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Desenvolvimento econômico

novos e antigos desafios


Camila do Carmo Hermida
Anderson Moreira Aristides dos Santos
Verônica Nascimento Brito Antunes
(Org.)
Camila do Carmo Hermida
Anderson Moreira Aristides dos Santos
Verônica Nascimento Brito Antunes

(Org.)

Desenvolvimento econômico:
novos e antigos desafios

Arapiraca/AL
2022
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE ALAGOAS COORDENAÇÃO GERAL DO XI ENCCULT
Reitor: Odilon Máximo de Morais Dr. José Crisólogo de Sales Silva
Vice-Reitor: Anderson de Almeida Barros
Diretor da Eduneal: Renildo Ribeiro-de-Siqueira COMITÊ CIENTIFICO
Coordenadores do grupo de Trabalho
CONSELHO EDITORIAL DA EDUNEAL Dr. Anderson Moreira Aristides dos Santos
Presidente: Renildo Ribeiro-de-Siqueira Drª. Camila do Carmo Hermida
Titulares Drª. Verônica Nascimento Brito Antunes
Professores:
José Lidemberg de Sousa Lopes Revisores Científicos
João Ferreira da Silva Neto Dr. Anderson Moreira Aristides dos Santos
Luciano Henrique Gonçalves da Silva Dr.ª Ariane Danielle Baraúna da Silva (UFAL)
Natan Messias de Almeida Dr.ª Camila do Carmo Hermida (UFAL)
Maria Francisca Oliveira Santos Dr. Paulo Henrique De Oliveira Hoeckel (UFGD)
Márcia Janaína Lima de Souza - Sistema de Bibliotecas (SIBI) Dr.ª Verônica Nascimento Brito Antunes (UFAL)

Suplentes Revisão ortográfica


José Adelson Lopes Peixoto Kátia Barbosa Feitosa
Edel Guilherme Silva Pontes
Capa
Maryny Dyellen Barbosa Alves Brandão
Rima Produção Editorial
Ariane Loudemila Silva de Albuquerque
Ahiranie Sales dos Santos Manzoni
Imagem da Capa
Elisângela Dias de Carvalho Marques - Sistema de Bibliotecas (SIBI)
Freepik
Imagem da entrada
Evanilson Landim
Diagramação
Rima Produção Editorial

Catalogação na Fonte

D451 Desenvolvimento econômico : novos e antigos desafios / Camila do Carmo Hermida,


Anderson Moreira Aristides dos Santos, Verônica Nascimento Brito Antunes (Org.). –
Arapiraca : Eduneal, 2022.
205 p. : il. : color (e-book).

Inclui bibliografia.
Índice remissivo: p. [202] -204.
ISBN: 978-65-86680-77-5
DOI: https://doi.org/10.48016/xienccultgt6
E-book: https://www.eduneal.com.br/produto/desenvolvimento-economico/

1. Economia. 2. Desenvolvimento econômico. 3. Políticas econômicas. I. Hermida, Camila


do Carmo, org. II. Santos, Anderson Moreira Aristides dos, org. III. Antunes, Verônica
Nascimento Brito, org. IV. Encontro Científico Cultural.

CDU: 332.1

Elaborada por Fernanda Lins de Lima – CRB – 4/1717

Direitos desta edição reservados à


Eduneal- Editora da Universidade Estadual de Alagoas
SUMÁRIO

Apresentação........................................................................................................................6

1. A relação entre Cadeias Globais de Valor e mudança estrutural no período 2006-


2015: uma análise descritiva.............................................................................................. 9
Raul Costa Cavalcanti Manso
Camila do Carmo Hermida

2. Desempenho da Produtividade Total dos Fatores brasileira: uma análise para o


período de 1960 a 2017.................................................................................................... 27
Jailson Rodrigues
Anderson Moreira Aristides dos Santos
Camila do Carmo Hermida

3. A contribuição do grau de abertura comercial para ganhos de produtividade da


economia brasileira: 1982-2019....................................................................................... 44
Thallyson Eduardo Alves Martins
Camila do Carmo Hermida

4. Composição dos gastos públicos estaduais e crescimento econômico no período de


2000 a 2019: evidências a partir de dados em painel..................................................... 65
Nathalia Lavínia Farias de Araújo

5. Keynes, crises e principais resultados da implementação de políticas econômicas


para o Brasil: uma avaliação............................................................................................. 82
Thaís Guimarães Alves

6. Florestan Fernandes e os desafios do desenvolvimento socioeconômico na periferia


do capital.......................................................................................................................... 107
Elson dos Santos Gomes Junior

7. Deterioração dos termos de troca: uma análise comparativa entre Brasil e Coreia do
Sul (1995-2017)................................................................................................................ 124
Vinicius Melo Araújo
Camila do Carmo Hermida
8. Novas tecnologias sobre o mercado de trabalho no setor bancário brasileiro...... 144
Fausto Bruno Mendes Leite de Oliveira
William Nascimento da Silva
Natallya de Almeida Levino
Cristiano da Silva Santos

9. O que influencia a reeleição de Deputados Federais? Uma análise para o Nordeste


brasileiro a partir das eleições majoritárias de 2018................................................... 163
José Francisco Oliveira de Amorim

10. O artesanato em favor da identidade cultural no território de Belo Monte/AL... 185


Bruna Izabela Ribeiro Alves dos Santos

Sobre os organizadores.................................................................................................. 200

Índice remissivo............................................................................................................... 202


APRESENTAÇÃO

E
ste e-book, na forma de coletânea, contém 10(dez) artigos frutos das apresentações
orais ocorridas na 11ª Edição do Encontro Científico Cultural (XI ENCCULT) no
âmbito do grupo de trabalho (GT 6): “Desenvolvimento socioeconômico: novos e
antigos desafios”. O encontro ocorreu virtualmente entre os dias 14 e 17 de setembro de
2021 e contou com a participação de professores, estudantes e pesquisadores de várias
instituições do Brasil. Os organizadores do livro, coordenadores do GT 6, objetivavam
realizar discussões interdisciplinares com diferentes aportes teóricos e metodológicos
sobre o Desenvolvimento Econômico e, nesse sentido, o evento se mostrou exitoso. O
e-book é o resultado de várias reflexões e contribuições científicas sobre o tema.
Sob diferentes métodos e procedimentos, a obra traz majoritariamente uma
perspectiva macroeconômica, com interfaces da teoria econômica, da economia internacional
e do crescimento de longo prazo. No entanto, também traz questões do desenvolvimento
regional em um plano mais micro e da economia política e sociologia econômica.
Dessa forma, o objetivo deste e-book é compartilhar textos produzidos por
estudantes e professores de graduação e mestrado de várias universidades brasileiras em
torno da perspectiva do desenvolvimento econômico, assim como fortalecer interações e
diálogos que auxiliem no avanço e aprofundamento do conhecimento científico brasileiro.
Os dez artigos do e-book foram sequenciados de acordo com a abrangência do tema
tratado: das contribuições mais macroeconômicas para aquelas mais setoriais e regionais.
O Capítulo 1: “A relação entre Cadeias Globais de Valor e mudança estrutural no período 2006-
2015: uma análise descritiva” trata da participação dos países nas denominadas Cadeias
Globais de Valor (CGV) e de que forma ela está correlacionada com o desenvolvimento
econômico via mudanças estruturais. O artigo realiza uma análise descritiva para 58
economias por meio do cálculo de indicadores que expressam, por um lado, tal participação
nas CGV e, por outro, mudanças estruturais, como o índice de sofisticação das exportações
e o índice de Complexidade Econômica.
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

O Capítulo 2: “Desempenho da Produtividade Total dos Fatores brasileira: uma análise


para o período de 1960 a 2017” e o Capítulo 3: “A contribuição do grau de abertura comercial
para ganhos de produtividade da economia brasileira: 1982-2019” tratam de uma importante
questão em torno do desenvolvimento: a produtividade dos fatores, ambos com enfoque
para a economia brasileira. Sendo que: o Capítulo 2 analisa o papel da Produtividade Total
dos Fatores para o crescimento econômico do Brasil entre 1960 e 2017, por meio da aplicação
da técnica de decomposição do crescimento; e o Capítulo 3 verifica o papel da abertura
comercial sobre os ganhos de produtividade do trabalho da economia brasileira entre 1982
e 2019, utilizando-se de modelos Autorregressivos de Defasagens Distribuídas (ARDL).
O Capítulo 4: “Composição dos gastos públicos estaduais e crescimento econômico
no período de 2000 A 2019: evidências a partir de dados em painel” também se preocupa
em compreender o crescimento da economia brasileira, mas por meio de uma análise da
composição e do papel dos gastos públicos dos estados federativos, utilizando-se de uma
abordagem econométrica baseada em dados em painel.
No Capítulo 5: “Keynes, crises e principais resultados da implementação de políticas
econômicas para o Brasil: uma avaliação” a autora avalia de maneira descritiva as políticas
econômicas adotadas em dois períodos de crises (2008 e 2020) vividos pelo Brasil. De
maneira exploratória e crítica, o artigo faz um paralelo entre as causas de tais crises e as
ações tomadas pelo governo brasileiro.
O Capítulo 6: “Florestan Fernandes e os desafios do desenvolvimento socioeconômico
na periferia do capital” também apresenta uma discussão teórica sobre os desafios para
o desenvolvimento socioeconômico do Brasil, no entanto, baseada nas contribuições
do sociólogo Florestan Fernandes. Já o Capítulo 7: “Deterioração dos termos de troca: uma
análise comparativa entre Brasil e Coreia do Sul (1995-2017)” avalia o desenvolvimento sob
a perspectiva teórica estruturalista. O artigo parte da tese da Deterioração dos Termos de
Troca de “Prebisch-Singer” e de uma análise comparativa entre Brasil e Coreia do Sul para
compreender de forma exploratória se as diferenças internacionais dos termos de troca do
Brasil permanecem no período entre 1995 e 2017, dificultando a retomada do crescimento
econômico brasileiro num período mais recente.
O Capítulo 8 “Novas tecnologias sobre o mercado de trabalho no setor bancário
brasileiro” possui um caráter mais setorial, ao tratar dos impactos das novas tecnologias
sobre o mercado de trabalho do setor bancário do Brasil na década de 2010. O artigo
utiliza dados qualitativos e avalia os efeitos da digitalização para os postos de trabalho do

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setor, tema de fundamental relevância para os novos desafios impostos pela tecnologia ao
desenvolvimento econômico inclusivo.
O Capítulo 9: “O que influencia a reeleição de deputados federais? Uma análise para o
nordeste brasileiro a partir das eleições majoritárias de 2018” analisa o processo eleitoral no
Nordeste brasileiro. Por meio de uma metodologia econométrica (modelo Logit), busca
identificar as principais variáveis que podem ter influenciado a reeleição de deputados
federais do Nordeste do Brasil e suas implicações para o desenvolvimento da região.
Por fim, o Capítulo 10: “O Artesanato e a identidade cultural no território de Belo
Monte/AL” trata do desenvolvimento regional por meio de um estudo de caso sobre o
artesanato local do município de Belo Monte no estado de Alagoas. Com uma perspectiva
menos econômica e mais sociológica, o artigo analisa de maneira exploratória a relação
entre a identidade cultural dos cidadãos da cidade e o desenvolvimento socioeconômico
do município.

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1

A relação entre Cadeias Globais de Valor e


mudança estrutural no período 2006-2015: uma
análise descritiva1
Raul Costa Cavalcanti Manso(1)
Camila do Carmo Hermida(2)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6147-2066; Universidade Federal de Alagoas/Mestrando em Economia
Aplicada (PPGEA-UFAL), BRAZIL, E-mail: raulmanso@live.com;
(2)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7206-5132; Universidade Federal de Alagoas/Coordenadora do
Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada (PPGEA-UFAL), BRAZIL, E-mail: camila.hermida@feac.
ufal.br.

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas do século XXI a globalização estimulou mudanças na


configuração das cadeias produtivas: houve uma multiplicação de bens produzidos na esfera
internacional, isto é, pela divisão de etapas produtivas para além das fronteiras nacionais,
tornando a produção de um único bem uma dinâmica cada vez mais complexa. O esforço
transfronteiriço da produção implicou a intensificação dos fluxos de comércio internacional
com o recrudescimento dos bens intermediários, os quais são formas de mensuração do que
hoje se tem percebido como Cadeias Globais de Valor (CGV) (STURGEON; MEMEDOVIC, 2011).
Há, por conseguinte, a inserção produtiva de “fábricas sem fronteiras” pelo espalhamento do
processo produtivo pelo mundo como uma forma de diminuir custos, por exemplo, e de
difundir o know-how de tais processos entre países desenvolvidos e em desenvolvimento,
criando novas possibilidades de participação no comércio internacional (BALDWIN, 2013).

1 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap1
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Torna-se, não obstante, importante verificar a relação entre mudança na estrutura


produtiva e participação dos países nas CGV, dada a heterogeneidade de países que integram
as novas cadeias produtivas, além da própria forma de inserção nas CGV, principalmente por
razão de ser possível um “aprisionamento” no longo prazo na função em que um país se
insere na cadeia produtiva, sem mudanças concretas em sua estrutura produtiva (CORRÊA;
PINTO; CASTILHO, 2017).
Há majoritariamente duas correntes teóricas sobre a inserção de um país nas
CGV: (i) as que salientam grandes benefícios na participação, especialmente para
países em desenvolvimento; e (ii) as que advogam que pode ocorrer um retrocesso no
desenvolvimento de tais economias via CGV (KUMMRITZ, 2016). Os estudos empíricos
para testar a relação entre a participação em CGV e mudanças estruturais são escassos.
Deste modo, o presente trabalho, de natureza aplicada, propõe avaliar a correlação
entre tais variáveis no período entre 2006-2015, diferenciando países desenvolvidos
e em desenvolvimento. A ideia é apresentar um panorama da mudança estrutural de
58 economias por meio de duas proxies: a variação de um índice de construção nossa,
denominado índice q, que reflete a mudança no grau de sofisticação tecnológica da pauta
de exportações de uma economia; e, a variação do índice de Complexidade Econômica,
desenvolvido por Hidalgo e Hausmann (2009), o qual é mais amplo e traduz a diversidade
e sofisticação da estrutura produtiva. Entende-se que essa análise descritiva permite
compreender o cenário atual em que tais economias se inserem globalmente e verificar se
existem possíveis caminhos para o desenvolvimento econômico via mudança estrutural.
Por conseguinte, na segunda seção, elaborou-se uma breve revisão de literatura
sobre as CGV, mudança estrutural e a relação entre ambos os fenômenos. Na terceira
seção, expôs-se a metodologia utilizada neste estudo, descrevendo as variáveis adotadas
e a composição da amostra; enquanto na quarta seção discutiram-se os resultados
por meio de estatísticas descritivas e análises de correlação. Por fim, na última seção,
esboçaram-se as considerações finais, com recomendações de pesquisas futuras sobre o
objeto de pesquisa.

REFERENCIAL TEÓRICO

Nesta seção, conceituamos e descrevemos as CGV, incluindo seus aspectos


comerciais e conceitos primordiais. Também traçamos um panorama teórico sobre
a mudança estrutural na literatura econômica, desde modelos tradicionais (fatores

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do trabalho) aos mais recentes (mais de um fator sob análise). Enfim, realizamos uma
exposição da literatura que relaciona a participação em CGV e mudança estrutural.

AS NOVAS FORMAS DE COMÉRCIO: CADEIAS GLOBAIS DE VALOR

Entendem-se as CGV como uma forma específica de abertura ao comércio, por meio
da qual se transfere conhecimento sob um determinado contexto muito mais organizado de
interação administrado por firmas líderes no processo produtivo (FAGERBERG; LUNDVALL;
SHROLEC, 2018). As CGV formam-se sobre estruturas de produção nas quais são distribuídas
funções entre firmas, envolvendo parceiros contratuais, afiliados estrangeiros e fornecedores
externos independentes. Como resultado, têm-se fábricas capazes de atravessar fronteiras
(DARIA; WINKLER, 2016), cuja fragmentação dos processos produtivos e a própria dispersão
internacional de funções definem-se sejam como cadeias sequenciais ou como redes
complexas, podendo ser global, regional ou mesmo bilateral (TAGUCHI, 2014).
A interação entre países diversos criaria a oportunidade para a importação de
habilidades e tecnologias, promovendo empregos e aumentando a produtividade do
trabalho. Tais impulsos em países de pequenas e médias rendas poderiam acelerar a
industrialização e, assim, pavimentar um caminho para o desenvolvimento por meio de
spillovers (transbordamentos) (DARIA; WINKLER, 2016).
A emergência das CGV ocorreu somente no final da década de 1980, na “segunda
desagregação” da globalização, nos termos de Baldwin (2013). Nesse período, as tecnologias
da informação e comunicação (TICs) desenvolveram-se de modo a permitir coordenar
complexidades produtivas em maior distância e, assim, baratear custos ao aproveitar-
se de diferenças salariais entre países desenvolvidos e em desenvolvimento: “alguns
estágios produtivos anteriormente realizados em proximidade (entre países desenvolvidos)
foram dispersos geograficamente (entre países desenvolvidos e em desenvolvimento)” (Ibid.,
p. 17, tradução e grifos nossos). Isto permitiria o offshoring do know-how produtivo pela
internacionalização das cadeias produtivas.
Uma forma de mensuração das CGV, segundo Constantinescu, Mattoo e Ruta (2019,
p. 2385, tradução nossa), é “a parcela do valor adicionado estrangeiro incorporado nas
exportações brutas”. Em específico, os bens intermediários costumam funcionar como
a principal proxy para tal mensuração (STURGEON; MEMEDOVIC, 2011). De acordo com
Baldwin (2013), a verificação do valor adicionado é possível por meio das matrizes de insumo-
produto, pois se consegue distinguir o que são insumos para outras indústrias (i.e., bens

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intermediários). Estes dados podem ser obtidos na Trade in Value Added (TiVA), dentre outras
matrizes, na qual se individualiza o valor adicionado, doméstico ou estrangeiro, incorporado
nas exportações (DARIA; WINKLER, 2016).

ASPECTOS TEÓRICOS DA MUDANÇA ESTRUTURAL

Um conceito generalizado de mudança estrutural é o de deslocamentos na estrutura


produtiva de uma economia no longo prazo. Cabe, logo, interpretar quais seriam estes
deslocamentos. Inicialmente, considerava-se o movimento da força de trabalho de atividades
tradicionais para atividades modernas, como em Lewis (1954): a mudança estrutural seria
o processo por meio do qual o progresso técnico nos setores modernos atrairia a força
de trabalho excedente da agricultura, transformando uma economia tradicional em uma
economia industrializada. Já Chenery (1960) encontrou uma correlação positiva entre o
crescimento econômico e o crescimento da participação do setor industrial no produto de
uma economia.
De modo similar, Kaldor (1966) identifica esta relação em Chenery (1960) no que
ficou conhecido como leis de Kaldor: (i) a existência de uma relação de causa e efeito entre
o crescimento do produto real e o crescimento da produção industrial; (ii) a existência de
uma relação de causa e efeito entre o crescimento desta mesma produção industrial e
da produtividade na indústria; e (iii) a existência de uma relação de causa e efeito entre o
crescimento do setor industrial e a produtividade, desta vez, fora da indústria, significando
um impacto direto no crescimento econômico de um país. Por esta razão, podemos
identificar mudança estrutural como mudanças direcionadas à sofisticação tecnológica de
uma estrutura produtiva.
Estes três trabalhos seminais, entretanto, têm limites inerentes à sua construção
devido à época em que foram escritos, até o final da década de 1950: “[…] o crescimento
econômico era em grande parte explicado pela quantidade de trabalho, investimento e
terra disponíveis, e presumia-se que o crescimento ocorria na margem extensiva, isto é, pela
aplicação de mais recursos à produção” (KAPLINSKY; FAROOKI, 2010, p. 126, tradução nossa).
Posteriormente, Chenery e Syrquin (1975) buscaram salientar a importância da
alocação de recursos pelo crescimento balanceado. Associaram mudança estrutural a
mudanças na composição da demanda dos consumidores, transformações no comércio
internacional, além de outros fatores socioeconômicos, como o crescimento demográfico
e da urbanização.

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A publicação de Kuznets (1973) foi a primeira a apresentar fatos estilizados sobre


crescimento e desenvolvimento econômico. Os avanços tecnológicos são mais relevantes
na mudança estrutural, ao contrário de Lewis (1954). Especificamente, ao relacioná-los à
mudança estrutural, menciona:

O crescimento econômico de um país pode ser definido como um aumento


de longo prazo na capacidade de ofertar bens cada vez mais diversos para a
sua população, esta capacidade crescente baseada em tecnologia avançada
e em ajustes institucionais e ideológicos que ele demanda (KUZNETS, 1973,
p. 247, tradução nossa).

Para Kuznets (1973), identificam-se mudanças estruturais quando ocorre a realocação


de recursos provenientes do setor agrícola em direção ao setor industrial e posteriormente ao
setor de serviços; quando se expande a transformação de firmas pessoais em organizações
impessoais; e quando se percebe os deslocamentos do padrão de consumo no país.
Essas análises, todavia, caminham majoritariamente sobre modelos setoriais duais.
Estudos mais recentes expandem seus modelos para além da noção tradicional.
Fagerberg (2000) realizou estudo, limitado a manufaturas, sobre a relação da
mudança estrutural com o progresso tecnológico e o crescimento da produtividade com
uma amostra de 39 países entre 1973 e 1990. Entendeu que há novas configurações da
mudança estrutural ao compará-las com o passado: antigamente se dava por meio de forte
correlação entre o crescimento do produto, da produtividade e do emprego, enquanto
nas últimas décadas, com as novas tecnologias da revolução eletrônica, expande-se a
produtividade rapidamente sem necessariamente afetar o nível de emprego de novas
indústrias. Observa ainda um “bônus de crescimento” em países que estabeleceram novas
indústrias de eletrônicos à época.
Ding e Knight (2011), ao avaliarem regiões chinesas, apontaram variáveis importantes
para que se ocorram mudanças estruturais, como o nível de renda inicial, o investimento, o
grau de abertura comercial, o capital humano, a infraestrutura, as instituições, o crescimento
demográfico, etc.
McMillan e Rodrik (2011) discutiram os fatores que influenciam os deslocamentos
do trabalho: ao existirem vantagens comparativas reveladas no setor primário de uma
economia, inibem-se tais deslocamentos, ou seja, se uma maior parcela da pauta de
exportação for conduzida por recursos naturais, haveria um menor patamar na mudança
estrutural para prover elevação da produtividade. Ainda, quando economias operam a

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taxas de câmbio competitivas ou desvalorizadas, haveria uma tendência a ocorrerem


mudanças estruturais. Os autores também apontaram que um mercado de trabalho mais
flexível facilitaria este processo.

MUDANÇA ESTRUTURAL NAS CGV: UMA NOVA DISCUSSÃO

Estudar a relação entre a participação em CGV e mudanças estruturais é atividade


recente na literatura econômica. Esta relação, ademais, fundamenta-se no raciocínio
pelo qual quanto mais fragmentada é a produção no mundo, maior será a demanda por
bens intermediários e serviços especializados (STURGEON; MEMEDOVIC, 2011) — fatores,
cujo recrudescimento, Bianchi e Labory (2013) identificaram nas últimas décadas —,
aprofundando a interdependência produtiva. Sturgeon e Memedovic (2011) explicitaram
que as CGV permitiriam um maior acesso à informação, à abertura de novos mercados e à
criação de oportunidades para o desenvolvimento de novas capacidades tecnológicas e de
capital humano.
Neste contexto, porém, há uma distinção entre economias “sedes” e economias
“fábricas”: enquanto essas têm muitos bens intermediários em suas exportações, aquelas
não os têm demasiadamente, criando uma dependência muito mais forte do lado das
economias que são fábricas, algo que não é observado para as sedes (BALDWIN, 2013).
Nessa dinâmica também podem existir dificuldades de acompanhamento dos padrões
de qualidade exigidos pelas firmas líderes porque, geralmente, os ofertantes nas CGV não
integram firmas grandes ou diversificadas, gerando uma dificuldade de identificação dos
padrões e de adaptação interna (KAPLINSKY; FAROOKI, 2010). Deste modo, “por definirem
o papel desempenhado por partes individuais na cadeia, os compradores também podem
bloquear os caminhos para o aprimoramento estrutural de produtores” (Ibid., p. 128,
tradução nossa).
Whittaker et al., (2010) identificaram as CGV como meios para comprimir o
trajeto para o desenvolvimento por meio de um processo de catch-up não linear.
Breznitz e Murphree (2011) abordaram o caso da China como um exemplo para isso:
sua participação em um sistema fragmentado de produção global beneficiou o seu
crescimento econômico, ocorrendo, não obstante, processos de inovação em várias
etapas produtivas das quais participou.
Em alternativa, “as CGV não são necessariamente uma panaceia para o
desenvolvimento” (STURGEON; MEMEDOVIC, 2011, p. 3, tradução nossa). É possível
que se criem barreiras ao aprendizado, por exemplo, ou até mesmo que se estimule o

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desenvolvimento desigual no longo prazo, aprisionando firmas e indústrias nacionais em


funções pouco lucrativas de baixo valor adicionado (Ibid.), cenário bem discutindo por
Corrêa, Pinto e Castilho (2017). Um país poderia limitar-se ao setor de exportação, gerando
efeitos minúsculos sobre a estrutura produtiva geral da economia. O baixo valor adicionado
também acarretaria uma baixa endogeneidade tecnológica e limitado dinamismo
econômico (Ibid.). Segundo Fagerberg, Lundvall e Shrolec (2018, p. 537, tradução nossa),
a intensidade do valor adicionado estará a ditar os efeitos do desenvolvimento: “se uma
empresa permanecer aprisionada em funções limitadas, as implicações para a economia
nacional podem não ser tão favoráveis quanto os gestores públicos desejariam, pelo
menos não no longo prazo”. Por exemplo, atividades de montagem e fornecimento de
bens intermediários geram menor valor adicionado, ao passo que atividades de pesquisa
e desenvolvimento (P&D) e serviços de venda e pós-venda geram um valor adicionado
comparativamente maior.
Sem embargo, há, segundo Kummritz (2016), duas linhas gerais de pensamento
sobre a relação entre mudança estrutural e CGV. Tem-se uma linha, cujo principal trabalho
é de Samuelson (2004, apud KUMMRITZ, 2016), na qual se considera que os países de
menor renda (Sul) obtêm maiores benefícios ao receberem atividades de offshoring. Isto
se dá porque a especialização permitiria que estes países diminuíssem os empecilhos da
produtividade pelo learning-by-doing; é, ademais, algo como um jogo de soma zero, visto
que no longo prazo os países desenvolvidos teriam prejuízo com essa realocação produtiva
— uma deterioração de suas vantagens comparativas.
A outra linha, complementar ao trabalho de Baldwin e Robert-Nicoud (2014, apud
KUMMRITZ, 2016), aponta para os malefícios das CGV nos termos de troca dos países do
Sul, visto que “a ascensão das CGV permite que o norte combine a sua tecnologia superior
com baixos salários no sul através do offshoring de algumas etapas de produção” (Ibid., p. 4,
tradução nossa).
Há, portanto, diversas questões que precisam ser consideradas ao estudar a relação
entre CGV e mudança estrutural.

METODOLOGIA

Este estudo tem natureza aplicada e uma abordagem quantitativa descritiva (métodos
estatísticos). Buscou-se explorar, descrever e explicar o objeto de pesquisa pela pesquisa
bibliográfica e ex-post facto.

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Propomos avaliar a mudança estrutural por meio de proxies imperfeitas cuja proposta
é refletir a mudança na “qualidade”, ou no grau de sofisticação, da pauta comercial dos países.
Afinal, conforme o referencial teórico, a mudança na pauta de especialização comercial dos
países em direção a setores industriais e com maior teor tecnológico é capaz de refletir em
grande medida os processos de mudança estrutural nas economias. Duas proxies foram
utilizadas para mensurar tais mudanças estruturais: um índice de sofisticação da pauta de
exportações — Índice q — e o Índice de Complexidade Econômica (ECI).
O Índice q foi calculado com base nos dados de valor adicionado doméstico nas
exportações disponibilizados na TiVA (2018, apud OCDE, 2019). O valor adicionado doméstico
suprime valores realizados por países estrangeiros. A metodologia de cálculo seguida foi a
desenvolvida em Hermida (2016), na qual se utiliza a classificação setorial da OCDE para
categorizar os setores da classificação comercial ISIC Rev.4 em termos tecnológicos. Seu
cálculo dá-se da seguinte forma:

(1)

Onde: é o valor adicionado doméstico de setores de média e alta tecnologia,


é o valor adicionado doméstico de setores de baixa tecnologia, éo
valor adicionado doméstico total e é o Índice q de um país i no ano t, variando entre
, em que os valores próximos de indicam uma pauta
menos dinâmica, e vice-versa. Deste modo, podemos avaliar o padrão de especialização
comercial de um país.
A outra proxy para mudança estrutural é o ECI, cujo primeiro desenvolvimento foi
realizado por Hidalgo e Hausmann (2009). Nele se mensura o conhecimento necessário para
alcançar o produto de uma determinada localidade, o que reflete também a sua capacidade
produtiva, por conseguinte, a quantidade de trabalho e capital empregados para gerar seu
respectivo produto. Assim, as mudanças na estrutura produtiva viriam tanto do processo
no qual se encontram novos produtos por meio de novas combinações inexploradas
anteriormente como do processo pelo qual se acumula capacidades e combina-as
com capacidades prévias para criar novos produtos. Mensura-se, portanto, o nível de
complexidade das capacidades de um país. Considerando
como a função de todas as atividades de um local com complexidade , temos:
(2)

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Onde: é a média de e é o desvio-padrão de . Este índice é


disponibilizado pelo Atlas of Economic Complexity, da Harvard Kennedy School of Government.
Ambas as proxies, embora possibilitem a mensuração de mudanças estruturais por
meio de suas variações, diferenciam-se em pontos cruciais. O Índice q é composto somente
por informações de valor adicionado doméstico nas exportações, sendo mais simples,
portanto, limitado aos setores voltados a esta atividade nas CGV. Adequa-se a este estudo por
utilizar bens intermediários e ser integralmente direcionado às CGV. É, afinal, uma medida
de resultado da inserção de um país perante um mundo fragmentado produtivamente. Por
outro lado, o ECI agrega mais fatores, a incluir exportações e importações; propõe-se, assim,
a mensurar o conhecimento técnico da economia na totalidade.
A participação em CGV foi calculada a partir da TiVA (2018, apud OCDE, 2019) pela
seguinte forma:

(3)
Onde: é o total, em pontos percentuais das
exportações totais do país, da participação em CGV, resultado da soma de
, porcentagem da participação para trás (conteúdo estrangeiro importado
presente nas exportações do país em análise), e ,
porcentagem da participação para frente (conteúdo estritamente nacional presente nas
exportações dos países).
O Quadro 1 elenca minuciosamente as características gerais de cada variável utilizada
neste estudo e sua respectiva fonte.

Quadro 1 - Lista de variáveis e descrição


Variável Descrição Fonte
Índice de qualidade ou sofisticação das exportações,
calculado por meio do valor adicionado doméstico nas Trade in Value-Added
Índice q exportações tal como descrito na presente seção. Expresso (2018); Elaboração
em termos logaritmos. Primeira proxy para mudança própria.
estrutural (HERMIDA, 2016).
Índice de Índice de Complexidade Econômica desenvolvido por
The Atlas of Economic
Complexidade Hidalgo e Hausmann (2009). Expresso em termos logaritmos.
Complexity (2009)
Econômica Segunda proxy para mudança estrutural.
Índice de participação nas CGV, calculado por meio das
Trade in Value-Added
Participação nas medidas de participação para frente e participação para
(2018); Elaboração
CGV trás (indicador e Koopman, Wang e Wei, 2014). Expresso em
própria.
termos logaritmos.
PIB real per PIB real per capita inserido na forma de logaritmo utilizando o World Development
capita início do período (t-1) Indicators (2019)
Fonte: Elaboração própria (2021).

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A amostra reunida neste estudo foi selecionada de acordo com a disponibilidade de


dados na TiVA (2018), a qual contém dados referentes a 64 países no período de 2005 a 2016.
Tal conjunto, porém, teve de ser limitado às restrições de disponibilização do ECI. Foram
suprimidos da amostra Islândia, Brunei, Chipre, Taiwan, Malta e Luxemburgo (seis países). O
ano de 2016 foi também suprimido devido à ausência de informações referentes a muitos
dos países que compõem a amostra. Ademais, calculamos as variações no tempo, fazendo
com que o período amostral fosse de 2006 a 2015.
Foram também diferenciados, na amostra, países desenvolvidos e em
desenvolvimento, conforme a classificação da OCDE (2019). Elencamo-nos no Quadro 2.

Quadro 2 - Lista de países da amostra, por grau de desenvolvimento (OCDE, 2019)


Países desenvolvidos Países em desenvolvimento

Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, República


Argentina, Bulgária, Brasil, China, Colômbia,
Tcheca, Chile, Suíça, Alemanha, Dinamarca,
Costa Rica, Hong Kong, Croácia, Indonésia, Índia,
Espanha, Estônia, Finlândia, França, Reino Unido,
Cazaquistão, Camboja, Marrocos, México, Malásia,
Grécia, Hungria, Irlanda, Israel, Itália, Japão, Coreia
Peru, Filipinas, Romênia, Rússia, Arábia Saudita,
do Sul, Lituânia, Letônia, Países Baixos, Noruega,
Cingapura, Tailândia, Tunísia, Turquia, Vietnã, África
Nova Zelândia, Polônia, Portugal, Eslováquia,
do Sul.
Eslovênia, Suécia, Estados Unidos da América.

Total: 32 Total: 26
Fonte: Elaboração própria (2021).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Nesta seção analisamos o atual estágio de inserção das economias nas CGV, e, por
conseguinte, caracterizando suas estruturas produtivas. A Tabela 1 elenca os países com
maiores e menores Índice q e ECI a partir da média do período amostral (2006 a 2015).
Verifica-se que, em relação ao Índice q, os países com alta intensidade tecnológica na sua
produção obtiveram os maiores resultados, entre eles o Japão e a Coreia do Sul figurando as
duas primeiras posições.

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Tabela 1 - Países com maiores e menores Índice q e ECI conforme a média de 2006 – 2015
Média do
Média do ECI
Índice q
Menor Maior Menor Maior
Nova
-0,63509 Japão 0,904121 Camboja -1,08475 Japão 2,307414
Zelândia
Coreia do
Camboja -0,51367 0,787606 Peru -0,70881 Suíça 2,004165
Sul
Chile -0,41712 Cingapura 0,771751 Marrocos -0,56665 Alemanha 1,964914
República
Vietnã -0,31703 0,740067 Cazaquistão -0,51494 Suécia 1,838339
Tcheca
Letônia -0,30451 México 0,71307 Austrália -0,37188 Áustria 1,711146
Peru -0,24766 Alemanha 0,692287 Vietnã -0,35825 Finlândia 1,697431
Argentina -0,16104 Israel 0,633412 Chile -0,26086 Cingapura 1,620084
Coreia do
Indonésia -0,12206 Irlanda 0,600637 Indonésia -0,12133 1,619961
Sul
Arábia Reino
Estônia -0,06069 Hungria 0,596866 -0,12104 1,600405
Saudita Unido
Reino República
Lituânia -0,04899 0,593127 Argentina -0,03663 1,584267
Unido Tcheca
Fonte: Elaboração própria (2021).


Não obstante, identificam-se países asiáticos, da Europa oriental e ocidental, do
Oriente Médio e da América Latina, dos quais somente dois são países em desenvolvimento
— México e Cingapura. Em contraposição, os menores resultados são de países situados na
Oceania, Ásia, América Latina e Europa Oriental, dos quais cinco são países desenvolvidos e
cinco são países em desenvolvimento — Camboja, Vietnã, Peru, Argentina e Indonésia.
Podemos observar resultados similares do ECI perante o Índice q: as maiores médias
do ECI foram de Japão, Cingapura, Coreia do Sul, Reino Unido, Alemanha e República Tcheca,
países os quais apareceram entre as maiores médias do Índice q. No entanto, no ECI, temos
apenas países desenvolvidos figurando entre as maiores médias, diferentemente do que
observamos entre as suas menores médias, dos quais apenas Austrália e Chile são países
desenvolvidos.
A fim de ampliarmos a visão de análise sobre o período, podemos dividi-lo em
dois grupos: de 2006 a 2010, e de 2011 a 2015. O Gráfico 1 é um gráfico de dispersão da
relação entre o logaritmo do ECI (eixo Y) diante do logaritmo da participação em CGV (eixo
X) no período de 2006 a 2010, com classificação por países em desenvolvimento (azul) e
desenvolvidos (vermelho) e pelo PIB per capita (tamanho). Também se desenhou uma linha
de tendência geral ao longo do gráfico.

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Gráfico 1 - Dispersão de ECI em relação à participação nas CGV de países desenvolvidos e em


desenvolvimento (2006 – 2010)

Fonte: Elaboração própria (2021).

Quanto à presença de outliers, o Camboja ficou quase imperceptível no gráfico: renda


per capita e ECI baixíssimos. Outros casos especiais, como Austrália, Chile, Nova Zelândia
e Grécia, países desenvolvidos, situaram-se abaixo da linha de suavização. Apesar dessas
exceções, há uma clara divisão generalizada entre países em desenvolvimento (abaixo) e
países desenvolvidos (acima).
A mesma estrutura de gráfico foi configurada na figura 2, porém agora com o
logaritmo do Índice q nas ordenadas. Salienta-se o caso da Nova Zelândia, no canto inferior
esquerdo do gráfico, com ambos os Índice q e participação baixíssimos. Os países tidos
como desenvolvidos, Chile, Letônia, Lituânia, Portugal e Grécia, encontraram-se abaixo da
linha de regressão local. Não obstante, comparativamente, temos nesse caso mais países em
desenvolvimento com maior Índice q (acima da linha de suavização). Em ambos os gráficos
2 e 3, percebe-se uma maior concentração amostral em patamares com maior participação
em CGV.

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Gráfico 2 - Dispersão do Índice q em relação à participação nas CGV de países desenvolvidos


e em desenvolvimento (2006 – 2010)

Fonte: Elaboração própria (2021).


O Gráfico 3 tem a mesma estrutura do Gráfico 1, porém no período de 2011 a 2015.
Devido à presença de enorme outlier, diminuiu-se a escala do gráfico para o ponto mínimo
de logeci ser igual a -1 a fim de conseguir visualizar a dispersão dos dados. Novamente, os
países desenvolvidos Austrália, Grécia e Chile tiveram seu ECI abaixo da linha de suavização.
Devido à presença de outliers, vê-se uma concentração de países em desenvolvimento acima
da linha de suavização.

Gráfico 3 - Dispersão de ECI em relação à participação nas CGV de países desenvolvidos e em


desenvolvimento (2011 – 2015)

Fonte: Elaboração própria (2021).

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O Gráfico 4 estrutura-se de modo igual ao Gráfico 3, porém com o logaritmo do Índice


q sob análise. A Nova Zelândia aparece novamente no canto inferior esquerdo. Outro ponto
importante é a presença de países desenvolvidos como Letônia, Chile, Lituânia, Estônia e
Portugal abaixo da linha de suavização. Também se pode perceber a presença de países
em desenvolvimento alcançando maior grau de sofisticação de sua pauta de exportações
comparativamente a outros países desenvolvidos.

Gráfico 4 - Dispersão do Índice q em relação à participação nas


CGV de países desenvolvidos e em desenvolvimento (2006 – 2010)

Fonte: Elaboração própria (2021).


No Gráfico 5, analisa-se a dispersão do ECI perante o Índice q, nossas duas variáveis
para a mudança estrutural, de 2006 a 2015, com classificação pelo PIB per capita. Percebe-se
uma tendência positiva por meio da trajetória da linha de suavização. Também é possível
perceber a concentração de países com maiores níveis de PIB per capita em áreas de maior
nível tanto de ECI como de Índice q.
Em todos os gráficos, percebe-se uma tendência, média, em comum da curva de
suavização subdividida em três estágios. Primeiramente, em níveis baixos de participação
em CGV, o acréscimo desta mesma participação provoca um crescimento acentuado de
ambos os Índices q e ECI. Ou seja, marginalmente, os dados sugerem que integrar as CGV,
inicialmente, estaria correlacionado com efeitos positivos sobre as capacidades produtivas
de uma dada economia. Porém, a partir de loggvcpart = 3,5, há, aparentemente, um nível de
“estabilidade”, ou até mesmo decréscimo, da capacidade produtiva conforme cresce o grau
de participação em CGV. Este seria o segundo grupo, entre os mencionados acima.

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Por fim, percebe-se algo similar a um ponto de inflexão quando o logaritmo da


participação em CGV situa-se entre 3,75 e 4, em que os benefícios de participar em CGV são
bem observados com o aumento, em média, das proxies de mudança estrutural.

Gráfico 5 - Dispersão do ECI perante o Índice q, classificados pelo produto per capita, 2006 – 2015

Fonte: Elaboração própria (2021).

À medida que se incrementa a participação, há uma relativa estabilidade (ou mesmo


decréscimo) da sofisticação da pauta de exportações e da complexidade da economia
quando o logaritmo da participação em CGV situa-se entre 3,5 e 3,75. Percebe-se, também,
que neste estágio concentra-se relativamente a maior parte da amostra de países, tanto
desenvolvidos como em desenvolvimento. Isto sugere um “aprisionamento” na estrutura
produtiva conforme se acrescenta a participação em CGV até certo nível, semelhante ao
que se observou, de outras formas, em Corrêa, Pinto e Castilho (2018), Fagerberg, Lundvall
e Shrolec (2018) e Sturgeon e Memedovic (2011). Em outras palavras, o aumento da
participação nas CGV não parece estar relacionado com mudanças positivas na estrutura
produtiva; chegou até mesmo a diminuir, sugerindo um processo de desindustrialização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As principais características das CGV são seu alto grau de dinamismo e sua
complexidade no decorrer de suas redes produtivas. Nela, há uma divisão do trabalho e o
valor adicionado doméstico varia conforme a intensidade de conhecimento e tecnologia
neste processo. O presente estudo teve como objetivo analisar a existência de uma relação

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entre a participação em CGV e o fenômeno das mudanças estruturais a partir de uma base
de dados de 58 países no período de 2006 a 2015. Realizamos uma revisão de literatura
pertinente à temática, desde a conceituação de CGV até as novas discussões entre este
fenômeno atual e as mudanças estruturais.
Os resultados obtidos sugerem que a relação entre ambas variáveis depende, a priori,
do grau de participação nas CGV. Inicialmente, integrar a elas parece estar relacionado
positivamente a uma mudança na capacidade produtiva de um país, até certo ponto em
que há estabilidade para alguns países e declínio para outros de sua capacidade estrutural.
Há, no entanto, um ponto posterior a partir do qual a relação entre participação e mudança
estrutural mostra-se positiva.
Dessa forma, considerando o aprofundamento recente da participação de diversos
países nessas CGV e as evidências descritas preliminarmente neste trabalho é fundamental a
recomendação de que as empresas busquem alcançar melhores posições ao longo das CGV,
desenvolvendo novas funções, absorvendo conhecimento e buscando assimilar formas
de upgrading a fim de garantir ganhos contínuos em termos de mudança estrutural que
se traduzam em desenvolvimento econômico para as economias onde estão localizadas.
Concomitantemente, políticas industriais e comerciais devem ser pensadas com o intuito
de ampliar a competitividade dos distintos setores por meio das CGV sem desconsiderar as
reais perspectivas de upgrading ao longo de cada CGV e seus diversos impactos para o nível
de renda e emprego nas economias.
Algumas considerações devem ser feitas acerca das limitações deste estudo. A
mensuração empírica de ambas as variáveis é primordial para verificar a existência de
um padrão entre a participação e a mudança estrutural. Todavia, a limitação temporal e
de países da amostra, devido à disponibilidade de dados, dificulta o estudo. A estatística
descritiva também não se mostrou suficiente para verificar se os efeitos são os mesmos para
países desenvolvidos e em desenvolvimento. Sugere-se que, após o lançamento de uma
base de dados relativamente maior, a TiVA 2020, que se realize maiores estudos, inclusive
com instrumentos econométricos a fim de estudar o sentido de determinação entre tais
fenômenos econômicos.

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26
2

Desempenho da Produtividade Total dos Fatores


brasileira: uma análise para o período de 1960 a 20172
Jailson Rodrigues (1)
Anderson Moreira Aristides dos Santos (2)
Camila do Carmo Hermida(3)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6050-1048; Universidade Federal do Ceará/Doutorando em Economia,
jailsonufal@gmail.com;
(2)
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4234-8665;Universidade Federal de Alagoas/Professor Adjunto 3, E-mail:
anderson.santos@feac.ufal.br;
(3)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7206-5132; Universidade Federal de Alagoas/ Coordenadora do PPGEA
e Professora Adjunta da FEAC, camila.hermida@feac.ufal.br.

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

Diversos trabalhos apontam para um declínio da produtividade agregada brasileira


nos últimos anos, declínio este que tem contribuído para o baixo crescimento econômico
de longo prazo (CAVALCANTE; NEGRI, 2014; BONELLI, 2016; VELOSO et al, 2017; e BONELLI;
VELOSO; PINHEIRO, 2017). Diante deste quadro, é fundamental entender quais os fatores
que influenciam esse processo e impedem o Brasil de crescer como os países desenvolvidos,
ou mesmo como alguns dos seus pares da América Latina.
O presente trabalho, portanto, tem como objetivo principal analisar o desempenho
da Produtividade Total dos Fatores (PTF) brasileira no período de 1960-2017, por meio
da aplicação da metodologia de decomposição do crescimento (ou contabilidade do
crescimento). Neste caso, a contribuição ocorre no sentido de trazer uma atualização das
estimativas da PTF, explorando três especificações da função de produção: sem capital
humano, com capital humano e considerando as variáveis em termos de horas trabalhadas.

2 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap2
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Tanto a revisão quanto a parte aplicada seguirão a mesma ordem cronológica,


dividida em quatro intervalos de interesse: período dourado do crescimento (1960-1980),
década perdida (1980-1990), período das reformas (1990-2000) e período recente (2000-
2017). Com isso, busca-se extrair alguns insights dos respectivos contextos para explicar o
comportamento da PTF ao longo do tempo.
Os trabalhos consultados utilizam metodologias, dados e recortes temporais
distintos. Como esperado, isso provoca resultados diferentes e até mesmo conflitantes, em
alguns casos (CAVALCANTE; NEGRI, 2014). Além disso, boa parte dos estudos que realizaram
a decomposição do crescimento para o Brasil construíram suas respectivas séries a partir
de dados das contas nacionais ou fizeram uma combinação com bases internacionais, em
particular para o capital humano e o estoque de capital físico. Na parte aplicada, além dos
intervalos supracitados, uma decomposição adicional será realizada considerando intervalos
específicos, comumente considerados pela literatura.3
Além desta introdução, o trabalho conta com mais 4 seções. A seção 2 trata da
metodologia de decomposição do crescimento, bem como da fonte de dados para a
construção das variáveis que compõem a função de produção. A seção 3 empreende
uma ampla revisão empírica sobre o desempenho da PTF brasileira. Na seção 4 aplica-se a
metodologia de contabilidade do crescimento para o caso brasileiro. Finalmente, na seção
5, são as considerações finais.

METODOLOGIA DE PESQUISA E FONTE DE DADOS

A decomposição do crescimento é uma técnica de diagnóstico. Pretende-se, a partir


da sua aplicação, tão somente analisar em que medida a acumulação dos fatores (capital
físico e humano) e a PTF determinam o crescimento do produto por trabalhador, ao longo do
tempo. Portanto, neste tópico serão discutidas algumas especificações dessa metodologia
que será empregada na seção 4.
Primeiramente, baseando-se em Aghion e Howitt (2009), realiza-se uma aplicação que
considera a abordagem convencional da decomposição do crescimento, ou seja, aquela que
inclui apenas o capital e o trabalho na função de produção. Assim, seguindo o pressuposto
neoclássico de que os mercados funcionam sob concorrência perfeita, tem-se:
(2.1)

3 Ellery (2014) faz um balanço com as principais dificuldades em relação às metodologias e bases de dados
utilizadas para calcular a PTF. O autor ainda discute as mudanças recentes realizadas na base da Penn World
Table (PWT).

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A decomposição do crescimento pode ser então realizada substituindo a elasticidade


do crescimento para o capital (α) na função de produção, já em termos intensivos e de taxa
de crescimento.
(2.2)

Lembrando que, enquanto a contribuição dos fatores é obtida diretamente


multiplicando as taxas de crescimento pelas elasticidades respectivas, a PTF, por outro lado,
é calculada de forma indireta (residual). Nesse sentido, reordenando a expressão acima:
(2.3)

Além dessa forma mais geral, explora-se mais duas especificações adicionais:
considerando o capital humano e fazendo as variáveis da função de produção em termos de
horas trabalhadas. Ademais, para verificar a robustez dos resultados, considera-se também
valores distintos para as elasticidades do crescimento e para algumas medidas da função de
produção, bem como outros recortes temporais.
Por fim, cabe destacar que na aplicação dessa técnica para o caso brasileiro, optou-se
por coletar os dados diretamente da PWT 9.14 em vez de construir as medidas da função de
produção a partir de dados das contas nacionais, como é feito por boa parte dos trabalhos
empíricos. A base supracitada já conta atualmente com medidas específicas para produto,
estoque de capital físico, capital humano e emprego. O Quadro a seguir fornece uma
descrição compacta das variáveis que foram utilizadas.

Quadro 1 - Variáveis utilizadas na decomposição do crescimento


Variável Descrição

PIB real do lado da despesa em PPP’s encadeadas (em US $


rgdpe;
mil. 2011); PIB real a preços nacionais constantes de 2011
rgdpna
(em US $ mil. 2011).
Estoque de capital a preços nacionais constantes de 2011
rnna; rkna (em US $ mil. 2011); Serviços de capital a preços nacionais
constantes de 2011 (2011 = 1)
emp Número de pessoas envolvidas (em milhões)
Índice de capital humano, baseado em anos de
hc
escolaridade e retornos à educação.
avh Média anual de horas trabalhadas por pessoas contratadas.
Participação da remuneração do trabalho no PIB a preços
labsh
nacionais atuais.
Fonte: PWT 9.1. Elaborado pelo autor.

4 Para uma visão mais detalhada sobre a construção e descrição das variáveis da PWT, ver Feenstra et al. (2015).

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EVOLUÇÃO DA PTF BRASILEIRA: UMA BREVE REVISÃO EMPÍRICA

PERÍODO “DOURADO” DO CRESCIMENTO (1960-1980)

O período posterior à Segunda Guerra Mundial foi de crescimento expressivo para


a economia brasileira, lembrando que é justamente nesse intervalo que ocorre o chamado
“milagre econômico”, onde o PIB per capita cresceu a uma taxa acima de 5%. Os achados
mostram inequivocamente que o crescimento da PTF foi um dos principais responsáveis
no sentido de explicar esse ritmo de crescimento vigoroso. A esse respeito, Veloso, Vilella
e Giambiagi (2008) destacam que, para o período específico do milagre econômico, há
evidências de que se tratou de um “milagre de produtividade”.
Nesse período, há também um profundo esforço industrializante e de crescente
urbanização, fazendo com que a economia brasileira deixasse de ser totalmente rural e
agrícola e entrasse em outra dinâmica social e produtiva. Inclusive, um dos argumentos para
explicar o crescimento também acentuado da PTF foi a transferência de recursos do setor
agrícola para a indústria e serviços, setores considerados mais produtivos. Tal processo teria
contribuído para ampliar a produtividade agregada da economia (PINHEIRO et al., 2004;
FERREIRA; VELOSO, 2013).
O importante papel da produtividade durante este intervalo também é relatado
no trabalho de Gomes et al. (2003), mostrando que a Produtividade Total dos Fatores
Descontada (PTFD)5 cresceu algo em torno de 10% entre 1950 e 1967, possivelmente
indicando uma trajetória de crescimento balanceado, isto é, estabilidade da relação capital-
produto acompanhada de crescimento da produtividade próximo da taxa do progresso
tecnológico. Esse resultado também é reforçado por Ferreira e Veloso (2013), quando
encontram estabilidade da relação capital-produto para o período de 1950 até meados da
década de 70.
Barbosa e Barbosa Filho (2014), na parte em que realizam o exercício de decomposição
do crescimento, a partir de dados da Penn World Table 8.0, mostram que o ápice de crescimento
se deu na década de 1970 (PIB per capita atinge 5,9% a.a.). Os autores também encontram
resultados que sugerem que a PTF foi um dos principais fatores explicativos desse ritmo de
crescimento, mas a acumulação de capital físico e a participação da força de trabalho na
população também desempenharam papel fundamental.

5 Medida alternativa calculada pelos autores para representar a diferença entre a evolução da PTF brasileira e
a da fronteira tecnológica.

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É importante destacar que, nesse período de forte expansão, diferentemente


da experiência asiática, no caso brasileiro, pouca atenção foi dada à questão do capital
humano, bem como para as políticas sociais, o que explicaria o pouco avanço nos
indicadores sociais apesar do crescimento expressivo (FERREIRA; VELOSO; 2013; BARBOSA;
BARBOSA FILHO, 2014).
Algo que ainda não foi discutido neste subtópico, é que esse período também
é caracterizado por um expressivo grau de intervenção estatal na economia. O esforço
industrializante mencionado anteriormente tinha o Estado como principal responsável.
Esse também é o período do chamado Processo de Substituição das Importações (PSI),
uma política que intensifica o isolamento do Brasil em relação ao resto do mundo e
consequentemente provoca uma estagnação da produtividade, na medida em que dificulta
os ganhos de eficiência. Portanto, essa agenda que priorizava a indústria, a todo e qualquer
custo, em detrimento de uma agenda que promovesse o aumento da eficiência brasileira,
acabou preparando o caminho para o colapso da década seguinte. (FRANCO, 1998; PINHEIRO
et al., 2004).
Já a partir de meados da década de 1970 a produtividade agregada começa a
apresentar sinais de queda, um processo que pode ser considerado um “fato estilizado”
da economia brasileira, em virtude da quantidade de trabalhos que também encontraram
esse resultado (FERREIRA; ELLERY; GOMES, 2008). O excesso de intervenção estatal é então
apontado como uma das causas explicativas principais desse movimento de declínio da
produtividade, evidenciando a insustentabilidade do modelo de desenvolvimento que
vigorava à época.

DÉCADA PERDIDA (1980-1990)

A década de 1980 marca a interrupção do crescimento vigoroso observado na era


dourada. Queda brusca na produção e inflação crônica são algumas das características
principais desse período tão conturbado da economia brasileira. Com a PTF não foi
diferente, a maioria dos trabalhos encontra variação negativa da produtividade nesse
intervalo (BONELLI; FONSECA, 1998; BUGARIN et al., 2007; PINHEIRO et al., 2004; BACHA;
BONELLI, 2005).
Gomes et al. (2003) e Ferreira et al. (2008) realizaram várias formas de decomposição
do crescimento e de mensuração da PTF, em ambos os trabalhos o declínio da
produtividade agregada nos anos 80 parece ser um resultado bastante robusto. Desde

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então, a PTF não conseguiu se recuperar de modo a voltar para as taxas observadas no
intervalo anterior.
Franco (1998) argumenta que o velho modelo (se referindo ao modelo de crescimento
por substituição de importações) parecia ter se esgotado ao longo dos anos 80. O excesso
de políticas comerciais e industriais típicas dessa lógica, bem como a intensificação de
estímulos fiscais para sustentar o crescimento, acabaram por agravar a ineficiência industrial
e a competitividade e, desta forma, impactando negativamente a produtividade. De forma
semelhante, Ferreira, Ellery e Gomes (2008) levantam três hipóteses para explicar o colapso
da produtividade na década de 70 e na década perdida: (i) aprofundamento das políticas
protecionistas; (ii) excesso de intervenção estatal em setores produtivos; e (iii) intervenção
governamental no sistema de preços relativos da economia.
Voltando-se para uma questão mais técnica, mas que tem implicações importantes
para análise do intervalo em questão, Barbosa Filho e Pessôa (2014) sugerem que a PTF
na década de 1980 poderia ter sido maior que a normalmente é estimada pela maioria
dos trabalhos, dado que os estudos ainda não consideravam horas trabalhadas em vez de
população ocupada. O argumento é que a PTF mensurada com base em população ocupada
subestima o desempenho da produtividade no período (houve redução da jornada de
trabalho nesse período). Embora os resultados continuem confirmando desempenho ruim
da PTF para esse intervalo, seria uma queda bem menor do que a que convencionalmente
tem sido reportada.

PERÍODO DAS REFORMAS (1990-2000)

A década de 1990 é conhecida na historiografia econômica brasileira como período


das reformas, por conta da postura reformista adotada nesse intervalo. Lembrando que é
nesse momento será executado o mais importante plano de estabilização da economia
brasileira: o Plano Real, em 1994. Plano este que visava dar conta do grave problema de
hiperinflação. Portanto, sob a influência do chamado “Consenso de Washington”6, uma
série de reformas foram efetuadas não só no Brasil, mas em boa parte da América Latina.
A economia brasileira passa de uma lógica de desenvolvimento puxada pelo estado para

6 O termo “Consenso de Washington” foi criado em 1989 pelo economista britânico John Williamson para
designar um conjunto de medidas políticas que visava dar conta dos problemas econômicos dos países em
desenvolvimento, começando pela América Latina. O supracitado consenso pode ser sumarizado em 10
pontos: (i) Disciplina fiscal; (ii) Reordenação das Prioridades de Despesas Públicas; (iii) Reforma tributária;
(iv) Liberalização das taxas de juros; (v) Taxa de Câmbio competitiva; (vi) Liberalização comercial; (vii)
Liberalização do investimento estrangeiro direto; (viii) Privatização; (ix) Desregulamentação; e (x) Direitos de
propriedade (WILLIAMSON, 2009).

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um novo modelo onde o Estado teria uma postura mais reguladora e fiscal (PINHEIRO et
al, 2004).
Como fora discutido, a década anterior havia sido demasiadamente caótica em várias
instâncias da economia, inclusive em relação ao desempenho da PTF. Para a década de
1990, por outro lado, os trabalhos que empreendem a metodologia de decomposição do
crescimento encontram um movimento de recuperação dessa medida, recuperação esta
que se mantém até boa parte da primeira década dos anos 2000. Por exemplo, Gomes et
al. (2003) mostram que a taxa de crescimento da PTF se tornou positiva entre 1992 e 2000,
crescendo 1% a.a. Em Ellery (2017) a contribuição da PTF para o crescimento do PIB por
horas trabalhadas foi de 1,6%, para o intervalo de 1992-1998. Os trabalhos de Bonelli e
Fonseca (1998) e Pinheiro et al. (2004) mostram que durante a década de 1990 a PTF cresceu
significativamente. Estes últimos, em particular, fizeram a decomposição do crescimento
com e sem capital humano, para ambos os casos, os resultados foram bastante similares.
Uma das hipóteses levantadas para explicar o processo de recuperação da PTF na
década de 90 foi a redução da instabilidade macroeconômica, com destaque para o controle
da inflação (a partir do êxito do Plano Real). De modo geral, é bastante comum se destacar
a contribuição das demais reformas estruturais para o crescimento da produtividade
nesse período, onde a busca da eficiência se tornou uma prioridade (PINHEIRO et al., 2004;
PINHEIRO; GIAMBIAGI; GOSTKORZEWICZ, 1999).
Assim, é possível destacar dois achados principais que são comumente apontados
para esse intervalo. Primeiro, houve recuperação, ainda que modesta, da produtividade
agregada e, em segundo lugar, as reformas empreendidas à época teriam desempenhado
alguma parcela de influência nesse processo. Uma discussão que será retomada em seguida
é sobre o tempo de maturação das reformas, ou seja, acerca do tempo até que os efeitos
sobre a produtividade fossem efetivados.

PERÍODO RECENTE (2000-2017)

O período das reformas possibilitou uma reversão no processo de declínio da


produtividade agregada brasileira. No entanto, há controvérsia sobre qual teria sido
a importância do impacto das reformas no processo de recuperação da PTF, iniciada já
na década de 90. O fato é que a melhora no desempenho dessa variável segue até boa
parte da primeira década dos anos 2000, tendo inclusive um desempenho superior no
período mais recente. Nesse sentido, algumas questões precisam ser discutidas. Primeiro,

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o que explica, em parte, o ritmo de crescimento experimentado nesse período mais


recente e qual foi a contribuição da PTF nesse processo? Em segundo lugar, esse ritmo de
crescimento era sustentável?
Em geral, a literatura aponta três fatores principais para explicar o bom desempenho
da economia e o desempenho razoável da PTF nesse intervalo: comércio internacional,
bônus demográfico e efeito tardio das reformas. Sobre o primeiro fator, Bacha e Bonelli
(2016) usam a expressão “China Syndrom” para descrever o efeito desempenhado pelo
crescimento da China sobre a economia brasileira. Lembrando que nesse contexto o boom
dos preços das commodities favoreceu sobremaneira não só o Brasil, mas boa parte dos
países primário-exportadores (NEGRI; CAVALCANTE, 2014). Ainda dentro dessa discussão,
há outra hipótese de que a melhora nos termos de troca teria desempenhado um impacto
positivo sobre a PTF.7
Além do fator comércio internacional, a economia brasileira também teve o
seu desempenho econômico favorecido pela sua dinâmica demográfica, ou mais
especificamente, pelo “bônus demográfico”. Este é o momento no qual a população em
idade de trabalho cresce mais rápido que a população total. Entretanto, Barbosa e Barbosa
Filho (2014) alertavam que o crescimento do PIB per capita não poderia mais contar com a
contribuição do esforço de trabalho (trabalho/população), vez que os dados já apontavam
para o fim do bônus demográfico e a queda na taxa de desemprego observada na década
passada muito dificilmente ocorreria nos próximos anos.8
Agora voltando para o debate em torno do papel das reformas sobre a recuperação
da produtividade, iniciadas a partir dos anos 90, o desempenho da PTF durante a primeira
parte do período recente foi superior ao observado no intervalo em que as reformas foram
empreendidas. Uma das razões para explicar esse resultado seria o tempo de maturação
das reformas. Em outros termos, a ideia é que levaria um certo tempo até que as reformas
desempenhassem um efeito significativo sobre a produtividade agregada (LISBOA; PESSÔA,
2013; BONELLI, 2016; ELLERY, 2017).
Portanto, esses fatores acabaram encobrindo o fraco desempenho da PTF no período
mais recente, pois mesmo a produtividade não tendo crescido vigorosamente, o ganho de
bem-estar foi expressivo e parecia realmente que a economia brasileira trilharia uma rota
de crescimento duradouro. Isso ajuda a entender o porquê de o tema da produtividade

7 Ver Negri e Cavalcante (2014) e Bacha e Bonelli (2016) para uma discussão mais aprofundada.
8 Barbosa et al. (2016) discutem sobre as implicações da transição demográfica sobre a oferta de trabalho e o
crescimento econômico.

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ter sido relegado a um papel secundário. O fato é que com a nova tendência de queda da
produtividade, aprofundada após 2014, além da nova dinâmica demográfica e as mudanças
na condução da política econômica, a busca por ganhos de produtividade se torna um
imperativo. (CAVALCANTE; NEGRI, 2014; MATOS, 2016).
Dentre os principais resultados para o período recente, Bonelli (2014) encontra uma
taxa de 1,3% para o intervalo 2003-13 da PTF, esta que explica a maior parte do crescimento
observado. É uma taxa até razoável quando se considera o desempenho pós-década perdida.
Bacha e Bonelli (2016) encontraram valores de 2% e -0,2% para os intervalos 2004-2010 e
2011-2014, respectivamente. Em Bonelli (2016) o crescimento da PTF passou de 2,1% a.a. no
período 2007-2010 para 0,4% a.a. entre 2011 e 2014. Ellery (2017), por sua vez, mostra que,
enquanto no intervalo 1992-2002 a taxa média de crescimento da PTF foi 0,91% a.a., nos dez
anos seguintes, a taxa de crescimento anual foi de 1,4%.

APLICAÇÃO DA CONTABILIDADE DO CRESCIMENTO PARA O CASO BRASILEIRO

Neste tópico será aplicada a técnica de decomposição do crescimento para a


economia brasileira, seguindo os intervalos discutidos anteriormente. Lembrando que as
medidas que compõem a função de produção não serão calculadas, em vez disso, serão
coletadas diretamente da PWT 9.1. Ademais, optou-se por utilizar especificações mais gerais,
dado que o foco é analisar apenas o desempenho da PTF.
Os resultados podem ser visualizados na Tabela 1, onde já é possível verificar
consistência em relação aos achados da literatura quando se observa uma taxa de
crescimento de 3.06% da PTF no intervalo 1960-70. Ou seja, no período “dourado” a PTF
foi o fator que mais contribuiu para o crescimento expressivo do produto por trabalhador
(0.658%). Constata-se também variação negativa da PTF durante a década perdida (-2%) e
uma recuperação durante o período das reformas (1,37%). De 2000 a 2017 a variação da PTF,
embora positiva, esteve em um nível muito baixo, apenas 0,6%. Portanto, nessa primeira
aplicação da forma mais tradicional, tanto em termos de magnitude quanto de sinal, os
resultados parecem corroborar com as evidências encontradas para o desempenho da
PTF brasileira.

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Tabela 1- Brasil – Decomposição do crescimento: sem capital humano (em %)


Período

1960-1970 4,65 3,06 1,59 0,658 0,486

1970-1980 4,42 1,74 2,68 0,393 0,486

1980-1990 -2,00 -1,76 -0,233 0,883 0,486

1990-2000 1,37 0,369 0,999 0,269 0,467

2000-2010 1,36 0,965 0,399 0,707 0,458

2000-2017 0,618 0,144 0,474 0,234 0,446

1960-2017 1,67 0,640 1,03 0,384 0,471

Fonte: Elaborado pelo autor com base na PWT 9.1 (2021).

A incorporação do capital humano gera algumas mudanças nos resultados da


contabilidade do crescimento. Ou seja, agora o resíduo (ou a PTF), é a parcela do crescimento
que não está sendo explicada não só pelo aprofundamento de capital físico, mas também
pela contribuição do capital humano. Neste caso, será feito uma pequena adaptação na
forma funcional da função de produção proposta por Aghion e Howitt (2009), adicionando
o capital humano (h).
(4.1)

Onde é a taxa de crescimento do capital humano.


É possível observar na tabela 2 que continua valendo alguns achados anteriores.
Isso significa que mesmo mudando a especificação da função de produção, os resultados
são bastante similares. Porém, há algumas mudanças nos sinais para alguns períodos, por
exemplo, no intervalo 1990-2000, período das reformas, o crescimento da PTF foi negativo,
mas note que, embora negativo, ainda parece indicar um movimento de recuperação. Observe
ainda que com a incorporação do capital humano os valores para a taxa de crescimento e a
contribuição da PTF foram alterados, reduzindo em alguns casos e aumentando em outros.

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Tabela 2 - Brasil – Decomposição do crescimento: com capital humano (em %)

Período

1960-1970 4,65 2,65 1,59 0,569 0,486 0,110

1970-1980 4,42 1,85 2,68 0,418 0,486 0,116

1980-1990 -2,00 -2,52 -0,233 1,26 0,486 -0,257

1990-2000 1,37 -0,567 0,999 -0,415 0,467 0,390

2000-2010 1,36 -0,0635 0,399 -0,0465 0,458 0,397

2000-2017 0,618 -1,05 0,474 -1,70 0,446 0,896

Fonte: Elaborado pelo autor com base na PWT 9.1 (2021).

Com e sem capital humano, durante o intervalo 1970-1980 é possível observar uma
redução da PTF, mas a taxa de crescimento do produto por trabalhador permanece bastante
elevada. De certa forma, esse resultado reforça a ideia de que houve um processo de
descolamento entre a produtividade e o crescimento, ainda na década de 70, um processo
considerado insustentável a longo prazo.
Nas próximas aplicações serão considerados valores distintos para as elasticidades
do crescimento: , valor frequentemente utilizado
pela pesquisa econômica e , estimativa para o Brasil, obtida a partir
da média da participação da remuneração do trabalho no PIB a preços nacionais, entre 1960
e 2017. Com essas novas especificações, a principal diferença em relação ao comportamento
da PTF são valores maiores nos intervalos 1990-2000 e 2000-2010.

Tabela 3 - Brasil – Decomposição do crescimento: com capital humano e explorando α


diferentes (em %)

Período PTF PTF


1960-1970 4,99 3,10 0,81 1,03 3,42 1,52 3,06

1970-1980 3,08 4,94 -0,21 1,65 1,58 2,42 0,77

1980-1990 0,84 -0,05 1,48 -0,02 -1,81 - 0,03 -1,57

1990-2000 4,42 1,73 1,77 0,58 2,67 0,85 2,68

2000-2010 3,75 0,25 1,92 0,08 2,39 0,12 2,65

2010-2017 0,65 1,35 2,55 0,45 -1,50 0,66 -1,31


Fonte: Elaborado pelo autor com base na PWT 9.1 (2021).

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Na tabela 4, a decomposição foi realizada considerando produto e capital por horas


trabalhadas. No intervalo que corresponde à década perdida, embora a PTF tenha sido de
valor muito baixo, ficou positiva. Portanto, concordaria com Barbosa Filho e Pessôa (2014),
os quais sugerem que as estimativas que não consideravam horas trabalhadas poderiam
subestimar a PTF na década de 80. Para o intervalo 2010-2017 a PTF continua sendo negativa.
Aliás, em termos de horas trabalhadas, esse é o único intervalo em que a PTF ficou negativa;
mas também não é um resultado surpreendente, vez que após 2008 a produtividade
agregada brasileira entra novamente em uma trajetória de queda.

Tabela 4 - Brasil – Decomposição do crescimento: Y e K por horas trabalhadas e com capital


humano (em %)

Período PTF PTF


1960-1970 7,64 5,70 0,81 1,90 5,20 2,79 4,43

1970-1980 7,97 9,91 -0,21 3,30 4,81 4,86 3,22

1980-1990 3,32 4,14 1,48 1,38 0,95 2,03 0,53

1990-2000 5,80 3,07 1,77 1,02 3,60 1,51 3,40

2000-2010 6,40 2,80 1,92 0,93 4,18 1,37 4,04

2010-2017 2,10 2,82 2,55 0,94 -0,53 1,38 -0,58

1960-1980 7,80 7,79 0,30 2,60 5,01 3,81 3,84

1980-2017 4,58 3,24 1,88 1,08 2,25 1,59 2,03


Fonte: Elaborado pelo autor com base na PWT 9.1 (2021).

Ainda foi realizada uma decomposição adicional a partir de períodos específicos


e considerando outras medidas de produto e estoque de capital da PWT 9.1. Além disso,
foram feitos intervalos longos e curtos. Na primeira parte da tabela 5, com variáveis na
forma intensiva, os resultados da PTF foram negativos, exceto no período do milagre
econômico. No caso de 1976-92, é importante lembrar que em meados da década de 1970
a PTF já começava a apresentar sinais de desaceleração. Na parte que considera variáveis
por horas trabalhadas, o comportamento da PTF segue mais fielmente os resultados
encontrados pela literatura.

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Tabela 5 - Brasil – Decomposição do crescimento: intervalos alternativos (em %)

Por trabalhador Por horas trabalhadas


Período

1967-1976 4,91 2,61 -0,04 2,34 9,92 5,08 -0,04 4,89

1976-1992 0,12 0,69 0,62 -1,19 3,61 2,43 0,62 0,57

1992-2000 1,49 1,10 0,92 -0,53 2,97 1,83 0,92 0,22

2000-2013 1,34 0,60 1,08 -0,34 3,79 1,81 1,08 0,91

2000-2017 0,54 1,07 1,11 -1,63 2,65 1,57 1,11 -0,04

1967-2017 1,33 1,04 0,71 -0,43 4,28 2,50 0,71 1,07


Fonte: Elaborado pelo autor com base na PWT 9.1 (2021).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A despeito das formas funcionais de cálculo utilizadas pela ampla literatura


referenciada, bem como suas respectivas bases de dados (nacionais, internacionais ou uma
combinação de ambas), é possível resumir o comportamento da PTF brasileira ao longo
desses 57 anos da seguinte forma:
i. Período dourado – Esse é o período em que PTF atinge a sua máxima histórica, sobretudo
no período do milagre econômico. Há evidências de que nesse intervalo o Brasil também
esteve em uma trajetória de crescimento balanceado. Um dos principais argumentos
para explicar esse comportamento vigoroso da produtividade agregada foi a mudança
estrutural, aprofundada durante o Segundo Pós-Guerra, em particular porque a economia
brasileira deixa de ser totalmente agrícola e rural e torna-se mais urbanizada, intensificando
o esforço industrializante. Este último tendo o Estado como principal indutor. Ainda na
década de 1970, ocorre a precipitação de um descolamento entre o crescimento do produto
e da PTF, um movimento que, de acordo com a ótica neoclássica, seria insustentável.
ii. Década perdida – trata-se de um período bastante dramático para a economia
brasileira, em diversos aspectos, inclusive em relação ao desempenho da PTF.
Em certa medida, expõe o esgotamento do modelo de desenvolvimento que
predominava até então, baseado fundamentalmente em forte intervenção estatal
e substituição de importações. Há, portanto, evidências que sugerem que o
colapso econômico da década de 80 teria sido também causado pela queda da PTF.

iii. Período das reformas – a década de 90 marca uma certa ruptura com o
modelo de desenvolvimento anterior, adotando-se profundamente uma
postura mais reformista. Embora haja controvérsia sobre qual teria sido o
impacto das reformas, os resultados obtidos pela maioria dos trabalhos

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mostram que houve um processo de reversão da queda da PTF nesse


intervalo. Os estudos também divergem sobre a força dessa recuperação.

iv. Período recente – são duas histórias que, embora relacionadas, tiveram desenvolvimentos
bastante distintos. A recuperação da PTF segue até boa parte da primeira década, porém
apresentando um desempenho muito aquém do esperado. Esse fraco desempenho teria
então sido encoberto por dois fatores: bônus demográfico e boom das commodities,
que propiciaram uma ampla sensação de bem-estar, mesmo a produtividade estando
praticamente estagnada. Após a crise de 2008, vem a segunda parte da história, com a PTF
apresentando novamente variação negativa. Sem embargo, muito dificilmente o Brasil
poderá contar com os fatores que favoreceram a dinâmica virtuosa da década anterior.

O fato é que a economia atravessa o período pós-década perdida até os dias recentes
com um fraco desempenho da produtividade agregada. Quando finalmente parecia que
o quadro iria mudar, durante a primeira década dos anos 2000, novamente a PTF volta a
colapsar após a crise de 2008 e mais ainda após a recessão de 2014. No geral, os trabalhos têm
reportado que a economia brasileira caminha para fechar quatro décadas de estagnação da
produtividade. É um diagnóstico preocupante, considerando o fato de que no longo prazo
a produtividade é o que garante crescimento sustentado.

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42
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43
3

A contribuição do grau de abertura comercial para


ganhos de produtividade da economia brasileira:
1982-20199
Thallyson Eduardo Alves Martins(1)
Camila do Carmo Hermida(2)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2760-1706; Universidade Federal de Alagoas/Graduando em Economia
(FEAC-UFAL); BRAZIL, E-mail: thallysoneduardo12@gmail.com.
(2)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7206-5132; Universidade Federal de Alagoas/Coordenadora do
Programa de Pós-Graduação em Economia Aplicada (PPGEA-UFAL), BRAZIL, E-mail: camila.hermida@feac.
ufal.br.

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

O debate teórico em torno do comércio internacional e sua relação com a


produtividade transborda para o campo de formulação de políticas do comércio exterior.
Há aqueles, com base nas ideias liberalizantes e nos modelos teóricos do mainstream, que
destacam as políticas de abertura comercial e estratégias globalizantes para obter maiores
níveis de produtividade e crescimento. Contudo, há os que, influenciados pelas ideias
estruturalistas de Prebisch, Furtado e outros, enfatizam políticas de proteção das indústrias
nascentes que tendem a reduzir a inserção internacional das economias e a promover a
substituição de importações (GONTIJO, 2007; BADO, 2004).
O Brasil caracterizou-se como um país primário-exportador, explorando as
suas vantagens comparativas neste setor até os anos de 1930, quando, por ímpetos
industrializantes, o país adotou a substituição de importações como estratégia de
desenvolvimento econômico, estratégia esta utilizada, também, nas décadas de 1950 e 1970.

9 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap3
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No final dos anos de 1980 e na década de 1990, o país passou por um processo de abertura
comercial que tinha como um dos objetivos o aumento da produtividade. Veloso, Matos
e Peruchetti (2019) encontram que entre o período de 1981-2018, a renda per capita e a
produtividade por hora trabalhada cresceram 0,9% e 0,4% ao ano, respectivamente. O baixo
crescimento da produtividade foi compensado pelo bônus demográfico que correspondeu
ao acréscimo de 0,5% ao ano no período. No entanto, a sociedade brasileira vem passando
por mudanças demográficas no sentido de redução da taxa de natalidade. Nesse contexto,
muito se argumenta que o crescimento de renda per capita no Brasil estará cada vez mais
condicionado a ganhos de produtividade (Boneli e Fontes, 2013). Isto posto, faz-se a seguinte
pergunta norteadora deste trabalho: em que medida um aumento da abertura comercial
pode contribuir para ganhos de produtividade na economia brasileira?
Dado que há uma extensa literatura, tanto ao nível internacional como nacional,
acerca da relação causal entre a liberalização comercial e ganhos de produtividade (SILVA,
2004), e que esta é considerada uma variável central no debate acerca do crescimento
econômico, o presente trabalho tem por objetivo analisar o processo de abertura
comercial no Brasil, bem como investigar e mensurar os impactos de tal processo sobre o
comportamento da produtividade da economia brasileira no período entre 1982 e 2019.
Ademais, não há mais trabalhos empíricos recentes buscando explicar os
impactos do grau de abertura comercial para sua produtividade do Brasil. Logo, uma das
contribuições desse trabalho é atualizar a análise dessa relação considerando um período
mais recente. Outra contribuição importante é a aplicação de uma metodologia distinta
daquelas até então aplicadas na literatura para investigar tal relação – a abordagem
econométrica baseada em Modelos Autorregressivos de Defasagens Distribuídas (ARDL)
-, os quais permitem avaliar e diferenciar os efeitos de curto e longo prazo do grau de
abertura econômica sobre a produtividade do trabalho.
O artigo está dividido em três seções além desta Introdução: uma revisão da
literatura empírica sobre a relação entre abertura comercial e produtividade, com especial
ênfase para o Brasil e literatura no âmbito nacional; uma seção de aspectos metodológicos;
e uma seção de resultados, além das considerações finais.

REVISÃO DE LITERATURA EMPÍRICA

A produtividade mensura o quão eficiente um país é em converter seus insumos em


produtos, consistindo num dos elementos cruciais para o crescimento de longo prazo. Dessa

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forma, a produtividade gera não apenas um aumento do produto com a mesma quantidade
de trabalho e outros insumos, como também incentivos para que mais investimentos
sejam feitos, ocorrendo um “efeito transbordamento” para toda a economia (SILVA, FILHO e
KOMATSU, 2016). 
Srenivasan e Bhagwati (2000 apud SILVA, 2004) argumentam que uma abertura
comercial pode afetar positivamente a produtividade através de uma alocação mais eficiente
de recursos, redução de atividades de rent-seeking e um maior retorno social do investimento
direto estrangeiro.    Já Lee (1993 apud SILVA, 2004) e Romer (1996 apud SILVA, 2004),
discutindo o impacto da liberalização sobre a produtividade, considerando o efeito positivo
da maior disponibilidade de insumos para as economias domésticas. Os autores chegaram
à conclusão de que uma política comercial protecionista pode diminuir a quantidade de
insumos importados necessários ao processo produtivo, afetando negativamente a taxa de
crescimento do produto de curto prazo. 
Por sua vez, Edwards (1998) argumenta que a evolução da produtividade de uma
economia em desenvolvimento depende das inovações domésticas e da imitação de novas
tecnologias do resto mundo, corroborando assim com os trabalhos de Lee e Romer discutidos
em Silva (2004), dado que uma política comercial protecionista reduziria a quantidade de
insumos necessários ao desenvolvimento das inovações domésticas, por conseguinte, a
imitação das novas tecnologias estrangeiras.
Em contraste, com o mesmo modelo de crescimento endógeno sustentado por um
processo de learning by doing, Chuang (1998 apud SILVA, 2004) conclui que, sob certas
condições, abrir a economia doméstica significa aumentar a taxa de crescimento do produto
através da transmissão de conhecimento via comércio.
Tybout et al., (1989) realizam um estudo para o Chile com a finalidade de verificar se as
proteções de comércio reduzem a eficiência da indústria, com dados de plantas industriais
que datam de 1967 e 1979, anos pré e pós a abertura comercial chilena.  Os principais
resultados obtidos foram que não houve evidência de uma melhoria de eficiência do setor
manufatureiro como um todo. Contudo, aquelas indústrias que sofreram maior redução de
tarifas foram as que apresentaram um maior aumento de produtividade.
Com relação aos estudos sobre o caso brasileiro, a maior parte dos trabalhos corrobora
com os apontamentos do mainstream do debate, apresentando evidências de efeitos
positivos da abertura para a produtividade. Hidalgo (2002) examinou a relação existente
entre o aumento da produtividade e o processo de abertura comercial brasileiro iniciado

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em 1988. O autor utiliza como medida de produção o indicador de produção física da PIM-
PF, como medida de trabalho utiliza o nível de emprego na indústria de transformação da
PIM-DG e como medida de capital o consumo industrial de energia elétrica da Eletrobrás,
sendo analisado o período entre 1976 e 1998. O trabalho aponta uma relação positiva entre
a abertura comercial e a produtividade a partir do início dos anos 90, por meio do acesso a
insumos de maior qualidade e implementação de programas de qualidade e produtividade
nas empresas.
Bonelli e Fonseca (1998) estimam a Produtividade Total dos Fatores por meio da
metodologia de contabilidade do crescimento. Um dos resultados aponta para a elevação
da produtividade causada possivelmente por elevação tecnológica e possíveis alterações
nas estruturas das empresas.
Lisboa, Menezes Filho e Schor (2002) investigaram em que medida uma alteração
nos preços relativos causada pela queda de barreiras tarifárias resultou na adoção de novas
tecnologias nas empresas que favoreceram à produtividade. Foi realizado um estudo
utilizando dados de 1700 firmas de diversos setores da economia. Os dados tiveram como
origem a Pesquisa Industrial Anual – PIA – realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), e foram usados dados que representassem estoque de capital, número
de trabalhadores, produção, tarifa sobre produtos e tarifas sobre insumos para o período
entre1988 a 1998. Os resultados sugerem que houve um aumento efetivo da produtividade
na economia como um todo. Além disso, a queda das tarifas dos insumos foi a principal
causa do aumento da produtividade.
Rossi Júnior e Ferreira (1999) mensuram a produtividade do trabalho e a produtividade
total dos fatores e avaliaram os impactos da abertura comercial para o crescimento da
produtividade em 16 setores da economia. O estudo mostra que o desempenho positivo da
produtividade não foi resultado de questões cíclicas e que o impacto da abertura sobre a
produtividade é passado principalmente pela importação de insumos de maior qualidade,
bem como pela maior concorrência nos setores que forçam as empresas se manterem cada
vez mais eficientes em troca da permanência no mercado.
Ferreira e Guillén (2004) também buscaram verificar se o processo de abertura gerou
um aumento da produtividade média da indústria de transformação. Utilizaram dados de
produção, mão de obra e capital de dezesseis setores da indústria de transformação brasileira
correspondente ao período de 1985-1997. Os resultados obtidos indicam a existência de
um significativo aumento na produtividade industrial na maior parte dos setores estudados

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após a abertura comercial. Contudo, não houve evidência estatística de redução de mark-
up, o que leva a supor que o canal para este aumento de produtividade não foi o aumento
da concorrência. Desse modo, o acesso a insumos importados e uso de novas tecnologias
podem ter sido possíveis canais de aumento da produtividade (FERREIRA; GUILLÉN, 2004).

METODOLOGIA

Essa pesquisa possui caráter quantitativo de acordo com sua abordagem e


explicativa de acordo com seus objetivos. A literatura empírica aponta que os efeitos
de uma abertura comercial sobre a produtividade são dispersos ao longo do tempo,
por isso adotamos como método de estimação o modelo de defasagens distribuídas,
mais especificamente o modelo Autorregressivo de Defasagens Distribuídas (ARDL). A
aplicação deste modelo parte da identificação da existência de vetores de longo prazo e,
posteriormente, da estimação de um coeficiente que mede a velocidade que choques de
curto prazo são absorvidos, além da obtenção de coeficientes de curto prazo para cada
variável (PESARAN; SHIN; SMITH (2001).
A escolha desse método em relação a outros de cointegração convencional justifica-
se justamente pelo fato de capturar as relações de longo prazo para pequenas amostras
de dados e de capturar as relações de curto e longo prazo simultaneamente. Ademais,
justifica-se também por: 1) a técnica de cointegração pode ser aplicada para variáveis com
diferentes ordens de integração; 2) o teste de cointegração em modelos ARDL tende a ser
mais eficientes para captar relações de longo prazo, especialmente em amostras pequenas;
3) é possível definir um nível ótimo de defasagens para cada uma das variáveis do modelo,
por meio de um critério de seleção previamente determinado. Enfim, essas características
da metodologia ARDL permitem algumas vantagens em relação a outros métodos como,
por exemplo, os modelos de vetores autorregressivos (VAR). Por fim, não encontramos na
literatura a aplicação deste método, o qual é relativamente novo, para a questão que este
trabalho se propõe a responder.
A análise econométrica das relações de longo prazo foi e continua sendo o foco de
muitas pesquisas empíricas e teóricas em economia. Quando a variável de interesse detinha
uma relação de longo prazo com uma tendência estacionária, a prática geral consistia em
reduzir a tendência e modelar a série resultante como um modelo autorregressivo com
defasagens distribuídas. A estimativa e inferência sobre as propriedades de longo prazo
do modelo eram realizadas usando a teoria normal assintótica padrão. Contudo, a análise

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tornava-se mais complicada quando as variáveis eram estacionárias em primeira diferença,


a literatura de cointegração tinha em sua premissa de que na presença de variáveis
estacionárias em primeira diferença, a abordagem tradicional dos modelos autorregressivos
com defasagens distribuídas não poderia ser mais aplicada (PESARAN; SHIN, 1995).
Pesaran e Shin (1995) examinaram as propriedades assintóticas dos estimadores OLS
num contexto de modelo autorregressivo simples com uma tendência linear determinística
e os k-regressores dimensionais estritamente exógenos I(1). Posteriormente consideraram
um modelo ARDL mais generalista, com uma série residual de correlações e uma possível
endogeneidade e desenvolveram a teoria assintótica resultante. Por fim, compararam
a abordagem baseada no modelo autorregressivo com defasagens distribuídas com a
abordagem baseada na cointegração de Phillips e Hansen (1990, apud Pesaran e Shin, 1995)
e discutindo os resultados obtidos dos experimentos de Monte Carlo, chegaram à conclusão
de que há fortes evidências a favor de uma reabilitação da abordagem ARDL tradicional à
modelagem econométrica de séries temporais.
Para validar as estimativas dos parâmetros do modelo ARDL é necessário realizar
cinco testes de diagnósticos. O primeiro deles, o teste de heterocedasticidade de White,
cuja hipótese nula é a de homoscedasticidade. Por meio de um teste F verifica-se a relação
conjunta das variáveis em relação aos resíduos ao quadrado. A estatística F acima do valor
crítico, dado o tamanho da amostra e o número de parâmetros, indica se pode rejeitar a
hipótese nula, apresentando heterocedasticidade, ou seja, a variância dos erros não é
constante para toda a amostra, o que resulta em perda de eficiência dos parâmetros. A
heterocedasticidade pode ser corrigida a partir do método de correção de White.
O segundo teste a ser realizado é o Bound Test, desenvolvido por Pesaram et al. (2001),
que mostra se as variáveis explicativas em conjunto mantêm relação de longo prazo com a
variável dependente. Também a partir de um teste F, cuja hipótese nula é a não relação de
longo prazo, conclui-se que há relação de longo prazo caso o valor do teste seja maior que
os limites das bandas.
Deve-se ser realizado também os testes de estacionariedade da série, vez que os
modelos ARDL permitem estimar eficientemente apenas os coeficientes de longo prazo de
variáveis integradas de ordem 1 e 0. Por fim, estimam-se os coeficientes de curto e longo
prazo ARDL, por meio de um modelo de correção de erros (Error Corrrection Model – ECM),
que também indica a velocidade com que os choques de curto prazo são absorvidos até a
retomada do equilíbrio.

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Dada a discussão acerca dos modelos de defasagens distribuídas, torna-se


necessário apresentar os critérios para a determinação das defasagens. A escolha do
número de defasagens, num modelo dinâmico, consiste em identificar o menor número
das defasagens nas variáveis explicativas que devem ser incluídas no modelo a fim de que
este explique de maneira adequada a variável dependente (FURLAN, 2010). Sendo assim,
os dois principais critérios de seleção do modelo são o critério de informação de Akaike
(CIA) e o de Schwarz (CIS).
Para fins de testar se a abertura comercial tem efeitos sobre o crescimento da
produtividade da economia brasileira. O modelo funcional a ser testado neste trabalho é:

(1)

Sendo que: PROD1 e PROD2 serão indicadores de produtividade do trabalho por


horas trabalhadas e por pessoal ocupado, respectivamente; COMEX é um indicador do
grau de abertura comercial e FT é um indicador do fator trabalho. A ideia é por meio desses
dois modelos avaliar se as variáveis independentes cointegram com a variável dependente
de forma conjunta e individualmente. Optamos por estimar os mesmos modelos, mas
considerando duas proxies distintas para a produtividade do trabalho, assim como
encontrado na literatura empírica.
O cálculo da produtividade do trabalho compreende a razão entre o valor adicionado
da economia e a quantidade de insumo do fator trabalho, num dado período. Esse pode
ser expresso em termos de horas trabalhadas (PROD1) e de pessoal ocupado (PROD2).
Como nosso objetivo é saber o quanto esta produtividade tem variado como efeito da
abertura comercial, ambas as proxies estão expressas em variação percentual. Estas são
apresentadas a seguir:
(2)

Sendo assim, a produtividade do trabalho por horas trabalhadas é a razão entre


o valor adicionado e a quantidade de horas efetivamente trabalhadas no período t. Já
a produtividade do trabalho por pessoal ocupado é a razão entre o valor adicionado da
economia e a população ocupada no período t.

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(3)
A variável aqui considerada para o indicador do grau de abertura comercial é a soma das
exportações e das importações como percentual do Produto Interno Bruto (PIB) do país no período
t, como segue:
(4)

A soma de exportações e importações como parcela do PIB é a forma mais tradicional


na literatura de se medir o quanto um país está exposto ao comércio internacional.
Quanto ao indicador do fator trabalho, as variáveis consideradas foram horas anuais
trabalhadas e pessoal ocupado. As horas anuais trabalhadas representam uma medida das
horas efetivamente trabalhadas, incluindo horas extras pagas e excluindo horas pagas que
não são trabalhadas por motivo de doença, férias, feriados, dentre outros. Da mesma forma,
a medida de pessoal ocupado engloba todas as pessoas envolvidas em alguma atividade
produtiva contabilizada no sistema de contas nacionais, como empregados, indivíduos da
família não pagos, mas engajados economicamente, aprendizes, dentre outros.
Vale ressaltar que a literatura de produtividade do trabalho no Brasil, em geral,
utiliza a população ocupada como medida deste insumo. Contudo, esta não considera
a tendência observada em diversos países, inclusive no Brasil, de redução da jornada de
trabalho. Devido a isso, o crescimento do fator trabalho pode estar sendo superestimado ao
utilizar a quantidade de pessoas empregadas, resultando assim num cálculo subestimado
do aumento de produtividade. Por isso, optou-se por usar tanto a quantidade de população
ocupada, como também a de horas efetivamente trabalhadas com o intuito de fazer
inferências estatísticas mais condizentes com a realidade (Veloso, Matos e Peruchetti, 2019).
Segue o Quadro 1 que resume as variáveis descritas e suas fontes:

Quadro 1 - Resumo das variáveis

Fonte: Elaboração própria.

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Por fim, os dados possuem frequência anual e são referentes tanto à produtividade
do trabalho por horas trabalhadas quanto por pessoal ocupado, os quais foram obtidos
a partir da base de dados do observatório de produtividade da Faculdade Getúlio Vargas
(FGV). Já os dados referentes à participação da balança comercial no PIB brasileiro foram
obtidos na base World Development Indicators do Banco Mundial. O período analisado nesta
pesquisa compreende 1982-2019, que corresponde a todo o período disponível na base de
dados da FGV.

RESULTADOS

RESULTADOS DESCRITIVOS

Conforme o Gráfico 1, a produtividade por horas trabalhadas, medida em termos de


variação percentual, apresenta uma leve tendência de crescimento, com uma média de 1%
ao longo do período de 1982-2019. A menor taxa de variação corresponde a -5% no ano
de 1983, enquanto que seu maior valor foi no ano de 2010 com uma taxa de variação de
6%. A produtividade por pessoal ocupado (Gráfico 2) também exibe uma leve tendência de
crescimento ao longo de 1982 a 2019 e movimentos similares ao apresentado em termos
de horas trabalhadas. A média de crescimento para este período é nula, tendo o seu menor
valor de -0,06 em 1983 e o seu maior de 0,06 em 2010.

Gráfico 1- Produtividade por horas trabalhadas (variação percentual %)

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da FGV (2020).

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Gráfico 2 - Produtividade por pessoal ocupado (variação percentual %)

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da FGV (2020).

Até o início dos anos 2000, o Brasil apresentou mudanças na composição setorial
de sua mão de obra, reduzindo a participação nas atividades agrícolas tradicionais e
registrando aumento nos setores de serviços urbanos e indústria. A redução contínua da
produtividade a partir de 1980 nos serviços levou a efeitos negativos na produtividade da
economia, compensada parcialmente pelos ganhos de produtividade da indústria a partir
dos anos de 1990 (FILHO; CAMPOS; KOMATSU, 2014). Expansão do crédito, programas de
transferência de renda e aumentos no valor real do salário mínimo, nos anos 2000, teriam
impulsionado a demanda por produtos do setor de serviços mais que proporcionalmente
na economia, ampliando sua participação no consumo. Dessa forma, a partir da década de
2000, o Brasil apresentou uma reversão importante da tendência decrescente dos serviços,
levando o setor a ter uma importância fundamental para o crescimento da produtividade do
trabalho, com absorção de mão de obra (FILHO; CAMPOS; KOMATSU, 2014).
A abertura comercial brasileira iniciada em 1988, gradualmente, reduziu tanto
barreiras tarifárias como não tarifárias. A título de exemplo, a tarifa média de 130% vigente
em 1987 foi para menos de 15% em 1994. Também a partir da década de 1990, o Brasil
eliminou uma série de barreiras quantitativas e regimes especiais de importação que tornava
a proteção comercial praticada pelo país pouco transparente (SCHMIDT, 2008). Desse modo,
o processo de desenvolvimento do país passou a depender de sua capacidade de competir

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interna e externamente com os bens produzidos nas demais economias presentes no


comércio internacional.
O Gráfico 3 revela uma tendência de crescimento do grau de abertura comercial
brasileiro para os anos de 1982 a 2019.

Gráfico 3 - Grau de abertura comercial (% do PIB)

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados do WDI (2020).

A média do grau de abertura comercial para este período foi de 21% do PIB.
Apresentou seu menor valor, de 14%, no ano de 1989 e seu valor máximo de 29% no ano
de 2004. O período de maior abertura comercial brasileira ocorreu entre os anos de 1999
até 2008, quando houve queda do comércio internacional devido à crise mundial iniciada
naquele ano. Desde então, tal abertura permanece em patamares mais baixos.
Por fim, a Tabela 1 sumariza as principais estatísticas das variáveis utilizadas nos
modelos econométricos, conforme descrito na metodologia: Produtividade por horas
trabalhadas (prod1) e Produtividade por pessoal ocupado (prod2), ambos medidos em
termos de variação percentual; Grau de abertura comercial (comex); Horas trabalhadas em
termos percentuais (ht) e Pessoal ocupado em termos percentuais (po). Considerando um
total de 38 observações que correspondem a dados anuais para o período de 1982 a 2019.

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Tabela 1 - Estatísticas descritivas


Desvio
Variável Obs Média Mínimo Máximo
Padrão
prod1 38 0,006 0,235 -0,0505 0,058
prod2 38 0,002 0,229 -0,0577 0,566
comex 38 21.967 4.804 14.390 29.678
ht 38 17.115 1.702 -2.291 6.607
po 38 2.100 1.635 -1.865 6.715
Fonte: Elaboração própria.

RESULTADOS ECONOMÉTRICOS

TESTES DE ESTACIONARIEDADE, CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DE DEFASAGEM E TESTES DE


DIAGNÓSTICO

Dada a importância da estacionariedade da série para realizar projeções e inferências


sobre os parâmetros, a Tabela 2 apresenta os resultados obtidos do teste Dickey-Fuller para
cada variável do modelo, assim como dos testes Dickey-Fuller aumentado (ADF), Phillips-
Perron (PP) e o Kwiatkowski–Phillips–Schmidt–Shin (KPSS). O resultado obtido pelo teste
Dickey-Fuller revela, assim como pelos demais testes citados, que a variável produtividade
por hora trabalhada (prod1) é estacionária a um nível de significância de 1%, dado que
a estatística Z(t) foi de 0,0002, não sendo necessário fazer a primeira diferença. O teste
também indica que a produtividade por pessoal ocupado (prod2) é estacionária a um nível
de significância de 1% e a variável horas trabalhadas (ht) mostrou-se estacionária a um nível
de 10%. Já o grau de abertura comercial (comex) e a variável pessoal ocupado (po) não são
estacionários nem mesmo a um nível de significância de 10%.

Tabela 2 - Testes de Estacionariedade


Teste Dickey-Fuller ADF PP KPS
Variáveis
Stat. P-value Stat. P-value Stat. P-value Stat.
Prod1 -4.475 0,0002 -4.211 0,0774 -4.775 0,0005 0,101
Prod2 -4,4 0,0003 -4.188 0,0047 -4.387 0,0023 0,101
Comex -1.105 0,7132 -2.678 0,2454 -2.482 0,337 0,129
Ht -2.709 0,0725 -3.264 0,0724 -3.433 0,0471 0,924
Po -2,46 0,1255 -2.874 0,171 -3.732 0,0203 0,105
Comex (primeira diferença) -4.249 0,0005 -4.253 0,0037 -2.482 0,337 0,496
Ht (primeira diferença) -5.924 0,0000 -5.959 0,0000 -3.433 0,0000 0,374
Po (primeira diferença) -4.978 0,0000 -4.946 0,0003 -3.732 0,0003 0,0381
Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.

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Sendo assim, nota-se a necessidade de realizar a primeira diferença das variáveis


do grau de abertura comercial e pessoal ocupado, visto que estas foram não estacionárias.
Optou-se também por fazer a primeira diferença da variável horas trabalhadas, pois ela
foi estacionária a um nível de significância de 10%. O objetivo é tornar todas as variáveis
estacionárias a um nível de 1%. Feita a primeira diferença das variáveis acima citadas, estas
foram novamente submetidas ao teste Dickey-Fuller e demais testes a fim de verificar a sua
estacionariedade. Os resultados obtidos indicam que todas as variáveis dos modelos são
estacionárias a um nível de 1%. Com isso, têm-se os requisitos necessários para a estimação
dos parâmetros dos modelos autorregressivos com defasagens distribuídas.
O modelo ARDL mescla diferentes defasagens de todas as variáveis (dependentes e
explicativas) em busca de um modelo mais ajustado seguindo um critério de informação.
A Tabela 3 apresenta a escolha das defasagens ótimas seguindo o critério Akaike e outros
critérios de seleção descritos na metodologia. Para a produtividade por horas trabalhadas
(prod1), os critérios de seleção FPE, AIC, HQIC e SBIC recomendam 0 defasagem como o
ideal. Com relação à produtividade por pessoal ocupado (prod2), os critérios de seleção FPE
e AIC recomendam uma defasagem como a ideal. Já os critérios HQIC e SBIC recomendam
zero como o ideal para a defasagem. Dessa forma, os critérios de seleção sugerem o uso de
zero ou um como o número ideal de defasagem para a produtividade por pessoal ocupado.
Quanto ao grau de abertura comercial (comex), os critérios de seleção, LR, FPE, AIC, HQIC
e SBIC, orientam uma defasagem como o ideal. Para as variáveis horas trabalhadas (ht) e
pessoal ocupado, os critérios de seleção LR, FPE, AIC, HQIC e SBIC indicam uma defasagem
como o ideal.

Tabela 3 - Critérios de seleção das defasagens das variáveis


Critério de seleção das defasagens
Variaveis Número ideal de defasagens
Prod1 0
Prod2 (0,1)
Comex -1
Ht -1
Po -1

Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.

Além desses testes foram realizados testes diagnósticos para os modelos ARDL tais
como os testes de autocorrelação, de heterocedasticidade, normalidade e estabilidade do

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modelo. Os testes de autocorrelação Durbin-Watson e Breusch-Godfrey indicam não haver


uma correlação serial entre os resíduos tanto do modelo prod1 quanto do prod2. Além
disso, com base nos resultados dos testes White e Cameron & Trivedi’s não podemos rejeitar
a hipótese nula de homocestacidade, ou seja, de que a variância é constante ao longo do
tempo, nem do modelo prod1 nem do prod2. Realizamos ainda o teste de normalidade
Jarque-Bera, por meio do qual se rejeita a hipótese nula de normalidade a um nível de 5%
de significância para o modelo prod1. Para o modelo prod2 o resultado foi de 0,0294, sendo
inferior a 0,05, também se rejeitando a hipótese nula de normalidade.
Por fim, os gráficos seguintes apresentam os testes de estabilidade Square Cusum
das nossas duas estimações via ARDL.

Gráfico 4 - Teste Cusum Square do modelo ARDL prod1 e do modelo ARDL prod2

Fonte: Elaboração própria.

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Gráfico 5 - Teste Cusum Square do modelo ARDL prod1 e do modelo ARDL prod2

Fonte: Elaboração própria.

O teste de Cusum Square verifica a estabilidade dos parâmetros do modelo a um nível


de significância de 5% e representa a soma acumulada dos resíduos recursivos ao quadrado,
sendo que há instabilidade no modelo quando as somas ultrapassam a área formada pelas
duas retas críticas dos testes.

Estimação dos modelos autorregressivos com defasagens distribuídas

Na Tabela 4 são apresentados inicialmente os resultados dos modelos ARDL de curto


prazo em que foi definido o número máximo de defasagens em um período, tal como
apontado pelos critérios de seleção de defasagem na Tabela 3. Notamos que, para o modelo
prod1, cuja variável dependente é a produtividade por horas trabalhadas (prod1) e as
independentes são o grau de abertura comercial (comex), horas trabalhadas (ht) e pessoal
ocupado (po), os únicos coeficientes que não foram estatisticamente significantes foram o
da produtividade com um período de defasagem e o das horas trabalhadas. Os coeficientes
do grau de abertura comercial e pessoal ocupado foram estatisticamente significantes a um
nível de 5%. O aumento de 1% no pessoal ocupado ocasionaria o crescimento de 0,012%
na produtividade no curto prazo, enquanto com um período de defasagem para aquela
variável, levaria a uma redução de 0,005% na variável dependente.

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Tabela 4 - Resultados das estimações ARDL de curto prazo para os modelos prod1 e prod2
  Prod1 Prod2
Prod1 (t-1) 0,284 .294***
Comex -.0038** -.003**
Comex (t-1) .0041** .0036**
Ht -0,006 0,004
Po .0126** -.0054***
Po (t-1) -.0052** 0,003
Constante -0,005 -0,006

Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.


Notas: *significância a 10%, ** a 5% e a 1%.

Já com relação à variável de interesse, notamos que um aumento percentual do


coeficiente do grau de abertura comercial leva a uma redução de 0,003% da produtividade,
por horas trabalhadas, no curto prazo. Contudo, uma mudança em termos percentuais
na primeira defasagem do grau de abertura comercial levou a um aumento de 0,004% na
produtividade, com 5% de significância. Portanto, parece que o resultado imediato de um
aumento do grau de abertura da economia brasileira é negativo e significativo, mas em
termos defasados passa a ter benefícios.
Os resultados do modelo ARDL prod2, os coeficientes de horas trabalhadas e pessoal
ocupado não foram estatisticamente significantes, não podendo fazer qualquer inferência
estatística sobre eles. Já com relação aos coeficientes da produtividade por pessoal ocupado
e o grau de abertura comercial, estes foram estatisticamente significativos a um nível de
10% e 5%, respectivamente. O aumento de 1% na produtividade no passado levaria a um
aumento de 0,29% no período atual. O coeficiente das horas trabalhadas com um período
de defasagem foi estatisticamente significante a um nível de 10%, e o aumento de 1% nas
horas trabalhadas no passado leva a uma redução de 0,005% na produtividade no período
atual. Já o aumento do grau de abertura comercial ocasionaria uma redução de 0,003% na
produtividade no curto prazo, ao passo que o mesmo aumento no grau de abertura comercial,
com um período de defasagem, acarretaria num aumento de 0,003% na produtividade por
pessoal ocupado.
A Tabela 5 apresenta as matrizes de defasagens de cada variável para os modelos
prod1 e prod2 que demonstraram significância estatística para explicar o comportamento
das variáveis dependentes e que serão utilizadas para estimar os modelos de correção de
erros (ECM) para o longo prazo. A variável produtividade por horas trabalhadas, considerada
apenas no modelo prod1, assim como o grau de abertura comercial, nos dois modelos,

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foram significantes quando defasadas em um período. Já a variável horas trabalhadas não


terá defasagem no modelo prod1, ao passo que no modelo prod2 terá; e a variável pessoal
ocupado terá uma defasagem no primeiro modelo e não terá no segundo.

Tabela 5 - Matriz das defasagens significativas dos modelos prod1 e prod2


  Prod1 Prod2
  Defasagens Defasagens
Prod1 1 1
Comex 1 1
Ht 0 1
Po 1 0

Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.


Notas: Significância a 5%.

A Tabela 6 apresenta os resultados do teste de cointegração (teste Bound), em que a


estatística F acima de F-crítico indica cointegração. Os resultados, tanto para o modelo prod1
quanto para o modelo prod2, indicam que há cointegração de longo prazo entre as variáveis
explicativas e a variável dependente, pois os valores dos testes F foram superiores a todos
as bandas inferiores I(0) e superiores I(1) com um nível de significância de 10%, 5%, 2,5% e
1%. Portanto, essas variáveis foram relevantes para explicar a dinâmica de longo prazo da
produtividade da economia brasileira no período analisado.

Tabela 6 - Teste de Cointegração

Valores Críticos
Estatística Cointegração
Modelo
F I0 I1 I0 I1 I0 I1 I0 I1 de longo prazo
L1 L1 L05 L05 L025 L025 L01 L01
Prod1 6,889 2,72 3,77 3,23 4,35 3,69 4,89 4,29 5,61 Não
Prod2 9,397 2,72 3,77 3,23 4,35 3,69 4,89 4,29 5,61 Não
Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.
Notas: L1: significância a 10%; L05: a 5%; L025 a 2,5%; e, L01 a 1%.

Baseado no resultado das matrizes de defasagens apresentadas acima e no teste de


cointegração estimaram-se os coeficientes de curto e longo prazos por meio do modelo de
correção de erros (Error Corrrection Model – ECM). Na Tabela 7, apresentam-se os resultados
de curto prazo estimados pelos modelos ECM - ARDL. Os coeficientes, para o modelo prod1,
do grau de abertura comercial e do pessoal ocupado foram significantes a 5%, e seus valores

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indicam que uma variação percentual, tanto em uma como em outra variável, levariam a
uma redução de 0,004% e aumento de 0,005% na produtividade, respectivamente. Já para
o modelo prod2, os coeficientes do grau de abertura comercial e horas trabalhadas foram
estatisticamente significativos a um nível de 5% e 10%, respectivamente. O aumento de 1%
no grau de abertura comercial levaria a uma redução de 0,003% na produtividade, assim
como o aumento de 1% nas horas trabalhadas ocasionaria um aumento de 0,005% na
produtividade por pessoal ocupado no curto prazo.
Além disso, o coeficiente do ajustamento (ECM-1) de ambos os modelos foram
significantes, a um nível de 1%, e com sinais negativos, indicando convergência das variáveis
no longo prazo e que choques anteriores serão corrigidos no período atual. A velocidade do
ajustamento para o primeiro modelo foi de 71%, enquanto para o segundo foi de 70%.

Tabela 7 - Coeficientes de curto prazo dos modelos ECM -ARDL


Variáveis Prod1 Prod2
Comex (t-1) (0,0041**) -
Po 0,0553** -
Prod1 (t-1) (0,7159*) -
Comex (t-1) - (0,0040**)
Ht (t-1) - 0,0054***
Prod2 (t-1) - (0,7056*)
Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.

Notas: L1: significância a 10%; L05: a 5%; L025 a 2,5%; e, L01 a 1%.

Por fim, a Tabela 8 apresenta os coeficientes de longo prazo das variáveis explicativas
de cada modelo. A nossa variável de interesse apresentou sinal positivo como esperado,
mas nenhum coeficiente foi estatisticamente significativo tanto para o modelo prod1 como
para o prod2, não podendo fazer qualquer inferência estatística dos coeficientes de ambos
os modelos. Sendo assim, o teste de cointegração (Bound test) indicou que deveria se
especificar um vetor de correção de erros no modelo, mas no longo prazo as variáveis não
se apresentaram significativas para determinar a produtividade da economia brasileira.

Tabela 8 - Coeficientes de longo prazo dos modelos ECM – ARDL


Variáveis Prod1 Prod2
Comex 0,0047 0,0004
Ht (0,083) (0,0026)
Po 0,0098 0,0046

Fonte: Elaboração própria a partir de estimação no STATA 13.


Notas: *significância a 10%, ** a 5% e a 1%.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve por objetivo analisar, à luz da teoria econômica, o processo
de abertura comercial do Brasil e seus reflexos em eventuais ganhos de produtividade para
a economia brasileira. Foi realizada uma revisão de literatura empírica sobre os efeitos da
abertura comercial para a produtividade da economia brasileira até o final da década de 90
e confirma os apontamentos teóricos do mainstream do debate, os quais sugerem efeitos
positivos diretos e indiretos (HIDALGO, 2002; LISBOA; MENEZES FILHO; SCHOR, 2002; ROSSI
JÚNIOR; FERREIRA, 1999; FERREIRA; GUILLÉN, 2004; HIDALGO; MATA, 2009). No entanto,
os resultados encontrados no presente trabalho, utilizando-se modelos ARDL para dados
agregados, não corroboram com aqueles encontrados por tais autores de que maior abertura
comercial impacta positivamente a produtividade.
Primeiramente, os resultados do modelo ARDL de curto prazo demonstraram que
elevações do grau de abertura comercial da economia brasileira levaram a uma redução
imediata da produtividade, medida tanto por horas trabalhadas quanto por pessoal ocupado.
Quando considerada a defasagem de um ano desta variável o efeito também foi significativo,
porém positivo, ou seja, os benefícios da abertura apareceram somente em termos defasados.
Já os resultados de curto prazo dos modelos com correção de erros (ECM) demonstraram
um efeito negativo da abertura comercial para os ganhos de produtividade mesmo para
a defasagem ótima de um período. Considerando que o teste Bound demonstrou haver
cointegração entre as variáveis no longo prazo, tomamos como preferíveis os resultados do
modelo ECM que captura tal relação entre as variáveis. Portanto, os efeitos de curto prazo
da abertura comercial para a variação da produtividade do trabalho da economia brasileira
foram significativos e negativos.
Quanto aos resultados das estimações para o longo prazo, a abertura comercial
apresentou sinal positivo, mas que não foi capaz de garantir ganhos significativos de
produtividade, vez que seu coeficiente não apresentou significância estatística.
A principal contribuição desta pesquisa foi a utilização do método ARDL que é
relativamente novo e permite analisar as relações de curto e de longo prazo entre o grau
de abertura comercial e a produtividade para a economia brasileira. Embora esse tenha
sido um exercício válido de verificação da pergunta norteadora, é importante que outras
estimações sejam realizadas com o sentido de verificar a robustez da nossa análise. Vale
destacar ainda que as proxies utilizadas aqui refletem apenas a produtividade do trabalho,
sendo importante estender a análise para os impactos sobre a produtividade total dos

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fatores (PTF). Além disso, a fim de obter um maior diálogo com a literatura é importante,
em trabalhos futuros, utilizar outras variáveis explicativas que refletem a abertura comercial
como tarifas sobre importação de produtos finais e de insumos intermediários, tal como em
Rossi Júnior e Ferreira (1999) e Hidalgo (2002). Essa variável pode refletir de maneira mais
próxima os efeitos positivos apontados pela literatura já que, como indicado, a produtividade
aumentaria por meio da importação de insumos de melhor qualidade e pela implementação
de programas de qualidade nas empresas devido à maior concorrência. Por fim, ressalta-
se, para trabalhos futuros, avaliar os efeitos desagregados da abertura comercial sobre os
distintos setores da economia brasileira, na medida em que eles foram afetados de maneira
diferente, tal como aponta Ferreira e Guillén (2004).

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64
4

Composição dos gastos públicos estaduais e


crescimento econômico no período de 2000 a 2019:
evidências a partir de dados em painel10
Nathália Lavínia Farias de Araújo (1)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6481-6066. Universidade Federal de Alagoas/ Mestranda do programa de
pós-graduação em Economia Aplicada da Faculdade de Economia/ BRAZIL, E-mail: nathalia.araujo@feac.ufal.br

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade de seus autores.

INTRODUÇÃO

Entre os diversos estudos que relacionam a política fiscal e o crescimento econômico,


o foco destas análises se concentrou ou no impacto dos gastos de maneira agregada ou no
impacto somente dos investimentos em infraestrutura econômica, sem evidenciar os efeitos
diferenciados da composição das despesas sobre o crescimento.
A oferta de bens públicos colocados na sociedade considera a composição das
despesas e gera externalidades no tocante ao desenvolvimento das regiões e na distribuição
espacial dos agentes econômicos, evidenciando as inter-relações entre as mesmas, em que,
nesse sentido, surgem as políticas públicas como uma tentativa do setor público de corrigir
os desequilíbrios que podem surgir devido à concentração de fatores em determinadas
regiões (TEIXEIRA et al., 2016).
O papel do Estado na economia, tanto nos países desenvolvidos quanto nos
países em desenvolvimento, é um dos assuntos que mais provoca divergências entre os
economistas. A política fiscal e seus componentes (tributação, gasto, orçamento, dívida
pública, entre outros) têm sido tema recorrente, evidenciando a preocupação com
os efeitos dos gastos públicos na economia e o impacto que os mesmos provocam no
crescimento econômico (DE OLIVEIRA, HASEGAWA E TOMAZ, 2018).

10 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap4
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A investigação acerca da trajetória das transferências governamentais e mudanças


quanto à evolução e disposição dos serviços para a sociedade, além do fato de o período
ser marcado por fortes ciclos políticos e econômicos atrelados a sucessivos ajustes fiscais,
respaldam a análise desses resultados quanto à contribuição de seus componentes, assim
como o impacto dessas variáveis para o crescimento dos estados brasileiros. Conhecer essas
variáveis pode contribuir significativamente para a gestão e alocação eficiente dos recursos
públicos, sendo sempre um diferencial compreender quais gastos geram retornos positivos.
Nesse contexto, o objetivo deste artigo é avaliar empiricamente como a composição
dos gastos públicos e das transferências de renda federais, entre o período de 2000-2019,
estão relacionados ao crescimento econômico dos estados, explorando a trajetória dos
gastos em setores fundamentais ao desenvolvimento como educação e cultura, saúde e
saneamento, aplicando-se a metodologia de dados em painel, composto pelos estados
brasileiros, onde os gastos são inicialmente decompostos de acordo com suas características
econômicas (corrente e de capital), e em seguida de acordo com a sua classificação funcional,
extraídos a partir de bases oficiais de acesso público, da Secretaria do Tesouro Nacional –
STN, Ipeadata e IBGE.
O artigo está organizado da seguinte maneira: após esta Introdução, segue-se a
segunda seção, a qual traz uma discussão de literatura, onde são abordados os principais
trabalhos que buscam avaliar os efeitos da composição do gasto público na economia,
seguido da literatura internacional e nacional que aponta a relação entre o gasto e o
crescimento econômico. A terceira seção apresenta o modelo teórico e a quarta seção traz os
resultados encontrados, levantando uma discussão sobre a contribuição para o crescimento
dos estados a partir da trajetória dos dados. Por fim, a quinta seção apresenta a conclusão
deste trabalho.

REVISÃO DE LITERATURA

Mazoni (2005) aponta como marco da discussão sobre os impactos do papel do Estado
na economia a década de 1990, quando a mudança de um Estado predominantemente
regulador em detrimento de um Estado produtor acarreta modificações para a economia que
resultam em redução dos investimentos públicos.
A situação do Brasil impôs severas dificuldades às políticas de estabilização
implementadas na década de 1990, em que os esforços em busca de austeridade fiscal
do governo central e adequação às medidas adotadas, eram parcialmente cancelados
pelos gastos excessivos dos governos. O controle da inflação, ligado ao Plano Real, teve

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como consequência um agravamento dos desequilíbrios fiscais, aumento das despesas e


endividamento interno.
A qualidade do gasto público passou a ser um tema cada vez mais debatido, levantando
a necessidade de análise de sua composição e relação com o crescimento econômico dos
estados. Para Araújo, Monteiro e Cavalcanti (2010) vários são os fatores que afetam o nível dos
gastos e suas oscilações, dentre eles estão a renda nacional, a capacidade do governo de obter
receitas, problemas sociais, mudanças políticas, entre outros. Sendo os gastos públicos um
dos principais meios de atuação do governo, pois através deles manifesta as suas prioridades
mediante a prestação de serviços públicos básicos.
O debate perpassa questões ligadas ao federalismo brasileiro, que se caracteriza pela
separação entre os poderes políticos e econômicos, alvo de grandes transformações ao
longo dos anos, assumidas com a descentralização fiscal, presente no Art.18 da Constituição
Federal de 1988, que discorre sobre a organização político-administrativa, compreendendo
autonomia à União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
A nova Constituição concedeu aos governos subnacionais competências tributárias
exclusivas, autonomia para legislar, coletar, controlar e gastar os recursos, podendo até
mesmo fixar as alíquotas dos impostos, possuindo como principal aspecto do processo
o aumento da participação dos estados e municípios na arrecadação do governo federal,
através do aumento das alíquotas de transferências dos fundos de participação (GIAMBIAGI;
ALÉM, 2016).

RELAÇÃO ENTRE OS GASTOS PÚBLICOS E O CRESCIMENTO ECONÔMICO

No tocante à literatura internacional, Aschauer (1989), como um dos pioneiros a


propor a associação dos gastos públicos e crescimento econômico, destaca que os mesmos
podem vir a acelerar o crescimento, utilizando dados da economia dos Estados Unidos
através da estimação por mínimos quadrados ordinários (MQO), discute o efeito do gasto
sobre o Produto Interno Bruto (PIB) da economia, destacando particularmente a importância
dos serviços em infraestrutura do governo.
Observando a ligação entre o nível de gasto e o crescimento, Devarajan, Swaroop e
Zou (1996), derivam as condições sob as quais uma mudança na composição das despesas
conduzem a uma taxa de crescimento estável da economia, utilizando dados de 43 países
em desenvolvimento ao longo de 20 anos onde demonstra que um aumento na participação
das despesas correntes tem resultado positivo e efeitos de crescimento estatisticamente

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significativos, diferentemente das despesas de capital em que o crescimento per capita


é negativo. Concluindo que os gastos produtivos, quando usados em excesso, podem se
tornar improdutivos, implicando que os governos dos países em desenvolvimento têm
distribuído incorretamente os gastos públicos.
Easterly e Rebelo (1993), buscaram analisar como a composição do gasto público afeta
o crescimento de países, concluindo haver uma forte associação entre o desenvolvimento,
nível de crescimento e estrutura fiscal, em que o investimento em transporte e comunicação
é consistentemente correlacionado com o crescimento.
Diversos são os autores que investigaram e concluíram que as despesas públicas têm
por consequência elevar o crescimento econômico, entre eles Ram (1986), Cashin (1995) e
Summers e Heston (1988). Ram (1986) destaca a importância do estudo sobre o impacto
do tamanho do governo no desempenho econômico e crescimento, identificando o papel
do governo no tocante ao desenvolvimento econômico em que se poderia argumentar
que um governo maior e mais interventor provavelmente será um motor mais poderoso
no desenvolvimento econômico. Os resultados gerais de suas análises identificam que o
impacto geral do tamanho do governo é geralmente positivo.
Em conseguinte, estudos na literatura empírica brasileira relacionam a política fiscal
e o crescimento econômico a partir da análise de dados que discorrem sobre a eficiência e
composição dos gastos e o crescimento econômico. Falar sobre gastos é discorrer sobre o
orçamento, sendo este o principal instrumento de planejamento e intervenção econômica
através de repasses intergovernamentais e políticas públicas.
A partir disso, Oliveira (1999) analisa o gasto público no período de 1980/1996 com
o objetivo de identificar as forças que influenciam o seu comportamento e sua dinâmica
e observa que na década de 80, dada a conjuntura política e econômica, em busca pela
estabilização atrelada a uma profunda crise fiscal, o gasto social sofre efeitos nocivos
provocados pela contração da atividade econômica, queda da arrecadação e objetivos de
reestruturação das contas públicas.
De Castro e Afonso (2009) se concentram na descentralização dos gastos públicos
sociais no Brasil a partir da constituição de 1988, em que passam a ter destaque os governos
subnacionais, concluindo que ainda que o objetivo inicial da constituição de 88 esteja
relacionado com a descentralização, os gastos públicos sociais, conhecidos por elevar o
bem-estar social dos indivíduos, permanecem centralizados, enquanto os gastos sociais
universais passam a ser descentralizados proporcionando melhorias na capacidade de

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sustentação financeira dos governos estaduais e municipais, ressaltando a importância do


federalismo brasileiro.
No entanto, a teoria desenvolve uma racionalidade para a provisão pelo governo
de bens e serviços públicos ofertados pelo setor público quando os mercados privados
falham em fornecer esses bens, sendo necessário a presença do governo para internalizar
externalidades negativas (ROCHA; GIUBERTI, 2007).
Seguindo esse contexto, Rocha e Giuberti (2007) avaliam o impacto do gasto
público sobre o crescimento econômico sustentado, usando uma abordagem estatística/
econométrica de métodos de efeitos fixos em um painel composto pelos estados brasileiros
no período de 1986 - 2003, considerando características específicas dos estados, em que inclui
variáveis dummies de ano para controlar fatores comuns afetando a taxa de crescimento dos
diferentes estados, posteriormente classificando os gastos em “produtivos” e “improdutivos”
de acordo com o seu efeito sobre o nível de atividade, preocupando-se com os efeitos da
composição do gasto público sobre o crescimento. Os resultados de seus estudos apontam
uma relação positiva e estatisticamente significante sobre o crescimento, com exceções, as
despesas com saúde apresentam uma relação negativa com o crescimento de longo prazo.
Teixeira et al., (2016), em sua análise sobre os gastos públicos estaduais, transferências
de renda e desequilíbrios regionais, evidenciam o forte papel do federalismo em seu amplo
sistema de transferências intergovernamentais e em como esses recursos são distribuídos,
exemplificando os resultados obtidos em que a categoria de gastos sociais abrange a maior
parcela do total de gastos governamentais durante o período de 2000-2010, em detrimento
dos gastos em infraestrutura econômica.
Em vista disso, Araújo, Monteiro e Cavalcanti (2010), dialogam sobre a influência dos
gastos públicos e crescimento econômico de 73 municípios do Ceará, na tomada de decisões
relevantes para a implementação de políticas públicas, a partir de uma boa análise de variáveis
que podem contribuir para a alocação eficiente de recursos públicos, destacando que os gastos
públicos podem ser considerados como um dos principais meios de atuação do governo.
De Oliveira, Hasegawa e Tomaz (2018) buscam determinar como o gasto público e
seus componentes influenciaram o crescimento econômico dos municípios paranaenses
no período de 1999 – 2011, estimando regressões lineares e quadráticas para verificar as
relações entre os componentes do gasto público municipal e o seu crescimento econômico,
por meio dos componentes econômicos do gasto corrente e de capital, bem como por
categoria do gasto funcional, considerando também variáveis de renda.

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Suas principais conclusões destacam que a relação entre os gastos em saúde,


educação, transporte e comunicação com o crescimento econômico é positiva, enquanto a
relação entre os gastos correntes e o crescimento econômico é positiva e não linear e entre os
gastos de capital e taxa de crescimento é negativa e não linear. Para essa análise foi aplicado
o método de efeitos fixos, que considera características específicas dos municípios, incluindo
variáveis dummies de ano para captar fatores comuns, afetando a taxa de crescimento dos
diferentes Municípios e captando o efeito específico de tempo.
O comportamento dos gastos dos governos públicos passa a ser, então, não
apenas uma variável de análise quanto à composição e qualidade do gasto, mas um
objeto de identificação quanto ao impacto no crescimento econômico dada às políticas
fiscais implementadas, ademais as obrigações orçamentárias e mensuração quanto às
desigualdades inter-regionais no que se refere à composição do mesmo.
Sendo assim, a composição dos gastos com despesas públicas, partindo da
desagregação dos dados, permite a avaliação das desigualdades inter-regionais provenientes
da repartição desses recursos que posteriormente se traduzem na necessidade de criação e
manutenção de políticas públicas que considerem diferentes características socioeconômicas
locais e específicas, refletindo no crescimento econômico dos estados.

METODOLOGIA E DADOS

Para alcançar os objetivos gerais e específicos desta pesquisa, utilizamos um painel


composto pelos Estados brasileiros durante o período de 2000 – 2019, recorrendo a dados
disponibilizados pelo IBGE, Ipeadata e Finbra. O modelo econométrico empregado forneceu
informações de quais fatores estão associados ao crescimento dos estados brasileiros.

MODELO ECONOMÉTRICO

O modelo aqui estimado segue o modelo teórico desenvolvido por Devajaran (1996),
aplicado por Rocha e Giubert (2007) e Teixeira (2010), para os estados brasileiros, e por
Sant’anna (2018) para os municípios Paranaenses sendo adotado como metodologia, vez que
o objetivo principal desta análise é compreender como a composição dos gastos públicos e
das transferências de renda federais, entre o período de 2000 - 2019, estão relacionados com
o crescimento econômico dos estados brasileiros.
Para alcançar os objetivos gerais e específicos desta pesquisa, pretende-se utilizar
os dados do banco de informações da Secretaria de Tesouro Nacional – STN -; esses dados

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fazem parte do conjunto de informações que compreendem a execução orçamentária dos


estados e municípios.
Em paralelo, serão coletados dados oficiais referentes a um conjunto de variáveis
socioeconômicas que servirão como vetor de controle para o modelo proposto,
levantamentos realizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que se
referem ao total populacional, seus recortes territoriais e a densidade demográfica, além de
dados sobre o Produto Interno Bruto (PIB) e PIB per capita dos estados brasileiros divulgados
pelo Ipeadata, deflacionados pelo Índice Geral de Preços do Mercado (IGPM) para valores-
base de 2018, o ano escolhido leva em consideração a divulgação de dados oficiais do PIB
2018, duplicando os resultados para 2019, em que não há divulgação veiculada oficialmente.
A partir disto, utiliza-se um painel composto pelos estados brasileiros durante o
período de 2000 – 2019. Nonnenberg e Mendonça (2005) discorrem sobre a vantagem do
emprego de modelos econométricos na estrutura de dados em painel, afirmando que esse
método permite levar em consideração as características idiossincráticas (heterogeneidade)
existentes entre as unidades estudadas.
A justificativa para o controle da heterogeneidade não observável das unidades
federativas brasileiras pode ser atribuída a diversos fatores, considerando que ao longo do
território nacional os estados brasileiros apresentam características diferenciadas.
Com o objetivo de avaliar como os componentes do gasto, classificados em
infraestrutura social e econômica (Teixeira, 2010) estão associados a um maior crescimento
dos estados, as parcelas de cada um dos componentes do gasto no total do gasto do governo
aparecem como as varáveis explicativas, incluindo-se a parcela do gasto do governo no PIB
para controlar os efeitos de nível, permitindo que seja controlado o efeito do financiamento
dos gastos sobre o crescimento, que é uma função do nível do gasto.
A equação estimada tem a seguinte forma:

Yit = α i + γ t + β ′ X it + ε it
(1)

onde: Yit é a taxa média de crescimento per capita anual para o período estudado,
αi
calculada pela diferença de logaritmos; corresponde aos efeitos específicos de cada
γt
estado, representa as variáveis constantes entre os estados e Xit consiste de todas as
variáveis independentes:

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1) (GT/PIB)it = parcela do gasto total do governo no PIB referente ao estado i para o


período t.
2) (G/GT)it = vetor de razões do gasto público para o estado i no período t, ou seja,
a participação de cada tipo de gasto por funcionalidade, no gasto total. Sendo
consideradas as frações relativas às despesas, classificadas a partir da análise de
Teixeira (2010) como gastos em infraestrutura social e uma segunda categoria
relacionada à infraestrutura sobre o gasto total.
3) (PIB per capita)it = PIB per capita para o estado i no período t
4) (FPE per capita)it = FPE per capita para o estado i no período t, dada pela razão entre
as cotas do fundo e o número de habitantes de cada estado, a inclusão da mesma
busca analisar o impacto dessa política no crescimento dos estados.
Alguns testes foram realizados de modo a identificar qual método melhor se ajusta
às variáveis analisadas neste modelo, sendo necessário, primeiro, testar se realmente a
heterogeneidade não observada está presente no modelo a ser estimado, confrontando
os modelos de Regressão Pooled com o de Efeitos Fixos e por meio do teste de Breusch-
Pagan confrontando os modelos Pooled com o de Efeitos Aleatórios. Caso seja detectada
a heterogeneidade não observável, é necessário a realização do teste de Hausman para
verificar qual o método é mais adequado, se o de Efeitos Fixos ou de Efeitos Aleatórios
(GREENE, 2003).
No caso de modelos de Dados em Painel são comuns os problemas de autocorrelação e
de heterocedasticidade. Para detectar a presença do primeiro tipo de problema, aplica-se o teste
de autocorrelação serial dos erros, proposto por Wooldridge (2002). Já para verificar a presença
de heterocedasticidade no modelo estimado é necessário aplicar o teste de Wald. Diante da
presença de heterocedasticidade e de autocorrelação serial, recomenda-se que seja realizada
uma nova estimação do modelo selecionado com erros-padrão robustos (GREENE, 2003).

RESULTADOS

Com o controle da inflação no final de 1999, havia espaço para o crescimento no início
dos anos 2000. O desafio da política econômica brasileira passou a ser aliar esse crescimento
à manutenção do controle inflacionário e o equilíbrio externo (TEIXEIRA, 2010).
Ainda que, a partir da década de 1980, os compromissos assumidos pelo Estado
tenham se tornados maiores e que a ampliação do grau de descentralização e autonomia
fiscal dos entes federativos tenham sido um dos princípios-base do federalismo fiscal,
o Gráfico 1 a seguir ilustra o comportamento das séries temporais da parcela dos gastos

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estaduais em infraestrutura social e econômica com relação às despesas estaduais totais para
o período em análise de 2000 a 2019, indicando que não há descentralização na trajetória
dos gastos entre esses dezenove anos.

Gráfico 1 - Evolução dos gastos por infraestrutura em relação às despesas orçamentárias


estaduais totais - 2000 à 2019

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da Secretaria do Tesouro Nacional – STN – (2020).

Os gastos, classificados em infraestrutura social, abrangem a maior parcela do total


dos gastos governamentais durante todo o período, corroborando com a análise feita por
Teixeira (2010), para o período de 1986 a 2006, em que predomina os gastos nas áreas sociais.
Observa-se que nos anos 2000 os gastos em infraestrutura social representavam 35,64% das
despesas totais governamentais, entretanto, dezenove anos depois, esse gasto apresentou
um acréscimo de sua participação de apenas aproximadamente 1,77%, perfazendo um
total de 37,41% em 2019. Apresentando uma maior relação percentual para o ano de 2002,
quando a parcela do total dos gastos corresponde a 40,05%, e um menor dispêndio do
mesmo em 2013 com 36,26%. Um período de relativa estabilidade nessa relação foi de 2002
a 2011, quando a parcela do gasto se matinha a um valor médio de 38,70%.
Com relação aos gastos em infraestrutura econômica, essa trajetória passa a ser
negativa, quando a parcela do gasto com relação ao total dos gastos governamentais
durante o período de 2000 – 2019 apresenta uma variação de -1,82% quando comparado ao
ano de 2000. A partir de 2013 o total despendido com infraestrutura econômica apresenta
diminuições anuais.

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O que se pode destacar é a relação entre essas despesas, quando em períodos de


crescimento dos gastos em infraestrutura social há redução das despesas em infraestrutura
econômica, ao passo que o contrário também é válido, no ano de 2002 quando as despesas
em infraestrutura social atingiram 40,05%, as despesas em infraestrutura econômica
chegaram a um de seus menores percentuais de 4,82%. A partir de 2015, ambas as despesas
apresentaram reduções anuais. Quando somadas às despesas, atingem aproximadamente
45% do orçamento dos estados.
O exame do Gráfico 2 ilustra o comportamento desses gastos governamentais
de forma desagregada, analisando as despesas por funções, a saber: segurança e defesa
nacional; educação e cultura; saúde e saneamento; habitação e urbanismo; comunicação,
energia e transporte.

Gráfico 2 - Evolução dos gastos públicos por tipo de função com relação às despesas
orçamentárias estaduais - 2000 à 2019

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da Secretaria do Tesouro Nacional – STN – (2020)

A categoria de gastos relacionada à educação e cultura abrange a maior parcela dos


gastos estaduais durante todo o período de análise, alcançando um patamar de 19,05% em
2001. Entretanto, nos anos seguintes essa relação apresenta reduções anuais. Essa relação

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negativa se dá também para as despesas que compreendem habitação e urbanismo, e


energia e transporte, em que ambas as despesas se encontram em patamares menores ao
longo do período analisado.
Por outro lado, os gastos relacionados à saúde e saneamento, apresentaram um
crescimento de 4,75%, quando em 2000 correspondiam a 7,89%, passando para 12,64% em
2019, assumindo assim a segunda função de gastos com maior peso na esfera estadual.
Os resultados apresentados sobre a composição e distribuição das despesas nos
gastos totais estaduais, corroboram com a análise de De Castro e Afonso (2009), o qual
aponta que, apesar da preocupação dos governos estaduais com a descentralização do
gasto associada ao federalismo fiscal, não houve descentralização significativa nas despesas,
nem uma mudança estrutural do padrão de gastos.
Portanto, para Souza (1999) é importante saber como esses serviços estão sendo
dispostos pelos governos subnacionais e como os cidadãos estão tendo acesso a eles; em
que a análise do impacto dessas variáveis na taxa de crescimento dos estados pode auxiliar
na melhor identificação de como essas despesas devem compor o orçamento dos estados,
contribuindo por fim na tomada de decisão dos agentes formuladores de políticas.
Na Tabela 1 constam os resultados da estimação, utilizando como variável dependente
a taxa média de crescimento dos entes federativos. Dentre as variáveis explicativas estão as
despesas em infraestrutura econômica e social sobre a despesa total, as despesas correntes
e de capital sobre a despesa total, a despesa total sobre o PIB, o FPE per capita e o PIB
per capita, a constante remete às características específicas dos estados consideradas no
modelo, todas as variáveis estão empregadas na forma funcional de logaritmos, aplicando-
se a defasagem em um período para as variáveis explicativas pelo fato de que deve demorar
algum tempo para que o gasto público afete o crescimento e que um possível problema de
endogeneidade entre o gasto público e o crescimento econômico é minimizado, vez que
aqui o gasto afeta o crescimento em t - 1. Dessa forma, constam as regressões Pooled, de
Efeitos Fixos e de Efeitos Aleatórios.
Por meio dos testes de Breusch-Pagan, constatou-se que as características não
observadas afetam a taxa de crescimento das unidades federativas. Nessa situação, as
estimativas provenientes do modelo de regressão Pooled são inconsistentes e viesadas.
Identificada a existência da heterogeneidade, aplica-se o teste de Hausman para
verificar se o componente não observado é correlacionado com as variáveis explicativas. Os
resultados do teste de Hausman indicaram a presença da correlação entre os termos, dessa
forma, o modelo mais adequado é o de Efeitos Fixos.

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Ademais, a escolha do modelo de efeitos fixos está relacionada ao fato de ele ser
o mais adequado para analisar o impacto de políticas sobre os estados, corroborando
com trabalhos similares como Rocha e Giuberti (2007), Divino e Silva Júnior (2012) e De
Oliveira, Hasegawa e Thomaz (2018), e com a disponibilidade dos dados para o período
de 2000 – 2019.

Tabela 1 - Estimativa dos determinantes da taxa de crescimento dos estados brasileiros

Variáveis Modelo
a Efeito
Pooled Efeito Fixob
aleatório
(Desp.Infra. Econômica/Desp. Total)it-1 0.3992*** 0.3992*** 0.3625*
(Desp.Infra. Social/Desp.Total)it-1 0.1045* 0.1045* 0.3198***
(Despesa total/PIB)it-1 -0.0270* -0.0270* -0.0077
(Despesa corrente/Desp. Total)it-1 0.1145* 0.1145* 0.1297*
(Despesa capital/Desp. Total)it-1 -0.1778** -0.1778** -0.1755*
(FPE per capita)it-1 -0.0022 -0.0022 0.2101***
(PIB per capita)it-1 -0.0411*** -0.0411*** -0.1830***
Constante 0.1991** 0.1991** -0.8382***
Obs. 508 508 508
Estados 27 27 27
2
R
0.077 0.077 0.1538
Teste Breusch-Pagan (Prob > chibar2) 0.000
Teste Hausman (Prob>chi2) 0.000
Teste Wald (Prob>chi2) 0.000
Teste Wooldridge (Prob > F) 0.000
Fonte: Elaboração própria
a
Variáveis estão em logaritmos; bModelo estimado com erros padrões robustos. Para os modelos de efeitos
fixos e efeitos aleatórios é utilizado o R2 do within groups.
+ p<0.10, * p<0.05, ** p<0.01, *** p<0.001.

O modelo a ser utilizado para a discussão dos resultados foi o de Efeitos


Fixos. Entretanto, é necessário realizar testes para a verificação dos problemas de
autocorrelação e heterocedasticidade. Pelos testes de Wooldridge (autocorrelação) e Wald
(heterocedasticidade) foram detectados os dois problemas, no qual os resultados foram
menores que o nível de significância adotado de 5% ou 1%, dessa forma a hipótese nula
de não autocorrelação e heterocedasticidade foi rejeitada; assim, para a correção desses
problemas foi realizada uma nova estimação do modelo escolhido com erros-padrão
robustos, conforme recomendado por Greene (2003).
Os resultados alcançados indicam que as variáveis de despesas com infraestrutura
econômica e social contribuem para a taxa de crescimento dos estados brasileiros, em que

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se nota uma correspondência positiva e estatisticamente significante. Entretanto, a análise


descritiva feita por meio do Gráfico 2 mostra que a partir de 2015 os gastos despendidos
com essas funções vêm sendo reduzidos anualmente, o que influência diretamente na
taxa de crescimento dos entes federativos e repercute no fato de que novos ajustes fiscais
foram adotados, assim como suas implicações refletem a longo prazo no que diz respeito à
provisão de bens e serviços à sociedade.
A parcela do gasto corrente no gasto total apresenta a mesma relação positiva
e estatisticamente significante. No entanto, a parcela do gasto de capital no gasto total
apresenta uma relação negativa e estatisticamente significante, ou seja, um aumento
unitário nesta razão reduz a taxa de crescimento dos entes em 0,175 pontos percentuais.
Esse resultado corrobora com a análise feita por Devajaran (1996), reforçando a
ideia de que o retorno do gasto não depende apenas da sua produtividade, mas também
da quantidade destinada a essa despesa, que são efetuadas pela máquina pública com a
intenção de adquirir ou construir bens de capital, os quais, por sua vez, serão capazes de
gerar novos bens e serviços, relacionada a despesas com investimentos, inversões financeiras
e amortizações da dívida, ou seja, a maneira com que essas despesas estão sendo alocadas
influenciam no seu retorno sobre o crescimento.
Ademais, essa relação positiva para os gastos correntes, que incluem despesas com
pessoal, e negativa para o gasto de capital, enfatiza que os efeitos dos gastos correntes sobre
o crescimento não devem ser negligenciados frente aos investimentos em bens de capital.
Encontra-se a mesma relação negativa para as despesas totais sobre o PIB, entretanto a
mesma não é estatisticamente significante.
Para a variável FPE per capita, a relação é positiva e estatisticamente significante, em
que um aumento unitário nesta razão aumenta a taxa de crescimento dos entes em 0,21
pontos percentuais; entretanto, a literatura aponta que a expansão dessas transferências
pode se dar de forma ineficiente ou improdutiva, tendo em vista o fato de que os estados
que possuem uma menor capacidade de geração própria de receitas se tornam cada vez
mais dependentes desses recursos e seu crescimento dependente de fatores como ciclos
econômicos e políticos.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo tem como questão central a análise da relação entre os gastos
públicos e o crescimento econômico dos estados para o período de 2000 – 2019. Sendo as
despesas instrumentos de políticas públicas, em especial, os gastos em infraestrutura social
e econômica. O modelo estimado identificou uma possível vinculação dos gastos públicos
com um maior crescimento no futuro.
No que diz respeito à relação entre composição dos gastos e crescimento econômico
dos Estados brasileiros, tem-se que a relação entre os gastos com infraestrutura social e
econômica é positiva, bem como os gastos correntes e o fundo de participação estadual,
entretanto, a relação entre os gastos de capital e a taxa de crescimento dos entes é negativa.
A existência de um efeito negativo dos gastos de capital sobre o crescimento indica
a necessidade de reorientação na composição dos gastos em direção às despesas em
infraestrutura social e econômica, dado que essas têm um efeito positivo maior sobre o
produto. A relação com as despesas correntes requer a compreensão de que os mesmos
não devem ser negligenciados quanto às demais despesas.
Os resultados expõem também que dada as grandes transformações trazidas com
a descentralização fiscal, o fundo de participação dos estados apresentou relação positiva
com o crescimento dos entes, estando a ampliação do papel dos governos subnacionais
ligado à oferta de bens e serviços, entretanto, o padrão de alocação dessas despesas está
fortemente relacionado à legislação atuante sobre as finanças públicas, definindo limites
constitucionais e quais despesas devem ser privilegiadas.
Vale ressaltar que esses repasses federativos estão concentrados nas regiões Norte,
Nordeste e Centro-Oeste, indicando a fragilidade dos entes que compõem essas regiões na
geração própria de receitas a partir da sua dinâmica econômica e arrecadação tributária,
gerando um certo grau de dependência desses repasses para manter suas políticas e ofertas
de serviços à sociedade. A transferência de recursos financeiros para os estados não tem
se mostrado suficiente para atacar as desigualdades e desequilíbrios regionais no que diz
respeito a distribuição desses gastos.
A trajetória das despesas com infraestrutura social abrange a maior parcela do
total dos gastos governamentais durante todo o período e os gastos com infraestrutura
econômica apresentam ao longo desses dezenove anos uma tendência decrescente com
relação às despesas estaduais totais.

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CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

Ainda que ambas as despesas apresentam uma relação positiva com o crescimento
dos entes federativos, as mesmas vêm apresentando reduções anuais, expondo, dessa forma,
um menor espaço na composição do orçamento público, o que explicita um contexto de
limitação fiscal após uma série de ajustes sofridos pelo funcionalismo público.
A avaliação macroeconômica da composição das despesas é importante, contudo, se
mostra insuficiente, ainda que gastos com infraestrutura social se mostrem como promotores
do crescimento, torna-se de fundamental importância uma avaliação microeconômica
desses gastos. Duas décadas após a promulgação da lei que rege as finanças públicas
estaduais, LRF, a composição orçamentaria, para a melhor adequação das demandas da
sociedade, é tida como pauta quanto à oferta de bens e serviços, influenciada por diversos
fatores, ciclos e períodos de crescimento econômico como um todo, na atualidade são as
despesas de maior flexibilidade orçamentária ainda que os impactos dessas variáveis para o
crescimento dos entes sejam expressivos e positivos.
Uma sugestão para trabalhos futuros será aprofundar a análise de regressões para
dados em painel dinâmico, incluindo como variável explicativa a variável dependente
defasada, considerando para a análise que o crescimento passado afeta o crescimento
futuro, a partir do Método de Momentos Generalizados (GMM) contornando possíveis
problemas de endogeneidade no modelo, utilizando variáveis dummies de ano para captar
fatores comuns, como choques macroeconômicos, que afetam a taxa de crescimento dos
diferentes estados.
Por fim, conclui-se que a avaliação tão somente pela ótica do equilíbrio fiscal não
está necessariamente associada a maiores níveis de qualidade de serviços públicos
locais, havendo necessidade de adequação dos gastos às demandas de bens e serviços
fundamentais ao desenvolvimento da sociedade.

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5

Keynes, crises e principais resultados da


implementação de políticas econômicas para o
Brasil: uma avaliação11
Thaís Guimarães Alves(1)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8286-6611; Professora Associada I do Instituto de Economia e Relações
Internacionais (IERI) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e pesquisadora; Brazil; E-mail: alvesthais@
ufu.br.

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

Partindo das conclusões sobre como a teoria econômica ortodoxa trata a política
monetária e o Estado, esse artigo tem como objetivo avaliar, a partir de dois períodos
de crises distintos, tanto os resultados das políticas econômicas implementadas pelo
governo brasileiro em momentos de crise generalizada, como a do mercado subprime
dos Estados Unidos, em 2007, e a crise do coronavírus, vivenciada no período recente,
assim como, com base nas repercussões das crises supracitadas, investigar se a posição
assumida pelo governo brasileiro para amenizar os efeitos econômicos das crises tem
alguma fundamentação keynesiana.
A escolha das duas crises se justifica, pois, não se pode afirmar que a economia
mundial já havia se recuperado por completo depois da crise financeira de 2007, muito
menos que o Brasil teria superado incertezas nos campos econômico e político instauradas
a partir das Jornadas de Junho, em 2013; além disso, desde o início da pandemia, e
principalmente durante o isolamento social, uma das principais pautas governamentais ao
redor do mundo, bem como no Brasil, passou a ser como solucionar, ou ao menos frear, a

11 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap5
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crise econômica causada pela COVID-19. Em síntese, a economia brasileira encontra-se em


um momento de estagflação e nível de desemprego muito elevado, o que dificulta ainda
mais sua recuperação.
É importante ressaltar que este artigo é eminentemente teórico, baseado na leitura
e nos manuais do brilhante economista britânico John Maynard Keynes (1933; 1936) e
dos vários estudiosos (e economistas) que estudam o autor e as duas crises econômicas
supracitadas, como Bacha e Goldfajn (2009), Ferrari Filho e Conceição (2001), Oreiro (2020),
Oreiro e Paula (2021), entre outros.
O artigo subdivide-se em duas seções, além desta introdução, das considerações
finais e das referências bibliográficas. A seção 2 apresenta a posição favorável de Keynes
(1978) com relação à ação do Estado na economia capitalista, dada a sua incapacidade de
autorregulação, em que, fundamentalmente, o economista britânico defende indicações
de suporte, coordenação e ordenação do Estado para a estruturação de uma economia
com menos flutuações. Com base nas repercussões das crises de 2007 e da pandemia do
coronavírus, a seção 3 discute a posição assumida pelo Estado como agente econômico
imprescindível para amenizar os efeitos econômicos maléficos da crise. Na tentativa de
suavizar os impactos negativos sobre a economia, em especial, no que tange às dimensões da
política econômica monetária, creditícia, cambial, regulatória, fiscal e social, as ações tomadas
pelo Estado acabam por gerar resultados ora positivos, ora1negativos, na abordagem dos
mais diversos economistas. Portanto, é crucial detalhar a posição assumida do Estado
brasileiro frente às crises financeiras norte-americanas do subprime e do coronavírus e
investigar se as ferramentas que o governo vem utilizando na implementação das políticas
econômicas pensadas no contexto das crises têm uma fundamentação keynesiana.

KEYNES: UMA BREVE ANÁLISE DO INVESTIMENTO E DO PAPEL DO ESTADO EM UMA


ECONOMIA EMPRESARIAL

Keynes (1978 [1933]) não trata da eficiência do investimento, mas da eficiência


do capital. A eficiência marginal do capital está relacionada à expectativa de rendimento
futuro dos bens de investimento, e consiste na medida da rentabilidade esperada dos
ativos instrumentais como riqueza. Disso, assinala-se a capacidade que tem de reproduzir-
se a si mesmo e de gerar um excedente. Anota-se que a lógica da valorização do capital
pode ser realizada tanto na esfera produtiva quanto na esfera financeira; no entanto, é na
esfera produtiva que ocorre a geração de renda, produção e emprego. Quando as aplicações

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financeiras são maiores que os investimentos, diz-se que não há geração de riqueza nova,
apenas de riqueza velha.
Tomando-se por base a existência de incerteza e a instabilidade das expectativas,
Keynes (1936) desdobra a crise do mercado de capitais em dois momentos: primeiro, os
motivos da instabilidade da eficiência marginal do capital, caso em que as variações da
eficiência marginal do capital independem da taxa de juros; e, segundo, a relação entre a
eficiência marginal do capital e a taxa de juros como esclarecedora do cálculo capitalista
perante as perturbações em um ambiente de incerteza. Segundo Amado (2000), o que pode
abalar as expectativas e o estado de confiança é o próprio mercado de capitais, visto que a
análise deste é o resultado da dissociação da propriedade efetiva do capital e da gestão da
máquina produtiva. Dessa forma, a crise é o momento de plena expressão da acumulação
de riqueza velha em detrimento da acumulação de riqueza nova. A decisão no mercado
financeiro fundamenta-se nas expectativas de curto prazo, e não nas de longo prazo, em
uma circunstância em que o especulador tenta prever o que a opinião média julga ser a
opinião média dos agentes de mercado.
O mercado de capitais permite que o capital tenha maior liquidez e maior mobilidade.
Porém, esses mercados podem tornar-se tão atrativos a ponto de inibirem novos
investimentos. A crise se origina no colapso da eficiência marginal do capital, que, buscando
valorização, é barrado pelas altas taxas de juros. No momento em que se apresentam as
decisões acerca de investimentos, atua um conjunto de expectativas otimistas. Contudo, se
os rendimentos esperados não ocorrem, tem-se uma reação imediata e desproporcional,
fato que provoca uma redução das expectativas em um momento extremamente pessimista.
Com o colapso, há uma corrida pela liquidez, geradora do aumento da taxa de juros, que só
ocorre depois do colapso da eficiência marginal do capital. A crise do capital é explicada pela
incapacidade de se realizarem investimentos prováveis: projetou-se uma renda provável, que
não foi realizada. Assim, o cálculo expectacional, a expectativa das decisões e a incoerência
destas resultam no colapso.
Além disso, Keynes (1978) enfatiza que o colapso das expectativas não é
compensado apenas pela política monetária, pois deve ocorrer a digestão da capacidade
excedente que leve à retomada dos investimentos. Isso possibilita afirmar que, no cerne
da proposição keynesiana, está a ideia de que o Estado deve regular as expectativas em
parceria com a iniciativa privada para a tomada de decisão dos investimentos, evitando
mudanças abruptas nestes.

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A análise de Keynes (1978) mostra que, embora o sistema econômico seja


inerentemente instável, ele não é caótico e apresenta algumas regularidades. O sistema pode
manter-se em ordem, ainda que seja longe do equilíbrio. Para isso, é necessário minimizar a
instabilidade e tentar aumentar a estabilidade. Nesse sentido, Libânio (2001, p. 11) destaca
que: as propostas econômicas em Keynes são sempre apontadas pela regulação pública da
economia, mas esta regulação não é totalmente centralizada, são indicações de suporte,
coordenação e ordenação do Estado para uma economia com menos flutuações.
Assim, é possível dizer que Keynes (1978) visualiza o Estado como o sinalizador das
expectativas, evitando que as crises se acentuem numa perspectiva de que o Estado deve ser
corretivo e preventivo. A preocupação maior de Keynes (1978) deriva de seu ceticismo em
relação à capacidade de autorregulação do mercado, e, neste sentido, refere-se à necessidade
de o Estado assumir maior responsabilidade na organização dos investimentos, por meio de
uma política de regulação que vise minimizar sua instabilidade. Nestes termos, o Estado
deve atuar sobre as expectativas com o objetivo precípuo de evitar súbitas flutuações da
eficiência marginal do capital, favorecendo e estimulando os investimentos.
Para Keynes (1978, p. 378), cabe ao Estado exercer uma influência orientadora sobre
a propensão a consumir, em parte mediante o sistema de tributação, em parte por meio
da fixação da taxa de juros. Por seu turno, parece improvável que a influência da política
bancária sobre a taxa de juros seja suficiente por si mesma para determinar a inversão ótima.
Ao advogar a socialização das inversões, Keynes não desconsidera a necessidade de ações
que permitam ao Estado cooperar com a iniciativa privada, visto que, se este for capaz de
determinar o montante agregado dos recursos destinados a aumentar os meios de produção
e a taxa básica de remuneração aos seus detentores terá realizado o que lhe compete. A
partir disso, as medidas necessárias de socialização poderão ser introduzidas gradualmente,
sem afetar as tradições gerais da sociedade (KEYNES, 1978, p. 217).
Ademais, é comum presenciar o conflito de interesses, individual e coletivo, como um
produto do funcionamento dos mecanismos dos chamados mercados livres, incapazes de
equacionarem a sua incapacidade para proporcionar o pleno emprego e a sua arbitrária e
desigual distribuição da riqueza e das rendas (KEYNES, 1978, p. 372). Mais especificamente,
conforme aponta o economista britânico, a contradição entre racionalidade individual
e social é resolvida por meio da ação do Estado na economia. Além disso, continua ele, o
enfrentamento da incerteza e da ignorância requer medidas de sustentação da demanda
efetiva e balizamento das expectativas dos agentes, bem como o controle deliberado da
moeda e do crédito.

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Convém ressaltar que a postura ativista de Keynes (1978) não pode ser inteiramente
justificada apenas pela detecção de problemas sistêmicos na economia. A proposição de
que o livre mercado gera resultados insatisfatórios não implica, necessariamente, que a
intervenção estatal seja desejável. O ativismo da concepção do economista britânico decorre
também de sua postulação de que é possível formar uma burocracia pública eficiente e
bem preparada para a gestão da política econômica, assim como de sua convicção de que o
intervencionismo não representa, em si mesmo, uma ameaça à liberdade individual. Ademais,
reconhece-se que o Estado dispõe de instrumentos importantes para influenciar a economia.
Por sua capacidade de mobilizar recursos, de criar moeda, de correr riscos e, principalmente,
por possuir capacidade institucional de moldar os horizontes de expectativas dos agentes
privados e de afetar o grau de incerteza no ambiente em que tais expectativas são formadas,
o Estado se diferencia de qualquer agente privado e pode direcionar a trajetória do sistema.
Assim, admitida a possibilidade e a conveniência da intervenção governamental,
cabe discutir os instrumentos e os canais de atuação das políticas fiscal e monetária, vez que
influenciam diretamente as variáveis relevantes na determinação da renda e do emprego.
A política fiscal representa um instrumento importante ao elevar o gasto agregado e
afetar o multiplicador do produto agregado. Nesse caso, o orçamento público deve ser
deficitário, quando a economia está em retração, e superavitário, em períodos de expansão,
funcionando, por conseguinte, como um estabilizador automático de demanda (FERRARI
FILHO; CONCEIÇÃO, 2001). Por sua vez, a política monetária influencia a taxa de juros por
meio da variação da oferta de liquidez, com impactos sobre os níveis de investimento.
Keynes (1936) defende que a política monetária deve ter papel acomodativo. Tal
afirmação indica que a oferta de moeda deveria acompanhar oscilações em sua demanda,
causadas por variações do produto nominal e no grau de preferência pela liquidez, buscando
manter certa estabilidade nos termos de crédito e evitar impactos negativos sobre a
atratividade dos bens de investimento. Neste sentido, o economista procura demonstrar
o limite da política monetária em termos da regulação do sistema, na medida em que o
manejo da taxa de juros se revela insuficiente para contra-arrestar a volatilidade das
decisões de investimento. Isso não significa, no entanto, negligenciar a importância de uma
taxa de juros compatível com a eficiência marginal do capital. Uma taxa de juros elevada
pode inibir o processo produtivo, posto que afeta a funcionalidade do sistema de crédito
como provedor de liquidez à economia. A taxa de juros, que define o estado do crédito, deve
ser reduzida em relação à eficiência marginal de capital, como meio de favorecer a decisão
pelos investimentos.

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Portanto, a necessidade da ação do Estado defendida por Keynes (1936) deriva da


identificação que ele faz acerca da natureza intrinsecamente instável da economia capitalista,
cujo modo de operação é marcado pela contradição entre racionalidade individual e social,
antes que pela harmonia social advogada pelos adeptos do laissez-faire. A ação do Estado,
um justificado meio de a sociedade exercer o controle consciente sobre a economia, é a
resposta de Keynes à incapacidade de autorregulação da economia capitalista, posto que
a operação da “mão invisível” não produz a harmonia apregoada entre o enriquecimento
privado e a criação de riqueza nova para a sociedade (BRAGA, 1985).

O PAPEL DO ESTADO BRASILEIRO NO CONTEXTO DAS CRISES DO MERCADO


SUBPRIME E DO CORONAVÍRUS

Perante o tratamento keynesiano do papel do Estado como agente capaz de


estabelecer, por meio de seus instrumentos de política econômica, o controle da economia
capitalista frente à incapacidade do mercado de se autorregular, podem ser levantadas duas
questões cruciais a serem respondidas neste artigo: (a) quais as reações do governo brasileiro
perante o contexto recessivo e de instabilidade instaurado com o acirramento da crise do
mercado subprime e da pandemia de COVID-19? (b) existe uma fundamentação keynesiana
na implementação das políticas econômicas pensadas pelo governo brasileiro no contexto
das crises supracitadas? Em outras palavras, apesar das críticas realizadas pela corrente
ortodoxa da teoria econômica, em tempos de crise, existe uma orientação do Estado para a
adoção de medidas de inspiração keynesiana? Em um primeiro momento, as questões serão
avaliadas para a crise do mercado subprime e, posteriormente, para a crise do coronavírus,
vivenciada no período recente.

CRISE DO MERCADO SUBPRIME

Conforme Malan (2008) e Lanzana e Lopes (2009), a crise financeira internacional,


irrompida no segundo semestre de 2008, ou, mais intensamente, além-fronteira, desde
setembro de 2008 a partir do mercado subprime dos Estados Unidos, consiste na crise
mais grave experimentada pela economia mundial nos últimos setenta e cinco anos. Essa
constatação permite asseverar que nenhum país deixou de sofrer as consequências desta
crise, embora ocorram de formas distintas.
Nesse contexto, analisando as repercussões da crise financeira internacional no
Brasil, pode-se verificar que grande parte das autoridades monetárias domésticas confiou

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em uma menor fragilidade da nossa economia frente à instabilidade econômica provocada


pelos efeitos perversos da crise financeira internacional. Isso se explica pelo fato de que o
governo brasileiro, após crise de 2002, já vinha se pautando pela adoção de medidas mais
rígidas de política econômica, as quais, em harmonia, propiciaram a construção de um
cenário econômico relativamente mais favorável no enfrentamento da crise. Basicamente,
o país contou com a configuração de um cenário caracterizado por um contexto de relativa
estabilidade macroeconômica, com inflação controlada, superávit fiscal, elevado volume de
reservas internacionais, saldo comercial favorável, e menor dependência do financiamento
externo (MALAN, 2008).
Na visão de Keynes (1936), o Estado, em um contexto de crise, no qual se verifica a
instabilidade das expectativas e a incerteza dos agentes quanto ao futuro, deve propiciar
condições para que haja uma retomada do estado de confiança por meio da utilização dos
instrumentos de política econômica, tanto no que diz respeito à política monetária, cujo
caráter seria mais acomodativo, como, principalmente, pela utilização da política fiscal,
caracterizada pela redução de impostos e/ou expansão dos gastos públicos, e pela atuação
do Estado na coordenação, ordenação e regulação do sistema econômico.
Com o recrudescimento da crise financeira internacional e a ampliação do risco de
recessão em escala mundial, verifica-se que os governos das economias desenvolvidas se
engajaram em um agressivo movimento de defesa da solidez dos respectivos sistemas
financeiros, dada a incapacidade dos mercados de se autorregularem. Nessa estratégia
de defesa, os bancos centrais dos Estados Unidos e da Europa injetaram grandes volumes
de liquidez no sistema bancário, negociaram operações de socorro a algumas instituições
problemáticas e promoveram reduções nas taxas básicas de juros na tentativa de restaurar
a liquidez nos diversos mercados. Portanto, de certa forma, observa-se que os governos
dos principais países desenvolvidos reagiram e atuaram em conjunto com medidas de
apoio aos sistemas financeiros para atenuar a desconfiança dos agentes econômicos. Cabe
destacar que, apesar da ação dos governos dos países desenvolvidos, permaneceu o clima
de desconfiança dos investidores quanto à solução da crise financeira, fato que motivou a
migração para aplicações em títulos do tesouro norte-americano em detrimento de outros
ativos, acarretando queda dos preços dos ativos, elevação do risco dos títulos dos mercados
emergentes e depreciação das taxas de câmbio desses países. As alterações nas condições do
crédito repercutiram sobre os indicadores de atividade econômica, com queda da produção
e aumento do desemprego, refletindo uma postura bastante cautelosa de consumidores e
empresários na tomada de decisões de consumo e investimento.

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Nas condições da crise financeira internacional, o crédito externo recua não porque
o risco de emprestar aumenta, mas porque os intermediários estrangeiros precisam
recapitalizar seus balanços no exterior. O sistema de preços perde seu efeito sinalizador
e prevalecem comportamentos de mercado racionado. Justifica-se, nestas condições, a
intervenção do governo para evitar uma ruptura dos padrões de produção e comércio.
Segundo Lopes (2008), de forma antecipada a diversos países, inclusive em relação
ao próprio governo americano, o governo brasileiro já tinha encomendado um pacote de
medidas de política econômica de caráter expansionista, mesmo antes da crise se manifestar
na sua forma mais contundente sobre o contexto econômico brasileiro. A Tabela 1 apresenta
as principais medidas de políticas econômicas implementadas pelo governo brasileiro para
enfrentar um possível cenário recessivo delineado pela crise financeira internacional.
Em termos das medidas de política econômica implementadas na economia
brasileira, observa-se uma disposição das autoridades monetárias em utilizar o conjunto
de instrumentos que possui para assegurar o funcionamento do sistema financeiro
brasileiro e amenizar os impactos negativos da crise internacional sobre o ambiente
macroeconômico, principalmente no que diz respeito à contração de crédito, que
influencia o nível da atividade econômica, e em relação às pressões cambiais, que podem
gerar impactos inflacionários na economia.
De forma geral, verificam-se indícios de uma política econômica (seja monetária,
fiscal, cambial ou comercial) de caráter mais expansionista. Mesmo assim, é possível verificar
uma tendência de o governo brasileiro pautar-se, inicialmente, em políticas de liquidez com
base na utilização dos instrumentos de controle de crédito, com uma resposta mais atrasada
e lenta no que diz respeito à alteração da taxa de juros básica da economia, em função dos
temores inflacionários das autoridades monetárias.
Nesse sentido, o Banco Central adotou diversas medidas no âmbito do mercado
monetário para minimizar os efeitos da contração do crédito externo sobre a economia,
reduzindo a exigibilidade incidente sobre depósitos compulsórios dos bancos, criando
linhas de operações de crédito em moeda estrangeira para financiamento do comércio
exterior, e, só posteriormente, reduzindo a taxa de juros básica da economia, numa tendência
comum com as atitudes tomadas por diversas outras economias. Cabe destacar que o
rápido estancamento de uma crise de liquidez foi possível graças às reservas internacionais
elevadas, à atuação dos bancos públicos, aos depósitos compulsórios altos e aos juros
elevados, fatores que formaram um capital que pôde ser utilizado, de forma criteriosa e

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temporária, para contrapor-se aos efeitos negativos da súbita parada dos fluxos de capital
externo sobre a atividade econômica.
Segundo Carneiro e Bolle (2008), as medidas de política monetária e creditícia tiveram
como objetivo: (a) evitar a propagação da desaceleração do crédito; (b) expandir os ativos
dos bancos públicos, que, normalmente, aumentam sua captação de depósitos, de modo a
compensar a redução dos ativos dos bancos privados, tanto pela perda de depósitos e de
funding externo, quanto pela menor disposição para o risco, além de compensar os efeitos
da desalavancagem das instituições financeiras não bancárias. A crítica ortodoxa, a esse
respeito, é a de que a utilização dos bancos públicos no fornecimento de crédito mascara
uma política fiscal expansionista e pouco transparente, travestida de política monetária
compensatória, que pode resultar na deterioração do balanço do Estado e dos critérios de
alocação de crédito.
Com relação à política cambial, as autoridades monetárias optaram por manter o
sistema de câmbio flexível, com a utilização das reservas apenas para reduzir a volatilidade
cambial, mas deixando claro que não se trata de uma defesa com relação a algum nível
de câmbio suposto como o de equilíbrio da economia. A utilização de reservas é o
instrumento mais usual nessas situações, entretanto, a intervenção do Banco Central por
meio de derivativos cambiais vem ganhando relevância nos últimos anos. Neste sentido,
desde a intensificação da crise, em setembro de 2008, o Banco Central colocou quase
US$ 33 bilhões em swaps cambiais. Segundo Neto e Wajnberg (2008), tal política sinaliza
uma recusa da tentativa de estabelecer um teto ou banda de flutuação da moeda e uma
percepção de que a depreciação do Real ajudará a reduzir o déficit na conta-corrente,
principalmente se a contração de crédito e os ajustes dos estoques da economia reduzirem
os efeitos sobre a inflação.
A política fiscal no contexto da crise pautou-se pela redução e/ou isenção das
alíquotas de alguns impostos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), sobre
determinados segmentos da economia (especialmente automóveis e bens de consumo
duráveis), a fim de estimular o consumo e, consequentemente, reaquecer a atividade
econômica. Além disso, o reajuste mais expressivo do salário mínimo e dos benefícios
previdenciários estimula a demanda das famílias. Semelhantemente se verifica uma atuação
dos bancos públicos e o anúncio de programas de gastos, como o novo pacote habitacional
divulgado pelo governo, além do reforço dos gastos em infraestrutura previstos no Programa
de Aceleração do Crescimento (PAC), como forma de incentivar a construção civil e seus
efeitos multiplicadores sobre a atividade econômica. Assim, cabe destacar uma perspectiva

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keynesiana de que, dado o contexto de expectativas negativas por parte de empresas e


famílias, não basta reduzir a taxa de juros básica da economia, mas são necessárias ações
que melhorem o estado de confiança de investidores e consumidores para reorientar as
expectativas dos agentes. Uma postura keynesiana indica que o governo deve assumir um
papel ativo, principalmente em termos de sustentação da demanda agregada por meio dos
gastos públicos, defendendo que se deve investir mais, ampliando os gastos, porém, sem
desconsiderar uma preocupação clara com a melhoria na qualidade do gasto público.
A corrente ortodoxa critica a utilização da política fiscal expansionista em termos
dos seus efeitos negativos para o controle inflacionário e crescimento de longo prazo. Além
disso, existe a desconfiança baseada no histórico brasileiro do excesso de gastos no período
de necessidade não ser acompanhado por sua redução nos períodos de bonança (PARNES;
GOLDFAJN, 2008). Os autores dessa corrente enfatizam que a redução do superávit primário
como instrumento contracíclico de política econômica seria recomendável apenas num
cenário extremo de depressão mundial, caracterizado por aumento da aversão ao risco e
piora das expectativas de renda, com queda significativa dos componentes da demanda
agregada, contração da oferta de crédito doméstico e dificuldade de financiamento para
empresas e consumidores. Nestes termos, uma política fiscal mais frouxa deveria ser utilizada
onde o ajuste via política monetária não fosse suficiente.

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Quadro 1: Principais medidas de políticas econômicas adotadas no Brasil em decorrência da


crise financeira internacional
Política Medidas

• Reversão da tendência de alta e posterior redução


(gradativa) da taxa de juros básica da economia
(SELIC);
• Liberação dos compulsórios;
• Autorização de operações de redesconto em
moeda nacional e operações de empréstimo em
Monetária/Creditícia
moeda estrangeira com garantia de carteiras de
crédito;
• Transferência de carteiras de instituições pequenas
e médias;
• Antecipação ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC);
• Resgate de títulos públicos.

• Venda de swaps cambiais;


Cambial
• Venda de dólares no mercado à vista de câmbio

• Redução de alíquotas de IPI sobre a venda de


veículos e caminhões, materiais relacionados à
construção civil, e suspensão de IPI de materiais e
equipamentos para estaleiros navais;
• Redução e/ou isenção da alíquota de IPI sobre bens
de consumo duráveis (linha branca);
• Redução da alíquota de IOF sobre operações de
crédito com pessoas físicas;
Fiscal • Criação de alíquotas adicionais intermediárias para
o IR;
• Pacote habitacional, com financiamento público;
• Aumento do salário mínimo;
• Reajuste dos benefícios previdenciários;
• Ampliação de gastos com os programas sociais
(Bolsa-Família entre outros);
• Reforço dos gastos com o PAC;
• Aumento de recursos para o BNDES e crédito rural.

• Alterações nas alíquotas de impostos (IPI, PIS/PASEP,


Confins) na importação de produtos específicos;
Comercial • Criação de linhas de operações de crédito em
moeda estrangeira para financiamento do
comércio exterior.
Fonte: Banco Central do Brasil (2009a, 2009b, 2009c, 2009d).

Outro importante debate que emerge em períodos de crise diz respeito à


consolidação das instituições e à adequação dos atuais sistemas de regulação e supervisão
financeira vigentes nas diversas economias. Nesse sentido, verifica-se o retorno de
discussões sobre a necessidade de adaptar a regulamentação do sistema financeiro para
evitar que os excessos se repitam e voltem a provocar crises da magnitude atual.

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Conforme Resende (2008), um sistema financeiro eficiente é fundamental para o


bom funcionamento da economia. A desorganização desse sistema ameaça lançar toda a
economia mundial numa recessão de grandes proporções. Para evitá-la, os governos e os
bancos centrais viram-se na obrigação de concretizar uma ação coordenada, com medidas
extraordinárias, até pouco tempo inconcebíveis. Portanto, torna-se fundamental dedicar
atenção ao desenho do sistema financeiro que se deseja para sair da crise e viabilizar a
retomada da economia. Nesse contexto, faz necessário o estabelecimento de uma política
que seja preventiva com relação ao agravamento da crise, ao mesmo tempo em que se
deve pensar o arcabouço desejável para o sistema financeiro no pós-crise. Em outras
palavras, deve-se pautar por uma regulamentação simples e transparente para garantir a
competitividade e reduzir os riscos, e que não possa se transformar em barreira à entrada
aos agentes no sistema financeiro.

CRISE DO CORONAVÍRUS

Para entender o atual cenário brasileiro e responder especialmente as duas questões


propostas no início dessa seção, fazem-se necessário: i) uma breve análise do quadro em
que o país se encontrava antes da disseminação desse vírus no mundo; ii) uma discussão
sobre as principais consequências da crise econômica resultante da pandemia do novo
coronavírus no Brasil; e, iii) análise dos principais (e iniciais) resultados quanto às medidas
adotadas pelo governo brasileiro no combate aos efeitos da crise do coronavírus.

SITUAÇÃO PRÉ-PANDEMIA

Desde 2015, o Brasil vem adotando políticas fiscal e monetária de corte ortodoxo,
sendo que a partir de 2016 passou a implementar um conjunto de reformas liberais, que
incluíram: (i) um teto constitucional de gastos públicos, vigorando a partir de 2017, que
congelou o gasto primário do governo por 20 anos, já que o gasto público foi reajustado
tão-somente pela inflação do ano anterior, um tipo de regra fiscal que só existe no
Brasil; (ii) uma reforma trabalhista, vigorando a partir de novembro de 2017, que levou
a flexibilização do mercado de trabalho, incluindo, entre outras medidas, implantação
de contrato temporário, trabalho intermitente e possibilidade de jornada de trabalho de
12 horas; e (iii) uma reforma previdenciária, aprovada em novembro de 2019, que, entre
outras mudanças, aumentou a idade mínima de aposentadoria, o tempo mínimo de
contribuição, entre outros.

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Com o governo Temer e Bolsonaro, retomou-se a promessa do crescimento a partir


da implementação de reformas liberais, baseado tanto na hipótese da contração fiscal
expansionista - ajuste fiscal feito com cortes dos gastos públicos que aumentaria a confiança
dos agentes, estimulando os gastos privados de firmas e famílias e, consequentemente, maior
crescimento econômico (ALESINA; ARDAGNA, 2010) -, quanto na tese da fada da confiança,
segundo o qual as políticas liberais contribuiriam para destravar o espírito empresarial das
amarras do Estado. Todavia, o crescimento econômico foi aquém, com a economia ficando
semiestagnada em 2017-2019 (crescimento médio do PIB de 1,5% a.a.).
No seminário online “Economia, trabalho e proteção social em tempos de crise” (2020),
organizado pelo Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (CESIT), Carneiro
(2020), afirma que o país já apresentava uma desaceleração desde a crise de 2007 junto ao
processo de financeirização da economia. Ou seja, a economia brasileira não apresentou
crescimento econômico trimestral maior que 1% em 2019, e o período de outubro a
dezembro teve crescimento inferior ao trimestre anterior. Acrescentou ele que, o consumo e
a atividade em construção civil deram algum sinal positivo, mas, em compensação, os demais
setores não tiveram grandes avanços, com destaque para a indústria e o investimento em
capacidade produtiva. A atividade industrial veio oscilando e de modo algum apresentou
sinais de que se encaminhava para uma forte recuperação. Segundo dados da Confederação
Nacional da Indústria (2020), a pandemia encontrou o setor operando aquém de sua
capacidade produtiva, com utilização da capacidade instalada variando entre 77 e 78%
desde junho de 2018, e caindo para 76% em março de 2020, iniciando uma tendência brusca
de queda a ser observada nos próximos meses.
A situação do mercado de trabalho, conforme Saboia et al (2020), já era ruim pelo
menos desde 2016, e vinha seguindo a tendência mundial da informalidade e precarização,
afetando sobremaneira a parcela da população em situação mais vulnerável. De acordo com
Oreiro e Paula (2021), a taxa de desemprego se manteve elevada e o mercado de trabalho
foi se precarizando, com aumento de trabalho informal e parcial. Nesse ínterim, o principal
problema da economia brasileira não estava no lado da oferta da economia, mas sim na
existência de uma demanda agregada insuficiente para dar suporte ao crescimento.
Krein e Borsari (2020, p.1) apontam que “o ano de 2019 terminou com 16,2 milhões
de desempregados (aberto e desalento) e 6,7 milhões de subocupados por insuficiência de
horas, além do forte peso do trabalho informal, 38,4 milhões de trabalhadores (subocupados
inclusos neste contingente), quadro relativamente estável desde 2016”.

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Também, é importante ressaltar que, segundo Neri (2019), a desigualdade de renda


veio crescendo por 17 trimestres seguidos desde o último trimestre de 2014. Ele ainda
enfatizou que o ritmo de aumento da desigualdade de renda durante o período, foi similar ao
ritmo da queda observada no período de 2001 até 2014, ou seja, se esse processo continuar
por um período maior todo avanço nessa área poderá ser revertido.
Conforme Barbosa et al (2020), após anos de redução na desigualdade social no
Brasil, houve uma acentuada piora a partir de 2015. O Índice de Gini aumentou entre 2015 e
2019, de 0,525 a 0,543, resultado de um conjunto de fatores, que incluíram principalmente
a queda na renda de trabalho, devido ao crescimento do desemprego, do desalento e do
trabalho informal.
Portanto, quando a pandemia da COVID-19 atingiu o Brasil, no início de março de
2020, a economia brasileira já se encontrava estagnada, com um mercado de trabalho
precarizado – elevada informalidade e desemprego (11,0% em dezembro de 2019) - e
uma piora substancial na desigualdade social. Já a dívida pública bruta encontrava-se no
patamar de 75,2% do PIB em fevereiro de 2020. Por outro lado, os fatores econômicos
positivos para enfrentamento da crise econômica que resultou da crise sanitária incluem
um elevado nível de reservas cambiais (US$ 357 bilhões em 2019), uma taxa de inflação
sob controle (4,3% a.a. em 2019); e um setor bancário resiliente, com os bancos bem
capitalizados e níveis de liquidez e estruturas de balanço robustas para enfrentamento de
períodos de estresse (BCB, 2021).

CONSEQUÊNCIAS DA CRISE DO CORONAVÍRUS SOBRE A ECONOMIA BRASILEIRA

Os efeitos da crise do coronavírus sobre a economia brasileira foram muito fortes


e imediatos a partir de março de 2020. O choque da atividade econômica decorrente da
irrupção da pandemia do COVID-19 transmitiu-se imediatamente para o sistema financeiro
“em termos da necessidade de liquidez, dentre os quais se destacam desembolsos com
ajustes de derivativos e chamados de margem decorrentes de volatilidade de mercados,
redução de fontes de funding externos, elevados saques de linhas de crédito abertas e de
processos de renegociação de repactuação de operações de crédito por parte de empresas
e famílias” (BCB, 2020, p,13). Por outro lado, houve uma rápida realocação dos portfólios
dos agentes na direção de ativos financeiros de maior liquidez (em especial títulos públicos
com vencimentos mais curtos ou operações compromissadas) nos meses de março e abril
de 2020, em particular nos mercados de renda fixa, com grande depreciação dos preços

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dos ativos financeiros e uma forte diminuição na liquidez do mercado financeiro (Martins
et al., 2020).
A adoção de medidas de isolamento social provocou uma queda drástica no ritmo
de crescimento econômico. Os setores da indústria, comércio e serviços apresentaram em
março queda de 9.1%, 2.5 % e 6.9%, respectivamente, conforme dados do IBGE, Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (2021). O declínio no produto foi determinado pela
queda no setor de serviços e no setor industrial, enquanto na agricultura se manteve um
crescimento inicialmente elevado em função das exportações de commodities.
Consequentemente os impactos também foram sentidos no mercado de trabalho,
que já vinha passando por um processo de fragmentação. Segundo a pesquisa PNADC,
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Mensal, (2020), a taxa de desocupação
no primeiro trimestre de 2020 foi de 12,2%, representando um aumento de 1,3 pontos em
relação ao trimestre anterior. A desocupação prejudicou mais as mulheres que os homens,
assim como as pessoas que se declararam pretas e pardas do que as brancas. O número de
desalentados foi de 4,8 milhões de pessoas, sendo a Bahia o estado com maior contingente
(778 mil), abrigando 16,3% do total nacional. O percentual de pessoas desalentadas foi de
4,3%, 0,2 pontos percentuais a mais que o quarto trimestre de 2019. Em relação ao trimestre
anterior, a criação de novas vagas de emprego reduziu em 2,3 milhões de janeiro a março de
2020, e a redução com relação ao mesmo trimestre de 2019 foi de 1,8 milhão. A população
fora do mercado de trabalho bateu um recorde atingindo a soma de 67,3 milhões de pessoas.
Ainda conforme a PNADC (2020), a informalidade foi de 40% da população ocupada, e
houve uma queda de 7% de empregados sem carteira, a primeira redução desde o primeiro
trimestre de 2016. Este cenário expressou a forte informalização que vem sendo a alternativa
de sobrevivência para os brasileiros desde a crise de 2015-2016. A queda nos empregos sem
carteira assinada ocorreu sem um correspondente aumento na formalização, o que sugere,
segundo Krein e Borsari (2020), uma sinalização do agravamento do desemprego para os
próximos meses. Foram 12,9 milhões de pessoas desocupadas, 6,5 milhões subocupadas
por insuficiência de horas e 8,3 milhões na força de trabalho potencial (desalentadas ou
não). Estas três categorias somadas representaram a subutilização da força de trabalho, o
que quer “dizer que, em certo sentido, faltou trabalho para 27,6 milhões de pessoas” (Krein
e Borsari, 2020, p. 1).
Já no que se refere ao mercado de crédito bancário, a contração na concessão do
crédito ocorreu a partir de março de 2020 para pessoas físicas e em abril para as pessoas

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jurídicas. No caso do crédito corporativo, o crescimento em março se deveu aos empréstimos


às firmas de grande porte, que buscaram recursos para reforçar a liquidez, financiar a cadeia
produtiva e proteger-se da variação cambial (BCB, 2020, p.6), mas a taxa de crescimento
do crédito em abril a junho caiu fortemente tanto para grandes empresas quanto para
pequenas e médias empresas. A repactuação de dívidas com extensão de prazos aos
devedores – favorecida pela regulamentação do Conselho Monetário Nacional que permitiu
às instituições financeiras ofertarem prorrogações de parcelas nos créditos anteriormente
concedidos –, influenciou a melhora nos índices de ativos problemáticos para empresas de
todos os tamanhos. No caso das concessões de crédito para os indivíduos, a desaceleração
maior ocorreu nas modalidades “financiamento de veículos” e “cartão de crédito”, sendo
sua recuperação resultada em parte da renegociação de operações realizadas previamente
(BCB, 2020, p.7).
Segundo a Pesquisa Industrial Mensal do IBGE, (2020), em março, a produção
industrial recuou 9,1% frente ao mês anterior, e os bens de consumo duráveis e bens de
capital foram os que apresentaram maiores retrações: -23,5% e -15,2%, respectivamente, na
comparação mensal. No caso da indústria automotiva, em 28 de abril de 2020 já havia 74%
dos trabalhadores com jornada de trabalho reduzida ou contrato suspenso.
No tocante à situação cambial, verificou-se que a balança de pagamentos já vinha
apresentando déficits sistemáticos antes da pandemia, de modo que já estava cristalizada
a tendência de desvalorização do real. Portanto, a pandemia não engendrou o processo
de desvalorização do real, embora o influenciasse em virtude da posição do dólar como
reserva de valor. O dólar, cotado a R$ 4,28 no início de fevereiro, chegou ao patamar de R$
5,86 em meados de maio. Diante da vertiginosa escalada do dólar, o Banco Central atuou no
mercado de câmbio a fim de arrefecer a demanda por dólar e, assim, conter a depreciação
cambial. Só na primeira semana de maio de 2020, o Banco Central do Brasil, BCB, perdeu R$
24 bilhões nas operações de swaps cambiais. Tomando o acumulado do ano, a autoridade
monetária apresentou uma perda total de R$ 79 bilhões. Até o início de março, R$ 44,8
bilhões foram retirados da bolsa brasileira, o que superou o saldo negativo concernente a
todo o ano de 2019, que foi de R$ 44,5 bilhões. No que diz respeito às transações correntes,
o país apresentou um déficit de US$ 11,9 bilhões no primeiro quadrimestre do ano. A saída
líquida de investimento em portfólio no mercado doméstico somou US$ 31,4 bilhões nos
quatro primeiros meses do ano. Portanto, problemas já presentes na estrutura do balanço
de pagamentos se agravaram no contexto da pandemia, o que culminou num vertiginoso
processo de depreciação cambial. Tal processo ocorreu muito em virtude do componente

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de saída de investimentos em portfólio no mercado doméstico, ou seja, a saída do capital


acionário/ fictício.
Existe um consenso entre os economistas que com a paralisação das atividades
econômicas em conjunto com as ações governamentais para reduzir o impacto social, o
déficit fiscal de 2020 será muito maior do que o normal, o que deve levar ao aumento da
dívida pública brasileira. Para Oreiro (2020), esses fatores deverão “levar a dívida pública
como proporção do PIB para patamares próximos de 100% em 2021”, porém, ao contrário
do que muitos acreditam, ele não crê em um colapso fiscal, o que necessitaria de medidas
drásticas de ajuste fiscal pós-pandemia. Ele argumenta que, ao contrário da dívida existente
no final da década 1970, a atual dívida é formada majoritariamente por moeda nacional,
sendo o Brasil credor em moeda estrangeira e possuindo reservas internacionais.
Desta forma, as informações apresentadas demonstraram um cenário crítico, com
impactos nos diversos setores da economia, deprimindo ainda mais o investimento e o nível
de emprego em um país marcado pela desigualdade social. A desestruturação política e
econômica do Brasil é crescente e está mais evidente à medida que os dados estatísticos são
divulgados; ademais, as políticas públicas de cunho fiscalista que vêm sendo adotadas nos
últimos anos não entregaram as benesses econômicas que prometeram por se basearem
em modelos abstratos da economia e em pensamentos econômicos bastante questionáveis.

BRASIL: ANÁLISE DOS PRINCIPAIS (E INICIAIS) RESULTADOS QUANTO ÀS MEDIDAS ADOTADAS


PELO GOVERNO BRASILEIRO NO COMBATE AOS EFEITOS DA CRISE DO CORONAVÍRUS

Diante do quadro trágico na saúde pública e de suas consequências para a economia


já sentidas de imediato e igualmente previstas para o longo prazo, o governo federal
brasileiro, assim como governos no mundo todo, implantou políticas públicas para tentar
diminuir os impactos da crise sanitária, econômica e social.
Em termos da experiência internacional, quatro ações foram necessárias: (i) reposição
de renda para as pessoas mais atingidas pela crise, através de transferência direta de renda,
ampliação do seguro-desemprego, compensação para redução de jornada, entre outros.; (ii)
manutenção do fluxo de caixa para as empresas em função da perda de receitas resultante
da paralisia total ou parcial da atividade econômica, o que requer um conjunto de medidas
de alívio para empresas, incluindo provimento de capital de giro em especial para pequenas
e médias empresas, postergação de pagamento de impostos, redução de jornada de
trabalho, entre outros; (iii) apoio financeiro para Estados e Municípios em função da queda

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na arrecadação fiscal, sobretudo em países como o Brasil onde esses entes subnacionais
estão proibidos de emitir dívida pública; e, (iv) ampliação do sistema público de saúde para
enfrentamento da crise sanitária.
De acordo com Martins et al., (2020), no que se refere às medidas adotadas pelo
Banco Central do Brasil (BCB) para evitar uma crise de liquidez no mercado financeiro
e assegurar o funcionamento do mercado de crédito, as medidas de liquidez foram
bem-sucedidas tanto para evitar uma crise de liquidez no setor bancário quanto para
reverter, ao menos parcialmente, a queda nos preços dos títulos públicos e privados,
em particular nos títulos curtos e pré-fixados. Cabe destacar que boa parte dos recursos
liberados através da redução de recolhimentos compulsórios, alívio nos coeficientes de
conservação de capital e relaxamento temporário das regras de provisionamento das
instituições financeiras migrou para o mercado das operações compromissadas do BCB,
uma aplicação de alta liquidez, que tiveram forte aumento no período de abril a setembro
de 2020. Isto sugere que tais medidas evitaram uma crise de liquidez, mas tiveram efeitos
limitados sobre a oferta de crédito, ainda que tenha evitado a ocorrência de uma redução
repentina e acentuada na oferta de crédito bancária, que eventualmente pode resultar
em uma crise bancária.
Após a desaceleração na concessão de crédito em abril e junho de 2020, houve uma
recuperação da oferta de crédito, sendo maior para pessoa física do que para pessoa jurídica,
sendo no primeiro caso favorecido pela renegociação dos empréstimos, com extensão de
prazos e redução nas taxas de empréstimos. No caso do crédito corporativo, verifica-se um
racionamento de crédito para pequenas e médias empresas nos meses de abril a junho de
2020, o que evidencia a baixa efetividade das medidas adotadas inicialmente de injeção
de liquidez pelo BCB para estimular a oferta de crédito neste segmento. De fato, o PESE,
Programa Emergencial de Suporte ao Emprego, não foi bem-sucedido, tendo financiado
o total de R$ 7,9 bilhões, em particular microempresas (menos de 30 funcionários), bem
abaixo dos R$ 34 bilhões disponibilizados pelo Tesouro para o programa. Os problemas do
PESE estão relacionados às condicionalidades (obrigatoriedade de crédito direto nas contas
dos empregados) e ao fato de que os bancos tinham que prover 15% dos recursos dos
empréstimos em um ambiente de alto risco.
Somente com o uso dos fundos garantidores (FGI e FGO) que a concessão de crédito
fluiu para pequenas e médias empresas, ainda com certo atraso. Os montantes de recursos
financiados pelo PRONAMPE e pelo PEAC-FGI até 31/12/2020 foram R$ 37,5 bilhões e R$
92,4 bilhões, e realizando 516.790 e 35.959 operações, respectivamente (BCB, 2021). De

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julho a setembro em 2020, houve um forte aumento na taxa de crescimento do crédito para
pequenas e médias empresas.
No tocante ao impacto da crise do coronavírus sobre o mercado financeiro no Brasil,
tem-se que as taxas de juros de mais de 3 anos subiram acentuadamente em março de 2020,
mantendo-se elevadas até o mês de maio, vindo a cair até julho, acompanhando a redução
na taxa Selic (1 dia). A partir de agosto, notou-se uma elevação gradual em todos os vértices,
inclusive nas taxas de juros de 1 ano, o que evidenciou uma piora na percepção de risco dos
agentes, em função de fatores diversos como incerteza sobre futuro da economia, sobre a
condução da política econômica, crise política, entre outros, que inclusive gerou problemas
no gerenciamento da dívida pública pelo Tesouro. Cabe destacar que embora o BCB tivesse
à sua disposição em 2020 uma permissão para comprar títulos públicos e privados no
mercado secundário para achatar a curva de juros, ele não utilizou a mesma.
O programa de auxílio emergencial (AE) a indivíduos vulneráveis, que respondeu
por mais de 50% dos gastos do governo federal, contribuiu para uma rápida melhora na
distribuição de renda, na medida em que evitou a redução de renda das famílias de baixa
renda, em comparação com outros segmentos da população, em particular o segmento
que ganha menos de meio salário mínimo. Além da redução na desigualdade social,
verificou-se uma forte redução na pobreza e extrema pobreza devido ao programa de
auxílio emergencial: a percentagem da população abaixo da pobreza reduziu de 23,7% em
maio para 18,4% em agosto de 2020, enquanto que a percentagem da extrema pobreza
caiu ainda mais, de 4,18 para 2,29.
Sanches et al., (2021) estimaram o efeito multiplicador do Auxílio Emergencial, ou
seja, os fatores que atenuaram a profundidade da recessão no primeiro ano de pandemia.
Suas simulações indicaram que, com um gasto equivalente a 4,1% do PIB de 2020, o Auxílio
foi responsável por evitar que a economia brasileira caísse entre 8,4% e 14,8% em 2020. Já
a redução no consumo das famílias poderia ter diminuído entre 11,0% e 14,7% na ausência
desse benefício, em vez de sofrer a queda de 6%.
Ao analisar o índice de atividade econômica do BCB, (2021), observou-se que a
crise sanitária, em função do isolamento social que seguiu a pandemia, levou a uma forte
queda na atividade econômica entre abril e junho de 2020. A economia viria a se recuperar
parcialmente a partir de agosto, quando a pandemia arrefeceu parcialmente no Brasil e o
impacto contracíclico do auxílio emergencial se fez sentir. Já em janeiro de 2021, houve uma
nova queda na atividade econômica em função da segunda (e forte) onda da pandemia, que

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resultou em paralisações parciais em vários estados brasileiros, e dos efeitos negativos da


renda em função do aumento na taxa de inflação causada por choques de oferta (elevação
nos preços de commodities e desvalorização cambial). Cabe lembrar que a projeção do FMI
para o crescimento do PIB do Brasil em 2020, segundo o World Economic Outlook de junho,
apontou para uma queda de 9,1%, quando na realidade a taxa de crescimento real foi de
-5,3% em 2020, um desempenho bem melhor que a média da América Latina (-7,7%) e das
maiores economias da região, conforme estimativas preliminares da CEPAL.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo procurou avaliar, a partir de dois períodos de crises distintos, tanto os
resultados das políticas econômicas implementadas pelo governo brasileiro em momentos
de crise generalizada, como a do mercado subprime dos Estados Unidos e a crise do
coronavírus, quanto, com base nas repercussões das crises supracitadas, investigar se a
posição assumida pelo governo brasileiro para amenizar os efeitos econômicos das crises teve
alguma fundamentação keynesiana. Em um primeiro momento, com base no pensamento
keynesiano, foi realizado uma breve análise do investimento e do papel do Estado em uma
economia empresarial. Sob a visão de Keynes, tem-se que a presença do Estado na economia
capitalista é imprescindível, pois a participação do setor público na economia deriva da
própria incapacidade de autorregulação da economia capitalista e, embora as propostas
econômicas elaboradas pelo economista britânico sejam sempre apontadas pela regulação
pública da economia, esta não é totalmente centralizada. Tais propostas são indicações de
suporte, coordenação e ordenação do Estado para uma economia com menos flutuações,
portanto, numa perspectiva de um Estado que seja corretivo e preventivo.
No contexto da crise financeira internacional de 2007, abre-se espaço para a discussão
sobre a adoção de medidas de cunho keynesiano no debelamento da crise, tais como a
criação de um sistema de coordenação de políticas econômicas, a utilização de política
fiscal expansionista, a implementação de controles de capitais e sistemas de regulação e
de supervisão mais eficientes, dentre outras. Obviamente, não se espera o fim das políticas
ortodoxas que vêm sendo implementadas em diversas economias desde a década de 1990.
No entanto, em condições de instabilidade, há que se considerar um papel mais ativo do
Estado no enfrentamento da crise e na reversão da desconfiança dos agentes econômicos.
As medidas de política econômica adotadas pelas autoridades monetárias sugerem o
posicionamento efetivo dos Estados na busca pela estabilidade do mercado, na medida
em que os governos montam pacotes de resgate e injetam liquidez no sistema, além de

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promover uma estatização temporária de instituições, o reforço de regras de controles


e a adoção de normas prudenciais mais rígidas. Sob esse enfoque, o papel do Estado na
recuperação da situação de confiança dos agentes econômicos, em momentos de crise,
se faz absolutamente necessário a fim de balizar expectativas e permitir a retomada da
atividade econômica.
O alastramento da crise do crédito em 2008 deixa claro que a política monetária
sozinha não é suficiente para estimular a economia e reorientar as expectativas dos agentes
econômicos. A prova disso é que a manutenção das taxas de juros perto de zero nos EUA
e Japão não conseguiu estimular o nível de atividade econômica naqueles países. Assim,
observa-se um papel efetivo para as políticas fiscais mais expansionistas para se enfrentar as
perspectivas de um período recessivo nas diversas economias.
No tocante à crise do coronavírus, a análise aqui desenvolvida difere de outras
análises heterodoxas feitas por economistas brasileiros, segundo o qual a ação estatal de
enfrentamento da crise pandêmica no Brasil foi fraca e inconsistente, de tal forma que as
políticas fundamentais não foram implementadas e que o conjunto de medidas adotadas
foi tímida, lenta e descoordenada. Sustentou-se que, as ações contraciclicas, em especial as
aquelas relacionadas ao auxílio emergencial, tiveram um forte efeito contracíclico sobre a
economia brasileira e para redução da pobreza e desigualdade social durante a crise, ainda
que não tenha havido uma estratégia previamente coordenada pelo governo federal para
enfrentamento da crise econômica e social, sendo as medidas aprovadas frequentemente
sob pressão da opinião pública e por iniciativa do Congresso Nacional.
Outra questão importante é em que medida as análises de Keynes podem ser úteis
para entender a crise do coronavírus e as políticas adotadas para enfrentamento da crise. No
caso de Keynes, a conclusão é que, dado que a crise sanitária resulta em uma forte contração
da demanda agregada da economia, em especial a redução na demanda privada dos agentes,
se coloca a necessidade de aumentar os gastos públicos com vistas à implementação de
programas voltados para atenuar a perda de renda e o emprego dos trabalhadores.
Também foi possível observar que, de fato, a economia brasileira já não atravessava
um grande momento no período anterior à chegada do Sars-CoV-2. Os dados relativos
ao mercado de trabalho, produção industrial e crescimento do PIB indicaram grandes
dificuldades enfrentadas pelo país no tocante à sua economia antes de 2020, fazendo com
que, no geral, os problemas passassem a adquirir uma proporção ainda maior devido ao
isolamento social, entre outras medidas relativas ao controle da pandemia. Também é

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possível concluir que as decisões do Governo Federal até o momento não se mostraram
capazes de suavizar os efeitos nocivos da crise para a economia e o bem-estar dos brasileiros,
visto que o auxílio emergencial não pareceu dar conta das necessidades dos cidadãos. Nesse
caso, é imprescindível rediscutir as medidas adotadas.
Os dados relativos ao mercado de trabalho apontaram uma situação ruim há muito
tempo e que não melhorou como foi prometido no momento da implantação das reformas
trabalhista e previdenciária, que objetivaram o ajuste fiscal. Considerando o cenário
prévio, a chegada do coronavírus no Brasil apenas aprofundou as dificuldades que o país
já enfrentava; portanto, acreditar que o vírus seja o único responsável pelos problemas
econômicos e sociais que se apresentaram desde já, bem como àqueles que ainda virão, é
negar o quadro anterior da economia brasileira indicado pelos dados disponíveis.
Assim, a maior ou menor intervenção do Estado na economia (e o retorno com maior
ou menor força das proposições keynesianas) depende dos efeitos da crise serem duradouros
ou mais superficiais. É indispensável se ter em mente que a solução da crise não se pauta
pela defesa de uma atuação do Estado de maneira desregrada, em que se deva aumentar
desmesuradamente a despesa pública financiada com dívida para sairmos da crise, ou o fim
da liberalização dos mercados financeiros. Nesse sentido, torna-se necessário pensar todo
um programa estratégico de intervenção, bem desenhado, com mecanismos eficazes, que
seja capaz de transformar a crise em oportunidade.
Em suma, não se pode pensar na atuação mais direta do Estado na economia como algo
estritamente maléfico ao pleno funcionamento dos mercados, mas como algo complementar
ao bom funcionamento destes. De fato, nenhum governo aplica na administração econômica
o receituário neoclássico ou keynesiano no seu estado puro. O pragmatismo deve prevalecer,
com uma combinação mais adequada possível das proposições de uma ou outra escola,
considerando as necessidades e conveniências do momento.

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106
6

Florestan Fernandes e os desafios do


desenvolvimento socioeconômico na periferia
do Capital12
Elson dos Santos Gomes Junior (1)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7222-8288; Professor da Educação Básica, Técnica e Tecnológica;
Instituto Federal Fluminense – IFF; Santo Antônio de Pádua, Rio de Janeiro; BRAZIL; E-mail: elsonuenf@
yahoo.com.br.

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

O presente capítulo apresenta os desafios do desenvolvimento socioeconômico na


obra do sociólogo paulista Florestan Fernandes. Patrono da sociologia brasileira e autor de
vasta produção, entre tantos temas, não deixou de privilegiar a questão do desenvolvimento
socioeconômico e seus entraves no que chamou de “periferia” do capital (FERNANDES, 2010,
p.46; 1979a, p.39).
Neste sentido, o objetivo deste trabalho é apresentar os elementos constitutivos do
processo de formação social brasileiro e os “entraves” que impossibilitam o que Florestan
Fernandes chamou de “radicalização democrática”. Estes, segundo o autor, são os pilares
conservantistas que impedem o desenvolvimento e usam da produção de uma condição
humana subalterna da maior parte da população para o benefício próprio e a manutenção
do “exclusivismo de classe” (FERNANDES, 2005, p.360).
O material usado, no dizer de nosso autor, a “instância empírica” (FERNANDES,
1972, p.3), é a própria obra do autor que nos fornece um aparato analítico e interpretativo
a respeito dos impeditivos do desenvolvimento no Brasil. Para isso nos pautaremos nos

12 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap6
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conceitos desenvolvidos por Florestan e da perspectiva de “longa duração” propostas por


ele para a delimitação de um arcabouço analítico-crítico e coerente a respeito das limitações
do desenvolvimento no Brasil.
Os resultados demostram que a análise de Florestan a respeito do desenvolvimento
socioeconômico denuncia a existência de um traço cultural “autoritário”, “reacionário” e
“conservador” (FERNANDES, 1979a, p.53). Este conjunto tem impedido historicamente a
radicalização democrática e nutrido uma sociedade civil “não civilizada” (FERNANDES, 2006.
p.87) e um sistema jurídico que se comporta mais como aparato formal do que uma instância
de efetivação de direitos baseados no pacto democrático (FERNANDES, 1989a, p. 51). Neste
último aspecto, situa a cultura política brasileira como distante do que Nunes (1994, p.33-
34) chamou de “universalismo de procedimentos”, ou seja, manifestamos uma “gramática
política” cujo exercício efetivo da cidadania encontra-se ligado ao lugar de classe.
Dito isto, salientamos que o percurso explicativo a ser seguido encontra-se em três
tópicos principais, ou seja, (I) a interpretação de Florestan Fernandes a respeito da formação
social brasileira e suas implicações para o desenvolvimento; (II) a crítica direcionada à
burguesia nacional que optou pela interrupção da “revolução democrática” e, por último;
(III) questões salientadas por Florestan Fernandes a respeito das peculiaridades do
desenvolvimento (sócio) econômico no Brasil.
Este percurso cumpre o objetivo de demonstrar que, no Brasil, existe uma cultura de
dominação política e econômica que apartou os objetivos de desenvolvimento social dos
projetos e ações em prol das classes econômicas do país. Assim, ao bel-prazer de ideologias
de cunho conservador e autoritário, o país enfrenta taxas de desigualdade em diversos
aspectos – econômicos, sociais, políticos, culturais, educacionais – (FERNANDES, 1989b,
p.89; 2005, p.233; 2010, p.236; 2011, p.235; 2014, p.47; 2015a, p.33), sem, com isso, privilegiar
um esforço de ampliação de oportunidades e equidade ou, nos termos de Mészáros (2008,
p.47), a busca de vias “para além do capital”.

REFERENCIAL TEÓRICO

O conceito de desenvolvimento não é consenso entre os campos de conhecimento


onde é comumente aplicado – economia, sociologia, educação, política, administração
pública, entre outros –, neste sentido, situaremos este conceito, primeiramente, na realidade
histórica da América Latina. Essa delimitação importa para salientarmos as dinâmicas do
capitalismo que, em termos globais, evidencia-se pela desigualdade de condições de troca,

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de desenvolvimento tecnológico e de poder no que tange às relações internacionais. Por


isso, partimos da concepção de desenvolvimento que, ao invés de se deter ao conteúdo
estritamente econômico, salienta a importância do social, ou seja, o que foi designado de
“desenvolvimento à escala humana” (DOMÍNGUEZ; CARIA, 2019, p.62).
Essa perspectiva teórica busca superar o economicismo como sinônimo de
desenvolvimento, principalmente, tendo o Produto Interno Bruto – PIB – como parâmetro
para a produção de riquezas e de desenvolvimento humano (FURTADO, 1974, p.408). Assim
essa concepção rasteira e rasa de desenvolvimento foi chamada de “mito”, ou seja, uma
espécie de falácia que não considera os impactos ambientais e, muito menos, as necessidades
humanas como elementos norteadores das práticas econômicas.
Essa leitura torna-se imprescindível para a localização e especificidade do
desenvolvimento em países como o Brasil onde vigora uma ideologia das classes comerciais
e políticas que associa balança comercial com desenvolvimento e/ou os índices do PIB
com a ampliação da qualidade de vida da população. Estes indicadores escamoteiam as
contradições internas, as verdadeiras divisões que fazem com que a riqueza siga certo fluxo
de classe (SOUZA, 2018, p.12; BARBOSA; SOUZA; SOARES, 2020, p. 11).
As pesquisas recentes sobre a distribuição de renda no Brasil, as desigualdades
educacionais (CORBUCCI, 2014, p.19), as desigualdades de participação política e
associativismo (AZEVEDO; RIBEIRO; SANTOS JÚNIOR, 2012, p.50) e as desigualdades de
acesso à saúde (VIEIRA, 2020, p.15) têm confirmado a insuficiência dos dados do PIB como
parâmetro para a concepção de desenvolvimento necessária para países de economia
periférica, de passado colonial e escravocrata.
Este quadro aponta para a necessidade de parâmetros de desenvolvimento que
ultrapassem a ideia superficial de PIB em direção a uma concepção que se coloque como
“para além do capital” (MÉSZÁROS, 2008, p.51). “Além do capital” não significa desprivilegiar
o âmbito econômico e sua importância para as economias nacionais da periferia e
suas populações, mas sim, associar a estas outras necessidades indispensáveis para o
desenvolvimento humano pleno – em termos culturais, políticos, bem-estar, educação,
entre outros.
Esta delimitação também privilegia a ruptura de uma roupagem democrática e
de certo formalismo jurídico em prol da efetividade, ou seja, do “capitalismo histórico”
(WALLERSTEIN, 2001, p.18), ou seja, que o desenvolvimento e o Estado Democrático de
Direito seja, antes de tudo, uma realidade experimentada no mundo da vida pela população.

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Sem isso, o que chamamos de desenvolvimento não passa de uma retórica capitalista cuja
finalidade serve para justificar o status quo e a manutenção de uma estrutura excludente e
descomprometida com o reconhecimento da humanidade dos mais vulneráveis da escala
socioeconômica.
Este é o quadro histórico tratado por Florestan Fernandes em diversos momentos
da história recente brasileira, o qual buscou denunciar e combater com rigor crítico além
de, muitas vezes, participação em atos contra as ações excludentes e ideologicamente
comprometidas com as elites brasileiras; por isso suas análises se fazem importantes e atuais
para o entendimento de questões que ainda se fazem empecilhos para o desenvolvimento
econômico e social no Brasil. Sua interpretação preza pela valorização de um passado que
ainda vigora com desdobramentos para o Brasil contemporâneo (FERNANDES, 2005, p.409-
410; 2008, p. 421; 2010, p.245; 2011, p.178).
Acrescentamos a estes elementos a existência de uma gramática política que, em
sua maior intensidade, manifesta-se estranha ao “universalismo de procedimentos” (NUNES,
2004, p.35). Assim, o desenvolvimento é freado por uma cultura marcadamente personalista
no que tange às instâncias deliberativas do aparelho estatal. Esta característica, quando
não hegemônica, manifesta a relação entre as classes organizadas – de cunho privatista
– e a defesa de seus interesses através de representantes políticos por elas financiados
(FERNANDES, 1966, p.131).
Por último, mas não esgotando as conexões analíticas de Florestan Fernandes no
que tange ao tema do desenvolvimento socioeconômico, podemos citar a existência de
uma “retórica da intransigência” (HIRSCHMAN, 2019, p.19). Nesta, as mudanças em prol do
desenvolvimento humano são combatidas pelas classes conservadoras através de um discurso
que aponta para a “perversidade”, “futilidade” e “ameaça” de políticas de caráter distributivas.
Nestes termos, tratar de desenvolvimento no Brasil é considerar um embate que
ultrapassa a mera distribuição de renda e/ou, como já foi citado, o bom desempenho do PIB.
Esta questão entrelaça-se com disputas ideológicas, de classes, de culturas administrativas e
políticas enraizadas na condução do Estado e de suas políticas e, além de tudo, principalmente
com o desenvolvimento dos meios de comunicação e redes sociais, uma batalha contra
informações descabidas e falsas a respeito do conceito de desenvolvimento econômico
e social. Por isso, ressaltamos certa complexidade e, sem incorrer em anacronismos,
consideramos que a obra de Florestan pode nos fornecer elementos explicativos deste
campo de estudos.

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Neste quadro, reiteramos que os objetivos deste trabalho se encontram na


evidenciação de um conceito de desenvolvimento que valorize o elemento humano e
suas diversas dimensões como importante para sua existência (SCHELER, 2008, p.51), se
não plena, ao menos, o mais próximo possível desta condição. Além disso, salientar a
crítica de Florestan Fernandes com um elenco de questões pertinentes para entendermos
as especificidades do desenvolvimento brasileiro e a difusão de uma concepção de
desenvolvimento aquém das necessidades da maioria dos brasileiros.

PROCEDIMENTO METODOLÓGICO

No campo de estudos do Pensamento Social Brasileiro, assim como em demais


campos cujos objetivos se concentram no âmbito teórico, a “instância empírica” de análise,
no dizer do próprio Florestan Fernandes (1972, p.3-4), é a própria obra e/ou conjunto de
obras dispostas para análise. Neste sentido, a própria natureza deste campo de estudos,
dedica-se a uma análise bibliográfica dos principais trabalhos do autor sobre o tema.
Deste conjunto evidenciamos os principais conceitos, críticas e seus
direcionamentos para a compreensão das raízes do subdesenvolvimento no Brasil
e, além disso, para demonstrar que este não pode ser considerado sanável através de
indicadores estritamente econômicos. Como bem demonstraremos a seguir, para que
seja evidenciado “histórico” desenvolvimento (WALLERSTEIN, 2001, p.37), exige-se que
a população experimente, em sua maioria, condições de dignidade em várias instâncias
existenciais. É o que demonstraremos em nosso percurso explicativo e analítico.

FORMAÇÃO SOCIAL BRASILEIRA

Na área das Ciências Sociais no Brasil, o campo de estudos denominado de


“pensamento social brasileiro” abriga uma gama de autores que contribuíram para a
compreensão dos principais dilemas do Brasil. Assim, os chamados “intérpretes do Brasil”
(PERICÁS; SECCO, 2014, p.10-11) abordam os dilemas, questões e práticas que, de modo
geral, podemos denominar de interpretações clássicas.
Este termo, no dizer de Alexander (1999, p.24), corresponde aos trabalhos
sociológicos que suplantaram seu tempo e servem de ponto de partida para a reflexão
a respeito de seus respectivos campos de contribuição e, consequentemente, de
interlocutores para as novas abordagens e os avanços interpretativos. Neste quadro, se

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encontra a interpretação de Florestan Fernandes, ou seja, de um “clássico” que suplantou


seu tempo e ainda interroga a sociedade atual a respeito de suas “questões”.
Florestan Fernandes, no tocante à formação social brasileira, apresenta uma
interpretação que enfatiza o passado escravocrata e seus desdobramentos para o Brasil
contemporâneo. Neste sentido, aponta que as rupturas com as mudanças institucionais
nunca foram completamente realizadas, ou seja, dos períodos Colônia, Império e República,
nunca houve uma total ruptura institucional devido à existência de uma estrutura social
deficitária e de uma elite orientada para a manutenção das desigualdades como forma de
sobrevivência e autopreservação (FERNANDES, 2005, p.361; 2008b, p.185).
Em um de seus trabalhos mais significativos, Florestan Fernandes (2008, p.10) aborda
a questão da integração da população negra no Brasil pós-abolição. Neste estudo de fôlego,
demonstrou que, apesar do formalismo constitucional apontar para uma igualdade perante
a Lei – social, econômica, cultural, política e simbolicamente –, essa configuração não
passou de uma falácia discursiva cujo fim foi apresentar o Brasil como sociedade moderna;
no entanto, na prática, isso não passou de formalismo.
O mesmo ocorreu com o processo de formação da “ordem competitiva burguesa”
(FERNANDES, 2005, p.361), onde as classes dominantes, em condições de aprofundarem a
dominação burguesa como paradigma de dominação e “gramática política” (NUNES, 2004,
p.12), preferiram a manutenção de uma relação de dependência em relação ao Estado.
Para Florestan Fernandes, a revolução burguesa no Brasil se fez através da consolidação do
“Estado Autocrático-Burguês”.
Este se caracteriza pela concentração de forças das elites dominantes em diversos
setores – agrário, exportador, financeiro, político, industrial, entre outros –, onde seus
objetivos são operacionalizados como prioridade através dos mecanismos de legitimidade
burguesa da organização político-institucional (FERNANDES; 2005, p.374; STOPPINO, 1998,
372). Neste sentido, Florestan Fernandes salienta que as mudanças institucionais ocorridas
ao longo da história política do Brasil se caracterizam pela existência de um lastro, ou seja,
continuidades que afetam o presente e a plenitude das forças democráticas no país.
A formação social brasileira é assim marcada por desdobramentos oriundos de seu
passado escravocrata (FERNANDES, 2008a, p. 7; BASTIDE; FERNANDES, 2008, p.11); pela
cultura do bacharelismo como forma de distinção social, e o descomprometimento com o
desenvolvimento e democratização da educação e da ciência (FERNANDES, 1966, p.24; 1975,
p.12; 1984, p.27; 1989, p.13), pela existência de uma cultura política autoritária e violenta

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quanto aos direitos de contestação e reivindicação (FERNANDES, 1979, p.7) e, entre outros
fatores; pelo formalismo constitucional, cuja ressonância das leis e direitos formais não são
facilmente experimentados pela maior parte da população (FERNANDES, 1989, p.10).
Por isso Florestan Fernandes (2010, p.11) fala de um “circuito fechado”, ou seja, da
existência de uma estrutura social autoritária e contrária aos elementos constitutivos dos
privilégios das classes dirigentes e, logo, do Estado Autocrático-Burguês. Essa perspectiva
deixa o país no que denominou de “compasso de espera”, ou seja, em um constante estado
de expectativas que na realidade “histórica” (WALLERSTEIN, 2001, p.9) não se realizam e/ou
se concretizam com inúmeras inconsistências.
Esta via interpretativa, embora pareça um circuito fechado, é, ao contrário,
empregada por Florestan Fernandes como ponto de partida para embasar e justificar
a “contestação necessária” (FERNANDES, 2015b, p.16). O autor apresenta uma série de
exemplos históricos de pessoas que ousaram contestar as estruturas através de uma
práxis revolucionária, contudo, estes exemplos não seriam possíveis sem uma leitura da
dominação, da formação e reprodução das desigualdades, a identificação dos formalismos
constitucionais e políticos, entre outros fatores já citados.
Compreender a formação social brasileira e como suas configurações contribuem
para a manutenção do status quo das classes historicamente privilegiadas é, para Florestan
Fernandes, imprescindível para que as forças contestadoras (2015b, p.33) possam atuar.
Além disso, o autor alerta a respeito de uma preocupação muito pertinente, afirmando que
o intelectual deve estar em contato com a realidade social, com os acontecimentos, com o
mundo e deve seguir de forma crítica a regra de constituição de uma boa práxis, ou seja,
reflexão-ação-reflexão, sem dispensa da “autocrítica” (ANDERSON, 1985, p.13-14).

A “REVOLUÇÃO TRAÍDA”

Outro importante ponto desenvolvido por Florestan Fernandes em sua sociologia


encontra-se no conceito de “revolução traída” o qual, sinteticamente, o autor salienta que
a burguesia brasileira abdicou historicamente do que ele denomina como “radicalismo
burguês” (FERNANDES, 2014, p.38). Este ponto é importante, primeiramente, por evidenciar
sua leitura marxiana e marxista-trotskista com a qual realiza uma interpretação da
acomodação burguesa que, de classe revolucionária, passou a ser uma classe conservadora.
Essa análise foi elaborada através de experiências históricas no século XIX e XX,
considerando respectivamente as influências teóricas anteriormente citadas. Marx (1985,

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p.329) evidencia essa “tragédia” burguesa que logo se transformou em “farsa”, principalmente,
pela interrupção do movimento de aprofundamento da dominação burguesa e do avanço
das contradições, cuja expectativa seria aproximar as sociedades europeias do socialismo e
consequentemente do comunismo.
Com Trotsky (2007ª, p.62; 2007b, p.8-9) a “revolução permanente” logo se transformou
em “revolução traída” pela acomodação burocrática que ganhou as lideranças do Partido
Comunista Soviético, principalmente depois da ascensão de Stalin (1922-1953). Neste quadro,
os avanços conquistados e que visavam à ampliação da participação dos trabalhadores do
controle dos processos sociais e da produção da vida em suas variadas instâncias, foram
reduzidos a um período marcado por perseguições políticas e assassinatos.
Estas experiências históricas ganharam um tom marcante na sociologia crítica,
principalmente, pelo fato de anunciar a farsa burguesa na sociedade brasileira (FERNANDES,
2005, p.350; 2010, p.149; 2011, p.157). Os esforços para ampliação da dominação burguesa,
para Florestan Fernandes, não passaram de ajustes para a manutenção da integração da
economia nacional ao comércio internacional. Isso levou a burguesia nacional a um estado
de acomodação histórica e de ruptura com os avanços democráticos.
No dizer de Wallerstein (2001, p.38), essa postura das elites evidencia a busca pela
manutenção de uma sociedade de retórica moderna, contudo, no que tange à realidade
experimentada cotidianamente para a maior parte da população, isso não passa de uma
falácia burguesa. O capitalismo assim é desenvolvido menos pelas frações burguesas
e seus próprios capitais, bem como, de maneira mais geral, pelo uso do aparelho estatal
como mediador e, até mesmo, financiador dos interesses de classe destas elites dirigentes
(FERNANDES, 2008c, p.60-61).
Assim, a concepção de uma “revolução traída” passa por evidências como a existência
de uma estrutura socioeducacional altamente excludente (FERNANDES, 1966, p. 36; 1989,
p.79), pela marginalização da população negra e pelo descaso com sua efetiva inclusão
nos espaços de deliberação e decisão (FERNANDES, 2008a, p.567; BASTIDE; FERNANDES,
2008, p.200), assim como pela existência de uma valorização das leis – mesmo que estas
não possuam ressonância no mundo da vida (FERNANDES, 1989a) –, além disso, afirma
Florestan Fernandes (1994, p.11) que:

As classes burguesas nativas, como sócios menores, tinham de contentar-se


com parcelas menores e decrescentes do bolo. Em consequência, perdiam
as condições de conduzir-se como uma “burguesia conquistadora” e, se
possuíam força militar e poder para reprimir e oprimir as massas populares

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e as classes trabalhadoras, não podiam realizar as tarefas históricas típicas


das reformas e revoluções capitalistas. Em ocasiões de perigo extremo,
recorriam à ditadura civil, militar ou civil-militar para esmagar brutalmente
as ameaças abertas ou veladas dos de baixo. (...) A descolonização manteve-
se como face oculta e congelada; a revolução nacional e democrática foi
afastada do cenário; e a violência organizada passou a mostrar o quanto ela
continha de supranacional ou de internacional.

Florestan Fernandes demonstra claramente este aspecto da cultura burguesa


brasileira, ou seja, a busca pela manutenção de seu domínio através de uma estrutura
de modernização controlada e limitada. Neste sentido as forças produtivas, as inovações
tecnológicas, a ciência, educação, as condições de trabalho e todo o aparato de direitos que
rege a relação capital-trabalho, entre outros elementos presentes nos modelos de Estado
Democrático de Direito, devem ser assimilados com ressalvas (FERNANDES, 1979a, p.25;
2014, p.24).
Esta “traição” para Florestan Fernandes (1989a, p.146) se manifesta através de uma
cultura autoritária e, em muitos casos, violenta com a população humilde e pobre que
busca, através de movimentos de contestação, a efetividade “histórica” de seus direitos
(WALLERSTEIN, 200, p.65). Quando forças políticas progressistas conseguem, por qualquer
motivo ou conjunto de fatores, atravessar essa blindagem conservadora, a face violenta
das classes conservadoras ganha força através de manifestações reacionárias e, até mesmo,
ditatoriais (FERNANDES, 2014, p. 40; 2015a, p.30).
A revolução burguesa no Brasil é assim um ponto de inflexão para o desenvolvimento
da efetividade democrática, visto que as condições sociais de existência demonstram que os
direitos e as condições que caracterizam os Direitos Humanos e a própria humanidade não
são válidos para todos. Entre os “iguais” o reconhecimento de cidadania e de democracia
impera como intensa solidariedade de classe e de reconhecimento. Por outro lado, no que
concerne à população pobre, as condições de trabalho, educação e reconhecimento não
são as mesmas, seus direitos são burlados pala mesma falsa legitimidade burguesa que usa
a roupagem democrática para dissimular as demarcações entre os cidadãos efetivos e os
cidadãos apenas no discurso (FERNANDES, 1989a, p.192; 2014, p.45).
Para Florestan Fernandes (1994, p.99), estes fatores, longe de paralisarem a luta por
direitos e sua efetividade histórica, servem como justificativas de que a condição formalista
da realidade democrática enfrentada pela maioria dos homens e mulheres no Brasil necessita
urgentemente de ajustes. Por isso, através desta constatação, faz-se necessário a revogação

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do contrato social pseudodemocrático em prol de mudanças que possam, no mínimo,


assegurar a condição de dignidade para cada brasileiro; ou seja, a revolução democrática,
paralisada pelas classes conservadoras, necessita ser retomada tendo como horizonte o que
chamou de “radicalização democrática”.

DESENVOLVIMENTO (SÓCIO) ECONÔMICO

Para Florestan Fernandes (1994, p.9), “o ‘desenvolvimento econômico


autossustentado’ exige certos requisitos sociais ou premissas históricas” que não podem ser
simplesmente transplantados e/ou assimilados. Neste sentido os elementos constitutivos
do subdesenvolvimento não são simplesmente conjunturais, mas sim, frutos de um
processo histórico longo, cujo estabelecimento contribuiu para uma cultura política das
elites nacionais.
Essas elites possuem uma peculiaridade em relação a sua atuação que contribui
fortemente para a manutenção da condição subalterna do capitalismo nacional. Para Florestan
Fernandes (1994, p.105), houve uma interrupção do que chamou de “revolução nacional”,
assim, a formação do capitalismo industrial no século XX e as mudanças modernizantes
realizadas em termos de política econômica foram, no máximo, uma estratégia para uma
readaptação dentro do sistema econômico internacional (FERNANDES, 2005, p.348-349).
Neste sentido, a transição de uma economia majoritariamente agroexportadora para
uma economia industrial e de serviços, apesar de consideráveis mudanças em termos de
“dominação” burguesa (WEBER, 2003, p.187), não logrou aprofundar tal modelo que, além
da dimensão econômica, traz em si o “radicalização” democrático-burguês (FERNANDES,
2011, p.32; 2014, p.18). Esta acomodação burguesa (MARX, 1985, p.338) é apontada por
Florestan Fernandes (2005, p.361; 2010, p. 158; 2014, p.54) como um dos principais fatores
da não expansão do desenvolvimento socioeconômico no Brasil.
Florestan Fernandes (2005, p.410) apresenta um comportamento dúbio em relação
às elites nacionais, onde estas atuam através de uma dinâmica “interna” e “externa”.
Externamente, as elites absorvem as transformações causadas pela reestruturação produtiva
e os demais elementos necessários para manter a integração ao mercado internacional. Já
internamente, a manutenção de uma estrutura social marcada pelo exclusivismo de classe
permanece um dos grandes fatores de controle e de limitação do desenvolvimento.

Nada como os “velhos empresários” com suas limitações intelectuais


para esclarecer aos novos empresários sem estas limitações: o que estes

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querem é realizar o mais depressa possível o processo de aceleração da


incorporação, adotando a racionalidade da produção capitalista que
criaria um fluxo de duas mãos, um vaivém, da economia brasileira para a
economia internacional. Há também uma ausência de projeto econômico
porque, no essencial, este vem pronto e acabado de fora, como os pacotes
de tecnologia, de educação, etc. (FERNANDES, 1994, p.180).

Neste quadro de longa duração o desenvolvimento tem sido limitado e manipulado,


dado que este conceito não assumiu no Brasil a importância de um objetivo com status de
projeto de sociedade. Apesar de Florestan Fernandes (2005, p.382; 2008c, p.149) salientar
algumas especificidades regionais em relação ao desenvolvimento – constatação que ele
não se aprofundou –, em termos nacionais, as elites nacionais não se propuseram o papel de
aprofundar a revolução nacional.
O que temos como característica histórica de nossas elites é um comportamento
dúbio que faz somente o necessário para não desconectar completamente a economia
nacional do sistema capitalista global. Assim, a ideia de desenvolvimento ganhou contornos
estritamente econômicos, ou seja, no Brasil, o sinônimo de desenvolvimento tem sido
atribuído à balança comercial favorável. Esta concepção de desenvolvimento economicista
escamoteia as profundas fissuras impeditivas do “desenvolvimento autossustentado”
(FERNANDES, 1994, p.9).
Para Florestan Fernandes (2014, p.146-147), sem o avanço das relações sociais-
democráticas, será cada vez mais distante a efetividade democrática devido a discrepância
entre a efetividade histórica e a retórica da dominação burguesa. Na primeira, a maior parte da
população consegue experimentar os avanços sociais, econômicos, culturais, educacionais
e simbólicos produzidos pela sociedade. Por outro lado, em termos de ideologia e retórica,
simplesmente tem-se a evocação de fundamentos e ideias que ficam no campo das ideias
para a maior parte da população, entre estes, podemos citar a ideia de igualdade, dignidade,
humanidade, liberdade e identidade.
Para Florestan Fernandes sem a “radicalização democrática” que, segundo ele,
ganharia efetividade histórica através da democratização da educação (FERNANDES, 1966,
p.337), a democratização dos espaços políticos e decisórios (FERNANDES, 2014, p.223), a
democratização das relações raciais e a abolição de suas “mistificações” (FERNANDES,
2008a, p.427), a democratização das relações de trabalho e da dignidade do trabalhador
(FERNANDES, 2008b, p.19), enfim, sem estes elementos a ideia de desenvolvimento como
projeto de sociedade dificilmente ganhará contornos históricos.

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Florestan Fernandes salienta que até mesmo a Constituição de 1988, considerada por
muitos como “Constituição Cidadã”, é incapaz de gerar qualquer alteração histórica sem que
haja uma mudança da “condição humana” no Brasil (FERNANDES, 2014, p.105). Enquanto
houver tratamento diferenciado para a população negra e pobre, enquanto o trabalhador
continuar sendo visto como um escravo, enquanto a estrutura educacional for excludente
com os mais humildes, enquanto os “miseráveis da terra” continuarem servindo de oceano
para ilhas de privilégio, não podemos considerar que alcançamos o desenvolvimento.
As críticas de Florestan Fernandes são impressionantemente atuais e se nos
valermos dos últimos dados do Instituto de Pesquisas Aplicadas – IPEA – veremos que
boa parte dos elementos abordados continua em situação deplorável em termos de
desenvolvimento (SOUZA, 2018, p.5; BARBOSA; SOUZA; SOARES, 2020, p.29; AZEVEDO;
RIBEIRO; SANTOS JÚNIOR, 2012, p.40-41; VALADARES; SILVEIRA; PIRANI, 2017, p.162-163 );
ou seja, renda, educação, participação política e acesso à propriedade da terra, para ficar
entre os principais, ainda são “questões” sem solução no Brasil.
Neste sentido podemos situar que os entraves do desenvolvimento econômico
no Brasil, antes de o associarmos ao âmbito estritamente econômico, perpassa, segundo
Florestan Fernandes (2005, p.233; 2010, p.122; 2011, p.235; 2014, p.141), uma série de
dimensões sem as quais o desenvolvimento não passa de uma anedota. Estes são os pilares
que devem ser construídos com a humanização das relações, ou melhor, com a perspectiva
de desenvolvimento que contemple um “novo homem” (FERNANDES, 1979b, p.112).
Esta perspectiva salienta que a dignidade humana é essencial para a construção
de uma sociedade de igualdade de oportunidade, onde não haja distinção por cor e/ou
classe social, discrepâncias educacionais e culturais. Florestan Fernandes (1979b, p.143)
salienta que o humanismo como caminho histórico pautado sobre a democratização das
oportunidades não significa o fim da pobreza ou das desigualdades, mas sim, a garantia da
dignidade. O desenvolvimento começa assim por essa garantia fundamental sem a qual não
cabe apregoarmos avanços econômicos enquanto não houver avanços humanísticos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A proposta de apresentar os desafios do desenvolvimento em uma sociedade com as


características e conformações históricas do Brasil foi obtida através de uma perspectiva de
análise crítica proposta neste trabalho. Neste sentido, a análise de Florestan Fernandes foi

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salientada como importante e atual para desvendar as estratégias ideológicas que associam
desenvolvimento a indicadores como o PIB, por exemplo.
Além disso, no que tange aos tópicos utilizados para o desenvolvimento da análise
proposta, estes cumpriram seu papel em evidenciar outras “dimensões” (SCHELER, 2008,
p.87-88) da existência humana, sem as quais, não podemos pensar em desenvolvimento.
Por isso este trabalho também se prestou ao papel de ampliar a compreensão do conceito
de desenvolvimento que, para além das definições economicistas, necessita incorporar
efetivamente a ideia de humanidade e os elementos necessários para a sua existência o
mais próximo possível da plenitude.
Outro ponto que vale a pena ressaltar é que, ao contrário do que dizem muitas
vertentes conservadoras, em sociedades com as características de desigualdade como a
brasileira, “conservar” torna-se uma afronta à própria humanidade, ou no dizer de Florestan
Fernandes, um desrespeito à “condição humana”. Esta, quando entendida em sua plenitude,
deixa claro o quanto ainda precisamos melhorar enquanto sociedade para chegarmos a ter
o que “conservar”.
Assim, mesmo que tenhamos hegemonias conservadoras, estas somente alcançarão
estabilidade após a efetivação dos preceitos e necessidades humanas mais básicas ganharem
corpo e materialidade na vida da maior parte da população. Enquanto isso não acontece,
vivemos uma história de ondas antidemocráticas (FERNANDES, 1979a, p.53; 2014, p.131)
que não se sustentam pela mesma inconsistência com que se materializam.
Enquanto essa dinâmica ocupa o tempo histórico brasileiro e demonstra uma das
dimensões das tensões sociais existentes em nossa história, de forma crítica devemos
manter os punhos levantados pois a cultura autoritária continua destilando seus ideais,
na maior parte das vezes, silenciosamente (ADORNO, 1995, p.119). Por isso, devemos
manter o compromisso de desmistificar anedotas e falácias sobre o desenvolvimento
socioeconômico, principalmente, quando estes não estiverem comprometidos com a
radicalização democrática e com a inclusão à condição de dignidade dos mais vulneráveis
da escala social.
Nestes termos, o debate se faz urgente como forma de nortear e de combater
qualquer forma de desleixo em relação aos cuidados com a humanidade e com a promoção
de condições verdadeiramente humanizadas de existência. Enquanto mantivermos índices
de concentração de riquezas e de todos os bens produzidos pela sociedade – materiais,
simbólicos, culturais –, a crítica e a desconstrução de ideologias conservadoras do
desenvolvimento permanecerão necessárias, importantes e atuais.

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comparativa entre Brasil e Coreia do Sul (1995-2017)13
Vinicius Melo Araújo (1)
Camila do Carmo Hermida(2)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6907-6730; Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade –
Universidade Federal de Alagoas/Pesquisador, BRAZIL, E-mail: viniciusaraujo.2013.va@gmail.com;
(2)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7206-5132; Programa de Pós-graduação em Economia Aplicada –
Universidade Federal de Alagoas/Professora, BRAZIL, E-mail: camila.hermida@feac.ufal.br;

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

Em 2015 se iniciou uma das maiores crises da história econômica do Brasil e dentre
os fatores conjunturais que contribuíram para essa desaceleração da economia brasileira
estão os choques cambiais, com 50,0% de desvalorização do real; taxa de juros básica da
economia (Selic de 14,25% a.a.); e de alinhamento de tarifas públicas com controle de preços
administrados, que se traduziram em um aumento de 10,7% no IPCA de 2015 (BACEN, 2015).
A dificuldade de retomada da economia brasileira no período recente somada à conjuntura
advinda com a pandemia da Covid 19 denota a importância de se debater as limitações e
dificuldades estruturais enfrentadas pelo Brasil para seu desenvolvimento econômico.
Sobre isso, destacam-se as contribuições da teoria desenvolvimentista para o debate
sobre o desenvolvimento econômico das economias latino-americanas. Uma das teses
que melhor sintetiza o corpo teórico desenvolvimentista é a “Tese Prebisch-Singer”, ou
“Teoria da Deterioração dos Termos de Troca”, a qual busca explicar as dificuldades para o
desenvolvimento econômico enfrentado pelas economias periféricas – principalmente as
latino-americanas.

13 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap7
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Segundo essa tese, a medida dos termos de troca é fundamental para explicar
o atraso das economias subdesenvolvidas e em desenvolvimento, já que esses países
não conseguem nem mesmo manter os ganhos conquistados em seus níveis salariais e
em seus valores de exportações pelo baixo valor agregado e elasticidade dos bens que
exportam. Dessas perdas em balanças comerciais é que se explicariam os problemas
econômicos internos dessas economias – a periferia econômica mundial –, pois, para
compensar esses constantes déficits e perdas de ganhos em comércio internacional,
necessitam recorrer à conta de capital, o que implica em juros altos (consequentemente
baixos investimentos e aumento de serviço da dívida). Isso, por sua vez, causa um déficit
em contas governamentais (por conta de baixa arrecadação), financiamento da dívida
nacional e monetização da dívida, causando, por exemplo, os problemas inflacionários
vistos na economia brasileira. Ademais, acentua-se o processo de desindustrialização
nacional, por não haver incentivos a sair do gargalo infraestrutural que se tem para
promover a industrialização (PREBISCH, 1949).
Nesse contexto, buscaremos verificar por meio dessa abordagem teórica se essas
condições desfavoráveis dos países periféricos ainda permanecem para o Brasil e em que
medida se sustentam no período entre 1995 e 2017. O objetivo geral deste trabalho é verificar
a permanência ou não da deterioração dos termos de troca da economia brasileira nesse
contexto de depressão econômica recente, utilizando a experiência desenvolvimentista
sul-coreana de maneira comparativa. Este trabalho contribui para a literatura ao tratar da
discussão sobre políticas de desenvolvimento por meio de um estudo comparativo entre
o Brasil e a Coreia do Sul no período recente. Além disso, no campo político, contribui por
tratar de entraves para o desenvolvimento econômico do país.
Metodologicamente o artigo pode ser classificado como dedutivo e exploratório
de natureza qualitativa, em sua análise comparativa histórica, e quantitativa, na medida
que utilizará dados secundários conjunturais das duas economias supracitadas. Ele está
dividido em três seções, além desta introdução e das conclusões. Na primeira seção será
exposto o referencial teórico baseado na formulação originária da tese Prebisch-Singer.
Na segunda seção é realizado um breve estudo histórico-comparativo entre o Brasil e
a Coreia de Sul como método de investigação, identificando semelhanças e diferenças
nos processos de industrialização de ambos os países, considerando seus respectivos
ciclos/período de formação econômica, além do contexto internacional no qual os
países estavam e/ou estão inseridos. Por fim, na última seção, apresentamos uma análise
comparativa desses países com os indicadores mais relevantes à teoria de deterioração

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dos termos de troca, utilizando estatística descritiva com dados obtidos em sites
institucionais internacionais como Banco Mundial, Atlas da Complexidade Econômica e
UN Comtrade.

A TEORIA DE DETERIORAÇÃO DOS TERMOS DE TROCA

A tese de deterioração dos termos de troca (preço das exportações como razão do
preço das importações) está consubstanciada nos trabalhos de Prebisch (1949) e Singer
(1949). A hipótese Prebisch-Singer sustenta que os ganhos de comércio são distribuídos
de forma desigual, o que causaria a não equalização de remuneração, principalmente, do
trabalho entre centro (países avançados) e periferia (países subdesenvolvidos).
Com relação ao entendimento da tendência de deterioração dos termos de
troca, o primeiro ponto relevante é a compreensão de como os ganhos econômicos se
distribuem na economia. Progressos tecnológicos e ganhos de produtividade são refletidos
em ganhos reais, sendo estes possibilitados por duas formas: incrementos de renda ou
queda de preços. Quando se considera que as economias estão abertas para o comércio
internacional, consumidores e produtores são duas classes que podem estar em regiões
geográficas distintas, por exemplo, os países subdesenvolvidos são o mercado consumidor
que importam bens duráveis produzidos por capitalistas industriais que estão em países
desenvolvidos (PREBISCH, 1949).
Considerando que os países periféricos necessitam de uma maior inserção
internacional para se promoverem economicamente, o progresso tecnológico nos países
subdesenvolvidos é repassado em queda de preços, o que já causaria uma deterioração
dos preços relativos internacionais, e nos países desenvolvidos se reflete em aumento de
remuneração dos fatores. Como consequência, temos que os países periféricos tomam
perdas ao distribuir seus ganhos pela queda de preços, afetando seus rendimentos em
trocas internacionais, enquanto os países industrializados tomam vantagem por manter
uma crescente ou estabilidade de preços e distribuindo seus ganhos internamente em
níveis de remuneração (PREBISCH, 1949).
É dessa diferença na forma de distribuição que os países industrializados começam
a ter suas vantagens frente aos países subdesenvolvidos, porque conforme o país tem sua
cadeia produtiva mais especializada em bens finais, os ganhos econômicos são repassados
em ganhos de remuneração dos fatores, o oposto ocorre para os países desindustrializados
focados em commodities.

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Do ponto de vista de Prebisch (1949), é fundamental também correlacionar ciclos


da economia capitalista com o movimento dos preços no mercado internacional. Segundo
o autor, na crescente do ciclo, a procura pelos bens da periferia supera a oferta e o excesso
de demanda tende a se ajustar via preços. O inverso se aplica para a “minguante” do ciclo.
Nesse contexto, há deterioração dos termos de troca em favor da periferia, pois os preços
dos bens primários sobem com maior elasticidade que os bens finais na crescente do ciclo,
mas também caem mais rapidamente na “minguante”. Isso significa que os preços dos
bens finais vão se distanciando do preço dos bens primários. Na crescente cíclica, o centro
transforma seus ganhos em remunerações. Todavia, na minguante cíclica, o aumento de
salários conquistados anteriormente são resilientes a baixas pela força dos sindicatos. Esta
pressão é transmitida para a periferia do sistema e isso se dá porque há concorrência entre
os empresários e pressões sindicais no centro, além de uma melhor estrutura política. Nesse
contexto, Prebisch (1949) explica como os centros industriais conservam os ganhos oriundos
do progresso técnico em suas economias, bem como se colocam em situação conveniente
para colher parte dos frutos do progresso técnico da periferia.
De acordo com Singer (1949, 1978), outros fatores também ajudam a explicar a
relação desfavorável nos termos de troca. Os bens primários possuem uma elasticidade de
preços muito maior do que bens acabados, que leva a flutuações de preços mais acentuadas
do que setores manufatureiros possuindo uma elasticidade de oferta maior. As importações
e exportações impactam acentuando essa volatilidade de preços em períodos cíclicos,
causando desequilíbrios nas contas externas, porque o centro tem um poder de monopólio
maior para determinar seus preços e sua oferta.
Prebisch (1949) denota ainda que a elasticidade-renda da demanda dos bens
primários também não é tão elevada quanto a de manufaturas que estão sempre renovando
a estrutura de consumo do mundo, impactando assim no retorno em balança comercial
dos países. Os coeficientes de importação dos países industrializados acabam por cair e
ferem ainda mais os saldos de transações correntes dos países subdesenvolvidos; pois
eles se mantêm ativos no mercado internacional pela necessidade de importar bens de
capital, bem como outros bens de consumo duráveis, e possuem uma forte participação
no comércio internacional por meio de exportação de bens intermediários e primários.
Sendo assim, os ganhos de renda, produtividade, entre outros alcançados pelo resto do
mundo, não são passados para os países subdesenvolvidos, que até certo ponto causaria
uma escassez de dólares nesses países, acompanhada de uma tendência de déficits em
transações correntes.

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Além disso, com a intensificação em tecnologias mais eficientes, há uma


necessidade menor de insumos básicos na indústria dos países desenvolvidos, diminuindo
estruturalmente as exportações nos países periféricos. Logo, essa elasticidade-renda nem
sempre converte os excedentes do comércio internacional em maior consumo para países
que exportam commodities (PREBISCH, 1949).
Singer (1949) mostra que os preços se moveram contra os países exportadores de
bens primários e a favor dos exportadores de bens manufaturados. Isto quer dizer que, de
acordo com esta teoria, os preços dos bens primários mantêm uma tendência secular de
deterioração em relação aos preços dos bens manufaturados. Em resumo, temos que os
países desenvolvidos possuem ganhos ao longo do tempo, dado que em períodos cíclicos
os bens manufaturados possuem uma menor volatilidade de seus preços e uma tendência
mais inclinada de elevação de preços do que os bens primários.
A teoria de Prebisch-Singer causou grande impacto no pensamento econômico
latino-americano por tratar dos efeitos de se exportar bens primários, apresentar
a questão estrutural dual que existia na época e como isso gerava um entrave para o
desenvolvimento econômico da região. Em suma, Prebisch (1949) buscou falsear a
suposição das vantagens comparativas mostrando que, na prática, países exportadores
de bens primários, possuindo baixa elasticidade-renda da demanda e intensos
importadores de produtos manufaturados, enfrentariam empecilhos para equilibrar
suas contas externas. Como dedução da diferença entre elasticidade-renda dos países,
as importações teriam uma tendência de serem maiores que as exportações. De forma
similar, Singer (1949) enxergava a necessidade de modificar o perfil de investimento e
comércio internacional mudando gradualmente a estrutura considerada de vantagens
comparativas dos países subdesenvolvidos.
Uma decorrência importante da tese Prebisch-Singer é que, por meio da
deterioração dos termos de troca, os ganhos do comércio internacional induziriam muito
mais o crescimento da renda em países exportadores de bens manufaturados do que
aqueles exportadores de bens primários. A conclusão do visto é que, surpreendentemente,
a deterioração dos termos de troca ocorreria não apenas pela natureza dos produtos
exportados, mas também pela configuração da estrutura econômica destes países. O
investimento externo de países industrializados em subdesenvolvidos levaria à criação de
economias duais e heterogêneas, onde o setor exportador de bens primários seria mais
moderno e dinâmico, deixando a mercê o arcaico setor doméstico, de baixa produtividade.

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Por fim, a falta de novos setores de atividade, barreiras à imigração (nos países
industrializados) e obstáculos ao processo de industrialização tardio (falta de capital e
geração de novas tecnologias), resultam em abundante mão de obra para as atividades
exportadoras (oferta elástica) e esta competição minaria seus salários. Deste modo, por
conta da dificuldade de organização sindical, os ganhos de produtividade deste setor seriam
transferidos para os preços, e não transformados em renda. Portanto, a tese Prebisch-Singer
é um modelo de interligação entre a estrutura econômica e social e o comércio internacional.
Nessas condições, os caminhos pelos quais os ganhos do comércio conectar-se-iam com
ganhos para o trabalhador são dificultados. A estrutura de má distribuição de renda tenderia
a se reproduzir, mantendo inócuas as vantagens advindas do comércio internacional, vez
que as premissas de oferta inelástica de trabalho e de tecnologia como um bem livre não
seriam satisfeitas (PREBISH 1949; SINGER 1949).

CONTEXTO HISTÓRICO DA ECONOMIA BRASILEIRA E SUL-COREANA

Este trabalho se propõe analisar empiricamente a permanência da tese de


deterioração dos termos de troca descrita na seção anterior para o Brasil comparativamente
à Coreia do Sul no período recente (1995-2017). A escolha desse país se dá como uma forma
de entender o Brasil à luz de uma trajetória contrafactual, visto que ambos são países de
industrialização tardia e implementaram políticas industriais, mas obtiveram resultados
bastantes distintos em termos de desenvolvimento econômico. No entanto, vale destacar as
similaridades e diferenças históricas do processo de formação econômica e industrialização
de ambos. Dessa forma, segue o Quadro 1 que sumariza um comparativo entre o Brasil e a
Coreia do Sul no que se refere ao período pré-industrial, de industrialização e às principais
políticas apontadas na literatura para ambos.
No período de formação econômica o Brasil e a Coreia do Sul tiverem sua inserção no
comércio internacional de forma muito similar. A Coreia teve sua colonização feita pelo Japão
e sendo uma região de conflitos e disputa pelo seu domínio contra a China, principalmente
por ser uma boa região para se investir, sempre manteve seu caráter agroexportador e
tributário para sua metrópole, sendo constantemente explorada economicamente (CHANG,
2002). No Brasil não foi diferente, porém não houve tais disputas territoriais ao nível de
guerra, e o país chegou a se inserir no comércio mundial com a extração de ouro, ainda
enquanto colônia de Portugal (FURTADO, 1959).

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Quadro 1 - Comparativo histórico de Brasil e Coreia do Sul


  Período pré-industrial
  Brasil Coreia do Sul
Economia Agrária de Subsistência (Século XIV –
Ciclo Açucareiro (Século XVI – XVII)
XIX)
Ciclo Aurífero (Século XVIII)
Estrutura Cultivo de Arroz (1910 – 1940)
Ciclo Cafeeiro (Século XIX – 1930)
Econômica Indústria elétrica, têxtil e química (1940 – 1950)
Ciclo da Borracha (1890 – 1915)
Indústria de iluminação (1950 – 1960)
Metal-siderurgia (1930 – 1945)
 
Brasil Colônia (1500 – 1822) Estado Tributário Chinês (Século XIV – XIX)
Estrutura Brasil Império (1822 – 1889) Território japonês (1910 – 1945)
Política Primeira República (1889 – 1930) Separação da Coreia do Sul (1950)
Era Vargas (1930 – 1945)  
Financiamento japonês (1920 – 1945)
Concessões e subvenções (Brasil Império)
Participação da elite coreana (1919 – 1945)
Redução de tarifas de importação (Brasil
Políticas Império) Financiamento japonês (1920 – 1945)
Industriais Intervenção militar americana (1950)
Financiamento americano (Era Vargas)
Cotas e licenças de importação (Era Vargas)  Isenções fiscais e monopólio de preços (1950 –
1960)
  Período de industrialização
Era Vargas (1930 – 1945)
Vargas (1950 – 1954)
Syngman Rhee (1950 – 1961)
JK (1956 – 1961)
Governo militar (1962 – 1988):
Período militar (1964 – 1985):
Estrutura Park Chung Hee (1962 – 1979)
Castelo Branco (1964 – 1967)
Política Chung Doo Hwan (1980 – 1988)
Costa e Silva (1968 – 1969)
Roh Tae Wov (1989 – 1993)  
Médici (1970 – 1974)
 
Geisel (1975 – 1979)
Figueiredo (1980 – 1985)
1º Plano Econômico (1962 – 1966)
1ª Fase do PSI (Era Vargas) 2º Plano Econômico (1967 – 1971)
Políticas
Industriais 2ª Fase do PSI (Juscelino Kubitschek) 3º Plano Econômico (1972 – 1976)
3ª Fase do PSI (Período Militar) 4º Plano Econômico (1977 – 1981)
 
4ª Fase do PSI (Período Militar)   5º Plano Econômico (1982 – 1986)
6º Plano Econômico (1987 – 1991)
Investimento em empresas públicas
Isenções Tributárias
Isenções Tributárias
Estatização dos bancos
Cotas de importações
Prêmios vinculados a Metas
Arrocho Salarial
Fiscais Liquidações e Aquisições de empresas privadas
Reforma no sistema financeiro
ineficientes
Renegociação da dívida interna
Endividamento e financiamentos externos
Endividamento e financiamentos externos
Unificação Cambial
Cotas e desvalorizações cambiais
Foco ainda agroexportador Foco exportador primário
Processo de substituir importações Substituição de Importações
Foco Protecionismo econômico Substituição de Exportações
Exportador  Estruturação do PND I e II Expansão institucional
Planejamento Público-Privado para zonas Especialização de instituições públicas novas
industriais  Política guiada pela elite chaebol
Fonte: Elaboração própria

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Brasil e Coreia começam com um processo de industrialização tardia igualmente


por volta do fim da primeira metade do século XX. A primeira divergência nas estruturas
produtivas dos países começa aqui, majoritariamente pela herança do pós-guerra. Os
coreanos herdam uma capacidade administrativa dos japoneses e a indústria nascente
financiada pelos mesmos com finalidade de expandir sua capacidade produtiva, adquirindo
uma base industrial elétrica e química (AMSDEN, 1989; CHANG, 1993). O Brasil precisou
superar a crise mundial de 1929 e a dependência do café direcionando os excedentes
econômicos desse setor para a industrialização – com algum financiamento americano para
o complexo metal-siderúrgico (FURTADO, 1959; DE PAIVA ABREU, et al., 1989).
Em termos de política econômica, a princípio, os países não destoaram tanto, dado
que o processo de fases de industrialização foi similar com restrições cambiais e comerciais,
promovendo o processo de industrialização e restrição de importações para ser possível
haver a política de substituição de importações (PSI). O que realmente se mostra marcante
é a coordenação e continuidade por parte do processo coreano, muito devido aos longos
mandatos dos presidentes militares na Coreia do Sul, mas também havia diretrizes e contextos
claros para se conduzir a política industrial do país como: os grupos empresariais dos chaebols;
os planos quinquenais; a política de seleção de indústrias; a posterior mudança de foco de PSI
para orientada pelas exportações; entre outras peculiaridades (CHANG, 1993; 2002).
Durante o fim da década de 1970 e ao longo de 1980, destacam-se as dificuldades
econômicas que não se cessavam rapidamente. O Brasil perde todo seu crescimento pujante
do milagre econômico, ficando com uma frágil situação macroeconômica (GIAMBIAGI et al.,
2011), enquanto na Coreia do Sul se enfrentava uma forte recessão na economia, tendo
o primeiro decrescimento econômico após se iniciar sua industrialização tardia na década
de 1960 (CHANG, 1993). Esse contexto ocorre e se perpetua mais à frente, principalmente,
pela crise do petróleo e dos juros americanos, quando os países enfrentaram momentos
de muita fragilidade, devido à necessidade de capital para conclusão de seus respectivos
PSIs. Nesse período as dívidas externas subiram e a dependência do petróleo importado
era alta. Nesse contexto, não era possível que o Brasil ou a Coreia do Sul crescessem sem
endividamento (GIAMBIAGI et al., 2011). Ademais, nesse mesmo momento, tanto a Coreia
do Sul quanto o Brasil enfrentaram um grave momento de instabilidade política: a Coreia do
Sul com o assassinato do seu presidente em 1979 e eleição de um novo presidente em 1980;
o Brasil com o movimento de “Diretas Já” iniciado em 1983.
Internacionalmente é na década de 90 que os países sofrem pressões, inclusive
internas, para abrir o mercado e colocar fim ao protecionismo da indústria local. No entanto,

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diferentemente do caso brasileiro, a Coreia do Sul consegue se tornar competitiva no


contexto mundial.
Em contraponto, o Brasil estava constantemente renegociando seus compromissos
com o Fundo Monetário Internacional, perdendo o foco no seu processo de industrialização
e desenvolvimento, e a Coreia do Sul saldava antecipadamente seus compromissos,
retomando suas elevadas taxas de crescimento (CHANG, 2002; GIAMBIAGI et al. 2011).

ANÁLISE EMPÍRICA E DESCRITIVA DE BRASIL E COREIA DO SUL

Explicitados os elementos teóricos fundamentais que envolvem a tese Prebisch-


Singer e expostos os caminhos históricos trilhados pelo Brasil e a Coreia do Sul, cabe, nesta
seção, uma análise comparativa dos países no que tange, especialmente, aos elementos de
comércio internacional, no sentido de verificar a existência de deterioração dos termos de
troca do Brasil no período recente, especialmente entre 1995-2017. A escolha desse período
se deu pelo fato de ser aquele em que foi possível cruzar as informações em todas as fontes
de dados utilizadas: Banco Mundial, Atlas da Complexidade Econômica e UN Comtrade.14
Ademais, não há estudo comparativo entre essas duas economias na literatura para esse
período recente. Para atingir tal objetivo, foram selecionados apenas alguns indicadores
relacionados aos apontamentos da teoria supracitada, tais como: PIB per capita; Proporção de
trabalho assalariado; Especialização comercial; Pautas de importação e exportação; Saldos
comerciais e suas variações; Participação da indústria no PIB; Capacidade de importação e
Termos de troca.
No Gráfico 1, é possível perceber a divergência que se forma entre a Coreia do
Sul e o Brasil. Coreia apresenta um PIB per capita três vezes maior que o apresentado
pelo Brasil em 2017. O percentual de mão de obra formal superior na Coreia também
demonstra um forte indicador de como se comportaram os ganhos de produtividade
em remuneração dos fatores para a economia industrializada sul-coreana. Os dados
crescentes de PIB per capita da Coreia em paralelo com o percentual de trabalhadores
assalariados comparados com os mesmos dados para o Brasil confirmam um dos
argumentos da tese de Prebisch (1949), a qual explica como uma economia da periferia
não consegue acompanhar os ganhos salariais do centro conforme se tem ganhos de
produtividade e emprego.

14 Entendemos que esse período é relevante ao servir como uma análise ex-post dos efeitos das políticas
industriais de ambos os países (apontados na análise das trajetórias históricas da seção anterior) e ainda ser
um longo período de 23 anos dando contribuições à literatura mais focada na década de 1990.

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Ademais, a taxa acumulada de crescimento do PIB coreano também é maior. A Coreia


do Sul conquistou 171,3% de crescimento do PIB per capita em 22 anos, enquanto o Brasil
conseguiu 72,86%. Nota-se também uma volatilidade menor para a economia sul-coreana,
que se reflete na capacidade de recuperação em períodos de recessão mundial – como em
2009 –, ou interna – como em 2014 para o caso brasileiro e 1998 para o caso coreano.

Gráfico 1 - PIB per capita (US$) e Percentual de trabalhadores assalariados – Brasil e Coreia do
Sul (1995-2017)

Fonte: Elaboração própria a partir de World Bank (2020).

Nos Gráficos 2 e 3, evidencia-se a disparidade dos padrões de especialização comercial


por meio do indicador de vantagem comparativa revelada (VCR). Esse indicador reflete “a
posteriori” as vantagens relativas de custos de diferentes países a partir da eficiência de suas
especializações comerciais, ou seja, o indicador VCR supõe que as diferentes dotações de
fatores resultam em uma estrutura padronizada de exportação. Quando um país tem uma
vantagem comparativa em um produto em relação à economia mundial tem-se um VCR
>1. Notamos que o Brasil possui uma vantagem comparativa revelada para matérias-primas
muito elevada em relação à Coreia do Sul, mas também, é perceptível a queda das VCR do
Brasil para manufaturas (Gráfico 3), enquanto a Coreia do Sul consegue se manter acima da
unidade em todo o período.

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Gráfico 2 - Vantagens comparativas reveladas para matérias-primas – Brasil e Coreia do Sul


(1995-2017)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados de UN Comtrade (2020) em World Integrated Trade Solution
(WITS, 2020).

Gráfico 3 - Vantagens comparativas reveladas para manufaturas – Brasil e Coreia do Sul


(1995-2017)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do UN Comtrade (2020) em World Integrated Trade Solution
(WITS, 2020).

Esses dados refletem de certo modo o nível de desenvolvimento industrial com baixa
competitividade comercial do Brasil – também expresso em produtividade e valor agregado
– que seria justamente o que mede as vantagens comparativas.
A Figura 1 mostra que até 2017 a composição das exportações do Brasil se baseia,
em grande parte, em produtos primários e, no máximo, produtos derivados desses
mesmos, como minério de ferro e produtos de metal-siderurgia, sendo seus principais
demandantes os Estados Unidos e a China. No que tange à pauta de importações do Brasil
em sua maior parcela é composta por: derivados de petróleo, produtos industriais gerais,
veículos automotivos, bens relativos a telecomunicações, máquinas elétricas e fertilizantes.
Curioso atentar para dois fatores: (i) - exportamos petróleo, entretanto importamos seus
derivados; (ii) – importamos muita manufatura, que em sua maior representatividade

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não é transformada em bens de capital, ou importamos bens intermediários como os


fertilizantes, componentes eletrônicos e derivados de petróleo.

Figura 1 - O que o Brasil exporta e importa?

Fonte: Elaboração própria a partir de Atlas of Economic Complexity (2020).

Podemos observar no Gráfico 4 que o saldo final das transações correntes do Brasil
foi sustentável em seus superávits, exceto em 2013 e 2014 com saldos muito próximos de
nulos. Estes dados demonstram a dependência brasileira aos fatores externos para se ter
saldos excedentes, algo que não se sustenta nos períodos de crise externa e quando não se
pode contar com o setor externo para reduzir as perdas das crises internas.
As exportações brasileiras tiveram um crescimento moderado, mas positivo até 99
– o que pode ser explicado pela nova fase de reestabilização da economia. Depois dessa
fase, temos o crescimento consistente do governo Lula, que alguns atribuiriam ao boom
das commodities, seguido por um devido decrescimento em 2009, porém não abalou a
tendência de crescimento mantida até 2011 (também vale salientar a “quase estagnada”
em 2002). Posteriormente, temos uma tendência de queda e manutenção da mesma até
2016, quando temos o impeachment da presidente Dilma e o crescimento é retomado em
2017 com os reajustes austeros na economia e uma suposta melhora nas expectativas do
setor privado.

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Gráfico 4 - Saldo de balança comercial do Brasil (1995-2017)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do UN Comtrade (2020).

Até certo ponto, isso nos mostra como os retornos da economia brasileira estavam
inteiramente ligadas às flutuações do comércio internacional quanto à elasticidade preço-
demanda e renda-demanda dos seus bens primários. Além disso, o fator da queda interna
do PIB também parece ter afetado negativamente os níveis de exportação do país. No
tocante às importações, o comportamento dissonante do volume importado pode estar
relacionado a uma problemática da tese Prebisch-Singer: o quanto as exportações das
periferias impactam sua capacidade de importar, além da problemática das importações
não estarem bem alocadas em bens de capital.
Na Figura 2 apresenta-se a pauta de exportação e importação sul-coreana. Nota-
se nas exportações a presença tanto de automóveis quanto outros meios de transporte,
componentes elétricos, derivados de petróleo, produtos relativos a telecomunicações
e instrumentos óticos. Já a pauta de importação é formada por óleos de petróleo e óleos
naturais, com uma parcela também para componentes eletrônicos, sendo esses três grandes
blocos responsáveis pela matéria-prima e pelas condições de funcionamento da indústria
sul-coreana – no caso, energia e componentes eletrônicos para montagem de outros bens.

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Figura 2 - O que a Coreia exporta e importa?

Fonte: Elaboração própria a partir de Atlas of Economic Complexity (2020).

Seus principais parceiros comerciais são China e EUA, seguidos por Japão e Hong
Kong, que estão como a Argentina para o Brasil na sua lista de parceiros. Os dados de destino
das exportações da Coreia do Sul mostram que ela consegue ter uma penetração muito
mais pulverizada no mercado internacional, dado que tanto países desenvolvidos quanto
subdesenvolvidos demandam seus bens finais.
De forma geral, o saldo comercial coreano sempre foi muito estável, com uma leve
crescente de 2015 em diante (Gráfico 5).

Gráfico 5 - Saldo de balança comercial da Coreia do Sul (1995-2017)

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do UN Comtrade (2020).

Diferente do Brasil, a volatilidade dos saldos comerciais é bem menor, há também


uma melhor constância nesses resultados, ou seja, sem picos de variações por contextos
externos (com devida exceção para o caso de 2008/09 que deteriorou toda a demanda

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mundial). Vale ressaltar também nos valores de volume comercial, muito maiores que os
do Brasil, aproximadamente duas vezes maior em certos períodos. Observa-se também
que a elasticidade do setor industrial exportador é bem mais condizente com as taxas
de crescimento sul-coreanas, suas maiores constâncias e menor volatilidade podem ser
explicações para a divergência em termos de PIB per capita dos países. Além disso, na Coreia
do Sul as flutuações de PIB seguem as flutuações dos saldos comerciais. Ou seja, a indústria
e consequentemente o setor externo parecem apresentar relevância quando se trata do
desenvolvimento econômico coreano.
Temos no Gráfico 6 os dados de exportação como capacidade de importação (em
moeda local) para os dois países e é possível observar o quanto a Coreia do Sul adquiriu de
capacidade de importação a partir do momento em que se industrializa. O Brasil também
possui ganhos em sua capacidade de importação, mas claramente a uma constância menor
e, podemos observar pelas inclinações das retas, numa velocidade até mais acelerada,
se comparado com a Coreia do Sul, que se cessa por pelo menos 6 anos. Aqui também é
visível a dependência externa do Brasil quando atentamos para os períodos em que sua
capacidade de importação oscila: crise mundial, boom de commodities e recessão interna
– comportamento muito diferente da capacidade de importação sul-coreana, que não
decresce em nenhum momento.

Gráfico 6 - Exportação como capacidade de importação (em moeda local) – Brasil e Coreia do
Sul (1995-2017)

Fonte: Elaboração própria a partir de World Bank (2020).

Esse ponto também acaba sendo muito relevante para a tese de deterioração dos
termos de troca por demonstrar como os países agroexportadores perdem a capacidade de

138
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se desenvolver – ou aumentam sua necessidade de endividamento – importando bens de


capital e tecnologia, já que não há capacidade para tal.
O Gráfico 7 apresenta os termos de troca líquidos (taxa percentual do índice de
exportações sobre o índice de importações) e é interessante observar que aparentemente
se mostra contraditório com a tese. Seguindo toda a causalidade descrita pela teoria
e demonstrada pelos dados econômicos de ambos os países, os termos de troca não se
revertem para a economia sul-coreana. Na realidade a Coreia do Sul perde acentuadamente
em termos de troca para o Brasil a partir de 1999/2000, que se mantém quase constante ao
longo dos anos – apesar de apresentar volatilidade maior nas suas oscilações.
Todavia, ao se analisar os períodos descritos no início da seção (Coreia do Sul em 1998
e 2008/2009; Brasil em 2014 e 2008/2009), há mais um viés de confirmação para as premissas
de Prebisch e Singer, porque as oscilações dos termos de troca em períodos de crise interna
e externa se dão de forma muito mais acentuadas para o Brasil, o que seria explicado pela
dependência externa do país e pela capacidade de recuperação sul-coreana – visualizado
pelo crescimento do PIB.

Gráfico 7 - Permuta líquida de termos de troca (2000=100)

Fonte: Elaboração própria a partir de World Bank (2020).

Por fim, para analisar a relação centro-periferia Coreia do Sul-Brasil é importante


avaliar a relação bilateral (Gráfico 8). Aqui vemos como a Coreia do Sul toma vantagens em
termos de troca se comparada ao Brasil, porque sua pauta comercial baseada numa estrutura
produtiva industrializada possibilita um significativo superávit nas relações comerciais com
o Brasil e a crescente em termos de troca.

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Gráfico 8 - Balança comercial do Brasil com a Coreia do Sul

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do UN Comtrade (2020).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para compreender a realidade da Coreia do Sul e do Brasil para a análise comparativa,


primeiro verificou-se o contexto histórico de desenvolvimento da economia brasileira.
Percebeu-se que sua formação econômica se encaixa nas premissas da teoria de deterioração
dos termos de troca. Ademais, a comparação com a experiência desenvolvimentista sul-
coreana foi fundamental para entender que embora possuam similaridades em seus
processos de formação e no contexto externo em que estavam inseridos, existiram diferenças
especialmente nos modelos de industrialização tardia e nos aspectos das políticas internas.
Houve diferenças particulares nos rumos e contextos entre as industrializações
brasileira e sul-coreana. Obviamente, tais digressões históricas podem explicar, com base
nos apontamentos teóricos de Prebsich (1949) e Singer (1949), o porquê das discrepâncias
também no desempenho econômico dos dois países. Pode-se dizer que o modelo sul-
coreano foi eficaz em industrializar o país e garantir um maior crescimento do PIB sem as
dependências externas existentes no Brasil, bem como em evitar os efeitos sofridos pela
periferia, como descrito na tese Prebisch-Singer.
Ao se utilizar da análise estatística descritiva, observamos que os efeitos assimétricos,
descritos como na tese Prebisch-Singer, ocorrem após as tentativas de inserção econômica
dos dois países dentro do comércio internacional. Isso comprovaria nossa hipótese inicial
de que os efeitos negativos provenientes, segundo tal tese, da deterioração dos termos
de troca em países com foco em exportações primárias ainda permanecem. Dentre esses
efeitos estariam a concentração tecnológica nos países industrializados, a perda de renda
e salário real relativa entre os países, a perda da capacidade de importação e os baixos

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benefícios econômicos de especialização que ocorrem na periferia. No entanto, ao se


analisar a permuta líquida dos termos de troca do Brasil e da Coreia do Sul no comércio
internacional não confirmou uma deterioração dos termos de troca nas últimas décadas.
De fato, os indicadores macroeconômicos apontaram que a Coreia do Sul perdeu termos de
troca em relação ao Brasil. Quando muito, o Brasil também se mantém estável quanto a seus
termos de troca e a Coreia do Sul permanece na tendência de queda.
Não obstante, ao se analisar as relações econômicas entre o Brasil e a Coreia do
Sul, a economia sul-coreana salta no saldo de valor exportado por saldo importado com a
economia brasileira. Além disso, os produtos trocados entre os países se modificam ao longo
do tempo, saindo de um padrão de troca mais equitativo para um padrão visto nas relações
de centro e periferia. O Brasil passa a ter um valor de exportação crescente e com maior
participação da agricultura e minérios como um todo, enquanto a Coreia do Sul possui uma
crescente maior ainda no seu valor exportado para o Brasil e um aumento na participação
dos setores de eletrônico, maquinário e veículos.
Essa diferença dos termos de troca nas relações entre a Coreia do Sul e o Brasil, com
os termos de troca nas relações de ambos os países com o mundo, dá margens para uma
continuidade no trabalho analisando as relações de centro-periferia relativas aos parceiros
comerciais de cada país, posto que a Coreia do Sul exporta bens industrializados, mas também
importa tecnologia, enquanto o Brasil é um país exportador de commodities que também
importa commodities. Ou seja, os países não possuem relações estreitas com o mundo como
têm entre si (no sentido de apenas exportar commodities e apenas importar bens de capital,
por exemplo). Essa é uma explicação possível para a interpretação dos dados.
A análise desenvolvida neste artigo denota que os desafios persistentes para o
desenvolvimento econômico brasileiro podem estar relacionados às suas características de
país periférico, tal como sua estrutura produtiva primária e pauta de exportações pouco
complexa, além da tendência de deterioração dos seus termos de troca no comércio
internacional. Dessa forma, ressalta-se a importância de políticas econômicas internas e
externas que contemplem uma transformação estrutural e uma estratégia de inserção no
comércio internacional centrada em produtos industriais de maior conteúdo tecnológico,
como aquelas apresentadas pela Coreia do Sul a fim de romper os entraves para o seu
desenvolvimento socioeconômico no longo prazo.

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REFERÊNCIAS

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BRASIL. Banco Central. Focus – Relatório de Mercado. Brasília, 31 de Dezembro de 2015.

CHANG, Ha-Joon. Chutando a Escada: a estratégia do desenvolvimento em


perspectiva histórica. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

CHANG, Ha-Joon.The political economy of industrial policy in Korea. Cambridge Journal


of Economics, Cambridge, v. 17, n. 2, p. 131-167. Junho, 1993.

DE PAIVA ABREU, M. et al. Ordem do Progresso: Cem Anos de Política Republicana. Rio de
Janeiro: Campus, 1989.

FURTADO, C. Formação Econômica do Brasil. 32. ed. São Paulo: Editora Nacional, 1959.

GIAMBIAGI, F. et al. Economia Brasileira Contemporânea: 1945-2010. 2. ed. Rio de Janeiro:


Elsevier, 2011.

PREBISCH, R. O Desenvolvimento econômico da América Latina e seus principais


problemas. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p. 47-111. 1949.

SINGER, H. Relações de troca no pós-guerra entre países sub-desenvolvidos e países


industrializados. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p.47-111. 1949.

SINGER, H. Strategy of International Development: Essays in the Economics of


Backwardness. 2. ed. Nova Iorque: The Macmillan Press LTD. 1978.

THE ATLAS OF ECONOMIC COMPLEXITY, Growth Lab. 2020. Disponível em: http://atlas.cid.
harvard.edu/. Acesso em: 18 fev. 2020.

THE WORLD BANK. 2020. Disponível em: https://data.worldbank.org/. Acesso em: 18 fev.
2020.

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CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

UN Comtrade Analitycs. UN Comtrade. 2020. Disponível em: https://comtrade.un.org.


Acesso em: 18 fev. 2020.

WORLD Integrated Solution. 2020. Disponível em: https://wits.worldbank.org/. Acesso em:


18 Fev.2020.

143
8

Novas tecnologias sobre o mercado de trabalho


no setor bancário brasileiro15
Fausto Bruno Mendes Leite de Oliveira(1)
William Nascimento da Silva(2)
Natallya de Almeida Levino(3)
Cristiano da Silva Santos(4)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7130-7403; Universidade Federal de Alagoas/Bacharel em Sistema da
Informação, BRAZIL, E-mail: faustobmendes@hotmail.com;
(2)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9064-9676; Universidade Federal de Alagoas/Bacharel em Sistema da
Informação, BRAZIL, E-mail: willnascimento03@gmail.com;
(3)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1215-3798; Universidade Federal de Alagoas/Professora, Departamento
de Administração na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEAC), BRAZIL, E-mail: natallya.
levino@feac.ufal.br;
(4)
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1689-7513; Universidade Federal de Alagoas/Professor, Campus Sertão/
Unidade Santana do Ipanema; BRAZIL; E-mail: cristiano.santos@santana.ufal.br.

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

Ao longo do curso da nossa história, a tecnologia tem moldado as nossas vidas. Foi a
partir dela que conseguimos melhorar a produtividade no campo, na indústria e no setor de
serviços. De acordo com Rodrigues, Oliveira e Freitas (2007), percebe-se que ela tem sido um
divisor de águas no que se refere ao aumento da nossa qualidade de vida, produtividade e
ganhos de escala na forma de produção dos bens e serviços.
De acordo com Crépon, Heckel e Riedinger (2003), estudos realizados para verificar
os efeitos das tecnologias da informação na produção de 3646 empresas, conduzidos ao
longo do período de 1994 a 1997, demonstraram que a Tecnologia da Informação (TI) tem

15 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap8
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influência sobre a eficiência do trabalho. Dessa forma, pode-se ver que a adoção de políticas
de investimento em TI tem a capacidade de impactar diretamente o mercado de trabalho.
Segundo Mansur (2019), as transformações causadas pela Inteligência Artificial
(IA) transporá muitas barreiras. Em muitas áreas de negócios, as aplicações tecnológicas
relacionadas à IA sofrerão processos de otimização nos próximos anos, e a sociedade
caminha na direção de implementar tecnologias relacionadas a ela nas mais diversas áreas
do conhecimento ou negócios.
Dessa forma, na visão de Schaff (1995), vê-se que a partir do desenvolvimento de
novas tecnologias e sua implementação no cotidiano, algumas profissões e/ou atividades
tendem a ser gradativamente substituídas por processos inerentes a esta revolução. E isso
tem ficado mais evidente nas três últimas décadas, quando Castells (2000) intitulou de era
da informação, muito embora estes processos de transformação tecnológica tenham sido
criados ou aprimorados a partir da sequência de outras eras de revolução que a antecederam.
Ainda na visão de Mansur (2019), a partir do momento em que forem adotadas
aplicações de IA, torna-se desnecessária a presença humana em algumas atividades da
cadeia produtiva estendida, fazendo com que alguns empregos sejam redundantes dentro
do processo produtivo.
Atualmente, profissões que exigem elevado grau de conhecimento como bancário,
têm tido parte dos seus processos de trabalho substituídos por ferramentas de automação de
tarefas e processos, muitas destas na forma de algoritmos que executam tarefas, processos
e/ou procedimentos de forma automatizada fazendo o reaproveitamento de dados e/ou
bases de conhecimento fartamente disponíveis em bancos de dados oficiais ou privados,
gerando uma distribuição de tarefas entre homens e máquinas, e que vem favorecendo a
diminuição gradativa dos postos de trabalho de pessoas que executam tais tarefas de forma
manual, principalmente.
De acordo com Bellotto (2004, apud MARQUES; RESENDE, 2013), o surgimento da
tecnologia propiciou a substituição de trabalhos físicos por softwares capazes de extrair
dados e transformá-los em conhecimento, por conseguinte, em informações. Isso trouxe
mais dinamismo no acesso às informações, tornando o processo de controle, organização,
armazenagem e disponibilização das informações mais veloz, contribuindo assim para o
processo de tomada de decisões.
Neste sentido, o presente trabalho busca analisar o impacto que novas tecnologias
podem gerar no mercado de trabalho do setor bancário brasileiro. Este setor foi escolhido

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em decorrência dos avanços de tecnologias recentes (década de 2010) que estão sendo
incorporadas nos mais diversos serviços financeiros. Para esta análise foi realizada uma
pesquisa bibliográfica com enfoque qualitativo e de natureza exploratória em diferentes
bases de dados.
Este trabalho está dividido em mais três seções além desta introdução. Na seguinte,
é exposto o referencial teórico que dará subsídios às discussões do artigo. Na terceira
seção, apresentamos os resultados e discussões acerca da pesquisa realizada. Por fim, as
considerações finais sobre este estudo.

NOVAS TECNOLOGIAS E MERCADO DE TRABALHO NO SETOR BANCÁRIO

No contexto histórico do setor bancário, a relação entre tecnologia e o setor financeiro


não é tão recente quanto parece ser. Conforme Calliari; Moraes; Leonelli et al. (2010), o
processo de automação da indústria bancária brasileira tem início a partir da década de
1960 com a instalação de computadores de grande porte e sistemas. Tais computadores
tinham capacidade de processamento muito aquém em comparação aos computadores da
atualidade. O seu uso propiciou o processamento de grandes volumes de informações, ora
produzidas pelas agências. Dessa forma, o objetivo principal destes equipamentos foi o de
garantir automatização às operações de retaguarda (back office).
A partir da década de 1970, o processo de automação da indústria bancária brasileira
já tinha se estabelecido. Dadas as condições geográficas do país, a expansão do sistema
bancário brasileiro e a falta de infraestrutura viária e de comunicação existente à época, os
CPDs (Centro de Processamento de Dados), criados ao longo da década anterior, já não eram
tão eficientes; e, para contornar tal situação, foram criados os subcentros de processamento.
Além disso, a racionalização de processos se mostrava um grande desafio aos bancos, já
que haviam trocas de informações entre os bancos, em especial, aquelas relacionadas a
pagamentos e cobrança (CALLIARI; MORAES; LEONELLI et al., 2010; DE PAULA, 2013).
A busca pela integração dos bancos e o processamento em tempo real (real time)
foram norteadores para os bancos dentro do processo de automação e melhoria da
qualidade dos serviços prestados à população. Com a ampliação da rede de agências, houve
aumento do número de trabalhadores bancários. Dessa forma, durante as décadas de 1970
e 1980, o investimento em automação bancária no Brasil não teve motivação com a redução
de custos operacionais e de mão de obra, mas sim para propiciar uma otimização dos fluxos
de caixa e atendimento aos clientes (CALLIARI; FONSECA; MAGALHAES et al., 2010).

146
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
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Nos anos seguintes, com o surgimento de empresas de tecnologia bancária


genuinamente brasileira, a exemplo da Cobra (Computadores Brasileiros), Itautec, Tecban
(Tecnologia Bancária) e Procomp, os bancos, no anseio de desenvolverem tecnologias
voltadas às necessidades da cultura brasileira, criaram em conjunto com estas empresas,
soluções de automação bancária que vieram a atender às suas necessidades, a exemplo da
rede de atendimento Banco 24 horas. O período inflacionário ao qual o Brasil atravessava,
ajudou a consolidar a automação bancária no Brasil, visto que para o processamento de
correções monetárias, mudanças de planos econômicos e outras indexações, necessitava-
se de sistemas que processassem as demandas dos clientes de forma mais ágil e eficiente
(FONSECA et al., 2010; BARROSO, 2018).
Passado o período inflacionário, vividos até antes da implantação do Plano Real em
1994, que garantiu lucros fáceis aos bancos neste período, os recursos seriam mais escassos
e, como consequência, isso demandou um posicionamento dos bancos no sentido de
economia no processamento de transações e busca de eficiência operacional. Na prática, isso
significou que os investimentos em automação necessitavam de contrapartida relacionada
à economia de recursos humanos ou operacionais. A título de comparação, em 1985 o total
de trabalhadores bancários era próximo de um milhão, e quinze anos depois passou para,
aproximadamente, quatrocentos mil. Entre o período de 1995 e 1999, por exemplo, o Banco
do Brasil viu sua carteira de clientes dobrar ao passo que houve uma redução pela metade
do seu quadro funcional (CORREA; MEIRELLES; DINIZ, 2010; FONSECA et al., 2010)
Estava, portanto, evidenciado que as inovações tecnológicas vieram no sentido de
promover um enxugamento dos quadros de pessoal e diminuição do custo do trabalho,
conforme observado por Machado e Amorim (2012). A afirmação de Conde (1991), durante
o primeiro Congresso Internacional de Automação Bancária (CIAB), de que em simultâneo
aos crescentes investimentos em automação, a redução de custos seria obrigatória aos
bancos, demonstra justamente o avanço da tecnologia sobre os postos de trabalho.
Atualmente, no contexto do trabalho bancário, com a crescente demanda tecnológica,
vê-se que a sociedade vem demandando serviços bancários cada vez mais inovadores e,
como consequência, os bancos têm promovido verdadeiras transformações digitais com
o objetivo de promover experiências diferenciadas aos seus clientes (FOSSE, 2017). À luz
destas transformações, o papel dos órgãos de controle e regulamentação como o Banco
Central do Brasil (BACEN), por exemplo, têm papel fundamental na dinâmica das relações
entre clientes e funcionários das instituições financeiras. A Resolução n.º 4.480, em 25 de
abril de 2016, a qual dispõe sobre a abertura e encerramento de contas de depósitos por

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meio estritamente eletrônico16 é um bom exemplo disso, dado que os processos de abertura
de conta (início do relacionamento do cliente com o banco) são delegados a processos de
verificação e checagem automatizados e sem a interferência humana.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

EVOLUÇÃO DOS ATENDIMENTOS VIA CANAIS TRADICIONAIS VERSUS CANAIS DIGITAIS

Segundo dados do BACEN (2019), entre Bancos Comerciais e Caixa Econômica


Federal, há em funcionamento no Brasil cerca de 21 (vinte e uma) instituições financeiras.
Dentre estas instituições, destacam-se pelo volume de ativos o Itaú Unibanco, Banco do
Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Santander. Que nesta ordem, representam as
cinco maiores instituições financeiras do país, administrando cerca de R$ 6,4 trilhões em
ativos no Sistema Financeiro Nacional em 2018.
Ainda conforme dados do BACEN (2019), os cinco maiores bancos brasileiros
possuíam ao final de 2019, 17.994 agências e 5.883 postos de atendimento espalhados em
praticamente todas as cidades brasileiras. Ao passo que ao final de 2015 haviam 19.770
agências e 5.638 postos de atendimento. Na Figura 1, é possível ver a evolução do número
de agências e postos de atendimento dos cinco maiores bancos brasileiros ao longo
do período entre os anos de 2015 e 2019. Enquanto entre 2015 e 2016 houve uma leve
expansão da rede, a partir do final de 2016 até 2019, o que se observa é um declínio da rede
de atendimento, devido a processos de organização institucionais realizados pelos bancos,
na forma de planos de desligamento voluntário e de aposentadoria incentivada, conforme
aponta o DIEESE (2017b).

Figura 1 – Total de agências e postos de atendimento entre 2015 e 2019

Fonte: IF.data BACEN (2019).

16 Resolução BACEN n.º 4.480, em 25 de abril de 2016 (…) § 1º Consideram-se meios eletrônicos os instrumentos
e os canais remotos utilizados para comunicação e troca de informações, sem contato presencial, entre
clientes e as instituições referidas no caput.

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Com a popularização do uso de internet e smartphones, os usos de canais digitais para


efetuar transações bancárias têm crescido consideravelmente a cada ano. Neste contexto,
a importância da tecnologia no setor bancário vem se tornando cada vez mais necessária
para acompanhar a crescente bancarização da população brasileira, bem como promover
um atendimento eficiente e com baixo custo operacional. Segundo dados levantados pela
FEBRABAN (2019), levando-se em consideração todos os canais em que há possibilidade de
se efetuar transações financeiras, o uso do mobile banking vem se mostrando em crescimento
constante, conforme Figura 2.

Figura 2 – Evolução das transações bancárias por canal, 2014-2018

Fonte: FEBRABAN (2019).

Ainda de acordo com a FEBRABAN (2019), nos últimos anos, os canais digitais vêm
apresentando constantes evoluções no que se refere à praticidade, conveniência e segurança
na realização de transações bancárias. O resultado disto é visto no aumento do número de
transações bancárias nos meios digitais. Em 2018, por exemplo, o mobile banking representou
cerca de 40% das transações bancárias realizadas nos mais variados canais disponíveis de
atendimento17, ao passo que, em 2011, este número representava apenas 0,03%. Quando
considerado o uso dos canais digitais (mobile e internet banking), o percentual de transações
bancárias realizadas nestes canais representou cerca de 60% ao longo do ano de 2018.
Assim sendo, conforme visto na Figura 2, fica demonstrado um crescimento de 85% no uso
de transações via canal mobile banking entre 2014 e 2018, superando inclusive as transações
via internet banking.
17 Mobile banking, internet banking, POS (Point of Sale), ATM (Autoatendimento), Correspondentes, Agências e
Contact Centers (Call Centers).

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Diante deste cenário, é possível perceber que há uma tendência de crescimento e


de uma maior aceitação dos canais digitais, em especial o mobile banking, para realização
de transações bancárias. A Tabela 1 representa todas as transações realizadas em canais
digitais18 ao longo de 2017 e 2018. Nela, é possível perceber uma grande evolução em
termos percentuais das transações realizadas no canal mobile entre os anos de 2017 e 2018,
havendo variação positiva em todas as transações observadas. Ainda na mesma tabela,
verifica-se que no canal internet banking não houve crescimentos significativos face aos
crescimentos apresentados no canal mobile.

Tabela 1 – Evolução das transações realizadas em canais digitais, 2017-2018


MOBILE BANKING INTERNET BANKING

2017 2018 2017 2018


Variação Variação
Tipos de transação
(%) (%)
(milhões) (milhões) (milhões) (milhões)

Pagamento de contas 872 1.600 80 1.500 1500 0


Transferências/DOCs/TEDs 394 862 119 485 534 10
Contratações de crédito 225 359 60 87 86 -1
Investimentos/Aplicações 10 14 36 58 94 63
Pesquisa de saldo 18.600 21.800 17 6.200 5.100 -17
Fonte: FEBRABAN (2019).

A Tabela 2 representa todas as transações realizadas em agências bancárias/PABs e


ATMs ao longo de 2017 e 2018. Nela, é possível perceber que no canal Agências/PABs houve
uma significativa queda percentual nas transações de pagamento de contas e saques,
enquanto que nas operações que demandam consultoria financeira (contratação de crédito
e investimentos/aplicações), tiveram ligeira evolução. Ainda na mesma Tabela 2, verifica-se
que no canal ATMs houve involução em praticamente todos os tipos de transações, exceto
para saques que teve ligeira variação positiva.

18 Mobile e internet banking.

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Tabela 2 – Evolução das transações realizadas presencialmente nas agências, 2017-2018


AGÊNCIAS E PABs ATMs
2017 2018 2017 2018
Variação Variação
Tipos de transação
(%) (%)
(milhões) (milhões) (milhões) (milhões)
Pagamento de contas 587 468 -20 841 780 -7
Transferências/DOCs/TEDs 54 53 -1 223 213 -4
Contratações de crédito 30 36 19 77 63 -18
Investimentos/Aplicações 26 31 19 43 10 -77
Pesquisa de saldo 1.700 1.300 -26 3.500 3.000 -13
Depósitos 416 443 7 762 735 -3
Saques 584 367 -37 2.400 2.500 4
Fonte: FEBRABAN (2019).

Estes dados representam uma mudança no comportamento dos clientes, que


vêm buscando se relacionar com os bancos de forma mais remota. Conforme dados da
FEBRABAN (2019, p. 18), diante da queda no número de todas as transações nos ATMs –
exceto os saques – combinado ao crescimento do número de transferências bancárias e
dos pagamentos realizados através dos canais digitais, revela-se uma tendência de forte
digitalização do pagamento de serviços e produtos.
Verifica-se, portanto, que o uso dos canais digitais para realização de transações
bancárias, conforme dados expostos na Tabela 1, tiveram uma franca expansão entre os anos
de 2017 e 2018, ao passo que as transações realizadas nos canais alternativos de atendimento,
conforme dados expostos na Tabela 2, apresentaram involuções ou crescimento em termos
percentuais menores aos observados nos canais digitais. Assim, estes dados reforçam uma
mudança de postura dos clientes, que cada vez mais estão procurando se auto atender, ou
seja, realizar as suas transações bancárias a partir de seus smartphones ou internet banking.
O crescimento do uso dos canais digitais em detrimento aos canais tradicionais de
atendimento está relacionado com uma maior comodidade, praticidade e segurança na
execução destas transações. Além disso, estes dados reforçam haver uma consistência no
crescimento das transações pelo canal mobile banking, que vem ganhando um maior alcance
e relevância entre os canais de atendimento disponibilizados pelas instituições financeiras
aos seus clientes. Dessa forma, percebe-se que o uso do celular como canal de acesso
aos serviços bancários está se consolidando como uma alternativa ao uso de alternativas
disponibilizadas pelas instituições financeiras.

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INVESTIMENTOS EM TECNOLOGIA NO SETOR BANCÁRIO

Todo esse resultado positivo relativo ao uso de canais digitais em detrimento dos
canais tradicionais de atendimento é possível a partir de investimentos em Tecnologia
da Informação (TI) pelos bancos. Neste contexto, pode-se mensurar a importância dos
investimentos em TI para o setor bancário a partir do montante de recursos investidos
pelos bancos.
Conforme dados da consultoria Gartner (Figura 3) – apresentados na Pesquisa
FEBRABAN de Tecnologia Bancária – em 2018, os investimentos em tecnologia
representaram cerca de R$ 5,7 bilhões. Com base no mesmo ano, os valores aplicados
pelos bancos para cobrir as despesas tecnológicas foram de R$ 13,9 bilhões, que somados
aos R$ 5,7 bilhões destinados a investimentos, representam R$ 19,6 bilhões em recursos
aportados em áreas relacionadas às TI. Assim, o total gasto em 2018 com tecnologia supera
os gastos realizados dos três anos anteriores, conforme apontado na Figura 3. Segundo a
pesquisa, no item investimentos e despesas estão inseridos gastos com Software, Hardware
e Telecom, representando uma escala dos maiores aos menores valores investidos ou
despendidos, respectivamente.

Figura 3 – Investimentos e despesas com tecnologia nos bancos, 2014-2018

Fonte: Gartner – FEBRABAN (2019)

Noutro ponto, o uso de inteligência artificial já é uma realidade nos grandes bancos
brasileiros e, segundo dados da FEBRABAN (2019), levando-se em consideração as interações
via canais digitais (chat, chatbot e e-mail) entre 2017 e 2018, enquanto o crescimento do chat
e e-mail para interações com clientes foi de 364% e 19%, respectivamente, o chatbot teve um
crescimento de 2.585% em relação ao ano de 2017. Dessa forma, para a FEBRABAN (2019, p.
34), esse “tem sido um dos recursos nos quais os bancos mais têm aplicado as ferramentas

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de inteligência artificial e computação cognitiva para proporcionar ao usuário uma melhor


experiência com as soluções e produtos bancários.”.
Em termos comparativos e, visando demonstrar a importância dos investimentos em
TI para os bancos, em 2018 o setor bancário atingiu o mesmo patamar de investimentos em
tecnologia que os observados pelo Setor Público, além de apresentar relação percentual
maior de investimento que em outros setores econômicos, conforme Figura 4.

Figura 4 – Composição dos dispêndios em tecnologia por setor em 2018 (%)

Fonte: Gartner – FEBRABAN (2019)

Assim, verifica-se que os bancos vêm levando a sério a sua política de investimentos
em tecnologia, e os recursos aplicados em computação cognitiva e inteligência artificial têm
sido largamente utilizados pelos bancos visando melhorar a experiência do usuário com
relação aos seus produtos e serviços e dinamizar o seu potencial de negócios.
A comodidade no acesso ao banco pelo celular pode explicar a crescente demanda
pelos serviços de tecnologia. Diante disto, os bancos têm procurado investir cada vez mais
em tecnologia para suprir a demanda dos serviços e promover um ambiente mais cômodo
e seguro aos seus clientes (FEBRABAN, 2019).
Dessa forma, fica evidenciado que os bancos estão procurando adequar as suas
rotinas à realidade que vem sendo desenhada a cada dia pelo avanço de novas tecnologias
que permitem aos clientes se autoatenderem, não necessitando, portanto, a ida a uma
agência física para tratar de rotinas corriqueiras do dia a dia, tais como consulta de saldos e
extratos, pagamento de contas, transferências, etc.

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MERCADO DE TRABALHO NO SETOR BANCÁRIO

Assim como vivido no passado, em decorrência dos processos inflacionários


relacionados aos planos econômicos que antecederam o Plano Real e mais recentemente
com a manutenção da taxa Selic19 em patamares de dois dígitos, os bancos brasileiros
obtinham lucros extraordinários praticando spreds20 elevados. Hoje, com a crescente queda
na taxa Selic e uma maior concorrência a partir da introdução das fintechs e big techs no
mercado financeiro, os bancos tradicionais se veem obrigados a repensar o seu modelo de
atendimento, visando buscar uma maior eficiência operacional.
Assim, algumas instituições financeiras, no afã de promover redução de custos
operacionais, vêm promovendo a terceirização de parte de suas atividades. No entanto, neste
estudo, não se pretende adentrar ao mérito da terceirização do trabalho no setor bancário.
Interessa, portanto, analisar as transformações sobre o mercado de trabalho bancário em
decorrência das mudanças surgidas a partir da introdução de novas tecnologias no setor
bancário brasileiro.
Embora os dados apresentados pelo DIEESE (2019), conforme Tabela 5, demonstrem
uma tímida queda no número de empregos nos cinco maiores bancos brasileiros quando
analisados os dados entre 2017 e 2018 – havendo inclusive aumento de número de
trabalhadores em alguns bancos em determinando momento –, a análise do período
compreendido entre 2012 e 2018, conforme Figura 5, observa-se uma tendência significativa
de redução do quantitativo de trabalhadores bancários (força de trabalho), as quais
vêm sendo substituídas pelo uso mais intensivo de sistemas tecnológicos apoiados em
tecnologia da informação, ora fruto dos avanços vividos no setor neste período, em especial
as tecnologias que possibilitam aos clientes se auto atenderem pelos canais digitais de
atendimento disponibilizados pelas instituições financeiras.

19 Taxa básica de juros da economia. Selic – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia.


20 Termo que define a diferença entre o preço de compra e venda de um ativo financeiro.

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Figura 5 – Número de empregados nos cinco maiores bancos, 2012-2018

Fonte: DIEESE (2019).

Os dados levantados na Figura 5 consideram o quantitativo de trabalhadores


bancários presentes nos cinco21 maiores bancos brasileiros. Estes dados ilustram bem
esta situação e servem de indicador no que se refere ao futuro do emprego dentro do
setor bancário. No período de 2012 a 2018, a redução de empregados bancários nestas
instituições financeiras chegou a 39.529 postos de trabalho, representando uma variação
negativa de 8,7%. Neste período, estas instituições financeiras promoveram enxugamentos
em seus quadros de pessoal conforme números absolutos e percentuais negativos abaixo
(DIEESE, 2019): a) BB: -17.293 (-15,1%); b) CEF: -7.974 (-8,6%); c) Bradesco: -4,780 (-4,6%); d)
Itaú Unibanco: -3.502 (-3,9%); e) Santander: -5.980 (-11,1%).
Assim sendo, enquanto o número de transações em canais que necessitam de
alguma intervenção humana para a sua realização diminui (vide Tabela 2), o número de
transações por canais digitais cresce (vide Tabela 1). Como consequência, os bancos buscam
estruturar melhor a sua força de trabalho, prezando pela padronização dos produtos,
processos e serviços, redução de custos operacionais e maior eficiência operacional,
conforme apontado por Teixeira e Souza (1985).
Seguindo a ótica de ser cada vez mais digital, o DIEESE (2017a) aponta que os bancos
tradicionais têm investido pesado em tecnologia com vistas ao alcance de automação e
digitalização dos seus processos como forma de alcance de eficiência operacional. Essa
onda digital que se aproxima a cada dia face aos avanços tecnológicos, terá impacto direto
na redução de custos operacionais envolvendo papéis, arquivos físicos, postagens de
documento, impressão, transporte de valores e, em especial, na força de trabalho (DIEESE,
2017a).

21 Banco do Brasil, CEF, Bradesco, Itaú Unibanco e Santander.

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Dessa maneira, pode-se compreender que o trabalho bancário atrelado às rotinas


de back office tende a ser gradualmente reduzido. Conforme Tabela 3, é possível verificar a
dimensão da mudança no perfil no quadro funcional dos bancos privados22.

Tabela 3 – Principais ocupações que tiveram redução e ampliação na participação em relação


ao total de empregados - Bancos privados - 2003 e 2015
Variação Variação
Ocupações 2003 Participação 2015 Participação
absoluta percentual
Redução
Escriturários 20.362 8,9% 4.708 1,80% -15.654 -77%
Chefe de serviços bancários 16.213 7,1% 7.547 2,90% -8.666 -53%
Assistente administrativo 15.586 6,8% 10.011 3,80% -5.575 -36%
Analista de desenv. de
6.313 2,8% 5.509 2,10% -804 -13%
sistemas
Caixas 46.668 20,4% 41.520 15,80% -5.148 -11%
Gerente de agência 14.987 6,6% 13.300 5,10% -1.687 -11%
Ampliação
Atendente de agência 449 0,3% 10.350 3,90% 9.901 2.205%
Analista financeiro 1.808 0,8% 5.900 2,20% 4.092 226%
Gerente de contas – PF/PJ 16.213 8,3% 41.520 16,00% 25.307 156%
Gerente administrativo 11.307 4,9% 23.852 9,10% 12.545 111%
Supervisor administrativo 7.052 3,1% 14.343 5,50% 7.291 103%
Administrador 6.326 2,8% 9.251 3,50% 2.889 45%
Total bancos privados 228.515 100,00% 263.114 100,00% 34.599 15%
Fonte: MTB/RAIS, DIEESE (2017a).

Sobre a redução de trabalhadores vinculados aos atendimentos de caixa, inclusive


gerentes de tesouraria, isso se deve à implantação do terminal de autoatendimento
reciclador. Este equipamento reconhece automaticamente as cédulas e permite a realização
de depósitos em dinheiro sem envelope de forma online. No modo convencional de
depósito, o dinheiro é creditado à conta do cliente somente após conferência manual do
quantitativo existente no envelope ora depositado pelo usuário, o que acaba refletindo
em baixo índice de eficiência operacional. Embora tenha bastante representatividade
no contexto das transformações observadas, o cargo de analista de desenvolvimento de
sistemas viu seu contingente de trabalhadores ser reduzido em 13%, em decorrência de
processo de terceirização23.
Dadas as condições observadas nos últimos anos, onde houve evolução das
transações em canais digitais – alinhada a uma maior participação destas na quantidade
total de transações bancárias – e crescimento dos investimentos em tecnologia, as agências
22 Os dados referentes aos bancos públicos (Banco do Brasil e CEF) não foram incluídos na tabela, vez que
estes bancos registram na RAIS seus trabalhadores nas carreiras inicialmente contratadas (escriturário e
técnico bancário, respectivamente).
23 IBM assume operação da Scopus em acordo com Bradesco. EXAME. Disponível em: https://exame.com/
negocios/ibm-assume-operacao-da-scopus-em-acordo-com-bradesco/. Acesso em: 5 out. 2020.

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têm percebido o impacto destas transformações na forma de redução de postos de trabalho


ligados às atividades mais burocráticas, conforme dados da Tabela 3. Não obstante, na
mesma Tabela, observado o mesmo período temporal, verificou-se uma elevação em
outras ocupações que desempenham atividades de perfil mais consultivo e gerencial,
ou seja, aquelas que visam dar apoio à área negocial destes bancos. Analisando-se os
dados constantes na Tabela, face aos cortes e criação de novas funções, percebe-se que
no período observado houve ampliação de postos de trabalho, havendo destaque para as
contratações em ocupações cujas funções estão relacionadas às atividades mais consultivas
que burocráticas.
Para o DIEESE (2017a), estes dados demonstram uma mudança no perfil profissional
dos bancários, os quais passaram a atuar em atividades mais consultivas e de relacionamento
com clientes, visando o foco na venda de produtos e serviços bancários diversos. Ainda
conforme a revista Ciab FEBRABAN (2017), os aplicativos móveis desenvolvidos para
smartphones e oferecidos pelos bancos brasileiros, são considerados os mais inovadores em
termos de recursos. Estes recursos incluem depósitos de cheques pelo celular, transações
realizadas por identificação biométrica, dispositivos inteligentes para realizar pagamentos,
além de videoconferências para orientações financeiras diversas.
De posse destas informações, os bancos têm movidos esforços para se manterem
próximos às transformações digitais e atuarem nos novos modelos de negócios digitais que
estão ou serão criados nos próximos anos. Assim, tal como dito por Sérgio Rial, presidente do
Santander, em entrevista à revista Ciab FEBRABAN (2017, p. 12),“não estamos mais na indústria
de capital, mas na indústria de dados”. Isto evidencia uma mudança de postura a qual o setor
bancário vem passando. Em meio a estas crescentes transformações tecnológicas, surgem
as fintechs – empresas de tecnologia que atuam no segmento financeiro –, e logo ganharam
espaço no mercado por manterem estruturas enxutas (custos operacionais baixos), assim
como atuarem oferecendo produtos e serviços personalizados.

EVOLUÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO BANCÁRIO FRENTE ÀS NOVAS TECNOLOGIAS

Como resultado de amplas transformações vividas no setor, o mercado de trabalho


no setor bancário vem sendo transformado ao longo dos últimos anos. Percebe-se que
ao longo do período observado, enquanto os investimentos em tecnologia aumentam e
são representativos, o número de empregos bancários vai em direção oposta, reduzidos
gradativamente ano após ano. Assim, fica claro que o mercado de trabalho bancário vem

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perdendo espaço para os novos modelos de negócios proporcionadas pelas inovações


tecnológicas ora introduzidas no setor bancário.
Além disso, com a crescente autonomia experimentada pelos clientes na realização
de transações bancárias em canais digitais, o quadro total de trabalhadores bancários entre
os cinco maiores bancos brasileiros vem encolhendo a cada ano. Observa-se ainda que
os cargos ocupados por profissionais cujas tarefas são voltadas ao back office, tiveram um
enxugamento considerável de pessoal. Dessa forma, percebe-se um redesenho no perfil
profissional dos bancários que, cada vez mais, vem atuando em tarefas relacionadas à
consultoria financeira em detrimento de atividades burocráticas relacionadas ao back office.
Assim, entre os bancos tradicionais e seus concorrentes digitais ou fintechs, no que se
refere à disparidade dos custos operacionais entre os dois modelos (bancos tradicionais versus
bancos digitais), percebe-se que os bancos tradicionais têm movido esforços para reduzir o seu
custo operacional e manterem-se competitivos no mercado. Essa redução pode ser percebida
a partir das inúmeras reestruturações e/ou reorganizações adotadas pelos bancos.
Segundo reportagens publicadas na Folha de São Paulo24, num amplo programa de
reestruturação com foco no fechamento de agências e redução de custos, os bancos Bradesco,
Itaú Unibanco e Banco do Brasil lançaram programas de demissão voluntária ao longo de
2019 visando corte de custos, melhoria dos índices de eficiência operacional e a migração
para serviços digitais. Não obstante, os esforços no sentido de promover desligamentos no
ano de 2019, os bancos já vêm implementando estas políticas desde 2015.
Conforme Relatório Anual BB 2015, por exemplo, em 2015 houve um total de 4.992
desligamentos em função do Plano de Aposentadoria Incentivada (PAI), ao passo que 4.883
novos funcionários foram empossados aos quadros da empresa. No ano seguinte, segundo
dados do Relatório Anual BB 2016, houve 10.474 desligamentos, dos quais 8.760 foram em
decorrência do Plano Extraordinário de Aposentadoria Incentivada (PEAI), ao passo que
1.428 novos funcionários foram empossados aos quadros da empresa.
Dessa forma, considerando as reduções dos postos de trabalho no setor bancário
vividas nos últimos anos, sejam elas advindas do surgimento de planos de desligamento

24 BB reduz cargos, agências e abre programa de demissão. Folha de S. Paulo. 29 jul. 2019. Disponível
em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/07/bb-reduz-cargos-agencias-e-abre-programa-de-
demissao.shtml. Acesso em: 26 jul. 2020.
Bradesco anuncia PDV para funcionários com 20 anos de banco e perto da aposentadoria. Folha de S. Paulo.
29 ago. 2019. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2019/08/bradesco-anuncia-pdv-
para-funcionarios-com-20-anos-de-banco-e-perto-da-aposentadoria.shtml. Acesso em: 26 jul. 2020.
Itaú anuncia programa de demissão voluntária. Folha de S. Paulo. 29 jul. 2019. Disponível em https://www1.folha.
uol.com.br/mercado/2019/07/itau-anuncia-programa-de-demissao-voluntaria.shtml. Acesso em: 26 jul. 2020.

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voluntários ou não, de reestruturações, do fechamento de agências bancárias, etc.,


observa-se que não há contratação de novos postos de trabalho na mesma velocidade em
comparação aos desligamentos, resultando, assim, em um enxugamento paulatino dos
postos de trabalho nos bancos analisados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa teve como objetivo analisar os impactos das novas tecnologias sobre
o mercado de trabalho no setor bancário brasileiro, tomando como base de pesquisa os
dados referentes aos cinco maiores bancos brasileiros (Banco do Brasil, Bradesco, Itaú,
CEF e Santander). Os dados coletados demonstram um uso mais incisivo dos canais de
autoatendimento para realização de transações bancárias, em especial o mobile banking, uma
redução acentuada no número de postos de atendimento (agências e PABs) e consequente
redução no quantitativo de funcionários ao longo do período estudado.
Este movimento vem demonstrando uma clara mudança no perfil profissional
dos bancários, os quais estão passando a atuar em atividades mais consultivas e de
relacionamento com os clientes, com foco na venda de produtos e serviços destes bancos
(FEBRABAN, 2019). À medida que os correntistas destes bancos vão se familiarizando com
os serviços oferecidos em meio digital, há uma tendência natural para ampliação destes
serviços, inclusive com a adição de novas funcionalidades antes restritas ao atendimento
presencial nas agências bancárias.
Assim, de modo a prover a demanda por inovações tecnológicas do mercado
financeiro, os bancos vêm investindo milhões de reais em tecnologia com vistas a oferecer
uma maior imersão dos clientes em um ambiente mais seguro, agradável, eficiente e eficaz
na realização de transações bancárias sejam do cotidiano ou em outras transações mais
complexas, tais como financiamentos de veículos e imóveis25, que inclusive já possuem
suporte à contratação estritamente em meio digital.
A limitação do presente trabalho está relacionada à impossibilidade de se mensurar a
economia realizada pelos bancos a partir da implementação do uso de novas tecnologias em
seu modelo de negócios, ou seja, comparativo entre o modelo de atendimento convencional
e digital; à impossibilidade de se mensurar os índices de eficiência operacional (IEO) obtidos
entre os dois modelos; e à impossibilidade de se mensurar o nível de aceitação dos novos
padrões de atendimento/relacionamento entre os modelos de atendimento convencional
25 No financiamento imobiliário, a presença do requerente a uma agência se faz necessária apenas para
formalizar a assinatura no contrato e, após, submetê-lo ao registro cartorário.

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e digital, além de não demonstrar o perfil dos clientes que possuem ou não uma maior
inclinação ao uso destas novas tecnologias.
Este trabalho abre campo para que novas pesquisas relacionadas ao setor possam ser
realizadas com maior profundidade, visando a obtenção de dados a respeito do papel que
as novas tecnologias podem gerar sobre cargos específicos dentro do sistema financeiro,
bem como o papel dos canais tradicionais (agências, PAB, ATM, correspondentes bancários
e contact centers) de atendimento em detrimentos aos canais de atendimento digital.

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DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

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162
9

O que influencia a reeleição de deputados


federais? Uma análise para o Nordeste brasileiro
a partir das eleições majoritárias de 201826
José Francisco Oliveira de Amorim (1)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4494-8365; UFAL / UFRGS/Professor da Universidade Federal de Alagoas
e Doutorando em Economia pela UFRGS, BRAZIL, E-mail: josefranciscoamorim@gmail.com;

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira vem passando por intensas transformações promovidas, em


parte, pelo impacto do avanço das tecnologias, dado que o processo de comunicação se
tornou amplo, democrático e com uma agilidade nunca vista; um indivíduo pode enviar
uma mensagem (texto, áudio ou mesmo vídeo) para o outro lado do mundo em poucos
segundos. Contudo, essa vantagem também tem sido utilizada pejorativamente, cuja
principal finalidade é propagar mensagens falsas com informações da gestão de recursos e/
ou atuação dos representantes da sociedade.
Os estudos sobre carreiras políticas ganharam força a partir da segunda metade
do século XX, seja pelas interações com a finalidade de manter-se no cargo, seja pelas
evidências de institucionalização da regra da seniority, conforme o debate no congresso
norte-americano (POLSBY, 1968), o que poderia levar ao interesse pela manutenção no cargo.
Dentre outros estudos, podemos destacar os que buscaram analisar e prever as reeleições
ou busca por cargos mais altos como Black (1972), Brace (1984) e Copeland (1989).
Em relação ao Brasil, vários estudos têm se destacado no campo da ciência política
durante os últimos anos, buscando identificar possíveis fatores que interferem na eleição,

26 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap9
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a exemplo de Pereira e Mueller (2000), Pereira e Mueller (2003), Melo (2004), alguns outros
apontam para possíveis aspectos que impactam nas reeleições, como Pereira e Rennó (2001)
e Graça e Souza (2014).
Com base nessa breve introdução, o presente estudo possui por finalidade analisar
possíveis fatores que influenciaram na reeleição de deputados federais em 2018. As
eleições majoritárias proporcionam informações dos políticos à sociedade, os eleitores
podem conhecer as ações desenvolvidas ao longo da ocupação do cargo, a reputação dos
agentes que representam a sociedade, e ainda, com uma quantidade menor de candidatos
em disputa é possível escolher eventuais representantes com base nas disputas locais
e regionais, considerando possíveis alianças políticas entre o executivo local (prefeitos),
legislativo municipal (vereadores) e o legislativo estadual (deputados estaduais).
Dentro desse contexto onde o trabalho é desenvolvido, surge o seguinte
questionamento: O que influencia as reeleições para deputados federais no Nordeste?
A partir desta questão, o objetivo geral que norteia o presente estudo é analisar variáveis
que influenciaram os resultados das reeleições para o cargo de deputado federal no
Nordeste nas eleições majoritárias de 2018.
Em desdobramento ao objetivo geral apontado acima, temos os objetivos
específicos abaixo:
i) Realizar uma breve descrição da representação eleitoral para o Nordeste durante a
eleição de 2018.
ii) Analisar o sucesso da reeleição na performance nacional e o impacto do apoio de
governos estaduais na eleição de 2018.
A partir dessas informações iniciais, o presente estudo é dividido em quatro seções
além desta introdução. Na segunda seção, são desenvolvidos aspectos teóricos que norteiam
o presente estudo, desde aspectos referentes à estratégia eleitoral e atuação parlamentar até
estudos sobre reeleição; já na terceira seção, temos os aspectos metodológicos utilizados
para o estudo. Dando prosseguimento, na quarta seção, são apresentados os resultados do
estudo realizado; e, por fim, na quinta seção, temos as considerações finais do estudo com
breves conclusões, limitações e recomendações.

ASPECTOS TEÓRICOS: A TEORIA DA ESCOLHA PÚBLICA E O CONTEXTO POLÍTICO ELEITORAL

Política e economia podem apresentar relação de dependência, conforme podemos


verificar em Mendonça (2000) em que, de um lado, temos a política contemplando diversos

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interesses econômicos, de outro, temos a dependência à medida que as relações econômicas


se realizam. Esse contexto corrobora com a Teoria da Escolha Pública (TEP), seguindo o que
evidencia (Borsani, 2004) sobre a Public Choice. O autor destaca que a TEP vem a ser “o estudo
dos processos de decisão política numa democracia, utilizando um instrumental analítico
da economia, fundamentalmente os conceitos de comportamento racional e autointeresse
que definem o homo economicus”. A TEP tem sua origem ligada ao século XVIII, a partir dos
estudos do Marquês de Condorcet e o estudo do paradoxo do voto.
Em relação à natureza contemporânea, temos a importância dos trabalhos de Arrow
(1951) que deu origem à teoria da escolha social, porém, não busca analisar a tomada
de decisão coletiva no âmbito político, mas quais deveriam ser os procedimentos que
garantem as escolhas sociais do conjunto da sociedade, para isso, considera-se o caráter
democrático. Destaca-se ainda, que as escolhas sejam agregação de preferências individuais
que maximizem a satisfação ou bem-estar do conjunto social. Outros autores que podem
ser citados são Downs (1957), Buchanan e Tullock (1962) e Riker (1962), ambos os autores
são considerados fundadores da TEP contemporânea.
A TEP apresenta duas abordagens, uma normativa – estuda os processos pelos quais
são escolhidas as regras e instituições que definem as regras do jogo (decisões coletivas
do governo) (PEREIRA, 1997; BORSANI, 2004); uma abordagem positiva – busca-se decifrar
as estratégias individuais de diferentes atores que interferem em processos de decisões
coletivas em governo democráticos e determinar possíveis resultados (PEREIRA, 1997;
BORSANI, 2004). Considerando ambas as abordagens, temos os pressupostos centrais: i)
comportamento racional e o ii) interesse próprio, sendo estes motivadores de preferências
de eleitores e governantes, e iii) o conjunto de regras e instituições políticas, assim, cada
indivíduo escolhe a estratégia que possibilite maior utilidade, maximizando seus benefícios,
por outro lado, a escolha coletiva será um embate das preferências individuais que acabam
determinando possíveis relações entre participantes e o resultado (PEREIRA, 1997; BORSANI,
2004; SOUZA, 2006).
Quanto à TEP, ainda são apresentados conceitos necessários sobre a decisão
coletiva e os efeitos de tais preferências, a citar: i) regras da maioria – a aprovação ocorre
conforme maior quantidade de votos para a tomada de decisão, porém, uma limitação é a
impossibilidade de avaliar a intensidade da preferência; ii) teorema do eleitor mediano – o
eleitor passa a optar pela escolha que está na média das preferências; iii) paradoxo do voto
– escolha entre pares de alternativas, contudo, nem sempre apresenta a opção preferida
do grupo. Desta forma, os agentes escolhidos pela sociedade possuem um papel essencial

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na elaboração, implementação e gestão de políticas públicas, assumindo a TEP um caráter


interdisciplinar entre política e economia.
Quanto a sua aplicação, a TEP apresenta um papel importantíssimo para a sociedade,
as decisões políticas e econômicas estão sujeitas ao conjunto de poderes repartidos por
diferentes grupos e funções no sistema político (PEREIRA, 1997).
O contexto político e eleitoral tem sido amplamente debatido nos últimos anos,
fornecendo importante papel para toda a sociedade, visto que uma infinidade de impactos
é proporcionada como fruto dos resultados eleitorais, desde a proposição de um projeto de
lei, a escolhas de valores e direcionamentos de políticas públicas. Umas das escolhas que
afetam positiva ou negativamente, a depender de sua aplicação, é o orçamento público,
tendo em vista que o processo de elaboração é complexo e envolve uma diversidade de
variáveis, pois considera as prioridades para o Brasil.
Mesmo que o Estado possua a responsabilidade na manutenção da ordem e em
oferecer serviços básicos à população, diferentes medidas podem ser tomadas pelo conjunto
de agentes que representam a sociedade. Tais medidas afetam os contextos político, social
e econômico, tendo em vista que o comportamento dos representantes da sociedade pode
ser classificado como oportunista, dado queiram aumentar suas chances de permanecer no
cargo (Binswanger e Prufer, 2012; Acemoglu et. al., 2013; Chesterley e Roberti, 2018).
O interesse em compreender o interesse e alternativas escolhidas pelo eleitor
remete-se às décadas de 50 e 60, com o surgimento da TEP, Polsby (1968) é um dos autores
que se destacam no estudo da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos (House of
Representatives), a considerar a regra da seniority, a qual premiava os representantes que
possuíam maior tempo de permanência na estrutura legislativa com cargos de chefias
em comissões. Essa regra permitia o incentivo à profissionalização dos representantes da
sociedade e busca por reeleições, contudo, essa regra foi modificada na década de 1970,
assim passa a surgir o custo de não concorrer à reeleição com a finalidade de disputar cargos
mais altos. Vários estudos foram realizados buscando prever as decisões dos agentes, sejam
estes amadores ou incumbentes candidatos à reeleição, destes podem ser citados Black
(1972), Copeland (1989) e Canon (1993). Embora possa existir a candidatura para outros
cargos além da House of Representant, existe o custo de não ser eleito para o cargo em carreira
progressiva e ainda que na reeleição o candidato seja o principal, o destaque da mídia.
Por outro lado, o sistema eleitoral brasileiro também tem sido amplamente
estudado, entretanto, diferente do norte-americano já enfrentou diversas modificações,

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desde o período da República Velha (1899-1930) ao atual período da Nova República


(1985 – até os dias atuais). O atual período tem sido amplamente analisado, desde estudos
de natureza quantitativa (SCHMITT, 1999; MENEGUIN; BUGARIN, 2001; LEONI et. al., 2003;
ARVATE, 2004; MANCUSO et. al., 2013; DIAS; FERRAZ, 2019; AVIS et. al., 2020), até outros
com aplicações mais complexas envolvendo jogos (MORAIS; KOPRIK, 2018; GRIEBELER e
STEIN, 2020), dentre outros.
Diferente do sistema eleitoral norte-americano, o sistema eleitoral brasileiro
possui particularidades que permite a intercalação de eleições, a depender da função do
incumbente o custo das funções é minimizado. A ciência política aliada à economia tem
destacado o fato de incumbentes da função de deputados federais concorrerem a outros
cargos, um exemplo é o cargo de prefeito. O gráfico abaixo apresenta um exemplo da busca
por essas funções.

Gráfico 01 - Deputados federais candidatos nas eleições municipais

Fonte: Elaboração do autor com base em DIAP, 2020.

O exemplo acima é reflexo da não simultaneidade das eleições brasileiras, enquanto


temos as eleições majoritárias em 2018 e a próxima em 2022, temos as eleições proporcionais
em 2020 e 2024. Esse fato ocasiona a não perda de mandato de incumbente de deputados
federais ao concorrerem às eleições municipais, por isso, a busca pelas eleições municipais
(cargo de prefeito). No entanto, temos duas possibilidades para tal fato: a primeira
possibilidade refere-se à busca por eleições alternadas na finalidade de obter maior
representatividade para as próximas eleições, o deputado federal pode concorrer a prefeito
com a finalidade de tornar-se mais conhecido em domicílios eleitorais onde foi votado,
visando maior apoio e mais votos no futuro; como segunda possibilidade, evidencia-se o
desejo por progressão na carreira política, visando eleições para o executivo por ambição

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política, dado que no executivo o incentivo consiste na maior capacidade para influenciar
políticas públicas, aplicação de recursos e melhor apresentação de resultados, podendo os
resultados no executivo servir para alavancar o retorno à bancada federal.
Corroborando com o argumento acima, temos em Graça e Souza (2014) um estudo
que debate sobre esse processo, no qual os autores consideram o retorno eleitoral obtido
via desempenho nas eleições para o executivo municipal. Antagônica às eleições nos
Estados Unidos, o custo das eleições no Brasil é menor, em função da utilização de eleições
alternadas. Neste caso, não estão sendo tratados valores da campanha eleitoral no Brasil,
mas sim o custo eleitoral, ou seja, o custo relacionado à perda de mandato em função da
perda de eleição.
Quando consideramos a eleição no Brasil, temos a possibilidade de os candidatos
concorrerem a cada dois anos, espaço de tempo entre as eleições majoritárias (nacionais) e
eleições locais, logo, se o candidato for incumbente no cargo de deputado federal seu custo
em concorrer ao executivo municipal é menor. Outro aspecto a ser registrado corresponde
ao apontado por Graça e Souza (2014) em que os custos financeiros de uma campanha
majoritária são proporcionalmente maiores que os custos de eleições locais, então a busca
por concorrer ao executivo corresponde à intenção de satisfazer uma das duas possibilidades
acima: maior representatividade nas próximas eleições ou progressão na carreira política.
Assim, temos internamente a estratégia de utilizar o candidato a prefeito como um possível
puxador de votos no futuro. Apesar disso, tivemos uma mudança no código eleitoral com o
Projeto de Lei 5735/1327, no qual os candidatos devem obter pelo menos 10% do quociente
eleitoral, mesmo assim, as alianças proporcionadas em partidos com puxadores de voto
ainda correspondem como meio para a reeleição.
Desde que tivemos o retorno do processo democrático, a eleição de 2020 foi a que
apresentou menor quantidade de deputados federais concorrendo ao pleito do executivo
municipal, conforme o Gráfico 01. A diminuição da quantidade de candidatos pode ser
reflexo da queda de arrecadação e repasse de recursos para os municípios, conforme estudo
técnico de dezembro de 2020 da Confederação Nacional dos Municípios28.
27BRASIL – Câmara dos Deputados. Projeto de Lei 5.735/2013. Brasília-DF, 2015. Disponível em: https://
www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1102056&filename=PL+5735/2013.
Acesso em: 15 de abr. 2021.
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planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13165.htm. Acesso em: 15 de abr. 2021.
28 CONFEDERAÇÃO NACIONAL DOS MUNICÍPIOS. O Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em
2020 e as perspectivas para 2021. Porto Alegre- RS, 2020. Disponível em: https://www.cnm.org.br/cms/
biblioteca/O-Fundo-de-Participacao-dos-Municipios-FPM-em-2020-e-as-perspectivas-para-2021.pdf.
Acesso em: 15 de abr. 2021.

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ASPECTOS METODOLÓGICOS PARA ANÁLISE

A presente seção possui por finalidade apresentar a metodologia utilizada, as


variáveis e comentar sobre os dados escolhidos para o estudo. Em relação ao período, temos
como ponto de análise o período eleitoral de 2018. A escolha pelo ponto de corte deve-se
à tentativa de verificar efeitos pós-processo do impeachment da presidente Dilma Roussef,
ocorrido em 31 de agosto de 2016. A escolha pelo período não reflete uma decisão em
defesa do processo de impeachment, nem tão pouco contrário, a análise refere-se apenas
à tentativa de investigar o efeito da reeleição dos deputados federais representantes do
Nordeste, dada a crise política instaurada desde o início do processo do impeachment. Assim,
a única eleição a ser considerada é o pleito eleitoral de 2018.
Como região, destaca-se a escolha pelo Nordeste em função de suas particularidades
e problemas sociais, dos quais podemos citar a concentração de renda, pouca diversificação
da indústria e fenômenos naturais, a exemplo da seca no Nordeste brasileiro.

DEFINIÇÃO DAS VARIÁVEIS UTILIZADAS NO ESTUDO

Para a análise das relações estabelecidas entre a reeleição dos deputados federais,
representantes da região Nordeste e dos fatores que podem influenciar a variável
dependente, foram utilizados como base alguns estudos realizados anteriormente, a
exemplo de Amorim Neto et al. (2003), Leoni, Pereira e Rennó (2003), Rennó (2007), Mancuso
et. al. (2013), Graça e Souza (2014), Cervi et al. (2015), Avelino et al. (2016) e Morais e Koprik
(2018). A partir de tais estudos, tornou-se evidente a necessidade de compreender não
apenas o voto como um todo, mas também compreender as partes, ou seja, as cidades em
que os políticos apresentaram maior quantidade de votos, assim, foi realizada uma análise
descritiva e um modelo logit no presente estudo, com isso, as relações com a base também
foram consideradas.
Três tipos de variáveis independentes foram utilizadas: i) relação com o executivo –
para a relação com o executivo foram consideradas duas variáveis: a aliança estabelecida
com prefeito eleito em 2016 e aliança com o governador em 2018; ii) variáveis eleitorais
– para a relação de variáveis eleitorais foram consideradas: o voto em 2018 em todo o
estado, o voto em 2018 nas cidades que tiveram mais votos, o quociente eleitoral em
2018, a concorrência para prefeito em 2016; iii) variáveis gerais – PIB per capita, gastos
com voto em 2018, quantidade de famílias inscritas no Bolsa Família em 2017. Como
variável dependente foi utilizada o sucesso eleitoral, variável dicotômica que mede a

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reeleição dos deputados federais, com valores de 0 e 1. O quadro 01 realiza uma breve
descrição das variáveis.

Quadro 01 - Variáveis utilizadas no estudo


Quadro Analítico das Variáveis

Variável dicotômica que determina as alianças


AL_P_2016 (TSE) dos deputados federais com os prefeitos eleitos
em 2016 – 0 (Não) e 1 (Sim).
Relação com o
Executivo
Variável dicotômica que determina as alianças
AL_G_2018 (TSE) dos deputados federais com os governadores
eleitos em 2018 – 0 (Não) e 1 (Sim).

Quantidade de votos obtidos no Estado pelos


V_2018 (TSE)
deputados federais em 2018.
Quantidade de votos obtidos na cidade em que
V_Cid_2018 (TSE) os deputados federais foram mais votados em
2018.

Variáveis Eleitorais Divisão entre a quantidade de votos e a


Q_C_2018 (TSE)
população.

Variável dicotômica que expressa se o candidato


C_P_2016 (TSE) concorreu ou não à eleição de 2016 – 0 (Não) e 1
(Sim).

Representa a soma das riquezas divididas pela


P_cap_2018 (IBGE) população das cidades em que os deputados
tiveram maior quantidade de votos.
Variáveis Gerais
Quociente das despesas eleitorais pela
G_V_2018 (TSE)
quantidade de votos
Quantidade de famílias inscritas no Programa
Q_Fam_2017 (Min.Cid.)
Bolsa Família em 2017
Fonte: Elaborado pelo autor, 2021.

Diante do exposto, os dados representam valores correspondentes ao total de 114


deputados federais que concorreram à reeleição em 2018, sendo estes representantes
dos Estados do Nordeste. Contudo, destaca-se que essas variáveis foram utilizadas para
análise do modelo, porém, algumas não foram significativas ao modelo. Os dados foram
obtidos via site do Tribunal Superior Eleitoral, referente às eleições de 2014 (eleição para
deputado), 2016 (eleição para prefeito) e 2018 (reeleição para deputado), IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística) e Secretaria Especial do Desenvolvimento Social
(Ministério da Cidadania).

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MÉTODO PARA TRATAMENTO

Visando analisar variáveis que impactam na reeleição dos deputados federais, foi
apresentada como variável dependente o Sucesso na Reeleição. Os dados foram analisados
através de software estatístico, quanto à análise dos dados foram utilizadas: técnicas
descritivas – visando estabelecer uma descrição referente às características; técnica de
regressão logística (logit) – modelo de regressão que possui a variável de saída categórica
dicotômica e apresenta variáveis previsoras contínuas ou categóricas.
Segundo Field (2009), “a regressão logística é uma regressão múltipla, mas
com uma variável de saída categórica dicotômica e variáveis previsoras contínuas ou
categóricas.” Assim, torna-se possível prever a qual categoria um indivíduo ou evento
está associado. A regressão logística é muito utilizada na literatura biomédica devido
a sua aplicação em formular modelos sobre fatores que determinam e/ou contribuem
para determinada doença, da mesma forma, em relação a tratamentos de doenças,
como exemplo podemos citar: fatores que determinam se um tumor é benigno, se a
utilização do tabaco influencia em doenças pulmonares, avaliação da disponibilização
de crédito, satisfação quanto ao mercado de trabalho, enfim, sua aplicação não fica
condicionada a apenas uma realidade. Sucintamente, o modelo de regressão logit
estima a probabilidade de ocorrerem eventos binários.
Diferente do modelo de regressão linear, o modelo logit não busca prever ou explicar
a existência de relação entre uma variável dependente com uma e/ou várias variáveis
independentes, conforme destaca Malhotra (2012), o modelo logit estima “a probabilidade
de uma observação pertencer a determinado grupo.” A probabilidade pode ser estimada a
partir da equação:

(1)

P(Y) corresponde à probabilidade de Y ocorrer e à base dos logaritmos naturais, os


demais coeficientes formam uma combinação linear, semelhante à regressão simples, onde,
b0 refere-se à constante, (X) à variável previsora, b1 é o coeficiente agregado ao previsor e
ℇi corresponde ao erro. Ao estender a equação para incluir diversas variáveis previsoras, a
equação assume o resultado a seguir:

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(2)

Ou ainda,

(3)

p = probabilidade, Xi = variável independente de i, e αi = parâmetro a ser estimado.


Assim, a combinação linear foi estendida com a finalidade de incluir uma maior
combinação de variáveis, sejam estas dicotômicas e/ou quantitativas. Segundo Field
(2009), a equação de regressão logística acima, expressa uma regressão múltipla em termos
logarítmicos, resolvendo o problema da violação da hipótese de linearidade. O valor
resultante da equação varia entre 0 e 1, em que Y poderá ser 0 (com a saída não ocorrer) e 1
(da saída ocorrer).
Para Malhotra (2012), as medidas de adequação do modelo são baseadas na função
de probabilidade e no R2 de Cox & Snell e o R2 de Nagelkerke, medidas semelhantes ao R2
da regressão múltipla. O R2 de Cox & Snell não vem a chegar próximo de 1,0, mesmo com a
adequação do modelo de forma perfeita aos dados, porém, essa limitação é superada pelo
R2 de Nagelkerke, para isso, foi utilizado o modelo de verossimilhança-log (VL), baseado na
soma das probabilidades que são associadas com as saídas real e prevista.
(4)

E o R2 de Cox & Snell (5) e de R2Nagelkerke e (6).

(5)

(6)

Em continuidade, para análise dos coeficientes, temos o teste de Wald nos


informando se os bs são significativamente diferentes de 0, ocorrendo tal fato, esse teste
é utilizado para determinar se uma variável pode ser significativa, sendo mais precisa para

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examinar a estatística de razão da verossimilhança. O teste de Wald se assemelha ao teste


de parâmetros ou de coeficiente individuais da regressão múltipla. Sobre o teste, Malhotra
(2012) destaca que “é um teste de significância do coeficiente de regressão logística com
base na propriedade de normalidade assintótica de estimativas de probabilidade”, Field
(2009) evidencia que da “mesma forma que o teste t na regressão linear, a estatística de
Wald nos informa se o coeficiente b de cada previsor é significativamente diferente de zero.”
De forma básica e sucinta, pode ser destacado que o teste de Wald é análogo ao teste t da
regressão linear.
Wald = b / EPb (7)

Outro aspecto a ser analisado para a interpretação da logit é o Exp b, corresponde um


indicador da mudança de probabilidades da mudança de unidade a ocorrer no previsor, conforme
destaca Field (2009).

FATORES QUE INFLUENCIAM A ELEIÇÃO DOS DEPUTADOS FEDERAIS NO NORDESTE

A presente seção segue uma breve divisão, conforme os objetivos apresentados na


introdução do presente estudo.

DESCRIÇÃO E REPRESENTAÇÃO ELEITORAL NAS ELEIÇÕES

Conforme descrito anteriormente no presente trabalho, o público-alvo utilizado


como objeto de estudo foram os deputados federais eleitos na região Nordeste no pleito de
2014, e que concorreram para a mesma função em 2018. Não foram considerados indivíduos
que concorreram para outras representações públicas, seja senador, deputado estadual,
presidente ou governador; ficaram de fora da análise indivíduos que concorreram ao cargo
de prefeito na eleição de 2016 e venceram as eleições. Desta forma, tivemos um quantitativo
de 114 indivíduos distribuídos ao longo dos 9 estados nordestinos, com a seguinte divisão
conforme o Quadro 02.
O Quadro 2 apresenta 3 informações: Quantitativo – quantidade de deputados que
concorreram por Estado; Percentual – percentual de candidatos que disputaram as vagas
por Estado, como, por exemplo, no Estado de Alagoas que possui 9 vagas, porém, apenas 7
concorreram à reeleição (7/9 = 0,7777778, aproximadamente 0,78), e assim sucessivamente
para os demais Estados; Sucesso – percentual de sucesso na reeleição, quantidade de
deputados que tentaram a reeleição e foram reeleitos (quantidade de eleitos / quantidade
de vagas). O sucesso é medido em 0 (não for reeleito) e 1 (se for reeleito).

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Em relação ao quantitativo de indivíduos que concorreram às vagas, temos que o


estado que atingiu o maior percentual foi a Bahia com 85%, seguido por Piauí – 80% e Alagoas
– 78%. O Estado que se destaca com o menor percentual de concorrentes à reeleição foi a
Paraíba, indicando um maior percentual de possível renovação do quadro político, embora
aqui não estejamos considerando grupos políticos.

Quadro 02 - Quantidade de deputados que concorreram à reeleição por Estado, Percentual e


Sucesso
Estados Quantitativo Percentual Sucesso
Alagoas 7 0,78 0,44
Bahia 33 0,85 0,64
Ceará 18 0,75 0,33
Maranhão 12 0,67 0,44
Paraíba 7 0,58 0,42
Pernambuco 18 0,72 0,52
Piauí 8 0,80 0,50
Rio Grande do Norte 5 0,63 0,38
Sergipe 6 0,75 0,50
Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do TSE, 2021.

Ainda no Quadro 02, temos o Sucesso da reeleição, indicando a Bahia com a maior
taxa de sucesso (reeleitos / quantidade de vagas) – 64%; seguido do Pernambuco – 52%. A
menor taxa de sucesso foi apresentada pelo Estado do Ceará com 33% de reeleição.
Outro fator importante analisado descritivamente corresponde à possibilidade
de eleição intercalada, o que isso significa? Quando políticos utilizam de eleições a cada
2 anos com a finalidade de alcançar cargos mais elevados, ou obter cargos no executivo.
Um exemplo que podemos destacar é a eleição intercalada entre a candidatura a prefeito
(executivo municipal) e deputado federal, alguns candidatos podem concorrer à prefeitura
para obter maior quantidade de votos, ou ainda, utilizar a eleição para deputado para obter
vitória no pleito eleitoral para prefeitura.
Em relação ao fato de terem concorrido à prefeitura nas eleições de 2016, apenas 11
deputados federais concorreram ao cargo. Desta forma, tal fator pode não ser significativo
e não tenha influenciado na eleição para deputado em 2018, conforme a coluna 04, variável
C_Pref_16.

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Tabela 01- Variáveis categóricas

Taxa_S_F Mudou C_Pref_16 AL_Pref_16 AL_G_18 AL_P_18

Sim 75 41 11 46 52 3
Não 39 73 103 68 62 111
Média ,66 ,36 ,10 ,40 ,46 ,03
Variância ,227 ,232 ,088 ,243 ,250 ,026
Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do TSE, 2021.

SUCESSO DA REELEIÇÃO E PERFORMANCE ELEITORAL

A presente subseção discute sobre o possível sucesso do deputado federal em


mandato de reeleição. A performance eleitoral é fruto de possíveis interações, algumas
relações podem influenciar no sucesso da reeleição, seja de natureza quantitativa, seja de
alianças eleitorais estabelecidas antes ou durante as campanhas eleitorais.
Embora o processo de reeleição esteja em debate, exemplos dessas discussões são
as PECs29: i) 77/2003 – debate sobre a criação de um Fundo Especial para o Financiamento
da Democracia, cuja finalidade foi a modificação do sistema político eleitoral brasileiro,
essa PEC também foi conhecida como a ‘PEC do distritão’, seus críticos destacaram
favorecer apenas os interesses de alguns, diferente do atual sistema eleitoral; ii) 35/2014
– busca modificar artigos da Constituição Federal, estabelecendo a proibição da reeleição
para cargos do poder executivo, estabelecendo ainda regras de transição (arquivada
em 21/12/2018); iii) 282/2016 – busca vedar as coligações em eleições proporcionais,
disciplinando a autonomia dos partidos políticos e estabelece normas sobre fidelidade
partidária e funcionamento parlamentar; iv) PEC de 2020 (Deputado Alessandro Molon
– PSB/RJ) – busca acabar com a reeleição para cargos do executivo já em 2022; PEC de
2020 (Partido Podemos) – proposta do líder do Podemos, deputado Léo Moraes, busca
acabar com a reeleição para os eleitos na campanha de 2026, fator de não impacta na
atual vigência do cargo para presidência.
Desta forma, buscou-se o efeito de variáveis na taxa de reeleição dos deputados
federais eleitos em 2014. Para tanto, foi realizado um teste de regressão logística binária,
29 Proposta de Emenda Constitucional – A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pode ser apresentada pelo
presidente da República, por um terço dos deputados federais ou dos senadores ou por mais da metade das
assembleias legislativas, desde que cada uma delas se manifeste pela maioria relativa de seus componentes.
(GLOSSÁRIO LEGISLATIVO DO SENADO BRASILEIRO, 2021).
Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/glossario-legislativo/emenda-
constitucional#:~:text=A%20Proposta%20de%20Emenda%20%C3%A0,maioria%20relativa%20de%20
seus%20componentes. Acesso em: 7 abr. 2021.

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a escolha por esse método deu-se em função da variável dependente ser binária. O teste
analisou o efeito de variáveis na reeleição em 2018.
O teste buscou o efeito dos votos gerais na reeleição e foram utilizadas as seguintes
variáveis: Votos em 2018 – referente ao quantitativo de votos obtidos no pleito eleitoral de
2018; Gastos por voto em 2018 – despesas de campanha sobre os votos obtidos no Estado
(despesas/quantidade de votos); Aliado do Prefeito eleito em 2016 – variável dicotômica
que verifica o impacto da aliança com prefeitos eleitos em 2016; Aliado do Governador
2018 – variável dicotômica que busca verificar o impacto da aliança com governadores
eleitos em 2018.
Em continuidade, no modelo de regressão linear temos o R2 como medida estatística,
sendo analisado o quão próximo os dados podem estar da linha de regressão. Na regressão
múltipla temos o R2 como coeficiente de determinação, onde é analisada a correlação de
Pearson ao quadrado entre os valores de saída e previstos. Seguindo essa direção, Field
(2009) e Malhotra (2012) destacam que podemos realizar a análise de aderência do modelo,
para isso utilizaremos o modelo de verossimilhança-log (VL).
Inicialmente, foi determinado o modelo utilizando somente a constante, com isso,
é possível verificar que a constante apresentou adequação ao modelo via estatística Wald,
a qual informa se o coeficiente β do previsor é significativo. Conforme a seção 3 sobre os
Aspectos Metodológicos para Análise, o teste de Wald vem a ser o teste de significância do
coeficiente de regressão logística.
O modelo foi estimado por máxima verossimilhança e podemos verificar que os
valores do β foram significativos, conforme valores presentes na quinta coluna da Tabela 02.
Uma observação em relação à Tabela 02 refere-se a não significância da variável aliança como
prefeito eleito em 2016, por isso, a variável foi excluída quando o modelo de verossimilhança
foi estimado.
Em continuidade, o modelo de verossimilhança apresentou uma diminuição e
melhor ajuste. A partir da 3ª interação, o ajuste diminuiu de 58,502 para 42,444, com um
pseudo R2 de 0,743 para 0,827; o pseudo R2 de Nagelkerke pode vir a ser destacado como
um valor similar ao R2 da regressão linear.
Com base nas informações da Tabela 02, temos que a variável voto influenciou
positivamente na reeleição dos deputados federais da região Nordeste em 2018, valor com
indicador Exp b maior que 1,0, indicando que quando o previsor aumenta, as chances de a

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saída ocorrer aumentam, ou seja, isso significa que quanto maior a quantidade de votos, isso
influencia na eleição do candidato à reeleição.
Por outro lado, as demais variáveis, assim como a constante, apresentaram valor
negativo, os gastos por voto em 2018 apresentaram coeficiente negativo. A explicação para
esse resultado deve-se ao fato de candidatos terem despesas altas de campanha, porém
com performance eleitoral não favorável, basicamente alta despesa e votos não suficientes
para reeleição; candidatos tiveram maiores despesas eleitorais e não foram eleitos, por
outro lado, candidatos que gastaram menor quantidade de recursos tiveram êxito eleitoral
alcançando o sucesso na reeleição.
Com isso, necessariamente ter uma quantidade maior de recursos não significa
reeleição se o candidato não conseguir obter o ‘carisma’ do eleitor, logo, recursos de
campanha podem não influenciar a eleição positivamente, embora, destacam-se os casos
analisados no presente estudo.
A variável aliança com o candidato ao governo também não contou positivamente,
mesmo que alguns buscassem a reeleição, logo, ser aliado do candidato ao governo não foi
significativo. Por fim, a porcentagem global de sucesso na reeleição foi de 65%, com um total
de 75 candidatos reeleitos. O teste de Wald surge como teste de significância do coeficiente
de regressão logística, comprovando a adequação dos resultados ao modelo.

Tabela 02 - Performance Eleitoral em 2018


Modelo (0) Modelo (1)
Variáveis
β Teste Wald β Teste Wald

,00051 14,398
Votos em 2018
,000

(0,04381) 6,884
Gastos por voto em 2018
,009

(3,23221) 10,076
Aliado do Governador 2018
,002
10,9718 (44,70217) 15,476
Constante 0,6539
0,00 ,000

Observações 114 114


R 2 Cox & Snell 0,538 0, 598
R 2 Nagelkerke 0,743 0,827
Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do TSE, 2021.

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Com a finalidade de verificar os efeitos de colinearidade, autocorrelação e ajuste


do modelo, foram realizados três testes. Para verificar a presença de multicolinearidade foi
realizada a estatística Variance Inflation Fator – VIF -, com a verificação da tolerância maior
que 0,10 e VIF com valores menores 5,0, indicando a não necessidade de preocupação com
multicolinearidade.
Em relação à autocorrelação, a estatística Durbin-Watson apresentou resultado
próximo de 2,0, (1,9) atendendo o pressuposto. Em relação ao ajuste do modelo, foi realizado
o teste de Hosmer-Lemeshow, calculado dividindo o qui-quadrado do modelo pelo valor
original de −2VL, assim temos, um qui-quadrado de 2,794 e p de significância de 0,947,
acima dos 0,05 necessários ao aceite de ajuste do modelo.

Tabela 03 - Estatística VIF (Votos – Estado)

Variáveis Tolerância VIF

Votos em 2018 0,697 1,435

Gastos por voto em 2018 0,840 1,191

Aliança com Governador em 2018 0,773 1,293

Fonte: Elaborado pelo autor com base nos dados do TSE, 2021.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atual seção busca apresentar os principais resultados obtidos após o presente


estudo. Com a finalidade de promover a melhor apresentação e guiar possíveis limitações
e recomendação, as considerações finais foram separadas em subseções, conforme
disponibilizado abaixo.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESTUDO

O presente estudo buscou identificar os possíveis determinantes para a reeleição de


deputados federais e o ponto de corte da análise foi a eleição de 2018. O público-alvo do
estudo foram os deputados federais eleitos em 2016 e que concorreram ao mesmo cargo
em 2018, assim, deputados eleitos que não concorreram ao mesmo cargo, independente
do motivo, não entraram na análise; o Nordeste foi utilizado como foco de investigação.
Desta forma, 114 indivíduos foram considerados na análise, com esse público dividido em 9
estados, conforme apresentado na análise dos resultados.

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Em relação à concorrência na reeleição, temos os estados da Bahia (85%), Piauí (80%)


e Alagoas (78%). Em relação ao sucesso, temos: Bahia 64% e Pernambuco (52%), por outro
lado, a menor proporção de sucesso foi no Ceará com 33% de reeleição.
Observando a totalidade, o Sucesso da Reeleição foi 66%, com um total de 75 de
indivíduos. A quantidade de reeleitos que mudaram de partido foi de 41 mudanças em
relação a 2014, porém não foram considerados no presente estudo.
Um aspecto apontado foi o fato de terem concorrido à eleição para o executivo
municipal em 2016, dos 114 candidatos, apenas 11 pretendentes.
Ao considerar a ideologia partidária, presenciamos a maior quantidade de indivíduos
em partidos de ala esquerda, tendo o Partido dos Trabalhadores – PT - com a maior
quantidade de pretendentes, partidos considerados fortes em outros colégios eleitorais
não obtiveram votação significativa, a exemplo do Partido da Social Democracia Brasileira –
PSDB - com apenas 1 voto. Outro fator a ser apresentado refere-se à aliança com o vencedor
à eleição presidencial de 2018, tal variável não se apresentou como significativa. A tentativa
considerada foi resultado da possível crise política instaurada no país, pós-2015, quando a
discussão entre ‘direita e esquerda’ tomou forte proporção nas mídias sociais.
Em continuidade, foi analisado um modelo logit, no qual analisou a performance
nacional quanto à reeleição, quatro variáveis foram incluídas, porém, o modelo logit
desconsiderou a significância da variável aliança com o prefeito, no caso da cidade em que
o deputado teve maior quantidade de voto. Desta forma, as variáveis inclusas na equação
foram Votos para 2018, gastos por voto (quociente das despesas/votos em 2018) e aliança
com o governador eleito, destas, apenas a variável voto em 2018 foi considerada positiva.
Assim, temos que a aliança com o governador não foi necessária para a reeleição dos
deputados, muito pelo contrário, contou negativamente; e quanto aos gastos por voto, o
fato de gastar mais em campanha não contribuiu para a reeleição em casos específicos.
Assim, o modelo voltado apenas para o Nordeste brasileiro aponta que outros fatores
podem ter influenciado a reeleição. O processo de mudança eleitoral ocorrido ao longo da
última década pode ter influenciado um pouco a percepção dos eleitores quanto as suas
escolhas, como resultado, 65,7% dos deputados se reelegeram, podendo apontar para
possíveis mudanças nas escolhas dos eleitores.
Outra consideração refere-se ao impacto de possíveis eleições alternadas, favorecendo
políticos que não serão afetados em função de perda de cargos, caso venham a perder a
eleição para o executivo municipal. Os deputados federais podem utilizar desse artifício para

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aumentar a quantidade de votos e possíveis apoios futuros a novas candidaturas, embora,


a quantidade de deputados federais que tentam eleição para o executivo municipal tem
diminuindo consideravelmente, uma das possíveis explicações consiste na diminuição de
recursos e de arrecadação dos municípios.
Contudo, ainda estamos distantes de fortes mudanças da sociedade. Um fator que
poderia modificar os agentes e a própria percepção da sociedade consiste na aprovação de
uma PEC que possa limitar o tempo e a possibilidade de reeleição.

LIMITAÇÕES DO ESTUDO

Como limitações, apontam-se:


 Foram utilizados dados de deputados eleitos em 2014 e que concorreram à reeleição
em 2018, totalizando 114 observações.
 A formação de grupos políticos e como tais grupos favorecem as eleições de seus
simpatizantes ou integrantes.

RECOMENDAÇÕES

Como recomendações, destacam-se:


 Incorporação de uma maior quantidade de variáveis referentes às eleições;
 Aplicação da análise de dados em painel - o período a ser analisado será de 1998
(período da nova república em que ocorreu a primeira reeleição) a 2022 (segunda
eleição pós-impeachment, podendo ser verificado o impacto da crise política
originada pós-eleições de 2014).

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184
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O artesanato e a identidade cultural no território


de Belo Monte / AL30
Bruna Izabela Ribeiro Alves dos Santos(1)

(1)
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0618-6454; Mestranda no Programa de Pós-graduação em Dinâmicas
Territoriais e Cultura (Prodic), da Universidade Estadual de Alagoas, BRAZIL, E-mail: brunaizabelaribeiroalves@
hotmail.com. ID Lattes: 4668910836933822

Todo o conteúdo expresso neste capítulo é de inteira responsabilidade dos seus autores.

INTRODUÇÃO

O enfoque deste trabalho é analisar o artesanato da cidade de Belo Monte - AL e


suas contribuições para o desenvolvimento econômico local que, além de suscitar práticas
mantidas entre gerações, apresenta um modo de expressão individual, realizada através
da arte, como construção da identidade do sujeito na contemporaneidade. Nesse sentido,
o objetivo é apresentar de que forma o artesanato está relacionado com a identidade
cultural a partir de um olhar pautado na ressignificação dos artefatos produzidos na
cidade. Para tanto, fez-se necessário adotar uma metodologia de natureza bibliográfica,
ancorada em teorias de autores como Bhabha (2007), Bauman (2013), Canclini (1998,
1983), Deleuze e Guattari (1996, 1980 apud Haesbart, 2007), Giddens (2003), Haesbaert
(2007) e Hall (1996, 2003).
Importante ressaltar que serão abordadas as temáticas relacionadas ao artesanato,
tradição, cultura e identidade, com uma breve explanação desses quatro elementos, sob a
perspectiva dos teóricos citados, que trazem diversos olhares sobre as questões em análise.
Assim, a proposta do artigo parte de uma preocupação relacionada à ressignificação
das culturas locais, em meio ao contato frequente com diferentes grupos sociais que se
conectam em uma rede veloz, em decorrência da modernidade, pós-modernidade e da
30 DOI: https://doi.org/10.48016/XIenccultgt6l1cap10
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globalização, influenciando no processo de aculturação do sujeito. Nessa direção, Giddens


(2003, p. 17) discorre que: “Vivemos num mundo de transformações, que afetam quase
todos os aspectos do que fazemos. Para bem ou para mal, estamos sendo impelidos rumo
a uma ordem global que ninguém compreende plenamente, mas cujos os efeitos se fazem
sentir sobre todos nós”.
Tem-se, na perspectiva de Giddens, que a cultura está sujeita a transformações
relacionadas ao meio ao qual está inserida, bem como que a globalização gera ganhos e
perdas de autenticidade em diversos aspectos da cultura e da sociedade, incluindo o campo
da produção artesanal, quando nos referimos ao desenvolvimento e comercialização de tais
artefatos, frutos da tradição e da cultura popular.
É cediço que a globalização proporciona no âmbito tecnológico, da informação e da
comunicação importantes contribuições para o desenvolvimento da economia mundial,
mas, ao mesmo tempo, influencia o campo cultural, das tradições e dos costumes. Para
corroborar com esse processo complexo que as sociedades vivenciam, trazendo para o
contexto atual, Giddens (2003, p. 23) assevera que: “A globalização não é, portanto, um
processo singular, mas um conjunto complexo de processos. E estes operam de uma
maneira contraditória ou antagônica […] A globalização é a razão do ressurgimento de
identidades culturais locais em várias partes do mundo”.
A base da cultura, por outro lado, reside no passado, na essência das tradições que
são parte da história da humanidade, refletida nos costumes, sujeitas a interferências
da modernidade, pós-modernidade e da globalização. Dessa maneira, é importante
compreender nesse contexto que:

Uma primeira tarefa é levar em conta as discrepantes concepções da


modernidade. Enquanto na arte, na arquitetura e na filosofia as correntes
pós-modernas são hegemônicas em muitos países, na economia e na
política latino-americanas prevalecem os objetivos modernizadores […] A
modernidade é vista então como uma máscara. Um simulacro urdido pelas
elites e pelos aparelhos estatais, sobretudo os que se ocupam da arte e da
cultura, mas que por isso mesmo os torna irrepresentativos e inverossímeis.
(CANCLINI, 1998, p. 24-25).

As tradições e os costumes manifestam-se como forma de resistência à


modernidade, em que se percebe uma contradição nos modos de produção e de
comercialização dos produtos, quando comparados com as grandes empresas, pois estas
utilizam a produção em massa, equipamentos de última geração e, em grande parte,

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fabricados não por pessoas e sim por máquinas, com uma geração de lucro substancial
quando comparados ao produto artesanal.
O artesão busca agregar ao seu produto um valor, aquilo que aprendeu, construiu e
se identificou ao longo da sua vida, por isso que comparar o artesanato aos modelos atuais
de produção e de mercado é uma distorção sem fim, no sentido de intimidar o sujeito a
perder um dos seus valores mais importante, que é a sua identidade.
Ademais, não significa dizer que o artesanato deve se restringir ao tradicional, tanto
em sua produção quanto em sua comercialização, o que se veda é que ele seja visto como
uma mercadoria em massa e não como algo único. Destaca-se que, essa forma de enxergar
o resultado final do produto artesanal como algo que não pode ser feito ou criado de
igual modo por outra pessoa, vem agregar um valor ao produto e também potencializar o
território onde está inserido.
Em outro enfoque, Giddens (2003, p. 54) afirma que “viver a tradição da maneira
tradicional significa defender as atividades tradicionais por meio de seu próprio ritual e
simbolismo – defender a tradição por meio de suas pretensões internas à verdade”. Dessa
forma, a discussão deste trabalho gira em torno da relação do artesanato, fruto da tradição
e da cultura popular, que estabelece uma identidade para a população belomontense, com
as interferências causadas pela modernidade, pós-modernidade e globalização, dando-se
ênfase ao campo da produção, difusão e comercialização destes artefatos.
Portanto, serão analisadas como essas transformações podem causar consequências
e danos para diversos setores do trabalho artesanal e de que forma o hibridismo cultural
é impactado. Na visão de Hall (2014), tem-se que a globalização vem causando uma
tendência ao colapso de todas essas identidades culturais fortes, tornando as identidades
fragmentadas e efêmeras pela multiplicidade de culturas híbridas que transformam o antigo
sujeito sociológico em sujeito pós-moderno global.
Por sua vez, Canclini (1998) sinaliza que a globalização se trata de um processo
formado a partir da internacionalização não só econômica, mas também cultural. Desse
modo, percebe-se que foram gerados organismos múltiplos, cuja sede não se encontra
predominantemente em nenhum país, mas suas conexões mantêm traços das nações
de origem.
Assim, o processo de globalização pode ser entendido sob uma ótica ampliada,
permitindo ver nesse fenômeno implicações que superam a simples denúncia de apropriação
do sistema capitalista e de uma eventual homogeneização da cultura, do sistema capitalista
e de uma eventual homogeneização da cultura.

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CULTURA E IDENTIDADE: UMA BREVE CONCEITUALIZAÇÃO

O conceito de cultura está ligado às transformações ocorridas através do


desenvolvimento da modernidade, o qual Bauman (2013, p. 6) entende como: “O conceito
original da cultura seria um agente da mudança do status quo, e não de sua preservação; ou,
mais precisamente, um instrumento de navegação para orientar a evolução social rumo a
uma condição humana universal”.
A cultura pode ser vista como parte integrante no processo de formação humana, a
qual aponta caminhos para sua ressignificação. Esses caminhos servem para que o homem
possa evoluir constantemente e não apenas para trazer uma sensação de imutabilidade ou
de conforto, pois nada do que é hoje pode continuar o sendo amanhã.
O que se entende por cultura e/ou por tradição pode(m) sofrer modificações a
depender do contexto social, político e econômico no qual o sujeito está inserido. Hall
(2003), sobre o assunto, aponta que:

A cultura e as tradições estão ligadas aos grupos sociais em que os


indivíduos estão inseridos […] os sentidos e valores que nascem entre
as classes e grupos sociais diferentes, com base em suas relações e
condições históricas, pelas quais eles lidam com suas condições de
existência e respondem a estas; e também com as tradições e práticas
vividas, através das quais esses entendimentos são expressos e nos quais
estão incorporados. (p. 142).

Dessa forma, seguindo o pensamento de Stuart Hall, compreende-se que a cultura


está intimamente ligada ao indivíduo, relacionando-a com a sua identidade e de acordo
com as suas dimensões temporais, a partir de suas reflexões práticas e ações acerca do
valor cultural, como algo em constante evolução. Sobre o fator tempo, Bhabha (2007)
enfatiza que:

A implicação dessa cisão enunciativa para a análise cultural […]


especialmente enfatizar sua dimensão temporal. A cisão do sujeito
da enunciação destrói a lógica da sincronicidade e da evolução que
tradicionalmente legitimam o sujeito do conhecimento cultural.
Frequentemente torna-se como pressuposto na problemática materialista
e idealista que o valor da cultura como objeto de estudo e o valor de
qualquer atividade analítica que seja considerada cultural reside na
capacidade de produzir uma unidade inter-referencial, generalizável, que
signifique uma progressão ou evolução de ideias-no-tempo, assim como
uma autorreflexão crítica sobre suas premissas ou determinantes. (p. 66).

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Dessa maneira, compreende-se que os conceitos de cultura e identidade possuem


diversos enfoques, saindo da perspectiva isolada de pensamento, com o intuito de refletir
acerca de novos quadros teóricos, observando-se que o processo de identificação cultural é
complexo, mas pode estabelecer novas formas de ver o mundo e sua cultura nos processos
de transformação.
Importante destacar que a identidade e, consequentemente, a cultura são construídas
através de um contraste, tendo o território como um dos fatores de referência patrimonial do
sujeito. Segundo Haesbaert (2007. p. 22), “o território é a combinações, funcional e simbólico,
pois as relações de poder têm no espaço um componente indissociável tanto na realização
de “funções” quanto na produção de “significados”. Assim, tem-se que o autor vem reafirmar
a importância da territorialidade no contexto de formação da identidade do sujeito, que
será mais bem explanado no tópico seguinte.

TERRITORIALIDADE COMO IDENTIDADE CULTURAL

O território traduz elementos culturais de uma maneira muito própria, fazendo


uma leitura da cultura, a partir do material e do imaterial. A cultura nos envolve em
questões relacionadas ao entendimento acerca do território, da identidade cultural como
representação. Para Bauman, (2013, p. 119) “já entremostrado pelas fragmentações e
particularizações sensíveis em toda parte devidas à cultura e ao território”. É, portanto,
uma forma de reconhecer, através da marcação da cultura, tais particularidades e
fragmentações, sensíveis a representação do território, que através do simbólica atribui,
no espaço e no tempo, referências para construção de uma identidade, marcada pela
cultura em suas particularidades.
Deleuze e Guattari (apud HAESBAERT, 2007, p. 40-41), trouxeram importantes
apontamentos sobre a desterritorialização, discorrendo que:

Jamais nos desterritorializamos sozinhos, mas no mínimo com dois


termos (…). E cada um dos dois termos se reterritorializa sobre o outro.
De forma que não se deve confundir a reterritorialização com o retorno a
uma territorialidade primitiva ou mais antiga: ela implica necessariamente
um conjunto de artifícios pelos quais um elemento, ele mesmo
desterritorializado, serve de territorialidade nova ao outro que também
perdeu a sua.

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Nessa perspectiva, há o estabelecimento de uma relação entre território, indivíduo e


sociedade, cujo conjunto, agregado a outras territorialidades, forma uma (re)territorialização,
estabelecendo um fortalecimento de identidades, causando possivelmente um processo de
aculturação, da modificação cultural de um indivíduo, grupo ou povo, que se adéqua a outra
cultura ou dela retira traços significativos para se fortalecer.
Importante trazer à baila o pensamento de Haesbaert (2007, p.2) sobre o território,
quando pondera que:

Território, assim, em qualquer acepção, tem a ver com poder, mas não
apenas ao tradicional “poder político”. Ele diz respeito tanto ao poder no
sentido mais explícito, de dominação, quanto ao poder no sentido mais
implícito ou simbólico, de apropriação. Lefebvre distingue apropriação de
dominação (“possessão”, “propriedade”), o primeiro sendo um processo
muito mais simbólico, carregado das marcas do “vivido”, do valor de uso, o
segundo mais concreto, funcional e vinculado ao valor de troca.

Desse modo, ao analisar a cidade de Belo Monte, situada no sertão de Alagoas,


percebe-se que se trata de um território marcado pelo crescimento e desempenho do
artesanato como desenvolvimento cultural e econômico, pois traduz a representação do
sertanejo a partir da produção de artefatos advindos do fazer artesanal da localidade,
agregando um grande valor simbólico, além de gerar renda para os menos favorecidos, os
quais estão negligenciados pelo poder público, encontrando amparo no saber herdado
entre gerações.
Para Canclini (1983, p. 50-51) “analisar as mudanças da cultura popular no capitalismo
[…] sintetizam os principais conflitos da sua incorporação”. Nesse sentido, Canclini apresenta
que em detrimento do capitalismo, a cultura sofre alterações e conflitos entre sua identidade
e as influências ideológicas do mercado.
Assim, segundo Bauman (2013, p. 82): “As formas, em meio as transformações todas
praticamente relacionadas com o território: uma economia territorial, uma cultura territorial,
regidas por regras, igualmente territorialidades, na forma de leis e de tratados, mas também
de costumes”.
Portanto, é necessário pontuar que o território, tanto na perspectiva material quanto
na simbólica, representa relevante aspecto da vida humana, pois é a partir dele que o homem
constrói a sua identidade.

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Importante trazer à baila que o que está em “jogo” não é a ressignificação da cultura
como expressão popular, mais sim os ganhos gerados por tal produção. O capitalismo quer
transformar o fazer artesanal em uma produção em massa; ou seja, com interferências
da indústria, privando o artesanato da sua autenticidade, fato que se encontra em
descompasso com o que se objetiva do trabalho artesanal. Nesse sentido, Canclini (1998,
p. 22) apresenta que:

A modernização diminui o papel do culto e do popular tradicionais no


conjunto do mercado simbólico, mas não os suprime. Redimensiona
a arte e o folclore, o saber acadêmico e a cultura industrializada, sob
condições relativamente semelhantes. O trabalho do artista e o do
artesão se aproximam quando cada um vivencia que a ordem simbólica
específica em que se nutria é redefinida pela lógica do mercado. Cada
vez podem prescindir menos da informação e da iconografia moderna,
do desencantamento do mundo de seus mundos autocentrados e do
reencantamento que a espetacularização da mídia propicia. O que se
desvanece não são tantos os bens antes conhecidos como cultos ou
populares, quanto à pretensão de uns e outros de configurar universos
autossuficientes, e de que as obras produzidas em cada campo sejam
unicamente ‘expressão’ de seus criadores.

A globalização também é uma forma de promover a mudança na construção


territorial e cultural, pois ela possibilita a interação dos lugares através da sua
multiplicidade. É importante ressaltar que o território carrega dimensões simbólicas e
está relacionado ao poder, fruto da modernidade, globalização e das relações projetadas
nas identidades ontológicas, essas que partem da existência do próprio grupo, para a
formação de um território, sendo a identidade territorial um elemento fundante, a
exemplo, os quilombolas e indígenas.
O território, no sentido de que seria primeiramente um valor, ao qual nós ligamos
espiritualmente, embasa o que foi dito em linhas anteriores, que o sujeito carrega consigo
valores e sentimentos de pertencimento a determinado grupo como, por exemplo, o de
artesãos. Esse sentimento é causado pelo que sentimos pelo nosso espaço-tempo vivido.
Assim, sobre o território simbólico, Haesbaert (2007, p. 6) cita que:

Para os geógrafos Bonnemaison e Cambrèzy (1996), por exemplo, vivemos


hoje sob uma “lógica culturalista” ou “pós-moderna” de base identitária e
reticular que se impõe sobre a lógica funcional e zona (estatal) moderna. Por
isso, “o território é primeiro um valor”, estabelecendo-se claramente “uma
relação forte, ou mesmo uma relação espiritual” com nossos espaços de

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vida. Numa distinção bastante questionável, o próprio “território cultural”


precederia os territórios “político” e “econômico”.

Dessa forma, enquanto artefato simbólico, em seu território de origem, o artesanato


está sendo valorizado através de uma cultura que pode ser chamada “memória espacial”,
considerada como cultura da materialidade e da imaterialidade que nos envolve, através da
história e do espaço, carregando uma herança de costumes e valores, contribuindo para a
melhoria das condições econômicas dos grupos sociais menos favorecidos.

CONTEXTO LOCAL DA CIDADE DE BELO MONTE (AL)

A cidade de Belo Monte (AL) é uma região com uma área de 334.116 Km² (Figura
1). Sua população é calculada em 6.710 habitantes, aproximadamente, sendo 16,7% da
população habitante na zona urbana e 83,3% na zona rural (IBGE, 2010). A cidade é localizada
à margem do Rio São Francisco, a uma distância de 210 km da capital Maceió. A população
belomontense tem como predominância econômica agricultura, pecuária, comércio e
turismo, como principais fontes de renda.

Figura 1 - Mapa do estado de Alagoas com localização do município de Belo Monte.

Fonte: IBGE (2010). Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/al/belo-monte/panorama. Acesso em 23


abr. 2021.

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Assim, acredita-se que o sertão alagoano possui um grande potencial criativo


capaz de contribuir para o desenvolvimento da região e de todo o Estado. Neste aspecto,
relacionamos o artesanato como um produto de desenvolvimento criativo, o qual utiliza os
saberes herdados entre as gerações, e destes saberes são produzidos diversos objetos que
possibilitam a geração de renda, destacando-se o fazer artesanal como papel fundamental
no desenvolvimento econômico deste território.
O artesanato agrega novas formas de pensar a produção cultural e artística, seja no
aspecto produtivo ou sustentável, pois quando falamos em artesanato, podemos agregar a
reciclagem como aliada neste processo de produção e de conscientização ambiental, além
do aspecto de transmissão do conhecimento para o aperfeiçoamento de novos saberes e
técnicas, possibilitando geração de renda e construções identitárias.
Questão relevante que deve ser posta é sobre o desafio da produção artesanal no
atual contexto da globalização, no sentido de perceber se a atividade desenvolvida se mostra
capaz de garantir a sustentabilidade econômica, através da permanência no mercado, sem
incorrer em descaracterização cultural e perda da identidade.
O interesse no artesanato como fonte de renda e sua articulação com o
desenvolvimento socioeconômico é crescente e abre diversas possibilidades de discussão.
Logo, o artesanato é a atividade que traduz a cultura de uma população por meio dos
sentidos e diversos significados que o constituem, guardando estreita relação com a
tradição, os modos de vida e a identidade do local em que é produzido.
Na visão de Hall (1996), as identidades do artesanato são estabelecidas pela
associação entre as diferentes representações dos agentes envolvidos no processo de
troca e constitui-se como um meio de produção que está em constante modificação,
caracterizando-se como um processo incompleto e intimamente relacionado a essas
representações. Portanto, o artesanato pode ser caracterizado como uma atividade social,
dadas as relações existentes entre os seus integrantes e a comunidade, bem como sobre a
atividade desenvolvida por eles.
Nesse viés, as diversas dimensões do fazer artesanal, somadas às suas diferentes
conceituações, contribuem para a existência de uma considerável diversidade de concepções
em torno do que é artesanato, não existindo uma mais certa do que a outra.

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ARTESANATO BELOMONTENSE

A cidade de Belo Monte, estado de Alagoas, possui vários artesãos, os quais, com
a sua arte e dedicação, desenvolvem o fazer artesanal com excelência, contribuindo
economicamente e potencializando o turismo cultural. Relacionando a vivência do conjunto
de elementos significativos do patrimônio histórico e dos eventos culturais, valorizando e
promovendo os bens materiais e imateriais da cultura local.
Na composição dos artefatos desenvolvidos, são exemplos: as carrancas, cadeiras
personalizadas, pinturas em tela, bordado, tricô, fuxico, dentre outras modalidades artesanais.
Para a economia de Belo Monte, no que se refere ao artesanato, as carrancas e as
cadeiras personalizadas ganharam maior visibilidade no fazer artesanal, especialmente
através do trabalho do artesão Jasson Gonçalves Da Silva, personagem que compõe a gama
de artesãos e que faz exposições de suas obras em outros municípios, estados e até mesmo
fora do Brasil (Figura 2).

Figura 2 – Peça do artista no estande Marco 500, no Instituto Europeu de Design, durante a
Design Week 2019 em São Paulo – SP.

Fonte: Arthur Lins (2021). Disponível em: http: artesol.org.br/2021

A história de vida deste mestre se une com a arte através da analogia entre o fazer
artesanal, a criatividade e o desejo de passar o seu legado adiante, ao mesmo tempo em
que, ao criar peças advindas de sua imaginação, alimenta a sua inspiração com elementos
da natureza, da fauna e da flora local, a partir de tudo que tenha vida e gera inspiração,
estando muito além da renda e ganhos econômicos, mas sim de uma autonomia pessoal,
transformando até mesmo a adversidade em oportunidade.

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Jasson Gonçalves da Silva (Figura 3), nascido em 1954, leva uma vida modesta ao lado
de sua família no Povoado Monte Santo, município de Belo Monte/AL, a poucos quilômetros
do Rio São Francisco. Um artesão que, com sua criatividade e empenho, exerce suas técnicas
e habilidades, construídas ao longo do tempo com suas experiências de vida, pois o mesmo,
além de artesão, tem uma gama de habilidade tais como: alvenaria, marcenaria, construção
civil, agricultura, pecuária, dentre outras, que desenvolveu ao longo de sua vida. No entanto,
a sua paixão está ligada aos artefatos que produz manualmente, com matéria-prima retirada
da natureza.

Figura 3 – Artesão Jasson Gonçalves da Silva

Fonte: Autor (2021)

Para encontrarmos este mestre do artesanato local, passamos por uma sinuosa
estrada de terra, nos perímetros do município de Belo Monte (AL), sinalizados pela arte a
qual é desenvolvida pelo artesão (Figura 4); em cada curva há um pouco de sua imaginação,
tornando a chegada ao destino mais entusiasmante. Com muita simplicidade, ele provou
que o talento não reconhece fronteiras.

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Figura 4 – Arte do mestre Jasson Gonçalves da Silva, seta de indicação para a residência do artesão.

Fonte: Autor (2021)

O artesão, desde criança, viveu e se criou na roça com os seus pais e familiares,
dedicando-se ao trabalho braçal e pesado no sertão alagoano. As obras que produz,
utilizando recursos e materiais existentes na localidade, possui em seus detalhes uma
história a contar. O mestre Jasson, como é conhecido, inspira-se na natureza e nos
acontecimentos diários de sua vida para expressar em suas obras um pouco do que vive
ou já viveu (Figura 5).

Figura 5 - Cadeiras de Jasson da coleção de Renan Quevedo na Exposição Criativos por


Tradição promovida pela Artesol, no Museu do Jardim Botânico em 2018.

Fonte: Arthur Lins. http: artesol.org.br/2021.

Segundo o site da Associação dos municípios Alagoanos (AMA), as peças do artesão


passaram a ser reconhecidas e fizeram parte de várias exposições, como, por exemplo,
cadeiras em madeira, cadeiras estilizadas, multicoloridas, citando-se outros exemplos, como
as carrancas (Figura 6), pássaros e frutos típicos da caatinga alagoana.

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Figura 6 – Carrancas. Arte do mestre Jasson Gonçalves da Silva.

Fonte: Autor (2021).

Jasson passou de agricultor desconhecido a artesão famoso, trazendo uma


compreensão de que o desenvolvimento socioeconômico e cultural desta comunidade
permitiu a identificação deste artesão local, produzindo suas peças com recursos oriundos
da região, pouco explorado pela população, tendo sua produção e comercialização em
vários locais que possibilitam a venda de sua arte.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreende-se que o artesanato é fruto da cultura popular e das tradições,


constituindo um modo no qual o sujeito transmitirá sua identidade através do seu fazer
artesanal, fruto do desenvolvimento criativo, utilizando-se dos saberes herdados entre as
gerações para se produzir diversos artefatos, os quais possibilitam a geração de renda e a
manutenção da família.
O artesanato também possibilita uma reflexão sobre a inserção dos indivíduos
no mundo moderno e suas especificidades, principalmente no que diz respeito à sua
constituição identitária, dando-nos pistas por meio de múltiplos olhares, sobre a relação
entre os diferentes sujeitos com o seu território e o meio social.
A perspectiva que se evidencia é na direção da necessidade de propor o
desenvolvimento de uma ação sistêmica para fortalecer o artesanato local e sua identidade,
visto que este se encontrava desvalorizado em decorrência dos fatores socioeconômicos
ocasionados pela globalização, que são desconectados da realidade da comunidade local,
tão rica em expressões e elementos culturais regionais.
A modernidade que para muitos traz riqueza e poder, para outros serve como fator
de pobreza e de exclusão social, modificando substancialmente os espaços de convivência

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entre as pessoas. Dentro desse contexto, o artesanato serve como importante mecanismo
para trazer fonte de renda para as comunidades locais e também proporcionar visibilidade
para o território onde esses bens são produzidos.
O exemplo do sucesso do artesão Jasson Gonçalves da Silva, demonstra que, mesmo
com as adversidades econômicas enfrentadas, é possível desenvolver o artesanato e ter
visibilidade nos cenários nacional e internacional, servindo de paradigma e de inspiração
para que outros artesãos devolvam suas habilidades no trabalho artesanal.
Importante destacar que o fazer artesanal constitui-se de uma atividade cultural, na
medida em que é construída, transmitida e modificada ao longo do tempo, perpetuando
modos de vida, saberes e fazeres de uma determinada sociedade, fazendo com que esses
valores sejam preservados e transmitidos de geração a geração.
Assim sendo, percebe-se que a globalização confirma, contraditoriamente, um
renovado interesse pela cultura local como antídoto à massificação; por esse motivo, o
desafio constante é de não transformar em simples modismo que, em tese, é passageiro,
por aquilo que mobiliza e torna sustentável a atividade inventiva dessas formas de vida, as
suas tradições e bens culturais.

REFERÊNCIAS

ARTISTA de Belo Monte tem obra exposta no Salão do Móvel de Milão. AMA – Associação
dos municípios Alagoanos. Disponível em: https://ama-al.com.br/artista-de-belo-monte-
tem-obra-exposta-no-salao-do-movel-de-milao/. Acesso em: 10 jul. 2021.

ENCONTRE os artesãos do Brasil. ARTESOL – Artesanato solidário. Disponível em: http:


artesol.org.br/. Acesso em: ago./set. 2021.

BAUMAN, Z. A cultura no mundo líquido moderno. Tradução Carlos Alberto Medeiros.


Rio de Janeiro: Zahar, 2013.

BHABHA, H. O Local da cultura. Belo Horizonte: EDUFMG, 2007.

CANCLINI, N. G. As culturas populares no capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1983.

CANCLINI, C. N. Culturas Híbridas. Estratégias para entrar e sair da modernidade. 2.ed.


São Paulo, 1998.

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CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

GIDDENS, A. Mundo em descontrole: o que a globalização está fazendo de nós. Tradução


Maria Luiza X. de A. Borges. 3. ed. Rio de Janeiro: Record, 2003.

HALL, S. Identidade Cultural e Diáspora. In: Revista do Patrimônio Histórico e Artístico


Nacional, n. 24, p. 68-75, 1996.

HALL, S. Da diáspora: Identidades e mediações culturais. Organização Liv Sovik; Tradução


Adelaine La Guardia. Resende. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.

HALL, S. A identidade cultural na pós-modernidade. Tradução: Tomaz Tadeu da Silva &


Guaciara Lopes Louro. Rio de Janeiro: Lamparina, 2014.

HAESBAERT. R. Território e multiterritorialidade: um debate. In: Geographia, ano IX, n. 17,


2007.

IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Brasileiro de 2010. Rio


de Janeiro: IBGE, 2012. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/al/belo-
monte.html. Acesso em: 15 jul. 2021.

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SOBRE OS ORGANIZADORES

Camila do Carmo Hermida


Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade
Federal de Uberlândia (UFU), mestrado em Desenvolvimento
Econômico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e
doutorado em Economia pelo Programa de Pós-graduação
em Economia pela UFU, onde também realizou um ano
de pós-doutorado. Atualmente é professora Adjunta da
Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
(FEAC), coordenadora e professora do Programa de Pós-graduação em Economia Aplicada
da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Ganhadora do Prêmio BNDES de Economia
2016 (1º lugar na categoria tese) com a tese intitulada: Padrão de especialização comercial
e crescimento econômico: uma análise sobre o Brasil no contexto da fragmentação da
produção e das cadeias globais de valor. Atuou como “Visiting Scholar” no “Center on
Globalization, Governance and Competitiveness” da Duke University, Estados Unidos no
período de 2014-2015. Atua principalmente nas seguintes áreas: economia internacional;
desenvolvimento econômico e economia e Organização Industrial

Anderson Moreira Aristides dos Santos


Possui graduação em Ciências Econômicas, mestrado em
Economia Aplicada, ambos pela Universidade Federal de
Alagoas (UFAL), e, doutorado em Economia pela Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Atualmente
é professor Adjunto da Faculdade de Economia, Administração
e Contabilidade (FEAC), do Programa de Pós-graduação em
Economia Aplicada e do PROFIAP da Universidade Federal de
Alagoas (UFAL). Atua principalmente nas seguintes áreas: economia da saúde; pobreza e
desigualdade de renda e avaliação de políticas públicas.
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

Verônica Nascimento Brito Antunes


Possui graduação em Ciências Econômicas pela Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (PPGE/UERJ), mestrado em Ciências
Econômicas (área de concentração: Economia Internacional) e
doutorado em Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento
pelo Programa de Pós-graduação do Instituto de Economia
da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPED/IE/UFRJ).
Atualmente é professora Adjunta da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade Federal de Alagoas (FEAC) e do Programa
de Pós-graduação em Economia Aplicada da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Anteriormente, fez parte do quadro docente do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas
da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (ICSA/UFRRJ). Atua principalmente nas
seguintes áreas: Desenvolvimento, Instituições, Governança, Políticas Públicas, Economia
Industrial e do Meio Ambiente.

201
ÍNDICE REMISSIVO

A
Abertura comercial  13, 44, 45, 46, 47, 48, 50, 51, 53, 54, 55, 56, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64
Alianças  164, 168, 170, 175
Artesanato  185, 187, 190, 191, 192, 193, 194, 195, 197, 198

B
Bancos  88, 89, 90, 93, 95, 99, 130, 145, 146, 147, 148, 151, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 158, 159, 161, 162
BAUMAN, Z  198
Brasil  18, 25, 27, 28, 31, 34, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 51, 53, 62, 66, 68, 80, 81, 82, 87, 92, 93,
95, 97, 98, 99, 100, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 112, 115, 116, 117, 118, 120, 121, 122,
124, 125, 129, 130, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138, 139, 140, 141, 142, 146, 147, 148, 156, 158,
159, 160, 161, 163, 166, 168, 181, 182, 183, 194, 198

C
Cadeias Globais de Valor  9, 11, 25
Carreira política  167, 168, 182
Comércio internacional  9, 12, 34, 44, 51, 54, 63, 114, 125, 126, 127, 128, 129, 132, 136, 140, 141
Crescimento econômico  12, 13, 25, 27, 34, 45, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 75, 78, 79, 81, 94, 96, 131, 161
Crises  82, 83, 85, 87, 92, 101, 124, 135
Cultura  66, 105, 108, 110, 112, 115, 117, 119, 120, 122, 147, 161, 162, 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191,
192, 193, 194, 197, 198

D
Dados em painel  65, 66, 71, 72, 79, 180
Decomposição do crescimento  27, 28, 29, 31, 33, 35, 36, 37, 38, 39
Desenvolvimento  9, 10, 11, 14, 15, 16, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 31, 32, 39, 42, 46, 53, 65, 66, 67, 68, 79,
81, 107, 108, 109, 110, 112, 115, 116, 117, 118, 119, 120, 121, 124, 125, 132, 134, 140, 141, 142, 145,
156, 170, 186, 188, 190, 193, 197
Desenvolvimento econômico  10, 13, 24, 26, 42, 44, 68, 110, 116, 118, 124, 125, 128, 129, 138, 141,
142, 185, 193
Despesas Públicas  32, 68, 70

E
Economia  10, 12, 13, 15, 17, 22, 23, 25, 26, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 39, 40, 41, 42, 44, 45, 46, 47, 48, 50,
53, 59, 61, 62, 63, 64, 65, 66, 67, 79, 80, 81, 82, 83, 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92, 93, 95, 98, 100, 101, 102,
103, 104, 105, 106, 109, 114, 116, 117, 123, 124, 125, 127, 130, 131, 132, 133, 135, 139, 140, 142, 141,
147, 154, 159, 161, 164, 165, 167, 180, 181, 182, 183, 190, 194
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

Economia brasileira  30, 31, 32, 34, 35, 39, 40, 41, 42, 44, 45, 50, 59, 60, 61, 62, 63, 83, 89, 94, 95, 100,
102, 103, 104, 117, 124, 125, 129, 136, 140, 141, 142
Eleições majoritárias  8, 163, 164, 167, 168
Escolha Pública  164, 165, 181, 183
Estrutura produtiva  10, 12, 15, 16, 23, 139, 141

F
Formação social  107, 108, 111, 112, 113
Formalismo  109, 112, 113
Fragmentação  11, 25, 96

G
Gastos públicos estaduais  65, 69, 81
Globalização  9, 11, 162, 186, 187, 191, 193, 197, 198, 199
Governo brasileiro  82, 87, 88, 89, 93, 98, 101

I
identidade  117, 161, 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191, 193, 197, 199
industrialização  11, 23, 125, 129, 130, 131, 132, 140

K
Keynes  82, 83, 84, 85, 86, 87, 101, 102, 103, 105, 161

M
Mercado de trabalho  14, 93, 94, 95, 96, 102, 103, 144, 146, 145, 154, 157, 159, 171
Modelo ARDL  49, 56, 57, 58, 59, 62

N
Nordeste  78, 160, 163, 164, 169, 170, 173, 176, 178, 179

O
OLIVEIRA, F.  81

P
Periferia  107, 109, 121, 125, 126, 127, 132, 136, 139, 140, 141
Política econômica  35, 72, 83, 86, 87, 88, 89, 91, 100, 101, 106, 116, 131
Produtividade agregada  27, 30, 31, 33, 34, 38, 39, 40, 42
Produtividade do trabalho  11, 45, 47, 50, 51, 52, 53, 62, 64
Produtividade total dos fatores  27, 30, 41, 42, 47, 62

203
DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

R
Reeleição  163, 164, 166, 168, 169, 170, 171, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 180, 183, 184
Regressão logit  171

S
Sistema eleitoral  166, 167, 175
Sociedade civil  108, 120
Subdesenvolvimento  111, 116, 121
Sucesso na reeleição  171, 173, 177
Sujeito  185, 186, 187, 188, 189, 191, 197

T
tecnologias  11, 13, 46, 47, 48, 128, 129, 144, 145, 146, 147, 153, 154, 157, 159, 160, 163
Termos de troca  15, 34, 124, 125, 126, 127, 128, 129, 132, 138, 139, 140, 141
Tradição  85, 87, 185, 186, 187, 188, 193, 196

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DESENVOLVIMENTO SOCIOECONÔMICO: NOVOS E ANTIGOS DESAFIOS
CAMILA DO CARMO HERMIDA • ANDERSON MOREIRA ARISTIDES DOS SANTOS • VERÔNICA NASCIMENTO BRITO ANTUNES (ORG.)

O
s textos apresentados nesta obra são fruto do
XI ENCCULT - Encontro Científico Cultural
de Alagoas, que teve como tema nesta edição
a Quebra de paradigmas e mudanças sociais: os novos
desafios para a ciência. São 11 anos contribuindo
para o fomento das discussões científicas no âmbito
interdisciplinar, congregando pesquisadores de diferentes
instituições no contexto local e regional.

Dr. José Crisólogo de Sales Silva


(Organizador do evento)

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