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MULHERES

E RELAÇÕES
DE GÊNERO
o jornal como fonte
e recurso pedagógico

Cristina Satiê de Oliveira Pátaro


Frank Antonio Mezzomo
Mulheres e relações de gênero

Cristina Satiê de Oliveira Pátaro


Frank Antonio Mezzomo

MULHERES E RELAÇÕES DE GÊNERO


o jornal como fonte e recurso pedagógico

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Mulheres e relações de gênero

Universidade Estadual do Paraná – Unespar


Câmpus de Campo Mourão

Reitoria
Antonio Carlos Aleixo

Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação


Frank Antonio Mezzomo

Direção do Câmpus
Eder Rogério Stela

Diagramação e capa
Lila Pacci

Fotos – Jornal Folha do Norte do Paraná


Acervo do Grupo de Pesquisa Cultura e Relações de Poder

Versão eletrônica disponível em: http://www.fecilcam.br/culturaepoder

Realização

Apoio

UNESPAR
Universidade Estadual do Paraná

Este material, em versão eletrônica, foi distribuído gratuitamente para as escolas públicas
vinculadas ao Núcleo Regional de Educação de Campo Mourão

Mulheres e relações de gênero: o jornal como fonte e recurso pedagógico.


PÁTARO, Cristina Satiê de Oliveira; MEZZOMO, Frank Antonio. Grupo
de Pesquisa Cultura e Relações de Poder. Campo Mourão, 2014, 68p.

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Mulheres e relações de gênero

Ninguém nasce mulher: torna-se mulher.


Nenhum destino biológico, psíquico, econômico define
a forma que a fêmea humana assume no seio da sociedade;
é o conjunto da civilização que elabora esse produto intermediário
entre o macho e o castrado que qualificam de feminino.

Simone de Beauvoir, 1949

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Mulheres e relações de gênero

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Mulheres e relações de gênero

Sumário
7 Apresentação

8 Grupo de Pesquisa Cultura e Relações de Poder

Parte I: Jornal, mulher e História

11 1. Por que olhar para as relações de gênero e a mulher na sociedade?

17 2. O jornal: fonte e recurso metodológico

21 3. O Jornal Folha do Norte do Paraná

27 4. Década de 1960

Parte II: Representações da mulher no Jornal Folha do Norte do Paraná

33 5. Mulher e propaganda

43 6. Mulher e trabalho

49 7. Mulher e beleza

55 8. Mulher e família

61 9. Mulher e modelos de conduta

66 Referências

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Mulheres e relações de gênero

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Mulheres e relações de gênero

Apresentação

O livro Mulheres e relações de gênero: o jornal como fonte e recurso sobre as mulheres (SOIHET, 2007), na medida em que dita regras, valores,
pedagógico tem como objetivo trazer discussões, materiais e atividades que comportamentos e papéis que, em muitos casos, reforçam as relações de
possam auxiliar os docentes da Educação Básica no trabalho com temáti- desigualdade entre homens e mulheres e de dominação do feminino pelo
cas relativas às mulheres e às relações de gênero, utilizando como base o masculino.
Jornal Folha do Norte do Paraná. Embora o material produzido tenha como O material está organizado em duas partes. A primeira parte, “Jornal,
foco principal os eixos estruturantes e conteúdos da disciplina de História, mulher e História”, é composta por quatro capítulos que apresentam um
as ideias aqui presentes poderão ser também utilizadas e adaptadas a outras embasamento teórico-metodológico acerca da utilização do Jornal Folha do
disciplinas do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, em especial da área Norte do Paraná (década de 1960) como fonte e como recurso pedagógico
das Ciências Humanas. no ensino, com vistas à problematização de questões referentes à mulher e
Este volume foi produzido por pesquisadores vinculados ao grupo de às relações de gênero na sociedade. Na segunda parte, “Representações da
pesquisa Cultura e Relações de Poder, da Universidade Estadual do Paraná, mulher no Jornal”, são abordadas temáticas que tangenciam as representa-
câmpus de Campo Mourão, e é parte dos resultados da investigação intitula- ções da mulher presentes no Jornal Folha do Norte do Paraná, buscando-se
da “Representações da mulher e relações de gênero no Jornal Folha do Norte compreender as características da fonte histórica no diálogo com outras pes-
do Paraná: estudos sobre a utilização do jornal como fonte e como recurso quisas e produções acadêmicas.
metodológico no ensino de História”, desenvolvida no período de 2011 a No intuito de refletir sobre as possibilidades de trabalho com base no
2013 com apoio do CNPq. Jornal em questão e nos temas discutidos, são apresentados, ao longo de
No que diz respeito à temática das relações de gênero e as possibilidades todo o livro, sugestões de atividades, textos complementares e outros ma-
de sua abordagem junto aos conteúdos da Educação Básica, a literatura tem teriais que podem ser utilizados pelos docentes dos anos finais do Ensino
apontado uma lacuna existente na formação de professores (VIANA; RI- Fundamental e do Ensino Médio. Cabe destacar que as propostas indicadas
DENTI, 1998; MAIO; SPIRITO, 2010), de modo que a problematização de não esgotam as possibilidades de trabalho, e que as ideias aqui presentes
tais questões em momentos de capacitação dos docentes pode trazer impor- podem ser adaptadas e complementadas a depender das características da
tantes resultados ao trabalho desenvolvido nas escolas. turma, dos conteúdos e das necessidades de cada docente e escola.
Em paralelo, os objetivos, prioridades e metas estabelecidos pelo II Plano Esperamos que o material, ao acenar alguns caminhos e questiona-
Nacional de Políticas para as Mulheres (BRASIL, 2008) destacam a impor- mentos, sirva como ponto de partida para novas elaborações e problema-
tância de problematização das representações de gênero, muitas vezes discri- tizações quanto às relações de gênero, o papel da mulher na sociedade
minatórias, presentes nos veículos de comunicação e utilizadas, em muitos e, ainda, a utilização do jornal como fonte e como recurso pedagógico
momentos, como formas de vigilância e controle do corpo e da sexualidade no ensino.
das mulheres. Assume-se, nesse sentido, a necessidade de enfrentamento das
diferentes formas de violência presentes na sociedade, entendendo a norma- Os autores.
tização do corpo e da sexualidade como uma violência simbólica imposta Janeiro de 2014.

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Mulheres e relações de gênero

Grupo de Pesquisa Cultura e Relações de Poder


Este material é parte dos resultados de pesquisas realizadas por membros do Grupo de Pesquisa Cultura e Relações de Poder junto
ao acervo do Jornal Folha do Norte do Paraná. Os trabalhos desenvolvidos, e que ainda estão em andamento, têm contado com a
participação de pesquisadores e estudantes vinculados a projetos de Iniciação Científica Júnior e Iniciação Científica, com bolsas
concedidas pela Fundação Araucária e CNPq, além de estudantes de graduação voluntários.

Frank Antonio Mezzomo


Pesquisadores
Cristina Satiê de Oliveira Pátaro

Adriana de Cássia dos Anjos Jane Kelly Araújo


Amanda de Souza Ribeiro Lara de Fátima Grigoletto Bonini
Ana Paula Zubek Lucas Onofre
Andressa Paula Mara Cristina de Morais Machado
Estudantes Bruno Souza Picinini Maria Eduarda Martins de Souza
Daiana Nunes Mariele Eloisa Pinzan
Elaine Leal Jacomel Marina Ribeiro de Almeida
Flavia Brunetta Daboit Valeria da Silva Almeida
Géssica Aline Silva

Agradecimentos
Agradecemos a colaboração do Programa Centro de Documentação Histórica (PROCDH) da Universidade Estadual de Maringá,
que possibilitou o acesso ao acervo do Jornal Folha do Norte do Paraná. Agradecemos ainda a participação e apoio de Ricardo
Fernandes Pátaro e Amanda de Souza Ribeiro na elaboração deste material.

Apoio
UNESPAR
Universidade Estadual do Paraná

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Mulheres e relações de gênero

Parte I
Jornal, mulher e História

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Mulheres e relações de gênero

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Mulheres e relações de gênero

1 Por que olhar para as relações de


gênero e a mulher na sociedade?

É certo que nem sempre as mulheres se espelharam nas imagens construídas sobre elas.
E é evidente que os modelos não descrevem a realidade, esta muito mais rica e cheia de possibilidades. Entretanto,
é importante conhecer as representações que prevalecem em cada época,
pois elas têm a capacidade de influenciar os modos ser, agir e sentir das pessoas,
os espaços que elas ocupam na sociedade e as escolhas de vida que fazem.
Os discursos sobre o que é “próprio da mulher” ou qual o “seu papel” afetam também as políticas públicas,
o valor dos salários, a oferta de empregos, as prescrições religiosas, os procedimentos jurídicos,
a educação oferecida e até o trabalho dos cientistas de cada época.
(PINSKY, 2012, p. 470).

Embora o discurso da igualdade exemplo, a capacidade de gerar e mulheres seriam naturalmente seres
esteja em voga e seja defendido em amamentar que caracteriza as mulhe- da imaginação, da paixão, do desejo
todos os espaços na atualidade, vi- res (VIANNA; RIDENTI, 1998). Tal e fantasia, com pouca capacidade e
vemos inegavelmente em uma socie- pensamento está na base do que cha- discernimento para invenção e genia-
dade na qual homens e mulheres são mamos androcentrismo. lidade, ainda que venham a ter aces-
tratados de forma desigual. O androcentrismo é uma forma de so às ciências e à literatura (SOIHET,
Essa desigualdade e hierarqui- pensar que considera o sexo mascu- 2007). Diante de tal compreensão,
zação entre os sexos são, em geral, lino como o centro do universo: os a inferioridade das mulheres, assim
justificadas por aspectos biológicos, homens seriam, assim, os mais aptos como sua submissão diante do sexo
isto é, pelo fato de homens e mulhe- para governar, definir leis, estabelecer masculino, passa a ser considerada
res nascerem com algumas caracte- justiça e pensar racionalmente (MO- incontestável, sendo portanto de res-
rísticas específicas – tais como, por RENO, 1999). Em contrapartida, as ponsabilidade dos homens governar

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Mulheres e relações de gênero

a sociedade. São também eles – os homens sexos. De acordo com Moreno (1999), cada se sentido, questionar as relações de gêne-
– que detêm o poder, os meios de comuni- sociedade e cultura escolhem determinadas ro significa chamar a atenção para o fato
cação e de produção, as técnicas e a ciência formas de atuação que compõem um mode- de que “uma parte da humanidade estava
(MORENO, 1999). lo a ser transmitido às pessoas ao longo da na invisibilidade – as mulheres –, e seu uso
A visão androcêntrica é compartilhada história. Para a autora, “Estes padrões ou assinala que, tanto elas quanto os homens
tanto por homens quanto por mulheres, modelos não são os mesmos para todos os são produto do meio social, e, portanto, sua
como resultado de um processo educativo indivíduos; existem uns para o sexo femi- condição é variável.” (SOIHET; PEDRO,
perpetuado há várias gerações. As mulhe- nino e outros para o masculino, claramente 2007, p. 288).
res, ao compartilharem desse pensamento, diferenciados.” (MORENO, 1999, p. 29). O conceito de gênero implica ainda
aceitam – muitas vezes de forma incons- Assim, podemos verificar que as repre- compreender que os papéis e os compor-
ciente – as ideias discriminatórias, e são sentações de homem e de mulher que são tamentos de homens e mulheres são defini-
também defensoras e transmissoras dessa transmitidas pela sociedade contribuem dos em termos recíprocos, e influenciados
forma de ver o mundo. intensamente para a formação dos indiví- por fatores relacionados ao contexto his-
No entanto, é necessário ter em vista duos, trazendo modelos que cada um dos tórico, social e cultural (VIANA; RIDEN-
que nosso comportamento e nossa forma sexos deve ter como inspiração para seguir TI, 1998). Isso significa reconhecer que os
de pensar e sentir são influenciados pelas ou rejeitar. Dessa forma, tanto as mulheres papéis sociais associados ao gênero não
representações que possuímos de nós e do como os homens trazem marcas de elemen- são inatos ou universais e que, portanto,
mundo que nos cerca. De fato, não agi- tos externos que possibilitaram a criação de podem – e em muitos casos devem – ser
mos com base na realidade em si, mas de uma representação de si e do mundo. modificados.
acordo com a forma como compreendemos Diante do exposto, ressaltamos a im- Assim, passa a ser possível evidenciar
o mundo e as pessoas. Nossas represen- portância de um olhar que problematize as um sistema de relações sociais e de relações
tações – que balizam e organizam nosso relações de gênero presentes em nossa so- de poder os quais influenciam a construção
pensamento – são construídas a partir dos ciedade. O conceito de gênero – surgido, de modelos de conduta que determinam lu-
modelos oferecidos pela sociedade em que na historiografia, na esteira de novos pro- gares sociais, naturalizando a diferença e
vivemos, no contato com os outros e com blemas, novos objetos e novas abordagens, criando exclusões (CARVALHO, 2001).
a cultura – a partir do que nos dizem, dos menção à trilogia organizada por Jacques De acordo com Soares (2006, p. 56), em
julgamentos emitidos, do que se considera Le Goff e Pierre Nora – tornou-se oportuno nossa sociedade, as identidades de gênero
bom, correto, desejável. para analisar a organização social e as di- têm sido conceituadas com base na dico-
Nesse sentido, aprendemos desde cedo ferenças entre os sexos, buscando enfatizar tomia entre o público e o privado. Deste
que existem atividades e comportamentos o caráter social e relacional que permeia a modo, enquanto o espaço público é desti-
destinados especificamente a cada um dos definição do feminino e do masculino. Nes- nado aos homens – o que garante ao sexo

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Mulheres e relações de gênero

masculino o desempenho de atividades re- pados pelas mulheres acaba por delimitar conduzir os sujeitos a valores, crenças e vi-
muneradas, valorizadas pela sociedade – o também suas possibilidades de atuação na sões de mundo que estabelecem, muitas ve-
espaço privado é, em geral, destinado às sociedade. Já no caso dos homens, o modelo zes, relações de desigualdade entre homens
mulheres, associadas a tarefas (não remu- vigente – que lhes concede poder e domí- e mulheres.
neradas e menos valorizadas) relativas aos nio – parece ofertar mais oportunidades e Do ponto de vista biológico, as diferen-
cuidados com o lar e com a família. Ainda incentivar continuamente a busca por novos ças de gênero se manifestam de forma evi-
para Soares, caminhos e conquistas. dente. O que se constata, no entanto, é que
Em vista das ideias apresentadas, pode- tais diferenças acabam se transformando
mos dizer que as representações de gêne- em desigualdades e discriminação, dissemi-
As mulheres são coração, os homens são ca-
beça, racionalidade, elementos determinan- ro presentes na sociedade procuram impor nadas historicamente pela sociedade e pela
tes da supremacia masculina, concretizada valores, visões de mundo e comportamen- cultura.
no exercício de atividades administrativas e
de mando, e da subordinação feminina sim- tos, definindo e reforçando papéis sociais Por fim, conhecer as representações de
bolizada pelo desempenho de atividades de a serem desempenhados tanto por homens gênero que se fazem presentes em nossa so-
pouca visibilidade, escondidas no recesso do
lar. (SOARES, 2006, p. 56). quanto por mulheres na vida pública e pri- ciedade se faz oportuno para que possamos
vada. Historicamente, assim como nos pro- problematizar e transformar os modelos
cessos educativos voltados para as gerações existentes, em vista da construção de rela-
A delimitação dos espaços a serem ocu- atuais, as diferenças de gênero acabam por ções mais justas e igualitárias.

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Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício
Sugestões de Leitura

Dos filósofos gregos aos dias atuais MORENO, M. Como se ensina a ser menina. São
Paulo: Moderna, 1999.
TEXTO 01
PEDRO, Joana Maria. Traduzindo o debate: o uso
[...] dividimos o governo doméstico em três poderes: o do da categoria gênero na pesquisa histórica. Revis-
senhor, de que acaba de se tratar, o do pai e o do marido. O pai de ta História, São Paulo, v. 24, n. 1, p. 77-98, 2005.
família governa sua mulher e seus filhos como a seres livres, mas Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/his/v24n1/
cada um de um modo diferente: sua mulher como cidadã, seus a04v24n1.pdf
filhos como súditos.
Na ordem natural, a menos que, como em certos lugares, isto
tenha sido derrogado por alguma consideração particular, o ma-
cho está acima da fêmea e o mais velho, quando atinge o termo
de seu crescimento, está acima do mais jovem, que ainda não
alcançou sua plenitude. Sugestão de Filme
Na ordem política, tal como ela existe na maior parte dos po-
vos, obedece-se e comanda-se alternadamente. Todos os homens
Título: Mulheres perfeitas (Título original: The
livres são considerados iguais por natureza e todas as diferenças
se eclipsam; tanto que se torna preciso distinguir os que coman- Stepford Wives)
dam dos seus inferiores por marcas exteriores, os hábitos e as Ano: 2004
dignidades, como disse Amasis, falando de sua bacia transfor- Direção: Frank Oz
mada em deus. Nacionalidade: EUA
Quanto ao sexo, a diferença é indelével: qualquer que seja a Gênero: Comédia Dramática
idade da mulher, o homem deve conservar sua superioridade. Duração: 93 min.
Fonte: ARISTÓTELES. A Política. São Paulo: Martins Fontes,
1991, p. 29. ● Sugere-se elaboração de roteiro para análise do
filme, buscando suscitar reflexões sobre o papel da
mulher na sociedade.
● Após a leitura do trecho em destaque, pesquisar materiais
que refletem as influências do pensamento de Aristóteles nos
dias atuais.

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Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Leitura de Texto Complementar

A Mulher nas antigas civilizações

Você conhece a escultura da imagem? Ela que a guerra ganhava importância, o papel
é chamada Vênus de Willendorf e represen- dos homens assumiu, igualmente, uma im-
ta uma mulher. A escultura foi feita em cal- portância cada vez maior. De acordo com
cário oolítico, tem aproximadamente 12 cm Armstrong,
de altura e uma idade estimada em 30.000
anos! A estatueta foi encontrada acima do
rio Danúbio, na Áustria, em 1908 e se en- nas sociedades mais primitivas, as mul-
heres eram às vezes tidas em mais alta
contra em exposição no Museu de História
conta que os homens. O prestígio das
Natural de Viena. Acredita-se que represen- grandes deusas na religião tradicional
ta uma deusa, cujo prestígio era justificado reflete a veneração ao feminino. O surgi-
pelo importante papel desempenhado pela mento das cidades, porém, significou que
mulher nas civilizações antigas. As formas as qualidades mais masculinas de força
arredondadas e os seios fartos são símbolo marcial e física foram colocadas acima
das características femininas. Daí em
da maternidade e realçados na escultura.
diante, as mulheres foram marginaliza-
Na época em que foi esculpida, tanto a das e tornaram-se cidadãos de segunda
mulher quanto o homem eram responsá- classe nas novas civilizações [...]. O culto
veis pela subsistência dos grupos. A partir das deusas seria vencido, e isso seria um
da Revolução Neolítica desenvolveu-se um sintoma de uma transformação cultural
novo modelo de organização social, no qual característica do mundo recém-civilizado
(ARMSTRONG, 1994, p. 61).
os homens assumiram a responsabilidade de
trabalhar no campo e domesticar os animais
e as mulheres passaram a cuidar dos filhos,
tecer roupas e desempenhar tarefas domésti- Leia mais em: ARMSTRONG, Karen. Uma
cas. O papel dos homens foi pouco a pouco história de Deus: quatro milênios de busca
Vênus de Willendorf (24.000-20.000 a.C.)
sendo considerado mais importante e domi- do judaísmo, cristianismo e islamismo. São Fonte: http://www.infoescola.com/arqueologia/
nante na sociedade. Além disso, à medida Paulo: Companhia das Letras, 1994. venus-de-willendorf/

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Mulheres e relações de gênero

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Mulheres e relações de gênero

2 O jornal: fonte e recurso


metodológico

Ao longo do século XX, a partir duzidos originalmente para uma finali- tiplas vinculações e pertencimentos
das discussões impulsionadas sobretu- dade específica, constituindo-se como (MACIEL, 2004; CRUZ; PEIXOTO,
do pela terceira geração dos Annales, veículo de (in)formação e inseridos, 2007; SAMARA; TUPY, 2007), en-
foi-se ampliando o conceito de docu- em geral, na lógica do mercado. Nes- tendendo-o não apenas como veículo
mento histórico, que passou a ser en- se sentido, entende-se que a imprensa de comunicação, mas como portador e
tendido como resultado (in)consciente detém uma historicidade e peculiari- produtor de práticas e discursos. Para
das ações humanas, de modo que o dades próprias, devendo ser trabalhada tomar, portanto, o jornal como fonte é
pesquisador pode discutir sobre o pas- de modo a compreender as relações necessário conhecer o contexto de cria-
sado utilizando-se de artefatos (i)mate- entre imprensa e sociedade, bem como ção do periódico, sua linha editorial, os
riais, ou, conforme Le Goff (1996, p. os movimentos de constituição e insti- jornalistas contratados, os patrocinado-
540), “com tudo o que, pertencendo ao tuição do social que tal relação propõe res e anunciantes, no intuito de mapear
homem, depende do homem, serve o (CRUZ; PEIXOTO, 2007). os interesses e as relações de poder que
homem, exprime o homem, demonstra Ao utilizar o jornal como fonte, e permeiam a produção e circulação do
a presença, a atividade, os gostos e as aqui a reflexão de Darnton faz-se opor- periódico (SILVA; FRANCO, 2010).
maneiras de ser do homem”. tuna, é preciso pensar sua inserção Especificamente no ensino de His-
Nesse movimento, o jornal passa a histórica enquanto força ativa da vida tória, o trabalho com o jornal impresso
ser visto como uma fonte de pesquisa, moderna, muito mais ingrediente do adquire relevância, sendo sua impor-
que possibilita um olhar sobre as repre- processo do que registro dos aconte- tância discutida por diversos autores
sentações, os discursos e as relações de cimentos, atuando na constituição de (ZAMBONI, 1998; BITTENCOURT,
poder dos grupos sociais, influenciando modos de vida, perspectivas e consci- 2004; FARIA, 2009) e também pelos
a formação das identidades individuais ência histórica (DARNTON, 1990). documentos oficiais tais como os Parâ-
e coletivas. No entanto, é necessário Dessa maneira, deve-se ter em vista metros Curriculares Nacionais (BRA-
compreender que os jornais são pro- suas parcialidades, propósitos e múl- SIL, 1997) e as Diretrizes Curriculares

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Mulheres e relações de gênero

da Educação Básica (PARANÁ, 2008). A se modo, os jornais acabam sendo tomados Igreja Católica, de modo que o perfil do Jor-
utilização de diferentes linguagens no ensi- como meras fontes de informação, focando- nal reflete, de alguma forma, a orientação
no, no entanto, não deve ser encarada apenas se nos assuntos em pauta encarados, em mui- sociopolítica da instituição religiosa. Assim,
a partir do viés metodológico – com vistas tos casos, de forma descontextualizada, “[...] ao analisar as representações veiculadas no
a motivar o aluno ou para aproximar-se dos deslocados dos veículos e integrados, sem Jornal, entende-se que as questões políticas,
conhecimentos cotidianos –, mas sim como quaisquer mediações de análise, ao contex- econômicas e sociais que envolvem a re-
compreensão epistemológica da disciplina to macro da pesquisa.” (CRUZ; PEIXOTO, gião norte do Paraná são filtradas por uma
(BRUCE; FALCÃO; DIDIER, 2006), aten- 2007, p. 256). perspectiva vinculada à religião. Ao mesmo
tando-se para a relevância de tais materiais As Diretrizes Curriculares da Educação tempo, essas questões, que se apresentam
como fontes históricas e como elementos que Básica da disciplina de História (PARANÁ, inicialmente na esfera regional, devem ser
influenciam os processos de subjetivação e 2008) indicam a relevância de se observar as compreendidas tendo em vista a instabilida-
a construção das identidades individuais e especificidades na utilização de cada fonte de política e econômica vivida no país no pe-
coletivas. Nesse sentido, a utilização de di- histórica, buscando superar os usos mera- ríodo estudado, além das dinâmicas próprias
versas fontes no ensino de História visa fa- mente ilustrativos das diferentes linguagens. de um mundo em constante e intensa globa-
vorecer o desenvolvimento da consciência Para tanto, é fundamental que o docente aten- lização e cuja geopolítica está marcada pelo
histórica (RÜSEN, 1992, 2001), a aproxima- te para a relevância de cada tipo de material e desenrolar da Guerra Fria.
ção dos estudantes com os métodos de tra- dos procedimentos específicos para subsidiar
balho do historiador e o desenvolvimento da as ações, com o respaldo epistemológico ne-
autonomia para a leitura crítica da sociedade cessário.
(BITTENCOURT, 2004).
De acordo com Cruz e Peixoto (2007), as
orientações dos documentos oficiais, como os
Parâmetros Curriculares Nacionais e as Dire- O Jornal Folha do Norte do Paraná foi,
trizes Curriculares para a Graduação em His- durante as décadas de 1960 e 1970, a princi-
tória, têm apontado a relevância do trabalho pal mídia impressa da região norte do estado,
com diversas fontes documentais, tanto na de caráter comercial e de ampla circulação.
pesquisa acadêmica quanto no ensino da dis- Pode ser caracterizado como um periódico
ciplina. No entanto, embora esse movimento de temática livre (SILVA; FRANCO, 2010),
tenha incentivado a utilização das diferentes com assuntos diversificados, apresentando
linguagens no ensino e na pesquisa, poucos conteúdos (in)formativos, notícias, opiniões
são os estudos acerca dos procedimentos te- e análises, anúncios e propagandas. Ao mes-
órico-metodológicos necessários para o tra- mo tempo, seus proprietários, equipe e linha
balho especificamente com a imprensa. Des- editorial mantinham estreita ligação com a

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Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Sugestões de Leitura

FARIA, Maria Alice. Como usar o jornal na sala de aula.


São Paulo: Contexto, 2009.

CRUZ, Heloisa de Faria; PEIXOTO, Maria do Rosário da


Cunha. Na oficina do historiador: conversas sobre história
e imprensa. Revista Projeto História, São Paulo, n. 35, p.
253-270, dez. 2007. Disponível em: http://revistas.pucsp.
br/index.php/revph/article/view/2221/1322

SILVA, Ana Cristina Teodoro da. Introdução à análise das


imagens de imprensa. In: PÁTARO, Cristina; MEZZO-
MO, Frank.; HAHN, Fabio (orgs.). Instituições e socia-
bilidades: religião, política e juventudes. Campo Mourão:
Editora Fecilcam, 2013, p. 103-122.

SILVA, Márcia Pereira; FRANCO, Gilmara Yoshihara.


Imprensa e política no Brasil: considerações sobre o uso do
jornal como fonte de pesquisa histórica. Revista História
em Reflexão, Dourados, v. 4, n. 8, p. 1-11, jul./dez. 2010.
Disponível em: http://www.periodicos.ufgd.edu.br/index.
php/historiaemreflexao/article/view/941/575

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Mulheres e relações de gênero

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Mulheres e relações de gênero

3 O Jornal Folha do
Norte do Paraná

O Jornal Folha do Norte do Paraná, cesano de Maringá (ROBLES, 2007; o Jornal, ainda no início da década de
que representa parte do patrimônio ima- PAULA, 2009). 1960. Além de serem poucos os profis-
terial produzido pela Igreja Católica da O Jornal esteve em circulação em sionais que atuavam na área, o bispo
diocese de Maringá – sede Provincial mais de 90 cidades, abrangendo sobre- não desejava contratar os aqueles que
–, constituiu-se como a principal mí- tudo capelas, paróquias e dioceses de trabalhavam no O Jornal de Maringá,
dia impressa da Igreja Católica na re- Campo Mourão, Paranavaí e Umuara- a fim de não criar desentendimentos
gião norte do Paraná, entre as décadas ma, pertencentes à Província Eclesi- com o concorrente e, principalmente,
de 1960 e 1970. Foi fundado no ano de ástica de Maringá, além de manter su- porque desejava que a Folha do Norte
1962, pelo arcebispo Dom Jaime Luiz cursais em capitais como Curitiba, São fosse uma novidade, uma grande ino-
Coelho, e teve suas atividades encerra- Paulo e Florianópolis. vação em relação à imprensa na cidade
das em 1979. Desde sua fundação, a Folha do Nor- de Maringá. Dom Jaime também sabia
Conhecido como o Jornal do Bispo, te do Paraná teria defendido e servido que grandes profissionais da capital,
a Folha do Norte do Paraná era o se- aos interesses dos militares, atuando Curitiba, não trabalhariam em um jor-
gundo maior jornal da região. Dom Jai- ainda contra o comunismo e em defesa nal que estava nascendo. Assim, os pri-
me não tinha intenção de ganho finan- da moral e dos bons costumes (PAULA, meiros funcionários da Folha do Norte
ceiro ou político, sendo que o periódico 2009). Dom Jaime pedia aos católicos do Paraná eram da própria cidade de
foi criado a princípio para propagar a que permanecessem na fé cristã para Maringá, e tratavam-se, em sua maio-
fé cristã, combater o jornal esquerdis- não cair no assédio dos que encoraja- ria, de padres da diocese, radialistas da
ta de Samuel Wainer, o Última Hora, e vam mudanças políticas e econômicas Cultura e Difusora e estudantes do cur-
o movimento comunista em expansão em descompasso com a compressão da so científico – dentre eles Frank Silva,
na região. Qualquer ganho financeiro, Igreja Católica. repórter da Cultura e que assinou até
se houvesse, deveria ser encaminhado Dom Jaime teria encontrado dificul- 1973 uma coluna social do jornal.
para a construção do Seminário Dio- dades em montar a equipe para tocar No segundo semestre de 1962, foi

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Mulheres e relações de gênero

lançada uma edição experimental da Folha do das notícias chegava pela agência de notícias 7 mil exemplares. Mesmo nessa fase, a pre-
Norte do Paraná, sem data e expediente, com- Transpress, que esteve em Maringá até 1965. sença do discurso religioso cristão se faz pre-
posto por oito colunas, seguindo o modelo de Já as notícias nacionais e esportivas chega- sente, muita das vezes, pela voz onipresente
jornal da época, títulos em caixa alta e alguns vam através do rádio. do bispo da diocese Dom Jaime Coelho, que
na cor azul (na capa e última página) – o que Em 25 de setembro de 1962, foi lançada a permaneceu como presidente-proprietário do
era uma novidade no interior do estado. Den- edição de número 1 da Folha do Norte do Pa- Jornal, além de outros porta-vozes do sagra-
tre as colunas publicadas estavam a de espor- raná, que não trazia grandes novidades em re- do, como padres e lideranças religiosas vin-
tes e a Folha Feminina, esta última escrita, lação à edição experimental, com a manchete culadas a setores eclesiásticos, congregações
embora não assinada, por Irene Mota. “Estação Ferroviária não tem condições para e dioceses de outras regiões do Brasil (RO-
A edição experimental trazia uma exalta- funcionar: lama”. BLES, 2007, p. 214). Após a saída de Dutra,
ção a John Kennedy, presidente dos Estados o jornal foi arrendado para Jorge Fregadolli e
Unidos, menção a tragédias que ocorreram seu grupo, que manteve a mesma linha edito-
rial até 1979, quando as atividades da Folha
pelo mundo, além de críticas ao então pre-
do Norte do Paraná foram encerradas.
feito de Maringá, João Paulino. Grande parte

Jornal Folha do Norte do Paraná, primeira página (parte


superior) da Edição n. 1, publicada em 25 de set. de 1962.
Fonte: Acervo do Grupo de Pesquisa Cultura e Relações
de Poder.

No período de 1964 a 1973, o jornal es-


teve sob a administração de Joaquim Dutra,
quando o periódico passa a ser mais dinâmi-
co, com várias colunas assinadas, utilização
Edição experimental do Jornal Folha do Norte do Paraná,
frequente do recurso fotográfico, aumento na
publicada no 2º semestre de 1962. quantidade de anúncios, valorizando notícias
Fonte: http://jornaldobispo.blogspot.com.br/ (PAULA, 2009). regionais e alcançando uma tiragem diária de
22
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

A imprensa no Brasil e sua modernização a


partir da década de 1960

TEXTO 01

A história do Brasil é repleta de peculia- a vida da colônia, que se torna sede da mo- táxis. E mais recentemente a internet criou
ridades. Nossa Independência foi declarada narquia portuguesa. Às tão citadas abertura outras formas de embalar e fazer circular a
pelo filho do imperador português. Passa- dos portos e fundação do Banco do Brasil, informação. [...]
mos a maior parte do século XIX sob uma somou-se a menos propalada criação da Im- A nação brasileira nasce e cresce com a
Monarquia, enquanto o resto do continente pressão Régia, responsável, a médio prazo, imprensa. Uma explica a outra. Amadure-
era republicano. Assim, não é de espantar pela impressão dos vários periódicos em ter- cem juntas. Os primeiros periódicos iriam
que o primeiro jornal brasileiro tivesse sido ras brasileiras. Somente me São Paulo foram assistir à transformação da Colônia em Im-
publicado em... Londres. De fato, o Correio registrados cerca de 1.500 títulos no fim do pério e participar intensamente do processo.
Brasiliense surgiu em 1808. Oposicionista e século XIX. Em geral, jornais simples, com A imprensa é, a um só tempo, objeto e su-
crítico, o periódico era feito na Inglaterra, duas páginas, eles foram ganhando simpatia jeito da história brasileira. Tem certidão de
mas discutia os problemas da Colônia e atra- da população letrada. Hoje, há títulos para nascimento lavrada em 1808, mas também é
vessava o Atlântico para circular por aqui. todos os gostos. Há jornais novos, outros veículo para a reconstrução do passado.
Assim, no mesmo ano em que a Corte por- que começaram a circular ainda no Império.
tuguesa transferiu-se para o Rio de Janeiro Há revistas de informações gerais, outras
fugindo de Napoleão, o jornal idealizado e voltadas a nichos específicos. Há, também, Fonte: MARTINS, Ana Luiza; LUCA, Ta-
realizado por Hipólito da Costa, disponível variedade de preço e formas diversas de dis- nia Regina de. Introdução: pelos caminhos
a nobres e plebeus do Novo Mundo. Estava tribuição, que vão da entrega em semáforo a da imprensa no Brasil. In: _____ (orgs.).
longe de ser um beija-mão dos poderosos. domiciliar, passando pela venda em bancas. História da imprensa no Brasil. 2 ed. São
A diversidade de títulos começaria logo. Não é de hoje que há publicações colocadas Paulo: Contexto, 2012, p. 7-8.
A chegada da Corte mudaria radicalmente à disposição em consultórios, aviões e em

23
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

TEXTO 02

Ao mesmo tempo em que censuravam ondas em visibilidade e em tropodifusão na escrita, o rádio e a televisão já dependiam
matérias e interferiam no conteúdo da infor- Amazônia (nesse caso ainda não era possí- fundamentalmente da publicidade para so-
mação, os governos militares financiaram vel a transmissão da televisão, que só chega- breviver, e que os maiores anunciantes eram
a modernização dos meios de comunica- ria à região em 1975). Em 1965 foi também os órgãos estatais. Valorizando a eficiência
ção. Isso se explica porque, para eles, essa criado o Ministério das Comunicações, e em técnica e gerencial, o governo entregava sua
modernização era parte de uma estratégia 1972 a Telebrás, Telecomunicações Brasi- publicidade aos órgãos da mídia que tinham
ligada à ideologia da segurança nacional. leiras S/A, empresa pública federal respon- maior capacidade de circulação.
A implantação de um sistema de informa- sável pela coordenação dos serviços de tele- O contraponto da tendência à concentra-
ção capaz de “integrar” o país era essencial comunicações em todo o território nacional. ção os meios de comunicação foi o desapa-
dentro de um projeto em que o Estado era A criação da Embratel, com um plano de es- recimento de vários jornais. Alguns títulos
entendido como o centro irradiador de to- tações repetidoras e canais de microondas, tradicionais, jornais que haviam sido cria-
das as atividades fundamentais em termos permitiria a formação e a consolidação das dos entre o início do século e a década de
políticos. redes de televisão no país. [...] 1940, foram extintos.
A criação da Embratel, Empresa Brasi- A formação de grandes redes, estimula-
leira de Telecomunicações, pode ser vista das pelos militares, exigia investimentos.
como o símbolo desse projeto. A empresa Foi então que se assistiu à formação dos oli- Fonte: ABREU, Alzira Alves. A moderni-
foi criada em setembro de 1965 e deu início gopólios da informação, com recursos obti- zação da imprensa (1970-2000). Rio de Ja-
à instalação da rede básica de telecomuni- dos junto ao governo. Não se deve esquecer neiro: Jorge Zahar Ed., 2002, p. 15-17.
cações, implantando os sistemas de micro- que nos anos de regime militar a imprensa

24
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

TEXTO 03

Dois fatores parecem ter sido decisivos o preço do papel de jornal. consequente aumentou do custo de produ-
para o processo de concentração das em- Nos primeiros anos da década de 1960 ção dos jornais, empresas jornalísticas que
presas jornalísticas: um de ordem política; houve uma queda no ritmo de crescimento até então viviam sobretudo de venda avulta e
outro, econômica. O primeiro está relacio- da publicidade no Brasil, reflexo inevitável de assinatura passaram a depender das recei-
nado ao avanço das forças conservadores, da crise política e econômica por que passa- tas publicitárias. As que não foram capazes
que passaram a controlar o país a partir de va o país. Ademais, parcela da antiga receita de atrair anunciantes não sobreviveram no
1964. O regime militar [...] interveio dire- publicitária – sobretudo aquela destinada à competitivo mercado que se firmava então.
tamente na atividade jornalística (mediante promoção dos produtos de grande consumo
leis de imprensa e profissionalização) e de – começou a se transferir para a televisão.
impostos, subsídios e preços de insumos e [...] Fonte: RIBEIRO, Ana Paula Goulart. Moder-
matérias-primas, além disso, o Estado ma- Frente a essa conjuntura, a modernização nização e concentração: a imprensa carioca
nipulava as verbas publicitárias dos órgãos técnico-administrativa do jornalismo talvez nos anos 1950-1970. In: NEVES, Lúcia Ma-
do governo e pressionava os anunciantes a tenha sido o mais decisivo elemento do êxi- ria Bastos P.; MOREL, Marco; FERREIRA,
recusar determinados veículos, não simpáti- to de alguns jornais. Apesar de todos terem Tania Maria Bessone da C (orgs.). História
cos ao regime. sido afetados de alguma forma pela crise e imprensa: representações culturais e prá-
Do ponto de vista econômico, o proces- econômica, os maiores, mais organizados tica de poder. Rio de Janeiro: DP&A, Faperj,
so de concentração empresarial decorreu de administrativamente e mais eficientes tive- 2006, p. 430-431.
uma aguda crise por que passou a imprensa ram melhores condições de atravessá-las. À
devido a um conjunto de fatores (alguns ma- medida que alguns jornais se modernizavam,
croestruturais, outros conjunturais), como a tornavam-se mais aptos a ganhar a corrida
queda do volume de publicidade, o desen- concorrencial, cada vez mais acirrada.
volvimento da televisão e os problemas com Por outro lado, com a modernização, e o

25
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

Os fragmentos dos textos apresentados acima oferecem um rápido panorama sobre a história da imprensa no Brasil, sua importân-
cia na construção da identidade brasileira e sua contribuição como fonte histórica. Com base nos textos e pesquisa complementar,
responder:

● Apresentar alguns fatos históricos que marcaram o processo da instalação da imprensa no Brasil desde o século XIX.

● Durante as décadas de 1960 e 1970 a imprensa brasileira teria sofrido fortes interferências políticas e econômicas. Quais
influências e heranças, inclusive na sua modernização, teriam deixado para as décadas seguintes?

● Por que a imprensa pode contribuir para se conhecer a história do Brasil?

26
Mulheres e relações de gênero

4 Década de 1960

No contexto brasileiro, a década de das em função da Guerra Fria, além mentos de publicação diária e sema-
1960 representa uma fase de instabi- do movimento da contracultura que nal, assim como esteve sob a direção
lidade política e transição do período se organiza com manifestações de de membros ligados diretamente à
democrático para a instauração do Re- protesto, em especial dos segmentos Igreja Católica e noutros por pro-
gime Militar, em 1964, que provocou juvenis, contra uma sociedade con- fissionais liberais (PAULA, 2009).
grandes transformações na sociedade servadora. Especificamente para as Ainda nesse período, o jornal man-
e se estendeu até meados da década discussões acerca do gênero, os anos teve, em determinados momentos,
de 1980. de 1960 representam um momento de sucursais nos municípios de Curitiba,
Em paralelo, é possível perceber grande relevância, com a “explosão Londrina e Paranavaí, além de repre-
modificações no cenário econômi- do feminismo” (SOIHET; PEDRO, sentantes comerciais em capitais de
co do país, e em especial no Paraná, 2007), os questionamentos em torno outros estados como São Paulo e Flo-
quando começam a ser notados os do controle legal da procriação e a rianópolis.
primeiros passos de um processo de parcela cada vez maior de mulheres Ao lado da estruturação do jornal,
industrialização, de urbanização e de que ingressavam no mercado formal salienta-se o momento eclesiástico
investimento no agronegócio. Im- de trabalho (ROSA, 2009). pelo qual passava a recém-criada dio-
pulsionado pelas políticas do estado, Com relação ao Jornal Folha do cese de Maringá (1956): ampliação
esse movimento, que atinge seu auge Norte do Paraná, é importante não dos serviços religiosos, como orga-
na década de 1970, trouxe profundas perder de vista – conforme abordado nização de capelas e paróquias, insti-
modificações nas formas de organiza- anteriormente – que a década de 1960 tucionalização de diretrizes e normas
ção da sociedade. engloba os primeiros anos da funda- eclesiásticas, definição de plano de
No cenário mundial, na década de ção, difusão e consolidação do jornal, pastoral, entre outros, e a criação da
1960 destaca-se, sobretudo todo o que se iniciou em setembro de 1962. Frente Agrária Paranaense, iniciativa
conflito, tensão e especulações gera- Durante esse período, intercalou mo- de Dom Jaime Coelho, cuja intenção

27
Mulheres e relações de gênero

foi inibir a expansão do sindicalismo de No período ocorre, ainda, a realização possível identificar os ventos de renovação
inspiração comunista no norte do Paraná do Concílio Vaticano II (1962-1965), even- da Igreja oriundos de tais transformações,
(DIAS; GONÇALVES, 1999). O jornal, ao to intra-eclesie que impulsionou profundas bem como analisar as mudanças e perma-
que parece, é utilizado como veículo privi- mudanças litúrgicas e sociais no Brasil e no nências impulsionadas pelo Concílio Vati-
legiado na defesa dos interesses da Igreja e mundo. Estando o Jornal Folha do Norte do cano II, enfatizando as possíveis inovações
de grupos sociais da região. Paraná vinculado à Igreja Católica, torna-se da Igreja Católica no Brasil.

Alguns eventos que marcaram a década de 1960 no Brasil e no mundo, retratados pelo Jornal Folha do Norte do Paraná

■ Concílio Vaticano II (1962-1965) ■ Conflitos entre Estados Unidos e União Soviética (Guerra Fria)

22 nov. 1962 08 dez. 1965

25 out. 1962

11 jan. 1963

06 ago. 1964
08 dez. 1965

04 abr. 1968

28
Mulheres e relações de gênero

■ Política no estado do Paraná e no Brasil

02 abr. 1963

04 mar. 1964

27 fev. 1966

26 mar. 1964

14 abr. 1967

16 maio 1965

15 mar. 1967
14 ago. 1969

29
Mulheres e relações de gênero

■ Religião e sociedade

21 dez. 1966

05 jan. 1963

08 abr. 1967

08 ago. 1967

■ Regime militar e política

22 jan. 1966
02 jun. 1966

14 dez. 1968
22 jan. 1967

17 jan. 1969

30
Mulheres e relações de gênero

Parte II
Representações da mulher
no Jornal Folha do Norte do Paraná

31
Mulheres e relações de gênero

32
Mulheres e relações de gênero

5 Mulher e propaganda

No Jornal Folha do Norte do Para- lise das propagandas presentes no Jor- lheres. As propagandas publicadas no
ná, as propagandas estavam dispostas nal durante a década de 1960 permite Jornal são em geral referentes a veícu-
ao longo de todo o caderno, em geral identificarmos a intensificação dos pro- los, serviços e peças para automóveis,
na parte inferior das páginas, de tama- cessos de urbanização, industrialização máquinas, equipamentos e insumos
nhos variados e apresentando textos e e modernização pelos quais passavam agrícolas, cigarros, lâminas e apare-
figuras (fotografia ou desenhos). Por o Brasil e o estado do Paraná. lhos de barbear (que a partir de 1964
sua característica comercial, o Jornal Durante os primeiros anos de circu- são ofuscados pelos barbeadores elé-
trazia anúncios de diversos produtos e lação do periódico, em 1962 e 1963, tricos). As imagens a seguir ilustram
estabelecimentos, e de diferentes anun- pode-se afirmar que praticamente não o tipo de propaganda que representa
ciantes regionais e nacionais. Uma aná- há propagandas direcionadas às mu- esse período:

16 out. 1962 05 mar. 1963

33
Mulheres e relações de gênero

venda de produtos voltados para o homem,


o “chefe de família”. A propaganda a se-
guir, por exemplo, faz alusão ao homem
que tem a mulher (esposa) e os filhos “em
suas mãos”. O anúncio, cuja intenção é co-
mercializar um título de sócio-proprietário
de um hospital, fortalece a representação
da mulher enquanto mãe e dependente do
marido, ao mesmo tempo em que o homem
aparece como provedor e responsável pelo
sustento da família.

11 dez. 1962

15 dez. 1963 19 mar. 1963

29 nov. 1962

As propagandas a seguir trazem implí-


cita essa mesma relação de dependência. A
baixa frequência de propagandas que têm
a mulher como público alvo dos produtos
20 out. 1962 anunciados indica ainda que, nesse perío-
do, a mulher não era tida como potencial
Com relação aos conteúdos que, de al- taque a algumas das propagandas publica- consumidora – realidade que, ao que de-
guma forma, faziam referência à mulher, das. Nesses (poucos) casos, a imagem da monstra o Jornal Folha do Norte do Paraná,
ainda nos anos de 1962 e 1963, cabe des- mulher é sempre utilizada para reforçar a começa a se modificar nos anos seguintes.
34
Mulheres e relações de gênero

cos novos estabelecimentos


comerciais e novos produtos
começam a se fazer presentes
nas propagandas publicadas,
fazendo uso cada vez mais de
imagens – fotografias, logoti-
pos e não mais apenas textos
e desenhos. Essa realidade re-
gional está em sintonia com
o contexto desenvolvimentis-
ta pelo qual passava o Brasil,
com ênfase na valorização da
mentalidade consumidora, na
oferta de novos produtos e
bens de serviços, que passam
a configurar novos padrões de
consumo doméstico (MELLO;
NOVAIS, 2006).
22 dez. 1963
Nesse contexto, é impor-
A partir dos anos de 1964 e 1965 – e cada tante ressaltar que cada vez mais a mulher
vez com maior frequência nos anos posterio- passa a ser alvo dos produtos comercializa-
res – passam a se intensificar as propagan- dos e dos serviços oferecidos. As propagan-
das comerciais publicadas no Jornal Folha das vão, aos poucos, fazendo cada vez mais
do Norte do Paraná. Além de mais frequen- uso da imagem feminina, em mensagens
tes, é possível perceber algumas mudanças que têm como destinatária a própria mulher,
tanto no que diz respeito à produção dos enquanto público alvo dos anúncios publi-
anúncios quanto no que tange aos produ- cados.
tos e serviços divulgados. São os reflexos Podemos afirmar que as propagandas
da modernização – inclusive da imprensa presentes no Jornal que são direcionadas às
– fazendo-se cada vez mais presentes nas mulheres estão relacionadas a cuidados com
páginas do Jornal. Roupas, calçados e aces- o lar e os filhos, em anúncios de produtos ou
sórios, móveis e decorações, eletrodomésti- serviços que se ligam ao espaço e à função
06 ago. 1963
cos, automóveis, discos e filmes... aos pou- destinados à mulher na sociedade.

35
Mulheres e relações de gênero

07 set. 1969 09 abr. 1968

A propaganda traz a mulher ao lado de tentamento diante das facilidades trazidas Já na propaganda de supermercado, po-
utensílios domésticos como liquidificador, pelos “fabulosos produtos” que estão “pre- demos ver uma mulher com uma criança,
ferro elétrico de passar roupa, enceradeira, sentes em mais de 5 milhões de lares brasi- escolhendo um detergente em pó na seção
entre outros. A mulher apresenta-se sorri- leiros”. Ao final, a propaganda arremata: “o de produtos de limpeza. Mais uma vez, a
dente, radiante e elegante, denotando con- que é que falta para você?”. mulher é utilizada na propaganda associan-

36
Mulheres e relações de gênero

do sua função ao mundo privado, domésti- Outras propagandas, a seguir, ilustram esse
co, onde teria a responsabilidade pelo cui- movimento, que passa a ver nas mulheres um
dado dos filhos e marido. novo e promissor público consumidor.

08 jan. 1969

24 maio 1966

13 jun. 1967

37
Mulheres e relações de gênero

13 jun. 1969 23 nov. 1968

01 set. 1968 01 maio 1969

38
Mulheres e relações de gênero

Ainda com relação às propagandas pre- produtos lançados e comercializados. incentivar a venda e o consumo de produ-
sentes no Jornal, ganham destaque aquelas Por fim, cabe apontar que a utilização tos e serviços em que a mulher é a principal
que anunciam produtos e serviços referen- da imagem da mulher nos anúncios apre- interessada. Ninguém melhor para ajudar
tes aos cuidados com a beleza e o corpo da sentados traz uma representação de alguém a vender produtos domésticos do que elas,
mulher. Essa preocupação se reflete de for- dedicada ao lar e à família, associando a que vão comprá-los e utilizá-los em seu lar.
ma cada vez mais intensa nos anúncios pu- figura feminina como a responsável pelos A este respeito, Miguel (2012) afirma que
blicados, nos estabelecimentos comerciais cuidados domésticos. Assim, a recorrência essas propagandas:
que passam a se instalar nas cidades e nos a esta representação parece adequada para

apresentam um retrato da função social es-


perada pelas mulheres da época, função esta
diretamente vinculada ao cuidado de si, ao cui-
dado da casa e ao cuidado dos outros, incluin-
do, aí, os filhos e o marido. Indicando, dessa
forma, o papel social vinculado às mulheres
nesta época: ser esposa e mãe. (MIGUEL,
2012, p. 222).

14 out. 1967

12 jun. 1964 09 maio 1968

39
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

● Na sequência são apresentados dois fragmentos de textos de autoria de Margareth Rago e Carla Pinsky. Após a leitura, fazer uma aná-
lise das representações da mulher presentes nas propagandas das páginas 36 a 39 e responder: que relações é possível estabelecer entre
as mudanças ocorridas ao longo da década de 1960 e a imagem da mulher que passa a ser veiculada nas propagandas?

Exercício

Representações da mulher nas propagandas da década de 1960

TEXTO 01

De modo geral, no momento em que a esposa-mãe-dona de casa e de seus filhos.Os foi fortemente valorizada, enquanto nas artes
industrialização absorveu várias das ativi- positivistas, os liberais, os médicos, a Igre- a figura da “mulher fatal”, poderosa, amea-
dades outrora exercidas na unidade domés- ja, os industriais e mesmo muitos operários çadora e demoníaca, como Salomé, invadia
tica – a fabricação de tecidos, pão, manteiga, anarquistas, socialistas e, posteriormente, os o palco e fazia grande sucesso.
doces, vela, fósforo – desvalorizou os servi- comunistas incorporaram o discurso de va- Fonte: RAGO, Margareth. Trabalho femini-
ços relacionados ao lar. Ao mesmo tempo, lorização da maternidade, progressivamente no e sexualidade. In: DEL PRIORE, Mary
a ideologia da maternidade foi revigorada associado ao ideal de formação da identidade (org.). História das mulheres no Brasil.
pelo discurso masculino: ser mãe, mais do nacional. Nos anos 20 e 30, a figura da “mãe São Paulo: Contexto, 2010, p. 591-592.
que nunca, tornou-se a principal missão da cívica” passa a ser exaltada como exemplo
mulher num mundo em que se procurava es- daquela que preparava física, intelectual e
tabelecer rígidas fronteiras entre a esfera pú- moralmente o futuro cidadão da pátria, con-
blica, definida como essencialmente mascu- tribuindo de forma decisiva para o engrande-
lina, e a privada, vista como lugar natural da cimento da nação. A imagem de Santa Maria

40
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

TEXTO 02

Se o trabalho doméstico nunca é fácil, na trar) tudo isso com um sorriso nos lábios. va mais ter a casa limpa, era preciso também
virada do século XIX para o XX, era ain- À medida que as casas passavam a contar enfeitá-la com cortinas e almofadas. Já era
da mais pesado. Todas as tarefas cotidianas, com eletricidade, gás e água encanada, a vida pouco simplesmente matar a fome dos fa-
mesmo as mais banais, tomavam muito tem- das donas de casa objetivamente melhorava. miliares, era necessário confeccionar pratos
po e energia: carregar lenha, acender o fogo, Os ambientes ficaram mais limpos, os ali- variados e mais elaborados. Não era sufi-
transportar água, processar alimentos, cozi- mentos e a água livres de contaminação por ciente limpar as panelas, agora elas tinham
nhar, ajoelhar-se para esfregar o chão, esva- dejetos, os móveis menos empoeirados, as que brilhar. Louças, tapetes, vasos e bibelôs
ziar penicos, lavar toda a roupa (de lençóis roupas menos encardidas. Os lares ganha- tomaram o tempo poupado de antigas ta-
a paninhos higiênicos) à mão, ferver, esfre- ram chuveiros, privadas, descargas, lâmpa- refas domésticas que não precisavam mais
gar, bater, quarar, estender, passar a ferro das. A pasteurização aumentou a segurança ser feitas. O desempenho da dona de casa
quente com brasas, engomar... Também era alimentar. Aos poucos, o crescimento da passou a ser julgado por novos critérios no
preciso fazer sabão e confeccionar as vesti- indústria do vestuário e o consequente bran- momento em que a aparência do interior do-
mentas mais comuns. O pão, a manteiga, as queamento da confecção de roupas livraram méstico ganhou relevância ao se tornar uma
geleias, as compotas e, frequentemente, os as donas de casa de terem que produzi-las. vitrine do status da família para as visitas,
embutidos e os defumados eram produzidos Contudo, elas continuavam encarregadas os hóspedes, os colegas ou sócios do chefe
em casa. Mesmo nas cidades, quando havia dos remendos, bordados e enfeites que não da casa.
quintais, as famílias tinham galinhas, por- só diferenciavam as roupas como exibiam,
cos e uma horta caseira – fontes importantes aos olhos de todos, a ventura de se ter em Fonte: PINSKY, C. B. A era dos modelos
de alimento – sob os cuidados femininos. A casa uma “mulher prendada”. rígidos. In: PINSKY, C. B.; PEDRO, J. M.
“boa dona de casa” não tem preguiça, é tra- Com as novidades, a figura da “dona de (orgs.). Nova história das mulheres. São
balhadeira e dá conta de fazer (ou adminis- casa perfeita” adquiriu sutilezas. Não basta- Paulo: Contexto, 2012, p. 496.

41
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício Exercício

Propaganda e sensualidade da mulher


O apelo à sensualidade presente nas representações da mu-
lher que emergem de determinadas propagandas parece ser
utilizado como forma de chamar a atenção do homem para
o produto anunciado. Segundo Beleli (2007, p. 198), “alu-
sões à sexualidade são estímulos que prendem a atenção do
consumidor.” Para Vestergaard e Schrøder (2004), a utiliza-
ção da imagem feminina nas propagandas

comprova que as características femininas mais


apreciadas pelos homens são o reconhecimento da
inferioridade e da dependência, assim como a pron-
ta disposição em servi-los. [...] Os anúncios de “pro-
dutos” mais comuns também atendem à predileção
masculina por moças sexualmente submissas, muito
embora a associação entre o produto e mulheres
sensuais tenha de ser inferida pelo leitor a partir
de alusões visuais ou verbais. (VESTERGAARD;
SCHRØDER, 2004, p. 157).
09 out. 1970

● A partir das considerações acima, analisar a propagan- ● A partir das considerações acima, analisar a propaganda
da da “Cerveja Antarctica” publicada no Jornal Folha do da “Cerveja Polka” publicada no Jornal Folha do Norte do
Norte do Paraná em 1969. Procurar observar: quais as Paraná em 1970. Procurar observar: quais as característi-
características que emergem da mulher representada? cas que emergem da mulher representada? Qual as rela-
Qual a relação que parece se estabelecer entre ela e o ções que são construídas entre ela e a cerveja anunciada?
homem presente na imagem?

42
Mulheres e relações de gênero

6 Mulher e trabalho

No Brasil, segundo dados do IBGE em geral associadas a atividades que No trecho acima, fica evidente que
(2012), as mulheres recebem salários seriam mais adequadas a seus dons na- as relações entre a mulher e o espa-
cerca de 70% menor do que o dos ho- turais – de afeto, cuidado, asseio – e, ço do trabalho formal não se dão sem
mens, mesmo tendo o mesmo nível – portanto, de menor prestígio e valori- conflitos e preconceitos a serem supe-
ou até superior– de escolarização. Essa zação econômica. rados.
constatação se faz presente na atualida- No cenário do desenvolvimento so-
de, ainda que, nas últimas décadas, te- cioeconômico ocorrido no Brasil após
nha ocorrido um importante acréscimo a II Guerra Mundial, a inserção da mu-
na quantidade de mulheres que desem- lher no mercado de trabalho foi se dan-
penham um trabalho remunerado – as do paulatinamente, conforme apontam
mulheres constituem 46,1% da popu- Mello e Novais:
lação economicamente ativa no Brasil
A mulher de classe média vai chegando com
(IBGE, 2012). O Gráfico 1, na página muito esforço à universidade, vencendo a opo-
seguinte, traz os dados referentes ao sição dos pais, às vezes até do noivo ou do
ano de 2011 que comprovam esta afir- “namorado firme”. O preconceito contra sua
presença nas escolas mais importantes, de di-
mação. reito, medicina ou engenharia, ainda era mui-
Assim, ainda que ingressem ao mer- to grande. Natural, portanto, que se dirigisse
predominante às faculdades de filosofia, com o
cado de trabalho, as mulheres encon- objetivo de ingressar no professorado de giná-
tram maiores dificuldades do que os sio, do curso clássico ou científico, uma ocupa-
homens. Além de salários inferiores, ção, aliás, já transformada em feminina. Mas a
maioria das moças de classe média continuava
enfrentam preconceitos para ocupar professora primária, uma “segunda mãe” do
cargos de chefia e decisórios, atuar em “segundo lar”, a escola. (MELLO; NOVAIS,
2006, p. 596).
carreiras tipicamente masculinas e são

43
Mulheres e relações de gênero

Gráfico 1

R$ 2.467,49
Rendimento médio real habitual da população ocupada,
por grupos de anos de estudo, segundo o sexo - 2011*

R$ 1.706,39
R$ 1.111,12
R$ 1.045,24
R$ 927,52
R$ 812,73

R$ 734,91
R$ 640,08
R$ 570,18
R$ 555,65

Homens

Mulheres

Sem instrução e 1 a 3 anos 4 a 7 anos 8 a 10 anos 11 anos ou mais


menos de 1 ano

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal de Emprego 2003-2011.
Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/trabalhoerendimento/pme_nova/Mulher_Mercado_Trabalho_Perg_Resp_2012.pdf
* Média das estimativas mensais.

44
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

Trabalho feminino e conquista do espaço público no Brasil


● O texto a seguir trata do trabalho feminino no Brasil durante o processo de industrialização do país, em especial na primeira metade
do século XX. Já o Texto 02 apresenta reflexões sobre a inserção da mulher no espaço público diante de uma sociedade andrógena. Os
dois materiais possibilitam algumas reflexões acerca dos desafios enfrentados por mulheres no Brasil.

TEXTO 01

O que mais chama a atenção quando ten- social. No discurso de diversos setores so- visão está associada, direta ou indiretamen-
tamos visualizar o passado da mulher traba- ciais, destaca-se a ameaça à honra feminina te, à vontade de direcionar a mulher à esfera
lhadora não é o discurso de vitimização, tão representada pelo mundo do trabalho. Nas da vida privada.
enfático e recorrente na imprensa operária denúncias dos operários militantes, dos mé-
– que procurava, em geral, “formar” o tra- dicos higienistas, dos juristas, dos jornalis-
balhador, conscientizando-o e chamando-o tas, das feministas, a fábrica é descrita como Fonte: RAGO, Margareth. Trabalho femini-
para a luta revolucionária. O que salta aos “antro da perdição”, “bordel” ou “lupanar”, no e sexualidade. In: DEL PRIORE, Mary
olhos é a associação frequente entre a mu- enquanto a trabalhadora é vista como uma (org.). História das mulheres no Brasil.
lher no trabalho e a questão da moralidade figura totalmente passiva e indefesa. Essa São Paulo: Contexto, 2010, p. 585.

45
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

TEXTO 02

Vimos aqui uma parcela das trabalha- foram definidos códigos sociais e morais, nal dotado de capacidade intelectual e moral
doras que ajudaram a construir o país nas noções de certo e de errado, assim como a para a direção dos negócios da cidade. Pelo
primeiras décadas do século XX. Eviden- legislação trabalhista que deveria reger por menos até a década de sessenta, acreditava-
temente, as mulheres pobres não estavam muitas décadas as relações de trabalho com se que a mulher, sendo feita para o casamen-
apenas nas indústrias do Sudeste. Muitas consequências nos lares e na vida social. O to e para a maternidade, não deveria fumar
estavam no campo, trabalhando nas planta- espaço público moderno foi definido como em público ou comparecer a bares e boates
ções e colheitas, em fazendas e em outros esfera essencialmente masculina, do qual as desacompanhada, e a política ainda era con-
tipos de propriedade rural. Nas cidades, elas mulheres participavam apenas como coadju- siderada assunto preferencialmente masculi-
trabalhavam também no interior das casas – vantes, na condição de auxiliares, assisten- no.
como empregadas domésticas, lavadeiras, tes, enfermeiras, secretárias, ou seja, desem- Muitas mulheres trabalhadoras e, espe-
cozinheiras, governantas –, em escolas, es- penhando as funções consideradas menos cialmente, as feministas, têm lutado nas úl-
critórios, lojas, hospitais, asilos ou, ainda, importantes nos campos produtivos que lhes timas três décadas pela construção de uma
circulavam pelas ruas como doceiras, ven- eram abertos. esfera pública democrática. Elas querem
dedoras de cigarros e charutos, floristas e As autoridades e os homens de ciência afirmar a questão feminina e assegurar a con-
prostitutas. Entre as jovens que provinham do período consideravam a participação quista dos direitos que se referem à condição
das camadas médias e altas, muitas se tor- das mulheres na vida pública incompatível de mulher. Por isso mesmo, é importante que
navam professoras, engenheiras, médicas, com a sua constituição biológica. Os ar- possamos estabelecer as pontes que ligam as
advogadas, pianistas, jornalistas, escritoras gumentos criados ou reproduzidos e até as experiências da história recente com as do
e diretoras de instituições culturais, como a classificações preconceituosas que pregaram passado, acreditando que nos acercamos de
famosa feminista Bertha Lutz. Aos poucos, converteram-se em códigos que aos poucos um porto seguro e nos fortalecemos para en-
as mulheres iam ocupando todos os espaços passaram a reger as relações entre os sexos, frentar os inúmeros problemas do presente.
de trabalho possíveis. bem como entre as diferentes classes sociais
Falamos sobre a vida das operárias nas e grupos étnicos. Só muito recentemente a
fábricas criadas no começo de nossa indus- figura da “mulher pública” foi dissociada Fonte: RAGO, Margareth. Trabalho femini-
trialização, momento particularmente im- da imagem da prostituta e pensada sob os no e sexualidade. In: DEL PRIORE, Mary
portante para o futuro das mulheres no mun- mesmos parâmetros pelos quais se pensa o (org.). História das mulheres no Brasil.
do do trabalho, no Brasil. Nesse contexto, “homem público”, isto é, enquanto ser racio- São Paulo: Contexto, 2010, p. 603-604.

46
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

Mulheres e oferta de emprego


• Os anúncios a seguir trazem ofertas de emprego destinadas a mulheres durante o ano de 1965, publicados no Jornal Folha do Norte do
Paraná. Quando não estavam dispersos pelas páginas das edições, tais anúncios eram publicados na seção “Avulsos”, que ocupava, em ge-
ral, o canto direito da página 5, e trazia anúncios diversos referentes a compra e venda de imóveis, veículos e outras mercadorias, além de
ofertas de emprego e serviços. No material a seguir, é possível observar as ocupações que eram direcionadas explicitamente às mulheres.

03 jun. 1965

30 maio 1965
04 maio 1965

08 dez. 1965
23 jun. 1965
29 jun. 1965

29 jun. 1965 10 dez. 1965 23 dez. 1965 28 dez. 1965

● Ao analisar as ocupações e vagas disponíveis às mulheres, o que é possível observar?


● Realizar uma pesquisa nos Classificados de Jornais da atualidade, a fim de identificar quais as ocupações e vagas disponíveis às mulhe-
res. A partir desses dados, que diferenças e semelhanças podem ser observadas em relação à década de 1960?

47
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

Mulheres e oferta de emprego


Os dados da tabela a seguir são referentes ao estado do Paraná e foram obtidos a partir dos Censos realizados no Brasil nos anos de 1960
e de 2010:

1960 * 2010 **
N % N %
Homens 2.211.922 51,9% 5.128.503 49,1%
População do
Mulheres 2.051.799 48,1% 5.311.098 50,9%
estado do Paraná
Total 4.263.721 100% 10.139.601 100%

N % N %
55% do total de 61% do total de
Pessoas de 10 anos Homens 1.216.453 3.127.960
homens homens
ou mais de idade
9,6% do total de 46,3% do total de
economicamente Mulheres 197.007 2.460.003
mulheres mulheres
ativas
Total 1.413.460 33,2% da população 5.587.963 53,5% da população
* Disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/68/cd_1960_v1_t14_pr.pdf
** Disponível em: http://www.ibge.gov.br/estadosat/temas.php?sigla=pr&tema=censodemog2010_trab

Com base nos dados da tabela, é possível afirmar que, enquanto no ano de 1960 as mulheres representavam 14% da População Economi-
camente Ativa do estado do Paraná, em 2010 essa parcela se amplia para 44%.
● Que fatores estão relacionados a essas transformações ocorridas nos últimos anos?
● Quais as implicações decorrentes do ingresso da mulher no mercado de trabalho?

48
Mulheres e relações de gênero

7 Mulher e beleza

No período de 1962 a 1970, com exceção dos anos de 1965 e 1970, a Folha do Norte do Paraná manteve uma coluna
feminina, publicada diariamente ou semanalmente, a depender do período. A coluna era composta, em geral, por matérias
ilustradas direcionadas às mulheres. Ao longo da década de 1960, a coluna feminina do Jornal apresentou diferentes de-
nominações e formatos:

■ Folha Feminina
A coluna, publicada entre 1962 e 1967, era apresentada geralmente na página
6 ou 7, ocupando em torno de um quarto da página ou, em alguns momentos, a
página toda. Era organizada por duas ou mais matérias, por vezes com fotos. Em
alguns períodos, a coluna era diária e, em outros, semanal, publicado em geral
às quintas feiras.

09 nov. 1962

49
Mulheres e relações de gênero

■ Folha da Mulher
Publicada no Jornal aos domingos, apresentava, nos meses de janeiro e fevereiro de 1968,
em média seis páginas, sendo a última delas destinada a histórias em quadrinhos e outras
atividades para as crianças. No restante do ano, ocupava somente uma página, localizada em
geral na página 08. Trazia sempre diferentes matérias com textos e muitas fotografias, além
de propagandas de produtos e serviços direcionados às mulheres.

28 abr. 1968

■ Sua Excelência a Mulher


Durante todo o ano de 1969, foi publicada às quartas-feiras e aos sábados, ocupando em
geral uma página inteira. Apresentava uma estrutura que se assemelhava a uma coluna social,
e era dividida em três partes. A primeira delas, ao lado esquerdo, com o título Aconteceu,
trazia matérias sobre eventos que ocorriam na sociedade, como casamentos, aniversários,
desfiles de modas. Essas notas, algumas delas com fotos, davam destaque, em sua maioria,
a mulheres e sua participação nos eventos sociais. A parte central da página era dedicada
a entrevistas com mulheres, abordando questões sobre o nascimento da entrevistada, sua
formação, seu marido, seus filhos e, para as que trabalhavam fora do lar, era também comen-
tado sobre suas carreiras e de que forma conciliavam os cuidados com a casa, o marido e os
filhos. Ao lado direito da página, existia um espaço com o nome O Mundo Feminino, onde
eram publicadas notas sobre nascimento de crianças, eventos sociais, casamentos, desfiles
de moda, entre outros, com conteúdo semelhante ao publicado no espaço Aconteceu.

15 fev. 1969

50
Mulheres e relações de gênero

seu corpo, em vista da beleza física e boa


apresentação.
Ao analisar anúncios publicitários da
Revista Capricho veiculados nas décadas de
1950 e 1960, Miguel (2012, p. 224) afirma
que a mulher deveria “cuidar de si, mas não
unicamente para sentir-se bem, mas, princi-
palmente, para agradar o outro, leia-se, aí, o
marido, noivo ou namorado”.
Outras matérias, a seguir, trazem também

08 jan. 1963

Embora com estruturas e diagramação


que variou ao longo de toda a década, a co-
luna feminina trazia conteúdos que versa-
vam sobre os cuidados com o corpo – dicas
de moda e beleza, higiene pessoal, etiqueta
02 mar. 1963 09 nov. 1967
–, os cuidados com o espaço doméstico –
receitas culinárias, dicas de limpeza e deco-
ração – e os cuidados com a família, como exemplos que indicam que a beleza da mu-
a educação dos filhos e a dedicação ao ma- lher e os cuidados com o corpo eram temá-
rido. ticas frequentemente abordadas no espaço
Assim, eram frequentes as matérias so- feminino do Jornal Folha do Norte do Para-
bre moda, exercícios físicos boa forma, di- ná. De certa forma, pode-se dizer que a ma-
cas de beleza, cuidados com o cabelo e pele, nutenção da beleza, entre outros atributos,
sugestões sobre maquiagem. Esses conteú- era tida como uma condição para o sucesso
dos indicam a valorização e cuidado que a do casamento, responsabilidade delegada à
mulher deveria ter principalmente para com 22 mar. 1964 mulher (CUNHA, 2001).

51
Mulheres e relações de gênero

De acordo com Vilhena, Medeiros e No-


vaes (2005, p. 113), “A imagem da mulher na
cultura confunde-se com a da beleza. Este é
um dos pontos mais enfatizados no discurso
sobre a mulher – a mulher pode ser bonita,
deve ser bonita – do contrário não será total-
mente mulher”. Assim, já na década de 1960,
as matérias presentes no Jornal Folha do Nor-
te do Paraná salientam a associação que se
faz, em geral, entre mulher e beleza, em uma
relação na qual o corpo ganha destaque: é fun-
damental uma boa apresentação, as roupas e
acessórios da moda, o corpo belo e jovem, a
boa forma. Assim, vão se moldando não ape-
nas os corpos, mas também os gestos, as con-
dutas, os gostos, desejos e expectativas.
03 mar. 1968

52
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício Exercício

TEXTO 01 Infância, moda e beleza


A matéria a seguir foi publicada no Jornal
Sem dúvida, as mulheres não tinham sa a ser pressionada pelo consumo, com a
Folha do Norte do Paraná, na seção Folha
voz para falar sobre sexualidade até os venda de produtos de beleza e da moda.
Então, há dois movimentos: um movimen- Feminina do dia 20 de junho de 1966:
anos 70. Elas se sentiam culpadas por
não terem orgasmo, não terem prazer. to de mulheres voltadas para discutir seus
Poucas falavam da questão da anticon- direitos e sua força; e outro que utiliza a
cepção. Havia um sentimento de culpa mulher para que ela sinta a necessidade
ou de cobrança. A partir da década de de consumir muita coisa para ser aceita
80, elas passaram a se voltar mais para socialmente. A política de consumo faz
a sexualidade, a falar dos seus compor- com que a mulher fique erotizada. Hoje,
tamentos. Isso é um fenômeno mundial. a moda faz com que as crianças se vistam
E foi nesse período também que a ati- como pequenas adultas e usem objetos de
vidade sexual começou a ser cada vez consumo para se sentirem aprovadas. Na
mais precoce. Precoce não só em ter- escola, a menina que não tem o tênis da
mos de idade, mas em relação a víncu- moda acaba se sentindo discriminada. A
los afetivos. Em muito pouco tempo de questão da erotização passa também por
conhecimento entre os parceiros, já há uma necessidade de se vender produtos
a relação sexual, e a mulher passa a ser que valorizam o corpo de meninas e meni-
vítima da cobrança no que diz respeito nos. E, certamente, as roupas da moda são
ao corpo. [...] objetos eróticos.
Eu não acho que seja apenas a mídia.
Acho que é uma política do corpo na
qual a mulher começa – no movimen- Fonte: DUARTE, Albertina. A erotização, Com base na leitura dos materiais apre-
to histórico – a se cobrar por não ter o mais que uma violência, é um retorno à sentados:
corpo exigido pelos padrões globais e escravidão. In: INSTITUTO ALANA.
Projeto Criança e Consumo. Entrevistas: ● Fazer uma pesquisa sobre o crescimen-
internacionais de beleza. A mulher co-
meça a lutar pelas suas reivindicações, Erotização precoce e exploração sexual to, nos últimos anos, da divulgação e co-
pelos seus cuidados. Mas também pas- infantil. São Paulo, 2009, p. 41-42 mercialização de produtos – em especial
de roupas e acessórios – voltados para o
público infantil.

53
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício
Sugestões de Leitura

● A partir da pesquisa realizada, analisar:


TEXTO 01
• Como e em quais circunstâncias as crianças surgem nas propagandas (ou nos pro-
dutos comercializados)? No Brasil, a partir de 1960, as bal-
anças da marca Filizola começaram a
• Quais as influências da moda na forma de ser e agir de mulheres e homens?
aparecer na propaganda impressa e a
• Quais os aspectos positivos e negativos da indústria da moda na sociedade con- marcar presença nas drogarias do país.
temporânea? Era uma novidade. Até então, sabia-se
o próprio peso raramente [...]. Ora, com
a introdução das balanças nas drogarias,
saber o próprio peso virou algo natural,
um conhecimento integrado à identidade
de cada um, uma necessidade. Coinci-
Exercício dentemente, é nessa época que apareceu
Metercal, um “alimento cientificamente
preparado para o emagrecimento”, di-
A imprensa feminina sponível em vários sabores. Era o começo
da tentativa de casar a dieta com o prazer
● Selecionar dois periódicos impressos em circulação – revistas, jornais, folhetins ou en- de comer. Fora do Brasil, a indústria de
cartes – voltados ao público feminino que tenham, preferencialmente, circulação regional alimentos diet e light iniciava uma car-
e nacional. Com base nos periódicos da atualidade e no Jornal Folha do Norte do Paraná, reira de sucesso. Os adoçantes tornavam-
analisar: se símbolos de distinção social e a marca
• Apontar as continuidades e inovações apresentadas na construção dos periódicos atu- Suita anunciou na imprensa que ninguém
ais em relação ao Jornal Folha do Norte do Paraná. gostava de gordos.

• Destacar permanências e mudanças nas representações construídas sobre a mulher no Fonte: SANT’ANNA, Denise Bernuzzi.
jornal e nos periódicos contemporâneos. “Sempre bela”. In: PINSKY, C. B.; PEDRO,
J. M. (orgs.). Nova história das mulheres.
São Paulo: Contexto, 2012, p. 117.

54
Mulheres e relações de gênero

8 Mulher e beleza

Na década de 1960, a mulher era re- para escrever sobre o dia das mães. Pode-
presentada como a responsável pelos se afirmar que o recurso utilizado pelo
cuidados com o seu lar, marido e filhos. Bispo ratifica uma posição de que a ins-
Ela deveria manter o lar organizado, de- tituição eclesiástica, não obstante dizer-se
sempenhar a função de mãe, tendo ainda portadora de uma mensagem universal e
o dever de zelar pela educação de seus atemporal, deveria dialogar com a socie-
filhos. dade e a cultura do seu tempo, talvez im-
A respeito da representação da mu- pulsionado pelas implicações decorrentes
lher nesse período, Farias e Tedeschi das Constituições Gaudium et Spes e Lu-
(2010, p. 148) afirmam que “as caracte- men Gentium, produzidas durante o Con-
rísticas construídas e atribuídas ao femi- cílio Vaticano II (1962-1965). Na matéria,
nino são aquelas necessárias ao cuidado um dos textos utilizados é o da romancista
do lar, da família e do bom desempenho Gertrud von Le Fort, intitulado “A Mulher
da maternidade, negando à mulher ou- Eterna”, no qual se afirma que:
tras possibilidades e reforçando seu en-
clausuramento no espaço doméstico”. A mãe não é uma figura excepcional, não tem
Possivelmente em função da vincula- lei própria. Sua lei é o seu filho – tudo quanto
tem fora de seu centro de gravidade é sem-
ção do Jornal Folha do Norte do Paraná
12 maio 1968 pre mais ou menos impessoal [...]. Na hora do
à Igreja Católica, pode-se identificar a nascimento, a mãe entrega sua vida incondi-
presença de diversos conteúdos escritos (12/05/1968), Dom Jaime Luiz Coelho, cionalmente em prol do filho. Depois do nasci-
mento ela perde a disposição de sua vida para
por membros ligados à Igreja, como no arcebispo de Maringá, recorre à literatura entregá-la ao filho [...] a mulher maternal é a
exemplo a seguir. clássica e contemporânea, além de obras mulher que desapareceu em seu filho. (Jornal
Em matéria de capa intitulada “Mãe” Folha do Norte do Paraná, 12 maio 1968).
produzidas por membros ligados à Igreja,

55
Mulheres e relações de gênero

É possível verificar que a posição defendida dificuldade. A oração dominical é a súplica do


pela Igreja Católica, ao valorizar a maternida- Perdão ao próximo, como condição para o nos-
de, traz um modelo que sinaliza a diluição da so próprio perdão conquistado diante de Deus”
identidade da mulher e sua anulação em prol (Pe. Novaes, 12 mar. 1963).
de seu filho, dedicando-se exclusivamente aos Desse modo, diferentes matérias do Jornal
cuidados para com ele, deixando de lado seus Folha do Norte do Paraná sugerem uma repre-
próprios anseios e expectativas pessoais. sentação da mulher devotada ao lar, aos filhos e
Nesse sentido, “As características constru- ao marido, cuja conduta deve estar inspirada na
ídas pela moral cristã, em torno do feminino, figura de Maria Santíssima, modelo cristão de
como o cuidado do lar, da família e do bom virtude e doação. Dessa compreensão emergem
desempenho da maternidade, além de negar prescrições direcionadas à mulher, que incidem
à mulher outras possibilidades, servem para sobre sua dedicação e doação aos afazeres do-
enclausurá-la no espaço doméstico” (FARIAS; mésticos, seu sacrifício e renúncia no cuidado
TEDESCHI, 2010, p. 158). Parece que é im- com os filhos, e a submissão e tolerância na
possível dissociar a mulher de sua função de vida matrimonial.
13 maio 1964
mãe, tendo em vista que a maternidade requer Nesse sentido, é também possível notar, no
que ela se dedique exclusivamente à educação Jornal, conteúdos que faziam alusão ao posi- presentações da mulher presentes no Jornal na
e criação de sua prole. cionamento contrário que parte da sociedade da década de 1960, é que casar-se – e permanecer
As representações da mulher, presentes no época – e em especial a Igreja Católica – adota- casada – e ser mãe eram elementos fundamen-
Jornal Folha do Norte do Paraná na década de vam com relação ao divórcio. Como exemplo, tais para que a mulher fosse bem vista pela so-
1960, fazem ainda alusão à mulher – esposa e temos a matéria publicada em maio de 1965, a ciedade. Afinal, como afirma Sant’Ana,
mãe – que, segundo Sasaki (2011, p. 2) “ofere- seguir.
cia conforto ao marido e supria todos os amores A coluna “Reconstruir o mundo” era pu-
e necessidades de um ou mais filhos, sempre blicada frequentemente no Jornal desde sua Nos anos 1960, apesar da ampliação de visões
alternativas, ainda era tido como altamen-
disposta ao perdão e sem cobrança ou reconhe- criação, em 1962, trazendo matérias escritas te desejável que a mulher se casasse, tives-
cimento”. em geral por membros da Igreja Católica com se filhos e pudesse se dedicar integralmente
à família depois de casada. E era isso que a
A este respeito, cabe destaque às colocações assuntos ligados sobretudo à moralidade e à
maioria das mães ensinava às filhas. Casamen-
do Padre Novaes, colunista do Jornal, que afir- doutrina social da Igreja. Na matéria apresenta- to e procriação continuavam a ser o destino da
ma que, diante do arrependimento do marido da, o colunista traz reflexões fundamentadas na mulher; ser mãe (depois de tornar-se esposa,
é claro) conferia-lhe uma posição de prestígio
infiel, cabe à mulher perdoá-lo, afinal é também Bíblia Sagrada, para justificar o posicionamen- na sociedade, maior que qualquer outra “car-
uma pecadora. Em suas palavras, “É difícil para to contrário que a instituição religiosa assumia reira”. Não desempenhar o papel materno
a mulher traída perdoar. Não negamos a dificul- frente ao divórcio. seria algo como “trair a essência feminina”.
(SANT’ANA, 2012, p. 24).
dade. E convidâmo-la a contornar e vencer a Por fim, o que fica evidente, a partir das re-

56
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

As famílias brasileiras

TEXTO 01

A década de 50 e o início da década de 60 poucos conquistando o pensamento social çavam a trabalhar fora do lar exerciam ati-
foram marcados pela continuidade do movi- nessas décadas, especialmente no que diz vidades de cuidado e educação de terceiros,
mento de nuclearização da família que ca- respeito às mulheres (VAITSMAN, 1994). condizentes com as profissões femininas que
racterizou as duas décadas precedentes. [...] Obviamente, as repercussões foram inegá- emergiam nessas décadas. Nesse contexto, a
Na década de 50, as famílias eram constitu- veis para a divisão de papéis sexuais, tanto religião (católica) tinha um papel importan-
ídas basicamente por pai, mãe e filhos que no espaço público quanto no espaço priva- te, sobretudo para a manutenção dos valores
obedeciam ao pai, econômica e afetivamen- do, incluindo o da família (CHAVES, 2006). vigentes, e o discurso da religião confirma-
te. “Esse novo arranjo familiar consolidava Neste último, a mulher ainda mantinha seu va e enfatizava o discurso da própria família
definitivamente o espaço privado e o indivi- papel exclusivamente voltado para a mater- (BIASOLI-ALVES, 2000).
dualismo” (GALANO, 2006, p. 124). Além nidade, sendo rigorosa no cuidado da casa Embora tenham ocorrido algumas impor-
disso, devido à nova tendência de diminui- e na educação dos filhos, complementando tantes e decisivas transformações no papel
ção do número de descendentes, a partir dos o papel do pai, que era quem exercia a au- feminino, foi somente no final da década de
anos 50 e começo dos anos 60, os casais toridade e se responsabilizava pelo sustento 60 que o papel da mulher se modificou ex-
passaram a ter uma média de três a quatro fi- financeiro do lar (SIMIONATO-TOZO & pressivamente, com mudanças evidentes na
lhos, diferindo da geração anterior, que tinha BIASOLI-ALVES, 1998). [...] família (DESSEN & BRAZ, 2005a).
muitos filhos (MONTEIRO, 1998). Com relação ao estado civil dos genito-
No âmbito das relações sociais, começa- res das famílias das décadas de 50 e 60, a
va uma nova participação social da mulher, maioria era casada, e, embora as mães conti-
com a ascensão do movimento feminista, a nuassem trabalhando em casa e o pai no am- Fonte: DESSEN, Maria Auxiliadora. Estu-
revolução técnico-científica e o desenvol- biente profissional, os primeiros indícios de dando a família em desenvolvimento: de-
vimento acelerado de novas ciências, espe- uma nova participação social da mulher co- safios conceituais e teóricos. Psicologia:
cialmente as humanas (TRINDADE, 2001). meçavam a surgir (VAITSMAN, 1994). De Ciência e Profissão, Brasília, v. 30, número
Esses eventos ganharam espaço e foram aos acordo com esse autor, as mães que come- especial, p. 204-206, dez. 2010.

57
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

● Após a leitura do texto em destaque, realizar uma entrevista com familiar que tenha vivido na década de 1960, buscando identificar as
características dos arranjos familiares no período em questão e as mudanças que ocorreram na constituição das famílias até a atualidade.

Exercício

O processo de urbanização e as mudanças na constituição familiar nos últimos anos


Os dados da tabela a seguir são referentes ao estado do Paraná e foram obtidos a partir dos Censos realizados no Brasil nos anos de
1960 e de 2010:
1960* 2010**
N % N %
População do estado Zona Urbana 1.310.969 30,7% 8.906.442 85,3%
do Paraná – Local de Zona Rural 2.952.752 69,3% 1.533.159 14,7%
residência Total 4.263.721 100% 10.139.601 100%

N % N %
Até 2 pessoas 110.829 13,7% 1.000.718 32,4%
3 pessoas 117.529 14,5% 987.177 31,9%
Composição das 4 pessoas 135.871 16,8% 719.081 23,2%
famílias 5 pessoas 118.115 14,6% 271.445 8,8%
Mais de 5 pessoas 326.871 40,4% 115.627 3,7%
Total de famílias 809.215 100% 3.094.048 100%
* Disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/periodicos/68/cd_1960_v1_t14_pr.pdf
** Disponível em: http://www.ibge.gov.br/estadosat/temas.php?sigla=pr&tema=censodemog2010_trab

● Analisar os dados da tabela acima e identificar quais as mudanças na constituição familiar nos últimos anos.
● Quais as relações que podem ser identificadas entre o processo de urbanização e as mudanças na constituição familiar?

58
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício Exercício

Encíclica papal Humanae Vitae A esposa ideal

Diante das transformações ocorridas na A matéria publicada em


década de 1960, a Igreja Católica intensi- 02/08/1970 no Jornal Folha do Nor-
ficou os pronunciamentos que abordavam te do Paraná traz as características
seu posicionamento diante dos métodos que deveriam ser observadas pela
contraceptivos, da sexualidade, dos princí- “esposa ideal”, em atendimento aos
pios morais no matrimônio, das mulheres anseios e desejos de seu marido.
e sua função na Igreja e no mundo con-
temporâneo. Nesse movimento, observa- ● Após a leitura do texto, fazer uma
se, em 1968, a publicação da encíclica de reflexão acerca do tipo de relação
Paulo VI, Humanae Vitae. Segundo Car- que deveria se estabelecer entre ma-
valho (2001) rido e esposa, justificando a análise
com base em trechos do material
apresentado.
Através da ética moral proposta pela encíclica
Humanae Vitae, fica claro que a sexualidade ● Pesquisar materiais da atualidade
instituída e consagrada pela Igreja é a sexuali- – filmes, livros, revistas, jornais, si-
dade conjugal, cujo exercício está circunscrito
ao espaço do matrimônio, sendo este o local no tes, anedotas – que:
qual os esposos são chamados a colaborar com • Tragam implícita essa mesma
Deus “na geração e educação de novas vidas”.
(CARVALHO, 2001, p. 164).
relação entre o casal;
• Questionem os valores e ideais
subjacentes ao modelo apresen-
tado na matéria.
● Pesquisar sobre a referida encíclica,
enfatizando os posicionamentos da Igreja
Católica diante das mudanças que vinham
ocorrendo no Brasil e no mundo na segun-
da metade da década de 1960.
02 ago. 1970

59
Mulheres e relações de gênero

60
Mulheres e relações de gênero

9 Mulher e modelos de conduta

No que diz respeito às representações Apesar das mudanças que vinham tilizadas e segregadas da sociedade, pois
da mulher, de acordo com Pinsky (2012) ocorrendo, é possível afirmar que, ain- poderiam desvirtuar as moças de famí-
a década de 1960 no Brasil representa a da na década de 1960, as mulheres que lia com seu comportamento pernicioso.
passagem da “era dos modelos rígidos”, fugiam do padrão de recatada, doce, Como afirma Soihet:
quando se consolidam os modelos de virginal e pura eram menosprezadas
feminilidade, para a “era dos modelos pela sociedade e não podiam conviver
Manter-se virgem enquanto solteira e fiel
flexíveis”, quando se começa a questio- com as “moças de família” (PINSKY, quando casada era sinônimo de honra femi-
nar os valores do período anterior e no- 2012), pois poderiam exercer má influ- nina, que se estendia a toda a família, signi-
ficando um conceito sexualmente localizado
vas referências passam a se constituir. A ência sobre elas. Por esses motivos, es- – violência que se tornou fonte de múltiplas
este respeito, Sant’Ana afirma que: sas mulheres deveriam ser escondidas, outras violências. Enquanto aos homens es-
retiradas de circulação, detidas, pois re- timulava-se o livre exercício da sexualidade,
símbolo de virilidade, na mulher tal atitude
Um conjunto de mudanças ocorridas no
presentavam um atentado à moral e aos era condenada, cabendo-lhe reprimir todos os
Brasil a partir das décadas de 1960 e 1970 bons costumes da sociedade. desejos e impulsos dessa natureza. (SOIHET,
2007, p. 42).
permitiu às mulheres colocar em causa es- Segundo Cunha (2001), as mulhe-
tes valores e ideais: o aumento da partici-
pação feminina no mercado de trabalho e res “são definidas a partir dos papéis
a luta das mulheres por crescimento e re- femininos tradicionais (principalmente Nos conteúdos publicados no Jornal
conhecimento profissional; o maior acesso
à educação formal; a conquista feminina
mães, donas de casa e esposas) e das ca- Folha do Norte do Paraná, é possível
do poder de decidir se e quando ser mãe racterísticas consideradas ‘próprias das identificar diversas matérias que fazem
(com a disponibilização de métodos contra- mulheres’ englobadas no termo ‘femi- referência às mulheres que fugiam ao
ceptivos mais eficientes); a instituição do
divórcio (por lei, em dezembro de 1977) e nilidades’ (pureza, doçura, resignação, padrão, ao modelo de feminilidade de-
a possibilidade de estabelecer outros rela- instinto materno etc.).” (CUNHA, 2001, sejado e imposto pela sociedade. A ma-
cionamentos afetivos socialmente reconhe- p. 202). Para a autora, as mulheres que
cidos. (SANT’ANA, 2012, p. 24).
téria de capa publicada em 05/01/1963,
não seguiam o modelo ideal eram hos- por exemplo, traz a chamada de notícia

61
Mulheres e relações de gênero

acerca da prisão de mulheres de “vida fácil”, As matérias aqui representadas evidenciam público. De acordo com Soihet (2007), no pe-
“visando livrar o centro da cidade de sua pre- a ação da polícia de Maringá e a preocupa- ríodo do governo militar no Brasil e início do
sença perniciosa e atentatória à moral”. ção em livrar o centro da cidade das mulhe- movimento feminista no país:
res geralmente acusadas
de vadiagem e de praticar
Mulheres solteiras que se deixassem desvir-
trottoir. A matéria publica- ginar perdiam o direito a qualquer conside-
da em 09/02/1968 noticia ração e, no caso de uma relação ilegítima,
os homens não se sentiam responsabilizados
a prisão de mais de 20 mu- por sua atuação, devendo àquelas arcar com
lheres que foram levadas o peso das consequências do seu “erro”. Afi-
para a delegacia, advertidas nal, “pureza” era fundamental para a mulher,
e o desconhecimento do corpo representava
e liberadas, como resultado um signo de alto valor, num contexto em que
de uma blitz realizada na a imagem da Virgem Maria era exemplar.
(SOIHET, 2007, p. 43).
madrugada, por determi-
nação do coronel Reinaldo
Machado. Já na matéria pu-
blicada em janeiro de 1969,
consta que “A Policia Ma-
ringaense na sua impor-
Assim, as mulheres que não atendem ao mo- tante campanha de moralização, vem obtendo
delo ideal da época aparecem com frequência excelentes resultados quanto à apreensão de
relacionadas aos temas prostituição, vadiagem, mulheres vadias que quase publicamente, vi-
embriaguês e trottoir – termo que designa o ca- nham praticando o ‘trottoir’ na cidade” (Jornal
minhar das prostitutas pelas ruas à espera de Folha do Norte do Paraná, 23 jan. 1969).
clientes. As matérias informam sobre a prisão Com base no exposto, é possível afirmar
dessas mulheres e as medidas que a prefeitura que os conteúdos presentes no Jornal denotam
e a polícia de Maringá tomavam para livrar o uma preocupação com a moralidade e a nor-
centro da cidade da presença indesejável. matização da sexualidade da mulher no espaço

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Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício Exercício

Leila Diniz e a censura prévia


TEXTO 01
A imagem abaixo retrata nota publi-
cada no Jornal Folha do Norte do Para- Embora, com o Golpe Militar de 1964, já aconteceu comigo.” Como era de espe-
ná sobre Leila Diniz, na coluna social o Brasil passasse a viver seus Anos de rar, essas afirmações provocaram a ira ma-
de Waldir Pinheiro. Chumbo, sob um regime ditatorial que res- chista e foram usadas como bode expiatório
tringia liberdades, o movimento feminista para a instituição por parte do governo da
paulatinamente ganhava força, assim como lei de censura prévia à imprensa, apelidada
produziam eco algumas vozes rebeldes que de “Decreto Leila Diniz”.
desafiavam os valores da “tradicional fa-
mília brasileira”. Em 1969, por exemplo, Fonte: SCOTT, Ana Silvia. O caleidoscó-
a atriz Leila Diniz (1945-1972) chegou a pio dos arranjos familiares. In: PINSKY, C.
declarar-se, em uma entrevista ao jornal B.; PEDRO, J. M. (orgs.). Nova história
Pasquim, a favor do amor livre e do prazer das mulheres. São Paulo: Contexto, 2012,
sexual para as mulheres: “Você pode amar p. 23-24.
uma pessoa e ir para a cama com outra. Isso

08 abr. 1970

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Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Exercício

TEXTO 02

O protótipo de mulher liberada no Brasil quíni à praia de Ipanema, uma prática hoje O Pasquim, que se notabilizou por publi-
foi Leila Diniz, estrela de cinema e TV, musa natural, mas que na época muitos tomaram car suas entrevistas tal e qual o entrevistado
de Ipanema e de uma geração de boêmios como uma afronta à tradição, à família e à falava, sem cortes ou retoques, no caso de
cariocas. Ex-professorinha de curso primá- maternidade. Leila não pode agir assim. O vasto repertó-
rio, Leila ganhou notoriedade em1967 com O maior zebu, entretanto, aconteceu em rio de palavrões da atriz – “cu”, “caralho”,
o filme ”Todas as mulheres do mundo”, de novembro de 1969, quando chegou às ban- “tesão”, “fodida” – foi substituído por aste-
Domingos de Oliveira, que a mostrou nua cas uma edição de O Pasquim trazendo uma riscos e frases inteiras foram suprimidas ou
e esplendidamente bonita. Mas talvez bem reveladora entrevista com Leila Diniz. Foi maquiadas na redação.
mais do que na arte, foi na vida que a atriz um estouro. Nunca uma mulher brasileira
desempenhou seu melhor papel. Com suas tinha falado de sexo de forma tão aberta na
atitudes corajosas e liberais, Leila rompeu imprensa. Os vigilantes da moral e dos bons Fonte: ARAÚJO, Paulo César de. Eu não
preconceitos, quebrou tabus, avançando os costumes ficaram de cabelo em pé. O curio- sou cachorro não: Música popular cafona
rígidos limites da moral vigente. Em 1971, so é que muito pouco do que Leila efetiva- e ditadura militar. Rio de Janeiro: Record,
grávida de mais de seis meses, ela ia de bi- mente falou sobre o tema saiu no jornal. 2002, p. 155.

Exercício

● Com base nos materiais apresentados, fazer uma pesquisa sobre a vida de Leila Diniz e os impactos e significados de seu comportamento para
a época.

● Em 26 de janeiro de 1970, o presidente do Brasil publicou o Decreto-Lei n. 1.077, que trata, fundamentalmente, de determinar e monitorar
a liberdade da imprensa com o pretexto de proteger a população das “exteriorizações contrárias à moral e aos bons costumes”. A este respeito,
pesquisar:
• Por que a publicação e o conteúdo do decreto representam a dinâmica ditatorial do regime político pelo qual passava o Brasil?
• Quais foram as principais críticas apresentadas pela imprensa e pela intelectualidade brasileira ao conteúdo do Decreto-Lei n. 1.077/70?

64
Mulheres e relações de gênero

Materiais e Atividades

Sugestões de Leitura

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Mulheres e relações de gênero

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