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DE CASOS
A PRÁTICA CLÍNICA
FENOMENOLÓGICA-
EXISTENCIAL
Autores(as)
Aline Nunes Donato
Andréia Ramos Patrocínio
Andreia Souza Reis
Augusto Carlos Rodrigues da Cunha
Jonathan de Oliveira Neves
Mikaelly Gallerani Pacheco
Paulo Henrique Basilio Alves
Vanessa Lima Rodrigues da Trindade
Geise Campêlo
Luciana Santos
(Organizadoras)
www.afethos.com
ISBN: 978-65-994257-0-7
As organizadoras
sUMÁRIO
1) ENTRE O COLO E À AUTENTICIDADE, O CAMINHO PARA SI. ESTUDO
DE CASO NUMA PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICA-EXISTENCIAL
.............................................................................................................................................................................
A CLIENTE
SE ASSUMIR
O “esforço” de ser a filha que ela tanto queria, junto com o fato de
olhar-se no espelho e não se ver, traduz as tentativas de se
enquadrar, moldar-se diferente de quem é, e com isso a
consequente cristalização das possibilidades de sua existência, sendo
outra pessoa além de si mesma. Em suma, um modo de ser
inautêntico. De acordo com Kierkegaard, o Eu se constitui no
sentimento de Desespero (vontade de sermos nós próprios e não
sermos nós próprios), este que é emaranhado aos paradoxos do
existir, já que para o autor somos ao mesmo tempo: Finito x Infinito;
Temporal x Eterno e Possibilidade x Necessidade. A cristalização da
“Vontade de ser si próprio” e de “Não ser si Próprio”, este último
correspondente ao percebido como tendência na cliente, além da
também cristalização dos fatores constituintes dos paradoxos,
acabam por cercear as possibilidades de escolha, literalmente grades
construídas por nós (FEIJOO, 2011).
Como não nos relacionamos apenas com os objetos, mas com outros
seres, a trindade satreana se completa na relação do ser-para-outro,
que se manifesta no olhar desse outro. Da mesma forma como a
subjetividade transcende de nós para o outro, o contrário também
ocorre. “Da mesma maneira que posso olhar o outro e defini-lo
através de minha subjetividade, sei que o outro pode olhar-me e
definir-me através de sua subjetividade” (SARTRE, 2014). O outro nos
vê como um objeto, um em-si, e com isso nos reduz, repele e
também, ao mesmo tempo, atrai. A atratividade de ser um objeto
para o outro, está no fato de atribuir ao para-si o que tanto deseja,
sua estabilidade. Viver como um objeto para o outro é
consequentemente atribuir para o mesmo o papel de sujeito. O
para-si, apesar de buscar a concretude do em-si, paradoxalmente
não quer deixar sua fluidez e liberdade, isto é a tentativa de um
projeto nomeado em-si-para-si. A consciência atrás dessa síntese
perfeita, em-si-para-si, falha, principalmente pela objetificação,
cristalização do ser por uma atribuição de outra liberdade, fora de si
mesmo (JUNIOR; ARDANS-BONIFACINO; ROSO, 2016).
Tudo isso caracteriza a relação com nós mesmos e com o outro, que
é essencial para a existência, mas nunca completa em si,
funcionando como o Desespero (desejo de não ser si mesmo e ser si
mesmo) para Kierkegaard.
Uma atitude da jovem fez com que ela se sentisse de fato livre,
contextualizou dizendo que frequentemente saía para comprar
roupas com sua mãe e a mesma opinava sobre o que ela deveria
vestir, consequentemente adquiria peças que não condiziam com
seu gosto pessoal. Revela que não costumava arrumar tanto o quarto
e ao fazer isso, no seu guarda-roupas, selecionou todas aquelas
roupas que não gostava, mas acabou comprando e decidiu doá-las,
algumas delas, nas suas palavras, sequer foram utilizadas. Revela
indiferença no comportamento de sua mãe com sua escolha, porém,
mesmo afirmando ser “besta” tal atitude, no sentido de talvez ser
pequena para a visão dos outros, as roupas era um resquício, um
símbolo dos atravessamentos, e para ela foi mais um cântico,
temeroso, porém frequente de liberdade, autonomia e
autenticidade.
O EU DA RELAÇÃO, IMPLICAÇÕES
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Moly foi casada (com o pai de sua filha) durante 3 anos; hoje em dia,
está divorciada. Uma de suas demandas e o ressentimento, e é fazer
a filha vivenciar situações de afastamento como a que Moly passou
com sua própria mãe. Quando Moly era bem pequena, sua mãe
biológica saiu de casa e perderam o contato uma com a outra.
Implicação pessoais
Pode-se dizer que cada cliente e cada sessão nos sensibiliza de uma
maneira. O caso em questão, Moly, fez com que houvesse uma
abertura em minha e uma atualização da minha prática clínica.
Parece que o novo se fez desse lado também. O desafio de atender
on-line e a demandas que não estavam na minha zona de maior
conforto e expertise corroboraram para a “ciranda cirandinha” dos
meus afetos também.
Pode-se afirmar que estar presente nas relações nos faz vivenciar e
experienciar diversas formas de emoção. Neste caso não foi
diferente. Raiva, tristeza, impotência, ansiedade, alegria, amor,
compaixão, empatia e leveza foram alguns sentimentos
experienciados por mim. É enriquecedor perceber e confirmar cada
emoção sentida, no momento sentido.
1. Introdução
Nome: Alan
Idade: 35 anos
1.2 Local
1.3 Instalações
2.1 Setting
3. Discussão Diagnóstica
3.1 Histórico do paciente
Em um de seus relatos, Alan se refere que por mais que ele tenha
medo da morte, é uma pessoa sonhadora e que tem muitos planos
para concretizar, principalmente profissionalmente. Procura sempre
se cuidar e fazer o tratamento corretamente, zelar pela sua vida e
pelas pessoas com quem convive, pois no momento faz parte de
vários projetos religiosos e enquanto educador físico, além da
militância pelo "respeito ao próximo e dizer não ao preconceito" (sic).
4. Hipótese Diagnóstica
5. Fundamentação Teórica
"É um medo constante. Desde limitações de coisas que não posso fazer, aos
tratamentos contínuos que preciso fazer, à certeza que aminha vida terá fim.
Morrer todos iremos. Mas desde que descobri o que tenho a vida se torou mais
frágil. Parece que as pessoas vivem sem saber que irão morrer. Eu penso nisso
todos os dias. E vivo como se fosse de fato o último. [...] E não falo só do morrendo
aos pouquinhos porque não posso fazer isso ou aquilo, porque perdi amigo com
mesmo quadro, porque sei de relações que não tenho por causa da doença. Falo
da morte mesmo, de não existir mais, de não estar mais aqui. [...] E por mais que as
vezes questione o sentido de tudo já que o destino e a morte, quero viver
intensamente, tudo agora, com urgência". (sic)
5.1 Prognóstico
6. Considerações Finais
Inicialmente pensei que essa parte fosse ser a mais fácil de realizar
nesse estudo de caso. No entanto, colocar no papel o que
representou para mim e de que forma me impactou todo esse
processo, não está sendo a tarefa mais fácil. Considero que essa
dificuldade possa ser atribuída ao receio de julgamento ou de críticas
e acredito que isso está me levando a ficar travada, sem permitir que
os pensamentos e a escrita possam fluir.
A demanda
O paciente
Outro ponto que enfatiza como contribuindo para o seu estado atual
de ansiedade é a questão financeira. Ele faz sempre referência às
suas dificuldades atuais, à bolsa de pequeno valor, à taxa de câmbio,
ao preço do aluguel e demais empecilhos ao seu bem-estar material.
São questões superdimensionadas, às quais ele confere atenção
exagerada, talvez fruto da penúria de seu passado. Nas últimas
sessões, K relatou que seu filho tinha começado a prestar serviços no
comércio, contribuindo para o orçamento familiar. Sua mulher
também havia começado a trabalhar como prestadora de serviços
gerais. E ele estava perturbado com o cenário.
Fundamentação Teórica e Desenvolvimento da Psicoterapia
K revela estar muito preso aos fatos trágicos de sua existência, como
se não houvesse outras possibilidades de significar suas situações
atuais. Coloca a mulher e o filho como objetos de seu medo, de seus
receios e temores, resultantes de suas construções comuns de
cenários catastróficos. Na verdade, o receio e o medo são dele
mesmo. K racionaliza tudo o que acontece em sua vida. Tem na
ponta da língua todos os exames, índices e remédios para os males
que atribui a si mesmo e aos seus. A sua profissão e atuação refletem
muito bem os seus sintomas.
O Psicoterapeuta na Psicoterapia
Posfácio
Ele falou que achava terrível ficar só em casa, que isso era um
tormento. Surgiu a ideia de arranjar alguma ocupação, enquanto não
retomava a atividade que estava suspensa devido à COVID-19.
Não sabemos que decisão tomou. Mas ficou evidente o avanço da
terapia, já que esta se deslocara das questões de sua família,
principalmente mulher e filho, que demonstraram enorme presença
e capacidade de adaptação, para as indecisões e questões próprias
de K.
Referências
O caso
A paciente relata que sempre teve um grande sonho de estudar, e por isso,
haja vista que a mulher pela qual ela trabalhava não gostava dessa ideia,
Rosa continuava trabalhando, indo pra escola e estudando no tempo que
lhe restava. A paciente responsabiliza essa mulher por ter “tirado dela” o
sonho de estudar, limitado suas possibilidades e não ter concluído os
estudos. Também é possível relacionar aqui a responsabilidade colocada no
mundo. A paciente é uma mulher que permanece em seu passado, presa
na culpa que atribui à aquilo que lhe ocorreu. Segundo Feijoo (2017), como
mundo e homem são indissociáveis, um influenciando a existência do
outro, percebe-se a responsabilidade do mesmo por aquilo que se apropria.
Uma vez que Rosa atribuía a responsabilidade àquilo que lhe era externo,
ficava impossibilitada de mudar sua situação, uma vez que não assumia
essa responsabilidade. Moreira (2009) também aborda a necessidade da
retirada da dicotomia entre mundo e homem, uma vez que o social e o
individual não se dissociam. A autora também trata do momento em que
isso é superado.
Rosa conheceu o homem com o qual se casou, contudo, ele era uma
pessoa que viajava muito. Quando ela ficou grávida, seu esposo não passou
esse período na cidade com ela e sumiu por um tempo. Quando retornou,
muito tempo depois, Rosa disse que não iria mais viver nessa angústia.
Rosa retornou à casa do padrasto e em seguida voltou a morar com a filha
deste, visando não ser uma “despesa” (sic) na casa do marido da mãe.
Quando sua irmã viria para Brasília, Rosa foi junto e deixou a mulher,
momento que considera seu “grito de liberdade” (sic), mas deixou o filho na
cidade junto com a mãe.
É possível hipotetizar um arrependimento de Rosa, por não levar, em
princípio, o filho com ela para Brasília. Segundo De Queiroz (2010), o
arrependimento vem da impossibilidade de anular a escolha que seria
inerente a todo ser humano. A paciente também evidencia muita
culpa por não ter cuidado desse filho no começo de sua vida. Seus
irmãos, seu filho e sua mãe, depois de um período, foram morar com
ela em Brasília, onde ficou sobrecarregada e sustentava praticamente
tudo. Sendo assim:
A liberdade conduz o homem à dúvida em relação à opção que irá adotar. Apesar
disso Sartre fundamenta que o homem nunca deve ter remorso, embora se o tiver,
demonstrará arrependimento pelas opções escolhidas. De certa forma, os remorsos
seriam uma forma de negar a própria atitude humana. (DE QUEIROZ, 2010, p. 12)
Referências
Algo que foi constante em quase todas as sessões foi dizer que não
saberia o que falar ali, apresentando uma grande dificuldade de
relatar seus problemas e o que sentia. Não obstante, a percepção de
que não se beneficiaria da terapia começou a mudar a partir do
segundo atendimento e já era radicalmente contrária no fim das
sessões.
TRABALHO
Um dos motivos, além dos gastos da família que o marido não ajuda,
é que ela não estava recebendo em dia no seu “bico” (sic). Se sentia
muito mal com isso por ficar exausta de trabalhar, pois fazia esse
trabalho todos os dias depois do expediente, e não estava
conseguindo realizar seu objetivo que era juntar dinheiro. Mesmo sem
receber, autocobrava-se de continuar trabalhando lá.
RELACIONAMENTOS
Quando saiu da casa da mãe, ela relata que começou a viver a vida
que lhe era negada, podendo então “ser menina” (sic). Diz que as
pessoas da rua e da família viviam comentando para seu marido que
ele teria se casado com uma criança e não com uma mulher pois ela
estava sempre na rua brincando, descalça e subindo em árvores. Não
tinha nenhum interesse em arcar com as responsabilidades que eram
esperadas de uma mulher casada e simplesmente ignorava tudo e
vivia como queria. Diz que tinha uma cunhada da mesma idade e que
ela era sua companheira nas brincadeiras. Ela estava vivendo a
infância que não tinha vivido, sem grandes responsabilidades.
A busca pela liberdade aqui foi um grande tema. Diz que se casou
buscando ser livre, mas “como que eu iria me libertar, se eu ia ter era
um dono porque eu era de menor?” (sic). Mesmo se focando mais nos
cuidados do filho e da casa, ela não perdeu o foco na sua própria
liberdade. Relatou que depois disso pensou: “hoje em dia eu sou dona
do meu nariz. Homem nenhum vai mandar em mim. Eu vou fazer o
que eu acho que é certo e vou fazer do meu jeito. Não vou pedir
autorização, eu vou comunicar” (sic).
Relata que ele sempre foi assim, mas que foi se intensificando
gradualmente na medida em que seu alcoolismo foi aumentando. Ele
sempre bebeu bastante, mas nos últimos anos seu relacionamento
com o álcool foi ficando abusivo de uma forma que Sara não
conseguia, ou queria, mais lidar. Relata que ele nunca foi agressivo de
forma alguma com ela, ou com os filhos. O marido sempre encarava
esses conflitos de forma simples, como sendo uma questão de ele não
ter vontade de se prender ao trabalho, doméstico ou profissional, e às
obrigações de marido e pai. Ele apresenta de forma bem clara em seu
discurso que ele não mudará, pois essa é uma vontade dos outros e
não dele.
Nesse sentido, ficou muito claro no discurso de Sara que não havia
nenhum interesse em tentar resolver os conflitos do relacionamento e
seu foco agora seria somente em sair de casa e seguir sua vida. No
começo dos atendimentos ela trazia que não tinha tanta pressa para
sair da casa, apesar de estar completamente esgotada, ainda
preferindo levar esse objetivo de forma lenta. Mas nos últimos
atendimentos sua postura em relação a isso teve uma mudança
brusca.
Ela já havia falado várias vezes nos últimos anos que pretendia se
separar, sem grandes reações dele por não acreditar. A principal
barreira para se separar era conseguir uma casa, pois a casa onde
moravam era da mãe dele. Há cerca de um ano, quando decidiu sair
de fato, combinando com os filhos que iriam se juntar para comprar
uma casa, ela não relatou para ele. Mesmo com os planejamentos
estarem bastante avançados e com uma certeza que sairia, ela
mantinha suas “obrigações” (sic) como dona de casa e esposa.
Preferia manter assim, por uma questão de não conseguir ignorar
muito bem suas “obrigações” e por ser “mais fácil” (sic) assim. Mas
depois desse evento do assédio, seu comportamento mudou
drasticamente.
O sexo no relacionamento já não se dava de maneira prazerosa para
ela há algum tempo. Ele entrava no pacote de “obrigações de esposa”.
Relata que não tinha nenhum desejo de ter relações com ele e até se
sentia muito incomodada às vezes quando ele tocava nela, mas que
ainda mantinha relações por ser “mais fácil” (sic). Mesmo sem nunca
agredir ninguém da casa, quando eles não transavam ele ficava mais
impaciente e difícil de lidar, então ela cedia para "facilitar as coisas"
(sic). E também por sentir que fazia parte do papel de esposa. Os
únicos momentos em que ela se recusava a fazer sexo com ele era
quando ele bebia demais.
Depois desse evento, ela foi direta com ele e disse que eles estariam
morando na mesma casa, mas que não seriam mais casados e que se
ele quisesse poderia dormir na mesma cama, mas nada ocorreria
entre eles. Relatou também que iria se mudar e que já tinha feito um
contrato de aluguel, se mudando depois do natal. O comportamento
dele, como ela relatou, mudou muito depois dessa mudança dela. É
como se ele tivesse percebido de fato que ela iria embora. Ele
começou a ser mais atencioso com a filha e a se dedicar às tarefas
domésticas. Isso a abalou um pouco, a fazendo pensar em dar mais
alguma chance para ele, mas relata que não pensava muito nisso e
que não tinha mais como voltar atrás.
FAMÍLIA
Ela relata uma grande mágoa que sentia pela mãe e que a
responsabilizava muito pelos seus sofrimentos na vida. No entanto,
essa revolta se mostrou mais como um afeto passado, pois seu
relacionamento com a mãe hoje é diferente. Ainda tem alguns atritos
com ela, mas diz amar muito a mãe e que não guarda nenhum rancor
pelo que ela fez, estando sempre presente na vida dela e a ajudando.
Tem clareza em seu discurso que atribui sim “parcela da culpa” (sic) à
mãe, mas que não tem motivo para se prender a isso.
Quanto aos seus filhos, ela relata um relacionamento muito bom com
eles. Os únicos conflitos que teve com o mais velho foram quando se
separou de seu pai, pois os conflitos ficaram maiores entre ele e o pai.
Hoje em dia ele é sua companhia mais próxima. Diz que “ele acaba se
tornando o meu parceiro, o meu companheiro, o pai da minha filha.
Ele que responde por ela [...]. Atualmente ele é meu porto seguro”
(sic). Assim, ele acaba sendo quase toda a sua rede de apoio primária.
OBJETIVOS PESSOAIS
Esse desejo não aparecia como uma questão a ser resolvida no futuro
próximo, por terem figuras mais urgentes, mas também não
apareceu como um sonho distante. Não aparenta também
“romantizar” a questão, trazendo as dificuldades que seriam para ela,
na sua idade, trabalhar e fazer esse curso, e também as dificuldades
de entrar em uma nova área profissional.
A culpa, assim como a angústia, pode ser negada, não gerando em reconhecimento
da facticidade e das limitações próprias ao existente. Se por um lado, ela pode
evoluir para um grau de responsabilização frente à existência, nesse caso o
existente assimila a impossibilidade da plena realização e escolhe algo mais viável
em relação a seu projeto existencial. Por outro, na relação com a culpa o existente
pode criar um estado existencial em que se sente que tudo é determinado, não
oferecendo nenhuma possibilidade ou potencialidade de escolha diante à
existência. Esse estado de que se é hiperesponsável pelas circunstâncias à volta,
mesmo sem a participação nisso, é uma das formas como a culpa pode evoluir e se
tornar patológica. O Transtorno Obsessivo Compulsivo em nosso argumento
demonstraria uma das formas em que a culpa se torna patológica.
Esses ambientes podem não permitir que os sentimentos de culpa e angústia não
sejam plenamente vivenciados como inerentes à existência, mas negados e
obstruídos, acabando por predominar numa série de sintomas que tendem a
obstruir o tempo (SANTOS, 2013 p. 89).
Quando seu filho não tinha, por algum motivo, terapia no mesmo dia
que ela, Sara perguntava se poderia remarcar, ainda como se seu
processo não fosse importante e central como o do filho. Um dia o
jovem não teria terapia, mas queria acompanhar a mãe mesmo assim
da mesma forma que ela sempre o acompanha. Sara não quis que ele
a acompanhasse e quando o filho insistiu de acompanhá-la o proibiu
de ir junto. Sara teve dificuldades de relatar isso, mas não conseguia
se ver no papel de ser cuidada e não queria que seus filhos
sacrificassem sua vida para cuidar da mãe, de forma semelhante à sua
relação com sua mãe. A filha a vê se sacrificando constantemente e
sente necessidade de ajudá-la, mas ela não permite. Trabalhamos nas
sessões seguintes o processo de que cuidar de si também era se
permitir ser cuidada, sendo que nas últimas sessões ela estava se
abrindo mais com os filhos nesse sentido e se apoiando mais neles no
processo de sair de casa, sem sacrificar-se ou sacrificá-los no processo.
Muito frequentemente havia recebido, sem reagir, ordens mais revoltantes do que
aquela que desencadeia sua recusa. Usava de paciência, rejeitando-as talvez
dentro de si, mas, já que se calava, mais preocupado com seu interesse imediato do
que consciente de seu direito (CAMUS, 2017, n.p).
ANÁLISE DE IMPLICAÇÃO
“Como vou fazer terapia com alguém que não quer fazer?”, não havia
resposta. Esse quadro rapidamente mudou, mas me fez questionar
como isso toca em dificuldades minhas de lidar com as limitações
como profissional. Quero fazer algo, mas não tenho total ação sobre as
coisas. Nem tudo depende de mim ou da Psicologia, pouco na
realidade, mas sinto uma responsabilidade enorme. Junto disso vem o
medo e a ansiedade. Forçar “ajuda” é algo historicamente usado nas
psicologias alinhadas com processos hegemônicos também para
propagar diversas violências sociais e mecanismos de higienização.
Nesse caso em específico essa foi uma preocupação que durou
pouco, mas ressoa em toda a atuação da classe.
REFERÊNCIAS
A paciente
As sessões
Juliana falou algumas vezes sobre sua dificuldade em lidar com o seu
tempo livre, havendo a necessidade de sempre preencher esse
‘’tempo vazio’’ (sic), seja estudando, se programando, ou arrumando a
casa. Momentos de lazer como assistir TV, por exemplo, não são
aceitos por ela. Werle (2003) falou a respeito de como a angústia
aparece quando em meio a nossas ocupações, no nosso dia-a-dia, nos
sobrevém um certo tédio. De acordo com o autor:
Começamos a ficar fartos dos entes que estão ao nosso redor e não encontramos
em nenhum ente um apoio para nos tirar deste tédio. Pelo contrário, acreditamos
mesmo que temos de procurar sempre mais o contato com os entes e as coisas do
mundo, para assim nos ocupar [besorgen], em vez de nos preocupar [fürsorgen], e
sair desta estranha indiferença na qual nos joga o mundo. Mas, com isso, sempre
afundamos mais na angústia. Nos sentimos meio estranhos na angústia (WERLE,
2003, p. 106).
Ou seja, os pacientes nos contam por meio de seus sonhos quais são
os fenômenos de sua existência que ainda não são acessíveis para
eles. Com isso, é fundamental que o psicoterapeuta tenha o manejo
necessário para fazer com que o paciente tenha mais clareza a
respeito de si mesmo.
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