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Contextualização do tema

Desde da antiguidade, várias crianças advêm dos abusos sexual nas suas próprias famílias, ou
seja, em um local onde deveriam receber carinho, atenção e principalmente respeito, são
afligidas pela pessoa na qual colocaram sua confiança e sua vida, e agora, é a causa do seu
abatimento e sofrimento. Tais vítimas passam anos ou mesmo suas vidas acautelando um
segredo que só lhes causam mal, não tendo coragem ou até mesmo o espaço para revelar ao que
tiveram que se submeter. E os abusadores acabam por sair ilesos nestas situações.

Salienta-se que factos como esses abrangem todo tipo de família no mundo, não tendo
preferência por raça, cultura ou classe social, apenas são repetidas ao longo da história em um
ciclo que parece não ter fim. Esta problemática foi salientada por Rangel (2001) e Sanderson
(2005), em que realçaram que diferentes pesquisas feitas em torno do tema, obtiveram
resultados, os quais comprovam a prática de abuso sexual dos menores dentro da família não se
prende a fronteiras geográficas ou culturais, podendo ocorrer em todas as culturas, comunidades
e classes. Ainda na mesma linhagem de pensamento, Sanderson (2005) complementa ainda que o
perigo de se admitir que o abuso só acontece em algumas comunidades apenas é o que contribuiu
para seu andamento, pois se ignora a realidade do problema. É importante voltar a atenção para o
fato de que as histórias se repetem da mesma maneira, e em famílias de históricos distintos, o
que mostra que o que perpetua é um segredo, um mito familiar, que se passa de geração em
geração, e por consequência disso, faz com que as vitimas ou mesmo a família não denunciem as
autoridades competentes.

Em Moçambique, o abuso sexual intra-familiar dos menores não tem limite de condição social,
origem ou religião. No nosso Paiss manifesta-se de várias maneiras e, em muitos casos, também
está ligada à tradição, à cultura e à forma como a criança e o membro da família se relacionam.

Para fazer face ao panorama do abuso sexual intra-familiar dos menores, “o acesso ao direito e a
justiça constitui um direito humano consagrado em vários instrumentos jurídicos internacionais,
com destaque para a Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamada em 1948 pela
Organização das Nações Unidas e a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos adoptada
em 1981. Tendo em conta a situação criminal que o país enfrenta, sobretudo atentas as novas
formas e modus operandi levado a cabo pelos agentes dos crimes, como também a intervenção
das autoridades no sentido de garantir da melhor forma a protecção das vítimas Fumo (2016).

Nesse contexto, o estado deparou-se com a necessidade de intervir de uma forma especial,
identificando como o maior obstáculo ao sucesso do regime jurídico - criminal ora criado o fato
de abuso sexual contra menores se tratar uma questão estrutural da sociedade, baseada nas
relações de poder por vezes do violador sobre os menores.

Por outro lado, o abuso sexual da criança deve ser visto tanto como uma questão dos direitos da
criança quanto um problema de saúde e de saúde mental, isto é, quando se refere aos direitos da
criança, ao longo dos anos foi sendo construído e discutido melhores maneiras de se estabelecer
e firmar os direitos fundamentais das mesmas, por meio de uma gama de leis para que assim
fosse possível manter sua dignidade e respeito. Desta forma, é criado a Lei nº 7/2008 que aprova
a lei de promoção e protecção dos direitos da criança.

E mais adiante, artigo 1, relatando que “ (…) a protecção da criança e visa reforçar, estender,
promover e proteger os direitos da criança, (...) ”. Diante de tal preocupação com os direitos que
as crianças têm na sociedade actual, é que acaba por emergir os problemas que elas enfrentam
durante seus primeiros anos de vida, pois se passa a discutir mais sobre os temas infantis, e com
isso incondicionalmente vem à tona as questões de abuso sexual por ser uma das maiores
violações dos direitos da criança.
Definição e Teoria dos Conceitos

Criança

Nos termos da lei 7/2008 de 9 de Julho, Lei de Protecção e Promoção dos direitos da Criança,
considera-se criança “toda a pessoa menor de dezoito anos de idade”. Este aspecto é
corroborado pela Convenção dos Direitos da Criança Adoptada pela Assembleia Geral nas
Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989, ao referir que “criança é todo o ser humano menor
de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo”.

Em outras palavras perpetua-se que conceito de criança é atribuído a pessoa que seja menor de
dezoito anos, exceptuando-se os que, por força da lei do seu país, o atribua a maioridade com
idade inferior a dezoito anos.
Entretanto, Moçambique enquadra-se nos países que consideram crianças os menores de dezoito
anos, sendo-lhe assim aplicável o previsto na Convenção dos Direitos da criança acima
mencionado.
Elasticidade do conceito do abuso sexual de menores

Furniss (1993, citado em oliveira 2012) considera o abuso sexual de menores como uma
síndrome de segredo em relação à vítima e seus familiares e de adição no que tange ao autor. Em
consonância ao foco de discussão da pesquisa, no contexto interno, o legislador ordinário
estabeleceu um conceito legal sobre o abuso sexual de menores como qualquer conduta que
configure a corrupção de menores, o atentado de violência de menores e o estupro.

Assim sendo, Sanderson (2005, p. 15) avalia que o abuso sexual de menores

(…) tem uma natureza social, pois é influenciado pela cultura e pelo tempo histórico em que
ocorre, o que acaba por culminar em uma dificuldade de se estabelecer uma definição aceita
universalmente. Diante do contexto, histórico-cultural que se observa nos dias actuais, o abuso
sexual pode ser definido, por meio do ambiente de sua ocorrência, podendo ser fora da família ou
dentro do grupo familiar, intra-familiar.

Não obstante as teorias existentes sobre o fenómeno do abuso sexual de menores e a perspectiva
do d autor acima, em outras palavras, o abuso sexual de menores pode ser definido como o
envolvimento de crianças e adolescentes em actividades sexuais seja fora ou dentro da família
que não compreendem em sua totalidade e com as quais não estão aptos a concordar. Desse
modo, o abuso sexual da criança configura-se como uma relação que viola as regras sociais e
familiares de nossa cultura.

Vale salientar que o abuso sexual intra-familiar de menores pode variar de contactos que
envolvem a penetração ou não a actos em que não há contacto sexual como assédio sexual,
voyeurismo, exibicionismo, abuso sexual verbal, telefonemas obscenos e pornografia (Ministério
da Educação, 2004).

Uma outra definição dada por Azevedo (1995, citado em Ferrari & Vecina, 2002) está calcada no
facto da autora declarar que qualquer tipo de violência que ocorra no âmbito familiar, seja ela
física sexual ou psicológica, é um acto de omissão praticado pelos pais (parentes ou
responsáveis) contra os menores de idade. Esses molde de abuso demonstram para a autora, uma
infracção de poder por parte do adulto e bem como uma crucificação da infância da criança, onde
se nega os direitos das crianças e negam a capacidade de serem examinados como sujeitos e
pessoas em condição especial de desenvolvimento. Mais adiante, as mesmas autoras mantêm a
postura enfatizando que quando sucede o abuso sexual a criança é negligenciada, sendo suas
indispensabilidades básicas postergadas e até mesmo esquecidas, sendo elas constantemente
humilhadas e aviltadas com palavras.

Família e suas funções

Quando aborda-se sobre o abuso sexual intra-familiar de menores, é indispensável que se busque
compreender como é essa família em que os indivíduos estão inseridos, para que assim se possa,
de certa forma, tentar entender como se relacionam essas pessoas, e o que faz com que essa
dinâmica do abuso se perpetue. Precedentemente, porém, é necessário compreender as
significações de família, para que assim se possua uma óptica de como é o núcleo familiar de
uma família em que ocorre o abuso sexual infantil.

De uma forma genérica a família é descrita por Ferrari e Vecina (2002), como uma constituição
de diferentes indivíduos que partilham ocorrências históricas, culturais, sociais e afectivas, sendo
assim ela é tanto uma emitente quanto receptora de eventos culturais e ocorrência históricas por
meio de uma correspondência única, o que origina uma dinâmica específica. Na Lei n.º 22/2019,
de 29 de Dezembro legislador cuidou de consagrar expressamente o conceito da família no artigo
2 e 3. A família é a comunidade de membros ligados entre si pelo parentesco, casamento,
afinidade e adopção. É ainda reconhecida como entidade familiar, para efeitos patrimoniais, a
união singular, estável, livre e notória entre um homem e uma mulher.

Para alem disso, no que se refere ao posicionamento e papel da família em relação à criança,

Ministério da Educação (2004, p. 23) cita o Art.227:

É dever da família (...) assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao
respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Assim sendo, a família tem, como uma de suas obrigações, manter protegidos seus membros e
exercer as demais funções a ela relacionadas. Por outro lado a CRM (2018) consagra no artigo
47 sobre o direito da criança, cingindo que as crianças têm direito a protecção e aos cuidados
necessários ao seu bem-estar. Porém quando esse grupo falha com seu papel social de proteger
os sujeitos e de transmitir os valores culturais, Ferrari e Vecina (2002) afirmam que ela fracassou
no cumprimento de suas funções. Tal declaração remete ao que sobrevém em uma família, na
qual existe o abuso sexual de menores, pois na meio em que a criança deveria se sentir segura e
amparada, ela acaba não recebendo os devidos cuidados que sua família deveria lhe oferecer e
fica diante de um mundo de riscos e intranquilidades.

Factores envolventes na dinâmica do abuso sexual de menores no meio intra-familiar

A conjuntura do abuso, em que as crianças são usadas para a satisfação de desejos e das
necessidades dos adultos dentro de sua própria família, intensamente ocorre por meio do uso da
força, mas o que vagamente se nota é um jogo sedutor que ocorre, levando a uma manipulação
da criança que pode durar anos, sem que a criança consiga falar sobre o assunto ou pedir ajuda.
Ferrari e Vecina (2002) chamam atenção na postura sedutora da criança como um fator
desencadeante do abuso intra-familiar não deve ser considerada como uma causa plausível do
início e bem como do desenrolar do abuso, pôs a criança é o sujeito envolvido nesse jogo
patológico, e ela não tem a capacidade de maquinar e planejar toda uma trama familiar de
vitimização.

Ferrai & Vecina, (2002). A maneira pela qual o abusador abrange a criança e particularmente os
demais membros da família, faz com que ele possa legitimar sua actuação sem que os indivíduos
que compõem o núcleo familiar o possam perceber sobre qualquer caso, pois seu jogo de
sedução conquista a todos.

Seugndo Williams e Finkelhor (1990, citado em Sevene 2016, p. 21), em seus estudos realizados
com pais abusadores, identificam cinco tipos de pais incestuosos. “os primeiros seriam os
sexualmente preocupados, em seguida os que regridem à adolescência, outros seriam os que
buscam um instrumento de auto-satisfação, os emocionalmente dependentes e os vingativos
raivosos”. Assim sendo, varias são as explicações dos pais abusador dos seus filhos/as
sexualmente. Entretanto, o que não se pode negar é que todos, independente de seus motivos
iniciais, extrapolam as relações afectivas que existe entre pais e filhos, criando um
relacionamento doentio e destrutivo para a criança.

Em moçambique o abuso sexual de menores intra-familiar é mais susceptível à


famílias com relações assimétricas e hierárquicas, nas quais a proximidade
caracteriza a relação e intensifica o impacto na vítima, sendo o incesto 1 a forma
certamente mais conhecida (sevene 2016, p. 35).

Pode-se, então, dizer que as questões de família ficam em família? Tratando-se do abuso sexual
de menores, na maioria dos casos, sim. Primeiro, porque o ambiente mais recorrente é a própria
residência do agressor/vítima e segundo, devido à síndrome do segredo adiante caracterizada.

A proximidade, factor que marca a dinâmica do abuso sexual intra-familiar, é também nutrida
pela relação de confiança, diz Almeida (2005). Devido ao jogo de sedução do ofensor ou pela
carga afectiva exercida, o menor deposita confiança neste o que facilita a sua acção. Oliveira
(2012) salienta que essa característica nutre o acordo imposto e selado do segredo que é
reforçado pela ameaça tanto à integridade física à vítima quanto à integridade física de alguém
de grande afecto da criança.

Por conseguinte, o excesso de sentimentos contraditórios, que envolve a sedução, os afectos e as


ameaças podem levar a criança a um estado de confusão mental com o qual desencadeia o medo,
a fúria, o prazer, a culpa, o desamparo SIQUEIRA et all, a ansiedade, o isolamento, a fraca

1
Incesto é a relação proibida com tabu implícito entre pessoas do mesmo grupo de parentesco cultural ou legal entre
as quais não é aceite a relação de matrimónio (walker, 1980, citado em monge e olmo.
vinculação e até a ideação suicida. É provavelmente essa confusão mental que origina um
conjunto de reações geralmente associadas ao abuso sexual.

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