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Comentários sobre o tédio


O Spleen na adolescência: sentir tédio ou ser entediante.

José Outeiral.
(segunda versão do texto/ material exclusivamente para circulação nos
Seminários: não revisado. Fevereiro de 2007. )

Cuidado leitor, ao voltar esta página


Aqui dissipa-se o mundo visionário e platônico
Álvares de Azevedo, Lira dos vinte anos

Morrer de tédio
Arthur Rimbaud, Une saison en enfer

Enunciado
O objetivo deste texto é discutir, num tempo de novíssimas, complexas e sempre
atualizadas classificações diagnósticas, estabelecidas numa perspectiva fenomenológica, uma
condição clínica, o “Spleen”, o tédio, relacionando-o à adolescência e à cultura contemporânea.
As raízes e relatos dessa experiência emocional, o “spleen” ou o tédio, são
encontradas no romantismo do século XIX e, em certos aspectos, tem hoje uma presença
marcante na adolescência.
Quero, também, abordar a importância de estabelecermos uma compreensão
psicodinâmica do tédio, mais especificamente entre “sentir tédio” e “ser entediante”. Ao tratar do
tema do “spleen” na adolescência, somos também remetidos às questões relativas às
resistências com as “transformações” dessa etapa da vida, da superficialidade nas relações e
da dificuldade em estabelecer uma intimidade verdadeira, assim como sentimentos de vazio e
de falta de sentido na vida.
Recorrerei, brevemente, a algumas contribuições da filosofia que poderão se
mostrar úteis ao clínico, indivíduo de per si habitualmente curioso.
O leitor logo reconhecerá que o tédio não é uma condição exclusiva do processo
adolescente, mas faz parte de diferentes momentos do ciclo vital.

O Spleen

Charles Baudelaire (1821-1867), conhecido poeta francês, publicou em 1851 um


conjunto de quatro poemas sob o mesmo título de “Spleen”. Ivan Junqueira, tradutor para nosso
idioma desses poemas, explica que “Spleen” é um vocábulo de origem inglesa que a língua
francesa incorporou no século XVIII para designar uma sensação de “tédio sem causa”. Para
este tradutor “o spleen é a expressão suprema do famoso “tédio baudelairiano”, oposto à
aspiração do poeta pelo absoluto e o infinito, cujo símbolo é o ideal. É sob essa tensão
antitética que se desenvolve toda a primeira parte da coletânea, não sem razão intitulada
´Spleen e o Ideal”. O “spleen”, refere Sérgio Alcides, foi uma expressão importante ao “ jargão
romântico”. Palavra inglesa que significa “baço”, órgão que os antigos gregos relacionavam aos
sintomas da melancolia, o “spleen” caracterizava sentimentos relacionados ao “pessimismo,
ceticismo e um irresistível tédio...Era chamado de mal do século – inspiração da corrente que
no Brasil ficou conhecida como ultra-romantismo, e que teve em Álvares de Azevedo seu
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primeiro grande nome” ( Sérgio Alcides, 2004 ). Recentemente Moacyr Scliar (2003) escreveu
sobre este tema, o “spleen” e o tédio, fazendo referências tanto a Charles Baudelaire como a
Álvares de Azevedo, no livro Saturno nos Trópicos. A Melancolia Européia Chega ao Brasil.
Jaime Ginzburg, em 1997, por sua vez, apresentou uma tese de doutorado exatamente sobre a
“Lira dos Vinte Anos” de Álvares de Azevedo, falando desses mesmos sentimentos.

Buscando conceituar o tédio mais precisamente

Alguns pontos: necessitamos de um conceito mais preciso sobre o que é tédio,


saber se existe mais de um tipo de tédio, buscar saber se o tédio tem uma datação ou se terá
sempre existido; são questões a serem consideradas. Vejamos.
O tédio, certamente, faz parte das emoções humanas desde o início. Sêneca, por
exemplo, escreveu sobre o tedium vitae, de uma forma a lembrar muito o tédio
contemporâneo. Existe, por exemplo, uma interessante discussão envolvendo vários filósofos,
como Kiergaard e Nietzsche, sobre a questão , sobre os mitos de criação, relacionando-os ao
tédio dos Deuses e, mesmo, sobre o tédio de Adão e Eva.
Kiergaard, por exemplo, escreveu (Svendsen, 1999) que “os Deuses estavam
entediados e por isso criaram o homem. Adão ficou entediado por estar só e por isso Eva foi
criada. Desde então, o tédio penetrou no mundo e cresceu em proporção exata ao crescimento
da população”. Assim o tédio seria parte do processo criativo. Nietzsche, por sua vez,
considerou que Deus, provavelmente, estava entediado no sétimo dia da Criação e que os
Deuses tentavam em vão lutar contra o tédio (Svendsen, 1999). Svendsen cita Henry Thoureau
(”Sem dúvida,a forma de tédio e lassidão que se imagina ter esgotado toda a felicidade e que se
imagina ter esgotado toda a felicidade e variedade da vida é tão antiga quanto Adão”) e escreve
que “Alberto Moravia afirmou que Adão e Eva estavam entediados, ao passo que Kant declarou
que Adão e Eva teriam se entediado se tivessem permanecido no Paraíso. Para Robert Nisbet,
Deus baniu Adão e Eva do Paraíso para salva-los do tédio que, com o tempo, os afligiria”.
Como vemos temos uma discussão com muito pano para manga... Svendsen, entretanto,
discorda destas teses sobre o tédio de Adão e Eva, afirmando que no Paraíso não poderia
haver tédio, pois Deus estaria em todo o lugar e sua onipresença tornaria tal sentimento
desnecessário. Essa polêmica é interessante pois mostra como o problema do tédio é objeto de
especulações de pensadores de diversas áreas e, mais importante; será o tédio, essa falta de
sentido, um fenômeno recente, ligado à modernidade, ou algo sempre existente?

Muitos autores são categóricos em relacionar o tédio ao homem moderno.


Svendsen faz uma distinção entre o “tédio situacional”, experiência emocional que acompanha o
homem ao longo da história e o “tédio existencial”, fenômeno relacionado ás condições
engendradas pela modernidade. Na verdade, acreditam alguns, o tédio tem sido um relato cada
vez mais freqüente. Ele parecia antes do advento da modernidade e do romantismo ligado aos
religiosos, afastados dos afazeres mundanos, e aos nobres, em seu ócio nada criativo.Símbolo
até então de status, locado nos espaços sociais privilegiados, o tédio, na cultura
contemporânea, se espraia por diversos setores, por diferentes estratos sociais.

Existe , inclusive, uma tipologia do tédio (Sveden, 1999).

Milna Kundera cita três tipos de tédio: passivo (bocejo, falta de interêsse), tédio
ativo (como quem necessita e pratica um hobby) e o tédio rebelde (arruaças, depredações).
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Martin Dohelmann define quatro tipos: tédio situacional (uma dada situação nos deixa
entediados, uma espera prolongada, por exemplo), tédio da saciedade (quando temos em
demasia a mesma coisa e ocorre a banalização), tédio existencial (quando existe uma falta de
sentido na vida) e o tédio criativo (somos levados a criar para escapar do tédio). Flaubert
diferenciou o tédio comum (ennui commun) do tédio moderno (ennui moderne) .

O leitor solicita uma melhor definição de tédio; é necessário aguardar, pois


compreender o tédio não é tarefa fácil, tédio alguém sente e ao sentir é difícil colocar em
palavras. É como diz Santo Agostinho sobre o tempo: todos sabem o que é o tempo, mas é
difícl dizer o que é. Vamos lá, seguindo com a ajuda de nosso filósofo norueguês na questão
etimológica..

“O uso da palavra tédio está cada vez mais presente em nosso cotidiano. Não há
ocorrência do substantivo boredon, na língua inglesa antes de 1760, e, desde então, seu uso
aumentou progressivamente...o francês ennui e o italiano noia, ambbos através do provençal
enojo, têm raízes no latim inodare (odiar ou detestar) e remontam ao século XIII. Mas essas
palavras são menos usáveis para nosso propósito, porque são estreitamente emaranhadas com
o conceito de acedia (acedia), melancolia e tristeza geral. O mesmo se aplica ao inglês spleen,
que remonta ao século XVI.”

A acédia medieval (acedia ou accidia) corresponde ao que temos hoje como tédio,
com suas características de indiferença e ociosidade, configurando o tédio pré-moderno ; a
acedia, entretanto, representava um conceito moral, próprio das minorias (monges e
aristocratas), enquanto o tédio é um estado psicológico que pertence a todos os sujeitos.
Sveden (Sveden, 1999) escreve:

“Havia palavras no grego antigo para ociosidade (skholé, alays e argós) e para um
tipo de saciedade ou estado de espírito blasé (kóros), mas nada que correspondesse
inteiramente ao nosso conceito de tédio. O mais próximo era a palavra akedia, palavra
composta de kedos, que significa importar-se com, e um prefixo negativo. O conceito, no
entanto, desempenha apenas um pequeno papel no pensamento grego antigo, em que
descrevia um estado de desintegração que podia se manifestar como estupor e falta de
participação. Foi apenas no século IV d.C., com os antigos patriarcas da Igreja dos desertos
além de Alexandria que o termo adquiriu significado mais técnico, passando a descrever um
estado de cansaço ou de saciedade com a vida.”

Ao falar do tédio contemporâneo, E. Coran (Sveden, 1999) escreve que “a dor é


localizada enquanto que o tédio evoca um mal sem nenhuma localização, sem nenhuma base,
sem nada exceto esse nada, inidentificável que os corrói”. Sveden vale-se de Heideggeer e
registra que “o tédio profundo é caracterizado pelo fato de a própria situação ser um
passatempo; ele não tem origem, portanto, na situação, devendo ser procurado, segundo
Heidegger, no próprio Dasein”. Heidegger escreveu: “O tédio brota da temporalidade do
Dasein”.
Vale a pena ler esta afirmação de Heidegger: em Conceitos fundamentais de
metafísica:
Essa ausência de uma opressividade essencial no Dasein é o vazio como umm
todo, de modo que ninguém se aproxima de ninguém, e nenhuma comunidade se aproxima de
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outra na unidade plena de raízes de um agir essencial. Todos nós, sem exceção, somos servos
de slogans, aderimos a programas, mas ninguém é o guardião da grandeza interior do Dasein e
de suas necessidades. Esse deixar vazio repercute finalmente em nosso dasein, seu vazio é a
ausência de qualquer opressão essencial. Falta mistério a nosso dasein, e, assim, o terror
interior que cada mistério carrega consigo, e que confere ao dasein sua grandeza, permanece
ausente”.
Podemos então discutir no tédio a questão da “falta de sentido”, do “vazio” e da
“temporalidade”.. Ai temos temas para reflexões.

O adolescente Álvares de Azevedo


Manuel Antônio Álvares de Azevedo (1831-1852) nasceu em São Paulo, na
esquina da Rua da Cruz Preta com a Rua da Freira (atuais Quintino Bocaiúva e Senador Feijó),
e morreu aos 21 anos, no Rio de Janeiro. O atestado médico revela “enterite, com perfuração
do intestino”. Foi enterrado no extinto cemitério do Hospício Pedro II, na Praia Vermelha. Uma
ressaca destruiu o cemitério e os restos desaparecidos do poeta foram localizados, segundo
consta pela crônica da época,, pelo seu cão, chamado Fiel, o que possibilitou que sua ossada
fosse para o túmulo definitivo no Cemitério São João Batista. Um final, sem dúvida, bem ao
style literário ultra-romântico. O autor de Noites na Taverna começou a escrever recém saído
da meninice e aos 17 anos, em 1848, quando se matriculou na Faculdade de Direito do Largo
de São Francisco, registrando em uma carta que enviou carta à mãe (Sérgio Alcides, 2004), em
11 de junho :

“.... adeus e viva que não há mais nada digno de contar-me senão que a cidade
ainda não deixou de ser São Paulo... o que quer dizer muitas coisas: entre as quais tédio e
aborrecimento... “.

Ele escreveu da mesma forma que Charles Baudelaire, ambos entediados com
suas cidades. Estes dois flaneurs tinham, entretanto, queixas distintas. Álvares de Azevedo
queixava-se da falta de progresso e civilização de São Paulo, enquanto Charles Baudelaire
queixava-se da modernização e da velocidade de sua Paris. Isso é relevante pois mostra que
para o verdadeiro “Spleen” adolescente a realidade externa, como tal, não importa tanto, como
veremos a seguir..

No ano seguinte Álvares de Azevedo prosseguia entediado e, a 12 de junho,


escreveu novamente à mãe, registrando:

“Nunca vi lugar tão insípido, como hoje está São Paulo. Nunca vi coisa mais tediosa e
inspiradora de spleen... a vida aqui é um bocejar infindo”.

Álvares de Azevedo escreveu em Lira dos Vinte Anos uma série de versos aos
quais ele deu o título de Spleen e Charutos, onde sua, digamos, filiação ao “Spleen” fica mais
uma vez caracterizada. Não querendo tirar do leitor o prazer de procurar ele mesmo a leitura das
obras de Álvares de Azevedo, quero trazer um dos poemas da série Spleen e Charutos, e
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comentá-lo, na medida do possível e de forma breve, sob o olhar da psicanálise, deixando o leitor
completar a tarefa.

Solidão

Nas nuvens de cor cinza do horizonte


A luz amarela a face embuça;
Parece que tem frio, e no seu leito
Deitou, para dormir, a carapuça.

Ergueu-se, vem da noite a vagabunda


Sem xale, sem camisa e sem mantilha,
Vem nua e bela procurar amantes;
É doida por amor da noite a filha

As nuvens são uns frades de joelhos,


Rezam adormecendo no oratório;
Todos têm o capuz e bons narizes
E parecem sonhar o refeitório.

As árvores prateiam-se na praia


Qual de uma fada os mágicos retiros...
Ó lua, as doces brisas que sussurram
Coam dos lábios teus como suspiros!

Falando ao coração que nota aérea


Deste céu, destas águas se desata?
Canta assim algum gênio adormecido
Das ondas moças no lençol de prata?

Minh´alma tenebrosa se entristece,


E muda como sala mortuária...
Deito-me só e triste, sem ter fome
Vejo na mesa a ceia solitária
Ó lua, ó lua bela dos amores,
Se tu és moça e tens um peito amigo,
Não me deixes assim dormir solteiro,
À meia-noite vem cear comigo!

Alguns críticos, como Jaci Monteiro, consideram que um dos poemas mais
significativos de Álvares de Azevedo é aquele onde ele comenta sobre o poeta Lamartine,
escrevendo que “Ossian o bardo é triste como a sombra que povoa seus cantos”, onde
“Lamartine é monótono e belo como a noite, como a lua sobre o mar e como o murmúrio das
ondas... Mas choraminga uma eterna melodia, tem a lira de seu um gênio uma só corda... “. O
“Spleen”, então, se caracteriza não só pelo tédio, como também pela monotonia e pela
superficialidade , em lugar de um viver criativo, como veremos adiante e como escreveu o poeta:
“monótono...murmúrio sobre o mar...eterna melodia...lira de uma só corda”.
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Um adolescente “desmotivado”
Alfredo tem dezesseis anos e não apresenta “maiores problemas”. Concorda
com a sugestão dos pais, que o acham “desmotivado”, para que procure uma ajuda psicológica.
A entrevista com os pais, e as subseqüentes com o jovem, não revelam nenhuma condição
particular que justifique sua dificuldade, “tédio” ou “desânimo”, como ele diz Não é exatamente
uma “tristeza” ou algo que configure uma depressão, no sentido psicopatológico habitual. Durante
a infância não apresentava esses sintomas e brincava e se relacionava com facilidade. Era uma
criança alegre e disposta. O sentimento que é agora referido começou há cerca de dois anos.
Quase nada o agrada e se queixa de tudo, dizem os pais e ele concorda. Na verdade, conta com
enfado, “acho tudo um saco”. Um fator que pareceu positivo ao analista foi a queixa dos pais de
que ele passava muitas horas, com revistas, “lendo” no banheiro. Nas sessões Alfredo provoca
uma certa sonolência no analista e não é fácil, para ele, seguir o relato do adolescente, que
parece monocórdico e monótono. Alfredo, aos poucos, revela uma moralidade exagerada e
crítica. As mulheres, em suas associações, ou são “virginais” ou “vagabundas e vulgares”, sendo
que hoje a maioria delas, diz ele, são “pouco confiáveis”. Repete o mesmo tema e o analista tem
de tomar cuidado para não se contaminar com o “Spleen”; esse “Spleen” agora com causa,
sentido pelo analista.por meio da identificação projetiva e percebido na contratransferência.

Alfredo mostra uma dissociação entre “ideais” de integridade e moralidade e


a percepção crescente da sexualidade que produz o desejo, nem sempre reconhecido e, até
mesmo, negado. Coloca esperanças em um amor “verdadeiro e sincero” que espera um dia
encontrar, o que considera que é muito difícil de se realizar. Há uma tensão que se percebe entre
as novas demandas pulsionais e as aspirações e exigências que se relacionam a fortes ideais de
atitude e comportamento. A latência é, agora, “uma página virada” e “dissipa-se o mundo
visionário e platônico”, como escreveu Álvares de Azevedo nos versos que servem de epígrafe a
este texto. O que pede passagem de forma vigorosa, agora, é a “turbulência” adolescente. A re-
edição, nas etapas inicias da adolescência, de experiências emocionais da infância, leva, dentre
vários outros elementos, a novos arranjos no “Ideal de Ego”. Surgem altas exigências que se
chocam com as novas demandas puberais. É nessa tensão antitética, no vazio que se cria, que
emerge o “spleen”, no que concordo perfeitamente com o poeta Charles Baudelaire, quando ele
descreve este estado emocional como “a aspiração do poeta pelo absoluto e o infinito cujo
símbolo é o Ideal...”. Não é incorreto pensar em um paciente esquizóide. W. Fairbairn comentou
o grande desejo de comunicação e o pavor que a comunicação aconteça, em que ficam presos
esses pacientes, assim como apresentam, também, uma forte sensação de artificialidade. A
história posterior, que emerge na processo transferencial, permitiu descobrir um cuidado parental
emocionalmente frio, embora eficiente nos cuidados físicos, uma falha no holding mas um
handling exitoso. Cuidados físicos efetivos, mas repetitivos, monótonos e sem afeto; apenas uma
técnica eficaz e repetitiva. O material transferencial de Alfredo reproduz, como acontece, sua
história. Não se revelam as esperadas “transformações” da adolescência. Existe uma profunda
sensação de superficialidade e falta de intimidade no encontro com Alfredo; ele reconhece esses
sentimentos.

A adolescente que pensava em ser freira


Os pais de uma adolescente de 13 anos me procuram, em busca de
orientação, pois estão muito preocupados com sua filha. Ela diz achar o mundo “sem sentido” e
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que a religiosidade é o caminho que irá buscar. Nada a interessa e passa o dia “entediada”.
Cumpre suas tarefas escolares, é gentil com as pessoas e não parece estar deprimida. Não é
possível encontrar eventos que possam estar relacionados com o que ela sente. Apenas acha
“tudo uma droga!”. Como comentou com os pais de que estava pensando em entrar para “uma
vida religiosa” eles ficaram bastante preocupados. Eles relatam, entretanto, um fato paradoxal:
ela tem em seu arquivo escolar fotos de atores. A adolescente se percebe como uma “chata”,
dizem os pais, em contraste com a criança alegre e criativa que ela fora. Sugeri aos pais que
aguardassem e me procurassem dentro de seis meses, ou antes se considerassem necessário,
após termos conversado sobre a situação. Cerca de dois anos depois eles me procuram dizendo
que a preocupação era outra: a “entediada e desinteressada”, agora queria sair todas as noites e
só pensava em namoros. A sugestão de Donald Winnicott de que o tempo é um fenômeno
curativo na adolescência me pareceu ser verdadeira.

O Spleen na adolescência
A adolescência é caracterizada, como sabemos, por inúmeros elementos, dos
quais quero referir alguns: (1) a perda do corpo infantil, dos pais da infância e da identidade
infantil; (2) da passagem do mundo endogâmico ao universo exogâmico; (3) da construção de
novas identificações assim como das imprescendíveis desidentificações; (4) da resignificação
das “narrativas” de self; (5) da reelaboração do narcisismo; (6) da reorganização de novas
estruturas e estados de mente; (7) da aquisição de novos níveis operacionais de pensamento (do
concreto ao abstrato); (8) da apropriação do novo corpo; (9) do recrudescimento das fantasias
edípicas; (10) da vivência de uma nova etapa do processo de separação-individuação; (11) da
construção de novos vínculos com os pais, caracterizados por menor dependência e idealização;
(12) da primazia da zona erótica genital; (13) da busca de um objeto amoroso; (14) da definição
da escolha profissional; (15) do predomínio do ideal de ego sobre o ego ideal; enfim, de muitos
outros aspectos que seria possível seguir citando, mas, em síntese, da organização da identidade
em seus aspectos espaciais, temporais e sociais. Em vários outros textos enfoquei diferentes
facetas desse momento evolutivo de uma maneira mais detalhada (Outeiral, 2003; 2004). As
transformações da adolescência, por outro lado, ocasionam flutuações que se caracterizam por
momentos progressivos – nos quais predomina, entre outros aspectos, o processo secundário, o
pensamento abstrato e simbólico e a comunicação verbal - e momentos regressivos – com a
emergência do processo primário, da concretização defensiva do pensamento e a retomada de
níveis não verbais de comunicação.

Os aspectos fundamentais para a compreensão da adolescência, sob o ponto


de vista da psicanálise, nos foram dados pelo próprio Sigmund Freud, que foi um grande
“psicanalista de adolescentes”. O caso Dora, o caso de Katharina, o relato da “mulher
homossexual”, todas elas “jovens de dezoito anos”, assim como o estudo sobre Gradiva e
inúmeras vinhetas clínicas de pacientes nessa etapa evolutiva, que encontramos ao longo de sua
obra, nos permitem fazer essa afirmação sobre o criador da psicanálise.

Retomando, nesse texto quero, entretanto, enfocar uma das manifestações


sintomáticas que caracterizam a adolescência, o “Spleen”: pessimismo, ceticismo e um irresistível
tédio. Sintomas sem algo da realidade que verdadeiramente os atormente, pois, como vimos, os
jovens Charles Baudelaire e Álvares de Azevedo se queixavam de suas cidades, de progresso de
mais ou de progresso de menos. Rebeldes sem causa, isto é, sem causa aparente. Na verdade,
as transformações deste período originam modificações que atingem a personalidade como um
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todo, provocando tristeza pela identidade infantil que vai sendo perdida e um temor pelo mundo
adulto e suas representações que vão se avizinhando ( o tão temido e desejado mundo adulto ...).
René Passeron, como nos recorda Edson Souza, considera que toda a obra de arte é um
“curativo do vazio”. O “Spleen” se insere, a meu ver, por essas vias. Minha intenção é, apenas,
reavivar a memória e ativar as associações, fornecendo elementos para reflexão. Álvares de
Azevedo é o nosso exemplo de adolescente sofrendo de “Spleen”, condição que todos
reconhecemos nos adolescentes que estão á nossa volta e no adolescente que, espero, nós
fomos, somos e seremos.

A ênfase na adolescência dos poetas não deve sugerir que compreendo a


presença do “Spleen”, que é um sentimento dominante de uma certa época (romantismo),
traduzida em arte, como derivada unicamente do fato de eles serem adolescentes. O “Spleen”
romântico é maior que sua manifestação individual. Produto de uma época e de uma sociedade,
resultado de uma cultura e de um mundo em transformações, em que sistemas antigos não
regem mais os novos tempos e os novos tempos, por sua vez, ainda não se consolidaram;
momento de transformação e de crise , em que tudo está em aberto, indefinido, como foi o fin-du-
siécle, na passagem do século XIX para o século XX.

A contemporaneidade, da mesma forma, é um momento onde uma série de


paradigmas e valores são contestados, modificados ou substituídos por outros, gerando uma
situação em muitos aspectos similar ao período em que Charles Baudelaire chamou de
“modernidade”. Sérgio Rouanet comenta esses momentos estabelecendo ligações entre eles
(Rouanet, 1993; 1998). O adolescente da contemporaneidade (da “alta modernidade” ou da “pós-
modenridade”) vive profundamente esses movimentos: as patologias do”vazio”, as estruturas
narcísicas, os quadros “borderline”, e outras tantas denominações que podemos utilizar estão
presentes nesse mundo onde encontramos, como escreveu André Green, mais Hamlets do que
Édipos, mais superficialidade e transitoriedade do que intimidade e permanência. Repensando as
contribuições de Freud referentes às séries complementares (equação etiológica) podemos
entender o enlace entre constituição e a cultura (família e sociedade) (Outeiral, 2004).

Alguns recortes filosóficos sobre o tédio

Recentemente Lars Svendsen, professor de filosofia na Noruega publicou um livro intitulado:


Filosofia do tédio. O autor investiga, no livro, a natureza do tédio e a dificuldade que
enfrentamos em escapar dele por nossa própria vontade. Como acontece com questões desse
gênero, a complexidade do tema (E. Morin) nos leva a questão da interdisciplinariedade, e é o
que faz o autor, ao percorrer desde a filosofia e a psicologia, da literatura e da cultura popular,
passando pelo tédio no “torpor medieval” para chegar aos problemas contemporâneos da
alienação e da transgressão. Ele “percorre” filósofos, nos oferecendo nada entediantes citações
destes pensadores, e busca, também, nas artes, exemplos ilustrativos em autores como Samuel
Beckett e Andy Warhol. O autor faz uma ampla exposição da relação entre o tédio e a
modernidade, endereçando ao romantismo a “base histórica” do tédio: coisa bem já sabida, mas
vem a engrossar o apoio à esta tese. Mas há um mérito: ele nos poupa de fazer uma pesquisa
que poderia ser entediante sobre a “filosofia do tédio”, suas citações de vários autores são
interessantes e, mesmo, bem humoradas. Um escrito sobre o tédio corre sempre o risco de se
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tornar entediante: acredito que seja por isso que Holding e interpretação de Donald Winnicott,
que trata de um paciente “boring”, seja um livro não muito lido...

Lars Svendsen busca uma série de citações de pensadores, especialmente filósofos e


escritores ,para introduzir e contextualizar seu ensaio, abordando o tédio, especialmente, como
um problema filosófico. No campo da filosofia ele cita Pascal, Rosseau, Kant, Schopenhauer,
Kiergaard, Nietzsche, Heidegger, Benjamin e Adorno, dentre outros. Na literatura ele refere
Goethe, Flaubert, Stendhal, Mann, Beckett, Büchner, Dostoyevski, Tchekhov, Baudelaire,
Leopardi, Proust, Byron, Eliot, Ibsen, Valéry, Bermanos, Fernando Pessoa, registrando que “a
lista está incompleta...”.

Uma compreensão psicodinâmica sobre o “Spleen”

A adolescência é, como explicitei antes, um período de importantes


trasnformações psíquicas. W. Bion, em seu texto sobre a condição borderline, nos fala dessa
etapa como um momento de “turbulências”. A finalização da latência e a eclosão puberal, além de
vários outros elementos que são postos em movimento ao final do período de latência, criam uma
porosidade consciente e inconsciente e a possibilidade de que um novo conjunto de
identificações se realize, assim como uma forte operação de desidentificações (resultado, dentro
outros aspectos, das inevitáveis desilusões que fazem parte da vida de todos nós). O ego, como
descreve Anna Freud, tem de lidar com novas condições, tanto no Superego e no Id (novas
demandas instintivas), como na realidade externa. Essa “turbulência” interna, os movimentos
psíquicos que se incrementam, as reedições de elementos primitivos que eclodem, determinam a
busca, através da projeção no mundo externo ou real, dessas tensões, no intuito de tentar
restabelecer a homeostase psíquica.

A questão não é, como escreveram, queixando-se, Charles Baudelaire e


Álvares de Azevedo, o externo. O “Spleen”, esse “pessimismo, ceticismo e tédio sem causa” é
determinado no mundo interno pelas transformações, ocasionado pelas perdas e pelas novas
aquisições, desejadas e temidas. O poema de Álvares de Azevedo, da série Spleen e os
charutos, denominado, significativamente, de Solidão, é eloqüente. A mulher “...vagabunda,
sem chale, sem camisa e sem mantilha, nua...”, sensual, que anda pela noite produzindo desejo,
surpresa e medo, no tímido e envergonhado rapaz, é fantasia, fantasiar (fantasying) e sonho
diurno (daydream). As figuras dos frades, nas nuvens a tudo observando numa representação de
um superego rígido e crítico com a sexualidade, é próprio da re-edição edípica das primeiras
etapas da adolescência. A moça pura, casta, que o poeta adolescente espera encontrar, como o
jovem Werther de Goethe, que o tire de sua solidão. A vagabunda e a virginal, evidente cisão
causada pela angústia frente à sexualidade genital demandante. Atormentado por questões da
mesma natureza, o jovem arqueólogo Norbert Hanold sofreu com seus delírios e sonhos
envolvendo Gradiva e Zoe Bertgang, como sabemos, desde o texto freudiano, um texto da
modernidade.
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Donald Winnicott e o spleen


Um outro ângulo que nos permite compreender o “Spleen” nos é
dado pela contribuição de Winnicott . Masud Khan, na esclarecedora introdução que faz ao livro
Holding e Interpretação (Winnicott, 1989), comenta a questão do tédio como um elemento
importante para Winnicott. Ele conta que, em janeiro de 1971, um grupo de pastores anglicanos
pediu a Winnicott uma orientação para que soubessem quando uma pessoa que os procurassem
para pedir ajuda, deveria ser encaminhada para tratamento psiquiátrico, por estar doente, ou se a
ajuda espiritual seria suficiente. Winnicott respondeu:

“... se uma pessoa vem falar com você e, ao ouvi-la, você sente que
ela o está entediando, então ela está doente e precisa de tratamento psiquiátrico. Mas se ela
mantém seu interesse independentemente da gravidade do seu conflito ou sofrimento, então você
pode ajudá-la”.

Winnicott estabeleceu, assim, uma importante diferença entre


“causar tédio” (boring) e “sentir-se entediado” (boredon). Para ele, então, sentir-se entediado é
um estado normal e entediar o outro é um sintoma de doença psiquiátrica. O “sentir tédio” está,
com freqüência, associado aos elementos próprios das tensões do desenvolvimento e dos
processos maturacionais, enquanto que o “causar tédio” costuma ser o resultado de reações à
falhas importantes no “ambiente facilitador” ( mãe-suficientemente-boa, mãe-devotada-comum ) .
O “causar tédio” se relaciona à repetição, na transferência dos cuidados iniciais, falhos em
oferecer um holding suficientemente bom, e está ligado às defesas maníacas, como fuga da
realidade interna, e/ou à tendência anti-social, como uma tentativa esperançosa de encontrar um
ambiente ( amizade, amor, setting analítico, etc. ) que compreenda as experiências traumáticas
experienciadas e possibilite um novo começo., O “causar tédio” impede as transformações
psíquicas e situa-se na superficialidade e na transitoriedade de um falso self. Esse falso self, ao
mesmo tempo que encobre e protege o verdadeiro self (que propicia a intimidade e a
permanência) possibilita, como uma defesa altamente organizada, que a vida siga adiante, da
maneira que der, mesmo que sem um “viver criativo”.

Em um trabalho intitulado Ansiedade associada à Insegurança,


Winnicott (1952) comentou o resultado das falhas ambientais nos cuidados que um bebê
necessita, referindo que o registro (catalogação, registros mnêmicos especialmente sensoriais)
dessa experiência fracassada constitui o fundamento da apresentação do paciente entediante,
através da circularidade transferência/contransferência, como acontece , por exemplo, com
alguns pacientes esquizóides, ou com tendência anti-social ou, ainda, com estruturas tipo falso
self.

Winnicott explicou essa dinâmica que nos permite


compreender ,também, os elementos de superficialidade, futilidade, transitoriedade,
fragmentação e não-tranformação , estase psíquica, que os pacientes entediantes revelam,
escrevendo:

“... não integração, tornando-se um sentimento de desintegração;


falta de relacionamento entre psique e o soma, tornando-se um sentimento de
despersonalização; e também o sentimento de que o centro de gravidade da consciência é
transferido do cerne para a superfície, do indivíduo para o cuidado, para a técnica”.
11

Essa afirmativa, aparentemente simples, oculta e revela a


profundidade e a complexidade do pensamento desse autor. Masud Khan, na introdução referida
antes, comenta:

“... o ato de provocar tédio possui a qualidade de “tendência anti-


social” (Winnicott, 1956) e implica uma exigência e uma experiência, enquanto que sentir tédio é
um estado organizado e defensivo de uma estrutura psíquica... o paciente entediante tenta
manter um controle onipotente sobre sua realidade interna através de um controle obsessivo da
linguagem e dos objetos. Sua narrativa é um espaço petrificado onde nada pode acontecer... é
por isso que estou ampliando o conceito de Winnicott para postular que o paciente que nos
oferece uma narrativa entediante não está permitindo que a linguagem e a metáfora elaborem ou
modifiquem a sua experiência. Ele cria um espaço de comunicação onde ambos – ele e o analista
– ficam paralisados pela técnica da narrativa, assim como pela monotonia e pela repetição do
conteúdo ”.

Masud Khan, na introdução referida, busca traçar o percurso de


Winnicott na descoberta da psicodinâmica do estado psíquico da pessoa entediante, condição
apresentada pelo paciente cujas sessões analíticas estão descritas nesse livro. Winnicott
demonstrou interesse no “entediar” desde seu texto sobre a defesa maníaca (1935), o primeiro
trabalho analítico importante do autor, onde ele considerou essa manifestação psíquica como
uma tentativa de negar a realidade interna, fazer uma fuga para a realidade externa e uma
tentativa de manter um estado de “hibernação”, “estase” ou “coagulação”, até Holding e
Interpretação, publicado poucos anos antes de sua morte, em 1971.

Nas vinhetas clínicas apresentadas no trabalho sobre as defesas


maníacas, a condição de ser uma pessoa entediante é revelada e compreendida. Masud Khan
escreveu sobre esse material clínico:

“Nesses fragmentos clínicos, já temos os pontos essenciais da


abordagem de Winnicott com os pacientes. Já podemos vê-lo questionando a autenticidade
daquilo que o paciente produz ou apresenta na situação e na relação analítica. A partir daí, ele
concluiria que aquilo que é entediante é intrinsecamente inautêntico, tanto para o paciente como
para o analista. Ainda assim, temos de aprender a tolerar esse discurso forjado, a fim de ajudar o
paciente. Freud (1985), no primeiro caso em que abandonou as técnicas hipnóticas e trabalhou
exclusivamente com o método da associação livre, deparou-se com o “fator entediante” e fez a
seguinte observação: ´ A história que a senhorita Elizabeth contou sobre sua doença era
cansativa`...”.

Espero que possamos ter percorrido algumas idéias sobre o


“spleen” e o “sentir-se entediado” ou “ser entediante” ,e a adolescência. Quero apenas fazer os
meus rabiscos, convidando o leitor a fazer os seus.

SUMÁRIO
12

O autor faz uma abordagem psicanalítica do “Spleen” adolescente, através da poesia


“Solidão” de Álvares de Azevedo, e distingue entre “causar tédio” e “sentir-se entediado”,
a partir das contribuições de Donald Winnicott.

SUMMARY
The author makes an psychoanalytic overview about the adolescent “Spleen”, trough the
poem “Solidão” of Álvares de Azevedo and distinguish between the activity of “boring
someone” from the feeling of “being bored”, with the contributions of Donald Winnicott.

Bibliografia
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