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Disciplina Análise Estrutural – Método dos Elementos Finitos

Turma 2/2019

MODELAGEM E ANÁLISE DE UMA BIELA AUTOMOTIVA

UTILIZANDO O MÉTODO DOS ELEMENTOS FINITOS

Gabriel Martins de Castro


João Marcos Hilário Barcelos Júnior
Paulo Cezar da Silva

castro.mgabriel@outlook.com
joaomarcos.hilario@gmail.com
pcs_dir2@yahoo.com.br

Universidade de Brasília. Faculdade do Gama


Área Especial de Industria Projeção A, DF-480 - CEP 72444-240 – Gama – DF – Brasil

Resumo: A biela apresenta-se como um dos principais componentes de uma máquina que tem
como principal função transmitir ou transformar um movimento retilíneo em circular contínuo.
Em motores de combustão interna, a biela é o componente responsável por transmitir a força
gerada na câmara de combustão, obtida pelo pistão, à árvore de manivelas. Neste artigo, será
realizada uma análise de convergência de uma biela automotiva – durante um ciclo em um
motor a gasolina de 4 tempos – a partir da variação do tipo de elemento utilizado no modelo e
o refino gradual de sua malha. O modelo foi desenvolvido utilizando o software SolidWorks
2018 e posteriormente, com base no software ANSYS mechanical APDL 18.1, é efetuado a
verificação do deslocamento total e a tensão de von Mises do componente, de forma a se
verificar a convergência dos resultados. As análises mostraram uma variação significativa dos
valores obtidos conforme a mudança da escolha do tipo de elemento a se utilizar, enquanto,
que relativamente ao refinamento da malha do modelo, constatou-se um menor grau de
sensibilidade dos resultados.
Palavras-Chave: Biela, malha, ANSYS, análise de convergência.
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Turma 2/2019
1. INTRODUÇÃO

A biela é um dos principais componentes de um motor de combustão interna, sendo


responsável por transmitir a força gerada na câmara de combustão, obtida pelo pistão, à árvore
de manivelas. De acordo com Anusha (2013), as tensões desenvolvidas em uma biela
automotiva durante o ciclo do motor é uma combinação de esforços axiais e de flexão. A tensão
axial ocorre devido as pressões oriundas da queima durante a combustão, enquanto os esforços
de flexão são causados pelos efeitos centrífugos referentes ao movimento do conjunto pistão-
biela. Além disso, devido aos avanços dos processos de fabricação, concomitantemente com a
engenharia de materiais, a biela – por se apresentar como um componente vital ao
funcionamento do motor – vêm sendo foco principal em linhas de pesquisas nos últimos anos,
podendo ser obtida uma extensa revisão bibliográfica acerca do assunto.
A análise de tensão e deformação em uma biela de uma Hero Honda Splendor foi realizada
por Anusha (2013). Os resultados mostraram que em condições de carregamento, os maiores
valores de tensão e deformação são obtidos na região da biela onde conecta-se ao pistão.
Gautam (2013), em seu estudo, apresenta as análises de tensões em diferentes seções de uma
biela de um motor diesel. Três carregamentos diferentes foram aplicados ao modelo de forma
a verificar a variação das tensões nas seções, desta forma, foi verificado que nas seções
próximas a extremidade conectada ao pistão desenvolvem-se as maiores tensões, tendo uma
maior propensão à falha por fadiga.
O trabalho de Reddy e Shag (2016), apresenta uma análise estrutural e de frequências em
uma biela com insertos de titânio em sua estrutura, comparativamente a uma biela feita com
insertos de aço. As tensões foram calculadas teoricamente e verificadas numericamente
utilizando o software ANSYS Workbench. É demonstrado que a biela com insertos de titânio é
uma melhor opção relativamente a de aço, visto que, possui um maior tempo de vida sob fadiga
e proporciona uma redução do peso do componente. Ainda referente a comparação de materiais
da biela, Andoko e Saputro (2018) e Antony et al. (2016), em seus estudos, realizam uma análise
estática para obter as distribuições de tensão da peça e efetuar a comparação entre a utilização
de materiais distintos utilizados na fabricação da biela. Os resultados mostraram uma maior
influência de tensões compressivas próxima à região que se conecta ao pistão. Ademais, foi
observado que bielas feitas de aço possuem um desempenho superior em relação às de alumínio.
Baseado na revisão da literatura citada, uma análise de convergência de uma biela
automotiva de um modelo VW Golf GTI 2.0, fabricada a partir de aço SAE 4340, é apresentada
neste artigo. O modelo foi desenvolvido a partir do software SolidWorks 2018 e importado para
o ANSYS Mechanical APDL 18.1, sendo a análise realizada a partir do método dos elementos
finitos. Durante a análise, foram obtidos os respectivos valores de tensão de von Mises e
deformação total na região do furo de menor diâmetro, visto que, baseado na literatura, é a
região que está sujeita aos maiores esforços durante o funcionamento do motor. Além disso, foi
efetuado um refinamento p e um refinamento h da malha de elementos finitos, de forma a
verificar a influência de cada refinamento na análise de convergência dos resultados.

2. DESCRIÇÃO DO OBJETO

O material utilizado nesse estudo é o aço SAE 4340 devido a sua grande aplicação na área
automobilística, especialmente na produção de bielas de alto desempenho. O material em
questão possui uma composição química baseada principalmente em cromo, níquel e
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molibdênio. A curva de tensão-deformação é mostrada na Fig. 1. As propriedades mecânicas
são as seguintes: módulo de elasticidade, 𝐸 = 190 GPa, coeficiente de Poisson, 𝜈 = 0.3, limite
de escoamento, 𝜎𝑦 = 470 MPa e densidade, 𝜌 = 7850 kg/m³.

Figura 1. Curva tensão-deformação do aço SAE 4340 (Overfelt, R. A. et al., 2011)

A biela foi modelada utilizando o SolidWorks 2018 como mostrado na Fig. 2.


Posteriormente, o modelo foi importado para o software ANSYS Mechanical APDL 18.1, Fig.
3. Após a definição do tipo de elemento e as propriedades do material, a malha do modelo foi
gerada. Para a análise em consideração, a malha foi criada utilizando o elemento tetraédrico a
partir de três tipos diferentes de elementos, o Solid 185, 186 e 187. Além disso, em relação ao
tamanho dos elementos, foi realizado um refinamento gradual da malha, com tamanho máximo
de 4 mm e mínimo de 1.5 mm.

Figura 2. Modelo
SolidWorks da biela Figura 3. Modelo importado
para o Ansys APDL

Devido à complexidade intrínseca ao comportamento de um motor à combustão interna,


fez-se necessário uma análise mais apurada sobre as aplicações das condições de contorno do
modelo. Para determinar qual carga aplicar à biela é necessário saber qual a pressão gerada
durante a queima em um motor de combustão interna. No presente artigo, foi considerado um
motor de um modelo VW Golf GTI 2.0, que gera 230 cv à 4300 RPM. De acordo com Prof. Dr.
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Fernando Lang da Silveira (UFRGS), a pressão média efetiva (PME) em um motor à combustão
interna pode ser determinada analiticamente pela Eq. (1):

P
PME = 877
v. f (1)

Onde, P representa a potência do veículo em cavalos-vapor (cv), V é a cilindrada, em


litros (L) e f, a frequência de rotação do motor (RPM) para determinada potência.
Assim, para o veículo em questão, teríamos uma pressão média igual a 23,5 atm.
Entretanto, a PME representa somente uma aproximação de todos as pressões geradas durante
um ciclo no motor, ou seja, subestima o verdadeiro valor da pressão média, que ocorre durante
o tempo de explosão e expansão da mistura ar/combustível. Desta forma, em seu estudo,
observa-se que a pressão média durante a queima pode atingir até 3 vezes o valor da PME.
Logo, para o modelo, será aplicada uma pressão de 70 atm no orifício de menor diâmetro, tendo
um valor equivalente igual a 7 MPa. Na outra extremidade, devido à junção ao eixo de comando
de válvulas, foi colocado um suporte fixo na região, restringindo todos os graus de liberdade
do sistema naquele ponto. As condições de contorno são mostradas na Fig. 4.

Figura 4. Condições de contorno aplicadas sobre a biela

3. METODOLOGIA

Inicialmente será realizada a escolha do elemento de modo a representar o comportamento


físico do objeto de estudo de forma adequada. A partir disso, a estrutura será discretizada em
uma malha de elementos finitos que, por sua vez, receberá dois tipos de refinamentos, o
refinamento p e o refinamento h. O refinamento p, faz com que a ordem polinomial das funções
de interpolação em cada elemento seja aumentada sucessivamente e mantém a topologia da
malha inalterada. No refinamento h, a ordem polinomial das funções de interpolação permanece
constante. Porém, o tamanho dos elementos é alterado de forma a proporcionar um refinamento
da malha. Assim, será feito um refinamento p ao aumentar a ordem da função de forma do
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elemento e, concomitantemente, será realizado um refinamento h em cada tipo de elemento
selecionado, de forma a avaliar a variação da resposta conforme o refinamento da malha.
Com base na literatura é possível observar a utilização de três tipos de elementos
tridimensionais para análises estruturais. Estes elementos são, o Solid 185, 186 e 187. O
elemento Solid 185 tetraédrico, por sua vez, possui 4 nós com 3 graus de liberdade em cada nó,
sendo 3 translações, nas direções x, y e z. De acordo com Moaveni (2007), o elemento
tetraédrico de 4 nós é o mais simples dos elementos tridimensionais utilizados para análises
estruturais. Assim, devido ao fato de ser um elemento de mais baixa ordem, quando aplicado
em geometrias complexas, não representa fielmente o modelo em regiões mais curvas, não
podendo ser possível obter resultados que corroborem com o verdadeiro comportamento da
estrutura quando se é solicitada. O elemento tetraédrico Solid 186 é caracterizado como um
elemento de alta ordem, que possui 10 nós por elemento com 3 graus de liberdade por nó,
translação em x, y e z. Quando comparado com o tetraédrico de 4 nós (Solid 185), mostra-se
uma escolha mais adequada e mais precisa na modelagem de problemas com limites curvos.
Por fim, o elemento tetraédrico Solid 187, possui um comportamento bem similar ao do Solid
186, também sendo um elemento tridimensional de alta ordem que possui 10 nós por elemento,
com 3 graus de liberdade por nó. Possui um comportamento de deslocamento quadrático, sendo
adequado para modelar malhas irregulares (como as produzidas a partir de vários sistemas
CAD/CAM).
Após a escolha dos elementos e realizados os devidos refinamentos, serão obtidos os
deslocamentos, bem como as tensões de von Mises, de modo que os valores convirjam, ou seja,
devem parar de variar a partir de determinado nível de refinamento. Os refinamentos serão
realizados de forma iterativa até que os resultados convirjam, visando a acurácia dos valores
juntamente com um bom custo computacional durante a simulação.

4. ANÁLISE NUMÉRICA E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A princípio, foi realizado um refinamento h, com esse tipo de refinamento foi observado
que quanto menor for o tamanho do elemento, maior será a quantidade de elementos totais
usados para discretizar o domínio, sendo que a cada refinamento realizado pode-se obter
resultados que representam mais fielmente o comportamento real da estrutura. Entretanto, a
quantidade de refinamentos desta natureza que é necessário realizar para garantir uma boa
acurácia das respostas depende principalmente da ordem polinomial do elemento selecionado
para discretizar o domínio.
Para o refinamento p, foram utilizados três tipos diferentes de elementos, Solid 185, 186 e
187. Sendo o Solid 185 o elemento de menor ordem, notou-se uma maior presença de elementos
distorcidos durante a obtenção dos resultados, principalmente em regiões curvas (Fig. 5),
comparativamente ao Solid 186 e 187 (Fig. 6). De acordo com Soriano (2009), isso se deve ao
fato de o Solid 185 ser um elemento que possui um campo de deslocamento linear, ou seja, ao
se utilizar elementos tetraédricos, somente é possível representar campos de tensões constantes,
necessitando de um grande refinamento para se obter resultados confiáveis. Além disso, por ser
um elemento de baixa ordem, não é indicado para aplicações em geometrias complexas. Em
relação ao Solid 186 e 187, seus resultados são idênticos. Isso aconteceu por conta do fato de
ambos os elementos terem o mesmo número de nós por elemento, com um comportamento de
deslocamento quadrático.
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Figura 5. Deslocamento Figura 6. Deslocamento


total obtido utilizando o total obtido utilizando o
Solid 185 Solid 186

Destarte, os resultados encontrados para os deslocamentos e tensão de von Mises para cada
refinamento são mostrados nas Tabelas 1 e 2, respectivamente. Posteriormente, foi realizada
uma análise de convergência dos resultados que são indicados na Fig. 7 e Fig. 8. Com base nos
gráficos de convergência, é possível notar a perda de qualidade dos resultados ao se utilizar um
elemento de baixa ordem, apresentando também, uma maior dificuldade de se obter uma
convergência de seus resultados, visto que, é necessário um custo computacional muito maior
– devido à necessidade de um maior refinamento na malha – para que seja obtida uma maior
acurácia das variáveis primárias e secundárias do modelo, que, no presente artigo, representam
os deslocamentos e tensão de von Mises, respectivamente.

Tabela 1. Deslocamento total para diferentes refinamentos e elementos

Elemento Tamanho dos elementos da malha de discretização


utilizado 4 3 2 1.5 1.25

Deslocamento
(mm) para o Solid 5,29 5,51 6,52 7,61 7,4
185

Deslocamento
(mm) para o Solid 8,18 8,25 8,35 8,37 -
186

Deslocamento
(mm) para o Solid 8,18 8,25 8,35 8,37 -
187
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Tabela 2. Tensão de von Mises para diferentes refinamentos e elementos

Elemento Tamanho dos elementos da malha de discretização


utilizado 4 3 2 1.5 1.25

Tensão de von
Mises (MPa) para 22,8 24,7 30,4 34,9 1.25
o Solid 185

Tensão de von
Mises (MPa) para 38,7 39,0 39,0 39,9 -
o Solid 186

Tensão de von
Mises (MPa) para 38,7 39,0 39,0 39,9 -
o Solid 187

Convergência deslocamento
8,5
Deslocamento (mm)

8
7,5
7
Solid 185
6,5
Solid 186
6
Solid 187
5,5
5
0 100000 200000 300000 400000 500000
Número de elementos

Figura 7. Convergência dos resultados para o deslocamento total

Convergência tensão
44
Tensão de von Mises (MPa)

40

36

32 Solid 185
28 Solid 186

24 Solid 187

20
0 100000 200000 300000 400000 500000
Número de elementos

Figura 8. Convergência dos resultados para a tensão de von Mises


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5. CONCLUSÃO

Uma análise de convergência foi proposta para uma biela automotiva de um modelo VW
Golf GTI 2.0. A biela foi analisada com base no método dos elementos finitos a partir do
software ANSY mechanical APDL 18.1. Foi arbitrado uma pressão de 7 MPa no furo superior
que se conecta ao pistão, enquanto sua outra extremidade foi mantida fixada.
O deslocamento total e a tensão de von Mises foram obtidos para cada refinamento
realizado no modelo. Assim, observou-se que ao se efetuar um refinamento h, que consiste na
redução do tamanho do elemento que compõe a malha de elementos finitos, os valores das
grandezas analisadas aumentavam de tal forma a atingir um valor de equilíbrio, onde era
verificado a sua convergência. Entretanto, para o caso do elemento Solid 185, por se tratar de
um elemento de baixa ordem, mesmo após realizado os devidos refinamentos os resultados
encontrados divergiam em relação as mesmas análises feitas a partir do Solid 186 e 187.
Desta forma, o Solid 185 necessita de um grande refinamento de malha para que se obtenha
uma boa acurácia de resultados, porém, isso exige um grande custo computacional. Logo, o
refinamento p apresentou-se como uma boa alternativa para casos em que é necessária uma
acurácia elevada aliada a um bom custo computacional, posto que, as análises feitas a partir do
Solid 186 e 187, que são os elementos tridimensionais de mais alta ordem, mostraram-se mais
precisas e menos sensíveis em relação ao refinamento h, ou seja, foi necessário um menor
refinamento da malha para que pudesse ser observada a convergência dos resultados.

REFERÊNCIAS
Abhinav, G., K, P. A, 2013. Static stress analysis of connecting rod using finite element
approach. IOSR Journal of Mechanical and Civil Engineering, v. 10, n. 1, p. 47-51.
Andoko e Saputro, 2018. Strength analysis of connecting rods with pistons using finite
element method. MATEC Web of Conferences, v. 204, p. 1-6.
Antony, S. et al., 2016. Design and analysis of a connecting rod. International Journal of
Engineering Research, v. 5, n. 10, p. 188-192.
Anusha, B., 2103. Modeling and analysis of two-wheeler connecting rod by using Ansys.
IOSR Journal of Mechanical and Civil Engineering, v. 6, n. 5, p. 83-87.
Moaveni, S., 2007. Finite element analysis: Theory and application with ANSYS. 3rd ed.
Pearson Education, Inc.
Overfelt, R. A. et al., 2011. Hydrogen embrittlement of 4340 steel due to condensation during
vaporizes hydrogen peroxide treatment. Material Science and Engineering, v. 528, n. 10-
11, p.3639-3645.
Reddy, A. R, Shah, G. V., 2016. FEA based selection of connecting rod using ANSYS. p.
184-188.
Silveira, F. L. Força média exercida em um pistão. CREF, 2015. Disponível em:
<https://www.if.ufrgs.br/novocref/?contact-pergunta=forca-media-exercida-em-um-
pistao>. Acesso em: 25 de novembro de 2019.
Soriano, H. L., 2009. Elementos finitos – Formulação e Aplicação na Estática e Dinâmica das
Estruturas. Rio de Janeiro: Editora Ciência Moderna Ltda.

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