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Aspectos da Vitimologia

DIREITO PENAL

POR: ANTONIO AUGUSTO COSTA EVERTON JUNIOR

SUMÁRIO. 1. INTRODUÇÃO. 2. HISTÓRICO. 3. CONCEITO


DE VITIMOLOGIA. 4 CLASSIFICAÇÕES.  4.1 Classificação
segundo Benjamin Mendelsohn. 4.2 Classificação
segundo Hans Von Henting4.3 Outras
Classificações.  4.3.1 Classificação segundo Guaracy
Moreira Filho. 4.3.2 Classificação segundo Jimenez de
Asúa. 4.3.3 Classificação segundo Guglielmo Gulotta. 5
VITIMOLOGIA: Ciência autônoma ou ramo da
Criminologia? 6 CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS.

 
 

1       INTRODUÇÃO

Heitor Piedade Júnior (1993), sobre o tema


Vitimologia, ressalta que o termo é recente, apesar de seu
objeto de estudo ter suas raízes fincadas na Antiguidade.
A Vitimologia, como adiante se discutirá com
maior precisão, tem se desenvolvido “ora prevenindo a vítima
de processos vitimizantes, ora estudando e pesquisando a
personalidade da vítima, ora tentando buscar alternativas que
lhe assegurem a reparação de um dano” (PIEDADE JÚNIOR,
1993, p.24). Visa defender, sobretudo, a garantia de uma
assistência multidisciplinar que venha a ressarcir a vítima
materialmente, promovendo também sua reestruturação
afetiva.
Neste trabalho serão abordados sucintamente os
principais pontos acerca da Vitimologia: seu conceito
historicamente construído, as principais classificações
sugeridas pelos teóricos do assunto, bem como a discussão
quanto a tratar-se de ciência autônoma ou ramo da
Criminologia.

2       HISTÓRICO

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O Direito Penal, desde a Escola Clássica, sempre
concentrou seus estudos no trinômio delinquente-pena-crime,
pois os estudos nesta época eram centrados na pessoa do
autor do crime, deixando sem a necessária atenção a vítima.
A História da Vítima se deu em três fases.
A primeira fase é a denominada “fase da
vingança privada e da justiça privada”, conhecida como “idade
de ouro” da vítima, período que marcou profundamente a
civilização, pois foi quando o vitimizado deteve em suas mãos
a garantia de escolher a solução para o problema decorrente
do delito; ou seja: era-lhe facultado o direito de vingança ou
de compensação em relação ao seu agressor. Esses direitos
concedidos às vítimas, nos primórdios da existência do
direito, tinham, além da finalidade de proporcionar ao
ofendido uma satisfação pessoal, o propósito primário de
fazer com que voltasse a prevalecer a paz originária no seio
da coletividade, paz esta que fora conturbada em decorrência
da prática do fato criminoso. Considerando essa vingança
como uma forma de resposta à agressão, consistia na
imposição ao algoz de punições físicas, na retirada de seus
bens materiais, culminando até em sua morte.
Com o surgimento das organizações sociais,
através da evolução social e política, compreendeu-se que a
vingança ilimitada não era mais interessante, havendo,
portanto, a decadência do instituto da vingança privada. O
Direito Penal passa a ser tratado como matéria de ordem
pública, trazendo para si a responsabilidade da administração
da justiça.
Nesta fase, a vítima é marginalizada, passando a
segundo plano decaindo de sua então posição central para
uma posição periférica, com sua consequente neutralização e
enfraquecimento.
Nesse sentido, Luiz Flávio Gomes e Antônio
García Pablos de Molina comentam: 
“O abandono da
vítima do delito é um
fato incontestável que
se manifesta em todos
os âmbitos: no Direito
Penal (material e
processual), na
Política Criminal, na
Política Social, nas
próprias ciências
criminológicas. Desde
o campo da
Sociologia e da
Psicologia social,
diversos autores, têm
denunciado esse
abandono: o Direito
Penal contemporâneo
– advertem – acha-se
unilateral e
equivocadamente
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voltado para a pessoa
do infrator, relegando
a vítima a uma
posição marginal, no
âmbito da previsão
social e do Direto civil
material e
processual”. (GOMES
& MOLINA, 2000,
p.73)
 Já a terceira, e atual fase da vítima, denominada
como a fase do “redescobrimento”, teve seu início com o fim
da II Guerra Mundial, momento em que a sociedade mundial
presenciou uma das maiores atrocidades já praticadas, que
foi o genocídio realizado nos campos de concentração
nazistas. Nesta fase, surge a Vitimologia, então encarregada
de realizar a referida redescoberta, pois passou a estudar os
motivos que levaram o sistema penal a relegar as vítimas ao
esquecimento, e quais as razões de ela não poder ser
enquadrada no rol dos sujeitos de direitos, prerrogativa esta
concedida aos acusados.
A Vitimologia tem como fundador Benjamin
Mendelsohn, professor de Criminologia da Universidade
Hebraica de Jerusalém que em 1947 apresentou a
conferência “Um novo Horizonte na ciência biopsicossocial –
a Vitimologia”. Nessa conferência, o autor deixa claro que não
se poderia mais considerar a vítima como simples
coadjuvante de um ilícito penal, mero sujeito passivo do
crime, enfatizando ser indispensável o estudo do
comportamento vitimológico, os atos conscientes e
inconscientes que podem levar à eclosão de um crime.
Propõe também a sistematização de pesquisas e estudos
sobre o referido assunto, não mais como um ramo da
Criminologia, mas como uma ciência própria e autônoma
denominada de Vitimologia.
Em 1056, é lançada por Mendelsohn “A
Vitimologia”, obra que foi publicada na Revista Internacional
de Criminologia e de Polícia Técnica, sendo posteriormente
reproduzida nas demais revistas de grande prestígio político
no mundo.  Apesar de Mendelsohn ser considerado pelos
especialistas como o fundador da Vitimologia, outros autores
contribuíram para a formação dos estudos sobre a vítima.
Um deles foi Marvin Wolfgang, direcionado
exclusivamente ao homicídio provocado pela vítima. Em sua
obra A Filosofia Penal (1912), criticou as legislações por se
focarem quase que exclusivamente para a premeditação do
delito pelo delinquente, tratando com irrelevância os motivos
que mostram uma inter-relação entre a vítima e o criminoso. 
Outro estudioso da área, Ernest Roesner lançou
em 1936 e 1938, na Alemanha, dois estudos sobre homicidas
relacionados com suas vítimas, valendo-se de estatísticas de
condenados cumprindo pena privativa de liberdade.

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Em 1979 foi criada a Sociedade Mundial de
Vitimologia, e em 28 de Julho de 1984, foi fundada no Rio de
Janeiro a Sociedade Brasileira de Vitimologia, através da
união de vários especialistas das áreas de Direito, Medicina,
Psiquiatria, Psicanálise, Psicologia, Sociologia e Serviço
Social, além de outros estudiosos das ciências sociais, que se
uniram para consolidar no Brasil os conhecimentos
relacionados com a Vitimologia.
Essa Sociedade tem como objetivo realizar
estudos, pesquisas, seminários e congressos referentes ao
tema, mantendo, para tanto, contato com outros grupos
nacionais e internacionais organizando reuniões regionais,
nacionais ou internacionais sob aspectos relevantes dos
diversos campos do Direito que refletem na Vitimologia.
Finalmente, no ano de 1985, na Assembleia Geral
da ONU, foi aprovada a Declaração dos Princípios Básicos de
Justiça para as Vítimas de Delito e de Abuso de Poder,
mesmo ano em que a Sociedade Mundial de Vitimologia foi
credenciada como órgão consultivo. 
3 CONCEITO DE VITIMOLOGIA
Etimologicamente, o léxico “vitimologia” pode ser
conceituado como “o estudo da vítima”, já que tal palavra
deriva do latim “victima”, “ae” e da raiz grega “logo”.
Silva (2008, p. 1495), entende que “vítima é toda
a pessoa que é sacrificada em seus interesses, que sofre um
dano ou é atingida por qualquer mal. A linguagem penal
designa o sujeito passivo de um delito ou de uma
contravenção. É assim o ofendido, o ferido.”.
Consoante os ensinamentos de  Guilherme de
Souza Nucci (2008, p. 1017):
“Vítima” é o sujeito
passivo do crime, ou
seja, a pessoa que
teve o interesse ou o
bem jurídico protegido
diretamente violado
pela prática da
infração penal.
Denomina-se,
também ofendido.
Deve ser ouvido,
sempre que possível,
durante a instrução, a
fim de colaborar com
a apuração da
verdade real, valendo
a oportunidade,
inclusive, para indicar
provas e mencionar
quem presuma ser o
autor do delito (art.
201, CPP).
Nas lições de Júlio Fabbrini Mirabete e Renato N.
Fabbrini (2007, p. 301):

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Estudos de
Vitimologia
demonstram que as
vítimas podem ser
‘colaboradoras’ do ato
criminoso, chegando-
se a falar em ‘vítimas
natas’ (personalidades
insuportáveis,
criadoras de casos,
extremamente
antipáticas, pessoas
sarcásticas, irritantes,
homossexuais e
prostitutas etc.).
Maridos vergudos e
mulheres megeras
são vítimas potenciais
de cônjuges e filhos;
homossexuais,
prostitutas e marginais
sofrem maiores riscos
de violência diante da
psicologia doentia de
neuróticos com falso
entendimento de
justiça própria. Quem
vive mostrando sua
carteira, recheada de
dinheiro, aumenta as
probabilidades do
furto e do roubo; o
adúltero há de ser
morto pelo cônjuge.
Alguns conceitos de Vitimologia foram
destrinchados por Heitor Piedade Júnior (1993, p. 81-86),
dentre os quais destacam-se as seguintes definições
esquematizadas na tabela:
AUTOR CONCEITO
A Ciência sobre as
Benjamin Mendelshon vítimas e a vitimização.
 
É o ramo da
Criminologia que se ocupa
da vítima direta do crime e
que compreende o
Henry Ellenberger
conjunto de conhecimentos
biológicos, sociológicos e
criminológicos
concernentes à vítima.

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A Vitimologia
representa um
determinado departamento
do campo total,
relativamente fechado da
Hans Göppinger
Criminologia empírica, e,
em particular, do complexo
problema: o delinquente
em suas interdependências
sociais.
É o ramo da
Criminologia que estuda a
vítima não como efeito
consequente da realização
Raúl Goldstein
de uma conduta delitiva,
porém como uma das
causas que influenciam na
produção de um delito.
O estudo psicológico
e físico da vítima que, com
o auxílio das disciplinas
Ramírez González que lhe são afins, procura
a formação de um sistema
efetivo para a prevenção e
controle do delito.
4 CLASSIFICAÇÕES
4.1 Classificação segundo Benjamin
Mendelsohn
A primeira classificação existente é a do próprio
fundador da Criminologia, indicando que o objetivo
fundamental da disciplina é a existência de menos vítimas em
todos os meios da sociedade, sempre que a sociedade estiver
honestamente interessada na solução do problema.
Benjamin Mendelsohn destaca três grupos
principais de vítimas: a Inocente, a Provocadora e a
Agressora. As vítimas Inocentes ou ideais são aquelas que
não tem participação, ou se tiverem, a mesma será ínfima na
produção do resultado. A vítima Provocadora, por sua vez, é
responsável pelo resultado e pode ser caracterizada por
provocadora direta, imprudente, voluntária e ignorante. A
vítima Agressora pode ser considerada uma falsa vítima em
razão de sua participação consciente, praticamente como co-
autora do resultado pretendido pelo agente. Assim, tais
vítimas são classificadas como: (a) vítima completamente
inocente; (b) vítima menos culpada que o delinquente; (c)
vítima tão culpada quanto o delinquente; (d) vítima mais
culpada que o delinquente e (e) vítima como única culpada.
      Vítima completamente inocente
Também chamada de vítima ideal. É aquela que
não tem nenhuma participação no evento criminoso, o
delinquente é o único culpado. Ex: sequestro, roubo
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qualificado, terrorismo, vítima de bala perdida, infanticídio,
etc.
      Vítima menos culpada que o delinquente
Também conhecida como vítima por ignorância.
Trata-se daquela que contribui de alguma forma para o
resultado danoso do evento. Ex: Pessoa que frequenta locais
perigosos expondo seus objetos de valor.
     Vítima tão culpada quanto o delinquente
Vítima chamada de provocadora, pois sem a
participação ativa da vítima, o crime não teria ocorrido. Ex:
corrupção, sedução, rixa, etc.
     Vítima mais culpada que o delinquente
Nesse caso, a participação da vítima foi maior ou
mais intensa do que a do próprio autor. Ex: lesões corporais e
homicídios privilegiados cometidos após injusta provocação
da vítima.
      Vítima como única culpada
Nestes casos a vítima constitui-se a única pessoa
culpada do evento criminoso. Comum nos crimes culposos.
Ex: Indivíduo embriagado que atravessa avenida
movimentada, ou também no caso da legítima defesa.
4.2 Classificação segundo Hans Von Henting
A Vitimologia, com a finalidade de estudar a
relação vítima-criminoso no fenômeno da criminalidade,
surgiu a partir de 1947.
Benjamim Mendelsohn, advogado israelense, e
Hans Von Henting, professor alemão, quando exilado nos
Estados Unidos, são considerados os pioneiros da
Vitimologia.
Von Henting, professor alemão radicado nos
Estados Unidos, já vinha aprofundando seu conhecimento
com a problemática da vítima. Em 1941, publicou trabalho em
que propôs uma concepção dinâmica e interacionista da
vítima, não só como sujeito passivo do delito, mas também
como sujeito ativo, que contribui para a gênese e execução
do crime. “The Criminal and his victim”, escrito em 1948, em
vez de falar em Vitimologia, usa o termo Vitimogênese.
É com este estudo, portanto, que Von
Henting desenvolve a relação criminoso-vítima,
colocando esta última como elemento preponderante
e decisivo na realização do delito, em que, consciente
ou não, coopera, provoca ou conspira para a
ocorrência do crime. A noção de vítima e Vitimologia
de Mendelsohn supera a de Von Henting, embora não
tenha ficado imune às críticas. Porquanto discorrera
sobre sua concepção ampla e abrangente, não se
restringindo à vítima do crime, apenas Mendelsohn
buscou levar a vitimologia como um ramo
independente da criminologia, com investigação e
objeto próprio, pelo que parte substancial da doutrina 
o considera como o pai da Vitimologia.

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Hans Von Henting com a obra “O criminoso
e sua vítima”, deu passo importante no estudo da
relação criminoso- vítima tomou grande impulso.
Hans Von Henting  conclui a classificação das
vítimas da seguinte forma:
1.  Vítima isolada.  A vítima neste caso vive na
solidão, não se relacionando com outras pessoas. Em
decorrência desse meio de vida ela se coloca em situações
de risco.
2. Vítima por proximidade. Este grupo de vítimas
subdivide-se em: a) Vítima por proximidade espacial, que se
torna vítima pelo fato de estar em proximidade excessiva do
autor do delito em um determinado local, como ocorre nos
casos de furto no interior de um ônibus; b)  Vítima por
proximidade familiar,  a qual ocorre no núcleo familiar, como
pode ser visto no caso do parricídio, em que o filho mata seu
próprio genitor; c)  Vítima por proximidade profissional,  que
geralmente ocorre no caso de atividades profissionais que
requerem um estreitamento maior no relacionamento
profissional, como no caso do Médico.
3. Vítima com ânimo de lucro. São taxadas dessa
forma as vítimas que pela cobiça, pelo anseio de se
enriquecer de maneira rápida ou fácil, acabam sendo
ludibriadas por estelionatários ou vigaristas.
4.  Vítima com ânsia de viver.  Ocorre com o
indivíduo que, com o fundamento de não ter aproveitado sua
vida até o presente momento de uma forma mais eficaz,
passa a experimentar situações de aventura até então não
vividas, que o colocam em situações de risco ou perigo.
5. Vítima agressiva. Neste caso a vítima se torna
agressiva em decorrência da agressão que sofre do autor da
violência, chegando a um nível de não suportar mais a
agressão sofrida, ela irá rebater tal ato de modo hostil.
6.  Vítima sem valor.  Trata-se da vítima que em
decorrência de seus atos, não recomendáveis praticados
perante a sociedade, acaba sendo indesejada ou repudiada
no meio em que vive. Por praticar certos atos, este indivíduo
vem a sofrer agressões físicas, verbais, ou até mesmo
podendo ser morto. Um exemplo clássico desse tipo de vítima
é o caso do estuprador ou assassino que é morto pela
comunidade, pela polícia, ou por sua própria vítima.
7.  Vítima pelo estado emocional.  Essas vítimas
são qualificadas desta forma em decorrência de seus
sentimentos de obsessão, medo, ódio ou vingança que vem a
sentir por outras pessoas.
8.  Vítima por mudança da fase de existência.  O
indivíduo passa por várias fases em sua vida, sendo que ao
mudar para certa fase de sua existência, poderá se tornar
vítima em conseqüência de alguma mudança comportamental
relacionada com alguma das fases.

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9.  Vítima perversa.  Enquadram-se nesta
modalidade de vítimas os psicopatas, pessoas que não
possuem limite algum de respeito em relação às outras,
tratando-as como se fossem objetos que podem ser
manipulados.
10. Vítima alcoólatra. O uso de bebidas alcoólicas
é um dos fatores que mais leva pessoas a se tornar vítimas,
sendo que na maioria dos casos acabam resultando em
homicídios.
11. Vítima depressiva. Ao atingir um determinado
nível, a depressão poderá ocasionar a vitimização do
indivíduo, pois poderá levar a pessoa à autodestruição.
12.  Vítima voluntária.  São as pessoas que, por
não oporem resistência à violência sofrida, acabam
permitindo que o autor do delito o realize sem qualquer tipo
de obstáculo. Casos que exemplificam esse tipo de vítima são
os crimes sexuais ocorridos sem a utilização de violência.
13.  Vítima indefesa.  Denominam-se vítimas
indefesas as que, sob o pretexto de que a persecução judicial
lhes causaria maiores danos do que o próprio sofrimento
resultante da ação criminosa, acabam deixando de processar
o autor do delito. São vistos tais comportamentos geralmente
nos roubos ocorridos nas ruas, nos crimes sexuais e nas
chantagens.
14. Vítima falsa. São taxadas de falsas vítimas as
pessoas que, por sua livre e espontânea vontade, se auto
vitimam para que possam se valer de benefícios.
15. Vítima imune. São consideradas dessa forma
as pessoas que, em decorrência de seu cargo, função, ou
algum tipo de prestígio na sociedade em que vive acham que
não estão sujeitas a qualquer tipo de ação delituosa que
possa transformá-las em vítimas. Um exemplo é o padre.
16. Vítima reincidente. Neste caso a pessoa já foi
vítima de um determinado delito, mas mesmo após ter
passado por tal episódio, não toma qualquer tipo de
precaução para não voltar a ser vitimizada.
17.  Vítima que se converte em autor.  Nesta
hipótese ocorre a mudança de pólo da violência. A vítima que
era atacada pelo autor da agressão se prepara para o contra-
ataque. Um exemplo clássico é o crime de guerra.
18. Vítima propensa. Ocorre com as pessoas que
possuem uma tendência natural de se tornarem vítimas. Isso
pode decorrer da personalidade deprimida, desenfreada,
libertina ou aflita da pessoa, sendo que esses tipos de
personalidade podem de algum modo contribuir com o
criminoso.
19. Vítima resistente. Por não aceitar ser agredida
pelo autor, a vítima reage e passa a agredi-lo da mesma
forma, sempre em sua defesa ou em defesa de outrem, ou
também no caso de cumprimento do dever. Neste caso há
sempre a disposição da vítima em lutar com o autor.

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20.  Vítima da natureza.  São pessoas que se
tornam vítimas em decorrência de fenômenos da natureza,
como no caso de uma enchente, um terremoto etc.
4.3 Outras Classificações
4.3.1 Classificação segundo Guaracy Moreira Filho
Guaracy Moreira Filho,  através do exercício da sua
profissão de Delegado de Polícia, chegou à conclusão de que
as vítimas devem ser classificadas do seguinte modo:
a) Vítimas Inocentes: são as que não contribuem para
o fato delituoso, não colaborando de nenhuma forma para a
consumação do crime. Entre outros exemplos, podem ser
citadas as vítimas de infanticídio, de abandono, de extorsão
mediante sequestro, de produtos adulterados ou falsificados,
etc.
b) Vítimas natas: são as que contribuem para a
consumação de uma infração penal, devido ao seu
comportamento agressivo e personalidade insuportável, que
acaba precipitando a eclosão do crime. Exemplos são a
imprudência nos crimes de trânsito, a prepotência ao expor
objetos de valor em locais perigosos, etc. As vítimas desta 
categoria normalmente se faz presente onde o criminoso
ocasional já se encontra, não precisando este “procurar sua
caça”. Apesar da culpa das vítimas imprudentes e
prepotentes, obviamente em caso de crime elas são menos
culpadas do que os delinquentes.
c) Vítimas omissas: são as que recusam integrar-se
na sociedade em que vivem, por atos como, por exemplo,
deixar de fazer as devidas denúncias à autoridade pública
quando sofrem algum dano, desprezando assim a cidadania,
já que tampouco há solidariedade em sua conduta. As vítimas
deste tipo se encontram nas regiões mais carentes da
sociedade, onde o Poder Público não se faz presente.
Exemplos de crimes onde se verificam esta categoria de
vítimas são os atentados sexuais como estupros, além da
violência doméstica, crime muito comum e que, todavia,
muitas vezes permanece impune.
d) Vítimas da Política Social: também chamadas de
vítimas da negligência do Poder Público, ou ainda de crime
branco, que é o poder público organizado contra o povo. A
corrupção é a principal causa dos crimes que acometem
estas vítimas da improbidade administrativa, verificada em
todos os países, com predominância nos mais pobres e nos
emergentes, como o Brasil.
4.3.2 Classificação segundo Jimenez de Asúa
A despeito de sua relutância em aceitar a Vitimologia
como ciência, Jimenez de Asúa deixou um ensaio sobre uma
nova tipologia de vítima, que abrange:
a) Vítima indiferente, que diz respeito à pessoa
atacada aleatoriamente;
b) Vítima indefinida ou indeterminada, que pode ser
colocada como a coletividade, ou indivíduos medianos que
sofrem com agressões e com a violência da sociedade
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moderna;
c) Vítima determinada, isto é, a pessoa atacada em
razão de uma característica própria.
Esta classificação apresenta um teor sociológico
delimitador da tipificação apenas em razão da sociedade
como um todo.
4.3.3 Classificação segundo Guglielmo Gulotta
Este autor assim descreve os tipos de vítima:
a) Vítima falsa – simulada ou imaginária: a vítima falsa
simulada é aquela que atua conscientemente ao provocar o
movimento da máquina judiciária, com o desejo de gerar um
erro judiciário ou, ao menos, alcançar a impunidade por algum
fato delitivo que tenha cometido. Já a vítima falsa imaginária é
aquela que erroneamente crê, por razões psicopatológicas ou
imaturidade psíquica, haver sido objeto de uma agressão
criminal.
b) Vítima real – fungível e não fungível: as vítimas
reais fungíveis podem ser, também, chamadas de
inteiramente inocentes ou vítimas ideais, pois, caso venha a
ocorrer um delito, sua relação com o criminoso é irrelevante e,
justamente por isso, elas  são “substituíveis” na dinâmica
criminal. As vítimas fungíveis não desempenham este papel
em função de uma concreta relação com o delinquente; o fato
delitivo não se desencadeia com base em sua intervenção,
consciente ou inconsciente.
As vítimas fungíveis se subdividem em acidentais e
indiscriminadas. As acidentais são aquelas colocadas, por
azar, no caminho dos delinquentes como, por exemplo,
aquela que se encontra num banco no exato momento em
que um grupo de assaltantes ali adentra para roubá-lo.
Já as indiscriminadas representam uma categoria
mais ampla que a anterior, pois não sustentam, em nenhum
momento, vínculo algum com o infrator como, por exemplo, as
vítimas de atentados terroristas.
Por outro lado, as vítimas não fungíveis são aquelas
que desempenham um certo papel na gênese do delito. Daí
serem consideradas “insubstituíveis” na dinâmica criminal. As
vítimas não fungíveis se subdividem em imprudentes,
alternativas, provocadoras e voluntárias.
As imprudentes são aquelas que omitem as
precauções mais elementares facilitando, dessa forma, a
concretização de um crime. Exemplo: deixar à mostra um
objeto valioso dentro de um veículo que esteja com os vidros
abertos.
As alternativas são aquelas que, deliberadamente, se
colocam em posição de sê-lo, dependendo do azar sua
condição de vítima ou de vitimário. Exemplo clássico
mencionado pela doutrina é o duelo.
As provocadoras, em que o delito surge,
precisamente, como represália ou vingança pela prévia
intervenção da vítima. Exemplo são os homicídios
privilegiados cometidos após injusta provocação da vítima.
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As voluntárias, que constituem o mais característico
exemplo de participação. Nestes casos o delito é resultado da
instigação da própria vítima ou de um pacto livremente
assumido. Exemplo típico é a eutanásia.
5 VITIMOLOGIA: Ciência autônoma ou ramo da
Criminologia?
Quanto à natureza da Vitimologia, não há
unanimidade entre os que a estudam. Uns defendem que ela
seja uma ciência autônoma, outros que seja apenas um ramo
recente da Criminologia. No entanto, a maioria, p.ex. Lola
Aniyar de Castro, tem adotado uma posição mais moderada
entendendo-a como um ramo da Criminologia, mas com uma
possibilidade efetiva de se tornar ciência (MOREIRA FILHO,
2006, p.76). Nesta mesma linha está Sempertegui
(p.63) apud PIEDADE JÚNIOR (1993, p.122): “a Vitimologia,
no momento, nada mais é do que ‘o esboço de uma
esperança e uma possibilidade de que ela venha tornar-se
ciência’”.
Dentre os que se posicionam a favor da
autonomia científica está o próprio Benjamin Mendelson,
afirmando que a Vitimologia faz parte do grupo de ciências
que partem de um fundamento composto já que é ciência
interdisciplinar que se compõe de todos os segmentos das
ciências humanas, como o Direito, a Psicologia, a Sociologia,
a Psiquiatria etc. (PIEDADE JÚNIOR, 1993, p.121)
Outro defensor da autonomia científica da
Vitimologia é Israel Drapkin (1974, p.13)  apud  PIEDADE
JÚNIOR (1993, p.122) para quem “a Vitimologia ‘basicamente
se refere ao estudo a vítima, e é precisamente essa definição
plural a que credencia a possibilidade do estudo do sujeito,
desde um grande número de aspectos diferentes e
antagônicos”.
Ainda defendem esta posição Ester Kosovski,
Edmundo Oliveira, Manzarena.
Dentre os que negam esta autonomia estão
Shecaira, que afirma ser a Vitimologia um recente movimento
criminológico; Jiménez de Asúa; Ellenberger, afirmando que
ela é “um ramo da criminologia que se ocupa da vítima direta
de um crime e que compreende o conjunto de conhecimentos
biológicos, sociológicos e criminológicos concernentes à
vítima” (ELLENBERGER, 1954, p.121,  apud  PIEDADE
JÚNIOR, 1993, p.124). Além de Paasch, Goldstein e
Goppinger, todos reproduzindo os mesmos argumentos.
A Vitimologia, para Guaracy Moreira Filho (2006,
p.77) é:
[...] uma disciplina
independente,
autônoma, não mais
um ramo da
Criminologia, pois
suas, vitórias e
conquistas sociais,
conforme se vê nesse
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estudo, são
marcantes e sólidas
[...] uma entidade
múltipla que estuda
cientificamente as
vítimas visando
adverti-las, orientá-
las, protegê-las e
repará-las contra o
crime.
Portanto, para o referido autor, não se trata de
uma ciência, mas de uma disciplina autônoma.
Quanto ao caráter multidisciplinar diante das
considerações até então elencadas há que se concluir que,
diferente do que ocorre quanto à sua natureza, há um
consenso que o admite.
Kosovski (2008) afirma ser a Vitimologia campo
multidisciplinar por excelência o qual se estende por diversas
áreas de atuação, portanto em diversos contextos. Dessa
maneira
[...] a atenção à vítima
engloba o estudo e a
pesquisa para
dimensionar e
conhecer melhor o
objeto, a adaptação
da legislação a uma
nova abordagem e o
apoio, assistência e
proteção à vítima na
chamada advocacia
da vítima.
(KOSOVSKI, 2008,
p.34)
Cabendo com o resultado da pesquisa o
desenvolvimento de ações como a intervenção em crises, a
compensação, a restituição, o ressarcimento do dano, a
assistência médica, psicológica e jurídica que prevê o
acompanhamento tanto na mediação como no processo
criminal.
Moura Bittencourt por sua vez, no I Simpósio
Internacional de Jerusalém, em 1973, “concluiu que a
Vitimologia é ainda um capítulo da criminologia”, no entanto
não se prende a ela exclusivamente, “se comunica com
outras e muitas”. (PIEDADE JÚNIOR, 1993)
Por fim para Heitor Piedade Júnior (1993) a
necessidade de rotular a Vitimologia enquanto ciência ou não
é irrelevante; para ele o que é importante é o seu caráter
multidisciplinar para que atinja seus objetivos. Assim, a
Vitimologia deve trilhar seus próprios caminhos para conhecer
a complexa órbita da manifestação do comportamento da
vítima face aos processos vitimizantes tentando buscar
alternativas para a prevenção e reparação nos processos de
vitimização.
6 CONCLUSÃO
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De tudo o que até aqui se pode analisar, resta
claro que os estudos da Vitimologia propõem-se a ir muito
além da análise da influência da vítima na ocorrência do
delito, já que não se limita a um momento específico do crime,
atingindo inclusive as conseqüências dele decorrentes.
A fim de fomentar o protagonismo da vítima no
processo – não só penal –, mas, sobretudo, a superação dos
efeitos de um crime na vida da vítima, surgiu a Vitimologia. Ao
lado da sociologia, da psiquiatria, da psicologia e de outras
ciências, veio expandir o estudo do crime persuadindo a
vítima a compor a trilogia do delito e de sua resolução,
retirando-a da marginalidade, dando-lhe voz a fim de que ela
supere os efeitos decorrentes do ilícito sem, contudo, retirar a
responsabilidade do autor.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Brasileira de Vitimologia. Rio de Janeiro: Carta Capital, 2008;

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direito penal-Parte Geral. 24 ed. rev. e atual. São Paulo:
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