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Controles lito-estratigráficos dos turmalinitos auríferos na região de Ouro


Preto, Quadrilátero Ferrífero - MG

Article  in  Rem Revista Escola de Minas · April 1999

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Jose Adilson Dias Cavalcanti


CPRM - Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais - Sureg-BH
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Controles lito-estratigráficos dos turmalinitos
auríferos na região de Ouro Preto,
Quadrilátero Ferrífero - MG

José Adilson Dias Cavalcanti


Mestre em Geociências na área de Metalogênese pela Unicamp; E-mail: adilson@ige.unicamp.br

Alfonso Schrank
Prof. Livre Docente do Instituto de Geociência/UNICAMR E-mail: alfonso@ige.unicamp.br

Resumo Abstract
Os turmalinitos auríferos da região de Ouro The gold-bearing tourmalinites of Ouro
Preto possuem associação direta com os veios de Preto region occur directly associated with
quartzo nas diferentes litologias e nos diversos quartz veins in different lithologies and at several
andares estratigráficos que formam a serra de Ouro stratigraphics leveis thatform the Serra de Ouro
Preto. Possivelmente, sua formação resulta da in- Preto. They possibly formed by interaction of
teração de fluidos hidrotermais com as rochas hos- hydrothermal fluids with the host rocks in which
pedeiras, tendo o fluido penetrado nas fraturas, the fluids penetrated fractures independent ofthe
mas são independentes do empilhamento lito-es- stratigraphic sequence. The tourmalinites are
tratigráfico. O mapeamento revelou que a distri- found in the following situations: at the contacts
buição dos corpos de turmalinitos ocorre em três between (i) the Nova Lima Group and the Moeda
horizontes estratigráficos, associados aos conta- Formation, (ii) the Moeda and Batatal
tos litológicos e a veios de quartzo concordantes Formations, (iii) the Batatal and Cauê
e discordantes, a saber: nos contatos entre (i) o Formations; (iv) and as discordant veins in the
Grupo Nova Lima e a Formação Moeda, (ii) as for- Moeda and Batatal Formations.
mações Moeda e Batatal, (iii) as formações Batatal
e Cauê; e (iv) nos veios discordantes às forma-
ções Moeda e Batatal. Keywords: Gold-bearing tourmalinites, stratigra-
phic, hydrothermal, fluids.
Palavras-chave: Turmalinitos auríferos, estratigra-
fia, hidrotermal, fluido.

100 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999
Introdução Turmalinitos: guns trabalhos propõem origem sin a
pós-metamórfica, geralmente envolven-
A maioria dos estudos realizados estudos anteriores do magmatismo granítico. Os mais im-
sobre as mineralizações auríferas no Os turmalinitos aparecem como ca- portantes depósitos de ouro que con-
Quadrilátero Ferrífero abordam as hos- madas negras e têm sido muitas vezes têm turmalina são representados por vei-
pedadas no greenstone belt Rio das mapeados erroneamente como metasse- os de quartzo-Au com baixo sulfeto e
Velhas, onde se instalaram as princi- dimentos elásticos, cherts ou como se- ocorrem comumente associados a rochas
pais minas da região. No entanto, na dimentos carbonácios/grafíticos (Plimer, metavulcânicas e metassedimentares, no
serra de Ouro Preto, aba sul do Anti- 1986). Os turmalinitos ocorrem em rochas grau xisto verde e anfibolito; e também
clinal de Mariana, os estudos sobre de idade desde o Arqueano ao Permia- em rochas plutônicas, especialmente nos
as ocorrências auríferas são quase ine- no, encontram-se muitas vezes associa- greenstones belts arqueanos (e.g. Hu-
xistentes. Esta é a situação comum das dos aos metais básicos e a outras mine- tchinson, 1993; Hodgson, 1993).
mineralizações hospedadas no Super- ralizações. Muitos turmalinitos estão pre-
grupo Minas, à exceção do depósito Estudos recentes têm demons-
sentes em sequências do Proterozóico,
trado que muitos turmalinitos con-
de Passagem de Mariana. em metassedimentos elásticos, especi-
siderados associados a d e p ó s i t o s
almente nos pelitos, e ao longo do con-
Esse trabalho tem como objetivo do tipo stratabound na verdade são
tato de unidades. São constituídos de
apresentar a distribuição lito-estrati- o produto de sistemas hidrotermais
grãos finos (<lmm) compostos geral-
gráfica dos corpos de turmalinitos na locais. O depósito de Passagem de
mente por turmalina e quartzo. Alguns
serra de Ouro Preto, que se mostra di- Mariana é reconhecido internacional-
podem conter uma grande quantidade de mente como stratabound através dos
ferentemente do que ocorre no depó-
plagioclásio, muscovita, biotita, clorita, estudos realizados por Fleischer e
sito de Passagem de Mariana, como
granada, apatita, grafita, e/ou pirrotita. Routhier (1973) e Vial et al. (1988). Já
postularam Fleischer e Routhier (1973),
Seus acessórios mais comuns são: zir- os trabalhos de Schrank e Machado
que estudaram o depósito de Passa-
cão, titanita, rutilo, monazita e ilmenita (1996) dão ênfase à origem hidroter-
gem de Mariana e estenderam suas
(Slack, 1996). mal dos turmalinitos do depósito de
observações a toda região onde se
A turmalina tem sido reconhecida Passagem de Mariana e região, tendo
encontra o Anticlinal de Mariana. Se-
como um importante mineral de ganga como base no fato de que as estrutu-
gundo Fleischer e Routhier (1973), os
ras associadas à mineralização são
turmalinitos descritos na região estão em diversos depósitos metálicos e não-
predominantemente rúpteis e pré-da-
encaixados no horizonte dg Formação metálicos. Em alguns depósitos a turma-
tam a deformação principal que é de
Batatal. lina pode não ser parageneticamente re-
natureza essencialmente dúctil.
lacionada à mineralização aurífera, mas
A área de estudo foi delimitada em outros esses minerais claramente se
com base em reconstituições de anti- formaram contemporaneamente. Apare-
gos mapas encontrados no Arquivo ce em depósitos minerais do tipo veio Contexto geológico
Público Municipal de Ouro Preto, com sendo componente do veio ou como re- da área de estudo
localização de antigas galerias e áreas sultado da alteração de rochas encaixan-
de lavra, e das descrições de Eschwe- A região estudada localiza-se na
tes. O turmalinito de origem hidrotermal
ge (1833) eLacourt (1935). Com os le- cidade de Ouro Preto, porção sudeste
pode ser distinguido dos stratabound,
vantamentos de campo, foi possível do Quadrilátero Ferrífero, onde se en-
principalmente na sua base, que em ge-
contra o Anticlinal de Mariana. O Qua-
localizar vários níveis mineralizados ral é discordante da litologia encaixante.
drilátero Ferrífero é uma importante pro-
com turmalinitos e veios de quartzo- Mas podem ser stratabound em escala
víncia metalogenética brasileira, por ser
sulfetos, como ocorre no depósito de regional(Slack, op.cit). Os depósitos de
uma região que contém importantes jazi-
Passagem de Mariana, sugerindo que ouro com turmalina arqueanos ocorrem
das de minérios de ferro e também pelas
essas mineralizações sejam contempo- na Província Superior do Canadá (Jebrak
minas de ouro, tais como: Passagem,
râneas, mas com uma distribuição lito- et al., 1990), na Província de Goldfields
Morro Velho, Cuiabá, Raposos, São Ben-
estratigráfica mais ampla. Oriental e em terrenos de Norse Aman
to e outras. A região onde se insere o
da Austrália Ocidental (Groves et al.,
A serra de Ouro Preto localiza- Anticlinal de Mariana é de grande im-
1989), no Craton Kaapvaal da África do
se no sudeste do Quadrilátero Ferrí- portância devido às mineralizações aurí-
Sul (Foster e Piper, 1993) e no Kolar Gol-
fero. A área de enfoque situa-se na feras que se localizam ao longo de toda a
dfields da índia (Siva Siddaiah e Rajama-
encosta da serra de Ouro Preto, pró- estrutura. A área compreende terrenos
ni, 1992).
ximo a região central da cidade ho- do tipo greenstone belt arqueanos re-
mónima e corresponde a uma entre A origem dos turmalinitos tem sido presentados pelo Supergrupo Rio das
várias áreas de mineração, onde se objeto de controvérsia nas últimas dé- Velhas e uma sequência supracrustal
encontram os bairros Lages e Antô- cadas. Muitas teorias dão ênfase a pro- proterozóica representanda pelo Super-
nio Dias (Figura 1). cessos pré-metamórficos, entretanto al- grupo Minas.

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999 101
MAPA TOPOGRÁFICO DA AREA
DE ESTUDO, COM LOCALIZAÇÃO
DÁS PRINCIPAIS GALERIAS
E ÁREA URBANA

LEGENDA
SERR A D E O U RO PRET( ) Ruas e becos
<a Casario
E S C O L A D E is.
—•''BR-356 , : MINAS <>« Ruinas
M U S E U DA <m Captação de água
INCONFIDÊNCIA •
7.745.000 RFFSA ***« Drenagens ativas
Rio do Carmo
(i V— Escarpa vertical a subvertical
; ' MG-26 Curva de nível
Localização das galerias
| Galeria

Q Lavra de quartzito abandonada


M D B Mina Duas Bocas
MSC Mina Scliar
MCR Mina Chico Rei
Congonhas FONTE: Carta topográfica de Ouro Preto
escala 1:2.000 Articulação:6560/7450.
Ouro Branco Centrais Elétricas de Minas Gerais - CEMIG

Figura 1. Mapa de localização e articulação da área de estudo em relação à porção central da cidade de Ouro Preto (Cavalcanti,
1999).

102 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999
O Supergrupo Rio das Velhas metapelíticos cloríticos a sericíticos e sentam indícios de uma deformação
(SGRV) é representado pela unidade níveis conglomeráticos centimétricos. dúctil a dúctil-rúptil posterior à sua
metassedimentar elástica do Grupo Microscopicamente, tais quartzitos são colocação. Essa deformação é carac-
Nova Lima, com idade máxima de compostos por quartzo (90%), sericita, terizada por dobras, lineações de cre-
2857Ma (Schrank & Machado, 1996). biotita, turmalina, cianita e pirita. A For- nulação, clivagens de crenulação e fa-
Já o Supergrupo Minas (SGM), de mação Batatal é composta por filitos e lhas. Na área estudada, o ouro está
idade paleoproterozóica, correspon- xistos carbonosos sericíticos. Microsco- associado parageneticamente aos tur-
de a uma cobertura plataformal do picamente, possuem grandes quantida- malinitos, apesar destes não represen-
referido greenstone belt, tendo ida- des de material carbonoso amorfo, for- tarem o principal minério. Os veios de
mando estratos entre os quais ocorrem quartzo-sulfeto, que são o principal
des entre 2 6 1 2 ± 5 M a e 2 4 2 0 ± 1 9 M a
turmalina, sericita e quartzo. Observa-se, minério, também contêm turmalina, mas
(Machado et al., 1996). E represen-
em luz refletida, a presença de rutilo e em menor quantidade (Cavalcanti,
tado na região pelos grupos Caraça
pirita disseminados na matriz da rocha. 1999).
(formações Moeda e Batatal) e Ita-
Na Formação Cauê foram distinguidos
bira (formações Cauê e Gandarela). P o s i c i o n a m e n t o lito-
A Formação Moeda possui idades máxi- diversos litotipos: itabiritos silicosos tí-
mas de deposição entre 265 l M a ± 33Ma picos, itabiritos ocres, formações ferrífe- estratigráfico d o s
e 2606Ma ± 47Ma, com base em ida- ras pirrotíticas e formações ferríferas car- turmalinitos
des Pb/Pb de zircões detríticos (Ma- bonáticas. Observa-se ao microscópio
que os itabiritos típicos são compostos Em termos de distribuição areal, os
chado et al., 1996). Já as idades de corpos de turmalinitos concentram-se no
por quartzo, hematita, magnetita, mica
sedimentação das rochas carbonáti- domínio leste da área estudada, segun-
branca, turmalina e granada na forma de
cas no topo da F o r m a ç ã o Gandarela do um lineamento na direção 230°, e es-
inclusões no quartzo. Já a Formação
situam-se em 2420Ma ± 19Ma Pb/ tão distribuídos no intervalo estratigrá-
Gandarela é composta por mármores do-
Pb (Babinsky et al., 1995). fico entre o topo do Grupo Nova Lima e
lomíticos bege-claro, com bandamento
a Formação Cauê (Figura 3). Dentro de
Geologia local metamórfico escuro. Ao microscópio, os
cada sequência, ocorrem de forma dife-
A seção lito-estratigráfica foi esta- mármores são compostos essencialmen-
rente devido às diferenças químicas e
belecida a partir do mapeamento geoló- te por dolomita e possuem como aces-
reológicas do material envolvido no pro-
gico da área (escala 1:2.000), das minas sórios mica branca e pirita.
cesso de mineralização.
Chico Rei, Scliar e Duas Bocas (escala
1:200) e seções transversais aos corpos O mapeamento geológico permitiu
mineralizados (escala 1:50), realizadas Turmalinitos na distinguir cinco corpos de turmalina di-
ferentes, com as características assina-
nas minas estudadas em detalhe. Já os região de Ouro Preto ladas a seguir e resumidas na tabela 1 e
litotipos foram definidos através de des-
Na serra de Ouro Preto, os turmali- Prancha 1:
crições macroscópicas e microscópicas.
nitos estão encaixados em uma sequên-
Com o microscópio ótico efetuou-se es- Turmalinito 1: ocorre no contato
cia de rochas supracrustais metassedi-
tudos em seções delgada-polidas utili- entre o Grupo Nova Lima e a base da
mentares de idade paleoproterozóica e
zando-se de luz transmitida e refletida. Formação Moeda. Macroscopicamente,
são reconhecidos como um dos princi-
é uma camada com espessura máxima de
A coluna lito-estratigráfica compre- pais guias de prospecção na região. O
1,20 metros (Foto 1). Tem como lapa o
ende as seguintes unidades, da base para minério é composto, principalmente, por
sericita-quartzo xisto do Grupo Nova
o topo: metapelitos sericíticos, quartzi- turmalina, quartzo, matéria carbonácea,
Lima e, como capa, o filito negro carbo-
tos, metapelitos carbonosos, formações arsenopirita e pirita.
noso, quartzitos e veios de quartzo. M i -
ferríferas bandadas e formações carbo- Os turmalinitos foram descritos croscopicamente, é composto essenci-
náticas dolomíticas. Essas unidades re- macroscopicamente no campo e em amos- almente por turmalina (Foto 2) e, como
produzem a lito-estratigrafia formal do tras de mão. A caracterização mineraló- acessórios, rutilo, mica branca, pirita e
Quadrilátero Ferrífero, proposta por Dorr gica foi realizada através de estudos em ouro. No microscópio eletrônico (MEV),
(1969), e correspondem, respectivamen- seções delgada-polidas utilizando-se mi- observam-se, ainda, zircão, cobre-metá-
te, ao Grupo Nova Lima, F o r m a ç ã o croscopia ótica (luz transmitida e refleti- lico, apatita, monazita e xenotima. Teo-
Moeda, Formação Batatal, Formação da) e microscopia eletrônica (MEV). Já res máximos e mínimos em Au de 9 amos-
Cauê e Formação Gandarela (Figura 2). os teores em ouro (g/t) foram obtidos tras são, respectivamente, de 3,23g/t e
por análises químicas através dos méto- 0,19g/t.
O Grupo Nova Lima é formado por
dos de refluxo de plasma e via seca, com
sericita-quartzo xistos e filitos carbono- Turmalinito 2: associado a veios
abertura por água régia.
sos, totalmente intemperizados. A For- de quartzo encaixados no sericita quart-
mação Moeda é composta por quartzi- Os corpos de turmalinitos aqui zito da Formação Moeda. Macroscopi-
tos sericíticos, com conjuntos deposici- descritos estão caracteristicamente camente, ocorre de duas formas: envol-
onais separados por níveis milimétricos associados a estruturas rúpteis e apre- vendo os veios e na forma de buchos no

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999 103
656.000

656.000

CONVENÇÕES Foliação principal Si

Cobertura lateritica ^"221 Lineação mineral

Filito sericítico prateado Eixo de antiforme

y Veio de quartzo vertical a sub-vertical


Mármore dolomítico bandado

Itabirito silicoso, itabirito com ocre e itabirito —' Contato


anfibolítico
" ^ m Curva de nível
Filito carbonoso, filito cinza claro sericítico
Casario
Quartzito fino a médio com níveis sericiticos, quartzito
sericítico, níveis conglomeráticos centimétricos Ruas
Xistos decompostos com lentes delgadas de filito
carbonoso Ruínas de casario

Estação Geológica

100 200 300 400m Galerias

Figura 2. Mapa geológico da área de estudo (Lages-Antônio Dias), baseado na Carta Topográfica de Ouro Preto (escala 1:2000),
C E M I G . (Cavalcanti, 1999).

104 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999
interior dos veios. No primeiro
caso, forma camadas que atin-
1 1 1
gem de poucos centímetros a 1 1
metro de espessura (Foto 3).
Nas porções mais espessas do
turmalinito, ocorrem pequenos
Ti

:
veios de quartzo dispostos ale- A)
atoriamente. Uma feição comu-
mente observada é a turmalini-
Fonte de Fluido rico em boro
zação da rocha encaixante, prin-
cipalmente nos níveis pelíticos
, no caso do quartzito. Já os 1 à ;
buchos de turmalinito atingem
•'>--' í:.',,
:

dimensões métricas, não apre-


sentam foliação e possuem pe-
quenos veios de quartzo de di-
mensões centimétricas dispos-
tos aleatoriamente. Microscopi-
camente, esses corpos são for- Formação Cauê
mados essencialmente por tur-
F o r m a ç ã o Batatal
malina com zoneamento interno
V e i o de q u a r t z o + t u r m a l i n i t o Formação M o e d a
(Foto 4), quartzo com extinção
ondulante e ainda ouro granu- Fratura Grupo Nova Lima
lar com diâmetro em torno de
0,05 mm. Teores máximos e
Figura 03 Modelo do sistema mineralizante para a região de Ouro Preto. Baseou-se nas situações
mínimos em A u de 6 amos- e n c o n t r a d a s nas minas Duas Bocas, Scliar e Chico Rei. FF- fonte de fluido rico em boro; a)
tras s ã o , respectivamente, posicionamento inicial da sequência lito-estratigráfica; b) fraturamento das unidades; c) primeiro
de l,15g/te0,08g/t. estágio de injeção de fluidos na sequência basal, no contato do S G R V c o m o S G M ; d) segundo
estágio de injeção de fluidos no Quartzito Moeda e no contato c o m o Filito Batatal; e) terceiro
Turmalinito 3: ocorre no estágio de injeção de fluidos no Filito Batatal e na zona de contato c o m a Formação C a u ê ; f)
contato entre a Formação Moe- •deformação posterior à colocação dos veios (Cavalcanti, 1999).

da e a Formação Batatal. Asso-


ciado a esse contato também ocorrem em Au de 6 amostras são, respectiva- de quartzo microscópicos formaram-
veios em forma de "T" compostos por mente, de l,15g/te0,08g/t. se nas charneiras das microdobras. Te-
quartzo turmalina e arsenopirita. Micros- ores máximos e mínimos em Au de 3
Turmalinito 4; associado a vei-
copicamente, o turmalinito é formado por amostras são, respectivamente, de
os de quartzo encaixados na Forma-
bandas de turmalina, quartzo e sericita 0,81g/te0,07g/t.
ção Batatal (Foto 6). Ocorre envolven-
(60%) e bandas de material amorfo car- do o veio de quartzo. O turmalinito é Turmalinito 5: ocorre no contato
bonoso (40%) (Foto 5), e como acessóri- composto por matéria carbonosa amor- entre o topo da Formação Batatal e a base
os rutilo, arsenopirita e ouro. No MEV fa (60%), turmalina (35%) e mica bran- da Formação Cauê. O turmalinito ocorre
foram observados zircão, apatita e rutilo ca (15%) e, como acessórios, quartzo intercalado com veios de quartzo, deno-
e ainda arsenopirita alterada para arse- e ouro. O filito carbonoso está inten- tando um padrão fitado (Foto 7). O con-
nato de ferro. Teores máximos e mínimos samente dobrado e crenulado. Veios tato inferior é discordante e ocorrem

Tabela 0 1 : C o m p o s i ç ã o mineralógica dos corpos de turmalinito.

Corpos Espessura Minerais Essenciais (na ordem de abundância) Minerais Acessórios

Turmalinito 1 1,20 m turmalina pirita, sericita, rutilo, ouro, zircão, cobre,

apatita, monazita e xenotima

Turmalinito 2 1,0 m turmalina ouro, quartzo

Turmalinito 3 2,0 m turmalina, matéria carbonácea e quartzo arsenopirita, rutilo, ouro, zircão, apatita

Turmalinito 4 20 cm matéria carbonácea, turmalina e sericita quartzo e ouro

Turmalinito 5 2,0 m turmalina, quartzo e matéria carbonácea rutilo, monazita, zircão e titanita

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999 105
PRANCHAI

106 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 52(2): 100-108, abr. jun. 1999
cos de turmalinito imerso na matriz do sociados aos contatos entre as rochas. na zona do contato entre o topo dos
veio. Microscopicamente, aparece mui- Quando os turmalinitos estão associa- filitos carbonosos da Formação
to deformado com dobras fechadas e cli- dos com veios de quartzo verticais a sub- Batatal e a base da formação ferrífera
vagem de crenulação (Foto 8). E com- verticais envolvem esses veios e tam- bandada da Formação Cauê (Figura
posto por turmalina, quartzo e matéria bém formam buchos no seu interior. 3e). Nessa posição formou-se mais
carbonácea. No MEV foram observados uma camada de turmalinitos.
Os turmalinitos aparecem em três
rutilo, monazita, zircão e titanita, como Desta forma, a mineralização aurí-
níveis lito-estratigráfícos e podem estar
acessórios. Teores máximos e mínimos fera pode estar caracteristicamente rela-
associados a três estágios de
em Au de 3 amostras são respectivamen- cionada a fluidos ricos em Boro que aca-
formação(Figura 3), descritos a seguir.
te de 4,02g/t, e o mínimo é inferior a baram por dar origem aos corpos de tur-
3,35g/t. O primeiro estágio ocorreu na
malinitos em um campo de deformação
interseção de uma fratura com o
rúptil.
contato litológico entre o topo dos
História da xistos carbonosos do Grupo Nova
Lima e a base dos quartzitos da
colocação d o s Formação Moeda (Figura 3c). A
Conclusão
corpos de rocha, além de servir como Com base nos dados expostos,
reservatório de A1 0 , serviu também conclui-se que os corpos de turmalini-
turmalinitos 2

como uma barreira que pode ter


3

tos da ocorrência aurífera da serra de


A turmalinização pode estar relaci- ocasionado o frafuramento hidráulico Ouro Preto apresentam uma distribuição
onada à reação dos fluidos ricos em boro no pacote de quartzitos situado logo lito-estratigráfica mais ampla que a pro-
com rochas encaixantes ricas em A l O 2 r acima do contato. Nos quartzitos e posta para o depósito de Passagem de
Esse processo pode ter resultado na for- nos fragmentos de quartzitos Mariana e não ocorre de forma contínua
mação dos corpos de turmalinitos e lo- incorporados aos veios, ocorreram ao longo de toda a estrutura (flanco sul
calmente na precipitação do ouro metáli- injeções de fluidos nos níveis do Anticlinal de Mariana), mas, sim, em
co (ouro em turmalinitos sem sulfetos). pelíticos, que também resultaram na áreas isoladas com um controle local.
A turmalina formou-se, principalmente, turmalinização.
Os dados apresentados demons-
devido à alteração de camadas de filitos • No segundo e s t á g i o , ocorreu tram que os turmalinitos auríferos da Serra
e de xistos carbonosos, principais rochas novamente a formação de uma de Ouro Preto são de origem hidroter-
hospedeiras do turmalinito e possuem barreira física impedindo o fluido de mal. Isto é demonstrado pelos seguintes
uma estreita relação com os veios de prosseguir, o qual se acumulou na aspectos: os turmalinitos ocorrem em
quartzo. zona de contato entre os quartzitos e três níveis lito-estratigráficos distintos
os filitos carbonosos e gerou uma e estão diretamente relacionados a vei-
A turmalina formou-se principal-
nova camada de turmalinitos(Figura os e a níveis de composição aluminosa,
mente devido à alteração de camadas de
3d). Essa camada foi rompida, dando principalmente filitos e xistos carbono-
filitos e de xistos carbonosos, principais
origem a fragmentos de turmalinitos sos, mas também a níveis pelíticos inter-
rochas hospedeiras do turmalinito. Os
e filitos carbonosos em meio a massa calados nos quartzitos. Há portanto uma
corpos de turmalinitos possuem uma
de quartzo. interação nítida entre os fluidos ricos em
estreita relação com os veios de quartzo
• O terceiro e último estágio ocorreu Boro e o A1 0 disponível nos pelitos
e formam camadas paralelas, quando as- 2 3

Prancha 1. Legenda: turm - turmalinito; tur - turmalina; Qtzito - quartzito; Vqtz - veio de quartzo; Mcarb - matéria c a r b o n á c e a ; Qtz -
quartzo; Serie - sericita.
Foto 1. Turmalinito negro c o m b a n d a s de caulim a p r e s e n t a n d o foliação e dobras, situado no topo do sericita-quartzo xisto do Grupo
Nova Lima. Mina Duas B o c a s .
Foto 2. Turmalinito c o m p o s t o e s s e n c i a l m e n t e por turmalina, foliado e d o b r a d o encaixado no contato entre o topo do sericita-quartzo
xisto do Grupo Nova Lima e a base d o quartzito da Formação M o e d a . Mina Duas B o c a s .
Foto 3. Contato entre veio de quartzo e o Quartzito M o e d a . A turmalinização (negro) dá-se apenas no contato. Mina Duas Bocas.
Foto 4 . Porção de u m "bucho" de turmalinito no interior do veio de quartzo. A s turmalinas não a p r e s e n t a m orientação e p o s s u e m e
z o n e a m e n t o interno de cor. Mina Duas Bocas.
Foto 5. T u r m a l i n i z a ç ã o do filito c a r b o n o s o , o n d e se o b s e r v a m z o n a s p r e s e r v a d a s de filito c a r b o n o s o s e n d o d e s t r u í d a s pela
progressiva substituição por sericita e t u r m a l i n a . Mina Scliar.
Foto 6. Veio de quartzo subvertical envolvido por turmalinito, encaixado no filito c a r b o n o s o . Mina Scliar.
Foto 7. Amostra de m ã o do turmalinito b a n d a d o c o m veio de quartzo encaixado no contato entre a base da f o r m a ç ã o pirrotítica
bandada e o topo d o filito c a r b o n o s o da F o r m a ç ã o Batatal. Mina Scliar.
Foto 8. Deformação associada ao nível de turmalinito no contato entre a F o r m a ç ã o Batatal e a F o r m a ç ã o C a u ê , c o m dobras e
clivagem associada à crenulação. Mina Scliar.

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