Você está na página 1de 2

CFESS Manifesta

Serviço Social e o trabalho com refugiados/as


Brasília (DF), 26 de junho de 2019
CONJUNTURA E IMPAIONCTALO

SÉRIE
Gestão É de batalhas que se vive a vida! www.cfess.org.br
NO TRABALHO PROFISS
limites e possibilidades
SERVIÇO SOCIAL E REFÚGIO

T
ratar a temática do refúgio e do fazer violência ou perseguição caso voltassem para sua
profissional do/a assistente social na atual
conjuntura significa tratar de um duplo
casa, incluindo pessoas que fogem de guerras.
Em 2017, no mundo, 25,4 milhões de ? Você
desafio em meio a processos de conquistas
e expropriações cotidianas. As expressões da
pessoas são refugiadas e 3,1 milhões são pessoas
solicitantes de refúgio. Esse movimento envolve Sabia?
questão social, dentro da temática do refúgio, se logicamente também o Brasil, onde cerca de
Segundo a Lei nº 9.474/1997 (uma das
apresentam cada vez mais agudas, pungentes, e se 10.145 pessoas tiveram reconhecida sua condição mais modernas do mundo), trata-
manifestam no cotidiano profissional do Serviço de refugiadas e 86.007 são solicitantes de refúgio. se daquela pessoa que está fora do
Social reafirmando que a crise do capital afeta, Esse ano foi o maior em quantidade de pedidos seu país devido a fundado temor de
de diversas formas, as sociedades, em que todos de refúgio, num total de 33.866, segundo dados perseguição relacionado à raça, religião,
os tipos de fronteiras devem ser suprimidos, para do Comitê Nacional de Refugiados (Conare), nacionalidade, grupo social ou opinião.
Também são consideradas refugiadas
preservar direitos humanos elementares de pessoas divulgados pelo Acnur (Alto Comissariado das
as pessoas obrigadas a deixar seu
que precisam migrar de maneira forçada. Nações Unidas para Refugiados), de 2017. país por conta de conflitos armados,
O debate sobre o refúgio, muito embora não No estado do Rio de Janeiro, os/as refugiados/ violência grave e generalizada e dos
seja novidade em termos de difusão via mídia em as somam 4.373 e os/as solicitantes são 3.160. direitos humanos. Esta lei é embasada
geral, ainda é carregado de estigmas, preconceitos Diante de tal conjuntura, com o objetivo de em tratados internacionais e leis sobre
direitos humanos, como a Convenção de
e estereótipos. É discutido no âmbito internacional atuar no acolhimento, proteção legal e integração
Refugiados de 1951, Protocolo de 1967,
e envolve a participação de diversos sujeitos sociais local, o Programa de Atendimento a Refugiados e Declaração de Cartagena de 1984, etc.
em todo o mundo, buscando tratar a proteção aos Solicitantes de Refúgio (Pares) (ver box) atua há 43
A Cáritas Arquidiocesana do Rio
indivíduos impelidos a deixar seus países. anos no atendimento direto e, desde 1978, como de Janeiro trabalha, desde 1976, no
No texto Agudização da barbárie e desafios parceira implementadora da agência da ONU para atendimento direto a essa população.
ao Serviço Social, publicado na Revista Serviço refugiados (Acnur). Trata-se de um programa desenvolvido
Social e Sociedade nº128/2017, a autora Nessa dinâmica, o Serviço Social atua nas por uma instituição não governamental,
Ivanete Boschetti assinala que a condição das áreas de acolhimento e na integração local, que ligada à Igreja Católica. Cabe ressaltar
que se trata de um programa com
pessoas que migram de maneira forçada é uma promove não somente o atendimento direto, diretrizes não confessionais. A Cáritas-RJ
das expressões de um bárbaro processo de como também em grupos, além da produção também compõe o Comitê Nacional para
expropriação contemporânea: “é a expressão de de conhecimento e divulgação/formação Refugiados (Conare), órgão colegiado
uma humanidade que tudo perdeu e a quem tudo sobre a temática, articulação com as políticas responsável pelas análises e concessão
foi roubado”. Essa é a lógica que movimentou, intersetoriais e o sistema de garantia de direitos. dos pedidos de refúgio no Brasil.
em 2017 por volta de 68,5 milhões de pessoas No entanto, como de praxe para essa profissão Os três pilares de atendimento
no mundo, segundo o Relatório Anual de que está inserida na divisão sociotécnica do (acolhimento, proteção legal e
Tendências Globais da ONU (2017). Entre elas, trabalho, esse espaço sócio-ocupacional se integração local) são realizados por uma
equipe multiprofissional composta por
estão as pessoas refugiadas, que foram forçadas localiza na contradição entre as prerrogativas da assistentes sociais, psicóloga, advogadas,
a deixar seu país de origem e solicitar “proteção lei e proteções ao/à refugiado/a e as possibilidades pedagoga, e que realizou cerca de 6.300
internacional” em função de um risco de de efetivação na sociedade capitalista. atendimentos individuais em 2018.
CFESS Manifesta CONJUNTURA E IMPACTO Serviço Social e o trabalho com refugiados/as Brasília (DF), 26 de junho de 2019

SÉRIE
NAL
NO TRABALHO PROFISSIO

POSSIBILIDADES A construção da relação


de confiança, que se
A xenofobia e
preconceito compõem
A informação, a
pesquisa, a construção
Vislumbra-se atuar
na contramão da
DE INTERVENÇÃO inicia por meio de uma
escuta atenta, reflexiva
também esse rol de
questões que precisam
de conhecimento
e inserção dessa
criminalização dos
direitos humanos e dos
PROFISSIONAL e voltada para a
construção conjunta de
ser problematizadas
no âmbito do Serviço
temática, não somente
no âmbito do Serviço
próprios refugiados
e contribuir para o
possibilidades a partir Social, uma vez que Social, como também avanço do debate, dos
da realidade da pessoa refletem um novo ciclo em outras áreas e direitos e das políticas
em situação de refúgio. de violações de direitos profissões, têm um públicas em prol desse
dos/as refugiados/as. papel relevante. segmento.

Em um contexto de avanços e retrocessos, intervenção monitorada, ao se contabilizar, por e das políticas públicas em prol desse segmento.
observa-se, na atual conjuntura política, exemplo, quantas pessoas estão estudando, Conforme escreveu Eliane Brum no artigo
econômica e social de retração de direitos trabalhando ou com acesso a benefícios sociais. Êxodo venezuelano: a violência em Roraima é
historicamente conquistados, a agudização No entanto, esse acesso deve ser questionado contra a imagem do espelho, divulgado no El País
da vulnerabilização de pessoas que cruzam quanto à resolutividade e é obstaculizado em 27/8/2018, para aqueles/as cuja estabilidade
fronteiras em busca de proteção e o recomeço diversas vezes pelo não domínio do idioma e a é provisória, em um lugar onde é possível
de suas vidas. Inevitavelmente, esses processos consequente dificuldade de comunicação, tanto perder tudo mais de uma vez, não há lugar
atingem visceralmente o acesso a seus direitos do/a refugiado/a, quanto de quem o/a atende, assim seguro e o pertencimento é sempre precário,
mais básicos e às políticas sociais, ainda que como pelo desconhecimento de sua documentação para quem vive nessas condições: “Quem viveu
sejam direitos garantidos constitucionalmente e do que significa a condição de refúgio e suas escorregando de todos os mapas sente a dor
para estrangeiros/as e por legislações específicas. especificidades, dentre outras questões. dessa experiência no corpo”.
Nesse sentido, desafios se apresentam A construção da relação de confiança, Trata-se um complexo e contraditório
ao/à assistente social que atua no universo que se inicia por meio de uma escuta atenta, universo de questionamentos, demandas e
do refúgio, especificando sua intervenção reflexiva e voltada para a construção conjunta estratégias de intervenção que atestam os
profissional. Um deles se refere à premência do de possibilidades a partir da realidade da limites e possibilidades do fazer profissional,
conhecimento dos fenômenos sociais, políticos, pessoa em situação de refúgio, bem como de confirmando que a resistência é fundamental
econômicos, culturais que embasam esses suas particularidades, é um passo importante para manutenção dos direitos já conquistados
fluxos e deslocamentos, a fim de compreender na intervenção profissional. Em muitos casos, e que a luta é princípio básico para a conquista
a trajetória desses indivíduos que chegam devido aos traumas e contexto de violência ao de novos direitos.
carregados de histórias de vida, traumas, qual são expostos/as, é comum a dificuldade de
medos, mas também de força e resistência. expressar suas necessidades ou estabelecer essa
O processo de chegada em um novo
contexto, uma nova cultura, com códigos e
relação de confiança com a/o profissional.
A xenofobia e preconceito, em uma para usar
nuances distintas reflete um desafio para os/
as refugiados/as em qualquer lugar do mundo
e demanda o reconhecimento e compreensão
sociedade marcada historicamente por
intolerâncias, discriminações e estigmatizações,
compõem também esse rol de questões que
no cotidiano
desses elementos, inclusive para a comunidade precisam ser problematizadas no âmbito do • Convenção relativa ao Estatuto dos
que os/as recebe. Isto posto, para o Serviço Serviço Social, uma vez que refletem um Refugiados (1951), da Assembleia Geral
Social, esse também é um desafio, à medida novo ciclo de violações de direitos a que os/as das Nações Unidas. Conferência das Nações
Unidas de Plenipotenciários sobre o Estatuto
que intervém nessas questões, pautando-se em refugiados/as estão submetidos/as em diversos dos Refugiados e Apátridas, convocada pela
suas atribuições e competências profissionais, espaços, como nas escolas, no trabalho, no Resolução n. 429, de 14 de dezembro de 1950.
percebendo que essa integração é uma via atendimento em serviços públicos e privados. • Lei nº 9.474/1997. Define mecanismos para
de mão dupla e extremamente complexa: Nesse aspecto, a informação, a pesquisa, a implementação do Estatuto dos Refugiados
estar inserido/a no mercado de trabalho não construção de conhecimento e inserção dessa de 1951, e determina outras providências.
significa ser respeitado/a em termos étnicos e temática, não somente no âmbito do Serviço Brasília, 1997.
identitários, por exemplo. Social, como também em outras áreas e • Pesquisa Refúgio em números, da Secretaria
A integração é um processo complexo de se profissões, têm um papel relevante. Vislumbra- Nacional de Justiça. Comitê Nacional
para Refugiados. 3ª edição. Disponível
mensurar, apesar da possibilidade de apresentá- se atuar na contramão da criminalização dos em: https://www.acnur.org/portugues/
la de um modo prático (quantitativo), por meio direitos humanos e dos próprios refugiados e wp-content/uploads/2018/04/refugio-em-
do acesso a políticas sociais, a partir de uma contribuir para o avanço do debate, dos direitos numeros_1104.pdf Acesso em 14 jun 2019.

Gestão É de Batalhas que se vive a vida! (2017-2020)


Presidente Josiane Soares Santos (SE) Suplentes CFESS Manifesta
Vice-presidente Daniela Neves (RN) Solange da Silva Moreira (RJ) Serviço Social e o trabalho com refugiados/as
1ª Secretária Tânia Maria Ramos de Godoi Diniz (SP) Daniela Ribeiro Castilho (PA) Conteúdo (aprovado pela diretoria):
2ª Secretária Daniela Möller (PR) Régia Prado (CE) Aline Maria Thuller Aguiar, Débora Marques Alves,
nosso endereço
SHS Quadra 6 - Bloco E -
1ª Tesoureira Cheila Queiroz (BA) Magali Régis Franz (SC) Karla Ellwein e Jiulianne Pereira da Silva Gomes -
Complexo Brasil 21 - 20º Andar 2ª Tesoureira Elaine Pelaez (RJ) Lylia Rojas (AL) Assistentes sociais do Programa de Atendimento
CEP: 70322-915 - Brasília - DF Mauricleia Santos (SP) a Refugiados e Solicitantes de Refúgio do Rio de
Fone: (61) 3223-1652 Conselho Fiscal Joseane Couri (DF) - Licenciada
comunicacao@cfess.org.br
Janeiro (Pares-RJ)
cfess@cfess.org.br Nazarela Silva do Rêgo Guimarães (BA), Francieli Piva Neimy Batista da Silva (GO) Organização: Comissão de Comunicação
www.cfess.org.br Borsato (MS) e Mariana Furtado Arantes (MG) Jane Nagaoka (AM) Revisão: Diogo Adjuto Arte: Rafael Werkema

Você também pode gostar