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SÍNTESE E CARACTERIZAÇÃO DO ÓXIDO DE ZINCO A PARTIR

DO MÉTODO SOLOQUÍMICO

J. R. de MELO1, A. SCALCON1, R. P. NIPPES, N. R. C. FERNANDES-MACHADO1 e M. L.


GIMENES1
1
Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Engenharia Química
E-mail para contato: rmjoelma@gmail.com

RESUMO – Neste trabalho é apresentada a síntese e caracterização de nanoestruturas


de ZnO pelo método soloquímico. A reação ocorreu entre uma solução precursora
contendo Zn (Zn(NO3)2 e Zn(CH3COO)2 a 0,5 mol/L) e uma solução alcalina (NaOH 1
mol/L) aquecida a temperatura de 70°C por 3h de reação, sem posterior etapa de
calcinação. As amostras foram caracterizadas estruturalmente através de difração de
raios X (DRX) e texturalmente pelas medidas de área específica e porosidade (SBET,
volume e diâmetro de poros). Análises de espectroscopia fotoacústica (PA) e microscopia
eletrônica de varredura (MEV) para determinar a energia de band gap e caracterização
morfológica, respectivamente. Independente do precursor metálico, o ZnO puro e
cristalino foi produzido. As propriedades texturais e a morfologia do ZnO foram afetadas
conforme o precursor utilizado na síntese. O tamanho médio de partícula variou entre
42,2 nm (Zn(NO3)2) e 25,7 nm (Zn(CH3COO)2) e a área específica entre 19,24 m²/g
(Zn(NO3)2) e 28,93 m²/g (Zn(CH3COO)2). O método soloquímico foi eficiente para
obtenção de nanoestruturas de ZnO sob condições reacionais mais amenas do que as
empregadas pela maioria das técnicas disponíveis na literatura.

1. INTRODUÇÃO
O óxido de zinco (ZnO) é um material inorgânico multifuncional, de qualidade versátil e com
aplicações em diversas áreas da ciência, tais como a catálise, fabricação de borracha, cosméticos,
tintas, cerâmicas, industrias eletrônicas e optoeletrônicas (MAYRINCK et al., 2014).

Nos últimos anos, várias técnicas físicas e químicas de síntese foram desenvolvidas e
investigadas para preparar o ZnO, de forma a explorar suas possíveis aplicações. O uso de métodos
químicos por via húmida, tais como sol-gel, precursores poliméricos, co-precipitação, hidrotérmico,
solvotérmico, micro-ondas e sonoquímico têm sido relatados como uma forma bem sucedida para a
síntese do óxido de zinco (LOPES et al., 2015; HERNÁNDEZ-RAMÍREZ e MEDINA-RAMÍREZ,
2015).

Em adição a estes, o método soloquímico pode produzir materais com alta cristalinidade, à
temperaturas mais baixas, sem usar agentes direcionadores de superficie, templates ou etapas de
calcinação (WAHAB et al., 2007).

O processamento soloquímico envolve um número mínimo de etapas e reagentes, o que evita o


excesso de materiais indesejáveis, reações paralelas e produtos secundários que podem contaminar o
produto final (GUSATTI et al., 2015). Esta rota tem a vantagem de obter pós com elevada
cristalinidade e pureza, sem a necessidade de tratamentos térmicos adicionais (ex., calcinação) para
melhorar a estabilidade e a reprodutibilidade de seus parâmetros estruturais (AHSANULHAQ et al.,
2008), podendo ser usados reagentes químicos baratos e não tóxicos (VAEZI e SADRNEZHAAD,
2007).

O processo soloquímico é utilizado com sucesso para preparar nanoestruturas de ZnO (VAEZI e
SADRNEZHAAD, 2007; WAHAB et al., 2007; AHSANULHAQ et al., 2008; GUSATTI et al.,
2015) e também pode ser aplicado para diferentes precursores para formar outros óxidos, tais como
Mn2O3 e NiO (VAEZI e SADRNEZHAAD, 2007) e nanocompósitos como ZnO/TiO2 (VAEZI,
2008).

Dessa forma, o objetivo do trabalho foi sintetizar o ZnO pelo método soloquímico, a partir de
diferentes precursores.

2. EXPERIMENTO
2.1. Materiais
Os reagentes químicos testados para a síntese do ZnO soloquímico foram o nitrato de zinco
(Zn(NO3)2.6H2O), o acetato de zinco (Zn(CH3COO2)2.2H2O) e o hidróxido de sódio (NaOH).

2.2. Síntese Soloquímica


Dentre as técnicas conhecidas para a produção de ZnO, a escolhida neste trabalho foi a
soloquímica, conforme estudos realizados por Wahab et al. (2011) e Gusatti et al. (2010). Para a
síntese foram testados diferentes precursores (Zn(NO3)2.6H2O e Zn(CH3COO2)2.2H2O) na
concentração de 0,5 mol/L e 1,0 mol/L de NaOH.

A solução precursora foi preparada pela dissolução do precursor (Zn(NO3)2.6H2O ou


Zn(CH3COO2)2.2H2O) em água deionizada, na temperatura ambiente. Esta solução foi colocada em
um funil de separação, onde ficou armazenada até ser transferida ao reator. A solução alcalina foi
colocada em um reator (balão de destilação com três saídas) dentro de um banho para aquecimento
contendo areia e, aquecida até a temperatura de 70°C, sob agitação constante. O aquecimento foi
realizado em um agitador magnético com controle de temperatura e de agitação, conforme mostra a
Figura 1. O acompanhamento da temperatura é fundamental e indica o momento ideal para o início
da adição do precursor dentro do reator.
Figura 1 – Unidade experimental usada para síntese soloquímica do ZnO.

Na temperatura 70°C, a solução precursora (Zn(NO3)2.6H2O ou Zn(CH3COO2)2.2H2O) foi


adicionada no reator gradualmente, gota a gota, sob agitação por 1 h. Com a adição gradual da
solução precursora no reator, uma reação de decomposição do complexo metálico inicia-se, causando
a mudança de cor da solução de mistura, que passa de transparente para branca. Esta mudança na
coloração da mistura reacional é um indicativo da formação dos nanocristais de ZnO.

Após a completa adição da solução precursora, a suspensão formada no reator foi mantida para
envelhecimento por 2 h sob as mesmas condições de agitação e temperatura. Seguidamente, os
materiais foram filtrados, lavados com água deionizada e secos na temperatura de 65 °C por 12 h.

Depois de secas, as amostras foram desagregadas em almofariz com auxílio de pistilo e,


posteriormente identificadas e armazenadas. As amostras (ZnO) foram identificadas como A, quando
sintetizadas a partir da solução de Zn(NO3)2.6H2O e chamada de B, quando sintetizado a partir da
solução de Zn(CH3COO2)2.2H2O.

2.3. Caracterização dos Materiais


A estrutura cristalina dos materais foi analisada através de difração de raios X (DRX)
(difratômetro Bruker, modelo D8 Advance, com radiação Cu Kα). As amostras foram analisadas na
faixa de 2θ de 15° a 70°, com uma tensão de aceleração e corrente aplicada de 40 kV e 10 mA,
respectivamente. Os picos observados foram comparados com o banco de dados publicado pela
JCPDS, com o auxílio do pacote computacional X’Pert High Score 2.1b (PANalytical B.V.).

A área específica, o diâmetro e volume de poros foram determinados por meio da isoterma de
adsorção/dessorção de N2 a 77K, em equipamento Quantachrome NOVA 1200. A área específica foi
calculada pelo método BET (BRUNAUER et al., 1938) e o volume e diâmetro de poros foram
estimados pelo método BJH (BARRET et al., 1951).
A energia de band gap foi determinada a partir dos espectros de absorção e por meio do método
de Tauc (TAUC et al., 1966) utilizando-se dados de espectroscopia fotoacústica, medidas em um
equipamento consistindo de uma luz monocromática fornecida por uma lâmpada de xenon de
1 000 W (Oriel Corporation 68820), um monocromador (Oriel Instruments 77250), um microfone
capacitivo de alta sensibilidade (Bruel&Kjaer, modelo 2639) e um amplificador (EG&G 5110). O
feixe de luz foi modulado com um modulador mecânico (Stanford Research Systems SR540). O
espectro fotoacústico foi obtido na frequência de modulação de 21 Hz nos comprimentos de onda de
200 a 800 nm.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. Análise Estrutural
Os matérias obtidos após a síntese foram submetidos à análise de difração de raios X pelo
método do pó para confirmação estrutural do ZnO. Os difratogramas estão apresentados na Figura 2 e
foram analisados com o auxílio do banco de dados JCPDS.

Figura 2 – Difratograma de raios X dos materiais sintetizados à 70°C por 3h. Precursores: (a) nitrato
de zinco; e (b) acetato de zinco.

Os resultados do difratograma indicam a presença do ZnO com todos os planos cristalográficos


característicos correspondendo a geometria hexagonal da estrutura wurtzita, em ângulos de 2θ
próximos a 31,8°; 34,4° e 36,2° (JCPDS card n.° 79-2205), que correspondem às reflexões de Bragg
dos planos [100], [002] e [101], respectivamente.

Uma estimativa do tamanho médio do cristalito foi feita usando a Equação de Scherrer. Para
isso, foi utilizado o valor correspondente ao pico mais intenso do ZnO (36,2°/36,2544 cts), dando um
valor de aproximadamente 42,2 nm (A) e 25,7 nm (B).
Observa-se uma alta cristalinidade da amostra evidenciada pelas reflexões bem definidas.
Ambos os precursores apresentam um ordenamento estrutural semelhante, porém com diferença na
intensidade de reflexão dos picos. Não foram observadas reflexões características de outras
substâncias, como Zn(OH)2. Portanto, pôde-se verificar que independente do precursor utilizado, ZnO
puro e cristalino foi sintetizado via síntese soloquímica.

Nenhum template, agente de superfície, direcionador de estrutura ou alta temperatura


(calcinação) foram necessários para a produção de ZnO por meio desta técnica. Este método de
síntese é um dos mais simples, de alta eficiência e apropriada rota química para a produção de ZnO,
apresentando grande potencial para produção em larga escala (AHMED et al., 2014).

3.2. Análise Textural


Os resultados obtidos a partir das isotermas de adsorção/dessorção de N2 a 77K mostram que
independente do precursor utilizado, ambos materais apresentaram o mesmo comportamento:
isoterma do tipo IV com histerese do tipo H3 (Figura 3).

Figura 3 – Isotermas dos materiais obtida através dos dados de volume (cm³/g) e pressão relativa
(P/P0).

Os resultados indicam que os materiais sintetizados são materiais mesoporosos formando poros
tipo fenda, com tamanho e formato não uniforme. Os óxidos sintetizados possuem tamanho de poros
na região de mesoporos, confirmado pelo diâmetro médio do poro (DPO) (Tabela 1), que foi o mesmo
valor para ambos os precursores.

Entretanto, há diferenças texturais significativas dependendo do tipo de precursor utilizado na


síntese, sendo os menores valores de área específica (SBET) e volume dos poros, para o material A,
sintetizado a partir do nitrato de zinco. Com a diminuição da área específica, verificou-se um aumento
no tamanho da partícula (DBET), conforme apresenta Tabela 1, que pode estar relacionado com a
formação de um material mais cristalino.
Tabela 1 – Propriedades texturais dos materiais A e B.

Material SBET (m2/g)a DBET (nm)b DPO (nm) VP (cm3/g)c

A 19,24 54,9 3,06 0,04

B 28,93 36,5 3,08 0,05


SBET = área específica; DBET = diâmetro médio de partícula; DPO = diâmetro médio do poro; Vp = volume total dos poros.
a
Estimado pelo método BET a partir da parte linear da região BET (p/p 0 = 0,05-0,35).
b
Estimado a partir da área específica BET e densidade teórica do ZnO com valor de 5,675 g cm-3.
c
Estimado pelo método BJH.

3.3. Análise Morfológica


A morfologia, dispersão e o tipo de aglomeração das partículas do ZnO varou conforme o
precursor utilizado na síntese. A Figura 4 apresenta as micrografias dos materiais A e B.

Figura 4 – Micrografia do ZnO soloquímico. Precursores: (a) nitrato de zinco; e (b) acetato de zinco.

Um crescimento por aglomeração, sem muita definição na geometria das partículas pode ser
observado, no caso da Figura b, quando o acetato de zinco foi utilizado como precursor. Um
morfologia indefinida pode ser devido ao fato das partículas sintetizadas a partir desse precursor
serem bastante finas (DBET: (B) < (A)) e desta forma as partículas tendem a se aglomerar. Já para o
precursor A, pode ser observado que cristais de ZnO em forma de bastões coexistem com partículas
aglomeradas.

Acredita-se que o crescimento das partículas seja induzido pela estrutura intrínseca dos cristais,
embora o método ou condições de preparação, os precursores utilizados e a concentração de íons na
solução também influenciem a morfologia observada do material. O pH e a concentração do íon OH -
também podem influenciar a morfologia das nanopartículas, contudo, o pH (14) foi constante para
todas as sínteses.

3.4. Análise Espectral


A energia de band gap (Eg) determinada por espectroscopia fotoacústica está apresentada na
Tabela 2.

Tabela 2 – Energia de band gap UV-Vis.

Material Eg (eV)a λmax (nm)b

A 3,15 394

B 3,15 394
a
Eg = energia de band gap determinada por espectroscopia fotoacústica.
b
Comprimento de onda determinado a partir da equação: λ=1240/Eg

No caso dos materiais sintetizados, a energia de band gap foi igual a 3,15 eV, sendo que os
comprimentos de onda de máxima absorção estavam na região do ultravioleta do espectro
eletromagnético (100 nm < λ < 400 nm).

4. CONCLUSÃO
O óxido de zinco (ZnO) foi produzido via processamento soloquímico, independente do
precursor utilizado. Entretanto, diferenças texturais e morfológicas foram observadas nos materiais
dependendo do precursor utilizado.

Um material mais cristalino, mas com menor área específica e volume de poros foi obtido a
partir da síntese com o nitrato de zinco. Na síntese a partir do acetato de zinco, além de uma redução
no tamanho das partículas, um crescimento por aglomeração e um material com uma morfologia
indefinida foram observados. Contudo, ambos os materiais, apresentaram máxima absorção na região
do ultravioleta do espectro eletromagnético.

Nenhum template, agentes de superfície, direcionador ou alta temperatura foi necessário para a
produção do ZnO mesoporoso, puro e cristalino, por meio desta síntese. O método soloquímico foi
eficiente para obtenção de nanoestruturas de ZnO sob condições reacionais mais amenas do que as
empregadas pela maioria das técnicas disponíveis na literatura.

5. AGRADECIMENTOS
A CAPES pela bolsa de doutorado concedida para realização deste trabalho.
6. REFERÊNCIAS
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AHSANULHAQ, Q.; KIM, S. H.; KIM, J. H. ; HAHN, Y. B. Structural properties and growth
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GUSATTI, M.; SOUZA, D. A. R.; KUHNEN, N. C.; RIELLA, H. G. Growth of Variable Aspect
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LOPES, O. F.; MENDONÇA, V. R.; SILVA, F. B. F.; PARIS, E. C.; RIBEIRO, C. Óxidos de
Nióbio: uma visão sobre a síntese do Nb2O5 e sua aplicação em fotocatálise heterogênea. Química
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