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tema de capa
VIOLENCIA
curiosidades republicanas
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editorial
O filme “2001 – Uma Odisseia no Espaço” consciencializou-nos que
a Violência acompanha a Espécie Humana, desde o instante em que
um dos primeiros hominídeos assassinou um dos seus semelhantes,
com recurso a um qualquer objeto, ocasionalmente transformado
em arma. Desde aí, a Violência não tem deixado de estar presente
nas Sociedades, adaptando a sua topologia aos paradigmas dos
sucessivos “Aqui e Agora”.
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sumário
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Editorial
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não há tolerância para com os que se alimentam de ódio
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Os Medos e a Violência na Moderna Sociedade Líquida
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Feminicídio. O que falta fazer?
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Justiça e vingança
Usos e costumes nos princípios do século xx
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Manifesto Progressivo Redux
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Humildade
Valor fundamental do rito francês
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Rei Morto, Rei Deposto, Selo Posto …
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Degustações
Contacto: fanzine81@gmail.com
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não há tolerância para com os que se alimentam de ódio
a 16 de outubro de 2020, Samuel Paty foi assassinado em Conflans-Sainte-
Honorine por alguém cujo nome não merece ser lembrado; a 29 de outubro,
três pessoas são assassinadas em Nice, no interior de uma basílica; a 2 de
novembro, quatro pessoas foram mortas e mais de vinte feridas num ataque
com arma de fogo, nas ruas de Viena
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tema de capa
OS MEDOS E A VIOLÊNCIA
NA MODERNA SOCIEDADE LÍQUIDA
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surgem de qualquer lado, e a qualquer momento, e duram…. “um instante”.
As oportunidades surgem à velocidade de um “click eletrónico” e, têm que ser
respondidas, num mesmo “click”. A falta das balizas da “Sociedade Sólida”, que
davam ao indivíduo os parâmetros para a sua identidade, traduz-se em que o
“homem líquido” tem que se auto afirmar, tem que encontrar a sua identidade
por si mesmo, e à sua responsabilidade. Nessa tarefa, ele olha para a sociedade
procurando exemplos, valores e regras, que constituíam uma argamassa
suficientemente sólida, para utilizar na construção de uma identidade com
raízes duradouras. Todavia, o que o mercado tem para lhe oferecer são conceitos,
bens e serviços, para consumo e utilização imediata, de prazo de validade muito
perene, que o satisfazem num momento, e logo se esgotam. Então o indivíduo
percebe, que as identidades assim construídas também são fugazes, frágeis,
erigidas para consumo imediato. O “real” foi substituído pelo “aparente” ou, se
quisermos, pelo “virtual”. O indivíduo é acima de tudo um consumidor, e apenas
conta como tal. Tudo é vendável, porque
tudo é consumível. Porém, o consumo é, por
essência, uma atividade solitária mesmo que,
efetuada no meio de uma multidão.
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estranhos entre nós. Podíamos discordar de algumas decisões, ou sobre a
forma de as aplicar, mas, sabíamos que o objetivo era comum – o bem-estar
da comunidade. Também sentíamos o conforto de que se tropeçássemos e
caíssemos, os outros nos ajudariam a ficar de pé outra vez. Não era muito difícil
a concretização da comunidade dado que , na sociedade anterior havia pontos
sólidos, regras, pilares de conceção da sociedade e do relacionamento humano,
que serviam de pontos seguros onde se podia fixar as âncoras e construir o
edifício evitando-se, o flutuar ao sabor indefinido da corrente sem perspetiva de
se encontrar um porto seguro, se é que ele existe.
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Mas para serem viáveis, esses pactos necessitam de uma entidade que os
fiscalize e os faça respeitar – o Estado. Assim, o papel primordial do Estado seria
a garantia e provimento da segurança e essa seria a sua razão de ser. Todavia,
era inevitável que o indivíduo para poder auferir desse guarda-chuva de
proteção, teria que ceder algo – esse algo era parte da sua liberdade. O Estado,
instituído pelo poder e cedência dos indivíduos–cidadãos, regulava as relações
económico-sociais dentro do espaço geográfico que lhe competia, tentando
manter um “status quo” minimamente aceitável e, minimamente justo, para os
seus concidadãos. Cabia ao Estado, criar e regular as melhores condições para
o encontro entre os fatores capital e trabalho, assumindo mesmo custos com o
fator trabalho, através dos programas sociais, que o capital não estava disposto
a suportar mantendo assim, o custo do trabalho a níveis aceitáveis para o
capital.
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natureza secundária, a que Zygmund Bauman chama de “medos derivados”.
Estes podem abarcar a durabilidade da ordem social e confiabilidade nela,
ou mesmo, a posição do indivíduo no mundo, a sua posição na hierarquia
social, a sua identidade (classe, género, étnica, religiosa, etc.) ou, se quisermos,
a imunidade à degradação e exclusão social. Todos eles aumentam a
insegurança e vulnerabilidade do novo indivíduo líquido, que sente crescer
vertiginosamente os seus “medos derivados”. Olham à sua volta procurando
âncoras onde se possam agarrar e, colchões que lhes amorteçam as quedas
eventuais, mas, o que encontram são comunidades diluídas, ou no máximo
virtuais, e um Estado que já despiu a sua roupa da “proteção social” para vestir
a da “proteção pessoal”. O Estado pode reforçar as suas defesas (apesar de
na maioria das vezes serem insuficientes) contra inimigos e ameaças de fora
mas, é manifestamente incapaz de lhes acudir e fornecer remédios, para os
seus “medos derivados” relativos à insegurança e permanente incerteza sobre
o futuro, da garantia de manutenção da sua posição social, de se manterem à
“tona de água” na corrida vertiginosa da
nova sociedade e, logo, do risco de caírem
nos domínios do exército dos excluídos,
ou seja, daqueles que não são capazes de
permanecer na sociedade ativa, apenas
flutuando nas suas margens, e para quem
as portas da democracia fundada em
trabalho e direitos se fecharam. No meio de
toda a angústia, os indivíduos da “moderna
Sociedade Líquida” defrontam-se com
a cruel verdade de que, “estão sozinhos
não só na morte, mas também nos seus
esforços para se manter vivos“.
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os atuais medos.
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escolhas ou liberdade de movimentos – nem sentem já o interesse em regular
os outros. Nos novos tempos, a dominação já não assenta no compromisso, na
capacidade de os dirigentes observarem de perto os movimentos dos dirigidos
e intimidarem-nos à obediência, situação dado que isso, causa incómodo
e é custoso. Agora há um método mais seguro e eficaz, a insegurança dos
dirigidos, sobre qual será o próximo movimento dos governantes, caso estes
se dignem a fazê-lo. O estado de permanente precariedade que os dirigidos
sentem individualmente, é o melhor remédio para diluir qualquer resistência
firme, organizada e solidária contra os movimentos dos governantes. A
aparente ampla liberdade, dada ao novo indivíduo da Moderna Sociedade,
acaba por caminhar de mãos dadas com a sua própria autorrepressão, como
bem enuncia o filósofo Byung-Chul Han. Ao contrário da anterior sociedade
de cariz disciplinar, a atual, tornou-se numa “sociedade de rendimento”.
Nela, o indivíduo livre é um sujeito de rendimento que se tem que superar
todos os dias, auto explorando-se até ao limite, de modo, a demonstrar que
ainda é produtivo e útil à sociedade, diga-se poderes que a regem, tentando
permanentemente evitar, ser mais um, dos muitos, arrastados para as
profundezas do oceano, dos inaptos, ou seja, dos excluídos. Esta é uma violência
em que o agressor e vítima são o mesmo sujeito, provocando um enganador
desvio de culpas pois, existe a tendência de o indivíduo culpar-se pelo insucesso
e não, o sistema que o leva a isso a, “violência da positividade” na ótica de
Byung-Chul Han.
Jaime Freitas
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FEMINICÍDIO. O QUE FALTA FAZER?
«A luz brilhou a teus olhos desde o momento da tua iniciação. Cada dia ela te
iluminará mais e, se tiveres força para persistir, atingirás o verdadeiro objetivo
da Maçonaria. Toma assento, entre as Eleitas, Minha Irmã».
Assim, tenho tentado fazer. Tomo assento entre as Eleitas, lugar que me está
destinado neste percurso que procuro fazer em cada momento, em plena
liberdade de consciência, tendo presente que a minha liberdade terá sempre a
limitação do respeito devido aos outros.
Se, em 1673, Poulain de la Barre publica «De l`Egalité des deux sexes», onde
refere que «os homens, sendo os mais fortes, por toda a parte favorecem o
próprio sexo e que as mulheres aceitam por hábito essa dependência. Nunca
tiveram possibilidades, nem liberdade, nem instrução» .
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Na mesma linha de sentido, no Século XVIII, o
Século do Iluminismo, já em 1774 o autor da
«Controverse sur l`Ame de la femme» afirma «a
mulher criada unicamente para o homem deixará
de existir no fim do mundo, porque deixará de
ser útil ao objecto para o qual, foi criado, do que
se conclui naturalmente que a sua alma não é
imortal», e é ainda Rousseau que refere «Toda
a educação da mulher deve ser relativa ao
homem...A mulher é feita para ceder ao homem e
suportar-lhe as injustiças».
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direitos das mulheres, havendo quem o considere
percursor para o que viria a ser a Declaração Universal
dos Direitos Humanos.
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superior são mulheres, um acréscimo de 21% em cerca de 40 anos. Ao nível
superior do ensino, no Doutoramento, 54% são mulheres.
Sim, é verdade, passados cerca de 300 anos, a mulher na Europa tem o seu
reconhecimento social plasmado em igualdade de direitos na Carta dos
Direitos Fundamentais da União Europeia (18/12/2000), cujo Preâmbulo refere
– «Consciente do seu património espiritual e moral, a União baseia-se nos
valores indivisíveis e universais da dignidade do ser humano, da liberdade,
da igualdade e da solidariedade; assenta nos princípios da democracia e do
Estado de direito. Ao instituir a cidadania da União e ao criar um espaço de
liberdade, de segurança e de justiça, coloca o ser humano no cerne da sua
ação».
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receberam 727 contatos entre 19 de Março e 15 de Junho, um aumento de 180%
face ao primeiro trimestre de 2019.
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O relatório final com os resultados deste inquérito permitiu concluir «que a
violência contra as mulheres, em especial a violência baseada no género que
as afeta de forma desproporcionada, constitui uma violação frequente dos
direitos humanos».
MGP
Bibliografia consultada
Camila Moraes Monteiro, Mariana Imbelloni Braga Albuquerque, «Da revolução ao lar, do lar à
revolução».
Direção-Geral da Segurança Social Núcleo de Documentação e Divulgação, «A mulher em
Portugal: Alguns aspetos do evoluir da situação feminina na legislação nacional e comunitária»,
Volume I, dezembro 2014.
Alice Mendonça, «Evolução da Política Educativa em Portugal». Universidade da Madeira.
EUROPEAN UNION AGENCY FOR FUNDAMENTAL RIGHTS, «Violência contra as mulheres:um
inquérito à escala da União Europeia».
https://pt.wikipedia.org/wiki/Declararaçao_dos_Direitos_da_Mulher_e_da_Cidada - 18.11.2019
https://portuguesaletra.com/significados/significado-de-vingar/
http://www3.uma.pt/alicemendonca/conteudo/investigacao/
evolucaodapoliticaeducativaemPortugal.pdf,
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JUSTIÇA E VINGANÇA
USOS E COSTUMES NOS PRINCÍPIOS DO SÉCULO XX
Por causa das «coisas», disfarçavam-se com boinas, boinas enterradas nas
cabeças oleosas até aos olhos, muitas vezes com lenços ou com máscaras
de Carnaval a tapar as caras, armados com «gadanhos cordões grossos e
amarrados, espadas e punhais desembainhados, forquilhas e varas», que ao
bater no chão, à cadência de uma pancada, faziam um batuque de aterrorizar,
alguns mais ousados traziam mesmo «armas de fogo», para o que desse e
viesse. Tudo para desentortar e não desconversar.
Os que se não se arrumavam com «toga de juiz feito», rufiões sem vergonha,
usavam farpelas rasgadas, faziam a justiça dos usos e costumes, o costume era
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o de fazer «justiça pelas próprias mãos», e se a coisa ficasse tremida e se não ia
às boas, era «rachar lenha de criar bicho», era tempo de apertar os gorgomilos.
Primeiro vinha o «cabecilha» com o «sermão das falinhas mansas», se o
sermão era de «meias falas ou de meias missas», apareciam os varapaus para
desentortar de vez o que se entortara.
Tudo dependia de quem fazia a ronda, a justiça da noite, a justiça das mãos
negras, muitas vezes e quando os que estavam à testa eram
gente má, gente das pingolas de vinho dos fins de tardes nas
tabernas dos becos e das travessas, ou os que eram pior que
todos, os que «agiam só por vingança».
Todos os que ousavam «mijar fora do penico» tinham à perna a justiça da noite,
a justiça da mão negra, justiça de que haviam sido atores. Tinham que amochar,
amochar à força, e se a mulher dele desse uns «pontos» fora, logo lhe colocavam
a mala à porta e ao homem uma «catrefa de porrada», chegando-lhe a roupa
ao pelo, para ter vergonha na fronha, para reentrar nos eixos, metiam-se para
sempre na vida dele, era preciso controlá-lo para saber o preço da delação, o
preço apagar por informadores, delatores ou bufos.
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Se fosse hoje, em que separação de casais é «mato», a justiça da noite, a justiça
das mãos negras, não teria mãos a medir, mas, tudo evoluiu, outras liberdades
conquistadas, outras diferenças surgidas e outras soluções que emergiram,
agem de modo diferente com os mesmos objetivos.
Pobre casava com pobre, gente pobre era gente que não
sabia ler nem escrever, «nem sabia soletrar»… Filho(a)s de
gente de posses casavam com filha(o)s de gente de posses.
O senhor Padre estava sempre disponível, aconselhava
todos, para não terem problemas para o resto de toda a vida.
Era bem recompensado pela gente de posses, gente que
sabem ser generosa no seu interesse, especialmente para
quem servia Cristo com Amor.
Com gente de posses não se podia brincar, a justiça da noite, a justiça da mão
negra, acabava na mesma sendo feita, mas de uma maneira diferente, mais
elaborada, mais prensada, a justiça sumária. Contratavam um «capanga», com
a ajuda de intermediário, de intermediário de confiança, de gente segura, de
gente mesmo segura, gente bem paga e bem protegida. O «capanga» tinha
de aceitar, a bem ou a mal, senão nunca mais teria trabalho, nunca mais teria
descanso. As regras eram servir, receber pouco e calar fundo, calar bem fundo,
calar no fundo do poço, do poço que não estava seco e que era um poço com
um fundo que não se via.
Nunca faltou gente para «pintar a manta», gente ansiosa por cenas de
«porrada, de porrada de criar bicho», era na hora em que o vinho bebido pelos
bebedolas nas tabernas dos becos e das travessas, vinho servido em cálices de
vidro grosso, vinho carrascão das pipas das terras de Alenquer, vinho misturado
com petiscos, com iscas e pataniscas, e com os fumos do tabaco de onça.
Quando o vinho aquecido pelo tabaco de onça já tinha subido bem às cabeças
e se espalhara pelo corpo, já tinha tudo azedado. Muitas vezes, umas «fatias na
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hora», dadas na hora certa, davam jeito, e quando tocava à «pauzada», aquilo
era pancadaria de meter medo ao bicho!
Os encontros não eram coisa fácil, não havia motéis nem muitas outras
facilidades de agora, era coisa de encontros fugazes, combinados «por sinais
e por troca de secretas palavras», só por eles entendidos, em qualquer canto,
em abrigos temporários, em pardieiros com camas feitas de caruma seca, ou
atrás das moitas, lavavam os mínimos atirando fora a água suja. Em horas de
aflição era no lugar que estivesse à mão. Eram encontros sempre fugazes, para
ninguém ver, para ninguém ouvir, a regra era a do silêncio mútuo, a hora era a
de dar prazer ao homem, para ambos era só o prazer do risco.
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expondo o que as ceroulas tapam e os saiotes protegem. Tinham a prova, a
prova não provada, a prova não sujeita a contraditório.
Crime merece castigo, assim devia ser sempre, mas o pobre está mais sujeito a
castigo que o homem de posses, aqui, ali e em todo o lado, em todos os tempos
passados, atuais e vindouros. Tudo na justiça sempre dependeu e depende das
posses, da literacia, da cultura, dos usos e dos costumes, da moral da religião,
dos interesses da política.
Eu, nem sou muito exigente, gostava que os princípios e valores que enformam
a Maçonaria e que os que nos antecederam nos ensinaram, princípios e valores
que nunca podem ser esquecidos, que vingassem em todos os países, em todas
as sociedades, em todas as etnias, em todas as culturas, que se reforçassem no
nosso seio, nas nossas famílias, nos nossos círculos profissional e social.
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MANIFESTO PROGRESSIVO REDUX
Preâmbulo
A criação de um manifesto
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sobretudo, a atractividade das suas propostas, contribuem
para o seu triunfo, para a sua glória, embora esta seja muitas
vezes efémera.
Como criar algo que não seja efémero, que progrida, que
se reconstrua mas mantenha a sua orientação, o seu
propósito?
Como criar algo que não seja efémero, que progrida, que se
reconstrua mas mantenha a sua orientação, o seu propósito?
Partir da união dos homens para a união dos valores é um desafio de integração
num universo de diversidade e expansão, em que outros valores ou para-valores
contraditórios e disruptivos emergem. É um desafio perante o conhecimento
que se expande, mas também que se esquece e que importa recuperar,
revisitar, buscando uma integração da diversidade sem a necessidade de uma
verdade definitiva e dogmática.
Importa, pois, enquadrar nesta base fundacional, a questão que nos era
colocada (Face à violência das respostas identitárias e do comunitarismo, como
respeitar as singularidades individuais, sem colocar em risco o denominador
comum da humanidade?), reflectindo no que concerne aos limites éticos, e aos
vectores de ação, que a mesma aconselha, face aos paradigmas e dinâmicas do
Aqui e Agora.
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A necessidade de que todos possam viver em comum, de uma forma que
garanta a plena liberdade de consciência, e a igualdade de direitos, torna-
se cada vez mais acentuada, nas nossas sociedades contemporâneas,
teoricamente multi-étnicas, multiconfessionais, multi-ideológicas, e
socialmente diferenciadas.
Se o homem é dono do seu destino então ele é livre e a liberdade é o seu maior
potencial mas também deve ser a sua maior responsabilidade.
Se a Maçonaria tem como base o Homem livre e se todos os Homens são livres,
então todos são iguais na mesma dimensão da liberdade que possuem. A
Igualdade deve ser pois uma consequência e uma condição da liberdade de
todos e a sua medida uma dimensão da própria liberdade.
E que fazer com a liberdade de todos e a igualdade entre todos? Deixar que
se constitua cada um como um agente competitivo, um egoísta na procura
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estrita do seu interesse ou afirmação de opiniões pessoais, ou procurar no bem
comum o cenário de um futuro melhor para todos e para cada um?
A liberdade é condicionada, em cada tempo histórico, pela maioria, pelo
colectivo, partindo do princípio que as normas em vigor são estabelecidas por
modelos democráticos. Esta será portanto, uma liberdade individual plena
e consciente, inserida num colectivo com regras validadas e escrutinadas
democraticamente. Rousseau, no Contrato Social, afirmava que o Estado
assegura a liberdade de cada cidadão através da independência individual
privada e da livre participação politica.
Daí que a distinção entre as esferas pública, e privada, seja decisiva, na medida
em que permite distinguir os locais, e as regras de afirmação das diferenças, de
modo a salvaguardar-se tanto a livre escolha de uma opção ética ou espiritual,
como a neutralidade de espaços públicos comuns, como o devem ser as
escolas, ou os serviços de saúde.
Será, pois, pela educação cívica, orientada para o respeito pela diferença,
e para a valorização do espaço público, naturalmente laico, que se poderá
alcançar uma emancipação intelectual, e moral, das comunidades, que permita
resistir aos fundamentalismos religiosos, e ideológicos, permitindo a todos os
seres humanos, promovidos à verdadeira autonomia étnica, escolherem, em
liberdade, o seu modo de vida, e a sua relação com o outro, no respeito pelas leis
comuns.
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aquisição do conceito, da sua interpretação (que é uma desconstrução) e da
sua reconstrução num conceito próprio, numa visão própria, que se torna
mensagem e transmissão, sempre com algo de novo.
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tradição e vanguarda, e baseia-se numa concepção ternária do tempo – com
base em valores que vêm do passado, estabelece-se um vasto campo de
reflexão e de ação no presente, na esperança de se alcançar o progresso da
humanidade, no futuro.
E como criar este conceito cultural complexo, esse manifesto progressivo que é
a Maçonaria? Podemos tentar responder a esta questão com novas perguntas
deixando, ao bom estilo maçónico (e também das religiões), a cada IIr:. uma
dimensão subjectiva na sua resposta:
- Como seria possível criar uma visão da história, intemporal e transcultural, que
se baseasse na crença de que o homem é dono do seu próprio destino e que
pode encontrar na racionalidade a inspiração para o seu futuro?
- Como criar uma teoria de futuro inspirada pelo progresso científico que
integrasse a própria mutabilidade das teorias científicas como um factor de
evolução natural ao serviço da evolução da humanidade?
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rito francês
HUMILDADE
VALOR FUNDAMENTAL DO RITO FRANCÊS
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descer ao mais profundo do nosso ser, visitar o lado sombrio do nosso EU
e, conhecer as raízes dos nossos vícios, impulsos e, porque não, as nossas
imperfeições. Para Tomás de Aquino, a Humildade é um “equilíbrio entre a
força e a fraqueza; a grandeza e a pequenez”, por sua vez, para Agostinho de
Hipona é a “percepção da nossa medida”. Encontraremos isto mesmo num
versículo da Bíblia... “Por isso, pela graça que me foi dada digo a todos vocês:
ninguém tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que deve ter; mas,
ao contrário, tenha um conceito equilibrado” (Romanos 12,3).
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modalidade de novo-riquismo, outra forma de manifestação da soberba.
Se te julgas importante
Para provares que o és,
Respeita o teu semelhante
Que és baixo em bico de pés.
N Dias Pereira
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curiosidades republicanas
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Fig.1 - Bilhete-postal – imagens dos selos de todas as taxas emitidas
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Fig. 5 - Sobrecarga invertida Fig. 6 - Dupla Sobrecarga
Fig.7 - Carta circulada, Madeira, 8 Dez 1910 combinando selos com e sem sobrecarga
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a efígie do Rei deposto. Sobre estas últimas subsiste por vezes alguma dúvida
sobre a sua autenticidade (no pequeno mundo da filatelia a falsificação
também está presente).
Ainda de referir que entre Janeiro de 1911 e Outubro de 1912, a Casa da Moeda
imprimiu novas tiragens de selos de D Manuel II com sobrecarga «REPUBLICA».
A República continuava ainda refém da Monarquia que, não obstante
moribunda, ainda não estava morta, como de facto se veio a verificar mais
tarde, em 1919 numa derradeira e última tentativa de restaurar a Monarquia,
episódio conhecido como Monarquia do Norte.
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O processo, nas suas variadas etapas, teve início em 4 de Fevereiro de 1911
e foi dado como terminado quando o primeiro selo criado pela República
Portuguesa e a ela alusivo, foi colocado em circulação no dia 14 de Fevereiro de
1912.
O selo com taxa de 1 Centavo foi o primeiro colocado à venda ao público, no dia
em 14 de Fevereiro de 1912. A taxa já se apresentava na nova moeda o Escudo; 1C
é a centésima parte do Escudo; a palavra «Portuguesa» aparece escrita com a
letra “S” contrariamente ao projecto inicial onde aparecia com “Z”.
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selo são as da «regra de oiro» e por último ainda para alguns, horríveis, os piores
alguma vez emitidos; também havia quem deles dissesse simplesmente que
cumpriam a sua função, representavam bem o ideal Republicano. Não sabemos
se existiram reflexões sobre a foice, conhecendo-se no entanto, anos mais tarde,
em 1926, sátira apresentando a Ceres suicidando-se (melhor dizendo, talvez a
República), aquando da conhecida emissão “Ceres de Londres”, em que deixou
de ser Portuguesa e virou Inglesa , entenda-se o desenho e a impressão.
A qualidade de impressão das primeiras tiragens (1912) não terá sido a melhor,
o que se agravou ainda mais durante o período da 1ª Guerra Mundial, levando
a que alguns tivessem dito que a República apresentava-se de óculos (escuros
talvez e de olhos esbugalhados, acrescento eu). Quanto à qualidade da goma
para aderir ao papel também surgiram reclamações, já que a mesma teria
má aderência, fazendo com que frequentemente os selos se descolassem dos
envelopes, retardando a expedição da correspondência e originando multas a
pagar pelos destinatários (o controlo de qualidade não tinha na época a mesma
importância que tem nos dias atuais, já os atrasos na correspondência parecem
continuar a existir).
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degustações
“LE RITE FRANÇAIS, SES FONDAMENTAUX, SA PHILOSOPHIE” de
Gérard Chomier, com Prefácio de Philippe Guglielmi
No passado mês de Outubro foi editado, com No Rito Francês recusa-se, assim, a “Simbolatria”,
o nº 22 da “Collection Pollen maçonnique” encontrando-se o fundamental numa essência,
(Conform Edition, Paris), o livro “Le Rite Français, que está “para aquém dos nossos paramentos e
ses fondamentaux, sa philosophie” de autoria das nossas pantominas rituais”.
do Irmão Gérard Chomier, antigo membro da
Câmara de Administração do Grand Para fundamentar estas opiniões,
Chapitre Géneral du Rite Français o Irmão Gérard Chomier faz-
du GODF. Esta obra é prefaciada nos viajar pela História das
pelo Irmão Philippe Gugliemi, Mui Ideias, do Mithos ao Logos,
Sábio e Perfeito Grande Venerável descrevendo o longo caminho
desta Jurisdição. da Humanidade, em busca da
plena Liberdade de Consciência.
Tendo a História do Rito Francês Aborda, igualmente o conceito
vindo a ser objeto de diversos de Laicidade, salientando a sua
trabalhos publicados nos últimos importância nas bases filosóficas
anos, dos quais se destacam os da que sustentam o Rito Francês.
autoria dos Irmãos Ludovic Marcos,
Pierre Mollier, e da Irmã Cécile Por último, tece algumas
Révauger, o presente livro tem a considerações no que concerne
particularidade de se encontrar aos paramentos a utilizar nas
mais focalizado para as bases diferentes Ordens de Sabedoria,
filosóficas deste percurso Maçónico. propondo soluções que têm por
O Irmão Gérard Chomier centra- referência a trilogia humildade-
se, pois, mais nas questões: “O que sobriedade-laicidade, tendo
é que é o Rito Francês? Qual é a presente que quanto mais o
sua caraterística? Qual é a sua Maçon progride no seu percurso
essência?” iniciático, maior deverá ser o
despojamento do seu traje.
Segundo o autor, o Rito Francês é um Rito
de Liberdade, de livre pensamento e de livres O presente livro constitui, pois, uma abordagem
pensadores, construído na horizontal, que tem por original do Rito Francês, e revela-se uma
objeto a emancipação do Maçon, numa Sociedade ferramenta bastante interessante, para quem o
mais Justa, na qual ele é cidadão empenhado e queira compreender. É, seguramente, uma leitura
ativo. Visa libertar os seus adeptos de qualquer muito recomendada para os Irmãos e Irmãs que o
pensamento dogmático, e de qualquer sistema de praticam, especialmente para os que já trabalham
moral imposto na vertical, sendo a Laicidade um em Soberanos Capítulos Franceses.
dos seus pilares mais estruturantes.
Daí que se possa concluir, que a Bibliografia
O Rito Francês é, pois, um Rito terrestre, que disponível sobre este Rito ficou mais rica com a sua
coloca o Homem em busca do Universo que o publicação, podendo ser adquirido através do site
rodeia, e de si próprio. Assim, os Maçons do Rito da editora Conform Edition.
Francês encontram na horizontalidade as metas
da sua progressão. Contrariamente aos Irmãos
dos Ritos Deístas, que procuram “chegar mais Joaquim Grave dos Santos
alto”, eles satisfazem-se por “ir mais longe”. O Rito
Francês vai, assim, “do Outro ao Outro”, tendo
por caraterísticas fundamentais a sobriedade, e a
humildade, e no qual os Símbolos não são mais
do que um microscópio através do qual o Maçon
observa o Mundo, sob uma luz especifica, e um
ângulo particular.
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A Revista de Maçonaria é uma iniciativa independente das
organizações maçónicas e virada para a publicação de artigos de
investigação e reflexão sobre temas relacionados com Maçonaria,
Espiritualidade, Sociedades Fraternais e, também, temas de
actualidade.
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