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Jürgen Habermas
Tradução de Mauro Guilherme Pinheiro Koury
Recebido: 08.01.2015
Aprovado: 01.02.2014
Resumo: Neste importante texto o autor faz uma revisão das teorias da ação nas ciên-
cias sociais para neles estabelecer um parâmetro crítico onde situa as bases do conceito
de ação comunicativa no interior de sua teoria da ação comunicativa. Palavras-chave:
teorias da ação, ação comunicativa, mundo, mundo da vida
*
Tradução feita a partir do artigo de Habermas, Jürgen. Remarks on the concept of communicative action.
In: G. Seebass e T. Tuomela (Orgs). Social action. Boston: D. Reidel, 1985, pp. 151-177.
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ções que hoje competem entre si, a sa- teorias da ação se distinguem porque
ber: a teoria da troca social e o funcio- atribuem ao ator um conhecimento so-
nalismo sistêmico; a teoria da ação li- bre a estrutura proposicional. O ator
gada aos papéis e a fenomenologia da deve ser capaz de repetir in foro íntimo
autorrepresentação ou da apresentação os enunciados de um observador - (Por
que o sujeito faz de si; e, finalmente, o exemplo: ‘A’ acredita ou pensa, quer ou
interacionismo simbólico e a etnometo- pretende, deseja ou teme, que ‘p’) - e os
dologia (2). As unilateralidades e as dirige a si mesmo. Finalmente, as teo-
debilidades destas abordagens teóricas rias sociológicas da ação exigem para os
são aqui tomadas como uma oportuni- participantes da interação ao menos um
dade de introduzir os conceitos de ação conhecimento concordante: as suas in-
comunicativa e de mundo da vida (3). terpretações da situação devem se
Estas considerações intuitivas necessi- manter suficientemente dissimuladas.
tam de uma explicação que, no contexto Por conseguinte, todas estas abordagens
deste artigo, não é possível tentar dar. permitem ou admitem também a comu-
Mas, é possível enumerar e anotar aqui, nicação linguística, ou, em todo caso, a
pelo menos programaticamente, os pas- troca de informações. Além do mais, as
sos que precisariam ser dados para tal abordagens sobre teoria da ação se dis-
explicação, passos estes desenvolvidos tinguem segundo o acordo postulado
pelo autor no livro Teoria da Ação Co- pela coordenação da ação, ou seja, um
municativa (4). Em duas digressões se conhecimento comum, ou, simples-
adentrará, por um lado, na questão sobre mente, as influências externas de uns
qual é a relação que, no que diz respeito atores sobre os outros.
à teoria da sociedade, mantêm as cate- Um conhecimento "comum"
gorias de "ação estratégica" e de "ação deve satisfazer condições bastante rigo-
comunicativa", assim como as catego- rosas. Pois, não apenas se estar ante um
rias de “sistema” e de “mundo da vida”; conhecimento "comum" quando os par-
e, por outro lado, para apontar os pro- ticipantes concordam em algumas opi-
blemas filosóficos cujos esclarecimen- niões; tão pouco, quando sabem que
tos podem servir a uma teoria da ação concordam com elas. Chama-se aqui de
abordada em termos de uma pragmática comum a um conhecimento que funda
formal (5). um acordo, tendo tal acordo como
termo de um reconhecimento intersub-
1 - Os mecanismos de coor-
jetivo de pretensões de validade susce-
denação da ação. As teorias sociológi-
tíveis de crítica. Um acordo significa
cas da ação acima mencionadas coinci-
que os participantes aceitam um conhe-
dem em algumas decisões básicas. Em
cimento como válido, ou seja, como
primeiro lugar, optam por uma análise
intersubjetivamente vinculante. So-
que parte da perspectiva interna dos
mente, graças a este, pode um conheci-
agentes. Uma ação pode ser entendida
mento comum, atender e cumprir - na
como a realização de um plano de ação,
medida em que contêm componentes ou
que se baseia em uma interpretação da
implicações relevantes para uma se-
situação. O ator, ao levar adiante o seu
quência de interações, - as funções de
plano de ação, domina uma situação. A
coordenação da ação. As vinculações
situação da ação constitue um frag-
recíprocas apenas surgem de convicções
mento de um ambiente interpretado pelo
intersubjetivamente compartilhadas. Em
ator. Este fragmento se constitui à luz
contrapartida, o influxo externo (no
das possíbilidades de ações que o ator
sentido de influência causal) sobre as
percebe como relevantes para a execu-
convicções do outro participante da in-
ção do seu plano de ação. Das aborda-
gens sobre teoria do comportamento as
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teração tem apenas um caráter unilate- engano, não pode se contar subjetiva-
ral. mente como acordo. A sua capacidade
As convicções compartilhadas de coordenar a ação perde, assim, sua
intersubjetivamente vinculam os parti- eficácia. Um acordo perde o caráter de
cipantes da interação em termos de re- convicções comuns quando o afetado se
ciprocidade; o potencial de razões asso- dá conta de que este acordo é resultado
ciado às convicções constitue, então, de influência externa que outro exerceu
uma base aceita, em que se pode estar sobre ele.
para apelar para o bom senso do outro. Um ator só pode intentar tal
Este efeito de vínculo não pode estar intervenção se na execução do seu plano
presente em uma convicção onde um se de ação adota uma atitude objetivante
limita a induzir no outro (por meio de em direção ao seu entorno e se orienta
uma mentira, por exemplo). As convic- diretamente pelas consequencias que a
ções monológicas, ou seja, aquelas que, sua ação terá, quer dizer, se orienta di-
em seu foro íntimo, cada um possui retamente para o êxito de sua ação. Em
como verdadeiro ou correto, só podem contrapartida, os participantes da intera-
afetar as atitudes próprias de cada um. ção que tratam de coordenar de comum
No modelo do influxo ou da influência acordo os seus respectivos planos de
unilaterais (ou de uma influência recí- ação e só os executam sob as condições
proca) as razões, por melhores que se- do acordo alcançado, adotam a atitude
jam, não podem constituir instância de realizativa (performativa) de falantes e
apelação. Neste modelo, as boas razões ouvintes, e se entendem entre si, uns aos
não ocupam nenhuma posição privilegi- outros, sobre a situação dada e a forma
ada. Não é o tipo de meios que conta, de dominá-la. A atitude de orientação
mas o êxito da influência sobre as deci- para o êxito isola o agente dos outros
sões de um oponente, mesmo que se atores que encontra em seu entorno;
deva tal êxito ao dinheiro, à violência, porque, para ele, as ações de seus ad-
ou às palavras. versários, assim como o resto dos in-
Acordo e influência são meca- gredientes da situação, são simples
nismos de coordenação da ação que se meios e restrições para a realização do
excluem um ao outro, ou, ao menos, a seu próprio plano de ação; os objetos
partir do ponto de vista dos participan- sociais não se distinguem neste aspecto
tes. Os processos de compreensão não dos objetos físicos. A atitude de orien-
podem se realizar simultaneamente com tação para a compreensão, ao contrário,
a intenção de chegar a um acordo com torna os participantes da interação de-
um participante da interação e de exer- pendentes um dos outros. Estes depen-
cer influencia sobre ele, quer dizer, de dem das atitudes de afirmação ou de
obrar causalmente algo nele. Na pers- negação de seus destinatários, porque só
pectiva do participante, um acordo não podem chegar a um consenso com base
pode ser forçado, não pode ser imposto no reconhecimento intersubjetivo das
por uma parte ou pela outra - seja ins- pretensões de validade.
trumentalmente, por intervenções dire-
2 - O conceito de ação teleo-
tas na situação de ação do outro, seja
lógica ocupa, desde Aristóteles, o cen-
estrategicamente, por meio de um im- tro da teoria filosófica da ação. O ator
pacto calculado sobre as atitudes do realiza os seus fins ou faz com que se
próximo. Objetivamente, é verdade que produza o estado desejado elegendo, em
um acordo pode vir forçado ou indu- uma determinada situação dada, os
zido; porém, o que a olhos vistos se meios que ofereçam perspectivas de
produz por influência externa, através êxito, e os aplicando de forma ade-
de recompensas, ameaças, sugestão ou
quada. Central nesse processo é o plano
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sos para fins alternativos, a relação en- algo a outro por meio de sinais, o que
tre gasto e rendimento. A utilidade aqui indiretamente provoca este outro, atra-
é o valor generalizado, ou seja, signifi- vés de uma elaboração inferencial da
cando o termo generalizado aquilo que percepção da situação, para uma idéia
liga por igual, em todos os lugares e em particular ou para conceber uma inten-
todos os momentos, todos os atores que ção específica; ou porque um ator, com
participam das operações monetárias. O base em uma prática cotidiana de co-
código dinheiro esquematiza as possí- municação já estabelecida, logre atar o
veis tomadas de posição de alter, de outro a seus próprios fins, quer dizer, o
modo que este pode aceitar ou recusar a motive, através da manipulação dos
oferta de troca de ego e, com ele, adqui- meios linguísticos, a adotar o compor-
rir uma posse ou renunciar a esta aqui- tamento desejado, instrumentalizándo-o,
sição. Sob estas condições, os partici- portanto, para o próprio êxito de sua
pantes da troca podem condicionar as ação. Só que o uso da linguagem orien-
suas ofertas através de suas tomadas de tado às consequências a que se pre-
posição recíprocas, sem ter que se tende, perde o telos (inscrito na própria
apoiar na disponibilidade à cooperação, linguagem) de um acordo a que os par-
que é o pressuposto da ação comunica- ticipantes da interação podem alcançar
tiva. O que se espera dos atores é, antes, entre si sobre algo.
uma atitude objetivante frente à situação (b) Os modelos de ação não es-
da ação e uma orientação racional para tratégica pressupõem como componente
as consequências da ação. A rentabili- essencial da coordenação da ação um
dade constitui o critério no qual se cal- uso da linguagem orientado ao enten-
culam as chances de êxito da ação. dimento, mesmo sob aspectos unilate-
O conceito de uma interação rais de acordo com o tipo de ação em
regida pelo meio dinheiro surge da idéia questão. Na ação regulada por normas o
de ação estratégica mediada pelo mer- entendimento serve como uma atualiza-
cado, ao mesmo tempo em que a subs- ção de um acordo grupal normativo já
titui, e se encaixa a um conceito de so- vigente na ação dramatúrgica, que se
ciedade articulado nos termos da teoria refere a uma autorepresentação para um
dos sistemas, que não precisa ser com- público, onde os "atores" se impressio-
plementado por quaisquer princípios ou nam uns aos outros. Utiliza-se aqui es-
por conceitos básicos do tipo normati- ses dois conceitos tal como eles foram
vistas. introduzidos, respectivamente, por Par-
As interações estratégicas tam- sons (1949) e Goffman (1959; 1967).
bém são entendidas, normalmente, O conceito de ação regulada
como linguisticamente mediadas, mas, por normas não se refere ao comporta-
dentro deste modelo os atos de fala mento de um ator em princípio solitário,
mesmo são assimilados como ações que encontre a sua volta outros atores,
orientadas ao êxito. Pois, para os sujei- mas, a membros de um grupo social que
tos que atuam estrategicamente, que orientam sua ação através de valores
labutam diretamente, quer dizer, sem comuns. O ator particular segue uma
qualquer mediação, para a realização de norma (ou a transgride), no interior de
seus planos de ação, a comunicação uma dada situação, onde se estabelecem
linguística é um meio, como qualquer as condições nas quais a norma se
outro, que se serve da línguagem para aplica. As normas expressam um acordo
provocar efeitos perlocutórios. Sem dú- vigente em um grupo social. Todos os
vida que existem numerosos casos de membros de um grupo, em que norma
entendimento indireto: seja no caso, por se aplica, tem o direito de esperar uns
exemplo, em que um ator dá a entender dos outros que, em determinadas situa-
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ação estratégica. Os sujeitos que agem tários das regras, de forma similar a
estrategicamente, que não se limitam a como os fatos vêm representados por
intervenções instrumentais, mas que orações assertóricas verdadeiras.
perseguem os seus objetivos por meio Ao descrever um processo
da influência sobre as decisões de ou- como interação dirigida por normas se
tros atores, têm que expandir o seu apa- pressupõe que os participantes distin-
rato categorial em relação ao que pode gam os componentes factuais da sua
se apresentar no mundo3. Com a situação de ação, quer dizer, os meios e
complexidade das entidades intramun- as condições, dos direitos e deveres. O
danas, porém, não aumenta a complexi- modelo normativo de ação parte do
dade do conceito do mundo objetivo em príncipio de que os participantes podem
si mesmo. A atividade teleológica dife- adotar uma atitude objetivante em dire-
renciada em atividade estratégica conti- ção a algo duvidoso, bem como uma
nua a ser um conceito que conta apenas atitude de conformidade em relação às
com um mundo. Em vez disso, os con- normas frente a algo que, com razão ou
ceitos de ação regulada por normas e de sem razão, é enviado. Mas, como no
ação dramatúrgica pressupõem relações modelo de ação teleológica, a ação é
entre um ator e, em cada caso, um concebida essencialmente como uma
mundo a mais. relação entre um ator e um mundo, -
Porquanto, no primeiro caso, no aqui, como uma relação com o mundo
caso da ação regulada por normas junto social em que o ator se enfrenta em seu
ao mundo objetivo dos estados de coisas papel de destinatário da norma e de
existentes, aparece um mundo social, onde pode estabelecer relações interpes-
que é atribuído ao ator como um porta- soais legitimamente reguladas.
dor de papéis, junto a outros atores que Nem aqui nem ali, porém, se
podem participar com ele de relações pressupõe ao ator em si um mundo, so-
interpessoais legitimamente regula- bre o qual o próprio ator pode existir
mentadas. Um mundo social consiste reflexivamente. Somente o conceito de
deste modo, em ordens institucionais ação dramatúrgica exige um pressu-
que fixam quais as interações que per- posto a mais, um pressuposto de um
tencem à totalidade das relações sociais mundo subjetivo, ao qual se refere o
e que podem se considerar justificadas, ator que, em sua ação, coloca em cena a
de um lado, e, simultaneamente, de to- si mesmo.
dos os destinatários deste complexo de No caso da ação dramatúrgica
normas que são afetados pelo mesmo o ator ação há de inventar-se, sobre o
mundo social. seu próprio mundo subjetivo, para se
Idêntico ao sentido do mundo apresentar ante um público com um
objetivo, que pode ser explicado por aspecto de si mesmo. Esse mundo sub-
referência à existência de estados de jetivo pode ser definido como o con-
coisas, também o sentido de mundo junto de experiências do qual o agente
social pode ser explicado por referência possui acesso privilegiado, em cada
à validade normativa das regras (no caso. Mas, nesse âmbito da subjetivi-
sentido de serem dignas de reconheci- dade, só se pode dar o nome de
mento). No plano semântico, as normas "mundo" se o significado de um mundo
vêm representadas por orações normati- subjetivo pode ser explicado de modo
vas universais (ou preceitos), que são análogo ao de como o significado de
aceitas como justificadas pelos destina- mundo social pode ser explicado por
referência à vigência de normas (aná-
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Pois, agora, podem apresentar-se no mundo logo, por seu turno, à existência de es-
atores capazes de tomar decisões e não apenas tados de coisas). Talvez se possa afir-
coisas e eventos.
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mar que o subjetivo é representado por postos ontológicos das descrições onde
orações de vivência emitidas como ver- aparecem os conceitos correspondentes
dadeiras, do mesmo modo que os esta- de ação. Ao empreender, como cientis-
dos de coisas podem ser representados tas sociais, tal descrição, se supõe que
por enunciados verdadeiros e as normas os atores entram em relações com mun-
válidas por orações de dever justifica- dos concebidos como representados por
das. uma totalidade de orações assertóricas
As experiências subjetivas não ou normativas ou expressivas válidas.
devem ser entendidas como estados Enquanto se emprega o modelo de ação
mentais ou episódios internos. Ao assim orientada ao entendimento tem-se que
serem entendidas apareceria, porquanto, atribuir aos atores às mesmas relações
próximas a entidades, a ingredientes do ator-mundo, mas, desta vez como rela-
mundo objetivo. ções reflexivas. Pode-se supor, então,
O ter experiências pode ser en- porquanto, que os atores também domi-
tendido como algo análogo à existência nam linguisticamente as relações que
dos estados de coisas, mas, não se deve estabelecem com o mundo e as mobili-
assemelhar um ao outro. Um sujeito zam para o fim cooperativamente se-
capaz de se expressar não "tem" ou guido de se entenderem.
"possui" desejos ou sentimentos no Os próprios sujeitos descritos
mesmo sentido em que se diz que um fazem uso daquelas orações, se valendo
objeto observável tem extensão, peso, das quais o cientista social, ao descrevê-
cor e outras propriedades semelhantes. las, foi capaz de esclarecer aqui o status
Um ator tem desejos e sentimentos no dos fatos, as normas e as experiências,
sentido de, se assim o quiser, poder ma- quer dizer, os referentes da ação endere-
nifestar essas experiências ante um pú- çada à consecução de fins, da ação re-
blico, de modo que esse público possa gida por normas e da ação dramatúr-
atribuir esses desejos e sentimentos ao gica. Os participantes da interação utili-
agente (na medida em que lhe dê cré- zam tais orações em atos comunicativos
dito) como algo subjetivo. com aqueles que buscam entender a sua
Ao descrever um processo própria situação, de modo que lhes se-
como ação dramatúrgica se propôs que jam possível coordenar de comum
o ator isenta o seu mundo interno do acordo os seus próprios planos de ação.
mundo externo. No mundo externo o O conceito de ação comunica-
ator pode certamente distinguir entre os tiva força ou obriga a considerar tam-
componentes normativos e os não-nor- bém os atores como falantes e ouvintes,
mativos da situação de ação. No modelo que se referem a algo no mundo obje-
de ação de Goffman, contudo, não está tivo, no mundo social e no mundo sub-
previsto que o ator possa enfrentar o jetivo, e se envolvem reciprocamente a
mundo social através de uma atitude de este respeito pretensões de validade que
conformidade com as normas. O ator podem ser aceitas ou postas em causa.
leva em consideração as relações inter- Os atores não se referem com intentione
pessoais legitimamente reguladas, mas, recta para algo no mundo objetivo, no
apenas, como fatos sociais. Parece tam- mundo social ou no mundo subjetivo,
bém apropriado classificar a ação dra- mas relativizam suas transmissões sobre
matúrgica, então, como um conceito este algo no mundo tendo presente a
que pressupõe dois mundos, a saber: o possibilidade de que a validade delas
mundo interno e o mundo externo, ou o possa ser posta em questão por outros
mundo subjetivo e o mundo objetivo. atores.
As relações ator-mundo discu- O entendimento, então, fun-
tidas até agora pertencem aos pressu- ciona como um mecanismo coordenador
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mundo, podem ser classificados como possui o status de pano de fundo pró-
fatos, normas e experiências. prios do mundo da vida.
Ao se introduzir este conceito Este conhecimento de fundo,
de situação, contudo, cabe distinguir fundamental, que tacitamente comple-
aqui entre "mundo" e "mundo da vida" a menta o conhecimento das condições de
partir do ponto de vista da tematização aceitabilidade das emissões linguistica-
dos objetos e da restrinção dos espa- mente padronizadas para que um ou-
ções de iniciativa. Em primeiro lugar, vinte possa compreender o seu signifi-
os conceitos de "mundo" e "mundo da cado literal, tem propriedades curiosas.
vida" servem à demarcação de áreas que É um conhecimento implícito, que não
são acessíveis, aos participantes de uma pode ser exposto em uma multiplicidade
dada situação, à tematização ou dela são finita de proposições. É um conheci-
subtraídos. mento, assim, holisticamente estrutu-
A partir da perspectiva dos par- rado, a cujos elementos remetem-se uns
ticipantes, vertida para a situação, o aos outros, e é ao mesmo tempo um
mundo da vida aparece como um con- conhecimento que não se encontra à
texto formador de horizontes dos pro- disposição direta do ator, no sentido de
cessos de entendimento, que delimita a que não se pode torná-lo consciente à
situação de ação e, portanto, permanece vontade, nem tão pouco se pode pô-lo
inacessível à tematização. Com os te- em dúvida, à vontade.
mas, são deslocados, também, os frag- O mundo da vida se encontra
mentos do mundo da vida relevantes presente na forma de autoevidências
para a situação. Para os quais surge uma com as quais, os que agem comunicati-
necessidade de entendimento com vista vamente, estão intuitivamente familiari-
à atualização das possibilidades de ação. zados, de modo que não se pode sequer
Apenas o que, deste modo, pode contar com a possibilidade de que se
se converter em um ingrediente da situ- tornem problematizaveis. O mundo da
ação, pertence aos pressupostos temati- vida não é "conhecido" no sentido es-
zaveis (a vontade) das emissões comu- trito, pois o conhecimento explícito se
nicativas com as que os participantes da caracteriza porque pode por-se em
interação se entendem sobre algo no questão e porque pode se fundamentar.
mundo. É bem verdade que estas pres- Apenas o fragmento do mundo da vida
suposições dependentes da situação relevante, em cada caso, para uma dada
formam um contexto, mas, ainda não é situação, constitui um contexto suscetí-
um contexto suficiente, não é suficiente vel de tematizar-se à vontade, nas emis-
para completar o significado literal das sões que os agentes comunicativos con-
expressões linguísticamente padroniza- vertem em temas, isto é, como algo no
das, de modo que estas cobrem o signi- mundo.
ficado perfeitamente determinado de um Mas o mundo da vida não tem
texto. Então, convém distinguir assim apenas a função de formar um contexto.
entre o contexto que condiz uma situa- Oferece uma provisão de convicções,
ção e o contexto que condiz o mundo da onde os participantes em comunicação
vida. recorrem para cobrir, com interpreta-
Como Searle (1969) demons- ções susceptíveis de consenso, a neces-
trou, a partir do último Wittgenstein, o sidade de entendimento surgida em uma
significado de um texto só pode ser determinada situação. Como recurso, o
apreendido dentro do contexto de uma mundo da vida cumpre, portanto, um
pré-compreensão que se desenvolve na papel constitutivo no processo de com-
medida em que se cresce em uma cul- preensão. O "mundo" e o "mundo da
tura dada. Pré-compreensão esta que vida" se diferenciam, assim, não só do
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ponto de vista da tematização dos obje- mento, etc como algo subjetivo. Os
tos, mas, também, a partir da restrição meios do entendimento se mantêm atra-
de espaços de ação. O mundo da vida, vés de uma peculiar semitranscendên-
na medida em que entra em considera- cia.
ção como recurso de processos de inter- Embora os participantes da in-
pretação, pode ser representado como teração mantenham a sua atitude reali-
um acervo linguisticamente organizado zativa, a linguagem por eles usada no
de panos de fundo, que se reproduzem momento continua no entorno, à suas
na forma de tradição cultural. voltas. Assim, a cultura e a língua, não
O conhecimento de fundo contam normalmente como ingredientes
transmitido culturalmente ocupa, frente da situação. Não restringem, de modo
às emissões comunicativas geradas com algum, o espaço de ação, nem tão pouco
a sua ajuda, uma posição de certo modo caem sob um dos conceitos formais de
transcendental. Provê que os partici- mundo com cuja ajuda os participantes
pantes da interação encontrem, já de se entendem sobre uma determinada
antemão interpretada, - em relação ao situação. Não existe necessidade, assim,
que o conteúdo se refere, - a conexão de nenhum conceito sob o qual os parti-
entre o mundo objetivo, o mundo social cipantes pudessem apreender como
e o mundo subjetivo. elementos de uma situação de ação4.
Quando os participantes trans- Algo diferente do que sucede
cendem o horizonte de uma situação com as tradições culturais, é o que
dada, deste modo, não se movem em acontece com as instituições e as estru-
um vazio. Todavia, voltam imediata- turas de personalidade. Estas podem,
mente a se encontrar em outro âmbito, supostamente, limitar o espaço de inici-
agora atualizado, mas, no entanto, já ativa dos atores, ficar em seu caminho
pré-interpretado, através do cultural como ingredientes da situação. Daí que
autoevidente. Na prática comunicativa apareçam, também, como algo norma-
cotidiana não ocorrem situações abso- tivo ou como algo subjetivo, por assim
lutamente desconhecidas, e as novas dizer, de nascimento, sob um dos con-
situações emergem, também, de um ceitos formais do mundo.
mundo da vida que é construído através Mas esta circunstância não deve
de uma provisão de conhecimento de levar à suposição de que as normas e as
antemão sempre familiar. Frente ao experiências (como os fatos ou as coisas
mundo da vida quem atua comunicati- e eventos) se apresentem exclusiva-
vamente não pode adotar uma atitude
extramundana, nem pode tão pouco o 4
Apenas nos raros momentos em que fracassam
fazer frente à linguagem, como meio de
como recursos, a cultura e a linguagem
seus processos de entendimento. desenvolvem a peculiar resistência que se
Ao executar ou ao entender um experimenta nas situações de um entendimento
ato de fala, os participantes de uma co- conturbado. É quando se precisam, então, de
municação se movem até tal ponto no trabalhos de reparação de tradutores, intérpretes
ou terapeutas. Mas, nem eles, contudo, quando
interior de sua língua, que uma emissão tentam levar, a uma interpretação comum,
atual não pode pô-la ante si como "algo elementos do mundo da vida que se tornaram
intersubjetivo", do mesmo modo como disfuncionais (transmissões ininteligíveis,
pode ter a experiência de um evento tradições que perderam sua transparência e, no
como algo objetivo, ou da forma como caso limite, uma linguagem não decifrada),
podem recorrer a algo além dos três conceitos
uma expectativa de comportamento vem de mundo conhecidos. Esses elementos do
ao encontro deles como algo normativo, mundo da vida que falharam como recursos têm
ou, ainda, do modo como vivem (ou de ser identificados como fatos culturais que
atribuem a outro) um desejo, um senti- restringem o espaço de ação.
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mente como algo sobre o que os partici- parece impor-se a ele, e seja por ele
pantes da interação se considerem. Po- abordado como um problema que tem
dem adotar um status duplo, - como de solucionar, por assim dizer, por trás,
ingredientes de um mundo social ou de contudo, o mesmo agente se vê susten-
um mundo subjetivo, por um lado, e tado pelo pano de fundo que é o seu
como componentes estruturais do mundo da vida. O domínio das situa-
mundo da vida, por outro. O pano de ções se apresenta como um processo
fundo, que constitui o mundo da vida, circular onde o ator, simultâneamente, é
consiste de habilidades individuais, de o iniciador de ações atribuíveis e o pro-
conhecimento intuitivo sobre como lidar duto das tradições culturais de onde se
com uma situação, e de práticas social- encontra, quer dizer, dos grupos de soli-
mente conhecidas e exercitadas, - quer dariedade a que pertence e dos proces-
dizer, do conhecimento intuitivo sobre o sos de socialização e aprendizagem a
no em que se pode apoiar ou o no em que está sujeito.
que se pode confiar em uma determi- Em vez da perspectiva do
nada situação, - de convicções, de agente, contudo, se adotar a perspectiva
fundo, trivialmente conhecidas. do mundo da vida, se pode transformar
A sociedade e personalidade a questão articulada nos termos de uma
não apenas operam como restrições, teoria da ação em uma questão estrita-
mas cumprem, também, a função de mente sociológica: na qual as funções
recursos. A aproblematicidade do adotam a ação orientada ao entendi-
mundo da vida, no e desde o que se age mento para a reprodução do mundo da
comunicativamente, é explicado pela vida. Os participantes da interação, para
segurança que o ator credita a solidarie- entender um ao outro em uma situação,
dades e a competências comprovadas. se movem dentro de uma tradição cultu-
Pode-se mesmo dizer que a caráter pa- ral, da qual fazem uso ao mesmo tempo
radoxal do conhecimento de que se em que a renovam. Os participantes da
compõe o mundo da vida, um conheci- interação, deste modo, ao coordenar as
mento que apenas proporciona o senti- suas ações através do reconhecimento
mento de certeza absoluta porque não se intersubjetivo das pretensões de vali-
sabe dele, se deve ao fato de que o co- dade suscetíveis de crítica, as apoiam
nhecimento sobre o do em que se pode em seus pertencimentos a grupos sociais
apoiar e sobre o de como se faz algo, se e reforçam ao mesmo tempo a integra-
encontra ainda entrelaçado, de forma ção destes. No caso das crianças, nesse
indiferenciada, com o aquilo que prerre- aspecto, ao participarem de interações
flexivamente se conhece. Mas, se as com pessoas que agem competente-
solidariedades dos grupos integrados mente, internalizam as orientações valo-
por meio de valores e normas e as habi- rativas de seu grupo social e adquirem a
lidades dos indivíduos socializados capacidade generalizada para a ação.
afluem por trás da ação comunicativa, o Sob o aspecto funcional do
mesmo que o faz as tradições culturais, entendimento a ação comunicativa
o mais conveniente é corrigir o estreitís- serve, então, tanto à tradição quanto à
simo conceito culturalista de mundo da renovação do conhecimento cultural.
vida. Abaixo o aspecto de coordenação da
(c) Foi introduzido o conceito ação serve à ação social e ao estabele-
de mundo da vida como pano de fundo cimento de solidariedade, e, sob o as-
da ação comunicativa. Embora o frag- pecto de socialização, finalmente, a
mento do mundo da vida, relevante a ação comunicativa serve ao desenvol-
uma dada situação, em relação ao vimento das identidades pessoais. As
agente que atua comunicativamente, estruturas simbólicas do mundo da vida
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jos, etc, para que o ouvinte possa dar no mundo; uma atitude expressiva, que
credibilidade ao dito. um sujeito que faz uma apresentação de
A análise das pretensões de va- si mesmo manifesta algo do seu interior
lidade que tem por meta primeira a co- diante de um público, a que tem acesso
munidade de convicções normativas, privilegiado; e, finalmente, a atitude de
conhecimento proposicional e confiança conformidade com as normas, em que
recíproca, fornece, em segundo lugar, a um membro de um grupo social atende
chave para a identificação das funções ou viola as expectativas legítimas do
básicas do entendimento linguístico. A comportamento (HABERMAS, 1984, v.
linguagem serve (a) para o estabeleci- 1, pp. 390-420) 8.
mento e para a renovação de relações (d) Prática comunicativa coti-
interpessoais em que o falante se refere diana e mundo da vida. Por fim, a aná-
a algo no mundo das ordens legítimas; lise praticada nos termos da pragmática
(b) para a exposição ou pressuposição formal, que parte dos atos de fala alta-
de estados e eventos, com os quais o mente idealizados, isolados e elementa-
falante faz referencia a algo no mundo res, tem que ser desenvolvida até a cir-
dos estados de coisas existentes; e (c) custância de onde resultem reconhecí-
para a demonstração de experiências, ou veis os pontos de contato para uma pes-
seja, a autorepresentação do próprio quisa das tramas complexas da ação e
sujeito, no qual o falante faz referencia das formas e estilos de vida comunicati-
a algo no mundo subjetivo, a que tem vamente estruturadas. Trata-se aqui, em
acesso privilegiado. primeiro lugar, do problema funda-
A estas funções respondem, em mental de como se relaciona o signifi-
terceiro lugar, os modos básicos do em- cado contextual de um ato de fala com o
prego da linguagem; destes modos de- significado literal dos elementos da ora-
vem derivar um amplo espectro de for- ção e das orações referidas. Busca-se
ças ilocucionárias cunhadas em cada mostrar que o significado literal de-
idioma. Só alguns tipos ilocucionários pende dos complementos fornecidos
possuem um caráter tão universal, que pelo contexto que representa a situação
resultam diretamente aptos para caracte- e pelo pano de fundo que representa o
rizar um modo básico. Neste sentido, as mundo da vida. Mas, essa relativização
promessas e os mandatos podem repre- do significado das expressões linguísti-
sentar o uso regulador da linguagem, as camente estandartizadas não conduz a
constatações e as afirmações ao uso uma dissolução contextualística de
constatativo, e as confissões ao expres- constantes semânticas, quer dizer, para
sivo. um consequente relativismo do signifi-
Os tipos puros do uso da lin- cado. Isso porque, as formas e os estilos
guagem orientado à compreensão, sobre de vida particulares não apenas ofere-
todos os casos típicos de emprego de cem os ares de família, mas, também,
orações normativas, orações assertivas e neles se repetem as infraestruturas uni-
orações expressivas, oferecem, em versais do mundo da vida (HABER-
quarto lugar, bons modelos para a aná- MAS, 1987, v. 2, p. 429 e ss.; v. 2, p.
lise das referências ao mundo ou a rela- 193 e ss.).
ções com o mundo e com as atitudes
básicas que o falante adota ao se referir
a algo no mundo. Para os conceitos de 8
O autor ainda não fez nenhum estudo sobre
mundo objetivo, mundo subjetivo e uma lógica pragmática que pudesse explicar a
mundo social correspondem uma ati- conservação de validade no trânsito regulado de
tude objetivante, que um observador um modo de comunicação para outro. Sobre as
neutro possui sobre algo que acontece transferências intermodais de validade, ver,
Habermas (1984, v. 1, p. 422, nota 84).
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Para esta forte tese não basta parte da função de compreensão se en-
considerações relativas à teoria do sig- contram também, agora, a de coordena-
nificado. É necessário, nessa direção, ção da ação e a da socialização dos
em segundo lugar, mostrar que, entre os atores. Sob o aspecto da compreensão,
componentes estruturais dos atos de fala os atos comunicativos servem para o
elementares, por um lado, e as funções fornececimento de um saber cultural-
que os atos de fala podem cumprir na mente acumulado: a tradição cultural,
reprodução do mundo da vida, por ou- como já observado, se reproduz através
tro, se dão as conexões internas. do meio que representa a ação orientada
Fez-se corresponder assim, até à compreensão. Sob o aspecto de coor-
agora, os componentes proposicionais, denação da ação esses mesmos atos co-
ilocucionários e expressivos, que devem municativos servem ao cumprimento de
ser reconhecidos no formato normal de normas ajustado ao contexto definido
qualquer ato de fala elementar, em rela- em questão: a integração social também
ção às cognições ou conhecimentos, e se cumpre através desse meio. Sob o
em relação às obrigações e expressões. aspecto de socialização, finalmente, os
Mas, se si trás junto os correlatos pré- atos comunicativos servem à construção
linguísticos que são conhecidos através de controles internos de comporta-
das investigações sobre o comporta- mento, e, em geral, à formação de es-
mento animal, - a partir da perspectiva truturas de personalidade: uma das
de uma história evolutiva, e de forma a idéias básicas de Mead é a de que os
estabelecer uma comparação, - se vê processos de socialização se realizam
como estes tiveram que experimentar através de interações linguisticamente
uma mudança ao acederem ao nível mediadas (HABERMAS, 1987, v. 2, pp.
linguístico. 91-111).
As percepções e as representa- Resta, como terceira tarefa, a de
ções, de forma semelhante ao compor- por a pragmática formal em relação com
tamento adaptativo, adotam uma estru- as abordagens empíricas, de modo que
tura proposicional. As solidariedades os instrumentos analíticos veiculem
geradas ritualmente, e as obrigações uma flexibilidade suficiente para lidar
frente a um coletivo, são clivadas, no com a complexa prática cotidiana. Caso
plano de ação regida por normas, pelo contrário, o conceito normativo de ação
reconhecimento intersubjetivo das nor- orientada à compreensão pode ser usado
mas vigentes, por um lado, e por moti- para uma pesquisa sistemática dos ní-
vos de ação em conformidade com as veis linguísticos da realidade (como o
normas, por outro lado. jogo, a ficção, as piadas, a ironia, etc) e
As expressões relacionadas ao para as patologias da linguagem (HA-
corpo, que surgem espontaneamente, BERMAS, 1984, v. 1, pp. 419-427).
perdem o seu caráter involuntário, deste 5 - digressões (a) Os planos da
modo, quando são substituídas por ação social e da integração social.
emissões linguísticas ou interpretadas Considera-se a ação comunicativa e a
por meio delas. As emissões ou mani- ação estratégica como dois tipos de ação
festações expressivas servem assim a social, que representam uma alternativa
intenções comunicativas, e podem ser a partir da perspectiva do próprio
usadas intencionalmente. agente; os participantes da interação,
Este assentamento das cogni- mesmo que de forma intuitiva, têm que
ções, obrigações e expressões, sobre escolher entre uma atitude orientada ao
uma base linguística, pode explicar por êxito ou uma atitude orientada para o
que os meios linguísticos de comunica- entendimento. No entanto, é necessário
ção cumprem determinadas funções: à
frisar, as estruturas da atividade teleoló-
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das consequências da ação e dos resul- volvido pelo autor no Erste Zwischen-
tados da ação, que vai além do emara- betrachtung9 (HABERMAS, 1984, v. 1,
nhamento ou da concatenação das ori- pp. 351 e ss.) pode ser realizado, assim,
entações da ação. esta teoria também tem consequências
As sociedades podem ser con- para a resolução de problemas filosófi-
sideradas, assim, sob o aspecto do cos. Contudo, em primeiro lugar, esta
mundo da vida e sob o aspecto de sis- teoria pressupõe, do mesmo modo, uma
tema. No interior de cada um desses contribuição à teoria do significado.
aspectos, tem-se que contar com diver- Ao dar prosseguimento no inte-
sos mecanismos de integração social rior de uma abordagem da semântica
neles contidos. veritativa, a pragmática formal faz deri-
De novo, apenas se dá uma cor- var a compreensão de uma emissão lin-
respondência unívoca entre a ação co- guísticamente estandartizada do conhe-
municativa e a integração social. No cimento das condições gerais em que
entanto, os mecanismos de integração um ouvinte pode aceitar a emissão. Um
sistêmica partem ou operam sobre os ato de fala é entendido, assim, quando
resultados e as consequências da ativi- se sabe o que o torna aceitável. Do
dade teleológica, ou seja, sobre os efei- ponto de vista do falante, as condições
tos sobre que, tanto as ações comunica- de aceitabilidade são idênticas às condi-
tivas como as ações estratégicas podem ções do seu êxito ilocucionário. A acei-
provocar no mundo objetivo. tação não vem definida em um sentido
Mas, há uma classe de meca- objetivista a partir da perspectiva do
nismos sistêmicos que não são igual- observador, mas, desde a atitude per-
mente compatíveis com os dois tipos de formativa dos participantes na comuni-
ação: aqui são destacados, especial- cação.
mente, os meios de controle ou de re- Um ato de fala será chamado de
gulação, tais como o dinheiro e o poder. "aceitável" se satisfizer as condições
Estes meios de comunicação ampla- necessárias para um ouvinte tomar uma
mente deslinguistizados governam um posição com um "sim" frente à preten-
tráfico social amplamente fora das nor- são de validade trazida pelo falante.
mas e dos valores sociais e dos meca- Estas condições não podem ser satis-
nismos de formação linguística de con- feitas de forma unilateral, nem relati-
senso, - especialmente tendo em vista os vamente ao falante, nem relativamente
subsistemas de ação econômica e de ao ouvinte; antes, se trata de condições
ação administrativa "racionais com ori- de reconhecimento intersubjetivo de
entação a fins", que têm sido autonomi- uma pretensão linguística que, de um
zado frente aos contextos do mundo da modo típico para cada classe de atos de
vida. Assim, como estes meios de re- fala, fundou um acordo, especificado
gulação ou contrôle forçam a passagem em termos de seu conteúdo, sobre as
da ação comunicativa a uma interação obrigações relevantes para a interação
regida por meios resulta, aqui, por sua que acompanha.
vez, uma correspondência unívoca, ou A teoria da ação comunicativa
ao menos clara, entre a ação estratégica, se propõe como tarefa, ademais, inves-
por um lado, e os sistemas de ação dife-
9
renciados através de meios, por outro Habermas se refere aqui ao capítulo III do tomo
lado. I do seu livro Teoria do agir comunicativo. Na
tradução em português da Martins Fontes a
(b) Consequências filosóficas. tradução dada para Erste Zwischenbetrachtung
A teoria da ação comunicativa é talhada se encontra como ‘Primeira Consideração
no molde das necessidades da teoria da Intermediária’. Consultar a tradução para o
sociedade, mas, se o programa desen- português em Habermas (2012, v.1, pp. 473-
581). [Nota do tradutor].
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tigar a "razão" inscrita na própria prá- plano, a unidade da razão vem assegu-
tica comunicativa cotidiana e recons- rada processualmente, quer dizer, medi-
truir, a partir da base de validade do ante o procedimento que representam o
discurso, um conceito não reduzido de desempenho e as resoluções argumen-
razão. Ao se partir do emprego não co- tativos de pretenções de validade. Uma
municativo do conhecimento proposi- teoria da argumentação erguida nos
cional em ações orientadas à consecu- termos de uma pragmática formal pode,
ção de fins, se toma uma predecisão em deste modo, com base nos diferentes
favor do conceito de racionalidade cog- papéis das pretensões de validade na
nitivo-instrumental que, cunhou com ação comunicativa, distinguir entre dis-
tanta força através do empirismo a auto- tintas formas de discurso e esclarecer as
compreensão da modernidade. relações internas entre esses tipos de
Este conceito traz consigo co- discursos.
notações de uma autoafirmação acom- Por fim, a teoria da ação comu-
panhada pelo êxito, ativadas por um nicativa torna os seus determinados im-
controle informado, e uma inteligente pulsos críticos que, - desde Humboldt
adaptação, às condições de um entorno (até Austin e Rorty), - vêm ocorrendo
contingente. Ao se partir, no entanto, do no seio da filosofia da linguagem. A
emprego comunicativo do conheci- teoria da ação comunicativa critica a
mento proposicional em atos de fala, orientação unilateral da filosofia oci-
toma-se uma predecisão em favor de um dental pelo mundo do ser. A este pre-
conceito mais amplo de racionalidade domínio do pensamento ontológico cor-
que se conecta com as velhas idéias so- responde o privilégio de que é objeto o
bre o logos. conhecimento em epistemologia e em
O conceito de racionalidade teoria da ciência, assim como da im-
comunicativa traz consigo conotações portância metodológica que cobra ora-
que, em última instância, se remontam à ção assertiva da semântica.
experiência central da capacidade de O estudo pragmático-formal
unir sem coações e de fundar consensos dos processos de compreensão pode,
que possui um discurso argumentativo enfim, dissolver essas fixações. Contra
em que diferentes participantes superam estas unilateralizações ontológicas e
a subjetividade inicial de suas concep- cognitivistas pode fazer valer essa com-
ções e, graças à comunidade de convic- preensão descentrada do mundo que
ções racionalmente motivadas se asse- entrelaça, a limine, o mundo objetivo
guram, simultaneamente, da unidade do com o mundo social e o mundo subje-
mundo objetivo e da intersubjetividade tivo e exige uma orientação simultânea
do plexo da vida social em que se mo- visando às pretensões correspondentes
vem. Mas, essa contraposição é já o de validade, que são a verdade proposi-
resultado da tentativa disparatada de cional, a justeza normativa e veracidade
interromper o momento cognitivo-ins- ou a autenticidade.
trumental da razão desse conceito mais
Referências
amplo de razão.
Certamente que, no plano das BLAU, Peter. Exchange and Power in
culturas de especialistas, as orientações social life. New York: 1964.
racionais têm-se separado hoje até tal DAHRENDORF, Ralph. Class and
ponto que a elaboração reflexiva sobre class conflict in industrial society. Stan-
questões de verdade, questões de justiça ford, CA: Standford, University Press,
e questões de gosto se atêm a uma ló- 1959.
gica interna distinta para cada uma des-
tas três esferas. Mas, também, nesse GOFFMAN, Erving. Interaction ritual.
New York: Doubleday Anchor, 1967.
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Abstract: In this important text, the author reviews the theories of action in the social
sciences to establish in them a critical parameter which lays the foundation of the con-
cept of communicative action within his theory of communicative action. Keywords:
theories of action, communicative action, world, world of life
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