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as cidades no Brasil
"O machismo foi tornado crime, o que lhe reduz as manifestações públicas e abertas.
Mas ele sobrevive no imaginário da população, no cotidiano da vida privada, nas
relações afetivas e nos ambientes de trabalho, nas redes sociais, nos grupos de
whatsapp, nas piadas diárias, nos comentários entre os amigos “de confiança”, nos
pequenos grupos onde há certa garantia de que ninguém irá denunciá-lo. O mesmo
ocorre com o racismo, com o preconceito em relação aos pobres, aos nordestinos, aos
homossexuais. Proibido de se manifestar, ele sobrevive internalizado, reprimido não
por convicção decorrente de mudança cultural, mas por medo do flagrante que pode
levar a punição. É por isso que o politicamente correto, por aqui, nunca foi expressão
de conscientização, mas algo mal visto por “tolher a naturalidade do cotidiano...O
“brasileiro médio” gosta de hierarquia, ama a autoridade e a família patriarcal, condena
a homossexualidade, vê mulheres, negros e índios como inferiores e menos capazes,
tem nojo de pobre, embora seja incapaz de perceber que é tão pobre quanto os que
condena. Vê a pobreza e o desemprego dos outros como falta de fibra moral, mas
percebe a própria miséria e falta de dinheiro como culpa dos outros e falta de
oportunidade. Exige do governo benefícios de toda ordem que a lei lhe assegura, mas
acha absurdo quando outros, principalmente mais pobres, têm o mesmo
benefício.” LAGO 2020
Figura 2: Charge
coletada no site
Jornalistas Livres, na
matéria; Moro versus
Bolsonaro no site
Jornalistas Livres
Por outro lado, o Bolsonarismo envolve uma certa nostalgia da Ditadura Militar, seus
rompantes autoritários e uma revolta contra a liberalização geral das diversidades
comportamentais, que toda sociedade moderna apresenta e permite. O combate ao
que se convencionou chamar de ideologia de gênero, um ressentimento geral quanto
a uma suposta perda de valores morais presos a família patriarcal, branca e
conservadora é claramente alardeado numa semelhança assustadora com o nacional-
socialismo da década de 30 na Alemanha. Já fiz aqui no blog, uma analogia entre as
origens autoritárias do Estado alemão e o brasileiro no texto; Esclarecimento e
Barbárie, Democracia e Bolsonarismo, que aliás era a tese da via prussiana de
Florestan Fernandes, Nelson Werneck Sodré e Luiz Werneck Vianna, o texto está
disponível em
link; https://arquiteturacidadeprojeto.blogspot.com/2020/04/esclarecimento-e-barbarie-
democracia-
e.html?spref=fb&fbclid=IwAR2EE8qbLzefZDLSnS6JiIODbWyqw3X_EeINOFihWjJ-
RYQKYUmS9iJjg4g. Mas o Bolsonarismo articula grupos, que não saíram das trevas
tais como; torturadores, elaboradores de atentados como os que o então capitão do
exército, Jair Bolsonaro, elaborou para obtenção de aumento de salário em 1987,
policiais dos mais diversos matizes, que se consideram desprestigiados a partir dos
ganhos de direitos da Constituição de 88, promovendo uma celebração do
autoritarismo como panacéia para resolução dos problemas do país. É preciso
também reconhecer que, o Bolsonarismo e esse movimento conservador não mais se
apoia na Grande Mídia, como a Lava Jato, se utilizando de forma intensa das mídias
sociais, criando factóides falsos ou verdadeiros, que pela eficiente reprodução tornam-
se debates de destaque, apesar de seu conteúdo primário vazio, tais como; o kit-gay,
anti-Ptismo, anti-MST, atentado a faca em Juiz de Fora, mamadeira de piroca, nova
política, etc... A eficiência na manipulação das mídias sociais traz para o campo da
informação um debate fundamental, aonde o discurso conservador se utiliza de uma
estratégia de combate constante, que já havia conseguido sucesso no Brexit e na
eleição de Trump nos EUA. Essa última característica deu ao Bolsonarismo sua
aparência anti-sistêmica, apesar de seu vínculo histórico com o baixo clero do
legislativo nacional, nos medíocres 28 anos da sua atuação parlamentar. Portanto, a
atual crise política parece apontar, que Moro e o Lava-Jatismo se mantém apoiado
pela grande imprensa e pelo judiciário, enquanto Bolsonaro ainda mantém os grupos
que operam a violência do Estado, se aproxima do chamado Centrão no Poder
Legislativo, o agro negócio mais atrasado, desmatadores e as milícias digitais. Os
dois, Moro e Bolsonaro, parecem não mais caminhar juntos.
"A princípio, contra Bolsonaro, Moro dispõe dos mesmos instrumentos de que
dispunha contra Dilma e Lula: grande mídia e judiciário. Por um lado, não possui mais
o cargo de juiz e a narrativa em torno da Operação Lava-Jato. Por outro, mantém
prestígio popular acumulado da Lava-Jato, a despeito do escândalo (materialmente
comprovado) da Vaza-Jato pelo site The Intercept Brasil. Judiciário, sobretudo STF,
parece disposto a segui-lo. Nesta direção estão as decisões dos ministros Alexandre
Moraes, impedimento da posse de Alexandre Ramagem como diretor da Polícia
Federal, e Celso de Mello, pelo andamento do processo de investigação das
denúncias feitas por Moro.
Bolsonaro não formou base parlamentar no ano passado e parece disposto a fazer
este movimento agora, mas não sabemos se isto será suficiente para deter um
processo de impedimento. Terá ao seu lado, militância e milícia digital, que vão narrar
essa experiência em contraponto à grande mídia. O “combate à corrupção” perde
força, não só pela queda de Moro, mas pela aproximação com os parlamentares do
“centrão”. Os dois ressentimentos antidemocráticos, no entanto, se mantém intactos. A
tendência é que o discurso bolsonarista avance ainda mais nas pautas de ordem
moral..." PINHA2020 em artigo do Jornalistas Livres
Mas não esqueçamos dos dois partidos reformistas, PSDB e PT, que sofreram
derrotas marcantes nas eleições de 2018, mas que se mantém como forças políticas
potencialmente aglutinadoras de votos, o primeiro mais enfraquecido que o segundo,
mas ambas ainda atuantes e constituídas. E, que dominaram o cenário da Nova
República, a partir do Impeachment de Collor, tendo tido sua parcela de contribuição
na deterioração do sistema criado pela Constituição de 1988. O chamado
Presidencialismo de coalizão configurou uma importância para o Poder Legislativo,
que se manteve operando com uma maioria invisível, que usa de expedientes pouco
republicanos sempre barganhando a operação dos governos reformistas
conservadores dos dois partidos. No entanto, a proximidade programática nunca
reuniu as duas forças políticas, que em todas as eleições do período pós Collor se
colocaram disputando o segundo turno do pleito à presidência, exceto em 2018. Tal
condição, criou rusgas e atritos incontornáveis sempre aproveitada pela maioria
invisível do Centrão, muitas vezes materializadas pelo DEM ou pelo PMDB, que
comandaram verbas e recursos de maneira pouco republicana, e sempre
conservadora. Mas, essa forma de atuação conjuntural também deteriorou a confiança
geral da sociedade no sistema da Constituição Cidadã de 1988, fazendo com que as
reformas impactassem muito pouco na vida cotidiana da grande massa da população
brasileira, que permanece com índices de desigualdade explosivos, apesar de tímidos
avanços.
"Agosto de 2013. Quando entrei no salão oitocentista situado numa antiga fábrica
convertida em centro cultural e de eventos em Manchester, por dois segundos lembrei-
me dos textos de Friedrich Engels, e pensei foi aqui o começo dessa saga... Pela
paredes, cartazes marcados por pincel atômico definiam estratégias e cronogramas de
mobilização para os próximos meses: era um dos encontros regionais da campanha
contra a chamada bedroom tax (taxa de quarto), uma das medidas de austeridade
fiscal recém implantadas pelo governo que, mais uma vez, atingiam os moradores de
conjuntos habitacionais públicos britânicos... As cenas que acabamos de descrever -
em regiões tão distintas como a Europa, os Estados Unidos, a América Latina, o
Oriente Médio e a Ásia - são a expressão e o resultado, a partir da primeira década do
século XXI, de um longo processo de desconstrução da habitação como bem social e
de sua transformação em mercadoria e ativo financeiro." ROLNIK 2015 página25
"É isso que eu não vejo. Não vejo isso com Trump. Eu realmente não vejo isso com
Macron. É claro que ambos os presidentes são, supostamente, muito diferentes, como
todos sabemos, mas ao mesmo tempo, há um importante ponto em comum. É que
eles começaram seu mandato, promovendo um grande corte de impostos para os
ricos, para resumir. Na França, houve uma revogação do imposto sobre a riqueza. Nos
EUA, houve um grande corte de impostos para contribuintes de renda muito alta e
para grandes corporações. Trump também queria se livrar do imposto imobiliário. Ele
não conseguiu aprovar, mas esse era seu plano. Os dois presidentes fizeram esses
enormes cortes de impostos para os ricos... Essa é uma lição muito geral da história,
que o nível de desigualdade social nas sociedades depende principalmente da
mobilização política e da mudança ideológica, em vez de determinantes econômicos
ou tecnológicos puros." PIKETI 2020, publicado por Democracy Now e traduzido para
a Revista Carta Maior
BIBLIOGRAFIA:
LAGO, Ivann - O Jair que há em nós - artigo publicado em carta maior coletado em
maio de 2020 em https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Sociedade-e-Cultura/O-
Jair-que-ha-em-nos/52/47388