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A. M. BRAZ DA SILVA .L-

GÍRIA
MARINHEIRA
(Como falam os homens do mar) ,

RIO DE JANEIRO, 1964


A. M. BRAZ DA SILVA

G í R I·A
MARINHEIRA
(Como falam os homens do mar)

RIO DE JANEIRO, 1964


MEIA-NOITE-AS-QUATRO

Os marinheiros vivem com simplicidade: basta-lhes roupa limpa, mesa


farta e um pouco de aventura. No amor são como todos: juntam estórias
para a velhice resignada . ..
No mundo marinhei?·o há três aspectos sedutores: a linguagem, as
tatuagens e as estórias (lendas, canções, casos, episódios) .
A linguagem é ingênua e cordial. Define com precisão. Alcança o
objetivo, através de pitorescas analogias ou esquecidas reminiscências.
E o próprio espírito da classe .
As tatuagens, por sua vez, possuem conteúdo humano. Não só os
desenhos, mas as imperiosas 1·azões que os inspiraram. Um "coração
dilacerado e gotejante", poderá traduzir o romance de amor" em pôrto
longínquo de mulheres estranhas" .(as frases de mau gôsto calham muito
bem aqui).
Traduzirá, realmente, algum romance ou será, apenas, o 1·omantismo
do mar?
E as lendas, as estó1·ias, as canções ? Quanta beleza, lirismo e dra-
maticidade! Verdadeiras ou falsas (haverá falsidade na imaginação ?) ,
refletem o viver de gente curiosa e diferente. Às vêzes, é um misto de
realidade e fantasia. Onde termina a primeira e começa a segunda'!
Há crendices e supe·r stições. Imaginem01~ o que dirão os "cavernas"
do futuro, ao recontarem, nas proas, o misterioso desaparecimento do
"São Paulo"! O navio torturado, vencido, levado para longe, reagindo
como tigre ferido! Sozinho, sem os cantadores de violão de cobertas
abaixo; sem mestre e faxineiros, sem as bandeiras-em-arco no Sete de
Setembro! Torcera e retorcera os cabos de aço, e partira as algemas!
Encouraçado hercúleo, másculo, alta.neiro! Preferira morrer em pleno
oceano, na imensidão do largo, a sucumbir em portos estrangeiros ou
fundos de arsenal, sucata inutil!
O mar proporciona mil atividades. Cria imagens, ativa a imaginação,
abre horizontes, estimula a inteligência. Quantas profissões encontram
o campo de trabalho na água salgada dos oceanos ou na água doce dos
rios caminhantes ?

Cada grupo de profissionais fala a sua gtna. Deixando de parte os


marinheiros da Marinha de Guerra e os da Marinha Mercante, há um
número incalculável de pessoas ligadas ao destino do mar. Os pescadores.
em posição de ?'elêvo.

Navios como o "Ginlio Césare", o "Brasil", o "Vera Cruz", o "Hi-


ghland Brigade", "Loide Equador", conduzem todos os tipos e valores
humanos. A expressão con·iqueira cidade flutuante tem razão de ser.
Vivem "lá em baixo" os foguistas (serão de Cabo Verde, de Brooklyn
ou do Ceará?), rudes, abrutalhados, corajosos . "Na, frente das caldeints,
parecem demônios, em ruidoso conciliábulo. Nas enfermarias há môças
graciosas que andam de branco e falam com ternura.
li
UI
_ O mestre e a sua faxina representam a garantia dos tr·abalhos bra-
çats · Onde fôr necessário o músculo, tecnicamente aproveitado, aparecerá Todos êles utilizam gtrta pitoresca e viva. Entendem-se_com natu-
o mestre com a sua turma de homens escolhidos. A faxina do mestre ralidade. A língua que trouxeram de Palmeira dos !ndios, (como um filho
(~ó quem :!'~ve a _bordo po_de se!'-tir a virilidade da expressão) é uma de Graciliano Ramos, que encontrei a bordo do velho " Minas Gerais"),
vertebra solida e tndeformavel, a qual se prendem os elos do conjunto. da Grécia, de Barbados, do Algarve, de Maceió, de Singapura ou de
Georgetown, transformou-se num instrumento preciso, exato, internacio-
São t~pos curiosos. ~s~es mes~res: fortes, experientes, mandões, pa- nal. E a g'ria de bordo, aprendida em portos distanciados uns dos outros.
tescas, vatdos_os, ~utorttarws, sabtdos, trabalhadores etc. Reúnem quali- Belo exemplo de transplantação das gírias, dos falares, dos idiomas.
dades excepctonats. Do contrário, não seriam mestres com d·i reito de Mundo a desafiar a argúcia dos filólogos.
usar faca na cintura e apito reluzente. Vencem também camarote à
parte, onde há confortos pessoais. (Lembro-me do professor de línguas de certo transatlântico; atento
às conversas, pronto a registrar aquisições de tôdas as proveniências) .
. Quando o temporal pinta no horizonte, surge o mestre, traz a sua
faxtna, executa com perícia e rapidez as ordens do capitão. O sapateiro, o tipógrafo, o coroínha da capela, o môço que serve o
lanche às dezesseis horas, o pintor que não larga a brocha e o pincel,
Camões imortalizou-o em rros Lusíadas": o encarregado da biblioteca (sempre de mau humor)!, o repórter, o
maitre d'hôtel, a manicura, o bar·beiro (raça invencível, bem falante,
Mas, neste passo, assim prontos estando esperta), a vendedora da loja, e as centenas de ftomens e mulheres, que
Eis o mestre, que olhando os ares anda' guarnecem navios de luxo ou cargueiros austeros, possuem a gíria própria
O apito toca: acordam, despertando, ' e rica dos que vivem no mar.
Os marinheiros duma. e doutra banda.
E, porque o vento vinha refrescando, Não há só "liners" elegantes. As pequenas embarcações (desde a
Os traquetes das gáveas tomar· manda. cha~ana, para pintura do casco dos navios, até o dóri, para a pesca do
Alerta, disse, estai, que o vento cresce bacalhau, na T erra Nova e Groenlândia) baloiçam em tôdas as latitudes,
Daquela nuvem negra que aparece. dos pólos ao equador .

Não eram os traquetes bem tomados, Quem não se dei.rcará envolver pela beleza romântica dos saveiros
Quando dá a grande e súbita procela. baianos ? Otacílio Rainho, depois de ler "Mar Morto", de Jorge Amado,
Amaina, disse o mestre, a grandes brados mandou buscar um pedaço de vela, e encadernou o livro com o pano auto-
Amai-na, disse, amaina a grande vela/ ' grafado pelo mestre do barco.
Não esperam os ventos indignados
Que amainassem, mas, juntos dando nela, Assistir ao regresso das jangadas na costa do Nordeste constitut
Em pedaços a fazem cum ruído espetáculo enfeitiçante. Bando de pombos deslizando no mar. . . (Valha o
Que o Mundo pareceu ser destruído/ lugar comum) . Luiz da Câmara Cascudo - dono de jangada - consa-
grou-a em trabalho erudito.
(VI, 71)
O jangadeiro sente-se bem em cima de seis toros de madeira. Co-
Aí está o mestre, de apito à bôca, dirigindo, energicamente, as ma- nheci, na costa de P ernambuco, alguns caboclos que preferiam dormtr
nobras exigidas pela tempestade. nas jangadas, porque era mais seguro! O navio de guerra dava para
desconfiar . ..
, C! mestre e a_ sua faxina criam gíria. Motiva-a a fôrça muscular, a
pertcta na re??toçao de pesos, na estivação de cargas especiais. Entre os Os marinheiros, que andam em saveiros, jangadas, gambarras, gaio-
trabalhos mats patescas estão o de arriar e o de içar o f erro. las, catraias, chatas, alvarengas, encour·açados ou. contra-torpedeiros,
usam linguagem comum, com as diferenciações impostas pelas atividades
, Enq11;anto o~ marinheiros sobem ao tope dos mastros ou deslizam e ambientes regionais.
ate o lats da verga, os homens da faxina do mestre garantem o bom
estado, a sol~dez, a capacidade de estruturas e aparelhos. Aquêles são Pertencem ao mar os vendedores de búzios no Portinho da Arrábida;
acrob~tas (vwamente aplaudidos), outros são casacas-de-ferro (pouco os rezadores e tatuador·es que, na beira do cais, livram marinheir.os do
aprectados). mau-olhado e imprimem figuras nos cor·pos musculosos; as prostitutas
e os contr·abandistas que cercam embarcadiços, em busca de amor e de
_Vêem-se caras nas vtgtas dos navios atracados. São tripulantes que dinheiro; os pescadores de pérolas e apanhadores de esponjas; os lôbos-
esptam a terra, que a contemplam de longe, só de longe! Alg1tns dêsse11 do-mar envelhecidos, que remendam rêdes de pescar; as mulheres rttdes
ltomens (cozinheiros, taifeiros, bóis, moços, ajudantes, arrumadores) cru- que avançam para as ondas, de ganha-pão erguido, para pegar as algas
zam, incessantemente, os mares, vão de pôrtp a pôrto, mas não desem- e o moliço; os regatões, que vão, de porta em porta, ofer·ecer utilidades
barca-n:. Viraram cabrestantes... Vem-lhes o tédio das rttas, sufoca-os e fazem do barco a casa comercial e a moradia; os gondoleiros cantores;
o movtmento desencontrado das multidões, amargura-os a saudade da os farol eiros que assinalam pedras e abismos, alumiando as rotas; os
pátria. Met~m a ca':a na vigia e olham, como se estivessem à janela de peritos inglêses que escolhem carvalhos de bom cerne para rodas de proa;
casa, no batrro da ctdade natal. Procuram, em vão, as chaminés das ruas, os alunos da Escola Naval, que, em Villegagnon, sonham com cidades
em que foram meninos . .. exóticas, nos confins do planeta; as sereias e as iaras, que alguém viu,
certo dia, e jamais esqueceu . ..
IV
v
,E_ um m.und~ de fala peculiar, que inspira, cria, resguarda e perpetua
a g~na mannhetra. As andanças dos marinheiros transportam a gtrta e a terminologia.
Levam frases e têrmos técnicos, eruditos e populares. Misturam os falares
* (sentido comum), os meios de expressão. Muitas vêzes deformam pala-
** vras, dão-lhes fisionomia pitoresca ou estranha, até irreconhecível!

Leite de Vasconcelos transcreve do Padre D. Je1·ônimo Contador de O Comandante Eugênio de Castro, em seus "Ensaios de Geografia
Argote, nas "Regras da Língua Portuguêsa" (2.a ed. 1725) o seguinte: Lingüística", mostra êsse aspecto: "Bolinas são cabos empregados nas
.. ~'ambém e~ Lisboa, entre os homens a que chamam de ga~har, há um velas redondas para chamá-las bem pela testa para barlavento, a fim de
genero de dtaleto a que chamam gíria, de que os tais usam algumas vêzes se melhor aproveitar o vento pouco aberto ao rumo em que se navega.
entre si . E assim também os ciganos têm outra espécie de gíria, por que Sua etimologia é nórdica, e não inglêsa, como querem alguns diciona-
se entendem uns e outros." (Opúsculos, Vol. IV). ristas, e bem ma1·cada pelo vocábulo bóg-lina. Dêle féz-se o verbo bolinar,
aplicável quando se navega o mais possível aproximado da linli:a do vento .
Copia a definição de Fr. Luís do Monte Carmelo, em "Compêndio de Em terra carioca, o povo em sua gíria deu-lhe curso malicioso, talvez
Ortografia" (1767): "Gíria ou gira é linguagem de marotos ou brejeiros. industriado por algum marinheiro desembarcado . .. "
Os mais conhecidos têrmos da gira ou gíria são os seguintes: (segue-se
lista de 50 têrmos) . A pesquisa dêsse linguajar exige paciência. R equer regist?·o imediato,
Ci~a têrmos de, gíria usados pelos garotos do Pôrto. Lá está a penosa
no momento em que os grupos conversam. Ouví-los sem aviso prévio deve
ou gahnha, como e chamada. na nossa Marinha de Guerra. ser a maneira mais com pensadora. Surpreender a maruja quando a ima-
ginação alça vôo e vai caricaturando a linguagem dos eruditos.
Muita gente não dá às gírias a importância que têm: Pessoas há
que supõem tratar-se de deturpações grosseiras, de erros crassos, de A. necessidade do têrmo de gíria surge no instante mesmo em que e
atitudes primárias . urgente traduzir ·uma emoção, um sentimento, um gesto. O Tenente da
Marinha, diante de dificuldade inesperada, exclama: Que onça!
Na carta-prefácio da L ivro de Afonso do Paço - Gírias Milita1·es -
o insigne filólogo sugere doutrina, plasma conceitos, firma balizas . Co-
mentas " Todo êss~ vocabulá1·io é uma pilha de graça, mau grado algumas
amargas expressoes de natural caráter fúnebre". "V é-se além disso
co-m que facilidade o povo analisa todos os pormenores de ;_ma cousa o~
**
de um fato que o impresionam, e como põe em 1ôgo a imaginação para
interpretar isso". (Opúsculos - Vol. IV, pág. 5B8). Nada mais fácil do que o têrmo técnico escorregar para o campo da
gíria. Ninguém poderá afirmar, em certos casos, se u1n têrmo, conside-
O General Jonas Morais Corrêa apresentou, em 1958, os "Subsídios rado, hoje, como rigorosamente técnico, pertenceu, outrora, ao terreno
para um Vocabulário de Gíria Militar" (Bibliot eca do E xército-Editôra- da gíria . Exemplo: turco. O cabide dos escaleres, curvos (como as costas
1958) · Creio não haver conjunto mais rico de conceitos sôbre gíria. dos mascates que, no Rio \de Janeiro, em outra época, vendiam artigos
Desde a posição da. gíria, na lingüística, até verbetes que recolheu. de armarinho, ao som das matracas), chamam-se turcos. T erá sido um
têrmo de gíria ? Agora pertence à terminologia marinheira.
E claro: "O sentido comum de gíria, como linguagem difícil de
enten:~er! algo ?ecreta e até ilegal, · está já, à luz das modernas doutrinas Na navegação a pano há nomes curiosos (desprezemos os palavrões
da etenc:a de l!n{luagem, a Lingüística, substituído por um conceito mais enérgicos, incisivos, cantantes, - vai longe o tempo! -que comandavam
verdade~ro e logwo, com base científica, técnica atual". fainas e manobras) . E xemplos: gato, macaco, alças com sapatos, JOa-
netes, papa figos etc.
"A gíria é uma linguagem especial, de grupos profissionais defini-
dos. Po~s'll:t condições ~e ~ivência que os lingüistas lhe buscaram, para Antenor Nascentes adverte, em seu excelente A GIRIA BRASILEI-
c_a:_actenza-la dentro da hngua comum, da qual ela provém. Esta é a RA : "Não dei à palavra gíria o sentido técnico. D ei-lhe o comum. ·
hçao, entre outros, do acatado Professor Joseph V endryes da Universi-
dade de Paris .." ' Assim, pois, incluí na gÍ1-ia, ao lado da linguagem secreta dos mal-
feitores (lad1·ées, malandros, capoeiras etc.), a terminologia especial de
Julgo da maior importância e expressividade o trecho que trans- certas classes, de certas profissões lícitas, o conjunto de têrmos parti-
cre~o: "4s gírias, pois1 como _linguagens especiais, resultam da segmen-
taçao soctal. Mas provem da ltngua comum, da qual continuam a alimen- culares, muitas vêzes cômicos, usados por certos g1·upos sociais como o
tar-se, e à qual, muitas vêzes, voltam, por uma espécie de recriação ou dos estudantes, o dos atores, o dos esportistas, o· dM jogadores, o dos
milagre semântico." ' tipógrafos, o dos soldados etc."

. A gíria nasce numa área qualquer e aí vivÂn sua plenitude. Pode O trabalho em con,iunto cria a gíria. A rotina da equipe, que se
emtgrar, morrer e renascer, começando outro e t - Cada ge1·ação utiliza aplica a serviços especializados, faz surgir o têrmo comum às necessidades
Ds seus têrmos e os passa à geração seguinte. do g1-upo. Têrmo comum e sugestivo.

Hou_ve um tempo em _q71:e se dizia: oficial de catavento. Era no tempo Os marinheiros que dão lona e areia, no convés de um navio, aplicam
da Man71;ha de vela. Oftctal de talha ao lais. Bela expressão! Quem a a expressão em várias ocasiões; basta sentirem a analogia. Dar uma
conhecera, nos nossos dias? (Não sei, mesmo, se estará certa). lona e areia no rosto é barbear-se com esmêro; é lavar o rosto com
cuidado.
VII
VI
Caverna é uma peça essencial do navio só desaparecerá com a em- A imaginação dos marinheiros é uma prodigiosa fonte de vida nos
barcação. Marinheiro caverna é o que se liga de tal modo ao navio, que navios. A comunidade provoca estimulw. os vôos do espirito. Nas cobertas
ninguém o arrancará de lá . há um caprichoso mostruário de tipos humanos .. Desde o tímido, caladão,
concentrado, introvertido, ao falastrão, barulhento, camelô de iniciativas,
Mistérios espessos desafiam a argúcia dos investigadores. Por que extrovertido. Os marinheiros acreditam em quase tudo. Gostam do inve-
motivo mulher feia é canhão 'I rossímil. Simpatizam com o exótico (começando pelas mulheres) . Os
livros andam cheios de lendas e episódios que abonam a tese.
O eminente e saudoso Pro/. Serafim da Silva Neto ocupou-se das Não será o Adamastor um exemplo belo, vigoroso e clássico do poder
linguagens técnicas de indústrias e profissões: "Isso nos levaria natural- da imaginação, a bordo dos navios ? Camões' dá-nos a imagem do gigante
mente ao estudo das linguag ens técnicas de indústrias e profissões, estudo abraçado ao penedo (julgando abraçar Tétis), imobilizado, afinal, cercado
necesdário e rico em conseqüências, pois, como salientava Bréal: - Cha- pelas águas do oceano (a própria amada) .
que Science, chaque art, chaque métier, en composant sa morphologie
marque de son empreinte les mots de la langue commune." Sérgio Buarque de Holanda inicia o livro "Visão de Paraíso" da
seguinte maneira: "O gôsto da ma1·avilha e do mistério, quase insepa-
S erafim da Silva Neto enumera indústrias e wofissões populares, rável da literatura de viagens na era dos grandes descobrimentos marí-
do abridor ao zagal . timos, ocupa espaço singularmente reduzido nos escritos quinhentistas
dos portuguêses sôbre o Nôvo Mundo".
, -:4-tividades tipicamente brasileiras, desde o seringueiro ao funcionário
publtco. Faltam algumas, naturalmente. Os nordestinos (paus-de-arara), Não há dúvida de êsse gôsto da maravilha e do mistério incentivava
construtores de edifícios gigantescos, não estão citados. os devaneios.
A imaginação colabora no cotidiano e cria realidades. Seja nos dóris
O "Dicionário de Calão", de Albino Lapa (l.a ed. Lisboa, 1959) que pescam na Terra Nova, nas catraias do T erritório do Acre, nas
traz prefácio d~ Aquilino Rib eiro . Lê-se, aí: "O calão, a meu ver, começou gaiolas da Amazônia, ou na ubá do indígena brasileiro.
por ser uma ltnf!uagem de defesa do fraco contra o poderoso, do prêso
contra o carceretro e algoz, do conspirador contra o juiz e o tirano. Que A interpretação do subjetivo torna concretas as divagações ocasio-
procurasse tornar-se criptográfica o mais possível, é lógico. Que acabasse mais dos vigias de proa. V eja-se por exemplo, o que diz o marinheiro
por tornar-se parasita, está também na derivação das coisas humanas". Moacir C. Lopes, em seu "Maria de Cada Pôrto": " Subi as escadas de
quebra-peito e cheguei ao cêsto-de-gávea, o marinheiro que saía de se?'-
~ão é só 'J!Or defesa que a empregam, mas por vaidade, necessidade, viço perguntou quem era eu e respondi ser nôvo, tinha; embarcado em
deseJo de con[tgurar a imagem que brotou no cérebro ou na retina. Recife e não derll serviço naquelas alturas de mastro, nunca. O rapaz
passou o binóculo, explicou o serviço e desceu.
No dici?nário citado há uma apresentação em que o autor nos ofe-
rece notas, mformações bibliográficas e históricas de muito aprêço. Aí ... bem, primeiro enrolei-me na manta que trouxera e olhei para
baixo, o convés estava muito longe. Duas horas já é tempo para se
A leitura de qualquer vocabulário de gíria revela tanta expressivi- ficar balançando, estômago se maldizendo. Porisso é que larguei a pensar;
da~eque parece insubstituível. O têrmo de gíria tem vigor, sumo, côr. primeiro em Dilson, na necessidade de o encontrar um dia para tirar
Atmge sempre o alvo. A gíria é sucinta, breve, resumida, objetiva. aquela dúvida; depois pensamentos não classificados, como o de escre-
ver ... ,
.piz ~aiva Boléo : "O estudo da linguagem das profissões e indústrias
ca.setra~ e um dos campos mais vastos que se oferecem aos estudiosos de Está, portanto, o vigia no cêsto de gáv ea, dominado pela imensidão
Ftlologta'~. da noite: céu, mar, s'ilêncio, escu1·idão. Sozinho, entrou a pensar . .. Quan-
tos mundos nascem e morrem nas intermináveis solidões do meia-noite-às-
"Também interessam as gírias próprias de certas profissões como a quatro?
dos cardadores de Minde, sôbre a qual publicou Serra Frazão u.:n estudo O saboroso D. Francisco Manuel de Melo afirmava: "Já ouvireis a
na R evista Lusitana, 1999, Vol. 97." graciosa indecência com que disse um dos nossos discretos que a ima.gi-
nação era cur1·al do conselho, onde por não ter portas, todo o animal
l'!es.te passo, ~ecordo o trabalho curioso e enfeitiçante que assisti tinha entrada!" Se isto alguma vez foi verdade, na imaginação dos soli-
na fabrwa de tapetes de B eiriz, em Portugal (1959).
tários se ve?·ifica." (R elógios Falantes).
As mulh~r~s, que ._selecionam e amarram (dão nós) os fios, copiando E F ernão M endes Pinto? Não se propôs dar conta do "discurso de
desenhos arttstt~os, sao comandadas pela traineira, espécie de pilôto. sua vida e dos trabalhos, cativeiros, fomes, perigos e vaidades em que
Esta conta as cores e a quantidade de•. fios que as operárias devem enla- tanto sem razão havia gast·o quarenta anos ? Como o f êz ? Ficou pro-
çl!r: E,um ?,ant? vivo, engraçado: "Dois verdes, como as fôlhas da ma- verbial o poder de sua imaginação desmedida: - F er?táo, mentes ? -
et~tral - Tres vermelhos, como o telhado da igreja" (que, por acaso. Minto ...
nao era vermelho!)
Não resta a menor dúvida de que a imaginação produz imagens,
* analogias, relações, comparações, têrmos de gíria.
**
As analogias e comparações divertem e esclarecem. Constituem lin- Henrique Pongetti escreveu em "O Globo", do dia 12 de novembro de
guagem especial e necessàriamente expressiva. 1958, um de seus costumeiros "O Show da Cidade". Ocupou-se do têrmo
VIII

BULUFAS (lançado e gostosamente pronunciado por Walt er D'Avila,


na televisão) .
Seus conceitos definem, exemplarmente, o valor da gíria, o momento
exato e irreprimível de sua criação, o impulso de sua sonoridade.
"Dedico ad estudo da gíria do carioca o interêsse que um professor
A
de vernáculo dedica, por exemplo, aos sermões do Padre Vieira e a certos
trabalhos premeditadamente antológicos de Rui Barbosa. Ninguém inventa ABAFA! -Ordem de abafar o pano, de amarrotá-lo de en-
ou adapta m elhor uma palavra quando as existentes perdem substância, contro ao mastro ou vêrga. Usa-se, como gíria, por ana-
talvez consumidas pelo abuso ou f1uperadas pelo nosso pode1· de expressão. logia. Ex.: Abafar as~ . .6 e.\i.~ .
O homem não quer ser apenas entendido: faz questão de dar ao interlo-
cutor a nuança do seu pensamento e o sabor da sua expressão. A gíria ABAFAR! -Amarrotar a vela (o pano), dobrá-la, com o ob-
não nasce por um capricho verbal do homem da rua. Isso se1·ia gratuito jetivo de subtrai-la à ação do vento.
e imbecil, como se Zamenhof houvesse criado o esperanto para conversar
com a namorada sem deixar perceber aos estranhos a própria pieguice . E oportuno e agradável transcrever a explicação do
"As novidades orais brotam da bôca do povo num impasse do vocabulá1-io.
As pala.vras usuais não dizem com o colorido, a graça, o volume, o pêso Comte. João Braz de Oliveira: "Debaixo de vento muito
c a fo rma que sua necessidade de comunicação reclama". forte sendo necessário suprimir completamente qualquer
vela' depois de carregada, abafa-se de encontro à vêrga
* ou r~.astro aonde enverga. Abafar é manobra semelhante
** à de ferrar, mas sem o rigor dos preceitos indicados para
Esta conversa de praça-d'armas vai muito longa; transpusemos o as manobras de parada e de bom tempo."
meia-noite-às-quatro sem o gamão da inácia, mas batendo um papo quase "Amarra-se da melhor maneira, que o temporal dei-
filológico. Daqui a pouco, começará o quarto d'alva e gozaremos as delí-
cias do alvorecer, ao som juvenil da lona e areia, no convés. xar, não içando os paus de cutelo, e servindo para tomar
O úncio valor do trabalho é a reunião dos têrmos usados pelos ho- as velas alguns chicotes de cabos de manobra".
m ens do mar, no Brasil (alguns em Portugal). Constitui um ponto d "Navios há que usam de baixas de tempo, umas ga-
partida; outros, mais pacientes e· sagazes, aumentarão o ace1·vo.
xetas compridas para abraçar a vela e vêrga." (" Apa-
Ag1·adeço aos amigos que me enviaram colaborações. Lembro-me dos relho e manobra dos navios", Lisboa, 1934) .
seguintes nomes: Comandant e H élio Ramos de Azevedo L eite, Comte. Ale-
xandrino Paula Freitas S erpa, Comte. Lauro Freitas, Comte. José Ma- Contra-Almirante João Braz de Oliveira
chado Pavão, Comte. Jos é Francisco da Rocha (Cap. de Longo Curso),
Comte. Rui; da Cunha e Menezes (Cap. de Longo Curso), Major Sebastião ABARRACADO - adj. - Abaixado, descido, arriado, prêso
da Silva Furtado (o têrmo vaqueano), Comte. Alb erto D'Orsi (gíria do embaixo fechado semicerrado. Ex.: O marinheiro en-
Corpo de Fuzileiros Navais, a ser incorporado ao vocabulário), Tenente trou na briga, lev~u um tapa-ôlho e ficou com a vigia de
Luiz Henrique Grimer (naquele tempo, Aspirante de Marinha), Tenente
Luiz Antonio de Queiroz Matoso (aspirant e quando recolheu os verbetes), bombordo abarracada. (:~ste marinheiro ficou com o ôlho
Tenente Fernando Co elho Bruzzi (aspirant e, quando colaborou) . esquerdo fechado, amarrotado).
Naturalmente esqueci muitos nomes. O Almirante João do Prado - Se uma das bandas do guarda-chuva desarma,
Maia e o Cap. de Fragata Hamilton Elia, professôres de Escola Naval, cai, por se ter partido uma das varetas, diz-se que o guar-
zelaram sempre pela boa linguagem (s em n ega1·em o valor da gí-ria) e da-chuva está abarracado.
elevaram os padrões da Língua Portuguêsa na Marinha.
Continuarei a trabalhar enquanto D eus me der ânimo e alegria. ABARRACAR- v. .:_ Abaixar, descer, arriar, prender embai-
xo, semicerrar.
Há muito que dizer sôbre linguag em, tatuagens, estórias, ti pos de
embarcações, lendas, f eitiços, fatos e episódios, anedotas, apelidos etc. ABRE! - Voz de comando que significa: afaste, empurre,
Quem se dispõe a falar das coisas do mar sabe. que nunca chegará distancie, desencoste, desatraque !
ao f im da velha histó1-ia.
ABRIR ! - o mesmo que abre. Afastar a embarcação de
qualquer lugar, de outra embarcação, do cais etc. ys~-.se,
também com referência a rumos. Abrir o rumo sigmfiCa
acresce:r{tar-lhe um ângulo. Em geral, abrir indica a di-
reção do largo, do alto-mar, da margem safa. (:tl:ste têr-
mo nem sempre é de gíria).
2 3

ABERTO - adj. - Afastado, separado, distante. Ex.: o ADORMECER NO BORDO - É exatamente a demora em vol-
barco vinha muito aberto, isto é, muito por fora, distante tar à posição normal, depois de se ter inclinado sôbre o
de determinado ponto de referência. bordo, de se ter "inclinado de lado". Há navios que vol-
tam, ràpidamente, à posição anterior, outros que dor-
ABESOURADO - adj. - Amalucado, desnorteado, doidarrão, mem, adormecem. O perigo é adormecer e ficar.
desabotrinado, telhha (telha de menos), amolado, azucri-
nado, de côco cheio. ADRIÇA (A MEIA ... ) - (M. Mercante). Estar embriagado,
bebido, bêbedo.
ABICADO - adj. - Encalhado de proa, na praia. Meter o
bico, a proa, na areia na terra, no barranco. ADUBA - subs. - Cozido completo . Iguaria muito aprecia-
da pelas guarnições.
ABORDAR- v.- Chegar perto, aproximar-se, encostar, to-
car de leve no assunto, conversar sôbre determinada AFIR - Quer dizer sim, aprovação, concordância.
matéria. Ex.: Vou àbordar aquela pequena; será que ela
topa um sorvete ? AFOCINHADO - adj. - Navio com a proa enterrada na
água, fora das linhas .normais. Quando o navio está
ABORDAGEM - subs. - Ato de abordar. mais pesado avante, afocinha.
ABRE! -Voz de comando que significa: afaste-se, empurre AFOGADO - adj. - Marinheiro fraco em natação. Aquêle
para afastar, distancie-se, desencoste, desatraque. que não tem habilidade para nadar. Qualquer pessoa
que nade mal ou não saiba nadar .
ABRIR - v. - O mesmo que abre. Afastar a embarcação de
qualquer lugar, de outra embarcação, do cais etc. Usa-se A GARRA (DE ... ) - Abandonado, desarrumado, jogado,
também com referência a rumos. Abrir o rumo significa espalhado, perdido. Despreocupado, desleixado. Ex.: Os
acrescentar-lhe um ângulo. Em geral, abrir indica a di- remos andam de à garra pela ilha, isto é, andam espa-
reção do largo, do alto-mar, da margem safa. (O têrmo lhados, jogados pela ilha.
é usado em manobras de embarcações; neste caso, não
é têrmo de gíria) . Marinheiro desleixado anda com o uniforme de à
garra, sujo, mal passado, desalinhado.
ACACHAPAR OS MASTARÉUS- Humilhar-se, submeter-se,
entregar os pontos, pedir soda. Talvez o têrmo provenha de garrar, desagarrar.
Quando a âncora do navio garra,. êste desloca-se, sem
ADERNADO - adj. - Inclinado, tombado, caído, desapru- govêrno, sem rumo.
mado.
A expressão ficaria melhor. à garra.
Aplica-se a pessoas e coisas . Os bêbedos andam mais Nascentes informa: GARRA - Cortesão, do espa-
ou menos adernados. Os tenistas, por terem o lado di- nhol, que tira do antigo alto alemão harfan, arrancar.
reito (braço e espádua) mais desenvolvido, parecem ader-
nados. Como exageram, por elegância ! Quando alguém AGUADA (FAZER .... ) -Receber água, tomar água. É das
está com o chapéu tombado, diz-se que vai com a tampa fainas mais importantes a bordo. A água, nos navios, é
adernada. Navio adernado é expressão técnica. O têrmo, - como diria o Conselheiro Acácia - preciosa. As bar-
entretanto, é pitoresco e qualifica tôdas as coisas que cas-dágua servem para levar água aos navios.
estão fora da posição normal . Ex.: Reparaste como a
cantora tinha a bôca adernada? Nos tempos da velha Marinha a expressão fazer
aguada tinha sabor de aventura.
ADORMECER - v. - Diz-se da embarcação que, tendo ader-
nado, demora a voltar à posição primitiva. O balanço Nos roteiros quinhentistas há freqüentes alusões a
e o jôgo dos navios deitam-nos, inclinam-nos em tôdas tomar água. No "DIARIO DA VIAGEM DE VASCO DA
as direções. Se o navio t1emora a voltar à posição ante- GAMA" (Vol. I, pág. 25, do Diário) "Aqui estivemos cinco
rior, diz-se que êle dormiu, adormeceu. · dias tomando água, a qual nos acarretavam aos batéis
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aquêles que nos vinham a ver: não tol?amos águS: quanto - A sentinela foi agüentada no pôsto até chegar o
nós quiséramos porque o vento nos Iguava de via~em e vigia de retém.
nós estávamos ancorados ao longo da costa, no rolo do
mar". Em "Os Lusíadas": Quando o Gama cos seus de- - Estavámos agüentando os lugares para os mais
terminava de vir por água a terra apercebido. (I, 84 vs. antigos (guardando os lugares, enquanto os mais anti-
gos .não chegavam).
3 e 4) . (IGUAVA - talvez signifique soprava de feição
- no Diário) . AGUENTAR AS PONTA$, AGUENTAR OS BRONZES,
AGUAS (IR NAS) -Seguir alguém ou alguma coisa. Acom- AGUENTAR O FERRO - Esparar mais um pouco; resis-
tir; ficar na espectativa.
panhar. Seguir o exemplo, seguir, imitar, fazer o mesmo
que outra pessoa. Navegar no mesmo. ru~o. Ex.; O cru- ALAGADO - adj. - Distante, afastado, longíquo, cheio
zador foi nas águas do encouraçado, Isto e, segum atrás dágua, com água aberta, inundando. Diz-se das embar-
do encouraçado, segui-lhe o rumo; foi na sua esteira. cações que se encontram muito distantes da costa ou de
-Bonita pequena! Vou nas águas dela . .. qualquer ponto de referência. Ex.: -0 navio passou ala-
gado, isto é, muito afastado da costa ou do ponto de
A expressão é usada fora da Marinha; caiu no do- referência. O atleta que perdeu por muitos pontos tam-
mínio paisano. bém ficou alagado. Qualquer competidor mal · classifi-
cado está alagado.
AGUA ABERTA- É a mesma coisa que abrir água. Ag.u a
aberta é a invasão pela água, é a penetração de água no ALAGAR - v. - Afastar-se, ir para o largo, abrir rumo, de-
navio, na embarcação. Ex.: O cruzador arribou por estar saparecer, desaparecer no horizonte, sumir, desaparecer
de água aberta. Sofreu um rombo no costado, nas obras à distância. Ex.: O farol alagou, isto é, ficou para trás,
vivas, e a água está penetrando. desapareceu.
Ouvi um juiz do Tribunal Marítimo . (porta:r:to, e~ ALA ! - É a voz de comando correspondente ao verbo ALAR.
contacto diário com a água aberta nas embarcaçoes) di-
zer o seguinte: "Estou de água aberta ... " ALAR- v. - "Exercer tração num cabo para executar qual-
Para ilustrar, mostrava a roupa inteiramente enso- quer manobra". (Comte. Maurílio Fonseca). Puxar, le-
var, transportar.
pada de suor, sob a canícula do dia 16 de abril de 1959!
Era uma analogi~. ·
ALCATROEIRO- subs-.- (M. Mercante). Homem que faz
AGUENTA- v. - É a voz de comando correspondente a parte do grupo de manobra.
Pára ! Cessa ! Chega !
ALEXANDRINO - adj. -'--- Uniforme que consiste em jaque-
AGUENTAR - v. - Suster, sustentar, cessar, suspender a tão (azul) e calça branca. Dizem que o uniforme foi
ação, parar, paralisar, prender, manter-se firme. ~x.: Na idealizado e era usado com freqüência pelo Almirante
faina de içar os escaler.es é inevitável ~ voz de ~~e~tar, Alexandrino Faria de Alencar. Daí, o seu nome. (Será
quando se faz necessário parar. Tem, amda, o s1gmf1~.ado verdade?) Emprega-se também, irônicamente, para de-
de guardar, re&ervar. Ex.: "Chefe de dia, mande ague~­ signar o uniforme mescla cuja calça fica desbotada, fa-
tar rancho para a guarnição da lancha". O rancho fi- zendo contraste com o dólmã. (Que saudade do mescla!).
cará guardado à espera ~a · guarr:ição que, por qualquer · ALFAIATE - subs. - Tubarão.
motivo, estava ocupada ou fora, a hora do rancho (hora
marcada na rotina) .
ALIJAR- v. - Retirar a carga de bordo, atirando-a ao mar.
AGUENTA, AGUENTADO, AGUENTANDO -Modos de em- Emprega-se para indicar lançamento da carga ao mar,
pregar o verbo, de acôrdo com a oportunidade. Ex.: por acidente ou para evitar acidente. Atirar fora qual-
Agüenta aí, rapaz, deixa o pai da pequena arvorar . .. quer coisa.
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ALINHADO ---' adj. - Elegante, distinto, bem vestido, bonito, ALMIRANTE DE GALAO EM BICO- (M. Mercante) Sar-
de boa aparência, bem apessoado, bem apresentado, vis- gento da Marinha de Guerra.
toso, qualquer coisa bonita. Pessoa de caráter bom, es-
correito. Ex.: Aspirante alinhado, o Alberto! É 0 1 pri- ALMIRANTE (NOITE DE) - subs. - Noite bem dormida, .
meiro em tudo. - ~sse comandante fêz manobra ali- calma, sem interrupções.
nhada. Mande dois marinheiros bem alinhados para o
palácio. As vêzes, por ironia, é empregada com significado
contrário, isto é, de noite agitada, mal dormida. Ex.: Tive
ALINHAD!SSIMO - adj. superlativo - Acho que o têrmo uma noite de almirante ! Significa que a noite foi exce-
alinhado, na Marinha, proveio de linho. Como os uni- lente, macia, suave, povoada de sonhos doces. Há um
formes de "linho branco", quando engomados, ficam ele- conto de Machado de Assis - "Noite de Almirante" -
gantissimos, com aspecto irrepreensível, talvez a analogia cuja leitura ilustrará êste verbete. Reflete a sábia ironia
tenha criado o adjetivo. machadiana .. .
Os velhos linhos .. . os belgas, os irlandeses: "belle ALOPRADO - adj. - Amalucadô, desajuizado, confusionista,
époque" dos uniformes na Marinha. . . Como é bonita a "pancada", aluado.
história do linho, desde o momento em que o semeador
atira as sementes à terra ! ALVORADA- subs.- Toque de despertar, de acordar, pela
ALIVIA! - Voz de comando correspondente ao verba ALI- manhã. Exs.: Tocou alvorada, iça !
VIAR. Voz que se dá ao timoneiro para que êle ponha o - Amanhã a alvorada será mais tarde. A alvorada
leme a meio, quebrando a guinada . é inimiga dos dorminhocos. Em geral, depois dêsse toque,
ALIVIAR- v.- Retirar carga (total ou parcialmente), des- vem o de reunir. A alvorada é estridente. Entram, nessa
tortura matinal, cornetas e tambores. Há corneteiros
carregar, tornar mais leve. caprichosos, que executam o "concêrto" com perícia.
Quando o navio cala muito, há perigo de encalhe, Quem poderá conciliar o sono, depo_is dela?
em certas zonas. Só aliviado, o navio poderá aproximar- Infelizmente, como tôdas as práticas tradicionais, vai
se de tais zonas. Desfazer a guinada; trazer o leme a perdendo o seu "panache" . As vêzes, um corneteiro sO-
meio. zinho dá o toque, roubando à praça de guerra ou ao
ALMANAQUE - subs. - Livro tradicionai que contém os navio, "a marcialidade imperativa da fanfarra!" Li-
nomes e os dados relativos aos oficiais da Armada. Pu- vrem-nos sereias e tritões da época dos despertadores de
blica-se anualmente. ~sse ALMANAQUE registra nome, cabeceira ...
data de nascimento, data de asentamento de praça, pro-
moções, condecorações, cursos, etc. Os nomes obedecem ALTURAS (TOMAR . .. ) ·- Considerar, examinar, fazer pre-
à ordem de antiguidade. visões, pesar as circunstâncias, fazer exame da situação,
sondar, investigar. Ex.: Cheguei cedo, fui tomando as
A Marinha, para render homenagem perene ao seu minhas alturas, e fiquei dono da festa.
patrono, inscreve,eomo n. 0 1, o Almirante Joaquim Mar-
quse Lisboa, Marquês de Tamandaré. Preito justo e AMARAR - v. - Fazer-se ao mar, distanciando-se da costa.
simples. Ir para o largo, para o alto mar.
Tôdas as dúvidas são tiradas no almanaque; o que AMARADO - adj. - Distanciado da costa. Emprega-se para
ali está é a verdade. Os segundos-tenentes alojam-se nas mencionar embarcação que navega afastada de terra.
últimas páginas. Com pulsam o livro com compreensí- Ex.: A esquadra não será avistada, pois vai muito ama-
vel desânimo ... Mudar de fôlha éobra de anos, às vêzes ! rada.
Os almirantes olharão o famigerado almanaque com cres-
cente melancolia ... A proximidade da capa significa pelo AMARELOS - subs. - Metais amarelos ou dourados. Guar-
menos, 60 anos de idade ! Ouvi um reformado dizer: nições de metal amarelo (em escadas, batentes, portas,
Estou no fim; saí do almanaque ... quadros, armamento, embarcações etc.)
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De modo genérico, o têrmo AMARELOS designa me- ANTA - adj. - Bôbo, tolo, papalvo, "burro", simplalhão,
tais dourados, reluzentes, luzidos, limpos, tão gabados palerma, pateta, parvo.
pelos paisanos que visitam os navios de guerra. Os ma-
rinheiros capricham; por vêzes, exageram, e "dão caol" ANTA é aquêle que não sabe aproveitar as oportu-
(Kaol) o ·dia inteiro. nidades: o que não tira partido nem proveito de situa-
ções. Em linguagem atual, é o não "golpista", o que é
AMARRAR ( .. . O RUMO) - Governar o navio sem alterar sempre "passado para trás"; o que "não tem vez" .
o rumo. Manter firme o rumo do navio. Há os ANTAS, realmente molóides, lentos de gestos
AMARRAS (A DUAS AMARRAS) -Estar prêso por dois la- e decisões, tardas de raciocínio, apoucados de inteligên-
dos; estar duplamente prêso . Quando alguém assume cia, exágerados nos escrúpulos.
dois compromissos concomitantes está prêso a duas amar- Há entretanto, os que passam por verdadeiros AN-
ras. :E comum ouvir de um namorador: - Imagine, as TAS e ~ão apenas, preguiçosos, comodistas, indifer~ntes .
duas pequenas irão à festa, ficarei a duas amarras.
Na Escola Naval, em 1929 e 1930, ANTA era o aspi-
AMOSTRA- subs. (ou MOSTRA) -Bandeja com "amos- rante nada ou pouco safo.
tras" do almôço, do jantar, do café ou do mate, que um ANTIGALHAÇO - adj. - Aumentativo expressivo, sinônimo
dos rancheiros da guarnição leva ao oficial de serviço,
para que êle as prove. Antes de "tocar rancho", "toca imperfeito do superlativo antiquíssimo.
rancheiro". O mestre-d'armas manda preparar a AMOS- . O ANTIGALHAÇO é inconfundível . ..
TRA, a fim de levá-la ao oficial de serviço, como é da
t;nácia. O cozinheiro tira pequena porção de cada panela, ANTIGo- adj.- Autoridade, graduado, velho na profissão,
guarnece as "travessinhas" próprias, arruma a bandeja praça antiga, militar de graduação ~levada. Pr?sa, con-
de madeira . (em geral, retangular) e a entrega a um dos vencido, pretencioso, casmurro, metido a supenor.
rancheiros. A bandeja (em verdade, pequena mesa por-
tátil), é coberta com toalha limpa, absolutamente limpa, ANTIGO (O MAIS) -O MAIS ANTIGO- Qualificação ~o
enfeitada, bordada. Muitas vêzes, com letras encarnadas, militar mais graduado, indicação do militar que tem mais
verdes ou azuis, apesar de ser de pano grosso, barato autoridade, do militar que manda mais.
(os marinheiros conseguem _tirar beleza das coisas mais Ex.: Quem é o mais antigo aqui ?
simples). Um rancheiro, bem uniformizado, conduz a
bandeja; acompanha-o o mestre-d'armas, responsável Equivale a dizer: Quem é o maü;; graduado ?
pela correção do rancho. O oficial de serviço prova os Na vida militar o mais antigo é-responsável por tudo,
quitutes e dá a sentença: serve ou não serve! Se lhe razão por que o mais antigo deve estar sempre em evi-
agrada, diz: "Pode servir". Se não gosta, determina:
"Ponha mais sal na sopa, cozinhe mais o cabrito, traga dência.
nova amostra" . Como a AMOSTRA é apresentada pouco Ex.: Serei o mais antigo na lancha ? (Indaga o te-
antes da hora do rancho, o oficial de serviço está com nente, diante de situação que demande iniciativa).
fome e aproveita para fazer uma boquinha. Contam que o têrmo é pejorativo, por vêzes: -Estás com cara
alguns caveiras de pau engolem a amostra tôda, inclu-
siva as bananas. Depois disso, reclamam: "Cozinheiro de de antigo!
Marinha não aprende; gororoba sexta-classe, estropo le- Traduz ironia, endereçada a colega que assuma ati-
gítimo ... " (MOSTRA é o têrmo usual). Ver: MOSTRA. tude de antigo, que se parte como antigo, o que tome·
ares de antigo.
ANJO - adj. (Escola Naval) - Aspirante inocente, desco-
nhecedor dos regulamentos; também o que simula des- Não é raro aparecer em corporações militares um
conhecê-los. tipo que "já nascel;l antigo". Surge "importante", vis-
toso, manobreiro, íntimo dos superiores, entrado. Co-
Não é gíria essencialmente marinheira. menta a tenentada:- Sujeito antigo!
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ANTIGUIDADE- Pôsto, tempo de serviço, graduação, ordem
na escala hierárquica. escreveu : "Muitos paisanos, antes de mim, se aventura"
ram com suma felicidade, a escrever de coisas militares".
Ex.: - Qual é a sua antiguidade ? Sem' intenção pejorativa, usa o têrmo à maneira militar.
E como se perguntassem: Você foi promovido a êsse AP:ERTO- subs. -Dificuldade, atrapalhação, situação di-
pôsto em que data ?
fícil. Rigor, cuidados especiais, coação, disciplina, tesa-
Ex.: "Este comando está fora da minha antiguidade . menta, repreensão, recomendação, observação com sen-
(Ainda não sou suficientemente graduado para ocupá-lo tido disciplinar, reclamação.
ou já ultrapassei a graduação respectiva). ANTIGUIDA- Ex.: - Ando num apêrto medonho por causa da ba-
DE E PôSTO - Velho aforismo militar. lística.
APAGADO- adj.- Farol sem luz, navio sem luzes. Usa-se fora da Marinha: -Que apêrto, meu velho,
Quando o farol não está emitindo o facho de luz, estou sem dinheiro !
diz-se que êle está apagado. Se o navio não mostra as Ex.:- Peço-lhe que dê um apêrto no Guilherme, êle
luzes ~e posição, diz-se que está apagado. não estuda nada.
Ouve-se, todos os dias, o AVISO AOS NAVEGAN- Equivale a pedir que tese o Guilherme, que o repre-
TES: "Farol tal: apagado, temporàriamente" isto é, sem enda, que o ponha nos eixos, no bom caminho.
emissão de luz, durante algum tempo.
Ex.: - Ainda não recebi sobressalentes, vou dar um
APAGADO quer dizer também que o navio está com apêrto no intendente do depósito.
as caldeiras apagadas.
APITO- subs.- É o apito do mestre ou do contra-mestre.
Por extensão: Um marinheiro leva um tapa-ôlho e Em navios pequenos os oficiais usavam apito. Mesmo
cobre o ôlho com esparadrapo ou gaze. Dirão os compa- nos grandes, em certas fainas, o apito entrava e entra em
nheiros:
função. ·
- Fulano está com um farol apagado. Na vida comum, APITO é apenas o som pr0duzido
APAISANADO- adj. -Tendência para o paisano. O que pelo instrumento (apito) .
está ficando igual ao paisano. Refere-se a pessoas ou Ex. - A autoridade será saudada com quatro apitos.
coisas. (tril.){os ou trinados) .
Ex.: Os preás ainda estão muito apaisanados (não Os navios também possuem apito. É um dispositivo,
perderam ainda os hábitos e atitudes civis). em geral acionado por vapor, que ressoa, ecoa, vibra, para
Por extensão, aplica-se a coisas também. determinado fins .
Ex.: Uniforme apaisanado. Sapato apaisanado. Ex.- Aquêle navio deu dois apitos, vai guinar para
bombordo.
Nos meios mil~tares abusa-se muito do têrmo. Por
ex.: Um orador vai ao quartel ou ao navio e faz uma pa- APITAR- v.- É o verbo correspondente.
lestra. Se aborda poesia, se não fala em batalhas, tiros,
tática e estratégia, não agradará. Dirão os militares: - Na gíria comum quer dizer: est~r sem dinheiro, sem
meios, sem recursos. Ainda é encontrado o têrmo apito
Discurso apaisanado; tudo muito .paisano ... na gíria comum, com a significação de ofício, trabalho,
Se os gestos, as atitudes e os assuntos perdem a rigi- função. Registram-no Viotti e Nascentes.
dez militar, receberão a classificação de apaisanados. Em Coimbra, o têrmo APITAR é usado nas escolas.
Rui Barbosa, em "Cartas de Inglaterra", (Min. Educ. Corresponde ao soprar dos estudantes brasileiros. Apita:
e Saúde, 1946,- Vol. XXIII, 1896,- Tomo I - Pág. 4), é dizer, baixinho, ao colega, que est~ a ser c~amado a
lição, o que deve responder. Ex.:. Se nao me apitas, estou
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perdido. (Amilcar Ferreira de Castro - "A Gíria dos Es- As críticas ao ARQUIDUCADO eram e são freqüentes
tudantes de Coimbra"). (ainda hoje) ouvem-se referências maldosas aos ARQUI-
DUQUES) . Setas venenosas foram desferidas contra ês-
AQUARTELAR - v. - Morar, residir. Ficar morando no ses oficiais .
quartel, no navio, na escola. Ir morar no navio, estabele-
cimento, escola. Ficar interno, isto é, em regime de in- Talvez a pose dos ARQUIDUQUES sugerisse anti-
ternato. patia. Talvez a rispidez de certos componentes do grupo.
Ex.: O Corpo de Alunos aquartelará na segunda-feira, Os exageros provocavam represálias. O ARQUIDUCADO
isto é, ficará na Escola Naval definitivamente, saindo era fechado, hermético. Sua int egridade ferozmente de-
apenas nos dias de licenciamento. fendida . Só tenentes de comprovada eficiência e inaba-
lável crença conseguia~ aproximar-se dos ARQUIDU-
AQUARTELADO - adj. - Aquêle que está aquartelado. QUES . Havia um arremêdo de noviciado, até a admissão
Aquêle que goza de aquartelamento. Gozar de aquarte- normal.
lamento é fôrça de expressão . Basta perguntar aos aspi-
rantes e êles dirão a respeito. O ARQUIDUCADO, como é voz corrente, foi benéfico
à Marinha. Reuniu energias esparsas e organizou vários
AQUARTELAMENTO - subs. - Ato de aquartelar. O aquar- setores da vida naval. Sua história, porém, ainda não
telamento dá direito ao rancho, moradia, etc. foi contada. Urge fazê-lo.
I
ARCHOTE- subs.- Vela de estearina usada a bordo quan-
do falta luz elétrica. Em geral, na mesa do oficial de ARQUIDUQUE - Subs. - Membro do ARQUIDUCADO. Ofi-
serviço há archotes para as emergências. O "flash-light" cial pertencente ao grupo referido . Crente, devotado ao
vai desbancando o archote . t.:ste tem o ranço da Marinha serviço e à Marinha. Bom profissional, disciplinado, cum-
antiga, conquant o resguarde o encanto da simplicidade . pridor das obrigações. Exigente, tesa, resignado, patesca,
O nome dava "majestade" à vela humilde. inimigo de terra, austero, "casado com a Marinha" (ex-
Ex. Renovação dos archotes pelo moço das luzes . pressão pitoresca) .
(Pep.alva -"Patescas e Marambaias", pág. 28. Editôra ARRANCAR O FERRO - Expressão que designa o ato de
Brasileira "Lux") . arrancar do fundo do mar, do rio, da água, a âncora do
(Ver: FOGACHO) . navio. Quando o navio está fundeado (ancorado), a sua
ARDENTE- adj. - "É o navio que se chega bem depressa âncora prende-se ao fundo do mar. Assim que o navio
à linha do vento". (Alves Camâra - "Ensaio sôbre as inicia as manobras, para largar, uma das providências é
Construções Navais Indígenas do Brasil" - 2~ ed. fô- arrancar o ferro.
lhas 18). ARRANCOU ! - Logo que a âncora se desprende do fundo,
ARFAR - v. - Balançar no sentido de proa a pôpa. Os o homem que está no pôsto (local) próprio, e tem por
navios arfam. Aplica-se a embarcações, de qualquer tipo. função fiscalizar o ferro; exclama, para ser ouvido pelo
comandante:- ARRANCOU!
ARFAGEM- subs.- Ação de arfar.
ARQUIDUCADO -subs. - Coletivo de ARQUIDUQUE. Es- ARRANJAR UM PG- Conseguir maneira de alcançar o ob-
pécie de ordem, confraria, irmandade, sociedade secreta, jetivo; utilizar artifício que leve à obtenção do que se
maçonaria, conjunto, principado, nobreza, aristocracia, deseja.
grupo, elite, casta. Ex. Preciso arranjar um PG para não fazer serviço
Formou-se, na Marinha, há cêrc·a de 40 anos, um no Carnaval.
grupo homogêneo de oficiais, com o objetivo de "levar
tudo a sério". Oficiais distintos, crentes, cumpridores de ARRASTANDO A CACHORRA- (M. Mercante) - Estar de-
seus deveres. sembarcado e passando necessidades.
Caracterizava-os a crença. Havia emocionante espí-
nto de sacrifício, capaz de cortar tôdas as comodidades ARREGO - interj. (Escola Naval, 1955/ 6) - Expressão de
e estabelecer regime duro, austero, monástico ! surprêsa, desespêro. Clemência ! Misericórdia ! ·
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Não sei como apareceu o têrmo, na Escola Naval. o patrão manda armar a buja para um bordo e o
Não encontrei analogias. Será reminiscência de arrega- grande para o outro, como se fôssem asas de pombo.
lar ou arreganhar ? Realmente, quem contempla as jangadas ou os barcos-
como os vi em Maceió -quando regressam do mar, às
ARRIADO- adj. -Cansado, esfalfado, desarrumado, mal dezenas, tem a impressão de uma revoada de pombos !
vestido.
ASSENTAMENTOS- subs.- "Curriculum itae" do militar.
ARRIBADA - subs. - Ato de arribar. Dados referentes aos militares, registrados nos livros ofi-
ciais. Em geral, as Diretorias do Pessoal são as reparti-
ARRIBAR DEl - Expressão usada qtlando alguma coisa está . ções que se ocupam do assunto. :G:sses assentamentos
acabando. guardam tudo aquilo que diz respeito a cada um dos
Ex. - Estou arribando de cigarros. Fulano está ar- membros da corporação. AS CADERNETAS SUBSIDIA-
ribando de roupa limpa. RIAS contêm translados dêsses assentamentos .
Ex. -Faça constar dos assentamentos dêsse oficial
ARRIBAR - v. - Abandonar o rumo . Desviar o rumo para o elogio que recebeu do Comandante.
sotavento. Emprega-se o têrmo quando o navio não al-
cança o pôrto de destino e toca em outro, fora da escala. - Impossível deferir o requerimento, uma ve~ que
As vêzes, o -mau tempo obriga o comandante a arribar não consta dos assentamentos do requerente a vmgem
par~ defender o navio, para abrigar o navio . Usa-se para a que se refere.
designar o abandono dos projetos iniciais.
ASSEXTAVADO - adj. - Deselegante, errado, inábil, desa-
Desistência . jeitado, mocorongo, esquisito, exótico. Refere-se a pes-
soas; por extensão, a causas .
ARRIBAR - v. (M. Mercante) - Fugir do serviço. Ir para
terra, estando de serviço, a bordo . Abandonar, afastar-se. Ex. -Você viu que calouro assextavado? (Calouro
de mau aspecto, principalmente deselegante, bron.co, mal
ARRUINAR ( . . . O VENTO) - ~udar o vento de direção, amanhado, de físico desagradável, de formas capnchosas,
rondar o vento; saltar o vento de uma direção para outra. imperfeitas).
ARVORA ! - Voz que manda ARVORAR , Cessa ! Pára ! ASSOBIAR- v.- Para chamar vento. Costume antigo, do
ARVORAR~ v.- Cessar, deixar de trabalhar, de remar, de
• tempo da Marinha a pano. Em textos de autor~s navai~,
aparece o verbo com assiduidade. Se a calmana parah-
estudar. Abandonar . Parar . Desistir. sava os navios os marinheiros assobiavam para chamar
. o ' mestre, com o seu apito
vento. Sena . ?
_ Exs. --:- A guarnição do barco arvorou, isto é, parou, • •
.deixou de remar . (A palavra, com êste significado, faz
parte da linguagem naval) . ATARRACHAR - v. - Tesar, apertar, arroxar, tornar ri-
goroso. · ·
· - O atleta corria velozmente; de repente, arvorou.
Ex. - 1!: preciso atarrachar um pouco, a voga está
(quer dizer que parou, desistiu) . muito larga.
- Fulano estava no rancho, assim que deu o 1.0 ATOPETAR- v.- Perder a paciência . Queimar os fusíveis .
sinal de. condução, arvorou e correu para a ponte.
_· Há empregos peculiares. Ex.: O aspirante estava ATRACAR- v. - Chegar perto, encostar, unir-se, abordar,
firme no namôro; não sei por que motivo arvorou (aca- aproximar-se, "dar as falas" . Ser dono, estar de posse,
bou o namôro) . apoderar-se.
ASA ~E POMBO - Maneira de dispor as velas para apro- Ex. - Vê se atracas aquêla garôta. (A regência do
veitar o vento que sopra pela pôpa. verbo é peculiar).
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___: Quando voltei da regata atraquei um bife a ca-


valo. (Anotar a regência) .
- Atraquei na casa da pequena durante as férias.
ATRACADO - v. - Particípio passado do verbo atracar. B
Ex.- Passei o domingo atracado com a apostila. BACALHAU - subs. - Remendo, consêrto, emenda, refôrço,
chapa, tampão.
O v~rb~ ~TRACAR, na vida marítima, como todos
sab~m, sigmfiCa encostar ao cais ou no cais. A embar- Se o navio bate e abre um rombo, vem a turma do
caça? atraca; o navio-tanque atraca (para receber com- arsenal, e coloca um bacalhau .
bustiVel ou outra coisa).
Comumente significa remendo no costado. Colocação
. A reg~~cia do verbo varia. Na Marinha é sempre es- de nova chapa onde havia um rombo .
pecial, exigmdo preposições diferentes. Com relação a Ex.- O navio entrou com um bruto bacalhau (re-
mulheres, a atracação é sempre amorosa . • f mendo) na proa.
ATRACAÇÃO - subs. - Ato de atracar. Ao avistarmos, pela manhã, o companheiro que, ao
fazer a barba, lanhou o rosto, exclamamos:- Estás com
ATRAVESSAR- v.- "É deter o seguimento adiante todo um bacalhau vastíssimo!
ou quase todo, reduzindo o velame e pondo sôbre ~ertas
velas" (Alm. Melo Batista). Usa-se por analogia. Pela mesma razão, os esparadrapos, as gazes, os cura-
tivos têm essa denominação.
AZEITEIRO - subs. (M. Mercante) - Maquinista· aquêle É têrmo delicioso, expressivo, marinheiro.
que trabalha nas máquinas propulsoras ou a~liares
Ver GRAXEIRO. . Não fôsse bacalhau . . .
BACALHAU - subs. (Escola Naval) - Banho que os aspi-
rantes proporcionam ao companheiro, atirando-o ao tan-
que do páteo Saldanha. Motiva-o bom êxito nas provas,
nos exames, na vida . Não é trote . É uma brincadeira.
t
• BACALHOADA - subs. -:-- Anedota ou dito de mau gôsto.
Peruada, frase, réplica .
Piada de mau gôsto.
• • Atitude que revele má educação, falta de classe,
modos estabanados, opinião desastrada ou desrespeitosa;
gafe, rata. Falta de sensibilidade.
BACANAL- subs.- Farra, brincadeira o.u diversão ruidosa,
desordem. Como adjetivo, significa: fácil, simples, corri-
queiro. No sentido de farra ou birncadeira o têrmo não
é marinheiro, todos o empregam. Na Marinha, é sinô-
nimo de coisa fácil, favorável.
Ex. - A prova foi ~acanal , isto é, foi muito fácil.
BACIA- subs. (M. Mercante) -Conjunto de lâmpadas fi-
xadas num dispositivo (cabo ou flo) volante. As vêzes
fica àmarrado no vergueiro para clarear determinado
ponto do convés ou do costado. Chuveiro.
18 19

BAGAGE~- subs.- Pessoa componente habitual do esta- BAIXADO - subs. - Aquêle que baixou à enfermaria etc .
do-maior de ~m chefe. Estende-se àqueles que costumam Fazer a tabela dos baixados é relacionar os homens que
acompanhar esse chefe em várias comissões. Que o acom- se encontram doentes e recolhidos à enfermaria etc .
panham sempre. '
Ex.- O Tene:nte Silva é bagagem do Almirante. BAIXA (DAR ... ) - Deixar o serviço da Marinha. Licenciar-
se do serviço, definitivamente. Abandonar a vida mili-
Qu~r dizer que o Tenente Silva acompanha o Almi- tar. Voltar a ser paisano. Há empregos interessantes .
rante ha bastante tempo, como ajudante-de-ordens. Ex.: Dar baixa no sapato é jogá-lo fora. Precisas dar
. · Quando o Almirante mudar de comissão levará con- baixa nesse boné (substituí-lo por outro). Taifeiro, diga
Sigo o Tenente Silva. ·
O têrmo é e:ctensivo a taifeiros, despenseiros, etc.
BAG~GEM tambem tem o significado normal cá de fora
e designa os teréns do oficial que vai assumir 'a comissão:
, . ao despenseiro que dê baixa no picadinho de couve com
carne-sêca; êsse prato está de serviço há muitas semanas.
Também significa retirar da relação, diminuir, omi-
tir. Ex.: Dar baixa no material de rádio, isto é, riscá-lo
da relação.
Ex.- As 14 horas haverá condução para levar aba-
gagem do comandante João. Dar baixa, neste sentido, é t ornar qualquer cousa
"inexistente", quanto à responsabilidade do encarregado.
BAGANEIRO- ~ubs. (M. Mercante) - Aquêle que vem a
bordo comerciar com a tripulação . Em geral, nos portos BAIXAR - v. - Ir, seguir, sair, retirar-se, ausentar-se, en-
de escala, durante as viagens.
trar, ingressar, recolher-se.
BAGULHO- subs.- Coisa sem valor, que se compra nos Recolher-se ao hospital, à enfermaria, ao camarote,
portos de escala dos navios. Pequenos objetos curiosida- ao isolamento.
des, lembranças. '
- Ricardo não fêz exame? - Não; baixou. (Re-
BAGULHAR- v.- Comprar bagulhos. colheu-se ao hospital ou à enfermaria). - Vou baixar
para não formar no dia 20 (vou para a enfermaria ou
BAGULHEIRO - adj. sÚbs. - Aquêle que compra bagulhos. para o hospital) .

BAILEU: - subs. - Prisão na Escola Naval (destinada aos BAIXAR TERRA - Ir para terra, para a rua, para casa.
aspirantes) . Solitária, xadrez. Sair do navio (em virtude de licenciamento, licença, ou
Ex. - 9 Venceslau pegou dez dias de. bailéu isto é
pegou dez dias de prisão. ' '
• • simples retirada).
Ex. - A guarnição baixará a terra às 17 horas .
. ~a terminologi~ naval·, ~AILÉU é, segundo o Comte. (Quer dizer que a guarnição será licenciada às 17 ho-
Ma~nllo M .. Fonseca, um pavimento parcial abaixo do úl- a • ras). O quarto de retém não baixará a terra.
ti~o pavimento. -~ontínuo, isto é, no espaço do porão; Prova de que as gírias devem ser divulgadas : Certa
nele fazem-se paiOis ou outros compartimentos semelhan- senhora telefonou para a Escola Naval e pediu que cha-
tes. (Arte Naval, 1954, pág. 18) . massem um sargento. Daí a instantes, retrucou o cabo-
A an_alo?ia é imperfeita porque o BAILÉU, na Escola auxiliar (cabo que auxilia o oficial de serviço): -Minha
N~val, nao e local desagradável, nem escuso . Digam os senhora, o sargentou baixou a terra.
clientes .b aseados .. . Soube, depois, que a senhora, ao ouvir a informação
BAIXA - subs. - Ida para o hospital, enfermaria ou isola- amável, perdeu os sentidos, estatelando-se no chão da
m~nto. M?rte. ~es~i~amento· do serviço. Ex.: Quantas padaria donde telefonara. Quando ouviu que o sargento
baiXas,_hoJe? (Sigmfica: quantos homens seguiram para baixara a terra, pensou que êle morrera, que fôra enter-
o hospital ou _foram para a enfermaria). Pode significar rado ...
morte _ou fer;mento. Ex.: Quantas baixas no ataque à
~~çao ? ~o a. expressão BAIXAR A TERRA pertence . BAIXAR A LENHA - Ou BAIXAR O PAU é dar uma surra,
à gina mannheira. É expressiva e usual. dar pancada, maltratar.
20 21

. BAIXAR O OVO (Escola Naval) - Dar pancada, espancar, BANCACHO- subs.- Usado na expressão porão bancacho .
caçar, castigar. E a coberta da carvoeira de meia nau, quando utilizada
para conduzir carga. É corruptela da palavra inglêsa
BALA- adj. (Escola Naval ) - Mau patrão de barco de vela; "bunkerhatch". Os marinheiros conduzem os seus fala-
patrão sem perícia ou sem sorte; manobreiro inábil ou res e os misturam ·com aquêles que encontram nas via-
desastrado . Ex.: O patrão do 2.0 ano é bala, bateu na gens. Eis uma das razões por que considero da maior
bóia, foi desclassificado ! importância o estudo dos falares marinheiros. A Mari-
nha precisa de um paciente dicionarista que registre as
BALANÇO- subs.- Jôgo do navio, no sentido transversal. conversas nas proas e os bate~papos nas praças-d'armas.

BALANCEAR - v.- Usa~se para indicar o trabalho experi- BANDALHO - subs. - Rascunho do livro-de-quarto. Borrão
mental e prévio de máquinas e aparelhos. Ex.: Balancear do livro em que é escriturado o serviço, durante o qual
a máquina, isto é, pô-la em funcionamento, para verifi- o oficial vai anotando as ocorrências em caderno-borrão .
car se tudo está bem, se não pega nada. Depois do ba- Depois, passará tudo a limpo, no livro próprio, oficial.
lanceamento, a máquina é parada, at é que venha a ordem BANZEIRÇ> - adj. - Mar picado, agitado, encarneirado.
de manobrar . Navio que balança muito. Embarcação que joga
BANDA- subs.- Inclinação dos navios para um dos bordos. muito.
Diz-se dos navios adernados, isto é, inclinados para qual- Na Amazônia, significa · vagalhão, agitação nas
quer dos bordos. águas. (Raimundo Morais).
O têrmo é técnico também. Define-o o Comte. Mau- BARATAS (Estar entregue às . .. ) -Estar desorientado, de-
rílio Fonseca: "Banda ou adernamento é a inclinação sarvorado, perdido, inerte.
para um dos bordos; o navio pode estar adernado, ou ter Ser tomado pelo relaxamento, pela indiferença. Fi-
banda para BE ou para BB; a banda é medida em graus". car na miséria ou desprovido de recursos.
Nada mais fácil do que 'o têrmo escorregar do campo
t~cnico para o da gíria. _As tripu)açõe's, por menor es-
BASEADO- adj. - Sabedor, instruído, conhecedor do as-
forço, batizam fatos, . coisas, pessoas, peças, tipos, fazendo sunto, sabido, perito.- Ex.: O cabo é baseado em artilha-
maravilhosas analogias. As vêzes, é analogia ao jeito ria, foi criado na "Tôrre 6" , do Minas. ·
marinheiro. . . Ex.: Certo preá, levado à audiência do BATATA- adj.- A acepção qualificativa não é marinheira.
Comandante, queixava-se de que o paioleiro da 5.a divisão Quer dizer: certo, exato, justo, positivo, afirmativo, en-
o ofendera, chamando-lhe BOCAGE. O Comandante, quadrado, verdadeiro. ·
ho_m em ilustrado, mostrou-lhe que o nome não ofendia,
pois Bocage fôra poeta de raro merecimento. Em Setú- BATE-QUILHA subs. - Festa a bordo. Em geral, festa
bal, a estátua eloqüente mantinha o renome e a fama dançante.
do imortal sonetista. O preá, ingênuo, desligado de gló-
rias literárias, replicou: "Não é isso, não, "seu" Coman- BATENDO - v. (Está batendo) -Usa-se para indicar
dante, êle me chama de Eocae;e porque eu tenho a bôca pancada, ruído anormal de peça, aparelho, etc.
muito grande ... Isso é humilhante ! "
BATER - v. - Ir de encontro, abalroar, colidir, chocar. O
BANANA EM 1.0 UNIFORME- Torta de banana. É a apre- navio bate quando choca com pedra, casco soçobrado,
sentação mais requ~ntada da banana, na Marinha . Os tronco de árvore, etc. Bate, com razão mais forte, quando
despenseiros safos inventam mil sobremesas à base da abalroa outro návio.
banana. Em 1. 0 uniforme é bem recebida. Cobre-a sus- BATER também exprime irregularidade no funcio-
piro tostado! Dentro da mistura, há ameixas! Realmente, namento de máquina, dispositivo, peça, etc.
é _acepipe digno de reforma". Na Escola Naval (1929), era Quando se diz ...:..- qualquer coisa está batendo - é
dia em que os calouros passavam sem sobremesa· em sinal de que foram ouvidos ruídos ou pancadas sucessi-
geral, ofereciam-na aos veteranos. . . ' vas, anormais, constantes; muitas vêzes, rítmicas.
22
. 23
BATER COSTADO- É a faina de bater o costado do navio,
a fim de remover a ferrugem e outras impurezas. Con- BIGODAÇO - Aumentativo de bigode.
servam-se, dêsse modo, as chapas do costado.
BIGODEIRA - subs. - Grande bigode.
BATER FERRUGEM- É a faina de remover a ferrugem das
chapas, dos ferros, batendo-a com utensílios próprios BIGUA- subs. (M. Mercante) - Refeição servida à meia-
(raspadeiras, picadeiras etc.). A ferrugem é, assim, reti- noite e, às vêzes, às quatro horas, para os que entram e
rada, e as peças ficam livres de um dos maiores inimigos . saem de quarto. Consta, geralmente, de carne, farofa,
café e pão.
BATIDA - subs . .:__Pancada, ruído; abalroação, colisão. BILHETE - subs. (Escola Naval) - Nas regatas a pano,
BATIDO (MAR ... ) ~Tem êsse nome o mar que arrebenta, quando . o vento falta, os barcos amontoam-se, permane-
que tem arrebentação. cem juntos, imóveis. Se um dêles se distancia, graças a
correntada ou a leve brisa ocasional, diz-se que êsse tirou
MAR BATIDO é agitado, espumoso, revôlto. um bilhete (V. Loteria).
BATIDA (PRAIA) -Praia agitada, cujas águas arrebentam BISBILHOTEIRA- subs. (M. Mercante) -Registrador de
e espumam . rumos
BEIJOCA - subs. - Navio-Escola "Benjamin 'Constant". BISU - Saber, com antecedência, as questões das provas.
(Quanta saudade o "BEIJOCA" reacende ! ) Antes do exame, saber o que cairà. Ex.: A prova foi ba-
canal, eu sabia o bisu (Escola Naval). (Não é têrmo da
BELICHEBOL- subs. (Escola Naval) - "Esporte" praticado Marinha. Foi importado, nos últimos anos, com a trans-
por aquêles que dormem o dia inteiro, em qualquer lugar. ferência de alunos do Exército ou da Aeronáutica. Vul-
garizou-se) .
BELONGUES - subs. - Pertences, haveres, coisas, merca-
dorias, objetos. Designa as coisas que nos pertencem. BOA PRAÇA - Indivíduo bom, simpático, camarada, hones-
Vem de "Tobelong". to, direito.
BENEFICIO- subs.- Desarrumação, confusão. BOCA DE MAR- Mau tempo, mar agitado, mar revôlto.
Na Escola Naval, era um trote que se dava por brin- Mar grosso, tempestade.
cadeira ou desforra (1928-32). Ex.- Êste menino é nôvo, sem experiência; quando
Ex. - Vamos dar um benefício em Fulano. pegar uma bôca de mar vai levar o diabo ...
Consistia a brincadeira em ir aos armários dêsse Fu- Gíria gostosa, essa bôca de mar !
lano e desarrumar tudo. Ir às malas dêsse Fulano e de-
sarrumar as coisas guardadas. Arrancar botões das rou- BOÇAL - adj. (Escola Naval) - ótimo, excelente, extraor-
pas, cortar cadarços etc. dinàrio, agradável, belo.
Ex. - Fui a uma festa boçal .
BENEFICIO (DAR UM .. . ) - Praticar o benefício. Que dia boçal! (Dia lindo, agradável). Não me pa-
BIGODE- subs.- Volume de água e espuma que a proa do rece têrmo da Marinha.
navio, em movimento, forma, a bombordo e a boreste. BOCHECHAS - subs. - Denominação dada às partes curvas
Ex._:__ O navio entrou fazendo um bonito bigode; ia do costado, a BB e a BE, na proa. Por analogia, dá-se
a 30 milhas. êsse nome às coisas que pareçam bochechas.
BIGODEAR - v. - Enganar, iludir, trapacear, prejudicar.
Ex. - O Carlos foi bigodeado na promoção. (Signi-
fica que foi preterido injustamente).
A C.
CAB}iéEAR- v.- Aporrinhar, intrujar, zombar, prejudicar
intencionalmente, . azucrinar . Proporcionar sofrimentos,
contrariedades, aborrecimentos. Fazer picuinhas, amo-
lar, chatear.
O sentido exato é o de perseguir, causar desvanta-
gens sucessivas a outrem.
CABELOS (PELOS CABELOS) - Pendurado, suspenso. Amo-
lado, aborrecido, atestado, irritado, desesperado, impa-
ciente, chateado.
CABRESTANTE- (FIRME COMO CABRESTANTE) -Só-
lido, fixo, rijo, bem plantado, irremovível, irredutível.
CAÇADA - subs. (E. N.) - Surra, pancadaria , castigo cor-
poral, bordoada. É sempre coletiva.
Quando um colega sai dos eixos, leva uma caçada
da turma . As vêzes, o paciente é calouro. Calouros muito
safas levam caçadas. Pode ser manifestação de regosijo,
nos aniversários, na época de exames, nas datas alegres.
A caçada autêntica consistia em chineladas nas ná-
degas.
CAÇAMBADA - subs. - Pancada, golpe, pescoção, paulada,
agressão.
Dar uma caçambada é o mesmo que dar um pes-
coção. ·
Em sentido figurado, quando o indivíduo sofre des-
gôsto, prejuízo, preterição; injustiça, diz-se que levou
uma C.A:ÇAMBADA.
CACHIMBO A AMURADA (M. Mercante) - Cachimbo ao
canto da bôca.
CADERNETA- subs.- Livro (caderno de capa dura), em
que é registrada a vida do pessoal da Marinha. É indi-
vidual . Cada oficial, suboficial, sargento tem a sua ca-
derneta; cada marnheiro, a sua. Contém todos os ele-
mentos relativos ao hom~m , na vida civil, e às suas ati-
vidades profissionais. O nome completo é caderneta sub-
sidiária. Tem valor legal.
Só vale o que está na caderneta. Nada é requerido
sem que o fundamento esteja devidamente registrado na
caderneta.
26 27
CAGALHOÇAS- subs. (M. Mercante) -Marinheiro nôvo O têrmo CAMAROTE é usual. A prisão do oficial
na profissão, o mesmo que penosa. (Ver PENOSA). (hoje, não), desde que requeresse reclusão, seria no ca-
CAIR- v.--:- Desviar-se do rumo, por efeito do mar, do vento, marote. Ex.: O Tenente pegou três dias de camarote.
?a m~re, etc. o_ navio também cai por estar à matraca; CANETA- subs. (M .. Mercante) -Vassoura.
Isto e, sem governo. Deslizar. O navio segue determi-
na~a ~·ota; ~os :poucos, por efeito de fôrças estranhas, CANTANTE - subs., adj. - Gozador, mentiroso, aproveita-
vai camdo, Isto e, vai chegando para perto da costa ou dor, preguiçoso, folgado, tapeador, contador de rodelas,
afas~ando-se dela. Os navegadores prevêm o caimento,
corn~em-no, compensam-no. Por vêzes, não percebem
golpista.
ou n ao calculam, exatamente o seu valor sobrevindo Os cantantes passam boas cantadas. São mestres
acidente. ' ' no conto do vigário ou, simplesmente, em pequenas ta-
-' peações, que se convertem em comodidades.

.
CAIMENTO - subs. - Ação de cair, de deslizar.
Cantante é, afinal, isso mesmo: o comodista que se
_E~. - Esta embarcação tem muito caimento, é ne- proporciona sombra e água fresca, servindo-se de sua
cessano navegar com cautela. ) habilidade de persuasão.
CAIXA - subs. - Caixa de madeira em que os marinheiros
guardam as suas coisas. Não é regulamentar. Os mari- CAOL (KAOL) - subs. - Líquido ou pasta para limpar me-
n_h~iros gos~am de usá-la e lhe dispensam cuidados espe- tais. Não se trata, apenas, do líquido que tem êsse nome,
ciais. Enfeitam-na com carinho. Pintam-na, põem-lhe essa marca. Qualquer "preparado" que sirva para limpar
capa de pano, decoram-na com retratos de mulheres bo- metais é caol.
nitas (Farta contribuição de Hollywood e ·do cinema ita- Ex.- Vou "dar" um caolzinho nos amarelos porque,
liano. Algumas ·· constantes" revelam as preferências da amanhã, haverá mostra. (Caol sem K desmerece
.tdarinha . .. ) . (Há também a Caixa de Economias) • muito .. . ).
CAJU - subs. - Vento forte de noroeste, na baía de Guana- CAPA- subs.- Define o Comte. Maurilio Fonseca: "Por o
bara . Surge repen tinamente e não dura muito. Levanta navio à capa, ou capear, é manter o navio com a proa
mar, vira embarcações, rasga toldos, faz g·a rrar escale- chegada ao vento para aguentar o mau tempo, com pouco
res, lanchas, etc. É um Deus nos acuda ! Cai, em geral, seguimento, mas abatendo consideràvelmente e forman-
nos dias quentes e ·abafados. do uma esteira calma." Usa-se, como têrmo de gíria, por
Parece que a denominação proveio do bairro do Caju analogia. Os homens do mar descobrem sempre uma ma-
(onde está o cemitério dêste nome) , uma vez que o vento neira sui-generis de comparar, identificar, caricaturar.
sopra de lá.
• 11 CAPACETE- subs.- Usou-se, na Marinha, há cêrca de 30
CALMARIA PODRE - Calmaria, falta absoluta de vento. anos, um chapéu colonial, branco, revestido de tecido
Ex. : " ... quando a calmaria podre e maré contrária re- leve, guarnecido de cortiça. Coisa de explorador africa-
tinham can oas . .. ·~ (Xavier Marques - "Praieiros - no. Era elegante, imponente. Os patescas exibiam-no
Maria Rosa"- pág. 27). com explicável orgulho. ~sse capacete era conhecido
CAMALEAO- subs.- Centro de Adestramento Almirante também por COLONIAL. Sem dúvida, nome trazido das
Marques de Leão. colônias africanas por oficiais inglêses ou portuguêses .
CAMAROTE- subs.- Quarto onde se aloja o oficial subofi- CAPITAO- subs. (M. Mercante) - Grumete mais moderno
cial ou sargento. Morada do oficial, suboficial 'ou sar- do navio. Encarregado dos serviços mais sujos, como a
gento. A bordo não se diz : vou para o quarto dormir. a remoção do lixo.
Seria absurdo igual à expressão: vá ao almoxarifado bus-
car uma corda para prender o escaler. Diremos: vou dor- CARAO- subs. -Aspecto do céu; "fisionomia" do tempo;
mir no camarote; vá ao paiol buscar um cabo para panorama. Usado para indicar o mau aspecto do céu,
amarrar o escaler. do mar, da natureza, prenúncio de mau tempo.
29
28
CARREGAR (O PANO) - Define o Comte. Melo Batista:
CARGA - subs. - Material sob a responsabilidade dos encar- "Carregar é a operação de abafar a vela de encontro à
regados de incumbências. vêrga ou pau que trabalha a fim de subtraí-la à ação
A organização da Marinha é quase perfeita. Pouca do vento."
gen~e sabe a que minúcias chega a curiosidade adminis- Obs.: Há outros empregos do verbo carregar, prin-
tratlv3:. Tod? o ma~erial de bordo (repartições, bases, cipalmente na Artilharaia e no Serviço de Intedência.
e~c.) e relac10na~o, ~nventariado. Há livros próprios -
Livros de Incumbencta- nos quais é feito o inventário CARTEAR - v. - Contar as milhas percorridas ou a percor-
obj~to por objeto. Êsses livros contêm a relaçao uo ma~ rer. Medir distâncias nas cartas de navegação. Empre-
tenal e os preços ...Assim, cada oficial conhece a carga ga-se também, na gíria, como sinônimo de conversar
sob sua .resp?nsabi!Idade. As autoridades, por seu lado, fiado. Ex.: O tenente estava carteando a pequena ..,.
podem fiscalizar, comodamente, o estado dêsse material.
E~.: O Encarregado de Navegação só desembarcará de- , ' CASA - subs. - O têrmo é empregado em expressões que

.
pms de passar a carga. (Quer dizer que o oficial encar- indicam estar fora do ambiente naval, em conseqüência
re~~do da navegação só mudará de navio depois de trans- de reforma, de afastamento do serviço ativo. Ter saído
mitir ~ o~tro ofi~ial o material sob sua guarda) . Êsse ) da ativa.
~atenal e _confendo, peça por peça, sob as vistas do Ime-
d~3:to. Serao l~vrados têrmos de conferência e responsa- CASA (ESTAR EM ... ) - Estar reformado; fora, portanto,
b~lldade .. O Tnbuna} de Contas participará da conferên- do serviço ativo.
cia, no fim do exercicio . Ex. - Como vai o Comandante Florêncio ? - Refor-
mou-se há seis meses; já está em casa; "está na pra-
CARIZ - subs. - Aparência do tempo da atmosfera. As- teleira" .
pecto do céu, do mar, das nuvens. E~.: O tempo está de Ex. - Assim que sair o aumento, irei para casa ...
mau cariz, isto é, está mau tempo.
CARE~IN'!'EIRO- subs.- Vento do mar que sopra com vio- CASA (VOU PARA ... ) -Vou pedir reforma, vou deixar o
lencia nas costas meridionais do Brasil . Vento rijo, no serviço ativo.
sul do Brasil. . Ex. - Quanto vais levar para casa?
CARREGAR - v. - Responsabilizar alguém pela quantia - Levarei os vencimentos integrais.
corre~pondente a determinado objeto, material, etc. Fazer CASACA DE FERRO - subs. - Encouraçado "RIACHUELO".
o registro da quantia mencionada para que o responsá-
vel a pague. CASCA-GROSSA - adj. - Mal educado, grosseirão, estúpi-
Ex. -A Diretoria de Intendência mandou carregar do (na acepção brasileira), malcriado, incivil, "gaffeur".
uma enceradeira na caderneta do Tenente Malaquias.
•• •
CASTANHO- subs. (M. Mercante). Remo. (Ver PINHO).
A frase, aparen~emente mal construída é usada com
freqüência. ' CASTOR - subs. - Marinheiro ou oficial de Marinha que
. Si~nif~ca que o Tenente Malaquias foi carregado na não navega (Larousse).
Importan~Ia correspondente à enceradeira, desde que ela CATADURA- Semblante, aspecto, fisionomia, cara. As vê-
se e~trav10u ou desapareceu. Na ocasião da conferência zes, é a aparênçia total da pessoa. Usa-se, em geral, na
do Livro de Inc~mbência , o Tenente Malaquias não mos- expressão MA CATADURA. Nêste caso, significa má apa-
trou .a enceradeira ao ~eu substituto ou autoridade; daí, rência, mau aspecto, cara antipática.
ter s1do carregado, a fim de recolher aos cofres públicos
a quantia correspondente. CATAVENTO OU CATA-VENTO- subs. ~É o lugar, a bor-
do, onde fica o oficial que dirige a manobra. É próprio
CARRE~AR (O LEME) -Virar o leme para um dos bordos. dos navios a pano. Ex.: "No Catavento de um Veleiro"
Inclmar o leme. Dar certo ângulo ao leme. Guinar.
30
31
é o título de um livro do Alm. Ernesto de Melo Batista - Chame o paioleiro do mestre, êle sabe onde estã
sôbre o "Guanabara". Diz Gastão Penalva: "Bom na• a lanterna primitiva, a que veio com o navio; êle não
navegação (o Gaudêncio), safo na manobra, esperto no pode deixar de saber, pois é caverna do navio.
catavento ... " (Patescas e Marambaias, pág. 48).
CAVERNA-MESTRA - É um superlat ivo expressivo. Muito
CATURRAR- v.- Balanço do navio no sentido de proa e caverna.
e pôpa. Por analogia, emprega-se como gíria. Se um in- Que é caverna em um navio? Tecnicamente:
divíduo anda oscilando para a frente e para trás, ca-
turra ... "Peça d.e madeira flexível, de forma curva, fixa à
parte SiU;perior da sobrequilha. As suas extremidades
CAVADO - subs. - Concavidade do mar. Depressão entre superiores são ligadas aos alcatrates". ("Manual do Pa-

-.
duas ondas. trão de Pesca". - CMG Frederico Villar).
"É a parte da balisa que une a quilha e vai até o
CAVADO (MAR ... ) -Estado do mar quando há ondas lon- bôjo (encolamento) da embarcação." ("Marinha Teóri-
gas, que produzem concavidades, depressões, sulcos. On- ca" - 29 Tte. Adelino Braz das Neves) .
duiação .
Pelas definições, parece claro que a caverna é uma
CAVALO BRANCO (M. Mercante) -Frio rigoroso, intenso. parte essencial e "eterna" do navio . A caverna será a
última peça a ser substituída; pelo menos, das últimas.
CAVEIRA - subs. - Pessoa, indivíduo, tipo, sentinela,
guarda. CAXANGA - subs. - Chapéu de marinheiro, gorro.
Ex. - Vou ver se arranjo um caveira para entrar CERRAR- v.- Escurecer o tempo; tornar-se mau o tempo.
de serviço por mim. (Natar o gênero masculino) . Cair cerração, neblina, nevoeiro, a ponto de impedir a
visibilidade. Aproximar, diminuir distância. Ex.: O tem-
CAVEIRA-DE-PAU - Aplica-se a expressão ao Oficial de po estava cerrado na barra, não entramos.
Serviço.
Por extensão, a qualquer pessoa de serviço. Ex. - Cerrar fileiras!
Talvez a aparência do "caveira-de-pau" revele can- CERRADO- v. adj.- Relativo ao verbo CERRAR. Ex.: O
saço, esgotamento. tempo está muito cerrado, há muita cerração.
Há serviços que exigem grande esfôrço . Não provirá a
expressão da analogia com fantasma, uma vez que o ofi- CHA DE BURRO - Canjica . "Canjica de milho branco, o
cial de serviço anda, qual fantasma, durante a madru- saboroso mungunzá baiano, para êle é chá de burro. "
gada, pelo convés deserto? (Gastão Penalva, "A Galera", Dez. 1944) .
Creio que a denominação só calha bem quando é • •
atribuída ao CAVEIRA-DE-PAU em navio parado, fun- CHANFRO - subs. - Rosto, cara, face, fachada, fisionomia.
deado, atracado. O navio em movimento transmite no- Usado, em geral, pejorativamente, quando a beleza
breza ao Oficial de Serviço e o integra no dinamismo da ou a harmonia estão ausentes. Também é aplicado ao
máquina, do conjunto, do próprio mar revôlto. rosto de pessoas antipát icas; chefes de maus bofes, auto-
ridades muito tesas, pessoas ranhetas, pirracentas, amo-
CAVERNA :--- adj. - Antigo, amigo do navio, apegado ao lantes. Aparece o professor exigente: -Olhem só o chan-
barco; embarcado, há muitos anos, no mesmo navio· fro dêle! (Embora o professor seja apolíneo, se dá graus
marinheiro que passa muito anos no mesmo navio. ' baixos, tem chanfro ... ) A origem é chanfrar: "Cortar em
Por extensão: crente, patesca, dedicado. ângulo ou esguelha; cortar com plaina ou garlopa as
arestas ou quinas de ; fazer chanfros em". (PDB).
Exemplos: A bordo do "Minas Gerais" havia o cabo
Bispo, com mais de vinte anos de navio; era um caverna. CHATINHA (M. Mercante) - Têrmo afetuoso ou pejorativo
Não saía, não desgrudava do navio. com que se designa o navio.
32 33
CHAVECO- subs.- Cruzador "PRIMEIRO DE MARÇO". "Mais dois dêles estavam, em geral, ainda a traba-
lhar quando se servia a sopa da meia-noite, chamada
CHAVETA- subs. (M. Mercante). -Nariz, ventas. chora". (ALAN VILLIERS- A CAMPANHA DO ARGUS
CHECAR- v.- Conferir, comparar, marcar, examinar, fis- - Trad.· de José da Natividade Gaspar - Liv. Clássica
calizar. Edit Lisboa, pág. 261) .
Ex. - É preciso checar os vales da cantina com os CHUPA- adj.- Aquêle que não faz fôrça; o que se exime
registros da caixa. de qualquer trabalho ou faina. Preguiçoso . -Na Póvoa
de Varzim (Portugal) há as variantes CHUPANTE e
CHECAGEM - subs.- Ato de checar. Ex.: Fazer a checa- CHUPISTA: que vive à custa do alheio .
gem dos tiros.
CHEFE DE ALVIELA (M. Mercante) - Môço de paiol.
CHEGA LA SE PODES (M. Mercante) - Toque de reunir.
Ordem de concentrar. Reunir os homens.
' . CHUPAÇAO- subs.- Ato de chupar.
Em navio em que não há muitos exercícios e fainas,
há muita chupação.
CHUPAR- v.- Não fazer fôrça, poupar-se, descançar nas
CHERIFE- subs. (M. Mercante) -Comandante do navio.
• costas dos outros.
(Apart. de sheriff) . Não envidar esforços, não trabalhar.
Na Póvoa de Varzim (Portugal) significa enganar os
CHIBATA - subs. -Chicote usado para castigar os mari- outros (Santos Graça - O Poveiro, pág. 221) .
nheiros, nos velhos tempos. Instrumento que servia para
·dar cumprimento às penas impostas pelos comandantes. CHUPAR UMA PRETERIÇÃO- Ser preterido; não ser pr?-
A chibata penetrou na Marinha do Brasil, vinda de movido na ocasião própria, em benefício de outro, ma1s
outras Marinhas. Foi banida quando a mentalidade não atrasado na escola.
mais a admitia. Nunca foi característica da nossa Ar- CHUVEIRO- subs.- Na Marinha Mercante o nome é BA-
mada. CIA. Conjunto de lâmpadas fixadas em dispositivo, que
Hábito de outros t empos, de outras épocas, sob dife- permite levá-las de um lado para outro, pendura-las,
rentes concepções de disciplina e autoridade. etc ... O conjunto fica alimentado, prêso à tomada de
eletricidade, pronto a ser u tlizado .
CHICO - subs. (M. Mercante) - Comandante do navio. • a
Capitão de navio. CIMENTO ARMADO - subs. - Pirão, puré.
CHICOTE - subs. - Extremidade de cabo, amarra ou cor-
rente . Ponta do cabo.
CHILIPAR ou CHILIPIAR - v. (M. Mercante) - Dormir
.. . CINZENTO - subs. - Pintura cinzenta. Aplica-se, em geral
às anteparas. O cinzento é côr naval. Os navios de
guerra são cinzentos.
Quando aparece navio branco, a primeira idéia é a
(Apart. de to sleep).
de iate (yacht) .
CHIBA - subs.- Dancinha improvisada na proa do navio. Os navios hidrográficos são brancos, algum8:s vêzes.
Muitas vêzes, há só marinheiros na brincadeira; faltam Os que servem de hospital também.
as damas. É diversão de marinheü·os.
CINZENTO no linguajar diário, é a côr cinzenta de antepa-
CHOPEADO - adj. -'- Embriagado, bêbedo. ras, alguns tubos, chapas, aparelhos, etc. Assim, LAVAR
(Formou-se de chopp) . CINZENTOS quer dizer lavar anteparas, chapas, tubos,
que, normalmente, são pintados de cinzento.
CHORA - subs. - Sopa da meia noite, servida nos barcos Em determinado dia da semana, há um regime es-
portuguêses de pesca do bacalhau, na Terra Nova e na pecial: lona e' areia, limpeza de amarelos e lavagem de
Groenlândia. cinzentos.
34 35
CIRCUITO- subs.- Relação, ligação interêsse, combinação, COCHA- subs.- Proteção, pistolão, cunha, auxílio, ajuda,
conjunto, companhia. empurrão, recomendação . A cocha é ciência das mais
profundas; é também, arte sutilíssima. Merece um tra-
CIRCUITO (ESTAR FORA DO) - Desligar-se do conjunto tado. A cocha é uma grande instituição: decide, ampara,
ou não fazer parte dêle. salva, justifica, aceita, compreende, cria valores, engen-
Combina-se qualquer causa; as pessoas que não to- dra mereceimentos. É humana.
marem parte estarão fora do circuito .
ARRANJAR OU METER UMA COCHA.
CIRCUITO (ESTAR NO) - Tomar parte em algum traba- Arranjar uma proteção, pedir auxílio a pessoa in-
.lho, em alguma combinação. Fazer parte de um con- fluente.
junt o. Ex. - O aluno está em maus lençóis, está com a
Ex. - Já paguei a minha parte; estou no circuito. f • borda nágua, estudou pouco, não sabe a matéria; resolve,
Dá-se qualquer fato a bordo; abre-se inquérito; tôdas então, meter uma cocha. Vai ao amigo do professor e
as pessoas citadas estão no circuito. pede, chora as mágoas, arrazoa, "prova" absurdos !
I I
O amigo, por sua vez, recomenda ao professor o seu
CISNE BRANCO- Qualquer navio a pano. Era o navio-es- cochado, o seu protegido.
cola "BENJAMIN CONSTANT", incompreensivelmente As comissões no estrangeiro movimentam, intensa-
perdido, desmontado e vendido a paisanos! Deve-se la- mente, as cochas e os cochados.
mentar, sempre, o desaparecimento do "BENJAMIN
CONSTANT". Relíquia inesquecível, gloriosa, de tradi- COCHADO - adj. - Aquêle que desfruta da cocha; o que
ção cívica, histórica e marinheira ! Sofreu a injustiça se beneficia de boas relações, boas cochas. O cochado é,
dos homens, talvez de seus velhos timoneiros e caveiras- em última análise, um bem-aventurado; não tem preo-
de-pau! O "Benjamin" deveria ser, hoje, um museu de cupações, não sofre injustiças (a não ser a de ter, sem
marinharia, de troféus marinheiros; uma oficina de ma- merecer), tudo se resolve a seu contento, na hora certa,
rinharia, uma fonte inspiradora de crença. Museu dos
Aspirantes da Marinha . sem complicações ...
COCHAR - v. - Proteger, amparar, proporcionar as me-

.
CISNE BRANCO também é o "Saldanha", o NE "ALMIRAN-
TE SALDANHA"". lhores situações aos amigos e filhos de amigos; evitar
desvantagens ou desconfortos a certos venturosos indi-
Em verdade, poucas analogias serão tão gratas ao ,. víduos .
espírito dos navegantes. Poucas seduzirão tanto os artis-
tas que sabem contemplar veleiros, no cenário das águas. COLOCADO - adj. - Distinto, alinhado, posudo, respeitável.
Nada há de mais romântico do que um navio-escola, a "Poseur", insaciável, orgulhoso.
pano, à noite, iluminado de luar, traçando, carinhosa-
mente, o caminho da aventura ...
• • Ex. - Gosto daquele comandante porque êle é muito
colocado.
A CANÇAO DO MARINHEIRO (CISNE BRANCO), de Antô- Ouve-se, freqüentemente, êsse comentário, entre ma-
nio Manuel do Espírito Santo e Benedito Xavier de Ma- rinheiros. Quer dizer que o tal comandante é distinto,
cedo traduz muito bem a imagem . É a canção senti- aprumado, tem boas maneiras, não admite intimidades.
mental da gente do mar. Fala da saudade da terra ama- - Môça colocada aquela! Ia passando, quando eu
da, evoca o "cisne branco" que, em noite de lua, vai des- disse: Mulher bonita está aí. . . Ela sorriu e respondeu:-
lizando num lago azul ... como o meu navio que tam- Muito obrigada, seu cabo. (Frases ouvidas, pelo autor,
bém flutua nos verdes mares de norte a sul ... na portaria do Ministério da Marinha) .
COATI RABUDO- subs- Calouro, novato, estreante. COLONIAL- subs.- Capacete colonial usado, antigamente,
na Marinha. Há mais ou menos trinta anos, ainda havia
COBRA ou COBRAO - subs. (EN) - Patrão de muità pe- oficiais patescas com os seus coloniais . Eram chapéus
rícia na arte de velejar. brancos, revestidos de cortiça, cobertos por um tecido
36 37

branco. Muitas vêzes, com um pedaço do tecido caído preciosos. Não têm papas na língua; são entradas, con-
para as costas, como no deserto africano. Ver CAPA- fiantes. Lavaram a roupa da tenentada desde os primei-
CETE. ros embarques. . . Deram à Marinha os filhos e os netos.
Muitas vêzes, são viúvas de marinheiros. As lavadeiras
COMISSÃO - subs. - Missão profissional. Serviço que se môças namoram, enquanto a faina de conferir os róis se
deve desempenhar. Trabalho profissional a executar, du- desenrola na forma do costume. Uma ou outra, de beleza
rante algum tempo. Não é tarefa de momento. A comis- invulgar, merece atenções e derriços. Muitos casamentos
são, em geral, é de desempenho longo. começaram nessas sextas-feiras. A Marinha recolhe, em
Ex. - Qual é a comissão do Comte. Alberto ? sua crônica, a presença das lavadeiras. Elas amam o mar
-Está comandando o "Almirante Saldanha" . apaixonadamente, e a êle pertencem pelo convívio longo
e compreensivo.
- Boa comissão.
COMPADRE - subs. - Apelido que o pessoal do "MINAS CONTAR EMBARQUE- Permanecer embarcado durante de-
GERAIS" deu ao Enc. "SÃO PAULO" . terminado período exigido por lei.
OBS.: Atualmente - ignoro se já foi assim - o
COMPANHA- subs.- A tripulação de um barco; a reunião embarque pode ser contado em terra. Dispositivo legal
das mulheres para a divisão dos ganhos, "fazer a campa- permite, em determinadas condições, a contagem de tem-
nha", "ganhamos em comum", "ir de campanha". (O po de embarque, estando o "embarcado" em terra!
Poveiro, Santos Graça . Póvoa de Varzim - Portugal) .
Não deixa de ser extremamente curioso e singular.
CONDUÇÃO - subs. - Qualquer veículo que sirva para Nada tem a ver com o sentido lingüístico do têrmo. Eis
transportar. Transporte . Na Marinha o sentido é pe- um caso de interpretação que poderá, um dia, perturbar
culiar, tem sabor marinheiro . o raciocínio de investigadores "paisanos". Jamais com-
Ex. - A que horas é a condução ? preenderão o "fenômeno semântico" que justifique o em-
barque de um marinheiro em terra. Os que estudamos
Significa: a que horas é o licenciamento ou, simples- filologia portuguêsa, deparamos problemas dêsse jaez;
mente, o veículo, a lancha ou ônibus que conduzirá os palavras cujo significado está em completo desacôrdo
homens para terra. com o emprêgo corrente. Caprichos da linguagem ...
CONDUÇÃO DE COMPRAS - Lancha ou escaler que larga
de bordo antes da alvorada e regressa com as compras, • • CONTROLADA - subs. - Nome que indica a última fase do
isto é, com as melhorias do dia. Saem do paiol os gêne- exercício de tiro. Vem de "firecontrol".
ros triviais, de "sustância" . O paiol só tem a base, como
é sabido. As melhorias ou os gêneros que precisam ser
adquiridos, diàriamente, vêm de terra, pela manhã, na
.. . CORAMASTRO- subs.- Vigia, plantão, sentinela.
Corruptela da expressão inglêsa "quarter-master".
condução das· compras.
Obs.: Há outras conduções: CONDUÇÃO DO HOSPI- CORRER - v. - Praticar a corrida (Ver CORRIDA) .
TAL, CONDUÇÃO DO EXTERNO, CONDUÇÃO DOS LI- Conjuga-se em todos os tempos e modos. Jamais
CENCIADOS, etc. será verbo defectivo.
CONDUÇÃO DAS LAVADEIRAS - Lancha que conduz as CORRER COM O TEMPO - Dar a pôpa ao vento, mantendo
lavadeiras para bordo. Uma vez por semana (quase sem- o pano reduzido. É recurso contra o mau tempo. Usa-se,
pre às sextas-feiras), as lavadeiras (tradicionais amigas como gíria, por analogia.
e símbolos de fidelidade) vão a bordo buscar a roupa S!Uja
dos oficiais, suboficiais, sargentos, marinheiros. e a do CORREDOR - subs. - Aquêle que corre, que pratica a cor-
navio. É uma festa! As velhas, com tempo de serviço com- rida. Bajulador, adulador, servil, espinha-mole, puxa-
pleto, sabem coisas incríveis da Marinha. Conhece~ ~l­ saco, águia. O melhor sinônimo de corredor, na lingua-
mirantes e cavernas da velha guarda. Contam epsodios gem comum, é puxa-saco.
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COURO DE ONÇA- Dívida antiga, calote . Explica Penalva:
Não se corre só para cima, isto é, para os que man- "Desde então, no Ladário, em Corumbá, por tôda a parte
dam; corre-se, também, para baixo, estabelecendo um da imensa região mato-grossense onde foi divulgada a
clima de simpatia e receptividade. façanha do Gaudêncio, quando alguém quer se referir a
uma dívida que ficou para as calendas gregas, ou a um
Os indivíduos amáveis, os "rapazes muito finos", que calote de primeira classe, é costume afirmar:
todos conh~cemos , por vêzes, não passam de objetos cor-
redores. Vao longe. . . O teatro e a literatura de costu- - Levei um "couro de dmça". (Gastão Penalva
mes registram espécimes perfeitos dessa fauna. "Patescas e Marambaias" - pág. 53) .
Poderíamos endereçar a êsses arrivistas um conceito CROCODILO- adj.- Crente, patesca.
atribuído a certas mulheres: "Não devemos temer as mu-
11?-eres que simulam sentimentos falsos, mas aquelas que CRONICO- adj.- Avarento, pão duro, unhas de fome.
srmulam sentimentos verdadeiros ... "
. Há corr:e~ores sutis, hábeis. Alguns fingem atacar; CROQUE- subs. (M. Mercante) -Garfo.
simulam cnt icar resoluções, ordens. regulamentos. No
~u.ndo, pel_a inflexão da voz, pela atitude acocorada, pelo
CRUZAR - v.- Navegar, passar, viajar. Passar ao largo.
Jeito humilde, pela presteza intencional, juram servidão Patrulhar.
amor, doce fidelidade. ' Emprega-se, na navegação: cruzar duas retas.
Manifestações: Estar sempre por perto qi'.Iando che- CRUZAR REMOS - Cessar o trabalho, as atividades. Parar
gam os chefes; pass~r, ."por acaso", exibindo roupa suja
de graxa, pelas proximidades do chefe . . . É arte genial ! de comer (cruzar os talheres).
CORRIDA-::- subs.- Agrado, chaleirismo, bajulação, lisonja, CUCA - subs. ..,.-- Cozinheiro, mestre-cuca, chefe da cozinha.
adulaçao, servilismo .
. A corrida é um processo de agradar a qualquer preço.
Mmtas vêzes, é sutil, disfarçada, encoberta, falsa. Em
geral, esconde calculada hipocrisia. Quase sempre dá os
res'!lta~os previstos; daí a sua larga e sábia (sabida ... )
apllcaçao.
CORTAR AS AMARRAS -Libertar-se soltar-se ir embora
· desprender-se. Cumprir a obrigação, desobrlgar-se. ' • •
COSER - v. - Encostar-se, aproximar-se, juntar-se.
COSIDO- Encostado, muito junto, unido.
Ex. -O navio vai muito cosido à costa.
.. .
COZER BATATAS (M. Mercante) - Ressonar com estridên-
cia. Roncar.
COURAÇA- subs., adj. -Pessoa que não gosta de tomar
banho . Usava-se, na Escola Naval (1928-1932, pelo me-
nos), para designar o aspirante que não tomava banho
de chuveiro
- todos
. . os dias (não havia banho de imersão ,
a nao ser na piscma; no mar, era proibido).
O brasileiro de certa camada social abusa do banho·
é freqüentador assíduo do chuveiro .. No inverno essa vo:
lúpia diminui. Revelam-se então os couracas ... Por falta
de água e sabão, o corpo adquiria uma couraça desagra-
dável. ·

D
DAR BAIXA- Significa retirar da relação, diminuir, omitir.
Ex.- Dar baixa no material de rádio, isto é, riscá-lo
da relação .
Dar baixa, neste sentido, é tornar qualquer causa
t • "inexistente", quanto à responsabilidade do encarregado.
DAR COM OS BURROS NAGUA- Ter mau resultado, não
conseguir os objetivos, falir, arruinar-se. (Não é expres-
• • são naval).

DAR COM OS COSTADOS- Ir para algum lugar; ir ocupar


posição.
(Não é expressão naval) .
DAR EM DESPESA - Abandonar, jogar fora, ficar indife-
rente, não dar importância, aceitar com resignação, con-
siderar perdido.
Ex. - Aquêle sujeito deu a vida em despesa; en-
frenta todos os perigos.

.. . DAR PÉ - Ser acessível, compreensível. Emprega-se para


qualificar assunto que se pode entender, matéria ao al-
cance da maioria .
Ex. - Se a conversa é sôbre Balística, não dá pé
para mim .
DAR UM SOCO NO COMISSARIO (M. Mercante) -Pedir
dinheiro antes do dia do pagamento.
DAR UM TIRO NO IMEDIATO (M. Mercante)- Pedir uma
licença sem ter direito.
DEFUNTO - subs. - Massa feita com farinha e estôpa. Ser-
ve para vedar buracos . É usada n o norte do país (região
amazônica ) , e é empregada em reparos de emergência.
Quando a embarcação bate em pau, que vem à deriva, e
abre água, os caboclos prepar am um DEFUNTO, com o
qual vedam a entrada da água . Também é amarração
de fortuna, em terra .
42
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DEIXAR - v. - Passar, ultrapassar .
DESBOLINAR-SE- v.- Safar-se, agir, enfrentar situações,
Indica posição relativa. Assim: - Deixamos a ilha trabalhar, desembaraçar-se, tomar atitudes claras, pra-
por BE, isto é, a ilha ficou à nossa direita, quando pas- ticar atos eficientes. Ex.: " . . . e no primeiro pôrto a que
samos por ela. _ chega desbolina-se em aventuras donjuanescas de meter
Pode indicar partida do pôrt o, do fundeadouro. Ex. : num chinelo os viúvos e os solteiros." (Penalva- "Pa-
Deixamos a Guanabara às 18,00 horas. tescas e Marambaias"- pág. 15).
DEITAR CARGA AO MAR - O mesmo que BOTAR CARGA DESBOLINADO- adj. - Safo, esperto, inteligente, efici~nte ,
AO MAR. desembaraçado, apto, diligente, ativo, capaz, audacioso,
jeitoso .
. DENTRO (PASSAR POR ... ) - A expressão é clara. Passar 6 •
por dentro dos Abrolhos quer dizer: passar entre o con- DESCANJICADO - adj. - Escagalhado, desarranjado, de-
tinente e os Abrolhos. Passar por fora da Redonda, quer sengonçado, desarmado. Mal uniformizado, relaxado.
dizer: passar pelo lado do oceano largo .
DESCOCHADO - adj. - o contrário de cochado. Com êste
DERIVA (A)- A DERIVA- Ir com a correnteza ou com o
• • pega tudo .. .
É

vento. Emprega-se para designar deslocamento por ação


do vento ou da corrente . DESCOCHAR- v.- Perseguir com o intuito de prejudicar;
não proteger, intrigar, fazer referências prejudiciais.
Ex. - O barco vai à deriva, isto é, vai "andando" ao
sabor da corrente ou do vento. Vai caindo - é outra DESCRENTE - adj. e subs. - Aquêle que não acredita na
expressão usada. profissão, displicente, marambaia. Pessoa que não revela
entusiasmo pela carreira. Ex.: No livro "Patescas e Ma-
DERRABADO- adj.- Navio que está com a pôpa enterra- rambaias", de Gastão Penalva, há um capítulo (pág. 71)
da, muito mergulhada. intitulado UM DESCRENTE. Está claro, ali, o conceito .
DESABONADO- (M. Mercante) - Cambal~ante, sem equi- DESEMBARCAR - v. - Antônimo de EMBARCAR. Aceitas
líbrio; em geral, por embriaguez. as analogias e empregos citados.
Ex. - O foguista vai desabonado.
• • Ex. - A tenentada está muito sonhadora; é o mal
de viver desembarcado. Há seis meses numa base, eis o

.
DESABOTINADO - adj. - Qualifica o indivíduo descontro- resultado.
lado, desgovernado, amalucado, impulsivo.
.. DESGUARNECER- v.- Deixar sem ninguém, desocupar,
DESABOTINAR - v. - Descontrolar-se, desgovernar-se
Agir sem equilibrio ou senso comum. retirar os homens. Esvaziar.

DESARVORADO - adj. - Desorientado, tonto, zonzo, desar- DESTRAMBELHADO - adj. - Trapalhão, amalucado, im-
ranjado, sem direção. Truculento, desequilibrado, afoba- pulsivo, desequilibrado, estoura-vêrgas, desabusado .
do, impetuoso. Pessoa ou coisa com má aparência, mal
vestida, mal arr,u mada. DIAS DE MAR - Dias de viagem. Um dos requisitos neces-
sários ao bom conceito profissional é o embarque. Assim,
Ex. - Francisco vai mal; com a reprovação, ficou é necessário contar os dias de mar, para cômputo das
completamente desarvorado. condições de merecimento. Tantos dias de mar, isto é,
tantos dias passados em viagem.
DESARVORA~ -:- v. - Desorientar-se, perder a razão, o senso
comum. Agir em desacôrdo com as normas usuais e sen- DIDI - DADA - subs. - Prática do alfabeto Morse . Indica o
satas. Escangalhar, abandonar, estragar. alfabeto Morse.
44 45

DO-AO - subs. - Ofício, comunicação, correspondência. DURO DE BORDA- Navio que não cede com facilidade à
Interessante êste têrmo. Os ofícios começam da se- ação do vento.
guinte maneira: DO - . Cqmandante-Chefe da Esquadra; Assim o define ALVES CAMARA: " É veloz se anda
AO - Chefe da Flotilha de Submarinos. A repetição anda ligeiro, e se anda devagar é ronceiro, é ar~ente o
diária da fórmula DO-AO acabou por formar têrmo pró- que se chega bem depressa à linha do vento, se nao cede
prio, em substituição ao ofício, memorando, aviso, etc . com facilidade à impressão do vento é duro de borda, afo-
Ex. - Secretário, prepare um DO-AO sôbre as ma- ga-se na vaga se não flutua com presteza pelo empuxo
nobras. do mar arfa como um cisne, tem esqueleto, ossada, bo-
checha~, costado, é garboso, elegante, lindo, ou feio, e
DORMIR- v.- Período de repouso dos navios antes de vol- tantos outros epítetos muito conhecidos" .
tarem à posição normal, quando estão jogando, balan-
çando. O navio balança de bombordo para boreste; por Transcrevemos o trecho completo para revelar o s_a bor
vêzes, demora sôbre um dos bordos; demora, adormece ... marinheiro do linguajar utilizado pelos homens do mar.
Diz-se que o navio dormiu no bordo. É perigoso! (Alm. Antônio Alves Câmara - "Ensaio sôbre as
Construções Navais Indígenas do Brasil. ")
DORMIR NO BORDO - DORMIR SôBRE O BORDO - Re- • :t

cuperação lenta do balanço. O navio aderna e fica dei-


tado sôbre o bordo, por muito tempo, mais do que seria
de desejar. A Engenharia tem a última palavra a res-
peito do assunto.
DORMINDO - Ato de dormir.
DORMIR DE VOLANTE- Significa dormir em qualquer lo-
cal, fora do beliche ou da maca. Improvisar um leito.
Os marinheiros, quando se faz necessário, dormem
em bancos, em tábuas, no próprio convés (no "Chão"),
isto é, dormem de volante.
Os preguiçosos, para não terem o trabalho de armar ·
a maca e de ferrá-la, na ' manhã seguinte, estiram-se em
qualquer recanto e dormem de volante. Os retardatários, • •
por não terem retirado as macas das trincheiras ou ar-
mários, arranjam-se de qualquer maneira e acomodam-
se num volante de fortuna. • o

Os tempos modernos sacrificam as tradições. A maca,


em breve, perderá o seu reinado; os beliches oferecem
mais confôrto (dizem os técnicos; não sei se os marinhei-
ros do No:rte e do Nordeste concordam).
Sempre foi proibido dormir de volante.
DOURADOS - subs. - Botões e galões dos uniformes . Sem-
pre há ouro nos uniformes da Marinha. As más línguas
falavam em miséria dourada ... Na Escola Naval rima-
va-se: Quanto mais ouro mais calouro. Isto porque os
distintivos dos uniformes eram dourados e iam ficando
prateados à medida que o curso avançava. No 4"' ano
(quando havia 4"' ano) eram duas âncoras prateadas
cruzadas.
E
E- último da turma, último das relações, das listas de cha- .
mada, etc.
Simplesmente por um motivo: Aquêle que está fa-
zendo a chamada vai lendo os nomes; ao passar do penúl-
. timo para o último, diz sempre: Fulano e . .. menciona
o último. Portanto, E é sempre o último.
Na Escola Naval ouve-se o misterioso: Vê se o E já
chegou.
)
• • EGA- subs.- Encarregado Geral de Artilharia. Nome for-
mado com as iniciais das três palavras da expressão ci-
tada.
Fruto, como em milhares de casos, da lei do menor
esfôrço.
Ex.- O EGA está na tôrre VI?
EMA- subs.- Estado-Maior. Também não é gíria, no sen-
tido comum. Ouve-se a todo instante : -Vou ao EMA .
EMBALSAMADO - adj. - Enjoado, estrompado, cansado,
mal tratado pelo temporal.
EMBANDEIRADO - adj. - Feliz, satisfeito, alegre, conven-
cido, presunçoso, orgulhoso, crente, cheio de vida, entu-
siasmado, elegante, falastrão . Zangado, agressivo, vee-
• • mente.
EMBANDEIRADO EM ARCO - Muito embandeirado. Em-
bandeiradíssimo.
EMBANDEIRAR, EMBANDEIRAR-SE - v. - Enfeitar, ale-
grar, proporcionar euforia, dar motivos a entusiasmo .
Tomar atitude, reagir, animar-se (neste caso é prono-
minal).
EMBARCANDO AGUA (ESTA .. . ) - Díz-se do navio que é
invadido pelas ondas alterosas . Com mar de vagalhões,
algumas yêzes, as ondas transpõem a borda e se espraiam
no convés. O navio embarca água .
Ex. - Não gosto da barcaça "Real", embarca muita
água.
Por extensão, fazer água será sinônimo de embar-
car água.
(Fazer água traduz a entrada de água por orifício,
fresta, junta, etc.)
48 49 •

EMBARC~- y.- Servir em navio. Apresentar-se, a bordo, ENCOSTAR- v.- Cessar, parar, terminar, suspender o tra-
para esse f~m. Penetrar, entrar, introduzir-se, encher; balho, deixar o pôsto. Aproximar, atracar .
carregar (por carga), faina de carregamento. Não é ape-
nas, o ato. de. entrar e~ embarcação, em navio, (acepção ENERGIA DE TERRA (RECEBER ... ) - Morar perto do
é usual) ; mdiCa tambem a entrada em qualquer veículo. sogro e receber a bóia (ou outros benefícios).
Ex.: Embarquei no bonde n 9 27 e só desembarquei no Por analogia com os navios que, estando atracados,
Largo de S. Francisco . utilizam a energia elétrica de terra, poupando a de bordo.
OBS.: Atualmente- ignoro se já foi assim- o em- Ex. - Agora vou fazer economia; mudei-me para
b3:rque pode ser contado em terra. Dispositivo legal per- perto da sogra, ela adora os netos ; vou receber energia
mite, em determinadads condições, a contagem de tempo de terra . . .
de embarque. estando o "embarcado" em terra ! Não
· deixa de ser extremamente curioso e singular. Nada tem ENFORCADO - Remos enforcados são remos desajustados,
a ver com o sentido lingüístico do têrmo. Eis :Um caso de fora das chumaceiras, atrapalhados, embaraçados.
interpretação que poderá , um dia, perturbar o raciocínio
de investigadores "paisanos". Jamais compreenderão o
"fenômeno semântico" que justifique o embarque de um
m~rinheiro em terra. Os que estudamos filologia portu-
' . ENFORCAR - Aplica-se na expressão ENFORCAR O REMO.
Quer dizer tirá-lo da posição conveniente, impedindo a
remada. Atrapalhar-se na remada.
guesa, deparamos problemas dêsse jaez; palavras cujo ENFURNADO - adj. - Escondido, oculto, recolhido, reti-
significado está em completo desacôrdo com o emprêgo rado, metido, introduzido.
corrente.
Caprichos da linguagem. . . Da linguagem ? ENFURNAR - v. - Esconder, esconder-se, ocultar, sumir,
dormir, eclipsar-se, entrar, meter.
EMBA!1-QUE (FAZER)- Embàrcar. Servir em navio . É pre- Ex. - Enfurna êsse calouro atrás do jazigo, vem aí
ceito legal para promoção. Dá merecimento. Diz-se fazer o chefe-de-dia.
ou contar embarque .
- Não fui a terra ontem, passei o dia enfurnado.
EMBOCADURA- Capacidade, vocação, jeito, tendência. ENGOLE-VAGAS- Patesca, crente, bom profissional, mari-
Ex. - João tem embocadura para artilheiro tem nheiro eficiente, ótimo manobreiro. Equivale a TRAGA-
jeito para artilheiro. ' VAGAS.
• •
ENCALHADO - adj. - Parado, irresoluto, indeciso, desorien- ENJAMBRADO- Enguiçado, estragado, defeituoso, avaria-
tado . Sem solução. do. Coxo, doente .
• • São muitas as analogias.
ENCALHAR- v. -Não ir até o fim. Parar no curso dos
· acontecimentos. Parar, deter-se. ENSACADO - adj. - Navio que vai muito junto de terra .
Embarcação de vela em local sem vento. Navio muito
ENCARRILHAR - v. - Transcrevo a significação do verbo: para dentro de enseadas, golfos, entradas, etc.
"O barco singrando no dorso das ondas" - (Santos Navio na sombra de montanhas, morros.
Graça - "O POVEIRO" - pág . 222) . .
ENSACAR - v. - Ação de navegar muito junto de terra,
· ENCOSTA! :__v.- Imperativo correspondente ao verbo EN- fora da ação dos ventos.
COSTAR . Voz de comando com o significado supra . Penetrar em região em que não há vento para a na-
Aproxime-se, atraque! vegação.
. Ex. - Vigia de proa, encosta ! (Pode sair de ser- ENSAIO DE MANTA- Surra que o marinheiro sofria depois
VIÇo).
de lhe haverem coberto a cabeça com manta ou cobertor.
- Encosta a banda ! (A banda está dispensada) . Ocorria depois da faxina de macas, segundo contam.
50 51

ENTERRADO - adj. - Navio muito carregado, muito pesa- Fulano é muito escamado, isto é, não comparece às
do. Quando o navio vai com a linha dágua coberta pela práticas que constituem as atividades normais do grupo
água do mar, rio, (lago etc.), está enterrado. (escola, navio, clube, etc.). Zangado, aborrecido, con-
trariado.
Diz-se: o barco vai muito enterrado, de proa ou de
pôpa . ESCAMADtSSIMO - Superlativo.
ENTERRAR- v.- Ir o navio com a linha dágua ao nível ESCAMAR- v.- Fugir, sair, dar o fora, não participar de
da água ou mergulhada. trabalho, faina, diversão; ausentar-se.
Zangar-se, arreliar-se.
ENTRADO - adj. - Aquêle que entra, que toma intimidade,
que não demonstra timidez perante os mais antigos. ESCORADO - adj. - Diz-se daquele que tem as costas quen-
Aquêle que não cumpre as normas usuais, quanto ao tes. Cochado. Protegido.
trato devido aos mais graduados. ESCORAR-SE - v. - Tomar cuidado, tomar tento, atenção.
Ex. - Calouro entrado! (Porque não trata os ve- Arranjar proteção, cocha.
teranos com mêdo, timidez ou constrangimento; que se
dirige aos veteranos ousadamente. Os veteranos julgam-
• • ESCOTEIRO- adj.- Sozinho, sôlto, desgarrado, sem apli-
cação, disponível.
se entidades quase divinas). ·
Ex. - Você tem algum cabo escoteiro? (Um cabo
ENTRAR- v.- Tomar intimidade, ousar, faltar com ores- que não esteja sendo utilizado?).
peito, ir além do limite. ESFREGAÇÃO - subs. (de lona e areia) - Esfregar o con-
vés com lona e areia. Essa é a verdadeira esfregação . Há
ESCADEIRO - adj. (M. Mercante) - Pedinchão, filante, outras. Qualquer esfregação pode t omar êsse nome ge-
sugador. nérico. A esfregação da inácia é a do convés, com lona
e areia, empregando-se os pés, no quarto d'alva.
ESCALA - subs. - Relação dos escalados. Tabela. Pôrto
ou local onde o navio toca. Ato de escalar. ESPELHADO - adj. - Mar liso, sem ondulações. Mar seme-
- Qual é a escala da máquina para esta semana ? lhante a espelho.
Quer dizer: como estão discriminados, quanto ao ESTADO- subs.- Sala em que permanece o oficial de ser-
serviço e ao horário, os homens que trabalham na má- • • viço. Serviço .
quina? Ex. - Verifique ~e o Tenente está no estado (na sala
Mudar a ESCALA é mudar a tabela . de estado). O serviço de estado dura 24 horas; não é
a • serviço por quartos.
ESCALAÇAO - subs. - Ato de ESCALAR . A própria ES-
CALA. ESTAR A ESTE VERDADEIRO - Não perceber nada de
qualquer assunto. Ignorância absoluta.
ESCALAR - v. - Discriminar, relacionar, pôr de serviço,
indicar para missão. ESTAR A SOMBRA DA VELA GRANDE- Estar em posição
invejável. Gozar de excelente situação.
ESCAMAÇÃO- subs.- Ato de escamar, de fugir, de safar- ESTAR COM A- BORDA NAGUA -Estar em dificuldades.
se. Ato de zangar-se, de protestar com rispidez. Esca- Estar na onça. Estar sem dinheiro, desprevenido, na mi-
mação é fugir aos exercícios, fainas, trabalhos etc. séria. Estar sem saúde, sem recursos, sem elementos.
ESCAMADO - Fujão, preguiçoso; inimigo de trabalhar, de ESTAR DE FICAR - Estar de serviço ou de pernoite. Empre-
aplicar-se a fainas ou exercícios. ga-se para designar a permanência, a bordo ou na repar-
Diz-se daquele que sempre acha um jeito de não to- tição, de um dia para o outro, por obrigação . Não ir para
mar parte em práticas esportivas, aulas ou cerimônias. a terra.
52

ESTAR NO GUARDA-LOUÇA (M. Mercante) - Estar na


prisão. ·
ESTAR NAS MAQUINAS- Estar dormindo debaixo da cama.
Cl3:~o está que é contravenção disciplinar. Ex.: Hoje não F
aguento de cansaço, vou para as máquinas ...
FALAR AOS PEIXES- Igual a DEITAR CARGA AO MAR.
ESTEIRA (SEGUIR NA ... ou (IR NA .. . ) -Seguir, acom- Vomitar. ·
panhar, levar o mesmo rumo, perseguir. FALCA- subs.- Pedaço de pão, saco de pão.
ESTENDER O PESCOÇO (M. Mercante) -Diz-se de alguém FARMACIA- subs.- Doces, pudim, bôlo, frutas, gulodices,
que deseja pedir algo mas fica indeciso. alimentos.
• t
ESTICAR O REBOQUE -Morrer, falecer. Usado na velha Usa-se o têrmo, na Escola Naval, para designar as
Marinha. gulodices que os aspirantes recebem de casa. Em geral,
mães carinhosas ou noivas diligentes mandam aos filhos
ESTIF~-:- adj. - Alinhado, aprumado, elegante, satisfeito, "
t • e noivos um refôrço, para melhorar o rancho. Algumas
eufonco, convencido, alegre. administrações proíbem as farmácias . É preciso que não
Ex. - Ficou todo estifa com o grau dez. se faça mau juízo da bóia ou do cozinheiro ...
A FARMACIA é esperada com ansiedade e comida,
ESTOIRA-Vll:RGAS - Brigão, valentão, desajeitado, estúpi- secretamente, com egoísmo e gôzo. Os felizardos, que a
do, brutamontes, atrabiliário. recebem, tomam providências drásticas quanto à sua
chegada, entrega e posse. Não fôssem os colegas fami-
gerados glutões, não haveria perigo. . . Um chefe de dia
de bom apetite, boa bôca, banqueteia-se à custa dos ou-
tros . É perdoável ...
Bater uma FARMA.CIA é prazer diabólico.
Conta Gastão Penalva ("A Marinha do Meu Tempo",
1951, pág. 43): "Outra vítima era o Nelson Simas. t:ste
costumava receber de uma namorada que habitava o
• • morro do Castelo, tôdas as quintas-feiras, com a sua
roupa lavada, um pacote de ·doces primorosos, umas co-
cadas inesquecíveis, preparadas pela mãe da pequena.
• c Seguia à frente, com a sua saborosa dádiva, e a turma
atrás, guiada por Tomás Gonçalves, a cantar aos berros,
na toada; dos clarins carn'a valescos:
"O Nelson tem
farmá-ciá
O Nelson ,t em
farmá-ciá . . . "
A meio do caminho, num charivari improvisado, o
único que não tinha farmácia era o Nelson, porque os
outros já se haviam apoderado das cocadas e fugido pela
ilha afora a devorá-las a distância do seu dono."
FAXINA - subs. - Trabalho, faina, serviço, limpeza, arru-
mação. Toque de alvorada. Pancadaria, ação de punir,
54 55
dar pancada, causar danos, molestar, prejudicar. Briga . arrumar, a consertar, a pintar. São faxirljeiros todos
Grupo de homens para determinado serviço. aquêles que não têm virtudes intelectuais. Homens de
. As ordens que determinam faxinas são diárias. .A.&- poucas letras, sem livros, sem preparo intelec~ual.
sim: -Fazer uma faxina no paiol de mantimentos (fa- Como os FAXINEIROS são úteis a bordo!
zer arrumação, limpeza).
FAZER CABEÇO- FAZER CABEÇA (Só usado, como gíria,
-Tirar uma faxina de 10 homens para o serviço da por analogia) - Orientar a proa. Manobrar até que a
prancha (escalar 10 homens para êsse serviço) . proa do navio fique em determinada posição. Para isso é
-_Sexta-feira será dia de faxina nos camarotes (ar- necessário usar técnica própria.
rumaçao, enceramento, mudança de ·roupas etc. dos ca- "Se na ocasião de suspender o navio não estiver
marotes). ' aproado à saída do fundeadouro e se a evolução fôr difí-
- Vamos fazer uma faxina no boteco do silva êle cil por causa da corrente, vento forte, ou pouco espaço,
anda roubando na conta. (Já se sabe que o botec~ do o melhor é guinar com auxílio do ferro, antes de arran-
Silva vai ficar em pedaços). cá-lo, isto é, fazer cabeça sôbre o ferro". (Comte. Mau-
rilio Fonseca - Op. cit.) .
Há ~mpregos pitorescos . Ex.: A dona da pensão fêz
uma faxma completa na ·fachada (pintou-se espremeu
•• Já em "Os Lusíadas" o verso Da proa as velas sós
cravos, pôs creme e pó-de-arroz etc. ) . ' ao vento dando (II, 18 v. 3) -significa fazer cabeço (ou
cabeça). A manobra completa-se no outro verso: Incli-
FAXINA (TOC_!1R ... ) - Toque dé alvorada; de despertar nam pera a barra abalizada (II, 18 v. 4) .
p~la m~nha. Toque para início dos trabalhos, mesmo qu~
nao seJa pela manhã. Maltratar, dar pancada. Como FAZER DA QUILHA PORTALó- Bela expressão. Significa
os t_rabalhos devem começar de manhã cedo, tornou-se emborcar, virar, tombar. Morrer.
habitual chamar o toque de alvorada de toque de faxina, Compreende-se a imagem: o navio que põe a quilha
embora sejam toques diferentes. na posição do portaló, está emborcado.
Há emprêgo pitoresco para a expressão: Ex.: Não Emprega-se como sinônimo de dar com os burros
esta~ gostando ~a cara d?s pais~?os; daqui a pouco man- nágua. Quando um empreendimento não vai adiante,
d~rei tocar faxma em cima deles (expulsá-los maltra- quando desmorona, quando arruína, diz-se que fêz da
ta-los). ' quilha portaló.
FAXINARI~- su~s.- Compartimento no qual é ~ardado
• • FAZER MAROLA ou FAZER MARETA- Igual a FAZER
o m~ter~al de ·lrmpeza (vassouras, ·b aldes, escôvas, estôpa, ONDA, em menores proporções.
sabao, lixa, caol, raspas, etc.) .
• ll FAZER ONDA - Complicar as coisas. Dar-se valor, por
FAXINEIRA- subs.- Toalha que foguistas usam no pes- meios reprováveis ou "jeitosos". Fazer propaganda de
coço. Usam-na, ei? ger::I, quando saem de serviço. Toa- sua pessoa. Chamar a atenção dos outros para a sua
~a ?e pequ~n8:s dimensoes e, por vêzes, encardida. Cons- pessoa, seus atos, suas ações. Cabotinismo, enfim. Cau-
titUI falta disciplinar usar faxineira . sar estragos, alterações, anormalidades. Provocar traba-
lheiras, providências, movimento.
FAXINEIRO- subs.- Marinheiro cuja função é zelar pelo
material de limpeza. FAZER PAU - Estar de serviço de quarto ou de estado. O
serviço, na Marinha, tem significação peculiar e hon-
. ~m_geral, é homem cuidadoso, atento. Incumbe-lhe rosa.
distnbmr e recolher o material de limpeza. ·
ysa-se_ o ~êrmo com significado pejorativo, quando FAZER-SE AO LARGO - Sair em viagem, largar, ir embora.
deseJamos IndiCar pessoa com vocação para as atividades Na linguagem comum, exprime: dar o fora, desaparecer,
materiais, triviais elementares, .a arrumar, a mandar fugir, safar-se.
56
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FAZ~R-SE DE VELA- Expressão bonita, de sabor quinhen-
tista.! FOBó _ adj. - Ordinário, de má qualidade, insignificante,
Significa, também, sair em viagem, largar, partir medíocre, fraco.
para o mar. Ir embora. Ex. - Rancho fobó, isto é, rancho ruim, mal prepa-
rado ou escasso, inapetecível.
FAZER UMA PINHA DE XADREZ (M. Mercante)- Dormir - Exame fobó, isto é, exame fraco, medíocre.
ir para o beliche. '
Ex. _ Aquela pequena arranjou um noivo muito
FEIXE DE LENHA (M. Mercante) -Navio de madeira. fobó ...
Navio fobó; guarnição fobó.
FERRAR UMA BADERNA (M. Mercante) - Dormir um FOBOSISSIMO - Superlativo .
po~co . Tirar uma tira .
Ver: Tirar uma coelha. FOCINHO - subs. - Proa da embarcação..
Ex. - O navio entrou com o focmho mergulhado .
FERRINHOS - subs. - Dinheiro miúdo, trocados. FOGONEIRO - subs. - Homem da máquina, marinheiro que
trabalha nas máquinas.
FERRO VELI;IO- Navio velho, em estado precário, prestes
a, ~ar baixa., Marin~eiro inválido ou em condições pre- • • FOGUISTA- subs.- O mesmo q~e F~~NE~R~. FOGUIS-
canas de saude. Da-se a denominação aos marítimos TA é mais usado e tem emprego oficial, tecmco.
aposentados. Sucata.
FOLGA- subs.- Licença, dispensa do serviço; sobra do de-
FERROS - subs. - Ancoras, algemas. talhe de serviço.
Ex. _ Só irá ao jôgo o quarto de folga, isto é, o
FERROS (~ETER A ... ) -Prender alguém, aprisionar, pôr quarto de licença. _
na cadeia. ·
Ex. - Você vai fazer serviço à noite? - Nao, estou
FICA~ (ESTA~ DE ... ) -Estar de serViço ou de pernoite . de folga.
Nao estar licenciado. Obrigação de permanecer a bordo FOLGAO - Maneira irregular de g~zar as f~rias. Se o ho-
ou na repartição, fora das horas do expediente normal mem não pode faltar a bordo dia~ segmdos (e?I geral,
Significa sempre FICAR DE SERVIÇO. . 30 dias) . goza as férias "de .FOLG~O" .. Quer dizer o se-
Ex. - Hoje estou de ficar, não poderei ir à festa guinte: fica em casa um, dms ou tres di~s, e re.gressaA no
dos cadetes. dia de serviço ou no dia em que o _na':o pr~cis~r .dei~.
• Goza as férias intermitentemente: dia Sim, dia nao, d?IS
FIM DE RAÇA (E. N.) -O pior, o mais ordinário. dias, sim, um dia, não . É , realmente, a melhor maneira
0
. Ex. - O 5. pelotão é o fim de raça ou é o mais anar- de estragar as férias .. .
qmzado. · FOLGAR A ESCOTA - Deixar o serviço correr naturalmen.te.
Alargar a .voga. Permitir um regime folgado de serviÇ()
FINíSSIMO - adj. - Tempo bom, muito seguro. (Santos ou trabalho.
Graça - "O POVEIRO"). (Têrmo português, provàvel- FOLHA- subs.- Fôlha de pagamento. Relação p~ra rece-
mente da costa norte). bimento de uniformes, vantagens etc. As vezes, e melhor
FINO - adj. - Próximo, junto, rente . empregar MAPA. ,
Ex. _Estou em fôlha pelo "Ceará", portanto so de-
FINO (TIRAR UM ... ) - Em linguagem comum, quer dizer sembarcarei depois do pagamento.
passar muito próximo. Significa, também, BOM TEMPO,
na Póvoa de Varzim (Portugal) , terra de pescadores he- FôLHA (ESTAR EM .. . ) - Const_a~ da fôlha d;
róicos. Dizer terra é um tanto absurdo; na verdade é pagamento de determinado navio, repartiçao etc. Podera
mar de pescadores heróicos. ' ser outra fôlha, para vantagens ~t? ._
FORA - interj. - Usado como interJeiçao: FORA !
FLANELA - subs. - Uniforme azul dos marinheiros. :É um imperativo, uma ordem, uma voz de comando.
Equivale a JA !
58 S9
VAMOS! COMECE! INICIAR! PRONTO! AGORA! outro, em viagem de instrução, po~ longes terras,
É a palavra de uso freqüentíssimo na vida naval. bate continência caprichada para o porteiro, engalanado,
Exemplo: O sinaleiro de serviço está, de binóculo, do hotel ... Dá um fora dos bons I
aguardando o momento exato do . arriar de um sinal
qualquer (indicado por bandeira do código respectivo). FORA (PSSAR POR ... ) - Passar com o navio pelo lado
Olha, fixamente, para o mastro em que o sinal está içado, do alto mar.
e espera. Assim que o sinal é arriado, grita: FORA! se o navio vai em demanda dos Abrolhos, é possível
É um aviso que êle dá aos interessados, ao seu navio, passar entre os continentes e as ilhas ou por fora das
ao grupo que dependia daquele sinal . ilhas, isto é, "entre" as ilhas e o alto mar.
Há cerimônias - como a da Bandeira - que são re- FORTUNA (DE ... ) - De improviso, ajeitado, improvisado,
guladas pelo FORA. ! do sinaleiro . Começam exatamente adaptado.
no instante em que êsse homem dá o FORA! Ex.- Quebrou-se o leme do escaler; ':amos colocar
FORA (DAR O . .. ) - Emitir a voz aGima. Isso é feito, eni um leme de fortuna. (Improvisa-se, entao, um leme,
geral, em altos brados. empregando remo ou tábua) .
Exclamação usada ·quando a marcação é, afinal, • •
obtida. FORTUNA (-DE MAR) - Fortuidade, a?aso,. f.ôrça maior: É
· expressão bonita. ~zar, ~es~raça_, mfellcidade. Mmtos
Exemplo: O Comandante diz áo Tenente: Fique aí, acidentes, no mar, sao atnbmdos a fortuna do mar.
na agulha, assim que o farol estiver na marcação tal,
dê o fora! FRANQUIA (PORTO DE .. . ) - Fundeadouro. dos navios que
O Tenente fica de ôlho, esperando, meio afobado, en- esperam a visita das autoridades portuánas. Aguardam,
quanto o navio avança ... Logo que enfia o farol na tal aí, a alfândega, a saúde etc .
marcação, grita, enfàticamente: FORA!
Avariar-se, quebrar, partir-se, inutilizar-se, enguiçar, FRECHEIRO OU FLECHEIRO- adj.- Conquistador, mu-
enjambrar, acabar, dar o prego, cansar, pregar, parar de lherengo, sensual, don juan, casanova, barba-azul.
funcionar, sair de circuito. Amante de várias mulheres.
A vida a bordo é uma luta constante contra o mate- _Tenente frecheiro- designa um casanova de alta
rial que se avaria, isto é, que dá o fora. reputação na especialidade.
Volta e meia, sobe o maquinista para informar que
a bomba deu o fora, isto é, enguiçou .
• • FRESCO (VENTO) - Vento forte.
- O leme deu o fora! Advertência grave, que des- FRESQUINHAS - subs. - Boatos, novida?es, informações
perta os ânimos e provoca medidas imediatas. Quer dizer de última hora, notícias frescas , revelaçoes surpreenden-
que o leme está com defeito ou deixou de funcionar. • • tes, diz-que-diz. · .
Depois de três meses de viagem, o rancho dá o fora, Em épocas anormais (com~ nas guerr.as ou pronti-
isto é, fica ruim, fraco, invariável, sai do paiol. dões) há abundância de fresqumhas. Assrm que surge
Emprega-se também com a significação de acabar: alguém, perguntam-lhe todos:
a munição deu o fora, isto é, acabou. -Alguma fresquinha? . .
FORA (DAR UM .. . ) - Dar aviso no momento exato, pre- os oficiais de alamares, (ajudantes-~e-or?ens , assis-
. visto. tentes) sempre têm boas fresquinhas . Sao discretos, no
- Você quer dar um fora, para eu regular o apa- entanto, dão a muda.
relho? FRICOTE - subs. - Nervosismo, histeria,. raiva, gritaria
Cometer êrro, engano, gafe. descontrôle, exaltação, chilique. Atitude mespe~a~a, fora
- Veja, diz o Guarda-Marinha, dei um fora tremen- dos moldes usuais, contrária ao bem estar rotmeiro .
do: mandei abrir toque de almirante para o tenente que Ex. - A môça teve um fricote na sala de aula (exas-
vinha de sobrecasaca ... perou-se, chorou, ficou nervosa, exaltou-se).
60

- O nôvo imediato queimou-se com a . desorganiza- ·


ção do quadro de chaves; teve um fricote tremendo.
FRICOTEIRO - subs. - Pessoa que tem fricote ou que cos-
tuma simular fricote. G
FRIZAR - v. (M. Mercante) . - Gelar, congelar. É angli-
cismo generalizado. UAIOLA - Centro do navio, armações de madeira.
FUNDEAR- v.- Lançar à água, deitar ao mar, atirar ao GAIVOTA- subs. (E. :N.) - Garôta desfrutável, "muito na-
mar. Jogar fora, pôr no lixo, atirar ao monturo. Parar, val", admiradora exagerada dos aspirantes. Menina que
permanecer, não ir além. vive nos meios navais.
E verbo de significação técnica. Tem sentido popu- •
lar naval; é giria muito usada, exprime o ato de atirar GALERA DE OURO - Apelido do NE "BENJAMIN CONS-
fora qualquer coisa. TANT".
Ex. - Imagine, fundearam o boné do instrutor ! GALO (PE DE ... ) Serviço contínuo .
(atiraram-no à água) . • • Serviço sem descanso, feito em pé, sem sentar, sem
Ex. - Dos quatro salões do clube, êste é o melhor,
o que está com melhores "pequenas", vou fundear por interrupção.
aqui. . . GAMADO- adj. (E. N.) -Apaixonado, enrabichado, caído
- Passei em Termodinâmica, vou fundear as apos- por mulher.
tilhas.
FUNDO. DUPLO - Bôlso secreto, esconderijo, desvão. GANHADOR (M. Mercante) -Carregador.
FUNERAL - subs. - Entêrro, exéquias, cerimônia fúnebre. GANHA-PAO- subs. -Saco de rêde aberto por um arco,
E, também, o dinheiro pago por instituição beneficente com cabo de madeira, próprio para apanhar sargaço ou
para o entêrro do ex-sócio . peixe que descangue da rêde . (Santos Graça - Op. cit.
225) .
FUNIL - subs. - Igualação, rotina, mesmice, uniformidade,
moldagem, planificação. GANSADA- subs.- Trapaça, traição, rasteira, deslealdade,
Sem generalizar, designa a transformação dos ofi- má fé, esperteza.
ciais, depois de algum tempo_ de serviço. A princípio, Ex. - Aquilo foi gansada; o cabo repetiu o serviço
muito entusiasmo, pruridos reformistas; depois, a rotina, no domingo.
a aceitação, a calma ... o funil.
Não traduzindo a situação verdadeira do corpo de GARANTIA- subs.- Representante de fábrica ou estaleiro.
oficiais - cumpridores de seus deveres até o fim - é E o técnico que permanece no local durante as experiên-
palavra expressiva e se adapta a algitlns pessimistas ou cias.
conformados. Quando um navio é entregue, segue a bordo um GA-
O FUNIL é, realmente, o perfeito moldador: afunila, RANTIA. :t!:ste só desembarca depois de aprovada a en-
iguala, achata, torna homogêneo, dá a mesma côr, des- trega e cumpridas tôdas as especificações.
bota, arrasa. Tem sentido pejorativo.
· Que profissão não possui o seu FUNIL ? A imagem que temos dos GARANTIAS resume-se no
inglês fleugmático, nada comunicativo, calado, introver-
FURIOSA - subs. - Banda de música fanfarra, conjunto tido, aéreo, abstrato, de cachimbo à boca, olhar distante.
musical. Se pega alguma coisa a bordo, chama-se o GARAN-
Quando lhe dá na gana tocar à hora . do rancho, TIA. Sempre ouvi dizer que os garantias não entendem
quem a pode aturar ? patavina do riscado. Viajam, divertem-se, não garantem
FUSIVEIS (QUEIMAR OS FUSíVEIS) - Aborrecer-se, per- coisa alguma. Não garanto ...
der a paciência, explodir, perder a calma. GASOLINA - subs. - Lancha, embarcação de vapor.
62 63

GASPEAS - subs. (M. Mercante) - Rosto, cara, chanfro. GOIABAS- subs.- Gudes. Coisas compradas em viagem,
Usa-se também para denominar as costeletas (no rosto). para uso particular.
É têrmo das gerações modernas. Gudes ou bilongues
GATEIRA- subs.- Maleta em que se carregam os gatos, os eram os têrmos antigos, consagrados.
roubos, os furtos. (Ver gato) . GOLA - subs. - Gola do uniforme dos marinheiros . Usa-se
GATO - subs. - Roubo, furto, escamoteação. Mercadoria para indicar a condição de marinheiro .
roubada . Qualquer coisa pertencente à Marinha, sub- Ex. - Aquêle tenente tem muita prática, veio da
traída indevidamente As vêzes, é um martelo, um venti- gola (quer dizer que êle foi marinheiro). ·
lador, uma chave de fenda . Pode ser um pedaço de carne, GOLPE DO BAú (E. N.) -Sair da Escola Naval para casar
um frango assado . É sempre gato. com môça rica .
GORILA- subs. (M. Mercante) -Marinheiro novato, apren-
GAZELA- Subs.- Apelido do "PARNAíBA" . Naturalmente diz-marinheiro. Emprega-se mais para designar apren-
tinha boa velocidade. dizes-marinfieiros.
G:ELO- subs.- Ato de gelar . Espera dolorosa . GOROROBA - subs. - Comida, alimento, rancho . Empre-
ga-se para indicar comida mal feita, mal preparada.
GELADO - ad.- Aquêe que ficou esperando, além da hora. GOVERNAR- v.- Dirigir, conduzir, guiar. Refere-se a na-
vios, a embarcações .
GELAR- v.- Fazer esperar, não render o companheiro na Ex. - :reste navio governa mal ; sai do rumo fàcil-
hora certa, retardar-se, chegar atrasado ao serviço . Dei- mente, desvia-se da rota; não obedece bem ao t imoneiro .
xar alguém esperando. - :reste patrão governa mal.
Ex. - São 04,10 h. , você me gelou 10 minutos ! GOVERNAR A MEIO - Ser cordato, sensato, ponderado .
- Até que enfim você chegou, eu estava gelando . .. Manter-se com equilíbrio .
É evidente que o têrmo nasceu da baixa temperatura, GOV:reRNO- subs. -Ato de governar, dirigir, guiar .
no passadiço, durante travessias em alto mar, no inver- Ex. - Quem está no leme ? :resse timoneiro faz bom
no. O caveira-de-pau conta os últimos minutos com o govêrno .
ôlho colado ao relógio. São minutos vagarosos, lentos. GOZAÇAO - subs. - Vadiar, vagabundear, andar à toa,
Enquanto espera, o frio castiga, o caveira gela. . . Por
extensão, emprega-se o têrmo, em igualdade de condi- nada fazer.
ções, no serviço da máquina. Positivamente, não há que Ex. - Lá na ilha anda uma gozação geral, nem ser-
pensar em gêlo naquelas fornalhas. viço há!
GOZADA (DAR UMA . . . ) - subs. - Amolar , ridicularizar,
GERER:re- Subs. -Erupção leve nas virilhas e parte inter- aborrecer, chamar a atenção de modo brincalhão.
na das coxas. Produz coceira. Ex. : O tenente deu uma gozada no guarda-marinha.
O GERER:re pode estender-se a outras partes do GOZAR-v.
corpo. · Desfrutar, aproveit ar, entrar de licença, tirar férias , não
A causa será o banho de mar freqüente? fazer serviço. Ter direito.
Na Escola Naval havia uma "fórmula" milagrosa . Ex. : Os taifeiros dos suboficiais podem gozar três
Pincelava-se o GERER:re e êle desapar-ecia. Questão de dias. - Entende-se que êsses t aifeiros não darão serviço
três ou quatro dias. durante três dias.
A coceirinha não era má, na opinião dos entendi- - Seu Comandante, ainda não gozei as férias.
dos. Cultivar o GERER:re era gozar dos prazeres de um - Gozei a licença em Friburgo .
cafuné especial . - Só os telegrafistas gozarão êste licenciamento .
GôZO- subs.
GIA- subs. (M. Mercante) -Ponta de cigarro, bagana. Ato de gozar .
64

Ex.: A guarnição do submarino entrou no gôzo da


licença, há um mês.
GRANADAS- subs. - (M. Mercante).
Grão de bico. I
GROSSO- Adj. - (E . N.).
IÇAR- v.- Pôr no livro de castigo. Torrar, sacramen~ar.
Pessoa sem educação, grosseira, indelicada.
GROSSO (MAR ... ). IMEDIATO LINHA - Oficial manobreiro, que toma inicia-
Mar forte, agitado, de vagas. tivas, que se arvora em imediato. Aquêle que tem jeito
de imediato. ·
GUARNECER - v. - Ocupar, preench'er, tomar o lugar,
completar, formar. Tomar posição, preencher os lugares INACIA - subs. f. - Regra, prescrição, norma, preceito, or-
vagos. dem (conjunto de ordens) , rotina, maneira usual e obri-
Ex. -Durante as solenidades, a 1.a divisão guarne- gatória de agir. Regulamento, lei, ordenança, código.
cerá os postos de continência. ., OBS.: Quem terá sido essa mulher- Inácia? Tal-
- Não deixe de guarnecer os postos de vigilância. vez mulher de um Inácio .
Há emprêgo pitoresco: -O sinaleiro estava guarne-
cendo a amurada . . . Quem sabe se, apenas, regulamento elaborado por
Quer dizer que estava deitando carga ao mar estava algum Inácio ?
vomitando. ' Há um Inácio, em Camilo Castelo Branco. Seria o
-O aspirante estava guarnecendo o beliche, isto é Almirante Joaquim José Inácio, Visconde de Inhaúma?
estava dormindo, estava deitado. ' Ele tomou parte na elaboração do Regulamento Disci-
GUDES - subs. - Coisas compradas em viagem. Objetos plinar para a Armada.
para uso pessoal ou doméstico. As viagens de instrução INACIA (CUMPRIR A ... ) - Cumprir o que está estabele-
proporcionam a compra de gudes em boas condições. Os cido, obedecer às regras tradicionais, imutáveis, consa-
guardas-marinha fazem negócios da China! A ilusão é gradas; agir de acôrdo com os regulamentos, leis, etc .
s~~pre confortadora ... As noivas organizam listas ge-
niais. INACIA (É DA . .. ) - É regulamentar, legal, rotineiro.
GUINADA - subs. - Ato de guinar. Mudança de rumo. J • Ex. - Bom oficial, é rigorosamente da inácia . ..
Ex. - O rapaz ia distraidamente pela calçada; quan-
do viu a loura, deu uma guinada e abordou-a. INACIA (ESTAR FORA DA ... ) - Fugir às normas usuais,
- Aquêle sujeito bebeu, vai dando guinadas tre- ) . .(
abandonar as regras compulsórias, afastar-se dos regu-
mendas . lamentos ou prescrições .
GUIN_AR- v. - Mudar de rumo, alterar o caminho, des- Ex. - Aq~êle môçb precisa de cadeia, anda sempre
viar-se, trocar de destino. fora da inácia ...
Mudar de idéias, de ações, de trabalho, de conduta.
Ex. - A môça era direitinha, depois guinou ... INTELIGENCIA- subs. (E. N.) -Tapa na testa do calou-
ro. É uma das amabilidades dos veteranos ...
GURN,IR- v.- Penetrar, entrar, intrometer-se, recolher-se
ficar prêso. ' ,. Até 1932, era praticada a inteligência com a perícia
Ex.- O arrebite gurniu na antepara e saiu do outro e o ardor natural aos mais antigos.
lado .
-O aspirante gurniu três dias de bailéu (ficou prêso
três dias) .
- Onde está o paisano ? - Gurniu pela coberta·
vá buscá-lo. '
GURUPES - subs. - Nariz grande ..
J
JACUBA - subs. - Refrêsco, bebida gelada, fresca ou mes-
mo sem gêlo; bebida reconfortante da classe dos refrescos.
Distribuída nas fainas e festas da guarnição.
Jacuba que se preza é a famosa "groselha". Não
contém álcool. No Verão é sempre bem vinda a jacuba. Há
• marinheiros peritos em sua confecção. Preparam-na em
baldes muito limpos e servem-na em canecos.
Os baldes são transportados até onde fôr necessário
• servir a bebida .
O pessoal da Marinha emprega o têrmo, pejorativa-
mente, para qualificar qualquer refrêsco mal feito. Ex.:
Que tal a bóia na festa de ontem? - Só "tinha" uns
docinhos fobós e jacuba ...
Antigamente, durante as fainas de carvão, a JA-
CUBA virava. Todo o pessoal de bordo tomava parte na
faina de carvoar. Desde o comandante ao sexta-classe,
todos conduziam, pelo menos, um carrinho de carvão, até
a bôca do agulheiro. Enquanto durasse a faina, a banda
de música (a furiosa ... ) tocava e a JACUBA virava re-
dondo.
Os dicionários dizem que a JACUBA se compõe de
. água, farinha e açúcar ou mel. Anfilóquio Reis acres-
centa-lhe aguardente, algumas vêzes. Nunca vimos colo-
car alcool na JACUBA. Compõe-se de groselha, (xarope
de groselha) , água, açúcar e gêlo.
) i
JAQUETAO - subs. - Uniforme azul dos oficiais e subofi-
ciais e sargentos.
É o uniforme que tem o feitio de jaquetão. Abrevia-
se: Vou pôr o jaquetão.
JARDIM ( .. . DE POPA) -Espécie de varanda que ficava
na parte externa da pôpa dos antigos encouraçados. O
"Minas Gerais" e o "São Paulo" possuíam jardins de
pôpa. Só o Almirante e o Comandante tinham direito de
utilizar o jardim.
JARRA- subs.- Bebedouro que ficava na coberta da guar-
nição. Conjunto de bebedouros, um ao lado do outro.
68 .. 69
JAZIGO- subs.- Cada um dos compartimentos do móvel Havia o lado mesquinho : as intrigas, o ataque às
em que os aspirantes guardam os livros, nas salas de aula. reputações. Paciência !
Havia nas salas de aula, antigamente, um ou mais A Marinha, na súa dignidade, também sofre de males
armários grandes, com subdivisões. Nas subdivisões os inventados pelos homens.
aspirantes guardavam os livros. Eram escaninhos com A pequena história da Marinha foi contada à som-
portas. bra das árvores do Arsenal enquanto as lanchas não
Por que JAZIGOS ? Naturalmente porque os JAZI- vinham... '
GOS guardavam coisas que jamais de lá sairiam . ..
JUMENCIA- subs. (E. N.)- Pescoção praticado com a mão
JEJUM - subs. - O têrmo é empregado na expressão QUE- e o ante-braço . O veterano "sabido" chamava o calouro
BRAR O JEJUM e significa EMBARCAR PARA NÃO IN- passav~-l~e o braço pelos ombros, como, se fôsse um pal
CORRER NAS PENAS DA LEI, por excesso de comissões amantiSSimo (pelo menos um tio benevolente . . . ) Da-
em terra. As leis não permitem que o pessoal da Marinha va-lhe conselhos referentes à vida na Marinha esclare-
passe em terra mais de "certo número" de anos . Os ma- c_ia-o quanto à conduta na escola; captava-Ih~ a con-
rambaias confessos ou os patescas dissimulados aprovei- fiança. Em meio à lição "proveitosa" (os calouros esta-
tam, até a última gota, as comissões de terra. No limite, vam aprendendo, entre outras coisas, o espírito de leal-
embarcam para QUEBRAR O JEJUM. ~les estavam je- dade) , a mao do veterano puxava para trás o inocente
juando de mar, de navio, de balanços, de dias de mar ... calouro e o a~te-braço antigo, escorava-o, rijamente, apli-
cando-lhe masculo pescoção !
JOGO- subs.- Jantar da guarinção. O calouro saía mais homem, dessa prova, dizia-se . . .
Sair depois do jôgo significa sair depois do jantar.
JORNAL DA PRAIA- Conversas no Arsenal de Marinha,
enquanto não chegam as lanchas que levarão os oficiais
aos navios em que servem.
Cochichos, boatos, intrigas, falatórios, diz-que-diz,
murmúrios. Até o jornal da praia vai perdendo o pres-
tigio tradicional. Nos velhos tempos - o Arsenal ainda
era feio- os oficiais chegavam ao Arsenal e aí aguarda-
vam as conduções. Pouco a pouco, iam surgindo as lan-
chas, os bois, as vedetas. Os proeiros passavam os cro- •
ques, agüentavam as lanchas, e os oficiais embarcavam
por antiguidade, ficando o mais antigo para o fim . Sen-
tavam, também, por antiguidade : o paneiro para o mais )

antigo. Movimentavam-se as embarcações, obedecendo a


sinais próprios, emitidos por pequenos sinos manobrados
pelo patrão. Uma escola de patescaria! Espetáculo de
enternecer qualquer paisano. Que menino resistiria ao
convite da Marinha, ao presenciar êsse desfile matutino
de . lanchas, guarnecidas por marinheiros, em uniforme
branco, impecável? Nos feriados, a bandeira nacional
na pôpa! O JORNAL DA PRAIA era a antecâmara da
Marinha. Ali, pela manhã, selavam-se os destinos.
Ex. - O JORNAL DA PRAIA já disse que o Oliveira
vai para o Alaska ! Era certo, podia arrumar as malas .
. - O JORNAL DA PRAIA anda espalhando que o
Terêncio vai chupar uma preterição.
L
LABRADOR ou LAVRADOR - adj. - "Chamar lavrador a
alguém é o mesmo que dizer-lhe que não sabe nada da
arte do mar". (Santos Graça, op. cit. 226).
LAGARTIXA - subs. - Galão de guarda-marinha. É uma
tira fina, modesta, simpática, estimulante. Sem dúvida,
o melhor símbolo de autoridade satisfeita.
LARGAR POR MAO- Abandonar, evitar dar conselhos para
que o tripulante proceda bem ou deixe de proceder irre-
gularmente, incorrendo em faltas sucessivas.
LASTRO (SAIR EM .. . ) - Diz-se de navio que sai descarre-
gado, completamente vazio. Navegar em lastro é navegar
sem carga.
LAVAR O CONVÉS -Diz-se' quando o mar assoberba o navio,
quando embarca e molha o convés.
Ex. - O mar está grosso, está lavando a proa.
LAVOISIER - subs. - Sopa feita com as sobras do almôço.
Pudim de pão. Pressupõe-se que a sopa e o pudim sejam
feitos com o que sobrou, com os restos.
Assim, nada se criará, não se perderá, tudo se trans-
formará .
LAZEIRA - subs. - Espaço, área, largueza, campo, ampli-
tude, vaga, medida de tempo.
Ex. - O navio girou bem, havia lazeira.
-Podemos ir ao cinema, a aula é às 16,30 horas,
temos lazeira.
- É preciso deixar lazeira para os encouraçados;
êles vão fundear aqui.
- O rebocador vem com muita lazeira, saiu com
dois dias de antecedência.
LEILAO- subs. (M Mercante) -Avarias que um navio pro-
duz, quando abalroa ou colide.
-LEVAR A RÉ- Levar marinheiro ao oficial de serviço, para
dar parte dêle.
É expressão usada em navios, pois os oficiais de ser-
viço, no pôrto, ficavam a ré.
73
72

LEVAR A TOLDA- O mesmo que levar a ré . LOGARITMO _ subs. - Corpo estranho ~ue apareça na
sopa, no caldo, no líquido. Cisco. Nome, numero e compa-
LICENÇA- subs.- Permissão para ausentar-se de bordo ou nhia do aspirante (Escola Naval) . .
do estabelecimento . Sair no dia de folga ou com autori- Ex. _ Vá cantando o logaritmo, diz o Chefe de dia ·
zação especial. Entrar no gôzo de licenciamento especial.
o aspirante dará, então, o nome, o número e a com-
LICENÇA DE PAGAMENTO- Depois do pagamento, há a panhia, a que pertence.
praxe de licenciar a guarnição mais cedo, às 13 ou às 14
horas. É uma concessão que visa permitir que os mari- LOTERIA_ subs. _Regata em que, por falta de vento, os
nheiros possam resolver certos problemas particulares, barcos permanecem emparelhados. Por sorte, al.guns to-
dependentes de horário. mam a dianteira em virtude de correntada ou bnsa even-
Ex. - Enviar dinheiro para a mãezinha que ficou tual. (V. Bilhete).
no Norte (os bancos fecham às 15,30 horas). Pagar im- )
LUBRIFICAÇAO _ subs. - Cachaça, abrideira, aperitiv~.
postos; comprar coisas que dependam da opinião da
patroa. Cocha, pistolão, recomendação, ajeitação. Suborno.
As licenças de pagamento têm uma longa história . gorjeta, molhadura.
Safam muitos apelos sentimentais. ~sses caprichos não LUBRIFICAR- v. (M. Mercante) - Toll_lar um trago, um
constam dos livros de quarto . .. aperitivo, uma abrideira, qualquer bebi.da. Cochar, reco-
LINHA (IMEDIATO ... ) - Oficial que tem o hábito de ma- mendar, empistolar. Subornar, dar gorJeta.
nobrar como se fôsse o imediato. LUZES _ subs. _ Luzes de posição do navio ou outras luzes
LINHA DO VENTO- Posição em que o navio recebe vento do navio (exceto a iluminação de ca~arotes, praças, cor-
favorável à navegação. redores). Faróis. Lampejos dos faroiS.
Ex. - " ... é ardente o que se chega bem depressa Ex. - o "mercante" passou com as luzes apagadas -
à linha do vento". (Alves Câmara- Op. cit., pág. 18).
Emprega-se P.l!ra designar o indivíduo que está pros-
perando na vida, que está com o vento pela pôpa.
Ex. - Sujeito de sorte; pegou a linha do vento.
LINHO - subs. - Uniforme de linho branco.
Ex.- No dia 11 de junho vou meter 1:1m linho im·· •
pecável.
- Estás com o linho muito amarrotado.
LIVRO - subs. - Livro de contravenções disciplinares. Li-
vro onde os oficiais lançam os nomes daqueles que come-
tem contravenções disciplinares.
Ex. - Não posso baixar a terra, estou no livro.
LIVRO DE QUARTO é outra coisa.
LOBO-DO-MAR - Pessoa de grandes qualidades marinheiras.
Marinheiro de muita aptidão para a vida do mar. Pescador,
pilôto, embarcadiço de grande perícia, de farta experiência e
longo tirocínio no mar.
Aquêle que se sente bem no mar, que está perfeita-
mente identificado com a vida do mar.
M
MACA-FERRADA- subs. -Carne enrolada com toucinho
dentro . Além de toucinho pode levar outros ingredien-
tes. Prato famoso na Marinha. Famoso e gostoso .
Quando bem feito, é iguaria apetecível . Mal feito e muito
freqüente, acaba legítimo estropo.
MANOBRA - subs. - Ato, atitude, ação, decisão, procedi-
mento.
MANOBRAR - v. - Agir, at uar, decidir, proceder, interferir,
recomendar, ajeitar .
MANOBREIRO - adj. - Indivíduo que manobra , que age
bem, com perícia. Pessoa ativa, esperta.
MANTA - subs. - Cobert or, capa , colcha . É o agasalho do
marinheiro, na maca, ou quando dorme de volante.
MAPA - subs. - Impresso destinado a relações referentes a
serviço, tempo de serviço, recebimento de uniformes, con-
dições de promoção, etc.
Ex. - Só receberão semestre, as praças que entra-
ram no mapa.
MAQUINA CAIU NO PORAO (A ... ) (M. Mercante) - Dei-
• xar a m~quina de funcionar por ter a manivela caído em
ponto morto.
MARAMBAIA - adj e sub. -Descrente, tolerante, gozador,
amigo de festas e passeios, pouco ou nada dedicado à
profissão, inimigo de manobras, fainas, exercícios. Na
Escola Naval é marambaia o aspirante que não se en-
t rega aos misteres da profissão, que prefere namorar,
dan çar . O marambaia não perde licenciamento; é o pri-
meiro a baixar a terra e o último a regressar. É sociável,
conversador, amável. Disputam-no as meninas, uma vez
que o marambaia topa tudo, até uma patescaria, a pe-
dido das garôtas . Não resiste quando lhe falam de festas,
reuniões etc .
Gastão Penalva (Patescas e Marambaias) assim o de-
fine: "O marambaia, leitora amiga, é um espécime naval
de qualidades diametralmente opostas às do patesca .
Nunca é patesca, como êste nunca foi marambaia .
76 77
Desde a escola que ambos os tipos se revelam e se des- MATROCA (A .. . ) - adj.- A MATROCA- A garra, des-
tacam, cada qual no seu ofício, com atribuições comple- governado, ao léu, abandonado, sem direção, sôlto, ao
tamente antagônicas, antípodas em tudo, até na maneira sabor do vento e da corrente, desarr,u mado.
de andar e de vestir.
Marambaia quer dizer namorador, dado a conquistas Ex. - Lá vai a chalana à matroca; acabará na praia.
inocentes, roxo pela convivência suave e cariciante das -Ainda tudo à matroca neste navio; mande o fa-
mulheres, que constituem a sua idéia fixa e a principal xineiro recolher o material.
razão de ser da sua vida. -Depois do temporal, havia muita coisa à matroca, ·
O marambaia entrou para a Marinha, veste uma no meio da baía .
farda de dourados unicamente para satisfazer a vontade
de uma prima, de uma vizinha, de uma criatura adorá- MATUTINA - subs. -Alvorada. Toque de alvorada. É o
• toque de despertar, pela manhã, na Escola Naval.
vel, que, um dia, entre dois beijos furtados, lhe segredou
de mansinho: - Juca, como tu ficarias bem fardado ! " Ex.- Amanhã a matutina será mais tarde ... (Eis
O têrmo terá vindo da restinga de Marambaia ? um milagre ! ) .
Quando os aspirantes vinham ao Rio, licenciados, deixa-
vam a velha escola, na Tapera, e a restinga, muito ao MEIO-FIO (M. Mercante) - Antepara longitudinal que se
longe. . . Quem gostasse de as deixar pela pôpa seria um instala nos porões para evitar que as cargas a granel se
marambaia . desloquem durante a viagem.
MARAMBA!SMO- subs.- Normas, atos e atitudes dos ma- MELHORIA - subs. - Qualquer acréscimo ao rancho. Pode
rambaias. Ex.: "Era no tempo do marambaísmo oficial, · ser em alimentos ou em dinheiro para comprar alimen-
parte integrante da educação social e militar do antigo tos, além do normal.
guarda-marinha" . (Penalva, P . e M . pág. 48) .
O rancho é confeccionado com o dinheiro previsto -
MAR BATIDO- Mar que arrebenta, que tem arrebentação . _ (etapas), acrescentando-se-lhe a melhoria. Em geral, a
Espumoso, revôlto. melhoria é uma sobremesa aristocrática. Por ex.: Bana-
na em 1.0 uniforme !
MARE NO OSSO- Baixamar de sizígias .
MENINAS - subs. - Questões de prova, na Escola Naval
MAREADO - adj. - Enjoado, tonto, zonzo, bombardeado . • (1929-32) .
MARIAR- "Erguer o pano da vela para navegar". (Santos Ex .. - Apanhaste as meninas?
Graça, op. cit. 227) . A pergunta traduzia a ansiedade da turma, antes
das provas. Entrar na sala com as meninas no bôlso seria,
MAREIRO, A- adj.- Que vem ou sopra do mar (vento); realmente, cômodo e repousante ...
propício à navegação; s. m. vento do mar (PDB) (Xavier
Marques- "Praieiros- Maria Rosa" pág. 19) MERECIMENTO- subs.- Conjunto de condições que reco-
Ex.: "A brisa mareira suspirava, tépida, no folhame mendam o oficial à promoção . Cotação .
dos mangues ... "
MESCLA - subs. - Uniforme mescla; uniforme confeccio-
MAlUNHEIRO DE VAPOR (M. Mercante). - Marinheiro nado com brim azul claro; uniforme de má qualidade,
que nunca embarcou em veleiros.
próprio para faxinas, de uso restrito; uniforme "domés-
MAROMBA - subs. - Vadiagem. tico", para "fins domésticos" . A fazenda é conhecida por
sarjão. Os oficiais não usam mais o mescla. Antigamente
MASSA BRUTA- subs.- Pessoa ignorante e grosseira. usavam-no mesmo em casa; às vêzes, para regar o jar-
dim. Não era raro ver oficiais reformados envergando,
MATAR A GUINADA- Levar o leme a meio para desfazer em casa, o mescla sem galões . Percebiam-se as marcas
a guinada. dos galões nas mangas .
78 79

MESTRE-D'A~S- subs.- Sargento (na sua falta, pode MONTAR- v.- Ultrapassar, ir além, deixar para trás, ven-
ser um cabo) encarregado de zelar pelo rancho da guar- cer, passar adiante.
nição . É o delegado das autoridades para fiscalizar a Ex. : - O cruzador mantou o farol às 12 horas, isto é
confecção e a distribuição do rancho. Escolhem-se, em passou pelo farol, foi além dêie, ultrapassou-o às 12 horas.
geral, sargentos ou marinheiros cuidadosos e compe-
tentes, com certo jeito para a cozinha. MONTANHA (C. F. N.) - Designa o CORPO DE FUZILEI-
ROS NAVAIS . Surgiu a denominação do fato de estar
MEXILHAO - subs. e adj. - Marinheiro que não gosta de instalado no alto de uma colina .
baixar a terra. Marinheiro que permanece a bordo por
prazer, por gôsto . Patesca, crente. MOSTRA- subs. (Ver AMOSTRA) -Amostra da comida
que vai ser servida. Antes de tocar rancho, sai a MOS-
MITffi - subs. ~ Sopa de composição duvidosa, desconheci- TRA. O mestre-d'armas, manda tirar um pouco de cada
da, inqualificâvel. (Habilidade de mestre-cuca !) prato, organiza a mostra e a leva, em tabuleiro limpo e
.. ' enfeitado, ao oficial de serviço. ~ste come da MOSTRA
MOÇO DAS LUZES- Marinheiro encaregado de lanternas,
luzes, archotes. Marinheiro encarregado de manter as e a aprova ou não. No primeiro caso, manda tocar ran-
luzes do navio em bom estado . Era ocupação da velha cho; no segundo, ordena modificações, etc. É ato obriga-
Marinha, quando as lanternas e · os archotes prestavam tório nos navios e repartições . Episódio comum e disci-
serviços . Hoje, pràticamente, só as lanternas dão preo- plinador . Pouco antes do rancho, vê-se um marinheiro
cupações . (rancheiro) carregando o tabuleiro da MOSTRA ; ao lado
dêle, o mestre-d'armas. Vão até a Sala de Estado ou à
MOITA- subs.- Silêncio, sigilo, discrição, pano prêto, mu- presença do oficial de serviço, a ré, na tolda. Quan do o
dez; não falar, não revelar segredos; guardar informa- oficial de serviço está com fome , devora a MOSTRA, in-
ções. clusive a sobremesa, embora resmungue : "Qual! êstes
MOITA (FICAR NA ... ) - Igual a moitar. cucas da Marinha não tomam jeit o ... "
Exemplos que ilustram o verbete: - Aquêle sujeito
é um moita, isto é, não fala, não revela seus planos, não
. . MOSTRAR O NOME (M .. Mercante) - Quando um navio
ultrapassa outro, em competição de velocidade, e passa
se abre, não diz o que fêz. nem o que pretende fazer; es- a navegar no mesmo rumo do alcançado, depois de cor-
conde intenções e projetos, sobretudo encobre vantagens , .. tar-lhe a proa . O navio que ultrapassa, mostra o seu
que obteve. n ome inscrito na pôpa.
-Manuel convidou a pequena para um passeio; ela
MOVIDO A ALCOOL (M. Mercante) - Ébrio habit ual .
moitou. (Quer dizer que ela não correspondeu, não topou
o passeio). MUDA - subs.- Semelhante a moita . É têrmo moderno .
Pitoresco é o seguinte : Na hora da salva, (tiros do Dar a muda é não falar com alguém . Não falar .
cerimonial), ju~tamente na hora H, o canhão n .0 5 moi-
Atualmente, aplica-se a coletividades .
tou, (significa que o canhão n .0 5 não disparou, en-
guiçou). MUITA BOCA (M. Mercante) -Pessoa muito gorda ou coisa
MOITAR -v. - Não falar, calar a bôca, não dar opinião, muito larga .
guardar segrêdo, esconder o jôgo. · MUITA GUINDA- Pessoa de estatura elevada, pessoa muito
MOLHO- sub~. -Dinheiro, pecúnia . alta. Aplica-se, também, a coisas.
80

MULA MANCA (M. Mercante)


;
-Denominação dada aos na-
vios do Lloyd Brasileiro da classe "RIO".

MUNICIADO - adj. - Na vida comum da Marinha é aquêle


que faz parte da guarnição do navio ou do estabeleci-
N
mento, para efeitos de rancho. Os municiados têm di- NOITE DE ALMIRANTE - Noite bem dormida, sem inter-
reito ao rancho. rupções, povoada de sonhos côr de rosa.
Ver Conto de Machado de Assis com êsse título. -
Diz-se do felizardo que come na casa da sogra. o Apontado por Henrique Pongetti como seu conto prefe-
Tenente vai ficar rico, está municiado na casa da sogra . rido - (Vamos ler! Rio, 25-2-1943) .
MUNICIAR- v.- Prover, tornecer, pagar, conceder direito NOTA - subs. - Penalidade, castigo, registro de castigo,
ao rancho, carregar, agasalhar. registro de qualquer fato que diga respeito à vida pro-
fissional .
Ex. - Não há uma nota na caderneta daquele ma-
rinheiro; está com a caderneta limpa. (Quer dizer que
. esse marinheiro nunca foi punido) .
- Há alguma nota na sua caderneta relativa ao
curso de telegrafia ? (Quer dizer : foi registrado êsse
curso?) ·
NOTA (POR . . . ) - Registrar na caderneta subsidiária a
pena correspondente à falta cometida . Registrar qualquer
fato relativo à vida profissional do militar. .

'

/
o
ONÇA- subs.
Dificuldade, empecilho, situação difícil, perigo, êrro;
adversidade, contrariedade, obstáculo.
1!: têrmo muito empregado na Marinha; talvez o
mais empregado no mundo da gíria. ONÇA resume ex-
pressões, pensamentos, histórias.
ONÇA (ALGUMA ... ?) -
Pergunta corriqueira, da rotina, quando o caveira-
• • de-pau entra de quarto; quando o encarregado de qual-
quer incumbência chega aos compartimentos de sua res-
ponsabilidade. O Imediato, quando chega a bordo, pela
manhã, vindo de terra, dirige-se ao oficial de serviço:
-Alguma onça? responde-lhe o Tenente: - "Não,
Sr. Imediato, não pegou nada". E o Imediato segue,
descansado, para o camarote.
ONÇA (A ONÇA ESTA SOLTA) -
Quer dizer: há muitas coisas pegando. Há grandes
dificuldades. Quando a onça está solta, tudo pode acon-
tecer ...
Surgirão bolos, entraves ao serviço, soluções desas-
trosas, azares, ocorrências adversas.

. ..
- Episódio típico da vida a bordo:
O Tenente, ao entrar de pau, recebe, do colega a
quem vai render, a seguinte advertência: "Olho vivo, meu
velho, a onça está sôlta". Nada mais é preciso dizer: o
serviço exigirá muita atenção.
Num serviço em que. a onça estiver sôlta, só o zêlo
excessivo poderá dar jeito. Tudo poderá sobrevir, deve-se
esperar o pior.
Alguns fatos que, naturalmente, ocorrerão quando
a onça estiver sôlta: mar grosso, temporal, avaria no leme,
· vasamento de tubos da caldeira, salgamento da água, in-
terrupção nos circuitos elétricos, avaria na giroscópi-
ca, etc. No pôrto, basta que o comandante pernoite a
bordo para que a guarnição cochiche, cobertas abaixo:
A onça está sôlta ...
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ONÇA (ESTAR NA ... ) -Estar em dificuldade. da Armada oferece Harry C. Conners, Chief Yeoman,
U. S. N., Servindo na Missão Americana, Rio de Janeiro,
Estou na onça, isto é, atrapalhado, cheio de dificul- Fevereiro, 1943).
dades a vencer.
Pode significar estar sem dinheiro. OURO - subs. - Dólar ao câmbio oficial, dinheiro ganho
pela "table de estrangeiro" .
Exemplo expressivo é a falta de peça do uniforme, Dólar muito barato. Moeda em que são pagos os
no momento exato da formatura, festa ou reunião obri- vencimentos dos que estão no estrangeiro. "Ganhar em
gatória. Exclama o oficial: "Estou na onça, perdi a gra- ouro" ou receber em dólares.
vata de laço horizontal buj arrona; o jantar começa da-
qui a cinco minutos ... " (Não resta a menor dúvida de Ex.- Esta viagem deu pouco ouro; só estivemos 100
que, se êsse onceiro fôr tenente ou guarda-marinha, a dias fora de águas brasileiras.
gravata será fabricada de qualquer maneira, e êle estará, - Os guardas-marinha vão ganhar muito ouro, esta
impecável, no seu lugar, à hora prot ocolar. Safará a viagem é de circumnavegação.
onça .. ) .
OURO (VIAGEM DE OURO) - Viagem em que o pagamento
Significa estar em perigo . Socorrer uma embarcação • • é feito em dólares, isto é, em dólares ao câmbio oficial.
que está na onça, isto é, em perigo. Sonho dos deuses ...
Nota: -Antigamente o ouro era a libra esterlian.
ONÇA ! (QUE .. . ) - Expressão interjectiva de muito colori-
do naval. Dir-se-ia: Que trapalhada! Que complicação!
Que dificuldade ! Que rascada !

ONÇA (SAFAR A ... ) - Resolver a dificuldade . Dar solução


satisfatória ao problema . Afastar o obstáculo perturba-
dor . Desfazer imbróglios.
SAFAR A ONÇA pode ser uma solução provisória, de
emergência, até que seja possível solucionar, definitiva~
mente, o caso. ·
Exemplo - Chegam, para almoçar, dez pessoas, fora
da lotação do navio . A bóia da Marinha nunca é medida;
sobra, normalmente; entretanto, às vêzes, é preciso esti-
car um pouco. Determina o oficial-rancheiro ao despen-
seiro: "Vá safando a onça com umas latinhas de "petit-
pois" e salchichas, até que chegue a lancha com os ca-
."
marões e as coxinhas da Colombo" .
- Existe um livrinho chamado "SAFA ONÇA, es-
pécie de "INGLt:S SEM MESTRE". Contém o necessário,
en inglês e português, para a vida cotidiana. Encontrei ,
em livraria desta cidade, uma senhora americana curio-
stssima: queria, por fôrça, que o livreiro lhe mostrasse o
livrinho, lhe explicasse o titulo. O livreiro também não
sabia. Aproximei-me e safei o enigma.
("SAFA-ONÇA" - Pequeno "safa-onça" de inglês
bássico para os companheiros da Marinha do Brasil que
tiverem de trabalhar com os da U. S. Navy. Ao Pessoal
p
PACIFICO - Há uma expressão muito boa, da Côrte do ft.l-
mirantado Inglês, quando quer exprimir falta de· vigi-
lância: "Estar no meio do Oceano Pacífico ."
PAIOL- subs. e adj.- Vulgar, comum, fácil, ordinário (má
qualidade), abundante, banal.
Exs.- Você é capaz de atravessar a Guanabara a
nado?
- Sou; isso é paiol (é fácil) .
- Um colecionador possui muitos exemplares de
certo sêlo; êsse exemplar, fácil de obter, é paiol.
- Quando o aluno verifica que as questões de exa-
me são muito fáceis, diz que são paiol.
Suponho que o têrmo derive do paiol dos navios ou ·
dos paiós em geral.
PAIOL é o compartimento onde se guardam as coisas
necessárias à vida cotidiana ou serve para armazenar
material. Há, nêles, objetos comuns, de aplicação ime-
diata.
Em viagem, um paiol bem abastecido garante a tra-
vessia. Tranqüiliza. Basta ir ao paiol e retirar a coisa
desejada. O paiol está ao alcance da mão .
.
Qual a coisa mais necessária ? A comida, evidente-
mente. Lá está o paiol de mantimentos, no qual se en-
contram iguarias apetecíveis. Que iguarias ? Feijão, ar-
roz, carne-sêca, batata, farinha, etc. Nada de caviares,
patês, fios-d'ovos. O paiol garante a barriga, fornecen-
do-lhe o trivial (de acôrdo com a significação exata, são
três petiscos: feijão, arroz e farinha) .
Os ranchos da Marinha recebem melhoria. Além do
paiol, o rancheiro recebe verba parcimoniosa para extras.
Quando o rancho decai e as refeições pioram, diz-se que
o rancho é paiol. Se a verba estourar no dia 15, será
forçoso comer do paiol, até o dia 30 !
Bom cozinheiro e paiol atestado proporcionam ban-
quetes pantagruélicos, em pleno Antártico !
Paiol de prestígio, a bordo, é o do mestre. Encon-
tram-se, nêle, ferramentas e aparelhos diabólicos.
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PAIRAR- v.- Parar o navio sem fundeá-lo. Ficar sob (ou
sôbre ? ) máquinas. Em geral, à espera de qualquer pr~ dade social, as atrações civilizadas. Só acha encanto .n<?s
vidência. · encargos marítimos, nas suas horas. de pau, no ~eu bmo-
culo, nas suas tábuas de navegação, no seu cac!_lrmbo, no
PAISANO- Civil. Denominação que os marinheiros dão aos taboleiro de xadrez, no cheiro acre a alcatrao q'!e. se
que não pertencem à Marinha, como miljtares. Roupa evola das enxárcias retesadas. E não há mocta· femmma
civil. Traje civil. Vestir o paisano. que se lhe compare a uma gola maruja engomada a ca-
PANEJAR - Ficar a embarcação a pano sem vento para an- pricho."
dar, navegar. Bater das velas, por falta de vento. Fala o patesca diferente de todo o m~do. Tem a
PANO PR1!:TO - Segrêdo, mistério, moita, discrição. Fazer sua linguagem própria, condim;~tada da pltoresc~ ~ec­
pano prêto é esconder as coisas, as instruções, as notí- . nologia do mar. Avêsso ao conviVlO alegre das mult1does,
cias, as soluções. Deve ter provindo do pano prêto utili- aos encantos terrestres, ao colorido variegad:o . d~ uma
zado pelos fotógrafos de rua (lambe-lambe). platéia de teatro ou de u~. camp~ d~ sport, m1m1go ~e
leitura, insensível ao contagio balsam1co das artes ---:-. ~le
PARALELAS- subs.- Régua de paralelas utilizada na na- sofre uma hora de spleen por dia, e atura as consequen-
vegação.
PASSAR O BELICHE A FERRO (M. Mercante)- Rolar com
o balanço do navio. Quando o marinheiro passa a noite,
.' cias de uma neurastenia eterna".
Passa a vida a bordo. Conhece o séu navio a pole-
gadas; informa sôbre tudo,~ quase ~empre se arvora em
de cá para lá, rolando, no beliche, da direita para a es- imediato, quando êste se deiXa dommaAr pela sua c~e~ça
querda, vai passando a cama a ferro. e pela ascendência moral que exerce sobre _a guarmçao.
PASSAR O C .. . PELAS OSTRAS OU PELAS BRAZAS (M. É 0 que se chama "imediato linha". (Gastao Penalva -
Mercante) - Dormir um pouco. · "Patescas e Marambaias").
(Veja: Tirar uma coelha ou ferrar uma baderna) . PATESCAO- adj.- Aumentativo. Muito patesca.
PATESCA- adj. -Crente, dedicado, caprichoso, ajustado, OBS: A PATESCA é peça indispensável a bordo,
entusiasta, intolerante . Diz-se que o marinheiro é pa- presta serviços inestimáveis. Daí a adjetivação su?:_a.
tesca quando executa com prazer, alegria e espontanei- Define o Manual do Patrão de Pesca do Sr. Capltao-
dade, as tarefas que têm cunho marinheiro. Ex.: nave- de-Mar-e-Guerra. (Hoje, Contra-Almirante) FREDERI-
gar a vela, rebocar embarcação, manobrar o pano. CO VILLAR:
Um aspirante patesca fica na Escola, aos sábados,
a fim de velejar de cúter, de guanabara, de barco, enfim. PATESCA - "Poleame de uma só roda, maior que o moitão
Ninguém lhe precisa dar essa ordem, o patesca faz isso e mais alongado; na caixa, uma das faces é .aberta por
por gôsto, por vocação. PATESCA é o contrário de MA- meio de dobradiça para nela se passa~ o seiO ~o cabo.
RAMBAIA. fechando-a em ·seguida. Na parte supenor da caiXa, tem
I '
Os patescas abominam a terra, a cidade, as ruas; ela um gato de tornei por onde é prêsa aos olhais. Serve
para êles, só o mar possui atrativos. para retôrno dos cabos."
Descreve-o Gastão Penalva, em "Patescas e Maram- PATESCARIA- subs.- Trabalho, ação, ato, faina, qualquer
baias": atividade puramente marinheira, nitidamente caracteri-
"PATESCA, meu caro paisano, é o indivíduo que se zada por virtudes marinheiras.
apega a bordo e às cousas do seu navio, e dêle não arreda
pé senão uma ou outra vez para ir a terra em visita a PATRIA AMADA (M. Mercante) - Oficial ou marinheiro
um parente ou amigo, quando os tem, fazer uma ou ou- da Marinha de Guerra.
tra comprinha de urgência, e matar a saudade das está-
tuas, num giro indiferente e apressado. Só o interessam PAU- subs.- Serviço, serviço de quarto ou de estado .. Ser-
as questões do seu barco. Não lê jornais nem quer saber viço que o militar da Marinha faz durante determmado
como vive a cidade. Detesta o mundanismo, a banali- tempo, obedecendo a escala.
Ex.- O Tenente está de pau, isto é, está de serviço.
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O têrmo não é recomendável. Muitos o repelem por
desprestigiar o serviço, por rebaixá-lo, ridicularizando-o. PAU (RODAR O .. . ) -Correr a escala de serviço.
Entretanto, é usual ~ está generalizado. A gíria tem muita
fôrça e define, perfeitamente, as coisas. PAUS (ESTAR A TANTOS) -Pertencer a uma escala que
estabeleça tantos serviços, em determinado período. As-
PAU será sinônimo de cacête? Cacête, na gíria ca- sim: Estar a 4 paus quer dizer que o pessoal está dividido
rioca, quer dizer aborrecido, monótono, maçante, enfa- em 4 grupos (poderá ser um homem e não um grupo).
donho. O serviço nem sempre é monótono ou enfadonho. Estes grupos entram de serviço, sucessivamente, no de-
Outra hipótese: PAU FURADO é espingarda; por exten- curso das 24 horas.
são, qualquer arma. Ora, o oficial de serviço, quando Entrar de serviço de 4 em 4 dias, também é estar a
assume o quarto, coloca a arma na cintura.
4 paus.
Quem sabe se. o óculo comprido, usado pelos antigos
oficiais de serviço, no convés, não teria provocado o P:E CHATO ou PÉ INCHADO (M. Mercante) -Navio ron-
nome? O óculo parecia um pau. Seria a espada dos ve- ceiro, vagaroso, de pouca marcha . (V. PÉ INCHADO) .
lhos tempos, arma que os oficiais de serviço arrastavam
pelo convés? P:E DE CARNEIRO - Coluna, poste, suporte.
PAU AMERICANO- É modalidade adotada, principalmente, PEGAR TEMPO - Pegar mau tempo, temporal. Pegar mar
durante o Carnaval. Quem entra de serviço deve chegar grosso.
a bordo ou ao local em que fará o serviço algum tempo
antes da sua hora (às vêzes, 4 horas antes). Não é neces- PEIXE DE COURO - Cação, lixa, peixe gato, meiga etc .
sário permanecer a bordo o dia inteiro, basta estar lá um Têrmo depreciativo com que designam . os homens que
pouco antes da hora de iniciar o serviço . não são da classe (Santos Graça. O Poveiro - pág. 228) .
PAU CACHORRO- O quarto das 16 às 20 h. é dividido em PEPINEIRA - Coisa boa; vantagem, negócio da China, ob-
dois: um homem dará o pau de 16 às 18 e o outro, das jeto barato, boa vida.
18 às 20 horas. Razão: jantar. É cômodo, a bordo, per-
mitir que um oficial- entre de. pau, "jantado", e que o PERNOITAR- v. - Dormir a bordo ou no local da comis-
outro saia e vá jantar. Há outras razões para quebrar o são, sem fazer parte -da escala do serviço rotineiro (ser-
pau . As vêzes, para que não se tornem fixos os quartos, viço dos oficiais inferiores, suboficiais, sargentos, mari-
para os mesmos oficiais. nheiros).
PERNOITAR é passar a noit e no local da comissão.
PAU COM FORMIGA- Serviço duro, cheio de onças, de abor-
recimentos, de dificuldades, de casos difíceis de resolver. PERNOITE- subs.- Passar a noite a bordo. Por extensão :
' ... passar a noite onde quer que esteja servindo . Ato de
PAU DENTRO, PAU FORA - Ficar de serviço, dia sim, dia
não . Quarto sim, quarto não. pernoitar.
O PERNOITE é feito por oficiais (inclusive o coman-
PAU (ESCALA DE ... ) - É a escala de serviço. Nela figu- dante) , oficiais dos quadros anexos, suboficiais, sargen-
ram tôdas as pessoas que devem dar serviço e o horário tos, e pessoal escalado. Os que dão serviço de quarto, na
respectivo. sala de estado, no convés, na máquina, dormem a bordo
por fôrça do próprio serviço. O têrmo PERNOITE só se
PAU (ESTAR DE ... ) - Estar de serviço . aplica àqueles que não pertencem à escala de serviço de
estado ou de quarto. Há uma tabela de pernoite.
PAU REDONDO -Virar o pau pelo redondo. Fica~ _ sempre
de pau. Ninguém, desde o comandante, deixa de dormir a
bordo uma noite, pelo menos, por semana. O pernoite é
PAU RODADO - Serviço contínuo. Essa· continuidade de- instituição patesca, regulamentar.
pende das necessidades. Aproveitar o PERNOITE é ciência de poucos. Em
geral, perdem-no preguiçosamente. Depois do jantar
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(que é cedo, às 18 horas) começa o gamão, o xadrez, o Pela madrugada, quem está atento à costa, pensan-
papo, o mah-jong, a anedota, a trepação. Pernoitar em do, profissionalmente, no aparecimento dos faróis, tem a
noite de cinema é privilégio de comandantes e imediatos. impressão, a ca.d a momento, de que vê luzes. É um pipo-
Por outro lado, o PERNOITE serve para pôr em dia car continuo. Pipocas. em profusão!
o serviço ou para fazer leituras agradáveis, tranqüilas, Exemplo eloqüente: No dia 23 de setembro de 1955,
prolongadas. Eça de Queiroz é companheiro ideal nos · ao discursar, perante o Corpo de Alunos da Escola Naval,
pernoites. Registre-se, com interêsse e simpatia, a pre- no tradicional almôço dos 100 dias, o Sr. Almirante Dire-
sença do querido poveiro em todos os camarotes, da proa tor, paraninfo, disse o seguinte: "Na vida {utura tereis
à pôpa. · grandes alegrias. Vereis. pipocar ·o farol no horizonte e
Um "pernoitezinho" oportuno favorece altas e bai- sentireis, em seus lampejos, a segurança da técnica, a
xás cavalarias. Permite religiões, surubas, aventuras don- ·c erteza dos cálculos da navegação". Belo exemplo do têr-
juanescas. mo e conceituação magnífica! Traduz o orgulho profis-
O álibi é perfeito para os farristas que desejam uma sional do navegador, em pleno mar.
noite fora de casa. • '>
PIROLITO - subs. - Uniforme azul das praças. Uniforme
PESCAR (O ferro, o torpedo) - Recuperar, apanhar; roce- cheviô dos ofieiais, suboficiais e sargentos. (Os oficiais e
gar, trazer. suboficiais não têm ma,is êsse uniforme) . Denominação
PG (ARRANJAR UM . . . ) -Conseguir uma solução favorá- pitoresca .do Alvo de Batalha "ONZE DE JUNHO" .
vel. Obter vantagem. Encontrar uma solução. Arranjar
cocha, maneira ou jeito . . PLATINA- Peça do uniforme, que se coloca sôbre os om-
bros, com as insígnias .
PICAR ( .. . A AMARRA) - Cortar a amarra. É manobra
técnica, em ocasiões de emerg_ê ncia QU por necessidade PLOTAGEM- Marcação, determinação, c_h ecagem.
do serviço.
PLOTAR - Marcar, determinar, checar .
PINTAR O SUDOESTE- Surgir o vento de sudoeste . Apon-
tar êsse vento. Começar a soprar. PODRE (CALl\4ARIA) - Falta de vento . Ausênci"a de brisa,
PIPOCAR - v. - Surgir, aparecer, revelar-se, mostrar-se, aragem, vento, etc .
luzir, emitir lampejos . PONGAR - v. (M. Mercante) - Tomar bonde andando.
Emprega-se com relação ao facho luminoso dos
faróis. POPINHA - Praça dos camarotes dos oficiais, a ré, na pri-
Informa o oficial de serviço: -O farol de Castelha- .. .,. meira coberta, no "Minas Gerais" e no "São Paulo" .
nos pipocou ·às 2 horas. Quer dizer que a luz do farol foi Praça pequena, recatada, isolada, circundada por cama-
percebida àquela hora. rotes de oficiais antigos. Bom local para longos e dis-
Ex. - O farol da Rasa ainda não pipocou . Signifi- cretos papos. Se fôsse possível gravar as palestras nas
ca: ainda não foi avistada a sua luz. popinhas·, surgiria, talvez, a verdadeira história das Ma-
rinhas... ·
O têrmo PIPOCAR refere-se, apenas, ao facho lumi-
noso, não à tôrre do farol, à armação, à construção. PORTALO A PORTALó- Mesma graduação entre oficiais.
Usa-se, também, como sinônimo de surgir, aparecer, Mesma antiguidade, mesma graduação na hierarquia.
chegar a reunião ou encontro etc. Ex.: - Daqui a pouco Igualdade no pôsto . De igual para igual.
o Fernando pipoca na Escola.
- O trem pipocou na hora exata ! PRAÇA D'ARMAS- Refeitório dos oficiais.
Há evidente analogia entre o aparecimento da luz de PRAIA - Denominação genérica da costa. Dar à praia, isto
um farol e o salto do grão de milho, quando se trans- é, ir, à deriva, até a costa. Os navios desgovernados aca-
forma em pipoca. bam na praia.
PRAIA BATIDA- Praia agitada, cujns águas arrebentam e
espumam.
PRANCHEAR - v. - Cair, estender-se ao comprido, pro-
jetar-se. Q
PREA ·_ subs. - Marinheiro novato, recem-chegado à Ma~ QUEIXOS - subs. - Proa, parte de vante das embarcações .
rinha, grumete.
QUEIXOS (PELOS ... ) - Trazer a reboque, arrastar, re-
PROA- subs. -Rosto, cara, chanfro. Prosa, convencimento. bocar . ·
PROLONGAR REMOS- Cruzar os talheres. Cessar, parar, . Ex. - o BIGUA entrou pelos queixos. Significa:
suspender. veio rebocado.
PUNHOS - subs. - Galões no jaquetão .
PUNICAS (Guerras) - Revoluções brasileiras. Movimentos
revolucionários. l!:poca que começou em 1922, sob amea-
ça de revoluções ou em revoluções (no Brasil) .
PURA - subs. (M. Mercante) -Cachaça .

. ,.
R
RABEAR- v.- É têrmo técnico. Girar o navio, quando fun-
deado, acompanhando a maré.
Os navios podem rabear sob outras influências.
Como gíria, por analogia .
• RABICHO- subs. (M. Mercante) -Luz volante. Lâmpada
que se tr~;~.nsporta na extremidade de cabo elétrico.
RAMONAGEM - Limpeza, raspação, raspagem, purgação.
RANCHAR- v.- Comer, almoçar, jantar etc.

RANCHO VOLANTE- Refeição sem mesa e cadeira ou ban-


co. E tomada em pé, ajeitando-se cada um à sua vontade .
Está em moda na sociedade carioca (jantar americano) .
Nos dias de fainas pesadas ou exercícios prolongados
(como o de tiro) é praxe organizar rancho volante . A
base dessa refeição é o pão com carne .
RASCADA - subs. - Complicação, onça, bôlo, dificuldade.
RATO - adj. - Aspirante (aluno da Escola Naval) que vive
a observar, sorrateiramente, as faltas de outros colegas,
a fim de dar parte às autqridades (1955).
REBARBAR - v. - Reclamar, protestar, invectivar, quei-
xar-se, reagir, opor argumentos.
Ex. - O pessoal está rebarbando a sujeira do aloja-
mento. (A regência do verbo REBARBAR é peculiar) .
REBARBATIVO - adj. - Aquêle que rebarba. Ex.: Calouro
rebarbativo, isto é, reclamador.
Também se emprega para designar cousa desagra-
dável.
Ex. - Remédio rebarbativo.
REBOJADA- subs.- Agitação das águas.
REBOJO - subs. - É a água agitada. Em geral, em conse-
qüência do movimento dos hélices.
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RONCEIRO- Lento (navio). Embarcação de pouca marcha.
RECREAÇÃO (Escola Naval) - ·Recreio. Tempo de folga,
sem qualquer obrigação. RONDA - subs. - Marinheiro escalado para pequenos ser-
viços. Acompanha o oficial de serviço ou quem faz as
O toque de r~creação é estimulante, alegre, aliciante, suas vêzes. Em qualquer unidade da Marinha. (em terra
gostoso. ou no mar) poderá ser escalado um RONDA. Na Escola
REFORÇAR - Aumentar. Pôr mais. Naval os aspirantes dão serviço de ronda.
Emprega-se com relação à comida. Quando o prato É o menos graduado da escola de serviço. Fica às
é bom, pede-se refôrço. ordens de quem está dando serviço e atento aos constan-
REFORÇO - subs. - Acréscimo, aumento, reserva, multipli- tes chamados. Leva recados, conduz pacotes, vai chamar
cação de fôrças . pessoas. Faz tudo, se é necessário dar um aviso, lá vai
o ronda; se faltam cigarros, lá vai o ronda à cantina; se
No rancho também se usa o têrmo. Um colega de um homem escalado não apareceu, lá vai o ronda pro-
turma, amante de arroz, dizia ao taifeiro: - Reforça ! curá-lo.
(:Ele queria mais arroz, pedia mais).
Conta-se que ilustre almirante perguntava a certo
Se um cano está a ponto de rebentar, coloca-se um oficial, famoso pelo desembaraço: -Você seria capaz de
refôrço. levar êste navio à Bahia? Resposta : -Dê-me um RON-
A bordo, escalam-se alguns marinheiros, além dos DA safo que o levarei à China ...
previstos para o serviço normal, a fim de servirem de O episódio assegura a utilidade dos prestimosos
REFORÇO. Caso apareça alguma faina que exija mais rondas.
braços, ch~ma-se o REFóRÇO. '
REFORMA - subs. - Nova porção, outra quantidade, bis, RONDAR - v. - Mudar o vento de direção. Puxar o cabo.
mais, repetição . Rondar o brando, isto é, colhêr o seio do cabo.
A reforma dos militares é a sua retirada do serviço RONDAR (O VENTO) - Mudar o vento de direção. O vento
ativo. Essa acepção não faz parte da gíria marinheira . rondou, isto é, mudou de sentido, de direção.
O emprêgo do têrmo no rancho é comum. Ex.: Tai-
feiro, traga reforma do pàstel. (É possível que venha ROTINA- subs.- Costume, hábito, norma, doutrina, or-
outro pastel. . . não custa tentar) . dens em vigor, tabela, vida cotidiana, vida normal, dia-a-
dia, discriminação dos serviços, atividades normais.
Por extensão, emprega-se o têrmo com relação aos
objetos velhos, de mau aspecto. Ex.: Preciso reformar Cumprir a rotina quer dizer: cumprir o que está estabe-
êste jaquetão. Na vida paisana reformar a roupa é con- lecido, o que vem sendo feito.
sertá-la. Na Marinha, reformar o jaquetão é dá-lo de pre- Ex. - O exercício de remo é de rotina, isto é, não
sente ao taifeiro ou ao roupeiro. (As sobrecasacas e os constitui exceção, é habitual, normal.
jaquetões, algumas vêzes, se transformam em costumes Ex. - :Este reunir é da rotina? - Deseja-se saber
ou casacos femininos) . se o reunir que tocou (toque de reunir) é normal, se é
Quando se reforma qualquer objeto, virá outro subs- tocado todos os dias, àquela hora.
tituí-lo; daí a idéia primitiva, que significa nova porção, Usa-se uma expressão que me parece imperfeita,
quantidade, bis. pleonástica: ROTINA NORMAL.
REGISTRO- subs.- Serviço especial nos velhos tempos da O imediato, ao dar as ordens em parada, diz quase
Marinha (há cêrca de '25 anos ainda se verificava). Um sempre: Rotina normal . A advertência estabelece regime
dos navios da Esquadra ficava pronto para qualquer normal, sem alteração. Ora, isso é a própria rotina.
emergência. O médico ia ao açougue examinar a carne A expressão é usada, entretanto, por haver rotinas para
(trazia um bife) e um tenente ia ao Hospital da Marinha várias situações. Há rotina de sábado, rotina de sexta-
visitar os doentes. O açougue era o da Marinha, no Ar- feira, rotina de domingo. Rotina, nêsse caso, é o mesmo
senal da Marinha. A noite, uma luz, no tôpo do mastro, que dia de trabalho.
indicava o navio de registro .
100
ROTINEIRO- adj.- Aquêle que cumpre exemplarmente a
rotina. Mais do que isso: aquêle que se revela incapaz
de se afastar da rotina. O têrmo é depreciativo. Quando
. alguém chama um ~ficial de rotin~iro, fá-lo ~OJ?. a. in-
tenção de o qualificar como medwcre, sem miciativa,
s
amarrado à rotina. SAFAR- v. - Realizar, resolver, conseguir, livrar, escapu-
lir, desencalhar . .
ROTUNDA - subs. - Privada, conjunto de privadas, local
· onde há privadas e lavatórios (Escola Naval), banheiro . SAFAR-SE- v.- Sair-se bem, livrar-se, realizar .
No Colégio Naval (1955), ROTUNDA é banheiro.
SAFA-ME UM- Dá-me um. Arranja-me um. Safa-me um
RUA- subs.- Terra, fora do navio, da repartição, da Ma- cigarro ou dá-me um cigarro.
rinha. Tem sentido particulàríssimo. Só os aspirantes
de Marinha o compreendem perfeitamente. IR PARA A SAFAO e SAFlSSIMO- Aumentativo e superlativo.
RUA quer dizer deixar a Marinha, ser desligado da Es-
cola Naval. ... SAFA-RASCADA- Confusão, bôlo.
Ex. - Tratem de estudar se não quiserem ir para Tal situação ocorre quando surgem várias onças, ao
a rua. mesmo ·tempo.
Escritor de talento comporia excel~nte novela na SAFANDO (ESTAVA "SE" ... ) -Estava obtendo qualquer
qual a RUA fôsse a principal personagem. Tudo, na Es- vantagem. ·
cola Naval, gira em função da RUA. Basta citar o amor,
o galão, a liberdade. Pensa-se em não ir para a rua, a Aplicável às mulheres: O Guarda-Marinha estava "se
fim de conquistar a RUA definitivamente.
safando" com aquela garôta, quando tocou reunir.
e
SA~SE! (Em tom imperativo) -Vá embora. Retire-se.
Resolva o seu problema . Musque-se, desapareça. Dê um
jeito nas suas dificuldades. Execute as ordens.
SAFEI (NAO SEI 'SE ... ) - Não sei se safei (acertei) a 2.•
questão. É corrente na Escola Naval.
SAFISMO - subs. - Qualidade do que é SAFO.
SAFO (LOCAL ... ) - Local favorável, sem obstáculos ou di-
ficuldades. Local em que a navegação é fácil.
SAFO (MANDE UM HOMEM . .· . ) -Isto é, um homem capaz
de executar o serviço ou o trabalho com presteza e per-
feição.
SAFO (PASSAR ... ) - Não bater, não abalroar. Quando o
navio passa perto de pedra ou areia e não bate, diz-se
que passou safo.
SAFO? (VOCt: ESTA ... ) -Em outras palavras: Está livre?
Terminou o serviço ? Passou no exame ? Cumpriu a pri-
são ? Tôdas as suas coisas estão em ordem ? Tem di-
nheiro?
102 103
SAFOU-SE (O NAVIO ... ) - Livrou-se, desencalhou, venceu Alguém fala e eu não entendo: sobrei. Sinônimo
dificuldades, ultrapassou perigos. Depois do temporal, de boiar.
o navio que nada sofreu está safo; safou-se. Os navios - Emprega-se também da seguinte maneira: -
podem encalhar, diria o Conselheiro Acácio, devendo sa- Tocou rancho, vamos depressa, senão sobraremos (não
far-se e prosseguir viagem. Aparece, nos jornais, com pegaremos o rancho) .
freqüência: " O petroleiro Caçamba encalhou ao sul da
barra; safou-se com o auxílio do rebocador da pratica- - Com a sobra do almôço o cozinheiro fará um jan-
gem". · tar aceitável.
No dia do pagamento o intendente vai fazendo a distri-
S.AúDE E PAC!t:NCIA - Expressão que trad~z ceticismo. buição dos envelopes com o dinheiro; a certa altura,
Significa: o oficial que th•r saúde e paciênCia chegará a chega ordem de suspender a faina. Dizem logo:- A 5.a
almirante. Basta esperar. A vida correrá, os galões · · · · divisão sobrou, isto é, não recebeu.
virão ...
. .. . . . ..
..
SE - Marinheiro sem especialidade. SOCIO- Sócio do Clube Naval .

SEDE- subs. ~Rio de Janeiro, Capital Federal; lugar em SOCIO (FAM!LIA DE ... ) -Pessoa da família de sócio do
que, habitualmente, se serve. Clube Naval. Pode ser espôsa, irmã, prima, qualquer
ligação.
Ex. - Todos os oficiais devein servir fora da sede.
Isto quer dizer que devem servir em comissão fora SOCIO (MULHER DE ... ) - Espôsa de sócio do Clube Na-
do Rio de Janeiro, considerada "fora de sede". Não se val. As vêzes tem sentido pitoresco, como recomendação,
aplica a comissões no estrangeiro. Só por ironia amável, na iminência de qualquer bragalhada .
diríamos a colega habituado a viver no estrangeiro:
"Você está fora de sede, não sai há dois anos do Rio ! " SOLITARIA - Prisão para marinheiros. Cela, bailéu (que
Pura ironia, quase sátira, que é - em última análise- é para aspirantes) .
ambicionado elogio ...
SOMBRA - subs. - Local protegido, espaço abrigado do
SEXTA-CLASSE - adj. - Ordinário, ruim, desajeitado, úl- vento e do mar, lado calmo do mar, com relação a navio,
timo na classificação, de má qualidade. Indica, geral- ~osta ou elevação; bordo mais tranqüilo relativamente
mente, o marinheiro de classificação (antiguidade) mais ao mar. É empregado para designar o local mais calmo,
baixa. em virtude da proteção de qualquer corpo.
Ex. - t:ste serviço é muito fobó, qualquer sexta-clas- Ex. - O escaler colocou-se na sombra do navio, a
se poderá fazê-lo. Isso quer dizer que um marinheiro fim de desembarcar os passageiros .
. novato, inexperiente, desleixado, poderá executar o tra- Quer dizer que o escaler procurou o lado protegido
balho em vista. do vento e do mar para a sua manobra.
Ex. - A festa estava muito sexta-classe. Significa -Coloque o barco na sombra da ilha, isto é, no lado
que a festa estava ruim, mal organizada, desagradável, mais calmo da ilha, onde o mar estiver mais tranqüilo.
pobre, sem graça, pouco satisfatória. Tem emprêgo pitoresco. Ex.: O Justino fará boa
SILENCIO - Toque de silêncio, à noite. 1!: o fim do dia de carreira, navega sempre na sombra do chefe ...
trabalho . Todos irão dormir, excetq os ~omens de serviço.
SPRING (ESPRINGUE)- Cabo. Corda.
SOBRA - subs. - Excesso, repetiçãQ, eircedente, reforma.
Ex. - Despenseiro, hâ sobra de empada ? SUJAR A CADERNETA- Pôr uma ou várias notas na ca-
. _ - Taifeiro, arranje uma sobra, isto é, outra empada. derneta. Tais notas são punições, castigos; daí, a cader-
r
neta ficar suja.
SOBRAR - v. - Não compreender, não perceber.
Ex. - Sobrei na 2.a ·questão, isto é, não soube re- SUJO (LOCAL .. . ) - Local desfavorável à navegação, por
solver a 2. 3 questão. apresentar pedras, bancos, areia, cascos soçobrados et c.
104

SUMAQUEIRO'- CASCA GROSSA - Homem mal educado


Marinheiro ou ofici l mal educado. A velha Marinha an~
d.ava cheia de sumaqueiros. As manobras a pano reque-
nam palavrões imperativos. . . .
T
SURUBA .- subs.- Farra com mulher, festinha em compa-
panhia de mulheres, encontro amoroso. TAIFA- subs. - Coletivo de taifeiro, conjunto de todos os
A sun~b~ nun~a é ing~nua, inocente, platônica. Há taifeiros. Um tai!eiro.
de ser maliciOsa, picante, licenciosa. Ex.- A taifa é muito boa neste navio.
A expressão significa que todos os taifeiros são bons,
SURUBA (AQUILO É ... ) - As vêzes um casal suspeito pro- que o serviço dos taifeiros é bom . Pode, entretanto, de-
voca tal exclamação. Suruba, contrabando, aventura signar apenas um taifeiro.
amorosa.
Ex. - Taifa ! grita o oficial. Apresenta-se um tai-
SUR(~BA (É DA. ·,. ) ~ Aquela pequena é da suruba. Quer feiro (se o grito fôr muito estridente, violento e sonoro,
dizer q~e ela e farnsta, boa companheira para noitadas, acorrerão vários taifeiros; quiçá a taifa completa, com o
para ceias alegres ou passeatas clandestinas. despenseiro à frente. Quem não conheceu um gritador
de tamanho poder?) .
TAIFISTA- subs. -Já ouvi essa denominação como sinô-
nimo de taifeiro. É pejorativa. Desinência dos especia-
listas: telegrafistas, foguistas, etc.
TALHA AO LAIS- Expressão bonita, marinheira.
Designa oficiais /patescas, manobreiros, crentes (Ma-
rinha antiga).
TAMPA- subs.- Boné, quépi, chapéu, gorro, boina, cober-
tura de cabeça.
Ex. - Safa a tampa! Quer dizer: Tirar o boné ou o
,.. chapéu I
- Aspirante, a sua tampa está muito sexta-classe!
TERRA (BAIXAR A ... ) - Ir para terra, para a rua, para
casa. Sair do navio (em virtude de licenciamento, licen-
ça, ou simples retirada) .
Ex. - A guarnição baixará a terra às 17 horas.
(Quer dizer que a guarnição será licenciada às 17 horas).
- O quarto de retém não poderá baixar a terra (não
irá para terra, para casa).
Prova de que as gírias devem ser divulgadas: Certa
senhora telefonou para a Escola Naval e pediu que cha-
massem um sargento. Daí a instantes, retrucou o cabo-
auXiliar (cabo que auxilia o oficial de serviço): -Minha
senhora, o sargento baixou a terra.
Soube-se, depois, que a senhora, ao ouvir a informa-
ção amável, perdeu os sentidos, estatelando-se no chão
da padaria donde telefonara. Quando ouviu que o sar-
107

gento baixara a terra, pensou que êle morrera, que fôra


- o aspirante Fulano arranjou uma pequena muito
tesa, não o deixa sozinho. Ela é tesíssima !
enterraçio .. .
_ Fulano fêz um bom curso de comunicações, houve
TERRA (IR A ... ) -Sair do navio, licenciado, a passeio, de muito tesamento durante o ano .
folga. Sempre que um ·m arinheiro se ausenta do navio,
vái a terra. Por extensão, aplica-se a qualquer comissão TESISSIMO - 1!: o superlativo aplicável a tesa, quando as
da Marinha. Um marinheiro da Escola Naval também qualidades mencionadas apresentam elevado teor .
vai a terra, apesar de já estar em terra.
TIO- subs. (M. Mercante) -Comandante do navio .
TESA - adj. - Enérgico, rigoroso, duro, inflexível, cumpri-
dor dos regulamentos. TIRAR UMA COELHA (M. Mercante)- Dormir um pouco .
Aplica-se êsse adjetivo, em geral, ao oficial ou militar que Ver: Tirar uma baderna ou Passar o c. . . pelas os-
tem as qualidades mencionadas. tras ou pelas brazas.
Oficial tesa é aquêle que cumpre os regulamentos TIRAGEM (Velocidade) - É aplicado para designar veloci-
com exatidão, é aquêle que fiscaliza o serviço, a incum- dade dos navios . Por analogia, aplica-se a pessoa.
bência ou a missão, com cuidado exemplar.
O militar tesa não deixa passar as faltas ou contra- TIRAR UMA TORA -- Dormir . Encornar . Soneca, fora de
venções em branca nuvem; não passa a mão pela cabeça, horas.
~ão perdoa, não dispensa.
TORA - subs. - A TORA não é o dormir normal, à n?ite, à
Quando o subordinado o procura e llie pede alguma hora da rotina. É eventual, extemporânea, fortmta o~
concessão, a resposta é: o regulamento não permite, cum- furtiva, disfarçada, ilegal, pu~ível. Pode ser um dormir
pra o regulamento, as instruções, a lei. .. inocente, em hora de recreaçao ou folga .
O tesa não age por si, age "dentro" do que está É gostosa; geralmente de dia.
escrito, exige o prêto no branco. Ex._ Tocou alguma coisa? Eu estava tira~do uma
1!: comum ouvir-se: Esta incumbência está muito bem torinha no sofá do salão de recreio (ou na arqmbancada
tratada, o encarregado deve ser muito tesa. da piscina) .
TESAMENTO OU TESAÇAO - Ato de tesar. TORAR - v. - Dormir .
Frase habitual: Neste navio anda uma tesação tre-
menda! TRAVl!:S (Cabo ou marcação) ~Cabo passado para o bordo
Neste navio anda um tesamento horrível ! (As guar- do navio. De través, isto é, de lado.
nições dizem isso porque sentem o rigor da disciplina e TRONQUEIRA - Troncos de árvores, à deriva, nos rios.
do trabalho) . Qualquer direlito ao sabor das águas . São comuns no
TESAR- v. -Exercer o tesamento; praticar as regras do Amazonas e no Jacuí.
tesamento.
Ex. - Vamos tesar, o navio anda muito largado .
. Esticar, puxar, enrijar.
Quando é necessário esticar com um cabo, o encar-
regado da manobra dá a voz: Tesa! A essa voz, os mari-
nheiros, que estão lidando com o cabo, esticam-no, te-
sam-no.
Ao inspecionar a amarração do navio, diz o oficial:
-As espias estão muito tesadas; atenção, poderão par-
tir-se. . :;i
v
VA DEITAR CINZAS AO MAR (M. Mercante) - Não me
aborreça! Retire-se! Não me amole! Vã amolar outro!
VAGA - subs. - Falta, ausência, lugar na escala, posto hie-
rárquico, número não preenchido na escala de promoção,
claro aberto à promoção.
Ex.- :S:ste ano não haverã vaga no quadro dos den-
tistas.
- Deu-se uma vaga de mar-e-guerra.
VAGA (DEU ... ) - Morreu, faleceu. Pode ser também: re-
formou-se, retirou-se.
Ex.: - Não deves comer cogumelos, acabarãs dando
vaga.
VAGALHÃO - subs. - Vaga que proporciona vãrias promo-
ções. Em geral, é a vaga de almirante.
VAGALHAO MORTO - Ondas grandes em extensão, pouco
alterosas. São vagas mansas, longas, lentas. Poderão
ser cavadas.
VARREDURA- subs. (M. Mercante) -Lixo recolhido após
a descarga dos porões. Sobras que ficam no "chão", em
conseqüência de vazamento dos volumes (sacos, caixas,
etc.).
VARRER (A PROA,~ CONVÉS) - Diz-se quando o mar as-
soberba o navio lpvando-o. A ãgua embarca, molha, lava,
varre.
VENCER - v. - Ganhar. Ter direito de receber. Ex.: Só os
aquartelados vencem ranchos.
- Ainda não venci uniforme azul.
VENTO DO PORAO- Motor, vapor, mãquina, energia pro-
pulsora que não seja o pano.
Usa-se nos navios de vela para significar que o navio
estã com o motor em funcionamento. Por vêzes, o vento
cessa, os "panos panejam", o navio não anda. Coiru)a
data da chegada foi marcada, é necessãrio arranjar um
jeito de andar. O jeito é um só: ligar o motor. Diz-se
então que o navio prossegue na sua rota com vento do
porão. A máquina fica sempre em baixo, onde estão os
porões. O motor fica em baixo, também.
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- terem o trabalho de armar
· VENTO FRESCO - '
Vento forte.
os preguiç_oso~, para t-a~-se em qualquer recanto e
a maca e de terra-la, es 1~ d tários por não terem re-
VIBRAÇÃO - subs. - Ato de vibrar. dormem de volante. ~s r~ei:a:ou ar~ários, arranjam-se
tirado as macas da_s trmc odam-se em volante de for-
VIBRAR - v. - Entusiasmar-se. Sentir entusiasmo, crença, de qualquer manerra e acom
admiração pelas coisas da Marinha. tuna. crificam as tradições. A
Ex. - A guarnição vibrou com as palvras do nôvo os tempos modem5>s sau reinado· os beliches ofe-
encarregado do pessoal. maca ' em breve,cperdera o se te'cn1'co's· não sei se os
t (dizem os '
recem mais con or to do Nordeste concordam).
VIRAÇAO- Igual a VIRADA. (Menos empregado). arinheiros do Nor e e
m . 'b'do dormir de volante.
sempre fo1 pr01 1 .
VIRADA - Ato de virar. Ação de virar. Conjunto de atos ou Refei ão sem mesa e cadeira ou
ações. VOLANTE (RANCHO) - a.'ei'iando-se cada~ à sua von:
banco. :É tomada em pé, l . dade carioca (Jantar ame
VIRADO - adj. - Encabulado. Envergonhado. tade. Está em moda na soc1e .
Esta acepção parece decorrente da idéia transmitida ricano).
pela côr do sangue. Se um indivíduo virasse pelo avês5o
ficaria vermelho. O encabulado fica vermelho, daí. ..
VIRAR - v. - Trabalhar. Trabalhar com afinco, empregar-
se a fundo, agir com dinamismo, entregar-se a qualquer
tarefa com entusiasmo, assiduidade e constância. Estudar.
Ex.: - O imediato chama os oficiais e lhes diz: - O
navio deverá suspender daqui a três dias, precisamos vi-
rar muito; a virada vai ser grande.
- A guarnição vai entrar em período de férias; vi-
rou muito êste ano (Virou muito, isto é, viajou muito,
fêz muitos exercícios, etc.) .
Na Escola Naval, virar é sinônimo de estudar.
Encabular. Ficar envergonhado. Enrubecer; ficar
vermelho, de vergonha.
VIREBA- Igual a virômetro (Escola Naval} .
VIROMETRO - Aquêle que vira. O trabalhador incansável
. é um virômetro. O estudioso exemplar é um virômetro .
VOLANTE - subs. ou adj. - Coisa que não é fixa, que pode
, mudar de lugar. Objeto sôlto. Material transportável.
Cama ocasional. Maneira de dormir.
VOLANTE (DORMIR DE ... ) Significa dormir em qualquer
local, fora do beliche ou da maca. Improvisar um leito.
Os marinheiros, quando se faz necessário, dormem
em bancos, ~m tábuas, no próprio convés (no "chão"),
isto é, dormem de volante.

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