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Brazilian Journal of health Review

Fármacos utilizados no tratamento de hipercolesterolemia: uma análise


histórica e químico-medicinal

Drugs used in the treatment of hypercholesterolemia: a historical and


medicinal chemistry focused analysis

DOI:10.34119/bjhrv3n4-143

Recebimento dos originais: 20/06/2019


Aceitação para publicação: 22/07/2020

Isaac Santiago Cedraz


Graduando em Farmácia pela Universidade Federal do Oeste da Bahia
Instituição: Centro das Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal do Oeste da
Bahia
Endereço: Rua da Prainha, 1326 - Morada Nobre, Barreiras – BA, Brasil
E-mail: isaacsantiagocedraz@gmail.com

Stefânia Neiva Lavorato


Doutora em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Federal de Minas Gerais
Instituição: Centro das Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal do Oeste da
Bahia
Endereço: Rua da Prainha, 1326 - Morada Nobre, Barreiras – BA, Brasil
E-mail: stefania.lavorato@ufob.edu.br

RESUMO
Nesse trabalho, são apresentados aspectos relacionados ao desenvolvimento das principais
classes farmacológicas utilizadas no tratamento de hipercolesterolemia, explorando-se as
características estruturais importantes a sua ação biológica.

Palavras-chave: hipercolesterolemia, estatinas, ezetimibe, sequestradores de ácidos biliares

ABSTRACT
In this work, the development of main pharmacological classes used in the treatment of
hypercholesterolemia is described, exploring the most important structural features to their
biological activity.

Keywords: hypercholesterolemia, statin, ezetimibe, bile acid sequestrant

1 INTRODUÇÃO
A hipercolesterolemia é um importante fator de risco para o desenvolvimento de
doenças cardíacas. Isso porque o excesso de colesterol pode levar ao desenvolvimento de placas
de ateroma no endotélio das importantes artérias do nosso organismo, podendo contribuir para

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a ocorrência de infarto agudo do miocárdio (IAM), tromboses, arritmias e outras isquemias
cardíacas, além de acidente vascular cerebral (AVC) (; Krause et al., 2007). As doenças
cardiovasculares constituem a principal causa de morte no Brasil, sendo contabilizados
anualmente em média 300 mil óbitos, tendo esse número crescido gradualmente (Faludi et al.,
2017).
A conduta terapêutica para escolha do tratamento da hipercolesterolemia é realizada
pela análise do lipidograma do paciente conjuntamente a seu risco de doença cardiovascular. A
todo paciente hipercolesterolêmico, é necessário que sejam feitas intervenções não
farmacológicas, como a prática de atividade física diária, dieta com alimentos saudáveis e
abstinência de álcool e tabaco, pois mudanças em termos de alimentação e estilo de vida
auxiliam diretamente no sucesso do tratamento. Mas, quando os valores de lipídeos séricos
estão muito expressivos e/ou o paciente não consegue se adaptar às mudanças de rotina
propostas, é preciso intervir com medicamentos (Nadruz Júnior, 2009). Entre os fármacos que
agem na regularização dos níveis de colesterol, destacam-se as estatinas, a ezetimiba e os
sequestradores de ácidos biliares (Faludi et al., 2017).
Sabendo do impacto causado pela hipercolesterolemia na população e dos seus graves
riscos ao desenvolvimento de aterosclerose e doenças coronarianas graves, é de suma
importância o estudo dos aspectos químico-farmacêuticos dos medicamentos disponíveis para
seu tratamento, a fim de se otimizar em termos de efetividade e potência as opções terapêuticas
vigentes e buscar novos tratamentos para assim melhorar a qualidade de vida dos pacientes
acometidos.

2 INIBIDORES DA HMG-COA REDUTASE: ESTATINAS


A HMG-CoA redutase é uma enzima crucial na via metabólica responsável pela síntese
de colesterol no organismo. Por participar da etapa limitante de produção endógena de
colesterol, torna-se uma interessante escolha como alvo para inibição de sua biossíntese (Haines
et al., 2012).
A HMG-CoA redutase participa catalisando a redução de 3-hidroxi-3-metilglutaril
coenzima A (HMG-CoA) a mevalonato, com auxílio de duas moléculas de NADPH como
cofatores (Figura 1A). Tanto sua atividade quanto sua quantidade ser moduladas por
mecanismos de regulação a partir da quantidade de colesterol sintetizada, o que faz dela um
importante ponto de regulação da produção endógena de colesterol (Roche, 2005; Istvan &
Deisenhofer, 2001).

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Por participar catalisando uma etapa limitante da biossíntese do colesterol, o interesse
pela HMG-CoA redutase como possível alvo molecular de fármacos hipocolesterolêmicos
sempre foi grande (Harrold, 2013). Na década de 1960, muitos fármacos para o tratamento de
dislipidemias já estavam em comercialização. Porém, essas classes possuíam efeitos adversos
que dificultavam a adesão ao tratamento pelo paciente e seu uso por longos períodos. Dessa
forma, outras terapias mais seguras eram necessárias, visto a crescente morbidade por parte das
doenças cardiovasculares na população (Endo, 1992).
Na década seguinte, o grupo de pesquisas liderado por Akira Endo iniciou a análise de
mais de 6 mil extratos fúngicos por possíveis inibidores da síntese do colesterol, conseguindo
identificar a mevastatina (Figura 1B), derivada do Penicillium citrinum, com capacidade de
inibir competitivamente a HMG-CoA redutase e diminuir um mesmo nível de colesterol sérico
em concentração menor que os outros agentes redutores de colesterol testados até então (Stossel,
2008; Endo et al., 1976). Estudos mostravam que a inibição da HMG-CoA redutase pela
mevastatina levava a uma diminuição dos níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL) e de
colesterol sanguíneos ao gerar um feedback positivo dos receptores de LDL. Em testes
toxicológicos, porém, constatou-se que a mevastatina podia gerar graves lesões gastrointestinais
em animais, limitando a continuidade dos estudos (Endo, 2004).
Nos anos seguintes, pesquisadores do laboratório Merck seguiram com uma nova
triagem de análogos da mevastatina e obtiveram sucesso nos testes com a substância
denominada lovastatina (Endo, 1976). Ensaios animais mostraram uma redução significativa
nos níveis de colesterol sanguíneo e nenhum efeito tóxico como os anteriormente descritos com
o uso de mevastatina. Diante desses resultados, em 1983, inciaram-se os estudos clínicos com
pacientes com risco elevado de IAM. Após resultados satisfatórios em estudos de Fase II e III,
a Merck conseguiu a aprovação regulatória da lovastatina pela Food and Drug Administration
(FDA) em 1987 (Tobert, 2003).
A introdução da lovastatina no mercado trouxe grandes avanços no tratamento da
hipercolesterolemia. Uma dose diária de 80 mg possibilitava a redução em cerca de 40% no
nível de LDL sanguíneo dos pacientes, com um tempo inferior de tratamento quando comparado
a outros medicamentos disponíveis, que exigiam doses superiores para alcançar tal efeito e
ainda geravam desconforto gastrointestinal (Hajar, 2011; Tobert, 2003).
Em 1988, a sinvastatina, novo fármaco da classe, foi aprovada para comercialização.
Diversos representantes das estatinas foram aprovados posteriormente, como pravastatina em
1991, fluvastatina em 1994, atorvastatina em 1997, cerivastatina em 1998, rosuvastatina em

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2003 e pitavastatina em 2009. A cerivastatina, devido a observação de efeitos adversos severos,
foi retirada do mercado em 2001 (Wensel et al., 2010; Tobert, 2003; Bruckert, 2003).
As estatinas são classificadas em de tipo I, que remetem àquelas obtidas de fontes
naturais ou por semissintética, ou em estatinas de tipo II, que apresentam origem sintética
(Figura 1B) (Bruckert, 2003). Como característica estrutural, as estatinas possuem uma região
hidrofílica na porção superior, derivada do ácido diidroxi-heptanóico, e uma região hidrofóbica
na porção inferior, composta por um sistema de anéis aromáticos ou heteroaromáticos
substituídos (Figura 1B) (Jain et al., 2007). A região hidrofílica, também conhecida como
“cabeça” polar, constitui o grupo farmacofórico da classe, pois mimetiza a unidade 3-
hidroxiglutaril da HMG-CoA, substrato da HMG-CoA redutase, bem como tal unidade
estrutural do mevaldil-CoA, intermediário da reação (Figura 1A). No caso da sinvastatina e
lovastatina, representantes das estatinas do tipo I, a região hidrofílica se apresenta na forma de
uma lactona e, para tornarem-se ativas na forma do hidroxiácido, precisam sofrer ação de
esterases metabólicas. Dessa forma, podem ser consideradas pró-fármacos (Figura 1B) (Jain et
al., 2007; Roche, 2005).

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Figura 1 – Biossíntese do colesterol e papel das estatinas como agentes hipocolesterolêmicos. (A) Etapas da
biossíntese do colesterol, com destaque a etapa limitante e intermediários envolvidos na reação catalisada pela
HMG-CoA redutase. (B) strutura geral das estatinas e exemplos dos principais representantes de tipo I e tipo II e
seus respectivos log D7,4*.
(A)

(B)

TIPO I

TIPO II
* O coeficiente de distribuição a pH 7,4 (log D7,4) foi calculado usando o programa Marvin Sketch 5.9.3, 2012,
ChemAxon (http://www.chemaxon.com).

As estatinas de tipo II são de origem sintética, planejadas por meio da estratégia de


simplificação molecular e com o propósito de reduzir efeitos adversos causados pelas primeiras
estatinas lançadas no mercado e também facilitar a síntese desses compostos. Apesar de
apresentarem um sistema aromático de maior volume, possuem uma quantidade
significativamente reduzida de estereocentros, o que as permitem ser facilmente obtidas
sinteticamente (Evans et al., 2003).
A enzima HMG-CoA redutase possui um caráter estereosseletivo bastante peculiar, o
que se aplica também às estatinas, de modo que na porção hidrofílica, os carbonos C-3 e C-5 se
comportam como estereocentros (Figura 1B). O sítio ativo da enzima apresenta maior afinidade
pelo isômero 3R,5R (considerando configuração para pravastatina), sendo que todas as estatinas

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comerciais conservam essa mesma característica de disposição espacial dos grupos (Roche,
2005; Evans et al., 2003).
A região hidrofóbica das estatinas se liga à enzima na mesma região em que a porção
coenzima A da HMG-CoA se liga (Figura 2), sendo perceptível a diversidade de sistemas de
anéis aromáticos entre elas (Figura 1B) (Roche, 2005; Moghadasian, 1999).
Os substituintes dos anéis decalínicos, que caracterizam as estatinas do tipo I, são de
caráter lipofílico. Essas estatinas possuem um ou dois grupos metila e um substituinte éster
metilbutirato no anel, como na lovastatina. A presença do grupo metila na posição α-6’ do anel
decalina (Figura 1B) dobra a atividade inibidora da HMG-CoA redutase em relação a
substâncias que não possuem o substituinte nessa posição (Stein, 2003; Gotto, 2001).
As estatinas do tipo II possuem anéis nitrogenados que conferem um menor número de
estereocentros aos compostos e uma menor lipofilia do fármaco, contribuindo esse último para
um redução dos efeitos adversos causados em comparação às estatinas de tipo I. Tais anéis
heteroaromáticos possuem grupos isopropila (ou análogo estrutural) e p-fluorofenila como
substituintes. O substituinte p-fluorofenila se assemelha em tamanho molecular ao grupo éster
metilbutirato, além de ambos contribuírem para a lipofilia dos compostos (Gotto, 2001).
O ligação da estatina à HMG-CoA redutase se dá principalmente devido ao
reconhecimento da “cabeça polar” pela enzima, de forma a simular ao substrato endógeno, por
meio de uma ligação iônica entre o grupo carboxilato e o resíduo de LYS735 e ligações de
hidrogênio com os resíduos de LYS691, ASP690 e SER684, importantes no mecanismo
catalítico da enzima (Figura 2). O ponto chave para a inibição da HMG-CoA redutase está
relacionado aos grupos que compõem a porção hidrofóbica das estatinas. Esses fármacos
exploram a flexibilidade de seu sítio ativo, de modo a alojar o sistema aromático com
substituintes lipofílicos. A acomodação desses grupos volumosos é capaz de distorcer o sítio
ativo para a exposição de um bolso hidrofóbico (Garcia et al., 2003). Nessas interações, o átomo
de flúor do grupo p-fluorofenila promove uma ligação íon-dipolo com o resíduo de ARG590
ionizado. Já as cadeias alquílicas dos grupos metilbutirato, isopropila e metila, além dos anéis
aromáticos, interagem, por interações de Van der Waals, com resíduos de leucina, valina e
alanina da enzima. Em situações em que há outros grupos presentes na estatina, outros pontos
do sítio ativo são explorados, como no caso da atorvastatina e rosuvastatina, em que o oxigênio
carbonílico da amida e o grupo sulfonamida, respectivamente, interagem com o resíduo de
SER565 via ligação de hidrogênio (Figura 2) (Roche, 2005). Todas as interações
complementares fornecidas pela porção hidrofóbica conferem a esses inibidores uma afinidade

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pela HMG-CoA redutase 100 vezes maior que a do substrato endógeno. Essa característica
reafirma a efetividade das estatinas como inibidores enzimáticos, uma vez que dificulta a
competição direta da HMG-CoA pelo sítio ativo da enzima (McTaggart, 2003).
Em relação a lipofilicidade desses fármacos, das seis estatinas disponíveis no mercado,
quatro são classificadas como lipofílicas (sinvastatina, atorvastatina, fluvastatina e
pitavastatina) e duas são bastante hidrofílicas (pravastatina e rosuvastatina), como pode ser
percebido pelos valores de coeficiente de distribuição a pH 7,4 (log D7,4) na Figura 1B. Quanto
maior o valor de log D, mais lipofílico é considerado o fármaco. As estatinas consideradas
lipofílicas possuem como desvantagem uma menor seletividade às células hepáticas em relação
às hidrofílicas, visto que é nos hepatócitos onde ocorre o maior volume de síntese de colesterol,
sendo o fígado o principal órgão-alvo dessa classe. Apesar de se difundirem passivamente com
mais facilidade pelas membranas dos hepatócitos, as estatinas mais lipofílicas também são
capazes de se difundirem para outros tecidos com a mesma capacidade, interferindo na função
desses outros tecidos, em geral de forma negativa (Ishikawa et al., 2018; Hamelin & Turgeon,
1998).

Figura 2 - Interações intermoleculares entre a HMG-CoA redutase e seu substrato natural HMG-CoA (A) e o
inibidor atorvastatina (B).

Fonte: Adaptado de Jain et al., 2007

Diferentemente das estatnas lipofílicas, as hidrofílicas penetram os hepatócitos por meio


de um sistema de transporte ativo, constituído por um polipeptídeo de transporte de ânions
orgânicos (OATP-C), importante para a captação hepática de estatinas hidrofílicas, como
rosuvastatina e pravastatina. OATP-C é expresso no tecido hepático, mais especificamente
na membrana basolateral dos hepatócitos. Devido a hidrofilia acentuada dessas duas estatinas,
elas tendem a permanecer na célula penetrada, sendo assim incapazes de transpor membranas

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por difusão passiva, não acessando tecidos extra-hepáticos. Essa característica define uma
maior hepatosseletividade para esses fármacos (Ishikawa et al., 2018; Pfefferkorn et al., 2007).
O principal efeito adverso relacionado ao uso das estatinas é a rabdomiólise. Esse quadro
acomete pacientes em uso de estatinas lipofílicas, com alta biodisponibilidade sistêmica e
capazes de se distribuírem a tecidos extra-hepáticos por meio de difusão passiva. As estatinas
hidrofílicas, por não terem passagem livre por difusão passiva e serem mais hepatosseletivas
que as lipofílicas, são menos propensas a causar rabdomiólise em pacientes que as utilizam
(Souich et al., 2017). A cerivastatina, não disponível no mercado atualmente, foi suspensa de
comercialização por possuir uma alta biodisponibilidade sistêmica, cerca de 60%, e lipofilia
considerável, sendo associada a diversos casos de mialgia nas doses administradas (Schachter,
2004).
A rabdomiólise é causada por injúria e ruptura do músculo esquelético, liberando altas
concentrações de mioglobina na corrente sanguínea, que se acumulam e precipitam nos rins,
causando danos ao tecido e insuficiência renal grave. O mecanismo pelo qual as estatinas podem
levar à ruptura dos miócitos ainda não está totalmente esclarecido. Sugere-se que as estatinas
estejam envolvidas na depleção intracelular de ubiquinona nas células musculares, composto
cuja função é promover o transporte de elétrons para as mitocôndrias. Com isso, há uma redução
da fosforilação oxidativa e comprometimento direto no processo normal de respiração celular
do miócito. Outra hipótese é a modificação da permeabilidade da membrana celular por meio
do bloqueio do sistema de canais de cloro intracelular, responsáveis pela hiperpolarização
celular e relaxamento do músculo (Magalhães, 2005).

3 INIBIDOR DA NIEMANN-PICK C1-TIPO 1: EZETIMIBE


A Niemann-Pick C1-tipo 1 (NPC1L1) é uma proteína expressa principalmente no
intestino delgado, mais especificamente nas membranas dos enterócitos da borda em escova,
mas também encontrada no fígado. Nesses compartimentos, a NPC1L1 modula a absorção
luminal e reabsorção biliar do colesterol, respectivamente. Essa proteína está ativa para a
captação de colesterol apenas quando se encontra expressa na camada apical da célula, seja
intestinal ou hepática. Previamente, a proteína é armazenada em vesículas de reciclagem
endocítica e seu transporte à membrana celular passa por uma regulação a partir da quantidade
de colesterol endógeno. Quando ocorre redução, a NPC1L1 é transportada às membranas.
Quando o nível de colesterol é reposto ao organismo, a proteína é regulada de forma a retornar
às vesículas (Ge et al., 2008; Garcia-Calvo et al., 2005).

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A absorção do colesterol a partir da dieta acontece nas bordas em escova do intestino e,
anteriormente à elucidação da NPC1L1, a principal hipótese relatava que esse biocomponente
difundia-se pelas microvilosidades do lúmen intestinal de forma passiva e acessava o enterócito
a partir de um favorável gradiente de concentração devido ao seu caráter lipofílico. Após a
descoberta da NPC1L1, bem como a elucidação de outras proteínas de transporte que participam
ativamente do processo de regulação e absorção do colesterol, essa hipótese foi descartada (Jia
et al., 2011; Yu, 2008).
Uma vez no interior da célula intestinal, parte do colesterol pode ser expelido de volta
ao lúmen por bombas de efluxo ABCG5 e ABCG8, que formam um heterodímero na membrana
apical do enterócito, ou serem destinadas a biogênese de novas lipoproteínas. A maior parte
sofre esterificação pela enzima acil-CoA:colesterol aciltransferase (ACAT) e destinada,
juntamente com triglicerídeos por meio da proteína microssomal de transferência de
triglicerídeos (MTP) e apolipoproteína B-48, à biogênese intracelular dos quilomícrons, que
logo são transportados para a corrente sanguínea por meio da linfa para execução do ciclo
metabólico dos lipídios (Jia et al., 2011; Yu, 2008; Lammert & Wang, 2005). O colesterol não
esterificado, quando aportado pelo fígado, é levado de volta para o lúmen intestinal por meio
da reabsorção biliar desse composto mediada pela NPC1L1 expressa na zona apical das células
do canal biliar (Karaki et al., 2013).
Devido ao desconhecimento da existência da NPC1L1, as primeiras pesquisas por
inibidores da absorção de colesterol, desenvolvidas no início da década de 1990 pela
farmacêutica Schering-Plough, tinham como principal alvo a enzima ACAT, responsável pelo
processo de esterificação do colesterol anteriormente a biogênese da lipoproteína que o levará
para a corrente sanguínea (Sliskovic et al., 2002). Até aquele momento, uma série de compostos
que possuíam ação inibitória da ACAT em ensaios in vitro bem como reduziam o nível de
colesterol esterificado (CE) em roedores submetidos a uma dieta rica em colesterol e com níveis
de ésteres de colesterol aumentados já eram descritos (Clader et al., 1995; Burnett et al., 1994).
Porém, os efeitos sobre os níveis de colesterol sérico (CS) eram mínimos, o que levou a busca
por novos inibidores, alcançando-se a classe das 2-azetidinonas (Clader, 2004; Burnett et al.,
1994).
Apesar de todos os esforços em se planejar substituintes que permitissem estudos de
relação estrutura-atividade da classe, de forma surpreendente, um subproduto de um
intermediário de reação das 2-azetidinonas planejadas (Figura 3A) foi o composto que
apresentou melhor atividade nos ensaios in vivo entre os sintetizados, alcançando uma redução

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de CE e CS em 26 e 10%, respectivamente, na concentração de 100 mg/Kg, mesmo com uma
concentração inibitória a 50% (IC50) da ACAT in vitro de 7,5 µM (Clader, 2004; Burnett et al.,
1994). O padrão estrutural de azetidinonas baseado nesse novo composto ativo passou a ser
então explorado.

Figura 3 – Etapas do desenvolvimento da ezetimiba. (A) Padrões estruturais planejados e avaliados até a
descoberta do compostos SCH 48461. (B) Principais pontos de metabolismo do compostos SCH 48461 explorados
para planejamento das modificações que levaram a ezetimiba: posição para do anel aromático ligado à cadeia
alquílica (a); posição benzílica (b); grupo p-metoxila do anel ligado ao carbono alfa do anel beta-lactâmico (c);
grupo p-metoxila do anel ligado ao nitrogênio do anel beta-lactâmico (d). (C) Reação metabólica para formação
do metabólito ativo da ezetimiba.

Após extensas modificações estruturais, o composto SCH 48461 foi identificado com o
melhor perfil hipocolesterolêmico entre os estudados ao reduzir o nível de CE no fígado em
93% a 10 mg/Kg, uma porcentagem superior a qualquer outra substância testada até então. Além
disso, ele também conseguiu diminuir os níveis de CS em 43% na mesma concentração em
ensaios animais. Vale ressaltar que o valor de IC50 encontrado para essa azetidinona contra
ACAT foi de 26 µM, reforçando divergências entre os resultados de testes in vitro e in vivo,

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situação que acabou levando os pesquisadores a dar mais atenção aos resultados dos testes in
vivo bem como a questionar qual seria o real alvo molecular da classe química em estudo
(Salisbury et al., 1995).
De posse de um composto bastante promissor, os estudos seguintes tiveram como
objetivo entender as propriedades metabólicas de SCH 48461. Os principais metabólitos
encontrados eram derivados de oxidação nas posições a, b, c e d indicadas na Figura 3B
(Clader, 2004).
A partir da avaliação da atividade hipocolesterolêmica dos metabólitos isolados, foram
adotadas diferentes estratégias para a otimização estrutural de SCH 48461. Foi observado que
a oxidação na posição a e desmetilação na posição d (Figura 3B) geravam compostos com
atividade reduzida. Foi adotada então uma estratégia de bioisosterismo pela substituição do
hidrogênio e do grupo metoxila nas posições indicadas por um átomo de flúor, tornando tais
posições ou grupos resistentes ao metabolismo oxidativo, o que evitaria a inativação da
substância. Outra estratégia foi explorar as características benéficas do metabolismo. A
desmetilação na posição c (Figura 3B) seguida de uma conjugação ao ácido glicurônico do
grupo fenólico exposto contribuía para melhorar a ação hipolipidêmica de SCH 48461. Além
de apresentar atividade, o metabólito glicuronídeo era encontrado majoritariamente na parede
intestinal, um possível local de ação desses compostos. Essas observações levaram a
modificação estrutural que substituiu a metoxila na posição c por uma hidroxila para formação
direta do metabólito glicuronídeo ativo (Pereira, 2007; Rosenblum et al., 1998). O metabólito
(S)-álcool, formado pela oxidação benzílica (posição b, Figura 3B) apresentava uma atividade
superior ao SCH 48461, o que levou a introdução de um grupo hidroxila nessa posição,
respeitando a estereosseletividade adequada. O raciocínio conjunto dessas observações
ocasionou na síntese de uma azetidinona mais ativa que SCH 48461, conhecida posteriormente
como ezetimiba (Dugar et al., 1996).
A descoberta da ezetimiba aconteceu em 1990 e sua aprovação pela FDA em 2002.
Desse modo, iniciou-se a busca por seu alvo molecular, considerando que os ensaios animais
sugeriam que a ezetimiba agia diretamente no mecanismo de absorção de colesterol na borda
em escova intestinal e não na ACAT e, ainda, sua ação estereosseletiva levava os pesquisadores
a imaginar que havia um alvo molecular estruturalmente específico. Apenas em 2004 a NPC1L1
foi elucidada, evidenciando-a como um mediador crítico da absorção do colesterol e uma
macromolécula sensível à ação da ezetimiba. Foi constatado também que o metabólito
glicuronídeo ativo se liga especificamente a um único local da borda em escova do intestino, o

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mesmo em que há expressão da NPC1L1 na zona apical dos enterócitos, sendo assim
reconhecida como o alvo molecular da ezetimiba (Lammert et al., 2005; Altmann et al., 2004).
A inibição da absorção do colesterol diretamente na borda em escova intestinal reduz a
quantidade de colesterol enviada para as células hepáticas e, consequentemente, reduz o estoque
do lipídio no fígado. Nisso, com o aumento da demanda, mais colesterol é recrutado da corrente
sanguínea, fazendo diminuir tanto seus níveis biliar quanto sérico (Kastelein & van Dan, 2001).
Em vista de sua alta lipofilia, a ezetimiba é rapidamente captada pelos enterócitos,
sofrendo nessas células glicuronidação para formação do metabólito glicuronídeo
farmacologicamente ativo (Figura 3C) (Patrick et al., 2002; Ezzet et al., 2001). Esse metabólito
é considerado mais potente que o composto original devido a sua maior resistência à
recirculação êntero-hepática, pois se aloja nos enterócitos e sofre hidrólise enzimática,
liberando novamente o composto original no intestino para um novo ciclo de inibição da
absorção de colesterol (Kosoglou et al., 2005).

4 SEQUESTRADORES DE ÁCIDOS BILIARES


Os ácidos biliares (Figura 4A) fazem parte de um grupo de esteroides ácidos que são
encontrados majoritariamente na vesícula biliar. Esses compostos possuem um caráter
anfifílico, por apresentarem em sua estrutura regiões de caráter hidrofílico e hidrofóbico. Essa
característica permite que essas moléculas atuem como uma espécie de surfactante, formando
uma interface entre meio aquoso e compostos hidrofóbicos, como lipídios, o que caracteriza a
produção de micelas no trato gastrointestinal. As micelas são estruturas responsáveis por
auxiliar a digestão e absorção de colesterol ao auxiliar sua solubilização no intestino,
contribuindo com as lipases para sua digestão e para sua aproximação à borda em escova para
que possam ser absorvidos (Fiorucci et al., 2009).
Tendo em vista que a solubilização e absorção do colesterol são dependentes da presença
de ácidos biliares, foram desenvolvidos fármacos que agem na redução dos níveis de ácidos
biliares no lúmen intestinal com intuito de também diminuir a absorção lipídica. Denominados
sequestradores de ácidos biliares (BAS) ou apenas resinas, eles são grandes polímeros aniônicos
(Figura 4B) e, devido ao seu tamanho, não são absorvidos a nível intestinal (Beigel et al.,
2014).
A colestiramina, o primeiro BAS, foi desenvolvida pelo laboratório Merck na década de
1950. Trata-se de um copolímero insolúvel de estireno-divinilbenzeno contendo íons
quaternários de amônio (Figura 4B), caracterizando-a como uma resina de troca iônica. Nos

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estudos primários com a colestiramina, foi observada uma redução em 20% do colesterol total
sérico em seres humanos em doses diárias de 24 g administradas em três tomadas (Bergen et
al., 1959).
Apenas no início dos anos de 1970 uma nova resina foi desenvolvida. O colestipol é um
copolímero derivado de reação da dietilenotriamina com epicloridrina (Figura 4B). Assim
como a colestiramina, ele é um composto insolúvel de alto peso molecular e apresenta um efeito
clínico semelhante à primeira resina desenvolvida, porém necessitava de doses diárias que
chegavam a 30 g (Heel et al., 1980; Glueck et al., 1972).

Figura 4 – Estruturas químicas do colesterol e ácidos biliares encontrados em nosso organismo (A) e principais
agentes sequestrantes de ácidos biliares (B).

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Um terceiro BAS, o colesevelam, foi aprovado para comércio nos Estados Unidos em
2000. Trata-se de uma polialilamina reticulada com epicloridrina e alquilada com 1-
bromodecano e brometo de 6-bromo-hexiltrimetilamônio (Figura 4B). A presença de aminas
alquiladas neste composto aumenta a capacidade de ligação e a afinidade pelos sais biliares. O
mais recente sequestrador de ácido biliar, descoberto já na primeira década de 2000, a
colestimida é um polímero derivado da reação entre 2-metilimidazol e epicloridrina (Figura
4B). Esse fármaco é administrado na forma de comprimido e atualmente comercializado no
Japão (Suzuki et al., 2012; Kawashiri et al., 2005).
O pKa dos sais biliares é aproximadamente 5, o que indica que 95% dessas substâncias
estão em sua forma ionizada em pH intestinal. Deste modo, os BAS agem ligando-se
diretamente aos ânions conjugados ou não conjugados de sais biliares presentes no duodeno por
meio de ligações iônicas, o que impede a reabsorção dessas substâncias, afetando também a
digestão do colesterol. Por serem uma resina de alto peso molecular, são excretadas nas fezes
em conjunto com os sais biliares captados (Davidson et al., 2000).
A ligação dos ácidos biliares ao BAS gera um aumento na excreção fecal e, em resposta
à depleção de ácidos biliares, os níveis de colesterol hepático caem, levando ao aumento da
síntese de colesterol e à expressão aumentada dos receptores hepáticos de LDL. Os níveis
plasmáticos de LDL então caem devido ao aumento da captação no fígado para suprir seu
estoque de colesterol e dar continuidade à síntese de novos ácidos biliares. Com o uso de BAS,
a excreção diária de ácidos biliares passa de 500 a 3000 mg (Ballantyne, 2014; Johns & Bates,
1969).

5 PERSPECTIVAS PARA NOVOS FÁRMACOS: INIBIDORES DA PCSK9


A pró-proteína convertase subtilisina/kexina tipo 9 (PCSK9) foi elucidada no ano de
2003 por um grupo de pesquisa canadense, que identificou sua expressão por um gene
localizado no cromossomo 1. Observaram que uma mutação de ganho de função nesse gene era
responsável pela incidência de hipercolesterolemia familiar, enquanto que uma mutação de
perda de função no mesmo gene levava a uma redução nos níveis de colesterol sérico, o que
diminuía os riscos de doenças cardiovasculares (Elguindy & Yacounb, 2013; Seidah et al.,
2003).
A PCSK9 é uma proteína convertase produzida majoritariamente no hepatócito e,
quando ativada e liberada, é responsável pela regulação da degradação do receptor de LDL
localizado na membrana dessa célula. Em condições normais, quando formado o complexo

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entre o receptor de LDL e a lipoproteína, este é endocitado e o pH ácido do endossomo reduz a
afinidade entre LDL e seu receptor. Assim, ao serem separados, o LDL pode ser usado no
metabolismo celular e o receptor é reciclado e encaminhado de volta para a superfície celular
(Figura 5A). Quando a PCSK9 se liga ao receptor de LDL, a proteína impossibilita a
reciclagem do receptor, modificando sua conformação e encaminhando-o para degradação no
interior dos lisossomos (Figura 5B) (Chaudhary et al., 2017).
Desse modo, a partir da elucidação da proteína PCSK9 e do conhecimento dos riscos do
desenvolvimento de hipercolesterolemia associados à ação dessa proteína, os pesquisadores
passaram a traçar estratégias para sua inibição. Ao inibir a ação da PCSK9, mais receptores de
LDL seriam reciclados e devolvidos para as membranas dos hepatócitos, aumentando a
depuração da LDL e reduzindo os níveis séricos de colesterol (Hajar, 2019).
Várias possibilidades para a inibição da PCSK9 já foram estudadas, incluindo
estratégias de inibição da produção da proteína por meio do silenciamento gênico através de
oligonucleotídeos antisense ou pequenos RNAs interferentes e o bloqueio da ligação da PCSK9
ao receptor de LDL por meio de sua inibição utilizando anticorpos monoclonais (mAb) (Page
& Watts, 2016).
Dentre essas abordagens, a utilização de anticorpos monoclonais tem sido a mais eficaz
na inibição da proteína e redução dos níveis de LDL. Ainda não há muitos detalhes dos locais
de ligação, mas sabe-se que o mAb liga-se à PCSK9 próximo ao sítio ao qual se liga o receptor
de LDL, promovendo um bloqueio estérico da interação do receptor com a PCSK9 (Figura 5C)
(Yadav et al., 2016).

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Figura 5 – Participação da PCSK9 na absorção de colesterol e mecanismo de inibição. (A) Reciclagem do receptor
de LDL após endocitose do complexo receptor-LDL e disponibilização do LDL para metabolismo celular. (B)
Processo de degradação do receptor LDL mediada pela ligação à PCSK9. (C) Os anticorpos monoclonais se ligam
à PCSK9, impedindo a degradação do receptor de LDL.
(A) LDL (B) PCSK9 ativada (C) LDL mAb

Receptor de LDL

Endossomo Endossomo Endossomo

Lisossomo

Reciclagem do
receptor de LDL
Regeneração do receptor e
recrutamento do LDL sérico
Colesterol da LDL O receptor de LDL ligado
é incorporado à célula à PSCK9 é digerido

Fonte: Adaptado de Chaudhary et al., 2017.

Os primeiros mAb conhecidos como alirocumabe e evolocumabe foram aprovados no


ano de 2015 e chegaram ao mercado como medicamentos injetáveis. São isotipos das
imunoglobulinas G1 e G2, respectivamente, produzidos a partir da técnica de DNA
recombinante em suspensão de uma cultura de células do ovários de roedores. As estruturas
moleculares de ambos consistem em duas cadeias pesadas ligadas entre si por pontes dissulfeto,
sendo cada uma delas ligadas a cadeias leves do tipo kappa por outras pontes dissulfeto. Os
domínios variáveis das cadeias pesadas e leves foram projetados para a combinação ao local
específico de ligação na PCSK9 (Manniello & Pisano, 2016). Um terceiro mAb, denominado
bococizumabe, está atualmente em fase III dos estudos clínicos (Reiss et al., 2018).
Os anticorpos monoclonais são administrados por via subcutânea e, devido ao tamanho
das substâncias e por serem derivados peptídicos, o uso por via oral não é opção viável
(Chaudhary et al., 2017; Tavori et al., 2014), o que faz com que esses fármacos sejam opções
apenas quando há um alto risco de doenças cardiovasculares associado e que níveis ideais de
LDL e HDL não tenham sido alcançados mesmo em tratamento com estatinas na maior dose
tolerada ou com a associação estatina e ezetimiba, ou ainda em casos de intolerância aos
tratamentos de primeira linha (Ferrari et al., 2019). Apesar da alta eficácia dos fármacos
inibidores da PCSK9 aprovados, algumas desvantagens são levadas em consideração,
principalmente em relação ao tamanho dessas substâncias, que implica em alto custo de
produção e também na dificuldade de administração, o que pode levar a falha na adesão ao
tratamento de muitos pacientes (Chaudhary et al., 2017).

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dada a prevalência das doenças ateroscleróticas e o grande impacto da
hipercolesterolemia para seu desenvolvimento, faz-se importante que a terapia
hipocolesterolemiante seja continuamente estudada e difundida entre profissionais de saúde em
suas abordagens químicas e clínicas. Nesse sentido, a releitura molecular das classes
farmacológicas descritas nesse trabalho, esclarecendo toda a trajetória de planejamento, seus
alvos moleculares, propriedades físico-químicas e mecanismos de ação e toxicidade são
relevantes para a aplicação desses conhecimentos nas práticas em saúde, de modo a melhorar a
adesão ao tratamento dos pacientes e evitar o acometimento de possíveis reações adversas
potenciais, promovendo melhoria na qualidade de vida da população alvo.

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