou tal padrão de desempenho foi de aproxi-
Tal procedimento é utilizado logo após a apli- madamente 4%. Dentre as possíveis explica-
cação-padrão do Códigos e não tem limite de ções para a maior recordação de dígitos na
tempo. No entanto, para aplicação da apren- ordem inversa que na direta está o fato de que,
dizagem espontânea, é necessário que o exa- para algumas pessoas, a ordem inversa apre-
minando complete, no mínimo, quatro linhas senta-se mais estimulante, de vez que exige
de símbolos durante a aplicação do Códigos. maior processamento que a ordem direta.
Caso o examinando necessite de tempo além
do limite estabelecido na aplicação (120 segun-
dos) para completar quatro linhas, os símbo- VANTAGENS E LIMITAÇÕES DO WAIS-III
los completados após o tempo limite não con-
tam no resultado do Códigos. Como todo instrumento psicológico, o WAIS-
O segundo procedimento opcional é apli- III apresenta vantagens e limitações. As publi-
cado no final do WAIS-III, sendo chamado de cações recentes sobre o referido instrumento
Cópia. A tarefa consiste em que o examinando avaliam tais aspectos (Gregory, 1999; Kaufman
copie, no espaço inferior, o símbolo constante & Lichtenberger, 1999; Sattler & Ryan, 1999),
na parte superior de cada um dos quadros apre- que serão apresentados a seguir. As caracterís-
sentados na parte final da folha de registro do ticas do WAIS-III consideradas como vantajo-
WAIS-III. Este procedimento é composto de sete sas foram destacadas ao longo do capítulo.
itens para treino e 133 para execução, dentro Dentre as características do WAIS-III tidas como
do tempo limite de 90 segundos. limitações, destacam-se:
Tendo em vista que a ordem direta e a or- 1) O teste não é aplicável a pessoas grave-
dem inversa do subteste Dígitos avaliam dife- mente retardadas ou extremamente inteligentes.
rentes aspectos da memória, tem-se o proce- 2) Três subtestes apresentam baixa fidedig-
dimento opcional de comparar os resultados nidade, a saber, Arranjo de Figuras, Procurar
obtidos em cada uma das ordens. No manual Símbolos e Armar Objetos.
americano de aplicação e correção do WAIS-III 3) Os subtestes Seqüência de Números e
constam duas tabelas (tabelas B.6 e B.7; We- Letras, Arranjo de Figuras e Armar Objetos não
chsler, 1997), que apresentam o desempenho apresentam excelente estabilidade temporal.
da amostra de padronização na ordem direta 4) Os fatores Organização Perceptual e Ve-
e na ordem inversa. A tabela B.6 apresenta as locidade de Processamento não emergem

626 JUREMA ALCIDES CUNHA


como constructos separados para as pessoas 7) O material e o desenho de alguns sub-
com idades entre 75 e 89 anos. testes, como Arranjo de Figuras e Raciocínio
5) Ocorrem dificuldades em interpretar as Matricial, são considerados de má qualidade.
normas quando se usa um subteste suplemen- No caso do Arranjo de Figuras, alguns deta-
tar em substituição a um subteste-padrão, pois lhes são bastante discretos, podendo dificul-
não existem estudos investigando os efeitos de tar a compreensão das estórias. No caso do
tais substituições. subteste Raciocínio Matricial, alguns itens de-
6) Possíveis dificuldades podem ocorrer ao pendem do reconhecimento das cores para
pontuar respostas nos subtestes Vocabulário, solucioná-los, o que pode prejudicar pessoas
Semelhanças, Compreensão e Informação. que apresentam cegueira para cor.

PSICODIAGNÓSTICO – V 627
Anexo A

MINI-EXAME DO ESTADO MENTAL* Registro dos dados

Objetivo Pergunte ao paciente se você pode testar sua


memória. Então, diga os nomes de três obje-
O Mini-Exame do Estado Mental fornece uma tos não relacionados, clara e vagarosamente,
avaliação quantitativa do desempenho e da aproximadamente 1 segundo para cada. Após
capacidade cognitiva do paciente. O teste é útil ter dito os três, peça-lhe que repita. Essa pri-
na avaliação quantitativa da gravidade do pre- meira repetição determina seu escore (0-3), mas
juízo cognitivo e na documentação em série ele deve ficar tentando até que possa lembrar
de alterações cognitivas. todos os três nomes até seis tentativas. Se não
conseguir, eventualmente, lembrar os três, sua
Método capacidade de lembrança não poderá ser tes-
tada significativamente.
O entrevistador é instruído a deixar o paciente
confortável, a estabelecer rapport com o pa-
ciente e a evitar pressioná-lo em itens que ele Atenção e cálculo
ache difícil, enquanto faz uma série de 11 per- Peça ao paciente que, começando em 100, con-
guntas. O exame geralmente requer 5 a 10 mi- te ao inverso de 7 em 7. Pare após cinco subtra-
nutos para ser administrado. ções (93, 86, 79, 65). Classifique o número total
de respostas corretas. Se o paciente não puder
ou não quiser desempenhar essa tarefa, peça-
Instruções lhe que diga a palavra “mundo” de trás para fren-
te. O escore é o número de letras em ordem cor-
Orientação reta (p.ex., odnum = 5, odunm = 3).
1. Pergunte a data. Então, pergunte especifi-
camente as partes omitidas (por exemplo, Lembrança
“Você pode me dizer também em que estação
do ano estamos?”). Um ponto para cada res- Pergunte ao paciente se lembra das três pala-
posta correta. vras que você pediu que ele gravasse anterior-
2. Pergunte sucessivamente “Você pode me mente. Escore 0-3.
dizer o nome deste hospital? (cidade, estado,
etc.)”. Um ponto para cada resposta correta.
Linguagem

*Reproduzido de MacKinnon, R.A. & Yudofsky, S.C. Nomear. Mostre ao paciente um relógio de
(1988). A avaliação psiquiátrica na prática clínica. Por- pulso e pergunte-lhe o que é. Repita com um
to Alegre: Artes Médicas (com autorização da Editora). lápis. Escore 0-2.

628 JUREMA ALCIDES CUNHA


Repetição. Peça ao paciente que repita uma os dez ângulos devem estar presentes e dois
frase depois de você tê-la dito. Permita apenas devem se cruzar para contar 1 ponto. Tremor e
uma tentativa. Escore 0-1. rotação devem ser ignorados.
Comando em três estágios. Dê ao paciente Avalie o sensorium do paciente ao longo
um pedaço de papel em branco e repita o co- de um continuum, de alerta à esquerda, à coma
mando. Conte 1 ponto para cada parte corre- à direita.
tamente executada. Comando: pegue uma fo-
lha de papel, dobre ao meio e coloque-a no chão.
Leitura. Em um pedaço de papel branco, es- Classificação
creva a frase “Feche os olhos”. Escreva com
letra suficientemente grande para que o pa- O escore para o Exame do Mini-Estado Mental
ciente veja claramente. Peça-lhe que a leia e pode ser encontrado no formulário, que é
faça o que ela diz. Conte 1 ponto somente se mostrado a seguir.
ele realmente fechar os olhos.
Escrita. Dê ao paciente um pedaço de pa-
pel branco e peça-lhe que escreva uma frase. Interpretação
Não dite a frase; esta deve ser escrita esponta-
neamente. Ela deve conter um sujeito, um ver- Um escore total possível é de 30; o escore mé-
bo e ser sensível. Gramática e pontuação cor- dio para pacientes com demência é de 9,7; para
retas não são necessárias. pacientes com prejuízo cognitivo devido à de-
Cópia. Em um pedaço de papel em branco, pressão, a média é de 19,0; e para pacientes
desenhe pentágonos cruzados, cada lado com com uma perturbação afetiva não-complicada
aproximadamente 2,5 cm, e peça ao paciente ou depressão, a média é de 25,1. O escore
que copie exatamente da mesma forma. Todos médio para pessoas normais é de 27,6.

“Mini-Exame do Estado Mental”


Máximo
Escore Escore ORIENTAÇÃO
5 ( ) Em que (ano) (estação) (mês) estamos?
5 ( ) Onde estamos (estado) (município) (cidade) (hospital) (andar)?
REGISTRO
3 ( ) Nomeie 3 objetos: Eu ajudo a dizer cada um. Então pergunte ao paciente todos
os 3 após tê-los nomeado. Conte 1 ponto para cada resposta correta. Então
repita-os até que ele tenha aprendido os 3. Conte as tentativas e registre.
No de tentativas: ___________________________
5 ( ) ATENÇÃO E CÁLCULO
Conte de 7 em 7. 1 ponto para cada subtração correta. Pare após 5 respostas.
Alternativamente, soletre “mundo” de trás para frente.
LEMBRANÇA
3 ( ) Pergunte os 3 objetos repetidos acima. Dê 1 ponto para cada correto.
LINGUAGEM
9 ( ) Nomeie um lápis e um relógio (2 pontos). Repita o seguinte
“Nem mas, nem meio mas”. (1 ponto).
Siga um comando de 3 estágios.
“Pegue um papel com sua mão direita, dobre-o ao meio e coloque-o no chão”
(3 pontos).
Leia e obedeça ao seguinte:
Feche os olhos (1 ponto).
Copie um desenho (1 ponto).
Escore total
AVALIE o nível de desempenho ao longo do continuum

alerta sonolento estupor coma

Fonte: MacKinnon & Yudofsky, 1988, p.201 (reproduzido com autorização da Editora).

PSICODIAGNÓSTICO – V 629
Anexo B

PASSOS BÁSICOS DO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA (PBDC)

Aidyl L. M. de Queiroz Pérez-Ramos

a) Finalidade apreciar os progressos e atrasos no desenvol-


vimento da criança pequena, devendo ser de
O presente instrumento consiste de uma es- aplicação ampla, não só por psicólogos, mas
cala de avaliação referencial do comportamen- também por outros profissionais da equipe de
to esperado da criança, ao longo dos seus três diagnóstico infantil, e inclusive pelos pais,
primeiros anos de vida. Seu emprego se desti- quando instruídos no seu uso. No caso de ou-
na a obter uma apreciação geral do desenvol- tros profissionais dessa equipe, como pedia-
vimento durante esse período evolutivo. Não tras, educadores, enfermeiras, entre outros, a
se pretende, com seu uso, conhecer níveis exa- escala lhes permitirá obter um conhecimento
tos desse processo, mas sim configurar uma geral do nível de desenvolvimento da criança e
imagem aproximada dos progressos alcança- de informações intercambiáveis entre os mes-
dos, assim como dos déficits detectados. mos, usando parâmetros comuns. No caso dos
A escala é composta de uma listagem de pais, o instrumento lhes proporcionará uma
comportamentos evolutivos (84 itens), que percepção mais objetiva do processo evoluti-
podem ser considerados indicadores desse pro- vo do filho e, também, segurança para colabo-
cesso, os quais são agrupados em 14 unida- rar no exame psicológico que for necessário
des, de natureza etária, denominadas Passos realizar no estudo da criança. Além disso, a
Básicos. Os mesmos variam não só em função Escala poderá constituir para eles efetivo re-
dos comportamentos que os definem, mas curso para auxiliar na sua condição de media-
também da sua periodicidade, conforme o dores nos programas de intervenção precoce
ritmo e mudanças que ocorram ao longo desse aplicáveis a seus filhos, dessas idades, com
período de vida. Assim, no 1o ano de vida, os necessidades especiais. Quanto ao psicólogo,
Passos Básicos são especificados de mês a mês, a PBDC lhe permitirá obter um conhecimento
até o 4o mês; passando depois de dois em dois preliminar do desenvolvimento da criança e,
meses, até o 12o; no segundo ano, de três em com tal informação, prosseguir com maior se-
três meses; e, no terceiro, de seis em seis meses. gurança, com os exames psicológicos que fo-
rem pertinentes.
b) Fundamentação Este instrumento provém de experiências
clínicas da própria autora, durante mais de duas
A escala PBDC surgiu da necessidade de se décadas, havendo publicado escala no gêne-
dispor de um instrumento referencial para ro, em 1975, como recurso útil, para os pais

630 JUREMA ALCIDES CUNHA


observarem o comportamento de sua criança ver-se de mesa alta, cama de consultório ou,
pequena (Pérez-Ramos, A., 1975). Desde en- ainda, bebê-conforto. Para crianças maiores,
tão, o uso desse instrumento passou a ser tam- que engatinham, que sentam ou caminham, é
bém um auxiliar efetivo para o psicodiagnósti- recomendável área livre, com tapete próprio
co e seguimento do desenvolvimento das crian- de criança.
ças, nas idades referidas, atendidas em clíni- – Explicar à mãe ou responsável, em lingua-
cas psicológicas, creches e serviços de estimu- gem coloquial, as finalidades do exame, des-
lação precoce. tacando que o mesmo permitirá conhecer, de
À medida que o emprego dessa escala ini- maneira geral, o desenvolvimento do filho.
cial se mostrava de utilidade, comprovou-se Além disso, deve-se motivá-la a exercer o pa-
também a necessidade de generalizar a possi- pel de mediadora nesse processo avaliativo,
bilidade de sua aplicação a alguns profissio- com explicações de como desempenhar esse
nais não psicólogos (pedagogos, fisioterapeu- papel na realização dos itens da prova, espe-
tas, entre outros) e de incluir determinadas mu- cialmente quando se tratar de criança menor
danças destinadas a precisar e atualizar a es- de um ano de idade. As explicações transmiti-
cala original, dando lugar à atual. Tais altera- das à genitora devem ser tão práticas quanto
ções foram feitas em função de contingências possível, mas sem utilizar-se da criança como
atuais, da comparação com outros instrumen- recurso demonstrativo. Adverti-la também para
tos congêneres (Atkin, Superviellet, Canton et não interferir nas tentativas que a criança faz
alii, 1987; Karnes, 1992), de sua utilização em para reagir ao solicitado.
pesquisas de estudos de casos (Carpentiri, – Solicitar dela informações, quando neces-
1994; Silva, 1997) e, principalmente, da verifi- sárias, sobre o comportamento do filho,
cação de sua validade (validade de conteúdo, como garantia às respostas daquele aos itens
efetuada por juízes ad hoc, especialistas em psi- da prova.
cologia do desenvolvimento). – Assegurar-se de que a criança se encon-
c) Recomendações para a aplicação da Es- tre em bom estado de saúde e suas necessida-
cala PBDC des básicas satisfeitas. No caso de bebês, es-
As mesmas são de caráter geral, sem espe- pecialmente nos seus primeiros meses, verifi-
cificar instruções para sua aplicação, uma vez car se as condições que apresentam são as pró-
que se trata de uma guia sistematizada de ob- prias de “estado de alerta”, isto é, que estejam
servação, utilizando itens progressivos de de- bem despertos, calmos, alimentados e limpos.
senvolvimento e equipamentos e brinquedos – Estabelecer um rapport com a mãe e a
não determinados especificamente. Indicam- criança, por meio de “conversas” e brincadei-
se a seguir recomendações consideradas ne- ras com esta última.
cessárias para poder garantir efetividade no uso – Iniciar a aplicação da Escala pelo nível cor-
do instrumento: respondente à idade da criança e ir descendo
– Solicitar a presença da mãe ou, na impos- ou subindo conforme o seu desempenho. Mar-
sibilidade desta, da pessoa que cuida quotidi- car no traço que precede os itens do protocolo,
anamente da criança, para efetuar o exame. um sinal +, no caso de reação positiva, e um –,
– Preparar um ambiente adequado para sua quando negativa, além de registrar as observa-
aplicação, se possível silencioso e sem muitos ções que forem pertinentes sobre o comporta-
estímulos que possam distrair a criança. No mento da criança e também da genitora, para
caso de bebês menores de 6 ou 7 meses, pro- subseqüentes interpretações e orientações.

PASSOS BÁSICOS DO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA

Folha de Aplicação (do nascimento aos três anos de idade) Nº __________


Nome:......................................................................................Sexo:........................................... Data Aplic.:..........................
Data Nasc.:...........................
Idade:..................................

PSICODIAGNÓSTICO – V 631
1 o mês 11o ao 12o mês
– Realiza movimentos de sucção ao estimular-lhe os lábios. – Vale-se de gestos e poucas palavras para se comunicar.
– Agarra firmemente o dedo do adulto quando colocado na – Arremessa e rola uma bola.
palma de sua mão. – Permanece sentada longo período.
– Movimenta-se levemente na posição deitada. – Manifesta afeto por beijos e abraços.
– Acalma-se ao ouvir a voz humana. – Explora brinquedinhos por algum tempo.
– Olha brevemente a face dos outros, quando próxima da – Tenta rabiscar pegando o lápis com toda a mão.
sua. 1 ano a 1 ano e 3 meses
– Emite sons guturais. – Brinca de “esconde-esconde”.
2o mês – Diz “mamã” e “papá” e sons semelhantes para designar
– Sustenta a cabeça por momentos, quando de bruços. os pais.
– Segue com movimentos dos olhos e de cabeça um – Anda apoiando-se nos móveis ou segurada por um
estímulo que se move ao alcance de sua vista. adulto.
– Esboça um sorriso como resposta às “brincadeiras” – Manifesta variedade de emoções: possessividade, ciúmes,
que lhe fazem. afeto, ansiedade.
– Emite sons em forma variada. – Vira grosseiramente páginas de um livrinho.
– Segura, com as duas mãos, um pequeno objeto, – Fica atenta por períodos de tempo, demonstrando
no centro de seu corpo. interesse pelo que passa ao seu redor.
3o mês 1 ano e 4 meses a 1 ano e 6 meses
– Mantém com firmeza a cabeça e o tronco, na posição de – Caminha firmemente.
bruços. – Agacha-se e levanta-se com facilidade.
– Leva à boca a mão ou o chocalho. – Empilha ou enfileira vários brinquedinhos.
– Volteia o corpo lateralmente. – Reconhece sua imagem no espelho.
– Segue com o olhar o movimento das pessoas. – Alcança com uma das mãos algum objeto desejado.
– Ri e sorri às “brincadeiras” que lhe fazem. – Balbucia repetindo diferentes sílabas.
– “Brinca” com suas mãos, fixando seu olhar nos 1 ano e 7 meses a 1 ano e 9 meses
movimentos que faz com as mesmas. – Sobe e desce escada alternando os pés.
4o mês – Bebe líquido usando xícara ou copo.
– Apóia-se nas mãos e nos braços para sustentar a cabeça – Começa a tirar sua roupa.
e o tronco, estando de bruços. – Compreende e executa várias ordens.
– Vira-se de posição de bruços para a de costas. – Identifica animais e pessoas por palavras simples.
– Segura e leva à boca um objeto pequeno. – Puxa carrinho por cordinha.
– Começa a sentar-se com apoio. 1 ano e 10 meses a 1 ano e 12 meses
– Murmureja e ri fortemente. – “Nina” boneca ou ursinho de pelúcia.
– Pula quando sustentada na posição de pé, pelas axilas. – Dá e recebe bola.
5o ao 6o mês – Faz vários riscos com lápis.
– Sorri esponteamente às pessoas que lhe são familiares. – Come sozinha, usando colher.
– Agarra seus pés e “brinca” com eles. – Usa palavras-frases.
– Senta-se brevemente, sem apoio. – Encaixa peças simples.
– Reconhece as vozes dos familiares. – Começa a comer alimentos sólidos com as próprias mãos.
7o ao 8o mês – Identifica carrinhos e animais por onomatopéias.
– Tira o pano que lhe cobre o rosto. 2 anos a 2 anos e 5 meses
– Passa um objeto de uma a outra mão. – Acompanha música com movimento rítmico.
– Introduz objetos pequenos em caixinha, utilizando o – Sobe e desce escada alternando os pés.
polegar e o indicador. – Nomeia e identifica partes do corpo.
– Faz barulho, intencionalmente, com objetos nas suas mãos. – Pede para ir ao banheiro.
– Reage negativamente às pessoas estranhas. – Forma frases de duas ou três palavras.
– Engatinha com certa soltura. – Participa de jogos de “casinha”.
9o ao 10o mês 2 anos e 6 meses a 3 anos
– Grita e chora para chamar a atenção. – Corre de maneira desenvolta.
– Fica de pé, apoiando-se ou agarrando-se. – Desabotoa botões em casas grandes.
– Imita sons e movimentos, como estalo de língua ou bater – Faz perguntas “por quê?” e “o quê?”.
palmas. – Participa de jogos de “casinha”.
– Empilha dois objetos. – Diz seu nome e idade.
– Compreende e executa algumas ordens simples. – Veste e desveste peças simples de roupa.
– Repete alguns sons do que lhe “falam”. – Realiza “garatujas” com rabiscos em várias direções.

632 JUREMA ALCIDES CUNHA


MATERIAL DE APOIO

A seguir, é apresentada a relação do material a ser utilizado para a observação dos diferentes comportamentos contidos na
Escala. Ao lado da indicação dos materiais, são sugeridos os “passos” da Escala para os quais aqueles são recomendados.

Material Passos básicos


• Chocalho 2o e 3o mês
• Bichinho de borracha 4o, 5o ao 6o mês
• Pano quadrado de 50cm (mais ou menos) 7o ao 8o mês; 11o ao 12o mês
• Bichinhos pequenos de borracha 7o ao 8o mês; 11o ao 12o mês
• Caixinha para pôr os bichinhos pequenos 7o ao 8o mês; 11o ao 12o mês
• Dois pratinhos de metal 7o ao 8o mês
• Dadinhos coloridos 7o ao 8o mês; 9o ao 10o mês; 1 ano e 4 meses a 1 ano e 6 meses
• Bolachinha 1 ano e 4 meses a 1 ano e 6 meses
• Livrinho com folhas grossas 1 ano a 1 ano e 3 meses; 2 anos a 2 anos e 5 meses
• Carrinho de puxar, com barbante 1 ano e 7 meses a 1 ano e 9 meses
• Bola, tamanho normal 11o mês ao 12o mês; 1 ano e 10 meses a 1 ano e 12 meses
• Um espelho manual 1 ano e 4 meses a 1 ano e 6 meses
• Carrinhos e animaizinhos de brinquedo 1 ano e 4 meses a 1 ano e 6 meses
• Lápis grosso com capa e papel 11o ao 12o mês; 1 ano e 10 meses a 1 ano e 12 meses
• Xícara ou copo 1 ano e 7 meses a 1 ano e 9 meses
• Boneca ou ursinho de pelúcia 1 ano e 10 meses a 1 ano e 12 meses
• Coletinho simples, com botões e casas grandes 2 anos e 6 meses a 3 anos
• Aparelhinho de café 2 anos e 6 meses a 3 anos

Observações sobre o comportamento da criança e da mãe ou responsável:_____________________________________________


_______________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________________________________________________________

Data: ________/________/________

PSICODIAGNÓSTICO – V 633
Anexo C

QUADRO C.1 Tabela para conversão de escores das escalas óbvias e sutis do MMPI em notas T
Escore Sexo masculino
bruto D-O D-S Hy-O Hy-S Pd-O Pd-S Pa-O Pa-S Ma-O Ma-S
40
39 120
38 118
37 116
36 114
35 111
34 109
33 107
32 105 115
31 102 112
30 100 110
29 98 108
28 95 105 84 111
27 93 103 81 118
26 91 101 79 106
25 89 98 77 103
24 86 96 75 100
23 84 93 73 97 121 109 103
22 82 91 70 95 102 117 105 99
21 80 89 68 92 98 114 102 95
20 77 85 86 66 89 94 110 98 91
19 75 81 84 64 86 90 107 95 87
18 73 78 82 62 83 86 103 92 84
17 71 74 79 59 81 82 100 97 88 80
16 68 70 77 57 78 78 96 93 85 76
15 66 67 74 55 75 74 93 88 81 72
14 64 63 72 53 72 70 89 84 78 68
13 62 60 70 51 70 66 86 80 74 64
12 59 56 67 48 67 62 82 76 71 60
11 57 52 65 46 64 58 79 71 68 57
10 55 49 63 44 61 54 75 67 64 53
9 53 45 60 42 59 50 72 63 61 49
8 50 41 58 39 56 46 68 58 57 45
7 48 38 56 37 53 42 65 54 54 41
6 46 34 53 35 50 38 62 50 50 37
5 44 31 51 33 48 34 58 46 47 34
4 41 27 48 31 45 31 55 41 44 30
3 39 23 46 28 42 27 51 37 40 26
(continua)

634 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO C.1 Tabela para conversão de escores das escalas óbvias e sutis do MMPI em notas T (continuação)
Escore Sexo masculino
bruto D-O D-S Hy-O Hy-S Pd-O Pd-S Pa-O Pa-S Ma-O Ma-S
2 37 20 44 26 39 23 48 33 37 22
1 35 16 41 24 37 19 44 28 33 18
0 32 13 39 22 34 15 41 24 30 14
40 112
39 110
38 108
37 106
36 104
35 102
34 100
33 98
32 95 103
31 93 101
30 91 99
29 89 97
28 87 95 85 115
27 85 93 83 112
26 83 91 81 109
25 81 88 78 107
24 79 86 76 104
23 77 84 73 101 109 105
22 75 82 71 98 105 106 101
21 73 80 69 95 101 102 97
20 71 83 78 66 92 97 119 99 93
19 69 79 76 64 89 93 115 96 89
18 67 76 74 61 86 87 111 92 85
17 65 72 72 59 84 84 107 104 89 81
16 63 68 70 57 81 80 103 99 86 77
15 61 65 67 54 78 76 99 94 82 73
14 59 61 65 52 75 72 95 90 79 69
13 57 57 63 50 72 68 91 85 76 66
12 55 54 61 47 69 64 87 80 72 62
11 53 50 59 45 66 60 83 75 69 58
10 51 46 57 42 64 55 79 71 66 54
9 49 43 55 40 61 51 75 66 63 50
8 47 39 53 38 58 47 71 62 59 46
7 45 35 51 35 55 43 67 57 56 42
6 43 31 49 33 52 39 63 52 53 38
5 41 28 47 31 49 35 59 47 49 34
4 39 24 44 28 46 31 55 43 46 30
3 37 20 42 26 43 26 51 38 43 26
2 34 17 40 23 41 22 46 33 39 22
1 32 13 38 21 38 18 42 29 36 18
0 30 9 36 19 35 14 38 24 33 14
Fonte: Wiener & Harmon (1946), apud Dahlstrom, Welsh & Dahlstrom, 1972, p.402-403.

PSICODIAGNÓSTICO – V 635
QUADRO C.2 Tabela para conversão de escores da escala de Força do Ego (ES) em notas T
Escore Sexo Escore Sexo
bruto Masculino Feminino bruto Masculino Feminino
68 87 94 30 27 34
67 86 92 29 25 32
66 85 91 28 24 31
27 22 29
65 83 89 26 20 28
64 82 87
63 80 86 25 19 26
62 78 84 24 17 24
61 77 83 23 16 23
22 14 21
60 75 81 21 12 20
59 74 80
58 72 78 20 18
57 70 76 19 17
56 69 75 18 15
17 14
55 67 73 16 12
54 66 72
53 64 70 15
52 62 69 14
51 61 67 13
12
50 59 65 11
49 58 64
48 56 62 10
47 54 61 9
46 53 59 8
7
45 51 58 6
44 49 56
43 48 54 5
42 46 53 4
41 45 51 3
2
40 43 50 1
39 41 48 0
38 40 47
37 38 45
36 37 43

35 35 42
34 33 41
33 32 39
32 30 37
31 29 36
Fonte: Hathaway & Briggs (1957), apud Dahlstrom & Welsh, 1962, p.441-442.

636 JUREMA ALCIDES CUNHA


Anexo D

QUADRO D.1 Itens evolutivos de Koppitz: percentis por faixa etária


Escore Faixa etária
bruto 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14
5 5 3 2 1 – – – – – –
6 10 4 3 2 – – – – – –
7 15 5 4 3 1 – – – – –
8 20 7 5 4 2 – – – – –
9 30 10 7 5 3 – – – – –
10 35 15 10 8 4 1 1 – 1 –
11 45 25 15 10 5 2 2 1 2 –
12 50 30 20 13 6 3 3 2 3 1
13 65 40 25 15 7 4 4 3 4 2
14 75 50 40 20 10 5 5 4 5 3
15 80 60 50 30 15 10 10 5 8 4
16 90 70 55 40 25 15 15 10 10 5
17 95 75 65 50 35 25 25 20 15 10
18 98 80 75 55 45 35 35 30 25 20
19 99 85 85 65 55 50 50 40 35 30
20 90 90 75 65 65 60 50 45 40
21 95 95 85 75 75 70 60 50 50
22 98 98 90 85 85 80 70 60 60
23 99 99 95 95 90 85 75 75 70
24 99 97 95 90 80 80 80
25 99 97 95 85 90 85
26 99 98 90 95 90
27 99 95 98 95
28 99 99 99
Fonte: Hutz & Antoniazzi, 1995, p.8.

PSICODIAGNÓSTICO – V 637
QUADRO D.2 Indicadores emocionais de Koppitz: percentis por faixa etária
Escore Faixa etária
bruto 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14
0 99 99 95 90 85 85 80 75 75 70
1 95 95 85 75 70 70 60 50 50 50
2 90 85 70 50 50 50 40 30 30 20
3 80 70 50 45 30 30 20 15 15 10
4 70 50 35 30 15 10 10 5 8 8
5 50 30 20 15 10 1 1 1 5 5
6 40 20 10 10 5 – – – 1 1
7 20 15 5 5 3 – – – – –
8 10 10 3 3 1 – – – – –
9 5 5 1 1 – – – – – –
10 1 1 – – – – – – – –
Fonte: Hutz & Antoniazzi, 1995, p.9.

638 JUREMA ALCIDES CUNHA


Anexo E

QUADRO E.1 Lista de perguntas para interrogatório do HTP


P1 É um homem, uma mulher, um menino ou uma menina?
P2 Que idade tem?
P3 Quem é?
P4 (Se dá o nome) Quem é ele?
P5 O que está fazendo?
P6 Onde está?
A1 Que tipo de árvore é esta?
A2 Onde está esta árvore?
A3 Que idade tem esta árvore?
A4 Esta árvore está viva?
A5 a. O que você acha que fez com que ela morresse?
b. Viverá de novo?
C1 Esta casa tem um andar de cima?
C2 É a sua casa?
C3 Você gostaria de possuir esta casa?
C4 Que quarto você escolheria?
C5 Quando você olha para a casa, parece próxima ou longe?
C6 Parece que está acima de você, abaixo ou na mesma altura?
A6 Esta árvore se parece mais com um homem ou com você, abaixo ou na mesma altura?
A7 Se esta árvore fosse uma pessoa, para que lado está você, abaixo ou na mesma altura?
A8 Esta árvore está sozinha ou num grupo de árvores?
A9 Olhando para esta árvore, parece que está acima de você, abaixo ou na mesma altura?

P7 Em que está pensando?


P8 Como se sente?
P9 Em que esta pessoa lhe faz pensar?
P10 Esta pessoa está bem?
P11 Esta pessoa é feliz?
P12 Como é que está o tempo neste quadro?

C7 Em que esta casa faz você pensar?


C8 É um tipo de casa que parece feliz, amiga?
C9 Como é que está o tempo neste quadro?
C10 Em que pessoa que você conhece esta casa lhe faz pensar?
C11 Alguém ou alguma coisa alguma vez fez algum mal a esta casa?
C12 (Sujeito instruído a desenhar o sol.) Suponhamos que este sol fosse alguma pessoa,
que você conhece, quem seria?

A15 (Sujeito instruído a desenhar o sol.) Suponhamos que este sol fosse alguma pessoa, que você
conhece, quem seria?
A16 Em que esta árvore lhe faz pensar?

PSICODIAGNÓSTICO – V 639
QUADRO E.1 Lista de perguntas para interrogatório do HTP (continuação)
A17 É uma árvore sadia?
A18 É uma árvore feliz?

P13 Esta pessoa lhe lembra que pessoa?


P14 Que tipo de roupa esta pessoa está usando?
P15 De que esta pessoa mais precisa?
P16 Alguém fez algum mal a esta pessoa?
a. Como?
b. Que idade ela tinha quando aconteceu?
P17 (Sujeito instruído a desenhar o sol.) Suponhamos que este sol fosse alguma pessoa, que
você conhece, quem seria? (Sujeito instruído a desenhar a linha do solo)

A19 De que pessoa, que você conhece, esta árvore lhe lembra?
A20 Alguém ou alguma coisa alguma vez fez mal a esta árvore?
A21 De que esta árvore mais precisa?

C13 Em que esta casa lhe faz pensar?


C14 De que esta casa mais precisa?
Fonte: Jolles, 1969, p.225-228.
Observação: Nem sempre são usadas todas as perguntas, e, às vezes, são incluídas mais algumas no todo ou em cada série.
Tomaremos a lista utilizada no interrogatório de uma criança.

QUADRO E.2 Manual de tabulação para os 30 itens evolutivos do teste da figura humana (infantil),
segundo Koppitz
1. Cabeça: qualquer representação; necessário um es- 17. Cotovelo: requer que tenha ângulo definido no bra-
boço claro da cabeça. ço.
2. Olhos: qualquer representação dos mesmos. 18. Mãos: requer definição dos braços e dos dedos, tais
3. Pupilas: círculos ou pontos definidos, dentro dos como alargamento do braço ou uma demarcação
olhos. Um ponto com um risco em cima se compu- relativa ao braço mediante uma manga ou pulsei-
ta como olhos e sobrancelhas. ra.
4. Sobrancelhas ou pestanas: uma ou outra ou am- 19. Dedos: qualquer representação que distinga dos
bas. braços e das mãos.
5. Nariz: qualquer representação. 20. Número correto de dedos: cinco dedos em cada
6. Fossas nasais: pontos acrescentados aos narizes. mão ou braço, a menos que a posição da mão oculte
7. Boca: qualquer representação. alguns dedos.
8. Lábios: dois lábios esboçados e superados por uma 21. Perna: qualquer representação; no caso de figuras
linha: não se computam duas fileiras de dentes. femininas, com saias largas, computa-se só se a dis-
9. Orelhas: qualquer representação. tância entre a cintura e os pés é suficientemente
10. Cabelo: qualquer representação ou chapéu ou gor- larga para permitir a existência de pernas sob as
ro cobrindo a cabeça e ocultando o cabelo. saias.
11. Pescoço: precisa separação nítida entre cabeça e 22. Pernas em duas dimensões: cada uma das pernas
corpo. assinalada por mais de uma linha.
12. Corpo: qualquer representação; requer esboço cla- 23. Joelho: um ângulo nítido em uma ou ambas as per-
ro. nas (perfil) ou desenho da rótula (frente). Não se
13. Braços: qualquer representação. computa quando há só uma curva na perna.
14. Braços em duas dimensões: cada um representado 24. Pés: qualquer representação.
por mais de uma linha. 25. Pés bidimensionais: pés que se estendem numa di-
15. Braços apontando para baixo: um ou ambos, em reção a partir dos calcanhares (perfil) ou pés dese-
um ângulo de 30º ou mais, com relação à posição nhados em perspectiva (frente).
horizontal ou braços erguidos adequadamente para 26. Perfil: cabeça de perfil, embora o resto da figura
a atividade que está realizando a figura. Não se não esteja todo de perfil.
computa quando os braços se estendem horizon- 27. Roupa: uma peça ou nenhuma, nenhuma peça in-
talmente e logo se inclinam para baixo, a certa dis- dicada ou só chapéu, botões, cinto ou esboço de
tância do corpo. vestimenta sem detalhes.
16. Braços corretamente unidos ao ombro: ombro pre- 28. Roupa: duas ou três peças; computam-se como rou-
cisa estar indicado, e os braços devem estar firme- pa: calças ou calção, saias, camisa ou blusa (parte
mente conectados ao tronco. superior de um vestido, separada por um cinto, é

640 JUREMA ALCIDES CUNHA


QUADRO E.2 Manual de tabulação para os 30 itens evolutivos do teste da figura humana (infantil),
segundo Koppitz (continuação)
contada como blusa), chapéu, copa do chapéu, cin- 29. Roupa: quatro itens ou mais; quatro ou mais dos
to, gravata, fita de cabelo, fivela ou broche de pren- citados anteriormente.
der cabelo, colar, relógio, anel, pulseira, cachimbo, 30. Boas proporções: a figura está bem, ainda quando
cigarro, guarda-chuva, bengala, arma de fogo, an- não seja inteiramente correta do ponto de vista ana-
cinho, sapatos, coturnos, livro de bolso, maleta, tômico.
bastão (de beisebol), luvas, etc.

Fonte: Koppitz, 1976, p.379-381.

QUADRO E.3 Manual de tabulação para os 30 indicadores emocionais do teste da figura humana
(infantil), segundo Koppitz

Sinais qualitativos 14. Braços compridos: excessivamente; por seu com-


1. Integração pobre das partes (meninos: 7 anos; me- primento, podem chegar debaixo das rótulas ou
ninas: 6); uma ou mais partes não estão unidas ao onde estas deveriam estar.
resto da figura; uma das partes só está unida por 15. Braços presos ao corpo; não há espaço entre o cor-
um risco ou apenas toca o resto. po e os braços.
2. Sombreado no rosto: de todo o rosto ou de parte 16. Mãos grandes: de tamanho igual ou maior que o
do mesmo, inclusive sardas, sarampo, etc.; um som- rosto.
breado suave e parelho de rosto e mãos para re- 17. Mãos omitidas: braços sem mãos nem dedos. Não
presentar a cor da pele não se computa. se computam as mãos ocultas atrás da figura ou
3. Sombreado do corpo e/ou extremidade: (meninos: nos bolsos.
9 anos; meninas: 8). 18. Pernas juntas; pernas unidas, sem nenhum espaço
4. Sombreado das mãos e/ou pescoço: (meninos: 8 entre si; nos desenhos de perfil, se aparece só uma
anos; meninas: 7). perna.
5. Assimetria grosseira de extremidades: um braço ou 19. Genitais: representação realista ou inconfundível
perna difere marcadamente de outro na forma. Não simbólica dos genitais.
se computa se os braços ou as pernas têm forma 20. Monstro ou figura grotesca; pessoa ridícula, degra-
parecida, porém, são um pouco desparelhos no ta- dada ou não humana; o grotesco da figura deve
manho. ser buscado deliberadamente pela criança e não é
6. Figuras inclinadas: o eixo vertical da figura tem uma resultado de sua imaturidade ou falta de habilida-
inclinação de 15º ou mais em relação à perpendi- de para o desenho.
cular. 21. Desenho espontâneo de três ou mais figuras: vá-
7. Figura pequena: mede 5cm ou menos de altura. rias figuras que não estão inter-relacionadas ou rea-
8. Figura grande: (desde os 8 anos, em ambos os se- lizando uma atividade significativa; desenho repe-
xos); mede 23cm ou mais de altura. tido de figuras quando foi solicitado só uma pes-
9. Transparências: aquelas que compreendem as pro- soa. Não se computam o desenho de um menino e
porções maiores do corpo ou as extremidades. Não uma menina ou o da família do examinado.
se computam os riscos ou quando as linhas dos bra- 22. Nuvens: qualquer representação de nuvens, chuva,
ços atravessam o corpo. neve ou pássaros voando.
10. Cabeça pequena: a altura da cabeça é menos de 23. Omissão dos olhos: ausência total dos olhos; não
um décimo da figura total. se computam olhos fechados ou vazios.
11. Olhos estrábicos ou desviados: ambos os olhos vol- 24. Omissão do nariz: (meninos: 6 anos; meninas: 5).
tados para dentro ou desviados para fora. Olhares 25. Omissão da boca.
de soslaio não se computam. 26. Omissão do corpo.
12. Dentes: qualquer representação de um ou mais den- 27. Omissão dos braços (meninos: 6 anos; meninas, 5).
tes. 28. Omissão das pernas.
13. Braços curtos: acessórios curtos tipo braços; bra- 29. Omissão dos pés (meninos: 9 anos; meninas, 7).
ços que não chegam à cintura. 30. Omissão do pescoço (meninos: 10 anos; meninas, 9).

Nota: Todos os indicadores emocionais são considerados válidos para meninos e meninas de 5 a 12 anos, a menos que expressa-
mente se indique o contrário.
Fonte: Koppitz, 1976, p.383-385.

PSICODIAGNÓSTICO – V 641
QUADRO E.4 Questionário para crianças (teste da Associações
figura humana de Machover) 1. O que essa pessoa está fazendo? ..........................
Desenho da Figura Humana na Técnica de Machover 2. Que idade tem? ......................................................
Questionário para crianças 3. É casada? ................................................................
4. Tem filhos? ..............................................................
Nome ......................... Idade ................ No................... 5 Com quem vive? .....................................................
Escolaridade ............... Sexo ................ Data................. 6. Está mais ligada ao pai ou à mãe? ........................
Instruções: Conte uma história sobre esta figura como 7. Quantos irmãos tem? .............................................
se ela (ou ele) fosse o personagem de uma novela ou 8. Que trabalho faz? ...................................................
de uma peça, respondendo às seguintes perguntas 9. Vai à escola? ...........................................................
sobre ela (ou ele) da melhor maneira que você puder. 10. O que quer ser? ......................................................
11. É inteligente? ..........................................................
1. O que ela (ele) está fazendo? ................................ 12. É forte? ...................................................................
2. Qual é a idade dela(e)? .......................................... 13. Tem boa saúde? ......................................................
3. Ela (ele) é casada(o)? .............................................. 14. É simpática? ...........................................................
4. Tem filhos? Meninos ou meninas? ......................... 15. Qual é a melhor parte de seu corpo? ....................
5 Que trabalho ela (ele) faz? ..................................... 16. Qual é a parte mais feia do seu corpo? Por quê? ..
6. Em que ano está na escola? ................................... 17. É um tipo nervoso? ................................................
7. O que ela (ele) quer ser? ........................................ 18. O que está pensando? ...........................................
8. Ela (ele) é inteligente? ............................................ 19. Do que tem medo? ................................................
9. Tem boa saúde? ...................................................... 20. É triste ou alegre? ..................................................
10. É bonita(o)? ............................................................ 21. O que a encoleriza? ................................................
11. Qual é a parte mais bonita do seu corpo? ............ 22. O que mais deseja? Quais são seus três maiores
12. Qual é a parte mais feia do seu corpo? ................. desejos? ..................................................................
13. Ela (ele) é muito bonita(o)? ................................... 23. Quais são suas três melhores qualidades? ............
14. O que a(o) preocupa? ............................................ 24. Quais são seus três piores defeitos? ......................
15. Quando ela (ele) se irrita? ...................................... 25. Prefere estar sozinha ou com outras pessoas? ......
16. Que sinais de nervosismo ela (ele) dá? .................. 26. Ela se perturba quando é observada? ...................
17. Quais são os seus três piores hábitos? .................. 27. O que as pessoas dizem dela? ...............................
18. Quais são os seus melhores hábitos? .................... 28. Confia nas pessoas? ...............................................
19. Tem muitos amigos? Mais velhos ou mais novos? .. 29. Tem medo das pessoas? .........................................
20. O que as pessoas dizem dela(e)? ........................... 30. Ela se dá bem com a mulher (ou marido) ou com
21. Quanto ela (ele) gosta de sua família? .................. os pais (se é solteira)? ............................................
22. Quanto ela (ele) gosta da escola? .......................... 31. Ela está sempre junto ou separada do cônjuge?
23. Ela (ele) sai muito com meninos(as)? .................... (se é solteira, pular esta pergunta) .......................
24. Como ela (ele) se diverte? ...................................... 32. Como são as relações sexuais com o marido ou
25. Ela (ele) se casará? ................................................. a mulher? (se é solteira, pular esta pergunta) .......
26. Com que idade? ..................................................... 33. Quando teve sua primeira experiência sexual? .....
27. Com que tipo de rapaz (moça) ela (ele) vai se casar? 34. Tem namorado(a) firme? (para solteiros) ..............
28. Quais são os três maiores desejos? ........................ 35. Espera casar-se? (para solteiros) ............................
29. Quem ela (ele) lembra? .......................................... 36. Que tipo de moço ou moça ela prefere?
30. Você gostaria de ser como ela (ele)? ..................... (para solteiros) .......................................................
Tradução de Van Kolck, de Machover (1956). 37. Já teve relações sexuais com moças? Se for homem,
Fonte: Van Kolck, 1984. com moços? ..........................................................
38. Já foi abordado? (homossexualmente) ..................
39. Ela se masturba freqüentemente? .........................
40. O que pensa sobre isso? ........................................
QUADRO E.5 Questionário para adolescentes e 41. Com quem essa figura se parece? .........................
adultos (teste da figura humana de Machover) 42. Você gostaria de ser parecida com ela? ................
43. Qual é a parte mais bonita do corpo dessa pessoa?
Desenho da Figura Humana na Técnica de Machover
44. Qual é a parte mais feia desse desenho? ...............
Questionário para adolescentes e adultos
Nome ......................... Idade ................ No................... Apreciação de si mesma
Escolaridade ............... Sexo ................ Data................. 45. Qual é a parte melhor do seu corpo? Por quê? .....
46. Qual é a parte pior do seu corpo? Por quê? ..........
Instruções: Conte uma história sobre esta figura como
47. O que você tem de bom? .......................................
se ela (ou ele) fosse o personagem de uma novela ou
48. O que você tem de mau? .......................................
de uma peça, respondendo às seguintes perguntas
sobre ela (ou ele) da melhor maneira que você puder. Tradução e adaptação de Van Kolck, de Machover (1956).
Fonte: Van Kolck, 1984.

642 JUREMA ALCIDES CUNHA


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PSICODIAGNÓSTICO – V 661
Índice Onomástico

A Arzeno, 39, 40, 267, 271, 416 Ben-Porath, 247 Brasil, 67


Asgard, 199, 200 Benton, 171, 173, 182 Brem-Gräser, 219, 220
Abduch, 384 Atlas, 242 Benton, A., 208, 276, 285 Brenner, 241
Aberastury, 97, 98, 99, 423, Augras, 208, 257, 356, 358, Berg, 115, 136, 531 Brent, 199, 200
428, 431 359 Bergman, 228 Breslin, 89, 90
Aberholzer, 368 Ávila, 183, 185, 188, 189, Berman, 199, 200, 264 Briskin, 206, 320, 321, 326,
Adelman, 214 192 Berndt, D., 241, 242 333
Adrados, 257, 356, 359 Axelrod, 285 Berndt, S., 241, 242 Brito, 193
Agras, 241 Azevedo Jr., 194, 243 Bernstein, 264, 270 Brizolara, 206, 311, 313
Aiello-Vaisberg, 430, 438 Bertolucci, 181 Brody, 344
Ainsworth, 356, 358, 359, Beskow, 199, 200 Brown, 22, 206, 207, 238,
362, 363, 389 B Bevens, 251 281, 300, 315, 317, 320,
Ajuriaguerra, 96, 100 Bezerra, 181 321, 322, 323, 549
Alchieri, 238 Bach, 206, 293 Biaggio, 233, 235 Brozek, 462
Alcock, 393, 394 Bacon, 25 Bianchi, 242 Brucki, 181
Aleichem,67 Baddelay, 181 Bien, 93 Brutschke, 181, 182
Alexander, 243 Baker, 119, 218, 241, 242 Biermann, C., 259 Bucher, 141
Alexopoulos, 199, 200 Balken, 400 Biermann, R., 259 Buck, 222, 232, 522
Alford, 241, 242 Balla, 272, 274 Billingslea, 206 Bühler, 359
Allison, 276, 544, 551, 569 Bandeira, 22, 222, 238, 252, Billingslea, 295, 317, 326, Bumberry, 242
Alloy, 228 507, 508, 510, 511, 512 327 Burgemeister, 215, 216
Allsop, 92 Bandura, 93 Binet, 23, 208, 216, 253 Burger, 226
Ambrosini, 242 Bannatyne, 610 Binetti, 285 Burkhart, 497
Ames, 257 Barlow, 21, 22, 238, 241 Bion, 266 Burley, 509, 510
Amiralian, 438 Barnes, 486 Birley, 75 Burns, 219, 220, 513, 517,
Anastasi, 160, 161, 163, 164, Barraz, 241 Birskin, 296 519
170, 211, 253, 558 Barreto, 383 Bishop, 228 Butcher, 25, 225, 247, 468,
Anderson, 281, 389 Barrett, 483 Blackburn, 228 497, 500
Andolfi, 142 Barron, 451, 452 Blanco, 285 Butler, 261
Angelo, 142 Beatty, 284 Blatt, 587 Byrd, 296
Antoniazzi, 221, 508, 509, Beck, A.T., 227, 228, 229, Blatt, S.J., 276
512 230, 238, 239, 241, 242 Blatt, S.S., 264
Antúnez, 369 Beck, J., 228 Bleichmar, C.L., 96 C
Anzieu, 214, 218, 248, 259, Beck, R., 228 Bleichmar, N.M., 96
266, 267, 269, 389, 411, Beck, S., 254, 255, 256, 257, Bleuler, 253 Caldwell, 452, 482, 500, 501-
421, 422 345, 358, 359, 368, 372, Blizard, 182 502
APA, 21, 35, 36, 48, 75, 76, 389 Blum, 211, 214, 215, 216 Calhoun, 224
77, 78, 80, 81, 82, 83, 119, Beckwith, 463 Boccalandro, 248 Camargo, 181
120, 146, 160, 179, 188 Behn-Eschenburg, 386 Bochner, 257 Campaci, 181
Appel, 218, 220 Bell, 207, 215, 248, 270, 271 Bohm, 257, 359 Campbell, 463
Archer, 247 Bellak, L., 64, 211, 213, 214, Bolognani, 181 Campos, 220, 224, 232, 253,
Ardilla, 285 215, 259, 262, 400, 410, Bolton, 206, 224, 293 510, 513, 514, 520, 523
Argimon, 206, 207, 228, 229, 411, 412, 413, 414, 415, Boone, 285 Canivet, 386, 389
230, 242, 276, 288, 333, 416, 417, 418 Boring, 519 Capleton, 285
334, 335, 571, 591, 595, Bellak, S., 211, 214, 215, 416, Bornstein, 285 Cappa, 285
598 417, 418 Bose, 21, 239 Cardoso, 369
Arietti, 587 Bender, 203, 204, 311, 326 Bottino, 178 Carlen, 591
Arnold, 259 Benensohn, 199, 200 Boulenger, 21, 239 Carlson, 560
Aro, 199, 200 Benkö, 245 Bowen, 142, 143 Carmio, 266
Aron, 345 Bennett, 448 Boyd, 281, 537, 545 Carneiro, 142
Aronov, 378 Benowitz, 207 Brannigan, 207, 315 Carpenter, 619

662 JUREMA ALCIDES CUNHA


Carpentieri, 151, 154 Curphey, 196, 197, 198, 199, Edwards, G., 93 Fonseca, 155
Carr, 218, 259, 531, 569, 200 Efron, 98, 99, 100, 101 Forbes, 251, 253
579, 582, 585, 586, 592, Curtiss, 284 Eizirik, 261 Foulds, 251
593, 597 Cytrin, 282 Eksberg, 369 Fowler, 199, 200, 226
Carrigan, 199, 200 Elizur, 378, 543, 591 Fox, 189
Carson, 241, 242 Elkins, 483 França e Silva, 409, 410
Carvajal, 211 D Elliot, 208, 441, 442, 447, Franks, 242
Carvalho, 38 450, 452, 453 Franzen, 235
Carvalho, L.C., 238 Dahlstrom, L., 247, 439, 442, Emery, 228, 230 Freides, 285
Cassidy, 416 445, 446, 447, 448, 454, Endara, 257, 300, 359 Freitas, A., 269, 292
Castex, 194 456, 457, 458, 460, 464, Endicot, 75 Freitas, A.M.L., 369, 389, 390
Cattell, 23, 224, 226, 233, 465, 466, 467, 468, 469, Engle, 224 Freitas, N., 238, 253, 261,
557 470, 472, 473, 476, 478, Epstein, 238, 285 290, 400, 404, 407, 418,
Cavanaugh, 461 482, 486, 487, 500 Erbaugh, 241 419, 526
Celener de Nijamkin, 270 Dahlstrom, W., 247, 439, Erdberg, 341, 365, 366 Freud, A., 97, 415
Ceverny, 227, 258, 259 441, 442, 445, 446, 450, Erikson, 100 Freud, S., 54, 24, 29, 96, 97,
Chabert, 380 451, 452, 454, 456, 457, Espada, 186, 191, 192 99, 211, 324, 409, 410
Chanon, 285 458, 460, 463, 464, 465, Exner, D.E., 264 Fruchter, 170
Chase, 482 466, 467, 468, 469, 470, Exner, J.E., 254, 255, 256, Fuld, 181, 182
Chelune, 28, 34, 175, 241, 284 472, 473, 474, 475, 476, 257, 265, 368, 369, 376, Fulgêncio, 206, 311, 313
Chioqueta, 241, 242 478, 482, 486, 487, 497, 389, 400 Full, 180
Christ, 229, 230 500
Christian, 497 Dana, 22, 206, 224, 259, 293,
Christy, 285 400 F G
Chu, 136 Dare, 142
Chwaki, 244 Davanloo, 48 Fabbiani, 212, 214 Gabbard, 19, 22, 64, 501
Cicchetti, 272, 274 Davidson, 88, 89, 257, 345 Fainberg, 99 Galifret-Granjon, 206
Cisco, 281 Davis, 228 Fairbairn, 266 Galland de Mira, 248
Clark, 21, 22, 199, 200, 229, De Tichey, 378, 385 Farber, 199, 200 Galton, 23, 216
239, 448 Deabler, 523 Farberow, 196, 199, 200, 230 Galvin, 560
Clarkin, 20 Delatte, 224 Faro, 612 Gambos, 416
Clawson, 204, 206, 295, 296, Delis, 276, 278, 279 Faterson, 223 Gameiro, 142, 143
297, 298, 299, 300, 301, DeMendonça, 455, 456, 458, Feifil, 569 Gardner, 355
311, 313, 314, 321 462, 465, 467, 468, 470, Fein, 172, 173, 180, 276, Garfield, 23
Clements, 228 472, 473, 475, 477 278, 279, 542, 544, 545, Garney, 206
Climent, 77 Denkla, 285 563, 564, 566, 567, 569, Garrison, 228, 230
Cloninger, 21, 238 Desmond, 92 570, 571, 573, 574, 575, Garron, 482, 483
Cockburn, 181 Despert, 264 576, 578, 579, 584, 585, Gaston, 52
Coie, 151 Detre, 58 586, 591, 594, 596, 598 Gavião, 430
Collins, 285 Di Leo, 219, 220, 221, 224, Feixas, 228 Gaviria, 476
Constantino, 211, 261 510 Felippe, 261 Gay, 284
Coolidge, 180 Di Nardo, 21 Fenwick, 206 Gehring, 253
Cooper, 20, 51, 75 Dickstein, 587 Féres-Carneiro, 51, 226, 227 Genshaft, 264
Cordioli, 52 DiClemente, 88, 89, 90, 91, Ferguson, 281 Gerber, 211
Córdoba, 270 92 Fernández-Ballesteros, 107, Gerson, 143, 146, 148, 149,
Corman, 218, 220, 513, 515, DiScipio, 242 179, 180, 23 150
516 Dobson, 28, 35, 241 Ferreira, 35, 38, 227 Ghesti, 243
Corson, 504 Dolmetsh, 461 Ferron, 613 Ghrist, 242
Costa-Fernandez, 261 Dolto, 194 Field, 206, 293, 552 Gibb, 321, 333
Court, 253 Donadussi, 509 Figlie, 90 Gibbon, 48, 49, 77, 78, 79,
Cox, 221 Donders, 612 Figueiredo, 283, 284 80, 81, 83
Coy, 193 Dool, 272 Fin, 230 Giglio, 250
CPS, 196 Draime, 378 Fine, 324 Gilberstadt, 455, 456, 458,
Cristiano de Souza, 392 Drake, 472, 478, 489 Finkel, 199, 200 464, 473, 474, 476, 504
Cristoffi, 431 Duarte, 369 First, 77, 78, 79, 83, 83 Gill, 389
Cronbach, 22, 162, 170, 211, Ducros, 264 Fisher, 199, 200, 466 Gilleard, C., 288
261, 264 Duker, 455, 456, 458, 464, Fishkin, 612 Gilleard, E., 288
Croughan, 48, 75, 83 473, 474, 476, 504 Fiszbein, 75 Gitlin, 23, 32, 33, 34-35
Crovara, 151 Dumont, 612 Flaherty, 476 Giurgea, 177
Cunha, 19, 21, 22, 27, 43, Düss, 264, 421, 422 Flanagan, 211, 276, 278, Glang, 228
109, 171, 174, 192, 206, Duszynski, 221, 224 285, 289, 529, 557, 564, Glass, 186
207, 214, 216, 218, 224, 574, 580 Glasser, 224, 276, 281, 507,
228, 229, 230, 238, 239, Fleck, 241 531, 532, 533, 534, 535,
241, 242, 247, 253, 257, E Fletcher, 208, 276, 285 536, 538, 539, 540, 541,
261, 264, 265, 269, 270, Flynn, 253, 272, 276, 277, 544, 551, 552, 555, 566,
274, 276, 288, 290, 311, Eber, 226, 296 283, 284, 549, 603 567, 568, 569, 571, 573,
313, 322, 324, 331, 421, Ebert, 199, 200 Foley, 142, 143 577, 578, 580, 581, 582
422, 423, 426, 550, 571, Edington, 378 Folstein, F. G., 181, 182 Glutting, 606
591, 595, 598 Edwards, 242, 243 Folstein, M. F., 181, 182 Gold, 619

PSICODIAGNÓSTICO – V 663
Goldberg, D.P., 250 Gynther, M., 224, 225, 247, Hiller, 21, 181, 239 570, 571, 573, 574, 575,
Goldberg, P.A., 218 497, 500 Hillman, 38 576, 578, 579, 584, 585,
Goldeberg, 619 Gynther, R., 224, 225, 247, Hiltman, 265 586, 591, 594, 596, 598
Goldfried, 206, 320 497, 500 Hinshelwood, 54, 96, 97 Kaplan, H., 33, 61
Goldman, 285, 598 Hirsch, 211, 214, 215 Karam, 228, 230
Goldstein, G., 20, 24, 171, Hirst, 264 Karol, 226
261, 288 H Hishinuma, 612 Kaspar, 300
Goldstein, K., 218, 224, 591 Hoffman, 500 Kast, 42
Goldstein, M., 441, 442, 447, Haas, 228 Holt, 262 Kathy, 288
450, 452, 453 Haasiosalo, 269 Honaker, 226 Katon, 21
Gomes, 195 Hagen, 210 Hooper, 281, 537, 545 Kaufman, 314
Goodenough, 221, 222, 507 Hain, 204, 206, 314, 320, Horn, 557 Kaufman, A.S., 211, 216,
Goodpaster, 450 321, 326, 331 Horner, 285 219, 220, 270, 274, 276,
Goodstein, 400, 401 Hair, 162 Horton-Deutsch, 199, 200 281, 284, 289, 547, 548,
Gordon, 92, 93 Hall, 399 Horvath, 52 549, 550, 551, 552, 554,
Gorsuch, 233, 235 Hallikainen, 285 Hotz, 71 555, 556, 559, 560, 561,
Gossop, 93 Halpern, 203, 206, 257, 293 House, 242 572, 603, 605, 606, 608,
Gotts, 136, 448, 451, 452, Halpern, 321 Howarth, 221 609, 611, 612, 618, 620,
461, 497, 498, 499, 500 Hames, 284 Huber, 285 622, 625, 626, 627
Gough, 461, 497 Hammer, 206, 219, 220, 221, Hulse, 218, 220 Kaufman, S.M., 513, 517,
Goulart, 240, 241 223, 224, 232, 322, 507, Hurvich, 214, 215 519, 523
Gould, 199, 200 509, 510, 513, 514, 515, Hutt, 189, 203, 204, 206, Kay, 75
Gouveia, 181 519, 520, 522, 523 293, 295, 296, 312, 315, Kazenstein, 259
Grace Arthur, 243 Hammon, 431 317, 320, 321, 322, 326, Keatinge, 247, 258, 277, 288,
Graham, 247, 449, 450, 452, Hammond, 463 327, 329, 330, 331, 332, 480, 623
503, 505 Handler, 222, 224, 509, 510, 333 Keller, 19, 25, 225, 247
Grassano, 267, 271, 416, 511 Hutz, 22, 221, 507, 508, 509, Kelley, 257, 344, 345, 350,
430, 431 Hankins, 281, 549 510, 512 351, 355, 359
Grassi, 244 Hänniken, 285 Hymowitz, 565 Kelly, 199, 200, 228
Grayson, 500, 501 Hannum, 242 Kendall, 20
Greenbaum, 206 Hanvick, 483 Kent, 269
Greene, 235, 497 Harmon, 46, 463, 464, 466, I Kerner, 253
Gregory, 626, 627 468, 472, 476 Kierman, 77
Greist, 77 Harris, 218, 220, 221, 285, Ibañez, 183 Kilgore, 247, 449, 450, 452,
Grisso, 183, 185, 193 474, 507, 508 Iglesias, 43 454, 462, 463, 464, 465,
Groth-Marnat, 19, 20, 23, 24, Hart, 597 Iguchi, 228 466, 468, 469, 470, 471,
25, 29, 136, 202, 205, 207, Hartlage, 206 Ingling, 206, 320 472, 473, 474, 476, 478,
214, 218, 220, 221, 224, Hartman, 587 Iozzi, 378 482, 487, 488, 489, 490,
232, 247, 256, 257, 261, Hartmann, 400, 421 Isenhart, 89 493, 495, 496, 501, 502,
274, 277, 284, 300, 314, Hathaway, 247, 442, 445, Isometsa, 199, 200 503, 504, 505
315, 316, 317, 320, 321, 446, 454, 463, 466, 467, Ivnik, 561 Kinder, 189, 256, 257
331, 333, 440, 441, 442, 470, 472, 476, 478, 497, Izal, 179 Kinget, 268, 269
445, 452, 454, 455, 456, 502 Kinnersley, 89
457, 458, 459, 461, 462, Hatzenbuehler, 242 Kitay, 296
464, 465, 466, 467, 468, Haworth, 211, 214, 420 J Kjenaas, 462
469, 470, 471, 472, 473, Head, 224 Klein, 96, 97, 99, 199, 200,
474, 475, 477, 478, 479, Heather, 88, 93 Jackson, 211, 242 266
480, 481, 482, 483, 484, Heaton, 175, 284 Jacobs, 199, 200 Klein-Benheim, 199, 200
485, 486, 487, 488, 489, Heikkinen, 199, 200 Jacobson, 51, 219 Kleiner, 99
490, 491, 492, 493, 494, Heilae, 199, 200 Jacquemin, 214, 243, 245, Klepsch, 513
495, 496, 501, 513, 516, Heimann, 54 276 Klepsh, 218, 219, 220, 221,
517, 519, 520, 521, 523, Heineck, 264, 265 Johnson, 321 223, 224, 232
530, 531, 534, 547, 549, Heiss, 265 Jolles, 507, 511 Klerman, 23, 24, 35
550, 551, 552, 553, 555, Hellman, 500 Joseph, 89, 90 Klopfer, B., 254, 255, 256,
556, 557, 558, 562, 563, Helzer, 48, 75, 83 Jung, C., 24, 231, 268 260, 344, 345, 350, 351,
564, 566, 568, 572, 573, Hendrikson, 224 Jung, M., 261 355, 356, 357, 358, 359,
574, 575, 576, 579, 580, Henri, 253 Jungerman, 91, 95 362, 363, 364, 368, 369,
605, 606, 607, 609, 610, Henriksson, 199, 200 372, 389, 394
612 Hens, 254 Klopfer, W. G., 206, 320, 356,
Guarnaccia, 24, 261, 264 Heráclito, 40 K 358, 359, 362, 363
Guazzelli, 289 Herbart, 410 Knehr, 259
Gudjonsson, 185 Hersen, 20, 24, 171, 261 Kabacoff, 226 Knijnik, 261
Guerra, 292, 386, 390 Hertz, 254, 256, 359, 368, Kahill, 224 Knobel, 423
Guilford, 170 372, 389 Kahn, 189 Kohs, 243
Guinzbourg de Brande, 270 Hesselbrock, 276, 591, 598 Kalton, 163 Koivisto, 285
Güntert, 266, 369, 376 Hewes, 211 Kamphaus, 607 Kolko, 199, 200
Gustin, 450 Heyman, 181, 182 Kaplan, C., 289 Koller, W., 285
Guthrie, 208 Heyne, 199, 200 Kaplan, E., 542, 544, 545, Koppitz, 204, 206, 218, 221,
Gutkin, 560 Hildreth, 216 563, 564, 566, 567, 569, 223, 224, 295, 296, 297,

664 JUREMA ALCIDES CUNHA


300, 306, 307, 308, 309, Lindemann, 276 Martins, M., 264 Montoro, 179
310, 311, 312, 313, 314, Lindlolm, 269 Martins, M.L., 229, 230 Montoya, 613
315, 316, 507, 508, 509, Lindzey, 399 Marton, 242 Moor, 590, 593, 596
510, 552 Lingoes, 474 Marttunen, 199, 200 Moore, 324
Kornblit, 99 Lishman, 172, 174, 208 Maser, 77, 241 Moraes, 238, 269, 270
Koss, 500 Litman, 196, 199, 200 Matarazzo, 276, 507, 531, Morali-Daninos, 386
Kovacs, 228 Little, 466 570, 582, 586, 622 Moreira, 257, 356, 358, 359
Kraemer, 247 Livingston, 182 Mathom, 271 Morgan, 259
Kraepelin, 24, 29 Löberg, 288 Matthews, 242 Morgenthaler, 254, 368, 386
Kramer, 206, 264 Logan, 99 Mattlar, 269 Moritz, 199, 200
Krampe, 208 Logie, 218, 219, 220, 221, Mauco, 211 Morris, R., 172, 173, 180,
Krevelen, 270 223, 224, 232, 513 Mayman, 276, 355, 565, 568, 181, 182, 276, 278, 279,
Krís, 211 Lohrenz, 355 573, 574, 577, 579, 580, 542, 544, 545, 563, 564,
Kroeff, 205, 206, 309, 308, Lönnquist, 199, 200 581, 582, 583, 591, 592, 566, 567, 569, 570, 571,
310 Looft, 569 594, 596 573, 574, 575, 576, 578,
Kupfer, 58 Loosli-Usteri, 257, 359 Maza, 386 579, 584, 585, 586, 591,
Kusnetzoff, 415 Lopes, 206, 300, 301 Mc Fie, 586, 591 594, 596, 598
Kutcher, 241 López-Pedraza, 43 McArthur, 224 Morris, W.W., 232, 519
Kwentus, 597 Lorge, 215, 216 McClure, 242 Morval, 380
Kwitko, 34 Lösel, 151 McConaughy, 90, 91, 93 Moser, 163
Loureiro, 222, 266 McCormick, 315 Mosse, 264
Lubin, 261, 507 McGlasman, 35 Mount, 181
L Luborski, 48, 52 McGoldrich, 143, 146, 148, Mundy, 321
Lucas, 32 149, 150 Munley, 247
La Rosa, 234, 235 Lucca, 509 McGraw, 321 Murphy, 166, 285
Lachar, 501 Luria, 243 McGrew, 211, 276, 278, 289, Murray, H., 380, 399, 400,
Lacks, 206, 207, 326, 327, Lushene, 233, 235 529, 557, 564, 574, 580 401, 402, 403, 406, 407,
331, 332, 333, 334, 335, Lydiard, 21 McHugh, 181, 182 408, 410, 411, 412, 416
336, 337, 339 Lydiard, 239 McIntosh, 315, 316 Murray, R., 288
Lafond, 416 Lynn, 154 McKinley, 247, 442, 454, 463,
Lair, 482 466, 476, 478, 502
Laks, 294 McLachlan, 224 N
Lanyon, 207, 400, 401, 502 M McPhee, 219
Laranjeira, 91, 95 McReynolds, 233, 235, 241 Naglieri, 221
Larsen, 507 Macedo, 292, 386, 390 McWilliams, 51 Nascimento, E., 283
Lau, 199, 200 Machover, 222, 223, 224, MEC, 155, 156 Nascimento, S., 369, 376
Lavalleé, 21, 239 507, 509, 511 Medina, 509 Natalício, 233
Lavon, 501 MacKinnon, 114, 119, 288, Meehl, 470, 472, 480 Nathan, 211
Lawton, 215, 218 40, 41, 57, 59, 60, 61, 62, Meisner, 189 Navran, 257, 356
Learned, 257 74 Melo, 71 Neill, 199, 200
Leavitt, 482, 483 Maddux, 92 Melton, 183, 188, 189, 193 Nekanda-Trepka, 228
Lebovici, 96 Magni, 285 Melvin, 100, 101 NEME, 160
Lemes, 241, 242 Magnum, 219 Mendelson, 241 Netter, 189
Lemgruber, 227 Mahler, 60 Menéndez de Rodriguez, 214 Newland, 551
Leonard, 199, 200 Mahmood, 386 Menninger, 324 Newman, 228
Lester, 228 Mahoney,19 Merril-Palmer, 243 Newport, 207
Letric Law Library, 67 Mainord, 215 Metraux, 257 Nick, 236, 237, 238, 245, 250
Levenbaerg, 219 Malan, 48 Metz, 242 Niemeyer, 228
Levin, 171, 173, 208, 276, Malgady, 261 Michels, 40, 41 NIMH, 77
285 Malhorta, 264 Miermont, 143 Norcross, 90, 91, 92
Levine, 207, 322, 323, 326 Maller, 613 Miller, H.B., 285 Norris, 261
Levitt, 136, 233, 448, 451, Maloney, M., 264 Miller, W.R., 598 Nunes, 22, 109, 214, 216,
452, 461, 497, 498, 499, Maloney, M.D., 507 Mineka, 21, 228, 229, 239 261, 264, 265, 274, 421,
500 Maloney, M.P., 224 Minella, 17l, 174, 206, 207, 422, 423, 426
Levy, 218, 224, 507 Man, 199, 200 276, 288, 333, 334, 335,
Lezak, 171, 172, 173, 174, Mandler, 208 571, 591, 595, 598
175, 176, 178, 180, 189, Mann, 199, 200 Minkoff, 228 O
206, 208, 211, 224, 232, Maraninchi, 257 Minuchin, 141, 148, 149
243, 245, 253, 257, 276, Marcuse, 215 Miotti, 195 O´Brien, 219
279, 285, 288, 293, 535, Marder, 250 Mira y López, 248 Oas, 224, 321
549, 551, 563, 564, 565, Margulies, 228 Miranda, 206 Oberholzer, 254, 386
566, 567, 568, 569, 572, Marion, 351 Mitchell, 224 Ocampo, 110, 271, 39, 40
573, 574, 578, 579, 580, Marks, 455, 464, 471, 472, Mittelhammer, 181 Oehming, 199, 200
582, 583, 584, 585, 586 483, 496, 505 Moch, 241 Oetting, 472, 478, 489
Liberman, 266 Marlatt, 92, 93 Modlin, 448 Olin, 247, 258, 277, 288,
Lichtenberger, 618, 620, 622, Marley, 321 Mohs, 181, 182 480, 623
626, 627 Marlin, 148, 149 Monachesi, 467, 495 Oliveira, 214, 216, 228, 229,
Lighezzolo, 378, 385 Marmor, 48 Monod, 380 230, 241, 264, 265, 274,
Lima, 249, 437 Martin, 285 Montagna, 215 422

PSICODIAGNÓSTICO – V 665
Oliver, 242 Piotrowski, 19, 368, 389 Rich, 199, 200 Schuerger, 549
Ollendick, 235 Pistori, 151 Riebe, 549 Schuerholtz, 285
Ombredane, 380, 389 Pitcher-Bake, 219 Rinkers-Ovsianka, 258 Schulberg, 326
OMS, 120, 147, 37 Pitrowski, 510 Roberts, 296, 321 Schulte, 613
Opler, 75 Plass, 288 Robiner, 331 Schultz, D., 399
Oren, 285 Platt, 228 Robins, 48, 75, 83 Schultz, S., 399
Orr, 598 Pollyson, 261 Rocha, 269-270 Schwartz, 264, 285
Ortega, 218, 220 Pope, 118, 218, 42, 44, 442, Rodríguez-Sutil, 185, 188, Scott, H., 180
Osterrieth, 230, 232 443, 444, 566, 567, 584 189, 192 Scott, W. H., 42, 44, 118, 218,
Othmer, E., 51, 83 Popovic, 280, 281, 547 Roemer, 254 566, 567, 584
Othmer, S., 51, 83 Popplestone, 206, 293 Rogers, 188, 451, 461 Scott, W.E., 442, 443, 444
Ott, 261 Porot, 218, 219 Roid, 607 Scribner, 224
Oxford, 93 Portuondo, 222, 223, 224, Rollnick, 88, 89, 92 Sechrest, 218
262, 276, 404, 408, 414, Rorschach, 24, 253, 290, 341, Seeman, 455, 464, 471, 472,
420, 551, 566, 568, 573, 345, 358, 368, 377, 379, 483
P 582, 586, 587, 591, 592, 386, 392 Seidman, 171, 172, 173, 175,
594, 597 Rosman, 199, 200 176, 232
Padovani, 285 Post, 242 Ross, 224 Seligman, 416
Paín, 236, 238, 252, 253, Poulos, 571, 591, 595, 598 Rosseli, 285 Semer, 369
569, 589 Poythree, 188, 189 Rossi, 285, 422 Sendin, 368, 376
Paine, 507 Prieb, 241, 242 Rossini, 300 Serebrinski, 392
Palma, 382 Prigatano, 285 Roth, 181 Serralta, 21, 238, 239
Pancheri, 468 Prochaska, 89, 90, 91, 92 Rotter, 216 Setten, 416
Paniak, 285 Pruitt, 261, 507 Rouquayrol, 165 Shaffer, 221, 224
Paolo, 285 Psychological Corporation, Roy, 487 Shaffi, 199, 200
Parkin, 221 279 Roy-Byrne, 21 Shapiro, 206, 316
Parpal, 53 Runeson, 199, 200 Shaw, 32, 33, 228, 230
Parsons, 288 Ruschel, 206 Shearn, 218
Partenen, 285 Q Rush, 228, 230 Shek, 242
Partenio, 314 Russell, 207, 218, 226 Shellemberger, 146, 148,
Pascal, 204, 206, 293, 296, Quast, 295 Ryan, 285, 561, 618, 619, 149, 150
314, 317, 326, 327, 328 Quereski, 549 620, 626, 627 Shentoub, 112, 259, 261,
Pasquali, 158, 242, 243, 250, Quintela, 258, 356, 358, 359 400
271, 272 Sherman, 199, 200
Patterson, 285 S Shum, 288
Patton, 219 R Siegel, 351
Pauker, 326 Sá, 192 Sifneos, 48
Paul, 284 Rabin, 569 Sacks, 216, 217, 218 Sigelman, 356, 358, 359
Payne, 216 Rabinovich, 242 Sadock, 33, 36, 37, 61 Silva Neto, 369
Peçanha, 226, 227, 265 Racker, 54 Safra, 249 Silva, A.A.V., 243, 244, 245
Peck, 295 Ramanaiah, 233, 234, 235 Sajadi, 14 Silveira, 38, 109
Pera, 151, 155 Rammohan, 285 Salomon, 386 Silverstein, 282, 545
Percheux, 204, 206, 293, 302, Randolph, 619 Saltijeral, 199, 200 Simon, 49, 75, 195
303, 304, 305 Rapaport, 254, 256, 276, Sampaio, 142, 143 Simpson, 296, 316
Pereira, D., 238 357, 359, 368, 369, 389, Sanchez, 93 Sims, 224
Pereira, I., 591, 595, 598 392, 401, 402, 404, 406, Sanders, 416 Singelmann, 257
Pérez-Ramos, A., 151, 152, 407, 408, 420, 531, 535, Sanderson, 136 Siqueira, 165
154, 155, 212 536, 537, 538, 539, 540, Santos, 258 Skaf, 190
Pérez-Ramos, J., 151, 154 541, 544, 545, 551, 564, Santucci, 204, 206, 293, 302, Skinner, 89, 90
Perlman, 216, 274, 289 565, 568, 569, 571, 572, 303, 304, 305 Skodol, 48, 83
Perlstein, 324 573, 574, 575, 576, 577, Sattler, 210, 607, 611, 618, Slate, 612
Perper, 199, 200 579, 580, 581 619, 620, 626, 627 Sluske, 225
Perry, 189, 369 Raskin, 219 Satz, 208, 261, 276, 285 Slutske, 247
Person, 505 Raush de Trautenberg, 379, Schachter, 392 Small, 64, 258
Peterson, 355, 357, 448 380, 382 Schafer, 43, 256, 257, 276, Smith, 261, 507, 551
Petrila, 188, 189 Raven, J., 253 300, 359, 364, 389, 391, Snow, 285
Petzel, 241, 242 Raven, J.C., 250, 253 393, 565, 568, 574, 577, Soares, 165
Pfister, 265, 386 Raymundo, 257, 290 579, 580, 581, 582, 583, Someonoff, 386
Phillipson, 265, 267 Reader, 285 592, 596 Sopchak, 224
Piaget, 100, 236, 252 Reed, 276, 591 Schaffer, 199, 200 Soukoup, 208, 276, 285
Piccolo, 215, 222, 224, 267, Resnik, 230 Scheerer, 591 Soukup, 171, 173
271, 420 Rey, 230, 231 Schelini, 284 Soulé, 96
Pichot, 211, 218 Reynolds, 211, 219, 270, 281, Schilder, 206, 510 Spader, 269
Pick, 54 507, 547, 548, 549, 550, Schill, 235 Sparrow, 272, 274
Pietrowski, 254, 256, 257 551, 552, 554, 555, 556, Schilling, 355, 357 Spearman, 271, 529
Pigem, 270 559, 560, 561, 572 Schlanck, 500 Spellman, 199, 200
Pincus, 142 Reznokoff, 218 Schlieper, 257 Spielberger, 233, 234, 235,
Pinheiro, 283 Rhode, 189, 216 Schneidman, 196, 197, 198, 296
Pinto, 430 Rian, 261 199, 200, 230 Spiro, 425

666 JUREMA ALCIDES CUNHA


Spitzer, 48, 49, 75, 77, 78, 79, 478, 482, 487, 488, 489, Walls, 507 Wilkinson, 288, 571, 591,
80, 81, 83 490, 493, 495, 496, 501, Walters, 497 595, 597
Spreen, 182 502, 503, 504, 505 Ward, 242, 264, 609 Williams, 49, 77, 78, 80, 81,
Steer, 228, 230, 238, 242 Trinca, A., 430 Warner, 136 83, 247
Stein, 136, 216, 218 Trinca, W., 42, 248, 249, 428, Warteg, 267, 269 Wilson Jr., 62, 65
Sternberg, 207, 322, 323, 430, 431, 436, 437 Watkins, 609 Wilson, 181
326 Troster, 285 Watson, 21, 22, 229 Windholz, 258
Stipp, 268, 269 Troter, 285 Watt, 151 Wing, 75
Stork, 569 Tryon, 136 Weaver, 211 Winnicott, 384, 428
Stotland, 227 Tucker, 296 Wechsler, D., 175, 181, 182, Witmer, 23
Stott, 89 Tupa, 614 243, 274, 276, 277, 279, Witt, 549
Strauss, 59, 60 Tym, 181 281, 283, 285, 288, 289, Wolff, 218, 220
Streb, 21, 238, 239 536, 540, 542, 544, 545, Wolkmar, 100, 101
Suczek, 206, 320 546, 549, 551, 558, 561, Wolman, 24
Sullivan, 613 U 562, 564, 565, 567, 568, Woltman, 204, 206, 293
Sundberg, 507 570, 572, 578, 582, 588, Wong, 470
Supers, 224 Urbina, 160 590, 592, 593, 603, 606, Woo-Sam, 276, 535, 536,
Suttel, 204, 206, 293, 296, 607, 608, 609, 612, 613, 538, 539, 544, 566, 567,
314, 317, 326, 327, 328 614, 617, 618, 622, 623 569, 571, 573, 577, 580,
Sutton, 91 V Wechsler, L., 508, 509 584, 586, 591, 592, 594
Sweeney, 228 Wechsler, S., 221, 284
Valle, 269, 270 Weidemman, 276
Van Kolck, 208, 211, 218, Weinberg, 619 X
T 222, 224, 232, 238, 248, Weindenmann, 591
259, 270, 431, 508, 510, Weiner, 202, 368, 376, 377, Xavier, 182, 386
Taley, 175, 285 511, 520 386, 389 Xavier, M.A., 243, 245
Tambara, 247 Van Praag, 22 Weinstein, 171, 172, 173,
Tamkin, 207 Vance, 549 175, 176, 232
Tardivo, 212, 214, 248, 265, Vane, 24, 261, 264 Weishaar, 228 Y
431, 432, 435 Vasconcelos, 224 Weissman, 228
Tarvis, 88 Vaz, 258, 292, 354, 386, 389, Weitzel, 77 Yager, 23, 32, 33, 34-35
Tavares, 49, 75, 76, 78 390, 391, 392, 393, 394, Welsh, 247, 439, 442, 445, Yazigi, 369
Taylor, 230, 314 395, 396 446, 450, 451, 452, 454, Younger, 199, 200
Tellier, 285 Velicer, 91 456, 457, 458, 460, 463, Yudofsky, 57, 59, 60, 61, 62,
Tendler, 216 Viana, 159, 161, 162, 165 464, 465, 466, 467, 468, 74, 114, 119
Terman, 211 Viglione, 189, 369 469, 470, 472, 473, 474,
Terroba, 199, 200 Vilhena, 1 476, 478, 482, 486, 487,
Thelen, 261, 507 Villemor Amaral, 266 497, 500 Z
Thomas, 221 Vincent, 207, 241, 247, 331, Wenger, 219
Thorndike, 210 454, 457, 458, 459-460, Werba, 269, 270 Zacher, 25
Tobiansky, 182 462, 467, 471, 474, 479, Werlang, 214, 228, 229, 230, Zamorani, 259
Tolor, 206, 326 480, 482, 486, 487, 489, 264, 265, 422, 423 Zandig, 21, 181
Tonigan, 93 490, 493, 494, 495, 551, Wertheimer, 203 Zarontonello, 247
Topper, 519 558, 559, 598 West, 151 Zazzo, 271
Touguinha, 229, 230, 242 Von Hug-Hellmuth, 96 Wetzel, 228 Zimmerman, 39, 276, 281,
Tratt, 482 Von Staabs, 258, 259 White, 321, 497 531, 532, 533, 534, 535,
Treis, 549 Whittinghill, 199, 200 536, 537, 538, 539, 540,
Trentini, 229, 230 Widiger, 136 541, 544, 551, 552, 555,
Trexler, 228 W Widlocher, 218, 220 566, 567, 568, 569, 571,
Trimboli, 247, 448, 449, 450, Wiener, 463, 464, 466, 468, 573, 577, 578, 580
452, 454, 462, 463, 464, Wade, 88, 597 472, 476, 497 Zubin, 20
465, 466, 468, 469, 470, Wail, 236, 237, 238 Wiggins, 136 Zulliger, 290, 386, 387
471, 472, 473, 474, 476, Wallerstein, 20 Zweben, 88

PSICODIAGNÓSTICO – V 667
Índice

A Análise clínica (Murray), 399, função de, 587 de adolescentes e adultos,


401, 402, 404, 406, 407 Apatia, 73 615
Abreviação, 321 Análise fatorial nas escalas Apercepção temática, 429 Avaliação
Abstração, 70, 536, 572, 573, Wechsler, 554, 555 Apercepção, 379, 380, 409, clínica, 32, 34, 57, 104, 146,
580-583, 600 Análise fatorial, 159, 165 410, 411, 414 184, 201
Abuso de substâncias (do ál- Análise Aplicação (Z), 386, 387-388 cognitiva, 177, 180
cool, de drogas), 147, de adultos, 96 Aprendizagem da SCID, 83, 86, 87 comportamental, 19
458, 477, 484, 486, 490, de conteúdo (D-E), 431 Argumentação, 92 compreensiva, 27, 28t, 57,
493, 495 de documentos, 197, 198 Aritmética, subteste de, 274, 119
Ação, 88, 90, 91, 92, 93 de fantasias, 99 275, 276, 280, 288, 289 computadorizada, 25
ACID, perfil, 555-557 infantil, 96 Armar Objetos, subteste de, da motricidade, 102
Aconselhamento, 89, 93, 93 retrospectiva, 196 274, 280, 288 da psicopatologia, 36
Aculturação, 380 Anamnese, 57, 59, 65, 107, Arranjo de Figuras, subteste dinâmica, 64, 65, 211, 218,
Adaptação 124 de, 274, 280 222, 232, 260, 263, 270,
Lacks, 294, 326, 331, 337 Angulação Arranjo de Sentenças, subtes- 380
Hutt, 326 aumento ou diminuição, te de, 278 dos padrões de funciona-
Hutt-Birskin, 316 321, 330 Associação livre, 46 mento, 148, 149
Adequação à realidade, 100, dificuldades de, 333, 334, Associação Escala de, Global, 36
104 335, 337 de palavras, 24 estratégia de, 19, 20, 21, 22,
Aderência ao tratamento, 87 mudança na, 321, 329 Associação/ões livre/s, 378, 197, 198
Adolescentes, 424, 425, 427 Ângulos 385 familiar, 219
Afasia, 71 adição, acréscimo ou omis- Associação/ões livre/s, 429, forense, 183, 185, 186
Afetividade, 68, 72 são, 314, 321 431, 437 impressionista, 22
Agitação psicomotora, 597, agudos, 315 Associação/ões instrumentos de, 185
598 por curvas, 309, 314 fonética, 571 intelectual, 121
Agorafobia, 78, 79 Angústia, 72, 73 Ataque/s de pânico, 78 multiaxial, 35, 36
Agressão, 321, 322, 324, 380, Anomia, 570, 585 Atenção, 68, 171, 178-181 neuropsicológica, 22, 109,
380, 467, 469, 470, 488, Ansiedade de castração, 104 ausência de, 68 177, 179, 203-207, 207-
490, 504-506 Ansiedade, 72, 73, 177, 403, diminuição da, 68 208, 230-232, 245, 274,
Agressividade, 72, 317, 318, 405, 405, 406, 407, 453, extensão da, 566 277, 279, 284, 547, 568,
319 462, 465, 467, 468, 473, falta de, 68 586, 600
Agrupamentos de Horn, 555, 473, 479, 481-485, 487, seletiva, 596 objetivo da, 109, 110
557 488, 483, 493-496, 500, Atitude básica (D-E), 431, 435 pericial, 186
Ajustamento, nível global de 501-505, 510-511, 521- Atitude do examinando, 448 plano de, 106-111, 113, 127
(MMPI), 449-452 532, 534, 536, 537, 539, Atividade lúdica, 96 preliminar, 84
Alcoolismo, 199, 200, 595, 549, 555, 562, 566-568, Atuação/ões, 62, 458, 467, processo de, 19
598 573, 575, 576, 577, 579, 470, 478, 485, 486, 488, prospectiva, 151
Alcoolistas pacientes, 333 584, 585, 588-590, 592, 490, 492-495, 500, 501, psicidinâmica, 22, 57
Algoritmo/s, 79, 83, 84, 85, 86 593, 596, 597, 601, 602 502, 504, 505 psicológica, 19, 21, 22, 23,
Aliança avaliação da, 510-511 Auto-eficácia, 90-93 26, 27, 32, 35, 101, 199,
de trabalho, 52, 52 índices de, 510 Auto-imagem, 511 183, 185, 188, 193, 194,
terapêutica, 52 nível de, 110 Automotivação, 90 200, 158
Altruísmo vs. narcisismo, 423 situacional, 390, 395, 397, Autópsia psicológica, 196- psicométrica, 158
Alucinação/ões, 68, 69, 475, 398 201 psiquiátrica, 185
481, 488, 495, 496, 501 Ansiedade/s Auto-referência, 391-392, 564, recursos de
Ambivalência afetiva, 73 natureza das, 413, 414, 415 565, 570, 571, 575, 576, conforme a faixa etária
Ambivalência, 88-90, 92, 93 Ansiedade/s, 46, 52, 53, 60, 577 adolescentes, 204, 208,
resolução da, 88, 92 61, 418, 420, 431, 432, Auto-retrato, 520, 523 210, 216, 219, 221, 223,
Amplitude (WISC-III) 436 Avaliação (WAIS-III) 228, 231, 232, 238, 240,
dos escores, 606 Antecipação da inteligência, cognitiva, 244, 248, 251, 258, 259,
dos subtestes, 606 capacidade de, 587 618 263, 266, 268, 270, 272,

668 JUREMA ALCIDES CUNHA


273, 274, 276, 279, 281, cognitivo, 277 Bender (B-G), 203-207 dos transtornos mentais 24,
284, 286, 290 familiar, 226, 258 Bender memória, 205 29
adultos, 204, 208, 210, hiperatividade, 284 Bender, teste de, 111, 112, nosológica/s, 21, 24, 27, 28,
216, 219, 223, 228, 231, inteligência, 204, 210, 117, 127, 134, 135 35, 36, 37, 407, 408
232, 233, 238, 240, 248, 215, 221, 237, 244, 251, Benton, 207-208 oficiais, 25
250, 251, 258, 259, 263, 269, 274, 277, 281, 282 Bestiário, teste do, 270 psiquiátrica, 23
265, 266, 268, 270, 272, lesão cerebral, 204, 207, BHS, Beck Hopelessness Scale. simples, 27, 29
273, 274, 276, 279, 284, 208, 284 Vide Escala de Desespe- sistemas de, 21
286, 290 maturação grafo-moto- rança de Beck Codificação do perfil (MMPI),
crianças, 204, 208, 210, ra-perceptiva, 204 Binet-IV, 208-211 445-447
212, 219, 221, 223, 231, maturação visomotora, 204 Bizarria, 570 sistemas (MMPI), 446
232, 233, 244, 248, 251, maturidade mental, 215, Blacky, teste, 211 uso do (MMPI), 447
258, 259, 263, 268, 269, 221 Borderline Código (ou Símbolos),
270, 271, 273, 279, 281, memória, 207, 231, 285- contato, 134, 135 subteste de, 274, 280
282, 284, 288 288 personalidade, 127 Coeficiente
idosos, 208, 231, 240, imediata, 208 transtorno, 127 Alfa de Cronbach, 160, 162
263, 268, 276, 279, 286 pensamento abstrato, Brinquedo/s, 96-104 de consistência interna, 160,
pacientes psiquiátricos, 284 BRTV. Vide Visual Retention 161
230, 231, 238, 239, 248, percepção, 231 Test. Vide Benton de estabilidade da medida,
250, 266 visoespacial, 208 BSI, Beck Scale for Suicide Idea- 160
conforme a forma de admi- personalidade, 211, 216, tion. Vide Escala de Idea- de fidedignidade, 159, 161,
nistração 223, 225, 232, 242, 248, ção Suicida de Beck 162
coletiva, 204, 216, 219, 255, 259, 266, 267, 268 BVMGT (Bender Visual Motor de Kuder-Richardson, 162
221, 223, 225, 226, 227, pessimismo, 227 Gestalt Test). Vide Ben- Coesão, 333, 333, 337
232, 235, 240, 242, 244, raciocínio der, teste de Cognição, 171-173, 178
246, 250, 251, 263, 268, analógico, 272 Coleta de dados (de subsídios),
269, 290 geral, 215 57, 60, 65, 66
consensual, 226, 255 relações C Colisão (ou tendência a), 321,
individual, 204, 208, 210, familiares, 226, 232 329, 330, 333, 336
212, 215, 216, 219, 221, objetais, 266, 267 Cambridge Mental Disorders Colisão, 313, 314, 315
223, 225, 227, 231, 232, retardamento mental, of the Elderly Examina- Columbia Mental Maturity Sca-
235, 240, 242, 244, 246, 273 tion (CAMDEX), 181 le. Vide Columbia
248, 250, 251, 255, 263, retrospectiva, 196, 197, 198 Capacidade simbólica (de sim- Columbia, 213, 215-216
266, 268, 269, 271, 273, Avaliação/ões bolizar), 97, 100, 103 Combinação confabulatória,
274, 277, 278, 279, 281, de sintomas demenciais, 171 Casa de Animais, subteste de, 361
282, 284, 287, 288, 290 neuropsicológica/s, 171, 288 Co-morbidade, 21, 147
conforme o problema 173-176 Casa-árvore-pessoa, teste da. Competência legal, 186
ajustamento, 246 psicológica, 171 Vide HTP Competência/s do entrevista-
alcoolismo, 204 Avaliação-intervenção, 151, CAT, 114, 211-215, 385 dor, 47
ansiedade, 222, 234, 152, 153 Categoria diagnóstica, 119, Competição, 393, 396
235, 238, 239 modelos, 151 120 Completamento de Sentenças,
aproveitamento escolar Categoria/s 216-218, 288
problemas de, 204, 209 diagnóstica, 28 Completar Figuras, subteste
atenção, déficit de, 284 B nosológica/s, 28 de, 274, 276, 280, 288,
atitude frente à testa- Categorias diagnósticas, 35, 289
gem, 246 Baby tests, 154 78, 83 Completamento
atuação, 204, 246 BAI, Beck Anxiety Inventory. Children Apperception Test. de desenhos, teste de, 266-
competência social, 273 Vide Inventário de Ansie- Vide CAT 269
conflitos, 212, 217, 263 dade de Beck Ciclo vital, 141, 142, 150 de Figuras. Vide Completar
crises, 263 Balança decisional, 89, 90 adaptação ao, 150 Figuras, subteste de
declínio cognitivo, 208 Bannantyne, categorias de Classificação diagnóstica, 65 de Sentenças. Vide teste de
defesas, 212, 263 (WISC-III), 610 Classificação Internacional das Completamento de Sen-
déficits (ou disfunções) Bannatyne, categorias, 555, Doenças (CID), 77 tenças
cognitivos, 204, 284 556 Classificação Comportamento aditivo, 484,
depressão, 227, 230, 241 Bateria de testes, 26, 28, 109, categorias de (Bellak), 413, 487, 489
desenvolvimento cogniti- 110, 113, 119 415 Compreensão (entendimento)
vo, 221 não-padronizada, 110 da resposta, 353 dinâmica, 400, 403, 407,
desesperançca, 227 padronizada, 109, 110 das respostas (Z), 388-389 408
dinâmica familiar, 219 Bateria/s (de testes), 178, 181, de transtornos mentais, 120 Compreensão Verbal (CV)
disfunção cerebral (tria- 182 diagnóstica, 118, 119, 120, (WISC-III), 603, 604, 606
gem), 204 fixas, 178, 180 121 Compreensão Verbal
estádios do desenvolvi- Bateria/s neuropsicológica/s, nosológica, 106, 118, 121, fator de, 283, 288, 289
mento, 212 171 124, 125, 415 índice de, 276
fatores de personalidade, compreensivas, 171 sistema de (Z), 389 subteste de, 274, 276, 281
203, 224-226 fixas, 171 simples, 108, 121 Compreensão verbal, 506,
flexibilidade do pensa- flexíveis, 171 sistema/s de, 120, 121 551, 554, 555, 574
mento, 284 BDI, Beck Depression Inven- tipos, 121 Compreensão, 457, 461
funcionamento tory. Vide Inventário de Classificação/ões dinâmica, 389
adaptativo, 272 Depressão de Beck da psicopatologia, 36 subteste de, 115, 119

PSICODIAGNÓSTICO – V 669
Comunicação de resultados, Contrato de trabalho, 26, 30 cognitivo/s, 177-180, 181, da casa-árvore-pessoa (HTP),
107, 118, 121, 122, 123, Contrato terapêutico, 47 551, 563, 564, 568, 573, 112, 114, 127, 108
124 Contratransferência, 41, 42, 591, 600 da figura humana, 112, 134,
assistemática, 124 43, 47, 54, 115 de atenção, 573, 597, 598 135
sistemática, 124 Controle Mental, subteste de, de memória, 110, 573, 597, de Estória com Tema, 438
Comunicação dos resultados, 286 598 livre, 429, 430
31 Controle, 391, 393, 395, 397, espacial, 591 Desenhos Geométricos, sub-
Conceito/s, 70 398 nas funções executivas, 574 teste de, 288
abstrato, 573 Cópia de Símbolos, subteste perceptual/ais, 588 Desenvolvimento
âmbito do, 580 de, 278 psicológicos, 173 do ego, 418
aritmético, 573 Criatividade, 100, 103, 386, sensoriais, 178, 552 infantil, 416
concreto, 580 392 visoespacial, 590 grafoperceptivo, 304
formação de, 580 Crise/s, 35 visuais, 569, 583 neuropsicológico, 301, 309,
Concentração, 171 depressiva, 526, 527 Definição operacional, 159 311, 312-314
Concepção do meio (Bellak), intervenção/ões em, 76, 199, Delírio/s, 68, 71, 488, 495, Desesperança, 227, 230
414, 415 200 496, 501, 502 Desfecho (Murray), 402, 403-
Concordância com o critério, psicótica, 83 persecutórios, 471 407
83 da adolescência (ou adoles- somático/s, 462 Desintegração, 306, 307, 309
Concordância entre juízes, 509 cente), 65 de grandeza, 487, 496, 502 Deslocamento (mecanismo
Condição/ões médica/s geral/ de desenvolvimento, 64, 65 somático/s, 483, 484 de), 503
ais, 80, 81, 84 edípica, 66 Demência, 68 Desvio/s padrão, 167-170
Condições cognitivas, 177 pré-adolescente, 64, 65 de Alzheimer (ou doença de), Desvios
Conduta suicida, 148, 149 psicossociais, 64 591, 597 Bender, 311
Conduta, 68, 71, 72, 73 Critérios diagnósticos, 76, 79, de Alzheimer. Vide também Clawson, 313, 314
Confabulação (Z), 391-392 82, 83 Doença de Alzheimer, Koppitz, 313, 314
Confabulação, 361 Cubos 178, 180-182 Determinação genética, 176
Confiabilidade, 77 de Goldstein-Scheerer, teste Denominadores comuns, 65, Determinação, 90, 92
Configurações específicas de, 591 117 Determinante/s (Z), 388-398
das escalas de validade, 459- Cubos, subteste de, 272, 276, Dependência de substâncias Determinantes
460 278, 280, 288 (do álcool, de drogas), escore de 349, 356-357
Conflito intrapsíquico, 394 Cultura 486 inquérito de, 351, 354
Conflito/s, 401-403, 405-407, efeito da, 508 Dependência do álcool ou dro- Determinismo psíquico, 411
413, 414, 415, 417, 418, gas, 147 Devolução
420, 421-427, 430-432, Dependência vs. independên- entrevista de, 30
435-437, 45, 47, 49, 53, D cia (conflito de), 467, Devolução, 87
55, 56, 57, 60, 61, 62, 65, 479, 490, 493 Dezesseis PF, 224-226
66, 96, 97, 100, 102, 103 D, escala (MMPI), 462, 463- Dependência, 106, 133, 134, DF-E (Desenhos de Família com
Confusão 465, 469, 475 135, 424, 426 Estórias), 436, 437
conceitual, 534 D, escala 2 (MMPI), 482, 486, Depressão maior, 199, 200 DFH. Vide também Desenho da
Conhecimento semântico, 494, 503, 505 Depressão/ões, 178, 462-465, Figura Humana
569, 571 Dano/s 467, 476, 481-483, 484- Diagnostic Interview Schedule
Consciência, 68, 70 moral, 194, 195 486, 487, 488, 491, 495, (DIS), 48, 75, 83
alterações da, 68 psíquico, 194, 195 500, 501, 502, 505 Diagnóstico, 50, 401, 403,
intra e inter-entrevistador, Declínio dupla, 80, 81, 83, 84, 85, 86, 407, 408
78, 83 associado à idade, 179 87 clínico, 67, 77, 83
turvação da, 70 cognitivo, 177 mascarada, 87 nosológico, 67
Consistência interna, 159-162 associado à idade, 179, recorrentes, 53 diferencial, 49, 76, 80, 81,
Consortium to Establish a Re- 182 Desatenção seletiva, 68 83, 84, 87, 106, 107,
gistry for Alzheimer’s Di- normal, 177 Desejos, 431, 432, 436, 437 108, 118, 119, 121, 125,
sease (CERAD), 181 Defesa/s, 46, 49, 52, 53, 97, Desempenho (maturidade) 126, 137, 174, 178, 179
Construção absurda, 594 98, 100, 107, 111, 120, perceptomotor, 310-311, neuropsicológico, 174
Constructo/s 131, 132, 136, 389, 391, 315 psicodinâmico, 50
teórico/s, 158, 159, 164 393, 403, 405, 406, 409, Desempenho, 390, 396 sindrômico, 51
validade de, 159, 163, 164, 413, 418, 420, 454, 459, Desenho da casa, árvore e pes- Diferenças individuais, 19, 23,
165 465, 471, 473, 476-478, soa. Vide HTP 35
Contaminação (Z), 391-393 484, 485, 493, 495, 496, Desenho da Família, 218-220 Dificuldades cognitivas, 171
Contaminação, 361 501-505 Desenho da Figura Humana Dificuldades
Contemplação, 90-92, 93 mecanismo/s de, 399, 407, (1), 220-221 de cruzamento, 329
Conteúdo 410, 411, 415, 418, 420, Desenho da Figura Humana de fechamento, 330, 331,
escore de, 356, 357 466 (2), 222-224 333, 337
inquérito de, 353 sistema de, 458, 459 Desenho da Figura Humana de superposição, 329, 333,
latente, 402 Defesa/s. Vide também Me- sexo da figura, 511-512 336
manifesto, 402 canismos de defesa, 32, utilidade clínica, 507 na angulação, 333, 337
Conteúdos (Z), 388, 389, 391- 33 validade, 507, 508, 511 na curvatura, 329
399 Deficiência cognitiva, 177 Desenho/s Dígitos, subteste de, 182,
Conteúdos edípicos, 424-426 Déficit/s, 118 cinético, 517 274, 276, 280, 281, 282,
Contexto familiar, 60, 62 auditivo/s, 537, 567 da família, 436, 517 286
Contrato de trabalho, 121, cognitivo, 109, 172, 173 da casa, árvore e pessoa. Dinâmico
122, 123, 125 cerebrais, 543, 582 Vide HTP abordagem, 60, 66

670 JUREMA ALCIDES CUNHA


avaliação, 64, 65 E familiar, 146 3ª ed. (WMS-III), 285-288
da personalidade, 399, 406, inicial (ou primeira), 27, 45, de Memória Wechsler Revisa-
407 Edward’s Personal Preference 47, 53 da (WMS-R), 175
da personalidade, 428 Schedule. Vide Inventário lúdica, 66 de Merrill-Palmer, 243
entendimento, 57, 65, 66 Fatorial de Personalidade não-estruturada, 48 de observação do desenvol-
familiar, 63, 119, 124, 428, EFE. Vide Entrevista Familiar objetivo da, 45, 46, 48 vimento infantil, 154
437 Estruturada psicodinâmica, 49, 50 de psicopatologia, 314, 315,
inconsciente, 428 Ego, 409-413, 414, 415 psiquiátrica/s, 20 329, 330
Direito funções do, 57, 404 semi-estruturada, 48, 75, 76, de Stanford-Binet, 209
de família, 193 ideal do, 65 201 de Wechsler. Vide Escalas de
penal, 192 integração do, 407 sistêmica/s, 51 inteligência
Disartria, 71 Egossintônica com a fase, 423 técnica/s de, 48 do MMPI
Discalculia, 573 Eixo tipo/s de, 46, 48 Ad, de Admissão de sinto-
Discrepância, 92, 93 horizontal, 142 Envelhecimento, 177-179, 182 mas, 465, 466
Discrepâncias entre (WAIS-III) vertical, 142 Episódio/s depressivo/s, 127, clínicas, 447, 461-470
pares de Índices Fatoriais Elaboração, 296, 300, 329 133, 137, 138 CLS, de descuido, 445, 446,
(WAIS-III), 624 Elipse, 570 Episódio/s 461, 506
QIV-QIE (WAIS-III), 623, 625 Embelezamento, 321 depressivo maior, 80, 81, 82, D, de depressão (escala 2),
Disfonia, 71 Empatia, 92, 93 83, 84 482, 494, 503, 505
Disforia, 72, 132 Encaminhamento/s, 25, 26, hipomaníaco/s, 82, 84, 85, D, de depressão, 462, 463-
Disfunção (orgânica) cerebral, 27, 29, 30, 32, 45, 46, 47, 86 465, 469, 475
314, 320, 326, 332-333, 49, 50, 52, 58, 65, 105- maníaco/s, 82, 83, 84, 85 de caráter, 469, 478, 501-
339 108, 118-120, 123-126, misto, 80, 81, 82, 84, 85 505
Disfunção cerebral, 172, 173, 137, 171-174 Escala de Desesperança de de sintomas, 461, 502, 503
175, 526 motivos do, 27, 30 Beck (BHS), 227-229 de transtorno da persona-
Disfunção Encefalopatia/s tóxica/s, 174 Escala de Handler, 511 lidade, 134-136
cerebral, 565-568, 573, 579, Ensino, 75, 77, 78, 86, 87 Escala de Ideação Suicida de de Tryon, Stein e Chu, 136
580, 588, 593, 598 Entendimento dinâmico, 100 Beck (BSI), 229-230 de validade, 454-461
cognitiva, 584 Entendimento Escalas de desenvolvimento, de Wiggins, 136
Disfunção/ões da memória, dinâmico, 24, 27, 28, 57, 65, 154 Dn, de negação de sinto-
110 66 , 106, 115, 121, 124, Escalas de QI (WISC-III), 604, mas, 465, 466
Disfunção/ões 127, 133 605-606 D-O, 463, 464
do SNC, 180 Entrevista Clínica Estruturada Escalas Wechsler de Inteligên- Drev, 463
Disgrafia, 590 para o DSM-IV (SCID), 49 cia (WAIS-III), 615 D-S, 463, 464
Dislalia, 71 Entrevista Clínica Estruturada Escalas Wechsler, 22, 180-182 Ds, de dissimulação, 497,
Dislexia, 590 para o DSM-IV, 75 Escalas 500
Dispersão (ou discrepância) Entrevista Diagnóstica Adapta- aditiva, 159, 160, 162 ES, de força do ego, 441,
(WISC-III), 606 tiva Operacionalizada de avaliação da EFE, 226-227 500
entre índices fatoriais, 605 (EDAO), 49, 75 de Binet-Simon, 23, 208 especiais, 497, 498, 499
entre subtestes, 605, 606, Entrevista Estruturada para de Grace Arthur, 243 F, 441-442, 456-458, 484-
607-608 Diagnóstico de Demência de inteligência, 274-290 487, 491, 494-497, 502
Dissimulação, 188, 189 (ENEDAM), 181 Bellevue, 272, 280 F-K, 136
Distância das figuras, 513, 516 Entrevista Familiar Estrutura- Binet-IV, 208-211 Hs (escala 1), 483, 484,
Distimia, 72, 79, 83, 84, 85, da, 226-227 para adultos (WAIS), 274- 485, 503, 506
86 Entrevista lúdica, 96, 98, 99, 276 Hs, 462-463
Distorção, 184, 187-189, 321, 101-104 revisada (WAIS-R), 274- Hy (escala 3), 483, 491,
328 Entrevista Motivacional (EM), 276 501, 504, 505
Distorção/ões da forma, 306, 88, 95 3ª ed. (WAIS-III), 276-278 Hy, 465-467
309, 312 Entrevista/s, 20, 21, 35, 183- para crianças (WISC), 279- Hy-O, 466
Distração, 68 185, 187, 188, 190, 193 282 Hy-S, 465, 466
Distúrbios emocionais, 507 clínica, 45, 46, 47, 48, 49, revisada (WISC-R), 279- I-RD, de Distorção da Rea-
Doença de Alzheimer, 174, 50, 53, 54, 75 282 lidade, 136
591, 597 com pais, 64 3ª ed. (WISC-III), 282-284 K, 442-444, 458-459, 483,
Doença de Parkinson, 284 com terceiros, 197, 198 para pré-escolares (WPPSI), 491, 492, 502, 503, 506
Doença mental, 32, 33, 35, 36, conjunta, 63 279 L, 440, 441, 455-456, 487,
58 de anamnese, 50, 154 revisada (WPPSI-R), 279 492, 502, 506
Doença de devolução (devolutiva), de Koppitz, 309, 311, 312 Ma (escala 9), 481, 486,
física grave, 147 30, 47, 51, 52, 121, 122, de Likert, 159 492, 502, 504
mental, 24, 29, 147 123, 124, 125 de maturação (visomotora), Ma, 475-477
Dominância devolutiva (de devolução), 41 308-310, 312 Ma-O, 476
anômala, 176 de família, 52 de maturidade intelectual, Ma-S, 476
lateral, 175 de livre estruturação, 48 213, 215-216 Mf (escala 5), 492, 501,
manual, 175 de triagem, 50 de maturidade mental, 213, 506, 497
DSM-III, 21 diagnóstica/s, 25, 50, 79, 83 215-216 Mf, 468-471
DSM-III-R, 35, 36 dinâmica, 64 de maturidade social. Vide Não posso dizer, “?”, 439-
DSM-IV, 22, 35, 36, 37, 75, 77, epidemiológica, 48 Vineland 440, 454, 455
78, 83, 106, 119-121, estruturação da/s, 75 de medida, 166 óbvias, 488, 497
125, 136, 138, 179, 188, estruturada, 20, 25, 48, 75, de memória (WMS), 285-288 Pa (escala 6), 484, 486,
480, 498, 499 77, 78, 83 revisada (WMS-R), 285-288 489, 494, 495, 502, 504

PSICODIAGNÓSTICO – V 671
Pa, 471-473 Estimulação precoce, 154 437, 378, 382, 384, 385, G
Pa-O, 472 guia curricular para, 154 422, 423, 425-427, 430-
Pa-S, 472 programas individuais de, 431 Ganho/s
Pd (escala 4), 484, 485, 154 análise de, 104 primários, 59
486, 487, 488, 492, 495, Estratégias facilitadoras, 156 Fase edípica, 104 secundário/s, 59
501, 502, 504, 505, 506 Estresse, 35, 63, 457, 460, Fator g, 529 Generabilidade, 77
Pd, 467-468 461, 462, 465, 467, 468, Fatores Genetograma, 60, 143, 144,
Pd-O, 468 482, 483, 484, 485, 488, de personalidade, 222, 224- 145, 147-150
Pd-S, 468 495, 500, 503, 506, 497 226, 242-243 construção do, 146
Pt (escala 7), 481, 495, Estressor, 83, 84 G, 237, 250, 251, 271 Gerações, 143, 147-149
496, 503 Estressores, 32, 33 de proteção, 151, 152, 153, Goodenough-Harris, teste de,
Pt, 473-474 Estrutura familiar, 143, 147, 154 221
Sc (escala 8), 484, 487, 150 de risco, 151, 152, 153, 154
491, 495, 503, 504 Estruturação das entrevistas, Fechamento, 295, 298, 299
Sc, 474-475 75 dificuldades de, 329, 331- H
Si (escala 0), 495, 502 Ética/s, 45, 47, 55, 56 333, 336, 329
Si, 477-479 Código de, 121, 122 falta de, 321 Hemisfério
suplementares, 136 implicações, 122 Feedback, 89, 93-94 Cerebral, 543
sutis, 488, 497 profissional, 125 Fenômeno, 115 direito, 563, 573, 573, 578,
Merrill-Palmer, 154 Euforia, 394 transferencial, 41 579, 584, 586, 587, 590,
Weschsler, 172, 175 Evitação fóbica, 78 contratransferencial, 42 591, 594, 595, 598
Escola Wechsler de Memória III Evocação retardada, subteste Fenômeno/s especial/is (Z), esquerdo
(WMS-III), 181 de, 286 388, 391, 397 Herói (Murray), 401-407
Escolha de brinquedos e jogo, Evocação, 69 Fenômenos afetivos, 72 Herói principal (Bellak), 413-
100, 101 Exame do Estado Mental, 181 Fidedignidade, 77, 78, 83, 115, 415
Escore (sistema) Exame psiquiátrico, 74 158-162 Hipocondria, 483-484
da Escala da Maturação, 308 Exame tipos de, 160, 161 Hipótese/s
de Koppitz, 306 criminológico, 192, 192 Figura/s em quadros, 296, 300 diagnóstica/s, 400, 483, 487
de Santucci-Percheux, 302 das funções do ego, 28, 127 Figuras Complexas de Rey, inicial/is, 26, 28, 30, 109,
Escore de atribuição (MMPI), do estado mental, 28, 30, 57, 230-232 118, 126, 134, 135, 136
442 65, 172 Figuras-símbolos, 143 História relacional, 51
Escore/s no Rorschach, 342-344 Fixação, 67, 69 História
bruto/s, 166-168, 170 objetivos do, 27, 28, 30, 31, Flexibilidade mental, 178, 596 clínica, 26, 28, 30, 57, 58, 60,
crítico, 330 60, 66, 105, 106, 107, Fluência verbal, 181, 182, 563, 65, 106, 116-120, 124,
de Lacks, 337 108, 110, 113, 116-118, 580 127, 136, 137, 442, 484,
marginal, 330 121, 122-125 Fobia/s, 73, 473, 487, 495 487, 489
padronizado/s, 166-170 psicológico, 23, 29, 31 Forma/s conjugal, 62, 63
percentílicos, 167 precoce da criança, 151 do conceito, definição da, da doença atual, 57, 58
T, 168-170 subjetivo, 28, 30 359 do caso, 121
Z, 168-170 retrospectivo/s, 196 escore da, 355 do estado mental, 57
Escuta, 52, 53 Expansão, 297, 300, 321 inquérito da, 351 do paciente, 480
Especificações, 343, 348-351, Explicação psicodinâmica, 171 Formas reduzidas (WISC-III), escolar, 62
359, 361-363 Extensão espacial, subteste de, 610-612 ocupacional, 63
Especificidade, 165-166 278, 286 Fragmentação (ou tendência pessoal. Vide também Anam-
Esquizofrenia, 35, 49, 79, 82, Externalização, 410, 411, 472 à), 313, 314, 329, 330, nese, 57, 58, 59, 60, 106
83, 137-138, 142, 199, 333-335, 336 pré-natal e perinatal, 60
200, 474, 479, 481, 484, Fuga de idéias, 71 da primeira infância, 60
487, 488, 491, 495, 496, F Fuld Object Memory Evalua- da infância intermediária,
497, 502, 565, 566, 570, tion (FOME), 181 61
575, 576, 577, 582, 584, Fábula/s Função catártica, 426 da pré-puberdade, puber-
585, 592 de Despert, 262 Função/ões dade e adolescência, 62
paranóide, 471, 472, 487, F1, do Passarinho, 421-427 cognitiva/s, 100, 171, 173, da vida adulta, 63
493, 494, 495 F2, do Aniversário de Casa- 175, 530, 547, 562 pessoal, 26, 28, 30
Estado/s mento, 424-427 do ego, 70, 106, 127, 130, pregressa, 59
de crise, 500 F3, do Cordeirinho, 423, 424, 136, 563, 568, 580, 587, Homicídio, 494
de fuga, 490 426, 427 602 Homossexualidade, 469, 492
de pânico, 496 F4, do Enterro, 426 do juízo, 579, 580, 582, 588, Hora de Jogo Diagnóstica, 428
depressivo, 495 F5, do Medo, 426 600 Hora de jogo. Vide também
hipomaníaco, 502 F8, do Passeio, 424-427 do superego, 391 Entrevista lúdica, 98-100,
maníaco, 484, 495 Teste das, 262-265 executivas, 173, 180 104, 111
paranóide, 495 Fadiga, 113, 125 receptivas, 173 diagnóstica, 98, 99, 102
psiquiátrico, 500 Família, Desenho da, 218-220 defensiva, 503 terapêutica, 98
Estados emocionais, 423, 424, Família/s, 141 psíquica, 71 Hostilidade, 468, 473, 483,
426 de origem, 141 Funcionamento cognitivo, 484, 485, 486, 487, 489,
Estanino/s, 169, 170 disfuncionais, 142 177, 179 490, 495, 504
Estereotipia(Z), 393 organização da, 141 Funcionamento familiar, 142, HTP
Estereotipia, 101 saudável, 142 143, 148, 149, 150 administração, 519
Estimativa do nível formal, Fantasia/s, 39, 41, 43, 46, 51, Funções impressão geral, 520, 523
349, 350, 359-363 52, 52, 53, 97-104, 196, egóicas, 431 interpretação, 519-523

672 JUREMA ALCIDES CUNHA


simbolismo, 519, 523 indicadores psicopatológi- Instrumentos Específicos de K
HTP. Vide também Desenho da cos, 222 Avaliação Forense, 185
casa-árvore-pessoa, 112, Indicadores, 419 Integração, 312, 314 KFD, 219
114, 127, 134, 135 de atuação, 315, 321 Intelectualização, 42, 570, Kit “Brinquedos e Brincadei-
Http, 232 de depressão (CAT), 419 572, 573, 579, 583 ras”, 155
acromático, 232 de esquizofrenia (CAT), 420 Inteligência, 68, 71, 72, 390, Kohs, 243-245
cromático, 232 de Hain, 320 391, 393, 395, 398 Koppitz, sistema de, 204
Humor de impulsividade, 321 cristalizada, 552, 557, 564,
deprimido, 80, 81, 82, 83, de Koppitz, 300, 309, 314 574, 580 L
84, 85 de lesão cerebral, 311, 330 fluida, 552, 557
elevado, 82, 83, 84 de patologia orgânica cere- pré-mórbida, 569 Labilidade afetiva, 73, 83
expansivo, 82, 83, 84 bral, 311-313 social, 574, 586, 588 Labirintos, subteste de (WISC-
hipomaníaco, 84, 85 de perturbação emocional, Intenção III), 604
irritável, 80, 81, 82, 83, 84 295 de autodestruição, 197, Labirintos, subteste de, 280,
maníaco, 84, 85 de tendências maníacas 198 281, 282, 288
misto, 84 (CAT), 419 letal, 196 Lâminas do TAT, 400, 401, 404,
sintomas de, 83 emocionais, 296, 300, 314, suicida, 196 406, 407, 411
Hy, escala, 465-467, 483, 491, 318-321, 508, 509 Intencionalidade, 197, 198, específicas, 412, 413
501, 504, 505 evolutivos, 508, 509 199, 200, Fig.18-a femininas, 412
preditivos, 156 Interação clínica, 41, 43, 44, masculinas, 412
Índice de Memória Geral, 175 107, 115, 119 universais, 412
I Índice Interação/ões clínica/s, 57 Laudo, 25, 30, 58, 60, 64, 66,
AI, 500 Intergeracional, 142, 143 185, 186, 187, 188, 190-
Id, 409, 410, 414, 415 AV, 500 Internalização, 584 192, 195
IDATE, 232-235 de Goldberg, 487 Interpretação (Z), 388-389 Lesão cerebral, 173, 176, 330,
IDATE-C, 235 F-K, 136, 451, 457, 461, 506 Intervenção em crise, 76 568, 569, 581, 591
Ideação suicida, 77, 80, 81, IR, 500 Intervenção, 151-156 Letalidade, 199, 200, Fig.18-a
205, 227, 229-230, 322, ME, 448 Introjeção, 425 Limites, teste de, 343
330, 326, 487, 488, 505 TR, 454, 457, 460-461, 506 INV, 236-238, 271 Linguagem corporal, 39
Ideal de ego, 65, 411, 412 TR+CLS, 136 Inventário Cumulativo de Esti- Linguagem lúdica, 97
Idéia TR e a Escala de Descuido, mulação Ambiental Linguagem, 68, 71, 122, 123,
de auto-referência, 391-392 445-446 (ICEA), 154 126, 130, 131, 138, 178-
de referência, 391-392, 471, Índices de WMS, 204, 287 Inventário de Ansiedade de 180, 181
472, 492, 494, 505 Índices fatoriais (WAIS-III), Beck (BAI), 238-239 Linha
Identidade, 457, 469, 470, 615, 621 Inventário de Ansiedade Traço- densa, 315
474, 476, 492, 494, 505 ICV, 623 estado. Vide IDATE fina, 298, 299, 300
do receptor, 121-123, 125 IMT, 624 Inventário de Depressão de ondulada, 298-300
Identificação com o herói, 422 IOP, 624 Beck (BDI), 239-242 Lista de Palavras, 182
Identificação do paciente, 40, IVP, 624 Inventário de Depressão de Lobo frontal, 587
41 Índices Fatoriais (WISC-III), Beck. Vide também BDI, Localização
Identificação sexual, 511 604, 606-607 22 escore de, 349, 351, 353
Identificação Infantilismo, 394 Inventário Fatorial de Persona- inquérito de, 350
da unidades de escore, 347 Inferência clínica, 27, 28, 109, lidade (IFP), 242-243 Localização/ões
Idosos, 177-180, 181, 182 118 Inventário Multifásico Minne- Atlas de, 390
Imagem corporal, 510 nível de, 26, 27, 30, 118, sota de Personalidade.
Imagem de si mesmo, 449, 119, 121 Vide MMPI
460, 461, 497 Informação, subteste de, 110, Irritabilidade, 395 M
Implicações terapêuticas 274, 276, 278, 281, 286, Itens
(MMPI), 462, 464, 467, 288 críticos, 456, 465, 479, 488, Ma, escala (escala 9) (MMPI),
468, 470, 471, 473, 475, Informe 496, 500-501 481, 486, 492, 502, 504
477, 479, 482-497 sistemático, 124, 125 Ma, escala (MMPI), 475-477
Impotência vs. onipotência, tipo de, 107, 121, 124 Manejo
423, 424 Iniciativa, 393-396 da agressão, 504-505
J
Impotência, 333, 336, 337 Inquérito (Bellak), 412, 413, da ansiedade, 503
Impressão geral do desenho, 415 Manual de Diagnóstico e Esta-
513 Inquérito, 341-344, 344, 346- Jogo de Rabiscos, 428 tística de Transtornos
Impulsividade, 130, 321, 394, 357 Jogo, 60, 61, 62 Mentais , 75
468, 546, 563, 574, 575, Insight, 58, 398, 400, 404, atividade do, 97 Manutenção, 90-92, 93, 95
576, 578, 580, 585, 588, 455, 456, 458-460, 461, hora de, 98-100, 104 Material de teste, 114, 115, 133
598 462, 466, 467, 469-471, sala de, 98 Material lúdico, 98, 99
Impulso/s, 393, 394, 431-432, 473, 542, 545, 583, 589 técnica do, 97 Matrizes Progressivas, teste
436, 476, 477 Instruções do teste, 113, 115, Jogos estruturados de Lynn, das. Vide Raven
controle dos, 467, 488, 489, 131 154 Maturidade visomotora, 301
492, 495, 504 Instrumento/s Juízo, 70, 71 ME (média dos escores) (MMPI),
Impulsos do id, 101 cognitivos, 45 prático, 584 448
Indicadores (ou itens) de medida, 159, 162, 165 social, 573, 600 Mecanismos de defesa, 120,
emocionais, 223 projetivos, 45 Julgamento clínico, 34, 35, 76, 131, 431, 432, 436, 437,
evolutivos, 221 qualitativos, 159 77, 83, 87 466, 478, 501-503
indicadores psicológicos, 222 quantitativos, 158 Julgamento, 179, 180 arcaicos, 492

PSICODIAGNÓSTICO – V 673
Média, 167-170 metapsicológico, 20 de funcionamento da perso- P
Mediana, 167 psicométricos, 428 nalidade, 110, 121
Médico legista, 197, 198, 201 psicológico, 23, 29, 30, 31, de inteligência, 105, 130 Pa, escala (MMPI), 471, 473,
Medo/s, 454, 473-474, 477 57, 118 de inferência, 118, 119, 121 484, 486, 489, 494, 495,
Memória de Trabalho (WISC- qualitativo, 172 de projeção, 516 502, 504
III), 607 quantitativo, 172 do conteúdo, 515, 516 Paciente identificado, 143-147
Memória Lógica, subteste de, teórico/s, 20, 21 fantasmático, 379, 380, 380 Padrões
182 Modo da morte, 196, 197, 198 formal, 131 de funcionamento, 148, 149
Memória Motivação, 199, 200 gráfico, 515 de interação, 142, 148, 149
auditiva, 572, 573 ausência de, 89 lúdico, 111 de organização, 148, 149
comprometimento, 113 conceito de, 88, 89 perceptivo, 379 familiares, 143, 146, 150
de Figuras, 286 inconsciente, 399 psicótico, 110 sintomáticos, 150
de Trabalho, índice de, 276, para a mudança, 88, 93 Normas éticas, 121, 154 transacionais, 141
532 Motivational Enhancement Normas, 141 vinculares, 150
déficit, 110 Therapy (MET), 88 Papel do psicólogo, 38, 42, 43,
desorganização, 535 Motivational Interviewing (MI), 99
disfunção, 110 88 O Paranóia, 87
escala de. Vide WMS, WMS- Motivo/s (Murray), 402-403, Parecer/es, 30, 107, 121, 124,
R, WMS-III 405-406 Objetividade, 390, 391, 396 125
Geral, índice de, 286 aparente, 40 Objetivo/s Pares Visuais Associados, sub-
imediata, 555, 567, 572, 573 conscientes, 38 da avaliação, 42, 109, 110 teste de, 292
incidental, 597, 598 defensivos, 60 de entendimento dinâmico, Passos para manejo (MMPI),
Lógica, subteste de, 286 do encaminhamento, 118- 106 441-453
preservação, 567 120, 126, 137 de prevenção, 106 Pátrio poder, 187, 191, 192
psicomotora, 598 explícitos, 40, 58 de prognóstico, 106 Patte Noir, 211
remota, 564, 566, 580, 584 inconscientes, 38 diferencial, 127 Penetração, 322
Verbal, índice de, 286, 600 subjacentes, 63 do psicodiagnóstico, 40, 44, Pensamento, 68, 70, 173
Visual, índice de, 286, 583, Motricidade, 100, 102 106, 107, 110, 111 abstrato, 130, 569, 574, 579,
584 MPAS, 24 forenses, 106 580, 581, 591, 600
Visual, subteste de, 286 Mudança Objetivos do psicodiagnóstico, bizarro, 474
Memória, 68, 69, 171, 173, associadas à idade, 180 23, 26, 30, 64 bloqueio do, 71
175, 178-181 de tamanho, 295, 297, 300, de avaliação compreensiva, concreto, 565, 567, 569,
alterações da, 69 315 27, 28 575, 576, 577, 580, 582,
dimensões da, 69 estágio/s de, 89, 90, 92, 93 de classificação 590, 594, 595
Menu (recaída), 93 motivação para, 88, 93 nosológica, 27, 28 conceitual, 130, 136, 581,
Método na angulação, 295, 298, 299 simples, 27 582, 591, 592
das Fábulas, 262 na curvatura, 295, 298, 299 de descrição, 27, 28 confuso, 474, 488
das formas paralelas, 160, plano de, 93, 94 de entendimento dinâmico, delirante, 472, 491
161 processo de, 88-92, 93 27, 28 desagregação, 71
das metades, 160, 161 prontidão para, 89, 92 de perícia forense, 27, 28 desorganização do, 472,
do teste-reteste, 160, 161 Mutilação, 298, 299 de prevenção, 27, 28 475, 496, 563
Mf, escala (MMPI), 468-471, de prognóstico, 27, 28 esquizóide, 474
492, 501, 506 diferencial, 27, 28 extravagante/s, 535
Mini-Exame do Estado Mental N Obnubilação, 68 fluidez do, 584
(MEEM), 181, 182 Observação inibição do, 71
Minnesota Multiphasic Perso- Não posso dizer, “?”, escala direta, 83 infantil, 104
nality Inventory. Vide (MMPI), 454, 455 participante, 154 lógico, 70, 131, 136, 391,
MMPI National Institute of Mental por meio de vídeo, 83 396, 575, 576
Miocinético, teste. Vide PMK Health (NIMH), 77 por sala de espelho, 83 mágico, 70, 132, 503
Mitos, 141, 142 Necessidade/s (Bellak), 409, sobre o comportamento, 136 obsessivo, 473
MMPI, 22, 24, 112, 113, 125, 411, 413-415 Omissão, 321, 514, 516, 517 organização, 568, 569
127, 131-132, 136, 137, Necessidade/s (Murray), 399, Oposicionismo, 131 patologias do, 70
245-247 402 Organização do ego, 365 perseveração do, 71
MMPI-2, 245 Necessidade/s, 70, 71, 72, 73, Organização grafoperceptiva, primário, 582
MMPI-A, 245 380, 382, 384, 385 302, 303, 305 processos de, 488, 544, 568,
Mobilização afetiva, 421, 426 Negação, 124, 406, 418-420, Organização Perceptual (OP) 569, 570, 582, 588
Modalidade de brinquedo, 427, 456, 459, 460, 461, (WISC-III), 603, 604, 606 rigidez do, 567, 582, 583
100, 101 465-467, 469, 476, 477, fator de, 283 seqüencial, 586, 600
Modelo 481, 482, 485, 486, 495, índice de, 276, 288 tangencial, 496
categórico, 28, 35, 121 497, 501, 502 Organização, 390, 391 transtornos do, 115, 137,
conceitual, 25 Neuropsicologia, 172, 174, afetiva, 131 138, 487, 491, 495, 531,
de avaliação, 23 176 das defesas, 132 565, 570
de avaliação psicológica, 19 Neurose de transferência, 97 espacial, 590 Pequeno Hans, 96
de Murray, 399 Nível/eis perceptual, 551, 554-555, Percepção autista, 410, 411
de psicopatologia, 35 abstrato, 580 587, 589, 593, 600-602 Percepção subjetiva do idoso,
dimensional, 21, 35 conceitual, 580 visoespacial, 592 179
estatístico, 119 concreto, 565, 580 visoperceptual, 594 Percepção visomotora, 306, 308
médico/s, 24, 29, 35, 58, das estruturas formais, 515 visual, 586, 588 Percepção, 131, 132, 133, 379,
118, 121, 428 de ansiedade, 110, 136 Orientação, 68, 69, 70 380, 410, 415

674 JUREMA ALCIDES CUNHA


errônea, 591 Potencial suicida, 465, 488, judicial, 183 Regras, 141, 142, 148, 149
espacial, 596 489, 505 Psicometria, 171, 174 Rejeição, 426, 427
Perda/s, 416, 418-420 Praxia, 180, 181 Psicomotricidade, 102 Relação profissional, 45, 46
Perfil (WISC-III) Precipitadores e/ou estresso- Psicopatologia Relatório, 30
ACID, 609 res, 199, 200, Fig. 18-a subjetiva, 22, 33 Renard Diagnostic Interview
SCAD, 609-610 Precisão Psicopatologia, escala de, 329, (RDI), 75
Perfil de classificação diagnóstica, 330 Reparação, 398
no MMPI, 442-445 76 Psicose breve (reativa), 83 Repassamento, 298-300, 328,
validade do. Vide também diagnóstica, 77 Psicose de Korsakoff, 569, 598 238
Escalas de validade, 447 Pré-contemplação, 90, 93 Psicoterapia breve, 400 Representação/ões simbólica/s,
Perguntas iniciais. Vide tam- Preditores de altas habilidades, Psicoterapia infantil, 97 514, 516, 517
bém Hipóteses iniciais, 156 Pt, escala (MMPI), 481, 495, Repressão, 132, 391, 394, 405,
106, 107, 122, 126, 134, Present State Examination 496, 503 425, 426, 456, 481, 482,
135 (PSE), 75 490, 501-505
Perícia psicológica Pressões (Murray), 399, 402, Reprodução Visual, subteste
destituição de pátrio poder e, 403, 405-407 Q de, 286
187, 191, 193 Pressupostos psicodinâmicos “Resiliência”, 151-154
ética e, 187, 191, 192 (ou psicanalíticos), 106 QI (WAIS-III), 622 Resistência à Distratibilidade
exame criminológico e, 192 Prevenção, 151, 196, 201 QI (RD) (WISC-III), 603, 604,
informe pericial, 187 Problema/s significação do, 529, 530 554, 555, 572-573, 596,
instrumentos de medida na, ambientais, 35, 36 QIE (WAIS-III), 622, 623 597
185 definição de, 33 QIT (WAIS-III), 622 Resistência, 38, 39, 41, 42, 46,
papel do psicólogo na, 186, psicossociais, 35, 36 QIT, 547-551 52, 54, 89, 90, 92, 94,
191 Problemas de aprendizagem, QIV (WAIS-III), 622, 623 184
reincidência, 191, 192 507 QIV-QIE (WAIS-III), 623 Responsabilidade/s, 89, 93, 95
Perseveração (Z), 391, 393 Procedimentos de Desenhos- QIV-QIE, 550-553, 558, 587 Resposta/s
Perseveração/ões, 101, 298, Estórias, 248-249 Qualidade absurda/s, 535, 563, 564
299, 307-309, 312-314, Procedimentos opcionais no da/s medida/s, 22, 158 bizarra/s, 564
321, 329, 330, 333-336, WAIS-III, 616-617 metodológica, 21 caótica/s, 582
571, 579, 594 Processo/s psicométrica, 21 circunstancial/ais, 570
Personagem, valorização do, avaliativo, 43 dos testes diagnósticos, 165- confabulatórias, 570
516, 518 de separação-individuação, 166 classificação da/s, 342, 349,
Personalidade 422 Questionário de Saúde Geral 353-359
anti-social, 495 defensivos, 43 de Goldberg (QSG), 249- de posição (Z), 391
borderline, 475 demencial/ais, 174, 178 250 desorganizadas, 582
esquiva, 489 diagnóstico, 24, 38, 42 Questionário dos 16 Fatores de desviante/s, 571
esquizóide, 488, 494 inconscientes, 42 Personalidade. Vide De- errônea, 535
histriônica, 461, 466 perceptivo/s, 379 zesseis PF estereotipada/s, 580, 582
narcisista, 461 psicótico, 473, 473, 487, 490 Questionários extravagante/s, 573
paranóide, 494 psicodiagnóstico, 38, 39, 41, estruturados, 159 idiossincrásicas, 563
passiva-agressiva, 490, 493 58 semi-estruturados, 159 inusitadas, 533, 563, 564
psicopática, 467, 469, 476 Procurar Símbolos, subteste de Questões personalizada/s, 570
Personificação, 100, 102, 103 (WAIS-III), 603, 604, 606, descritivas, 174 perturbada/s, 582
Personologia, 399, 400 616, 620 diagnósticas, 174 populares, 295, 298, 299,
Pfister, teste de. Vide Pirâmides Procurar Símbolos, subteste psicodinâmicas da fase, 64, 65 307, 309, 312-314
coloridas de, 282 tangencial/ais, 570
Phillipson, teste de. Vide Rela- Produção, 390 vagas, 570
ções Objetais, teste de Prognóstico, 27, 28, 87, 105, R Retardamento mental
Pigem, teste de. Vide Teste De- 106, 118-120, 124, 134, Retrato gráfico, 143
siderativo 135, 151, 156 Raciocínio analógico, 272 Retrogressão, 329, 333, 336
Pirâmides coloridas, teste das, Projeção invertida, 410 Raciocínio Matricial, subteste Revisão geral dos sistemas e
265-266 Projeção simples, 410 de (WAIS-III), 276, 616, funções, 180
Planejamento, 390, 393 Projeção, 142, 409, 472, 487, 620 Rigidez, 98, 101
Plano de avaliação, 26, 28, 30, 490, 493, 502, 504 Raciocínio/s, 70 Rorschach temático
106-111, 113, 127, 158, Projeto MATCH, 88, 93 lógico, 391, 393 estudos em
180 Propriedades psicométricas do Racionalização, 406, 425-427 crianças, 379-380, 383,
Plano de mudança, 93, 94 WAIS-III, 616-617 Rapport, 42, 82, 114, 115, 385
Plano de tratamento. Vide Propriedades psicométricas, 122, 344, 387, 388 imigrantes, 380, 382
também Planejamento 158 Rasura, 298, 299 sujeitos com AIDS, 384
do tratamento, 119 Psicodiagnóstico miocinético. Raven, 250-253 sujeitos com candidíase
Plasticidade, 101 Vide PMK Reação transferencial, 120 vaginal, 382
PMK, 248 Psicologia Realidade Rorschach, 218, 253-258
Posição clínica, 45, 48, 75, 76, 183 sentido de, 131 aplicação (Exner), 369, 370
do papel, 329 do desenvolvimento, 45, 100 teste de, 131, 134,135, 134- atividade organizativa (Ex-
do primeiro desenho, 329 do ego, 97 136, 137, 367 ner), 368, 369
na família, 514 evolutiva, 102 Recaída, 91-93 auto-estima, 374, 376
Positive and Negative Symp- experimental, 183 Receptor, 121-125 autopercepção, 376
toms for Schizophrenia forense, 75, 76, 183 Recomendações terapêuticas, 87 códigos especiais (Exner),
(PANSS), 49, 75 hospitalar, 49, 50, 75 Reconhecimento, 68, 69 372-377

PSICODIAGNÓSTICO – V 675
Combinação fabulada (FA- reflexos, 371 expressos, 431, 432, 436 Situação-problema, 421
BCOM), 373 resposta/s Seqüência de Letras e Núme- SNC, 171, 173, 174
Combinação incongruente classificação das (Exner), ro, subteste de, 276 SOCRATES, 93
(INCOM), 373 370-374 Seqüência de Números e Le- Solidão, 424, 426
Confabulação (CONFAB), de cor (Exner), 371 tras, subteste de (WAIS- Sombreamento, 509, 510
374 de forma-dimensão (Ex- III), 616, 619-620 SSCT (Sacks Sentence Comple-
Contaminação (CONTAM), ner), 371 Seqüência, 329 tion Test). Vide Comple-
373 de movimento (Exner), Setting, 47, 49 tamento de Sentenças
Conteúdo abstrato (AB), 371, 374 Sexualidade infantil, 96 Stanford-Binet, escala. Vide
374 de pares (Exner), 372 Sigilo profissional, 105, 121, Binet IV
Conteúdo mórbido (MOR), de reflexo (Exner), 372 124 Sublimação, 501
374, 376 de sombreado (Exner), 371 Simbolismo, 103 Sucessos da vida, 150
Fenômeno especial de cor desviantes (Exner), 373 Símbolos, subteste de, 143, Suicídio, 196-201, 229, 324,
(Cp), 374, 375 localização das (Exner), 146-149, 274, 276, 280 501
Lógica inadequada (ALOG), 370 Simplificação, 298, 299, 313, avaliação da história, 75
373 número das (Exner), 370, 314, 329, 333, 336 idéias de, 227, 229, 230, 464
Movimento agressivo (AG), 373-375 Simulação, 187, 188, 189 risco de, 124, 131, 136, 228,
374, 376, 377 personalizadas (Exner), 374 “Sinais de alerta”, 151-154, 230, 486, 488, 496, 505
Movimento cooperativo populares (Exner), 370, 372 155, 156 risco de tentativa de, 75
(COP), 374, 376 RIAP, 377 altas habilidades, 151, 155, tentativa/s, 486-488, 490,
Perseveração (PSV), 374, suicídio, 376 156 494
377 sumário estrutural (Exner), deficiência mental, 156 tentativa de, 126, 229, 230
Respostas desviantes (DR), 374-376 Sinal/ais, 32, 33, 34, 45, 50, Suicidologia, 201
373 variável/eis chave (Exner), 51, 68 Superdotação, 151
Respostas personalizadas 377 de alerta, 34 Superego, 65, 409, 411-413,
(PER), 374 verbalizações de Brown, 323 414, 415
Verbalizações desviantes desviantes (Exner), 373 de Hutt-Briskin, 333 desenvolvimento do, 420
(DV), 373 inusuais (Exner), 372, 374 de penetração, 322, 324 forças do, 402
combinações inadequadas, Rorschach, teste de, 24, 110, de perturbação, 62 sanções do, 402
373 112, 114, 115, 117, 127, de Sternberg e Levine, 323, severidade do, 418, 420
confabulação, 374 131, 133, 134-137 326 Superelaboração, 570
conteúdo/s, 372 Rotação, 321, 328, 329, 330, simbólicos de agressão, 326 Superinclusão, 570
abstrato, 374 332, 333, 334, 335 Síndrome/s, 34, 36, 50, 51 Superposição, 298, 299, 321,
idiossincrático, 372 agudas e crônicas, 451-452 322, 329, 330, 333, 336
mórbido, 374 Síntese dinâmica (Murray), 401 Supervisão (prática supervisio-
projetivo, 377 S Síntese interpretativa (CAT), nada), 47, 55, 56
déficit relacional, 376 420 Supressão (mecanismo de),
depressão Saúde Geral. Vide Questioná- Síntese, 68, 70, 71 501
constelação da, 376 rio de Saúde Geral Sintoma/s, 32, 33, 34, 35, 36, Szondi, 24
índice de, 376 Saúde mental, 32, 33, 35, 36, 45, 49, 50, 51, 54, 68, 73,
determinantes (Exner), 371- 75, 76, 77, 78, 83 150
372 Sceno-test, 258-259 admissão de, 58 T
dinâmica aplicação familiar do, 258 aparecimento de, 62
da personalidade, 377 Schedule for Affective Disor- de humor, 83, 84 Tamanho, 513, 514, 516, 518
distorção/ões ders and Schizophrenia demenciais, 171, 182 aumentado, 297, 300, 315,
perceptivas (Exner), 377 (SADS), 75 emergentes, 57, 58 321
esquizofrenia, índice de (Ex- SCID, 75-79, 83-87 especiais, 61 diminuído, 297
ner), 376 SCID-B/C, 78 na adolescência, 65 irregular, 297
estilo obsessivo, 376 SCID-II, 78 obsessivo-compulsivos, 60 pequeno, 300
estresse SCID-NP, 78 psicóticos, 80, 81, 83 redução de, 321
situacional, 375 SCID-P, 78 psiquiátricos, 77 TAT (Thematic Apperception
tolerância ao, 375 Screening, 179, 181 pré-adolescentes, 65 Test), 112, 127, 131-133,
hipervigilância, 376 Segredos, 142 Sistema disfuncional, 143 136, 137, 218, 259-262,
ideação, 373, 375 Segunda tentativa, 295, 297 Sistema legal, 183 378, 380, 385
interpretação (Exner), 376- Self ideal, 523 Sistema nervoso central. Vide TDM, 83, 84, 86
377 Semelhanças, subteste de, também SNC, 68, 71 Técnica/s
mediação, 375 274, 276, 278, 281, 288, Sistema auto-administrada, 112
pares (Exner), 370-372, 376 289 de Koppitz, 221 de associação livre, 378
pensamento, 373, 375 Senescência normal, 178, 180 de Naglieri, 221 de Zulliger, 386
percepção, 372, 375-377 Sensibilidade, 165-166 Sistemas de escore gráficas, 110, 111, 137
perseverações (Exner), 377 Sensibilização, 410 de Billingslea, 326 projetivas, 20, 22, 35, 108,
processamento (Exner), 375 Sensopercepção, 68 de Hain, 331 110-112, 116, 132, 154,
projeção transtornos da, 68 de Hutt, 326, 329 159, 300, 301, 429, 431,
de cor (Exner), 374, 375 Sentenças, subteste de, 288 de Pascal e Suttell, 326, 327, 437
qualidade Sentimentos 328 psicanalítica, 96
evolutiva (Exner), 370, 371, derivados Situação psicológicas, 121
375 do conflito, 432 clínica especial, 114 psicométricas, 109
formal (Exner), 370, 372, do instinto de vida, 432 de testagem, 115, 116 Tema (Murray), 402, 404-407
375-377 do instinto de morte, 432 padronizada, 115 Tema principal (Bellak), 413

676 JUREMA ALCIDES CUNHA


Tendência/s (Murray), 401, de Harris, 221 borderline, 83 mentais, 75, 76, 77, 78, 120,
402, 405-406 de inteligência não-verbal. ciclotímico, 82, 86 121
Tendências, 431, 432, 436, 437 Vide INV classificação dos, 24, 29 mental/is, 29, 32, 35, 36,
Teoria da personalidade, 118, de Nathan e Mauco, 211 conversivo, 482, 483 147, 313, 469
119, 399 de Pfister. Vide Pirâmides de abuso de álcool, de dro- misto de ansiedade e depres-
Teoria/s sistêmica/s, 45 Coloridas, teste de gas, de substâncias, 484, são, 21
Terapia familiar, 143 de Phillipson, 266 486, 490, 493, 495 neurótico/s, 487
Terceira idade, 426, 427 de realidade, 131, 134, 135, de ajustamento, 84, 86, 296, no desenvolvimento neuro-
Testagem, 107, 108, 110-113, 134-136, 137 300, 458, 479, 486, 487, psicológico, 301, 311,
115-116, 119, 120, 122, de Relações Objetais, 266, 490, 495 312-314
124, 126, 127, 131, 132, 267 de alimentação, 79 obsessivo-compulsivo, 79,
136, 137 de Rey. Vide Teste da Figura de ansiedade, 21, 79, 473, 461, 473, 496
Testagem, tempo de (MMPI), Complexa de Rey 479, 481, 484, 487, 493, orgânicos, 24
441-442 de Rorschach. Vide Ror- 495, 496 psicótico/s, 79, 82, 83, 84
Teste Comportamental de Me- schach de caráter, 467 psiquiátricos, 24, 33
mória de Rivermead, 181 de Frustração, 259 de conduta, 300, 457 relativos ao uso de substân-
Teste das Fábulas, 213-214, Desiderativo, 270-271 de estresse agudo, 35, 79 cias, 79
262-265 diagnósticos, 165-166 de estresse pós-traumático, somatoforme/s, 79, 479,
Teste das Pirâmides Coloridas, do Bestiário, 270 35, 79 481, 484, 491
265-266 estruturados, 115, 119, 130 de humor, 488 Treinamento prático, 83
Teste das Relações Objetais, Guestáltico Visomotor. Vide de pensamento, 115, 137, Treinamento, 46, 47, 55, 56
266-267 Bender 138, 487, 491, 495 Tríade
Teste de Completamento de Miocinético. Vide PMK de personalidade, 24, 121, neurótica, 443, 444, 449, 452,
Desenhos (Wartegg), neuropsicológicos, 180 127, 134-136, 484, 497, 464, 471, 486, 496, 500
266-269 projetivos, 110, 115, 117, 498, 499 Triagem
Teste de Evocação de Buschke, 119, 399, 400 anti-social, 126, 484, 486, de conflitos emocionais, 263
181, 182 psicométricos, 110, 117, 174 493, 498, 499 intelectual, 215-216, 269
Teste de Lembranças Seletivas, psicométrico/s. Vide também borderline, 127, 127-138, Triangularidade edípica, 61
182 Técnicas psicométricas, 183, 184, 458, 461, 474, Triangularidade relacional, 521
Teste de Sondagem Intelectual, 22 488, 493, 498, 499 Triângulos, 150
269-270 psicológicos, 183, 185 dependente, 127, 136, Tristeza, 426
Teste Desiderativo, 270-271 temático. Vide também Tes- 137, 498, 499
Teste Não-Verbal de Raciocínio te de apercepção infantil esquiva, 487, 488, 498,
para Crianças (TNVRI), Picture Story Test, 259 499 U
271-272 Pickford Projective Pictures, esquizóide, 488, 498, 499
Teste projetivo, 413, 416 211 esquizotípica, 127, 136, Urgência psiquiátrica, 124
Teste Z, 386 Senior Apperception Test, 138, 474 URICA, 93
Testes 259 histriônica, 483, 498, 499 Uso de substâncias, 79
Alfa, 23 TAT. Vide TAT narcisista, 498, 499 Uso do álcool, 486
administração, 113-115 Tell Me A Story Test, 211 obsessivo-compulsiva, 487,
bateria de, 109, 110, 113, Wisconsin de Classificação de 488, 498, 499
116 Cartões. Vide Wisconsin paranóide, 471, 498, 499 V
Bender. Vide Bender (B-G) Wisconsin de Classificação de passivo-agressiva, 484,
Benton, 207-208 Cartas, 175 486, 487, 498, 499 Vale conversivo (V conversivo),
Beta, 24 Teste-reteste, 78, 83 delirante, 79, 82 462, 482, 483
Blacky, 211 Tétrade psicótica, 443, 444, depressão maior, 21 Valência afetiva, 514
das Pirâmides Coloridas, 450 depressivo maior, 79, 82, 83, Validação de escalas ou testes,
265-266 The Middlessey Elderly Assess- 85, 86, 127, 483, 488, 159, 166
das Relações Objetais, 266, ment of Mental State 489 Validade, 158, 159, 163
267 (MEAMS), 181 depressivo, 50, 85, 86, 481, concorrente, 163-164
de apercepção infantil Tolerância à fatigabilidade, 111 483, 485, 487, 493 convergente, 163, 164
Blacky, 211 Tolerância à frustração, 100, dissociativo, 484, 491 de conteúdo, 163
CAT-A, 211, 212 104 distímico, 82, 75, 85, 86, de face, 163
CAT-H, 211, 212 Traço/s (Murray), 402, 405 479, 483, 484, 487, 489, discriminante, 163, 164
CAT-S, 211 Traços 496 do diagnóstico, 76, 83
da Patte Noir, 211 de disfunção cerebral, no do humor, 79, 83, 84, 85 fatorial, 163, 164, 165
TEMAS, 211 HTP, 526 do pânico, 78, 79 hipóteses de
de atitudes familiares, 211 depressivos, no HTP, 526-527 doloroso, 106 de Dahlstrom, Welsh e
de Casa-Árvore-Pessoa. Vide hipomaníacos, no HTP, 526- emocionais na criança, 296 Dahlstrom, 443-445
http 527 esquizoafetivo, 79, 83, 85, de Levitt e Gotts, 446-447
de Completamento de Dese- psicóticos, no HTP, 523-525 458, 488, 497 de Vincent, 443-445
nhos, 266, 269 Transferência, 41, 42, 43, 52, esquizofrênico, 127, 131, preditiva, 163-164
de Completamento de Sen- 53, 54, 97 134, 135, 137, 487 relacionada a constructo,
tenças, 216-218 Transgeracional, 142 esquizofreniforme, 79 159, 163, 164, 165
de Cubos de Kohs. Vide Tes- Transtornos (ou problemas) funcionais, 24 relacionada a conteúdo, 163
te de Kohs afetivo, 127, 136, 479, 488, generalizada, 79 relacionada a critério, 163-164
de desenho. Vide Desenho 493 maturação (maturidade) Validade, escalas ou indicado-
de Goodenough, 221 bipolar, 79, 83, 85, 108, 127, viso-motora, 301 res (MMPI), 454-461,
de Goodenough-Harris, 221 458, 477, 488 médicos, 33 502, 506

PSICODIAGNÓSTICO – V 677
Valores, 141, 142 W WASI, 279, 281 WISC-III, Wechsler Intelligence
Variáveis psicológicas WCST (Wisconsin Card Sor- Scale for Children 3ª edi-
do paciente, 43 WAIS, Wechsler Adult Intelli- ting Test). Vide Wiscon- ção, 282-284
do psicólogo, 43 gence Scale, 119, 127, sin Wisconsin, 284-285
Velocidade de Processamento 136, 137, 274-276 Wechsler, escalas. Vide tam- WISC-R, Wechsler Intelligence
(VP) (WISC-III), 603, 604 WAIS-III, Wechsler Adult Inte- bém Escalas de Inteligên- Scale for Children Revi-
fator de, 283 lligence Scale 3ª edição. cia sed, 279-282
índice de, 276 276-278, 287 de memória, 285-288 WMS, 285-288
Verbalização/ões, 388, 390 WAIS-R NI, 278-279, 542, 544, WIAT, Wechsler Individual WMS-III, 285-288
Vineland, 272-274 547, 563, 565, 569, 571, Achievement Test, 283 WMS-R, 285-288
Visita domiciliar, 154 573 WIS (Wechsler Intelligence Sca- WPPSI, 281, 288, 290
Vocabulário, subteste de, 115, WAIS-R, Wechsler Adult Inte- les), 22, 180 WPPSI-R, 281, 288, 290
274, 275, 276, 278, 281, lligence Scale Revised, WISC, Wechsler Intelligence
288, 289 110, 274-276 Scale for Children, 279-
Vulnerabilidade/s (prévia/s) no Wartegg. teste de. Vide Teste 282 Z
desenvolvimento, 64, 65, de Completamento de WISC-III, em grupos clínicos,
66, 423, 425-427 Desenhos 612-614 Z-teste, 290-292, 386

678 JUREMA ALCIDES CUNHA

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