Você está na página 1de 39

CLIPP – CLÍNICA LACANIANA DE ATENDIMENTO E PESQUISAS EM

PSICANÁLISE

O SINTOMA NA PSICANÁLISE

MONALISA M. CIANI

Monografia apresentada à CLIPP – Clínica


Lacaniana de Atendimento e Pesquisas em
Psicanálise, para conclusão do curso de
Psicanálise, sob a orientação de Carmen Silvia
Cervelatti.

São Paulo - SP
2013
AGRADECIMENTOS

À Carmen Silvia Cervelatti pelo apoio e orientação.

À Daniela pela transmissão da psicanálise no divã.

A todos os professores e colegas da CLIPP que contribuíram no decorrer deste


percurso.
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Quadro da tábua da sexuação...............................................................30


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO………………………………………………………………….................05

1 – O SINTOMA EM FREUD.....................................................................................07

1.1 - OS

PRIMÓRDIOS DO CONCEITO DE SINTOMA EM PSICANÁLISE.............07

1.2 – O SINTOMA COMO FORMAÇÃO DO INCONSCIENTE..................................08

1.3 – O SINTOMA A PARTIR DA SEGUNDA TÓPICA..............................................12

2 – O SINTOMA EM LACAN.....................................................................................16

2.1 – O SINTOMA NA CLÍNICA ESTRUTURAL LACANIANA...................................16

2.2 – O SINTOMA SOB A PERSPECTIVA DA CLÍNICA BORROMEANA................20

3 – APONTAMENTOS SOBRE O SINTOMA NO “CASO DORA”...........................24

CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................32

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................35
5

INTRODUÇÃO

O conceito de sintoma é geralmente relacionado à sua definição clássica


proveniente da medicina. Tal concepção leva à compreensão do sintoma como um
sinal, ou seja, um signo que pode ser fenomenologicamente observado em um
indivíduo. Nesta perspectiva o conjunto dos sintomas (sinais) apresentados conduz
ao diagnóstico de uma determinada doença ou transtorno. Na medicina, o sintoma é
entendido como uma desarmonia, que após um diagnóstico preciso e tratamento
restituirá ao individuo um status harmônico.

No campo da saúde mental, a psiquiatria, enquanto ciência, visa a


objetificação e a generalização dos sintomas através do estabelecimento de uma
classificação diagnóstica universal, o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais). Trata-se de classificar e rotular os indivíduos em categorias
como, por exemplo: transtornos depressivos, transtornos somatoformes, transtornos
de ansiedade, entre outros. Porém, se há essa rápida e pronta capacidade de
responder aos sintomas na medicina, o que faz um sujeito procurar uma análise?
Quais respostas ele busca?

Ao contrário da psiquiatria, a psicanálise permite pensar o sintoma desde


outra perspectiva. Vai buscar o que há de mais particular em cada sujeito, ou seja,
sua singularidade em relação ao seu desejo inconsciente e seu modo de gozo. É a
clínica do caso a caso, onde o foco não é o que um sujeito tem em comum com os
outros, e sim o seu diferencial mais específico.

A partir de sua descoberta do inconsciente, Freud inaugura a clínica


psicanalítica supondo que há um saber no sintoma, fazendo-o passar de um status
de sinal, que representa uma doença para um médico, para o status de significante,
que representa o sujeito para um outro significante. Assim, através da relação
transferencial, Freud faz falar o sintoma.

A psicanálise, desde seu início no século passado até a contemporaneidade,


tem o conceito de sintoma como algo crucial e norteador para a sua prática e, por
mais que as mudanças ocorridas na sociedade ao longo dos anos tenham se
refletido nos modos de subjetivação e produção dos sintomas, uma coisa é certa: os
sintomas e suas diversas facetas continuam a insistir no ser falante.
6

Insuportáveis ou amenos, difíceis ou mais aceitáveis, os sintomas estão em


todos os neuróticos. O sujeito dividido, constituído por sua falta-a-ser, não escapa às
agruras do sintoma. Desse modo, se destacam algumas questões a serem
elucidadas por este trabalho: Para que serve o sintoma? Por que, apesar de causar
dor e sofrimento, ele é tão caro ao sujeito? A serviço de que ele está e a que
responde? O que pode a psicanálise diante da fixidez do sintoma?

A fim de responder a estes questionamentos, o presente trabalho pretende


fazer um percurso a respeito do conceito de sintoma na psicanálise, desde seu início
com Freud até a segunda clínica de Lacan, marcando seus desdobramentos e sua
evolução ao longo do tempo. Para tanto iniciaremos esta jornada com alguns textos
capitais da obra de Freud, em especial, suas Conferências Introdutórias sobre
Psicanálise. Depois, com o Lacan dos anos 50 e sua clínica estrutural,
observaremos como este empreende sua releitura da obra de Freud e, a seguir,
como o sintoma é entendido por Lacan através de sua clínica borromeana. Ao final,
após trilhar estas veredas, faremos alguns apontamentos sobre o sintoma no caso
Dora.
7

1. O SINTOMA EM FREUD

A questão do sintoma se localiza no nascimento da clínica psicanalítica à


medida que Freud, através de uma escuta diferenciada, se propõe a buscar a
origem dos sintomas na particularidade do sujeito.

Ao longo de sua obra é possível observar os diversos desdobramentos do


conceito de sintoma, que será abordado neste capítulo em três momentos: o
sintoma antes da publicação de “A interpretação dos sonhos” (1900); o sintoma
como formação do inconsciente e; o sintoma a partir da segunda tópica.

1.1. OS PRIMÓRDIOS DO CONCEITO DE SINTOMA EM PSICANÁLISE

Inicialmente, com a influência de Charcot e através de seus estudos sobre a


histeria realizados em conjunto com Breuer, Freud supõe que o sintoma histérico é
originado de um conflito psíquico suscitado por um evento traumático que foi
esquecido e que deixou marcas.

Em “Sobre o mecanismo psíquico dos fenômenos histéricos: Comunicação


preliminar (1893)”, Freud e Breuer afirmam: “Os histéricos sofrem principalmente de
reminiscências” (1893/2006, p.43). Desse modo, acreditavam que restos de eventos
traumáticos esquecidos retornariam no corpo através de sintomas conversivos
como: paralisias, afonias, dores de cabeça, cegueira, entre outros.

É importante frisar que é neste período que Freud começa a desenvolver uma
outra forma de entender o sintoma, diferente do que era proposto pela medicina da
época. Ele supõe que há um enigma a ser decifrado na histeria, havendo, portanto,
um saber na perturbação. A partir deste ponto, posteriormente, desenvolverá o
conceito de inconsciente e a associação livre como regra fundamental da
psicanálise. Conforme comenta Sidon: “[...] Freud faz falar o sintoma. Este
dispositivo de suposição de um saber do Outro é inaugural do “corte” de Freud em
relação à Charcot”. (1998, p. 246).

Em “A etiologia da histeria”, distanciando-se do que postulavam Charcot e


Breuer, Freud (1896/2006) propõe como tese que:

[...] na base de todos os casos de histeria, há uma ou mais


ocorrências de experiência sexual prematura, ocorrências estas que
pertencem aos primeiros anos da infância [...]. (p. 200).
8

Através dos relatos de seus pacientes e, consequentemente, a rememoração


de cenas infantis que apontam para o trauma, Freud percebe que refazendo o trajeto
do sintoma até a cena traumática era possível o desaparecimento do sintoma,
comprovando assim sua tese de que as neuroses são originárias de cenas infantis
traumáticas de conteúdo sexual.

Quanto à origem destas cenas, inicialmente Freud acreditava que os abusos


infantis de ordem sexual, narrados por seus pacientes, eram reais. Porém,
posteriormente, no ano de 1897, na famosa Carta 69 endereçada a Fliess afirma:
“Não acredito mais em minha neurótica” (FREUD, 1897/2006, p. 309). Nesta
conjuntura, mais tarde será levado a desenvolver a teoria da fantasia, onde o trauma
é suposto ou deduzido na realidade psíquica do sujeito, não se tratando de uma
realidade factual.

1.2. O SINTOMA COMO FORMAÇÃO DO INCONSCIENTE

O ano de 1900 é considerado como momento inaugural da psicanálise por


conta da publicação de “A interpretação dos sonhos”. É neste texto, considerado um
dos mais importantes de sua obra, que Freud descreve sua descoberta do
inconsciente, demonstrando suas características, seu modo de funcionamento e
suas leis.

De acordo com Freud (1900/2006) os sonhos são realizações de desejos. É


por meio do sonho que o desejo inconsciente vai buscar uma forma de expressão
substituta que escape à censura. “[...] esses desejos, mantidos sob recalcamento,
são eles próprios de origem infantil, como nos ensina a pesquisa psicológica das
neuroses” (FREUD, 1900/2006, p.583) e por não serem aceitáveis no plano da
consciência, apenas conseguem se apresentar no conteúdo manifesto de maneira
disfarçada, através das múltiplas distorções produzidas pelos mecanismos de
condensação e deslocamento.

Tais mecanismos, constitutivos do processo primário, além de serem


encontrados na formação dos sonhos também podem ser observados em outras
formações do inconsciente como os lapsos, os atos falhos, os chistes e os sintomas,
os quais se assemelham pela busca da realização de desejos e pelo
estabelecimento de formações de compromisso.
9

Em “Sobre a psicopatologia da vida cotidiana” (1901) Freud fala sobre os atos


falhos, os lapsos e os sonhos como formações do inconsciente da vida psíquica
normal, passíveis de serem encontrados em qualquer sujeito e considera que estas
formações fazem parte das funções psíquicas menos importantes. Porém, em
contrapartida, afirma que:

Uma distribuição dos sintomas contrária a essa – seu aparecimento


nas funções individuais e sociais mais importantes, a ponto de serem
capazes de perturbar a alimentação, as relações sexuais, o trabalho
profissional e a vida social – é própria dos casos graves de neurose.
(FREUD, 1901/2006, p.272)

Assim, o sintoma neurótico se difere das outras formações do inconsciente à


medida que causa sofrimento, impedimentos e perturbações nas funções e na vida
do individuo. Como afirma Freud nas “Conferências introdutórias sobre psicanálise”,
os sintomas psíquicos “... são atos, prejudiciais, ou, pelo menos, inúteis à vida da
pessoa, que por vez, deles se queixa como sendo indesejados e causadores de
desprazer ou sofrimento”. (FREUD, 1917/2006, p.36).

As “Conferências introdutórias sobre psicanálise” foram proferidas entre os


anos de 1915 e 1917, na Universidade de Viena, para um público de leigos. O
primeiro ciclo destas conferências tratou das parapraxias e dos sonhos, enquanto
que o segundo ciclo se concentrou nos sintomas neuróticos e na psicanálise
propriamente dita. Neste segundo ciclo, Freud fala mais detidamente sobre o
sintoma em duas conferências: XVII – “O sentido dos sintomas” e XXIII – “Os
caminhos da formação dos sintomas”. Miller (2011) aponta que estas duas
conferências possuem um valor binário, onde é possível observar que Freud vai do
sentido ao gozo do sintoma. Há que se fazer um percurso entre estas duas
conferências para que se compreenda qual o caminho tomado por Freud.

Na conferência XVII – “O sentido dos sintomas”, se trata de imprimir um


sentido ao sintoma, equivalendo-o às outras formações do inconsciente. “Os
sintomas neuróticos têm, portanto, um sentido, como as parapraxias e os sonhos, e,
como estes, têm uma conexão com a vida de quem os produz”. (FREUD,
1917/2006, p. 265).

A questão do trauma será explanada na conferência XVIII – “Fixação em


traumas – O inconsciente”, onde Freud (1917/2006) afirma que os sintomas
10

neuróticos são originários de fixações em experiências traumáticas e que, por serem


derivados de processos inconscientes, o seu sentido é desconhecido pelo paciente.

Cabe ressaltar que, neste contexto, Freud acredita que o sintoma neurótico
aparece como uma mensagem cifrada e que, assim como as outras formações do
inconsciente, possui um sentido e pode ser interpretado. O trabalho de análise
consiste então em tornar consciente o inconsciente, trazendo o sentido do sintoma à
tona.

Partindo para a conferência XIX – “Resistência e repressão”, são feitas


algumas deduções sobre a resistência que surge no decorrer do tratamento
analítico. Freud coloca como questão o porquê de o paciente empregar grande
energia em prol da permanência de seu sintoma e, conclui: “[...] forças poderosas
que se opõe a qualquer modificação na condição do paciente; devem ser as
mesmas que, no passado, produziram esta condição”. (FREUD, 1917/2006, p.300).

Se o sintoma, como formação do inconsciente, é o substituto daquilo que não


pode aceder ao plano da consciência, há nele também uma oposição de forças
atuando como resistência ao trabalho terapêutico, impedindo da mesma forma que o
conteúdo inconsciente se torne consciente. Freud (1917/2006) nomeia este
processo, que é observado através da resistência, como repressão e coloca-o como
pré-condição para a formação dos sintomas.

Neste período de elaboração teórica, o conceito de sintoma remete,


necessariamente, à existência de um conflito psíquico, cuja origem Freud nos diz:

O conflito surge pela frustração, em consequência da qual a libido,


impedida de encontrar satisfação, é forçada a procurar outros objetos
e outros caminhos. A precondição necessária do conflito é que esses
outros caminhos e objetos suscitem desaprovação em uma parte da
personalidade, de forma que se impõem um veto que impossibilita o
novo método de satisfação, tal como se apresenta. (1917/2006,
p.353).

A partir deste conflito psíquico o caminho está aberto para a formação do


sintoma, que traz em si o estabelecimento de uma relação de compromisso entre as
duas forças opostas produtoras do conflito, ou seja, a libido que quer satisfação e o
veto (repressão) imposto pelo ego como anticatexia.

Na conferência XXIII “Os caminhos da formação dos sintomas” Freud


(1917/2006) afirma que, na constituição do sintoma, a libido toma o caminho da
11

regressão. Por ter sido rechaçada, ela retira-se do ego e busca vincular-se a
representações do sistema inconsciente de acordo com o princípio do prazer.

Neste processo regressivo, a libido poderá encontrar como destino a


catexização de fixações existentes em objetos primários e/ou em etapas anteriores
do desenvolvimento, sendo o primeiro mais comum na histeria e o segundo mais
característico da neurose obsessiva. Quanto a estas fixações, Freud (1917/2006)
diz que são relativas às atividades e experiências sexuais infantis e que exercem
uma atração sobre elas por reterem uma certa quantidade de energia libidinal. Sobre
os caminhos tomados pela libido, Miller comenta:

Os circuitos pulsionais são correlativos à constância da finalidade


libidinal. Rodeios, metáforas, metonímias, plasticidade, colocam
ainda mais em destaque a constância da finalidade libidinal. A libido
é sempre a mesma e seus rodeios indicam a satisfação. (2011, p.25).

Em relação ao campo das vivências infantis, ao qual a libido frustrada se


destina, Freud (1917/2006) destaca, através de suas observações clínicas, a
ocorrência frequente de três fantasias primitivas. São elas: a observação do coito
dos pais, a sedução por um adulto e a ameaça de castração. Observa também, a
irrelevância em definir se estas fantasias ocorrem na realidade concreta ou não, pois
seus efeitos são os mesmos quando consideramos a realidade psíquica.

Se num primeiro momento, na época dos estudos sobre histeria com Breuer,
Freud concebe o trauma como base real do sintoma, posteriormente, considera que
o trauma é suposto ou deduzido. Neste momento de suas elaborações, ele adota a
teoria da fantasia, onde o trauma é considerado como o fundamento da fantasia na
realidade psíquica do sujeito.

Destarte, Freud define o sintoma na histeria como a repetição de uma


satisfação infantil que havia ficado no passado. Essa satisfação agora é sentida
como desprazer ou sofrimento por conta da censura que surge no conflito entre as
forças opostas. Ao mesmo tempo em que há satisfação libidinal, há defesa contra a
mesma. “Aquilo que para o indivíduo, em determinada época, constituía uma
satisfação, na realidade passa, hoje, necessariamente a originar resistência e
repugnância”. (FREUD, 1917/2006, p.368).

Sobre este ponto das elaborações freudianas, Miller faz um paralelo com o
conceito lacaniano de gozo:
12

Freud nos fala de uma satisfação que não se confunde com o prazer.
O sintoma histérico apresenta-se na dimensão do desprazer, ainda
que satisfaça – o que justifica a introdução de uma palavra distinta
para indicar a conjunção da satisfação e do desprazer. É o que
Lacan chama de gozo. (MILLER, 2011, p.27).

Ainda segundo Miller (2011), no final do capítulo XXIII – “Os caminhos da


formação dos sintomas” das Conferências de Freud, há uma indicação do gozo para
além das fantasias primitivas (sedução, castração e coito), onde Freud afirma que
sempre há um resto de gozo, o qual não se submete nem à realidade externa, nem
ao princípio do prazer. Este resto de gozo é o que Freud chama de fixação, que
seria como uma memória do trauma do gozo. Assim, supõe haver um real que se
abriga dentro do fantasma.

1.3. O SINTOMA A PARTIR DA SEGUNDA TÓPICA

No decorrer do exercício de sua clínica, Freud se depara com as dificuldades


de tratar o sintoma, por este trazer em si uma grande satisfação. Percebe que é só
com muita resistência que um paciente abandona seu sintoma, sendo que alguns
não conseguem ou o fazem parcialmente. “Sua prática clínica foi lhe demonstrando
que a decifração dos significados não era suficiente.” (OCARIZ, 2003, p.78). Neste
contexto, Freud é levado à construção de novas elaborações na teoria psicanalítica.

A segunda tópica freudiana, estabelecida na década de 20, surge como uma


nova concepção do funcionamento do aparelho psíquico que, entre outras coisas,
tenta dar conta da questão do beneficio do sintoma, sua fixidez e sua relação de
compromisso com o eu. Entre os principais textos metapsicológicos da segunda
tópica estão: “Além do princípio do prazer (1920)”, “O ego e o Id (1923)”, “O
problema econômico do masoquismo (1924)” e “Inibições, sintomas e Ansiedade
(1926)”.

A publicação de “Além do princípio do prazer (1920)” marca o início das


elaborações concernentes à segunda tópica. É neste artigo que Freud desenvolve a
noção de pulsão de morte e de compulsão à repetição, principiando a virada teórica
dos anos 20.
13

Até então, acreditava-se que o curso dos processos mentais estava


automaticamente regulado pelo princípio do prazer, o qual consiste na redução da
tensão desagradável, onde o desprazer corresponde a um aumento na quantidade
de excitação e o prazer a uma diminuição. No entanto, através da observação das
brincadeiras de seu neto (jogo do fort-da), da transferência durante a análise e da
repetição dos sonhos na neurose traumática, Freud (1920/2006) começa a
questionar a dominância do princípio do prazer no aparelho mental. Por meio destas
observações, onde há uma repetição de situações que causam dor e sofrimento, ele
chega à conclusão de que existe na mente uma compulsão à repetição com
tendências mais primitivas e independentes do princípio do prazer.

[...] chegamos agora a um fato novo e digno de nota, a saber, que a


compulsão à repetição também rememora do passado experiências
que não incluem possibilidade alguma de prazer e que nunca,
mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos
instintuais que desde então foram reprimidos. (FREUD, 1920/2006,
p. 31).

A compulsão à repetição é considerada por Freud como uma propriedade do


movimento pulsional no qual o objetivo é retornar a um estado anterior à vida, ou
seja, a um estado inorgânico. É a chamada pulsão de morte, da qual sobre sua
origem Freud no diz:

[...] ‘o objetivo de toda vida é a morte’ [...] Os atributos da vida foram,


em determinada ocasião, evocados na matéria inanimada [...] A
tensão que então surgiu no que até aí fora uma substância
inanimada se esforçou por neutralizar-se e, dessa maneira, surgiu o
primeiro instinto: o instinto a retornar ao estado inanimado.
(1920/2006, p. 49).

A descoberta da pulsão de morte, que representa a destruição e a


agressividade que atua no sujeito, leva Freud à elaboração de uma nova teoria
pulsional. A oposição entre as pulsões de vida e as pulsões de morte passa a
comandar o funcionamento psíquico, sendo que as primeiras atuam no sentido do
prolongamento da vida, e as últimas, por sua vez, no sentido da morte e volta ao
estado inorgânico do organismo.

Neste período de elaborações teóricas, surge uma nova dimensão do


sintoma. Além do sintoma como formação do inconsciente e mensagem que pode
14

ser interpretada, ele também passa a ser caracterizado por uma outra faceta, a
saber, o sintoma como satisfação pulsional (gozo).

Como lembra Ocariz: “A satisfação pulsional tem uma dupla impossibilidade:


a de alcançar a satisfação e a de deixar de buscá-la. Pulsão e repetição entrelaçam
seus fios e produzem um complicado tecido”. (2003, p.86). Levando-se em conta
que a pulsão nunca cessa seu movimento em busca de satisfação e que há no
sintoma um real de gozo impossível de ser representado, o sujeito é levado a uma
compulsão à repetição, que causa, paradoxalmente, satisfação e sofrimento.

Segundo Cottet (1998), neste momento de seu percurso:

[...] Freud identifica o sintoma à compulsão de destino, de maneira


que não se vê mais qual é o desprazer que o sintoma evita ao eu,
nem qual é a instância que pode se satisfazer com isso. [...] A
compulsão de repetição vem no lugar do conflito neurótico como se
os sintomas manifestassem cada vez mais sua autonomia em
relação aos interesses do eu. (p.49).

Se nas “Conferências introdutórias sobre psicanálise” (1916-1917) Freud se


dedicou a falar mais detidamente do sintoma na histeria, posteriormente, em
“Inibições, sintomas e ansiedade” (1926[1925]) abordará o sintoma na neurose
obsessiva e na fobia em seus pormenores, utilizando-se dos avanços da segunda
tópica. É também neste texto que propõe uma mudança na teoria da angústia,
estabelece sua relação com o sintoma e coloca o complexo de castração como pivô
na formação do sintoma.

No segundo capítulo de “Inibições, sintomas e ansiedade”, Freud (1926/2006)


reafirma o conceito de sintoma como “[...] um sinal e um substituto de uma
satisfação instintual que permaneceu em estado jacente; é uma consequência do
processo de repressão.” (p. 95). A formação do sintoma ocorre por uma espécie de
falha da repressão, onde:

[...] o impulso instintual encontrou um substituto apesar da repressão,


mas um substituto muito mais reduzido, descolado e inibido, e que
não é mais reconhecível como uma satisfação. E, quando o impulso
substitutivo é levado a efeito, não há qualquer sensação de prazer; e
sua realização apresenta a qualidade de uma compulsão. (FREUD,
1926/2006, p. 98).
15

Se o sintoma é o substituto de uma satisfação pulsional, como é possível que


esta satisfação seja liberada no ego como desprazer? Questionamentos como este,
levam Freud à elaboração de sua segunda teoria da angústia.

Através da análise do caso ‘Little Hans’ e do ‘Homem dos lobos’, Freud


(1926/2006) chega à conclusão de que não é o processo repressivo que produz o
afeto de angústia como se pensava anteriormente, e sim que a angústia originada
no ego é a força motriz da repressão. “É sempre a atitude de ansiedade do ego que
é a coisa primária e que põe em movimento a repressão. A ansiedade jamais surge
da libido reprimida.” (FREUD, 1926/2006, p. 111).

Segundo a nova teoria, a angústia é emitida como um sinal de alerta, que é o


indicativo de que há uma situação de desamparo que pode ser revivida pelo sujeito.
De acordo com Freud (1926/2006):

[...] o perigo de desamparo psíquico é apropriado ao perigo de vida


quando o ego do indivíduo é imaturo; o perigo da perda de objeto,
até a primeira infância, quando ele ainda se acha na dependência de
outros; o perigo da castração, até a fase fálica; e o medo do seu
superego até o período de latência. (p. 140).

Sobre a predeterminação nas neuroses Freud (1926/2006) comenta “[...]


afigura-se provável que, como um determinante da ansiedade, a perda do amor
desempenha o mesmíssimo papel na histeria que a ameaça da castração nas fobias
e o medo do superego na neurose obsessiva”. (p.141).

Desse modo, diante da angústia gerada pela situação de perigo, cada


estrutura neurótica se utilizará de mecanismos de defesa que lhes são mais
característicos e formará sintomas específicos para tentar se proteger. A constituição
de um sintoma neurótico funciona como uma espécie de proteção ao sujeito à
medida que permite dar um contorno à angústia despertada pela iminência do
trauma. Por outro lado, paradoxalmente, o sintoma como formação substitutiva
insistirá na satisfação pulsional impossível, trazendo sofrimento ao sujeito.

No final de sua obra, mais especificamente em “Análise terminável e


interminável”, Freud (1937/2006) discorrerá sobre os limites do tratamento analítico:

Deparamo-nos com pessoas, por exemplo, a quem estaríamos


inclinados a atribuir uma especial ‘adesividade da libido’. Os
processos que o tratamento coloca em movimento nessas pessoas
são muito mais lentos do que em outra, porque, aparentemente, elas
16

não podem decidir-se a desligar catexias libidinais de um


determinado objeto e deslocá-las para outro, embora não possamos
descobrir nenhuma razão especial para essa lealdade catexial. (p.
258)

De acordo com Freud (1937/2006), fatores como a intensidade pulsional, a


fragilização do ego, a força do superego e a influência do trauma podem dificultar
um processo de análise e torná-lo interminável. Ele chega à conclusão de que a
psicanálise não pode dar garantias face à impossibilidade da satisfação pulsional
que se repete no sintoma, sendo o sucesso de uma análise dependente de fatores
específicos e constitucionais do aparelho psíquico de cada sujeito.

2. O SINTOMA EM LACAN

O conceito de sintoma em Lacan, segundo Miller (1989) (2011), é abordado


ao longo de seu ensino por um caminho que vai do sentido - sintoma como
mensagem interpretável - a algo que vai além dele, ou seja, o gozo como satisfação
real do sintoma.

Este percurso é realizado por Lacan no decorrer de suas duas clínicas: a


clínica estrutural, que compreende as décadas de 50 e 60, e, a clínica borromeana,
estabelecida na década de 70.

2.1. O SINTOMA NA CLÍNICA ESTRUTURAL LACANIANA


17

A clínica estrutural lacaniana é caracterizada por um “retorno a Freud”,


através da releitura de sua obra sob a ótica da linguística estrutural saussuriana, da
antropologia lévi-straussiana, entre outras influências. Este período é marcado por
uma primazia do registro do simbólico, onde a decifração simbólica e a máxima do
“inconsciente estruturado como linguagem” dominam a cena.

O texto “Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise”, resultado


do “Discurso de Roma” de 1953, marca a inauguração do ensino de Lacan, trazendo
a psicanálise sob a perspectiva do simbólico, ou seja, da linguagem. Neste texto,
segundo Miller (2011), Lacan “[...] destaca e constrói o sentido na prática da
psicanálise, o sentido no inconsciente e o sentido no sintoma.” (p. 12). Através dos
recursos da linguística estrutural, Lacan demonstra o quanto o campo da psicanálise
se identifica ao campo da linguagem.

Sobre o sintoma, Lacan afirma: “[...] o sintoma se resolve por inteiro numa
análise linguajeira, por ser ele mesmo estruturado como uma linguagem, por ser a
linguagem cuja fala deve ser libertada.” (1953/1998, p. 270).

É possível notar, através desta passagem, que neste momento Lacan está
em consonância com o Freud de “A interpretação dos sonhos” (1900). Tal qual o
mestre, Lacan acredita que o sintoma, assim como as outras formações do
inconsciente, pode ser perfeitamente decifrável na experiência analítica. Como já foi
dito anteriormente, neste momento, o que Lacan traz de novo em relação à Freud é
a utilização das ferramentas da linguística estrutural.

Neste contexto, Lacan (1953/1998) também traz a seguinte definição a


respeito do sintoma:

O sintoma, aqui, é o significante de um significado recalcado da


consciência do sujeito. Símbolo escrito na areia da carne e no véu de
Maia, ele participa da linguagem pela ambiguidade semântica que já
sublinhamos em sua constituição. (p. 282).

Desse modo, o sintoma é articulado em cadeias significantes e pode ser


decifrado num processo de análise através do deslizamento e do desdobramento
dos significantes recalcados ligados a ele. O efeito de sentido, ou seja, o significado
é entendido por Lacan (1957/1998) pela relação que um significante estabelece com
outro significante retroativamente.
18

Em “Instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud” (1957) Lacan


apresenta a cadeia significante como o que coordena o mundo humano, expõe as
mudanças que realiza do conceito de signo de Saussure e representa os
mecanismos freudianos de condensação e deslocamento em, respectivamente,
metáfora e metonímia.

Estes mecanismos, que comandam os processos inconscientes, são efeitos


de linguagem que serão responsáveis pela transformação do conteúdo reprimido em
substitutos que possam passar pela censura. Desse modo, o sintoma é pensado
como uma metáfora, ou seja, como um significante que ocupa o lugar de um
significante recalcado, como o representante de algo que não se sabe:

O mecanismo de duplo gatilho da metáfora é o mesmo em que se


determina o sintoma no sentido analítico. Entre o significante
enigmático do trauma sexual e o termo que ele vem substituir numa
cadeia significante atual passa a centelha que fixa num sintoma –
metáfora em que a carne e a função são tomadas como elemento
significante – a significação, inacessível ao sujeito consciente onde
ele pode se resolver. (LACAN, 1957/1998, p. 522)

Desse modo, o sintoma no início do ensino de Lacan aparece como um


enigma, como um sentido recalcado. Revela-se por meio de um significante que não
foi autenticado pelo Outro.

Nestes primeiros anos de ensino, situados na década de 50, Lacan


desenvolve toda a questão do sentido do sintoma privilegiando a vertente do
simbólico. Mas, e quanto à questão da satisfação? Como o gozo é concebido neste
primeiro momento de sua teoria? Segundo Miller (2011), “Na primeira orientação de
Lacan, há uma desvalorização da pulsão, embora não advertida quando falamos do
imaginário, mas presente.” (p. 13). O gozo, então localizado no registro imaginário
em a-a’, é uma questão que praticamente não é abordada por Lacan neste período.

Com o avanço de sua clínica e o desenvolvimento de suas elaborações


teóricas, Lacan se depara com o limite da decifração simbólica e passa a dar maior
acento à questão do sintoma como gozo. A partir de meados da década de 60, suas
elaborações serão orientadas em direção ao real, como o que resiste a qualquer
significação. Não se trata mais de considerar o sintoma como algo perfeitamente
decifrável, é preciso dar conta deste “a mais” que persiste, ou seja, do gozo como
satisfação pulsional.
19

Dito isso, é importante destacar aqui o texto “Os seis paradigmas do gozo”
(2012), onde Miller faz um estudo localizando os desdobramentos que o conceito de
gozo tem ao longo do ensino de Lacan, bem como a relação estabelecida entre
sentido e gozo. Se como primeiro paradigma temos a “imaginarização do gozo”,
posteriormente, como segundo paradigma, localizado a partir do Seminário 5, temos
a “significantização do gozo”. Trata-se de um gozo mortificado, que “está
essencialmente repartido entre o desejo e a fantasia” (MILLER, 2012, p.11).

No Seminário 5 - “As formações do inconsciente”, Lacan (1957-1958/1999)


apresenta o grafo do desejo e demonstra como a formação do sintoma é gerada
pelo fantasma, localizando o sintoma em s(A) como efeito de significado do Outro. É
na demanda endereçada ao Outro que o desejo circula através de seus disfarces, de
suas máscaras, se apresentando por meio do sintoma de forma ambígua. O
sintoma, “... na medida em que se trata de desejo de reconhecimento, ele é diferente
do desejo” (p. 338), do desejo recalcado. Desse modo, o desejo não pode ser
decifrado pelo sintoma na medida em que é da ordem do indizível, não podendo ser
inscrito na ordem significante.

A relação do sujeito com o gozo é vislumbrada por Lacan através do grafo do


desejo, que traz a articulação entre sentido e gozo. De acordo Miller (1986-87) apud
Gorostiza (1998):

Existe uma necessidade, dada pelo caráter específico do sintoma,


que o diferencia das demais formações do inconsciente: sua fixidez,
sua inércia. E é isto o que obriga Lacan a incluir sua determinação
significante em um circuito mais vasto onde o gozo e a castração se
encontram implicados. (p. 98)

Seguindo Freud, Lacan (1957-1958/1999) assinala que a satisfação real do


sintoma – o gozo -, reconhecida pelo sujeito como sofrimento, corresponde ao real
traumático, que não pode ser dito. Nesta perspectiva, o sintoma é uma solução que
o sujeito encontra para não ter que se haver com a castração.

Com o Seminário 7 – “A ética da psicanálise”, segundo Miller (2012), Lacan


empreende uma reviravolta a respeito do conceito de gozo, que passa a ser
considerado como um “gozo impossível”, atribuído ao real e do lado de das Ding.
Neste terceiro paradigma há uma disjunção entre significante e gozo:
20

[...] o sintoma, que até então ele [Lacan] relacionava ao reacalque, é


aí relacionado à defesa. Ele articula o sintoma ao caráter
estruturalmente desarmônico da relação com o gozo. O sintoma é o
modo pelo qual o sujeito formula que o gozo é mal, quer dizer: o
sintoma se estabelece exatamente sobre a barreira que existe entre
o significante e o gozo [...]. (MILLER, 2012, p. 15).

Mais tarde, no Seminário 10 – “A angústia”, Lacan (1962-63/2005) faz o


seguinte apontamento sobre sintoma e gozo:

[...] o que a análise descobre no sintoma é que ele não é um apelo


ao Outro, não é aquilo que mostra ao Outro. O sintoma, por natureza,
é gozo, não se esqueçam disso, gozo encoberto, sem dúvida,
untergebliebene Befriedigung; [...] ele se basta. É da ordem daquilo
que lhes ensinei a distinguir do desejo como sendo o gozo, isto é,
aquilo que vai em direção à Coisa [...]. (p.140).

O sintoma é uma solução que traz em si um profundo paradoxo, que reside


no fato de ser fonte de padecimento e, ao mesmo tempo fonte de satisfação, porém
uma satisfação que não se confunde com o prazer. Essa satisfação, expressa pelo
gozo, é nomeada por Lacan (1957-59/1999) como uma “satisfação às avessas”.

Sobre a satisfação da pulsão Lacan (1964/1979) nos diz:

[...] se nos referimos à pulsão, é na medida em que é no nível da


pulsão que o estado de satisfação deve ser retificado. Esta
satisfação é paradoxal. Quando olhamos de perto para ela,
apercebemo-nos de que entra em jogo algo de novo – a categoria do
impossível. [...] o real como o impossível. (p. 158-159).

No Seminário 11 – “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise”, de


acordo com Miller (2012), é estabelecido o quarto paradigma, nomeado como “gozo
fragmentado” ou “gozo normal”. Há uma antítese entre este paradigma e o anterior,
pois com os mecanismos de alienação e separação, Lacan volta a articular o
simbólico e o gozo.

Neste momento, o gozo é mostrado sob a forma do objeto a, que


complementa o efeito de sentido. O gozo é “[...] alcançado ao se seguir o caminho
normal da pulsão, seu ir e vir, e sem transgressão” (MILLER, 2012, p. 17). O objeto
a se localiza entre o objeto de desejo e o objeto da pulsão, oscilando entre a
dimensão de objeto causa do desejo e a de objeto pulsional com o mais-gozar.

Como quinto paradigma Miller (2012) propõe o “gozo discursivo”, que é


localizado nos Seminários 16 e 17, bem como em “Radiofonia”. Este paradigma
21

supõe haver uma relação primitiva entre significante e gozo. O sintoma, neste
momento, trata-se de repetição:

A repetição é o que merece ser chamado de sintoma, o que nos


apresenta, efetivamente uma repetição de gozo e, por isso mesmo,
uma constância, mas não está concentrada sobre a fantasia
fundamental a ser atravessada. É uma constante que se prolonga,
que dura. Ela não está propriamente envolvida na fantasia que –
como uma fórmula – teria de ser extraída, atingida. (p. 35).

O final de análise, que em paradigmas anteriores era pensado em termos de


atravessamento da fantasia, agora caminha em direção ao que será proposto no
último ensino de Lacan, ou seja, o saber fazer aí com o sinthoma. Assim, “O objetivo
do tratamento analítico é que o sujeito possa renunciar à parte de gozo insuportável,
fazer um acordo consigo mesmo e usufruir das formas de gozo adequadas com as
quais ele já conta ou inventar, criar outras que o satisfaçam”. (OCARIZ, 2007,
p.125).

O sexto e último paradigma, que será abordado no item seguinte, trata-se do


paradigma da “não relação”, sendo localizado por Miller (2012) a partir do Seminário
20, se estendendo ao longo da clínica borromeana.

2.2. O SINTOMA SOB A PERSPECTIVA DA CLÍNICA BORROMEANA

Estabelecida na última década do ensino de Lacan, mais especificamente na


década de 70, a clínica borromeana traz uma nova abordagem do sintoma através
da topologia dos nós. Ao contrário da clínica estruturalista, a clínica borromeana é
uma clínica além do Édipo, onde o Outro não existe e o sintoma está ligado a um
modo particular de gozo e de amarração dos três registros - imaginário, simbólico e
real.

Se num primeiro momento de seu ensino, através da clínica estrutural, assim


como Freud, Lacan apresenta uma clínica do conflito, posteriormente, com a clínica
borromeana, há uma mudança de perspectiva à medida que não se trata mais de
resolver o conflito, mas de obter um novo arranjo. Como assinala Miller (2011):

A clínica dos nós é uma clínica sem conflito. [...] É uma clínica do
enodamento e não da oposição, dos arranjos que permitem uma
satisfação e conduzem ao gozo. Há dificuldades, mas não há
22

conflito. A estrutura mesma dos nós não permite a dimensão do


conflito. (p. 28 e 29).

O nó borromeano, que é apresentado por Lacan pela primeira vez no ano de


1972, consiste no enlaçamento dos três registros - simbólico, real e imaginário -,
sendo o ponto central o lugar onde se situa o objeto a, núcleo real de gozo. Estes
três registros estão enlaçados de um modo que o desprendimento de um deles
provoca o desatamento simultâneo de todos os elos.

Quanto ao modo de compreensão do conceito de sintoma neste período, em


“A terceira” (1974), Lacan nos dá a seguinte definição:

O sentido do sintoma não é aquele com o qual o nutrimos para sua


proliferação ou extinção. O sentido do sintoma é o real, na medida
em que ele se põe de través para impedir que as coisas caminhem,
no sentido em que elas garantam a si mesmas de modo satisfatório.
(LACAN, p. 18).

Neste contexto, o real tem um papel central na formação dos sintomas à


medida que é colocado como “o que não cessa de se repetir [...] o que retorna
sempre ao mesmo lugar” (Lacan, 1974/2011, p.16). O real é o que ex-siste ao corpo
na qualidade de gozo.

No ano seguinte, no Seminário “R.S.I” (1974-75), Lacan vai definir o sintoma


como o “modo como cada um goza do inconsciente, na medida que o inconsciente o
determina” (p.37). Neste seminário o sintoma é entendido como letra, que articula
inconsciente e gozo. A letra que vem do real é o que “não cessa de se escrever”
para dar conta do que “não cessa de não se escrever”, que diz respeito à
impossibilidade da relação sexual.

Retomando o texto “Os seis paradigmas do gozo”, Miller (2012) localiza neste
momento do ensino de Lacan o último dos paradigmas, que é nomeado como o
paradigma da “não relação” e pode ser localizado a partir do Seminário 20 – “Mais,
ainda”.

Este é o paradigma da disjunção. Como aponta Miller (2012), há disjunção


entre o gozo e o Outro, o que implica no gozo UNO, ou seja, o gozo sem o Outro.
Também há disjunção entre o significante e significado e, entre o homem e a mulher,
evidenciando que não há possibilidade de conexão.
23

No Seminário 23 – “O sinthoma”, Lacan (1975-76/2007) apresenta o nó


borromeano de quatro termos, onde imaginário, simbólico e real, inicialmente
separados, são unidos por um quarto elemento – o sinthoma, que faz a função do
Nome-do-pai. Assim, como afirma Lacan: “... o pai é um sintoma, ou um sinthoma,
se quiserem". (p. 21). O Nome-do-pai é um recurso simbólico e, portanto, é o
sinthoma do neurótico. Contudo, não é a única forma de manter os três registros
unidos, há outras versões do Pai, há outras formas de enodamento e suplência.
Neste mesmo seminário, temos o exemplo de James Joyce que, pela carência do
Nome-do-pai, faz uma suplência com sua obra, permitindo que os três registros
permaneçam unidos.

Sobre a utilização da forma antiga de escrita da palavra sintoma (sinthoma),


Miller (2004) faz o seguinte apontamento:

A mudança de ortografia à qual Lacan procede, sabemos que é uma


mudança de sentido; [...] é a diferença entre o sintoma, como
escrevemos normalmente, e o sinthoma que reflete a diferença entre
linguagem e língua. Isso indica um ponto de vista sobre o sintoma
em que o sintoma não é mais uma formação do inconsciente.

O sinthoma está relacionado à lalingua, como uma forma de gozo anterior à


linguagem, e a um modo singular de amarração do nó realizada pelo sujeito.

Se na clínica estrutural o sintoma é apreendido como metáfora significante, na


clínica borromeana o sintoma é signo isolado da cadeia significante, ou seja, algo
que não remete a nada, que não é para ser decifrado. O sintoma é entendido como
função de letra, como uma cifra de gozo. A letra, que vem do real, é o que “não
cessa de se escrever” no sintoma.

Entretanto, chegar a essa perspectiva de sintoma como letra (signo) é o


resultado de um processo de decantação que nos remete ao final de análise e,
portanto, ao sinthoma.

Desse modo, primeiramente, no início de um processo de análise, temos o


sintoma do qual o paciente se queixa e busca uma resposta. Trata-se do que Lacan
chamou de invólucro formal do sintoma, ou seja, o sintoma em sua função
significante. Porém, há um limite, onde o sintoma já não é significante, ele é signo.
Este limite é o núcleo não analisável do sintoma, o S1 isolado, ao qual se chega
quando um processo de análise está próximo do fim. Desse modo, como afirma
Belaga (2009): “O elemento significante do sintoma é reduzido ao status de letra,
24

desligado do sentido. Em suma, o nó do sintoma será uma letra que se repete no


real.” (p.345).

Assim, o sinthoma como final de análise é o que restou como ponto


irredutível do sintoma, algo muito singular do sujeito. Segundo Miller (2004) o
sinthoma é uma peça avulsa a qual, durante a análise, se buscará “bricolar” um uso
para ela, ou seja, inventar um uso diferente. “A partir de então, ele saberá fazer com
a-coisa que o a-cossa.” (BELAGA, 2009, p.345).

Segundo a perspectiva do último ensino de Lacan, o objetivo da análise é


localizar no sujeito o seu ponto incurável e possibilitar uma nova solução frente ao
gozo. Como afirma Lacan (1975-76/2007) “Só se é responsável na medida de seu
savoir-faire”. (p. 59). Saber fazer aí com o sinthoma é, portanto, encontrar uma
solução própria para fazer um uso diferente do gozo. “A boa maneira é aquela que,
por ter reconhecido a natureza do sinthoma, não se priva de usar isso logicamente,
isto é, de usar isso até atingir seu real, até se fartar”. (p. 16).
25

3. APONTAMENTOS SOBRE O SINTOMA NO “CASO DORA”

O texto “Fragmento da análise de um caso de histeria” (1905), mais


conhecido como o “caso Dora”, trata-se de um caso clássico de histeria com
sintomas conversivos e sem grandes prejuízos, ou como o próprio Freud nomeia:
uma “petite hystérie”. A paciente em questão foi atendida por Freud durante três
meses, no final do ano de 1900.

No ano seguinte, 1901, Freud escreve o caso clínico para uma posterior
publicação. É importante ressaltar que, neste mesmo ano, ele estava se dedicando à
escrita de “Sobre a psicopatologia da vida cotidiana” (1901) e havia publicado,
recentemente, a obra inaugural da psicanálise – “A interpretação dos sonhos”
(1900). Tais obras, evidentemente, tiveram grande influência na investigação e
análise do caso clínico, bem como a publicação de “Três ensaios sobre a teoria da
sexualidade” (1905) no mesmo ano em que foi publicado o caso.

Dora é uma jovem de dezoito anos de idade, que chegou até Freud pela
insistência do pai, o qual havia se tratado com ele há alguns anos. Quanto à
constituição familiar, além de Dora e os pais, havia também um irmão, um ano e
meio mais velho. A relação entre o casal parental era distante, sendo a mãe uma
dona-de-casa simples e o pai um industrial com ótima situação financeira, mas
também constantemente acometido de males de saúde, sendo este último, um dos
motivos pelos quais Dora sempre foi muito amorosamente apegada a ele.

Quando Dora tinha seis anos de idade, por conta da saúde do pai, a família
teve de se mudar para outra cidade, onde conheceram o Sr. e a Sra. K, que se
tornaram amigos da família. Nos momentos em que a saúde do pai piorava, era a
Sra. K quem lhe administrava os cuidados necessários e, por serem muito próximos,
Dora acreditava que tinham um relacionamento amoroso. Por outro lado, o Sr. K
também era muito atencioso e gentil com Dora.
26

Os sintomas histéricos de Dora começaram a se manifestar desde sua


infância, estando entre os principais: enurese noturna, aos sete anos; dispneia
crônica, aos oito anos; enxaqueca e tosse nervosa, aos doze anos, sendo que a
última persistiu por um longo período. Aos dezoito anos, quando inicia o tratamento
com Freud, Dora apresentava desânimo, alteração do caráter, crises de tosse
nervosa e afonias.

É importante ressaltar que a análise do caso clínico é realizada através de


dois sonhos relatados por Dora. Nesta época, em consonância com “A interpretação
dos sonhos”, Freud (1900/2006) acredita que os sintomas, assim como os sonhos,
são como realizações de desejos por se apresentarem como substitutos de fantasias
sexuais recalcadas. O sintoma é entendido como uma formação de compromisso
entre forças opostas e, para a sua remissão, é necessário que este conflito apareça,
tornando consciente o que até então estava inconsciente.

No decorrer da análise do caso clínico, podemos observar que Freud levanta


vários fatores para explicar a precipitação dos sintomas de Dora. Isto se deve ao
que ele chamou de sobredeterminação, ou seja, o fato de um sintoma possuir
múltiplas causas e sentidos. No Lacan da clínica estrutural, trata-se da articulação
das cadeias significantes na decifração simbólica, as quais constituem o invólucro
formal do sintoma.

Quando Dora inicia seu tratamento com Freud, havia uma forte pressão por
parte dela para que o pai cortasse relações com o Sr. e a Sra. K. Este
comportamento teve início após a cena do lago, onde o Sr. K se declara para Dora.
Como o pai prosseguia a amizade com o casal K, ela dizia que se sentia como
objeto de troca, pois ele permitia as investidas do Sr. K para com ela com o intuito
de ter o caminho livre para se relacionar com a Sra. K.

Durante a análise, Dora relata que, quando tinha quatorze anos, houve uma
outra cena com o Sr. K. Trata-se do episódio em que ele estreita a moça contra si e
lhe dá um beijo, causando grande repugnância. Para Freud (1905/2006), além deste
sentimento de repugnância - que evidencia a inversão do afeto por conta do
recalcamento da zona erógena oral -, este episódio também teria causado a
formação de outros dois sintomas: uma sensação de pressão no tórax, que pode ser
lida como um deslocamento da sensação original recalcada de sentir o pênis do Sr.
K contra seu ventre; e, a evitação de encontrar homens em situações afetivas,
27

funcionando como uma espécie de fobia que protege contra o revificação da


percepção recalcada.

Esta cena, caracterizada como traumática, demonstra o funcionamento do


fenômeno da repulsa, que é considerado por Freud (1905/2006) um critério para a
histeria: “Eu tomaria por histérica, sem hesitação, qualquer pessoa em quem uma
oportunidade de excitação sexual despertasse sentimentos preponderante e
exclusivamente desprazerosos [...]”. (p.370).

Como nos lembra André (2011), considerando-se que o recalque é o que


sexualiza o organismo pela intervenção do significante do falo, a repulsa histérica
demonstra, através da falha do recalque, que há um furo representado por um por
um real que não pode ser simbolizado. É precisamente por este fracasso do
recalque, que a presentificação da função orgânica do corpo se estabelece no
fenômeno da repulsa.

Desse modo, podemos entender o que acontece com Dora neste momento.
Quando é beijada pelo Sr. K, ao invés de sentir uma excitação sexual pela
estimulação da zona erógena oral, Dora sente repulsa e nojo, pois se acentua a
função orgânica do aparelho digestivo. Ocorre uma dessexualização do real, por
meio da invasão da função orgânica do corpo sobre a função sexual, ou seja, o que
é da ordem do desejo é degradado ao nível da necessidade. Este acontecimento
também pode ser entendido como uma defesa que evita que Dora entre em contato
com a feminilidade.

Ao relacionar o fenômeno da repulsa e o sintoma conversivo, característicos


da histeria, André (2011) aponta que a conversão histérica se consolida como uma
resposta à repulsa e ao susto:

[...] se a repulsa aparece como uma defesa, um recuo do sujeito


diante da presentificação da função orgânica do corpo, manifestando
o fracasso do sexual diante do orgânico, a conversão por sua vez
exprime, ao contrário, a réplica pela qual o sexual se afirma às
expensas do orgânico. (p. 126).

Desse modo, o sintoma conversivo se constitui como uma forma de reparar o


fracasso do recalque, onde a barreira entre o sexual e o não sexual não pode mais
ser estabelecida. Para que se possa entender o estatuto do corpo histérico e a
28

estrutura do sintoma conversivo, Miller (2003) propõe a retomada da primeira teoria


das pulsões em Freud.

Como se sabe, na primeira teoria pulsional trata-se da oposição entre as


pulsões do ego (de autoconservação) e as pulsões sexuais, onde o corpo é
entendido como recoberto tanto pela função orgânica para a sua manutenção,
quanto pela função sexual para a obtenção de prazer. Em Lacan, entende-se que há
inicialmente um “corpo orgânico”, puro real, que será sobreposto por um “corpo
especular”, resultado do investimento simbólico realizado pelo Outro. Assim sendo,
cada órgão deste corpo está destinado a servir a estas duas ordens.

Nesta perspectiva, o sintoma conversivo é resultado de um conflito entre o


orgânico e o sexual, que encontra como solução a completa invasão da função
sexual sobre a função orgânica. É preciso destacar aqui que esta função sexual diz
respeito às múltiplas pulsões parciais.

Sobre o que ocorre com o corpo na conversão histérica Miller (2003) nos diz:

[...] o corpo histérico é disputado entre a autoconservação e o gozo


pulsional fragmentado. [...] se constata que um órgão deixa de
participar deste fim de autoconservação, se emancipando de toda a
unidade e nos impõe a presença do corpo fragmentado. (p. 367,
tradução nossa).

Assim, o acontecimento de corpo na conversão denuncia o fato de que um


determinado órgão deixa de obedecer a um saber natural do corpo, que está sob o
domínio do eu, para se emancipar e se transformar em fonte de puro gozo.

No caso Dora, podemos notar o apelo à oralidade através da formação dos


sintomas conversivos de tosse nervosa e afonia. A boca, como órgão que serve
tanto à função orgânica (comer, falar) quanto à função sexual (beijo) é, neste caso,
totalmente destinada a servir à pulsão sexual parcializada, se tornando suporte de
um gozo autoerótico.

Segundo Freud (1905/2006) o sintoma de tosse teria como uma das causas o
desejo inconsciente de Dora pelo pai. Ela acreditava que, por conta das limitações
do pai, a relação entre ele e a Sra. K acontecia através de sexo oral. Por estar
identificada a Sra. K e desejar estar em seu lugar, Dora desenvolve o sintoma
através da hipererotização da região da boca e da garganta. Assim, a coceira na
garganta e a tosse espasmódica denotam a simulação de uma felação.
29

Outro ponto que Freud (1905/2006) assinala para a precipitação do sintoma


seria uma “complacência somática” para a região da boca, pois Dora se lembrava de
que na infância, até os quatro ou cinco anos de idade, fora uma “chupadora de
dedo”. O que Freud chama de “complacência somática” pode ser entendido como
uma fixação na fase oral. Desse modo, o sintoma se configurou através de uma
regressão da libido a períodos anteriores de satisfação, neste caso à zona erógena
oral.

Retomando a questão do fracasso do recalque na histeria, podemos notar


que o recobrimento da imagem corporal se torna problemático à medida que a
histérica se encontra sempre sob a ameaça do desnudamento, que denuncia a
presença de um corpo real. Para entender as causas desta fragilidade da imagem
corporal, André (2011) retoma as construções lacanianas a respeito do estádio do
espelho para dizer que o ponto de origem da desordem histérica pode ser situado na
falta do Outro, à medida que a falha da imagem corporal i(a) é produzida devido à
falta no nível da identificação simbólica I(A) fornecida pelo Outro, representado pela
instância paterna.

Esta falta de ponto de apoio para uma identificação especialmente


feminina [...] faz com que a imagem corporal, numa mulher, não
possa revestir e erotizar completamente o real do corpo. [...] Mas
qual é este real onde fica abandonada a parte propriamente feminina
da feminilidade? Nenhuma resposta positiva pode resolver esta
questão, pois que se trataria de nomear um não representável.
(ANDRÉ, 2003, p.132).

O pai da histérica é estruturalmente impotente porque não pode lhe dar uma
referência para a construção da identidade feminina, visto que a insígnia paterna
indica apenas o falo e não há no Outro um significante que represente a mulher.
Assim sendo, a histérica dedica todas as suas forças no intuito de reparar a falta
fundamental no Outro ou fazer parecer que ela não existe, na esperança de que um
dia possa obter um signo da identidade feminina.

Todo este movimento pode ser observado em Dora, cujo pai se apresenta
como um homem de saúde frágil e impotente. “O amor que ela tem por esse pai é
então estritamente correlativo e coextensivo à diminuição deste.” (LACAN, 1956-
57/1995, p. 142). Dora sustenta o desejo enfraquecido do pai à medida que contribui
para a manutenção do relacionamento amoroso dele com a Sra. K, se dedicando a
30

cuidar dos filhos do casal K e sendo alvo das investidas do Sr. K. Assim, se Dora
colabora para que esta situação se mantenha até o momento da cena do lago é
porque tem um interesse especial neste esquema.

Durante os três meses em que Dora esteve sob os cuidados de Freud, ele
acreditava que a jovem estava apaixonada pelo Sr. K. Entretanto, num momento
posterior, ao acrescentar uma nota ao caso, Freud admite ter cometido um erro no
manejo da transferência que custou a saída de Dora do tratamento. Ele se dá conta
de que o verdadeiro objeto do desejo de Dora era a Sra. K. Segundo Lacan (1955-
56/2008), a falha de Freud acontece porque “Ele se pergunta o que Dora deseja,
antes de se perguntar quem deseja em Dora” (p. 205).

De acordo com Lacan (1955-56/2008), a relação entre Dora e o Sr. K é na


verdade uma identificação imaginária. Dora deseja a Sra. K por meio do Sr. K à
medida que está imaginariamente identificada a ele no nível do outro especular. Ela
se identifica à posição do Sr. K, representado como possuidor do órgão viril, como
forma de apreender o desejo que este homem mantém em relação à mulher e,
assim, se interrogar sobre a feminilidade.

Além de desejar a Sra. K por meio da identificação imaginária com o Sr. K,


Dora também a deseja à medida que ela é o desejo de seu pai, porém um desejo
barrado. Dora se pergunta o que seu pai pode amar nesta Outra mulher.

Deste modo, estas duas situações funcionam como uma espécie de arranjo
entre os quatro elementos – Dora, o pai, o Sr. K e a Sra. K. Esta última representa o
que o pai de Dora ama “para além” dela. E Dora, por sua vez, representa o que o Sr.
K ama “para além” da Sra. K. Esta arrumação permite que Dora, na posição de
identificação viril com o Sr. K, sustente o desejo enfraquecido do Outro e possa
encontrar seu lugar no circuito.

Todo este esquema gira em torno da figura central da Sra. K, a qual


representa a grande questão de Dora enquanto histérica: O que é uma mulher? Este
é o enigma encarnado pela Sra. K. De acordo com Lacan (1951/1998): “o valor real
do objeto que é a Sra. K para Dora [...] não um indivíduo mas um mistério, o mistério
de sua própria feminilidade, queremos dizer, de sua feminilidade corporal.” (p. 220).
Seu corpo exerce um verdadeiro fascínio em Dora, que se deslumbra diante da
31

brancura de sua pele na busca de uma representação do feminino. A Sra. K encarna


este enigma porque ocupa o lugar de objeto do desejo para os homens.

Dito isso, podemos perceber porque o desarranjo do esquema descrito acima


provoca a descompensação neurótica de Dora. Tudo ia muito bem até que na
fatídica cena do lago, o Sr. K se declara para Dora e lhe diz que sua mulher não
representa nada para ele. Dora entende que “[...] pelo lado de sua mulher, não há
nada” (LACAN, 1956-57/1995, p. 146), ou ainda, que ela também não representaria
nada para o pai. Diante disso, ela dá uma bofetada no Sr.K.

No Seminário 10, Lacan (1962-63/2005) vai dizer que esta atitude de Dora
trata-se de uma passagem ao ato, que simboliza sua tentativa de fuga da cena à
medida que é tomada pela angústia de ser puro objeto de desejo do Sr. K.

Deste modo, o desmoronamento da construção identificatória de Dora acaba


por conduzi-la a uma posição problemática e de difícil aceitação para uma histérica,
que diz respeito a sua condição de objeto para o homem. É a partir deste fato que
Dora começa a reivindicar que seu pai corte relações com o casal K. De acordo com
Lacan (1956-57/1995) “Ela reivindica o que estava muito disposta até então a
considerar que recebia, mesmo que por intermédio de uma outra, e que é o amor de
seu pai.” (LACAN, p.147). Dora retorna ao nível da demanda a partir do momento
em que se percebe como objeto de troca, pois o pai a entrega ao Sr. K para ter livre
acesso a Sra. K.

Sobre esta barganha, que remete ao princípio da instituição da troca e da lei,


Lacan (1956-57/1995) nos lembra: “Como explica o Sr. Claude Lévi-Strauss em As
estruturas elementares de parentesco, a troca de laços de aliança consiste
exatamente no seguinte: Eu recebi uma mulher e devo uma filha”. (p.146). Por não
estar incluída na primeira instituição do dom e da lei na relação direta do dom do
amor, o que resta a mulher é ser tomada como objeto.

Mais tarde, no Seminário 20 – “Mais, ainda”, Lacan tecerá novas elaborações


sobre a feminilidade através da exposição da tábua da sexuação, onde apresenta do
lado esquerdo a posição subjetiva masculina e, do lado direito a posição subjetiva
feminina. Na parte inferior da tábua há cinco elementos: sujeito barrado ($), o
significante fálico (Φ), o objeto (a), o significante da mulher barrada (La/) e o
32

significante da falta no Outro [S(A/)]. Os dois primeiros encontram-se do lado


masculino e os três últimos do lado feminino.

Figura1: Quadro da tábua da sexuação.

Fonte: LACAN, J. “Le Séminaire Livre XX: Encore”. Paris, Éditions du Seuil, 1975. p. 73.

No que diz respeito à posição feminina, situada do lado direito da tábua, para
a histérica, ocupar o lugar de objeto do desejo para o homem em sua fantasia é algo
problemático, pois envolve um assujeitamento e uma dessubjetivação que traz
angústia. Desse modo, a histérica se posicionará justamente do outro lado da tábua,
“se fazendo de homem”. Nesta posição, como podemos observar acima na análise
do caso Dora, a histérica “[...] interroga o Outro sexo a partir de sua identificação
viril. Isto não significa que ame as outras mulheres, mas que se interessa por elas na
medida em que se tornam um objeto de desejo para o homem”. (TENDLARZ, 2002,
p. 160, tradução nossa). É neste ponto que reside o interesse de Dora pela Sra. K.

Levando-se em conta o que foi apresentado nos capítulos anteriores deste


trabalho, particularmente sobre o caminho que vai do sintoma ao sinthoma como
desdobramento de um processo de análise, podemos entender que no caso Dora os
sintomas permaneceram ao nível de uma queixa inicial devido à ruptura do
tratamento no terceiro mês. Desse modo, Dora não chega a entrar em análise.

Entretanto, através da narrativa freudiana e das leituras posteriores de Lacan,


foi possível visualizar a caracterização dos sintomas conversivos de Dora tanto em
33

sua vertente significante como metáfora do desejo, quanto na expressão do gozo


como forma de satisfação pulsional.

Nos termos do último ensino de Lacan, podemos fazer o exercício de pensar


o que poderia ocorrer em relação ao sintoma caso a análise de Dora prosseguisse.
Sob a luz da clínica borromeana, hipoteticamente falando, teria sido possível um
trabalho analítico centrado na redução do gozo, com a transformação do sintoma
como sentido em um sintoma letra de gozo, desligado do sentido. Assim, chegando-
se ao sinthoma, Dora poderia encontrar uma forma de lidar com o real do qual ela
não poderia se desembaraçar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho teve como objetivo realizar um estudo sobre a forma de


entendimento do sintoma em psicanálise no que se refere à sua estrutura, formação
e modo de funcionamento, através de uma perspectiva que possibilitasse a
exposição dos desdobramentos teóricos ao longo do tempo. Para tanto foi
34

necessário percorrer as obras de Freud e Lacan em sua extensão a fim de


compreender e identificar os principais momentos de viragem e a maneira como o
conceito de sintoma foi se modificando no decorrer das descobertas trazidas pela
prática clínica.

Inicialmente, seguindo os caminhos percorridos por Freud, observamos que,


se distanciando do que era preconizado pela medicina, ele introduz uma nova forma
de pensar o sintoma, que passa a ser entendido como um enigma, um sentido que o
sujeito desconhece. A partir da descoberta do inconsciente, Freud afirma que os
sintomas são realizações de desejos sexuais infantis recalcados e que sua
constituição demonstra que há uma formação de compromisso entre a libido que
busca satisfação e o veto imposto pela realidade. Mais tarde, no decorrer de seu
exercício clínico, Freud nota que há algo a mais no sintoma que resiste à decifração.
Trata-se da satisfação pulsional que o sintoma vem substituir, que se apresenta
como uma compulsão à repetição, além do princípio do prazer.

Lacan, por sua vez, nos primeiros anos de seu ensino, segue os passos de
Freud ao considerar o sintoma como algo que contém um sentido recalcado e que
pode ser interpretado na experiência analítica. Neste período, onde há a primazia do
registro do simbólico, o sintoma é metáfora, pois se trata de um significante que
ocupa o lugar de um outro significante, que se encontra recalcado. Entretanto, assim
como Freud, Lacan chega a um ponto onde a decifração simbólica já não é
suficiente e a partir de meados da década de 60 seu ensino será orientado em
direção ao real, como o que resiste à significação. O que passa a ser priorizado no
sintoma é sua vertente de satisfação pulsional, ou seja, o gozo do sintoma. Ao final
de seu ensino, com a clínica borromeana da década de 70, Lacan chega à
perspectiva do sintoma como letra de gozo que não cessa de se escrever e, ao
sinthoma como um modo singular de gozo e amarração dos três registros (real,
simbólico e imaginário) na constituição do nó.

Desse modo, como apontamos por diversas vezes no decorrer deste trabalho,
segundo Miller (2011), tanto Freud quanto Lacan vão do sentido ao gozo do sintoma
ao longo de suas elaborações teóricas. Principiam seus estudos sobre o sintoma
pela vertente do simbólico, onde o sintoma é uma formação do inconsciente, que
35

possui um sentido e pode ser decifrado; e, ao final, desembocam na vertente do


gozo, como uma satisfação que persiste no sintoma e resiste à interpretação.

Se na medicina o sintoma é visto como desequilíbrio e desarmonia, na


psicanálise podemos dizer que ele é uma resposta à falta estrutural do sujeito, ou
seja, à castração. A formação do sintoma, para a psicanálise, denuncia o modo
singular no qual um determinado sujeito tentará se defender desta falta.

Assim, ao mesmo tempo em que o sintoma funciona como uma forma de


proteção e defesa, paradoxalmente, traz satisfação e sofrimento ao sujeito. A
impossibilidade da satisfação leva a pulsão a uma eterna busca, que é expressa
pela compulsão à repetição manifesta no sintoma, fixando o sujeito num gozo que o
faz sofrer. É por tratar-se de uma satisfação, mesmo que às avessas, que o sintoma
é tão caro ao sujeito e algo muito difícil de se desvencilhar.

Por se localizar numa dimensão subjetiva, o sintoma pode se apresentar de


forma menos dolorosa para um determinado sujeito quando este tem a ilusão de que
pode tamponar sua falta de alguma maneira. Em contrapartida, quando há a busca
por uma análise é porque algo não vai bem, a dor e o sofrimento sobrepujam a
satisfação e o sujeito já não consegue uma adaptação satisfatória diante de seus
sintomas.

Durante o processo de análise, observamos que mesmo após trazer a


significação do sintoma à tona, não é possível eliminá-lo. Porém, é necessário
passar por este período de decifração dos sentidos para que se possa atingir um
ponto em que o sintoma já não é significante e se cristaliza num resto inarticulável.
Através deste ponto incurável, seu sinthoma singular, o sujeito poderá encontrar
uma forma menos dolorosa para lidar com o gozo do qual ele não pode se livrar, ou
seja, saber fazer aí com seu sinthoma. É precisamente neste ponto que a
psicanálise pode operar reduzindo o gozo petrificado.

Na atualidade, nos deparamos com sintomas onde parece não haver limites
para o gozo, pois o Nome-do-pai já não opera como outrora. Novos sintomas como
as neo-conversões, transtornos alimentares e drogadição demonstram que em
tempos de mais-gozar o sintoma já não se dirige ao Outro como já sinalizava Lacan
em seu último ensino. O trabalho de decifração do sentido do sintoma durante uma
36

análise parece estar em declínio diante dos novos sintomas, o que lança novos
desafios à psicanálise na atualidade. Como opera a psicanálise diante desse novo
panorama sintomático é o que proponho como tema de um estudo posterior.
37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANDRÉ, S. “O que quer uma mulher?”. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

BELAGA, G. “Sintoma e sinthoma”. In Scilicet: Semblantes e sinthoma. São Paulo: Escola


Brasileira de Psicanálise, 2009, p. 343-345.

COTTET, S. “Os benefícios do sintoma e a segunda tópica”. In: O sintoma-charlatão. Rio de


Janeiro: Jorge Zahar Ed. 1998. p.47-53.

FREUD, S. “A etiologia da histeria” (1896). In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. III. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006.
p.187-215.

______. “A interpretação dos sonhos: capítulo III – O sonho é a realização de um desejo”


(1900). In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud, Vol. IV. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006. p.157-167.

______. “A interpretação dos sonhos: capítulo VI – O trabalho do sonho” (1900). In: Edição
Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. IV e V. Rio
de Janeiro: Imago Editora, 2006. p.303-539.

______. “A interpretação dos sonhos: capítulo VII – A psicologia dos processos oníricos”
(1900). In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund
Freud, Vol. IV. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006. p.541-648.

______. “Além do princípio do prazer” (1920). In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. XVIII. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006.
p.13-75.

______. “Análise terminável e interminável” (1937). In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. XXIII. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006.
p.231-270.

______. “Carta 69 de 21 de setembro de 1897”. In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. I. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006.
p.309-311.

______. “Conferências introdutórias sobre psicanálise” (Parte III) (1917 [1916 -17]). In:
Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. XVI.
Rio de Janeiro: Ed. Imago, 2006. p. 251-378.

______. “Estudos sobre a histeria: Capítulo I – Sobre o mecanismo psíquico dos fenômenos
histéricos: Comunicação preliminar” (1893-95). In: Edição Standard Brasileira das Obras
Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. II. Rio de Janeiro: Ed. Imago, 2006. p.39-
53.

______. “Inibições, sintomas e ansiedade” (1926[1925]). In: Edição Standard Brasileira das
Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. XX. Rio de Janeiro: Ed. Imago, 2006.
p.81-170.

______. “Sobre a psicopatologia da vida cotidiana: Capítulo V – Lapsos da fala” (1901). In:
Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. VI.
Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006. p.67-114
38

______. “Sobre a psicopatologia da vida cotidiana: Capítulo IX – Atos casuais e


sintomáticos” (1901). In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de
Sigmund Freud, Vol. VI. Rio de Janeiro: Imago Editora, 2006. p.193-215

______. “Sobre a psicopatologia da vida cotidiana: Capítulo XII – Determinismo, Crença no


acaso e superstição – Alguns pontos de vista” (1901). In: Edição Standard Brasileira das
Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. VI. Rio de Janeiro: Imago Editora,
2006. p.237-272.

______. “Fragmento da análise de um caso de histeria” (1905 [1901]). In: Edição Standard
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. VII. Rio de Janeiro:
Imago Editora, 2006. p.15-116.

GOROSTIZA, L. “O sintoma como mensagem”. In: O sintoma-charlatão. Rio de Janeiro:


Jorge Zahar Ed. 1998. p.95-100.

LACAN, J. “Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise” (1953). In: Escritos. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

______. “A instância da letra no inconsciente ou a razão desde Freud” (1957). In: Escritos.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

______. “Intervenção sobre a transferência” (1951). In: Escritos. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 1998.

______. O Seminário. Livro 03: “As psicoses” [1955-56]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
p. 203-213.

______. O Seminário. Livro 04: “A relação de objeto” [1956-57]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1995. p. 139-150.

______. O Seminário. Livro 05: “As formações do inconsciente” [1957-58]. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 1999.

______. O Seminário. Livro 10: “A angústia” [1962-63]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.

______. O Seminário. Livro 11: “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise” [1964].
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1979.

______. O Seminário. Livro 20: “Mais, ainda” [1972-73]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.

______. O Seminário. Livro 23: “O sinthoma” [1975-76]. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.

______. “A terceira” (1974). Opção lacaniana, n°62, 2011.

______. “Conferência em Genebra sobre o sintoma” (1975). Opção lacaniana, n°23, 1998.

______. “Le Séminaire Livre XX: Encore”. Paris, Éditions du Seuil, 1975.

______. O Seminário: “R.S.I” (1974-75). Inédito.

MILLER, J. - A. “Seminário sobre os caminhos da formação dos sintomas”. Opção


lacaniana, n°60, 2011.

______. Perspectivas do seminário 23 de Lacan. O sinthoma. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,


2009.
39

______. La experiencia de lo real em la cura psicoanalítica. Buenos Aires: Paidós, 2003.


p.109-126, 363-369.

______. Curso de Orientação Lacaniana III, 7 (2004-2005). “Pièces détachées”, aula 1, 17


de novembro de 2004. Inédito.

______. “Os seis paradigmas do gozo”. Opção Lacaniana on-line nº7, 2012. Disponível em:
http://www.opcaolacaniana.com.br/pdf/numero_7/Os_seis_paradigmas_do_gozo.pdf

OCARIZ, M. C. “O sintoma e a clínica psicanalítica: o curável e o que não tem cura”. São
Paulo: Via Lettera Editora e Livraria, 2003.

PACHECO, L. “Fins de análise e identificação com o sinthoma”. In: Sintoma e laço social.
Belo Horizonte: Escola Brasileira de Psicanálise, 2009.

SIDON, P. “Nascimento e vicissitudes do sintoma”. In: O sintoma-charlatão. Rio de Janeiro:


Jorge Zahar Ed. 1998. p.245-251.

Szulzynger, A. “Pode-se não recusar a feminilidade?”. In: O sintoma-charlatão. Rio de


Janeiro: Jorge Zahar Ed. 1998. p.110-115.

TENDLARZ, S.E. “Histeria y feminilidad”. In: Las mujeres y sus goces. Buenos Aires,
Colección Diva, 2002.

Você também pode gostar