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MUSEU DA VIDA/ CASA DE OSWALDO CRUZ / FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ

CASA DA CIÊNCIA / UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO


FUNDAÇÃO CECIERJ
MUSEU DE ASTRONOMIA E CIÊNCIAS AFINS
INSTITUTO DE PESQUISA JARDIM BOTÂNICO DO RIO DE JANEIRO

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIVULGAÇÃO


E POPULARIZAÇÃO DA CIÊNCIA

Maurício Marques Soares Filho

O Inusitado é Atraente:
O Prêmio Ig Nobel enquanto Estratégia de Divulgação Científica

Rio de Janeiro
2022
Maurício Marques Soares Filho

O Inusitado é Atraente:
O Prêmio Ig Nobel enquanto Estratégia de Divulgação Científica

Monografia apresentada ao Curso de


Especialização em Divulgação e
Popularização da Ciência, do Museu da
Vida/Casa de Oswaldo Cruz/Fundação
Oswaldo Cruz, como requisito parcial à
obtenção do título de especialista em
Divulgação e Popularização da Ciência.

Orientador: Prof. Dr. Douglas Falcão Silva

Rio de Janeiro
2022
Biblioteca de Educaçao e Divulgaçao Científica Iloni Seibel

S676i Soares Filho, Maurício Marques.

O i nusitado é atraente: o Prêmio Ig Nobel enquanto estratégia de divulgação


científica / Maurício Marques Soares Filho. -- Rio de Janeiro, 2022.
110 f.: il.: tab.

Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização em Divulgação e Popularização


da Ciência) – Fundação Oswaldo Cruz. Casa de Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2022.

Orientador: Douglas Falcão Silva.

Bibliografia: f. 104-110.

1. Divulgação científica. 2. Método Científico. 3 .Pesquisa. I. Silva, Douglas


Falcão, orient. II. Título.
CDD - 501.4

Elaborado pelo Sistema para Geração automática de ficha catalográfica para cursos de Pós-graduação da Casa de Oswaldo Cruz,
sob a responsabilidade de Beatriz Schwenck - CRB-7/5142.
Maurício Marques Soares Filho

O Inusitado é Atraente:
O Prêmio Ig Nobel enquanto Estratégia de Divulgação Científica

Monografia apresentada ao Curso de


Especialização em Divulgação e
Popularização da Ciência, do Museu da
Vida/Casa de Oswaldo Cruz/Fundação
Oswaldo Cruz, como requisito parcial à
obtenção do título de especialista em
Divulgação e Popularização da Ciência.

Orientador: Prof. Dr. Douglas Falcão Silva

Aprovado em: ___/___/____.

Banca Examinadora

________________________________________________________
Diego Vaz Bevilaqua, Doutor, Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz

________________________________________________________
Josina Oliveira do Nascimento, Doutora, Observatório Nacional - ON
O presente trabalho é dedicado à
memória de Loloano Claudionor da
Silva, colega de formação, militante
engajado politicamente por uma
realidade melhor para o povo, um
excelente divulgador e popularizador
da ciência, cuja carreira certamente
seria ainda mais prolífica se não nos
tivesse deixado tão cedo...
AGRADECIMENTOS

Considero a seção de agradecimentos sempre especialmente difícil, pois a


possibilidade de suprimir um nome e magoar uma pessoa querida é alta: sigamos,
cuidadosamente, com a tarefa, já que ignorá-la é certamente a pior das soluções.
Em primeiro lugar, gostaria de legar um agradecimento muito especial à
minha família, com a qual morei durante o período de aulas e parte da redação
deste trabalho. Reservar horários específicos para assistir às palestras demandou a
contribuição de todos, já que estávamos juntos no isolamento imposto pela
pandemia do novo coronavírus. Cito minha mãe, Ivane Rosa Gomes Soares, como
minha principal incentivadora nesse período tão turbulento: sem ela dificilmente essa
vitória e todas as minhas outras seriam possíveis.
É hora de agradecer à família que me adotou em 2020 e com a qual
permaneço em contato até hoje – sem a cumplicidade dela a conclusão desse curso
teria sido impossível: minha turma da Especialização em Divulgação Científica e
Popularização da Ciência! Embora tenha criado uma relação mais próxima com
alguns, todos sem exceção contribuíram para meu desenvolvimento pessoal,
enquanto aluno e futuro divulgador e popularizador da ciência. Foi uma experiência
das mais engrandecedoras, serei grato sempre a todos.
A equipe de professores e servidores associados ao curso deve ser lembrada.
Fiquei, disciplina após disciplina, cada vez mais surpreso (da melhor maneira
possível) com a qualidade das exposições didáticas e com o companheirismo
mesmo com que nossos mestres nos tratavam – considero que foi, mesmo levando
em conta as limitações impostas pela Covid 19, um curso pleno e excelente, que
atingiu de maneira ampla seus objetivos: e isso foi responsabilidade da equipe
técnica e docente que nos guiou ao longo do percurso. Cito, especialmente, os
nomes do professor Luís Henrique de Amorim e da professora Carla Gruzman,
coordenadores da Especialização à época em que fui aluno, e da sempre excelente
Verônica de Souza Conceição, secretária acadêmica.
Por fim, merece palavras de gratidão o meu orientador, professor Douglas
Falcão Silva. Adotou o mote do meu projeto em nossa primeira reunião coletiva, e
buscou me ajudar da melhor forma possível no desenvolvimento deste. Nem sempre
temos tempo ou disponibilidade, mas o que fazemos com o que nos é dado é o que
determina a qualidade de nosso trabalho: obrigado!
Eu continuo sendo apenas um palhaço,
o que já me coloca em nível bem mais
alto do que o de qualquer político.
(CHAPLIN, Charles. 1889-1977)
RESUMO

SOARES FILHO, Maurício Marques. O Inusitado é Atraente: O Prêmio Ig Nobel


enquanto Estratégia de Divulgação Científica. 2022. 113f. Trabalho de Conclusão de
Curso (Especialização em Divulgação e Popularização da Ciência) – Fundação
Oswaldo Cruz. Casa de Oswaldo Cruz. Museu da Vida; Universidade Federal do Rio
de Janeiro. Casa da Ciência; Fundação CECIERJ; Museu de Astronomia e Ciências
Afins; Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: 2022.

O tema e objeto desta monografia é o Prêmio Ig Nobel. Essa premiação recompensa


“conquistas que fazem as pessoas rirem e então pensarem”: ele é dado a pesquisas
científicas consideradas pela comunidade acadêmica como “não usuais”, priorizando
o poder da imaginação e atraindo inevitavelmente o interesse das pessoas para a
ciência e a tecnologia. É entregue anualmente em setembro, em uma cerimônia na
faculdade Harvard, nos EUA, onde muitos ganhadores do verdadeiro Nobel fazem o
papel de mestres de cerimônia – o evento é aberto para 1100 convidados e é
veiculado pela internet. O Ig Nobel é atualmente de responsabilidade da revista
Annals of Improbable Research, editada pela Improbable Research, Inc., que foi pela
primeira vez publicada nos EUA em 1995 sendo voltada a veicular “fatos inusitados”
e humor científico. A primeira entrega de prêmios ocorreu em 1991 e continua
anualmente até hoje, sem interrupções. A questão ou problema de pesquisa é se o
referido prêmio pode ser considerado ou pode se tornar, para quais públicos e sob
quais circunstâncias, um meio de divulgação e popularização da ciência. Um dos
motivos pelos quais este tema foi escolhido como proposta de monografia do Curso
de Especialização em Divulgação e Popularização da Ciência é o paradoxo aparente
que é a divulgação desse prêmio no Brasil: poucos fora da comunidade científica
têm acesso às minúcias do Ig Nobel e, no que diz respeito aos cientistas e
acadêmicos, trata-se eminentemente de uma “piada interna”. Será que é possível
fazer melhor do que isso? Podemos usar esse material para, de fato, fazermos um
número maior de pessoas rirem e então pensarem? Os artigos submetidos à seleção
da Improbable Research, Inc. para o Ig Nobel advêm de pesquisas científicas reais –
são “ciência genuína”: aplicam o método científico, apresentam referências
metodológicas e bibliográficas, foram publicados seguindo as mesmas normas
procedimentais que qualquer outra pesquisa. O trivial, tanto quanto o inusitado,
sempre tiveram potencial para desencadear descobertas científicas relevantes,
resultados continuamente assimilados aos eventos e demandas cotidianas, à
chamada “vida normal". O prêmio ressalta a imaginação e a originalidade
imprescindíveis ao fazer ciência. Como encerramento deste trabalho e maneira de
provar a relevância do prêmio Ig Nobel, propomos o projeto de uma oficina didática
para professores, onde textos de divulgação científica baseados em artigos
vencedores do Ig Nobel, a serem usados em sala de aula, podem ser desenvolvidos.

Palavras-chave: Divulgação científica. Prêmio Ig Nobel. Método Científico.


ABSTRACT

SOARES FILHO, Maurício Marques. O Inusitado é Atraente: O Prêmio Ig Nobel


enquanto Estratégia de Divulgação Científica. 2022. 113f. Trabalho de Conclusão de
Curso (Especialização em Divulgação e Popularização da Ciência) – Fundação
Oswaldo Cruz. Casa de Oswaldo Cruz. Museu da Vida; Universidade Federal do Rio
de Janeiro. Casa da Ciência; Fundação CECIERJ; Museu de Astronomia e Ciências
Afins; Instituto de Pesquisa Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: 2022.

The theme and object of this monograph is the Ig Nobel Prize. This award rewards
“achievements that make people laugh and then think”: it is given to scientific
research considered by the academic community to be “unusual”, prioritizing the
power of imagination and inevitably drawing people's interest to science and
technology. It is given annually in September, at a ceremony at Harvard College, in
the USA, where many true Nobel laureates play the role of masters of ceremonies –
the event is open to 1100 guests and is broadcast over the internet. The Ig Nobel is
currently the responsibility of the Annals of Improbable Research, edited by
Improbable Research, Inc., which was first published in the USA in 1995 and aimed
at conveying “unusual facts” and scientific humor. The first awards ceremony took
place in 1991 and continues annually to this day without interruption. The research
question or problem is whether the aforementioned award can be considered or can
become, for which audiences and under what circumstances, a means of
disseminating and popularizing science. One of the reasons why this theme was
chosen as a monograph proposal for the Specialization Course in Dissemination and
Popularization of Science is the apparent paradox that is the dissemination of this
award in Brazil: few outside the scientific community have access to the details of the
Ig Nobel and, as far as scientists and academics are concerned, it is eminently an
“inside joke”. Is it possible to do better than that? Can we use this material to actually
make more people laugh and then think? Articles submitted for selection by
Improbable Research, Inc. for the Ig Nobel come from real scientific research – they
are “genuine science”: they apply the scientific method, present methodological and
bibliographic references, were published following the same procedural rules as any
other research. The trivial, as well as the unusual, have always had the potential to
trigger relevant scientific discoveries, results that are continually assimilated to
everyday events and demands, to the so-called "normal life". The award emphasizes
the imagination and originality essential when doing science. As a way to prove the
relevance of the Ig Nobel prize, we propose the project of a didactic workshop for
teachers, where scientific dissemination texts based on Ig Nobel winning articles, to
be used in the classroom, can be developed.

Keywords: Scientific Divulgation. Ig Nobel Prize. Scientific Method.


LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 Gráfico que mostra os trabalhos que foram fontes do 20


Prêmio Ig Nobel ao longo dos anos.
Figura 02 Diagrama conceitual da Proposta de Oficina. 101
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Capes Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior


CEB Câmara de Educação Básica
CNE Conselho Nacional de Educação
COVID 19 Corona Virus Disease 19
DC Divulgação Científica
DDC Discurso da Divulgação Científica
EAD Educação à Distância
EM Ensino Médio
ES Ensino Superior
EUA Estados Unidos da América
FEUSP Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
FWCI Field-Weighted Citation Impact
Georgia Tech Georgia Institute of Technology
IES Instituições de Ensino Superior
Inc. Incorporated
LDA Latent Dirichlet Allocation
LSI Latent Semantic Indexing
MAST Museu de Astronomia e Ciências Afins
Nutes Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde
OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PLSI Probabilistic Latent Semantic Indexing
PMRA PubMed Related Citations Algorithm
PNEM Política Nacional de Educação Museal
QI Quociente de Inteligência
TDC Textos de Divulgação Científica
UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization
UNIRIO Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
USA United States of America
Sumário

1 Introdução ................................................................................................................ 13
2 O Prêmio Ig Nobel .................................................................................................. 16
2.1 História do Prêmio Ig Nobel ......................................................................... 16
2.2 Alguns Estudos Bibliométricos do Prêmio Ig Nobel ............................. 17
2.2.1 Quem são os Premiados do Ig Nobel e Pelo Quê? ..................................... 18
2.2.2 Qual é o Papel do Humor na Promoção da Ciência? ................................. 21
2.2.3 Análise de Tópicos no Prêmio Ig Nobel através de Machine Learning . 23
2.2.4 Como as Organizações de Pesquisa Respondem ao Recebimento do
Prêmio Ig Nobel? ............................................................................................................ 25
2.3 Apresentação dos Artigos a Serem Estudados ...................................... 28
2.4 Breve Análise de Matérias Jornalísticas .................................................. 35
2.4.1 Jornalismo: Notícias e Linguagem .................................................................. 35
2.4.2 Como o Prêmio Ig Nobel é apresentado pela Superinteressante? ......... 37
3 Sobre a Divulgação Científica e Outros Termos ............................................ 40
3.1 Conceitos de Divulgação Científica e sua Crítica .................................. 40
3.2 DC enquanto Gênero de Discurso ............................................................. 45
3.3 Breve Revisão sobre Nomenclatura .......................................................... 49
3.3.1 Vulgarização da Ciência ..................................................................................... 49
3.3.2 Alfabetização Científica ...................................................................................... 50
3.3.3 Divulgação Científica .......................................................................................... 51
3.3.4 Popularização da Ciência ................................................................................... 52
3.4 Uso de Textos de DC como Estratégia Didática: Breves
Apontamentos ........................................................................................................ 53
3.5 Uma Reflexão sobre a História das Ciências .......................................... 55
4 Teorias da Motivação ............................................................................................ 61
4.1 Motivação Intrínseca e Extrínseca ............................................................. 62
4.2 Teoria de Metas de Realização .................................................................... 65
4.3 Autoeficácia ...................................................................................................... 66
4.4 Do Ambiente Escolar e do Mundo Interior do Estudante .................... 67
5 Oficinas de Formação Inicial e Continuada .................................................... 72
5.1 A Formação Continuada de Professores.................................................. 72
5.2 Oficinas: O que é? Como se faz? ............................................................... 79
5.3 Ensino Colaborativo ....................................................................................... 85
5.4 Parcerias entre Museus e Instituições de Ensino Superior na
Formação de Professores ................................................................................... 89
6 Proposta de Produto: Oficina ............................................................................. 92
6.1 Uso de Artigos Acadêmicos na Alfabetização Científica ..................... 93
6.2 A Motivação do Participante Reflete-se na do Futuro Aluno .............. 95
6.3 O Trabalho num Grupo Heterogêneo ........................................................ 97
6.4 Desenho da Oficina “O Método Científico através do Ig Nobel” ....... 98
7 Conclusão .............................................................................................................. 102
Bibliografia ................................................................................................................ 104
13

1 Introdução
Todos nós temos temas ou assuntos que nos intrigam, que nos fazem
pensar sobre os limites do que conhecemos ou duvidar das “verdades
estabelecidas” de nossas tão breves vidas. E se nós tivermos sorte,
enfrentaremos muitos desses desafios ao longo de nossa existência: eles nos
permitem pensar de uma maneira não habitual, ensejam a reflexão e talvez o
debate e, quem sabe, crescimento pessoal e profissional.
Foi em 2006, durante o meu bacharelado em Física, por ocasião da VI
Escola do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (um evento bianual de duas
semanas onde há palestras e cursos para graduandos e pós-graduandos, e
que dá a oportunidade de estudantes de Física e afins se conhecerem e
criarem uma rede de contatos - e amizades, com um pouco mais de esforço)
que ouvi falar pela primeira vez no Prêmio Ig Nobel, e automaticamente percebi
que seria, para mim, um desses tópicos desafiadores que citei no primeiro
parágrafo.
Lembro ter rido muito, eu e meus amigos, com a lista de artigos
ganhadores do Ig Nobel até aquele ano: era de fato surpreendente que tais
temáticas tivessem sido motivo de publicação, eu pensava. “Como um prêmio
para ciência ‘de brincadeira’, ‘inútil’?” – essa foi, não duvido minha primeira
indagação. Minha pergunta não podia estar num caminho mais equivocado.
Eu estava apenas no segundo ano da graduação, e confesso que
pensar sobre a natureza da ciência ainda não tinha se tornado hábito ainda
para mim. Em breve descobri que nenhuma pergunta é “inútil” em termos
científicos, tudo pode colaborar para uma nova descoberta, que vai ensejar
uma nova teoria ou fazer ruir outra, nesse eterno devir que é a ciência – tanto é
que se atribuiu até um nome para esses esforços que não são imediatamente
voltados à produtos: ciência pura (que por incrível que pareça costumam gerar
produtos incríveis a longo prazo e expandir as fronteiras teóricas e
experimentais conhecidas até então). Outro elemento que eu subestimada
nesta história era a “brincadeira”: a produção científica tem muito de ludicidade
(afinal, se fosse uma atividade excruciante ninguém toparia fazer), há um
prazer intelectual enorme no processo da descoberta – e o lúdico também é
necessário na empreitada da docência (ao se criar um meio efetivo de se
14

comunicar com os alunos) outro desafio que os cientistas em nosso país


costumam assumir.
Amadureci com os anos e os percalços, e quando surgiu a oportunidade
de me candidatar ao curso de Especialização em Divulgação Científica e
Popularização da Ciência, da Casa de Oswaldo Cruz e órgãos associados,
refleti que era a oportunidade ideal de enfrentar a questão sobre a pertinência
do Prêmio Ig Nobel como ferramenta de divulgação científica – esse se tornou
o tema e questão principal desta monografia. Como objetivo específico
principal, que surgiu do debate sobre meu objeto com meus professores,
colegas e orientador, assumi a tarefa de propor uma oficina pedagógica cujo
objetivo nominal seria transformar artigos vencedores do prêmio Ig Nobel em
ferramentas de divulgação científica a serem usadas em salas de aula, seja do
Ensino Médio como nos primeiros anos do Ensino Superior.
A presente monografia é constituída de sete capítulos, da forma que
segue:
 Capítulo 1, Introdução: a presente seção do texto;
 Capítulo 2, O Prêmio Ig Nobel: aborda a história do prêmio, além de
apresentar alguns estudos bibliométricos de interesse que comprovam a
relevância do Ig Nobel dentro da comunidade acadêmica. Também são
apresentados os artigos que sugiro serem objeto de trabalho da oficina,
e uma brevíssima análise de como o Ig Nobel é percebido na mídia
brasileira.
 Capítulo 3, Sobre Divulgação Científica e outros Termos: como parte de
um trabalho de conclusão de curso de uma Especialização em
Divulgação Científica e Popularização da Ciência, acredito que é
esperado que discutamos de alguma forma a temática central do curso -
isso foi feito já preparando terreno para a proposta da oficina, quando
discutimos o uso de textos de DC como estratégias didáticas.
 Capítulo 4, Teorias da Motivação: este capítulo é totalmente voltado a se
estabelecer diretrizes para a implementação de uma oficina, tanto no
trato com os docentes participantes quanto na futura relação desses
com seus alunos, quando forem utilizar os produtos da oficina como
ferramentas de ensino. É útil ressaltar que embora seja um assunto em
geral “conhecido” por professores, a aplicação das Teorias da Motivação
15

pode ser muitas vezes negligenciada no trato diário pelo profissional,


seja porque tem muito tempo de formado e está distante da academia,
ou mesmo devido às pressões de caráter prático do serviço.
 Capítulo 5, Oficinas de Formação Inicial e Continuada: é útil, antes de
propor efetivamente a oficina, contextualizar do que se trata e
correlacionar a esse conceito assuntos pertinentes, tais como ensino
colaborativo e parcerias entre instituições de nível superior e museus na
sua efetivação.
 Capítulo 6, Proposta de Produto - Oficina: como o nome do capítulo
indica, trata-se da proposta de uma oficina didática voltada à formação
de professores, cujo fim é a produção de textos de divulgação científica,
centrados na temática do Método Científico, baseados em artigos
vencedores do Ig Nobel para serem usados em sala de aula.
 Capítulo 7, Conclusão: uma breve recapitulação de nossos objetivos e
do que foi feito.

Em minhas pesquisas para a conclusão desta monografia não encontrei


trabalho com temática semelhante feito em nosso país, de forma que tenho a
esperança que o presente venha trazer novos tópicos para a discussão da
divulgação científica e popularização da ciência envolvendo o uso de artigos
científicos como base, sendo eles usados a partir de mediação ou na prática da
reescrita. O texto deste foi projetado de forma a legar o máximo das
ferramentas necessárias para se implementar uma oficina pedagógica da forma
que foi sugerida: torcemos para que que essa semente floresça em grupos de
docentes que assumam o desafio de acolhê-la. A escrita deste foi um processo
demorado, mas muito divertido e instrutivo: como o mote do Prêmio Ig Nobel,
“conquistas que fazem as pessoas rirem e então pensarem”.
16

2 O Prêmio Ig Nobel

2.1 História do Prêmio Ig Nobel


Nosso tema e objeto de pesquisa é o Prêmio Ig Nobel. Essa premiação
recompensa “conquistas que fazem as pessoas rirem e então pensarem”
(conforme o mote repetido vezes e vezes em sua página web): ele é dado a
pesquisas científicas consideradas pela comunidade acadêmica como “não
usuais”, priorizando o poder da imaginação e atraindo inevitavelmente o
interesse das pessoas para a ciência e a tecnologia – prêmios são dados
também a personalidades não vinculadas às ciências, mas que prestaram
algum serviço notável, por vezes dúbio, à espécie humana (foi o caso do
prêmio Ig Nobel de Educação Médica de 2020, em que o atual presidente desta
nação foi contemplado “por mostrar na prática como não se lida com uma
pandemia”). É entregue anualmente sempre no mês de setembro em um
cerimonial na faculdade Harvard, nos EUA, onde muitos ganhadores do
verdadeiro Nobel fazem o papel de mestres de cerimônia – o evento é aberto
para 1100 convidados e é veiculado pela internet, além de contar com a
apresentação pública e palestras dos vencedores, esquetes de teatro e até
mesmo, desde 1996, apresentações de operetas inevitavelmente cômicas. Um
arquivo das apresentações anuais da premiação pode ser acessado através do
site https://www.improbable.com/2021-ceremony/archive/.
O Ig Nobel é atualmente de responsabilidade da revista Annals of
Improbable Research, editada pela Improbable Research, Inc., que foi pela
primeira vez publicada nos EUA em 1995, voltada a veicular “fatos inusitados” e
humor científico. A primeira entrega de prêmios ocorreu em 1991 e continua
anualmente até hoje, sem interrupções.
A grande personalidade por trás do Ig Nobel é Marc Abrahams. Ele é
formado em matemática aplicada pela Universidade de Harvard, e passou
vários anos desenvolvendo sistemas de computador de reconhecimento óptico
de caracteres (incluindo uma máquina de leitura para cegos) na Kurzweil
Computer Products, e mais tarde fundou a Wisdom Simulators, que usava
computadores para dar às pessoas experiência em fazer decisões difíceis.
Marc é o tema de um estudo de caso da Harvard Business School chamado
“Marc Abrahams: Annals of an Improbable Entrepreneur”. Ele é casado com a
17

psicóloga Robin Abrahams, que escreve a coluna de conselhos sobre “Miss


Conduct” para a Boston Globe Magazine.
De 1990 a 1994, Marc foi editor do Journal of Irreproducible Results
(periódico estadunidense de humor científico que começou suas atividades em
1955). Em 1994, depois que o editor da revista decidiu abandoná-la, os
fundadores e toda a equipe editorial do Journal deixaram a editora e criaram
imediatamente o Annals of Improbable Research. O conselho editorial da
Improbable Research, Inc., conta com mais de 50 cientistas ilustres e inclui
muitos ganhadores do Prêmio Nobel, vários ganhadores do Prêmio Ig Nobel, a
detentora do recorde de QI Marilyn Vos Savant e um criminoso condenado.
Marc fundou a cerimônia de entrega do Prêmio Ig Nobel em 1991 e atua como
mestre de cerimônias principal, trajando sempre gala, desde então. Abrahams
tem livros editados em várias línguas, escreveu por quatorze anos uma coluna
no jornal The Guardian (além de contribuições pontuais para diversas revistas
e jornais pelo globo), apresenta podcasts, programas de TV e rádio, e é
reconhecido mundialmente por sua ligação com a “ciência improvável”. As
informações elencadas aqui sobre Marc podem ser acessadas através de seu
perfil no site https://www.improbable.com/whatis/about-marc-abrahams/.

2.2 Alguns Estudos Bibliométricos do Prêmio Ig Nobel


Na presente seção, vamos trazer uma série de contribuições que tiveram
lugar na Annual Conference on Science and Innovation Policy de 2017, que
aconteceu em Atlanta, Georgia, Estados Unidos, baseada no Georgia Institute
of Technology (Georgia Tech). São estudos bibliométricos feitos sobre o prêmio
Ig Nobel, que de 1991 a 2015 foi concedido cerca de 250 vezes a mais de 600
agraciados.
O Ig Nobel tem fundo lúdico e brinca com os arquétipos de
excentricidade vinculados à ciência como ramo de atividade e à figura do
cientista, mas numa época em que a disputa por recursos domina o campo
científico e são levantados questionamentos quanto ao seus propósito e valor
subjacentes (e, pode-se acrescentar, à sua credibilidade como nunca antes
sugerido), esse prêmio é uma maneira criativa e divertida de atrair a atenção
para a educação científica e explicar através do exemplo como as pesquisas
guiadas primariamente pela curiosidade e perspicácia podem encontrar
18

utilidade no mundo real, mesmo que sendo bons e divertidos exemplos de


princípios científicos.
Veremos resumos de trabalhos que investigam as características dos
vencedores do prêmio Ig Nobel, como também exploram os tópicos e nomes
premiados, os temas de pesquisa “sérios” a que se vinculam e os impactos do
prêmio em bolsas de estudos, patrocínio para pesquisa e aceitação pelo
público amplo.

2.2.1 Quem são os Premiados do Ig Nobel e Pelo Quê?


Vamos nos debruçar nesta seção sobre o trabalho de Shapira, Gök et al.
(2017). Segundo Marc Abrahams, um dos idealizadores do prêmio Ig Nobel,
essa premiação “homenageia as mentes mais inovadoras e excêntricas e seus
esforços únicos nas ciências, artes e humanidades”, que vão desde medições
de diferentes padrões de ondas cerebrais advindos da mastigação de diversos
sabores de chiclete (Ig Nobel de Biologia, 1997) a demonstrar que ratos
eventualmente não conseguirão distinguir entre uma pessoa falando japonês
de trás para frente de outra falando holandês de trás para frente (Ig Nobel de
Linguística, 2007), passando por averiguações de como dificuldades em se
reconhecer a própria incompetência levam a avaliações hiperconfiantes e,
eventualmente, equivocadas (Ig Nobel de Psicologia, 2000) e por levitações
magnéticas de sapos (Ig Nobel de Física, 2000) – como já mencionado, os
artigos científicos premiados são projetos da ciência formal, revisados por
pares e que passaram por todas as etapas para a publicação, e muitas vezes
somente depois desse processo foram considerados também engraçados.
O estudo citado na abertura desta subseção se baseia num conjunto de
dados associados à premiação com vários parâmetros de interesse, tendo sido
examinados 253 prêmios Ig Nobel concedidos a 595 destinatários de 1992 a
2016, e serão aqui elencadas algumas descobertas que os autores
disponibilizaram na grande rede. Tradicionalmente, os prêmios são concedidos
a indivíduos únicos, a vários autores de um único artigo, a autores e
organizações vinculados a dois ou mais artigos. 62% dos contemplados vêm
de artigos de vários autores recebendo um único artigo premiado, sendo o
arranjo mais comum. 25% dos premiados vieram de prêmios divididos entre
dois artigos. 16% são premiados sozinhos por autoria única. 3% dos premiados
19

são organizações. A cada ano o número de prêmios por tema concedidos varia
de 9 a 13, e os campos abrangidos podem variar, mas usualmente vão para
Química, Medicina e Física (25 anos cada). Os prêmios pela paz, que são os
próximos mais comuns, foram dados em 23 anos do período estudado,
seguidos por Biologia (21 anos), Literatura (21 anos) e Economia (20 anos).
Em quase metade do período houve prêmios em Psicologia (12 anos) e Saúde
Pública (10 anos), sendo menos comuns prêmios em matemática (7 anos),
nutrição (6 anos), engenharia (5 anos) e arte (3 anos). Dez categorias
adicionais foram oferecidas em dois anos ao todo e 29 categorias foram
oferecidas exclusivamente por apenas um ano.
Utilizando o agrupamento disciplinar usual proposto pela Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para os campos de
ciência e tecnologia, constata-se que 38% do total de premiações vão para as
ciências naturais, 20% são concedidos a área de medicina e saúde (cujo
aumento em período mais recente foi a maior mudança do prêmio ao longo dos
anos), 16% destinam-se às ciências sociais, 11% são designados para as
humanidades, 20% para reconhecer “esforços pela paz” e 18% são dados a
estudos na área de engenharia e tecnologia. Chegamos aqui a uma conclusão
dos autores citados em epígrafe que é interessante para este trabalho: a
maioria dos prêmios, embora não todos, são para trabalhos acadêmicos – 74%
fazem referência a um artigo acadêmico, enquanto o restante se refere a
artigos de notícias (9%), livros (7%), patentes (5%), relatórios (3%) ou outros
documentos (e.g., artefatos, relatórios, teses, filmes, mandatos ou software).
Artigos científicos estão tomando cada vez mais o protagonismo do prêmio Ig
Nobel: entre 1991 e 1999, foram 60% dos premiados; entre 2000 e 2007, 71%;
entre 2008 e 2015, 88% dos prêmios faziam referência a artigos científicos.
20

Fontes do Ig Nobel, Série Histórica


2%
5% 3%
7%

9%

74%

Artigos Acadêmicos Notícias Livros Patentes Relatórios Outros

Figura 1: Gráfico que mostra os trabalhos que foram fontes do Prêmio Ig Nobel ao longo dos
anos. Fonte: os autores (2022).

Por último, os autores estudam a premiação por pátria dos agraciados:


55 países tiveram representatividade, a maior parte composta de nações do
norte (o que talvez nos revele também quem faz ciência segundo os padrões
ocidentais no mundo), embora haja representantes da América Latina e África.
A Europa e as Américas juntas representam 77% dos primeiros autores e 73%
de todos os autores. Os EUA têm 34% de todos os agraciados (32% se for
considerado apenas o primeiro autor), sendo o país que mais congrega
premiados, e é seguido por Reino Unido com 14% (12% de primeiros autores)
e Japão com 12% (11% de primeiros autores). Há um esperado paralelo com o
Prêmio Nobel (dado que ambos refletem de certa maneira o investimento em
ciência e tecnologia feitos pela nação), onde os EUA acumulam a maioria
absoluta de conquistas, seguido pelo Reino Unido (com menos da metade de
vitórias do primeiro colocado) e a Alemanha – o Japão vem somente em oitavo
lugar de número absoluto de vencedores, talvez demonstrando que os mesmos
são mais criativos em se tratando de ciência não ortodoxa (veremos ainda que
nas comunidades acadêmicas de alguns países há certo preconceito contra o
prêmio Ig Nobel, o que reduz drasticamente o número de aceitações do prêmio
pelos cientistas).
21

2.2.2 Qual é o Papel do Humor na Promoção da Ciência?


O artigo de Woo e Li (2017), que trataremos nesta seção, pretende
estudar como indivíduos, incentivos e instituições podem ser influentes na
direção tomada pela evolução científica, partindo do exame dos impactos de
prêmios científicos e sendo seu alvo, no presente caso, o Ig Nobel. Essa
distinção foi escolhida porque, ao contrário da maior parte dos prêmios de
ciências, os prêmios Ig Nobel são concedidos por méritos não estritamente
acadêmicos: seu grande crivo é o conteúdo de humor no resultado final da
pesquisa (mesmo que esse não fosse o objetivo original), independentemente
das conquistas científicas do premiado ou sua influência no campo. A despeito
de sua característica sui generis, o passar do tempo tem demonstrado que o Ig
Nobel atrai a atenção da comunidade científica ampla, amplia a reputação dos
vencedores do prêmio e, até mesmo, atrai recursos para os temas de pesquisa
premiados: os autores do estudo o conceitualizam como “choques” para as
áreas onde os cientistas vencedores publicaram. O artigo em pauta utiliza um
método baseado em palavras-chave para delinear campos científicos, ao invés
do agrupamento baseado em colaboração, coautoria ou redes sociais de
cientistas – esse método de palavras-chave utiliza o PubMed Related Citations
Algorithm (PMRA) que é voltado para circunscrever artigos dentro de uma
mesma área de pesquisa, através da comparação de informações detalhadas
de palavras-chave e frequência relativa das mesmas. Ao se utilizarem do
PMRA, os autores do estudo em apreço construíram um banco de dados de
subáreas científicas contendo artigos que receberam prêmios Ig Nobel e que
são indexados no PubMed (veja em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/).
O objeto de pesquisa e o período de abrangência do estudo que
trazemos nesta subseção são os vencedores do prêmio Ig Nobel entre 1991 e
2016, tendo sido a fonte de dados primária a própria página web que lista os
ganhadores ano a ano (ela fornece informações detalhadas sobre cada
premiado, incluindo os nomes dos vencedores, tópicos de estudo, seus países
de origem e afiliações e, o mais importante, publicações acadêmicas
associadas a seus prêmios), além de se levar a cabo um trabalho de
complementação com informações adicionais sobre características-alvo dos
vencedores. Foi levantado um total de 267 premiações com 629 vencedores,
onde esses vencedores variam de um vencedor individual a uma equipe de
22

pesquisa ou a uma entidade. Dos 267 prêmios, 158 foram associados a pelo
menos uma publicação acadêmica: os autores não vêm essa informação com
surpresa, dado o fato de que alguns prêmios são selecionados puramente com
base em sua natureza humorística, e não em suas contribuições acadêmicas.
Desses 158 prêmios, foram identificadas 188 publicações acadêmicas únicas.
Com o fito de delinear subáreas científicas, os autores restringem sua amostra
a 108 publicações indexadas pelo PubMed, sendo o número médio de artigos
dentro de cada subárea cerca de 90 – em seguida compararam os artigos
selecionados com os marcadores da Web of Science e recuperaram suas
informações de citação.
A parte seguinte do estudo empreendido pelos autores foi analisar a taxa
de publicações, verificando quem contribui e de onde vem a pesquisa de alto
impacto nas subáreas em momentos anteriores e posteriores à concessão do
prêmio Ig Nobel – de maneira mais atenta, rastrearam as atividades de
publicação dos vencedores do prêmio Ig Nobel e seus colaboradores
comparadas com as de não-colaboradores, e mediram as contribuições e
impactos relativos de colaboradores e não-colaboradores com base em número
de citações. O fato de o prêmio Ig Nobel ser multidisciplinar e já contar com
uma longa duração permitiu levantar as diferenças na dinâmica entre as áreas
ao longo do tempo. Por fim, os autores demonstram a robustez de seu conjunto
de dados comparando-os com uma amostra correspondente (de áreas com
características semelhantes) mas de não agraciados com o prêmio Ig Nobel.
Concluindo, os autores asseveram que, ao observar o impacto dos
prêmios Ig Nobel em subáreas das ciências, eles foram capazes de “capturar a
microdinâmica da evolução científica”: os resultados alcançados teriam
implicações em políticas públicas ao fornecer mais diversas opções em
potencial para influenciar o rumo das áreas da ciência através de prêmios e
incentivos – principalmente, os resultados indicam que incentivos não
materiais, mas que proveem os cientistas de atenção pública e dinamizam sua
influência, como é o caso do Ig Nobel, podem ser tão efetivos quanto incentivos
materiais no que se refere ao incentivo à produção científica.
23

2.2.3 Análise de Tópicos no Prêmio Ig Nobel através de Machine


Learning
Já foi dito aqui que os Annals of Improbable Research se encubem da
tarefa honrosa de distribuir anualmente, desde 1991, os prêmios Ig Nobel em
diferentes áreas do conhecimento para realizações científicas que muitas
vezes são aparentemente triviais, mas que “primeiro fazem as pessoas rir e
depois pensar”. O artigo da autora Ranaei (2017) cita o prêmio de 2016 para a
área de psicologia, concedido à uma pesquisa intitulada, em tradução livre, “Do
Pinocchio Júnior ao Sênior”, que consistiu em perguntar a milhares de
mentirosos com que frequência eles mentiam e se os entrevistadores deveriam
acreditar na resposta dada por eles – os autores desse estudo estavam
examinando a proficiência em mentir de pessoas ao longo de todas as suas
vidas. Mas, ressalta a autora, esses artigos de pesquisa que tem um quê de
humorísticos impactam áreas da ciência, como já foi evidenciado, através, por
exemplo, da contagem do número de citações. Apesar do humor presente nos
artigos vencedores do prêmio Ig Nobel, ressalta ela, eles transmitem
mensagens legítimas. O artigo em pauta, motivado a explorar as características
da ciência que são destacadas pelo prêmio Ig Nobel, busca explorar o
conteúdo dos trabalhos premiados: usa modelos de tópicos probabilísticos
baseados em metodologias de aprendizado de máquina que extraem “tópicos”
subjacentes de um conjunto de coleções de documentos para examinar até
que ponto existem padrões subjacentes em dado conjunto de artigos
vencedores do Ig Nobel - um algoritmo de modelagem de tópicos popular, o
Latent Dirichlet Allocation (LDA)1, um modelo probabilístico generativo, é
aplicado pela autora. O LDA, a autora do trabalho afirma, tem um desempenho
mais eficiente na distinção entre polissemia e sinonímia, pois inclui modelos
probabilísticos tanto em nível de documento quanto de palavra. A análise de

1
No processamento de linguagem natural, a Alocação Latente de Dirichlet (LDA) é um modelo
estatístico generativo. Ele permite que conjuntos de observações sejam explicados por
variáveis latentes que explicam por que algumas partes dos dados são semelhantes. Por
exemplo, se as observações são palavras coletadas em documentos, ele postula que cada
documento é uma mistura de um pequeno número de tópicos e que a presença de cada
palavra é atribuível a um dos tópicos do documento. O LDA é um exemplo de modelo de
tópicos e pertence às ferramentas principais do campo do aprendizado de máquinas e, em
sentido mais amplo, às ferramentas de inteligência artificial. (disponível em
https://pt.wikipedia.org/wiki/Aloca%C3%A7%C3%A3o_latente_de_Dirichlet, acessado em
12/09/2021).
24

dois níveis do LDA o torna superior a outros modelos, como Latent Semantic
Indexing (LSI) ou Probabilistic Latent Semantic Indexing (PLSI). A suposição
por trás dos modelos de tópicos de LDA é que os documentos são uma mistura
de tópicos; o algoritmo busca detectar esses tópicos latentes subjacentes em
uma coleção de documentos: o tópico é percebido como uma distribuição sobre
um vocabulário de palavras.
O estudo apresentado na Annual Conference on Science and Innovation
Policy de 2017 foi uma análise baseada em textos de apresentação e
homenagem, coletados no próprio site do Ig Nobel
(http://www.improbable.com/ig/winners/), de 262 artigos vencedores, no período
entre 1991 e 2016. Como diz a autora, palavras são consideradas como um
proxy que descreve os tópicos emergentes do conjunto de dados. Dez tópicos
de 35 foram selecionados para fins de demonstração. Por exemplo, “tópico 1 é
sobre casca de banana”, “tópico 3 é sobre métodos de captura de
sequestradores de avião”, “tópico 4 descreve um despertador provavelmente
feito de wasabi”, “tópico 9 aparece como a relação entre besouros de esterco e
a Via Láctea!" (a triagem manual do documento associado ao tópico 9 mostra
que o artigo era sobre besouros de esterco perdidos que podem encontrar o
caminho certo usando a Via Láctea). Os tópicos 19, 32 e 21 são tópicos mais
gerais sobre economia, vida e drogas ilegais. O tópico 17 representa uma
relação entre a roupa íntima do marido e a infidelidade. A palavra “fisherman”
também está neste tópico, refletindo a relação semântica entre “marido” e
“homem”. Isso sugere que documentos que discutem personagens masculinos
podem estar associados a este tópico. Em resumo, diz a autora, os tópicos
sugerem um papel distinto para dimensões de conteúdo da vida cotidiana,
como comportamento animal, comportamento ilegal/de risco e atividades de
vida e morte na pesquisa homenageada no site do Ig Nobel.
A autora reconhece as limitações desse experimento de pesquisa: o
resultado apresentado é aquele de um estudo sobre um pequeno conjunto de
dados tomados de predicados contidos nos textos oficiais sobre os vencedores
do prêmio Ig Nobel disponíveis no site da premiação, que são, ademais,
constituídos de frases muito curtas. Mesmo assim, esse experimento sobre um
pequeno conjunto de dados mostra tópicos promissores e interpretáveis (como
visto no parágrafo anterior) e demonstra ser possível remover o fardo da
25

avaliação manual de 262 documentos para detecção de tópicos (em princípio:


estudos mais abrangentes podem provar a efetividade da técnica para um
número muito maior de documentos).

2.2.4 Como as Organizações de Pesquisa Respondem ao


Recebimento do Prêmio Ig Nobel?
Os autores Belyakov e Kolesnikov (2017) definem o foco do artigo que é
estudado nesta subseção como sendo o comportamento que organizações de
pesquisa diante de um tipo muito particular de ciência que pode ser
eventualmente produzida por seus pesquisadores filiados: aquela que, de
maneira geral, o grande público e alguns formuladores de políticas públicas
consideram como “ciência que desperdiça” – em nossa sociedade capitalista
voltada a resultados sempre houve uma controvérsia latente em torno de
pesquisas que parecem não ter utilidade óbvia, ainda que haja numerosos
casos de aplicações da chamada “ciência pura” desenvolvidas décadas depois
que o conceito foi concebido ou a descoberta foi feita. A resposta dessas
organizações científicas varia: algumas delas podem perceber o potencial valor
futuro, enquanto outras podem ver essas práticas como uma possível ameaça
à sua reputação, até mesmo decorrer daí um corte no seu financiamento
público para pesquisa. Dois exemplos importantes de resposta social dentro
desse “terreno pantanoso” do fazer ciência são elencados pelos autores:
 um relatório público de 2016 foi produzido pelo senador norte-
americano Jeff Flake sobre vinte estudos com financiamento público
que ele considerou “difíceis de justificar” (um desses estudos foi
agraciado com o prêmio Ig Nobel);
 em 1995, Sir Robert May, o conselheiro científico-chefe do governo na
Grã-Bretanha, pediu ao comitê do prêmio Ig Nobel que parasse de
incluir pesquisadores do Reino Unido como premiados, após polêmica
pública em torno das fontes de financiamento do trabalho que recebeu
o prêmio.

Podemos deduzir a partir da história que esse tipo de controvérsia não


impedirá que os pesquisadores agraciados aceitem o prêmio, mas pode ser
motivo para que as organizações às quais estão vinculados não se engajem na
26

comunicação pública sobre essas pesquisas premiadas tanto quanto em outras


mais ortodoxas.
O objetivo do artigo em pauta é analisar como as universidades e outras
instituições vinculadas à pesquisa científica respondem quando um de seus
pesquisadores afiliados recebe o prêmio Ig Nobel – as principais dúvidas,
segundo os próprios autores, seriam: essas organizações orgulhosamente
reconhecem isso como uma grande conquista de seus pesquisadores e usam o
prêmio como uma oportunidade para comunicar cuidadosamente a motivação e
os benefícios potenciais de tal pesquisa para o público? Ou eles simplesmente
o ignoram, esperando que seja rapidamente esquecido? Ou eles tomam
alguma providência para evitar que esse tipo de pesquisa aconteça sob sua
supervisão? O artigo apresentado no evento da Georgia Tech traz como
argumento que a linha de ação tomada por essas organizações depende de
dois fatores: o valor científico e o reconhecimento do trabalho que recebeu o
prêmio Ig Nobel, e uma potencial reação pública à pesquisa como resultado da
premiação.
A seguinte metodologia foi adotada pelos autores do artigo para
investigar a resposta das instituições às quais os ganhadores do prêmio Ig
Nobel são afiliados: foram coletados dados sobre publicações científicas
vencedoras referenciadas no site oficial do prêmio; o mérito científico dessas
publicações foi mensurado através do Field-Weighted Citation Impact (FWCI) e
pela métrica Citation Benchmarking, que ranqueia o impacto da citação de um
artigo em relação a outras publicações da mesma idade e área de estudo
(ambas as métricas estão incluídas no banco de dados bibliométrico Scopus,
da Elsevier). O outro fator relevante para o estudo, a reação do público, é
representado pelo número de menções nas redes sociais no Twitter, também
disponível entre as métricas oferecidas pela Scopus. O corpus separado para
análise se constitui em 62 artigos agraciados pelo prêmio Ig Nobel entre 2008 e
2015 (esse período foi selecionado devido à disponibilidade de dados de mídia
social que mensuram a atividade da base de usuários do Twitter). Foi adotada,
para visualização dos resultados, uma disposição em matriz dois por dois, onde
foram posicionadas essas publicações ao longo de duas dimensões de acordo
com o número de citações e menções no Twitter (ou “viralidade”) – foram,
portanto, criados quatro grupos de classificação: “inteligente e divertido”
27

(altamente citado/altamente viral), “inteligente” (altamente citado/pouco viral),


“divertido” (pouco citado/altamente viral), “nenhum” (pouco citado/pouco viral).
Essa classificação foi explorada com uma terceira dimensão: menções ao
prêmio Ig Nobel em comunicados à imprensa, páginas de notícias e outros
gêneros de comunicação em sites de organização de pesquisas reconhecidas
como afiliações de ganhadores do prêmio – foram encontrados 130 nexos de
filiação (algumas instituições tiveram mais de um agraciado com o prêmio entre
seus colaboradores, e os artigos podem ter mais de um autor) na amostra.
Então os autores discutem os resultados apresentados em seu artigo,
usando a metodologia mencionada: as instituições de pesquisa se gabam da
conquista, se mantêm discretas/são indiferentes ou empregam outras
estratégias? Segundo os dados, 56% das organizações reconheceram o
recebimento do prêmio de alguma forma (manifestando-se publicamente a
respeito do prêmio). O maior reconhecimento (65%) é observado para artigos
“inteligentes”, sugerindo que é a forma “mais segura” para as instituições
alavancarem a publicidade conquistada com o prêmio (nesse caso, elas podem
facilmente rejeitar alegações em potencial de “ciência desperdiçadora”
apelando para impactos de alta citação das publicações subjacentes). Os
setores “divertido” e “nenhum” da matriz receberam reconhecimento
institucional em 56% e 52% dos prêmios, respectivamente.
Surpreendentemente, o menor reconhecimento – apenas 48% – é encontrado
nos artigos “inteligente e divertido”, que são compostos por apenas oito
publicações. No entanto, ao observar os padrões de reconhecimento nas
organizações, também foram detectados fatores exógenos. Por exemplo, foram
encontradas muito poucas menções a prêmios Ig Nobel em sites de instituições
francesas, que estão bem representadas tanto na população total de
premiados com Ig Nobel quanto no grupo “inteligente e divertido”. Também foi
descoberto que instituições nos Estados Unidos, Canadá e Holanda tendem a
ser muito mais abertas quanto ao recebimento do prêmio Ig Nobel. Conforme
palavras dos autores, essa variação em nível de país sugere uma forte
influência do ambiente institucional e requer maiores explicações. Podemos ver
que há uma influência consolidada do prêmio Ig Nobel nas diversas instituições
de pesquisa, que tendem a ver com bons olhos seus membros vencedores e
até mesmo usá-los como meios de propagar o nome da instituição e o fazer
28

ciência – contudo, há em determinados bolsões acadêmicos resquícios de


preconceito contra o prêmio e o que ele pode representar para o “cidadão
comum” (talvez, desperdício de recursos que deveriam ir para um motivo mais
“sério”?), que reduzem sua aceitabilidade geral.

2.3 Apresentação dos Artigos a Serem Estudados


Abordaremos aqui um dos objetivos específicos elencados para este
trabalho: um breve levantamento bibliográfico, acompanhado de uma
discussão eminentemente qualitativa, de cada um dos artigos vencedores do Ig
Nobel na área de Física entre os anos 2011 e 2020. Serão cerca de dez obras
científicas que vão ser identificadas por título e conjunto de autores, a às quais
providenciaremos um breve resumo (segundo a descrição existente das
mesmas nos respectivos portais de publicação), e as estudaremos sob três
aspectos: facilidade de acesso (e.g., é material pago?), “grau de
inusitabilidade” (baixo, médio ou alto, numa classificação completamente
subjetiva, segundo a experiência pessoal do autor desta monografia com
publicações científicas) e complexidade do conteúdo (que responde à pergunta
“um estudante de que nível poderia acompanhar sem maior esforço a
metodologia do artigo?”).
1. Campeão de 2011:
“Dizziness in Discus Throwers is Related to Motion Sickness Generated
While Spinning,”, de autoria dos pesquisadores Philippe Perrin, Cyril
Perrot, Dominique Deviterne, Bruno Ragaru e Herman Kingma.
O artigo estuda uma diferença crucial entre esportistas de duas
modalidades do atletismo, lançamento de disco e lançamento de
martelo, ambas envolvendo movimentos de rotação corporal. Os
praticantes da primeira constantemente relatam tontura após a prática, e
os da segunda nunca experimentaram esse tipo de estado. O estudo
usa entrevistas com praticantes de alto nível de ambos os esportes e um
trabalho de perícia sobre vídeos de diversos desportistas praticando
lançamentos. Como resultado do trabalho, são determinadas as
diferenças cruciais na execução específica de cada esporte que são
responsáveis pela tontura dos arremessadores de disco.
29

O acesso ao artigo é pago, sendo, portanto, restrito. O “grau de


inusitabilidade” é baixo, pois apresenta um problema prático e
relativamente conhecido pelos profissionais da área de interesse. O
conteúdo do artigo não é complexo: sua metodologia é simples e bem
descrita, e não são utilizadas funções matemáticas avançadas – um
aluno do Ensino Médio (EM) acompanharia a argumentação
apresentada sem problemas maiores.

2. Campeão de 2012:
“Shape of a Ponytail and the Statistical Physics of Hair Fiber Bundles”,
de autoria de Raymond E. Goldstein, Patrick B. Warren, e Robin C. Ball,
e “Ponytail Motion” de autoria de Joseph B. Keller.
O prêmio de 2012, que foi dividido entre dois artigos, foi dado pelo
cálculo do equilíbrio de forças que moldam e movem o cabelo em um
rabo de cavalo humano. O primeiro artigo desenvolve uma teoria geral
de meios contínuos para a distribuição dos fios de cabelo em um feixe,
que é usada para se propor uma “equação de estado” para um rabo de
cavalo e, a partir disso, identifica-se o equilíbrio de forças em várias
regiões do sistema. O segundo artigo mostra que o movimento
horizontal não intencional do rabo de cavalo de um corredor se dá
porque seu movimento vertical (que acompanha o da cabeça da pessoa)
é instável e sujeito a perturbações laterais.
O primeiro artigo tem acesso pago, já o segundo apresenta
acesso livre. O “grau de inusitabilidade” de ambos é alto, uma vez que
os problemas propostos, bem como as modelagens feitas a partir deles,
são extremamente não imediatos e praticamente desconhecidos até sua
proposição. O conteúdo dos artigos tem nível de complexidade alto,
sendo usadas relações matemáticas mais comumente conhecidas por
estudantes de física dos dois últimos anos da graduação.

3. Campeão de 2013:
“Humans Running in Place on Water at Simulated Reduced Gravity”, de
autoria de Alberto E. Minetti, Yuri P. Ivanenko, Germana Cappellini,
Nadia Dominici e Francesco Lacquaniti.
30

O prêmio deste ano foi vencido por cientistas que descobriram


que algumas pessoas seriam fisicamente capazes de correr pela
superfície de um lago, se essas pessoas e aquele lago estivessem na
lua. Parte-se da hipótese de que, se existem espécies de animais
terrestres que conseguem correr sobre a água, seria somente questão
de reduzir-se a gravidade para que o esforço muscular de tal atividade
fosse possível aos humanos. Os autores usam um modelo
hidrodinâmico para prever os níveis de gravidade nos quais seres
humanos deveriam ser capazes de correr sobre a água, e testam essas
previsões em laboratório, usando um simulador de gravidade reduzida.
O artigo é de acesso aberto. O seu “grau de inusitabilidade” é alto
pois, embora seja de conhecimento geral que alguns animais são
capazes de correr sobre a água, nunca havia sido levantada a hipótese
de que seres humanos seriam capazes de tal façanha, mesmo em
gravidade reduzida. O conteúdo da argumentação do artigo é repleto de
modelagens matemáticas, análises gráficas e descrição de experimento,
sendo adequado para a compreensão de estudantes do ES (ensino
superior) em física que estejam nos dois primeiros anos do curso.

4. Campeão de 2014:
“Frictional Coefficient under Banana Skin”, de autoria de Kiyoshi
Mabuchi, Kensei Tanaka, Daichi Uchijima e Rina Sakai.
O prêmio de 2014 foi dado aos cientistas listados por medirem a
quantidade de atrito entre um sapato e uma casca de banana, e entre
uma casca de banana e o chão, quando uma pessoa pisa em uma
casca de banana que está no chão. Chegou-se à conclusão que o
coeficiente de atrito entre a casca de banana e o chão é similar ao de
superfícies bem lubrificadas, e estimou-se, por observação
microscópica, que o gel folicular polissacarídeo exerce papel dominante
no efeito lubrificante da casca de banana após o esmagamento pela
pisada.
O artigo é de acesso livre. Seu “grau de inusitabilidade” é
mediano, pois é da sabedoria popular que não se deve pisar em casca
de banana sob o perigo de escorregar e cair, somente ninguém havia se
31

dado ao trabalho de fazer uma apreciação científica séria do tema. Ele é


repleto de análises gráficas e descrição de experimento, sendo
interessante e compreensível mesmo para estudantes do EM.

5. Campeão de 2015:
“Duration of Urination Does Not Change With Body Size”, de autoria de
Patricia J. Yang, Jonathan Pham, Jerome Choo, e David L. Hu.
O prêmio do ano de 2015 foi dado à equipe de profissionais que
testou o princípio biológico de que quase todos os mamíferos esvaziam
a bexiga em cerca de 21 segundos (com um desvio padrão de 13
segundos). Com a justificativa de que muitos estudos urológicos se
baseiam em modelos animais (como ratos ou porcos), mas que sua
relação com o sistema urinário humano é mal compreendida, os autores
elucidam a hidrodinâmica da micção em cinco ordens de magnitude de
massa corporal. Para tanto, usaram gravações em vídeo de alta
velocidade para medir a taxa de fluxo obtida nos mamíferos do zoológico
de Atlanta. Os autores esperam que estes resultados possam ser
usados para ajudar no diagnóstico de problemas urinários em animais, e
em projetos de sistemas hidrodinâmicos escaláveis baseados na
natureza.
O artigo é de acesso aberto. Seu “grau de inusitabilidade” é
mediano: problemas em modelar a realidade biológica humana a partir
de animais tidos como compatíveis ocorrem frequentemente, mas a
extensão do estudo do artigo e suas pretensões são novidade. O
trabalho possui considerações de caráter matemático que devem ser
familiares para alunos de nível superior em física nos seus dois
primeiros anos de estudo.

6. Campeão de 2016:
“An Unexpected Advantage of Whiteness in Horses: The Most Horsefly-
Proof Horse Has a Depolarizing White Coat”, de autoria de Gábor
Horváth, Miklós Blahó, György Kriska, Ramón Hegedüs, Balázs Gerics,
Róbert Farkas e Susanne Åkesson, e “Ecological Traps for Dragonflies
in a Cemetery: The Attraction of Sympetrum Species (Odonata:
32

Libellulidae) by Horizontally Polarizing Black Grave-Stones”, cujos


autores são Gábor Horváth, Péter Malik, György Kriska, Hansruedi
Wildermuth.
O prêmio de 2016 foi dado a duas equipes de pesquisadores, por
descobrir por que os cavalos de pelo branco são os aqueles mais
resistentes as moscas, e por descobrir por que as libélulas são
fatalmente atraídas por lápides pretas. O primeiro artigo trata
essencialmente de cavalos brancos (muito apreciados por sua raridade,
mas que apresentam deficiências biológicas extremas que vão desde a
maior risco de câncer de pele maligno a uma frequência de predação
maior quando na natureza, dado que não contam com camuflagem
própria) e sua relação com moscas sugadoras de sangue, usualmente
vetores de doenças em mamíferos: o estudo demonstra que a mosca
utiliza luz polarizada refletida na pelagem para localizar hospedeiros, o
que se mostrou uma vantagem evolutiva em favor dos cavalos brancos.
O segundo artigo observa libélulas sendo atraídas por lápides polidas
pretas em um cemitério húngaro: usando a polarimetria de imagem,
descobriu-se que as lápides em questão refletem a luz polarizada
horizontalmente e que as libélulas, em condições naturais, detectam
água por meio da luz refletida horizontalmente, o que explica, em
essência, sua atração pelas lápides – se as fêmeas atraídas por esses
objetos desovam ali, eles vão se constituir em armadilhas ecológicas
para libélulas que não estão próximas à água.
Ambos artigos são de acesso pago. O “grau de inusitabilidade” do
primeiro é baixo: o problema de moscas parasitas na pecuária e criação
de animais de fazenda é digno de atenção, e a restrição no assunto
imposta pelos autores, embora chame a atenção, não é nem de longe
injustificada (dado o retorno comercial de cavalos de pelagem branca).
Já o “grau de inusitabilidade” do segundo artigo é alto, uma vez que as
particularidades do problema estão presentes em um nível elevado – é
interessante perceber como uma observação inicial tão peculiar possa
gerar uma série de descobertas ecologicamente relevantes. Os dois
artigos apresentam em seu desenvolvimento alguma bagagem
conceitual relativa à óptica e estudos estatísticos, além de desenho de
33

experimento, sendo adequados para a compreensão de estudantes do


EM.

7. Campeão de 2017:
“On the Rheology of Cats”, de autoria de Marc-Antoine Fardin.
O prêmio de 2017 foi dado ao pesquisador que usou a dinâmica
de fluidos para sondar a pergunta “um gato pode ser sólido e líquido?”.
O artigo é evidentemente uma brincadeira acadêmica que foi publicada
em homenagem a um colega pesquisador.
O artigo é de acesso livre. Seu “grau de inusitabilidade” é
evidentemente alto, embora tutores de gatos domésticos conheçam
suas propriedades entre o sólido e o líquido. O texto do trabalho
apresenta conceitos simples de mecânica dos fluidos e desenho de
experimento, sendo apropriado para a leitura e compreensão de
estudantes do EM.

8. Campeão de 2018:
Infelizmente não houve premiação na área de física no ano de 2018.

9. Campeão de 2019:
“How Do Wombats Make Cubed Poo?”, de autoria de Patricia J. Yang,
Miles Chan, Scott Carver, e David L. Hu, e “Intestines of Non-Uniform
Stiffness Mold the Corners of Wombat Feces”, cujos autores são Patricia
J. Yang, Alexander B. Lee, Miles Chan, Michael Kowalski, Kelly Qiu,
Christopher Waid, Gabriel Cervantes Benjamin Magondu, Morgan
Biagioni, Larry Vogelnest, Alynn Martin, Ashley Edwards, Scott Carver, e
David L. Hu.
O prêmio de 2019 foi dado a uma equipe de pesquisadores que
investiram seu tempo estudando como e por que wombats fazem cocô
em forma de cubo. O primeiro trabalho não foi publicado na íntegra, até
onde se sabe, sendo apenas apresentado numa reunião anual de
dinâmica dos fluidos. O segundo artigo tratou de estudar como o
intestino mole do wombat (um marsupial australiano fossorial, herbívoro)
esculpe fezes achatadas e de cantos agudos: foi feito um estudo
34

experimental e numérico combinado, mostrando o mecanismo para a


formação de “cantos” em um ambiente altamente amortecido. Esses
resultados podem ter aplicações em fabricação de produtos, patologia
clínica e saúde digestiva.
O acesso ao artigo é pago. Seu “grau de inusitabilidade” será
classificado como alto, uma vez que converte o que parece ser uma
curiosidade escatológica da natureza em um objeto digno de estudos e
que fornece resultados a serem aproveitados em ampla gama de ramos
científicos e tecnológicos. Devido aos conceitos e métodos matemáticos
e numéricos envolvidos na apresentação e solução do problema, é
recomendável que o leitor do trabalho tenha nível equivalente a um
estudante de física em seus dois últimos anos de curso.

10. Campeão de 2020:


“Excitation of Faraday-like body waves in vibrated living earthworms”, de
autoria de Ivan S. Maksymov e Andrey Pototsky.
O prêmio de 2020 foi concedido a pesquisadores por determinar,
experimentalmente, o que acontece com a forma de uma minhoca viva
quando ela vibra em alta frequência. O estudo parte do princípio que
células biológicas são principalmente constituídas por líquido e, em
analogia com gotas de líquido, elas devem exibir uma gama de
fenômenos não-lineares fundamentais. Foram testadas quatro espécies
de minhocas com a finalidade de demonstrar a hipótese de que a
vibração de vermes vivos que se deitam horizontalmente em uma
superfície sólida plana resulta no início de determinado tipo específico
de ondulações corporais. As descobertas dos autores poderiam ser
usadas para sondar, e potencialmente controlar, processos biofísicos
importantes – como a propagação de impulsos nervosos – de maneira
não cogitada anteriormente.
O artigo tem acesso liberado. O “grau de inusitabilidade” que
vamos associar ao mesmo é alto, dado não tanto os métodos utilizados
na pesquisa, mas sim à inferência feita pelos autores que as
descobertas podem abrir caminho para um novo tipo de pesquisa in vivo
35

em animais complexos. O conteúdo do estudo deverá ser familiar a um


graduando em física nos seus dois primeiros anos de curso.

É importante aqui salientar que não encontramos, ao longo das


pesquisas para este trabalho, evidências do uso de artigos do prêmio Ig
Nobel em sala de aula, tanto no Ensino Médio como no Ensino Superior,
no Brasil ou no exterior, para fins de divulgação científica ou estudos
acadêmicos. Para todos os fins, essa seria uma utilização inovadora do
material, ao menos ainda não documentada.

2.4 Breve Análise de Matérias Jornalísticas


O conteúdo desta seção foi inspirado no trabalho final da disciplina
Divulgação da Ciência e da Tecnologia em Meios de Comunicação de Massa:
através de um experimento simples, contando como ferramentas somente a
internet e um dado nível de bom senso metodológico, chegamos à conclusão
que a mídia pode, inadvertidamente, induzir ao pensamento anticientífico
(como veremos no decorrer deste texto). Essa afirmação é interessante para se
prever a recepção de algo como o prêmio Ig Nobel pela sociedade ampla, mas
também para se compreender como uma parcela dessa comunidade pode
sustentar um discurso ativo de negação da ciência, como vimos acontecer
durante a pandemia do novo coronavírus.

2.4.1 Jornalismo: Notícias e Linguagem


O jornalismo, segundo Motta (2006, p. 9), é o lugar do racional e não da
imaginação, e usa, portanto, de uma linguagem objetiva e referencial, evitando
o inefável – quando apela para esse, é com o intuito de ironizar e debochar dos
pretensos “fatos reais”, desqualificando-os e negando qualquer transcendência.
Contudo, se não há exceção não existe a manchete – o jornalismo tende a
flertar com o inverossímil, com o inusitado, com o estranho, e aí não são
somente jornais populares que apelam para o absurdo, mas também a grande
mídia. O ponto é como essas questões serão tratadas: conforme Motta (2006,
p. 10) vemos que há um balé entre a atração e o desprezo (imprimidos sobre a
mente jornalística tradicional pelo “inacreditável”) manifestado em jogos de
36

linguagem e de significado da notícia, uma disputa de contrários entre o mythos


e o logos no jornalismo – “em uma linguagem que se apresenta como racional
e objetiva transparece então a presença do mistério”.
Como lidar com o que é estranho à sua experiência normal? A notícia
ativa um processo cognitivo no seu receptor, quando busca explicar, nomear,
designar, apontar, analisar, contextualizar, que busca naturalizar ou negar o
absurdo ou o incomum. Contudo, além de repassar a informação 2, os
enunciados das notícias podem, como ferramenta de abstração desse mythos,
ironizar, debochar, criticar, mas também, em contrário, referendar ou legitimar
atos, acontecimentos, objetos ou indivíduos. A notícia pode afirmar ou negar
algo através do tom de seu texto – tons imperativos afirmativos ratificam
informações, por exemplo, enquanto negativos as desautorizam –, das
palavras usadas e dos significados sugeridos pelo título, ilustração ou foto:
mesmo escrito numa linguagem objetiva e sob uma aparente neutralidade, uma
notícia pode fazer às vezes de ironia, deboche, crítica, julgamento e
condenação. Como efeito, o ato de enunciar é muito poderoso: “o relato pode
surpreender ou espantar, caso as ocorrências enunciadas se choquem com os
conhecimentos institucionalizados do mundo da vida” (Idem, p. 12), mas
também podem vir a impressionar o leitor com um novo conceito, ou reafirmar
as posições desse. Temos que:

(...) o que se comunica é toda a informação que se transmite com o


enunciado, mas que é diferente de seu conteúdo proposicional. Trata-
se, portanto, de um conteúdo implícito e recebe o nome de
implicatura. As implicaturas devem definir-se e explicar-se de acordo
com os princípios que organizam a conversação, são os efeitos de
sentido que se insinuam no ato comunicativo, que derivam tanto dos
significados das palavras e sinais do texto como de princípios
estéticos, morais ou sociais subentendidos no ato comunicativo
(MOTTA, 2006, p. 20).

Podemos ver que o conteúdo informacional de uma notícia vai além de juntar

2
“Além de informar, os relatos das notícias confirmam a confiança de quem ouve em quem
fala, legitimam papéis, realizam outros atos simultâneos desencadeados por efeitos de sentido
não necessariamente linguísticos” (MOTTA, 2006, p. 12). A despeito de não ser um tópico
deste trabalho, devemos perceber como a mídia precisa, para se justificar como fonte viável de
informação e manter um público cativo, legitimar constantemente suas posições pelo próprio
discurso: nele pessoas e instituições vão parecer como “boas” ou “más”, “úteis” ou “inúteis”,
“relevantes” ou “irrelevantes”, “feias” ou “bonitas”, “certas” ou “erradas”, e o discurso de
amanhã precisa reiterar essa posição ou justificar sua mudança, sempre marcando um espírito
de “isenção”, “serenidade” e “competência”, para que o pacto convencional, tácito entre
interlocutores (emissor e receptor, jornalista e leitor) que deve ser pautado pela relevância,
clareza, concisão e precisão não seja rompido.
37

palavras. As marcas da implicatura estão presentes, por exemplo, nas dêixis,


no contexto, nas intertextualidades, no modo de se colocar ênfases, no uso da
retórica (figuras de linguagem, opção por certos verbos), na diagramação e
apresentação da matéria, em seus títulos e texto, e muitos outros recursos
linguísticos e extralinguísticos naturais do jornalismo, conforme Motta (2006, p.
20).
É interessante vermos como um profissional experimentado da área
entende a “força ilocucionária” da notícia:

Ademais de descrever que algo ocorre no mundo, as notícias


seduzem, afirmam ou negam algo, podem nomear, esclarecer,
analisar, comparar, atribuir funções e prioridades, dar ênfases,
convocar, ameaçar, prevenir, ironizar, debochar, fazer rir, criticar,
julgar e outras tarefas infinitas que se cumprem no ato de
comunicação jornalística: realizam algo que pode estar expresso ou
implícito nos enunciados, constituindo sua dimensão pragmática. As
notícias realizam algo além de informar, são quase sempre
enunciados realizativos, pois ao informar repassam também outras
“instruções de uso” (MOTTA, 2006, p. 22).

É essa implicatura presente em notícias que tratam do prêmio Ig Nobel


que vamos observar na próxima subseção.

2.4.2 Como o Prêmio Ig Nobel é apresentado pela Superinteressante?


Revista Superinteressante: revista mensal de divulgação científica de
ampla circulação (tiragem superior a 400 mil exemplares), voltada
principalmente ao público jovem (pré-universitários). Vencedora do prêmio José
Reis de Divulgação Científica de 1992. Seu mote é “expanda seus
conhecimentos com a Superinteressante e enxergue além do óbvio. Desperte a
sua curiosidade com conteúdos de ciência, história, tecnologia e muito mais”. A
Superinteressante mantém acesso pago a maior parte de seu acervo digital,
inclusive ao das notícias usadas como amostra nesse pequeno estudo, o que
justifica o pequeno número arrecadado.
Coletamos da internet seis notícias que tratam especificamente do Ig
Nobel e que faziam parte do conteúdo original da revista em questão. São elas:
 “Ig Nobel: a Ciência que Ri da Ciência”, publicada em 31 de março de
1995, de autoria de Ricardo Bonalume Neto;
 “Ciência Inútil”, publicada em 31 de outubro de 2000, de autoria de Denis
Russo Burgierman;
38

 “O Prêmio das Bizarrices”, publicada em 31 de outubro de 2001, de


autoria de Denis Russo Burgierman;
 “Prêmio Ig Nobel – O Tapete Vermelho da Ciência Maluca”, publicada
em 31 de maio de 2012, sem designação de autor;
 “Veja os Campeões do Prêmio Ig Nobel 2012”, publicada em 21 de
setembro de 2012, de autoria de Carolina Vilaverde;
 “Qual Pesquisa Bizarra do Ig Nobel Você Seria?”, publicada em 15 de
setembro de 2017, de autoria de Guilherme Eler e Bruno Vaiano.

Feita nossa coleta de dados vamos, tendo em mente a discussão feita


na última subseção, tentar analisar o conjunto de notícias a partir de um
marcador linguístico simples. O mais óbvio é o constituído por adjetivos e
locuções adjetivas – foram encontrados os seguintes qualificadores
relacionados ao prêmio Ig Nobel no conjunto de seis notícias coletado: bizarro;
inútil; esdrúxulo; risível; absurdo; desperdício de tempo e dinheiro; besteira;
asneira; estranho; sem o menor sentido aparente; maluco; paródia; esquisito;
besteirol acadêmico; bagunça; estapafúrdio; louco; sátira; excêntrico; galhofa;
etc. Obviamente a revista se manteve apresentando, ao longo dos anos, uma
qualificação eminentemente crítica, irônica e jocosa do prêmio Ig Nobel – esse
posicionamento influenciou e permanece influenciando leitores em larga
escala, dado que seu conteúdo é majoritariamente consumido por pessoas que
ainda não tiveram seu primeiro contato com o fazer ciência profissional.
O Prêmio Ig Nobel se baseia no humor e na sátira? Sim. Mas trabalha
sobre o inesperado, o inusitado, o engenhoso, o criativo – não se trata
simplesmente de uma “comédia-pastelão da ciência”. Os artigos vencedores
são exemplos tão bons quanto quaisquer outros do que é a produção científica:
são fruto da imaginação e da criatividade, somadas ao conhecimento; seguem,
como era de se esperar, o Método Científico; apresentam considerações de
embasamento teórico e comparações de suas hipóteses com a experiência;
todos foram publicados em revistas científicas reconhecidas e de ampla
circulação: passaram pelo processo de revisão por pares, etc.
Segundo nossa avaliação (que foi sobre um conjunto de dados pequeno,
admitimos, e usando a técnica mais simples e qualitativa possível, mas que
mesmo assim não merece ser descartada pois se trata de um exemplo de
39

impressão isenta sobre um tema) aponta que esse tipo de caracterização de


tópicos da ciência pode apresentar muitos problemas:
 Incentiva uma visão idealizada da ciência e a reafirmação de arquétipos
inalcançáveis (qualidades como intelecto superior, seriedade sisuda,
perfeccionismo, infalibilidade) do cientista: de algum modo pode dizer ao
leitor “a Torre de Marfim não é para você”!
 Enseja um afastamento do pensamento científico, enquanto forma de
entender e agir no mundo, da realidade cotidiana: o anula como opção
de ferramenta para, e método de, solução de variados tipos de
problemas (simples ou nem tanto).
 Promove a supervalorização da “ciência que serve para alguma coisa”
em detrimento ao exercício da pesquisa básica (ciência pura).
40

3 Sobre a Divulgação Científica e Outros Termos


Em 1982, para o primeiro número da revista Ciência Hoje, o patrono da
divulgação científica e popularização da ciência brasileiras, o cientista, médico,
jornalista e escritor José Reis, concedeu uma entrevista. É assim que ele
responde quando a entrevistadora o pede para definir divulgação científica:

É a veiculação em termos simples da ciência como processo, dos


princípios nela estabelecidos, das metodologias que emprega.
Durante muito tempo, a divulgação se limitou a contar ao público os
encantos e os aspectos interessantes e revolucionários da ciência.
Aos poucos, passou a refletir também a intensidade dos problemas
sociais implícitos nessa atividade. Para muitos divulgadores, a
popularização da ciência perdeu sentido como relato dos progressos
científicos, porque o cidadão se acha hoje cercado desse tipo de
informação. Embora concorde em parte com essa posição, considero
que a divulgação pela imprensa é muito importante, principalmente
em países como o Brasil, onde as dificuldades e as precariedades
das escolas fazem com que estudantes e professores obtenham
informações sobre os progressos da ciência através de artigos de
jornais. Para mim, depois de um longo caminho percorrido como
divulgador, é com a maior alegria que encontro por toda parte
professores e pesquisadores que dizem haver encontrado em meus
escritos o despertar de sua vocação, assim como pessoas de variado
nível cultural que em artigos meus descobriram pistas para resolver
até problemas pessoais (REIS, 2002, p. 76).

Neste capítulo abordaremos conceitos relacionados ao que se entende


por divulgação científica (DC) e termos que são usados como sinônimos, mas,
veremos, podem designar práticas e disposições diante do mundo muito
dessemelhantes. Em paralelo a isso, discutiremos a aplicação de técnicas de
DC como coadjuvantes na aprendizagem de conceitos científicos em educação
formal. Encerraremos o capítulo com uma breve reflexão sobre como podemos
ver o presente trabalho e o prêmio Ig Nobel sob o prisma da História das
Ciências enquanto disciplina e conjunto de princípios metodológicos, atentando
para o fato que a divulgação científica e a popularização da ciência sempre
andaram de mãos dadas ao caminho percorrido pela ciência, ainda que
assumindo propostas e formas diferentes ao longo do mesmo.

3.1 Conceitos de Divulgação Científica e sua Crítica


Existem autores para quem o termo divulgação científica não designa
um estilo ou gênero do discurso, um tipo específico de texto ou iniciativa, mas
sim está relacionado a como a ação é formulada e como circula em nossa
sociedade, conforme Da Silva (2006, p. 53). Voltando nossos olhares para a
41

comunidade científica do século XVIII, percebemos claramente que as


atividades voltadas à produção do conhecimento e aquelas para sua
popularização ainda eram pouco diferenciadas, e mesmo os espaços em que
se desenrolavam eram muitas vezes sobrepostos; contudo, havia uma tensão
que mirava a ruptura entre o científico, pautado pela produção profissional de
conhecimento, e o popular: “filósofos naturais acadêmicos da época do
Iluminismo esforçavam-se por parecerem diferentes dos chamados
‘vendedores científicos’, com suas palestras e shows itinerantes” (DA SILVA,
2006, p. 55).
Seria possível definir uma barreira que separe o que é externo do que é
interno à atividade científica? A ciência é uma produção social complexa que
envolve muitos atores que não só os cientistas profissionais (esses mesmos,
basta refletirmos brevemente e veremos, são tão somente humanos nascidos e
criados em sistemas sociais, ainda que diversos dada a capacidade de diálogo
internacional promovida pela academia). Ao encararmos a produção textual
voltada para seus pares e aquela com fins de divulgação, perceberemos que
diferentes discursos, constituintes ao mesmo tempo de sentidos e sujeitos,
formam diferentes textualidades que resultam em diferentes efeitos-leitores
(conceito que pode ser explicado neste caso como no trabalho de Da Silva,
Ramos et al. (2015), “posição de leitura e relação com a ciência que o leitor
pode vir a ocupar”), reproduzindo relações sociais simétricas ou assimétricas
entre os sujeitos, autor e leitor, conforme Da Silva (2006, p. 57). Invocando a
construção do leitor-discordante de Bruno Latour (2000, p. 53), podemos inferir
que um sujeito-autor pode se antecipar às criticas desse tipo de leitor ao
construir seu discurso científico, que será textualizado de forma que venha a
ser pautado em relação a esse leitor-virtual: o que pode-se dizer é que haverá
um efeito-leitor bem específico numa eventual troca entre um sujeito-leitor e o
texto, e que será “construído historicamente com a institucionalização da
ciência” (DA SILVA, 2006, p. 57).
A que conclusões os parágrafos anteriores nos levam? Há um ato, o de
divulgar ciência, que seria subproduto de um modo de fazer científico que
impõe restrições autorais, e que gera um efeito-leitor voltado à
“institucionalização, profissionalização e legitimação da ciência moderna” (DA
SILVA, 2006, p. 58) – há uma clivagem no corpo social da modernidade entre
42

produtores e consumidores (do saber científico), e a figura do divulgador da


ciência nasce para minimizar a tensão histórica que essa cisão causa.
Segundo Da Silva (2006), a divulgação científica trabalha num lugar
“diferenciado” com relação a esse imaginário (essas relações sociais
constituídas historicamente e auto perpetuadoras, pois evocam um “conflito”
que se reproduz no tempo e na sociedade) que vem estabelecer uma
diferenciação e hierarquização entre o discurso do texto acadêmico e aquele
do texto que será objeto de divulgação. Até onde se pode ver, para o autor a
própria essência da divulgação científica nasce do conflito entre uma
comunidade que faz ciência e uma sociedade em grande parte alheia ao
científico – contudo, é de se crer que haja interfaces entre esses sujeitos,
entidades que habitam lugares de locução que podem não ser exatamente o do
cientista profissional, mas que os tangenciam: professores, por exemplo. Sob
esse ponto de vista, é pertinente a nossa iniciativa de transformar artigos
vencedores do prêmio Ig Nobel (textos acadêmicos, portanto) em material de
divulgação científica a ser usado em sala de aula por intermédio de oficinas
voltadas à formação continuada de professores do Ensino Médio, pois então se
promove a conexão entre a esfera acadêmica e o público através justamente
de um sujeito privilegiado (o docente) e por meio de tópicos que são por si
mesmos já considerados chamativos, fora do comum, interessantes.
Devemos prosseguir em nossa revisão sobre o conceito de DC e a
crítica que alguns autores fazem a ele. Podemos propor uma definição mais
direta nos seguintes termos: “‘divulgação científica’ é uma expressão que
designa atualmente a transmissão de conhecimento científico para um público
leigo no assunto; como acréscimo deveríamos considerar que a divulgação
entre pesquisadores também é científica” (MASSOLA, CROCHÍK e
SVARTMAN, 2015, p. 310). Os autores proponentes dessa definição aventam a
hipótese que o grande motivador da atividade de DC é a necessidade dos
cientistas de prestarem contas ao corpo social de suas atividades, que são,
num país como o Brasil, em grande medida levadas a cabo em instituições
públicas – ademais, é uma forma de angariar apoio popular, que deve se
converter em institucional, para suas pesquisas atuais e futuras. Então é
proposto o seguinte questionamento: se “a importância da ciência, sobretudo a
básica e a teórica, não se perde, devido ao imediatismo e ao pragmatismo”
43

(Idem, p. 311), isso não nos força a levantar uma crítica a uma “lógica contábil”
da DC (que promoveria uma cisão entre o conteúdo do conhecimento
produzido e a maneira como é retratado na divulgação)?
É de se concordar que o sentido do “prestar contas” pode variar
conforme a visão pessoal do profissional de ciências do seu próprio trabalho e
as condições dadas pelos veículos de informação que promovem a divulgação
científica como pauta, indo desde a apresentação das vantagens e
desvantagens de dado produto tecnológico a uma “narrativa ‘épica’ de uma
busca intelectual sem qualquer aplicação prática imediata” (Idem, p. 311), e daí
infere-se que a DC seria imiscuída de razões político-sociais, que
eventualmente definiriam o futuro (sucesso ou fracasso) de projetos e linhas de
pesquisa. O temor exposto nos autores Massola, Crochík e Svartman (2015, p.
312) é que, sendo a “sociedade” (que podemos entender como a grande
maioria leiga) o fórum de ajuizamento da atividade científica, privilegiar-se-ia
uma “ciência de resultados” (embora os autores mesmos admitam que já
testemunharam o oposto). É da opinião do autor desta monografia, diante de
depoimentos de diversos divulgadores da ciência (inclusive de José Reis, cujo
testemunho abre este capítulo), que o profissional de ciências precisa (para o
bem do tema de seu próprio ofício e para, sempre, contribuir com o letramento
científico da sociedade) saber falar de seu próprio trabalho em termos
inteligíveis, ou ao menos apreensíveis, a um leigo (que pode ser tanto um
jovem estudante quanto um capaz pesquisador de outra área do conhecimento,
além de, claro, um jornalista interessado) – isso é divulgar ciência e mesmo
“prestar contas” do investimento social inerente ao fazer ciência no Brasil: se
essa cobrança acontecer a nível pessoal ou institucional local, não deve ser
possível vê-la como algo negativo (prejudicial à pluralidade das linhas de
trabalho científicas e ao investimento nelas) per se, mas compreende-se o
problema quando se imagina que o “prestar contas” seja exigido, em termos
generalistas, por veículos de formação de opinião (não somente associados ao
jornalismo, mas, por exemplo, a conselhos que meçam a produção nas
universidades) numa sociedade de baixíssimo letramento científico.
Ainda de acordo com Massola, Crochík e Svartman (2015, p. 312)
levanta-se a hipótese da incompatibilidade intrínseca entre a imagem criada do
conhecimento no âmbito da divulgação científica e o caráter dilacerador de
44

paradigmas do mesmo (que é, portanto, radical), e mesmo que o divulgar


ciência poderia ser usado como ferramenta de controle de opinião. Se fosse
possível eliminar tais incongruências e perigos, ainda assim o fazer ciência
“necessitará de ampla liberdade frente a instâncias sociais de julgamento que,
ao contrário, terão muito interesse em que os cientistas lhes prestem contas” –
novamente vemos que, para os autores, o “prestar contas” foi levado a um
nível superior, imposto por mecanismos sociais estabelecidos, talvez uma
forma dos grupos dominantes evitarem que a ciência, ela sim, se constitua
como âmbito de medida e julgamento da vida social (o que poderia implicar
numa reforma ou uma ruptura completa das instituições): a solução passa por
transformá-la numa intricada empresa comercial, que por sua própria natureza
deve apresentar balancetes periódicos, que seriam constituídos pelos
resultados que vêm a tornar-se “um fetiche repetido indefinidamente sem
qualquer substância” (Idem, p. 313). Eis que os autores determinam como se
daria a redenção do processo e iniciativas de DC: o que há de essencial na
ciência não são seus resultados, mas como, por qual forma, foram alcançados.
Vemos ainda em:

O conteúdo de uma afirmação científica, abstraído de seu contexto


argumentativo, pode assumir um caráter fetichizado e acrítico que
impede o pensamento em vez de fomentá-lo e, ainda mais grave,
torna opaco ao público leigo o processo pelo qual é (ou deveria ser)
ininterruptamente criticado no interior da própria atividade científica
(MASSOLA, CROCHÍK e SVARTMAN, 2015, p. 313).

Trata-se de tornar relevante o método, através do qual pode sempre haver o


falseamento e que sempre caracterizou o esforço científico, ao invés de reificar
o resultado, que é sempre transitório. Ainda assim, mesmo por essa via, a
divulgação científica poderia mitificar agora o cientista em seu ofício: talvez o
grande problema seja a ação de mecanismos de informação sobre um público
que não pode ser devidamente crítico por sua falta de formação – chega-se à
conclusão que a DC então marcaria a oposição entre a autoridade legitimada,
produtora do conhecimento, e o sujeito consumidor, quase completamente
leigo, e que essa relação se mantêm no tempo, uma vez que a divulgação
científica, como entendida hoje, seria incapaz de promover a emancipação do
consumidor, pois trata o conhecimento como mercadoria, não propondo o
exercício real da reflexão pelos indivíduos. A divulgação científica é um dos
45

muitos termos que denominam a iniciativa de levar ao público as conquistas e


métodos das ciências, e é possível concordar com as críticas expostas sem
necessariamente cair num vazio propositivo ou na tendência a assumir
posicionamentos acríticos. A proposta do presente trabalho concorda com o
texto estudado em alguns pontos: há a necessidade de se valorizar o método
muito mais que o resultado quando se fala de ciência, e a figura do cientista
não deve ser tomada como algo distante e etéreo – escolhemos promover a
divulgação científica e a popularização da ciência através do estudo de artigos
vencedores do Ig Nobel porque essas obras primam por trazerem resultados
que são sumariamente descartados numa sociedade voltada à “prestação de
contas”, mas são altamente interessantes por serem inusitados e criativos e se
tornam uma das muitas formas de se valorizar e apreender o método que
constitui a ciência, além de aproximar a figura do cientista ao do leigo através
das proposições um tanto fora do esperado para um habitante da Torre de
Marfim. Em nossa proposta de capacitar através de uma oficina professores do
Ensino Médio para usarem dos textos adaptados desses artigos científicos em
suas aulas, almejamos promover uma superação de fato da laicidade através
da reflexão, não a manutenção de uma relação mercadológica, mas didática.

3.2 DC enquanto Gênero de Discurso


Vamos prosseguir em nossos estudos sobre a DC pensada como um
gênero do discurso. Os autores Cunha e Giordani (2009, p. 2) declaram que no
processo de divulgação científica acontece um apagamento circunstancial do
sujeito que efetivamente lida com o processo do fazer ciência: não raras são as
vezes que a voz do cientista é substituída pela da figura do jornalista divulgador
de ciência – daí a possibilidade de se entender a DC essencialmente como um
discurso próprio, distinto do científico. Contudo, os autores afirmam que,
segundo as novidades na área da análise do discurso, não pode ser
considerada verdadeira a declaração que a divulgação científica é
simplesmente a “simplificação do discurso científico ou simplesmente a
tradução de um discurso científico para formas mais compreensíveis” (CUNHA
e GIORDANI, 2009, p. 3). Como elemento que corrobora esse posicionamento,
os autores citam Marandino, que lista cinco categorias possíveis de um texto
de DC:
46

1. Divulgação Utilitária: relacionada à aplicação da ciência, do


resultado aplicado do trabalho científico;

2. Divulgação do Método: que procura mostrar como determinados


conceitos ou mesmo resultados foram obtidos, sem haver a
preocupação com as implicações que podem ocorrer, não dando
margem a uma discussão de caráter social ou político;

3. Divulgação dos Impactos: relacionada com as possíveis aplicações


das novas descobertas;

4. Divulgação dos Avanços ou Evolutiva: na qual a ciência é


apresentada como um processo de acúmulo de informações e de
progressos contínuos, sendo os resultados agrupados de forma
linear;

5. Divulgação Cultural: seu objeto é a cultura enquanto sua linguagem


é a ciência e, sendo assim, esta é um elemento inicial a partir do qual
se aborda a cultura; preocupa-se com a forma como a ciência se
insere num contexto histórico-cultural, sendo ela uma expressão
deste mesmo contexto (MARANDINO, 2001, p. 107).

Podemos afirmar que, para os propósitos deste trabalho, a divulgação científica


utilizando artigos vencedores do prêmio Ig Nobel como proposta aqui será algo
como uma associação entre Divulgação de Método e Divulgação Cultural,
como se verá nos próximos capítulos.
O que nos diz Cunha e Giordani (2009, p. 4) é que há uma assimetria
entre o texto de DC e o texto científico: no primeiro, o profissional da
divulgação científica é quem toma a palavra e a imagem do cientista é usada
como apoio para indicar a veracidade do que é reportado; no segundo, a
pessoa do profissional da ciência desaparece ante a impessoalidade imposta
pelo estilo de escrita adotado. Questiona-se então como são construídos esses
diferentes tipos de texto: o que os particulariza é o gênero adotado por cada
um. Segundo Cunha e Giordani (2009, p. 4), o gênero discursivo caracteriza “a
organização das ações que os interlocutores produzem e as interações
dialógicas que realizam do eu com o outro”, é como um elemento organizador
das experiências de linguagem. Os autores referenciados dizem que as ações
de linguagem seriam assim estabelecidas: “o divulgador fala pelos outros [os
cientistas] para os outros [os não especialistas]. Constitui-se, deste modo, uma
articulação entre os seguintes elementos: a enunciação, o discurso da ciência,
o discurso do público e o DDC3”.
Conforme Bakhtin (2003), citado por Cunha e Giordani (2009, p. 5), os
3
Segundo (CUNHA e GIORDANI, 2009), DDC refere-se a Discurso da Divulgação Científica,
esse tipo particular de gênero do discurso que nos interessa aqui.
47

seguintes aspectos caracterizam um gênero em particular, e tal é sua relação


com o discurso da DC:

1. Conteúdo Temático: o conteúdo temático ou tema deve ser único,


concreto e histórico, pois é a partir dele que podemos definir uma
enunciação. Mas o tema é um “sistema de signos dinâmico e
complexo, que procura adaptar-se adequadamente às condições de
um dado momento da evolução” (BAKHTIN, 2003, p. 115). Em
relação ao conteúdo temático da divulgação científica podemos dizer
que ele está relacionado a assuntos de Ciência e Tecnologia, e,
portanto, constitui-se num tema único, concreto, histórico e que se
adapta às condições do momento, conforme Bakhtin propõe para
constituir um gênero discursivo.

2. Estilo: para Bakhtin, estilo é a seleção entre os recursos lexicais,


fraseológicos e gramaticais da língua. Neste ponto, as condições em
que os textos de divulgação científica são produzidos podem se
observar o emprego de metáforas, analogias, comparações,
exemplificações etc. que se constituem em recursos lexicais que dão
um estilo próprio ao DDC.

3. Forma Composicional: em relação à forma composicional, a


maneira como o DDC é constituído e as relações dialógicas que
acontecem entre o locutor e o receptor (interlocutor) põem em ação
procedimentos discursivos variados, dentre eles: a recuperação de
conhecimentos tácitos, gancho frio, conclusão no início do texto etc.
Todas estas formas dão à divulgação científica uma composição
característica deste gênero de discurso (CUNHA e GIORDANI, 2009,
p. 5).

Os autores garantem então que o discurso da divulgação científica se


enquadra nos termos de Bakhtin para se constituir em gênero discursivo em
particular. Podemos comentar que, quanto ao conteúdo temático, a DC é
bastante variada, podendo se constituir num gancho inclusive para se discutir
temas sociais de relevância (como ignorar comentários sobre o negacionismo
científico presente em nossa sociedade feitos em um texto para o grande
público cujo assunto principal é vacina e prevenção de doenças virais?),
embora seus temas clássicos e mais patentes sejam realmente ciência e
tecnologia, em suas variadas facetas. No que tange ao estilo, certamente a
divulgação científica é metafórica por excelência, e guarda toda uma identidade
particular (impossível falar sobre a teoria física de buracos negros sem apelar
para a criatividade a fim de contornar uma matemática complexa que só é
compreendida por profissionais versados no tema). Da mesma maneira, a
forma composicional dos textos de DC apela para uma série de fórmulas e
artifícios que tendem a se repetir por sua comprovada eficiência na transdução
do discurso acadêmico para algo mais de acordo com o grande público,
48

apelando constantemente para as noções implícitas e os saberes escolares


básicos desse, por exemplo.
No texto de Cunha e Giordani (2009), os autores vão se debruçar sobre
algumas ideias de Bakhtin a respeito da produção textual, ideias essas que
tangem a construção do texto de DC como gênero. Bakhtin exalta as relações
dialógicas, “nas quais sujeitos se constituem nas suas relações com os outros”
(CUNHA e GIORDANI, 2009, p. 5). Mikhail também estabelece a não
neutralidade das palavras, que são ideológicas (possuem um sentido dentro do
discurso, sentido esse que foi construído ao longo das interações entre o autor
e o “outro”, que não necessariamente o interlocutor atual).
Dos parágrafos anteriores podemos inferir que um discurso é sempre
endereçado a um ou mais receptores, são atos de enunciação dirigidos ao
outro e que demandam uma resposta dele – e esses fatores serão modulados
segundo “o grau de informação que o destinatário tem, seus conhecimentos
especializados, suas opiniões, seus preconceitos etc.” (Idem, p. 6).
Percebemos aí que o perfil de um texto de DC vai se adaptar ao público alvo
que pretende alcançar: quando o autor seleciona seu interlocutor privilegiado,
determina as características do discurso e um gênero específico. É fácil, a
partir disso, verificar que o DDC não deve possuir uma formatação estanque:
um dos objetivos da DC é “cativar” o interlocutor para um assunto muitas vezes
fora de sua experiência cotidiana (mas nem sempre, a divulgação científica é
usada com sucesso para instruir e trazer à baila assuntos e temas comuns,
mas ignorados, e que podem contribuir para um aprimoramento da vivência do
interlocutor – por exemplo, como age uma vacina ou como funciona uma
hidroelétrica), e isso “requer do DDC muito mais que adaptações de linguagem;
requer a constituição de um gênero específico, em que os recursos expressivos
da língua desempenham um papel fundamental” (Idem, p. 6). Percebemos
então que o DDC é diretamente relacionado ao interlocutor, e vai assumir
características e recursos linguísticos de textos da esfera midiática e de textos
científicos, mas é essencialmente diferente desse último, um gênero distinto,
mas que guarda como fator comum a “informação” – informação essa que será
submetida a um “jogo de interpretações”, pois o divulgador não fala mais da
ciência, mas sim sobre a ciência, e o fala para um público que constituirá
significados a partir do que recebe. É importante mantermos isso em mente no
49

nosso esforço de transformarmos artigos em texto de divulgação científica,


para que não se exija um grau de minúcia técnico-matemática tal que ponha
em risco tanto a experiência dos professores que farão a ponte entre o discurso
científico e o da DC, quanto dos alunos que vierem a usar o material
processado nas diversas formas de educação formal ou não formal (cabe a
pergunta aí, se o texto produto da nossa oficina deverá passar por mais uma
mudança de gênero discursivo, do DDC para o “material didático”: acreditamos
que, por terem sido trabalhados já com fins, entre outros, de utilização com
discentes do Ensino Médio, seu uso não deve implicar prejuízo para a
constituição de uma visão crítica do estudante sobre a ciência e a apreensão
de seu método).

3.3 Breve Revisão sobre Nomenclatura


Seguindo a proposta de Germano e Kulesza (2007), vamos discutir
brevemente os termos pelos quais, no Brasil, costuma-se designar estratégias
e iniciativas associadas usualmente à DC. Aqui há uma profusão de
nomenclaturas que muitas vezes são utilizadas de maneira intercambiável,
dado que foram no geral apropriadas pelos autores nacionais através
traduções diretas de termos estrangeiros.

3.3.1 Vulgarização da Ciência


Na interpretação dos autores mencionados, o uso do termo em língua
portuguesa possui um sentido pejorativo ao qual não se é possível escapar
(acreditam inclusive que esse problema é partilhado pelo termo em língua
francesa, do qual foi apropriado): embora designe idealmente algo “a se tornar
conhecido”, não supera sua aproximação com a ideia de vulgar, que provem do
latim vulgare, “relativo ao vulgo; trivial; usual, frequente ou comum”
(GERMANO e KULESZA, 2007, p. 9). A despeito desse pormenor, os autores
lembram que uma das primeiras e mais bem sucedidas iniciativas de
vulgarização da ciência na Idade Moderna, logo na época da Revolução
Científica, foi a publicação por Galileu Galilei de duas obras (O Diálogo sobre
os Dois Principais Sistemas do Mundo, em 1624, e Duas Novas Ciências, em
1636) em língua vulgar (em italiano, não o latim, língua franca da época). A
terminologia, a despeito de sua conotação dúbia, foi bastante utilizada no Brasil
50

do século XIX e início do século XX – os autores citam ainda obras que em


pleno século XXI ainda empregam a nomenclatura, embora minoritárias.

3.3.2 Alfabetização Científica


Conforme Germano e Kulesza (2007, p. 12), “alfabetização é o ato ou
efeito de alfabetizar, isto é, ensinar o alfabeto e difundir o ensino básico e a
instrução primária”: o que se entenderia por alfabetização científica (que pode
ter sido em sua origem uma apropriação de um termo do inglês, cientific
literacy) seria prover “o nível mínimo de compreensão em ciência e tecnologia
que as pessoas devem ter para operar a nível básico como cidadãos e
consumidores na sociedade tecnológica” (SABBATINI, 2004, p. 2). No Brasil,
iniciativas de alfabetização popular tendem a incluir uma perspectiva de
reflexão sobre a própria realidade por parte do alfabetizado, daí que nossa
alfabetização científica poderia, se entendida em sentido amplo, abranger da
mesma maneira uma abordagem crítica, de forma a capacitar os indivíduos
também a emitir opiniões sobre temas e matérias de caráter científico.
A grande questão aqui, conforme pontuado por Germano e Kulesza
(2007, p. 13), é que o termo alfabetização está inextrincavelmente ligado ao
espaço escolar: diferentemente de outras designações cujo uso favorece o
emprego na educação informal e não formal, essa parece ser inevitavelmente
restrita à sala de aula e à relação estrita docente-discente. Por fim, emergiram,
de acordo com o artigo, ao longo do uso três formas do conceito em estudo: a
alfabetização científica prática, voltada à resolução de problemas concretos,
incutindo no indivíduo os saberes necessários para solucionar com rapidez e
efetividade contratempos cotidianos; a alfabetização científica cívica, que
prioriza a informação do cidadão no que tange a assuntos científicos de forma
que ele possa tomar decisões, na esfera da sociedade, bem embasadas e o
permita cobrar de seus representantes posicionamentos coerentes; a
alfabetização científica cultural, já abrangendo um outro patamar cognitivo-
intelectual, voltada a atender os anseios de uma pequena parcela da
população que tem por interesse descobrir a ciência de uma forma mais detida
e minuciosa.
51

3.3.3 Divulgação Científica


Divulgar, do latim divulgare, “tornar conhecido; propalar, difundir,
publicar, transmitir ao vulgo, ou ainda, dar-se a conhecer; fazer-se popular”
(GERMANO e KULESZA, 2007, p. 14). Como vimos na abertura do capítulo,
José Reis via na DC mais do que o falar sobre o incrível científico, mas, a partir
de termos simples e inteligíveis aos diferentes públicos, promover a intelecção
da ciência como processo e o conhecimento de seus princípios e metodologias,
tratando de não se ofuscar os diversos problemas sociais e humanos
imbricados no seu fazer.
Os autores fazem a ressalva que, ao se trabalhar em divulgação da
ciência (em especial quando temos em foco vertentes superespecializadas do
saber científico) não deve se propor executar um processo de tradução da
linguagem acadêmica para a popular, pois isso mesmo deve ser considerado
impraticável dadas a impossibilidade tácita de correspondências apropriadas,
mas sim criar conexões, muitas vezes metafóricas, entre a esfera científica e
outros campos. E isso não acontece senão mediante o ato de comunicar-se: o
verbo comunicar (do latim communicare, pôr em comum) pode assumir seu
sentido transitivo, “pôr em comunicação”, transmitir ou informar, ou seu sentido
intransitivo, de “estar em comunicação” ou formar um diálogo horizontal entre
interlocutores. Os autores já citados Germano e Kulesza (2007, p. 15) afirmam
que a divulgação (significando “transmitir ao vulgo”) tende a se aproximar ao
verbo comunicar em sentido transitivo: na DC haveria uma posição privilegiada
que seria a do ator social especializado, aquele que usualmente detém a
palavra – e não só isso, o interlocutor desse usualmente não tem a
oportunidade de experimentar o método através do qual se dá o fazer
científico, sua posição é passiva no sentido que só recebe comunicados
ditados pelo divulgador. Tratar-se-ia de uma relação eminentemente vertical
que lembra a chamada educação bancária, onde o divulgador, que domina as
ferramentas para a compreensão da linguagem científica e tecnológica (muitas
vezes hiperespecializada), determina o nível de conhecimento a ser passado a
um público cuja cultura geral, via de regra, é alheia ao mundo acadêmico.
Não obstante, uma perspectiva de divulgação a partir do conceito de
comunicação reflexiva, quando o verbo comunicar é intransitivo, parece não ser
impossível. Esse tem seu papel em “várias correntes de pensamento
52

importantes como a teoria do agir comunicativo do filósofo frankfurtiano Jurgen


Habermas e a Pedagogia do Oprimido do educador Paulo Freire” (GERMANO
e KULESZA, 2007, p. 16) e prima por indicar um processo horizontal de troca
dialógica. Contudo, é importante salientar que esse processo não é
necessariamente entre iguais (completamente simétrico) e nem isento de
conflitos, mesmo por que muitas vezes há uma concepção rasa por uma ou
ambas as partes sobre a ciência (que infelizmente não é uma panaceia) e suas
articulações múltiplas com a sociedade em suas diversas facetas.

3.3.4 Popularização da Ciência


Popularização é o ato de divulgar, propagar, tornar popular alguma coisa
entre o povo. Os autores mencionam que há aí dois termos problemáticos:
“popular” (que agrada o povo) e “povo” (o vulgo, ou mesmo a turba). Eles
seriam redimidos desde que tomemos como norte as práticas da chamada
educação popular, que associa o primeiro termo aos esforços que aparecem no
trabalho daqueles que compõe o segundo: a lida de subsistência associada às
classes populares, a luta por libertação social, política e econômica dos
movimentos sociais. No Brasil o termo “popularização da ciência” tem o uso
expandido com a criação, em 2004, do Departamento de Difusão e
Popularização da Ciência e Tecnologia, órgão do então Ministério de Ciência e
Tecnologia, e de iniciativas voltadas a valorização da comunicação entre
ciência e público, conforme podemos ver em Germano e Kulesza (2007, p. 19).
Mas qual é a grande diferença que se imporia entre os termos
divulgação científica e popularização da ciência? Conforme os autores, a
mesma diferença que existe entre educação bancária e educação libertadora:
popularizar é colocar a ciência a serviço das razões dos oprimidos, de forma
dialógica e reflexiva. E para concretizar um tipo de ação como essa, deve-se se
despir dos receios de que a classe trabalhadora não consiga alcançar um tipo
de pensamento sistemático que é a regra na ciência, seja por incompatibilidade
cultural ou qualquer outro motivo semelhante, ou que os saberes de senso
comum ou tradicionais que permeiam essas populações sejam desprovidos de
valor, mesmo científico: “compreender a razão de ser das coisas, tendo delas
uma visão mais profunda, não pode ser privilégio das elites” (Idem, p. 21).
Durante todo o presente trabalho falamos sobre divulgação científica
53

utilizando os artigos vencedores do prêmio Ig Nobel: nos referimos sempre aqui


a uma DC baseada no conceito de comunicação reflexiva, que julgamos
procedente e factível. Haverá uma disparidade entre os interlocutores, mas o
objetivo é que essa seja anulada no tempo, e que não haja ouvintes passivos,
mas parceiros de trabalho na jornada que será refletir sobre temáticas
científicas que ocupam lugar de destaque justamente por “zombar” (e aqui nos
damos ao luxo de usar o termo de forma conotativa) da ciência voltada a
resultados. A popularização da ciência, como aqui apresentada, é um desafio
para mentes mais preparadas e deve se dar em situações bastante
específicas, tomando provavelmente um tempo prolongado de interação e
compromisso sólido de todas as partes.

3.4 Uso de Textos de DC como Estratégia Didática: Breves


Apontamentos
Há uma miríade de autores que asseveram a importância do uso de
textos de DC, por vezes adaptados, como prática de aprendizagem e
estratégias didáticas em sala de aula, por ensejarem a incorporação do saber
das ciências e a criação e manutenção de posicionamentos críticos nos
discentes, que vão permanecer após a conclusão dos estudos (seja de nível
médio, ou mesmo universitários). Dentre os benefícios que as estruturas de
argumentação e variedades de pontos de vista presentes nos textos de DC
podem trazer aos alunos, podemos citar: “acesso a uma maior diversidade de
informações; desenvolvimento de habilidades de leitura e domínio de
conceitos, formas de argumentação e elementos de terminologia científica”
(FERREIRA e QUEIROZ, 2012, p. 4). Trata-se de garantir acesso à cultura
científica aos discentes, e isso passa por apresentar aos mesmos uma ampla
gama de tipos de textos que abordam ciência, desde notas de mídia até
originais de cientistas, e, acrescentamos, porque não fazer uso também de
artigos científicos devidamente processados (sejam ativamente adaptados
através da reescrita ou mediados de alguma forma) para serem apresentados
em sala de aula?
As autoras Ferreira e Queiroz (2012, p. 9) fazem uma ampla revisão de
literatura, estudando 88 publicações acadêmicas que abordam textos de
54

divulgação científica (TDC) e elencam as categorias principais à que pertencem


suas temáticas centrais:
 seleção, caracterização e/ou análise de TDC para fins escolares;
 experiências em salas de aula de ciências com TDC;
 formação de professores e o uso de TDC em contextos escolares;
 ponderações sobre DC e suas implicações no ensino de ciências;
 estado da arte das pesquisas relacionadas à DC.
Agregamos esta informação ao presente trabalho com fito de demonstrar que
nosso objetivo, que é nada menos que a formação de professores a partir do
uso de artigos científicos singulares, e a preparação desses textos para o uso
em sala de aula, está entre as temáticas mais valorizadas por pesquisadores
da área. Informações atualizadas não indicam mudança apreciável nos dados
citados.
Dando continuidade, o argumento de muitos dos autores estudados para
a utilização de textos de DC em ambiente escolar é que, mesmo que eles
possam apresentar imprecisões científicas (no caso de produtos de mídia),
ainda assim seriam ferramentas úteis na aprendizagem de conceitos, pois
esses erros, uma vez localizados, poderiam ensejar o ensino da informação
correta e um estudo do motivo que levou ao equívoco, além de proporcionar
momentos de interação de qualidade entre docentes e discentes, conforme
Ferreira e Queiroz (2012, p. 12). Há ainda um problema maior e que é uma
constante não só no uso da DC no âmbito da sala de aula, mas para a DC em
si, e que já foi mencionado neste trabalho: enquanto a produção científica é
pautada no debate e sempre no crivo de validade a partir do método científico
(baseia-se na dúvida), materiais de divulgação científica muitas vezes
apresentam os resultados do processo científico como revestidos de uma aura
de infalibilidade e quase como produtos acabados (exibem-se como certeza) –
isso pode proporcionar uma visão de ciência deturpada aos consumidores
finais da DC, e o processamento de textos de divulgação científica em sala de
aula pode contribuir para que os alunos escapem a essa inconsistência,
conforme Ferreira e Queiroz (2012, p. 13).
A pesquisa das autoras indica que:
55

(...) a utilização de TDC em sala de aula exige um intenso trabalho de


reelaboração textual que depende da consideração de características
contextuais, das relações entre as práticas sociais de divulgar e de
ensinar ciências, das finalidades e objetivos do ensino, dos interesses
dos alunos, entre outros. Da mesma forma que existe uma
multiplicidade de formas de se divulgar a ciência, há uma diversidade
de possibilidades de utilização dos TDC na sala de aula e que, em
todas elas, a presença do professor como mediador é fundamental.
Qualquer tentativa de se estabelecer um único método de trabalhar
com TDC ficaria muito aquém das possibilidades que os próprios
textos oferecem (FERREIRA e QUEIROZ, 2012, p. 17).

Devemos atentar para a importância do ponto focal do trabalho com o TDC,


aquele que vai preparar o texto para o uso da turma e vai assumir a mediação
do debate: o professor. As autoras ressaltam que, a partir de sua pesquisa,
constatou-se que o hábito da leitura, essencial para a tarefa mirada, não era de
maneira alguma amplamente difundido entre docentes: o uso de TDC como
prática educativa vem também para pôr em questão procedimentos fossilizados
na esfera escolar, renovando percepções e demonstrando a necessidade de
renovação de certas práticas, conforme Ferreira e Queiroz (2012, p. 18) e
Gabana, Lunardi e Terrazzan (2003, p. 3). O uso dos TDCs como ferramenta
de ensino vem trazendo discussões profícuas a respeito de como pode ser sua
relação com o material didático padrão, como reelabora-lo para o uso com os
alunos, como articulá-lo com os currículos de ciências do nível médio ou
mesmo da faculdade e, em última instância, como proporcionar a preparação
necessária aos docentes que vão pensar essas atividades e empreender essas
tarefas, além levarem adiante o trabalho com o texto em sala de aula.
Afirmamos aqui, seguindo também o declarado por Ferreira e Queiroz (2012, p.
20) e as conclusões a que chegam Gabana, Lunardi e Terrazzan (2003, p. 4), a
importância de iniciativas de formação de professores que os preparem e
habilitem para lidar com TDC e os auxiliem na tarefa de estuda-los e adaptá-los
para empreenderem práticas de ensino diferenciadas na sala de aula.

3.5 Uma Reflexão sobre a História das Ciências


No início do curso que deu origem a este trabalho, foram suscitadas
questões provocativas que iriam guiar nossa reflexão ao longo de todas as
aulas: “o que é História das Ciências?”, “quem (e o que) faz parte da História
das Ciências? Por quê?”, “o que é a Ciência? Como ela funciona (de
verdade)?” – no que se segue guiar-nos-emos por essas interrogações (que
56

não serão respondidas, mesmo porque elas servem mais como ferramentas de
reflexão do que como conceitos fechados) e simultaneamente vamos pensar o
tema desta monografia de maneira crítica.
Gavroglu (2007) contrapõe duas percepções de Ciência, um “ontem e
hoje” cuja diferença podemos remeter à construção moderna da disciplina de
História das Ciências. No passado, a Ciência era pensada como puramente
objetiva, independente dos fatores que consideramos mundanos,
eminentemente humanos; na modernidade, há a percepção que as Ciências
são produto de interações intelectual, mas também social, cultural, ideológica,
filosófica, ontologicamente orientadas. Os premiados pelo Ig Nobel
representariam qual versão de Ciência? Uma arte intelectual levada ao extremo
e que visa à satisfação por sua própria prática, imaculada e mesmo
independente de resultados, ou se localizaria mais como uma contestação dos
quadros sociais e ideológicos vigentes, das relações de poder dentro dos
ambientes, múltiplos e hierarquizados, onde o ofício do cientista se desenrola?
É sem surpresa que este trabalho defende a última versão como a mais
realista, que, portanto, concorda com a visão atual que a História das Ciências
tem da prática científica: é possível acrescentar que o caráter lúdico (que é um
conceito que transcende a mera diversão, e está associado também ao prazer,
inclusive o intelectual, e a valores da vida de jovens e adultos) dos artigos
premiados, indubitavelmente proposital, são um elemento de metalinguagem,
oferecem uma pintura surrealista que ironiza o “fazer ciência em busca de
(grandes) resultados”.
Há que se perceber a complexidade das relações entre as esferas
pessoais e profissionais do cientista, e entendo como trabalho da História das
Ciências ressaltar esse nexo significativo: sob esse prisma, a disciplina não
deve tomar critérios absolutos de julgamento – homens, instituições e a prática
intelectual precisam ser vistos como produtos do tempo e espaço, sociedade e
cultura, não ahistóricos ou idealizados. Quando se toma como objeto de estudo
o prêmio Ig Nobel, será que se está praticando a História da Ciência em algum
sentido? Está-se estudando um objeto pertencente ao arcabouço de saberes
identificados como parte das Ciências, cuja duração já se estende por quase
três décadas e que é de maneira cabal dependente também das relações
interpessoais, sociais e culturais de seus protagonistas (tudo que o envolve,
57

desde a escolha do objeto de estudo de cada artigo até a eleição para o prêmio
é, de maneira hiperbólica e em seus próprios termos, amostra do fazer ciência
que a sociedade ampla considera como “atividade séria”). É possível crer que
daremos uma (pequena) contribuição nesta monografia, mas Gavroglu faz uma
ressalva: a História das Ciências não se faz somente por aqueles que detêm o
conhecimento científico na área correlata – faz-se necessário apreender antes
História, suas técnicas de investigação, suas abordagens teóricas e de método,
além de conhecer as controvérsias relacionadas aos temas de pesquisa.
Percebe-se que a tarefa de compreender o locus do Ig Nobel na História das
Ciências e como ferramenta de popularização da ciência é mais complexa que
a trivial compilação de anedotas e “fatos inertes”.
Dominique Pestre (1996) nos traz um apelo semelhante ao do autor
anterior, mas nos mostra um quadro mais “moderno” da história da História
(social e cultural) das Ciências: nos remete já aos anos 70 do século XX,
quando um grupo mais ou menos coeso e coordenado de profissionais
vinculados à historiografia das práticas científicas lança um conjunto de
concepções, e de maneiras de se acercar dos temas, contestadoras e que
deveriam reescrever o que se entendia como o fazer ciência. Ao ler o texto
desse autor, suscita-nos imediatamente que seria próprio buscar averiguar as
influências desse movimento sobre a concepção da premiação que é tema
deste trabalho – eles atuaram até meados da década de 1980, mas
influenciaram as gerações seguintes e permanecem relevantes ainda hoje: o
que definiram como Ciência e prática científica é tema de estudos de
historiadores contemporâneos. Podemos partir do pressuposto que essa visão
contestatória, que nasce nos anos de 1970 e amadurece nos 1980, é uma das
bases para o movimento que resultará no Ig Nobel dos anos 1990? Fica
registrado esse questionamento como eminentemente relevante e que deve
procurar ser respondido, de maneira não leviana, mas também não definitiva.
Poderíamos propor um estudo de “genealogia científica”: averiguar se alunos,
ou alunos dos alunos, dos membros reconhecidos do grupo original agiram
como apoiadores ou mesmo conceberam a proposta do Ig Nobel – a coautoria
de trabalhos, ou a autoria de trabalhos sobre, ou diretamente ligados às,
propostas do grupo em questão também poderiam ser indicadores aceitáveis.
O que é certo é que o arcabouço conceitual da História das Ciências se
58

renovou depois da década de 1970, em nível de objetos de estudo, abordagens


e problemas relevantes, passando a ver suas próprias práticas sob olhos mais
críticos e com distanciamento, permitindo uma concepção mais pessoal, social,
cultural, ideologicamente localizada das Ciências.
Em certa parte de seu texto, Pestre evoca como prática essencial do
historiador ser imparcial com, e contextualizar os, atores de sua disciplina, que
não se deixe seduzir em seu ofício por uma narrativa simplista de “verdadeiro”
ou “falso”, ou ainda de “vencedores” e “vencidos” – a ambos caberia
explicações equivalentes em sua natureza. Será que na História das Ciências
aplicadas ao Ig Nobel não lidamos com situação semelhante, mas que marca
um conflito entre “sérios” e “inusitados”? Constantemente o prêmio é designado
como uma “piada interna” da comunidade científica – por que deveríamos
aceitar sem refletir essa designação e nos privar de considerar ciência não
voltada para (grandes) resultados como “menos ciência”? Essa é uma grande
questão que se impõe a partir da análise de um fato isolado.
Novamente, consultando o texto do autor supracitado, encontramos o
apelo da nova História das Ciências para localizar, contextualizar, harmonizar, a
prática científica em seu sistema sociocultural de significado – e, embora
alguns cientistas profissionais não se sintam à vontade com essa afirmação por
uma certa “inércia mental”: igualar as práticas científicas a toda e qualquer
produção cultural humana. Isso pode suscitar se seria o prêmio Ig Nobel uma
tentativa de equivaler, mesmo no reino da ironia, ciência “séria” e ciência
“lúdica” – esse princípio não é imbuído do mesmo espírito levantado?
Ao dissertar sobre o “Vida de Laboratório”, de Bruno Latour, Dominique
Pestre ressalta que seu autor apresenta uma alternativa aos métodos de
descrição em voga, foge de uma explicação intencional, baseada em uma
etnografia funcionalista, “esquece” de ressaltar os produtos como razão natural
de ser da Ciência. Não seria essa uma das múltiplas facetas do prêmio Ig
Nobel? Voltar os olhos para um produto das ciências que não é aquele
hipervalorizado pela pós-modernidade, não o que carrega um caráter
eminentemente funcional: trazer à pauta como se faz ciência ainda que o
resultado seja lúdico e, a priori, sem função imediata. É uma constante ver
professores universitários em uma tentativa de reafirmar a importância da
Ciência Básica, frente a uma supervalorização da Ciência Aplicada – talvez
59

esse mesmo clamor esteja presente em cada edição do prêmio, da valorização


do fazer ciência frente ao resultado (e sem considerar isso qualquer tipo de
idealização da prática científica).
Pestre continua sobre Latour, discutindo como esse supera o programa
clássico da História das Ciências (verdades epistemológicas), e o programa da
controvérsia (verdades negociadas), e propõe um modelo de como enunciados
científicos se impõe (“vencem”), social e cognitivamente, através de suas
práticas e objetos. O Ig Nobel não seria uma forma de premiar os “melhores
perdedores”, dado que dentro do universo da “Ciência séria” esses resultados
seriam em geral descartados como curiosidades ou mesmo catalogados sob
epítetos menos caridosos? Não é uma forma de tentar desvelar, expor mesmo,
os preconceitos que seguem associados ao fazer ciência?
A discussão presente no texto em apreço nos convida a refletir, quando
mencionado o programa mais atual de Latour e as questões a ele associadas,
como as “questões científicas verdadeiramente importantes” são definidas,
como “atores [social/estruturalmente] privilegiados” agem para defini-las: o
prêmio Ig Nobel de certa forma trata dessa história tomando seu negativo, um
instantâneo do que seria desconsiderado (não por inconsistência, mas por
“falta de importância”) no conto da Ciência atual.
Em contraponto ao estabelecido no texto de Pestre, e a despeito de seu
caráter iconoclasta, o prêmio não faz qualquer crítica ao Método Científico
enquanto pilar incorruptível do edifício científico: as práticas ideais da ciência
são lá reiteradas como factíveis no mundo real. Percebemos também que o Ig
Nobel consagra antes de tudo aqueles que rompem com os ditames do que é
pertinente em ciência estabelecidos por seus grupos – premia os
“momentaneamente outsiders”, que ousam rir de si mesmos, fere a moral do
tradicional em Ciência. Sob a perspectiva de uma atividade científica
socialmente localizada, cujos resultados são alvo de crivo por parte de um
grupo, não seria correto afirmar que deve existir, diante da realidade do Ig
Nobel, um núcleo em todo departamento ou instituto de pesquisas que gera ou
reitera resultados lúdicos advindos das práticas científicas? Há de se
considerar que se a reprovação a temas inusitados fosse categórica e sumária,
seus proponentes, a menos que tivessem capital social e capital cultural
institucionalizado suficientes, seriam constrangidos a retirá-los.
60

Como última referência ao texto de Pestre, vamos propor uma pergunta


para ser guia de futuras considerações: se os tópicos de interesse da ciência
são validados (ou melhor, que são categorizados como “importantes”,
“necessários”) segundo diversos critérios (sociais, técnicos, políticos, etc.) por
grupos distintos, isso significa que o prêmio Ig Nobel criou um enclave de
valorização para produtos da ciência excluídos do rol das “descobertas
relevantes”?
Nesta etapa final da presente seção, surgem algumas questões que
deveríamos deixar encaminhadas, nem todas da área de História das Ciências,
mas diretamente vinculadas. Divulgação científica do Ig Nobel, “como, o porquê
e para quem?”. Diante do que foi escrito aqui, é de se pensar o prêmio em
alguma de suas facetas como uma forma de contestação da Ciência pós-
moderna voltada para resultados – seu trabalho de DC acontece per se, de
forma a levar tal visão (a de que uma pesquisa que pode ser instrutiva – e
divertida! – sem ser inacessível), mas resta muito a explorar e responder. Em
qual modelo de DC (difusionista, paradigmático, crítico ou dialético e o
culturalista, como pode ser visto em mais profundidade em Ramos (1994)) se
enquadra os artigos vencedores do prêmio? Essa questão é primária em todas
as monografias do nosso curso de Especialização em Divulgação Científica e
Popularização da Ciência, mas tenho dúvidas se possa dar uma resposta
simples a ela: a Perspectiva Crítica (vide Ramos (1994, p. 346)) parece
comportar todas as sutilezas presentes nos modos e porquês de divulgar
ciência que são adotados pelo prêmio. Deve-se salientar uma palavra-chave
que pode vir a alguns ao pensar nisso: “seduzir” – o Ig Nobel seduz mentes,
principalmente as que são joviais e têm um interesse, talvez ainda não
fossilizado, pela ciência –, a partir disso podemos tentar aprimorar nossa
resposta. Como localizar os esforços do Ig Nobel numa possível crise de
credibilidade da Ciência que assola a sociedade? Esta é nossa última questão,
a mais relevante para o quadro que almejamos pintar, a em que mais a História
das Ciências nos ajudará a achar uma resposta viável.
61

4 Teorias da Motivação
Motivação: “aquilo que move uma pessoa ou que a põe em ação ou a
faz mudar o curso” (BZUNECK, 2001, p. 9). Estudaremos brevemente as
teorias da motivação do aluno, para buscarmos entender os meios para se
atingir nosso fim, que é usarmos como ferramenta de ensino e motivação para
a aprendizagem artigos científicos laureados com o Prêmio Ig Nobel. No
período de atuação dos fatores motivacionais, recursos pessoais do estudante
(e.g., tempo) serão investidos na atividade-alvo: quem e como é decidido o
foco da aprendizagem? Conforme a concepção construtivista priorizada aqui, o
discente é o verdadeiro protagonista de sua aprendizagem e monopolizador de
certos processos cognitivos inalienáveis (vide Bzuneck (2001, p. 10)), mas é
sabidamente papel da comunidade escolar orientar ou favorecer certos
comportamentos através do fomento à determinadas vias de motivação.
O maior desafio enfrentado é, através de técnicas de motivação,
possibiliar ao estudante a escolha de um caminho, dentre muitos outros
possíveis, que leve-o a envolver-se ativamente no processo de aprendizagem e
a alcançar desempenho socialmente valorizado. Quando o estudante está o
que se convenciona chamar de desmotivado, ele aplica de maneira deficitária
ou deixa de aplicar seus recursos no processo de aprendizagem, optando por
fazer o mínimo necessário para a realização da tarefa, ou mesmo desistindo da
empreitada, conforme Bzuneck (2001, p. 12).
Quando pensamos em termos quantitativos ou de magnitude, revela-se
que, em situações ideais, deve-se priorizar a motivação por sua qualidade e
não intensidade: a motivação em níveis elevados pode resultar em fadiga e
queda no desempenho, como também em ansiedade, elemento que acarreta
até mesmo o adoecimento do organismo. Estudos demonstram que a eficácia
versus a motivação tem o perfil de um U invertido: “a performance será melhor
quando a motivação estiver num nível médio e decrescerá quando ela for mais
baixa ou mais alta” (Idem, p. 17).
O histórico de pesquisas em motivação do estudante é amplo, mas há
dois ramos que se destacam nas linhas de pesquisa contemporâneas: a
abordagem cognitivista (que foca seus esforços sobre elementos como
autovalorização, atribuições causais, crenças de auto-eficácia, desempenho
62

adquirido, e reflexão sobre objetivos), e a abordagem sobre metas de


realização (meta aprender e meta performance, adaptação do modelo
conhecido como expectativa-valor: “posso realizar essa tarefa?”, “por que devo
realizar essa tarefa?”) que leva em conta essa variáveis como recompensas
externas e motivação intrínseca do estudante, conforme nos diz Bzuneck
(2001, p. 21).
Ressalta-se que, embora a motivação deficitária possa se manifestar em
última instância na vivência do estudante, na verdade ela é resultado de um
diálogo intricado entre predicados do discente e fatores ambientais e de
contexto, que têm lugar esses últimos em geral na sala de aula. Reestruturar
as estratégias de docência nesse ambiente, com o objetivo de incitar à
motivação positiva os estudantes, pode dar resultados relevantes – contudo, é
plausível que haja demandas que só serão contempladas por programas mais
específicos, caso a caso (conforme Bzuneck (2001, p. 24)). Quando se pensa
na agência do docente, deve-se ter em mente que “a motivação do estudante
em sala de aula resulta de um conjunto de medidas educacionais, que são
certas estratégias de ensino ou eventos sobre os quais todo professor tem
amplo poder de decisão" (Idem, pg. 27), mas também que a tarefa de promover
a motivação é um esforço coletivo, que envolve e é de responsabilidade de
toda a comunidade escolar ou acadêmica.

4.1 Motivação Intrínseca e Extrínseca


Há de se estabelecer a diferença entre a motivação intrínseca e a
motivação extrínseca do estudante. A motivação intrínseca é associdada a um
afã individual, uma inclinação para lidar com algum tipo de tarefa desafiadora
pelo puro prazer de fazê-lo, pela satisfação que essa trás ao estudante – é uma
“propensão inata e natural dos seres humanos para envolver o interesse
individual e exercitar suas capacidades, buscando e alcançando desafios
ótimos” (GUIMARÃES, 2001, p. 37). O rendimento e empenho do discente,
chegando até mesmo a apresentar a intenção de transcender o escopo
primário do tema em pauta, parecem ser majorados quando envolvido em uma
atividade por razões intrínsecas, pois gerar-se-ia maior satisfação pessoal,
conforme Guimarães (2001).
Se a motivação intrínseca deriva de um impulso interno do estudante, a
63

motivação extrínseca é aquela disposição para o trabalho em classe que é


resultado de um incentivo externo à tarefa, não pela própria natureza dessa ou
a relação muito pessoal que mantém com os interesses pessoais do estudante:
trata-se da perspectiva de recompensas materiais, sociais, egoicas, a anuência
a comandos por parte de uma autoridade ou “pressões de outras pessoas ou
para demonstrar competências ou habilidades” (GUIMARÃES, 2001, p. 46). Se
tem designado a motivação extrínseca como heteronôma ou de controle
externo, e a motivação intrínseca como autônoma ou de autocontrole, contudo,
uma melhor compreensão da natureza da motivação é certamente atingida
quando pensa-se que o espectro motivacional se estende num continuum entre
um extremo e outro, e que comportamentos extrínsecamente motivados podem
ser internalizados pelo estudante ao longo do tempo, conforme Guimarães
(2001, p. 47). Contudo, tem-se demonstrado, desde a década de 1970, que
recompensas externas podem prejudicar a motivação intrínseca a longo prazo,
principalmente quando o prêmio não é relacionado ao nível de desempenho do
sujeito – as atitudes mais simples tomadas pelos docentes e que sejam
possivelmente mais proveitosas no sentido de maximizar a motivação, dando-
lhe caráter o mais aproximado do intrínseco, é “apresentar desafios, promover
curiosidade, diversificar planejamento de atividades, propor fantasia,
compartilhar decisões” (Idem, p. 55).
Existem diversas origens teóricas para o conceito atual de motivação
intrínseca. Podemos primeiramente avaliar o contructo da competência,
enquanto habilidade de um organismo lidar de maneira satisfatória com seu
ambiente: seres humanos baseiam suas interações com o meio através de sua
capacidade de aprender, não em aptidões inatas – a competência, no que se
refere à pessoa humana, não provêm majoritariamente de instintos mas de “um
aspecto motivacional que orientaria o organismo a tentativas de domínio”
(GUIMARÃES, 2001, p. 40) que seria intrínseco, no sentido de que o
sentimento de gratificação não seria separável da interação em si.
A teoria da autodeterminação é outra a definir de maneira consistente a
motivação intrínseca. Essa conjectura estabelece que existe um objetivo
natural a ser alcançado (o relacionamento eficaz e benfazejo entre o indivíduo
e o ambiente no qual está inserido) e que o comportamento das pessoas são,
via de regra, guiados por um grupo de necessidades psicológicas basais que
64

visam promover o estabelecimento desse objetivo, e, por conseguinte, a


promoção do bem estar e de um funcionamento biológico e psíquico pleno. Os
imperativos psicológicos inatos que seriam as determinantes da motivação
intrínseca seriam: “necessidade de competência (...), necessidade de
autonomia ou autodeterminação e a necessidade de pertencer ou de se sentir
parte de um contexto” (Idem, p. 40). Pode-se perceber que a volição própria é
um tópico determinante na propensão a assumir a realização de uma tarefa –
indivíduos são designados como tendo “locus de causalidade interno” se se
percebem, pela combinação de fatores pessoais e naturais associados, como
agentes da mudança almejada; caso se entendam externamente guiados, há
grande possibilidade da prevalência de sensações de carência e inabilidade, o
que promove um desempenho inferior e deterioração das habilidades de
interação ótima com o ambiente, dado em Guimarães (2001, p. 41). Outro
tópico importante a ser salientado aqui é que discentes que mantêm contato
interpessoal saudável e respeitoso, principalmente com figuras de autoridade
dentro do meio escolar como seus pais e professores, “aceitam de forma mais
positiva os fracassos acadêmicos, são mais autônomos, mais envolvidos com a
aprendizagem e sentem-se melhor a respeito de si mesmos” (Idem, p. 42).
Os autores ligados à teoria da avaliação cognitiva associam à motivação
intrínseca três proposições essenciais. A primeira determina que há incremento
na motivação intrínseca à medida que é valorizado o locus de causalidade
interno, sendo que influências externas (recompensas e sanções) contribuem
para prejudicar o desenvolvimento da mesma. A segunda discute a influência
da percepção do indivíduo da própria competência para levar a cabo com
sucesso uma ou um conjunto de atividades de aprendizagem específicas. A
terceira proposição discorre sobre os fatores interpessoal e intrapessoal nos
quais transcorre o evento, e que caracterizará seu significado para a motivação
(esses fatores são classificados em: eventos informativos, de feedback;
eventos controladores, pressão no sentido de adotar o comportamento-norma;
eventos amotivadores, que não permitem julgar eficiência individual ou relação
de causa-consequência). Nessa classe teórica é referenciado também o termo
“fluir” como um estado mental de intenso envolvimento com uma atividade,
associado à aprendizagem espontânea (aquela que pode ser considerada
como desvinculada de programáticas ou cobranças externas ao discente):
65

“nesse caso [no ‘fluir’], as pessoas apresentam-se tão absorvidas naquilo que
estão fazendo que nada mais parece ter importância, sentem-se
completamente satisfeitas e não desejariam fazer nada além daquela atividade”
(GUIMARÃES, 2001, p. 44).

4.2 Teoria de Metas de Realização


Deve-se pautar as características da moderna Teoria de Metas de
Realização: tem como basal o conceito de motivação à realização, cujo
princípio é a relação entre motivação e metas (como abordar tarefas de forma a
conseguir sucesso e desenvolver competências?). Essa teoria é
sociocognitivista: não considera somente elementos da cognição como também
leva em conta influências socioambientais na motivação do estudante,
conforme Bzuneck (2001, p. 59).
Existem duas metas principais no ambiente dessa teoria: meta aprender
e meta performance. Cada uma delas faz referência a um propósito específico
do estudante quando se volta à uma tarefa particular, e têm, portanto,
características associadas (“processos específicos, pensamentos, propósitos,
percepções, crenças, atribuições e conceitos”) que devem induzir resultados
esperados (“de natureza cognitiva, afetiva e comportamental”), conforme visto
em Bzuneck (2001, p. 60).
O estudante que assume a meta aprender apresenta certas disposições
mentais específicas: “entendem que sucesso nas realizações escolares
consiste na melhora em conhecimentos e habilidades, em progredir, dominar
sempre mais conteúdos, com inovação e criatividade” (BZUNECK, 2001, p. 61),
e percebem que resultados ótimos nos desafios são frutos do esforço, que é
eminentemente um fator interno e passível de controle pessoal. Cabe fazer um
paralelo entre a motivação intrínseca e a meta aprender: as práticas que são
adotadas nesta última contribuem, por sua própria natureza, para o
desenvolvimento da primeira, conforme Bzuneck (2001, p. 62).
A meta performance tem um perfil muito diferente do que já foi visto: o
estudante que opta por ela tende a adotar um conjunto de estratégias que vai
maximizar seus resultados em desafios e tarefas, ou seja, que vai “comprovar
que o mesmo é inteligente”. Deve-se compreender que aqui o compromisso
não é com a aprendizagem sólida, mas em minorar o esforço necessário para
66

se obter um resultado aceitável: “mostrar-se capaz ou pelo menos como não


incapaz é a grande preocupação do estudante caracterizado pela meta
performance” (BZUNECK, 2001, p. 63). Contudo, ter como certo que a meta
performance não contribui com o aprendizado mediante incentivos à motivação
é um erro: a relação entre esses fatores é complexa e vai além da simples
negação da meta aprender.
Pode-se afirmar que a meta performance tem dois componentes que,
propõe-se, sejam tratados como independentes: a busca pelo sucesso
(designado como de aproximação), e a evasão do fracasso (evitação). Na obra
em estudo é feita a seguinte síntese a partir de pesquisas citadas no texto:

Os resultados mais salientes desse conjunto de estudos mostraram


que a orientação à meta domínio (aprender) apareceu associada a
esforço, persistência, processamento de profundidade e até como
facilitadora da motivação intrínseca. Entretanto, não teve relação com
notas mais altas, em provas específicas que contemplassem o critério
de notas referenciadas à norma. A meta performance-aproximação
favoreceu o desempenho em termos de notas, a persistência e o
esforço, mas com tendência a processamento de superfície. Já a
meta performance-evitação apareceu relacionada com baixa
persistência, pouco esforço, tendência à ansiedade e foi prejudicial
tanto à motivação intrínseca como ao desempenho por notas
(BZUNECK, 2001, p. 66).

4.3 Autoeficácia
Um conceito a ser esmiuçado é o da crença da autoeficácia do
estudante, que é, grosso modo, uma expectativa mensurada, levando em conta
suas próprias capacidades como autopercebidas, de proceder aos esforços
exigidos para se atingir um nível de performance alvo, conforme vemos em
Bzuneck (2001, p. 117). Pode-se afirmar que a motivação do indivíduo é
afetada pelo seu julgamento de autoeficácia? “(...) as crenças de autoeficácia
influenciam nas escolhas de cursos de ação, no estabelecimento de metas, na
quantidade de esforço e na perseverança em busca de seus objetivos” (Idem,
p. 118) – pode-se depreender que existe um elo de determinação (que não age
isoladamente, contudo) entre a motivação (que poderia ser, neste caso,
entendida como o estímulo para operar e alocar recursos de alguma forma) e a
perspectiva, baseada em um julgamento de expectativas, de alcançar
maximamente certos resultados. O juízo da autoeficácia torna-se um mediador
entre as verdadeiras capacidades do discente e a sua performance: a
67

intervenção no sentido de ampliar aptidões e leque de conhecimentos dos


estudantes não surtirá efeito em termos de desempenho a menos que sua
crença de autoeficácia progrida, conforme Bzuneck (2001, p. 119).
Como atuar também sobre a crença da autoeficácia do estudante? Antes
é necessário averiguar as instâncias que moldam a origem dessas
expectativas, e depois agir de maneira a maximizar o impacto positivo das
mesmas sobre a motivação, ou evitar circunstâncias que minorem essa. São as
origens da crença da autoeficácia: a) as experiências de êxito (sucessos em
tarefas semelhantes reforçam a crença de sucessos futuros, enquanto
fracassos reiterados deprimem a autoeficácia); b) experiências vicárias (no
presente caso o estímulo positivo ou negativo à crença da autoeficácia nasce
da observação de como seus pares lidam e se saem com as tarefas, pois o
estudante tende a crer que não terá mais dificuldades que seus colegas); c)
persuasão verbal (trata-se da comunicação ao estudante, por uma figura de
poder e de sua credibilidade e com base em fatos plausíveis pelo entendimento
do estudante, que o mesmo possui a capacidade de superar determinado
desafio, concluir com sucesso certa tarefa); e d) indicadores fisiológicos (a
ansiedade, por exemplo, quando percebida pelo indivíduo, pode leva-lo à um
decréscimo na crença de autoeficácia) (conforme visto em Bzuneck (2001, p.
121 - 124)).

4.4 Do Ambiente Escolar e do Mundo Interior do Estudante

É relativamente recente a percepção que é também tarefa das


instituições de ensino (formadas essas por educadores e o complexo escolar
em seus variados níveis) promover estratégias cujo objetivo seja empreender a
socialização do discente no sentido de que os mesmos desenvolvam
“propósitos, metas, expectativas, crenças e emoções que resultem numa
motivação positiva para a aprendizagem” (GUIMARÃES, 2001, p. 79).
Podemos inferir que no ambiente de sala de aula as ações do professor são a
materialização dessas estratégias e elas vão sobremaneira ter impacto sobre
os aspectos variados da motivação do estudante, não sendo essa fruto de
treinamento (como o é uma habilidade ou conhecimento específicos
adquiridos), mas de uma socialização eficiente, conforme Guimarães (2001, p.
68

80).
A formação de táticas promotoras da meta aprender parte de quatro
pontos:

1) As metas de realização assumidas são antecedentes primários da


motivação;

2) O ambiente psicológico criado na sala de aula é determinante da


escolha dessas metas pelos alunos.

3) Algumas dimensões da sala de aula são associadas ao


desenvolvimento de metas.

4) É necessário transpor sistematicamente as proposições


estritamente teóricas para estratégias concretas de organização e
condução de atividades de ensino (GUIMARÃES, 2001, p. 80).

Há três necessidades centrais dos estudantes que são moduladas pela


forma de ensinar do professor, segundo Guimarães (2001, p. 86):
1) necessidade de se sentir parte do contexto de sala de aula e
aprendizagem;
2) necessidade de se sentir competente;
3) necessidade de autodeterminação.
A atuação do docente pode promove-las ao dispensar aos estudantes atenção
atenta, estimular o envolvimento com atividades desafiadoras (com atenção ao
respeito ao ritmo e tempo necessário de cada estudante), promover o feedback
necessário à regulação do empenho, conduta e mesmo do desempenho (aqui
os mecanismos de avaliação devem ter espaço não como crivo de seleção ou
ranqueamento, mas oportunidade de se descobrir novas táticas para a
superação de pontos fracos) e, sempre criando um ambiente de respeito e
confiança geral, habilitar os estudantes a participarem de decisões relevantes à
sua sala de aula e escola (pesquisas demonstram que “a cultura da escola
como um todo afeta as metas assumidas pelos estudantes”), cultivando a
responsabilidade e o espírito de grupo (entendido de uma maneira abrangente:
a formação de grupos estáticos e homogêneos dentro de uma sala de aula
tende a cristalizar as formas pelas quais os estudantes abordam tarefas –
dinamizar a constituição de grupos, promover a variação, é ferramenta para a
socialização eficiente e cria oportunidades de se tentar novas soluções), como
podemos ver em Guimarães (2001, p. 86 - 92).
Existem muitas abordagens acadêmicas sobre a inteligência humana,
69

como entidade e como possibilidade incremental, como organização e


adaptação, como desenvolvida a partir da experiência social, como
processamento de informação, podendo ser múltipla em seus escopos
(independentes e funcionando combinados) ou resultado de processos e
habilidades emocionais-sociais. O interesse aqui é o processo dinâmico entre a
inteligência e a motivação individuais: antes vista como possível limitante para
o rendimento, atualmente a inteligência é entendida como fator a ser
plenamente desenvolvido e maximizado através de oportunidades
educacionais com ênfase nos procedimentos psicológicos através do qual o
aprendizado acontece, e o desafio da comunidade escolar é promover uma
motivação nos discentes voltada à aprendizagem autorregulada.
Uma afirmação plausível é que a motivação do discente para a
realização da tarefa está diretamente correlacionada à sua expectativa de
fracasso na mesma: se o estudante espera um resultado negativo,
provavelmente vai se engajar em condutas evasivas, de escusas, ou como
normalmente ocorre, vai pretender adotar ritmos de estudo insustentáveis ou
cair na procrastinação, ambas atitudes que fatalmente reduzem o rendimento
de um esforço de estudos direcionado – são situações ansiógenas, para as
quais os estudantes em geral e muitas vezes (mesmo quando estamos nos
referindo a discentes da academia) não possuem nunca o preparo eficiente e
adequado (a ansiedade pode estar presente muito antes do início da tarefa,
pode permanecer depois que o teste termina, e possui efeito
comprovadamente debilitante durante a execução da situação de avaliação),
segundo Boruchovitch e Da Costa (2001, p. 140).
Mas como compreender o processo ansioso? A Teoria do
Processamento da Informação, fruto da psicologia cognitiva, apresenta uma
explicação aceitável da relação ansiedade e desempenho. Supõe-se que a
capacidade de processamento intelectual (operações sobre informação)
humana seja finita: a ansiedade age como um absorvedor de recursos,
deixando menos espaço de trabalho para a resolução do problema ou tarefa a
que o estudante está dedicado – em determinado momento, o esforço exigido
pela atividade somado ao espaço ocupado pela ansiedade (pensamentos
irrelevantes) igualarão a capacidade de processamento cognitivo da pessoa, o
que resultará na interferência na aprendizagem e, consequentemente, numa
70

redução de desempenho em tarefas e avaliações, conforme Boruchovitch e Da


Costa (2001, p. 141).
Deve-se estar atento, quando no papel de docente, aos gatilhos de
ansiedade conforme elencados na obra em estudo:

Entre os fatores que mais predispõe os alunos a sentir ansiedade, de


acordo com Sogunro (1998), encontram-se os seguintes: a) o
feedback negativo por parte do professor que interfere na atenção e
na retenção da informação; b) déficits de memória que, em geral, são
mais associados à idade e à capacidade de aprender, fazendo com
que adultos mais velhos julguem que vão fracassar, o que os torna
propensos a sentir mais ansiedade do que os mais jovens; c)
presença de um clima competitivo e hostil em sala de aula; d) formas
impróprias de se avaliar a aprendizagem dos alunos (testes de última
hora, aplicar prova imediatamente depois de uma tarefa de
aprendizagem); e) pressão de tempo para a realização das atividades
escolares ou de testes aumentam a preocupação e a quantidade de
erros; e f) preparação inadequada para provas devido a um tempo
insuficiente ou hábitos de estudo inadequados (BORUCHOVITCH e
DA COSTA, 2001, p. 143).

No âmbito da discussão em voga há a chamada Teoria da Atribuição de


Causalidade, na qual a crença (enquanto expectativa) individual do discente no
seu próprio fracasso ou sucesso numa determinada tarefa é relevante antes e
durante a sua execução e as atribuições causais posteriores a um evento
também estão, no nível psicológico e emocional do estudante, conectadas à
sua interpretação pessoal a partir das suas crenças a respeito do evento: “uma
causa pode ser interna ou externa ao sujeito (localização), controlável ou não
controlável (controlabilidade) e interpretada pelo sujeito como estável ou não
estável (estabilidade), esse esquema pode ser denominado “dimensões da
causalidade” (MARTINI e BORUCHOVITCH, 2001, p. 148), baseado nas
propriedades básicas de cada grupo causal, que se encontram citadas entre
parênteses . “Em síntese, interpretação feita por estudantes sobre as causas
do sucesso ou do fracasso escolar influencia sobremaneira a motivação para
aprendizagem, as expectativas de sucesso futuro, as emoções e a autoestima
dos mesmos” (Idem, p. 150): a teoria da atribuição de causalidade, pode-se
perceber, é uma ferramenta efetiva no processo de investigação de como o
discente vivencia o processo educacional e de como interpretações causais
sobre o passado podem interferir na motivação em atividades futuras, conforme
visto em Martin e Boruchovitch (2001, p. 159).
A motivação não pode ser entendida como um efeito exclusivo da
71

relação estudante-disciplina: todo o entorno (com especial atenção ao


ambiente escolar) precisa ser encarado como produtor de fatores que
influenciam a força motivacional e seu viés, conforme Sisto (2001, p. 168). O
desafio da presente pesquisa é estudar a pertinência e o alcance do uso de
artigos científicos agraciados pelo Ig Nobel, mas não só esse material base
como também a própria “filosofia” do prêmio, mediante uma tutoria bem
orientada e preparada, como elementos motivadores do aprendizado e de
construção de produtos e resultados interessantes e criativos.
72

5 Oficinas de Formação Inicial e Continuada


No presente capítulo, vamos abordar a temática da formação inicial e
continuada de professores, com ênfase na modalidade oficina. Primeiramente
vamos buscar definir do que se trata a formação docente em suas múltiplas
formas; em seguida, abordaremos a oficina como modelo privilegiado de
iniciativa de formação inicial e continuada de docentes. Vamos perpassar o
tópico “ensino colaborativo” como complementar à ideia de oficina que
construímos e, por fim, mencionaremos um estudo que trata das relações entre
universidades e museus, como a formação de parcerias entre ambos pode
trazer ganhos para todos os envolvidos, especialmente para os licenciandos da
área de educação.
Este capítulo apresenta conceitos que vão ser essenciais na construção
de nossa proposta de produto, a ser vista no próximo.

5.1 A Formação Continuada de Professores


É parecer amplamente aceito na literatura especializada, conforme visto
em Rossi e Hunger (2013), que a formação do professor não se encerra de
maneira alguma com a conclusão de sua graduação (a sua chamada formação
inicial, que muitas vezes é tida como incompleta ou insuficiente), mas sim é
algo permanente, nunca pronto e acabado, processual, um fazer histórico, e
que vai percorrer toda a vida profissional do docente. O professor trabalha
diretamente com o conhecimento, motor dos processos de inovação, mas esse
envelhece rápido e cada vez maior é a defasagem de saberes conforme o
tempo passa nesta nossa sociedade da informação e da tecnologia digital: a
formação continuada, conclui-se, tornou-se essencial para viabilizar o ofício da
docência.
A imagem do profissional da educação frente à sociedade é resultado de
um processo de mudanças quase que constante durante grande parte do
século XX: em seguida à profissionalização ampla do ensino, tomou lugar uma
sistemática precarização das condições de trabalho associadas a esse, além
da perda de status social e redução salarial da grande maioria dos professores
dos ciclos básico e médio – as autoras Rossi e Hunger (2013, p. 11) afirmam
que “a profissão professor transita entre a ambiguidade da profissionalização e
73

da proletarização”. Diante desse quadro, iniciativas de formação continuada


ganham também importância, pois vêm devolver a profissionalidade à
docência, além de servirem de laboratório para estudo de soluções para
problemas enfrentados no dia a dia das salas de aula, segundo Rossi e Hunger
(2013, p. 12). Contudo, problemas imediatamente se impõe: as iniciativas de
aprimoramento levam em conta as experiências e vivências muito particulares
dos docentes? E esses conseguem avaliar as diversas questões, expectativas
pessoais e profissionais, envolvidas na formação continuada e logram
transmitir esse ajuizamento às entidades formadoras?
A discussão sobre a formação inicial e continuada de professores, e as
relações mantidas entre elas, é temática de nível transnacional: especialistas
internacionais (sejam representantes da UNESCO ou até mesmo da OCDE)
têm divulgado análises que indicam que “o sistema educacional precisa passar
por uma reforma visando qualificar melhor as pessoas para enfrentar um
mundo mais competitivo, mais afinado com o mercado” (MAUÉS, 2003) apud
(ROSSI e HUNGER, 2013, p. 26). Podemos ter claro que iniciativas de
formação continuada são construções sociais e campos de disputa, onde agem
e influenciam interesses variados, sejam eles políticos, econômicos, de grupos
(tanto locais como globais), culturais etc., segundo Rossi e Hunger (2013, p.
26) – a noção simplista que podemos ter sobre elas deve ser abandonada
quando percebemos que está em jogo a forma que se dará à educação
naquele tempo e espaço, o que será valorizado e quais elementos serão
suprimidos das grades curriculares, onde pesam tendências políticas e
econômicas, projetos de governo e de país.
Devemos atentar para o caráter muitas vezes eminentemente comercial
de algumas ações voltadas ao público docente:

(...) na conjuntura atual a educação continuada é mais do que um


projeto de formação: é um projeto econômico. Os programas são
destinados a grandes massas de professores, delineando-se como
projeto de consumo. O Estado não tem condições de oferecer tal
formação a esse contingente, sendo preciso a intermediação e a
parceria para o seu planejamento e execução, que, nesse caso, se
faz geralmente com grandes empresas de caráter privado (ROSSI e
HUNGER, 2013, p. 30).

Mais uma vez citando Maués (2003), Rossi e Hunger (2013, p. 33) afirmam que
muitos dos processos de formação continuada são regidos pela lógica do
74

capital, desvalorizando a capacidade crítica e de pensar historicamente do


docente, procurando ao invés disso somente alinhá-lo às políticas educacionais
em voga: mais uma vez o mercado e as necessidades do mundo globalizado
se impõe. “Vivemos um momento em que a educação, em todos os seus
aspectos, é assumida como mercadoria” (ROSSI e HUNGER, 2013, p. 33), e
para se contrapor a esse quadro precisamos “(...) construir novos paradigmas
de formação docente concebendo o professor como sujeito histórico, imerso
nas transformações sociais, políticas, econômicas e culturais” (Idem, p. 37).
Sob a ótica da situação brasileira em particular, as iniciativas de
formação continuada de docentes foram majoradas com a promulgação da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a Lei nº 9394, de 20 de dezembro
de 1996. Após isso, por iniciativa do governo federal a Capes, Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, foi transformada na Nova
Capes, agora agência reguladora da formação de professores, tanto inicial
quanto continuada, estabelecendo inclusive parâmetros de ênfase, na
formação continuada de docentes em exercício, para o uso de recursos e
tecnologias de educação à distância, segundo observações de Rossi e Hunger
(2013, p. 45). É interessante observar que

Os programas de formação inicial e continuada devem preparar os


profissionais da educação, de acordo com o artigo 57, parágrafo 2º
[da Resolução CNE/CEB 4/2010, documento complementar ao
Parecer CNE/CEB 7/2010, que juntos formam as Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica], para:

a) além de um conjunto de habilidades cognitivas, saber pesquisar,


orientar, avaliar e elaborar propostas, isto é, interpretar e reconstruir o
conhecimento coletivamente;

b) trabalhar cooperativamente em equipe;

c) compreender, interpretar e aplicar a linguagem e os instrumentos


ao longo da evolução tecnológica, econômica e organizativa;

d) desenvolver competências para integração com a comunidade e


para relacionamento com as famílias (Idem, p. 46).

Em sua pesquisa citada, essas autoras fazem uma reflexão sumamente


importante no que se refere às exigências que essas novas diretivas e normas
impõe sobre o professor atuante: “capacidade para enfrentar as urgências do
presente e as demandas do futuro”. Para tanto, segundo elas, o docente deve
desenvolver um perfil profissional baseado no tripé pessoal-intelectual-
75

profissional:

No plano pessoal é esperado que os professores sejam receptivos à


diversidade e às inovações, sensíveis às dificuldades e necessidades
dos alunos e comprometidos com o seu êxito; no plano intelectual, os
professores devem portar uma sólida formação científica e cultural,
dominar a língua materna e as novas tecnologias; e, no plano
profissional, serem capazes de articular os conteúdos curriculares de
sua disciplina com outros conhecimentos, trabalhar em equipe e,
ainda, assumir a gestão de seu próprio desenvolvimento profissional.
Isto requer que os professores sejam capazes de aprender a
aprender, de saber fazer e refletir sobre o que fazem (ROSSI e
HUNGER, 2013, p. 48).

É importante ressaltarmos a última sentença: aprender a aprender é uma nova


habilidade que precisa ser cultivada no profissional já atuante no campo, diante
do fluxo ininterrupto de informação que domina a realidade em que está
imerso. E não somente isso, a capacidade de refletir criticamente sobre seu
fazer profissional é essencial para um projeto de educação emancipatório para
alunos e professores.
As autoras Rossi e Hunger (2013, p. 65), citando Chantraine-Demailly
(1992), enumeram os quatro modelos que a formação continuada de
professores pode assumir, conforme seus objetivos, conteúdos abordados e
métodos de formação aplicados (grifos nossos):

 a forma universitária, que tem como finalidade a transmissão do


saber e da teoria. Neste modelo, a relação simbólica formador-
formando é semelhante à relação das profissões liberais com seus
clientes, onde os mestres são os produtores do saber e os alunos
atuam como receptores dos conhecimentos.
 a forma escolar, onde os formadores ensinam saberes que são
definidos exteriormente num programa oficial. Os formadores,
assim como seus alunos, possuem um papel passivo em termos
de planejamento.
 a forma contratual, aquela em que ocorre a negociação entre os
diferentes parceiros (formando e formador, formando e
organização etc.) para o desenvolvimento de um determinado
programa de formação.
 a forma interativo-reflexiva caracterizada por estimular a
capacidade de resolução de problemas reais. As iniciativas de
formação se fazem a partir da ajuda mútua entre formandos, que
buscam a elaboração coletiva de saberes profissionais, apoiados
na ajuda externa (o formador).

Tendo em vista que a observação desses tipos é interessante para


identificarmos “os jogos políticos, culturais e profissionais que a formação
contínua revela” (ROSSI e HUNGER, 2013, p. 65), e não havendo, a priori,
julgamento de mérito possível de qual seria “o melhor” método de maneira
76

genérica (dado que se aplicam em situações diferentes e particulares),


devemos, para os fins deste trabalho, mantermos nossa atenção sobre a forma
interativo-reflexiva de iniciativas de formação continuada, para qual daremos
um exemplo prático no próximo capítulo. Em todo o caso, deve ser apontada
mais uma vez a necessidade de que os atores responsáveis pela elaboração
dos projetos de formação continuada proporcionem o devido espaço para que
os professores, alvos do método, ganhem o protagonismo de sua formação,
segundo Rossi e Hunger (2013, p. 80) – que sejam ouvidos e consultados
durante a concepção da iniciativa de capacitação (quais são suas
necessidades?), tenham liberdade para propor pautas e caminhos de
discussão durante no decorrer da ação de formação (qual experiência você
deseja trazer?) e, finalmente, que opinem sobre a efetividade do
empreendimento e o impacto desse sobre sua rotina de trabalho (como você
julga a pertinência da ação?).
Em Selles (2000, p. 168), a autora nos apresenta algumas outras razões
pelas quais a formação continuada é elemento necessário à boa qualidade da
vida profissional do docente: o recém-egresso da universidade, dadas as
características e limitações da formação inicial, dificilmente poderia ser
designado como um professor na acepção total do termo, pois lhe falta a
experiência pedagógica que só pode ser obtida com o tempo, enfrentando o
trabalho constante em sala de aula. Chega-se facilmente à conclusão que é
imprescindível ao docente dispor de um ambiente (as iniciativas de formação
continuada) onde possa atualizar seus saberes, constantemente tensionados
pelas inovações tecno sociais onipresentes, e que sirva de arena para
discussão e compreensão das práticas cotidianas de ensino.
Ademais, Selles (2000) nos traz o que chama de “dimensões de
desenvolvimento profissional”, a serem alvos prioritários das ações de
formação continuada de professores:
I – Dimensão Metodológica:
a. Atualização de Novas Ideias Educacionais: isso abrange desde
conteúdos específicos até as questões educacionais mais genéricas
e amplas, mas com especial atenção ao progresso do conhecimento
científico e suas inovações, sempre pensadas criticamente em suas
implicações econômico-político-sociais.
77

b. Uso de uma Linguagem de Comunicação Acessível ao Professor:


essa ressalva é especialmente inteligível quando percebemos que,
na maioria das iniciativas pedagógicas voltadas para professores em
atividade, esses lidarão com instrutores acadêmicos que podem
assumir um estilo de discurso que se tornou distante das práticas e
experiências em docência dos primeiros. Há a necessidade de se
buscar uma linguagem mediadora entre instrutor (ou tutor) e o
docente a que a ação é direcionada, sem comprometer tanto o
entendimento quanto o sentido, promovendo o crescimento
profissional e o exame constante de sua prática.
II – Dimensão Institucional:
a. Estabelecimento de Parcerias: Universidades (e outras Instituições
do Saber) e Escolas Participantes: os meandros burocráticos são um
desafio para a maioria dos envolvidos, mas devem ser vencidos com
“cautela, ousadia e profissionalismo” para se estabelecer ações de
formação continuadas duradouras e que evoluam adequadamente no
tempo.
b. Indicadores de Desenvolvimento Profissional: aqui há o convite para
se transcender certo menosprezo enfatuado, por parte dos
planejadores da ação, pelas reais demandas docentes. Se não
houver resposta efetiva às necessidades existentes, a iniciativa será
puramente decorativa e um insucesso, a despeito do nível de
investimento, de qualquer tipo, feito.
c. Retorno dos Professores ao Ambiente Acadêmico: os projetos de
formação continuada precisam, idealmente, instigar nos profissionais
da docência o desejo de retornar ao ambiente universitário (ou
equivalente) para o permanente prosseguimento de sua formação
catedrática. A participação em reuniões acadêmicas de alto nível
(e.g., congressos científicos) é outro fator que permite que o
professor revigore a prática de seu ofício, ao travar contato com
novas reflexões teóricas.
d. Participação dos Professores nos Espaços de Debate das Questões
Científico-Educacionais Atuais: A reflexão sobre a prática pedagógica
é uma ferramenta para a valorização da identidade profissional do
78

docente – a criação de espaços voltados para o debate de temas


relacionados ao exercício do professorado é “essencial para o
desenvolvimento de uma atitude reflexiva que propulsione o
crescimento profissional”, conforme Schön (1983) apud Selles (2000,
p. 178).
Segundo Selles (2000, p. 179), a formação continuada de professores é
pautada por duas necessidades essenciais: atualização e ampliação dos
saberes numa sociedade de constante evolução tecno científica, e espaço para
a discussão de questões educacionais (vivências práticas do exercício da
docência) – esses imperativos são complementados por “subsídios teórico-
metodológicos capazes de auxiliar a ação do professor na sala de aula e dentro
da escola, na execução de trabalhos com seus parceiros institucionais”. A esse
grupo de fatores designamos “base pedagógica do desenvolvimento
profissional docente”, sabendo que esse é um processo em permanente
construção e que demanda ações de curto ou mais longo prazo, durante toda a
vida de serviço do professor.
Ao refletir sobre o motivo pelo qual se faz necessária a formação
continuada de professores, Christov (1998, p. 9) apud De Souza e Gouvêa
(2006, p. 304) salienta que o saber e o fazer humanos são por si mesmos
práticas em constante mudança, tal como a realidade que nos envolve: a
educação continuada de docentes enquanto programa é necessária não só
para atualizarmos nossos conhecimentos, mas também para avaliarmos o que
muda nas práticas didáticas e, além disso, para impormos sentido e direção
adequadas a essas mudanças. Citando Gil-Pérez (2003), De Souza e Gouvêa
(2006, p. 304) listam três fatores que levariam os países com sistema
educacional mais desenvolvido a fazer investimentos mais pujantes em
programas de educação continuada do que na formação inicial:

1) muitos dos problemas que devem ser tratados não adquirem


sentido até que o professor se depare com eles em sua própria
prática;

2) as exigências de formação são tão grandes que tentar cobri-las no


período inicial conduziria ou a uma duração absurda, ou a um
tratamento absolutamente superficial;

3) uma formação docente realmente efetiva supõe a participação


continuada em equipes de trabalho e em tarefas de pesquisa/ação
que, é óbvio, não podem ser realizadas, com um mínimo de
79

profundidade, durante a formação inicial.

5.2 Oficinas: O que é? Como se faz?


Em De Souza (2004, p. 15), a autora estabelece como objetivo central
de toda iniciativa de formação continuada instigar a mudança no professor, a
fim de aproximar seu perfil de um ideal profissional, mas, sem considerar de
antemão as ideias sobre o fazer docente que esses artífices do saber
carregam, toda ação voltada para uma “progressão da aprendizagem
profissional” está fadada ao fracasso. O que espera, via de regra, um professor
ao se inscrever numa oficina pedagógica ou de ensino? Segundo a autora em
questão, subsídios para abordar em sala de aula conteúdos nos quais não se
sente seguro e sugestões de atividades que possam despertar o interesse do
aluno, especialmente para temáticas que tenham se mostrado especialmente
difíceis em abordagem ou compreensão. E o que espera um formador (aquele
que empreende e constrói a ação de formação)? Muitas das vezes, promover a
mudança nas concepções de ciência e do processo ensino-aprendizagem dos
participantes. Percebemos que pode haver uma incompatibilidade de
expectativas por parte de ambos os atores envolvidos na construção de uma
iniciativa de formação continuada como essa.
Severino (2000, p. 179 - 180) apud De Souza (2004, p. 63) nos traz uma
breve definição de oficina pedagógica:

Trata-se de reuniões mais restritas em termos de número de


expositores e de participantes, destinadas à apresentação de
trabalhos, de experiências, de pesquisas, propiciando oportunidade
de divulgação e debate. Elas podem ocorrer tanto no âmbito de
eventos mais amplos quanto como atividades autônomas. Têm um
caráter de uma realização participada, ou seja, com a preocupação
de levar os participantes a vivenciarem experiências, projetos,
programas etc.

Devemos nos concentrar na proposta que as mesmas sejam mais limitadas em


termos numéricos do que os cursos e minicursos, e que estejam centradas no
debate, na interação, articulando aspectos teóricos e práticos da construção do
conhecimento, muitas vezes voltadas para a produção de material didático ou
de metodologias mais atraentes para a abordagem de conteúdos específicos.
Para De Souza (2004, p. 67), as oficinas pedagógicas são “um importante
recurso tecnológico educacional que possui uma linguagem específica e que se
80

utiliza de estratégias próprias para a formação profissional dos professores”.


Em seu trabalho sobre o uso de oficinas como estratégias de ensino no
campo das ciências naturais, De Souza (2016) chega à conclusão que
atividades práticas em grupo, tais como as oficinas pedagógicas, constituem
estratégias eficazes se adotadas por professores, pois “promovem uma maior
interação entre professores, alunos, e os objetos de estudo” – decerto o autor
tem em mente ações pedagógicas a nível de sala de aula, mas isso não
invalida sua argumentação quanto à natureza em si de uma ação de promoção
do saber. Citando Pereira (2008), De Souza (2016, p. 15) assevera que
“atividades práticas devem ser capazes de desenvolver saberes e
competências nos alunos, de modo que os mesmos possam ser capazes de
compreender e dar sentido ao estudo das Ciências” – devemos prestar atenção
ao binômio “compreender” e “dar sentido”, essencial ao estudo de ciências
naturais, como é o caso da obra. Em outra etapa de seu estudo, De Souza
(2016, p. 7) nos faz pensar que parte das atribuições do ensino de ciências
naturais é formar discentes (e, por que não, docentes) que sejam habilitados
para “lidar com problemas de natureza cientifica e tecnológica, questionar
esses problemas e propor soluções baseadas em conhecimentos teórico-
práticos oriundos desse processo”: novamente percebemos a necessidade do
desenvolvimento de um saber crítico e, sobretudo, criativo.
Ao descrever do que se trata uma oficina pedagógica, De Souza (2016,
p. 2) cita Vieira e Volquind (2002, p. 11), ao reputar que a mesma é “um
sistema de ensino-aprendizagem que abre novas possibilidades quanto à troca
de relações, funções, papéis entre educadores e educandos”, sendo aqui
essencial perceber como, por suas próprias características, a oficina impões
relações mais dinâmicas que aquelas vistas nos cursos e minicursos
tradicionais. Ao citar Anastasiou e Alves (2004, p. 95), De Souza (2016, p. 2)
afirma que as principais ênfases da oficina pedagógica são a construção e
reconstrução do saber, de forma eminentemente horizontal em suas relações
humanas, onde toda a forma de incentivo ao conhecimento plural e coletivo é
válida: “pode-se lançar mão de músicas, textos, observações diretas, vídeos,
pesquisas de campo, experiências práticas, enfim vivenciar ideias,
sentimentos, experiências, num movimento de reconstrução individual e
coletiva”. Segundo Nascimento (2007) apud De Souza (2016, p. 3), “as oficinas
81

também são capazes de proporcionar aprendizagens mais completas, pois


valoriza a construção do conhecimento de forma participativa e questionadora,
baseada em situações do cotidiano do aluno” – novamente vemos o
componente horizontal da aprendizagem e seu caráter crítico e coletivo. Por
fim, citando Paviani e Fontana (2009), De Souza (2016, p. 3) nos traz a
seguinte assertiva:

Vale ressaltar, que a oficina pedagógica se diferencia do minicurso


enquanto estratégias, sendo que, o minicurso se caracteriza como
sendo uma atividade que quer um supervisionamento constante, e a
oficina não requer tal procedimento. Há vários modos de ministrar
uma oficina, porém, é necessário atentar-se ao planejamento da
tarefa ou atividade a ser realizada, pois assim como as demais
estratégias de ensino, a oficina deve ser uma atividade com um
objetivo bem definido, embora possua como característica um
planejamento mutável. Deve-se ressaltar que as oficinas pedagógicas
possuem como foco uma ação consciente, ou seja, sua principal
ferramenta é a atividade prática.

Que, além de estabelecer uma diferenciação entre oficina e minicurso, reafirma


a característica eminentemente prática da primeira. Em citação semelhante, o
autor caracteriza a oficina pedagógica como uma construção do conhecimento
pautada na ação, sem, contudo, esquecer sua natureza teórica: o pensar-agir é
fruto de uma coleção de fatores que impulsionam o indivíduo a executar a
tarefa-alvo proposta na oficina. Na mesma direção, citando Marcondes (2008),
De Souza (2016, p. 7) estabelece que “podemos então, dizer que uma oficina,
representa uma atividade prática onde se trabalha com resolução de problemas
que levam em consideração os conhecimentos teóricos e práticos dos alunos”,
novamente ressaltando um processo onde teoria e prática são levadas em
conta, em seu conjunto. Citando os Parâmetros Curriculares Nacionais
(Resolução CEB nº 3, de 26 de junho de 1998), o autor em pauta menciona
mais uma vez que as atividades práticas são concebidas como elemento de
importância para a compreensão efetiva dos conceitos científicos, uma vez que
tornam a aprendizagem mais efetiva ao estabelecerem uma relação mais
tangível entre o assunto e o objeto de estudo. É trazido por Fonseca (2013, p.
13), com o mesmo foco das contribuições já citadas, que as oficinas de ensino
têm como finalidade, habitualmente, “a promoção da investigação, ação e
reflexão, combinando sempre o trabalho individual com a socialização de
tarefas; garantindo a unidade entre teoria e prática; permanecendo sempre o
82

pensar, sentir e agir”. Complementarmente, De Souza (2016, p. 7) reafirma a


utilidade das oficinas pedagógicas como também ferramenta de formação
continuada de docentes em atividade (e não somente como “base para a
construção criativa e coletiva do conhecimento de alunos”), dado que “são
capazes de promover a articulação entre diferentes níveis de ensino e
diferentes níveis de saberes” e “por se tratar de uma atividade de curta duração
que a longo prazo age como meio de formação contínua”.
É de se pensar os motivos que levariam ao docente optar por uma
modalidade de iniciativa de formação continuada como a oficina, que por sua
própria natureza tende a ser menor em termos de tempo e número de
encontros que os cursos ou minicursos, e por vezes tem o ambiente online
como seu próprio. Citando De Souza e Gouvêa (2006, p. 305), podemos inferir
que não é raro que o professor não tenha disponibilidade de tempo ou de
recursos para frequentar um curso de longa duração. As autoras identificaram,
em seu estudo aqui citado, pelo menos dois fatores que tendem a inviabilizar a
participação dos profissionais em ações de formação continuada mais longas:
os salários baixos (que é fruto de um processo diacrônico de desvalorização da
educação enquanto profissão), e a acumulação de funções (especialmente no
caso feminino, professoras que não raro, além do emprego formal, “acumulam
a maior parte das tarefas domésticas, dos cuidados com a casa à saúde e
educação dos filhos”).
A reflexão presente em Da Silva e Ferraz (2012, p. 2) sobre oficinas
pedagógicas as caracterizam como propostas objetivas e curtas e que juntam
teoria e prática num só espaço, o que, segundo os autores faz da
aprendizagem um processo mais agradável para os participantes. Os autores
ressaltam que trazer a prática para o ambiente de ensino não é uma iniciativa
necessariamente nova, mas que sempre dependeu muito da tendência
pedagógica adotada (quando essa é tradicional, a experimentação consiste na
repetição de um experimento; quando ela é um processo investigativo, há a
problematização da prática) – atualmente, a perspectiva didática é o ensino por
investigação, onde a atividade prática “é coordenada por alguém que tenha
uma compreensão maior do processo abordado no ensino, trazendo para o
concreto alguns elementos da teoria” (DA SILVA e FERRAZ, 2012, p. 4). O
procedimento de problematização trazido pelo ensino por investigação é um
83

elemento de desenvolvimento do aluno (que pode ser, por que não, o professor
participante da ação de capacitação na forma de oficina) que induz a um
posicionamento inquisitivo, questionador e ativo diante dos problemas com os
quais vai se deparar e para os quais ainda não possui uma resolução pronta ou
sequer base de conhecimentos adequadamente constituída, segundo Da Silva
e Ferraz (2012, p. 5). Especificamente sobre as oficinas pedagógicas, os
autores asseveram que as mesmas são ambientes voltados para a formação e
a reflexão, que dão viabilidade a uma verdadeira troca de saberes, e prezam
pela construção coletiva de experiências, buscando “proporcionar vivências de
ensino-aprendizagem em que todos os seus participantes interagem na busca
do saber para viver e aprender” (DA SILVA e FERRAZ, 2012, p. 6) – e aqui
percebemos que essa modalidade tende a deixar um legado pessoal no
participante, um método de aprender a aprender.
Em Paviani e Fontana (2009, p. 77), as autoras reafirmam a importância
e o caráter único das oficinas pedagógicas como recurso de articulação entre
teoria e prática – ao longo dos estudos apresentados no trabalho citado, chega-
se à conclusão que as mesmas são “técnica bastante eficaz na formação
continuada de professores”. Em seu texto, as autoras declaram:

A articulação entre teoria e prática é sempre um desafio, não apenas


na área da educação. Entre pensar e fazer algo há uma grande
distância que, no entanto, pode ser vencida. Um dos caminhos
possíveis para a superação dessa situação é a construção de
estratégias de integração entre pressupostos teóricos e práticas, o
que, fundamentalmente, caracteriza as oficinas pedagógicas
(PAVIANI e FONTANA, 2009, p. 78).

No mesmo artigo, as autoras trazem mais uma vez que uma oficina pedagógica
é espaço de construção do conhecimento que é pautado pela ação, sem,
contudo, negligenciar-se a teoria:

Uma oficina é, pois, uma oportunidade de vivenciar situações


concretas e significativas, baseada no tripé sentir–pensar–agir, com
objetivos pedagógicos. Nesse sentido, a metodologia da oficina muda
o foco tradicional da aprendizagem (cognição), passando a incorporar
a ação e a reflexão. Em outras palavras, numa oficina ocorrem
apropriação, construção e produção de conhecimentos teóricos e
práticos, de forma ativa e reflexiva (Idem Ibidem).

Logo em seguida, são listadas as duas finalidades essenciais de uma oficina


pedagógica: articular teoria (conceitos, pressupostos e noções) com a prática
(ação concreta); edificação de saberes com ênfase essencial no esforço grupal,
84

coletivo. No ver das autoras, a ênfase dessa modalidade de iniciativa de


formação continuada não está no coordenador ou tutor, em seus
conhecimentos e saberes, mas sim na necessidade de saber dos participantes,
cuja viabilização da satisfação é a meta da oficina – é, portanto, uma
abordagem pautada no aprendiz e na aprendizagem: “a construção de saberes
e as ações relacionadas decorrem, principalmente, do conhecimento prévio,
das habilidades, dos interesses, das necessidades, dos valores e julgamentos
dos participantes” (PAVIANI e FONTANA, 2009, p. 79). Daí concluímos que a
oficina pedagógica não pode ser, por sua própria natureza, semelhante a
outras iniciativas como o curso ou minicurso, cuja pauta pode se repetir ao
longo dos anos relativamente sem mudança: cada realização de uma oficina é
única, dado que as características de seus participantes (seja idade, formação
inicial, experiências pessoais que carregam, experiências profissionais que já
experimentaram etc.) são determinantes para o processo e o resultado final.
É oportuno listarmos os oito princípios pedagógicos que norteiam uma
oficina de ensino, conforme apresentados em Fonseca (2013, p. 14), citando
Barros e Búrigo (2005):

1) aprender fazendo: a oficina avança de um falar repetitivo para um


fazer produtivo; aprender vendo é mais significativo do que aprender
por comunicação de ideias: se aprende fazendo;

2) metodologia participativa: aprende-se participando e não


teoricamente, desenvolvendo atitudes e comportamentos
participativos;

3) pedagogia da pergunta: desenvolver a capacidade de reflexão é ter


condições de apropriar-se do saber e de buscar respostas sem
certezas absolutas, permitindo assim o desenvolvimento de uma
atitude científica;

4) trabalho interdisciplinar: atuar onde muitas áreas do conhecimento


se articulam sob diferentes perspectivas;

5) buscar uma tarefa comum: envolve todos os componentes do


grupo, de forma que um depende do outro; educadores e educandos
construindo o conhecimento juntos;

6) caráter globalizante e integrador: superação da dissociação entre


corpo e mente-espírito; buscando o desenvolvimento do ser humano,
sendo ele, ação, cognição e afeto;

7) implica e exige trabalho grupal: procurar promover a busca de


resposta aos problemas, ricas de conteúdo e vivências;

8) integração da docência, da investigação e da prática em um só


85

processo: projeto de trabalho, com teoria guiando e orientando a


prática, de forma reflexiva. Cada participante assume o papel da
aprendizagem para mudar.

5.3 Ensino Colaborativo


Conforme a definição presente em Barbosa e Concordido (2009, p. 73),
o Ensino Colaborativo pode é o termo que designa uma prática ou abordagem
educacional onde é valorizado o esforço intelectivo quando estudantes, ou
estudantes e professores, trabalham em conjunto – em grupos de dois ou mais,
os envolvidos buscam atingir um determinado grau de entendimento a respeito
de dado assunto ou tema, solucionando problemas propostos ou que surgem
em seu desbravamento, ou ainda idealizando ou mesmo construindo produtos.
Embora não exista uma fórmula fechada para o ensino ou aprendizagem
colaborativos, a maior parte do que será assim designado envolve a exploração
do material de base ou resultante do curso ou oficina não apenas nestes, não
restritos à aula ministrada pelo docente ou tutor. Esses autores, citando
Amonachvili (1989), decidem “(...) englobar em Ensino Colaborativo todas as
iniciativas na direção de uma prática mais democrática e humanizada (...),
envolvendo o desenvolvimento de habilidades sociais através do trabalho em
grupo”.
Os autores Barbosa e Concordido (2009, p. 73) afirmam, trazendo uma
citação de Johnson e Johnson (2003), que o ensino colaborativo (entendido
como o apelo didático a pequenos grupos, fazendo com que os discentes
trabalhem juntos de forma a otimizar a possibilidade de aprendizado de todos e
de cada integrante) comparado ao tradicional (designado usualmente como
“competitivo”), tende a fomentar entre os alunos um mais alto nível de
motivação para proceder ao trabalho, dado que usualmente estabelece entre
eles um clima mais interessante, divertido e aprazível, ao passo que as
realimentações positivas entre os membros do grupo constrange-os a perseguir
as metas estabelecidas – trata-se de se explorar as características da
interdependência social como fator modulador da interação individual, como a
primeira pode afetar os resultados da última.
Ao descrever a relação entre professores e alunos no ensino
colaborativo, Barbosa e Concordido (2009, p. 74) estabelece que os primeiros,
de maneira geral, abandonam a figura de especialistas doadores de saberes,
86

para assumirem o manto de “projetistas de experiências intelectuais para


estudantes”, que se aproxima do papel de um facilitador em um procedimento
de aprendizagem mais avançado. Numa turma colaborativa, a aula expositiva
não vai, via de regra, ser suprimida, mas sim conviverá com modalidades de
ensino outras, baseadas no debate e no trabalho ativo sobre o material das
aulas. Ademais, o aprimoramento das habilidades interpessoais dos discentes
está na ordem do dia: certas tarefas são designadas com objetivos tanto
acadêmicos como de melhorar aptidões sociais – a fim de capacitar os alunos
a praticar as diferentes habilidades do trabalho coletivo, pode-se, por exemplo,
atribuir a cada elemento da equipe um papel específico, para promover uma
interdependência positiva entre os participantes. Devemos reafirmar que a
aprendizagem cooperativa visa alçar a troca de informações entre os membros
dentro de cada pequeno grupo à categoria de meio de aprendizagem, “(...) em
que o estudante é responsável por sua própria aprendizagem e motivado a
participar da aprendizagem dos outros, o que aumenta o interesse e o
compromisso entre os membros do grupo” (TORRES, 2002) apud (BARBOSA
e CONCORDIDO, 2009, p. 74). O caráter metacognitivo dessa modalidade de
ensino-aprendizagem também é de relevância: os estudantes podem refletir
sobre seus próprios mecanismos de aprendizado – pensar sobre o
conhecimento construído, mas também aprender a como aprender.
Os autores Barbosa e Concordido (2009, p. 74-75) discutem a relação e
as diferenças entre cooperação e colaboração como estratégias de ensino.
Elencando diversas fontes, os pesquisadores em pauta afirmam ser o processo
de colaboração o mais complexo, dado que tem por característica essencial o
trabalho em equipe que, além de prever a cooperação entre os estudantes
membros de um mesmo grupo, estabelece a realização de um produto como
resultado final do esforço de aprendizagem. Há ainda um elemento de distinção
essencial que se refere às posições hierárquicas dentro de um grupo: no
ensino colaborativo o trabalho usualmente é feito em conjunto sem distinções
de posição, todos contribuindo para que se alcance o fim almejado com suas
próprias e singulares habilidades, tendo liberdade para porem em discussão
seus pontos de vista; no esquema cooperativo a atribuições de papéis é usual,
sendo que cada um permanece como responsável por uma parte da tarefa.
Vejamos que “ao contrário da cooperação, a colaboração é uma atividade
87

coordenada, sincronizada, resultado de um esforço continuado de construir e


manter uma concepção compartilhada de um problema” (BARBOSA e
CONCORDIDO, 2009, p. 75). Contudo, ambos os termos têm elementos afins
quando aplicados a processos de ensino: rejeitam o autoritarismo que é usual
na sala de aula competitiva, dominada pela figura de um docente doador de
saberes, na medida em que o processo pedagógico se dá com a participação
ativa dos diversos atores interessados, de forma solidária, e em que a
socialização tem lugar pela e na aprendizagem.
Os autores Costa, Barbosa e Castro del Rio (2018, p. 107-110)
dissertam sobre o ensino colaborativo como praticado no Brasil hoje. Apontam
que um fator vantajoso ensejado pela prática colaborativa é a formação de um
ambiente que estimula a chamada autonomia cognitiva, ou seja, a capacidade
do discente de reunir recursos com o objetivo de resolver um problema,
independentemente de informações trazidas por um agente externo. Mesmo
que a aprendizagem colaborativa tenha por cerne “proporcionar o
desenvolvimento cognitivo por meio do intercâmbio de experiências entre os
indivíduos envolvidos [que são, na maior parte das vezes, elementos
profundamente heterogêneos] em um dado processo”, envolvendo,
necessariamente, uma construção coletiva de saberes (onde a já citada
heterogeneidade assume muitas vezes o papel de instigador do debate), ela
proporciona ao aluno o instrumental para confrontar os diversos
posicionamentos dados por seus iguais frente a um desafio, fazendo com que
ele desenvolva e aprimore as habilidades necessárias para se posicionar e ser
ouvido diante de seu grupo de trabalho: os discentes vão aprender a trabalhar
em grupo, sem contudo dispor das habilidades individuais oriundas desse
processo de interação e convivência – enquanto o ensino colaborativo ajuda no
aperfeiçoamento da comunicação entre alunos e entre alunos e professores,
cria-se um ambiente socialmente instigante que viabiliza discussões sobre os
temas trazidos pelo mediador e que vai possibilitar a construção de saberes; os
alunos que se envolvem nesse padrão de ensino apresentam ganhos em
habilidades sociais, para além dos ganhos em habilidades intelectuais, que vão
acompanha-los ao longo da sua vida dentro e fora da escola, também como
cidadão agente na sociedade.
Como é visto o papel do professor, tutor ou mediador no ensino
88

colaborativo segundo Costa, Barbosa e Castro del Rio (2018, p. 110)? O


docente deve se despir da aura de única fonte possível de conhecimento
dentro dos limites da sala de aula e passar a ser o guia de um processo
coletivo de construção de conhecimento. Atividades corriqueiras passam a ser
produzir interferências de quando em quando em cada grupo para estimular a
troca e o debate, promover a ordenação e o direcionamento da discussão,
avaliar as interações e, individualmente, verificar o desenvolvimento diante do
conteúdo proposto. Outro elemento que cabe ao papel do professor numa
iniciativa de aprendizagem colaborativa é cuidar para que a linha de raciocínio
proposta no início da aula se feche ao seu final, senão tudo não passará de
“uma reunião desordenada de ideias”, e não uma prática pedagógica
colaborativa: então é admissível que o mentor tenha certa autoridade de
coordenação sobre os grupos, de forma a concluir as discussões observando o
devido rigor científico que, por suposto, ele conhece com propriedade.
Uma suscinta enumeração de passos para uma dinâmica de ensino
colaborativo é apresentada na obra dos autores em pauta, que replicamos
aqui, enumerando os tópicos:

1. A fim de que tenhamos um controle adequado das atividades


programadas, devemos dividir a turma em grupos de 3 a 5 alunos,
buscando o maior grau de heterogeneidade possível. Isto significa
mesclar alunos com características distintas no que diz respeito ao
desempenho escolar e às suas vivências, possibilitando a
construção de um ambiente mais rico em termos de trocas de
experiências e de aprimoramento de seus conhecimentos.
2. A aula deve se iniciar com uma rápida exposição do assunto pelo
professor, respeitando o planejamento já elaborado, em termos
dos pré-requisitos e dos objetivos a serem alcançados e, em
seguida, as atividades devem ser propostas aos grupos. Os
grupos, por sua vez, devem realizá-las, de forma interativa, em
que as dúvidas são sanadas pelos próprios colegas no grupo e,
em caso de necessidade pelo professor. É possível também que,
alcançado um determinado grau de maturidade, as discussões
possam ser estendidas entre os grupos. Assim, as soluções dos
exercícios propostos e das várias situações-problema colocadas
surgem de forma coletiva.
3. No final da aula, o professor deve fazer o fechamento da atividade
desenvolvida, podendo envolver a correção de exercícios
pendentes, reforço de pontos ainda não suficientemente bem
entendidos e observações complementares (COSTA, BARBOSA e
CASTRO DEL RIO, 2018, p. 111).
89

5.4 Parcerias entre Museus e Instituições de Ensino Superior na


Formação de Professores
Já foi falado aqui sobre as iniciativas de formação continuada ter grande
penetração de instituições de ensino particulares, e um dos motivos pelos quais
os docentes muitas vezes deixam de participar de cursos e oficinas
pedagógicas é a necessidade de investimento incompatível com sua renda
média. Quando se fala sobre formação de professores gratuita, tendemos a
pensar imediatamente em universidades e instituições de ensino superior
análogas. Mas e sobre museus? Eles teriam transcendido a sua natureza de
locus da educação não formal e poderiam apresentar parcerias com
instituições formadoras de professores, formando professores segundo suas
expertises? Em sua recente obra, a doutora Carla Mahomed Gomes Falcão
Silva (2020, p. 20-24) julga que pode ser afirmado que, nos últimos anos,
existem museus de ciência e tecnologia que mantiveram estreitos laços com a
universidade através da criação em parceria de iniciativas de formação inicial e
continuada de professores, trazendo ao licenciando a experiência de espaços
de educação não formal. Contudo, ao se consultar o Caderno da Política
Nacional de Educação Museal (PNEM), embora seja mencionado que a
formação de professores pode ser uma das ações educativas em museus (vide
Eixo II, “Profissionais, formação e pesquisa”), percebe-se que o tema formação
inicial e continuada de docentes não é devidamente contemplado ou tido como
estratégico. Na opinião da autora, esse fato revela o pouco interesse formal
dos órgãos de gestão de museus numa área de relevância já comprovada por
pesquisas acadêmicas.
Antes de retornar à nossa temática principal desta seção, precisamos
abordar o tópico “parcerias” quando no âmbito educacional: conforme Silva
(2020, p. 33), podemos definir parceria enquanto um acordo, visando alcançar
objetivos comuns, entre pessoas ou grupos que compartilham a dinâmica de
trabalho necessária para esse fim – colaboração e planejamento são as
palavras chaves associadas a esse tema. Conforme a pesquisa da autora,
revela-se essencial que as Instituições de Ensino Superior (IES) percebam a
necessidade e efetivem relações de parceria para o cumprimento de sua
missão social, especialmente com museus de ciência e tecnologia cuja
90

contribuição para a formação inicial e continuada de profissionais e professores


pode ser de monta. Ao firmar esse tipo de parcerias e incluírem em suas
grades curriculares disciplinas de formação docente nas áreas de ciências da
natureza, pedagogia e educação não formal, as IES formalizam a pertinência
do papel exercido por museus de ciência e tecnologia na formação de
professores. E quais são as vantagens mútuas que podemos elencar como
resultado das parcerias museu-universidade? A audiência dos museus torna-se
mais diversificada e tende a se ampliar (passam a ter contato com essas
instituições não somente os formandos, mas membros de seu círculo familiar e
de amizades); a universidade passa a prover uma formação mais aprimorada,
pois se tem a apropriação pedagógica do espaço (tanto físico, de acervo e
como lugar de atuação sobre a educação não formal) dos museus e dos
saberes construídos na experiência de seus representantes.
Sobre o MAST, já nos preparando para o próximo capítulo, tem a nos
dizer:

O Museu de Astronomia e Ciências Afins (RJ), por exemplo, tem


promovido e aperfeiçoado ações conjuntas com a universidade,
pondo em prática atividades, cursos e eventos voltados para a
formação de professores. Nessa perspectiva, distingue-se o I
Encontro Internacional de Formação de Professores e Educação Não
Formal, organizado pelo no Rio de janeiro a junho de 2012, que
contou com a apresentação de cerca de 180 trabalhos sobre
iniciativas e pesquisas referentes ao tema no Brasil. Além disso, entre
as três mesas-redondas, destaca-se a intitulada “Parcerias entre as
universidades, museus e escolas na área de formação de professores
e o papel dos órgãos de fomento”, ministrada pelas pesquisadoras
Guaracira Gouvêa (Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro – UNIRIO/RJ e Núcleo de Tecnologia Educacional para a
Saúde – Nutes/UFRJ – RJ) e Martha Marandino (Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo – (FEUSP/SP) (SILVA,
2020, p. 46).

Esse caráter de formador de professores, e as parcerias museu-universidade e


museu-escola do MAST, embora louvável e consolidado, não é inédito no
Brasil: muitos museus de ciência e tecnologia têm se dedicado ao estudo de
parcerias voltadas à formação inicial e continuada de docentes. Mas, para a
efetividade dos resultados das parcerias, as mesmas precisam ser uma
constante que abrange mesmo os primeiros anos de graduação, possibilitando
que os discentes tenham contato com o saber construído na prática pelos
mediadores e representantes de museus. A autora em tela nos traz que:
91

Com respeito aos aspectos dos processos de ensino e


aprendizagem, foco de todo professor, alguns possíveis efeitos da
institucionalização da parceria são: a apropriação pedagógica pelos
licenciandos do espaço museal e dos seus recursos para o ensino de
ciências; e o entendimento do contexto do museu como detentor de
potencial para afetar positivamente o processo de ensino na sala de
aula, por apresentar o conhecimento científico em roupagem diferente
da utilizada pela escola, frequentemente limitada a uma forma
tradicional de ensino. Além disso, a experiência de estagiar em um
museu de C & T pode abrir possibilidades de atuação profissional
para o futuro professor (SILVA, 2020, p. 51).

Aponta ainda que a institucionalização de parcerias é fundamental para um


trabalho continuado de formação a partir do museu, senão as iniciativas
tendem a se resumir a esforços pontuais e sem continuidade temporal,
dependentes de relações pessoais eminentemente contingentes. Um
subproduto de uma iniciativa de formação inicial e continuada que abranja
desde os primeiros anos da graduação (como também atividades extraclasse,
iniciações científicas, estágios etc.) é a formação de docentes que estarão
capacitados para usar devidamente os recursos do museu com seus alunos,
“que por sua vez se apropriam desses espaços como prática cultural e
estimulam as famílias [a fazer o mesmo]” (SILVA, 2020, p. 51).
Ao elencar as relações estabelecidas entre IES e museus, a autora volta
a nos falar sobre o MAST e o papel de vanguarda que desempenha:

Não foi identificada nenhuma parceria com IESs visando à formação


inicial de professores. No entanto, o MAST promove diversas
atividades de formação continuada de professores na área de
Astronomia: oficinas, atividades educativas, assessoria ao professor
nas visitas, capacitação de professores; palestras; mesas redondas;
sessões de planetário; encontros de apresentação da proposta
metodológica do MAST; eventos científicos; etc. (SILVA, 2020, p.
108).

Em 2008, por exemplo, o Museu de Astronomia e Ciências Afins executou


capacitação docente equivalente a “80 oficinas com duração média de 2,41
horas, envolvendo 2.870 professores em serviço ou em formação” (SILVA,
2020, p. 108) – essa instituição, segundo a autora, apresenta resultados
expressivos tanto em iniciativas de formação continuada de professores como
de formação inicial.
92

6 Proposta de Produto: Oficina


No presente capítulo vamos construir uma proposta de oficina de
formação inicial e continuada de professores baseada em artigos da área de
Física laureados pelo prêmio Ig Nobel. Ela foi inicialmente pensada para ser
ministrada em parceria com o Museu de Astronomia e Ciências Afins – MAST,
contudo, devido à pandemia de COVID-19 e às restrições impostas pela
realidade à escrita e produção deste trabalho de conclusão de curso, não foi
possível promover uma primeira edição sua antes do final da submissão desta
monografia. Fica aqui um plano de ação, baseado no que foi visto até o
momento, para que seja usado oportunamente, ou mesmo adaptado às
idiossincrasias dos profissionais e das instituições que tomem para si a tarefa
de implementá-lo.
A ideia inicial da proposta de oficina, intitulada provisoriamente como
“Método Científico através do Ig Nobel” era conjugar, num ambiente EAD, entre
16 e 20 professores em formação ou já docentes, além de um orientador
experimentado e um monitor que levaria a cabo tarefas extras com os
participantes, como rodadas de perguntas para dirimir quaisquer dúvidas. Os
partícipes seriam divididos em grupos de quatro ou cinco pessoas – cada grupo
seria uma unidade de trabalho – e cada um dos grupos receberia um artigo
premiado com o Ig Nobel para analisar durante o período da oficina. O estudo
desse artigo (que poderia ser o original em inglês ou uma versão traduzida
pelos organizadores, dependendo dos perfis de participantes que seriam
atendidos) visa transformar seu conteúdo e sua mensagem em um ou mais
textos de divulgação científica a serem usados preferencialmente como
ferramenta de estudo do método científico em turmas do Ensino Médio, ou
mesmo para universitários em seus primeiros semestres da graduação.
A estrutura da oficina seria baseada em aulas gravadas e encontros
online alternados, após um primeiro encontro online onde se apresentaria o
curso e se definiriam os grupos, além de determinar a distribuição dos artigos.
Cada aula gravada poderia ser proferida por um profissional com expertise em
Divulgação Científica, Física e Ciências ou Educação, e o encontro online
seguinte poderia ser uma discussão acerca dessa aula, comentários sobre os
tópicos em estudo e um espaço para se compartilhar o andamento de cada
93

projeto. Os últimos dois encontros seriam para apresentação do artigo original


aos colegas e dos textos resultantes de seu processamento tendo por base o
conteúdo apresentado no curso, e avaliação por pares do material produzido –
nesta última aula, além de apresentarem críticas construtivas sobre os
trabalhos de seus colegas, reservar-se-ia alguns minutos para uma avaliação
do curso como um todo (objetivo, aulas, encontros, metas alcançadas etc.).
No que segue, faremos uma sucinta recapitulação de alguns tópicos já
abordados ou essenciais para se compreender mais profundamente os
objetivos e forma de conduzir a oficina, e depois vamos descrever em
pormenor e em primeira aproximação os assuntos que julgamos serem
adequados para cada aula gravada, além de especificarmos qualquer detalhe
de maneira mais detida.

6.1 Uso de Artigos Acadêmicos na Alfabetização Científica


Constantemente somos chamados a opinar, discutir e avaliar, enquanto
cidadãos, sobre temas e assuntos cruciais e que vão influenciar, muitas vezes
determinar, nosso destino como sociedade – muitos desses tópicos têm a ver
com ciência e tecnologia e, para que todos sejam capazes, antes de qualquer
coisa, de entender as matérias sob discussão, um programa de alfabetização
científica deve ter tido espaço na vida dessas pessoas: “todos devem ser
capazes de participar de tais discussões além de merecer compartilhar a
emoção e a realização pessoal de poder compreender o mundo natural”
(GHENO e DA SILVA, 2007, p. 1) – as mesmas autoras salientam que a
alfabetização científica torna possível um futuro melhor para a população que
tem contato com ela.
A alfabetização científica não é meramente expor uma coleção de
terminologias, mas enriquecê-las com conteúdo e torna-lo acessíveis à
população, com especial atenção os estudantes que estão na fase de aprender
a solucionar problemas concretas e a responder às necessidades da sociedade
a partir de competências e conhecimentos aos quais deveriam estar expostos,
segundo Gheno e Da Silva (2007, p. 2). Os estudantes que tiveram contato
durante sua educação com conhecimentos científicos e maneiras de aplica-los
vão, quando no momento de exercer suas funções como cidadãos, estar
preparados para tomar decisões sobre temas tecno-científicos, muitos dos
94

quais podem representar potencial perigo para pessoas em particular ou a


população como um todo – no momento em que estas páginas são escritas,
instituições brasileiras de fomento ao ensino e à pesquisa estão sendo
atacadas e desarticuladas pelo governo executivo federal, com anuência no
mínimo suspeita de grande parte do Congresso nacional, e isso é fruto direto
da infeliz decisão de imensa parte da sociedade de apoiar nas urnas um
candidato à presidência da República que baseou sua campanha em absurdos
pseudocientíficos e no uso inescrupuloso de tecnologias de comunicação e de
redes sociais. Um ensino voltado para o descobrir científico, que ensinasse o
método científico como maneira de resolver problemas práticos, que
valorizasse a ciência e a tecnologia como meios de busca de respostas
racionais, teria certamente contribuído, na opinião do autor do presente
trabalho, para que o atual estado de coisas não se instaurasse. Conforme
Gheno e Da Silva (2007, p. 2), “a educação científica não deve visar o ensino
para formar futuros cientistas, e sim para que os cidadãos possam
compreender mais sobre a ciência e a tecnologia com a qual convivem
diariamente”. Pode ser um ponto de vista ingênuo achar que um modelo de
ensino direcionado ao “descobrir via método”, que valorize a ciência e a
tecnologia, seria uma das soluções para uma sociedade carente da aplicação
de estratégias básicas de educação (e onde mesmo o fenômeno das fake news
prolifera entre muitos seguimentos mais letrados), mas decidimos sustenta-lo.
As autoras Gheno e Da Silva (2007, p. 3) asseveram que, para uma
alfabetização científica plena, o professor deve buscar novas estratégias
didáticas, além de apresentar possíveis novas fontes de informação. O trabalho
com artigos científicos deve ser voltado para o desenvolvimento nos alunos de
uma concepção crítica e de uma reflexão “sobre os aspectos político-
econômico e sociocultural presentes neste material”. Na maior parte das vezes,
para que os objetivos de aula como expostos sejam atingidos, o docente
deverá reestruturar e adaptar o texto original do artigo acadêmico de forma a
torna-lo inteligível ou de leitura mais fácil pelos alunos, salientando pontos
importantes e que contribuirão com a absorção do conhecimento pelo discente.
Esse é justamente o objetivo prático da oficina que estamos construindo neste
capítulo: processar um texto acadêmico por si só já interessante, de forma a
salientar tópicos que se deseja que os alunos ou um leitor não experimentado
95

entendam, aprendam, e talvez usem para a vida.


As autoras em Gheno e Da Silva (2007, p. 7-8) descrevem uma
experiência de uso de artigos acadêmicos, tanto em suas versões originais
como adaptadas, em ensino de tópicos científicos para estudantes do Ensino
Médio. Chegaram à conclusão que artigos científicos, ou suas versões de
divulgação científica, são efetivamente instrumentos de importância como
coadjuvantes na aprendizagem discente. Muitas vezes os artigos trazem mais
informação, e de maneira mais aprofundada, do que o disponível no material
didático padrão, além da possibilidade desse estar desatualizado no que se
trata de temáticas “quentes” (que estão em pleno desenvolvimento na
atualidade). A oportunidade do professor de incentivar a leitura crítica e o
desenvolvimento das habilidades de julgamento dos alunos quando lidando
com o tipo de texto em questão também foi salientada. Segundo palavras das
autoras Gheno e Da Silva (2007, p. 8), “a utilização dos artigos científicos na
sala de aula desmistifica estas ideias desfocadas da ciência, que nos livros
didáticos é apresentada como descobertas ao acaso e sem nenhum interesse
político ou econômico”. Além de atribuírem aos alunos que lidaram com o
material experimental uma maior capacidade de articulação das informações e
argumentação, as autoras propõem que o uso de artigos, tanto acadêmicos
como de divulgação científica, no ensino de ciências permite a articulação entre
a matéria vista pelos alunos e seu dia a dia, além de refletirem com mais
justeza o presente da sociedade.

6.2 A Motivação do Participante Reflete-se na do Futuro Aluno


Pode-se inquirir o porquê de termos optado, dentre todo o escopo de
artigos acadêmicos de ciência e tecnologia disponíveis, pelos textos premiados
pelo Ig Nobel. A resposta é relativamente simples diante do arcabouço
conceitual das Teorias da Motivação: “características importantes das
atividades cujo grau de motivação é alto são a novidade, ambiguidade,
incongruência e surpresa” (TEIXEIRA, 2014, p. 71) – os artigos escolhidos pela
Improbable Research, como já vimos em capítulo anterior, prezam justamente
pelo incomum, pelo diferente, pelo inusitado e inesperado: esperamos que
tanto os professores inscritos na oficina, quanto seus alunos que usufruirão do
texto adaptado, sejam contaminados com esse sentido de maravilha que a
96

ciência criativa é capaz de imprimir numa mente alerta, que o riso, inevitável
num primeiro contato, se transforme numa reflexão ativa sobre o que é ciência,
como se faz pesquisa, e quem são os cientistas (ainda existe uma ideia latente
em muitos cidadãos que associam o profissional das ciências a um dado
arquétipo, em geral bastante preconceituoso, e isso precisa ser modificado até
mesmo para que mais estudantes venham a se interessar a dedicar sua vida
profissional à ciência).
Usaremos o presente espaço para reafirmar alguns tópicos abordados
em nosso capítulo “Teorias da Motivação”. A questão não é somente fomentar a
motivação intrínseca dos professores inscritos em nossa oficina, estimulá-los
para que atinjam um estado de autodeterminação durante a tarefa, e quem
sabe alcancem o estado de “fluir” que já discutimos, sempre valorizando a meta
aprender dentro do escopo da Teoria de Metas de Realização. O grande
desafio é instruir esses docentes para que imprimam tanto nos textos que vão
produzir durante o evento, como no trato com seus alunos, ocasião em que
trabalharão as obras de divulgação científica, os princípios das Teorias da
Motivação, especialmente o sentimento de autoeficácia tão caro ao bem estar
no processo de aprendizado do aluno. Acreditamos que seja possível que o
trabalho com textos de divulgação científica em sala de aula, seguidos, embora
não necessariamente, de avaliações alternativas (debates, discussões em
grupo, resenhas, produção de seu próprio texto etc.) tenham potencial
motivacional amplo que precisa ser explorado, além de serem menos
ansiógenos que a rotina normal de trabalho com o material didático padrão.
Embora as Teorias da Motivação sejam assunto da formação inicial de
professores, com amplo campo de pesquisa ativo, precisamos ter em mente
que em nossa oficina podem ser aceitos graduandos recém-ingressos ou
docentes já muito experimentados, mas distantes do ambiente acadêmico. Em
ambos os casos se faz necessário recordar os princípios norteadores da
motivação, além de fazer os inscritos sentirem-se como parte do programa do
evento: enquanto o mediador e demais profissionais de tutoria monitoram e
manipulam o grau de motivação dos docentes quanto ao trabalho em tela,
podem também exemplificar estratégias e noções básicas relacionadas à
motivação de alunos. Planeja-se, como encerramento da bateria de aulas
gravadas, uma justamente sobre o tema. Ademais, tendo os alunos acesso a
97

presente monografia, podem revisar o arcabouço conceitual através do estudo


do devido capítulo e suas referências.

6.3 O Trabalho num Grupo Heterogêneo


Ao abrir a discussão do presente tópico, gostaria de trazer as pertinentes
palavras de Pacca e Villani:

Como resultado da nossa pesquisa aspectos novos pareceram


importantes para a condução de cursos de Formação Continuada.
Propomos focalizar a importância do diálogo e ressignificá-lo na
interação pedagógica que ocorre numa situação de aprendizagem;
numa formação de professores em que o diálogo é o cerne do
procedimento, pesquisamos a atuação dos professores na realidade
da sua sala de aula, focalizando o diálogo que ele é capaz de manter
com seus alunos, levando-os a construir um conhecimento científico
(PACCA e VILLANI, 2018, p. 62).

Esse exceto traduz com precisão a nossa opinião, emitida a partir do já visto
em capítulos anteriores, que o processo dialógico numa oficina pedagógica tem
paralelo na sala de aula. Numa classe de estudantes o professor poderá
encontrar os mais variados tipos de personalidade e histórias de vida, e deve
ser capaz de lidar com sucesso e criar uma ponte com essa bagagem pessoal
de cada estudante. A ideia que permeia esta proposta de iniciativa de formação
inicial e continuada é fazer com que os mais diferentes docentes ou aspirantes
possam interagir: as diferenças enriquecem o debate de ideias, possibilitam
vivências que não seriam possíveis quando não se experimenta sair de sua
bolha econômico-político-social e mesmo regional, sua área de conforto
composta por pessoas com histórias e personalidades semelhantes à sua, que
têm as mesmas vivências.
Ao propormos que a nossa oficina seja norteada pelo trabalho coletivo, e
dando-se preferência à formação de grupos o mais heterogêneos possível (no
que tange idade, experiência em sala de aula, gênero, etnia, região do país de
atuação etc.) num ambiente plenamente igualitário em princípio, democrático,
estamos convidando os participantes a um esforço intelectual que afasta
preconceitos e possibilita a inovação dos repertórios individuais de ideias e
argumentos, verdadeiramente colaborativo. Espera-se que esses docentes
tenham sucesso em replicar essa estratégia em suas salas de aula durante a
exposição dos textos resultantes da oficina, e que se permitam, na melhor das
98

hipóteses, a aplicar as técnicas de ensino colaborativo também em suas


turmas.

6.4 Desenho da Oficina “O Método Científico através do Ig Nobel”


Nesta seção apresentaremos brevemente e em linhas gerais a estrutura
de nossa proposta de iniciativa de formação inicial e continuada de professores
– deve-se observar que a expertise num tópico como esse só é alcançada com
esforço e contínuo aperfeiçoamento, de forma que o ideal seria que a
implementação da oficina fosse orientada por um profissional experiente na
área de formação docente. A equipe ideal seria composta por esse orientador,
que viabilizaria a infraestrutura necessária à realização do evento; um
mediador, que teria a incumbência de tratar com a turma nos encontros
síncronos e responderia pela organização efetiva da oficina pedagógica; um
monitor, que trataria com os participantes de forma a dirimir dúvidas e ajudar
nos arranjos de cada grupo para que o trabalho flua da melhor forma possível,
além de auxiliar o mediador em assuntos gerais; uma equipe que, idealmente,
seria composta por cinco professores ou acadêmicos de ciências, divulgação
científica e educação para ministrarem as aulas de conteúdo (é possível que
essas aulas sejam disponibilizadas como gravações aos participantes – dessa
forma eliminam-se os impeditivos de disponibilidade de todos e tem-se a
possibilidade de aproveitar o conteúdo já salvo para outras edições da oficina);
entre 16 e 20 docentes ou professores em formação da área de Física, que
dispusessem de acesso à internet de alta velocidade e possibilidade de
trabalhar cerca de oito horas semanais para os fins da iniciativa.
O objetivo de nossa oficina é a produção de textos de divulgação
científica a partir do conteúdo original de artigos acadêmicos agraciados com o
prêmio Ig Nobel. De maneira ideal, esse material de divulgação será usado em
sala de aula como conteúdo complementar, com foco em apresentar o método
científico para os estudantes, além da rotina de uma pesquisa científica.
A oficina foi originalmente pensada como uma atividade EAD. Esse
formato maximiza a possibilidade de se atender interessados de todas as
regiões do país, o que otimiza nossa busca por heterogeneidade, além de
reduzir impeditivos como indisponibilidade de horário e custos de
deslocamento. As iniciativas de ensino remoto em IES durante a pandemia do
99

novo coronavírus, algumas das quais revelaram sucesso apreciável (embora


esse fato careça de melhor estudo por pesquisadores dedicados), foram
determinantes para se optar por esse modelo de atividade.
A periodicidade das atividades da oficina é um pouco mais complexa. A
semelhança de outras iniciativas, deixamos a sugestão que as aulas síncronas,
com presença dos participantes, mediador e monitor, sejam feitas aos sábados,
de forma a maximizar o contingente online simultaneamente – esses encontros
podem ser gravados e disponibilizados para aqueles que tiverem interesse. A
aula de conteúdo, gravada, ficará disponível sempre a partir de cada segunda
feira do curso, e poderá ser acessada pelo participante a qualquer momento a
partir daí. Como desejamos que os debates tenham foco em um tema
específico prioritariamente por vez, consideramos desaconselhável
disponibilizar todas as aulas gravadas ao mesmo tempo.
Quanto à metodologia da iniciativa, iniciaremos os trabalhos com um
encontro síncrono (que terá de uma hora e meia a duas horas, como todos os
demais) onde todos os participantes (monitor e mediador aí inclusos) deverão
se apresentar à turma, de maneira informal, mas o mais abrangente possível.
Em seguida, o mediador vai abrir os trabalhos apresentando o Ig Nobel, o
objetivo da oficina e o conteúdo a ser visto. Nessa primeira aula ainda vão se
dividir os grupos (que devem ter entre quatro e cinco participantes cada) e se
sortear os artigos a serem trabalhados em cada grupo. A cada semana as
atividades vão se proceder da seguinte forma: há a liberação da aula de
conteúdo, gravada, na plataforma; os participantes devem assistir a essa aula
(que deve ter entre uma hora e meia a duas horas) e discutirão entre si e com o
mediador no encontro síncrono seguinte – dependendo da disponibilidade da
turma, é interessante solicitar que cada grupo prepare um pequeno resumo
criativo da aula de conteúdo, salientando que tópicos vão ser úteis na redação
do texto de divulgação científica final. Os dois últimos encontros síncronos,
posteriores à última discussão de conteúdo, seriam reservados para a
apresentação dos textos produzidos, uma “avaliação por pares”, onde os
grupos iriam comentar construtivamente os trabalhos de outros, e uma
avaliação da iniciativa em si, onde todos teriam oportunidade de fazer críticas
construtivas e apontar acertos ou tópicos que precisam ser melhorados.
Ademais, uma vez por semana o monitor deverá reservar um horário para
100

atender às dúvidas ou quaisquer demandas dos participantes. É claro que se


espera que o monitor e o mediador se mantenham disponíveis por correio
eletrônico e outros tipos de mensageria virtual. Embora não determinemos
aqui, acredita-se ser essencial (e deve ser constantemente incentivado) que os
integrantes de cada grupo sustentem um ritmo constante de conversas entre si,
para o que hoje não há impedimento algum devido à ampla disponibilidade de
aplicativos sociais existente.
As aulas de conteúdo teriam as seguintes temáticas, nesta ordem:
 Aula 01: “O Método Científico, Modo de Usar”
Apresentação das minúcias do método científico e o porquê dele ser útil
como ferramenta de decisão no “mundo real”.
 Aula 02: “A Leitura de um Artigo Acadêmico”
Estrutura de um artigo científico padrão, e como lê-lo de forma efetiva.
 Aula 03: “Reelaboração do Artigo Acadêmico em Texto de Divulgação”
Uma abordagem não exaustiva de como dar os primeiros passos na
transcodificação de um texto acadêmico – o principal será aprendido na
prática.
 Aula 04: “O Uso do Texto de Divulgação Científica em Sala de Aula”
Esse tópico é inovador e motivo de muitos trabalhos na área de
educação.
 Aula 05: “Motivação do Estudante a partir de um Texto de Divulgação
Científica”
Voltamos ao assunto sala de aula, dessa vez para ajudar os docentes
com um primeiro passo para conquistar seus estudantes através dos
textos paradidáticos produzidos.
101

Figura 2: Diagrama conceitual da Proposta de Oficina. Fonte: os autores (2022).


102

7 Conclusão
Chegamos ao final da nossa trajetória no presente trabalho com a
certeza de dever cumprido.
Revisitamos a história do Prêmio Ig Nobel, desde sua origem em 1991
até o ano de 2020, e, principalmente, trouxemos evidências através da reflexão
sobre trabalhos publicados fora do Brasil de que o Ig Nobel possui sim
relevância, tanto acadêmica quanto para o público interessado em ciências.
Tivemos oportunidade de lançar também um breve olhar sobre como esse
prêmio é referenciado numa das principais revistas de popularização da ciência
do Brasil, e daí tiramos algumas lições.
Discutimos a definição de Divulgação Científica e termos correlatos, o
que nos deu a oportunidade de usarmos o cabedal de conhecimentos
aprendidos durante o curso de Divulgação Científica e Popularização da
Ciência. Ademais, fizemos considerações sobre a pertinência do uso de textos
de Divulgação Científica em sala de aula e debatemos sobre a história das
ciências e onde o Prêmio Ig Nobel se encaixaria nela enquanto ferramenta de
Divulgação Científica.
Reavivamos um tema central na formação docente, mas que
infelizmente tem sido muito negligenciado na maioria instituições de ensino,
mormente por um quadro de sucateamento das mesmas e desvalorização da
profissão do professor: teorias da motivação do estudante. É claro que não se
espera aqui abordar o assunto à exaustão, já que é visto em variadas
disciplinas das diversas graduações em licenciatura: pretendemos somente
prover ao leitor os elementos necessários para se (re)familiarizar com o
assunto e buscar aplicá-lo quando tomar parte na oficina que é também objeto
deste trabalho.
Por necessidade de nossa proposta de produto, foi necessário
abordarmos o tema de oficinas de formação inicial e continuada de
professores, trazendo diversas contribuições para se responder à pergunta "o
que é uma oficina didática?". Ficamos satisfeitos em abordar em separado
esse tema, dadas as possibilidades de discussão que vieram à tona - além
disso, pudemos tocar em assuntos muito sutis e transformadores, como o de
ensino colaborativo (que podemos dizer que é uma antiga novidade) e o de
103

parcerias entre instituições de nível superior e museus no que se trata


principalmente da efetivação de oficinas e eventos análogos voltados para
docentes em formação ou formados.
Finalmente, utilizando todo o conhecimento tecido ao longo deste
trabalho, propomos um produto de nosso estudo, uma oficina voltada para
professores formados e em formação, cujo objetivo seria a confecção de textos
de divulgação científica a serem usados em sala de aula, tendo por base
artigos vencedores do prêmio Ig Nobel previamente listados e analisados.
Pelo ineditismo do tema (o Prêmio Ig Nobel), a relevância do objeto (o
uso, ainda que de forma intermediada ou processada, de artigos acadêmicos
em salas de aula do EM e ES) e a pertinência do objetivo final (a divulgação e
valorização do Método Científico, do conhecimento sobre os processos da
ciência), principalmente quando estamos cercados pelas fake news e perdendo
a luta contra um pensamento anticientífico, acreditamos na pertinência deste
trabalho.
104

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