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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ

COORDENAÇÃO DE CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM TRANSTORNO DO


ESPECTRO AUTISTA: INTERVENÇÕES MULTIDISCIPLINARES EM
CONTEXTOS INTERSETORIAIS

ESTUDO DE CASO B

ALUNO TEA: CARLOS MONTEIRO

Carlos Monteiro é um pré-adolescente de 12 anos de idade, vive com o pai, a mãe e


uma irmã de dois anos, cuja família está classificada segundo o IBGE na classe social B (de
dez a vinte salários mínimos), possui casa própria com número de quartos é proporcional ao
número de moradores. O pai é contador, trabalha em prefeitura de município, no interior do
Estado, e sua mãe é formada em direito e é delegada em uma delegacia na capital. O pai
passa 15 (quinze) dias trabalhando no interior e 15 (quinze) dias com a família.

Carlos Monteiro possui uma condição de vida tanto social quanto econômica
favorável. Iniciou sua educação escolar, em 2009, aos 3 (três) anos de idade, em uma escola
da rede privada, de porte pequeno, no bairro onde mora. Ainda no primeiro ano de matrícula,
na educação infantil, a professora e a gestora da escola perceberam alguns comportamentos
diferenciados apresentados por Carlos, tais como: isolamento do grupo de pares, prejuízo
em sustentar o contato visual e estabelecer atenção compartilhada - usava a professora
como extensão para acessar coisas longe do seu alcance; não atendia a professora quando
chamado para manifestação de carinho; quando estimulado ao abraço, aconchegava-se de
costas; apresentava comportamento repetitivo de girar em torno de si; andava na ponta dos
pés; demonstrava interesse pelo giro da paleta do ventilador; não apresentava indicativos
de intenção de comunicação verbal; não demonstrava interesse pelas atividades de música,
jogos de imitação e brincadeiras. Carlos gostava de manusear o alfabeto móvel, conhecia
todas as letras e dominava a composição das letras de seu nome e identificava e organizava
os números até trinta (sem correspondência de quantidades) – comportamentos que as
crianças de sua idade não apresentavam e nem dominavam.

A gestão da escola, após quatro meses de observação e registro dos avanços de


Carlos, bem como de suas possibilidades de desenvolvimento, chamou a família para
conversar a respeito dos registros feitos quanto ao seu repertório comportamental, seus
avanços e desafios. Durante a reunião com os responsáveis familiares, foi apresentado o
quadro de comportamentos identificado e a recomendação de que os pais procurassem os
profissionais da área da saúde para esclarecer os comportamentos observados. A família
que contava com plano de saúde privado, logo agendou a consulta com pediatra especialista
em desenvolvimento infantil, fonoaudiólogo e psicólogo. A escola elaborou o relatório de
aprendizagem do aluno a fim de subsidiar as observações dos especialistas.
No final do mês de junho do 2009, a mãe trouxe o laudo médico da pediatra com
diagnóstico de autismo infantil. A mãe chorou e, pouco tempo depois, apresentou quadro de
depressão ao saber que seu primeiro e único filho apresentava autismo. A gestão da escola
incentivou a mãe a acreditar nas possibilidades de desenvolvimento da criança e que a
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escola estava disposta a trabalhar com Carlos, organizando o processo educacional para
estimular o seu desenvolvimento e a aprendizagem escolar.
Carlos frequentou a mesma escola durante nove anos, dos 3 (três) aos 12 (doze)
anos, da educação infantil ao 5º ano do ensino fundamental. Uma Instituição Escolar
organizada por ciclos de aprendizagem e composta por alunos de duas faixas etárias na
turma. (Exemplo: educação infantil - crianças com 3 e 4 anos e 4 e 5 anos, 1º ano do ciclo I-
crianças com 6 e 7 anos, e sucessivamente). O critério de enturmação de todos os alunos
era a faixa etária, e desse modo, Carlos acompanhou os seus colegas de turma até o do 5º
ano do ensino fundamental, quando metade dos colegas foram promovidos para o 6º ano e
transferidos para outras escolas. Durante o percurso escolar de Carlos, sua família buscou
o acompanhamento de profissionais da fonoaudiologia e da psicologia comportamental. A
partir dos 8 anos de idade, o aluno passou a frequentar somente o fonoaudiólogo. Durante o
período dos 3 (três) anos aos 12 (doze) anos de idade, o aluno não frequentou o Atendimento
Educacional Especializado em escolas de educação especial, embora a família fosse
orientada a buscar esse apoio educacional especializado para o filho. Apesar da
recomendação escolar, a família decidiu não matricular Carlos em uma escola de educação
especial.
Durante o percurso escolar de Carlos, na referida instituição, as professoras
organizavam o trabalho pedagógico, a ser desenvolvido em sala de aula, buscando atender
a necessidade de flexibilização curricular nos conteúdos, apresentando estratégias de ensino
e recursos pedagógicos que auxiliassem o processo de aprendizagem de Carlos. Aos 11
(onze) anos de idade permaneceu na escola enturmado na sala do 4º e 5º ano do ensino
fundamental (ciclo de aprendizagem II), com metade dos alunos que compunham a sua
turma no ano anterior e metade de novos alunos que vinham do 3º ano do ciclo de
aprendizagem I. Desse modo, Carlos contava com o convívio de uma parte de seus colegas
do ano anterior e desenvolvia a convivência com os novos alunos.
Ao final de 2017, a escola percebeu que o pré-adolescente estava deslocado em
relação ao grupo social em que estava enturmado. Carlos estava com 11 anos de idade e
seus colegas de sala tinham de 9 (nove) a 10 (dez) anos de idade. A professora e a gestora
escolar levantaram a possibilidade do aluno não apresentar avanços no seu comportamento
social e afetivo em decorrência da ausência de parâmetros sociais apropriados a faixa etária
do aluno.

A escola chamou os pais de Carlos para uma conversa a respeito da situação e, junto
com a família, avaliarem a possibilidade da busca por uma escola na qual Carlos pudesse
conviver com alunos da sua faixa etária. A família de Carlos recusou a proposta feita pela
escola com a justificativa de que o pré-adolescente sempre seria uma criança, que já
estudava na escola desde a educação infantil e que tinham medo dele não se acostumar em
outra escola, uma vez que não tinham garantia de que em outro espaço escolar ele seria
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contemplado com um trabalho pedagógico que atendesse as suas especificidades de


aprendizagem.
Carlos estudou o ano de 2018 na mesma escola, já com 12 (doze) anos de idade junto
com alunos de 9 (nove) e 10 (dez) anos. Próximo do final do ano, a gestão escolar e a
professora chamaram os pais para uma nova conversa sobre o desenvolvimento de Carlos
Monteiro e da importância do pré-adolescente se relacionar com alunos da sua faixa etária,
a fim de conviver com parâmetros sociais e afetivos mais próximos de sua idade. Embora
resistente, os pais concordaram e procuraram outra escola para que o aluno fosse
matriculado em 2019.

A escola elaborou o relatório de aprendizagem do aluno ao final de 2018, para levar à


próxima escola, com as seguintes informações:

Comportamento sócio-afetivo:
Precisa ser inserido nos momentos oferecidos pela escola, como: acolhimento/aula
coletiva; dinâmicas; atividades dirigidas em grupo; vídeos; aula de leitura e educação motora,
por conta de suas características de preferir o isolamento.
Com frequência costuma ir ao banheiro e beber água sozinho, mas sempre sendo
observado por um adulto.
Escova os dentes sozinho, mas com a supervisão de um adulto.
O aluno aos poucos teve seu comportamento de retirar suas roupas somente dentro
do banheiro diante das necessidades fisiológicas em utilizá-lo. Um trabalho de reforçamento
diferencial trabalhoso, realizado pela professora, visando a redução do seu comportamento
inadequado em retirar as roupas antes de chegar ao banheiro.
É organizado com seus materiais pessoais e, quando solicitado, organiza alguns
materiais de uso coletivos.
A interação com professores e alunos tem suas especificidades: em alguns momentos
busca o carinho, beijos, abraços e, até mesmo colo. Em outros momentos, é procurado pelos
colegas e retribui.
Apresenta resistência às mudanças de horários, sequências e, principalmente, com a
disposição espacial dos objetos na escola.
Quando contrariado, apresenta intolerância à frustração. Em algumas circunstâncias,
apresenta gritos e choros.
Diminuiu os momentos de hiperfoco por lápis de cor, canetinhas e giz de cera a fim
de quebrá-los. No entanto, aumentou o hiperfoco pelo uso do corretivo (ainda que o registro
esteja correto, o aluno procura o corretivo para refazer as letras).
Precisa de um tempo maior para concluir o momento do lanche, pois se alimenta de
maneira lenta. Em alguns momentos, tende a querer lanchar deitado no chão.
O aluno está entrando na fase da puberdade. Apresenta momentos de toque nas
partes íntimas. No entanto, precisa ser lembrado todos os dias que não é o local, nem o
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momento adequado para se tocar. Nesse sentido, respeita e obedece a maioria dos
comandos e combinados.

Comportamento psicomotor:
Segura adequadamente o lápis, canetas e demais objetos com a mão direita.
Tem preferência em registrar com caneta esferográfica. Sua escrita oscila entre a
forma bastão e cursiva, é forte, legível e organizada.
Realiza registro do quadro com agilidade e organização.
Apresenta dificuldades com o uso da tesoura.
Seus movimentos motores são desordenados. Apesar do estímulo que recebe,
apresenta resistência quanto às atividades da educação motora e karatê, portanto nestes
momentos é proposta outra atividade pedagógica.
Apresenta movimentos repetitivos de balançar as mãos e andar em círculos, assim
como motricidade intensa.

Comportamento cognitivo:

Face às características do autismo, necessita de apoio contínuo para estar atento e


manter a concentração durante as atividades.
Requer o apoio de imagens para a compreensão e realização das atividades
trabalhadas em sala de aula e compreensão de conceitos.
Ao longo do semestre, o aluno tem apresentado fixação pelo uso do corretivo. Nesse
caso, leva-se bastante tempo para a continuação das atividades. Com o objetivo de manter
o ritmo de concentração constante, optou-se por realizar a maior parte das propostas, por
meio da colagem, já que qualquer desvio na escrita o incomoda e quer utilizar o corretivo.
Quando está diante de situações que já conhece, demonstra autonomia para realizá-
las.
Necessita de apoio contínuo referente à sua aprendizagem, a qual acontece de
maneira lenta.
Mantem nível de concentração satisfatório nas aulas expositivas, quando demonstra
interesse pelo que está sendo exposto, mas sua tolerância é baixa quando se trata de algo
que não o desperta interesse.
Apresenta agitação e resistência quando lhe é proposto um novo desafio.
Necessita de um espaço de tempo maior para aceitar e concluir as atividades dirigidas.
Aceita ser ajudado pelos colegas de turma para concluir uma atividade.
Tem interesse em montar quebra-cabeça e mini lego.
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Aprendizagem escolar:
O aluno apresenta linguagem oral não compreensível na maioria das vezes, mas
algumas palavras consegue reproduzir de forma compreensível.
Língua Portuguesa: realiza leitura de palavras com fonemas simples e vem
adquirindo competência em alguns fonemas complexos. Está em processo de leitura e
produção de frases, a partir de imagens e sem imagens também. Geralmente, palavras são
dispostas de maneira desorganizada, para que a partir da oralização de cada palavra pelos
professores, o aluno a pegue e cole no espaço adequado. As frases contêm pronomes ou
artigos, substantivos e verbo, no intuito de que o estudante conheça e amplie o seu
vocabulário. Sua interpretação é estimulada com auxílio de imagens e opções de múltiplas
escolhas. Apresenta competência para escrever os nomes de figuras, apresentando poucos
desvios gramaticais. Apresenta autonomia na realização da maioria das suas atividades
referente à relação nome/imagem. Identifica e diferencia vogais e consoantes.
Língua Estrangeira (Inglês): Reproduz falas e atende a comandos simples. Aponta
quando solicitado. Realiza atividades com autonomia e apoio. Demonstra interesse nas
aulas. Possui um vocabulário de palavras soltas. Escreve com apoio.
Matemática: demonstra compreensão de sequência numérica longa (até o número
500); reproduz sequência de cores e formas. Escreve alguns números por extenso sem apoio
de fichas. Associa e pareia números por extenso com o referido algarismo. Realiza
operações de adição e subtração com números baixos e apoio de material concreto, como
palitos de picolé. Identifica e registra nomeando as formas geométricas.
Ciências: reconhece as partes do corpo humano e consegue nomeá-las. Percebe o
uso dos sentidos como importante para perceber o ambiente e realizar atividades diárias.
Compreende a importância dos hábitos de higiene pessoal para manutenção da saúde. Vem
adquirindo conhecimentos sobre o funcionamento dos sistemas do corpo humano. Realiza a
distinção entre seres vivos (mulher, homem, plantas e animais) e não vivos (materiais
escolares, entre outros utensílios). Vem adquirindo conhecimentos acerca das estações do
ano, (primavera, verão, outono e inverno). Porém, ainda precisa de recursos visuais para
observar e compreender as características dos seres vivos e não vivos, além das estações
do ano.
História e Geografia: identifica as moradias, porém precisa de apoio para classificá-
las. Identifica os membros de sua família, registrando os nomes do pai, mãe e irmã. Identifica
os meios de transporte e comunicação.

O aluno venceu em 2018 o currículo proposto para o 2º do ensino fundamental, sendo


promovido para cursar o 3º ano do ensino fundamental em 2019.

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