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Rio de Janeiro
Abril de 2014
Mably Jane Trindade Tenenblat
Rio de Janeiro
Abril de 2014
Mably Jane Trindade Tenenblat
Orientador: _________________________________________
Prof. Dr. Guilherme Silva de Almeida
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social
(UERJ)
_________________________________________
_________________________________________
Dr. Maurílio Castro de Matos
Programa de Pós-Graduação em Serviço Social
(UERJ)
CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CBC
__________________________________________________________
Assinatura Data
_________________________ ____________________
Se procurar bem, você acaba encontrando.
Não a explicação (duvidosa) da vida.
Mas a sua (inexplicável) poesia!
Meu agradecimento todo especial a Fabio, não apenas pelo amor, mas
pela compreensão e apoio que garantiram a tranquilidade necessária à
elaboração desta dissertação. Agradeço, ainda, pela colaboração na revisão
final deste trabalho, dedicando sábados, domingos e feriados sob um verão
escaldante no Rio de Janeiro (eu sou muito mais feliz depois de você!).
Não poderia deixar de ser grata à minha família, por toda a dedicação
e amor, principalmente aos meus filhos Joãozinho e Lili, por tolerarem os
momentos de ausência e estresse durante os meses de elaboração desta
dissertação (vocês são a prova irrefutável de que a vida vale a pena!).
MS Ministério da Saúde
INTRODUÇÃO .............................................................................................15
1
O uso da sigla LGBT – que significa Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – foi
acordado e difundido a partir da II Conferência Nacional de Políticas Públicas e Direitos
Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, realizada no período de 15 a
18 de dezembro de 2011 em Brasília.
15
O presente trabalho, cujo campo de pesquisa limita-se ao Estado do
Rio de Janeiro, coincide com esse crescimento e aborda um dos inúmeros
aspectos relacionados à transexualidade, mais precisamente o Processo
Transexualizador, compreendido como o conjunto de alterações corporais e
sociais que consubstanciam a transição do gênero atribuído para o gênero
identificado, sendo a cirurgia de redesignação sexual uma das etapas deste
processo (Bento, 2008).
16
Cabe ressaltar que a escolha desta temática de pesquisa partiu da
experiência profissional na coordenação – atualmente afastada em razão do
mestrado – de um dos Centros de Referência e Promoção da Cidadania LGBT
(CR LGBT2) do Rio de Janeiro, órgão público específico de atendimento à
população discriminada em decorrência de homofobia e sexismo.
2
Existem atualmente quatro Centros de Referência (CRs LGBT) em funcionamento no Estado
do Rio de Janeiro: CR Capital (onde atuo como uma das coordenadoras), CR Nova Friburgo,
CR Duque de Caxias e CR Niterói, com expectativa de abertura de outros serviços semelhantes
em Nova Iguaçu e em outras regiões do Estado.
3
O Programa Rio sem Homofobia objetiva combater a discriminação e a violência contra a
população LGBT, promovendo sua cidadania e respeitando as suas especificidades em todo
território fluminense. Por meio da disseminação de informações e da defesa de direitos, o
programa atua no combate à homofobia, bem como na produção, implementação e
monitoramento de políticas públicas transversais, em todas as áreas de Governo. O Programa
Estadual Rio Sem Homofobia estabelece ações e metas, monitorando e avaliando as diretrizes
inspiradas no Brasil Sem Homofobia. Informações disponíveis no site oficial do programa:
http://www.riosemhomofobia.rj.gov. Último acesso em 09 de julho de 2013.
17
medicamentos e discriminação nos diversos espaços sociais, principalmente
em questões relacionadas a registros de identidade e a outros documentos.
18
em permanente ebulição e aparentemente incapaz de oferecer às pessoas
transexuais alternativas que não o alijamento, a exclusão e a violência
transfóbica4.
4
A transfobia pode ser compreendida como um grave quadro de hostilidade e violência contra
pessoas transexuais, submetidas ou não à cirurgia de transgenitalização. A violência
transfóbica, independentemente da subjetividade masculina ou feminina, desencadeia
processos discriminatórios, estigmatizantes e de exclusão, voltados contra tudo que remeta,
direta ou indiretamente, a práticas sexuais e identidades discordantes do padrão heterossexual
e dos papeis estereotipados de gênero (Schramm, Barboza & Guimarães, 2010).
19
particularidades do Estado do Rio de Janeiro (RJ). O recorte temporal reside
no período compreendido entre 1970 (quando se iniciam as primeiras
incursões cirúrgicas de transgenitalização no Brasil) e 2008 (ano das portarias
que instituíram o Processo Transexualizador no âmbito do SUS5).
5
Não obstante o fato de vários hospitais públicos, notoriamente universitários, terem realizado
cirurgias de transgenitalização antes de 2008, foi somente a partir deste ano que o Ministério da
Saúde, por meio das Portarias nº 1.707/2008 e nº 457/2008, fixou normas e procedimentos
específicos para o Processo Transexualizador no âmbito do SUS.
20
Em relação à metodologia utilizada, privilegiou-se, como instrumentos
e técnicas de investigação, o trabalho de campo e a entrevista semiestruturada
a partir da formulação prévia de questionamentos e hipóteses, de modo a
propiciar maior aproximação com a realidade. Além disso, estabeleceu-se uma
interação com os “atores” que conformam a realidade, construindo-se, assim,
um conhecimento empírico importantíssimo para esta pesquisa.
21
aspectos da despatologização da transexualidade e algumas das questões
jurídicas concernentes às demandas de pessoas transexuais.
22
horizontes mais amplos. Desta forma, será possível desconstruir os
estereótipos e estigmas que expõem as pessoas transexuais à margem dos
equipamentos sociais, não somente no campo da saúde, mas também na
educação formal e no acesso ao mercado de trabalho.
6
Desembargador Titular da 27ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, foi o
primeiro magistrado no Brasil a julgar favoravelmente uma demanda de retificação de nome e
sexo de um homem transexual em 1989, quando era juiz na Comarca de Mangaratiba (RJ).
23
1. RELAÇÕES DE GÊNERO E CONTROVÉRSIAS NAS COMPREENSÕES
DE TRANSEXUALIDADE
24
Se as meninas não podiam aprender matemática tão facilmente
quanto os meninos, o problema não estava em seus cérebros.
A dificuldade decorria das normas de gênero – expectativas e
oportunidades diferentes em relação a meninos e meninas. Ter
um pênis ou uma vagina é uma diferença de sexo. O
desempenho superior dos meninos em relação ao das meninas
em provas de matemática é uma diferença de gênero
(idem:16).
A visão androcêntrica é assim continuamente legitimada pelas próprias
práticas que ela determina: pelo fato de suas disposições resultarem da
incorporação do preconceito desfavorável contra o feminino, instituído na
ordem das coisas, as mulheres não podem senão confirmar seguidamente tal
preconceito (Bourdieu, 2002).
25
Afinal, o avanço da medicina propiciou técnicas capazes de criar
órgãos genitais “apropriados” para pessoas nascidas com alguma anomalia
genética7 ou, a exemplo das pessoas intersexuais8, com partes do corpo que
não são facilmente identificáveis como masculinas ou femininas. As mesmas
técnicas podem ser aplicadas, evidentemente, à reconstrução dos órgãos
sexuais de homens e mulheres transexuais.
7
Segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à
Saúde (CID-10), são exemplos de anomalia genética ou malformações congênitas dos órgãos
sexuais: ausência congênita de ovários, ausência congênita da vagina, ausência e aplasia do
testículo, sexo indeterminado, não especificado, ausência e aplasia congênitas do pênis e
outras malformações congênitas do pênis.
8
Intersexuais são pessoas que nascem com uma anatomia reprodutiva e sexual que não
parecem se encaixar nas definições e padrões típicos do sexo masculino ou feminino. Dito de
outro modo, a intersexualidade caracteriza-se fundamentalmente por uma genitália ambígua:
pode acontecer de a pessoa ter a genitália interna feminina e a externa masculina. Por
consequência, do ponto de vista biológico, o sexo neste caso não pode ser identificado de
forma inequívoca.
26
Percebe-se, por conseguinte, que a construção social do que pode ou
não ser reconhecido como corpo, sexo ou ser humano é um jogo de relação
entre poderes que se organizam, embatem e criam resistências dentro das
normas de gênero.
27
práticas e às formas pelas quais os indivíduos podem e devem se reconhecer
como sujeitos sexuados. Na visão do autor, portanto, a sexualidade está
necessariamente imbricada em relações de poder:
28
1.2 Compreensão de Transexualidade como “Transtorno Mental”
9
O termo “transexualismo” foi utilizado durante muito tempo para se referir à forma como a
literatura científica tradicional compreendia pessoas transexuais, uma terminologia cada vez
menos adotada, em função de seu caráter estigmatizante associado ao sufixo “ismo”. Por outro
lado, o termo “transexualidade” é a forma mais adequada para tratar de uma identidade
socialmente construída e, por isso, será utilizada ao longo desta dissertação.
10
Interessantes análises a respeito do caso Jorgensen podem ser encontradas em Arán (2006
e 2008), Alby (1996) e Bento (2006). Porém, este não é o primeiro registro de cirurgia na
literatura. A primazia caberia ao médico alemão Magnus Hirschfeld que, em estudos sobre
“transexualismo” de 1912, menciona a ocorrência de intervenção cirúrgica e hormonal de
redefinição sexual (Castel, 2001).
29
feminilização de sua aparência e de se submeter à operação de
transgenitalização, George passou a se chamar Christine.
30
ao sexo contrário ao da sua anatomia, razão pela qual se transvestem e têm
verdadeira obstinação por modificações corporais. Para o autor, haveria uma
incongruência cruel entre o corpo, a mente e o comportamento social. Por
conseguinte, quando tais pessoas são obrigadas, por circunstâncias sociais ou
familiares, a agir de acordo com seu sexo biológico, podem surgir situações de
profundo estresse, com graves consequências neuróticas e psicóticas, como a
mutilação da própria genitália e o suicídio.
11
A Escala de Orientação Sexual de Harry Benjamin (no original, Harry Benjamin Sexual
Orientation Scale – SOS), específica para a transexualidade, foi proposta na década de 1960 a
partir do caso de um paciente que desejava transformar-se em mulher. A escala classificava as
pessoas em grupos e tipos, abrangendo desde os indivíduos com desejos ocasionais de se
vestir com roupas do sexo oposto até aqueles com intenção declarada de mudar de sexo (Leite
Jr., 2011).
31
Outra referência importante sobre o transexualidade são as teses de
Robert Stoller (1982), para quem havia, essencialmente, três aspectos
relevantes para se definir uma pessoa como transexual masculino12: (1)
sentimento de identidade permanente e crença inabalável numa essência
feminina, sem ambiguidades (diferentemente do “transvestismo”13); (2)
verdadeira aversão ao pênis; (3) relação peculiar com a mãe, que o autor
chama de simbiose. Stoller (idem), contudo, não considera tal relação
psicotizante, na medida em que – ao contrário do que defende a psicanálise
lacaniana, que associa transexualidade a psicose – não há alteração na
capacidade de integração social dessas pessoas (Arán, 2006).
12
Entre os pioneiros da discussão do tema – e, ainda na atualidade, por alguns profissionais de
saúde –, é comum a utilização do termo “transexualismo masculino” para se referir àqueles
indivíduos que rejeitam o gênero masculino imposto durante o nascimento. Por outro lado, é
relativamente recente a utilização pela literatura científica do termo “transexualismo masculino”
para identificar indivíduos que rejeitam o gênero feminino imposto ao nascerem. Esta alteração
terminológica decorre da tomada de uma posição ética, no sentido de ratificar a identidade de
gênero afirmada pelo sujeito, e não pelo profissional de saúde (Almeida, 2012b).
13
Utilização pelo indivíduo de vestimentas do sexo oposto, a fim de satisfazer o desejo
temporário ou permanente de pertencer ao sexo contrário ao nascimento, mas sem aspiração
de mudança sexual definitiva ou de uma intervenção cirúrgica.
32
Desordens Mentais14 (DSM-III). Na versão seguinte do referido manual (DSM-
IV)15, publicada em 1994, o termo “transexualismo” foi substituído por
Transtorno de Identidade de Gênero (TIG, Código 302), definido como um
estado psicológico no qual a identidade de gênero está em desacordo com o
sexo biológico (Murta, 2011:18-19).
14
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual
of Mental Disorders – DSM) é um guia voltado para profissionais da área da saúde mental que
lista as diferentes categorias de transtornos mentais e apresenta critérios para diagnosticá-los.
Publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (American Psychiatric Association – APA)
em 1952 tem sido uma das bases de diagnósticos de saúde mental mais utilizadas no mundo.
O referido Manual sofreu desde então cinco revisões, a maior delas é o DSM-IV, publicado em
1994. Disponível em: http://www.psicosite.com.br/cla/DSMIV.htm. Último acesso em 17 de
março de 2014.
15
A atual versão do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V) foi
publicada em maio de 2013, substituindo o DSM-IV, criado em 2000. Nesta nova edição, a
categoria “transtorno de identidade de gênero” é substituída por “disforia de gênero”. Disponível
em www.dsm5.org. Último acesso em 05 de maio de 2014.
16
Ao contrário da CID, que se estende além de critérios de diagnósticos, para incluir também
processos de atenção médica não baseados em enfermidades - gravidez, por exemplo -, o
DSM refere-se exclusivamente a doenças mentais.
33
indivíduos que manifestam orientação sexual e subjetiva divergente do padrão
heteronormativo são considerados portadores de uma desordem ou doença.
17
O termo “complexidade” vem sendo debatido no campo da saúde coletiva por alguns autores
como Almeida Filho (1997), Tarride (1998), Samaja (2000) e Paim (2008). Todos enfatizam a
necessidade de a ciência resgatar sua capacidade de gerar sínteses, diante de um mundo cada
vez mais fragmentado e com graves desafios a serem enfrentados. Tal capacidade, relegada a
segundo plano ao longo da história da ciência ocidental, é considerada um atributo essencial na
construção de um novo modelo de ciência, que supere as dicotomias simplificadoras e
alienantes da ciência normal (Porto & Almeida, 2002).
34
O sexo, como o ser humano, é contextual. As tentativas de
isolá-lo de seu meio discursivo e determinado socialmente são
tão fadadas a erro como a busca do philosophe por uma
criança verdadeiramente selvagem ou os esforços do
antropólogo moderno para filtrar o cultural e deixar um resíduo
de humanidade essencial. E acrescentaria ainda que o corpo
privado, incluso, estável, que parece existir na base das noções
modernas de diferença sexual, é também produto de
momentos específicos, históricos e culturais (idem:27).
Por sua vez, de acordo com Rago (2003), o saber ocidental opera no
interior da lógica da identidade, valendo-se de categorias reflexivas, incapazes
de pensar a diferença, razão pela qual os conceitos com os quais trabalham as
Ciências Humanas são muitas vezes arbitrários e excludentes.
18
Em inglês, o termo queer significa estranho, esquisito, algo próximo do anormal e aberrante,
sendo também uma gíria agressiva para gays, lésbicas ou todas as pessoas que não seguem
as orientações heterossexuais e desestabilizam os padrões de gênero dominantes. Os estudos
queer têm como objetivo a crítica a pressupostos universalizantes e naturalizados sobre mulher,
homem, corpo, sexo e dualidades como sexo/gênero, masculino/feminino, ativo/passivo,
homo/hetero e natureza/cultura, mostrando as fissuras e contradições destes padrões
socialmente reguladores (Leite Jr., 2011).
35
Tais conceitos são formulados a partir da ideia universal de homem
“branco-heterossexual-civilizado-do-primeiro-mundo”, deixando à margem
todos aqueles que escapam desse modelo de referência, como transexuais e
travestis.
36
Em suma, é fundamental romper definitivamente as fronteiras do
binarismo entre sexo e gênero, deslocando essa discussão do indivíduo e
transferindo-a para a construção de uma política mais eficaz e voltada às
relações de gênero para que a transexualidade, já instaurada como realidade
inexorável, deixe de ser observada por boa parte da sociedade como uma
doença ou, na melhor das hipóteses, como um fenômeno exótico.
19
A esse respeito consultar Zambrano, (2003); Bento (2006); Lionço, (2006); Arán, (2007);
Murta, (2008 e 2011); Almeida, (2010) e Suess (2010).
37
deveria necessariamente ser patologizado para configurar critério de acesso a
serviços de saúde, ao contrário do que defende o determinismo biomédico
(Arán, Zaidhaft e Murta, 2008).
20
Segundo Suess (2010:29), o termo trans “refere-se a todas as pessoas que elegeram uma
identidade ou expressão de gênero diferente da atribuída ao nascer, incluindo pessoas
transexuais, transgêneros, travestis, cross dressers, não gêneros, multigêneros, de gênero
fluído, gênero queer e outras denominações relacionadas”.
38
para o gênero com o qual a pessoa transexual se identifica. Por outro, muitos
ativistas propalam que o diagnóstico pode ter efeitos deletérios e se tornar –
em particular nas mãos dos transfóbicos – um instrumento de patologização
(Butler, 2009).
21
Texto no original: “Dicho de uma manera más coloquial, si hay personas que quieren seguir
terapias pisquiátricas que lo hagan, pero que eso no implique que todas las personas trans
estemos obligadas a passar por ellas, ni que los derechos de las personas trans dependan de
un diagnóstico. La diferencia fundamental entre el modelo patologizador y el despatologizador
es que la patologización de la transexualidad, tal y como está planteada, es inherentemente
autoritária y excluydente, pues se impone a todo el mundo y excluye que haya otras
experiencias posibles: para ser creíble, niega las demás identidades”.
39
Para Murta (2011), não se trata apenas de recusar um rótulo
psiquiátrico, mas também de expor a diversidade dessa experiência e
demonstrar que existe uma multiplicidade de subjetividades e sexualidades
que não necessariamente se enquadra ao modelo binário dos sexos.
40
Como se observa, o debate é incisivo e complexo, pois aqueles que
defendem a manutenção do diagnóstico fazem-no em função da maior
facilidade em alcançar seus objetivos e, desse modo, exercer sua autonomia.
Paradoxalmente, os interessados em eliminar o diagnóstico também
pretendem ampliar a autonomia das pessoas transexuais, entendendo que tais
pessoas devem ser vistas e tratadas de modo não patologizante.
41
1.5 Reflexos da Transexualidade no Cenário Jurídico
42
decorreu de atos administrativos editados pelo Poder Executivo (Ministério da
Saúde), obviamente sem força de lei. Por conseguinte, mesmo após a
realização de cirurgia pelo SUS, apenas mediante a propositura de ação
judicial revela-se possível a requalificação civil. Mais grave ainda, o
ajuizamento de ação não garante a efetivação do direito, visto que a
jurisprudência não está consolidada e, portanto, o teor da decisão, na prática,
espelha a visão pessoal do magistrado sobre o tema.
43
pode ser compreendido como um ato de violência à integridade e à autonomia
do indivíduo.
A primeira assevera:
(...)
22
Intersexual, como dito anteriormente, é o indivíduo possuidor de sexo indeciso com
caracteres somáticos e psíquicos de ambos os sexos.
44
A segunda corrente, capitaneada pela Desembargadora Rosa Maria
Nery, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, constitui um avanço em
comparação à anterior, mantendo, contudo, resquícios discriminatórios:
23
A Portaria MS nº 675/2006 – que aprovou a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde –
estabelece, como um dos princípios, a necessidade de constar em todo documento de
identificação do usuário, um campo para registrar o nome pelo qual prefere ser chamado,
independentemente do registro civil. A referida Portaria foi revogada e substituída pela Portaria
MS nº 1.820/2009, que ratifica o direito mencionado.
45
Na verdade, o Estado manifesta-se contrariamente a tais demandas a
partir dos silêncios, das obstruções e da lentidão em face de
encaminhamentos de quaisquer projetos de lei relacionados à temática
(Teixeira, 2013).
46
2. ASPECTOS HISTÓRICOS DA POLÍTICA DE SAÚDE PÚBLICA BRASILEIRA
24
A clássica análise de Marshall (1967) caracteriza três espécies de direito de cidadania: 1.
Direitos Civis – instituídos no século XVIII e inerentes à propriedade, à justiça e às liberdades
individuais, de expressão, de pensamento e de contratar; 2. Direitos Políticos – conformados no
século XIX e referentes, essencialmente, ao exercício do poder político (votar e ser votado); 3.
Direitos Sociais – conquistados no século XX e correspondentes ao conjunto de direitos
relativos ao bem-estar econômico e social, desde a segurança até o direito de partilhar dos
padrões de vida prevalecentes na sociedade. Segundo o autor, a cidadania somente pode ser
considerada plena quando dotada simultaneamente das três espécies de direitos. Tal análise,
contudo, gerou bastante controvérsia entre autores brasileiros. Behring & Boschetti (2007:102),
por exemplo, assinalaram que “muitas críticas foram feitas ao trabalho de Marshall, desde sua
linearidade, sua tentativa de generalização da experiência inglesa numa suposta teoria da
cidadania e sua explícita subsunção da desigualdade à cidadania”. Outra reflexão crítica,
consistente e indispensável sobre o referido tema pode ser encontrada na obra “A Cidadania”
de Jack Barbalet, publicada em 1989. Sobre o tema, é importante conferir também: Wanderley
Guilherme dos Santos (1987) e José Murilo de Carvalho (2004).
47
garante, por exemplo, a existência de governos atentos aos problemas básicos
da população (Carvalho, 2004).
25
A Santa Casa de Misericórdia é uma irmandade religiosa fundada em 1582 e ainda em
atividade. Administrada por um provedor sem fins lucrativos, sua “missão é acolher e cuidar dos
mais carentes”, prestando-lhes serviços assistenciais, inclusive na área médico hospitalar.
Maiores informações podem ser encontradas na página eletrônica da instituição:
www.santacasarj.org.br. Último acesso em 13 de agosto de 2013.
48
Com a abertura dos portos em 1808, surgiram no Brasil as primeiras
epidemias, agravadas pela intensificação da imigração (Silva, 1996). Por
conseguinte, “o controle desta situação exigiu o estabelecimento de reformas
administrativas no setor sanitário, consolidando a atuação do Estado no que se
convencionou chamar, desde o início, de saúde pública” (idem:9).
49
Foi através do especialista em higiene que o Estado imiscuiu-se
no interior das famílias. Com livre trânsito neste espaço outrora
impenetrável à ciência, o médico higienista acabou impondo
sua autoridade em vários níveis. Além do corpo, também as
emoções e a sexualidade dos cidadãos passaram a sofrer
interferências desse especialista cujos padrões higiênicos
visavam melhorar a raça e, assim, engrandecer a pátria. A
partir da ideia de um corpo saudável, fiel aos ideais de
superioridade racial da burguesia branca, criavam-se rigorosos
modelos de boa conduta moral, através da imposição de uma
sexualidade higienizada, dentro da família. Acreditava-se que a
libertinagem enfraquecia as nações.
26
Termo de origem bíblica usado à época para designar as perversões sexuais, com ênfase
para o sexo anal entre dois homens.
27
Em 1869, o alemão Karl Maria Kertbeny cunhou o termo homossexual para designar pessoas
que se relacionavam afetiva e sexualmente com outras de seu próprio sexo, em substituição –
pelo menos no discurso oficial – a expressões pejorativas como sodomita e “pederasta
passivo”. O objetivo primordial era evitar que mais homens (em maior medida) e mulheres
fossem condenados à prisão ou à morte por atos homoeróticos. Esta nova terminologia retira o
tema da seara criminal para incluí-lo, num primeiro momento, entre as questões afetas à
natureza biológica, determinada por genes e hormônios. No Brasil do final do século XIX, o
“homossexualismo” passou a definir – no bojo de uma biomedicina preocupada com a higiene
da nação – as relações entre pessoas do mesmo sexo. Mais de 100 anos depois, o termo
cedeu lugar à palavra homossexualidade, expressão que, ao contrário de sua antecessora, não
remete a um sentido de doença (Silva, 2006).
50
pederastia28 para classificar a relação sexual entre dois homens. Sobre a
transição do homossexualismo do campo penal para a área médica, assinala
Trevisan (ibidem:177):
28
A palavra de procedência grega designa o relacionamento erótico entre um homem e um
menino. Por extensão de sentido, o termo foi utilizado por muito tempo para designar, além da
prática sexual entre um homem e um rapaz mais jovem, qualquer relação homossexual
masculina.
51
As mazelas decorrentes da migração e as expressões da questão
social29 não haviam, ainda, assumido dimensão que demandasse permanente
intervenção estatal na área de saúde. Ademais, não obstante a profusão de
doenças transmissíveis neste período, a filantropia – presente em instituições
como a Santa Casa de Misericórdia – e a medicina liberal continuavam a
representar praticamente o único modelo de atenção médica vigente. O Estado
brasileiro intervinha somente sobre o perfil de mortalidade e morbidade, por
meio de campanhas sanitárias pontuais (Escorel, 1999).
29
Sabe-se que o conceito de questão social não é unívoco. Contudo, uma definição clássica,
pertinente e lúcida – além de muito difundida no Serviço Social brasileiro e latino-americano –
pode ser encontrada na obra “Relações Sociais e Serviço Social no Brasil” de Iamamoto &
Carvalho (1995).
30
O modelo campanhista teve origem nas brigadas militares formadas, por volta de 1901, para
combater os mosquitos causadores da malária e febre amarela, que se abatiam sobre a tropa
americana durante a construção do Canal de Panamá, na América Central.
52
da concepção de que as doenças endêmicas representavam um problema cujo
enfrentamento exigia uma estratégia eminentemente militar. Por consequência,
apesar de fundamentadas na teoria bacteriológica e na engenharia sanitária,
as campanhas eram carregadas de ações coercitivas, concentradas na
tentativa de erradicação dos agentes ou vetores causadores das moléstias.
53
divisão do trabalho e da emergência do trabalho assalariado (Braga & Paula,
1986).
31
Reflexões densas e pertinentes podem ser encontradas em Santos (1979); Aureliano &
Draibe (1989); Kowarick (1994); Mota (1998); Behring & Boschetti (2007) e Cardoso (2010).
32
Getúlio Dornelles Vargas foi Presidente do país de 1930 a 1945 e depois de 1950 a 1954.
Historicamente, seu primeiro Governo é dividido em Provisório (1930 a 1934); Constitucionalista
(1934 a 1937) e Estado Novo (1937 a 1945).
54
que Wanderlei Guilherme dos Santos classificou de ‘‘estratificação da
cidadania” ou “cidadania regulada” (Santos, 1979:75).
55
predomínio do autoritarismo propiciou ao Estado maior autonomia na definição
de ações para a promoção do desenvolvimento nacional.
33
A Intentona Comunista – também conhecida como Revolta Vermelha de 1935 e Levante
Comunista – foi uma tentativa de golpe contra o Governo de Getúlio Vargas engendrada
pelo PCB (à época, Partido Comunista do Brasil).
Disponível em http://www.historiabrasileira.com/brasil-republica/intentona-comunista/. Último
acesso em 14 de julho de 2013.
56
State34 nacional, conforme assinalam Aureliano e Draibe (1989:139),
chamando a atenção para “a emergência de sistemas nacionais, públicos ou
estatalmente regulados de educação, saúde, integração de renda, assistência
social e habitação popular".
34
Sobre conceituação, emergência, desenvolvimento e crise do Welfare State, consultar Fleury
Teixeira (1985).
57
O populismo – característica marcante da ação política pós-Vargas –
cristalizou-se definitivamente na relação Estado-Sociedade. Com efeito, a
ambiguidade das políticas populistas engendradas pelos Presidentes Eurico
Gaspar Dutra e Juscelino Kubitschek, ao mesmo tempo em que propiciava
condições para o crescimento dos movimentos populares, permitia a
manipulação das aspirações da classe trabalhadora. Além disso, as
reivindicações dos trabalhadores ensejaram a ampliação do aparelho estatal,
cujas intervenções eram dirigidas, essencialmente, para o atendimento das
necessidades geradas pelo incremento da urbanização (Escorel, 1999).
Não obstante o viés populista, o Governo JK – cujo lema era "50 anos
em 5" – promoveu a modernização do país, mediante a intensificação do
processo de industrialização e integração nacional. Seu projeto político e
econômico visava o aprofundamento da inserção do Brasil no sistema
capitalista mundial, ao mesmo tempo em que pretendia reforçar o papel do
Estado como planejador e fomentador do desenvolvimento.
58
Resumidamente, as medidas de saúde do Governo Kubitschek foram
emolduradas pela ideia de desenvolvimento acelerado do Brasil, guardando,
porém, algumas semelhanças com os objetivos gerais do movimento médico-
higienista da Primeira República. No entanto, apesar dos inegáveis avanços, o
trágico ciclo que associava pobreza, desnutrição, moradia precária e
enfermidade não foi superado.
35 Reflexões interessantes sobre o tema podem ser encontradas em Mello Filho (1972).
59
no Brasil tornou-se, portanto, ainda mais ineficiente e conservadora, com
intervenções que se restringiam a campanhas pontuais e de baixa eficácia,
trazendo consequências nefastas para a saúde da população mais pobre.
60
manifestações foram duramente reprimidas pelo regime ditatorial, inclusive
mediante a aplicação de sanções criminais por atentados à moral pública e aos
bons costumes.
61
3. TRAJETÓRIA DA ASSISTÊNCIA À SAÚDE DE PESSOAS TRANSEXUAIS NO
BRASIL
62
Todavia, além do movimento de tradição marxista, participavam da
discussão acerca da Reforma Sanitária diversos outros atores inconformados
com a Ditadura e comprometidos com as imprescindíveis mudanças nas
políticas públicas da área de saúde, inclusive os integrantes da Social-
Democracia.
63
contra Homossexuais”, passeata em São Paulo que reuniu cerca de 1.000
manifestantes, contando com o apoio de outros militantes do movimento social,
como feministas, estudantes e negros. O protesto, direcionado primordialmente
contra a ação policial que – por vezes com ordem de prisão – intimidava os
homossexuais nas ruas, teve ampla repercussão na mídia (Zanata, 1996).
36
Acquired Immunodeficiency Syndrome (Síndrome de Imunodeficiência Adquirida).
64
“Você sabe qual é a diferença entre a AIDS e o Amor? A AIDS dura
para sempre”! Esta pichação nos muros da cidade de São Francisco – reduto
dos homossexuais americanos – representava inequívoco sinal de que o
pânico estabelecia-se; afinal, a infecção pelo vírus HIV fez entre os
homossexuais suas maiores vítimas (Zanata, 1996).
65
Saúde de São Paulo. Contudo, tratava-se de ações isoladas, pois não havia a
adesão do Governo – e nem de boa parte das instituições da área de ensino e
pesquisa em saúde – a qualquer plano de combate à disseminação da doença
(Galvão, 2000).
37
Em português, “Imunodeficiência Relacionada a Gays”.
66
informação e do tratamento, tornando mais difíceis as relações sociais com
familiares e no ambiente de trabalho (Silva, 1998).
Em tal contexto, foi criada por Brenda Lee, uma travesti da cidade de
São Paulo, a primeira casa de apoio a pessoas com HIV/AIDS no Brasil. Com
efeito, em 1984, Brenda passou a acolher em sua própria casa os chamados
“pacientes sociais” que não tinham condições de exercer uma ocupação
profissional, além de carecer de cuidados médicos diários, embora sem
necessidade de internação hospitalar. A maioria dos acolhidos era composta
por travestis soropositivas, vítimas de violência. Inicialmente chamada de
“Palácio das Princesas”, em 1986 a instituição passou a se chamar “Casa de
Apoio Brenda Lee” e funciona até hoje, a despeito da morte violenta de sua
fundadora38 (Carvalho, 2011).
38
Brenda Lee foi assassinada em 1996. Maiores informações sobre a instituição podem ser
encontradas em www.brendalee.org.br. Último acesso em 17 de julho de 2013.
39
Fundado em 1978, o Somos é considerado o primeiro grupo brasileiro em defesa de direitos
dos homossexuais.
40
O Grupo Gay da Bahia (GGB), fundado em 1980, é uma das mais antigas associações de
defesa dos direitos dos homossexuais no Brasil. O Grupo integra a Associação Brasileira de
Gays, Lésbicas e Travestis (ABGLT) e a Comissão Nacional de AIDS do Ministério da Saúde.
Desde 1995, faz parte também da Comissão Internacional de Direitos Humanos de Gays e
Lésbicas (IGLHRC). O GGB é uma “entidade guarda-chuva”, oferecendo espaço para outras
instituições da sociedade civil que trabalham em áreas similares, especialmente no combate à
homofobia e na prevenção da disseminação do HIV/AIDS entre a comunidade LGBT e a
população em geral. Maiores informações estão disponíveis no site da instituição:
http://www.ggb.org.br/ggb.html. Último acesso em 27 de fevereiro de 2014.
67
arcabouço político visando à instituição de programas estatais de combate à
epidemia e de apoio a pessoas infectadas.
68
Com efeito, apenas em 1985, mesmo ano em que foi criado o Grupo
de Apoio e Prevenção à AIDS (GAPA)41 e quando vários Estados da
Federação já haviam instituído programas correlatos, o Ministério da Saúde
assumiu a coordenação e a organização institucional das atividades de
controle e prevenção da doença. Finalmente, em 1988, foi formalizado o
Programa Nacional de DST/AIDS, que, paulatinamente, à semelhança do que
havia ocorrido com o Programa Global de AIDS da OMS, ganhou relevância no
âmbito do Ministério da Saúde.
41
O GAPA é uma ONG brasileira exclusivamente voltada para a questão da AIDS e tem por
missão institucional a defesa dos Direitos Humanos e a integração das pessoas vivendo com a
Síndrome da Imunodeficiência Humana (AIDS/SIDA). Seus principais objetivos são o
estabelecimento de uma política efetiva de saúde pública ligada à AIDS; o combate à
discriminação e a comportamentos lesivos aos direitos humanos dos pacientes com HIV/AIDS;
a melhoria do atendimento médico, hospitalar e psicológico de tais pacientes. Ademais, a ONG
promove ações de apoio emocional a todos os pacientes, bem como a seus familiares e amigos
e apoio material aos mais carentes.
Disponível em http://www.gapabrsp.org.br/quem_somos.html. Último acesso em 03 de março
de 2014.
42
Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD).
69
Tal interlocução, juntamente com o Movimento de Reforma Sanitária,
além de ter contribuído para a ampliação do acesso à saúde da população de
lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, revelou-se estratégica na
formulação da Política Nacional de DST/AIDS, instituída em 1999, com o
objetivo precípuo de sistematizar as diretrizes norteadoras das ações do
Programa Nacional de DST/AIDS. Estas ações visavam à redução da
incidência da doença nos diferentes segmentos populacionais em situação de
risco e vulnerabilidade, bem como buscavam garantir direitos da cidadania e
uma melhor qualidade de vida para pessoas que viviam com o HIV/AIDS
(Ministério da Saúde, 1999).
43
Maiores informações estão disponíveis em www.aids.gov.br. Último acesso em 26 de
fevereiro de 2014.
44
Nesses planos integrados, as ações voltadas para transexuais foram contempladas no
documento destinado às mulheres, enquanto as relativas a travestis constaram daquele
concebido para o grupo de homens. Tal distinção resulta de decisões políticas e está associada
a disputas identitárias próprias do movimento LGBT e a uma concepção de política pública
marcada pelo binarismo de gênero.
70
movimento de mulheres (Carvalho, 2011). Nesse cenário, foi constituído o
Conselho Nacional de Transexuais (CNT)45, uma rede nacional visando a
articulação e o intercâmbio de informações entre homens e mulheres
transexuais e parceiros. Tal Coletivo viria a compor o Comitê Técnico de
Saúde da População LGBT46, instância na qual boa parte da política do
Processo Transexualizador do SUS foi pactuada.
45
O CNT, fundado em 7 de novembro de 2005 na cidade de Brasília (DF), é a única entidade
nacional a responder, oficialmente, pela população transexual, tendo por princípios básicos:
promover o bem-estar físico, mental e moral, bem como a saúde integral de mulheres e
homens transexuais; promover e defender os direitos humanos para todos, resguardando as
especificidades do segmento de transexuais; resguardar a cidadania de mulheres e homens
transexuais na posição de cidadãos e sujeitos de direito; educar e informar a sociedade para a
transexualidade e seus significados provenientes do próprio segmento de transexual; erradicar
a ignorância, a falta de conhecimento e os preconceitos acerca das identidades de gênero,
enfatizando a identidade transexual; valorizar a transexualidade e a vivência transexual em
todas as multiplicidades, implicações e variações, mostrando-a como mais uma das qualidades
humanas; debater e discutir “de baixo para cima” os discursos, estudos e teoria sobre a
transexualidade, ultrapassados pelo tempo e estigmatizados por instituições e pessoas que não
vivenciam a experiência transexual; superar o caráter patologizante da transexualidade que, por
ser cruel e desumano, vulnerabiliza, provoca ignorância e violência e não fala a verdade sobre a
experiência da transexualidade; e propiciar o intercâmbio e repasse de informações com outros
segmentos sociais, sejam eles minoritários ou não, com o objetivo maior de um Brasil e mundo
mais justo e mais humano para todos(as).
Disponível em: http://ead.senasp.gov.br/modulos/educacional/conteudo/00977. Último acesso
em 27 de fevereiro de 2014.
46
Instituído em 2004 no âmbito do Ministério da Saúde por meio da Portaria nº 2.227/2004, a
principal atribuição do Comitê é sistematizar a proposta de política nacional da saúde da
população LGBT, com vistas à garantia de equidade na atenção à saúde desse segmento
populacional.
47
Segundo Teixeira (2013), a expressão “mulher e/ou homem que vivencia a transexualidade”
como substituta para “mulheres e/ou homens transexuais” foi proposta pela primeira vez em
fevereiro de 2008, na lista do Coletivo Nacional de Transexuais (CNT) e no bojo de uma
discussão promovida pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais
(ABGLT), com vistas à definição do termo transexual. Ainda de acordo com a autora, muitas
pessoas transexuais – especialmente homens – demonstram profundo desagrado pela
utilização da expressão “mulheres e homens que vivenciam a transexualidade”, ou seja, trata-
se de questão ainda bastante controversa no movimento social.
71
jargão médico “transexual feminino” (FtM) e “mulher transexual”, em
substituição a “transexual masculino” (MtF) (Teixeira, 2013).
48
É preciso ressaltar, contudo, que ainda não houve uma cisão completa entre AIDS e saúde
de transexuais e travestis. Um exemplo crucial de tal fato é o funcionamento de centros de
referência em saúde trans no mesmo espaço de centros de tratamento de pessoas com HIV,
cabendo mencionar, ainda, que boa parte da discussão sobre o Processo Transexualizador
ocorre, de modo geral, nos espaços e fóruns propiciados pela AIDS, como os Encontros
Nacionais de Travestis e Transexuais (ENTLAIDS).
72
3.2 Transformações da Década de 1980
73
grupos de interesse ou pela tecno-burocracia já estabelecida” (Santos,
1987:93).
49
Relatório final da VIII CNS.
74
3.3 Possibilidades do SUS sob a Ofensiva Neoliberal
50
O fordismo refere-se a um sistema produtivo idealizado por Henry Ford em 1914 com base
em inovações técnicas e organizacionais que se articulam tendo em vista, de um lado, a
produção em massa e, de outro, o consumo em massa. Ademais, caracteriza-se, segundo
Harvey (2011:121), “como um novo sistema de reprodução da força de trabalho, uma nova
política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova psicologia, em suma,
um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada, modernista e populista”.
51
De acordo com Chesnais (1996:17), “a mundialização financeira ou financeirização designa,
em linhas gerais, a concentração do capital na mão de grandes grupos oligopolistas e sua
atuação estratégica nesses moldes”. O fenômeno da financeirização consolida-se
definitivamente na cena internacional em meados dos anos 1990.
52
Quando se afirma a existência de governos "neoliberais", a utilização do prefixo 'neo' não se
refere a uma nova corrente do Liberalismo, mas à aplicação de alguns dos preceitos liberais
consagrados e em certo contexto histórico (qual seja, o contemporâneo) diverso daquele no
qual foram formulados no início do século XVII, na Inglaterra, com John Locke. Maiores
informações sobre liberalismo e neoliberalismo podem ser encontradas em Friedman &
Friedman (1980).
75
À época, já se evidenciava a tensão entre os dois principais projetos
em disputa no campo da saúde: o da Reforma Sanitária e o da saúde
vinculada ao mercado ou modelo privatista (Bravo, 1991). Durante o Governo
Collor, o Movimento Sanitário ainda obteve êxito na consolidação do acesso
aos mencionados programas de combate à AIDS e na aprovação da Lei
Orgânica da Saúde (Lei n° 8.080/1990) – de natureza abrangente e
progressista –, viabilizada apenas porque a composição do Congresso
Nacional era a mesma da Assembleia Nacional Constituinte (Lima, 2010).
76
Um olhar mais atento sobre as políticas de saúde – herdadas da
Ditadura Militar, porém aplicadas até os dias atuais – revela que sua
construção, a despeito da natureza eminentemente social, baseou-se no
binômio público/privado, como se observa, por exemplo, no maciço
investimento realizado para estruturar as ações de saúde no âmbito
previdenciário. Tal investimento – não obstante a origem dos recursos residir
na contribuição compulsória de empregados e empregadores – direcionou-se
precipuamente para o desenvolvimento subsidiado do setor privado,
contratado, desde sempre, como prestador hegemônico dos serviços públicos
de saúde.
53
Análise muito lúcida e pertinente acerca da submissão da seguridade social à lógica da
financeirização do orçamento público pode ser encontrada em Maria Lúcia Werneck Vianna
(1998).
77
De acordo com Polignano (2013), a opção neoliberal – então
hegemônica no campo econômico –, procurava rever o papel do Estado e o
seu peso na economia nacional, propondo a sua redução para o chamado
“Estado Mínimo”, especialmente na área social, ampliando os espaços nos
quais a regulação far-se-ia pelo mercado capitalista.
78
Os hospitais universitários – últimos redutos da assistência médica
hospitalar de excelência em termos do SUS – igualmente entraram em crise,
sendo forçados a reduzir o número de atendimentos e induzidos pelo próprio
Governo a privatizar parte de seus serviços, como solução para resolver a crise
financeira do setor. Em abril de 1997, as dívidas de tais hospitais, muitos deles
operando com menos da metade do número de funcionários necessários ao
seu adequado funcionamento, ultrapassavam os R$ 100 milhões (Silva, 1996).
79
sociabilidade embasada em autoritarismos e ampliada por processos de
globalização54 (Freire, 2006).
54
A globalização é um conceito amplo e empregado por diferentes autores para explicar fatos
de natureza absolutamente diferentes. Contudo, todos aqueles que se debruçaram sobre essa
questão reconhecem não ser este um fenômeno recente.
80
3.4 Política de Saúde nos Anos 2000
81
Ainda dentro da mesma lógica de apoio estatal aos serviços privados
na área de saúde, não obstante a afronta ao texto constitucional – que veda a
transferência de recursos públicos para o setor privado –, foi engendrada a
política de universalização de planos privados para os servidores civis da
União, reproduzida no âmbito de estados e municípios (Bahia, 2008).
82
privatista que consolida a existência do SUS somente para os pobres e a
lógica de segmentação do sistema.
83
3.5 Cenário Político da Regulação do Processo Transexualizador
55
O médico Roberto Farina foi o primeiro cirurgião brasileiro a realizar, em 1971, na cidade
de São Paulo, uma cirurgia de redesignação sexual. Sete anos depois, Farina foi condenado a
dois anos de reclusão, sob a alegação de haver infringido o disposto no art. 129, § 2°, III,
do Código Penal Brasileiro. Tal processo foi movido pelo Conselho Federal de Medicina, que o
acusou de “lesões corporais graves”. Posteriormente, em grau de recurso, o médico foi
absolvido, pois a Justiça concluiu que a cirurgia era o único meio de aplacar a angústia da
pessoa operada. Além disso, havia um parecer favorável à intervenção cirúrgica como solução
terapêutica, elaborado por junta médica do Hospital das Clínicas de São Paulo (Nery, 1984).
56
A Resolução nº 1.482/1997 foi revogada pela Resolução nº 1.652/2002, que, por sua vez, foi
revogada pela Resolução CFM nº 1.955/2010, atualmente em vigor.
84
Diante da autorização do CFM, alguns hospitais universitários públicos
começaram a realizar, em caráter experimental, a cirurgia de transgenitalização
em mulheres e homens transexuais. Estas primeiras intervenções cirúrgicas,
não obstante os profundos dissensos que provocaram, configuraram, sem
dúvida, um marco importante para a futura institucionalização do Processo
Transexualizador no âmbito do SUS.
57
Universidade do Estado do Rio de Janeiro; Universidade Federal do Rio de Janeiro;
Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Universidade de São Paulo; Universidade Federal
de Alagoas e Universidade Federal do Espírito Santo.
85
Durante a Jornada, foram debatidas questões cruciais para a
estruturação de um modelo de serviços públicos de saúde voltados
especificamente à população transexual, desde os aspectos históricos,
políticos e sociais da transexualidade, até os efeitos éticos e jurídicos que
envolvem o tema. Também foram discutidos pontos técnicos relacionados ao
diagnóstico psiquiátrico, à terapia hormonal e às cirurgias de transgenitalização
e seus desdobramentos (ajustes, correções e intercorrências).
58
Quase uma década depois da I Jornada, a discussão sobre a saúde da população trans –
que em 2005 pautava-se exclusivamente nos aspectos do não atendimento e da falta de
institucionalização – ganhou outros contornos, para abarcar também questões como a inclusão
das travestis e a necessidade de ampliação de serviços.
86
19/08/2008, a primeira instituindo o Processo Transexualizador no âmbito do
SUS e definindo suas diretrizes e a segunda regulamentando tal processo.
59
A integralidade constitui antiga bandeira de luta do Movimento Sanitário que, apesar de
consagrada como um dos princípios do SUS, infelizmente, ainda está longe de se efetivar na
prática. Para Franco (2007), a integralidade significa assistência ao usuário em todas as suas
necessidades, desde a garantia de boas condições de vida, até o acolhimento nas unidades de
públicas de saúde, passando pelo acesso às tecnologias disponíveis de cuidado.
87
cirurgias de transgenitalização não foram habilitados para a realização do
procedimento no âmbito do SUS.
60
Trata-se da constituição de uma neovagina, mediante a remoção dos testículos e a utilização
da pele para a constituição dos lábios vaginais. Após a construção do orifício da neovagina, a
pele do pênis é invertida e colocada dentro do orifício, para que constitua a parte interna da
mesma. São mantidos os corpos cavernosos, veias e glande, ou seja, toda a inervação
sensória, sendo que da glande se constituirá o clitóris, parte sensível que possibilitará o
orgasmo com ejaculação. A cirurgia, além de corrigir a estética do corpo, mantém a
funcionalidade do órgão genital. Disponível em: www.medicinanet.com.br. Último acesso em 15
de março de 2014.
61
Cirurgia para a construção de um neofalo ou implantação de uma prótese peniana. Na
neofaloplastia, a construção do pênis ocorre a partir da pele de outras partes do corpo do
próprio homem transexual, enxertada na área do órgão sexual. É possível ter uretra, glande e
testículos. A pele e o tecido dos lábios vaginais são utilizados para criar um escroto
(escrotoplastia), implantando-se próteses de silicone para simular a existência de testículos.
Também é possível colocar no pênis um implante de ereção, para viabilizar a penetração.
Disponível em: www.medicinanet.com.br. Último acesso em 15 de março de 2014.
88
acompanhamento psiquiátrico por, no mínimo, dois anos para a confirmação
do diagnóstico.
89
complexidade de demandas, necessidades e aspirações das pessoas
transexuais.
62
A presente pesquisa foi aprovada pelo Parecer CEP/UERJ nº 512.841.
90
programas de saúde, a partir de diferentes perspectivas, delimitadas pelo lugar
institucional ocupado por cada um(a) dos(as) entrevistados(as).
91
Transexualizador. Naturalmente, no decorrer de cada entrevista, algumas
respostas ensejavam outras perguntas e novos desdobramentos.
63
O Grupo Pela Vidda do Rio de Janeiro (GPV-RJ) foi fundado em 24 de maio de 1989, pelo
escritor Herbert Daniel. Trata-se da primeira organização brasileira de pessoas vivendo com
HIV e AIDS, seus amigos e familiares, com ações e iniciativas garantidas pela intensa
dedicação de voluntários e profissionais engajados na luta contra a epidemia no país. O GPV-
RJ não possui fins lucrativos, sendo mantido por meio de financiamentos de instituições
brasileiras e internacionais que atuam em saúde e desenvolvimento social. O Grupo conta,
também, com um grande número de parcerias locais com outras organizações que lutam pela
defesa da cidadania. Seus objetivos principais são a ruptura do isolamento e a desconstrução
do estigma relacionado à doença; a reintegração no quotidiano social das pessoas vivendo com
HIV e AIDS, a defesa dos direitos e a garantia da dignidade dessas pessoas. Disponível em:
www.pelavidda.org.br. Último acesso em 09 de março de 2014.
64
Trata-se de um grupo político que trabalha com travestis, profissionais do sexo e pessoas
transexuais. Sua principal contribuição se dá por meio de palestras sobre temáticas como:
prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, HIV/AIDS, direitos políticos, sociais e
culturais desse segmento, atuando também na preservação da autoestima e da cidadania
desses indivíduos.
92
Tais eventos propiciaram muitas horas de observação participante,
bem como registros e anotações em diário de campo, dando ensejo, inclusive
à apresentação de um trabalho sobre o tema no 10° Fazendo Gênero em
Florianópolis, onde usuários(as) do Processo Transexualizador oriundos de
diversos Estados do país expuseram suas narrativas. Todas essas fontes e
experiências somadas permitiram a construção de um mosaico de informações
que contribuíram de alguma maneira para esta pesquisa.
93
4.2. Participantes da Pesquisa
Quadro Sinótico
94
4.3 IEDE: O Pioneirismo e a Ousada Iniciativa de uma Equipe
65
Na realidade, não havia qualquer resolução ou parecer do Conselho Federal de Medicina
referendando a hormonioterapia para pessoas transexuais; por outo lado, a prática tampouco
era formalmente vedada pelo CFM. Cabe mencionar que em fevereiro de 2013, por meio do
Parecer nº 8/2013, o CFM passou a disciplinar a terapia hormonal para adolescentes travestis e
transexuais, com base nas linhas de cuidado para hormonioterapia estabelecidas pelos padrões
internacionais da Sociedade Internacional de Endocrinologia.
66
Segundo o Ministério da Saúde, a hormonoterapia ou terapia hormonal baseia-se no princípio
de administração ou subtração de hormônios para vários fins, como terapia de masculinização
e feminilização.
95
de Medicina. Em outras palavras, o atendimento restringia-se à emissão de
laudos atestando se a pessoa era ou não transexual.
96
pois foi pioneiro na realização de cirurgias de transgenitalização
numa conjuntura muito desfavorável a esta questão. Este
pioneirismo contribuiu enormemente para a disseminação dos
problemas afetos à transexualidade (universo desconhecido
naquele cenário). O terceiro e último aspecto refere-se às
contribuições inestimáveis do IEDE que foram responsáveis, na
minha visão, pela instituição de uma assistência médica voltada
especificamente à população transexual no Estado do Rio de
Janeiro (Profissional B).
67
Maiores informações podem ser conferidas também em Teixeira (2013) e Leite Jr. (2011).
68
Jalma Jurado, PhD em Medicina pela USP, foi, por mais de três décadas, professor de
cirurgia plástica na Faculdade de Medicina de Jundiaí. Além disso, é um dos médicos que fez
mais cirurgias de adequação genital no Brasil, tendo se tornado nacionalmente conhecido por
ser um dos pioneiros no país em cirurgias de redesignação sexual de qualidade para mulheres
transexuais.
97
4.3.1 Hormonioterapia: Entraves e Limitações no Acesso
69
Define-se o hirsutismo – também chamado frazonismo – como a presença de pelos terminais
na mulher, em regiões anatômicas onde tal presença é característica do sexo masculino.
Disponível em: http://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/5301/hirsutismo.htm. Último
acesso em 04 de fevereiro de 2014.
70
O teste de vida real ainda é amplamente utilizado no país como critério de distinção entre
transexuais “falsos” e “verdadeiros”, a despeito de protestos das pessoas transexuais, de
alguns profissionais de saúde e de estudiosos que adotam perspectivas mais críticas a respeito
do tema. Nesta fase, o indivíduo deve aprender, durante dois anos de acompanhamento, a
viver segundo as normas culturalmente determinadas ao sexo a que se sente pertencer.
Maiores informações podem ser encontradas em Arán (2006).
98
Havia, portanto, a máxima preocupação da equipe do IEDE em garantir
a suposta veracidade da condição transexual do(a) paciente, diferenciando
os(as) “transexuais verdadeiros(as)” dos(as) “falsos(as)” por meio de um
protocolo psiquiátrico extremamente rígido, que incluía testes como o de “vida
real”. Do relato do usuário, depreende-se, ainda, que, não obstante tratar-se de
instituição pública, o(a) paciente precisava arcar com custos significativos para
realizar o tratamento. As angústias decorrentes de todo esse processo são
assim descritas:
Por outro lado, além dos preços elevados, alguns medicamentos eram
praticamente inacessíveis no Brasil. O Usuário A apresenta sua narrativa
concernente a esses problemas, bem como aos obstáculos na obtenção de
receituário médico para aquisição de hormônios:
99
Então, o que complica na compra dos hormônios masculinos
são as exigências de uma receita médica, o que as trans
mulheres não precisam, pois elas conseguem comprar
71
qualquer tipo de anticoncepcional na farmácia . Desta forma, o
mercado negro corre solto (sobretudo, nas academias de
ginástica), porque quem toma a testosterona não é só trans
homem (tanto homens cis como mulheres cis). As mulheres
72
cisgêneras também tomam testosterona – claro que uma
quantidade um pouco menor – para ter mais musculatura e
disposição. Então, se vende receita na internet. Eu conheço
trans homem que fabrica receita, entra no PowerPoint e faz a
receita. Claro que a gente aconselha a todos buscarem um
endocrinologista e eles procuram, mas não são aceitos. A
maioria não consegue porque o endócrino não quer se
comprometer; nunca tratou de transexual. Não existe essa
cadeira dentro da faculdade de medicina. Como é que se
ministra testosterona num corpo feminino? Eles não sabem.
Então, muitos se recusam a atender. (Usuário A).
71
É importante ressaltar que medicamentos adquiridos em farmácias e drogarias podem diferir
de forma significativa daqueles especificamente indicados para hormonioterapia. Além disso, os
hormônios – cujos efeitos variam bastante de pessoa para pessoa – são drogas potentes e
altamente nocivas ao organismo quando mal administrados ou na hipótese de o paciente ter
alguma contraindicação. Por tais razões, revela-se imprescindível o acompanhamento de um
endocrinologista.
72
Um indivíduo é dito cisgênero (do latim cis = do mesmo lado) quando sua identidade de
gênero está em consonância com o gênero que lhe foi atribuído ao nascer, ou seja, quando sua
conduta psicossocial – expressa nos atos mais comuns do dia-a-dia – está inteiramente de
acordo com o que a sociedade espera de pessoas do seu sexo biológico. Disponível em:
http://transfeminismo.com/2011/11/17/o-que-cissexismo. Último acesso: 06 de fevereiro de
2014.
100
elimina a produção de estrogênio. Por isso, a importância dos
73
bloqueadores (eu tomei bloqueador). Os estrogênios são
responsáveis pelos caracteres secundários (Usuário A).
101
estabelecemos um protocolo de atendimento clínico e, em
1999, começamos a fazer o atendimento. Após a forte suspeita
de “transexualismo” – assinada pela equipe, principalmente
pelo psiquiatra –, começávamos a fazer o processo de
reposição hormonal; o processo de hormonização; de dar
hormônio (não era nem fazer reposição) e dentro daquele
esquema de observar dois anos. No final de no mínimo dois
anos, essas pessoas seriam ou não encaminhadas para a
cirurgia de transgenitalização (Profissional A).
102
Com efeito, a fila para ingresso no referido programa era extensa, com
anos de espera. Os potenciais usuários procuravam seguidas vezes o IEDE
em busca de atendimento, sendo informados da inexistência de vagas.
74
O Projeto Damas da Prefeitura do Rio de Janeiro, pioneiro no Brasil, tem por objetivo a
reinserção social e profissional de travestis e transexuais, por meio de capacitação e incentivo à
escolaridade, bem como de ações voltadas para a empregabilidade desse segmento
populacional. Dentre os profissionais responsáveis pelas aulas ministradas no projeto estão
psicólogos, fonoaudiólogos, professores, juristas, médicos, infectologistas e especialistas em
hormonioterapia. Disponível em: http://www.pcrj.rj.gov.br/web/smds. Último acesso em 25 de
fevereiro de 2014.
75
A questão das longas filas de espera no Hospital Universitário Pedro Ernesto será abordada
no item 4.5.4, intitulado “Filas de Espera: Alta Demanda e Oferta Insuficiente de Vagas”.
103
A situação é descrita por B:
76
Androcur ou Acetato de Ciproterona é um produto sintético com estrutura semelhante à dos
hormônios sexuais naturais. É, também, um potente antagonista de androgênios, que possui
atividade progestacional e suprime a secreção de gonadotrofinas. Além disso, a Ciproterona
inibe a produção de testosterona, interferindo na ação androgênica. Disponível em:
http://www.medicinanet.com.br/bula/8086/ciproterona.htm. Último acesso em 07 de fevereiro de
2014.
77
Há que se ter cuidado para não se naturalizar a existência de longas filas de espera na área
de saúde. Tal questão deve ser compreendida como algo grave, pois o indivíduo que está
aguardando um tratamento ou cirurgia passa por enorme sofrimento psíquico.
78
Cariótipo é o conjunto cromossômico ou a constante cromossômica de uma espécie e
representa o número total de uma célula somática do corpo. Em outras palavras, o cariótipo é o
conjunto de cromossomas dentro do núcleo de uma célula e fornece as informações
substanciais para o estabelecimento das relações entre espécies, com respeito à organização
dos cromossomos. Disponível em: http://www.medicinanet.com.br. Último acesso em 07 de
fevereiro de 2014.
104
Em sua experiência como ativista do movimento transexual, o Usuário
A assevera que muitas pessoas transexuais sofrem de depressão, enfrentando
situações muito difíceis e angustiantes em seu cotidiano, situações estas
potencializadas pelo despreparo técnico e ineficiente dos(as) profissionais de
saúde em questões afetas à transexualidade:
105
Ainda sobre o sofrimento psíquico, a Profissional A relata um fato
marcante e emblemático:
106
Em síntese, a despeito dos obstáculos no atendimento do Instituto
Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione, marcado,
especialmente, pela limitação no acesso ao programa – a demanda por vagas
é bastante superior à oferta – e pela inexistência de serviços cirúrgicos, o
caminho aberto pela instituição foi de suma relevância para a sistematização
da assistência voltada à saúde de pessoas transexuais no Estado do Rio de
Janeiro.
107
Logo após a primeira Resolução do CFM, uma paciente
procurou o Serviço de Endocrinologia do hospital e o Chefe do
Serviço de Endocrinologia me procurou e me disse que achava
que era da minha especialidade e não da dele. Foi aí que eu
soube da Resolução do CFM, inclusive. Eu passei a ser o
Coordenador do Programa como um todo. Chamava-se
Programa de Atenção a Pacientes Transexuais e Cirurgia de
Transgenitalização. A Resolução não foi prévia. Foi a partir de
um pedido de um colega, chefe de outro serviço. Claro que isso
não explica a minha manutenção ou o fato de eu ter ficado no
Programa e tê-lo conduzido por 15, 17 anos, sei lá quanto
tempo que eu fiquei nisso (Profissional C).
79
O fato de não ter havido nenhum receio por parte do Profissional C em relatar esse episódio
demonstra que o estranhamento inicial foi superado (anotações do caderno de campo, Rio de
Janeiro, 04 de novembro de 2013).
108
pacientes sendo acompanhados por uma equipe informal composta de um
psiquiatra e uma psicóloga:
109
cansado ou você está cansada?”. Eu não falava assim. Eu
falava: “você está com cansaço?” Para exatamente não ter que
definir. E em algum momento, depois das sessões e das
consultas, eu me percebia já falando num determinado gênero
espontaneamente, masculino ou feminino e aí eu percebia que
neste momento, para mim, o diagnóstico estava feito. Aí eu
autorizava a cirurgia (porque já teve alguns casos que não
eram transexuais, enfim, pacientes psicóticos confundindo
realmente). No momento em que eu percebia que estava
falando com uma mulher, ela era uma mulher! (Profissional C).
110
4.4.1 Perfil dos(as) Usuários(as)
111
Ainda sobre o perfil da população feminina, C assinala:
80
Esteroides ou anabolizantes são compostos com propriedades que intensificam os efeitos
fisiológicos da testosterona, como o aumento da massa muscular e a redução de gordura.
Disponível em: http://www.brasilescola.com/quimica/esteroides-anabolizantes-forca-beleza-
enganosas.htm. Último acesso em 10 de março de 2014.
112
Como se depreende do discurso de C – médico psiquiatra que atendeu
por mais de 15 anos este segmento populacional –, não há distinções
significativas, em termos psíquicos e comportamentais, entre pessoas
transexuais e não transexuais, isto é, a transexualidade, por si só, não
configura um quadro clínico específico.
113
programa; não achavam que o resultado era bom. Eles
achavam que os benefícios trazidos pelas cirurgias eram muito
pequenos e tinha um deles especialmente (era uma mulher e
um homem), um deles especificamente se sentia muito mal
(tem uma frase que me marcou muito). Ele se sentia muito mal
de fazer uma cirurgia num pênis saudável, embora não seja
uma extirpação; é uma reconstrução... Ele sempre falava muito
isso e se sentia muito impactado emocionalmente. Para ele
aquilo era muito difícil. Ele falava que na época tinha que tomar
medicação e foi fazer terapia, porque para ele aquilo estava
sendo uma violência. Então, se eu não me engano (não tenho
muita certeza), mas acho que o argumento dele para a Direção
do hospital de que ele não faria mais o procedimento era um
pouco isso, no mal estar que aquilo estava lhe fazendo. Isso
tudo era uma coisa nova para este profissional (Profissional D).
81
O Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ é também conhecido como Hospital
do Fundão, por estar localizado na Ilha do Fundão, Zona Norte do Rio de Janeiro.
114
Ainda de acordo com o relato da Profissional D, os(as) usuário(a)s
reclamavam muito da longa fila de espera. Entretanto, nunca levavam tais
reclamações ao conhecimento formal dos profissionais envolvidos diretamente
no atendimento.
115
assistente social que me sugeriu procurar o Hospital do
Fundão. Quando eu cheguei ao Fundão, procurei o Serviço
Social e, com muita insistência e depois de várias idas ao
hospital, eu consegui chegar ao médico psiquiatra do programa.
No início, ele me disse que não havia vagas e me pediu que
esperasse mais um tempo. Aconselhada por outras meninas
transexuais que estavam sendo atendidas no hospital, todos os
meses eu o procurava e acabei sendo inserida no programa. Eu
tinha 28 anos de idade, ou seja, isto aconteceu há 10 anos. Na
primeira consulta com o psiquiatra, aconteceu algo muito
desagradável. Depois de perguntar minha idade, ele me
questionou com muita frieza: “você não acha que o tempo para
você passou, não? Você está velha para procurar uma cirurgia
dessas”. Bastante sem graça, olhei para ele muito triste e
respondi: “nunca é tarde para começar nada nesta vida doutor,
especialmente quando se tem fé em Deus”. Nesse dia ele me
inscreveu e eu fiquei indo nas consultas (Usuária C)
82
Atualmente, a entrevistada está tentando fazer a cirurgia de transgenitalização no Hospital
Universitário Pedro Ernesto (HUPE/UERJ).
116
como carência de leitos – havia, ainda, o desinteresse dos cirurgiões em
continuar com as cirurgias de transgenitalização. Consequentemente, na
ordem de prioridade, tais cirurgias acabavam sendo relegada a segundo plano.
117
83
Em seguida, vão descobrir que são Klinefelter e não
conseguem ter filhos porque são estéreis, porque o testículo
ficou preso no abdômen e não desceu. Os homens são
estéreis. Muitos homens heterossexuais são Klinefelter. A
paciente que chegou para mim era uma mulher transexual e
tinha um companheiro no interior do Estado do Rio de Janeiro.
O pai era um profissional universitário sério. Ela estudou na
faculdade como um homem e fez faculdade no interior do
Estado como homem. O pai, além de ser uma pessoa
importante na cidade, era um líder de uma religião importante.
Então, ela saiu lá da cidade e veio pro Rio (talvez pra sair dessa
questão familiar) e aqui no Rio é que resolveu se assumir e
passou a se vestir de mulher, tomar hormônio, botar prótese e
essas coisas. Era uma pessoa bem informada com nível
universitário e ela chegou com esse exame que tinha – a olho
nu – pênis e testículos e tinha também ovário e útero. Bom,
finalmente chegou a época de fazer a cirurgia e ela era a da
vez. Mas, tinha um problema de que, quando era um caso
assim, manda-se repetir os exames (porque era uma coisa tão
rara) e ela trouxe de novo a ressonância em que tinha a
presença de útero, de ovário, atresia de vagina (atresia é um
estreitamento e/ou um encurtamento do canal vaginal). Faria
sentido numa pessoa XXY que teve alguma alteração
anatômica esquisita e foi confirmado. Fizemos o cariótipo de
novo e deu de novo, não me lembro se XXY ou XX, já nem me
lembro mais. Não importa... O que importa é que na hora da
cirurgia, os cirurgiões combinaram que primeiro de tudo tinham
que ver qual era a situação desse útero, porque tinham receio
que um útero em vigência de um cromossomo XXY, produzindo
hormônio masculino, poderia cancerizar. Então, tinha que tirar
esse útero, primeiro de tudo, antes de tirar pênis e testículos.
Tinha que abrir o abdômen para ver o útero e o ovário como é
que estavam; para ver o estado, pelo menos fazer um corte
para ver. Na hora da cirurgia, abre-se e não tem útero e nem
ovário. O cirurgião fecha. Klinefelter é um homem que tem
pênis e testículo e não tem útero e nem ovário. Ele seria um
hermafrodita (com presença de útero e ovário; pênis e vagina).
O cirurgião abre e não tem útero e nem ovário. Ele fecha e na
hora percebe-se que houve um logro, houve um engano... Ela
forjou. A pessoa que ia para cirurgia, forjou os exames
(Profissional C).
83
A síndrome de Klinefelter, descrita pela primeira vez por Harry Klinefelter em 1942, é a causa
mais frequente de hipogonadismo e infertilidade em indivíduos do sexo masculino. A causa
genética da síndrome foi descoberta em 1959. As pessoas com síndrome de Klinefelter, do
sexo masculino, têm um cromossomo X adicional, estatura elevada, algum desenvolvimento do
tecido mamário e testículos pequenos.
Disponível em: http://www.sobiologia.com.br/conteudos/Genetica/genesnao. Útimo acesso em
03 de fevereiro de 2014.
118
trouxe e os exames que ela fez, eram da amiga. Do mesmo
modo que e o cariótipo e que o exame de cromossomo que ela
fez, não foi ela que fez e a amiga não era XY, era XX. Bom,
isso dá processo e os médicos queriam processá-la. Imagina?
O cara foi induzido a erro e queria processar a paciente;
mandá-la embora e desligá-la do programa... O que eu
consegui fazer, depois de pensar muito tempo (ela realmente
não tinha mais condições e os cirurgiões se negaram e eu
compreendo completamente) foi mandá-la para o Hospital
Pedro Ernesto e ela foi operada lá. O Alexsandro a aceitou e eu
contei para ele a história. Tirando isso, era a pessoa mais
rígida, rigorosa, honesta que eu já vi na minha vida...Tamanho
desespero a levou a isso. Essa foi uma situação terrível. Essa
marcou! (Profissional C).
119
4.4.3 Encerramento do Programa
120
maleabilidade. A pessoa vinha lá de “Caixa-Prego”, chegava 8
horas e 10 minutos e não podia mais ser atendida (o horário era
às 8 horas). Havia má vontade e as pessoas sentiam isso. No
começo, ainda tinha uma psicóloga lá (cujo nome, não vou
lembrar), a gente tentou fazer uma pareceria: eu, o IEDE; o
HUPE/UERJ; exatamente para poder ter uma troca de
informações. Muitos pacientes se matriculavam nos dois
lugares. Então aqui acabou basicamente por isso. Uma das
professoras e cirurgiãs se aposentou e eu assumi outras
funções. O Ministério da Saúde chancelou o Pedro Ernesto,
que tinha muito mais cirurgia do que aqui, o que eu acho justo.
Por isso acabou basicamente (Profissional C).
121
Universitário Clementino Fraga Filho, deixando claro que a experiência não
passou do que Bento (2012), referindo-se a mecanismos jurídicos, denomina
“gambiarra”.
84
Informação disponível em
http://www.ccr.org.br/uploads/eventos/seminariomar10/eloisio_reconstrutora_genital.pdf. Último
acesso em 17 de junho de 2013.
122
85
ver a questão dos transgêneros como interessante apenas e
entendê-la como uma questão importante, de uma minoria
ainda com poucas oportunidades de inserção social. Não
estamos oferecendo às pessoas que vivenciam a
transexualidade nenhum favor, é uma questão de direito (Silva,
2012:13).
85
Transgênero é um termo utilizado para descrever pessoas que escapam da visão tradicional
do que é masculino e feminino. Isso inclui as pessoas transexuais que têm um forte e constante
desejo de viverem e serem aceitas como membros do sexo oposto. Muitas se submetem ao
tratamento com hormônios e cirurgia de readequação de gênero.
86
Para maiores informações acerca da despatologização da transexualidade, inclusive da
campanha internacional sobre o tema, conferir Lionço (2006), Bento (2008) e Murta (2011).
123
a procura por um médico do Estado que tivesse capacidade e
foi na época que eu estava aqui. Aí, chegou esse papel na mão
do serviço (eu não sei bem por meio de qual burocracia
chegou, mas chegou à mão do chefe da Urologia) e ele me
perguntou se eu tinha treinamento para isso e eu falei que tinha
treinamento e ele me perguntou se a gente poderia cumprir
aquela ordem judicial e assim foi o primeiro caso. A partir daí,
um foi contando paro o outro e aí apareceu muita gente. O juiz
avaliou o direito, os deveres, o bem do paciente, se arvorou ali
de laudos (eu não tive acesso ao processo em si) e tomou uma
decisão que eu acho que foi muito pertinente (hoje soa até
comum, mas eu imagino que isso há 13 anos, bem isso foi
bastante interessante). Eu faço um agradecimento em nosso
livro a esse juiz. Eu botei ele como Juiz D. (d de desconhecido)
porque são aquelas coisas que a gente influencia vidas e não
está nem sabendo quais são as influências que a gente vai
tendo na vida de outras pessoas. Então, esse juiz influenciou a
minha vida. Por causa de uma sentença correta, pertinente. Ele
determinou e está tudo ok. E aconteceu... As coisas foram
acontecendo. A partir dessa cirurgia, a demanda aumentou...
As pessoas vão comentando, um vai contando para o outro. Até
tenho um gráfico numa apresentação de como foi aumentando
o ingresso de inúmeros novos pacientes em nossos serviços...
Foi um aumento exponencial assim. A primeira pessoa que fez
a cirurgia era uma mulher trans. Eu não me lembro de detalhes.
Mas, em principio, estava tudo correto. Ela já era casada, já
tinha uma união estável com uma pessoa. Tudo certinho
(Profissional F).
124
Não obstante a motivação e a satisfação dos profissionais na
realização deste trabalho e o aumento da demanda, o programa não foi
adequadamente estruturado e continuou funcionando dentro do Ambulatório
de Urologia, que efetuava serviço de reconstrução genital de intersexuais e
transexuais, bem como de pacientes que sofreram acidentes. Em outras
palavras, o(a) usuário transexual era atendido juntamente com quem, por
exemplo, sofria de estenose de uretra87 ou tivera o órgão genital mutilado por
queimaduras ou acidentes.
87
Estenose uretral é um estreitamento do canal por onde a urina flui para fora de bexiga, que
acarreta diminuição ou mesmo interrupção completa do fluxo urinário, provocando uma série de
complicações. Este tipo de problema é mais comum e mais complexo em homens, pois a uretra
é bem mais longa nos indivíduos do sexo masculino.
Disponível em: http://www.hospitalsiriolibanes.org.br/hospital/especialidades/nucleo-avancado-
urologia/doencas-urologicas/doencas-bexiga-uretra/Paginas/estenose-uretra.aspx.
Último acesso em 10 de fevereiro de 2014.
125
diversos pontos relacionados direta ou indiretamente ao programa. Tais
questionamentos partem frequentemente dos próprios profissionais da equipe,
como se percebe a partir do depoimento do Profissional F:
Tem que ter uma equipe multi, multi, multi e eu ainda brinco
que eu não gosto do multi. É trans. Tem que ser
transdisciplinar. As disciplinas têm que conversar umas com as
outras. Por isso eu acho perigoso e potencialmente danoso
para as demandas desse individuo que a gente está chamando
também de transexual que também é outra complicação,
porque exclui. A ideia de ser inclusiva, a política de
transexualidade foi extremamente exclusiva e excludente para
as travestis. É ridícula. É uma coisa não pensada na sua
completude. Foi uma coisa feita às pressas parece. E o pior, é
que muitas discussões que foram feitas, antes de sair a
primeira Portaria do Ministério da Saúde, foram por pessoas
126
muito capacitadas, muito congruentes e muito legais assim e
muitas dessas pessoas que participaram me dizem que não se
viram na Portaria final (Profissional F).
88
A Portaria nº 2.803, de 19 de novembro de 2013, que redefine e amplia o Processo
Transexualizador no âmbito do SUS, estende às travestis o acesso aos serviços.
127
Rio Grande do Sul (o Hospital das Clinicas de lá é diferente do
Hospital Universitário de Goiás, que é diferente da USP, que é
diferente da gente). Cada um desses tem sua particularidade e
então quando se fala e se institui um Processo
Transexualizador, esse entendimento é muito inadequado,
inoportuno e gera incômodo. É muito equivocado e perpetua-
se. Isso me incomoda muito (Profissional F).
128
escolaridade e com menor inserção no mercado de trabalho formal,
atualmente, tais indicadores estão um pouco diferentes, conforme assevera o
Profissional F:
129
4.5.4 Filas de Espera: Alta Demanda e Oferta Insuficiente de Vagas
130
Eu deixei o Fundão em 2009. Na época, consegui uma
declaração do psiquiatra atestando que eu estava há quatro
anos sendo acompanhada pela equipe do programa de lá e, por
isso, pronta para fazer cirurgia. Foi com este laudo que eu
consegui ser atendida pela equipe de saúde mental do HUPE
em 2010. O psiquiatra do HUPE me deu outro laudo dizendo
que eu já podia fazer a cirurgia, mas até agora estou na fila de
espera sem previsão de ser atendida (Usuária C).
131
E vira e mexe determinam que a gente passe alguém na frente
na fila. Eu respondo (e acho que eu vou ter problema jurídico
qualquer dia, porque eu não sei se eu posso fazer isso). Eu já
tenho a resposta pronta e apenas copio e colo. O juiz não
manda passar na fila (esse é o problema). Ele manda assim
“que se cumpra, tem um nome técnico e jurídico, mas que se
cumpra” e em 15 dias eu vou ter que operar o paciente. É um
cumpra-se! Mas, eu respondo. Eu falo assim: “equipe nós
temos e muito disposta a operar. Os residentes de urologia
adoram e estão muito dispostos. Não temos, contudo,
condições de fazê-lo. Existe a fila de tantos pacientes. Este
paciente está na posição tal e vai ser operado em detrimento
dos demais. Se o senhor esclarecer na sua sentença que está
mandando passar na frente da fila, eu comunico isso a todas as
outras com o seu nome e aí o senhor manda”. E ainda falo
assim: “se o julgamento de vossa excelência acha que é muito
importante para o beneficio desse individuo passar na frente e
fazer a cirurgia, que se faça e que se criem condições para não
interferir. Me arrume um centro cirúrgico e um anestesista que
eu opero, mas eu não estou prejudicando quem está na fila”.
(Profissional F).
132
aceitar ou não, é o direito de autonomia do corpo. Há um termo
de consentimento e é o que a gente faz todo dia e toda hora
quando opera qualquer pessoa. Não há nada diferente e,
quando eu falo que o preconceito se disfarça de varias formas,
é que parece que está tudo ok, porém, é mais um
‘preconceitozinho’ e quando se fala assim: “ah, é para proteger
o individuo”. Gente quem protege o indivíduo é ele mesmo, ele
tem que estar informado. Agora é o contrário: as pessoas
chegam com um terror para fazer a cirurgia genital e só o faz
aquele indivíduo que quer muito mesmo o falo (também tem
uma característica do homem trans que são as mamas, pois
têm uma representação fática). Então, a demanda imediata é
por mastectomia (a retirada das mamas). Quanto à
histerectomia, é isso que eu estou te falando: a menstruação
deixa de ser um incômodo quando começa o uso dos
hormônios e tem o desconforto de que você, pelo uso dos
hormônios, corre riscos: o câncer do endométrio
principalmente. Então, tem que fazer as avaliações de
preventivo, o que gera um desconforto nos homens. O homem
não gosta de ir ao ginecologista porque é muito desconfortável
(Profissional F).
133
centros? Isso está na mão deles. Isso é poder delegado às
pessoas. Não está pensado. Nitidamente, vão entrar pessoas:
endocrinologistas, clínicos, psicólogos etc. Vamos falar então
da psicologia. Foi muito difícil trabalhar congruente com a
gente, pois estava cheio de gente com abordagens diferentes e
que confundiam a cabeça do usuário. Então assim... quando se
fala em protocolo de atendimento PSI, meu Deus, qual
protocolo? Não existe isso! Não existe essa regrinha! Quem
dera... Se fosse uma receita de bolo. Então, temos um
megaproblema. Mas, eu estou feliz; está andando, está
mobilizando. Mas, eu queria muito estar vivo no momento em
que se criasse um atendimento próximo do que é digno pra
esses indivíduos (Profissional F).
134
Em doze anos atendendo este segmento populacional, aprendi
muito. Em geral, o que me faz muito bem é o bem que eu faço
a eles! Isso me faz muito bem. O reconhecimento que eles têm
não tem preço, não é? É impressionante! O agradecimento que
eles sentem. Eles descobrem o dia que eu faço aniversário, me
dão presentes no Natal. Sou muito querido. É uma alegria que
não tem preço! Tamanha gratidão mudou o meu modo de ver a
vida. Sinto-me uma pessoa melhor em saber que fiz a minha
parte ao atender as pessoas transexuais (Profissional E).
89
O referido Código prescreve direitos e deveres do assistente social, segundo princípios e
valores humanistas para o exercício cotidiano, dentre os quais se destacam: defesa
intransigente dos direitos humanos contra todo tipo de arbítrio e autoritarismo; defesa,
aprofundamento e consolidação da cidadania, da democracia, da socialização da participação
política e da riqueza produzida; posicionamento a favor da equidade e da justiça social, que
implica a universalidade no acesso a bens e serviços e a gestão democrática; empenho na
eliminação de todas as formas de preconceito e garantia do pluralismo; bem como
compromisso com a qualidade dos serviços prestados na articulação com outros profissionais e
trabalhadores (CRESS – 7ª Região, 2006).
135
Tal esforço contrapõe-se ao conservadorismo do passado, quando
os(as) assistentes sociais, na maioria das vezes, esperavam passivamente ser
demandados pelo(a) usuário(a) necessitado de uma cesta de alimentos, do
dinheiro de passagens ou de qualquer outro auxílio assistencial imediato
(Almeida, 2012a).
136
De acordo com os autores, “a tendência da produção científica
demonstra que, na atualidade, a diversidade sexual é tema de estudo da
Academia, ainda que, para abordá-lo, seja utilizado um conjunto de outros
temos” (idem:79).
90
A campanha, denominada “O Amor Fala Todas as Línguas: assistente social na luta contra o
preconceito” fundamenta-se no Código de Ética do Serviço Social e na Resolução nº 489/2006
do CFESS. O objetivo é desnaturalizar e desconstruir a heterossexualidade como a única
expressão socialmente legítima da sexualidade humana (Matos & Mesquita, 2011). Apesar de a
campanha ter despertado resistência em vários segmentos da categoria profissional, o conjunto
CFESS/CRESS – em consonância com os princípios preconizados pelo referido Código de
Ética e pela própria Constituição Federal de 1988 – não arrefeceu diante das críticas e
prossegue defendendo e veiculando a propaganda.
137
política semelhante, especialmente quando confrontada com travestis e
transexuais em seu cotidiano profissional. Com efeito, a existência dessa
legislação é fundamental, mas por si só não basta para proporcionar ao
Serviço Social todos os recursos teórico-metodológicos e técnico-operativos
necessários ao atendimento das demandas desta população.
91
Na norma atualmente em vigor, Portaria n° 2.803/2013, não estão expressas as atribuições e
competências específicas dos profissionais que atuam no Processo Transexualizador.
138
Como fatores que agravam a angústia e o sofrimento das pessoas
transexuais devem ser mencionados, ainda, fragilidades em termo de
cobertura previdenciária, dificuldades na garantia do trabalho e na retirada de
novos documentos civis, falta de acesso a medicamentos e ao Tratamento
Fora do Domicílio (TFD), transfobia, estigmas e preconceitos que envolvem os
mais variados espaços sociais: escola, moradia, instituições públicas e
privadas, trabalho, etc.
139
coisas assim que me deixam nervoso também. Chegam assim
uns papeis. Perguntinhas assim: “o usuário tem saúde para ir
de ônibus? Ele é obrigado a ir de avião?” Saúde tem. Mas, aí
eu escrevo... Eles querem botar nas minhas costas o
desconforto da pessoa pegar 3 ônibus e demorar dois dias de
viagem... E chegar; atender e voltar para rodoviária e fazer isso
várias vezes por mês. É muito complicado. Vem gente do Acre
e do país inteiro. Eu espero, assim, contar essas coisas para
você e que você multiplique essas informações por aí e saia do
academicismo que eu sei que você tem contatos e vínculos... É
surreal... É copo meio cheio. Então o Serviço Social começou a
ajudar, ver e repensar o TFD. Porque o TFD foi escrito por um
teórico do SUS em algum lugar aqui e a gente tem um
instrumento que vai resolver, ok, criou-se. Vamos ver o controle
de qualidade desse TFD? O que está acontecendo? O paciente
vai ficar um dia, vamos pagar uma diária. Não se pode pagar
R$ 15,00 de diária para uma pessoa que vai ficar aqui no Rio
de Janeiro... Aí naturalmente, o Serviço Social começou a ver
os abrigos para pessoa ficar. Pronto! Na dicotomia de gênero,
onde é que a pessoa trans entra no abrigo? Se os abrigos não
estão pensados para ver isso? Varias histórias de transfobia e
violência. Teve uma que foi e preferiu dormir na rua e deu esse
retorno para gente “ah, eu dormi na rua”. Toda boazinha. São
pessoas muito boas de forma geral. Aí ela falou assim: “doutor,
o senhor me desculpa a apresentação que eu estou aqui. Mas,
é que eu não tomei banho e não me arrumei porque eu dormi
na rua”. Mas, e o abrigo? “O abrigo não deu muito certo não.
Eles queriam me colocar junto com os homossexuais lá. Eu sou
uma mulher. Eu sou uma mulher”. É claro que é. E chegam
com fome e a gente arruma comida (que também não é papel
nosso). Várias vezes eu já pedi aqui; às vezes eu peço a um
residente. O residente conhece e eu peço “vai ao refeitório
extraoficialmente e arruma uma comida aí para essa pessoa”.
Como é que eu vou consultar a pessoa que não come há 24
horas, pálida e feliz? Então, eu comecei o Serviço Social com
as estrangeiras e já veio aqui colombiano, venezuelano,
argentino querendo fazer atendimento e aí você fala assim:
“como? Não sei? A gente vai ver aqui porque a gente sabe que
o SUS é para brasileiro”. Aí fiz um pedido ao departamento
jurídico para saber. Mas, até o departamento jurídico se
manifestar, teve que fazer alguns atendimentos porque ela
tinha um visto de turista; aí depois o visto venceu e renovou. E
aí são aprendizados que não estão em lugar nenhum...
(Profissional F).
140
planejamento urbano, previdência social, políticas ambientais, culturais, de
lazer e segurança pública. Por conseguinte, diante de tais atribuições e do
relevante papel desempenhado, não faria sentido a constituição de uma equipe
básica de saúde responsável pelo Processo Transexualizador no HUPE sem a
inserção do(a) assistente social.
141
social e político, isto é, um Serviço Social centrado no processo de
emancipação política e entrincheirado, sem tergiversações, nas fileiras das
lutas em prol de uma sociedade livre, justa e solidária.
92
Anotações extraídas do caderno de campo, após reunião no Grupo Pela Vidda em 04 de
outubro de 2013.
142
para cortar o meu cabelo e ela chegou a me agredir
fisicamente. Isto chegou à Direção. Ela cortou o meu cabelo e
quando a minha mãe foi à escola reclamar, ela disse: “você não
está vendo que o seu filho é gay? Faz alguma coisa!!” Minha
mãe respondeu: “ele pode ser gay, mas você não tem nada
com isso e não é problema seu!” Era um colégio público
(Usuária C).
143
Ademais, a obtenção de um vínculo formal de emprego torna-se
praticamente impossível enquanto os documentos civis estiverem em
desacordo com a identidade de gênero, o que relega as pessoas transexuais a
atividades subalternas e informais.
144
muitas vezes, no seu ponto de contato instantâneo com o
poder.
Enfim, restou cristalino neste item que a violência – seja física, verbal
ou institucional, velada ou não – atravessa a vida das pessoas transexuais. De
fato, há um conjunto de sistemáticas violações que se manifestam nas longas
93
Anotações extraídas do caderno de campo, após participação da roda de conversa:
“Transexualidade e direitos: expressões da Questão Social e Reconhecimento da Cidadania”,
realizada no dia 29 de janeiro de 2013 na Faculdade de Serviço Social da UERJ.
145
filas de espera pelos serviços de saúde, nos olhares preconceituosos de
funcionários das instituições, na falta de respeito quanto ao uso do nome
social, no descaso sistemático da rede de proteção social, enfim, nas inúmeras
e cotidianas discriminações comuns a uma sociedade capitalista.
94
Adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da Assembleia Geral das Nações Unidas
em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Diretos Humanos, num dos seus
principais artigos, determina que “todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e
direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com
espírito de fraternidade”. Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/ct/legis. Último acesso em
10 de março de 2014.
95
A Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) – também chamada de Pacto de San
José da Costa Rica – é um tratado internacional entre os países-membros da Organização dos
Estados Americanos, constituindo uma das bases do sistema interamericano de proteção dos
Direitos Humanos. Os Estados signatários desta Convenção se "comprometem a respeitar os
direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa
que está sujeita à sua jurisdição, sem qualquer discriminação". Disponível em:
www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm. Último acesso em 10 de março de 2014.
146
Evidentemente, o direito à saúde da pessoa transexual já se
encontrava assegurado, no plano teórico, pelas normas acima mencionadas.
Contudo, até 2008, as demandas específicas desse segmento populacional
eram solenemente ignoradas pelo Poder Público.
147
estabelecimento de diretrizes para a atenção integral em sentido estrito, mas
daquelas ações necessárias à garantia do direito à saúde, circunscritas à
passagem do sexo de nascimento para a vivência social no gênero com o qual
a pessoa se identifica (Lionço, 2009).
148
reuniões anteriores, com textos e pessoas em equipe, muitas
sem conhecimento do mundo trans. Eu até pensava que eram
pessoas técnicas, porque também é importante alguém que
conheça, porque às vezes a gente está pensando em algo
muito maravilhoso para saúde, mas fere um direito
constitucional. Então, a gente ir com conhecimento é importante
para construir a Portaria. Foi em 2005. Eu tinha mais contato
com um professor titular, que era o responsável pelo serviço de
urologia e era ele quem fazia a cirurgia no ambulatório de Porto
Alegre. Mas, eram reuniões muito desgastantes para a gente.
Aconteciam em Brasília no MS. Então, o que acontece? A
gente não se sentia ouvido e no momento em que colocava as
nossas angústias e até as divergências dos centros, não era
ouvido. E, no final, foi apresentado um texto em que a gente
não se sentiu representado ou com muito poucas questões de
atendimento. Acho que houve muita pressa para que fosse
realizada, assinada e divulgada a Portaria no momento político
relacionado às eleições. De qualquer forma, a gente é
convidado para um comitê técnico, a gente chega lá e entra
numa festa que já está acontecendo com convidados e sai... Eu
me senti desconfortável por não conhecer as regras de como
funcionavam as coisas e fui muito inocente, como outras
pessoas, na boa intenção de querer somar mesmo ao grupo e
aí você percebe que a coisa não é bem assim, tanto que na
segunda Portaria a gente foi convidado também (dessa mais
recente de 2013) e quando a gente foi lá, eram outras pessoas
no grupo técnico de alta complexidade. Não eram as mesmas
pessoas, não há uma continuidade... Não eram os mesmos
personagens. Técnicos alguns eram, mas não todos. Ficou
esquisito e houve grandes embates (Profissional F).
Por outro lado, o grande mérito de a gente ter uma Portaria, foi
o reconhecimento moral do trabalho. Não mudou nada o
trabalho da gente. Nada, nada e não houve grandes ganhos.
Absolutamente nada, de 2000 até 2013. É ridículo! O que
mudou realmente, talvez, é que a gente teve que fechar o
número de vagas porque se tornou de conhecimento público. É
como se pessoas que não entendiam o nosso trabalho (e
criticavam), depois que o nosso Governo endossou esse
trabalho, aí está certo... Aí um monte de gente procura, a
demanda explodiu... Muita gente veio procurar e aí,
infelizmente, por uma questão administrativa, a gente não tem
como dar vazão. Outro efeito colateral dessa história do
Processo Transexualizador é que muita gente de outros
serviços e de outros centros de referência quer se operar aqui.
149
Então eles vêm de acompanhamentos que não
necessariamente são o que a gente faz aqui no Rio e o usuário
chega com um perfil diferente. Aqui a gente tem um perfil de
trabalhar muito esse indivíduo, muito, muito, muito... Muitas
consultas. Muita conversa. A equipe inteira se envolve e,
quando chega a minha etapa de cirurgia (genital no caso), está
tudo muito conversado. Eu já estou me envolvendo com esse
indivíduo e, pela fila de espera, a gente já se conhece há 5 ou 6
anos... Então, é muito diferente daquele indivíduo que chega
cheio de papéis dizendo que está pronto e querendo uma
cirurgia no dia seguinte, sem nem me conhecer (Profissional F).
150
5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS:
151
pois usurpam da pessoa o direito de exercer a própria identidade. Angústias e
sofrimentos psíquicos não podem ser tratados como algo de menor relevância.
152
Entretanto, os avanços foram mínimos, considerando as fragilidades
dos programas de saúde instituídos no âmbito do SUS e a insuficiência da
rede de proteção social igualmente destacadas no decurso deste trabalho. Por
conseguinte, ainda há um extenso caminho a ser percorrido até que se alcance
a equidade nas ações de saúde e a efetiva materialização dos direitos
previstos na Constituição Federal.
153
traz consequências deletérias às diversas áreas sociais, inclusive na saúde.
Ademais, o capitalismo selvagem deteriora as relações sociais e esvazia a
noção de direitos, desvinculando-os do parâmetro de justiça e igualdade. Por
consequência, a contenção do avanço desenfreado do capital representa
condição sine qua non para a implantação de um sistema público de saúde
inclusivo, igualitário e que propicie atendimento integral à população.
154
REFERÊNCIAS:
155
ARILHA, Margareth; LAPA, Thaís de Souza; PISANSESCHI, Tatiane Crenn.
Transexualidade, travestilidade e direito à saúde. São Paulo, Comissão de
Cidadania e Reprodução. São Paulo: editora, CCR, 2010.
156
BARCELLOS, T. M. (coord.). A Política Social Brasileira: 1930-1964. Porto
Alegre: Fundação de Economia e Estatística, 1983.
157
Saúde. Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde. Portaria. N° 675/GM/ 2006.
31 de março de 2006.
BRASIL. Ministério da Saúde. Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde. 2006.
Disponível em
http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/cartilha_integra_direitos. Ultimo
acesso em 12 de novembro de 2013.
BUTLER, J. Cuerpos que importan. Sobre los límites materials y discursivos del
"sexo". Buenos Aires: Paidós, 2002.
158
Movimentos Sociais, educação e sexualidades. Rio de Janeiro: Garamond,
2005.
159
DANIEL, H. & PARKER, R. AIDS – A Terceira Epidemia. São Paulo: Iglu, 1991.
DINIZ, M. H. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. I: Teoria Geral do direito civil.
São Paulo: Saraiva, 2002.
160
FLEURY TEIXEIRA, S. M. Política social e democracia: reflexões sobre o
legado da seguridade social. Cad. Saúde Pública, vol. 1, nº 04, Rio de Janeiro,
1985.
161
GALVÃO, J. AIDS no Brasil: agenda de construção de uma epidemia. Rio de
Janeiro/São Paulo, ABIA/Editora 34, 2000.
162
__________. O Serviço Social na cena contemporânea. In: Serviço Social:
Direitos Sociais e Competências Profissionais. Cortez, 2010.
163
sobrinha: a saúde no fio da história. Rio de Janeiro: FioCruz/COC;
FioCruz/EPSJV, 2010.
164
MERHY, E. & QUEIROZ, M. S. Saúde Pública, Rede Básica e o Sistema de
Saúde Brasileiro. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1993.
165
__________. Portaria nº 1.707/GM, de 18 de agosto de 2008. Institui, no
âmbito do SUS, o Processo Transexualizador, a ser implantado nas unidades
federadas, respeitadas as competências das três esferas de gestão. Diário
Oficial da União, Brasília, DF, 19 de agosto de 2008(a).
NERY, J.W. Erro de Pessoa: Joana ou João? Record, Rio de Janeiro, 1984.
166
NUNES, E. D. Saúde Coletiva: história e paradigmas. Aula Inaugural proferida no
Curso de Pós-Graduação de Medicina Preventiva. Faculdade de Medicina,
Universidade de São Paulo, 7 de março de 1997, com adaptações.
167
PRINCÍPIOS DE YOGYAKARTA. Princípios a Aplicação da Legislação
Internacional de Direitos Humanos em Relação à Orientação Sexual e
Identidade de Gênero. Tradução: Jones de Freitas, Observatório de
Sexualidade e Política, julho de 2007.
168
1998. Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
311X1998000600012. Último acesso em 21de julho de 2013.
SILVA, M. A. da: “Este corpo não te pertence!” Algumas reflexões sobre saúde
e doença na modernidade – O caso do “Homossexualismo”, Santa Catarina,
2006. Disponível em: http://br.monografias.com/trabalhos912/este-corpo-
nao/este-corpo-nao.pdf. Último acesso em 11de março de 2014.
169
TREVISAN, J. Devassos no paraíso. 4ª edição. Rio de Janeiro, Record, 1986.
170
6 – ANEXOS:
ANEXO I
171
determinado pelo participante e terão duração aproximada de duas horas,
sendo conduzida pelo pesquisador responsável e com registro de áudio. Seu
conteúdo restringe-se a elementos que compõem a história do processo
transexualizador no Estado do Rio de Janeiro.
Os dados obtidos por meio desta pesquisa serão confidenciais e não
serão divulgados em nível individual, visando assegurar o sigilo de sua
participação. O pesquisador responsável compromete-se a tornar públicos nos
meios acadêmicos e científicos os resultados obtidos de forma consolidada,
sem qualquer identificação dos indivíduos participantes.
Caso você concorde em participar da pesquisa, assine ao final deste
documento, em duas vias, sendo uma delas sua e a outra do pesquisador
responsável e coordenador da pesquisa.
Seguem os telefones e o endereço institucional do pesquisador
responsável e do Comitê de Ética em Pesquisa – CEP, onde você poderá tirar
suas dúvidas sobre o projeto e sua participação nele, agora ou a qualquer
momento.
Contatos do pesquisador responsável: Mably Trindade, mestranda do
PPGSS/UERJ. Endereço: Rua São Francisco Xavier, 524 – sala 9002,
Maracanã, Rio de Janeiro, CEP 20559-900. E-mail: mablytrindade@gmail.com;
Telefones: (21) 2334-0299, ramal: 216 / (21) 9388-3916.
Comissão de Ética em Pesquisa – SR2 da UERJ: Rua São Francisco
Xavier, 524, Sala 3018, Bloco E. Cep: 20550-900. Tel: (21)2334-2180. E-
mail: etica@uerj.br
Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha
participação na pesquisa, e que concordo em participar.
________________________________
172
ANEXO II
173
Bloco II – Memória do(a) entrevistado(a) sobre a trajetória do programa
em que esteve inserido
1) O que sabe sobre a origem do Processo Transexualizador no Brasil
(quais foram as primeiras instituições e profissionais envolvidos, onde,
etc.?
2) O que sabe sobre a origem do programa em que foi usuário(a) ou do
qual tomou conhecimento como ativista (quais os sujeitos envolvidos,
em que período, a partir de quais motivações etc.): profissionais que
coordenavam e compunham a equipe na época; como era conduzido o
trabalho (funcionamento, critérios, horários, onde funcionava,
periodicidade, atividades realizadas, incluindo reuniões, discussões de
caso, pesquisas etc.); serviços que eram oferecidos(as) a pessoas
transexuais naquela unidade de saúde; número médio de pessoas
atendidas; recursos materiais e humanos dos quais a equipe dispunha;
origem dos recursos financeiros do programa; motivações da equipe
para trabalhar com o tema; compreensão de transexualidade que a
equipe transparecia; existência de profissionais de diferentes categorias
envolvidos(as); características principais das pessoas que ingressavam
no programa (homens ou mulheres, naturalidade, classe social etc.);
maior dificuldade que uma pessoa transexual enfrentava naquele
momento; tempo médio em que uma pessoa transexual era
acompanhada antes e depois de cirurgias.
3) Descrever pelo menos uma das situações vividas como usuário(a) na
relação com os profissionais do programa que ficaram na lembrança.
174
ANEXO III
175
Bloco II – Memória do(a) entrevistado(a) sobre a trajetória do programa
em que esteve inserido
176
4) Sofreu ou viu alguém da equipe sofrer alguma discriminação dentro e
fora do hospital quando trabalhou com essa população? Se sim, por
parte de quem?
5) Razão pela qual deixou de atuar no programa (se for o caso).
6) Aspectos positivos e negativos relacionados à atuação no programa.
7) Dificuldades enfrentadas pela equipe para realizar o trabalho.
8) Qualidade do conhecimento que tem sobre as razões pelas quais
aquele serviço foi interrompido.
9) Voltaria a trabalhar com este público no Processo Transexualizador,
se tivesse oportunidade (Sim, não, razões).
177
ANEXO IV
Ministério da Saúde
Gabinete do Ministro
Considerando que a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, instituída pela
Portaria nº 675/GM, de 31 de março de 2006, menciona, explicitamente, o
direito ao atendimento humanizado e livre de discriminação por orientação
sexual e identidade de gênero a todos os usuários do Sistema Único de Saúde
(SUS);
178
Considerando a pactuação ocorrida na Reunião da Comissão Intergestores
Tripartite - CIT do dia 31 de julho de 2008, resolve:
179
ANEXO V
Ministério da Saúde
Secretaria de Atenção à Saúde
180
- Anexo II: Formulário de Vistoria do Gestor para Classificação e
Credenciamento/Habilitação de Unidade de Atenção Especializada no
Processo Transexualizador;
- Anexo III: "Diretrizes de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador"; e
- Anexo IV: Relação dos Serviços com expertise, Habilitados para a realização
dos procedimentos previstos no Processo Transexualizador.
181
e, ainda, adotem as providências necessárias para que haja a articulação
assistencial entre os serviços e, considerem na distribuição geográfica das
Unidades de Assistência os parâmetros a seguir:
I- ter base territorial de atuação definida por Macroregião;
II- população a ser atendida, conforme os parâmetros utilizados na
Programação Pactuada Integrada - PPI;
III- necessidade de cobertura assistencial;
IV- mecanismos de acesso com os fluxos de referência e contra referencia;
V- capacidade técnica e operacional dos serviços; e
VI- Expertise confirmada dos serviços e equipe.
§1º Para fins de credenciamento de que trata o caput deste Artigo, deverão ser
utilizadas/seguidas as Normas de Credenciamento/ Habilitação de Unidade de
Atenção, referência para a realização dos procedimentos para a Atenção aos
indivíduos com indicação para a realização do Processo Transexualizador,
conforme estabelecido no Anexo I desta Portaria.
182
§3º O credenciamento/habilitação da Unidade de Atenção Especializada será
realizado nos limites orçamentários previstos para o exercício financeiro pelo
Ministério da Saúde.
183
Redesignação sexual.
184
Art. 10 - Criar o procedimento específico para cirurgia de trangenitalização:
Redesignação Sexual.
185
Art. 11 - Estabelecer que os procedimentos definidos nos artigos 8º e 9º desta
Portaria serão operacionalizados no SIA/SUS, por meio de Autorização de
Procedimentos Ambulatoriais de Alta Complexidade/Custo (APAC).
186
ANEXO VI
Ministério da Saúde
Gabinete do Ministro
Considerando a decisão judicial transitada em julgado proferida nos autos da Ação Civil
Pública nº 2001.71.00.026279-9/RS, que versa sobre a implantação no SUS de cirurgias de
readequação sexual;
187
Considerando a Resolução nº 2, de 6 de dezembro de 2011, da Comissão Intergestores
Tripartite (CIT), que estabelece estratégias e ações que orientam o Plano Operativo da Política
Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais no âmbito
do SUS;
Art. 3º A linha de cuidado da atenção aos usuários e usuárias com demanda para a
realização das ações no Processo Transexualizadoré estruturada pelos seguintes
componentes:
188
Art. 4º A integralidade do cuidado aos usuários e usuárias com demanda para a
realização das ações no Processo Transexualizador no Componente Atenção Básica será
garantida pelo:
Art. 5º Para garantir a integralidade do cuidado aos usuários e usuárias com demanda
para a realização das ações no Processo Transexualizador no Componente Atenção
Especializada, serão definidas as seguintes modalidades:
Art. 7º Fica definido que, para fins de habilitação no Componente Atenção Especializada
no Processo Transexualizador, os gestores de saúde interessados deverão cumprir as Normas
de Habilitação previstas no anexo I, conforme modalidade assistencial ambulatorial e/ou
hospitalar do estabelecimento de saúde a ser habilitado, e encaminhar à Coordenação-Geral de
Média e Alta Complexidade (CGMAC/DAET/SAS/MS):
189
Parágrafo único. Os estabelecimentos abaixo descritos mantêm-se habilitados em
Unidade de Atenção Especializada no Processo Transexualizador e terão o prazo máximo de
12 (doze) meses contado da data de publicação desta Portaria para adequação conforme
descrito no "caput" deste artigo:
UF MUNICÍPIO CNES ESTABELECIMENTO - RAZÃO SOCIAL
Hospital de Clínicas de Porto Alegre - Universidade
RS Porto Alegre 2237601 Federal do Rio Grande do Sul/ Porto Alegre (RS)
Universidade Estadual do Rio de Janeiro - HUPE
RJ Rio de Janeiro 2269783 Hospital Universitário Pedro Ernesto/ Rio de
Janeiro(RJ)
Fundação Faculdade de Medicina HCFMUSP - Inst.
SP São Paulo 2812703 de Psiquiatria Fundação Faculdade de Medicina
MECMPAS/ São Paulo (SP)
Hospital das Clinicas - Hospital das Clínicas da
GO Goiânia 2338424 Universidade Federal de Goiás/ Goiânia (GO)
Art. 10. Os procedimentos da modalidade ambulatorial e hospitalar serão realizados
exclusivamente nos estabelecimentos de saúde habilitados nos Códigos 30.01, 30.02, 30.03
respectivamente.
III - para habilitação nos Códigos 30.02 e 30.03, cumprir as exigências do anexo I e
encaminhar formulário de vistoria do anexo II, ambos das modalidades ambulatorial e
hospitalar.
Art. 12. O acesso aos procedimentos cirúrgicos de que trata esta Portaria será regulado
por meio da Central Nacional de Regulação de Alta Complexidade (CNRAC), quando houver
ausência ou insuficiência do recurso assistencial no Estado de origem, cabendo ao
Departamento de Regulação, Avaliação e Controle de Sistemas (DRAC/SAS/MS) adotar as
providências cabíveis para sua operacionalização.
190
153 Atenção 001 Acompanhamento 1
Especializada no Clínico, pré e pós-
Processo operatório e
Transexualizador hormonioterapia.
Médico
225133
psiquiatra
Médico
225155 Endocrinologista
225125 Médico Clínico
223505 Enfermeiro
251510 Psicólogo
Assistente
251605
Social
2
251510 Psicólogo
Médico
225155 Endocrinologista
225125 Médico Clínico
223505 Enfermeiro
Assistente
251605
Social
002 Cirurgia e 3 Médico
Acompanhamento 225250 ginecologista
pré e pós- obstetra
operatório.
Médico Cirurgião
225235
Plástico
223505 Enfermeiro
Médico
225133 psiquiatra
Médico
225155
Endocrinologista
Médico
225285 Urologista
Assistente
251605 Social
4
Médico
225285
Urologista
Médico
225250 ginecologista
obstetra
191
Médico Cirurgião
225235 Plástico
223505 Enfermeiro
251510 Psicólogo
Médico
225155 Endocrinologista
Assistente
251605 Social
Art. 14. Ficam incluídos na Tabela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS os
procedimentos a seguir:
03.01.13.004-3 - Acompanhamento do usuário(a) no processo
Procedimento:
transexualizador exclusivo nas etapas do pré e pós-operatório
Consiste no acompanhamento mensal de usuário(a) no Processo
Transexualizador, no máximo dois atendimentos mensais, durante
no mínimo de 2 (dois) anos no pré-operatório e por até 1 ano no
Descrição: pós-operatório.
Origem SIGTAP 03.01.13.002-7
Complexidade: MC - Média Complexidade
Modalidade: 01 - Ambulatorial
Instrumento de Registro: 02 - BPA-I (Individualizado)
Tipo de Financiamento: 04 - Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC)
Sexo: Ambos
Valor Ambulatorial SA: R$ 39,38
Valor Ambulatorial Total: R$ 39,38
Valor Hospitalar SP: R$ 0,00
Valor Hospitalar SH: R$ 0,00
Valor Hospitalar Total: R$0,00
Idade Mínima: 18 Ano(s)
Idade Máxima: 75 Ano(s)
Quantidade Máxima: 02
225133, 225155, 225250, 225285, 251510, 225235, 251605,
CBO: 223810,, 225125.
CID: F64.0
153/001 - (Serviço de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador) Acompanhamento Clínico, pré e pós-operatório
Serviço/classificação:
e hormonioterapia; 153/002 (Cirurgia e Acompanhamento pré e
pós-operatório).
Habilitação: 30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador; 30.02 - Atenção Especializada no Processo
Transexualizador realizando Acompanhamento Clínico, pré e pós-
operatório e hormonioterapia; 30.03 Atenção Especializada no
Processo Transexualizador realizando Cirurgias e
Acompanhamento Pré e Pós-Operatório
192
Consiste na utilização de terapia medicamentosa hormonal
Descrição: disponibilizada mensalmente para ser iniciada após o diagnóstico
no Processo Transexualizador (estrógeno ou testosterona).
Origem SIGTAP 03.03.03.007-0
Complexidade: MC - Média Complexidade
Modalidade: 01 - Ambulatorial
Instrumento de Registro: BPA-I (Individualizado)
Tipo de Financiamento: 04 - Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC)
Valor Ambulatorial SA: R$ 50,00
Valor Ambulatorial Total: R$ 50,00
Sexo: Ambos
Idade Mínima: 18 Ano(s)
Idade Máxima: 75 Ano(s)
Quantidade Máxima: 01
CBO: 225155, 225250, 225285, 225125
CID: F64.0 e F64.9
153/001 - (Serviço de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador) - Acompanhamento Clínico, pré e pós-
Serviço/Classificação: operatório e hormonioterapia.
30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador; 30.02 Atenção Especializada no Processo
Habilitação:
Transexualizador, realizando Acompanhamento Clínico, pré e
pós-peratório e hormonioterapia.
193
Especialidade do Leito: 01 - Cirúrgico
CBO: 225235, 225285, 225250
CID: F64.0
153/002 - (Serviço de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador). Cirurgia e Acompanhamento clínico pré e pós-
Serviço / Classificação: operatório.
Habilitação: 30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador; 30.03. - Atenção Especializada no Processo
Transexualizador realizando cirurgias e acompanhamento pré e pós -
operatório
194
redesignação sexual no processo transexualizador.
Consiste na terapia medicamentosa hormonal a ser disponibilizada
Descrição: mensalmente no período de 2 anos que antecede a cirurgia de
redesignação sexual no Processo Transexualizador (ciproterona).
Complexidade: MC - Média Complexidade
Modalidade: 01 - Ambulatorial
Instrumento de Registro: 02 - BPA-I (individualizado)
Tipo de Financiamento: 04 - Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC)
Valor Ambulatorial SA: R$ 65,52
Valor Ambulatorial Total: R$ 65,52
Sexo: Masculino
Idade Mínima: 18 Ano(s)
Idade Máxima: 75 Ano(s)
Quantidade Máxima: 01
CBO: 225155, 225250, 225285, 225125
CID: F64.0 e F64.9
153/001 - (Serviço de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador). Acompanhamento Clínico, pré e pós-operatório e
Serviço/Classificação: hormonioterapia.
30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador 30.02 - Atenção Especializada no Processo
Transexualizador realizando Acompanhamento Clínico, pré e pós-
Habilitação: operatório e hormonioterapia.
195
Especialidade do
01 - Cirúrgico
Leito:
CBO: 225235, 225250, 225255
CID: F64.0
Serviço / 153/002 - (Serviço de Atenção Especializada no Processo
Classificação: Transexualizador). Cirurgia e Acompanhamento pré e pós-operatório.
30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador 30.03 - Atenção Especializada no Processo
Transexualizador realizando cirurgias e acompanhamento pré e pós -
Habilitação: operatório.
196
clitóris e tratamento de deiscências e fístulectomia.
Complexidade: AC - Alta Complexidade
Modalidade: 02 - Hospitalar
Instrumento de
03 - AIH (Proc. Principal)
Registro:
Tipo de
04 - Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC)
Financiamento:
Valor Hospitalar SP: R$ 214,67
Valor Hospitalar SH: R$ 183,38
Valor Hospitalar
R$ 398,05
Total:
Atributo
Complementar: 001 - Inclui valor da anestesia, 004 -Admite permanência à maior
Sexo: Ambos
Idade Mínima: 21 Ano(s)
Idade Máxima: 75 Ano(s)
Quantidade Máxima: 01
Média Permanência: 05
Pontos: 270
Especialidade do
01 - Cirúrgico
Leito:
CBO: 225235, 225285, 225250
CID: F64.0
153/002 - Serviço de Atenção Especializada no Processo
Serviço /
Transexualizador). Cirurgia e Acompanhamento clínico pré e pós-
Classificação:
operatório.
30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador 30.03 - Atenção Especializada no Processo
Habilitação:
Transexualizador realizando cirurgias e acompanhamento pré e pós -
operatório.
197
Idade Máxima: 110 Ano(s)
Quantidade Máxima: 01
CBO: 225133, 225155, 251510, 251605,223810,
CID: F64.0, F64.9
153/001 - (Serviço de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador). Acompanhamento Clínico, pré e pós-operatório
Serviço/classificação: e hormonioterapia.
30.01 - Unidade de Atenção Especializada no Processo
Transexualizador 30.02 - Atenção Especializada no Processo
Transexualizador realizando acompanhamento Clínico, pré e pós-
Habilitação: operatório e hormonioterapia.
198
30.03 - Atenção Especializada no Processo Transexualizador realizando
Cirurgias e acompanhamento pré e pós - operatório.
§ 1º Os procedimentos de Código 03.01.13.004-3 - Acompanhamento do usuário(a) no
processo Transexualizador exclusivo nas etapas do pré e pós-operatório e Código
03.01.13.003-5 - Acompanhamento de usuário(a) no Processo Transexualizador
exclusivamente para atendimento clinico de que trata este artigo são excludentes entre si.
I - a hormonioterapia que trata esta Portaria será iniciada a partir dos 18 (dezoito) anos
de idade do paciente no processo transexualizador; e
Art. 16. Os procedimentos descritos nesta Portaria poderão ser realizados somente nos
estabelecimentos de saúde habilitados pelo Ministério da Saúde para prestar Atenção
Especializada no Processo Transexualizador, conforme normas de habilitação estabelecidas
nos anexos a esta Portaria.
Art. 17. Os recursos financeiros para o custeio das atividades de que trata esta Portaria
são oriundos do orçamento do Ministério da Saúde, devendo onerar o Programa de Trabalho
10.302.2015.8585 - Atenção à Saúde da População para Procedimentos de Média e Alta
Complexidade.
Art. 18. Ficam aprovadas, na forma dos anexos a esta Portaria, as normas de habilitação
e formulários de vistoria do Processo Transexualizador no âmbito do SUS:
Art. 19. Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, com efeitos operacionais
na competência seguinte.
199
ALEXANDRE ROCHA SANTOS PADILHA
ANEXO I
O processo de habilitação, ao ser formalizado pelo respectivo Gestor do SUS, deverá ser
instruído com:
1.5. Caso a avaliação seja favorável, a Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) tomará as
providências para a publicação da habilitação.
b. Anamnese;
d. Evolução;
e. Prescrição;
200
f. Exames laboratoriais e de imagem necessários ao processo transexualizador na
modalidade ambulatorial; e
201
1.10. Materiais e Equipamentos:
O processo de habilitação, ao ser formalizado pelo respectivo Gestor do SUS, deverá ser
instruído com:
202
2.4. O Ministério da Saúde avaliará o formulário de vistoria do anexo II dessa portaria
encaminhado pela Secretaria de Estado da Saúde, podendo proceder a vistoria "in loco" para
conceder a habilitação do estabelecimento de saúde em Atenção Especializada no Processo
Transexualizador - modalidade hospitalar.
2.5. Caso a avaliação seja favorável, a Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) tomará as
providências para a publicação da habilitação.
b. Anamnese;
d. Evolução;
e. Prescrição;
f. Exames; e
Outros registros a constarem nos prontuários, tais como: descrição de cirurgia, fichas de
infecção e acompanhamento ambulatorial.
203
Urologia ou Ginecologia ou Cirurgia Plástica e comprovada por certificado de Residência
Médica reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC) ou título de especialista registrado no
Conselho Regional de Medicina;
204
c. Realizar tipagem sanguínea e tratamento hemoterápico, inclusive para complicações
hemorrágicas;
ANEXO II
(Este formulário deve ser preenchido e assinado pelo Gestor e não deve ser modificado
e/ou substituído)
I. MODALIDADE AMBULATORIAL:
____________________________________________ __
ENDEREÇO: ___________________________________
CEP:_____________TELEFONES: ( ) ___________
FAX: ( ) _________________________________________
E-MAIL: ________________________________________
DIRETOR TÉCNICO:
205
__________________________________
E-MAIL: _________________________________________
TIPOS DE ASSISTÊNCIA:
( ) Ambulatorial
( ) Internação
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
2. ESTRUTURA ASSISTENCIAL
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
c) acompanhamento clínico.
( ) Sim ( ) Não
206
( ) Sim ( ) Não
e) hormonioterapia
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
g) possui um prontuário único para cada paciente que possua todos os tipos de
atendimento a ele referentes, contendo as informações completas do quadro clínico e sua
evolução, todas devidamente escritas, de forma clara e precisa, datadas e assinadas pelo
profissional responsável pelo atendimento:
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) 01 psiquiatra ou psicólogo
( ) 01 assistente social;
( ) 01 enfermeiro.
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
207
( ) Sim ( ) Não
CNPJ: __________________________
CNES:_______________
ENDEREÇO: ___________________________________
CEP:_____________TELEFONES: ( ) ___________
FAX: ( ) _________________________________________
E-MAIL: ________________________________________
DIRETOR TÉCNICO:
__________________________________
E-MAIL: _________________________________________
TIPOS DE ASSISTÊNCIA:
( ) Ambulatorial
( ) Internação
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
) Sim ( ) Não
208
2. ESTRUTURA ASSISTENCIAL
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
g) possui um prontuário único para cada paciente que inclua todos os tipos de
atendimento a ele referente (cirurgias e acompanhamento pré e pós-operatório), contendo as
informações completas do quadro clínico e sua evolução, todas devidamente escritas, de forma
clara e precisa, datadas e assinadas pelo profissional responsável pelo atendimento.
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não ( )
( ) Sim ( ) Não
209
( ) enfermeiros (dimensionados conforme Resolução COFEN 293/2004);
( ) 01 psiquiatra ou 01 psicólogo;
( ) 01 endocrinologista;
( ) 01 assistente social.
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
210
t) possui acesso às Centrais de Regulação para encaminhamento dos casos de maior
complexidade:
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
DATA:_____/__________/__________
-----------------------------
211
ANEXO VII
212
CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na Sessão Plenária de 10 de
setembro de 1997,
RESOLVE:
5.
3) permanência desse distúrbio de forma contínua e consistente por,
no mínimo, dois anos;
213
ANEXO VIII
214
CONSIDERANDO que o espírito de licitude ética pretendido visa
fomentar o aperfeiçoamento de novas técnicas, bem como estimular a
pesquisa cirúrgica de transformação da genitália e aprimorar os
critérios de seleção;
RESOLVE:
215
Art. 4º Que a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo
obedecerá a avaliação de equipe multidisciplinar constituída por
médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente
social, obedecendo os critérios abaixo definidos, após, no mínimo, dois
anos de acompanhamento conjunto:
1. Diagnóstico médico de transgenitalismo;
2. Maior de 21 (vinte e um) anos;
3. Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia.
216
ANEXO IX
217
secundários não constitui crime de mutilação previsto no artigo 129 do
Código Penal brasileiro, haja vista que tem o propósito terapêutico
específico de adequar a genitália ao sexo psíquico;
218
são atos médicos em sua essência;
RESOLVE:
219
2) Maior de 21 (vinte e um) anos;
Presidente Secretário-geral
220
ANEXO X
221
consequentemente, na naturalização da invisibilidade das práticas afetivo-
sexuais entre pessoas do mesmo sexo;
RESOLVE:
222
Art. 4º - É vedado ao assistente social a utilização de instrumentos e técnicas
para criar, manter ou reforçar preconceitos, estigmas ou estereótipos de
discriminação em relação a livre orientação sexual;
Elisabete Borgianni
Presidente do CFESS
223
ANEXO XI
224
meios médicos, cirúrgicos ou outros) e outras expressões de gênero, inclusive
vestimenta, modo de falar e maneirismos” (Princípios de Yogyakarta, 2006).
RESOLVE:
Art. 1º. Fica assegurado às pessoas travestis e transexuais, nos termos desta
resolução, o direito à escolha de tratamento nominal a ser inserido na Cédula e
na Carteira de Identidade Profissional, bem como nos atos e procedimentos
promovidos no âmbito do CFESS e dos CRESS;
225
Art. 3º. Fica permitida a utilização do nome social nas assinaturas decorrentes
do trabalho desenvolvido pelo(a) assistente social, juntamente com o número
do registro profissional.
Art. 6º. Os casos omissos serão resolvidos pelo Conselho Pleno do CFESS.
226