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Análise e simulação de um motor diesel de 3 cilindros

e 4 tempos, utilizando AVL BOOST

Gabriel Marcos Ponstein Pereira


Motores de Combustão Interna I - Prof. Leonel Rincon Cancino

Março de 2023

1 Introdução

A fim de analisar o desempenho e operação de um motor diesel de 3 cilindros e 4 tempos,


conforme representado na figura 1, será realizada uma simulação com o auxílio do software
AVL BOOST. Os modelos de troca de calor em dutos, cilindro e porto adotados, serão respecti-
vamente, Gnielinski, Bargende e Zapf. Os detalhes destes modelos serão discutidos na revisão
bibliográfica.

Figura 1: Esquema do motor analisado

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2 Revisão bibliográfica

2.1 Método Gnielinski

Para a análise de troca de calor em dutos, será adotado o método Gnielinski. Este método
consiste em uma formulação analítica para determinar o coeficiente de transferência de calor
em escoamentos turbulentos plenamente desenvolvidos em dutos. Consiste numa correlação
complexa e válida para tubos em uma grande variação no número de Reynolds, incluindo a
região de transição (LIENHARDT, 2019).

Ao contrário das equações de Dittus-Boelter e de Sieder-Tate, que podem gerar erros de até
25% em certos casos, a equação de Gnielinski se apresenta como uma solução mais complexa
e precisa, ao reduzir erros para até 10% (INCROPERA, 2011). Também é importante notar
que todas essas equações são aplicáveis a tubos lisos. Para escoamentos turbulentos em tubos
rugosos, o coeficiente de transferência de calor aumenta com a rugosidade da parede, à medida
que o número de Reynolds aumenta (LIENHARDT, 2019).

A transferência convectiva de calor entre o gás de exaustão e a parede do tubo pode ser
modelada pela abordagem de Nusselt:

αgw · dhyd
Nu =
λg

E a aproximação do número de Nusselt de acordo com Gnielinski é a seguinte:

(f /8) · (ReDh − 1000) · P r


N uDh =
1 + 12, 7 · (f /8)1/2 · (P r2/3 − 1)

Em que Dh consiste no diâmetro hidráulico, Re o número de Reynolds, Pr o número Prandtl


e f o coeficiente de atrito de Darcy. Nota-se a validade da expressão para Pr entre 0,5 e 2.000 e
ReDh entre 3.000 e 5 E6.

2.2 Método Bargende

A análise da troca de calor dentro do cilindro será realizada utilizando o método Bargende,
que consiste em um modelo transferência de calor fenomenológico para motores de combustão
interna tridimensionais. O modelo inclui a energia cinética turbulenta e descreve o processo de
combustão com a ajuda de um modelo de duas zonas, sendo baseado na aplicação local de uma
correlação Re-Nu aprimorada (BARGENDE, 2001).

O modelo de Bargende é considerado uma abordagem consistente para a parte de alta


pressão e baixa pressão do ciclo em motores, e sua formulação encontra-se a seguir.

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2.3 Método Zapf

Para a troca de calor no porto foi escolhido o método Zapf, que consiste em um mé-
todo numérico para geometrias complexas, desenvolvido pelo engenheiro e matemático alemão
Ernst-August Zapf na década de 1970.

O método tem como base a solução da equação de condução de calor usando o método
das diferenças finitas, usando um sistema de coordenadas não ortogonal que é alinhado com a
geometria do problema, o que permite uma modelagem mais precisa de formas complexas. O
método também leva em conta a transferência de calor convectiva na superfície do objeto que
está sendo modelado. Dessa forma, o método Zapf é aplicado da seguinte forma.

E as constantes são obtidas conforme as equações:

2.4 Considerações gerais sobre os métodos adotados

Com base na revisão bibliográfica realizada sobre os três métodos de cálculo de transferên-
cia de calor que serão utilizados nas simulações, é possível afirmar que se encontram dentro dos
limites de validade estipulados pelas fórmulas, além de serem métodos relativamente modernos
e com bom grau de acuracidade.

Em sequência encontram-se os dados obtidos a partir das simulações com os métodos


descritos.

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3 Simulação

3.1 Dimensões e características do motor

Conforme já enunciado, a simulação e posterior análise dos resultados será feita com base
em um motor ciclo Diesel de tempos. Na tabela a seguir encontram-se algumas de suas carac-
terísticas geométricas e de operação.

Tabela 1: Dados do motor

Característica Medida Unidade


Diâmetro do cilindro 100 mm
Curso do cilindro 130 mm
Comprimento da biela 220 mm
Taxa de compressão 18 / 19
Rbs 0,77
Pressão média no bloco do motor 1 bar
Ciclindradas 3.036 cm3

3.2 Resultados das simulações

Inicialmente foram obtidos os parâmetros de desempenho do motor, realizando simula-


ções em diferentes rotações do motor para uma taxa de compressão de 18:1, e esta foi a curva
característica obtida.

Figura 2: Curva característica para RC = 18

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Para estas condições, destaca-se uma potência máxima de 173,8 kW (236 cv) a 5000 rpm, e
um torque máximo de 435 Nm já obtidos em uma baixa faixa de rotação (1600 rpm), o que é um
comportamento característico de motores que operam em ciclo Diesel. A média do consumo
específico entre 1600 e 4100 rpm foi de 214 g/kWh.

Também foi obtida o gráfico de pressão média efetiva em função da velocidade média do
pistão na faixa de rotações simuladas.

Figura 3: Bmep para RC = 18

Em seguida, foram realizadas as mesmas simulações, somente alterando a razão de com-


pressão, desta vez para 19:1. A seguinte curva característica foi obtida.

Figura 4: Curva característica para RC = 19

Desta vez, destaca-se uma potência máxima ligeiramente maior que a anterior, de 176 kW
(238 cv) a 5000 rpm, e um torque máximo semelhante de 437 Nm na mesma faixa de rotação
(1600 rpm). A média do consumo específico entre 1600 e 4100 rpm se manteve próxima à
condição anterior, com uma pequena redução, sendo de 213 g/kWh.

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Segue o gráfico da pressão média efetiva em função da velocidade média do pistão, agora
para a nova razão de compressão.

Figura 5: Bmep para RC = 19

4 Análises

4.1 Considerações gerais sobre os resultados

Em um primeiro momento, pode-se afirmar que as simulações foram bem sucedidas. Não
houve nenhum erro registrado durante o processo, e todos os valores obtidos foram razoáveis.
Não houve, por exemplo, casos de potência negativa, nula ou com curvas demasiadamente
inconsistentes. Dessa forma, segue-se para uma análise do aspecto geral do formato das curvas.

4.2 Formato das curvas obtidas

Sobre o formato geral das curvas de torque e potência em relação à velocidade do mo-
tor, com base em curvas características genéricas para motores que operam em ciclo Diesel, é
possível afirmar que os resultados obtidos encontram-se coerentes.

As curvas seguem um comportamento/formato similar ao proposto por Robert Bosch,


como evidenciado na Figura 6.

É possível também comparar as curvas de consumo específico e pressão efetiva média com
o gráfico de um motor 6 cilindros, de 8.4L Diesel, naturalmente aspirado, com dimensões de di-
âmetro e comprimento do cilindro semelhantes (bore = 115mm, stroke = 135mm), representado
na figura 7.

Em ambas as razões de compressão houve um comportamento semelhante de queda, acom-


panhando a tendência de BMEP na figura 6. E para o consumo específico BSFC, a tendência
de aumento progressivo também foi observada nas curvas obtidas.

Nota-se, entretanto, que a ordem de grandeza dos valores da curva em relação às rotações
não parecem ser muito próximas, mas essa questão será melhor analisada na seção 4.4.

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Figura 6: Curva característica geral para motores Diesel

(BOSCH, 2004)

Figura 7: Curva característica geral para motores Diesel

(HEYWOOD, 2004)

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4.3 Comparação entre razões de compressão

A fim de comparar diretamente a variação específica no desempenho nas duas razões de


compressão, um novo gráfico foi plotado, desta vez com as duas curvas de torque e as duas
curvas de potência juntas.

Figura 8: Comparação de curvas características em diferentes RC

O gráfico da Figura 8 apresenta um comportamento esperado, uma vez que com uma razão
de compressão maior, houve um aumento nos valores das curvas de torque e potência. Para este
caso específico, um pequeno aumento na no RC, causou um pequeno deslocamento das curvas
para cima (maior potência e torque).

4.4 Comparação com valores reais

Outro passo importante na avaliação dos resultados obtidos nas simulações, além das aná-
lises teóricas, é a comparação dos valores encontrados com dados de motores reais já testados.

As especificações obtidas no motor simulado foram comparadas com outros 4 motores de


3.000 cm3 . Não foram encontrados exemplos de motores com esta cilindrada e 3 cilindros,
somente com 6, em posição em V e em linha.

A partir da comparação dos dados da tabela 2, concluí-se que os valores obtidos de potência
e torque, correspondem à valores próximos dos demais motores de mesma cilindrada. Nota-
se um torque abaixo da média dos demais (435 Nm obtidos, contra a média de 553 Nm dos
demais), mas seu valor ainda encontra-se próximo do torque máximo obtido no motor da Ford.

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Tabela 2: Comparação entre motores Diesel 3.0L

Potência Torque
Cilindrada
Fabricante Modelo Cilindros máxima máximo RC
(L)
(cv) (Nm)
Simulado referência 3.0 L3 236 435 18
Mercruiser
Mercury 3.0 V6 274 594 16,5
3.0L TDI
BMW M57 3.0 L6 286 580 16,5 a 18
Power Stroke
Ford 3.0 V6 253 440 16
Lion
AJ-V6D
Jaguar 3.0 V6 275 600 16,4
Gen III

Para o caso da potência máxima, o valor obtido na simulação ficou ligeiramente abaixo da
média dos demais (236 cv ante 272 cv). De forma geral, estes valores encontram-se em uma
ordem de grandeza suficientemente razoável.

Ambos valores de torque e potência ligeiramente inferiores aos demais motores pode ser
explicado pela quantidade inferior no número de cilindros. Portanto, concluí-se que os valores
obtidos expressam uma boa aproximação do comportamento real do motor.

4.5 Resumo dos resultados

Por fim, segue uma tabela com todos os dados obtidos nas simulações e utilizados para
montar os gráficos.

Tabela 3: Resumo dos dados obtidos

RC RPM Potência (kW) Torque (Nm) SFC (g/kW h) bmep (bar)


18 1660 75,6018 434,906 197,614 17,8423
18 2150 94,3958 419,262 204,988 17,2005
18 3400 136,394 383,077 224,351 15,716
18 4150 161,496 371,609 231,274 15,2455
18 5000 173,821 331,973 259,08 13,6194
18 5350 170,325 293,06 294,473 12,023
19 1660 76,057 437,525 196,432 17,9497
19 2150 95,0159 422,016 203,65 17,3135
19 3400 137,572 386,386 222,43 15,8517
19 4150 162,753 374,501 229,489 15,3641
19 5000 175,413 335,014 256,717 13,7441
19 5350 175,865 313,904 274,276 12,8781

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Referências Bibliográficas

BERGMAN, T. L. et al. Fundamentals of Heat and Mass Transfer. [s.l.] John Wiley Sons,
2011.

BOSCH, R. BOSCH Automotive Handbook. [s.l.] Robert Bosch, 2004.

CHIODI, M.; BARGENDE, M. Improvement of Engine Heat-Transfer Calculation in the


Three-Dimensional Simulation Using a Phenomenological Heat-Transfer Model. Warren-
dale, PA: SAE International, 24 set. 2001.

HEYWOOD, J. Internal Combustion Engine Fundamentals. [s.l.] McGraw-Hill Education,


1988.

LIENHARD, J. H. What is Gnielinski Equation - Definition. Disponível em: <https://www.thermal-


engineering.org/what-is-gnielinski-equation-definition/>. Acesso em: 30 mar. 2023.

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