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Alvin Plantinga Daniel Dennett


ofo cristão contemporâneo e o mais notável
porâneo, Alvin Plantinga e Daniel C. Dennett,
ajuda a pensar e responder criticamente:
Dada a proeminência de seus dois
São Compatíveis?
protagonistas, Ciência e Religião –
nte, tanto como porta de entrada para a filosofia São Compatíveis? se tornará uma
erminologia filosófica, como para o suposto espécie de clássico instantâneo,
o e evolução. O cristianismo é compatível com a ocupando lugar único e especial na
? A evolução é ateísta? literatura sobre o assunto. Será lido
por muito tempo e permanecerá útil
São Compatíveis? é o primeiro volume da série como um texto suplementar.
que reúne dez volumes de filosofia da religião – Gary Rosenkrantz, Universidade da
para tornar conhecidos livros, autores e algumas Carolina do Norte em Greensboro
s da fé cristã.

Ciência e Religião – São Compatíveis?


é envolvente e trata de questões-chave
Ciência e Relig ião

de probabilidade e design no
Alvin Plantinga Daniel Dennett diálogo ciência-religião. Um livro
apropriado para cursos de filosofia
da religião, religião e cultura, e ciência

Ciência e e religião.
– Michael L. Peterson, Asbury College

Religião
São Compatíveis?

GUIA DE ESTUDOS
Marcelo Cabral

1
Edição de texto: Davi Bastos
Revisão de Conteúdo: Davi Bastos
Diagramação e capa: Mariane Lin

Esta publicação foi possível através


da bolsa 62163 da fundação John
Templeton Foundation. As opiniões
expressas nessa publicação são de
seus autores e não necessariamente
refletem as visões da John Templeton
Foundation.

Este guia de estudos é uma realização


da Associação Brasileira de Cristãos
na Ciência e da Editora Ultimato.
Distribuição gratuita, reprodução
permitida desde que cite a fonte.
A P R E S E N TAÇÃO DA O B R A

Ciência e Religião: São Compatíveis? é mais uma contribuição da


ABC² e da Ultimato em português sobre o suposto conflito entre
religião e ciência. É um livro curto e instigante, e destacaremos
três de suas características.
Em primeiro lugar, o livro trata de uma questão bem es-
pecífica: a religião e a teoria da evolução são compatíveis ou in-
compatíveis? O leitor encontrará duas posições bem delineadas:
Alvin Plantinga, filósofo cristão, defende que a fé cristã e a teo-
ria da evolução não são intrinsecamente antagônicas. Mas há,
segundo ele, uma religião (ou quasi-religião) que é incompatí-
vel com a evolução: o naturalismo! Segundo Plantinga, muitos
proponentes do naturalismo filosófico assumem que ele é parte
constitutiva da ciência. Como o naturalismo filosófico é incom-
patível com a existência de Deus, a ciência seria incompatível
com a existência de Deus. Ele argumenta, entretanto, que es-
sas formulações (ou defesas públicas) da teoria da evolução na
verdade revestem essa teoria com o naturalismo filosófico, que
não é de fato parte da ciência. Plantinga vai além: ele afirma que
o naturalismo é incompatível não apenas com a existência de
Deus mas com a própria teoria da evolução. Do outro lado, Da-
niel Dennett, filósofo ateu, defende que há sim uma incompati-
bilidade entre o cristianismo e a teoria da evolução: enquanto o
cristianismo fala de um Deus que guia os eventos da natureza,
a teoria da evolução ensina que os processos naturais não são
guiados. Para Dennett, os religiosos devem reconhecer que os
eventos da natureza não são guiados por nada e por ninguém,
e devem abandonar a doutrina da criação. Mas, conforme sus-
tenta, não é isso o que costuma acontecer, pois cristãos, judeus
e muçulmanos frequentemente defendem que Deus realmente
atua criando seres a partir do nada, modificando processos na-
turais e realizando milagres que contrariam as leis naturais.

3
Em segundo lugar, o livro é apresentado em forma de um
debate, e essa é uma de suas grandes virtudes. No capítulo 1,
Plantinga apresenta a defesa de sua posição, e, logo depois, há
uma resposta de Dennett seguida, finalmente, por uma trépli-
ca de Plantinga. De igual modo, no capítulo 4, Dennett fornece
uma versão mais robusta de sua tese, seguida por uma resposta
de Plantinga, e, finalmente, por uma tréplica de Dennett. Isso
garante aos leitores uma visão justa e equilibrada de ambas as
posições.
Em terceiro lugar, o livro não endossa nenhum dos lados
do debate. Fica a cargo do leitor pesar os vários argumentos,
analisar os princípios que guiam os raciocínios dos autores e,
finalmente, formar o seu próprio julgamento. Ao ler este livro
com atenção, você não apenas adquirirá conhecimento de di-
versas teses e ideias (como na leitura de um tratado filosófico),
mas também terá a oportunidade de desenvolver competências
intelectuais e refinar seu poder de análise.
É provável que você, assim como eu, já tenha uma posi-
ção definida sobre esse debate. Entretanto, para maior proveito
deste livro o leitor precisará exercer a virtude da caridade inte-
lectual: avalie com imparcialidade as ideias de ambos os auto-
res; procure entender o que querem dizer, e reconstrua seus ar-
gumentos do melhor modo possível, sem construir espantalhos
de suas posições. Isso não força ninguém a mudar de posição,
em vez disso, contribui para uma maior compreensão das ques-
tões pertinentes e para um aprofundamento em sua própria
posição, capacitando o leitor para contribuir no debate público.

4
S O B R E O S AU TO R E S

Alvin Plantinga e Daniel Dennett são filósofos muito compe-


tentes, muito conhecidos por suas relevantes contribuições
acadêmicas, bem como por sua competência argumentativa.
Também são famosos por serem acadêmicos capazes de se co-
municar com audiências não profissionais: Dennett é um fer-
voroso defensor do ateísmo, e Plantinga um fervoroso defensor
do cristianismo.

O D E BAT E O R I G I N A L

Originalmente, esse debate foi uma apresentação de Plantinga


em uma reunião da Associação Americana de Filosofia. Den-
nett deveria comentar sobre o artigo de Plantinga (que virou o
capítulo 1 desse livro). Claro que todos já esperavam que o deba-
te esquentasse. Os três primeiros capítulos do livro, portanto,
são uma transcrição editada e recortada do debate original. O
debate original (em inglês) pode ser ouvido no YouTube, embo-
ra o áudio seja bem ruim:

https://www.youtube.com/watch?v=f06J2R4MwGA&pp=ugMICgJw-
dBABGAE%3D

5
CA P Í T U LO 1
C I Ê N C I A E R E L I G I ÃO : O N D E D E FATO S E
E N C O N T R A O C O N F L I TO ?
Alvin Plantinga
Este é o maior capítulo do livro. Para o caso de um estudo em
grupo, pode ser interessante dividir esse capítulo em dois — ou
até três — estudos. Sugerimos um estudo sobre as seções I e II,
com especial atenção à seção II, e outro estudo sobre a seção
III, para avaliar e discutir com calma o argumento de Plantinga
contra o naturalismo.

PERGUNTAS PARA DISCUSSÃO


[Seção I do capítulo]
Nesta seção são colocadas as discussões e os termos
que regem todo o restante do livro.
1.  Plantinga elenca diversos motivos para a suposta incompati-
bilidade entre a ciência contemporânea e a fé cristã. Quais são
esses motivos? Você possui dúvidas ou angústias a respeito de
algum ou alguns deles?

2.  Um conceito importante para Plantinga é o “naturalismo”. O


que Plantinga entende por esse conceito?

3.  O que é o teísmo? Por que, e em que sentidos, o naturalismo


é incompatível com a crença teísta?

4.  Plantinga apresenta a teoria da evolução como um conjunto


de quatro teses principais. Quais são essas teses?

5.  Qual das quatro teses pode gerar conflito com a crença teísta,
segundo Plantinga?

6
6.  De acordo com Plantinga, há dois sentidos distintos do ter-
mo “aleatoriedade”, e apenas um desses sentidos contradiz a
crença teísta. Quais são esses dois sentidos? E por que apenas
um deles não se encaixa com a visão teísta?

[Seção II do capítulo]
Esta seção é densa e argumentativa. Alguns pontos
ficarão mais claros ao longo da discussão nos capítulos
seguintes. Leia com atenção e calma.
7.  Plantinga destaca três outras possíveis fontes de conflito en-
tre a teoria da evolução e a crença teísta: (i) a alegação de que a
evolução enfraquece o argumento do projeto/design, (ii) a su-
gestão de que o sofrimento causado pelos processos evolutivos
é incompatível com a visão cristã de Deus, e (iii) a ideia de que
a evolução não-guiada é uma hipótese superior à tese de que a
evolução é um processo guiado. Em grupo, discutam cada um
desses três pontos, e os argumentos que Plantinga utiliza para
responder a cada um.

8.  A resposta predileta de Plantinga ao problema do mal é o


argumento “O Felix Culpa”. Em que consiste esse argumento?
Como você o avalia?

9.  Plantinga faz uma comparação de probabilidades: o que é


mais provável dado o que sabemos pela ciência: que a evolução
seja guiada (como creem teístas) ou não guiada (como creem os
naturalistas)? Para comparar essas probabilidades, Plantinga
enumera diversos fatos e teorias que aumentam uma ou outra
probabilidade. Primeiro, quais são esses fatos e teorias? E em
segundo, qual é, para ele, a maior probabilidade?

10.  Plantinga diz que “se o teísmo é verdadeiro, é provável que


ele tenha sua própria fonte intrínseca e básica de aval” (p. 40).
Essa afirmação é importante não apenas no argumento que
Plantinga desenvolve neste livro, mas contém uma das teses

7
mais fundamentais e influentes de todo seu projeto filosófico.
O que significa “ter uma fonte básica de aval?” E por que isso se
segue se o teísmo for verdadeiro?

[Seção III do capítulo]


Nesta seção Plantinga apresenta seu argumento principal.
A discussão sobre sobreveniência é bem técnica, mas
não é necessária para a compreensão do restante do
livro, nem do argumento de Plantinga.
11.  Plantinga apresenta o argumento evolucionário contra o
naturalismo. Esse argumento conclui que a teoria evolutiva e
o naturalismo são fundamentalmente incompatíveis. Aqui te-
mos uma inversão radical: a teoria evolutiva é incompatível não
com a crença teísta, mas com o naturalismo ateísta. Primeiro,
explique o argumento de Plantinga: quais são seus pressupos-
tos? Como a conclusão se segue dos pressupostos? Em segundo,
qual é a sua avaliação desse argumento? Quais são seus pontos
fortes e fracos?

12.  Ao concluir este primeiro capítulo, quais pontos de Plan-


tinga você acha que Dennett irá atacar no próximo capítulo?
Onde a argumentação de Plantinga é mais vulnerável, na sua
opinião?

CITAÇÕES-CHAVE DO CAPÍTULO 1

⋅  “O que não é compatível com a crença cristã, contudo, é a ale-


gação de que a evolução e o darwinismo não são guiados – e
entendo que isso inclui não serem planejados e não serem inten-
cionados. O que não é compatível com a crença cristã é a alega-
ção de que nenhum agente pessoal, nem mesmo Deus, guiou,
planejou, intencionou, dirigiu, orquestrou ou moldou todo esse
processo.” (p. 27)

8
⋅  “O naturalismo implica, é claro, que nós seres humanos não
fomos projetados nem criados à imagem de Deus (porque ele
implica que não há Deus); mas a ciência evolutiva por si mesma
não tem essa implicação. O naturalismo e a teoria da evolução
juntos implicam a negação de um projeto (design) divino, mas a
teoria da evolução por si só não implica.” (p. 29)

⋅  “Tanto a observação cotidiana como a pesquisa atual no estu-


do científico da religião sugerem que uma tendência para acre-
ditar em Deus ou em algo similar a Deus, independentemente
de qualquer evidência proposicional, é parte de nossa capacida-
de cognitiva inata. Além disso, se a crença teísta é verdadeira,
ela provavelmente não requer evidência proposicional para que
seja aceita racionalmente.” (p. 31-32)

⋅  “Suponha que haja evidência científica contra o teísmo: dis-


so não se segue que o teísmo é falso, ou que haja um anulador
para as crenças dos teístas, ou que a crença teísta é irracional ou
problemática de qualquer outra forma. Talvez também hajam
evidências, científicas ou não, para o teísmo. Mas em segundo
lugar, e mais importante, como já mencionei, se o teísmo é ver-
dadeiro, é provável que ele tenha sua própria fonte intrínseca e
básica de aval – algo similar ao sensus divinitatis proposto por
João Calvino ou o conhecimento natural embora confuso de
Deus proposto por Tomás de Aquino” (p. 40)

⋅  “[...] há um conflito entre o naturalismo e a evolução; a con-


junção deles não pode ser aceita racionalmente. A evolução,
contudo, é um dos pilares da ciência contemporânea. Logo,
concedo que há um conflito religião–ciência ou talvez religião–
quasi-ciência em torno da evolução, mas não entre a evolução
e a religião teísta. O conflito real é entre a evolução, um pilar da
ciência contemporânea, e o naturalismo.” (p. 47)

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CA P Í T U LO 2
V E R DA D E S Q U E E R R A M O A LVO : O
N AT U R A L I S M O I L E S O
Daniel Dennett

Este capítulo é surpreendente em dois sentidos. Primeiro, pois


Dennett parece concordar que não há contradição entre o teís-
mo e a evolução. Segundo, pois é bem curto, e Dennett parece
não levar muito a sério a argumentação de Plantinga. Mas uma
curiosidade explica por que o capítulo é curto. Este capítulo é
uma transcrição do debate que ocorreu ao vivo. Contudo, uma
parte significativa do que Dennett disse em tom bem firme e as-
sertivo no debate original foi cortado para a edição deste livro
(presumivelmente, pelo próprio Dennett).

PERGUNTAS PARA DISCUSSÃO

1.  Dennett organiza o ensaio de Plantinga em três teses princi-


pais. Quais são essas teses?

2.  Dennett diz concordar com Plantinga que “a teoria da evo-


lução contemporânea não pode demonstrar a ausência de um
projeto inteligente (intelligent design)” (p. 54). Por que então, se-
gundo Dennett, não devemos acreditar em tal projeto?

3.  Dennett compara a crença de Plantinga em um Deus que


guia o processo evolutivo através de intervenções pontuais à
uma história de um “Super-Homem” que teria iniciado e guia-
do a explosão cambriana. Para Dennett, as duas histórias são
compatíveis com a teoria evolutiva, mas não são mais que “his-
torinhas para boi dormir”. Em que sentidos a história do Super-
-Homem de Dennett é comparável à crença em um Deus que
faz intervenções pontuais no mundo natural?

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4.  Após narrar o cenário fictício sobre a morte de Fred e a acu-
sação de Tom, Dennett diz que “o naturalismo é assumido taci-
tamente em todos os tribunais respeitáveis” (p. 59). O que ele
quer dizer com isso?

5.  Comentando sobre o argumento evolucionário contra o na-


turalismo de Plantinga, Dennett diz que uma das premissas do
argumento – a premissa de que “P(C/N&E) é baixa” (ou, em lin-
guagem não formal, “que é baixa a probabilidade de que nossas
faculdades cognitivas sejam confiáveis dado que o naturalismo
e a teoria da evolução sejam verdadeiros” (p. 64)) – é problemá-
tica. Quais são as críticas de Dennett a essa premissa?

6.  Como você espera que Plantinga responda a Dennett? Quais


pontos você atacaria se estivesse no lugar de Plantinga?

CITAÇÃO-CHAVE

⋅  “Eu poderia alegremente conceder que qualquer um que


queira se entreter com a fantasia de que projetistas inteligentes
de outra galáxia (ou de outra dimensão) brincaram com nossa
pré-história evolutiva, ou salpicaram a Terra com formas de
vida, ou mesmo tomaram providências para que as constan-
tes físicas tivessem seus valores particulares “locais”* desco-
brirá que sua fantasia é consistente com a biologia evolutiva
contemporânea. Não há um pingo de evidência para qualquer
uma dessas fantasias, mas estamos em um país livre, e pode ser
suficientemente inofensivo manter vivos tais contos de fadas.”
(p. 54)

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CA P Í T U LO 3
SUPER-HOMEM VERSUS DEUS?
Alvin Plantinga

Neste curto capítulo, Plantinga tenta desmontar e desmerecer a


argumentação de Dennett no capítulo 2. A leitura é fluida e rápida.

PERGUNTAS PARA DISCUSSÃO

1.  Plantinga argumenta que sua defesa da hipótese teísta de


que Deus guiou o processo evolutivo não pode ser comparada
com crenças “bobinhas”, como o “super-homismo” (ver p. 71).
Quais são, para Plantinga, as diferenças mais importantes entre
sua hipótese teísta e o super-homismo?

2.  Plantinga também discorda de Dennett a respeito do status


do naturalismo: para Dennett, todos os tribunais assumem o
naturalismo, para Plantinga, isso não é verdade. Seria possível
que, nessa discussão, sentidos distintos do termo naturalismo
estejam sendo empregados? Quais seriam esses sentidos?

CITAÇÃO-CHAVE

⋅  “Dennett propõe sim uma analogia, uma que muito me ape-


tece. Ele nos compara a calculadoras, que rastreiam verdades
mesmo sendo mecanismos puramente mecânicos. Essa me
parece ser uma analogia infeliz do ponto de vista de Dennett.
Calculadoras, é claro, são projetadas e criadas por seres inte-
ligentes, a saber, nós, seres humanos. Calculadoras rastreiam
verdades e o fazem precisamente por serem projetadas para
isso. E isso é o que o teísta pensa acerca dos seres humanos: eles
também rastreiam verdades porque foram criados e projetados
por um ser inteligente.” (p. 74)
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CA P Í T U LO 4
HÁBITOS DA IMAGINAÇÃO E SEU EFEITO
SOBRE A INCREDULIDADE
D a n i e l C. D e n n e t t
Os capítulos 4, 5 e 6 foram escritos para o livro, não sendo uma
transcrição do debate original. Neste capítulo 4, Dennett apre-
senta mais extensamente sua crítica.

PERGUNTAS PAR A DISCUSSÃO

1.  Um argumento central de Dennett é que a fé de Plantinga


“disciplinou sua imaginação” (p. 78). O que Dennett quer dizer
com isso?

2.  Dennett defende, contra Plantinga, que o fato de milhões de


pessoas sustentarem a crença teísta não confere a ela nenhu-
ma credibilidade extra. Ela continua tão “bobinha” quanto o
super-homismo, no qual ninguém acredita. Como você avalia
esse argumento de Dennett? O fato de muitos acreditarem em
algo faz alguma diferença para a razoabilidade de tal crença?

3.  Em sua contínua defesa do naturalismo como ponto passi-


vo das ciências (e dos tribunais), Dennett afirma que o natu-
ralismo é a hipótese nula (p. 81). O que isso significa? Por que
o naturalismo, concebido desse modo, não desacredita os mi-
lagres? E por que, mesmo não desacreditando, torna-os não
relevantes?

4.  Dennett aborda (criticamente) a tese de Stephen J. Gould a


respeito dos Magistérios não-interferentes (p. 82). Por que Den-
nett acredita que a tese de Gould é problemática? Quais seriam
as possíveis virtudes dessa tese?

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5.  Dennett lida, nesse capítulo, com o pressuposto central do
argumento evolutivo contra o naturalismo de Plantinga. Ele
diz que, ao contrário do que Plantinga afirma, a adaptativida-
de das nossas faculdades geradoras de crença está associada
com o fato dessas faculdades serem capazes de gerar uma alta
taxa de crenças verdadeiras. Agora, tendo já lido ambos os la-
dos do debate, procure (a) reconstruir o argumento de Plan-
tinga e (b) elencar todas as críticas que Dennett encontra no
argumento. Por fim, (c) apresente sua própria posição.

CITAÇÕES- CHAVE

⋅  “Os cristãos tiveram de abandonar suas doutrinas iniciais


do Céu quando a revolução copernicana se instaurou. E tive-
ram que reconhecer que muitas das histórias da bíblia não
são relatos factuais, mas pura lorota (chamados mais educa-
damente de mitos), quando pesquisas históricas e arqueológi-
cas demonstraram sua falsidade. E agora terão que abandonar
suas doutrinas da criação.” (p. 83)

⋅  “De acordo com Plantinga, ‘a seleção natural não dá a míni-


ma para se a crença é verdadeira ou não’ (p. 45). A tese central
é que ‘falsidade de forma alguma interfere na adaptatividade
das propriedades NF [neurofisiológicas]’ (p. 45) que, de algu-
ma maneira, contribuem para a sua realização. Eu mencionei,
sim, essa tese, e a rejeitei, e expliquei por quê. É precisamente a
competência de rastrear verdades de mecanismos fixadores de
crenças que explica sua ‘adaptatividade’, da mesma forma que
é a competência de bombear sangue dos corações que explica
a sua adaptatividade. Corações servem para fazer o sangue cir-
cular, e cérebros servem para rastrear as condições relevantes
do ambiente e fazer isso corretamente.” (p. 85)

⋅  “Entendo que a questão retórica de Plantinga expressa


uma convicção de que o rastreio de verdades simplesmente
não poderia evoluir, in silico ou em formas de vida proteicas,

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sem uma mãozinha de projetistas inteligentes. Mas se essa é
a visão dele, ela revela uma falha de imaginação, e não uma
intuição correta sobre necessidades. E, é claro, ela é circular
com relação a nossa própria evolução por seleção natural, pois
certamente nós rastreamos verdades. Para transformar seu
exemplo das calculadoras em um argumento, Plantinga teria
que demonstrar que elas não poderiam ser direcionadas para
rastrear verdades sem a ajuda de projetistas inteligentes, e
isso exige mais do que sua mera expressão pessoal de incredu-
lidade.” (p. 88-89)

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CA P Í T U LO 5
O NATURALISMO CONTRA A CIÊNCIA
Alvin Plantinga

Esse é o último capítulo de Plantinga no livro, e seu único capí-


tulo escrito para este livro (os outros são transcrições do debate
original). Aqui, Plantinga tenta dar um tom de finalização em
sua argumentação, explicando e retomando todos os tópicos e
seus pontos gerais.

PERGUNTAS PARA DISCUSSÃO

1.  O capítulo se inicia com uma discussão de Plantinga de algu-


mas estratégias que alguns grupos ateus utilizam para atacar o
teísmo. Quais são essas estratégias?

2.  De acordo com Plantinga, o que difere a crença no teísmo


clássico de outras crenças “bobinhas”, como o Espaguete Voa-
dor Monstruoso, o Unicórnio Rosa Invisível, o bule de Russell,
e a Fada do Dente?

3.  O que, para Plantinga, caracteriza o Deus do teísmo clássico?

4.  Segundo Plantinga, insistir, como fazem Dawkins e Dennett,


que ciência e religião estão em um conflito irreconciliável causa
danos não somente à religião, mas também à ciência. Quais são
as razões que Plantinga utiliza ao apresentar esse argumento?

5.  Qual é a diferença construída por Plantinga entre indicação


precisa e crença verdadeira?

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CITAÇÕES-CHAVE

⋅  “Eu acho extremamente difícil acreditar que toda a maravi-


lhosa diversidade de vida na Terra, incluindo o cérebro huma-
no, deva ter surgido (como Dennett e seus amigos pensam que
ela de fato surgiu) através da evolução não guiada. Não acho tão
difícil acreditar que a vida tenha surgido através da evolução
darwinista – seleção natural peneirando algo similar a muta-
ções genéticas aleatórias. Como argumentei, Deus certamente
poderia ter criado os seres vivos usando tal processo. O que é
inacreditável é que as maravilhas do mundo vivo possam ter
surgido pela evolução não guiada.” (p. 97)

⋅  “Mas uma parte central e crucial da imagem de Deus em nós,


seres humanos, é a nossa habilidade de um conhecimento va-
lioso e importante sobre nós mesmos e o nosso mundo. Obvia-
mente, a nossa habilidade de fazer ciência é uma parte impor-
tantíssima da imagem de Deus quando entendida dessa forma.
Deus criou tanto nós como o nosso mundo, e criou de tal manei-
ra que nós podemos conhecer muitas coisas sobre o nosso mun-
do. Mas isso implica que Deus não iria arbitrariamente impedir
nosso acesso a tal conhecimento – por exemplo, frustrando ca-
prichosamente os nossos experimentos.” (p. 102)

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CA P Í T U LO 6
MILAGRES SÃO DESNECESSÁRIOS
D a n i e l C. D e n n e t t

Este capítulo final mal ocupa 4 páginas. É uma resposta bem


curta de Dennett, onde ele reitera resumidamente o que falou
nos outros capítulos e acrescenta a cartada final: a tese de Plan-
tinga acarreta que a racionalidade da ciência depende da crença
em Deus. Essa é uma consequência forte da visão de Plantinga,
e Dennett parece ter guardado ela para esse último capítulo.

PERGUNTAS PARA DISCUSSÃO

1.  De acordo com Dennett, “Plantinga quer mostrar, em outras


palavras, que a ciência e a religião não são apenas compatíveis:
a ciência depende do teísmo para assegurar sua autoconfiança
epistêmica” (p. 115). Essa tese de Plantinga é razoável? Quem
não acredita em Deus não pode acreditar na evolução? O que
Dennett pretende ao revelar esse ponto? O que significa ‘auto-
confiança epistêmica’? Discutam em grupo a razoabilidade ou
irrazoabilidade da tese de que a racionalidade da ciência depen-
de da crença em Deus, assim como suas implicações sociais.

2.  Dennett concorda com Plantinga que nós, humanos, temos


uma incrível capacidade para descobrir fatos e confiar em tais
descobertas. Qual é a base, para Dennett, dessa capacidade? Por
que podemos confiar nela?

CITAÇÃO-CHAVE

⋅  “Plantinga pretende de fato usar seu argumento para de-


monstrar que nossa óbvia competência como rastreadores de
verdade – nossa capacidade de voar como cientistas, pode-se
18
dizer – serve de base para acreditar que um milagre deve ter
acontecido. Segundo o argumento de Plantinga, um Projetis-
ta Inteligente teve uma mãozinha (bem, não literalmente uma
mão, mas um empurrãozinho divino de algum tipo) em nossa
evolução, dado que uma competência tal qual a nossa não po-
deria ter surgido de outra forma.” (p. 114)

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G LO S SÁ R I O

Argumento evolutivo contra o naturalismo (EAAN)


É um dos argumentos centrais de Plantinga no que tange a rela-
ção entre religião e ciência. Nesse argumento, Plantinga defen-
de a tese – surpreendente – de que não é a crença em Deus, mas
o naturalismo filosófico (materialista) que está em uma tensão
fundamental com a teoria da evolução. Para Plantinga, proces-
sos evolutivos completamente não guiados, como postulam os
naturalistas, são suficientemente propícios para produzirem
estruturas bem adaptadas (como um coração que bombeia san-
gue); mas não são suficientemente propícios para produzir fa-
culdades que geram crenças verdadeiras. Assim, um defensor
do naturalismo não tem razões para confiar nas suas próprias
faculdades mentais, e nem nas crenças e teorias que essas facul-
dades produzem – e, portanto, não tem razões para confiar que
a própria teoria evolutiva seja verdadeira.

Complexidade Irredutível
“Complexidade irredutível” é uma das teses centrais de Michael
Behe. Em termos gerais, é a ideia de que certos organismos e sis-
temas biológicos que são (i) compostos de várias partes e (ii) são
funcionais, também são tais que (iii) todas as partes precisam
estar simultaneamente presentes para que a funcionalidade
do sistema opere apropriadamente. Assim, Behe defende que
como todas as partes precisam estar operando conjuntamente,
não é possível que tal organismo ou sistema tenha evoluído por
pequenos incrementos; todas as partes precisam estar lá desde
o início para que ele seja funcional. A existência de tais siste-
mas, segundo Behe, corrobora a tese de que foram previamente
projetados.
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Estrutura noética
A estrutura noética é a estrutura de crenças que um agente
possui. Embora existam diversas teorias de como, exatamente,
nossas crenças são estruturadas, a vasta maioria dos filósofos
e psicólogos concordam que nossas crenças são acumuladas
não individualmente, mas de modos conectados, estruturados.
Assim, quando queremos nos referir às crenças de uma pessoa,
podemos nos referir à sua estrutura noética. O termo ‘noética’,
que pode soar estranho, é derivado da palavra grega nous, que
significa ‘ideia’, ‘pensamento’ ou ‘inteligência’.

Implicação
Em filosofia e lógica, uma implicação é uma conclusão que
decorre por consequência lógica de certas premissas. Assim,
“implicar” no livro é um termo técnico: ser consequência ló-
gica das premissas assumidas. Veja esta passagem: “o natura-
lismo e a teoria da evolução juntos implicam a negação de um
projeto (design) divino, mas a teoria da evolução por si só não
implica” (p. 29). O que está sendo dito é que a negação do pro-
jeto divino (uma conclusão, “Deus não projetou a realidade”) é
consequência lógica do naturalismo (que é aqui um conjunto
de premissas), e não da teoria da evolução (um outro conjunto
de premissas).

Naturalismo
Esse é um dos termos mais discutidos no debate entre
Plantinga e Dennett, e é um termo que pode significar coisas di-
ferentes dependendo do contexto em que é utilizado. De acordo
com o próprio Plantinga: “O naturalismo possui mais de uma
variante. Aqui, como já disse, tomo-o como sendo a posição de
que o Deus da religião teísta não existe, nem nada parecido com
Deus. Entendido dessa forma, o naturalismo não é uma religião”
(p. 41). Mas Plantinga assume também que o naturalismo inclui
o materialismo. Assim, naturalismo nesse sentido é a tese de
21
que a realidade é composta apenas de entes naturais e materiais
e de que, portanto, a totalidade dos eventos da realidade é pas-
sível de ser explicada por um apelo aos objetivos empíricos e
às leis naturais. Milagres, seres espirituais, uma realidade que
transcenda o mundo natural — tudo isso é descartado por esse
tipo de naturalismo.

A complicação é que Dennett diz que o naturalismo é ne-


cessário para a prática da ciência – como também para a con-
dução dos tribunais e de outros assuntos legais. Mas, como diz
Plantinga, nem cientistas nem juízes ou advogados precisam
ou devem deixar suas crenças de lado para fazer boa ciência ou
para julgar de modo apropriado. Como entender essa disputa?

Aqui entra um outro sentido possível do termo natura-


lismo. Para facilitar a compreensão, farei uma distinção que os
autores não exploram neste livro (embora esteja presente em
outras obras). Chamarei o naturalismo definido por Plantinga
de naturalismo ontológico, e o distinguirei do naturalismo meto-
dológico.
O que Dennett parece dizer, e Plantinga – nos seus pró-
prios termos – pode concordar, é que a prática científica tem
um certo escopo ou delimitação: ela se ocupa em entender os
entes naturais, e as relações naturais que guiam as operações
desses entes; assim, é de se esperar que um cientista, seja teísta
ou ateísta, procure entender tais entes naturais e suas relações
naturais. Esse abordagem pode ser chamada de naturalismo
metodológico, que baliza a prática diária das diversas ciências.
Como Plantinga diz, os cristãos creem em um Deus consistente,
que fundamenta um mundo consistente e que pode ser estuda-
do e compreendido em suas dinâmicas naturais. Isso é condi-
zente com o naturalismo metodológico.
Assim, enquanto as práticas científicas funcionam bem a
partir de um naturalismo metodológico (entendido nos termos
acima), elas não precisam, e talvez sejam até empobrecidas, por
um apelo ao naturalismo ontológico.

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Teísmo
‘Teísmo’ normalmente se refere à crença em um Deus criador e
sustentador do cosmos. Assim, enquanto o ‘deísmo’ é a crença
em um Deus que, após criar o mundo, não mais interfere em seu
funcionamento, o ‘teísmo’, por contraste, captura a visão de um
Deus sempre presente, que não apenas criou o mundo a partir
do nada (ex nihilo), mas que continuamente sustenta o funcio-
namento do mundo. O teísmo também pode ser distinguido
do panteísmo: enquanto o panteísmo se refere a crença de que
Deus e o mundo são parte da mesma realidade e indistinguí-
veis um do outro, o teísmo defende que Deus e sua criação são
realidades distintas, e que Deus, embora criador e sustentador,
não pode ser confundido com sua criação – Deus é um ser ne-
cessário e independe da criação para existir, enquanto a cria-
ção é contingente e dependente de Deus para existir. O teísmo
frequentemente é associado às grandes religiões monoteístas,
como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.

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L E I T U R AS C O M P L E M E N TA R E S
E M P O RT U G U Ê S

SOBRE A EVOLUÇÃO E A RELIGIÃO

⋅  DENNETT, Daniel. (1998) A Perigosa Ideia de Darwin. Rio de


Janeiro: Rocco. 612 pp.

⋅  PLANTINGA, Alvin. (2018) Ciência, Religião e Naturalismo:


Onde está o conflito? São Paulo: Vida Nova. 320 pp.

SOBRE A RACIONALIDADE DA RELIGIÃO

⋅  DENNETT, Daniel. (2012) Quebrando O Encanto: A religião


como fenômeno natural. Editora Globo. 456 pp.

⋅  PLANTINGA, Alvin. (2012) Deus, a Liberdade e o Mal. São


Paulo: Vida Nova. 144 pp.

⋅  PLANTINGA, Alvin. (2017) Conhecimento e Crença Cristã.


Editora Monergismo. 224 pp.

ARTIGO GRATUITO TRADUZIDO PELA ABC²

⋅  CLARK, Kelly J., e BARRETT, Justin L. (2011) “A Epistemolo-


gia Religiosa de Thomas Reid e a Ciência Cognitiva da Religião”.
Journal of the American Academy of Religion. Traduzido por
Davi Bastos, Marcelo Cabral e Gesiel da Silva. Disponível em:
http://www.cristaosnaciencia.org.br/content/uploads/A-Epis-
temologia-Religiosa-de-Thomas-Reid-e-a-Ci%C3%AAncia-
-Cognitiva-da-Religi%C3%A3o-1.pdf

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Confira também os livros da ABC²
das séries “Ciência e Fé Cristã” e
“Coleção Fé, Ciência e Cultura”.

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